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Manejo da Vida Silvestre

Laury Cullen Jr. • Rudy Rudran • Cláudio Valladares-Padua


(Organizadores)

FUN D A Ç Ã O O BOTICÁRIO
Smithsonian
DE PROTEÇÃO A NATUREZA
National Zoological Park
Institu to de Pesquisas Ecológicas


Ví in
MÉTO D O S DE E S T U D O S EM

Biologia da ConservaçãoO
Manejo da Vida Silvestré-JL
UFPR

Reitor
Zaki Akel Sobrinho

Vice-Reitor
Rogério Andrade Mulinari

Diretor da Editora UFPR


Gilberto de Castro

Conselho Editorial
Andrea Carla Dore
Cleverson Ribas Carneiro
Francine Lorena Cuquei
, Lauro Brito de Almeida
Maria Rita de Assis César
Mario Antonio Navarro da Silva
Nelson Luis da Costa Dias
Paulo de Oliveira Perna
Quintino Dalmolin
Sergio Luiz Meister Berleze
Sergio Said Staut Junior
Métodos de Estudos em Biologia da Conservação
e Manejo da Vida Silvestre
2 .®£dição revisada

Adalberto José dos Santos Organizadores:


Adriano Pereira Paglia Laury Cullen Jr.
Adriano Sanches Melo i. n i ^ i
Alexandre Uezu C la u d l° Valladares-Padua
Anael Aymoré Jacob Rlldy Rlldran
André Victor Lucci Freitas ^ . i . i
D D c
Beatriz M. Perez-Sweeney
Organizadores
°
associados:
.
Clarice Bassi P a u l° Auricchio
Cláudio B. Valladares-Padua Maria da Graça Salomão
Cristiana Saddy Martins
Don J. Melnick
Donald P. Eaton
Eduardo Humberto Ditt
Fernando P. Rodrigues
Flávio Bertin Gandara
Giselda Durigan
Guilherme H. B. de Miranda
James D. Nichols
Jean Paul Metzger
John G. Robinson
Keith S. Brown Jr.
Laury Cullen Jr.
Marco Aurélio Pizo
Maria das Graças de Souza
Marlene E Tabanez
Mauro Galetti
Patricia Avello Nicola ,
Patrícia C. Morellato
Paulo de Marco Junior
Paulo Kageyama
Paulo Rogério Mangini
Pedro Ferreira Develey
Renata Pardini
Richard E. Bodmer
Ronaldo Bastos Francini
Rudy Rudran
Sandra M. C. Cavalcanti
Suzana M. Padua 4
Ullas Karanth
Waldir Mantovani
Walfrido Moraes Tomas
A primeira edição deste livro foi realizada
em regime de coedição com a
Fundação O Boticário de Proteção à Natureza
Métodos de Estudos em Biologia da Conservação e Manejo da Vida Silvestre
Laury Cullen Jr. •Cláudio Valladares-Padua •Rudy Rudran
(Organizadores)

Coordenação editorial: Daniele Soares Carneiro


Revisão de texto: Jan Gerd Schoenfelder
Atualização da nova ortografia: Stheffany Aparecida Chang
e Maria Cristina Perigo
Capa, projeto gráfico e editoração: Cecilia Yojo

Serie Pesquisa, n. 143

Coordenação de Processos Técnicos. Sistema de Bibliotecas, UFPR.

Métodos de estudos em biologia da conservação e manejo da vida


silvestre / Larry Cullen Jr., Cláudio Valladares-Padua, Rudy
Rudran (organizadores); Adalberto José dos Santos... [et al.J: - 2. ed.
rev. - Curitiba : Ed. Universidade Federal do Paraná, 2006.
652 p. : il. algumas color., grafs., tabs. - (Pesquisa; n. 143)

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7335-174-3

1. Biologia. 2. Animais. 3. Zoologia. 4. Biologia - População.


5. Ecologia. 6. Ecossistema. 7. Conservação da natureza. I. Cullen
Junior, Laury. II. Pádua, Cláudio Valladares. III. Rudran, Rudy.
IV. Santos, Adalberto José dos. V. Título.
CDD 574.5
CDU 577.4

ISBN 978-85-7335-174-3
Ref. 530 \

Direitos desta edição


j Editora UFPR
Rua João Negrão, 280, 2 .° andar -‘Centro
Tel: (41) 3360-7489 - Fax: (41) 3360-7486 ,
Caixa Postal: 17.309
80010-200 - Curitiba - Paraná - Brasil
editora@ufpr.br
www.editora.ufpr.br
2012
« .

Apresentação
Suzana Machado Padua
Presidente IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

É um prazer incomensurável lançar este livro com uma coletânea de textos


escritos por profissionais experientes e com competência reconhecida no
Brasil, muitos respeitados também internacionalmente. Cada um em sua área
de conhecimento tem contribuído significativamente para a conservação da
natureza, o que é de importância vital em um país como o Brasil, que se
destaca por sua riquíssima biodiversidade. A responsabilidade assumida
por esses profissionais em proteger o patrimônio natural brasileiro é
inquestionável e agora ainda mais abrangente, ao compartilharem, nos seus
respectivos capítulos, seus conhecimentos acumulados e suas lições
aprendidas no percurso do fazer com competência. Vale ressaltar, portanto, a
generosidade de se disporem a disseminar o que sabem com um público
amplo que inclui você, leitor.

Não posso deixar de ressaltar o empenho dos organizadores. Vimos Laury


Cullen Jr. crescer profissionalmente e orgulhar nossa instituição e nosso
país. No início de 2 0 0 2 , Laury recebeu pelas mãos da Princesa Anne da
Inglaterra o prêmio de conservação “Whitley Gold Award”, que o jornalista
Marcos Sá Correa tão bem descreveu como o Oscar da conservação no
mundo. Seu jeito simples, muitas vezes tímido e sempre despretensioso
esconde sua persistência e sua obstinação por qualidade em tudo o que faz.
O comprometimento do Laury com a valorização da vida como um todo e
sua postura ética têm sido fontes de inspiração para muitos jovens que veem
nele um herói da conservação.

Cláudio Valladares-Padua abdicou de uma vida como administrador de


empresas para se dedicar a uma paixão que vem contaminando muitos: a
conservação da natureza brasileira. O início de sua trajetória se deu com
estudos científicos ligados a espécies ameaçadas como o mico-leão-preto
(Leonthopitecus chrysopygus) . Porém, desde cedo expandiu suas ações e
incluiu numerosas áreas que sentia serem necessárias para a efetividade de
seus cada vez mais audaciosos objetivos. A recuperação de hábitats, o
envolvimento comunitário e principalmente a capacitação em vários níveis
dos mais diversos atores que podem influenciar positivamente a
conservação no país são alguns de seus feitos que estão sendo implantados
em yárias regiões do Brasil. Sua influência sobre profissionais da área tem
sido marcante, o que o levou a ser agraciado com honrosos prêmios
nacionais e internacionais.

Finalmente, Rudy Rudran é originário do Sri Lanka, mas sem dúvida tem
reconhecimento internacional/Há anos vem atuando como pesquisador pela
Smithsonian Institution, onde encontrou meios de intercambiar
conhecimentos ligados à conservação, ao ministrar cursos abrangentes em
todos os continentes do planeta. Suas pegadas ecológicas certamente já estão
fixadas nas mentes e nos trabalhos bem realizados de muita gente ligada à
proteção ambiental. Devemos ao Rudy a primeira concepção dos cursos que
originaram este manual. Seu apoio, sua determinação e confiança, foram
básicos para que nós pudéssemos ter evoluído e .ousado produzir este
manual.

Tenho a certeza de que o leitor poderá perceber rapidamente os cuidados


tomados para que esta obra seja um manual do bem aprender a lidar com a
natureza e com as questões socioambientais em nosso país. Os interessados
nos assuntos aqui tratados terão a chance de ver teoria e prática de mãos
dadas, o que é relativamente raro. Comumente, ou se tem um conteúdo
denso e acadêmico ou, com nienos frequência, metodologias sein relatos de
aplicações. Relatos embasados em experiências práticas e devidamente
respaldados em conteúdo científico passam a ser valiosos e muitas vezes
inspiradores. A junção de ciência, metodologia, experiência prática e
generosidade pessoal são, portanto, alguns dos atributos desta publicação. A
tônica de inovação está no como fazer por gente que faz, sabendo o que faz e
ainda se dispondo a compartilhar o como fazer.

A diversidade e a heterogeneidade do conteúdo apresentâdo tem o propósito


de enriquecer e ampliar a abrangência da visão da conservação. Os
colaboradores, autores de cada capítulo, atuam em territórios diversos do
Brasil e em outras regiões neotropicais, muitos em regiões isoladas, o que
significa que grande parte do aprendizado compartilhado é fruto de erros e
acertos, ajustes e persistência no acreditar que o fazer faz diferença e o risco
de errar vale a pena ser corrido. Todos, de uma maneira ou de outra, estão
trabalhando para a conservação com a visão de reduzir a perda da riqueza
natural e cultural que tem dominado os nossos dias.
A publicação deste livro é o resultado de um sonho antigo do IPÊ - Instituto
de Pesquisas Ecológicas, da Smithsonian Institution e do Wildlife Trust de
registrar e disseminar em conjunto conhecimentos e experiências que vêm
se acumulando desde 1994, quando essas instituições se uniram para
promover o primeiro curso de Biologia da Conservação e Manejo da Vida
Silvestre no Brasil, curso este que vem sendo melhorado ,ano a ano desde
então. Em 2000 o curso tornou-se internacional e foi um marco decisivo na
priorização desta publicação. O material foi já bastante utilizado no curso
oferecido em 2001 e foi possível averiguar sua pertinência e valor como
ferramenta de apoio. Este livro certamente irá contribuir para os alunos dos
cursos já realizados e para quem deles ainda participará no' futuro. O livro
visa ampliar o poder de abrangência, pois muitos, em regiões diversas,
poderão usufruir a experiência e o amadurecimento de seus colaboradores.

Disseminar conhecimento e experiência faz parte da nobre missão do IPÊ,


que tem hoje a capacitação de conservacionistas como um de seus principais
objetivos. O Brasil necessita de grandes quantidades de profissionais aptos a
trabalhar pela proteção de nossa riqueza socioambiental, grande patrimônio
do nosso país. A exuberância e a diversidade de vida no Brasil ainda são
aspectos.significantes e dignos de reverência e respeito. Precisamos trabalhar
para que este possa ser o orgulho desta e das gerações futuras, para o que se
faz necessário contarmos com uma legião de profissionais competentes. E,
finalmente, com o apoio da Fundação O Boticário de Proteção à Natufeza,
esperamos que este manual possa contribuir de alguma forma, mesmo que
como uma semente que, se bem plantada, possa desabrochar em frondosos
troncos da conservação em nosso país.
Este manual é o resultado de uma colaboração entre o IPÊ - Instituto de
Pesquisas Ecológicas e o National Zoological Park, Washington - DC
(Smithsonian Institution - SI, EUA). O esforço colaborativo iniciou-se em
1993 quando Laury Cullen Jr, pesquisador do IPÊ, participou como aluno
do Curso Internacional em Biologia da Conservação e Manejo da Vida
Silvestre, realizado na Malásia. Este acontecimento preparou o caminho para
uma parceria entre o IPÊ e a SI no sentido de promover a conservação da
biodiversidade no Brasil e em outros países da América Latina. Um
importante objetivo desta parcetia é oferecer formação científica para
profissionais da América Latina e com isso melhorar a capacidade dèsses
profissionais em manejar e conservar espécies e hábitats, muitos ameaçados
de extinção. Um outro objetivo desta parceria é preparar, dentre os
profissionais participantes dos cursos, instrutores que passem a capacitar
outros, produzindo um efeito multiplicativo desse processo de formação.
Ainda um último objetivo é. o de desenvolver um centro de educação em
Biologia da Conservação, que sirva de base para as atividades
conservacionistas desenvolvidas pelo IPÊ e pela colaboração IPÊ/
Smithsonian Institution.

Para alcançar esses objetivos, foram treinados vários profissionais do IPÊ


nos cursos oferecidos pela SI em diversos países do mundo, como Estados
Unidos, índia, China e Uganda. Em 1995, o IPÊ e a SI começaram a oferecer
anualmente no Brasil cursos de Biologia da Conservação e Manejo da Vida
Silvestre. Inicialmente, esses cursos incluíam somente alunos brasileiros,
*
mas em 2000 se tornaram internacionais, recebendo participantes de países
diversos. Nos primeiros sete anos da parceria IPÊ/SI foram capacitados 109
conservacionistas de 10 países da América Latina. Ao oferecer capacitação
teórica e prática para os profissionais participantes, os cursos também
ofereceram excelentes oportunidades para treinar futuros instrutores. Até o
momento, dez brasileiros passaram por eventos de treinamento como
instrutores e alguns já fazem parte do quadro de professores seniores em
cursos nacionais e internacionais. Ao mesmo tempo em que conduz esses
cursos, o IPÊ tem se empenhado contiíiuamente em. alavancar recursos para
construir seu. centro de capacitação: o Centro Brasileiro de Biologia"da
Conservação (CBBC). Oficialmente inaugurado em Fevereiro de 1998, o
CBBC funciona lado a lado com a base administrativa do IPÊ no Município
de Nazaré'Paulista, São Paulo.

Com ^ continuidade da parceria entre o IPÊ e a SI, ficou cada vez mais
evidente a necessidade de um manual em português que incorporasse o
conteúdo curricular dos cursos oferecidos. Esse material, além de útil para
os participantes dos cursos, poderá servir como ferramenta de instrução de
atividades que integrem a teoria à prática. Tornou-se evidente, também, que
essa publicação poderá atingir um público mais amplo de estudantes
universitários e profissionais na área de Biologia da Conservação, mesmo
que não tenham tido a oportunidade de participar dos cursos oferecidos
anualmente. Sendo assim, o desenvolvimento do manual foi iniciado em
1998, baseado no currículo dos cursos lecionados, com um cuidadoso
aprimoramento contínuo. Os instrutores e palestrantes que oferecem os
módulos durante os cursos foram convidados a contribuir com capítulos
relacionados a seus temas específicos de trabalho. O resultado desse
processo é este manual, que trata extensivamente de metodologias, técnicas
de campo e suas aplicações práticas e teóricas em Biologia da Conservação e
Manejo da Vida Silvestre. Este manual apresenta, ainda, bases conceituais
atuais nos principais temas da conservação da biodiversidade e seu manejo.
Os capítulos se complementam de modo a se tornar um guia prático na
condução de pesquisa de campo em animais e plantas e uma referência
nacional e internacional em técnicas de manejo da vida silvestre. Esperamos
que “Métodos de Estudos em Biologia da Conservação” venha a contribuir
de uma maneira ampla e que preencha a grande lacuna de livros em Biologia
da Conservação e manejo de vida silvestre na América Latina.

Dedicamos,este livro ao grande pesquisador brasileiro, José Márcio Ayres,


pela sua enorme contribuição ao desenvolvimento da Biologia da .
Conservação em nosso país. Certamente a esta altura já deve estar criando
reservas no Paraíso. Saudades, amigo Márcio.

Laury Cullen,' Rudy Rudran e C láudio Valladares-Padua.


Macroinvertebrados, mamíferos e aves
l f Estimativas de riqueza em espécies 19
A dalberto Jo sé dos Santos

2. Macroinvertebrados aquáticos como


indicadores ambientais da qualidade de água 43
D onald P. Eaton

3. Diversidade de macroinvertebrados em riachos 69


A driano S an ch es M elo

4. Captura e marcação de animais silvestres 91


Paulo Rogério M angini
Patrícia Avello N icola

5. Insetos como indicadores ambientais 125


André Victor Lucci Freitas
R on aldo Bastos Francini
Keith S. Brown Jr

6. Métodos para estudos com aves 153


Pedro Ferreira D eveley

7. Transectos lineares na estimativa de densidade


de mamíferos e aves de médio e grande porte 169
Laury Cullen Jr.
Rudy Rudran

8. Levantamento rápido de mamíferos


terrestres de médio e grande porte 181
R enata Pardini
E duardo H um berto Ditt
Laury Cullen Jr.
C larice B assi
Rudy Rudran

9. Manejo e controle de danos


causados por espécies da fauna 203
Sandra M. C. C avalcanti
10. Uso de armadilhas fotográficas
em levantâmentos populacionais 243
Walfrído Moraes Tomas
Guilherme H. B. de Miranda

11. Armadilhamento fotográfico de grandes felinos:


algumas considerações importantes 269
Ullas Karanth
James D. Nichols
Laury Cullen Jr.

12. Radiotelemetria em estudos populacionais 285


Anael Aymoré Jacob
Rudy Rudran

13. Metodologias moleculares


utilizadas em genética da conservação 343
Beatriz M. Perez-Sweeney
Fernando P. Rodrigues
Don J. Melnick

Vegetação e ecologia de paisagem


14. R estau ração e co n serv ação de e c o s s i s t e m a s t r o p ic a is 383
P au lo K a g e y a m a
F lá v io B ertin G a n d a r a
i
15. Fenologia, frugivoria e dispersão de s e m e n t e s 395
M au ro G aletti
M arco A u rélio P izo
P atrícia C. M o rella to

16. Estrutura da paisagem : o uso adequado de m é tric a s 423


Je a n P aul M etzger

17. Métodos para análise de vegetação arbórea 455


G iselda Durigan

18. Uso do sistema de informações geog ráficas em B iolog ia da C on serv a çã o 481


A lexan dre Uezu
Análises estatísticas
19. Estatística e interpretação de dados 501
Paulo de M arco Ju nior
A driano Pereira Paglia

2 0 . Delineamento de experimentos
numa perspectiva de ecologia da paisagem 525
Jea n Paul M etzger

Educação ambiental e conservação


2 1 . A abordagem participativa
na educação para a conservação da natureza 543
S uzana M. Padua
M arlene F. Tabanez
M aria d as G raças d e Souza

2 2 . Análise da sustentabilidade de caça


em florestas tropicais no Peru - Estudo de caso 579
R ichard E. B odm er
Joh n G. R obinson

23. Entrevistas e aplicação


de questionários em trabalhos de conservação 617
Eduardo H um berto Ditt
Waldir M antovani
Cláudio Valladares-Padua
C larice B assi

24. Manejo integrado de espécies ameaçadas 633


Cláudio B. V alladares-Padua
Cristiana S addy Martins
Rudy Rudran
'.I
Estimativas de riqueza em espécies
Adalberto José dos Santos
Departamento de Zoologia, Universidade de São Paulo
Laboratório de Artrópodes, Instituto Butantan

Introdução
O conhecimento atual sobre a diversidade biológica do planeta é extremamen­
te escasso (Wilson 1997). A despeito de todos os avanços da ciência no século
XX, dizer quantas espécies de um determinado grupo taxonômico existem no
mundo, ou ainda em um pequeno fragmento de floresta, é extremamente difí­
cil, se não impossível (May 1988). Isso é especiálmente preocupante quando
se considera o ritmo atual de destruição de ecossistemas naturais, aliado a
altas taxas de extinção de espécies (Wilson 1997). O desenvolvimento de pro­
gramas de conservação e uso sustentado de recursos biológicos, a única forma
conhecida para desacelerar a perda de biodiversidade global, exige uma ampli­
ação urgente dos conhecimentos nessa área.

O estudo da diversidade biológica nunca foi tão importante quanto atualmen­


te, pois qualquer projeto ligado à conservação ou ao uso sustentado exige um
mínimo de conhecimentos de ecologia e sistemática de organismos e ecossisté-
*
mas (e.g. Scott et al. 1987). Entretanto, o tempo para obtenção desses dados,
bem como os recursos logísticos e humanos disponíveis, são muito escassas,
especialmente em países pobres e com grande diversidade (Cracraft 1995).
Diante dessas dificuldades, é essencial desenvolver estratégias de inventário e
monitoramento rápido da diversidade biológica, assim como criar a infraestru-
tura necessária para gerar, armazenar e utilizar dados sobre biodiversidade.

Inventariar a fauna e flora de uma determinada porção de um ecossistema é o


primeiro passo para sua conservação e uso racional. Sem um conhecimento
mínimo sobre quais organismos ocorrem neste local, e sobre quantas espécies
podem ser encontradas nele, é virtualmente impossível desenvolver qualquer
projeto de preservação. Porém, devido à altíssima diversidade de plantas, ani­
mais e microrganismos que podem ser encontrados em qualquer ambiente,
por pequeno e aparentemente simples que seja, é praticamente impossível

19
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

determinar a sua riqueza total. A única opção factível neste caso é inventariar
alguns grupos taxonômicos e algumas características físicas do ambiente, na
tentativa de construir uma visão geral sobre toda a biota. O que se espera
desses organismos selecionados para o inventário é que sua diversidade em
um determinado local reflita a diversidade total, ou pelo menos de uma parte
de seus componentes (Pearson 1994). Isso não significa que os táxons não
selecionados não sejam importantes, mas apenas que, diante da urgência de se
obter dados úteis para projetos de conservação, é necessário concentrar esfor­
ços em alguns grupos.

Mensurar a riqueza em espécies de um determinado grupo taxonômico em um


determinado local não é uma tarefa simples. Embora inventários de fauna tra­
dicionais permitam acessar rapidamente este número, resultados de diferentes
estudos dificilm ente podem ser comparados. Isso porque estes inventários,
além de utilizar diferentes métodos de coleta, em geral mostram grandes varia­
ções quanto ao esforço de amostragem (Walther et al. 1995). Em alguns casos,
descrições claras dos métodos utilizados e medidas de esforço de coleta_(quan-
tos coletores participaram do inventário? Por quanto tempo? Quantas horas
foram gastas em coletas por dia?) nem sequer são informados.

Para que os inventários biológicos se tornem úteis para a tomada de decisões


em conservação, é essencial que protocolos de coleta e análise de dados sejam
desenvolvidos e testados (e.g. Coddington et al. 1991; Longino 1994). Um dos
maiores desafios desses protocolos é obter dados de riqueza em espécies com­
paráveis, mesmo entre conjuntos de dados obtidos com métodos e esforço de
coleta diferentes. Uma das maneiras para resolver esse problema é o uso de
métodos de estimativa de riqueza a partir de dados amostrais.

Atualmente, há grande variedade de métodos de estimativa de riqueza, cada


um com diferentes princípios de funcionamento (para uma revisão teórica,
veja Bunge & Fitzpatrick 1J993). Embora a adequação desses métodos a estudos
de estimativa de diversidade biológica seja ainda pouco conhecida (Colwell &
Coddington 1994), seu uso pode ajudar a reduzir dificuldades de interpreta­
ção de resultados de inventários de espécies. Neste sentido, este capítulo apre­
senta descrições dos principais métodos utilizados em estudos de diversidade
biológica. E importante mencionar que este capítulo não constitui uma revisão
exaustiva, mas apenas uma introdução didática. Recomenda-se a qualquer lei­
tor interessado em empiregar algum destes métodos em projetos de pesquisa
que procure.se aprofundar através de bibliografia especializada.

20
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

Coleta de dados de riqueza em espécies


O primeiro passo na execução de projetos de inventário de biodiversidade é a
seleção dos grupos a.serem amostrados, lima vez que, como apontado anterior­
mente, é impossível inventariar todos os táxons presentes em um ecossistema
em um único estudo. Os grupos mais explorados em estudos deste tipo (rela­
tórios de impacto ambiental, planos de manejo de parques e reservas, por
exemplo) são vertebrados (principalmente aves e mamíferos), plantas superio­
res e, em alguns casos, borboletas. Embora não haja problema algum na sele­
ção destes táxons, é lamentável que outros grupos de grande diversidade e
muitas vezes de grande importância para o funcionamento dos ecossistemas
sejam ignorados. A inclusão de grupos não tão populares como artrópodes
(Brown 1997; Kim 1993; Kremem et al. 1993) e nematoides de solo (Bongers
1990) pode gerar dados muito interessantes para estudos deste tipo, apesar
das dificuldades envolvidas em se estudar grupos muito diversos e pouco
conhecidos (Lawton et al. 1998).

Geralmente, inventários de fauna e flora são feitos por sistematas ou equipes


de museus de história natural. Essas equipes normalmente utilizam estratégias
de coleta intensiva, procurando obter o maior número possível de espécimes
em uma dada localidade. Os resultados desses inventários em geral se restrin­
gem a listas de espécies e alguns poucos dados de riqueza local, além do
incremento de material em coleções biológicas. Apesar da eficiência desses
inventários, eles apresentam uma grande desvantagem. Os dados de riqueza
gerados nesses estudos raramente são comparáveis, porque não apresentam
métodos de coleta padronizados. Muitas vezes, resultados de inventários tra­
dicionais são publicados sem nem sequer apresentar uma descrição detalhada
dos métodos utilizados e do esforço de coleta despendido. Quando não se
sabe quanto esforço de coleta foi aplicado a um determinado local, é difícil
determinar se este apresenta maior diversidade em espécies do que outros.

Uma vez escolhido o grupo e o local a serem amostrados, é importante selecio­


nar um método de coleta em massa (que permita obter o máximo de espécimes,
com o mínimo de esforço) e planejar uma maneira de medir o esforço de cole­
ta. Exisle uma grande variedade de métodos de coleta e muitas vezes um mes­
mo táxon pode ser coletado por várias técnicas diferentes. A escolha dos mé­
todos de coleta é muito importante porque técnicas diferentes permitem amos­
trar partes diferentes do ambiente (serrapilheira, sub-bosque, troncos e copa
das árvores, entre outros). Nesses casos, o emprego de mais de um método de
coleta pode ser muito útil, permitindo amostrar uma porção maior da comuni-

21
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

dade. Isso não significa, entretanto, que todos os métodos disponíveis devam
ser empregados, uma vez que muitos são redundantes (veja um bom exemplo
disto em Longino & Colwell 1997).

Como mencionado acima, o planejamento da coleta deve levar em conta medi­


das de esforço amostrai. A melhor estratégia neste caso é dividir o esforço em
unidades de tamanho padronizado, que podem ser usadas como réplicas em
análises estatísticas. Esta divisão implica um pouco mais de esforço na coleta,
uma vez que o material coletado deve ser acondicionado e examinado em uni­
dades separadas (por exemplo, insetos seriam colocados em frascos separa­
dos, por unidade amostrai, ao invés de acondicionados todos em um grande
frasco). Cada método de coleta permite um tipo de unidade amostrai, por exem­
plo: unidades de tempo (horas) para coletas baseadas em busca visual (redes
para insetos, amostragem de aves), unidades de áreas (parcelas de tamanho
padronizado para amostragem de vegetação ou coleta de folhiço) ou por núme­
ro de coletas (como número de armadilhas para mamíferos ou insetos, sendo
cada armadilha uma unidade independente). Embora isso possa ser bem mais
trabalhoso do que meramente chegar ao local e começar a coletar, a criação de
unidades de medida de esforço será discutida abaixo.

Uma vez terminada a coleta, os espécimes devem ser analisados em laboratório


e identificados. Essa é uma fase difícil para estudiosos de grupos hiperdiver-
sos, como invertebrados ou microorganismos, porque esses são justamente os
grupos menos estudados por sistematas (Gaston & May 1992). Em alguns ca­
sos, esses grupos podem ser separados em morfoespécies (ou unidades taxo-
nômicas operacionais) por pessoas treinadas para este fim (Oliver & Beattie
1996). Isso não significa que taxonomistas sejam figuras dispensáveis nesse
tipo de estudo, uma vez que listas de espécies podem ser importantes para
comparações de composição entre áreas, especialmente quando se busca pa­
drões de similaridade entre diversas localidades. Porém, se o que se deseja é
analisar padrões de riqueza, não é necessário saber o nome das espécies cole­
tadas para prosseguir com as análises.

Um sistema de trabalho semelhante ao descrito acima é utilizado pelo progra­


ma de inventário nacional da Costa Rica (INBIO), que utiliza técnicos, chama­
dos parataxonomistas, treinados para coleta e separação de vários grupos taxo-
nômicos em morfoespécies. Ü material examinado por estes técnicos é envia­
do a especialistas para correções e identificação (Gamez 1991).

Um ponto impottante a se considerar em inventários é o destino dos espéci­


mes coletados. Em muitos casos, as instituições onde trabalham autores des-

22
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

tes estudos não apresentam infraestrutura para manutenção de coleções bioló­


gicas e o material coletado acaba se estragando, quando não é simplesmente
descartado. Isso é lamentável, considerando que esses espécimes poderiam
ser muito úteis para estudos de sistemática. Além disto, uma vez que muitos
inventários, mesmo aqueles executados por sistematas, apresentam poucas
morfoespécies identificadas (devido a problemas na sistemática do grupo ou à
ausência de especialistas), a única forma de garantir futuras comparações qua­
litativas entre esses estudos é a preservação de testemunhos em coleções (Hu-
ber 1998). Os melhores locais para preservar esses testemunhos são museus
de história natural ou outras instituições qüe mantenham coleções com infra­
estrutura e curadoria adequadas. Uma vez que se saiba quantas espécies foram
coletadas e quantos indivíduos de cada uma ocorrem em cada unidade amos­
trai, é possível iniciar a análise dos dados.

Estimativas de riqueza
Como mencionado anteriormente., a riqueza em espécies obtida em um inven­
tário depende não só das características da área amostrada, mas também do
esforço de coleta despendido. Uma forma simples, mas infelizmente nem sem­
pre utilizada, de mostrar isso são as curvas de acumulação de espécies ou
curvas do coletor. Este tipo de gráfico mostra o acúmulo de espécies diferentes
coletadas à medida que se aumenta o esforço de amostragem, como exemplifi­
cado na Figura 1.

Número acumulativo de espécies

Figura 1. Curva de acumulação de espécies hipotética, mostrando o aumento do número de


espécies à medida que novas unidades amostrais são adicionadas. A linha representa uma
curva média calculada a partir de cem curvas construídas com ordem aleatória de adição de
am ostras. As barras verticais mostram a variação possível entre essas curvas.

23
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

O primeiro detalhe importante que se pode notar nesta figura é que, para mon­
tar esta curva, é essencial que a coleta esteja dividida em unidades amostrais.
As unidades amostrais podem ser adicionadas à curva em qualquer ordem,
embora adicioná-las na ordem em que foram feitas (por exemplo, da primeira
até a última hora de coleta] pode ajudar na detecção de possíveis mudanças de
hábitat durante a amostragem. É relativamente comum observar curvas de cole­
tor que apresentam degraus; a curva se apresenta quase estabilizada, mas em um
determinado ponto ocorre um grande incremento de riqueza, o que pode indicar
que outro tipo de hábitat, com uma comunidade distinta, foi amostrado.

Quando o objetivo é analisar o padrão geral de incremento em riqueza da


coleta, é importante considerar que o formato da curva pode variar em relação
à ordem de adição de amostras. Isto é especialmente notável quando o conjun­
to de amostras é muito heterogêneo, com algumas unidades amostrais muito
ricas e outras com poucas espécies. Para contornar esse problema, Colwell &
Coddington (1994) sugeriram um método que consiste em montar várias cur­
vas adicionando-se as amostras em uma ordem aleatória. Após construir várias
curvas por este método, pode-se calcular uma curva de coletor média (baseada
na riqueza média para cada número de amostras) e expressar a variação possí­
vel em torno dessa média (Figura 1- ver barras verticais ao longo da curva). E
importante frisar que esta variação não corresponde ao conceito estatístico de
intervalo de confiança, já que é calculada por repetições das mesmas unidades
amostrais.
As curvas de acumulação de espécies são um excelente procedimento para
avaliar o quanto um inventário se aproxima de capturar todas as espécies do
local estudado. Se a curva estabiliza, isto é, atinge um ponto em que o aumen­
to do esforço de coleta não implica em aumento no número de espécies, isto
significa que aproximadamente toda a riqueza da área foi amostrada. Entretan­
to, isto raramente acontece, sendo que na maioria dos inventários (principal­
mente em ecossistemas tropicais) obtém-se curvas semelhantes à da Figura 1.
Uma vez que a captura de todas as espécies de uma área é virtualmente impos­
sível, como se pode compará-la com outras localidades amostradas pelos mes­
mos métodos, mas com maior ou menor esforço de coleta? Alternativas que
têm sido exploradas atualmente para resolver esse problema são métodos para
estimativa de riqueza total a partir de dados amostrais. A seguir, os principais
métodos utilizados em inventários serão descritos e comparados. Após esta
breve descrição suas vantagens e limitações serão discutidas.

24
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

Principais métodos utilizados em inventários rápidos


Os métodos de estimativa mais utilizados podem ser divididos em três catego­
rias, de acordo com suas premissas e com o tipo de dados necessários para
estimar o número total de espécies da comunidade. Os métodos do primeiro
grupo se baseiam na distribuição de abundâncias das espécies, os do segundo
grupo nas curvas de acumulação de espécies e os do terceiro no número de
espécies raras nas amostras.
Além de estimar a riqueza total da comunidade amostrada, alguns métodos
permitem o cálculo de intervalos de confiança para as estimativas. Isso consti­
tui uma vantagem adicional desses métodos, uma vez que um cálculo de varia­
ção em torno das estimativas pode facilitar comparações entre inventários de
diferentes localidades. Um exemplo hipotético: como saber se um local com
riqueza estimada igual a 35 espécies difere significativamente de outro com
riqueza - estimada pelo mesmo método - igual a 45 espécies? Comparando os
intervalos de confiança, pode-se responder a essa questão: os valores são signi­
ficativamente diferentes se seus intervalos de confiança não se sobrepõem.

A ju ste d e m o d e lo s d e d istr ib u iç ã o d e a b u n d â n c ia : Em qualquer estudo de


diversidade biológica é possível observar que as espécies nunca apresentam
abundâncias iguais, sendo que, em geral, algumas são muito comuns e outras
são relativamente raras. Isso pode ser visualizado em gráficos de sequências
de espécies, onde estas são colocadas no eixo X em ordem decrescente de
abundância, e a abundância de cada uma é colocada no eixo Y (ver o Capítulo
2, D iversidade d e m acroin vertebrados em riach os, neste volume). Vários pa­
drões de distribuição de abundância já foram descritos a partir deste tipo de
figura (para mais detalhes, ver Magurran 1988; May 1975; Ludwig & Reynolds
1988), sendo o modelo log-normal um dos mais discutidos. Este modelo pode
ser descrito através dos gráficos da Figura 2 , em que as espécies são colocadas
em categorias de abundância em escala logarítmica no eixo X e o número de
espécies em cada categoria é colocado no eixo Y. Pode-se perceber nessa figura
um padrão semelhante a uma curva normal truncada à esquerda, como se lhe
faltasse uma das caudas (Fig. 2 A). Aumentando-se o esforço de coleta, obser­
va-se que parte da cauda oculta se revela, uma vez que surgem novas categori­
as de abundância à direita (Fig. 2B), e muitas espécies mudam de categoria
com a captura de novos indivíduos. Teoricamente, aumentando-se ainda mais
o esforço, seria possível revelar ainda mais essa cauda, até descobri-la por
completo, quando então todas as espécies do ambiente teriam sido coletadas.
A partir deste princípio teórico, foi proposto que seria possível estimar a riqueza total
ADALBERTO JO SÉ DOS SA NTOS

do am biente? calcu lan d o o núm ero de esp écies presentes na cauda oculta da
cu rva (P reston 1 9 4 8 ). A pesar da sim p licid ad e aparente dessa proposta, ela
tem sido pouco utilizad a, provavelm ente devido a d ificuldades na escolh a do
m elh o r m étodo para aju ste do m odelo a dados am ostrais (veja detalhes em
C olw ell & C oddington 1994).

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C ateg o rias de ab u nd ân cia (log)

Fiqura 2 C urva log-norm al. (A) D istrib u ição de ab u n d ân cia s d a s e s p é c ie s co letad a s em um


in ventário h ip o tético . A s e s p é c ie s fo ran , distrib u id as » ; catego rias
la lo a a rítm ica O n ú m ero d e e s p é c ie s de ca d a ca te g o ria ap a re c e no eixo Y. (B) O m e sm o
g ráfico , ap ó s um au m en to no e sfo rço de co leta. D u as no vas ca te g o n as de abundância foram
a d icio n a d a s e a m oda d e slo co u -se para a direita, o que revelou parte da caud a oculta da
cu rva, à e sq u e rd a .

26
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

Um exemplo de aplicação prática desse método foi um inventário de aranhas


nos EUA feito por Coddington et al. (1996). Esses autores utilizaram dois
modelos de ajuste de curva: o modelo clássico, que pressupõe uma distribui­
ção contínua entre as categorias, e o modelo "log-normal-Poisson", que é ade­
quado para dados categóricos e permite o cálculo de um intervalo de confiança
para a estimativa (Bulmer 1974; Colwell & Coddington 1994; Slocum et al.
1977). Os dois métodos geraram resultados muito diferentes, sendo que a es­
timativa pelo "log-norm al Poisson" chegou ao dobro da estimativa pelo log-
normal contínuo. Apesar dessa disparidade,' é difícil avaliar qual o modelo
mais adequado, uma vez que existem poucos estudos Utilizando esse método.

As estimativas baseadas em ajustes de modelos de distribuição de abundância


têm como principal vantagem o fato de não exigirem coletas divididas em uni­
dades amostrais. Por outro lado, para usar este método é extremamente impor­
tante testar estatisticamente o ajuste dos dados ao modelo em questão. No caso
da curva log-normal, é essencial que se obtenha uma moda definida na distri­
buição de abundâncias, como na Fig. 2. Além disso, é importante mencionar
que o uso desse modelo exige conjuntos de dados com grande riqueza obser­
vada (no mínimo 100 espécies, segundo May 1975), uma vez que não é possí­
vel determinar com certeza o ajuste do modelo com amostras pequenas.

E x tr a p o la ç ã o d e cu rv as d e a c u m u la ç ã o d e e s p é c ie s : Esta categoria de méto­


dos se baseia na modelagem de curvas de coletor, ná tentativa de estimar a
riqueza total prevendo o ponto de estabilização da curva. O maior problema
dessa categoria é que vários modelos matemáticos podem ser ajustados a uma
mesma curva, resultando em diferentes estimativas de riqueza máxima para o
mesmo conjunto de dados (Flather 1996; Soberón & Llorente 1993). Os mode­
los disponíveis para moctelagem de curvas podem ser divididos em assintóti­
cos e não assintóticos. No primeiro caso, utiliza-se uma equação para prever a
assíntota da curva (seu ponto de estabilização), o que corresponderia à riqueza
total em espécies para a área amostrada (León-Cortéz et al. 1998; Miller &
Wiegert 1989; Samu & Lõvei 1995; Stout & Vandermeer 1975).

Os modelos não assintóticos não preveem um ponto de estabilização para a


curva, que cresceria infinitamente. Assim, esses modelos são mais úteis para
prever o aumento do número de espécies diante de um aumento de esforço de
coleta,, embora eles possam ser usados para prever a riqueza total quando a
amostragem se baseia em unidades de área (por exemplo, parcelas de 1 ha).
Nesses casos, deve-se conhecer a área total para a qual se deseja estimar a
■v
riqueza total (Palmer 1990).

27
ADALBERTO JOSÉ -DOS SANTOS

Apesax da grande diversidade de modelos de ajuste de curva disponíveis (ver


exemplos em Flather 1996 e Soberón & Llorente 1993), existe um que tem sido
muito utilizado para estimativas de riqueza; a equação de Michaelis-Menten.
Esta equação, originalm ente desenvolvida para modelar cin ética de enzi­
mas, permite estimar a assíntota a partir de qualquer ponto da curva, sendo
um modelo facilm ente ajustável a diferentes conjuntos de dados (Colwell
& Coddington 1994). Uma desvantagem desta equação, entretanto, é o fato de
ainda não existir um método para calcular o intervalo de confiança da estima­
tiva (ver Raaijmakers 1987).
Como mencionado por Colwell & Coddington (1994), mesmo que não seja
possível estimar a riqueza total, a modelagem de curvas de acumulação de
espécies pode ser muito útil para prever o esforço necessário para obter novas
espécies em um inventário, permitindo inclusive discutir o esforço mínimo
necessário para capturar uma determinada proporção das espécies da comuni­
dade. Um exemplo interessante de aplicação prática desses métodos é o traba­
lho de Flather (1996), em que o autor estudou efeitos de modificações de
hábitats naturais sobre comunidades de aves através de comparações de cur­
vas de acfumulação. Esse autor testou vários modelos de ajuste e, através de
análise de regressão entre taxas de incremento das curvas e índices de intensi­
dade de uso antrópico para várias localidades no leste dos EUA, detectou
reduções de riqueza em espécies em áreas muito modificadas.

M éto d o s n ã o p a r a m é t r ic o s : A terceira categoria reúne métodos conhecidos


como não paramétricos, por serem aplicáveis a dados com diferentes distribui­
ções de abundâncias e, em alguns casos, não exigirem uma divisão da coleta
em unidades amostrais. Existem várias equações disponíveis na literatura,
muitas delas desenvolvidas e utilizadas em áreas como arqueologia ou linguís­
tica, e outras desenvolvidas por ecólogos. A seguir serão apresentados os 7
modelos mais usados em ecologia (ver as equações no apêndice):

1. J a c k k n i f e l e J a c k k n ife Z : estes métodos foram originalmente desenvolvi­


dos para estimativas de tamanho populacional baseado em marcação e recap­
tura (Burham & Overton 1979), sendo posteriormente utilizados para estimati­
vas de riqueza {ver detalhes históricos em Hellmann & Fowler 1999). Os dois
métodos estimam a riqueza total somando a riqueza observada (o número de
espécies coletado) a um parâmetro calculado a partir do número de espécies
raras e do número de amostras (ver apêndice). As duas equações diferem basi­
camente em relação ao critério pelo qual se considera uma espécie como rara,
sendo que o Jackknife de primeira ordem (Jackknifel) requer o número de

28
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

espécies que ocorrem em apenas uma amostra {"uniques") e o Jackknife de


segunda ordem (Jackknife 2) utiliza os "uniques" e o número de espécies que
ocorrem em duas amostras ("d u p licates" - Palmer 1991; Smith & van Belle 1984).
Assim como ocorre com outros métodos não paramétricos, as equações de
Jackknife apresentam um limite superior para o número de espécies estimado.
Por exemplo, na equação do Jackknifel, a riqueza estimada atinge seu valor
máximo para uma determinada riqueza observada quando todas as espécies
são "uniques" e, neste caso, a estimativa é sempre próxima ao dobro do núme­
ro de espécies coletadas. Neste método, quando todas as espécies observadas
ocorrem em mais de uma amostra, a riqueza estimada é igual à observada, ou
seja, o método considera que todas as espécies do ambiente foram coletadas.
Uma equação para o cálculo de um intervalo de confiança para a estimativa de
Jackknifel foi desenvolvida por Heltshe & Forrester (1983).

2 . C h a o l e C h ao2 : estes métodos foram desenvolvidos por Chao (1984; 1987)


a partir de modelos teóricos de estimativa de classes e adaptados pára estima­
tiva de riqueza em espécies ou de tamanho de populações. A riqueza estimada
pelo Chaol é igual à riqueza observada, somada ao quadrado do número de
espécies representadas por apenas um indivíduo nas amostras ["singletons"),
dividido pelo dobro do número de espécies com apenas dois indivíduos
["doubletons"). A mesma equação foi adaptada para utilizar o número de espé­
cies que ocorrem respectivamente em uma ou em duas unidades amostrais
[uniques e d u p licates -C h a o 2 ). O método C h ao l estima seu valor máximo
quando todas as espécies menos uma são "singletons". A mesma regra vale
para o Chao 2 , se todas as espécies menos uma são "uniques", e nos dois casos
a riqueza estimada é igual a aproximadamente metade do quadrado da riqueza
observada. Uma equação para calcular um intervalo de confiança para as esti­
mativas geradas por estes métodos foi desenvolvida por Chao (1987).

3. A CE e IC E: estes métodos foram desenvolvidos por Chao & Lee (1992), base­
ando-se no conceito estatístico de "cobertura de amostra" [sam ple coverage), e
posteriormente modificados por Chao et al. J1993) e Lee & Chao (1994). O
primeiro modelo (ACE - A bu n d an ce-based Coverage Estimator) trabalha com a
abundância das espécies raras (com poucos indivíduos), enquanto o segundo
(ICE - In cid en ce-based C overage Estimator) requer o número de espécies infre­
quentes (que ocorrem em poucas unidades amostrais). Entretanto, diferente
dos anteriormente citados, os métodos ACE e ICE permitem ao usuário deter­
minar os limites para que uma espécie seja considerada rara ou infrequente.
Em geral, são consideradas raras espécies com abundância entre 1 e 10 indiví-

29
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

duos, e infrequentes espécies com incidência entre 1 e 10 amostras (Chazdon


et al. 1998) ou 1 a 20 (Walther & Morand 1998). A riqueza estimada pode
variar conforme se aumente ou diminua o limiar de abundância/incidência, e
infelizmente não existem critérios biológicos definidos para a escolha do me­
lhor intervalo. Intervalos de confiança para estes estimadores podem ser cal­
culados a partir de equações desenvolvidas por Chao & Lee (1992).

4. B o o tstr a p : este método difere dos demais por utilizar dados de todas as
espécies coletadas para estimar a riqueza total, não sé restringindo às espécies
raras. A estimativa pelo bootstrap é calculada somando-se. a riqueza observada
à soma do inverso da proporção de amostras em que ocorre cada espécie (ver
apêndice). As equações de estimativa foram desenvolvidas por Smith & van
Belle (1984), que também fornecem uma equação para cálculo de variância da
estimativa, que tem sido pouco utilizada (talvez devido a sua complexidade).

Aplicações e avaliação dos métodos


Os métodos citados acima são os mais utilizados em estudos de biodiversida­
de, embora outros tenham sido propostos (por exemplo: Edwards 1993; 1997;
Solow 1994; Tackaberry et al. 1997). A alta frequência de uso desses métodos
pode estar ligada à facilidade de cálculo (no caso dos não paramétricos) e ao
fato de serem executáveis através de um programa de computador gratuito,
disponível pela internet - http://viceroy.eeb.uconn.edu/estimates (Colwell 1997).
Para citar exemplos, esses métodos já foram usados como instrumentos de aná­
lise ou avaliados em inventários de aves (Karr et al. 1990), aranhas (Coddington
et al. 1996), ácaros arborícolas (Walter et al. 1998), macrofungos de solo (Schmit
et al. 1999), bancos de sementes (Butler & Chazdon 1998), plântulas em flores­
tas tropicais (Chazdon et al. 1998) e comunidades de parasitas de vertebrados
(Walther & Morand 1998), além de alguns trabalhos utilizando simulações
com comunidades artificiais geradas por computador (Baltanás 1992; Keating
1998; Walther & Morand 1998).
Uma das questões mais frequentemente levantadas em estudos sobre métodos
de estimativas de riqueza é o quanto seus resultados se aproximam da riqueza
real da comunidade. Para se analisar esta questão, é importante delimitar o
universo amostrai do inventário. Estimativas calculadas, por exemplo, para
uma amostragem de espécies de formigas através de armadilhas de solo em um
fragmento de mata se referem apenas à fauna de solo deste fragmento, e não ao
ambiente como um todo. Em outras palavras, isto significa que os métodos
estimam a riqueza de espécies que podem ser capturadas pelas técnicas utili-

30
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

Por outro lado, a estimativa do método 2 pode ser utilizada para comparações,
uma vez que atingiu um valor estável, independentemente do aumento do
esforço de coleta. Obviamente, essa riqueza estimada poderia ser comparada
apenas a inventários que também apresentassem estimativas estáveis pelo mes­
mo método. Observando-se o início das curvas nessa figura, pode-se perceber
que o método 1 gerou uma superestimativa de riqueza, que diminui com o
aumento do número de amostras. Este é um artefato muito comum em alguns
métodos de estimativa (Coddington et al. 1996, Colwell & Coddington 1994),
principalmente naqueles baseados no número de espécies que ocorrem em
apenas uma amostra (Jackknife, Chao 2 , ICE). Uma vez que este número é ex­
tremamente alto quando se tem poucas amostras, as estimativas tendem a ser
excepcionalmente altas. A detecção desse artefato é possível apenas quando se
analisa o comportamento das estimativas em relação ao esforço amostrai, como
na Figura 3, o que é também essencial para determinar se ufha' estimativa está­
vel foi obtida.
A busca por valores de riqueza estimada estáveis adiciona mais um parâmetro
importante na avaliação de métodos. Uma vez que mais de um método fornece
valores estáveis, seria interessante que eles surgissem'com um mínimo possí­
vel de esforço de coleta. A Figura 3B mostra uma comparação entre dois méto­
dos que atingem patamares estáveis de riqueza. Embora os dois métodos te­
nham chegado ao mesmo resultado, o método 3 é preferível, pois atinge a
assíntota com menor esforço de coleta.

Para que comparações entre estimativas de riqueza de diferentes inventários


sejam confiáveis, é importante que estas, além de estáveis, reflitam a riqueza
real das comunidades amostradas. Isso significa que, quando se deseja fazer
esse tipo de comparação, não é um problema que a riqueza estimada não seja
idêntica à riqueza real, desde que o desvio seja estável. A Figura 4 ilustra o
desempenho de três métodos hipotéticos de estimativa, em relação a seis co­
munidades com diferentes valores de riqueza total. O método 1 é o melhor,
estimando com exatidão a riqueza real, independentemente de sua magnitude.
- O método 2 apresenta baixa- exatidão, pois ele sempre subestima a riqueza da
comunidade, mas pode ser utilizado para comparações de inventários porque
o desvio entre a riqueza estimada e a riqueza real é constante. Por outro lado,
o método 3 não é útil para estudos comparativos, porque o desvio entre a
riqueza estimada e a riqueza real aumenta com a diversidade total da comuni­
dade. Ou seja, este método tende a mascarar diferenças de riqueza entre comu­
nidades com muitas espécies.

32
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

Número de amostras

Número de amostras

Figura 3. Perform ance de métodos hipotéticos de estim ativa de riqueza, em relação ao


esforço amostrai. (A) Desempenho d e dois métodos, comparado à curva de acumulação de
e sp é cie s (riqueza observada). A riqueza estim ada pelo método 1 m ostra um pico nas
primeiras am ostras, um artefato do método e um aumento crescente da riqueza estimada,
sem uma estabilização. O método 2 também mostra um aumento com o esforço amostrai,
porém a riqueza estimada estabiliza-s^ a partir de um certo número de am ostras. (B) Dois
métodos de estimativa que apresentam valores estáveis de riqueza estimada, a partir de
um certo nfvel de esforço de coleta. O método 3 é preferível ao método 2 por estabilizar-se
com menor esforço.

33
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

Riqueza real
»
Figura 4. Riqueza estimada usando-se 3 métodos hipotéticos, para seis comunidades com
diferentes valores de riqueza total. Cada ponto representa uma comunidade, amostrada uma
única vez e submetida aos três métodos. O método 1 estima perfeitamente a riqueza de cada
com unidade. O método 2 apresenta estim ativas abaixo da riqueza real, porém com um
desvio constante, que não varia em relação à diversidade total. 0 método 3, o pior de todos,
também subestim a a riqueza, porém o desvio da estim ativa em relação à riqueza real é
maior em comunidades mais diversas.

Infelizmente, para a maioria dos métodos de estimativa não existem informa­


ções de como eles se comportam em relação à riqueza total da comunidade, e
as poucas evidências existentes não são muito animadoras. Em um estudo de
simulação por computador, Baltanás (1992) gerou várias estimativas para doze
comunidades artificiais, com diferentes valores de riqueza total. O autor testou
o desempenho de três métodos de estimativa, entre eles o Jackknifel e o ajuste
de curva log-normal, e concluiu que ambos se comportam como o método 3 da
Figura 4. Além disso, foi observado que as estimativas podem variar entre
diferentes inventários, feitos sobre a mesma comunidade, apresentando, por­
tanto, um desvio variável em relação à riqueza total. A variância do desvio se
mostrou correlacionada à riqueza total, sendo que, para comunidades muito
diversas, a riqueza estimada poderia ser maior, igual ou muito menor que a
riqueza real. Os resultados tornam completamente inviável qualquer tentativa
de compensar matematicamente o aumento do desvio da riqueza estimada em
relação à riqueza total, o qué faz desses dois métodos instrumentos muito

34
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

pouco confiáveis para estudos comparativos.

Além da exatidão, ou estabilidade de desvio, em relação à riqueza real, e da


baixa sensibilidade ao esforço amostrai, é desejável que métodos de estimativa
de riqueza sejam pouco sensíveis a variações na estrutura das comunidades.
Isso nem sempre se verifica, uma vez que alguns métodos podem ser bastante
influenciados pela distribuição espacial das espécies. Esse problema pode ser
explicado através de um exemplo hipotético: duas comunidades com riqueza
total igual, amostradas com o mesmo método e com esforço equivalente. A
diferença fundamental entre as duas comunidades estaria na distribuição es­
pacial das espécies. Na primeira comunidade, as espécies se distribuem de
forma homogênea pelo ambiente, enquanto na segunda se observa uma distri­
buição em manchas. Neste caso, algumas espécies ocorreriam de forma agrega­
da, com muitos indivíduos concentrados em poucos pontos. Em uma amos­
tragem desta comunidade, estas espécies tenderiam a aparecer com vários in­
divíduos em poucas amostras, o oposto da comunidade homogênea,- na qual
os indivíduos coletados de cada espécie estariam mais bem distribuídos en-.
tre as unidades amostrais. Qualquer método de estimativa aplicado aos in­
ventários destas comunidades deveria resultar em valores idênticos, o que
nem sempre se observa.

Dois estudos (Chazdon et al. 1998; Santos 1999) demonstraram em simula­


ções por computador que todos os métodos tendem a gerar estimativas dife­
rentes quando se aumenta artificialmente o nível de agregação dos indivíduos
entre as amostras. Além disto, Chazdon et al. (1998) observaram que muitos
métodos que apresentavam estimativas estáveis tornavam-se extremamente sen­
síveis ao tamanho da amostra após um aumento da heterogeneidade. Esses
resultados sugerem que comparações entre resultados de estimativas de rique­
za seriam confiáveis apenas se executados entre comunidades com mesmo
nível de agregação.

Um exemplo mais preocupante de sensibilidade .à estrutura das comunidades


foi descoberto por Keating (1998). Este autor'executou várias estimativas atra­
vés da equação de Michaelis-Menten, utilizando dados de comunidades artifi­
ciais com riqueza total igual, mas com diferentes padrões de distribuição de
abundâncias, obtendo resultados diferentes para cada tipo. O estudo confir­
mou previsões de vários autores (Colwell & Coddington 1994; Soberón & Llo-
rente 1993), que sugeriram que não existiria um método de ajuste de curvas
apropriado para comunidades com padrões de distribuição de abundâncias
diferentes. E necessário que outros modelos de ajuste sejam testados e que se

35
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

descubra como avaliar em que situação cada um deve ser usado.

Apesar de todas as informações apresentadas, ainda há niuito para se desco­


brir sobre a aplicabilidade, de métodos de estimativa de riqueza a estudos de
biodiversidade. A maioria dos métòdos não passou por avaliações extensas
através de simulações de computador, alguns foram pouco testados com da­
dos empíricos, e ainda não foi feito nenhum estudo testando a validade de
estimativas de riqueza para comparação de inventários, o que seria o principal
objetivo desses métodos. Como sugerem as datas de publicação da maioria
dos trabalhos citados neste capítulo, esses métodos e seu uso em ecologia são
relativamente recentes. A disseminação de seu uso como instrumento para
análise de inventários depende de avaliações rigorosas sobre sua atuação em
diferentes tipos de dados.

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Apêndice
Equações dos métodos não-paramétricos de estimativa de riqueza
(fonte: Colwell 1997)

Variáveis
Sest Riqueza estimada pelo método "est" (Jackknife, Chaol etc);
Sobs Riqueza observada;
Sraras Número de espécies raras;
Sabund Número de espécies abundantes;
Sinfr Número de espécies infrequentes;
Sfreq Número de espécies frequentes;
m Número de amostras;
minfr Número de amostras que têm pelo menos 1 espécie infrequente;
Fi Número de espécies que têm exatamente "i" indivíduos em todas as
amostras juntas;

Qj Número de espécies que ocorrem em exatamente "j" amostras;


Pk Proporção de amostras que contêm a espécie "k";
Nraras Número total de indivíduos de espécies raras;
Ninfr Número total de indivíduos de espécies infrequentes;
Cace Estimativa de cobertura da amostra, baseado em abundância;

39
ADALBERTO JOSÉ DOS SANTOS

Cice Estimativa de cobertura da amostra, baseado em incidência;


^ace Coeficiente de variação estimado para Fi;
y^ice Coeficiente de variação estimado para Qj.

Equações

1 ) Jackknife de primeira ordem

Sscfcl = Sb6s+ Q1 '


m

2) Jackknife de segunda ordem

0 Qi(2m-3) Qz(m- 2)2


QNÜ2 = c b f c s - h --------------------------------------------------- ; “
m m (m - 1)

3) Bootstrap
Sobs
Sbool= Sobs+ ^ (1 —pk)
*=1
4} Chaol

F i2
School — Sobs H"
, 2Fi

5) Chao2 .

School = Sobs H ~~
2 Q2

6 ) ACE (Abundance-based Coverage Estimator)

_ Sraras F I 2
Sacc — SabiinJ "h----------------------4"~Yacc
Cate Cat-c

em que
10
£ / ( / - 1)F i
5 SvSSx I-1
y*» = m a x ----- * — —
Cace ( Nraras)( Nraras—1)

Fi
Cace — I —
N,

40
ESTIMATIVAS DE RIQUEZA EM ESPÉCIES

em que

/V raras = ^ UF' I

7) ICE (Incidence-based Coverage Estimator)

„ c S inf r Q\ 2
ò ic e — ò fre a + — ---------------------------------------------- 1
-----------------— Wee

C ic e C fc e

em que
10

I /■(/- 1)Q
„ 2 _ J ' « IT Iin Ir , i ,__________________

Cice 1) (ft/ in lr)2

C ,e e = I
N Mr

em que

N « f r = '£t JQ j
y=1

41
1 Macroinvertebrados aquáticos como
indicadores ambientais da qualidade de água
Donald P. Eaton
Earthwatch Institute e IBC - Instituto de Biologia da Conservação

Introdução
O termo "macroinvertebrado aquático" refere-se à classe de animais de água
doce, cujo tamanho pode ser visto a olho nu. A maioria deles pertence aos
filos Arthropoda (insetos, ácaros de água e crustáceos maiores), Mollusca (ca­
racóis e bivalves), Annelida (vermes segmentados), Nematoda (vermes cilín­
dricos) e Platyhelmintes (vermes plapos). Eles estão presentes em todos os
níveis tróficos, com uma atuação ecológica bem diversa nos ecossistemas
aquáticos (Cummins & Klug 1979). Por exemplo, um grupo misto de espécies
(comunidade) de predadores chamados "desfibradores" converte partículas
orgânicas grandes, provenientes de ambientes terrestres (por exemplo, folhas
caídas), em uma forma mais' acessível para predadores aquáticos, atuando como
decompositores. Um segundo grupo de decompositores, chamados "coleto--
res", come as partículas produzidas pelos desfibradores menores, juntando-as

aos sedimentos ou filtrando-as da coluna de água. Um papel ecológico diferen­
te é executado por uma comunidade de macroinvertebrados chamada "raspa­
dores" que se alimentam de perifiton (capa nutritiva fopmada por algas, proto­
zoários, fungos e bactérias', e que cresce em substrato aquático). Exemplos
destes decompositores incluem os vermes achatados (Turbellaria) que se ali­
mentam de protozoários e outros invertebrados pequenos nos sedimentos,
tais como: larvas de Corydalidae (Megaloptera), as quais engolfam insetos aquá­
ticos que vivem entre as partículas de detritos, e o "gigante d'âgua" (Hemiptera:
Belostomatidae), que perfura e suga os fluidos de invertebrados, peqüenos
peixes e anfíbios.

Os macroinvertebrados aquáticos apresentam uma grande diversidade de es­


pécies e são encontrados em quase todos os tipos de hábitats^de água doce,
sob diferentes condições ambientais, por exemplo, fontes termais (Hoeppli

43
DONALD P. EATON

1926; Capart 1951), cursos de água cobertos com gelo (Maciolek & Needham
1951), lagoas temporárias (Dodson 1987), lagos salinos e rios altamente polu­
ídos sem oxigenação (Hynes 1960). Consequentemente, os macroinvertebra-
dos aquáticos são extremamente úteis para monitorar a qualidade da água,
além de serem de fácil amostragem (Rosenberg e Resh 1993). A análise biológi­
ca dos macroinvertebrados aquáticos, para avaliar a qualidade da água, tem
sido realizada durante quase um século e atualmente esses tipos de análises
fazem parte dos programas de monitoramento na Europa, América do Norte e
Austrália (Moss et al. 1987; Barbour et al. 1996, Marchant et al. 1997).

Os objetivos deste capítulo são apresentar uma introdução aos métodos de


amostragem e análise de populações e comunidades de macroinvertebrados
aquáticos. Os métodos abordados aqui são apropriados para investigações
descritivas ou experimentais na área da biologia da conservação, como, por
exemplo, levantamento da biodiversidade, análises da história natural local,
ou comparações de abetas aquáticos primitivos e perturbados.

Identificação de espécies
Um dos maiores problemas que os investigadores enfrentam quando estudam
invertebrados aquáticos nos neotrópicos é a falta geral de uma chave de classi­
ficação para a identificação de espécies em categorias taxonômicas como or­
dens ou famílias. Publicações sobre "Sistema de Classificação para os Insetos
Aquáticos da América do Sul", ou "Efemerópteros do Mato Grosso do Sul" etc,
infelizmente, não existem. A maioria da literatura sobre taxonomia consiste
em descrições de espécies individuais ou grupos de espécies dentro de gêne­
ros (veja os volumes de Hurlbert, Rodriquesz, & Santos (1981 a é b) para
referências de taxonomia para organismos aquáticos neotropicais publicados
antes de 1981). Um problema adicional - e um desafio excitante - é que, apesar
do progresso considerável feito em anos recentes (Lugo-Ortiz & McCafferty
1995; Froehlich 1998), o conhecimento taxonômico ainda se encontra incom­
pleto para muitos grupos de macroinvertebrados aquáticos na região Neotropi­
cal (Epler 1988). Em regiões relativamente desconhecidas, como o Pantanal, é
muito provável que espécies não classificadas sejam coletadas durante inven­
tários de macroinvertebrados (AquaRAP 1998). Assim, ecólogos especialistas
em água doce e biólogos conservacionistas terão dificuldades em identificar
estas espécies.

O primeiro e mais importante passo seria colaborar com museus e especialis­


tas de taxonomia. Todos os biólogos de campo que coletam invertebrados de
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

água doce no Neotrópico deveriam reservar espécimes para ser depositadas


em museus. Essas coleções servem como documentos sobre biodiversidade e
podem ser estudadas por futuras gerações de biólogos, uma vez que identifica­
ções de espécies são necessárias para interpretar com precisão os resultados
de um estudo ecológico (Resh & Unzicker 1975). Por exemplo, em uma inves­
tigação sobre a história da vida de um inseto aquático, é importante saber se os
padrões avaliados são referentes a uma única espécie ou a um grupo morfolo­
gicamente semelhante, mas com espécies distintas ecologicamente (Adler 1987).
Assim, o taxonomista, em troca, benéficiar-se-á da colaboração; obtendo infor­
mação sobre a distribuição geográfica de espécies conhecidas e da possível
descoberta de espécies novas.

Outro procedimento útil para os não especialistas seria o de conhecer bem a


literatura sobre a taxonomia do grupo a ser estudado, e identificar taxonomica-
mente os espécimes, se possível, até o nível de espécie. A maioria dos especi­
alistas em taxonomia não tem tempo ou interesse para separar invertebrados
não identificados quando analisam frascos cheios de lama. Já os não especia­
listas podem começar o processo de identificação consultando chaves gerais
de regiões biogeográficas citadas por Pennak (1989), Thorp & Covich (1991), e
Merritt & Cummins (1996). Pox meio destas referências, podem-se frequente­
mente identificar espécimes e classificá-los até Ordem ou Família. Porém, as
identificações devem ser confirmadas através de consultas sobre descrições
dos táxons e listas de confirmação (checklists) da região Neotropical, quando
disponível (Hurlbert et al. 1981a, 1981b). Para aqueles grupos aquáticos bem
estudados, como o da família Simuliidae (Diptera), identificações no nível de
gênero e de espécies são possíveis através de descrições atuais na literatura.
Porém, para grupos menos desconhecidos, como o da família Chi,ronomidae
(Diptera), identificações ao nível de gênero são difíceis.

Grupos de espécies não identificados dentro de um gênero ou de uma catego­


ria taxonômica mais ampla podem ser separados pelo não especialista em gru­
pos morfologicamente semelhantes, chamados de "morfoespécies". Mesmo que
o significado biológico dos grupos de morfoespécies precise ser avaliado atra­
vés de comparação com espécimes de referência de museus, estes grupos po­
dem apresentar uma estimativa inicial da riqueza do táxon e ajudar os taxono-
mistas no processo de separação dos espécimes. Na colaboração com os mu­
seus, o especialista em taxonomia deve ter o cuidado de apresentar espécimes
em bom estado de conservação, devidamente etiquetados. Também deve se
preocupar em coletar espécimes em vários estágios do ciclo biológico.

45
DONALD P. EATON

Preservação, etiquetagem e preparo dos espécimes


Para que as amostras se tornem úteis, os espécimes devem ser preservados e
etiquetados corretamente. Trabalhos desenvolvidos por Thorp & Covich (1991)
descrevem uma variedade de métodos utilizados para preservação e identifica­
ção, particularmente de um determinado táxon de invertebrados aquáticos.
Estudos realizados por Martin (1977) apresentam métodos gerais para preser­
vação, montagem e etiquetagem de insetos e aracnídeos. Invertebrados com
corpo do tipo macio, como vermes chatos e moluscos, requerem frequente­
mente técnicas especiais de preservação (Thorp & Covich 1991). Por exemplo,
os vermes chatos são mais bem observados, quando vivos, em montagens
úmidas, sob microscópio. No caso dos caracóis pertencentes a família dos
hidrobiídeos (Prosobranchia: Hydrobiidae) é preciso utilizar um agente de re­
laxamento antes da preservação. Agentes como etanol (70-90%) e formaldeído
(5%) são bons conservantes para as fases aquáticas da maioria dos outros
grupos. A solução de 5% formaldeído é preparada misturando-se aproximada­
mente 1 parte de formalina concentrada (uma solução líquida que contém 40%
formaldeído) para 9 partes de água. Devido à propriedade carcinogênica do
formaldeído, deve-se usar luvas de borracha e trabalhar em uma área bem
ventilada. Sacos plásticos do tipo Ziplock são excelentes recipientes temporá­
rios para armazenar amostras de invertebradas, em 5% formaldeído, coletadas
do campo. Uma vez limpos dá sujeira da amostra (procedimentos descritos
abaixo), os espécimes são transferidos para frascos de vidro contendo 70-90%
etanol para um armazenamento em longo prazo.
As etiquetas dos espécimes devem ser feitas de papel resistente com um alto
teor de algodão (aproximadamente 100%). Essas etiquetas são colocadas dentro
dos frascos junto com os espécimes, portanto, elas devem ser escritas à máquina
ou à mão com tinta ou lápis que não borrem na presença do líquido conservan­
te. As etiquetas devem sempre incluir as seguintes informações (Martin 1977):

1) local:
* município, estado, país (coordenadas geográficas, se possível);
* especificar o local em ambiente aquático (litoral norte, 200 m da fonte);
* hábitat (zona de planta aquática emergente, tronco submergido etc).
2 ) data:
* da coleta ou do aparecimento (veja "Desenvolvimento de Métodos" abaixo);
* 3 de agosto de 1999 deve ser escrito como 3-agosto-99 ou 3-VIII-99
(abreviações ou números romanos são usados para meses para evitar uma
possível confusão entre dias e meses);

46
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA-

3) tipo de amostragem: (por exemplo: Hess, Surber, rede etc);


4) fluido usado para conservar (por exemplo 5% formaldeído, 90% etanol etc);
5) nome do coletor.
% J
Embora haja muitas exceções, a maioria dos insetos aquáticos passa as fases
imaturas do ciclo biológico (ovo, larva e pupa) na água e a fase adulta voadora
em terra (Merritt & Cummins 1996). Muitos dos trabalhos clássicos de taxono-
mia sobre insetos aquáticos e até mesmo algumas publicações recentes são
principalmente baseadas em descrições de adultos (por exemplo, Lutz 1910;
Roback 1971). Porém, durante uma pesquisa típica de macroinvertebrados,
somente as fases imaturas aquáticas são coletadas. Portanto, para fazer identi­
ficações de espécies, é necessário associar as fases imaturas e fases de adulto.
Para tal, numerosas técnicas específicas, para algumas determinadas ordens
ou famílias de insetos, foram desenvolvidas (Merritt & Cummins 1996). Em
geral, uma larva adulta ou pupa é colecionada e mantida em um ambiente
seminatural até a emergência da fase adulta. O espécime adulto é, então, pre­
servado e identificado junto com o exoesqueleto liberado da larva e pupa.
Junto com os espécimes adultos, deve-se coletar as fases aquáticas dos insetos
não adultos para ajudar na identificação do exoesqueleto.

Finalmente, coletas de adultos devem ser feitas perto dos ambientes aquáticos,
amostrados, sempre que possível. Pode-se usar redes de varredura ou'redes
do tipo fole (beatin g nets) para capturar insetos pousados na vegetação próxi­
ma da água, e armadilhas luminosas e-armadilhas de M alaise, que são méto­
dos efetivos para obter espécimes de adultos (Martin 1977). Também podem
ser usadas armadilhas emergentes flutuantes, as quais capturam insetos assim
que eles deixam a água para iniciar a fase adulta voadora. Métodos de preser­
vação variam para os adultos pertencente a um determinado táxon de inseto,
mas a maioria pode ser armazenada em etanol 95%.

Um microscópio estereoscópico (10X a 60X ampliação) com uma fonte lumi­


nosa incidente é necessário para separar e identificar a maioria de macroinver­
tebrados aquáticos. O microscópio deve ser provido de um micrômetro ocular
(uma régua com uma escala visível pela lente ocular), caso seja necessário
obter medidas de comprimento, largura da cápsula da cabeça etc. O micrôme­
tro é calibrado para cada ampliação comparando suas gradações com as da
régua de cálculo colocada na base do microscópio (Pantin 1960). Para exami­
nar o menor detalhe das estruturas morfológicas e pequenos macroinvertebrà-
dos - por exemplo, as cápsulas da cabeça das larvas da família quironomídeos
(Diptera: Chironomidae) ou nematoides inteiros - é necessário um microscó­

47
DONALD P. EATON

pio mais poderoso (40X a 400X ampliação) com um campo intenso de ilumi­
nação. Lâminas temporárias ou permanentes podem ser preparadas usando-se
meios de suporte contendo glicerina ou meio de Hoyer (Martin 1977).
- i ' ,
Delineamento da amostragem, técnicas e análises
Algumas das melhores referências deste assunto são Elliot (1977), Morin (1985),
e Merritt & Cummins (1996).

Medida de espaço e tempo para amostragem


A medição espacial e temporal do delineamento da amostragem dependerá
dos objetivos do estudo (Elliot 1977). Frequentemente, avalia-se a história e o
comportamento dos macroinvertebrados aquáticos em. uma única área rasa da
lagoa ou ao longo de uma extensão curta do riacho (por exemplo, Smith 1979;
Sweeney & Vannote 1982). Estudos também podem ser realizados nesta área,
como, por exemplo, fazer uma comparação do crescimento dos perifiton em
cima de áreas pequenas do substrato, na presença ou ausência de macroinver­
tebrados do tipo raspadores (McAuliffe 1983). Porém, se as amostras forem
usadas para tirar conclusões sobre uma área geográfica maior, por exemplo,
uma bacia de rio ou uma região grande de zòna aquática/pântanos, a área espa­
cial a ser amostrada precisará ser bem maior. As investigações sobre população
e comunidade são geralmente realizadas nessa escala. Por exemplo, para docu­
mentar a densidade da população de uma espécie de inseto de um riacho
localizado em uma região da floresta tropical sazonal, amostras devem ser co­
letadas de mais de um riacho e de vários pontos longitudinais (rio acima-a
jusante) ao longo dos riachos. Os resultados desse tipo de estudo servirão
para o cálculo de populações para a região, para bacias de fluxos individuais,
e mostrarão as posições longitudinais ao longo de fluxos onde o inseto é mais
abundante. Outros exemplos de estudos nessa escala incluem uma compara­
ção experimental da resposta de comunidades de macroinvertebrados para
sedimentação em lagoas de fazenda, com e sem gado de pastagem, ou uma
pesquisa sobre a biodiversidade de macroinvertebrados em uma bacia desco­
nhecida de um rio.

A escala temporal para realizar a amostragem também varia com as necessida­


des do estudo. Para documentar eventos da história natural, como o desenvol­
vimento das larvas, pupas ou períodos de acasalamento, amostras frequentes
devem ser coletadas. Intervalos de amostragem, os quais variam de dias a
meses, serão necessários dependendo das espécies de macroinvertebrados e

48
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

os fatores ambientais como temperatura e disponibilidade de comida. Para


estudos regionais ou de grandes bacias, o tempo e os recursos limitados nor­
malmente restringem a frequência das coletas das amostras para mensais, sa­
zonais ou anuais.

Inventários qualitativos versus quantitativos


A amostragem quantitativa é usada para calcular a abundância absoluta ou
relativa de macroinvertebrados aquáticos. Dados de abundância absoluta po­
dem ser expressos de vários modos: 1 ) número ou biomassa por área do subs­
trato aquático; 2 ) número ou biomassa por massa do substrato aquático (por
exemplo, se o substrato consiste de partículas de detritps com massa/pesáveis,
como folhas), ou 3) número ou biomassa por volume de água.

As duas primeiras medidas aplicam-se aos macroinvertebrados do tipo bênti-


co, os quais passam as suas fases aquáticas presos ou se mudando de substra­
tos em ambientes aquáticos (por exemplo, pedras, sedimentos, as partículas
de detritos, e plantas aquáticas). A terceira medida é usada para um número
pequeno de macroinvertebrados que vivem principalmente em água aberta, por
exemplo, camarões misidácèos (Crustacea: Mysidacea) e (Diptera: Chaoboridae)
iThorp e Covich 1991). A abundância relativa é normalmente expressa como
dados relativos de composição, por exemplo, por cento (%) ou proporção de
desfibradores, g razers etc (Cummins & Klug 1979).

Amostragens quantitativas são requeridas para estudos sobre a história natu­


ral, populações, comunidades e produção secundária de macroinvertebrados
aquáticos. Embora alguns tipos de amostras qualitativas possam ser usados
para calcular as medidas das abundâncias relativas, eles são normalmente usa­
dos para coletar dados categóricos sobre os macroinvertebrados. Esses dados
são usados para cálculos métricos ou índices discutidos abaixo. Exemplos
comuns de dados coletados incluem:

1) composição'de porcentagem (por exemplo: % Trichoptera, % Plecoptera etc);


2 ) abundância semiquantitativa (por exemplo: raro, comum, ou abundante), ou
3) presença/ausência de táxons (por exemplo: espécies A - presente, espécies
B - ausente, etc).

Essas medidas, juntamente com os cálculos métricos e os índices, são princi­


palmente usadas para pesquisas sobre fauna, isto é, lista de táxon de locais
diferentes ou regiões (Elliot 1977), ou em uma avaliação biológica dos detritos
na qualidade de água (por exemplo Barbour et al. 1996).

49
DONALD P. EATON

Amostragem quantitativa e análise


Análise preliminar: cálculo do número de réplicas necessárias para
a amostragem quantitativa
Para inventários quantitativos de macroinvertebrados, é preciso fazer repeti­
ções ou réplicas da amostragem (Elliot 1977). As réplicas das amostras permi­
tem ao investigador fixar limites de confiança estatística das medidas de abun­
dância. Por exemplo, 95% de limite de confiança ao redor da densidade média
de algumas espécies em um determinado local. O número ótimo de réplicas
necessário para estimar a abundância pode ser determinado com a seguinte
informação (Morin 1985): 1) a precisão necessária para as estimativas de abun­
dância (é determinado pelos objetivos do estudo); 2 ) o custo (tempo) de coletar
e processar as amostras; 3) a variação das medidas da abundância, 4) a abun­
dância média do macroinvertebrados de interesse e 5) o tamanho (área) do
ambiente aquático amostrado para cada réplica.

A primeira pergunta que se faz antes de começar um inventário quantitativo é:


qual é o nível de precisão necessária para alcançar os objetivos deste estudo?
Normalmente, precisão é expressa como a razão do erro padrão da média sobre
a média. Razão com valores baixos significa uma maior precisão e uma maior
habilidade para descobrir diferenças entre locais, estações, tratamentos, etc. O
problema com alta precisão é que requer um aumento no número de réplicas
da amostras e, portanto, um aumento no custo do estudo, ou seja, o tempo
gasto para coletar e processar as amostras. O programa para uma ótima amos­
tragem equilibra as necessidades para precisão e baixo custo (Morin 1985).

Macroinvertebrados aquáticos geralmente são distribuídos em grupos;. Assim,


a variância entre as réplicas' da amostragem é tipicamente alta (Elliot 1977,
Downing 1979, Morin 1985). Elliot (1977) descreveu um método para calcular
o número de réplicas exigido para obter üm determinado nível de precisão
para as estimativas de abundância. Este método é baseado em se fazer uma
amostragem preliminar do local de estudo e estimativas preliminares subse­
quentes da abundância média e da variância dos macroinvertebrados. O nú­
mero de réplicas requerido é determinado pela fórmula:

n = s 2 p 2 Ç ~2

na qual: n é o número de réplicas, s 2 é a variância das amostras preliminares,


p é a precisão desejada (erro padrão / média) para o estudo e ^ é a abundância
média das amostras preliminares. A Tabela 1 ilustra um exemplo do procedi-

50
l
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

mento. Os dados são de uma pesquisa preliminar de ninfas de libélula em


duas cabeceiras de riachos da Estação Ecológica dos Caetetus no Estado de
São Paulo, Brasil (Eaton, dados não publicados).

Tabela 1. Número de repetições das amostras necessárias para se obter a precisão desejada
para a estimativa da abundância dos macroinvertebrados aquáticos (Elliot 1977).

Número de
Número de repetições para
repetições por uma precisão
amostra a desejada b
Curso (número / 0.6 Precisão
d’água m2) Média Variância -* 0.1 0.2 0.4
r 4È
Jararaca 22, 20, 4, 14 15.0 65.32 29 7 2

Floresta 0, 1, 3, 1 1.3 1.58 101 25 6

* As am ostras sâo estim ativas preliminares da abundância de ninfas de Progom phus sp.
(Odonata: Gomphidae) em duas cabeceiras de cursos d'ãgua da Estação Ecológica dos
Caetetus, São Paulo, Brasil.

: Numero de repetições calculado pela equação: n = s 2 p 2 x 2 , em que n é o número de


repetições; s2 é a variância; p é a precisão (erro padrão / m édia), e x é a média da abundância.

Os exemplos mencicfnados na Tabela 1 mostram claramente que, para se obter


estimativas mais precisas sobre a abundância, é preciso trabalhar com um
maior número de repetições por amostras (quanto menor a razão erro padrão /
média, maior a precisão), pois, à medida que a abundância média diminui, o
número de repetições tem que ser maior. Devido ao fato da presença das ninfas
de Progom phus sp. (Odonata: Gomphidae) ser muito mais rara no Córrego
Floresta do que no Córrego Jararaca, o número de réplicas por amostra tem que
ser três vezes maior para se obter um nível de precisão de 0 .2 . Esta tendência
é verdadeira para as amostragens de macroinvertebrados em geral. Para se obter
uma precisão mais alta e diminuir a média das abundâncias, é preciso aumen­
tar o número de repetições das amostras (Morin 1985).

O tamanho ótimo, ou área, do ambiente aquático a ser amostrado está relacio­


nado à média da abundância dos macroinvertebrados e os custos de coletar e
processar as amostras (isto é, preservação, lavagem, identificação e contagem).
O tempo que se leva para coletar as amostras é geralmente pequeno quando
comparado ao tempo de processo, portanto, a redução do processamento é
fundamental ao desenvolvimento de um programa eficiente de amostragem.

5?
DONALD P. EATON

Trabalhos conduzidos por Morin (1985) revelaram que quando as médias das
abundâncias eram altas, o número de repetições das amostras obtidas em uma
área menor do substrato reduziu o tempo de processamento. Isto porque havia
menos invertebrados para lidar durante os processos de identificação e conta­
gem. Porém, para o mesmo nível de precisão, de amostras e com baixas médias
de abundâncias, Morin (1985) observou que era vantajoso usar uma área maior
para amostragem. Neste caso, foi gasto um tempo menor durante o processo de
coletas. Quando uma área maior foi amostrada, uma menor abundância de
invertebrados foi coletada mais frequentemente e, portanto, o número exigido
de réplicas foi reduzido.

Escolha das áreas,a serem amostradas em um local e amostragem ao


acaso do sublocal
Após a definição da área a ser estudada, da frequência a ser amostrada, do 5
número de repetições/amostra a ser coletado e o instrumento aquático para
coleta a ser usado (ver tópico abaixo), o pesquisador finalmente pode iniciar a
amostragem da área. O primeiro passo é escolher de onde as réplicas das amos­
tras serão retiradas. Os locais são geralmente escolhidos ao acaso, de forma
que representem com precisão a abundância e a variância das populações ou
comunidades dos macroinvertebrados no local (Elliot 1977). Além disso, fazer
amostragens ao acaso é suposição básica de muitos testes estatísticos, por exem­
plo, ANOVA. Amostragem ao acaso pode ser realizada dividindo-se o local de
estudo em lotes imaginários, que são do mesmo tamanho da a área a ser amos­
trada. Os lotes são numerados e escolhidos ao acaso como os locais da coleta
das amostras.

Este sistema funciona muito bem se o ambiente aquático for relativamente


homogêneo com respeito à composição de substrato, profundidade, caracterís­
ticas de fluxo etc. Claro que essa situação é rara. Hábitats aquáticos distintos
estão frequentemente presentes em um local ou pode existir um gradiente
ambiental. Por exemplo, no caso de riachos, existem áreas rasas com correntes
rápidas e áreas fundas com correntes lentas. Já os pantanais normalmente
apresentam zonas de plantas aquáticas distintas, as quais estão relacionadas
com a profundidade da água. Essas diferenças ambientais aumentarão a varia­
bilidade da abundância estimada, se os locais amostrados forem escolhidos
aleatoriamente dentro da área total de estudo. Isso ocorre porque muitos ma­
croinvertebrados se encontram em zonas ambientais específicas ou hábitats.

Um método mais adequado seria o de dividir o local geral de estudo em sublo-

52
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

cais baseando-se em características ambientais, e escolher ao acaso os sublo-


cais a serem amostrados. Este método é conhecido como amostragem estratifi­
cada ao acaso (Elliot 1977). O ambiente dentro de cada sublocal deve ser rela­
tivamente homogêneo quando comparado às diferenças observadas dentro do
local geral a ser investigado. Da mesma forma que o método de blocos ao acaso
do teste ANOVA, esse procedimento diminuirá a variância da abundância es­
timada e aumentará a habilidade do investigador para descobrir diferenças
entre locais, estações, tratamentos etc. Essa metodologia também pode revelar
importantes aspectos relativos à distribuição e à ecologia de macroinvertebra-
dos aquáticos. Por exemplo, um estudo pode mostrar que os macroinvertebra-
dos de uma zona de plantas aquáticas (sublocal 1 ), em um pantanal, são afeta­
dos pela pastagem do gado, enquanto os macroinvertebrados de uma segunda
zona de planta (sublocal 2) não o são. Um estudo realizado por Angradi (1995)
mostrou que a variação entre as comunidades de macroinvertebrados de um
riacho era maior para hábitats diferentes do mesmo riacho do que para os
mesmos hábitats em riachos diferentes.

Para estimativas de abundância do local de estudo, uma média ponderada


pode ser calculada usando os tamanhos relativos (áreas) dos sublocais (Elliot
1977). Esse método requer estimativas de abundância dos táxons e medidas
de área de cada sublocal. A proporção de cada sublocal é calculada como a
área de sublocal / área do local de estudo e usada para ponderar as médias das
abundâncias dos sublocais para uma média do local dé estudo. A fórmula
para calcular a média ponderada é:

em que Çw é a média ponderada para abundância do local geral, i significa


sublocais número 1 até o número total de sublocais, é a área do sublocal i
expressa como uma proporção da área do local geral), e ^ é a média da abun­
dância do táxon no sublocal i. Um exemplo desse procedimento é mostrado na
Tabela 2, para três espécies de macroinvertebrados de um riacho pequeno,
com sublocais de hábitats distintos.

53
DONALD P. EATON

Tabela 2. Exemplos da abundância estimada de um esquema estratificado de amostragem


acasuali?ada e as médias ponderadas para um local geral de abundância (Elliot 1977).

Média da abundância
(número /m2) para hábitatsa

Hábitat -*
Lago Cachoeira Maço de Local geral
arenoso pedregosa folhas
Espécies Áreab -> 0.77 0.18 0.05 abundância d
Repetiçõesc -► n = 4 n= 6 n= 5 (número /m2)

Simulium 0 667 66 123


pertinax
Phylloicus sp. 1 0 28 2
Progomphus sp 42 0 0 32

a A m ostras sã o p rov en ien tes d e um único lo c a l d e um curso d á g u a d a E staçao E cológica


dos Caetetus, S ã o Paulo, Brasil:
b Á rea é a p resen ta d a com o a p ro p o rçã o d a á rea total do local;
° n é o nú m ero d e rep etições d a s am ostras obtid as d e c a d a h ábitat;
d A bu n dân cia g eral do lo c a l (núm ero / m 2) ca lcu la d a p e la eq u a çã o :
4 w = Z p i \ ; , em qu e \ ví é á m éd ia p o n d er a d a p a r a a a b u n d â n cia g eral d o local, i significa
hábitats (cam adas) d e 1 a 3, p a p ro p o rçã o do h á b itat i no lo c a l d e estudo, e ^ é o m édia
da abu n d ân cia dos táxons no h ábitat (cam ada) i.

A Tabela 2 mostra que as três espécies em estudo são especialistas do hábitat.


Simulium pertin ax (Diptera: Simuliidae) é do tipo que se alimenta por filtração
e foi observada em abundância em superfícies rochosas onde a corrente era
rápida. Phylloicus sp. (Trichoptera: Calamoceratidae), uma espécie desfibra-
dora muito abundante nas acumulações de detritos, como maços de folhas, e
Progom phus sp. (Odonata: Gomphidae), predadora escavadoTa, que foi coleta­
da na areia de piscinas de correntes lentas do riacho. Além disso, a variância
observada com as réplicas das amostras retiradas dos três hábitats pesquisa­
dos foi maior que a variância dentro dos hábitats preferidos das espécies. Tal
dado foi observado mesmo com o aumento do tamanho da amostra, quando o
esperado seria a diminuição da variância (n = 14 para o local geral; n = 6, 5,
ou 4 para o manto, maço de folhas, ou hábitats de areia, respectivamente). A
diferença foi significativa para dois'dos três táxons (Fmax - testes: S pertinax, df
= 5, S2local / S2m anto d e rochas = 16.61, p < 0.01; PhylloiCUS sp., df = 4, S2lo ca l /
S2 m aço d e folh as = 32.52, p < 0.01; Progom phus Sp. , df = 3, S2lo ca i / S2 areia = 1.15,
p > 0.05). Perante esses dados, a amostragem ao acaso de sublocais por
hábitat foi vantajosa.
As diferenças observadas entre as estimativas das abundâncias do local em

54
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

geral e entre hábitats específicos podem ser explicadas pela composição desi­
gual do hábitat e pela alta variabilidade do táxon- entre hábitats. Também é
importante observar que a variância da amostragem foi diferente para cada
hábitat. Portanto, o número de réplicas requerido para cada hábitat foi diferen­
te (Tabela 2 ). Cachoeiras com padrões heterogêneos de fluxo apresentam dis­
tribuições características de macroinvertebrados agrupados, como aqueles que
se alimentam por filtração, S. pertinax, e requerem maior número de repeti-
•ções por amostra (Morin 1985). Hábitats mais homogêneos, como as piscinas
de areia, que mostram menor variabilidade nas abundâncias estimadas dos
táxons, como Progomphus sp., requerem menor número de repetições por
amostra.
Finalmente, a abundância de macroinvertebrados distribuída ao longo de dife­
rentes ambientes, pode ser calculada através de amostras obtidas aleatoria­
mente dentro de intervalos sistematicamente definidos ou zonas. Por exem­
plo, as réplicas' das amostras podem ser obtidas ao acaso, de locais de uma
profundidade específica em uma lagoa ou ainda de intervalos de distância
regularmente espaçados a jusante de uma fonte de poluição (Hynes 1960).

Escolha e uso de instrumentos para amostrar


macroinvertebrados aquáticos
*
Quase todos os instrumentos para amostragem usam algum tipo de rede ou
malha para separar os invertebrados da água e detritos. A tamanho da malha é
muito importante e deve ser sempre o mesmo durante a condução do estudo.
Os tamanhos das malhas típicas para amostrar macroinvertebrados aquáticos
variam de 0.1 a 1,0 mm (100 a 1000 fim). A malha mais fina, 0,1 mm, retém
quase todos os estágios do ciclo biológico (excluindo ovos) da maioria dos taxa
dos macroinvertebrados. Já as malhas com poros de 0,5 mm permitem a passa­
gem de estágios prematuros de larvas de moscas pretas (por exemplo, as famí­
lias Simuliidae e Chironomidae) e de muitos dos vermes mais finos (por exem­
plo, Nematoda). Assim, o tamanho da malha deve ser adequado ao estudo em
questão. Para estudos da população da família Chironomidae, é necessário
malhas com poros de tamanhos pequenos (i.e. 0.1 mm). Já, para amostrar
crustáceos grandes, como camarão e caranguejos, podem-se usar malhas com
poros de até 1.0 mm. O uso de malhas com poros grandes ajuda a coletar
menos detritos (partículas de sedimento, algas filamentosas etc) e, portanto, o
tempo para separar os invertebrados dos escombros das amostras é reduzido.
Merritt & Cummins (1996) organizaram um resumo excelente com numerosas

55
DONALD P. EATON

referências relativas a este assunto. Também se encontram boas referências so­


bre o tema no Capítulo 3, Diversidade de macroinvertebrados, neste volume.

Os instrumentos de coleta podem ser separados em tipos gerais e são basea­


dos, dependendo do seu uso, em hábitats fáçies lóticas (água realmente cor­
rente) ou fácies lêntica (água parada) e no tipo do material do substrato a ser
amostrado, por exemplo, fundo pedregoso, pedregulhos,, pedras menores, se­
dimentos bons, detritos, ou plantas aquáticas. Os instrumentos usados em
hábitats lóticos usam a corrente da água para ajudar a desalojar e coletar os
macroinvertebrados com redes colocadas a jusante. Exemplos incluem o Hess,
Surber, e amostrador-T (Merritt & Cummins 1996). Estes são colocados em
cima do substrato (Surber) ou introduzido nele (Hess e amostrador T), de
forma que uma área específica é projetada ou confinada pelo amostrador. Os
materiais do substrato dentro da área do amostrador são agitados (normalmen-
tê para uma profundidade de 10 cm) para desalojar os macroinvertebrados.
EleS são então levados pela corrente até a rede a jusante. As superfícies de
pedras grandes e as partículas de detritos dentro da área do amostrador preci­
sam ser esfregadas suavemente e examinadas, de forma que invertebrados
fixos, como larvas de simulídeos (Díptera: Simuliidae) è de hidrosiquídeos
(Trichoptera: Hydropsychidae), são coletados e adicionados à amostra. Uma
versão especialmente adaptada do amostrador T tem um fundo de espuma
para se fixar em uma posição nas superfícies rochosas de fundo pedregoso e
cachoeiras. Como todos esses amostradores coletam macroinvertebrados de
uma área conhecida de substrato, a abundância absoluta é calculada e pode ser
expressa como número ou biomassa por área.

Cilindro e amostragem de bomba são ideais para o substrato de sedimento fino


de hábitats lênticos. Com esse método, a abertura de um plástico ou tubo de
metal, de área conhecida, é empurrado no substrato. Uma bomba de mão com
uma mangueira de extensão é usada para bombear os sedimentos, detritos e
invertebrados para uma rede. Os invertebrados capturados são transferidos
para sacos de z ip lo ck rotulados ou outros recipientes. Esse método também
provê estimativas de abundância absolutas. Para lagos fundos, recomenda-se o
uso de garras tipo Ekman ou um instrumento .cilíndrico próprio para ser usa­
do nesta situação (Merritt & Cummins 1996).

O acúmulo de detritos, como maços de folha e plantas aquáticas vivas, podé ser
amostrado para macroinvertebrados por uma coleta rápida, usando-se redes de
mergulho grandes ou bolsas de rede. As amostras são transferidas para bande­
jas de plástico brancas e lavadas levemente para desalojar os invertebrados

56
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

presos nos detritos e superfícies de plantas. A água da bandeja deve ser, en­
tão, vértida por uma rede para concentrar e coletar os invertebrados. Os detri­
tos ou as plantas das amostras são secados e convertidos em cinzas à tempera­
tura de 550°C, para determinar o peso seco livre de cinza (método descrito em
APHA 1995). Usando essa técnica, as densidades dos invertebrados são ex­
pressas como números ou bipmassa pór peso seco livre de cinza, de detrito ou
material de planta.

Os maiores e mais móveis dos macroinvertebrados, como as ninfas de libélula,


camarões e caranguejos são frequentemente sub-representados quando se usam
os amostradores descritos acima. Eles ficam visualmente atentos ao amostra-
dor e podem algumas vezes escapar antes que o instrumento se fixe no subs­
trato. Para evitar esse problema, um segundo tipo mais ativo de coletor pode
ser usado para cobrir uma área maior e amostrar somente macroinvertebrados
grandes. Em hábitats lóticos, a amostragem pode ser feita através de arremes­
sos utilizando-se uma malha de 1 mm. Para usar esse método, uma rede em
formato de D ou com uma armação triangular e manivela é apoiada e levada
contra o substrato, com a boca da rede perpendicular para o fluxo de água. O
substrato imediatamente acima da rede é revolvido completamente, enquanto,
move-se rio acima por uma distância conhecida. Consequentemente, a corren­
teza levará os invertebrados desalojados na rede. A área amostrada é calculada
multiplicando-se a distância arremessada (normalmente 1 a 2 metros) pela
largura da boca da rede.

Em hábitats lênticos, uma rede de arremesso pode ser usada para amostrar os
macroinvertebrados grandes móveis, associados com os sedimentos ou plan­
tas aquáticas (Turner & Trexler 1997). Uma rede de arremesso consiste em uma
armação cuboamoldada, de 0,5 a 1 metro comprimento de tubo de plástico. Os
quatro lados do cubo são envoltos por uma rede com tela de 1 mm, enquanto
o topo e o fundo são mantidos abertos. O fundo aberto da rede é derrubado
rapidamente em cima da área (lote) a ser amostrada e introduzido no substrato
para apanhar os invertebrados dentro do espaço da rede. O uso de uma tela de
mergulho de 1 mm permite que os sedimentos e as plantas dentro da rede de
gota sejam varridos repetidamente até que nenhum macroinvertebrado seja
capturado. A profundidade de dentro da rede de lanço é medida e as abun-
dâncias são expressas sob uma variedade de modos. Estes dependem do lote
e dos hábitos dos macroinvertebrados amostrados, por exemplo, o número ou
a biomassa por área de substrato, por número de plantas aquáticas ou por
volume de água.

57
DONALD P. EATON

O uso de amostradores de substratos artificiais para macroinvertebrados é dis­


cutido por Rosenberg & Resh (1982). Os substratos são feitos de uma varieda­
de de materiais, como tijolos, azulejos, discos de madeira e tira de plástico,
cuja finalidade é imitar substratos naturais. Várias réplicas de amostradores
são colocadas, normalmente, em um ambiente aquático por um período de
tempo para, posteriormente, serem coletados. Os invertebrados que colonizam
os amostradores são retirados dos substratos artificiais e analisados. Embora
sejam úteis para estudos de impacto ambiental e estudos sobre colonização de

substratos, substratos artificiais permitem estimativas parciais de abundâncias
de macroinvertebrados (Morin 1987). Isso porque eles não podem se igualar
em todas as características aos substratos naturais.

Processamento da amostra
O processamento das amostras começa logo após a coleta, seguido da preser­
vação e da etiquetagem. Como previamente mencionado, uma quantia consi­
derável de detritos é coletada normalmente com amostras aquáticas. Os inver­
tebrados devem ser separados dos detritos, de forma a que possam ser identi­
ficados e contados. Este processo é conhecido popularmente como "escolha de
bicho". Para facilitar esse processo, os escombros e os invertebrados podem
ser subdivididos em frações de pequenos tamanhos por meio de várias lava­
gens, vertendo as amostras gentilmente através de uma série de peneiras com
tamanhos decrescentes de malhas, por exemplo, 1, 0.4, e 0.1 mm, respectiva­
mente. Isso faz com que seja mais fácil ver e escolher os macroinvertebrados.
As frações maiores podem ser escolhidas em uma bandeja de plástico branca,
a olho nu; porém, um microscópio binocular com pelo menos 10 X de amplia­
ção é necessário para observar as frações menores. Como é de se esperar, a
fração menor sempre contém o maior número de invertebrados e leva a maior ?
parte do tempo para escolher. Se necessário, pode-se fazer subamostras das
frações menores (Elliot 1977).

Para se obter a abundância quantitativa, todos os macroinvertebrados das amos­


tras ou das subamostras devem ser identificados e contados. Isso envolve
exame microscópico de cada espécime como descrito na seção de identificação
de espécies. Uma única amostra pode ter milhares de indivíduos e mais de 50
táxons, assim, um contador mecânico é muito útil para espécies mais abun­
dantes.

O uso de biomassa para estimar a abundância é frequentemente o método mais


escolhido, em vez do número de indivíduos. Isso porque, na perspectiva eco-

58
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

lógica, a biomassa pode ser mais significativa (Benke et al. 1999). Além disso,
dados da biom assa são essen ciais para estim ar produções secundárias.
Um exemplo das diferenças que podem ser obtidas usando-se biomassa ver­
sus número pode ser observado com as larvas de quironomídeos (Diptera:
Chironomidae). Numericamente, mais de 50% dos macroinvertebrados em uma
amostra são documentados como quironomídeos, mas a biomassa total deles é
normalmente inferior a 20%.

As medidas de peso dos macroinvertebrados são obtidas após secagem indivi­


dual de cada espécime (logo após coleta ou preservação em formalina), seguida
de pesagem em uma balança analítica precisa para 0.1 a 10 /xg, dependendo do
tamanho a ser avaliado (Benke 1999). Alguns investigadores usam peso seco
livre de cinza no lugar de peso seco simples. Como esse processo é demorado
e a medida de comprimento é relativamente fácil, uma função quantitativa que
converte comprimento em peso é frequentemente determinada. Para cada es­
pécie analisada, uma regressão linear é usada com as medidas de peso e com­
primento da amostra, sendo convertidas para logaritmo, para calcular as cons­
tantes da equação:
log W = log a + b log L

em que W é o peso, L é o comprimento e a e b são as constantes. O termo log


a é a intersecção Y e b é o declive da equação de regressão. Esta equação pode
ser determinada diretamente por medidas de espécimes. Também podem ser
Utilizadas regressões publicadas de comprimento-peso (Benke et al. 1999). Ao
usar as regressões publicadas, devem-se usar equações desenvolvidas para os
táxons mais próximos às espécies em estudo, por exemplo, equações j)ara
espécies do mesmo gênero.

Opções de análise para estudos quantitativos


As análises estatísticas apresentadas exploram padrões e tendências nos da­
dos quantitativos que foram coletados e também permitem testar as hipóteses
de estudos experimentais. Dois textos excelentes em análise estatística são os
de Sokal & Rohlf (1995) e Zar (1996). Para que as análises revelem diferenças
estatísticas, é preciso uni número adequado de repetições das amostras e, para
que estas análises sejam válidas, é necessário um esquema apropriado para
amostragem aleatória. Outras suposições que devem ser satisfeitas para muitos
dos testes estatísticos paramétricos usados, por exemplo, ANOVA ou análise
de regressão, são: as abundâncias das amostras devem ser normalmente distri-

59
DONALD P. EATON

buídas e as amostras comparadas devem apresentar variâncias iguais (Sokal &


Rohlf 1995). A última suposição raramente é satisfeita para as amostras.de |
ipacroinvertebrados aquáticos (Elliot 1977). As distribuições das amostras são
tipicamente deslocadas à direita (isto é, deslocadas positivamente), e as variân­
cias frequentemente aumentam com o aumento da média das abundâncias.
Portanto, os dados precisam ser transformados antes dos testes paramétricos ,4
serem usados. Para os dados dos macroinvertebrados, uma das mais comuns
conversões para satisfazer as suposições estatísticas é:

y' = log (y + í)
em que y' é a abundância estimada transformada e y é a abundância não trans­
formada. Ressalta-se, porém, que os dados transformados devem ser testados
para "confirmar se eles satisfazem as suposições da análise estatística. Caso
isso não ocorra, outras conversões devêm ser avaliadas ou outros testes, tais
como os não paramétricos (Zar Í996), devem ser usados.

Estudos populacionais que comparam locais, períodos de tempo ou tratamen­


tos podem ser analisados com uma variedade de desenhos de ANOVÀ. Re­
gressão ou análise de correlação podem ser usadas para explorar as relações de
variáveis ambientais e abundâncias de espécies (Sokal & Rohlf 1995; Zar 1996).
Os seguintes exemplos ilustram o uso de diferentes opções de análise:

1 ) um fator-único (ANOVA) para comparar as amostras das populações de


uma espécie de mexilhão de água doce'(Bivalvia: Unionacea) coletadas de
10 riachos regionais (se uma diferença entre as populações do riacho for
estatisticamente significativa, comparações múltiplas emparelhadas serão
usadas para mostrar quais foram as populações de mexilhão que diferiram
umas das outras);

2) um fator-dois (ANOVA) que usa um bloco delineado ao acaso para com


parar as populações de uma espécie de libélula (Odonata) em diferentes
-zonas de planta aquáticas e em diferentes lagoas (lagoas são usadas como o
critério para a formação dos blocos);

3) um fator-dois (ANOVA) que compara os efeitos da cobertura da vegeta­


ção de uma área ribeirinha e a intensidade de tráfico de barcaça em popula­
ções de uma espécie (Efemeróptera) que habita um rio longo (o efeito de
interação da cobertura da vegetação ribeirinha e a intensidade de tráfico de
barcaça também são testados);

4) uma análise de regressão que investiga o efeito de efluentes de uma


destilaria de álcool em populações de camarões de água doce (Decapoda;

60
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

Palaemonidae) (amostras são obtidas de vários intervalos de distância a ju­


sante da destilaria, assim pode-se observar os efeitos de uma gama de con­
centrações de efluentesj.

Os conjuntos de dados dos estudos das comunidades de macroinvertebrados


são muitos. Eles consistem de tabelas ou matrizes, de estimativas de abundân­
cias organizadas por táxon e local (Pielou 1984). Pode haver 200 ou mais táxons
nas matrizes, e os locais podem ser organizados em dois ou mais-níveis hierár­
quicos, por exemplo, hábitat, trecho da correnteza e bacia do rio. Para inter-.
pretar os dados de matrizes, vários métodos, como por exemplo o de Análises
de Componentes Principais (PAC) e Análise de Correspondência (DAC) foram
criados para agrupar ou classificar as espécies e locais, de forma a esclarecer a
estrutura subjacente (se houver uma). Pode-se, por.exemplo,- agrupar locais de
correnteza em vales arborizados e em vales desflorestados. Outros métodos
correlacionam variáveis ambientais às comunidades classificadas, em uma ten­
tativa para explicar a estrutura da comunidade, por exemplo, Análise Discri­
minante Múltipla (AMD) (Marchant et al. 1997). O campo de classificação da
comunidade está em constante evolução e, portanto, é vasta a literatura no
assunto. Os textos introdutórios de Pielou (1984) e Ludwig & Reynolds (1988)
são muito bons. O uso dessas técnicas para analisar as comunidades de ma­
croinvertebrados aquáticos é discutido por Jackson (1993), Norris & Georgfes
(1993), dentre outros.
Os macroinvertebrados aquáticos também podem ser agrupados em um con­
junto funcional com mais de uma comunidade, dependendo dos m ecanis­
mos morfológicos e de comportamento alimentar (Cummins & Klug 1979).
Os conjuntos que são chamados de grupos funcionais de alimentação, por
exemplo, foram descritos na introdução, ou seja, desfibradores, coletores,
raspadores, predadores etc. Número e biom assa de cada grupo funcional
podem ser determinados somando-se os dados de táxons individuais, e as
comparações entre locais e estações podem ser analisadas através da ANOVA.
índices de diversidade, como os descritos no capítulo que trata de vegetação
(Capítulo 17, neste volume), também podem ser usados para comunidades
de macroinvertebrados. Porém, esses índices foram criticados na literatura
porque eles são relativamente insensíveis a mudanças em estrutura de comu­
nidade, e eles são difíceis de ser interpretados corretamente (Washington
1984; Norris & Georges 1993).
DONALD P. EATON

Amostragem qualitativa e análise para avaliação biológica da


qualidade de água
Os métodos qualitativos de amostragem são usados para economizar tempo e
recursos. Por exemplo, um taxonomista pode se interessar pela distribuição
geográfica de espécies de uma determinada família ou outra categoria taxonô-
mica. O objetivo neste caso é compor listas de espécies de várias regiões. A
avaliação da abundância neste caso é de importância secundária e pode não
ser prática. Órgãos ambientais de fiscalização interessados em monitorar a
qúàlidade da água precisam -usar métodos que lhes permitam visitar muitos
locais regularmente (Rosenberg & Resh 1993). Vários dos métodos usados, os
chamados "protocolos de avaliação biológica rápida (RAP)", minimizam o tem­
po e o custo da coleta, processamento e classificação das amostras.

Para as avaliações biológicas, amostras qualitativas de macroinvertebrados são


coletadas normalmente através de redes de arremesso ou imersão. Dependen­
do do protocolo a ser usado, a coleta é feita durante um determinado período
de tempo ou até que um número específico de macroinvertebrados (por exem­
plo, 200) seja coletado. Normalmente, em um único local, não há nenhuma
réplica, e a área amostrada não é escolhida ao acaso. Para obter o maior número
possível de taxa de um local, coletas de amostras são realizadas em diferentes
hábitats e, em seguida, são agrupadas para formar uma única amostra.

O processamento da amostra pode ser realizado no local usando bandejas


brancas e pinças. Redes com tamanhos de malha relativamente grandes são
usadas, de forma a tornar possível a seleção de amostras sem o uso de um
microscópio. Porém, exames microscópicos ainda são necessários para identi­
ficar espécies ou classificar os espécimes em categorias taxonômicas. Depen­
dendo do protocolo usado, uma avaliação biológica subjetiva também é feita
sobre a condição ambiental do local aquático (ótimo, subótimo, marginal, ou
pobre) (Plafkin et al. 1989) ou variáveis ambientais são avaliadas no local e
usadas na análise (Marchant et al. 1997).

Amostras qualitativas podem ser usadas para calcular uma variedade de "métri­
cas" que avalia a qualidade da água de um local por intermédio da informação
biológica sobre os macroinvertebrados. Nos Estados Unidos, as "métricas" são
combinadas de várias maneiras e apresentadas em resumo de notas (sum m ary
scores), utilizado para avaliar locais de água doce (Barbour et al. 1996). Esse
método de análise de avaliação biológica é chamado de procedimento "multime-
tríc" (Norris 1995). As avaliações são baseadas em notas multimétricas de um
número grande de locais de referência, ou seja, locais que estão em uma

62
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

condição cristalina ou quase cristalina. Locais não visitados também podem


ser avaliados, recebendo seus conceitos através da comparação das suas notas
multimétricas com as dos locais de referência. Essas análises süo realizadas den­
tro de ecorregiões relativamente homogêneas, de forma que diferenças naturais
entre os locais de referências e os de testes são minimizadas. Por exemplo, o
interior do estado de São Paulo, poderia ser dividido em uma ecorregião de
planalto superior, associado com cursos de água menores em elevações mais
altas, e uma ecorregião plana de inundação associada com rios maiores em ele­
vações mais baixas. Algumas das métricas mais comumente utilizadas, que pro­
varam ser sensíveis a mudanças em qualidade de água, são apresentados na
Tabela 3.

Algumas métricas, como "número de taxa", são válidas em todos os ambientes


aquáticos, enquanto outras são mais apropriadas para hábitats lóticos ou lên-
ticos, como por exemplo "número do táxon EPT" e "número do táxon Chirono-
midae", respectivamente. O "índice biótico" precisa ser adaptado regionalmen­
te para responder pelas diferenças em composições de espécies e tolerâncias
de poluição (Lenat 1993). É necessário adquirir um conhecimento significati­
vo sobre os macroinvertebrados regionais e ambientes aquáticos, porém, esse
conhecimento pode ser refinado e melhprado com o crescimento dos bancos
de dados.

No Reino Unido e Austrália, as avaliações biológicas são analisadas por meio


do uso de amostras qualitativas de macroinvertebrados utilizando-se procedi­
mentos multivariados (Norris 1995). Com esse sistema, dados sobre a presen­
ça/ausência dos macroinvertebrados são coletados de vários locais de referência
(cristalinoj e, então, analisados com técnicas de classificação para distinguir
grupos de locais de referência semelhantes. Dados ambientais, não relacionados
com o distúrbio humano e o comprometimento da qualidade de água (por
exemplo, altitude, latitude, heterogeneidade do substrato, condutividade etc),
também são obtidos nos locais e correlacionados com os grupos do local de
referência. A mesma informação ambiental é obtida em locais de teste desco­
nhecidos e usada para ser comparada a dados dos grupos apropriados dos
locais de referência. Em seguida, os conjuntos funcionais de macroinvertebra­
dos são comparados com os dos locais de referência. A diferença entre os
conjuntos funcionais observados (local de teste) e esperados (local de referên­
cia) determinam o nível de dano da qualidade da água (Marchant et al. 1997).
Um estudo recente revelou que a precisão e exatidão das avaliações são mais
altas com o procedimento "multivariado" do que com o procedimento "multi-
métrico" (Reynoldson et al. 1997). A adaptação desses métodos para avaliar
63
DONALD P.' EATON

Tabela 3. Exem plos de m acroinvertebrados aquáticos e "métricas" usadas para avaliação


biológica da qualidade da água (Rosenberg & Resh 1993; Lenat 1993; Barbour et al. 1996).

C ondição da
Tipo d e dados
M é tric a D efinição m étrica em água
co leta d o s
degradada

Número de presença/ Número de espécies de macroinverte­ Diminui


táxons ausência brados aquáticos, ou taxa diferenciá­
veis (ou seja, “morfoespécies”)
Número de presença/ Número de espécies de insetos das Diminui
táxons EPT ausência ordens Efemeróptera, Plecóptera e
Tricóptera (EPT)
Número presença/ Número de espécies da fam ília Diminui
de táxons ausência Chironomidae (Diptera)
Chironomidae
Porcentagem % composição Porcentagem do táxon mais abundan­ Aumenta
de táxon te (No. do táxon mais abundante /No.
dominante de macroinvertebrados) x 100
"Porcentagem % composição Porcentagem dos desfibradores do Diminui
de grupo funcional de alimentadores (No.
desfibradores de desfibradores/ No. de macroinver­
tebrados) x 100
índice semi- So m a. das espécies abundantes Aumenta
Biótico quantitativo a ponderada pelas tolerâncias da
poluição; calculadas pela & n t t / N,
Onde Uj é a nota da abundância semi-
quantitativa para espécies i, í2 é valor
b da espécie i, e N é a soma das notas
das abundâncias semiquantitativas
para todas as espécies na amostra

° D ad o s s e m iq u a n tita tiv o s s ã o c a te g o r ia s a b u n d a n tes , p o r ex e m p lo : r a r a (1-2 in d iv íd u o s /


am o stra ), co m u m (3-9/a m ostra], e a b u n d a n te (> 1 O /am ostra), a s q u a is s ã o d a d a s c o m o n o ta s
n u m érica s p a r a c a lc u la r os ín d ices bióticos, p o r ex em p lo : ra ra = 1, co m u m = 3, a b u n d a n te =
10 (L en at 1993],
b Valores de tolerância variam entre 0, para espécies intolerantes à poluição, e 10 para espécies
tolerantes à poluição. Os valores de tolerância são baseados em uni grande número de amos­
tras que mostram a frequência e o lim ite das espécies em diferentes categorias de qualidade da
água (Lenat 1993). Valores de tolerância são geralmente determinados conforme base regional,
por exemplo, por estado.

biologicamente a qualidade da água na região Neotropical é um desafio impor­


tante para os pesquisadores que estudam macroinvertebrados aquáticos.

64
MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS COMO
INDICADORES AMBIENTAIS DA QUALIDADE DE ÁGUA

É de suma importância ter referências disponíveis para professores e estu­


dantes de limnologia da América Latina. Mais literatura especializada pode
ser obtida na consulta de periódicos, tais como A quatic Insects, A rchiv fü r
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67
3 Diversidade de macroinvertebrados
em riachos
Adriano Sanches Melo
Departamento de Pós-graduação em Ecologia,
Museu de História Natural, Unicamp

Introdução
Lagos, rios, riachos e outros corpos de água doce recebem influência direta
dos processos que ocorrem na área de drenagem da bacia onde estão localiza­
dos. Em pequena escala, corpos de á§ua doce podem receber resíduos tóxicos
de uma determinada indústria ou esgoto çloméstico. Em escala maior, levando-
se em conta a própria bacia de drenagem, por exemplo, podem receber pestici­
das e fertilizantes utilizados na agricultura e sedimentos carreados pelas chu­
vas em áreas desmatadas (Allán & Flecker 1993). Os impactos de tais ativida­
des refletem na qualidade da água consumida pela população local, na biota
aquática, tais como em peixes e insetos,, e indiretamente na biota terrestre
dependente da água, como em aves que se alimentam de peixes (Allan &
Johnson 1997).

Pelo tamanho da bacia de drenagem e, portanto, pelo grande potencial de dife­


rentes fontes de perturbações, as barragens, os rios médios e grandes são os
mais afetados pelos impactos causados pelo homem. Exemplos claros desta
situação são os rios Tietê e Paraíba, no sudeste do Brasil. De maneira diversa,
alguns riachos, por estarem relacionados a áreas menores, ainda podem ser
encontrados em bom estado de conservaç.ão. Em geral, esses riachos estão
localizados em áreas historicamente de baixa ocupação populacional ou im­
próprias para a ocupação humana, principalmente para a agricultura, como é o
caso da escarpa da Serra do Mar, também na região sudeste do país.

Riachos possuem uma fauna muito diversificada, composta principalmente


por vários grupos de insetos aquáticos. Outros grupos também importantes,
mas com menor número de espécies, inclui peixes, crustáceos e oligoquetas.
Assim como em outros ecossistemas com alta diversidade, os elementos da
biota aquática possuem grande potencial como bioindicadores, apresentando

69
ADRIANO SANCHÉS MELO

desde espécies muito sensíveis até fortemente tolerantes à poluição (Plafkin et


al. 1989). Mais especificamente, as ordens de insetos exclusivamente aquáticas,
Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera (EPT), são apontadas por Brown (1997)
como grupos com alto potencial para uso como indicadores ambientais.

Apesar da alta diversidade e da grande importância como indicador do estado


de conservação da área de drenagem, o conhecimento da biota aquática em
riachos é ainda muito escasso no Brasil. O número de pesquisadores empe­
nhados em seu estudo é muito pequeno, mesmo quando avaliados em termos
comparativos a outros grupos, tais como*os que se dedicam aos temas da inte­
ração inseto-planta, aos vertebrados em geral ou, mesmo, àqueles voltados a
outros ambientes de água doce, como lagos e represas. Apesar da grande quan­
tidade de pesquisadores estudando riachos, hoje, nos Estados Unidos, o grande
interesse por riachos só surgiu no início da década de 70 (Resh & Rosenberg
1984). No Brasil, apesar de tardia, a tendência de aumento do número de
pesquisadores atuando nesta área é sensível, e pode ser comprovada tanto
pela quantidade de artigos publicados nos últimos anos por autores brasilei­
ros, como pelo crescente número de sócios brasileiros na North A m erican
B enthological Society (NABS), uma das mais importantes sociedades científi­
cas relacionadas à ecologia de riachos.

Em consequência do pouco conhecimento da biota de riachos no Brasil é prati­


camente impossível a identificação ao nível de espécie, mesmo por especialis­
tas, de larvas e ninfas pertencentes à maior parte dos grupos de insetos aquáti­
cos. Em alguns grupos, até mesmo a determinação de gêneros é complicada,
pois faltam chaves de identificação e, mesmo, a descrição de alguns gêneros.

Neste capítulo são apresentados métodos para o estudo de diversidade da


fauna de macroinvertebrados do bentos em riachos. A maior parte das infor­
mações citadas provém da experiência de tfabalho em riachos nas serras do
Mar e da Mantiqueira, de algumas poucas coletas feitas na Amazônia e nos
campos rupestres, em Minas Gerais. Maior ênfase foi dada aos métodos de
coleta em corredeiras, onde supostamente concentra-se a maior diversidade de
macroinvertebrados. Não foi feita uma revisão extensiva do assunto, por ser
inadequada para a finalidade deste manual. Assim, são descritos de forma
direta e objetiva métodos práticos de estudo, fornecendo referências nas quais
o leitor poderá encontrar informações detalhadás sobre os diferentes tópicos
abordados. O capítulo está dividido em 9 seções. As três primeiras seções
incluem métodos de coleta quantitativa e qualitativa do bentos, formas de
triagem das amostras coletadas e identificação do material. Nas três seções

70
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

subsequentes, abordam-se as formas de gerenciamento dós dados, os métodos


para a sugestão de um tamanho amostrai adequado e para a análise de dados
de diversidade. Nas últimas duas seções, são apresentadas algumas listas de
discussão e endereços eletrônicos de interesse.

Coletas em corredeiras de riachos


As coletas em riachos podem ser feitas com o auxílio de uma infinidade de
equipamentos, muitos dos quais apenas variações de outros modelos ^ver de­
senhos e referências em Merritt et al. 1996). Um dos métodos mais simples e
frequentemente utilizado é o “k ic k n e t”. O método fornece dados qualitativos
ou, dependendo do uso, semiquantitativos, quando a área de amostragem e ou
a duração da coleta são padronizadas. Neste caso, delimita-se uma área, revol­
vem-se as pedras com o auxílio dos pés e mãos e retém-se o material deslocado
com um puçá aquático ou uma tela com dois bastões nas laterais (Figuras IA e
1 B) (Hauer & Resh 1996). O método, apesar de prático, acaba sendo seletivo,
pois muitos indivíduos de algumas espécies ainda ficarão retidos nas pedras,
como larvas de várias famílias de Tricoptera que constroem casas fixas no
substrato. Portanto, a retirada e a inspeção das pedras contidas na área amos­
trada fornecerá, ainda, um bom número de espécies.

Figura 1. Equipamentos de coleta utilizados em corredeiras de riacho. (A)"hand screen"; (B)


D-net; (C) Surber; (D) Hess; (E) U-net.
ADRIANO SANCHES MELO

Também comum, entre os métodos para coleta em corredeiras de riachos, é o


amostrador Surber. Ele consiste de duas armações quadradas dispostas em
ângulo reto. Em uma delas prende-se um puçá, ficando a outra aberta para a
delimitação da área a ser coletada. Com o intuito de minimizar a perda de
material pela lateral da armação,'existe uma tela acompanhando a parte anteri­
or da armação até o puçá (Figura 1 C) (Williams & Feltmate 1992; Hauer & Resh
1 9 9 6 ;'Merritt et al. 1996). O tamanho das armações utilizadas varia entre os
trabalhos, mas o tamanho mais comum é de 0,09 m2. O procedimento de cole­
ta, assim como com o “ki c k n e f , é simples. Escolhe-se uma área a ser amostra­
da e coloca-se a armação sobre o local, procurando causar o menor impacto
possível na área ao redor. Em seguida, revolvem-se as pedras, deslocando os
macroinvertebrados, assim como detritos orgânicos, para dentro do puçá.
Novamente, uma inspeção posterior das pedras é altamente recomendável.
Storey et al. (1991) compararam coletas feitas por “k ic k sa m p lin g ’ e Surber e
concluíram que o primeiro método subestimou a riqueza local, principalmente
quanto à presença de taxas pouco abundantes.

Existem também outros amostradores que, ássim como o Surber, delimitam


uma determinada área do substrato. Muitos são com pletamente fechados
nas laterais, restando apenas a parte posterior com o puçá e a parte superi­
or e inferior aberta. Um modelo circular, com tais características é o amos­
trador Hess (Figura 1 D) (W illiams & Feltmate 1992; Hauer & Resh 1996;
Merritt et al. 1996).

Outra forma de amostrar quantitativamente corredeiras em riachos é coletar


pedras isoladamente, que estejam relativamente separadas de outras e que não
estejam profundamente enterradas na areia. O procedimento consiste em colo­
car um puçá imediatamente posterior à pedra a ser coletada e rapidamente
levantá-la e inseri-la dentro do puçá. Em seguida, segurando a pedra ainda
dentro do puçá com uma das mãos, agita-se a pedra rapidamente com o intuito
de soltar eventuais organismos ainda presos. Após agitar por alguns instantes,
retira-se o puçá da água. O material coletado no puçá pode ser de&pejado
numa bandeja branca para a triagem ainda no campo, ou preservado para ser
levado ao laboratório. Ao mesmo tempo, examina-se cuidadosamente a pedra
à procura de indivíduos ainda presos e casas de quironomídeos e tricopteros
fixas. Caso á pedra tenha muitas reentrâncias, uma pinça de ponta fina será
muito útil.

O tamanho de abertura do puçá, assim como o espaçamento da malha, pode


variar de acordo com o tamanho da pedra que se pretende coletar. Em geral,
' DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

são utilizadas pedras em torno de 15 a 20 cm. de diâmetro-máximo. Quanto aos


puçás utilizados, o mais coiqum é o “D-Net” (Figura TB) (Williams & Feltmate
1992; Merritt et al. 1996). Um modelo mais recente, desenvolvido com o obje­
tivo de minimizar a perda de organismos, é o “U-Net” (Figura 1 E) .(Scrimgeour
et al. 1993). Em ambos os casos,'as letras que dão nome aos modelos refletem
a forma de abertura dos puçás. Há, ainda um terceiro modelo, porém pouco
usado, desenvolvido por Doeg & 'Lake (1981). O modelo é parecido com um
Surber e é composto por um puçá acoplado a uma armação cuboide sem as
faces posterior, inferior e superior. As faces laterais e a anterior da armação são
delimitadas com malhas finas, semelhante às usadas no puçá. Um sistema de
encaixe permite que o coletor desacople o puçá ,da armação, facilitando à reti­
rada da pedra. Assim como o amostracior “U-Net”, a suposta vantagem deste
modelo é a minimização da perda de indivíduos no momento da coleta.

A escolha do tamanho da malha a ser utilizada na construção dos puçás é de


fundamental importância. Malhas de tamanho muito grande podem não reter
indivíduos pequenos, enquanto malhas muito pequenas podem não ser sufi­
cientes para a vazão da água dentro do puçá, causando um refluxo com conse­
quente perda de muitos indivíduos. Para o caso de malhas muito pequenas,
pode-se aumentar o comprimento do puçá, ou seja, a superfície de vazãó em
relação à área de abertura do puçá. Na literatura, boa parte dos autores utiliza
malhas entre 0,2 e 0,3 mm, podendo, no entanto, variar entre 0,12 até 1,5 mm.
O uso de pedras individuais como unidades amostrais apresenta vantagens
sobre os métodos que englobam uma determinada área. As pedras vêm sendo
utilizadas com crescente frequência nos últimos anos por diversos autores
(Stout & Vandermeer 1975; Lake & Doeg 1985; Minshall et al. 1985; Death &
Winterbourn 1995; Melo & Froehlich 2 0 0 1 a, 200 1 b). Minshall & Petersen (1985)
argumentam que pedras individuais são unidades naturais da comunidade,
onde as relações entre os organismos de fato ocorrem. A facilidade de manipu­
lação, tanto em experimentos piensurativos como manipulativos, é outro atra­
tivo para o método (Lake & Doeg 1985). Em experimentos de colonização,
Douglas & Lake (1994) trataram cada pedra como uma ilha e puderam aplicar
várias técnicas de análise derivadas da Teoria de Biogeografia de Ilhas. Outras
formas de coleta em riachos, incluindo métodos para hábitat com fundo de
areia, podem ser encontradas em Merritt et al. (1996) e nas referências por eles
citadas.

B|í-1 i

73
ADRIANO SANCHES MELO

Triagem
A separação dos macroinvertebrados 'dos detritos coletados é uma tarefa que
demanda certo tempo e pode ser feita ainda no campo ou no laboratório. A
grande vantagem de se fazer a triagem no campo é a facilidade na localização
dos indivíduos, principalmente dos menores, devido a sua movimentação. A
desvantagem é o tempo gasto no campo, o que muitas vezes torna esta prática
inviável (no entanto, deve-se lembrar que maior tempo no campo não significa
tempo perdido, mas, sim, maior possibilidade de encontro de algo interessan­
te, novas ideias e experiência para o delineamento de um próximo trabalho).
No laboratório, a triagem pode ser feita a olho nu e ou com' o auxílio de uma
lupa de baixa magnificação. Neste caso, o tempo necessário para uma boa tria­
gem é em geral maior que aquele gasto no campo.

Podem-se também utilizar alguns métodos que auxiliam a triagem. Uma possi­
bilidade é utilizar jogos de peneiras, com malhas sucessivamente menores.
Caso existam muitos detritos grandes, tais como folhas e gravetos, é aconse­
lhável uma inspeção posterior nestes fragmentos, pois podem reter indivíduos
menores e casas de tricópteros construídas com folhas e gravetos. A desvanta­
gem da utilização de peneiras são os cfanos causados aos indivíduos.

Outra forma de separação é feita por meio da adição de açúcar ou outro mate­
rial solúvel, o que provoca um aumento da densidade da água e a consequente
flutuação dos indivíduos e de outros componentes orgânicos. Caso existam
muitos detritos orgânicos, uma triagem posterior acaba sendo necessária. Uma
inspeção posterior do material restante no fundo do recipiente também deve
ser feita, no intuito da coleta de casas de tricópteros construídas com pedras.
Alguns corantes também podem ser utilizados como auxiliares na triagem.
Dois dos mais utilizados são a Fluoxina e o Rosa de Bengal.

Identificação
Como citàdo anteriormente, o conhecimento taxonômico dos macroinvertebra­
dos de riachos ainda é escasso no Brasil (Hurlbert et al. 1981). A identificação
até gênero ou mesmo família é a pratica mais comum, atualmente, em estudos
de diversidade no país. Apesar da óbvia perda de resolução quando se utiliza
gênero ou família, vários trabalhos realizados em outras regiões mostram a
validade deste procedimento para estudos comparativos em escalas espaciais
maiores, como em bacias hidrográficas (Marchant et al. 1995).

Uma forma de contornar o problema de identificações é trabalhar com morfo-


espácies (Oliver & Beattie 1996a, 1996b). A ideia é colocar em categorias dife­

74
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

rentes indivíduos que apresentem diferenças morfológicas entre si (ver o Capí­


tulo 2 , neste volume). Apesar do princípio simples, a prática possui algumas
dificuldades. Talvez a maior delas seja lidar com insetos imaturos de diferen­
tes estádios, uma vez que um indivíduo de primeiro estádio pode ser bem
diferente de outro já bem desenvolvido. Como exemplo, no caso de plecópte-
ros da família Perlidae, a separação por inspeção visual de indivíduos peque­
nos é praticamente impossível, visto que até mesmo as brânquias ainda não
estão desenvolvidas. Em outros casos, as diferenças entre grupos são muito
pequenas e apenas com muito treino pode-se fazer uma separação segura.

Apesar das dificuldades na utilização de morfoespécies, o resultado obtido é


sensivelmente melhor, em termos de resolução, do que a separação em gêne­
ros/famílias. Outro aspecto interessante é que se pode construir inventários de
áreas, nas quais se faz coletas com grande frequência. Na construção deste
inventário, uma breve descrição ou desenhos das morfoespécies e uma peque­
na coleção dé referência é algo muito útil. Assim, a cada nova morfoespécie
encontrada podem-se designar alguns indivíduos como “tipos” e dar um nome
fictício ou código. Com o aumento da coleção, problemas envolvendo a distin­
ção das morfoespécies provavelmente serão comuns; algumas morfoespécies
serão agrupadas e outras, desmembradas. No entanto, conforme aumenta a
coleção e também a familiaridade com o material, estes problemas tendem a
diminuir e, com o tempo, a determinação se torna rápida e mais segura.

O problema de identificação de larvas e ninfas aquáticas em riachos não é


exclusivamente brasileiro. Vários trabalhos sobre diversidade feitos em outras
regiões tropicais utilizam morfoespécies (Stout & Vandermeer 1975; Flowers
1991). Mesmo em regiões temperadas, com faunas mais conhecidas, a utiliza­
ção de morfoespécies não é rara (Death 1995). Muitos destes estudos utilizam
morfoespécies como se cada categoria correspondesse a uma espécie biológica.
De fato, Oliver & Beattie (1996b), em um interessante estudo sobre a utilização
de morfoespécies, coletaram formigas, aranhas e besouros em quatro tipos de
vegetação e testaram a eficácia da separação em morfoespécies feita por leigos
(sem conhecimento prévio das famílias e sem auxílio de chaves) e por especia­
listas, para cada grupo. No caso das formigas, 92% das morfoespécies separa­
das pelo leigo corresponderam a espécies biológicas determinadas pelos espe­
cialistas. No caso dos besouros e das aranhas, a porcentagem de acerto (1
morfoespécie = 1 espécie) foi de 80% e 85%, respectivamente. Uma posterior
análise multivariada produziu resultados semelhantes com os dois conjuntos,
sendo ambos suficientes na separação dos tipos de vegetação.

75
ADRIANO SANCHES MELO

Mesmo utilizando morfoespécies, é de grande importância saber a que grupos


taxonômicos pertencem as morfoespécies. Em geral, um não especialista é ca­
paz de fazer determinações de famílias na maioria dos grupos e, em alguns
poucos casos, até mesmo em gêneros. No entanto, uma averiguação posterior
do material por parte de um especialista é altamente desejável, principalmente
quando o autor não possuir muita experiência com o material.

Não existem muitas chaves taxonômicas que tenham como objetivo os taxa
brasileiros e, portanto, o uso de chaves.de outras regiões é, apesar do alto risco
de erro, a única solução em alguns casos. Dentre as com possibilidade de uso
no Brasil, podem-se citar Merritt & Cummins (1996), Lopretto & Tell (1995),
Domínguez et al. (1992, 1994), Froehlich (1984); Trivinho-Strixino & Strixino
(1995), Wiggins (1996). Apesar de um pouco antigo, o livro de Hurlbert et al.
(1981) apresenta breves revisões sobre cada grupo de artrópodes que habita
águas doces, com referências bibliográficas pertinentes.

Gerenciamento dos dados


A organização dos dados obtidos após as determinações de morfoespécie /
gêneros / famílias é de fundamental importância em estudos de diversidade.
Uma má organização dos dados pode gerar dúvidas quanto à exatidão da data
de coleta de uma amostra ou se um determinado táxon realmente foi coletado
em um determinado local. De maneira geral, quanto maior o volume de dados,
maior deve ser a sua organização. Uma boa organização não só impede o apare­
cimento de dúvidas e erros, como também possibilita uma rápida obtenção
das informações pretendidas para um trabalho.

Uma forma simples de organização do material é o preenchimento de formulá­


rios para cada amostra analisada. Neste formulário devem existir campos refe­
rentes aos dados de local de coleta, coletores, método de coleta, morfoespécies/
grupos encontrados, número de indivíduos e um espaço adicional, no qual
pode-se fazer comentários sobre determinado indivíduo ou grupo de indiví­
duos como, por exemplo, assinalar a dúvida sobre tratar-se de uma ou duas
morfoespécies. Anotações sucessivas da mesma impressão podem revelar a
necessidade de uma revisão cuidadosa dos indivíduos daquela morfoespécie /
grupo. A numeração dos formulários também é importante, mesmo que per­
tençam a áreas ou trabalhos diferentes.

Após o preenchimento dòs formulários, podem-se digitar os dados num progra­


ma de planilha eletrônica como o MS Excel ou em um banco de dados. A vanta­
gem do primeiro é a facilidade do uso, tanto na entrada de dados como na sua

76
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

recuperação, na forma de planilhas (“espécies” nas colunas e amostras nas li­


nhas ou vice-versa) ou no formato que um determinado programa de análise
necessita. No entanto, com grandes volumes de dados, a manipulação de várias
planilhas *e a combinação entre algumas delas se torna entediante & sujeita a erros.

A utilização de um programa de banco de dados não é tão simples quanto um


redator de texto ou uma planilha eletrônica. Deve-se estudar o funcionamento
e as opções do programa e, ainda, pensar muito antes de construir as diferen­
tes planilhas e a relação entre elas. Caso não se tenha um bom planejamento
inicial, futuras modificações na estrutura do banco de dados podem exigir
grande trabalho. Uma opção é a utilização de um banco de dados em que as
“rotinas” já estejam definidas, ou seja, a relação entre os diferentes grupos de
informações já se encontre implantada. Um bom programa de banco de dados,
feito especificamente*para o gerenciamento de dadop ecológicos e de museus,
é o BIOTA. O programa possui entradas hierárquicas para dados taxonômicos
(indivíduos dentro de espécies, estas dentro de gêneros, estes dentro de famí­
lias etc) e várias opções para o preenchimento de dados de coleta. Outras
características, especificamente implantadas para coleções biológicas incluem
um sistema de sinonímias (com possibilidades de sinonimizar duas categorias
e, ainda, desfazer tal sinonímia no futuro, quando se descobre que realmente
eram duas morfoespécies distintas); banco de fotos dos taxa; relação espécie-
hospedeiro; empréstimos e senhas para limitar o uso de “iniciantes” ou pesso­
as não autorizadas. Caso o usuário não tenha familiaridade com programas de
banco de dados, uma boa leitura do manual será necessária antes do início de
entrada de dados. Um detalhe importante: o preço do programa é acessível.
Para latino-americanos existe um desconto. Mais informações no endereço ele-*
trônico citado no final deste capítulo.

Tamanho amostrai
A importância da escolha de um tamanho amostrai adequado é Vital no suces­
so de um trabalho sobre diversidade. Amostragens pequenas podem não in­
cluir espécies ráras, porém importantes na comunidade, levando a resultados
errôneos (Cao et al. 1998). Stout & Vandermeer (1975) coletaram pedras indivi­
duais em riachos de regiões tropicais e temperadas e concluíram que trabalhos
anteriores, sugerindo que riachos tropicais são mais pobres que similares em
regiões temperadas, foram na verdade conclusões errôneas baseadas em amos­
tragens insuficientes. Nas curvas de acumulação de espécies (ou do coletor)
construídas para-as duas regiões, Stout & Vandermeer (1975) mostraram que
curvas de regiões tropicais têm um crescimento lento, menor que o de regiões

77
ADRIANO SANCHES MELO

temperadas. Com amostragens sucessivamente maiores, as curvas de regiões


tropicais continuam a crescer, refletindo a entrada de espécies raras, enquanto
nas de regiões temperadas uma assíntota ou algo próximo disso é atingido
(Figura 2 ).

Riacho de região * * *
tropical #•*
•# ’
* q 0 o o o o o q

Aa ° 0 ° Riacho de região
□8 temperada
□*
o °9 •
■o
o

Tamanho amostra!

Figura 2. Exemplo de curvas de acumulação de espécies para riachos tropicais e de regiões


temperadas. Com tamanhos amostrais pequenos, riachos de regiões temperadas apresen­
tam maior número de espécies em relação a riachos tropicais. Com o aumento do tamanho
amostrai, a situação se inverte, refletindo a entrada de muitas espécies raras.

O tamanho amostrai vai depender claramente dos objetivos do trabalho (quan­


to menor a diferença a ser detectada, maior será o tamanho amostrai necessá­
rio) e da disponibilidade de recursos. Existem diversos métodos de análise
que auxiliam na escolha de um tamanho amostrai adequado e ainda recomen­
dações de diversos autores (Martin et al. 1993; Schleier & Bernem 1998). A
Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos Estados Unidos possui protocolos
de coleta para macroinvertebrados em riachos que podem ser encontrados no
endereço eletrônico citado no fim deste capítulo. Nestes protocolos, as amos­
tras de bentos são coletadas de forma semiquantitativa [kick net) e seguindo
uma subamostragem de 100 indivíduos. Na Austrália, Kay et al. (1999), base­
ando-se em protocolos de coleta para bioavaliação, subamostraram em torno
d^ 119 indivíduos de coletas feitas em corredeiras e outros hábitats, procuran­
do indivíduos grandes e raros, maximizando o número de famílias encontra­
das. No caso dos 100 indivíduos, este número foi determinado para riachos
em zona temperada, supostamente com riqueza de espécies menor e maior
equitabilidade em relação a regiões tropicais. No caso do trabalho australiano,
apesar do número relativamente pequeno de organismos subamostrados (119),
eles foram escolh id os dentro de uma coleção maior.

78
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

Provavelmente o método mais simples para a determinação de um tamanho


amostrai adequado é a construção de curvas de acumulação de espécies (ou do
coletor) (Fig. 2 ). A curva é construída com a riqueza observada acumulada em
tamanhos amostrais sucessivamente maiores. Ou seja, com uma unidade amos­
trai tem-se, por exemplo, cinco espécies. Com a adição da segunda unidade
amostrai, tem-se cinco espécies da amostra anterior mais o número de espécies
novas, ou seja, que não apareceram na unidade amostrai anterior. A forma da
curva vai depender da ordem de entrada das unidades amostrais, e, portanto,
a construção de uma curva “m édia” é fortem ente desejável (Colw ell &
Coddington 1994). Um programa gratuito que faz tais cálculos é o Estim ateS
(Colwell 1997). A ideia do uso de curvas do coletor é que a amostragem seja
encerrada quando uma assíntota for atingida, quer dizer, quando não se cole­
tar mais espécies ainda não vistas, ou quando este número for muito pequeno
em relação ao esforço de coleta. Um problema é que em comunidades ricas,
como no caso de macroinvertebrados em riachos, a curva praticamente nunca
atinge uma assíntota. Isso ocorre devido ao constante aparecimento de espé­
cies raras, muitas das quais pertencentes a outros hábitats. Uma solução seria
retirar essas espécies de outros hábitats do conjunto de dados, mas, com o
baixo conhecimento de história natural dos organismos, isso seria arbitrário
na grande maioria dos casos (para mais detalhes sobre curvas de acumulação,
ver Capítulo 2 , neste volume).

Para contornar o problema de não atingir uma assíntota, pode-se usar curvas
semelhantes às curvas do coletor, mas utilizando-se um índice de diversidade.
Neste caso, um determinado índice de diversidade é calculado para cada
tamanho subamostral. O método é conhecido como “P ielou ’s p o o le d qu adrat
m eth o d ” e foi relativamente pouco utilizado desde sua criação, devido princi­
palmente à grande quantidade de cálculo necessária (Lloyd et al. 1968; Pielou
1975; Magurran 1988). A ideia é que a entrada de espécies raras no conjunto
seja contrabalançada pela grande abundância de outras espécies (diminuindo
a equitabilidade). Novamente, o programa Estim ateS calcula tais curvas com
índices de Shannon, Simpson e Alpha.

Outra possibilidade, utilizada principalmente na área de biologia marinha e


botânica, é a construção de curvas de similaridade (Weinberg 1978; Kronberg
1987; Martin et al. 1993). Para tanto, é necessário que se tenha um conjunto
para “càlibração”, com tamanho maior que duas vezes o tamanho ideal. Esse
conjunto é dividido aleatoriamente em dois subconjuntos, por exemplo, A e
B. Retira-se uma unidade amostrai do conjunto A e outra do B. Calcula-se um

79
ADRIANO SANCHES MELO

índice de similaridade entre as duas unidades amostrais. Repete-se o procedi­


mento quantas vezes forem possíveis para se ter uma média representativa.
Repete-se todo o procedimento novamente, mas agora com duas unidades
amostrais de cada subconjunto, e assim sucessivamente. O pressuposto, é que,
se uma amostra de tamanho X for realmente representativa da comunidade em
questão, uma segunda amostra de mesmo tamanho, e retirada nas mesmas
condições, deverá produzir resultados muito semelhantes à primeira. Portan­
to, com tamanhos amostrais sucessivamente maiores, representando cada vez
melhor a comunidade, deve-se atingir uma assíntota, indicando o tamanho
amostrai adequado. Para algumas situações em biologia marinha, estão dispo­
níveis na literatura sugestões de valores de índices de similaridade considera­
dos adequaclos (Weinberg 1978; Martin et al. 1993).

Apesar da existência desses métodos para sugestão de um tamanho amostrai


adequado, muitos autores'usam valores obtidos sem qualquer critério analíti­
co ou valores utilizados em trabalhos publicados na literatura. Autores que
utilizam Surber costumam coletar entre 4 e 10 unidades amostrais por local de
estudo. Aqueles que utilizam pedras individuais coletam entre 10 e 15 pedras
em cada ocasião. Esses valores são resultantes de uma rápida verificação em
20 trabalhos publicados, em geral referentes a regiões temperadas. Para regiões
tropicais, Diniz-Filho et al. (1998) coletaram 10 unidades amostrais com
Surber, mas com área de*0,2 m2, ou seja, mais do que o dobro da área tradi­
cionalmente utilizada (0,09 m2). Quanto aos que utilizam pedras individuais,
Lake et al. (1994) coletaram 28 unidades em um estudo de comparação entre
riachos temperados e tropicais na Austrália. Em riachos de Mata Atlântica, o
autor deste capítulo tem coletado 25 pedras (Melo 1998). Com este tamanho
amostrai, pode-se mostrar um claro padrão na composição de comunidades
em 10 riachos ao longo de um gradiente de tamanho (Melo & Froehlich 2 0 0 1 a).
Adicionalmente, coletas feitas no verão e inverno foram muito semelhante^
entre si. Esse resultado foi possível somente com a ausência de, modificações
sazonais e uma amostragem’ representativa (princípio semelhante às curvas de
similaridade descritas acima, mas obtido com análises mulfivariadas). Neste
trabalho, uma coleta feita por dúas pessoas em cada riacho durou cerca de 1
dia inteiro de trabalho, exceto nas primeiras coletas, nas quais o período foi de
cerca de 1,5 dia devido à falta de prática. Esse período inclui o deslocamento
dentro da mata, por trilhas (na maioria das vezes em torno de 1 hora em cada
percurso), coleta das pedras, triagem do material com pinças/bandeja e medi­
ções ambientais rápidas, tais como vazão, cobertura vegetal, condutividade e
temperatura. *

80
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

Análise de dados
Riqueza de espécies nas amostras
A forma mais simples de expressar a diversidade biológica e, ainda, utilizá-la
com intuito comparativo é o número ou riqueza de espécies encontradas em
uma determinada amostra. O primeiro problema que surge quando utilizamos
tal medida é que o número de espécies encontradas numa área é fortemente
dependente do esforço de coleta. Assim, quanto mais se coleta, mais se encon­
tram espécies ainda não vistas, porém numa taxa decrescente. Portanto, com­
parar amostras com diferentes esforços de coleta claramente poderá levar a
conclusões errôneas. Deve-se, portanto, padronizar o esforço em todas as cole­
tas. Mas, deve-se padronizar a quantidade de unidades amostrais (parcelas,
armadilhas, tempo de observação etc) ou o número de indivíduos? Uma boa
discussão sobre o assunto, aplicada ao problema de bioavaliações, é feita por
Barbour & Gerritsen (1996), Courtemanch (1996), Vinson & Hawkins (1996) e
no Capítulo 1 , neste volume).

Courtemanch (1996] argumenta que não se pode comparar amostras padro­


nizadas por uma certa quantidade de indivíduos, visto que se perde muita
informação quanto à abundância/densidade das espécies nas comunidades.
Por outro lado, Barbour & Gerritsen (1996) defendem a padronização por
número de indivíduos, pelo menos para o caso de bioavaliações. Como cita­
do anteriormente, este autor tem padronizado as coletas pela quantidade de
unidades amostrais (25 pedras). Isto produziu números muito diferentes de
indivíduos entre os diferentes riachos amostrados, apresentando em um caso
extremo 385 e 1148 indivíduos para um mesmo riacho, porém, em duas
épocas distintas do ano. Ainda assim, as duas coletas apresentaram riquezas
muito semelhantes (56 e 61 morfoespécies) e foram, nas análises multivaria-
das, ordenadas/classificadas em posições muito próximas uma da outra (Melo
& Froehlich 2 0 0 1 a). *

Caso se decida pela padronização por número de indivíduos ou, ainda, quan­
do os dados não foram coletados utilizando-se unidades amostrais distintas,
uma solução é o uso de curvas de rarefação (Hurlbert 1971; Heck et al. 1975;
Sim berloff 1979; Krebs 1989). Suponha-se que há duas comunidades a ser
comparadas quanto à riqueza, porém com quantidades de indivíduos diferen­
tes. Na comunidade A temos 144 indivíduos, distribuídos'em 26 espécies, e
na comunidade B temos 320 indivíduos em 38 espécies. A pergunta que se faz
é: caso retiremos 144 indivíduos ao acaso do conjunto B, quantas espécies

81
ADRIANO SANCHES MELO

encontraremos? O número obtido é comparado com as 26 espécies da comuni­


dade A. A desvantagem é que se perde informação, ou seja, aquela contida nos
176 indivíduos desprezados da comunidade mais rica (B) (Elphick 1997). O
método também possui algumas restrições, sendo uma delas a necessidade de
que a relação entre espécies-indivíduos seja semelhante nas comunidades a
ser comparadas (ver exemplo em Peet 1974; Sim berloff 1979). O programa
EstimateS calcula curvas de rarefação, mas com um algoritmo diferente que,
segundo Brewer & Williamson (1994) e Colwell (1997), é mais fácil de calcular e
produz praticamente os mesmos resultados. Uma outra forma de padronização
pará comparações de riqueza por meio de regressões é sugerido por Elphick
(1997).

Estimativas de riqueza na comunidade


Como citado anteriormente, Stout & Vandermeer (1975) concluíram que a fau­
na de insetos em riachos tropicais é de fato mais rica que em regiões tempera­
das. No entanto, os autores mostram que isso só fica claro com tamanhos
amostrais grandes, nem sempre possíveis de se coletar e identificar (Fig. 2 ).
Uma solução utilizada por Stout & Vandermeer (1975), para resolver o proble­
ma, foi o ajuste de uma.curva com assíntota aos dados, e a extrapolação para
tamanhos amostrais maiores. A curva utilizada foi derivada a partir das equa­
ções da Teoria de Biogeografia de Ilhas. O pressuposto da extrapolação da
curva é que a assíntota é um melhor estimador da riqueza total na área do que
a riqueza observada na amostra. O princípio de extrapolação de curvas de
acumulação de espécies é bem antigo e muitas curvas podem ser utilizadas
(Clench 1979; Soberón & Llorente 1993; Colwell & Coddington 1994; Flather
1996; Melo & Froehlich 2001b).

Além do método de extrapolação da curva de acumulação de espécies, existem


também dois outros grupos d'e estimadores da riqueza na comunidade, que
são os métodos paramétricos e os não paramétricos. Mais detalhes podem ser
obtidos no Capítulo 1 , neste volume).

índices de diversidade e similaridade


índices de diversidade são resultantes da combinação, sob uma mesma medi­
da, de dois atributos de comunidades biológicas: a riqueza de espécies e a
equitabilidade entre elas. Uma característica almejada em tais índices é que
sejam independentes do tamanho amostrai, em oposição ao caso da riqueza de
espécies (Harrison & Martinez 1995). Existe uma grande variedade de índices
e, teoricamente, pode-se criar uma infinidade de outros, caso se- dê importân­

82
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

cia diferencial à riqueza de espécies (maior peso para espécies raras) e à equi-
tabilidade (maior peso para as espécies dominantes) (Peet 1974). Magurran
(1988) apresenta os índicçs mais utilizados e resume de forma clara as caracte­
rísticas principais de cada um. Ganeshaiah et al. (1997) apresentam um novo
índice de diversidade que, além de riqueza e equitabilidade, inclui também
diferenças biológicas entre os taxa considerados. Neste caso, para duas comu­
nidades com mesmo número de espécies, indivíduos e proporção de indiví­
duos em cada espécie, o índice produzirá maior valor para a comunidade que
possuir espécies mais diferentes entre si, morfo ou filogeneticamente.

Apesar da grande variedade de índices de diversidade existentes e seu largo uso


na literatura ecológica, existem várias críticas quanto à sua validade (Hurlbert
1971; James & Rathbun 1981; Brewer & Williamson 1994). Uma delas, aponta­
da por Hurlbert, é que em muitos casos, dependendo do índice utilizado,
resultados opostos podem ser obtidos. Ou seja, se com o Índice X a comuni­
dade A mostra-se mais diversa, com um outro índice Y a comunidade B pode
ser apontada como a mais diversa. Um segundo motivo apontado por Hurlbert
é a dificuldade na correta interpretação de índices de diversidade. James &
Rathbun (1981) e Magurran (1988) apontam também a grande perda de infor­
mação quando se utilizam tais índices. James & Rathbun (1981) recomendam
fortemente o abandono de índices de diversidade em favor de curvas de rare-
fação e curvas de abundância relativa, enquanto Brewer & Williamson (1994)
sugerem o uso da riqueza de espécies observadas e da rarefação quando os
tamanhos amostrais forem diferentes.

A utilização de índices de diversidade,-na maioria das vezes, mostra o interes­


se em saber qual comunidade é a mais diyersa em um estudo’ comparativo.
Pode-se, no entanto, com os mesmos conjuntos de dados, querer saber quem
é mais parecido com quem. Com um outro enfoque, podemos querer estudar o
quanto existe de mudança (diversidade beta), conforme se coleta ao longo de
um gradiente de altitude. Nestes casos, diversos índices de similaridade são
aplicáveis (Wolda 1981; Colwell & Coddington 1994). Um exemplo de compa­
rações feitas com índice de similaridade da fauna de insetos em diversos ria­
chos no Panamá é apresentado por Flowers (1991).

Curvas de abundância relativa


Neste caso, os resultados são expressos como gráficos, e diferentes aspectos
sobre a diversidade das comunidades são comparados por inspeção visual e/
ou ajuste de algum modelo de distribuição de abundâncias (ex. lognorm al,

83
ADRIANO SANCHES MELO

logseries, broken stick, geom etric series). Uma das formas de construção do
gráfico (ver Magurran 1988) é a ordenação no eixo das abscissas das espécies
de maior para as de menor abundância e, no eixo das ordenadas, a abundância
relativa das espécies em uma escala logarítmica (Figura 3). Além da riqueza de
espécies, o gráfico permite uma rápida comparação quanto à distribuição de
indivíduos entre cada espécie, ou seja, a equitabilidade (ver alguns exemplos
em James & Rathbun 1981). O posterior ajuste de algum modelo de abundân­
cia aos dados permite também outras interpretações sobre a estrutura da co­
munidade (Magurran 1988).

100

<8
> 10-
C8
£
m Comunidade A
73

0.1 Comunidade B

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60

Rank das espécies

Figura 3. Espécies encontradas em dois riachos, dispostas em rank. Note a maior equitabi­
lidade e o número de espécies na comunidade A.

Análises multivariadas
Em uma dada área, com 3 comunidades A, B e C cada uma com as espécies X
e Y, mas com abundâncias diferentes, pergunta-se: qual é mais semelhante a
qual? Uma forma simples de responder a questão é construir um gráfico com
as duas fontes de informações disponíveis, ou seja, as variáveis X e Y. Neste
caso, o par de comunidades que estiver mais próximo será o mais semelhante.
Considere-se, agora, que em vez de 2 , tenhamos 3 espécies. O princípio conti­
nua o mesmo, porém num gráfico tridimensional. E com 4 ou mais espécies?
Agora não é possível construir mais gráficos e a solução é a utilização de um
método (Análise Multivariada) que resuma os diversos eixos (as diversas variá­
veis/espécies) em alguns poucos, que possam ser então utilizados na cons­
trução de um gráfico com 2 ou 3 dimensões. Mas, como “resumir” diversas

84
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

variáveis em algumas poucas? A resposta está na utilização da maior variação


no conjunto das variáveis estudadas. Continuemos com nossas 3 comunida­
des (A, B e C), mas com 4 espécies cada. Caso a espécie X apresente abundân-
cias 3, 24 e 117 nas três comunidades, ela será mais importante na determina­
ção dos resultados do que uma outra que tenha 7, 10 e 16 ou 8 6 , 92 e 99. Isto
porque, no primeiro caso, a variável (espécie X) possui maior variabilidade.
Voltemos ao caso do gráfico tridimensional, ou seja, com 3 espécies. Caso um
dos eixos tenha como valores 8 6 , 92 e 99, enquanto os outros dois tenham 3,
24 e 117 / 55, 92 e 120, a omissão do eixo com 8 6 , 92 e 99 nãò causará grandes
mudanças nos resultados. É claro que alguma informação é perdida, mas os
resultados podem ser, agdra, melhor interpretados. De uma maneira mais refi­
nada, pode-se imaginar este gráfico tridimensional como um cubo que se pode
girar em qualquer direção e sentido. Desprezando-se uma dimensão e, portan­
to, olhando os pontos dentro do cubo como se estivessem em um plano, em
cada posição diferente que olharmos, teremos uma configuração diferente dos
pontos. A melhor delas, que resume a maior variação em dois planos, será
aquela em que podemos ver os dados de forma mais espalhada possível. Uma
análise multivariada faz isto (é claro, com o uso de cálculos refinados) em
conjuntos com muitas variáveis. •'

Apesar da ideia relativamente simples, os cálculos nem sempr^ são facilmente


compreendidos por alguém que não tenha bons conhecimentos matemáticos.
No entanto, a compreensão da matemática do método não é algo imprescindí­
vel para o bom uso dos diferentes métodos disponíveis. Saber o que a análise
está fazendo com os dados, restrições e pressupostos, escolha adequada de
transformações, índices de similaridade, método de análise e a correta interpre­
tação dos dados são suficientes (e necessários) p^ra o usuário não matemático.

De forma simplista podemos dividir os métodos multivariados em dois gran­


des grupos: o das classificações e o das ordenações. Apesar de terem objetivos
comuns, a redução da complexidade, a matemática e a forma de apresentação
dos resultados são bem diferentes. Nas classificações são utilizados índices de
similaridade e, métodos de “ligação” ou “agrupamento” e os resultados são
apresentados na forma de um dendrograma (também chamado de fenograma,
em taxonomia numérica). Voltando no gráfico cçm 3 ou mais dimensões utili­
zadas anteriormente, procura-se o par com maior semelhança entre si, segun­
do o índice de similaridade escolhido. Agora, agrupa-se o par de maior seme­
lhança com o ponto mais semelhante ao par já agrupado, que pode variar
dependendo do método de ligação escolhido, e assim sucessivamente. Isto se
chama classificação aglomerativa, em que se começa da basé (1 par) e se sobe
85
ADRIANO SANCHES MELO

para níveis maiores (até todo o conjunto). Existe outra forma chamada classifi­
cação divisiva, em que divide-se conjunto total em duas partes, cada fração
então sendo subdividida sucessivamente até a base, ou seja, até um par de
pontos. ”

Nas ordenações, os resultados são apresentados na forma de gráficos de dis­


persão. A análise produz eixos com importância decrescente. O primeiro eixo
sendo, no exemplo, do cubo citado anteriormente, a maior reta que, entre as
diferentes possíveis formas de se olhar o cubo, pode ser traçada ao longo dos
dados. Em geral, se utilizam apenas os dois ou três primeiros eixos fornecidos
pela análise.

Diversos livros-texto e artigos estão disponíveis sobre o assunto, com leitura


obrigatória para que um iniciante possa fazer bom uso dos métodos .(Gauch
1982; Pielou 1984; Digby & Kempton 1987; Ter Braak & Prentice 1988; Manly
1994; Jongman et al. 1995). Diferentes transformações, índices e métodos po­
dem produzir resultados bem diferentes. Algumas avaliações para escolha das
diferentes opções estão disponíveis na literatura, inclusive para dados com
invertebrados bentônicos (Jackson 1993; Cao et al. 1997). Uma série de progra­
mas para computadores está disponível, muitos dos quais podem ser obtidos
.gratuitamente na internet. Um excelente programa em DOS, de fácil uso, com
muitas Opções e ainda em português, é o FITOPAC, que pode ser obtido com
o autor (George J. Shepherd, Dep. Botânica, IB, Universidade Estadual de Cam­
pinas, Campinas, SP, C.P. 6109, 13083-970, Brasil). Outro, pago, porém bara­
to, é o PC-ORD. Em relação a outros programas, o PC-ORD é extremamente
fácil de usar e está disponível tanto em DOS como em Windows. Mais infor­
mações podem ser obtidas no endereço eletrônico citado no final deste capítu­
lo. Informações gerais sobre análise multivariada e também sobre programas
do assunto para computadores podem ser vistas no endereço eletrônico man­
tido por Michael Palmer, citado também no final deste texto.

Listas de discussão eletrônicas de interesse


Benthos-L. Aspectos relacionados ao bentos em geral. Para subscrever, mande um e-mail para
EISTSERV@LISTSERV.UOTTAWA.CA com a seguinte linha “SUBSCRIBE BENTHOS-L seu
nome com pleto”.
Biocriteria-L. Relacionada a assuntos de bioavaliação, critérios para conservação etc. Para
subscrever, mande um e-mail para listserver@unixm ail.rtpnc.epa.gov deixando a linha do
“subject” em branco. No corpo da mensagem escreva “subscribe BIOCRITERIA seu nome
completo”. Não se esqueça de deixar um espaço em branco entre cada palavra.
Biotasp-L. Biodiversidade e conservação no Estado de São Paulo. Para inscrição, visite : http:/
/www.biota.org.br/mailman/listinfo/biotasp-l.

86
DIVERSIDADE DE
MACROINVERTEBRADOS EM RIACHOS

Endereços eletrônicos de interesse na Internet


Coleoptera (Aquáticos) Com centenas de outros endereços de interesse -
http://www.zo.utexas.edu/faculty/sjasper/beetles/index.htm
Trichoptera - Região Neotropical - Ralph Holzenthal -
http://www.ent.agri.umn.edu/museum/people/Holzênthal.html
Trichoptera - Catálogo mundial - http://entweb.clemson.edu/database/trichopt/
Tree of Life - http://phylogeny.arizona.edu/tree/phylogeny.html
North American Benthological Society (NABS) Com dezenas de outros endereços de
interesse - http://www.benthos.org
Environmental Protection Agency (EPA) - http://www.epa.gov
Manual de bioavaliações rápidas para riachos e rios nos USA (EPA) -
http://www.epa.gov/OWOW/monitoring/rbp
Programas BIOTA e ESTIMATES - Robert Colwell -
h ttp://viceroy.eeb.uconn.edu
Análise multivariada - M ichael Palmer http://www.okstate.edu/artsci/botany/ordinate/
Programa PC-ORD - http://www.ptinet.net/~mjm
Biodiversidade do Estado de São Paulo (BIOTASP/FAPESP) :
http://www.biota.org.br/ ..

Fundação Tropical André Tosello - http://www.bdt.org.br/

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DIVERSIDADE DE
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90
4 Captura e marcação de animais silvestres
Paulo Rogério Mangini
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Patrícia Avello Nicola


Departamento de Parasitoíogia, Unicamp

Introdução
A pesquisa de fauna em vida livre pode ser executada sob diferentes metodo­
logias com objetivos variados. Em determinados momentos, em muitos traba­
lhos de campo, é necessário que alguns ou todos os indivíduos de uma popu­
lação sejam capturados e manipulados. A obtenção dé dados biométricos e
amostras biológicas, na maioria das vezes, requer que os animais sofram con­
tenção física ou química. A capacidade da equipe de campo em capturar e
manipular animais silvestres, com eficiência e segurança, pode representar o
sucesso ou o fracasso de um projeto. Os objetivos da pesquisa e a espécie
estudada são alguns dos fatores determinantes na escolha dos métodos empre­
gados na captura e manipulação dos animais.

A marcação dos animais pode ser empregada com diferentes objetivos, como
facilitar a observação a distância, conferir um número de registro, evitar ou
possibilitar que dados de um mesmo animal sejam obtidos mais de uma vez
ou, simplesmente, individualizar os animais em estudo. Assim como o méto­
do de captura, o método de marcação deve ser escolhido considerando-se a
espécie e os objetivos da pesquisa. Diversos métodos de marcação podem ser
utilizados, com códigos alfanuméricos, geométricos ou marcas coloridas. Na
maioria das situações, a aplicação de marcas requer contenção.

Diversos modelos de captura e marcação de animais silvestres podem ser obti­


dos na literatura técnica brasileira e internacional, contudo, em geral, essas
informações estão dispersas em variados títulos. Muitas vezes, as poucas in­
formações sobre determinadas espécies encontram-se disponíveis apenas na
experiência e rotina de pesquisadores. Neste capítulo serão demonstradas, dê
forma conceituai, as implicações decorrentes da contenção física e química de
animais silvestres. Também serão apresentados os métodos de captura e mar­
cação mais utilizados e eficientes, considerando-se as suas limitações, aplica-

91
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PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA"

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bilidade e segurança para equipe e para os animais manipulados. Deve-se con- *
siderar que, dentro de um mesmo grupo taxonômico, podem existir experiên­
cias de sucesso com uma determinada espécie e local, que resultem em fracas­
so com outra espécie aparentada. Dessa forma, as considerações apresentadas
.
referem-se,'em parte, à experiência dos autores e às informações obtidas com
diferentes pesquisadores no Brasil e exterior.
■■ ' .• y <j
>■ K ' 1
Contenção e manipulação de animais silvestres
Para cumprir os requisitos básicos na contenção de qualquer espécie selva­
gem, em cativeiro ou vida livre, é necessária uma equipe multidisciplinar bem
treinada e perfeitamente entrosada. A realização de uma reunião prévia ao
trabalho é ponto fundamental para o procedimento. O responsável pela equipe
deve discutir a proposta de contenção e programar os trabalhos, levando em
consideração todas as possibilidades de falha, a fim de minimizar quaisquer
riscos. Tratando-se de animais potencialmente perigosos, como grandes feli­
nos e animais peçonhentos, o fator segurançfâ da equipe deve ser prioritário,
pois a saúde das pessoas envolvidas é de responsabilidade do coordenador da
captura e do médico veterinário responsável pela anestesia do animal a ser
contido. Por outro lado, tanto para animais potencialmente perigosos quanto
para animais com menor capacidade de defesa, devem ser priorizados também
/
a segurança e o bem-estar do animal (Figura 1 ).
A escolha do método de contenção para animais silvestres depende da espé­
cie, peso, idade e da situação em que se encontra o indivíduo a ser contido.

Figura 1. A) Contenção física de Leonthopithecus chrysopygus com auxílio de puçá e luvas de


couro. Pequenos mamíferos podem ser manipulados com segurança tanto pára os animais
quanto para o operador. Contudo, tais procedimentos devem ser rápidos. B) Manipulação de
Tayassu tajacu, em vida livre, sob contenção química. Procedimentos mais elaborados como
biometria e coleta de material biológico podem ser inviáveis em espécies potencialmente
agressivas, sem uso de drogas an estésicas. C) Contenção física de Tayassu pecari, com
auxílio de rede em baia de contenção. N esse sistem a de contenção é possível realizar
procedimentos rápidos, como a colheita de amostras de sangue e aplicação de medicamen­
tos. (Fotos 1A e 1B de Alessandra Nava; Fotos 1C de Paulo Rogério Mangini).

92
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

Segundo Pachaly (1992), a contenção pode ser realizada pelos seguintes'


meios: 1 ) Meios físicos (“contenção física”); 2 ) Meios químicos (“contenção
farmacológica”) e 3) Associação de ambos os meios. Segundo o mesmo autor,
, alguns requisitos fundamentais devem ser observados na escolha do método
de contenção adequado. O método escolhido deve: 1 ) Permitir plena seguran­
ça para o animal; 2 ) Permitir plena segurança para a equipe envolvida; e 3)
Permitir a realização adequada do procedimento médico ou de manejo que
causou a necessidade de contenção (Figura. 2 ).

Figura 2. A) Colheita de sangue^ sob contenção química, de um exemplar de Panthera onca. B)


Contenção química de Panthera onca para instalação de rádio-colar e coleta de material
biológico. C) Assistentes de campo conduzindo um exemplar de Puma concolor, sob contenção
química, -para que seja aferida a massa corporal do animal. D) Exemplar de Panthera onta, no
interior de uma arm adilha de ferro . (Foto s de Laury Cullen Jr. e A le ssa n d ra Nava.)

Sejam quais forem os meios empregados, o sucesso do procedimento de mani­


pulação de animais silvestres em vida livre requer planejamento intenso. Esse

93
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

planejamento deve considerar principalmente:

1 . A espécie que se deseja manipular;

2 . A quantidade de indivíduos que serão manipulados durante cada captura;

3 . 0 método de captura que será empregado;

4. Os equipamentos disponíveis para realizar o procedimento;

5. A necessidade ou não do uso de fármacos anestésicos;

6 . Quanto tempo será necessário conter os animais capturados;

7. Se há necessidade de translocar o animal do local de captura;

8 . A capacidade técnica das pessoas envolvidas;

9. As condições do ambiente onde serão realizadas as capturas, e

1 0 . Quais as eventualidades que podem ocorrer durante a captura, além dos


procedimentos qué deverão ser tomados caso elas ocorram.

O equipamento de captura deve conferir segurança à equipe e evitar que o


animal capturado sofra ferimentos durante a permanência no interior da jaula.
Somente contemplando todos esses pontos pode-se minimizar o estresse de­
corrente de tais práticas., As consequências do estresse envolvido em um pro­
cesso de captura podem ser graves, ocasionando a morte do animal. A patofi-
siologia do estresse e suas consequências médicas são. assuntos que poderiam
ser abordados em um capítulo à parte, entretanto, tais temas são discutidos em
detalhes por Pachaly et al. (1993) e Spraker (1993), textos fundamentais ao
entendimento mais profundo do estresse. Como fator relevante, devemos con­
siderar que algumas espécies ou grupos taxonômicos são mais suscetíveis aos
efeitos do estresse e devem ser manipulados com mais cuidados. Dessa forma,
a metodologia de captura deve ser avaliada conforme as características da espé­
cie com que se trabalha. Deve-se ressaltar que o estresse é um dos fatores de
maior importância durante qualquer procedimento que envolva manipulação
de animais silvestres. Todo o manejo deve ser planejado de forma que esse
seja reduzido. Contudo, silêncio durante os procedimentos é uma das medi­
das mais efetivas na redução do estresse, principalmente quando se manipu­
lam animais apenas sob contenção física. O excesso de ruídos e a movimenta­
ção desnecessária ao redor do animal são importantes fatores de estresse e po­
dem alterar os efeitos de determinados agentes anestésicos. Adicionalmente,
essas situações de desordem alteram a capacidade de concentração da equipe.

Durante qualquer procedimento deve-se priorizar dois aspectos éticos funda-


4

94 ;
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

mentais. Primeiramente, toda a manipulação deve ser planejada de forma que


possa preservar a integridade física do animal capturado. Devem-se evitar sem­
pre quaisquer práticas que possam prejudicar o bem-estar futuro do animal ou
pôr em risco sua vida. Em segundo, conforme as prioridades e objetivos do
estudo, todo o processo deve ser planejado de forma que possa ser cumprido
em etapas. Caso a execução de qualquer uma das etapas demonstre ser .perigo­
sa à sobrevivência do animal, as demais devem ser suspensas. Essa decisão
deve vir em benefício da saúde do animal, mesmo que isso prejudique os
resultados do estudo proposto.

Contenção física de animais silvestres


Segundo Pachaly (1992), a contenção física baseia-se no “confinamento” do
animal que se pretende conter, na “restrição” de seus movimentos defensivos
e, finalmente, em sua subjugação, permitindo o acesso seguro a seu corpo. A
contenção física pode ser realizada diretamente, sem o auxílio de equipamen­
tos de segurança, com as mãos nuas, ou utilizando-se alguns equipamentos
especiais.

A metodologia de contenção ffsica deve impossibilitar a ocorrência de aciden­


tes que possam causar lesões, tanto ao animal quanto ao indivíduo que o
manipula. O indivíduo que realiza a contenção física deve cumprir às exigên­
cias básicas, ressaltadas por Fowler (1983), onde um procedimento de restri­
ção física, para ser bem sucedido, requer o conhecimento da biologia da espé­
cie e a autoconfiança do pesquisador que realiza a contenção, o que demanda
experiência.

Primeiramente, como citado acima, é preciso conhecer a biologia do animal em


questão, atentando ao seu comportamento, anatomia e a maneira como este
suporta ou responde às situações de estresse. Isto implica saber se a reação
decorrente da contenção resulta numa postura de ataque, defesa ou fuga e
quais estratégias o animal pode responder, seja usando unhas, dentes, chifres,
bico, dentre outras. Importante também é estimar o possível ponto de fuga da
espécie e reconhecer como essa distância pode influenciar de forma positiva
ou negativa a contenção. Diante dessas características, intrínsecas ao animal,
deve-se selecionar a técnica de contenção física mais apropriada. Muitas das
técnicas de contenção comuns à rotina em zoológicos, detalhadas por Fowler
(1978), podem ser perfeitamente aplicadas a animais.

A autoconfiança, experiência e disciplina da pessoa que subjuga o animal sâo


fundamentais. A disciplina em cumprir todas as etapas do processo deve ser

95
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

observada. Algumas vezes o operador demonstra tendência a relevar pontos


importantes no processo de contenção, principalmente quando um método é
executado repetidas vezes e cria-se familiaridade com os procedimentos. Essa
negligência, decorrente da sensação de que o processo tornou-se extremamente
seguro ou fácil, é responsável por muitos acidentes. Deve-se evitar a presença de
obstáculos que possam impossibilitar o trabalho com o animal, ou a presença de
extremidades agudas ou cortantes que possam causar lesões ao espécime captura­
do. No projeto das armadilhas, devem-se vislumbrar algumas formas de acesso
eficiente áo corpo do animal, seja por meio de equipamentos especiais õu não.

Equipamentos para contenção física


A utilização de equipamentos especiais para contenção física de animais silves­
tres varia com a idade, o peso e o grupo taxonômico do animal capturado. A
seguir descrevem-se alguns dos equipamentos mais utilizados e sua aplicação.

Gancho: Equipamento utilizado para contenção de serpentes. E composto de


um cabo de madeira, plástico ou metal, que em uma de suas extremidades
possui uma haste de metal resistente na forma de “L”. É utilizado para, além
de permitir a imobilização do crânio numa superfície sólida, suspender pela
porção medial do corpo, fazendo com que a serpente perca o equilíbrio dificul­
tando "a investida do animal contra o operador. Utilizado na manipulação de
serpentes em geral. Algumas espécies da família C olubridae conseguem, com
facilidade, progredir em movimento mesmo quando suspensas, esquivando-
se do gancho. Grandes serpentes constritoras dificilmente podem ser suspen­
sas de forma satisfatória por ganchos.

Luvas de raspa de couro: Utilizadas para proteção das mãos na contenção


direta de um animal ou em associação a outro equipamento de contenção físi­
ca. Utilizada como único equipamento de segurança, em situações que propor­
cionem maior aproximação do indivíduo que realiza a contenção. Podem ser
empregadas em ampla variedade de espécies de aves, répteis e mamíferos de
pequeno e médio porte.
Puçá: Equipamento utilizado para contenção de várias espécies de aves, mâ-
míferos, anfíbios, répteis e peixes. Utilizado, principalmente, para animais
pouco agressivos. É composto de um cabo de madeira ou ferro, possuindo, em
uma de suas extremidades, um aro de metal que sustenta uma rede de cordas
ou saco de pano. O aro de metal e a rede podem possuir diferentes tamanhos,
apropriados às dimensões do animal em estudo.

Rede: Geralmente confeccionadas em cordas de fibras naturais ou sintéticas,

96
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

podem ser empregadas de diferentes formas na contenção e na captura de uma


grande variedade de espécies de aves e mamíferos. Devem ser preferencial­
mente de cor negra, dificultando que os animais as vejam a longas distâncias.
Redes de malha fina, chamadas redes de neblina ou m ist nets, confeccionadas
com fios muito delgados, são utilizadas como um dos principais métodos de
captura de aves e morcegos (mais detalhes em Auricchio & Salomão 2 0 0 2 ).
Redes mais resistentes, com malhas maiores posicionadas em pontos estraté­
gicos, têm sido utilizadas com sucesso na captura de cervídeos (JDuarte 1992;
Segundo 1999) e na contenção de taiassuídeos.

Cambão e corda: Os cambões são equipamentos utilizados para contenção de


várias espécies, principalmente mamíferos e grandes répteis. Existem vários
modelos de cambões, sendo que todos utilizam o princípio do laço para a
contenção dos animais. São compostos por um cabo de madeira, ou outro
material resistente, que serve de guia para um laço feito com tira de couro ou
corda. Preferencialmente, deve-se laçar a região cervical e um dos membros
torácicos do animal que está sendo manipulado. Quando se contém um ani­
mal apenas pela região do pescoço, deve-se ter cautela para não aplicar força
excessiva, ou permitir que o animal capturado gire ao redor do seu eixo sagi-
tal, o que pode causar lesões comprometendo as vértebras cervicais. Usuâl-
mente, não se empregam cordas para contenção de animais silvestres, como se
utilizam para animais domésticos, como bovinos e equinos. Em algumas si­
tuações, para maximizar a ^segurança de outros métodos de contenção, cordas
podem ser empregadas, atando os membros locomotores ou a cabeça do ani­
mal para imobilização por via química.

Jaulas e caixas de contenção: São confeccionadas em madeira ou metal com


um mecanismo de engrenagens e trilhos, que possibilitam o movimento de
uma das laterais, comprimindo o animal contra uma grade ou tela. Esse equi­
pamento possibilita certa manipulação do animal, administração de medica­
mentos e outros procedimentos mais complexos. Apresenta vantagens, como
imobilização completa e acesso fácil ao animal, além de baixa incidência de
traumas durante o processo.

Tubos: Os tubos são usados na contenção, de aves, répteis e mamíferos, po­


dendo ser de diversos diâmetros, confeccionados em plástico rígido ou outro
material leve e de fácil limpeza. São utilizados na manipulação de serpentes.
Podem, também, facilitar o anilhamento de aves ou procedimentos rápidos em
mamíferos de pequeno e médio porte. Proporcionam fácil manipulação da
porção posterior do corpo do animal quando esses têm a região anterior conti­

97
FAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICÒLA

da no interior do tubo.. Outras informações sobre captura e contenção podem


ser obtidas çle Auricchio & Salomão (2 0 0 2 ).

Transporte de animais silvestres


O transporte pode ser necessário em situações como translocação de popula­
ções, introdução de indivíduos, translocação de animais-problema e retirada de
animais da natureza para o‘ cativeiro. O sistema de transporte deve ser planejado
com antecedência e ser adequado à espécie que será deslocada. Devem-se sem­
pre considerar as características de resposta ao estresse da espécie e, quando
possível, do indivíduo em questão. E muito importante que o projeto tenha
licença da autoridade local (no Brasil, do Ibama), além da licença de captura.

Deve-se planejar se o animal vai ser contido por meios físicos ou químicos ou
vai ser induzido a entrar no transporte por meio de corredores de lona ou
outro sistema. A caixa de transporte deve impossibilitar que o indivíduo obser­
ve o meio externo, conferindo condições de penumbra. Nessas condições, as
respostas do animal aos agentes estressantes, como sons e odores vindos do
meio externo, ficam atenuadas. Animais muito estressados podem ser tranqui­
lizados ou sedados para o transporte. Outro fator importante, que deve ser
ponderado, refere-se às condições ambientais durante o período de transpor­
te. Deve-se evitar o transporte de animais nos dias de temperatura muito eleva­
da ou extremamente baixa. Deve-se evitar ainda a permanência prolongada
desses animais em locais ensolarados. O transporte por terra deve ser feito
preferencialmente durante a noite, pois, nesse período, as estradas apresen­
tam, em geral, menor tráfego e consequentemente menos ruídos.

As dimensões das caixas e recipientes de transporte devem ser compatíveis


com o indivíduo transportado, respeitando a*estrutura corporal e a postura
normal da espécie. A estrutura deve oferecer resistência ao peso normal do
animal e a possíveis investidas contra as paredes da caixa. As dimensões
devem possibilitar que o animal mantenha seu decúbito normal de descanso e
estação, porém devem impossibilitar a mudança de direção do animal no inte-
riqr da caixa. As condições de manutenção da caixa de transporte devem ser
verificadas antes dos animais serem embarcados.

Em geral, os animais devem ser transportados individualmente, evitando con­


flitos agonísticos, comuns em decorrência da situação eistressante gerada pelo
transporte. Espécies que apresentam forte vínculo social podem ser transpor­
tadas, por curtas distancias, em caixas com mais de um indivíduo. Contudo,
a possibilidade da ocorrência de traumas fica aumentada. Animais de peque-
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

no porte podem ser transportados, por curtos períodos de tempo, em sacos de


pano. Estes devem ser preferencialmente confeccionados com tecido negro,
impossibilitando que o animal transportado observe o meio externo. Quando
pequenos animais são transportados em gaiolas, elas devem também ser reco­
bertas por algum tecido opaco.

Contenção química de animais silvestres


Nessa seção não se pretende elucidar questões referentes às características das
drogas anestésicas ou às doses que poderiam ser empregadas em determina­
das espécies ou grupos taxonômicos. A anestesiologia de animais silvestres
consiste dp um assunto extenso, permeado por inúmeros pontos de variação
no que diz respeito às espécies que serão manipuladas, às drogas utilizadas e
às suas associações. Dessa forma, aqui serão ressaltados apenas os pontos
fundamentais na determinação dos protocolos de contenção química para tra­
balhos de campo. Considerações importantes sobre a imobilização, drogas anes­
tésicas, manipulação e anestesia de mamíferos silvestres cativos e em vida livre
são apresentadas em Bush (1996), Nielsen (1996), Fowler (1993), Paçhaly (1992).

A contenção química consiste na administração de fármacos anestésicos ou


tranquilizantes que possibilitem a manipulação do indivíduo. De maneira ge­
nérica, não se busca a anestesia geral, mas, sim, um estado^de imobilidade que
permita a realização de um procedimento médico ou de manejo mais prolonga­
do, minimizando o estresse do animal e oferecendo segurança para o animal e
para a equipe (Pachaly 1992). Em condições de campo, a via preferencial para
administração de fármacos anestésicos é intramuscular, devido a maior facili­
dade de acesso e segurança nos resultados. Diversas drogas podem ser empre­
gadas com sucesso, isoladamente ou em combinação. A injeção das drogas
pode ser realizada diretamente, mediante contenção física, ou a distância, com
o auxílio equipamentos especiais, como zarabatana e armas de fogo ou pres­
são. Essas armas são utilizadas na propulsão de dardos próprios para injeção
de medicamentos. Quando se tratam de animais pequenos e pouco agressivos,
contidos em redes, sacos, cambões ou tubos, a administração de agentes anes­
tésicos deve ser feita preferencialmente de forma direta. A administração dire­
ta de medicamentos tem como Vantagem o melhor controle do volume injeta­
do, possibilidade de injeção de grandes e pequenos volumes com exatidão. A
necessidade de permanecer muito próximo ao animal pode ser uma desvanta­
gem, quando espécies potencialmente perigosas são manipuladas. Em muitas
situações de campo, a única forma" de administrar drogas anestésicas, para
captura de animais em vida livre, é por meio de dardos medicamentosos, pro-
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

pelidos por equipamentos como zarabatana ou armas especiais.

O emprego da zarabatana e dardos artesanais presta-se a uma série de situa­


ções nas quais, primariamente, a distância de tiro e o volume de drogas neces­
sário são pequenos. Segundo Pachaly (1993), esses equipamentos apresentam
como vantagens o silêncio, o menor impacto e a injeção menos dolorosa, sen­
do aplicáveis a grande variedade de espécies. Não apresentam necessidade de
manutenção sofisticada, sendo os dardos descartáveis e de baixo custo. A
zarabatana, quando comparada às armas especiais, apresenta menor precisão
de tiro e maiores limitações de potência e alcance. Adicionalmente, falhas
frequentes na trajetória dos dardos podem ser notadas. Estes são mais frágeis
e proporcionam injeção de volumes pequenos, quando comparados a dardos
utilizados em armas especiais. As agulhas artesanais, utilizadas nesses dar­
dos, são simples, sem ganchos de fixação ao corpo do animal, o que pode
levar ao desprendimento precoce do dardo, antes que ocorra a injeção total do
medicamento.

As armas especiais mais utilizadas no Brasil são importadas e pertencem às


marcas Telinject, Pneu-dart, Paxarm s e C a p -C h u f’. Os rifles e pistolas Telinject
utilizam C 02 sob pressão ou ar comprimido, lançando dardos plásticos. Os
equipamentos Pneu-dart, Paxarm s e Cap-C hur possuem dois tipos básicos de
armas: os rifles de longo alcance, que utilizam cargas de pólvora como prope-
lente,- e os rifles e pistolas de curto alcance que utilizam como propelente C 02
ou ar comprimido. Os rifles de maior alcance lançam dardos metálicos, que
podem comportar maiores volumes de medicamento. Os equipamentos de
menor alcance podem lançar dardos metálicos ou plásticos. Em geral, esses
dardos devem possuir capacidade máxima de 5 ml, a fim de garantir precisão
no disparo (Figura 3).

As principais vantagens no uso de rifles com propelentes de pólvora são a


precisão de tiro, a possibilidade de tiros a grandes distâncias e de injeção de
grandes volumes. Como desvantagens, notasse que o método é mais doloroso,
apresenta risco de fraturas, lesão muscular severa e penetração de dardos nas
cavidades torácica ou abdominal, dos animais atingidos. Adicionalmente, são
menos aplicáveis quando o animal apresenta “áreás-alvo” pequenas. Pode-se
ainda ressaltar que esses equipamentos apresentam alto custo para aquisição e
manutenção. Por se tratar de armas, sua importação requer aprovação de ór­
gãos e agências federais. No caso das armas que utilizam pólvora como prope­
lente, o estampido emitido durante o disparo pode afugentar o animal, sendo
um fator limitante em algumas situações de captura. Em geral essas armas são

100
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

anel de vedação êmbolo de borracha anel de vedação

mor | carg a de pólvora v


p eça interm ediária estabilizador de vôo
e p eça posterior

Figura 3. A) Dardo do Sistema Cap-Chur. A carga de pólvora possui um mecanismo interno


que é acionado quando o dardo sofre impacto contra o corpo do animal, esse impacto detona
a carga que propele o êmbolo de borracha, injetando o medicamento no animal. O gancho, ou
o colarinho, no cano da agulha impede que o dardo seja expulso da musculatura do animal, no
momento em que a medicação é injetada. B) Dardo artesanal produzido a partir de uma
agulha de 3 ml. O sistema pode utilizar, como propelente para o medicamento, ar comprimi­
do ou gás butano. Utilizado em conjunto com a zarabatana, esse sistema representa uma
alternativa barata e eficiente na injeção 4de drogas em curtas distâncias. C) dois dardos do
Sistema Telinject (acima) e um dardo artesanal (abaixo), todos com capacidade para 3 ml de
medicamento. Dardos do sistema Telinject podem ser utilizados em armas de longo alcan­
ce, utilizando C 0 2 como propelente para o disparo. D) Pistola Teleinject com coronha de
madeira para disparos de médias distâncias. O sistema pode utilizar C 0 2 ou ar comprimido
na propulsão dos dardos e representa uma alternativa versátil e potente para o disparos em
distâncias curtas ou m édias, lançando dardos com precisão entre 20 e 30 m. (Figura A
adaptada de www.cap-chur.com; Fotos B, C e D de Paulo Rogério Mangini)

utilizadas na imobilização de grandes mamíferos terrestres, sendo amplamente


empregadas em trabalhos de campo com grandes ungulados e carnívoros afri­
canos. No Brasil, são populares nos grandes zoológicos, onde muitas vezes
seu uso é imprescindível.

A escolha do equipamento utilizado na contenção química do animal depende


de algumas variáveis, como o método de captura, a espécie e o porte do indi­
víduo que se pretende capturar. No planèjamento do protocolo de contenção,
devem-se considerar as falhas possíveis e comuns ao uso de zarabatanas ou
armas especiais. As causas de falha no processo de injeção de drogas a distân­
cia podem ser decorrentes de mau funcionamento dos equipamentos, falhas
do operador ou condições adversas. As falhas no equipamento, geralmente,
são ocasionadas por falta de manutenção ou testes prévios que avaliem a fun-
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

cionalida.de do equipamento. Adicionalmente, o operador deve estar familiari­


zado com o uso do equipamento e treinado para operá-lo em situações adver­
sas como vento, chuva e ambiente que ofereça obstáculos. Contudo, o sucesso
na operação de captura e contenção química não depende somente de uma
simples .ponderação entre os diferentes fatores que influenciam os resultados,
mas também, em grande parte, da experiência pessoal de toda a equipe envol­
vida. A consulta a outros pesquisadores, trabalhando com a mesma espécie,
ou espécies correlatas, e as recomendações dessas pessoas devem ser conside­
radas nas etapas de planejamento. ' . j

Quatro questões básicas devem ser respondidas quando se propõe a captura e


contenção química de animais em vida livre:

1 ) Por que anestesiar o animal?

2) Qual a espécie que se pretende capturar?

3) Qual o lugar onde se encontra o animal?

4) Qual o objetivo da contenção?


A primeira questão refere-se a aspectos de ordem ética. O médico veterinário
que realizará a contenção química deve, primeiramente, compreender e con­
cordar com os motivos do estudo e com a necessidade de manipular os ani­
mais. Somente dessa forma poderá determinar a real necessidade de realizá-lo
e ponderar sobre os riscos e o benefício desse procedimento.

As demais questões são fundamentais na determinação dó protocolo mais ade­


quado cujos pontos são:
1 ) Características básicas de anatomia, do metabolismo e dá fisiologia da espé­
cie estudada; /

2) Contraindicações e efeitos adversos das drogas que se pretende usar;

3 ) Tempo necessário para execução de todos os procedimentos necessários ao


estudo.
Adicionalmente, a facilidade de acesso ao animal e o volume da droga que
necessita ser injetado são decisivos na escolha do equipamento que será utili­
zado para administração dos fármacos. Diante da impossibilidade de determi­
nar a massa corporal exata dos animais capturados, é recomendável elaborar
protocolos que garantam margem de segurança. Predeterminar doses, para in­
tervalos dè massa corporal, confere maior segurança no trabalho com animais
de médio e grande porte. Para que se obtenha maior segurança na contenção
química de animais em vida livre, devôm-se elaborar protocolos em que as

102
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

aplicações de doses únicas sejam efetivas e proporcionem tempo suficiente


para a completa manipulação do animal. Porém, esses protocolos devem ser
facilmente complementados com sobredoses, caso o tempo manipulação tenha
que ser prolongado ou a dose ministrada tenha sido insuficiente.

Na maioria das vezes, quando animais em vida livre são manipulados, não é
possível que seja realizada uma avaliação prévia das condições de saúde. Em
geral, é possível avaliar superficialmente a condição corporal e a presença de
lesões cutâneas ou deformidades visíveis a certa distância. A dificuldade em
avaliar a condição prévia de saúde do animal é um dos fatores que aumenta o
risco dos procedimentos anestésicos. A integridade do sistema circulatório e
do aparelho respiratório só poderá ser avaliadà após o animal estar imobiliza­
do. A manipulação de animais extremamente estressados deve ser evitada. Os
efeitos do estresse agudo sobre o aparelhcy circulatório podem comprometer o
efeito das drogas anestésicas, além de pôr em sério risco sua vida.

No caso da captura de indivíduos que, na avaliação prévia, demonstrem ser


animais de alto risco, o médico veterinário deve ter autonomia e autoridade
para liberar o animal, sem que este sofra qualquer procedimento. A partir do
momento em que se torna seguro manipular o animal, devem ser aferidos, no
mínim o, parâm etros fisiológicos como tem peratura corporal, frequência
cardíaca e respiratória, em intervalos regulares de 5 a 15 minutos. Monitorar o
animal manipulado até total recuperação é fundamental e, em geral, espera-se
que, após o procedimento, o exemplar capturado seja capaz de realizar a tota­
lidade das suas funções biológicas. Tal monitoramento deve ser conduzido
desde a indução até a plena recuperação. Durante o período de recuperação
anestésica, recomenda-se deixar o animal restrito à armadilha ou em uma caixa
de transporte, evitando-se, assim, acidentes.

Antes de qualquer procedimento, devem ser determinados protocolos para


possíveis emergências durante a contenção química. As situações de emergên­
cia mais comuns durante esses procedimentos são hipotermia, hipertermia,
bradicardia e paradas cardiorrespiratórias. O monitoramento da temperatura
corporal é fundamental à segurança do procedimento de contenção química,
pois, por ação farmacológica das drogas anestésicas, ocorre diminuição*na
capacidade de termorregulação do indivíduo contido. Sendo assim, cuidados
na recuperação anestésica, são necessários, sobretudo nos dias de frio ou calor
pronunciados. A fim de evitar quadros de hipotermia, o animal não deve ficar
exposto a correntes de ar frio ou a superfícies molhadas. Nenhum animal, sob
efeito de drogas anestésicas ou, mesmo, sob contenção física, deve permanecer

1 03
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

exposto diretamente aos raios solares ou a ambientes com pouca, circulação de


ar e altas temperaturas. Sob essas condições, podem ser observados quadros
de hipertermia. Adicionalmente, deve-se considerar também a capacidade
metabólica de troca de temperatura da espécie em questão. Indivíduos com
altas taxas metabólicas perdem ou acumulam calor com maior facilidade. Indi­
víduos com grande massa corporal estão mais sujeitos a desenvolver quadros
de hipertermia, do que de hipotermia. Animais que perdem temperatura de
forma significativa devem ser aquecidos e isolados, evitando-se a perda de
calor. Animais com aumento da temperatura corporal devem ser banhados,
posicionados em local ventilado e com temperaturas mais amenas.

A ocorrência de traumas durante a captura é um fator de risco intrínseco ao


processo. Contudo, o planejamento^ bem elaborado do método de captura e
protocblo de contenção química reduz os riscos de forma significativa. Ani­
mais traumatizados durante o processo de captura devem ser avaliados com
rigor, estimando-se sua capacidade de sobrevivência no ambiente natural. O
destino dos animais seriamente comprometidos deve ser determinado confor­
me a severidade do quadro observado e da espécie capturada. Instituições
como museus, zoológicos, centros de reabilitação e criadouros científicos po­
dem ser contatados previamente, a fim de providenciar destinos apropriados
para diferentes situações. *

Adicionalmente, manter um amplo arquivo com dados sobre parâmetros fisio­


lógicos e doses anestésicas empregadas é parte integrante do trabalho de cam­
po. Os resultados obtidcte, sucesso e falhas, devem sér divulgados a fim de
proporcionar a oiitros pesquisadores de campo subsídios para trabalhos futu­
ros. Toda informação sobre fauna nativ^ em vida livre é importante e deve ser
disponibilizada.

Princípios para captura de animais em ambientes naturais


A captura de animais em vida livre é uma necessiâade para queo sejam apro­
fundados os estudos sobre biologia e conservação de diversas espécies da
fauna nativa. Avaliar características morfológicas, fisiológicas e sanitárias de
indivíduos isolados pode contribuir de forma fundamental à conservação das
populações silvestres. As técnicas de captura estão baseadas, na grande maio­
ria das vezes, em técnicas tradicionais de caça, praticadas por populações
nativas ou povos colonizadores. Informações de outros pesquisadores são
importantes fontes de referência. A experiência de mateiros e caçadores pode
ser bem aproveitada, principalmente quando se pretende capturar espécies

104
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

tradicionalmente utilizadas como fonte de recursos alimentares.

O sistema empregado deve obedecej aos mesmos preceitos da contenção de


animais silvestres descritos por Pachaly (1992), possibilitando a realização
adequada de todos os procedimentos que determinaram a necessidade da cap­
tura, sejam coletas de amostras biológicas, colocação de radiotransmissores,
marcação, transporte ou translocação do animal. Devido ao empenho de pes­
soal e recursos financeiros, recomenda-se que as capturas sejam realizadas em
campanhas, concentrando-se os esforços. Quando se trata da captura de espé­
cies de médio e grande porte, que invariavelmente necessitam de contenção
química, é aconselhável que a duração das campanhas não exceda 15 a 20
diâs; períodos mais prolongados tornam-se desgastantes, com sensível redu­
ção na qualidade do trabalho de toda a equipe. A escolha do método de captu­
ra deve considerar a espécie que se pretende capturar, condições ambientais
locais, condições de transporte da equipe e equipamentos necessários, além
da capacidade pessoal dos assistentes de campo.

Sistemas de Captura
Métodos genéricos para captura de animais silvestres
*

Na grande maioria dos sistemas de captura, quando se pretende manipular


animais em vida livre, estes são capturados em locais que frequentam regular­
mente qu são atraídos a um ponto específico por meio de cevas. Estabelecer
pontos de ceva também é recomendável para algumas espécies de aves e répteis,
melhorando a eficácia de captura. Entre as técnicas mais utilizadas na captura
de animais silvestres podemos citar a captura com armadilhas. Estas podem
funcionar de diversas formas e, em geral, possuem alguma variedade de ali­
mento como isca. Além dos métodos aqui descritos, outros, especialmente
para pequenos animais, podem ser vistos em Auricchio & Salomão (2 0 0 2 ).
Entre as armadilhas mais usadas estão as caixas, as gaiolas e os currais.

Caixas e gaiolas .
As caixas, gaiolas e arapucas são amplamente empregadas na captura de gran­
de variedade de espécies de aves, répteis e mamíferos. Podem ser confecciona­
das em diversos tamanhos, em madeira ou metal. Podem ser armadas duas ou
mais armadilhas em um mesmo ponto, ou posicionadas isoladamente em tran-
sectos. Essas armadilhas podem possuir apenas uma entrada ou portas na
frente e fundo, sendo então denominadas armadilhas de carreiro. Através de
um sistema de gatilho, o animal desarma as portas que se fecham simultanea­

105
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

mente. O gatilho pode ser um pedal posicionado no piso da armadilha ou um


gancho que fixa uma isca. O piso das caixas e gaiolas, quando posicionadas no
solo, deve ser coberto com palha ou substrato semelhante ao do ambiente no
local. Alguns indivíduos relutam em entrar nas armadilhas, quando o substra­
to em que pisam possui consistência diferente da usual.
As armadilhas devem possuir espaço (suficiente pàra conter a espécie que se
deseja capturar, sem que o desarme das portas possa ferir o animal capturado.
Por outro lado, deve-se evitar o excesso de espaço, pois, nessas condições, o
animal capturado pode ferir-se gravemente, chocando-se contra as grades ou
paredes da armadilha. É interessante, que as paredes da armadilha sejam sóli­
das, com áreas abertas por onde se possam aplicar as drogas necessárias ou
realizar o manejo desejado. Quando são utilizadas jaulas e gaiolas, confecciona­
das em barras ou leia metálica, recomenda-se cobrir a armadilha depois dê reali­
zada a captura, evitando que o animal observe o meio externo e fique estressado.

A captura em armadilhas do tipo caixa, gaiola ou jaula apresenta vantagens,


tais como a proximidade e facilidade para injeção de drogas anestésicas e a
manipulação do animal.Também facilita a translocação de animais, se necessá­
rio. Quando essas armadilhas possuem sistema de trava nas portas e estão
dimensionadas de acordo com a força e o tamanho da espécie que se pretende
capturar, demonstram-se extremamente eficientes, com baixa ocorrência de fugas.

Currais de captura
Os currais são estruturas excelentes para captura* de ungulados solitários ou
em grupos. A utilização de currais e corredores é empregada com frequência
na captura de grandes e pequenos ungulados africanos, sendo comum também
a utilização dessas estruturas para adaptação de animais ou grupos que foram
translocados. Nas Américas, têm sido empregados principalmeiite na captura
de taiaçuídeos, cervídeos e grandes roedores. Devem ter dimensões compatí­
veis com o animal ou grupo a ser capturado, porém não.podem possibilitar
que os indivíduos capturados possam correr demasiadamente no seu interior.
Os currais podem ser erguidos sobre locais de ceva ou posicionados em pon­
tos estratégicos para os quais os animais possam ser conduzidos com o auxílio
de helicópteros, de pessoas a pé ou a cavalo. Para currais montados em pontos
de ceva, o sistema de desarme e fechamento mais utilizado é a porta em guilho­
tina, acionada por uma corda presa a uma isca ou operada por um observador
oculto. Os sistemas de desarme automático conferem grande eficiência e me-
nores custos ao processo. Entretanto, primatas como o macaco-prego, procio-
nídeos como os quatis e alguns pequenos roedores podem acionar os gatilhos

106
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

a utilização de redes de espera, redes de armação rápida e outros sistemas


comumente empregados na captura de cervídeos no Brasil e América do Sul.

Laço
O laço pode ser empregado para captura de uma grande variedade de espécies,
incluindo aves, répteis e mamíferos. Podem ser camuflados no solo, próximos
a uma isca, laçando o animal pelos membros locomotores, acionados por de­
sarme automático. Para captura de aves, o laço pode ser simplesmente fixado
ao .solo, fazendo com que a tentativa de fuga do animal estique a corda, atando
o laço. Laços armados na extremidade de longas hastes de madeira são utiliza­
dos na captura de psitacídeos e outras aves, geralmente enquanto essas se'
alimentam. A captura por meio de laços pode ser traumática e requer a associa­
ção imediata de outra forma de contenção.

Trincheiras
Asxtrincheiras, armadilhas de queda ou pitfalls constituem-se de buracos fei­
tos no solo. Devem ser dimensionadas conforme a espécie ou grupo taxonômi-
co que se pretende capturar, sejam mamíferos terrestres, répteis ou anfíbios.
Para captura de animais de pequeno porte, essas trincheiras geralmente são
revestidas internamente com baldes plásticos e dispostas próximas umas às 1
outras. Adicionalmente são utilizados, em conjunto com as trincheiras, corre­
dores de lona plástica que direcionam os animais para o interior dos buracos.

Na captura de ungulados, as trincheiras devem estar camufladas e podem ser


abertas sob um ponto de ceva ou caminhos comuns da espécie. Quando se
trata de captura de grandes animais, é preciso conciliar a profundidade e ou­
tras dimensões da trincheira com a capacidade de fuga da espécie em questão,
a fim de evitar ferimentos ao animal capturado. Deve ainda ser ponderada a
necessidade de contenção química e do animal ser retirado da trincheira du­
rante os procedimentos (Figura 4).

Apesar de descrita como segura e eficiente para captura de antas (Tapirus


terrestris), o uso das trincheiras para grandes e médios ungulados é bastante
controversa (Médici & Mangini 1998), Na escolha desse método, devem ser
levadas em conta: a possibilidade.de fraturas, queda de mais de um indivíduo
na armadilha, necessidade de manipular os indivíduos no interior da trin­
cheira, condições geológicas do terreno e as alterações ambientais promovidas
no local. Algumas vantagens podem ser destacadas, como o fato das armadi­
lhas serem imperceptíveis, possibilitando que o mesmo indivíduo seja captu­
rado repetidas vezes no mesmo local. Em geral, os animais permanecem tran-

108
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

Figura 4. Processo de camuflagem da uma trincheira para captura de antas. A trincheira deve
ser instalada em um carreiro utilizado pelo animal que se pretende capturar. A cobertura da
trincheira é realizada com telhas de amianto que proporcionam resistência, sustentando a
camuflagem. No momento em que o animal pisa sobre as telhas essas se quebram com
facilidade e não produzem ferimentos ao animal capturado. (Fotos de E. Patrícia Médici)

quilos e calmos, quando capturados nas trincheiras, possibilitando que a equipe


se reúna e decida o momento mais apropriado para manipulação. Nessas con­
dições, torna-se fácil estimar a massa corporal do animal. Adicionalmente, a
curta distância até o animal possibilita a utilização de zarabatana ç dardos
artesanais, para contenção química. Â captura em trincheiras ainda proporci­
ona a utilização de protocolos anestesiológicos que envolvam a aplicação de
medicação pré-anestésica, além de manter o animal restrito até a total recupera­
ção, antes da soltura (Figura 5).

Espreita ou perseguição
Em algumas ocasiões, a captura de médios e grandes mamíferos pode ser feita
por meio de espera ou perseguição. Em algumas espécies é possível capturar o
indivíduo, diretamente no ponto de ceva, com o auxílio de dardos contendo
anestésicos. Todavia, tal técnica pode tornar-se dispendiosa, por estar sujeita
a muitos erros ou por demandar muito tempo de espera até que o animal
desejado venha ao local de captura e esteja em posição para receber um dardo
anestésico. Para diminuir o risco de erro na trajetória dos dardos, o ponto de
espera não deve estar além de dez metros da ceva. Dardos disparados por
sistemas de armas de fogo são contraindicados, pois o estampido invariavel-

109
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

Figura 5. A) Injeção de drogas an e sté sicas com auxílio de dardo e zarabatana em um


exem plar de Tapirus terrestris, no interior da trincheira de captura. B) Exem plar de T.
terrestris com dois dardos fixados à musculatura cervical. A captura em trincheiras permi­
te que sejam utilizados protocolos de contenção com medicação pré-anestésica. C) Exem ­
plar de T. terrestris em indução anestésica após aplicação da associação de cloridrato de
medetomidina e sulfato de atropina, seguido pela injeção de cloridrato de tiletam ina e
cloridrato de zolazepam. D) Manipulação de um exemplar de T. terrestris no interior de uma
trincheirá de captura. Após a manipulação, deve-se aguardar a total recuperação do animal
antes que seja aberta a rampa para que esse possa ser liberado. (Fotos A, de Laury Cullen
Jr. Fotos B e C, de Paulo Rogério Mangini; Foto C, de E. Patrícia Médici.)

mente afugentará o animal,.sendo preferíveis, então, os sistemas de C 0 2 ou ar


comprimido. Adicionalmente, a estimativa de massa corporal e a preparação
do dardo para disparo devem ser feitas rapidamente, e isso demanda grande
experiência do operador. Esse método é essencialm ente dependente do perí­
odo de atividade da espécie que se pretende capturar. Para a grande maioria
das espécies de mamíferos, a espera deve ocorrer durante a madrugada, sen­
do necessários longos períodos de espera sobre a ceva. A baixa lum inosida­
de dificulta a precisão (\o disparo e a estimativa da massa corporal, dessa
forma, luzes complementares podem ser necessárias no momento em que se
lança o dardo. Atualmente, óculos de visão noturna e miras com infraverme­
lho têm sido utilizados, porém, os custos ainda são muito altos. Outro ponto
importante, que deve ser considerado, é o fato de que as drogas anestésicas,
disponíveis no mercado nacional, possuem tempo de indução entre cinCo e
quinze minutos, para m aioria das espécies já avaliadas. Tempo suficiente

110
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

para a fuga do animal até um ponto onde não possa ser encontrado. Ainda,
é possível que durante a fuga 0 indivíduo possa ferir-se ou morrer, devido
aos efeitos da anestesia. Entretanto, a possibilidade de recaptura,, a necessi­
dade de poucos assistentes de campo e a fácil implementação logística são
pontos positivos do método. Esse sistema de captura tem sido utilizado com
sucesso para diversas espécies de ungulados neotropicais, incluindo Tayas-
suidae e Tapiridae.

O método de perseguição, também empregado na captura de ungulados e gran­


des carnívoros, assemelha-se, como o anterior, às técnicas frequentemente
empregadas por caçadores. O método consiste na utilização de cães treinados
que perseguem e acuam o animal desejado. Quando o animal perseguido posi­
ciona-se em determinados locais defendendo-se dos cães, possibilita que os
dardos còm anestésicos sejam disparados. Outras variações desse método,
sem os cães, podem ser executadas. A metodologia requer grande experiência
de campo, tanto dos pesquisadores, quanto assistentes e cães envolvidos.
Eventualmente, os cães atacam com mordidas os animais durante a persegui­
ção, causando ferimentos cutâneos, em geral poüco graves, mas que merecem
atenção. O método também é considerado dispendioso e extremamente estres-
santes aos animais capturados. Todavia, constitui em algumas situações a úni­
ca opção viável para captura de grandes felinos ou ungulados. Recomenda-se
que esse método só seja utilizado quando as outras formas possíveis de captu­
ra foram exaustivamente testadas sem sucesso. As caçadas com cães treinados
devem ser evitadas ao máximo, pois em geral infligem estresse excessivo aos
animais capturados. O processo anestésico nesses casos torna-se menos eficien­
te e de maior risco ao animal; deve-se, portanto, evitar o uso dessa metodolo­
gia com espécies mais suscetíveis ao estresse.

Captura de animais silvestres segundo grupos taxonômicos


Nesta seção, não se pretende elaborar um guia definitivo sobre os métodos de
captura que podem ou devem ser aplicados para determinadas espécies. Pre­
tende-se apenas esclarecer sobre os métodos mais utilizados e de maior suces­
so. Todavia, cada pesquisador deve procurar a adaptação de maior simplicidade
e eficiência para atingir seus objetivos. Muitos métodos de coleta de excelente
eficiência, complementares aos descritos aqui, podem ser vistos em Auricchio &
Salomão (2 0 0 2 ).

111
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

Captura de anfíbios e répteis


Para captura de répteis e anfíbios, recomenda-se a utilização de metodologias
combinadas. Uma das metodologias mais frequentes é a de reconhecimento
por encontro visual, seguido de captura com trincheiras (pitfall), ganchos ou
laços. O perípdo matutino de 6:00 h às 10:00 h, vespertino das 16:00 h às
19:00 h, e noturno, das 20:00 h às 24:00 h, são os horários mais apropriados
para a captura destes grupos taxonômicos.

Répteis
As informações sobre história natural e ecologia de répteis são ainda escassas
ou inexistentes, para algumas espécies nativas. A captura de répteis em flores­
tas neotropicais é dificultada pelo tipo de vegetação e solo, com grande camada
de material vegetal vivo e em decomposição. Em geral, a baixa densidade de
indivíduos também prejudica o sucesso de captura. O encontro de répteis,
principalmente serpentes, é na grande maioria das vezes ocasional, ocorrendo
durante outras atividades de campo. É importante o reconhecimento prelimi­
nar da área de estudo, bem como o conhecimento de alguns hábitos da espécie
que se pretende encontrar.

Serpentes e lagartos
A captura de serpentes é baseada na procura visual. O pesquisador deve des­
locar-se pela área de interesse à procura dos indivíduos. O esforço de procura
deve se estender ao micro-hábitat, investigando tocas ou sob troncos e pedras
em áreas abertas. A identificação de locais frequentados por possíveis presas
pode auxiliar a procura. Os materiais mais usados na captura de serpentes são
o laço e o gancho. Algumas espécies de lagartos podem ser capturadas com
uso de iscas, com o auxílio de laços de desarme automático ou por uso de
armadilhas tipo caixa ou jaula.

Quelônios
A captura de jabutis pode seguir o mesmo padrão de procura utilizado para
serpentes, pois a baixa velocidade de deslocamento dos quelônios terrestres
beneficia a captura manual dos indivíduos. Nesse grupo, a captura com cerca­
dos e isca pode ser utilizada, porém, em situações de baixa densidade, pode
ser de pouco sucesso. Para quelônios aquáticos, como cágados, o uso de iscas
em armadilhas posicionadas a beira dos cursos d’água e lagoas representa uma
boa opção. O posicionamento das armadilhas deve ser criterioso, preferivel­
mente em locais sombreados. A revisão das armadilhas deve ocorrer mais de
uma vez ao dia, evitando-se que o animal capturado permaneça por longos

112
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

períodos fora do ambiente aquático,- principalmente nas horas mais quentes


do dia. Temperaturas elevadas podem ser prejudiciais à saúde de algumas
espécies.

Captura de Aves
O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) editou uma edição revisada e ampliada do Manual de Anilhamento de
Aves Silvestres (Ibama 1994). O manual apresenta várias técnicas de captura e
características comuns ao trabalho de campo com aves. O método mais utiliza­
do para captura de aves é por meio de redes de neblina. Essas podem ser
posicionadas em transectos, distribuídas em áreas abertas ou no interior da
floresta, mas o método é considerado não seletivo. As redes são erguidas com
o auxílio de varas e devem permanecer abertas durante aproximadamente qua­
tro horas. Os horários de maior número de impactos, de grande variedade de
espécies, é das 6:00 h às 10:00 e das 16:00 h às 19:00 h. A revisão das redes
deve ser intensificada nesses horários, pois pequenas aves podem sofrer esgo­
tamento físico ou traumas decorrentes do esforço de fuga, após estarem presas
à malha da rede.

Técnicas tradicionais, como o uso de laços e visgo, usadas por populações nati­
vas e apanhadores de aves, podem ser cogitadas como formas alternativas de
captura para fins científicos, porém requerem extrema cautela, pois, em geral,
podem ser excessivamente traumáticas. O laço é tradicionalmente utilizado na
captura de psitacídeos adultos, ao passo que filhotes em geral são apanhados no
ninho. Nas regiões litorâneas, é comum que os caiçaras utilizem substâncias vis­
cosas e aderentes nos galhos das árvores, em locais de dormitório ou alimentação,
fazendo com que as aves fiquem presas, capturando-as em seguida. A utilização
dessa técnica é contraindicada por causar danos severos à plumagem das aves
capturadas, muitas vezes prejudicando a capacidade de voo dos animais.

Captura de Mamíferos
A escolha do método e o sucesso na captura dos mamíferos dependem do
conhecimento do pesquisador sobre as diferentes dietas e comportamentos
alimentares, distribuição espacial, área de uso, período de atividade e outros
fatores individuais ou populacionais, comuns a cada grupo de mamíferos.
Algumas características devem ser consideradas, como a distribuição espacial,
horizontal e vertical dà espécie. A distribuição horizontal pode ser analisada
em diversas escalas, desde o micro-hábitat até macrorregiões geográficas. A
distribuição vertical refe*re-se à utilização de diferentes estratos de vegetação.

113
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

São relevantes, também, as características da dieta e modo de alimentação.


Para a grande maioria das espécies de mamíferos, a instalação de pontos de
ceva amplia o sucesso de captura.

Pequenos mamíferos não voadores


Denominam-se pequenos mamíferos não voadores todos os marsupiais neo­
tropicais e a maioria das espécies de roedores pertencente às famílias M uridae,
Sciuridae, C tenom yidae, E chim yidae e C aviidae. Devido à alta diversidade de
espécies desses dois grupos, várias são as técnicas de captura. Porém, o uso
de gaiolas [live traps) é o método mais convencional para capturar pequenos
mamíferos não voadores. Para a ampla maioria das espécies, são utilizadas
gaiolas do tipo S h erm an , T om ah aw k ou, ainda, gaiolas de grade de arame
galvanizado. As gaiolas podem ser colocadas em transeçtos de tamanhos varia­
dos ou dispostas em grades quadradas (consultar Auricchio & Salomão 2 0 0 2 ,
para detalhes).
Previamente, deve-se determinar o ambiente onde serão posicionadas as arma­
dilhas. Algumas espécies' são capturadas apenas próximas a margens de rios,
outras apenas nas áreas de vegetação mais densa. Deve-se também determinar
se as armadilhas estarão posicionadas no solo ou no dossel. As gaiolas coloca­
das no sub-bosque ou dossel devem ser amarradas com arame, barbante ou
corda ou, ainda, dispostas sobre plataformas. Outro fator importante é a esco­
lha da isca. Essa pode servir como fator de seleção entre diferentes espécies
em um mesmo hábitat. Algumas variedades de pequenos mamíferos possuem
predileção por determinados tipos de isca. Como exemplo, a cuíca, Gracilinanus
spp., pode ser capturada com pedaços de abacaxi, o rato-do-mato, A kodon
spp., com milho verde e pasta de amendoim, e a cuíca-d’água, C hironeçtes
m inim us, com iscas de sardinha.

A captura de pequenos primatas pode ser feita principalmente por meio de


gaiolas ou retirando-se os animais dos ocos de árvores, onde se abrigam du­
rante a noite. Espécies de médio porte, como o macaco-prego (Cebus spp.) e o
bugio [Alouatta spp.), podem também ser capturados por armadilhas, porém
com eficiência reduzida. Primatas maiores, como macaco-barrigudo (Lagothríx
spp.) e o macaco-aranha [Ateies spp.), em geral, precisam ser capturados com
uso direto de dardos anestésicos, disparados por armas especiais que usam
como propulsor ar comprimido ou C 0 2, muitas vezes sendo necessário em­
pregar o mesmo método para captura de primatas de médio porte.

114
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

Pequenos mamíferos voadores v


A Ordem Chiroptera é rica em número de espécies e, portanto, podem ser
observados em um número variado de hábitats. Cada família apresenta hábitos
alimentares diferentes e cada espécie de uma mesma família pode apresentar
preferências alimentares distintas. Para capturá-los, o método mais empregado
utiliza redes de neblina, como utilizado para aves, porém, neste caso, redes
duram menos. Elas são colocadas em locais estratégicos, em geral áreas co­
muns de passagem, assegurando êxito na captura.

O reconhecimento e a identificação dos, refúgios pode auxiliar de forma impor­


tante na captura desses animais. Abrigos naturais ou artificiais também podem
ser explorados e os exemplares podem ser capturados com auxílio de luvas de
couro e puçá. Existem dois tipos básicos de refúgios: 1 ) refúgios diurnos, que
são locais onde os indivíduos dormem é realizam parte das atividades sociais
e 2 ) refúgios noturnos, que são os locais de pousos temporários e servem de
abrigo durante o período de atividade dos morcegos. Os abrigos ainda podem
ser classificados como naturais ou artificiais. Os abrigos naturais geralmente
usados pelos morcegos são ocos de árvores, folhas, cascas soltas de árvores,
fendas em rochas, matacões, cavernas ou grutas. Os abrigos artificiais mais
comuns são construções abandonadas, espaços entre telhas, forros de telha­
dos, cômodos de casas abandonadas, vãos de escadas externas, chaminés de-v
Cativadas, cumeeiras de telhados, caixas d’água vazias, pontés e viadutos.

Não se recomendam incursões ao interior de cavernas com alta densidade de


morcegos, sem que o pesquisador e sua equipe estejam utilizando equipamen­
tos de segurança e adequadamente imunizados contra raiva. A simples inala­
ção de esporos de fungos que crescem sobre as fezes de morcegos pode causar
histoplasmose (Auricchio & Salomão 2 0 0 2 ).

Mamíferos de médio e grande porte


Apesar da grande variedade de espécies contidas nesse grupo, algumas formas
básicas de captura podem ser relacionadas. Todavia, cada método está sujeito
a uma série de variações para que seja aplicado a diferentes espécies. De forma
genérica, os mamíferos médios e grandes podem sér capturados com o uso de
armadilhas tipo caixa ou gaiola, currais, redes ou por espreita e perseguição.

Armadilhas de caixa são utilizadas na captura de uma grande variedade de


mamíferos de médio porte. As jaulas representam uma das formas mais efici­
entes na captura de pequenos e grandes felinos. Outros carnívoros como caní­
deos, procionídeos e mustelídeos, além de grandes roedores, geralmente são

115
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRICIA AVELLO NICOLA

capturados em armadilhas de carreiro ou caixa. Além de uma armadilha com


estrutura adequada, o ponto diferencial no sucesso da metodologia de. captura
parece ser a escolha do local mais apropriado e da isca mais palatável para os
indivíduos da população local. As caixas também podem ser utilizadas com
eficiência na captura de ungulados como Tayassuidae e pequenos cervídeos.
O sucesso de captura de cervídeos do gênero M azam a e O zotocerus nessas
armadilhas é extremamente baixo, sendo aparentemente a disponibilidade de
recursos alimentares fator que contribui para tanto. Na ausência de períodos
de seca e invernos rigorosos, os animais relutam em entrar em armadilhas em
busca de alimentos (Nunes et al. 1997). Em termos gerais, a utilização de sis­
temas de captura com redes demonstram-se mais eficientes para diferentes
espécies de cervídeos. Entretanto, eficiência e segurança têm sido obtidas por
outros métodos. Duarte (1999) descreve a técnica de bulldoging para captura
do cervo do Pantanal (Blastocerus dichotom us). Com auxílio de um helicópte­
ro, o animal desejado é direcionado para uma área alagada e de vegetação
densa, com cerca de 0,6 a 1,5 metros de lâmina d’âgua. Nesse terreno, torna-se
lento, podendo ser contido manualmente por dois técnicos de captura, que
saltam do helicóptero. O primeiro contém o animal pela região escapular e o
segundo pela região coxofemoral. Na sequência, o animal deve ser anestesiado
por um terceiro técnico. O tempo de perseguição é um fator importante para a
segurança do método. Esse não deve ser maior que cinco minutos, até que o
animal esteja em local adequado para contenção. Cervídeos são animais extre­
mamente suscetíveis ao estresse, facilmente chegando à morte. O autor relata
que essa técnica demonstrou-se mais eficiente na captura da espécie do que^o
uso de net gun, a qual necessita de ambientes mais abertos para ser operada.

O uso de currais é um dos meios mais eficientes para captura de queixadas


[Tayassu p ecarí) (Margarido, T.C.C. 1996, comunicação pessoal). Quando cons­
truídos com medidas de dez por seis metros, em uma ceva de milho bastante
frequentada, possibilitaram a captura de grupos de até 35 animais. Quando a
ceva foi mantida em um mesmo local por períodos prolongados, foram realiza­
das recapturas, com sucesso. Todavia, para captura de catetos (Tayassu tajacu),
tais currais mostraram-se insatisfatórios, principalmente quando frequentados
pelos queixadas. A captura de catetos foi mais eficiente quando foram utiliza­
das caixas, com dimensões de 40,0 cm de largura, 60,0 cm de altura e 110,0
cm de comprimento, dispostas em grupos de três ou quatro, em um mesmo
ponto de ceva. Currais d e captura também foram utilizados com sucesso para
Tayassu p eca rí, por Karesh et al. (1998), na Bolívia. Os autores utilizaram salei­
ros frequentados pelos animais, construindo ao redor deles um grande cerca­

116
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

do com portões, acionados a distância. O método possibilitou captura e imobi­


lização química de 40 indivíduos.

Na captura de Tapirus spp, os métodos mais empregados têm sido as trinchei­


ras e a espera em plataformas, ambos com sucesso. Alguns pesquisadores têm
utilizado também laços ou perseguição com cães treinados. Porém, recomen-
da-se que o método só deve ser utilizado quando outras formas de captura
como trincheiras, armadilhas de caixa e currais sofreram fracassos repetidos
ou mostraram-se inviáveis devido a condições ambientais ou outros fatores. O
método de perseguição, em geral, é estressante aos animais capturados. Con­
tudo, em determinadas situações, onde os animais não estão habituados a
frequentar cevas e existe a necessidade de urgência na captura, a utilização de
cães treinados pode ser a única alternativa eficiente.

Sistemas de m arcação
Em estudos que envolvem fauna silvestre, muitas vezes é necessário que os
indivíduos componentes das populações estudadas, sejam marcados. Tanto
os propósitos do estudo, quanto à espécie em questão, determinam as formas
de marcação e o tipo de marcas utilizadas. O ideal é que seja possível cumprir
todos os propósitos do estudo com apenas um tipo de marcação em cada
indivíduo e que as marcas não representem incômodo para o animal que as
utiliza. O material utilizado deve ser inerte e de fácil aplicação. A utilização de
marcas, como brincos e colares, grandes e de cores fortes, facilita a observação
dos indivíduos. Porém, podem influenciar nas estratégias reprodutivas ou,
ainda, alertar predadores ou suas presas, o que levaria à obtenção de dados
alterados sobre algumas relações inter e intraespecíficas. Loomis (1993) ressal­
ta, ainda, que a identificação do animal deve ser capaz de individualizá-lo dos
demais e não deve causar estresse ou dor ou, ainda, alterar sua sobrevivência ou
comportamento. Adicionalmente' é interessante que a marca utilizada seja facil­
mente identificada a distância. Muitas vezes todos esses requisitos não podem
ser cumpridos e dois ou mais tipos de marcas precisam ser aplicados. As mar­
cas podem ser diferenciadas em permanentes ou de longa e curta durabilidade.

Marcas permanentes

Diversos métodos podem promover uma marcação eficiente e definitiva nos


animais envolvidos em estudos ambientais. Como característica comum, algu­
mas delas causam lesão aos indivíduos marcados, geralmente no tecido cutâ­
neo. A utilização de anestésicos pode ser necessária à aplicação dessas marcas
na grande maioria das espécies.

117
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

T ran spon ders


Um dos equipamentos mais modernos para identificação de animais é conhe­
cido como Transponder ou M icrochip. O m icrochip está disponível em tama­
nhos variados, desde um grão de arroz, e é colocado no tecido subcutâneo do
animal. Para isso, utiliza-se um aplicador semelhante a uma seringa. A aplica­
ção é rápida e pouco dolorosa. Em diversas espécies, a colocação pode ser
realizada apenas mediante contenção física. O revestimento destes componen­
tes eletrônicos é biocompatível e não migra no tecido subcutâneo. Os trans­
pon d ers são reyestidos por sílica e polipropileno, possuem um código gravado
a laser, que é interpretado por um decodificador ou scan n er, e que confere
uma sequência numérica, diferente para cada animal. A distância de leitura
varia de poucos centímetros a até alguns metros, conforme o modeló e o fabri­
cante. O local de implantação deve ser padronizado e escolhido conforme o
porte da espécie em estudo, devendo ser de fácil acesso para aplicação e leitu­
ra., Loomis (1993) apresenta os locais àe implantação mais indiçados segundo
os grupos taxonômicos.

Mamíferos - Caudal ao pavilhão auditivo direito ou esquerdo.


- Região dorsal entre as escápulas.
- Região maxilar direita ou esquerda.
Aves - Área peitoral direita ou esquerda.
- Musculatura da, coxa direita ou esquerda.
Répteis - Quelônios - Região umeral direita ou esquerda.
- Serpentes e lacertídeos - Porção.dorsal da base da cauda.
Anfíbios - Cavidade celomática.
Peixes - Base direita ou esquerda da nadadeira dorsal.

Usualmente nos trabalhos de campo, a utilização de m icrochips fica limitada


pela necessidade de estar muito próximo ao animal para realizar a identificação.

Tatuagem
Método tradicional na marcação de animais, a tatuagem depende de equipamen-
tb especializado. Em geral, é necessário anestesiar o animal. O método é doloro­
so e necessita de depilação. Ademais, assim como o uso de transponders, é
necessário conter o indivíduo em estudo pará verificar o seu registro. E muito
utilizado em zoológicos, assim com o método anterior.

118
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

Marcas dérmicas
Consistem em marcas feitas na derme dos animais. Essas marcas podem ser
realizadas com substâncias de pH ácido ou básico, metal quente e por congela­
mento da pele e folículos pilosos. Tais técnicas causam cicatrizes que alteram
o padrão de crescimento dos pelos, evitando seu crescimento ou mudando
sua coloração. Como característica comum, todas são dolorosas e requerem
anestesia para aplicação.

Picotes
São pequenos cortes realizados, em geral, no pavilhão auditivo de mamíferos,
escamas marginais da carapaça de quelônios, cauda dos crocodilianos e esca­
mas ventrais de serpentes. Em geral, quando aplicadas em indivíduos jovens,
podem desaparecer ou apresentar deformações com o crescimento do animal.
As marcas no pavilhão auditivo, geralmente, são utilizadas em ungulados e
roedores de médio e grande porte. Esses picotes podem compor um sistema
com formatos diferentes em regiões distintas do pavilhão auditivo, sendo atri­
buídos a cada combinação, valores numéricos diferenciados. O modelo de
códigos pode ser copiado do sistema denominado M ossa A ustraliana, utiliza­
do em suínos domésticos (Figura 6). Para a realização das marcas, não são

Figura 6. Padrão de marcação denominado Mossa Australiana. As linhas pontilhadas repre­


sentam os locais de corte. A soma dos valores indicados ao lado das linhas de corte, na
figura superior, confere o número da marca, como indicado na figura inferior. O sistema tem
sido empregado em grandes roedores e outros m am íferos silvestres, muit.as vezes com
algumas m odificações. (Ilustração de Paula Beatriz Mangini).

119
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

necessários equipamentos específicos, porém, existem alicates especiais para


marcação de suínos domésticos, os quais podem ser utilizados çm mamíferos
silvestres. A natureza traumática desse sistema de marcação requer que o ani­
mal seja anestesiado para realizar os picotes.

Mutilações
Quando o sistema de marcação não necessita de muitos números ou sequências
elaboradas, é possível marcar indivíduos por cortes das falanges ou extremi­
dade da cauda dos animais em estudo. Geralmente esse método só se aplica a
pequenos mamíferos, anfíbios e répteis, e requer anestesia. Como desvanta­
gens, as lesões causadas possibilitam infecção bacteriana e podem causar incô­
modo aos animais. Alguns anfíbios podem apresentar regeneração dos dígitos
amputados, o que pode resultar em erros no sistema de numeração. Adicio­
nalmente, mesmo em condições naturais, muitos dos animais em que é possí­
vel aplicar essa método, podem apresentar lesões como a perda de dígitos,
geralmente ocasionadas por traumas.

Resenha
Algumas espécies de mamíferos possuem, na coloração natural,/ padrões que
nunca se repetem em indivíduos diferentes. O mesmo acontece com algumas
espécies de quelônios. A anotação de tais marcas, por desenhos e fotografias,
é uma forma de identificação simples e econômica (Figura 7). Muitas vezes não
requer captura ou anestesia dos animais em estudo. Tal método pode ser em­
pregado em grande variedade de espécies de répteis, além de mamíferos, como
felinos de pequeno e grande porte. Em levantamentos fotográficos também é
possível identificar diferentes indivíduos, mesmo nas espécies que não apre­
sentam padrões de cores, através da identificação de cicatrizes, comuns em
animais em vida livre.

Figura 7. A e B) Padrão de manchas, evidenciando ambos os lados do indivíduo, em uma


fêmea livre de Leopardus pardalis. (Fotos de Laury Cullen Jr.)

120
CAPTURA E MARCAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES

Marcas de longa durabilidade

Brincos, colares e anilhas

Brincos, anilhas e colares, em geral, são confeccionados em variedades resis­


tentes de plástico, metal ou outros materiais inertes ao organismo animal (Fi­
gura 8-A). Podem possuir diferentes cores e sequências alfanuméricas. Os brin­
cos plásticos, muito comuns na marcação de animais domésticos, são de fácil
aquisição e aplicação, representando a alternativa mais viável na maioria das
situações de campo, sendo muito apropriados para marcação de ungulados e
roedores. Em geral, permanecem por longos períodos presos ao pavilhão audi­
tivo de mamíferos de porte médio e grande. Apesar de resistentes, muitas
vezes são arrancados enquanto o animal se locomove entre a vegetação.

Figura 8: A) Alicate aplicador e brincos plásticos numerados. A aplicação desse tipo de


marca requer contenção química em algumas espécies. B) Exemplar de Puma concotor com
radio colar instalado. O equipamento também serve como forma de individualizar o animal
em estudo. (Fotos A e B, de Paulo Rogério Mangini.)

No caso da aplicação de anilhas e colares, deve-se tomar cuidado quanto à


idade do indivíduo marcado e flexibilidade do equipamento de marcação. Deve-
se evitar que, com o passar do tempo, o equipamento se torne apertado, cau­
sando lesões ou desconforto ao animal. Usualmente, as anilhas são aplicadas
nos membros pélvicos em aves. Anilhas e grampos especiais podem ser fixa­
dos nas asas de aves e morcegos.

Os colares geralmente são confeccionados em material maleável e cores varia­


das. Quando fixados ao corpo do animal, não devem ser extremamente justos.
O contato direto do colar com a pele do animal pode proporcionar irritação
local ou acúmulo de umidade, predispondo a infecções bacterianas, fúngicas
ou a infestação por ectoparasitos. Em algumas espécies de cervídeos, que apre-.

121
PAULO ROGÉRIO MANGINI
PATRÍCIA AVELLO NICOLA

sentam sazonalidade reprodutiva bem definida, os indivíduos de sexo mascu-


lino apresentam aumento do diâmetro cervical durante o período de acasala­
mento. Quando são fixados colares nesses animais, devem-se observar essas
peculiaridades, evitando que os colares tornem-se extremamente apertados
nessas fases.

Radiotransmissores
Diversos modelos de radiotransmissores podem ser fixados nos animais por
meio de colares que, por si, representam uma forma de marcação (Figura 8-B).
Adicionalmente, cada transmissor possui uma frequência específica, identifi­
cando o animal em estudo. Em serpentes, os radiotransmissores são implanta­
dos por meio de cirurgia, na cavidade celomáticà, não demonstrando marcas
identificáveis externamente.

Marcas de curta durabilidade

Pinturas, colares e anilhas


Colares e anilhas também podem ser confeccionados em material pouco resis­
tente, com a intenção de que o animal os perca após um curto período de
tempo. Podem possuir cores variadas ou sequências alfanuméricas. A utiliza­
ção de tinta, diretamente sobre a pelagem ou plumagem dos indivíduos estu­
dados, pode representar uma alternativa rápida de marcação. Podem ser utili­
zadas cores distinguindo animais de grupos diferentes ou sequências alfanu­
méricas conforme os objetivos dos estudos. O material utilizado não deve ser
tóxico ao organismo. Tintas que utilizem chumbo na sua composição devem
ser evitadas. As marcas com tinta podem ser aplicadas a distância, utilizando-
se equipamentos especiais, como armas do tipo p ain t-ball, ou através da con­
tenção dos animais.

Bibliografia
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M. E. Zoo e Wild Animal Medicine, Current Therapy 3. Philadelphia-USA, W. B. Saunders.

Locais na internet para informações sobre equipamentos


Gaiolas de captura
http://www.doyourownpestcontrol.com/tomahawk.htm
http://doyourownpestcontrol.com/catalog.htm
http://www.bugspray.eom/catalog/products/pagel.html#80
http://www.animaltraps.com/
-http://trap-supply.hypermart.net/
http://www.havahart.com/ ,
http ://homel.gte.net/aces/TRAPS.HTM

A nilh as
http://home.earthlink.net/~lmbird/index.html
Brincos
http ://www. nationalband.com/
http://www.ag-link.com/Products/Prod_IdentTagE.htm

Redes de neblina
http://www.polbox.eom/e/ecotone/index.html
http://homel.gte.net/aces/nets.htm

123
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

polinizadores, dispersores de sementes, predadores, participantes de anéis


miméticos e mutualistas com plantas e homópteros, contribuindo, ainda, de
-modo considerável, como biomassa alimentar para níveis tróficos superiores),
mesmo que algumas interações importantes não estejam representadas nestes
grupos (como parasitoidismo, por exemplo).

Mesmo levando-se em conta o fato de que a descrição de todos os métodos


conhecidos para elaboração de inventários nesses grupos não seja possível nes­
te volume, este capítulo traz um resumo de alguns dos métodos mais eficientes
usados pelos autores nos últimos anos, com as principais referências relacio­
nadas a cada um e os principais métodos de análise utilizados em cada caso.

Lepidópteros
Borboletas compreendem representantes de 5 famílias de Lepidoptera diurnos
(Papilionidae, Pieridae, Nymphalidae, Lycaenidae e Hesperiidae) que prova­
velmente formam um grupo natural dentro dos lepidópteros (veja Scoble 1986).
Existem algumas espécies crepusculares, voando nas primeiras horas da ma­
nhã ou no final da tarde, mas a maioria é ativa no meio do dia. Mariposas
grandes e melhores conhecidas (Famílias Castniidae, Arctidae, Sphingidae,
Saturnidae e algumas Noctuidae e Geometridae) são principalmente noturnas
(exceto Castniidae e muitos Arctidae) e são mais eficientemente observadas
quando atraídas pela luz. A sistem ática dos grupos citados é relativam en­
te bem conhecida, com algumas lacunas de conhecim ento em Lycaenidae,
Hesperiidae, Noctuidae e Geometridae. Pelo fato de serem grandes, coloridas
(muitas diurnas) e de fácil visualização, os grupos têm sido considerados as
melhores “bandeiras” para conservação e indicadores para monitoramento
ambiental, inclusive por leigos e membros de populações tradicionais, com
as necessárias reservas (Brown 1991, 1996a, 1996b, 1997a,- 1997b; Brown e
Freitas 1999; Kremen 1992; New.ef al. 1995; New 1997),

Principais métodos de captura


Sem dúvida, a coleta com puçás é o método mais conhecido para capturar,
borboletas e mariposas diurnas, tendo um grande alcance (até 7 metros, de­
pendendo do equipamento e do coletor) e permitindo que boa parte dos exem­
plares seja capturada sem danos maiores (Fig. la). No entanto, este método
restringe bastante a captura de alguns grupos de borboletas, privilegiando es­
pécies que são atraídas por flores no sub-bosque.

Para muitos grupos importantes de Nymphalidae e Noctuidae atraídas por

126
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

frutas fermentadas e fezes, a captura com armadilhas é muito mais eficiente,


pois estas podem ser montadas em diversas alturas, concentrando indivíduos
pelo odor, e permitindo a captura de muitas espécies de dossel (DeVries 1987;
DeVries et al. 1997; Shuey 1997). As armadilhas consistem em um cilindro de
tela fina, fechado na extremidade superior e montado em uma plataforma de
madeira fina, onde são colocadas as iscas (podem ser colocadas dentro de
pratos pequenos de plástico (Fig. lb ), o que mantém a isca úmida por mais
tempo, aumentando a capacidade de atração) (Fig. lb-d). Os Lepidoptera en­
tram pela abertura inferior, se alimentam na isca sobre a plataforma (Fig. lb) e,
no momento de sair, voam para cima, ficando presos no cilindro (Fig. lc).
Existem diferentes modelos descritos na literatura, mas a forma básica é sem­
pre a mesma (detalhes da construção em DeVries 1987 & Shuey 1997). A isca
mais indicada a ser usada nessas armadilhas é banana fermentada com gara­
pa (DeVries 1987). Essa isca atrai a maior parte das espécies das subfamílias
Eurytelinae, Brassolinae, Morphinae, Satyrinae, Charaxinae, Apaturinae e Li-
menitidinae (Nymphalidae), além de, em algumas regiões, atrair também al­
guns Ithomiinae (DeVries et al. 1999) e, de noite, atrair muitos Noctuidae.
Outras iscas também usadas são fezes (as de cachorro são especialmente efi­
cientes para alguns grupos), que atraem boa parte das espécies que apreci­
am banana com garapa (Fig. lje), além de diversos besouros, especialmente
Scarabeidae (Coleoptera). Peixe e carne em decomposição atraem diversos
Hesperiidae e Lycaenidae.
Além das armadilhas já descritas, o uso de iscas de H eliotropium indicum
(Boraginaceae) para borboletas das su bfam ílias Ith om iin ae e D anainae
(Nymphalidae) e mariposas Arctiidae é bastante eficiente em muitas áreas da
região Neotropical (Beebe 1955; Brown 1985). Arbustos de H eliotropiu m
indicum são comuns em barrancos de rios e áreas alagáveis. Plantas inteiras
devem ser arrancadas, amarradas em pequenos feixes e penduradas na vegeta­
ção (Fig. lf), de preferência em áreas onde Ithomiinae e Arctidae são vistos
com mais frequência. Com este método, (que atrai quase que exclusivamente
machos) dezenas de diferentes espécies podem ser atraídas por uma única
isca, maximizando os inventários das espécies destes grupos (Fig. lf, g).

Espécies noturnas (mariposas e algumas borboletas crepusculares) são eficien­


temente atraídas por luz ultravioleta em superfície branca (um filó fino). A
superfície as faz parar de voar e, pousando, o trabalho de identificação e coleta
fica mais fácil (Southwood 1978; Brown & Freitas 1999; Martin 1977). Além
desses métodos, iscas feitas com papel higiênico molhado em saliva e colocado
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

Figura 1: A) Coletas com uso de puçás (Teodoro Sampaio, SP), B) Borboletas no prato com isca
de banana fermentada (Reserva Extrativista do Alto Juruá - REAJ, Marechal Thaumaturgo, AC),
C) Visão geral de uma armadilha de borboletas (note-se a grande quantidade de borboletas na
parte superior da armadilha) (Morro do Diabo, Teodoro Sampaio, SP), D) Vistoria de uma
armadilha de borboletas (REAJ, Marechal Thaumaturgo, AC), E) Borboletas em fezes de onça
(Serra dos Carajás, PA), F,G) Borboletas em iscas de Heliotropium indicum (REAJ, Marechal
Thaumaturgo, AC), H) Grupo de borboletas na areia do Rio (Rio Itacaiunas, Serra dos Carajás,
PA), I) Borboletas em flor de Asteraceae (São Bernardo do Campo, SP).

128
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

em folhas largas, em áreas de mosaico de sol e sombra, são extremamente


eficientes para atrair espécies de Hesperiidae em algumas áreas dos trópicos
(Lamas et al. 1993; Austin et al. 1993). Mesmo considerando que os métodos
descritos sejam de eficácia comprovada, sua eficiência pode variar de forma
considerável, de acordo com a região estudada, condições meteorológicas do
dia, altitude ou com a comunidade de lepidópteros presente na área.

Listas totais e censos de borboletas


O trabalho de monitoramento fica mais fácil quando uma lista de espécies já
existe para a área. Uma lista relativamente completa poderá ser obtida com um
ano de trabalho, seguindo os métodos descritos acima. Isto deverá incluir
visitas no verão (especialmente nas áreas montanhosas), outono (período de
máxima riqueza e diversidade em muitos locais na região centro-sul do Brasil),
fim do inverno (quando a maior parte das espécies atraídas a armadilhas de
frutas atinge seu máximo) e início das chuvas (quando boa parte das maripo­
sas aparece). Tendo esta lista disponível, o trabalho de identificação e registro
de espécies torna-se muito mais fácil e eficiente.

Para os censos, a amostragem de borboletas, em geral, envolve a localização,


atração, observação, identificação e quantificação, do maior número possível
de borboletas no período de trabalho diurno. Além da utilização dos métodos
descritos acima, o reconhecimento dos principais ambientes a serem amostra­
dos e a identificação dos principais recursos de adultos e larvas é indispensá­
vel para uma maior eficiência do trabalho. Isto inclui a investigação em clareiras,
riachos e praias (Fig. lh ), arbustos em flor tanto dentro como fora da mata (Fig.
li), frutos em decomposição e bolsões de Ithomiinae (Ebert 1969; Brown 1972;
Clench 1980; Brown & Hutchings 1997). Armadilhas e iscas devem ser posicio­
nadas antes do início dos censos (geralmente na tarde anterior ou cedo de ma­
nhã). Os principais ambientes e caminhos são continuamente visitados ao longo
do dia com intensivos censos visuais (de preferência com auxílio de binóculos),
enquanto armadilhas e iscas são visitadas em períodos variados do dia e da
noite. Para uma maximização dos censos, um observador deve se mover por
uma área de 100-1000 ha, cobrindo diferentes ambientes e recursos, enquanto
dois ou mais observadores complementam os esforços, cobrindo mais intensi­
vamente alguns setores em separado. Nos locais mais ricos, o trabalho pode
continuar até que nenhuma espécie adicional seja registrada por 5-10 minutos.

Ainda que a identificação de todos os indivíduos observados seja virtualmen­


te impossível (principalmente nas famílias Lycaenidae e Hesperiidae), a coleta

12 9
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

deve ser restrita ao mínimo possível (usualmente menos de 5% das espécies


registradas por observadores com muita pratica). Em espécies raras ou ameaça­
das, o manuseio deve ser limitado a poucos machos. Ainda que as listas diá­
rias possam ser usadas para comparações, o melhor é acumular um total de 12
a 14 horas/pessoa (num’ período máximo de uma semana). Com esse número
de horas, até 50% das espécies presentes na comunidade no período estudado
podem ser amostradas (Brown & Freitas 2000b).

Amostras padronizadas e censos parciais


Uma alternativa para comparação de áreas é a utilização de métodos padroni­
zados com relação ao esforço e eficiência. Ainda que iscas possam ser usadas
para estç fim, armadilhas são muito mais confiáveis, uma vez que a maior
parte dos indivíduos que chegam fica retida no local. Um dos aspectos negati­
vos desse método e que apenas uma parte da comunidade é amostrada. Por
outro lado, existe a possibilidade de que o número, posição e tamanho das
armadilhas, tipo e quantidade de isca e esforço de coleta (em horas) sejam
padronizados. Além disso, a eficiência da captura é independente da prática
ou condição física do pesquisador. Desse modo, análises que levem em conta
o número de indivíduos por espécie em cada área, o que inclui índices de
diversidade e diversas análises de similaridade, são muito mais confiáveis.

Censos que resultem em amostragem de um ou poucos subgrupos de um gru­


po taxonômico mais amplo serão aqui chamados de “censos parciais”. A ideia
dos censos parciais é que um subgrupo facilmente amostrado possa fornecer
uma estimativa da riqueza total de uma área, dessa forma diminuindo o esfor­
ço amostrai e permitindo que mais áreas sejam amostradas em menos tempo.
Por exemplo, em ambientes neotropicais, os Nymphalidae, geralmente muito
comuns e facilmente reconhecíveis, perfazem de 25 a 29% do total da comuni­
dade de borboletas de uma dada área; à riqueza total de borboletas, então,
pode ser obtida multiplicando-se pela amplitude correspondente (pòr exem­
plo, 3,4 a 4,0) o total de Nymphalidae amostrados (Brown & Freitas 2000b). Os
Ithomiinae também foram propostos como um bom subgrupo preditor da co­
munidade to'tal (Beccaloni & Gaston 1994), perfazendo 4,3 a 4,6% do total de
borboletas em um dado local. De fato, os Ithomiinae variam muito, e apenas na

Mata Atlântica variam de 2% do total (em Joinville, SC) a mais de 6 % (Santa
Teresa, ES) (Brown & Freitas 2000a, b), com extremos de menos de 2% (em
ambientes periféricos mais secos) a mais de 8 % (nas encostas orientais dos
Andes, Brown 1996b, 1997a, b). Sendo assim, o uso de subgrupos como pre-

130
( * 1
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

ditores da comunidade total deve ser visto com cautela em estudos de comuni­
dades de borboletas.

Formigas
As formigas são insetos sociais da fam ília Formicidae (Hymenoptera). No
Brasil são encontradas representantes de 8 subfam ílias (Cerapachyinae,
D olichod erinae, E citon in ae, Form icinae, L ep tan illoid in ae, M yrm icinae,
Ponexinae e Pseudomyrmecinae). Muitas formigas apresentam hábitos oportu­
nistas e dieta generalista e a maioria das espécies apresenta distribuições res­
tritas (Brandão 1999). Formigas ocorrem em todos os ambientes terrestres, des­
de o Equador até latitudes de cerca de 50°, e desde o nível do mar até altitudes
de cerca de 3 mil metros, e são importantes por manterem relações ecológicas
com muitos organismos. Muitas espécies criam homópteros, outras predam
artrópodes, outras dispersam sementes, alguns Attini criam fungos e, em ge­
ral, formigas são os primeiros animais invertebrados a visitar outros animais
mortos no solo (Hõlldobler & Wilson 1990).

A sistemática ainda está sendo trabalhada, mas bibliografia sobre taxonomia


(Ward et al. 1996; Bolton 1995) e chaves ilustradas para a identificação de
gêneros do mundo inteiro (Bolton 1994) dão subsídios importantes aos pes­
quisadores iniciantes. Adicionalmente, o Museu Americano de História Natu­
ral mantém um sítio (http://research.amnh.org/eijtomology/social_insects) com
muitas informações preciosas sobre insetos sociais (incluindo foAnigas) e
sugestões de padronização em inventários quantitativos, para permitir melho­
res comparações entre diferentes estudos em localidades diversas.

As formigas vêm sendo consideradas um dos principais componentes biológi­


cos de ambientes estruturalmente complexos como as florestas (Fittkau & Klinge
1973). Muitas espécies ocorrem no solo, cuja biota é organizada, tanto estrutu­
ral quanto funcionalmente, em microcomunidades específicas (Dindal 1990).
Essas comunidades podem ser modificadas tanto naturalmente quanto pelas
atividades humanas, sendo que o grau de mudança depende da natureza do
impacto, sua intensidade e duração (Rao et ah 2001). O manejo inadequado
dos solos agrícolas, por exemplo, faz com que a mesofauna, da qual as formi­
gas fazem parte, desapareça quase por completo (Primavesi 1994).

O número e a composição dos organismos do solo e sua função refletem o


caráter pedogênicO, padrões de sucessão da vegetação e eventuais perturba­
ções em um dado local. No entanto, um dos problemas encontrados no estudo
da fauna do solo é a barreira taxonômica, pois muitos dos grupos de organis-

131
ANDRÉ VICTQR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

mos mais importantes no solo têm taxonomia pouco conhecida, principal­


mente nas regiões tropicais. Formigas, por serem de- fácil amostragem e de
identificação, são especialmente úteis para esse tipo de trabalho, principal­
mente se existe ênfase no seu uso como indicadores ambientais (Andersen
1997; King et al. 1998).
A diversidade local de formigas tem sido correlacionada com a complexidade
da vegetação, clima, disponibilidade de recursos e interações interespecificas
(Greenslade & Greenslade 1971; Andersen 1986a, b; Davidson 1977; Levings
& Franks 1982; Levings 1983; Majer et al. 1997; Vasconcelos 1998; Silva 1999;
Dansa & Rocha 1992). Por isso, a família Formicidae pode ser considerada um
dos melhores grupos de invertebrados para avaliação e monitoramento ambien­
tal (Moraes & Benson 1988; Brown 1991, 1996, 1997, Andersen 1997; Silvestre
& Brandão 1999; Moutinho 1991; Matos et al. 1994; Andersen 1995; Verhaagh
1991), considerados por Folgarait (1998) como “engenheiros do .ecossistema”
pelas suas múltiplas atividades de transformação.

Para estudos de comunidades, o uso de iscas tem facilitado muito a amostragem


dessa taxocenose (Benson & Brandão 1987; Benson & Harada 1988; Romero &
Jaffé 1989; Caldas & Moutinho 1993; Castro & Queiroz 1987, Leal et al. 1993;
Leal & Lopes 1992; Andrade Neto 1987; Menezes 1998; Silvestre 1995), princi­
palmente se combinadas com coletas de amostras de solo, com armadilhas ,de
queda e amostragens aleatórias no solo e/ou folhiço e na vegetação (Agosti 1997).

Andersen (1997) alerta para o problema da escala amostrai quando se usam


formigas como bioindicadores, pois os processos ecológicos são nitidamente
dependentes de escala e os dados obtidos numa escala geralmente não podem
ser facilmente transportados para outra. Segundo ele, a biologia da conserva­
ção tem o problema de ter uma lacuna na congruência entre as escalas espaciais
da pesquisa ecológica, envolvendo tipicamente pequenas amostras, e o manejo
que envolve tipicamente grandes áreas.

Protocolo de campo e principais métodos de captura


A “grade amostrai” consiste em 20 pontos amostrais dispostos em uma grade
num transecto aproximadamente linear e tem como intuito facilitar e otimizar
o trabalho de inventário de formigas em uma dada área. A direção do transecto
deve ser escolhida para incluir o maior número de hábitats diferentes de for­
migas, ou seja, a maior diversidade estrutural e vegetacional (uma vez que luz,
temperatura, umidade e o acúmulo de folhas parecem ser fatores importantes
na distribuição da abundância de formigas em uma determinada área) (Francini,

132
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

in prep.). Antes da escolha do transecto, uma inspeção na área deverá ser feita
para verificar qual o lugar mais adequado. Para facilitar o trabalho, uma linha
marcada a cada dez metros, presa ao solo por espeques, deverá ser usada como
referencial. É importante que a vegetação do local seja pisoteada o mínimo
possível, pois isso irá interferir na qualidade dos dados obtidos. Ao longo da’
linha, as seguintes técnicas de coleta pontual devem ser aplicadas nos pontos
previamente marcados:
1 - Metro quadrado de folhiço peneirado, para ser extraído no “Extrator de
Winkler” [em cada ponto alternado = 10 amostras]

2 - Armadilha de queda [em cada ponto = 20 amostras]

3 - Amostra de solo de 15 X 15 cm em camadas de 1 cm até 10 cm de profun­


didade [em cada ponto alternado = 10 amostras]

4 - Iscas de solo e vegetação, usando sardinha e/ou carboidrato [em cada ponto
= 20 amostras]
Adicionalmente, após as coletas padronizadas, devem ser feitos o desmonte
de pelo menos um tronco podre, além de coleta por procura ativa (aleatoria­
mente e/ou usando rede de bateção) por uma hora durante o dia e uma hora à
noite. Por razões comparativas, o metro quadrado de folhiço e as armadilhas
de atração devem ser padronizados, considerando que as outras técnicas serão
incluídas para acrescentar um número adicional de espécies.

As anotações de campo deverão incluir os seguintes dados: data da coleta;


caracterização geral do hábitat na data da coleta; micro-hábitat no ponto amos­
trai; tipo e densidade do folhiço; presença de raízes; umidade do solo e do
folhiçb; inclinação do terreno e exposição dos locais. Adicionalmente poderão
ser feitas fotografias do dossel, com objetiva de 180° (Anderson 1964a, 1964b,
1964c, 1970; Burger 1972, 1976; Becker et al. 1989; Barrie et al. 1980) que
fornecerão informações preciosas relacionadas ao microclima de cada um dos
20 pontos de coleta.

A etiquetagem adequada de todos os frascos e amostras é de extrema importân­


cia, sendo que a maior parte poderá ser feita antes da ida ao campo. Os sacos
para o folhiço peneirado, assim como os de solo, devem ser marcados com
números grandes, correspondentes aos pontos na linha de amostragem; o
mesmo vale para ós frascos de coleta de material das armadilhas de atração e
de queda. Além disso, todos os frascos (incluindo os de coleta manual aleató­
ria) deverão incluir uma etiqueta interna com toda a informação respectiva. Para
preservação dos exemplares, o melhor líquido de preservação é o etanol 90%.

133
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

Aniostras de folhiço [protocolo adaptado de Agosti (1997)]


A amostra de um metro quadrado deve ser retirada com o auxílio de um gaba­
rito quadrado desmontável (pode ser feito de cordão de náilon colorido e pre­
so nos quatro vértices por espeques de arame fino, como varetas de guarda-
chuva, ou por espetos de bambu) para delimitação da área (Fig. 2a, b). A coleta
deve ser feita próxima à linha base da grade amostrai (por exemplo, a linha do
lado esquerdo deve ficar a aproximadamente 1 m da linha base).

Para evitar uma grande evasão dos organismos do folhiço, a coleta da massa de
folhas do quadrado amostrai deve ser feita das partes externas para o centro e
colocada no saco-peneirador o mais rápido possível (Fig. 2c, d). Por razões de
conveniência e para não interferir muito qom o material peneirado, o saco-
peneirador (“Siftei■”) deve ser longo (120 cm), de forma que o material coletado
fique apoiado no solo, enquanto o resto do material está sendo peneirado. Um
bom peneirador pode ser feito com um balde plástico (aprox. 40 cm de diâme­
tro) com o fundo cortado (Fig. 3). O fundo deve ter uma rede de fios de náilon
monofilamento grosso espaçados em 20 mm (inseridos em orifícios feitos com
prego aquecido), e um saco de pano deve ser preso externamente ao fundo do
balde (a conexão com o balde deverá ser de tecido forte, como lonita, e o final,
de tecido fino, como tela de náilon). O saco de pano deve ter uma extremidade
afilada de uns 20 cm de diâmetro, de forma a concentrar o material peneirado,
e possibilitando o fechamento com um nó, impedindo que o saco seja inadver­
tidamente aberto durante o processo de peneiragem.

A peneiragem deve ser efetuada perto do lugar de onde o material está sendo
coletado, minimizando assim o escape de muitas das formigas que simples­
mente caem. O peneirador deve ser agitado logo que estiver cheio até a metade.
Não há nenhuma maneira padrão de agitar o peneirador, mas ela deve ser feita
com movimentos laterais e verticais. Observe o conteúdo e certifique-se de que
todo o material tenha sido girado ao redor diversas vezes. Em condições secas,
a peneiragem não deve ser prolongada, pois a maioria das formigas cai para o
saco quase imediatamente, e a agitação prolongada adiciona mais restos que
podem dificultar a extração. Em circunstâncias úmidas, a peneiragem deve ser
mais prolongada, pois muitas formigas que aderem às folhas molhadas demo­
ram mais, a cair, no entanto, o folhiço não deve ser coletado se estiver muito
molhado, com gotas de água visíveis.

Durante todo o processo de peneiragem, é desejável que a parte mais inferior


do saco descanse sobre o solo (principalmente em locais muito úmidos, onde
o material peneirado tende a formar uma massa compacta), diminuindo a

1 34
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

Figura 2.A. Sequência de coleta de folhiço para separação nos extratores de Winkler; A,
B. Demarcação do metro quadrado; C, D. Junção do folhiço no centro da área demarca­
da (com auxílio de luvas); E, F. Colocação do folhiço no peneirador; G. raspagem da
superfície; H. saco de pano que recebe o folhiço peneirado.

135
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

iE_ f.-):.:::

B ald e V 7
Plástico jfjpK
L------------
r 1
. Tela de nylon
* J» P de 10 mm

. Tubo de
r lonlta
'

Saco de
k p a n o p ara
' a amostra
peneirada

Figura 3. Esquema de um peneirador

movimentação do material já peneirado (por essa razão a peneiragem deve ser


feita de pé). Após cada sessão de agitação, os resíduos de folhas restantes
devem ser jogados fora antes de se adicionar mais material. Depois de termi­
nada a peneiragem do metro quadrado, o saco do peneirador deve ser torcido
duas vezes, para que não aconteça nenhum escape dos animais através da
extremidade superior enquanto se enche o saco de amostras com mais mate­
rial. Na passagem do material para o saco de amostras, o conteúdo deve ser
derramado com cuidado para evitar alta atividade das formigas. O saco de amos­
tras deve ser de pano resistente (morim ou tecido branco de tapeçaria) suficien­
temente grande para conter uma amostra de cada vez (um saco de 30 x 60. cm
pode receber até 3 kg de folhiço peneirado) e deve ser identificado por letras ou
números grandes. Após a conclusão, uma observação rápida no saco de amostra
serve como verificação da atividade das formigas e da consistência da massa de
folhas, ajudando quanto ao cuidado no transporte dos sacos para a base. O
fechamento do saco de amostra pode ser feito com um nó com o próprio pano
do saco, mas um barbante fino amarrado acima do nó ajuda lacrar o conteúdo.

Com a rotulagem prévia dos sacos (de acordo com o número de amostras a ser
coletadas) os problemas resultantes da rotulagem no campo são minimizados.

136
INSETOS COMO INDÍCADORES AMBIENTAIS

A maneira mais conveniente de rotulagem dos sacos de amostra consiste em


( 1 ) uma marca externa grande e visível no próprio pano, e (2 ) uma etiqueta
plástica no interior do saco, com a mesma informação do rótulo externo. Os
sacos devem ser mantidos à sombra e, durante o transporte, em veículo moto­
rizado devem ser tomados cuidados para evitar o contato das amostras com
partes quentes, pois o calor pode matar rapidamente os animais da amostra.

Coleta de solo
As amostras de solo deverão ser coletadas no mesmo quadrado onde o folhiço
foi coletado, em uma área de 10 x 10 cm no canto esquerdo inferior (este
método é recomendado para coleta de formigas de solo que forrageiam no fo-
lhiço). Para isso, cinco camadas de solo de 2 cm de profundidade devem ser
retiradas até uma profundidade de'10 cm. Cada camada deve ser colocada
num saco individual e todós os 5 sacos de solo deverão ser colocados em um
único saco.

Armadilhas de queda (“p itfa ll-t r a p ”)


Estas armadilhas devem ser colocadas na grade a 1 metro à direita da linha
base, e enterradas de modo que a margem superior da armadilha esteja no
nível do solo e seja coberta com um pouco de folhiço. Erascos de polietileno
de 30 x 45 mm com tampa de pressão de forma indelével devem ser numera­
dos (de 1 a 20) e podem ser usados como armadilhas de queda. Cada frasco
deve ser preenchido até um terço com uma solução de etilenoglicol: etanol
92%: formol 40% na proporção de 70:28:2, e com duas'gotas de detergente
caseiro por litro de solução. As armadilhas devem permanecer no campo por
aproximadamente 24 horas. Após^este período, os frascos devem ser coletados
em sequência, tampados e colocados em um único saco plástico para posterior
separação e identificação em laboratório.

Iscas de solo com sardinha e carboidrato


As iscas devem ser colocadas na grade amostrai! a 2 metros à esquerda da linha
base. Cada isca deve sér preparada em pedaços de guardanapos de papel claro
(10 x 10 cm), pois isso permite uma melhor visualização na hora da coleta.
Para facilitar o trabalho no campo podem ser usadas bisnagas plásticas com as
substâncias atrativas (óleo comestível retirado de uma lata de sardinha e solu­
ção saturada de açúcar de cana são as mais adequadas), o que facilita a aplica­
ção nos pedaços de papel. Essas iscas atraem quase todas as formigas de solo

137
ANDRÉ VICTOR LUCCI ÍREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

(mas não atraem as especialistas em certos itens alimentares e as cortadeiras por


exemplo), até Ponerinae grandes como espécies de Pachycondila, Dinoponera,
O dontom achus e P arapon era. As iscas devem ser coletadas após 1 hora (se
deixadas mais tempo podem resultar em dominância total de algumas espécies
de formigas com bom recrutamento, como Pheidole, Cam ponotus e Solenopsis).
A coleta das iscas deve ser feita com uma luva (pode ser com um saco plástico
de 15 x 30 cm envolvendo a mão e contendo externamente uma bola de algo­
dão umedecida com acetato de etila). Após a retirada da isca, o próprio saco
plástico evertido envolve a isca, servindo de depósito do material coletado. No
momento da coleta, algumas das folhas sob a isca devem ser pegas junto com a
isca (algumas espécies de formigas de folhiço são atraídas pelo óleo que impreg­
na o papel por baixo no contato com o solo). Uma outra maneira de coleta é a
triagem no campo, sobre uma bandeja plástica branca. Toda a isca com o folhiço
é jogada na bandeja, e os indivíduos de cada espécie são coletados à medida que
aparecem. Repetições óbvias de exemplares poderão ser desprezadas, já que o
número de indivíduos por amostra não será importante. Todo o material de cada
armadilha deve ser colocado em frascos individuais com etanol 90%.

Procura manual aleatória incluindo coleta com “rede de bateção”


A coleta manual aleatória pode ser feita ao longo de todo o período de estudo,
mas é recomendável um mínimo de uma hora durante o dia e uma hora duran­
te a noite. Essa técnica de coleta é a mais subjetiva, e embora não sirva para
fins comparativos, geralmente adiciona espécies que são pouco coletadas Com
as técnicas mencionadas anteriormente, como aquelas que fazem ninhos em
pequenos galhos suspensos acima do solo. A coleta noturna é recomendada
porque muitas espécies de formigas são principalmente ou exclusivamente
ativas durante a noite. A coleta aleatória pode ser feita com pinças (exemplares
maiores) ou com pincel de pelo de marta, embebido no etanol (espécies meno­
res, que .podem ser esmagadas com a pinça). Algumas espécies muito ativas e
rápidas podem ser atordoadas com jatos de etanol (em bisnaga plástica tipo de
desodorante), e depois coletadas com pinça ou pincel. Na coleta noturna é
indispensável o uso de lanternas de testa, deixando as mãos livres para o
manuseio do material. Por razões de segurança, botas de borracha de cano alto.
camisas grossas de manga comprida e bonés devem ser usados em trabalho de
campo durante a noite.

Plantas mirmecófitas também serão procuradas ativamente (dentro e fora da


área da grade amostrai) e poderão ser identificadas pelas suas domácias (câma-

138
)
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

ras onde as formigas fazem seus ninhos) ou pela presença conspícua de formi­
gas em suas partes vegetativas (Janzen 1966, 1967, 1969; Bentley 1977; Benson
1985; Davidson et al. 1989; Fonseca 1991, 1996, 1999). Para cada espécie de
mirmecófita reconhecida, as formigas envolvidas na relação serão coletadas e
colocadas em frascos individualizados por planta. Os exemplares de cada ni­
nho devem ser mantidos em frascos separados, mas animais ávulsos podem
todos ser postos em um único frasco.
0

Na coleta com rede de bateção, mais adequada em vegetação herbácea e/ou


arbustiva, pode ser usada uma rede de 30 çm de diâmetro e 60 cm de profun­
didade (tipo “puçá”), feita de tecido grosso. A bateção será feita ao longo de
um transecto linear, com velocidade constante, dos dois lados do transecto,
atingindo todas as folhas de plantas situadas entre 0,5 e 1,5 m de altura do
solo. Ao fim de cada transecto, o conteúdo da rede deve ser despejado em
sacos plásticos com anestésico (acetato de etila) ou etanol.

Gravetos e troncos podres


Troncos podres contêm frequentemente uma fauna diferente, que geralmente
não é achada no folhiço ou no solo, e pouco atraída pelas iscas. Ninhos de
muitas espécies de formigas pequenas e de pequena capacidade de dispersão
(como as espécies de Myrmicinae da tribo Dacetini), ou espécies especialis­
tas em cupins e tatuzinhos (diversos Ponerinae, como espécies do gênero
Leptogenis) podem ser encontradas ao se quebrar pedaços de gravetos e galhos
ocos caídos no solo ou em troncos podres. A quebra de gravetos é simples e
deve ser feita sobre uma bandeja branca, o que facilita a visualização das formi­
gas que caem ao se quebrar o graveto. Para o desmonte de troncos, deve ser
usada uma faca de campo de lâmina não flexível. Os pedaços retirados são
pulverizados sobre uma bandeja plástica branca (com o mesmo fim descrito
anteriormente). O material coletado no tronco e/ou graveto, com operárias e
soldados avulsos deverá ser armazenado em um único, frasco, mas ninhos
individuais devem ser separados em frascos individualizados.

Extração do material das amostras de folhiço (extrator de W inkler)


O “Extrator de W in k lef’ (íig. 4) é um dos melhores métodos de obtenção de
animais de folhiço (Besuchet et al. 1987), sendo muito ma'is eficiente que o
tradicional “Funil de Berlese”. Basicamente, o Extrator de W inkler é formado
por uma caixa externa de madeira e pano, e por um saco interno de malha
larga (onde o folhiço é depositado), que fica suspenso no interior. A caixa

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ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI . / J
KEITH S. BROWN JR

externa pode ser feita com duas armações quadradas ou retangulares (do tipo
moldura de madeira) distantes cerca de 50 cm (a profundidade do corpo do
W inkler). As dimensões da caixa externa podem variar (por exemplo, 2 5 x 25
cm ou 28 x 23 cm), mas de maneira geral quanto maior o extrator menos tempo
será necessário para o processo de extração. Por outrdlado, extratores maiores
demandam mais material, pesam mais e ocupam mais espaço, qualidades que
podem ser proibitivas em viagens longas. O corpo do extrator consistirá num
saco cilíndrico feito de pano fino com 100 cm de comprimento com as duas
bocas de 100 cm de diâmetro abertas e com uma largura que seja compatível
com o perímetro da armação de madeira escolhida (100 cm no caso de uma
armação quadrada de 25 cm de lado). Na montagem, o saco envolvendo a
armação é preso com “tachinhas” em vários pontos das armações, de forma
que o conjunto fique rígido. Na armação superior existirão pregos que servirão
de suporte para um saco interno de pano, que conterá a amostra. O saco inter­
no com a amostra a ser extraída é dependurado no meio e deve ter uns 2 cm a
menos que o saco externo, de forma a não tocar suas paredes. Esse saco deverá
ser feito do mesmo material do corpo do extrator e deverá ter uma rede com
malha de 1 cm que permita a passagem das formigas maiores. O folhiço deve
ser colocado aos poucos dentro do saco interno e sobre o próprio saco da
amostra de campo (de forma que, se algum animal escapar, irá voltar ao saco
original) ou sobre uma bandeja branca ou um quadrado de plástico branco
(cerda de lm x lm ).
Mantenha os sacos de amostras prontos e os frascos com álcool, rotulados,
além de pinças e pincéis à mão para a coleta das formigas em fuga. O material
a ser extraído deve ser acomodado de forma a evitar a formação de espaços

Figura 4. A) Detalhe do extrator de Winkler; B) Copo receptor

140
INSETOS COMO INÒICADORES AMBIENTAIS

vazios dentro dele. Se houver material em quantidade suficiente, é melhoi;


preencher esse saco o mais completamente possível, pois as formigas tendem
a andar para o topo e depois cair. Os sacos internos com as amostras devem
ser colocados de forma rápida no extrator, evitando-se bater ou tocar as pare­
des da caixa externa. O saco interno deve pender livre, sem tocar nenhuma
das paredes da caixa externa. Quaisquer resíduos caídos sobre o plástico bran­
co devem ser recolocados no saco de extração. Antes de colocar qualquer ma­
terial no saco de extração, um recipiente vazio de coleta (copo receptor) tem
que estar colocado na saída do extrator, e um frasco com fixador tem que estar
disponível para coleta das formigas perdidas durante o processo de transfe­
rência para o extrator. Depois de completada a operação, etanol (90%) deve ser
adicionado ao copo receptor, que fica na parte de baixo do extrator (uma opção
boa é esperar para adicionar o etanol apenas após ter o extrator pendurado, pois
muito detrito pode cair na amostra durante o processo). A boca superior do
extrator deve ser fechada com barbante, evitando eventuais escapes de animais.

Durante todo o processo de retirada, os extratores de W inkler devem ser


pendurados apoiados em uma parede de alvenaria ou madeira, ou encosta­
dos em uma parede feita de plástico, de forma que fiquem estáveis, evitando
a queda de terra e folhiço no copo receptor. Devem ser evitados locais onde
exista incidência direta de sol (causa morte rápida dos animais) ou vento
forte (interfere no comportamento dos animais e deixa cair muito detrito no
copo receptor). A cada dia, o material acumulado no recipiente de coleta com
etanol deve ser passado pára um frasco etiquetado. E recomendado que se
verifiquem as paredes internas do saco de Winkler, com a boca sobre uma
bandeja, pois frequentemente as formigas ficam paradas ou escondidas, cain­
do no último minuto. Se há tempo disponível, vale a pena^ dar uma olhada
no folhiço que esteja sendo descartado, pois algumas formigas maiores ten­
dem a não cair.

Triagem do material
Em todos os métodos descritos, a triagem preliminar do material pode ser feita
mesmo sem lupas, na volta do campo para a base. Todos os frascos ou amos­
tras devem ser abertos individualmente'e todo seu conteúdo colocado numa
placa de Petrí. Antes da triagem inicial, o material deve ser lavado em acetona
(para retirada da gordura no caso de iscas de sardinha) e só depois feita a
separação das morfoespécies de formigas. A triagem inicial exige a separação
das formigas dos outros organismos. Todo material coletado deve ser colocado
em um frasco rotulado com o mesmo número da amostra de campo.

141
'ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

Identificação
É preciso algum treino básico para fazer a separação das formigas nas amos­
tras, o que deverá ser feito em laboratório, com auxílio de microscópio( ou
lupa. É possível usar cor, tamanho e algumas características morfológicas bási­
cas para separar a maioria dos táxons, e com a prática algumas espécies maio­
res podem ser reconhecidas de imediato nas amostras. O primeiro passo é
sepárar as formigas em subfamílias sendo aconselhável, porém, aprender o
mais cedo possível a separar as amostras em gêneros. Com um pouco mais de
treino, cada um dos gêneros poderá ser dividido em morfoespécies. É reco­
mendável a montagem de pelo menos três exemplares de cada espécie, ou até
mais em casos duvidosos. Ao término do processo de triagem, todas as formi­
gas não montadas da amostra devem ser reunidas de volta no frasco original.
Das séries de ninhos, uma série com fêmeas, operárias e eventuais machos
disponíveis deverá também ser montada.

O modo mais rápido e bastante fidedigno para identificar os espécimes monta­


dos é fazer uma coleção completa com todas as amostras do transecto. Isto pode
ser feito sem qualquer conhecimento taxonômico das amostras, e foi demonstra­
do ser um método muito eficiente no caso de diversos grupos animais, especial­
mente formigas (Oliver & Beattie 1996; Pik et al. 1999). Dessa forma, a coleção
estará organizada em espécies de A a Z, para cada gênero, normalmente com
algum espécime de identidade genérica incerta. Nesse ponto, todas as amostras
podem ser identificadas usando-se nomes preliminares como, por exemplo, “sp.
A do gênero X ”, e assim a análise dos dados do trabalho pode ser iniciada. No
entanto, para comparações entre locais e experimentos diferentes e com dados
publicados, é necessário que as morfoespécies tenham nomes, e isso deverá ser
feito pela consulta a especialistas e/ou coleções.

Análise dos dados


Processamento dos dados e programas de computador disponíveis
Existe vasta literatura sobre métodos em ecologia (veja Magurran 1988; Krebs
1989, Southwood 1978), e muitos programas de computador para as mais
variadas análises. Para o sistema operacional DOS rodando em PCs existem
vários programas em BASIC fornecidos (e listados) no livro de Ludwig &
Reynolds (1988) e no livro de Brower & Zar (1984). Para o sistema operacional
Windows rodando em PCs éxistem o Estimâtes v. 5.0.1 (Cowell 1997) e o
pacote ADE-4 (Thioulouse et àl. 1996, 1997), ambos gratuitos e disponíveis

142
INSETCJS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

via WEB. O pacote ADE-4 é mais completo e dispõe de farta documentação,


parte em inglês e parte em francês. O programa Diversity (Site da Pisces
Conservation hhttp://www.irchouse.demon.co.uk) é um programa comercial
que também faz análises de diversidade. Usar esses programas implica o co­
nhecimento dos algoritmos e aconselhamos que o usuário sempre faça testes
usando matrizes de tamanhos variáveis com resultados conhecidos. E sempre
bom lembrar que é importante que todas as estimativas feitas tenham uma
medida do seu erro para que possam ser comparadas.

M atrizes co m u n itá rias


Embora sejam' muitas vezes de tamanho considerável, as matrizes com unitá­
rias dão informações preciosas ao leitor e permitem que, no futuro, os mes­
mos dados possam ser analisados de maneira diferente. Elas constam basica­
mente de uma tabela com a frequência de cada espécie nas linhas e de cada
amostra nas colunas.

C urvas d e a c u m u la ç ã o d e e s p é c ie s , cu rvas d e W h itta k er e a ju ste a


d istrib u içõ es e s ta tís tic a s
A construção de uma curva de acumulação de espécies é uma atividade im­
prescindível sempre que as amostragens forem padronizadas. O gráfico resul­
tante deve ter o número de amostras no eixo x e o número cumulativo de
espécies no eixo y. As curvas resultantes, que são geralmente logarítmicas,
podem ser “linearizadas” mudando as escalas dos dois eixos de linear para
logarítmica ou trabalhando diretamente com os logs dos números de amostras
e. dos números cumulativos de espécies. A forma que esta curva adquirir dará
uma boa indicação do ponto a que o processo de amostragem está chegando,
ou seja, se está incluindo todas as espécies ou não. Métodos mais sofistica­
dos, através do uso da técnica “ja c k n ife ”, aleatorizações por “bootstrap", cur­
vas de rarefação (consultar A. J. Santos, neste volume) (Magurran 1988; Krebs
1989) também são informativos e têm se tornado cada vez mais rotineiros nes­
se tipo de análise. A comparação, afravés de testes de aderência, da distribui­
ção observada das frequências dos indivíduos de cada espécie com a que seria
esperada para uma dada distribuição estatística (geométrica, log-normal, log-
normal truncada, “brocken -stick”) também é recomendável. Desde que certas
premissas tenham sido obedecidas, no caso do ajuste à distribuição log-nor-
mal truncada ser bom, o parâmetro [sT] (espécies raras ainda não coletadas
nas amostragens) pode ser usado para estimar o número de espécies ainda não
amostradas na comunidade em estudo.

143
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

índices de diversidade
Usar um índice de diversidade é algo- simples e objetivo, permitindo uma
rápida comparação das comunidades e/ou taxocenoses de diferentes áreas.
Ainda que esses índices não permitam a avaliação da semelhança entre as dis­
tintas áreas (embora usados em algumas análises de similaridade, ver na próxi­
ma seção), são bons indicadores de semelhança de estrutura comunitária.

Devido às características dos métodos de amostragem empregados com for­


migas, índices de diversidade são especialmente úteis e amplamente utiliza­
dos em estudos deste grupo de insetos (Benson & Brandão 1987; Benson &
Harada 1988; Caldas & Moutinho 1993; Leal & Lopes 1992^Leal et al. 1993;
Castro & Queiroz 1987; Moutinho 1991; Silvestre 1995; Menezes 1998; Silva
1999). Com borboletas, existem lim itações no emprego dos índices, devido à
dificuldade da obtenção da abundância de cada espécie nas comunidades
em estudo.

ín d ic e s d e d iv e r s id a d e a lfa
Um índice de diversidade alfa é um número que dá, de forma muito sintética,
uma indicação da riqueza e da frequência de cada espécie numa comunidade.
A escolha do índice depende dos objetivos do trabalho, da bagagem de conhe­
cimento teórico do pesquisador e dos recursos computacionais disponíveis
(veja também Peet 1974 e revisão de Magurran 1988).

ín d ic e s d e d iv e r s id a d e b e t a (sim ila rid a d e)


A diversidade beta mede o quanto diferentes hábitats são similares (ou dife­
rentes). Uma das abordagens mais comuns é a de verificar como a diversidade
alfa varia ao longo de um gradiente (Wilson & Mohler 1983). Uma outra manei­
ra é comparar a composição em espécies de diferentes comunidades. Quanto
menor for o número de espécies comuns (compartilhadas) entre duas ou mais
comunidadçs, maior será a diversidade beta. Enquanto a diversidade alfa é
uma característica de uma única comunidade, a diversidade beta é uma caracte­
rística de um conjunto delas. A diversidade beta, que também é representada
por um único número, é usada para descobrir o nível de heterogeneidade
existente entre amostras coletadas ao longo de um suposto gradiente. Dos vários
índices existentes, o de Whittaker (Whittaker 1960) parece ser o mais consis­
tente (veja revisão de Wilson & Shmida 1984).

Análises de similaridade também são úteis na comparação direta das faunas


de diferentes locais. Como os índices levam em conta espécies em comum

144
INSETOS COMO INDICADORES AMBIENTAIS

entre as diferentes amostras, eles são um indicativo direto de semelhança fau-


nística entre diferentes áreas. Vários índices são empregados para essas análi­
ses, tendo uma aplicação bastante ampla em relação à natureza das amostras;
são especialmente úteis quando os dados fornecem apenas presença ou ausên­
cia de determinada espécie em uma área. Por exemplo, em estudos comparati­
vos de listas de borboletas (Brown & Freitas 2000a, b), onde o único dado
possível de ser analisado é a presença das espécies em cada área, análises
simples de similaridade (sem levar em conta o número de indivíduos por
espécie) estão entre os poucos métodos que podem ser usados. Um dos índi­
ces mais simples e mais usados é o de Ja cca rd . Outros índices, como o Mori-
sita, levam em conta a proporção entre espécies e podem ser usados na maioria
i
dos estudos com formigas (em que o conjunto de amostras de um transecto
padrão fornece dados quantitativos para cada espécie presente), e em estudos
padronizados com armadilhas de borboletas. Além da utilidade na compara­
ção de diferentes áreas, os índices de similaridade podem ser usados para
comparação entre diferentes estações do ano e até entre diferentes amostras,
nestes casos fornecendo resultados que permitem detectar à reposição faunís-
tica e a variação na estrutura das comunidades de uma determinada área.

As opções de representação gráfica para uma matriz de similaridade são muito


variadas, ainda que dendrogramas sejam mais comumente utilizados. A opção
do método de agrupamento das amostras a ser utilizado depende da esco­
lha do pesquisador e traz muita subjetividade na interpretação dos dados
(Ludwig & Reinolds 1988).

Buscando relações entre dados de fauna e características ambientais


Os procedimentos descritos acima apenas consideram os dados provenientes
dos inventários ou censos e, ainda que bastante úteis, não mostram de que
maneira os diferentes grupos de borboletas respondem a diferentes fatores
ambientais. No entanto, a busca de relações entre as características ambientais
e os organismos inventariados é de vital importância nos estudos de conserva­
ção e monitoramento ambiental.
Se, de um lado temos o número de espécies e a sua presença ou ausência nas
diferentes amostras, por outro, diversos fatores ambientais podem ser avalia­
dos. Como exemplo podem ser utilizados desde fatores objetivos, relativa-
mehfe fáceis de ser obtidos (como temperatura média anual, variação de tem­
peratura, altitude média, pluviosidade e número de meses secos), até índices
compostos (como poluição total, conectividade da paisagem, mosaico de solos),

145
ANDRÉ VICTOR LUCCI FREITAS
RONALDO BASTOS FRANCINI
KEITH S. BROWN JR

passando por diversos níveis intermediários, como topografia e quantidade de


água na superfície. Além destes, fatores bióticos diversos podem ser muito
úteis, como quantidade de cipós e bambus, proporção de vegetação secundá­
ria, tipo de vegetação dominante, riqueza de espécies arbóreas, profundidade
da camada de folhiço, e muitos outros, inclusive riqueza de outros grupos
animais (como sapos, aves, mamíferos e outros grupos de animais indicadores).

Os diferentes métodos utilizados para se alcançar estes objetivos incluem cor­


relação e regressão, análises de componentes principais (PCA) e análise canô­
nica (CA). Correlação e regressão mostr.am apenas relações diretas entre um ou.
mais componentes ambientais e algumas características da comunidade amos­
trada. Como exemplo, Brown (1997a) mostrou que a riqueza total de uma área
esta bastante correlacionada com fatores ambientais diversos. Uma alternativa
é usar um índice de diversidade das características ambientais e correlacioná-
lo com a diversidade do grupo estudado. (MacArthur et al. 1966).

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fi Métodos para estudos com aves
Pedro Ferreira Develey
Departamento de Ecologia Geral
Instituto de Biologia, USP

I • ___ k____________

Introdução
Quando qualquer pessoa interessada em aves, profissional ou amador, visita
pela primeira vez uma determinada área, seja para planejar um futuro estudo
ou simplesmente como atividade de lazer, a primeira pergunta que lhe vem à
mente é: quais são as espécies de aves que existem aqui? Ou: determinada
espécie é comum na área? Essas questões refletem o interesse e a importância
da obtenção de dados relacionados à composição e abundância das aves. Em
termos de conservação,- é fundamental o conhecimento do tamanho popula-.
cional das espécies, sendo este um dos principais critérios usados pela IUCN
(International Union Conservation of Nature) para a definição da lista global
de espécies ameaçadas (Bibby et al. 1998). No entanto, apesar da sua impor­
tância, informações sobre o tamanho populacional da maioria das espécies
neotropicais ainda são escassas.

Por ser um dos grupos mais conhecidos e diversos entre os vertebrados, com
mais de 9.000 espécies no mundo, além do fato da maioria das espécies possuir
hábitos diurnos e vocalizar com frequência, as aves são, relativamente, um
grupo de fácil detecção em campo. No entanto, uma série de fatores dificulta a
obtenção de dados que refletem a situação real das aves na área estudada.
Fatores físicos como condições atmosféricas, que alteram a atividade das aves
e o grau de detectabilidade das espécies, devem ser considerados durante a
realização de censos. A eficiência-de um método também pode variar de acordo
com a biologia das espécies e o tipo de ambiente onde elas se encontram.

A melhor maneira de garantir que um projeto de pesquisa com aves (ou com
qualquer outro grupo) seja bem-sucedido é a realização de um bom planeja­
mento antes de se iniciar o trabalho, através dos seguintes passos: 1 ) Determi­
nar claramente qual o objetivo do estudo e quais sãcras questões a ser respon­
didas; 2 ) Selecionar o método mais indicado para responder às questões pro­
postas; 3) Verificar os tipos de dados que serão obtidos e como esses dados
PEDRO FERREIRA DEVELEY

responderão às questões; 4) Determinar quais análises serão aplicadas; 5) De­


terminar custos, logística e viabilidade do projeto. Todos esses passos são de
extrema importância, uma vez que somente o acúmulo dos dados não garante,
necessariamente, um resultado satisfatório.
A seguir são descritas algumas das principais metodologias utilizadas para
-levantamentos de avifauna e estudos de comportamento e de ecologia de aves.
Para cada método apresentado são discutidas as limitações, vantagens, des­
vantagens e os exemplos de utilização.

Levantamentos
Levantamentos qualitativos
Em um levantamento qualitativo, o objetivo é conhecer a riqueza (número de
espécies) da comunidade de aves na área de estudo. Esses levantamentos são
muito utilizados na elaboração de diagnósticos ambientais em um período li­
mitado de tempo. O Programa de Levantamentos Rápidos (Rapid Assessment
Program - RAP), concebido por Ted Parker, é um dos melhores exemplos da
importância e utilização de levantamentos qualitativos para a caracterização de
uma área com base na sua biodiversidade (Parker & Carr 1992). Por meio de
uma equipe altamente qualificada (premissa básica para um levantamento bem-
sucedido), o Programa de Levantamentos Rápidos identifica e prioriza áreas
que devem ser conservadas, precedendo trabalhos de levantamentos de maior
duração.
Se o tempo disponível para o levantamento for limitado, é importante escolher
a época mais favorável. Durante a temporada reprodutiva, as aves estão muito
mais ativas, vocalizando com maior frequência, tornando muito mais eficiente a
localização e identificação das espécies. A utilização de gravações e “p lay backs”
é um recurso fundamental para identificação de aves raras, pouco conspícuas
ou seguidoras de bandos mistos de dossel (Parker 1991). Outra vantagem de se
gravar o canto das espécies registradas é a possibilidade da identificação pos­
terior por meio da consulta a arquivos sonoros. No Brasil, as melhores “bi­
bliotecas” de vozes de aves neotropicais são o Arquivo Sonoro Neotropical, na
Universidade Estadual de Campinas e o Arquivo Sonoro Elias Pacheco Coelho
da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O método das gravações também
pode ser usado para se determinar o território de uma espécie (Falis 1981) ou
para se testar, por exemplo, a capacidade que uma determinada espécie típica de
interior de mata tem de atravessar áreas abertas (Sieving et al. 1996).

154
MÉTODOS PARA ESTUDOS COM AVES

A comprovação do registro das espécies presentes em uma determinada área


deve ser uma preocupação de qualquer listagem, sendo importante para dar
maior credibilidade ao trabalho (Silveira 1998). Espécies muito semelhantes
em relação à sua plumagem (espécies crípticas) ou vocalização podem resultar
em identificações erróneas. Gravações das vocalizações das espécies, fotogra­
fias de qualidade e coleta de indivíduos são as melhores evidências para com­
provar a presença de espécies em uma dada área. A coleta de espécim es é
sem dúvida a melhor forma de identificação e o registro de ocorrência mais
confiável, além de ser indispensável para estudos de sistem ática e filogenia
(Vuilleumier 1998). No entanto, a decisão de coletar uma espécie deve ser
realizada com muito critério*, e para cada indivíduo coletado devem-se apro­
veitar todas as informações possíveis (pele, esqueleto, amostra de tecido, san­
gue, conteúdo estomacal, ecto e endoparasitas). Instruções de um bom apro­
veitamento na coleta de aves podem ser vistas em Auricchio & Salomão (2 0 0 2 ).

O resultado de um levantamento qualitativo é uma listagem com o número de


espécies que ocorrem na área de estudo. A comparação dessa lista corii lista­
gens obtidas em outras áreas é uma prática bastánte comum para se determinar
padrões de riqueza de espécies. Quando listas de avifauna são comparadas,
alguns aspectos devem ser levados em consideração, como a diferença tio es­
forço de coleta e qualidade das amostragens, a heterogeneidade dos hábitats
nas áreas a ser comparadas e a distinção entre a avifauna característica do
hábitat com espécies vagantes ou ocasionais registradas (Remsen 1994). A des­
crição bem detalhada dos métodos, explicando como as espécies foram identi­
ficadas, e a caracterização da área de estudo ajudam a evitar comparações in­
consistentes que levem a conclusões errôneas.

Levantamentos quantitativos
Em um levantamento quantitativo o pesquisador não está interessado apenas
no número de espécies presentes na área, mas também no tamanho popula­
cional das espécies. Os principais métodos usados para censos de aves são:
pontos fixos ou amostragem por pontos, transecto, redes de neblina e “spot
mapping”. Cada um desses métodos apresenta vantagens e desvantagens,
sendo que a escolha de qual será utilizado vai depender, basicam ente, da
questão proposta no estudo. No momento da seleção do método de censo,
deve-se se ter em mente p fato de que não existe uma metodologia perfeita,
sendo que algumas espécies ou grupos certamente serão sub ou superamos-
trados. Por essa razão, quando se consideram estudos enfocando toda a

155
PEDRO FERREIRA DEVELEY

comunidade, um conjunto de métodos deve ser utilizado para se obter esti­


mativas de abundância ou densidade de todas as espécies em um mesmo
período (Karr 1981). O trabalho de Terborgh et al. (1990) sobre estrutura e
organização de uma com unidade de aves am azônicas é um dos melhores
exemplos de um estudo em que foram empregados diferentes métodos. Esse
trabalho usou re^es de neblina, “sp ot m a p p in g ”, transectos e outros métodos
específicos para grupos de espécies como icterídeos coloniais, bandos m is­
tos de sub-bosque e aquelas que ocorrem em grupos monoespecíficos (araras
e papagaios). Porém, para trabalhos que empregam várias metodologias, é
necessário que haja um grupo de pesquisadores envolvidos ou um longo
período de amostragem. A utilização de dois métodos diferentes, o que é
bem mais viável, minimiza problemas relacionados à sub ou superamostra-
gem de algumas espécies.

Pontos fixos
No método do ponto fixo o observador permanece parado por um tempo pre­
determinado, anotando todas as aves registradas por observação ou vocaliza­
ção. Por ser um método menos seletivo, é indicado para estudos envolvendo
toda a comunidade. Uma vez que o observador fica imóvel e em silêncio, a
identificação de espécies pouco conspícuas ou ariscas é mais fácil. Para flores­
tas tropicais, onde a maior parte dos registros é auditiva, o método do ponto
fixo também é mais indicado. De acordo com Bibby et al. (1993), algumas
premissas devem ser consideradas quando se utiliza o método: 1 ) a presença
do observador não altera o comportamento das aves, 2 ) o observador é capaz
de detectar e identifiqar, com a mesma eficiência, todas as espécies presentes
na área, 3) as estimativas de distâncias entre o observador e a ave identificada
estão corretas, 4) as aves não se movimentam muito durante o período de
amostragem, 5) o comportamento de uma espécie ou indivíduo não influencia
o comportamento de outro. Todas estas premissas são importantes, porém, a
experiência do pesquisador na identificação das espécies é, sem dúvida, fun­
damental para que o método possa ser aplicado.

A determinação do número de pontos ou repetições dos mesmos pontos a ser


amostrados vai depender do objetivo do trabalho, das espécies amostradas, da
precisão desejada e dó tipo de hábitat, sendo que não existe uma “fórmula
mágica” para essa determinação (Hamel et al. 1996). A disponibilidade de
tempo do pesquisador é uma questão prática que também deve ser considera­
da na definição do esforço amostrai. A partir de dados obtidos num estudo

156
MÉTODOS PARA ESTUDOS COM AVES

piloto, é possível estimar o tamanho amostrai necessário. A definição de um


esforço amostrai adequado é importante para que se tenha certeza que o núme­
ro de dados a ser coletado será suficiente para responder às questões propos­
tas e que não haverá tempo perdido coletando-se dados além do necessário»

O tempo de amostragem em cada ponto também deve-ser definido. Na maioria


dos trabalhos realizados em regiões temperadas, o pesquisador permanece entre
5 e 10 minutos em cada ponto. Para áreas de florestas neotropicais Vielliard &
Silva (1990) sugere-se a permanência de 20 minutos. Quanto mais tempo o *
observador permanecer no pgnto, aumenta a chance de detecção de espécies
mais raras, mas também aumenta a chance de contar o mesmo indivíduo mais
de uma vez. Um gráfico com o número de espécies acumulado por tempo de
amostragem, obtido no estudo piloto, pode determinar e justificar a duração
da contagem por pontos. Em relação à posição dos pontos, estes devem estar
distantes o suficiente para garantir uma independência estatística entre as de­
tecções. Bibby et al. (1993) determinam uma distância mínima de 200 metros
entre os pontos. Nos pontos amostrados nas primeiras horas do dia, o número
de aves registradas será maior, já que as aves estão mais ativas durante este
período. Por isso é importante que se altere a sequência de amostragem dos
pontos em dias diferentes.

A amostragem por pontos pode ser realizada eonsiderando-se todas as de­


tecções com uma distância ilimitada, na qual são anotadas todas as espécies
vistas ou ouvidas, independentemente da distância (Blondel et al. 1991). Se a
área estudada apresentar uma heterogeneidade de hábitats, por exemplo, no
caso de fragmentos florestais em meio a pastagens, dependendo do objetivo,
pode-se anotar apenas as espécies registradas no hábitat de interesse. No Bra­
sil, a maior parte dos trabalhos utiliza pontos fixos com distância ilimitada,
que permite o cálculo do índice Pontual de Abundância (IPA) que correspon­
de ao númeco de contatos com uma determinada espécie, dividido pelo núme-'
ro total de amostras. Aleixo (1999) utilizou essa metodologia numa área de
Mata Atlântica e mostrou que algumas espécies eram menos abundantes em
florestas que sofreram retirada seletiva de madeira, comparando-se com flores­
tas primárias.

Para o cálculo da densidade das espécies, devem ser utilizadas amostragens


por pontos, considerando um raio fixo (Reynolds et al. 1980). Nessas amos­
tragens são consideradas bandas circulares imaginárias ao redor do ponto,
geralmente variando de 5 em 5 metros. Cada ave registrada é anotada dentro de
sua respectiva banda de acordo com a distância do observador, permitindo

157
PEDRO FERREIRA DEVELEY

que seja calculado para cada espécie, o número de indivíduos registrados em


virtude dessa distância. A representação gráfica dessa função (número de in­
divíduos / distância do observador) permite que seja obtida uma curva de
detecção para cada espécie. Por meio dessa curva será determinada a distância
considerada para o cálculo da densidade de cada espécie. Uma discussão de­
talhada de como se obter as curvas de detecção de cada espécie, além de cuida­
dos e problemas na análise dessas curvas, pode ser encontrada em Bibby et al.
(1998), e um exemplo prático da utilização do métòdo, em Blair (1996). Alguns
pesquisadores optam em determinar apenas um raio fixo de detecção, por
exemplo: 50 metros, e anotar todos os registros separadamente, dentro e fora
desse raio (vide Hutto et al. 1986). Em florestas tropicais, devido à dificulda­
de de estimar a distância de detecção das espécies, ainda mais quando a ave é
registrada somente através da vocalização, é mais recomendável utilizar pon­
tos com distância ilimitada.

Transectos
O método de transecto é basicam ente sim ilar ao ponto fixo, no entanto, o
observador anota os registros visuais ou auditivos enquanto caminha ao longo
de uma trilha (ver capítulo 7 de Cullen & Rudran neste volume). Enquanto o
observador está caminhando, há uma preocupação com o deslocamento, pre­
judicando a detecção das aves. Além disso, o barulho durante o deslocamento
prejudica o registro auditivo das espécies. Uma vez que este é um método basi­
camente visual, é mais indicado para áreas abertas. Amostragens pòr transectos
são adequadas no caso de espécies de fácil detecção (conspícuas ou de grande
porte), caso de cracídeos como jacus (P en elop e spp.) e mutuns (Crax spp.).
Nesses casos, os transectos também são adequados para ambientes florestais.

Durante o transecto, o tempo deve ser controlado de modo a não se perder


muito tempo na identificação de uma determinada ave. Este é um ponto im­
portante, uma vez que cada segmento do transecto, teoricamente, é amostrado
da mesma maneira. Geralmente, os primeiros segmentos do transecto são amos­
trados nas primeiras horas do dia, quando as aves estão muito mais ativas.
Quando o observador chega ao fim do transecto, o seu grau de detectabilidade
não é mais o mesmo, seja em virtude da menor atividade das aves ou do
cansaço do observador. A realização de vários transectos curtos, no lugar de
apenas um longo, pode ser uma solução para este problema. A questão do
tempo pode ser um fator complicante. É o caso, por exemplo, de um encontro
com um bando misto, no qual comumente mais de 10 espécies estão se deslo­

158
MÉTODOS PARA ESTUDOS COM AVES

cando em conjunto, sendo necessário, neste caso, um maior tempo para iden­
tificação correta de todas elas.

Para cada ave identificada ao longo de um transecto, a distância em que ela se


encontra da trilha deve ser medida com trena. Essa distância permitirá, como
no caso do ponto fixo, o cálculo da curva de detectabilidade de cada espécie
que, por sua vez, é a base para se calcular a largura da faixa lateral a ser
amostrada em cada um dos lados do transecto.

Redes de neblina
O uso de redes de neblina é sem dúvida a melhor maneira de se capturar aves.
Dependendo das espécies de interesse, também se pode utilizá-la para recen­
sear populações. A maior limitação do uso de redes está no fato de ser um
método bastante seletivo, uma vez que são armadas no sub-bosque. Aves de
grande porte, de dossel e que andam no chão da mata são geralmente subesti­
madas. Alguns trabalhos armaram redeS no dossel da floresta (vide Munn &
Loiselle 1995), porém essa é uma técnica extremamente trabalhosa, sendo que
os resultados obtidos acabam não compensando os custos.

O trabalho de Whitman et al. (1997) numa floresta subtropical em Belize ilus­


tra bem a seletividade do método, já que, de um total de 203 espécies registra­
das na área, 58 foram registradas através do uso de redes e 119 pelo método do
ponto fixo, que também é seletivo. No entanto, se o interesse é amostrar aves
de sub-bosque, redes são eficientes para a maioria das espécies. Um exemplo
de bons resultados obtidos com o uso de redes pode ser encontrado no traba­
lho sobre o efeito da fragmentação na comunidade de insetívoros de sub-bos-
que na Amazônia (Stouffer & Bierregaard 1995). Nesse trabalho, os autores
identificaram quais eram as espécies mais afetadas pela fragmentação, o efeito
do tamanho dos fragmentos e a influência da vegetação secundária ao redor
dos fragmentos no seu uso após o isolamento. Também por meio de redes de
neblina Loiselle & Blake (1991), trabalhando na Costa Rica, demonstraram que
várias aves realizavam uma migração altitudinal de acordo com a disponibili­
dade de frutos. Como vantagens no uso de redes de neblina pode-se citar o
pequeno risco de identificação errada das espécies, a maior chance de que
aves que raramente vocalizam sejam amostradas, a possibilidade de manipula­
ção e marcação dos indivíduos, dando margem a muitos outros estudos, além
do esforço amostrai ser de fácil padronização (Karr 1981).

A localização das redes em campo vai depender do objetivo do estudo. Ralph


et al. (1993) sugerem que as redes sejam armadas nas bordas de hábitats,

159
PEDRO FERREIRA DEVELEY

otimizando o número de capturas se o objetivo for medir a diversidade. Obser­


vações preliminares da movimentação das aves na área de estudo é a melhor
maneira de se determinar o local onde as redes serão armadas. As redes devem
ser abertas alguns minutos antes do nascer do sol e permanecer abertás por, no
mínimo, 4 horas. Se uma mesma área for amostrada por vários dias, é reco­
mendável que se mudem os locais da rede a cada dois dias, para maximizar o
número de capturas. O intervalo de verificação varia de acordo com o horário
do dia. Nos períodos de maior atividade das aves, as redes podem ser inspe­
cionadas a cada 40 minutos, sendo que este intervalo pode ser um^pouco
maior em horários de baixa atividade. No entanto, é importante verificar as
redes com regularidade nos horários mais quentes, já que espécies.mais sensí­
veis podem morrer devido ao calor. Também se deve lembrar que, quanto mais
tempo uma ave fica presa na rede, mais enrolada na malha ela fica, dificultan­
do muito sua retirada. Para a retirada da ave da rede há diferentes técnicas que
são aplicadas dependendo da espécie e da prática do pesquisador. O primeiro
passo é determinar de que lado a ave entrou na rede, pois é por esse lado que
deverá ser retirada. Basicamente, deve-se iniciar liberando-se os pés e as per­
nas da ave, seguidos pela cauda, asas e finalmente a cabeça, sempre com muito
çuidado no"seu manuseio.

O tipo de rede mais utilizado mede 12 metros de comprimento por 2 metros de


altura, com uma malha de 36 mm, porém, existem vários outros modelos. É de
extrema importância que na metodologia de um trabalho seja descrito o com­
primento, altura e tamanho da màlha das redes utilizadas. Isto porque o esfor­
ço amostrai é medido em horas-rede, de forma que uma rede aberta durante
uma hora equivale a uma hora rede de esforço. Se um pesquisador obteve uma
amostra de 100 horas rede trabalhando com redes de 12 metros, esse esforço
não é o mesmo que 100 horas rede usando redes de 6 metros.

Existem métodos de estimativa populacional usando técnicas de captura -


recaptura, no entanto esta não é uma técnica muito usada em estudos com
aves (Bibby et al. 1993). Uma revisão sobré essas técnicas pode ser encontrada
em Nichols et al. (1981). Para obtenção de dados quantitativos podem-se utili­
zar índices de abundância simplificados, considerando o número de capturas
de uma determinada espécie dividido por cada 100 ou 1000 horas rede, de­
pendendo do esforço total (Stouffer & Bierregaard 1995). No entanto, Remseh
& Good (1996) criticam o uso de redes para estimativas de abundância relativa,
argumentando que fatores como distância e frequência de voo, altura de forra-
geio e tamanho da área de vida das espécies são determinantes no número de

160
MÉTODOS PARA ESTUDOS COM AVES

capturas. De acordo com esses autores, as espécies estimadas como mais abun­
dantes são, na verdade, espécies mais propensas a ser capturadas. Aves não
territoriais que apresentam alta mobilidade, se deslocando com muita frequên­
cia (beija-flores, piprídeos, seguidores de formiga de correição e tiranídeos frugí-
vòros com comportamento de “lek”) estão entre as espécies mais abundantes
nas estimativas bâseadas em redes de neblina, o que demonstra a tendência
presente no resultado da utilização desse método (Remsen & Good 1996).

As redes de neblina são o principal método de captura usado em trabalhos


com anilhamento. No Brasil, o órgão que coordena o sistema nacional de ani-
lhamento é o Centro de Pesquisa para Conservação das Aves Silvestres - CE-
MAVE/IBAMA. Inicialmente, o órgão foi criado com objetivo de estudo e pre­
servação das aves migratórias, mas atualmente desenvolve atividades mais
abrangentes. O CEMAVE cadastra os anilhadores, fornece as anilhas, organiza
cursos e treinamentos além de desenvolver projetos de pesquisa. Pesquisado­
res que realizam pesquisas envolvendo anilhamento devem submeter o proje­
to para o CEMAVE e mandar relatórios anuais das atividades.

“S po t-M a p pin g”
Este método se baseia no comportamento territorial das espécies, principal­
mente no período reprodutivo. Através do mapeamento das localizações dos
indivíduos na área de estudo, é possível determinar o tamanho e número de
territórios das espécies e estimar sua densidade. Este método não pode ser
aplicado no caso de espécies não territoriais ou com territórios muito grandes.
É fundamental que se tenha um mapa detalhado da área de estudo, com um
bom sistema de trilhas. O método exige trabalho de campo intenso, já que é
preciso um acúmulo de registros de um mesmo indivíduo para que se possa
determinar seu território. Problemas na interpretação dos mapas estão relacio­
nados em reconhecer se um determinado registro pertence a um mesmo indi­
víduo ou não. A marcação com anilhas coloridas ou radiotelemetria resolve
esse problema. Duas boas referências são Terborgh et al. (1990) e Thiollay
(1994), que recensearam várias espécies amazônicas através de “spot-m ap p in g ”
no Peru e na Guiana Francesa, respectivamente. Os dois trabalhos delimitaram
e mapearam detalhadamente uma área de estudo com cerca de 100 há, encon­
trando 245 espécies (Peru) e 248 (Guiana) residentes nessa área, sendo que
aproximadamente 60% dessas espécies apresentavam territórios fixos e pude­
ram ser recenseadas através do “spot-m apping".

161
PEDRO FERREIRA DEVELEY

Comportamento e ecologia
A partir dos resultados gerados por levantamentos quantitativos ou qualitati­
vos, questões específicas a respeito da estrutura da comunidade e biologia das
espécies que ocorrem na área podem ser respondidas. Estudos enfocando a
dieta, o comportamento alimentar e a preferência de hábitat são exemplos de
questões simples, mas de grande importância no estudo da ecologia das aves.
Projetos que envolvem a estrutura da vegetação ou a quantificação de recursos
alimentares são bastante trabalhosos e obrigam o pesquisador a utilizar méto­
dos em botânica, ecologia vegetal ou entomologia. Porém, apesar dessas difi­
culdades, trabalhos envolvendo recursos alimentares ou estrutura da vegeta­
ção com o comportamento e distribuição das aves são fundamentais para se
propor planos de manejo e medidas práticas de conservação.

Comportamento de forrageio
Durante um levantamento de aves, enquanto o pesquisador observa as espécies,
certamente também observa diferentes comportamentos, inclusive de forra­
geio. O registro desses comportamentos pode enriquecer o trabalho, ajudando
a explicar o padrão de distribuição e abundância das espécies. No entanto,
uma vez que se decida coletar dados de forrageio durante um levantamento,
deve-se ter claro como e por que essas informações irão contribuir na hora da
análise. O importante é que se evite simplesmente seguir uma ave anotando
seu comportamento, sem uma metodologia e objetivo pré-estabelecidos.

Existem inúmeras maneiras de se classificar e quantificar comportamentos


de forrageio, sendo d ifícil uma padronização. Remsen & Robinson (1990)
propuseram um sistema para medir e classificar o comportamento de forra­
geio na tentativa de padronizar o método e a terminologia, permitindo com­
parações entre espécies e áreas. Esse sistema é dividido em 5 sequências do
comportam ento de forrageio: procura, ataque, local de forrageio, item ali­
mentar e m anipulação do item alimentar. Para cada uma das sequências, os
autores descrevem em detalhes as manobras e substratos de forrageio, sem­
pre comparando com outras publicações. Esse trabalho deve ser consultado
e o pesquisador deve estar familiarizado com os termos e com uma noção
bem clara do tipo de informações que deseja obter para iniciar um projeto
enfocando comportamento de forrageio. De acordo com Remsen & Robinson
(1990) algumas das manobras aéreas e não aéreas mais comuns são: voo cur­
to (“sally ”), pegar (“g le a n ”), alcançar (“r e a c h ”), pendurar (“h a n g ”), sondar
(“p r o b e ”), puxar (“p u ll”), bote (“lu n g e”) e saltar (“le a p ”). Exemplos de subs­

162
MÉTODOS PARA ESTUDOS COM AVES

tratos de forrageio, locais onde a ave investiu para obter o alim ento, são:
agregados de folhas secas suspensas na vegetação, folhas verdes, bromélias,
troncos, lianas e ar.

Uma questão que deve ser pensada, antes de se iniciar o projeto, é qual o nível
de refinamento desejado na coleta de dados. Em estudos de ecomorfologia,
anotações detalhadas do comportamento e do substrato são importantes, já
que uma determinada característica morfológica, por exemplo, o bico de uma
espécie, pode estar diretamente relacionada com o tipo de manobra e substrato
de forrageio (Remsen & Robinson 1990). Já no caso de estudos de comunida­
de, um refinamento muito grande acaba impossibilitando que espécies sejam
agrupadas, definindo guildas, por exemplo.

Coletas de dados sobre comportamento de forrageio podem ser realizadas de


maneira sequencial ou pontual. Na amostragem sequencial vários comporta­
mentos são anotados observando-se continuam ente apenas um indiyíduo.
Dados coletados dessa forma são estatisticamente dependentes, criando pro­
blemas na hora da análise. Hejl et al. (1990) sugerem três maneiras para se
contornar esse problema: usar apenas a primeira ou segunda observação de
cada indivíduo, desprezando as outras observações; realizar um estudo piloto
para coleta de dados sequenciais, fazer um teste de autocorrelação e selecionar
o intervalo de tempo entre as amostras necessário para garantir independên­
cia; analisar os dados coletados de maneira sequencial com métodos capazes
de ajustar a autocorrelação. Na amostragem pontual, apenas um comportamen­
to é anotado para cada indivíduo. Nesse caso há uma independência estatísti­
ca entre as amostras, porém, pode haver uma tendência em se amostrar um
comportamento ou indivíduo mais conspícuo e perder informações.

O importante é não desperdiçar nem tempo, nem dados cóletados, principal­


mente com relação a espécies raras ou de difícil observação. Portanto, como já
citado para outros métodos, devem-se conhecer bem as limitações metodológi­
cas embutidas no tipo de dado que foi coletado para que a análise e as conclu­
sões estejam corretas.

Disponibilidade de recursos alimentares


Entre todos os métodos apresentados até agora, provavelmente os mais traba­
lhosos envolvam a quantificação de recursos alimentares. O fato de esses tra­
balhos exigirem habilidade na identificação de espécies de plantas, artrópodos
ou outros gr.upos animais, é mais um fator complicante. Apesar das dificulda­
des metodológicas, o conhecimento das interações eqtre recursos alimentares

163
PEDRO FERREIRA DEVELEY

e consumidores é de grande importância para explicar padrões no comporta­


mento e distribuição das aves.

Com relação aos frutos, existem diferentes métodos para amostragem no dos­
sel e no sub-bosque. Frutos de sub-bpsque são de fácil observação e coleta, em
comparação com os de dossel. Portanto, no caso do sub-bosque podem ser
realizadas contagens diretas do número de frutos produzidos por cada planta.
Para o dossel, uma contagem direta com precisão é praticamente impossível, e
a amostragem depende de estimativas. O acompanhamento fenológico no sub-
bosque pode ser realizado através de transectos aleatórios na área de estudo
(Gentry & Emmons 1987) ou, no caso de trabalhos que utilizem redes de nebli­
na para amostragem das aves frugívoras, podem ser realizados transectos loca­
lizados ao longo de cada linha de rede (Levey 1988, Loiselle & Blake 1991).

Censos de frutos de dossel podem ser realizados por meio de três metodolo­
gias básicas: armadilhas de frutos (Terborgh 1983), acompanhamento fenológi­
co de árvores marcadas (Sun & Moermond 1997) e transectos (Develey & Peres
1999). O método de armadilha de frutos estima sua disponibilidade de manei-
I
ra indireta com base na biomassa dos frutos caídos (kg/ha) nas armadilhas. O
método apresenta algumas limitações como o grande consumo de tempo para a
construção, manutenção e monitoramento das armadilhas, o que acaba fazen­
do com que apenas uma pequena porção do hábitat seja amostrada. Outro
problema está relacionado ao fato de que as armadilhas medem a queda de
frutos e não a produção de frutos, assim, os frutos mais consumidos pelos
frugívoros acabam sendo menos representados nas armadilhas do que aqueles
menos consumidos.

Transectos e trilhas seguindo árvores marcadas apresentam vantagens em


comparação ao método de armadilha de frutos. Esses métodos são estimati­
vas diretas da produção,de frutos e amostram uma maior porção do hábitat.
Para o cálculo dos índices de produção de frutos na copa, pode-se usar a
medida do diâmetro à altura do peito (DAP), uma vez que esta medida é
proporcional à capacidade da árvore em produzir frutos (McDiarmid et al.
1977, Peters et al. 1988). Também se pode estimar a quantidade de frutos
através de um “rank” de produtividade, geralmente de zero a quatro, obser­
vando-se diretamente a copa (Fournier 1974). Chapman et al. (1994) utilizou
essas três metodologias em uma mesma área de floresta e mostrou que as
estimativas de abundância obtidas através de transectos e trilhas de frutos
estavam correlacionadas, ao contrário da abundância medida através de ar­
madilhas de frutos. Zhang & Wang (1995) utilizaram plataformas é passare-

164
MÉTODOS PARAESTUDOS COM AVES

las construídas no dossel da floresta para contagem de frutos. Este método é


eficiente, porém muito trabalhoso devido, à necessidade da construção das
plataformas e uso de técnicas de escalada para acessar o dossel. Revisões
sobre métodos de estimativa de produção de frutos em árvores tropicais po­
dem ser encontradas em Chapman et al. (1992, 1994) e Zhang & Wang (1995).
Mais informações sobre métodos de fenologia são encontradas no Capítulò
15, neste volume:

Estimativas da abundância de artrópodos são ainda mais complicadas. Muitas


vezes o número de espécies e indivíduos amostrados não corresponde, neces­
sariamente, às presas que realmente são consumidas por uma determinada ave
insetívora. As diferentes técnicas existentes para amostragem de artrópodos
utilizam diferentes tipos de armadilha ou mesmo observação direta. Cooper &
Whitmore (1990) fazem uma ampla revisão da^ diferentes técnicas de amostra­
gem de artrópodos, para ornitologia, mostrando as vantagens e desvantagens
de cada uma. Devido à enorme diversidade do grupo, somente um método não
irá amostrar da mesma maneira as diferentes ordens de artrópodos. No entan­
to, a utilização de mais de um método implica mais tempo de campo e, depen­
dendo da técnica, o trabalho'de laboratório pode tornar a execução do projeto
inviável. Definir o objetivo da amostragem, por exemplo, variação sazonal ou
comparação de diferentes hábitats, e o grupo de artrópodos a ser amostrado,
facilita na escolha e no ajuste do método. Se o objetivo do estudo são aves
especialistas em forragear em folhas mortas suspensas na vegetação, a escolha
do método deve considerar a biologia dos artrópodos que se abrigam nessas
folhas, Rosenberg (1990) estudou esse grupo de aves e para amostragem de
artrópodos coletou agregados de folhas secas, colocou essas folhas dentro de
sacos plásticos, pulverizou com inseticida e identificou e mediu os artrópodos
em laboratório. Poulsen (1996) utilizou redes de inseto para capturar artrópo­
dos voadores, padronizando o número de golpes de rede. Essas redes de inse­
to também são comumente usadas para capturar insetos na superfície das fo­
lhas. Censos mensais de artrópodos, através da observação direta, foram reali­
zados por Develey & Peres (1999) para medir a variação sazonal na disponibi­
lidade de artrópodos. Este método certamente subamostra alguns grupos de
artrópodos, porém uma vez que essas limitações são homogêneas durante os
censos, o método se mostrou eficiente.

Uma maneira de viabilizar projetos envolvendo quantificação de recursos ali­


mentares é a realização de projetos de pesquisa integrados, envolvendo orni-
tólogos, entomólogos e botânicos. A participação de diferentes profissionais

165
PEDRO FERREIRA DEVELEY

trabalhando num mesmo projeto facilita muito a coleta e interpretação dos


dados e gera discussões enriquecedoras que melhorarão muito a qualidade
dos resultados.

Conclusão
A definição da metodologia é uma das etapas mais importantes na realização
de um projeto e também uma das mais complicadas. É sempre importante que
se conheça claramente quais são as limitações do método utilizado para que,
na hora da análise dos dados, seja possível discernir até onde os resultados
encontrados refletem a realidade ou são artefatos da amostragem, principal­
mente em situações onde tanto o tempo disponível quanto o número de inves­
tigadores é limitado. Muitas vezes, esse discernimento é extremamente com­
plicado, mas, se as prpmissas e limitações do método são bem conhecidas, a
chance de se chegar a conclusões errôneas devido à metodologia usada é bem
menor. O conhecimento prévio dá biologia das espécies a ser estudadas tam­
bém é importante para a determinação do método e interpretação dos resulta­
dos. A realização de um estudo piloto antes de se iniciar o projeto em si é a
melhor maneira de se testar e definir a metodologia, calcular o tempo e o
esforço amostrai e treinar a identificação das espécies de aves a ser estudadas.

As dificuldades mostradas nesse capítulo não devem, de modo algum, desen­


corajar a realização de um projeto. Maior do que a limitação dos métodos é a
falta de conhecimento sobre a biologia das aves neotropicais, existindo uma
quantidade enorme de questões a ser respondidas. Mesmo com as limitações,
foi por meio desses métodos que se tornou possível conhecer diferentes as­
pectos da biologia de muitas espécies de aves, informações valiosas e funda­
mentais para se propor planos de conservação.

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168
7 Transectos lineares na estimativa
de densidade de mamíferos e aves
de médio e grande porte
Laury Cullen Jr.
V
. instituto de Pesquisas Ecológicas-IPÊ

Rudy Rudran
Smithsonian Institution, USA.

Introdução
O método dos transectos lineares (Line Transcects), da família DISTANCE de
estimadores de densidade (Buckland et al. 1999), está entre as metodologias
mais utilizadas na estimativa de densidade de populações. Esse método vem
sendo utilizado com sucesso em espécies vegetais, insetos, anfíbios, répteis,
aves, peixes e mamíferos, tanto marinhos quanto terrestres. Em todos os ca­
sos, a ideia e o princípio são sempre os mesmos: o observador conduz um
censo ao longo de uma série de linhas ou trilhas previamente selecionadas,
procurando pelo indivíduo de interesse (usualmente animais ou um grupo de
animais). Essas trilhas podem ser definidas de várias maneiras, dependendo
da espécie a ser estudada. Estudos em terra podem incluir caminhadas, aero­
naves, veículos terrestres e cavalos, além de outros animais de cárga. Em am­
bientes àquáticos, as linhas podem sér definidas' de barco ou outros meios de
transporte afins.

Para cada indivíduo observado, anota-se a distância perpendicular entre ele e


a trilha. Nem sempre todos os indivíduos presentes serão detectados, mas um
dos pressupostos fundamentais dessa metodologia é o de que todos os indiví­
duos presentes sobre a linha de estudo devem ser detectados. E de se esperar
que a detecção do animal de interesse fique mais difícil quanto mais distante
ele estiver da linha, resultando em menos observações, com o aumento da
distância. Sendo assim, o segredo e o ponto chave desta metodologia está em
encontrar um modelo, ou uma F u n çã o d e D e te c ç ã o , que melhor espelhe o
comportamento das distâncias observadas. Depois, utiliza-se essa função para

J ' 169
LAURY CULLEN JR.
RUDY' RUDRAN

estimar a proporção de indivíduos que não foram detectados durante o censo


e, a partir daí, pode-se obter uma estimativa de densidade da população de
interesse.

Estimativas
Distâncias perpendiculares (X) são medidas a partir de cada animal detectado
(figura 1). Em algumas situações, a distância de detecção (r) e o ângulo de
detecção 0 são anotados, e a distância perpendicular é calculada como sendo X
= r sen o 0. Suponhamos que uma série de trilhas de comprimento l v ...... lk
(com X lj = L] são posicionadas seguindo um esquema aleatório e n animais
são detectados a distâncias perpendiculares X v .....Xn. Suponhamos, também,
que alguns anim ais, além de uma certa distância w da trilha (truncation
distan ce), não são detectados. Sendo assim, a área levantada pode ser calcula­
da como sendò: a = 2wL, onde os animais foram observados. Agora faça Pa ser
a probabilidade de um animal, escolhido aleatoriamente dentro da área levan­
tada, ser detectado, e suponha que uma estimativa para Pa esteja disponível.
Então, a densidade animal (D) poderá ser estimada como:
n
D = ------------ -

2wLPa
Para a estimativa de PQ , definimos a Função de Detecção g (X) como sendo a
probabilidade de um animal à distância X da trilha ser detectado, 0 < X < w, e
assumimos que g (0 ) = 1 , ou seja, que todos os animais na trilha são detecta­
dos. Se plotarmos todas as distâncias perpendiculares observadas em um his­
tograma, então, o problema se resume em encontrar o melhor modelo ou fun­
ção para g (X) e ajustá-lo para servir aos nossos dados de distância perpendi­
cular. Como mostrado da Figura 2, se definirmos iÁ = ^ ' g ( x J d x então, PQ
= ju/w. O parâmetro n é chamado como a meia largura efetiva da trilha; é a
distância limite da trilha de onde os animais são observados (figura 1 ). Assim:

n n

2wLp/w 2f)L

170
TRANSECTOS LINEARES NA ESTIMATIVA DE
DENSIDADE DE MAMÍFEROS E AVES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Figura 1 . Esquema para a estimátiva da probabilidade de um animal ser detectado em uma


amostragem. (A) Área de estudo; (L) = Comprimento total do transecto; (Z) = Observador; (r)
= Distância de detecção; 0 = Angulo de detecção; (X) Distância perpendicular (X = r seno 0);
(/n) = Meia largura efetiva da trilha.

Figura 2. A área [xsob a função de detecção g (X), quando expressa como a proporção da área w
do retângulo, é a probabilidade que um indivíduo dentro na área levantada ser detectado; i±
também é a largura efetiva da trilha, que toma um valor entre 0 e w. (Fonte: Thomas et al. 2002 ).

Para obtenção de uma estimativa da integral de /j . (n ~ ) , ou seja, a área /x sob a


função de detecção g (JQ, observa-se a função probabilidade de detecção
(probability detection function - pdf) das distâncias perpendiculares observa­
das, indicada como f (X), que é simplesmente a integral da função de detecção
g (X) em uma escala de 0 a 1. Ou seja, f (X) = g (X) / /jl. Pelo fato de assumir-se
que g (0) = 1 , de onde se segue que f (0) = 1/ /j . (figura 3). Então:

171
LAURY CULLEN JR.
RUDY RUDRAN

n N f( 0 )
D= = ----- -
2ÍJL 2L

Figura 3. A função probabilidade de d etecção, f [X], plotada no histogram a de frequência de


d istâncias perpendiculares (numa escala em que a área total das barras do histograma é 1). A
área sob a curva também é a unidade por definição. Como as duas áreas listradas são idênticas
em área, a área do re tâ n g u lo n f ( 0 ) tam bém é a unidade. Assim /x = 1 /f (0). (Fonte: Thom as,
L. e t a l. 2002).

O problema agora fica reduzido a modelagens, ou seja, em encontrar a melhor


função que se ajuste às distâncias perpendiculares observadas. O programa
DISTANCE como demonstrado adiante, utiliza uma série de métodos para
ajustar a melhor função aos dados coletados.

Conduzindo os Ira n se cto s Lineares


A intenção deste capítulo é oferecer uma série de instruções e recomendações
práticas para a melhor condução dos transectos no campo, de maneira que os
dados possam ser integralmente tratados dentro da teoria e premissas da meto­
dologia DISTANCE. Uma melhor padronização na coleta desses dados pode
permitir boas análises comparativas com outros trabalhos que utilizaram a
mesma metodologia. Essas recomendações se aplicam principalmente para as
estimativas de densidade de mamíferos e aves de médio e grande porte, para
os quais a observação direta no campo não é um impedimento sério. Para uma
complementação de literatura, ver os trabalhos de Cullen & Valladares-Padua
1998, Brockelman & Ali 1987, Whitesides et al. 1988, Buckland et al. 1993 e
Peres 1999.

172
TRANSECTOS LINEARES NA ESTIMATIVA DE
DENSIDADE DE MAMÍFEROS E AVES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Estabelecendo os transectos na área de estudo


A primeira providência é definir a região ou localidade específica para a qual
se deseja obter estimativas de densidade da espécie ou das espécies de estudo.
Uma vez escolhida a área, deve-se utilizar a regra 4 x 4 . Ou seja, estabelecer, de
maneira aleatória, no mínimo 4 transectos de 4 km cada. Sempre que possível,
a distância entre transectos deve ser de, no mínimo, 500 metros e deve-se
evitar, quando possível, que um transecto intercepte o outro. É recomendável
o uso de mapas, imagens de satélites ou outras bases cartográficas da área para
posicionar os transectos da maneira mais aleatória possível. Os transectos de­
vem cobrir a maior diversidade possível de hábitats, de elementos hídricos e
da topografia, evitando-se ao máximo áreas com atividades antrópicas. Uma
boa estratificação dos transectos pode permitir análises comparativas de den­
sidade entre diferentes hábitats, áreas com diferentes pressões antrópicas, pro­
ximidade de água etc.

No caso de um fragmento florestal (ex. < 1000 ha), muitas vezes não é possível
aplicar a regra 4 '* 4. Nestes casos, deve.-se conhecer aò máximo o fragmento de
estudo, antes do início da pesquisa. Uma boa conversa e relação de confiança
com a comunidade vizinha pode ajudar em muito a melhor disposição dos
transectos. A combinação de conhecimento específico da área, bom senso e
algum desenho aleatório, faz-se necessária.

A preparação dos transectos


A preparação das trilhas ou transectos deve ser considerada tão importante
quanto a coleta de dados. A experiência dos autores tem mostrado que a aber­
tura de cada trilha de 4 km, principalm ente em ambientes de floresta mais
densa, leva em média de 8 a 10 horas. Para ajudar no trabalho, é essencial a
presença de 2 ou 3 assistentes de campo locais para realizar o trabalho mais
Operacional de corte e limpeza das trilhas.’ O pesquisador, neste caso, deve
assumir a responsabilidade de direcionar, medir e marcar as trilhas em prepa­
ração. Com o uso de uma bússola, deve-se procurar manter a melhor direção
possível. Pequenos desvios provocados por troncos caídos ou outros obstácu­
los não ferem o princípio da metodologia, desde que, após o desvio, a mesma
orientação da trilha seja retomada. O comprimento total da trilha deve ser
medido com trena. Sugere-se, também, a marcação com fita colorida a cada 50
metros para facilitar a localização das observações animais. Depois de defini­
das, preparadas e marcadas, as áreas e as trilhas que serão utilizadas para o
censo não deverão ser frequentadas e perturbadas, pelo menos por um período

173
LAURY CULLEN JR.
RUDY RUDRAN

de 24 horas. Esse tempo é necessário para os animais voltarem e se distribuírem


normalmente na área que foi perturbada durante a preparação das trilhas.

Considerações importantes antes da coleta de dados nos transectos


Recomendamos que a coleta de dados somente seja feita por pessoas conhece­
doras e com experiência sobre a fauna local. Normalmente assistentes da co­
munidade local são os mais indicados para esse trabalho. Na prática, e na
maioria das vezes, a identificação do animal se baseia em uma observação clara
e direta. Entretanto, em algumas situações, a detecção do animal é feita indire­
tamente por meio de vocalização, seguida de quebra de galho, de movimento
*

de arbustos, de corrida na serrapilheira etc. Vinda de observadores experien­


tes, e uma vez identificada a espécie, essas observações indiretas podem ser
consideradas, desde que anotada corretamente a distância perpendicular no
local de onde se observou o primeiro indício da presença do animal.

Durante o trabalho de campo, todas essas decisões devem ser analisadas à luz
da teoria e metodologia DISTANCE, que assume quatro premissas, em ordem
decrescente de importância: (l) todos os animais na trilha devem ser observa­
dos; ( 2 ) todos os animais são detectados na sua posição inicial, antes de qual­
quer movimento em resposta ao observador (daí.a importância de se anotar o
local do indício da presença em observações in diretas);'(í) as distâncias per­
pendiculares são medidas corretamente e (4) as detecções devem ser eventos
independentes, ou seja, o mesmo animal, ou grupo de animais, não pode ser
observado durante o mesmo esforço amostrai. Portanto, durante os trabalhos
.d e campo, é extremamente importante ter essas premissas em mente para evi­
tar tendências e erros amostrais. Os censos devem ser evitados durante dias
chuvosos e com muito vento. Os barulhos provocados pela chuva e pelo vento
muitas vezes impedem a detecção de uma vocalização ou algum outro sinal
sonoro que pode levar a observações diretas e indiretas equivocadas.

A coleta de dados em cada transecto deve ser realizada preferencialmente por


um único observador. O barulho provocado pelas passadas de um observador
atrapalha a audição do outro observador. Isso ocorre principalmente em ambi­
entes de floresta semidecidual onde se forma uma camada de folhas secas que
produz muito barulho durante as caminhadas. O melhor horário para percor­
rer os transectos é das 6:00^10:00 pela manhã e, novamente, das 14:00-18:00
pela tarde. Paradas breves a cada 50 metros são recomendáveis para uma me­
lhor observação e audição do ambiente. A velocidade média utilizada durante
as caminhadas deve ser de aproximadamente 1.000 m/h. Em se tratando de
TRANSECTOS LINEARES NA ESTIMATIVA DE
DENSIDADE DE MAMÍFEROS E AVES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

trilhas de 4 km, o período das quatro primeiras horas da manhã deve ser
suficiente para a realização de cada esforço amostrai. O período subsequente,
da tarde, deve ser novamente usado para o segundo esforço amostrai, retor­
nando pela mesma trilha. O período das 10:00 às 14:00 horas, no fim da
trilha, deve ser utilizado para o descanso do observador e da trilha, para um
lanche, para conferência dos dados e outras anotações que se fizerem necessá­
rias. E importante enfatizar que todos os animais observados durante o retor­
no na trilha também devem ser considerados para as análises, por se tratarem
de observações realizadas em um outro esforço amostrai.

Coletando os dados
Uma boa ficha de campo deve ser preparada antes do início da coleta de dados.
A seguir temos um exemplo de ficha utilizada nas experiências dos autores:

Nome do Observador: Local ou região da coleta:


Data: Condições do tempo:
Horário de Início: Horário Final:
Nome ou n° do Transecto: Distância total caminhada:

Horário da Posição Espécie Tamanho Distância 3Observações


Observação na Trilha Observada do Grupo Perpendicular Associadas

7:30 Entre fita Cebus 16 23 1 Contagem


04-05 a p ella total

8:04 Entre fita Cebus 6 09 Contagem


16-17 a p ella parcial

9:11 Fita 48 2M azama 1 0 Macho


sp.

(1) O observador tem certeza q ue contou todos os indivíduos do grupo. Isso ocorre muitas vezes
quando os animais estão bastante agrupados ou em ocasiões em que os animais cruzam a
trilha ou estrada sen do p o ssív e l contar a seq uên cia com pleta de indivíduos. Os dados das
contagens parciais devem se r utilizados para as estimativas d e densidade de grupos. Entretan­
to, para a estimativa de tamanho m édio dos grupos observados, o pesquisador só d eve utilizar
os dados dp contagens totais.

(2) Na incerteza quanto à e sp écie observada, anota-se o gên ero e mais tarde obtém -se uma
estimativa de densidade para aquele gên ero especifico.

(3) O bservações associadas e ou oportunísticas devem se r sem pre anotadas (por exem plo:
comportamento, alimentação, idade aproximada, hábitat etc).

175
LAURY CULLEN JR.
RUDY RUDRAN

Uma vez detectado o animal, o observador marca a posição exata da detecção,


caminha na trilha até a posição perpendicular em relação à observação (90°) e,
com o uso de uma trena, mede exatamente (pelo menos na precisão do metro)
a distância perpendicular do animal à trilha. Os observadores só devem sair
da trilha para medir a distância perpendicular e para facilitar a contagem com­
pleta de alguns grupos de animais observados. Quando a espécie observada
estiver em grupo, toma-se a distância perpendicular do primeiro animal obser­
vado. Recomenda-se que, quando necessário, para animais de hábito social e
que vivem em grupos, calcule-se primeiro a densidade de grupos e, depois,
anote-se a informação do tamanho médio dos grupos, para cálculo da densida­
de dá população.*

As distancias nunca devem ser estimadas em classes de 5 metros (10, 15„ 20,
25...). Esse agrupamento tendencioso pode dificultar mais tarde o perfeito
ajuste da função de detecção nas distâncias .observadas. Cuidado específico
deve ser tomado com a medida das distâncias mais próximas das trilhas, pois
são estas que mais pesam na hora do perfeito ajuste da função. Erros ou esti­
mativas de distâncias perpendiculares, de observações mais distantes das tri­
lhas, são menos problemáticos, uma vez que essas distâncias têm menos influ­
ência na escolha do melhor modelo para ajuste nas distâncias perpendiculares
(Buckland et al. 1993).

Esforço amostrai e tamanho da amostra


Recomenda-se que, em cada transecto pré-determinado, seja caminhada uma
distância mínima de 80 km, incluindo idas e voltas no mesmo transecto. Para
transectos de 4 km, isso significa aproximadamente 10 dias de trabalho de
campo na área de estudo e 320 km caminhados em todos os transectos, quan­
do observadores independentes caminharem transectos diferentes simultanea­
mente. Na prática, mesmo todo esse esforço amostrai pode não ser suficiente
para coletar o número de observações suficientes para estimativas confiáveis.
Muito embora o número mínimo de detecções independentes recomendável
seja 40, tamanhos amostrais menores também podem gerar estimativas robus­
tas quando analisadas com cuidado. Isso porque a meia largura efetiva da
trilha (i) é intimamente dependente da distribuição das distâncias de detecção
e, em algumas situações, até 20 observações podem ser necessárias, quando a
distribuição dos dados facilita o ajuste da função de detecção (S. Buckland,
pers. comm. In: Peres 1999). Porém, em todas as .situações, é recomendável
que, na publicação dos resultados, o pesquisador apresente os dados do nú­

176
TRANSECTOS LINEARES NA ESTIMATIVA DE
DENSIDADE DE MAMÍFEROS E AVES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

mero de observações (N), o esforço amostrai (L), o intervalo de confiança (Cl) e


a estimativa pontual de densidade (D).

Análise dos dados


Muito embora, durante os transectos, o pesquisador colete dados para várias
espécies simultaneamente, a análise é feita individualmente para cada espécie
em estudo. Conforme foi ressaltado anteriormente, a questão se resume em
encontrar a F u n ção d e D e t e c ç ã o , ou o modelo que melhor se ajuste às distân­
cias perpendiculares observadas para uma determinada espécie. São várias as
possibilidades de distribuição das distâncias perpendiculares. Por exemplo, a
figura 4, a seguir, mostra algumas das funções que podem ser escolhidas para
ajuste na distribuição das distâncias perpendiculares.

D istân cia y

Figura 4. Funções mais comuns na modelagem dos dados durante a análise no programa
DISTANCE (Fonte! ww w .ruw pa.st-and.ac.uk/distance).

Até meados de 1995, os programas TRANSECT, TRANSAN, LINETRAN,


SIZETRAN, entre outros, eram os mais utilizados nas estimativas de densida­
des populàcionais. Todos estes programas foram praticamente abandonados a
partir do lançamento do programa DISTANCE, principalmente as versões 3.5
e 4.0 disponíveis na plataforma Windows (Buckland et al. 2001). O programa
pode ser ob tid o sem cu sto no en d ereço da In s titu iç ã o m an ten ed ora
(www.ruwpa.st-and.ac.uk/distance). Este endereço também oferece vários cursos
e publicações associadas à metodologia de uso do programa, bem como todos
os capítulos do seu principal manual. O software DISTANCE, de fácil utiliza­

177
LAURY CULLEN JR.
RUDY RUDRAN

ção, é apresentado de maneira que auxilia o usuário com explicações detalhadas


durante todos os passos da análise. Embutidos no programa DISTANCE estão
vários modelos para as funções de detecção e ajustes matemáticos que serão
automaticamente e estatisticamente selecionados para uma boa estimativa de
densidade.

Recomenda-se que, durante a análise dos dados no programa DISTANCE, o


usuário tente todas as funções principais disponíveis, associadas aos seus
ajustes. Essas análises devem ser feitas separadamente, ou seja, o usuário
deve escolher um modelo e seu ajuste e realizar a análise em sequência.
Depois, selecionar outro modelo e seu ajuste e realizar a análise novamente.
Geralmente os modelos e ajustes mais utilizados são: 1) Uniform + Cosine; 2)
Uniform + polynomial; 3) Half-normal + Hermite e 4) Hazart rate + Cosine.
As análises devem ser feitas separadamente, considerando pelo menos todas
essas quatro com binações de modelos. O modelo com menor valor de AIC
(Aikaike’s Information Criterion) deve ser escolhido como o de melhor ajuste
aos seus dados. Em seguida, usando apenas o modelo selecionado, utilize
diferentes filtros (por exemplo, tente truncar distâncias ou extremos que não
necessariamente se comportam como a maioria de seus dados). Lembre-se que
são as distâncias próximas da» trilha que têm maior importância no ajuste e na
escolha do modelo. Devem-se agrupar dados para análise, se esses foram real­
mente coletados em classes de intervalos. Caso contrário, deve-se fazer a aná­
lise com dados contínuos.

Depois de realizar a análise com o mesmo modelo, porém com diferentes fil­
tros, devem-se observar os valores de GOF (Goodness of Fit: > GOF). Um
maior (> ) valor de GOF significa um melhor ajuste da função e, consequente­
mente, um resultado de densidade mais preciso. Assim, o índice AIC deve ser
utilizado para escolher entre modelos e o índice GOF deve ser utilizado para
selecionar, dentro de um mesmo modelo, a modelagem com melhor ajuste
dentro da mesma função. Cuidado especial deve ser tomado com o modelo
Hazart-rate, pois ele normalmente apresenta resultados irreais, principalmente
quando existe uma grande quantidade de distâncias observadas próximas à
trilha. O bom senso e o conhecimento da história natural da espécie analisada
servirão para descartar tais resultados.

E muito importante que o usuário se fam iliarize com o programa antes de


conduzir sua análise principal. Usar os arquivos de exemplo incorporados no
programa, para conhecer a rotina do softw are e considerar as várias possibi­
lidades de análise, são recom endações úteis. Quando em dúvida, não se

178
TRANSECTOS LINEARES NA ESTIMATIVA DE
DENSIDADE DE MAMÍFEROS E AVES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

deve prosseguir. Deve-se incluir questionam entos na lista de discussão do


DISTANCE, enviar mensagens eletrônicas para jiscm ail@ jiscm ail.ac.u k, es­
crevendo no corpo da mensagem “join distance-sam pling”, seguido do pri­
meiro nome e sobrenome do pesquisador (por exemplo: join distance-sam-
pling Laury Cullen). Não colocar nada no campo do assunto. Com certeza,
serão obtidas uma resposta e uma ótima solução para o seu caso, vinda de
vários praticantes e profissionais no assunto.

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179
S Levantamento rápido de mamíferos terrestres
de médio e grande porte
- . Renata Pardini
Departamento de Ecologia, Instituto de Biociências, USP

Eduardo Humberto Ditt


IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Laury Cullen Jr.


IPÊ- Instituto de Pesquisas Ecológicas
Clarice Bassi
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Rudy Rudran
Smithsonian Institution, USA

Introdução
Entre os mamíferos, existe uma variação muito grande de tamanho corpóreo,
hábitos de vida e preferências de hábitat. Por isso, pesquisas e inventários de
mamíferos requerem a utilização de várias metodologias específicas para dife­
rentes grupos de espécies (Voss & Emmons 1996). Dentre estes grupos, os
mamíferos de médio e grande porte das florestas neotropicais, particularmente
os de hábitos terrestres, têm sido pouco abordados em estudos ecológicos,
especialmente no que diz respeito à composição, estrutura e dinâmica de comu­
nidades. Os hábitos predominantemente noturnos da maioria das espécies, as
áreas de vida relativamente grandes e as baixas densidades populacionais di­
ficultam o estudo como, por exemplo, de tatus, tamanduás, cutias, pacas,
antas, porcos-do-mato, veados e carnívoros de nossas florestas.

Nos últimos anos, entretanto, o núm ero.de trabalhos, principalmente auto-


ecológicos, que estudam esses mamíferos aumentou consideravelmente. Infor­
mações sobre a dieta, uso de hábitat e tamanho da área de vida começam a ficar
disponíveis para alguns desses animais (Kiltie 1981a, b; Cárter & Encarnação
1983; Rabinowitz & Nottingham 1986; Emmons 1987, 1988; Crawshaw 1989;
Konecny 1989; Bodmer 1989, 1990, 1991; Crawshaw & Quigley 1991; Olmos’
1993; Fragoso 1994; Motta-Junior et al. 1994; MacDonald & Couternay 1996;
Facure & Monteiro-Filho 1996; Facure & Giaretta 1996; Pardini 1998, Pardini
& Trajano 1999; Olmos et al. 1999; Bezerra et al. 2001; Rodrigues et al. 2001).

181
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLA RICE BASSI
RUDY RUDRAN

O conhecim ento da biologia dessas espécies, por sua vez, tem colocado em
evidência a im portância desses mamíferos em uma série de processos nos
ecossistemas florestais. Aparentemente, as espécies frugívoras e/ou herbívo­
ras, como antas, veados, porcos-do-mato e roedores de grande porte, desem­
penham papel muito importante na manutenção da diversidade de árvores da
floresta, através da dispersão e predação de sementes e da predação de plântu-
las (De Steven & Putz 1984; Dirzo & Miranda 1991; Fragoso 1994), ao passo que
os carnívoros regulariam as populações de herbívoros e frugívoros (Emmons
1987; Terborgh 1988, 1990, 1992; Terborgh et al. 2001). A baixa densidade ou
a extinção local de predadores de topo aparentemente leva também ao aumento
de densidade de espécies de médio porte de hábitos generalistas (mesopreda-
dores), o que pode, por sua vez, causar alterações drásticas nas comunidades
de pequenos vertebrados, como aves ou pequenos m am íferos (Fonseca &
Robinson 1990; Palomares et al. 1995; Rogers & Caro 1997; Terborgh et al.
1997; Sieving & Karr 1997; Crooks & Soulé 1999).

A fauna e a flora brasileiras vêm sendo constantemente ameaçadas pelos des-


matamentos, e consequente pela fragmentação das florestas, o que causa a
perda de hábitat, a restrição do tamanho populacional e o isolamento de popu­
lações locais (Wilcox & Murphy 1985; Shafer 1990; Saunders et al. 1991). A
preocupação çom os efeitos das perturbações humanas nas comunidades b io­
lógicas é ainda mais urgente com relação aos mamíferos de médio e grande
porte, que necessitam de áreas comparativamente maiores e estão sujeitos à
caça. A pressão de caça é, sem dúvida, uma das principais ameaças a esses
animais, tanto em áreas de floresta contínua na Amazônia (Redford, 1992;
Robinson & Bennett, 2000), mas principalm ente em florestas fragmentadas
como a Mata Atlântica (Cullen et al., 2 0 0 0 , 2001 e o Capítulo 23 de Avaliação
da sustentabilidade da caça no neotrópico, neste volume). O grau de ameaça e
a importância ecológica do grupo tornam, portanto, evidente a necessidade de
se incluir informações sobre os mamíferos terrestres dtí grande porte em in­
ventários e diagnósticos ambientais.

O método trad icionalm ente utilizado para tais levantam entos é o de cen ­
sos visüais em transectos lineares, m uito utilizado em estudos realizados
na região A m azônica e da A m érica Central (Eisenberg & Thorington 1973;
Eisenberg et al. 1979; Charles-Dominique et al. 1981; Glanz 1982; Terborgh
1983; Emmons 1984; Jason & Emmons 1990) e em alguns casos na Mata Atlân­
tica (Cullen et al. 2000, 2001; Chiarello 1999, 2000). Porém, as visualizações
de algumas espécies nesses estudos são muito raras (em geral, carnívoros).

182
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Além disso, algumas regiões florestais apresentam densidades de mamíferos


relativamente mais baixas, o que torna o método de censo pouco eficaz, espe­
cialmente quando o tempo disponível para o estudo é pequeno.

A contagem de pegadas para a estimativa da frequência relativa de espécies de


mamíferos terrestres de médio e grande porte já vem sendo mencionada na
literatura como alternativa ao método de censo há algum' tempo (Keith & •
Windberg 1978; Soutiere 1979; Pulliainen 1981; Raine 1983; Reid et al. 1987;
Emmons et aí. 1989; Thompson et al. 1989; Carrillo et al. 2 0 0 0 ). Nestes traba­
lhos, o número de pegadas foi determinado em ambientes naturalmente favo­
ráveis à impressão de rastros, como locais com frequentes nevascas (Keith &
Windberg 1978; Soutiere 1979; Pulliainen 1981; Rain« 1983; Reid et al. 1987;
Thompson et al. 1989) ou cotn acúmulos de sedimento fino, como estradas ou
praias de rio (Emmons et al. 1989). Dirzo & Miranda (1990) adaptaram este
método para as florestas tropicais, por meio da disposição de parcelas artifi­
ciais de areia ao longo de trilhas no interior da floresta.

Resultados baseados na captura de animais em armadilhas indicam que o


número de pegadas deixadas na neve é um bom índice da abundância de
espécies de pequenos carnívoros em florestas temperadas (Thompson et al.
1989). Por exemplo, o número de pegadas encontradas em estradas reflete a
abundância do puma (P um a con color) em diferentes áreas dos Estados Uni­
dos. Entretanto, não existem informações na literatura que confirmem a vali­
dade do método quando se usam parcelas^ de areia em trilhas de florestas
tropicais.

Neste capítulo, temos como objetivo apresentar a metodologia de registro de


pegadas em parcelas de areia e discutir as vantagens e desvantagens desse
método de levantamento. Neste sentido, iremos inicialm ente apresentar e com­
parar as frequências relativas de ocorrência das espécies terrestres de mamífe­
ros de grande porte obtidas por meio do método de registro de pegadas em
parcelas de areia e por meio do método de censo visual em três áreas de flores­
ta no interior do Estado de São Paülo (tabela 1 ). Os resultados com o método
de parcelas nessas três áreas serão também utilizados para indicar o esforço de
amostragem mínimo necessário para que se obtenha a riqueza de mamíferos
terrestres de grande porte em uma dada área. Serão também apresentados e
comparados os resultados do método de registro de pegadas utilizando-se par­
celas de areia dispostas ao longo e fora de trilhas e parcelas iscadas com diferen­
tes iscas. Finalmente, será apresentado um exemplo de utilização do método em
um diagnóstico ambiental do entorno do Parque Nacional das Emas, Goiás.

183
RENATA PARDINI •
EDUARDO HUM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLARICE BASSI
RUDY RUDRAN

Tabela 1. tam anho, pressão de caça e localização das três áreas de floresta semidecídua
estudadas no interior do Estado de São Paulo. Fonte: Cullen (1997).

Parque Estadual Fazenda Mosquito Fazenda Tucano


- do Morro do Diabo

Área (ha) 35.000 2.100 2.000

Localização 22 ° 50’ S, 52° 30’ W 22 ° 67’ S, 51° 52’ W 22 ° 48’ S, 52° 47’ W

Pressão Baixa: área do Moderada: área Alta: área privada,


de caça governo estadual, privada, distante dé 50 famílias vivem
bem protegida habitações humanas, a 50 m da floresta,
mas com visitas caça frequente
V eventuais de na área
caçadores

Comparação com o censo: métòdos


Parcelas de areia
Em cada uma das três áreas de floresta, utilizamos 100 parcelas de areia a
intervalos de, em média, 10 metros de distância. Cada parcela consiste de uma
área de 50 cm x 50 cm preenchida com areia fina e úmida até uma altura de em
média 3 cm. A área de cada parcela foi previamente limpa, retirando-se a vege­
tação e o folhiço e a areia foi colocada sem pressioná-la para baixo, para permi­
tir o registro de pegadas de animais mais leves.

As 100 parcelas de cada área foram distribuídas em três a seis trilhas diferen­
tes com 15 a 35 parcelas cada, dependendo do número de trilhas já abertas
disponíveis e do tamanho das florestas. Em cada uma das parcelas foram colo­
cadas iscas de um pedaço de banana. As pegadas foram registradas diariamen­
te, durante quatro ou cinco dias consecutivos, sem chuva. Em cada visita
diária, a areia das parcelas era remexida para apagar as pegadas e descompac­
tar a areia. Se necessário a areia também era umedecida. A identificação das
pegadas foi baseada em Becker &'Dalponte (1991). Cada registro representa a
presença de pegada de uma determinada espécie em uma dada parcela de areia
em um dia. A figura 1 ilustra as pegadas de algumas espécies de mamíferos
terrestres de médio e grande porte.

184
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Cateto (Tayassu tajacu) Ouriço (Coendou prehensilis)

Anta (Tapirus terrestris) Onça-pintada (Panthera onca)

***

Tapiti (Sylvilagus brasiliensis) Mão-pelada (Procyon cancrivorus)

Figura 1. Pegadas de mamíferos registradas nas parcelas de areia.

185

*
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR. *
CLARICE BASSI
RUDY RUDRAN

Censo em transectos lineares


A abundância das espécies de mamíferos terrestres de grande porte foi calcu­
lada nas mesmas três áreas através de censos em transectos lineares (Eisenberg
et al. 1979; Emmons 1984; Peres 1996; Bodmer et al. 1997, Cullen 2000, 2001,
capítulo 7 neste volume). Gs valores de abundância para cada espécie foram
dados pelo número de indivíduos avistados para cada 10 km de censo. Em
cada uma das três áreas de estudo foram estabelecidos de quatro a oito transec­
tos variando de 0.5 a 8 km de extensão, percorridos diversas vezes, mas nunca
mais de uma vez por dia. Os transectos foram marcados em campo com fitas a
cada 50 m e a vegetação foi aberta para facilitar o deslocamento. A distância
acumulada nos censos em cada área variou de 161 a 618 km. Os censos foram
realizados das 6 às 10 horas da manhã e, novamente, das 3 às 7 horas da tarde,
andando lentamente (1 km/h) e parando momentaneamente a cada 50-100 m.
A maioria dos censos foi realizada por uma pessoa sozinha.

Resultados
E importante ressaltar, inicialm ente, que, em apenas cinco dias de coleta de
dados, o método das parcelas de areia possibilitou o registro de 19 espécies de
mamíferos terrestres de médio e grande porte, contra 14 espécies obtidas com
o método de censo ao longo de um ano de estudo, considerando-se o conjunto
das três áreas (tabelas 2 e 3). Um número maior de espécies foi registrado por
meio das pegadas também em duas das três áreas estudadas. Este maior núme­
ro de espécies está associado principalmente aos carnívoros, raramente visua- .
lizados em censos. Além disso, as parcelas parecem ser mais eficientes para o
registro de animais de hábitos predominantemente noturnos como o gambá, a
paca, o tapiti e o cachorro-do-mato (tabela 2 e 3).

Por outro lado, o método de parcelas de areia não indica adequadamente a


presença ou frequência relativa das duas espécies de porcos-do-mato (tabelas
2 e 3). Esses animais têm hábitos sociais e se locomovem em bandos relativa­
mente coesos por extensas áreas de floresta (Fragoso 1994). No caso dos quei­
xadas, que realizam os maiores deslocamentos de longa distância entre os
mamíferos não voadores de florestas neotropicais, se o censo por transectos
lineares não for realizado durante um longo período, as estimativas de abun­
dância também podem ser bastante desviadas (Fragoso 1994).

Oito espécies de mamíferos terrestres foram registradas pelos dois métodos,


permitindo a comparação dos resultados (tabela 4). Apesar do número de áreas
amostradas ser insuficiente para a realização de testes estatísticos, verifica-se

186
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Tabela 2. Número de registros de pegadas de mamíferos terrestres em parcelas de areia em


três áreas de floresta do interior do Estado de São Paulo.

Espécie Nome Popular P. E. Morro Fazenda Fazenda


do Diabo Tucano Mosquito

Didelphis albiventris gambá 116 74 2


Sylvilagus brasiliénsis tapiti 200 4 15
Dasyprocta aza ra e Cutia 159 322 1
Agouti paca paca 1 0 4
Cavea sp. preá 4 0 0
Dasypus novemcictus tatu-galinha 0 35 21
Cabassous sp. tatu-rabo-de-couro 0 0 2
Tamandua tetradactyla tamanduá-mirim 0 0 1
Mazama spp. veado 4 • 0 1
Tayassu pecari queixada 0 0 3
Tapirus terrestris anta 23 0 17
Galictis vittata furão- 1 3 0
Eira barbara irara 0 2 0
Nasua nasua coati 2 0 48
Leopardus wiedii + L. tigrina gato-do-mato 0 0 1
Leopardus pardalis jaguatirica 32 9 0
Cerdocyon thous cachorro-da-mato 11 ' 0 5
Puma concolor- onça-parda 15 0 0
Panthera onca onça-pintada 29 0 0
Total de espécies 13 7 13
TotaF de registros 597 449 121
Esforço (parcelas/dia) 500 500 400

que para todas essas espécies, o número de pegadas indica claram ente em
quais áreas de floresta esses animais são comuns e onde são mais raros, levan­
do-se em consideração o resultado dos censos. Além disso, para cinco das
oito espécies (Tapirus terrestris, N asu a n a s u a , L e o p a r d u s p a r d a lis , Pum a
concoloT e Panthera on ca), os resultados obtidos com os dois métodos geram
a mesma ordenação de abundância entre as três áreas (tabela 4).

187
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLA RICE BASSI
RUD Y RUDRAN

Tabela 3. Visualizações por cada 10 km de censo de espécies de mamíferos terrestres em


três áreas de floresta do interior do Estado de São Paulo, segundo Cullen (1997).

Espécie Nome Popular P. E. Morro Fazenda Fazenda


do Diabo Tucano Mosquito

Sylvilagus brasiliensis tapiti 0 0.02 0.06


Dasyprocta aza ra e cutia 1.39 0.92 0.06
H idrochaerís hidrochaeris capivara 0.05 0 0
Dasypus sp. + Cabassous sp. tatu 0.01 0.16 0.29
M azam a spp. veado 0.10 0 0.29
Tayassu p ecari queixada 6.72 0 0.66
Pecari tajacu cateto 4.45 0.52 0.08
Tapirus terrestris anta 0.13 0 0.12
Eira barbara irara 0.01 0 0
Nasua nasua coati 0.28 0.20 1.79
Herpailurus yaguarondi gato-mourisco 0.01 0 0
Leopardus p ardalis jaguatirica 0.01 0 0
Puma concolor onça-parda 0.06 0 0
Panthera onca ónça-pintada 0.01 0 0
km censados 618 161 474
Total de espécies 13 5 8

188
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Tabela 4. Número de registros em parcelas de areia e número de visualizações durante censo


para as oito esp é cie s de m am íferos terrestres registradas pelos dois m étodos nas três
áreas de floresta do interior do Estado de São Paulo. PMD - Parque Estadual Morro do Diabo,
FM - Fazenda Mosquito, FT - Fazenda Tucano. Em negrito, os valores que mais se distinguem
entre as três áreas e que coincidem com os dois métodos.

Espécie Local Visualizações / Registros /


10 Km de censo parcelas /dia

Dasyprocta azarae PMD 1.390 0.318


Cutia FM 0.060 0.003
FT 0.920 0.644
Dasypus sp. C abassous sp. PMD 0.010 0
Tatu FM 0.290 0.056
FT 0.160 0.070
Mazama spp. PMD 0.100 0.008
Veado FM 0.290 0.003
FT 0 0
Tapirus terrestris PMD 0.130 0.046
Anta FM 0.120 0.043
f FT 0 0
Nasua nasua PMD , 0.280 • 0.004
Coati FM 1.790 0.120
FT 0.200 0
Leopardus p a rd a lis PMD 0 .010 0.064
Jaguatirica FM 0 0
FT 0 0.018
Puma con color PMD 0.060 0.030
onça-parda FM 0 0
FT 0 0
Panthera onça PMD 0.010 0.058
onça-pintada FM 0 0
FT 0 0

189
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLARICE BA SSI
RUDY RUDRAN

Esforço amostrai com parcelas de areia para a estimativa da riqueza


de mamíferos terrestres de grande porte: métodos
Utilizando-se o programa EstimateS (Colwell 1997), foram construídas curvas
médias de incremento do número de espécies com o aumento do esforço de
amostragem (número de parcelas/dia) e foram calculados os números, totais
estimados de espécies de grandes mamíferos terrestres, por meio de três esti­
madores não paramétricos (Chaol, Jacknifel e Bootstrap), para cada uma das
três áreas de estudo. Os cálculos foram realizados considerando um dia de
verificação em cada parcela de areia como amostra, através de 50 sorteios alea­
tórios de sequências dessas amostras. As fórmulas de cálculo dos estimadores
de número de espécies podem ser encontradas em Colwell & Coddington (1994).

Resultados
A figura 2 mostra as curvas médias de acúmulo de espécies de grandes mamí­
feros terrestres com o aumento do esforço de amostragem para cada uma das
três áreas de estudo. Observa-se que no caso das duas áreas amostradas du­
rante 5 dias (Parqüe Estadual Morro do Diabo e Fazenda Tucano) as curvas
tendem à estabilização do número de espécies com o esforço realizado. Na
Fazenda Tucano, de. áréa menor e maior pressão de caça (tabela 1 ), esta estabi­
lização ocorre com um esforço de amostragem menor do que no caso do Morro
do Diabo, o qual, pelo menor tamanho e pela menor pressão de caça, apresenta
uma riqueza de espécies bem maior.

Por outro lado, o número de espécies não chegou a estabilizar-se no caso da


Fazenda Mosquito, amostrada por um número menor de dias (4 dias de amos­
tragem). A não estabilização deve estar relacionada não apenas ao menor esfor­
ço realizado, mas também ao fato dessa área de tamanho equivalente à Fazenda
Tucano, mas com uma menor pressão de caça (tabela 1 ), abrigar um número
elevado de espécies, porém em densidades mais baixas que o Parque Estadual
Morro do Diabo (tabelas 2 e 3). Ou seja, um maior esforço é necessário para
registrar as espécies nessa área onde elas são relativamente mais raras.

De fato, os valores em número de espécies de grandes mamíferos terrestres


observados para o Parque Estadual Morro do Diabo e para a Fazenda Tucano
estão muito próximos dos valores (ou dos intervalos de valores) totais espera­
dos pelos estimadores Chao 1 , Jacknife 1 e Boostrap (tabela 5). O mesmo não
ocorre para Fazenda Mosquito, cujos valores estimados para o número total de
espécies de grandes mamíferos terrestres são maiores do que os observados,
no caso de dois dos três estimadores utilizados (tabela 5).

190
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

P. E. MORRO DO DIABO

0 1 100 200 300 400 500

esforço de amostragem (parcelas - dia)

FAZENDA TUCANO

V
100 200 300 400 500

esforço de amostragem (parcelas - dia)

FAZENDA MOSQUITO

100 200 300 400 S00

esforço de amostragem (parcelas - dia)

Figura 2. Curvas médias de acúmulo do número de espécies de mam íferos terrestres de


grarídé porté com o aumentò do esforço de amostragem para as três áreas de estudo.

191
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLARICE B A SSI u*
RUDY RUDRAN

Tabela 5. Número de espécies de mamíferos terrestres de grande porte observado e estima­


do através de três diferentes estimadores de riqueza, para três áreas de floresta do Estado
de São Paulo. Entre parênteses, desvio padrão.

Riqueza
Local Chao 1 Jacknife 1 Bootstrap
obtida

Fazenda Tucano 7 (0) 7(0) 7.20 7

P. E. Morro do Diabo 15 (3.74) 15 (1.41) 13.91 13

Fazenda Mosquito 17 (5.29) 16.99 (1.99) 14.81 13

Isc a s e posicionamento das parcelas: métodos


Com o intuito de testar o efeito do uso de diferentes iscas e da posição das
parcelas na frequência de registro de pegadas, foram distribuídas 160 parcelas
de areia na Reserva Biológica de Una, Sul da Bahia. As parcelas forapi divididas
em dois grupos de 80, um deles disposto ao longo de uma trilha antiga e larga
que corta a Reserva e outro disposto paralelamente ao primeiro, mas a 10 metros
da trilha, no meio da mata. Três tipos de iscas foram usadas: banana, bacon e sal
grosso. Em cada grupo de 80 parcelas, subgrupos de 5 parcelas foram iscadas
diferentemente, de forma que se alternaram no ambiente quatro subgrupos isca­
dos com banana, quatro com bacon , quatro com sal grosso e quatro sem isca. As
parcelas foram verificadas durante quatro dias consecutivos sem chuva.

Resultados
As parcelas de areia apresentaram resultados muito semelhantes nos dois
ambientes amostrados (trilha e fora de trilha), tendo registrado o mesmo nú­
mero de espécies e as mesmas espécies, com exceção do coati (dois registros) e
tamanduá-mirim (um registro), que apareceram em apenas um dos ambientes
amostrados (tabela 6 ). Esse resultado é esperado, já que os dois grupos de
parcelas foram colocados em áreas bastante próximas, e estão amostrando a
mesma fauna.

Por outro lado, o número total de registros foi maior fora da trilha (92 em
comparação a 81), o que se deve ao maior número de registros de gambá neste
ambiente. Esse marsupial foi a única espécie em que a diferença do número de
registros foi estatisticamente significativa entre os dois ambientes, mostrando
possivelmente uma preferência por locais mais protegidos do interior da mata.

192
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

Apesar do número baixo de registros para alguns tipos de isca não permitir
análise estatística na maior parte das espécies, verifica-se que os animais res­
ponderam nitidamente de maneira diferente às iscas utilizadas (fabela 6 ). A
banana e o b a co n foram as iscas mais eficientes tendo resultado no maior
número de espécies (7) e nos maiores números totais de registro. No caso da
cotia e do gambá, as duas espécies com maior frequência relativa nessa amos­
tragem, e do tapiti, o maior número de registros ocorreu nas parcelas iscadas
com banana. Já os marsupiais de menor porte e o tatu-galinha parecem ter sido
mais atraídos pelo bacon .

Tabela 6. Número de registros de pegadas de mamíferos nas parcelas de areia com diferen­
tes iscas na Reserva Biológica de Una, Sul da Bahia.

Espécies Nome Popular Banana B acon Sal Sem isca Total P

Marsupiais 1 2 0 1 4
pequenos
Metachirus cuíca-quatro- 6 9 3 0 18
nudicaudatus olhos
Didelphis aurita Gambá • 25 16 5 5 51 < 0 .001*

Dasypus tatu-galinha 1 3 1 3 8
novemcictus ‘
Dasyprocta sp. Cutia 35 21 15 9 80 < 0 .0 0 1 *

Sylvilagus Tapiti 8 1 0 0 9
brasiliensis
Nasua nasua Coati 1 1 0 0 2

Tamandua tamanduá- 0 0 0 1 1
tetradactyla mirim
Total de espécies 7 7 4 5 8

Total de registros 77 53 24 19 173


/

P= probabilidade associada ao teste de qui-quadrado comparando os resultados da mata e


trilha. * diferença significativa, a = 0,05

193
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CULLEN JR.
CLARICE B A SSI ,
RUDY RUDRAN

O sal grosso, que foi utilizado com o intuito de atrair os ungulados, não apre­
sentou os resultados esperados. Sabe-se que a anta e o queixada estão prova­
velmente extintos na região, mas tanto o veado-mateiro e o cateto são ainda
relativamente comuns e um indivíduo de cada espécie foi observado em uma
ocasião na área de amostragem durante ò trabalho. É provável que esses ani­
mais não sejam atraídos por quantidades pequenas de sal, como as dispostas
nas parcelas.

Conclusões e considerações sobre a utilidade do método


1 . O método de registro de pegadas em parcelas de areia, aplicado durante
períodos curtos, mostrou ser satisfatório para o levantamento das espécies
de mamíferos terrestres de médio e grande porte presentes em áreas de
floresta. O método foi çficiente para o registro dos carnívoros e de ani­
mais de hábitos noturnos, para os quais o método de censo, mesmo quando
aplicado em longo prazo, não é eficiente. Por isso, este método parece ser
bastante adequado para levantamentos rápidos, permitindo a utilização
de inforiáações seguras sobre a presença dos mamíferos de médio e gran­
de portes (em contraposição ao método de entrevistas) e comparáveis en­
tre áreas (em contraposição à procura aleatória de pegadas) na realização
de diagnósticos ambientais (CAIXA 1 ).

2 . Na obtenção da riqueza de espécies de mamíferos terrestres de grande porte


em florestas tropicais, o método de registro de pegadas em parcelas de areia
apresenta uma grande vantagem relacionada com a facilidade de utilização
de estimadores de riqueza. Como a delimitação de amostras no método das
parcelas de areia é simples e é possível utilizar um número bastante grande
de amostras, o método é adequado ao uso desses estimadores.

3. O esforço amostrai de 5 dias com 100 parcelas de areia é provavelmente


adequado para a obtenção da riqueza de espécies de mamíferos terrestres
de médio e grande portes na maioria das florestas, incluindo aquelas bem
preservadas, com alta riqueza e abundância, como também aquelas com
fauna empobrecida pela forte pressão de caça. Em áreas ricas, mas com
baixa densidade das espécies, entretanto, uma amostragem mais intensa
pode ser necessária.

4. Como uma medida, não só da presença das espécies, mas de suas frequên­
cias relativas entre áreas, o método de registro de pegadas em parcelas de
areia, mesmo quando aplicado durante períodos de poucos dias, possibili­
tou diagnosticar as áreas com maior e menor abundância para várias espé-

194
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

cies. É provável que, se o método for aplicado ampliando-se o esforço de


amostragem tanto no tempo quanto no espaço, seja possível a obtenção de
dados de frequência relativa mais precisos.

5. Ao se utilizar o método, deve-se ter em mente que a presença ou a frequên­


cia rélativa das duas espécies de porcos-do-mato que ocorrem em nossas
florestas não são adequadamente refletidas pelo número de pegadas encon­
tradas nas parcelas. Pelas características da organização social dessas espé­
cies, os resultados obtidos com censos visuais em transectos lineares tam­
bém devem ser interpretados com cautela.

6 . Apesar do método de registro de pegadas em parcelas de areia ser adequa­


do para a comparação da frequência de uma espécie entre diferentes áreas,
ele não é um método que possa ser utilizado na comparação da frequência
entre espécies de uma mesma área, ao contrário do método de censo em
transectos lineares. Isso porque o padrão de deslocamento, o tamanho das
áreas de vida e outras características que diferem grandemente entre as
espécies de mamíferos terrestres, impedem que se assegure a premissa que
seria necessária de que o número de pegadas e o numero de indivíduos de
uma área apresentem o mesmo tipo de correlação em todas as espécies da
comunidade. Ao contrário, é de se esperar que a forma da correlação seja
bastante diferente entre as diferentes espécies do grupo.

7. O método de registros de pegadas em parcelas de areia apresentou resulta­


dos bastante semelhántes quando as parcelas foram dispostas ao longo e
fora dessas trilhas. Aparentemente, entretanto, as espécies de menor porte
podem ser mais facilmente registradas fora de trilhas largas, provavelmente
por evitarem a exposição em ambiente de vegetação mais aberta.

8 . A utilização de determinadas iscas nas parcelas de areia pode facilitar o


registro de algumas espécies, podendo ser bastante útil, principalmente,
em levantamentos rápidos ou em áreas com baixa densidade. Porém, deve
ser lembrado que para a comparação de áreas é necessária a padronização
da utilização de iscas, para evitar interferência nos resultados.

195
RENATA PARDINI
EDUARDO H UM BERTO DITT
LAURY CfJLLEN JR.
CLARICE BASStf
RUDY RUDRAN

CAIXA 1
ESTUDO DE CIRCULAÇÃO DE FAUNA NO ENTORNO DO PARQUE NACIONAL DAS
EMAS/ GO: UM EXEMPLO DA UTILIZAÇÃO DO MÉTODO DE REGISTRO DE PEGA­
DAS EM PARCELAS DE AREIA EM DIAGNÓSTICOS AMBIENTAIS
O Parque Nacional das Emas (PNE), com seus 1.330 km2 de área, é considerado a mais
importante reserva de cerrado, bioma que vem sendo o principal alvo da expansão agrícola
e pecuária no país. A construção de uma ferrovia na área de entorno do parque e os estudos
de impacto ambiental relacionados ao empreendimento levaram à realização de uma série de
diagnósticos, exigidos pelos órgãos ambientais. Um deles foi uma avaliação da importância
das áreas naturais do entorno para a fauna do parque, com o intuito de subsidiar estratégias
para mitigar os efeitos da ferrovia sobre a fauna em um contexto de paisagem.
Os mamíferos terrestres de médio e grande porte foram um dos grupos da fâuna escolhi­
dos para esta avaliação. Através da identificação, caracterização e mapeamento das áreas
naturais presentes em um polígono de 117 km x 140 km que inçlui a área do Parque,
foram escolhidas 4 áreas naturais consideradas como mais relevantes na paisagem e 2
tipos principais de matrizes, lavouras e pastagens. Amostragens padronizadas com 500
parcelas/dia foram realizadas no Parque e em cada uma das quatro áreas naturais do
entorno. A ocorrência das espécies nas matrizes foi avaliada através da observação direta
de animais nestes ambientes e do número de animais mortos nas rodovias ao redor do
Parque. Foi estabelecido, a priori, um sistema de interpretação da condição de circulação
da fauna na região de estudo, baseado no seguinte esquema:

Áreas PNE Áreas Matriz Interpretação


naturais do entorno

presente presente presente • 1.a Existe circulação, são


(matriz é duas subpopulações e trocam
permeável) indivíduos OU são a mesma
ausente população
(matriz não 2 .a São duas populações
é permeável) . isoladas, troca de indivíduos
dependente de corredores
presente ausente presente 3.b Os fragmentos não são
(matriz é adequados OU
permeável) 4.b Os fragmentos são muito
ausente distantes
(matriz não 5.c População do parque é
é permeável) isolada; possibilidade de
implantação de corredores
ausente presente presente 6 .c Os hábitats do parque não
(matriz é são adequados
permeável) 7.c Os fragmentos são muito
ausente distantes do PNE
(matriz não 8 .c Espécie necessita de
é permeável) corredor para dispersar
9.d Espécie de área alterada
D aüsente ausente presente ou migrante

196
LEVANTAMENTO RÁPIDO DE MAMÍFEROS TERRESTRES
DE MÉDIO E GRANDE PORTE

No total, foram obtidos 564 registros de pegadas de 20 espécies de mamíferos


terrestres.

Área Distância Riqueza de


Local Número
(km 2 ) mínima de registros mamíferos
do PNE (km)

Fazenda Bacuri 2 0 ,8 ' 167 9


Fazenda São Domingos 12 1,9 17 • 3
Fazenda Treze Pontos 68 7,9 102 13
Fazenda Morro Vermelho 103 7,7 78 11
Parque Nacional das Emas 1130 0 200 12

Fonte: C. F. & Ramos-Neto, M. B. (1998) Estudo de Circulação de Fauna no Entorno do Parque


Nacional das Em as, GO. Relatório Técnico. Licenciamento FERRO N O RTE, IBAMA, Tetraplan,
SR 20 p. ,

Utilizando-se o esquema estabelecido a priori, conclui-se que a maior parte


das espécies de mamíferos terrestres de médio e grande porte da paisagem que
inclui o Parque Nacional das Emas e as principais áreas naturais de seu entor­
no encontra-se nas seguintes situações: 1 ) onde a fauna circula pela matriz
entre o Parque e as áreas naturais do entorno e 2 ) onde as espécies ocorrem nas
manchas de hábitat e no PNE, mas não circulam entre eles. Essa análise sim­
ples e rápida permitiu concluir a importância da região de entorno do Parque
para a fauna do mosaico regional, além de responder a algumas questões bas­
tante importantes como:

1 . quais áreas naturais sustentam a fauna mais rica no entorno do parque;

2 . quais espécies provavelmente necessitam de corredores para dispersar


entre diferentes áreas do mosaico;

3; em que áreas seria mais importante o estabelecimento de corredores.

197
RENATA PARDINI _ .
EDUARDO HUMBERTO* DITT
LAURY CULLEN JR.
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201
Manejo e controle de danos
causados por espécies da fauna
Sandra M. C. Cavalcanti
Centro de Conservação do Pantanal,
Wildlife Conservation Society, W CS

Introdução
Todas as espécies da fauna silvestre possuem valores positivos ou benefícios
para a sociedade de uma maneira geral. Algumas pessoas gostam de ver e
ouvir espécies da fauna silvestre, outras gostam de caçar. Outras, ainda, sen­
tem um grande prazer em simplesmente saber que essas espécies existem e
vivem livres de qualquer dependência humana. Essas espécies possuem tam­
bém valores negativos, associados aos impactos adversos que elas podem cau­
sar, tais como danos a propriedades do homem, danos à agricultura, predação
sobre animais domésticos, ou simplesmente por serem consideradas espécies-
praga.

O valor de um recurso faunístico resume-se na somatória de todos os seus


valores positivos e negativos. O objetivo da disciplina do manejo de fauna se
baseia no aumento desses valores faunísticos, através do aumento do aspecto
positivo e/ou a redução dos atributos negativos de certas espécies. A maioria
dos programas de m anejo de fauna desenvolvidos no país é, geralm ente,
direcionada ao aumento dos valores positivos inerentes a certas espécies. O
manejo de fauna silvestre é normalmente visto em termos de proteção e sus­
tento de populações e do hábitat necessário para süa sobrevivência. Muito
menos atenção tem sido devotada ao aumento do valor dos recursos faunísti­
cos através da redução de valores negativos.

O manejo e controle de danos causados por espécies da fauna silvestre, sendo


.uma área específica da disciplina de manejo de fauna silvestre, se torna cada vez
mais importante, devido ao rápido e constante crescimento populacional e ao
uso cada vez mais intensificado de áreas naturais. À medida que conflitos entre
»
espécies da fauna silvestre e atividades antrópicas se tornam uma realidade,

203
SANDRA M. C. CAVALCANTI

existe a necessidade de sua redução. Planos ou ações de manejo de interesse


público, além de eficientes, devem ser justificáveis ecológica e economicamente.

O Brasil ainda não possui uma política de manejo, prevenção e controle de


danos causados por espécies da fauna silvestre. Em países que já possuem
programas desse tipo, eles são caracterizados por quatro etapas: 1 ) definição
do problema; 2) conhecimento da tecologia da espécie-problema; 3) aplicação
de métodos de controle e 4) avaliação desses métodos de controle.

A definição do problema se refere à determinação da espécie e ao número de


indivíduos causadores do problema, à quantidade de dano causado e/ou à
natureza do problema, e outros fatores biológicos e sociais relacionados ào
problema. O conhecimento da biologia da espécie-problema, principalmente
no que se refere ao tipo de conflito gerado, é extremamente importante para a
implementação de um método ou programa dé controle eficiente. A avaliação
dos métodos de controle permite que se faça uma estimativa da redução nos
danos causados em relação aos custos e aos impactos causados à espécie em
questão bem como a outras espécies.

As técrlicas descritas nesse capítulo consistem em metodologias que têm sido


aplicadas, em sua maioria, em outros paí&es. No Brasil, as informações sobre o
uso dessas práticas são ainda bastante escassas. O objetivo do presente capítu­
lo é introduzir o leitor às práticas existentes na área de manejo e controle de
danos, bem como discutir suas vantagens e desvantagens.

Captura e controle de esp é c ie s da fauna silvestre


Antes que qualquer ação de controle seja tomada, é importante que um indiví­
duo esteja ciente da legislação referente à espécie em questão. O manejo das
espécies da fauna silvestre brasileira é responsabilidade do Governo Federal,
cujo órgão atuante é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis, IBAMA. A Diretoria de Ecossistemas (DIREC), pela Divi­
são de Animais Silvestres (DEVIS), é a responsável pelo manejo de espécies
silvestres, juntamente com governos estaduais, pela aplicação da Lei de Cri­
mes Ambientais 9.605, criada em 12 de fevereiro de 1998.

De acordo com o artigo 29 da referida lei, é proibido matar, perseguir, caçar ou


apanhar espécimes da fauna silvestre sem a devida permissão, licença ou au­
torização da autoridade competente. O artigo 36 abre uma exceção ao abate de
animais e não o considera crime quando é realizado para proteger lavouras,
pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais. Porém, em
-MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

qualquer situação em que o controle seja necessário, ele deve ser legal e ex­
pressamente autorizado pela autoridade competente.

O IBAMA tem recebido vários pedidos para liberação da caça das espécies que
causam problemas, principalm ente dos estados de Tocantins, Paraná, Mato
Grosso do Sul, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Porémr
apesar de considerar a caça como um instrumento importante de manejo e
controle ambiental, o órgão federal não dispõe de recursos para estudos do
“status” populacional das espécies-problema (F. Dal’ava, comun. pessoal). Al­
gumas espécies danosas à agricultura, como a lebre-europeia (Lepus europaeus),
por exemplo, apesar de não serem nativas da fauna brasileira, têm sua caça
proibida em todo território nacional, com exceção do estado do Rio Grande do
Sul (Silva 1984). O artigo 29 da lei 9.605 (Parágrafo 3o), considera como fauna
silvestre todos os espécimes que tenham todo ou parte do seu ciclo de vida
ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro. A Representação Estadual
do IBAMA no Rio Grande do Sul está atualm ente trabalhando numa nova
portaria referente à caça, que abrangerá espécies que causam danos à agricultu­
ra e à pecuária no estado.

Quando procurado por produtores rurais, o IBAMA intervém, buscando re­


solver cada situação de acordo com as circunstâncias locais. O Brasil ainda
não possui uma política de manejo e controle de danos causados por espécies
da fauna silvestre. Cada caso é avaliado e o produtor é orientado a tomar
medidas que visem à proteção da plantação ou do rebanho doméstico em ques­
tão. Quando necessário, um técnico é enviado para avaliar o problema em uma
vistoria e, de acordo com as circunstâncias, pode ou não indicar a retirada do
excedente populacional. Até o presente momento, a retirada de animais exce­
dentes tem sido realizada apenas com capivaras (H ydiochaerís h y d ro ch a eris),
após extensivas tentativas de isolamento das áreas onde os problemas ocor­
rem, sendo os animais retirados da natureza enviados para criadouros comer­
ciais, através de um termo de cooperação técnica entre o IBAMA, a Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ-USP), a Pró-Fauna Asses-
soria e Comércio Ltda. e o Instituto Biológico de São Paulo.

O problema com a lebre-europeia é mais complicado, pela dificuldade da cap­


tura de indivíduos e pelo desconhecimento da biologia da espécie (M: P. Car-
bonari, comun. pessoal). Em situações como essa, o IBAMA opta pof convêni­
os com universidades para o desenvolvimento de estudos sobre a ecologia e a
biologia das espécies-pròblema (ESALQ - USP, UNESP Botucatu, UNESP Bau­
ru). No caso da pomba-amargosa (Z enaida au ricu lata), conhecida também como

205
SANDRA M. C. CAVALCANTI

avoante, o IBAMA tem feito uso de uma licença de caráter experimental para o
controle da espécie no estado de São Paulo. Renovações da licença são libera­
das mediante minuciosos relatórios técnicos/científicos (IBAMA 1998). Casas
da agricultura e associações de produtores rurais de diversos municípios tam­
bém mantêm contato com o órgão federal, colaborando para a formação de um
acervo dos principais problemas com espécies da fauna silvestre para que
futuras medidas de controle possam ser tomadas com maior eficiência.

A questão de colisões de pássaros com aeronaves em aeroportos e áreas adjacen­


tes é regulamentada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente, CONAMA,
através da resolução n° 4, de 9 de outubro de 1995, seguindo recomendações
da Organização Internacional de Aviação Civil. Propriedades vizinhas a aero­
portos e a instalações de auxílio à navegação aérea estão sujeitas a restrições
especiais. Áreas que se encontram em um determinado raio a partir dos cen­
tros geométricos dos aeroportos brasileiros são consideradas “Áreas de Segu­
rança Aeroportuária - ASA”. As Áreas de Segurança Aeroportuárias são divi­
didas em 2 categorias: 1) Raio de 20 km para aeroportos que operam de acordo
com as regras de voo por instr-umento; e 2) Raio de 13 km para os demais
aeroportos. Nessas áreas, não é permitida a implantação de atividades de natu­
reza perigosa, entendidas como foco de atração de pássaros, como, por exemplo,
matadouros, curtumes, vazadouros de lixo e culturas agrícolas que atraiam pás­
saros. Projetos para qualquer tipo de implantação ou aproveitamento de pro­
priedades localizadas nas ASA devem ser submetidos a autorização do Co­
mando Aéreo Regional - COMAR, que decide contrária ou favoravelmente
sobre a execução de tais projetos (Ministério da Aeronáutica 1987).

Princípios de manejo e controle de danos


A área de manejo de danos é bem complexa. Não existem guias ou receitas
para a determinação da situação exata em que o controle de danos seja neces­
sário. Cada situação individual deve ser avaliada de acordo com suas condi­
ções em relação a considerações ecológicas, como o impacto em outras espé­
cies, considerações econôm icas, sociais, éticas etc. Os danos causados por
espécies da fauna silvestre são normalmente associados à suas ativida'des de
alimentação. Atividades relacionadas à nidificação, construção de tocas ou
simples presença podem também muitas vezes estar associadas aos danos.
Porém, nem todos os conflitos gerados têm que ser necessariamente corrigi­
dos. O dano sustentado é que demanda a atenção de técnicos.

Para que uma estratégia de controle seja planejada de maneira eficiente, ela

206
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

deve ser desenvolvida em cooperação entre agências m ultidisciplinares que


trabalham na área. O controle de decisões não deve ser feito de maneira inde­
pendente. Vários aspectos e princípios devem ser levados em consideração.

A resolução de um problema torna-se difícil quando não existe seu reconheci­


mento. Existe a necessidade de se reconhecer os padrões e o potencial de dano
antes que ele ocorra. Por exemplo, em uma plantação de milho em que as espi­
gas foram encontradas comidas, o padrão de dano pode ser identificado através
da observação direta. Cervídeos que se alimentam de plantações de milho nor­
malmente deixam a espiga com uma pequena mordida nas pontas. Já o estorni­
nho (Sturnus vulgaris) ataca o milho verde, no período em que ele está macio.
Corvos e gralhas atacam a parte mais externa (superficial) dos grãos. Roedores
comem a espiga, enquanto fungos deixam “buracos” característicos de infecção.

E muito importante que o problema seja reconhecido quando o dano ainda é


ljiaixo, para que seja resolvido a tempo. Dessa maneira, há a possibilidade do
custo de controle ainda ser baixo, de existir um menor potencial de risco a
outras espécies e de o número de espécies afetadas ser menor. Nos Estados
Unidos por exemplo, uma espécie de roedor que cava túneis na terra, os p ocket-
gophers (Thom om ys talpoides), come somente a raiz de plantas novas em áreas
de reflorestamento. Ele tende a não atacar áreas com plantas adultas. Métodos
preventivos incluem a eliminação da vegetação nova antes do plantio de novas
plântulas e a colocação de veneno ao redor da' área a ser plantada para evitar
sua invasão. Quando a planta cresce, não há necessidade de preocupação.
Alguns roedores (M icrotus spp.j podem causar danos a laranjeiras no leste
dos Estados Unidos (O’Brien 1993). Métodos preventivos incluem a colocação
de uma tela ao redor do tronco das árvores. A determinação do potencial de
dano será possível baseando-se na situação da vegetação cobrindo o pomar. Se
for feita uma limpeza física ou química, conhecida como “modificação do hábi­
tat”, talvez não haja a necessidade das telas ao redor dos troncos.

O conhecimento das espécies que ocorrem na área também é importante. Se


existem pombas na área,, por exemplo, a construção de telhados sem parapei­
tos é mais indicada. O histórico do problema e mais uma parte da informação
que pode ajudar. Esse é um problema recorrente ou é o primeiro episódio?
Quais os resultados das ações de controle empregadas anteriormente? Quais
os prejuízos passados? Se o proprietário, por exemplo, perde 2 cabeças de
gado por ano por causa de ataques de onça-pintada (Panthera onca), e uma
cerca elétrica custa o preço de 20 cabeças de gado, esse método de controle se
torna inviável economicamente.

207
SANDRA M. C. CAVALCANTI

O entendimento da biologia das espécies em relação a práticas de manejo é


também muito importante para uma estratégia de controle eficiente. Por exem­
plo, gambás (D idelphis sp.j são capazes de escalar. O uso de telas de arame
como cercas ao redor de um galinheiro provavelmente não funcionará para
excluí-los da área. Estorninhos são animais gregários. Uma armadilha austra­
liana modificada (Bogatich 1967) conta com essa característica da espécie para
capturar essas aves de maneira eficiente. Alguns indivíduos são presos no
interior da armadilha e funcionam como chamariz para outros indivíduos.

O conceito de “unw elt” refere-se ao mundo de acordo com a percepção animal.


Uma cobra falsa poderia, por exemplo, ser utilizada como estímulo visual para
amedrontar roedores ou pássaros em uma determinada área. Mas apesar de
uma cobra causar as mais diversas reações de medo em humanos, pode passar
completamente despercebida pelos animais em questão, como ser confundida
* com um galho, por exemplo. Sim plesm ente porque os humanos veem algo
como assustador, não quer dizer que os animais percebam ou reajam ao estí­
mulo da mesma forma. Entendendo a biologia da espécie, é possível uma me­
lhor avaliação de £ua reação ao método de controle a ser aplicado.

A importância do conhecim ento de diferentes técnicas a serem empregadas


para o controle de danos se mostra em situações nas quais elas têm seu uso
' restringido. Se existe a escolha entre diferentes métodos, um programa de
controle pode ser mais eficientem ente implementado. O conhecim ento de
métodos alternativos possibilita uma flexibilidade para agir de acordo com
diferentes situações. Se só se conhece uma técnica a ser utilizada e por algum
motivo essa técnica não pode ser aplicada, não resta outra para a resolução do
problema. Mas se 5 ou 6 técnicas forem conhecidas, ainda restam alternativas
na impossibilidade do uso de algumas delas.

T écnicas de controle - Descrição geral


Modificação do hábitat e práticas culturais e de manejo
A atração de um animal por uma determinada área pode estar associada a
atividades de alimentação, acasalamento, construção de tocas, nidificação, pro­
teção ou pela sua simples presença. A remoção de um ou mais recursos essen­
ciais como água, proteção, alimentação ou espaço pode ser classificada como
uma modificação no hábitat de determinada espécie. A modificação no hábitat
é geralmente associada a modificações de comportamento.

Modificações no hábitat e algumas práticas culturais e de manejo podem ser

208
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

implementadas em várias situações para tornar algumas áreas menos atrativas


para a espécie causadora de danos. O controle de roedores em áreas rurais
pode ser alcançado através da remoção de cobertura vegetal densa no entorno
de cocheiras e outras edificações. Sem a proteção da cobertura vegetal, os ani­
mais não se sentem seguros e tendem a evitar a área. Cabe mencionar que essa
prática não é necessariamente não letal. No caso dos roedores, por exemplo,
desprovidos de proteção, podem vir a ser capturados por predadores, ou mes­
mo enfrentar a competição de outros indivíduos da espécie.

O plantio de lavouras atrativas alternativas, onde aves são encorajadas a se


alimentar, pode ser uma técnica economicamente efetiva. Essa prática é utiliza­
da para diminuir os danos causados em plantações comerciais próximas onde
outras práticas de controle são aplicadas, como por exefriplo o uso de estímu­
los visuais e acústicos (Cummings et al. 1987). O plantio de cultivares de
milho, soja e girassol resistentes a aves é outra prática que tem demonstrado
eficiência na redução de danos (Dòlbeer et al. 1982). Áreas com cobertura
vegetal densa são geralmente associadas com ataques a animais domésticos. A
limpeza de campos utilizados para o pastoreio desses animais domésticos pode
ser por vezes recomendável.

Exclusão
A exclusão consiste em manter um animal longe do alcance de determinado
item ou área. A área ou alvo de proteção pode variar de uma simples flor ou
árvore até grandes áreas, através do uso de cercas ou telas,, plásticas ou de
arame. A quilométrica cerca para dingos (Canis fa m ilia rís dingo) na Austrália
é um exemplo clássico do método de exclusão.

A metodologia de exclusão utilizada para proteção de árvores frutíferas ou


plantas jovens em áreas de reflorestamento tem sido utilizada principalmente
contra a ação predatória de roedores. Os métodos incluem vários materiais
amarrados diretamente nos troncos das árvores, cilindros protetores de arame,
ou outros materiais ao redor da base das plantas, os quais restringem a alimen­
tação dos animais-problema e o consequente dano por eles causados. Uma
completa revisão de protetores de troncos para árvores frutíferas e outros mé­
todos de exclusão para plantas pode ser encontrado em artigo publicado por
Marsh e seus companheiros (Marsh et al. 1990).

Nenhum método é 100% eficiente, e deve ser monitorado com frequência.


Alguns animais conseguem escalar, cavar, se espremer, morder ou roer. Os
materiais a serem utilizados dependem de vários fatoref como a espécie em

209
SANDRA M. C. CAVALCANTI

questão, sua biologia, tamanho e comportamento, do grau de proteção neces­


sário (lano? 20 anos?), da motivação do animal, da razão de seu custo/eficiên­
cia, se é uma plantação perene ou anual (pomar ou campo de feijão), e da
disponibilidade de material. O tipo e a localização do alvo de proteção também
é importante. O terreno irá influenciar no material a ser utilizado, seja para a
proteção de uma planta ou da plantação inteira.

Entre as desvantagens relacionadas à técnica da exclusão estão: a movimenta­


ção de outras espécies pode ser afetada, existe a possibilidade de destruição
da barreira ou cerca por outras espécies, os animais podem ficar presos dentro
da área, e o custo pode ser alto.

Repelentes
Repelentes são substâncias que reduzem o interesse de um animal sobre um
determinado item ou área. Um repelente eficiente é aquele que causa um efeito
imediato e de longa duração. Repelentes de área são aqueles baseados no olfa­
to dos animais, enquanto os repelentes de contato produzem reações de tato
ou de paladar. Um repelente, para ser eficiente na redução de danos, precisa
preveni-los por longos períodos. Seu sucesso depende de uma série de variá­
veis como, por exemplo, o quanto de fome tem o animal e o conceito de unwelt,
anteriormente citado.

As vantagens relacionadas ao uso de repelentes incluem sua rapidez de ação


(funciona “imediatamente”), são socialmente aceitáveis, estão disponíveis no
mercado e são geralmente de fácil utilização. Desvantagens incluem seu alto
custo, o potencial para impacto em outras espécies e o fato de seus resultados
serem muito variáveis.

Características de um repelente ideal incluem ser específico para o animal em


questão, ser barato, eficiente, fácil de usar, não tóxico, disponível no mercado,
e utilizar mais de um sentido animal: visão, olfato, paladar. São três as catego­
rias de repelentes: 1 ) Substâncias picantes são aquelas que produzem dor, tem
gosto ruim, queimam ou são azedas; 2) Substâncias de significância biológica
são aquelas que imitam a urina de um predador, por exemplo; e 3) Agentes
eméticos são aqueles usados em condicionamento aversivo, que causam um
mal-estar no animal em questão quando usados em concentrações altas. A
diferença entre um repelente e um agente aversivo é basicamente que repelen­
tes atuam na hora e o animal é imediatamente repelido da área. Agentes aver-
sivos utilizam o aprendizado do animal, baseando-se na sua resposta ao estí-

210
MANEIO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

mulo através do tempo até que uma associação seja estabelecida entre o mal-
estar causado pelo agente aversivo e o alvo de proteção. Veja mais detalhes
sobre condicionamento aversivo na seção de carnívoros.

Repelentes de área devem ser voláteis para evaporar, porém são menos eficien­
tes devido à ação do vento e tem um período de duração que é fácil do animal
ignorar, se o desejo pela área ou objeto for grande. Repelentes de área não são
eficientes para grandes áreas, pois sãò afetados por condições ambientais como
umidade e temperatura. Seu custo é maior do que repelentes de contato. Exem­
plos de repelentes de área incluem a naftalina e a súlfura, usada no repelente
Snake-A-Way® para cobras (Wildlife Supplies, Plymouth, MI).

Repelentes de contato que se baseiam no paladar têm um período de duração


maior do que repelentes que se baseiam no odor. Para que surtam efeito, os
animais precisam saboreá-los. Uma desvantagem desse tipo de repelente é que,
se aplicado ao milho, por exemplo, o gado não o irá comer devido ao gosto
modificado. Outra desvantagem é que esse tipo de repelente pode ser lavado
com as chuvas e existe a necessidade de uma reaplicação. Exemplos de repe­
lentes de contato incluem iscas para cervídeos como o Deer-away Big Game
Repellent® (Margo Supplies Ltd., Calgary, Canada).

Nos Estados Unidos, os repelentes são legalmente caracterizados como pesti­


cidas. A Agência de Proteção Ambiental (EPA) proíbe que compostos quími­
cos sejam registrados e usados como repelentes antes que sua eficiência seja
devidamente comprovada. Resultados obtidos em testes de campo com repe­
lentes como controle de predação de animais domésticos têm demonstrado
uma eficiência limitada, com efeitos de curta duração que não têm justificado
a continuação de experimentos onerosos. Diante dessa situação, pesquisado­
res têm procurado desenvolver práticas não letais alternativas.

Estímulos visuais e acústicos


Estímulos visuais e acústicos têm sido largamente usados para reduzir danos
causados por espécies da fauna silvestre a propriedades do homem. Esses
estímulos consistem em métodos não letais de controle com o potencial de
produzir resultados imediatos. Por isso, eles são tidos como métodos “huma­
nos” e práticos. Equipamentos como luzes brilhantes, sirenes, sinos, espanta­
lhos e explosivos já foram largamente testados para afugentar espécies causa­
doras de danos.

Todos esses equipamentos podem promover uma diminuição temporária na pre­


dação, mas todos apresentam a mesma limitação: os animais logo se habituam

211
SANDRA M. C. CAVALCANTI

com eles e recomeçam a causar danos. Algumas técnicas são específicas para
determinadas espécies, porém a maioria não é e existe a possibilidade de ou­
tras espécies serem afugentadas da área em questão. Algumas técnicas de con­
trole não letais podem fazer os animais simplesmente mudar sua atividade
para uma área próxima e desprotegida, ocasionando a simples transferência
do problema, em vez de sua resolução (R. Schmidt, comun. pessoal).

Alguns fatores que influenciam a eficiência desses estímulos visuais e/ou au­
ditivos incluem o grau em que esses estímulos afetam o animal-problema, a
motivação do animal, sua idade e as experiências prévias desse animal com os
mencionados estím ulos, associados com a disponibilidade e adequação de
áreas próximas, que sirvam como alternativas para a alimentação e descanso
dos anim ais. Programas de controle de danos através do uso de estímulos
visuais ou acústicos podem ter resultados melhores se forem iniciados ao
primeiro sinal de dano, à primeira ocorrência, aos primeiros vestígios dos
animais problema na área. Devido a sua eficiência ser relativamente de curta
duração, estím ulos que visem afugentar anim ais são mais indicados para
situações onde o controle necessário seja de curta duração. Eles também po­
dem ser usados em combinação com ou de maneira complementar a outras
técnicas de controle.

Existem maneiras de melhorar a eficiência desses estímulos e dessa forma


diminuir a habituação dos animais. A utilização alternada ou simultânea de
diversos estímulos é uma maneira de diminuir a habituação, assim como a
mudança da localização dos equipamentos produzindo tais estímulos. O suces­
so dessas técnicas depende largamente da prática e da motivação do operador.
Existe falta de informação sobre essas técnicas tanto no Brasil quanto nos Esta­
dos Unidos. Alguns equipamentos estão sendo vendidos comercialmente nos
dois países, porém, sua eficiência varia de acordo com a situação em questão.

Alguns estímulos visuais incluem objetos móveis, luzes constantes ou inter­


mitentes, objetos refletores ou cintilantes e imagens assustadoras. Estímulos
acústicos incluem sons altos, sons biologicamente relevantes (a maioria dos
estudos com sons biologicamente relevantes incluem pássaros; há ainda falta
de informação cpm mamíferos) e ul-trassônicos. Outros estímulos incluem ti­
ros não letais com balas de borracha.

Agentes contraceptivos
Para muitos a ideia do uso de agentes contraceptivos no manejo de populações
animais é nova, mas na realidade seu potencial para tal finalidadé é conhecido

212
\ MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

desde 1953, quando pesquisadores conduziram um estudo usando um hor­


mônio sintético, o diethylstilbestrol, em canídeos (Balser 1964). Agentes con­
traceptivos ou agentes antifertilidade são substâncias capazes de interferir na
fisiologia reprodutiva de machos e fêmeas de uma população, levando a uma
redução no número de descendentes produzidos. A ideia básica envolvida no
uso de contraceptivos ou agentes antifertilidade para controle de populações
animais é bastante simples: em se reduzindo as taxas de reprodução abaixo das
taxas de mortalidade, a população de uma determinada espécie deve diminuir.

O uso de contraceptivos pode ser visto como o manejo de taxas de natalidade,


ao contrário de métodos tradicionais letais de controle que utilizam o manejo
das taxas de mortalidade. Além de outros mecanismos, os agentes contracep­
tivos podem interferir com a reprodução através de um bloqueio na produção
ou liberação de feromônios e, dessa forma, alterar o comportamento reprodu­
tivo do animal. Embora a ideia seja antiga, ainda existe falta de estudos que
visem ao uso de contraceptivos como método de controle de populações de
animais-problema.

Agentes tóxicos
> *

No Brasil, alguns agentes tóxicos são disponibilizados para o controle de deter­


minadas espécies de roedores. Outros agentes são utilizados no controle de
carnívoros predadores, como a estricnina, por exemplo, apesar de serem consi­
derados ilegais. Nos Estados Unidos, todo e qualquer agente tóxico utilizado no
controle de danos deve ser registrado na Agência de Pro.teção Ambiental (EPA)
para finalidades específicas. A maioria dos agentes tóxicos existentes está ainda
em fase de testes, sendo manejados somente por pessoas credenciadas. Os prin­
cipais pesticidas existentes nos Estados Unidos hoje, em uso ou em testes,
serão descritos brevemente nas seções referentes a carnívoros predadores.

Grandes Carnívoros - Predadores de criações domésticas


0 problema de predação
Nos últimos anos, devido principalmente à degradação de seus hábitats e à
consequente perda de suas presas naturais, grandes predadores têm ficado
restritos a uma fração de suas áreas de ocorrência original, sendo muitas vezes
forçados a coexistir com criações de animais domésticos. Em áreas fragmenta­
das, onde espécies de presas/naturais tiveram suas populações bastante redu­
zidas, os predadores são forçados a buscar fontes alternativas de alimento e,
muitas vezes, acabam atacando criações domésticas. O problema de predação a

213
SANDRA M. C. CAVALCANTI

animais domésticos tem sido documentado em diferentes partes do mundo,


onde quer que grandes carnívoros tenham sido forçados a coexistir com essas
criações. No Brasil, os principais problemas de predação envolvem espécies
de carnívoros como a onça-pintada (P an thera o n c a j, a onça-parda (Puma
co n c o lo r), o lobo-guará (C hysocyon b ra c h y u r u s ), a jaguatirica (L eopardu s
p a r d a lis ) , o cachorro-do-m ato (C erd o cy o n th o u sj e o graxaim -do-cam po
(P seu dalop ex g ym n ocercu s).

Um problema sério que vem acontecendo nos últimos anos no Parque Nacio­
nal de Brasília, em Goiás é o ataque a animais domésticos, silvestres e, inclu­
sive, humanos por matilhas de cães domésticos (Canis fam iliarís). Esses ani­
mais, geralmente abandonados ou foragidos da casa de seus antigos donos,
passam a viver sem contato humano e acabam se tornando asselvajados, co-
mumente conhecidos como cães ferais. O maior vazadouro de lixo da cidade,
localizado nas imediações do parque nacional, serve de atrativo para esses
animais, que passam a viver em matilhas e acabam matando espécies da fauna
silvestre que vivem no parque. Carcaças de lobos-guará, tamanduás (Myrmeco-
p h a g a tridactyla], veados-campeiros (B lastocerus dichotom us) e antas (Tapirus
terrestris) têm sido frequentemente encontradas por equipes de patrulhamento
do IBAMA (R. Milano, comun. pessoal). Além de causar a morte de espécies
silvestres e domésticas, os cães ferais podem transmitir doenças como a parvo-
virose e a raiva (W. Tomas, comun. pessoal). A Universidade de Brasília recen­
temente assinou um contrato com o IBAMA e a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA) para um programa de controle dos cães ferais em
que se usam fêmeas no cio como isca para capturar os animais.

Determinação da causa da mortalidade


Em animais de grande porte, as evidências de predação são mais facilmente
observadas do que em animais menores, devido a suas carcaças desaparece­
rem com menos facilidade. A presença de predadores ou de seus vestígios
numa área não constitui evidência suficiente para confirmar casos de predação
no local. Predadores são oportunistas e podem alimentar-se de uma carcaça,
sem necessariamente ter causado a morte do animal. Muitas vezes o animal
doméstico teve morte natural, por doenças-(bacterianas ou viróticas), parasitas
internos, ingestão de plantas tóxicas, picada de cobra ou até mesmo pode ter
nascido morto.

Casos de predação podem ser avaliados e confirmados com mais facilidade se


o exame da carcaça for conduzido o mais breve possível. A decomposição da

214
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

carcaça, que é mais rápida em áreas de clima quente, assim como urubus e
outros animais que se alimentam da carcaça, pode obliterar evidências impor­
tantes em poucas horas. Devem-se tomar as devidas precauções para que as
evidências de um possível ataque não sejam prejudicadas por transeuntes ou
curiosos. Um histórico do problema de predação na região pode também aju­
dar na identificação da causa da mortalidade.

Uma causa de mortalidade bastante comum em ruminantes é a distensão do


rúmen por produção de gases, que pode ser causada pelã ingestão excessiva
de grãos, alfafa (M edicago sativa) ou outras plantas. Essa distensão do rúmen
não deve ser confundida com distensões excessivas da carcaça causadas por
gases formados durante o processo de decomposição. A carcaça deve ser exa­
minada, procurando-se por fraturas no crânio, ossos quebrados, perfurações
na pele do animal e" outras feridas. O peito e a cavidade estomacal do animal
morto devem ser abertos para que se possa verificar a presença de lesões inter­
nas ou hemorragia. A posição da carcaça também pode ser importante. Ani­
mais que morrem de outras causas normalmente morrem deitados de lado,
com as patas dobradas abaixo do corpo. As carcaças de animais mortos por
predadores geralmente apresentam-se acompanhadas de sinais de briga ou luta
no local. A vegetação muitas vezes se apresenta revolvida e marcas de sangue,
unhas e pelos são geralmente presentes. Algumas vezes o predador arrasta a
presa até outros locais onde se alimentará dela, deixando marcas claras no
solo. O comportamento do rebanho também pode ser indicativo de um ataque
por predador, principalmente quando se apresenta mais alerta e assustado.

Identificação da espécie por meio dos danos


A correta identificação do predador de animais domésticos é um passo impor­
tante na determinação do método de controle adequado, que dependerá das
características da espécie em questão. Carnívoros silvestres têm hábitos cre­
pusculares e noturnos e s.ão geralmente bastante elusivos, sendo dificilmente
vistos na natureza. Entretanto, sinais típicos como rastros, fezes e pelos são
frequentemente deixados pelos animais, podendo fornecer informações quan­
to a sua espécie.

A espécie de presa e o seu tamanho também podem fornecer informações so­


bre o predador. Animais de grande porte como gado bovino, equino e muar
são geralmente pred^dos por onças. A onça-parda, por ter um menor porte,
geralmente ataca mais animais jovens, usualmente bezerros, garrotes e potros
(até 1 ano e meio de idade], enquanto a onça-pintada preda também indivíduos

215
SANDRA M. C. CAVALCANTI

adultos de até 500 kg. Espécies domésticas de porte médio, como carneiros e
Cabras, além das onças, podem também ser atacadas pelo cachorro-do-mato,
graxaim-do-campo ou pelo cachorro doméstico. A predação destes animais se
dá em indivíduos jovens (cordeiros e cabritos). Cachorros domésticos podem
ocasionalmente matar animais adultos. Por outro lado, a predação em galinhei­
ros se dá por todas as espécies de predadores de menor porte, incluindo ca­
chorro-do-mato, graxaim-do-campo, jaguatirica, gato-mourisco (Herpailurus
yagou arou n di) e até mesmo pelo lobo-guará. Entretanto, a correta identificação
do predador muitas vezes não é fácil, pois os pa.drões de predação e alimentação
podem variar entre indivíduos e se sobrepor entre espécies. Deve-se considerar
também a possibilidade da utilização da carcaça por mais de uma espécie.

Onça-pintada
Carcaças de animais mortos por onça-pintada geralmente apresentam uma
mordida na base do crânio ou na área da nuca/pescoço, perfurando o crânio
ou rompendo as vértebras da nuca. A morte é normalmente ocasionada pela
quebra do pescoço, decorrente do impacto da queda do animal. A cabeça do
animal predado fica geralmente voltada para trás. Embora possa existir uma
variação entre indivíduos, raramente a presa é morta por sufocamento, com
uma mordida na garganta. A onça-pintada normalmente começa a consumir a
presa pela porção anterior, iniciando a alimentação pelo focinho e pescoço e
então a região peitoral. A parte inferior do pescoço e o peito são as partes
preferidas. Muitas vezes as partes posteriores são deixadas intactas. Bezerros,
por outro lado, podem ser completamente consumidos, inclusive a cabeça e as
patas. A onça-pintada normalmente não cobre a carcaça e pode arrastá-la por
até 1,5 km de distância. Os rastros a elas associados são grandes, têm uma
forma arredondada, sendo que o comprimento total é geralmente um pouco
menor do que a largura. Os dedos são redondos, as almofadas grandes e deli­
neadas de forma arredondada.

Onça-parda, Suçuarana ou Leão-baio


Os animais domésticos abatidos pela onça-parda são normalmente de menor
porte. Esse predador tende a matar sua presa com uma mordida na área dorsal
do pescoço ou, então, por sufocamento, através de uma mordida na garganta.
A carcaça usualmente apresenta grandes hemorragias na área do pescoço e
nuca, bem como marcas de unhas na paleta e dorso da presa. A alimentação
geralmente é iniciada logo após as costelas, que podem até mesmo se quebrar. O
estômago e os intestinos são habilmente retirados, geralmente sem rompimento,

216
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

permitindo o alcance do fígado, dos pulmões e do coração. A musculatura das


patas posteriores é geralmente a próxima parte a ser consumida, quase sempre
pela porção ventral. As carcaças parcialmente consumidas pela onça*parda
são comumente cobertas com material orgânico, como folhas secas, para prote­
ção contra outros animais, para futura alimentação. Os rastros associados à-
onça-parda são semelhantes aos de um cachorro doméstico, porém, não apre­
sentam marcas de unhas. Normalmente, o comprimento total da pegada é maior
que a largura total. Os dedos são mais finos e pontudos do que os da onça-
pintada.

Graxaim-do-campo
As carcaças de ovelhas e cordeiros predados por graxains-do-campo apresen­
tam mordidas em várias partes do corpo. Suas pegadas fazem lembrar as de
um cachorro doméstico, porém, em menor tamanho e mais alongadas.

Cachorro doméstico
* As carcaças predadas por cachorros domésticos, na maioria das vezes, apre­
sentam ferimentos nos membros posteriores, com evidências de mordidas e
ataques antes da morte da presa. Por ser uma espécie doméstica, os cachorros
não são eficientes durante os ataques e acabam machucando as presas de ma­
neira considerável e desnecessária. Muitas vezes a carcaça não é consumida.
As pegadas associadas a cachorros domésticos fazem lembrar as de onça-par­
da, porém apresentam marcas de unha e são mais alongadas. Devido ao forma­
to mais alongado dos dedos, a distância entre a parte superior da almofada e
os dedos é maior nas pegadas de cachorro do que nas pegadas de onça. É
importante notar que existe uma grande variação entre as diferentes raças de
cachorros, o que pode influenciar na apresentação das pegadas.

Outras espécies
A predação das demais espécies ocorre majoritariamente em galinhas, marre­
cos, patos e outras espécies domésticas de pequeno porte, o que faz com que
quase nada reste para que se possa proceder a uma análise da carcaça. A me­
lhor forma de identificação nesses casos é através dos rastros deixados. Pega­
das de jaguatirica são muito similares às de onça-pintada, porém em menor
tamanho. Os gatos-do-mato (Leopardus spp.J apresentam pegadas similares às
de jaguatirica, mas em tamânho menor. Pegadas de gato-mourisco são simila­
res às dos gatos-do-mato, porém com dedos mais alongados.

217
SANDRA M. C. CAVALCANTI

Técnicas de controle
Práticas de manejo dos animais domésticos
Algupias práticas de manejo podem ser eficientes na prevenção de danos cau­
sados por predadores. A relação custo-benefício precisa ser avaliada para cada
prática e a sua eficiência irá depender de cada situação específica.

O recolhimento do rebanho durante a noite, quando os predadores estão mais


ativos, é uma prática frequentemente aconselhada em casos de predação. Ape­
sar de um pequeno aumento nos custos operacionais e de seu efeito potencial
na diminuição da produção, essa prática ainda é a maneira mais simples e
mais eficiente para redução dos prejuízos. O tempo adicional necessário para
confinar o rebanho à noite geralmente diminui, à medida que os animais se.
habituam a essa prática.

A instalação de luzes em currais e a colocação de colares com cincerros (sinos,


guizos) no gado também têm sido aconselhadas para a prevenção da predação.
Essas práticas encontram as mesmas limitações citadas em seções anteriores
do presente capítulo: os mamíferos predadores possuem a capacidade de adap­
tação a novas situações e podem se habituar também à presença de luzes em
currais onde o rebanho seja mantido e ao som de cincerros. É importante,
porém, lembrar que não existe .uma técnica ou prática de manejo que proporci­
one uma margem de segurança de 100%. A melhor opção é sempre utilizar
uma combinação de alternativas de maneira aditiva ou supletiva. A manuten­
ção de alguns animais agressivos no rebanho pode ser muitas vezes aconselhá­
vel, de preferência animais com chifre. A ideia é a de que esses animais pos­
sam ensinar às crias mais novas e a outros animais no rebanho o comporta­
mento agressivo numa situação de ataque.

Os animais prestes a parir devem ser separados do rebanho e mantidos em


uma área protegida, onde possam ser supervisionados diretamente. Outra prá­
tica recomendada é o confinamento de bezerros ou animais mais susceptíveis
durante o período de pastoreio do rebanho adulto. Essa prática permite um
melhor manejo da operação, uma vez que animais jovens criados em sistemas
de confinamento podem ganhar peso em menos tempo e dessa maneira serem
comercializados mais cedo.

Pastagens onde a predação. é severa devem ser evitadas durante os períodos


em que os animais são mais vulneráveis. Áreas próximas de matas, capoeiras
e corpos d’água devem ser evitadas, pois elas proporcionam cobertura para os
predadores e podem facilitar sua aproximação. O tipo de cobertura vegetal nas

218
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA-FAUNA

pastagens também é um fator importante. Alguns estudos têm demonstrado


que os prejuízos são maiores em áreas com cobertura vegetal mais densa.

A predação de animais domésticos por predadores se mostra mais significati­


va em pastagens maiores (R. Boulhosa, comun. pessoal), sugerindo a possibi­
lidade de maiores oportunidades para o ataque, uma vez que o rebanho tende
a uma maior separação e consequentemente alguns animais se distanciam do
resto do rebanho. Um bom manejo profilático do rebanho também é indicado,
pois a manutenção de um rebanho vacinado e sadio pode contribuir para a
prevenção de mortes desnecessárias e o consequente prejuízo econômico as­
sociado a elas.

A remoção das carcaças dos animais abatidos é um assunto polêmico. Alguns


pesquisadores aconselham o récolhim ento (R Crawshaw, comun. pessoal),
argumentando que o abandono das carcaças no campo pode levar os animais a
se alimentarem delas e subsequentemente atacarem criações domésticas. Por
outro lado, para predadores que se alimentam de animais mortos, a remoção
dessa fonte de alimento poderá encorajar ataques adicionais a outros indiví­
duos do rebanho. E importante lembrar que a densidade de coiotes em uma
determinada área é diferente da densidade de onças-pintadas, por exemplo.
Geralmente, se um anim al do rebanho for atacado por um predador como a
onça-pintada, existe uma maior possibilidade de que a carcaça desse animal
não seja encontrada por outro indivíduo. Dessa maneira, é aconselhável dei­
xar a carcaça no campo desde que seja comprovada a predação e a carcaça não
se encontre em áreas muito próximas a comunidades rurais. Os predadores
podem voltar a se alimentar do animal abatido e a presença da carcaça no local
de abate podç evitar ataques adicionais. No caso da morte de indivíduos do
rebanho por doenças ou picadas de cobra, por exemplo, as carcaças devem ser
removidas, evitando assim que os predadores sejam atraídos por elas. Esse tópi­
co ainda não é bem compreendido e existe a necessidade de estudos adicionais.

A construção de cercas de espinhos é outra prática para prevenção da preda­


ção adotada por diferentes tribos no Quênia (Kruuk 1980). Essas cercas são
construídas geralmente com diferentes espécies de acácias (A cacia spp.J em
diferentes formas e tamanhos, com a função primária de conter animais dos
rebanhos domésticos. Porém, são também utilizadas para reduzir o acesso de
predadores. As taxas de predação nas áreas cercadas são menores do cfue nas
áreas abertas. No Brasil existem estudos sendo conduzidos que poderão, num
futuro próximo, testar a possibilidade da utilização de cercas vivas na preven­
ção da predação (F. Azevedo, comun. pessoal). O plantio de culturas de citrus

219
SANDRA M. C. CAVALCANTI

em áreas de pastagens limítrofes com matas foi proposto, porém, ainda são
necessários dados que possam comprovar sua eficiência.

Cães de guarda
Outro tópico de controvérsia é a utilização de cães para prevenção da preda-
ção. A manutenção de cães preparados para dar o alarme é aconselhada para
espécies de cães de grande porte e em grande número. É aconselhado o uso de
pelo menos cinco animais que não devem ficar soltos pela propriedade, mas
sim contidos numa área próxima à possível área de acesso dos predadores ao
rebanho. A presença de cães de estimação de pequeno porte soltos pela pro­
priedade não é aconselhada. Deve-se impedir que esses animais entrem em
áreas de mata ou outras áreas de utilização dos predadores. Um estudo realiza­
do no Quênia (Kruuk 1980) comparou taxas de predação em áreas com presen­
ça e ausência de cães para prevenção de danos. Os resultados obtidos sugeri­
ram que a presença de cães em áreas com criações domésticas pode ser eficien­
te na sua proteção.

Cercas elétricas
Métodos de exclusão como cercas têm o objetivo de prevenir ou reduzir o
acesso de predadores a criações domésticas. Por se constituir numa barreira
física não letal, as cercas são vistas como um método racional, com o potencial
de excluir predadores sem a necessidade de prejudicá-los.

A atitude de um predador frente a uma cerca é influenciada por vários'fatores,


como, por exemplo, experiências prévias desse animal com cercas e sua moti­
vação. Alguns animais necessitam levar vários choques até que aprendam a
evitar cercas elétricas, enquanto outros aprendem até mesmo sem nunca as
terem tocado, possivelmente copiando ou tendo testemunhado o comporta­
mento de outros animais frente a uma cerca elétrica. O condicionamento dos
animais pode ter várias durações, que dependem da frequência com que esses
animais entram em contato com as cercas elétricas. Alguns animais aprendem a
evitar os choques, no lugar de evitar o contato com as cercas. Algumas espécies,
como os coiotes nos Estados Unidos, tornam as cercas quase ineficientes, devi­
do à grande variedade de técnicas que utilizam para cruzá-las (Thompson 1979).

Cercas podem ser construídas de várias maneiras, e sua eficiência irá depen­
der da situação local. Na escolha do tipo de cerca a ser utilizado,-o produtor
deverá considerar a espécie do predador a ser excluído, as criações domésticas
a ser protegidas, o tamanho da área a ser cercado, o acesso à área, as caracterís­

'2 2 0
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

ticas do solo no local, as condições do terreno e os custos. O produtor deve


estar motivado para lidar com o problema de predação e estar ciente de que
algum tempo será necessário para atingir os resultados em relação ao custo-
benefício, ou seja, a amortização da cerca. Em áreas onde a produtividade gera
uma suficiente margem econômica para custear a construção da cerca, a prote­
ção eficaz contra produtores se torna possível.

Existem três tipos básicos de cercas elétricas: 1 ) cercas elétricas portáteis, tem­
porárias, 2) cercas elétricas adaptadas de cercas já existentes; e 3) cercas elétri­
cas permanentes de alta tensão. Cercas elétricas portáteis temporárias consis­
tem, normalmente, de 1 a 5 fios de arame. O objetivo principal desse tipo de
cerca é dividir piquetes para um melhor manejo de pastagens. Essas cercas
não dão proteção contra predadores, embora seu uso possa ser sugerido para
manter o gado em áreas especiais. Cercas elétricas adaptadas podem reduzir
problemas de predação. A cerca existente precisa estar em boas condições para
que fios extras possam ser adicionados.

Assim como qualquer outro método empregado para controlar a predação, as


cercas elétricas também têm sua desvantagem. O problema de manutenção das
cercas parece muitas vezes ser crônico. A neutralização da corrente elétrica é
muito comum, mas pode ser minimizada se a construção inicial for de boa
■qualidade e os procedimentos básicos de manutenção forem seguidos. Cercas
elétricas necessitam dè inspeções periódicas para assegurar seu bom funciona­
mento. A vegetação deve ser limpa ná área da cerca, para evitar que o capim
neutralize ou drene a voltagem, particularmente na época mais úmida. Alguns
autores recomendam o uso de herbicidas ao longo da cercas para a remoção da
vegetação.

Quanto maior a área a ser-cercada, maior será o potencial para um mau fun­
cionamento ou danificação da cercas, tornando-as menos eficientes. Devido a
isso, o uso de cercas elétricas não é aconselhável para áreas muito extensas.
Sua utilização é mais eficiente e mais viável para a proteção de rebanhos meno­
res em pastagens menores. Limitações físicas podem ser impostas pelo tipo de
solo, tipo de vegetação, características do terreno e condições climáticas.

O custo-benefício de uma cerca elétrica é influenciado pela sua configuração e


manutenção, taxa de unidade animal, práticas de manejo, topografia e vegetação
e a severidade da predação. Por exemplo, uma cerca será mais eficiente em áreas
onde existam ao mesmo tempo uma alta taxa de predação e uma alta taxa de
unidade animal. Os custos de construção podem variar enormemente de acordo
com a área geográfica, a quantidade e a qualidade dos materiais necessários e o

221
SANDRA M. C. CAVALCANTI

tipo de mão de obra utilizada. Os custos de manutenção são relacionados às


condições do terreno e ao tipo de vegetação ao redor da cerca. O uso de cercas
elétricas é um método não letal promissor. Porém, o produtor deverá avaliar
cada situação específica, baseado em todos os fatores relevantes, para determi­
nar se a instalação de uma cerca elétrica será o 'melhor investimento.

Captura e remoção ou translocação


Apesar da nova legislação ambiental não considerar crime o abate de animais,
quando devidamente autorizado e realizado para proteger rebanhos da ação
predatória, a captura e remoção de carnívoros como forma de controle de da­
nos é um assunto contraditório no Brasil. Essas técnicas são geralmente apli­
cadas em projetos de pesquisa ou em situações de última instância, quando a
remoção é á única alternativa, seja por razões biológicas, de segurança, de ética
ou outras questões de consideração pública. Quando necessário, grandes car­
nívoros são capturados basicamente de duas maneiras: através do uso de ar­
madilhas ou com a assistência de cães caçadores. O uso de cães em capturas
deve ser feito por pessoas experientes devido ao elevado nível de “stress” e
desgaste físico que o método pode causar ao animal a ser capturado e à equipe
de trabalho. Armadilhas devem ser seguras para propiciar uma menor proba­
bilidade de acidentes e devem ser verificadas periodicamente.

Mamíferos menores, assim como aves e herbívoros, são geralmente capturados


com o uso de armadilhas. Existem vários tipos de armadilhas utilizadas para
captura tanto de mamíferos como de aves e herbívoros, que variam bastante
em forma e tamanho. As tradicionalmente utilizadas são do tipo caixa, trampa,
rede ou curral.

A translocação de animais-problema é uma ideia comumente questionada em


ocasiões de ataques frequentes a criações domésticas. Porém, de acordo com
Nielsen (1988), “a translocação não é tão universalmente aplicável quanto o
seu apelo público e político sugerem”. A metodologia não tem apresentado
suceSso nos escassos experimentos de campo que a têm testado como forma
de controle (Rabinowitz 1986, M iller & Ballard 1982, Rogers 1986, Rogers
1988). Animais translocados tendem a retornar a áreas de origem ou continu­
am causando problemas no local para o qual foram transportados. Além disso,
por serem animais territorialistas, tendem a defender uma área de vida. Quan­
do um território fica vago devido à translocação, pode ser ocupado por dife­
rentes indivíduos que poderão também vir a causar problemas de predação
(Balser 1964). Quando o animal-problema é mantido em sua área de ocupação

222
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

original, novòs ataques devem ser prevenidos através da implementação de medi­


das de controle que incluam a melhoria no manejo das criações domésticas.

Estímulos visuais e acústicos


Estímulos visuais e acústicos como sirenes, luzes brilhantes e explosivos, têm
sido usados para reduzir predação a animais domésticos. Durante períodos
em que as criações domésticas estejam mais vulneráveis, o uso de estímulos
para afugentar predadores é justificado, mesmo que eles sejam eficientes so­
mente em curto prazo.

P astor E le tr ô n ic o : Existem algumas limitações para o controle de predação.


Muitas áreas são cobertas por vegetação ou florestas densas em áreas remotas
e/ou de terreno acidentado onde o acesso de veículos é geralmente limitado.
Essas condições tornam algumas técnicas de controle impraticáveis. Com o
objetivo de solucionar esse problema, o Centro Nacional de Pesquisa em Vida
Silvestre nos Estados Unidos (NWRG), desenvolveu um equipamento para
afugentar coiotes com estímulos múltiplos, que combina luzes brilhantes, sire­
nes e outros sons de alta frequência. Esse equipamento, após cinco anos de
testes em condições de campo, sofreu várias modificações em sua configura­
ção, visando à melhor eficiência e portabilidade. O aparato consiste em um
timer eletrônico e uma célula fotoperiódica, ligados a uma luz intermitente e a
uma sirene, e funcionam com uma bateria recarregável. Emitem uma sequência
irregular de luzes e sons, sendo ativados no crepúsculo pela célula fotoperió­
dica, e desligados ao amanhecer (Linhart 1984).

Esses equipamentos foram testados em áreas com pastagens cercadas. As uni­


dades promoveram períodos de proteção mais longos em pastagens menores.
As unidades mais eficientes foram as localizadas nas áreas de descanso dos
rebanhos de ovinos (áreas onde o rebanho passava a noite) ou em áreas do
terreno conspícuas, que interceptavam os cam inhos provavelmente usados
pelos predadores para se aproximar do rebanho. Durante testes de campo, foi
observada uma queda na taxa de predação de 6 ,6 % para 2,7%. Os rebanhos
das propriedades testadas não foram observados correndo ou se espalhando
de maneira desordenada por terem sido assustados (Linhart 1984). Os resulta­
dos desses testes indicaram que os pastores eletrônicos podem modificar pa­
drões de predação por predadores como coioteís, por exemplo, embora haja
uma variação no período de eficiência. As perdas podem ser reduzidas co n si­
deravelmente, mas podem não necessariam en te cessar. Esses resultados
também indicaram que a predação em áreas adjacentes não aumentou signifi­

223
SANDRA M. C. CAVALCANTI

cativamente, uma vez que os predadores tendem a evitar a área de localização


das unidades, mas continuam a frequentar os mesmos territórios. Não existem
dados disponíveis que indiquem se esses pastores eletrônicos funcionam para
onças-pardas, desencorajando-as a atacar criações domésticas. Recentemente,
pesquisadores no NWRC têm testado adaptações promissoras no pastor ele­
trônico. A mais recente versão, atualmente sendo testada em lobos nos Esta­
dos Unidos (J. Shivik, comun. pess.), é disparada pela presença do predador
nos arredores do aparato, o que contribui bastante para uma diminuição na
habituação do predador.

E x p lo siv o s d e P r o p a n o : A utilização de materiais pirotécnicos é uma outra


maneira de emitir estímulos auditivos que podem afugentar predadores. Ex­
plosivos de propano têm sido usados com sucesso na tentativa de afugentar
coiotes de criações domésticas (Pfeifer & Goos 1982). Os primeiros canhões
explosivos testados foram os da marca ScareAway®, disponíveis comercial­
mente e fabricados pela Joseph International Company. Esses explosivos fun­
cionam em intervalos intermitentes, quando uma determinada quantidade de
propano é acesa eletronicamente, resultando em um estouro alto. Esses explo­
sivos apresentam algumas vantagens sobre outros métodos convencionais. Eles
são portáteis, disponíveis no mercado e de fácil operação. Os custos para aqui­
sição e operação são considerados baixos, em torno de 200 dólares americanos.

Os explosivos de propano são mais eficientes quando usados em combinação


com outros métodos de controle. Em áreas de difícil acesso e/ou onde outros
métodos de controle se tornam impraticáveis, os canhões explosivos de propa­
no podem ser usados para forçar os predadores a mudar as áreas mais fre­
quentadas ou suas vias de aproximação do rebanho. Explosivos podem tam­
bém ser usadps piara evitar que um padrão de ataque se estabeleça.

Assim como qualquer outra técnica, a operação e a manutenção dos canhões


explosivos é um fator-chave na eficiência dos métodos que visam afugentar os
animais. Outro fator que pode influenciar na eficiência dos canhões explosi­
vos é a pressão de caça no local. Quanto maior a pressão de caça, maior a
probabilidade dos predadores temerem sons semelhantes aos de tiros de ar­
mas de fogo.

Detectores de movimento
Os detectores de movimento são dispositivos parecidos com os pastores ele­
trônicos, porém como o próprio nome sugere, são ativados através de um
sensor de movimento, e produzem sons de diferentes frequências. Esses dis­

224
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

positivos são mais eficientes com mamíferos, sendo que animais maiores são
mais fáceis de ser detectados. Os detectores de movimento podem facilmente
registrar a aproximação de um animal da forma e do tamanho de um veado,
por exemplo. Algumas vantagens incluem sua sensibilidade, que pode ser
ajustada na fábrica e seu modo de operação, que não liga e desliga mesmo
quando o predador não se encontra no local, diminuindo assim a habituação.
A principal desvantagem desses aparatos é o fato deles não serem específicos
para o animal-problema em questão.

C olar sô n ico a la r m a n te : Outra alternativa testada para o controle de preda­


ção, o colar sônico é energizado com bateria e possui uma célula fotoelétrica,
que liga o aparelho ao anoitecer, desligando-o pela manhã. Possui também um
detector de movimento, o qual, assim que o rebanho se move e com eça a
correr, faz o colar emitir luzes brilhantes por aproximadamente 2 minutos.
Pode ser instalado em algumas cabeças do rebanho, dependendo do seu tama­
nho. Também tem o potencial para diminuir a habituação do predador, porém
sua eficiência não foi devidamente testada.

Tiros n ã o le t a is ( b a la d e b o r r a c h a ): Outra maneira de fazer com que animais-


problema evitem uma área é através de tiros não letais com balas de borracha
ou com espingardas de cartucheiras. Os animais sentem desconforto com o
tiro, porém não são mortos. Essa técnica é particularmente útil em situações
em que o animal-problema é uma espécie legalmente protegida. Porém, seu
uso fica bastante limitado quando a espécie em questão é elusiva ou apresenta
hábitos noturnos. Os tiros não letais apresentam resultados imediatos, porém
apresentam as mesmas limitações dos outros métodos.

Repelentes químicos e agentes aversivos


Vários compostos químicos, incluindo odores animais com erciais, atrativos
sexuais, odores sintéticos, desodorantes comerciais, ésteres, aminas, ácidos e
sulfatos já foram testados para desenvolver um odor natural ou sintético que
pudesse repelir canídeos predadores de criações domésticas (Lehner et al.
1976). O único repelente que se mostrou eficiente para repelir canídeos foi o
Beta-cloro-acetil, que repeliu todos os animais em que foi testado. Porém, a
repelência mostrou-se devido às propriedades irritantes desse composto. Irri­
tantes desse tipo provavelmente não têm valor prático devido à irritação que
possam causar também aos animais domésticos.

Vários outros testes de campo foram conduzidos nos Estados Unidos testando
a eficiência de sprays, estações de odores e colares para criações domésticas.

225
SANDRA M. C. CAVALCANTI

Embora alguns compostos tenham evocado certa repelência, esses testes de


campo não indicaram uma eficiência significativa ou prática para uso de repe­
lentes por produtores rurais.

A visão é o senso predominante usado por canídeos durante a sequência de


predação, quando ela se dá durante o dia (Wells & Lehner 1978). Dessa forma,
estímulos visuais são os mais importantes no estabelecimento de uma respos­
ta condicionada por parte dos predadores (Olsen & Lehner 1978). Provavel­
mente, para canídeos pelo menos, e possivelmente para felídeos, o controle da
predação através do uso de repelentes ainda seja difícil devido ao fato desses
animais usarem predominantemente o senso visual durante a localização e a
captura de sua presa. A colocação de compostos químicos em carcaças de
animais mortos faz com que os animais deixem de se alimentar dessas carca­
ças, porém, não tem efeito na detenção da predação.

Uma alternativa para essa situação seria o princípio do condicionamento aver­


sivo, baseado na hipótese de que, se o consumo de um determinado item é
seguido por um mal-estar, o animal irá associar esses efeitos com o item consu­
mido e irá desenvolver uma aversão a esse item. Alguns estudos têm sido
desenvolvidos com agentes químicos aversivos, especificamente com cloreto
de litium (LiÇl) (Gustavson et al. 1974, Burns 1980).

Apesar de alguns autores apresentarem resultados positivos (Gustavson et al.


1974), estudos de campo e experimentos obtiveram resultados limitados (Bourne
e Dorrance 1982, Burns 1980, Burns 1983), indicando que o uso de LiCl tem
ação muito reduzida no que diz respeito ao ataque de criações domésticas. Em
estudo com o composto LiCl (Conover et al. 1977), os autores observaram que
os indivíduos testados apresentavam um comportamento de alimentação sele­
tiva, consumindo apenas as partes não tratadas das carcaças. Esses resultados
sugeriram que os animais evitavam apenas o composto químico e não necessa­
riamente a carcaça da espécie predada.
* y
Nos estudos realizados com agentes aversivos, a apresentação de LiCl numa
forma que não perm itisse a sua detecção aumentou a aversão às carcaças
tratadas, mas não causou nenhum efeito na prevenção da predação (Burns
1983). Alguns pesquisadores puderam constatar uma certa aversão, mas a
dificuldade continua sendo a de demonstrar a aversão à predação, causada
pela aversao à carcaças tratadas. Até o presente ainda não existem compostos
químicos com erciais para prevenção da predação. Embora os resultados obti­
dos até o momento não tenham sido muito encorajadores, existe um potencial
para utilização dessa técnica com outras espécies.

226 /
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

Agentes contraceptivos
Na teoria, o uso de contraceptivos poderia reduzir populações de predadores
carnívoros e dessa forma reduzir a predação em todas as espécies de presa,
incluindo animais domésticos. Balser (1964) sugere que, quando indivíduos
são removidos de uma população, animais transientes podem se mudar para a
área desocupada e continuar o problema, como previamente mencionado. Po­
rém, quando animais estéreis adultos ocupam seu território original, eles o
protegem de indivíduos transientes que possam eventualmente causar proble­
mas. No Brasil, o uso de contraceptivos ainda deixa dúvidas quanto ao seu uso
como método de controle, devido ao status em que se encontra a maioria das
espécies que causam problemas com predação. A maioria dessas espécies está
classificada pelo IBAMA como ameaçadas de extinção, apesar de ocuparem cate­
gorias diferentes nas listagens da IUCN e da CITES. Porém, no caso de cachor­
ros domésticos, por exemplo, mais estudos deveriam ser desenvolvidos devido
ao potencial do método como ferramenta para o manejo e controle de danos.

Pesticidas e agentes tóxicos


E stricn in a: A estricnina é provavelmente o veneno mais comumente usado
no mundo (Buck 1991). Apesar de já ter sido utilizado como pesticida para
predadores e aves, nos Estados Unidos ela é hoje usada somente como pesti­
cida para roedores (Savarie 1991). No Brasil a estricnina é usada ilegalmente
por produtores de gado principalmente. Animais como a onça-parda, por exem­
plo, tendem a retornar à carcaça nos dias seguintes ao ataque, após cobri-la
com matéria morta. Produtores se utilizam desse comportamento e injetam
estricnina nas carcaças de animais predados para eliminar o predador.

A estricnina é derivada de plantas do gênero Strychnos, do sudeste da Ásia. É


extremamente tóxica para aves e mamíferos. É metabolizada no fígado, onde
mudanças patológicas ocorrem devido a sua ação. Atua diretamente no siste­
ma nervoso central. Os principais sintomas do envenenamento por estricnina
•envolvem ataques convulsivos, que normalmente acontecem minutos após a
ingestão. A morte ocorre devido à anoxia causada por esses ataques convulsi­
vos. De acordo com a Agência de Proteção Ambiental (U. S. EPA 1980), se o
animal sobreviver, a estricnina é excretada e o indivíduo é desintoxicado den­
tro de 24 horas. Porém, quando o animal morre, como acontece na maioria das
vezes, a estricnina no trato gastrointestinal resiste à decomposição for longos
períodos e pode estar disponível para outros predadores ou espécies necrófa-
gas, nas quais pode ocorrer inclusive toxidade secundária (Marsh et al. 1987).

227
SANDRA M. O! CAVALCANTI

C o m p o sto 1080: O composto 1080 (fluoro-acetato de sódio) é usado em colares


para a proteção de animais domésticos, conhecidos por Livestock Protection
Collar (ou LPC). O Composto 1080 é um agente tóxico agudo que mata o pre­
dador com uma potente dose única. Em carnívoros, a morte resulta de parada
respiratória (Crabtree 1962). O Composto 1080, embora podendo ter toxicida­
de primária e secundária (Ward e Spencer 1947) e sendo um agente tóxico não
específico, possui um potencial mínimo de ser ingerido por outras espécies
além da espécie-alvo, devido ao seu modo de aplicação. Desenvolvidos por
Roy McBride no Texas, os LPC consistem em pequenas bolsas de borracha
contendo uma solução aquosa do composto 1080 que são amarrados ao redor
do pescoço dos animais domésticos, geralmente em ovelhas e cabras. Ao per­
furar o colar no pescoço da presa, o pfedador morre pela ação do agente tóxi­
co. De acordo com Connolly (1980), urubus e corvos que se alimentam de
carcaças evitam se alimentar de porções contaminadas ao redor do pescoço.
Atualmente, o Composto 1080 tem uso bastante limitado, sendo registrado
' xclusivamente para pessoas credenciadas para o controle de predação de ove­
lhas e cabras por coiotes nos Estados Unidos.

C ia n e to d & s ó d io : Assim como o Composto 1080, o cianeto de sódio também


tem sido usado para o controle de predação de animais domésticos por coiotes
nos Estados Unidos, exclusivamente por agentes da A nim al Plant an d Health
Inspection Service (APHIS) do governo federal. A substância é distribuída em
uma cápsula do tamanho de um cartucho calibre 44, que é colocada em um
dispositivo com uma mola conhecido como M-44. Quando ativada, ejeta a
substância diretamente dentro da boca da espécie-alvo (Connolly 1978). Os
dispositivos, raramente utilizados ao longo de estradas, são geralmente distri­
buídos ao longo de trilhas deixadas por coiotes em áreas remotas. Seu modo
de ação envolve a produÇão de ácido hidrociânico quando a cápsula entra em
contato com a umidade na boca do predador. A morte rápida, levando geral­
mente de 1 a 3 minutos, é causada por asfixia. O cianeto de sódio é uma
substância altamente tóxica para a maioria das espécies. Entretanto, toxicidade
secundária é improvável, devido à rapidez da morte, que limita a assimilação
do composto tóxico na carcaça, deixando-a sem resíduos para espécies necró-
fagas como urubus e. corvos. Sua degradação no ambiente também é extrema­
mente rápida (USFW S 1975) e- seu uso é bastante limitado, exclusivamente
por pessoas credenciadas pelo governo.

228
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

Aves
Estimativa de danos
Algumas espécies de aves causam danos consideráveis em plantações nas mais
diversas áreas do país. No estado do Tocantins, fazendeiros enfrentam prejuí­
zos por bandos de marrecas-piadeiras (D endrocygna viduata) e marrecas-cane-
leiras (Dendrocygna bicolor), que após terem se proliferado na região têm des­
truído lavouras de arroz. As avoantes (Z énaida au ricu lata) são o maior proble­
ma nos estados de São Paulo e Paraná, onde se reproduzem em canaviais e se
alimentam de lavouras de soja. Como em qualquer monocultura, existe nessas
plantações uma fartura de alimento e, por ser um ambiente bastante modifica­
do antropicamente, a densidade de predadores naturais é bastante baixa. Des­
sa forma, essa espécie chega a procriar mais de uma vez durante o ano, o que
aumenta suas populações consideravelmente.

Algumas espécies causam dano econômico a produtores de peixes e alevinos.


Colisões de algumas espécies de aves com aeronaves são outro tipo de' dano
que pode ter, além de danos econômicos significativos, sérias consequências.
Nos Estadqs Unidos, existe um prejuízo anual de pelo menos 20 milhões de
dólares envolvendo empresas comerciais e aeronaves militares (M. Conover,
comun. pessoal).

Ao contrário da maioria dos mamíferos, que são bastante reservados quando


estão causando danos, as aves são na maioria das vezes muito visíveis e o
dano por elas causado é conspícuo. Por essas razões, estimativas subjetivas
dos danos causados são muitas vezes superestimadas e às vezes chegam até a
dez vezes mais que o dano real (Weatherhead et al. 1982). Dessa forma, estima­
tivas objetivas dos danos causados são importantes para que a magnitude do
problema seja claramente definida e para que as ações de controle sejam apro­
priadas e economicamente viáveis.

Para estimar os danos causados por aves a lavouras comerciais, deve-se imple­
mentar um esquema de amostragem que irá selecionar os campos a serem amos­
trados e determinar as plantas ou a área a ser medida nesses campos (Stickley
et al. 1979). Por exemplo, para que se possa estimar objetivamente a quantida­
de de dano causado pela pomba-avoante numa plantação de milho, o pesqui­
sador deve examinar pelo menos 10 localidades distantes umas das outras
nessa plantação. Se a plantação tiver 100 linhas e tiver 300 m de largura, o
pesquisador deve cam inhar distâncias alternadas por 30 m ao longo de 10
linhas selecionadas aleatoriamente (por exemplo, 0-30 m na linha 9, 31-60 m

229
SANDRA M. C. CAVALCANTI

na linha 20, e assim por diante). Em cada distância de 30 m, o pesquisador


deve selecionar 10 plantas aleatoriamente e estimar o dano causado em cada
planta. O dano causado por aves a lavouras de milho pode ser estimado pela
medida do seu comprimento na espiga (DeGrazio et al. 1969) ou pela estimati­
va visual da percentagem de perda de grãos (Woronecki et al. 1980) e a subse­
quente conversão para quilos perdidos por hectare. A perda na pródução de
frutas pode ser estimada através da contagem dos frutos normais, dos frutos
com danos e dos frutos retirados dos galhos (Otis et al. 1983). Danos causados
a plantações de girassol podem ser estimados a partir da área danificada no
miolo da planta. Alguns autores estimam os danos causados a lavouras comer­
ciais através da bioenergética das aves. Através da estimativa do número de
pássaros da espécie em questão numa determinada área, de seus requerimen­
tos calóricos e da percentagem da planta em questão na dieta desses pássaros,
o pesquisador pode projetar a biomassa total removida pelas aves diariamente
ou ao longo de determinada estação do ano (Weatherhead et al. 1982, White et
al. 1985).

Identificação da espécie por meio dos danos


A maioria dos danos causada por certas espécies de avés ocorre durante o dia
e a melhor forma para identificação da espécie causadora é pela observação
direta. Entretanto, a simples presença de determinada espécie de ave numa
lavoura que vem sendo danificada não prova que essa espécie seja necessaria­
mente a que vem causando danos. Em 1979, Dolbeer e seus colegas descobri­
ram que apesar das lavouras de trigo estarem sendo visitadas por grandes
bandos de chopins (Q uiscalus qu iscu la), essas aves estavam se alimentando
dos resíduos da lavoura prévia de milho. Os danos à lavoura de trigo estavam
sendo causados por bandos menores de estorninhos (Sturnus vulgaris), que se
alimentavam das sementes que começavam a germinar. Danos reais e potenci­
ais causados por vários grupos de aves são descritos a seguir.

G a iv o ta s: Várias espécies de gaivotas (Larus spp.J, tendo se adaptado a viver


em proximidade de centros urbanos, usufruem áreas com lixões para ali­
mentação. São também as ameaças mais sérias para acidentes em aeroportos
(Bucher 1984, R. Schm idt, comun. pessoal). Essas aves têm cada vez mais
causado incômodo em áreas urbanas, não só por degradar propriedades com
seus dejetos, mas também por nidificar em telhados e contaminar áreas muni­
cipais de abastecimento de água. Em áreas rurais, gaivotas às vezes se alimen­
tam em plantações frutíferas e em zonas com atividade de aquicultura. Além

230
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

de comer ovos de patos e marrecos e matar filhotes dessas espécies, elas po­
dem competir, com espécies ameaçadas, por locais de nidificação.

Pom bas é p a r d a is : Pombas e pardais são aves que habitam zonas urbanas e
rurais e cujos dejetos desfiguram e deterioram edificações, além de servirem
como agentes de contam inação de diferentes zoonoses. Quando os dejetos
dessas espécies são acumulados por longos períodos, podem conter esporos
do fungo que causa histoplasmose (Weber 1979). Em áreas de estocagem de
cereais, essas espécies consomem e contaminam grãos.. Apesar de atacar lavou­
ras de grãos, o dano causado por pardais não é de importância econômica. Já
a pomba-amargosa pode causar danos econômicos consideráveis à agricultura.
Essa espécie é atualmente tida como a que causa mais danos econômicos às
plantações, como a soja, no Brasil e em outras partes da América Latina. Na
Argentina, sua população tem crescido rapidamente desde os meados dos anos
50, coincidindo com a difusão das plantações de soja em larga escala (Bucher
& Bedano 1976). O problema mais sério se mostra em áreas que formam um
mosaico de plantações e manchas de capoeira. Essa situação, semelhante a
outras regiões como o México e a África, sugere que o problema causado por
espécies de aves-praga tende a aparecer em zonas de transição onde o desen­
volvimento agrícola avança em direção a áreas previamente não cultivadas (Bu­
cher & Bedano 1976). Após a colheita, uma quantidade considerável de grãos
(entre 160 e 500 kg por ha) fica desperdiçada no solo, o que sustenta uma
população bastante alta da pomba-amargosa, principalmente durante períodos
em que a disponibilidade de outros alim entos é pequena. Na Argentina, a
quantidade de grãos desperdiçada devido à ineficiência do maquinário de co­
lheita fica entre 10 e 30%, sendo muitas vezes maior do que as perdas causa­
das pelas aves, porém esse problema raramente recebe a atenção que merece
(Bucher & Bedano 1976).

Gansos e m a r r e c o s : Gansos e marrecos causam sérios danos econômicos em


plantações de grãos na região centro-norte dos Estados Unidos e na Argentina
(Bucher & Bedano 1976). No Brasil, os danos sofridos se concentram em plan­
tações de arroz^hos estados do Tocantins e Rio Grande do Sul. Os danos
ocorrem tanto devido ao consumo direto quanto ao pisoteio dos grãos, que
pode infringir danos econômicos duas vezes maiores que o consumo, (Sugden
& Goerzen 1979). As espécies frequentemente envolvidas são D endrocygna
spp. e A nas spp. O dano produzido varia de acordo com a localização das
lavouras, sendo maior quando elas são localizadas perto de banhados ou outros
hábitats preferidos por essas espécies (Plotnick 1971). Nos Estados Unidos,

231
.SANDRA M. C. CAVALCANTI

gansos adaptados a ambientes suburbanos têm causado incômodo em parques


públicos e campos de golfe, devido às atividades de alimentação e à deposição
de seus dejetos em áreas gramadas (Conover & Chasko 1985).

P s ita c íd e o s : A caturrita (M yiopsitta m o n a ch a ) é o único psitacídeo que pode


causar danos consideráveis à agricultura (M. P. Carbonari, comun. pessoal).
Sendo uma ave gregária, nidifica em ninhos comunais de tamanho considerá­
vel. Os ninhos são construídos em árvores nativas dominantes ou em planta­
ções artificiais, principalmente eucaliptos. Em algumas regiões, as caturritas
podem causar sérios danos a plantações de girassol e milho. Nas plantações
de girassol, as aves se empoleiram nas flores, removendo algumas sementes
do miolo e causando a queda de muitas outras. No milho, elas não somente
comem os grãos, mas permitem a ocorrência de danos adicionais por insetos e
fungos através da abertura das espigas. Numa escala menor, as caturritas po­
dem também causar danos a plantações de sorgo, arroz e trigo, assim como a
frutíferas, principalmente citrus, pêssego e figo (Bucher & Bedano 1976).

G a rça s, b ig u á s e m a r t in s - p e s c a d o r e s : Essas espécies muitas vezes se con­


centram ao redor de áreas com atividades de piscicultura. No Brasil e na Ar­
gentina têm sido registradas queixas sobre o biguá (P halacrocorax olivaceus) e
o Martim-pescador (C hloroceryle spp.J, acusado de competir com pescadores
esportivos em corpos de água doce (Bucher 1984, A. Cutolo, comun. pessoal).
Porém, as informações sobre esse tipo de dano ainda são bastante escassas,
devido à sua ocorrência eventual (M. P. Carbonari, comun. pessoal). Nos Esta­
dos Unidos, garças e biguás podem causar danos econômicos significativos
(Salmon & Conte 1981).

F a lc õ e s e c o r u ja s : Aves de rapina são muitas vezes responsáveis por casos de


predação de animais domésticos. Alimentando-se de presas de menor porte
do que aqueles predadores carnívoros, essas espécies predam geralmente gali­
nheiros e criações de marrecos, embora possam ocasionalmente causar a morte
de cordeiros e cabritos recém-nascidos (P. Crawshaw, comun. pessoal). Aves
de rapina normalmente predam apenas uma ave por dia, deixando perfura­
ções com marcas de sangue nas costas e peito de sua presa. Corujas normal­
mente removem a cabeça de, suas presas. Montes de penas são característicos
de ataques de aves de rapina, que removem as penas com seus bicos. Uma
maneira de diferenciar casos de predação de situações em que o animal já
morto apenas serviu de alimento para o predador é através do exame da ponta
das penas arrancadas. Penas com pequenas quantidades de musculatura pre­
sas a sua base foram geralmente arrancadas de uma ave cuja carcaça estava fria

232
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

e o animal provavelmente morreu de outra causa. Se a base da pena estiver lisa


e limpa, as penas provavelmente foram arrancadas logo após a morte da ave
(Dolbeer et al. 1994).

Técnicas de controle para aves


Modificação do hábitat e práticas culturais
Modificações no hábitat e algumas práticas culturais podem ser implementa­
das em várias situações para tornar algumas áreas menos atrativas para aves
em suas atividades de nidificação, alimentação ou sua simples presença. Em­
bora o investimento inicial de- tempo e dinheiro possa ser alto, essas modifica­
ções normalmente promovem um alívio de longo prazo. Uma diminuição ou
poda na vegetação pode levar as aves a procurar outras áreas, muitas vezes
aumentando ao mesmo tempo o valor comercial e estético da plantação (Good
& Johnson 1978, M icacchion & Townsend 1983). Em aeroportos, o objetivo é
tornar a área o menos atrativa possível. A cada ano, nos EUA, pelo menos seis
pessoas morrem em acidentes de avião envolvendo colisões com aves (M.
Conover, comun. pessoal). Gaivotas são os pássaros que mais causam problemas.
As atividades dessas aves em aeroportos podem ser praticamente eliminadas atra­
vés da eliminação de fontes de água parada, do cultivo de gramas mais altas ao
longo de pistas de pouso e da proibição de lixões nas imediações da área.

Nos Estados Unidos, a Administração Federal de Aviação (FAA) mantém uma


política segundo a qual qualquer disposição de lixo sólido deve ser feita em
áreas que se localizam no mínimo a 3 Km de qualquer pista de pouso utilizada
por aeronaves turbinadas (Harrison 1984). No Brasil, essa distância aumenta
para 10 Km para aeroportos que operam dé acordo com as regras de voo por
instrumento e para 6,5 Km para os demais aeroportos (CONAMA 1995). Exis­
te a necessidade de uma avaliação prévia de cada situação incluindo: 1 ) estra­
tégias em curto prazo, como o uso de estím ulos visuais para afugentar os
animais, o que deve ser coordenado com a torre de comando e deve estar de
acordo com a legislação; 2 ) um time móvel, que preste serviço quando necessá­
rio e que esteja sempre à disposição; 3) uma boa base de dados na qual se
possa observar, se possível, uma variação estacionai, anual e diária da ocor­
rência de acidentes; e 4) estratégias de longo prazo, incluindo a modificação
do hábitat por meio de uma mudança na vegetação.

A utilização de cultivares mais atrativos, onde as aves são encorajadas a se


alimentar, também pode ser uma técnica economicamente efetiva. Essa prática

233
SANDRA M. C. CAVALCANTI

é utilizada para diminuir os danos causados em plantações comerciais próxi­


mas onde outras práticas de controle são aplicadas, como, por exemplo, o uso
de estímulos visuais e acústicos (Cummings et al. 1987). O plantio de cultiva­
res de milho, soja e girassol resistentes às aves é outra prática que tem de­
monstrado eficiência na redução de danos. O controle de insetos em certas
plantações pode também contribuir para a diminuição dos danos, uma vez
que podem tornar os cultivares menos atrativos para certas espécies de aves
(Woronecki et al. 1981).

Uma prática de controle já testada para o controle da pomba-amargosa, nas


plantações de milho e soja no estado de São Paulo, envolve a coleta de ovos
dessa espécie, visando ao seu controle populacional (Guimarães 1993). Porém,
esse método não tem demonstrado resultados práticos. A velocidade de coleta
dos ovos não acompanha a velocidade de crescimento da população. Porém,
estudos revelaram que o milho deixado no solo após a colheita serve de ali­
mento para as pombas no período da entressafra. A eliminação dos grãos tem,
de certa forma, minimizado o problema (Garcafé 1999).

Exclusão
Em áreas de cultivo de frutíferas ou outras plantações de alto valor comercial,
o uso de telas de nylon ou de plástico pode ser justificável economicamente
(Fuller-Perrine & Tobin 1993). Telados de arame podem ser usados também
para excluir aves de áreas como tanques de piscicultura ou zonas de ventila­
ção de certas edificações. Prédios e/ou telhados com parapeitos podem ser
cobertos com fios eletrificados para prevenir o pouso de pombas e outras aves.
Áreas com deposição de lixo, tanques de piscicultura e outras estruturas po­
dem se valer de fios paralelos de linhas ou arame, pendurados em intervalos
de 2,5 a 12 m, para diminuir problemas causados por gaivotas. Linhas ou fios
de arame pendurados em intervalos de 30 a 60 cm repeliram pardais de áreas
de alimentação num experimento conduzido por Agüero e seus colegas (1991).
Pardais e gaivotas se mostram relutantes para voar por entre as fiações, mesmo
quando o espaçamento das mesmas é maior do que a envergadura de suas
asas. Fitas de PVC grosso também são eficientes para excluir pássaros de edi­
ficações (Johnson & Glahn 1993).

Repelentes
Aves têm o olfato e o paladar pouco desenvolvidos de uma maneira geral e os
repelentes baseados nesses sentidos norm alm ente não são eficientes. Nos

234
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

Estados Unidos, por exemplo, cristais de naftalina, apesar de serem registrados


como repelentes de odor para aves de cativeiro, não surtiram efeito quando testa­
dos em situações de ambiente natural (Dolbeer et al. 1988). Heisterberg (1983)
observou que sementes tratadas com repelentes de paladar foram consumidas por
aves da mesma forma que sementes sem tratamento. Em contraste, substâncias
químicas que produzem mal-estar ou respostas fisiológicas adversas (agentes aver-
sivos) parecem funcionar bem como repelentes para aves (Rogers, 1974). Nos
Estados Unidos, os aeroportos com maiores problemas utilizam o Rejex-it® (RJ
Advantage, Inc.), uma isca forrriulada com antranilato de metila, que causa uma
sensação de queima e faz com que as aves abandonem a área.

Estímulos visuais e acústicos


Vários aparatos têm sido comercializados ou construídos de forma caseira para
afugentar aves. Provavelmente o aparato mais comumente utilizado para essa
finalidade é o canhão de propano, que produz uma explosão alta em interva­
los de tempo pré-programados. Vários modelos têm sido comercializados, in­
cluindo aqueles com tim ers automáticos e bases giratórias. Para que esses ca­
nhões sejam eficientes em afugentar aves de plantações, o uso de pelo menos
1 canhão para cada 2 hectares é recomendado e a sua localização deve ser
mudada periodicamente. Dolbeer (1980) recomenda o uso de uma pessoa com
arma de fogo de vez em quando para reforçar o uso dos canhões. Outros apa­
ratos pirotécnicos para afugentar aves incluem foguetes e bombas que emitem
sons durante sua trajetória e explosão (Booth 1993).

Outra técnica utilizada é o emprego de sons biologicam ente relevantes. De


acordo com Bomford & O’B rien.(1990), em certas situações esses sons podem
funcionar bem, quando eles são emitidos através de um sistema de alto-falan-
tes. Alguns aeroportos nos Eãtados Unidos trabalham com um sistem a de
unidades móveis (veículos) com alto-falantes, que emitem sons biologicamen­
te relevantes. Essa técnica também é normalmente usada em conjunto com
tiros de armas de fogo, que servem para reforçá-la. Nos Estados Unidos esses
sons são disponíveis comercialmente para várias espécies de aves (Schmidt &
Johnson 1983).

Aparatos emitindo ultrassons são também vendidos com ercialm ente para o
controle de aves nos Estados Unidos e no Brasil (Monte Química/SP e MRZM
Indústria e Comércio/SP). Tratam-se de aparelhos emitindo sons com frequên­
cia acima do nível da audição humana (20.000 Hz), desenvolvidos para con­
trolar aves nas imediações de edificações rurais e urbanas. Contudo, testes de

235
SANDRA M. C. CAVALCANTI

campo objetivos ainda não conseguiram demonstrar a eficiência desses apara­


tos em afugentar aves (Woronecki 1988).

Em 1984, Conover conseguiu controlar danos causados por aves com certa
dose de sucesso, por meio da utilização de bandeiras, balões de gás com dese­
nhos imitando olhos grandes de predadores e pipas com o formato de águias
predadoras, suspensas por balões ou postes de bambu. Bandeiras fluorescen­
tes também podem ser utilizadas para afugentar gansos de plantações de trigo,
milho e alfafa. Heinrich & Craven (1990) recomendam o uso de 10 bandeiras
por hectare. Fitas refletivas foram também testadas com sucesso para a mesma
finalidade, penduradas em linhas paralelas em intervalos de 3 a 7 m. Essa
prática reduziu danos causados por pássaros-pretos em diversos cultivares
nos Estados Unidos (Dolbeer et aí. 1986).

Herbívoros, roedores e outros animais


Lebre-europeia
Nos últimos anos, a lebre-europeia vem sendo considerada como espécie pra­
ga no Estado de São Paulo, devido aos danos econômicos que causa à agricul­
tura. As principais culturas que sofrem com a ação da lebre são maracujá,
melancia, feijão, milho, pupunha e hortaliças como repolho, couve e brócolos
(Garcia 1999, França 1999). Os danos são ocasionados’ durante o crepúsculo
ou durante a noite, quando-os animais estão mais ativos. Em alguns casos, o
dano econômico é considerável, o que pode levar ao desestímulo do produtor
rural e ao abandono da cultura (Bosquê 1998).

O ataque à cultura do maracujazeiro ocorre principalmente em mudas, as quais


são seccionadas, levando à perda total das plantas. Porém, os ataques não se
restringem à fase inicial da cultura. Pomares adultos também têm sofrido o
ataque, onde perdas, embora menos significativas do que em pomares jovens,
também são registradas devido a lesões e secções nos troncos das ár.vores. O
ataque às plantas do maracujá acarreta um atraso no desenvolvimento dos
pomares, além de incorrerem em gastos decorrentes da substituição de plantas
atacadas. Já na cultura da melancia, as lebres-europeias se alimentam das bro-
tações pos estágios iniciais da cultura. Após o início da formação dos frutos,
as lebres roem o pedúnculo ou partes do fruto e nas culturas já formadas elas
roem a casca das frutas, não atingindo a polpa avermelhada, porém fazendo
com que as frutas, mesmo não destruídas, percam seu valor comercial. Na
região de Marília, estado de São Paulo, os primeiros ataques foram observados

236
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

no estágio final de desenvolvimento dos frutos e o dano foi o mesmo tanto em


áreas próximas a residências como em áreas com a presença de cães ou em
áreas mais distantes de contato antrópico (M. L. Neto, comun. pessoal).

Nas plantações de pupunha (Bactris g a z ip a e), as lebres atacam as mudas no­


vas, destruindo as folhas laterais para se alimentar do caule e das folhas mais
tenras. Nas plantações de café, as plantas são atacadas quando atingem aproxi­
madamente 30 cm de altura e liberam as primeiras brotações. A lebre ocasiona
uma quebra das mudas, por meio de um corte na região do colo da planta,
próxima ao solo. Plantas com altura superior a 30 cm não são susceptíveis (M.
A. C. Grande, comun. pessoal). Nas plantações de citros, os danos causados
pela lebre são semelhantes aos danos às lavouras de café, porém as pilantas
continuam suscetíveis quando já estão mais desenvolvidas, tendo seu caule
roído. Nas culturas do feijão, as lebres ocasionam a destruição total das plan­
tas novas. Plantas adultas têm suas vagens consumidas. Na cultura do milho,
ás lebres se alimentam das plantas receiri-germinadas. As mudas de hortaliças
atacadas pela lebre-europeia são totalmente destruídas (L. E. R. Zamariolli,
comun. pessoal).

Apesar de preferir áreas abertas (Dorst 1973, Garcafé 1999), a lebre se adapta a
uma grande variedade da hábitats, tendo sua presença registrada tanto em
pastagens quanto em áreas reflorestadas com Pinus e E ucaliptus (Auricchio &
Olmos 1999).

Capivara
Nos últimos anos, a Divisão de Ecossistemas do IBAMA (DIREC) tem recebido
diversas solicitações para a retirada de capivaras (H ydrochaeris hydrochaeris)
em áreas agrícolas devido aos danos econôm icos causados em culturas de
cana-de-açúcar, milho, pupunha e arroz. Nessas culturas, as capivaras geral­
mente se alimentam da parte aérea das plantas e causam o pisoteio e o conse­
quente acamamento das plantas e touceiras (W. Galbiatti, comun. pessoal). O
dano causado pelas capivaras é bastante conspícuo e geralmente acompanha­
do de grande quantidade de fezes e trilhas no local. Porém, grande parte das
propriedades que apresentam problemas é caracterizada por áreas propícias à
reprodução e ao desenvolvimento de capivaras, por apresentarem áreas de
preservação permanente (APP), córregos, grande quantidade de açudes e lo­
cais adequados que funcionam como perfeito abrigo aos animais. Uma solução
encontrada por técnicos do IBAMA tem sido vistorias para a retirada de exce­
dente populacional.

237
SANDRA M. C. CAVALCANTI

Essa situação tem sido acrescida de problemas com indivíduos dessa espécie
em áreas urbanas e problemas potenciais relacionados à saúde pública, com a
possível transmissão da febre maculosa, causada pelo organismo Rickettsia
ríckettsi, através do carrapato estrela (Andlyom m a cajen n en se). Apesar de não
existirem até o momento estudos constatando a transmissão da referida doen­
ça, vários pedidos para retirada de capivaras vêm sendo justificados com base
nessa possibilidade (M. P. Carbonari, comun. pessoal).

Lontra
Nos últimos anos, o número de pisciculturas e pesqueiros comerciais (pes-
que-pagues) tem aumentado consideravelmente, principalmente no interior do
estado de São Paulo, o que tem atraído aves predatórias e lontras (Lontra
lon g icau d is), que veem os peixes como uma fonte alternativa de alimentação. Os
danos econômicos podem ser consideráveis (A. Cutolo, comun. pessoal), po­
rém as informações a esse respeito são bastante escassas. Não existe uma estima­
tiva do real impacto causado por lontras nessas atividades de piscicultura.

Considerações finais
O profissional que trabalha nessa área de identificação, prevenção e controle
de danos causados por animais silvestres precisa estar aberto e disposto a
entender as questões sociais envolvidas num trabalho como esse. É necessário
que o profissional (biólogo, agrônomo, veterinário, engenheiro florestal), além
de entender a necessidade da proteção da fauna silvestre, compreenda o lado
do produtor rural, que muitas vezes depende do sucesso de suas atividades
para sua sobrevivência. É necessário, ainda, entender que o nível de dano
inaceitável para uma pessoa pode não ser considerado prejuízo para outra.
Tome por exemplo o caso de pessoas reclam ando sobre capivaras em suas
hortas e plantações, quando outras pessoas, simplesmente por gostarem des­
ses animais, até os alimentam para que eles permaneçam em suas proprieda­
des. A caracterização do comportamento dessas espécies é baseada etn parâ­
metros humanos, o que torna esse campo de prevenção e controle de danos
tão interessante.

238
MANEJO E CONTROLE DE DANOS
CAUSADOS POR ESPÉCIES DA FAUNA

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242
10 ^ Uso de armadilhas fotográficas em
levantamentos populacionais
Walfrido Moraes Tomas
EMBRAPA Pantanal

Guilherme H. B. de Miranda
Instituto Nacional de Criminalística
Serviço de Perícias de Engenharia e Meio Ambiente
i __________________________________________

Introdução
A estimativa de tamanho de populações é de importância central no manejo e
conservação de fauna. Segundo Mourão & Magnusson (1997), os levantamen-'
tos populacionais são ferramentas auxiliares na definição dos propósitos de
manejo de populações silvestres. Eles permitem, segundo Caughley (1977),
(1) o tratamento de populações pequenas ou em declínio, visando aumentar
sua densidade e/ou área de distribuição; (2) o uso econômico sustentado da
população e (3) o tratamento de populações com densidade e/ou taxa de cres­
cimento inaceitavelmente altos, visando estabilizar ou reduzir sua densidade.

Biólogos de campo, às vezes, deparam a necessidade de estimar o tamanho de


populações de espécies esquivas, de difícil observação em condições naturais,
como espécies de hábito noturno (Duckworth 1998), que apresentam densida­
des baixas ou de difícil captura e recaptura. Situações como essas geralmente
resultam em baixa taxa de encontro (ou em virtualmente nenhum encontro)
em levantamentos por observação direta, levando à necessidade de um esforço
amostrai, logística e financeiramente inviável, ou em amostras muito reduzi­
das, para que seja possível algum nível de confiabilidade nas estimativas de
abundância. Outro problema comum é resultante da baixa probabilidade de
captura e recaptura, seja porque a espécie em questão evita artefatos de pesqui­
sa (como armadilhas, por exemplo) ou porque, em algumas espécies, a captura
provoca algum tipo de resposta, diminuindo substancialmente as chances de
recaptura do mesmo indivíduo. Estes tipos de problemas geram estimativas de
pouca precisão e requererem formas de detecção e/ou análise de dados adequa­
das para contornar estas limitações.

243
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

Várias técnicas alternativas de amostragem/estimativa têm sido utilizadas com


a intenção de se ter uma noção do tamanho ou da densidade de população de
espécies “complicadas”. Para grandes felinos, por exemplo, é comum a tentati­
va de identificação de indivíduos através de particularidades das pegadas dei­
xadas em determinada área (por exemplo, Panwar 1979) para, a partir daí,
estimar-se o tamanho da população. A precisão do método tem sido constan­
temente questionada (Karanth & Nichols 1998), apesar de ainda ser utilizado
por muitos pesquisadores. Outra abordagem é a tentativa de se obter estimati­
vas de densidade/tamanho populacional baseando-se em contagens de pilhas
de fezes. Entretanto, essa técnica é pouco consistente, uma vez que o grau de
incerteza é grande, principalmente devido à grande variabilidade na taxa de
deposição de fezes. Essas diferenças podem ocorrer entre diferentes estações
do ano, entré indivíduos de idade e sexo diferentes e entre indivíduos em
diferentes condições fisiológicas. Com isso, a técnica tem sido utilizada ape­
nas como um meio de obter índices de abundância para comparar a mesma
população em diferentes momentqs ou diferentes populações ao mesmo tem­
po. Por outro lado, tecnologias mais sofisticadas estão hoje disponíveis, facili­
tando a resolução de problemas amostrais que restringiam o trabalho de cam­
po. Entre elas, destacam-se a radiotelemetria, os marcadores moleculares e as
câmeras fotográficas automáticas.

Existem poucos trabalhos publicados sobre câmeras fotográficas automáticas


utilizadas para estimativa de tamanho populacional. Karanth (1995), Karanth
& Nichols (1998) e Karanth & Nichols (2002) aplicaram modelos de captura e
recaptura para estimar abundância de tigres (P anthera tigrís) na índia, com
base em registros fotográficos. Os referidos autores afirmam que a associação
de captura-recapfura e câmeras automáticas fornece escopo para estimativas
objetivas de parâmetros como tamanho, densidade, sobrevivência e recruta­
mento de populações de tigres e outras espécies animais inconspícuas e de
baixa densidade, com marcas naturais. Koerth et al. (1997) compararam re­
sultados de estimativas de tamanho da populàção de veados-de-rabo-branco
(O docoileu s virginianus) obtidas através de contagem por helicóptero e por
câmeras automáticas. Os autores afirmaram que as câmeras podem ser razoá­
veis para se estimar o tamanho de populações de veados e ainda sugeriram
que pode haver influência da presença de outras espécies sobre a detectabili-
dade de veados. Jacobson et al. (1998) conduziram dois levantamentos popu­
lacionais de veado-de-rabo-branco usando câmeras fotográficas. As estimativas
/ foram feitas pelo índice de Lincoln-Petersen para animais marcados e não mar­
cados, e pela estimativa de visualização de diferentes categorias de indivíduos

244
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

(machos com galhadas, fêmeas e jovens, ambos sem galhadas). Os autores reali­
zaram ainda experimentos interessantes relacionando os efeitos da densidade
de câmeras na área de estudo sobre as estimativas populacionais. Jacobson et aí.
(1998) demonstraram que há uma relação inversa entre a densidade de câmeras
e as estimativas de população obtidas pelo índice de Lincoln-Petersen.

O equipamento
O sistema fotográfico automático consiste, basicamente, de uma câmera foto­
gráfica comum, com lente de 35 mm, fotômetro, disparo de fla s h , foco e avanço
do filme automático. A máquina fotográfica fica acoplada a um sistema dispa­
rador que pode ser: (1) com sensor de raios infravermelhos (RIV); capazes de
detectar calor corporal irradiado e movimentos relativos ao fundo de disper­
são dos RIV, (2) sensor de radar (detecta movimentos contra um. fundo relati­
vamente fixo) ou (3) sistema mecânico (acionado por pressionamento ou tra­
ção). O conjunto é acondicionado em envoltório de material resistente que
protege contra o excesso de umidade e evita a ação danosa de animais curiosos
(Figura 1 ). A maioria dos equipamentos, hoje disponíveis, permite a impres­
são da data e horário em que cada foto foi obtida, que são informações impor­
tantes para análise via captura-recaptura, para eventuais análises de períodos
de atividade. Existem ainda opções de regulagém para fotos diurnas, noturnas
ou contínuas, e opções de intervalômetro capazes de retardar uma próxima
fotografia por intervalos de 3, 6 e 10 minutos. Com estes aparatos, é possível
economizar material fotográfico e baterias, otimizando os custos do estudo em
virtude do comportamento da espécie estudada. Apesar do custo relativamen­
te alto dos equipamentos com erciais, máquinas fotográficas equipadas com
sensores infravermelho ou com sistemas m ecânicos podem ser confecciona­
das a partir de componentes disponíveis no mercado de material fotográfico,

Figura 1. Armadilha fotográfica, modelo CAM TRAKKER instalada no campo A. vista frontal da
câmera; B. detalhe da instalação ao longo de uma estrada no interior de um parque. (Foto,
Laury Cullen Jr.)

245
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

'de sistemas de alarmes residenciais e eletroeletrônicos, em geral. Com isso,


pode-se obteí uma redução de cerca de 50% no custo final .em relação aos
modelos prontos disponíveis. Karanth (1995) sugere o uso de câmeras mais
simples e baratas, acionadas por disparadores mecânicos no solo, naqueles
casos em que não houver problemas com a presença de animais de outras
espécies indesejadas e de umidade ou chuva.

As espécies que mais se prestam ao uso do equipamento fotográfico são aque­


las que se encaixam em duas categorias:

Espécies difíceis de capturar/observar - Para essas espécies, a,existência de


marcas naturais é um ponto fundamental. A capacidade de diferenciar indiví­
duos é a vantagem central do uso das câmeras, considerando-se que as fotogra­
fias são capturas e/ou recapturas. Dentre essas espécies, encontra-se a paca
(■Cuniculus p a c a ) (Figura 2) e felinos pintados, como a jaguatirica (Leopardus
p a rd a lis), onça-pintada (Panthera o n c a ) e outros gatos selvagens (Figura 3).
Machos de cervídeos, cujas galhadas apresentam ampla variação, como o cer-
vo-do-pantanal (B lastoceru s d ich otom u s), também são passíveis de levanta­
mentos através de registro fotográfico. Entretanto, essa abordagem apresenta
algumas complicações com soluções bastante adequadas, que serão discutidas
mais adiante.

Espécies difíceis de recapturar - Para algumas espécies, a probabilidade de


recapturar um indivíduo é menor do que a de capturar um ainda não captura­
do. Qualquer espécie passível de captura, pelo menos em uma primeira oca­
sião, e que possa ser marcada de forma a ser identificada através de fotografias
obtidas subsequentemente, permite a utilização eficiente do método das câme­
ras fotográficas e um tratamento estatístico adequado para os dados. Neste
caso, espécies de porte médio a grande são as mais interessantes, uma vez que
marcas em animais muito pequenos são de difícil reconhecimento nas fotogra­
fias. Importante ressaltar que a recaptura através de fotografia deve ser capaz
de identificar corretam ente os indivíduos marcados dos não marcados, ou
seja, as marcas devem ser visíveis nas fotos obtidas. A escolha do tipó e loca­
lização das marcas é ponto central nesses casos, além da capacidade de fazer
com que os animais sejam fotografados em posição adequada para expor o
artefato de marcação. Colares, brincos, despigmentação de pelagem, além de
mutilações podem ser úteis para isso. Em alguns casos, dependendo da abor­
dagem estatística utilizada, a identificação de cada indivíduo capturado é ne­
cessária ou, pelo menos, a ocasião da captura/marcação precisa ser correta­
mente determinada na “recaptura” fotográfica.

246

I
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS pbpULACIONAIS

Figura 2. Exem plos de diferentes padrões de pelagem de pacas (Cuniculus paca) atraídas
para pontos com iscas e fotografadas no Parque Nacional de Brasília. Padrões de cor.

Figura 3. Momento de captura fotográfica de onça pintada (Panthera onca). Foto obtida com
câmera automática no Parque Estadual Morro do Diabo, São Paulo. Fotos em posição lateral,
como esta, permitem uma comparação entre indivíduos diferentes com base no padrão de
manchas da pelagem. (Foto: Laury Cullen Jr.)

247
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

Protocolos de amostragem
Antes de iniciar qualquer trabalho de campo utilizando equipamento fotográ­
fico, é fundamental estabelecer um protocolo adequado à espécie a ser estuda­
da, ao tipo de hábitat e aos objetivos do estudo.

Espécie-alvo - No que se refere à espécie, algum conhecimento sobre horário


de atividade, hábitat utilizado, comportamento de deslocamento e dieta, entre
outros, são importantes para orientar quando, onde e como instalar o equipa­
mento. Essas informações podem ser obtidas na literatura, em consulta a pes­
quisadores experientes ou mesmo consultando moradores de áreas rurais da
região onde o estudo for desenvolvido. Um-exame prévio da área de estudo
pode auxiliar bastante, já que sinais da presença da espéciè em questão podem
ser encontrados, mas a correta identificação e interpretação desses sinais re­
quer experiência de campo. Finalmente, caso a amostragem se baseie em sinais
naturais (padrões de pelagem, por exemplo), deve-se decidir sobre a necessi­
dade de fotos de ambos os flancos dos animais, já que não é esperado que haja
simetria bilateral no padrão de pelagem (ver Figuras 7A e 7B do Capítulo 4,
neste volume). Duas abordagens são possíveis neste caso: a primeira, utilizan­
do-se duas câmeras postadas frente a frente, de forma que se obtenha duas
fotos em um mesmo momento, uma de cada lado do animal, como utilizado
por Karanth (1995), Karanth & Nichols (1998) e Karanth & Nichols (2002) ao
longo de trilhas utilizadas por tigres. Nesse caso, a sincronia das fotos é fun­
damental. Testes realizados pelos autores com máquinas individuais (ou seja,
com sensores infravermelho separados) postadas frente a frente não produzi­
ram essa sincronia. A situação ideal, portanto, é um conjunto de duas câmeras
disparadas por um único sensor ao qual estarão conectadas. A segunda abor­
dagem é a obtenção de fotos através de uma única câmera, de forma a obter
imagens de um mesmo flanco de todos os animais. Isso funciona melhor para
espécies que são atraídas para iscas, como a paca (Figura 4) e, nesse caso, a
aproximação dos animais pode ser direcionada, por exemplo, colocando-se
obstáculos que impeçam a aproximação com exposição do flanco não deseja­
do. Em outro esquema, ahimais fotografados em trilhas podem expor tanto o
lado esquerdo como o direito, mas as análises devem ser feitas considerando
apenas um dos lados de todos os animáis, descartando-se fotos de indivíduos
obtidas do lado oposto. A seleção de qual lado será incluído nas análises é
arbitrária, mas pode-se, por exemplo, escolher aquelç que produziu maior
número de registros.

Quando a identificação de indivíduos se baseia em outros aspectos, como

248
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS -POPULACIONAIS

galhadas em cervídeos, por exemplo, este cuidado pode ser relaxado, desde que
as fotos ofereçam uma visão dos chifres o mais completa possível (ver Jacobson
et al. 1998). Em animais capturados previamente e marcados, os mesmo cuida­
dos devem ser tomados, dependendo do tipo de marcação utilizada.

Figura 4. (A) Grupo de queixada (Tayassu pecari)-, (B) macho de veado-mateiro (Mazama am e­
ricana)-, (C) cachorro-do-mato (Cerdocyon thous): (D) anta adulta (Tapirus terrestris). Registros
fotográficos realizados com câm eras automáticas durante inventário na fazenda Nhumirim,
Pantanal da Nhecolándia, no Mato Grosso do Sul.

O Uso de Iscas
A utilização de iscas é comum em protocolos de captura com armadilhas e
também pode ser um meio para atrair os animais para frente das câmeras foto­
gráficas. Conhecimentos sobre comportamento e hábitos alimentares são fun­
damentais para o estabelecimento de protocolos. Testes preliminares podem
ser realizados com o Objetivo de selecionar os itens mais eficientes na atração
da espécie-alvo. A paca, por exemplo, pode ser atraída por uma grande Varie­
dade de grãos, frutas e tubérculos. A escolha deve recair sobre iscas que reú-
nam atratividade, maior resistência ao apodrecimento, facilidade de transporte
e utilização e, no caso de frutas ou grãos exóticos em áreas de preservação,
menor risco de germinação.

249
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

Por outro lado, alguns efeitos das iscas devem ser ponderados: iscas podem
atrair mais espécies do que o desejado e, em alguns casos, a presença de uma
dada espécie pode influenciar a presença de outra (Koerth et al. 1997). Ou
seja, a atração de espécies que não são alvo do estudo pode alterar a probabi­
lidade de detecção fotográfica da espécie de interesse. Outro efeito que pode
ocorrer, dependendo da duração do trabalho, é o de viciar os animais aos
pontos de ceva, onde se encontram as iscas. Se o trabalho for de longa dura­
ção, predadores podem “aprender” a espreitar os animais nesses pontos, in­
fluenciando a sobrevivência dos indivíduos na população em relação à situa­
ção natural. Para esses problemas não há soluções fáceis, mas o pesquisador
deve levá-los em consideração e estabelecer um protocolo de forma a tentar
minimizá-los.

A disponibilidade de iscas deve ser coerente com as premissas do protocolo


de amostragem e da análise dos dados. Por exemplo, a disponibilidade de
iscas não pode variar ao longo do tempo e nem entre pontos diferentes de
amostragem numa mesma área. A eventual falta de iscas em alguns pontos
pode resultar em variação na probabilidade de captura fotográfica de indiví­
duos, o que viola premissas im portanteí de alguns modelos disponíveis para
estimar tamanho de populações através de captura-recaptura. Para minimizar
esse problema, iscas devem estar disponíveis em todos os pontos de amostra­
gem ao longo do estudo.

Distribuição das câmeras


A distfibuição do equipamento fotográfico depende também do hábitat, do
comportamento da espécie estudada e da questão a ser investigada. Hábitats
podem ser contínuos e de grande extensão (como florestas extensas e contínuas),
podem ser lineares*(como matas de galeria), além de mosaicos de dois ou mais
tipos de hábitats (em áreas de hábitats fragmentados, por exemplo).

O comportamento dos animàis também é um importante aspecto a ser conside­


rado. Animais podem se deslocar ao longo de trilhas definidas; podem percor­
rer os hábitats através de rotas muito variáveis no tempo e no espaço ou po­
dem estar associados a aspectos físicos particulares dos hábitats, como proxi­
midade da água, afloramentos rochosos etc. Além disso, muitas espécies são
de comportamento solitário, enquanto outras podem viver em grupos sociais
numerosos, como os taiassuídeos, Tayassu tajacu e T. p e c a r í (ver Figura 4a).
Finalmente, um aspecto muito associado ao tamanho de grupo e ao tamanho
corporal é a densidade e/ou a área de vida da espécie estudada. Algumas espé­

250
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

cies possuem territórios individuais da ordem de milhares de hectares, en­


quanto outras estão restritas a uns poucos hectares. A detectabilidade dos
animais, sob esse aspecto, varia muito entre esses dois extremos e, portanto, a
definição de um esforço amostrai adequado, que inclui a distribuição das câ­
meras, deve ser definido a priori através de testes a campo.

Levantamentos populacionais de espécies que utilizam trilhas definidas para


deslocamentos não necessitam atração através de iscas, uma vez que equipa­
mentos fixados às margens dessas trilhas conferem boa probabilidade de “cap­
tura” fotográfica dos animais. Espécies que não são tão fiéis a trilhas são mais
difíceis de se detectar e, assim, as iscas podem ser uma opção conveniente. A
distribuição das armadilhas, nesse caso, pode ser desenhada com maior flexi­
bilidade dentro da matriz de hábitat da área de estudo. Em hábitats contínuos,
é possível distribuir câmeras formando uma grade cuja área efetivamente amos­
trada pode ser calculada, facilitando a obtenção de.estimativas de densidade.
Isso é possível mesmo com câmeras associadas a trilhas, caso a área amostrada
seja suficientemente grande (Karanth 1995).

Em hábitats de formato linear, o estabelecimento de grades de câmeras com


área amostrada conhecida é dificultada. Nesses casos, uma possível aborda­
gem é a colocação de linhas de câmeras ao longo da área amostrada e a obten­
ção de estimativas de densidade, considerando-se a área total do hábitat da
espécie em questão. Por outro lado, em áreas de mosaico, o problema é mais
complexo e a definição da distribuição do equipamento dependerá da espécie
estudada e sua relação com o hábitat. Quando se tratar de espécie generalista,
a distribuição das câmeras pode ser relaxada, no que diz respeito ao tipo de
hábitat. Espécies especialistas devem ser estudadas apenas naqueles elemen­
tos da paisagem aos quais estão associadas. A distribuição das câmeras pode
então seguir os preceitos discutidos anteriormente para hábitats contínuos.
Áreas compostas por muitos fragmentos, por exemplo, podem ser amostradas
através de uma grade de câmeras, e a estimativa de densidade.pode ser então
corrigida com base na proporção de hábitats da espécie estudada em relação à
área total amostrada.

Outro aspecto que pode definir a distribuição das câmeras fotográficas é a


questão do que se deseja saber/descobrir. Em planos de manejo e conservação,
bem como em estudos ecológicos, muitas vezes, não é necessária a estimativa
da densidade e do tamanho populacional, bastando um índice de abundância.
Para se obter uma estimativa de densidade, é preciso conhecer a área efetiva­
mente amostrada e considerar o efeito de borda.

251
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

Esforço amostrai
Basicam ente, o esforço amostrai é determinado pela densidade de câmeras
distribuídas na área de estudo e pela duração do período de amostragem. A
densidade deve estar coerente com a área de vida da espécie estudada, evitan­
do-se falta de independência entre pontos de amostragem. Como a área de
vida varia muito de espécie para espécie, não é coerente utilizar a mesma
densidade de câmeras para estimar tamanho da população de espécies com
áreas de vida muito diferentes, como por exemplo, de uns poucos hectares, e
espécies que ocupam áréas de centenas ou milhares de hectares. Entretanto,
não há regras pré-estabelecidas para o desenho da amostragem, e testes preli­
minares podem ser realizados para avaliar o efeito de diferentes densidades
sobre as estimativas (ver, como exemplo, Jacobson et al. 1998). Informações de
literatura podem fornecer alguns indicadores sobre como distribuir as câmeras
no campo, mas qualquer experimento deve descrever detalhadamente a forma
como as amostragens foram realizadas (notadamente para espécies cujas áreas
de vida são desconhecidas).

A duração da amostragem deve estar coerente com o desenho experimental e


com a metodologia estabelecidos para amostragem e análise de dados. Como
descrito a seguir, experimentos de longa duração resultam em complicadas
soluções para lidar com a violação de premissas sobre a população, tais como
a ocorrência de nascimentos, mortes, imigração e emigração durante o período
de estudo. Além disso, a duração da amostragem tende sempre a ter uma
correlação com a densidade da espécie estudada. Espécies de densidade muito
baixa, por exemplo, têm menor probabilidade de ser capturadas/fotografadas
e, por isso, há sempre que se direcionar maior esforço amostrai para a obten­
ção de dados suficientes para inferências consistentes. Isso pode ser feito atra­
vés de três formas não excludentes: aumento do período amostrai, aumento
do número de câmeras e levantamentos repetidos duas ou mais vezes.

Abordagens estatísticas b ásicas e análise de dados


Captura - m arcação - recaptura (CMR)
Métodos baseados em CMR têm sido desenvolvidos e aplicados a uma miría­
de de espécies e situações, haja vista que sua base conceituai e estatística é
relativamente robusta e bastante adequada à maioria dos casos. Em algumas
situações, tornam-se a única alternativa viável para se obter estimativas de
tamanho de populações animais. O método de CMR data do século 18, quan­

252
USD DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

do Laplace o utilizou para estimar a população da França (Seber 1982). Em


1896, C. Petersen deserivolveu um método probabilístico simples de CMR, o
qual foi popularizado, a partir de 1930, por F. Lincoln (Begon 1979). O método
passou a ser conhecido como estimador Lincoln-Petersen e baseia-se em duas
ocasiões de captura. Assim,

N = (n1 * n2) / m2
em que,

N = estimativa do tamanho da população


iij = número de animais capturados e marcados numa primeira ocasião
n 2 =. número de animais capturados numa segunda ocasião
m2 = número de animais capturados marcados na segunda ocasião

Esse estimador possui as seguintes premissas: (A) a população é fechada (não


ocorrem mortes, nascimentos, imigração ou.emigração entre a primeira e se­
gunda amostragem); (B) a marcação não altera a probabilidade de recaptura; (C)
todos os animais marcados se misturam na população, conferindo igual chan­
ce de captura na segunda ocasião a todos os indivíduos presentes na popula­
ção (marcados e não marcados); e (D) as marcas não são perdidas. Uma modi­
ficação deste estimador foi proposta por Bailey para amostras pequenas, cbmo
segue:

N = nt * (n2 + 1) / (m2 + 1)
cujo erro padrão é:

EP = V n j2 * (n2 + 1) * (n2 - m 2) / (m2 + l } 2 * (m2 + 2)

Esses estimadores simplificados são bem aplicados ao uso. de câmeras fotográ­


ficas automáticas, desde que as premissas sejam obedecidas. Em espécies com
marcas naturais que permitem identificação de indivíduos, a marcação não
precisa ser feita e, portanto, reduz-se o risco de violação das premissas B, C e
D. Em animais capturados por qualquer método para marcação e posterior
“recaptura” fotográfica, essas premissas devem ser consideradas, mesmo a “re­
captura” não implicando o uso de armadilhas ou outro artefato para contenção
dos animais. Entretanto, caso metade ou mais da população não seja marcada
(óu fotografada), a distribuição de estimativas repetidas e independentes do
tamanho da população sempre apresentará uma .tendência à direita, ou seja,
positiva (Caughley e Sinclair 1994). Assim, os limites de confiança também
apresentam uma tendência e não podem ser facilmente calculados a partir do
erro padrão das estimativas.

253
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

A premissa menos realista do modelo Lincoln-Petersen é a de igual probabili­


dade de captura, a qual é rotineiramente violada em quase todas as populações
cujo tamanho é estimado por biólogos que estudam vida selvagem (Eberhardt
1969). Assim, as estimativas do modelo Lincoln-Petersen e de todos os mode­
los dele derivados (formulações de Bailey, de Schnabel e de Jolly-Seber, entre
outros) devem ser consideradas com cautela (Caughley & Sinclair 1994).

A partir dos estimadores de Lincoln-Petersen e de Bailey, vários métodos mui­


to mais sofisticados foram desenvolvidos para populações fechadas sujeitas a
mais de duas ocasiões de amostragem. Em se tratando de populações fecha­
das, o problema que mais afeta as estimativas de tamanho de populações é a
violação das premissas 2 e 3, ou seja, a variação na probabilidade de captura
(Otis et al. 1978, Burnham & Overton 1979, Jolly & Dickson 1983). Basicamen­
te, as violações dessas premissas são de três tipos, para os quais modelos
específicos foram desenvolvidos:

(A) - Modelo Mt - as probabilidades de captura variam com o tempo, para


todos os indivíduos na população, ao longo do período de amostragem. Este
modelo foi desenvolvido por Schnabel (1938) e pode ser altamente tendencio­
so se as probabilidades de captura não forem iguais para todos os indivíduos
num dado período.

(B) - Modelo Mb - as probabilidades de recaptura variam como respostas


comportamentais à captura. Essas respostas podem ser de dois tipos: animais
capturados que se tornam mais atraídos às iscas e/ou armadilhas do que os
não capturados (trap h a p p y ) e os animais que evitam as iscas/armadilhas após
a captura (trap shy). Todos os animais têm uma mesma probabilidade inicial
de captura (p) e todos os animais marcados têm a mesma probabilidade de
recaptura (c) em todas as ocasiões posteriores. Entretanto, p e c não são iguais.
Esse modelo é basicamente uma forma de captura-por-unidade-de-esforço, com
uma diferença importante: os animais não são removidos fisicamente, já que
os indivíduos marcados são ignorados em amostras subsequentes. Dessa for­
ma, o número de animais não marcados a cada ocasião tende a diminuir ao
longo do tempo.

(C) - Modelo Mh - as probabilidades de captura de indivíduos da população


amostrada variam em virtude da heterogeneidade entre sexos, faixas etárias,
status social e estado fisiológico. Ou seja, cada animal tem uma probabilidade
única de captura, a qual permanece constante ao longo do estudo. Além disso,
as probabilidades de captura são assumidas como uma amostra ao acaso de
todos os indivíduos na população. Esse modelo foi desenvolvido inicialmente

254
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

por Burnham (1972) e posteriormente detalhado por Burnham & Overton (1978,
197-9), os quais produziram um procedimento baseado no método de jackkn ife.
Chao (1988) propôs um outro modelo baseado em um estimador de momento
(m om ent estim ator), o qual é superior ao de Burnham & Overton (1978, 1979)
quando as probabilidades de captura são baixas.

Como é intuitivo esperar, combinações desses modelos podem ocorrer na rea­


lidade. Pollock (1974) inicialm ente desenvolveu um modelo Mbh (incorporan­
do heterogeneidade e resposta comportamental à captura). Posteriormente, Otis
et al. (1978) desenvolveram um método de remoção generalizado, e Pollock &
Otto (1983) aplicaram o método de ja c k k n ife para a obtenção dos estimadores
de tamanho de população. Esses modelos baseiam-se na premissa de que cada
animal tem uma única combinação de probabilidades de captura (pj e Cj), efn
que pj é a probabilidade inicial de captura e Cj é a probabilidade de recaptura.
Essas probabilidades são assumidas como constantes ao longo do período de
amostragem. Conceitualmente, os modelos apresentados anteriormente podem
ser generalizados para incluir o fator tempo. Entretanto, modelos foram desen­
volvidos apenas para Mth (Chao et al. 1992) e Mtb (Rexstad & Burnham 1991).
O modelo Mtbh.ainda não possui solução publicada para a estimativa de tama­
nho de populações.

Todos os modelos propostos acima para populações fechadas estão inseridos


no programa CAPTURE (Rexstad e Burnham 1991), o qual inclui um método
para a seleção do modelo que mais se ajusta aos dados coletados. Estes méto­
dos são baseados em testes de ajuste de modelos (goodness-of-fit) e testes entre
modelos, mas devem ser utilizados com cautela e, se possível, associados a
informações sobre a biologia da espécie em questão. Detalhes sobre os mode­
los e os procedimentos são encontrados em Rexstad & Burnham (1991).

Finalmente, estes modelos são adequados para períodos de amostragem cur­


tos, durante os quais as chances de violação de premissas (notadamente a
premissa A) são desprezíveis. Para períodos de amostragem longos, a violação
dessa premissa requer tratamento diferenciado, considerando-se a população
estudada como aberta. -

Métodos de remoção
O modelo mais simples de remoção assume que todos os indivíduos têm uma
mesma probabilidade de captura, que é constante em todas as ocasiões (Hayne
1949, Moran 1951, Zippin 1956, 1958, Seber & Whale 1970, Otis et al. 1978,
Seber 1982, White et al. 1982). Este método possui apenas dois parâmetros: o

255
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

tamanho da população (N) e a probabilidade de captura (p). O único dado


coletado é o número de capturas em cada ocasião de amostragem, consideran­
do-se apenas os animais não capturados e marcados em ocasiões anteriores.
As premissas do modelo são: (A) esforço de captura igual em todas as ocasiões;
(B) a população é fechada e (C) a probabilidade de captura não é heterogênea.
Esta última premissa geralmente falha, uma vez que é esperada variação na
probabilidade de captura entre sexos, idades e status social diferentes.

Uma outra abordagem é o método generalizado de remoção. A ideia básica é


que a probabilidade de captura constante nem sempre se ajusta aos dados de
remoção (White et al. 1982). Quando isso ocorre, é necessário generalizar o
modelo, ou seja, fazer com que o modelo seja màis flexível por aceitar algum
grau de desigualdade nas probabilidades de captura. De um modo geral, essa
abordagem permite aplicar uma probabilidade de captura diferente para aque­
les indivíduos não capturados que permanecem na população -a cada ocasião
de captura. Assim, os parâmetros do modelo passam a ser o tamanho da popu­
lação (N) e a probabilidade de captura de indivíduos que permanecem na po­
pulação no início de cada ocasião j (p j. Entretanto, este modelo é muito gené-
rico para poder ter uma aplicação prática. Uma estratégia é assumir que há
alguma relação entre as probabilidades de captura p j,......pt, ao contrário do
modelo básico onde pa = p 2 = ......= pt = p. Se as probabilidades de captura
variam devido à heterogeneidade, um modelo generalizado de remoção é pos­
sível; já com variação temporal isso é impossível. A solução é conduzir um
estudo que procure minimizar qualquer variação temporal. Por exemplo, isso
pode ser feito pela utilização de metodologia padronizada durante condições
ambientais constantes:

Duas abordagens são possíveis para analisar dados através de modelos de


remoção com probabilidade constante de captura: métodos de regressão (cap­
tura por unidade de esforço) e métodos baseados em máxima verossimilhança
(ver Zippin 1956, Carie & Strube 1978, Seber 1982, White et al. 1982), sendo
que os primeiros são inferiores aos segundos.

Para utilização de câmeras fotográficas, os animais fotografados em cada oca­


sião são considerados “removidos”, e a cada ocasião só se computam os ani­
mais novos fotografados. Aqui, a padronização do protocolo, incluindo dispo­
nibilidade permanente de iscas em todos os pontos e períodos amostrais, é
fundamental para que não haja variação na probabilidade de captura entre
uma ocasião e outra ou entre um ponto e outro.

256
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

Populações abertas
Uma população aberta é aquela em que ocorrem mortes, nascimentos, imigra­
ção e emigração durante o período de amostragem. Entretanto, é difícil diferen­
ciar morte de emigração e nascimento de imigração através de marcação-recap-
tura. O modelo básico para se estimar tamanho de populações abertas é o de
Jolly-Seber (Jolly 1965, Seber 1965, Cormack 1973, Seber 1982). Esse modelo
permite a estimativa do tamanho da população a cada ocasião amostrai, bem
como taxas de “sobrevivência” (inclui mortalidade e emigração) e “natalidade”
(inclui imigração) entre as ocasiões. As premissas do modelo Jolly-Seber são
ás seguintes: (A) Todos os indivíduos marcados presentes na população a
cada ocasião têm a mesma probabilidade de captura; (B) Todos os animais
marcados presentes na população imediatamente após uma dada ocasião de
captura/marcação têm a mesma probabilidade de sobreviver até a próxima
amostragem; (C) Marcas não são perdidas ou mal-identificadas e (D) Todas as
amostras são rápidas e cada soltura é feita imediatamente após a amostragem.

0 modelo se baseia no cálculo de M; (número de animais marcados na popu­


lação imediatamente antes de se conhecer todos os valores de amostras de i a
1 = 2, ..., k ocasiões de amostragem). M; é desconhecido em populações aber­
tas porque mortalidade e/ou emigração podem ocorrer. A única exceção é M1;
que é sempre igual a zero. Intuitivamente, o estimador de Ni (tamanho da
população na ocasião i) é o estimador Lincoln-Petersen, já discutido anterior­
mente. O desenvolvimento desse estimador segue Lancia et al. (1994):

M j / n ; = Mj / Nj

em que Mj é o número de animais marcados, recapturados na amostra i, e n; é


o número total de animais capturados na mesma amostra. Assim,

N; = (ni * Mj) / ui;

A taxa de sobrevivência é a razão entre o número de animais marcados na


amostra i + 1 e o número de animais marcados na amostra i. O número de
animais marcados na amostra i é o número de animais marcados na população
imediatamente antes da amostragem i (M;), mais os animais não marcados (U;),
que são marcados nessa amostra i.

Assim, U; = R; - nj, em que Rj é o número de animais soltos, já que pode


•haver mortalidade no manuseio (isso não ocorre no caso de “capturas” fotográ­
ficas). Portanto, o número de animais marcados na amostra i é - uij + R;.

257
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

O número de animais que continuam vivos na população imediatamente antes


da amostragem i + 1 é Mi + 1, e, portanto, a taxa de sobrevivência no período
amostrai i é:
<|)i = Mi + 1 / (Mi - mi + Ri)

Taxas de sobrevivência são definidas apenas para i = 1 k - 2 ocasiões de


amostragem. Portanto, o planejam ento de um período de amostragem deve
incluir três ocasiões adicionais para os quais não haverá estimativas de taxas
de sobrevivência. O recrutamento no intervalo de tempo de i a i + 1 é dado
pela diferença entre o tamanho da população na ocasião i + 1 (= N; + 1 ) e o
número esperado de sobreviventes de i a i + 1 (que é o produto da taxa de
sobrevivência e o número de animais na ocasião i, ou seja, (j)i * N;). O número
de sobreviventes pode ser representado por <)>i (N; - n; + R J. Assim, o número
de nascimentos na ocasião i é estimado por:

B - ^ N j + l - f c (Nj - iij + Rj)

As estimativas de nascim entos, assim como a taxa de sobrevivência,


não podem ser estimada para i = 1 e para as duas últimas ocasiões amostrais.
A probabilidade de captura (p j pode ser estimada como a proporção de ani­
mais marcados e vivos na ocasião i, e que são capturadosnesta ocasião, ou a
proporção do número total de animais vivos (marcados e não marcados) na
ocasião i que são capturados na ocasião i. Assim,

Pj = m; / Mj = nj / N;

Aqui também pi só pode ser estimada para i = 2,...., k - 1 ocasiões amostrais.


Por fim, como dito anteriormente, M; é desconhecido numa população aberta
e pode ser estimado por:

Zj / (M; - mj) = Ti / R;
que corresponde às taxas futuras de recaptura de dois grupos de animais mar­
cados na população no período amostrai i, em que zi e r; são animais dos
grupos Mj-ni; e R;, respectivamente, e que são recapturados pelo menos uma
vez. Assim, r; é o número de animais recapturados mais tarde a partir dos
animais soltos na ocasião i; z; é o número de animais capturados antes da
ocasião i que não são recapturados na ocasião i, mas são capturados novamente
durante uma sessão de amostragem subsequente. Portanto, o estimador de M; é:

Mj = Itlj + Rj * Zj / Tj

258
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

Aqui também estimativas de M; s‘ão possíveis apenas para i = 2 ,...., k - 1


ocasiões amostrais.

Seber (1982) apresenta versões quase não tendenciosas desses estimadores e


fornece equações para varianças e covarianças. Programas que incluem estima­
tivas de tamanho de populações através do modelo Jolly-Seber são disponí­
veis, entre os quais citam os POPAN (A rnason & Baniu k 1980) e JOLLY
(Pollock et al. 1990).

Um problema do modelo Jolly-Seber ocorre quando a premissa de igual proba­


bilidade de captura não é obedecida. Heterogeneidade de respostas à captura
pode afetar significativamente as estimativas de tamanho de população porque
a proporção amostrai ni; / n; não refletirá acuradamente a razão populacional
Mj / N; (Lancia et al. 1994). No caso de capturas e recapturas fotográficas,
baseadas em marcas naturais, esta preocupação pode ser negligenciada, já que
não é esperada resposta à “captura”.

O modelo Jolly-Seber tem sido apresentado em variações que se aplicam às


mais diversas situações. Por exemplo, para casos em que nascimentos e im i­
grações são desprezíveis, um modelo que incorpora apenas mortes e emigra­
ção pode ser útil, assim como modelos que só consideram nascimentos e im i­
gração (perdas são desprezíveis). Estes modelos foram propostos por Darroch
(1959). Modelos alternativos também foram propostos para situações em que
as taxas de sobrevivência e captura são constantes (Jolly 1982, Brownie et al.
1986). Outras variantes podem ser de aplicação mais restrita, em se tratando
de capturas/recapturas fotográficas como, por exemplo, quando se marcam
animais com idades conhecidas (Buckland 1982, Loery et al. 1987).

Um método proposto por Fisher e Ford (1947) estima tamanho da população


através de uma modificação do estimador de Lincoln-Petersen: a estimativa do
número de indivíduos na população, assim como sobrevivência e recrutamen­
to, é feita com base na estimativa de M; de forma diferente de Jolly-Seber. O
método assume que a taxa de sobrevivência é constante ao longo do período
de amostragem, e os dados são agrupados no cálculo da uma única taxa de
sobrevivência, o que é vantajoso em casos em que o período amostrai é longo
e resulta em poucas recapturas. Por outro lado, o método não é recomendado
quando a taxa de sobrevivência sofre muita variação temporal (Fernandez 1995).
Já o método de Manly & Parr (1968) admite variações temporais na taxa de
sobrevivência.

259
WALFR1D0 MORAES TOMAS
GUILHERME H. B . DE MIRANDA

índices de abundância
Um índice de abundância ou de densidade é algum atributo que muda de
forma previsível conforme ocorram mudanças no número de indivíduos ou na
densidade de uma população (Caughley & Sinclair 1994). Quando índices de
abundância relativa são comparáveis, eles podem ser úteis para comparar a
densidade ou abundância de duas ou mais populações ou avaliar tendências
de uma população ao longo do tempo. Às vezes, uma comparação é exatamen­
te o que se necessita, ou seja, quando a questão relevante não é saber quantos
indivíduos compõem uma população, mas sim se ela está declinando ou au­
mentando. Isso caracteriza um monitoramento. Nesses casos, a acurácia do
índice não é relevante, mas a precisão é crucial (Caughley & Sinclair 1994). A
precisão de uma estimativa de índices depende fundamentalmente da consis­
tência e rígida padronização de técnicas de amostragem, porque deles depende
a variância nos índices obtidos.

No caso do uso de câmeras fotográficas, índices podem ser expressos como o


número de animais fotografados em relação ao número de noites de exposição
e ao número de câmeras, por exemplo. Pode-se ainda utilizar o número de
detecções por hora/câmera, por dia/câmera, ou, caso as detecções sejam raras,
o número de registros por semana ou por um período de tempo maior. A
padronização do protocolo de amostragem (técnica e esforço amostrais) entre
os períodos de amostragem de uma mesma população ou entre diferentes po­
pulações em um mesmo período deve ser uma preocupação constante. Isso
significa que o número de câmeras utilizadas, o período de tempo de exposi­
ção, o intervalo mínimo entre cada foto (os equipamentos atuais permitem
programar este período), o uso ou não de iscas, o tipo de hábitat amostrado, a
estação do ano etc devem ser semelhantes nas diferentes amostras.

Monitoramento
Tanto estimativas de densidade ou de abundância absoluta, como de índices
de abundância, podem ser utilizados para monitorar as tendências de uma
população. O objetivo, nesse caso, é saber se a população está estabelecida,
diminuindo ou aumentando além da taxa de variação de um ano para outro.
Algumas complicaçõés surgem quando esta é a intenção do investigador. Nota-
damente o grande risco que se tem de cometer erros tipo I e II (ver Capítulo 19,
neste volume) nas inferências estatísticas (por exemplo, concluir que a popu­
lação está declinando quando na verdade ela está estável). Os resultados entre
uma estimativa e outra tendem a não ser iguais mesmo se a população se

260
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

mantiver estável. Entretanto, essa variação das contagens não é tão séria se o
erro associado é aceitável. OutVo complicador é o fato de que declínios (ou
aumentos) numa população são quase sempre difíceis de se detectar em perío­
dos relativamente curtos, a não ser que as taxas de declínio sejam catastróficas.

Estimativas de longo prazo permitem detectar declínios bem menos acentua­


dos. Esse tipo de monitoramento é relevante porque uma população não pode
persistir indefinidamente com uma tendência de declínio consistente. A difi­
culdade está em determinar se a tendência detectada existe realmente ou se na
verdade é resultado de outros fatores componentes da série temporal de amos­
tragens, refletindo características da dinâm ica da população (por exemplo,
populações tendem a apresentar um aumento logo após a estação de nasci­
mento, devido ao recrutamento inicial de indivíduos). Esse tipo de variação é
mais presente em esquemas de monitoramento cujo intervalo entre amostra­
gens é relativamente pequeno.

A capacidade de detectar aumento ou declínio em uma população, através de


um esquema de monitoramento, sempre estará associada a um grau de incerte­
za. Por isso, declarar que uma população está declinando pode ser perigoso, a
não ser que esse declínio seja realmente drástico ou acentuado, a ponto de ser
percebido mesmo com levantamentos inconsistentes. Para taxas de declínio
ou aumento mais sutis, mas que em longo prazo podem levar uma população
até mesmo à extinção, a capacidade de detecção é reduzida. O grau de incerte­
za, associado à capacidade de detectar tendências na população, depende de
dois fatores principais: a variância nas diferentes estimativas de abundância e
o esforço amostrai ao longo do tempo. O planejamento de um programa de
monitoramento requer um conhecimento prévio da variação das estimativas
num momento inicial, para que o esforço amostrai seja definido de forma ade­
quada para detectar declínios ou aumentos com um grau de Certeza desejável.
Esse procedimento é o que se chama de análise de poder (power analysis),
baseada nos resultados prelim inares obtidos em levantam entos iniciais na
população a ser monitorada. Dois programas de computador facilitam esta
análise: MONITOR e TRENDS. A diferença entre esses programas é que o
MONITOR executa a análise com base na variação nas unidades amostrais
(transectos, quadrados, pontos com câmeras, etc), quando se realizam conta­
gens ou levantamentos repetidos em cada uma delas; o TRENDS se baseia na
variância entre as unidades amostrais, sejam elas transectos ou outra forma de
amostragem. Ambos os programas são úteis porque, baseando-se nos levanta­
mentos preliminares, calculam a probabilidade de detecção de declípio ou au-

261
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. 6 . DE MIRANDA

mento na população, em diferentes taxas anuais e sob diferentes esforços amos­


trais (número mínimo de anos de monitoramento, número de repetições de cada
levantamento anual etc). Assim, o investigador pode escolher o melhor esforço
amostrai para atingir o objetivo do trabalho, com o nível de certeza requerido.

O grau de probabilidade de detecção de declínio pode ser mais ou menos


relaxado, dependendo da espécie e do problema em questão. Usualmente, é
desejável conduzir um esquema de amostragem que resulte em chances mais
altas possíveis de detecção de um determinado percentual anual de declínio
(por exemplo, 95% de chance de detectar um declínio anual de 3% na popu­
lação). Para espécies ameaçadas de extinção, é provável que se queira ser mais
conservador, ou seja, definir, por exemplo, que a partir de 85% de probabili­
dade de detecção de declínio de 3% na população já seja o suficiente para
serem iniciadas ações de pesquisa e manejo para deter esta redução.

O exemplo a seguir é o resultado de uma análise de poder executada para


determinar o melhor esquema de monitoramento de uma população de mutum
(Crax fa scio la ta ) no Pantanal. Foram utilizadas câmeras automáticas colocadas
em 5 pontos amostrais nas matas ciliares do Rio Negro, Mato Grosso do Sul.
Um índice de abundância (número médio de detecções a cada 3 dias/câmera)
foi calculado para cada ponto amostrado. As câmeras foram programadas para
registrar fotos continuamente (dia e noite) com intervalo mínimo de 10 minu­
tos entre uma foto e a subsequente, além de registrar o dia e hora de cada
registro. Com isso, podem-se eliminar detecções de indivíduos associados a
outros já fotografados e, portanto, sem independência entre uma detecção e
outra. Grupos fopam considerados com uma única detecção. Foi utilizado o
programa MONITOR para orientar um esquema de monitoramento. Nas simu­
lações variou-se a taxa anual de declínio e o número de pontos amostrados
com câmeras, mantendo-se fixos o período de 10 anos de monitoramento e um
total de 2 amostragens anuais. A intenção foi estabelecer um programa de
monitoramento de 10 anos com um mínimo de 90% de probabilidade de de­
tecção de declínios anuais de pelo menos 5% na população. A Tabela 1 apre­
senta uma síntese dos resultados obtidos.

Os resultados da tabela 1 indicam que, para se detectar 5% de declínio anual


na população de mutum, será necessário distribuir 20 câmeras em pontos a
serem monitorados nas matas ciliares, duas vezes ao ano por um período de
10 anos consecutivos. Cada câmera deverá permanecer instalada por 15 dias
em cada período amostrai. Esse resultado pode ser considerado razoável para
um esquema de monitoram ento. Entretanto^dependendo das espécies, do

262
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

Inicial com Expectativa para 10 anos


1 amostragem (com 2 amostragens/ano)
Porcen­ Número
tagem de de pontos S 5 10 15 20
declínio amostrais
10 0 .1 0 8 0 .6 3 2 0.978 0.998 1 .0 0 0
9 0 .0 7 2 0 .5 9 2 0.968 0.992 1 .0 0 0
8 0 .0 9 0 0 .5 3 4 0.942 0.986 0.998
7 0 .1 0 6 0 .4 5 6 0 .8 6 0 0.968 0.992
6 0 .0 6 4 0 .4 3 8 0 .8 1 2 0.934 0.984
5 0 .0 7 4 0 .3 2 8 0 .6 8 4 0 .8 2 2 0.926
4 0 .0 9 2 0 .2 8 4 0 .5 0 6 0 .7 1 2 0 .8 3 0
3 0 .0 8 0 0 .1 8 0 0 .4 0 4 0 .4 7 8 0 .6 2 6
2 0 .1 0 6 0 .1 6 2 0 .2 4 4 0 .3 0 4 0 .3 9 0
1 0 .0 7 4 0 .1 0 2 0 .1 2 2 0 .1 9 6 0 .2 0 2
0 * 0 .0 7 4 0 .0 7 2 0 .0 9 8 0 .1 1 0 0 .1 0 8

Tabela 1. Probabilidades de detecção de declínio na população de mutum (Crax fasciolata) a


partir d e Jn d ice s de abundância (número de detecções a cada 3 dias) obtidos através de
câm eras fotográficas au tom áticas. Os núm eros em negrito correspondem àq ueles que
atingem a meta estabelecida nas análises.

problema a ser investigado, bem como das condições financeiras, decisões


diferentes podem ser tomadas.

Sem este tipo de análise prévia, um esquema de monitoramento pode ser con­
siderado um “tiro no escuro”, já que tanto pode haver exageros nas amostra­
gens ou insuficiências dá intensidade amostrai (número de pontos x número
de amostras anuais x número de anos de monitoramento). Corre-se o risco de
estar despendendo tempo e dinheiro para coletar informações que não serão
suficientes para detectar mudanças na população. Assim, é fortemente reco­
mendado que se conduzam projetos piloto e posterior análise de poder antes de
se implantar ou de buscar financiamento para um programa de monitoramento.

Outros usos ,
0 equipamento fotográfico automático pode ainda ser utilizado para respon­
der questões outras que não estimar o tamanho de populações animais. A
realização de inventários (listagem de espécies que ocorrem em determinada
área ou hábitat) pode ser facilitada com o uso de câmeras fotográficas, mas o

263
WALFRIDO MORAES TOMAS
GUILHERME H. B. DE MIRANDA

equipamento é pouco eficiente para os grupos de animais mais “complicados”


de se identificar, como pequenos mamíferos, morcegos, aves, répteis e assim
por diante. Entretanto, o equipamento pode ajudar na detecção de espécies de
hábitos noturnos, por exemplo, diminuindo o tempo despendido no campo
pelo investigador. O equipamento pode ainda ajudar a diferenciar espécies de
difícil identificação através de pegadas e outros sinais, como veados do gênero
M azam a e alguns felinos de pequeno porte. É necessário levar em conta o
custo-benefício do equipamento, principalm ente porque outros indicadores
da ocorrência de espécies podem ser encontrados, alternativamente aos regis­
tros fotográficos (pegadas, fezes etc).

FYequentemente, a predação é um aspecto importante em estudos ecológicos


ou de manejo de fauna silvestre. A identificação de predadores geralmente é
dificultada e o equipamento fotográfico pode ser de grande valia nestes casos.
A correta instalação do equipamento é fundamental, assim como a certificação
de que não afetará a probabilidade de ocorrência de predação. As câmeras
podem ser bastante interessantes se instaladas junto a ninhos, tocas e colônias,
somente pàra citar algumas possibilidades.

Como as câmeras geralmente são equipadas com intervalômetros, é possível a


determinação do horário em que cada fotografia foi obtida. Assim, é possível
inferir sobre os horários de atividade de espécies em estudos dessa natureza.
Por exemplo, num trabalho realizado com pacas no Parque Nacional de Brasí­
lia, utilizou-se o número de registros obtidos para cada animal (diferenciados
através dos padrões de pelagem) em períodos de tempo de 1 hora como indi­
cador de atividade. Com isso, foi possível construir uma curva de atividade
para a espécie no período amostrado (Fig. 5), baseado nos registros de 4 pacas
diferentes. Essa abordagem simples pode ser suficiente, por exemplo, quando
a intenção é determinar o melhor horário para tentativas de captura. A limita­
ção maior é a dificuldade em analisar diferentes tipos de atividade, já que as
câmeras fazem uma amostragem num único ponto no espaço, além dos ani­
mais serem atraídos pela presença de ceva. Em fotos obtidas sem atração por
cevas, as detecções tendem a ser mais raras dificultando esse tipo de análise.

O uso de hábitats por determinada espécie também pode ser avaliado através
de equipamento fotográfico automático. Entretanto, cuidados devem ser to­
mados quanto à distribuição de câmeras e à localização do equipamento nos
pontos de amostragem, além dos efeitos do uso de iscas. A distribuição das
câmeras deve incluir todos os hábitats ou categorias de hábitats na área de estu­
do, sendo que o esforço amostrai deve ser equiparável entre essas categorias.

264
USO DE ARMADILHAS FOTOGRÁFICAS EM
LEVANTAMENTOS POPULACIONAIS

Figura 5. Atividade de paca (Agouti paca) inferida por meio de câm eras fotográficas auto­
máticas no Parque Nacional de Brasília, entre 05 e 17 de setembro, 2000. n = 4.

O risco que se corre é considerar não detecção como não uso. Torna-se neces­
sário ainda nesse tipo de estudo avaliar as vantagens e desvantagens de uma
distribuição ao acaso das câmeras na área de estudo, e assim definir o protoco­
lo de amostragem. A utilização de iscas pode. por outro lado, atrair animais
para hábitats de outra forma pouco utilizados.

O uso das câmeras em estudos ecológicos e ou populacionais deve sempre ser


precedido de uma avaliação das limitações impostas pelo equipamento e pelos
protocolos amostrais possíveis. Estudos de comportamento, atividade e uso
de hábitats, principalmente, tendem a ser mais problemáticos, e as câmeras
podem ser consideradas uma alternativa eficiente quando comparadas com
técnicas como radiotelemetria.

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267
11 Armadilhamento fotográfico de grandes felinos:
algumas considerações importantes
Ullas Karanth
Wildlife Conservation Society, International Programs

James D. Nichols
USGeological Survey, Patuxent Wildlife Research Center
Laury Cullen Jr.
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Introdução
O armadilhamento fotográfico é uma ferramenta relativamente nova no estudo
da biologia de animais silvestres, tendo sido extensivamente empregado em le­
vantamentos de campo com grandes felinos e outros animais. Como qualquer
ferramenta, pode ajudar no trabalho quando bem utilizado, ou atrapalhar quan­
do usado erroneamente. Este capítulo pretende dar algumas diretrizes iniciais
aos biólogos que queiram fazer uso de armadilhas fotográficas com animais sil­
vestres, particularmente com grandes felinos. Informações mais detalhadas quanto
,à utilização adequada desta técnica podem ser encontradas na literatura citada.

Uma leitura apropriada e completa sobre a definição cuidadosa e objetivos


antes do planejamento de um levantamento com armadilhamento fotográfico é
a melhor maneira de começar. Neste sentido, Karanth e Nichols (2002) apre­
sentam uma compilação bastante completa sobre amostragens por captura e
recaptura. A lista de questões discutidas abaixo não pretende compor um guia
explicativo, tampouco substituir a revisão apropriada da literatura. Ela preten-
de servir como amostra de uma forma mais produtiva de usar (ou não usar)
armadilhas fotográficas. Estas sugestões são baseadas em experiências com
armadilhas fotográficas desde 1991, em diversos hábitats e áreas na índia, com
densidades de tigres variando entre < 1 até 17 animais/l00 km2.

As observações feitas neste capítulo poderão ser relevantes também em estu­


dos com outros animais “marcados”, embora aqui o enfoque seja dado aos
tigres. As “marcas” nos animais podem ser naturais (listras, manchas etc) ou
artificiais (brincos, colares, anilhas etc), mas elas devem permitir a identificação
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

do indivíduo sem ambiguidade. Este capítulo não trata em princípio de levan­


tamentos de animais que não sejam identificáveis como indivíduos em foto­
grafias. Aqui estão alguns itens com os quais começar:

Razões para um levantamento


A maior parte dos pesquisadores faz levantamentos de campo com um ou
mais dos objetivos abaixo, embora nem sempre eles sejam claramente formula­
dos, antes que o levantamento seja feito:

1. Para estimar a distribuição espacial de uma espécie (presença ou ausência).


Isso pode acontecer de duas fornias:
1.1 Determinando as proporções da área de estudo ocupadas por ela; ou
' l . 2 Determinando todos os lugares onde ocorre.

2. Para estimar a abundância relativa, por exemplo, a razão da abundância em


dois diferentes pontos no tempo e/ou espaço (para isso, frequentemente,
utiliza-se um índice de densidade. No caso de estudos com tigres, por
exemplo, pode-se empregar o número de animais diferentes individual­
mente fotocapturados em 100 noites ou 0 número de pegadas ou fezes de
tigre encontradas em 100 quilômetros de caminhada, entre outros).

3. Para estimar a abundância absoluta' em termos de tamanho populacional ou


densidade (número de espécimes na população amostrada; número de es­
pécimes em 100 km 2 na área amostrada). No decorrer deste capítulo, usare­
mos a abundância como sendo o tamanho da população N, sendo a densi­
dade, então, simplesmente N dividido por uma estimativa da área amostra­
da. Entretanto, acredita-se que a estimativa da abundância absoluta ou den­
sidade em dois pontos no tempo e/ou espaço forneçam a melhor maneira
de se obter estimativas não viciadas de abundância relativa.

4. Para estimar a sobrevivência anual e taxas de recrutamento em locais estu­


dados por longos períodos.

Uso de armadilhas fotográficas em levantamentos de campo


Sugere-se usar armadilhas fotográficas somente quando rastros (pegadas ou
fezes) não puderem ser encontrados mais facilmente (em termos de trabalho,
tempo, dinheiro etc); quando o objetivo do estudo for estimar abundâncias
absolutas, ou estimativas menos viciadas de abundância relativa (objetivo 3),
e/ou estimar taxas de sobrevivência e recrutamento (objetivo 4). Se rastros
forem relativamente mais fáceis de encontrar, e os objetivos forem somente os
itens 1 . 1 , 1.2 e 2 mencionados anteriormente, uma melhor relação custo-bene-

270
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

fício pode ser alcançada se não utilizarmos armadilhas fotográficas, e sim con­
tarmos seus rastros. Sendo a precisão de um índice uma função do tamanho
da amostra, taxas de encontro de rastros podem muitas vezes produzir maio­
res amostras (número de conjuntos de pegadas vistos /100 km andados) do
que fotografias (número de indivíduos fotografados/l00 noites de captura). Se
nossos objetivos incluem os itens 3 e 4, ou se os rastros forem realmente mais
“caros e/ou difíceis” de se obter do que as fotografias, então as armadilhas
fotográficas devem ser utilizadas.

A estimativa de parâmetros de populações animais (a maioria dos estudos não


experimentais) é um ramo muito especializado da bioestatística. Deve-se, por­
tanto, ser cauteloso na adoção de abordagens estatísticas convencionais. Mui­
tas vezes, essas abordagens, com enfoque em desenhos experimentais, não
têm muita relevância para experimentos de abundância e densidade (para de­
talhes ver Thompson (1992), Buckland et al. (1993), Thompson et al. (1998),
Johnson (1999)). Muitos trabalhos foram realizados nesse ramo específico da
bioestatística por mais de um século, e os estatísticos não necessariamente têm
conhecimento ou acesso a esses trabalhos, por isto orientam de maneira equi­
vocada a condução de trabalhos nesta linha. Tais problemas incluem princi­
palmente a diferença na probabilidade de detecção dos animais.

A importância da estrutura formal, baseada em amostras


Ao longo de décadas, o trabalho de ecologistas quantitativos de primeira li­
nha, matemáticos e bioestatísticos vem sustentando a abordagem dos proble­
mas envolvidos na estim ativa de parâmetros de populações animais. Esses
trabalhos têm forte influência no que se faz em campo. Nos últimos vinte anos,
em especial, ferramentas extremamente poderosas foram desenvolvidas nas
áreas de estimativa e amostragem de populações animais, de maneira que o
enfoque da biologia de campo deveria ser o de conseguir bons dados biológi­
cos, no lugar de criar novas abordagens ou formas de estimativa. Seria um
verdadeiro desperdício descartar as ferramentas de análise já disponíveis e
softWares recentes para amostragens de populações animais, como se fossem
irrelevantes para o trabalho. Como não podemos estar em todos os lugares ao
mesmo tempo, nem podemos detectar todos os animais em nossa área de pes­
quisa, uma estrutura formal, baseada em amostras e direcionada por modelos,
é imprescindível para levantamentos populacionais, sobretudo quando se pre­
tende alcançar qualquer dos objetivos 1 . 1 , 2 e 3. Quanto menos viciado e mais
preciso for o processo de amostragem, e quanto melhor este processo for mo­
delado, tanto mais confiáveis nossas estimativas serão.

271
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

Embora os modelos de estimativas populacionais usados na literatura moder­


na e os softw ares recomendados pareçam terrivelmente complicados e difíceis
de entender, na verdade não o são. Basicamente, qualquer que seja o levanta­
mento, trabalha-se com o modelo (Nichols 1992; Lancia et al. 19^4):

N= p .a . C
Onde:
N = é a população da área amostrai a estimar;
a = a proporção da área total efetivamente amostrada;
p = a proporção do número de animais na área amostrada;
C = o número de animais ou a contagem estatística.

Todos os modelos estimativos baseados em amostragens (seja com métodos de


transectos ou com métodos de captura) podem ser descritos como vergões do
simples modelo geral descrito acima. O trabalho de Nichols (1992), Lancia et
al. (1994) e Thompson et al. (1998) fornece maiores elaborações deste concei­
to. Assumindo que “p ” e “a ” sejam ambos = 1 na equação acima/, eles não
obrigatoriamente terão este valor na realidade, e o problema persistirá. Por
outro lado, dispomos, hoje, de um corpo de conhecimento para lidar com o
problema de estimar “p ” e “a ” através de. amostragens apropriadas.

A estrutura de estimativas baseada em amostras é apropriada e relevante se


nossos objetivos incluem qualquer dos seguintes itens: estimar a proporção
de área ocupada (1.1), abundância relativa (2.0), abundância absoluta (3.0) e
sobrevivência/ recrutamento (4.0). Na verdade, a estrutura acima tem sido uti­
lizada para estimar riqueza de espécies e movimentação animal.

Como definir a estrutura amostrai mais apropriada e utilizar o DNA


de tigres obtido através de fezes ou pelos
A amostragem por captura e recaptura é uma ferramenta robusta e bem desen­
volvida, que conta com sólidas bases teóricas, bons softw ares e maneiras for­
mais de acomodar e testar premissas biológicas, subjacentes às capturas foto­
gráficas de tigres ou mesmo à obtenção de dados baseados em DNA. Estas
ferramentas permitem testar o ajuste dos diversos modelos alternativos de
estimativa aos dados coletados (Otis et al. 1978; White et al., 1982; Pollock et
al., 1990; Burnham & Anderson 1998). Karanth & Nichols (2002) forneceram
detalhes sobre levantamentos por captura e recaptura para a estimativa de
abundância absoluta de tigres.

272
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

Como saber não apenas a proporção de hábitat disponível, mas


determinar a presença ou ausência efetiva de uma certa espécie
Nenhum método pode dar 100% de certeza de que uma determinada espécie
esteja ausente pelo fato de não terem sido encontrados rastros ou não se ter
conseguido as fotos. Pode-se'estimar a probabilidade de não se encontrar ras­
tros, considerando que haja a presença de animais, usando múltiplos levanta­
mentos ou réplicas, utilizando a estrutura geral baseada em amostras mencio­
nada anteriormente (Thompson et al. 1998). Da mesma forma, em termos de
cobrir a área de amostragem mais eficientemente para espécies raras e de ocor­
rência restrita, como os tigres, o método de Amostragem Agrupada Adaptativa
(“Adaptive Cluster Sampling”) parece ser uma abordagem que pode se mostrar
útil (Thompson et al. 1998; Thompson 1992). Na maioria das vezes, o conhe­
cimento biológico das necessidades de hábitat da espécie ajuda bastante a
determinar sua ausência.

Como determinar a abundância relativa, a partir de um índice, entre


dois locais
A taxa de armadilhamento é apenas o elemento estatístico C da equação apre­
sentada (número de indivíduos distintos dividido pelo número de noites de
captura) expresso de forma diferente. Ao comparar-se C (taxa de armadilha­
mento) entre dois locais, com um índice válido para N (a abundância realmen­
te fundamental a estimar), deve-se assumir que “p ” e “a ” são iguais entre as
duas áreas sendo comparadas.

Mesmo que sejam amostradas áreas de tamanho similar e se assegure que a


seja, pelo menos aproximadamente, igual para os dois locais, não se pode
simplesmente assumir que as probabilidades de captura (p) sejam também
iguais entre as duas áreas. Não há bases para assumir que as probabilidades de
captura sejam as mesmas; tais probabilidades são influenciadas pelos padrões
de movimentação individuais dos animais, pela localização das armadilhas e
pelo espaçamento entre elas em relação aos movimentos dos tigres, pela quan­
tidade de trilhas no local e por uma série de outras variáveis desconhecidas ou
até mesmo impossíveis de se conhecer. Por isso, ainda faz sentido utilizar um
protocolo de estimativa por captura e recaptura como parte integral do dese­
nho do levantamento. Se forem usadas amostragens por captura e recaptura,
além das taxas de captura simples, serão obtidas, também, estimativas de “p ”
para ambos os levantamentos e será possível, então, utilizar taxas de captura
como índ ices válidos para N, se as probabilidades de captura, p, forem

273
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

realmente similares (mesmo que amostras pequenas possam inflar estimativas


da variância de N). Então, ter-se-á evidências, dos próprios dados, para apoiar
a afirmação de que as probabilidades de captura (os “p ”) são realmente iguais
entre os dois lugares e motivos para utilizar taxas de captura para comparação
de abundância.

Suponha-se que sejam capturados todos os animais de uma área. O uso da


técnica de captura e recaptura evidenciará isso. A probabilidade total de cap­
tura estimada vai se aproximar de 1 e o número de animais capturados C será,
então, na verdade, o total da conta N! Por outro lado, em capturas a d h oc, nas
quais não se estima nenhum valor para p , mesmo que todos os tigres sejam
capturados, isso nunca será confirmado. Para este assunto, ver também o Ca­
pítulo 10 neste volume.

Como escolher entre amostragem por captura e recaptura e


esquemas a d h o c próprios (ou já usados)
A habilidade biológica e o esforço logístico necessários para que as capturas
fotográficas tenham sucesso baseiam-se, em primeiro lugar, em encontrar os
melhores locais possíveis para armadilhamento e, em segundo lugar, em dese­
nhar um esquema de espaçamento entre as câmeras, que não deixe gràndes
“furos”, áreas onde a probabilidade de captura venha a ser muito baixa ou
mesmo igual a zero (Karanth & Nichols 2002). Isso vai depender de bom senso,
tempo, recursos, câmeras e trabalho para se obter a maior fração possível de
animais na área e mais recapturas destes indivíduos.

Em qualquer esquema a d h o c de armadilhamento fotográfico, serão também


necessárias todas estas habilidades de campo para sobrepor os problemas lo­
gísticos. Portanto, as habilidades de campo, tempo e força de trabalho necessá­
rios, tanto para o armadilhamento a d h o c quanto para amostragens por captura
e recaptura formais, são os mesmos. Parece não haver nenhuma base para a
arraigada noção de que o armadilhamento, num esquema de captura e recaptu­
ra, seja de alguma forma mais complicado e difícil de pôr em prática no cam­
po. O único esforço adicional é intelectual, envolvendo o desenho do levanta­
mento e a análise de dados.

Seria possível, ainda, argumentar que mesmo a análise de um esquema de


captura e recaptura é razoavelmente fácil e sém complicações para alguém com
conhecimentos básicos de informática. Na verdade, nem mesmo os conheci­
mentos de informática são absolutamente necessários, pois mesmo o simples
estimador de Lincoln-Petersen para duas amostras é preferível a uma conta­

274 Í
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IM POSA N TES

gem bruta de números de animais capturados. Mesmo nos idos de 1960, George
Schaller utilizou um índice de Lincoln na estimativa dé leões marcados em
Serengeti. Desde então, tem sido disponibilizada uma abundante literatura e
softw ares com melhores desenhos e análises de levantamentos por captura e
recaptura, que estão largamente disponíveis (Otis et al. 1978; W hite et al.
1982, revisado por Nichols em 1992). Parte desta literatura e softw ares já se
encontra disponível gratuitamente na Internet.

Como tornar mais eficaz a amostragem por captura e recaptura com


a colocação aleatória de câmeras fotográficas
A não utilização dos melhores locais de armadilhamento disponíveis, que
podem ser identificados por conhecim entos de campo, diminuirá a probabili­
dade de captura (menos animais capturados e menos recapturas), enfraque­
cendo assim a estimativa populacional. Alcançar a “aleatoriedade” é a razão
utilizada muitas vezes para o padrão de distribuição das armadilhas, mas deve-
se lembrar que o real objetivo é a obtenção de probabilidades de captura seme­
lhantes para todos os animais na área de amostragem. Colocar armadilhas em
locais menos visitados pelos animais não é necessariamente útil para tal obje­
tivo. A colocação aleatória de armadilhas pode ser útil somente em situações
em que não é possível distinguir locais melhores para armadilhas do que lo­
cais piores, baseando-se na movimentação ou em rastros dos animais. Bons
lugares para armadilhas são difíceis de encontrar, particularmente em áreas de
baixa densidade, e não otimizar a utilização dos melhores locais disponíveis
não melhorará a qualidade dos dados. A coisa mais importante em armadilha­
mento fotográfico é conseguir tantas capturas fotográficas quanto possíveis.
Portanto, deve-se otimizar a localização das armadilhas de forma a conseguir o
maior número de fotos e fazê-lo de forma a produzir probabilidades de captura
similares para os animais na área de levantamento. As armadilhas não devem
nunca ser colocadas de forma regular, pois, fazendo isso, pode-se excluir lo­
cais com melhor potencial e de alguma forma diminuir as probabilidades de
captura.

Como explicado em Karanth & Nichols ( 2 0 0 2 ), de maneira ideal, não deve


haver falhas na área de amostragem, na qual um animal com uma pequena área
de uso possa viver durante o período do levantamento, e ter probabilidade
zero de ser fotografado. Somente alguns animais entrarão na amostragem, mas
todos devem ter alguma probabilidade de ser capturados. Isto quer dizer, teorica­
mente, que se a amostragem fosse repetida por muitas vezes, todos os animais
terminariam sendo capturados. Se houver um animal que tenha chance zero

275
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

de alguma vez esbarrar com uma armadilha (assumindo que todas as armadi­
lhas estejam fora de sua área de uso), então, o tamanho populacional estimado
será baixo demais, devido.à não detecção daquele animal.

Uso de armadilhamento fotográfico em populações de baixa


densidade
Como qualquer outro método para estimar número de animais (por exemplo,
transectos), o método de captura e recaptura funciona melhor com animais de
altas densidades. Por exemplo, para os tigres, indicações iniciais, a partir de
levantamentos na índia, mostram que o método funciona bem com densidades
acima de 2 a 3 tigres/100 km2, aproximadamente. O fato é que nenhum outro
método, n'em mesmo o armadilhamento fotográfico, é mais eficaz em baixas
densidades.

Dados obtidos pelos presentes autores sugerem que, mesmo em situações de


baixas densidades de tigres, como em Sundarbans (aproximadamente 0.8 ti-
gre/100 Km2, somente 6 animais capturados), seria um estratégia melhor defi­
nir um protocolo de amostragem aplicável a subsequentes análises baseadas
em modelos de captura e recaptura do que as baseadas simplesmente em arma­
dilhamento fotográfico. Considerando todas as outras restrições, não há moti­
vo para crer que um protocolo de captura e recaptura seja mais difícil de
implementar do que um armadilhamento fotográfico, mesmo em áreas de baixa
densidade. Com base em Karanth & Nichols (1998) e dados não publicados
desses autores, acredita-se que amostragens por captura e recaptura não preci­
sam de um investimento de tempo, dinheiro ou esforço maior do que com
armadilhamento fotográfico. No pior dos casos, com baixas taxas de captura
ou nenhuma recaptura, ainda será possível utilizar modelos mais simples,
como o de remoção (Mb) ou nulo (M0), sob uma abordagem de captura e recap­
tura. O modelo Mb trabalha se^rn recapturas (sendo utilizado em análises de
dados com remoção), embora em estudos com tigres espera-se que Mh seja o
modelo preferível.

Mesmo que os modelos com estimadores menos robustos, como o Mb ou o M0,


não funcionem, o pesquisador ainda terá a opção de derivar índices com base
nas taxas de captura brutas. Por outro lado, se começar com um esquema de
captura fotográfica a d h o c , o pesquisador terá basicam ente só esta última
opção e estará jogando fora chances de fazer uma análise superior dos dados.
Uma estatística baseada em contagem tão básica (como, por exemplo, o núme­
ro de tigres capturados) simplesmente não será muito útil sem a estimativa

276
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

correspondente de probabilidades de detecção (como, por exemplo, a probabi­


lidade de captura), conforme explicado anteriormente.

Em diversas situações de baixa densidade, é possível que não se consiga uma


estimativa confiável de densidade, independentemente da quantidade de es­
forço de captura dedicada. Em um local da índia onde os tigres ocorriam em
baixas densidades, obteve-se zero capturas depois de mais de 600 .noites de
esforço. Em tais casos, dados de presença/ausência, baseada em rastros ou
outra informação, pode ser tudo o que se pode conseguir. Deve-se decidir se
vale a pena gastar dinheiro com câmeras em tais situações.

Como se definir a área efetivamente amostrada quando se utilizam


armadilhas fotográficas
A área amostrada é a área englobada pelas armadilhas situadas mais externa­
mente, adicionada de uma área de amortecimento, aproximadamente igual à
metade do comprimento da área de uso do animal ao seu redor (veja detalhes
em Karanth & Nichols 1998, 2002). A área amostrada não pode ser arbitraria­
mente aSsumida como uma área em torno de cada ponto de armadilhamento.
Não se pode tratar cada ponto no grid de amostragem como uma “área de
amostragem” distinta. Fazê-lo seria sugerir que se estão amostrando popula­
ções diferentes e sem conexão entre si e ao mesmo tempo.

Fazer armadilhamento fotográfico em áreas pequenas demais á


aconselhável? Quantas câm eras são necessárias para determinar a
densidade? Quão ampla deve ser a área de cobertura? Não é melhor
ter amostras demais do que de menos na área de estudo?
Assumindo que se queiram estimar densidades absolutas ou relativas, o obje­
tivo deveria ser o de conseguir tantos indivíduos diferentes quanto possível,
por ser essa a base de amostragem. Armadilhas em áreas muito pequenas po­
dem reduzir o número de indivíduos potencialmente expostos 'às armadilhas
fotográficas, mas aumentar as recapturas de indivíduos na área de amostra­
gem, devido ao aumento da intensidade do armadilhamento. Por outro lado,
considerando um número limitado de câmeras e de tempo para fazer o levan­
tamento, ao tentar capturar mais indivíduos promove-se a redução das taxas
gerais de recaptura. Portanto, é realmente uma difícil escolha entre aumentar o
número de novos indivíduos capturados ou aumentar a probabilidade de re­
captura de um indivíduo conhecido. Um índice aproximado é ter 2 armadi­
lhas por área de uso. Ü tis et al. (1978) e o Capítulo 1 0 , neste volume, tratam
deste assunto com bom detalhamento.

277
I

ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

Por exemplo, para tigres, as armadilhas devem ser colocadas de modo que uma
fêmea em estágio reprodutivo possa encontrar pelo menos duas câmeras. Consi­
derando que a menor área de uso registrada em hábitats de grande produtivida­
de na Ásia do Sul tem por volta de 15 km 2 (onde se pode posicionar as câmeras
com distâncias de 3 - 4 km), em áreas com maior densidade (áreas de uso mais
amplas de fêmeas) pode-se usar um espaçamento maior com segurança.

Finalmente, a confiabilidade da estimativa depende tanto do número de indi­


víduos capturados como das taxas de recaptura. Portanto, é uma escolha difí­
cil e deve ser tomada com base na biologia dos animais. Não há regras para se
ter um bom espaçamento entre armadilhas. Isso realmente depende das restri­
ções logísticas, tais como disponibilidade de tempo, número de câmeras, habi­
lidade em cobrir a área e uma ideia de qual seria a área de usó de uma fêmea
em estágio reprodutivo na região estudada.

Modelos de captura e recaptura mais apropriados para estimar a


abundância
Uma suposição injustificada é a de que todos os animais na área de amostra­
gem têm a mesma probabilidade de ser fotocapturados. Isso é pouco provável.
As probabilidades de captura dependem de fatores como a localização das
armadilhas em, relação à área de uso e movimentos de cada indivíduo, diferen­
ças sociais (residente, em trânsito) etc. Elas podem variar também (embora
com menos frequência) devido às respostas comportamentais, ao armadilha-
mento, à época de armadilhamento etc. Situações em que existem probabili­
dades diferentes de captura devem ser modeladas e estimadas a partir dos
dados históricos de captura. Colocar as armadilhas em um grid modelo, para
se obter o que é erroneamente considerado uma “amostragem aleatória”, não
evita o problema de diferentes probabilidades de captura (White et al. 1982;
Thompson et al. 1998). Por outro lado, ao usar-se o modelo Mh, considera-se
este problema (Otis et al. 1978), e este modelo é implementado no programa
CAPTURE (Rexstad e Burnham 1993).

Como definir o número de câmeras


Pode-se utilizar uma única câmera se ela for colocada no alto da trilha, miran­
do para baixo e fotografando á padronagem de listras no dorso do animal. Este
procedimento im plica na perda de informações de idade e sexo do animal,
sem contar que as fotos não teriam boa definição.

Por outro lado, o uso das laterais dos animais para identificação necessita do

278
ARMADILHAMENTO -FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

registro de ambos os lados. Caso contrário, os dados terão de ser analisados


como dois- conjuntos separados e menores, o que enfraquece a análise. Para
uma dada amostra de fotos de ambos os flancos, todos os indivíduos devem
ter os dois lados fotografados, com exceção de um dos indivíduos, cuja foto de
apenas um dos lados seria suficiente para distingui-lo de todos os outros
animais. Em locais de baixas densidades, esses animais podem se deslocar
por distâncias de 100 - 2 0 0 + km, e suposições sobre a identidade dos espéci­
mes deixam margem a críticas. O registro dos flancos do animal pode permitir
o uso de dados oportunos, tais como um avistamento do mesmo animal, fotos
tiradas por turistas, peles confiscadas em algum outro lugar etc.

Definindo a duração do armadilhamento fotográfico


Uma premissa crítica ao usar modelos de população fechada é justamente que
a população esteja demograficamente fechada (sem emigrações/imigrações nem
nascimentos/mortes) durante o levantamento. Portanto, o “ideal”, com relação
à premissa de fechamento da população, seria fazer o levantamento em apenas
uma noite, mas isso não é viável. Em termos de populações fechadas, quanto
mais curta a duração, melhor. Sendo os felinos animais dè vida razoavelmente
longa, armadilhamentos fotográficos por alguns meses se encaixam no caso de
população fechada.

A amostragem da mesma área por um tempo longo o bastante resulta na captu­


ra de animais. Se for esse o caso, o uso modelos de “população aberta” (imple­
mentados nos softw are POPAN, JOLLY, JOLLYAGE etc) para estimar o tama­
nho populacional será necessário. Estes não são tão poderosos ou versáteis
quanto os modelos fechados implementados nos softw are CAPTURE e MARK.
Não se justifica utilizar modelos fechados para estimar tamanho populacional,
caso se trate de uma população aberta. Os resultados tenderiam a ser superes­
timados. Há um teste estatístico para fechamento populacional embutido no
software CAPTURE, para o caso de populações que possam estar violando tal
premissa.

Onde e como usar modelos abertos


Modelos abertos são particularmente úteis para estimar sobrevivência e recru­
tamento a partir de dados obtidos em levantamentos anuais em um mesmo
lugar. Se for esse o caso, então podemos usar modelos fechados para estimar a
abundância a cada ano, e o modelo aberto para estimar taxas de sobrevivência
entre os anos. Ambos podem ainda ser com binados no que é chamado de
desenho robusto de Pollock (Pollock et al. 1990).
279
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAUKY CULLEN JR.

Qual a aparência de um conjunto de dados de captura e recaptura?


Em um armadilhamento fotográfico de 7 noites consecutivas, cada noite repre­
senta uma amostra ou “ocasião de amostragem”, ou várias noites combinadas
podem ser tratadas como uma amostra. De preferência, amostras devem ser de
igual intensidade (noites de captura), mas essa não é uma condição absoluta­
mente essencial na maioria dos modelos. Dados brutos obtidos de um levanta­
mento simples, por armadilhamento fotográfico de tigres, estão na tabela a
seguir:

Identidade Noite Noite Noite Noite Noite Noite Noite


do tigre 1 2 3 4 5 6 7

Jim 0 1 1 0 0 1 0
Ullas ,1 0 0 0 1 0 1
Alan 0 0 1 1 0 0 1
Tim ' 1 1 0 0 0 0 0
Josh 0 0 0 0 0 0 1
Dale 0 1 1 0 1 0 0

Poderia h a v er outros tigres n a á rea am ostrada, com o Tony, Ruth e Margaret, que
n ã o foram captu rados neste levan tam ento am ostrai específico. A inda assim eles
n ã o p o d erã o es ca p a r do p ro cesso d e estim ativa p o r captura e recaptura.

No quadro apresentado, o número “1” indica que o tigre, em particular, foi


capturado naquela situação específica de captura e “0 ” indica que ele não foi
capturado naquela ocasião. Portanto, do arquivo de fotos cria-se uma-matriz de
históricos de captura de uns e zeros. O software CAPTURE lê a entrada de
dados como um arquivo de texto simples, faz um teste de fechamento popula­
cional, compara entre 8 modelos diferentes e sugere, então, o modelo mais
apropriado aos dados. Por fim, ele dá uma estim ativa da probabilidade de
captura por amostra e do número de animais na área amostrada, incluindo
uma média e o erro padrão nos resultados. Ele também gera intervalos de
confiança utilizando dois procedimentos diferentes.

No nosso caso específico, o modelo Mh é o melhor para os tigres, em razão da


existência de conhecimentos biológicos sobre seu comportamento e organiza­
ção social. Em bons conjuntos de dados, Mh costuma ser avaliado pelo sof­
tware como o melhor modelo, geralmente mais robusto a falhas em premissas
subjacentes.
. \-
280
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

O uso de pegadas e de DNA para identificações em levantamentos de


captura e recaptura
A amputação de falanges (toe-clippin g) em tigres permite fazer identificações
baseadas nas pegadas. Exceto desta forma, identificar todos os indivíduos na
área usando somente o formato da pegada é pouco seguro.

Os métodos de discriminação estatísticos de formatos de pegada podem funcio­


nar, às vezes, para pequenos números de animais em cativeiro (Riordan 1998),
em substratos padronizados eso b condições controladas. Entretanto, esta abor­
dagem, na maioria das vezes, não pode ser usada no campo. Variações basea­
das na pata específica que gerou a pegada, nas condições do solo, inclinação e
velocidade do animal etc, tudo isso pode causar distorções no formato da
pegada e criar “animais diferentes” para o softw are de discriminação de pega­
das. Isso tem acontecido muito na índia. O que acontece muitas vezes no
campo é que o softw are usado para identificações baseadas em pegadas é “en­
ganado”, fornecendo ao pesquisador “números de tigres” que, na verdade, são
apenas o número de pegadas “com aparências diferentes” que os algoritmos
podem reconhecer. Além disso, essas identificações baseadas em discrimina­
ção de formato são probabilísticas (a pegada poderia ser de um tigre X, com
uma probabilidade de 0,6). Tais identificações probabilísticas não podem ser
usadas nos modelos de captura e recaptura atualmente disponíveis.

Identificações por análise de DNA extraído de pelos ou fezes dos animais po­
dem dar identificações mais seguras e podem ser usadas em uma estrutura de
captura e recaptura. Entretanto, ainda não foram desenvolvidos microssatélites
específicos, necessários para individualizar a maioria dos felinos silvestres.

Armadilhamento fotográfico e radiotelemetria


A radiotelemetria fornece dados de movimentação que podem ser incorpora­
dos em uma estimativa melhor da área amostrada. Relatos de uso inovador de
dados de telemetria, combinados com métodos de captura e recaptura, podem
ser encontrados em Powell et al. (2 0 0 0 ). Mas a radiotelemetria é uma técnica
muito cara, e tigres são difíceis de capturar e rastrear com o rádio.

Localizações com câmeras dão uma ideia de áreas de uso, mas, na prática,
recapturas, na maioria das vçzes, não são suficientes para tal. Acima de tudo,
em vez de tentar estimar o número de tigres de diversas formas sem bases teóri­
cas sólidas, parece mais sábio usar o protocolo baseado na amostragem por
captura e recaptura, e usar informações adicionais de radiotelemetria e outras
evidências para alimentar este processo rigoroso de estimativa populacional.

281
ULLAS KARANTH
JAMES D. NICHOLS
LAURY CULLEN JR.

Como capturar filhotes e animais que evitam armadilhas


fotográficas
Filhotes de felinos com menos de um ano parecem ter probabilidades de cap­
tura inerentes muito baixas, o que torna a estimativa de seu número, através
de levantamentos feitos por captura e recaptura, difícil. Pode-se supor o nú­
mero de filhotes como uma proporção da população total, com base no núme­
ro de fêmeas em estágio reprodutivo na área, ou, ainda, por meio de modelos
demográficos de populações de tigres (Karanth & Stith 1999).

Se as armadilhas forem evitadas em escala significativa no conjunto de dados,


o software CAPTURE i'dentificará isso e sugerirá um modelo que incorpore os
efeitos da resposta de captura (modelos Mb ou Mbh) que sejam mais apropria­
dos para a análise destes dados. Mais detalhes são encontrados em Otis et al.
(1978) e White et al. (1982).

Como escolher o equipamento para armadilhamento fotográfico


Depende das condições de armadilhamento. Porém, a aquisição e o uso de um
equipamento que dispare duas câmeras praticamente ao mesmo tempo, ou a
utilização de duas unidades avulsas de armadilhamento fotográfico em cada
ponto, é recomendável. A comparação de custos deve ser baseada nisso. Uma
questão importante é a demora entre dois disparos sucessivos da câmera.
Modelos com sensores ativos de infravermelho da Trailm aster permitem que
essa demora seja de apenas 6 segundos. Isso é bom, pois às vezes pode-se
capturar 2 ou 3 tigres juntos (mãe com filhotes ou jovens, machos e fêmeas).
Se houver uma longa demora entre os disparos, perderemos o segundo ani­
mal. Uma armadilha fotográfica desenhada especificamente para cada necessi­
dade, e mais barata quando comparada ao Trailm aster e ao CamTrakker, entre
outros, é desejável.

Exemplo de informações obtidas em armadilhas fotográficas: o


número de presas
O número de presas é uma das informações que podem ser obtidas através das
armadilhas fotográficas, mas isso vai depender de onde e de como foram colo­
cadas as câmeras. Otimizações visando predadores fornecem poucas fotos de
espécies de presas. A menos que as espécies de presa também apresentem
padrões individuais de marcas, não podemos deduzir uma estimativa por cap­
tura e recaptura de abundância de. presas. O melhor que se pode conseguir é
um índice baseado em taxas de captura para densidade de presas (número de

I
282
ARMADILHAMENTO FOTOGRÁFICO DE GRANDES
FELINOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

fotos/l000 noites de captura). Se a armadilha estiver colocada de forma parti­


cularmente favorável às espécies de presas, poderemos estar capturando o
mesmo animal diversas vezes. Neste caso, a taxa de captura não terá muita
relação com a real densidade do animal. Se for possível, deve-se conseguir
outra estimativa independente de densidade de presas, através de levanta­
mentos por transectos lineares ou de contagem de fezes de presas, além do
armadilhamento fotográfico. Em locais onde chove ou neva com frequência, a
contagem de pegadas em trilhas pode dar um bom índice de densidade relati­
va da abundância de ungulados.

O armadilhamento fotográfico em hábitats ótimos permite afirmar


algo sobre o status genérico dos animais ao longo dessa área?
Uma estimativa boa e confiável de alguns pontos representativos pode forne­
cer boas inferências para outras áreas, baseado no que já se sabe sobre os
animais, tais como as avaliações de qualidade de hábitat. Boas estimativas de
densidade, derivadas de dados disponíveis de armadilhamento fotográfico em
algumas áreas, podem resultar muitos frutos ao combiná-las com exercícios de
mapeamento espacial. Para isso, estimativas confiáveis, cientificamente defen­
sáveis, usando os melhores métodos possíveis são requeridas. E fundamental
ter algumas poucas estatísticas de densidade realmente boas, no lugar de esti­
mativas em um grande número de pontos, mas com uma qualidade pobre. Ao
se extrapolar dados, partindo-se de uma estimativa ruim, cometem-se erros
ainda maiores sobre regiões mais amplas. Portanto, o controle de qualidade
sobre os dados do armadilhamento fotográfico deve ser a maior prioridade
para biólogos que estejam trabalhando com animais silvestres.

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Sites na Web:
O software CAPTURE é gratuitamente disponibilizado na rede no site da USGS Patuxent
W ildlife Research Center, Laurel, Maryland http://www.mbr-pwrc.Usgs.gov/software.html
mantido por Jim Hines.

Os softw are CAPTURE, MARK, JOLLY, JOLLYAGE etc. e a monografia em vida silvestre não
publicada de Otis et a l., 1978, mencionada no texto, estão disponíveis no site da Universidade
Estadual de Colorado, Fort Collins, Colorado http://www.cnr.colostate.edu/~gwhite/mark/
mark.htm mantida por Gary White. Ele também mantém a lista de discussão MARK no site
da Colorado, que lida com tópicos sobre captura e recaptura.

284
■ 12 Radiotelemetria em estudos populacionais
L Anael Aymoré Jacob
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Rudy Rudran
Smithsonian Institution, USA

I ____________________________________________________

Introdução
Há aproximadamente 40 anos, a técnica de radiotelemetria vem permitindo a
pesquisadores obter preciosas informações sobre a ecologia e o comportamen­
to de populações silvestres, sem estarem obrigatoriamente em contato com os
indivíduos estudados. Tal fato reflete-se principalmente em estudos com espé­
cies elusivas ou de hábitos noturnos, que tornam difícil seu monitoramento
por meio de observação direta.

Através de um sistema eletrônico que consiste basicamente de um transmissor


acoplável ao animal estudado, que emite sinais de rádio captados por um
receptor através de uma antena, faz-se possível, mesmo a distância, localizar,
acompanhar o deslocamento, monitorar sinais vitais e fisiológicos e padrões
de atividade do indivíduo ou grupo marcado. Da mesma forma, a radioteleme­
tria possibilita ao pesquisador aproximar-se da origem do sinal, a fim de regis­
trar aspectos comportamentais através de observação direta ou identificar cau­
sas proximais de mortalidade do espécime marcado. De posse dessas informa­
ções, coletadas ao longo de um gradiente temporal e a partir de uma amostra
representativa da população em estudo, pode-se buscar padrões de movimen­
tação, territorialidade e utilização de recursos, bem como avaliar parâmetros
demográficos tais como densidade, sobrevivência e dispersão.

Por ser uma técnica sofisticada e em constante evolução, a radiotelemetria tem


se tornado extremamente popular, principalmente nas últimas duas décadas
(Macdonald & Amlaner 1980). Esse fato pode induzir a sua escolha como meto­
dologia antes mesmo da devida consideração às questões biológicas que se dese­
ja investigar, contrariando princípios básicos do método científico. Segundo
vários autores (Sargeant 1980; Kenward 1987; White & Garrott 1990; Samuel &
Fuller 1994), provavelmente mais recursos e esforços foram desperdiçados em
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

estudos m al-concebidos utilizando radiotelemetria do que quaisquer outras


técnicas de campo. Lance e Watson (1980) e Harris et al. (1990) reafirmam que
a radiotelemetria raramente é explorada em todo o seu potencial para a pesqui­
sa ecológica. E a clara definição dos objetivos da pesquisa (descrição de pa­
drões ou processos, teste de hipóteses ou construção de modelos) e das infor­
mações necessárias para que estes sejam atingidos, os quais devem orientar
todo o processo metodológico, inclusive a escolha da técnica para coleta de
dados. Cada problema específico a ser investigado possui em si elementos que
permitem a identificação, por parte do pesquisador, das melhores técnicas a
serem empregadas para sua solução (Volpato 2001).

O propósito deste capítulo é fornecer aos leitores uma introdução ao uso da


radiotelemetria no estudo de populações de animais silvestres, com os ele­
mentos básicos necessários para o planejamento e a condução da pesquisa,
bem como problemas e dificuldades que podem ser encontrados nesse proces­
so. Além de uma base teórica sobre as principais questões ecológicas que po­
dem ser abordadas por essa técnica, serão oferecidas também algumas reco­
mendações práticas, advindas de experiências próprias com essa técnica no
campo. Em virtude do caráter prático dessa publicação, não serão abordados
excessivamente os aspectos físico-teóricos envolvidos com a técnica, reservan-
do-se-os apenas para fins de contextualização e para justificar determinados
procedimentos no campo. Maior ênfase será dada ao sistema convencional de
radiotelemetria (VHF), em virtude de ser ainda o mais largamente utilizado,
porém sem deixar de lado os sistemas mais avançados atualmente disponí­
veis. Com isso, espera-se contribuir para o crescimento do uso desta técnica
de maneira correta e planejada, com o devido conhecimento de suas potenci­
alidades e limitações. Dessa forma, a radiotelemetria será cada vez mais útil
como ferramenta, capaz de enriquecer nossas pesquisas e permitir o avanço no
conhecimento científico da vida silvestre.

C onsiderações Preliminares
Mesmo que a definição dos objetivos do estudo aponte para a radiotelemetria
como uma das técnicas capazes de fornecer as informações desejadas, deve-se
inicialm ente avaliar sua aplicabilidade à realidade do projeto. É também im­
portante lembrar que existem outras técnicas que podem suprir as mesmas
necessidades da pesquisa em questão. Para algumas espécies que vivem em
ambientes abertos e com boa visibilidade, observações diretas de indivíduos
com marcadores individuais permitem análises de comportamento e territo-

286
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

rialidade (Macdonald 1978; Cullen Jr. & Valladares-Pádua 1997). O uso de


armadilhas fotográficas pode fornecer boas estimativas de abundância/densi­
dade para espécies que possuam marcas naturais (ver também neste volume os
Capítulos 10 e 11). Nem sempre o uso da radiotelemetria é o mais adequado
ou vantajoso. De fato, uma série de restrições pode até inviabilizar a utiliza­
ção da radiotelemetria, ou ao menos tornar sua relação custo/benefício m e­
nos atraente em comparação com metodologias alternativas.

A primeira questão que deve ser considerada refere-se a restrições de ordem


biológica. Mesmo com todo o avanço na tecnologia de miniaturização de com ­
ponentes eletrônicos, muitas espécies são ainda demasiadamente pequenas-
para conseguir carregar transmissores com potência suficiente para permitir
seu monitoramento. Adicionalmente, é importante lembrar que o tipo de hábi-
tat da espécie estudada exerce influência sobre a capacidade das ondas de
rádio se propagarem. Ambientes de relevo acidentado, florestas densas e cor­
pos" de água com alta condutividade (salinos) interferem diretamente no sinal
de rádio, requerendo transmissores de maior potência e consequentemente
maior peso. Assim, o tipo de hábitat também deve ser levado em conta na
avaliação da possibilidade de uso da radiotelemetria.

0 segundo tipo de restrição é o elevado custo de equipamento, principalmente


para os padrões orçamentários sul-americanos. Estimam-se os custos iniciais
apenas em equipamento para um projeto com radiotelemetria em não menos que
US$ 6 mil (Crawshaw 1997). Esse fator impossibilita a utilização de radiotele­
metria em muitos projetos, principalmente para pesquisadores iniciantes. Além
desses gastos, recursos financeiros também são necessários para montar toda a
logística de coleta de dados, que envolve pessoal habilitado no uso do equipa­
mento, transporte terrestre e eventualmente até uso de aeronaves para localiza­
ções de animais em áreas de difícil acesso.

Outra questão logística a ser avaliada é o nível de dificuldade na captura de


indivíduos da espécie desejada, uma vez que esta é necessária para a instala­
ção do transmissor. E importante certificar-^e da eficiência do método de cap­
tura em sua área de estudo, antes de efetuar a compra de todo o equipamento.
Deve-se também atentar para o risco de capturar amostras viciadas da popula­
ção que se deseja estudar, por força de diferentes probabilidades de captura
em função do sexo, idade ou outros fatores. Por último, o tempo disponível
para a condução da pesquisa irá determinar se esta é factível. Projetos bem-
estruturados’ devem prever prazos de importação dos equipamentos, períodos
de campanha de captura, projetos-piloto, coleta e análise dos dados, além de

287
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAIÍ

contar com eventuais imprevistos como perda de indivíduos monitorados por


mortalidade ou falha no equipamento. Particularmente, o tempo necessário para
se dominar a técnica no campo é muitas vezes subestimado, quando até mesmo
pesquisadores com experiência em radiotelemetria podem levar algum tempo
para conseguir informações de qualidade em um trabalho de pesquisa com uma
nova espécie (Kenward 1987). Crawshaw (1997) recomenda que a radioteleme­
tria não seja utilizada em pesquisas com menos de 2 anos de duração.

Após a devida consideração quanto à viabilidade do uso da radiotelemetria, o


próximo passo a ser tomado é a formulação de um plano metodológico, que
descreva como se pretende atingir tais objetivos através da técnica proposta.
Este processo pode ser dividido em quatro aspectos fundamentais: o delinea­
mento da pesquisa, a escolha do equipamento, o procedimento de campo e a
análise de dados (Samuel & Fuller 1994). Cada um destes aspectos deve ser
cuidadosamente pensado e embasado em revisão bibliográfica, para que se
possa obter o máximo possível de qualidade nas informações coletadas.

Delineamento da Pesquisa
A maior parte das críticas dirigidas a estudos da vida silvestre gira em torno da
ausência ou pouca elaboração no delineamento da pesquisa, também chamado
desenho experimental. Esse sintoma pode ser explicado em parte pelas ori­
gens desta ciência relativamente jovem, basicamente constituída de estudos
descritivos e de história natural, aliada à dificuldade de controlar e replicar
experimentos frente à magnitude de variáveis que se encontram neste campo
de pesquisa. Ainda assim, cada vez mais autores clamam por um aumento de
rigor científico nesta disciplina (Ratti & Garton 1994; Volpato 2 0 0 1 ), de forma
a produzir uma sólida base de conhecimento para direcionar áções de manejo
e conservação da vida silvestre (Romesburg 1981). Contudo, isto não deve
implicar o abandono dos estudos de história natural, especialmente em regi­
ões Neotropicais, onde ainda persistem imensas lacunas de conhecimento
básico. Os estudos baseados na observação e descrição de processos ecológi­
cos devem ser encarados como um solo fértil, necessário para instigar o surgi­
mento de hipóteses ou modelos que permitam testar ou prever as respostas
das populações estudadas a diferentes condições ambientais.

O delineamento de uma pesquisa consiste em definir elementos determinantes


para a condução dos procedimentos de campo, visando obter resultados estatis­
ticamente mais significativos e biologicamente mais representativos (Eberhardt
& Thomas 1991). Este processo, iniciado na definição dos objetivos da pesquisa,

288
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

envolve também a definição do desenho amostrai e das análises estatísticas ade­


quadas. Embora esteja além do escopo deste capítulo a explicação detalhada do
processo de delineamento de pesquisas, as seguintes recomendações podem ser
feitas no que diz respeito a estudos com radiotelemetria:

1 ) De forma geral, pesquisas que utilizam radiotelemetria seguem a tendência


de estudos de vida silvestre por serem de natureza descritiva, principalmente
para espécies que ainda carecem de informações básicas sobre sua história
natural. Com isso, testes de hipóteses ainda são pouco comuns nesse tipo de
pesquisa, apesar de sua relevância no esclarecimento de relações causa-efeitó
para padrões observados em trabalhos descritivos (Garton et al. 2001).

2) Burnham & Anderson (1998) sugerem que estudos de radiotelemetria são


mais eficazes dentro de uma abordagem de modelagem, oferecendo um melhor*
entendimento das relações potenciais dos animais marcados com seu ambiente.

3) Tenha em mente que o processo de amostragem se dá em dois níveis: com


amostras de um universo de possíveis localizações para cada indivíduo moni­
torado, e o total destes como uma amostra da população em estudo. Na maioria
dos estudos com radiotelemetria, a unidade amostrai consiste dos indivíduos
ou grupos sociais monitorados, devendo as localizações de cada indivíduo ou
grupo ser consideradas como subamostras.

4) Da mesma forma, o tamanho amostrai deve ser considerado nos dois níveis,
buscando-se sempre o melhor termo entre o número de indivíduos monitora­
dos e o número de localizações por indivíduo (Alldredge & Ratti 1986). A
tendência de amostrar poucos indivíduos intensamente, apesar de potencial­
mente fornecer um profundo entendimento sobre a autoecologia e comporta­
mento desses indivíduos, normalmente resulta na carência de representativi-
dade da população amostrai (Samuel & Fuller 1994; Garton et al. 2001).

5) Dependendo dos objetivos da pesquisa, as localizações de cada indivíduo


deverão ser coletadas em regime contínuo ou descontínuo. Pontos contínuos
são coletados durante curtos intervalos de tempo pré-determinados (5 - 15
minutos), oferecendo uma noção do trajeto desenvolvido pelo animal monito­
rado (Harris et al. 1990). Pontos descontínuos podèm ser colhidos de forma
aleatória ou sistemática, com intervalos de tempo mais amplos. Nestes casos, o
devido cuidado deve ser tomado para se distribuir equitativamente as localiza­
ções entre os períodos do dia, de forma a não introduzir vícios na amostra,
advindos de padrões de comportamento circadianos diferenciados.

6 ) A autocorrelação entre as localizações consecutivas de um mesmo indivíduo


ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

pode ter um impacto significativo em algumas das análises de área de uso,


devendo ser levada em consideração durante a definição do regime de coleta
de dados (Harris et al. 1990; White & Garrott 1990). Um teste de independên­
cia foi descrito por Swihart & Slade (1985), baseado na razão da média do
quadrado das distâncias entre localizações consecutivas (t2J e a variância entre
as localizações (s2), chamado de índice de Schoener (t2/s2). Sim ulações de
Monte Cario indicaram que o valor esperado do índice de Schoener para amos­
tras estatisticam ente independentes (não autocorrelacionadas) seria de 2 ,0 .
Portanto, valores do índice significativam ente menores que 2,0 indicariam
dependência entre localizações consecutivas (Swihart & Slade 1985; Solla et
al. 1999). A maioria dos programas de computador voltada para análise de
dados de radiotelemetria incorporou o cálculo do índice de Schoener, facili­
tando o trabalho do pesquisador. Com dados preliminares, é também possível
calcular o índice de Schoener para prever o intervalo mínimo de tempo neces­
sário para atingir a independência estatística entre localizações, permitindo o
planejamento adequado do regime de coleta.

7) Deve-se considerar a possibilidade de um estudo piloto. Dados prelimina­


res normalmente oferecem uma visão antecipada dos esforços e custos que
serão necessários para obterem-se resultados satisfatórios, bem como das difi­
culdades que serão encontradas mais -comumente no trabalho de coleta de
dados e estimativas iniciais de variâncias associadas às variáveis de interesse
para a pesquisa.

8 ) Procure otimizar o investimento de recursos em equipamento e pessoal.


Muitas vezes a organização de todo um aparato de pesquisa com radioteleme­
tria pode permitir que mais de um estudo seja desenvolvido conjuntamente.

White & Garrott (1990) lembram que este é um processo iterativo, em que cada
etapa exerce influência decisiva sobre a outra e a necessidade de reavaliação
do delineamento é uma constante até que a pesquisa esteja pronta para imple­
mentação. Para um maior aprofundamento no assunto, consultar Scheaffer et
al. (1986), Ratti & Garton (1994) e Volpato (2001).

Escolha do equipamento
A cada dia, torna-se mais difícil escolher o equipamento de radiotelemetria
ideal para um projeto de pesquisa. A evolução da tecnologia para radioteleme­
tria tem colocado à disposição dos usuários uma enorme gama de opções,
desde sistemas convencionais que utilizam ondas de rádio VHF até os mais
modernos sistemas de telemetria por posicionamento global (GPS). Felizmente,

290
t
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS PQPULACIONAIS

a maior parte dos fabricantes de produtos de radiotelemetria possui um amplo


serviço de suporte ao usuário, orientando na escolha e adequação do equipa­
mento a cada projeto específico. No entanto, é sempre prudente consultar
também pesquisadores que já estejam fazendo uso desta técnica para tomar
conhecimento dos benefícios e contratempos que estejam enfrentando com a
escolha de determinado equipamento ou fabricante.

O sistema de radiotelemetria mais utilizado ainda é o da faixa de ondas de rádio


Very High Frequency, mais conhecida como VHF. Embora esta faixa cubra um
espectío bastante largo (30 - 300 MHz, lembrando que 1 MHz = 1.000 KHz), a
maioria dós pesquisadores na América Latina utiliza frequências na faixa dos
150 - 170 MHz, que oferecem uma boa relação entre o alcance do sinal e a
durabilidade da bateria do transmissor. Neste sistema, o sinal de rádio é emi­
tido na forma de pulsos pelo transmissor e é captado diretamente pelo pesqui­
sador com o auxílio de um receptor, conectado a uma antena. Cada transmis­
sor deve operar em uma frequência única e com uma distância razoável (—10
KHz) de outros transmissores utilizados na mesma área de estudo, para evitar
confusão entre os diferentes indivíduos estudados. Segue uma breve descri­
ção dos principais componentes do sistema de- radiotelemetria por VHF, su­
gestões quanto a suas aplicações, bem como uma lista dos principais fabrican­
tes destes equipamentos (Anexo I). Descrições mais detalhadas podem ser
encontradas em Amlaner & Macdonald (1980) e Kenward (1987). Abordar-se-
ão também as novas tecnologias desenvolvidas para radiotelemetria e, final­
mente, discutiremos os efeitos da colocação de radiotransmissores em animais
silvestres.

Transmissores
Existem atualmente transmissores para quase todos os tipos de animais (pei­
xes, aves, répteis, mamíferos, invertebrados etc), podendo ser externos (aco­
pláveis) ou internos (implantes). O sistema completo de transmissão é com­
posto basicamente pelo transmissor propriamente dito (em outras palavras,
pelos componentes eletrônicos responsáveis pela emissão do sinal), pela bate­
ria, pela antena de transmissão e pelo mecanismo de fixação ao indivíduo. A
combinação das especificações dos três primeiros irá determinar a potência
efetiva do sinal emitido e a vida útil do transmissor. Por outro lado, os três
últimos são determinantes no efeito do radiotransmissor sobre o bem-estar do
animal marcado (Samuel & Fuller 1994).

Ao escolher um transm issor, é necessário ponderar sobre três aspectos: a

291
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

potência do sinal de rádio emitido, a vida útil da bateria e o peso do transmis­


sor. Tais características são altamente interdependentes, e a priorização de um
deles quase sempre será em detrimento dos outros dois. Transmissores mais
potentes ou de frequências mais altas, que emitem sinais de rádio com maior
alcance, consomem mais energia e têm vida útil mais curta. Para permitir um
estudo de lango prazo, é preciso utilizar baterias maiores, que aumentam o
fardo que o indivíduo marcado terá que carregar. A antena de transmissão, que
deve ser preferencialmente posicionada perpendicularmente ao solo e não se
encontrar em contato com o corpo do animal, possui um comprimento ideal
em virtude da frequência do transmissor. No entanto, pode e deve ser encurta­
da ou embutida caso interfira nas atividades normais do animal, mesmo que
signifique uma redução no alcance do‘ sinal. Em última análise, o objetivo da
pesquisa, o tipo de área de estudo e a espécie estudada devem ser os fatores
determinantes na escolha do tipo de transmissor. Os mecanismos de fixação
dos transmissores também evoluíram consideravelmente, refletindo a preocupa­
ção de fabricantes e pesquisadores, hão só em ampliar o espectro de espécies
que podem ser estudadas por esta técnica, mas principalmente em melhorar a
acomodação dos transmissores, reduzindo seu impacto sobre os indivíduos
marcados. Os tipos de mecanismos de fixação mais comumente utilizados são:

Colares: utilizados principalmente em mamíferos (Fig. 1 ) e em algumas espé­


cies de aves. Os colares devem ser presos de forma a garantir sua fixação sem
restringir os movimentos do animal marcado. Para animais de médio e grande
porte, uma forma de medir se o colar está bem ajustado é tentar passar a mão
sem esforço por entre o colar e o pescoço do animal, afrouxando-o caso não

Figura 1. Radiotransm issor acoplado por meio de colar a uma onça preta (Panthera onca).
(Foto: Laury Cuílen Jr.)

292
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

consiga. O mesmo procedimento pode ser aplicado em .animais de pequeno


porte, utilizando-se o dedo mínimo como- medida. Existem ainda modelos
especiais, feitos com material expansível (ideal para cervídeos machos, que
aumentam a grossura do pescoço em período reprodutivo), com costuras de
material perecível ou ainda com mecanismos de liberação automática (drop
off), que se partem, com o crescim ento de indivíduos jovens, ou após um
tempo predeterminado, permitindo a recuperação, o recondicionamento e a
posterior reutilização do transmissor.

Arreios: utilizados na m aioria das aves (Fig. 2), bem como em mamíferos
cujo formato do pescoço e da cabeça permite a eles se desvencilhar de cola­
res (ex. lontras e ariranhas). Consistem de um ou dois tirantes, podendo ser

Figura 2. Radiotransmissor tipo PTT, acoplado por meio de arreios a um Falcão-das-pradarias


{Falco mexicanus). (Foto: Anael Aymoré Jacob).

colocados em com binação ao redor do pescoço, torso ou abdômen. Reque­


rem basicam ente os mesmos cuidados que os colares, sendo que o processo
de colocação é um pouco mais delicado e demorado, especialm ente quanto
ao posicionamento, de forma a não impedir movimentos importantes como o
voo de aves.

Adesivos: utilizados em várias espécies, com especial sucesso em quelônios.


Foram sugeridos como uma alternativa menos incôm oda para o indivíduo
marcado, mas ainda pecam pela curta durabilidade, especialmente quando

293
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN -

grandes transmissores são aderidos diretamente contra a pele. Muito cuidado


deve ser tomado na escolha do adesivo, para que não provoque irritações ou
abrasões na-superfície de contato.

Implantes: embora utilizados em vários grupos distintos, desde mamíferos até


anfíbios, foi testado para relativamente poucas espécies. Possui como princi­
pal vantàgem o fato de não interferir externamente no comportamento do ani­
mal, mas pode interferir nas funções fisiológicas do mesmo caso implantado
incorretamente. Além disso, permite apenas a utilização de transmissores pe­
quenos, de reduzida potência, sendo pouco apropriado para espécies que se
movimentem por longas distâncias.

Além dos componentes básicos, muitos modelos de transmissores possuem


sensores embutidos que aumentam o número de informações que podem ser
obtidas de um mesmo transmissor. Os tipos de sensores mais utilizados são
os de temperatura, de atividade e de mortalidade. Todos se baseiam na mu­
dança do intervalo entre os pulsos do transmissor em função da variável sen­
do medida. O sensor de temperatura pode ser implantado para medições mais
precisas, servindo em estudos de termoregulação (Brown & Taylor 1984), ou
ser usado externamente para medir variações na temperatura, próximo ao cor­
po do animal marcado, servindo por exemplo para detecção de voo (Kenward
et al. 1982). O sensor de atividade funciona através de uma coluna preenchida
com mercúrio ligada a uma chave, que alterna entre dois intervalos de pulso
de acordo com o ângulo do transmissor em relação ao solo (Fig. 3). Portanto, o
que está sendo realmente medido pelo sensor de atividade é a alternância na
posição da parte do corpo do animal que carrega o transmissor. Certas ações
ou movimentos do animal marcado, que não envolvam mudanças no ângulo
do transmissor, podem ser confundidas com inatividade. Já o sensor de mor­
talidade detecta a inatividade prolongada do transmissor. Caso o transmissor
permaneça estático por um período de tempo predefinido pelo fabricante (de
acordo com o desejo do usuário), uma chave muda para um terceiro intervalo
de pulso, normalmente mais rápido, retornando ao intervalo original caso o
transmissor seja movido. O acionamento do pulso de mortalidade deve ser
sempre averiguado, e o mais rápido possível, para que se colete o máximo de
informações sobre ca u sa m ortis. Caso não se encontre nenhuma carcaça no
local, lembre-se de que sempre há a possibilidade de desvencilhamento do
transmissor por parte do animal.

Uma alternativa para medições de atividade mais precisas é sugerida por E. P.


Médici (com. pess.), que consiste em pré-definir frente ao fabricante um curto

294
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

período de inatividade do transmissor para o acionamento do pulso de morta­


lidade, de forma a medir também os momentos de inatividade do animal estu­
dado. Esta alternativa tem como única desvantagem o aumento no consumo da
bateria do transmissor, em virtude da maior rapidez do pulso de mortalidade,
mas pode ser empregada no estudo de grandes mamíferos capazes de carregar
transmissores com baterias de longa duração.

Figura 3. Esquema demonstrativo do funcionamento do sensor de atividade, com alternância


entre intervalo longo (I.L.) e intervalo curto (I.C.) de pulsos em função da posição do radio-
transmissor em relação ao solo.

0 transmissor é- provavelmente o componente que deve ser mais cuidadosa­


mente escolhido. Uma escolha impensada pode comprometer não -apenas o
trabalho de pesquisa, como principalmente o bem-estar dos indivíduos estu­
dados. Adicionalmente, todo transmissor deve ser minuciosamente inspecio­
nado e testado antes de utilizado. Muitas vezes, a inadequação ou defeito de
um transmissor só é percebido após a colocação e liberação do animal, quando
já não se pode reavê-lo facilm ente para enviar ao conserto ou requerer um
modelo mais apropriado. E recomendável a aqueles que estejam iniciando um
projeto de radiotelemetria com uma nova espécie ou novo modelo de equipa­
mento, que busquem não apenas revisões na literatura e sugestões de outros
pesquisadores, mas que também desenvolvam testes do equipamento com ani­
mais de cativeiro, para melhor avaliar a adequação do equipamento adquirido
e a qualidade do sinal emitido.

295
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Receptores
A escolha do receptor irá influenciar principalmente a quantidade de esforço
que o pesquisador terá que empregar durante a coleta de dados. Quase toda
novidade incorporada em modelos mais modernos gira em torno da maior
amplitude da faixa de captação, melhor portabilidade, praticidade e visibilida­
de da frequência sintonizada. O principal cuidado a ser tomado na compra do
receptor é a compatibilidade de suas frequências de captação com aquelas dos
transmissores adquiridos para o estudo. Receptores mais simples são capazes
de captar apenas um número fixo de frequências, enquanto modelos mais
modernos captam frequências ao longo de uma faixa de 1 até 10 MHz, traba­
lhando com um número muito maior de transmissores. Muitos fabricantes
questionam o cliente sobre a frequência utilizada na pesquisa quando da com­
pra de receptores ou transmissores isoladamente, justamente para evitar tais
problemas de incompatibilidade.

Os receptores mais comumente usados são compostos por um controle de


volume, por um mecanismo de seleção de frequência com sintonia fina, saída
para fones de ouvido e entradas para o alimentador de energia e para a antena.
Alguns modelos possuem atenuador de sinal para reduzir ruídos externos ou
ainda um medidor de decibéis para auxiliar o usuário a identificar 4 direção de
maior intensidade de sinal. Uma característica a ser observada no processo de
escolha do receptor é sua autonomia de energia e o tipo de bateria utilizada.
Modelos que utilizam baterias recarregáveis normalmente possuem menor au­
tonomia ( 5 - 8 horas), mas são mais econômicos em situações onde há a pos­
sibilidade de recarga. Em projetos de pesquisa que envolvam acampamentos
isolados por longos períodos, deve-se dar preferência a modelos que utilizem
baterias comuns, que proveem maior autonomia (8 - 10 horas) e podem ser
substituídas. <

Outro item opcional que pode ser acoplado ao receptor é o scan n er. Em sua
memória digital, podem-se armazenar as frequências dos -transmissores em
uso. Feito isto, o scanner realiza uma varredura constante das frequências
armazenadas, podendo ser interrompido quando o sinal emitido por algum
dos transmissores for captado. Essa ferramenta tem se provado muito útil em
estudos com muitos indivíduos marcados, especialmente em monitoramentos
aéreos de espécies com ampla área de vida, quando não há corrro saber ao certo
quais indivíduos serão encontrados em determinada área. Nessas ocasiões, 0
scan n er pode representar uma economia significativa de horas de sobrevoo, que
normalmente consomem grande parte do orçamento de projetos de pesquisa

296
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

com radiotelemetria. Na verdade, muitos dos modelos mais modernos de re­


ceptor já vêm com sca n n e r embutido.

Antenas
O terceiro componente do equipamento básico de telemetria é a antena, res­
ponsável por interceptar o sinal emitido pelo transmissor e retransmiti-lo mag­
nificado para o receptor. Normalmente ligada ao receptor por meio de cabos
coaxiais, a antena pode ter diversos tamanhos e configurações, que irão influir
diretamente na magnificação do sinal captado e na sua portabilidade. Nova­
mente, deverá ser feita uma escolha de acordo com os objetivos da pesquisa e
espécie sendo estudada. Quanto maior for o porte e a complexidade da antena,
maior será o ganho no sinal, porém maior será a dificuldade no seu manuseio.

Adicionalmente, as antenas podem ser divididas em direcionais e omnidire-


cionais (Fig. 4). Esta divisão se refere à capacidade da antena em captar mais
eficientemente o sinal transmitido de acordo com sua orientação em relação ao
transmissor. Antenas omnidirecionais possuem um padrão de captação homo­
gêneo em todas as direções, podendo ser utilizadas apenas para detectar presen­
ça/ausência de sinal e para m onitorar padrões de intervalo nos pulso do

Figura 4. Ilustração dos principais tipos de antena utilizadas em estudos de radiotelemetria


(Omni-direcionais: A - Chicote, B - Dipolo; Direcionais: C - Loop, D - Adcock ou "H", e E - Yagi).

sinal, produzidos por sensores embutidos no transmissor. Essa categoria in­
clui a antena do tipo chicote (whip), também chamada apenas de omnidireci-
onal, e composta por um único elemento vertical; e a antena dipolo, composta
por um elemento horizontal e que foi utilizada como antena direcional por
alguns pesquisadores (Parish 1980), tendo seu uso sido descontinuado em

297
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

virtude do aparecimento de modelos mais modernos. Os tipos de antena dire­


cionais utilizados para radiotelemetria são:

Loop: Composta por um único elemento circular, a antena loop tem um ganho
de sinal reduzido em comparação com outros modelos. No entanto, seu dese­
nho simplificado oferece maior praticidade em ambientes mais fechados, po­
dendo ser útil para trabalhos com espécies de pequeno porte que não realizem
longos deslocamentos.

Adcock: Também conhecida como antena em “H”, em função do seu formato.


A antena adcock possui dois elementos paralelos, aumentando o ganho de
sinal em até 4dB quando comparada com uma antena dipolo. Apresenta a
melhor relação custo-benefício entre as antenas direcionais, em termos de gan­
ho, portabilidade e preço, sendo o modelo preferido entre pesquisadores bra­
sileiros. Este modelo é também o mais utilizado em monitoramentos aéreos.

Yagi: O modelo yagi compreende todas as antenas com três ou mais elementos
paralelos, oferecendo as melhores performances em ganho e direcionalidade
do sinal. Estima-se que uma antena com três elementos possua um ganho de
sinal de até 6 dB em comparação a um modelo dipolo, podendo chegar a 13 dB
em uma antena com quatorze elementos. No entanto, excetuando-se a antena
com três elementos, os modelos yagi são de difícil manejo, sendo utilizadas
preferencialmente em estações fixas de monitoramento ou adaptadas a veícu­
los automotivos.

Em antenas direcionais, o padrão de captação é constituído basicamente por


dois campos de pico diametralmente opostos: um mais forte, chamado de “fren­
te” da antena e um mais fraco, chamado de “fundo” da antena. Tais campos
são separados em ambas as extrem idades por lados “surdos” ou nulos da
antena, onde há apenas uma mínima captação de sinal (Fig. 5). Dessa forma,
para um volume constante no receptor, o sinal será escutado com maior inten­
sidade quando a frente da antena estiver voltada para o transmissor. É este
padrão diferenciado que permite a identificação da direção do sinal e localiza­
ção do animal monitorado, conforme descrito mais adiante. \

Talvez pela ausência de circuitos eletroeletrônicos, a antena é muitas vezes


menosprezada pelos pesquisadores no momento de sua aquisição e principal­
mente na sua conservação. É conveniente lembrar que sé trata de um instru­
mento de precisão, desenhado para minimizar o erro humano na localização
do transmissor e que suas condições serão determinantes na qualidade dos
dados obtidos no campo.

298
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Figura 5: Padrão de captação de sinal para uma antena direcional do tipo Adcock, evidencian­
do o pico de captação na frente da antena, o campo de captação mais fraco no fundo e os
dois lados "surdos", com captação mínima.

ftovas tecnologias
Conforme mencionado anteriormente, a técnica de radiotelemetria vem pàs-
sando por um processo de modernização cada vez mais acelerado (Cohn 1999).
No entanto, duas dessas novas tecnologias merecem uma atenção especial: O
sistema de radiotelemetria por satélite e o sistema de radiotelemetria por posi­
cionamento global (GPS). Essas inovações já são uma realidade nos Estados
Unidos e Europa e vêm ganhando cada vez mais adeptos também entre os
pesquisadores da América Latina. Ambas têm ampliado o escopo dos estudos
de radiotelemetria, por incorporar elementos automatizados no processo de
obtenção das localizações dos indivíduos marcados. No entanto, vale lembrar
que também essas tecnologias têm suas limitações e podem não ser as mais
indicadas para determinado estudo.

Na telemetria por satélite, os transmissores (conhecidos com PTTs - Platform


Transmitter Terminais, Fig. 2) emitem sinais de rádio na faixa de UHF (Ultra
High-Frequency), sempre na frequência de 401.650 MHz. Cada PTT possui
um número próprio de identificação que, juntamente com informações de até
oito sensores, é codificado e enviado através do sinal de rádio também na
forma de pulsos. Tais pulsos são captados pelo sistema de receptores da em­
presa franco-americana ARGOS, 'que se encontra a bordo dos satélites norte-
americanos de órbita polar NOAA/POES, e retransmitidos para centrais de
recepção espalhadas pelo globo. Os dados coletados são enviados para cen­
trais de processamento ARGOS, que calculam a localização do PTT e decodi­
ficam as informações provenientes dos sensores, disponibilizando-as através
de correio eletrônico para o pesquisador contratante de seus serviços.

299
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Além da óbvia redução no esforço de coleta de dados, a grande vantagem desta


tecnologia é a possibilidade de rastreamento de indivíduos realizando amplos
deslocamentos em relativamente curtos espaços de tempo, tais como migra­
ções ou dispersões. Com a telemetria convencional (VHF), tais deslocamentos
dificilmente podem ser acompanhados, pois seria necessário um esforço cons­
tante de monitoramento para que o rumo dos indivíduos estudados não fosse
perdido. No entanto, para espécies mais sedentárias ou em estudos que neces­
sitem um maior grau de acurácia nas localizações (ex. uso de hábitat), o uso de
PTTs não é recomendável. O sistema ARG^S não oferece estimativas quantita­
tivas de acurácia de suas localizações dos PTTs, apenas categorizando-as em
sete classes de qualidade. Segundo a empresa, a classe de localização mais
comumente obtida (classe “0 ” - 40% das localizações; Britten et al. 1999) cor­
responde a um erro de > 1 Km (Service ARGOS 1996). No entanto, estudos
realizados com diferentes modelos de PTT indicaram um erro médio de 9 Km
para a classe de localização “0”, podendo chegar até 15,8 Km (Brothers et al.
1998; Britten et al. 1999). Somando-se todas as classes de localização, foi esti­
mado um IC 95% para o erro de 1 - 3 Km (Harris et al. 1990; Keating 1994).

Também a elevação do terreno, ou altitude do PTT, pode induzir erros na


localização, pois o sistema ARGOS utiliza valores pré-determinados para efe­
tuar seus cálculos (Keating et al. 1991). Finalmente, estudos que se utilizam
desta tecnologia são limitados a um número de localizações diárias correspon­
dente às passagens dos satélites sobre a área de influência do PTT, que em regiões
tropicais variam entre 4 a 10 passagens diárias. Por fim, o custo desta tecnologia é
consideravelmente maior do que a radiotelemetria convencional, com os preços
de PTTs custando de 3 - 10 vezes o preço de transmissores de VHF.

Se o sistema ARGOS foi a grande novidade tecnológica para radiotelemetria


nos anos 80, na década seguinte temos o surgimento do sistema de posiciona­
mento global (GPS) como uma proposta verdadeiramente revolucionária (Rod-
gers & Anson 1994). Nesse sistema de radiotelemetria, os indivíduos monito­
rados carregam receptores GPS que podem efetuar localizações periódicas com
níveis de acurácia de até 10 metros. No entanto, o sucesso das localizações irá
depender das condições da área (cobertura vegetal, perfil do terreno) onde se
encontra o animal marcado, já que isso exerce influência na capacidade de
recepção do GPS. Áreas mais abertas têm mais chance de sucesso na localiza­
ção que áreas mais fechadas, podendo interferir em estimativas de proporção
no uso de hábitat (Moen et al. 1996).

O sistema GPS também oferece 24 horas/dia de funcionalidade, pois, diferen-

300
\
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

temente do sistema ARGOS, sua constelação de 24 satélites lhe permite atuali­


zações a cada segundo da localização de todos seus receptores. Isto possibilita
a realização de um número muito maior de localizações diárias, cujos interva­
los podem ser definidos pelo próprio pesquisador de acordo com as necessi­
dades de sua pesquisa.

A principal questão a ser resolvida ao optar-se por esse sistema é a forma de


recuperação dos dados coletados. Inicialm ente foi proposta a inclusão de um
pequeno transm issor convencional de VHF acoplado ao receptor GPS, que
permita a busca e recaptura do indivíduo marcado, retirada do receptor e recu­
peração dos dados. Apesar de representar uma alternativa mais simples e,
portanto, mais leve e barata, seu risco óbvio é a falha na recaptura do animal
marcado, com consequente perda de todas informações coletadas. A segunda
proposta foi a utilização de um transmissor de VHF mais complexo, que trans­
mita as informações codificadas através de seu sinal. Apesar de oferecer maior
segurança contrá a perda de dados, esta alternativa exige uma maior presença do
pesquisador no processo de coleta, além do risco de perda do sinal de VHF em
virtude de longos deslocamentos do animal marcado. A terceira proposta che­
gou talvez ao ápice da automatização, embora a preços ainda exorbitantes: a
asspciação dos sistemas GPS e ARGOS, em que as localizações são realizadas
pelo primeiro, restando ao segundo apenas a tarefa de aquisição dos dados e
retransmissão para centrais terrestres que os decodificam e enviam para o pesqui­
sador, já prontos para lançamentos em mapas e planilhas de análise de dados.

Embora revolucionários, esses sistemas são utilizado por pouquíssimos pes­


quisadores no Brasil, principalm ente por causa de seus custos ainda muito
elevados. A aquisição de poucos transmissores pode ainda influenciar no de­
lineamento da pesquisa, incorrendo nos riscos de amostras populacionais
pequenas e de pseudorreplicação, já que as amostras de localizações serão
provenientes de poucos indivíduos (Hurlbert 1984). Até recentemente, o peso
destes equipamentos os tornavam aplicáveis apenas em estudos de animais de
grande porte. Mas hoje já estão disponíveis no mercado receptores GPS de até
80 g e PTTs de 30 g, e a tendência é de constante evolução da tecnologia e
queda de preços.

Efeitos da radiotelemetria em animais silvestres


E crescente a preocupação com os efeitos da colocação de radiotransmissores
em animais silvestres, tanto pela perspectiva de seu bem-estar quanto da qua­
lidade das informações coletadas de indivíduos marcados (Friend et al. 1994).

301
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN
I

Uma das premissas básicas de estudos com radiotelemetria é a de que animais


marcados não sofram alterações significativas em seu comportamento e biono-
mia em virtude da presença do equipamento acoplado. Essa condição é neces­
sária para que eles possam ser considerados uma amostra válida da população
estudada (White & Garrott 1990). Embora seja senso comum que a captura, o
manejo e a acoplagem de instrumentos representam uma interferência nas ati­
vidades normais de um animal, divergências ainda existem quanto à signifi-
cância e persistência das alterações observadas (Samuel & Fuller 1994). Tais
divergências são fomentadas pela escassez de trabalhos experimentais publi­
cados abordando essa questão, reflexo da dificuldade em se obter dados sufi­
cientes de indivíduos não marcados da população (controle do experimento)
para compará-los com indivíduos marcados. Dessa forma, em muitos casos, o
melhor que pode ser feito é a avaliação qualitativa dos efeitos da marcação,
com atenção para possíveis anormalidades nas respostas comportamentais dos
animais que estiverem sendo monitorados, uma boa dose de bom senso e
conhecimento da literatura sobre o assunto.

Samuel & Fuller (1994) observaram que tais efeitos variam de acordo com a
espécie estudada, classe etária e época do ano, mas que o principal fator de
preocupação entre pesquisadores é, a relação peso do equipamento/peso cor­
poral e a acomodação do animal ao mecanismo de fixação. Geralmente, reco-
menda-se que o peso do equipam ento a ser acoplado não exceda 10% do
peso, corporal para répteis, anfíbios e grandes mamíferos; 5-10% para peque­
nos mamíferos e aves; e 1% para aves de grande porte. No entanto, Murray &
Fuller (2000) alertam para o uso indiscrim inado de regras gerais, sendo Tes-
ponsabilidade do pesquisador considerar previamente os efeitos potenciais
da colocação de radiotransmissores em sua espécie de estudo. W hite & Gar­
rott (1990) reforçam essa ideia ao recomendar a utilização de equipamentos
tão leves quanto possível, sem que se comprometam os objetivos do estudo.
Recomendam ainda: 1) a atenção à possibilidade de interferência do equipa­
mento em m ecanismos de camuflagem do animal; 2) um período de aproxi­
madamente uma semana após a m arcação para in iciar a coleta de dados,
permitindo a adaptação do animal ao equipamento e retorno a üm comporta­
mento normal; 3) evitar a colocação do equipamento durante estações repro­
dutivas, pois muitas espécies demonstram ser particularmente sensíveis neste
período.
i

302
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Procedimentos de campo
Uma vez passadas as £tapas de delineamento da pesquisa, escolha e teste do
equipamento a ser empregado, é chegado o momento de iniciar a coleta de
dados. O procedimento de campo refere-se principalmente à obtenção de loca­
lizações dos animais estudados, ao longo de um gradiente temporal. Conforme
mencionado anteriormente, tais informações podem ser coletadas por siste­
mas automatizados (ex. Sistem a ARCOS e GPS), ou pela própria equipe de
pesquisa, através de localizações terrestres ou aéreas. E importante lembrar
que através do sistema de recepção de VHF (receptor e antena direcional) pode-
se estimar apenas a direção do radiotransmissor, de onde seu sinal será capta­
do com maior intensidade. A determinação de sua distância pode ser feita,
apenas subjetivamente e de forma qualitativa (próximo ou distante) e, mesmo
assim, dependendo da experiência do pesquisador e das condições da área de
estudo.

Localizando o radiotransmissor
A acurácia de uma localização depende principalmente da qualidade das esti­
mativas de direção do transmissor. Tais estimativas são suscetíveis não apenas
ao erro humano, mas também sofrem a influência das diversas interferências
(reflexão, difração, polarização etc) a que são submetidos os sinais dos radio-
transmissores. Convém não poupar esforços no treinamento da equipe res­
ponsável por essa tarefa, a fim de identificar e corrigir eventuais vícios amos­
trais, obter uma ideia geral da capacidade do equipamento sendo usado e de­
finir locais vantajosos/problemáticos na recepção de sinais. De extrema impor­
tância também é a realização de testes, com transmissores colocados em locais
desconhecidos pela equipe. Dessa forma, através de simulações de diferentes
condições de coleta de dados e de suficientes repetições para cada membro da
equipe, é possível obter um valor de desvio padrão para as suas estimativas de
direção, o que será útil nos cálculos do erro associado às localizações do trans­
missor. Apesar da prática ainda ser a melhor forma de aprendizado, as infor­
mações a seguir podem ser de utilidade para quem está começando:

1) Conheça bem a sua área de estudo, de forma a se posicionar em pontos


onde a recepção de sinal seja avantajada. Pontos mais altos e de vegetação
mais aberta normalmente oferecem as melhores condições de recepção. Evite
posicionar-se próximo de obstáculos ou fontes de interferência eletromagnéti­
ca no sinal, bem como se distanciar excessivamente da provável localização do
transmissor; 2) Cuidado com a montagem e empunhadura corretas da antena

303
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

direcional. Lembre-se que cada modelo de antena tem um padrão de captação


diferente e erros desta natureza podem provocar localizações enganosas. Um
giro de 360° é recomendável para confirmar a direção geral de maior intensida­
de do sinal; 3) Faça uso de fones de ouvido sempre que possível; 4) Ajuste o
volume do receptor, de forma que seja possível definir com clareza os campos
de pico e nulo de sinal na antena. Lembre-se que ao diminuir o volume, o arco
de captação formado pelo campo de pico com maior intensidade de sinal (“frente”
da antena) será cada vez menor, facilitando a determinação de sua direção; 5)
Em casos de dúvidas quanto à direção precisa do sinal, utilize a reta que
representa a bissetriz do ângulo formado pelos limites de captação do sinal, ou
o início de ambos os lados “surdos” da antena (Fig. 6 ).

Figura 6. Estim ativa da origem do sinal pelo método da bissetriz, utilizando os limites dos
lados "surdos" da antena, para formação de um ângulo.

Para a medição do ângulo magnético correspondente à direção do transmissor


(também chamado “ângulo de visada” ou “azimute magnético”), utilize bússo­
las de qualidade (com escala ao nível de I o), tomando cuidado com a proximi­
dade a objetos imantados que interfiram na sua orientação (relógios, antenas,
receptores ligados etc).

A localização de um radiotransmissor pode ser obtida de duas formas: através


de rastreamento ou de triangulação. A técnica de rastreamento pode ser reali­
zada por via terrestre ou aérea, enquanto que a de triangulação pode ser efetu­
ada a partir de pontos fixos, móveis, ou de uma combinação de ambos. Cada

304
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

uma dessas técnicas possui prós e contras, ficando a critério do pesquisador


qual é a mais apropriada para sua pesquisa. Independentemente da técnica
escolhida, recomenda-se fortemente a aquisição de um receptor GPS portátil,
para auxiliar não apenas na localização do indivíduo monitorado, como mui­
tas vezes na sua própria localização.

Rastreamento terrestre
Essa técnica consiste em seguir no rumo de maior intensidade de sinal até o
estabelecimento de contato visual com o indivíduo marcado, com subsequente
localização desse ponto com auxílio de GPS ou de mapas. Apesar de ser um
método com margem mínima de erro de localização, pode ser inapropriado
caso a aproximação humana interfira no comportamento normal do animal
estudado. Também tem como desvantagem o tempo e esforço necessários para
se chegar até a localização desejada, o que dificulta o monitoramento de mui­
tos indivíduos. Essa técnica também é utilizada na recuperação de transmisso­
res em situações de desvencilhamento do mecanismo de fixação ou óbito do
animal marcado. A grande dificuldade do rastreamento'terrestre se dá com a
aproximação final ao radiotransmissor. Neste momento, o sinal será escutado
de todas as direções e, caso se trate apenas do radiotransmissor ou de um
animal pequeno e furtivo, pode haver certa dificuldade na sua visualização.
Nesses casos, deve-se sempre reduzir o volume do receptor à medida que for
se aproximando do transmissor e considerar a possibilidade de desconectar a
antena, utilizando apenas o cabo coaxial como substituto.

Rastreamento aéreo
Fundamental na localização de sinais perdidos por localizações terrestres, o
rastreamento por sobrevoo permite que se cubram longas distâncias na busca
de animais com amplas áreas de uso ou que habitam áreas de acesso muito
dificultado. Para tanto, utiliza-se uma antena direcional fixada em cada asa do
aeroplano e o auxílio de um comutador, que permite escutar o sinal de cada
antena em separado ou em conjunto. Após a identificação da região geral de
influência do radiotransmissor, através de um sobrevoo alto ( 1 0 0 0 - 2 0 0 0 m) e
utilizando as duas antenas em conjunto, é necessário buscar o rumo de maior
intensidade do sinal, requisitando ao piloto que faça um giro de 360° enquan­
to apenas a antena da asa externa à curva é mantida ligada. No momento em
que o sinal estiver mais forte, marca-se o rumo indicado pela bússola do aero­
plano (que indica a direção de voo) e se adiciona/reduz 90° de acordo com o
sentido da curva, orientando o piloto para ajustar o curso do aeroplano nesta

305
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

direção. Caso o rumo esteja correto, ao se alternarem as antenas, o sinal será


captado com igual e crescente intensidade. O rumo deve ser corrigido com
novos giros de 360°, sempre que necessário, até a aproximação definitiva à
localização do animal desejado. Este ponto pode ser identificado pelo súbito
pico e gradativa perda de intensidade do sinal, quando o piloto deverá retor­
nar e o volume do receptor ser reduzido. Então, realiza-se um novo giro de
360°, mas desta vez cqm as antenas sendo alternadas continuamente. Enquan­
to a antena da asa interna à curva captar o sinal com maior intensidade, pouco
a pouco o círculo deve ser fechado e a altitude reduzida. Caso o sinal passe a
ser captado com mais intensidade pela antena da asa externa, deve ser reorien-
tado até que o círculo e altitude cheguem ao mínimo capaz de ser descrito pelo
aeroplano, resultando na área estimada de localização do indivíduo monitora­
do (Fig. 7).

4 4if"
.-.....
/ t V

470
5

Figura 7. Esquema representativo do processo de localização por rastreamento aéreo (núme­


ros ao lado das asas indicam intensidade crescente do sinal captado por sua antena corres­
pondente, com ausência de número representando desligamento da antena).

Dependendo do grau de cobertura vegetal da área de monitoramento, é possí­


vel a visualização do indivíduo, melhorando consideravelmente a qualidade
da localização. Caso contrário, a estimativa da localização pode ainda ser melho­
rada com o sobrevoo de retas perpendiculares que cortem o círculo mínimo, de
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

forma a determinar o quadrante de localização do indivíduo (Mech 1983;


Kenward 1987). Os poucos estudos publicados .com avaliações da qualidade
de localizações feitas através dessa técnica estimaram seu erro médio em 1 0 0 -
200 m, sendo que tal erro pode sofrer influência da experiência do pesquisa­
dor e do piloto, velocidade do aeroplano e altitude sobrevoada (Hoskinson
1976; Mills & Knowlton 1989; Samuel & Fuller 1994).

Triangulação
Possivelmente a técnica de localização por telemetria mais utilizada, a triangulação
consiste em: escolher dois ou mais pontos de qualidade na captação do sinal;
obter suas coordenadas geográficas, no sistema UTM (Universal Transverse
Mercator); estimar suas respectivas direções de maior intensidade do sinal;
medir, com o auxílio da bússola, os ângulos de visada dessas direções; e final­
mente calcular a localização do transmissor, através dos pontos de encontro
das retas correspondentes aos ângulos medidos em cada ponto. Dependendo
do número de pontos utilizados para a triangulação, tais cálculos podem ser
de trigonometria simples (dois pontos) ou baseados em estimadores de máxi­
ma verossimilhança (três ou mais pontos). A existência de uma quantidade
razoável de programas de computador desenvolvidos para efetuar tais cálculos
(Anexo II) toma desnecessária aqui a descrição desses cálculos, porém, o leitor
mais afeito a procedimentos estatísticos pode buscar os trabalhos de Springer
(1979), Lenth (1981) e Saltz & Alkon (1985) ou ainda o bom resumo destes,
presente no livro de White & Garrott (1990).

Apesar de sua aparente simplicidade, a triangulação é um processo cuja qua­


lidade depende de uma série de detalhes na escolha dos pontos onde serão
estimadas as direções. A primeira decisão a ser tomada é sobre o uso de pon­
tos fixos para a. triangulação. Sua principal vantagem é a possibilidade de
construção de torres ou mastros (estações), no topo das quais a antena estaria
em posição privilegiada para captação do sinal. Quando o animal utiliza uma
área de vida bem definida e pequena, o uso de estações permanentes pode ser
aplicado com sucesso. Por outro lado, com o uso de pontos fixos perde-se a
flexibilidade na busca dos pontos ideais para a triangulação de cada indivíduo
monitorado e em cada ocasião diferente, principalmente quando os animais
percorrem longas distâncias diárias ou apresentam comportamento sazonal de
ocupação territorial. Recomenda-se nesses casos a conjugação de alguns pontos
fixos estratégicos (e estações, se possível) com a busca de pontos ocasionais,
deslocando-se em veículos ou mesmo a pé, de acordo com a necessidade.

307
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

O próximo passo a ser tomado é a definição de um protocolo amostrai que


contemple os seguintes aspectos para cada triangulação: o número mínimo de
pontos utilizados, a diferença mínima entre os ângulos de visada medidos em
cada ponto e o tempo máximo decorrido entre as estimativas de direção nesses
pontos. Esse protocolo será decisivo para que se obtenha estimativas de erro
nos cálculos das localizações, devendo sempre fazer parte da descrição meto­
dológica de publicações de trabalhos com radiotelemetria. A escolha do núme­
ro de pontos utilizados para a triangulação é de fundamental importância para
a acurácia do cálculo da localização. Teoricamente, dois pontos seriam suficien­
tes para se efetuar tal cálculo, mas dessa forma a triangulação fica extremamen­
te vulnerável a erros fortuitos na estimativa de direção em algum dos pontos,
causados por possíveis interferências no sinal (Macdonald & Amlaner 1980;
Kenward 1987). Com o uso de três ou mais pontos, é possível comparar as
estimativas de direção par a par, identificando estimativas discrepantes (ainda
que subjetivamente), além de utilizar cálculos da localização mais robustos,
lüealmente, òs pontos de triangulação e seus respectivos ângulos de visada
deveriam ser plotados em um mapa e as localizações correspondentes calcula­
das durante o processo de coleta, para que se pudesse ajustar o número de
pontos de triangulação necessários, caso a caso, e assim evitar a decepção de
descartar localizações inacuradas após o esforço de campo (Mech 1983). Mas
como raramente esse é o caso, recomenda-se que sejam tomados tantos pontos
quanto possíveis para cada triangulação, sem que se quebre o protocolo amos­
trai previamente definido.

A diferença entre os ângulos de visada medidos em cada ponto é, além de um


fator que influi na precisão da localização (Springer 1979), uma forma prática
de avaliar-se a distância desses pontos em relação ao transmissor. Até mesmo
intuitivamente é possível perceber que, dado um ângulo de visada obtido no
primeiro ponto de triangulação, quanto maior o deslocamento necessário até
um segundo ponto, para que o ângulo de visada se modifique, por exemplo,
em 30°, tanto maior será a distância da localização do transmissor (Fig. 8).
Conforme mencionado anteriormente, em condições semelhantes, quanto mais
próximo do transmissor, melhor será a qualidade do sinal, mais acurada a esti­
mativa de sua direção e mais preciso o cálculo da localização do transmissor.

Portanto, deve-se estipular previamente o valor mínimo da diferença entre os


ângulos de visada medidos para cada triangulação, associado a um valor
máximo de distância de deslocamento entre pontos. Dessa forma, em última
análise, se estará estipulando um valor máximo de distância dos pontos de
triangulação em relação ao animal monitorado. O valor ideal de diferença entre

308 ,
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

ângulos de visada é de 90°, comumente sendo estipulada uma faixa de tolerân­


cia em torno desse-valor. A amplitude dessa faixa, no entanto, deve ser decidi­
da em virtude das condições da área de estudo e principalmente do grau de
precisão aceitável para as estimativas de localização (Kenward 1987).

Figura 8. Ilustração dem onstrando que, quanto maior a distância do pesquisador para o
radiotransmissor, maior a distância a ser percorrida entre dois pontos de localização para a
obtenção de uma dada diferença a entre os ângulos de visada.

A terceira consideração a ser feita na definição do protocolo amostrai é o tem­


po transcorrido no deslocamento entre os pontos de triangulação. No caso de
grandes equipes de pesquisa, com vários subgrupos posicionados em estações
fixas e outros ainda em unidades móveis, esta é uma preocupação menor,
necessitando apenas que a equipe esteja corretamente sincronizada (White &
Garrott 1990; Samuel & Fuller 1994). Porém, nada poderia estar mais distante
de nossa realidade latino-americana, em que muitas vezes o pesquisador se vê
obrigado a realizar trabalhos solitários ou na companhia de apenas um guia para
garantir o seu retorno à base de campo. Nesses casos, é necessário lembrar que
o deslocamento do animal sendo monitorado pode embutir erros adicionais nos
cálculos de sua localização, pois a estimativa de direção em cada ponto de trian­
gulação seria referente a localizações distintas. Tais erros são impossíveis de ser
quantificados, devido à imprevisibilidade do deslocamento do animal. Portan­
to, baseado em conhecimentos existentes sobre aspectos da biologia comporta-
mental da espécie no que se refere à mobilidade, deve-se determinar um tempo
máximo aceitável de intervalo entre o primeiro e o último ponto de triangulação,
dentro do qual o deslocamento do indivíduo monitorado não represente um
aumento significativo no erro das estimativas de localização.

309
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Apesar da relevância dessas considerações, é importante ter em mente que a


localização por meio dessa técnica será sempre baseada em estimativas das
direções de maior intensidade do sinal em cada ponto de triangulação, sendo
então também uma estimativa da real localização do transmissor. Por maior
que seja o esforço em montar-se um protocolo amostrai estrito e segui-lo à
risca, o desvio padrão associado às m edições dos ângulos de visada criará
uma área de confiança em torno da localização estimada, que pode ser um
*
polígono no caso de localizações feitas com dois pontos (chamado “polígono
de erro”) ou uma elipse no caso de localizações feitas com três ou mais pontos
(Springer 1979; Lenth 1981; Fig. 9). Os cálculos de áreas de confiança também
estão normalmente inclusos nos programas de computador que realizam as
estimativas das localizações (Anexo II), devendo ser incluídos nas publicações
como parte dos resultados da pesquisa (Saltz 1994). Portanto, a rigidez de um
protocolo amostrai deve refletir sempre o balanço entre o mínimo de precisão
nas localizações que seja aceitável pelos objetivos da pesquisa e o máximo de
precisão possível de ser alcançado com os recursos disponíveis, espécie estu­
dada e condições da área de pesquisa. Dessa forma, antes de desistir de uma
pesquisa utilizando radiotelemetria por conta de problemas com a confiabili­
dade das localizações, lembre-se de tentar redimensionar os seus objetivos ou
o número de categorias de uma variável sendo medida, para que ambos pos­
sam ser satisfeitos pelo grau de precisão fornecido por essa técnica. Por exem­
plo, numa área de hábitat altamente heterogêneo, uma precisão da ordem de
algumas centenas de metros na localização dos indivíduos estudados pode
dificultar a determinação do tipo de hábitat que o animal está utilizando. Por
outro lado, a determinação do grau de precisão possível de ser obtido poderá
ajudar na decisão quanto às variedades ou categorias de hábitat que poderão
ser incluídas nesta pesquisa.

Finalmente, um ponto que necessita de menção em destaque é a necessidade


de correção da declinação ou variação magnética, fenômeno causado pelo pa­
drão do campo magnético do planeta Terra (geomagnetismo). A declinação
magnética faz com que os ângulos de visada, que são medidos pela bússola em
relação ao polo norte deste campo magnético, difiram dos ângulos em relação
ao polo norte verdadeiro (“azimutes verdadeiros”), referentes ao eixo de rota­
ção da Terra (encontros dos meridianos terrestres). Essa diferença, que no
Brasil pode chegar em até 23°, é relativamente pouco comentada fora das rodas
de geógrafos, geólogos e cartógrafos, apesar de sua relevância para técnicas
como a radiotelemetria. Segundo Samuel & Fuller (1994), uma diferença de I o
em um ângulo de visada pròduz um desvio linear de 17,5 m para cada 1 Km

310
\
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

de distância entre o transmissor e o ponto de triangulação. Considerando o


acúmulo de desvios para cada medida de ângulo de visada, pode-se facilmente
chegar a erros de 500 m a l quilômetro na localização. Como o geomagnetismo
varia de um local para outro e ao longo dos anos, cada pesquisador deve
procurar o valor atualizado de declinação magnética em sua área de estudo,
bem como o sentido da declinação (Leste ou Oeste). Tais informações normal­
mente constam de mapas e bases cartográficas, juntamente com o valor de
correção anual. Outra fonte bastante prática são programas de computador que
calculam a declinação atualizada para qualquer lugar do globo, bastando infor­
mar as coordenadas geográficas (ver Anexo II).

Polígono

Figura 9. Estimativas dè localização por meio de triangulações com dois e três pontos. As
áreas sombreadas representam as áreas de confiança associadas ao desvio padrão para as
medidas de ângulos de visada.

Análise de dados
O propósito da análise de dados em qualquer estudo, biológico ou não, é
extrair destes o máximo de informações segúras e passíveis de interpretação
por parte do pesquisador. Este é um processo que, apesar de trabalhoso, deve
fluir com tranquilidade quando o delineamento da pesquisa e os procedimen­
tos de campo foram bem planejados e conduzidos. Daí, então, entram em cena
o conhecimento e a criatividade do pesquisador para sintetizar tais informa­
ções, avaliar sua confiabilidade e oferecer sua visão de como tais informações
explicam a questão que se está investigando, bem como indicar novos passos
para o aprofundamento das pesquisas neste tópico (Ratti & Garton 1994).

311
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Como já deve estar claro até aqui, os componentes básicos de um banco de dados
proveniente de um estudo com radiotelemetria são as coordenadas geográficas x e
y, expressas no formato UTM, associadas a um tempo t, expresso sob a forma de
data e hora da localização do indivíduo monitorado. Dados adicionais podem
advir de sensores embutidos nos transmissores ou de medições de variáveis ex­
trínsecas ao animal monitorado, complementando o banco de dados de acordo
com os objetivos da pesquisa. Embora tais dados possam ser de ordem primária
ou secundária dentro do delineamento da pesquisa, são comumente analisados
em relação dos componentes x, y e t (White & Garrott 1990).

As análises de dados de radiotelemetria podem ter diversas orientações. Inicial­


mente, é recomendável a análise exploratória dos dados brutos, plotados em
mapas ou imagens de satélite georreferenciadas, que podem revelar padrões
não percebidos durante a coleta de dados (Fig. 10}. A partir desse ponto,
pode-se prosseguir na direção de análises de movimentação, de padrões de
utilização do espaço, de utilização de hábitat (ou recursos específicos) ou ainda
de parâmetros demográficos, sempre de acordo com os objetivos da pesquisa.

Figura 10. Exemplo de localizações de uma jaguatirica (Leopardus parda lis) monitorada no
Parque Estadual Morro do Diabo, SR

A descrição de cada tipo de análise de dados será limitada aos seus aspectos
teóricos, para que o leitor compreenda sua utilização e nuances, facilitando o
trabalho com os programas de computador dedicados a essas tarefas. O desen­
volvimento matemático dessas análises foge dos objetivos deste capítulo, po­
dendo ser encontrado
* na literatura indicada. r'

312
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Movimentação e atividade
«
Uma das formas mais simples de análise de dados coletados com radioteleme­
tria é a de movimentação e atividade dos indivíduos monitorados ao longo de
um gradiente temporal. Estas análises consistem no cálculo simples da taxa
deslocamento/tempo observado entre sucessivas localizações, da proporção
entre pulsos de atividade/inatividade durante o monitoramento, ou ainda da
proporção presença/ausência em uma área definida de descanso. Informações
desse tipo podem ser utilizadas para revelar padrões comportamentais para a
população estudada, que podem por sua vez ser correlacionados com outras
variáveis, tais como período fértil ou disponibilidade de recursos alimentares.

Para esse tipo de análise, são necessários regimes contínuos de coleta de da­
dos, a fim de registrarem-se também os movimentos ou períodos de atividade
erráticos dos indivíduos monitorados. Essa deve ser a principal preocupação
do pesquisador, pois intervalos muito longos de tempo entre triangulações
consecutivas podem excluir movimentos inteiros, que tenham se iniciado e
terminado em um mesmo local (ex.: partida e retorno a um ninho em busca de
alimento). Estudos de dispersão e migração também entram nesta categoria,
embora com gradientes temporais mais amplos. Nesses estudos, aspectos como
a distância, a direção e a proporção da população efetuando o deslocamento
são comumente avaliados, bem como os fatores determinantes do início desses
processos (Storm et al. 1976).

Uso do espaço
Análises do padrão de uso do espaço são normalmente feitas através da des­
crição das áreas de uso dos animais monitorados, a partir das localizações '
observadas e com o auxílio de diversos estimadores de seu contorno e medida.
Área de uso foi originalmente definida por Burt (1943) como: “A área percorri­
da por um indivíduo em suas atividades normais de busca de alimênto, acasa­
lamento e cuidado com filhotes. Saídas ocasionais dessa área, talvez de natu­
reza exploratória, não devem ser consideradas como parte da área de uso”.
Embora utilizado até os dias de hoje, esse conceito de área de uso deixa mar­
gem para controvérsias quanto ao que seriam “atividades normais” e “saídas
ocasionais”, evidenciando as dificuldades inerentes na estimativa dos limites
dessas áreas (Gautestad & Mysterud 1995). Segundo -White & Garrott (1990),
esse conceito deveria ser abandonado em troca da formulação de hipóteses
mais relevantes, a serem testadas pela análise estatística dos dados brutos
(localizações), evitando assim a constante violação de premissas por parte dos

313
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

modelos de estimativa numérica de áreas de uso. Em contrapartida, Powell


(2 0 0 0 ) defende a importância do conceito de área de uso e de sua quantifica­
ção, afirmando que a precisa definição de seus limites é menos relevante que o
conhecimento da intensidade de uso e importância biológica de sua estrutura
interna, cuja estimativa é menos sensível a localizações marginais. E mesmo
estimativas mais simplificadas, ainda que imprecisas, dos limites da área de
uso podem oferecer importantes informações sobre o “mapa cognitivo” do animal
estudado em relação ao ambientq que o cerca (Peters 1978). Por fim, pode-se
argumentar que a determinação do período de tempo durante o qual uma área
de uso será medida também tem papel fundamental na solução dessa contro­
vérsia. E a variável de tempo t que em última análise irá confinar o animal a
uma área de uso que seja plausível do ponto de vista biológico, cuja manuten­
ção seja vantajosa do ponto de vista das relações ecológicas com outros seres e
o seu meio circundante e que seja passível de ser estimada estatisticamente a
partir de uma amostragem de localizações (Morris 1988; Powel 2000).

Diversos estimadores de área têm sido propostos, sendo divididos basicamen­


te em três categorias principais: poligonais, probabilísticos paramétricos e não
param étricos. Enquanto a primeira deriva dos pontos mais periféricos das
localizações amostradas, as outras duas concentram-se em descrever padrões
de intensidade de uso do espaço através de modelos baseados principalmente
em funções de probabilidade de densidade (Worton 1987, 1989; Powell 2000).
Esse padrão é comumente chamado de “distribuição de utilização” e refere-se
à distribuição das frequências relativas das localizações amostradas para o
animal monitorado (Jennrich & Turner 1969; Van Winkle 1975). A importância
do conceito de distribuição de utilização reside justamente na transformação
de uma estimativa bidimensional de área em uma estimativa de volume, na
qual o terceiro eixo representa a densidade de uso, ou a quantidade de tempo
que o indivíduo paása em determinadas regiões de sua área de uso (Seaman et
al. 1999). Esse conceito possibilita até mesmo um critério mais objetivo e re-
plicável na solução da problemática de Burt (1943), ao permitir a separação
entre movimentos normais e ocasionais por meio da especificação de um con­
torno da distribuição cujo volume interno corresponda a determinada proba­
bilidade de se encontrar o animal estudado. O contorno de 95% do volume da
distribuição de utilização tem sido comumente escolhido como critério para
excluir movimentos ocasionais para fora da área de uso, sendo porém total­
mente arbitrário e sem qualquer explicação biológica (Anderson 1982; White &
Garrott 1990). Atualmente, os estimadores de área de uso mais utilizados são:

314
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Mínimo Polígono Convexo (MPC): Do tipo poligonal, o MPC é o mais. antigo


estimador de área de uso (Mohr 1947; Hayne 1949). Ainda extensamente uti-
lizàdo em função d'a simplicidade no seu desenho e por não possuir nenhuma
premissa estatística, consiste basicamente na união dos pontos mais externos
da distribuição de localizações, de forma a fechar o menor polígono possível
sem admitir concavidades (Fig. 1 1 ). No entanto, por sua susceptibilidade a
outliers (pontos extremos), o estimador MPC vem recebendo severas críticas.

Figura 11. Contorno da área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do Diabo,
estimada pelo método do Mínimo Polígono Convexo (MPC).

Ao ligar os pontos extremos da distribuição de localizações, largas áreas de


pouco ou nenhum uso são incluídas na estimativa, além de informações sobre
intensidade de uso, provenientes das localizações mais internas serem perdi­
das. A descrição de uma área de uso pelo estimador MPC, donforme demons­
trado por Metzgar (1973), subentende uma distribuição uniforme das localiza­
ções por toda a área, o que pode ser testadp estatisticamente para validar o
estimador (Samuel & Garton 1985). Outra crítica comum ao método é sua de­
pendência de um alto número de localizações para que sua área estimada atin­
ja um valor assintótico, ainda assim permanecendo sempre uma probabilida­
de ínfima de crescimento em função de um movimento ocasional para fora da
área previamente descrita (Jennrich & Turner 1969).

Vários autores propuseram alternativas para reduzir os efeitos de localiza­


ções extremas. Métodos de inclusão de concavidades foram descritos por
Stickel (1954), Harvey & Barbour (1965) e Voight & Tinline (1980), mas care­
cem de objetividade e, portanto, não devem ser generalizados. Kenward (1987)

315
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

e Worton (1995) discutem métodos de exclusão progressiva de pontos mais


externos, semelhantes a um “descascamento” do polígono, como uma forma
de estimar centros de atividade ou de importância para o animal. De maneira
gèral, convencionou-se em 5% das localizações a proporção a ser excluída da
amostra como forma de desconsiderar os outliers, formando uma área chama­
da de MPC 95% (Hartigan 1987; White & Garrott 1990; Fig. 12 ). Finalmente,
E. O, Garton (com. pess.) sugere, ào defender o abandono do estimador MPC
como método padrão de análise de área de uso, que este passe a ser utilizado
como uma medida bidimensional x e y dos limites (parâmetro estatístico) das
observações, fornecendo assim apenas uma boa perspectiva da real distribui­
ção das localizações.

Figura 12. Contorno da área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do Diabo,
estimada pelo método do Mínimo Polígono Convexo com 95% das localizações (MPC 95%).
Note a exclusão dos pontos mais extremos do núcleo de utilização do indivíduo.

Normal bivariado (Elipse): Do tipo probabilístico paramétrico, o estimador


normal bivariado, também conhecido como estimador da elipse, baseia-se na
noção de “centro de atividade” introduzida por Hayne (1949). Tal centro é
representado pela média aritmética das coordenadas x e y da amostra de loca­
lizações obtidas, correspondendo ao ponto de maior probabilidade dentro da
área de uso de se encontrar o animal estudado e cercado por zonas de probabi­
lidades decrescentes. Esta noção foi desenvolvida por Jennrich & Turner (1969)
para estimativas de área de uso seguindo um modelo espacial baseado em uma
distribuição probabilística normal bivariada, tendo o centro de atividade, as
variâncias e covariância estimadas de x e y como parâmetros de cálculo, geran­
do um contorno elíptico (Fig. 13). Samuel & Gafton (1985) propuseram ainda

316
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

uma modificação sobre o modelo de Jennrich-Turner, chamado de estimador


robusto da elipse. Neste modelo, diferentes pesos são atribuídos a cada loca­
lização, em função inversa, de sua distância do centro de atividade. Dessa
forma, o estimador robusto da elipse compensa a tendência do estimador de
Jennrich-Turner em inflar a área descrita da elipse na presença de outliers,
produzindo estimativas de área mais conservativas.

Figura 13: Contorno da área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do Diabo,
estimada pelo método normal bivariado de Jennrich-Turner com 9 5% da distribuição de
utilização (Elipse 95% ).

0 uso do estimador normal bivariado em análises de área de uso representou


um avanço em relação ao estimador MPC, pois transferiu o foco de atenção das
bordas da área de uso para o centro de atividade, introduzindo uma medida
de intensidade de uso da área em seus cálculos. Por ser baseado em um mode­
lo probabilísüco, é também menos sensível ao número de localizações do que
o MPC, oferecendo melhor grau de comparabilidade entre estimativas, além de
fornecer a possibilidade de estimar-se a variância associada ao cálculo da área
de uso (White & Garrott 1990). No entanto, por ter sido desenvolvido com
base em análises de dados de capturas, o estimador de Jennrich-Turner é m ui­
to sensível à autocorrelação de dados, característica comumente presente em
dados coletados por radiotelemetria. Mas, conforme mencionado anteriormen­
te, os testes de Swihart & Slade (1985) podem ser utilizados para determinar o
intervalo mínimo para se atingir a independência entre localizações consecuti­
vas, permitindo ao pesquisador retirar da amostra as localizações que estiverem
causando a autocorrelação. Críticos deste estimador argumentam que, apesar da
importância do conceito de centro de atividade, a obrigatoriedade da existência

317
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

de apenas um centro posicionado no meio da área de uso é destituída de


significado biológico (Dixon & Chapman 1980). Da mesma forma, o contorno
elíptico de suas áreas de uso é visto com ceticismo quando plotadas em ma­
pas, devido a sua simetria e à possibilidade de inclusão de áreas onde não foi
observada a presença do animal (Powell 2000). De fato, a própria distribuição
espacial dos movimentos reais de um animal raramente segue um modelo nor­
mal bivariado (Harris et al. 1990), apesar de Schoener (1981) ter concluído que
esse padrão pode ser aceitável para espécies que vivam em ambientes relativa­
mente homogêneos e distribuam suas atividades em torno e a partir de um
local focal. Testes para avaliar o ajuste dos dados coletados a uma distribuição
normal bivariada (Smith 1983; Samuel & Garton 1985) devem ser conduzidos
de forma a satisfazer a premissa básica deste estimador.

Média Harmônica: Do tipo não paramétrico, o estimador da média harmônica


surgiu a partir da insatisfação de alguns estudiosos com as premissas de esti-
madores probalísticos paramétricos, tais como o de Jennrich-Turner, que assu­
mem a existência de apenas um centro de atividade situado no centro aritmé­
tico de x e y da amostra de localizações e também da obrigatoriedade no forma­
to circular ou elíptico do contorno das áreas de uso. Dixon & Chapman (1980)
propuseram a utilização de uma distribuição média harmônica, muito utiliza­
da por geógrafos em estudos de distribuição espacial, como forma de estimar o
número de centros de atividade e posicioná-los nas devidas regiões de maior
utilização pelo animal. Através da superposição de um grid sobre a distribui­
ção das localizações, seria calculado para cada nó (interseção de linhas) deste
grid um valor baseado na média de suas distâncias para cada uma das localiza­
ções amostradas, chamado de distância média harmônica (Dixon & Chapman
1980; Fig. 14). Os centros de atividade seriam então estimados sobre os nós
que possuíssem o menor valor de distância média harmônica, ou seja, que
tivessem o màior número de localizações em sua proximidade, e os contornos
seriam traçados através da interpolação dos valores para cada nó (Kenward
1987; Fig. 15). Com a dificuldade na avaliação do significado de uma distância
média harmônica em relação à proporção da distribuição de utilização, conven­
cionou-se o cálculo com apenas uma porcentagem (normalmente 95%) das loca­
lizações amostradas - excluindo as mais extremas - ou a divisão do valor encon­
trado para cada nó pela área total do grid e desenho do contorno correspondente
à proporção desejada (Cresswell & Harris 1988; Ackerman et al. 1990). .

O uso de grids para cálculo de áreas de uso data de muito antes do surgimento
do estimador por média harmônica. A forma de cálculo inicialmente utilizada

318
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Figura 14. Sim plificação do processo de cálculo das distâncias m édias harm ônicas para
cada nó do grid superposto. Por estar mais próximo das localizações visualizadas no detalhe,
o nó A terá um valor de distância média harmônica menor que o nó B, sendo incluído em um
contorno de menor porcentagem da distribuição de utilização.

Figura 15. Contorno da área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do Diabo,
estimada pelo método da média harmônica, com 95% da distribuição de utilização.

319
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

consistia na simples contagem de células que continham localizações amostra­


das e multiplicação pela área da célula (Siniff & Tester 1965). Apesar do alto
grau de subjetividade na escolha do tamanho das células do grid, a utilização
deste método ainda é comum (Peres 1991, Rylands 1989, Kleiman et al. 1988),
por ser totalmente não paramétrico (não pressupõe um contorno para a área de
uso) e por sua extrem a facilidade de cálculo. Amostras com um reduzido
número de localizações podem gerar áreas de uso disjuntas, o que não neces­
sariamente significa que os trechos entre as áreas estimadas não tenham sido
utilizados pelo indivíduo estudado. Posteriormente, foi incorporada ao méto­
do a ideia de intensidade de uso, em que células com maior densidade de
localizações indicam maior utilização, tal qual um histograma tridimensional da
frequência de localizações em um grid, sendo este o precursor dos modernos
estimadores de área de uso por kernel, que será descrito a seguir (Anderson
1982; Horner & Powell 1990).
O desenvolvimento do estimador da média harmônica, como todos os outros,
veio para suprir as falhas do estimador mais utilizado àquela época, mas trou­
xe consigo sua própria parcela de problemas. Spencer & Barrett (1984) foram
os primeiros a identificar a questão da influência do posicionamento e tama­
nho do grid sobre a performance do estimador, baseando suas conclusões em
dados de radiotelemetria para cinco espécies de carnívoros norte-americanos.
Inicialmente, foi demonstrado que uma localização situada sobre um nó do
grid atribui um peso desproporcional a este nó, o que a princípio poderia ser
corrigido com um ligeiro reposicionamento do grid até que nenhum de seus
nós coincidisse com as localizações amostradas. No entanto, foi percebido que
tal deslocamento implica a completa mudança dos valores de distância média
harmônica dos nós e até mesmo na alteração das estimativas dos centros de
atividade e do contorno da área de uso, fato também percebido com a utiliza­
ção de grids com células de tamanhos diferentes. Essa sensibilidade do esti­
mador a critérios tão subjetivos limita sua aplicação prática e comparabilidade
entre estudos (White & Garrott 1990).
Dois critérios de correção mais objetivos foram propostos por Spencer & Barrett
(1984) e Samuel et al. (1985): o cálculo das distâncias médias harmônicas de
cada localização em relação às demais ou o deslocamento de cada localização
para o centro da célula em que está situada. O primeiro critério elimina a
necessidade de superposição de um grid, produzindo uma estimativa mais
estável do centro de atividade. No entanto, reduz o número de centros de
atividade a um único ponto e não permite o desenho do contorno da área de

320
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

uso, para o qual são necessários dados provenientes de um grid. Já o se­


gundo critério, embora m antenha a indesejável presença do grid, produz
valores balanceados de distância média harm ônica para cada nó, enquanto
mantém a capacidade de desenho do contorno da área de uso (Spencer &
Barrett 1984). Porém, o efeito da escolha do tam anho das células do grid
não é considerado por este critério, devendo ser ajustado de acordo com o
número de localizações amostradas e com suas respectivas estim ativas de
erro (Samuel et al. 1985).
Kernel: Do tipo não param étrico, o estim ador de kernel para áreas de uso
foi proposto por Worton (1987; 1989), tendo como fundamento a obra de
Silverman (1986) sobre métodos estatísticos não paramétricos de estimativa
de densidade. Este estimador utiliza um grupo particular de funções de proba­
bilidade de densidade, chamadas de “kernels” e representadas graficamente
por pequenos morros arredondados, associadas a cada uma das localizações
amostradas. Todo kernel possui um volume igual a 1 , porém sua forma e larguT
ra da base são definidas pelo pesquisador. A partir da combinação das funções
(kernels) de cada localização, obtém-se uma estimativa (semelhante a um rele­
vo) da real função de densidade da distribuição de utilização, sendo a estima­
tiva da densidade em qualquer ponto da distribuição equivalente à média de
todos os kernels que nele se sobrepõem. Com o auxílio de um grid, podem-se
então descrever contornos de probabilidade de densidade e estimar a área de
uso baseando-se na porcentagem desejada da distribuição de utilização (Worton
1987, 1989, Seaman & Powell 1996, Powell 2000; Fig. 16).

Figura 16. Contorno da área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do Diabo,
estimada pelo método de kernel adaptativo, com 95% da distribuição de utilização.

321
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Embora a escolha entre as diversas formas do kernel e a definição da largura de


sua base seja de responsabilidade do pesquisador, Epanechnikov (1969) de­
mostrou que qualquer função de probabilidade de densidade que satisfaça as
premissas de um kernel pode ser utilizada, independentemente de seu forma­
to. Por outro lado, é a largura da base do kernel o aspecto mais importante
deste estimador (Silverm an.1986). Descrita pela variável h e sendo também
chamada de fator ou parâmetro de “suavização” do kernel (Worton 1987), a
largura da base irá determinar o grau de detalhamento da estimativa de densi­
dade, assem elhando-se a relevos mais acidentados para baixos valores e a
relevos mais suaves para altos valores de h (Worton 1989). Estimativas de
densidade com kernels de bases estreitas enfatizam centros de atividade e o
detalhamento de seu uso, porém são mais sensíveis a erros nas estimativas de
localização e tendem a formar contornos disjuntos da distribuição de utiliza­
ção. Já kernels com bases largas enfatizam o contorno geral da distribuição de
utilização e são menos sensíveis a erros de localização, mas tendem a suprimir
detalhes da distribuição de densidade (Powell 2000).

A escolha de um valor ideal de h depende muito das características dos dados


analisados. Uma das formas mais simples é assumir que as localizações amos­
tradas distribuem-se segundo um padrão normal bivariado, cujo h ótimo já foi
determinado analiticamente e que, portanto, permite uma estimativa de seu
valor. Esse valor, chamado de “largura de íeferên cia” (href), produziu boas
estimativas em simulações de distribuição de utilização unimodais (um centro
de atividade) e normais bivariadas, o que raramente é observado em amostras
reais de localizações de animais. Nesses casos, a aplicação de href deve ser
feita com cautela, pois tende a produzir contornos exageradamente suavizados
(Worton 1995).

A forma mais acurada de escolha do h ideal é através do processo de “valida­


ção cruzada de quadrados m ínim os” (Least Squares Cross Validation), que
consiste basicamente na utilização de uma função M(h) para estimar o valor
hcv, para o qual a discrepância entre a estimativa do kernel e a real função de
densidade da distribuição de utilização seja a mínima possível (Silverman
1986; Seaman & Powell 1996). Apesar de sua complexidade matemática, o de­
senvolvimento de programas dé computador que efetuam os cálculos necessári­
os de M(h) tem contribuido para que a utilização de h cv se torne mais acessível
para pesquisadores em geral (Kenward & Hodder 1996; Seaman et al. 1998).

O estimador de kernel pode ainda ser dividido em duas categorias: o kernel


fixo e o kernel adaptativo. Essas categorias referem-se à utilização de um ou

322
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

mais valores de h. No estimador de kernel fixo, o valor escolhido de h man­


tém-se por toda a distribuição de utilização, suavizando por igual o volume de
densidade. Já no estimador de kernel adaptativo, o valor escolhido de h varia
de forma inversamente proporcional à densidade de localizações, promoven­
do um maior grau de suavização em áreas com menor concentração de localiza­
ções (Worton 1989). Intuitivamente, o uso do estimador de kernel adaptativo
seria mais eficiente que o de kernel fixo, já que explora a variação de h para
fornecer ao mesmo tempo um maior detalhamento dos centros de atividade e
das bordas da distribuição de utilização. No entanto, testes comparativos entre
esses dois estimadores e mais o estimador de média harmônica (que até então
era considerado o estimador mais acurado; Boulanger & White 1990) mostra­
ram que o kernel fixo com hcv (validação cruzada) produz as estimativas mais
acuradas de distribuição de utilização para grupos de dados simulando amos­
tras de localizações com diversas formas e números de centros de atividade
(Seaman & Powell 1996).

A grande vantagem dos estimadores de kernel está em reunir o caráter probabi-


lístico de estimadores como o de Jennrich-Turner, porém, com a abordagem
não paramétrica de estimadores como o de Média Harmônica. Dessa forma, o
estimador de kernel não fica preso às premissas de distribuições paramétricas
que pressupõem um formato rígido para os contornos de área de uso (ex.:
elipses), nem é afetado pelo posicionamento e tamanho de grids para a estim a­
tiva de centros de atividade e distribuições de utilização (Silverm an 1986;
Powell 2000). Modelos mais simplificados de estimadores de densidade foram
anteriormente propostos por Anderson (1982), utilizando as séries de Fourier
para suavização das funções de densidade. Apesar de estimar núcleos de ati­
vidade com boa acurácia, este estimador apresentou um mau desempenho
próximo às bordas da distribuição de utilização (Anderson 1982; W hite &
Garrott 1990; Powell 2000).

Embora seja considerado atualmente como um dos melhores estimadores de


área de uso, o estimador de kernel apresenta algumas falhas comuns a outros
estimadores. A pressuposição de independência estatística entre localizações
consecutivas na amostra ignora a própria natureza da variável sendo medida,
já que animais normalmente se movem de maneira não aleatória (Powell 2000).
Com isso, para satisfazer esta premissa dos estimadores de área de uso, o
caráter de sequência temporal da amostra de localizações é desconsiderado,
menosprezando informações de importante significado biológico (Solla et al.
1999). Segundo White & Garrott (1990), a maiór contribuição para análises de

323
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

área de uso virá com o desenvolvimento de estimadores probabilísticos não


paramétricos que sejam capazes de incorporar as séries temporais das localiza­
ções em suas análises. Outro aspecto que deve ser considerado é a diferença
entre padrões de uso do espaço e de utilização de recursos. Estimadores de
kernel, assim como muitos outros, referem-se à probabilidade de um animal
ser encontrado em determinada área, com diferentes contornos de densidade
ou frequência de utilização desse espaço. No entanto, nem sempre a maior
quantidade de tempo dispendido em determinado trecho da área de uso signi­
fica maior importância biológica desta para o animal (Powell 2000). Para tanto,
são necessários estudos mais detalhados de padrão de utilização de recursos,
que serão abordados mais adiante.

A opção pelo estimador de área de uso e contorno da distribuição de utilização


ainda permanece largamente a critério do pesquisador, que deve levar em con­
sideração fatores como: a adequabilidade dos dados às premissas subjacentes,
a significância biológica das áreas de uso estimadas e a sua comparabilidade
com áreas de uso estimadas em outros estudos relevantes (Harris et al. 1990;
Powell 2000). Uma das consequências dessa profusão de estimadores é a difi­
culdade na comparação de valores de área de uso entre estudos (Fig. 17), já
que diferentes estimadores produzem resultados distintos até mesmo quando
aplicados a grupos de dados idênticos (White & Garrott 1990). Por outro lado,
poucas diretrizes quanto ao método mais eficiente, com comparações de de­
sempenho em simulações em que o real valor da área de uso seja conhecido,
encontram-se disponíveis na literatura (Boulanger & White 1990; Worton 1995;
Seaman & Powell 1996). Outra questão digna de consideração é a escolha do
programa de computador para cálculos^ e desenho das estimativas de áreas de
uso. Lawson & Rodgers (1997) evidenciaram divergências entre as estimativas
produzidas por distintos programas para um mesmo estimador e grupo de
dados, restringindo a comparabilidade entre estudos que utilizaram diferentes
programas. A principal causa de tais discrepâncias são as diferenças no núme­
ro e tipos de opções dadas ao usuário, para definir parâmetros relevantes aos
cálculos de área, tais como tamanho e posicionamento do grid para cálculos de
média harmônica ou do valor de h para o estimador de kernel. Dessa forma,
torna-se imperativo que publicações de trabalhos com análises de área de uso
contenham informações quanto ao programa utilizado e aos parâmetros esco­
lhidos nas respectivas opções ao usuário.

324
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Figura 17. Comparação entre a área de uso de uma jaguatirica no Parque Estadual Morro do
Diabo, calculada por meio de diversos estimadores.

Interação e fidelidade territorial


Dois aspectos diversos da ecologia de populações que possuem abordagens
semelhantes na análise de dados de radiotelemetria são as medidas de intera­
ção e de fidelidade territorial. A primeira refere-se ao comportamento espacial
dos indivíduos de uma população com relação ao grau de tolerância à presen­
ça de outros indivíduos da mesma espécie, enquanto a segunda está relaciona­
da à tendência de um indivíduo em permanecer em determinada área por
prolongados períodos de tempo ou em retornar a esta após períodos de ausên­
cia (White & Garrott 1990). A semelhança de abordagem analítica deve-se ao
fato de ambas serem de natureza comparativa entre distribuições de localiza­
ções, sejam de indivíduos vizinhos ou de um mesmo indivíduo em épocas
distintas. Existem dois tipos de análise comparativa entre distribuições de
localizações: a forma estática e a dinâmica (Dunn & Gipson 1977; Dunn 1979).
Na forma estática, a análise é feita sobre as taxas de sobreposição entre áreas de
uso calculadas a partir das localizações. Embora forneça uma boa noção quali­
tativa quanto a possíveis mudanças territoriais de um indivíduo ou sobre pa­
drões de associação entre indivíduos, esse tipo de análise é fraco, pois assüme

325
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

um nível de utilização homogêneo das áreas de uso calculadas. Dessa forma,


podemos ter uma situação na qual dois indivíduos apresentem uma larga so­
breposição de áreas de uso, porém, em trechos com baixa frequência de utili­
zação, ou de um indivíduo que, apesar de manter uma área de uso sem maio­
res alterações no contorno, tenha modificado radicalmente seu padrão de uti­
lização e centros de atividade (White & Garrott 1990). No entanto, com o de­
senvolvimento de estimadores de distribuição de utilização por probabilidade
de densidade, é possível que a aplicação de índices de correlação, tais como o
coeficiente r de Spearman, forneçam melhores estimativas e sobreposição de
áreas (Doncaster 1990; Powel 2000).

A forma dinâmica de análise atua diretamente sobre a distribuição de localiza­


ções, evitando assim as generalizações da forma estática. Dunn (1979) desen­
volveu um teste estatístico para verificar a hipótese de que dois ou mais indi-,
víduos movem-se independentemente dos outros, através da análise de corre­
lação entre os deslocamentos destes, enquanto Morgan et al. (1974) propuse­
ram a utilização de análises de agrupamento para tal fim. No entanto, esses
métodos são pouco aplicáveis na maioria dos estudos com radiotelemetria,
pois necessitam de um regime contínuo de monitoramento e localizações si­
multâneas dos indivíduos estudados.

Seleção de hábitat
Um dos principais objetivos ém muitos estudos de animais silvestres é a iden­
tificação e análise de padrões de uso do hábitat, pois este engloba diversos
recursos necessários à sobrevivência de populações (alimento, abrigo, etc; ver
Haney & Solow 1992; Tufto 1996). Através do conhecim ento de como uma
população seleciona os hábitats disponíveis em seu meio, pode-se avaliar melhor
a importância de cada um para a adaptação dessa população e da espécie em
estudo, servindo como orientação para ações visando a seu manejo e a sua
conservação (Garshelis 2 0 0 0 ).

As análises de seleção de hábitats a partir de dados de radiotelemetria são


comumente efetuadas por meio de comparação entre as proporções de utiliza­
ção e de disponibilidade de cada tipo de hábitat em uma região geográfica, área
de estudo ou mesmo dentro da área de uso de cada indivíduo. A técnica de
radiotelemetria presta-se particularmente bem para esse tipo de estudo, por per­
mitir o monitoramento a distância e com melhor controle sobre a distribuição e
frequência das localizações ao longo do tempo, assim fornecendo através da
amostra de localizações uma medida da proporção de utilização dos diferentes

326
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

tipos de hábitats por parte dos indivíduos monitorados. No entanto, para que
possam ser consideradas como uma amostra representativa da proporção de
tempo que os indivíduos estudados passam em cada tipo de hábitat, dóis
aspectos das localizações são fundam entais: sua acurácia e independência
(White & Garrott 1986; Millspaugh et al. 1998). As localizações devem ser
obtidas com acurácia suficiente para garantir o seu correto posicionamento
dentro dos diferentes tipos de hábitat estipulados para a análise de uso pelos
animais, sendo aconselhável o uso do sistema de telemetria por GPS em estu­
dos com alto grau de detalhamento de hábitat (Moen et al. 1996). Já a indepen­
dência entre localizações consecutivas, tema recorrente neste capítulo, deve
ser observada para evitar que a proporção de utilização observada de determi­
nado hábitat seja uma amostra viciada por conta do processo amostrai, quando
deveria ser uma função da sua real seleção por parte dos indivíduos monitora­
dos (Millspaugh et al. 1998).

Como contraponto a esta medida de utilização, temos a medida de disponibi­


lidade desses diferentes tipos de hábitats, normalmente determinada através
do mapeamento e medição da área de cada tipo de hábitat, passível de ser
utilizada pelos animais monitorados. Com o surgimento de programas de com­
putador voltados para o geoprocessamento, esta tarefa tem se tornado cada vez
mais fácil e acurada, ainda que dependente da existência de bases cartográficas
apropriadas e devidamente digitalizadas para a área de estudo (White & Garrott
1990). Na ausência de mapas de hábitat, uma forma alternativa foi proposta
por Marcum & Loftsgaarden (1980), utilizando pontos escolhidos aleatória-"
mente na área de estudo. Através do cálculo da proporção de pontos encontra­
dos em cada tipo de hábitat, podem-se estimar as áreas correspondentes a cada
um desses tipos. No entanto, por serem estimativas, tais valores de disponibi­
lidade de hábitat possuem valores de erro associado, que devem ser incluídos
nas análises de seleção de hábitat (White & Garrott 1990). Esta aparente simpli­
cidade na determinação de disponibilidáde de' hábitat esconde ainda um grave
problema: a diferença entre a percepção do pesquisador e do animal quanto ao
que realmente se encontra disponível para utilização. Um trecho de hábitat apa­
rentemente adequado para a espécie pode conter características impróprias que
passem despercebidas pelo pesquisador, que incluirá tal trecho entre as áreas de
hábitat disponíveis. Embora possa causar danos à qualidade da análise, essa
questão ainda carece de uma solução prática, limitando-se ao grau de conheci­
mento do pesquisador sobre a biologia da espécie e da avaliação, durante o
trabalho de pesquisa, de áreas cujo grau de utilização contradiga aquela observa­
da em outros trechos de hábitat semelhante (Johnson 1980).

327
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Samuel & Fuller (1994) alertam ainda para a necessidade de cuidado com as
diferenças na abordagem'de um estudo deste tipo, fruto da natureza hierárqui­
ca do conceito de seleção de hábitat. Diferentes abordagens exigirão diferentes
delineamentos de pesquisa, unidades experimentais e procedimentos de aná­
lise, consequentemente resultando em diferentes tipos de informações adqui­
ridas. Por exemplo, a ênfase de um estudo de seleção de hábitat pode ser aó
nível individual, analisando como cada indivíduo estudado utiliza os recur­
sos a sua disposição dentro de suas áreas de uso já estabelecidas (Thomas &
Taylor 1990); ou ao nível populacional, avaliando ao longo de uma área de
estudo os componentes de hábitat mais determinantes na seleção e estabeleci­
mento de tais áreas de uso (Johnson 1980).

Uma vez que as medidas das proporções de disponibilidade e de utilização


tenham sido determinadas ou estimadas, a presença de seleção dentre os tipos
de hábitat pode ser testada. O método mais utilizado para a análise comparati­
va entre as proporções de utilização/disponibilidade de hábitat ainda é o teste
do qui-quadrado (c2), proposto inicialm ente por Neu et al. (1974) e melhor
elaborado por Byers et al. (1984). No método de Neu, a hipótese nula de
utilização, proporcional à disponibilidade pode ser testada em dois níveis,
com os tipos de hábitat sendo considerados em conjunto (H01) e separada­
mente (H02). No primeiro nível, a seleção de hábitat é verificada através de um
simples teste c 2 de qualidade de ajustamento (“goodness-of fit”) da distribui­
ção de localizações observada na amostra para aquela que seria esperada em
uma amostra de igual tamanho, tomada aleatoriamente na mesma área de estu­
do. Uma vez que os valores de c 2 encontrados sejam significativos, rejeitando
H01 e indicando a presença de seleção de hábitat, pode-se identificar quais
hábitats foram significativam ente selecionados através do teste da hipótese
nula H0 2 . Nesse teste, intervalos de confiança são calculados simultaneamen­
te para as proporções de utilização de cada um dos tipos de hábitat e posteri­
ormente comparados com suas respectivas proporções de disponibilidade. Para
aqueles hábitats cuja proporção de disponibilidade seja inferior ao limite mí­
nimo do seu intervalo de confiança de utilização, a H02 será rejeitada, indi­
cando que esse hábitat está sendo selecionado (Byers eí al. 1984; Cherry 1996).
Neste ponto, é importante evitar a confusão entre a ausência de seleção e o ato
de se evitar um tipo de hábitat, também conhecido como seleção negativa.
Como as medidas de utilização e de disponibilidade em cada hábitat são pro­
porções do total observado na área de estudo, somando ao valor de 1 através
de todos os tipos de hábitat, a seleção positiva de um ou mais tipos de hábitat
será sempre em detrim ento dos demais, que apresentarão uma utilização

328
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

desproporcionalmente menor do que sua disponibilidade. No entanto, isso


não significa necessariamente que tais tipos de hábitat estejam sendo ativa­
mente evitados e nem que suas utilizações, embora em pequenas proporções,
não tenham im portância para a sobrevivência e reprodução dos indivíduos
monitorados (White & Garrott 1990).

O método de Neu tem como vantagem, a sua simplicidade de cálculo e a possi­


bilidade de escolha entre a análise da amostra de localizações para cada indiví­
duo separadamente, a partir de onde conclusões podem ser tiradas sobre pa­
drões de seleção de hábitat para a população, ou através do agrupamento dos
dados de utilização dos indivíduos monitorados em uma única amostra que
represente a população estudada, como forma de se obter amostras maiores e,
consequentemente, maior poder de teste. No entanto, Garshelis (2 0 0 0 ) lembra
que tal agrupamento pode causar dois problemas: a violação da premissa de
independência entre as localizações, já que os indivíduos de uma amostra
agrupada podem influenciar mutuamente suas localizações através de respos­
tas comportamentais à proximidade de outros indivíduos da mesma espécie; e
a perda de perspectiva no que se refere à variabilidade na utilização de hábitats
entre os indivíduos da amostra, podendo até mesmo levar a uma conclusão
errônea de ausência de seleção em casos em que houver indivíduos com pa­
drões opostos de seleção de hábitat. Dessa forma, tal recurso de agrupamento
é recomendável apenas em última instância, quando o número de localizações
por indivíduo for muito reduzido para permitir uma análise individual confiá­
vel (< 10 localizações/indivíduo; Leban 1999).

Outros métodos foram propostos para a análise de dados de radiotelemetria


para seleção de hábitat, dentre os quais convém destacar brevemente os méto­
dos de Friedman (1937), de Johnson (1980) e o de Análise Composicional
(Aebischer et al. 1993). No método de Friedman (1937), as diferenças entre as
porcentagens de utilização e de disponibilidade de cada tipo de hábitat são
calculadas para cada animal monitorado, e tais diferenças são ordenadas em
categorias (“rankings”) de maior utilização. Para cada tipo de hábitat, a soma
das categorias obtidas através dos indivíduos é calculada, com os maiores
valores indicando os hábitats mais frequentemente selecionados. A consistên­
cia da ordem de categorias obtida pode então ser testada contra a hipótese nula
de que os valores são os mesmos para todos os tipos de hábitat (Conover 1980;
White & Garrott 1990). Já no método de Johnson (1980), a ordenação em cate­
gorias é feita, para cada indivíduo, diretamente e de forma separada sobre as
proporções de utilização e de disponibilidade de hábitat. As diferenças entre

329
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

as categorias de utilização e de disponibilidade para cada tipo de hábitat são


então calculadas e suas médias através dos indivíduos monitorados são deter­
minadas, produzindo uma estimativa de como os tipos de-hábitat estão sendo
selecionados pela população (Alldredge et al. 1998). Este método tem como
principal vantagem a expressão das proporções de disponibilidade de hábitat
na forma simplificada de categorias, sendo apropriado para situações ém que
seus valores exatos não possam ser determinados. Por fim, o método de Aná­
lise Composicional (Aebischer et al., 1993) segue a mesma linha de raciocínio
do método de Johnson (1980), diferindo na forma de ordenamento das catego­
rias. Na qnálise composicional, todas as proporções de utilização e de dispo­
nibilidade são tornadas independentes através de uma transformação por ra­
zão logarítmica (“log-ratio”), de forma que a estimativa de seleção positiva de
determinados hábitats não mais implique a seleção negativa dos demais (All­
dredge et al. 1998; Leban 1999). Embora seja um método relativamente novo e
conte com o entusiasmo de vários pesquisadores, Aebischer et al. (1993) ad­
mitem que a análise composicional ainda carece de desenvolvimento e não
representa ainda a forma definitiva para análise de seleção de hábitat para
populações silvestres.

Atualmente, a miríade de métodos e desenhos experimentais para esse tipo de


análise permite a utilização da técnica de radiotelemetria em diversas situações
de pesquisa, mas ao mesmo tempo causa diversos questionamentos quanto ao
método de análise mais apropriado (Alldredge et al. 1986; White & Garrott
1990; Manly 1993). No entanto, talvez mais importante que a avaliação do
melhor método seja a mudança de foco nos estudos de seleção de hábitat,
incorporando aspectos demográficos (tais como densidade, sobrevivência e
reprodução) que possam ser correlacionados aos padrões observados de sele­
ção, de forma a verificar a real importância e adequação dos diferentes tipos de
hábitat para a população estudada (Garshelis 2000).

Radiotelemetria scomo suporte a estudos demográficos


A técnica de radiotelemetria pode também ser utilizada em estudos demográfi­
cos, tais como estimativas de densidade populacional e de taxas de sobrevi­
vência. Embora algumas destas análises tenham como base metodologias já
conhecidas (transectos lineares, anilhamento, etc.) e não necessitem obrigato­
riamente da marcação da população estudada com radiotransmissores, a radi­
otelemetria pode oferecer um valioso suporte na validação de premissas e no
desenvolvimento de fatores de correção destes métodos (Samuel & Fuller 1994).

330
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Metodologias de estimativa populacional, íais como captura-marcação-recap-


tura e amostragem de distâncias, podem beneficiar-se da presença 4 e indiví­
duos marcados com radiotransmissores na população estudada. No primeiro
caso, a utilização da radiotelemetria oferece ao pesquisador maior controle
sobre o número de indivíduos marcados que ainda se encontram na popula­
ção antes de cada período de recaptura, permitindo a utilização de modelos
mais precisos de estimativa de abundância para populações fechadas (Otis et
al. 1978; White et al. 1982). No" caso de estimativas populacionais por amos­
tragem de distâncias, a presença de animais com radiotransmissores na popu­
lação possibilita ao pesquisador verificar o cumprimento de duas premissas
importantes da metodologia, a de que animais diretamente sobre a linha do
transecto são sempre vistos e de que os animais não são afugentados pela
passagem do pesquisador antes de serem notados por ele (White & Garrott
1990).

O uso da radiotelemetria para estimativas de sobrevivência traz algumas vanta­


gens em relação a técnicas mais tradicionais, como marcação ou anilhamento,
que se baseiam na proporção de animais marcados que são recapturados ou
observados (Bunck 1987; Samuel & Fuller 1994). Nessas técnicas, os eventos
de óbito raramente são confirmados, o que torna incerto o destino dos indiví­
duos cujos marcadores não são recuperados. Além da possibilidade de ter
efetivamente vindo a óbito, tais indivíduos podem ter emigrado, se desvenci­
lhado do marcador ou simplesmente não ter sido recapturados (Nelson et al.
1980; White 1983). Já com a radiotelemetria, graças a mecanismos como o
sensor de mortalidade, é possível a confirmação de eventos de óbito por meio
da localização das carcaças. Com isso, a cada intervalo de monitoramento o
pesquisador tem o número de animais marcados ainda vivos, salvo casos ex­
cepcionais de falha no radiotransmissor. Adicionalmente, ao propiciar o mo­
nitoramento da população em intervalos mâis curtos de tempo (até mesmo
diários), a radiotelemetria permite tanto a construção de curvas de sobrevivên­
cia (Lee 1980; Cox & Oakes 1984), que melhor avaliam a variação na sobrevi­
vência da população ao longo do período de estudo, como também a localiza­
ção das carcaças em tempo hábil de colher informações referentes às causas de
mortalidade. Assim, a radiotelemetria proporciona não apenas estimativas mais
robustas de taxas gerais de sobrevivência, como também possibilita a análise
N
comparativa de taxas encontradas entre categorias distintas de sexo e idade,
entre populações diferentes ou mesmo entre causas de mortalidade específi­
cas (predação, caça etc; Heisey & Fuller 1985). No entanto, os benefícios
advindos do uso da radiotelem etria na estim ativa de taxas de sobrevivência

331
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

encontram-se ainda distantes da realidade da maioria dos projetos realizados


na América do Sul. O custo envolvido apenas na aquisição do número de
radiotransmissores recomendado para compor amostras representativas da po­
pulação a ser estudada (n > 30; White & Garrott 1990} está, via de regra, muito
acima do padrão orçamentário médio latino-americano, o que infelizmente vem
inviabilizando sua utilização atualmente!

Conclusões
Apesar das várias décadas desde o início de sua utilização no estudo de popu­
lações de animais silvestres, a radiotelemetria encontra-se em plena evolução
técnica e metodológica. Na medida que o avanço tecnológico amplia suas fron­
teiras, novas aplicações para a radiotelemetria vão sendo desenvolvidas, en­
globando aspectos fisiológicos, ecológicos e comportamentais dos animais sil­
vestres, e com isso contribuindo para um melhor entendimento de seus pa­
drões naturais. Com o advento dos sistemas de informações geográficas (SIG)
e a incorporação de dados de localizações de animais em seu arcabouço, novas
portas se abrem para essa metodologia, alcançado novos níveis de análise e
interpretação de dados (Hooge & Eichenlaub 2000). Não obstante a isto, muito
ainda há para ser desenvolvido, principalmente no que se refere a como tratar
da enorme gama de informações que podem ser obtidas com esta técnica. White
& Garrott (1990) destacam a necessidade do desenvolvimento integrado de
pacotes estatísticos para análise de dados de radiotelemetria que englobem
todos os seus aspectos, desde triangulações e estimativas de erro nas localiza­
ções até análises mais complexas, como estimativas de área de uso e de utiliza­
ção de hábitat, entre outros.

O potencial de utilização da radiotelemetria em regiões neotropicais é imenso


e ainda pouco explorado. No caso do Brasil, pode-se dizer que apenas na
última década a radiotelemetria efetivamente figura como uma metodologia à
disposição de nossos pesquisadores, e muitas dúvidas ainda persistem quan­
to à aplicabilidade de equipamentos e modelos estatísticos, originalmente de­
senvolvidos para regiões mais temperadas, à nossa realidade. Recomenda-se
fortemente a pesquisadores que considerem a utilização desta técnica, mas que
procurem abordar o maior número possível de questões em seus estudos,
envolvendo diversas áreas do conhecimento e consequentemente vários pes­
quisadores associados, de forma a somar esforços e aumentar o volume de
discussões a respeito dessa metodologia. Assim, caminhar-se-á mais rapida­
mente na direção de ter em mãõs uma ferramenta eficiente e capaz de ser adaptada
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

para responder a diversos questionamentos sobre as populações de animais


silvestres, mas sem incorrer no risco de enxergar a radiotelemetria em si como
resposta.

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W hite, G. C. & Garrott, R. A. 1990. Analysis of wildlife radio-tracking data. Academic


Press, San Diego, USA.

White, G. C.; Anderson, D. R.; Burnham, K. P. & Otis, D. L. 1982. Capture-recapture and
removal methods for sampling closed populations. Los Alamos National Lab, Los Alamos,
New M exico, USA.

Worton, B. J. 1987. A review of models of home range for animal movement. Ecological
M odelling, 38:277-298.

Worton, B. J. 1989. Kernel methods for estimating the utilization distribution in home-range
studies. Ecology 70:164-168.

Worton, B. J. 1995. Using Monte Carlo sim ulation to evaluate kernel based home range
estimators. Journal of Wildlife Management 59:794-800.

338
RA D IO TELEM ETR IA EM EST U D O S POPULACIONAIS

Anexo I

Forn eced ores de equipam entos para radiotelem etria. Lista atualizada periodi­
cam en te por Robert Diehl & Ronald Larkin, do Illinois N atural H istory Survey,
e d isp on ível em h ttp ://n h sb ig .in h s.u iu c.e d u

A d van ced Telem etry Systems, Inc. Bytel Com m unications, Ltd. ( S o l u ç õ e s p a r a
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Fax: + 1 6 1 2 4 4 4 9 3 8 4 T el/ F ax: + 4 4 1 2 4 2 6 7 8 5 9 1
e -m a il :7 0 7 4 3 . 5 1 2 @ c o m p u s e r v e .c o m h t t p :/ / w w w .b y t e l.d e m o n .c o .u k
h t tp :/ / w w w .a t s t r a c k .c o in
D ata Sciences International, Inc.
AF Electronics, Inc. ( A n t e n a s ) ( T e le m e t r ia f i s i o ló g ic a )
R R # 1, Box 82 4 2 1 1 L e x i n g t o n A v e n u e N o r th
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T e l: + 1 6 5 1 4 8 1 7 4 0 0
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Fax: + 1 5 3 0 3 4 6 6 3 0 6 h ttp :/ / w w w .te lu s p la n e t.n e t/ p u b lic / g ts d m t/
e - m a il: b c k e r m e e n @ a v m i n s t r u m e n t . c o m
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9 D e v o n P la c e
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F ax : + 1 5 6 1 3 9 4 0 3 1 5 1 1 2 Jo h n C av an ag h R oad
e -m a il: b i o t r a n @ i x . n e t c o m . c o m C a r p , O n t a r io - C a n a d a
KOA 1L 0
Biotrack Ltd. T e l: + 1 6 1 3 8 3 9 0 6 7 6
52 F u rzeb ro o k R d . Fax: + 1 6 1 3 8 3 9 0 6 7 5
W a reh a m e m a il: in fo @ h o lo h il.c o m
D o rs e t B H 2 0 5 A X , U K h tt p :/ / w w w .h o lo h il.c o m
T el: + 4 4 1 9 2 9 5 5 2 9 9 2
F ax : + 4 4 1 9 2 9 5 5 4 9 4 8
e -m a il: b r i a n @ b i o t r a c k . c o . u k ,
s e a n @ b io tr a c k .c o .u k
h t tp :/ / w w w .b io tr a c k .c o .u k

3 3 9
ANAEL AYMORÉ JACOB
RUDY RUDRAN

Lotek Engineering, Inc. North Star Science and Technology, LLC


115 Pony Drive (Telemetria por satélite)
Newmarket, Ontario Technology Center Bldg.
L3Y 7B5 - Canada 1450 S. Rolling Rd.
Tel: +1 905 836 6680 Rm 4.036
Fax: +1 905 836 6455 Baltimore, MD 21227 - USA
e-mail: telem etry@ lotek.com Tel: + 1 410 961 6692
http://www.lotek.com Fax: +1 410-772-5985
http://www.northstarst.com
Magenta Products, Ltd.
Knighton Hill Service Argos (Telemetria por satélite)
Wembury 1801 McCormick Dr.. Suite 10
Plymouth, UK Landover, Maryland, USA 20785
. Tel: + 4 4 1752 862731 Tel: + 1 301 925 4411
Fax: + 4 4 1752 862066 Fax: +1 301 925 8995
http://www.magenta-products.co.uk e-mail: jw @argosinc.com
http://www.argosinc.com
M arinar Radar Ltd. (Transmissores por
satélite) S irtrack Limited
Bridleway, Campsheath, Lowestoft, Private Bag 1403
Suffolk NR32 5DN, UK Goddard Lane
Tel: + 4 4 502 567195 Havelock North 4201
F ix: + 4 4 502 567195 New Zealand
e-mail: w ardd@landcare.cri.nz
Merlin Systems, Inc. http://goddess.hb.landcare.cri.nz/sirtrack/
445 W U stick Rd sirtrack.htm l
Meridian, ID 83642 - USA
Tel: + 1 208 884 3308 Smith-Root, Inc. (Radiotelemetria aquática)
Fax: +1 208 888 9528 14014 Northeast Salm on Cr. Ave.
e-mail: m erlin@cyberhighway.net Vancouver, Washington, USA 98686
Tel: + 1 206 573 0202
M ini-mitter Co., Inc. Fax: +1 503 286 1931
(Telemetria fisiológica)
P.O. Box 3385 Telemetry Solutions
Sunriver, OR 97707 - USA 1130 Burnett Ave., Suite J
Tel: + 1 503 593 8639 Concord, CA 94520 - USA
Fax: +1 503 593 5604 Tel: +1 925 798 2373
e-m ail: rrushm m tr@ aol.com Fax: +1 925 798 2375
http://fairway.ecn.purdue.edu/~ieeeembs/ em ail: qkerm een@telem etrysolutions.com
companies/minimitter.html http://www.telemetrysolutions.com

’ Nature Conservation Bureau Ltd Telemetry Systems, Inc.


36 Kingfisher Court P.O. Box 187
Hambridge Road Mequon, W isconsin 53092 - USA
Newbury RG14 5SJ, UK Tel: +1 414 241 8335
Tel: + 44 1635 550380
Fax: + 44 1635 550230 Televilt International AB
e-mail: 100347.1526@ com p u serve.com Box 53
S-711 22 Lindesberg
Sw eden i
Tel : + 46 581 17195
Fax : + 4 6 581 17196
email: per-arne.lem nell@televilt.se
http://www.televilt.se

3 4 0 '
RADIOTELEMETRIA EM ESTUDOS POPULACIONAIS

Telonics, Inc.
932 Impala Ave.
Mesa, Arizona, 85204-6699 - USA
Tel: +1 602 892 4444
Fax: +1 602 892 9139
e-mail: info@ telonics.com
http://www.telonics.com

Titley Electronics Pty Ltd


P.O. Box 19
Ballina, NSW 2478
Australia
Tel: + 61 2 66 811 017
Fax: + 61 2 66 866 617
email: titley@ nor.com .au
http://www.titley.com.au

Toyocom (Telemetria por satélite)


20-4, N ishi-Shim bashi 3-chome,
Minato-ku,Tokyo 105
Japan
Tel: +3 3459 7320
Fax: + 3 3436 1434

Vemco (Marcadores ultrassônicos para


animais aquáticos)
3895 Shad Bay
RR#4
Armdale, Nova Scotia
Canada B3L 4J4
Tel: +1 902 852 3047
Fax: +1 902 852 4000
e-mail: vem co@ fox.n stn.cà

Wildlife M aterials, Inc.


Route 1, Box 427A
Carbondale, Illinois 62901, USA
'Tel: +1 618 549 6330, 618 549 2242
Fax: +1 618 457 3340
e-mail: w m i@ m idw est.net
http ://www. wildlifem aterials .com

341
Anexo II
Lista de programas de computador para análises de dados de radiotelemetria.

Sites p/ download, ou contato para compra de


Nome Tipos de análises
direitos de utilização

Calhome E stim a tiv a s de área de uso http ://nhsbig. inhs.uiuc.edu/wes/home_range.html


(M ínim o P olíg o n o C on vexo,
Elipse, Média Harmônica, Kernel
Adaptativo).

Home E stim a tiv a s de á re a de uso http ://www. ets.uidaho.edu/fishwild/homerange.htn


Range (M ín im o P olígono C on vexo,
E lip s e , M éd ia H arm ô n ica,
Fourier).

Home Estimativas de área de uso por http://nhsbig.inhs.uiuc.edu/wes/home_range.html


Ranger kernel fixo e adaptativo. ,

Ranges Estimativas de área de uso, utili­ http ://www. anatrack. com


zação de hábitat e interações
territoriais.

Tracker Estimativas de área de uso (Mí­ http://www.unisb.de/philfak/fb6/fr66/tpw/telem/


nimo Polígono Convexo, Elipse, software/tracker.hlm
M édia H arm ô n ica, K ernel
Adaptativo).

MagVar Cálculo de declinação magnética. http://www.pangolin.co.nz/free_stuff.html

Animal Extensão de análise de dados de http://www.absc.usgs.gov/glba/gistools


M ovem ent radiotelemetria para ArcView 3.2
Analysis

Ecology S oftw a res para estim ativas de http://www.ecostats.com


Softw are área de uso e de utilização de
Solu tions hábitat, integrados a SIG

Prefer Estim ativas de seleção de há­ http ://www. npwrc.usgs.gov/resource/tools/software


bitat pelo método de Johnson prefer/prefer.htm
(1980)

Surviv E stim a tiv a s de ta x a s de http://www.mbr-pwrc.usgs.gov/software/


sobrevivência

342
13 Metodologias moleculares
utilizadas em genética da conservação
Beatriz M. Perez-Sweeney
Universidade da Columbia, Nova York, USA

Fernando P. Rodrigues
Instituto de Biociências, USP

Don }. Melnick
Universidade da Columbia, Nova York, USA

Introdução
A Biologia da Conservação, desenvolvida em resposta à çrise pela qual a biodi­
versidade passa atualmente, utiliza um grande número de disciplinas das áre­
as de ciências naturais e sociais. Entre elas, duas subdisciplinas da genética, a
sistemática baseada em dados moleculares e a genética de populações, foram
organizadas em uma nova área de investigação científica aplicada, conhecida
cotno Genética da Conservação. Este capítulo tem como objetivo discutir o
valor dos estudos genéticos para as ações de conservação, fornecer algumas
instruções sobre como proceder a coleta e o armazenamento de amostras e
descrever resumidamente algumas das metodologias laboratoriais e analíticas
mais utilizadas pela Genética da Conservação.

Propósito e função da genética da conservação


O papel da genética na conservação das plantas e dos animais é muito diverso,
e as pessoas que trabalham com conservação não o limitam apenas à identifica­
ção e mitigação das consequências da endogamia e da exogamia. Em combina­
ção com outras disciplinas, como a ecologia e a biologia de populações, a
genética está se tornando uma ferramenta importante na determinação de o
que conservar (sistemática molecular), on d e focalizar os esforços de conserva­
ção (filogeografia) e com o conservar a maior quantidade de diversidade genéti­
ca nas populações com o objetivo de manter o potencial evolutivo de uma
espécie ou população (genética de populações).

343
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELNICK

O que conservar?
Os dados genéticos podem ser usados de forma com plem entar àqueles da
biologia reprodutiva, ecologia e morfologia, num esforço conjunto para de­
finir as unidades (como espécies ou subespécies) que serão o alvo da con­
servação. Para evitar uma discussão prolongada sobre as definições de es­
pécies, este capítulo focaliza-se em unidades evolutivam ente significativas
(UES) [“evolu tionarily significant units - ESU”]. O conceito de unidades evo­
lutivamente significativas (Ryder 1986, Moritz 1994) foi introduzido para defi­
nir populações parcialmente diferenciadas geneticamente, justificando assim
o seu manejo como linhagens evolutivas separadas. Diferentes critérios, todos
relacionados à sistemática molecular e usando derivações do conceito de espé­
cies filogenéticas, têm sido empregados para identificar UES (Cracraft 1983,
Avise & Bali 1990, Vogler & DeSalle 1992, Davis & Nixon 1992, Moritz 1994,
Avise 1996). Um exemplo da sua utilização pode ser encontrado no trabalho
de Eizirik et al. (1998), no qual a análise filogenética do DNA mitocondrial
revelou que, para. fins de manejo populacional, o gato-maracajá (Leopardus
wiedii) pode ser dividido em três UESs diferentes, ao contrário das onze su­
bespécies consideradas anteriormente. Muitos outros exemplos do uso da sis­
temática molecular para a definição das UESs podem ser encontrados na litera­
tura, entre eles o da tartaruga marinha de Ridley Kemp, L ep id och ely s olivacea,
(Bowen & Avise 1995), do lêmur E u lem u r fu lv u s (Wyner et al. 1999) e do
rinoceronte asiático, D icerorhin u s su m atren sis (Morales et al. 1997). Em al­
guns casos a pesquisa genética usada para definir UESs pode conduzir à des­
coberta de hibridização entre subespécies ou espécies, como no caso do puma
da Flórida, Pum a co n color coryi (O Brien & Mayr 1991).

Onde focalizar os esforços de conservação: história evolutiva e


áreas de diversidade genética e endemismo
O manejo conservatíionista, com frequência, necessita de informações sobre
quais áreas são importantes para a conservação e, no caso de áreas fragmenta­
das devido à destruição ambiental, para quais delas a conectividade deve ser
restabelecida. Nesses casos, as inform ações'genéticas na forma de filogenias
(uso da sistemática para reconstruir as relações evolutivas entre organismos)
ou genealogias de gene (uso da sistemática molecular ou outro método para
revelar relações entre indivíduos ou populações), associadas à análise de bio-
geografia (denominada assim de filogeografia), podem contribuir significativa­
mente para o planejamento da conservação, revelando rompimentos históri­
cos entre as populações e espécies, ou ainda áreas com alta diversidade gené­

344
■ METODOLOGIAS MOLECULARES
UTILIZADAS EM GENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

tica e endemismo. Rompimentos históricos foram encontrados, por exemplo,


no caso de felinos neotropicais (Eizirik et al. 1998, Eizirik et al. 2001). Neste
caso, o gato-maracajá (L eop ard u s w iiedi), a jaguatirica (L. p ard alis) e a onça-
pintada (P anthera on ca) apresentam divisões filogeográficas similares prova­
velmente causadas pelas mesmas barreiras, favorecendo assim a estratégia de
conservação sugerida para estes felinos, baseada nos. grandes biomas por eles
ocupados. Exemplos do uso da análise genética para a detecção de áreas com
alta diversidade genética e endemismo podem ser encontrados em Avise (1996),
e um exemplo da descontinuidade de hábitats pode ser encontrada no traba­
lho de Templeton & Giorgiadis (1996).

Como conservar as populações mantendo o seu potencial evolutivo


Não há nenhuma fórmula prescrita de como aplicar a genética a programas
conservacionistas. As metas de conservação em longo prazo são evitar a endo-
gamia em espécies que não são naturalmente endogâmicas e permitir a elas
manter o maior potencial evolutivo possível (ou seja, manter sua alta diversi­
dade genética), independente de sua fragmentação atual. Podemos fazer isso
realizando a análise genética das populações, incluindo a identificação da sua
estrutura genética e dos fatores que a afetam, como tamanho efetivo da popula­
ção, fluxo gênicó e sistemas de acasalamento.

A avaliação da estrutura genética populacional inclui medidas de endogamia,


diversidade e diferenciação. Essas medidas fornecem um retrato genético das
populações, além de algumas das informações mais importantes utilizadas para
o seu manejo, v

Os níveis de endogamia e de diversidade genética estão diretamente relaciona­


dos. Se a endogamia é alta, a heterozigosidade será baixa, e vice-versa. A mini-
mização da endogamia é uma meta válida, porque as mudanças evolutivas
estão diretamente relacionadas à quantidade de variação genética existente em
uma espécie ou população (ver o Teorema Fundamental da Seleção Natural;
Fisher 1930). Se não existir variação, a evolução se dará de forma mais lenta,
pois só poderá ocorrer com o surgimento de novas mutações (Hartl & Clark
1989). A endogamia também deve ser evitada para prevenir um aumento na
população de indivíduos homozigotos para genes recessivos deletérios ou le­
tais, o que poderia levar a população a sofrer os efeitos de um fenômeno co­
nhecido como depressão endogâmica. Embora não haja nenhuma prova de
que qualquer população natural tenha sido extinta como consequência direta
apenas da depressão por endogamia, o seu efeito negativo sobre o vigor das
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
\ DON J. MELNICK

populações é fartamente documentado na literatura (Eldridge et al. 1998; Mitton


& Grant 1984; Allendorf & Leary 1986).

A determinação do grau de diferenciação entre as populações é necessária por


várias razões, particularmente se translocações são contempladas dentro de
um programa de manejo. A primeira razão seria evitar a ocorrência de depres­
são por exogamia (diminuição do vigor da população). Uma população em um
tipo diferente de hábitat ou uma que ficou isolada durante algum tempo pode
ter desenvolvido certos complexos gênicos coadaptados (genes que interagem
de uma maneira vantajosa) ou genes que sejam localmente benéficos. O acasa­
lamento entre os indivíduos dessas diferentes populações pode resultar no
nascimento de indivíduos com um conjunto gênico desvantajoso, reduzindo
assim a sua viabilidade e lev.ando a população a sofrer os efeitos da depressão
exogâmica. Exemplos da ocorrência de depjessão exogâmica podem ser en­
contrados em primatas (de Boer 1982) e em lagartos (Templeton 1994). A se­
gunda razão seria evitar que, durante o manejo, ocorra redução da diferenciação
genética existente entre elas. O fluxo gênico é um processo evolutivo homoge-
neizador, que minimiza a diferenciação genética entre as populações (Fig. 1 ).

1.0

0.9

0.8

0.7

0.6

Equilíbrio
p 0.5

0.4

0.3

0.2

0.1

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Número de migrantes por geração

Fig u ra 1. E fe ito do flu x o g ê n ico s o b re a d ife re n c ia ç ã o g e n é tic a das


s u b p o p u la ç õ e s , m e d id a a tra v é s do ín d ic e de fix a ç ã o (F ). O fn d ice de fixação
varia em virtude de Nm, que re p re se n ta o núm ero de m ig ran tes entrando em cada
subpopulação por geração (Hartl e Clarck 1989).

346
METODOLOGIAS MOLECULARES
UTILIZADA^ EM GENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

Teoricamente, essa diferenciação genética permite que as “subpopulações” ex­


plorem as suas próprias combinações genéticas adaptativas ou seus comple­
xos gênicos coadaptados. Com várias subpopulações “explorando” esse “am­
biente adaptativo” independentemente, a chance de que uma delas encontre
as melhores combinações genéticas aumenta quando comparada à situação de
panmixia, em que não há nenhuma diferenciação genética entre elas (ver Teo­
ria da Troca de Equilíbrio de Wright 1931). Devemos estar atentos, entretanto,
aos casos em que a diferenciação entre as subpopulações é devida às alterações
genéticas decorrentes da sua fragmentação recente e isolamento em pequenas
populações, o que as tornam mais susceptíveis aos efeitos negativos do peque­
no número de fundadores e da endogamia. Nestes casos, o objetivo do manejo
pode ser a recuperação da variabilidade perdida pela ação dos processos de
endogamia e deriva genética, o que pode ser conseguido através da troca de
indivíduos entre subpopulações com a consequente redução da diferenciação
existente entre elas.

Outros métodos que nos permitem medir o tamanho efetivo de uma população
(número de indivíduos que nela se reproduzem), o fluxo gênico e os sistemas
de acasalamento têm sido desenvolvidos. O conhecimento desses atributos é
particularmente importante caso se queira evitar o rompimento dos processos
demográficos naturais enquanto se manejam as populações.

Alguns avanços têm sido obtidos nas estimativas dos tamanhos efetivo histó­
rico e atual das populações. A determinação do tamanho efetivo histórico da
população nos ajuda a identificar ocorrências passadas de gargalos genéticos
(declínio rápido do tamanho populacional, de longa ou curta duração). E útil
identificarmos se as populações passaram por gargalos genéticos antes da frag­
mentação do hábitat, para assim avaliarmos em que grau a fragmentação devi­
do à ação antrópica está afetando a estrutura genética de uma população. A
obtenção de estimativas do tamanho efetivo histórico de uma população não é
simples, mas testes estatísticos cada vez mais sofisticados estão sendo desen­
volvidos com esse propósito. Por outro lado, a determinação do tamanho efeti-'
vo atual da população através de dados genéticos está se tornando cada vez mais
realista. Esta é uma medida necessária já que o tamanho efetivo da população é
geralmente muito menor do que o tamanho de censo (Crow & Denniston 1988,
Templeton & Read 1994, Gerber & Templeton 1996, Schwartz et al. 1999). Em
populações em que há sobreposição de gerações, por exemplo, o tamanho do
censo pode incluir indivíduos subadultos e idosos, fazendo com que a estima­
tiva populacional seja maior do que o tam anho efetivo da população. As

347
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELNICK

estimativas dos tamanhos efetivos das populações nos ajudam a prever a taxa
de perda de variação genética com o passar do tempo e ainda ajudam na
avaliação da viabilidade presente e futura das populações (Lande 1998).

O conhecimento dos níveis atuais de fluxo gênico é importante, já que essa


informação ajuda os pesquisadores a determinar em que grau a fragmentação
está impedindo a troca genética entre as populações, se é que ela está ocorren­
do. Tradicionalmente, as medidas genéticas de fluxo gênico têm sido estima­
das usando-se os análogos da estatística F de Wright (Wright 1931, 1943 e
1951). Essas medidas requerem, pórém, que as populações sejam genetica­
mente bem diferentes uma das outras, e pode não representar necessariamente
os níveis atuais de fluxo gênico. Outras estimativas, diferentes das baseadas
na estatística F de Wright, vêm sendo desenvolvidas para medir o fluxo gênico
entre populações que não sejam necessariamente diferentes geneticamente uma
das outras.

Aspectos relacionados aos sistemas de acasalamento como, por exemplo, a


ocorrência de poligamia, podem, até certo ponto, ser determinados a partir de
dados genéticos através da avaliação da paternidade e do parentesco entre
indivíduos nas populações. O conhecim ento do sistema de acasalamento é
muito importante para que as práticas de manejo implementadas em um proje­
to de conservação causem a menor perturbação possível na história natural da
espécie manejada.

Em resumo, a avaliação da estrutura genética populacional, do seu tamanho


efetivo, do fluxo gênico e do sistema de acasalamento' pode auxiliar na tomada
de decisões em um programa de manejo, especialmente nos casos relaciona­
dos a uma metapopulação. O manejo de metapopulações envolve, entre outras
medidas, a translocação de indivíduos em uma área fragmentada, e requer
decisões sobre quem deve ser deslocado, para onde mover os indivíduos e
com que frequência fazê-lo, decisões que podem ser orientadas, ao menos em
parte, pela análise dos dados genéticos das populações.

Métodos
O processo de planejamento da pesquisa genética é uma etapa importante, prin­
cipalmente no que se refere ao sistema de amostragem (número de indivíduos e
localidades analisadas) e à escolha do marcador genético a ser utilizado. A dis­
cussão do sistema de amostragem não será contemplada nesté capítulo, mas
informações sobre o tema podem ser obtidas ,em Weir (1996a); Baverstock &
Moritz (1996); e GoodnighJ & Queller (1999).

348
METODOLOGIAS MOLECULARES
UTILIZADAS EM GENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

Diversos marcadores genéticos estão atualmente disponíveis para a análise


dos organismos, cada um deles apresentando características próprias que os
tornam mais adequados à resolução de uma ou outra questão específica em
conservação. Além da adequação analítica de um determinado marcador à
questão que se quer responder, o pesquisador também deve levar em conta
outros aspectos como, por exemplo, o custo por informação gerada, as condi­
ções laboratoriais disponíveis, o tempo necessário para a implantação da téc­
nica e o tempo necessário para obtenção dos resultados. As tabelas 1 e 2 apre­
sentam uma análise comparativa das metodologias moleculares mais utiliza­
das na genética da conservação, e que serão discutidas em mais detalhes ao
longo do texto.

Tabela 1. Características de diferentes metodologias m oleculares usadas para a avaliação


da diversidade genética (modificado de Frankham et al. 2002).

Tempo de
Amostragem Modo de
Método Fonte Custo desenvol­
não invasiva Herança
vimento3

Isoenzimas Proteínas Não Baixo Nenhum Codòminante


Sequenciamento DNA Sim Alto Nenhum Codominante
RFLP DNA Não Médio Pequeno Codominante
RAPD DNA Sim Baixo Pequeno Dominante
Minissatélites DNA Não Médio Pequeno Dominante
Microssatélites DNA Sim , Médiob Considerável Codominante

"Tempo levado para desenvolver a técnica de forma que a genotipagem possa ser feita para
espécies am eaçadas ou ainda não estudadas.
bCusto da operação rotineira. O custo é alto durante sua implementação e desenvolvimento
dos marcadores para novas espécies.

Algumas considerações são necessárias antes de se iniciar a discussão sobre


cada uma das metodologias moleculares disponíveis. A informação genética
pode ser obtida a partir de duas fontes principais: proteínas ou ácidos nuclei-
cos (DNA ou RNA). Esta discussão será concentrada na obtenção de dados
genéticos a partir do DNA, mas uma abordagem semelhante para as proteínas
pode ser encontrada em Dowling et al. (1996).

O tipo de DNA utilizado na análise depende das questões a serem investiga­


das na pesquisa, e as seguintes informações devem ser levadas em considera­
ção para sua escolha:

349
BEATRIZ M. PÉREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELNICK

• Deseja-se lo co s específicos ou dados de todo o genoma?


• Qual é o seu modo de herança?
1 ) é transmitido apenas pela mãe, só pelo pai ou por ambos?
2 ) é transmitido como um genoma haploide ou diploide?
3) é dominante ou codominante?
• Qual é a sua taxa de evolução relativa?
• Ele sofre pressão seletiva? Em que grau?
• Qual o modelo evolutivo de mutação mais provável?

A utilização de marcadores genéticos que são transmitidos por apenas um dos


sexos é muito útil para a sistemática molecular e para a genética de populações,
fornecendo dados sobre a evolução e dispersão dos organismos (Dowling et al.
1996; Hammer & Zegura 1996). Entre estes estão os marcadores localizados no
cromossomo Y (herança paterna), no DNA mitocondrial (herança materna) em
mamíferos e no cloroplasto (herança paterna ou materna em plantas, depen­
dendo da espécie). O DNA mitocondrial (DNA mt), transmitido predominan­
temente por via materna na maioria das espécies, é uma das moléculas mais
utilizadas em estudos filogenéticos e filogeográficos. A ausência de recombina­
ção no DNA mt, associado à sua taxa de evolução mais rápida relativa às se­
quências nucleares, é uma característica atraente para a construção filogenética
e de genealogias gênicas, porque a ancestralidade pode ser recuperada mais
facilmente'quando não há recombinação. Dentro da própria sequência do DNA
mitocondrial existem diferenças com relação às taxas de evolução molecular, e
estas devem ser levadas em consideração durante a elaboração do experimen­
to. No geral, questões populacionais beneficiam -se do uso da região controla­
dora do DNA mt (região “D-loop”, que contém o local da origem de replicação),
enquanto as questões relacionadás à espécie como um todo e sua distribuição e
à sistemática intergenérica, são abordadas de maneira mais apropriada quando
se utilizam genes como o NADH, ribossomais e dos citocromos.

Os marcadores utilizados podem apresentar expressão dominante ou codo­


minante. Os marcadores çodominantes fornecem maior quantidade de infor­
mação genética por loco, já que através deles é possível identificar os genóti-
pos heterozigotos e homozigotos. Marcadores gerados por metodologias como
a análise de m icrossatélites e a eletroforese de proteínas são çodominantes,
enquanto os m inissatélites e RAPDs apresentam expressão dominante. Ain­
da relacionado a essa questão devemos observar o número de ploidia do
genoma estudado. O DNA mitocondrial, por exemplo, é haploide, e por esse
motivo apresenta apenas um alelo por lo c o no indivíduo estudado. Já os

350
T a b e la 2. M é t o d o s d is p o n ív e is p a ra a c a r a c t e r i z a ç ã o g e n é t i c a d e in d iv íd u o s e p o p u la ç õ e s e s u a a p lic a b ilid a d e a q u e s t õ e s d e in t e r e s s e p a ra a
c o n s e r v a ç ã o (m o d ific a d o d e F r a n k h a m e t al. 2 0 0 2 ). •

Aplicação Morfologia Cromossomos Isoenzimas DNA mt RAPD Minissatélites Microssatélites


Questões forenses - - + +++ ++ ■ ++ ++
Tamanho populacional + - - +++ + § +
Estimativa de tamanho • ++a <
- - ++ - § +++
populacional efetivo
História demográfica - - - ++ § +
Detecção e datação ++ + +a ++ +++
de gargalos genéticos - - §
Detecção de ocorrência + + + +++ + ++ +++
de seleção
Migração e fluxo gênico § - ++ +a ++ ++ +++
Identificação individual + ++ + ++ +++
- -•
e rastreamento
Estrutura populacional § - ++ + +§ ++ ++ +++
Filogeografia - - - +++ - - +++
Identificação de populações
fontes para recuperação de +§ - ++ + ++ +++ +++
espécies ameaçadas
Introgressão + + ++ +a ++ ++ +++
Status taxonômico + +++ ++ +++ +++ +++ +++
Locais para reintrodução - - - + + - +++
Populações para reintrodução +§ • ++ '+ ++ +++ +++
Sistemas de acasalamento - - ++ ' + § +++
Paternidade - - + - + +++ +++
Sexagem de aves § +++ - - - § §
Detecção de doenças - - - + +§ ++ ++ +
Dieta - - - +++ ++ ++ ++ .
351

“Capaz de detectar apenas a contribuição da fêmea.


Notação: (+) Técnicas que podem ser utilizadas para o propósito especificado, com a presença de vários sinais indicando maior utilidade; (-)
Técnicas que não são utilizadas naquele contexto; (§) Técnicas úteis apenas em alguns casos.
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELNICK

lo co s nucleares de cromossomos autossômicos, herdados de ambos os pais,


apresentam dois alelos, podendo o indivíduo estudado ser homozigoto ou
heterozigoto dependendo se o mesmo alelo ou alelos diferentes estão presen­
tes naquele loco.

Diferentes lo co s sofrem diferentes pressões de seleção. A maioria dos modelos


analíticos requer genes neutros (genes que sofrem pouca pressão seletiva) e,
portanto, tais genes deveriam ser usados na pesquisa. As ferramentas analíti­
cas também levam em consideração o modelo evolutivo sob o qual acredita-se
que as mutações em um determinado marcador ocorram, sendo o seu conheci­
mento importante para a determinação das estimativas de divergência feitas
durante as análises. Acredita-se, por exemplo, que os microssatélites sigam
um modelo de mutação progressiva (“step-wise mutation model”), enquanto
para outros lo co s nucleares os modelos de alelos infinitos e k-alelos sejam
mais adequados (Shriver et al. 1993; Valdes et al. 1993; Di Rienzo et al. 1994;
Weir 1996b; Graur & Li 1999; Rosenbaum & Deinard 1998).

Por fim, é mais desejável a avaliação de mais de um lo co e mais de um tipo de


DNA (nuclear e mitocondrial, por exemplo) por duas razões. Primeiro porque
os genes sofrem tipos diferentes de pressão seletiva e, portanto, podem seguir
“caminhos evolutivos” distintos, com cada gene acumulando alterações ao longo
do tempo, as quais podem contar a sua própria “história”. Analisando-se so­
mente um loco, o quadro geral da evolução do organismo pode não ficar evi­
dente. Segundo, porque em muitos casos o aumento do número de lo co s usa­
dos em um estudo permite uma análise estatística mais consistente do que
aumentar o número de indivíduos analisados.

Métodos para coleta de dados


Três passos metodológicos básicos são necessários para a pesquisa em genética:
(1) coleta das amostras biológicas, (2) obtenção dos dados laboratoriais e (3)
análise quantitativa dos resultados. Cada um desses três passos tem uma varie­
dade de métodos, sendo a sua escolha dependente dos objetivos da pesquisa
realizada. Serão abordados aqui, de forma mais profunda, apenas os dois pri­
meiros tópicos. As metodologias para análise dos dados são apresentadas de
forma resumida ao final do capítulo, já que seria impossível cobrir de forma
adequada todas as abordagens atualmente disponíveis.

352
METODOLOGIAS MOLECULARES
UTILIZADAS EM GENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

Obtenção das amostras


A obtenção e o armazenamento das amostras que serão utilizadas em um
estudo genético são tópicos muito importantes e que merecem uma atenção
especial por parte da pessoa que irá realizá-los. Serão aqui descritas algumas
maneiras de se fazer isso, mas outras formas estão disponíveis em Auricchio
& Salomão ( 2 0 0 2 ).

A coleta das amostras pode ser feita de maneira invasiva ou não invasiva. Os
métodos invasivos são aqueles utilizados para obtenção de tecidos ou sangue,
para os quais geralmente se requer a captura e contenção dos animais. Os
métodos não invasivos são aqueles nos quais a captura dos animais não é
necessária, utilizando-se como amostras materiais biológicos como fezes, pe­
nas e pelos deixados em seu hábitat. Métodos pouco invasivos também estão
disponíveis, como aqueles em que se coleta pelos (Valderrama et al. 1999), ou
biópsias de pele através do uso de dardos. As amostras obtidas podem ser
armazenadas de várias maneiras, algumas delas específicas para o tipo de ma­
terial e estudo que será realizado. Alguns procedimentos para se armazenar
*-y
diferentes tipos de amostras são descritas a seguir:

Sangue: quando coletado para o estudo de isoenzimas, as amostras sanguíne­


as devem ser coletadas com um anticoagulante e as frações contendo hemáceas
e leucócitos devem ser separadas por centrifugação e misturadas (v/v) a um
tampão (exemplo: citrato tripotássio 0,1 M; KH2P 0 4 0,0345 M; K 2H P 0 4 0,0344
M; 40% glicerol), sendo a seguir congeladas (ver também Melnick et al. 1984).
Quando for utilizado para estudos de DNA, o sangue/também deve ser coleta­
do com anticoagulante, tomando-se cuidado para que este não seja a heparina,
que dificulta a realização de algumas técnicas laboratoriais. Para estudos de
DNA, o sangue pode, ainda, ser colocado em um tubo contendo etanol absoluto
(100 %), sendo em seguida armazenado à temperatura ambiente ou preferencial­
mente ém geladeira até o seu envio para o laboratório onde será processado.

Tecido anim al: ótimos resultados são obtidos para estudos de DNA, armaze­
nando-se os tecidos em etanol absoluto. Os pedaços de tecido devem ser pe­
quenos (biópsias de pele com alguns m ilímetros quadrados geralmente são
suficientes) e devem ficar totalmente mergulhados no álcool. O material assim
armazenado deve ser guardado preferencialmente sob refrigeração ou mantido
à temperatura ambiente até ser enviado ao laboratório. Etanol 70% também
pode ser utilizado, podendo ainda o tecido ser congelado a 2 0 °C. Tecidos
obtidos de espécimes conservados em formol não são adequados para estudos
de DNA, e, portanto, a conservação por este meio não deve ser realizada.

353
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELNICK

Tecido vegetal: pode ser congelado imediatamente (preferencialmente) ou se­


cado a 42°C, tomando-se cuidado especial com a secagem de folhas que sejam
duras (ver Dessauer et al. 1996).

Pelos e penas: em geral são armazenados secos, sendo colocados em envelo­


pes ou sacos plásticos e estocados dentro de algum recipiente contendo algum
dessecante, como sílica. Podem também ser armazenados em etanol absoluto.

Fezes: podem ser armazenadas em um tubo plástico (por exemplo, os tubos de


centrífuga de 50 ml com tampa) ao qual é adicionado etanol absoluto ou um
dessecante como a sílica (separada das fezes por um pedaço de papel ou gaze).
Muitos estudos são conduzidos armazenando-se as fezes na presença de síli­
ca. Entretanto nem sempre esta é a melhor opção para a amostragem em ecos­
sistemas tropicais, já que a umidade ambiental pode fazer com que a quantida­
de de água presente nas fezes esteja acima da capacidade de absorção da sílica,
acarretando assim o desenvolvimento de fungos e a degradação dos ácidos
nucleicos (J. E. Garcia, pers. comm.). A estocagem com etanol, além de conser­
var adequadamente o material genético, traz a vantagem de preservar também
parasitas e alguns hormônios. Mais informações podem ser obtidas em Wasser
et al. (1997), Frantzen et al. (1998) e Palomares et al. (2002).

Apesar de não ser objeto deste capítulo, vale lembrar que para estudos citoge-
néticos é necessária a obtenção de células nucleadas vivas, e por isso as amos­
tras coletadas devem ser armazenadas utilizando-se meios distintos dos aqui
descritos (Duarte et al. 1999).

Obtenção de dados laboratoriais


Como já citado anteriormente, diversas metodologias moleculares estão atual­
mente disponíveis para a análise genética dos organismos, sendo a escolha da
ferramenta a ser utilizada dependente de vários fatores, alguns dos quais são
listados nas tabelas 1 e 2 . A seguir descrevemos de forma um pouco mais deta­
lhada algumas destas metodologias, de forma a facilitar o entendimento dos
mecanismos de detecção, utilização, vantagens e limitações de cada uma delas.

Eletroforese
Todas as metodologias discutidas a seguir possuem em comum a necessidade
de se separar os fragmentos de DNA ou proteínas estudadas, para detecção de
suas diferentes formas ou alelos. Essa separação é obtida através do uso de
uma técnica básica conhecida como eletroforese. A eletroforese permite a sepa­
ração de m oléculas em um meio de suporte, em função das diferenças de

354
METODOLOGIAS MOLECULARES
UTILIZADAS EM GENÉTICA DA CONSERVAÇÁO

tamanho, carga e estrutura das moléculas estudadas. Durante a eletroforese, a


amostra é aplicada em um gel de corrida (os mais comumente utilizados sendo
feitos com agarose, amido ou poliacrilamida) que é, por sua vez, colocado em
uma cuba de eletroforese contendo uma solução tampão e submetido a uma
corrente elétrica. Após algumas horas, o gel é retirado e corado de acordo com
a sua matéria prima e a molécula estudada, permitindo assim a sua visualiza­
ção sob a forma de bandas.

Proteínas (Isoenzimas)
Um método clássico, muito utilizado a partir da década de 60, para avaliação
da diversidade genética em diferentes organismos, é o de eletroforese de prote­
ínas ou isoenzimas (ver Murphy et al. 1996). Isoenzimas são formas alternati­
vas de uma mesma proteína, resultante de sua codificação por mais de um
alelo ou loco. A sua detecção envolve a extração das proteínas do tecido, a
separação dessas proteínas através de eletroforese e a coloração histoquímica
do gel, o que permite a sua visualização na forma de uma banda. Cada uma das
bandas observadas corresponde ao produto de um alelo diferente, e desta for­
ma podemos identificar os genótipos dos indivíduos de uma população. Devi­
do a essa capacidade de revelar os diferentes alelos presentes em um determi­
nado loco e sua combinação na formação de indivíduos homozigotos ou hete-
rozigotos, dizemos que a eletroforese de proteínas fornece marcadores do tipo
codominante. Além da vantagem proporcionada por esse fato, essa é uma téc­
nica com uma boa relação custo-benefício, pois requer equipamentos relativa­
mente baratos, geralmente comuns nos laboratórios de genética.

Apesar das vantagens listadas acima, o uso de marcadores isoenzimáticos apre­


senta algumas limitações. Entre os fatores que limitam o seu uso estão o baixo
nível de polimorfismo encontrado e a ocorrência de diferenças na expressão
ou atividade enzimática da proteína, que podem dificultar sua detecção e gerar
a necessidade de uma quantidade significativa de material para a análise. A
eletroforese de proteínas geralmente é realizada utilizando-se proteínas extraí­
das do sangue, órgãos internos e tecido muscular dos animais e de folhas e
pontas de raízes das plantas. Consequentemente, os animais precisam ser cap­
turados para a obtenção de amostras sanguíneas ou sacrificados para a obten­
ção de amostras de tecidos, o que torna a técnica indesejável (Frankham et al.
2002 ). Além disso, as amostras coletadas no campo precisam ser congeladas
rapidamente para que a atividade da enzima não seja perdida, dificultando a
caracterização das suas variantes (Dessauer et al. 1996).

355
BEATRIZ M. PEREZ-SWEENEY
FERNANDO P. RODRIGUES
DON J. MELN1CK

DNA

Manuseio das Amostras


Um certo cuidado é necessário ao se trabalhar com as amostras que serão
utilizadas em um estudo de DNA. Cuidados devem ser tomados durante a
obtenção e o processam ento das amostras, durante a extração de DNA da
fonte e durante a execução da reação de PCR (descrita adiante), diminuindo
assim a possibilidade de contam inação das amostras por DNA estranho ou a
sua degradação.

Extração do DNA
A extração do DNA pode ser feita a partir de uma variedade de materiais,
incluindo pelos (Allen et al. 1998; Vigilant et al. 1989; Walsh et al. 1991),
peles de espécim es mantidos em museus (Herman & Hummel 1994), fezes
(Boom et al. 1990; Constable et al. 1995; Kohn & Wayne 1997; Flagstad et al.
1999; Wasser et al. 1997), sangue (Ausubel et al. 1992), tecidos (Ausubel et al.
1992), osso e penas (Herman & Hummel 1994) e até mesmo unhas e urina
(Boom et al. 1990; Veloso et al. 2000). A extração de DNA dessa variedade de
fontes pode ser realizada por meio de métodos tradicionais, como os protoco­
los baseados no uso de solventes orgânicos como fenol/clorofórmio (Sambrook
et al. 1989) e suas modificações, ou através de kits comerciais, os quais geral­
mente produzem DNA de alta qualidade para as análises.

Amplificação do DNA
Reação em cadeia da polim erase (“PCR”)

A tecnologia da Reação em Cadeia da Polimerase (“PCR - Polymerase Chain


Reaction”) foi desenvolvida por Kary Mullis em meados da década de 1980
(Mullis & Faloona 1987; Saiki et al. 1985) e foi a responsável por uma verda­
deira revolução na biologia, permitindo o desenvolvimento de diversas técni­
cas utilizadas atualmente na genética da conservação. Esse método, simples e
engenhoso, envolve a síntese enzimática in vitro de milhares de cópias de uma
sequência específica de DNA, usando a enzima DNA polimerase. Isso faz com
que seja possível obter material suficiente para análise genética, mesmo de
fontes que forneçam uma quantidade mínima de DNA, como pelos, material
depositado em museus, penas etc. A rfeação de PCR envolve uma série de
ciclos, cada um composto de três etapas:xlesnaturação, anelamento e extensão
(Fig. 2). Na primeira etapa, a fita dupla do DNA alvo é desnaturada, elevando-se

356
M ETO D OLO G IAS MOLECULARES
U TILIZA D A S EM G ENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

a temperatura para cerca de 94°C, o que faz com que as pontes de hidrogênio
que unem as duas fitas se rompam e a molécula passe a ser fita simples. Na
etapa de anelamento, a temperatura é reduzida para cerca de 40 a 65°C, permi­
tindo assim a hibridação do DNA molde aos oligonucleotídeos iniciadores
(pequenas moléculas de DNA de fita simples, em geral chamadas de “prím ers”).
Os prím ers são sintetizados artificialmente, de forma a que sua sequência seja
complementar à sequência que delimita a região que se quer amplificar. Na
terceira etapa, a temperatura da reação é elevada para 72°C, o que faz com que
a enzima DNA polimerase inicie a extensão a partir dos prím ers ligados ao
DNA na etapa anterior. Durante a extensão, nucleotídeos são incorporados à
nova fita que está sendo sintetizada, tendo como molde a sequência alvo que
será amplificada. Assim, ao fim do processo, temos uma nova cópia em fita
dupla da sequência de interesse. Este ciclo é repetido cerca de 30 a 40 vezes e,
em cada um deles, a quantidade da sequência alvo dobra. Dessa forma, a am­
plificação segue uma progressão geométrica, ao fim da qual teremos milhares
de cópias daquela sequência. A duração de cada etapa e a- temperatura de
anelamento podem variar e dependem do tamanho e da sequência dos prím ers
e das condições da reação, devendo ser otimizadas pelo pesquisador durante
o desenvolvimento do experimento. Os produtos do PCR podem ser visuali­
zados em gel de agarose ou poliacrilamida após coloração específica, podendo
ainda ser purificados e utilizados em outras técnicas como, por exemplo, a
clonagem e o sequenciamento. Apesar de sua aparente simplicidade, a técnica
de PCR possui muitas variáveis e a ocorrência de dificuldades durante sua
realização é comum. Para ajudar na resolução desses problemas, várias estraté­
gias estão disponíveis e podem ser encontradas na literatura (Innis et al. 1995;
Dieffenbach & Dveksler 1995; Palumbi 1996).

DNA em Desnaturação Anelamento Extensão

31

Figura 2. Diagrama esquemático de Reação em Cadeia da Polimerase (PCR).

357
B E A TRIZ M. P E R E Z -SW E E N E Y
FERN AN DO P R O D RIG U ES
DON J. MELNICK

Clonagem
Antes do advento do PCR, a clonagem era o principal método disponível para
obter numerosas cópias de ufn lo c o genético. Essa técnica envolve a introdu­
ção do DNA em uma bactéria e, através da m ultiplicação das células bacteria-
nas, o DNA de interesse também é multiplicado. Embora o PCR tenha, em
geral, substituído a utilização da clonagem para a amplificação do DNA, essa
técnica é ainda muito empregada em estudos de genética molecular. Ela é uti­
lizada, por exemplo, durante a construção de bibliotecas genômicas e bancos
de DNA microssatélite (Fig. 3). Esses bancos são usados posteriormente para
gerar os prím ers que serão utilizados na amplificação de marcadores microssa-
télites específicos para a espécie de interesse.

DNA
Inserção em vetores
Digestão do DNA
e separação dos Seleção dos
fragmentos por fragmentos com
eletroforese 300 a 500 bp

ó 0

Desenvolvimento dos
Seqüenciamento
prímers para amplificação
dos clones positivos
dos microssatélites por PCR
Introdução dos vetores em
bactérias, multiplicação em
meio de cultura, e detecção
das colônias que contêm
repetições microssatélites.

Figura 3. Diagrama esquem ático do procedimento de clonagem para a construção de um


banco de DNA m icrossatélites.

Seqüenciamento de DNA
A determinação da sequência de bases no DNA é a forma mais direta de avaliar
a variação genética existente nos organismo. Essa técnica envolve o isola­
mento do DNA, a am plificação do lo c o de interesse, a condução de uma
reação de seqüenciam ento e a resolução da respectiva reação através de ele­
troforese. Atualmente, esse processo é feito usualmente, utilizando-se equipa­
mentos para seqüenciam ento automático. O pesquisador pode amplificar o
DNA através de PCR ou clonagem, porém, o uso de PCR é geralmente mais

358
M ETO D OLO G IAS MOLECULARES
U TILIZA D A S EM G ENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

usado por ser mais simples e rápido. Apesar do sequenciamento ainda ser um
procedimento caro e trabalhoso, os avanços tecnológicos têm facilitado o uso
dessa técnica, muito utilizada para fins taxonômicos e filogeográficos.

0 método de sequenciamento mais comum é o método de dideoxinucleotídeo,


também conhecido como método de terminação de cadeia ou ainda método de
Sanger (“Sanger Dideoxy Sequencing” - Sanger et al. 1977). O método de di­
deoxinucleotídeo possui esse nome por utilizar na reação de sequenciamento
um nucleotídeo que não possui o radical OH no carbono 3 ' da molécula de
ribose do nucleotídeo, sendo chamado de dideoxinucleotídeo (ddNTP). Os
nucleotídeos normais, denominados desoxinucleotídeos (dNTPs) possuem este
grupo OH, o que permite a ligação covalente entre nucleotídeos durante a
síntese de uma nova fita de DNA (Fig. 4). Mais recentemente, uma variação
dessa metodolggia tem sido empregada, na qual é utilizada uma enzima termo-

N O VO SEG M EN TO D E DNA

^ 3'
Ligação iônica H HO

£ 5'
CH Base CH
5"
Base A
\
------ T
1\
I T
c— c
3' Ay

l / V l I/ ° \ l C r 4'f C
C 4‘ 1' C ^ C 4’ 1 ;C
^ / r
3' 2; / \ 3' 2;. /
c— C c —
T T I . I
OH H H H

Desoxinucleotídeo Dideoxinucleotídeo
(dNTP) (ddNTP)

C 4- Hc
\ 3-
c —-£ c)
r I
OH H
3’

Figura 4. Representação da estrutura molecular do desoxinucleotídeo (dNTP) e do dideoxinu-


cleottdeo (ddNTP), e a ligação covalente formada entre dois nucleotídeos durante a síntese
de uma nova fita de DNA.

359
BEA TRIZ M. P E R E Z -S W EEN EY
FERN AN DO P. RO D RIG U ES
DON J. MELNIGK

estável que facilita a realização da reação de sequenciamento através de PCR


(Craxton 1991; Murray 1989). Para a reação de sequenciamento baseada no
método de dideoxinucleotídeo, o DNA é fornecido juntamente com os quatronu-
cleotídeos normais (dNTPs), os quatro nucleotídeos sem o grupo OH (ddNTPs)
modificados com moléculas que emitem fluorescências de diferentes cores,
um p rim er e a enzima DNA polimerase. Como todos os quatro nucleotídeos
normais estão presentes, a elongação da cadeia ocorre normalmente até que,
aleatoriamente, um ddNTP seja incorporado pela DNA polimerase, interrom­
pendo assim a síntese da fita de DNA devido à falta do grupo OH necessário
para que o próximo nucleotídeo se ligue. Assim, durante a reação de sequen­
ciamento, são formados fragmentos de DNA com diferentes tamanhos, cada
um deles possuindo em sua extremidade um dos quatro ddNTPs marcados
com uma cor. Ao fim da reação, os fragmentos são separados por eletroforese
com base em seus tamanhos, o que, em conjunto com a fluorescência emitida
por cada um dos ddNTPs incorporados nas extremidades dos fragmentos,
permite a determinação da sequência procurada (Fig. 5).

Como as polimerases podem apresentar uma taxa de erro durante a incorpora­


ção dos nucleotídeos, é aconselhável que, para um mesmo indivíduo, mais de
uma sequência seja obtida para a determinação de uma sequência consenso
(Dunning et al. 1988; Ling et al. 1991). Ainda, deve-se ter cuidado com a
amplificação do lo co correto (e não de um pseudogene) e com a amplificação
de “genes exóticos” introduzidos através de contaminação.

360
M ETO D O LO G IA S MOLECULARES
U TILIZA D A S EM GEN ÉTIC A DA CONSERVAÇÃO

DNA fita simples a ser sequenciado

5' t t r i"i i r i i
C T G A C T T C G A C A A
| -|- r"i— 3'

Adicionar:
DNA polimerase

dNTPs (A, T, C e G)

ddNTPs fluorescentes
( J.CeG)

i_ L
-L i
U L

Fragmentos
grandes
3' 5'
G C
A T
Q Determinaçao q
j da sequência a
Eletroforese em G do DNA c
sequenciador A estudado j
automático A ------------ ► T
G C
C G
T A
G C
T A
T A
5' 3'
Fragmentos
pequenos
Figura 5. Diagrama esquemático do sequenciamento baseado no método de dideoxinucleo-
tideo de Sanger.

361
BE A TRIZ M. PE R E Z -SW E E N E Y
FERN AN DO P. RO D RIG U ES
DON J. MELNICK

Métodos de análise de fragmentos de DNA

Polimorfismo no comprimento de fragmentos de restrição (“RFLPs -


Restriction Fragment Lenght Polymorphisms”)
No final da década de 60 foram descobertas algumas proteínas, denominadas
enzimas de restrição, que são capazes de cortar o DNA em locais específicos de
sua sequência, os sítios de restrição (Linn e Aber 1968; M eselson & Yuan
1968). Por exemplo, a enzima EcoRV (assim chamada por ter sido isolada da
bactéria E sch erich ia coli) corta a dupla fita de DNA somente nos locais que
possuem a sequência 5' - GATATC - 3 '. Atualmente são conhecidas centenas
de enzimas de restrição, cada uma reconhecendo e cortando uma sequência
específica no DNA. Na análise genética, essas enzimas podem ser utilizadas
para determinar a variação existente na sequência de DNA dos organismos.
Pelo fato das sequências de DNA variarem na com posição de nucleotídeos
entre indivíduos, cada enzima de restrição cortará o DNA de indivíduos dife­
rentes em um número diverso de fragmentos. A variação observada nos com­
primentos dos fragmentos gerados entre indivíduos, depois que seus DNAs
foram digeridos com enzimas de restrição específicas, é chamada de polimor­
fismo nos comprimentos de fragmentos de restrição ou, simplesmente, RFLP.
As enzim as de restrição são obtidas com ercialm ente, e inform ações sobre
centenas delas podem ser obtidas em um banco de dados público (REBASE;
Rober.ts & M acellis 1993).

Na metodologia tradicionalmente utilizada para a análise RFLP, o DNA é dige­


rido com uma ou mais enzimas de restrição e separado através de eletroforese
em gel de agarose, produzindo uma faixa contínua (arraste) na qual estão pre­
sentes fragmentos de DNA de diferentes tamanhos. Para tornar possível a vi­
sualização dos marcadores RFLP, os fragmentos presentes no gel de agarose
são transferidos para uma membrana de nylon ou nitrocelulose através de uma
técnica conhecida como “Southern Blot”, desnaturados, e fixados a ela. Em
seguida, os fragmentos transferidos para a membrana são hibridados com son­
das radioativas, o que permite, então, a visualização de bandas após a exposi­
ção da membrana a um filme de raios-X (autorradiografia). Mais recentemente,
tem-se utilizado uma variação desse procedimento, denominado PCR-RFLP,
no qual a digestão com enzimas de restrição é feita em sequências de DNA
amplificadas anteriormente por PCR. Os fragmentos resultantes são'visualiza-
dos através de separação eletroforética usando gel de agarose ou poliacrilami-
da, após sua coloração. O método de sítio de enzima de restrição é um proce­
dimento com custo menor do que o sequenciamento de DNA para obter dados

362
M ETO D O LO G IA S M OLECULARES
UTILIZA D A S EM G ENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

sobre o caráter do DNA, mas é menos preciso e fornece menos informação para
as análises quantitativas. Ele ainda,requer que as condições da reação sejam
consistentes e bastante rigorosas para que o repetimento seja obtido. Os dados
gerados através da técnica de RFLP podem ser usados tanto para sistemática
molecular como para a análise de genética de populações.

Polimorfismo de DNA Amplificado ao Acaso (“RAPD - Random


Amplified Polymorphic DNA”)
Esta técnica, baseada na técnica de PCR e desenvolvida paralelamente por
Williams et al. (1990) e Welsh & M cClelland (1990), utiliza p rím ers curtos
(com cerca de 10 bases) e de sequência arbitrária, eliminando assim a necessi­
dade se conhecer previamente a sequência que flanqueia a região que será
amplificada (como no caso de.microssatélites, por exemplo, na qual os prím ers
são desenvolvidos para se ligarem a sequências específicas do DNA). Este
prím er único e de sequência arbitrária irá se ligar a vários pontos do genoma,
produzindo assim uma série de fragmentos que são então separados através de
eletroforese em gel de agarose ou poliacrilamida e visualizados na forma de
bandas. A variação existente no padrão de bandas observada entre indivíduos,
ou seja, a presença ou ausência de bandas, pode ser devida à ocorrência de
mutações, inserções ou deleções nos sítios, de ligação do prím er, o que impede
a amplificação correta de determinados segmentos de DNA. Através do poli­
morfismo obtido com o uso de marcadores RAPD é possível obter estimativas
de sem elhança genética entre indivíduos e de diversidade em populações
(Hadrys et al. 1992). A principal vantagem dos marcadores RAPD é o fato de
os prím ers arbitrários poderem ser usados para qualquer organismo, sem ne­
cessidade de conhecimento prévio das sequências de DNA da espécie que se
quer estudar. Além disso, a técnica permite gerar uma quantidade muito gran­
de de polimorfismo de DNA através da amplificação de segmentos distribuí­
dos por todo o genoma, necessita de uma quantidade mínima de DNA para a
análise e apresenta um custo relativamente baixo quando comparado com ou­
tras técnicas. Apesar de todas essas vantagens, há algumas limitações sérias
que impedem o seu uso de forma mais ampla. A principal delas refere-se à
baixa repetência do ensaio RAPD,, já que esta é uma técnica muito sensível a
fatores como qualidade e concentração do DNA, condições da reação de PCR e
condições da eletroforese (Ellsworth et al. 1993; Lessa 1993; Muralidharan &
Wakeland 1993). Outra desvantagem é o baixo conteúdo-de informação genéti­
ca fornecido, já que os RAPDs são marcadores dominantes. Isso significa que
os indivíduos heterozigotos não podem ser distinguidos dos indivíduos

363
B E A TRIZ M. P E R E Z -SW E E N E Y
FERN AN DO P. R O D RIG U ES
DON J. MELNICK

homozigotos, limitando muito as análises genéticas subsequentes. Além do


uso já descrito anteriormente, os marcadores RAPDs também podem ser usa­
dos com cautela na análise de exclusão de maternidade e paternidade, detec­
ção de híbridos e outros (Hillis 1994; Smith et al. 1995).

Minissatélites
Várias classes de sequências repetitivas são encontradas nos organismos euca-
riotos e têm sido descritas e caracterizadas em várias espécies animais e vege­
tais. Uma dessas classes é conhecida como m inissatélites, ou ainda VNTRs
(“Variable Number of Tandem Repeats” - Sequências adjacentes que se repe­
tem em número variável). As regiões m inissatélites são encontradas em todo o
genoma e são constituídas por um número variável de sequências repetidas,
cujo tamanho do grupo de repetição pode variar de 10 a 100 bases (Jeffreys et
al. 1985, Armour & Jeffreys 1992, Bruford et al. 1992, Frankham et al. 2002).
Os m inissatélites são altamente variáveis, sendo sua evolução devida à recom-
binação não equivalente e conversão gênica (Armour & Jeffreys 1992; Jeffreys
et al. 1991, 1994). A análise dos m inissatélites é feita de maneira semelhante à
análise de RFLP, sendo o DNA cios indivíduos analisados cortado com enzi­
mas de restrição e separado através de eletroforese. Em seguida é desnaturado
(passado para fita simples) e transferido para uma membrana através da técni­
ca “Southern blot”, a qual permite a detecção das repetições através da hibrida-
ção com sondas radioativas ou fluorescentes. Essas sondas radioativas se. li­
gam aos fragmentos contendo m inissatélites através do pareamento comple­
mentar de bases, e o resultado é visualizado através de uma autorradiografia.
A autorradiografia revela um padrão de bandas semelhante a um código de
barras, o qual, em espécies não endogâmicas, permite a caracterização de cada
indivíduo analisado. Por esse motivo essa técnica também é conhecida como
“DNA fingerprinting”, por fornecer uma impressão digital genética de cada
indivíduo.

Entre as vantagens dessa técnica podemos citar a sua alta variabilidade, o


acesso à variação distribuída por vários lo co s e a possibilidade de ser realizada
sem que haja conhecimento prévio da sequência de DNA da espécie estudada.
Entre as desvantagens estão: o fato de que os lo co s não podem ser identifica­
dos, são marcadores dominantes e de requerer uma grande quantidade de
DNA para ser realizada, o que im possibilita o seu uso quando associada a
técnicas não invasivas de obtenção de amostras. A utilização da técnica dos
minissatélites vem diminuindo ao longo dos anos, sendo substituída pelas
técnicas baseadas em PCR.

364
METO D OLO GIAS MOLECULARES
U TILIZA D A S EM G ENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

Microssatélites
Outra classe de sequências repetitivas encontrada nos genomas eucariotos são
os microssatélites, denominados ainda sequências simples repetidas (“SSR -
Simple Sequence Repeats”) ou repetições pequenas em Tandem (“STR - Short
Tandem Repeats”). Os m icrossatélites possuem sequências repetidas mais sim­
ples do que os minissatélites, com comprimento das repetições variando de 2
a 5 bases (Tautz 1989; Weber & May 1989). Uma unidade de repetição com três
bases pode ser constituída, por exemplo, pela repetição ATG. A variação en­
contrada nos m icrossatélites é resultado da variação no número dessas repeti­
ções, que produzem uma mudança no tamanho dos alelos observados. Assim,
para um determinado lo co estudado em uma população, podemos encontrar
muitos alelos que variam quanto ao número de repetições que ele possui. Em
um organismo diploide poderemos encontrar um ou dois alelos, dependendo
se ele é homozigoto ou heterozigoto para o lo co estudado. Portanto, os micros­
satélites são marcadores codominantes, e por isso geneticamente muito infor­
mativos. Os m icrossatélites são detectados por meio da amplificação por PCR
utilizando-se p rim ers específicos, que se ligam a regiões conservadas que deli­
mitam a sequência de DNA que contém a região repetitiva. Os fragmentos re­
sultantes da amplificação são então separados por eletroforese em gel de poli-
acrilamida e corados com nitrato de prata, para visualização e registro do re­
sultado. Alternativamente, pode-se utilizar p rim ers modificados por fluores­
cência, o que permite a detecção dos fragmentos amplificados usando-se equi­
pamentos de sequenciamento automático.

Entre as vantagens do uso dos m icrossatélites estão o alto nível de polimor­


fismo observado, sua característica codom inante e a facilidade de uso através
de PCR, uma vez que os p rim ers estejam disponíveis para a espécie estuda­
da. A principal desvantagem se refere à necessidade de desenvolvim ento
dos p rim ers para espécies em que eles não estejam disponíveis, sendo este
um processo caro e trabalhoso. Existe ainda a dificuldade de avaliar a homo-
logia dos fragmentos observados entre populações e a ocorrência de alelos
nulos, ou seja, alelos que não são amplificados (Callen et al. 1993). A ocor­
rência de alelos nulos, agravada quando se usa DNA de qualidade ou quan­
tidade inferior, como os obtidos da extração de fezes e pelos, pode levar a
estimativas distorcidas das frequências alélicas e genotípicas, assim como a uma
identificação errada da paternidade ou de outro grau de parentesco (Taberlet et
al. 1999a, b).

365
BE A TRIZ M. P E R E Z -SW E E N E Y
FERN AN DO P. RO D RIG U ES
DON J. MELNICK

Métodos para a análise de dados


Através das metodologias laboratoriais apresentadas anteriormente é possível
determinar a variação genética presente em uma espécie e em suas populações.
Em seguida, esses dados devem ser analisados, fazendo-se deduções para ex­
plicar as prováveis razões para os padrões observados. Para que haja confiabi­
lidade nas conclusões obtidas, usamos uma variedade de métodos estatísticos
e confirmamos nossos resultados com as informações oriundas de outras dis­
ciplinas, como a biogeografia, a etologia e a ecologia. A habilidade para inter­
pretar os dados genéticos só pode ser desenvolvida através do estudo cuida­
doso da literatura, uma compreensão detalhada dos mecanismos genéticos dos
processos evolutivos, um bom conhecimento sobre modelos estatísticos e suas
suposições e muita experiência prática. Infelizmente, uma abordagem adequa­
da sobre as metodologias utilizadas na análise de dados genéticos está além
dos objetivos deste capítulo. Para aqueles que se interessarem em ir mais a
fundo nessas metodologias, fornecemos a seguir uma lista de referências biblio­
gráficas que tratam da análise dos dados genéticos para diferentes fins (Tabela
3), e anexa uma lista com os principais programas computacionais utilizados
para a realização dessas análises (Anexo 1).

366
M ETO D OLO G IAS MOLECULARES
U TILIZA D A S EM G ENÉTICA DA CONSERVAÇÃO

Tabela 3. R efe rên cias biblio g ráficas re fere nte s às m etodologias de an álise dos dados
genéticos.

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Marshall et al. 1998.

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população de origem

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Waser 1999, Slatkin 1977, Slatkin 1985 a, b, Slatkin &
Barton 1989, Slatkin & Madison 1989 & 1990, Smith
1989.

Tamanho Crow & Denniston 1988, Ewens 1982, Haldane 1939,


populacional efetivo Kühner et al. 1995, Luikart & Cornuet 1999, Wright
1931.

367
B E A TR IZ M. PER E Z -SW E E N E Y
FERNANDO P. RO D RIG U ES
DON J. MELNICK

Conclusão
A Genética da Conservação é uma disciplina aplicada que está em franco cres­
cimento. Nela, a sistemática molecular e a genética de populações são utiliza­
das conjuntamente, com o objetivo de fornecer instrumentos para que o mane­
jo das espécies possa ser realizado visando-se à manutenção do seu potencial
evolutivo e consequentemente a sua viabilidade a longo termo. Ela faz uso de
várias metodologias laboratoriais e analíticas, através das quais é possível ob­
ter marcadores moleculares que nos auxiliam na resolução de numerosos pro­
blemas pertinentes à conservação. Em conjunto com outras disciplinas que v
fazem parte da Biologia da Conservação, as ferramentas aqui apresentadas são
capazes de formar um quadro robusto da diversidade encontrada nas popula­
ções naturais, fortalecendo os meios pelos quais a biodiversidade pode ser
conservada.

368
A n e x o 1: P ro g ra m a s c o m p u ta c io n a is m a is u tiliz a d o s na a n á lis e d e d a d o s g e n é tic o s .

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380
Vegetação e ecologia de paisagem
14 Restauraçãoeconservação de
ecossistemas tropicais
Paulo Kageyama
Universidade de São Paulo (USP)

Flávio Bertin Gandara


Universidade de São Paulo (USP)

Introdução
A Mata Atlântica original cobria cem milhões de hectares. Hoje, em virtude da
densa população e industrialização, resta somente cerca de 7% dessas flores­
tas. Diversos pontos desse bioma são atualmente apontados como sendo hotspots
de biodiversidade, locais onde se concentra uma alta diversidade de espécies
associada a uma grande ocorrência de endemismos - parâmetros indicadores
de prioridade parà a conservação e a preservação (MacNeely et al. 1990).

Apesar de ainda restarem remanescentes de Mata Atlântica, o ritmo da destrui­


ção tem se acelerado: muitos desses ecossistemas foram e vêm sendo destruí­
dos, antes mesmo que se tenha desenvolvido o pleno entendimento dessa enor­
me diversidade de ecossistemas e da riqueza imensurável de espécies, associada
a uma tão grande complexidade de interações entre organismos. A prioridade,
no caso da Mata Atlântica, é portanto desenvolver tecnologias para a restauração
dos ecossistemas degradados da maior parte (93%) desse bioma, assim como
para a preservação dos fragmentos pouco perturbados (7%) ainda restantes.

A restauração de ecossistemas degradados, também denominada “revegetação” e


“recomposição florestal”, deve utilizar os conceitos de diversidade de espécies,
interação entre espécies, sucessão ecológica, assim como adaptar as tecnologias
já conhecidas de silvicultura tradicional às espécies nativas (Kageyama &
Gandara 2000). A meta da restauração é a de reconstituir um novo ecossistema
o mais semelhante possível ao original, de modo a criar condições de biodiver­
sidade renovável, em que as espécies regeneradas artificialmente tenham con­
dições de ser autossustentáveis, ou que sua reprodução esteja garantida e a
diversidade genética em suas populações possibilite a continuidade de evoly-
ção das espécies.

383
PAULO KAGEYAMA
F L Á y iO B E R TIN GANDARA

Os grupos ecológicos sucessionais, que se baseiam na çxistência de diferentes


tipos de espécies arbóreas, com exigências comuns para seu desenvolvimento,
têm sido o ponto focal para a construção de modelos de associação de espécies
na restauração de áreas degradadas. Os diferentes grupos ecológicos, também
denominados de grupos funcionais, têm exigências específicas, principalmen­
te quanto à qualidade e à quantidade de luz, e refletem suas características de
regeneração natural quanto à existência ou não de tipos distintos de clareiras
na mata natural. O desenvolvimento de modelos de restauração, a partir des-
ses^conceitos, visa simular, na plantação, as exigências dos diferentes grupos
ecológicos (Kageyama & Gandara 2000).

A conservação de ecossistemas pressupõe que as espécies que os compõem


devam ter populações geneticamente representativas, para que as espécies não
só se estabeleçam e cresçam, mas que também tenham habilidade para segui­
rem seu caminho natural de evolução. Assim, a coleta de sementes ou propá-
gulos para representar cada uma das espécies deve. ser feita a partir de um
número adequado de indivíduos de populações conhecidas, de modo a asse­
gurar um tamanho efetivo representativo para as populações a serem utiliza­
das na restauração.(Vencovsky 1987).-
/

Dessa forma, a restauração ecológica deve criar um novo ecossistema que per­
mita não só o desenvolvimento das espécies arbóreas estabelecidas, como tam­
bém dos seus organismos associados, tanto vegetais como animais, além de
microrganismos. Deve-se salientar que a maioria das espécies arbóreas tropi­
cais tem animais como vetores de pólen e de sementes, os quais são essenciais
na restauração (Bawa 1974). Portanto, a restauração adequada seria aquela que
possibilitasse que os novos ecossistemas fossem importantes para a reconsti­
tuição de hábitats, bem como para a conservação genética e como fontes de
sementes e de propágulos para novos projetos de restauração.

Bases teóricas da restauração e da conservação

Diversidade de espécies
A alta diversidade de espécies nos ecossistemas, sem dúvida, é uma das prin­
cipais características das florestás tropicais, podendo-se encontrar até cerca de
400 espécies em um só hectare de mata (SOS Mata Atlântica 1996).

O mais interessante é que o número de espécies arbóreas ocorrendo em um


hectare representa somente cerca de 60% do total das espécies encontradas em
uma área de 1500 hectares. Isso mostra que determinadas espécies são mais

384
RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO DE
E C O SSIS T E M A S TRO PIC A IS

dificilmente amostradas em pequenas parcelas, como em 1 ha de área (Foster &


Hubbell 1990). Em coletânea de diversos levantamentos fitossociológicos de
florestas do Estado de São Paulo, foram apresentados dados que revelaram
que cerca de 30% das espécies raras apresentavam um só indivíduo na amos­
tragem em áreas de aproximadamente 1 ha, enquanto cerca de 30% dos indiví­
duos pertenciam a somente 3 espécies mais comuns (Kageyama, Namkoong &
Roberds 1991).

Assim, pode-se concluir que essa alta diversidade de espécies na floresta não
é igualmente distribuída entre os diferentes tipos de espécies. Existem grupos
que ocorrem em mais alta densidade, tais como as pioneiras (comuns nas
clareiras grandes) e algumas clim ácicas que ocorrem sob o dossel da floresta
fechada, assim como aqueles que são raros e que têm normal ocorrência no
grupo das espécies secundárias (Kageyama et al. 1986).

Sendo a diversidade e a raridade da maioria das espécies características tão


marcantes e determinantes das florestas tropicais, elas não podem ficar fora
das pesquisas em modelos de revegetação. Assim, as associações entre essas
características e a sucessão, a reprodução, a regeneração, a distribuição espacial
dos indivíduos e a interação planta x animal devem ser envolvidas nos mode­
los de revegetação a ser propostos.

Dinâmica da sucessão
A sucessão secundária é o processo de mudanças que se verifica nos ecossis­
temas após a destruição parcial da comunidade. Pode ser em uma pequena
área de floresta nativa, devido à queda de uma árvore, ou em vários hectares
de uma cultura agrícola abandonada. Nesse processo, ocorre uma progressiva
mudança na composição florística da floresta, iniciada a partir de espécies
pioneiras até espécies climácicas.

Esse mecanismo é responsável pela autorrenovação das florestas tropicais,


através da cicatrização de locais perturbados, ou clareiras, que ocorrem a cada
momento em diferentes pontos da mata (Gómez-Pompa 1971). As clareiras são
formadas pela morte natural ou acidental de uma ou mais árvores, resultando
em uma abertura no dossel da floresta. Nesses locais, há uma grande mudança
nas condições ambientais, tais como o aumento da quantidade de luz, de tem­
peratura do solo e do ar e da disponibilidade de nutrientes, e um decréscimo
da umidade relativa (Bazzaz & Pickett 1980). As mudanças são mais pronuncia­
das quanto maior for a área da clareira.

Nas clareiras, ocorre uma reocupação por diferentes grupos ecológicos de espécies

385
PAULO KAGEYAMA
FLÁ V IO BE R TIN GANDARA

adaptadas a regenerar em clareiras de diferentes tamanhos (Whitmore 1982). A


classificação das espécies, baseada na resposta a essas clareiras, pode ser mui­
to interessante para o entendimento da dinâmica das florestas tropicais e para
a elaboração de estratégias de regeneração de áreas deflorestadas. Diversos au­
tores elaboraram classificações de grupos ecológicos sucessionais baseando-se
em observações demográficas, germinação, resposta à luz e outras (Budowski
1965; Denslow 1980; Whitmore 1982; Martínez-Ramos 1985; Gómez-Pompa &
Vásquez-Yanez 1981).

Interação planta-animal
A interação entre plantas e animais em florestas tropicais é muito intensa e
determinante para a estruturação do ecossistema, pois envolve relações funda-
mefttais, tais como polinização, dispersão de sementes e herbivoria/predação.
As espécies das florestas tropicais, em sua maioria, são alógamas, ou seja,
necessitam trocar pólen para que haja a sua polinização (Bawa et al. 1985a).
Essa troca é fundamentalmente realizada por animais (Bawa et al. 1985b), des-
tacando-se os insetos, os morcegos e as aves.

Os animais também têm uma participação muito importante na dispersão de


sementes (Howe & Smallwood 1982), apesar da anemocoria ser bastante co­
mum. Porém, em matas ciliares a zoocoria cresce significativamente em impor­
tância em relação à mata adjacente {Durigan 1989). Nesse ecossistema, a herbi-
voria e a predação também são fatores fundamentais para a determinação dos
processos de regeneração e de reprodução. Também deve ser citada a atuação
de patógenos, principalmente fungos, nesse processo (Augspurger 1990). Por­
tanto, essas relações devem ser levadas em conta na implantação de um pro­
grama de revegetação, tanto para a escolha das espécies e a elaboração dos
modelos de plantio como para o manejo e a reintrodução da fauna.

Restauração de florestas tropicais


A restauração de ecossistemas degradados deve seguir o princípio de que as
espécies nativas do local são as que têm maior probabilidade de se desenvol­
ver plenamente, mantendo suas características de reprodução e de regenera­
ção natural, em equilíbrio com seus organismos predadores naturais. Um
outro princípio fundamental é o de que, na restauração, todos os grupos de
espécies são importantes para a nova comunidade, desde aqueles que são típi­
cos do início da sucessão ecológica, como as espécies que são mais comuns
em estágios serais (de desenvolvimento de uma comunidade de vegetais) mais

386
RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO DE
E C O SSIS T E M A S TRO PIC A IS

avançados. Em situações especiais, podem-se premiar algumas espécies de


plantas que atraiam certos animais que podem ser importantes para o avanço
da sucessão, funcionando como “bagueiras”, ou espécies chaves na restaura­
ção (Reis, Zamborin & Nakazono 1999).

A maneira pragmática de simular as condições naturais de regeneração das


muitas espécies das florestas tropicais na restauração vem sendo agrupar essas
espécies em grupos ecológicos, baseados nas sucessões secundárias e antrópi-
ca. A sucessão secundária pode classificar as espécies em grupos distintos,
que têm exigências diferentes para a sua regeneração natural, basicamente em
virtude da necessidade de luz em diferentes estágios de seu desenvolvimento
ou da exigência ou não de clareiras de diferentes tamanhos (Denslow 1980). A
sucessão antrópica ocorre em áreas extensas desmatadas, após o seu uso e aban­
dono, mas sem os componentes totais básicos para a normal sucessão, que são
o banco e a chuva de sementes (Budowski 1965), com a mudança de função de
algumas espécies nessas áreas antropizadas (Kageyama, Reis & Carpanezzi 1992).

Os grupos ecológicos sucessionais da floresta tropical têm sido descritos por


diversos autores, com diferentes visões e tipos de sucessão, porém, com uma
certa concordância para os estágios serais mais iniciais ou finais, e algumas
diferenças quanto aos grupos intermediários. Os autores divergem tambjém
quanto à ocorrência ou não de uma separação brusca entre grupos, porém, há
uma certa unanimidade quanto à existência, em si, dos diferentes grupos eco­
lógicos. Dessa forma, dependendo da bibliografia utilizada, tanto o número como
as características dos grupos podem mudar, o que é esperado quando o consen­
so ainda não foi estabelecido entre os pesquisadores da área, como é o caso.

Uma classificação arbitrária dos grupos ecológicos pode ser tentada, buscan­
do-se um consenso entre os principais autores que mais se aprofundaram no
assunto, visando dar um certo pragmatismo a essa tarefa. Deve-se salientar
que, no caso, serãò consideradas somente as espécies arbóreas e arbustivas,
levando-se em conta que o componente herbáceo é muito efêmero no início da
sucessão, principalmente na secundária. Além disso, o pragmatismo na restau­
ração tem o objetivo básico de “apressar” a súcessão, e/ou encurtar cada um de
seus estágios. Abaixo é apresentada uma classificação desses grupos ecológicos:

1) Pioneiras: espécies arbóreas e arbustivas que recobrem rapidamente o solo


utilizam imediatamente os nutrientes da camada superficial do solo e pro-
, duzem sombra às espécies dos estágios seguintes da sucessão. As Pionei­
ras típicas, na sucessão secundária, têm ciclo de vida curto (5 a 15 anos),
reprodução abundante e precoce e as suas sementes ficam dormentes no

387
PAULO KAGEYAMA
FL Á V IO B E R T IN GANDARA

solo (banco de sementes). As Pioneiras antrópicas, na sucessão do pró­


prio nome, normalmente têm ciclo de vida mais longo (10 a 30 anos), po­
dem ou não ter dormência de sementes.e normalmente não formam banco
de sementes que fecham clareiras grandes na floresta natural. Esse grupo
de pioneiras pode ser incluído como sendo as Secundárias iniciais de
Budowski (1965) ou as Pioneiras longevas de Martinez-Ramos (1985).

2) Secundárias: espécies arbóreas do dossel ou emergentes na floresta natu­


ral, com ciclo de vida longo (100 anos ou mais), cujas sementes normal­
mente anemocóricas não têm dormência e podem germinar à sombra, mas o
banco de plântulas necessita de clareiras pequenas para se desenvolver.
Esse grupo geralmente tem muita baixa densidade de indivíduos na mata e
é o responsável pela alta diversidade de espécies da floresta tropical. As
espécies de Clareiras pequenas de Denslow (1980) as Secundárias tardias
de Budowski (1965) e as Nômades de Martinez-Ramos (1985) podem ser
incluídas neste grupo das secundárias.

3) Climácicas: espécies arbóreas de sub-bosque, do subdossel e às vezes atin­


gindo o dossel, com ciclo de vida médio a longo (40 a 100 anos ou mais),
cujas sementes podem germinar à sombra e com banco de plântulas que
tem a capacidade de se desenvolver também sob o dossel da floresta. As
espécies de Não clareiras de Denslow (1980) e as Tolerantes de Martinez-
Ramos (1985) podem ser incluídas no grupo das climácicas.

Para fins de elaboração de modelos de restauração de áreas degradadas, os


grupos ecológicos de espécies, segundo a sucessão, podem ser plantados de
forma a simular as condições da regeneração natural. Assim, ao se incluir as
Pioneiras como base para o rápido recobrimento do solo, está se considerando
que uma área degradada apta à restauração é uma grande clareira na sucessão,
secundária, ou mesmo uma área desmatada da sucessão antrópica. Dessa for­
ma, as plantas tanto pioneiras típicas comovas antrópicas serão utilizadas como
a matriz de um modelo. Entremeando as pioneiras, serão implantadas, simul­
taneamente ou sucessivamente, as plantas das secundárias e das climácicas,
atendendo-se às necessidades de menor ou maior sombreamento, respectiva­
mente para estes dois grupos (Kageyama et al. 1986).

Os modelos de restauração se restringem, portanto, à definição e à interpreta­


ção dos grupos ecológicos e da forma de usar e associar as plantas desses
grupos no plantio. Usando-se os três grupos de plantas referidos anteriormen­
te, pode-se ter simplificadamente os seguintes modelos já utilizados por diver­
sos autores, respeitando-se a sua terminologia:

388
RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO C E
E C O SSIS T E M A S TRO PIC AIS

1. Modelo sem o uso de grupos ecológicos e plantio completamente ao acaso


das diferentes espécies arbóreas, também denominado “coquetel”, com
o uso inclusive de espécies exóticas bem adaptadas silviculturalm ente
(Nogueira 1977).

2. Modelo sem o uso de grupos ecológicos e plantio das diferentes espécies,


seguindo as posições no terreno das plantas adultas dessas espécies obti­
das em um levantamento fitossociológico, feito em fragmento próximo da
área a ser restaurada (Joly 1990). (

3. Modelo com o uso de grupos ecológicos, im plantando-se as plantas do


grupo das pioneiras típicas sombreando as clim ácicas, e as plantas das
secundárias iniciais (pioneiras antrópicas) tutorando as das secundárias
tardias (Kageyama et al. 1986).

4. Modelo com o uso de grupos ecológicos, implantando-se as plantas do


grupo das pioneiras, tardias e clim ácicas em um módulo de 9 plantas (3 x
3), tendo a planta clim ácica ao centro e rodeada pelas dos outros dois gru­
pos, respeitando-se a sua abundância em levantamento fitossociológico
próximo (Rodrigues, Leitão Filho & Crestana 1992).

5. Modelo com o uso de grupos ecológicos, implantando-se as plantas dos


grupos das pioneiras e secundárias iniciais intercaladas em uma linha de
plantio, e a seguir uma outra linha de plantas do grupo das secundárias
tardias e clim ácicas também intercaladas, e assim sucessivamente, de modo
que o plantio operacional em grande escala seja facilitado (Kageyama &
Gandara 2000).

6. Modelo com o uso de grupos ecológicos, implantando-se as plantas dos


grupos das pioneiras típicas e antrópicas em uma linha, com a linha a
seguir implantada com as das secundárias e clim ácicas, respeitando-se a
densidade natural das espécies raras e comuns (Kageyama & Gandara 2000).

7. Modelo semelhante ao anterior, com a diferença que em toda a área são


implantadas somente plantas do grupo das pioneiras típicas e antrópicas,
com somente 20% da área (central ou distribuída) com todos os grupos
ecológicos, sendo que os restantes 80% devem ser naturalmente restaura­
dos após a reprodução das árvores das secundárias e clim ácicas implanta­
das inicialmente (Kageyama & Gandara 2000).

Como se.pode depreender, os modelos vêm sendo melhorados, em virtude do


avanço do entendimento dos conceitos da floresta tropical, principalmente da
sucessão ecológica e da distribuição espacial dos diferentes grupos de plantas.

389
PAULO KAGEYAMA
FLÁ V IO B E R T IN GANDARA

Além disso, o desenvolvimento de novos modelos também procurou adequar


a distribuição das plantas dos diferentes grupos ecológicos no campo à facili-
tação do trabalho operacional. Assim, os custos de implantação na restauração
tiveram uma redução bastante significativa nesses últimos anos, podendo-se
citar o caso do trabalho da Companhia Energética de São Paulo (CESP), no
qual cerca de 500 hectares de florestas nativas por ano estão sendo implanta­
dos. O custo original de U S$ 4 mil/ha foi reduzido a US$ 1,5 /ha, atualmente.

'Con servação genética de esp é c ie s arbóreas


População e tamanho efetivo
A coleta de sementes representativas da população de uma espécie necessita
dos conceitos de tamanho efetivo de Ne, que vem a ser a representatividade
genética que um indivíduo tem, em virtude de seu sistema reprodutivo e de
sua genealogia. Assim, por exemplo, a semente colhida de uma só árvore pode
representar um Ne desde 1 até próximo de 4, dependendo se a espécie for
autógama ou alógama, respectivamente. Entre esses dois extremos, podemos
ter outros valores para o Ne, sempre considerando o caso de colheita de se­
mentes de uma só árvore.
Uma população pode ter um número elevado de indivíduos em uma dada
geração, ao mesmo tempo em que apresenta um valor baixo de Ne. Isto pode
ocorrer se em uma geração anterior houve uma redução significativa do tama­
nho da população, quer por causas naturais ou antrópicas. A- colonização a
partir de poucos indivíduos ú uma das principais causas da ocorrência de
úma população natural com baixo valor de Ne. O plantio de uma população a
partir de'uma ou poucas árvores é o principal exemplo da redução antrópica
do tamanho efetivo populacional.

O tamanho efetivo de uma população tem implicação na sua capacidade de


manter as características genéticas ao longo de muitas gerações, sendo impres­
cindível para a análise de sua viabilidade a médio e longo prazos. Dessa forma,
se queremos de fato representar uma população em um plantio de proteção,
em uma áréa de proteção permanente, por exemplo, temos que considerar o
Ne para a coleta de sementes das espécies.

Tamanho efetivo para coleta de sementes


Para coleta de sementes de uma espécie arbórea, assumindo-a como sendo
alógama (grande maioria), podemos adotar um tamanho efetivo adequado para

390
1

RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO DE
E C O SSIS T E M A S TRO PIC A IS

a coleta de sementes como sendo de 50. Isso se justifica, considerando que


esse valor tem sido consagrado na literatura para casos de populações a serem
mantidas em médio prazo. Certamente, quanto mais importante se considerar
a sustentabilidade futura dd plantio a ser feito com as sementes coletadas,
maior o valor deve se dar ao conceito do Ne.

Diversas situações podem ocorrer na prática, em que se pode recorrer do tama­


nho efetivo para garantir a integridade da população na coleta de sementes de
uma espécie. Então, se queremos assegurar ter.um Ne de 50, podemos: i) cole­
tar sementes de 12-13 árvores de uma população natural grande (acima de 500
árvores); ii) juntar sementes coletadas de várias populações pequenas, soman­
do os Ne individuais; iii) coletar sementes de uma plantação, desde que as
sementes para formar essa população plantada tenham um Ne de 50. Em todos
esSes casos, as quantidades de sementes coletadas das árvores devem ser de
mesma magnitude. A aplicação prática do tamanho efetivo na coleta de semen­
tes é fundamentada por Vencovsky (1987).

Desta forma, não como uma camisa de força, mas como indicação, essas regras
devem ser gradativamente adotadas, uma vez que o uso de um grande número
de espécies nativas nos plantios mistos de revegetação não permite a sua ado­
ção a partir de um momento. No entanto, deve-se evitar coletar sementes de
populações plantadas, desconhecidas quanto à sua origem e ao seu tamanho.
Também se deve evitar terminantemente a coleta de uma árvore isolada, tanto
natural como plantada.

Na aquisição de material para a revegetação, deve-se considerar dois pontos; 1)


as espécies végetais estão geneticamente estruturadas e, na maioria, essa estru­
tura é hierárquica. Isso significa que a variação genética em uma espécie é
organizada e pode ser descrita como variação entre regiões fisiográficas, entre
populações dentro de regiões, entre fam ílias dentro de populações e entre
plantas dentro de famílias; 2) esses padrões frequentemente refletem adapta­
ções das plantas ao seu ambiente, no qual seus ancestrais evoluíram. A estru­
turação é particularmente presente em espécies arbóreas (Hamrick & Godt 1990).
Portanto, se a intenção é recriar comunidades vegetais, a estrutura genética
também deve ser replicada, aumentando a probabilidade de sobrevivência da
comunidade por um longo período de tempo. A introdução de material não
autóctone pode levar à mortalidade imediatamente, após o plantio, à mortalida­
de antes do período reprodutivo, ou a um desenvolvimento reduzido.

O ideal, portanto, é a coletá de sementes na própria área ou em áreas de vege­


tação remanescente próximas. Porém, nem sempre isso é possível, pela falta

391
PAULO KAGEYAMA
FLÁ V IO B E R T IN GANDARA

de ecossistemas naturais, em muitas regiões, tornando necessário o estabeleci­


mento de “zonas para coleta de sementes”. Essas zonas devem ser definidas
como áreas que apresentem características ambientais semelhantes, tais como:
altitude, relevo, solos, clima (temperatura, geadas, vento, precipitação, umida­
de etc) e composição florística. Assim, espera-se que dentro de cada zona as
espécies possuam adaptações genéticas apropriadas ao seu ambiente.

Considerações finais
I
O avanço das técnicas de restauração ecológica, transformando as áreas de­
gradadas em ecossistem as florestais, aliado com o aumento do rigor da fisca­
lização e da legislação ambientais, assim como da conscientização de proprie­
tários rurais e outros segmentos da sociedade, tem permitido que o ritmo do
plantio de áreas de preservação permanente e reserva legal venha crescendo
continuam ente. Dessa forma, constata-se que as áreas restauradas devem não
só conter a riqueza de espécies da floresta tropical como também uma repre-
sentàtividade genética das populações dessas espécies. Além do mais, no fu­
turo, essas áreas restauradas representarão grande parte da biodiversidade re­
manescente, passando a ser fontes de propágulos e de genes para uso econô­
mico ou de conservação.

Por outro lado, somente nos últimos anos a pesquisa sobre florestas naturais e
espécies nativas vem desenvolvendo técnicas sustentáveis de manejo de ecos­
sistemas naturais e de plantio econômico de nossas espécies. Essas florestas e
plantios, quando bem manejados, podem ter também um papel importante na
conservação genética, pela manutenção de populações representativas da bio­
diversidade original. Finalm ente, constata-se que para as espécies arbóreas
tropicais a conservação in situ e ex situ, às vezes, se confundem ou se sobre­
põem, como ocorre em áreas restauradas com material representativo das espé­
cies e populações. Como são áreas plantadas (restauradas), deveriam ser deno­
minadas de ex situ. Entretanto, como se espera que com o tempo se tornem
muito semelhantes às áreas naturais, e com representatividade das espécies e
populações, elas poderiam ser confundidas com uma conservação in situ.

392
RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO DE
E C O SSIS T E M A S TRO PIC A IS

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Publications. Oxford.

394
15 Fenologia, (rugivoria e dispersão de sementes
Mauro Galetti
i Universidade Estadual Paulista (UNESP)

Marco Aurélio Pizo


. Universidade Estadual Paulista (UNESP)

Patrícia C. Morellato
Universidade Estadual Paulista (UNESP)

Introdução
A polpa de frutos carnosos é a fonte primária de energia para muitas espécies
.de aves, mamíferos, lagartos e até mesmo de peixes. Esses animais podem
defecar, cuspir, regurgitar ou, simplesmente, derrubar frutos longe da planta
mãe, aumentando consideravelmente as suas chances de sobrevivência. Por­
tanto, a frugivoria e a dispersão de sementes são processos essenciais para as
populações das plantas, assim como para os animais.

Um dos temas centrais do manejo de vida silvestre é entender como os ani­


mais influenciam as populações vegetais e como a distribuição desses recur­
sos no ambiente afeta a abundância dos animais (principalmente folívoros,
frugívoros e nectarívoros). Os frugívoros são reconhecidamente importantes
na restauração de ambientes degradados e, por isso, os estudos da relação
animal-planta vêm sendo aplicados em manejo florestal (Wunderle Jr. 1997).

Do ponto de vista dos animais, os frutos representam uma importante fonte


energética por serem facilmente encontrados, capturados e processados (Levey
et al. 1994). Consequentemente, um grande número de vertebrados depende
de frutos para suas necessidades energéticas. Estimativas sobre a biomassa de
vertebrados frugívoros podem alcançar até 80% da comunidade em florestas
tropicais (Janson & Emmons 1990, Terborgh 1986, Gautier-Hion et al. 1985).
Além disso, a abundância dos frutos também pode influenciar o sucesso re­
produtivo de alguns frugívoros (Powlesland et al. 1997). A dependência de
frutos em alguns grupos é tão grande que alguns autores já documentaram o
efeito da baixa oferta de frutos devido a fatores estocásticos (El Nino) na mor­
talidade de frugívoros (Foster 1982, Wright et al. 1999).

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M A U RO G A L E TTI
MARCO AURÉLIO PIZO
PA TRÍC IA C. M ORELLATO

É fato conhecido que várias espécies de frugívoros deslocam -se no ambien­


te “seguindo” uma determ inada distribuição espacial e temporal de frutos
(Kinnaird et al. 1996). É também reconhecida a variação temporal na oferta de
frutos em florestas tropicais, mesmo sob climas pouco sazonais, representan­
do variações na oferta de recursos para frugívoros ao longo do tempo (van
Shaik et al. 1993, Morellato et al. 2000). Os frugívoros são geralmente mais
abundantes em hábitats e micro-hábitats com alta produtividade de frutos (Blake
& Loiselle 1991, Levey 1988, Loiselle & Blake 1991, Rey 1985).

Do ponto de vista da planta, o processo de dispersão representa a ligação entre


a última fase reprodutiva da planta com a primeira fase do recrutamento da
população. Sem a dispersão das sementes, a progénie está geralmente fadada à
extinção e a regeneração em novos locais torna-se impossível. Em alguns ca­
sos, espécies de plantas que perderam seus dispersores (como cutias, maca­
cos, elefantes) estão ameaçadas de extinção local (Chapman & Chapman 1995).

Importância prática do estudo de frugivoria e dispersão de sementes


Devido à grande dependência das plantas como fonte de alimento para os
animais frugívoros, as alterações nessa interação podem ter sérias implicações
para a conservação da biodiversidade (Allen-Wardell et al. 1998). A abundân­
cia de frutos na maioria das florestas tropicais é altamente sazonal (van Schaik
et al. 1993, Morellato et al. 2000.) e algumas populações de frugívoros são
mantidas durante os períodos de baixa oferta de recursos pelas chamadas “es-
pécies-chave” (Terborgh 1986). Do ponto de vista conservacionista, é crucial
identificarmos corretamente as chamadas espécies-chave para protegê-las e
manejá-las adequadamente (Galetti & Aleixo 1998, Galetti & Fernandez 1998).
A extinção das espécies-chave pode levar ao que tem sido chamado de “efeito
dominó”, ocasionando a extinção em cadeia de outras espécies que formam as
teias alimentares nas comunidades.

Outro tema importante para a conservação da biodiversidade diz respeito aos


efeitos da fragmentação na diversidade de espécies em uma área. A fragmentação
das florestas pode impossibilitar que organismos dependentes de frutos sobre­
vivam (Aleixo & Vielliard 1995). Esse problema é particularmente grave para as
espécies de aves e mamíferos migratórios (Powell & Bjork 1995, Peres 1996).
«
A fragmentação florestal não afeta somente a diversidade e a abundância de
frutos e frugívoros, mas pode alterar suas interações (Restrepo & Gomez 1998).
Apesar da maioria dos estudos sobre fragmentação abordar o padrão de perda
de diversidade com a redução de área, novos estudos têm abordado os efeitos

V
396
i
FEN OLOGIA, FRUG IVO RIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

da fragmentação na ruptura de mutualismos imprescindíveis para a manutep-


ção do ambiente, como polinização (Aizen & Feisinger 1994) e dispersão de
sementes.

A maioria das plantas de mata primária possui sementes grandes que são dis­
persas por mamíferos e aves de grande porte, como antas e macacos. Esses
dispersores atuam na regeneração de ambientes perturbados, transportando
sementes de florestas primárias para áreas perturbadas (Guevara & Laborde
1993). Entender como esses processos de regeneração ocorrem pode ajudar na
restauração de ambientes degradados (Duncan & Chapman 1998).

Outro aspecto importante no estudo da dispersão de sementes é a obtenção de


produtos naturais das sementes. Os frutos e sementes possuem diversos com­
postos secundários que poderiam ser usados na obtenção de fármacos (Gottlieb
& Borin 1997, Sedaghatkish et al. 1999). A maioria dos estudos sobre produ­
tos naturais (principalmente plantas medicinais) se baseia no uso das plantas
pelas comunidades tradicionais humanas (caboclos e índios), mas estudos
minuciosos do sistem a de dispersão de sementes podem nos dar melhores
“pistas” de novos produtos naturais. Por exemplo, o olho-de-cabra (O rm osfa
arbórea) possui sementes coloridas que, diferentemente da maioria das legu­
minosas, são raramente atacadas por patógenos. O porquê dessas sementes
não serem infestadas e a possibilidade de se utilizar, em fármacos e produtos
industriais, suas substâncias inibidoras de patógenos são questões ainda des­
conhecidas e a serem pesquisadas.

Métodos para o estudo da fenologia, frugivoria e dispersão de


sementes **
É comum entre os estudantes de ecologia que iniciam estudos sobre a dieta de
animais silvestres esquecer-se de avaliar a disponibilidade dos recursos ali­
mentares. Isso é particularmente importante quando a espécie é folívora ou
frugívora, porque são espécies que dependem de recursos sazonais, como fo­
lhas novas e frutos.

A avaliação de recursos alimentares para frugívoros tem sido estudada desde


Smythe (1970). Vários métodos têm sido usados e comparados, não havendo
um consenso sobre qual ou quais são os métodos de avaliação mais adequa­
dos. Desta forma, faremos uma abordagem geral sobre metodologias mais u tili­
zadas e literatura-chave sobre o assunto. Recomendamos a leitura cuidadosa
da literatura pertinente quando da escolha do método a ser utilizado.

397
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PATRÍCIA C. MO RELLATO '

Fenologia
A fenologia estuda a ocorrência de eventos biológicos repetitivos e sua relação
com mudanças no meio biótico e abiótico (Davis 1945, Morellato et al. 1989).
O estudo da fenologia é fundamental para avaliarmos que tipos de frutos,
quando e em que quantidades estão disponíveis aos frugívoros, em uma deter­
minada área. Antes de iniciar qualquer estudo fenológico é necessário definir
o nível de análise, se indivíduo, população ou comunidade e, a partir daí,
selecionar um método de amostragem dos indivíduos (arbóreos, arbustos, lia­
nas) que serão monitorados periodicamente na área.

Qual o método de amostragem?


Os métodos de amostragem mais utilizados em estudos fenológicos que envol­
vam frugivoria e/ou dispersão de sementes têm sido os de amostragem aleató­
ria de indivíduos ao longo dé transecções (“transects”) ou de trilhas pré-exis-
tentes. As transecções são preferíveis já que podem ser estabelecidas segundo
critérios definidos no estudo e em ambientes de interesse. As trilhas são mais
fáceis de utilizar, mas normalmente não são abertas seguindo algum critério
científico, embora muitas vezes sejam as únicas opções em certas áreas. Lem­
bre-se que certas trilhas, muito abertas, estão sujeitas aos “efeitos de borda”
causados por maior luminosidade ou pelo vento, entre outros.

Esses métodos utilizam-se de algum critério de exclusão (ou escolha) dos indi­
víduos, que estará relacionado aos objetivos do estudo. Por exemplo, árvores
podem ser selecionadas utilizando-se um diâmetro mínimo para sua inclusão;
esse pode estar associado ou não à posição do indivíduo na estratificação;
arbustos podem ser selecionados pela altura total, ramificação ou pelo diâme­
tro máximo; trepadeiras normalmente são selecionadas pelo seu hábito, que
pode ou não estar associado a serem trepadeiras lenhosas ou herbáceas, um
critério adicional. Não se esqueça que, além de árvores, as lianas e arbustos
também produzem frutos consumidos pelos animais. No caso de lianas e cer­
tas plantas herbáceas, é difícil definir o que é um indivíduo, e outras estraté­
gias têm que ser adotadas para caracterizar a fenologia das espécies (Morellato
& Leitão-Filho 1996, Romera 1999).

Quantos indivíduos amostrar?


Quando você considerar quantos indivíduos amostrar no seu estudo, deve
pensar primeiro no nível de abordagem. Quando procurar detectar variações
na oferta de recursos em uma espécie ou população, de maneira geral, tenha

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FENOLOGIA, FRUG IVO RIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

em mente que, quanto mais indivíduos você amostrar, melhor será. Estudos
de populações devem envolver o maior número amostrai compatível com a
sua capacidade de observação, para poder determinar variações significativas
na oferta de recursos e permitir testes estatísticos (eg. Milton et al. 1982, Man-
tovani & Morellato 1999), O número mínimo de indivíduos é dez (Fournier &
Charpantier 1975), mas pode chegar a mais de duzentos, dependendo das
características do estudo. Lembre-se que o estudo da fenologia demanda tem­
po e regularidade.

Em estudos de fenologia que tentam avaliar a disponibilidade de recursos para


os animais em nível de comunidade, tem sido utilizada a marcação entre 500 e
mais de 1000 árvores (Peres 1991, Wright et al. 1999). Geralmente, somente
uma porção da sua amostragem de indivíduos irá produzir flores ou frutos (c.
30% a 70%, Morellato et al. 1989, 2000), por isso é necessário marcar vários
indivíduos. Estudos fenológicos do ponto de vista botânico sugerem 5 a 10
indivíduos de cada espécie, mas para as espécies raras esse número é muito
difícil de ser encontrado e, portanto, ocorrem variações no número de indiví­
duos amostrado em cada espécie (Morellato & Leitão Filho 1992, Morellato et
al. 1989, 2000).

Frequência e duração das observações


Observações fenológicas devem ser realizadas no mínimo mensalmente. Inter­
valos de tempo menores podem ser necessários, dependendo dos objetivos do
estudo proposto. Você poderá levar até sete dias por mês para observar 300 a
1000 árvores. As observações fenológicas, em geral, deverão cobrir o período
mínimo de um ano. Entretanto, considera-se três a quatro anos como duração
mínima ideal, necessária para a observação das fenofases reprodutivas na mai­
oria das espécies e sua periodicidade e regularidade. Lembre-se que apesar da
fenologia ser trabalhosa e consumir tempo, seus resultados são fundamentais
para se avaliar a disponibilidade de recursos para os frugívoros.

O que observar
Após escolher e marcar os indivíduos, deve-se definir o que se vai observar ou
as fenofases que se desejam estudar. As fenofases ou fases a serem estudadas
dependem do objetivo do estudo proposto. Em estudos de frugivoria, normal­
mente se estuda a frutificação, que pode ser desdobrada nas fenofases frutos
verdes e frutos maduros. Muitos observam também a presença de flores, que
pode ser utilizada como-indicativo da capacidade reprodutiva da planta (razão
flor/fruto). Para a observação, utilize binóculos claros com magnitude 8 x 30, 8

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x 40 ou 10 x 40, para poder ter uma melhor observação da copa ou dossel, no


caso de árvores e lianas (evite binóculos 10 x 50, pois são muito difíceis de
detectarem objetos pequenos, são pesados e com baixa luminosidade). Em
locais onde a pluviosidade é maior que 3.000 mm/ano recomendam-se binócu­
los à prova d’água (Leica ou Zeiss). Numa planilha preparada previamente
(Tabela 1), deverá ser anotada a presença ou ausência de flores ou frutos. Se
houver a presença de flores, é aconselhável anotar se a planta apresenta botões
florais ou flor já aberta (antese). Para frutos, deve-se anotar se estão verdes
(imaturos) ou maduros. Colete sempre os indivíduos com flores e frutos, faça
exsicatas, procure um especialista para identificá-las e deposite-as num Herbá­
rio, como material testemunho e para que outros pesquisadores possam utili­
zar. Caso a espécie que você estudou seja renomeada por um taxonomista,
você terá uma amostra coletada para verificar o novo nome da sua planta.
Existem vários estudos fenológicos que podem servir de modelo (Morellato &
Leitão-Filho ‘1 992, 1996, Morellato et al. 1989, 2000).

Tabela 1. Modelo de tabela de campo para avaliação da fenologia.

Local: Data: Observador:

Espécie Número do Frutos Frutos Flores Observações


indivíduo verdes maduros

Como estimar a produção de frutos?


Existem vários métodos para quantificar a produção de frutos. Todos possuem
vantagens e desvantagens e, novamente, sua escolha depende dos objetivos
do estudo proposto. Descreveremos brevemente alguns desses métodos, mas
sugerimos a leitura da bibliografia citada, para discussão e comparação entre
diferentes métodos e sua utilização mais adequada.

(1) P resen ça/au sên cia - Esse método consiste em observar diretamente a copa
das árvores, registrando somente a presença ou ausência de flores e frutos
(Frankie et al. 1974, Morellato et al. 1989). Ele nos oferece o número de espécies
e indivíduos com frutos em um determinado local, porém, não nos fornece a
quantidade de frutos disponíveis para frugívoros.
FENOLOGIA, FRUGIVORIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

(2) P ercen tu al d e in ten sid a d e d e F o u r n ie r - Método de quantificação fenOlógi-


ca proposto por Fournier (1974), em que a fenofase é quantificada segundo
uma escala de 5 categorias (0 a 4), e que permite calcular a porcentagem de
intensidade da fenofase (0 = ausência da fenofase, 1 = presença da caracte­
rística (flor ou fruto) com uma variação de 1 a 25% ; 2 = presença da caracte­
rística com uma variação de 26 a 50% ; 3 = presença da característica com
uma variação de 51 a 75% ; 4 = presença da característica com uma variação
de 76 a 100% ). Em cada mês, faz-se a soma dos valores de intensidade obti­
dos para todos os indivíduos de cada espécie 'e divide-se pelo valor máximo
possível (número de indivíduos m ultiplicado por quatro). O valor obtido-,
que corresponde a uma proporção, é então m ultiplicado por 100, para trans­
formá-lo em um valor percentual. Para comparação entre os métodos (1) e (2),
veja Bencke (1999).
(3) C oletores d e frutos (fruit traps) - Esse método consiste na distribuição ale­
atória de caixas (coletores) de frutos no chão da mata. Os frutos dentro dos
coletores devem ser coletados e pesados a cada semana, quinzena ou mensal­
mente (Smythe 1970). Este método é um dos mais utilizados em estudos de
frugivoria. Entretanto, para alguns autores, fornece apenas a quantidade de
frutos não consumidos pelos animais arborícolas. Para mais comentários, veja
Kollmann &-Goetze (1998). Alguns estudos com coletores são m ais sofistica­
dos, fazendo coletas semanais, identificando as espécies que caem nos coleto­
res e estimando o número e o peso de frutos caídos, por espécies (Wrigth &
Calderon 1995, Wright et al. 1999).

As dimensões dos coletores irão fornecer a área amostrada. A maioria dos


estudos utiliza coletores entre 0.25 a 1 m2. Deve-se notar que coletores baixos
podem ter seu conteúdo alterado pela remoção de sementes ou frutos por
animais, como cutias e porcos. Outro fator importante a ser considerado é o
tempo de coleta. Em áreas onde a umidade é muito alta, os frutos devem ser
coletados semanalmente ou quinzenalmente para não apodrecerem.

(4) Contagem n o c h ã o d a m ata - Esse método é bastante similar ao anterior,


mas em lugar de coletores, o pesquisador anda em trilhas pré-estabelecidas,
olhando o chão e contando (ou estimando) o número de frutos em uma deter­
minada largura de trilha (Charles-Dominique et al. 1981). Assim como o méto­
do anterior, esse método não amostra a quantidade real de frutos disponíveis
a frugívoros arborícolas (ver referências no fim deste item). Deve-se tomar cui­
dado, também, em não amostrar frutos velhos, que provavelmente já foram
contados em amostras anteriores.

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(5) C ontagem n a co p a - Esse método consiste em contar (ou estimar) a quanti­


dade de frutos observados (Chapman et al. 1992). É o método que mais se
aproxima da quantidade de frutos produzida pelos indivíduos, disponível
para animais arborícolas. E difícil de ser aplicado, pois a visibilidade no inte­
rior da mata geralmente é muito baixa e a contagem de frutos é difícil, especial­
mente quando são pequenos e muito numerosos. Geralmente, amostra melhor
frutos grandes e conspícuos (ver referências no fim deste item).

(6) C ontagem d e p la ta fo rm a s - Esse novo método consiste em contar os frutos


a partir de plataformas localizadas à altura das copas das árvores (Zhang &
Wang 1995). É limitado porque o observador terá poucos indivíduos para ob­
servar, restritos ao campo de visão da plataforma, além de ser custoso e mesmo
perigoso. Permite uma boa visão da copa das árvores, mas também fica preju­
dicado no caso de frutos não expostos produzidos no interior da copa.

" Como vimos, há diversos métodos de avaliação fenológica e quantificação de


frutos. Não há um consenso sobre os métodos a serem utilizados, e estes po­
dem variar muito na dependência dos objetivos do estudo proposto. Portanto,
nossa intenção foi apresentar alguns dos métodos mais utilizados e mostrar a
literatura básica que discute o assunto, para que você possa consultá-la no
momento da escolha do método de observação e quantificação. Poucos estudos
têm se preocupado em avaliar métodos de observação fenológica (Fournier
1974, Fournier & Charpantier 1975), embora exista estudo recente comparan­
do diferentes métodos de avaliação (Bencke 1999). Quanto aos métodos rela­
cionados à avaliação e quantificação de frutos, sugerimos a consulta de alguns
estudos quando da escolha de métodos para seu trabalho (Chapman et al.
1992, 1994, Zhang & Wang 1995, Greene & Johnson 1994, Kollmann & Goetze
1998, Stevenson et al. 1998).

Frugivoria
O estudo da frugivoria avalia qualitativamente e quantitativamente quais os
frutos consumidos pelos animais. Os dados sobre frugivoria dependem muito
do tamanho da sua amostra. É comum que pesquisadores cheguem a conclu­
sões errôneas, como considerar uma espécie especialista em determinados fru­
tos, em razão da amostragem realizada ter sido pequena. Outro erro comum é
sugerir que uma espécie é especialista em determinado item ou espécie de
fruto sem ter avaliado a disponibilidade dos recursos no ambiente (Collar et
al. 1992). Não podemos dizer, por exemplo, que a jacutinga (Pipile jacutinga)
é especialista em frutos de palmito (E uterpe edu lis), porque essa planta é,

402
FENOLOGIA, FRUGIVORIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

geralmente, a mais abundante em florestas pouco alteradas.

Para se determinar a sazonalidade na dieta de frutos de um frugívoro é neces­


sário obter amostragens significativas durante todo o ano, juntamente com a
fenologia dos recursos explorados pelos animais (Galetti 1992). Frequente­
mente amostras viciadas em uma determinada estação do ano produzem con­
clusões errôneas sobre a frugivoria de uma determinada espécie. O fato de se
amostrarem mais frutos nas fezes de carnívoros na estação seca, por exemplo,
não significa que a espécie consuma mais frutos nessa época, como se alega em
alguns trabalhos. Revela, apenas, que as fezes são mais facilmente encontradas k
nessa estação. Quanto maior for a variação nos itens alimentares registrados na
dieta de um animal, maior deverá ser sua amostragem. Espécies mais genera-
listas terão maior variabilidade na dieta de frutos (ex. Cebus a p e lla ) que espé­
cies mais especialistas.

Conteúdo estomacal, esofágico ou fecal


Esse método consiste em analisar o conteúdo do estômago, do esôfago ou das
fezes do animal. A análise de conteúdo estomacal de alguns frugívoros (princi­
palmente granívoros) não é precisa, porque muitos itens estão fragmentados e
sua identificação é difícil (exemplo: psitacídeos e roedores).

Vários tipos de material podem ser analisados: fezes, estômagos de animais


atropelados, abatidos por caçadores ou para coleções zoológicas. As análises
dos estômagos ou fezes, em laboratório, requerem pouco equipamento: uma
lupa, pinças, bisturi, peneira de diferentes malhas, placas de p etri, paquíme­
tro, dinamômetros (pesolas) e “cilindros graduados” para determinação de volu­
me. Várias medidas podem ser tomadas na análise de cada amostra (Tabela 2).

Após a coleta do animal, o estômago é removido e seco, a temperaturas cons­


tantes de 60-80° C. Os conteúdos também podem ser preservados em formol
10% (Long 1984). Após a secagem, os conteúdos são pesados e identificados
em lupa ou microscópio. A coleta das fezes no campo requer a etiquetagem, na
qual o pesquisador deve identificar a espécie de animal que defecou, local,
data de coleta e o microssítio (por exemplo: em cima de cupinzeiro, na borda
da mata etc). A análise de estômagos e fezes é um trabalho minucioso e pacien­
te, no qual o pesquisador deve anotar todas as características das sementes,
polpa e outros conteúdos que possam ajudar na identificação exata dos itens
(Bodmer 1989, 1991, Henry 1999).

Alguns autores argumentam que pelo menos 100 estômagos são necessários
para se obter uma am ostragem rep resen tativ a da dieta de uma espécie

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MARCO A U RÉLIO PIZO
PA TRÍCIA C. MO RELLA TO

Tabela 2. Análise de fezes e conteúdos estom acais.

Espécie analisada:---------------------------
Data da coleta:__?___________ .Local:

; /•
Amostra Volume do Número Número Espécies Tamanho
n° estômago de de de sementes
(ml) itens sementes sementes e estado1

1 Se a semente está quebrada ou não.

(Korschegen 1987). Entretanto; esse número parece abusivo em regiões tropi­


cais onde a densidade de vertebrados é baixa e várias espécies estão ameaça­
das (veja Érard et al. 1991, Bodmer 1991). Por outro lado, nas regiões tropicais
a diversidade de itens amostrados é extremamente alta, o que dificulta a avalia­
ção correta da dieta das espécies estudadas. A análise de fezes, entretanto, é a
mais utilizada para estudos com aves e mamíferos (Motta Jr. et al. 1996), enquanto
a análise de conteúdo estomacal é mais utilizada para peixes (Gottsberber 1978,
Waldhoff et al. 1996).

Todos os estudos que visam identificar as espécies de frutos que são utiliza­
dos por uma espécie animal devem possuir uma coleção de referência de fru­
tos e sementes para análises comparativas. As carpotecas (coleção de frutos)
devem possuir amostras de frutos maduros preservados em álcool 70%: Nos
frascos, as amostras devem conter uma etiqueta com determinação da espécie,
local de coleta, cor dos frutos (já que alguns frutos mudam de cor no álcool),
data de coleta e local. Sempre que possível, deve-se colocar algumas sementes
no mesmo frasco - elas serão úteis para comparar com sua amostra. Também é
recomendável o pesquisador tomar medidas morfométricas de pelo menos 10
frutos de cada espécie (Tabela 3). Essas medidas podem ser usadas para se
fazer uma análise do tamanho de frutos em uma comunidade, em comparação
com os tamanhos de frutos utilizados pelos frugívoros (veja Herrera 1982,
Wheelwright 1985J.
*

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FENOLOGIA, FRUGIVORIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

Tabela 3. Ficha de descrição morfológica dos frutos.

Fam ília: K sn é rie :


Local e data de ro le ta :
Cor fru to: D isp e rso r:
Estrato1:

Fruto Peso Peso Peso da Número Comp. L arg u ra Com p. L argura


n° fruto Sem ente polpa/arilo de fruto fru to s e m e n te 1s e m e n te
(g) (g) (g) sem entes (mm) (mm) (mm) (mm)

’ . Estrato: sub-bosque, dossel etc.

Vários métodos têm sido empregados para avaliar quantitativamente os itens


alimentares encontrados no estômago ou nas fezes de uma espécie, não exis­
tindo, porém, um consenso sobre qual o método mais adequado. Cada pesqui­
sador terá que avaliar qual o mais recomendado para a espécie em questão.

Um método simples de análise é anotar se o estômago possui (1) somente


artrópodes, (2) somente frutos, (3) misto (frutos e insetos) ou (4) material vege­
tal não identificado (Remsen et al. 1993). Outros dados a serem anotados em
etiquetas-padrão são: quantidade de semenjes, se existe sementes predadas ou
inteiras, volume e peso de cada espécie, frequência de ocorrência da espécie
nas amostras. O grau de preferência alimentar também pode ser empregado
para estômagos cheios (Braga 1999).

Câmeras automáticas (c a m e r a traps)


O uso de câmeras fotográficas automáticas para estudos de fauna tem recebido
maior atenção nos últimos anos (Griffiths & van Schaik 1993, Jones & Raphael
1993, capítulos 10 e 11 neste volume), sendo empregado, também, para estu­
dos de frugivoria (Miura et al. 1997, Spironello 1999). Esse método consiste
em instalar um sensor de calor e movimento direcionado aos frutos colocados
no chão e ligado a uma câmera fotográfica. O censor dispara a câmera quando

405
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PATRÍCIA C. MO RELLA TO *

um objeto se move em seu campo de detecção (Figura 1). As câmeras automá­


ticas são especialmente úteis para avaliar a remoção de frutos durante a noite
por frugívoros furtivos, ou para estudar espécies de plantas em que a taxa de
remoção de frutos é muito baixa (exemplo: sementes miméticas, O rm osia spp.).

Figura 1. Cotia (Dasyprocta leporina) visitando experimentos de remoção de jatobá (Hymenaea


courbaril).

Análise de m arcas nos itens alimentares


Alguns frugívoros deixam marcas singulares nos frutos que consomem, como
esquilos, psitacídeos, alguns primatas e morcegos (Figura 2). Caso o pesquisa­
dor deseje apenas listar qualitativamente as espécies consumidas por um de­
terminado frugívoro, ele pode recorrer à análise de marcas deixadas pelos
animais nos frutos caídos no chão (Galetti & Rodrigues 1992, Galetti et al.
1992). Esse método também pode ser útil para avaliar preferência alimentar
ontogenética, como em esquilos (Bordignon et al. 1996). Esse método depende
muito da experiência do observador e da fauna do local. Em locais onde pos­
sam ocorrer duas espécies que marcam os frutos de modo semelhante, esse
método não é recomendável.

406
\

FENOLOGIA, FRUGIVORIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

Figura 2. Padrão de abertura do caxinguelê (Sciurus ingrami) em coquinhos de gerivá [(Syagrus


romanzoffiana (Palmae)].

Observação focal
Este método consiste em permanecer próximo a uma planta com frutos madu­
ros, registrando os animais que dela se alimentam, assim como o seu compor­
tamento. Para essas observações, escolha árvores com copa desobstruída, evi­
tando assim que alguns “visitantes” passem despercebidos. Não se deve ficar
muito próximo da árvore, pois isso pode afugentar ou alterar o comportamen­
to dos animais visitantes; quanto mais longe, melhor. As observações devem
ser iniciadas antes do amanhecer, pois esse é o horário em que alguns animais
(por exemplo, os cracídeos) preferencialmente visitam as fruteiras. Embora o
período da manhã seja, em geral, o que propicia o maior número de registros
por representar o horário preferencial de forrageamento dos animais (especial­
mente aves), observações ao fim da tarde também são recomendáveis, já que
alguns frugívoros alimentam-se também ao entardecer (Pizo 1997). Para o estu­
do de morcegos frugívoros, o melhor horário para as observações é no início
da noite, das 19 às 23 horas, que corresponde ao período de maior atividade
de forrageamento desses animais (Coatés-Estrada & Estrada 1986, Fleming &
Williams 1990). Nesses casos, faz-se necessário o pso de lanternas e/ou de
aparelhos para visão noturna, sensíveis ao infravermelho. Em geral, vários
dias são necessários para se ter uma lista confiável dos animais que se alimen­
tam da planta estudada.

Diversos dados podem ser anotados durante as observações focais. Os mais


comumente registrados são: o horário da visita, a espécie visitante, o número de
indivíduos, o tempo de permanência na árvore, o número de frutos consumidos
e detalhes do comportamento (por exemplo: modo de apanhar e manipular os

407
M AU RO G A LETTI
MARCO AURÉLIO PIZO
PATRÍCIA C . M ORELLATO

frutos). Podem-se ainda observar e registrar agressões intra e interespecíficas, a


direção e a distância do deslocamento do animal após se alimentar até o polei­
ro mais próximo e o tempo despendido se alimentando. Uma maneira fácil de
avaliar o tempo gasto pelos frugívoros no forrageamento em uma determinada
planta é usar dois cronômetros. Em um deles marca-se o tempo total da visita,
enquanto o outro cronômetro registra somente o tempo que o animal de fato
despendeu se alimentando. Dessa forma, desconta-se, por exemplo, o tempo
que o animal permaneceu na árvore, descansando ou realizando outras ativi­
dades. Quando um bando ou vários indivíduos de espécies diferentes está ao
mesmo tempo na árvore, deve-se fixar a atenção sobre um único indivíduo e
apenas registrar a presença dos outros.

Fica claro que nem todos os dados acima citados podem ser coletados por um
único observador em cada visita de um anim al à árvore. Dessa forma, são
necessárias várias horas de observação para que se obtenha dados para todas
as espécies visitantes. O uso de,um a planilha otimiza a coleta de dados no
campo, além de posteriormente facilitar a análise dos dados. A Tabela 4 apre­
senta um exemplo de planilha que pode ser usada para observações focais.

Tabela 4. Modelo de planilha de campo para observações focais.

Espécie/indivíduo Data: Período de


observado: observação:

Horário Espécie N°de Tempo N° de Com porta­ Com porta­ Outras


da visitante Indivíduos total frutos mento m ento observações
visita (g) da visita consum idos alim entar a pós-visita-b

a Refere-se ao modo de apanhar e manipular os frutos.


b Pode-se anotar, por exemplo, que direção tomou o animal após visitar a árvore ou que
distância percorreu até o próximo poleiro.
c Qualquer observação que o observador achar pertinente (e.g., agressões intra e interespe­
c ífic a s ).

408
FENOLOGIA, FRUGIVORIA É
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

Cada observador, no entanto, pode desenvolver sua própria planilha conten­


do apenas os dados que lhe interessam. O uso da planilha no campo apresen­
ta a desvantagem de distrair a atenção do observador enquanto anota os dados,
o que pode fazer com que algumas visitas e/ou comportamentos não sejam
notados. Para minimizar esse problema, alguns pesquisadores preferem regis­
trar suas observações em um gravador portátil para posteriormente transcrevê-
las para a planilha de dados.

Ao contrário do método de transecto descrito abaixo, as observações focais são


recomendadas para o estudo de plantas pouco comuns no ambiente (exemplo:
Virola bicu hyba, C ryptocarya m osch ata, C a bra lea can jeran a). Também em rela­
ção àquele método, a observação focal permite um registro mais detalhado do
comportamento dos animais, além de tornar mais provável o registro de visi­
tantes pouco comuns. Esse método, no entanto, não avalia a dieta global das
espécies, uma vez que as observações estarão centradas na espécie de planta
observada. Por exemplo, se você quiser avaliar a dieta do caxinguelê (Sciurus
ingrami) e fizer observações focais somente em jerivá (Syagrus rom an zoffia-
na), chegará à conclusão, errônea, de que esse esquilo é especialista em comer
frutos de jerivá. Se o seu estudo não leva em consideração o efeito da quanti­
dade de frutos produzidos sobre aspectos da frugivoria, recomenda-se esco­
lher as plantas mais produtivas, ou seja, aquelas com maior número de frutos
para observação, já que estas, em geral, são visitadas com mais frequência
pelos animais frugívoros (Foster 1990].

Transecto
Esse método consiste em cam inhar vagarosamente por trilhas e/ou estradas
previamente sorteadas e, a cada encontro com indivíduos da espécie em estu­
do se alimentando de frutos, anotar um registro de alimentação (feeding bout).
Dados adicionais que eventualmente podem ser coletados com o uso deste
método incluem horário em que o registro foi realizado, número de indivíduos
se alimentando, espécie vegetal e item consumido (polpa, arilo, semente, fruto
imaturo). Além disso, em algumas observações, é possível ainda registrar o
tempo em que o indivíduo (ou grupo de indivíduos) permaneceu se alimen­
tando, a taxa de alimentação (isto é, o número de frutos consumidos por uni­
dade de tempo) e detalhes do comportamento.

A unidade do registro de alimentação [feeding bout) pode ser variável, ou seja,


você pode considerar como um registro o grupo todo, independentemente de
seu tamanho, ou considerar um registro para cada indivíduo observado. E

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PA TRÍC IA C. MO RELLATO

mais utilizado considerar um registro para o grupo todo, já que é difícil contar
1

ou estimar o tamanho dos bandos se alimentando. Outra variação quanto ao


método é considerar um registro para cada espécie consumida ou para cada
indivíduo consum ido. Por exemplo, se um grupo de seis tucanos-de-bico-
preto [R am phastos vitellinus) está consumindo a polpa dos frutos do palmito,
você deve anotar um registro, mas se um ou mais tucanos voar para outro
palmiteiro, outro registro é anotado, embora a espécie consumida seja a mes­
ma (Galetti et al. 1999). No fim do seu estudo você terá vários registros de
alimentação e, para ter uma ideia da importância relativa das espécies consu­
midas na dieta da espécie em estudo, basta calcular a porcentagem de regis­
tros, o tempo total de consumo ou, até mesmo, o número de itens consumidos
por espécie de planta (Galetti & Aleixo 1998, Galetti et al. 1999).

Se o-interesse é estudar a dieta de uma determinada espécie de animal, reco­


menda-se usar o método de transecto para espécies relativamente abundantes
e/ou com extensa área de vida como, por exemplo, psitacídeos (Pizo et al.
1995) e tucanos. Se o estudo, no entanto, está focado nas plantas, o método de
transecto é especialm ente recomendado para espécies abundantes, preferen­
cialm ente aquelas que frutificam abundantemente (exemplo: E uterpe edulis,
Galetti et al. 1999). Com a utilização desse método, as espécies que apenas
raramente se alimentam da planta em estudo podem não ser registradas. Para a
observação dessas espécies, as observações focais são mais recomendadas.
-r

Redes de neblina
Redes de neblina têm sido amplamente usadas para o estudo da dieta de aves
e morcegos frugívoros (Loiselle & Blake 1990, 1999). Para isso o animal captu­
rado é colocado dentro de um saco de pano por 10-15 min, tempo em geral
suficiente para que ele defeque as sementes contidas em seu tubo digestivo. A
ave é, então, liberada e as fezes são coletadas e conservadas em álcool 70% ou
FAA (Formol - Álcool Ácido Acético) para análise posterior. Uma outra ma­
neira de obter as sementes do animal capturado é provocar sua regurgitação
através da administração de uma substância emética. Este método, conhecido
como tártaro emético, vem sendo utilizado para o estudo da dieta de aves
(Poulin et al. 1994, Poulin & Lefebvre 1995, Mallet-Rodrigues et al. 1997) e
consiste em fornecer oralmente à ave uma solução de Tartarato de Antimônio e
Potássio a 1%, através de um tubo plástico flexível ligado a uma seringa. O
tubo é cuidadosamente inserido até o esôfago da ave e a solução administrada
lentamente na dosagem de 0,8 cm 3 para cada 100 g de massa corporal da ave.

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FENOLOGIA, FRUGIVO RIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

\
Após a administração, a ave deve ser mantida em um saco de pano, como
descrito anteriormente.

O uso de redes de neblina para o estudo da dieta dos animais frugívoros


apresenta a vantagem de revelar o consumo de frutos pertencentes a espécies
pouco comuns e que raramente são observadas ao longo de transectos ou em
observações focais. Apresenta, entretanto, algumas desvantagens, como: (1)
amostra apenas os animais que voam a pouca altura (aves de sub-bosque; veja
Remsen & Good (1996) para os possíveis vícios relacionados ao uso de redes
de neblina para a captura de aves); (2) subestima a importância dos frutos que
apresentam sementes grandes, já que estas ou não são ingeridas ou não pas­
sam por todo o tubo digestivo; e (3) requer a utilização de uma coleção de
referências de sementes para possibilitar a identificação das espécies de frutos
consumidos. Todos os métodos possuem vantagens e desvantagens e depen­
derá do pesquisador determinar qual o método que melhor se adapta à espécie
a ser estudada (Tabela 5).

Tabela 5. Comparação dos métodos para se avaliar frugivoria

Método Vantagem Desvantagem

Conteúdo Avalia-se a proporção exata Necessário sacrificar o animal


estomacal dos frutos ingeridos, estado (estômago)
ou fezes da semente no tubo digestivo

Transecto Plantas com alta densidade Não detecta detalhes de comporta­


mento, quantos frutos são consu­
midos etc

Focal Detalhamento

Câmeras Detecta animais furtivos e de Não avalia o comportamento do


automáticas difícil visualização, plantas com animal referente ao fruto
baixa taxa de remoção dos frutos

Redes Não amostra sementes grandes,


de neblina nem animais na copa das árvores

Dispersão
O estudo da dispersão das sem entes envolve aspectos relacionados à frugi­
voria, como, em geral, quais anim ais se alim entam de determinado fruto e,
portanto, podem ser os dispersores das sem entes, e o número de sementes

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PATRÍCIA C. M ORELLATO

potencialmente dispersadas. Também envolve outros aspectos que, no entan­


to, vão além do âmbito dos estudos de frugivoria. Para concluirmos sobre a
qualidade da dispersão de sementes proporcionada por um determinado ani­
mal frugívoro, devemos avaliar, por exemplo, como esse animal processa o
fruto e trata as sementes ingeridas, a viabilidade dessas sementes, a distância
de dispersão e o local em que são depositadas (Schupp 1993). Dessa forma,.os
métodos empregados para o estudo da dispersão são distintos daqueles usa­
dos para a frugivoria. Abaixo estão descritos os métodos mais comumente
empregados. Esses métodos podem variar enormemente em seus detalhes,
dependendo do sistema de dispersão a ser estudado, da experiência de cada
pesquisador e da disponibilidade de material. Cabe, portanto, ao pesquisador
adaptar o método a sua realidade sem, é claro, perder a precisão dos resultados.

Germinação de sementes
A avaliação da taxa de germinação das sementes nas fezes dos frugívoros é a
primeira etapa para determinarmos se um animal é “bom ou mau” dispersor.
Para isso, as sementes coletadas devem ser lavadas em água corrente sobre
uma peneira de malha fina (< 1 mm2 ou 5 mm2). Existem diversos tratamentos
que são realizados para testar a germinabilidade da semente (exemplo: germi­
nação no claro versus escuro), e essa é uma área bastante promissora da fisiolo­
gia vegetal. Entretanto, a maioria dos estudos ecológicos utiliza a germinação
em verm iculita ou em placas de petri, sob papel absorvente, colocadas em
estufa. Alguns autores utilizam antifúngicos para evitar a infestação de fungos
nas sementes.

Dependendo da espécie, é interessante avaliar não somente a taxa (proporção)


de sementes germinadas contra o controle (sementes que não. passaram pelo
tubo digestivo do animal), mas também a velocidade de germinação. O pesqui­
sador também pode comparar diferentes tratamentos, como sementes que pas­
saram pelo tubo de um animal, sementes sem arilo (removidos manualmente)
e sementes com arilo (Figbeiredo & Perin 1995, veja revisão de Traveset 1998).

Observação direta
O registro da distância de dispersão e do local de deposição da semente por
observação direta do agente dispersor é inviável para a maioria dos dispersores
de sementes. Com a presença próxima do observador, o dispersor pode rapidà-
mente se afastar ou alterar seu comportamento. Entretanto, no estudo da mirme-
cocoria (isto é, dispersão de sementes por formigas), é possível acompanhar as
formigas enquanto elas removem as sem entes para seus ninhos (Passos &

412
FEN OLOGIA, FRUG IVO RIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

Ferreira 1996, Pizo & Oliveira 1999). Para isso, basta que o observador se mova
com cautela e tenha paciência, já que o caminho adotado por uma formiga para
chegar ao seu ninho nem sempre é aquele que julgamos ser o mais curto. As
formigas que dispersam sementes geralmente as removem para seus ninhos,
onde aproveitam a parte carnosa que envolve a semente (elaiossomo, polpa ou
arilo) para, depois de alguns dias, descartá-la em torno da entrada do ninho.
Assim, ao se acompanhar uma formiga carregando semente para seu ninho,
pode-se ao mesmo tempo registrar a distância de dispersão (normalmente <
10 m no caso das formigas) e o local de deposição da semente.

No estudo da m irm ecocoria, há ainda a possibilidade de manter colônias de


formigas em laboratório a fim de verificar o tratamento dado às sementes no
interior das colônias. Os ninhos artificiais podem áer montados em bandejas
plástiqas (em geral de 30 x 20 cm), cujas bordas foram previamente pincelas
com Fluon® ou qualquer outra substância que impeça a fuga das formigas.
Os ninhos podem ser construídos com gesso ou tubos de vidro transparente
(Holdobler & Wilson 1990). Neste último caso, colocam-se no centro da bande­
ja dois ou três tubos de ensaio com um pouco (4-5 cm) de água. A água,
importante para manter a umidade no interior da colônia, é mantida separada
do restante do tubo por um chum aço de algodão. Recom enda-se cobrir os
tubos com uma placa plástica transparente ou papéis celofanes vermelhos que
escurecem o interior do ninho, sem impedir a sua observação. As colônias
cativas devem ser mantidas em ambiente tranquilo e preferencialmente à tem­
peratura constante de 25°C. As formigas devem ser alimentadas a cada dois
dias com alimentos de origem animal (em geral, insetos, sardinha) e uma dieta
sintética desenvolvida por Bhatkar & Whitcomb (1970). '

Marcação de sementes com linhas


Para o estudo da dispersão de sementes por roedores, especialmente cutias
(Dasyprocta spp.), ratos-de-espinho (Proechim ys spp.) e, na Amazônia, cutia-
ras (M yoprocta spp.), é comum o uso de sementes marcadas com linhas. Esses
roedores têm o hábito de armazenar as sementes que encontram no solo para
consumo posterior. Algumas dessas sementes armazenadas, no entanto, nun­
ca são recuperadas e podem vir a germinar e se estabelecer. Para marcar as-
sementes, deve-se primeiramente perfurá-las (com uma furadeira elétrica, por
exemplo) e, através desse furo, atá-las a pedaços de barbante de 50-60 cm na
extremidade, aos quais amarra-se um pequeno pedaço de fita colorida (veja
figura em Forget 1990, e Figura 3). As sementes assim marcadas são colocadas
diretamente sobre a serrapilheira, sob a copa de árvores ou arbustos com

413
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frutos. Após algum tempo de exposição aos roedores, as sementes eventual­


mente dispersadas são visualmente procuradas a partir do local em que foram
inicialm ente colocadas. A procura das sementes removidas é facilitada pelo
barbante e pela fita colorida usados para marcá-las, que permitirão a localiza­
ção até mesmo das sementes enterradas pelos roedores, hábito comum entre as
cutias, e pela constatação de que as sementes geralmente são armazenadas
próximas a objetos naturais (em geral, um tronco caído ou a base de uma
árvore) e não muito longe do local onde foram inicialm ente descobertas pelos
roedores (Forget 1990, Cintra 1998).

Figura 3. Sem en tes de A strocaryum aculeatissim um (Palmae) m arcadas com carretéis e


linhas para estudar o destino das sem entes dispersas por mamíferos.

Normalmente, quatro “destinos” são possíveis para as sementes marcadas: (1)


elas podem não ser removidas e, portanto, permanecer intactas; (2) podem ser
predadas no local onde foram inicialm ente colocadas, quando, então, apenas
o barbante e â fita çolorida sem a semente são encontrados; (3) podem ser
armazenadas e posteriormente recuperadas pelos roedores, quando, então,
apenas o barbante e a fita colorida sem a semente são encontrados a uma certa
distância do local onde foram inicialm ente colocados; e (4) podem ter sido
efetivamente dispersadas, quando a semente, ainda atada ao barbante, pode
ser encontrada enterrada (no caso da cutia) ou sob a serrapilheira (caso o dis-
persor seja um rato-de-espinho) (Peres & Baider 1997, Peres et al. 1997).

Este método é normalmente usado para investigar a dispersão de sementes


grandes, que são aquelas mais frequentemente armazenadas pelos roedores.
Ele permite medir a distância exata de dispersão a partir da árvore-mãe. A pro­
babilidade de reencontrar uma semente armazenada diminui com a distância em

414
FENOLOGIA, FRUG IVO RIA E
D ISPERSÀ O DE SEM EN TES

relação ao local onde foi inicialm ente colocada, o que faz com que a proporção
de sementes recuperadas através do uso deste método seja normalmente baixa.
Por isso, sua eficácia limita-se a dispersões de curta distância (< 20 m).

Magneto (ímã) ou substâncias radioativas \


O uso de compostos radioativos para a marcação de sementes tem sido feito
principalmente em estudos de dispersão por roedores (Vander Waal 1990;
Vander Waal et al. 1998). As sementes são marcadas com radioisótopos, como
Scandium-46, um emissor de raios gama de meia vida de 84 dias. As sementes
são, então, rastreadas com um detector de radioatividade (Eberline ASP-1),
que pode detectar as sementes a cerca de 30 cm de distância.

O uso de ímãs é sem elhante ao de radioisótopos, porém, as sementes são


marcadas com ímãs e depois rastreadas com detector de metais (Cintra 1998).
Esse método é pouco utilizado por sér custoso e por amostrar dispersão a
curta distância. Além disso, a presença de pregos e outro material no ambiente
podem confundir o resultado (W. Spironello com. pess.).

Pó fluorescente
O pó fluorescente tem sido utilizado para o estudo de fluxo de pólen e rara­
mente se aplica a estudos de dispersão. Frutos de sementes dispersas por
formigas têm sido marcados com pó fluorescente. Assim, tanto o destino como
a rota através da qual o fruto é levado podem ser encontrados com a ajuda de
lanternas com luz ultravioleta (Bossard 1990). É imprescindível que o elaios-
soma (local onde a formiga carrega o fruto) não receba o pó, para não influen­
ciar na escolha dos frutos,pelas formigas. Esse.método pode ser empregado
para o estudo de dispersão por formigas e roedores em que a distância de
dispersão é geralmente curta. Também é mais recomendável para locais secos,
abertos e com pouca liteira. O principal problema desse método é que o pes­
quisador deve tomar muito cuidado com o manuseio do pó fluorescente para
não “contaminar” a vegetação, além do pó poder ser lavado facilmente pela
chuva. Também como na frugivoria (Tabela 5), os métodos a serem escolhidos
para se estudar a dispersão de sementes irão depender da espécie a ser estuda­
da (planta e animal) e do local (Tabela 6).

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Tabela 6. Comparação dos métodos para se avaliar o destino das sem entes dispersas por
an im ais.

Método Tipo de fruto Vantagem Desvantagem

Pó fluorescente Sementes ' Rota de Só pode ser usado em área


pequenas dispersão aberta, sai com a chuva,
ou grandes necessita de cuidado para
não cair na vegetação

Marcação Sementes Custo baixo Animais cortaïn o fio,,


com linhas grandes baixa taxa'de recuperação
de nylon das sementes

ímã ou Sementes Custoso, detecta somente


radioisótopo grandes sementes a pequenas
distâncias

Observação Qualquer Necessita de grande número de


direta tipo de fruto amostras, difícil de localizar

Experimentos de exclusão
Estudos naturalísticos sobre dispersão de sementes geralmente esbarram na
impossibilidade de se controlar todas as variáveis, como eficiência na disper­
são, remoção secundária das sementes encontradas nas fezes, sítio de deposi­
ção das sementes, estabelecimento das plântulas. Portanto, experimentos de
exclusão de um determinado grupo (formigas, roedores ou aves) poderão indi­
car precisamente qual a importância de cada grupo na remoção de sementes.
Esses experimentos, chamados de “ca feteria ex perím en ts”, estão se tornando
bastante comuns, principalmente para estudos de predação de sementes (Hul-
me 1998, Hulme & Hunt 1999, Edwards & Crawley 1999, Pizo & Oliveira 1999).

Uma premissa importante desses experimentos é ter certeza de que cada trata­
mento de exclusão (de roedores, aves ou formigas) é inviolável, ou seja, que o
grupo a ser excluído não tem acesso às sementes oferecidas. Geralmente dois
ou três tratamentos são realizados e os controles são comparados

(1) tratam en to d e ex clu são d e fo rm ig a s e outros in vertebrados - Nesse trata­


mento, as sementes são colocadas sobre placas de p etrí fixadas sobre uma
haste de metal (prego) a 5-10 cm do solo. Para evitar o acesso de formigas, a
haste m etálica é melada com graxa ou Tanglefood®, um produto usado em
jardinagem para evitar o acesso de formigas às plantas.

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FEN OLOGIA. FRUGIVORIA E
D ISPERSÃ O DE SEM EN TES

(2) tratam ento d e ex clu são d e roed o res - Esse tratamento consta de uma gaiola
metálica (15 x 15 x 10 cm) revestida por tela de arame (malha de 1,5 cm) com
aberturas laterais pequenas que permitem o acesso de roedores, mas impedem
o acesso de aves granívoras (Columbídeos e Tinamídeos).

(3) tratam ento aberto (controle) - Neste tratamento as sementes são dispostas
no chão da mata e todos os animais (aves, roedores e formigas) têm acesso às
sementes.
Cada tratamento é, geralmente, espaçado de dois a cinco metros um do outro e
cada estação (ca fe ter ia ) fica distante entre 50 e 100 metros uma da outra. Ano-
ta-se a proporção de sementes removidas após 7 a 30 dias do início do experi­
mento. O pesquisador deve levar em conta sempre a pergunta que norteia o
trabalho e não esquecer de obter o máximo número de réplicas possíveis.

Considerações finais
São vários métodos utilizados para o estudo da fenologia, frugivoria e disper­
são de sementes. Como ressaltado ao longo deste capítulo, a escolha de cada
método depende dos organismos estudados e das perguntas que o pesquisa­
dor pretende responder. Sugerimos que antes de iniciar um estudo o pesqui­
sador procure:
1) Ler trabalhos semelhantes para se familiarizar com o método que está sendo
mais empregado para seu objeto de estudo.

2) Fazer testes pilotos no campo antes do início das coletas, com o objetivo de
testar os métodos empregados.

3) Lembrar que a confiabilidade dos dados irá depender de que o desenho


amostrai evite pseudorreplicações (Hurlbert 1984), tanto nos experimentos de
campo como nos testes de germinação.

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422
16 Estruture da paisagem:
ousu adequado de métricas
Jean Paul Metzger
Instituto de Biociências, USP

Introdução
Como a ecologia da paisagem lida com a relação entre padrões espaciais e
processos ecológicos, é necessário quantificar com precisão os padrões espa­
ciais. Uma das formas de quantificação é a utilização das chàmadas “métricas
da paisagem” ou “índices da paisagem”. Seria impossível escrever aqui um
manual de cálculo e uso de índices da paisagem. Esta é uma tarefa para um
outro livro, voltado unicamente para essa questão. Porém, já existem vários
manuais sobre o assunto, como o livro do Frohn (1998) ou mesmo o de uso do
programa Fragstats (McGarigal & Marks 1995), mais utilizado para cálculo de
métricas da paisagem. Há também artigos de síntese excelentes, como Ritters et
al. (1995), Gustafson (1998), Hargis et al. (1998) e Fortin (1999). Assim, é
importante que o leitor consulte estas referências para maior detalhamento no
cálculo de métricas da paisagem. Este capítulo ficará restrito à apresentação
alguns índices e dicas de seu uso no planejamento de um estudo em ecoldgia
da paisagem.

Antes de calcular as métricas


Todos os índices apresentados a seguir são calculados a partir de mapas cate­
góricos, isto é, formados por classes ou unidades descontínuasT ou seja: tipos
de vegetação, classes de uso e ocupação dos solos, unidades pedológicas,
dentre outros. Para variáveis contínuas, como índices de vegetação ou valores
de refletãncia e radiância, os métodos de análise quantitativa da paisagem ba­
seiam-se em outros princípios, provenientes das geoestatísticas. Essa parte
das análises espaciais não será tratada aqui, mas podem-se encontrar sínteses
excelentes em Turner et al. (1991), Rossi et al. (1992) e Fortin (1999).

Os mapas categóricos são, em geral, obtidos através da interpretação visual de

423
JEAN PAUL M ETZG ER

fotografias aéreas ou da classificação de imagens de satélite. Nessa etapa, é


necessário ter particular cuidado com dois aspectos: a legenda e a validação do
mapeamento no campo. Antes mesmo de iniciar o mapeamento, deve-se pen­
sar com cuidado na definição da legenda em virtude do objetivo do estudo.
Em alguns casos, um mapa contendo apenas mata e não mata pode ser suficien­
te. Em outros casos, é necessária uma descrição mais pormenorizada da vege­
tação, incluindo, por exemplo, matas em diferentes estádios sucessionais se­
cundários. Uma legenda demasiadamente detalhada ou demasiadamente sim­
ples para os objetivos propostos resulta em um esforço desnecessário ou na
impossibilidade de se atingir o objetivo. Ambos os casos devem ser evitados.

Uma vez feita a interpretação das fotografias aéreas ou a classificação da ima­


gem de satélite, é necessário indicar ao leitor a acuracidade do mapa produzi­
do, de forma a avaliarmos a importância dos erros. Poucos mapas são 100 %
corretos. Sem um mapa de boa qualidade não é possível quantificar correta­
mente o padrão espacial. Em geral, considera-se que um mapa produzido por
meio de classificação numérica tem que ter no mínimo uma acuidade de 85%
(isto é, o mapa tem 15% de erro).

Mesmo que o mapa utilizado tenha sido feito pop outra pessoa, deve-se sempre
verificar a acuracidade da informação e adaptar a legenda para ^ pergunta pro­
posta (o que pode envolver o agrupamento de classes da legenda). É necessá­
rio também procurar fazer ou obter mapas numa escala minimamente compatí­
vel com a pergunta proposta.

Algumas métricas mais importantes


A estrutura da paisagem ou o padrão espacial pode ser quantificado por dife­
rentes parâmetros, índices ou métricas da paisagem (termos aqui usados como
sinônimos). Essas métricas são, em geral, agrupadas em duas categorias: os
• índices de composição e os de disposição. Os parâmetros de composição dão
uma ideia de quais unidádes estão presentes na paisagem, da riqueza dessas
unidades e da área ocupada por elas (o que permite inferir sobre o grau de
dominância espacial). Os parâmetros de disposição vão quantificar o arranjo
espaciál dessas unidades em termos de grau de fragmentação e frequência de
contato entre as diferentes unidades; grau de isolamento e conectividade de
manchas de unidades semelhantes e, finalmente, área, formato e complexida­
de de formas das manchas que compõem o mbsaico da paisagem. Essas métri­
cas de disposição podem ser utilizadas para caracterizar uma mancha (um
fragmento) da paisagem (em termos de tamanho, formato, ou isolamento); uma

424
E ST R U T U R A DA PAISAGEM:
O U SO ADEQUADO DE M ÉTRICA S

unidade da paisagem (por exemplo, a fragmentação das matas, o isolamento


das lagoas); ou, então, a paisagem como um todo (em termos de diversidade,
riqueza, conectividade, por exemplo). Existem mais de uma centena de métri­
cas, porém muitas delas medem a mesma coisa de forma diferente. A seguir
são apresentadas 27 métricas úteis para estudos de ecologia, sendo que algu­
mas estão incluídas no programa Fragstats, o mais utilizado para cálculo de
métricas da paisagem (obtido via internet por ftp:. ftp.fsl.orst.edu). Para uma
descrição mais detalhada das fórmulas e métodos de cálculo das métricas apre­
sentadas, deve-se consultar a tabela 1 e as figuras 1 a 1 0 .

425
Tabela 1. índ ices para quantificar a estrutura da paisagem . As fórm ulas apresentadas referem -se a cálcu los em im agens m atriciais (formato
426

"raster"). São indicadas as figuras de apoio para a compreensão do cálculo dos índices, assim como os índices calculados pelo programa Fragstats.

índ ice c o m o c a lc u la r fig Fragstats sig n ific a d o espa cia l r e fe r ê n c ia

Composição
da paisagem

Riqueza de n n= número de unidades da paisagem 1 ,2 PR Quanto maior n, mais rica é a


unidades paisagem em unidades da
paisagem. É um dos parâmetros
de diversidade da paisagem.
1, 2 RPR
Riqueza R R = nmax 100 onde: De forma similar a n, quanto maior Romme
relativa nmax = número máximo de unidades R, maior a riqueza da paisagem. (1982)
da paisagem (e.g., número de unidades Apresenta a vantagem de ter um
da legenda) valor máximo ( 100 ) quando
1, 2 SHDI n nmav

Diversidade Ho Ho=—£ (pj)in(pj) onde: pi = propor­ Este índice não apresenta valores O’Neill et al.
da paisagem ia limites. Quanto maior o valor, (1988)
ção de área ocupada pela unidade "i”; maior a riqueza e/ou a igualdade
n = riqueza de unidades na distribuição das áreas ocupadas
pelas diferentes unidades da
paisagem. Este índice não é sensível
1, 2 SHEI à disposição espacial das unidades
da paisagem.
Ho Rom m e
E q u a b ilid a d e Eo Eo = V aria de 0 a 1, sen d o q u e o v alo r
. •■rnax m á x im o é atin g id o q u an d o h á u m a (1982).
da p aisag e m onde:
H m ax = d iv e r s id a d e m á x im a d a d is t r ib u iç ã o ig u a l d a á re a o c u p a d a

....... ---------------------------------------------- - —
ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(D

Dominância Do Do = Hmax - Ho 1 ,2 Varia de 0 quando Ho = Hmax a H,max O’Neill et al.


da paisagem quando a paisagem apresenta ape­ (1988)
nas uma unidade (dominância má­
xima). Este índice é inversamente
relacionado àEo.

Diversidade
espacial da
paisagem

Bordas Ei,j Ei,j = X ei,j . 1 É um índice de intensidade de Gardner et al.


onde: contato entre duas unidades da (1987),
ei,j = número de interfaces horizon­ . paisagem. Como o índice não é nor­ Turner (1987)
tais ou verticais entre pixels das malizado, ele varia de 0 a infinito.
unidades "i" e "j"
1 = comprimento de uma interface de
um pixel (por exemplo, para imagens
Thematic Mapper do satélite Landsat,
1 = 30 m)
nn
Diversidade EE EE = - ZZ(qj j).ln(q: ;) onde: EE é um índice do tipo Shannon- O’Neill et al.
de contatos i=1j=1 ,J Wienner que reflete a diversidade (1988)
qi,j é a probabilidade da unidade "i" de contatos entre unidades conside­ Li & Reynolds
estar adjacente à unidade "j" (e.g., qi,j radas em pares. Quanto maior este (1993)
= ni,j /A, onde ni,j é o número de índice, menor o grau de agregação
pixels de contato entre as unidades "i" das unidades da paisagem, maior o
e "j"; e A é o número total de pixels da grau de fragmentação da paisagem.
paisagem)
427
“ ÍNDICE FIG F ra8 stats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(1)

Contágio 1 RCj RC = 1 - EE /EEmax Os valores de RCl e RC2 variam de Li & Reynold


0 (fragmentação máxima) a 1 (agre­ (1993)
Pode ser calculado de duas formas: gação máxima). RCl é sensível à Li & Reynolds
RC1 e RC2 n n distribuição espacial das unidades (1994)
I I ( q j j).ln(q| j) (regular, agregada, aleatória), mas
i=1M
RC 1 = 1 + j- LL n.ln (n) não é sensível ao número de unida­
onde: des.
qi,j = ni,j /ni ;
EEmax = n.ln(n)
n n
Contágio 2 RC, CONTAG RC2 é sensível à distribuição espa­ Li & Reynolds
Z Z ( q j j).ln(qj j)
Mj--1 cial e ao número de unidades da (1993)
RC2 = 1 + 2.(n (n)
onde: paisagem.
qi,j —pi.ni,j /n i ; pi é a proporção da
unidade "i" na paisagem ; EEmax =
2 .1n(n)

Proporção de C = Bc /A onde: 2 C é sensível ao grau de complexida­ Metzger &


pontos de Bc é o número de pixels em pontos de de no arranjo espacial das unidades Muller (1996)
convergência convergência (pixels de borda apre­ da paisagem, i.e. à fragmentação da Metzger
(C) sentando 3 ou mais unidades nos 9 paisagem. Quanto maior C, mais (1995)
pixels do seu entorno); complexa é a paisagem.
A é o número total de pixels da
paisagem
INDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(1)
NT
Diversidade HL 2 De forma similar a C, HL mede a Metzger &
HL — Z —qk-ln 2*114 onde:
espacial da k=l complexidade no arranjo espacial Muller (1996)’
paisagem NT: número de tipos diferentes de borda das unidades, considerando os NB Metzger
na paisagem (NB), mais as áreas de diferentes tipos de borda (incluindo (1995)
interior das n unidades (NT < NB + n); os pontos de convergência) e as
qk é a proporção de área ocupada áreas de interior das n unidades. HL
pelos NB tipos de bordas e n áreas de diverge de EE, pois considera tam­
interior bém bordas formadas por três ou
mais unidades (os “pontos de con­
vergência”). Quanto maior HL, mais
complexa é a paisagem.

Fragmentação

Número de NF Número de fragmentos de uma índice mais simples para medida Romme (1982)
fragmentos paisagem. Numa imagem matricial da fragmentação, i.e. do grau de Burkey (1989)
(formato "raster"), os fragmentos ou ruptura de uma determinada uni­ Kleinn et al.
polígonos podem ser definidos por dade. Os valores deste índice de­ (1993)
pixels de uma mesma unidade unidos: pendem da área da paisagem.
i) por contatos ortogonais (unicamen­
te); ii) ou por contatos ortogonais e/ou
diagonais. Esta última regra é a mais
us,ada nos trabalhos de ecologia da
paisagem.
429
430

INDICE COMO CALCULAR FIG Fra§stats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA

índice não EPP EPP _ BF 3 ED índice que mede o grau de ruptura Kleinn et al.
AF
normalizado em função da quantidade de borda. (1993)
de onde: Os valores deste índice dependem Li et al. (1993)
fragmentação BF é o número de pixels de borda da da área ocupada pela unidade (AF), Zipperer
unidade estudada; sendo que os valores máximos são (1993)
AF é o número de pixels da unidade obtidos quando a unidade estudada
estudada ocupa a metade da paisagem.
3
índice índice que mede o grau de ruptura Kleinn et al.
normalizado F=— — em função da quantidade de borda. ,(1993)
de VÃ * AF
Apresenta a vantagem de seu valor
fragmentação onde: ser independente da área ocupada
ITF é o número de interfaces da pela unidade da paisagem (AF),
unidade estudada com as demais assim como da área de paisagem '
unidades; (A). Quanto maior seu valor, maior
A é o número de pixels da paisagem. o grau de fragmentação.

Isolamento 4 NEAR

Isolamento ao ISP f É a distância mais curta do fragmento Medida simples de distância. Van Apeldoorn
fragmento "f" estudado ao fragmento mais et al. (1992)
mais próximo próximo. As distâncias são sempre
medidas entre os pontos mais próxi­
mos dos dois fragmentos.
ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERENCIA
(1)

Isolamento ISG f É a distância de um fragmento "f" 4 Medida simples de distância. Lynch &
ao “fragmento estudado ao fragmento fonte mais Whigham
fonte” mais próximo. Este fragmento "fonte" pode (1984)
próximo ser uma área não fragmentada (maciço Van Dorp &
ou reserva florestal, por exemplo) ou Opdam (1987)
um fragmento com um tamanho acima Verboom & Van
de um determinado limiar (para o qual Apeldoorn
consideramos ter uma população (1990)
estável da espécie estudada).
4 MNN
Isolamento ISTf É a distância média de um fragmento Medida média de distância. Ripple et al.
médio a todos "f" estudado a todos os fragmentos "g" (1991)
os fragmentos de uma determinada região no entorno Maller &
do entorno de "f, R0rdam
(1985)

IST f“ - 2----------
NF
onde:
NF é o número de fragmentos na
vizinhança considerada;
dg é a distância do fragmento "f"
estudado ao fragmento "g"

Isolamento *SMf d2 Isolamento de um fragmento “f” Metzger


baseado isM
,
f =' y AFg 9AFf baseado em leis físicas de atração (1995)
nas massas onde: g=i a de corpos, que depende das massas
AFf é a área do fragmento "f”; destes corpos (no nosso caso, das
AFg é a área do fragmento "g" áreas) e das distâncias entre eles.
431
432

ÍNDICE COMO CALCULAR FIG FraSstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA


( 1 ) ____

Isolamento GIL Média das proximidades (dj) de cada 5 Isolamento médio de uma paisagem Metzger
médio pixel "i" da imagem ao pixel mais em função da proximidade a uma (2 0 0 0 )

baseado em próximo da unidade estudada (e.g., o determinada unidade da paisagem.


proximidade hábitat). A proximidade de um pixel
da unidade estudada é 0 ; de um pixel
justo adjacente a esta unidade é 1 ; do
pixel seguinte é 2 ; etc.

Isolamento GIC Média das proximidades (dj) de cada Isolamento médio de uma paisagem Metzger
médio pixel "i" da imagem ao pixel de interior em função da proximidade a áreas ( 2 000 )
baseado em mais próximo da unidade estudada. de interior de uma unidade
proximidade Assim, o pixel de interior da unidade estudada.
estudada tem a proximidade 0 ; o pixel
de borda desta unidade tem o valor 1 ; o
pixel seguinte tem o valor 2 ; etc.

Isolamento GIB Média das proximidades (dj) de cada Isolamento médio de uma paisagem Metzger
médio pixel "i" da imagem ao pixel mais em função da proximidade a áreas (2 0 0 0 )
baseado em próximo de um fragmento "fonte" da consideradas como “fontes”.
proximidade paisagem. Os pixels destes fragmentos
fontes têm proximidade 0 ; os pixels
justo adjacentes têm proximidade 1 ; etc.
ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(1)

Conectividade CON CON = CO/A 6 Proporção de áreas de conexão. / Metzger


onde: (1995)
Densidade de CO é o número de pixels de corredores Metzger
estruturas de e de pequenas manchas de hábitat, (2 0 0 0 )
conexão chamadas de stepping-stones;
A é o nújúero total de pixels da
paisagem.
7e8
IHP E o número de dilatações de uma Mede o grau de conexão das man­ Metzger &
unidade para se obter um estado de • chas de uma determinada unidade. Décamps
Percolação percolação de áreas de interior. As Quanto maior IHP, menor a (1997)
de hábitat dilatações são transformações conectividade da paisagem.
de interior morfológicas matemáticas (Serra
1982) que permitem expandir um
determinado tema.

<•
433
“ ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(1)

Comprimento m 9 Conectividade baseada na teoria Keitt et al.


de correlação 2 9s ■ dos gráficos. RG representa o com­ (1997)
L= — --------
m primento do raio médio de um de­
X 9S terminado grupo de fragmentos
s=1 conectados num subgráfico. Pode
onde: ser entendida como a distância
m é o número total de subgráficos média que um organismo percorre­
(conjunto de fragmentos conectados) ria antes de encontrar a borda deste
numa paisagem; grupo de fragmentos.
gs é o número de pixels de um deter­ L é a média dos valores de RG de
minado subgráfico "s"; todos os “m” subgráficos de uma
paisagem, ponderados pelo tama­
R G = 1/ g ÍV ( x j - x )2+ ( V j - y )2 ;
nho “g” de cada subgráfico.
RG e L são medidos em unidades
xi e yi são as coordenadas do pixel "i" de distância (m, km) e variam de 0
de um determinado subgráfico "s"; (paisagem sem hábitat) a infinito,
x e y são as coordenadas médias à medida que a conectividade
de todos pixels de um aumenta.
subgráfico; •
g é o número total de pixels do
subgráfico
ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fragstats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERÊNCIA
(1)

Permeabilidade PM AM 10 IEi é o isolamento efetivo de um Metzger &


da matriz I IEj pixel, considerando não apenas a Décamps
PM= ‘ =1.AM
M distância ao hábitat, mas também (1997)
/
as resistências aos fluxos da unida­
onde: de presente no pixel “i”.
IEi = l i . R i ; PM é a média destes valores para
li é o isolamento do pixel "i" a um todo AM pixel da matriz. Quanto
pixel da unidade considerada (e.g., maior o valor de PM, menor a
hábitat); permeabilidade da matriz.
Ri é a resistência aos fluxos biológicos
da unidade da paisagem presente no
pixel "i";
AM é o número de pixels de matriz
(não hábitat) na paisagem

Forma dos ■*
fragmentos
TE
Proporção PBf PBf = BFf/AFf Proporção simples de pixels de
de borda onde: borda.
BFf é o número de pixels de borda do
fragmento " f; %
AFf é o número de pixels do fragmen­
to t :
435
436

ÍNDICE COMO CALCULAR FIG Fra§stats SIGNIFICADO ESPACIAL REFERENCIA


(1 )

Dimensão D D é estimado pela inclinação da reta FRACT Este índice mede a Gomplexidade Krummel et al.
fractal de regressão entre o logaritmo da área das formas dos fragmentos. As pai-' (1987),
pelo logaritmo do perímetro de todos sagens com manchas de formas Gardner et al.
os fragmentos que compõem o mosai- mais simples (quadradas, (1987), Milne
cada paisagem. retangulares) e regulares terão uma (1988),
D - log (Af) /log (Pf) dimensão fractal próxima de 1 . O’Neill et al.
onde: Paisagens com manchas de forma (1988)
Af é a área bidimensional de um mais complexas terão valores de D
fragmento " f ; próximos de 2 .
Pf é o perímetro do fragmento "f'

(1) Abreviação dos nom es dos índices no programa F ra g sta ts (McGarigal & Marks 1995).
Métricas de composição
Entre as métricas de composição, as mais importantes estão relacionadas com
a riqueza de unidades de paisagem (n) e com a proporção (pi) de área ocupada
por cada uma dessas unidades na paisagem. Esses dois parâmetros podem ser
utilizados para a avaliação da heterogeneidade da paisagem (Ho), a partir da
função de Shannon-Wiener, assim como da equabilidade (Eo) e dominância da
paisagem (Do). Essas métricas, apresentadas na tabela 1, permitem captar a
heterogeneidade não espacial da paisagem (Figura 1 ).

I—

Figura 1. Composição e diversidade de paisagens. Esta figura mostra quatro exemplos de


paisagens tendo a mesma riqueza (n= 2), a m esma proporção de áreas ocupadas por essas
duas unidades (p=0,5), porém tendo disposições espaciais diferentes, mais ou menos frag­
mentadas. O s índices de com posição não permitem captar esta com plexidade no arranjo
espacial (nos quatro caso s, Ho= 0,69, Eo= 1, Do= 0), que está diretamente relacionada ã
quantidade e ã diversidade de bordas (ver figura 2).

Métricas de diversidade espacial


As métricas de diversidade espacial baseiam-se na análise da quantidade e
diversidade de tipos de contato entre as unidades da paisagem (figuras 2 e 3).
Estes contatos podem ser formados por apenas duas unidades, como no caso
dos índices Ei,j e EE, ou pela convergência de três ou mais unidades (os
chamados “pontos de convergência”), como no caso de C e HL. Quanto menor
a quantidade e diversidade de bordas, mais agregadas (RCl e RC 2 ) ou mènos
fragmentadas (EE, C, HL) estão as unidades da paisagem.

437
JEAN PAUL M ETZG ER

Im a g e m d a s s ific a d a

f f (| p s p s íp s ps
f f f ps ps! ps ps
f f * PS p s jp s ps
t f f |ps p s fp s ps
ph ph >ph|ph ph ph ph
ph ph ph|ph Ph|ph ph

A-Codificaçao das unidades da paisagem

8 □ E I 2 2 2 2
8 8 8 2_ 2 2 2
8 8 8 2 2 2 2
£ 8 j 8 j _2 _2 _2 _2

4
4_ 4 I _4 _4 _4
4_ 4 4 _4 _A_ 4 _4
B-lsoiamento das unidades

JL □
4 _
2 2 2 2
n _8 n : 2 2 7
□ 8 n 2 2 2
□ 8 ö 2 2 2 2
■ Si H 4 4 4 4 4 4 4
4 _4_ 4 4 4 4 4
C-Dilataçâo das
unidades
8 8 8 8
8 8 8 8
8 8 8 8
8 8 8 8 4 4 4 4 4 4 4
8 8 8 8 4 4 4 4 4 4 4
4 4 4 4 4 4 4

C-Som a d as dilatações
8 El 10 10 2 2 2
8 D 10 10 2 2 2
8 "U! 10 2 2 2
EEm 14 14 6 6 6

te EE 14 14 6 6 o

Dj□ 4 4 4 4 4

Figura 2. D iversidade espacial da paisagem . A figura classificad a inicial apresenta três


c la sse s: florestas "f"; pradarias se ca s "p s": e pradarias úm idas "ph". A partir dessa ima­
gem é possível calcular alguns índ ices sim ples de com posição da paisagem , como por
exemplo: riqueza em unidades da paisagem (n= 3): proporção das diferentes unidades (Pf=
12/42, Pps= 16/42, Pph= 14/42); diversidade da paisagem (Ho= 1,09); equabilidade (Eo=
0,99): e dominância (Do = 0,007). Para medir a complexidade no arranjo espacial das unida­
des da paisagem, é necessário incluir na análise os diferentes tipos de borda. O método
apresentado nesta figura permite distinguir estes tipos de borda através: da codificação das
unidades; do isolamento dessas unidades em imagens booleanas; da expansão (dilatação)
em um pixel das unidades isoladas; e da soma d e ssas im agens dilatadas. A codificação
estabelecida (f= 8, ps= 2, ph= 4) permite, na imagem final, o reconhecimento dos diferentes
tipos de borda. Assim , a borda com o código 10 só pode ser uma borda das unidades 8 e 2;
a borda de código 6 está presente unicamente nas áreas de contato entre as unidades 4 e 2:
etc. A borda de código 14 é chamada de "ponto de convergência" (Forman & Godron 1986),
pois é formada pela convergência de 3 ou m ais unidades da paisagem (no caso, pelas
unidades 2, 4 e 8). A imagem final apresenta áreas de interior das unidades iniciais (2, 4 e 8),
e as áreas dos diferentes tipos de borda. Utilizando-se o conjunto dessas unidades é possível
calcular dois índices que medem a complexidade no arranjo espacial da paisagem: a propor­
ção de pontos de convergência (C= 4/42) e a diversidade espacial da paisagem (HL= 1,91).
E ST R U T U R A DA PAISAGEM:
1 O U SO ADEQUADO DE MÉTRICAS

Métricas de fragmentação
A fragmentação pode ser entendida como o grau de ruptura de uma unidade
da paisagem, inicialm ente contínua. Esse grau de ruptura é medido pelo nú­
mero de fragmentos (NF) ou então por índices baseados na quantidade de
borda entre a unidade estudada e as demais unidades da paisagem (índices
EPP e F, figura 3).

b b b
b i b
b b b b
V
b
b

b : pixels de borda interface


i : pixel de interior

Figura 3. Definição de borda. Grande parte dos índices de fragmentação está baseada na
quantidade de borda. Quanto maior a quantidade de pixels ou interfaces de borda entre a
unidade estudada e as demais unidades, maior a fragmentação desta unidade. Um pixel de
borda corresponde a um pixel da unidade estudada com contatos ortogonais ou diagonais
com um de outra unidade. Uma interface corresponde a um lado de um pixel que separa a
unidade estudada de outra unidade. Como a área submetida aos "efeitos de borda" pode ser
muito maior do que o tamanho de um pixel, pode-se considerar tam bém que a borda é
formada pelo conjunto de pixels de hábitats que estâo até uma determinada distância de
pixels de outras unidades da paisagem. Por exemplo, se considerarm os que o efeito de borda
■tem 90 m, entâo seráo consideradas bordas as três primeiras fileiras de pixels Thematic
Mapper (de 30 m) de um determinado hábitat.

Métricas de isolamento
As métricas de isolamento podem ser divididas em duas classes: as que me­
dem o isolamento de um único fragmento, em geral através de medidas sim­
ples de distância (índices ISPf, ISGf, IST f e ISMf, figura 4) e as que medem o
isolamento médio em relação a todas as áreas de uma determinada unidade da
paisagem, através de medidas de proximidade (índices GIL, GIC, GIB, figura 5).

439
JEAN PAUL M ETZG ER

índices de isolamento do fragmento af

ISPf = d3

ISGf = d5

dj + "t" d 3 + d 4 4- d$
IST f = --------------------------------------------
5

d* d* d/ d/ d/
ISMf <= ---------7 + --------- + ---------- + ---------- + ---------
a fa i a fa 2 a fa 3 a fa 4 a fa â

Figura 4. Medidas de isolamento de um determinado fragmento da paisagem. Existem várias


medidas de distância possíveis para medir o isolamento de um determinado fragmento T
da paisagem aos demais fragmentos similares (e.g. de hábitat): distância ao fragmento
mais próximo (ISPf); distância ao fragmento fonte mais próximo (ISGf): média das distânci­
as a todos os fragmentos da vizinhança (ISTf); distâncias ponderadas pela área de todos os
fragmentos da vizinhança (ISMf). Todas essas medidas consideram a distância mais curta
entre a borda de dois fragmentos. No caso de ISMf, quando apenas parte da área dos
fragmentos está dentro da vizinhança delimitada (caso de a5), a área toda do fragmento é
considerada no cálculo.

440
ESTR U T U R A DA PAISAGEM:
O U SO ADEQUADO DE MÉTRICAS

Im a g e m h á b ita t / n ã o h áb itat

0 0 0 1 2 2 2 3 3 4 0 0 1 2 3 4 5 5 5 5 6 5 4 4 4 4 4 4 4 4
0 0 0 1 1 1 2 2 3 3 0 0 1 2 3 4 4 4 4 4 6 5 4 3 3 3 3 3 3 3
0 0 0 1 0 1 1 2 2 2 1 1 1 2 3 3 3 3 3 3 6 5 4 3 2 2 2 2 2 2
1 1 1 0 0 0 1 1 1 1 2 2 2 2 3 2 2 2 2 2 6 5 4 3 2 1 1 1 1 1
2 1 1 1 1 0 0 0 0 0 3 3 3 3 3 2 1 1 1 1 6 5 4 3 2 1 0 0 0 0
2 1 0 1 1 1 0 0 0 0 4 4 4 4 3 2 1 0 0 0 6 5 4 3 2 1 0 0 0 0
2 1 1 1 2 1 0 0 0 0 5 5 5 4 3 2 1 0 0 0 6 5 4 3 2 1 0 0 0 0
2 2 2 2 2 1 0 0 0 0 6 6 5 4 3 2 1 0 0 0 6 5 4 3 2 1 0 0 0 0

GIL : Isolamento 3 todo pixel G IC : Isolam ento a todo pixel GIB : Isolamento a os fragmentos
d e interior fontes

Id i 77 Idi 195 218


G IL = ----- = ----- = 0,96 G IC = 2,44 GIB = 2,72
A 80 80 80

Figura 5. M edidas de isolam ento baseadas em proxim idades. Quando se quer saber o
isolamento médio de uma unidade da paisagem (e não apenas de um fragmento, como no
caso da figura 4), pode-se utilizar a função de proxim idade oferecida pela maioria dos
"S iste m a s de In fo rm ações G e o g ráficas". E s sa função perm ite co d ificar cada pixel da
paisagem em função de sua distância ao pixel-alvo m ais próximo. A ssim , o pixel-alvo tem
o código 0; o pixel ju sto adjacente tem o código 1; o pixel seguinte tem o código 2: etc.
Nesse caso, o pixel-alvo pode ser: todo pixel de hábitat (GIL); todo pixel de interior de hábitat
(GIC): ou todo pixel de fragmentos fontes (GIB). E sse s modelos estariam de acordo com o
isolamento no caso: de uma espécie menos sensível à fragmentação (GIL); de uma espécie
de interior (GIC); ou de uma espécie que necessita de fragm entos de hábitats com pelo
menos um determinado tamanho mínimo (GIB). A é o número total de pixels da paisagem.

Métricas de conectividade
A conectividade é a capacidade da paisagem de facilitar os fluxos biológicos.
Essa capacidade depende: da densidade de estruturas de conexão (índice CON,
figura 6 ); da proximidade ou percolação das áreas de hábitat (índice IHP, figu­
ras 7 e 8 ; índice L, figura 9) e da permeabilidade da matriz da paisagem (índice
PM, figura 10).

Forma dos fragmentos


A forma dos fragmentos ou das manchas da paisagem pode ser avaliada atra­
vés de proporções simples entre área de borda e área do fragmento (por exem­
plo, índice PBf) ou através do índice, fractal (D), que mede a complexidade
dessas formas.

441
JEAN PAUL M ETZG ER

Interpretação biológica dos índices


É bom insistir que o uso de métricas da paisagem só tem sentido se contextu-
alizado dentro de um questionamento bem definido. As métricas podem ser
tanto utilizadas para o estabelecimento de hipóteses/perguntas quanto para a
resposta a essas perguntas (ver Capítulo 20, que trata de experimentos em
ecologia da paisagem, neste volume). No entanto, elas não têm sentido por si
só, a não ser que sejam utilizadas de forma descritiva. Mesmo nesse caso, o
valor de muitos índices só'tem sentido de forma comparativa, para medir a
mudança ao longo do tempo ou para comparar duas regiões diferentes, utili­
zando-se exatamente o mesmo método de mapeamento e tipo de legenda. O
que se procura, em geral, é relacionar esses índices (ou a variação desses índi­
ces) com parâmetros biológicos. Qual a importância ecológica de uma paisa­
gem mais heterogênea? Qual o efeito do maior isolamento de uma determinada
mancha de hábitat? Como agem a fragmentação e a conectividade sobre a dinâ­
mica de populações subdivididas? Qual a influência da forma de um fragmen­
to sobre uma determinada comunidade? Esses são alguns exemplos de algu­
mas perguntas (gerais) que interessam aos ecólogos da paisagem. Poucos que­
rem quantificar a estrutura para apenas descrevê-la.

Figura 6. Extração de estruturas de conexão. As estruturas de conexão são áreas utilizadas ^


para passagem de um fragmento ao outro. Em geral, considera-se que fragmentos lineares
(isto é, os corredores) e os fragmentos muito pequenos (por exemplo, os stepping-stones ou
pontos de ligação) teriam essa função. Assim , a densidade de estruturas de conexão pode
dar uma ideia da capacidade da paisagem de facilitar os fluxos biológicos entre fragmentos.
As características do que vai ser chamado de corredor (e.g., largura mínima, relação largura/
comprimento) e stepping-stone (por exemplo, tamanho mínimo de um fragmento) depende do
objetivo do estudo e das espécies consideradas. No caso da figura A, considera-se que um
corredor tem no máximo dois pixels de largura e um stepping-stone tem no máximo 8 pixels.
Para isolar e ssas estruturas de conexão são realizadas operações morfológicas matemáti­
cas nas imagens (Serra 1982): uma erosão (no caso, o equivalente de um filtro de mínimo de
3 por 3 pixels) seguida de uma dilatação (no caso, o equivalente de um filtro de máximo de 3
por 3 pixels). A figura C resultante apresenta apenas as áreas de fragmento, enquanto a
figura A-C apresenta as estruturas de conexão. No caso, CON= 6/80.

442
E ST R U T U R A DA PAISAGEM :
O U SO AD EQUADO t)E M ÉTRICA S

Erosão ^
f
J

Dilatação y
r

'

A‘ C I
Estruturas de conexão

443
JEAN PA U L M ETZG ER

Paisagem A Paisagem B

Não percola Percola


Alta conectividade Baixa conectividade

Figura 7. Percolação e conectividade. Dois exemplos que mostram que paisagens que perco-
lam nem sem pre têm alta conectividade ou, inversam ente, paisagens que não percolam
podem ter alta conectividade. Uma paisagem percola para um determinado tema (em cinza
neste exem plo) quando este tem a se expande de um lado ao outro dos lim ites de uma
paisagem (da esquerda para direita, ou de cima para baixo; èm geral, a percolação é medida
em paisagens quadradas). A percolação pode indicar uma alta conectividade (isto é, a capa­
cidade da paisagem de. facilitar fluxos biológicos) da paisagem , m as nem sempre isso
ocorre.

Figura 8. O índice de percolação das áreas de interior (IHP). Só existem dois estados ,de f
percolação (percola ou não percola) e a maioria das paisagens fragm entadas, que tem
menos de 40% de hábitat, não percola. O índice IHP permite calcular um "grau de percola­
ção" para e ssas paisagens, tendo ainda a vantagem de não ser influenciado pelos corredores
da paisagem, em geral formados apenas por áreas de borda (figura 7). Para tanto, é avaliado
o grau de percolação das áreas de interior (em cinza escuro). Para eliminar as áreas de borda
(em cinza claro), realiza-se inicialmente uma erosão (no caso, o equivalente de um filtro de
mínimo de 3 por 3 pixels, que permite retirar uma fileira de pixels; um filtro de 5 por 5 pixels
permitiria retirar 2 fileiras de pixels; um filtro de 7 por 7 permitiria retirar 3 fileiras etc.). 0
valor de IHP é entáo o número de dilatações (nesse caso, filtro de máximo de 3 por 3 pixels)
necessário para obtermos um estado de percolação. O valor de IHP é inversamente propor­
cional à conectividade da paisagem.

444
E ST R U T U R A DA PAISAGEM:
O U SO ADEQUADO DE MÉTRICAS

Conectividade baixa Conectividade moderada Conectividade alta

n r
LLt

Erosão

Não percola Não percola Percola


Dilatação

Não percola
Dilatação j

Percola

IHP = 2 IHP = 1 IHP = 0


t
445
JEAN PA U L M ETZG ER

c e n tr o d o s fr a g m e n to s

d is tâ n c ia e n tre
a s b o r d a s m a is próxim as
d e d o is fr a g m e n to s

lin h as d e u n iã o d e
fr a g m e n t o s d e um
m e s m o s u b g rá fic o

Figura 9. A permeabilidade da matriz. A permeabilidade da matriz (considerada, nesse texto,


como o conjunto das unidades de não hábitat) corresponde a sua capacidade de facilitar os
fluxos biológicos. Essa permeabilidade depende da distância a uma área fonte (i.e., do seu
isolamento) e da resistência aos fluxos biológicos, o que pode estar relacionado com o grau
de dissimilaridade da unidade da matriz em relação ao hábitat considerado. Por exemplo, se
as matas forem o hábitat estudado, muito provavelmente as capoeiras serâo menos resis­
tentes aos fluxos de animais florestais do que uma área de pastagem. Ou seja, a permeabi­
lidade (PMi) de um pixel "i" da matriz pode ser considerada como uma variável inversamente
relacionada ao isolamento (li) e à resistência da unidade da matriz presente neste pixel (Ri).
O produto li.Ri representa o isolamento efetivo, IEi, de um determinado pixel "i" da matriz. 0
índice de permeabilidade proposto, PM, é a média destes valores. Quanto maior essa média,
menor a permeabilidade da matriz. Por definição, a resistência do hábitat é igual a 1, e a
resistência das dem ais unidades da paisagem é maior ou igual a 1, No caso do exemplo
apresentado, a permeabilidade (PM) é igual a 719 / 73 = 9,85.

Figura 10. A conectividade baseada na teoria dos gráficos. A avaliação da conectividade é, ►


nesse cáso, baseada no agrupamento de fragm entos da paisagem em subgráficos. Frag­
mentos são agrupados à medida que a distância (d) entre eles é menor do que uma distância
limiar (dlim) (obs.: as distâncias são sempre medidas entre as bordas mais próximas de dois
fragm entos). Em term os biológicos, dlim seria a distância máxim a que os organismos
estudados são capazes de cruzar na matriz inter-hábitat. Como essa distância varia com o
tipo de matriz, é possível fazer uma avaliação da distância limiar considerando as resistên­
cias R das unidades da paisagem. No caso do exemplo da figura, tem os 5 fragmentos e dois
subgráficos (um formado por três fragmentos e outro formado por dois). Cada subgráfico
tem um raio médio (RG), que seria a distância média que um organismo precisaria percorrer
até encontrar os limites do subgráfico. A média dos valores de RG de todos os subgráficos
de uma paisagem constitui o índice de conectividade L, cham ado de "comprimento de
correlação" ("correlation length"). Quanto maior este valor, mais conectados estâo os frag­
mentos da paisagem.

446
ESTR Ü T U R A DA PAISAGEM:
.O U SO ADEQUADO DE MÉTRICAS

Imagem classificada
f f c c c p p p ff f : floresta
f f c c c p p p ff c : capoeiras resistência aos
c c c c c p p p pp p : pastagens T fluxos
c c c c f p p p pp u : urbano +
c c c c f f p p pp
c c c c f f
u u uf
c c c c u u
u u u f
c c c c u u u u u f
c c c c u u u u u f

Isolamento (li) Coeficiente de resistência (Ri)


1 2 3 3 2 1 5 5 5 1 1 1
1 2 2 2 2 1 5 5 5 1 1 1
1 1 1 1 1 1 2 1 1 1 5 5 5 5 5 1 1 1 1 1
2 2 2 1 1, 1 2 2 2 5 5 5 5 1 1 1 1 1
3 3 2 1 1 2 1 1 5 5 5 5 1 1 1 1
4 3 2 1 1 2 1 5 5 5 5 10 10 10
4 3 2 1 1 1 1 2 1 5 5 5 5 10 10 10 10 10
4 3 2 2 2 2 2 2 1 5 5 5 5 10 10 10 10 10
4 3 3 3 3 3 3 2 1 5 5 5 5 10 10 10 10 10

Isolamento efetivo (lei = li. Ri)


5 10 15 3 2 1
5 10 10 2 2 1
5 5 5 5 5 1 2 1 1 1
10 10 10 5 1 1 2 1 2
15 15 10 5 1 2 1 1
20 15 10 5 10 20 10
20 15 10 5 10 10 10 20 10
20 15 10 10 20 20 20 20 10
20 15 15 15 30 30 30 20 10

447
JEAN PAUL M ETZG ER

Qual é o estado atual de conhecim ento sobre o significado biológico dos índi­
ces? E difícil fazer uma síntese sobre esse assunto, primeiro porque a literatura
sobre o assunto é muito grande e, em segundo lugar, porque muitos índices
diferentes são utilizados. Não se pretende aqui fazer uma síntese, mas sim
apresentar na tabela 2 as principais evidências, para as quais parece haver
consenso na comunidade de ecólogos da paisagem.

Cuidados na análise
Calcular os índices é simples e muitas vezes automático (quando se usa um
programa). Muito mais difícil é interpretar e analisar os resultados, em relação
aos dados biológicos/ecológicos coletados. Aqui vão algumas sugestões que
podem ajudar nessa interpretação:

1 . Testar o ín dice em con d ições con troladas - Antes de tudo é importante enten­
der o significado espacial de cada métrica e, se possível, testá-la em paisa­
gens manipuladas (com variações controladas de densidade, agregação etc).

2. T rabalhar com m étricas sim p les - Muitas métricas tendem a incorporar dife­
rentes informações em um único valor. Por exemplo, o índice de diversida­
de espacial da paisagem (HL) depende da riqueza da paisagem, do grau de
fragmentação das unidades da paisagem e da distribuição de área entre
estas unidades. Por isso, a interpretação biológica desse índice não é sim­
ples. O ideal, para facilitar a interpretação, é trabalhar com índices que
medem apenas um aspecto da estrutura da paisagem.

3. Distinguir o efeito d e á rea d o efeito d e d isp o siçã o - Muitos índices de distri­


buição espacial de uma unidade da paisagem (por exemplo, índices de
fragmentação e isolamento) estão fortemente relacionados à proporção de
área ocupada por esta unidad« ( P J . Ou seja, não há sempre necessidade de
sofisticadas análises estruturais se os organismos ou as espécies estudadas
respondem principalmente às variações de área. Assim, é necessário dis­
tinguir o efeito de área do efeito de disposição espacial. Para tanto, é preci­
so prestar particular atenção às correlações dos índices de disposição com
Pu e saber que a disposição parece ter particular importância quando Pu
está abaixo de uma determinada proporção crítica (e.g. pcrit = 0,30). Nesse
caso, a unidade está bastante fragmentada e a disposição espacial parece ter
mais importância do que a área da unidade (Andrén 1994).

4. O bservar a in flu ên cia d a es c a la - A escala espacial tem um duplo sentido:


é o grau de definição ou resolução de uma imagem de satélite ou a escala
geográfica de fotografias aéreas e mapas; é também a extensão (isto é, o

448
E ST R U T U R A DA PAISAGEM:
O U S O ADEQUADO DE MÉTRICAS

Tabela 2. Significado biológico dos principais parâmetros de estrutura da paisagem (segundo


revisão de Metzger 1999)

PARAMETRO SIGNIFICADO BIOLOGICO

Diversidade A relação entre diversidade da paisagem e diversidade de espécies ainda é


espacial pouco conhecida, provavelmente por se tratar de uma relação muito comple-
e composição xa, envolvendo um conjunto muito grande de variáveis. Em princípio, uma
da paisagem maior subdivisão da paisagem em pequenos fragmentos (i.é. uma maior
diversidade) leva a uma convergência espacial de recursos biológicos diversos
(alim entares, por exem plo), ou seja, a um a m aior com plem entação da
paisagem,(1) o que pode favorecer as espécies que utilizam recursos de várias
unidades. Segundo alguns autores, paisagens mais diversificadas favorecem
o desenvolvimento de espécies generalistas, predadoras e parasitas, e aumen­
tam assim indiretam ente a mortalidade de espécies sensíveis à fragmentação.
Por outro lado, uma maior homogeneidade pode ser favorável a espécies que
necessitam de amplas áreas de hábitat interno (i.e. as espécies mais sensíveis
à fragmentação). Obviamente, a diversidade tem que ser analisada junto com a
qualidade dos hábitats (ou das unidades) presentes na paisagem.

Fragmentação A fragmentação age fundamentalmente reduzindo e isolando as áreas propí­


cias à sobreviv ên cia das pop u lações, dando origem assim a extin çõ es
determ inísticas e estocásticas (veja os efeitos de área e isolamento).

Área do Uma relação positiva entre a área do fragmento e a riqueza de espécies foi
fragmento evidenciada para diferentes grupos taxonômicos (e.g. plantas, aves e pequenos
mamíferos). Essa relação parece estar relacionada a um conjunto de fatores: i)
diminuição da relação entre a área mínima necessária para a sobrevivência das
populações e a área do fragmento; ii) redução da heterogeneidade interna do
hábitat: iii) aumento da área sob efeito de borda; iv) dim inuição de recursos e,
por consequente, uma intensificação das com petições intra e interespecíficas;
v) extinções secundárias de espécies dependentes.

Isolam ento O isolamento age negativamente na riqueza de espécies ao diminuir a taxa (ou
o potencial) de imigração (ou de recolonização).

Conectividade A conectividade da paisagem age nos processos de recolonização após extinção


lo ca l e a ssim na m a n u te n çã o de um a m etap o p u lação em paisag en s
fragmentadas. Os corredores, em particular, são reconhecidos por serem
essenciais no controle de fluxos biológicos na paisagem, em geral, facilitando
esses fluxos, o que permite reduzir os riscos de extinção local e favorecer as
recolonizações, aumentando assim a sobrevivência das metapopulações. Os
corredores podem também apresentar o inconveniente de facilitar a propagação
de algumas perturbações, tais como o fogo ou certas doenças.

Forma do A forma, avaliada pelo índice BFf, permite estimar a proporção do fragmento
fragmento subm etido aos “efeito s de bord a”, que se caracterizam por uma maior
diversidade e densidade de espécies, maior exposição às perturbações externas,
e uma maior produtividade biológica, apesar dessas propriedades não se
aplicarem a todas as bordas.

(1) Segundo Dunning et al. (1992), a complementação é a capacidade da paisagem fornecer


recursos diferentes, com plem entares.

449
JEAN PAUL M ETZG ER

tamanho) da paisagem considerada. No caso de imagens classificadas (isto


é, de dados categóricos), podemos ainda acrescentar uma escala de defini­
ção da legenda, que pode ser mais ou menos detalhada. Esses três aspectos
da escala espacial (resolução, extensão e detalhamento da legenda) influem
sobre o valor das métricas da paisagem e, logo, influem sobre a interpreta­
ção biológica que faríamos delas. Além da escala espacial, há a escala de
percepção da paisagem pelas espécies estudadas, que muda em virtude de
características ecológicas dessas espécies. A interação da escala espacial
com a escala de percepção cria domínios de interpretação dos índices (ver
Capítulo 2 0 , E xperim en tos em eco lo g ia d a p a is a g em , neste volume). Ou
seja, determinadas propriedades biológicas podem ser válidas numa gama
de escalas espaciais (um domínio de escala) e não serem válidas em outras
escalas. Assim, é preciso estar atento à influência da escala em todas as
etapas da análise de métricas da paisagem, desde seu cálculo até na sua
interpretação e possível transposição dos resultados para outras escalas.

5. R eduzir o n ú m ero d e m étricas u tilizado - Existem atualmente mais de uma


centena de índices medindo diferentes aspectos da estrutura da paisagem
(Baker & Cai 1992, McGarigal & Marks 1995, Gustafson 1998). Na realida­
de, muitos desses índices medem a mesma estrutura, apresentando-se for­
temente correlacionados. Num experimento revelador, Riitters et al. (1995)
utilizaram 55 métricas para medir a estrutura da paisagem de 85 mapas dos
EUA. Eliminando as métricas mais correlacionadas, foi feita uma análise
multivariada com 26 métricas. Os resultados mostraram que apenas 6 fato­
res principais podiam explicar 87% da variância desses índices, isto é: era
possível utilizar apenas 6 métricas para ter uma quantificação dos diferen­
tes aspectos das paisagens estudadas - sem considerar uma paisagem “ou-
t lie f’, apenas 5 fatores seriam necessários. Esses fatores podem ser interpre­
tados como sendo: 2 métricas relacionadas à forma dos p a tch es; a dimensão
fractal (D); a riqueza de unidades da paisagem (n); e o grau de contágio. Isso
significa que não é necessário calcular uma infinidade de métricas. Basta um
número reduzido de métricas independentes, escolhidas em função do obje­
tivo do estudo, para uma quantificação adequada da paisagem.

6 . E scolh er a m étrica certa p a r a o objetivo p rop osto - Apesar deste ponto ser
bastante criticado por alguns autores, existe uma métrica certa para a per­
gunta e/ou o tipo de organismos considerados. Por isso, pode-se (e deve-
se) “adaptar” a métrica para a finalidade escolhida. Quando a questão é
relacionar métricas a processos ecológicos, essa “adaptação” é inevitável

450
E ST R U T U R A DA PAISAGEM :
O U SO ADEQUADO DE M ÉTRICA S

em diversos momentos, por exemplo: na definição dadistância limiar para


formar subgráficos no caso do índice L (figura 9); na escolha do que é
hábitat e do que não é hábitat; na definição dos limiares de corredores e
stepping-stones-, na definição das resistências (R) das unidades da paisa­
gem aos fluxos biológicos; na extensão de vizinhança a ser considerada
para calcular os índices de isolamento baseados em distância (figura 4).
Estudos descritivos e/ou comparativos podem contentar-se de um pacote
feito de métricas (como por exemplo, os oferecidos pelo programa Fragstats
ou pelo “r.le”). Mas o pesquisador não pode omitir-se de questionar a uti­
lidade de cada métrica utilizada em seu estudo.

Comentários finais
A ecologia da paisagem ainda está engatinhando na compreensão da influên­
cia da estrutura da paisagem em processos ecológicos. Para avançar neste cam­
po, são necessários estudos criteriosos, nos quais a quantificação da estrutura
da paisagem é sêm dúvida crucial. O cálculo dos índices pode ser automático,
mas o uso adequado, não. As sugestões apresentadas acima tiveram como
principal objetivo alertar o pesquisador para a importância da escala e da quali­
dade dos dados categóricos utilizados para o cálculo dos índices; da necessida­
de de se trabalhar com um número reduzido de métricas independentes, esco­
lhidas em função do objetivo do estudo e para os cuidados nas interpretações
biológicas dos índices. As métricas são uma ferramenta importante na investiga­
ção ecológica espacializada, porém é necessário usá-las de forma criteriosa.

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453
17 Métodos para análise de vegetação arbórea
Giselda Durigan
Instituto Florestal, Estação Experimental de A ssis, São Paulo

( , ____________________________ 1_______ _______ .____________

Introdução
Grande parte das pesquisas relacionadas com a biologia da conservação impli­
ca uma etapa de compreensão do hábitat e das relações da espécie animal com
os elementos do mèio, especialm entç a vegetação. O pesquisador de fauna,
frequentemente, encontra dificuldades nesse trabalho, em decorrência da falta
de intimidade com os métodos usuais empregados em estudos de vegetação e
do desconhecimento de qual o melhor método a ser adotado* de acordo com
os objetivos de sua pesquisa.

A demanda de informações sobre a vegetação pode variar desde a simples


identificação da formação vegetal, podendo se estender para a identificação
das plantas que fazem parte da dieta dos animais, da disponibilidade desses
alimentos ao longo do ano, até o extrèmo de ser necessário fazer uma minuciosa
caracterização do hábitat, compreendendo estudo detalhado da flora e da es­
trutura da com unidade vegetal.

Pretendem-se apresentar neste capítulo as ferramentas disponíveis na metodo­


logia científica para estudos de vegetação, desde uma escala ampla, de grandes
formações vegetais, até uma escala reduzida, que envolva apenas uma pequena
população ou mesmo um único indivíduo de determinada espécie. São apre­
sentadas no Anexo II sugestões de Fichas auxiliares de coleta de dados (Ficha
para levantamento fitossociológico por parcelas; Ficha para coleta de dados do
diagrama de perfil e Ficha para levantamento fitossociológico por quadrantes)
para auxilio do pesquisador.

Estudos qualitativos
Fitogeografia
A fitogeografia trata da localização geográfica de elementos da vegetação, desde
grandes formações vegetais até a área natural de ocorrência de uma determinada

455
N G ISELD A DURIGAN

espécie. Existem várias classificações das formações vegetais brasileiras, que


trazem diferenças na denominação e na abrangência geográfica dessas forma­
ções, podendo ser citados, entre outros, Veloso (1962), Hueck (1972), Romariz
(1998), Rizzini (1979), Eiten (1983), IBGE (1988), Veloso et al. (1991) e IBGE
(1992). Joly et al. (1999) desenvolvem uma ampla e atual análise da fitogeogra-
fia do Brasil e suas implicações para a conservação da biodiversidade.

O enquadramento da área de estudo é feito com facilidade quando se trata de


áreas “core” das diferentes formações. Em algumas regiões, no entanto, onde
há transição entre formações ou entre associações, essa classificação pode não
ser possível a partir dos mapas. Isso ocorre com frequência em áreas de mata
atlântica, entre a floresta estacionai semidecidual e a floresta perenifólia do
planalto e da encosta atlântica. Também é comum ocorrer confusão entre o
cerradão e a floresta estacionai semidecidual, cuja transição foi extensivamen­
te discutida por Furley et al. (1992). A diferenciação se faz, nesses casos, com
o auxílio de resultados de pesquisa publicados sobre a flora local ou com a
presença de espécies indicadoras. Por exemplo, pode-se afirmar que uma área
em que ocorra pequi {C aryocar b ta silien se) ou pau-terra (Q ualea grandiflora) é
uma área de cerrado, ou se ocorre pau-d’alho (G allesia integrifolia) certamente
é floresta, e assim por diante.'

A fisionomia da vegetação dentro de uma mesma formação vegetal reflete prin­


cipalmente o estado de conservação, mas também pode refletir a capacidade de
suporte do meio. Em se tratando de florestas, a capacidade de suporte do meio
leva a uma floresta mais baixa, árvores de pequeno porte e maior densidade
em solos mais pobres e floresta mais alta, mais estratificada, com árvores de
grande porte e menor densidade em solos mais férteis. A ausência de árvores
grandes pode facilmente confundir, aparentando tratar-se de estádio inicial de
sucessão secundária.

Em regiões de domínio de cerrado, a capacidade de suporte do meio, especial­


mente relacionada com a saturação de alumínio, acidez e fertilidade do solo,
define o gradiente de fisionomias (Fig. 1 ). Assim, à medida que vão melhoran­
do as condições do solo, a fisionomia da vegetação vai evoluindo de campo
sujo para campo cerrado, cerrado e, finalmente, cerradão, que é a fisionomia
mais densa, de maior biomassa. Essa correlação entre características do solo e
vegetação na transição entre cerrado e floresta é abordada por Ratter (1992).

A pressão antrópica também condiciona a fitofisionomia. No caso do cerrado,


impactos como o fogo e o pastoreio, quanto mais intensos e frequentes, levam
a fisionom ias mais abertas, no mesmo gradiente de biomassa apresentado

456
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

anteriormente (Eiten 1972; Goodland & Ferri, 1979). Protegida contra o fogo e
o pastoreio, essa vegetação volta a se adensar, em um processo dinâmico, que
compromete a qualidade dos mapas de fisionomias. Áreas que podem ter sido
mapeadas como campo cerrado, há 30 anos, podem apresentar-se atualmente
como cerradão e vice-versa.

fatores naturais: fertilidade do solo, disponibilidade hídrica. pH

fatores antrópicos: fogo, pastoreio, extração de lenha


fatores naturais: saturação de Al. saturação hídrica da superfície

Figura 1. Gradientè fitofisionômico do cerrado e seus fatores condicionantes.

Em florestas, além do fogo, a extração de madeira e os efeitos de borda decor­


rentes da fragmentação modificam a fisionomia da vegetação. A descontinui-
dade do dossel, a quantidade de lianas e outras evidências de perturbação,
caracterizam diferentes,estádios sucessionais ou estados de conservação, como
floresta primária (sem alteração) ou floresta secundária (regeneração de área
perturbada), capoeira alta ou capoeira baixa (florestas em declínio). Essas de­
nominações também variam entre autores.

Identificação de espécies
A identificação de plantas normalmente é feita com material reprodutivo (fru­
tos e, principalmente, flores) e material vegetativo (geralmente apenas ramos
com folhas). O material coletado deve ser prensado em jornal e secado em
estufa, para que não embolore e não derrube as folhas, o que pode impossibi­
litar ou, pelo menos, dificultar a identificação. Instruções detalhadas sobre
coleta de material botânico são encontradas em Mori et al. (1989) ou Fidalgo &
Bononi (1989). A identificação de espécies vegetais geralmente é feita por espe­
cialistas. Eventualmente, com a ajuda de bibliografia especializada e chaves de
identificação, um pesquisador que tenha familiaridade com a terminologia pode
fazer esse trabalho sozinho, mas os riscos de erro são grandes. A comparação

457
G ISELD A DURIGAN

do material cdletado com material já identificado em herbários é possível, mas


pode ser demorada e implica também riscos de erros.

Uma dificuldade adicional é que, na maioria das vezes, o pesquisador conse­


gue apenas material vegetativo ou apenas sementes retiradas do trato digestivo
dos animais. A identificação se torna ainda mais difícil e o ideal é procurar
especialistas. De qualquer maneira, qualquer que seja o material coletado, deve
ser acompanhado de cuidadosa descrição do local (localização geográfica), da
planta (forma de vida, tamanho, coloração, presença de espinhos ou látex,
odor característico, tipo de casca) e do ambiente em que ocorre (iluminação,
umidade do solo etc), para facilitar o trabalho de identificação. As obras mais
comumentè utilizadas na identificação de espécies vegetais a partir de material
reprodutivo são: Joly (1975), para identificação de famílias, e Barroso et al.
(1978; 1986), para identificação de gêneros. Recentemente, Barroso et al. (1999)
publicaram um livro que auxilia na identificação de plantas a partir de frutos
e sementes. Para material vegetativo existem algumas poucas chaves publica­
das, e nem sempre fáceis de encontrar. Essas chaves nem sempre são funcio­
nais, pois os caracteres vegetativos de uma espécie mudam de um local para
outro. Devem ter sua utilização restrita ao local para o qual foram elaboradas.

Fenologia
A fenologia é o estudo das fitofases em uma escala temporal, ou seja, época de
florescimento, frutificação etc. Além de caracterizar a época de ocorrência da
fitofase, pode-se ainda quantificar isso, através do índice fenológico:

’ IF = n úm ero d e indivíduos exibin do a fito fa s e / n ú m ero total d e indivíduos (da


p o p u la ç ã o ou d a co m u n id a d e, con form e o objetivo), geralm en te expresso em
porcen tag em .

Esse índice, calculado mensalmente, possibilita a apresentação das fitofases


ao longo do ano e permite uma boa correlação com a disponibilidade de ali­
mentos, por exemplo. Aspectos do estudo de fenologia são abordados em Bawa
e Hadley (1990).

Diagrama de perfil
Os diagramas de perfil, propostos por Richards (1996), são figuras que repre­
sentam uma faixa de vegetação de largura conhecida. Para florestas, no Brasil,
tem sido adotada geralmente a largura da faixa de 5m, e extensão variável,
geralmente não inferior a 30m. Pode-se elaborar um perfil real (Fig. 2 ), repro­
duzindo a estrutura vertical da floresta a partir de uma faixa em que são

458
M É T O D O S PARA A N Á L IS E D E V EG ETA Ç Ã O A R B Ó R E A

medidas a altura total da copa, altura inferior da copa, altu ra do prim eiro
ramo, largura da copa e formato da copa de cada um dos indivíduos presentes
na faixa, que são mapeados e identificados.

25 m

Figura 2. Diagrama de oerfil real K v ^


Aspidosperm a polyneuron; 2. Endlichería D a n ^ u l x t * - ^ Fazenda Berrante, Tarumã, SR 1 .
5. Holocalyx balansae; 6. Inga marginata 7 Nectandra m rp e e d u lis; 4 - Guarea kunthiana;
Prunus setow ii; 10. Sorocea bonplandir 11 T n c h Z n m egaP otamiC3' 8 - O rm osia arbórea; 9
Dungan e Leitão Filho 1995). clausseni; 12. Trichilia pallida (extraído de

sidade e porte das espécie^pTeM M es^èm lodl '!] dad° S médi° S ^

co7 um ^
OU do hábitat de espécies animais. da fis‘° " ° m ia da vegetação

4 5 9
GISELD A DURIGAN

Estudos quantitativos
Métodos de amostragem
A escolha do método a adotar depende essencialm ente das questões‘ que se
pretende responder sobre a vegetação. Há diversas obras trazendo detalhadas
explanações sobre métodos fitossociológicos, destacando-se Müller-Dombois
e Ellenberg (1974) e Pielou (1975). Os métodos usualmente empregados são
.apresentados a seguir.

Parcelas
A área amostrai é subdividida em parcelas, em número suficiente para estabi­
lização da curva do coletor. O tamanho das parcelas deve ser coerente com a
estrutura da comunidade a ser estudada. Para florestas no Brasil é comum a
utilização de parcelas quadradas de 10 x 10 m, embora teoricamente as parce­
las retangulares sejam consideradas mais representativas. Em matas ciliares,
recomendam-se parcelas de 5 x 20 m. A área de 100 m 2 facilita os cálculos. Para
comunidades herbáceas naturalmente as parcelas podem ser bem menores. E
comum, ainda, em comunidades herbáceas, utilizarem-se parcelas circulares.
Os pesquisadores são unânimes em afirmar que é melhor um número grande
de parcelas pequenas do que um número pequeno de parcelas grandes.

Geralmente se utilizam parcelas contíguas, pela facilidade, mas parcelas distri­


buídas em uma área m&ior, guardando uma distância entre si, certamente são
capazes de produzir amostragem mais representativa e, provavelmente, resul­
tar em maior riqueza e maior diversidade para uma mesma área amostrai, O
esforço despendido no trabalho de campo, no entanto, será muito maior. Par­
celas contíguas apresentam vantagens quando se busca mapear a distribuição
espacial dos 'indivídúos.

Quando se pretende amostrar separadamente diferentes estratos verticais da


vegetação, o ideal é utilizar subparcelas,' de tamanho menor, que amostrem
número semelhante de indivíduos em diferentes estratos. Para cada parcela
grande deve corresponder uma subparcela menor para cada estrato. E possível
também sortear algumas das parcelas grandes e fazer amostragem de estratos
inferiores apenas nessas parcelas, mas o resultado é menos representativo do
que com as subparcelas, porque as plantas de estratos inferiores tendem a ser
mais agregadas do que no dossel. As parcelas devem ser demarcadas com o
uso de bússola, GPS e trena, para que tenham a forma e as dimensões corretas.
Isso im plica um método demorado de amostragem. Por outro lado, fornece

460
M ÉTO D O S PARA A N Á LISE DE VEGETAÇÃO ARBÓ REA

d a d o s p r e c is o s d e d e n s id a d e e d o m in â n c ia .

Um problema que inevitavelmente surge na execução do método são os indiví­


duos que tocam a borda das parcelas. Um bom critério para resolver o proble­
ma é adotar que são incluídos os indivíduos que tocam dois lados da parcela
(sempre os mesmos) e excluídos os que tocam os outros dois lados.

Quadrantes
Existem alguns métodos de amostragem de vegetação denominados métodos
sem área. O método de quadrantes (Cottam & Curtis 1956) tem sido o mais
adotado no Brasil, dada a facilidade e rapidez de sua execução. No entanto,
conforme o nível de agregação dos indivíduos da comunidade, o método pode
acarretar um erro grande na estimativa de densidade e, consequentemente, na
dominância da vegetação. Comunidades com distribuição regular tendem a
uma superestimativa de densidade e comunidades agregadas levam a uma su-
bestimativa de densidade. Se o que importa no estudo é apenas a diversidade
e os parâmetros relativos entre as espécies, o erro desaparece e não há incon­
veniente em se utilizar o método. Pbrém, se os parâmetros absolutos são es­
senciais, há que se ter precaução na utilização do método de quadrantes, uma
vez que é impossível dimensionar o erro e corrigi-lo.

Para aplicação do método de quadrantes abrem-se transectos na área amostrai e


estabelecem-se pontos de amostragem, de preferência regularmente distribuí­
dos, para evitar subjetividade na escolha dos pontos. A distância entre pontos
deve ser tal que não ocorra sobreposição e o mesmo indivíduo venha a ser
amostrado em dois pontos consecutivos. É bom lembrar que, quanto maior o
diâmetro mínimo de inclusão, maior deverá ser a distância entre pontos.

Em cada ponto sãò amostrados quatro indivíduos, um em cada ângulo de 90°


(quadrante) a partir do ponto. É amostrado e identificado o indivíduo mais
próximo do ponto em cada quadrante e são medidos o DAP (Diâmetro à Altura
do Peito) e a distância do indivíduo ao ponto. Pode-se medir também a altura
e o diâmetro da copa, se for desejável. Para verificar o número de pontos
necessários adota-se também aqui a curva do coletor. Da mesma forma, é reco­
mendável que se adote a curva número de espécies x número de indivíduos.

A densidade da comunidade é estimada a partir da média das distâncias do


indivíduo ao ponto. Considera-se que a área média ocupada por indivíduo é
igual ao quadrado dessa distância média. E nessa estimativa que se encontra o
erro do método, pois uma comunidade agregada resulta em subestimativa e

461
GISELD A DURIGAN

uma comunidade com distribuição regular leva à superestimativa da densida­


de absoluta. A partir dos dados de densidade relativa (que são corretos), deter-
' /
mina-se então a densidade ábsoluta das espécies a partir daquela área média,
que dá a densidade absoluta da comunidade. Os cálculos de dominância tam­
bém partem dos valores relativos e são convertidos em valores absolutos a
partir daquela estimativa de densidade. Martins (1991) discorre exaustivamente
sobre o método de quadrantes e sua aplicação.

Método combinado (quadrantes + parcelas)


Embora ainda não seja consagrado, o uso combinado dos métodos de qua­
drantes e parcelas pode reunir a eficiência do primeiro com a precisão do
segundo. Aplica-se o método de quadrantes normalmente, sem, no entanto,
medir a distância ponto-árvore, que toma muito tempo e ainda resulta em
estimativa de densidade de baixa precisão. O dado de densidade absoluta da
comunidade, em vez de ser estimado a partir daquelas distâncias, é calculado
a partir de parcelas de área conhecida. Nessas parcelas não se medem e nem se
identificam os indivíduos, efetuando-se. apenas a contagem dos indivíduos,
dentro do critério de inclusão adotado, presentes em cada parcela. Essa conta­
gem é extremamente rápida, demandando menos tempo do que seria gasto na
medição de todas as distâncias árvore-ponto. O número de parcelas necessário
é pequeno, devendo ser suficiente para gerar uma densidade média com des­
vio padrão inferior a 10 %. Caso se deseje uma precisão ainda maior, o número
de parcelas pode ser aumentado.

Bitterlich
O método de Bitterlich começou a ser empregado no Brasil recentemente para
estudo de diversidade e estrutura de florestas tropicais. É normalmente utili­
zado para estimar volume de madeira. E um método que não leva em consi­
deração a área investigada, porém, possibilita uma estimativa razoavelmente pre­
cisa de densidade. Utiliza-se um aparelho denominado Relascópio de Bitterlich.
O observador faz um giro de 360° ao redor do ponto, e são identificadas e
medidas todas as árvores cujo diâmetro ultrapasse a banda selecionada, no
visor do aparelho. Aparentemente fácil de usar, entretanto carece de treina­
mento prévio e há poucos pesquisadores habilitados para o uso do método
com essa finalidade no Brasil. Embora as medições sejam relativamente fáceis,
o método envolve cálculos bastante complexos para estimativa de densidade e
dominância das espécies. Detalhes sobre o método de Bitterlich e sua aplica­
ção podem ser encontrados em Bitterlich (1984).

462
M ÉTO D O S PARÁ A N ÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

Estudos de dinâmica de populações e comunidades


Os estudos de dinâmica de populações ou comunidades büscam a compreen­
são das alterações a que elas se submetem ao longo do tempo. A maneira ideal
de conduzir esses estudos é estabelecer parcelas permanentes no campo e
repetir a amostragem na mesma área em momentos diferentes ao longo do
tempo. Naturalmente, para estudos de dinâmica não se recomendam métodos
sem área pré-determinada, já que é fundamental que seja possível o retorno à
mesma área em que foi efetuada a amostragem original. Os dados gerados em
dois momentos distintos permitem detectar, por exemplo, oscilações popula­
cionais inerentes a cada espécie ou alterações na comunidade, decorrentes de
perturbações ou de transformações sucessionais.

Coleta de dados no campo


Durante o trabalho de campo surgem muitas dúvidas sobre qual equipamento
usar e como usar corretamente o equipamento.

Diâmetro - Para os cálculos de dominância, a dúvida começa em se devemos


medir o perímetro ou o diâmetro. Sabe-se que o erro é maior quando se mede
o perímetro do tronco, no caso de troncos com secção irregular do que quando
se usa a média entre o maior e o menor diâmetro. Além disso, o porte da
árvore é muito mais facilmente visível a partir dos dados de diâmetro do que
de perímetro. Porém, a medição de diâmetro exige equipamento específico:
suta ou fita diamétrica, enquanto o perímetro pode ser medido com fita métri­
ca ou trena. A medição do diâmetro com a suta é muito mais fácil e rápida, além
de oferecer menos riscos de incidentes desagradáveis (espinhos, taturanas etc)
do que a medição com fitas. E bom lembrar que, em caso de árvores com mais
de um tronco, é preciso medir separadamente cada um e calcular separada­
mente a área basal para depois somar e obter a área basal do indivíduo. É
comum somarem-se os diâmetros e isso resulta em um enorme erro, com supe-
restimativa da área basal de indivíduos com troncos múltiplos.

Outra dúvida que surge em relação ao diâmetro é “onde medir?” O ideal é


medir a 1,30 m do nível do solo, mas em com unidades arbustivas ou em
estratos inferiores de florestas. É comum a medição ao nível do solo. Outras
alturas de medição são mencionadas, mas recomenda-se não empregar alturas
fora dos padrões, pela dificuldade de comparação dos resultados com outros
levantamentos. Com certa frequência encontram -se árvores bifurcadas ou de­
formadas a 1,30 do solo. Nesses casos, recomenda-se efetuar a medição um
pouco acim a ou um pouco abaixo, critério esse que deve ser previamente

'4 6 3
G ISELD A DURIGAN

estabelecido pára toda a amostragem. O diâmetro mínimo de inclusão depen­


derá dos objetivos da pesquisa e da estrutura da comunidade. Para florestas,
no Brasil, utilizam-se com frequência 5 ou 10 cm (DAP). Para cerrados, é co­
mum adotar-se 3 cm de diâmetro, no nível do solo.

Altura - Para medição de altura, existem vários aparelhos, todos desenvolvi­


dos para florestas de clima temperado e cuja utilização em florestas tropicais é
praticam ente impossível, porque pressupõem que seja possível visualizar o
topo e a base da árvore a partir de um mesmo ponto, o que raramente é viável.
Existem réguas dendrométricas telescópicas de até 15 m de comprimento, mas
são difíceis de operacionalizar no interior da mata e, além disso, só medem
árvores menores que o comprimento da régua. De modo geral, a altura das
árvores em florestas tropicais é estimada, com ou sem o auxílio de uma vara de
tamanho conhecido. Recomenda-se a precaução de que a estimativa de altura
seja feita sempre pelo mesmo membro da equipe de campo, o que gera um erro
sistemático, de pouca importância, já que dados de altura geralmente são em­
pregados apenas na compreensão da estratificação da floresta. E comum surgir
uma dúvida quando se depara árvores inclinadas: “mede-se o comprimento
ou a altura da árvore?” A opção fica a critério do pesquisador e deye ser feita
em virtude dos seus objetivos. Se é para quantificar biomassa, tem de ser
medido o comprimento. Se é para estratificação, mede-se a altura.

Identificação - A identificação das árvores no campo geralmente é difícil, a não


ser para especialistas. Recomenda-se a numeração dos indivíduos e coleta de
material de espécies desconhecidas, com o número correspondente. O traba­
lho de mateiros pode ser de muita valia nessa etapa. Porém, é difícil saber a
confiabilidade da identificação e é recomendável submetê-los a um teste de
confiabilidade (porcentagem de acertos). Uma ferramenta bastante simples,
porém extremamente útil, é fazer uma filoteca (coleção de folhas) das espécies
locais. Como raramente o número é muito grande, não é difícil coletar folhas
de cada uma delas e codificá-las, trabalhando com morfoespécies e evitando
ter de coletar material de milhares de indivíduos. Basta ser capaz de reconhe­
cer as folhas iguais à da espécie X da filoteca. Depois, basta fazer uma exsicata
de cada uma delas e procurar a ajuda de um botânico.

O que pode ser medido ou calculado?


Há diversos índices e diferentes parâmetros que podem ser adotados na análi­
se quantitativa, de populações ou comunidades vegetais. Os mais utilizados
são definidos a seguir e as fórmulas de cálculo são apresentadas no Anexo I.

464
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

ABUNDÂNCIA: É o número absoluto de indivíduos de uma espécie encontra­


do em uma determinada área. A abundância relativa de uma espécie pode ser
obtida dividindo-se a abundância da espécie pelo número total de indivíduos
de todas as espécies presentes na área. A abundância desconsidera o espaço
ocupado pelo indivíduo na comunidade, o que a difere da densidade. A abun­
dância relativa, no entanto, deve ser idêntica à densidade relativa.

DENSIDADE ABSOLUTA: expressa o número de indivíduos por unidade de


área. A densidade relativa de uma espécie é a proporção entre a densidade
absoluta da espécie e a densidade total da comunidade (soma da densidade
absoluta de todas as espécies). Determinar a densidade de uma espécie pode
ser difícil em alguns casos, como espécies lenhosas que rebrotam a partir das
raízes, formando “indivíduos clonais”, ou gramíneas estoloníferas, em que
não se consegue facilmente separar os indivíduos. No caso de árvores, estabe-
lece-se geralmente como critério que, se a conexão entre indivíduos não é
visível acima da superfície do solo, consideram-se indivíduos distintos. No
caso de espécies ou comunidades herbáceas é recomendável utilizar outros
métodos de amostragem, que não incluam densidade, como o grau de cobertu­
ra, por exemplo.

BIOMASSA: Expressa o peso de matéria seca por unidade de área, que reflete
a capacidade de suporte do meio ou a disponibilidade de forragem. Pode ser
de grande importância no estudo de animais herbívoros, ou ter uma importân­
cia mais genérica, como parte da caracterização do hábitat. Determinar a bio-
massa de comunidades herbáceas é relativamente fácil, já que é possível cole­
tar todo o material, secar e pesar. Para comunidades arbóreas, no entanto, é
praticamente impossível. Usualmente faz-se estimativa de volume de madeira,
através de medições de árvores em pé e converte-se em peso seco por unidade
de área com base em valores conhecidos de densidade da madeira das diferen­
tes espécies. Os cálculos de biomassa podem estender-se às folhas e até mes­
mo às raízes, conforme o objetivo da pesquisa.
\
DOMINÂNCIA: Representa o espaço ocupado pela espécie na comunidade.
Como a obtenção desse valor seria extremamente difícil, são utilizadas duas
formas para representá-lo: a cobertura (explicada a seguir) e a área basal. A
dominância absoluta de uma espécie corresponde ao somatório das áreas ba­
sais de todos os troncos da espécie, expressa em m 2/ha. A dominância relativa
é a proporção entre a dominância absoluta de uma espécie e o somatório da
dominância absoluta de todas as espécies.

ÁREA BASAL: A área basal, calculada em comunidades arbóreas, correspon­

465
GISELD A D U RI(?AN

de à área da secção do tronco (ou troncos, no caso de árvores com troncos


múltiplos) a 1,30 m acima do nível do solo. O somatório das áreas basais de
todos os indivíduos resulta na área basal da comunidade, que é expressa em
m 2/ha. A altura de medição (1,30 m) foi convencionada internacionalmente em
virtude da facilidade de medir à altura do peito e também porque a correlação
entre diâmetro e biomassa é mais estreita nessa altura do que na base da árvo­
re, que pode apresentar raízes tabulares, engrossamentos etc. Os valores de
área basal para florestas tropicais geralmente estão entre 20 e 45 m 2/ha. Quanto
maior a fertilidade do solo, maior deve ser a área basal. Valorés fora desses
lim ites podem indicar erros de cálculo ou de amostragem.

COBERTURA: É expressa pelá porcentagem da área coberta pela projeção da


parte aérea das plantas. Em comunidades herbáceas pode ser estimada visual­
mente, conforme proposto por Daubenmire (1968). Há, no entanto, outros
métodos mais precisos de determinar a cobertura. Em florestas pode-se medir
o diâmetro das copas e a partir desse valor obter a superfície coberta por elas.
Usualmente medem-se o maior e o menor diâmetro e calcula-se pela média,
como se a copa fosse circular. A cobertura de uma espécie é obtida pelo soma­
tório da superfície da copa de todos os indivíduos da espécie em determinada
área, expresso em porcentagem. Pode-se obter a cobertura relativa da espécie
(que pode ser adotada como indicadora de dominância) pela proporção entre a
cobertura da espécie e a cobertura total da comunidade (soma da cobertura de
todas as espécies).

O método de linhas é bastante fácil e pode ser adotado em qualquer tipo de


comunidade vegetal, (Canfield 1941). Nesse método determina-se a extensão
de uma linha (que pode ser uma trena) de comprimento conhecido, que é
coberta pela projeção da parte aérea de cada indivíduo. Da soma das exten­
sões cobertas por todos os indivíduos de uma espécie, dividida pela exten­
são da linha, obtém -se a cobertura da espécie. Para a comunidade, basta
somar todas as extensões medidas. É recom endável que seja registrada e
inserida nos cálculos a extensão de área descoberta (exposta à luz direta). A
cobertura é, geralmente, expressa em porcentagem. Em comunidades flores­
tais é comum a cobertura da comunidade ultrapassar 100 ou até 2 0 0 %, em
decorrência da superposição de copas. Uma boa comparação de diferentes
m étodos de determ inação da cobertura pode ser encontrada em Floyd &
Anderson (1987).

FREQUÊNCIA: É a porcentagem de unidades amostrais em que determinada


espécie está presente. Está correlacionada com o tamanho da população e,

466
M ÉTO D O S PARA A N Á LISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

principalmente, com a distribuição dos indivíduos na área amostrai. Espécies


de ocorrência agregada podem ter frequência baixa, mesmo que tenham alta
densidade. A frequência relativa de uma espécie é óbtida pela proporção entre
a frequência absoluta da espécie e o somatório da frequência absoluta de todas
as espécies.
AGREGAÇÃO: Os índices de agregação são utilizados para representar a for­
ma de distribuição espacial dos indivíduos de uma população ou da comuni­
dade como um todo. Existem vários índices, que dizem se os indivíduos se
distribuem de forma regular, aleatória ou agregada (ver Anexo I). Carvalho
(1983) apresenta os índices de MacGuinnes, Fracker & Brischle, Payandeh e
Hazen, com diferentes fórmulas, mas todos baseados nos mesmos parâmetros.

RIQUEZA DE ESPÉCIES: É expressa pelo número de espécies encontradas na


área de estudo. O ideal seria que correspondesse, sempre, a todas as espécies
presentes na comunidade dentro do critério de inclusão adotado. No entanto,
sabe-se que isso é impossível, a não ser em áreas muito pequenas em que seja
possível fazer um censo, identificando todos os indivíduos e não apenas uma
amostra.

A grande dúvida está em saber qual deve ser o tamanho da amostra para repre­
sentar a riqueza da comunidade em estudo. A maneira mais comumente adota­
da de verificar isso tem sido a curva do coletor. Quando houver estabilização
da curva do coletor, significa baixa probabilidade de aparecimento de novas
espécies com o aumento da área amostrai. Normalmente a curva é construída
utilizando o número de espécies (eixo Y) em função do aumento da área amos­
trai (eixo X). Porém, se é modificado o critério de inclusão (diâmetro mínimo,
por exemplo), a curva se desloca totalmente. E recomendável, portanto, que se
construa a curva número de espécies x número de indivíduos, que muda
muito pouco entre estratos para uma mesma comunidade. A estabilização da
curva tende a ocorrer com um número semelhante de indivíduos, indepen­
dentemente do critério de inclusão adotado, dentro de uma mesma comunida­
de. Para formações arbóreas do interior do Estado de São Paulo, por exemplo,
esse número gira em torno de 400 indivíduos, em área contínua. Isso facilita o
dimensionamento da amostra quando se estratifica a amostragem. Basta que se
amostre para cada estrato a área necessária para obter um número semelhante
de indivíduos em todos os estratos.

Há controvérsias se a construção da curva deve seguir a sequência de amostra­


gem ou se devem ser sorteadas as unidades amostrais. A diferença está em que,
no primeiro caso, podem surgir desvios na curva caso haja uma modificação na

467
G ISELD A DURIÓAN

de à área da secção do tronco (ou troncos, no caso de árvores com troncos


múltiplos) a 1,30 m acima do nível do solo. O somatório das áreas basais de
todos os indivíduos resulta na área basal da comunidade, que é expressa em
m 2/ha. A altura de medição (1,30 m) foi convencionada internacionalmente em
virtude da facilidade de medir à altura do peito e também porque a correlação
entre diâmetro e biomassa é mais estreita nessa altura do que na base da árvo­
re, que pode apresentar raízes tabulares, engrossamentos etc. Os valores de
área basal para florestas tropicais geralmente estão entre 20 e 45 m 2/ha. Quanto
maior a fertilidade do solo, maior deve ser a área basal. Valores fora desses
lim ites podem indicar erros de cálculo ou de amostragem.

COBERTURA: E expressa pelá porcentagem da área coberta pela projeção da


parte aérea das plantas. Em comunidades herbáceas pode ser estimada visual­
mente, conform e proposto por Daubenmire (1968). Há, no entanto, outros
métodos mais precisos de determinar a cobertura. Em florestas pode-se medir
o diâmetro das copas e a partir desse valor obter a superfície coberta por elas.
Usualmente medem-se o maior e o menor diâmetro e calcula-se pela média,
como se a copa fosse circular. A cobertura de uma espécie é obtida pelo soma­
tório da superfície da copa de todos os indivíduos da espécie em determinada
área, expresso em porcentagem. Pode-se obter a cobertura relativa da espécie
(que pode ser adotada como indicadora de dominância) pela proporção entre a
cobertura da espécie e a cobertura total da comunidade (soma da cobertura de
todas as espécies).

O método de linhas é bastante fácil e pode ser adotado em qualquer tipo de


comunidade vegetal, (Canfield 1941). Nesse método determina-se a extensão
de uma linha (que pode ser uma trena) de comprimento conhecido, que é
coberta pela projeção da parte aérea de cada indivíduo. Da soma das exten­
sões cobertas por todos os indivíduos de uma espécie, dividida pela exten­
são da linha, obtém -se a cobertura da espécie. Para a comunidade, basta
somar todas as extensões medidas. E recom endável que seja registrada e
inserida nos cálculos a extensão de área descoberta (exposta à luz direta). A
cobertura é, geralmente, expressa em porcentagem. Em comunidades flores­
tais é comum a cobertura da comunidade ultrapassar 100 ou até 2 0 0 %, em
decorrência da superposição de copas. Uma boa comparação de diferentes
métodos de determ inação da cobertura pode ser encontrada em Floyd &
Anderson (1987).

FREQUENCIA: E a porcentagem de unidades amostrais em que determinada


espécie está presente. Está correlacionada com o tamanho da população e,

466
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEG EJA Ç Ã O ARBÓREA

principalmente, com a distribuição dos indivíduos na área amostrai. Espécies


de ocorrência agregada podem ter frequência baixa, mesmo que tenham alta
densidade. A frequência relativa de uma espécie é óbtida pela proporção entre
a frequência absoluta da espécie e o somatório da frequência absoluta de todas
as espécies.

AGREGAÇÃO: Os índices de agregação são utilizados para representar a for­


ma de distribuição espacial dos indivíduos de uma população ou da comuni­
dade como um todo. Existem vários índices, que dizem se os indivíduos se
distribuem de forma regular, aleatória ou agregada (ver Anexo I). Carvalho
(1983) apresenta os índices de MacGuinnes, Fracker & Brischle, Payandeh e
Hazen, com diferentes fórmulas, mas todos baseados nos mesmos parâmetros.

RIQUEZA DE ESPÉCIES: É expressa pelo número de espécies encontradas na


área de estudo. O ideal seria que correspondesse, sempre, a todas as espécies
presentes na comunidade dentro do critério de inclusão adotado. No entanto,
sabe-se que isso é impossível, a não ser em áreas muito pequenas em que seja
possível fazer um censo, identificando todos os indivíduos e não apenas uma
amostra.

A grande dúvida está em saber qual deve ser o tamanho da amostra para repre­
sentar a riqueza da comunidade em estudo. A maneira mais comumente adota­
da de verificar isso tem sido a curva do coletor. Quando houver estabilização
da curva do coletor, significa baixa probabilidade de aparecimento de novas
espécies com o aumento da área amostrai. Normalmente a curva é construída
utilizando o número de espécies (eixo Y) em função do aumento da área amos­
trai (eixo X). Porém, se é modificado o critério de inclusão (diâmetro mínimo,
por exemplo), a curva se desloca totalmente. É recomendável, portanto, que se
construa a curva número de espécies x número de indivíduos, que muda
muito pouco entre estratos para uma mesma comunidade. A estabilização da
curva tende a ocorrer com um número semelhante de indivíduos, indepen­
dentemente do critério de inclusão adotado, dentro de uma mesma comunida­
de. Para formações arbóreas do interior do Estado de São Paulo, por exemplo,
esse número gira em torno de 400 indivíduos, em área contínua. Isso facilita o
dimensionamento da amostra quando se estratifica a amostragem. Basta que se
amostre para cada estrato a área necessária para obter um número semelhante
de indivíduos em todos os estratos.

Há controvérsias se a construção da curva deve seguir a sequência de amostra­


gem ou se devem ser sorteadas as unidades amostrais. A diferença está em que,
no primeiro caso, podem surgir desvios na curva caso haja uma modificação na

467
G ISELD A DURIGAN

comunidade, como o aparecimento de uma clareira, por exemplo. Com a alea-


torização da sequência, esse desvio tende a desaparecer.

RARIDADE: No Brasil, dois conceitos diferentes têm sido adotados para se


considerar uma espécie rara. O primeiro, relacionado com a densidade da
população, considera raras as espécies que são representadas com um único
indivíduo na área amostrai. Espécies de distribuição geográfica ampla, porém
com populações de baixa densidade, podem ser consideradas raras sob esse
conceito. O segundo conceito considera raras as espécies que ocorrem em um
único local, estando mais correlacionado com espécies endêmiças, mesmo que
nesse local a densidade da população seja alta.

Verdadeiramente raras seriam, porém, espécies que preenchem os seguintes


requisitos: populações muito pequenas e restritas a condições ambientais muito
específicas, ocorrendo em um ou em poucos locais. Rabinowitz (1981) apro­
funda a discussão do conceito de raridade, considerando as diferentes combi­
nações possíveis entre distribuição geográfica, especificidade de hábitat e ta­
manho da população. Dessa análise resultam oito combinações possíveis, sen­
do uma correspondente a espécies comuns (ampla distribuição, hábitat pouco
específico e populações com grande número de indivíduos) e as outras sete
correspondendo a diferentes níveis de raridade.

DIVERSIDADE DE ESPÉCIES: Representa a complexidade da comunidade. A


diversidade de espécies na comunidade é chamada diversidade alfa. Quanto
maior a diversidade alfa, menor a chance de que um segundo indivíduo amos­
trado seja da mesma espécie do primeiro. A diversidade beta representa a
variação da composição de espécies entre áreas de diversidade alfa (por exem­
plo, entre diferentes partes do mosaico ambiental ou ao longo de um gradiente
vegetacional). Magurran (1988) menciona ainda outros níveis dê diversidade,
relacionados com a extensão da área biogeográfica: diversidade delta é defini­
da como a alteração na composição e abundância dé espécies entre áreas de
diversidade gama, que ocorrem dentro de uma área de diversidade épsilon.

Há vários índices que são utilizados para expressar a diversidade (alfa) de uma
comunidade vegetal. São considerados melhores aqueles que incluem nos cál-
, culos a riqueza e a densidade relativa das espécies. Quanto maior for o núme­
ro de espécies, ihais semelhante for o número de indivíduos de cada espécie e
melhor distribuídos estiverem esses indivíduos na área amostrai, maior será a
diversidade da comunidade. Do ponto de vista da fauna, alta diversidade flo-
rística implica possibilidade de suportar também alta diversidade de espécies
animais. E importante ressaltar qus, para uma mesma comunidade, o índice

468
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEGETAÇÁO ARBÓREA

de diversidade obtido pode variar segundo o critério de inclusão adotado na


amostragem.

Os índices de diversidade devem .ser expressos como números puros. Uma


vez que a base logarítmica utilizada nos cálculos pode variar para a mesma
fórmula, alguns autores associam ao valor um indicativo da base utilizada,
por exemplo “n at” para loge, “b its” para log2 e “d ecit” para loglO. Esses
termos, listados por Pielou (1969), são originários da teoria da informação e
servem para descrever como foi efetuado o cálculo de diversidade. Erronea­
mente, no entanto, têm sido apresentados como “unidades de medição de
diversidade”, acompanhando o valor numérico obtido nos cálculos. Magurran
(1988) discute exaustivamente as questões relativas à diversidade ecológica
desde a sua conceituação às diferentes formas de avaliação. A autora apre­
senta ainda índices de diversidade beta, para avaliação da diversidade em
gradientes ambientais.

EQUABILIDADE: É obtida pela proporção entre a diversidade obtida e a diver­


sidade máxima possível, considerando-se a riqueza existente. Normalmente é
um índice mais confiável do que os índices de diversidade, uma vez que é
menos variável em função do critério de inclusão.

SIMILARIDADE: É o nível de sem elhança florística entre duas áreas distintas


(pode ser um indicador de diversidade beta ou gama) ou entre dois estratos
dentro de uma mesma área amostrai. Há várias maneiras de se calcular a simi­
laridade, sendo os índices de Sorensen e Jaccard os mais utilizados (Magurran
1988). São considerados nos cálculos o número de espécies exclusivas e o
número de espécies com uns às duas áreas que se deseja comparar. Quando
são comparadas várias áreas, podem ser construídos dendrogramas de si­
milaridade.

ÍNDICE DE VALOR DE IMPORTÂNCIA: É obtido pela soma dos valores rela­


tivos de densidade, dominância e frequência de uma espécie na comunidade.
Esse índice classifica as espécies da comunidade em ordem de importância,
com base na sua densidade, no porte dos indivíduos e na distribuição espaci­
al desses indivíduos. Naturalmente, tendem a ser mais importantes espécies
de alta densidade, com indivíduos de grande porte e regularmente distribuí­
dos por toda a área amostrai. O problema desse índice é que, sozinho, não
permite compreender a estratégia de ocupação do espaço pela espécie na co­
munidade. Qualquer análise deve ser feita considerando cada um dos parâme­
tros isoladamente.

469
G ISELD A DURIGAN

ÍNDICE DE VALOR DE COBERTURA: É obtido pela soma dos valores relati­


vos de dominância e densidade. Descarta-se a frequência, por ser esse parâme­
tro muito variável com o tamanho da unidade amostrai.

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471
G ISELD A DURIGAN

Anexo I
Fórmulas de cálculo

DENSIDADE ABSOLUTA (DA) = número de indivíduos da espécie i por


unidade de área (indVha, geralmente):-
DAi = ni/A x 10000 m2, onde:
DAi = densidade absoluta da espécie i (ind./ha)
ni = número de indivíduos da espécie i
A = área total amostrada (m2)
Se o levantamento for efetuado pelo método de quadrantes (sem área), o cálculo
de densidade passa a ser mais abstrato:
DAi = 10000/d2, onde
DAi = densidade absoluta da espécie i (ind./ha)
d = distância média árvore-ponto, para todos os indivíduos amostrados.

DENSIDADE RELATIVA (DR) = porcentagem dos indivíduos da comunidade


correspondente aos indivíduos da espécie i.

DRi = 100£Mí7]T DAi


Ou '
DRi = 100 ni/N , onde:
DRi = densidade relativa da espécie i (%)
DAi = densidade absoluta da espécie i (ind./ha)
ni = número de indivíduos da espécie i
N = número total de indivíduos amostrados

FREQUÊNCIA ABSOLUTA (FA) = porcentagem de unidades amostrais em


que ocorre a espécie.
FAi = 1Q0 p/ P, onde:
FAi = frequência absoluta da espécie i (%)
p = número de unidades-am ostrais (parcelas ou pontos) em que ocorre a
espécie i
P = número total de unidades amostrais

FREQUÊNCIA RELATIVA (FR) = frequência absoluta da espécie dividida pela


soma da frequência absoluta de todas as espécies, expressa em porcentagem.
Onde:

FRi =? 100 F A i / £ FAi


i - 1 ,

FRi = frequência relativa da espécie i (%)


FAi = frequência absoluta da espécie i (%)

472
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓ REA

DOMINÂNCIA ABSOLUTA (DoA) = área basal de todos os indivíduos da


espécie por unidade de área (m 2/ha).

- DoAi = A B i / A x 10000 m'


Onde:
DoAi = dominância absoluta da espécie i
ABi= área basal da espécie i

DOMINÂNCIA RELATIVA (DoR) = área basal da espécie i expressa em


porcentagem da área basal total de todas as espécies.
Onde:

DoR-i = 100 A B i / ^ A B i
(= i
DoRi = dominância relativa da espécie i (%)
ABi= área basal da espécie i

ÁREA BASAL DA ESPÉCIE (AB) = somatório da área da secção do tronco (ou


dos troncos) a l,3 0 m acima do nível do solo, de todos os indivíduos da espécie
(em m 2/ha).
Onde:
A B i = ^ D A P i 2 i / 4
i =i
ABi= área basal da espécie i
DAPi = diâmetro a 1,30 m acim a do nível do solo, de cada indivíduo da
espécie i

ÍNDICE DE VALOR DE IMPORTÂNCIA (IVI) = índice composto pela soma


dos valores relativos de densidade, dominância e frequência de uma espécie.

IVI i = DRi + DoRi + FRi


Onde:
DRi = densidade relativa da espécie i (%)
FRi = frequência relativa da espécie i (%)
DoRi = dominância relativa da espécie i (%)

ÍNDICE DE VALOR DE COBERTURA (IVC) = índice composto pela soma dos


valores relativos de densidade e dominância.

IVCi = DRi + DoRi


Onde:
DRi = densidade relativa da espécie i (%)
DoRi = dominância relativa da espécie i (%)

473
GISELD A DURIGAN

GRAU DE COBERTURA (C) = porcentagem do terreno coberta pela projeção


da parte aérea das plantas.
n

Pelo método de área (%):


Onde:
C = porcentagem da área amostrai coberta pela projeção da parte aérea das
plantas
ci = área da projeção da parte aérea do indivíduo i
A = área de amostragem
n = número de indivíduos amostrados na área A

Cobertura pelo método de linhas (%):

C = 100 lc/L

Onde:
C = grau de cobertura (%)
lc = extensão da linha coberta pela projeção da parte aérea das plantas
L = extensão total da linha de amostragem

ÍNDICE DE AGREGAÇÃO DE PAYANDEH (Payandeh 1970)

P = V/M
Onde: »
P = índice de agregação
V = variância do número de plantas por parcela
M = média do número de plantas por parcela

Valores de P menores que 1,0 indicam distribuição regular; P entre 1,0 e 1,5
indica distribuição aleatória e P maior que 1,5 indica distribuição agregada.

ÍNDICE DE DIVERSIDADE DE SHANNON = H’ (Pielou 1975).


Onde:
n

Pi = ni / N
ni = número de indivíduos da espécie i
N = número total de indivíduos amostrados

474
M ÉTO D O S PARA ANÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

ÍNDICE DE DIVERSIDADE DE SIMPSON = Ds (Simpson 1949).

D s = 1 - £ [n i ( n i - 1 ) / N (N - I )]
<= i
Onde:
ni = número de indivíduos da espécie i
N = número total de indivíduos amostrados

ÍNDICE DE DIVERSIDADE DE MARGALEF = DMg (Clifford and Stephenson


1975).

DMg = (s - D / l n N
Onde:
N = número total de indivíduos amostrados
s = número total de espécies amostradas
ln = logaritmo neperiano

ÍNDICE DE DIVERSIDADE DE MENHINICK = DMn (Whittaker 1977).

Onde:
N = número total de indivíduos amostrados
s = número total de espécies amostradas

ÍNDICE DE EQUABILIDADE (e) - (Pielou 1966).

e = H’/H’máximo ou e = H’/log s
Onde:
H’ = índice de diversidade de Shannon
s = número total de espécies amostradas
«
ÍNDICE DE SIMILARIDADE DE SORENSEN = S

S = 2c/(a +b)
Onde:
a = número total de espécies presentes em uma das amostras
b = número total de espécies presentes na outra amostra
c = número de espécies comuns a ambas as amostras

475
GISELD A DURIGAN

ÍNDICE DE SIMILARIDADE DE JACCARD = Cj

Cj = c/(a + b - c)
Onde:
a = número total de espécies presentes em uma das amostras
b = número total de espécies presentes na outra amostra
c = número de espécies comuns a ambas as amostras

Obs: o índice de similaridade de Jaccard é citado, por alguns autores, com a


fórmula: • ' v

Cj = c/(a + b + c)

Nesse caso, muda a definição de a e b, sendo:


a = número de espécies exclusivas da amostra A
b = número de espécies exclusivas da amostra B

Em qualquer uma das apresentações da fórmula, o denominador tem o mesmo


significado: corresponde ao número total de espécies amostradas nas duas
amôstras que estão sendo comparadas.

476
M ÉTO D O S PARA A N Á U SE DE VEGETAÇÃO ARBÓ REA

Anexo II - Fichas auxiliares


FICHA PARA LEVANTAMENTO FITOSSOCIOLÓGICO POR PARCELAS

LOCAL: , DATA:

PARCELA: ÁREA DA PARCELA:

OBSERVAÇÕES:

N» DAP ALTURA DIÂMETRO


ESPÉCIE
IND (cm) (m) DA COPA (m)

>

477
G ISELD A DURIGAN

FICHA PARA COLETA DE DADOS DO DIAGRAMA DE PERFIL

LOCAL: DATA:

OBSERVAÇÕES:

5m

0 5 10 15 20 25 30m

ALTURA ALTURA ALTURA DO DIÂMETRO


DAP TOTAL DA INFERIOR PRIMEIRO DA COPA FORMA
N° ESPÉCIE
(cm) ÁRVORE DA COPA RAMO (m) DA COPA
(m) (m) (m)

478
M ÉTO D O S PARA A N ÁLISE DE VEGETAÇÃO ARBÓREA

FICHA PARA LEVANTAMENTO FITOSSOCIOLÓGICO POR QUADRANTES

LOCAL: ’ DATA:

OBSERVAÇÕES:

Número Número, Distância Diâmetro


do do Espécie DAP Altura árvore da copa
quadrante indivíduo (cm) (m) ponto (m)

'
4

2 -
t
3

479
Uso do sistema do informações geográficas
em Biologia da Conservação
Alexandre Uezu
Mestrado e doutorando em Ecologia
- pela Universidade de São Paulo.

Os objetos encontrados em nosso mundo têm relações espaciais entre si, ou


seja, suas posições no espaço influenciam suas interações, o que, por conse­
quência, pode desencadear muitos processos. A importância do Sistema de
Informações Geográficas (SIG) em conservação provém da necessidade de en­
tendermos como essa localização no espaço dos diferentes elementos que com­
põem nosso ambiente e, portanto, suas interações interferem sobre a riqueza e
diversidade da fauna e da flora. Esse fato se torna ainda mais relevante quando
consideramos a ocupação humana sobre a Terra, que reduziu e fragmentou
grande parte dos habitats naturais, ao passo que aumentou os fatores antrópi-
cos que agem sobre os ecossistemas n atu rais..

Podemos citar três tipos de relação entre os objetos em nosso mundo (Câmara
& Medeiros, 1998): i. c o rrela ç ã o e s p a c ia l - objetos mais próximos tendem a
ser mais semelhantes entre si - por exemplo, doenças de animais domésticos
e selvagens têm mais chance de serem transmitidas entre as espécies se estas
tiverem um contato mais próximo; ii. co rrela ç ã o tem ática — um conjunto de
fatores determina as características de uma região - podemos citar o nicho de
uma espécie, que é constituído por um conjunto de condições abióticas (rele­
vo, tipo de solo, clim a) e bióticas (tipo de vegetação e presença de outras
espécies); e, finalmente, iii. co rrela ç ã o tem p oral - a paisagem atual retém mar­
cas do passado, ou seja, é uma transformação da paisagem que existia anterior­
mente. A existência dessas relações é que torna o SIG uma ferramenta útil para
entendermos melhor os fenômenos naturais em nosso mundo.

O SIG armazena em um banco de dados informações espacialmente referenci­


adas. Esse sistema abrange desde a captura dessa informação, passando por
sua manipulação, consulta, integração e análise em relação a outros dados, até

481
ALEXA N DRE U EZU

sua apresentação final, em mapas ou relatórios. É importante lembrar que,


além dos mapas - a parte gráfica desse sistema - , há também os dados armaze­
nados em tabelas (dados alfanuméricos). Essas tabelas podem conter várias
informações (atributos) sobre os objetos representados nos mapas.

Serão descritos neste capítulo os vários componentes que formam o SIG e


como as diversas informações referentes ao nosso ambiente podem se congre­
gar para resolver problemas reais da conservação, auxiliando na tomada de
decisões, no manejo de espécies e da paisagem e até, de maneira mais ampla,
no desenvolvimento de políticas públicas.

Caixa 1 ,

Noções de cartografia
Em um SIG, os diversos tipos de informações referentes a uma localidade po­
dem ser sobrepostos e integrados pelo uso de um sistema de referência geográ­
fica. E essa referência que faz a costura entre as informações. A cartografia
forneceu as bases para o georreferenciam,ento, suprindo-nos de conceitos como
sistema de coordenadas geográficas e planas, projeção, datum e escala.
Coordenadas geográficas: o globo terrestre é dividido em meridianos e parale­
los (Fig. 01a), cujd unidade é dada em graus. Os meridianos são círculos máxi­
mos da esfera, cujos planos passam pelo eixo de rotação da Terra. O meridiano
de Greenwich é o inicial, de origem (0o de longitude), e passa sobre o antigo
observatório britânico homônimo. A leste de Greenwich, os meridianos apre­
sentam valores positivos, crescentes, até + 180°. A oeste, as medidas decres­
cem até - 180°. Os paralelos são círculos da esfera perpendiculares ao eixo de
rotação da Terra. O equador é o paralelo inicial (0o de latitude) e divide a Terra
nos hemisférios norte e sul. Do equador em direção ao polo norte, os valores dos
paralelos são crescentes e positivos até + 90° e, para o sul, decrescem até - 90°.
A localização de um ponto na Terra é dada por sua latitude e longitude. A
latitude é a distância angular de qualquer ponto na superfície, partindo do
centro da Terra, até o equador. Por sua vez, a longitude é a distância angular de
um ponto até o meridiano de Greenwich. Por exemplo, a cidade de São Paulo
está a leste do meridiano de Greenwich e ao sul do equador e apresenta longi­
tude e latitude de - 46° 42’ e - 23° 32’, respectivamente.
Coordenadas planas: o sistema de coordenadas planas, também conhecido por
sistema de coordenadas cartesianas, baseia-se em dois eixos perpendiculares,
horizontal e vertical, em cujo cruzamento determinam-se as coordenadas inici­
ais (0 , 0). A localização de um ponto nesse sistema é determinada por dois
valores, um referente à projeção do ponto no eixo x e o outro referente a sua
projeção no eixo 7 . No SIG, as coordenadas cartesianas são usadas em projeções
geográficas (Fig. 01b).
)

482
U S O DO SIST E M A D E-IN FORM AÇÕES
G EOG RÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

Projeção: É uma tentativa de representação da superfície tridimensional da


Terra em um plano. Nesse processo, acontecem distorções de várias naturezas
(Joly, 2004), tais como: de área - áreas mapeadas apresentam diferenças de
proporção em relação às áreas reais que representam; de distância - a medida
de distância varia de uma região para outra, ou seja, a proporção de distância
não é mantida; e de conformidade - a escala do mapa em um ponto não é a
mesma em qualquer direção, isto é, apresenta distorções de forma.
Uma projeção muito utilizada em cartografia é a Universal Transverse Merca-
tor - UTM, que é a projeção de uma esfera em um cilindro, tangente ao meridi­
ano central. ATerra é dividida em 60 fusos de seis graus cada, nomeados zonas
(Fig. 01b). Cada fuso é projetado na parede de um cilindro. Ao se abrir esse
cilindro, temos o mapa em duas dimensões. Dessa forma, as distorções (de
escala, distância, direção e área) se tornam mais relevantes conforme nos afas­
tamos do meridiano central. A UTM é uma projeção adequada para grandes e
médias escalas. A extensão territorial do Brasil abrange as zonas 18 a 25 (Fig.
01 b).

Fontes de informação
Uma etapa importante no trabalho com o SIG é a obtenção das informações. A
qualidade de todas as análises empreendidas dependerá dos dados obtidos. A
escolha inadequada de uma fonte de informação pode gerar resultados pouco
consistentes e que pouco explicam os fenômenos que estamos estudando. A
escolha da fonte ideal dependerá de fatores como detalhamento dos mapas a
serem criados, precisão da localização dos objetos estudados e frequência de
coleta das informações. Nesta seção, serão citadas as fontes de informação
mais frequentemente utilizadas.

483
ALEXA N DRE U EZU

Sensoriamento remoto

O desenvolvimento das tecnologias para o sensoriamento remoto tem ocorrido


de maneira muito rápida, em razão de sua aplicação em diversos campos da
atividade humana, o que permite a ampla utilização e o relativo barateamento
dessa ferramenta. O sensoriamento remoto pode ser definido como a ciência
(e, a té certo p on to, arte) d e ca p tu ra r in fo rm a çã o d a su p erfície terrestre sem
estar em contato direto com ela.

Com base nessa definição, podemos fazer uma analogia com a nossa pró­
pria visão. Nossos olhos (sensores naturais) recebem inform ações proveni­
entes de fontes de radiação (como o sol ou uma lâmpada). Essa radiação
incide sobre os objetos e sofre m odificações, parte é absorvida pelos obje­
tos e parte é refletida, até chegar a nossas retinas. Com as informações que
chegam a nossos olhos, conseguim os id en tificar os objetos por sua cor,
textura e forma, sem entrar em contato direto com eles. O mesmo acontece
com os dados de sensoriam ento remoto. No entanto, nesse caso, os senso­
res estão em aviões, espaçonaves ou satélites. Uma outra diferença marcan­
te é que alguns sensores têm a vantagem de “enxergar” faixas do espectro
eletrom agnético além das visíveis a olho nu (Figura 03). Entre os produtos
do sensoriam ento remoto, temos as imagens de satélites, as fotografias aére­
as e os radares.

curto Comprimento de onda (m) longo

visível
C BER S Radares
0.45-0.90im

10" 101 IO1' l(f 106 104


alta baixa
Frequência (Hz)

Figura 03 - C om posição do espectro eletrom agnético e a localização dos intervalos de


operação do satélite CBERS/CCD, dos radares, bem como a posição da faixa do visível.

484
U SO DO SIST E M A DE INFORMAÇÕES
G EOG RÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

Imagens d e satélite: a fonte de radiação eletromagnética recebida pelos satélites


é oriunda do sol. A fração da radiação que é refletida pela superfície terrestre
é recebida pelos sensores que estão entre 680 km (Ikonos-2) e 32.000 km (GOES)
da superfície terrestre. Encontramos diversos tipos de imagens de satélites,
que têm diferentes especificações, que, por sua vez, determinam suas utiliza­
ções. As imagens podem variar quanto à resolução espacial, temporal, radio-
métrica e espectral.

A resolu çã o e s p a c ia l é a capacidade de distinção entre dois. objetos. O satéli­


te que produz imagens com m elhor resolução hoje em dia é o Quickbird
(0,64 x 0,64 m de pixel para a banda pancrom ática), que permite diferenciar
objetos relativamente pequenos como pequenas árvores isoladas em um pas­
to. A reso lu çã o tem p o ra l é dada pela frequência de obtenção das imagens em
um determinado ponto. O satélite NOAA, por exemplo, obtém informações
de um mesmo ponto da superfície terrestre duas vezes por dia, permitindo o
monitoramento constante. No entanto, as imagens desse satélite têm resolu­
ção espacial baixa, de 1,1 km de pixel. Há uma relação inversa entre a reso­
lução espacial e a resolução temporal. Normalmente, imagens com boa reso­
lução temporal apresentam baixa resolução espacial e vice-versa. A resolu ­
ção rad io m étrica é determinada pela sensibilidade dos sensores em perceber
as variações da radiação refletida pela superfície terrestre. As imagens anti­
gas do Landsat/MSS tinham resolução radiom étrica de 6 bits, ou seja, os
valores de pixel apresentavam variação de 0 a 63 ( 2 6). Já as imagens Landsat/
TM têm resolução de 8 bits, podendo perceber 256 (28) gradações de radia­
ção, de 0 a 255 (veja os valores de pixel na Figura 04). A r eso lu çã o esp ectra l
representa a quantidade e a largura das faixas do espectro eletromagnético a
que os sensores são sensíveis. As imagens do Landsat, por exemplo, apre- ’
sentam sete bandas m ultiespectrais, ao passo que o CBERS apresenta apenas
quatro (menor resolução espectral). No entanto, o CBERS tem a vantagem da
resolução espacial mais alta.

As imagens de satélite têm tido muitas finalidades em biologia da conserva­


ção. Uma vantagem importante é a cobertura de vastas extensões geográficas,
visto que grande parte das- questões em conservação diz respeito a áreas em
escala regional, que abrangem centenas de quilômetros. Uma imagem de saté­
lite Landsat ou do CBERS, por exemplo, cobre uma área de 185 x 185 km e
113 x 113 km, respectivam ente. Um outro ponto a favor das imagens de
satélite é o fato de podermos gerar mapas de amplas áreas, sem a necessidade
de visitar toda sua extensão. As imagens permitem a extrapolação das infor-

485
ALEXA N DRE U EZU

mações obtidas em uma área menor, bem conhecida, para toda sua extensão.
Isso é importante, sobretudo, em regiões de difícil acesso, como o interior da
floresta amazônica.

Como exemplo de imagem de satélite, utilizaremos o sensor TM do satélite


Landsat, um dos mais empregados em conservação. Essa imagem é composta
por sete bandas (Jensen, 1996; Tabela 1 ), que correspondem a diferentes faixas
do espectro eletromagnético: três referentes ao visível (azul, verde e vermelho)
e quatro ao infravermelho (próximo, médio, distante e termal). Isso significa
que há sete sensores captando as radiações, um para cada faixa do espectro.
Cada banda da imagem tem suas especificações quanto ao tipo de elementos
da paisagem que melhor elas podem distinguir (Tabela 1 ). A resolução espacial
da imagem produzida é de 30 metros para as bandas multiespectrais 1, 2, 3, 4,
5 e 7. A banda 6 é uma banda termal (ver especificações na Tabela 1), com 120
m de resolução.
Tabela 1. Características das bandas espectrais do sensor TM do satélite Landsat.
Bandas ■ Faixa do espectro Descrição de uso
1 Azul 0,45 a 0,52 um Permite a penetração em corpos
d'água. É útil para análises de ocupação
da terra, do " tipo de solo e das
características da vegetação.
2 Verde 0,52 a 0,60 um Corresponde à reflectância da coloração
verde da vegetação saudável. •
3 Vermelho 0,63 a 0,69 um Comprimento de onda muito absorvido
pela clorofila da vegetação verde e
.saudáveK É uma das bandas mais
importante para distinguir a vegetação.
4 , Infravermelho 0,76 a 0,90 um Representa a quantidade de biomassa
próximo da vegetação.
5 Infravermelho 1,55 a 1,75 um Sensível à turgidez ou à quantidade, de
médio água nas plantas.
6 Termal 10,4 a 12,5 i^m ■Representa a variação da temperatura
da superfície da Terra.
r Infravermelho 2,08 a 2,35 |xm Utilizada para diferenciar formações
distante rdchosas.

O satélite sino-brasileiro CBERS produz imagens com características seme­


lhantes às do Landsat. As imagens do CBERS apresentam quatro bandas mul­
tiespectrais, que correspondem às bandas 1 , 2, 3 e 4 dos sensores TM; no
entantcr, com uma melhor resolução espacial, de 20 x 20 m (Figura 04). Sua
frequência de obtenção dos dados é de 26 dias.

486
U SO DO SIST E M A DE INFORMAÇÕES
G EOG RÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

Banda 4

140
pasto .
120 ♦* » l

100 •
I í *u_±
80 » * . ♦ ♦
60

40
: ♦I . »*
água
20 u h
0
15 17 19 21 23 25 27 29 31 33

B anda 3

Figura 04 - Recorte de uma imagem de satélite C B E R S , ilustrando os valores de pixel das


quatro bandas que a compõem. O gráfico (d) representa a posição dos. pixels, considerando
as bandas 3 e 4 e as diferentes ocupações do solo que podem ser obtidas. As últimas figuras
(e) mostram um mapa tem ático, classificado com as inform ações dos valores de pixel de
todas as bandas e uma fotografia aérea da m esma área.

487
A LEXA N DRE U EZU

Entre as etapas do processamento da imagem de satélite para obtenção de ma­


pas temáticos, estão o georreferenciamento (Caixa 2), a interpretação e/ou clas­
sificação da imagem (Caixa 3) e a verificação da acurácia.

Caixa 2

Georreferenciamento
Para que as informações de diferentes mapas se sobreponham', a fim de que sejam
analisadas, elas devem estar em um sistema de coordenadas. Frequentemente,
deparamo-nos com essa tarefa, a de georreferenciar nossas fontes de informação:
imagens de satélite, fotografias aéreas e mapas topográficos (no formato digital).
Nesse processo, a imagem bruta, sem referência espacial (p. ex., aquela recém-
escaneada) deve se “encaixar” em um sistema de coordenadas, de acordo com uma
base de referência. Essa base pode ser uma carta topográfica, uma outra imagem, já
georreferenciada, ou pontos coletados com GPS. A ideia é procurar pontos (chama­
dos pontos de controle) que sejam identificáveis tanto na imagem bruta quanto na
base que se tem como referência. Esses pontos podem ser cruzamentos de estradas
e rios, construções isoladas (casas, fábricas), barragens etc. Quanto mais bem dis­
tribuídos estiverem os pontos na imagem, melhores serão os resultados. Ao indicar
esses pontos de controle em um programa específico, serão calculados os erros do
processo, que podem variar de frações de metro até vários metros, dependendo da
fonte de referência que se esteja usando e da resolução de sua imagem. Ao executar
o georreferenciamento, o programa criará uma nova imagem, inserido-a no siste­
ma de coordenadas de referência (ver exemplo na Figura 05).

Figura 05 - Fotografias aéreas da região de Nazaré Paulista, SP: a) antes do georre­


ferenciamento, e b) após o georreferenciamento.

488
U SO DO SISTEM A DESINFORMAÇÕES
G EOGRÁFICAS EM BIOLOGIA
« DA CONSERVAÇÃO

Fotografias a é r e a s : as fotografias aéreas apresentam vantagem em relação à re­


solução espacial. Por exemplo, se pretendem os mapear a área de vida de
uma espécie que usa de maneira distinta diferentes estádios de uma floresta,
provavelmente imagens de satélite com resolução de 30 m x 30 m de pixel não
.serão as fontes mais adequadas, por não serem capazes de diferenciar todas
essas fisionomias florestais. Nesse caso, fotografias aéreas poderiam ser mais
eficazes, em virtude da maior riqueza de detalhes. No entanto, uma desvanta­
gem é que, para mapearmos uma área muito extensa (p. ex., maior que 10.000
ha), é necessário um conjunto muito grande de fotografias, o que aumenta
demasiadamente o custo e a mão de obra.

De 1909 até 1960, as fotografias aéreas eram os únicos meios de geração de


informação por sensoriamento remoto (Florenzano, 2002). Portanto, em levan­
tamentos históricos do uso do solo,-essas são as únicas' fontes de que dispo­
mos (Figura 08).

No entanto, como verificamos anteriormente, as imagens de satélite apresen­


tam aprimoramento em seus sensores, com resolução espacial mais elevada,
comparável a muitos levantamentos aéreos. Exemplos desses avanços são os
satélites Quickbird e Ikonos, que produzem imagens com altas resoluções,
aliando a resolução espacial à resolução espectral e apresentando bandas mul-
tiespectrais referentes às faixas do visível e do infravermelho.

Caixa 3
|

Interpretação ou classificação de imagens


Quando estamos interessados em obter informações de fotografias aéreas para
construção de mapas, procedemos à técnica dé interpretação, que consiste na
identificação e atribuição de um significado aos elementos da paisagem. Em
um primeiro momento, essas fotos podem ser escaneadas (transferidas para o
formato digital) e georreferenciadas. Em seguida, os elementos da paisagem
serão identificados por características como: cor, forma, textura, tamanho, pa­
drão e localização. Podemos identificar em uma fotografia, por exemplo, rios,
tipos de vegetação, construções, estradas e outros gêneros de ocupação humana.
Nesse momento, visitas ao campo são imprescindíveis, para verificação da cor­
respondência entre as classes reconhecidas na foto e o que existe na realidade.
E, finalmente, procede-se à digitalização dessas informações, traçando-se as
linhas e os contornos dos elementos reconhecidos e, assim, gerando o mapa.
Com as imagens de satélite, podemos fazer de forma semelhante na interpreta­
ção. Nesse caso, porém, além das informações das faixas do visível do espectro
eletromagnético, teremos também as informações referentes às faixas do infra­

489
ALEXA N DRE U EZU

vermelho, auxiliando na diferenciação dos objetos (Figura 03). No entanto, no


caso dessas fontes de informação, podemos optar pelo uso de outra técnica: a
classificação da imagem. Para tanto, após a identificação das classes que se
quer distinguir na paisagem, deve-se localizar amostras desses elementos em
visitas de campo. Em seguida, em um programa apropriado (p. ex., o Spring -
http://www.dpi.inpe.br/spring/), serão indicados na imagem os locais onde se
encontram essas amostras, ou seja, serão indicados conjuntos de pixels da ima­
gem que correspondam àquelas categorias que foram verificadas em campo.
Com essas informações, usando um algoritmo pré-selecionado (p. ex., paralele­
pípedo - Figura 04d -, distância mínima e máximo de verossimilhança; Jensen,
1996), o programa automaticamente analisará cada pixel da imagem e o clas­
sificará em uma das categorias amostradas, aquela com .que ele tiver maior
semelhança em valores de pixel. Esse processo resultará em um mapa temático
com todas as classes indicadas (Figura 04e). E importante, após esse procedi­
mento, fazer uma nova verificação em campo, para avaliar a acurácia da classi­
ficação.

R a d a r e s : os radares, ao contrário das imagens de satélite e das fotografias


aéreas, são fontes ativas de captura de informação, ou seja, a radiação que
incide sobre a superfície terrestre é emitida pela própria espaçonave, que,
em seguida, recebe as informações modificadas através de sensores acopla­
dos a ela. Outra diferença m arcante dos radares é que eles trabalham na faixa
das microondas do espectro eletromagnético (Figura 03). Essa propriedade
permite que as informações atravessem as nuvens sem serem afetadas, possi­
bilitando o monitoramento constante, independentemente das condições cli­
m áticas. Dessa maneira, as inform ações da superfície terrestre podem ser
obtidas a qualquer momento, de dia ou à noite, mesmo com o céu nublado.
Um exemplo de dados obtidos através de radares é o mapeamento feito pela
m issão espacial da Nasa, a “S h u ttle Radar Topography M ission” (http://
www 2 .jpl.nasa.gov/srtm/), que produziu mapas de elevação de cerca de 80%
da superfície da Terra, com resolução espacial de 30 m e 90 m de pixel (ver
exemplo na Figura 06).

490
USO DO SISTEM A DE INFORMAÇÕES
GEOGRÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

Figura 06 - Mapa de elevação produzido com base em sistem as de radar da região do Pontal
do Paranapanema. Em maior escala, são mostrados os valores de pixel (com os valores de
altitude) de uma das escarpas do Morro do Diabo. Resolução de 90 m de pixel.

Cartas topográficas

As cartas topográficas são fontes adicionais a serem incorporadas em um SIG.


Elas representam a superfície terrestre de maneira precisa, considerando a
posição, a forma, as dimensões e as identificações de seus elementos. Desse
modo, são consideradas cartas topográficas apenas aquelas com escala entre
1 : 10.000 e 1:100.000 (Joly, 2004). Embora haja uma tendência para a digitaliza­
ção dessas informações, ainda grande parte das cartas está disponível em for­
mato analógico, i.e., em papel. Entre as informações que podemos abstrair
delas estão: rede de drenagem, construções, cotas de altitude, vegetação e sis­
temas de transporte. As cartas topográficas são feitas com base em fotografias
aéreas. Dessa maneira, devemos lembrar que as informações nelas contidas
datam do ano em que foi feito o aerolevantamento. Um exemplo de informação
que se pode abstrair das cartas são as cotas de altitude (Figura 07A). Com base
n'essa informação, é possível gerar, ainda, vários outros dados. Por exemplo,
podemos criar modelos em três dimensões, por um processo de interpolação
(Figura 07B). Com esses modelos, é possível gerar mapas de declividade (Fi­

491
ALEXA N DRE U EZU

gura 07C), que podem auxiliar na determinação das áreas de preservação per­
manente (APP). Por lei, terrenos com inclinação maior que 45 graus são consi­
deradas áreas de APP, em que se deve manter a vegetação natural (Figura 07D).
Os modelos em três dimensões podem gerar também mapas de elevação (seme­
lhantes aos obtidos por radares, conforme a Figura 06), que podem ser sobre­
postos a fotografias aéreas ou imagens de satélite, criando uma visão em três
dimensões das informações contidas nessas imagens (Figura 07E).

Figura 07 - Inform ações geradas com base em cartas topográficas da região de Nazaré
Paulista: A - cotas de altitude; B - mapa de elevação; C - mapa de declividade; D - mapa de
declividade mostrando as áreas de APP com declividade maior do que 45 graus (em verme­
lho); E - visualização, em perpectiva, de um modelo digital de terreno sobreposto a uma
fotografia aérea.

492
U SO DO SISTEM A DE INFORMAÇÕES
G EOGRÁFICAS EM BIOLOGIA
__ DA CONSERVAÇÃO

Sistema de Posicionamento Global [G lo b a l P osition System - GPS)

O GPS é ferram enta im prescindível hoje em dia em trabalhos de campo.


Muitas das informações inseridas em um SIG são provenientes dessa ferra­
menta. Suas funções básicas são localização, navegação e mapeamento.

Para obtenção da localização de um determ inado ponto na Terra, o GPS


utiliza a posição dos satélites como referência. Contamos atualmente com
uma constelação de 24 satélites, em seis órbitas, a uma distância de cerca
de 20.000 km da superfície terrestre. Para localizar um ponto, o GPS preci­
sa calcular a distância linear de pelo menos quatro satélites, processo co­
nhecido por trilateração. A distância é medida pelo tempo de viagem do
sinal do satélite até o GPS, que corresponde ao tempo de atraso dos sinais
dos satélites quando chegam à Terra em relação aos sinais do GPS. O sinal
viaja na velocidade da luz (300.000 km/s no vácuo), dessa'form a, sabendo
o tempo que ele demora, é possível calcular a distância do satélite até o
GPS, m ultiplicando esses dois valores.

Os sinais provenientes dos satélites podem sofrer interferências de diver­


sas fontes. A prim eira delas são as condições clim áticas. Ao passar pela
atmosfera, o sinal pode ter sua velocidade reduzida, o que dim inuirá a
precisão no cálculo da sua posição. Essa situação se agrava em dias de céu
encoberto. O relevo (áreas de baixada) e a vegetação (interior de florestas),
bem como a geometria pobre dos satélites, dada pela posição deles durante
a coleta dos dados, são outros fatores que dim inuem a precisão da localiza­
ção. Uma forma de m elhorar essa precisão é o uso do GPS diferencial, em
que os pontos obtidos em campo são corrigidos, valendo-se de dados de
uma base fixa. Nessa base, da qual se sabe exatam ente a localização, um
outro GPS coleta, sim ultaneam ente ao GPS de campo, os sinais provenien­
tes dos satélites, perm itindo que, posteriorm ente, seja feita a correção. Esse
método se torna necessário quando é requerida uma precisão maior, com
erro em torno de 2 m. Com o GPS convencional, em condições excelentes,
o erro fica em torno de 10 m.

Aplicações do SIG em Biologia da Conservação


São diversas as aplicações que se pode dar ao SIG em Biologia da Conserva­
ção, integrando dados espacializados de diversas naturezas para gerar infor­
mações úteis na solução de problemas reais. Serão mencionados aqui alguns
exemplos do potencial desse sistema.

493
ALEXA N DRE U EZU

Preferência de hábitat

As informações de uso e ocupação do solo e outros dados espacializados so­


bre o ambiente podem ser usados para gerar mapas de preferência de hábitat
para espécies de interesse, integrando dados que descrevam as condições para
que essas espécies estejam presentes ou tenham alta probabilidade de ocorrer
e_m um determinado local. Esse tipo de análise é especialmente interessante
para as espécies raras, indicadoras, invasoras e ameaçadas. As informações
podem ser usadas em modelos de viabilidade populacional ou em modelos de
previsão da distribuição potencial das espécies.

Modelos para análise de viabilidade populacional (PVA)

Os mapas de preferência de hábitat podem ser incorporados a modelos de


viabilidade populacional, tornando os primeiros espacialmente explícitos e,
portanto, mais próxim os da realidade. Esses modelos podem nos ajudar a
entender o problema derivado da fragmentação do hábitat e indicar meios de
minimizar seus efeitos negativos (Drechsler e Burgman, 2004). Os PVAs têm
sido usados para estimar a viabilidade de populações ém diferentes escalas
para muito grupos taxonômicos (Grimm e Storch, 2000; IUCN, 2001; Linden-
mayer et al., 2003; Reed eí al., 2003). Análises de sensibilidade dos modelos
mostram como alterações nos parâmetros afetam os riscos de extinção. Os
modelos podem ser usados para simular diferentes cenários de uma paisagem,
predizendo os efeitos de alterações como intensificação do processo de frag­
mentação (perda de hábitat ou de fragmentos) e manejo da paisagem (implan­
tação de corredores e steppings ston es e restauração de hábitats), permitindo
apontar áreas críticas e prioritárias para a conservação (Drechsler et al., 2003).
Em particular, a aplicação do PVA em uma metapopulação tem sido ampla­
mente utilizada para determirtar a chance de sobrevivência de espécies no
contexto regional de uma paisagem, enfocando a probabilidade de extinções e
colonizações de populações em fragmentos de hábitat (Hanski, 1994).

Distribuição das espécies

Em uma escala n^ais ampla, usando algoritmos apropriados (Garp, por exem­
plo) e mapas de condição clim ática, relevo, hidrografia e cobertura vegetal, é
possível mapear os nichos ecológicos de uma espécie (Petterson, 2001). Esses
modelos podem gerar mapas de distribuição potencial das espécies. Além de
ajudar no entendimento da distribuição das espécies, esses mapas têm fun­

494
U SO DO SISTEM A DE INFORMAÇÕES
GEOG RÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

ções práticas na Biologia da Conservação, tais como: indicar áreas propícias


para a reintrodução de espécies, permitir a avaliação dos efeitos das mudanças
climáticas sobre a biodiversidade (Peterson et al., 2002) e possibilitar a previ­
são da proliferarão de espécies invasoras e de doenças nos sistemas naturais
(Peterson e Vieglais, 2001).

Ecologia de paisagem

Uma outra aplicação para o SIG são os cálculos dos índices de paisagem, que
representarão a estrutura espacial da paisagem: tamanho, forma e grau de iso­
lamento de fragmentos; proporção de hábitat; conectividade e diversidade da
paisagem (ver capítulo 16). Relacionando os parâmetros da paisagem com os
dados biológicos (Uezu e t al., 2005), podemos verificar como a paisagem influ­
encia a biodiversidade de uma região. Programas como o Fragstats e a extensão
Patch Analyst do Arcview 3.2 são usados para calcular tais métricas.

Dinâmica da paisagem

O SIG pode ser usado no monitoramento e na análise da dinâmica da paisa­


gem. Embora as modificações da paisagem possam estar associadas a causas
naturais, muitas das transformações que presenciamos hoje são provocadas
pela ação humana. Entre as perturbações antrópicas, podemos listar o desma-
tamento, as inundações, as queimadas, a expansão de centros urbanos e a
exploração mineral.

Um exemplo de dinâm ica da paisagem é a devastação das áreas florestadas do


Pontal do Paranapanema (Dean, 1996). Ainda em 1945, apenas 3,04% da mata
havia sido extraída da área correspondente à Grande Reserva do Pontal; em
1955, restavam 84,21% de cobertura florestal e, em 1962, 60% da floresta
ainda permanecia de pé (Ferrari Leite, 1998). Possivelmente, até essa época, o
fator determinante do impacto sobre a fauna e a flora da região tenha sido a
perda de habitat, constituindo a fragmentação uma potencial ameaça. Porque a
fragmentação do Pontal é um fato recente, temos registros do desmatamento
em fotografias aéreas, cartas topográficas e imagens de satélites (Landsat/MSS
e TM), o que nos permite traçar o histórico da ação humana na região (Figura
08). Analisando uma área circular (com raio de 25 km) em mapas da região, em
diferentes anos, vemos que, já em 1965, a região continha apenas cerca de
36% da cobertura florestal (Figura 08a). Havia poucos mas grandes blocos de
floresta. Para essa época, foi verificada a presença de 39 fragmentos, que, em

495
ALEXA N DRE UEZU

média, tinham cerca de 1.791 ha. Em 1978, esse percentual atingiu 26,7%
(Figura 08b). Os grandes remanescentes deram lugar a várias manchas meno­
res de floresta e é verificado um alto grau de fragmentação, reduzindo o tama­
nho médio dos fragmentos. Em 1984, a região tinha cerca de 18% de floresta,
o mais baixo índice registrado até o momento neste estudo (Figura 08c). A
partir de 1988, começa a haver um aumento dessa percentagem, chegando a
18,5% (Figura 08d). Mais recentemente, entre os anos de 1997 e 2003 (Figura
08e-f), há uma estabilização da fragmentação, com a cobertura florestal chegan­
do a quase 19%. É destacável, nesse histórico, a perda de hábitat resultante do
enchimento das represas de Rosana, no rio Paranapanema, £ de Porto Prima­
vera, no rio Paraná.

Figura 08 - Evolução da cobertura florestal no Pontal do Paranapanema, SR entre os anos de


1965 e 2003. Os índices mostrados foram calculados dentro da área tracejada em vermelho
e representam: Perc. - percentagem de floresta e N.F. - número de fragmentos florestais.

496
U SO DO SISTEM A DE INFORM AÇÕES
GEOGRÁFICAS EM BIOLOGIA
DA CONSERVAÇÃO

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497
Análises estatísticas
19 Estatística e interpretação de dados
Paulo de Marco Junior
Departamento de Biologia Geral da Universidade Federal de Viçosa

Adriano Pereira Paglia


Analista de Biodiversidade Conservation International do Brasil
e Lab. de Mastozoologia da UFMG

Introdução
O objetivo deste texto não é, nem de longe, ser um manual completo para guiar
as suas atividades na área da análise de dados. Antes, deseja-se apresentar
algumas ideias interessantes que possam desafiar a vontade de ser mais efici­
ente no uso dessas ferram entas. A ênfase aqui é demonstrar que todos os
testes estatísticos mantêm a mesma estrutura lógica e, portanto, podem ser
facilmente entendidos.

Por que usar estatística


Considere o seguinte experim ento: um pesquisador está interessado em ava­
liar o status de conservação dê duas espécies filogeneticamente próximas. Ten­
do recursos limitados para ser gastos no manejo dessas populações, ele consi­
dera a possibilidade de medir sua variabilidade populacional natural para
escolher com qual delas vai gastar seus recursos. Aquela mais variável deve
ser, em longo prazo, mais ameaçada de extinção por estocasticidade demográ­
fica. O pesquisador escolhe utilizar estimativas do tamanho destas populações
nos últimos 5 anos e encontra que a população A é mais variável que a B.
Existe uma pergunta que gera toda a necessidade de uso de métodos estatísti­
cos: se outro pesquisador repetisse o experimento, qual a probabilidade de
encontrar os mesmos resultados, a mesma conclusão?

Tratando-se de fenômenos biológicos, cuja natureza está ligada a múltiplas


causas de variação, é possível que os resultados particulares observados não
sejam repetidos.' Isso quer dizer que suas conclusões podem ser falsas. Todo e
qualquer problema para o qual a pergunta do fim do parágrafo anterior possa ser
formulada com significado é um problema que exige uma solução estatística.
PAULO DE MARCO JU N IO R
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

Filosofia de testes estatísticos


Todos os métodos de inferência estatística (testes estatísticos) sãt> iguais no
sentido de que se baseiam em uma mesma série de argumentos lógicos. Consi­
dere ainda o problema anterior e siga os passos lógicos para um teste:

Formulação de uma hipótese


Neste caso, a hipótese básica é que não há diferenças na variabilidade popula­
cional para as duas populações estudadas, que pertencem a duas espécies.
Essa hipótese pode ser considerada a mais simples dentre as formuladas sobre
o problema. Qualquer outra (a espécie A varia mais; a espécie B varia mais) é
logicamente mais complexa, porque pressupõe a existência de no mínimo um
efeito a mais (há um fator que causa a maior variabilidade da espécie A ou B).
A hipótese mais simples é geralmente chamada de H ipótese nula.

Dedução do resultado esperado quando a hipótese nula é verdadeira


Este é um passo obviamente simples: *o esperado é que a variação seja igual.
Pode-se medi-la por uma grandeza estatística chamada variância. Esse passo é
importante para que se possá operacionalizar o teste, ou seja, definir clara­
mente o que medir na natureza para testar a hipótese.

Dedução da distribuição esperada dos possíveis resultados, se a


hipótese nula fosse verdadeira
Este passo é delicado. Como seria possível demonstrar que há uma alta proba­
bilidade de que os resultados sustentem ou não a hipótese nula? Considere
um exemplo: a espécie A apresentou uma variância de 17,6 e a espécie B, uma
variância de 21,3. Será que isso é suficiente para assumir que a espécie B varia
mais? O primeiro passo é calcular um número que represente o resultado
obtido. Uma possibilidade é dividir a maior variância pela menor. Chamemos
este número de F (em honra a R on ald Fisher). Neste exemplo, ele vale 1,21, e
representa que a variação na espécie B é 1,21 vez maior que a A. A atenção
deve se voltar agora para a hipótese nula. Qual seria a distribuição esperada
dos possíveis valores de F se a hipótese nula fosse verdadeira? Isso equivale a
dizer: como variaria F se na verdade as duas variâncias fossem iguais ? Uma
nova coleta de dados na mesma comunidade (ou mesmo amostragens em dias
diferentes do estudo original) mostraria pequenas diferenças. Tais diferenças
não significativas se devem ao a c a s o . O a c a s o reúne todos os outros fatores
da natureza não medidos e que podem afetar os resultados do experimento,

502
ESTA T ÍSTIC A E IN TERPRETAÇÃO DE DADOS

exceto os mecanismos que estão subjacentes à hipótese. Este passo é agora


feito por um “estatístico-matemático” que desenvolve uma equação que repre­
senta a distribuição esperada se o fenômeno descrito fosse devido somente ao
acaso. A equação é usualmente chamada de função de distribuição e descreve
a probabilidade de ocorrer cada uma das possibilidades de resultado, quando
o fenômeno é apenas dirigido pelo acaso.

A tomada de uma decisão


A decisão a ser tomada é a de aceitar ou rejeitar a hipótese nula. Isso equivale
a decidir se as variâncias podem ser consideradas iguais e suas diferenças
p.odem ser explicadas pelo acaso, ou se as variâncias podem ser consideradas
diferentes e é preciso invocar um outro mecanismo, fora o acaso, para explicar
as diferenças. O método para testar é simples. Se a variação de F é conhecida
quando a hipótese nula é verdadeira, basta calcular qual a probabilidade de
encontrar uni resultado como 1,21 quando a hipótese nula é verdadeira, usan­
do a função de distribuição de F. Se essa probabilidade for alta, não há nenhu­
ma razão para desconfiar que a hipótese nula seja falsa. Ou seja, se as diferen­
ças encontradas são passíveis de ocorrer mesmo quando as variâncias são
iguais, deve-se aceitar o acaso para explicar as variações observadas. Se a pro­
babilidade é baixa, então é muito raro ocorrer um resultado ctomo o que foi
observado quando a hipótese nula é verdadeira, o que mostra que ela não
satisfaz como explicação para o fenômeno. Assim, faz-se necessária outra ex­
plicação, que não o acaso, para as diferenças entre as variâncias. Elas são
estatisticamente diferentes.

Ao decidir pela rejeição ou não da hipótese nula (Ho) o pesquisador corre o


risco de tomar uma decisão errada. Existem dois tipos de erros associados à
decisão em um teste de hipóteses: o primeiro erro, dito Erro Tipo 1, é decidir
pela rejeição da hipótese nula sendo ela verdadeira. Voltando ao exemplo, Ho
foi rejeitada, ou seja, as populações A e B têm variâncias diferentes. Faz-se
necessário estimar o grau de incerteza associado a essa decisão. A probabilida­
de de se com eter o Erro Tipo 1 é o chamado nível de significância, ou a.
Adotar um nível de significância de 5% quer dizer probabilisticamente que, se
a amostragem for repetida 100 vezes, em 95 delas a decisão tomada estará
correta rejeitando-se Ho.

A outra decisão errada é aceitar a hipótese nula quando ela é falsa. Esse é o
chamado Erro Tipo 2, cuja probabilidade é definida por p. O poder de um
teste é definido como 1 - p, isto é, quanto menor a probabilidade de cometer o
Erro Tipo 2, mais poderoso é o teste. Ambos os erros são indesejáveis, porém,

503
PAULO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

o pesquisador tem controle mais efetivo sobre o Erro Tipo 1. Para diminuir a
probabilidade de rejeitar uma hipótese nula sendo ela verdadeira, basta redu­
zir o nível de significância (geralmente de 5% para 1 %). A mesma regra não se
aplica para o valor de p. Na verdade, quanto mais se reduz o nível de signifi­
cância mais se aumenta a probabilidade de cometer o Erro Tipo 2. A única
maneira de reduzir simultaneamente ambos os tipos de erro de decisão é au­
mentar o tamanho da amostra. Assim, para um dado nível de significância,
amostras grandes produzem um teste estatístico mais poderoso. Para concluir,
é importante ressaltar que não rejeitar a hipótese nula não prova que ela é
verdadeira. Pela lógica dos testes de hipóteses, quer dizer què não existem
evidências suficientes para concluir que ela é falsa.

Tipos de variáveis e escolha dos testes


Quando procuramos testar uma hipótese, é geralmente possível identificar
dois tipos de variáveis: a independente e a dependente. A variável indepen­
dente ou preditora é aquela que, em teoria, causa o efeito que procuramos
confirmar. A variável dependente é a que mede o efeito sofrido. No exemplo, o
tamanho da população é a variável dependente e a variável independente é a
espécie. Estamos investigando a possibilidade de que o tamanho populacional
(e a variabilidade dessa medida) seja diferente entre as espécies, como resulta­
do de suas diferenças ecológicas.

Uma outra maneira de classificar as variáveis é quanto à natureza de suas


medidas. Os dois exemplos extremos das escalas de medidas são as variáveis
categóricas e as quantitativas. Variáveis categóricas apenas representam dis­
tinções de qualidade, enquanto as variáveis quantitativas representam diferen­
ças de quantidades. No exemplo anterior, as espécies são variáveis categóricas
e o tamanho da população é uma variável quantitativa. Essa divisão refere-se à
forma como os dados foram coletados: uma variável categórica como a cor
(preto, branco etc.) pode ser medida como quantitativa (o comprimento de
onda da luz emitida). A Tabela 1 apresenta um mòdelo bastante simplificado
para a escolha do teste estatístico apropriado.

504
E S T A T Í S T I C A E IN T E R P R E T A Ç Ã O D E D A D O S

Tabela 1. S u g e s tã o d e a lg u n s te s te s e s ta tís tic o s a e m p r e g a r d e a c o rd o c o m o tip o d e va riáv el '


o b s e rv a d a . E n tre p a rê n te s e s a lg u n s te s te s n ã o p a ra m é tric o s .

Variável Variável
Teste
Dependente Inadependente
#
Quantitativa 1 C ategórica co m 2 níveis Teste t (testé U)
Quantitativa 1 C ategórica co m + 2 níveis ANOVA 1-fator (Kruskall-Wallys)
Quantitativa 2 C ategóricas ANOVA 2-fatores (Friedm an1)
Quantitativa 1 Q uantitativa R egressão sim ples
(correlação Spearm an)
Quantitativa 2 ou m ais Q uantitativas Regressão m últipla
Quantitativa 1 C ategórica e 1 ANCOVA
ou m ais Q uantitativas
Categórica 1 C ategórica Q ui-quadrado2; Teste G2
Categórica 2 ou m ais C ategóricas L og-linear2

1 No ca so d e a m o s tra s d e p e n d e n te s , 2 E ss e s te s te s e v e n tu a lm e n te v e rific a m n ã o a re la ç ã o
de d e p e n d ê n c ia e n tre v a riá v e is , m a s s im a a s s o c ia ç ã o e n tr e e la s , d e s c a r a c te riz a n d o , p o r­
tanto, a c la s s ific a ç ã o d e v a riá v e is d e p e n d e n te s e in d e p e n d e n te s .

A a p r e s e n t a ç ã o de r e s u l t a d o s
O cie n tista é, em e ss ê n cia , u m e scrito r. De que re a lm e n te v ale o c o n h e c im e n to
produzido se n ão for e x p o sto c o m c la re z a à c o m u n id a d e q u e p o d erá u tilizar
esse co n h e cim e n to ? A ssim , d ev e-se te r a p re o c u p a ç ã o d e a p re se n ta r as id eias
dando se m p re ên fase ao p ro b le m a b io ló g ico e ao ta m a n h o do efeito atin g id o , e
resg u ard an d o o r e s u lta d o d o s te s te s e s ta tís tic o s ao b e m d e lim ita d o e s p a ç o
interno dos p a rê n te se s. Por e x e m p lo , n ão se d ev e d izer: “A s p o p u la çõ e s tiv e ­
ram d iferen ças de v a riab ilid ad e p o p u la cio n a l e s ta tis tic a m e n te d iferen tes pelo
teste F ”. M elh o r d izer: “A p o p u la çã o A v ario u 2 v e z e s m ais que a p o p u la çã o B
(F = 2 , 3 1 ; P < 0 . 0 5 ) ”. N ão se e sq u e ça q u e é m ais fa cilm e n te c o m p re e n sív e l o
que nos for a p re se n ta d o p o r figu ras do que p o r lo n g as T abelas.

Um b r e v e a p a n h a d o de p r e s s u p o s t o s e t r a n s f o r m a ç õ e s
Serão a p re se n ta d o s aqui alg u n s te ste s e sta tístico s m ais em p reg ad o s, te n ta n d o
dem onstrar que to d o s seg u em a m e sm a ló g ica de to m a d a de d e cisã o . O que u m
teste e sta tístico faz é fo rn e ce r u m a m ed id a de in c e rte z a ou as c h a n c e s de se
tomar u m a d e cisã o errad a. P ara que tal ro tin a fu n cio n e , algu n s p re ssu p o sto s
devem ser cu m p rid o s.

505
PAULO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

Um primeiro cuidado envolve o desenho amostrai. É preciso garantir que as


amostras sejam tomadas ao acaso e, a menos que seja interesse explícito, que
elas sejam independentes. Muitos dos problemas na análise dós dados vêm
da não observância desses pontos.

Alguns testes estatísticos dependem da distribuição dos dados ou, mais preci­
samente, da distribuição da média amostrai. Tais testes são classificados como
“paramétricos” e, para empregá-los, deve-se garantir que, além da distribuição
ser normal, as variâncias entre grupos (no caso de teste t e ANOVA) devem ser
iguais. De maneira geral, os dois pressupostos, normalidade e homogeneidade
de variâncias, não são requisitados para os testes não paramétricos. O proble­
ma é que nem sempre existe uma alternativa não paramétrica para cada teste
paramétrico.

As transformações dos dados geralmente são empregadas para tentar corrigir a


não normalidade ou a hetérocedasticidade das variâncias. Como exemplo de
transformações temos a logarítmica (para corrigir distribuições assimétricas e
para remover a dependência entre média e variância, além de homogeneizar
variâncias entre grupos), a raiz quadrada (para dados de contagens, por exem­
plo, número de filhotes por gestação) e a transformação arcosseno da raiz qua­
drada ou angular (para dados em proporção). Independentemente da transfor­
mação escolhida, um problema comum é que os dados transformados perdem
seu significado biológico, o que pode levar a interpretações equivocadas das
possíveis relações entre as variáveis.

Uma breve resenha dos testes estatísticos


Serão apresentados aqui alguns dos principais testes estatísticos tentando
mostrar como são percorridos os passos lógicos definidos em nosso exemplo.

Comparando categorias: O teste do qui-quadrado


A Tabela 1 mostra que no estudo da dependência entre duas variáveis categó­
ricas utiliza-se o teste de Q-quadrado. Considere a seguinte questão: existe
associação entre uma determinada espécie de ave frugívora e uma determinada
família de plantas? Para dar nome ao experimento considere que a ave seja
Thraupis sa y a ca (o sanhaço) e a família de plantas as Melastomatáceas. Seguin­
do-se os passos predefinidos observa-se:

Hipótese. A hipótese nula seria a de que não há associação entre o sanhaço e


as Melastomatáceas. Como coletar dados para testar essa hipótese? Toda vez
que se observar um ato de frugivoria por uma ave no campo deve-se classificar

506
ESTA T ÍSTIC A E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

a espécie de árvore em uma das categorias: se é ou não uma M elastom atácea.


Da mesma forma deve-se classificar a ave como sendo ou não um sanhaço.
Existem agora duas variáveis categ óricas binárids. A Tabela 2 reúne os resulta­
dos desse experimento em observações de campo no campus da Universidade
Federal de Viçosa:

Tabela 2. Tabela de contingência de 99 observações de pássaros em árvores.

É um Sanhaço?

É uma Melastomatácea? Sim Não Total

Sim 13 34 47

Não 12 40 52

Total 25 74 99

A proporção de sanhaços encontrados em M elastom atáceas foi de 13/47 = 0,276 enquanto


nas não M elastomatáceas essa proporção foi de 12/52=0,231.

Dedução do resultado esperado se a hipótese nula for verdadeira


Qual o valor esperado para cada célula da Tabela acima sob a hipótese de que
não há associação? O esperado é que a proporção de que se encontre sanhaço
em M elastom ataceae é igual à proporção desta espécie quando não é M elasto-
m ataceae. Isso também quer dizer que as diferenças encontradas nos números
observados nas células internas da Tabela seriam explicadas apenas por dife­
renças no número de amostras (a coluna e a linha denominadas total na Tabe­
la). Assim, a proporção de 25 sanhaços no total de 99 aves observadas deveria
se manter tanto para as 47 aves encontradas em Melastomatáceas quanto para
as 52 encontradas em não Melastomatáceas. Isso é o equivalente a predizer que
o resultado esperado para o número de sanhaços observados em Melastomatá­
ceas seria obtido pela regra de três simples: 25 “está para” 99 como x “está
para” 47. A Tabela 3 mostra os valores esperados.

A pergunta agora passa a ser: quão diferentes são os resultados observados em


relação ao esperado pelo acaso? Para definir a estatística do teste usamos o Q-
quadrado cujo símbolo é cc2. Ele seria estimado simplesmente pela diferença
entre observado e esperado, elevada ao quadrado, dividida pelo esperado.
Esse número pode ser calculado para cada uma das células e o somatório,
utilizado como teste estatístico. Você pode olhar em uma Tabela de Q-quadra-
do com 1 grau de liberdade, calculado como: g.l. = (n° linhas- 1 ) x (n° colunas-
1), a um nível de significância de 5% e avaliar se esse valor é grande, compa-

507
PAU LO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

rado com o da Tabela. No entanto, mais usualmente, os programas atuais de


estatística já indicam qual foi o nível de significância atingido. Neste caso,
= 0,271 e o nível de significância atingido foi p = 0,602

Tabela 3. Valores esperados da Tabela 2 se Ho for verdadeira.

É um Sanhaço?

É uma Melastomatácea? Sim Não Total

Sim 11,9 35,1 47

Não 1 13,1 38,9 52

Total 25 74 99

Tomada de Decisão. O que representa o valor de p acima? Ele é a probabilidade


de encontrar resultados como o que se obteve quando a hipótese nula é verda­
deira. Se em um experimento delineado como o que você acaba de executar há
60,2% de chances de encontrar resultados como os que você encontrou quando
a hipótese nula é verdadeira, então há fortes razões para aceitá-la. No texto da
comunicação do resultado desse estudo deve, em alguma parte, estar escrito
algo como: “em torno de 27% das aves observadas em Melastomatáceas eram
sanhaços e essa proporção, em não Melastomatáceas, foi de 23%. Tais diferen­
ças foram consideradas como devidas ao acaso (x2 = 0,271; g l= l; p =0,602)”.

0 efeito de uma variável categórica com dois níveis sobre uma


variável quantitativa: o teste t de student
Um pesquisador quer avaliar o sucesso de duas técnicas de reintrodução de
indivíduos de uma espécie de macaco em uma área. A pergunta é: será que
deixá-los em um local de pré-adaptação com fornecimento apenas de com­
plemento alimentar aumenta as chances de sobrevivência do indivíduo? Neste
ponto, serão discutidos aspectos puramente estatísticos desse problema, mas
ao fim deste capítulo será apresentada uma análise mais completa do problema
como exemplo de questões mais amplas sobre Biologia da Conservação.

Considerando-se este como um experimento modelo, com recursos financeiros


suficientemente grandes para permitir o acompanhamento deste indivíduo rein-
troduzido até'sua morte, é pouco provável que existam muitos indivíduos que
possam servir de amostra. Outro fator complicante é que, para as comparações
aceitáveis, é necessário que todos os indivíduos sejam de mesmo sexo, mesma
idade e sejam aceitos por grupos sociais semelhantes (mesma estrutura social

508
I ' . ESTA T ÍSTIC A E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

r.
I .; . <.; ' T '
com mesmo número de machos, fêmeas e filhotes). Assumindo todas essas va­
riações, acompanhou-se a vida de indivíduos que foram reintroduzidos a partir
de dois grupos, os que passaram e que não passaram pela pré-adaptação. Esta
será a variável independente categórica binária. A variável resposta é a idade em
que o indivíduo morreu. A Tabela 4 resume os resultados encontrados:

Tabela 4. Longevidade do primata sob duas condições experimentais.

Indivíduo Pré-adaptação Longevidade


(anos)
1 Sim 2
2 Sim 3
3 Sim 3
4 Sim 2.5
- 5 Não 3
6 Não 2 ’
7 Não 2
8 Não 1
9 Não 0.5

A hipótese nula reza que não há diferenças de longevidade dos primatas com
ou sem pré-adaptação. Propositalmente, foi apresentado um conjunto de da­
dos que apresenta dois dos principais problemas que usualmente assustam
q\iem começa a usar os testes estatísticos. Os dados parecem muito regulares
para estarem apresentando “d istribu ição norm al" e a longevidade na ausência
do período de pré-adaptação parece variar mais que com a pré-adaptação.

Para entender melhor o significado desses dados, há necessidade de aprofun­


dar um pouco mais a fase da construção do teste referente à d ed u çã o da distri­
buição esp e r a d a ca so a h ip ó tese n u la seja verd ad eira. Esse passo exige uma
dedução baseada em alguns pressupostos básicos que podem variar entre os
testes, mas são múito semelhantes para o conjunto'de testes classificados como
modelos lineares gerais, do qual fazem parte o teste de t, a análise de variância
e a análise de regressão.

Na dedução, parte-se do princípio de que os dados provêm de uma distribuição


normal e de que a variação dos dados, em cada tratamento (a variância com e
sem a fase de pré-adaptação), é igual. Importante ressaltar que, quando os pres­
supostos não são cumpridos, nada assegura que os resultados dos testes este­
jam corretos. No entanto, os estatísticos consideram que um teste é robusto
quando, apesar de alguns pressupostos não serem cumpridos, ele permanece
Correto. O teste de t, por exemplo, é bastante robusto a desvios da normalidade.

5 09
PAULO DE MARCO JUN IO R
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

Quanto a diferenças de variação, há um teste de t para variâncias iguais (homo­


gêneas) e outro para variâncias diferentes, que podem ser facilmente encontra­
dos em qualquer dos softwares dedicados a análises estatísticas. Sendo assim,
o teste t é uma ferramenta muito útil e muito robusta, podendo ser utilizado
mesmo em situações como as do exemplo.

A partir dos dados da Tabela 4, observa-se que, em média, os indivíduos que


receberam o tratamento de uma fase de pré-adaptação viveram 2,625 anos,
enquanto os que não receberam sobreviveram 1,700 ano. Isso representa uma
sobrevivência de 0,975 ano a mais com a fase de pré-adaptação, mas a pergun­
ta persiste, qual a probabilidade disso ter ocorrido pelo acaso? Um aspecto
interessante é que diferenças como essas podem ser devidas ao acaso, princi­
palmente com poucas amostras (4 indivíduos sob a fase de pré-adaptação).
Conduzindo o teste, encontra-se um valor de t= l,7 2 2 , que com 7 graus de
liberdade (g l= n -l), leva a um valor de p = 0,129. A um nível de significância
de 5% aceitamos a hipótese nula de que a fase de pré-adaptação não alterou a
sobrevivência dos macacos.

Esse pode parecer um resultado incoerente que será discutido em detalhes


mais adiante neste capítulo.

0 efeito de uma variável categórica com vários níveis sobre uma


variável quantitativa: a análise de variância
Em algumas situações o pesquisador quer comparar não as médias de dois
grupos, mas de 3 ou mais. A alternativa de comparar as médias duas a duas de
cada grupo é pouco eficiente, uma vez que pode ser produzido um grande
número de pares. Se existirem 6 grupos, o pesquisador necessitaria de 15
testes t para comparar as médias de todos os grupos. Para resolver essa situa­
ção, Ronald Fisher desenvolveu, na década de 2 0 , a técnica da Análise de
Variância, ou ANOVA.

Imagine uma situação na qual o pesquisador deseja comparar a densidade


populacional de uma espécie- de planta ao longo de um gradiente altitudinal.
Para tal, ele definiu quatro cotas de altitude e em cada uma coletou em oito
pontos, perfazendo um total de 32 amostras. Estimou, então, os parâmetros
média e variância da densidade de plantas em cada uma das quatro cotas. A
partir daí ele formulou as seguintes hipóteses:

Ho: m = p2 = n3 = p4

Ha: Existe diferença na densidade média entre as cotas de altitude.

510
ESTA T ÍSTIC A E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

Observe que a hipótese nula (Ho) tarribém quer dizer que não há efeito da
altitude sobre a densidade da espécie, com consequência lógica da igualdade
das médias em altitudes diferentes. Para se rejeitar a hipótese nula, basta que
pelo menos um par apresente valores médios diferentes, para um nível de
significância de 5% (a = 0,05). Os valores obtidos pelo pesquisador estão
listados na Tabela 5.

Tabela 5. Número de indivíduos coletados em cada uma das 4 cotas de altitude.

ALTITUDE PONTOS DE COLETA

PI P2 P3 P4 P4 P6 P7 P8

Cota 1 19 15 17 21 22 23 .22 19
Cota 2 21 22 17 20 17 21 21 24
Cota 3 16 17 19 18 14 20 15 17
Cota 4 18 18 14 16 19 15 13 18

A partir dos dados coletados é possível estimar os parâmetros média e variân­


cia da densidade populacional para cada uma das quatro cotas de altitude. A
variância em particular pode ser dividida em dois componentes: variância
entre os grupos (ou variância devido ao tratamento) e variância dentro dos gru­
pos (variância devido ao erro). Um quadro de A N Q V A característicò, resultante
do conjunto de dados apresentados no exemplo está ilustrado na Tabela 6 .

Tabela 6\. Análise de variância testando o efeito da altitude sobre a abundância da planta.

Som a de G raus de Q uadrado .


Fonte de v a ria çã o , F Valor p
Q uadrados Liberdade m edio

Efeito (Altitude) 94.25 3 31,42 5,66 0,004


Erro amostrai 155.25 28 5,54

Total 249,5 31

Uma das maneiras de se estimar quanto um conjunto de dados varia em rela­


ção ao valor médio, é somar todas as diferenças entre cada valor e a média,
tomando o cuidado de elevar a diferença ao quadrado para evitar que a soma
iguale a zero. Essa é a chamada soma dos quadrados (SQ). Ao dividir esse
valor pelo número de graus de liberdade temos o quadrado médio (QM), ou
variância. A estatística F é calculada ao se dividir o QM do efeito (variância
entre os grupos) pelo QM do erro (variância deiítro dos grupos). Você deve

511
PAU LO DE MARCO JUN IOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

lembrar o que foi dito no início desse texto: o valor F é uma razão entre variân­
cias. Compara-se o valor F calculado com o valor esperado sendo a hipótese
nula verdadeira, e decide-se pela sua rejeição ou não. A maioria dos progra­
mas estatísticos calcula a probabilidade associada ao valor F calculado. No
exemplo acima, o valor F calculado foi de 5,66, com um nível de significância
atingido (ou valor-p estimado) de 0,004. Como o valor-p está bem abaixo do
nível de significância adotado de 0,05 rejeitam os a hipótese nula, ou seja,
existe efeito significativo da altitude sobre a densidade da planta. Uma boa
maneira para ilustrar o resultado sem apresentar o quadro completo é fornecer
o valor F com seus graus de liberdade e o valor-p. No exemplo acima, diría­
mos: “Existe diferença na densidade ente as cotas de altitude (F3,28 = 5, 66 ;
p = 0,004)”. Além disso, a apresentação gráfica dos valores médios por grupo,
com suas respectivas medidas de variação facilita a visualização dos resulta­
dos. Gráficos do tipo box-plot como o da figura 1 são^bem ilustrativos.

24

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22

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16

14
2 . 3
Cotas de altitude

Figura 1. Representação das m édias, erros-padrão e desvios-padrâo do número de plantas


nas quatro altitudes am ostradas.

O teste ANOVA indica se existe diferença, mas não informa onde esta se en­
contra. Para tal, tendo rejeitado a hipótese nula pela ANOVA faz-çe necessário
um teste a p osteriori. De uma maneira geral, existem dois grupos de testes a
p osteriori. Os prim eiros, denominados testes de comparação múltipla, nos
quais não se estabelece uma hipótese a priori, e os testes de comparação plane-

5X2
EST A T ÍST IC A E IN TERPRETA Ç Ã O DE DADOS

I a ' emPreSand° a técn ica de contrastes. Este último, mais “elegante" deve
ser otilizado sem pre quando o pesquisador já possuir, antes de iniciar o expe-
rimento, um a hipótese de com o seus grupos devem se diferenciar.

Existem m uitos testes de com paração m últipla, sendo os mais conhecidos,


u 'ey, D u n can e S ch effé . Aplicando o teste de com paração múltipla de Tukey
no exem plo, observa-se que as diferenças se encontram entre as cotas 1 e 4 -2
e 3; 2 e 4.

MnteaPr8ní,é,1CÍa dUaS ° U m a 'S variáveis P antltati'/as: regressão


Todos os modelos estatísticos lineares apresentam a mesma formulação. Pode­
mos escrever o m odelo do exem plo acim a da ANOVA como: JV° d e indivíduos
- a + p(altitu de) + Erro, ou seja, o número de indivíduos da planta é função
da altitude. O que determ ina a associação entre a variável dependente (n° de
indivíduos) com a variável independente (altitude) é o coeficiente bb. Devido
ao fato de a variável independente ser, no exemplo, categórica (quatro cotas de
altitude), empregamos a técn ica de ANOVA (veja a Tabela 1 ).

Agora im agine que o pesquisador, em vez de coletar oito amostras em cada


uma das quatro cotas de altitude, fez coletas ao longo de todo o gradiente
altitudinal. Além disso, estim ou também a riqueza de insetos polinizadores
em cada ponto de coleta e obteve os seguintes resultados:

Tabela 7. Abundância da planta e riqueza de espécies de polinizadores por altitude^1

t
Altitude N° de espécies de N° de indivíduos
(metros) polinizadores da planta

500 27 31
550 15 32
610 12 28
680 45 29
720 20 30
770 40 20
810 10 15
890 ' 27 15
930 29 13
990 12 12
1030 25 10
1080 8 8
1140 12 7
1200 9 9

513
PAULO DE MARCO JUN IOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

Em primeiro lugar, cabe testar se existe associação entre a abundância de plan­


tas e a altitude. O modelo linear seria então:

N° de indivíduos = <x + p(altitude) + £,

onde a e P são constantes, sendo a o intercepto, isto é, o ponto onde a reta de


regressão corta o eixo Y, e P é o coeficiente da regressão, que indica o grau de
associação entre as duas variáveis. O erro amostrai é indicado por e. O valor
estimado do coeficiente da regressão indica a intensidade e a direção da regres­
são. A figura 2 ilustra as retas originadas a partir de diferentes valores de
inclinação. O que a regressão linear faz é estimar, através do método chamado
“q u ad rad o s m ín im os”, os coeficientes do modelo. Associada a essa estimativa,
testam-se as seguintes hipóteses:

Ho: P = 0 (não existe associação entre as duas variáveis)

Ha: P * 0, (existe associação entre as duas variáveis)

p positivo P '9ual 3 zero P negativo

Figura 2. Retas produzidas por diferentes coeficientes de regressão, p > 0 indica associa­
ção positiva; p < 0 associação negativa: e p igual a zero indica ausência de associação
entre as duas variáveis.

Voltando ao modelo do exemplb, o método de quadrados mínimos estimou a


seguinte equação: N° de indivíduos = 52,9 - 0,04 (altitude) + erro. Isso signi­
fica que a diminuição de 0,04 unidade da variável independente leva a um
aumento de uma unidade na variável dependente. Com essa equação, é possí­
vel predizer quantos indivíduos deve ter uma população dessa planta numa
determinada altitude. Aindá não testamos se o coeficiente de inclinação é esta­
tisticamente diferente de zero. Note que o valor -0,04 , indicado na equação
acima, não é o valor de p. O coeficiente da regressão é calculado de tal forma
que varie entre -1 (alta correlação negativa) a 1 (alta correlação positiva), pas­
sando por zero (ausência de correlação). O resultado de uma regréssão pode
ser visualizado na Tabela abaixo:

514
ESTA T ÍSTIC A E IN TERPRETAÇÃO DE DADOS

Tabela 8. Efeito da altitude sobre a abundância de plantas.

Coeficientes Estatística

(3 B g.l. t Valor-p
Intercepto 52,928 12 15,316 < 0,001
Altitude -0,947 -0,0405 12 -10,275 < 0,001

O coeficiente de correlação estimado foi de -0,947, indicando uma alta correla­


ção negativa. À medida que aumenta a altitude, diminui a abundância da plan­
ta. Essa diminuição se dá na “velocidade” de menos 1 indivíduo a cada 0,04
metro de altitude. Na Tabela 8 também está indicado o teste t utilizado para
testar a hipótese nula de que o coeficiente de inclinação é igual a zero. Com o
valor calculado de -10,275 para 12 graus de liberdade rejeita-se Ho. Uma outra
maneira de testar a significância da regressão é utilizar uma análise de variân­
cia. A Tabela 9 demonstra a saída típica da maioria dos programas estatísticos
para o procedimento.

Tabela 9. Análise de variância para a regressão entre altitude e abundância da planta.

Soma de Graus de Quadrado


Fonte de variação F Valor p
Quadrados Liberdade médio

Regressão 1055,5 1 1055,5 105,57 < 0,001


Resíduo 119,9 12 9,99

Total 1175,5

Como foi dito no tópico sobre ANOVA, a soma dos quadrados (SQ) é uma
estimativa da variância particionada entre a regressão e o resíduo, ou erro. A
proporção entre a SQ reg e a SQtot indica quanto da variação é explicada pela
1055 5 s
regressão. Nesse caso --------— = 0,898 . A regressão explica 89,8% da variação
1175,5
dos dados. Esse valor é o chamado R 2 da regressão e pode também ser calcu­
lado simplesmente elevando-se ao quadrado o valor do coeficiente de correla­
ção (R = -0,947 —» R 2 = 0,898). O teste segue a mesma lógica de uma ANOVA
comum. Calcula-se o valor da estatística F pela divisão dos quadrados médios.
(QMReg/QMRes). Compara-se o valor calculado com o esperado, sendo verda­
deira a hipótese nula e toma-se a decisão. No exemplo, o elevado valor de F
indica que a regressão é altamente significativa (Figura 3).

515
PAULO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

Altitude (metros)

Figura 3. Regressão entre a altitude amostrada e abundância de plantas.

O pesquisador pretende testar se a altitude, assim como também a riqueza de


espécies de polinizadores, determina a abundância da planta. O modelo agora é:

N° de indivíduos = a + (^(altitude) + P2(riqueza) + e,

Foi incorporado ao modelo o efeito da riqueza de espécies polinizadoras sobre


a abundância de indivíduos. A regressão linear agora é dita regressão múlti­
pla. Em tese, podemos tornar um modelo cada vez mais explicativo pela inclu­
são de novas variáveis, porém, dois pontos devem ser observados. Primeiro, o
tamanho da amostra deve ser grande o suficiente para o número de variáveis.
Regressões com poucos pontos em relação ao número de variáveis são alta­
mente explicativas (apresentam altos valores de R2), mas não são confiáveis. 0
outro problema com muitas- variáveis independentes é que, se elas estiverem
correlacionadas, então a interpretação dos coeficientes de correlação de cada
uma fica prejudicada.

Voltando ao modelo, a regressão múltipla testa, por meio de ANOVA, a signi­


ficância do ajuste, e testa também, através do teste t, os coeficientes bb estima­
dos para cada termo da regressão. A saída usual de uma análise de regressão
múltipla é sim ilar à da regressão simples, apenas incluindo-se as variáveis
adicionais (Tabela 10 ).

516
ESTA T ÍSTIC A E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

Tabela 10. Efeito da altitude e da riqueza sobre a abundância de plantas.

Coeficientes Estatística

P B g i­ t Valor-p
Intercepto 52,495 ll 10,984 < 0,001
Altitude -0,942 -0,040 11 -9,092 < 0,001
Riqueza 0,014 0,011 11 0 ;l3 8 0,892

Estima-se o coeficiente de correlação de cada variável do modelo. Nesse caso, a


densidade é negativamente influenciada pela altitude e não sofre efeito da rique­
za de espécies de polinizadores. Além dos coeficientes parciais de correlação,
calcula-se também o coeficiente de correlação múltipla R, nesse caso de 0,947,
muito próximo do coeficiente de correlação da variável altitude. A regressão
explica cerca de 89,8% da variação total (R2 = 0,898). A analise de variância da
regressão múltipla também é similar à da regressão simples (Tabela 11).

Tabela 11. A nálise de variância para a regressão múltipla entre altitude e riqueza com a
abundância das plantas.

Soma de Graus de Quadrado


Fonte de variação F Valor p
Quadrados Liberdade médio

Regressão 1055,7 2 527,86 48,48 <0,001


Resíduo 119,8 11 10,88

Total 1175,5

Quando a variável dependente é binária: a regressão logística


Em algumas situações práticas de campo é difícil ter boas estimativas da abun­
dância de uma espécie. Isso é principalmente verdadeiro quando se trata de
espécies raras, ou de difícil coleta e/ou visualização. A questão é que muitas
vezes são essas espécies nosso foco de interesse. Imagine, então, que você está
interessado em discutir a influência de fatores antrópicos sobre uma espécie
rara. Imagine que tais fatores são mensuráveis como, por exemplo, área perdi­
da ou concentração de metais pesados na água. Podemos imaginar um modelo
preditivo (através da regressão linear, por exemplo) que nos forneça uma ideia
de qual seria a “velocidade” com que a população perde indivíduos à medida
que aumenta o nível de poluição.

Por se tratar de espécie rara, ou pelo" menos inconspícua, as chances de você


conseguir boas estimativas dos tamanhos populacionais é pequena. O máximo >

517
PAULO DE MARCO JUN IO R
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

que se consegue é afirmar se a espécie está ou não presente numa determinada


amostra, se não se está preocupado com a abundância, mas sim com a ocorrên­
cia da espécie. Assim,' a variável resposta (dependente) é categórica, e só pode
assumir dois valores (presença ou ausência). Para essa e outras situações se­
melhantes (morreu/sobreviveu; tem filhotes/não tem filhotes etc) a análise in­
dicada é a regressão logística (veja a Tabela 1 ).

Uma situação mais real: algumas espécies de macroinvertebrados de água doce


da família C h iron om id ae (Diptera) podem ser indicadoras de qualidade ambi­
ental. Certas espécies só ocorrem em ambientes preservados, enquanto outras
estão presentes em sistemas aquáticos bastante eutrofizados. Os dados apre­
sentados abaixo são de Marques et al. (1999). Os autores coletaram em 20
pontos da bacia do Rio Doce, no estado de Minas Gerais. Em cada ponto,
foram medidas diversas variáveis físico-quím icas da água, entre elas, a con­
centração de nitrogênio total, que é indicador de grau de eutrofização. Diversas
espécies de C h iron om id ae foram coletadas. Abaixo apresentamos os dados de
ocorrência de duas espécies. Observe que nos dados originais a presença das
espécies está categorizada em 3 classes de abundância.

Tabela 12. Presença (1) e ausência (0) de duas espécies de Chironomidae concentração de
nitrogênio total em 20 pontos da bacia do Rio Doce.

Nitrogênio total
Ponto Tanitarsus sp C ryptochironom us
(Hg/1)
1 1 0 262,4
2 1 1 420,6
3 0 1 1889
4 1 1 718,5
5 1 1 471,3
6 0 0 1219,3
7 0 1 1587
8 1 1 482,6
9 0 1 2132
10 0 0 3112
11 0 0 5257
12 1 . 1 454,3
13 0 0 1221
14 0 1 837,8
15 0 0 538,9
16 1 1 136,2
17 0 0 574,5
18 0 0 775,6
19 0 0 7283
20 . 1 0 308,8

518
e s t a t ís t ic a e in t e r p r e t a ç ã o d e d a d o s

Podemos elaborar as seguintes hipóteses referentes à Tanitarsus sp.:

Ho: A ocorrência de Tanitarsus na bacia do Rio Doce não depende da concen­


tração de nitrogênio total na água;

Ha: Tanitarsus é um organismo sensível à eutrofização e ocorre preferencial­


mente em ambientes menos poluídos.

O modelo seria: Ocorrência de Tanitarsus = a + ßj(N-tot) + e, (o símbolo =


indica “é função de”). O modelo logístico é:

1
Y=
1 + e - ( « + P t * l + p 2 X 2 + ~ + P i X i ')

onde Y é a probabilidade de ocorrência da espécie; a é análogo ao intercepto


na regressão linear e pi representa o coeficiente da i-ésim a variável. Nesse
caso, a e os coeficientes (3 representam os parâmetros que serão estimados
através do método conhecido como Máxima Verossimilhança (“Maximum Li-
kelihood”, em inglês). A interpretação é análoga à regressão linear. O modelo
indica a relação entre a ocorrência de Tanitarsus e a concentração de nitrogênio
total na água. Existem duas formas para se testar essa relação em uma regres­
são logística: 1 ) O teste LR (“L ikelih ood R atio”, ou Razão de Verossimilhança);
e 2) O teste de Wald.

O teste de razão de verossimilhança baseia-se na estatística LR. Essa estatística é


calculada a partir dos valores L = -2 Ln(U kelihood) tanto para o modelo com a
yariável (chamemos de Lc) quanto para o modelo simples, sem a variável (Ls).
No exemplo de Tanitarsus (com valores de N-total log-transformados) temos:
valor de verossimilhança para o modelo simples = -2ln(Ls) = 26,970 e valor de
verossimilhança para o modelo com a variável N-tot = -2ln(Lc) = 8,695.

Se fizermos Ls - Lc :

-2 Ln(Ls) - {-2 Ln(Lc)} ou pela propriedade de subtração de logaritmos:

-2 Ln(Ls/Lc) = LR, por isso é uma Razão de Verossimilhanças, ou LR.

A maioria dos programas fornece o valor de verossimilhança para o modelo


simples e para o modelo completo e calcula cf valor de LR diminuindo um do
outro. LR tem uma distribuição de Qui-quadrado, com o número de graus de
liberdade definido como a diferença no número de parâmetros entre o modelo
completo (ou o número de variáveis + a) e o modelo simples (apenas o parâ­
metro a). Com o valor da estatística LR e o número de graus de liberdade
calcula-se o valor-p associado ao LR.

519
PAULO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO 'PEREIR A PA G U A

Seguindo nosso exemplo: LR = 26,920 - 8,695 = 18,225; N° de parâmetros do


modelo completo = 2 (a e P,); N° de parâmetros do modelo simples = 1 (a);
Graus de liberdade = 1; e Valor-p < 0,001. Assim, rejeita-se H0: A ocorrência
de Tanitarsus sp. depende da concentração de nitrogênio total na água. Os
parâmetros estimados foram a == 44,26 e p = -15,97. Sendo P negativo, a
relação entre ocorrência da espécie e concentração de N-tot é inversa. A figura
4A ilustra essa relação,

A contribuição da variável N-tot é indicada pelo valor de LR. Se a variável tem


pouco peso para explicar a ocorrência da espécie, então o valor de verossimi­
lhança para o modelo com essa variável é grande, próximo ao valor de verossi­
milhança para o modelo simples. Ao subtrair um pelo outro, o valor de LR fica
pequeno. Assim, quanto mais próximo de zerd for a estatística LR, menor é o
peso que a variável tem para explicar a variável dependente. Isso pode ser
visto no exemplo abaixo, a análise para a relação entre N-total e a ocorrência de
C ryptochiron om u s sp.:

Ho: A ocorrência de C ryptochironom us sp. na bacia do Rio Doce não depende


da concentração de nitrogênio total na água;

Ha: C ryptochiron om us sp. é um organismo sensível à eutrofização e ocorre


preferencialmente em ambientes menos poluídos.

Valor de verossimilhança para o modelo simples = -2ln(Ls) = 27,72; Valor de


verossimilhança para o modelo com a variável N-tot= -2ln(Lc ) = 26,39; LR =
27,72 - 26,39 = 1,33; n° de parâmetros do modelo completo = 2 (a e pi); n°
de parâmetros do modelo simples = 1 (a); Graus de liberdade = 1 ; Valor-p =
0,247. Deste modo, aceita-se a hipótese nula, ou seja, a ocorrência de Crypto­
chiron om u s sp. não depende da concentração de nitrogênio total na água (Fi­
gura 4B).

520
E STA T ÍSTIC A E IN TERPRETAÇÃO DE DADOS

Ocorrência = 1/(1+exp-(44.26+(-15.97)*N-tot))

- 0.21_____ . __________________________ _________________________ _ _ _ _ _ _

2,0 2.2 2.4 2.6 2,8 3,0 3,2 3,4 3.6 3,8 4.0

Log da concentração de nitrogênio total (ug/l)

Ocorrência = 1/(1+exp-(3,71+(-1,26)*N-tot))

2.0 2.2 2.4 2.6 2.8 3.0 3.2 3.4 3,6

Log da concentração de nitrogênio total (ug/l)

Figura 4. Relação entre a concentração de nitrogênio total e a probabilidade de ocorrência de


A) Tanitarsus sp. e B) Cryptochyronomus sp. em 20 pontos da bacia do Rio Doce.

521
PAULO DE MARCO JUNIOR
ADRIANO PEREIRA PAGLIA

O outro teste para a relação entre as variáveis na regressão logística, o teste de


Wald, geralmente fornece resultados semelhantes ao teste de LR. A lógica do
teste de Wald é similar ã do teste t na regressão linear usado para testar se o
coeficiente de correlação R é diferente de zero. Quando o tamanho amostrai é
grande, os resultados de ambos os testes são iguais. Mas, se o tamanho amos­
trai é pequeno, recomenda-se utilizar o teste LR. Um outro problema do teste
de Wald é que sua interpretação para a situação de duas ou mais variáveis é
mais complicada e envolve a aplicação de álgebra matricial. Diversos estatísti­
cos recomendam que se utilize preferencialmente o teste de LR para inferênci­
as estatísticas associadas à regressão logística.

De maneira geral, vale lembrar que os mesmos princípios lógicos e interpreta-


tivos da regressão linear podem ser aplicados aos modelos de regressão logís­
tica, incluindo as situações de múltiplas variáveis. Nessas situações, aplica-se
à rotina de avaliação do valor de LR à medida que se adicionam variáveis no
modelo.

R iscos assim étricos, pensamento "d esejoso " e a importância da


estatística na biologia da conservação
- Voltemos ao exemplo da longevidade de macacos reintroduzidos com ou sem
uma fase de pré-adaptação, discutido na seção sobre o teste de t. Há muitas
questões importantes a serem analisadas ali.

Em prim eira lugar vem o problema do número de amostras. E muito comum


ouvir as escusas de pesquisadores na área da Ecologia e da Biologia da Conser­
vação de que não é possível um número maior de amostras e que, portanto,
deve-se trabalhar com o que se tem. Na maioria das vezes, essa observação não
é aceitável e pode gerar prejuízos maiores que os custos de se aumentar o
número de réplicas ou de pelo menos desenvolver um experimento bem pla­
nejado. Naquele caso, rejeitou-se uma hipótese (de que a pré-adaptação au­
menta a longevidade dos animais) que pode ser verdadeira principalmente
porque, para conseguir demonstrar um efeito com um número pequeno de
réplicas, o tamanho desse efeito precisa ser muito grande.

Isto nos leva também ao problema dos riscos assimétricos, discutido de forma
muito interessante, se bem que ligeiramente diferente, em Caughley & Gunn
(1996). Considere os dois tipos de erros estatísticos que podem ocorrer nesse
teste. Nós poderíamos rejeitar a hipótese nula sendo ela verdadeira (Erro tipo
1) ou aceitá-la sendo ela falsa (Erro tipo 2).

522
ESTA TÍSTICA E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

Ao aceitar H0 quando ela é falsa, está-se desconsiderando uma prática de ma­


nejo que pode aumentar a sobrevivência do macaco no campo e contribuir
para sua preservação. Ao rejeitá-la, sendo ela verdadeira, custos adicionais
desnecessários estão sendo introduzidos, onerando o projeto. Esse procedi­
mento pode resultar em um menor número de indivíduos reintroduzidos, em
resultado dos gastos adicionais. Isso mostra dificuldade na tomada de decisão.

E interessante notar certa assimetria entre os erros: em um caso diminui-se


diretamente o sucesso do projeto por desconsiderar uma prática útil. No ou­
tro, onera-se o projeto e apenas indiretamente diminui-se o sucesso da rein-
trodução. Muitos conservacionistas não hesitariam em correr o primeiro risco
e alguns outros fatores sustentariam essa decisão. Em uma comunidade cientí­
fica eficiente, em que projetos dessa natureza estão sendo continuamente avali­
ados, um possível erro do tipo I será facilmente detectado à medida que outros
experimentos forem sendo desenvolvidos e novos dados forem adicionados.

Há, no entanto, um problema sério no procedimento anterior. Considerar sig­


nificativo um valor-p de 0,10, aceitando um maior erro tipo I, em virtude de
uma escolha de riscos dentro do panorama da assimetria descrita acima, só faz
sentido se for uma decisão tomada antes do experimento ser executado. Com
uma frequência muito maior que o esperado em uma comunidade científica
madura, essas decisões são tomadas após os dados serem coletados, fruto do
que os ingleses chamaram de whishful thinking - aqui traduzido, pelo Dr
Miguel Petrere Jr., com o “pensam ento desejoso”. O “desejo” de que nossa
hipótese alternativa esteja correta é o caminho mais curto para afastar a Biolo­
gia da Conservação do vacilante, mas honesto, caminho das Ciências e trazê-la
para o caminho do dogmatismo. Afinal, se uma hipótese é considerada correta
mesmo que os dados digam o contrário, para que, então, se coletaram os dados?

Bibliografia recomendada
Caughley, G. & Gunn, A. 1996. Conservation Biology in Theory and Practice. Blackwell
Science, Inc., Cambridge, M assachusetts. 459p.

Hosmer, D. W. & lemeshow, S. 1989. Applied Logistic Regression. John Wiley & Sons, New
York. 307 p.

Kleinbaum, D. G. 1994. Logistic Regression: A self-learning text. Springer-Verlag, New


York. 282p.

Krebs, C. J. 1989. Ecological Methodology. Harper & Row, Publishers, New York. 654p.
Magurran, A. E. 1988. Ecological Diversity and its Measurement. Cambridge University
Press, London. 179p.

Neto, P. R. P.; Valentin, J. L. & Fernandez, F. {eds.}. 1995. Tópicos em tratamento de dados
biológicos. Volume 2. I a Edição. Oecologia Brasiliensis, Rio de Janeiro. 161p.

523
Manly, B, F. J. 1991. Randomization and Monte Carlo Methods in Biology. Chapman and
Hall, London. 28 lp .

Martin, P. & Bateson, P. 1986. Measuring Behaviour. Cambridge University Press, Cambridge.
200p.

Marques, M. M. G. S. M.; Barbosa, F. A. R. & Callisto, M. 1999. Distribution and abundance of


Chironomidae (Diptera, Insecta) in an impacted watershed in south-east Brazil. Ver. Brasil.
Biol. 5 9 (4 ):553-561.

Sokal, R. R. & Rohlf, 1995. Biometry. W. H. Freeman arid Company, New York,/USA. 887p.
Tonhasca, A., Jr. 1991. T-he three “capital sin s” of statistics used in biology. Ciência e Cultura,
4 3 (6 ):4 1 7 -4 2 2 .

Young, L. J. & Young, J. H. 1998. Statistical Ecology: a population perspective.

Zar, J. H. 1984. Biostatistical analysis. Prentice-Hall, Englewood Cliffs, N.J. 218p.

524
20 Delineamento de experimentos
numa perspectiva de ecologia da paisagem
Jean Paul Metzger
Instituto de Biociências. USP

I ____ _ __ .__ •_____ ;________________ ’ ____ _ _

Introdução
Avanços na ciência dependem da existência de um corpo teórico que permita
formular hipóteses e previsões testáveis. Na ausência deste corpo teórico e da
possibilidade de realizar experimentos, a pesquisa costuma resultar em sim­
ples estudos descritivos ou, entâo, em generalidades como “a escàla é impor­
tante”, “a relação depende das características das espécies ou do tipo de paisa­
gem”, que, apesar de chamarem atenção para aspectos importantes, não são
úteis nem para se.estabelecer teorias nem em termos aplicados (Wiens 1999a).
A realização de experimentos é a forma mais usual de se fazer ciência, de se
estabelecer relações de causa e efeito (Ims 1999), e tem sido aplicada com
sucesso nas mais diversas áreas de pesquisa, como na física, na bioquímica ou
na biologia molecular. No entanto, estudos experim entais ainda são pouco
numerosos em ecologia da paisagem, correspondendo a menos de 5% dos
artigos publicados na L a n d sca p e E cology de 1986 a 1995 (Wiens 1992, Hobbs
1999). Assim, não é de se espantar que a ecologia da paisagem ainda não tenha
um arcabouço teórico bem formulado, sendo considerada uma disciplina ima­
tura e em busca de uma identidade (Hobbs 1994).

Porém, várias razões podem ser apontadas para essa ausência de experimenta­
ção (Ims 1999). Primeiro, a ecologia da paisagem lida, em geral, com escalas
espaciais e temporais muito amplas, tornando difícil e muitas vezes impossí­
vel realizar um experimento bem controlado e delineado. Em segundo lugar,
cada paisagem tem uma história própria, o que torna difícil a tarefa de se
encontrar réplicas de paisagem ou paisagens-controle. Terceiro, a paisagem é
uma unidade que integra um sistema extremamente complexo de interações
entre variáveis, o que dificulta e, muitas vezes, torna irreal ou artificial o estabe­
lecimento de uma causalidade única (ou simples). Alguns autores consideram,
JEAN PA U L M ETZG ER

assim, que a experimentação, praticada unicamente segundo a visão falsifica-


cionista de Popper (1968), é uma visão muito estreita da ciência e não se aplica
para áreas de pesquisa que lidam com escalas espaciais mais amplas, como a
ecologia da paisagem (Bissonette 1997). Apesar da experimentação em escalas
espaciais amplas apresentar vários inconvenientes (Tabela 1 ), é nessa escala
que necessitamos de respostas aos problemas ambientais.

Este capítulo procura apresentar alternativas para se contornar os problemas


da experimentação em ecologia da paisagem, e sugerir um protocolo de pesqui­
sa, comentando os passos a serem seguidos para se fazer pesquisa com paisa­
gens. Para facilitar a leitura, confira no glossário do fim do texto a definição de
alguns termos usualmente usados em ecologia da paisagem.

Tabela 1. Comparação de alguns atributos de experim entação em escalas finas e globais


(adaptado de Bissonette 1997).

Atributos - Escala de análise


Fina Global

Resolução Alta Baixa


Adequabilidade da amostra Boa Ruim
Manipulação experimental Possível Difícil
Réplicas Possível Difícil
Rigor Alto Baixo
Testabilidade de hipóteses Alta Baixa
Problemas devido às falhas na amostragem Graves Menos graves
Generalizações Baixas Altas

Alternativas para a experimentação em ecologia da paisagem


A pesquisa em ecologia da paisagem precisa evoluir através de uma gama mais
ampla de formas de se fazer experimentação, não se limitando apenas ao teste
(falsificação) de hipóteses. Várias alternativas têm sido propostas para contor­
nar esses problemas experimentais.

Uma prim eira alternativa seria realizar experim entos em “micropaisagens”


(Wiens et al. 1993). Assim, se o foco principal de pesquisa em ecologia da
paisagem é o estudo da causalidade entre padrões espaciais (a estrutura da
paisagem) e os processos ecológicos, é possível abordar esse problema numa
ampla gama de escalas e, em particular, numa m icroescala. Por exemplo,

526
DELINEAM ENTO DE EXPERIM EN TO S
NUMA PERSPEC TIVA DE ECOLOGIA DA PAISAGEM

Gonzales et al. (1998) estudaram o efeito de corredores na distribuição e


abundância de espécies na fauna associada a musg09. Para tanto, eles criaram
diferentes micropaisagens nas quais rochas recobertas por musgos eram frag­
mentadas (raspando-se as rochas), em alguns casos mantendo corredores entre
os “fragmentos de musgo” e em outros, não. Dessa forma, foi possível criar as
réplicas e os controles necessários para estudar a influência dos corredores no
deslocamento entre manchas de musgo e realmente certificar que esses corre­
dores permitiam uma maior movimentação entre manchas.

Em um outro estudo semelhante, Wiens & Milne (1989) estudaram a influên­


cia da heterogeneidade da matriz no movimento de pequenos coleópteros en­
tre fragmentos de hábitat em paisagens de 25 m 2. Nesses dois casos, o que
caracteriza a paisagem é a existência de um padrão espacial (a conectividade e
a heterogeneidade), tornando possível o teste desse padrão sobre o desloca­
mento de algumas espécies. A questão agora é saber se as relações obtidas
nesta escala serão também válidas em escalas mais globais, como num perfeito
sistema fractal. Ou será que existem “domínios de escala”, dentro dos quais
determinados padrões de relação entre estrutura da paisagem e processos eco­
lógicos são válidos? Neste último caso, ao passarmos de um domínio de escala
para outro, as propriedades do sistema mudam e não seria possível transpor o
observado numa micropaisagem (alguns m2) para uma macropaisagem (de um
a algumas dezenas de km2, segundo Forman 1995). Assim, os experimentos
em micropaisagens seriam de pouca utilidade para se estabelecer uma teoria
em ecologia de macropaisagens.

Uma segunda alternativa para evitar os problemas do “falsificacionismo” e de


manter a análise em micropaisagens é a utilização de modelos nbutros (Gardner
et al. 1987, Gardner & O’Neill 1991). Estes modelos seriam um conjunto míni­
mo de regras para se criar um padrão espacial (isto é, uma paisagem) na ausência
da ação de um determinado processo (ou conjunto de processos) sob estudo
(Pearson & Gardner 1997). Dessa forma, é possível simular uma paisagem neutra
(isenta da ação do processo estudado) e testar, ao comparar a paisagem observa­
da com a paisagem neutra, se há ou não diferenças significativas no padrão
espacial. Se houver, isso indica que o processo estudado está atuando sobre a
estrutura da paisagem. O maior problema é que as paisagens simuladas através
desses modelos neutros estão restritas a paisagens totalmente aleatórias (paisa­
gem neutra para todos os processos) ou a paisagens que apresentam um deter­
minado grau de agregação das unidades (controlado através de regras de densi­
dade baseadas num a estra tifica çã o h ierá rq u ica ou através da variação

527

\
JEAl< PA U L M ETZG ER

da autocorrelação espacial em mapas fractais). Isto torna estas paisagens dema-


' siadamente neutras, não permitindo o teste de um processo mais específico.
Por exemplo, para testar o efeito do fogo nas alterações da estrutura da paisa­
gem, precisamos distinguir este efeito dos demais fatores que também influem
na estrutura da paisagem, como o relevo e as perturbações antrópicas. O mode­
lo neutro não permite gerar o uso e ocupação apenas na ausência de fogo, mas
sim na ausência de praticamente todos os outros processos geradores da paisa­
gem. Isto torna difícil distinguir o efeito de cada processo na estruturação da
paisagem e limita bastante o uso de modelos neutros.

Uma outra possibilidade é a utilização dos cada vez mais sofisticados progra­
mas de tratamento de informações espaciais (por exemplo, Sistemas de Infor­
mações Geográficas) para gerar simulações de determinados processos, consi­
derando-se determinadas premissas (ou hipóteses) sobre as relações entre pa­
drões espaciais e processos ecológicos. Através desses modelos, é possível
simular determinados eventos ou processos e comparar os resultados obtidos
com os simulados (esperados segundo o modelo) (figura 1 ). Essa é, sem dúvi­
da, uma opção tentadora para os ecólogos da paisagem construírem uma teoria
da paisagem, à medida que as simulações forem quantitativas e precisas. Até o
presente, os ecólogos da paisagem (em particular os norte-americanos) têm se
mostrado muito eficientes em produzir modelos cada vez mais complexos,
porém poucos estudos procuram testar as predições desses modelos, toman­
do essas simulações de pouca utilidade para a compreensão da paisagem real.
As simulações devem ser um caminho importante de pesquisa em paisagem,
porém é necessário estar sempre confrontando os resultados simulados com
os observados na paisagem estudada.

Enfim, uma forma bastante interessante de se fazer pseudoexperiência na esca­


la de micropaisagens é a utilização de perturbações naturais, como grandes
ciclones, avalanches, erupções vulcânicas, enchentes ou fogos de grandes pro­
porções. Em geral, esse tipo de experiência carece de réplicas (muitas vezes,
trata-se de um fenômeno único) ou de controle, mas essas perturbações podem
ser consideradas oportunidades raras para se compreender algumas relações
ou processos de funcionamento da paisagem. Em algumas circunstâncias, é
possível planejar a perturbação, em particular quando se trata de impactos
humanos. Esse foi o caso do Projeto de Dinâmica Biológica de Fragmentos
Florestais, no norte de Manaus (Lovejoy et al. 1986; Laurance e Bierregaard
1997), no qual os pesquisadores entraram num acordo com os fazendeiros de
forma que eles desmatassem deixando parte da mata (que eles são obrigados a

528
DELINEAMENTO DE EXPERIM EN TOS
N UMA PERSPECTIV A DE ECOLOGIA DA PAISAGEM

manter por lei) sob forma de fragmentos florestais de diferentes tamanhos.


Dessa forma, foi possível fazer um pseudoexperimento mais controlado, com
réplicas dos tratamentos (fragmentos de diferentes tamanhos) e a realização de
censos antes e depois da perturbação (fragmentação). Esse tipo de acordo é
raro, mas como salienta Hobbs (1999), se os ecólogos se associarem mais fre­
quentemente com gestores ambientais, haverá numerosas possibilidades de se
utilizarem impactos ambientais planejados para se fazer experimentação e, ao
mesmo tempo, pesquisa aplicada.

Teste da ^ _______ 7 Processo


Relação teórica ' 1 esperado

Figura 1. Fluxograma mostrando a interação de teste de modelos teóricos em ecologia da


paisagem. As relações sim uladas em modelos teóricos entre padrões espaciais e proces­
sos ecológicos devem ser testadas em relação às observadas em paisagens reais.

Como fazer experiências com paisagem: uma visão pessoal


Deixando as questões mais teóricas de lado, como devemos proceder para
fazer pesquisa quando se trabalha com paisagens? Não há a intenção aqui de
dar uma “receita de bolo”, até porque, como já foi dito, a pesquisa em ecologia
da paisagem deve se caracterizar por um pluralismo de abordagens, não se
restringindo ao modelo clássico do “falsificacionism o”. No entanto, propõem-
se aqui algumas reflexões pessoais (o leitor pode discordar) sobre quatro eta­
pas principais na elaboração de uma pesquisa com paisagens: a definição do
objetivo; a consideração da pertinência de uma abordagem característica de
ecologia da paisagem; o cuidado com a escala de trabalho e a definição de um
desenho experimental.

529
JEAN PAUL M ETZG ER

Definição do objetivo
Apesar de muitos estudantes desconsiderarem esta etapa, definindo o objeto
de estudo sem ter claro o objetivo do trabalho, esta é a etapa inicial, primordial
e, sem dúvida, crucial para o sucesso de uma pesquisa. Sem um objetivo bem
definido, é impossível fazer 1uma boa pesquisa. Muitas vezes o que permite
distinguir uma boa pesquisa é a capacidade do pesquisador de intuir ou per­
ceber quais são os fatores-chave a serem estudados numa determinada paisa­
gem. Outros autores consideram que a ecologia da paisagem tem que ser útil
em termos aplicados (pois sua escala de análise é compatível com a escala de
perturbação antrópica do ambiente) e, por isso, consideram que a definição da
pergunta tem que estar relacionada com uma necessidade prática ou um fim
aplicado. Assim, ao invés de procurar estudar o fator-chave, seria necessário
definir o problema-chave de uma determinada paisagem, para, então, definir o
objetivo da pesquisa.

Seja qual for sua prioridade (mais teórica ou mais prática), o objetivo tem que
ser formulado de forma clara e testável (refutável), e pode ser enunciado sob
forma de um grupo de hipóteses, baseado numa sequência lógica de suposi­
ções restritivas. Por exemplo, se o objetivo é provar que um determinado coi'-
redor funciona como um facilitador do fluxo de indivíduos de uma espécie
entre dois fragmentos, pode-se, na sequência: i) determinar se a espécie usa o
corredor (realizando censos no corredor), o que não significa que ela está usando
o corredor para ir de um fragmento a outro; ii) áe ela usa o corredor, então
podem-se marcar indivíduos da espécie estudada nos fragmentos em questão
e ver se indivíduos capturados nos fragmentos são encontrados no corredor,
ou se indivíduos de um fragmento podem ser encontrados no outro fragmen­
to. No caso positivo, ainda não se provou que o corredor foi utilizado para o
deslocamento e muito menos que ele facilita esse deslocamento, visto que os
indivíduos podem ter ido de um fragmento ao outro pela matriz; iii) tendo tido
sucesso na etapa anterior, deve-se agora provar que a espécie se locomove
preferencialmente pelo corredor e não pela matriz. Isso só pode ser feito com­
parando a intensidade de locomoção nesses dois casos (o que nem sempre é
fácil).

Fica claro que de nada adianta realizár a terceira parte da pesquisa se as duas
primeiras não forneceram os resultados esperados. Mesmo tendo sucesso nes­
sas três etapas, não se podem fázer grandes generalizações. Será que ,a espécie
não cruzaria de forma mais intensa pela matriz se não houvesse corredor? Ou
seja, seria necessário comparar os resultados obtidos acima com resultados de

530
D ELINEAM ENTO DE EXPERIM EN TO S
NUMA PERSPEC TIVA DE ECOLOGIA DA PAISAGEM

fluxos entre dois fragmentos não unidos por corredores. Para generalizar ain­
da mais essa relação (os corredores facilitam a locomoção das espécies em
questão em paisagens fragmentadas), seria necessário provar que o que foi
obtido nos dois pares de fragmentos estudados não é uma exceção. Ou seja, é
preciso replicar o estudo para vários outros pares de fragmentos. E, para a
generalização valer para qualquer paisagem, seria necessário estudá-la para
diferentes tipos de matrizes. Enfim, esse é apenas um exemplo de como é
necessário definir bem o objetivo conforme o que vai realmente ser estudado
(ou do que é possível estudar), e de como um objetivo simples pode envolver
uma cadeia grande de testes (ou hipóteses).

Pertinência da perspectiva da ecologia da paisagem


A segunda pergunta é saber se o estudo (ou o objetivo) proposto necessita de
uma pesquisa numa perspectiva da ecologia da paisagem. Nesse ponto, é ne­
cessário esclarecer que o principal objetivo da ecologia da paisagem, dentro da
abordagem dita “norte-americana” a que se refere neste capítulo, é relacionar
padrões' espaciais (a estrutura da paisagem) a processos ecológicos, indepen­
dentemente da escala geográfica (assim, a pesquisa pode ser feita em micropai-
sagens de apenas 25 m 2 ou em paisagens de vários km2). A ecologia da paisa­
gem, nesta abordagem, pode ser considerada como uma ecologia espacial, que
especializa as questões ecológicas. Assim, é necessário saber se há necessida­
de ou não de considerar explicitamente o espaço para alcançar seu objetivo.

Quando o espaço ou a paisagem é importante na análise ecológica? Provavel­


mente sempre, porém um deles deve ser mais crucial em determinados ca­
sos. Segundo Andrén (1994), o arranjo espacial de um hábitat (medido, por
exemplo, por seu grau de fragmentação, isolamento ou conectividade) é par­
ticularmente importante para as espécies desse hábitat quando o hábitat é
relativamente escasso, ocupando menos de 30% de paisagem. Quando o hábi­
tat é mais abundante, e possivelmente melhor conectado, o arranjo espacial,
importa menos do que a su perfície ocupada por esse hábitat, ou seja, as
espécies respondem mais às variações na abundância do que às variações na
disposição espacial das m anchas de hábitat. Se essa hipótese é válida, a
heterogeneidade da paisagem ou o padrão espacial só têm mais importância
em paisagens mais fragmentadas. Fahrig (1998) apresenta outras pistas para
se saber quando o espaço importa mais: i) quando a capacidade de desloca­
mento da espécie estudada é menor do que à distância entre m anchas de
hábitat; ii) quando o padrão de deslocamento difere muito entre as diferentes
unidades da paisagem; iii) quando o hábitat não é efêmero e dinâmico; iv) na

531
JEAN PAUL M ETZG ER

ausência de processos ecológicos que promovam uma homogeneização da


paisagem.

Considerando-se que o espaço é importante na resolução do problema, então o


pesquisador é bem-vindo ao mundo encantado da ecologia da paisagem, mas
deve estar preparado para sofrer na busca de uma solução “ideal” para seu
delineamento experimental. Se o espaço não for importante, então este capítu­
lo pode ser ignorado.

Considerar a escala de trabalho


Se o trabalho demanda uma abordagem espacial, é necessário ter consciência
da necessidade de integração da escala no desenho experimental. Primeiro, é
bom lembrar que escala se refere a uma dimensão física do espaço ou do tem­
po, que pode ser medida em termos de extensão (no espaço) ou duração (no
tempo), e de resolução (no espaço e no tempo). As relações entre padrões
espaciais e processos ecológicos dependem da escala por diversos fatores.
Primeiro, porque os próprios padrões espaciais podem variar de acordo com a
escala da abordagem. Por exemplo, fotografias aéreas devem permitir analisara
fragmentação de uma determinada região num grau de detalhamento muito
•mais fino do que seria possível com imagens do satélite NOAA, que têm uma
resolução de 1,21 km2. Com essas imagens não é possível observar fragmentos
com menos de 12 ha, que perfazem, em geral, a categoria mais frequente de
tamanho de fragmentos em paisagens intensamente fragmentadas. Ou seja, o
satélite NOAA permitiria uma análise da fragmentação considerando apenas
os maiores fragmentos, o que pode ter pouca relação com o padrão de fragmen­
tação dos pequenos fragmentos.

Além da estrutura da paisagem depender da resolução e da exténsão da análi­


se, é também importante considerar que essa paisagem é percebida em diferen­
tes escalas pelas espécies. Em princípio, uma espécie com maior capacidade
de locomoção vai perceber a fragmentação de uma forma mais grosseira do que
uma espécie com capacidade limitada de locomoção. Além da capacidade de
dispersão/locomoção, uma série de outras características ecológicas das espé­
cies pode afetar sua visão da paisagem (por exemplo, a especificidade quanto
às necessidades de hábitat, a capacidade de suportar as bordas, o tamanho do
território, a taxa de reprodução etc). Assim, a paisagem deve ser vista também
“através dos olhos das espécies”, segundo expressão utilizada por C.C. Vos.
Isso resulta que as teorias que relacionam padrão a processos ecológicos em
ecologia da paisagem podem ser dependentes de uma relação entre a escala de

532
D ELINEAM ENTO DE EXPERIM EN TO S
NUMA PERSPEC TIVA DE ECOLOGIA DA PAISAGEM

análise da paisagem e a escala de percepção das espécies (Wiens 1999b) (figura


2). Essa dupla dependência deve ser considerada através de uma indagação
simples: a escala de análise da paisagem é compatível com a escala (presumí­
vel) de percepção da ou das espécies estudadas? Se não há certeza de se estar
analisando a paisagem numa escala espaço-temporal conveniente, é necessário
prever um estudo multiescala, no qual as relações padrão/processo são anali­
sadas em várias escalas, de forma a tornar possível a detecção da escala onde
essas relações são biologicamente mais significativas.

Funções de escala e limiares

Relações teóricas

Domínio de escala 1 Domínio de escala 2 Domínio de escala 2

Relação teórica 1 Relação teórica 2


.

Padrão Padrão

f ■ # -

Processo v; Processo \

Figura 2. Importância da escala na definição de m odelos em ecologia da paisagem . As


relações entre padrões esp a cia is e p ro cesso s ecológicos podem depender de relações
(funções matemáticas) entre a escala espacial da paisagem e a escala de percepção das
espécies. Essas funções podem ter modificações bruscas (i.e., limiares), que definem "do­
mínios de escala".

Desenho experimental
Chega-se ao ponto crítico: de posse do objetivo bem formulado, do conheci­
mento que o espaço e a escala são importantes, como fazer para lidar com
todos os problemas de experimentação com paisagens (falta de réplicas e con­
troles, impossibilidade de isolar ou manipular variáveis etc)? Estão aqui apre­
sentadas apenas algumas sugestões, generalizando o estado da investigação

533
JEAN PAUL M ETZG ER

em três grandes casos: i) sabe-se que o espaço importa, mas não se tem a
mínima ideia de que a variável espacial é mais importante; ii) tem-se uma ideia
clara de que a variável espacial pode estar afetando mais efetivamente o pro­
cesso ecológico; iii) além de uma intuição de que variável espacial é mais
importante, há também um efeito previsto que pode ser simulado.

No primeiro caso, quando não se tem ideia de que variável espacial pode ser
mais importante, faz-se um estudo “exploratório”. Isso significa correlacionar
diferentes parâmetros espaciais (os “índices espaciais”, abordados com mais
detalhes no Capítulo 16, Estrutura d a p a isa g em : o uso a d eq u a d o d e métricas,
neste volume) com seus parâmetros ecológicos. Por exemplo, deseja-se enten­
der que parâmetros espaciais estariam agindo na definição da riqueza de espé­
cies de fragmentos florestais de uma determinada região. Nesse caso, necessi­
ta-se estudar a riqueza de espécies de diferentes fragmentos (pelo menos 10.
de preferência mais de 30) e estudar a estrutura espacial da paisagem no entor­
no desses fragmentos, utilizando índices da paisagem. Dessa forma será possí­
vel relacionar os índices da paisagem com a riqueza dos fragmentos, utilizan­
do possivelmente regressões lineares e não lineares. As relações mais signifi­
cativas darão uma ideia de que parâmetros espaciais podem estar agindo na
determinação da riqueza. Porém, ainda se está longe de poder estabelecer uma
relação de causa e efeito, pois outras variáveis correlacionadas podem ser res­
ponsáveis pelo padrão de riqueza observado. O importante é que esse tipo de
investigação “exploratória” permite levantar hipóteses e centralizar o foco num
conjunto reduzido de variáveis espaciais.

Tendo-se definido a variável ou um pequeno conjunto de variáveis mais signi­


ficativas biologicamente, podem-se realizar outros experimentos mais especí­
ficos. Quando existem indicações de que a densidade de corredores no entor­
no dos seus fragmentos parece ser um fator significativo na determinação da
densidade de uma espécie, testa-se a hipótese nula de que não há relação entre
densidade de corredores e densidade da espécie. Para tentar isolar o efeito do
parâmetro “densidade de corredores”, deve-se escolher um grande número de
fragmentos, semelhantes numa série de características que não se quer analisar
(por exemplo, de tamanhos semelhantes, em estádio de sucessão ou com graus
de perturbação similares), porém diferindo quanto à densidade de corredores
no entorno. Isso significa que, primeiramente, deve-se analisar a estrutura da
paisagem e a estrutura dos possíveis fragmentos a serem considerados no seu
estudo. A partir dessa quantificação da paisagem (no Capítulo 16, Estrutura
d a p a isa g em : o uso a d e q u a d o d e m étricas, neste volume), pode-se verificar se
o espaço será estratificado em áreas onde o parâmetro estudado apresenta, por
534
D ELINEAM ENTO DE EXPERIM EN TO S
NUMA PERSPECTIV A DE ECOLOGIA DA PAISAGEM

exemplo, valores baixos, médios e altos. Em um desenho ideal, seria necessá­


rio: ter pelo menos três réplicas de cada uma dessas áreas (para minimizar o
efeito de características locais); dentro de cada uma dessas áreas, escolher
réplicas de fragmentos (digamos entre 5 e 15) e ir a campo para analisar a
densidade da espécie estudada.

A escolha dos fragmentos em cada área de estudo, além de considerar a seme­


lhança em uma série de características citadas acima, deve ser feita ao acaso e
de forma a manter a independência entre os fragmentos, isto é,.os fragmentos
têm que estar suficientemente afastados para que os entornos considerados na
análise da paisagem não se sobreponham. Com os dados em mãos, podem-se
utilizar regressões entre a densidade de corredores e a densidade de espécie,
ou então fazer uma análise de variância testando a diferença de densidade da
espécie nas categorias de densidade de corredores. Em virtude do tipo de
dados (variáveis), outros testes serão mais apropriados (ver tabela 1 , no Capí­
tulo 19, sobre estatística, neste volume). Em resumo, esse tçste implica: anali­
sar a estrutura da paisagem; estratificar o seu espaço de acordo com a variação
do fator estudado; escolher réplicas para cada categoria de variação do fator
estudado; escolher aleatoriamente réplicas independentes de fragmentos; co-,
letar os dados no campo e analisar a relação entre os dados de campo e os
dados espaciais.

Tendo tido dados que apontem para uma relação positiva entre densidade de
corredores e densidade da espécie com o experimento acima, seria ainda ne­
cessário entender essa relação melhor: será que os corredores permitem uma
maior migração entre os fragmentos, compensando, por exemplo, mais rapida­
mente as perdas por mortalidade? Ou será que os corredores aumentam as
possibilidades de fuga da espécie estudada de um possível predador? Ou será
ainda que os corredores aumentam a capacidade da espécie de encontrar al­
gum tipo de recurso mais escasso e distribuído de forma irregular nos frag­
mentos? Todas essas perguntas requerem novos trabalhos experim entais e
deixam claro que o reconhecim ento de um determinado padrão de relação
entre uma estrutura da paisagem (no caso, densidade de corredores) e um
processo/padrão ecológico (densidade da espécie) não esgota o trabalho do
ecólogo da paisagem. Quanto maior a necessidade de detalhar uma determina­
da relação entre padrão e processo, mais o ecólogo de paisagem mostra que ele
nada mais é do que um ecólogo tradicional (que estuda populações ou comuni­
dades) que tem a particularidade de espacializar suas perguntas. Para realizar
um teste mais específico sobre o efeito de um determinado corredor, o ideal
seria eliminar ou criar (por restauração) um corredor, analisando o que ocorre

535
JEAN PAUL M ETZG ER

antes e depois do experimento, em relação a uma área fragmentada e não alte­


rada (controle). No entanto, isso é quase sempre inviável (e indesejável, no
caso da destruição de um corredor), a não ser que esteja previsto na implanta­
ção ou mitigação de uma determinada obra. Esse tipo de perturbação, apesar
de muitas vezes não fornecer réplicas, pode ser um instrumento útil para obter
informações sobre o funcionamento da paisagem.

Um último tipo de experimento a ser mencionado está relacionado com simu­


lações — quando se possuem conhecimentos suficientes que permitem mon­
tar um modelo sobre a relação entre padrões espaciais e um determinado pro­
cesso ecológico. Por meio de um modelo, podem-se gerar previsões (simula­
ções) do que ocorreria em determinadas situações. Por exemplo, estabelece-se
uma relação entre a presença e a ausência de uma determinada espécie focal
(uma espécie mais sensível à fragmentação) com determinadas características
espaciais dos fragmentos de hábitats (por exemplo, tamanho, forma, grau de
isolamento, grau de conectividade). Este modelo, se válido, pode ser muito
útil em termos de conservação, pois permitiria indicar os fragmentos (ou con­
junto de fragmentos) prioritários em termos de conservação. Para testar a vali­
dade do modelo, é necessário fazer previsões sobre a presença/ausência da
espécie em fragmentos não utilizados para estabelecer o modelo, e verificar no
campo a veracidade das previsões. É possível, assim, com testes simples (como
o do Q-quadrado), verificar a acuidade das simulações, validando ou não o
modelo.

Essas são apenas algumas opções plausíveis de desenho experimental em eco­


logia da paisagem, que devem estimular muitas outras formas de rçalizar expe­
rimentos. O importante é lembrar que, apesar das dificuldades e muitas vezes
das imprecisões, é possível delinear experimentos com paisagens. Apesar de
não serem perfeitos em termos estatísticos/experimentais, já são muito melho­
res do que estudos puramente descritivos.

Conclusões
A principal intenção deste capítulo foi a de sugerir formas de planejar a pes­
quisa, sem a pretensão de esgotar todas as opções. Muito pelo contrário, dese­
ja-se incentivar fortemente o leitor a adaptar sua forma de fazer pesquisa com
paisagem, de acordo com o objetivo específico de sua pesquisa. O importante
para fazer uma boa pesquisa é formular perguntas de forma lógica, ter um bom
desenho experimental, ser quantitativamente rigoroso na coleta dos dados, ter
uma análise objetiva e interpretações confiáveis (Wiens 1999a).

536
D ELINEAM ENTO DE EXPERIM EN TO S
NUMA PERSPEC TIV A DE ECO LOGIA DA PAISAGEM

Pequeno glossário de termos utilizados em ecologia da paisagem


Borda. Área de transição entre duas unidades da paisagem.

Conectividade. Capacidade da paisagem (ou das unidades de paisagem) de


facilitar os fluxos biológicos. A conectividade depende da percolação das uni­
dades de hábitat, da densidade de corredores, e stepping-stones e da permeabi­
lidade da matriz.

Corredor. Área homogênea (numa determinada escala) e linear da paisagem


que se distingue das unidades vizinhas. Segundo alguns autores (em particu­
lar os que trabalham com fragmentação), um corredor deve unir pelo menos
dois fragmentos.

Elemento da paisagem. Trata-se de cada mancha, corredor ou matriz que se


distingue das áreas vizinhas.

Escala de percepção. Grau de detalhamento com o qual cada espécie percebe a


paisagem, em função de suas características ecológicas (tamanho de território,
especificidade do hábitat, capacidade de locomoção etc).

Escala espacial. E definida por características de extensão (tamanho) e resolu­


ção (unidade mínima de representação espacial). Os mapas variam de escalas
finâs (mapas detalhados, com alta resolução e, em geral, extensão reduzida) a
escalas grosseiras (mapas com poucos detalhes, com resolução grosseira e, em
geral, ampla extensão).

Fractal. Sistemas fractais são sistemas que mantêm suas características/pro­


priedades em diferentes escalas.

Fragmento. Tipo de mancha originada por processos de perturbação antrópica.


Muitos autores utilizam os termos “fragmento” e “mancha” como sinônimos.

Mancha. Área não linear e relativamente reduzida e homogênea, numa deter­


minada escala, que se distingue das unidades vizinhas.

Matriz. Pode ser entendida de duas formas: como a unidade da paisagem fun­
cionalmente (e em geral, espacialmente) dominante (unidade que controla a
dinâmica da paisagem) ou como o conjunto de unidades de não hábitat (nesse
caso, é feita uma oposição entre hábitat e matriz).

Paisagem. Unidade caracterizada pela heterogeneidade. De uma forma geral, a


paisagem pode ser definida em qualquer escala espacial, sendo caracterizada
por um mosaico heterogêneo de manchas interativas ou então por um gradien­
te de variações. Em microescala (como é geralmente percebida), a paisagem é
um conjunto interativo de unidades (em geral, ecossistemas, tipos de cobertura

537
JEAN PA U L M ETZG ER

vegetal ou de uso e ocupação dos territórios), delimitado fisicamente por ter


características geomorfológicas comuns e/ou histórico de ocupação/perturba­
ção humana semelhante.

P ercolação. Diz-se que uma unidade da paisagem percola quando uma de suas
manchas atravessa espacialmente a paisagem de ponta a ponta.

P erm ea b ilid a d e d a m atriz. Capacidade da matriz de facilitar os fluxos biológi­


cos de organismos de um determinado hábitat (a matriz pode ter diferentes
permeabilidades em virtude do hábitat considerado).

S teppin g-ston es (em português, “p o n to s d e lig a ç ã o ” ou “tram polins ecológi­


co s”). Pequenas áreas de hábitat dispersas pela matriz, que podem, para algu­
mas espécies, facilitar os fluxos entre manchas.

U nidades d a p a isa g e m .'São os principais tipos de componentes da paisagem,


em geral: tipos de ecossistemas, de vegetação ou de uso e ocupação dos terri­
tórios. Uma unidade da paisagem pode estar presente sob forma de mancha,
corredor ou matriz.

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539
Educação ambiental e conservação
21 A abordagem participativa
na educação para a conservação da natureza
Suzana M. Padua
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Marlene F. Tabanez
Instituto Florestal de São Paulo

Maria das Graças de Souza


IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Introdução
A educação ambiental surgiu formalmente na década de 70, como resposta às
crises socioambientais crescentes que não estavam sendo abordadas efetiva­
mente nas diversas áreas da atividade humana, principalmente nas propostas
tradicionais de educação. A formação de cidadãos atuantes passou a ser o
centro dos debates sobre a temática ambiental, em eventos realizados em vári­
os países do mundo.

Pelas definições de educação ámbiental, torna-se evidente a sua amplitude e a


necessidade de adotar-se enfoques interdisciplinares que reflitam a complexi­
dade atual. Apenas informar ou transmitir conhecimentos ambientais não vi­
nha mais atendendo à abrangência da problemática desencadeada pelo proces­
so de desenvolvimento insustentável dominante. Os efeitos do sistema econô­
mico vigente nos meios naturais começaram a ser percebidos como caóticos e
devastadores, deflagrando a necessidade de se buscar medidas eficazes de
conservação, só possíveis- com a adoção de nova postura.

Em 1975, a ‘Carta de Belgrado’ descreveu educação ambiental como busca para


desenvolver um cidadão consciente do ambiente total, preocupado com os
problemas associados a esse ambiente e que tenha conhecim ento, atitudes,
motivações, envolvimento e habilidades para trabalhar individual e coletiva­
mente visando resolver problemas atuais e prevenir os futuros (Brasil, 1998).
Anos depois, os objetivos da educação ambiental foram definidos na Confe­
rência Intergovernamental de Educação Ambiental (1977):
SUZA N A M. PADUA
M A RLEN E F. TA BA N EZ
MARIA D A S GRAÇAS DE SO U ZA

(1) Ajudar grupos sociais a adquirirem consciência e sensibilidade sobre o


ambiente total e seus problemas;
(2) Propiciar conhecimentos que possibilitem uma maior compreensão sobre
o ambiente e seus problemas associados;
(3) Promover meios de mudanças de atitudes e valores que encorajem sentimentos
de preocupação com o ambiente e motivem ações que o melhorem e o protejam;
(4) Desenvolver capacidades que possam ajudar indivíduos e grupos a identi­
ficarem e resolverem problemas ambientais;
(5) Estimular a participação, que essencialmente significa envolvimento ativo
em todos os níveis da proteção ambiental.

Percebe-se a inclusão da sensibilidade e de valores de forma priorizada. Não


basta saber. E necessário tocar o indivíduo profundamente, desenvolver seu
lado sensível, estimular sua criatividade e oferecer meios para que desenvolva
suas habilidades. Dar a cada. um capacidades de solucionar problemas, de
engajar-se em processos de mudanças. Segundo Glazer (1999), o senso de
identidade indispensável ao fortalecimento individual, base da educação am­
biental, pode ser estabelecido de duas maneiras: de fora para dentro ou de
dentro para fora. O que vem de fora para dentro, interpretamos como imposi­
ção ou doutrinação. O que emerge de dentro para fora e que brota de nossas
experiências, compreendemos como expressão. A educação ambiental tem por
objetivo estimular a melhor expressão de cada um, podendo levar ao engaja­
mento do ser humano em processos de mudança (Padua 2000).

A medida que a formação inclui conhecimentos, valores e habilidades, pode


despertar o potencial transformador do indivíduo para que contribua para um
mundo mais ético. Pode estimular também o envolvimento responsável em
processos que visem a um bem maior çom respeito à vida. Trata-se, portanto,
de uma ferramenta de grande importância para a conservação de áreas natu­
rais, agora comumente ameaçadas.

Teoricamente, os princípios relativos à educação ambiental são de fácil com­


preensão. Entretanto, a maneira de aplicá-los na prática requer aspectos que
incluem a definição de referencial teórico; o conhecimento do contexto em .
questão e de éxperiências similares; e metodologias adequadas que possibili­
tem a implementação de programas com princípio, meio e fim. Este capítulo
busca contribuir com a apresentação da abordagem participativa e da metodo­
logia conhecida como PPP, Planejamento; Processo e Produto (Jacobson 1991),
que pode facilitar a inclusão da educação ambiental em projetos desenvolvidos
segundo princípios da Biologia da Conservação.

544
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

Importância da definição de metodologia na elaboração de


programas de educação ambiental
Na ânsia de busCar o envolvimento de'comunidades onde atuam, muitos pes­
quisadores desenvolvem atividadés de educação ambiental deficientes em re­
ferenciais teóricos ou na sistematização das estratégias a serem adotadas. Uma
vez que educação ambiental demanda tempo para surtir os efeitos profundos
de que é capaz, vale a pena investir na escolha de como atuar. A busca de
eficácia é ainda mais reforçada diante da escassez de recursos alocados à edu­
cação e à falta de oportunidades de capacitação nessa área. Nesse cenário, a
escolha de metodologias coerentes com as realidades específicas ajuda a aclarar
os passos a serem trilhados nos programas de educação para a conservação.

A definição de qual metodologia utilizar em educação ambiental é muitas ve­


zes um desafio, principalm ente para responder a necessidades abrangentes
comuns em programas da Biologia da Conservação. Somado ao fato de que a
proteção de áreas naturais é cada vez mais crítica em consequência das crescen­
tes pressões antrópicas, a educação ambiental precisa ser eficaz na promoção de
valores e comportamentos que resultem em sustentabilidade em longo prazo.

Descrição da metodologia
São muitas as metodologias que têm sido empregadas em programas de educa­
ção ambiental. EsSe trabalho concentrou-se em apresentar sucintamente a abor­
dagem participativa utilizada em vários contextos pelas autoras, sendo apri­
morada através de vivências contínuas, a maioria ligada ao envolvimento de
comunidades que vivem no entorno de áreas naturais protegidas (Padua &
Tabanez 1997; Padua et al; 1999a, Padua et al. 1999b).

A abordagem participativa surgiu da aplicação da metodologia Planejamento,


Processo e Produto (PPP), que estabelece passo a passo as estratégias a serem
desenvolvidas. Essa metodologia está descrita em detalhes a seguir, acompa­
nhada de um estudo de caso que ilustra sua aplicabilidade.

A abordagem participativa
Um elemento-chave para educação ambiental em programas de conservação é
desenvolver mecanismos que promovam o engajamento de comunidades lo­
cais. A adoção de abordagens participativas pode incentivar populações que
habitam regiões próximas a áreas naturais a se envolverem com conservação,
ajudando a protegê-las. Essa abordagem conta com o ouvir a todos e o processo
pode iniciar-se com a identificação de problemas locais e a busca de soluções,

545
SUZA N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
M ARIA DAS GRA ÇA S DE SO U ZA

levando em consideração aspectos sociais, econômicos e culturais, assim como


ecológicos. A valorização de culturas regionais, a atenção dada a opiniões de
pessoas locais, o respeito à diversidade de ideias, podem ser chaves em pro­
cesso de envolvimento comunitário (Padua & Tabanez 1977).

O processo participativo, em que os passos são construídos junto com os


envolvidos, pode promover o fortalecimento individual e coletivo. Boff (1999,
p.195) definiu o termcr “empoderamento” como “a criação de poder nos sem-
poder ou a socialização do poder entre todos os cidadãos e reforço da cidada­
nia ativa junto aos movimentos sociais”. Na abordagem participativa, os edu­
cadores tornam-se facilitadores, sendo o respeito a tônica para aumentar a
autoestima da população, facilitando o compartilhar de experiências e de li­
ções aprendidas. Os insucessos passam a fazer parte dos processos de apren­
dizagem e não são mais motivos de vergonha ou de sentimentos de fracasso.

A Metodologia Planejamento, Processo e Produto (PPP)


O PPP é uma metodologia baseada em um mqdelo de avaliação contínua criada
por Jacobson (1991) e utilizada e modificada por Padua (1991; Padua 1994;
Padua 1997, Jacobson.e Padua 1995; Padua e Jacobson 1993). Por ser um mo-
m
delo simples e objetivo, tem sido extremamente útil na implantação de diver­
sos programas de educação ambiental no Brasil. Sua base é avaliar continua­
mente cada etapa para que se possam obter indicadores de eficácia ou ineficá­
cia das atividades e das estratégias adotadas. Dessa forma, a avaliação passa a
ser um veículo importante para a educação ambiental, podendo contribuir não
só para melhorar a qualidade dos programas implantados, mas a Credibilidade
da área como um todo.

Ao se avaliar cada etapa de um programa, pode-se manter o que dá certo,


modificar as estratégias que não respondem às expectativas, ou abandoná-las
completamente se não estiverem compatíveis com os objetivos propostos. Em
consequência, economizam-se recursos, tempo e energia, maximizando os es­
forços e a eficácia geral dos programas. O processo de avaliar e re-avaliar per­
mite melhorar o programa gradativamente dentro de um rumo traçado, forne­
cendo dados sobre os resultados e muitas vezes desvendando aspectos impre­
visíveis. Aponta, ainda, novos cam inhos que podem ser incorporados aos
programas idealizados.

Uma das chaves é pensar em programas de educação ambiental com princípio,


meio e fim, e im plantá-los passo a passo. O PPP pode ser útil, pois inclui
planejamento, proGesso ou implantação e produto ou resultado. Nele, pensa-se

546
A ABO RDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÀO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

no todo, mas organiza-se por partes. A lista das etapas pode variar de acordo
com o contexto, permitindo sua adaptação às situações específicas de cada
t

programa. Os itens estão listados no Quadro 1, seguidos de uma descrição


detalhada de cada etapa para facilitar a compreensão. O estudo de caso acom­
panha também esta sequência (Anexo 1).

Quadro 1: Modelo de Avaliação Continua.

PLANEJAMENTO PROCESSO PRODUTO

a. Levantamento dos a. Criação de estratégias / a. Avaliação do processo


problemas / temas / atividades para alcançar (melhoria do programa)
os objetivos
questões b. Análise de resultados
b. Levantamento de esperados
b. Levantamento dos
materiais já existentes ou
potenciais locais c. Análise de resultados
elaboração de novos
inesperados
c. Definição dos objetivos
c. Elaboração de um
d. Utilização dos
d. Identificação dos cronograma de
resultados para apoio
atividades
públicos-alvo
e. Disseminação dos
d. Capacitação de pessoal
e. Análise dos recursos resultados
envolvido
disponíveis e possíveis
A avaliação geral indica
parcerias Cada etapa deve ser
eficácia ou ineficácia
avaliada continuamente
f. Seleção dos (avaliação somativa)
instrumentos de (avaliação formativa)
avaliação

I a Etapa: Planejamento
Avaliando a realidade ambiental
A fase de P la n eja m en to é quando o educador/pesquisador aproxim a-se da
realidade a ser trabalhada, procurando conhecê-la mais profundamente. En­
volve uma gama de aspectos tais como: identificação dos problemas e poten­
ciais locais, públicos a serem trabalhados e clarificação de objetivos. A avalia­
ção contínua deve permear todo esse processo.

a. Levantamento de tema, problema ou questão


0 primeiro passo é pensar em'um tema, problema ou questão que será focali­
zado pelo programa. O melhor é selecioná-lo de forma participativa para que
todos sejam envolvidos desde o in ício. Um levantam ento dos problem as

547
SU ZA N A M. PADUA
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MARIA D A S GRA ÇAS DE SO U ZA

ambientais da unidade de conservação, da escola, do bairro, da cidade, do


( * -
estado ou do país pode servir como um ponto de partida. E importante salien­
tar que um assunto local tem maiores chances de motivar o público porque são
relativos às suas vidas. Quando houver ações para solucionar tais problemas,
a diferença poderá ser percebida com mais facilidade. Temas locais facilitam
também a implantação de estratégias e o acompanhamento dos resultados.

b. Identificação dos potenciais locais

As riquezas socioambientais da região devem ser levantadas em seguida. Entre


elas podem estar espécies raras, belezas cênicas, áreas protegidas, matas cilia­
res ou mesmo monumentos históricos. Podem ser listadas, também, pessoas
com potencial, tais como conhecedores da vegetação do local e de ervas medi­
cinais, de fontes de água, da utilização de elementos naturais para artesanato
oú artigos afins. Os levantamentos desses potenciais podem ser feitos através
de visitas e observações de campo, ou por meio de questionários, entrevistas,
análise documental e registros fotográficos. A experiência é normalmente mais
rica e motivadora do que explanações ou leituras sobre determinado tema. A
abordagem experiencial ofereçè oportunidades de sensibilização ao mesmo tem­
po em que propicia informações, aumentando as chances do público partici­
par mais intensamente.

c. Clarificação dos objetivos

Uma vez que um problema/tema local tenha sido identificado como prioritá­
rio, podem-se identificar soluções e onde se quer chegar. Esses constituem
efetivamente os objetivos que podem visar ao aumento de conhecimentos e à
sensibilização.do público causador do problema, a fim de mudar seu compor­
tamento, visando minimizar os danos observados anteriormente. O objetivo
pode ser também obter participação para a busca de soluções propiciando
oportunidades para despertar o potencial transformador de cada um. Uma vez
que se sabe o que se quer, a forma de se ter êxito fica mais clara. Afinal, “o
vento só ajuda o navio que sabe para onde vai”.

d. Identificação do público-alvo

A escolha do público-alvo vai depender do problema/tema identificado, mas


deve também ser participativa. Nessa fase, perguntas importantes a serem res­
pondidas incluem :

548
A ABO RDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

•Para qüem se dirige o programa?

•Quem está causando o problema?

• Quem pode minimizar o problema?

Por exemplo, se for detectada a contaminação da água de um rio local por


agrotóxicos utilizados em propriedades rurais, o programa provavelmente será
direcionado aos fazendeiros. O importante é analisar cada caso para que pos­
sam ser identificados os públicos ligados diretamente aos problemas.
/
e. Levantamento dos recursos disponíveis

Os recursos normalmente são escassos. Mas, quando se identifica o que exata­


mente é necessário, fica mais fácil a busca de apoio e parcerias. Por exemplo,
se não há um local adequado para desenvolver atividades educativas ou para
promover reuniões com as comunidades locais, podem-se identificar alternati­
vas e contatar proprietários ou responsáveis por estabelecimentos que supram
tais carências. Se houver necessidade de copiar materiais didáticos, alguma
instituição local pode colaborar com cópias. Caso o objetivo seja a recuperação,
de uma área degradada, pode-se pedir ajuda aos órgãos governamentais e não
governamentais competentes.

f. Avaliação

Os instr.umentos de avaliação de cada uma das etapas a serem percorridas


podem ser variados, como por exemplo questionários, entrevistas, observa­
ções, anotações periódicas, análise documental, registros fotográficos, entre
outros. Enquanto os questionários e desenhos são úteis na obtenção de infor­
mações rápidas para aumento de conhecimento e mudanças de valores, outras
técnicas podem ser mais adequadas para detectar adoção de comportamentos.
Por exemplo, só se pode registrar a diminuição de lixo em determinado local,
depois de algum tempo do programa implantado. De qualquer maneira é im­
portante avaliar antes de começar um programa e ao fim de um período de
atividades. Por exemplo, um questionário com perguntas de conhecimentos e
valores deve ser respondido antes de qualquer iniciativa e no fim das ativida­
des desenvolvidas. Dessa forma, poderá haver uma constatação mais consis­
tente do efeito do programa educativo. O mesmo pode ser feito com fotografias
ou demais registros. E importante definir a forma de avaliação que será utiliza­
da já na etapa Planejamento.

54 9
SUZA N A M. PADUA
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MA RIA D A S GRA ÇA S DE SO U Z A

2a Etapa: Processo
Definindo a mensagem e implantando as ideias
A fase do P rocesso consiste em criar as estratégias e as atividades do programa
e implementá-las. Em geral, essa é a fase mais estimulante tanto para o público
quanto para o educador/pesquisador. E importante manter a motivação, o que
não é difícil quando se coloca a ‘fmão na massa”. Essa etapa pode incluir os
passos descritos a seguir.

a. Criação de atividades e estratégias

As atividades e estratégias a ser adotadas devem ser identificadas, implanta­


das e testadas à medida que vão sendo realizadas. O ideal é que os educado­
res/pesquisadores sejam facilitadores desse processo, para que juntamente com
o público possam alcançar os objetivos, criando e organizando o que e como
será feito. Quando se cria algo em conjunto, todos são coautores e donos da
ideia, o que encoraja a implementação do programa educativo. Ao se valoriza­
rem as capacidades individuais, estimula-se o agir, passando o indivíduo a
acreditar na sua própria capacidade de transformar o mundo para melhor.
Problemas e ações ambientais locais podem ser o foco que impulsiona o enga­
jamento pessoal ou coletivo, abrindo os horizontes para novos paradigmas e
para processos de transformação. Se o problema ambiental a ser tratado no
programa de educação é, por exemplo, a caça em unidades de conservação, as
estratégias a serem adotadas podem incluir a realização de palestras nas esco­
las e comunidades urbana e rural, campanhas nas emissoras de rádio e jornais
locais, capacitação de guarda-parques, visitas e palestras aos proprietários de
terras do entorno dessas áreas, elaboração de materiais didáticos e outras de
acordo com as necessidades locais.

b. Levantamento do que já existe

A fim de otimizar tempo e recurso é importante averiguar o que já existe no


local visando diminuir etapas desnecessárias. Por exemplo, se a região já con­
ta com programas de turismo ecológico que levam pessoas a locais de belezas
cênicas, por que não trabalhar com os guias e oferecer novas ideias que valori­
zem a região ou evitem o acúmulo de lixo e outras degradações? Caso seja
necessário elaborar material didático para trabalhar determinado assunto, pode
ser importante realizar levantamento do que já existe. Muitas vezes já foram
feitos estudos que podem subsidiar a elaboração de tais materiais ou enrique­
cer os existentes.

550
A ABO RDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

c. Elaboração de cronograma

Um cronograma de implantação é de grande importância para que as ativida­


des se encaixem em determinado espaço de tempo. O prazo dependerá muito
da extensão do programa, pois algumas atividades podem ser rapidamente
realizadas, enquanto outras demandarão mais tempo. E necessário priorizar as
atividades de acordo com a importância ou a oportunidade de implementá-las.

d. Capacitação de equipe

Como educação ambiental é ainda uma área nova, torna-se necessária a capaci­
tação do educador/pesquisador, bem como de sua equipe. Materiais didáticos
como livros e vídeos, reuniões e cursos podem contribuir em processos de
formação de pessoal. Cursos específicos dessa área podem capacitar o profis­
sional que muitas vezes quer executar, mas se sente inseguro em como fazê-lo.
Outro meio de formação é promover oportunidades de estágios em programas
de educação ambiental em andamento, quando o aprender fazendo pode ser
sempre uma estratégia enriquecedora.

3a Etapa: Produto
Avaliando as partes e o todo
Durante a fase Produto é possível verificar se os objetivos foram alcançados ou
não. Todo resultado é importante, pois se aprende tanto com às experiências
bem sucedidas quanto com as que não surtiram os efeitos esperados. Todos os
fatores devem ser considerados para que haja maior compreensão dos resulta­
dos. Trata-se de um desafio em que muitas vezes o processo é mais importante
do que os resultados propriamente ditos. Daí a importância da avaliação nos
diversos momentos do programa.

Jacobson (1991) considera a avaliação importante, podendo contribuir signifi­


cativamente para a educação ambiental ao analisar e interpretar dados relevan­
tes, referentes ao público e aos ambientes trabalhados. O estudo avaliativo
fornece dados que podem comprovar ou não o valor do próprio programa e
oferece oportunidades para melhoria e implementação de novas iniciativas. A
seguir são apresentadas as etapas do Produto.

a. Avaliação do processo

A avaliação oferece várias vantagens. Se as atividades ou estratégias forem


avaliadas durante a implementação do programa (avaliação formativa ou do

551
SU ZA N A M. PADUA
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M ARIA D A S GRAÇA S DE SO UZA

processo), haverá maiores possibilidades de melhorá-las. A avaliação formati­


va envolve a coleta das evidências necessárias durante a fase de elaboração e
de experimentação de iniciativas, de modo a permitir que as revisões tenham
por base essas evidências. Consiste na avaliação sistemática durante o proces­
so de elaboração do programa, de ensino e de aprendizagem, com o propósito
de aperfeiçoar quaisquer desses processos. Sendo assim, a avaliação formativa
permite o aperfeiçoamento de todo o processo educativo (Bloom, Hastings &
Madaus 1983). Quando não se consegue atingir resultados concretos, a avalia­
ção pode também ser útil para identificar as causas. E importante ter humilda­
de em reconhecer os erros para que se possa melhorar cada passo.

b. Avaliação dos resultados gerais

A avaliação do programa como um todo (avaliação somativa ou do produto)


tem a função básica de averiguar se os resultados correspondem aos objetivos
traçados. Trata-se de avaliação geral do grau em que os objetivos mais amplos
foram atingidos durante algum programa ou parte substancial dele (Bloom,
Fastings & Madaus 1983). Essa avaliação tem a finalidade de considerar o
produto da aprendizagem ou resultados de ensino no fim de um período.

Para mensurar a eficácia do que s.e fez, é importante comparar o antes e o


depois. Por isso, essa etapa deve ser pensada desde a fase de Planejamento.
Dentre os instrumentos de avaliação podem ser utilizados pré e pós-questio-
nários, entrevistas, observações ou registros fotográficos, pesagem de materi­
ais, como por exemplo o lixo.

A escolha de instrumentos a ser utilizados e a elaboração de roteiros para


levantamentos, devem estar diretamente relacionadas aos problemas, aos obje­
tivos e aos públicos envolvidos nos programas. Os instrumentos devem ser
testados previamente para que ajustes possam ser feitos, evitando distorções
ou a má compreensão da informação que se busca. Alguns exemplos de ques­
tionários e roteiro de entrevista podem ser «ncontrados nos Anexos 2 e 3.
Apresentam-se ainda no Anexo 4 algumas sugestões de referências bibliográfi­
cas agrupadas por temas.

c. Análise de resultados inesperados

Muitas vezes um programa de educação ambiental apresenta resultados ines­


perados que podem ser importantes contribuições para o tema/problema sele­
cionado. Por exemplo, proprietários de matas podem passar a protegê-las,
membros de comunidades locais podem contribuir para apagar incêndios flo­
restais, alunos podem estimular suas famílias a se envolverem em atividades

552
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

conservacionistas. Esses são resultados de grande importância que indicam a


adoção de comportamentos comprometidos com a conservação dpk natureza.

d. Busca de apoio

Os dados da avaliação podem ajudar na busca de apoio amplo, dentro das


próprias instituições e entre as comunidades envolvidas. Informações consis­
tentes podem aumentar as chances de se obter apoio para a continuidade de
programas ou para se dar início a novos. Dessa forma, avaliação é ferramenta
de fortalecimento para a área da educação ambiental.

e. Disseminação de resultados

Os resultados de programas de educação ambiental devem ser divulgados para


o mais amplo público possível. Outros educadores podem aprender e se ins­
pirar com as experiências analisadas. Pesquisadores podem passar a conside­
rar a educação ambiental como ferramenta importante para contribuir com as
diversas áreas do conhecimento. O públicc» em geral pode também se benefici­
ar se tiver acesso a informações estimulantes sobre a temática ambiental. Por
isso é de fundamental relevância que haja divulgação sobre programas de edu­
cação ambiental erri vários níveis, que podem incluir trabalhos técnicos, cien­
tíficos e de divulgação.

Considerações Finais
Como os problemas socioam bientais são muitos e o tempo parece curto, a
estruturação de programas educacionais pode economizar energia e recursos
de todos os envolvidos e propiciar resultados mais eficazes. Segundo Simões
(1995), o pragmatismo muitas vezes está direcionado a uma atuação emergen-
cial em relação ao quadro da degradação existente. Embora a educação ambien­
tal tenha a sua origem no enfoque da resolução de problemas e é o caráter
prático que lhe dá identidade, é imprescindível aprofundar essa reflexão buscan­
do significado para a prática. Daí a razão da importância da educação ambiental
buscar coerência teórica e metodológica. A metodologia apresentada neste arti­
go é uma das muitas utilizadas em programas de educação ambijental. Pode ser
adaptada para pesquisas qualitativa e quantitativa, de acordo com a situação
ou problema e os âmbitos do contexto.

553
SU ZA N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
M ARIA DAS GRAÇA S DE SO U Z A

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SU ZA N A M. PADUA
M A RLEN E F. TA BA N EZ
M ARIA D A S G RA Ç A S DE SO U ZA

Anexo 1
Exemplo da aplicação de uma metodologia de educação para a
conservação
Apresentamos, a seguir, a síntese de um programa de educação ambiental que
ilustra a utilização da metodologia PPP - Planejamento, Processo e Produto,
abordada neste capítulo.

* Publicado no CD ROM: M etodologias em E d u ca ção A m biental. Viçosa, MG:


Agromídia. 1999. j

Um Programa de Educação Ambiental para uma Espécie Ameaçada:


o mico-leão-preto (L e o n to p ith e cu s chrysopygu s)
♦ qS
Introdução
As espécies ameaçadas precisam de ajuda. Em geral quando se encontram em
riscos de desaparecimento é porque seu hábitat foi muito degradado ou a pró­
pria espécie superexplorada. Entretanto, regiões que têm espécies ameaçadas
podem tirar partido delas para elevar o orgulho das populações que vivem ao
seu redor. Especialmente espécies consideradas “belas” pelo ser humano con­
seguem conquistar uma popularidade bastante grande, se os programas de
educação souberem utilizar estratégias apropriadas. Tais espécies servem, en­
tão, como símbolos para despertar o interesse em conservação que pode rever­
ter em benefícios para todo o ecossistema onde se encontram. Com isso, todas
as espécies que vivem no mesmo ecossistema acabam sendo protegidas.

O programa de educação ambiental para o mico-leão-preto foi implantado em


1988 no Parque Estadual do Morro do Diabo (PEMD), unidade de conservação
administrada pelo Instituto Florestal de São Paulo. O programa utilizou o
modelo de avaliação contínua que possibilitou a verificação da eficácia de cada
etapa para seu aprimoramento. O modelo (proposto por Jacobson em 1991 e
adaptado por Padua desde-1991) pode ser dividido em três fases: Planejamen­
to, P rocesso e Produto (PPP)..O PPP facilitou a implementação do programa e a
adoção de atividades eficientes, economizando tempo e recursos. O “feedback”
periódico sobre a eficácia das atividades empregadas contribuiu muito para a
melhoria, a troca ou o abandono de atividades, de acordo com as respostas
obtidas. ‘

556
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

Planejamento
A fase P lanejam en to deve sempre iniciar com um levantamento da realidade
local, para que se possa estruturar o programa de acordo.

a. Levantamento do contexto
a.l. A rea lid a d e am bien tal

No levantamento inicial, o mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), um


dos primatas mais ameaçados de extinção do mundo, tornou-se uma estrela
com potencial para ser o símbolo do programa de educação. Seu hábitat, a
Mata Atlântica de Interior do Estado de São Paulo, foi grandemente devastado,
só sobrando cerca de 3% do que havia originalmente. A região, conhecida
como Pontal do Paranapanema, é pouco privilegiada e nos últimos anos foi
caracterizada pelos conflitos de posse de terra. Os desafios para conservar
uma espécie ameaçada são sempre numerosos. Mas, considerando os graves
problemas socioambientais dessa região, a educação ambiental proposta teria
que buscar uma eficácia ainda maior, pois tudo o que resta de mata precisa ser
preservado.

a.2. C onhecen do m elh o r a c o m u n id a d e .

0 contato com funcionários da unidade de conservação, comunidade e esco­


las foi de grande importância. Um levantamento inicial realizado através de
entrevistas com moradores de Teodoro Sampaio, a cidade mais próxima ao
Morro do Diabo, mostrou que o Parque e sua rica biodiversidade eram pratica­
mente desconhecidos ou mesmo desprezados pela população local. Os dados
indicaram também que a única espécie da fauna local mais conhecida era o
mico-leão-preto, pois devido à sua extrema raridade havia recebido alguma
atenção nacional e internacional. Esse fato facilitou a decisão de tornar esse
primata em símbolo do programa de conservação ambiental e a partir dele
valorizar as demais espécies que dificilmente conseguem receber atenção. As
entrevistas mostraram que muitos moradores locais acreditavam que animais
exóticos como tigres, elefantes, leões e ursos habitavam o Parque (Padua, 1991).
Outra constatação foi que apenas 15% havia ido à sede do Parque e 33% subi­
do o Morro do Diabof. apesar de morarem som ente a 12 Km da unidade de
conservação. Essas visitas tinham caráter recreativo e não educacional.

b. Levantamento dos potenciais locais


Dentro da unidade foi feito um levantamento dos recursos naturais do Parque,
identificando-se os valores a serem enfatizados no programa. As informações e

557
SU ZA N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
MARIA D A S GRAÇA S DE SO U ZA

visitas ‘in lo c o ’ ajudaram a definir trilhas e demais atividades que poderiam


ser implantadas. Em um primeiro momento, os recursos utilizados foram os
disponíveis na região. A administração do Parque cedeu funcionários para
serem capacitados como guias e muitos colaboraram para a implantação das
atividades do programa de educação ambiental. As placas interpretativas, por
exemplo, foram confeccionadas no próprio Parque com madeira disponível e
mão de obra dos funcionários, além de serem preparadas com informações
fornecidas pelos próprios guardas-parques, conhecedores da floresta. Esse
envolvimento contribuiu para o apoio interno ao programa, pois despertou
um senso de orgulho, já que seus familiares seriam os primeiros membros da
comunidade local a visitarem o Parque no programa educativo.

c. Definição dos objetivos


Os objetivos gerais do projeto incluem a proteção do mico-leão-preto e dos
fragmentos florestais onde a espécie se encontra, tendo para tal o apoio da
comunidade local. Como esses são objetivos muito abrangentes, foi necessário
definir objetivos específicos, objetivos que pudessem ser mensuráveis. Esses
incluem: o aumento de conhecimento sobre o mico-leão-preto e seu hábitat
maior sensibilidade da comunidade local para com a natureza e maior partici
pação na proteção das áreas naturais da região.

d. Identificação do público-alvo
O público-alvo foi composto por estudantes da região, mas muitas atividade:
foram deliberadamente dirigidas à comunidade em geral. Os objetivos especí
ficos incluíram: apresentar os alunos ao Parque e seus recursos naturais; fo
mentar uma apreciação do mundo natural; disseminar conhecimentos sobri
conceitos ecológicos; envolver a comunidade na conservação do Parque; tor
nar o programa estruturado para que sua continuidade pudesse ser assegura
da; e treinar alunos de segundo grau como guias de natureza. O treinamenti
incluiu ainda funcionários do Parque para garantir a continuidade do progra
ma e fomentar o envolvimento interno nas atividades educacionais.

e. Recursos locais e parcerias


Contatos com segmentos variados da sociedade local ajudaram a determinar a
necessidades, definir as diretrizes e obter apoios diversos. O objetivo foi, tam
bém, o de fomentar, através da troca de informações, a valorização não só d
Parque, mas de todos os fragmentos de Mata Atlântica da região, envolvendo
comunidade local em assuntos de conservação. Esse contato constante favort
ceu a obtenção de alguns recursos vindos da própria comunidade. Empresa:

558
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÁO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

bancos, cartórios, estabelecimentos de comércio e Prefeitura contribuíram com


materiais não disponíveis no Morro do Diabo, comq cópias de materiais edu­
cativos, prêmios para concursos, empréstimo de equipamentos para eventos,
entre outros. Além do apoio local, foram enviadas propostas a entidades
nacionais e internacionais sensíveis à causa conservacionista, para cobrir gasj
tos com itens como televiso*r e vídeo, um ônibus para transportar os estudan­
tes, combustível, projetor de slides, parte da construção de um centro de visi­
tantes, material de divulgação e o pagamento de alguns monitores e especialis­
tas em áreas específicas. O apoio do Instituto Florestal de São Paulo foi essen­
cial para a implantação do programa educativo.

f. Instrumentos de avaliação
Um delineamento de pesquisa foi elaborado com alunos expostos ao programa
(grupo experimental) para serem comparados a outros não participantes (gru­
po de controle). Esses alunos foram aleatoriamente separados nesses dois gru­
pos, aumentando assim a confiabilidade dos resultados. Os instrumentos de
avaliação foram questionários aplicados como pré-teste, pós-teste e teste de
retenção, o que possibilitou a comparação dos resultados nas três ocasiões. O
grupo de controle também respondeu aos questionários, permitindo uma com­
paração entre os dois grupos. Dessa forma, os resultados puderam ser estatis­
ticamente analisados, dando maior confiabilidade ao estudo.

Processo
Na fase Processo, ou de implantação, as atividades e estratégias foram criadas,
implementadas e constantemente avaliadas. Dessa forma, foi possível melho­
rar às atividades à medida que iam sendo implantadas.

a. Criação e implantação de atividades


Esse programa foi basicamente concebido com estratégias formais e não for­
mais de educação, em três etapas principais: pré-visita, visita e pós-visita.

a. 1. Pré-visita
A pré-visita incluiu a elaboração e distribuição de material didático para os
professores, que compreendia uma série de quatro apostilas, cada uma enfo­
cando aspectos regionais distintos: história, geografia, flora e fauna, e clima.
Para os alunos, foi apresentada uma palestra nas escolas, como preparação à
visita, mostrando o Parque e áfeus recursos naturais. Na palestra foram utiliza­
das técnicas audiovisuais como “slides” e cartazes e encorajou-se a participa­
ção dos espectadores por meio de perguntas, imitações de animais e debates.

559
SU ZA N A M. PADUA
.M A RL E N E F. TA BA N EZ
M ARIA D A S GRAÇA S DÈ SO UZA

O conteúdo incluiu conceitos ecológicos, éticos e modos adequados de com­


portamento quando em contato com a natureza.

a. 2. Visita

Na segunda etapa, os alunos visitaram o Parque, percorrendo três trilhas inter-


pretativas monitoradas, cada uma enfocando conteúdos diferentes. Foram apre­
sentados conceitos ecológicos como a diversidade das florestas tropicais e a
interdependência dos elementos da natureza com exemplos como cadeia ali­
mentar, nichos ecológicos e especificidade de territórios. Além de temas ecoló­
gicos, a história e a geografia regionais também foram abordadas no percurso
das trilhas.

Um centro de visitantes com um pequeno museu foi implantado, inicialmente


para exibir materiais simples da natureza como ninhos abandonados ou peda­
ços de ossos de animais. Aos poucos a exposição foi enriquecida com contri­
buições doadas pela empresa Centrais Elétricas de São Paulo - CESP e por
membros da comunidade. Animais encontrados mortos foram empalhados para
que pudessem ser observados pelos visitantes. Placas educativas contavam
histórias de como esses animais haviam morrido e de como os visitantes pode­
riam evitar essas mortes: não deixando lixo que poderia iniciar um incêndio
ou ser ingerido por animais da mata; evitando a caça e o consumo de produtos
oriundos da vida silvestre; e reduzir a velocidade dos carros quando próximo
ao Parque.
O levantamento inicial evidenciou que a maioria das pessoas (mais de 95%)
mataria cobras se as encontrasse. A fim de reverter essa atitude, o programa
manteve três cobras vivas, que podiam ser tocadas e estudadas pelos visitantes.

a. 3. Pós-visita

As estratégias de pós-visita visaram reforçar os conceitos transmitidos na ca­


minhada com atividades e materiais educativos para serem empregados em
sala de aula. O material constava de charadas, palavras cruzadas, textos, poe­
mas e jogos. A equipe de educação promoveu atividades extras como concur­
sos de desenho e redação, sempre enfocando aspectos da Mata Atlântica de
Interior. A equipe promoveu ainda jogos com conceitos ecológicos, simula­
ções e debates, de acordo com a faixa etária dos alunos.

a. 4. A tividades a d icio n a is

Atendendo a demandas, vários cursos para professores foram ministrados com


o objetivo de torná-los mais aptos a ensinar sobre valores socioambientais

560
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

locais. A abordagem multidisciplinar incluiu ciências, língua portuguesa, his­


tória, geografia, educação artística e matemática.

Além do programa para estudantes, foram realizadas atividades para envolver a


comunidade, tais como competições de artes, gincanas e maratonas, entre ou­
tras. A rádio local contribuiu sobremaneira para divulgar os eventos comunitá­
rios, além de se tornar um meio muito eficaz de transmitir para o público concei­
tos de conservação que reforçavam o orgulho pelo Parque do Morro do Diabo.

b. Avaliação do processo
Todas as atividades foram avaliadas periodicamente, fornecendo à equipe de
educação informações quanto à sua qualidade e adequação ao respectivo pú­
blico. A avaliação formativa, ou aquela adotada durante a implantação do pro­
grama, serviu para manter, aprimorar ou mudar completamente as linhas de
ação e adequar o conteúdo ao público-alvo. A metodologia de avaliação utiliza­
da foi a aplicação de questionários com perguntas simples e diretas. A quali­
dade do programa pode, portanto, ser monitorada, aumentando as chances de
se criar condições favoráveis ao aprendizado e às mudanças de atitude em
relação à natureza.

c. O cronograma de execução
A fim de organizar as atividades a serem desenvolvidas, foi elaborado um
cronograma que incluiu as diferentes etapas. A prática mostrou que, quanto
mais detalhado o cronograma, mais fácil pode ser a implantação das partes que
compõem o programa. Um exemplo de cronograma foi inserido a seguir para
ajudar a visualização de algumas atividades:

0 cronograma deve sempre ser adequado ao programa específico, com os deta­


lhes correspondentes. Desta forma, o educador terá uma ferramenta de organi­
zação e direcionamento de suas atividades. No entanto, é importante que haja
flexibilidade em relação a prazos assim como se aproveitem oportunidades
que possam surgir no decorrer do processo. Muitas vezes fatos imprevistos
podem contribuir para o programa como um todo e o fato de não terem sido
previstos não significa que não devam ser contemplados. Por exemplo, se houver
a visita de um especialista sobre um tema de importância, pode-se organizar
uma palestra ou um debate. O educador deve, portanto, manter uma postura
alerta, a fim de enriquecer suas ações e o programa que coordena, tornando o
todo mais atraente e estimulante.

561
SUZA N A M. PADUA
MARLEN E F. TA BA N EZ
MARIA D AS GRAÇA S DE SO U Z A

Tabela 1: Modelo de cronograma de atividades para um programa de educação ambiental.

Atividades /Meses - 1998 J F M A M J J A s 0 N D


Levantamentos X X X
Visitas às escolas X X X X X X X X X X X X
Cursos
Professores X X
Adolescentes X . X
>
Abertura de trilhas educativas X X X
Testagem das trilhas (melhoria) X X
Elaboração de materiais didáticos X X
Testagem de materiais (melhoria) X X
Eventos X X X X X
Rádio (entrevistas) X X X X
Jornais (artigos) X X
Avaliação X X X X X X X X X X X X
Divulgação dos resultados
Elaboração de artigos diversos X X X
Por meios diversos (mídia) X X X X X X

d. Capacitação
Uma vez que o programa para o mico-leão-preto começou do zero, não havia
equipe capacitada para desempenhar papéis como guias ecológicos, palestran­
tes ou demais funções necessárias. A capacitação começou com adolescentes
voluntários, através de dias de estudo e trocas de informações. Aos poucos,
esses voluntários tornaram-se estagiários e, como o programa foi criado com
participação e palpite de todos, sempre houve grande envolvim ento e entu­
siasmo em melhorar o desempenho pessoal, que reflete no programa como um
todo. Em pouco tempo os professores da região começaram a demandar cursos
de capacitação. Desde então, cursos têm sido oferecidos continuamente a pro­
fessores em diversas regiões onde o mico se encontra.

562
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

Produto

a. Resultados esperados

A fase Produto do programa de educação incluiu uma avaliação somativa, útil


para detectar sua eficácia e averiguar se os objetivos haviam sido atingidos.
Através de um delineamento de pesquisa, alunos expostos ao programa (grupo
experimental) puderam ser comparados a outros que não participaram (grupo
de controle). Nessa avaliação, 144 alunos de 5a a 8a séries foram aleatoriamente
separados em grupo experimental e grupo de controle, respondendo a questio­
nários em três ocasiões: pré-teste, pós-teste e teste de retenção. Os questionários
consistiram de dezenove perguntas idênticas nas três ocasiões, classificadas com
pontuações pré-estabelecidas, sendo o valor máximo possível 83 pontos e o
mínimo 19. Através de análises estatísticas, os resultados e as variáveis pude­
ram ser comparados (grupo experimental e grupo de controle, séries e sexos).

b. Análise dos resultados esperados

Uma vez que esse estudo serviu como dissertação de Mestrado, foram feitos
vários testes estatísticos para que os resultados pudessem ser melhor analisa­
dos. Esse não é um procedimento muito usual, mas mostra como um programa de
educação ambiental pode utilizar mecanismos mais estruturados de avaliação.

Uma análise de variância mostrou que não havia diferença entre os grupos no
pré-teste, o que indica que inicialmente todos tinham o mesmo nível. Entretan­
to, uma diferença significativa foi observada no pós-teste e no teste de retenção,
o que indica a eficácia do programa, ou seja, os alunos expostos ao programa
responderam com muito mais acertos do que o grupo que não participou (con­
trole). A Tabela 2 indica diferenças significativas no pós-teste e no teste de reten­
ção entre os grupos e entre as séries, mas não detectadas entre os sexos.

Tabela 2: Análise de variância.

Fonte de Somas de Graus de Quadrados F observ.


variação quadrados liberdade médios
Entre tratamentos 143

Grupo 9300.06 1 9300.06 * 98.29


Sexo 70.90 ' ( 1 70.90 0.75
Série 1872.32 3 624.10 * 6.60
Erro 13057.14 138 »

F significativo à razâo de p < .05 - representado por *.

563.
SU ZÁ N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
MARIA D A S GRAÇA S DE SO U Z A •

Um outro teste conhecido como Scheffé compara as médias individuais simul­


taneamente, em lugar de sequencialmente ao nível < .05, seguido de um valor
de F proporcional. A Tabela 2 mostra os resultados do teste Scheffé, em que o
pré-teste não apresentou diferenças entre os grupos de controle e experimen­
tal, mas o pós-teste e o teste de retenção, sim.

Tabela 3: Teste Scheffé para exame das relações entre as variáveis.

Médias

Variáveis Pré-teste Pós-teste Retenção

Grupos
Experimental N=70 61.65 76.5 76.04
Controle N=74 60.33 60.58 62.94

Sexo
Meninas = 68 * 59.73 68.64 69.70
Meninos = 76 * 62.09 68.02 68.9

Séries
8a - 7a 1.74 1.95 -0.85
8a - 6a 3.85 * 6.28 * 4.65
8a - 5a * 5.48 * 9.98 * 9.55
7a - 6a 2.11 * 4.32 3.80
7a - 5a 3.74 * 8.02 * 8.70
6a - 5 a 1.62 3.69 * 4.9

Diferenças significativas a 0.05 - representadas por *


N = número de estudantes

E interessante observar que entre meninos e meninas só apareceram diferen­


ças no pré-teste, com os meninos obtendo médias superiores às meninas. As
diferenças desapareceram, no entanto, nas demais ocasiões. Houve, também,
diferenças significativas entre séries, principalmente entre a quinta e â oitava.

A utilização de análises estatísticas nesse estudo contribuiu para evidenciar a


eficácia do programa de educação ambiental para o mico-leão-preto, mostran­
do resultados de ganhos cognitivos e mudanças de valores entre os alunos
participantes. Essa metodologia serve, também, para ampliar a credibilidade
da área da educação ambiental, que por seu poder de transformação necessita
de maior apoio em órgãos nacionais e internacionais.

564
A ABO RD AGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

b. Resultados inesperados

0 programa de educação ambiental para o mico-leão-preto teve alguns resulta­


dos inesperados que mostram o envolvimento da comunidade com a proteção
do Parque ou d e áreas d e florestas da região. Em 1992, p e la prim eira vez h ou v e
um empenho maciço da população local em ajudar os guardas-parques a apaga­
rem fogo no Parque, apesar de numerosos incêndios já terem ocorrido no
passado. A população m anifestou-se também contra o lixo da cidade, que
começou a ser d e p o s ita d o em área a d ja cen te a o Parque, p o r m e io d e cartas e
telefonemas às autoridades locais, forçando uma solução ambientalmente ade­
quada para o problema. Em outra ocasião, a população teve a coragem de ir
contra um desmatamento ilícito de um fragmento significativo de Mata Atlân­
tica de Interior, hábitat dos micos-leões-pretos. O proprietário foi multado e a
serraria responsável por receber as toras de madeira foi fechada, apesar de
pertencer a político da região.
0 programa de educação despertou na população local um interesse pela bus-
ca de alternativas de desenvolvimento que trazem benefícios para a região. Em
meados de 1989, os pesquisadores do Projeto Mico-Leão-Preto foram convoca­
dos por lideres comunitários para uma conversa sobre os destinos do m unicí­
pio de Teodoro Sampaio e da região do Pontal do Paranapanema. Dessa conver­
sa nasceu o Conselho de Desenvolvimento e Progresso de Teodoro Sampaio -
CONDEPRO, que, além de ações conservacionistas, representou uma oportu­
nidade ímpar de diálogo com a comunidade local.

c. Busca de apoio
Uma vez que o programa para o mico-leão-preto teve resultados concretos,
tanto esperados como inesperados, foi possível buscar apoio dentro do Insti­
tuto Florestal de São Paulo e instituições financiadoras. Os dados obtidos
através das avaliações facilitaram a argumentação porque ofereceram indicado­
res de eficácia. Portanto, a avaliação e a análise dos dados foi de grande valia.

Considerações Finais
0 programa descrito está longe de ser um processo acabado, pois é a sua
própria dinâmica que o faz evoluir. Entretanto, muitas das metas conservacio-
nistas têm sido atingidas, o que indica que a combinação de pesquisa, educa­
ção e envolvimento comunitário forma um modelo eficaz para a conservação
da natureza. Toda iniciativa que contribui para a conservação deve ser busca­
da, já que as pressões sobre a natureza são muitas e o tempo para encontrar
soluções parece cada vez mais curto.

565
SUZA N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
M ARIA D A S GRAÇAS DE SO U ZA

Anexo 2
Exemplo de questionários utilizados na pesquisa
“Avaliação de trilhas interpretativas para educação ambiental”**
Apresentamos, a seguir, modelo de pré e pós-questionários utilizados para
avaliação de trilha interpretativa na Estação Ecológica dos Caetetus, aplicados
com a finalidade de mensurar sua eficácia educacional.

* * Parte da publicação: Tabanez, et al. 1997. Avaliação de trilhas para educa­


ção ambiental. In: Padua, S. & Tabanez, M.F. (Organizadoras). E d u c a ç ã o am ­
b ie n t a l: c a m in h o s tr ilh a d o s n o B ra sil. Brasília: IPÊ - Instituto de Pesquisas
Ecológicas, p. 89-102.

Modelos de pré e pós-questionários


Questionários são instrumentos de coleta de dados que podem ser utilizados
em programas de educação tanto para fins técnicos como para fins científicos.

Questionário, segundo Nogueira (1964), “é uma série de perguntas organiza­


das com o objetivo de levantar dados para uma pesquisa, cujas respostas são
fornecidas pelo informante ou pesquisado sem a assistência direta ou orienta­
ção do investigador” (p. 120). Segundo o autor, o grau de validade das respos­
tas é maior para as perguntas referentes a dados objetivos e concretos, sendo
menor para perguntas relativas a atitudes e estimativas.

Respostas muito detalhadas podem levar a erros, sendo conveniente evitar


perguntas que impliquem respostas minuciosas que possam ser importantes à
pesquisa. Deve-se evitar perguntas que insinuem a própria resposta ou per­
guntas que induzam a generalizações ou inferências.

Nogueira (1964) sugere ainda algumas regras para a formulação de perguntas


de um questionário:

• serem reduzidas em número;


• exigirem resposta numérica ou um simples sim ou não;
• serem bastante simples e de fácil compreensão;
• serem de tal natureza que possam ser respondidas sem subterfúgios;
• não serem desnecessariamente indiscretas;
• confirmarem umas às outras;
• cobrirem diretamente os pontos em relação aos quais há necessidade de
in form ação.

Um questionário pode ser composto por “perguntas fechadas” e “perguntas

566
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

abertas”, a primeira com possibilidades relativas de respostas e a segunda com


maior liberdade de expressão. Os questionários devem ser cuidadosamente
testados antes de serem aplicados para o estudo em questão. Isto evita a perda
de tempo, dinheiro e material, que em última análise significa prejuízo para a
pesquisa.

Pré-questionário
Trilha Interpretativa do Jatobá - Estação Ecológica dos Caetetus

1- Nome:______________________________________________ 2- Idade:_____________
3- Sexo: M ( ) F ( )
4- Nome da Escola:______________________________________ 5- Série:_____________
6- Cidade:______________________________________________________________ _ _ _

7- Você já conhecia a Estação Ecológica dos Caetetus:


{ ) sim ( ) não
Se sim, você conheceu por meio de:
( ) visita à Estação Ecológica
( ) folheto da Estação Ecológica
( ) posters sobre o mico-leão-preto
( ) reportagens sobre a Estação Ecológica
( ) comentários de pessoas que a conhecem
( ) outros. Quais?____________________________________________________________

8- Você acha importante existir um local como a Estação Ecológica dos Caetetus?
( ) sim ( ) não
Por quê?____________________________________________________________________

9- Cite as características de Mata Atlântica de Interior:


( ) parte das folhas caem em determinada época' do ano
( ) o solo é rico e fértil
( ) possui espécies endêmicas (espécies que só existem neste ecossistema)
( ) nela vive o tamanduá-bandeira
( ) existem poucas espécies animais e vegetais

10- Explique com suas palavras o que você entende por Biodiversidade.

11-Monte uma cadeia alimentar usando os organismos citados abaixo:


cobra, planta, coelho, inseto, onça, gavião, homem, rato.

1 2 -0 que acontece com as árvores e animais que morrem numa floresta?

13-Dê 2 exemplos diferentes de como pode ocorrer a polinização das plantas numa
floresta:____________________________________________________________•________

567
SU ZA N A M. PADUA
M ARLEN E E TA BA N EZ
M ARIA D A S GRAÇA S DE SO U Z A

14- Cite 5 nomes de árvores que existem na Estação Ecológica dos Caetetus:

15- Cite 5 nomes de animais que vivem na Estação Ecológica dos Caetetus:

16- Extinção é:

17- Se você encontrasse algum desses animais da mata, o que faria?


levo para não o mato levo para outra co isa,
criar perturbo vender o que?
tamanduá
cobra
aves
veado
mico-leão
macaco
anta

18- Você poderia citar 3 causas para um animal ficar ameaçado de extinção:

19- Existe algum animal ou planta ameaçado de extinção na Estação Ecológica dos
Caetetus?
( ) sim ( ) não
Quais: _____________________________________

20- Hoje você vai conhecer a Trilha Interpretativa do Jatobá. O que você espera encon­
trar nessa Trilha (pode anotar mais de uma alternativa)?
( ) cipós ( ) vestígios de animais
( ) fungos ( ) flores
( ) árvores grandes ( ) frutos
( ) árvores pequenas ( ) árvores mortas
( ) animais ( ) “toca de animais”
( ) outras, quais:

21- A Mata Atlântica de Interior para você tem:


( ) muito valor ( ) pouco valor ( ) nenhum valor

22- Seu interesse na conservação da Mata Atlântica de Interior é:


( ) muito grande ( ) pouco ( ) nenhum

23- Você gostaria de receber algum material impresso sobre a Trilha?


( ) sim ( ) não
Que tipo?______________________________________________________

24- Comentários:_______________________________________________

568
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA ED UCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

Pós-questionário
Trilha Interpretativa do Jatobá - Estação Ecológica dos Caetetus

1- Nome:________________________

2- Você acha importante existir um local como a Estação Ecológica dos Caetetus?
^ ( ) sim ( ) não
Por quê?____________________________________________________________ ________

3- Cite as características de Mata Atlântica de Interior:


( ) parte das folhas cai em determinada época do ano
( ) o solo é rico e fértil
( ) possui espécies endêmicas (espécies que só existem neste ecossistema)
( ) nela vive o tamanduá-bandeira
( ) existem poucas espécies animais e vegetais

4- Explique com suas palavras o que você entende por biodiversidade.

5- Monte uma cadeia alimentar usando os organismos citados abaixo:


cobra, planta, coelho, inseto, onça, gavião, homem, rato.

6- O que acontece com as árvores e animais que morrem numa floresta?

7- Dê 2 exemplos diferentes de como pode ocorrer a polinização das plantas numa


floresta:

8- Cite 5 nomes de árvores que existem na Estação Ecológica dos Caetetus:

9- Cite 5 nomes de animais que vivem na Estação Ecológica dos Caetetus:

10- Extinção é:

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SU ZA N A M. PADUA
MARLEN E F. TA BA N EZ
MARIA D A S GRA ÇAS DE SOUZA

11- Se você encontrasse algum desses animais da mata, o que faria?


levo para não o mato levo para outra coisa,
criar per urbo vender o que ;
tamanduá
cobra
aves
veado
mico-leão
macaco
anta

12- Você poderia citar 3 causas para um animal ficar ameaçado de extinção?

13- Existe algum animal ou planta ameaçado de extinção na Estação Ecológica dos
Caetetus?
( ) sim ( ) não

14- Hoje você conheceu a Trilha Interpretativa do Jatobá. O que você encontrou nesta
Trilha (pode anotar mais de uma alternativa)?
( ) cipós ( ) vestígios de animais
( ) fungos ( ) flores
( ) árvores grandes ( ) frutos
( ) árvores pequenas ( ) árvores mortas
( ) animais ( ) “toca de animais”
( ) outras, quais: i

15- A Mata Atlântica de Interior para você tem:


( ) muito valor ( ) pouco valor ( ) nenhum valor

16- Seu interesse na conservação da Mata Atlântica de Interior é:


( ) muito grande ( ) pouco ( ) nenhum

17- Você achou a Trilha do Jatobá:


( ) excelente ( ) longa
( ) regular ( ) curta

18- Na Trilha do Jatobá você se sentiu:


( ) bem ( ) cansado
( ) interessado ( ) sem interesse

19- Você gostaria de voltar à Trilha do Jatobá?


( ) sim ( ) não Por quê?___________________

20- O que você mais gostou nesta Trilha:______________________

570
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

21- O que você menos gostou nesta Trilha:_____________________

22- Qual nota você daria para a Trilha do Jatobá?


( ) A - ótima ( ) B - boa ( ) C - média ( ) D - fraca

23- Você seria monitor da Trilha do Jatobá?


( ) sim ( ) Não
Por quê?___________________________________________________

24- Quais sugestões você daria para melhorarmos nossa Trilha?

571
SUZA N A M. PADUA
M ARLEN E E TA BA N EZ
MARIA D AS GRAÇA S DE SO U ZA

Anexo 3
Exemplo de entrevista utilizada na pesquisa “Significado para
professores de um programa de educação ambiental em unidade de
conservação ”***
Apresentamos, a seguir, modelo de roteiro de entrevista semiestruturada utili­
zada para avaliação do programa de educação ambiental desenvolvido com
professores de ensino fundamental e ensino médio na Estação Ecológica dos
Caetetus.
* * * Parte da publicação: Tabanez, M.F. 2000. Significado p a ra professores
de um program a de edu cação am bien tal em unidade de conservação. São
Carlos: UFSCar, 313 p. Dissertação (Mestrado em Educação) Programa de Pós-
Graduação em Educação.

Modelo de roteiro de entrevista


Entrevistas são utilizadas para coletar dados descritivos na linguagem dos
participantes de uma pesquisa. A entrevista possibilita maior aprofundamen­
to acerca de informações obtidas com pesquisados, por seu caráter de intera­
ção entre pesquisador e participante (Bogdan & Biklen 1994). Segundo Lüdke
& André (1986, p.33), “na entrevista, a relação que se cria é de interação,
havendo atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem res­
ponde”.
Para Alves-Mazotti & Gewandsznajder (1998) a entrevista, por sua natureza
interativa, permite tratar de temas complexos que dificilmente poderiam ser
investigados adequadamente através de questionários, explorando-os em pro­
fundidade.

Roteiro de entrevista
I- Dados Pessoais

1. Nome:

2. Formação Acadêmica:

3. Tempo que está no magistério:

4. Disciplina(s) que leciona:

5. Série(s) que leciona:

6. Escola(s) onde leciona:

572
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

II- Concepções de Meio Ambiente e Educação Ambiental


1. O que você entende por meio ambiente?

2. O que você entende por educação ambiental?

III- Interesse por educação ambiental


1. Fale como surgiu seu interesse por educação ambiental?

2. Você desenvolve alguma atividade de educação ambiental com seus alunos?


Se positivo, fale sobre os temas / conteúdos, avaliação e resultados.

IV- Educação Ambiental na Estação Ecológica dos Caetetus


1. O que a Estação Ecológica dos Caetetus representa para você?

2. Na sua opinião, qual a importância de se manterem áreas de conservação da


natureza?

3. Por que você procura o programa de educação ambiental da Estação Ecológi­


ca dos Caetetus?

4. Em que momento da sua disciplina vocé procura a Estação Ecológica dos


Caetetus? Relação com os temas desenvolvidos em sala de aula?

5. Você costuma fazer uma preparação dos seus alunos para a visita à Estação
Ecológica dos Caetetus? Como é essa preparação?

6. Como se dá a sua participação no programa de educação ambiental da Esta­


ção Ecológica dos Caetetus? E dos seus alunos?

7. Você faz avaliação das atividades desenvolvidas na Estação Ecológica dos


Caetetus? Como é feita? Resultados obtidos?

8. Continuidade das atividades realizadas na Estação Ecológica dos Caetetus


com seus alunos em sala de aula. Como?

9. Significado do programa de educação ambiental da Estação Ecológica dos


Caetetus para você?

10. Pontos relevantes e irrelevantes do programa de educação ambiental da


Estação Ecológica dos Caetetus?

11. Contribuições que você pode dar ao programa de educação ambiental da


Estação Ecológica dos Caetetus.

573
SUZA N A M. PADUA
M ARLEN E F. TA BA N EZ
M ARIA DAS GRAÇA S DE SO U ZA

Anexo 4
Algumas referências bibliográficas de apoio
Apresentamos algumas referências bibliográficas de apoio, procurando
agrupá-las por temas, a saber: pesquisa qualitativa; avaliação quantitativa;
abordagem participativa e Método PPP.

Referências bibliográficas de apoio


Pesquisa qualitativa
Alves, A. J . 1991. O planejam ento de pesquisas qualitativas em educação. C a d e r n o s de
P e s q u is a , v.77, mai, p .53-61.

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São Paulo: Pioneira, 2 0 3 p .
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Barbier, M. 1 9 8 5 .P e s q u is a - a ç á o n a in s t itu iç ã o e d u c a t iv a . Rio de Janeiro: Zahar.

Bloom, B.; Hastings, J.T. & Madaus, G. F. 1983. M a n u a l d e a v a l i a ç ã o f o r m a t i v a e s o m a tiv a


d o a p r e n d i z a d o e s c o l a r . Trad. Lílian, R.Q.; Florez, M. C. R. F. & Vanzolini, M. E. São Paulo:
Livraria Pioneira Editora, 307 p.

Bogdan, R. & Biklen, S. K. 1994. I n v e s t i g a ç ã o q u a l i t a t i v a e m e d u c a ç ã o : u m a a b o r d a g e m à


t e o r i a e a o s m é t o d o s . Trad. Maria João Alvarez; Sara Bahia dos Santos & Teimo Mourinho
Baptista. Porto, Portugal: Editora Porto, 336p.

Borda, O. F. 1983. Aspectos teóricos da pesquisa participante: considerações sobre o significado


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São Paulo: Editora Brasiliense, 3 ed., p.42 - 62.

Brandão, C. R. (Org.) 1983. P e s q u is a p a r t ic ip a n t e . São Paulo: Editora Brasiliense, 3 ed.,


211p.

Brandão, C. R. (Org.) 198 4 . R ep en san d o a p e s q u is a p a r tic ip a n te . São Paulo: Editora


Brasiliensef

Carvalho, L. M. 1994. Falta sistematizar melhor as avaliações de EA. E d u c a d o r A m b ie n ta l. N°


2. p.4.

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Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Educação Ambiental. Educação Ambiental:
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Demartini, Z. B. E 1988. História de vida na abordagem de problemas educacionais. I n : Simson,


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Demo, P. 1971. M e to d o lo g ia c ie n t íf ic a e m c i ê n c i a s s o c ia is . São Paulo: Atlas.

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Associados

Depresbiteris, L. 1999. A v a l i a ç ã o E d u c a c i o n a l e m T r ê s A to s . São Paulo: SENAC. 102p.

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574

I
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

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Gatti, B. (Org.) Alternativas metodológicas para a pesquisa educacional. C a d e r n o s d e P e s q u is a .


Fundação Carlos Chagas, n. 40, fev. 1992.
Guba, E. G. & Lincoln, Y. S. 1981. E f f e c t i v e e v a lu a tio n . San Fransçisco, California, Jossey-
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Haguette, T.M.F. M e to d o lo g ia s q u a lit a tiv a s n a S o c io lo g ia . Petrópolis: Vozes, 1987.

Hoffmann, J. M. L. 1998. P o n to s e c o n tr a p o n to s : d o p e n s a r a o a g ir em a v a lia ç ã o . Porto


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Kaplan, A. A. 1969. A c o n d u ta , n a p e s q u is a . São Paulo: Herder / EDUSP.

Kerlinger, F. N. 197 9 . M e t o d o l o g i a d a p e s q u i s a e m c i ê n c i a s s o c i a i s : um tra ta m e n to


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Maroti, Paulo S. 1997. P e r c e p ç ã o e E d u c a ç ã o A m b ie n ta l V o lta d a s a u m a U n id a d e N a tu r a l
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575
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M ARLEN E E TA BA N EZ
MARIA DAS GRAÇAS DE SO U Z A

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Bloom, B., Hastings, J.T., Madaus, G.F. 1983. M a n u a l d e a v a l i a ç ã o f o r m a t i v a e s o m a t i v a do
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San Franscisco, London: Jossey-Bass Publishers.
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Tabanez, M.F.; Padua, S. & Souza, M. G. 1977. A eficácia de um curso de educação ambiental

576
A ABORDAGEM PARTICIPATIVA
NA EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

não formal para professores numa área natural - Estação Ecológica dos Caetetus - SP. R e v is ta
v.8, n .l, p,71-88.
do I n s t i t u t o F l o r e s t a l ,

Tabanez, M. F.; Padua, S. Aí.; Souza, M. G.; Cardoso, M. M. & Gurgel, L. M. A. 1997. Avaliação
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Técnicas de coleta de dados


Festinger, L. & Kàtz, D. A. 1960. A p e s q u is a n a p s ic o lo g ia s o c ia l. São Paulo: Nacional.

Nogueira, O. 1964. P e s q u i s a 's o c i a l : in tro d u ç ã o à s s u a s té c n ic a s . São Paulo: Com panhia


Editora Nacional, 209 p.

Abordagem participativa e Método PPP


Padua, S. 1997. C e r r a d o C a s a N o s s a : u m p r o je t o d e e d u c a ç ã o a m b i e n t a l <fò J a r d i m B o t â n i c o
de B r a s í l i a . Brasília.

Padua, S. 1997. Uma pesquisa em educação am biental: a conservação do mico-leão-preto


(L eon top ith ecu s ch ry so p y g u s). In: Valladares-Padua, C., Bodm er, R. (O rgs.). M a n e j o e
C o n s e r v a ç ã o d e V i d a S i l v e s t r e n o B r a s i l , p. 34-42.

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U n id a d e s d e C o n s e r v a ç ã o . I n : E d u cação, M eio A m biente e C id adania - re fle x õ e s e
e x p e r iê n c ia s . S ã o P a u lo : S e c r e t a r i a d e M e io A m b ie n te d e S ã o P a u lo , p . 3 9 - 4 2 .

Padua, S., Tabanez, M. 1997. Uma abordagem participativa para a conservação de áreas naturais:
educação ambiental na Mata Atlântica. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE UNIDADES DE
CONSERVAÇÃO, 1, Curitiba-Pr, 15 a 23 de novembro. Curitiba, v.2, p. 371-379.

Padua, S., Tabanez, M.F. (Orgs.). 1997. E d u c a ç ã o A m b i e n t a l : C a m in h o s T r ilh a d o s n o B r a s il.


Brasília: IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas, 283 p.
Padua, S. et al. 1998. Participation: a key elem ent for com munity involvement. In: ANNUAL
C O N F E R E N C E O F T H E N O R T H A M E R IC A N A S S O C IA T O N F O R E N V IR O N M E N T A L
E D U C A T IO N , 27, NAAEE, Atlanta (Publicação em CD).

577
II Análise da sustentabilidade de caça
em florestas tropicais no Peru - Estudo de caso
Richard E. Bodmer
Durrell Institute of Conservation and Ecology, University of Kent, England

John G. Robinson
Wildlife Conservation Society, USA

Introdução
A caça de animais selvagens é uma atividade importante para as comunidades
rurais nas regiões Neotropicais, onde esse tipo de prática é permitido pela
legislação em vigor.1 (Robinson & Redford 1991, Robinson & Bennett 2000). A
sustentabilidade dessa caça é importante para oferecer benefícios em longo
prazo para essas comunidades que vivem da caça e também para a conservação
das espécies e ecossistemas (Swanson & Barbier 1992, Freese 1997).

Durantç a última década, vários estudos avaliaram a sustentabilidade da caça


de animais selvagens ocorrida nos Neotrópicos (Vickers 1991, Ojasti 1991,
Fitzgerald et al. 1991, Bodmer 1994, Townsend 2000, Peres 2000, Mena et al.
2000, Hill 2000, Alvard 1998, Leeuwenberg & Robinson 2000, Jorgenson 2000,
entre outros). Muitos desses estudos mostram que a caça de algumas espécies
não está sendo realizada de maneira sustentável. Em contraste, em áreas onde
há manejo ou nos locais onde ela é limitada, espécies podem ser caçadas de
maneira sustentável (Ojasti 1991, Alvard 1998, Bodmer & Puertas 2000). Para
espécies com taxas reprodutivas mais altas, como por exemplo, os porcos-do-

1 Nota dos editores: A atividade de caça no Brasil - sem a devida permissão - é proibida por
lei federal (N° 9.605 - Lei dos Crimes Ambientais de Fevereiro de 1998), sendo considerada
crime ambiental. Entretanto, conforme ressaltado por Lourival e Fonseca (1997), defronta­
mo-nos constantemente com uma situação de contrassenso, já que tal delito é praticado
diuturnamente, sem a possibilidade de fiscalização, monitoramento ou controle, principal­
mente no que se refere à caça tradicional de subsistência, escopo deste capitulo. A legisla­
ção referente ao tema nâo encontra ressonância nas realidades regionais e prova disso pode
ser encontrada em Almeida (1992) e Peres (2000) apontando a relevância da fauna para as
pequenas comunidades que ocupam áreas extrativistas da Amazônia brasileira. Este capítu­
lo apresenta uma metodologia para avaliar sistematicamente a sustentabilidade do modelo
de caça de subsistência praticado na Amazônia peruana, onde a caça de subsistência encon­
tra amparo legal.

579
RICH ARD E. BO D M ER
JOHN G. RO BIN SO N

mato, veados e roedores, a pressão de caça parece estar dentro dos limites
da sustentabilidade. Por outro lado, para espécies com taxas reprodutivas
mais baixas, como primatas e antas, a caça raram ente parece ser sustentável
(Bodmer et al. 1997). Este capítulo focalizará métodos utilizados para avaliar a
sustentabilidade da caça de animais selvagens nas florestas tropicais

Como avaliar a sustentabilidade


Para avaliar a sustentabilidade da caça é necessário observar os seguintes itens
(Robinson & Bodmer 1999):

1. Definir os lim ites, em termos de espaço físico, espécies capturadas e o


período de tempo. Espaço físico pode ser, por exemplo, parques ou reservas
extrativas, uma área específica dè um projeto, um estado ou uma região. Em
alguns casos, a caça de uma única espécie pode ser avaliada. Em outros casos,
grupos de espécies podem ser avaliados. E importante fixar o período de ava­
liação da sustentabilidade da caça, ou seja, se esta é praticada ém curto ou
longo prazo.

2. Dar uma definição exata do “uso sustentável” para o recurso da vida selva­
gem. Algumas definições - como, por exemplo, aceitar que a caça é sustentável
quando a população da espécie é sadia e estável, quando analisada - são mui­
to gerais. Outras definições, no entanto, podem ser específicas a certos mode­
los quantitativos: um modelo de caça para espécies de vida curta, pot exem­
plo, pode ser definido como sustentável quando menos de 40% dos indivíduos
são extraídos da população total.

3. Esclarecer bem a hipótese nula. Em geral é muito mais fácil demonstrar que
a caça é não sustentável do que mostrar que ela é sustentável. Se o nulo não for
aceito (ou não há nenhuma evidência de que a caça está sendo praticada em
excesso), então, a caça pode ser realmente sustentável.

4. Determinar os modelos que o investigador pode usar para aceitar ou rejeitar


a hipótese. Há uma variedade de modelos para avaliar a sustentabilidade da
caça. Cada modelo tem suas qualidades, falhas e suposições, e os modelos
diferentes requerem diferentes tipos de dados.

5. Os modelos determ inam o que precisa ser estimado, os tipos de dados a


ser coletados e o plano de estudo a ser elaborado. Os planos de estudo
mais com uns são aqueles do tipo com parativo, em que áreas de caça inten­
siva são comparadas a áreas de pouca ou nenhum a caça, e planos longitu­
dinais que monitoram o im pacto da caça em um determinado local durante

580
A N ÁLISE DA SU STEN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO R ESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

muitos anos. Dados norm alm ente coletados para avaliar a sustentabilidade
da caça incluem pressão de caça ou captura de anim ais para cada tentativa
realizada, abundância ou densidade anim al, reprodução animal e a estrutu­
ra da idade animal.

Planos de estudo
Os dois planos de estudo que são geralmente empregados para avaliar a sus­
tentabilidade da caça nas florestas tropicais são o plano comparativo e o de
monitoramento (Robinson & Redford 1994). O plano comparativo examina
variáveis entre os locais sem, com pouca ou muita caça. Essas variáveis podem
incluir abundâncias de animais, estruturas de idade, reprodução, captura de
animais para cada tentativa realizada, entre outros. Esse plano é útil se a sus­
tentabilidade da caça necessita ser determinada em um período de tempo rela­
tivamente curto. O plano apresenta suposições importantes que devem ser
consideradas, a ser:

1) Locais que são comparados devem ter o mesmo hábitat. Locais adjacentes
com hábitat semelhante normalmente são usados para as análises compara­
tivas. Porém, é difícil mostrar, de maneira convincente, a consistência de
hábitats tropicais entre locais, e as variáveis de hábitat estimadas podem
não ser as mais importantes para os animais;

2) A variável com a maior variação entre locais deveria ser a pressão de caça;

3) A pressão de caça deve ser conhecida para diferenciar entre locais sem
caça, com pouca caça e' com muita caça.

O monitoramento implica um compromisso em longo prazo em locais de caça.


A sustentabilidade da caça é avaliada através da observação das mudanças das
variáveis com o passar do tempo no local de estudo. Como mencionado ante­
riormente, essas variáveis podem incluir abundâncias de animais, estruturas
de idade, reprodução e captura de animais para cada tentativa realizada, entre
outros. O monitoramento é uma técnica muito importante e que frequentemen­
te avalia o impacto da caça, especialmente para estudos sobre o mercado e o
comércio de animais que se enquadram sob os regulamentos da CITES. Da
mesma forma que o plano comparativo, há suposições importantes sobre o
monitoramento, as quais incluem:

1) O hábitat do local não varia com o passar do tempo, sendo então constan­
te. Mudanças na qualidade do hábitat podem alterar a oferta de alimento
ou o abrigo utilizado pelas espécies e anular o impacto de caça;

581
RICH A RD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

2) Mudanças na variável de interesse estudada deveriam ser causadas princi­


palmente pelo impacto da caça;

3) A pressão de caça também deve ser monitorada com o passar do tempo.

Diretrizes para avaliar a sustentabilidade da caça


A avaliação da sustentabilidade da caça é frequentemente realizada por meio
de simples modelos relativos à população, os quais podem indicar se as espé­
cies são capturadas em excesso. Esses modelos estão baseados em parâmetros
de população e pressão de caça. Para a interpretação e análise, as seguintes
considerações devem ser observadas (Robinson & Bodmer 1999):

1. A confiança na dedução da sustentabilidade aumenta muito quando se


emprega uma combinação de modelos que usam variáveis independentes.
Se os resultados de diferentes modelos apontarem para a mesma conclu­
são, então, a confiança das conclusões aumenta significativamente;

2. Dadas todas as suposições requeridas para todos os modelos existentes, os


resultados específicos devem ser considerados como valores aproximados
e os valores numéricos atuais não devem ser usados como recomendações
de manejo. Os valorés específicos não devem ser usados para ajustar as
, capturas atuais (isto é, um modelo que estimou que 20% dos indivíduos
daquela população foram caçados não deve ser usado para recomendar um
aumento da caça para 40%);

3. É importante entender as qualidades e as falhas de cada um dos diferentes


modelos. Cada modelo tem suposições, as quais devem ser bem esclareci­
das. A crescente disponibilidade de informações adicionais sobre as popu­
lações de animais selvagens faz com que essas suposições possam ser fre­
quentemente revisadas, porém, raramente há informação suficiente dispo­
nível para modelar projeções detalhadas.

Os modelos
Os modelos usados para avaliar o uso sustentável de vida selvagem tropical
discutidos neste capítulo incluem:
1. Abundância, densidades ou com parações da biomassa existente;
2. Modelo de estoque;
3. Modelo de tentativa;
4. Modelo de estruturas de idade;
5. Modelo de exploração;

• 582
A N ÁLISÉ DA SUSTEN TA BILID A D E DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

6. Modelo unificado de exploração;


7. Modelo de produção;
8. Modelo de fonte-sumidouro.

Os dados da pesquisa conduzida na Reserva da Comunidade Tamshiyacu-


Tahuayo no Peru serão utilizados para ilustrar a utilidade dos modelos. A
Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo é um loc^l da floresta do pla­
nalto no nordeste da Amazônia peruana. Está situado nas florestas que divi­
dem o vale da Amazônia do vale do Yavari (Figura 1). Os dados foram coleta­
dos em locais do planalto na Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo,
em um local onde a caça é praticada de forma mais intensa (Blanco) e outro
onde a caça é praticada com menos intensidade (Yavari-Miri ).

Figura 1. Mapa da Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo, com destaque para as áreas


de estudo Blanco e Yavari-Miri .

583
RICH ARD E. BO D M ER
JOHN G. ROBIN SO N

1. Abundância, densidades ou comparações de biomassa


Dados sobre as mudanças na densidade, biomassa ou abundância de espécies
entre locais sem caça, com pouca caça e aqueles que apresentam muita caça
foram usados para avaliar o im pacto da caça (Robinson & Redford 1994;
Bodmer et al. 1997, Peres 2000). As diferenças na densidade, biomassa ou
abundância indicam o impacto causado pela caça. Esse procedimento é muito
útil ao comparar a suscetibilidade de diferentes espécies à caça praticada em
excesso. Porém, o modelo não é muito útil para determinar se uma espécie é
caçada de maneira sustentável (Robinson & Redford 1994).

Essa estratégia também pode ser usada para comparar densidade, biomassa ou
abundância de espécies com o passar do tempo no mesmo local (Cullen et al.
2001). O impacto da caça pode ser indexado pelo grau de declínio apresentado
pela população. A exploração é normalmente julgada como não sustentável se
as populações dos animais estão diminuindo com o passar dos anos.

Como exemplo, citam -se as comparações feitas na Reserva da Comunidade


Tamshiyacu-Tahuayo, entre o local de caça contínua, Blanco, e o local de pou­
ca caça, Yavari-Miri . Os dois locais apresentaram hábitats semelhantes, com
uma distância de 40 km entre eles e com florestas contínuas, sem rios princi­
pais dividindo as áreas. Diferenças nas abundâncias de mamíferos foram cor­
relacionadas com as características da história natural, as quais incluíram taxa
intrínseca de reprodução, longevidade e tempo de geração (Bodmer et al. 1997).
O modelo mostrou claramente que, para os mamíferos com taxas reprodutivas
mais altas, longevidade mais curta e tempo de geração mais curto, a diferença
de abundância foi menor entre esses dois locais. Por outro lado, os mamíferos
com taxas reprodutivas menores, períodos de vida mais longos e tempo de
geração mais longo tiveram diferenças maiores em abundância entre os locais
de pouca caça e com caça contínua (Figura 2 \ Essa análise indica que os
mamíferos com taxas reprodutivas intrínsecas mais altas, longevidade mais
curta e menor tempo de geração são menos suscetíveis à caça, mesmo que
praticada em excesso.

584
A N ÁLISE DA SUSTEN TA BILID A D E DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

Produtividade Tempo de geração

Longevidade

Figura 2. Relação entre a alteração na abundância e max. Max é uma medida da produtividade
reprodutiva e a idade da primeira reprodução. É a medida do período de geração e a idade da
última reprodução, a qual avalia a longevidade. Os pontos representam espécies diferentes.

2. Modelo de estoque
Uma variante das comparações da densidade é o modelo de estoque (stock-
recruitm ent m od el), que está baseado nos modelos de população dependente
da densidade que usam as estimativas de Rendimento Sustentável Máximo
(MRS) (m axim um su stain ed yield) e capacidade de suporte (K). Como a maio­
ria das espécies caçadas nos neotrópicos é de estratégia K, essas espécies de­
vem ter um aumento da população dependente de densidade (Caughley 1977).
Cotas sustentáveis de exploração dependem das relações entre a taxa do au­
mento e tamanho da população. O modelo de.estoque prediz níveis sustentá­
veis de exploração para tamanhos de populações diferentes (McCullough 1987).
A maior população-base encontra-se na capacidade de suporte (K) e a menor
encontra-se na extirpação (0). Uma cota sustentável pode ser conseguida em
qualquer tamanho de população-base, porém, só há um ponto em que a explo­
ração contínua está ao máximo, ou seja, no (MRS) (Caughley 1977).

585
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N
\

A população de uma determinada espécie, em uma área de caça, pode ser


comparada a um esperado K e MRS. Isto é conseguido através da comparação
da densidade da população caçada (N) com um K estimado, como N/K. Rendi­
mento sustentável máximo também é indicado como uma proporção de K. A
população caçada é posicionada em relação a MRS, a qual por sua vez é usada
para avaliar o risco da caça (Figura 3).

Tamanho da População (N)

Figura 3. Representação do modelo de estoque ilustrando K e M RS. A caça em excesso no


ponto A levaria a população à extirpação, enquanto no ponto B levaria a uma cota sustentável
de uma população de menor tamanho.

A exploração de espécies em MRS é uma estratégia de manejo arriscada e


deveria ser evitada. Se tentativas são feitas para o manejo de uma população
em MRS, seguida de uma simples decisão errada, essa caça levemente excessi­
va resultaria em um impacto negativo na população-base do ano seguinte. Se a
caça levemente excessiva passasse despercebida e a população for caçada no­
vamente na mesma proporção, o efeito da caça excessiva seria até mesmo mais
dramático e conduziria rapidamente à extirpação local da população (Mc­
Cullough 1987). De maneira semelhante, a exploração de espécies com popu-
lações-base pequenas (à esquerda de MRS) é uma estratégia de manejo arrisca­
da e deveria ser evitada. Novamente, se uma simples decisão errada for toma­
da com o cálculo da exploração sustentável, essa caça levemente excessiva
resultaria em uma população-base escassa no ano seguinte e poderia conduzir
rapidamente à extirpação da população (McCullough 1987).

Porém, a exploração de espécies com populações-base numerosas (à direita de


MRS) é uma estratégia de manejo segura e deveria ser empregada para o uso
sustentável de espécies em longo prazo. Caso uma simples decisão errada for
tomada sobre a exploração de uma população-base numerosa, essa caça leve­
mente excessiva resultaria em uma população-base extinta no ano seguinte. Se

586
AN ÁLISE DA SUSTEN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

a caça levemente excessiva ficar despercebida e a população for caçada nova­


mente na mesma proporção, a população estabilizaria a esse nível novo de
caça contínua e não diminuiria mais adiante. Assim, a exploração de uma
espécie com uma população-base numerosa é uma estratégia de manejo segu­
ra, uma vez que é pouco provável resultar na extirpação da população (Mc-
Cullough 1987).

Assume-se que o valor de MRS para muitas espécies de vida selvagem esteja
por volta de 60% da capacidade suporte (K). Tal informação é baseada em
estudos empíricos com mamíferos grandes (Robinson & Redford 1991). O va­
lor K é considerado como a densidade de populações não caçadas (Robinson
& Redford 1991), sendo N a densidade observada. Assim, N/K pode ser com­
parado ao valor calculado de MRS. A caça pode ser considerada arriscada ou
segura, dependendo se N/K é maior ou menor que o valor de MRS. Porém, o
valor exato de MRS para espécies tropicais não é ainda bem compreendido.
Realmente, um pesquisador poderia predizer que o valor de MRS de espécies
com reprodução lenta, como primatas e antas, seria maior que 60% de K. No
entanto, é mais provável encontrar-se em aproximadamente 80% de K. Como
mostram os estudos conduzidos na Amazônia peruana, espécies que apresen­
tam uma reprodução lenta têm uma variação na reprodução menos dependente
da densidade, com declínios na reprodução que só acontecem em densidades
altas. Como resultado, O valor de MRS seria mais próximo de K (Bodmer 2000).

O modelo de estoque foi usado para avaliar o risco da caça de ungulados na


Amazônia peruana. Por exemplo, queixadas (Tayassu p eca rí) e catetos (Tayassu
tajacu), veados (M azam a sp.) e antas (Tapirus terretrís) foram estudados na
Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo, em áreas com e sem caça (Bod­
mer 200Ò). A densidade desses ungulados em área sem caça foi usada para
calcular K. O valor de MRS foi fixado de 60% de K para os porcos-do-mato e
veados e 80% de K para a anta. As populações de catetos no local estavam a
87% de K, valor que foi bem superior ao MRS estimado, sendo que a caça de
catetos no local pode ser considerada segura. Em contraste, as ^populações de
anta na região de Blanco estavam a 45% de K, valor bem abaixo do MRS esti­
mado, sendo a caça da anta considerada arriscada (Tabela 1).

587
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

T ab e lai. A nálise do estoque da população de ungulados na Reserva da Comunidade de


Tamshiyacu-Tahuayo, Peru. O valor K foi estimado a partir das densidades na região de Yavari-
Miri. N é a densidade na região de Blanco com caça contínua. O valor M RS é dado como a
porcentagem de K. As estratégias são com ou sem risco.

Espécies RSM N/K Estratégia

Queixadas (Tayassu pecarí) 60% 50% risco


Catetos (Tayassu tajacu) 60% 87% sem risco
Veado-Mateiro (Mazama americana) 60% 75% sem risco
Veado-Catmgueiro (M. guazoubira) 60% 87% sem risco
Anta (Tapirus terrestris) 80% 45% risco

Esse método apresenta as seguintes considerações:

1) O cálculo de K de populações não caçadas pode ser um valor subestimado


do valor real de K (Caughley & Sinclair 1994). Isso é verdadeiro principalmen­
te'para populações de espécies que são controladas por predadores, sendo a
densidade das presas m antida quase sempre abaixo do valor K. Um valor
subestimado de K conduziria a um valor subestimado de MRS e uma repre­
sentação errônea na relação entre N e MRS atual.

2) O erro padrão dos valores estimados da densidade e cálculos da pressão de


caça podem ser incorporados nos resultados. Portanto, o risco da caça pode
ser avaliado ao longo de uma gama de estimativas de MRS e de uma gama de
tamanhos para populações caçadas. Assim, uma análise de sensibilidade deve
ser usada através da avaliação do risco da caça (Figura 4)

588
A N ÁLISE DA SU ST EN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

CATETO

V E A D O M A TE IR O

ANTA

Figura 4. Análise da sensibilidade do modelo de estoque ilustrando a variação (erro do desvio


padrão na horizontal) em M RS e na população caçada (N). As setas indicam a necessidade de
aumentar os níveis de segurança na população.

589
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

3. Modelos de tentativa
Os modelos de tentativa examinam as relações entre a tentativa de caçar e a
caça realizada, e geralmente usam um índice de captura para cada tentativa
realizada. Esses modelos normalmente requerem informação extensa sobre as
atividades diárias dos caçadores para avaliar as tentativas ou, ainda, o esforço
de caça realizado. Por isso, a maioria dos modelos de tentativa foi aplicada por
antropólogos (Vickers 1991).

Alterações na relação esforço/captura podem indicar mudanças na densidade


das populações. Uma diminuição na captura, para cada tentativa de caça, su­
gere um uso çm excesso (uma população decrescente); uma captura constante
para cada tentativa sugere uma população estável; e um aumento em captura
para cada tentativa sugere uma população crescente. A análise da captura para
cada tentativa pode ser conduzida através de um plano comparativo que avalia
as áreas sem caça, as que apresentam pouca caça ou aquelas com caça excessi­
va. A análise pode, ainda, ser usada para monitorar uma área com o passar do
tempo.

Registros de caça são usados para obter o número de animais mortos e índices
de relação esforço/captura (Puertas 1999). A análise da captura para cada ten­
tativa de caça realizada foi testada, neste estudo, para examinar um local du­
rante a estação chuvosa e a estação seca. Embora o nível de água não afete os
hábitats, ele determina o acesso da área aos caçadores. Durante a estação alta,
quando os riachos estão cheios de água, o acesso ao local de caça através de
canoa é relativamente fácil. Durante a estação seca, quando os riachos estão
secos, o acesso aos locais de caça é muito difícil. Acredita-se que a abundância
de mamíferos grandes não deva mudar muito entre as duas estações. Já a pres­
são de caça e a tentativa são consideravelmente diferentes entre as duas esta­
ções, sendo muito maior durante a estação chuvosa.

Os resultados mostraram claramente que a captura para cada tentativa de caça


feita não foi diferente entre as estações (Figura 5). Assim, a captura por tenta­
tiva refletiu bem a abundância das populações animais. As diferenças no su­
cesso de captura refletiram nas mudanças da abundância e deram uma indica­
ção da caça excessiva. As considerações sobre esse modelo são:

590
A N ÁLISE DA SU ST EN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU • ESTU D O DE CASO

Blanco

Capturas para Cada Tentativa


0 . 2-

w
>S
Sb
ê é
E I
S °
1 ? 0 . 1-

II
Ü

Chuvoso Seco

200 -, Tentativa

E I
to E
<s t- 100 -
Iœ âo
Ec
■3 O
Z 2

Chuvoso Seco

900-
Pressão da Caça
800
700
g " 600

I I 500
| | 400
Õ §. 300
200
100

Chuvoso Seco

Figura 5. Capturas para cada tentativa de caça feita durante a temporada chuvosa e seca na
região de Blanco. Repare que as capturas por tentativa são constantes, embora a tentativa e
a pressão de caça sejam bem diferentes entre as duas temporadas.

591
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

1) A tentativa de caça deve ser mensurável e a escolha de medidas é um


pouco arbitrária. Na Amazônia peruana isso foi registrado como o número
de dias que uma pessoa gastou caçando;

2) A tentativa deve ser constante. Se os caçadores mudam do arco e flecha


para armas de tiro ou rifles, a medida de captura por tentativa não seria
constante e a comparação não seria válida (Robinson & Bodmer 1999). As
atividades dos caçadores durante as viagens de caça podem não ser sempre
constantes. Assim, suposições precisam ser feitas sobre a atividade co­
mum de caçadores durante as viagens de caça;

3) A captura ou pressão de caça deve ser registrada com precisão. Se os ani­


mais caçados são omitidos, isso alterará o cálculo da captura por tentativa
e a análise não será confiável.

4. Modelos sobre a idade da população


Modelos de idade examinam a estrutura etária e demográfica das populações,
para ver se alterações nessa estrutura indicam uma exploração excessiva. Há
dois tipos de análises que definem se a caça é seletiva ou ao acaso (Caughley
1977).

Tipo 1. A caça é seletiva quando os caçadores capturam somente certas classes


de idade, como os indivíduos maiores ou mais velhos de uma espécie. Se os
indivíduos mais velhos ou maiores são capturados seletivamente, a distribui­
ção da idade da população terá uma tendência para animais mais jovens ou
menores. Se a distribuição estável de idade é mantida em uma população na
qual a caça é seletiva, os animais provavelmente não estão sendo caçados em
excesso. Em contraste, se a distribuição etária tem uma tendência para animais
mais jovens, então, provavelmente, a caça está além dos níveis ideais para
aquela população. Entretanto, se as amostras são coletadas em uma região
onde a caça é praticada de forma seletiva, a distribuição da idade da população
refletirá apenas a distribuição da idade dá captura. Se as classes da idade
selecionadas estão diminuindo com a exploração, isso irá refletir em uma mu­
dança na distribuição da idade da população, sugerindo uma caça excessiva.

Tipo 2. Caça ao acaso acontece quando os caçadores não escolhem suas presas,
caçando indivíduos ao acaso em termos de idade. Isso acontece mais provavel­
mente com o uso de armadilhas. Amostras de populações caçadas aleatoria­
mente refletem a distribuição da idade da população. As alterações na distri­
buição da idade das amostras caçadas devem então refletir diretamente as

592
A N ÁLISE DA SU STEN TA BIU D A D E DE CAÇA
EM FLO R ESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTUD O DE CASO

mudanças na população. Porém, a interpretação das mudanças na distribuição


de idade em termos de caça excessiva é problemática. Mudanças na distribui­
ção da idade causada pela caça em populações sofrendo abate aleatório podem
ser causadas por: 1) um progresso da taxa do aumento da população com
declínios de densidade, resultando em animais mais jovens proporcionalmente;
2) alteração de comportamento em certas classes de idade que se tornam me­
nos vulneráveis (dessa forma a caça torna-se seletiva); 3) uma maior mortalida­
de devida à ação de predadores naturais em áreas com poucas presas, a qual
resulta em uma maior mortalidade de animais novos ou jovens e a população
tende a apresentar maior número de animais mais velhos; 4) imigração de
indivíduos jovens de áreas-fonte para locais regiões de caça.

Para analisar a distribuição de idade, pode-se empregar um plano comparativo


que contrasta locais de pouca ou sem caça com locais de caça excessiva, ou
ainda através do monitoramento da distribuição de idade com o passar do
tempo no mesmo local. Em ambos os planos, comparativo e de monitoramen­
to, é importante ter informação precisa sobre a pressão de caça. Locais sem
caça só podem ser incluídos se há a possibilidade de obter dados sobre a
idade das populações dos animais das amostras não capturadas (presas vivas
ou capturadas).

Não é possível obter informação sobre a sobrevivência a partir das distribui­


ções de idade das amostras caçadas, pois as distribuições de idàde não consi­
deram grupos de indivíduos e sim, indivíduos capturados individualmente.
As relações de sobrevivência só podem ser deduzidas a partir da distribuição
de idade de amostras caçadas quando a caça ocorrer ao -acaso ou assumindo
uma distribuição estável de idade (Caughley & Sinclair 1994).

Uma série de técnicas é utilizada para averiguar a idade das espécies de vida
selvagem. A técnica mais comum para mamíferos é analisar os dentes. Os
crânios de populações caçadas na Amazônia peruana têm sido empregados
para determinar a idade através dos dentes e, assjm, avaliar as distribuições de
idade das populações das presas capturadas (Gottdenker & Bodmer 1998).
Porém, os resultados não são de fácil interpretação, quando se considera a
caça excessiva. Por exemplo, para predizer a idade dos modelos, as popula­
ções de queixadas e catetos capturados ao acaso deveriam mostrar algumas
diferenças entre áreas onde a caça é contínua e áreas de pouca caça. Porém, a
variabilidade da distribuição da idade entre os anos é significante e anula as
diferenças entre os locais de caça, ocultando dessa forma qualquer efeito da
caça (Figuras 6a e 6b).

593
RICH A RD E. BO DM ER
^ JOHN G. RO BIN SO N

Região de Blanco (Muita Caça)

1000
N=133
800
600
400 1991

200
Região de Yavari (Pouca Caça)
0

1000 1000
N=37 ‘ N=62
800 800
600 600
400 1994
400
200 200
0 0

1000 1000
N=44 N=89
800 800
600 600
400 1995
400
200 200
0 0

1000 100D
N=51 N=119
800 800
600 600
400 1996 400
200 200
0 0

1000 1000
N=39 N=89
800 800
600 600
400 1997
400
200 200
0 0
1 2 3 1 2 3
Categorias de Idade Categorias de Idade

Figura 6a. Distribuição da idade de catetos (Tayassu tajacu) caçados na região de Blanco
(muita caça) e Yavari (pouca caça), Amazônia peruana, no período de 1991 e 1999.

594
A N ÁLISE DA SUSTEN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTUD O DE CASO

Região de Blanco (Muita Caça)

1500i
N=148
1000
1991
500

n Região de Yavari (Pouca Caça)

1500 1500
N=67 N=163
1000 ■) 1000

1994
500 500

in La
1500 1500
N=63 N=240
1000 1000
1995
500 500

—L

3000 1500i
N=:92 N=155
2000 1000
1996
1000 500

2000 2000
N=56 N=217
1500 ■
=
--- 1500

1000 1997 1000
500 500

0 - 0
1 2 3 1 2 3
Categorias de Idade Categorias de Idade

Figura 6b. Distribuição da idade de catetos ( Tayassu pecari) caçados na região de Blanco
(muita caça) e Yavari (pouca caça), Amazônia peruana, no período de 1991 e 1999.

595
RICH ARD E. BO D M ER
JOHN G. ROBIN SO N

Obviamente, para as espécies caçadas em excesso, a distribuição da idade é


com certeza mais jovem nos locais de caça excessiva. Por exemplo, a. anta tem
uma distribuição de idade significativamente mais jovem dentro dos locais
onde ocorre caça excessiva na Amazônia peruana do que naqueles onde pouco
se caça (Figura 7).

Região de Yavari (Pouca Caça) Região de Blanco (Muita Caça)

1000 10001

800 800-

600 600J

400 400-

200 200-

0 0-
1 2 3 1 2 3
Classes de Idade Classes de Idade

Figura 7. Distribuição da idade para a anta (Tapirus terrestris) em áreas com pouca e muita
caça.

São considerações sobre esse modelo: 1) Os estudos devem determinar se uma


população é capturada ao acaso ou de maneira seletiva; 2) A interpretação das
causas das mudanças da distribuição da idade pode ser problemática em espé­
cies capturadas ao acaso; 3) É difícil determinar se uma espécie está sendo
caçada em excesso analisando-se as mudanças na sua distribuição de idade. E
possível mostrar, para as populações caçadas ao acaso, pequena variação na
distribuição da idade, se a população estiver sendo caçada em excesso. Esse
' fato acontece especialmente em populações de primatas, que têm pequena va­
riação na reprodução, a qual é dependente da densidade, desde que não haja
imigração entre as áreas. *

A compreensão sobre o efeito da caça na pirâmide etária das espécies da flores­


ta tropical ainda é incipiente. Porém, a avaliação do uso sustentável através do
conhecimento da estrutura da idade apresenta um enorme potencial, devido à
forte relação entre os dados obtidos e as atividades dos caçadores. Comunida­
des rurais podem facilmente coletar crânios de animais que eles mesmos caça­
ram, envolvendo o mínimo de esforço extra (Bodmer & Puertas 2000). Porém,
não é aconselhável tomar decisões quanto ao manejo, somente com análises de
dados sobre a idade das populações caçadas ao acaso, pois atualmente pouco
s^ sabe sobre a relação entre distribuição de idade e sustentabilidade da caça.

596
A N ÁLISE DA SUSTEN TA BILID A D E DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

5. Modelos de exploração
0 impacto da caça pode ser avaliado mais diretamente examinando-se a rela­
ção entre a produção e a exploração nas populações. As populações animais
podem, teoricamente, ser caçadas de forma sustentável em qualquer nível de
população, prevista na capacidade de suporte (K) e extirpação (0) (Caughley
1977). Assim, um modo para avaliar, a sustentabilidade de caça seria saber se
há produção de animais para .a população que está sendo capturada. A explo­
ração pode, então, ser comparada com a produção para averiguar se a propor­
ção explorada está dentro dos limites sustentáveis. Esse tipo de análise é co­
nhecido como “modelo da exploração” (Bodmer 1994).

O modelo da exploração emprega estimativas do índice reprodutivo que são


derivadas da capacidade reprodutiva da espécie e da densidade da população.
A capacidade reprodutiva é determinada através dos dados sobre a atividade
reprodutiva das fêmeas e usa informações de: 1) tamanho da prole; e 2) capa­
cidade reprodutiva bruta (número de jovens/número de fêmeas examinadas).
A densidade da população é determinada a partir de censos de campo. As
densidades animais sãó, portanto, multiplicadas pela capacidade reprodutiva
da espécie para obter uma estimativa da produção calculada como indivíduos
nascidos/km2, sendo:

P= (0.5D)(Y*g),
onde:
Y é o número de jovens documentados por fêmea (capacidade reprodutiva
bruta (número de jovens/número de fêmeas examinadas); g é o número médio
de gestações por ano e D é a densidade da população (deduzindo 50% sob a
suposição de que a razão do sexo da população é de 1:1 - ou seja, somente se
considera a densidade das fêmeas).

Se a população estiver sendo caçada em excesso, então esta pode ser determi­
nada através da comparação da exploração com a produção de animais. Os
dados de caça nas áreas de exploração dão uma estimativa sobre a pressão de
caça (exploração/km2 de indivíduos). A porcentagem da produção de animais
que pode ser capturada de maneira sustentável precisa ser calculada, uma vez
que o cálculo da produção dos animais não considera pré-reprodução ou mor­
talidade de indivíduos adultos. Robinson & Redford (1991) sugerem que o
tempo de vida de uma espécie pode ser usado como um índice do número de
animais que teria morrido mesmo na ausência da caça. Eles propõem que os
caçadores podem abater 60% da produção para animais de vida bem curta

597
RICH A RD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

(aqueles cuja idade da última reprodução ocorre com menos de cinco anos),
40% da produção para animais de vida curta (aqueles cuja idade da última
reprodução está entre 5 e 10 anos) e 20% da produção para animais de vida
longa (aqueles cuja última reprodução ocorre com mais de 10 anos).

Como exemplo deste modelo, análises sobre a condição reprodutiva das fê­
meas de catetos abatidas por caçadores são aqui apresentadas. Essas análises
revelaram que a produtividade total (número total de jovens/número total de
fêmeas examinadas) na região de Blanco foi de 0.76. Como os catetos têm uma
média de duas gestações por ano (Gottdenker & Bodmer 1998), a capacidade
reprodutiva anual foi de 1,52 jovens/fêmeas. A capacidade reprodutiva foi
multiplicada por metade da densidade de catetos, uma vez que foi considera­
do que metade da população de catetos no local era de fêmeas. O produto, ou
seja, a produção anual foi, então, dividido pela pressão de caça anual de 0.33
catetos caçados por km2. Isso resultou na porcentagem da produção abatida
pelos caçadores, a qual, nesse caso, foi de aproximadamente 31% da produção
de catetos. Esse valor está abaixo da quantidade máxima permitida (40%) para
uma espécie de vida curta e sugere que a captura de catetos na região de Blanco
é provavelmente sustentável.

Análises da sensibilidade podem ser usadas para avaliar se o erro no cálculo


de diferentes variáveis, tais como densidade, pressão de caça e reprodução,
influencia os resultados do modelo. Por exemplo, o modelo de exploração
utilizado para avaliar a sustentabilidade da caça na região de Blanco incorpo­
rou cálculos de erro padrão para observar a sensibilidade do modelo. Nesse
caso, o modelo mostrou que queixadas e catetos não são caçados em excesso
em áreas de caça contínua. Entretanto, para os catetos na região de Blanco, o
valor apresentou margens de erro que excederam os 40% do lim ite, o que
sugere que a exploração deste animal deva estar ocorrendo, possivelmente, em
excesso (Tabela 2). Da mesma forma, a porcentagem da produção abatida para
as duas espécies de M azam a, está próxima dos 40% do limite permitido, o
que sugere que este níveLde abate excederia os 40% do limite, caso margens de
erros superiores fossem considerados. Em contraste, as antas foram caçadas
em excesso na região de Blanco - acima de 100% da produção, até mesmo
quando as mais baixas margens de erro foram consideradas. Isso significa que
a população-base de antas está sendo esgotada nesses locais.

Algumas considerações sobre esse modelo podem ser feitas: o modelo de ex­
ploração é uma maneira útil de avaliar a sustentabilidade da caça em uma área,
pois usa informações sobre a produção e exploração dos animais em questão.

598
A N ÁLISE DA SUSTENTABILIDADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU ■ ESTUD O DE CASO

Tabela 2. Exemplo do modelo de exploração empregado em Blanco para porcos-do-mato.

. . Cateto Queixada

Região de Blanco T. tajacu T. pecari


. Produtividade total 0.76 0.57
Número de gestações/ano 2.00 1.65
1/2 densidade (ind/km2) 0 .7 0 ± 0 .1 5 3 .3± 1.45
Produção anual de animais (ind/km2) 1 .06± 0.23 3 .1 0± 1.36
Pressão de caçâ (ind/km2) 0.33 0.33
% dos animais apreendidos 31 % ±10% 11 % ±8%

Porém, é um modelo de população fechada e não considera a imigração ou


emigração de animais de áreas adjacentes (ver as considerações sobre fonte-
sumidouro - sou rce-sin k, abaixo). Por exemplo, a população de antas está
claramente sendo abatida em excesso na região de Blanco e o modelo da explo­
ração prediz sua extirpação nessa área. Porém', ainda existem populações de
antas na região de Blanco com abundâncias semelhantes em investigações, ano
após ano. Isso sugere, portanto, que os indivíduos estão imigrando de áreas
de florestas adjacentes.

6. Modelo unificado de exploração


O modelo unificado de exploração é uma combinação entre o modelo de esto­
que e o modelo de exploração, ambos unificados em um único modelo. Este
modelo unificado avalia a sustentabilidade da caça atual e o potencial do uso
sustentável em longo prazo. O modelo unificado utiliza uma curva de cresci­
mento populacional modificada. Nessa curva de crescimento, o eixo horizon­
tal é o tamanho da população desde sua extirpação (0) até a capacidade de
suporte (K). O eixo vertical tem o limite sustentável de exploração expresso
como rendimento sustentável (RS). O RS reflete o crescimento de uma popu­
lação (dN/dt) e tem como ponto máximo de crescimento o máximo rendimento
sustentável (MRS).

A diferença principal entre o modelo unificado de exploração e o modelo da


cuTva de crescimento da população é que o eixo vertical, no modelo da explo­
ração unificado, utiliza a porcentagem da produção caçada como uma medida
de RS, em vez do crescimento da população. Assim, o modelo da exploração
pode ser usado para avaliar a sustentabilidade da caça, tendo a linha da sus­
tentabilidade (na realidade os 20%, 40%, ou 60%) aferindo a porcentagem de

599
RICH A RD E. BO D M ER
JOHN G. RO BIN SO N

animais que podem ser caçados. Por exemplo, no máximo 40% da produção
de catetos daquela região podem ser abatidos de maneira sustentável, confor­
me o modelo da exploração. Portanto, a linha RS no modelo da exploração
unificado é o 40% de limite. Se a exploração de catetos exceder os 40% do
limite, então a exploração é julgada insustentável, caso contrário, for menor
que os 40% do limite, considera-se a exploração sustentável. Assim, explora­
ções sustentáveis podem acontecer a qualquer tamanho da população de cate­
tos, desde que a exploração seja menor que 40% da produção. No caso da
anta, o nível máximo de abate é de 20% da produção.

O modelo da exploração unificado analisa também o risco das capturas em


termos de seu potencial para uma sustentabilidade, em longo prazo, por meio
da incorporação de uma análise de estoque da população. Isso é realizado
através da determinação da proximidade da exploração atual à capacidade de
suporte (K) e 'ao máximo rendimento sustentável (MRS). Uma exploração sem
risco é aquela que ocorre à direita do ponto de MRS. MRS é específico da
espécie e acredita-se ser 50% para espécies com vida muito curta, 60% para
espécies com vida curta e 80% para espécies com vida longa. Como já dito
anteriormente, essas diferenças são devidas principalmente à variação na re­
produção e no modo como essa discrepância altera, à medida que as espécies
se aproxim am do valor K, conforme interações dependentes da densidade.
Espécies com vida muito curta têm uma maior variação na reprodução, a qual
passa a ser dependente da densidade, assim que a distribuição se torna nor­
mal. Isso é observado quando as densidades dessas espécies aumentam a par­
tir dos baixos números até atingir o valor de K. As espécies de vida curta
apresentam alterações ligeiramente variáveis na reprodução, com uma produção
máxima ocorrendo em um nível ligeiramente maior da população, normalmente
a 60% de K. Espécies com vida longa apresentam uma reprodução que pouco
depende da densidade, até que as suas populações estejam realmente bem nu­
merosas. Portanto, o MRS está à direitas e acredita-se ser 80% do valor de K.

O modelo da exploração unificado pode ser usado para avaliar se um nível


de exploração é arriscado ou seguro, dependendo do tamanho da população
relativa ao valor esperado de MRS. Por exemplo, espera-se que os catetos
tenham um MRS de 60% do K. Se o tamanho da população-base de catetos
for maior que 60% do K, a exploração é considerada segura em termos de sua
sustentabilidade em longo prazo. Se a população-base for menor que 60%, a
exploração seria arriscada em termos de sua sustentabilidade em longo pra­
zo. No caso da anta, o seu MRS esperado é de 80% do K, pois elas são
espécies de vida longa. Assim, a caça a anta seria segura quando a população

600
ANÁLISE DA SUSTENTABILIDADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTUD O DE CASO

c a ç a d a e s t i v e s s e a c im a d e 8 0 % d e K .

O modelo de exploração unificado pode combinar a porcentagem da produção


dos animais de uma população caçada com a sua posição relativa ao MRS,
indicando, assim, uma estimativa da sustentabilidade atual, como também, o
risco da exploração em longo prazo. Essas informações podem ser muito úteis,
caso ambas possam ser representadas por uma única linha, a qual irá mostrar
a porcentagem da produção dos animais abatidos em relação à linha de RS e
relativa ao MRS da espécie. Por exemplo, o modelo da exploração unificado
foi usado para avaliar a sustentabilidade da caça de ungulados na Reserva da
Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo. No caso dos catetos, 37% da produção
dos animais foi abatida - valor,' este, abaixo dos 40% do limite. A população
estava a 87% de K, bem acim a do MRS de 60% de K. Portanto, a caça de
catetos mostrou estar em nível sustentável, e a população da espécie estar
sendo caçada sem risco, quando considerada a sustentabilidade em longo pra­
zo. No caso dos queixadas, 11% da produção .dos animais foi abatida - valor
bem abaixo dos 40% do limite. Porém, a população está a 50% de K, sendo
que também se encontrava abaixo do MRS esperado de 60% de K. Portanto, a
exploração de queixadas mostroü-se sustentável, mesmo com a população sendo
caçada, sob riscos, nos termos da sustentabilidade em longo prazo. O caso do
veado foi semelhante ao do cateto. Já no caso da anta, 140% da produção foi
abatida, valor bem acima do limite sustentável de 40% e obviamente não sus­
tentável. Da mesma forma, a população da anta foi abatida a 45% de K, valor
bem abaixo do esperado MRS de 80% de'K. Portanto, a caça da anta foi realiza­
da em níveis insustentáveis e sob riscos em termos da sustentabilidade em
longo prazo (Figura 8a e 8b).

O modelo de exploração unificado é um modo prático para avaliar a sustenta­


bilidade da caça. As informações necessárias para o respectivo modelo são a
pressão de caça, produtividade da reprodução e a densidade da população em
locais com e sem caça. A densidade em locais com caça é usada para calcular
a proximidade das espécies ao MRS e é uma variável importante para estimàr
a produção de animais. A densidade em locais sem caça é usada para calcular
o K e também o MRS. Dados sobre reprodução e produtividade total são usa­
dos para calcular a produção. A pressão da exploração é usada para calcular a
porcentagem da produção abatida. Uma vez que o modelo de exploração uni­
ficado combina a análise do estoque da população com o modelo de explora­
ção, as considerações de cada um desses modelos devem ser observadas no
modelo unificado. A análise de sensibilidade pode ser incorporada ao modelo
nos cálculos de RS e de riscos da caça.
601
RICH A RD E. BO D M ER
JOHN G. RO BIN SO N

RSM

Figura 8a. Diagrama do modelo unificado de exploração. A altura das linhas sólidas, na
vertical, representa a porcentagem da produção abatida, enquanto a posição da linha verti­
cal, pontilhada, representa a proximidade da população abatida a K e M RS. A linha RS é o
limite estimado de caça sustentável que, para catetos e queixadas, é de 40% da produção.

O modelo de exploração unificado reflete as exigências de conservação da espécie,


fixando o limite de RS e os níveis de MRS de acordo com a vulnerabilidade da
espécie a uma càça excessiva. Conforme o discutido antes, sobre as comparações
de abundância, a suscetibilidade da espécie para uma caça excessiva é correlacio­
nada a características da história natural, as quais incluem reprodução, longevida­
de e tempo de geração. Espécies com maior vulnerabilidade e caçadas em exces­
so têm níveis mais altos no modelo de exploração unificado, como a anta, no
qual o limite de RS é considerado fixo a 20% e o MRS esperado é de 80%. Já as
espécies menos vulneráveis à caça excessiva têm níveis mais baixos, como o
cateto, em qüe o limite de RS é fixado a 40% e o seu MRS esperado é de 60%.

602
A N ÁLISE DA SUSTENTABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTUD O DE CASO

RSM

ANTA

Figura 8b. Diagrama do modelo unificado de exploração. A altura das linhas sólidas, na
vertical, representa a porcentagem da produção abatida, enquanto a posição da linha verti­
cal, pontilhada, representa a proximidade da população abatida para K e M RS. A linha RS é o
limite estimado da caça sustentável, que, para o veado-mateiro, é de 40% da produção e para
a anta é de 20% da produção.

7. Modelo de produção

Geralmente, o modelo mais usado para avaliar a sustentabilidade da vida sil­


vestre tropical é o modelo de crescimento da população, conforme Robinson &
Redford (1991, 1994) e Robinson (2000), denominado aqui como modelo de
produção. Na ausência de informações detalhadas sobre densidade de espéci­
es em um local específico e de informações a respeito da reprodução, a susten­
tabilidade de uma exploração pode ser avaliada através do cálculo da produ­
ção máxima possível da população, comparada aos abates atuais. Esse modelo
avalia somente a não sustentabilidade de uma exploração atual e não avalia se
a exploração atual se encontra em níveis sustentáveis.

O modelo da produção assume que populações de vida silvestre sejam depen­


dentes da densidade, com produção de, no máximo, 0.6 K. Como em outros

603
RICH ARD E . BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

modelos, K é calculado a partir de populações que não são caçadas e, portan­


to, sem pressões antrópicas. A produção máxima é calculada através da multi­
plicação da densidade, no ponto de máxima produção, pela taxa de cresci­
mento máximo da população, a qual rende P (produção máxima de presas),
usando-se:

P=(0.6K*Lmax) 0.6K
onde:
Lmax é a taxa finita do aumento da população, determinada a partir do expo­
nencial de rmax, quando rmax é a taxa intrínseca do aumento da população (taxa
mais alta do aumento da população quando uma espécie não está sob limites
de oferta de alimento, espaço, com petição de recurso ou predação). A taxa
intrínseca do aumento da população pode ser calculada usando a equação de
Cole (1954):

1 = ç -nn ax + b e -n n a x (a ).b e -rm a x jw + l )

onde:
o é a idade específica da espécie durante a primeira reprodução, w é a idade
da última reprodução e 6 é a taxa de nascimento anual de fêmeas. Esses parâ­
metros reprodutivos estão disponíveis na literatura sobre animais de cativeiro
e silvestres para espécies comumente caçadas.

Como no modelo de exploração, o modelo de produção não assume nenhum


parâmetro pré-reprodutivo ou mortalidade de animais adultos. Consequente­
mente, o período de vida comum de uma espécie é usado como um índice do
número de animais que teriam morrido na ausência da caça humana. Como no
modelo de exploração, os limites de caça são fixos a 60% da produção para
espécies de vida muito curta, 40% da produção para espécies de vida curta e
20% da produção para espécies de vida longa. A modificação de L por um
fator frr de 0.6, 0.4 ou 0.2 significa que a taxa efetiva do crescimento da popu­
lação Lrr é:

Lrr- 1 (Lmax- 1) fn

e a produção máxima possível, disponível aos caçadores é:

Prr=(Lrr -1)0,6K

(ver Slade et al. 1998). O Lrr tem sido utilizado para demonstrar a exploração

604
A N ÁLISE DA SUSTEN TA BILID A D E DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

máxima possível para várias espécies (Robinson & Bodmer 1999).

Como exemplo desse modelo, cita-se o caso do cateto caçado na Reserva da


Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo. A taxa de produção máxima para catetos
era de 1.99 (Robinson & Redford 1991). A densidade de catetos em locais sem
caça era de 1.6 indivíduo/km2, produzindo uma máxima exploração sustentá­
vel (Prr) de 0.95 indivíduo/km2, a qual era bem acima da caça atual de 0.33
indivíduo/km2 na região de caça de Blanco. Em contraste, o máximo da explo­
ração sustentável da anta estava bem abaixo da exploração observada no local
com pressão de caça. O modelo de produção sugere que os catetos, possivel­
mente, estão sendo abatidos de maneira sustentável no local com pressão de
caça, enquanto a exploração da anta parece não ser sustentável.

Considerações sobre o modelo


1. O modelo pode ajudar a determinar se uma espécie está sendo caçada em
excesso, quando seus abates estão excedendo o nível máximo. Entretanto, não
permite determinar se uma exploração é sustentável quando os níveis estive­
rem abaixo do máximo.

2. O modelo calcula muitos parâmetros sem empregar dados do local atual da


exploração. Isso pode resultar em muitas estimativas que não são apropriadas
para uma determinada área.

8. Modelos de fonte-destino
Os modelos descritos acima são indicadores úteis do uso sustentável de po­
pulações, mas eles não incorporam as complexidades dos ecossistemas natu­
rais e as flutuações imprevisíveis das populações de vida silvestre. Alguns
modelos, como o das comparações de abundância, o modelo de estoque e o da
análise da estrutura da idade, são modelos abertos que incorporam, por si, a
imigração e a emigração das áreas ao redor. Outros, como o modelo de explora­
ção e o modelo de produção, são modelos de população fechada que não con­
sideram imigração ou emigração.

Um modo promissor para incluir as considerações de complexidade, flutua-’


ções imprevisíveis e o movimento animal em estratégias de manejo para a vida
silvestre tropical, é associar a área estudada (destino) com possíveis áreas,
fontes de populações que não são caçadas (fontes) (McCullough 1996; Hill et
al. 1997; Navaro et al. 2000). A vantagem da estratégia fonte-destino é que ela
pode ser usada tanto em hábitats contínuos como em hábitats fragmentados,
considerando para ambos a estrutura de metapopulação (Navaro et al. 2000).

605
RICH ARD E.~BODM ER
JOHN G. RO BIN SO N

Modelos de fonte-destino requerem informações sobre o estado da população


da fonte e da população de destino, e os respectivos movimentos de animais
entre fonte e destino. Análises de sistemas de fonte-destino nos trópicos nor­
malmente usam informações sobre as populações de vida silvestre em fonte e
áreas de destino, mas geralmente não se sabe o grau de movimento entre am­
bas (Navaro et àl. 2000). Por exemplo, o modelo de exploração unificado pode
incorporar fontes e áreas de destino, calculando a porcentagem da produção
caçada e o perigo do abate em áreas de destino com muita caça, áreas fontes
com pouca caça e áreas fontes sem caça. Em áreas fontes sem caça, a porcenta­
gem da produção abatida deve ser zero. Por meio desse valor, é possível com­
binar fontes e áreas de destino para adquirir uma aproximação da porcentagem
da produção caçada e o risco da exploração ao longo de toda área fonte-destino.

Caso animais sejam abatidos em excesso em áreas de destino adjacente às


fontes, toda área maior fonte-destino pode,ser usada sustentavelmente, desde
que animais da área fonte possam suprir a área de destino. Porém, depender
das áreas fontes para suprir áreas de destino, que apresentam caça em excesso,
é uma estratégia de risco que deveria, se possível, ser evitada. As áreas fontes
deveriam ser incorporadas em estratégias de caça sustentável, de modo a ga­
rantir uma caça sustentável em longo prazo. As áreas de destino, que são
usadas de maneira sustentável, deveriam ser adjacentes às áreas fontes, que
podem suprir animais conforme as populações oscilam e por períodos que
apresentam caça em excesso. As áreas fontes não deveriam ser usadas para
manter a caça em níveis insustentáveis.

A Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo e as áreas vizinhas podem


demonstrar como a análise de fonte-destino pode incorporar o modelo da ex­
ploração unificada. A Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo foi divi­
dida em três zonas de caça: 1) uma área de 1.700 km2 com caça contínua; 2)
uma área de 4.000 km2 com pouca caça; e 3) uma área de 5.300 km2 sem caça
(Figura 9). As áreas sem e com pouca caça eram fontes potenciais de popula­
ções para a área de caça contínua. O tamanho das zonas de caça foi estimado a
partir de dados sobre a caça e área de uso dos caçadores, obtidos ao longo de
um período de oito anos de pesquisas.

A efetividade da estratégia de fonte-destino foi examinada para anta, porcos-


do-mato e populações de cervídeos. O modelo de exploração unificado de­
monstrou que, na região de Blanco, com caça contínua, 14% da produção da
anta foi capturada, sendo que a exploração era de risco. Esse dado ilustra
claramente que o local era uma área de destino para essa espécie. O local de

606
ANÁLISE DA SUSTENTABILID ADE DE CAÇA
em F l o r e s t a s t r o p ic a is n o p e r u - e s t u d o d e c a s o

pouca caça mostrou uma estimativa de 16% da produção de anta caçada, sen­
do que este valor estava abaixo dos 20% do limite permitido. Portanto, a caça
foi considerada sem risco (Tabela 3).

Figura 9. Mapa da Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo e as áreas ao seu redor, as


quais foram utilizadas para estim ar o tamanho das áreas fontes e de destino. O s pontos *
representam vilarejos e as linhas pontilhadas mostram as fronteiras oficiais da reserva.

Assim, os locais com pouca caça podem ser considerados parte da área de
fonte. Já os locais sem caça tiveram 0% da produção caçada, enquanto os com
pouca caça, associados àqueles sem caça, formaram uma área de fonte integra­
da. Os caçadores capturaram da área de fonte integrada, uma estimativa de 8%
da produção da anta, sendo que esse valor estava dentro dos níveis sustentá­
veis. Dentro de toda área fonte-destino, incluindo as áreas com caça contínua
com pouca e sem caça, os caçadores capturaram cerca de 18% da produção de
antas. Isso sugere que a caça da anta de toda área fonte-destino parece ser
sustentável e a sustentabilidade da caça na área com caça contínua depende
em grande parte das taxas de imigração (ou suprimento) de fontes adjacentes.
Porém, a caça excessiva da anta em locais com caça contínua deveria ser atenu­
ada para não depender somente das áreas fontes.

607
RICH ARD E . BO D M ER
JOHN G. RO BIN SO N

Tabela 3. Porcentagem de animais abatidos na região de Blanco. A proporção da produção


que pode ser caçada da maneira sustentável é considerada 40% para cervideos e porcos-do-
mato e 20% para antas.

Espécies %da produção abatida pelos caçadores


Nome Popular Blanco
Queixada 11 % ± 8%
Cateto 31 % ± 10%
Veado-Mateiro 38 % ± 6%
Veado-Catingueiro 38 % ± 9%
Anta 14 % ± 53%

Atualmente, não há nenhuma informação sobre a movimentação da anta entre


as zonas de caça. Porém, a persistência da anta na região de Blanco sugere que
a manutenção da população por meio da imigração a partir da área fonte seja
um fator importante. Além disso, as populações de anta na região de Blanco
são consideravelmente mais jovens que a população da anta na área com pou­
ca caça, o que sugere que animais mais jovens poderiam estar se deslocando
da área fonte para a área destino.

A efetividade da estratégia fonte-destino também foi examinada para as po­


pulações, de porcos-do-m ato e cervideos (Tabela 4). Os níveis de caça de
risco para os queixadas caçados na região de Blanco e a exploração de catetos
e veados próxima aos lim ites sustentáveis sugere que esses animais podem
estar sob o risco de ser caçados em excesso durante alguns anos. Porém, se
uma estratégia de manejo incluir as áreas fonte de pouca e sem nenhuma
caça, essa estratégia de risco passaria a ser mais aceitável, pois as áreas fon­
tes podem teoricam ente suprir a caça excessiva sobre as populações captura­
das continuam ente.

608
AN ÁLISE DA SUSTEN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DE CASO

Tabela 4. Resultados do modelo fonte-destino para anta em áreas na Reserva da Comunidade


i de Tamshiyacu-Tahuayo e entorno!

Caça Pouca Sem Pouca caça Todas


contínua caça - caça e Sem caça as áreas

Destino Fonte Fonte Fonte


Categoria Fonte
caçada não caçada Destino

Área
aproximada 1,700 4,000 5,300 9,300 11,000
(km2)
i
Densidade 0.21 0.91 0.91 0.91 0.80*
(Ind/ km2)

Pressão
de caça 0.07 0.02 0.0 0.01* 0.02*
(Ind/ km2)

% da
produção 140% 16% 0% 8% 18%
caçada

* Densidades e pressão de caça são médias ponderadas entre os locais.


*
Métodos
Todos os modelos acima discutidos requerem coleta de dados do campo. Abai­
xo, segue um resumo dos tipos de dados que precisam ser coletados para cada
um dos modelos.

1. Abundância, densidade ou com paração de biomassa

- São necessários dados para estimar a abundância, densidade ou biomassa da


população animal.
- A pressão de caça precisa ser determinada e relacionada à abundância, den­
sidade ou estimativas da biomassa

2. Análise da população-base-aumento da população

- São necessários dados para estimar a densidade da população animal, caçadá


e não caçada.

3. Modelos de esforço

- A pressão de caça e dados de atividade e esforço de caça são necessários, em


conjunto, para calcular a captura de animais para cada tentativa realizada.

609
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

4. Modelos de estrutura de idade

- A estrutura da idade das populações caçadas deve ser determinada.


- A pressão da exploração precisa ser calculada para ser correlacionada com a
idade.
- A preferência da caça deve ser determinada, considerando os métodos de
caça através das entrevistas com caçadores ou através da comparação da idade
das amostras caçadas com as idades dos indivíduos em vida livre no mesmo
local.

5. Modelo de exploração

- A produção total necessita ser calculada através da reprodução de fêmeas


caçadas, com a contagem do número total de fetos por número total de fêmeas
examinadas.
- Os períodos de gestação precisam ser estimados através de estudos dos tratos
reprodutivos das fêmeas ou a partir da literatura.
- O tamanho médio da prole precisa ser determinado através da análise dos
tratos reprodutivos de fêmeas prenhas abatidas.
- A densidade necessita ser estimada.
- A pressão de caça necessita ser calculada por área, o que significa que a área
de captura (área usada pelos caçadores) também precisa ser determinada.

6. Modelo de exploração unificada

- Os mesmos dados do modelo de exploração associados ao modelo de esto­


que da população.

7. Modelo de produção

- A pressão de caça e a área de captura precisam ser determinadas.


- E opcional o quanto de dados do local específico é usado e o quanto é agru-
pado da literatura, lembrando que, quanto maior a quantidade dos dados es­
pecíficos do local, maior a confiabilidade do modelo.

8. Análise de Fonte-Destino

- Os mesmos dados precisam ser coletados das áreas de fonte e de destino. Se


o modelo de exploração unificado está sendo usado, então os mesmos dados
dos modelos de exploração e de estoque combinados precisam ser coletados
em relação às áreas fonte e destino.

610
ANÁLISE DA SUSTENTABILIDADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC AIS NO PERU - ESTU D O DE CASO

Métodos de participação: trabalhando de maneira participativa com


os caçadores locais
A pressão de caça é uma das variáveis mais importantes que precisam ser
estimadas para avaliar a sustentabilidade da caça. Tais dados são normalmente
coletados dos caçadores que estão envolvidos no estudo, principalmente os
caçadores locais e as suas famílias (Vickers 1991; Bodmer 1994; Alvard 1998;
Townsend 2000; Jorgenson 2000; entre outros). Esse procedimento de partici­
pação tem várias vantagens quando comparado àqueles que não envolvem a
participação comunitária: 1) o procedimento de participação permite aos in­
vestigadores coletar informação sobre a pressão de caça; 2) permite aos inves­
tigadores e caçadores trabalharem juntos e entender melhor as necessidades
de cada um; 3) prepara o espírito local para o envolvimento com um futuro
manejo de recursos para preservar a vida silvestre; 4) ensina os caçadores
como coletar dados; assim, no futuro, eles estarão envolvidos diretamente
com a análise da sustentabilidade da própria caça; e 5) os caçadores podem
coletar facilmente partes animais, como crânios, tratos reprodutivos, gordura
de rim e material genético, entre outros tipos de material biológico, para futu­
ras análises. O procedimento de participação tem sido empregado para estu­
dar a sustentabilidade da caça na Amazônia peruana e tem sido utilizado como
instrumento para fazer com que os caçadores repensem o manejo e, ao mesmo
tempo, para fazê-los aprender sobre registros de caça (Bodmer & Puertas 2000).
O envolvimento dos caçadores foi obtido através de reuniões com a comunida­
de, apresentações educacionais e entrevistas informais e coleta de crânios -
atividades para as quais toda a .família era convidada. As mulheres foram en­
corajadas a participar desse programa, pois são elas quem cozinham e limpam
os crânios, além de estar sempre ajudando seus maridos e filhos a etiquetá-los
e armazená-los. Essa estratégia de participação ajudou a reunir investigadores,
extensionistas e caçadores para discutir problemas do manejo e da caça local.
O tópico de interesse de todos era os crânios de animais, Baseando-se neles,
os investigadores ou extensionistas discutiram com os caçadores sobre o sexo,
a idade e a espécie do animal. Também se discutia sobre manejo, além do
registro de presas. Foi possível, assim, obter informações adicionais, como
opiniões dos caçadores sobre o sistema de vigilância e caça, realizadas por
pessoas que não pertenciam à comunidade.

A aplicação do modelo de participação na Reserva da Comunidade Tamshiyacu-


Tahuayo vem permitindo a coleta de dados sobre: a pressão de caça (Puertas
- 1999); a captura de animais para cada tentativa realizada; a área de captura; a

611
RICH ARD E. BO DM ER
JOHN G. RO BIN SO N

estrutura da idade dos animais, por meio dos crânios e dos tratos reproduti­
vos das fêmeas abatidas. Esse procedimento mostrou quantos tipos diferentes
de dados podem ser coletados e a possibilidade de envolvimento de caçadores
na análise de dados e na iniciação do manejo, ponto fundamental para a ava­
liação da sustentabilidade da caça e início de práticas de manejo para a susten-
tabilidade.

Na Reserva da Comunidade Tamshiyacu-Tahuayo os caçadores tinham que


registrar por escrito números, espécies, sexos, crânios e presas dos animais
caçados, e esses registros eram administrados pelo inspetor da comunidade.
A vila nomeava um ou dois inspetores, responsáveis pela coordenação dos
trabalhos relacionados à vida silvestre, inclusive a vigilância e os registros de
caça. Tais registros são técnicas importantes que envolvem caçadores « fazem
com que eles iniciem ativamente o manejo dos recursos da vida silvestre e
monitorem sua própria caça.

Alguns projetos têm envolvido os caçadores em censos e muitos deles acham


que a atividad^ extra, exigida para coletar os dados do censo, não pode ser
assimilada facilmente em suas vidas. Apesar de frequentemente empregados
como assistentes em censos, isso é mais um serviço pago do que uma partici­
pação local. Atividades de participação são suficientes para manter as famílias
interessadas no manejo da caça, sem demanda de tempo adicional. Em con­
traste, censos exigem atividades extras e requerem muito tempo., além de ser
conduzidos sem a caça dos animais. Tal exigência compromete as atividades
dos caçadores. Portanto, censos são sempre realizados com auxílio de assis­
tentes de pesquisa e, normalmente, não devem fazer parte dos programas de
participação.

Avaliação dos diferentes métodos de análise de


sustentabilidade de caça
Durante a última década muitos estudos começaram a avaliar o uso sustentá­
vel da vida silvestre (Robinson & Bennett 2000). O modelo mais comum em­
pregado é o modelo da produção, desenvolvido por Robinson & Redford (1991).
Entretanto, outros modelos apresentados neste capítulo são utilizados regular­
mente, mostrando a possibilidade de escolha metodológica, em virtude da
situação analisada. Resultados apontam que há caça em excesso na maioria
das áreas estudadas, ao passo que poucos a exercem de maneira sustentável
(Robinson & Bennett 2000). Em regiões neotropicais, normalmente os roedo­
res e ungulados, com índices reprodutivos superiores, são animais caçados de

612
AN ÁLISE DA SUSTEN TABILID ADE DE CAÇA
EM FLO RESTA S TRO PIC A IS NO PERU - ESTU D O DÉ CASO

maneira mais sustentável. De maneira diferente, primatas e ungulados, que


têm reprodução mais lenta, são caçados em demasia.

A caça em excesso deve ser interrompida ou reduzida. Alguns autores têm


sugerido que a redução na exploração dessas espécies pode ser complementa­
da com o aumento do abate das espécies consideradas sustentáveis (Alvard
1998). Porém, essa é uma estratégia muito arriscada, que não deveria ser usada
no momento atual, devido ao conhecimento incompleto da vida silvestre tro­
pical, a simplicidade dos modelos e a falta de precisão em se avaliar a susten­
tabilidade da caça.

Os modelos descritos neste capítulo são ferramentas úteis para avaliar se a


caça é sustentável, mas eles não são precisos, a ponto de determinarem as
cotas exatas da caça. Os modelos apenas sugerem se as pressões atuais da caça
são sustentáveis e podem ser mantidas, mas não são precisos o bastante para
sugerir aumentos na caça ou o início da caça em áreas onde ela ainda não
ocorra. A informação disponível e a compreensão atual da biologia de popula­
ções não são suficientes para que se façam tais recomendações.

A avaliação da sustentabilidade da caça é um dos primeiros passos para rever­


ter o processo de caça não sustentável a níveis mais sustentáveis. É importante
aplicar a avaliação da sustentabilidade como parte do processo para o manejo
da caça. Em muitas áreas, ela poderá;ser mais bem realizada incluindo-se caça­
dores na avaliação, através de procedimentos de participação. Os caçadores,
tanto locais como esporádicos, são sempre os que mais utilizam a vida silves­
tre e desejam a continuidade e o manejo dessas populações. Além do mais,
são eles que visitam e passam o tempo em áreas remotas, onde há abundância
da vida selvagem. Os caçadores querem contribuir ativamente para o manejo
desse patrimônio. Portanto, se tiverem mais conhecimentos, estarão mais bem
preparados para implementar as atividades de manejo.

O envolvimento dos caçadores e de suas famílias na coleta de dados apresenta


uma série de fatores importantes para a conservação. Primeiramente, permite
encontros entres os extensionistas, os investigadores e os caçadores para dis­
cutir tópicos sobre a vida silvestre. Mas o aspecto principal desse envolvimen­
to é o fato de os caçadores poderem analisar o impacto de sua própria caça no
ambiente. Com isso, eles passam a entender melhor as consequências da caça,
o que, por sua vez, os ajuda a pensar sobre as vantagens do manejo dos abates.
Esse processo de monitoramento será importante quando se implementar a
caça de animais silvestres de maneira sustentável em longo prazo, o que fre­
quentemente se inicia por meio de técnicas de pesquisas do tipo. participativo.

613
RICH ARD E . BO D M ER
JOHN G. RO BIN SO N

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615
á 23 Entrevistas 8 aplicação de questionários
P em trabalhos de conservação
Eduardo Humberto-Ditt
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Waldir Mantovani
Instituto de Biociências, USP

Cláudio Valladares-Padua
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Clarice Bassi
IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

Introdução
Os projetos de pesquisa e de conservação frequentemente demandam a aplica­
ção de técnicas para elaboração de questionários, condução de entrevistas,
análise e interpretação de dados coletados a partir de relações interpessoais.
No entanto, essas técnicas costumam ser muito mais utilizadas por profissio­
nais das ciências sociais do que por aqueles que trabalham com Biologia da
\
Conservação.
Neste capítulo, que relata uma investigação de atitudes e de comportamento de
fazendeiros do interior do Estado de São Paulo, apresentam-se considerações
destinadas a auxiliar o planejamento e o desenvolvimento de trabalhos que
envolvem entrevistas e a maximizar o aproveitamento de maneira consistente e
segura das informações e dos dados que são coletados. Apesar de serem en­
contrados na literatura outros trabalhos que também envolvem entrevistas para
mensurar atitudes e comportamento, é importante ressaltar que as considera­
ções aqui apresentadas podem ser extrapoladas, tornando-se também válidas e
aplicáveis a trabalhos que envolvam entrevistas com propósitos diferentes.

Definição precisa do propósito das entrevistas


O assunto ou tema a ser tratado durante uma investigação pode ser compreen­
dido como uma dificuldade aindâ sem solução, que deve ser determinada com
mais precisão. Quando o tema passa a ser refinado e tratado de maneira mais
EDUARDO HUM BERTO DITT
WALDIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLADARES-PADUA
CLARICE BASSI

explícita, clara, compreensível e operacional, formula-se o problema, normal­


mente constituído por uma única pergunta (Marconi & Lakatos 2000).

Pode-se tomar como exemplo o caso do Pontal do Paranapanema, região do


interior de São Paulo, caracterizada por conflitos fundiários, onde se supõe
que os fazendeiros, por terem a posse de grandes fragmentos florestais rema­
nescentes, exercem um papel que pode ser determinante para a conservação
da biodiversidade no local. A atuação de proprietários de terra na conservação
da biodiversidade poderia ser o tema do trabalho. O enunciado do problema
ficou sendo: “Como variam as atitudes e o comportamento de conservação dos
fazendeiros que possuem os grandes fragmentos florestais da região?”. Consi-
derou-se a atitude como sendo a predisposição dos fazendeiros e o comporta­
mento de conservação como a ação positiva que eles tomam em relação à con­
servação dos fragmentos florestais. Explicações sobre essas definições de ati­
tudes e de comportamento são apresentados, respectivamente, por Chizzotti
(1991) e por McDowell & Sparks (1989). Recomenda-se uma atenção especial e
um investimento de tempo considerável por parte do pesquisador no momen­
to da formulação do problema, o que tornará mais fáceis as fases subsequentes
do desenvolvimento da pesquisa.

O problema formulado, em muitos casos, pode ajudar na elaboração de hipó­


teses a serem testadas pelo trabalho. Poder-se-ia testar, por exemplo, a hipóte­
se de que não existe variação de atitudes e de comportamento de conservação
entre os fazendeiros do Pontal ou, então, de que o fazendeiro A possui atitu­
des e comportamento mais conser.vacionistas do que o fazendeiro B, e assim
por diante. Informações mais detalhadas sobre temas, elaboração de proble­
mas e de hipóteses são apresentadas por Marconi & Lakatos (2000).

Conteúdo das perguntas


No exemplo do problema que foi formulado, espera-se que o questionário con­
tenha perguntas- que possibilitem avaliar as atitudes e o comportamento de
conservação dos fazendeiros. Os assuntos a serem abordados pelas perguntas
podem sér variados e sua escolha depende do que é encontrado na literatura e
também da experiência e do conhecimento que o pesquisador possui das con­
dições do objeto estudado.

Verificou-se, por exemplo, que alguns autores, para mensurar o comportamen­


to de conservação de fazendeiros, levaram em consideração a extensão de há­
bitat natural que era mantido nas propriedades rurais com o intuito de conser­
vação de ecossistem a (McDowell & Sparks 1989). Esse tipo de mensuração

618
EN TREV ISTA S E APLICAÇÃO DE Q U ESTIO N Á RIO S
EM TRA BA LH O S DE CONSERVAÇÃO

também se aplicava aos fazendeiros no Pontal do Paranapanema e, portanto,


passou a fazer parte do questionário. Com base em observações pessoais feitas
na região de estudo, considerou-se que a mensuração do conhecimento que o
fazendeiro tinha da fauna silvestre local também poderia refletir seu comporta­
mento de conservação, mesmo não tendo sido encontrada qualquer considera­
ção semelhante ha literatura. As estratégias de avaliação da consistência dos
parâmetros que foram adotados para a avaliação de atitudes e tfe, comportamento
serão mencionadas mais adiante, iias discussões sobre formas de análise.

0 questionário também pode conter perguntas que não se restringem apenas


ao problema da pesquisa, mas que proporcionam o aumento do conhecimento
do objeto de estudo. Essa função muitas vezes é atribuída às perguntas iniciais
da entrevista. Entretanto, deve-se tomar cuidado para que o questionário não
fique muito extenso, a ponto de o entrevistado, por se sentir incomodado,
deixar de fornecer respostas com a qualidade que o pesquisador deseja.

Na Tabela 1 estão apresentados os assuntos abordados pelo questionário. Eles


são agrupados em cinco categorias apenas para facilitar a organização e a for­
mulação das perguntas. Esse agrupamento pode também aparecer no próprio
questionário, que tornará fácil a etapa posterior que é a plotagem dos dados e
sua interpretação.

619
EDUARDO HUM BERTO DITT
WALÖIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLADARES-PADUA
CLA RICE BASSI

Tabela 1. A ssunto s abordados e núm eros das respectivas perguntas no questionário de


investigação sobre conservação ambiental.

Categoria A ssuntos Perguntas

Características Idade do proprietário 1, 2, 3, 4,


da propriedade Escolaridade 6, 7, 9
e do proprietário Tempo de vivência na zona rural
Tempo de posse da propriedade
Moradia na propriedade
Número de pessoas e de gerações da família,
envolvidas nas atividades da propriedade
Contato do entrevistado e de sua família com
a propriedade e com o rem anescente florestal

Produção Importância das atividades da propriedade na 5, 8, 13, 24


e renda renda do entrevistado
Tipos de uso do solo na propriedade
Aproveitamentos rentáveis da floresta

Afetividade e Conhecimento dos recursos presentes em sua floTesta 10, 11, 12,
preocupação Uso dã floresta para atividades de lazer 14, 25, 26
com meio Motivos pelos quais a floresta ainda existe
am biente Disposição em remover a mata no passado, no
presente e no futuro
Preocupação com o solo e com a água
Apreciação da beleza

Legislação Conhecim ento das leis de proteção das florestas 15, 16, 17,
Influência da legislação sobre as ações dos proprietários 18, 19
de terra para conservar os rem anescentes florestais
Reserva legal
Punições e multas por agressão ao meio ambiente
Opinião do fazendeiro sobre a legislação

Q uestões Questões que associam os problemas dominiais da 20, 21, 22,


fundiárias terra, com as práticas desenvolvidas pelos fazendeiros 23, 27
Acompanhamento de medidas do governo referentes
a problemas fundiários
Regularização fundiária e negociações pretéritas
Intenção de negociar com o governo
Grande Reserva do Pontal do Paranapanema

620
EN TREVISTA S E APLICAÇÃO DE QUESTION ÁRIOS
EM TRABALH O S DE CONSERVAÇÃO

Estrutura do questionário
As pesquisas realizadas por meio de entrevistas podem ser baseadas em ques­
tionários ou podem ser conduzidas livremente pelo pesquisador, da maneira
que lhe for mais conveniente para maximizar a obtenção de informações dos
entrevistados.

O questionário consiste em um conjunto de perguntas pré-elaboradas, siste­


mática e sequencialmente dispostas em itens que constituem o tema da pes­
quisa (ver anexo 1), para obter dos informantes respostas a assuntos sobre os
quais eles saibam opinar (Çhizzotti 1991). Quando o questionário é fechado,
para cada pergunta existe um número fixo de possíveis respostas a serem obti­
das do entrevistado. Quando ele é aberto, o entrevistado tem a oportunidade e a
liberdade de formular uma resposta não estruturada (Scheaffer et al. 1986).

Dependendo do tipo de dados coletados e da análise que se pretende realizar,-


a pesquisa por meio de entrevistas pode ser quantitativa, envolvendo a men-
suração de variáveis, ou qualitativa, fundamentada em dados obtidos nas inte­
rações interpessoais e na coparticipação dos informantes (Çhizzotti 1991). Neste
último caso, pode-se recorrer à obtenção de dados qualitativos, que constitu­
em formas de quantificação de eventos qualitativos, normatizando e conferin­
do um caráter objetivo às observações.

A análise de dados qualitativos representa uma alternativa metodológica, de


natureza quantitativa, que minimiza a manifestação de subjetividades. Os atri­
butos qualitativos podem receber rótulos numéricos, definidos pelo pesquisa­
dor que, apoiado em seu conhecim ento do objeto, estabelece premissas de
relação (Pereira 1999). Através da décima pergunta do questionário, que é apre­
sentado anexo, o entrevistado é indagado sobre o número de espécies de ma­
míferos silvestres, cuja ocorrência tem conhecimento na propriedade. O pes­
quisador, nesse caso, recorrendo ao conhecim ento prévio que já possuía da
fauna local, verifica se a resposta obtida procede e se as espécies que são
mencionadas pelo fazendeiro correspondem à realidade.

A atribuição de rótulos numéricos ocorre da seguinte maneira: assume-se que


um maior número de espécies m encionadas corretamente em uma resposta
reflete atitudes e comportamento mais favoráveis à conservação dos fragmen­
tos florestais. Portanto, essa resposta recebe uma pontuação elevada, quando
comparada a uma resposta em que o número de espécies mencionadas é pe­
queno. Outro exemplo pode ser verificado na questão seguinte, em que se
assume que a maior frequência de utilização da floresta para caminhadas e

621
EDUARDO H UM BERTO DITT
WALDIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLADARES-PADUA S .
CLA RICE BASSI

atividades de lazer está associada a atitudes e comportamentos mais favoráveis


à conservação.

Quando os rótulos numéricos que são atribuídos às diferentes respostas de


cada pergunta correspondem a um intervalo composto de cinco pontuações
distintas e ordinais (por exemplo: 1, 2, 3, 4 e 5), depara-se com propriedades
da escala de Likert que, de acordo com Pereira (1999), reconhece situações
opostas, gradiente e situação intermediária.

Os critérios de atribuição de pontos às diferentes respostas obtidas não são


necessariam ente definidos antes das entrevistas. Na décim a segunda per­
gunta do questionário (anexo 1), por exemplo, alguns dos motivos apresen­
tados pelos entrevistados para a existência de floresta na propriedade rural
eram diferentes das respostas/alternativas pré-formuladas e apresentadas a
eles. Definiram -se os critérios de pontuação após a realização de todas as
entrevistas, comparando-se as diversas respostas encontradas. Nessa ques­
tão, adotou-se a estratégia de apresentar ao entrevistado diferentes cartões,
sendo que cada um continha uma resposta, além de cartões em branco, para
que o fazendeiro escrevesse algo diferente, caso não concordasse com as
alternativas apresentadas.

Para minimizar o risco de serem obtidas respostas que não correspondem à


realidade, ou seja, respostas que por algum motivo não estão sendo expressas
de maneira sincera pelo entrevistado, o pesquisador deve recorrer a estratégias
que possibilitem testar a consistência dessas respostas. Uma delas é solicitar,
no decorrer da entrevista, um mesmo tipo de informação diversas vezes e
utilizando-se palavras diferentes. Por exemplo, pode-se perguntar qual é a
produtividade de uma determinada cultura, em kg/hectare/ano. Em seguida,
pergunta-se que área foi utilizada para aquela cultura no ano anterior. Num
outro momento, pergunta-se qual foi a produção em kg no ano anterior, obten­
do-se os dados necessários ao teste de consistência. Outra estratégia é aplicar
o mesmo questionário a diversas pessoas que estejam envolvidas com o mes­
mo objeto estudado'. No exemplo da pesquisa no Pontal do Paranapanema,
foram entrevistados os fazendeiros e suas respectivas esposas. Além de serem
testadas as consistências das respostas, já que os questionários para maridos e
esposas eram idênticos, evitaram-se problemas associados à desconsideração
das questões de gênero. Muitas vezes em que’ se busca um equilíbrio de gênero
na composição dos entrevistados, os benefícios são surpreendentes, no que
diz respeito ao conteúdo e à complementaridade das respostas e também em
assuntos relacionados à identificação de tomadores de decisão.

622
EN TREV ISTA S E APLICAÇÁO DE QUESTION ÁRIOS
EM TRA BA LH O S DE CONSERVAÇÃO

Entrevistas-piloto
Antes de ser concebida a versão final do questionário, é importante a realiza­
ção de entrevistas-piloto que, além de servirem como treino para o entrevista­
dor, possibilitam identificar problemas relacionados à maneira de conduzir a
entrevista, à compreensão por parte dos entrevistados e à funcionalidade do
questionário. Os entrevistados-piloto devem ser parecidos com aqueles para
os quais pretende-se aplicar a versão definitiva do questionário, no que diz
respeito a sua idade, a sua profissão, ao nível de escolaridade e a outras carac­
terísticas, às quais cabe ao pesquisador ficar atento.

Quando a pessoa que se deseja entrevistar é contatada, deve-se explicar o


motivo da realização da entrevista, recorrendo-se a uma linguagem simples e
lembrando que em muitos casos pode ser a primeira vez que o entrevistado
tem contato com assuntos relacionados àquela pesquisa. Embora deva ter ha­
vido preocupação com a adaptação da linguagem no momento da elaboração
do questionário, a entrevista-piloto é uma oportunidade para que se certifique
de que a interpretação das perguntas pelos entrevistados é única e que ela
corresponde às intenções do pesquisador. Se existem dois ou mais entrevista­
dores trabalhando na mesma pesquisa, sua presença simultânea durante as
entrevistas-piloto contribui para que eles busquem semelhanças nas suas pos­
turas e nas maneiras de expressar as perguntas.

É importante ficar atento também às reações do entrevistado, para que seja


definido um ritmo adequado na aplicação do questionário, evitando que a
entrevista-se torne cansativa a ponto de comprometer a obtenção das respos­
tas, principalmente referentes às últimas perguntas. Nas primeiras entrevistas-
piloto da pesquisa com os fazendeiros no Pontal do Paranapanema notou-se
que os entrevistados dispunham-se a responder as primeiras questões de for­
ma demasiadamente detalhada e quando se chegava às últimas questões, eles
tentavam abreviar suas respostas, por estarem cansados. Ao detectar esse pro­
blema, os entrevistadores passaram a tomar o cuidado de desestimular depoi­
mentos e respostas extremamente longos nas primeiras perguntas, promoven­
do um aproveitamento mais uniforme da dedicação do entrevistado, entre as
respostas de todas as perguntas do questionário. Se o ques.tionário for aplica­
do repetidas vezes no mesmo dia, o próprio entrevistador também pode com­
prometer a qualidade das respostas, devido ao cansaço no fim do período.

O número necessário de entrevistas-piloto depende da quantidade de proble­


mas que são identificados e do sucesso obtido diante das alterações realizadas
no questionário, com o,intuito de solucioná-los. No entanto, os cuidados que

623
EDUARDO HUM BERTO DITT *
WALDIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLADARES-PADUA *
CLARICE BASSI

são tomados e as observações que são realizadas no decorrer das entrevistas


piloto não devem cessar, considerando-se que determinadas falhas podem ser
evidenciadas apenas depois de se iniciarem as entrevistas definitivas. Nesses
casos, pode ser necessário descartar determinadas perguntas do questionário,
quando os dados e as informações estiverem sendo analisados.

Registro, armazenamento e organização das informações e dos


dados
Durante a entrevista, as respostas podem ser gravadas, escritas ou memoriza­
das. A gravação, apesar de'facilitar a atuação do entrevistador no momento em
que o questionário está sendo aplicado, posteriormente demanda um trabalho
extenso na transcrição de todas as respostas. Em alguns casos, o entrevistado
pode se sentir inibido ou suas respostas podem ficar comprometidas devido à
presença do gravador. Para evitar esse problema, muitos pesquisadores não
utilizam gravadores e limitam-se a registrar as respostas por escrito durante a
entrevista. Se o pesquisador optar por memorizar as respostas para transcrevê-
las apenas depois da entrevista, não fazendo qualquer tipo de anotação ou
gravação, aumentam os riscos de perder detalhes e informações. Independen­
temente da forma como as respostas são registradas, recomenda-se que, logo
após a entrevista, as informações obtidas sejam revisadas e organizadas, o que
evitará perdas e facilitará as etapas de análise e de interpretação.

Caso não se disponha de softw ares criados especificamente para a organização


e a análise de dados de questionários, as respostas podem ser organizadas e
tabuladas em planilhas de dados comuns. A planilha utilizada na pesquisa
com os fazendeiros no Pontal do Paranapanema teve o formato apresentado na
Tabela 2.

Tabela 2 - Planilha de armazenamento de dados de questionário.

Pergunta N° 1 Pergunta N° 2 Pergunta N° 3

Pontos Pontos Pontos


Nome do Propriedade Resposta Resposta Resposta
atribuídos à atribuídos à atribuídos à
entrevistado rural por extenso por extenso por extenso
resposta resposta resposta

624
EN TREVISTA S E APLICAÇÃO DE QUESTIO N ÁRIO S
EM TRABALH O S DE CONSERVAÇÃO

Na primeira coluna, registraram-se os nomes dos entrevistados e na segunda


coluna os nomes das propriedades rurais correspondentes. A partir de então,
foi criado um par de colunas para cada uma das perguntas do questionário.
Em cada um desses pares transcreveram-se os textos das respostas nas células
da esquerda e as respectivas atribuições de pontos ou rotulagens numéricas
nas células da direita. A rotulagem numérica não precisa ser feita no mesmo
momento das transcrições das respostas, pois, como já foi explicado, pode ser
necessário definir seus critérios após a realização de todas as entrevistas.

Interpretações e análises dos dados


A definição do tipo de análise de dados coletados por questionários depende
do delineamento da pesquisa. A seguir, descrevem-se as análises realizadas no
caso específico da pesquisa com fazendeiros no Pontal do Paranapanema.

Atribuíram-se pontuações às respostas de sete perguntas do questionário ane­


xo (perguntas de números 10, 11, 12, 14, 18, 25 e 26), para avaliar e comparar
os entrevistados quanto às suas atitudes e ao seu comportamento de conserva­
ção, assumindo-se que as respostas dessas perguntas refletem ações e predis­
posições em relação à conservação dos fragmentos florestais. Elas se referem a:
conhecimento da fauna silvestre na propriedade; uso da floresta para ativida­
des de lazer; motivos pelos quais o fragmento florestal vem sendo mantido;
desejo de remover a floresta caso não haja impedimento legal; punições por
agressão ao meio ambiente; remoção de floresta ocorrida nos últimos dez anos;
e intenção de remover floresta no futuro. Os critérios dè rotulagem numérica
são mencionados entre parênteses nesse anexo. Eles baseiam-se nas suposi­
ções de que os fazendeiros com atitudes e comportamento mais favoráveis à
conservação conhecem melhor a fauna silvestre de sua propriedade, utilizam
mais a floresta para lazer, mantém suas florestas com propósitos mais preser-
vacionistas, foram punidos menos vezes por agredir o meio ambiente, remove­
ram menos floresta nos últimos anos e pretendem remover menos floresta no
futuro.

Definiu-se um indicador aditivo de atitudes e comportamento, que consiste na


somatória das pontuações referentes às sete perguntas de cada questionário
aplicado. De acordo com Pereira (1999), para que esse indicador seja conside­
rado bom, é necessário que haja uma relação coerente entre as sete questões,
no esforço de medir as atitudes e o comportamento. Avaliou-se essa coerência
por meio do coeficiente Alfa de Cronbach, apresentado na tabela 3. Esse índi­
ce de confiabilidade pode ser calculado com auxílio de software de estatística,

625
EDUARDO H UM BERTO DITT
WALDIR MANTOVANI S
CLÁUDIO VALLADÁRES-PADUA
CLARICE BASSI

como o Statistica (StatSoft 1995). Segundo Pereira (1999), na interpretação do


Alfa de Cronbach, ele poda ser entendido como um coeficiente de correlação
ao quadrado (R2). Nesse exemplo, o alfa de 0,64 indica que 64% do fenômeno
relacionado às atitudes e ao comportamento estaria sendo medido, ou que ele
representa 64% do universo de possíveis indicadores de atitudes e de com­
portamento.

Tabela 3. Alfa de Cronbach para indicador de atitudes e comportamento de conservação


am biental.

Média de
.N Média Variância correlação Alfa de Cronbach
17 11,88 5,61 intervariáveis 0,64
0,23
%
Correlação
M édia se a Variância se a Correlação Alfa se a
corrigida entre
■ Variáveis variável é variável é m últipla ao variável é
variável e
desprezada desprezada quadrado (R2) desprezada
indicador

MAMÍFERO 10,12 3,99 0,20 0,40 0,68

LAZER 10,53 4,60 0,13 0,41 0,67

MOTIVO 9,41 3,77 0,49 0,34 0,56

SU B ST IT U IR 10,24 4,06 0,51 0,45 0,56

PUNIÇÃO 10,71 4,44 0,43 0,34 0,59

ÚLTIMOS 10 10,47 4,72 0,15 0,48 0,65

PRÓXIMOS 10 9,82 3,20 0,73 0,65 0,46

Variáveis: Mamífero (co n h e c im e n to da fauna silv e stre na p ro p rie d a d e ); Lazer (uso da


floresta para atividades d e lazer); Substituir (d e se jo d e re m o ve r a floresta ca so não haja
im pedim ento legal); Punição (pu hiçõ es p o r agressão ao m eio am biente); Últimos 70 (re­
m oção de floresta ocorrida nos últimos dez anos); Próximos 10 (intenção de rem over floresta
no futurd).

A média do indicador aditivo de atitudes e comportamento é de 11,88. Obser­


va-se nesta tabela que a maior contribuição vem dos itens “motivo” (motivos
pelos quais a floresta ainda existe na propriedade) e “proxlO” (intenção de
remover floresta no futuro), cujas exclusões causariam as maiores reduções na
média. Excluindo-se “motivo”, a média seria de 9,41 e excluindo-se “proxlO”,
ela seria de 9,82.

Essas duas variáveis são também as que possuem maior variabilidade nos
dados, ou seja, suas exclusões causariam as maiores reduções na variância.
No entanto, sua exclusão não se justifica, considerando-se que, juntamente

626
EN TREV ISTA S E APLICAÇÃO DE Q UESTIO N ÁRIO S
EM TRA BA LH O S DE CONSERVAÇÃO

com “substitu” (desejo de remover a floresta caso não haja impedimento legal)
e “Punição” (punições por agressão ao meio ambiente), elas apresentam altas
correlações com o indicador final, comparando-se com as demais variáveis. Os
valores de correlação apresentados na tabela para essas quatro variáveis evi­
denciam a importância de se levar em consideração, em trabalhos semelhan­
tes, os planos e a disposição do fazendeiro para reduzir áreas naturais ou para
convertê-las, os motivos pelos quais foram mantidas as áreas naturais que
ainda existem, e punições e multas que o fazendeiro tenha recebido por causar
danos ao meio ambiente.

A última coluna da tabela 3 revela as alterações que o Alfa de Cronbach sofre­


ria diante das exclusões de cada uma das variáveis. Observa-se que a exclusão
da variável “mamífero” (conhecimento da fauna silvestre na propriedade), da
variável “lazer” (uso da floresta para atividades de lazer) ou da variável “Últi­
mos 10” (remoção de floresta ocorrida nos últimos dez anos) provocaria uma
melhora no desempenho do indicador de atitudes e de comportamento. Essa
melhora, no entanto, seria muito pequena, já que o Alfa mudaria de 0,64 para
0,68, 0,67 ou 0,65, respectivamente. O fato de a melhora ser muito pequena,
de acordo com Pereira (1999), é uma indicação de boa consistência interna do
indicador, que pode ser mantido na forma como foi testado, sem a exclusão de
nenhuma variável. Resumindo, o valor obtido no cálculo do Alfa de Cronbach
é satisfatório, as variáveis escolhidas mostram-se apropriadas e encontra-se
uma boa consistência ou confiabilidade no indicador aditivo de atitudes e
comportamento de conservação.

As análises apresentadas neste trabalho constituem apenas uma amostra pe­


quena de um conjunto de possibilidades de tratamento estatístico e ou mate­
mático de dados coletados com uso de entrevistas e de aplicações de questio­
nários. Entre outros exemplos, podem ser citadas as regressões logísticas utili­
zadas por Gilligham & Lee (1999), as análises fatoriais utilizadas por Pyrovetsi &
Daoutopoulos (1999), o Qui-quadrado utilizado por Stein et al. (1999) e por
Wilson (1992), a ANOVA utilizada por Holl et al. (1999) e as regressões linea­
res utilizadas por Bôer & Baquete (1998). Essa diversidade de tipos de análise
existe principalmente devido aos diferenciados propósitos, temas e problemas
que são peculiares de cada trabalho de pesquisa.

627
I
EDUARDO HUM BERTO DITT
VyALDIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLÀDARES-PADUA *.
CLARICE BASSI

Considerações finais
As descrições apresentadas anteriormente contribuem para que, através de
abordagens quantitativas, muitas das informações levantadas por meio dos
questionários não sejam desperdiçadas. No entanto, esse desperdício de in-,
formações também pode ocorrer caso o pesquisador recorra apenas a aborda­
gens quantitativas. A investigação pode ser enriquecida quando sustentada
por bases quantitativas de análise, porém, levando-se em consideração, no
momento da interpretação dos resultados obtidos, todas as informações quali­
tativas e não “quantificáveis”.

Bibliografia •
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628
EN TREV ISTA S E A PUC AÇ ÀO DE Q U ESTIO N ÁRIO S
EM TRA BA LH O S DE CONSERVAÇÃO

Anexo I
Questionário aplicado aos fazendeiros que posseiam os fragmentos
florestais

D ata: Local da entrevista:


Nome: Profissão/ocupação:
N° de filhos:
Nome da propriedade: Tamanho da propriedade:
Outras propriedades onde o remanescente florestal está inserido:

1) Qual é a sua escolaridade? Até que ano o senhor estudou?


(dado quantitativo = valor 1 atribuído para quem tem no máximo o primeiro grau
completo; valor 2 atribuído para quem tem no máximo o segundo grau completo;
valor 3 atribuído para quem tem mais do que o segundo grau completo)

2) O administrador da fazenda trabalha há mais de 5 anos?


___Sim. Qual a escolaridade dele?
__ Não. Quanto tempo o administrador anterior trabalhou? Qual é a escolaridade dele?
(dado quantitativo = valor 1 atribuído para quem tem no máximo o primeiro grau
completo; valor 2 atribuído para quem tem no máximo o segundo grau completo;
valor 3 atribuído para quem tem mais do que o segundo grau completo) ^

3) O senhor mora na propriedade?


___Sim. Há quanto tempo?
___Não. Já morou? Quanto tempo morou?
(dado quantitativo = valor 1 para quem nunca morou na propriedade; valor 2 para
quem já morou até 10 anos; valor 3 para quem já morou mais de 10 anos)

4) Há quanto tempo a propriedade pertence à sua família?


(dado quantitativo = valor 1 para quem possui a propriedade'há menos de 10 anos;
valor 2 para quem possui há mais de 10 e menos de 30; valor 3 para quem possui há
mais de 30 anos)

5) Quais são os tipos de uso do solo na propriedade? Quanto cada um deles representa,
em porcentagem da área total da propriedade?
___% pastagem ___% benfeitorias ___% floresta ___% ______
(dado quantitativo = porcentagens) ,

6) Nos últimos 20 anos, quem da família atuou por mais tempo nos negócios e na
administração da propriedade? Qual é a idade desta pessoa?
(dado quantitativo = idade)

7) Essa pessoa, nos últimos 20 anos, morou quanto tempo na zona rural?
(dado quantitativo = número de anos de moradia na zona rural)

629
EDUARDO HUM BERTO DITT
WALDIR MANTOVANI
CLÁUDIO VALLADARES-PADUA
CLARICE BASSI

8) As atividades desenvolvidas na propriedade representam quanto na renda da


família?
(dado quantitativo = porcentagem da renda)

9) Quantas pessoas da família estão envolvidas nos trabalhos na propriedade? Quem


são? '
(dado quantitativo = número de pessoas)

10) Que espécies de mamíferos o senhor sabe que existem nesta mata?
(pedir no máximo 12 espécies. Dado quantitativo = número de espécies citadas pelo
entrevistado, que realmente existem na floresta. As respostas puderam ser confirmadas
consultando-se os resultados de levantamentos de fauna realizados por pesquisadores
do IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas nas mesmas florestas)
Que animais existem na propriedade, dos quais o senhor não gosta? Por quê?

11) O senhor ou alguém da família usa a floresta para caminhadas ou para algum
outro tipo de lazer?
Com que frequência?
(dado quantitativo = valor 1 atribuído àqueles que responderam que nunca usam a
floresta para caminhadas; valor 2 atribuído àqueles que utilizam no máximo uma
vez ao mês; valor 3 atribuído àqueles que utilizam mais de uma vez por mês)

12) Por que motivos a floresta ainda existe na propriedade? (Foram apresentados
quatro cartões, cada um contendo por escrito uma resposta diferente. Além destes,
também foram fornecidos cartões em branco aos entrevistados, para que pudessem
ser escritos outros motivos que eles sugerissem. Solicitou-se uma ordenação dos
cartões, por grau de importância.)
Primeiro cartão (peso 2); “Cumprimento da lei”;
Segundo cartão (peso 1): “A área não serve para outro uso”;
Terceiro cartão (peso 3): “Proteção do solo e da água”;
Quarto cartão (peso 3): “Apreciação da beleza”;
Outros cartões (peso definido após a entrevista): “Outros motivos apresentados pelos
entrevistados”.
(dado quantitativo = valor obtido pela somatória dos pesos dos cartões, multiplicados
pelas respectivas classificações ordinais atribuídas pelos entrevistados)
Obs.: Após as entrevistas, foram reunidas 16 pessoas que já atuaram na região, incluindo
biólogos, agrônomos, engenheiros florestais, veterinários, ecólogos, guardas-parques,
educadores e estudantes. Todas as respostas obtidas para essa questão foram
apresentadas ao grupo, que em consenso determinou os pesos a serem atribuídos
para cada cartão.

13) Se essa floresta não existisse, a área poderia estar sendo usada para alguma
atividade que proporcionasse renda? Que tipo de uso?
___Sim. Qual? ___ Não
(dado quantitativo = valor 1 atribuído para respostas “não” e valor 2 atribuído para
respostas “sim”)

14) Se a legislação permitisse, o senhor gostaria de substituir a mata por algum outro
tipo de ocupação do solo? ,

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EN TRE V ISTA S E APLICAÇÃO DE Q U ESTIO N Á RIO S
EM TRA BA LH O S DE CONSERVAÇÃO

_ Sim. Qual? ___Não. Por quê?


(dado quantitativo = valor 1 atribuído para respostas “sim” e valor 2 atribuído para
respostas “não”)

15) O senhor conhece as leis de proteção da floresta que existe na sua propriedade?
_ Sim. Quais o senhor conhece? ___Não
(dado quantitativo = valor í para aqueles que não conheciam nada sobre leis; valor 2
para aqueles que mencionaram apenas os 20% de reserva legal; e valor 3 para aqueles
que, além da reserva legal, também m encionaram as áreas de preservação
permanente)

16) O senhor já tentou averbar os 20% de reserva legal de sua propriedade?


_Sim. Por quê? ___ Não. Por quê?
(dado quantitativo = valor 2 para respostas “sim” e valor 1 para respostas “não”)

17) Conseguiu averbar a reserva legal?


_ Sim Não. Por quê? '
(não foram atribuídos valores quantitativos às respostas dessa pergunta)

18) Algum órgão do governo já lhe fez alguma crítica ou já lhe aplicou alguma punição,
alegando que o senhor fez algo contra o meio ambiente?
_Sim. Como foi? ___ Não
(dado quantitativo = valor 1 para respostas “sim” e vâlor 2 para respostas “não”)

19) O senhor considera a legislação de proteção da floresta:


_ Adequada ___Inadequada, mas aceitável ___ Inaceitável
(dado quantitativo = valor 3 para quem respondeu “adequada”; valor 2 para
“inadequada mas aceitável”; e valor 1 para “inaceitável”)

20) O governo reconhece que d título da sua propriedade estáregularizado?


_ Sim ___Não. Por quê?
(não foram atribuídos valores quantitativos às respostas dessa pergunta)

21) O senhor conhece o decreto assinado pelo governador, em 1997, permitindo a


negociação de terras com o estado?
_ Sim ___Parcialmente ___Não
(dado quantitativo = valor 1 para quem não conhecia o decreto; valor 2 para quem
sabia da existência mas não conhecia detalhes; e valor 3 para quem conhecia detalhes
dobre o decreto)

22) O senhor pretende fazer alguma negociação das terrascom o estado?


_Sim. Como? ___Párcialmente. Como? ___Não. Por quê?
(não foram atribuídos valores quantitativos às respostas dessa pergunta)

23) O senhor acredita que os conflitos que existem entre o governo e os fazendeiros
sobre a regularização fundiária da propriedade afetam a conservação das florestas?
Por quê?
(não foram atribuídos valores quantitativos às respostas dessa pergunta)

631
24) Existe algum aproveitamento comercial da floresta? (Por exemplo: cabo de enxada,
mourão, apicultura., lenha, madeira, carne de caça, outros) Qual? Quanto representa
na renda da propriedade?
(não foram atribuídos valores quantitativos às respostas dessa pergunta)

25) Quanto de floresta foi removida:


a) Nos 10 últimos anos?
b) Nos 20 últimos anos?
c) Nos 30 últimos anos?
(dado quantitativo = valor 2 para aqueles que não desmataram nada nos últimos 10
anos; valor 1 para aqueles que desmataram alguma coisa nos últimos 10 anos)

26) Quanto de floresta o senhor acredita que será removida nos próximos 10 anos?
Quanto o senhor pretende acrescentar?
(dado quantitativo = valor 3 para quem pretende plantar floresta; valor 2 para quem
não pretende plantar nem remover floresta; valor 1 para quem pretende desmatar)
porcentagem da área da fazenda onde se pretende remover floresta

27) O senhor sabe que existiu uma reserva na região, chamada Grande Reserva do
Pontal do Paranapanema?
_ Sim ___Parcialmente ___Não
O que o senhor sabe sobre isso?
(dado quantitativo = valor 1 para quem não sabia da Grande Reserva; valor 2 para
quem sabia mas não conhecia detalhes; valor 3 para quem conhecia detalhes).

632
i 24 Manejo integrado de espécies ameaçadas
Cláudio B. Valladares-Padua
Universidade de Brasília e IPÊ- Instituto de Pesquisas Ecológicas

Cristiana Saddy Martins


IPÊ- Instituto de Pesquisas Ecológicas

Rudy Rudran
Smithsonian Institution

Introdução
Como resultado principalmente da ação do homem, a diversidade biológica
que habita o planeta Terra está vivendo uma onda de extinções sem preceden­
tes (Ehrlich & Wilson 1991). O aspecto mais dramático dessa crise ambiental é
a irreversibilidade da extinção de uma espécie. Todas as outras agressões ao
meio ambiente podem ser revertidas ou minimizadas, mas uma extinção é para
sempre.

Inúmeras pesquisas têm mostrado que a probabilidade de uma espécie se ex­


tinguir aumenta enormemente quando sua população se torna pequena (Lande
1988; Young & Isbell 1994; Bailou et al. 1995). Definir o momento exato em
que uma população começa a sofrer as consequêntíias do número reduzido de
indivíduos depende de diversas variáveis, nem sempre conhecidas ou identi­
ficáveis. Entretanto, uma coisa é certa: todas as espécies da flora e da fauna
necessitam de um número mínimo de indivíduos para garantir que estejam
aptas a sobreviver e seguir seu cam inho evolutivo. Portanto, para garantir a
sobrevivência de uma espécie, é necessário garantir que ela possua pelo me­
nos essa população mínima viável. São numerosos os desafios para atingir­
mos esse mínimo necessário à sobrevivência das espécies e, quando isso não
é alcançado naturalmente, faz-se necessário o uso de manejo conservacionista
■que garanta os patamares mínimos genéticos, demográficos e ecológicos tom -
patíveis com sua perpetuação (Soulé 1987; Sim berlóff 1988). A questão central
nesse caso é saber quanto tempo uma espécie levará para se extinguir depois
que sua população for reduzida, seja pela intervenção humana ou não. Para
salvar espécies ameaçadas de extinção, conservacionistas estão sempre bus­
cando atingir dois objetivos principais: o primeiro é reduzir as ameaças sobre

633
CLÁ UDIO B . V A LLA D A RES-PAD U A
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RUDRAN

a espécie e o outro é recuperar sua viabilidade (Soulé 1987). Neste capítulo,


trataremos das maneiras para se atingir esses objetivos, discutindo as princi­
pais ameaças à sobrevivência de uma espécie em risco de extinção, maneiras
de reduzir ess^s ameaças e as técnicas de manejo conservacionista utilizadas
para salvá-las.

Causas da existência de espécies ameaçada^


A maior parte das espécies em extinção encontra-se nesse limiar pela ação do
homem. Segundo Primack & Rodrigues (2001), são várias as atividades huma­
nas que provocam essa situação. As mais importantes são as seguintes:

• destruição da natureza/fragmentação de ecossistemas;


• degradação de hábitat (incluindo poluição);
• superexploração das espécies para uso humano;
• introdução de espécies exóticas; e
• aumento de ocorrência de doenças.

A maior parte das espécies ameaçadas sofre de uma ou mais dessas ameaças e,
como consequência, tem o seu número reduzido. O grande desafio da conser­
vação de espécies é reduzir as pressões negativas sobre elas e seu hábitat e,
com isso, aumentar sua probabilidade de sobrevivência. Todavia, em casos
extremos, é preciso manejá-la genética e demograficamente para manter sua
população dentro dos patamares de viabilidade, enquanto se trabalha a redu­
ção das ameaças que recaem sobre si.

Desafios na conservação de pequenas populações


Os criadores de animais domésticos sempre souberam que às pequenas popu­
lações não eram tão saudáveis ou produtivas quanto as grandes populações.
Pequenas populações podem ser ameaçadas por fatores intrínsecos, como va­
riações ao acaso de eventos genéticos e demográficos, ou extrínsecos, como
eventos ambientais atuando na genética e na demografia da espécie (Nunney &
Campbell 1993). Os fatores intrínsecos mais importantes em demografia são
aqueles que, ao acaso, afetam as taxas de nascimento e morte ou a razão sexual
de uma população.' Entre esses fatores, as populações podem ser afetadas em
sua variabilidade genética. Uma pequena população pode, simplesmente pela
ação do acaso, ter alguns genes de uma geração não transmitidos para a geração
seguinte. Já entre os fatores extrínsecos, aquele que mais afeta uma pequena
população é simplesmente a variação ambiental.^ Final mente, uma outra amea­
ça às pequenas populações são as catástrofes, como um incêndio ou furacão,

634
MANEJO IN TEGRADO DE ESP É C IES AMEAÇADAS

que p odem d izim ar tod a a p o p u lação (B ailou et al. 1 9 9 5 ).

As populações pequenas não possuem, naturalmente, toda a gama de oportu­


nidades de recuperação das populações maiores. Assim, na conservação de
espécies que possuem populações reduzidas devem ter prioridade pesquisas
sobre a situação dessas espécies na natureza (statu s) e a formulação de um
programa de manejo específico para elas.

Objetivos na conservação de pequenas populações


Nos últimos anos, os especialistas em biologia da conservação desenvolveram
numerosos métodos para detecção do status e manejo conservacionista de es­
pécies que possuem pequenas populações (Thomas & Jones 1993; Simberloff
1994; Opdam et a l 1994; Lomolino & Channell 1998; Forbes & Boyd 1997;
Struhsaker & Siex 1998; Seddon 1999; Valladares-Padua et al. 2001). São várias
as etapas a serem percorridas nesse trabalho para a construção de um plano de
manejo, sempre com o objetivo de reduzir as ameaças sobre a espécie e recupe-
râr sua viabilidade. Uma questão importante, nesse caso, é o que vem primei­
ro: a espécie ou o hábitat. Não há como separar o hábitat e a espécie em um
programa de conservação. O objetivo de salvar uma espécie está relacionado,
também, à proteção e conservação de seu hábitat, e as ações para isso devem
ocorrer concomitantemente.

Primeiramente, há a necessidade de se diagnosticar a situação da espécie e de


seu hábitat, para que se possam definir quais são as ameaças à sua sobrevivên­
cia. Outra questão importante é onde se deve pôr mais ênfase primeiro: no
cativeiro ou na natureza. Após o diagnóstico, devem-se buscar soluções ade­
quadas e planejar ações futuras.

Para a conservação de populações pequenas é fundamental a criação de um


cenário onde exista fluxo gênico suficiente para escapar dos efeitos deletérios
genéticos e demográficos prejudiciais, já mencionados para pequenas popula­
ções, aumentando o número de indivíduos e mantendo ao mesmo tempo a
variabilidade genética da espécie. Esse fluxo gênico pode ser planejado através
de ações como translocações e reintroduções. As definições utilizadas para
essas movimentações estão relatadas abaixo:

a. Reintrodução: Movimentação de animais nascidos em cativeiro de volta à


vida livre, dentro do território original de ocorrência.

b. Translocação: Movimentação de animais selvagens entre subpopulações dis­


tintas, dentro do território de ocorrência.

635
CLÁUDIO B . V A LLA D A RES-PA D UA
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RUDRAN

O estabelecimento de populações em cativeiro para a conservação de espécies


ameaçadas é uso corrente em biologia da conservação, com programas de cria­
ção estabelecidos especialmente para esse fim e com diretrizes internacionais
padronizadas (IUCN 1987; IUDZGB/CBSG 1993). A popiilação de cativeiro
serve, nesse caso, como uma base para a reconstrução da população na nature­
za, após a ocorrência de possíveis catástrofes dizimadoras ou outros fatores
redutores populacionais. Serve também como incremento de indivíduos na
natureza em programas de reintrodução, e como instrumento de educação e
conscientização do público leigo nas instituições de criação em cativeiro. No
entanto, é importante salientar que a população em cativeiro e as reintrodu-
ções não devem figurar como as únicas e principais soluções para a conserva­
ção de uma espécie com tamanho populacional pequeno (Cohn 1988; Snyder
et al. 1996).

Uma população de cativeiro que possa manter os níveis desejados de variabi­


lidade genética (normalmente 95% da variação existente num período de 100
nos; Bailou et al. 1995) necessita de um tamanho considerável, o que dificul­
ta seu gerenciamento e aumenta os custos de criação. Além disso, há um pos­
sível depauperamento genético da população, com o tempo, se não forem adi­
cionados novos indivíduos selvagens a ela (novos fundadores). Existe ainda a
consequência da mudança de hábitos comportamentais dos animais em cati­
veiro, que podem passar a apresentar comportamentos que comprometam sua
sobrevivência em vida livre.

A pesquisa das populações naturais fornece dados fundamentais para o esta­


belecimento de padrões de criação em cativeiro. Além disso, as populações
selvagens são inseridas com o objetivo de manter a viabilidade populacional,
através das translocações, e ajudam a direcionar o planejamento das ações
futuras para a conservação de espécies com pequeno tamanho. Programas que
procurem unir de forma sistematizada e ágil as ações na natureza e no cativeiro
são os mais indicados (Simberloff 1988; Balmfoíd et al. 1995), mas ainda não
são comuns em nosso país.

Gomo fazer conservação de espécies


O grupo de pesquisas do IPÊ desenvolve um programa diferenciado para o
manejo de espécies ameaçadas, denominado programa de manejo de metapo-
pulação, que envolve ações integradas entre cativeiro e vida livre. A metapo-
pulação é tradicionalmente definida como um sistema de subpopulações que
possuem fluxo gênico interpopulacional limitado, e estão sujeitas a eventos de
MANEJO IN TEGRADO DE E SP É C IE S AMEAÇADAS

extinção e recolonização (Levins 1969). Atualmente, essa definição está sendo


utilizada de forma mais ampla, e a metapopulação é descrita como uma série
de subpopulações num ambiente fragmentado de hábitats ótimos e subótimos,
com ou sem a dinâmica de extinções e recolonizações (Hanski 1999). O manejo
de metapopulação em conservação segue essa definição mais ampla.

O programa de manejo de metapopulação enfoca a conservação de subpopula­


ções pequenas de uma espécie em conjunto, como uma grande população.
Esta estratégia considera a população em cativeiro, chamada de “população
núcleo”, como uma subpopulação. As outras subpopulações são aquelas con­
finadas a fragmentos florestais isolados. O programa de manejo assume que o
fluxo gênico entre as subpopulações é o fundamento da estratégia de conserva­
ção (Bailou & Valladares-Padua 1997), e esse fluxo é feito a partir de movimen­
tações de indivíduos entre as subpopulações, incluindo a população-núcleo,
por meio de reintroduções e translocações.
I
Neste manejo, a população em cativeiro (população-núcleo) não precisa ser
grande, porque o fluxo constante de indivíduos entre cativeiro e natureza
manterá a diversidade genética necessária, com um número menor de animais.
Desta forma, a população-núcleo possuirá sempre uma alta proporção da di­
versidade de genes selvagens. Isso a torna uma população com a mesma quali­
dade genética e demográfica da população selvagem, e que pode ser usada para
repovoar a natureza caso algum fator adverso aconteça.

No programa de manejo de metapopulação, a manutenção da viabilidade po­


pulacional não está limitada à população de cativeiro, através das reintrodu­
ções. O manejo é integrado entre as subpopulações selvagens e a população-
núcleo, sendo que a ênfase maior está nas subpopulações selvagens, que são a
base para a viabilidade da espécie (Figura 1) (Valladares-Padua et al. 2001).

É importante salientar que, nesse tipo de manejo, somente com um estreito


contato entre os profissionais que trabalham no cativeiro e na natureza pode-
se estabelecer um programa de sucesso, no qual se diagnostique e solucione os
problemas da espécie. As etapas básicas de um programa de manejo integrado
para a conservação de populações pequenas estão listadas abaixo e ilustradas
no fluxograma logo a seguir (Figura 2).

637
CLÁUDIO B . VALLAD A RES-PA D U A
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RU D RA N

METAPOPULAÇÃO

População Núcleo

% ® ■
Subpopulações selvagens
O

Figura 1. Conceito de metapopulação: o esquema indica o fluxo gênico entre a população-


núcleo (cativeiro) e as subpopulações selvagens.

A pesquisa
O primeiro passo é o desenvolvimento de um programa amplo de pesquisa,
que permitirá o diagnóstico das ameaças à espécie e ao seu hábitat. A pesquisa
leva à visualização da situação atual da espécie, seja no campo ou em cativeiro
(se já houver população em cativeiro) e fornece dados para o planejamento das
ações adequadas para a sua conservação. Um programa de pesquisa não preci­
sa necessariamente chegar ao fim antes que ações conservacionistas sejam es­
tabelecidas, mas deve direcioná-las sempre. Essas ações devem ser avaliadas
periodicamente e revistas de acordo com o avanço das pesquisas.

A Ação
O planejamento, a execução e a avaliação das ações são etapas fundamentais
para o sucesso do programa de conservàção. Após o diagnóstico do status da
espécie e de seu hábitat, deve-se compilar os dados e definir as ações pertinen­
tes. Em um manejo integrado para a conservação de espécies ameaçadas, ne­
cessita-se de um fluxo razoável de animais entre as diversas subpopulações.
Para isso, duas estratégias são adotadas: a primeira envolve manejo de movi­
mentação, em que são utilizadas as reintroduções e as translocações; a segun­
da, sempre que possível, consiste em criar as condições para que o fluxo de

638
MANEJO INTEGRADO DE ESP ÉC IES AMEAÇADAS

Pesquisa <• - i Obtenção de


Recursos

^ f
I 1 •' mi ......
W «n
<3
jpiiHKM.'i
Ação
Natureza '"'T-!'"' Cativeiro
_ f _
Educação Ambiental

f "

Ações Políticas

- <-
Conservação do Hábitat

♦ - .

Manejo Cativeiro/Natureza

Figura 2: Fluxo g ram a: etap as do program a integrado para co n se rv a ç ã o de e s p é c ie s


a m e a ç a d a s.

animais se faça naturalmente. É importante trabalhar na conservação do hábi­


tat, através da restauração da paisagem florestal.

Além dessas ações técnicas com as populações em cativeiro, na natureza e com


a conservação do hábitat, devem-se incorporar ao programa as atividades de
educação ambiental e de políticas públicas. Em um programa de conservação,
há a necessidade de apoio de diversos setores da comunidade, e somente com
ações políticas podemos ampliar nossos esforços e conseguir parcerias. Essas
ações envolvem equipes multidisciplinares, pesquisadores de campo e de ca­
tiveiro e educadores. É, também, importante que as etapas e avaliações sejam
feitas conjuntamente. Mesmo que existam trabalhos paralelos, periodicamente
o grupo envolvido com a espécie deve se reunir para investigar os avanços, os
problemas e as novas direções a serem tomadas. O sucesso desse manejo re­
quer a integração de manejo ex-situ (realizado fora da natureza) e in-situ (reali­
zado na natureza).

639
CLÁUDIO B . V A LLA D ARES-PA D U A
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RUDRAN

Os recursos
Um trabalho de conservação envolve ações em longo prazo e, antes do início
de qualquer programa, há a necessidade de se buscar recursos que garantam a
continuidade do programa. De forma geral, é interessante iniciar a busca de
recursos pelo menos um ano antes do início do programa.

Manejo integrado em conservação


Atividades na natureza
Levantamento: A etapa inicial da pesquisa na natureza é a realização do levan­
tamento da situação atual da espécie em sua área de distribuição. Esse trabalho
requer metodologias específicas, dependendo da espécie a ser investigada, o
que não será tratado neste capítulo (para maiores detalhes vide Cullen Jr. &
Valladares Pádua 1997). O levantamento indicará as subpopulações naturais
existentes, além do hábitat remanescente para a espécie. E nesse momento que
se diagnosticam as ameaças à espécie e ao seu hábitat como, por exemplo, se
existem pressões de caça ou de desmatamento na região. Deve também ser feito
um levantamento das áreas protegidas existentes e por serem constituídas,
para que se possa obter o diagnóstico do statu s da espécie, ou seja, se as
subpopulações estão em ambientes protegidos ou não.

Censo e demografia: A informação sobre o tamanho populacional da espécie é


fundamental e deve ser verificada concomitantemente ao censo das popula­
ções silvestres conhecidas. Com esse dado pode-se estabelecer o número mí­
nimo de animais existentes e estimar a capacidade-suporte para a espécie em
áreas protegidas e em áreas não protegidas, ou seja, o número de indivíduos
de uma espécie que o hábitat pode sustentar (Gysel & Lyon 1987). Ao se reali­
zar o censo, se houver possibilidade, dados de demografia devem ser coleta­
dos como, por exemplo, o número de animais nos grupos (se forem espécies
sociais), composição etária e sexual, presença de filhotes etc.

Análises genéticas: As análises genéticas fornecem dados importantes sobre


as populações selvagens. Análises bioquímicas comparativas, em nível intra-
específico, como o cariótipo, ou as análises de polimorfismo e heterozigose,
por eletroforese, indicam níveis de variabilidade populacional. Esses dados
são úteis para se detectar se a espécie já está prejudicada pelo seu pequeno
tamanho ou se existem algumas subpopulações com maior variabilidade que
outras. Análises mais sofisticadas de genética molecular (ADN satélite e ou­
tras) (Avise & Hamrick 1996) podem detectar diferenças importantes entre

640
MANEJO INTEGRADO DE ESP É C IES AMEAÇADAS

subpopulações na hora de se movimentar animais. Esses dados servem, por


exemplo, para se decidir quais são as subpopulações mais valiosas para o
manejo integrado ou se é mais interessante movimentar indivíduos machos ou
fêmeas dentro da metapopulação. Também são importantes para definir se exis­
tem diferenças genéticas grandes entre as subpopulações e, portanto, a neces­
sidade de se manejar algumas subpopulações de forma diferenciada.

As análises genéticas são custosas e, em muitas ocasiões, serão iniciadas e


tonclu íd as somente após o início do programa de manejo. Conforme já foi
citado, as etapas da pesquisa não precisam terminar antes do planejamento e
da implementação do programa de conservação, mas são importantes para sua
avaliação e, em alguns casos, seu redirecionamento.

Ecologia e comportamento: Estudos de longa duração em ecologia e comporta­


mento da espécie são básicos e devem fornecer, no mínimo, dados sobre: a)
identidade dos indivíduos estudados; b) idades individuais; c) composição
grupai quando for o caso; d) reprodução; e) descrição do território e de sua
qualidade; f) comportamento alimentar e dieta; g) uso do espaço; e h) orçamen­
to temporal (tempo destinado pela espécie às diferentes atividades durante o
dia). Esses estudos devem ser sistematizados e, novamente, a metodologia vai
depender da espécie-alvo. Dados de história natural também são valiosos, por
indicarem sutilezas da espécie que devem ser levadas em consideração tanto na
criação em cativeiro quanto na hora de se intervir por meio de movimentações.

É importante notar que a presença do pesquisador no campo é fundamental


para o sucesso do programa de conservação. O diagnóstico da situação da
espécie e de seu hábitat demanda tempo, por esta razão, a experiência e a
vivência do pesquisador no campo serão instrumentos valiosos no planeja­
mento das ações em prol da conservação da espécie. Alem disso, a presença
de pesquisadores tem, em geral, um efeito inibidor sobre algumas ameaças que
recaem sobre a espécie, como caça e destruição de hábitat.

Reconstrução de hábitat: Concomitantemente com a pesquisa na natureza, e


tão logo haja dados disponíveis, deve ser iniciado um programa de conserva­
ção do hábitat que contemple a reabilitação, a restauração ou ambas. As etapas
que envolvem a conservação do hábitat da espécie devem ser enfatizadas, pois,
sem a manutenção, o incremento e o bom gerenciamento dos locais onde a
espécie será manejada, não existe um comprometimento com a conservação
em longo prazo. Portanto, atividades de reabilitação e restauração do hábitat
devem ser estimuladas, ainda que não sejam realizadas pelo grupo envolvido
com o programa de manejo.

641
CLÁUDIO B . V A LLA D A RES-PAD U A
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RUD Y RUDRAN

Podem ser estimuladas parcerias com produtores rurais para o plantio de cor­
redores florestais que comuniquem fragmentos isolados de ambientes a serem
protegidos ou, ainda, linhas de ação direcionadas para a criação de Reservas
Particulares do Patrimônio Natural (RPPN’s), também com os proprietários
rurais. Estas ações podem gerar benefícios, como isenção de impostos ou faci­
lidade de crédito em bancos oficiais. Em muitos casos, esse plantio pode regu­
larizar a situação legal da propriedade, que necessita manter uma área de Re­
serva Legal (um percentual da propriedade) e muitas vezes não o faz. As pes­
quisas com modelos de uso da terra através de sistemas agroflorestais são
exemplos de correntes atuais de sistemas produtivos e que podem ser incor­
poradas ao programa através de parcerias (Cullen et al. 2001, Valladares-Padua
et al. 2002a; 2002b).

Atividades de cativeiro
Uma vez identificada a situação da espécie e d» seu hábitat, o estabelecimento
de uma subpopulação em cativeiro é parte do manejo integrado. Pode ser que
já exista uma população em cativeiro da espécie, e esta será incorporada ao
programa. O manejo de alta qualidade em cativeiro é muito importante para o
sucesso do plano como um todo. As etapas a seguir detalham como este mane­
jo deve ser feito.

Compilação de dados básicos da colônia: Esses dados são importantes para a


análise populacional das colônias de cativeiro. São necessárias as seguintes
informações: a) identificação dos indivíduos; b) data de nascimento ou entrada;
c) data da morte ou saída; f) filiação; g) local de origem; e h) outras informações.

Uma grande dificuldade no manejo em cativeiro é o acompanhamento da vida


de um indivíduo. Atualmente, existem programas de computador (softw ares)
específicos para zoológicos (Arks & Sparks, ISIS 1997), que permitem a entra­
da e o acompanhamento dos dados das colônias, de forma ágil e organizada.
Marcações permanentes como a tatuagem e/ou m icroch ip s permitem a separa­
ção individual dos animais, o que facilita o registro dos dados da vida de cada
animal. Esses dados são importantes para a construção dos livros de linha­
gem, os livros de registro (stu dbooks), que são documentos que contêm anota­
ções de todos os animais nascidos em cativeiro e de sua descendência, além
de todos os dados sobre o manejo de cada um dos animais. Os studbooks são
a fonte de informação para as análises demográficas e genéticas da população
de cativeiro.

642
MANEJO IN TEGRADO DE ESP ÉC IES AMEAÇADAS

Análise genética quantitativa


Para uma boa avaliação genética usando o método quantitativo são necessários
pelo menos os seguintás passos: a) construção do “pedigree” de cada animal;
b) identificação dos fundadores da colônia; c) estabelecer a participação dos
fundadores na colônia; d) localização dos possíveis gargalos genéticos; e) cál­
culo do número de crias e consequentemente a descendência de cada indiví­
duo; f) cálculo dos coeficientes de consanguinidade.

Todas essas análises são realizadas por programas de computador específicos


como Sparks (ISIS 1997) e/ou PM2000). Em um programa de conservação em
cativeiro existe um funcionário responsável pelo registro de dados (stu d book
k e e p e ij, que com pila os dados de todas as instituições que mantêm indiví­
duos em cativeiro e realiza as análises listadas acima. Esse profissional é esco­
lhido pelo grupo envolvido no programa de manejo e deve possuir conheci­
mentos tanto de genética quanto de biologia da espécie. As análises são reali­
zadas periodicamente (geralmente de dois em dois anos), para se avaliar o
desempenho da colônia de cativeiro e direcionar o seu manejo.

Análise genética bioquímica

Para uma boa avaliação genética usando métodos bioquímicos, são necessários
pelo menos os seguintes passos: a) cariotipia; b) análise de polimorfismo e hete-
rozigose por eletroforese; c) DNA satélite; e d) DNA nuclear ou mitocondrial. As
análises genéticas mais específicas podem e devem ser usadas num programa de
manejo. Análises como a oariotipagem podem contribuir para diferenciar alguns
grupos taxonômicos e definir “unidades de conservação” (Paetkau 1999). A ava­
liação por eletroforese pode indicar níveis de variabilidade genética presentes
na espécie e as análises mais modernas de genética molecular (DNA satélite),
tanto nuclear quanto DNA mitocondrial, fornecem informações detalhadas so­
bre a taxonomia e a variabilidade das populações (Avise e Hamrick 1996).

Análise demográfica

As análises demográficas requerem os seguintes parâmetros e ações: a) deter­


minação do tamanho atual da população; b) determinação da capacidade de
suporte do cativeiro; c) determinação da estrutura etária e sexual da popula­
ção; d) elaboração das curvas específicas de idade para sobrevivência e fecun­
didade; e) análise da taxa de mudanças e da capacidade de autossustentação;
f) organização da estabilização populacional em torno da autossustentação; e g)
reunião de dados de pesquisas em reprodução, comportamento etc. Essas aná­
lises, realizadas pelo funcionário (stu d book k eep er) responsável pela espécie,

643
CLÁUDIO B. VALLA D A RES-PAD U A
CR1STIANA SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RU D RA N

juntamente com as análises genéticas quantitativas, são fundamentais para o


bom manejo em cativeiro. Som ente com esse acompanhamento periódico e
detalhado pode-se estabelecer o papel da população de cativeiro no manejo
integrado da espécie.

A análise demográfica é realizada pelos mesmos softw ares das análises genéti­
cas e precisa ser discutida com os profissionais de cativeiro, que avaliarão o
desempenho das colônias com base nesses dados e nos do dia a dia, na insti­
tuição. Com essas análises, são detectados, por exemplo, problemas de repro­
dução numa colônia, se existe um desvio para o nascimento de determinado
sexo ou, ainda, se a colônia está muito velha e tende a diminuir com o tempo.
Esse acompanhamento demográfico também é feito periodicamente para ava­
liação do manejo proposto. A ilustração abaixo mostra esses passos do acom­
panhamento da população de cativeiro (Figura 3).

Criação'da população de cativeiro

0 \
/ ' * \

Profissionais de Studbook keeper


zoológicos I

0 0
Manejo das colônias Compilação dos dados
populacionais
Análises Genéticas
Análises Demográficas

Figura 3. Fluxograma: acompanhamento e manejo da população de cativeiro no programa


integrado de conservação

Padrões de criação

A elaboração de um guia de manejo da espécie em cativeiro, com versões anu­


ais, é de extrema importância para o programa conservacionista da espécie.
Além do cuidado genético e demográfico, informações sobre comportamento,
nutrição e patologias, .entre outras, são cruciais para a evolução e o aprimora­
mento da criação em cativeiro. Neste sentido, mais uma vez a comunicação
entre os profissionais de cativeiro e de campo é vital, pois a troca de informa­
ções pode gerar dados importantes para o manejo. Modificações que levem à
melhoria do manejo populacional devem ser adotadas por todas as colônias.

644
M ANEJO INTEGRADO DE ESPÉC IES AMEAÇADAS

Outras Atividades

E d u c a ç ã o a m b ien tal

Um dos pontos importantes a ser salientado em um programa integrado para a


conservação de espécies ameaçadas de extinção é o programa de educação
ambiental. Ele deve ser levado para o cativeiro e para áreas naturais e deve
tentar atingir os seguintes públicos: a) comunidades vizinhas às áreas de dis­
tribuição da espécie; b) proprietários de áreas de hábitat da espécie; e c) auto­
ridades governamentais. Se não existirem unidades de conservação na área de
ocorrência da espécie, todo esforço deve ser feito para que sejam criadas.

M o v im en ta çõ es

Um programa de manejo integrado para populações pequenas depende, para


seu êxito, das movimentações de animais. A reintrodução é um importante elo
entre cativeiro e natureza. As reintroduções e translocações são a base para se
estabelecer novas populações viáveis. Todo esforço deve ser concentrado nes­
sa etapa. A metodologia para a implementação dessas movimentações e de seu
posterior monitoramento é muito variável, dependendo da espécie em questão e
dos objetivos de manejo. A International Union for the Conservation of Nature
(IUCN] possui protocolos para o início de um planejamento nesse sentido.

C om itê de m an ejo

Os comitês de manejo são órgãos de consultoria, formados por especialistas


nas espécies e que, por isso, ajudam na conservação. Todas as atividades
constantes do programa de manejo integrado de uma espécie ameaçada devem
ser elaboradas e implementadas por um com itê de manejo. Atualmente, já
existem comitês formados para várias espécies no Brasil, sob a coordenação do
Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Esses comitês
são os responsáveis pelo Plano de Manejo de várias espécies ameaçadas, exis­
tindo comitês para os micos-leões, para a ararinha-azul-de-Lear, para o lobo-
guará, entre outros. Na formação de um comitê, é interessante a inclusão de
profissionais de diversas áreas, para que os problemas da espécie possam ser
tratados sob várias perspectivas.

F o rm u la çã o do p ro g ra m a

Após todas as etapas acima terem sido realizadas, ou concomitante com elas,
quando necessário, o programa deve ser elaborado. Na etapa das movimenta­
ções, recomendações claras devem ser especificadas animal por animal e insti­
tuição por instituição; a) designar animais excedentes; b) dar destino a esses

645
CLÁUDIO B . VALLA D A RES-PA D UA
C R IST IA N A SA D D Y M A RTIN S
RU D Y RU D RA N .

animais; c) designar animais reprodutores em cativeiro; d) propor retirada de


animais da natureza; e) propor retorno de animais à natureza; e f) designar
métodos e locais para manejo da espécie.

Essas recomendações são normalmente feitas pelo stu d book keep er, que é o
profissional que detém um profundo conhecimento da população em cativeiro
da espécie. Em um programa de manejo integrado, como são planejadas movi­
mentações tanto de cativeiro para a vida livre como entre populações selva­
gens, é de extrema importância contar com a equipe de pesquisadores de cam­
po na elaboração das movimentações. Isso porque os pesquisadores de campo
conhecem os locais mais adequados à soltura dos animais, as condições do
hábitat, as ameaças e o comportamento dos animais necessário à sobrevivência
em vida livre. Além disso, serão eles que realizarão as atividades de monitora­
mento posteriores à movimentação.

Im p la n ta ç ã o do p ro g ra m a

Uma vez aprovado pelo comitê de manejo, o programa deve ser divulgado a
todas as instituições participantes, através de seus representantes. Cada insti­
tuição assume a responsabilidade de executar a sua parte do programa.

R ev isõ es e m o d ifica çõ e s

Depois de elaborado e implementado, o programa deve ser revisto periodica­


mente, dependendo de cada situação. O manejo de uma espécie deve ser dinâ­
mico e aberto a novas informações e sugestões que possam melhorar sua cria­
ção e reprodução.

R e cu rso s e m eios

Várias são as fontes de recursos para um programa de manejo integrado: insti-


tuições que criam a espécie em cativeiro; agências governamentais nacionais e
internacionais; organizações não governamentais nacionais e internacionais.
Cada participante do programa pode obter seus recursos separadamente e exe­
cutar suas ações. O importante é que exista comunicação entre todos os envol­
vidos, para que a continuidade do programa seja garantida.

In flu en cian d o p o lítica s p ú b lica s

A Figura 4 ilustra como um programa integrado deve ser estruturado para


alcançar a conservação de uma espécie e de seu hábitat, e como pode atingir
resultados além dos inicialm ente previstos. A pesquisa em longo prazo com
uma espécie permite envolver a comunidade em um processo de conservação

646
MANEJO IN TEGRADO DE ESP ÉC IES AMEAÇADAS

do hábitat, com parcerias, ajudando a conservação e participando de uma


mudança lenta mas importante da paisagem. O conhecim ento profundo da
situação regional, após esse período de pesquisa, possibilita a influência nas
políticas públicas regionais e estaduais. Um programa de manejo, por ser um
trabalho longo e que envolve diversos setores de uma comunidade, gera opor­
tunidades de m udanças, além do espectro 'técnico-científico, promovendo
mudanças políticas, primordiais na manutenção da conservação da natureza.

Figura 4. Âmbito de desenvolvimento das tarefas num programa integrado de conservação


de espécies am eaçadas.

O fu tu ro: c ria n d o ce n á rio s

Por meio da modelagem matemática, podemos avaliar o sucesso de um progra­


ma de manejo. Os modelos nos permitem criar cenários ideais e trabalhar com
previsões em longo prazo. Alimentando determinados softw ares (Vortex, por
exemplo, -Lacy 1993) com resultados parciais do programa, pode-se avaliar a
necessidade de redirecionamento ou de se manter os objetivos estabelecidos
anteriormente. Embora todo modelo seja restrito, pois a natureza é mais com­
plexa que um modelo matemático, esse instrumento ajuda a avaliar o plano de
manejo, indicando prioridades. Por meio desses modelos, as análises de via­
bilidade de hábitat e populacionais são realizadas (PHVA / population and
habitat viability analysis), ou seja, previsões sobre a sobrevivência da espécie

647
C LÁU DIO B . VALLA D ARES-PA D U A
C R IST IA N A SA D D Y M A R TIN S
R U D Y RUDRAN

em períodos determinados de tempo (Harcourt 1995; Taylòr 1995). O exercício


de criar cenários que permitam a sobrevivência da espécie sob diferentes con­
dições leva os pesquisadores à avaliação dos diversos fatores envolvidos e
ajuda na identificação das prioridades de ação e pesquisa. No entanto, apesar
de valiosos instrumentos, os modelos não substituem os pesquisadores en­
volvidos no programa e os dados das pesquisas desenvolvidas sobre a espé­
cie. Um bom programa de conservação deve estar baseado em dados de pes­
quisa e na experiência dos especialistas envolvidos.

Conclusões
Mesmo sem ter a intenção e a responsabilidade de atuar em áreas diferentes do
m anejo da espécie, neste tipo de programa deve-se participar do processo
comunitário de busca de alternativas de desenvolvimento sustentáveis e iden­
tificação de agentes apropriados para a realização das ações. Resultados mais
duradouros para a conservação de uma espécie são atingidos quando se conse­
guem parcerias e o apoio da comunidade local.

Para o restabelecimento de uma população viável, de uma espécie ameaçada,


cinco aspectos são fundamentais: a) um conhecim ento aprofundado da sua
biologia; b) o manejo integrado na natureza e em cativeiro, com ênfase na
natureza; c) o envolvimento das comunidades humanas da região e a ocor­
rência com programas de educação am biental; e) uma visão conservacionista
baseada na paisagem, com o uso de técnicas de extensão conservacionista
na restauração do hábitat; e, finalm ente, f) o uso de manejo adaptativo com
avaliações periódicas dos resultados.

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650
M A N E IO IN T E G R A tíO D E E S P É C IE S A M E A Ç A D A S

A pêndice 1. Ilu stração das pesquisas e ativid ad es p ara a im p lem en tação do


program a de m anejo integrado para a co n se rv a çã o de esp écies am e a ça d a s de
extin ção.

Pesquisas de base do program a


Levantam entos
Censos
E cologia/com p ortam ento
Genética
E d u cação am biental
Políticas públicas

6 5 1
Rudy Rudran
Ph.D em ecologia e comportamento
animal pela Universidade de Maryland,
EUA é atualmente diretor da Divisão de
Educação e Treinamento do Smithsonian
Institution. A té o mom ento organizou
120 cursos sobre o tem a conservação da
biodiversidade em mais de 15 países,
além de ter contribuído com o
treinamento a capacitação de
aproximadamente 2000 profissionais de
80 países. Ajudou a produzir manuais em
Biologia da Conservação em Inglês e
Chinês. Esse manual em português é
mais um resultado de sua peregrinação
na conservaçãò da biodiversidade pelo
mundo.

Cláudio Valladares-Padu
é Biólogo e possui doutorado pela
Universidade da Flórida. Atualmente
exerce as funções de Professor na
Universidade de Brasília (UnB) e Direção
Científica do IPÊ Instituto de Pesquisas
Ecológicas. É pesquisador associado do
Centro de Estudos Ambientais e de
Conservação da Universidade de
Colúmbia (CERO e diretor internacional
de conservação do Wildlife Trust ambos
em Nova Iorque. Atualmente ocupa o
cargo de vice-presidente de conservação
da Sociedade Primatológica Internacional.
Entre 1997 e 2002 ganhou quatro
prêmios conservacionistas sendo um
nacional e três internacionais. Possui dois
livros e mais de 40 trabalhos publicados
em revistas científicas nacionais e
internacionais.
Este livro foi co m p o sto Z u rich LtX C nB t 2 4 /1 5 /8 e
Z apfElliptB t 1 0 ,5 /9 ,5 /5 , im presso em off-set, em
papel reciclato 9 0 g/m 2para o m iolo, e papel cartão
250 g/m2 para a capa, pela Imprensa da UFPR para a
Editora UFPR, em agosto de 20 1 2 .
IS B N 9 7 8 -8 5 -7 3 3 5 -1 74-3

E ste livro fo i escrito p or profissionais exp erien tes, cujas


lições aprendidas e conh ecim en tos acum ulados são aqui
com partilhados com com petên cia e gen erosid a d e com um
público am plo qu e inclui v o cê, leitor. Trata-se d e um n ovo
aprendizado ligado às q u estõ e s socioam bientais, no qual
teo ria e prática sã o inseparáveis. A junção de ciência,
m eto d o logia e experiência prática são a tôn ica de
in ovação do co m o fa z e r por g e n te qu e fa z, saben do o que
fa z e ainda se dispondo a ensinar o co m o fazer. Os
organ izad ores Lau ry Cullen Jr., Cláudio Valladares-Padua e
Rudy Rudran apresen ta m o qu e há de mais m odern o em
Biologia da C on servação. E ste livro é van gu arda no Brasil
e no mundo e indispensável nas bibliotecas de qu em se
interessa pelo tem a.
Suzana M achado Padua
Presidente do IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas

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