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SUMÁRIO

I  PENSAMENTO TEOLÓGICO ........................................................................2


II - MARCO HISTÓRICO - PALESTINA............................................................11
III - FONTES PARA O CONHECIMENTO DA PESSOA DE CRISTO..............15
IV  O EVANGELHO...........................................................................................18
VI  EVANGELHOS SINÓTICOS.......................................................................20
VII  OS EVANGELHOS E A PESSOA DE JESUS............................................22
VIII  DIVISÃO LITERÁRIA DO MINISTÉRIO DE JESUS.............................22
IX  O EVANGELHO DE MARCOS...................................................................23
X  O EVANGELHO DE MATEUS.....................................................................29
XI  O EVANGELHO DE LUCAS.......................................................................39
XII  O EVANGELHO DE JOÃO........................................................................47
CRISTO E OS EVANGELHOS

I  PENSAMENTO TEOLÓGICO  Messianismo

A  O Cristianismo apostólico emergiu no I século AD como uma das


facções do Judaísmo.1 Neste período a religiosidade judaica tornara-se destituída
de sentido espiritual, por terem feito das ordenanças do templo um fim em si
mesmas. O sacerdócio por sua vez corrompera-se pela “fraude, suborno e até pelo
homicídio.”2 Contudo entre o povo judeu percebia-se nesse período um
movimento reavivalista da esperança messiânica. Havia uma expectativa da vinda
do Messias como um libertador da nação. Até mesmo entre os gentios
levantaram-se homens que, tendo acesso à Escritura, anunciaram o Messias como
o libertador do pecado.3

1  O Cristianismo primitivo surgiu como um movimento


religioso com base no cumprimento das profecias messiânicas. Havia um senso
que a vinda do Messias estava às portas e que chegara a plenitude do tempo (Gl
4:4), conforme previam as profecias de Daniel 9:24-27.4 A liderança judaica,
entretanto, se opôs à mensagem profética e evangélica do Cristianismo e terminou

1
Esta ligação do Judaísmo eo Cristianismo é evidente em diversos
aspectos: (1) o templo era um lugar de culto comum, (2) a presença de grande
número de sacerdotes e fariseus entre os primeiros cristãos, (3) Paulo observa um
rito judaico no final de sua terceira viagem, (4) as sinagogas continuaram sendo
local de adoração e evangelização também para os cristãos, (5) os primeiros
líderes do cristianismo eram de origem judaica, (6) o Antigo Testamento era a
Palavra de Deus comum aos dois grupos. Ver: Jacques Doukhan, Drinking at the
Sources (Mountain View, CA:Pacific Press Publishing Association, 1981), 41;
Richard L. Niswonger, New Testament History (Grand Rapids, MI: Zondervan,
1992), 53, 61-69, 190-191; Merril C. Tenney, New Testament Times (Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1971), 67, 183-185; W. H. C. Frend, The Early Church
(Philadelphia: Fortress Press, 1982), 25.
2
Ellen G. White, O desejado de todas as nações, 17ª ed. (Tatuí, SP: Casa
Publicadora Brasileira, 1990), 23-27.
3
Ibid., 28-32.
4
Justo gonzález, Uma história ilustrada do Cristianismo, 3ª ed. (São
Paulo: Vida Nova, 1986), 1:15, 19; E. G. White, O desejado de todas as nações,
31-32. Há evidências históricas que o primeiro dia/ano foi usado na literatura
judaica para prever a vinda do Messias: (1) 70 semanas proféticas, (2) nos 10
jubileus, estes períodos aparecem nos Testamentos de Levi, em 1Enoque, na
literatura de Qumram, nos intérpretes rabínicos, na literatura apocalíptica pseudo-
epígrafa. Ver: William Shea, “Year-Day Principle  Part 2,” em: Frank B.
Holbrook, Selected Studies on PropheticInterpretation (Hagerstown, MD: Review
and Herald, 1982), 89-115.
por rejeitar o Messias, causando entre outros motivos a separação entre o
Judaísmo e o Cristianismo.1

2  Os primeiros cristãos e os judeus estavam identificados pela


mesma origem étnica e pela mesma fonte de revelação, o Antigo Testamento. A
mensagem neotestamentária fundamentava-se nas promessas da aliança e na ética
dadas por Deus ao povo israelita no decorrer de sua história. Após a ressurreição
de Jesus, entretanto, os cristãos passaram a Ter uma nova compreensão do
significado das profecias messiânicas. Para eles o Nazareno era o Messias
Sofredor ressurrecto, que ascendeu aos céus como Salvador e Mediador da nova
aliança. Esta verdade era nova para o povo judeu, que aguardava um Messias Rei,
libertador político do jugo romano.

3  Essa mensagem evangélica tornou-se o conteúdo da missão


da Igreja. No cumprimento dela os primeiros cristãos cresceram numérica e
territorialmente. Estabeleceram-se primeiramente em Jerusalém. A expressão
“enchestes Jerusalém de vossa doutrina” (At 5:28), retrata a penetração da
mensagem cristã na sociedade judaica. A estimativa da população de Jerusalém
nesses dias era de aproximadamente 44.000 pessoas,2 e os relatos bíblicos do
número de judeus convertidos aos cristianismo alcançou a grande maioria dessa
população (At 2:41; 4:4, 47; 6:7; 21:20). Por outro lado, com a perseguição
registrada em Atos 8 os cristãos se dispersaram além da Judéia e conquistaram
novos territórios. Samaria, Jope, Damasco, Fenícia, Chipre, Antioquia e Roma
foram progressivamente alcançadas. O zelo missionário da Igreja Apostólica a
conduziu até aos limites mais distantes do Império, possivelmente até a Índia.3

1
As sanções do governo romano contra o Judaísmo, desde o governo de
Claúdio em 49 AD e a insistência na observância literal de regulamentos mosaicos
levaram os cristãos a se separarem dos judeus, e a começarem a evitar práticas
religiosas judaicas, adotandoprogressivamente posturas religiosas pagãs. Ver:
Samuel Bacchiocchi, Do Sábado para o Domingo ([São Paulo: Samuel
Rodrigues], s.d.), 3:23-24, 58-97; 5:53-56; González, Uma história ilustrada do
Cristianismo, 1:49-52.
2
Niswonger, 191. F. F. Bruce estima que a população poderia variar
entre 25.000 e 55.000. Ver: F. F. Bruce, The Acts of the Apostles: The Greek with
Intorduction and Commentary, 3ª ed. (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1990), 445.
3
Henry C. Sheldon, History of the Christian Church (Peabody, MA:
Hendrikson, 1988), 1:17-21; Niswonger, 279-280; González, Uma história
ilustrada do Cristianismo, 1:37-47; Frend, 24-27. Diversos fatores contribuíram
para a expansão do Cristianismo: (1) o inclusivismo cristão contrastado com o
exclusivismo judeu, (2) a proteção legal que o Judaísmo legou ao Cristianismo
por diversos anos, (3) a falência do sistem religioso e filosófico romano, (4) o uso
do grego como língua internacional, (5) as estradas romanas e a política de paz do
Império, (6) a existência da LXX. Ver: Niswonger, 282-283.

3
4  Neste processo os primeiros cristãos sofreram infiltrações do
gnosticismo helênico1 do autoritarismo romano2 e do monosteísmo ético judaico.3
Estes três fatores contribuíram para o surgimento de divergências internas no
Cristianismo apostólico, fazendo emergir as diversas crises do primeiro século que
afetaram a vida cristã da época e o exercício da tarefa missionária.

5  As reações dos discípulos diante do julgamento e crucifixão


de Jesus Cristo retratam o profundo desapontamento de que foram vítimas,
quando viram suas mais acariciadas expectativas serem frustradas.

B  A Esperança Messiânica

1  A esperança messiânica tem sido uma das características


distintivas do povo judeu através de toda sua história (Gn 3:15; Gn 12:7; Gl
3:16).4 Foram contudo, as ocupações estrangeiras na Palestina a partir do Exílio
Babilônico que reavivaram mais intensamente essa esperança messiânica da vinda
de um rei da dinastia davídica, cujo surgimento traria libertação para a nação
escravizada.5 A crença judaica, desde então, que o Messias deveria vir para
libertar o povo de Israel logo após um severo período de sofrimento da nação,
fortaleceu-se.6 A insurreição dos Macabeus contra a política selêucida de
helenização, com a subseqüente vitória asmoneana (165 AC), teve conotações

1
William F. Albright, From the Stone Age to Christianity (Garden City,
NY: Anchor Books, 1957), 337; Simon Prince, “The History of the Helenistic
Period,” em: John Broadman, Jasper Griffin e Oswyn Murray, eds., The Oxford
History of the Classical World (Oxford: Oxford University Press, 1993), 323-325;
Russel Norman Champlin, O Novo Testamento interpretado versículo por
versículo (Guaratinguetá, SP: A Voz Bíblica, s.d.), 1:134-135; Justo González,
Uma história ilustrada do Cristianismo, 1:16-17; Niswonger, 79-85, 248-250.
2
Tenney, New Testament Times, 48-71; Henry Chadwick, “Envoy: On
Taking Leave of Antiquity,” em: Broadman, Griffin e Murray, eds. The Oxford
History of the Classical World, 808, 821-822; Will Durant, História da civilização
(São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1957), 7:35, 344-347; Earle E. Cairns,
O Cristianismo através dos séculos (São Paulo: Vida Nova, 1992), 51; Kenneth
Scott Latourette, A History of Christianity (New York: Harper & Brothers, 1953),
1:81-91, 112-188.
3
Bruce, The Acts of the Apostles, 22-23, 190-194.
4
R. J. Zwi Werblowski, “O Messianismo da História Judaica,” em: J.
Guinsburg, ed., Vida e valores do povo judeu (São Paulo: Editora Perspectiva,
1972), 27; AbrahanCohen, Everyman’sTalmud (New York: Schocken Books,
1975), 347.
5
Lester L. Grabbe, Judaism from Cyrus to Hadrian (Minneapolis, MS:
Fortress Press, 1992), 2:552, 579; Doron Mendels, The Rise and Fall of Jewish
Nationalism (New York: Doubleday, 1992), 227-228.

4
messiânicas. Era então comum a esperança de uma “gloriosa restauração
nacional” sob um rei da dinastia davídica.1

2  A literatura rabínica a partir do Segundo Templo


caracterizava-se por um significado marcadamente escatológico.2 Na literatura
apócrifa e pseudoepígrafa o messianismo tornou-se o tema principal da teologia
judaica. A iminente vinda do Messias com seu curto domínio introduziria o reino
de Deus que significava, por sua vez, a exaltação e libertação do povo judeu. A
crença messiânica presente na literatura judaica, estabelecida a partir de Zorobabel
(586 AC), permaneceu viva até a revolta de Bar Kokhba (135 AD), que foi
considerado Messias pelo Rabi Akiva.3

3  Durante os quase 600 anos de dominação estrangeira (605-


31 AC), em especial sob o domínio romano, a esperança messiânica adquiriu um
forte caráter político-militar nacionalista. Esta visão florescia na Palestina no I
século AD.4

4  O Novo Testamento evidencia que os discípulos de Cristo


incorporaram a crença messiânica de seus dias. A constante luta entre eles por
hegemonia (Mt 18:1-5; Mr 9:33-37), o interesse de terem uma posição de
destaque no novo governo de Cristo (Mt 20:20-28; Mr 10:35-45), a incapacidade
contumaz de entenderem o aspecto profético do Messias-Sofredor (Mr 9:30-32) e
o desespero de verem suas expectativas frustradas, demonstravam que eles

Samuel Sandmel, Judaism and Christian Beginnings (New York:


6

Oxford University Press, 1978); Geoffrey Wigoder, The Encyclopedia of Judaism


(New York: MacMillan, 1989), 481-482.
1
Werblowski, 22-25.
2
Para melhor informação sobre natureza, tipos de divisão da história da
língua e literatura hebraicas, ver: Cecil Roth, ed., Biblioteca da cultura judaica
(Rio de Janeiro: Editora Tradição, 1967), 2:789-793; 5:413-424, 554-556, 9:154-
157; Donald E. Gowan, Bridge between the Testaments: A Reappraisal of ?
Judaism from the Exile to the Birth of Christianity (Pittsburg, PA: Pickwick Press,
1980), 342-369. Para compreensão do conteúdo da literatura apocalíptica, ver:
Gowan, 445-469.
3
A história do pensamento messiânico pode ser encontrada em: Wigoder,
481-483. O Rabi Akiva era considerado um dos principais mestres rabínicos da
época (132-135 AD) como é declarado em: Werblowski, 26; Jacob Neusner, ed.,
The Social World of Formative Christianity and Judaism (Philadelphia: Fortress
Press, 1988), 50-65.
4
Werblowski, 26; Sandmel, 208; Wigoder, 482; Michael Green,
Evangelização na Igreja Primitiva (São Paulo: Vida Nova, 1984), 103-115; John
R. Stott, A mensagem de Atos (São Paulo: ABU Editora, 1994), 180; Walker, 1:32;
E. P. Sander, Judaism Practice Belief 63 BCE  66 CE (London: SCM Press,
1992), 279.

5
esperavam a vinda de um Messias-Rei que libertasse politicamente a nação (Lc
24:18-21).1 Mesmo após a ressurreição de Cristo essa mentalidade estava presente
entre os mais íntimos discípulos de Cristo (At 1:6).

C  A teologia judaica, com seu conceito de unidade absoluta para


Deus, e os pensadores gnósticos, com os diversos níveis de divindade, chocaram-
se inevitavelmente com a visão cristológica da Igreja Apostólica.

1  Os dois principais conceitos sobre a Divindade que


distinguem o povo judeu da crença dos demais povos foram o monoteísmo e o
fato de Jeová não Ter forma corpórea definida. Através da sua história, o
judaísmo se caracterizou pelo monoteísmo absoluto,2 tendo como locus classicus a
expressão: “Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor” (Dt 6:4). A
crença em Deus como unidade absoluta tornou-se o mais importante dogma do
judaísmo e sua característica distintiva diante do politeísmo.3

a  Jeová além disso era crido como um ser incorpóreo,


a despeito de toda descrição antropomórfica da literatura judaica,4 e da declaração
de Êxodo 31:18: “E tendo acabado de falar com ele no monte Sinai, deu a Moisés
as duas tábuas do Testemunho, tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus.” Por
causa disso essa crença tornou-se a principal bandeira contra a idolatria, o
sincretismo e a monolatria.

b  Muito da história do povo israelita através de seus


profetas condena qualquer tentativa de simplificação ou apoucamento da natureza
divina.

2  Os primeiros seguidores do Cristianismo eram oriundos do


monoteísmo ético, que por seis séculos enraizou-se na mentalidade judaica. Além

1
A imaturidade espiritual e a incompreensão dos discípulos foi a causa da
decepção apostólica como é declarado em: Jack Dean Kingsbury, Conflict in
Mark: Jesus, Authorities, Disciples (Minneapolis, MS: Fortress Press, 1989), 95-
113; idem, Conflict in Luke: Jesus, Authorities, Disciples (Minneapolis, MS:
Fortress Press, 1991), 137-139; Cesare Cantu, História universal (São Paulo:
Editora das Américas, 1958), 6:160.

Por monoteísmo absoluto entende-se que a Divindade é formada por um


2

só Deus como unidade simples.


3
Peter C. Craigie, The Book of Deuteronomy (Grand Rapids, MI:
Eerdmans, 1976), 168-169; J. A. Thompson, Deuteronômio: introdução e
comentário, Série cultura bíblica, [Antigo Testamento], vol. 5 (São Paulo: Vida
Nova e Mundo Cristão, 1985), 117-118; Nichol, ed., Seventh-day Adventist Bible
Commentary (1978), 1:974. A crença que a Divindade é constituída de uma só
pessoa é um princípio da fé judaica registrada na Segunda lei de treze princípios
da fé de Maimônides, encontra-se em:Wigoder, 501.
4
Wigoder, 48.

6
disso, quase simultaneamente se processou, entre as diversas colônias judaicas, a
influência helênica que se tornou uma ameaça à Igreja Cristã em seus primeiros
séculos. Como conseqüências desses dois fatores o ebionismo e o gnosticismo
ameaçaram a Igreja Apostólica.

a  Os Ebionitas  Na visão do ebionismo1 Jesus Cristo


era apenas o profeta semelhante a Moisés: “o Senhor, teu Deus, te suscitará um
2

profeta do meio de ti, de teus irmãos, semelhante a mim; a ele ouvirás” (Dt 18:15,
18). Jesus era concebido apenas como figura humana, filho de José e Maria.
Criam que Cristo desceu em forma de pomba sobre Jesus por ocasião do Seu
batismo ou de Sua ressurreição,3 sem alterar sua condição de homem comum.4
Logo, a encarnação, o nascimento virginal e a divindade de Jesus eram negados
pelos ebionitas. Esses conceitos causaram um conflito inevitável com os
seguidores de Cristo.

b  O Gnosticismo  A filosofia gnóstica5 era de


natureza sincrética possuindo na sua formação as tradições da astrologia
babilônica, do dualismo persa, da escatologia e tradição sapienciais judaicas e da

1
O cristianismo judaico herético é também conhecido como ebionismo.
É neste sentido que ele é definido no presente estudo. Ver: Hagglund, 25.
2
V. L. Walter, “Ebionitas”, em: Elwell, ed., Enciclopédia histórico-
teológica da Igreja Cristã, 2:1.
3
Hagglund, 26.
4
Ibid.
5
O estudo sobre a origem do gnosticismo tem duas faces: a primeira se
estende dos pais eclesiásticos até ao século XX, que faz de Simão, o mágico, o seu
originador; a segunda a partir da metade do século XX, com os manuscritos de
Nag Hammadi de 1946, que declara que o gnosticismo é pré-cristão, como pode
ser confirmado em: G. L. Borchert, “Gnosticismo,” em: Walter A. Elwell, ed.,
Enciclopédia histórico-teológica da igreja Cristã, 2:202-203; Hagglund, 27-28;
Charles W. Hedrick, “Introduction: Nag Hammadi, Gnosticism, and Early
Christianity  Beginner’s Guide,” em: Charles W. Hedrick e Robert Hodgson, Jr.,
eds., Nag Hammadi, Gnosticism and Early Christianity (Peabody, MA:
Hendrickson, 1986), 3; William L. Petersen, “Gospel of the Ebionities,” em:
David N. Freedman, ed., The Anchor Bible Dictionary (New York: Doubleday,
1992), 2:261-262; John Dart, The Jesus of Heresy and History: The Discovery
and Meaning of the Nag Hammadi Gnostic Library (New York: Harper & Row,
1988), xii, xiii.

7
filosofia helênica.1 Principalmente através da Ásia Menor2 o Gnosticismo
influenciou o Cristianismo, sendo responsável por considerável parte da crise
cristológica do I século AD. Por exemplo, o conceito das emanações3 infiltrou-se
no Cristianismo. Os heresiólogos descrevem a origem de deuses inferiores a
partir do Deus Supremo, também identificado como o Abismo, em quem está
presente o Deus Silêncio, os quais formaram dois outros deuses: A Mente e a
Verdade. Estes por sua vez trouxeram à existência o Verbo e a Vida, que a seu
turno originaram o Homem e a Igreja. As duas últimas duplas de seres, querendo
agradar ao Deus Supremo, fizeram surgir mais vinte e dois seres ou eons. O
conjunto deles era reconhecido como Pleroma ou Plenitude.4
(1) O último desses eons, a Sabedoria, não
podendo satisfazer sua paixão pelo Deus Supremo, deu origem ao Demiurgo, que
criou o mundo material. Ele foi identificado pelos gnósticos com Jeová do Antigo
Testamento.5 O Deus Supremo, para trazer harmonia ao Pleroma e resgatar o
mundo material, criou mais dois seres divinos: Cristo e o Espírito Santo,
identificados respectivamente com Jesus e o Consolador do Novo Testamento.
(2) Na crença gnóstica o redentor era um ser
espiritual e divino totalmente separado da matéria. Por isso mesmo o gnosticismo
cristão (docetismo) entendeu o aspecto humano de Cristo como uma aparência ou
uma inexistência.6 O mensageiro divino gnóstico, Cristo, adotou o corpo de Jesus
por ocasião do seu batismo e o abandonou antes de Sua crucifixão.7 Seu
nascimento virginal é negado, caso contrário Cristo teria que herdar os atributos
carnais de Maria, o que era inadmissível à mentalidade gnóstica.8 Neste processo
Cristo é uma emanação da Divindade Suprema, portanto, por ela criado e a ela
subalterno, o que se torna inaceitável para a cristologia apostólica.

1
Kurt Rudolph, “Gnosticism,” em: Freedman, ed., The Anchor Bible,
2:1036; Hagglund, 27; Hedrick e Hodgson, eds., 4-11; Borchert, 2:203-204;
Edwin M. Yamauchi, Pre-Christian Gnosticism (Grand Rapids, MI: Eerdmans,
1973), 21-28. A idéia contrária à posição da origem pré-cristã do gnosticismo
encontra-se em: Otto Weber, Foundations of Dogmatics (Grand Rapids, MI:
Eerdmans, 1988), 1:78.
2
Para constatar a localização do cristianismo na Ásia Menor, ver: Kurt
Rudolph, “Gnosticism,” em: Freedman, ed., The Anchor Bible, 2:1036.
3
Tenney, New Testament Survey, 73; Cairns, 79. Para apreender
explicação da crença gnóstica das emanações do ponto de vista do dualismo
horizontal e vertical ver:Borchert, 2:206.
4
González, Historia del pensamiento cristiano, 156; Hagglund, 29.
5
Kurt Rudolph, “Gnosticismo,” em: Freedman, ed., The Anchor Bible
Dictionary, 2:1033.
6
Weber, 1:79; Rudolph, 2:1037.
7
Dart, 98.

8
3  Tanto o judaísmo palestinense como o da diáspora
assimilaram, apesar de toda resistência asmoneana, as influências das tendências
sincréticas do gnosticismo da época. Inscrições da Ásia Menor atestam a presença
de cultos mistos pagãos-judeus.1

4  O fato de Paulo Ter escrito Filipenses, Filemon, Colossenses


e Efésios, com a finalidade de defender os primeiros cristãos contra as perversões
gnósticas quanto a pessoa de Cristo é prova suficiente de que havia infiltrações
gnósticas na comunidade cristã da época.2 O mesmo transparece nas obras de
João, escritas com o objetivo de esclarecer a realidade das duas naturezas de
Cristo. Nesta mesma linha está 1Pedro que fala da realidade histórica e espiritual
de Seu sacrifício e ressurreição. Pode-se dizer, portanto, que boa parte da
literatura do Novo Testamento visava enfrentar a crise gnóstica.

D  Há um contraste entre o ensinamento veterotestamentário sobre a


salvação e a maneira como as pessoas na história bíblica desse período
entenderam e vivenciaram essa verdade. Mesmo entre o povo escolhido e seus
mais representativos líderes, percebe-se uma tentativa legalística de salvação.

1  Conflitos desta natureza se infiltraram também na vida da


Igreja Apostólica. Eles motivaram a convocação do primeiro concílio da Igreja
Cristã (At 15:1-35). Paulo ainda escreveu pelo menos duas epístolas (Romanos e
Gálatas) entre os anos de 54-57 AD em resposta ao legalismo.3

2  Essa atitude tornou-se uma característica da religiosidade


judaica especialmente no período pós-exílico. A comunicação da lei e o zelo por
ela ao longo da história tiveram função preponderante para fortalecer o espírito
legalista do judaísmo. Segundo o Mishna,4 a transmissão da lei foi primeiramente
um ato de Deus, quando a deu a Moisés (Êx 31:18); este a entregou a Josué, que
por sua vez a passou aos anciãos, que a passaram aos profetas, que a comunicaram
aos membros da grande assembléia (os 120 anciãos) liderados por Esdras, o
escriba e por seus companheiros, os soferim (contadores de letras). O zelo por
essa tradição conduziu o povo hebreu ao legalismo.5

Millard J. Erickson, Christian Theology (Grand Rapids, MI: Baker


8

Book House, 1991), 713.

Para verificar a mistura dos cultos judaicos e pagãos, ver: Martin


1

Hengel, Judaism and Hellenism (Minneapolis, MN: Fortress Press, 1981), 1:308-
309.
2
Robertson, Word Pictures in the New Testament, 4:xvii.
3
Robertson, Word Pictures in the New Testament, 4:xvi.
4
Wigoder, 494: O Mishna foi a primeira autoritativa compilação da lei
oral, refletindo cinco séculos de tradições legais judaicas, desde a era dos escribas
até os tannaim.

9
a  Este último grupo (sofrerim) teve uma grande
influência sobre a nação, a partir de meio século depois do retorno de Israel do
cativeiro babilônico.1 A mentalidade religiosa judaica pós exílica caracterizou-se,
predominantemente, pelo monoteísmo ético,2 que fortaleceu o legalismo israelita.

3  TrÊs séculos aproximadamente depois do período pós-


exílico, no reino de João Hircano (135-105 AC), surgiram os saduceus e os
fariseus,3 que tinham a lei como centro da vida religiosa. As escolas de Hillel (70
AC  10 AD)4 e Shammai (50 AC  30 AD),5 que se originaram dentre os
fariseus, exageravam a importância da ética, sendo que os shammaítas eram mais
ortodoxos, tanto na hermenêutica como na aplicabilidade da lei. Na sociedade
judaica a importância da ética era enfatizada em detrimento do significado
salvífico de sua religião, tão claro na teologia do concerto.

a  Esta postura teológica foi decisiva no conceito


legalista de salvação dos israelitas6 e a seu tempo influenciou o cristianismo
judaico, que se desenvolveu a partir da Palestina.

4  O cristianismo desenvolvido na Palestina foi influenciado


pelo judaísmo, em decorrência da proximidade de espaço e doutrina, pois tanto
seus líderes como seus primeiros conversos eram todos de origem israelita.
Estavam condicionados através de diversas gerações por uma educação baseada
no monoteísmo ético.

5
Ibid., 308.
1
Ibid. A transgressão da lei de forma genérica (Am 3:14-15), o
quebrantamento do Sábado (Ne 13:17-18) e a prática da idolatria (Je 7:9), em
particular, e a maneira injusta como tratavam com os pobres (Jr 7:5-7) foram as
causas que conduziram ao cativeiro em Babilônia.
2
V. L. Walter, “Ebionismo,” em: Elwell, ed., Enciclopédia histórico-
teológica da Igreja Cristã, 1:376.
3
Niswonger, 34.
4
Wigoder, 339.
5
Ibid., 641.
6
Donald E. Gowan, Bridge between the Testaments: A Reappraisal of
Judaism from the Exile to the Birth of Christianity (Pittsburg, PA: Pickwick Press,
1980), 433-443; Roger Brooks, The Spirit of the Tem Commandments: Shattering
the Myth of Rabbinic Legalism (New York: Harper & Row, 1990), 21-27; Dan
Cohn-Sherbok, A Dictionary of Judaism & Christianity (Philadelphia: Trinity
Press International, 1991), 58-59, 152-153. Os méritos dos patriarcas não só
acumulam-se, mas beneficiam seus descendentes, acelerando a redenção de Israel.
Ver: Wigoder, 481.

10
a  Por isso a crise soteriológica no Novo Testamento
manifestou-se sob dois ângulos interrelacionados. Primeiro, o aspecto externo,
quando o conflito se processou entre os principais líderes do cristianismo e as
autoridades judaicas. O segundo, o aspecto interno, quando as lutas teológicas
sobre a salvação ocorreram entre os primeiros cristãos judeus, que conduziram a
Igreja Apostólica ao seu primeiro Concílio.

II - MARCO HISTÓRICO - PALESTINA

A  Domínio da Grécia  Depois de passar sucessivamente sob o


domínio de Babilônia e Medo-Persia, a Palestina veio ser subjugada pela Grécia.
A vitória na batalha de Grânico (334 AC) permitiu que Alexandre viesse a
dominar a Palestina em 332 AC. Sua morte em 321 Ac fez surgir uma luta pelo
domínio do seu império, como resultado a Palestina foi entregue a Ptolomeu
(general de Alexandre), que anexara sob seu controle a Egito. Pelo período de
aproximadamente 100 anos a Palestina ficou sob o governo dos Ptolomeus.

1  Mas em 198 AC, Antíoco III de origem selêucida anexou a


Palestina, tirando-a do domínio egípcio, dos Ptolomeus. Seu filho, Antíoco
Epifânio (175 AC  163 AC), grande admirador da cultura grega, procurou
helenizar a Palestina fazendo uso da violência. Antíoco Epifânio em 168 AC
publicou um edito em que os judeus estavam proibidos de praticar a circuncisão,
de comemorar suas festas religiosas e de guardar o Sábado. Ainda mandou
destruir as cópias da Lei, colocar um altar a Zeus no templo de Jerusalém e
ordenou que oferecessem sacrifícios de porcos neste altar.

2  Sob a liderança de Matatias, sacerdote da aldeia de Modin,


iniciou-se uma revolta contra os selêucidas, e continuada por seu filho Judas
Macabeu, que foi sucedido por seu irmão Jônatas. Foi contudo no período da
liderança de Simão, em 142 AC, que se deu a independência da Judéia. Com isto
terminou a influência dos selêucidas sobre a Palestina e consolidou-se a
autonomia do estado judaico, até que chegassem os romanos. Com a morte de
Simão e seus filhos (135 AC), assassinados por Ptolomeu, genro de Simão, o
governo passou às mãos de João Hircano, que se tornou o fundador da dinastia
hasmoneana, período em que surgiram várias seitas como fariseus e saduceus.
Com a morte de João Hircano seguiram-se lutas internas na família pelo controle
do poder que conduziram a Palestina a um caos político.

B  Domínio Romano  Devido ao caos político, Pompeu, imperador


romano, interveio na Palestina em 63 AC, terminando o curto período de
independência da Palestina (168 AC  63 AC).1 Reis hasmoneus se seguiram no
governo da Palestina até que Herodes, com auxílio de Roma, derrotou Antígono,
terminando a dinastia dos hasmoneus.

1
Merril C. Tenney, O Novo Testamento sua origem e análise, 2ª ed. (São
Paulo: Vida Nova, 1972), 44-61.

11
1  Da disnastia herodiana, teve em Herodes, o Grande, o seu
mais destacado estadista, reinando de 37 AC a 4 AC. Foi nomeado por Otávio
como rei dos judeus, contudo foi através de guerras internas que assumiu de fato o
controle de toda a Palestina. Um dos seus primeiros atos foi nomear o sumo-
sacerdote Hananiel, identificado possivelmente como o Anás dos evangelhos. Foi
este o Herodes que ordenou a matança das crianças de Jerusalém (Mt 2:1-8, 16),
quando o imperador de Roma era Augusto (27 AC  14 AD). Foram sucessores
simultâneos de Herodes, dividindo seu reino: Arquelau (4 AC  6 AD), Felipe, o
tetrarca (4 AC  34 AD) e Herodes Antipas (4 AC  39 AD). Este último é o mais
proeminente nos evangelhos. Jesus faz referência a ele como tendo a
personalidade enganadora de um raposo (Lc 13:31-32). Ele é o assassino de João
Batista e aquele diante de quem Jesus foi julgado (Mt 14:1-12; Mc 6:14-29; Lc
3:19; 23:7-12). No ano 39 AD foi deposto por Calígula (37  41 AD) ao
substituir Tibério (14  37 AD), amigo de Herodes Antipas.

2  O Governo de Roma sobre a Judéia  Os Imperadores


romanos administraram a Judéia por intermédio de seus procuradores. Esses
representantes de Roma tinham a finalidade de cobrar impostos diretos, uma vez
que os indiretos eram cobrados pelos publicanos (Levi Mateus, Zaqueu). Os
procuradores deviam ainda manter a ordem através de tropas compostas por
soldados nativos, os judeus neste caso eram dispensados do serviço militar (Lc
7:10; 23:47). Eles ainda eram investidos de autoridade judicial, para julgar crimes
que envolvessem penas capitais, enquanto os problemas judicais menores eram
analisados pelo Sinédrio.

a  Pôncio Pilatos  Governou a Palestina de 26 AD a 36


AD. Filo e Flávio Josefo declaram que Pilatos era um homem de mau caráter. Os
desafios de Pilatos ao povo culminou no episódio da matança de galileus no
templo (Lc 13:1). É igualmente conhecida sua inimizade com Herodes Antipas.
A partir do ano 30 AD tornou-se mais intransigente e cruel com o povo judeu.
Sua crueldade chegou ao conhecimento do Imperador Vitélio, que depôs Pilatos.
O fim da vida de Pilatos permanece sem informação histórica. Contudo, o
Espírito de Profecia, EGW, declara que ele se suicidou.

C  Geografia Política da Palestina nos dias de Cristo e suas Seitas.

1  A Palestina estava dividida em três territórios nos dias de


Cristo.

a  Jerusalém e Judéia estavam sob o governo do


procurador e do Sinédrio.

b  A Galiléia e a Peréia eram governadas por Herodes


Antipas.

c  O norte da Galiléia era controlado por Felipe. Além


dessas divisões havia uma federação de cidades gregas livres. A Fenícia era uma
delas que estava fora da autoridade de Herodes, sendo dirigida pela Síria.

12
2  Seitas  Apesar dos judeus terem uma única fonte de
revelação para orientar sua vivência religiosa, o Antigo Testamento, eles acabaram
por se dividir em várias seitas religiosas que rivalizavam entre si.

a  Saduceus  Deriva possivelmente de Zadoque, que


viveu 300 AC ou ao sacerdote dos dias de Davi. Por ocasião do Novo
Testamento, eles eram constituídos de famílias sacerdotais, aristocratas, ricas e
políticas. Eles eram responsáveis pela vida religiosa desenvolvida no templo.
Aceitavam apenas o Pentateuco como revelação divina. Eram de tendência mais
liberal. Rejeitavam as doutrinas da ressurreição (Mt 22:23), da vida eterna, da
punição final e da existência dos anjos.
(1) Foi aos saduceus juntamente com os fariseus
que João Batista os chamou de “raça de víboras” (Mt 3:7). Os saduceus e os
fariseus desafiaram a Jesus e Lhe pediram um sinal (Mt 16:1-4). Eles discutiram
com Cristo sobre a ressurreição (Mt 22:23-33), julgaram-nO facciosamente (Mt
26:57-68; Mr 14:53-64; Lc 22:66-71; Jo 18:12, 19-24). Posteriormente eles
perseguiram a Igreja Cristã Primitiva (At 4:1-3; 23:6-10). Na destruição do
templo de Jerusalém os saduceus desapareceram.

b  Fariseus  Seu significado é ser justo, separado,


santo. Eles se opuseram à helenização dos judeus. Sua origem como foi dito
acima parece Ter sido nos dias de João Hircano, por volta do ano 120 AC. Eles
tinham representantes no Sinédrio, por isso aparecem no julgamento de Paulo (At
22:30-23:6), deles originaram-se as mais ortodoxas escolas de interpretação dos
judeus: Hillel e Shammai. Eles se opunham passivamente às autoridades
romanas. Por serem da classe média tinham mais acesso ao povo em geral. Sua
religiosidade se caracterizava por um exacerbado legalismo. Eles estavam bem
representados entre os escribas e doutores da lei. Sua principal tarefa era estudar,
interpretar e aplicar os princípios da lei a cada circunstância da vida diária.
Acreditavam na ressurreição, na imortalidade da alma, na existência de espíritos,
na existência de anjos, na punição final com base nas obras.
(1) Eles estiveram envolvidos em diversos
momentos do ministério de Cristo: (1) discussão sobre as tradições (Mr 7:1-13);
(2) instigaram os discípulos de João contra ele (Mt 9:11, 14; Jo 4:1); acusaram
Jesus de possuir demônios (Mt 9:34; 12:24); de hipocrisia (Mt 23); acusaram e
condenaram Jesus à morte (Mt 27:62).

c  Essênios  Numerosa sociedade religiosa secreta


localizada nas encostas do Mar Morto que se caracterizava por seu separatismo
social. A admissão na sociedade acontecia depois de três anos de noviciado,
quando então o novo intregrante recebia os estatutos por sua filiação, sob
juramento de conservar os ensinos secretos da comunidade. Viviam sob o
princípio de distribuição equalitária do bem comum. Eram contrários ao
casamento. A lei ocupava uma posição central de sua religiosidade, que era lida
diariamente, e interpretada alegoricamente. Eram escrupulosos observadores do
Sábado. Eles não são citados no Novo Testamento, contudo aparecem nos escritos
de Filo e Flávio Josefo.

13
d  Seita de Qumran  Qumran é o nome da localidade
onde foram encontrados vários rolos sagrados, inclusive textos de todos os livros
do Antigo Testamento, menos do livro de Ester no fim do outono de 1947. Além
disso foram encontrados vestígios da existência de uma comunidade
rigorosamente organizada. Ela foi fundada nos fins do II século AC e floresceu no
I século AC. Julga-se que a sociedade foi extinta no ano 70 AD, na guerra
judaico-romana. Trata-se portanto de uma sociedade religiosa contemporânea de
Cristo e Seus apóstolos. A seita de Qumran não exerceu uma influência marcante
sobre o Novo Testamento nem sobre a Igreja Apostólica. Era uma comunidade
fechada que aceitava, contudo, o matrimônio. São identificados como sendo o
mesmo grupo dos essênios. Tinha uma teologia com uma forte ênfase
escatológica, tanto na sua visão do conflito do bem com o mal, como no seu
ensinamento sobre o remanescente.1

e  Escribas  Eram secretários profissionais da


comunidade, escrevendo cartas pessoais ou documentos oficiais, por cujo trabalho
recebiam proventos específicos. Ainda hoje são encontrados no Oriente Médio.
Diversos deles eram funcionários do governo e por isso mesmo tinham influência
política. Eram considerados como intelectuais dos seus dias. Eles ainda
copiavam a lei e outros escritos do Antigo Testamento. Exerciam ainda a
profissão de professores e intérpretes da Escritura. São chamados no Novo
Testamento de nomikov , advogados ou intérpretes da lei (Mt 23:33; Lc 10:25).
O título foi usado primeiramente na Escritura para Esdras (Es 7:6,10). Os mais
famosos foram Hillel, Shammai e Gamaliel. Sua interpretações eram
consideradas do mesmo valor da Lei de Moisés. Cristo, contudo, condenou tal
ponto de vista (Mt 15:1,3; 23:15,23,25,27,29,33). Eles também estiveram
envolvidos com a morte de Cristo (Mt 26:57-59; 16:21; 27:41). Muitos deles se
opuseram aos apóstolos (At 4:5; 6:12).

f  Os Zelotes  São chamados por Josefo de a 4ª


filosofia Flávio Josefo. Tratava-se de um partido nacionalista, centro da
resistência ao domínio do Império Romano sob a liderança de Judas Galileu. Eles
se opunham ao pagamento do imposto, porque entendiam que pagá-los a César era
uma traição a Deus. Teologicamente concordavam com os pontos de vista dos
fariseus. Acabaram por se degenerar em um corpo de assassinos, os sicários. Eles
contudo reviveram o espírito de independência dos Macabeus. Seu fim é relatado
em Atos 5:37. Jesus tinha pelo menos um zelote entre seus apóstolos (Mt 10:4; Lc
6:15).

III - FONTES PARA O CONHECIMENTO DA PESSOA DE CRISTO


Nos círculos teológicos tem-se discutido se os eventos relatados nos quatro
evangelhos são fidedignamente históricos. A autenticidade teológica dos
evangelhos estaria sujeita a sua veracidade histórica. Devido a teologia
racionalista do século XIX, os eventos miraculosos dos evangelhos foram
rejeitados, uma vez que foram entendidos como mito. Tais acontecimentos
1
Karl Hermann Schelkle, A comunidade de Qumran e a igreja do Novo
Testamento (São Paulo: Paulinas, 1972).

14
sobrenaturais foram vistos como obstáculos para a compreensão histórica de
Cristo, e como irrelevantes à mentalidade científica da época. O padrão de
aceitação de qualquer fato estava submetido ao que era justificadamente racional.
A verdade deveria ser demonstrada pela observação empírica e de acordo com os
princípios da razão humana. A teologia passou a ser uma serva da razão e a ela
limitada.1 Daí tornou-se necessariamente obrigatório ao teólogo moderno
procurar comprovar a autenticidade histórica de Cristo. Por isso que F. Lambiasi
em sua obra Autenticidade histórica dos Evangelhos conclui que “a criteriologia
permite aproximar-nos confiantes dos evangelhos, certos de encontrar neles,
mediante a fé da primeira comunidade cristã, Jesus, o Cristo, que continua a fazer
a cada homem a pergunta mais inquietante: “E tu, quem dizes que eu sou?” (Mt
16:16). A única reposta razoável é “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.”2
A  Os evangelhos como Documentos Históricos  Os evangelistas não
estavam tão interessados em dar informação histórica sobre a vida de Jesus, mas
sua abordagem visava apresentar a Cristo sob o significado da ressurreição.

1  Uma análise criteriosa da historicidade da vida de Jesus e de


Sua morte faria perder seu principal significado que “Cristo morreu pelos nossos
pecados, segundo as Escrituras” (1Co 15:3). Há portanto necessidade imperiosa a
abordagem teológica para se compreender o verdadeiro significado da vinda do
Messias, que transcende a sua realidade histórica.

2  O criticismo da forma que distingue entre si os diversos


tipos de material encontrado nos evangelhos (parábolas, milagres, discursos,
relatos), avalia de tal maneira esta pregação apostólica que desfigurou o próprios
evangelho. Na busca dos elementos originais conhecidos como a fonte “Q”, “L”,

1
Bengt Hägglund, História da Teologia, 4ª ed. (Porto Alegre, RS:
Concórdia, 1989), 291-355.
2
F. Lambiasi, Autenticidade histórica dos evangelhos (São Paulo:
Edições Paulinas, 1978), 260.

15
“M,”1 que deram origem aos atuais evangelhos, os eruditos
esvaziaram o conteúdo dos evangelhos, e fizeram de Jesus um homem ao modelo
de um europeu racionalista dos séculos XIX e XX. Chegou esta análise, dita
científica, a um ponto tal de crítica literária que não se pode mais saber, segundo
eles, com segurança, muito da vida e da personalidade de Cristo.

3  Nos quatro evangelhos encontramos o Jesus da Fé, criado


pela Igreja Primitiva conhecido através de Seu sacrifício feito em resgate de
muitos, e de Sua ressurreição que garante vida eterna a todos os que crêem n’Ele,
como o Penhor da sua salvação.

4  A historicidade dos Evangelhos  A dificuldade que os


primeiros discípulos tiveram para crer na pregação de Jesus, “Ó néscios e tardos
de coração para crer em tudo que os profetas disseram,” (Lc 24:25) comprova que
eles só creram depois que puderam ver, tocar e ouvir (1Jo 1:1-4). Portanto os
primeiros seguidores de Cristo não eram crédulos inconseqüentes, mas homens
que analisaram os eventos de seus dias à luz das profecias do Antigo Testamento.
O evangelho era um escândalo e loucura para contemporâneos do I século (1Co
1:23). Os apóstolos não manipularam a informação para criar uma atmosfera de
fanatismo religioso em torno da pessoa de Jesus, mas escreveram do que viram e
ouviram, e além disso do que examinaram em um processo comparativo com as
profecias do Antigo Testamento, como bem demonstram a maneira como fizeram
uso delas em seus diferentes discursos e documentos escritos.

a  Há primeiramente uma evidência interna da


historicidade dos evangelhos. Testemunhas oculares descreveram com muita
exatidão em um espaço geográfico real (Palestina), e em um momento histórico
específico os acontecimentos envolvendo a pessoa de Jesus (Herodes e seus
filhos, Pôncio Pilatos, César Augusto). Referências são feitas aos costumes,
linguagem, situações políticas, instituições com toda exatidão histórica. Os
evangelhos não fazem um culto à personalidade pelo exagero da realidade
histórica, mas apresentam o fim trágico de seu líder condenado a mais
ignominiosa morte, crucifixão. Este tipo de fim de um líder daqueles dias era
degradante para qualquer movimento religioso que iniciava diante da grandeza
dos cultos pagãos aos seus inúmeros deuses.

b  Fazendo uma análise comparativa entre os


evangelhos e outros escritos antigos, temos muita dificuldade de encontrar alguns
poucos documentos originais da literatura grega e romana. As obras de Homero e
Virgílio, por serem mais populares, existem alguns poucos originais. Outros
clássicos são raríssimos e alguns já nem existem mais. A cópia mais antiga da
obra Eurípedes,data de 1600 anos após sua morte. Semelhantemente poder-se-ia
dizer de outros autores como Sófocles, Platão, Catulo, Lucrécio e outros. Quantos

1
Para estudo posterior sobre a questão das fontes dos evangelhos, ver: B.
P. Bittencourt, A forma dos evangelhos e a problemática dos sinóticos (São Paulo:
Imprensa Metodista, 1969), 103-167; E. P. Sanders, Margareth Davies, Studying
the Synoptic Gospel (London: SCM Press, 1994), 51-119.

16
aos evangelhos a situação é oposta, pois existe tanta informação de manuscritos
que a dificuldade é como estudar todos. São cerca de 5.500 mss gregos completos
ou fragmentários do Novo Testamento, além de 13.000 mss das versões e milhares
de citações existentes nos Países Eclesiásticos. Pode-se, por isso, afirmar que
“tanto a autenticidade como a integridade geral dos livros do Novo Testamento
podem considerar-se como firmadas de modo absoluto e final.”1

c  Há também evidências externas da historicidade dos


evangelhos. Há fontes fora dos próprios evangelhos que fazem referência a eles.
Descobertas importantes foram feitas pelas pesquisas arqueológicas nos final do
século XIX. B. P. Greenfell, A. S. Hunt e D. G. Hogarth encontraram pedaços de
papiro relativos aos evangelhos, entre os quais o primeiro capítulo de Mateus,
todos datando aproximadamente de 300 AD.2 Existem cerca de 25 evangelhos
apócrifos, dos quais vários são pseudoepígrafos que levam o nome de alguns dos
discípulos (Mr 6:52,53, 7Q5, 1971, O’Callaghan, 20 letras entre 50-68 AD, 7Q4,
1Tm 4:1).
(1) Testemunho Pagão (55-117 AD): (a) Tácito
(60-120 AD)  historiador romano que estabeleceu uma relação entre o nome e a
origem dos cristãos a “Christus,” que por ocasião do reinado de Tibério (14-37
AD) “sofreu a morte por sentença do Procurador Pôncio Pilatos.” (b) Plínio 
autoridade judiciária, aconselhou-se com o Imperador Trajano (98-117), sobre a
maneira de tratar os cristãos. Nesta sua consulta ele revela características da ética
cristã e seu culto a Cristo, a quem tratavam como Deus. (c) Suetônio  declara a
existência de distúrbios na comunidade judaica por causa da pregação sobre
Chrestos (Cristo) e por isso foram expulsos de Roma, assunto relatado em Atos
18:1-2. (d) Outro testemunho é do escritor satírico Luciano, que escrevendo sobre
os cristãos e sua fé, por volta de 170 AD, fala que Cristo foi crucificado na
Palestina por Ter implantado uma nova religião, e O chama de “sofista
crucificado.” Há portanto evidência histórica da vida de Jesus Cristo.
(2) Testemunho Judeus  Flávio Josefo (30-100
AD), que procurou explicar o povo judeu para a sociedade romana de seus dias.
Nesta tentativa ele menciona a Cristo como um “homem sábio” condenado à
morte por crucifixão determinada por Pilatos. Por não ser Flávio Josefo um
amigo do cristianismo sua declaração se reveste de importância.
(3) Informações Históricas Diversas  Diversas
das informações históricas dos evangelhos, Atos e epístolas são comprobatórias da
existência de Jesus Cristo. As inscrições nas catacumbas testificam do Cristo
histórico, calendário cristão, seus cultos. Dionísio Exiguus (550 AD) apesar de
desafortunadamente marcar o nascimento de Cristo para o ano de 754 AUC, por
considerar que esta teria sido a data da morte de Herodes, o Grande, quando na

Sir Frederic G. Kenyon, The Bible and Archeology (New York: Harper
1

& Brother, s.d.), 288, citado em: Wilson Paroschi, Crítica textual do Novo
Testamento (São Paulo: Vida Nova, 1993), 19.

S. J. Schwantes, Arqueologia (São Paulo: Gráfica do Instituto


2

Adventista de Ensino, 1983), 153.

17
verdade teria ocorrido em 751 AUC (Lc 3:1) é outro testemunho da existência de
Cristo, como testificada desde os primeiros séculos do cristianismo.1

IV  O EVANGELHO
O termo euaggevlion é uma palavra composta de dois radicais: (1) eu - bem,
aggevlion - anjo, bom anúncio, boa mensagem, boas novas. Na literatura
clássica era um termo técnico para anunciar vitória, libertação e gozo. Usada para
anunciar o fim de uma guerra. Anúncio de que mediante a vitória, a paz foi
instituída.
A  No Antigo Testamento  O termo aparece em Isaías 52:7: “Que
formosos são sobre os montes os pés do que anuncia as boas novas, que faz ouvira
a paz, que anuncia boas coisas, que faz ouvir a salvação, que diz a Sião: O teu
Deus reina!” O tema desta seção que se inicia em Isaías 49:14 trata da restauração
de Sião e do Servo do Senhor. Esta restauração é a libertação do cativeiro
babilônico. O destino de Israel é a liberdade. Esta liberdade não custa nada a
Israel, é um ato de Deus na sua história: “por nada fostes vendidos; e sem dinheiro
sereis resgatados” (Is 52:3). Israel como que contempla a vinda, a chegada de um
Paladino da liberdade em seu território, trazendo paz e salvação. O evangelho não
é uma mensagem escrita, mas uma proclamação de Deus revestida de atividade. É
um anúncio repleto de energia vital. Ela é dinâmica, provocando transformação.
Muda a guerra em paz, escravidão em liberdade. Isto é evangelho. (Vida, morte,
ressurreição, intercessão e 2ª Vinda) X Justiça.

1  Os que são identificados como portadores da mensagem das


boas novas são chamados de evangelistas. Felipe é chamado de evangelista
porque sua aparição na história do Cristianismo nascente é dinâmica (At 8:5,
26,29-31, 35-40). Evangelistas não eram escritores primariamente, mas
testemunhas vivas. A Igreja não existe para um academicismo que apenas nos
conduza à pesquisa teológica, mas para nos lançar às ruas e praças do mundo
inteiro para proclamar.

2  Eles não falam para satisfazer a curiosidade intelectual, mas


para converter. Os evangelistas se tornaram sucessores dos profetas do Antigo
Testamento. A pregação do evangelho provoca transformação, pois a Palavra de
Deus nunca voltará vazia (Is 55:10-13). Assim foi com João Batista (Mr 1:4),
Jesus Cristo (Mt 7:28-29; Mr 1:22) e seus apóstolos (At 2:37-41) e tem sido por
toda a história do Cristianismo, e tem sido conosco também.

3  O Evangelho é de Deus e seu conteúdo é Jesus Cristo (Rm


1:1-7) em três aspectos, que são as três colunas do evangelho: Jesus Cristo é
Homem, Deus e Soberano. Evangelho é o anúncio da salvação, e a salvação não é
uma teoria teológica é uma pessoa (Sl 27:1, 32:1-2,5; 62:1-2; Is 12:2). Ele nasce

1
Earle E. Cairns, O cristianismo através dos séculos: uma história da
Igreja , 2ª ed. (São Paulo: Vida nova, 1992), 37-39; Luiz Nunes, “O reino de
Deus: uma abordagem bíblica em São Mateus 1 a 7,” tese de mestrado, Instituto
Adventista de Ensino, 1984, 5-6.

18
do amor eletivo de Deus (Ef 1:4-10); e da iniciativa d’Ele (Gl 4:4-5). É uma
revelação de sua justiça (Rm 1:16-17; Sl 119:172; cf. Sl 31:1; 143:1; Rm 3:21-22;
5:10,19; 1Pe 2:21-24).

a  Para Marcos o evangelho tem um sentido absoluto.


Jesus é o autor e o conteúdo do evangelho (Mr 8:35; 10:29). O evangelho é a
história de Jesus, não apenas como um relato, mas apresentada em seus atos de
salvação durante seu ministério, em seu sofrimento, morte e ressurreição.

b  Para Mateus o evangelho é um termo acompanhado


de qualificação Evangelho do Reino (Mt 4:23; 9:35) ou Este Evangelho (Mt
26:13). O conteúdo está acima de tudo nos ensinos de Jesus. É a narrativa da
paixão (Mt 26:13). É o conteúdo da proclamação (Mt 24:14).

c  Para Lucas o evangelho é libertação dos cativos. É a


libertação do prisioneiro de guerra, é a restauração da visão, é a libertação do
oprimido (Lc 7:22; 8:1, 9:6; At 10:36; 14:15; 13:32; 20:24). Em João não aparece
o termo.
V  DATAS APROXIMADAS DOS LIVROS DO NOVO TESTAMENTO
Tipo de Literatura Títulos Data Aproximada Escritos
Marcos 50 AD Marcos
Mateus 55 AD Mateus
Literatura Histórica
Lucas 60 AD Lucas
93 (5)
João 85 AD João
Atos 62 AD Lucas
Tipo de Literatura Títulos Data Aproximada Escritos
Romanos 55 AD
1 Coríntios 55 AD
2 Coríntios 56 AD
Gálatas 57 AD ou 48 AD
Efésios 60 AD
Filipenses 61 AD
Literatura Epistolar (21) Colossenses 61 AD Paulo
1 Tessalonicenses 50 AD
Dividem-se em: 2 Tessalonicenses 51 AD
1 Timóteo 63 AD
13 de Paulo 2 Timóteo 67 AD
2 de Pedro Tito 65 AD
3 de João Filemon 60 AD
1 de Tiago
1 de Judas Hebreus 65 AD
Hebreus Tiago 45 AD Tiago
1 Pedro 63 AD Pedro
2 Pedro 65 AD
1 João 85 AD João
2 João 85 AD
3 João 85 AD
Judas 68 AD ou 85 AD Judas
Literatura Profética Apocalipse 95 AD João

19
Embora estudiosos da Escritura difiram na data exata quando os documentos do
Novo Testamento foram escritos, estas informações cobrem a opinião mais geral,
dando-nos uma informação mais didática destes livros.

VI  EVANGELHOS SINÓTICOS
Os três primeiros evangelhos foram chamados de sinópticos por J. J.
Griesbach (XVIII século), devido seu alto grau de semelhança.
A semelhança se percebe na estrutura geográfica do ministério de Jesus:
Galiléia, Judéia e Peréia, então Jerusalém. A semelhança aparece também em
relação ao conteúdo: mesmos acontecimentos, mesmas curas, parábolas e
discursos. É comum a todos eles um clima de constante ação.
Como foram eles produzidos? (Lc 1:1-4)

1  Muitos empreenderam uma narração.


2  Testemunhas oculares e ministros da Palavra transmitiram.
3  Acurada investigação.
4  Autoria final  exposição e ordem.
(a) Fase Oral  Crítica da forma.
(b) Fontes escritas  crítica das fontes, crítica da redação.
(c) Pesquisa.
(d) Autoria.

Este modelo está explícito para o Evangelho de Lucas. No caso de João e


Mateus eles são testemunhas oculares e ministros da Palavra. Por sua vez, Marcos
expôs o que viu e ouviu do ministério de Pedro, conforme Papias (130AD) e
Eusébio (325 AD) atestaram:
“Marcos tornou-se intérprete de Pedro e escreveu com exatidão tudo
aquilo de que ele se lembrava, é verdade que não em ordem.”
Os quatro evangelhos possuem semelhanças de estrutura e mesmo de
palavras (Mt 23:37-39; cf. Lc 13:34-35), enquanto apresentam semelhanças de
palavra e termos. Tentativas de explicações: (1) dependência comum de um
evangelho original (escrito em hebraico ou aramaico; (2) dependência comum de
fontes orais, sumário fixo de biografia; (3) dependência comum de um número
cada vez maior de fragmentos escritos; (4) interdependência sugere o uso de um
ou mais evangelhos para comporem o seu ; (5) transmissão dos testemunhos com
alto grau de exatidão cf. Lc 1:1-4; (6) dependência comum da mesma fonte de
inspiração.
Até o século XIX foi ensinado que Mateus teria sido o primeiro evangelho
a ser escrito, seguindo o testemunho de Papias (século II). Esta posição foi
mantida porque Mateus era o único apóstolo entre os evangelistas sinópticos.
Outra posição é que Marcos seria o primeiro por Ter baseado sua narração nas
pregações de Pedro. Argumentos a favor de Marcos:
(1) A brevidade de Marcos.
(2) As irregularidades lingüísticas são mais comuns em Marcos.
(3) Preserva mais expressões aramaicas.
(4) Teologia mais primitiva  Mr 6:5; cf. Mt 13:58  Fez afirmações mais
difíceis.

20
“Q”  Schleiermacher foi o primeiro a propor a existência de uma
coletânea de declarações de Jesus como fonte para a composição dos evangelhos.
A aceitação dessa fonte única é a semelhança entre os evangelhos.
Papias declarou: “Mateus reuniu os oráculos na língua hebraica, e cada um
os interpretou da melhor maneira que pôde.”
Assim a fonte “Q” poderia Ter sido o evangelho de Mateus escrito em
hebraico.
Apesar das similitudes dos evangelhos sinópticos ele possuem uma
unidade teológica própria. Cada um deles deu uma ênfase específica e sua
estrutura biográfica: TEMA. Cada evangelista pela maneira de construir sua
narração tinha um propósito teológico próprio. RELAÇÃO entre historicidade e
teologia. Seria a preocupação do evangelista a exatidão histórica ou sua visão
teológica? Estava o evangelista defendendo uma visão teológica de historicidade
do Messias? São quatro retratos diferentes que procuram definir o Messias.

Evangelho  a mensagem do ato salvador de Deus em Seu Filh (Mr 1:14-


15; Rm 1:16; 1Co15:1; Gl1:6-7). Foi Justino que, em meados do século II,
tornou-se o primeiro a empregar a palavra evangelho para designar os relatos
canônicos da vida de Jesus Cristo: é uma biografia temática.
O método literário usado hoje para entender os evangelhos é o de analisar
as diferentes estruturas do texto para entender-lhe o sentido: (a) fonético, (b)
sintático, (c) semântico, (d) morfológico, (e) personagem, (f) foco narrativo, (g)
tipo de personagem, (h) contexto. Seria o estruturalismo um método moderno de
análise literária aplicável a obras tão íntegras como os evangelhos?
Até o século XVIII os evangelhos eram biografias historicamente
confiáveis. Com o surgimento do Iluminismo surgiu uma atitude crítica de sua
historicidade, em especial aos milagres. O principal ataque foi dirigido contra a
ressurreição, como um fato historicamente rejeitável. Na verdade os discípulos
roubaram o corpo de Jesus. Assim os evangelhos perderam sua relevância
histórica e passaram uma biografia repleta de mitos.
Albert Schweitzer demonstrou que esta visão do Jesus “histórico” nada
mais é do que a projeção da perspectiva cultural e histórica do autor.
Rudolph Buttman radicalizou mais, dizendo que não se pode Ter absoluta
certeza de quase nada da historicidade de Jesus. Para ele o que importava era o
encontro pessoal com Jesus hoje em dia. Portanto a história nada tinha a
contribuir nesta experiência (existencialismo). Contudo, obras têm surgido para
comprovar a historicidade que os evangelistas se propuseram ao escrever as
biografias temáticas sobre o Messias. Os evangelistas não estão, entretanto,
interessados em contar fatos históricos, nem estão preocupados com a cronologia
dos mesmos fatos.
Não se pode negar, apesar disso, as referências históricas contidas nos
evangelhos, que nos obrigam a aceitar que tais relatos ocorreram dentro do I
século AD: Herodes, o Grande (Mt 2), César Augusto (Lc 2:1)¸ Tibério César,
Pôncio Pilatos (Lc 3:1-2). Com tais informações podemos calcular que Jesus
deve Ter nascido em torno de 4 AC, e seu ministério teria começado ao redordo
ano 27 AD. Considerando-se as três pessoas mencionadas por João (2:13; 6:4;
11:55), mais uma outra festa não identificada poder-se-ia dizer que o ministério de

21
Jesus teria durado, provavelmente, mais de 3 anos. E a data de sua morte poderia
ser 14 de Nisan de 31 AD (+ 3 de abril de 31 AD).1
1  Os Evangelhos e Atos oferecem uma base histórica
necessária para se avaliar melhor as outras obras do Novo Testamento. A vida de
Cristo e da Igreja são fundamentais no entendimento de toda estrutura literária do
Novo Testamento. Há uma interligação histórico e teológica entre o material
histórico e o epistolar do Novo Testamento. A história de Jesus Cristo e de Sua
Igreja são o fundamento sobre o qual os apóstolos construíram sua teologia (Ef
2:20).

VII  OS EVANGELHOS E A PESSOA DE JESUS

1  Marcos caracteriza a pessoa de Cristo como o Filho de Deus


(Mr 1:1), que está ocupado com a obra do Pai. Marcos enfatiza a atividade, em
especial a atividade redentiva, de Cristo (Mr 8:31; 10:45).

2  Em Mateus, Jesus Cristo é o Rei dos Judeus, que veio


estabelecer Seu Reino para toda a humanidade. Com esta ênfase é relatado o
cumprimento de diversas profecias com a vinda do Messias. O ensinamento de
Cristo é enfatizado em seus discursos (Mt 1:1).

3  Lucas retrata Jesus como o Filho do Homem, o perfeito


representante da humanidade. A finalidade da vinda do Messias é libertar os
oprimidos pelo pecado e pela injustiça dos homens. A simpatia e a bondade de
Cristo em favor dos desfavorecidos é enfatizada (Lc 3:23).

4  Para João, Cristo é o Filho de Deus, o Verbo Eterno que veio


ao mundo revelar Deus ao homem (Jo 1:1, 14). Este evangelho enfatiza o
relacionamento de Cristo com aqueles que estão ao Seu redor, através de contatos
pessoais, que transforma a vida daqueles que têm um encontro com Ele. Este
evangelho foi escrito para que todos creiam ser Jesus Cristo o Filho de Deus e
tenham nEle a vida eterna (Jo 20:31).

VIII  DIVISÃO LITERÁRIA DO MINISTÉRIO DE JESUS

Período de Período do Ministério Público Período do Período do


Evangelho
Preparação Início Fim Sofrimento Triunfo

Mateus 1:1 - 4:16 4:17 a 16:20 16:21 a 26:2 26:3 a 27:66 28: 1-20
Marcos 1:1-13 1:14 a 8:30 8:31 a 13:37 14:1 a 15:47 16:1-20
Lucas 1:1 a 4:13 4:14 a 9:21 9:22 a 21:38 22:1 a 23:56 24:1-53
João 1:1-34 1:35 a 6:71 7:1 a 12:50 13:1 a 19:42 20:1 a 21:25

1
Esta seção está baseada em parte das informações encontradas em: D.A.
Carson, Douglas J. xxx e Leo Morris, Introdução ao Novo Testamento (São Paulo:
Vida Nova, 1997), 19-65.

22
IX  O EVANGELHO DE MARCOS

1  Marcos não pertencia ao grupo dos apóstolos de Cristo. Ele


era nativo de Jerusalém (At 12:12), companheiro de Pedro e primo de Barnabé,
que era íntimo colaborador de Paulo. O relacionamento de Marcos, portanto, com
os apóstolos deve Ter sido próximo, e por isso mesmo tornou-se familiar aos
acontecimentos que envolveram a vida de Cristo e às atividades da Igreja
Apostólica.

a  O fim da vida de Cristo, crucificado no Calvário, foi


uma profunda decepção para Marcos que, como os demais judeus de seus dias,
entendia as profecias messiânicas como o anúncio da vinda de um rei da dinastia
que viria para dar início à idade de ouro do povo de Israel.

2  Marcos era membro de uma família fundadora da Igreja


Apostólica. Ele é o João chamado de Marcos (At 12:25). O seu segundo nome
indica haver possibilidade de ser ele de origem também latina. O uso de palavras
romanas em seu evangelho escrito em grego e a tentativa de explicar o significado
de costumes judaicos fortalecem esta posição (Mr 7:3-4; legião, Mr 5:9; centurião,
Mr 15:39; pretório, Mr 15:16; executor, Mr 6:27; quadrante, Mr 12:42). Além
disso podem justificar a declaração que sua audiência não era primariamente
judaica, e sim romana.

3  Atos 12 descreve que na casa de Maria, mãe de João


Marcos, achava-se a igreja reunida orando pela libertação de Pedro. Ele quando
foi libertado dirigiu-se a esta residência sendo recebido por Rhode. Desses
detalhes se depreende que a família de João Marcos deveria ser abastada, por Ter
uma criada e uma casa de suficiente tamanho que servisse de reunião da igreja em
Jerusalém.

4  Marcos foi levado por Paulo e Barnabé em sua primeira


viagem missionária. Ao chegar em Pafos, na Panfília, João Marcos Não
suportando, possivelmente, as agruras da viagem missionária voltou para
Jerusalém (At 13:5, 13). A atitude de Marcos na visão de Paulo era de um cristão
sem raízes, pois logo vindo o sofrimento ele se separou dos seus companheiros de
viagem, voltando ao seu lar em Jerusalém. Em razão disso Paulo não o quis levar
em sua segunda viagem (At 15:36-40).

a  Além disso a tradição vem sustentando que o jovem


mencionado em Marcos 14:51-52 é o próprio João Marcos. Ele teria fugido nu na
hora difícil da crucifixão de Cristo. Apesar destas circunstâncias João Marcos
tornou-se um eficiente missionário em seus dias, pois é identificado por Paulo
como seu cooperador (Fm 24; Cl 4:10), e ainda declara que Marcos era muito útil
ao ministério (2Tm 4:11). Pedro também no final de sua primeira carta dirige-se a
Marcos como seu filho (1Pe 5:13).

b  Tais circunstâncias levaram Marcos a retratar com


exclusividade o medo manifestado pelos discípulos (Mr 4:40-41; 10:32). Em
Marcos predomina a atmosfera de pavor, pois as mulheres aterrorizadas se

23
calaram, demonstrando que o medo paralisa a ação missiológica (Mr 16:8).1 De
acordo com as palavras do evangelista, “possuídas de temor e de assombro; e, de
medo, nada disseram a ninguém” (Mr 16:8).2 E possivelmente ele termina seu
evangelho retratando a fraqueza dos seus discípulos, cujo medo os incapacitava
para a realização da missão. Os melhores manuscritos encerram o evangelho de
Marcos neste ponto. Embora seja considerado um término impróprio, o restante
do capítulo aparece em manuscritos gregos como uma alternativa
reconhecidamente não original. Este final harmoniza-se com o retrato da fraqueza
humana que ele procura retratar.

c  Ao mesmo tempo o evangelista ressalta a disposição


de Cristo em confiar em homens inseguros na sua fé (Mr 6:7-13; cf. 6:52; 8:2-5,
17-18; 9:28-29, 38-39; 10:13-16, 26-31; 14:37-42, 50, 71). Ao retratar tal postura
ele parece querer incentivar aqueles que enfrentavam sérias dificuldades em
seguir a Cristo. Esta é uma clara ênfase deste evangelista.

5  Autoria deste evangelho  É de Papias (150) a primeira


declaração de que Marcos é o autor do evangelho. É improvável que a Igreja
atribuísse o segundo evangelho a João Marcos se isso não fosse verdade uma vez
que ele era uma figura secundária.

a  Irineu e Clemente discordam quanto ao tempo em


que foi escrito o evangelho. O primeiro declarou que foi escrito depois da morte
de Pedro, enquanto o segundo afirma que Pedro estava vivo quando o evangelho
foi escrito. Sabe-se, entretanto, que ele deve Ter sido escrito entre 55 a 70 AD.

6  Forma da narrativa  Marcos está mais interessado em


relatar o que Jesus fez do que o que Ele disse. Seu evangelho é composto
predominantemente de eventos, e os discursos ou são reduzidos (Mt 24; cf. Mr
13), ou não existem (Mt 5-7). As cenas se sucedem rapidamente e são mais
vividamente relatadas. O uso do termo eujquv e seu correlato (imediatamente,
logo depois) ocorrem mais de 42 vezes, mais do que todo o restante do Novo
Testamento. O uso do grego é simples, quase infantil. A narração não é tão
elegante nos outros sinópticos. Contudo sua narração é dinâmica, repleta de muita
movimentação. Há um mínimo de discurso e o máximo de obras.

a  Seu evangelho se inicia com a mensagem de João


Batista e termina com a mensagem do anjo no túmulo vazio. Dentro destes dois

1
Riley Harold, The Making of Mark: An Exploration(Macon, GE: Mercer
University Press, 1989), 197-204.
2
Para a discussão da crítica textual de Marcos 16:9-20, ver: Robert H.
Gundry, Mark: A Commentary on His Apology for the Cross (Grand Rapids, MI:
Eerdmans, 1993), 1009-1021; Nolan B. Harmon, ed., The Interpreter’s Bible
(Nashville, TN:Abingdon Press, 1951), 7:915; Champlin, O Novo Testamento
interpretado versículo por versículo, 1:800-803; Harold, 197-204; Archibald
Thomas Robertson, Word Pictures in the New Testament (Grand Rapids, MI:
Baker Book House, 1930), 1:402-404.

24
extremos ele acomoda seu material predominantemente descritivo e narrativo. Ele
começa sua narrativa logo com Jesus sendo batizado para em seguida falar de seu
ministério.

b  Marcos apresenta a melhor descrição da humanidade


de Cristo ao falar de suas emoções (pesar, ira, surpresa, tristeza - Mr 3:5; 6:6, 34;
7:34; 8:12, 33; 10:14, 21), profissão (carpinteiro e não só filho de carpinteiro - Mr
6:3), cansaço (6:31), fome (11:12).

c  Cerca de 1/4 do livro trata dos eventos da paixão, a


última semana de Sua vida. Cristo é retratado como Príncipe dos Sofredores, para
mostrar que o caminho dos seus discípulos não poderia ser diferente. O tema do
sofrimento ainda aparece no seio familiar e da sociedade. Na tentação está
cercado de animais selvagens. Há fortes declarações sobre o custo do discipulado
e a perseguição (Mr 1:12-13; 3:21-30, 31, 35,; 8:32-38; 10:30, 33-34, 45; 13:8,
11-13). A instrução é clara que o discipulado levará ao sofrimento e à morte. A
vida de Cristo e de seus seguidores é dolorosa.

d  Justaposições criativas  Marcos coloca narrativas


lado a lado sem nenhuma aparente relação. Mas de fato elas são melhor
entendidas quando se verifica o relacionamento existente entre elas. Na
justaposição de histórias existe um entrelaçamento entre elas. Cada história
completa o significado da outra. O exemplo dessa característica de Marcos está
na relação da purificação do templo e na maldição da figueira em Marcos 11:11-
25. A figueira é uma das árvores que na Escritura é usada como símbolo de Israel,
que por ser estéril foi posta sob maldição. Enquanto o templo foi encontrado em
falta, pois a liderança de Israel transformara a casa de oração em covil de
salteadores. Em seguida Cristo fala sobre oração independente do templo, que era
reconhecido como “casa de oração para todos os povos.” Não é estranho que logo
depois ele prediz a destruição final do templo (13:2).

7  Divisão Básica  Marcos atribui a Cristo 2 títulos com base


em duas confissões: (1) a de Pedro em Marcos 8:29 (Cristo) e a do centurião em
Marcos 15:39 (Filho de Deus), com base nestas declarações divide-se o evangelho
em duas partes. A primeira parte: Marcos 1:1 a 8:30, enquanto a segunda parte
começa com Marcos 8:31 e vai até 16:8. A primeira parte chega ao clímax com a
declaração de Pedro de que Jesus é o Cristo. Deste ponto se inicia uma dramática
mudança que se constitui do tema principal da segunda parte: “Então começou ele
a ensinar-lhes que era necessário que o Filho do Homem sofresse muitas coisas,
fosse rejeitado . . . e . . . fosse morto” (Mr 8:31). O tema do sofrimento presente
na primeira parte, agora assume nos lábios de Jesus o assunto focal da segunda
parte. Casa uma delas está dividida em três seções que mantêm entre si uma
relação de similaridade ou de oposição.

a  Depois de uma introdução geral (1:1-15), a primeira


parte está constituída de três seções: 1:16 a 3:12; 3:13 a 6:6; 6:7 a 8:30. Cada
seção dessas se inicia com uma história sobre os discípulos (1:16-20; 3:13-19;
6:7-13) e termina com um resumo que envolve a mensagem da seção: (1) 3:7-12
grandes multidões são atraídas a Cristo que recebem os benefícios de Suas curas e

25
Seus ensinos. A seção termina com a declaração dos demônios de quem é Jesus:
“Tu és o Filho de Deus” (3:11; cf. 1:1). (2) 6:1-6 uma atmosfera de conflito
perpassa por toda esta seção. São os seus conterrâneos de Nazaré que o rejeitam
em uma relação de oposição com a seção anterior quando as multidões o recebem.
(3) 8:22-26 a cura do cego em dois estágios (só em Marcos) mostra o que deve
acontecer com os discípulos. No decorrer desta seção eles estão interessados em
saber quem é Jesus. Apesar de verem os milagres que Ele fazia e ouvir-Lhe os
discursos eles não entendem, da mesma maneira que o cego cuja visão restaurada
ainda está distorcida (vejo homens . . . como árvores . . . andando). Jesus então
lhe restaura a visão totalmente (“passando a ver claramente,” “distinguia de modo
perfeito”). O mesmo se dá com a exposição de Marcos nas palavras de Pedro:
“Tu és o Cristo.” Aqui se chega ao clímax da primeira parte. É a conclusão de
seu primeiro objetivo: O Jesus de Nazaré é o Messias anunciado nas profecias do
Antigo Testamento e aguardado pela nação israelita (Mr 8:29).

b  A segunda parte do evangelho de Marcos também se


divide em 3 seções: (1) 8:31 a 10:52, que termina com a cura de um homem cego
como na terceira seção da primeira parte; (2) 11:1 a 13:37 focaliza o ambiente de
conflito e oposição como na seção correspondente da parte anterior; (3) 14:1 a
16:8 relatando a história da crucifixão de Jesus cujo clímax é atingido com a
declaração do centurião: “Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus” (Mr
15:39), que se relaciona com o propósito do livro expresso em Marcos 1:1:
“Princípio do evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus.

ESBOÇO DO EVANGELHO DE MARCOS:


I  Preparação para o Ministério, Outono de 27 AD, 1:1-13.
II  Ministério na Galiléia, Páscoa, 29-30 AD, 1:14 a 7:23.
A  Ministério na Galiléia - 1:14-34.
B  Primeira Viagem Missionária - 1:35-45.
C  Ministério em e próximo a Cafarnaum - 2:1 - 3:19.
D  Segunda Viagem Missionária - 3:20  5:43.
E  Terceira Viagem Missionária - 6:1  7:23.
III  Afastamento do Ministério Público, Primavera a Outono, 30 AD, 7:24
a 9:50

A  Ministério nas Regiões Limítrofes da Galiléia  7:24-8:10.


B  Olhando para a Cruz  8:11-9:50.
IV  Ministério na Peréia, Outono a Primavera, 30-31 AD, 10:1-52.

V  Término do Ministério em Jerusalém, Páscoa, 31 AD, 11:1 a 15:47.

26
A  Conflito como os Escribas e Fariseus  1:11-12:44.
B  Sermão Profético  13:1-37.
C  Prisão e Julgamento de Cristo  14:1  15:20.
D  Crucifixão e Sepultamento  15:21-47.
VI  Ressurreição e Cristofanias  16:1-20.

EVANGELHO DE MARCOS: Dividido em duas partes.

INTRODUÇÃO: 1:1-15

a  Propósito Geral : 1:1


Filho de Deus

1ª SEÇÃO  1:16 a 3:12


a) 1:16-20  História sobre os discípulos  início
1) Curas
b) 3:7-12  Resumo da mensagem da seção  término
1) Resumo narrativo das curas
2) Espírito imundo o reconhecem como o Filho de Deus
2ª SEÇÃO  3:13 a 6:6
a) 3:13-19  História sobre os discípulos  início
1) Incompreensão
b) 6:1-6  Resumo da mensagem da seção  término
1ª PARTE
1) Ensinando sobre o reino  resumo
1:1 e 8:30
3ª SEÇÃO  6:7 a 8:30
JESUS É O
CRISTO a) 6:7-13  História sobre os discípulos  início
1) Jesus não é entendido: João Batista, Elias, Profeta, Fantasma.
2) Judeus não entendem
3) Mulher cananéia
b) 8:22-26  Cego 2 estágios: visão turva - restaurada - resumo - término.
1) Discípulos com visão restaurada  Pedro

27
1ª SEÇÃO  8:31 a 10:52
a) Termina com a cura dum cego como na 3ª seção  visão
aberta
2ª PARTE b) Começa com a incompreensão
2ª SEÇÃO  11:1 a 13:37
8:31  16:8
a) Ambiente de conflito e incompreensão como na 2ª seção
JESUS É O anterior
FILHO DE 3ª SEÇÃO  14:1 a 16:8  Crucifixão  Declaração do centurião -
DEUS
Filho de Deus (Mr 15:39, cf. Mr 1:1).
ÊNFASE NA a) Julgamento
PAIXÃO
b) Morte
c) Ressurreição
Epílogo  16:9 e 20

8  Conteúdo do evangelho  Sua mensagem pode muito bem


ser resumida nas seguintes palavras: “Pois o próprio Filho do Homem não veio
para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mr
10:45). Este é o centro do evangelho onde o autor apresenta Cristo como o Servo
Sofredor em dois aspectos: (1) A disposição de Cristo em servir  “não veio para
ser servido, mas para servir.” (2) Sua disposição de sofrer para salvar  “dar a sua
vida em resgate de muitos.” A Sua morte tornou-se neste evangelho a
comprovação final do seu objetivo, “Jesus Cristo, Filho de Deus.” O centurião
vendo os acontecimentos da paixão ficou convencido da divindade de Cristo ao
declarar que “verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus.”
a  Há desde o começo do evangelho uma
evidente situação de conflito, ela é mais evidente por ocasião da cura do paralítico
de Cafarnaum, quando Jesus declarou-lhe o perdão dos pecados. A reação dos
escribas foi pronta, dizendo que o perdão é um atributo exclusivo de Deus como
ensina o Antigo Testamento (Is 43:25; 44:22). Para os judeus, “perdoar pecados
era uma apropriação sacrílega.”1 O que se segue é uma atitude mais decidida de
Cristo, que comprovou Sua autoridade de perdoar pela cura do paralítico (Mr 2:1-
12). Os conflitos com as autoridades judaicas aumentaram de intensidade após as
curas realizadas em dia de Sábado. A partir deste fato manifestou-se,
explicitamente, a intenção dos judeus de matá-Lo (Mr 2:23-3:6). O clima de ódio
cresceu mais ainda quando Jesus sendo acusado de curar pelo poder dos demônios
declarou que os doutores da lei eram culpados de blasfemar contra o Espírito
Santo, que era um pecado sem possibilidade de perdão (Mr 3:20-30). Mais
adiante no transcurso da história, os judeus O acusam de ensinamentos contrários
às leis de higiene, enquanto Jesus os acusa de hipocrisia. Cristo percebendo as
circunstâncias que O cercavam, Jesus anuncia a Sua morte (Mr 8:31). Reiteradas
vezes Ele repete que a morte era a finalidade de Sua missão (Mr 9:31; 10:32-34,

1
G. C. Berkouwer, A pessoa de Cristo (São Paulo: ASTE, 1964), 129.

28
45). Até que finalmente Ele acrescenta à predição de Sua morte o conceito
teológico, “em resgate por muitos” (Mr 10:45; cf. Is 53). Os acontecimentos
seguintes levaram as autoridades judaicas a arquitetarem a Sua morte. As
autoridades judaicas depois que decidiram eliminar a Cristo (Mr 14:1-2)
procuraram fundamentar diante do povo judeu sua acusação com base no pecado
de blasfêmia, que impunha a lapidação como pena (Lv 24:16). Diante da
conjuração de Caifás, o Mestre reconheceu Sua natureza divina e foi declarado
culpado e digno de morte (Mr 14:53-65). É a Sua morte que valida a alegação
inicial de Marcos de que Jesus é o “Cristo, o Filho de Deus.”1

X  O EVANGELHO DE MATEUS

1  Dados Pessoais  Seu nome testifica de sua dupla origem


hebraica. Ele é chamado nos evangelhos de Levi (Mr 2:15; Lc 5:27) e Mateus
(Mt 9:9). Ele era, contudo, um judeu incomum por ser cobrador de impostos. A
função podia ser alcançada por licitação ou por indicação da autoridade romana da
região específica. Não se pode saber com segurança que tipo de publicano era
Mateus, contudo era certo que se tratava de uma pessoa impopular, até mesmo
odiado por ser considerado um traidor da causa judaica. Muitos dos coletores
extorquiam o seu próprio povo cobrando impostos indevidos. O publicano era por
tudo isso comparado na vida social judaica às prostitutas, gentios e quebradores
do Sábado. Era uma pessoa sob condenação popular, e por ser publicano sua
presença na sinagoga era rejeitada. A única opção de vida que lhe sobrava era
viver das beneces que o dinheiro lhe proporcionava. Mateus deve Ter sido um
homem que viveu com fortes conflitos interiores e exteriores. Sua vida não tinha
nenhuma perspectiva espiritual dentro de uma sociedade marcadamente religiosa.
Apesar disso, foi ele quem ofereceu um banquete a Jesus em que estiveram
presentes publicanos e pecadores (Mt 9:10; 10:3).

a  A conversão de Mateus é registrada em seu


evangelho sem nenhum processo anterior. Da função de coletor, por causa de uma
palavra de Cristo, Mateus tornou-se um seguidor de Cristo com todas as suas
conseqüências. Sua conversão significou abandono de sua profissão. Isto
significou abandonar a riqueza e escolher a pobreza, deixar a segurança para optar
pela perigosa vida de um missionário, abrir mão de sua autodeterminação para se
tornar um discípulo com todos os compromissos da dependência do Mestre.

2  Autoria do Evangelho  Cerca do ano 140 AD, Papias de


Hierápolis como citado por Eusébio declara que Mateus escreveu os oráculos na
língua hebraica. De acordo com Irineu, também citado por Eusébio, Mateus
publicou o evangelho em sua própria língua, enquanto Pedro e Paulo estavam
fundando a igreja em Roma. Assim conclui que este evangelho foi escrito por
Mateus em aramaico ou hebraico. Esta posição não tem a concordância de todos.
Alguns sugerem que Papia e Irineu não se referem ao evangelho como nós o
conhecemos hoje, mas a uma tradição oral. Os argumentos em favor de Ter sido

1
John Stott, Homens com uma mensagem (Campinas, SP: Editora Cristã
Unida, 1996), 12-28.

29
escrito em grego são os seguintes: (1) o grego de Mateus não tem características
de obra traduzida, (2) os aramaismos que ocorrem no evangelho e nos outros
podem refletir o pensamento aramaico e hebraico do autor, (3) há uma
uniformidade de estudo e linguagem, (4) há uma similaridade com o grego de
Marcos e menor com o grego de Lucas. O que parece eliminar que Mateus seja
uma versão para o grego.

a  A tradição de Papias diz também que Mateus


escreveu o evangelho que leva seu nome em hebreu ou aramaico. Hoje, contudo,
só se possui seu evangelho na tradução grega. A permanência de palavras
semíticas tem sido usada para confirmar ou duvidar de que Mateus é o autor deste
evangelho que tem o seu nome.

b  Alguns advogam que o grupo de palavras semíticas


(Emmanuel - Mt 1:23; Eli, Eli lamá sabactâni - Mt 27:46) se refere a uma coleção
de textos que comprova a messianidade de Cristo segundo a escolha de Mateus.
Por outro lado, outros acham que tais textos são resquícios da fonte “Q” que ainda
permanece no evangelho, como uma interpretação de Mateus do significado de
Jesus ao daquela oferecida pelo evangelho de Marcos. Neste caso a tradição de
Papias é negada, uma vez que não há nenhuma referência à versão de Mateus do
seu original semítico.

c  Modernos eruditos negam que Mateus escreveu o


evangelho que leva seu nome. Alguns sugerem que Mateus teria escrito o
documento “Q” (uma coletânea de anotações feitas por Mateus dos ensinamentos
de Jesus), e que indevidamente ligou-se pela tradição à autoria do primeiro
evangelho (ordem), portanto um desconhecido autor do I século o teria escrito.
Outros afirmam que Mateus escreveu a ambos (a fonte “Q” e o evangelho), e que
as anotações de “Q” foram incorporadas em seu próprio evangelho, uma vez que
ele não teria incorporado em seu evangelho informações de um autor que não
fosse apóstolo (Marcos).
(1) A tradição da Igreja Cristã Primitiva é
unânime em afirmar que Mateus é o autor do primeiro evangelho. A hábil
organização deste evangelho e por ser ele o único a se referir a questão do
pagamento de tributos a César confirmam que Mateus é o seu autor (Mt 17:24-
27). Além disso ele é o único que ao relatar o episódio do chamado coletor de
impostos o identifica como Mateus, nome omitido por Marcos e Lucas.
(2) A data deste evangelho está relacionada com a
possibilidade de Mateus Ter feito empréstimos do texto de Marcos. Assim sendo
Mateus teria sido escrito pouco tempo depois de Marcos. Alguns eruditos
modernos preferem datar este evangelho para as décadas de 80 a 90 do I século
AD, em razão da profecia sobre a destruição de Jerusalém que ocorreu no ano 70
AD, e sobre sua doutrina eclesiológica que teria assumido relevância quando os
primeiros cristãos perderam progressivamente a noção de urgência para a
Parousia (Mt 24).

3  Forma da Narrativa  Mateus escreve para a igreja como a


nova nação escolhida, que tinha substituído a nação escolhida de Israel. O

30
evangelho começa com a narrativa do nascimento virginal de Cristo, em seguida
ele insere cinco discursos de Cristo na estrutura narrativa de Marcos. Cada
discurso termina com uma expressão semelhante a: “quando Jesus acabou de
proferir estas palavras” (Mt 7:28; 11:1; 13:53; 19:1; 26:1).

a  Este estrutura quíntupla dos discursos sugere que


Mateus retrata Jesus como um novo e maior Moisés para benefício do povo de
Israel. Como Moisés, Jesus fala de Sua lei de uma montanha. O número de
discursos corresponde aos livros de Moisés, reconhecidos como Pentateuco. A
fraseologia para descrever o nascimento e a transfiguração de Cristo é em alguns
aspectos emprestada daquela usada na história de Moisés (Mt 2:13, 20-21; 17:2, 5;
cf. Êx 2:15; 4:19-20; 34:29; Dt 18:15). No sermão da Montanha os ensinamentos
de Cristo são postos em paralelo com a lei mosaica em uma série de declarações
(Mt 5:21, 27, 31,33, 38, 43; cf. Lc 6:27-35). Mateus procura organizar sua frases,
expressões, discursos e parábolas agrupando-as por temas, formando o todo uma
ralação entre a narrativa e o discurso. Ele não os agrupa em ordem cronológica,
mas temática. A narrativa introduz o discurso e o discurso explica o relato. Desta
forma poder-se-ia Ter a seguinte estrutura literária:

ESBOÇO DO EVANGELHO DE MATEUS

PRÓLOGO
(A promessa e oposição ao Reino)
1:1  2:23
1  Narrativa  3:1-4:25 (Estabelecimento do Reino
1  Discurso  -5:1-7:29 (Natureza do Reino)
 oposição)
2  Narrativa  8:1-10:4 (Enfermidades, milagres do
2  Discurso  10:5-11:1 (O poder do Reino)
poder do Reino)
3  Narrativa  11:2-12:50 (A incompreensão sobre
3  Discurso  13:1-53 (O mistério do Reino)
o Reino)
4  Narrativa  13:54-17:27 (Oposição crescente) 4  Discurso  18:1-19:2 (Disciplina do Reino)

5  Narrativa  19:3-23:39 (Hostilidade e discórdia) 5  Discurso  24:1-25:46 (Consumação do Reino)

CLÍMAX
(Paixão e poder do Rei)
26:1-28:20

4  Conteúdo do Evangelho (Natureza do Reino)  Do Prólogo


ao Primeiro Discurso  O prólogo é constituído de cenas que tratam do início da
vida de Cristo: Genealogia, Nascimento, Infância, Matança dos inocentes e Volta
do Egito para Nazaré. Cada uma delas termina com um texto do Antigo
Testamento (Mt 1:23; 2:6; 2:18; 2:23). Já no prólogo fica claro que Mateus quer
comprovar à mente judaica que Jesus é o Messias, haja vista o cumprimento
profético das profecias messiânicas.

a  Os títulos “Filho de Davi” e “Filho de Abraão”


aparecem na primeiras palavr4as do evangelista. O Messias é a um tempo

31
descendente da casa real e descendente da promessa abraâmica. Aqui em Mateus
as idéias de realeza e salvação estão unidas. Ele não é meramente da
descendência real, porém, inclusivemente, da descendência da promessa feita a
Abraão e interpretada por Paulo em Gálatas como sendo ele mesmo o descendente
prometido (Gl 3:16). A idéia de sacrifício substitutivo está claramente incluída na
promessa abraâmica no episódio do sacrifício de Isaque (Gn 22:2, 8, 13). O
Messias é o Rei prometido da dinastia davídica como o Servo Sofredor, cujo
sacrifício é a expiação pelos pecados.

b  Este Reino é estabelecido em oposição aos reinos


deste mundo. Este aspecto está revelado no seu nascimento, infância e na
pregação de João Batista. Por ocasião do nascimento de Jesus, os magos, vindos
do oriente, na sua busca relacionaram o título “rei dos judeus” com a adoração e o
ato de ofertar. “Onde está aquele que é nascido rei dos judeus? Vimos sua estrela
e viemos adorá-lo” (MT 2:2; cf. 2:11). “Através da humilde aparência exterior de
Jesus reconheceram a presença da divindade. Deram-lhe o coração como a seu
Salvador, apresentando suas dádivas . . .”1 Apesar de todo este interesse dos
magos pagãos no Reino de Deus, este episódio ocorre numa situação de
antagonismo com os reinos deste mundo. Isto está evidente no desinteresse
judaico e no ódio de Herodes ao nascido rei dos judeus. O mesmo se dá no
episódio das tentações de Cristo, em que Jesus se coloca contra o domínio de
Satanás nas tentações (Mt 2:3-23).

c  Na base das tentações está clara a contestação ao Pai


que havia declarado que Jesus era Seu filho amado. Através da conjunção SE,
Lúcifer introduz uma oração de condição de primeira classe, que declara uma
verdade duvidando-a. Trata-se de uma oração conclusiva e condicional ao mesmo
tempo. Gramaticalmente condicional, e ideologicamente conclusiva: Já que você
é filho de Deus, se de fato é. Aqui Jesus é tentado e Deus é contestado. A
tentação básica era Jesus ser o Messias-Rei sem ser o Messias-Sofredor.2 Os
reinos deste mundo tinham que ser conquistados através da luta contra o príncipe
deste mundo. Só poderia haver reino dos céus pela destruição do reino deste
mundo. Pecado e morte são correlativos e ambos pertencem a Satanás cujo reino
se opõe ao de Cristo. “Não sem obstáculo, devia o comandante celestial
conquistar a humanidade para Seu reino. Desde criancinha, em Belém, foi
continuamente assaltado pelo maligno. . . e nos conselhos de Satanás, decidiu-se
que fosse vencido . . . Foram-lhes soltas no encalço as forças da confederação do
mal, empenhando-se contra Ele, no intuito de, se possível, vencê-Lo.3 O Servo-
Sofredor era Sua missão. “A missão de Cristo só se podia cumprir através de
sofrimento. Achava-se diante d’Ele uma existência de dores, privações, lutas e
morte ignominiosa. Cumpria-lhe carregar sobre si os pecados de todo o mundo.

Ellen G. White, O desejado de todas as nações (Santo André, SP: Casa


1

Publicadora Brasileira, s.d.), 53.


2
Joachin Jeremias, Teologia do Novo Testamento (São Paulo: Edições
Paulinas, 1977), 119.
3
Ellen G. White, O desejado de todas as nações, 101.

32
Tinha de sofrer a separação do amor do Pai.”1 Diante desta oposição era
necessário apresentar-se a verdadeira natureza do reino de Deus. Na busca do
significado do Sermão da Montanha a teologia se divide em pelo menos quatro
concepções:
(1) Concepção Perfeccionista  Obedece e
viverás. É uma exigente ética perfeccionista. Trata-se da vontade do Pai e que
deve ser obedecida mais restritamente do que a ética judaica. Esta concepção
originou-se com Hans Windish, professor de exegese neotestamentária de Halle,
segunda década deste século.
(2) Concepção do Ideal Inatingível  Baseada na
ortodoxia luterana. A lei é vista como uma pedagogia da salvação pelo processo
do desespero. A exigência moral mosaica é levada a um extremo radicalizante.
Como ninguém consegue alcançar esta ética, ele se depara com sua insignificância
moral para cumpri-la. A lei é o preparatio evangélica que revela ao homem sua
incapacidade, conduzindo-o ao desespero, ela lhe abre os olhos à maravilha da
graça de Deus.
(3) Ética de emergência  Esta concepção se
baseia no fato que o Sermão da Montanha se fundamenta na iminente crise que se
avizinha, conforme declarações de Cristo. O fim está próximo e com ele, e antes
dele, estão terríveis catástrofes. Para um tal tempo se faz necessária uma moral
fundada na urgência do tempo. Para tal época é preciso um esforço supremo para
viver moralmente em harmonia com as exigências morais do Sermão do Monte.
Estas três concepções vêem este sermão como uma expressão da Lei.
(4) Conceito Soteriológico de Joachin Jeremias 
Para ele o dom de Deus precedeu suas exigências morais do Sermão da Montanha.
Logo trata-se de uma exposição do evangelho e não da exposição da Lei. Para
ele, Cristo está se dirigindo a homens libertados do domínio de Satanás, mediante
a concepção do perdão. Nas bem-aventuranças, Cristo se apresenta como o
Salvador dos pobres, o consolador dos que sofrem, a herança dos mansos, o
supridor de justiça. Este que foram alvos destas bênçãos são cidadãos do céu, e
portanto, devem exibir naturalmente uma justiça superior. São homens que,
segundo J. Jeremias, já vivem no Reino de Deus.
(5) Natureza do Reino  Este discurso de Cristo
não é apenas para tratar dos cidadãos do reino como o fizeram todas as teorias
anteriores, mas antes para falar da natureza do Reino, que tinha sido adulterada na
teologia judaica. O Reino de Deus se caracteriza pelos “makarismos.” Deus é a
fonte de todas as beatitudes do seu reino em favor dos seus súditos. Ser bem-
aventurado é receber o reino de Deus presente e futuro na sua vida. Portanto,
bem-aventurança é a irresistível alegria espiritual que o homem possui ao
participar na salvação do Reino de Deus presente e futuro. É a felicidade dos que
se alegram na salvação em Jesus nos frutos que a seguem. Cobrir o pecado e
salvar o perdido é a verdadeira natureza do Reino de Deus exposto por Cristo em
Seu sermão.

1
Ibid., 113.

33
5  O Poder do Reino dos Céus  2º bloco narrativo e
conceptual, Mateus 8:1 a 11:1  Os relatos desta seção são dez milagres: cura do
leproso, servo do centurião, sogra de Pedro, tempestade, libertação de
endemoniados, paralítico, mulher com hemorragia, ressurreição da filha do chefe
da sinagoga, cura dos cegos e cura do endemoniado mudo. Intercalados com estes
milagres aparecem textos com matéria de outra natureza como o preço do
discipulado, vocação de Mateus, refeição na casa dos pecadores e jejum. Segue-
se o envio dos doze dando-lhes o mesmo poder para expelir demônios, curar
enfermos e pregar, o mesmo que Ele tem feito. O mesmo poder de Cristo
demonstrado no Seu ministério é agora conferido aos seus apóstolos para
exercerem a missão de anunciar as boas novas. A realização da missão envolve a
comunicação do poder e de instruções quanto a mensagem a ser pregada, as
advertências quanto às dificuldades, os estímulos dentro de um senso de realidade
e finalmente as recompensas. Esta focalização dos milagres pode ser também
entendida como uma resposta ao questionamento posterior de João Batista sobre a
messianidade de Jesus (11:3-5).1

6  O Ministério do Reino dos Céus  3 º bloco narrativo e


conceptual, Mateus 11:2 a 13:53  Nesta seção aparecem cenas nas quais Jesus
não é compreendido. Mesmo o mais bem intencionado (João Batista) não o
consegue entender; “És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar
outro?” João o havia apresentado como juiz e como aquele que batiza com o
Espírito Santo e com fogo, agora ele O vê sentado com os pecadores (Mt 9:10-17)
e os perdoa. A resposta de Jesus é dada com base no significado do Servo
Sofredor de Isaías. O julgamento já começou no momento exato em que cada
pessoa se encontra com Jesus. Em seguida Ele usa a pessoa de João Batista e a
Sua mesma para mostrar que as pessoas não entenderam a missão de João Batista
e muito menos a d’Ele: “Veio João que não comia nem bebia, e dizem: tem
demônio! Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizem: Eis aqui um glutão
e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores” (Mt 11:18-19). Ele
continua sendo mal entendido pelos fariseus em duas oportunidades: quando seus
discípulos colhem espigas no Sábado e Ele cura diversas enfermidades, quando é
acusado de curar as pessoas pelo poder de Satanás. Eles entendiam muito mal os
atos de Cristo, quando deveriam ver em suas obras a implantação do Reino dos
Céus, os fariseus declaram ser tais obras evidência da origem satânica de Cristo.
Agora é a vez da mãe de Cristo. Ela vem buscá-Lo por não entender sua missão.
Cristo procura explicar-lhe o vínculo que Ele tem com Seus seguidores: “qualquer
que fizer a vontade de meu Pai celeste, esse é meu irmão, irmã e mãe” (Mt 12:46-
50).

a  Tudo isto demonstra que Jesus não é entendido por


ninguém, nem pelos Seus mais íntimos seguidores e muito menos por Seus
opositores. Diante desta situação Ele começa a explicar o mistério do Reino dos
Céu, através de sete parábolas. Parábola é uma justaposição de idéias, uma
comparação, por uma coisa ao lado da outra para esclarecer. É, portanto, uma

1
Donald A. Hagner, Mathew 1-13, em: David A. Hubbard, Glenn W.
Barker, Word Biblical Commentary (Dallas, TX: Word Books, 1993), 33a:195.

34
narrativa cujo propósito primário é ensinar a verdade, ou uma verdade específica.
É um espelho através do qual uma verdade pode ser vista, e ela (a parábola) não é
necessariamente uma verdade em si mesma. Ela é uma ponte através da qual uma
verdade espiritual é esclarecida e ensinada. Tais narrativas se referem a fatos
conhecidos dos ouvintes que ajudam a esclarecer por comparação a verdade a ser
ensinada. Logo, os detalhes da parábola não devem ser usados para se ensinar
outros assuntos além daquele a que ela se propõe (Jz 9:7-15). Esta parábolas estão
divididas em dois blocos, formando três pares:
(1) Semeador (separação) O reino dos céus
produzirá frutos apesar de toda oposição que lhe é imposta. Deve-se, contudo,
perceber que há de existir uma separação entre os diversos tipos de pessoas
(terrenos) onde a mensagem é semeada. O semeador é o próprio Cristo. Ele
planta Sua Palavra no coração do homem.
(2) Joio (separação) É uma resposta para
aqueles que querem que o juízo venha logo. O juízo, contudo, só virá no final. A
atitude correta com o Reino dos Céus é de espera e confiança na sabedoria de
Deus, pois só Ele é capaz de saber quem vai ser rejeitado ou aceito no Seu reino.
Isto só ocorrerá no dia final, e só Ele é capaz de fazer esta separação. Estas duas
parábolas enfatizam que a separação não acontece antes da colheita final. O
Messias é este juiz quem crê nEle não é julgado, mas que mO rejeita já está
julgado (condenado) (Jo 3:16-21).
(3) Grão de Mostarda (magnitude e grandeza)
Trata-se de uma resposta àqueles que querem ver o reino em sua plenitude. A
plenitude chegará, mas ela já está presente no coração das pessoas que O aceitam
como o Rei de um novo Reino, o Reino da Graça. Na aparente pequenez,
semelhante a um grão de mostarda, está escondida a sua grandeza. Na pequenez
de Sua natureza humana, Cristo abriga em Si a grandeza de Seu reino.
(4) Fermento (magnitude e grandeza) O
crescimento do reino de Deus é primeiramente interior, no coração das pessoas. O
reino de Deus cresce e se espalha silenciosamente, conquistando novas pessoas e a
pessoa toda em todas as direções. Trata-se portanto da magnitude do Reino de
Deus e do Seu Rei. Estas duas parábolas enfatizam a magnitude do reino de Deus
com seu crescimento silencioso, porém irresistível. Estes dois pares de parábolas
têm o propósito esclarecer a natureza e a finalidade do ministério de Cristo,
entendido como reino. Os verdadeiros discípulos compreendem melhor, enquanto
os falsos discípulos complicam-se cada vez mais para entender o significado
messiânico do ministério de Cristo. Nas últimas três parábolas, duas enfatizam a
relevância do reino em relação a todos os bens dessa vida, e termina voltando ao
tema dos que serão aceitos e rejeitados na separação final.
(5) Tesouro (valor)  O seu valor é tão grande
que é vantajoso vender-se tudo o que se possui para se obter este tesouro. O
Reino de Deus é um precioso tesouro, que compensa vender-se todos os bens para
tê-lo como um valor eterno. Cristo é o tesouro de grande valor que compensa
vender-se tudo que se possui para tê-Lo e ao Seu reino.

35
(6) Pérola (valor)  Quem acha a pérola de
grande valor a considera mais valiosa que todas as coisas, por isso também vende
tudo que tem para possuí-la; o inestimável valor do amor redentor. Apresenta a
Cristo como o Salvador em busca de homens, e homens em busca de salvação.
Cristo é a preciosa pérola. Trata-se aqui da relevância dEle e do Seu reino.
(7) Rede (separação)  A pregação do Reino
deve ser feita a todos sem acepção. Ela retorna a atitude de separação entre bons e
maus. Esta separação é realizada pelos anjos no eschaton, quando Cristo em Sua
glória voltar à Terra. Cristo é o Rei glorioso que há de vir.

b  Estas parábolas visavam esclarecer a verdadeira


natureza do Rei e do Seu reino. Jesus é o Rei que Israel finalmente espera, mas
suas esperanças só se realizarão depois que o Semeador lhes puser a semente do
evangelho em seu coração. Sendo ele recebido como o tesouro ou a pérola de
grande preço, ele crescerá no homem e no mundo até que o Dia Final chegue
quando o Messias separará os bons dos maus.

7  A Disciplina do Reino  Sua grandeza (13:54-19:2)  No


início do relato Jesus é rejeitado em Nazaré, porque os seus conterrâneos não
podem ver a grandeza do Messias. Ele era para eles uma pessoa comum, logo não
podia ser Ele o Messias. Tinham os habitantes de Nazaré uma noção errada do
que significa ser grande. Os dois milagres de multiplicação mostram que a
grandeza do Seu reino é Ter piedade dos que sofrem, dos pobres, uma vez que o
dinheiro nada podia resolver diante da necessidade da multidão. João Batista, o
maior nascido de mulher, morre sob o capricho de duas mulheres, mostrando que
a grandeza não se constitui em não Ter sofrimento. Após o martírio de João
Batista, Jesus se afasta das multidões e no fim desta seção Ele deixa a Galiléia (Mt
14:13). Ele sabe que aquilo que ocorreu com João ocorrerá também com Ele. A
partir da confissão de Pedro, Jesus começa a revelar com mais clareza qual será o
fim, e Ele o faz pelo menos sete vezes. Os paradigmas de Pedro quanto ao
Messias e o Seu reino o levaram a entender mal o que era grandeza para Cristo, e
procura convencê-Lo que o destino do Messias nada tem a ver com o sofrimento.
E é justamente o apóstolo Pedro que aparece em destaque neste relato (ele anda
sobre as águas, toma parte ativa no momento da transfiguração, identifica a pessoa
de Jesus e vive a experiência do pagamento do tributo).

a  Neste contexto, Cristo enuncia seu sermão sobre o


que de fato se constitui a grandeza para Deus. Ele começa com a pergunta:
“Quem é o maior?” Devido o surgimento da palavra igreja por duas vezes das
quatro existentes nos evangelhos se julga que Cristo quer falar primeiramente ao
seu povo escolhido sobre o significado da grandeza. Ele não fala quem é o maior,
mas antes como o maior se comporta. O maior é aquele que se faz pequeno. Ele,
então, toma uma criança pela mão e a põe no círculo dos discípulos como símbolo
da humildade. As crianças na sociedade judaica não eram levadas em
consideração, não eram contadas, não tinham valor e conversar com elas era
perder tempo. No mundo antigo as crianças eram pessoas insignificantes.
Homens em mulheres arrogantes que lutam para controlar o poder, só poderão Ter
acesso ao reino dos céus se se tornarem humildes, dependentes e confiantes como

36
uma criança é. Aquele que recebe o Reino dos Céus é o que não confia no valor
de seus supostos méritos pessoais.

b  A discussão entre os apóstolos sobre quem é o maior


está colocando em risco o seu acesso ao reino. O que qualifica alguém para entrar
no Reino é o se ver sem mérito para Ter esse direito. O homem verdadeiramente
grande não causa tropeço aos que são pequenos, pelo simples fato dele também se
achar pequeno. Grande é o que atende as necessidades dos pequenos. Grande é
aquele que atende a necessidade do que peca. No mundo, grande é o que tem
domínio, o que dita ordens. Para Deus, grande é o que busca a ovelha perdida, é o
que conduz o outro ao perdão ou perdoa.

c  No Antigo Testamento, a testemunha é para


estabelecer a culpa (Dt 19:15). Neste caso aqui, o propósito é outro. O objetivo
não é demonstrar quem é o culpado, mas antes estender o perdão ao culpado. E
mesmo que ele não aceite o perdão, ele deve receber o mesmo tratamento que
Cristo deu àqueles que eram considerados publicanos e pecadores. Portanto,
considerar alguém publicano e pecador não é puni-lo, mas procurar conscientizá-
lo que ele só pode ser restaurado reconhecendo sua pecaminosidade e o poder
purificador do perdão. Não é usar a disciplina como um meio de extravasar nosso
desejo de vingança contra a pessoa que pecou. “O único antídoto contra a
vingança é a consciência de quem somos nós.” (Amim Rodor).

d  O significado dos números aqui mencionados (Mt


18:21-22) ensina a disposição contínua e interminável de perdoar. É a totalidade
do perdão. Com base em Amós 1:3 os judeus advogavam a idéia de que só se
deve perdoar ao próximo 3 vezes. Pedro numa demonstração de misericórdia
mais que duplicou o conceito rabínico de perdão (7). Enquanto Cristo fazendo da
quantidade de Gênesis 4:24 (70 x 7) a aplica a extensão do perdão. Sendo o
número 7 usado na Escritura para um ciclo completo (vingança, criação, serviço,
profético), Cristo ainda o multiplicou por 70, dando a idéia de que a disposição de
conceder o perdão é sem fim. Cristo conclui este pensamento com a parábola do
servo que foi muito perdoado mas que não soube perdoar o pouco. A dívida de 10
mil talentos, aproximadamente “dois ou três milhões de libras,” era o montante do
débito deste servo, enquanto seu amigo lhe devia 100 denários, aproximadamente
30 libras. Segundo Josefo na sua obra Antigüidades, o montante desta excedia as
taxas cobradas nas províncias romanas. O perdão de Deus é incomensurável, ele
sempre oferece o direito de se recomeçar a vida de novo a cada dia. É saber que a
bondade de Deus com base na justiça de Cristo me concede o direito ao reino dos
céus, através do perdão. A reorganização da vida de qualquer pessoa depende
diretamente de receber o perdão de Deus, e ser um veículo deste perdão a outras
pessoas.

8  A consumação do Reino dos Céus (19:3-25:46)  A


hostilidade contra Cristo se intensifica, devido a Sua discordância com os
sacerdotes, fariseus, herodianos e saduceus. Os temas discordantes se relacionam
com o que havia de mais preciso para um judeu: família (divórcio e novo
casamento), riqueza como bênção, entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e com a

37
segunda expulsão dos cambistas do templo, quando compara o sacerdócio a um
covil de salteadores. Segue-se a maldição sobre a nação infrutífera (figueira). Os
líderes de sua nação se vêem ameaçados e questionam Sua autoridade. Diante
desse desafio Cristo fala da rebeldia e punição que sofrerá a nação: “o reino de
Deus vos será tirado e será entregue a outro povo que lhe produza os respectivos
frutos” (Mt 21:43). Daí Jesus conta a parábola das bodas para ensinar que só
aquele que tem as vestes da justiça de Cristo poderá entrar e permanecer no Seu
Reino, os outros serão lançados fora. A oposição continua com os herodianos na
questão do tributo, com os saduceus no tema da ressurreição e com os fariseus no
assunto da lei e do Messias. Aí Cristo pronuncia seu discurso contra a falsa
religiosidade dos escribas e fariseus. Neste contexto Jesus pronuncia o seu
sermão profético, deixando claro que haverá uma separação entre maus e bons por
ocasião da Parousia. E estva suficientemente claro que os fariseus e escribas se
incluíam entre os rejeitados. Daí o seu discurso profético possuir duas linhas de
argumentação: a destruição de Jerusalém com seu templo, e o significado da 2ª
Vinda.

9  Paixão e o Poder do Rei  Morte e Ressurreição. A cruz é o


julgamento para toda a humanidade, representando no julgamento dos dois
ladrões, na presença de terremotos e escuridão e na ressurreição de Cristo com
Suas primícias que testemunham a respeito d’Ele (Mt 27:52-53). A cruz é a
garantia de que o juízo final vai acontecer, pois ele já começou. Está consumado
foi o brado final de vitória. O que estava incluído neste brado?

a  Triunfo do Céu contra Satanás. O brado fora em


benefício dos anjos e dos homens.

b  Satanás fora desmascarado para os anjos não caídos


e o Universo celestial. Lúcifer revelara-se um homicida.

c  Foi vindicada a perfeita harmonia entre a lei e a


misericórdia. O transgressor da lei podia agora ser perdoado e a lei podia ser
obedecida perfeitamente pelo homem como tinha sido criado. “A lei requer
justiça - vida justa, caráter perfeito; e isso não tem o homem para dar. Não pode
satisfazer as reivindicações da santa lei divina. Mas Cristo, vindo à Terra como
homem, viveu vida santa, e desenvolveu caráter perfeito. Estes oferece Ele como
dom gratuito a todos quantos o queiram receber. Sua vida substitui a dos homens.
Assim obtêm remissão de pecados passados, mediante a paciência de Deus. Mais
que isso, Cristo lhes comunica os atributos divinos. Forma o caráter humano
segundo a semelhança do caráter de Deus, uma esplêndida estrutura de força e
beleza espirituais. Assim, a própria justiça da lei se cumpre no crente em Cristo.
Deus pode ser ‘justo e justificador daquele que tem fé em Deus.’1 A morte de
Cristo prova que a justiça divina não destrói a misericórdia, mas que o pecado
pode ser perdoado.

1
Ellen G. White, O desejado de todas as nações, 19ª ed. (Tatuí, SP: Casa
Publicadora Brasileira, 1995), 762.

38
d  A morte de Cristo prova que a lei divina não pode ser
ab-rogada, pois se a lei pudesse ser mudada não seria necessário Cristo Ter
morrido por causa da transgressão da lei. Foi porque a lei é imutável, porque o
homem só se pode salvar mediante a obediência a seus preceitos, que Jesus foi
erguido na cruz. Satanás, entretanto, tem usado os meios pelos quais Cristo
estabeleceu a lei, para dizer que ela foi abolida. Este será o tema do conflito final,
o último grande engano.1

e  A destruição do pecado e de Satanás para sempre


foram asseguradas. Em contrapartida a redenção do homem era certa e o
Universo estava salvo para sempre. Está consumado.

XI  O EVANGELHO DE LUCAS

Lucas é o autor tanto do evangelho que leva o seu nome como de Atos
dos Apóstolos. Estes dois volumes formam uma só obra, os dois volumes estão
unidas por um tema que lhes é comum: a Universidade do Reino de Deus. Ele
apresenta a história da vinda do Reino a partir de João Batista até que ele seja
proclamado em Roma. Desde do início destes dois volumes até o seu final é
evidente o tema que os une. O nascimento de Jesus é marcado pela declaração de
Simeão: “Porque os meus olhos já viram a tua salvação, a qual preparaste diante
de todos os povos; luz para revelação dos gentios. Ele continua como reino de
Deus foi estabelecido em Roma, vencendo todas as barreiras que lhe impuseram
no caminho, por isso termina o segundo volume declarando que a proclamação do
evangelho alcançou seu objetivo: “Tomai, pois, conhecimento de que esta
salvação de Deus foi enviada aos gentios. E eles a ouvirão” (At 28:28).

1  Dados Pessoais  -Lucas era o único gentio entre os


escritores do Novo Testamento. Seu nome era latino, pois Lucas é uma forma
reduzida do nome “Licius.”

a  Corrobora esta posição a distinção que Paulo faz


entre seus companheiros os que eram ou não judeus. Aristarco, Marcos e um tal
Jesus foram identificados como os únicos judeus que estavam com ele, “estes são
os únicos circuncisos que estão comigo.” Os demais, portanto, seriam gentios,
entre os quais é mencionado Lucas (Cl 4:10-14).

b  Outra evidência para advogar a origem gentia de


Lucas é o uso que ele faz da Escritura na versão grega. Ele não traduz o texto em
hebraico para o grego, mas faz uso direto do texto grego. Possivelmente ele não
falava hebraico, em razão da maneira como ele se refere ao hebraico (At 1:19,
21:40; 22:2; 26:14).

c  Há uma tradição que Lucas era originário de


Antioquia da Síria. Isto se evidencia até certo lugar que ele dá a igreja de
Antioquia (At 11:19-30; 13:1-3; 14:26-28). Lucas acompanhou Paulo a Jerusalém

1
Ibid., 763.

39
e esteve envolvido com sua viagem para Roma (At 21; 27:1; Fm 23-24). Tornou-
se companheiro e médico pessoal de Paulo (Gl 4:13 e At 16:6). Foi Lucas quem
atendeu Paulo em sua prisão: “só Lucas está comigo” (2Tm 4:11). O lugar de sua
morte é desconhecido. A tradição afirma que morreu martirizado numa árvore.

d  A dedicação (Lc 1:1; At 1:1) que ele faz de suas duas


obras a um tal Teófilo é única no Novo Testamento, e se trata de uma prática
romana. Mesmo quando um autor judeu assume esta mesma postura revela uma
influência pagã sobre o seu estilo, possivelmente com intenção de atrair leitores
gentílicos.

e  Educação  Por ser médico era necessário que Lucas


tivesse uma educação superior conforme os padrões dos seus dias. Nesta época a
Medicina era um ramo da Filosofia. Há uma declaração específica de que Lucas
era médico. Diversos estudiosos encontraram numerosos termos técnicos de
Medicina comuns aos escritos de Hipócrates, Dioscurides, Galeno e outros, os
quais eram contemporâneos de Lucas e que portanto corroboram sua declarada
profissão de médico. O grego usado por Lucas em seu evangelho e em Atos
revelam uma riqueza de vocabulário. Há cerca de 800 palavras em Lucas que não
aparecem nos outros livros do Novo Testamento. O prefácio do evangelho é
escrito em um esmerado grego clássico, para então mudar seu estilo em harmonia
com o grego do Antigo Testamento. Ele consegue através de seu apurado estilo, a
partir de Lucas 9:51, dar a dramaticidade própria e gradativa que conduz à paixão
de Cristo.
(1) Lucas se propõe escrever uma obra sobre a
vida de Cristo que fosse seriamente histórica, por isso mesmo ele diz que fará uma
“exposição em ordem” depois de “acurada investigação de tudo desde sua
origem” (Lc 1:3). As pesquisas de William Ramsey sobre a primeira e Segunda
viagens de Paulo comprovaram a meticulosa exatidão de Lucas na apresentação
dos fatos históricos, geográficos e administrativos. Ele declarou: “Você pode
espremer as palavras de Lucas a um grau acima de qualquer outro historiador, e
elas resistem ao exame mais severo e ao tratamento mais rígido.” Lucas era um
homem que primava pela exatidão de suas declarações.
(2) Este seu compromisso com a exatidão o levou
a se tornar um viajante, como bem o demonstram os textos “nós” de Atos (At
16:10-18; 20:5-21:18; 27:21-28:16), que indicam a presença de Lucas. Sua
descrição da viagem de Paulo e o respectivo naufrágio demonstram a exatidão de
termos quanto aos ventos, geografia e construção naval. Estas viagens de Lucas
sugerem que ele esteve com Paulo (2Tm 4:11) durante sua prisão em Cesaréia.
Pode Ter sido este período que Lucas empreendeu sua pesquisa que lhe permitiu
escrever o evangelho e Atos. Por ser um homem adaptado a sua época já por sua
origem ou por sua cultura helênica e por Ter compreendido e aceito a salvação
pela graça através da fé, como ensinada por Paulo, tinha o perfil da pessoa que
seria utilizado pelo Espírito Santo para falar da universalidade do evangelho.

2  Autoria do Evangelho  A tradição dos antigos Pais da


Igreja advogam unanimemente que Lucas é o autor do evangelho que leva o seu
nome. Eusébio declara que Lucas é o autor do terceiro evangelho. Irineu declara

40
que Lucas, o seguidor de Paulo, colocou no evangelho o que lhe foi pregado pelo
apóstolo. O Fragmento Muratoriano concorda com Irineu, declarando que Lucas
é o autor do evangelho; e o herege Marcion, que morreu em 160 AD, coloca o
evangelho de Lucas como o único no seu cânon particular. Pode-se ainda
acrescentar o testemunho de Tertuliano, Clemente de Alexandria e outros.

a  Teoria da Origem dos Sinópticos  Há pelo menos


duas teorias que procuram explicar a origem dos sinópticos: (1) Tradição Oral, (2)
Teoria dos Dois Documentos.
(1) Nos primeiros anos da Igreja Apostólica havia
necessidade de se ensinar aos novos na fé os aspectos essenciais da vida de Cristo,
e isto era realizado em conformidade com os hábitos semíticos de memorização.
E possivelmente a apresentação da vida de Cristo apresentada por Pedro tronou-se
básica para a doutrinação dos neófitos (At 10:37-41). Este texto decorado, antes
de sua escritura, tornou-se o texto geratriz dos evangelhos, segundo esta teoria.
(2) Na Teoria dos Dois Documentos, os
evangelhos foram escritos de uma série de documentos, num processo de
dependência literária. Mateus e Lucas fizeram uso de documentos escritos, de
Marcos e da fonte “Q” dos ditos de Jesus. Pode-se também falar de uma terceira
teoria mais conservadora e mais aceita.
(3) Cada evangelista compôs seu próprio
evangelho e que sua semelhança se deve ao fato de escreverem sobre o mesmo
tema: uma biografia temática e estarem sob o mesmo contexto sócio-cultural e
histórico.

3  Forma Narrativa  Lucas seguiu o estilo literário da época


ao dedicar seu livro a uma pessoa importante (Teófilo), o mesmo que Flávio
Josefo fez mais tarde ao dedicar sua obra “Antigüidades” a Epafroditos.
Semelhantemente fizeram Heródoto e Tucídides. Neste trecho, como já foi dito,
Lucas faz uso do grego clássico. O restante dos capítulos 1 e 2 ele emprega um
grego com características semíticas. A partir porém de Lucas 3:1 ele escreve em
um grego helenístico que relembra a Septuaginta. O evangelho de Lucas traz
informações sobre o ministério de Jesus na Judéia, o que não acontece com os
outros evangelhos sinópticos. Enquanto em Mateus as parábolas visam esclarecer
a natureza do Rei e do Reino de Deus, Lucas relata parábolas com o objetivo de
falar sobre a relevância da conversão diante de Deus e de seus anjos (Lc 15-16).
Universalismo e seu interesse pelos desfavorecidos são possivelmente suas mais
destacadas características: mulheres e crianças têm um lugar especial em seu
evangelho. Estudiosos conservadores datam este evangelho para um período
anterior ao ano 63 AD, porque tendo sido escrito antes de Atos, que termina de
forma repentina seu relato sem falar do fim do apóstolo Paulo. O que leva a se
admitir a data de 63 AD para sua produção. Se dividirmos o material dos
sinópticos, encontramos 244 seções. Em Mateus, 58 seções são comuns aos
outros dois e quase vinte lhe são próprias. Das 63 seções de Marcos, somente 5
lhe são peculiares. Lucas possui 45 seções que são de sua própria autoria no total
de 103 seções.

41
a  Divisão do Evangelho  Embora seja evidente o
tratamento temático do autor para o seu evangelho, ele também declara que ele se
propôs apresentar uma exposição em ordem desde o princípio, por isso se procura
seguir um esboço que possa apresentar estes dois aspectos:
ESBOÇO DO EVANGELHO DE LUCAS

I  Prefácio e Propósito do Evangelho  1:1-4.


II  Identificação do Filho do Homem com os Homens  1:5  4:13
1  Nascimento, Infância e Juventude  4 AC-27 AD  1:5-2:52.
2  Preparação para o Ministério  27AD  3:1-4:13.
III  O Ministério do Filho do Homem para com os Homens  29-31AD  4:14-9:50.
1  Ministério Inicial na Galiléia  4:14-41.
2 Primeira Viagem Missionária na Galiléia  4:12.
3  Ministério em e perto de Cafarnaum  5:17-6:16.
4  Sermão da Montanha  6:17-49.
5  Segunda Viagem Missionária na Galiléia  7:1-8:56.
6  Terceira Viagem Missionária na Galiléia  9:1-17.
7  Afastamento do Ministério Público  9:18-50.
IV  Rejeição do Filho do Homem pelos Homens  31AD  9:51-19:27.
1  Ministério em Samaria e na Peréia  9:51-10:24.
2  Ensinamentos de Parábolas  10:25-18:14.
3  Última Jornada para Jerusalém  18:15-19:27.
V  A Condenação do Filho do Homem e os Homens  31AD  19:28-23:56.
1  Conflito com Escribas e Fariseus  19:28-21:4.
2  Discurso Profético  21:4-38.
3  Prisão e Julgamento de Jesus  22:1-23:25.
4  Crucifixão, Morte e Sepultamento  23:26-56.
VI  A Vindicação do Filho do Homem diante dos Homens  31AD  24:1-53.
1  Ressurreição  24:1-12.
2  Cristofanias e Instruções  24:13-53.

4  Conteúdo do Evangelho  O título Filho do Homem que


serviu como princípio organizador do livro de Lucas, pode ser entendido sob três
ângulos diferentes: Filho do Homem Terreno, Filho do Homem Sofredor e Filho
do Homem Apocalíptico.

42
a  Filho do Homem Terreno  O título Filho do Homem
aparece no Antigo Testamento com dois sentidos básicos: (1) em Ezequiel aparece
diversas vezes como uma identificação do ser humano, ou mais especificamente
do profeta, (2) já em Daniel 7:13 e 14 o Filho do Homem aparece como um ser
celestial que se aproxima de um tribunal para participar da obra de julgamento
(Dn 7:9-10), e que tem o domínio de um reino que jamais passará. O uso que
Cristo fez do título Filho do Homem não O limita às potencialidades do ser
humano, embora não as negue como uma realidade vivencial dEle em seu
ministério terrestre. O Filho do Homem Terreno tem o direito de perdoar pecados,
embora se trate de uma prerrogativa divina. Este direito de Jesus deve ser visto
como sendo Ele o Filho do Homem celestial, que como Filho do Homem terreno
pode perdoar pecados (Lc 5:24). Ele tinha esta autoridade como Filho do Homem
celestial, agora esta prerrogativa é exercida na Terra. Isto demonstra que esta
visão terrena de Cristo no título Filho do Homem inclui prerrogativas divinas em
Sua messianidade como homem, uma vez que tem autoridade para perdoar
pecados.
(1) Em Lucas 6:5, o Filho do Homem reivindica
para Si a autoridade de interpretar os regulamentos dos escribas concernentes ao
Sábado. O princípio aqui exposto é que o Filho do Homem é portador de
autoridade teológica, pois interpreta o Sábado como não sendo um fim em si
mesmo, mas foi promulgado para o bem do homem. Isto advoga que o Filho do
Homem tem soberania na interpretação da verdade para os homens embora fosse
Ele homem. A autoridade teológica do Filho do Homem é portanto uma
característica do Messias. O fato dele ser o Filho do Homem terreno não dava ao
homem o direito, devido a essa semelhança, de soberania de interpretação sobre
os regulamentos de Deus, e nesse caso específico sobre o Sábado.
(2) Esta compreensão, contudo, não nega a
realidade de sua humanidade como Filho do Homem. Pois Lucas estabelece uma
comparação entre João Batista e Jesus Cristo, para mostrar a realidade de sua vida
terrena. Enquanto o primeiro teve uma vida asceta, o segundo é visto como
glutão, bebedor de vinho e amigo dos pecadores (Lc 7:25), e ambos são igualados
como sendo enviados por Deus para seu ministério específico (Mt 11:19).

b  O Filho do Homem Sofredor  A partir de Cesaréia


de Filipe e a confissão de Pedro responde a pergunta sobre quem é a pessoa do
Filho do Homem. A pergunta de Cristo foi “Quem dizem as multidões que eu
sou?” (Lc 9:18) ou como declara Mateus “Quem diz o povo ser o Filho do
Homem?” (Mt 16:13). A partir de Cesaréia de Filipe, Cristo começa a falar que
Ele, o Filho do Homem, deve sofrer (9:22) e o faz pelo menos sete vezes. Nos
evangelhos sinópticos,1 a partir da confissão de Pedro (Mt 16:21-23; Mr 8:31-33;

1
Há duas declarações de Cristo um tanto enigmáticas na época sobre Sua
morte no evangelho de João, por ocasião da purificação do templo (Jo 2:19-21) e
no diálogo com Nicodemos (Jo 3:14), que são anteriores à confissão de Pedro.
Nestas declarações a crise não está presente.

43
Lc 9:22), Cristo procurou lhes mostrar pelo menos sete vezes1 que a finalidade
última de Sua missão era a necessidade de Sua morte e ressurreição.2
(1) Na primeira predição (Mt 16:21) Pedro tentou
dissuadi-Lo e reprová-Lo, apelando ao suposto senso de auto-comiseração de
Cristo (Mt 16:22). Jesus põe-Se em evidente conflito declarando: “Arreda,
Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus
e sim das dos homens” (Mt 16:23). A causa do conflito estava clara, pois o
conceito do Messias-Rei de Pedro chocou-se com o do Messias-Sofredor de Jesus.
(2) A segunda predição deu-se numa viagem
secreta à Galiléia (Mr 9:30), quando Cristo repetiu a mesma mensagem. A reação
dos discípulos na ocasião foi de ignorância, tristeza e medo, como deixam
transparecer as palavras “então, os discípulos se entristeceram grandemente” (Mt
17:22-23) e a declaração de que “eles, contudo, não compreendiam isto e temiam
interrogá-lo” (Mr 9:30-32).
(3) Após Sua manifestação gloriosa na
transfiguração, Jesus fez a terceira predição de Sua morte ao dizer: “Assim
também o Filho do Homem há de padecer” (Mt 17:12), acrescentando: “A
ninguém conteis a visão, até que o Filho do Homem ressuscite dentre os mortos”
(Mt 17:9; Mr 9:12). A reação de ignorância repetiu-se mais uma vez, pois é dito
em Mateus que “então, os discípulos entenderam que lhes falara a respeito de João
Batista” (Mt 17:13) e em Marcos que “eles guardaram a recomendação,
perguntando uns aos outros que seria o ressuscitar dentre os mortos” (Mr 9:10).
(4) Na quarta oportunidade o Mestre, declarando
mais detalhadamente os acontecimentos relativos à Sua morte e ressurreição,
afirmou que eles eram um cumprimento profético messiânico. Lucas enfatiza a
ignorância dos discípulos ao afirmar que “nada compreenderam,” pois “o sentido
destas palavras era-lhes encoberto, de sorte que não percebiam o que Ele dizia”
(Lc 18:31-34; Mt 20:17:19; Mr 10:32-34).
(5) Após o pedido da mãe de Tiago e João por um
lugar de destaque no reino messiânico para seus filhos (Mt 20:20-23), Cristo
prediz Seu sacrifício indiretamente pela quinta vez, acrescentando à Sua morte o
significado teológico “em resgate de muitos” (Mt 20:28; Mr 10:45). Tudo que é
dito é que eles foram para Jericó. O silêncio dos discípulos evidencia o fato de

1
Três predições da morte de Cristo são preferivelmente apresentadas para
expor o conflito entre Jesus e Seus discípulos, como aparece em: Kingsbury,
Conflict in Mark: Jesus, Authorities, Disciples, 406-407. Aparecem, contudo, seis
ocasiões em que Jesus prediz a sua morte como é declarado em: Francis D.
Nichol, ed., The Seventh-day Adventist Bilbe Commentary, ed. ver. (Washington,
DC: Review and Herald, 1980), 5:464. Três outras passagens mais são
mencionadas apenas em Lucas, porém não apresentam uma situação de conflito
com os discípulos: Lc 12:50; 13:33; 17:2.
2
A ordem cronológica escolhida das predições de Cristo com relação à
Sua morte estão em: Nichol, ed., Seventh-day Adventist Bilbe Commentary (!980),
5:194-203.

44
que as palavras de Cristo não puderam ser por eles avaliadas. Resgate era-lhes um
conceito imperceptível.
(6) Na sexta ocasião, Cristo declara a
proximidade da Sua morte nas palavras “sabeis que, daqui a dois dias, celebrar-se-
á a Páscoa; e o Filho do Homem será entregue para ser crucificado” (Mt 26:2).
Fica claro que os apóstolos tomaram conhecimento da brevidade da morte dEle.
O silêncio dos discípulos parece indicar que eles não se importaram. Agiram
possivelmente com descaso.
(7) Na sétima predição Cristo, vendo que não
podia penetrar além da parede de ignorância deles, os advertiu que se
escandalizariam1 com Ele e O abandonariam naquela mesma noite por causa de
Sua morte (Mt 26:31; Mr 14:27). Sua palavras baseavam-se na expressão do
Antigo Testamento: “ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho ficarão dispersas”
(Zc 13:7).

c  O Filho do Homem Apocalíptico  Cristo não só


anunciou seu sofrimento como também sua volta em glória. Estas predições são
posteriores à confissão de Pedro em Cesaréia, enquanto a primeira delas é anterior
à transfiguração (Lc 9:28-36), sendo esta portanto uma demonstração do que
significava a vinda do Filho do Homem Apocalíptico (Lc 21:27). A sua
messianidade incluía Sua entronização junto ao Pai e Sua manifestação gloriosa
como Ele explicou ao Suma Sacerdote (Lc 22:66-69; Mt 26:63-64).
(1) Pode-se dizer portanto que Jesus usou o termo
Filho do Homem para reivindicar a “dignidade messiânica e a função
messiânica.”2 E mais do que a messianidade Ele reivindicou Sua
sobrenaturalidade. Ele é o homem em cuja morte há o resgate de todos os
pecadores, e que como ser celestial julga quem há de receber o galardão e que na
Sua segunda vinda gloriosa há de dar o galardão eterno a todos os Seu filhos. Só
assim será inaugurado o Reino de Deus, primeiramente no coração do homem
(Reino da Graça) e depois pelo Seu Retorno estabelecerá em toda terra o Seu
reino, o Reino da Glória.

5  Outros Aspectos do Conteúdo:

a  Universalidade  Lucas procura promover o


Cristianismo no mundo greco-romano e por isso ele dá informações históricas na
sua descrição de Cristo sobre o nascimento de Cristo (Lc 2:1-7).

1
O termo significa “pular para cima”, “fechar-se de repente,”
“armadilha,” nos evangelhos o significado da palavra é “ser repelido,” tornar-se
um motivo de tropeço, ver: J. Guhrt, “skavndalon,” em: Coenen, ed.,
Dicionário internacional de Teologia do Novo Testamento, 3:311-314; Gustav
Stählin, Theological Dictionary of the New Testament, 7:344-351.
2
George E. Ladd, Teologia do Novo Testamento (Rio de Janeiro: JUERP,
1984), 137-149.

45
(1) Segundo Lucas 3:1, João Batista iniciou seu
ministério no décimo quinto ano de Tibério César. Nesta ocasião Pilatos era o
procurador da Judéia, Herodes o tetrarca da Galiléia, Filipe da Ituréia e de
Traconites, e Lisânias de Abilene, enquanto Anás e Caifás pontificavam como
sumo sacerdote em Jerusalém. Tibério César começa a reinar logo após a morte
de Augusto em torno dos anos 12 a 14 AD.1 O décimo quinto ano, segundo
Leonard Goppelt, teria ocorrido em torno do ano 27 AD.2
Herodes, o Grande, começou a reinar em 717
AUC (ab urb condita). Ele reinou 34 anos em Jerusalém, o que alcança a data de
750 a 751 AUC, quando veio a falecer. Esta seria a data do nascimento de Jesus,
que corresponde em nosso calendário, aproximadamente, ao ano 4 AC. A
diferença com nosso calendário se deve ao fato de Dionísio Exíguo, no VI século
AD, Ter datado erradamente para o ano 754 AUC o nascimento de Jesus.
Na morte de Herodes, o Grande, o seu reino foi
dividido entre seus filhos. A metade foi dada a Arquelau, que por causa de sua má
administração foi deposto por decreto do imperador, e seu território ficou sob a
direção do procurador de Roma,3 Pôncio Pilatos, que foi nomeado no ano 26 AD,
e ali permaneceu até 36 AD. a outra metade do Reino foi dividida entre Herodes
Antipas (6 AC a 39 AD) e Filipe (4 AC a 32 AD).4 Ralph Earle corrobora as
informações acima, declarando que a morte de Herodes, o Grande, deu-se no ano
4 AC, ou 751 AUC.5
(2) Em Lucas, Jesus é “a luz para revelação aos
gentios” (Lc 2:32). Ele inclui em seu relato a citação de Isaías 40 que declara que
“toda carne verá a salvação de Deus” (Lc 3:6). A genealogia de Lucas apresenta a
origem de Cristo procedendo de Adão, pai de toda a humanidade, e este de Deus
(Lc 3:23-38). Ele também ressalta a atenção dada por Elias a viúva fenícia e a
cura do profeta Naamã, os quais eram estrangeiros, desvalidos e pobres. Além
disso Cristo se interessa pelas classes desfavorecidas: mulheres em diversas
ocasiões, Maria, Isabel e Ana no nascimento (Lc 1:27-28), a viúva de Naim (7:11-
17), a mulher imoral (7:36-50), a mulher que dava apoio financeiro a Jesus (8:1-
3), a viúva pobre (21:1-4), as mulheres que lamentaram a situação de Jesus
(23:27-31; 23:49-24:11), coletor de impostos (Lc 19:1-10), filho pródigo (Lc
15:11-32), samaritanos (Lc 9:51-56; 10:29-37) e pessoas pobres (Lc 4:16-22;

1
A. T. Robertson, Beacon Bible Commentary (Missouri: Beacon Hill
Press, 1964), 6:37.
2
Leonard Goppelt, Teologia do Novo Testamento (Petrópolis: Rio de
Janeiro: Sinodal/ Vozes, 1976), 60.
3
Coleman F. Luck, Luke the Gospel of the Son of Man (Chicago: Moody
Press, 1970), 37.
4
Carol Stechnueller,Evangelho de Lucas (São Paulo: Edições Paulinas,
1975), 37.
5
Robertson, Beacon Bilbe, 6:37.

46
14:12-13). Ele é o único que relata a parábola do rico e Lázaro (Lc 16:19-31).1
Lucas retrata a Jesus como um Salvador de ampla simpatia, que se socializa com
todo tipo de pessoa.

b  O evangelho de Lucas é o mais compreensivo dos


sinópticos. Nos primeiros 2 capítulos, ele começa com o prólogo e história
concernente ao nascimento e infância de Jesus. O batismo, a genealogia e a
tentação de Jesus se seguem em 3:1 a 4:13, o ministério na Galiléia (4:14 a 9:50),
a última jornada em 9:51 a 19:27, e finalmente a semana da paixão, a crucifixão,
ressurreição, cristofanias e ascensão em 19:28 a 24:53. A última jornada de Cristo
a Jerusalém marca a mais distintiva contribuição de Lucas para o nosso
conhecimento da carreira de Jesus. Nessa seção ele apresenta o ministério de
Jesus na Peréia, onde Ele apresenta muitas das mais famosas parábolas que não
estão relatadas nos outros evangelhos (O Bom Samaritano, O Tolo Rico, O Filho
Pródigo, O Rico e Lázaro, Os Fariseus e o Coletor de Impostos, e outras), e
enfatiza o significado de Jerusalém como alvo do ministério de Jesus, pois seria o
ponto de partida da missão mundial. Ele, Lucas, é o único a falar sobre ascensão.2

XII  O EVANGELHO DE JOÃO

Há cinco obras no Novo Testamento que são da autoria de João, o


apóstolo: o Evangelho, as três epístolas e o Apocalipse. As epístolas funcionam
como uma suplementação do evangelho em relação a sua preocupação com a
influência gnóstica no seio do cristianismo e especialmente em Éfeso. O conflito
de João foi mais especificamente contra Cerinto, defensor do gnosticismo em
Éfeso. A discussão envolveu pelo menos três aspectos: Cristologia - negavam
que Jesus e o Cristo fossem a mesma pessoa, que acaba conduzindo a uma
negação da expiação e da encarnação; Auto-engano moral - com a separação do
mundo material do mundo espiritual, sendo o primeiro apenas um invólucro do
segundo, eles consideraram a ética, que se processava através do corpo como algo
desnecessário, logo nada que o corpo faz afeta a realidade interior do espírito;
Auto-exaltação espiritual - considerando-se recebedores de uma revelação
especial própria, viam-se como uma aristocracia espiritual especialmente
iluminada, uma elite religiosa e por isso desprezavam os demais.

1  Goethe em sua obra Fausto apresenta um herói que aspira


por uma luz especial, e por isso se dispõe a traduzir o Evangelho de João.
Imediatamente, contudo, se depara na primeira frase com uma dificuldade, como
traduzir: “No princípio era o Verbo.” Acha entretanto que seria dar um valor
excessivo a este termo. Seria então melhor traduzir logos por pensamento, mas
não foi apenas o pensamento que criou todas as coisas, mas o poder. Então seria
melhor traduzi-la por “No princípio era a Ação ou a Palavra. Esta mesma

1
Para uma melhor informação sobre os desfavorecidos na sociedade
judaica, ver: Joachin Jeremias, Jerusalém no tempo de Jesus (São Paulo: Edições
Paulinas, 1986), 156-169, 403-494.
2
Gundry, A Survey of the New Testament, 207-210.

47
dificuldade está presente com todo pesquisador deste evangelho, haja vista as
inúmeras sugestões para organizar sua estrutura.1

2  Dados Pessoais  Ele era filho de Zebedeu que vivia ao


norte do Mar da Galiléia. Tratava-se de uma pessoa de recursos financeiros e de
elevada posição social na comunidade. Sua mãe Salomé era seguidora de Jesus e
ajudava nas necessidades pessoais de Cristo (MT 27:26, Mr 15:40). Juntamente
com seu irmão Tiago, João foi chamado de “boanerges” cujo significado é filho
do trovão (Mr 3:17). Vários incidentes do evangelho evidenciam seu
temperamento agressivo. Foi ele quem se irritou e proibiu o ministério de um
exorcista por não ser um dos doze (Lc 9:49-50). Ele e seu irmão se sentem
ofendidos devido a rejeição da aldeia de Samaria em receber Jesus, e à
semelhança de Elias quiseram invocar fogo do céu para consumir seus moradores.
Foram também eles que juntamente com sua mãe pediram a Cristo um lugar
especial no Seu reino. O seu íntimo relacionamento com Cristo transformou o
apóstolo João que passou a ser conhecido como o apóstolo do amor, devido a
importância que ele deu no evangelho e nas epístolas especialmente ao tema do
amor.

a  Agora ele está mais aberto ao ministério de outras


pessoas fora dos doze: mulher samaritana e os samaritanos (Jo 4). Em lugar de
procurar uma posição importante no Reino de Cristo, ele se apresenta no seu
evangelho como o apóstolo que amava a Cristo (Jo 13:23; 19:26; 20:2; 21:7, 20),
apagando seu nome no evangelho, possivelmente sendo o discípulo anônimo
(18:15-16). Ele aparece sentado a mesa no cenáculo que sussurra ao ouvido de
Cristo (13:21-24; cf. 21:20). No julgamento de Cristo ele O acompanha até o
pátio da casa do sumo-sacerdote (16:13; cf. 18:15). Na cruz Jesus lhe confia o
cuidado por Sua mãe. É ele ainda que recebe a notícia de Maria Madalena sobre o
túmulo vazio. Ele é ainda o primeiro que reconhece o seu Senhor ressurreto
(21:7, 20-23). João, portanto, desfrutou do mais íntimo relacionamento com
Cristo, por isso ele estava mais qualificado a falar das características mais íntimas
de Cristo. Ele foi o apóstolo que, possivelmente, mais absorveu da natureza de
Cristo, por isso pôde penetrar mais profundamente no espírito de Jesus. “Segundo
a tradição, João foi o único sobrevivente dos apóstolos, havendo cada um dos
outros encontrado a morte como mártir. Ele foi convocado a Roma para
comparecer perante o imperador Domiciano, o último dos doze grandes césares, a
fim de ser julgado por sua fé. Tão convincente foi sua defesa que os seus ouvintes
ficaram atônitos em face de sua sabedoria e eloqüência. Não puderam mistificar-
lhe o testemunho. O imperador, cheio de ira, ordenou que ele fosse lançado num
caldeirão de azeite fervente. Mas o Senhor preservou-lhe a vida . . . Mais tarde,
por decreto do imperador, foi ele banido para a ilha de Patmos, no ano 94 AD, a
fim de cumprir a sentença de prisão perpétua. Com a morte de Domiciano, Nerva

1
C. H. Diid, A interpretação do quarto evangelho (São Paulo: Paulinas,
1977), 13. Os vários planos são: simbólico, numérico, temático, lógico,
dramático, cronológico/geográfico, litúrgico, sinais. Ver: Mário Veloso,
Comentário do Evangelho de João (Santo André, SP: Casa Publicadora Brasileira,
1984), 20-26.

48
subiu ao trono e como era usual anistiou os presos políticos. Nestas
circunstâncias João foi liberto e retornou a Éfeso onde escreveu seu evangelho em
torno do ano 97 AD.

b  Apesar das muitas críticas à resistência de João em


Éfeso “nada é melhor atestado na história da Igreja Primitiva do que a estada de
João em Éfeso,” conforme atesta Westcott em The Gospel According to St. John,
xxxv. Jerônimo descreve João sendo conduzido pelas ruas de Éfeso. Irineu
apreciava relembrar a ocasião que Policarpo (discípulo direto de João) falava
sobre suas conversas com o apóstolo. Eusébio declara que João morreu em Éfeso.

3  Autoria  Até depois da morte de Orígenes, todos os Pais da


Igreja aceitavam que João escreveu tanto o evangelho como as epístolas.
Clemente de Alexandria declara que quando João viu os outros evangelhos
resolveu ele mesmo escrever o seu evangelho. Irineu declara que João teria
escrito seu evangelho quando morava em Éfeso. O Fragmento Muratório também
atesta o mesmo fato.

a  O autor do quarto evangelho declara Ter sido


testemunha pessoal dos acontecimentos que descreve sobre o ministério de Cristo
(1:14; cf. 19:35; 21:24-25) e mostra um estilo semítico, um acurado conhecimento
dos costumes judaicos  festa dos tabernáculos (7:37-39; 8:12), e da topografia da
Palestina antes que estourasse a guerra judaica de 66 AD e 70 AD (a piscina com
cinco pórticos próximo da Porta das Ovelhas, a área pavimentada chamada
Pavimento fora do Pretório). Ele oferece detalhes da história que só poderiam Ter
sido relatados por uma testemunha pessoal (seis talhas, 2:6; três ou quatro milhas).

b  Data  Alguns estudiosos pensam que este


evangelho teria sido escrito durante o II século AD, quando o gnosticismo era uma
forte influência entre os cristãos. A descoberta, contudo, do fragmento de Rylands
(P52), que apresenta um diálogo de Cristo e Pilatos que está registrado no
evangelho de João (Jo 18:31-33; 37-38). Este documento foi datado como
pertencendo ao início do II século AD. Isto demonstra que o evangelho de João
teria sido escrito no fim do I século. Por este motivo dentre outros a maioria dos
eruditos bíblicos aceita que o evangelho teria sido escrito entre 90 a 110 AD.

c  Há neste evangelho três relatos que são contestados:


(1) O anjo que desce para agitar as águas no tanque de Betesda (Jo 5:3-4), estes
versos não se encontram nos melhores manuscritos. O DTN não faz menção deste
aspecto; (2) o episódio da mulher adúltera não está escrito nos mais antigos
manuscritos gregos; (3) o último capítulo é contestado porque João é identificado
como autor do evangelho de forma evidente, quando ele evita sempre mencionar
seu nome. Além disso a declaração de João 20:31 parece estabelecer o
encerramento do evangelho.

4  Conteúdo do Evangelho  Devido às muitas facetas


teológicas deste evangelho é difícil se encontrar um único tema predominante,
apesar disso poder-se-ia dizer que o evangelho enfatiza a pessoa de Jesus como
Filho Eterno do Pai, enviado ao mundo para oferecer salvação a todo homem. A

49
revelação que Jesus faz de Seu Pai é para a salvação do mundo. Assim salvação e
revelação de Deus estão unidas em Cristo, cujo clímax é a cruz.

a  Na Introdução do evangelho (1:1-51), Jesus é


apresentado como ser divino que se fez homem (1:1,14), enquanto João Batista o
introduz como o Messias Salvador, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do
homem (1:29). Jesus é ainda apresentado como o Messias em cujo fim do
ministério inicia a dispensação do Espírito Santo. Além do testemunho de João
Batista sobre a messianidade de Cristo, seguem-se os de André e Pedro, Filipe e
Natanael.

b  Seguem-se a partir do capítulo 2 o livro de sinais


(2:1-12:50) pode ser dividido em 7 episódios: (1) fala do novo começo (2:1-4:54),
(2) a palavra que dá vida (5:1-47), (3) o pão da vida (6:1-71), (4) a manifestação e
a rejeição da luz da vida (7:1-8:59), (5) o julgamento pela luz (9:1-10:42), (6) a
vitória da vida sobre a morte (11:1-57), (7) vida através da morte, o sentido da
cruz (12:1-36). Segue-se daí o fim dos sinais (12:37-50).

c  Do capítulo 13:1 a 20:31 [21], tem-se o livro da


paixão, que se divide em dois aspectos: Discurso de despedida (13:1-17:26),
Narrativa da Paixão, Ressurreição e Cristofanias (18:1-21:25).1

5  Outros temas de João em seu evangelho  Dualismo,


Cristologia, Vida Eterna, Vida Cristã, Espírito Santo e Escatologia.2

1
Esta divisão foi retirada de C. H. Dodd, com alguns acréscimos
pessoais. Ver: C. H. Dodd, A interpretação do quarto evangelho (São Paulo:
Paulinas, 1977), 388-586.

Georfe E. Ladd, Teologia do Novo Testamento (Rio de Janeiro: JUERP,


2

1986), 199-338.

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