Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
/%*+'$%0'$%Sistemas de
1'+$*+)2#+#0*0!%!%34+#0*0!%0*%5*678#*%926*+*
(1871-2011)
resumo Lewis Henry Morgan costuma ser Segundo Thomas Trautmann, alguns as-
agrupado com McLennan, Lubbock e Tylor como pectos básicos do saber antropológico foram
um dos evolucionistas de gabinete cuja obra é men- profundamente moldados por Morgan, quer
cionada no início de cursos de antropologia, mas tenhamos noção disso ou não. Em outras pala-
cuja leitura não é recomendada. Na verdade, Mor- vras, Morgan foi incorporado ao inconsciente
gan foi um pioneiro da pesquisa de campo, cujo pri- coletivo do pensamento antropológico (Traut-
meiro projeto teórico foi provar a unidade humana mann, 2008, p. v). A disciplina da Antropolo-
e a origem asiática dos povos ameríndios, utilizando gia, ainda conforme Trautmann, não surgiu em
para isso um método que pode legitimamente ser consequência da expansão europeia no espaço
chamado de estrutural. O evolucionismo de Mor- do colonialismo, como reza o ensino habitual.
gan, ou o que ele chamou de “explicação conjetu- Ela seria, antes, o resultado de uma hiperinfla-
ral” da diversidade de terminologias de parentesco ção nos quadros temporais da história huma-
por meio de uma sequência progressiva de formas na, em cuja esteira criou-se um enorme vácuo
de família, foi um adendo à sua monumental obra a ser preenchido por narrativas conjeturais. No
Sistemas de Consanguinidade e de Afinidade na Fa- centro dessa nova narrativa estava o parentesco.
mília Humana, publicada em 1871. A “explicação Há consenso pelo menos sobre o seguinte:
conjetural” é o foco central de sua obra mais conhe-
cida que é A Sociedade Antiga, publicada em 1877. o parentesco como objeto de estudo foi virtual-
Mas, ainda que esta segunda obra não tivesse sido mente inventado por Morgan, e em grande me-
publicada, Morgan mereceria o reconhecimento de dida a antropologia cristalizou-se em torno do
ter sido o criador do objeto “sistema de parentesco”, parentesco e dos problemas intelectuais gerados
de ter criado um método para estudá-lo, e de ter por ele (Op. cit., p. vi).
realizado um esforço de pesquisa comparativa sem
igual até os dias de hoje. Lewis Morgan foi ainda Lewis Henry Morgan (1818-1881) cresceu
um pioneiro na pesquisa de sistemas políticos, da em uma cidade no estado de New York, habi-
arquitetura e da comensalidade de indígenas ame- tada outrora por povos indígenas que incluíam
ríndios, além de ter sido um naturalista que defen- os Iroqueses. Depois de formar-se em 1840,
deu os seres “mudos”, a quem atribuiu inteligência tornou-se advogado. Em 1844, mudou-se para
igual em sua natureza à dos seres dotados de fala. Rochester, onde residiu pelo resto da vida.
palavras-chave Morgan. Antropologia. Pa- A partir de 1842 estudou os iroqueses e, em
rentesco. Evolucionismo. História Humana. 1851, publicou o livro intitulado Liga dos Iro-
queses, até hoje reputado como uma importante
([1964] 1969), Trautmann (1981), Viveiros de Morgan afirma aqui que as funções de
Castro (2002), para citar apenas alguns exem- “guardião de direitos” que cabem ao Estado na
plos de análises de terminologias de parentesco “sociedade civilizada” são realizadas, nas socie-
que podem ser chamadas legitimamente de es- dades sem Estado, pelo “laço de parentesco”
truturais. Em segundo lugar, o método do es- (bond of kindred). Segue-se que o tamanho do
tudo comparativo de textos e de vocabulários grupo de parentesco tende, nessas sociedades, à
aplicado para rastrear trajetos migratórios da “escala máxima numérica”. A forma classificató-
“família humana” foi revitalizado nos tempos ria de consanguinidade, identificando pais e ir-
modernos por Joseph Greenberg, “o principal mãos dos pais, e identificando filhos e filhos de
taxonomista contemporâneo” de línguas na opi- irmãos, seria um método para maximizar o ta-
nião de Cavalli-Sforza, pesquisador de genética manho de grupos de parentesco, os quais cum-
de populações (Cavalli-Sforza, 2002, 2003). pririam certas funções do Estado em sociedades
sem Estado. Por outro lado, continua Morgan,
Henry Maine, cuja obra Ancient Law ([1861] Cabe ainda notar que Morgan considerou
1986) foi dedicada inteiramente a elaborar a tese várias “causas externas” para a existência das
de que a passagem da “barbárie” para a “civiliza- terminologias classificatórias, antes de apre-
ção” foi marcada pela transição entre um sistema sentar sua sequência progressiva de formas de
de direito baseado nos laços pessoais de status a família, no capítulo dos “Resultados Gerais”
um sistema de direito baseado nos laços de con- que conclui seu livro ([1871] 1997, p. 467-
trato. Em suma, trata-se de uma teoria funcio- 510). No fecho de sua grande obra, Morgan
nalista para explicar os sistemas classificatórios. discute minuciosamente várias hipóteses que
A passagem de Morgan citada acima con- agrupamos como “explicações sociológico-fun-
tém o cerne da nota de rodapé que Engels apôs cionais”. Estas explicações incluem: o papel dos
ao Manifesto do Partido Comunista, publicado laços de parentesco para proteção mútua, o sis-
originalmente em 1848, ao reeditá-lo em 1888. tema de linhagens, a poligamia e a poliandria
Logo após a frase que afirma que “a história de (Op. cit., p. 467-479). As três últimas hipóte-
toda sociedade até agora é a história da luta de ses foram testadas estatisticamente por George
classes”, Engels acrescenta: Murdock em seu Social Structure de 1949. É a
partir da seção IV deste capítulo, após indicar
Isto é, toda a história escrita. Em 1847, a pré-his- que nenhuma dessas explicações abrange todos
tória da sociedade, a organização social existente os fatos observados, que Morgan apresenta fi-
antes da história registrada, era praticamente des- nalmente sua “solução conjetural”,
conhecida. Desde então, Haxthausen descobriu a
propriedade comum da terra na Rússia, Maurer ... sob a hipótese da existência de uma série de
provou que ela é o fundamento social de que parti- costumes e instituições antecedentes a um estado
ram todas as raças teutónicas da história e, pouco a de casamento entre pares individuais, nos quais
pouco, verificou-se que as comunidades aldeãs são o costume havaiano se inclui (Op. cit., p. 474).
ou foram a forma primitiva de sociedade em toda
a parte, da Índia à Irlanda. A organização interna Em suma, Morgan estava longe de ignorar
desta primitiva sociedade Comunista foi posta explicações históricas com apoio documental
a nu, na sua forma típica, pela descoberta culmi- (casos da gens romana e grega), ou explicações
nante feita por Morgan da verdadeira natureza da funcionais e sincrônicas, apoiadas em dados da
gens e da sua relação com a tribo. Com a dissolução etnografia de primeira mão. É assim um tan-
destas comunidades primevas, a sociedade começa to injusto que Radcliffe-Brown (1952) utilize,
a diferenciar-se em classes separadas e finalmente para criticar a “história conjetural” como ex-
antagônicas. Tentei reconstituir este processo de plicação de terminologias classificatórias, uma
dissolução em A Origem da Família, da Propriedade explicação sincrônico-funcional baseada na
Privada e do Estado (Nota de Engels à edição ingle- organização de linhagens, sem mencionar que
sa do Manifesto do Partido Comunista, de 1888). Morgan foi o primeiro a propor e discutir pre-
cisamente essa explicação9. Com efeito, como
A sequência de invenções tecnológicas, for- disse Trautmann, “certos aspectos do conheci-
mas de família, formas de governo e institui- mento recebido na antropologia são profunda-
ções de propriedade, destacada por Engels na mente marcados por Morgan, quer saibamos
sua reelaboração da Sociedade Antiga de Mor- disso ou não” (Trautmann, 2010, p. v). Para
gan, prescinde de maior comentário, sendo a concluir esse sobrevoo da presença de Morgan
parte mais conhecida do legado de Morgan8. na teoria contemporânea, falta considerar o
nexo entre Morgan e a teoria lévi-straussiana do sistema turaniano (cujo tipo é o tamil), e in-
do parentesco, para além do objeto e do mé- dicou claramente o locus da diferença entre os
todo “estrutural”. A resposta passa por um dois, embora se afirmando incapaz de explicá-la
costume que Morgan ignorou, mas que Rivers (Morgan, [1871] 1997, p. 398). A “identifica-
([1910] 1991) invocou, para explicar a peculia- ção” entre esses dois sistemas foi obra das tipolo-
ridade que distingue o sistema tamil (dravidia- gias de Lowie ([1929] 1968) e Murdock (1949),
no) do sistema iroquês: o casamento de primos na qual iroquês e dravidiano de fato confun-
cruzados. Sobre esse ponto cego na análise de dem-se em um único tipo, até que Lounsbury
Morgan, eis o que diz Trautmann: (1964, nota 16) apontou a diferença, tendo lido
certamente a observação explícita de Morgan so-
Morgan deixou de reconhecer o papel do ca- bre o assunto.
samento de primos cruzados no sistema dra- Entende-se que Systems possa ter servido de
vidiano, e foi aqui particularmente obtuso já epígrafe tanto ao tratado culturalista compara-
que suas fontes de informação sobre o sistema tivo de Murdock como ao tratado estruturalis-
dravidiano indicaram claramente a regra e sua ta de Lévi-Strauss, e que possa ter contribuído
conexão com a terminologia. Como argumen- tanto para a teoria materialista da história de
tei, foi uma coincidência fatídica o fato de que o Marx e Engels assim como para a teoria fun-
próprio Morgan tenha se casado com a filha do cional-estrutural de sociedades sem Estado for-
irmão de sua mãe, uma prima cruzada em siste- mulada por Radcliffe-Brown e Evans-Pritchard.
mas onde a regra existe, fato que explica, a meu Compreende-se também que Tooker apresente
ver, seu ponto cego sobre o assunto ao tratar dos essa obra como “one of the most remarkable of all
dravidianos, erroneamente identificados com os anthropological studies” (Tooker, 1997, p. vii), e
iroqueses (Trautmann, 2008, p. 324). que Trautmann (2010, p. v) tenha afirmado que
Morgan continua “good to think” até nossos dias.
Como se sabe, toda a teoria das “estruturas A influência de Morgan sobre a Antropolo-
elementares do parentesco” pode ser entendida gia exerceu-se desde cedo, e é ilustrada pelos de-
como uma teoria da aliança de casamento entre bates com John McLennan sobre o parentesco
primos cruzados. A teoria, porém, não funciona classificatório, e pela teoria de Edward B. Tylor
para os sistemas de parentesco dos índios norte- sobre a conexão entre o casamento de primos
-americanos aos quais correspondem terminolo- cruzados e o parentesco classificatório (Tooker,
gias “iroquesas” (e em particular seus subcasos 1971). Talvez essa convergência esteja na raiz da
crow e omaha). Lévi-Strauss (1967) forneceu, opinião dominante que é a que inclui Morgan
assim, uma justificativa profunda para a dico- entre os “evolucionistas vitorianos”, em uma
tomia aguda que separaria as “estruturas ele- posição caudatária de Lubbock, McLennan e
mentares de parentesco” (exemplificadas pelos Tylor, agrupando todos ao depósito de velharias
sistemas dravidianos) das “estruturas complexas” teóricas que são mencionadas, mas não estuda-
(exemplificadas pelos sistemas “iroqueses”, par- das seriamente. Esse juízo é ilustrado sarcastica-
ticularmente em suas variantes crow e omaha): mente por Adam Kuper, que afirmou em 1993:
a existência ou ausência de uma regra prescritiva
de casamento. Cabe lembrar que a identificação A lâmpada de Edison realmente funcionava, e
“errônea” entre o sistema iroquês e dravidiano talvez as patentes ainda valham alguma coisa,
não vem de Morgan, que separou nitidamente ao passo que as fantasias intelectuais de Mor-
o sistema ganowaniano (cujo tipo é o iroquês) gan, McLennan, e [Max] Müller conservam
tando agudamente com o preconceito vitoriano, duração passada da existência humana; e é ape-
tem paralelo apenas na admiração de Morgan nas um fragmento das eras que virão. A dissolu-
pela organização social iroquesa, expressa desde ção da sociedade tem boas chances de ser o termo
1859 na Liga dos Iroqueses às páginas finais da final de uma trajetória da qual a propriedade é o
Sociedade Antiga em 1877. Mais descentralizado fim e o objetivo, porque tal trajetória contém os
e complexo do que o centralismo monárquico elementos da autodestruição. A democracia no
europeu que Morgan detestava, o sistema iro- governo, a fraternidade na sociedade, a igual-
quês foi exaltado por Morgan como exemplar dade de direitos e de privilégios, e a educação
(e tem sido apontado como precursor da demo- universal, prenunciam o plano superior da so-
cracia federalista norte-americana). Isso signifi- ciedade para qual a experiência, a inteligência e
cava, porém, que a ordem do progresso que ia o conhecimento estão conduzindo firmemente.
da barbárie à civilização caminhava do comple- Este será um renascimento, em forma superior,
xo para o simples; o fechamento da fronteira era da liberdade, da igualdade e da fraternidade das
ao mesmo tempo a simplificação dos intrinca- antigas gentes (Morgan, [1877] 1985, p. 552).
dos sistemas classificatórios que “maximizavam
os laços de parentesco”, e a destruição do fe- É a visão que já se anuncia em um discurso
derativismo democrático iroquês. A civilização dirigido por Morgan para uma associação de
também representou, aliás, o fim da elaborada trabalhadores já em 1852, e que marca a dis-
cultura material do castor norte-americano, que tância entre o evolucionismo social vitoriano
Morgan não diferenciava em essência da cultura e a noção ambígua de progresso em Morgan.
material dos indígenas iroqueses, já que incluía
os “mudos” na categoria de seres dotados de in- !"#$% &'()*+,% -./% :!*($% ';% Systems of
teligência e capacidade de invenção. 1'+$*+)2#+#<=%*+0%3;4+#<=%';%<>!%926*+%5*-
Se devemos falar de um evolucionismo so- mily (1871-2011)
cial em Morgan – que usou sempre a noção
de progresso, e não de evolução –, trata-se de abstract Lewis Henry Morgan is usually grou-
uma versão peculiar de evolucionismo social. ped with McLennan, Lubbock and Tylor as one of the
Assim como as estepes russas para Kropotkin, cabinet evolutionists whose work is mentioned at the
as pradarias americanas não combinavam, para beginning of anthropology courses, but whose reading
Morgan, com a “luta pela vida”. Mas Morgan is not recommended. In fact, Morgan was a pioneer in
assistiu ao fechamento da fronteira americana, fieldwork research, whose first theoretic project was to
e tomou parte dela como advogado de ferro- prove the unity of humanity and the Asiatic origin of
vias. Face a essa história real da propriedade Amerindian peoples, employing a method that can be
privada, a linha do tempo progressivo que leva legitimately named structural. Morgan’s evolutionism,
da barbárie à civilização adquiria para ele um or what he called as the “conjectural solution” of the
viés negativo, expresso em páginas célebres da diversity of kinship terminologies through a progres-
A Sociedade Antiga que vale a pena evocar: sive sequence of family forms was an addendum to
his monumental work Systems of Consanguinity and
A mera trajetória da propriedade não é o destino Affinity of the Human Family, published in 1871. The
final da humanidade, se o progresso continu- “conjectural solution” is the focus of his best known
ar a ser a lei do futuro como tem sido a lei do work, that is Ancient Society published in 1877. Even
passado. O tempo que transcorreu desde que a though, this second work had not been published,
civilização começou é apenas um fragmento da Morgan deserves being recognized as the creator of the
object “Kinship System”, of having created a system Ego masculino e “cousin” como o primo cruzado
to study it and, of having performed an effort of com- masculino). É o próprio Morgan quem afirma
parative research without pair until today. Lewis Mor- este último ponto, à página 391: “The children of
my male cousins, Ego a male, are my nephews and
gan was a pioneer in the research on political systems,
nieces; of my female cousins are my sons and dau-
of architecture and of commensalism of Amerindian ghters”, advertindo em seguida: “esse é o único
indigenous people, besides being a naturalist that de- detalhe em que [a forma tamil] difere substan-
fended the “muted” beings, to whom he attributed cialmente da forma sêneca-iroquesa”. A aparen-
intelligence equal in nature to that of beings endowed te contradição pode indicar a sobrevivência de
with speech. uma versão anterior no manuscrito final.
7. Sobre a tendência à maximização dos números
keywords Morgan. Anthropology. Kinship.
dos parentes, lembremos que a expansão ter-
Evolutionism. Human History. ritorial nuer foi atribuída ao tamanho de seus
grupos guerreiros, por sua vez explicado pelo
Notas sistema de linhagens (Kelly, 1985).
8. Acompanhamos aqui, por comodidade de exposi-
1. Em 1871, Morgan estava preocupadíssimo com ção, a posição segundo a qual a teoria marxista da
a demora de seis anos na publicação do livro, história é uma teoria funcionalista (Cohen 1978).
contando a partir de 1865, e de três anos, con- 9. Trata-se da crítica ao método da “história conje-
tando a partir de 1868 (Tooker, 1997, p. vii). tural” em The Study of Kinship Systems, datado de
2. O comentário detalhado sobre a diferença en- 1941 (Radcliffe-Brown, 1952). Radcliffe-Brown
tre as duas versões está em Trautmann, 2008, refere-se aos Systems como um “monumento de
Apêndice III. erudição e de pesquisa paciente na coleção de
3. A comparação direta está na tabela não nu- dados” (Op. cit., p. 50), mas afirma que Morgan
merada dos Sistemas, cujo título aparece como “não conseguiu entender a natureza e a função
Comparison of the System of Relationship of the da terminologia classificatória” que identificou
Seneca-Iroquois with that of the Tamil People of (Op. cit., p. 59). Radcliffe-Brown propõe uma
South America (Morgan, 1871, p. 511-514). A explicação funcional para essa terminologia
indicação “América do Sul” em vez de “Índia do como alternativa à “história conjectural”. O cer-
Sul” é um lapso profético já que, embora Mor- ne da explicação funcional de Radcliffe- Brown é
gan nunca tenha trabalhado com dados sobre o conceito de “solidariedade do grupo de germa-
índios da Amazônia, estes viriam a tornar-se ter- nos”. Mas Radcliffe-Brown deixa de mencionar
reno paradigmático de “dravidianato” (Overing, que foi Morgan quem primeiro propôs que os
1975; Silva, 1995; Viveiros de Castro, 2002). “sistemas classificatórios” poderiam ser expli-
4. A outra obra de Morgan citada por Darwin é cados por seu papel para a proteção mútua do
The American Beaver and His Works, também grupo de germanos. Assim, sua afirmação de que
publicada em 1868. “é óbvio que toda a teoria de Morgan é intei-
5. Morgan distinguiu “ganowaniano” e “turaniano”, ramente injustificada” ignora a teoria funcional
mas viu os dois sistemas como sendo “idênticos” proposta pelo próprio Morgan.
em seus traços essenciais, exceto por uma diver- 10. Sobre o prolongamento do debate sobre sis-
gência que não soube como explicar: no sistema temas iroqueses, dravidianos, kariera e crow-
tamil, a filha da minha prima cruzada (sendo eu -omaha, ver ainda Silva (1995, p. 25-28),
homem) é chamada de “minha filha”, enquanto Barnes ([1984] 2005, p. 194-217), Viveiros de
no sistema Iroquês o termo apropriado é “minha Castro (2002, p. 87-181), Trautmann e Barnes
sobrinha” (Morgan, [1871] 1997, p. 391). (2008), Trautmann (2008 p. 324-325).
6. À página 14 de Systems, Morgan afirma que na
sociedade tamil “my brother’s son and my cousin’s Referências bibliográficas
son are both my sons”. De fato, esse “traço in-
dicativo” aplica-se ao sistema sêneca-iroquês, ALMEIDA, Mauro W. Barbosa de. Marxismo e Antropo-
mas não ao sistema dravidiano (se tomarmos logia. In: TOLEDO, Caio N.; BOITO JR., Armando.
(Orgs.). Marxismo e Ciências Humanas. Campinas: LÉVI-STRAUSS. Les Structures Élémentaires de la Paren-
Editora Xamã, CEMARX e FAPESP, p. 48-59, 2003. té. Paris e Haia: Mouton, 1967.
BARNES, J. Two Crows Denies It. A History of Controversy LOUNSBURY, Floyd G. A Formal Account of the Crow-
in Omaha Sociology. Lincoln e Londres: University of and Omaha-Type Kinship Terminologies. In: TYLER,
Nebraska Press, [1984] 2005. Stephen A. Cognitive Anthropology. New York: Holt,
CAVALLI-SFORZA, L. Luca. Genes, Povos e Línguas. São Rinehart and Winston, p. 212-254, [1964] 1969.
Paulo: Companhia das Letras, 2003. LOWIE, Robert H. Relationship Terms. In: BOHAN-
CAVALLI-SFORZA, Luca; CAVALLI-SFORZA, Fran- NAN, Paul ; MIDDLETON, John(Orgs.). Kinship
cesco. Quem Somos? História da Diversidade Humana. and Social Organization. New York: The Natural His-
São Paulo: Editora UNESP, 2002. tory Press, p. 39-59, [1929] 1968.
COHEN G. A. Karl Marx’s Theory of History. A Defense. LUBBOCK, John. The Origin of Civilization and Primi-
Princeton: Princeton University Press, 1978. tive Condition of Man. Londres: Longmans Green,
DARWIN, Charles. The Descent of Man. Introdução de 1870.
James Moore e Adrian Desmond. Londres: Penguin MAINE, Henry S. Ancient Law. Its Connection with the
Books, [1871] 2004. Early History of Society, and its Relation to Modern Ide-
______. A Origem das Espécies. São Paulo: Escala, [1859] as. Tucson: University of Arizona Press, [1861] 1986.
2009. McLENNAN John F. Primitive Marriage. An Inquiry into
DUMONT, Louis. The Dravidian Kinshp Terminology as the Origin of the Form of Capture in Marriage Cere-
an Expression of Marriage. Man, vol. 53, p. 34-39, 1953. monies. Organização e Introdução de Peter Rivière.
DUMONT, Louis. Dravidien et Kariera. L’ Alliance de Chicago e Londres: The University of Chicago Press,
Mariage dans L’ Inde du Sud, et en Australie. Haia e [1865] 1970.
Paris: Mouton, 1975. MORGAN, Lewis H. Diffusion Against Centralization.
ENGELS, Friedrich. Der Ursprung der Familie, des Pri- A Lecture Delivered Before the Rochester Athenaeum
vateigenthums und des Staats. Stuttgart: Dietz Verlag, and Mechanic’s Association. Rochester Athenaeum: D.
1886. M. Dewey, 1852. Fac-simile disponível em: <http://
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O Manifesto do Parti- books.google.com.br>.
do Comunista. In: ______. Werke. Berlin: Dietz Ver- ______. A conjectural Solution of the Origin of the
lag, vol. 4, p. 459-493, [1890] 1972. Classificatory System of Relationship. Proceedings of
FORTES, Meyer. Kinship and the Social Order: The Le- the American Academy of Arts and Sciences, vol. VII, p.
gacy of Lewis Henry Morgan. New Bruswick: Aldine 436-467. Cambridge: Welch, Bigelow, and Company,
Transaction, [1969] 2005. [1868a] 1968. Disponível em: < http://books.google.
GODELIER, Maurice; TRAUTMANN, Thomas R.; com.br>.
FAT, F. Tjon Sie. Transformations of Kinship. Washing- ______. The American Beaver and His Works. Philadel-
ton e Londres: Smithsonian Institution Press, 1998. phia: J. B. Lippincott & Co., 1868b.
GOODENOUGH, Ward H. Yankee Kinship Terminolo- ______. Systems of Consanguinity and Affinity in the Hu-
gy: A Problem in Componential Analysis. In: TYLER, man Family. Lincoln e Londres: The University of Ne-
Stephen A. Cognitive Anthropology. New York: Holt, braska Press, [1871] 1997.
Rinehart and Winston, p. 255-287, [1865] 1969. ______. Ancient Society. Com prefácio de Elisabeth
KELLY, Raymond. The Nuer Conquest. The Structure and Tooker. Tucson: The University of Arizona Press,
Development of an Expansionist System. Ann Arbor: [1877] 1985.
The University of MichiganPress, 1985. MURDOCK, George P. Social Structure. New York: The
KROEBER, Alfred L. 1909. Sistemas Classificatórios MacMillan Company, 1949.
de Parentesco. In: LARAIA, Roque de Barros (Org.), NEEDHAM, Rodney. Rethinking Kinship and Marria-
Organização Social. Rio de Janeiro, Zahar Editores p. ge., Londres: Routledge Library Editions, 1971.
15-25, [1909] 1969. OVERING (KAPLAN), Joanna. The Piaroa. A People of
KUPER, Adam. The Development of Lewis Morgan’s the Orinoco Basin. A Study in Kinship and Marriage.
Evolutionism. Journal of the History of the Behavioral Oxford: Clarendon Press, 1975.
Sciences. vol. 21, January, p. 3-22, 1985. RADCLIFFE-BROWN, R. The Study of Kinship Syste-
______. Reply to Tooker. American Anthropologist. New ms. In: ______. Structure and Function in Primitive
Series, vol. 95, n.2, p. 443-446, 1993. Society, New York, Free Press, 1952.
______. Sistemas Africanos de Parentesco e Casamento tions of the American Philosophical Society, vol. 84,
– Introdução. In:MELATTI, J. C. (Org.). Radcliffe- partes 6 -7, 1994.
-Brown. Antropologia. São Paulo: Editora Ática, p. 59- TRAUTMANN, Thomas R.; BARNES, R. H. “Dra-
161, [1950] 1995. vidian”, “Iroquois”, and “Crow-Omaha” in North
RESEK, Carl. Lewis Henry Morgan. American Scholar. American Perspective. In: GODELIER, Godelier;
Chicago: The University of Chicago Press, 1960. TRAUTMANN Thomas R.;FAT, Franklin E. Tjon
RIBEIRO, Darcy. Estudos de Antropologia da Civilização. Sie.(Orgs.). Transformations of Kinship. Washington:
I. O Processo Civilizatório. Etapas da Evolução Socio- Smithsonian Institution Press, 2008.
cultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972. TRAUTMANN, Thomas. Dravidian Kinship. Cambrid-
RIVERS, W. H. O Método Genealógico de Pesquisa An- ge: Cambridge University Press, 1981.
tropológica. In: OLIVEIRA, Roberto C. de. (Org.). ______. Lewis Morgan and the Invention of Kinship.
A Antropologia de Rivers. Campinas: Editora da UNI- Berkeley: University of California Press, 1987.
CAMP, p. 51-70, [1910] 1991. ______. Languages and Nations. The Dravidian Proof in
SCHENEIDER, David. American Kinship. A Cultural Colonial Madras. Berkeley: University of California
Acount. Chicago: The Universit of Chicago Press, Press, 2006.
1980. ______. Lewis Morgan and the Invention of Kinship. New
______. What is Kinship All About? In: REINING Pris- Edition with a new Introduction and Appendices by the
cilla (Org.). Kinship Studies in the Morgan Centennial Author. Lincoln and London: University of Nebraska
Year, Washington: The Anthropological Society of Press, 2010.
Washington, p. 32-63, 1972. TYLOR, Edward. Primitive Culture. Cambridge: Cam-
SILVA, Márcio. Sistemas Dravidianos na Amazonia: O bridge University Press, [1871] 2010.
Caso Waimiri-Atroari. In: VIVEIROS DE CASTRO, VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A Inconstância da
E. (Org.). Antropologia do Parentesco. Estudos Amerín- Alma Selvagem. São Paulo: Cosac & Naify, 2002..
dios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, p. 25-60, 1995. WHITE, Leslie A. Lewis H. Morgan’s Western Field
STRATHERN, Marilyn. After Nature: English Kinship in Trips. American Anhropologist, New Series, vol. 53, n.
the Late Twentieth Century. Cambridge: Cambridge 1, p. 11-18, 1951.
University Press, 1992. ______. How Morgan Came to Write “Systems of Con-
TOOKER, Elisabeth. Introduction. Lewis Morgan, Sys- sanguinity and Affinity”. Papers of the Michigan Aca-
tems of Consanguinity and Affinity in the Human Fa- demy of Science, Arts, and Letters, vol. 42, p. 257-268,
mily. Lincoln e Londres: The University of Nebraska 1957.
Press, p. vii-xxi, 1997. ______. What is a Classificatory Kinshp Term? Southern
______. Lewis Morgan and His Contemporaries. Ame- Journal of Anthropology, vol. 14, n. 4 p. 378-385,
rican Anthropologist. vol. 94, n. 2, p. 357-375, 1992. 1958.
______. Reply to Kuper’s Commentary. American An- ______ (org.). Lewis Henry Morgan. The Indian Journals.
thropologist, vol. 95, n.2, p. 446-448, 1993. 1859-1862. Ann Arbor: The University of Michigan
TRAUTMANN, Thomas R.; KABELAC, Karl S. The Press, 1959.
Library of Lewis Henry Morgan. Philadelphia: Transac-
Recebida em 26/10/2010
Aceita para publicação em 26/10/2010