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irresistível
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VI KEELAND
ENGANO
irresistível
Beautiful Mistake
K34e
Keeland, Vi
336 p.
ISBN 978-85-503-0279-9
CDD 813.6
Capítulo 1
Rachel
Deve haver uma explicação científica para a relação entre ser geneticamente
abençoado e agir como um babaca.
Olhei de novo, tentando entender o motivo para a minha amiga estar parada em
pé do lado de fora do banheiro masculino, completamente embriagada. Claro
que a fila para o banheiro feminino estava cinco vezes maior, porque só os
homens podem se aliviar quando têm vontade. O Cara Casado estava ali parado,
digitando em seu celular – provavelmente mentindo para alguma mulher que não
desconfiava de nada. Analisei o seu dedo anelar esquerdo enquanto os outros
trabalhavam com afinco. Sem aliança. Pasma. Tenho certeza de que um aliança
brilhante de metal, que simboliza o comprometimento eterno com outra pessoa,
costuma dificultar o ato de dizer que está solteiro e procurando a mulher dos
seus sonhos.
Eu amo Ava, mas acho que desconfiaria de qualquer cara com seus trinta anos
Meu olhar subiu da mão do Cara Casado para o seu rosto, exatamente no
momento em que ele olhou para cima. Se ao menos olhos pudessem lançar
facas… Fiz careta para o desgraçado. Não sei por que fiquei surpresa quando ele
sorriu para mim.
Idiota.
Provavelmente pensou que eu o estava secando.
Peguei meu celular do bolso para me distrair, olhar para baixo e ler algumas
mensagens enquanto aguardava. Só que… eu não conseguia ler as malditas
palavras sem os óculos. Deixei o celular de lado e senti que estava sendo
observada enquanto esperava pacientemente. Franzir o cenho usa mais músculos
faciais do que sorrir, e não valia a pena produzir uma ruga por aquele idiota.
Olhei em seus olhos para garantir que ele soubesse que eu o tinha escutado,
então me virei de costas e segui pelo corredor comprido até o bar.
ele começou a dizer alguma coisa. Parei de repente e virei para encará-lo.
Revirei os olhos.
─ Você pensa que só porque é lindo pode ferrar com todo mundo, que pode
sorrir e se safar de qualquer coisa. Bom, espero mesmo que o carma te pegue
algum dia, que sua esposa bonitinha acabe dando para metade de Nova York e te
transmita uma DST que faça seu pau grande cair.
─ Ouça, docinho, não sei quem você pensa que eu sou ou o que pensa que meu
pau grande fez de errado, mas tenho quase certeza de que está me confundindo
com outra pessoa.
─ Isso seria errado, não seria? Considerando… que você sabe sobre mim… e
─ O quê?
─ Quem é Ava?
Inacreditável. Era o tipo de cara que não se lembrava do nome das mulheres com
quem transava. Quero dizer, fazia duas semanas desde a última vez em que
haviam dormido juntos.
Deixei o Owen Casado parado no corredor e voltei para a mesa onde Ava estava
afogando as mágoas em silêncio.
Achei melhor não mencionar meu pequeno desentendimento com Owen. Isso
pug.
Ironicamente, ele estava certo. O futuro deles envolvia, sim, dois filhos e um
pug. Porque ele estava segurando uma coleira enquanto passeava com suas duas
filhinhas loiríssimas no momento em que ela o viu no parque. Só que ele se
esqueceu de mencionar que, nessa versão do futuro, sua esposa também estaria
segurando o filho deles de um mês de idade enquanto passeavam.
─ Eu deveria subir neste balcão e dizer para todas as mulheres tomarem cuidado
com aquele babaca.
Em outra situação, eu teria concordado. Mas, naquela noite, tinha quase certeza
de que, se ela subisse no balcão, acabaria no hospital.
Peguei a blusa dela do encosto da banqueta e segurei para que ela vestisse.
Ava suspirou e, nas duas primeiras vezes, errou o buraco para enfiar o braço.
Atrás do balcão, Charlie ─ que tinha nos ouvido quase a noite toda ─ estava
servindo uma cerveja.
tampo de madeira, derramando cerveja por todo lado. ─ Vou investigar qualquer
babaca com quem uma de vocês duas estiverem saindo. ─ Charlie O’Leary era
Sorri.
─ Ok, mas saiba que isso me faz querer te dar nomes de suspeitos de assassinato,
só para ver suas orelhas ficarem daquela cor roxa adorável quando você está
bravo. ─ Inclinei-me sobre o balcão e lhe dei um beijo na bochecha. ─
Ele resmungou alguma coisa sobre ser grato por não ter filhas e me deu tchau.
─ Podemos sair pela porta dos fundos? ─ Ava perguntou. ─ Não quero passar
─ Claro. É lógico.
─ Humm, Ava, deveríamos sair pela frente. Ele está parado na porta dos fundos
agora.
─ Não, ele está na porta da frente conversando com Sal, o novo garçom.
Ela estava mais bêbada do que eu pensava. Apontei o queixo na direção da saída,
uma linha reta até Owen.
Franzi o cenho.
─ Eu disse que ele era o cara bonito de camisa azul, não o deus grego com cara
de modelo.
Virei rapidamente minha cabeça em direção ao bar. Havia apenas um cara perto
da porta da frente e eu não o conhecia. Ele estava conversando com Sal.
─ Ava… o cara conversando com Sal agora, neste exato momento, é Owen?
─ Sim.
Ela se virou de novo para a porta da frente, apertou os olhos e deu de ombros.
─ Talvez. Não estou conseguindo enxergar muito bem. Minhas lentes estão
embaçadas por causa da maquiagem e do choro.
Quando ela dissera que o seu ex havia acabado de entrar no bar e apontara para a
direção da porta da frente, havia apenas um cara com uma camisa azul de botão.
Merda.
Já que eu não podia fazer Ava sair pela porta da frente, onde o verdadeiro Owen
estava parado, engoli em seco. Claro que o Owen Errado ficou de olho em mim,
com um sorriso no rosto, enquanto eu caminhava até a porta de trás.
Ele assentiu para minha amiga quando passamos.
Saí de maneira covarde, olhando para a frente, sem fazer contato visual com o
cara, até estarmos fora do estabelecimento.
Ava não estava tão determinada. Virou a cabeça e manteve os olhos fixos no
Owen Errado, mesmo quando saímos na rua. Ela podia estar bêbada e com lentes
embaçadas, mas não estava cega.
Olhei para trás enquanto a porta do bar se fechava. O Owen Errado acenou com
um sorriso presunçoso.
Deus, eu ia me atrasar.
sala 208. Precisava muito fazer xixi, mas teria que segurar até o fim da aula. Eu
sabia de três coisas sobre o professor West, além de que ele era do departamento
de composição de música. Um: ele se livrou de sua última auxiliar porque ela se
recusou a corrigir todos os trabalhos que ele queria. Dois: na última semana,
quando eu contava para alguém que havia sido remanejada para o professor
West, todo mundo fazia uma cara ─ nada encorajadora ─ e dizia que ele era um
babaca e que quase fora demitido alguns anos atrás. E três: detestava quando os
alunos chegavam atrasados. Era conhecido por trancar a porta da sala assim que
a aula começava, para que os retardatários não conseguissem interromper.
Nenhuma dessas opções caía bem para mim. Mas que escolha eu tinha? Havia
Quando eu cheguei na sala de aula, gotas de suor desciam por meu decote. A
Trancada.
Merda.
E agora? Verifiquei a hora em meu celular. Estava apenas oito minutos atrasada,
e era o primeiro dia do segundo semestre letivo do ano. Mesmo assim, o
professor já havia dado início à aula lá dentro. Será que eu deveria bater à porta
e interromper a aula, sabendo que ele implicava com isso? Ou simplesmente não
apareceria no meu primeiro dia no novo cargo?
Bati levemente à porta com os nós dos meus dedos, torcendo para algum aluno
no fundo da sala escutar e me deixar entrar sem ser notada.
O professor ficou em silêncio assim que a porta se abriu. Era um auditório, então
eu entrei pela fileira de cima, enquanto ele estava lá embaixo. Para minha sorte,
quando entrei na ponta dos pés, ele estava de frente para o outro lado e
escrevendo na lousa.
Aff.
Queria me afundar no assento e fingir que não tinha sido eu. Mas eu era a
auxiliar, não uma aluna. Precisava que eles me respeitassem, já que daria aula
nessa sala às vezes.
Limpei a garganta.
Pisquei algumas vezes. Meus olhos só podiam estar zoando comigo. Peguei a
bolsa, encontrei meus óculos e os coloquei – mesmo que minha visão de longe
estivesse perfeitamente normal –, como se, por algum milagre, colocar os óculos
fosse transformar em outra pessoa o homem parado à frente da sala.
Não havia como negar. Aquele era um rosto do qual as pessoas não se
esqueciam.
Era ele.
Puta merda.
Estava ferrada.
─ Levante-se. Quem quer que tenha chegado atrasado, por favor, levante-se.
Ah, Deus.
─ Entendi.
A luz acima de sua cabeça refletia em seu rosto como se ele fosse um ator em
cima de um palco, dificultando a visão das fileiras no topo da sala. Ele ergueu a
mão e encobriu os olhos. Agora, eu estava vinte fileiras acima dele ─ devíamos
estar a mais de quarenta e cinco metros de distância ─, mesmo assim, quando
nossos olhos se encontraram, ficaram travados como se fôssemos as duas únicas
pessoas na sala.
Engoli seco.
Capítulo 2
Rachel
A sala estava completamente vazia. Nem tinha certeza se ele sabia que eu ainda
estava sentada lá. Se sabia, estava fazendo um ótimo trabalho em me ignorar
enquanto guardava o seu notebook.
Pulei quando ele falou. Agora que o auditório não estava mais cheio de alunos, a
acústica do espaço enorme ressoava sua voz grave por todas as paredes.
Respirei fundo.
─ Foi o que deduzi. Você pensou que eu fosse o babaca, o cara do pau grande,
não é?
Desatei a falar.
─ Minha amiga Ava saiu com esse cara chamado Owen por um mês ou mais.
Ele falava um monte de merda desde o primeiro dia, mas ela não percebeu. Certa
noite, quando ela estava saindo do trabalho, ele foi ao seu encontro e disse:
“Você se importa se te acompanhar até a sua casa? Minha mãe sempre disse para
seguir os meus sonhos”. Ela caiu na dele, em toda a farsa, desde o primeiro dia.
Assenti.
─ Ela chegou durante o meu turno e começou a beber vários Long Island.
Quando Owen entrou, ela apontou para a direção em que ele estava e disse que
era o cara de camisa azul.
─ Na verdade, não. Ava não é de beber muito. Acabou que ela estava mais
alterada do que pensei. A camisa de Owen era marrom… Não era nem preta, que
─ De qualquer forma, sinto muito mesmo. Mal lhe dei chance de falar e, quando
percebi o que tinha acontecido, fiquei com tanta vergonha que nem parei para
me desculpar.
─ Aceito sua desculpa por ontem à noite. Embora não devesse abordar um
homem no corredor para lhe dar um sermão sozinha, suas intenções foram
admiráveis.
Eu deveria ter ficado quieta e grata por ele aceitar minha desculpa. Deveria.
─ Porque você tem um metro e meio, e isso não é nada em um bar barulhento.
─ Eu sei me cuidar.
─ Não disse que não sabe. Disse que não deveria se colocar nessas situações.
─ Mas insinuou que eu não conseguiria fazer isso.
Deus, eu era mesmo uma idiota. Ficar perto desse homem parecia me
transformar em uma psicopata.
─ Não, desculpe. Agi como uma idiota e gostaria de começar de novo, se for
possível.
Ele assentiu.
─ Obrigada.
─ Mas esta manhã não. Não vou tolerar atrasos. Não deixe acontecer novamente.
Engoli.
─ Não deixarei.
Nesse horário eu estaria bem no meio do meu turno, mas daria um jeito.
─ Ok.
Isso fez o professor West me presentear com um sorriso amplo. Deus, ele
deveria fazer mais isso. Não, esqueça. Definitivamente, não deveria.
─ Te acompanho.
Droga.
─ Criativa.
─ Obviamente.
Ele me analisou.
─ Imagino que seja frequente você se atrasar?
─ Infelizmente, sim.
─ Fico feliz em ouvir isso, Srta. Martin. Mas não é isso que precisa ser
esclarecido.
─ Mais cedo, eu lhe disse que não mordia alunos. ─ Ele sorriu, e eu senti a
perversidade daquilo atingir locais interessantes. ─ Não mordo. Mas não
prometo não morder auxiliares estressadinhas.
Algumas garotas tinham pais que atiravam quando os garotos iam buscar suas
─ Então, quem é esse cara que vai encontrar hoje à noite? ─ Ele tirou o taco que
guardava atrás do balcão e o colocou no tampo. ─ Vou deixar isso aqui para
quando ele chegar.
─ Estou bem, Charlie. Ele é um contador de trinta e dois anos, de Upper East
Side.
─ Não se deixe iludir. As aparências enganam. Sal parece muito com açúcar,
docinho.
Eu não sabia por que estava tentando namorar agora. Desde que as coisas
acabaram com Davis, há oito meses, fiquei em um hiato de encontros
autoimpostos. Não tinha tempo nem energia para colocar em um relacionamento.
Sem contar que eu não tinha um bom histórico com homens, em geral. Fazia isso
mais para animar Ava. No último inverno, ela e o namorado terminaram depois
de sete anos de namoro, bem no aniversário de vinte e cinco anos dela. Eles
estavam juntos desde o último ano do Ensino Médio. Após meses vendo-a triste,
finalmente a convenci a entrar em um desses sites de encontro. Me inscrevi por
solidariedade, pois nunca tive realmente a intenção de sair com alguém. Que
ótimo trabalho eu havia feito: foi nesse site de encontro que ela conheceu o
Owen Casado. Com amigas como eu para animá-la, logo ela começaria a tomar
Prozac.
Pensei em realçar meus olhos verdes com um pouco de lápis preto, mas mudei
de ideia. Já está bom, pensei. Essa, provavelmente, não era a maneira ideal de
me preparar para um primeiro encontro.
Depois de nossa troca de e-mails inicial, Mason parecera legal o bastante para
que eu continuasse a conversar com ele pelas últimas semanas. Cumpria todos os
requisitos do cara certo para eu dar uma chance: bem empregado ─ check.
Educado ─ check. Mais de trinta, mas não perto dos quarenta ─ check. Não
escrevia coisas, como ctz e foi mal nas mensagens ─ check. Bonito. Bem-
arrumado. Check, check. Eu deveria estar mais animada. Muito tempo tinha se
passado desde Davis… Já estava na hora de seguir em frente.
Eu o vi antes que ele me notasse. Tinha ido ao estoque pegar algumas garrafas de
tequila para Charlie e vi Mason olhando para os lados. Ele parecia como nas
fotos, então isso era um plus. Talvez um pouco mais magro do que eu esperava,
mas nada drástico o suficiente para me surpreender. Tinha uma estatura mediana,
corpo normal, e bonito, mas não bem o tipo de corpo que te faria sentir frio na
barriga. Mason também estava vestindo uma camisa azul, o que fez eu me
lembrar do professor West na noite anterior. De um jeito estranho, isso me fez
sentir um pouco de frio na barriga.
Balancei a cabeça para ver se colocava alguma razão em meu cérebro e respirei
fundo antes de seguir para me encontrar com Mason.
Sabe aquela sensação que você tem quando vai provar uma coisa e acaba
sentindo o gosto de outra? Talvez água e refrigerante? Não que não goste de
ambos, mas estava preparada para algo com menos gosto e sem gás e, em vez
disso, você sente a efervescência inesperada ─ bastante efervescência.
Talvez tivesse sido a palavra contador que me levara a ter esses pensamentos
preconceituosos de que ele seria um tipo específico de pessoa. Mas ele era bem
mais confiante e atrevido do que eu esperava.
─ Você é linda mesmo. Não que, pela foto do seu perfil, eu pensasse o contrário,
mas ela só mostra o seu rosto. Acho que não esperava que viesse uma Megan
Fox do pescoço para baixo.
ele me olhou.
Tínhamos ido jantar a alguns metros dali e voltamos para o O’Leary para um
drinque. Os olhos dele percorriam o meu corpo conforme ele bebia seu quarto
drinque de uísque e Coca-Cola, o que era outra bandeira vermelha ─ três
drinques fortes durante um jantar no primeiro encontro? Cada um o deixava mais
ousado de uma maneira que eu gostava cada vez menos.
Aff. Eu estava prestes a dizer ao imbecil que iria brincar sozinho naquela noite,
quando Charlie interrompeu. Com o taco. Do bar, jogou-o próximo a nossos pés,
fazendo Mason pular para trás.
Eu não queria fazer uma cena. Só queria que aquele encontro ruim acabasse.
─ Vá embora, Mason. Antes que vá para casa com o taco do Charlie enfiado
na sua bunda.
Percebendo que não iria transar, Mason pagou a conta e foi embora. Sorri para
Charlie depois que ele saiu.
─ Você dobrou o preço do uísque e Coca?
Dei risada. Sem querer sair logo depois de Mason, me sentei no bar com Charlie
por um tempo.
─ Encontros são um saco ─ bufei. ─ É por essa razão que eu não faço isso
com frequência.
─ Ainda bem que os encontros, na minha época, não eram como os de hoje.
A esposa de Charlie havia falecido há, pelo menos, dez anos. Ela sofrera um
─ Sim. Ela devolveu a lista e disse: “Peguei o carrinho errado. Não gostaria que
se esquecesse de itens importantes da sua lista”.
─ Literalmente? Dizia queijo e outras merdas? Não tinha uma lista das outras
merdas?
à noite antes de dormir. As outras merdas incluíam o resto e não eram tão
importantes. ─ Charlie olhou em volta. ─ De qualquer forma, Audrey sorriu para
mim, e meu coração bateu duas vezes mais rápido, de um jeito esquisito que
nunca tinha batido antes. Pensei que estivesse tendo um ataque cardíaco. Precisei
me sentar bem ali ao lado das berinjelas para voltar a respirar. No fim, não foi
apenas queijo e merdas que peguei no supermercado aquele dia.
─ Eu nunca tentei, mas parece idiota. Faz você imaginar um checklist mental
Capítulo 3
Rachel
Era um saco. Mas eu tinha tempo, e o Davis, meu ex-colega de quarto, ex-
qualquer coisa que tenha sido por um tempinho, me ensinou a trocar pneu. Tudo
estava bem… no começo. Tirei o macaco, ergui o carro como uma profissional e
comecei a trabalhar no pneu furado. Tudo estava fluindo bem até eu chegar no
último parafuso. O maldito estava travado. Realmente travado. Em certo
momento, já que o parafuso estava na parte de cima, coloquei a chave inglesa
nele e usei o pé para tentar ceder ─ mesmo assim, nem se mexeu. Então, tive a
brilhante ideia de que talvez devesse colocar todo o meu peso nela. Assim, pulei
na alavanca que a chave fazia, torcendo para que a força repentina soltasse o
maldito parafuso. Mas, em vez disso, a chave inglesa escorregou e, de algum
jeito, quicou e voltou, me acertando direto na canela.
Quando cheguei no auditório, dei uma olhada antes de abrir a porta. Claro que o
professor West estava sentado à sua mesa.
─ Antes que diga qualquer coisa, eu estava meia hora adiantada. Juro.
─ Meu pneu furou no meio do caminho. ─ Não fazia ideia de onde meu rosto
estava sujo, mas estava nervosa e esfregava lugares aleatórios enquanto falava. ─
─ Mas é verdade. Realmente tentei chegar aqui cedo. Calculei todo um tempo
extra e então, bum, um pneu furado. Não foi minha culpa dessa vez.
─ Seu rosto está cheio de graxa. Por que não vai ao banheiro lavá-lo?
Assenti. Virei-me, dei alguns passos em direção à porta e, então, pensei em uma
coisa.
Depois de limpar a graxa das mãos e do rosto, pensei em tentar lavar a mancha
grande na minha camisa, mas isso não deu muito certo. Até então, tinha
encontrado meu novo chefe três vezes. Na primeira vez, dei um sermão nele, na
segunda, interrompi a sua aula vestindo uma camisa com mancha de café e, na
terceira vez, o fiz esperar por quase meia hora e entrei coberta de graxa,
parecendo um desastre. As coisas só melhoravam.
Escurecer?
amanhã e então, antes da aula, verificamos rapidamente o que você gostaria que
eu fizesse?
─ Não. Faremos isso hoje à noite. ─ Ele colocou a mão na minha lombar,
guiando-me em direção às escadas do auditório com ele. ─ Você não precisa
trabalhar no seu outro emprego, precisa?
─ Não há mais aulas aqui esta noite, então podemos voltar depois que
terminarmos.
─ Com seu carro. Vou colocar seu estepe e te seguir até um mecânico. Então,
podemos voltar e verificar o que precisamos discutir.
Os músculos de Caine combinavam com o seu rosto perfeito. Ele estava usando
uma camisa social branca, mas a tirou antes de começar a trocar o pneu.
esticar o braço e tocar sua barriga, passar os dedos pelo caminho estreito de
pelos que partiam de seu umbigo e mergulhavam no cós preto de sua cueca, que
estava um pouco à mostra.
─ Acho que te devo uma camiseta ─ eu disse, olhando toda a graxa que a cobria.
Caine limpou as mãos sujas de graxa no peito, formando linhas pretas no que
Com a visão de seu corpo incrível, acho que meu maxilar quase chegou ao chão.
Não fazia ideia se ele tinha reparado que eu estava olhando, porque não
conseguia tirar os olhos daquele banquete. Ele usou a camiseta para secar o suor
do rosto e, então, limpou as mãos mais um pouco. Eu mesma estava começando
Que pena.
─ Ok. Obrigada.
Fiquei sentada no carro por um minuto, grata por ter a chance de reorganizar
meus pensamentos antes de precisar dirigir. Há quanto tempo eu não fazia sexo?
Oito meses? Deus, eu provavelmente deveria ter transado com Mason na noite
anterior só para satisfazer meu desejo. Um pouco de abdome e músculo, e minha
calcinha estava molhada. Me senti uma adolescente com tesão.
Quando deixamos o carro na Pneu Express, eram quase sete e meia. Eles me
disseram que eu teria que pegar o carro pela manhã. Caine ficou ao meu lado o
tempo todo e até escolheu um pneu que era mais em conta quando o vendedor
tentou me vender um que custava mais do que eu ganhava em gorjetas em uma
semana no O’Leary.
Ele assentiu.
Antes de ele ligar o carro, meu estômago roncou de um jeito horroroso. Foi um
som alto, retumbante e borbulhante que ecoou pelo carro silencioso. Não havia
como tentar fingir que não acontecera.
Caine sorriu.
de sair do trabalho, mas o pub lotou, e eu não queria parar em algum lugar e
arriscar me atrasar. Minha programação para aquele dia tinha sido ótima
─ Eu adoraria.
Ele ligou o carro.
Capítulo 4
Rachel
─Só para constar, eu não estava te passando uma cantada na primeira vez que a
vi. Você parece mesmo familiar. ─ Caine bebeu sua cerveja.
O fato de ele ter pedido uma cerveja me deixou intrigada. Eu presumia que ele
gostasse de algo mais chique, como um vinho caro ou um uísque, talvez.
Observá-lo relaxado, com uma cerveja na mão, me fez ver o professor rígido de
uma forma totalmente diferente e leve. Ou talvez tivesse sido o abdome dele que
mudou meu pensamento.
─ Provavelmente nos vimos pelo campus ─ eu disse, apesar de ter quase certeza
de que nunca o tinha visto antes. Eu me lembraria de um homem como
ele.
─ Talvez.
─ Aquela noite foi minha primeira vez. Parei no caminho para casa, vindo da
Apontei o espeto de muçarela para ele e sorri. ─ E isso não tem previsão de
mudança. De acordo com a revista People, este será um ano de trabalho, sem
diversão.
─ Ah, é? Revista People? Parece uma fonte confiável para determinar suas
expectativas para o futuro.
─ Também acho. Respondi cinco perguntas para receber essa profecia, então é
─ Se aposentou da animação? Quantos anos você tem? Vinte e dois, vinte e três?
─ Vinte e cinco. ─ Dei de ombros. ─ Tive minha cota de aventura durante minha
adolescência, o que era fora de controle. Estou administrando a vida adulta.
Estar ocupada é bom. Ser adulta é bom.
tempo. Vou guardar algumas das histórias para depois que eu te mostrar como
sou esperta e talentosa.
Caine sorriu. Era o primeiro sorriso não contido que ele deixava passar.
Inclinando-se para trás em sua cadeira, jogou o braço casualmente por cima do
encosto.
─ Certo. Então me conte sobre você e a música. Quero saber um pouco mais
sobre a sua esperteza e o seu talento. Isso vai me ajudar a planejar as aulas que
você deverá dar.
─ Essa é uma pergunta muito ampla e meio difícil de resumir em algumas frases.
─ Ok. ─ Pensei por longos instantes. ─ Porque a música expressa todas as coisas
que uma pessoa não consegue dizer, mas fica impossibilitada de se manter em
silêncio.
─ Nenhum dos dois. Sou afinada, mas não canto excepcionalmen-te bem, e não
há um instrumento em particular no qual seja excelente, como a maioria dos
especialistas em música.
que isso fosse tirar um pouco do foco em mim, mas Caine devia estar ocupado
─ Presumo que a música tenha a ajudado a expressar algo que não poderia ser
dito, e que esse algo foi o responsável por aqueles anos fora de controle que
você viveu.
─ Sou tão transparente assim ou você que é muito bom em interpretar pessoas?
─ Nenhum dos dois. Vamos dizer apenas que consigo relacionar bem as coisas.
Assenti.
─ Algo parecido.
─ Você é sempre tão vago e evasivo quando te fazem uma pergunta direta?
─ Tudo bem. Eu queria ser um astro do rock quando era mais novo. Isso é uma
resposta direta o suficiente para você?
Sorri.
─ Tocava bateria.
─ Toca ou tocava?
─ Isso te incomoda?
Ele riu.
Assim que o funcionário limpou a mesa, Caine pegou uma pasta de sua maleta, e
começamos a verificar a matéria. Fizemos um rascunho de
─ Então, que boatos você ouviu sobre mim? ─ ele perguntou, recostando-se na
cadeira.
─ Tenho certeza de que já ouvi a maioria. Mas conte para mim e lhe direi se
─ Ok. Bom, de primeira ouvi que você era exigente com pontualidade. Acho
─ Você demitiu sua última auxiliar porque ela não era rígida o bastante para dar
notas.
Ele assentiu.
─ Isso também é verdade. Apesar de estar faltando parte da história. Ela não era
rígida o bastante para dar notas para o namorado dela. A não ser que estivesse
dando notas para coisas que ele queria fazer com ela… porque eram planos
muito bem pensados. Soube disso quando vi o que ele estava escrevendo nas
provas. Não eram realmente respostas sobre músicas e, mesmo assim, estava
recebendo dez em tudo.
─ Oh.
─ O que mais?
Não faço ideia do motivo, mas resolvi enfeitar a última fofoca para satisfazer
minha própria curiosidade.
─ Você é casado e quase foi demitido por dormir com suas alunas.
─ Não sou casado e parei de dormir com minhas alunas depois do primeiro ano.
Enruguei o nariz.
─ Eu era jovem e idiota. No primeiro ano em que dei aula, passava a maior parte
do tempo no campus. Era o único lugar em que conhecia pessoas.
Engasguei.
─ Nem me fale.
─ E…
─ Sexo?
Assenti.
qualquer expectativa. Embora possa te dizer que, mesmo deixando isso bem
claro desde o início, as mulheres nem sempre escutam o que digo. Elas escutam
o que querem ouvir. ─ Ele pausou. ─ Acho que pode-se dizer que mulheres
também conseguem ser babacas. Sem ofensa.
Dei risada.
─ Claro.
─ Você é linda. Qualquer homem que lhe disser que não pensa em fazer sexo
com você assim que a conhece estará mentindo. Mas se o cara não consegue
perceber que não é isso o que você está procurando, então ele não está prestando
atenção. As chances de que essa falta de atenção se repita na cama são grandes,
então, de qualquer forma, não vale a pena perder seu tempo com ele.
Ele estava totalmente certo, e haveria tempo para analisar a sua teoria mais tarde,
mas, naquele momento, eu só conseguia me perguntar uma coisa… será
Capítulo 5
Rachel
Percepção Oral.
Ok, talvez a aula fosse Percepção Aural. Que seja. Minha mente estava
definitivamente uma bagunça quando me sentei no fundo, observando o
professor West falar sobre como diferentes pessoas ─ filósofos, compositores,
médicos e adolescentes ─ enxergam o conceito de ouvir. Lembro-me dessa aula
nudes. Tinha rascunhado uma página de corpos sem rosto que eram, na
realidade, bem maravilhosos, mesmo que fossem um pouco sensuais e gráficos.
─ Tenho que fazer alguma coisa enquanto esse mala cheio de si fica delirando.
Caine não era um professor que dava aula sentado. Ele andava pela sala e
interagia com os alunos.
Um aluno respondeu:
─ Parece que a maioria das pessoas ouve música enquanto viaja ou trabalha.
Caine subiu mais alguns degraus e parou dois abaixo de onde eu estava sentada,
dando-me a desculpa perfeita para olhar para ele, sem deixar transparecer que o
estava analisando. Ele falava com outro aluno por perto, enquanto eu o secava.
Ele estava vestindo um colete escuro de botão por cima de uma camisa branca
com textura, sem gravata. Eu não era exatamente uma fashionista, mas conhecia
roupas caras quando as via, e Caine gastava mais com suas camisas do que eu
com todo o meu guarda-roupa. Ele era elegante, apesar de combinar a camisa e o
colete com calças jeans e tênis pretos. Sua pele era naturalmente bronzeada, o
que me fazia ter certeza de que ele era descendente de europeu ─ talvez grego ou
italiano. Não conseguia definir qual, mas o que fosse tinha produzido um homem
com traços bem fortes. Seu nariz era reto e másculo e, de perfil, era o mais
perfeito que eu já tinha visto. De lado, seus cílios pretos eram magníficos.
Qualquer mulher pagaria uma fortuna pela luxúria que emoldurava aqueles olhos
cor de chocolate. Seu maxilar era salpicado por uma barba por fazer, e me peguei
pensando em como seria senti-la em minha pele. Estava perdida em pensamentos
quando percebi que agora ele estava olhando para mim. Caine apertou os olhos,
e vi um fundo de diversão neles, embora não estivesse sorrindo.
Quando subiu mais um degrau, tentei parecer indiferente, como se não tivesse
ficado adorando os seus ancestrais, e olhei para a frente ─ só para perceber que
agora estava perfeitamente alinhada para encarar bem o meio de suas pernas.
Tentei olhar para outro lugar, mas tinha… tinha alguma coisa no bolso dele…
ou…? Pelo contorno, eu tinha quase certeza de que não era alguma coisa. Ou na
verdade era alguma coisa ─ algo bem impressionante.
Caine virou o tronco para chamar uma mulher do outro lado da escada, e sua
calça ficou mais justa, confirmando exatamente o que eu estava vendo. Descobri
que o homem maravilhoso também tinha um pau grande. Virei a cabeça,
precisando tirar os olhos de sua protuberância enorme, e o artista de gorro sorriu
para mim, como um flerte. Sorri de volta… bem quando Caine o chamou.
O artista de gorro era o primeiro aluno que Caine chamava sem que ele tivesse
se voluntariado com a mão para cima. Talvez ele tivesse visto o que o cara
─ E você? ─ A voz de Caine foi seca. ─ Qual foi a última música que ouviu e
─ Obrigado, senhor…
─ Ludwig.
─ Gostei de ouvir todos os exemplos de hoje. Antes da próxima aula, quero que
cada um baixe “Trumpets”, de Jason Derulo. Ouçam-na usando o último método
pelo qual ouviram música de forma apreciativa: com o fone, enquanto viaja no
trem, no caminhão fazendo entregas ou, no caso do sr. Ludwig, escutando em
seus Bose, em casa, enquanto se masturbava.
Alguns minutos depois, a aula de uma hora e meia tinha terminado, e os alunos
saíram. Esperei até a sala estar vazia e desci as escadas até a frente para
conversar com Caine.
Caine fechou o zíper de sua bolsa. Eu achei que nossa conversa era de
brincadeira, mas, aparentemente, estava enganada. O tom dele era sóbrio e ele
me olhou de um jeito que condizia com seu tom.
─ Confraternizar?
─ Não entendi.
Ele bufou.
─ Foder. Não deveria foder com os alunos. Ficou mais claro, Rachel?
─ Bom, sim, agora está claro o que quis dizer, mas não sei muito bem o que te
deu a impressão de que eu estava transando com um aluno. Não durmo com
universitários.
─ Não precisa se preocupar, eu não darei preferência nas notas para alguém,
Franzi o cenho, mas logo percebi que ele deve ter visto o teste ao qual eu estava
respondendo atrás da revista In Style antes da aula começar ─ Qual princesa da
Disney você é? . Joguei-a em cima da minha mochila, no chão, antes de a aula
começar.
─ Eles acertaram?
─ Deus, espero que sim. Mês passado fiz um teste na Men’s Health chamado O
quanto seus testículos estão saudáveis? , e o resultado não foi muito bom para
mim.
─ Na verdade… não.
─ O que aconteceu?
─ Quando eles tiraram o pneu, viram que as juntas da suspensão estavam ruins,
seja lá o que isso signifique. Vão trocá-las hoje.
─ Posso pegar o ônibus. Aqui no campus passa um que vai até dois quarteirões
do O’Leary.
reunião de departamento hoje à noite e preciso comer antes. Por que não vamos
ao O’Leary? Aí você já estará no trabalho quando começar o seu turno.
Charlie o cumprimentou.
─ Um passado?
─ É. Não gosto que minha garota se meta em encrenca.
Entrei na conversa.
Caine não pareceu se importar nem um pouco com a ameaça de Charlie. Se tinha
achado alguma coisa, era graça.
─ Bom saber.
─ Vou querer qualquer cerveja que estiver servindo. Estive aqui algumas noites
atrás. Um amigo meu acabou de se mudar para a esquina e disse que você faz as
melhores asas de frango, mas a cozinha já estava fechada, então não consegui
prová-las. Que tal uma porção de asas de frango?
─ É a receita secreta da minha Audrey. Duas porções saindo. Aliás, se vier aqui
quando a cozinha estiver fechada, só avise alguém que é amigo do Charlie.
─ São, sim. Rachel foi bem receptiva quando nos conhecemos. ─ Ele olhou para
mim com um brilho perverso no olhar. ─ Eu deveria ter lhe pedido para me fazer
uma porção. Tenho certeza de que teria ficado feliz com isso.
Sem entender, Charlie serviu cerveja para Caine e Coca Diet para mim e, então,
foi para a cozinha preparar ele mesmo as nossas porções. Era aquele período da
tarde em que os clientes do dia iam para casa, mas os clientes da noite ainda nem
tinham começado a aparecer, então havia apenas alguns de sempre no bar… a
maior parte, policiais aposentados.
Caine e eu fomos nos sentar a uma mesa tranquila no canto onde havia espaço
para nossas coisas e para trabalharmos enquanto comíamos. Como eu daria a
aula seguinte, ele falou como queria que os alunos analisassem a tarefa que tinha
passado naquele dia.
vai perceber coisas que não notaram da primeira vez. Os trompetes são
sintetizados.
─ São?
─ Uau. Ok. ─ Franzi o cenho. ─ Então você deixa os alunos levarem para casa
os duzentos fones da Bose? O professor não fazia isso quando eu tive a aula há
alguns anos. A faculdade certamente evoluiu dos fones horríveis que usavam
para dar a aula de gravação de música.
Fiz o cálculo. Eram no mínimo cinco mil dólares para uma aula.
Charlie estava com as mãos ocupadas pelas bandejas de asas de frango, então
usou a bunda para abrir a porta da cozinha e ir ao bar. Levantei-me para pegá-las
da mão dele.
─ Você deveria ter assobiado para mim, como faz normalmente. Não pode
carregar bandejas por causa das suas costas.
─ Não é um encontro.
─ Se beber comigo.
─ Eu não bebo.
Caine franziu a testa, mas então sua expressão foi de compreensão, e percebi o
que estava pensando.
─ Tá bom.
Realmente, não queria explicar, mas ele ficou esperando que eu falasse de novo.
Eu normalmente não fazia essa declaração por causa do modo como as pessoas
olhavam para mim, com empatia. Oh. Ela teve uma infância ruim. De modo
estranho, não foi essa expressão que vi em Caine. O rosto dele mostrava
admiração pelo que eu acabara de dizer, e eu não sabia direito o que fazer com
isso. Senti-me desconfortável.
─ Então… Vou pegar outra cerveja para você, e vou beber uma O’Doul’s para
te acompanhar.
─ Que bom.
─ Eu estava pensando… quando for a hora de recolher os fones, não vou tocar
─ Então?
Minha mão foi para o pescoço. Ele estava totalmente certo, mas meu cabelo as
cobria.
─ Certo…
─ Os rascunhos que o seu amigo estava desenhando tinham pescoço, mas não
cabeça.
─ É, ele presta atenção nos detalhes. Todas as mulheres tinham uma coisa em
comum.
Arregalei os olhos.
─ Não.
Caine assentiu.
Oh, Deus.
─ E é por isso que não saio com universitários. Não precisa falar nada, não vou
recolher os fones do garoto do gorro nem me sentar ao lado dele de novo.
Capítulo 6
Rachel
Era aquela época do mês. Não era um momento que eu temia, mas sim que
esperava ansiosamente chegar. As mensagens de texto mensais de Davis vinham
Assim que apertei “enviar”, Ava entrou. Ela trabalhava no turno da tarde
servindo as mesas, o que significava que eu me mudava para trás do bar, e
Charlie ia para casa.
─ Oi, Rach.
─ Oi. Davis acabou de mandar mensagem. Estará no jantar semana que vem.
─ Já era hora. Ele faltou nos últimos três. Talvez você consiga embebedá-lo e
finalmente quebrar esse feitiço de seca.
─ Cala a boca.
Ava era a única pessoa que sabia sobre mim e Davis. Joguei nela o pano que
Dei risada.
Enquanto Ava se trocava para o seu turno, pensei em meu antigo colega de
quarto. Davis não era o típico universitário, de jeito nenhum. Era do Sul, cheio
de educação, sim, senhora e não, senhora, e passara oito anos no exército antes
de ir para o Brooklyn estudar Administração. Quando se mudou, também estava
passando por um divórcio, tinha se casado com a sua namorada do ensino médio
aos dezoito anos, em um ato romântico, antes de partir para sua primeira viagem
ao Iraque. De acordo com Davis, o casamento deles pareceu durar um bom
tempo. Ele a visitava de vez em quando e enviava dinheiro para casa. Parou de
dar certo quando ele saiu do exército e sua esposa percebeu que era difícil
transar com outros sem ser pega quando seu marido não estava mais do outro
lado do mundo.
Durante os dois anos em que moramos juntos, Davis se tornou um dos meus
melhores amigos ─ até a noite em que comemoramos sua formatura. Nós dois
bebemos demais. Uma coisa levou à outra e, antes que a noite terminasse… Oh,
Davis.
Embora nunca o tivesse visto daquela forma antes, no dia seguinte eu estava
bom, meio que entendi. Pouco depois, quando nosso aluguel venceu, nos
separamos, mas continuamos amigos… com promessas de dar um tempo e
talvez explorar coisas no futuro. Depois de seus anos no exército e de estar
casado, ele tinha conquistado a sua liberdade.
O meu hiato de relacionamentos desde essa época pode ter sido causado pela
─ O quê?
─ Vai, adivinha.
─ Não.
Dei risada.
Um casal que estava sentado há um tempinho na mesa dois fez sinal de que
estavam prontos para fazer o pedido. Ergui o queixo para minha amiga louca e
apontei com o meu celular.
─ Fica pra depois, fica pra depois, fica pra depois… ─ Então seus olhos se
iluminaram. ─ Mesa dois!
Ava tirou o pedido da mesa dois e o deixou na cozinha, depois voltou para onde
eu estava servindo uma cerveja.
─ Fui a uma reunião de auxiliar hoje e conheci um cara que foi auxiliar do dr.
Anderson.
um cara de vinte e poucos anos, mas ele é fofo e me convidou para tomar uns
drinques com ele e mais um monte de auxiliares nesta sexta, então você vai
comigo.
─ Ok… ─ Fiquei feliz ao ver que Ava encontrara alguma coisa com que se
animar depois da maneira como estava se sentindo em relação a Owen. Apesar
de eu ainda não entender como esse cara a lembrou de Caine ou quem era Able
─ Dr. Anderson contou para ele que o professor West era membro de uma
banda. Também tinha um contrato com uma gravadora grande. ─ Ava pegou seu
O frio na minha barriga confirmou, mesmo antes de o músico olhar para cima.
Mas, quando aquele rosto foi filmado pela câmera, prendi a respiração.
O professor West era tão lindo quando adolescente quanto é agora. Só que, na
época, ele tinha aquela coisa toda de músico- bad- boy. Agora, se eu não o
conhecesse e tivesse que adivinhar, teria dito que ele era um músico de jazz ou
talvez até clássico. De alguma forma, o bad boy sexy cresceu e se transformou
em maturidade sexy.
Quando a música terminou, Caine ergueu a cabeça e deu um sorriso torto para
o público. Seu cabelo no ombro estava molhado de suor, e ele jogou uma
baqueta no ar, pegando-a com a outra. Então, usou sua mão livre para tirar a
camiseta suada. As garotas enlouqueceram com seus oito quadradinhos no
abdome. Enlouqueceram do tipo Beatles, astro do rock.
Uau.
Aquele sorriso.
Aquele corpo.
Apenas uau.
Pelo jeito, havia muitas camadas de Caine West, e eu mal havia passado pela
superfície.
Quando cheguei em casa naquela noite, eram mais de duas da manhã. Meus pés
estavam me matando, e tudo o que eu queria era afundar em uma banheira e
dormir. Para variar, eu não tinha que ir para a universidade ou para o trabalho até
a tarde. A banheira estava morna, e deixei a água da torneira inundar meus pés
enquanto me recostei para relaxar. Embora o meu cérebro pensasse em tudo,
menos em relaxar.
Acabei cedendo, peguei meu celular e me permiti ver mais uma vez.
Finalmente sozinha, em vez de ser flagrada por uma sorridente Ava enquanto
tentava olhar meu celular de forma discreta, procurei o rosto quadriculado pelos
trejeitos de Caine. Havia alguns que eu reconhecia ─ a forma como o seu lábio
se erguia e ele balançava a cabeça quando as mulheres começavam a gritar seu
nome enquanto tocava o solo. A maneira como andava pelo palco como se lhe
pertencesse. Hoje, sua arena era uma sala de aula, mas a confiança com que a
percorria era a mesma. Ainda assim, eram os seus braços que realmente
chamavam atenção. Toda vez que ele batia na bateria, a veia que corria de seus
bíceps para o seu antebraço pulsava. Nunca pensei que uma veia pudesse ser tão
sexy.
Quando terminei de assistir, a banheira estava quase cheia, então usei meus
dedos do pé para fechar a torneira. Eu sabia que não conseguiria relaxar o
suficiente para dormir se não satisfizesse minha curiosidade, então procurei no
Google o antigo nome usado por Caine.
Able Arsen.
Entrando em todos, como uma fanática, encontrei várias fotos de Caine. Ele não
era o principal da banda, mas aparentemente a mídia o adorava ─ e quem
poderia culpá-la? Percebi que havia a mesma garota em algumas fotos. Tinha
cabelo comprido e escuro e era magra ─ quase magra demais. A cavidade de
suas bochechas deixava suas lindas maçãs do rosto um pouco altas demais. Na
maioria das fotos, ela usava óculos de sol e parecia fugir da câmera. Havia
muitas fotos dela com a banda, algumas com o braço de Caine em volta dela, de
uma forma quase que protetora. Com certeza ela era mais nova que ele ─
Capítulo 7
─ Você não pode pedir perdão por alguma merda enquanto está pecando de
novo. É para se arrepender, otário.
Ele tinha razão. E já que o meu cérebro meio cozido estava quase ficando
totalmente bem passado, bati a cinza no chão e o guardei no bolso que restava do
cigarro enquanto ainda estava quente.
─ Que se dane essa merda. Diga ao padre Frank que fui para casa bater uma,
se ele me procurar.
Ainda restava meia hora para que eu fosse dispensado pelo padre Frank, então
me ajeitei, encostando no tecido macio vermelho e esperando tirar um cochilo. A
cadeira do lado do padre era bem confortável, talvez porque eles ficavam horas
escutando merda de outras pessoas todo sábado à tarde. Não tinha noção de
como esses caras passavam a vida toda naquele lugar. Ficar ali nos últimos
sábados já foi suficiente para me deixar louco.
Três semanas antes, minha mãe havia flagrado Liam e eu matando aula de novo.
Era o nosso último ano, minha mãe normalmente era bem legal, e os pais
esperavam algumas faltas. Não foi isso o que fez Grace West, temente a Deus,
ficar desesperada. Também não foi o fato de encontrar Emily Willis seminua e
totalmente drogada de joelhos, prestes a me pagar um boquete no jardim, o que
assustou minha mãe. Não. O que a fez me inscrever involuntariamente por um
mês para limpar a St. Killian aos sábados de manhã foi a minha música. Meus
Então, fui sentenciado a prestar serviços comunitários por querer tocar bateria e
cantar. Depois de uma longa conversa com o padre Frank e minha mãe, ele
também aproveitava toda chance que tinha para lembrar a mim e a Liam de que
tocar música não era a forma como um homem deveria construir a sua vida.
Merda.
Havia uma menininha do outro lado e ela achava que eu era o padre. Pelo som
da sua voz, imaginei que não tivesse mais do que dez ou onze anos. O que ela
poderia ter para confessar?
definitivamente deveria ter saído. Mas… talvez fosse a maconha. Talvez fosse o
som de sua voz trêmula que me deixou curioso. Talvez eu apenas estivesse
fodido da cabeça. Em vez de abrir a porta literalmente, acabei abrindo uma no
sentido figurado. E isso mudaria minha vida para sempre.
Capítulo 8
Rachel
De repente, consegui entender por que ele achava que o atraso dos alunos o
distraía. Nos últimos vinte minutos, eu estava distraída pelo homem sentado
onde eu sentara durante a última aula. Ao seu lado, o sr. Ludwig, o artista de
nudes que usava gorro, parecia tão nervoso quanto eu. Embora seu nervosismo
Eu tentava não olhar para cima, para onde eles estavam sentados. Mesmo assim,
podia sentir os olhos de Caine sobre mim. Como assim, eu tinha duzentos pares
de olhos focados em mim e só conseguia sentir dois?
Limpei a garganta.
─ Já que temos alguns minutos antes do fim da aula, vou entregar os fones de
ouvido dos quais falamos mais cedo.
Fui até o armário no canto da sala e peguei uma caixa. Entreguei-a para a
primeira fileira, pedi para que o aluno da ponta pegasse um e passasse a caixa
para o próximo, enquanto eu entregava uma caixa cheia para cada fileira. Caine
se levantou e, em silêncio, pegou algumas caixas para me ajudar a distribuir para
as fileiras no fundo do auditório e, depois, se sentou de novo. Conforme eu
distribuía, lembrei à sala do exercício que havia feito na primeira tarefa do
professor West e, então, anunciei minha própria tarefa.
─ Bom trabalho.
─ Obrigada. Não achei que viria. Fiquei meio surpresa quando chegou atrasado.
─ Sorri irônica. ─ Não gosto de atrasos. Acho que interrompe a aula.
─ Humm?
─ A tarefa que você passou. Qual é a música que lhe faz lembrar da infância?
O que veio imediatamente à minha mente foi uma música antiga de Lynyrd
Skynyrd chamada “Devil in a Bottle”, mas era sinceridade demais para eu
aguentar.
Como eu era uma péssima mentirosa, evitei olhar para ele. Mas, quando olhei
para cima, vi que ele estava apertando os olhos daquele jeito de sempre.
─ Do Bob Dylan?
─ Essa mesmo.
Humm… Assim, de cabeça, não conseguia me lembrar das palavras nela, mas
sabia que era uma música pesada e sincera. Eu, definitivamente, iria escutá-la
mais tarde com os meus fones Bose emprestados. Não havia forma melhor de
aprimorar minhas habilidades críticas do que tentar descobrir o mistério de
Caine West. Como ele falou, me senti obrigada a lhe responder alguma coisa.
─ “Hurt.”
Ele assentiu.
Sorri.
Havia uma tensão entre nós quando olhávamos um para o outro. Toda vez que
estávamos juntos eu sentia isso. Toda vez era um pouco diferente da última, mas
a tensão sempre estava ali ─ um peso no ar. Hoje não era tanto de uma natureza
sexual, mas uma sensação de compreensão e aceitação. Nós dois tínhamos
históricos depressivos como narrados pelas músicas. O que me lembrou…
─ Ah, é?
─ Bom, na verdade, era um boato, mas sei que é verdade agora. Então não sei
─ Na realidade, esse tem mais a ver com você ser um astro do rock que assinou
com uma gravadora.
─ Você deveria ir para o seu outro emprego. Em breve, ele poderá ser o único
que tem. ─ Tendo dito isso, ele pegou sua mala de couro, subiu as escadas e
estava fora da sala de aula antes de eu conseguir fechar minha boca grande, que
havia ficado aberta.
Ele enfatizou a sua saída batendo a porta da sala com tamanha força, que fez as
paredes tremerem.
Era a terceira vez que Charlie perguntava. A primeira foi quando derrubei uma
bandeja cheia de drinques no chão. Duas taças se quebraram, e eu fiquei tão
atordoada para limpá-las que cortei o dedo. Na segunda vez, eu estava viajando e
derramei a cerveja que estava servindo porque não vi que já tinha enchido o
copo. Agora ele estava se preparando para ir embora, e sua expressão estava
─ Não dou a mínima para as taças, contanto que você esteja bem. ─ Ele me
olhou nos olhos. ─ Tem certeza? Posso ficar e você tira o dia de folga.
Eu sorri.
Havia apenas alguns clientes na área pequena de jantar, aberta e anexada ao bar,
o que me dava tempo de sobra para pensar demais no que acontecera entre mim
e Caine à tarde. Claramente, eu entrara num território onde não era bem-vinda,
mas não parecia ser por causa do nosso pseudorrelacionamento de funcionária-
chefe. Ele tinha se intrometido na minha vida pessoal, então um relacionamento
mais pessoal não estava totalmente fora de questão para ele.
Parecia mais que eu tocara em um ponto que era muito além do limite. Ele disse:
“Fique longe da minha vida pessoal”. Mesmo assim, por motivos que não faziam
nenhum sentido, eu tive certeza de que ele quis dizer: “Fique longe desta parte
da minha vida pessoal”.
Mas não era isso que estava me incomodando. Não me entenda errado, me senti
mal por tê-lo irritado. Eu teria me sentido mal por ter me intrometido na vida de
qualquer um em uma área que não queriam que fosse trazida à tona. O
que era confuso era o grau com que aquilo o incomodava. Eu estava atraída por
Caine fisicamente, isso não podia negar ─ quem não estaria? Mas o fato de ele
ter sido tão seco e ficado irritado me fez perceber que minha atração por ele era
mais do que física. Eu estava gostando do meu professor. Desde aquele primeiro
dia depois da aula, passei a admirá-lo em outro nível.
Eram quase nove horas quando saí do banheiro feminino e verifiquei o único
casal que estava na mesa tomando café. Pela visão periférica, vi alguém sentado
sozinho em uma das mesas do pub e fui até lá para avisar que a cozinha já estava
fechada. Fiquei surpresa ao ver que era Caine sentado sozinho.
Seus olhos responderam por ele. Estava sentindo que seria problema.
─ Humm… Claro. Deixe só eu entregar a conta para minha última mesa e avisar
Al que eles a levarão para ele quando forem embora.
Caine assentiu.
─ Obrigado.
Quando voltei, já havia uma Coca Diet do meu lado da mesa e uma cerveja
diante de Caine. Desamarrando o avental, me sentei e esperei que ele falasse.
pessoal.
─ Isso é verdade. ─ Ele sorriu. ─ Mas foi errada a forma como reagi.
Balancei a cabeça.
─ Se há alguém que deveria saber que tem coisas do passado que a gente não
─ Ouviu?
Caine bebeu sua cerveja, me observando por cima da garrafa. Quando a colocou
na mesa, perguntou:
Ele assentiu.
Pensei que seria melhor esclarecer tudo. Inspirei fundo antes de confessar.
─ E posso ter pesquisado o seu nome no Google. Bom, não o seu. O do outro
filho de Adão.
─ Você era estiloso. Gostei. Tinha toda aquela coisa de bad boy sexy.
Sorri.
─ Vai.
─ O último artigo que li dizia que você assinou um contrato de gravação, mas
não consegui encontrar o álbum. O que aconteceu?
Caine ficou em silêncio por um tempo. Seu polegar esfregava o rótulo da garrafa
de cerveja quando falou:
─ Aquele estilo de vida era difícil. Havia muitas festas, ficávamos acordados a
noite toda, dormíamos durante metade do dia. Me fez perder a noção da
realidade e de minhas prioridades. ─ Ele olhou para mim. ─ Depois de
assinarmos com a gravadora, perdemos os prazos algumas vezes. O álbum ficava
sempre sendo adiado. Então, perdi alguém próximo a mim.
─ Sinto muito.
Ele assentiu.
Mais tarde, percebi que era bom em ensinar composição musical, então
continuei até terminar o doutorado. ─ Ele ergueu a garrafa de cerveja e a
inclinou para mim antes de levar aos lábios. ─ E aqui estou.
─ Acabou, Rachel.
Virei e acenei.
─ Obrigada, Al.
Após me despedir de Al, Caine me acompanhou até o meu carro. Ele abriu a
Nunca conversávamos sobre isso, e eu não estava certa se ele sabia que eu tinha
sido auxiliar dele no ano anterior.
─ Ele era uma pessoa muito boa. Trabalhei para ele no ano passado.
Assenti.
─ Ainda não encontrou outro professor para substituí-lo como seu orientador?
─ Você?
─ Pense nisso.
─ Ok. Obrigada.
Caine fechou minha porta e aguardou que eu ligasse o carro. Assim que saí do
meio-fio, acenei uma última vez e pensei Tenho um novo orientador.
Capítulo 9
semana. Era quase uma da tarde, e Liam fora embora há muito tempo ─ como eu
deveria ter feito. O nosso último dia de voluntariado havia terminado há uma
hora e, mesmo assim, ali estava eu, esperando uma menininha que tinha bastante
problema em casa e, com certeza, não precisava que eu fingisse ser um padre
para aumentar seus problemas.
Para começar, não fazia ideia do porquê tinha dito à menininha para voltar
naquela semana.
cabeça toda noite antes de dormir. Eu não conseguia parar de pensar na voz dela.
Às vezes, ele cai no sono no sofá com um cigarro na mão, e eu penso em não o
apagar e deixar a casa pegar fogo. Essa foi a sua confissão.
Eu não tinha certeza se pensar em deixar alguém se machucar era pecado. Mas
não ia deixar aquela pobre garotinha se sentir culpada por querer que alguém,
que eu suspeitava não ser um cara bom, se machucasse. Foda-se aquela merda.
Também precisava saber o que o babaca estava fazendo para que a menininha
Estava prestes a desistir – e seguir o meu caminho para casa a fim de limpar a
minha mente de toda a merda que passava por ela –, quando a porta se abriu do
outro lado.
─ Não falamos sobre isso na semana passada? Você não está pecando por ter
Claro que isso não era necessariamente verdade ─ a Igreja Católica tinha
algumas regras ─, mas era a única coisa que eu poderia fazer para aliviar a culpa
dela naquele momento.
─ Certo.
Eu sabia, pelo que tinha ouvido na semana anterior, que ela ficava nervosa ao
falar. Precisaria ganhar sua confiança para ela me contar o que quer que estivesse
acontecendo em sua casa. Então, comecei falando sobre a primeira coisa em que
consegui pensar.
─ Foi boa. Não me importo muito com o meu professor, mas Tommy, que senta
ao meu lado, é nojento. Ele sempre está com a mão dentro da calça.
─ Quinto.
─ Sinto muito por isso. ─ Pausei, depois acrescentei: ─ Ela está no Paraíso
agora. É um lugar legal.
Franzi o cenho.
─ Não. Yoda era meu cachorro. Ele tinha orelhas pontudas em sua cabeça
esquisita. Também morreu.
─ Ah. Sim, Yoda está no Paraíso com sua mãe. Eles estão juntos.
─ Que bom.
─ Ele não é meu pai. ─ Ela respondeu àquela pergunta rápido demais.
Demais.
─ Com meu padrasto. Ele não gosta muito de mim, na maior parte do tempo.
─ Sim.
─ Como sabe que ele não gosta muito de você? E por que diz que ele gosta da
─ Preciso ir. Benny vai voltar logo para casa. Ele fica bravo fácil.
─ Sim.
Eu queria saber mais, mas definitivamente não queria que ela se metesse em
─ Ok.
Capítulo 10
Rachel
Na sexta à tarde, demorei mais tempo que o normal para me arrumar. Sempre
gostei da universidade. Ela me dava coisas nas quais me concentrar quando me
sentia instável. Mas, atualmente, eu com certeza não estava muito ansiosa para
estudar.
Havia uma mulher do outro lado da linha. Podia ouvir o tom de voz dela mesmo
que não conseguisse decifrar o que dizia. Tentei agir como se não estivesse
prestando atenção, verificando a arte na parede e os livros na prateleira, mas
definitivamente estava ouvindo.
que colocá-la.
Pausa.
Pausa.
─ Ellen é lésbica desde a oitava série. Minha mãe é a única pessoa no planeta
que ainda não entendeu. É a filha do sócio do meu pai. Somos bons amigos, mas
minha mãe vem tentando nos casar pelos últimos trinta e dois anos. Ela me ligou
quatro vezes para falar sobre o mapa de mesas de algum evento de caridade que
meus pais oferecem todo ano, e é daqui a dois meses. Eu deveria ter lhe dito que
mal podia esperar para me sentar ao lado de Ellen e deixar assim mesmo. ─ Seu
celular começou a vibrar de novo, e ele ignorou a chamada. ─ Você tem plantão
esta tarde? Pensei que fosse às quintas.
─ E é. Só queria passar aqui e lhe dizer que, se a oferta ainda estiver de pé,
realmente gostaria que você assumisse o papel de meu orientador.
─ Bom ─ zombei. ─ Realmente tive que pensar nas minhas outras ofertas.
─ Por que não me manda um e-mail com o que fez até agora? Vou dar uma
olhada, e podemos sentar e verificar tudo em um dia na semana que vem.
─ Coloque seu número aí. Vou te mandar mensagem com meu contato para você
salvar.
─ Preciso correr.
─ Tem um encontro?
─ Não. Vai ter uma reuniãozinha dos auxiliares esta noite, e disse a Ava que iria
com ela.
Ele assentiu.
Na manhã seguinte, tinha acabado de sair do banho quando meu celular vibrou,
indicando nova mensagem. Terminei de secar o cabelo com a toalha e peguei
meus óculos. Fiquei surpresa ao ver que era de Caine. Era a primeira mensagem
que trocávamos, e meu corpo se agitou quando a li.
Embora eu tivesse enviado minha tese na noite anterior, antes de sair, não
esperava que ele fosse ler tão rápido. Deixou-me animada e nervosa ao mesmo
tempo. Tinha orgulho do meu trabalho com Umberto, mas meu rascunho
continha muitos pensamentos e anotações particulares. O fato de Caine lê-lo me
fez sentir vulnerável.
TRABALHANDO.
sair. Ele nem achava que era apropriado da minha parte confraternizar com
alunos da graduação. Ainda assim, qualquer contato da parte dele me fazia sentir
uma adolescente empolgada, cujo celular finalmente tocava depois de horas
esperando que o garoto fofo ligasse. Deus, sou patética.
DIA?
ENCONTRAR LÁ.
Eu não conhecia bem o protocolo adequado para as situações em que seu chefe
vem te buscar em casa. Será que eu deveria ir lá fora às nove e meia ou deveria
esperá-lo tocar a campainha e convidá-lo a entrar? Decidi a resposta às nove e
vinte, quando meu interfone tocou e eu ainda não estava pronta.
─ Caine?
─ Sim.
─ Terceiro andar. Vou abrir para você.
Apertei o botão que destrancou o portão principal do meu prédio e abri a porta
do meu apartamento. Quando Caine saiu do elevador, inspirei fundo para tentar
esconder minha reação à sua aparência. Ele estava vestido da forma mais casual
que eu já tinha visto, mas, mesmo com jeans e uma polo azul-marinho justa e
simples, ele ainda conseguia ser sexy pra caramba. Percebi que não eram as
roupas que ele usava, mas a forma como ele as vestia que pareciam funcionar
para mim. Tinha uma confiança silenciosa e uma elegância casual que eu achava
extremamente atraente. A barba por fazer que ele costumava ter no meio da tarde
estava totalmente feita e, embora eu realmente gostasse desse estilo, sua pele
bronzeada e os traços fortes de sua mandíbula também eram muito atraentes.
─ Apenas entre.
Caine sorriu e entrou. É claro que o cheiro dele era sempre maravilhoso. Não
tinha certeza se era o pós-barba ou a colônia, mas ele tinha uma essência
máscula que era distinta e amadeirada. Fazia aflorar um desejo que eu não sentia
há muito tempo e, por um segundo, pensei em enfiar o nariz em uma xícara com
grãos de café para interromper o ataque que meu corpo estava tendo. Isso teria
sido interessante de explicar.
Meu apartamento não era muito grande, mas era limpo e decorado de um jeito
─ O quê?
─ Combina com você. ─ Seu tom não indicava se era uma coisa boa ou ruim.
─ Talvez.
Ainda observando tudo à sua volta, ele pareceu pensar na minha pergunta.
─ É como se qualquer um pudesse morar lá. Muito branco, preto e aço inox.
Moro lá há cinco anos e nunca tinha percebido como não diz nada sobre mim até
entrar aqui.
Caine sorriu.
não estava secando nem nada, mas vi seus olhos fazerem uma varredura por meu
corpo de cima a baixo, e senti exatamente onde eles pararam. A camiseta clara
que usava deixava pouco para a imaginação, e os meus mamilos tinham se
endurecido quando ele saiu do elevador. Ao vê-lo me observando, pude sentir
seus olhos atravessando o tecido.
quiser.
Desapareci em meu quarto. A roupa que estava planejando usar de repente não
parecia boa o suficiente para Caine West apreciar e acabei mudando três vezes
antes de começar a secar meu cabelo e me maquiar um pouco. Quando
finalmente fiquei pronta, eram quase dez horas. Pensei que encontraria Caine
batendo os pés, mas, em vez disso, ele ainda parecia intrigado com o meu
apartamento. Encontrei-o analisando as fotos na parede.
Eu havia olhado tanto para a foto que conhecia cada um dos seus detalhes,
mesmo sem vê-la. Minha mãe estava sentada em um balanço, no jardim da casa
na qual cresci, e havia uma margarida branca atrás da orelha. Seu sorriso era tão
grande e brilhante que, às vezes, eu o usava para iluminar meu dia.
─ Sim.
─ Ela é linda.
─ Câncer ─ soltei.
Não fazia ideia do que tinha acontecido comigo para dizer isso. Até aquele dia,
acho que não havia falado sobre ela com ninguém, além de minha irmã. Sou
amiga de Ava desde que comecei a graduação, cinco anos atrás. Ela foi minha
colega de quarto por anos, e não tem ideia do porquê minha mãe morreu. Não
era um segredo; eu só mantinha muitas coisas engarrafadas.
Encarei a foto.
─ De ovário.
─ Sinto muito.
são minha tia Rose e meu tio Nate, a irmã da minha mãe e o marido. Eles
criaram minha irmã e eu depois que… bom, eles nos criaram como suas próprias
filhas depois que mamãe morreu. Meu pai não era presente na época em que eu
la. ─ Está pronto? Eles servem o almoço ao meio-dia e meia, e não gosto de
interromper a rotina de Umberto.
faço minhas anotações enquanto ele almoça e faz uma ou duas atividades. Então,
volto e finalizo.
Rachel
Caine dirigia um Porsche com câmbio manual e um pouco antigo, que estava
meticulosamente conservado. Não sei nada sobre carros, mas desconfio que era
um clássico e que deveria custar mais do que um novo. Parecia combinar com
ele ─ caro, mas sexy e discreto.
Nunca fiquei tão feliz por estar parada no trânsito. Caine tinha que mudar as
marchas constantemente, e algo no modo como a sua mão grande segurava o
câmbio mexia comigo. Sem falar no seu antebraço… e aquela maldita veia. Que
─ Machucou o nariz?
─ O carro morria toda hora e ficava dando trancos. Na quinta ou sexta vez, eu
estava soltando a embreagem, começando a andar, e os malditos pneus cantaram
e pararam de repente. Eu fui jogada para a frente e bati no volante. Achei que
tivesse quebrado o nariz.
─ Talvez você seja um pouco estressada demais para dirigir um carro manual.
DADOS DE ODINRIGHT
Sobre a obra:
Sobre nós:
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─ Eu? Você é mais estressado do que eu.
Você é estressadinha.
Minha primeira reação foi começar a discutir com ele, o que me fez perceber
─ Só um pouco.
─ Sabe, foi por isso que me interessei por terapia musical. Enquanto crescia,
Tentei me lembrar.
─ Sabe de uma coisa? Não. Eu estava nervosa e não queria ser distraída, então
desliguei o rádio.
─ Humm… Nunca pensei nisso. Talvez você devesse me deixar dirigir o seu e
Caine riu.
e cinco minutos nas manhãs de domingo, mas naquele dia parecia que seria uma
hora e meia. Na Ponte George Washington, havia apenas uma faixa liberada, e
demoramos para cruzá-la. Assim que o trânsito melhorou do outro lado,
começamos a conversar sobre a minha pesquisa.
─ Bom, sei que leu o básico em meu resumo. Ele tem setenta e três anos, está no
sexto ou sétimo estágio do Alzheimer, que é o último, e morou a vida inteira,
desde pequeno, na mesma casa, onde inclusive abriu sua clínica médica. Ele era
um clínico-geral que ainda atendia em casa até dez anos atrás. É casado com
Lydia há cinquenta e um anos, e ela o visita todos os dias. Eles têm um filho que
mora na Costa Oeste e os visita algumas vezes ao ano. Na maioria dos dias,
Umberto não se lembra mais de Lydia. Ele passou por um período de dois anos
─ Uau.
individualmente. Umberto não tinha muito interesse, apesar de sua esposa ter o
controle de suas decisões médicas e tê-lo inscrito para o estudo. Entrevistei as
famílias para saber se havia música no histórico dos pacientes, e toda semana eu
colocava uma música para tocar e fazíamos exercícios para ver se conseguia uma
resposta. Umberto nunca tinha reagido a nada, de nenhum jeito. Parecia gostar
de música, mas nem a canção de seu casamento ou qualquer outra de momentos
memoráveis da sua vida despertaram nele algum tipo especial de interesse.
responder a algo que a enfermeira lhe perguntou em italiano. Eu nem sabia que
ele era fluente nessa língua. Aparentemente, soltava algumas palavras de vez em
quando. Então, na semana seguinte, quando vim, pensei em tentar ópera. As
pessoas costumam realmente reagir à música em uma apresentação, então
pensei: por que não tocar uma?
─ E Umberto reagiu?
Apertei o peito.
─ Ele começou a soluçar. Foi desolador. Mas foi a primeira reação que eu tivera
dele com a música… negativa ou positiva. Aquele dia foi o mais lúcido que ele
teve em anos. Começou a contar velhas histórias sobre sua mãe, das quais sua
esposa nem se lembrava. Não sei se foi a própria ópera ou a música que trouxe a
lembrança de volta.
─ Le Nozze di Figaro.
─ Ah. Mozart.
apoiado no volante.
─ Li sua pesquisa. Seus argumentos são fortes. Você vai se dar bem.
Não tinha mencionado que estava nervosa. Ele deve ter interpretado a confusão
no meu rosto.
─ Quando foi a outra vez que você reparou que eu estava mexendo no relógio?
─ No primeiro dia de aula, depois que todos foram embora, e você teve que
Mais cedo no seu apartamento, quando vi que não estava usando sutiã.
Envergonhada, olhei em volta, no carro, para evitar seu olhar. Para minha
surpresa, quando meus olhos voltaram para os dele, ele estava focado em meus
lábios. Isso me fez mudar de um tique nervoso para outro.
Mordi o lábio inferior à medida que o frio na minha barriga se espalhava.
─ Não tem por que ficar nervosa. Agora, vamos, estou ansioso para ver você
arrasar.
Umberto estava com suas damas, Lydia e Carol. Ele estava sorrindo e rindo
quando fomos até sua mesa, no salão de visitas.
─ Oi, Umberto.
─ Oi.
Toda semana era como começar tudo de novo. Uma coisa que aprendi é que
─ Humm. Sim. ─ Sussurrei para Caine: ─ Max era o cachorro dele, um labrador
preto. Por algum motivo, ele sempre pergunta às pessoas se Max foi ao banheiro;
deve pensar que estávamos lá fora, andando com ele, ou algo assim.
Dei risada.
Nos juntamos aos três enquanto eles conversavam sobre o filme que havia
passado na noite anterior. O Alzheimer da Carol era menos avançado que o do
Durante toda a nossa conversa, Caine ficou quieto na maior parte do tempo, só
observando. Vi seus olhos irem e voltarem da expressão de Lydia para a mão de
Carol tocando Umberto por algumas vezes. Me acostumei com o trio incomum,
mas era algo interessante de se observar pela primeira vez. Uma mulher que não
tinha vontade de arrancar os olhos da outra quando a via tocando o homem que
amava ─ o homem ao qual fora fiel por cinquenta e um anos. Caine estava
definitivamente esperando uma reação. Mas a única coisa que vira em Lydia era
contentamento. Ela concordava com o que quer que permitisse que seu marido
sentisse um pouco de felicidade.
Depois que Umberto abraçou Carol para se despedir, ele se sentou conosco, mas
parecia agitado.
─ Umberto, Rachel vai tocar um pouco de música para você. Lembra que Rachel
coloca algumas músicas às vezes?
Essa era a forma de Umberto dizer Não faço ideia, mas não vou te falar.
─ Sim. Claro.
Coloquei um par de fones sem fio nas orelhas de Umberto enquanto Lydia
procurava pequenos fones de ouvido que passara a carregar na bolsa. Não era
necessário que ela ouvisse, mas ela queria se manter conectada ao marido.
Percebi, de repente, que não tinha trazido um par extra de fones sem fio, então
ofereci para compartilhar o meu com Caine. Não era necessariamente um
sacrifício ter que ficar pertinho dele para que pudéssemos escutar em um só.
tensão estampada em sua expressão pareceu sumir. Olhei para Caine, que estava
observando Umberto, e ele assentiu e sorriu. Em algum ponto durante a música,
Umberto esticou o braço e segurou a mão da esposa. Foi um gesto tão pequeno,
mas aqueles momentos curtos de reconhecimento faziam uma enorme diferença
manual universal das avós italianas, e disse: ─ Belle parole non pascon I gatti.
Ficamos assim por algumas horas, até pararmos para o almoço e voltarmos
depois. Mas essa foi a duração da explosão de lembranças de Umberto naquele
dia. Uma segunda rodada de música à tarde não trouxe de volta lembranças
específicas, mas eu esperava que a música tivesse algo a ver com os sorrisos que
todo mundo expressava.
─ Umberto, está quase na hora da missa. Quer tomar banho antes de ir?
─ Ok.
─ Querem ir conosco?
Depois que a enfermeira levou Umberto para o quarto, para arrumá-lo, Lydia
─ De alguma forma, não fico ofendida por meu marido ter se apaixonado por
outra mulher e não se lembrar de mim, mas, toda vez que ele se lembra de Max,
não consigo deixar de me sentir insultada. ─ Ela deu risada, mas pareceu, no
fundo, estar falando sério. ─ Então, espero que nossa Rachel tenha tirado dez
hoje. A terapia musical realmente parece estar dando certo.
Sorri.
─ Não é assim. O professor West não me dá uma nota. Ele meio que
supervisiona a pesquisa que estou fazendo e o que estou escrevendo.
─ Fiquei. Muito.
─ Estarei aqui.
─ Se Rachel me quiser.
─ Não vou à igreja há quinze anos. Não entraria lá nem que me pagasse.
Capítulo 12
tinha escrito na noite anterior, enquanto estava bêbado. Metade do que ele tinha
rascunhado em um saco de papel marrom estava engordurada e ilegível. Mas a
outra metade estava muito boa. Então, tocamos por bastante tempo, tentando
fazer o otário se lembrar das palavras que tinha escrito.
para aguardar. Minha amiguinha costumava entrar um pouco antes da uma hora.
Mas hoje eu estava atrasado, e ela, adiantada. Pelo menos pensei que estivesse
adiantada. Nunca a tinha visto claramente para afirmar que era ela. Até onde
sabia, podia estar me escondendo de alguma garotinha aleatória que entrou na
igreja em um sábado à tarde.
O velho confessionário de madeira era escuro, para começar, e a grade que nos
separava dificultava ainda mais a visão de qualquer detalhe além de seu rabo de
cavalo. Sabia que ela tinha cabelo escuro e era pequena ─ assim como a
garotinha que estava xeretando na parte do padre do confessionário. Observei
com curiosidade, de longe, quando ela olhou e, depois, abriu a porta. Entrou por
meio segundo, recuou e entrou no lado do paroquiano ─ o lado do pecador.
Cinco minutos se passaram, e ela não abriu a porta de novo, então, quando a
barra estava limpa, fui até lá para interpretar meu papel de padre. A cabine
estava normal, como sempre, exceto por duas moedas no chão. Pensei que talvez
ela estivesse querendo ver o padre.
Devia estar completando umas seis semanas agora que fazíamos isso. Mesmo
assim, toda vez que ela dizia essas palavras, meu peito doía. Ela estava
carregando um fardo muito grande para uma criança. Ultimamente, nem
conversávamos sobre os pecados que ela pensava que estava cometendo. Ela só
aparecia e batíamos papo por meia hora, mais ou menos. Eu tinha a sensação de
que era o único adulto no qual ela confiava, o que era irônico pra cacete,
considerando que eu nem adulto era ainda, e que estive mentindo para ela desde
o primeiro minuto em que ela entrou no confessionário.
─ Me conte.
─ Bom, sabe o menino que senta ao meu lado que te contei? Tommy?
─ Esse mesmo. Ele me fez falar um palavrão, e tomei advertência. Nós dois
levamos advertência.
─ Disse ânus.
─ Seu erro foi normal. Parece mais que foi Tommy quem pecou ao usar o
palavrão de forma intencional. Não você.
─ Oh?
adoradora-de-buraco. Então disse a elas que aprendi a palavra ânus com Tommy,
porque quando ele está com as mãos dentro das calças durante a aula, às vezes
enfia o dedo no ânus. Só não usei a palavra ânus quando disse isso.
O que eu queria dizer era Isso aí, garota, mas, em vez disso, permaneci com os
modos de padre.
─ Vai rezar três ave-marias por falar palavrão. Mas, cá entre nós, parece que o
Tommy é um babaca e mereceu.
Na semana anterior ela não tinha falado sobre o seu lar, e eu estava ansioso para
descobrir como as coisas estavam indo. A única coisa que consegui tirar dela,
além do que ela mesma admitiu sobre ter pensamentos ruins sobre seu padrasto,
era que ele bebia e gritava demais.
Duas semanas atrás, ela havia me dito que ficava com medo quando seu padrasto
gritava à noite. Tinha dificuldade para dormir às vezes. Sugeri que colocasse
fones de ouvido e escutasse sua música preferida para abafar o som.
Mas ela não tinha fones. Então, na semana anterior, coloquei um par de fones
extra no confessionário, antes de ela chegar, e disse para ela levar para casa.
─ Ajudou?
─ Isso é bom.
─ Falei pra minha irmã tentar, mas ela disse que não podia.
Ela não respondeu por alguns minutos. Comecei a perceber que seu silêncio
falava mais alto que sua própria voz.
─ Ela tem fones de ouvido. Ganhou de Natal, no ano anterior à morte de nossa
mãe. Eles estavam no armário dela.
─ Então, por que sua irmã acha que não pode usar? Ela não gosta de música?
─ Às vezes, quando ele está bravo, ou quando já bebeu bastante, entra no quarto
dela à noite.
Capítulo 13
Rachel
Eu havia debatido comigo mesma se faria ou não essa pergunta pelos últimos
cinco minutos. Embora tivesse passado o dia todo com Caine, não estava pronta
para que esse dia acabasse. Mas queria que minha sugestão de jantar soasse
casual. Ele tinha me chamado para comer antes, mas, por algum motivo, quando
era eu fazendo a pergunta, sentia como se o estivesse chamando-o para um
encontro.
Caine olhou para mim e depois de volta para a rua. Estava quieto, e tive a
sensação de que ele estava ponderando se nossa situação era apropriada antes de
responder. Fiquei surpresa quando ele disse:
e será por minha conta de novo. ─ Sorri com essa última parte.
─ Que tal comida grega, e dessa vez eu pago?
─ Por mim, tudo bem. Vire à esquerda na Elwyn Street. É logo à direita, se
conseguirmos encontrar vaga para estacionar… Greek Delight.
Ele olhou para mim por cima do cardápio com suas armaduras Burberry
elegantes.
─ Você usa óculos. Por que o fato de eu precisar de óculos para ler significa que
seja velho?
─ Tenho astigmatismo. Preciso deles para ler desde quando ainda não usava
sutiã.
cardápio. Ele resmungou alguma coisa que não entendi. Continuei a encará-lo,
ele tirou os óculos e olhou para mim.
─ O quê?
Sorri.
─ Sim, agora sim.
Inclinei-me.
Ele balançou a cabeça e continuou a ler, mas flagrei o canto de sua boca se
erguer.
Por que eu adorava aquele canto de boca erguido? Sentia como se fosse algum
─ Obrigada.
Lembrei do quanto me senti esquisita ao me sentar com o trio pela primeira vez.
─ Eu sei. Era estranho no começo, mas agora estou acostumada. Lydia é uma
─ O amor verdadeiro é altruísta. Ela quer o melhor para ele, mesmo que isso
afaste os dois.
A garçonete trouxe nossas bebidas e anotou nosso pedido. Caine pediu uma
cerveja grega, e eu, meu refrigerante diet de sempre. Precisei desviar o olhar
quando os lábios dele envolveram o gargalo da garrafa. A minha atração por ele
era muito forte para esconder.
As sobrancelhas de Caine pularam para cima, e percebi como deve ter soado
─ Quis dizer… Me senti assim em relação à minha mãe. Não que eu seja lésbica
ou algo assim. Gosto de homens. Não que eu tenha alguma coisa contra lésbicas.
Só prefiro… sabe… homens, quando o assunto é sexo. Não que a minha vida
sexual esteja muito ativa no momento. ─ Eu estava balbuciando.
Bebi meu refrigerante gelado para ocupar minha boca e, felizmente, conseguir
evitar que minha pele ficasse muito cor-de-rosa.
─ De qualquer forma, quando minha mãe ficou realmente doente, eu queria que
ela morresse para que não sentisse mais dor. Eu ficaria sem mãe, mas não me
importava. Só queria que ela ficasse em paz. É disso que Lydia e Umberto me
fazem lembrar.
─ Não sei se consigo ser altruísta. Passei a maior parte da vida sendo egoísta.
─ Sem namoradas?
Eu não conseguia enxergar Caine como uma pessoa egoísta. Ele trocara meu
pneu depois de eu ter brigado com ele e interrompido sua aula. E não conseguia
imaginar que não fosse atencioso na cama. Era tão observador que, em geral, era
uma distração, sem contar como conseguia ser intenso. E então havia aquela
coisa da música… Mãos habilidosas e bom ritmo. Não. Não tinha jeito de Caine
West ser egoísta na cama. Disso eu tinha certeza.
─ Você ficou quieta depois que eu disse que havia coisas piores na vida do que
ser egoísta.
─ Estava só pensando no que você disse. Não parece egoísta para mim.
─ Talvez. ─ Dei de ombros. ─ Mas você parece ser muito atencioso para ser
egoísta desse jeito também.
aproveito cada minuto do cuidado que tenho com essas necessidades. ─ Os olhos
dele voltaram a se fixar nos meus, e ele se aproximou ainda mais. ─ Ela goza
antes de mim, muitas vezes.
Engoli. Meu corpo todo reagiu, e Caine sabia disso. Ele se recostou com um
─ Oh.
─ Não sei se concordo. Acho que todos temos capacidade para ser Lydia. É
uma escolha não tentar encontrar seu Umberto. E sempre há um motivo para
essa escolha.
Felizmente, nossa comida chegou logo depois disso. Caine tinha pedido faláfel e
eu, gyro. Começamos a comer e nos dedicamos totalmente a isso.
Em pouco tempo, minha refeição tinha se tornado uma grande bagunça. O pão
estava rasgado, e metade do meu gyro estava caindo. Não percebi, mas o molho
branco tzatziki tinha pingado nas costas da minha mão.
Ainda segurando o lanche, virei o punho para olhar. O molho tinha escorrido
pela minha mão, passado pelo punho, e estava escorrendo por todo meu braço,
quase caindo na minha camisa. Se eu soltasse o sanduíche, não ia ter como pegar
tudo de volta sem deixar cair.
Então, lambi o braço todo até meu punho e dedo, limpando toda aquela meleca
de uma vez. Não era o tipo de coisa que uma moça faria, mas era melhor do que
deixar cair na minha linda camisa.
─ O quê?
─ Não entendi.
O trajeto de volta ao meu apartamento foi esquisito. Nenhum de nós disse uma
palavra. Sinceramente, eu não fazia ideia do que dizer. Percebi que os
comentários de Caine significavam que ele ficou excitado com a minha exibição
descuidada com a língua, mas também era um lembrete de que eu precisava
parar de fantasiar sobre algo que nunca aconteceria.
Não estava realmente propondo que ele entrasse para beber alguma coisa. Só
─ Acho melhor não ficarmos mais juntos fora do horário da aula. Sua pesquisa é
sólida, e acho que estamos com o semestre muito bem planejado. Se precisar
conversar sobre a tese, a secretaria do departamento tem a minha agenda e pode
marcar uma reunião.
porta.
Tomei um banho rápido, coloquei uma camiseta velha de alguma banda para
dormir e fui para a cama me sentindo confusa e triste. Meus sentimentos por
Caine tinham aumentado, apesar de saber que era idiotice gostar de um homem
Embora o tempo já tivesse passado para a gente, Davis nunca me mandava sinais
confusos. Não fazia joguinhos. Assumia seus sentimentos e era sincero comigo.
Suspirei e respondi a mensagem.
Capítulo 14
Rachel
Caine tinha me evitado com sucesso por quatro dias. Até hoje. Não haveria jeito
de me ignorar agora, a não ser que faltasse à reunião obrigatória, à qual
auxiliares e professores tinham de comparecer. Eu estava sentada sozinha no
fundo do enorme auditório e havia um assento vago ao meu lado – não que eu o
estivesse guardando para alguém em particular. Caine ainda não tinha chegado.
Cada vez que alguém entrava, meus olhos focavam na porta. Quando o chefe do
Ficou parado na porta, escaneando a sala com os olhos, até que eles chegaram
em mim, o que o fez desviar o olhar rapidamente. Ele não poderia ter se sentado
mais longe de mim.
Fiquei surpresa com o fato de seus cabelos não terem pegado fogo durante os
ele para cumprimentá-lo com um grande sorriso. Ela usava um terno pink que
gritava por atenção, mas, com exceção disso, era bem bonita ─ embora eu
detestasse admitir. Já a tinha visto pelos corredores e sabia que era professora
adjunta, mas não sabia seu nome.
Caine e a professora Pink estavam um pouco à minha frente na fila para sair
da sala, e ele fez questão de não olhar na minha direção. Quando sua mão tocou
a lombar dela, a fim de apressá-la para sair, percebi que eu era uma completa
idiota. Obviamente, o professor poderoso não tinha problema em confraternizar
Assim que saí do auditório, atravessei o corredor como um raio. Minhas pernas
nunca me tiraram tão rápido do campus. Estava irritada por pensar que seria
possível Caine estar interessado em mim e que talvez estivesse se contendo
apenas por eu ser sua auxiliar. Mais ainda estava brava por ele fingir que esse era
o caso. Os sinais que ele tinha dado na outra noite, durante o jantar, não foram
frutos da minha imaginação.
─ Desculpe.
Comecei a andar de novo. Eu deveria sair dessa merda de prédio, mas eu me
─ Jesus. Você vai sobreviver. Não ande tão perto das pessoas!
A porta da sala de Caine estava entreaberta. Parei por um instante, para organizar
os meus pensamentos, e então segurei a maçaneta. Dane-se, não vou bater antes
de entrar. Mas a voz de uma mulher me impediu de continuar. Sua risada atingiu
minha pele e a senti queimar até as minhas bochechas. Nunca tinha ouvido a voz
da professora Pink, entretanto, de algum jeito, sabia que era ela.
─ Giordano’s.
Tinha escutado o suficiente. Não fiquei para ouvir a resposta de Caine. Não
consegui. Por mais que estivesse irritada quando fui até seu escritório, escutá-lo
com outra mulher transformou aquilo em mágoa e vergonha, algo que eu preferia
que ninguém visse. Então, receitei a mim mesma minha própria terapia e, em vez
de entrar brava em seu escritório, coloquei meus fones de ouvido e fui para casa.
Estava com zero vontade de ir para o nosso jantar mensal dos amigos. Preferia
ficar em casa e me afogar em autopiedade. No entanto, quando tentei cancelar,
Ava exigiu que eu fosse. Então, me obriguei a me arrumar. Dane-se. Se eu não
me sentia bem, pelo menos tentaria parecer bem. Além disso, secar o cabelo era
estranhamente terapêutico para mim. Achava aquele ato repetitivo e constante de
escovar e alisar muito tranquilizador.
Não preciso mencionar que meu cabelo, naturalmente grosso e ondulado, estava
liso como uma agulha quando terminei – eu estava precisando de muita calma.
Já que eu tinha me disponibilizado a parecer bem, apostei com força total na
maquiagem e até coloquei uma roupa bonita e sandálias de salto alto.
menos, gostara do esforço extra. Naquela noite, éramos apenas eu, ele e Ava, já
que nossa antiga colega de quarto estava viajando com o novo namorado em um
cruzeiro. Assim que nós três nos sentamos, fiquei feliz por ter ido. Realmente
gostava de estar com eles. Dávamos muitas risadas quando nos reuníamos, em
grande parte por causa das histórias doidas que Ava contava. Contudo, apenas
meia hora depois de chegarmos, Sal, o novo garçom, se aproximou e disse que
se sentia mal e precisava ir embora. Perguntou se uma de nós poderia ligar para
Charlie e pedir-lhe que viesse até o O’Leary assumir seu turno.
Faltavam poucas horas até a cozinha fechar, então Ava e eu nos voluntariamos
para cobri-lo. Além do mais, sua pele estava levemente esverdeada, e eu tinha
quase certeza de que não conseguiria esperar Charlie sair do Queens e chegar até
ali.
─ Você está muito bonita para trabalhar hoje ─ Ava disse, apontando para os
meus pés. ─ E esses sapatos não são de garçonete. Deixa comigo. Não tem
muitas mesas, então vocês dois fiquem aí, e eu venho nos intervalos entre servir
uma mesa e outra.
Dei risada.
─ Eu sei. Por quê? Não deveria. Somos só nós. Já saímos um milhão de vezes.
─ Está dizendo que eu não era gostosa quando morávamos juntos e quando eu
Fiquei vermelha.
Davis e Ava tinham pedido uma garrafa de vinho, e ele a ergueu para encher
Hesitei, refletindo sobre a última vez em que bebemos juntos – eu tinha acabado
no quarto de Davis.
─ Só uma.
O vinho definitivamente ajudou. Agora que a garrafa estava vazia, a tensão entre
mim e Davis havia sumido. Devoramos a massa e o vinho e conversamos
Era típico dele se lembrar dos nomes dessas pessoas que eram importantes para
mim. Ele sempre foi muito cuidadoso e atencioso.
─ E sua tese?
─ Está indo bem. Caine pareceu feliz com meu progresso. Mas quem sabe ao
─ Caine?
Davis assentiu.
─ Ele é meio que um grande babaca ─ adicionei. Não que ele tenha perguntado.
─ E depois?
Davis sorriu.
─ E você? Está feliz aqui em Nova York? Acha que vai ficar para sempre?
─ Talvez.
Não sabia se estava imaginando coisas, mas podia jurar que seus olhos focaram
em meus lábios.
Meu bom humor mergulhou de cabeça. Eu não estava saindo com ninguém, mas
não significava que estava feliz com isso. Havia conseguido esquecer Caine pelo
total de uma hora. Suspirei.
Davis deve ter pensado que minha tristeza de espírito fosse uma declaração geral
sobre o meu estado de solteira.
É. Eu também.
Davis sorriu.
─ Também senti.
Ãh?
O vinho deve ter se apossado de mim. Realmente não tinha percebido que ele
estava me convidando para sair. Esperara por isso por quase um ano, agora não
tinha certeza. Felizmente, Ava chegou para me resgatar. Ela se sentou ao meu
lado, batendo os quadris nos meus de brincadeira, e assumiu a conversa. Fiquei
grata pelo adiamento do assunto.
─ Preciso estar no aeroporto às cinco da manhã para trabalhar, então vou indo.
Nós três fizemos planos para o jantar do mês seguinte, e ele deu um abraço de
despedida bem forte em Ava antes de se virar e me abraçar. Só que ele não
soltava meu abraço. Em vez disso, pegou minhas mãos.
Não fazia ideia do que dizer, então simplesmente assenti e sorri. Então, ele foi
embora.
─ O quê?
─ Nos embebedar.
Capítulo 15
Rachel
─Ele tem uma bunda maravilhosa. ─ Bom, isso era o que eu pretendia dizer, mas
o que realmente saiu da minha boca foi: ─ Ele tem uma munda varaviosa.
Suspirei.
─ Quero. É estranho?
um pouco de mordida durante o sexo, mas morder a bunda dele quando não está
─ Terminei há uma hora… Mas vou encher para você, porque não sei se
consegue andar os dez metros até o bar. ─ Ela se levantou e pegou a taça da
minha mão. ─ Mas essa é a última.
Enquanto Ava estava atrás do balcão, peguei meu celular na bolsa. Não sabia
por quê, mas queria xeretar no Facebook do Davis. Lembrei que ele tinha
postado algumas fotos com a mesma mulher há alguns meses e me perguntei se
estaria namorando com ela depois que as coisas terminaram entre nós.
Que imbecil.
Claro que ele não era realmente um imbecil. Só não estava interessado em mim
do mesmo jeito que eu estava interessada nele e não queria me dar corda, então
isso o tornava um imbecil na minha cabeça bêbada e emotiva. Deveria ter
desligado o meu celular e o ignorado, respondido ao meu chefe quando estivesse
pensando direito, entretanto, o álcool pensava diferente. Respondi.
VOLTAR PARA SUA SALA E FAZEREM O QUE QUER QUE SEJA QUE
FAZEM… DE NOVO.
Revirei os olhos.
Bufei. Alto. Que imbecil. E, então, minha mensagem desceu ladeira abaixo.
Estava segurando o meu celular, mas esperava receber uma mensagem, então
Atendi.
─ O quê?
─ Rachel?
Alguma coisa havia acontecido comigo, e pensei que esse fosse um trocadilho
─ Sou sua humilde auxiliar, que tem um ótimo potencial, só que você é muito
convencido para ver.
─ Estava bebendo?
─ Você estava bebendo?
─ Bom, não sabe o que está perdendo. Porque, depois da primeira dose, tudo
Ava.
Outra pausa.
─ Sim, tenho certeza. Estamos no O’Leary, vou levá-la para casa em um táxi e
garantir que ela chegue com segurança.
─ Vou guardar isso para que você não faça mais nenhuma idiotice.
─ Que foi? Tudo que fiz foi atender o celular. Não é minha culpa se ele é um
grande e tremendo imbecil.
Ava me deixou falando por mais quarenta minutos enquanto bebia meu drinque.
Ou eu tinha me acostumado com o gosto ruim ou a última Tanqueray com tônica
tinha mais gosto de tônica do que de Tanqueray. Como eu ainda estava
conseguindo falar, achei que era a segunda opção. Ava havia deixado minha
bebida mais fraca.
─ O quê? Não fique tão chocada. Ele é um cara legal. E Deus sabe que eu não
transo há tempos.
─ Bom, obviamente eu preferiria fazer sexo com ele. Mas talvez seja só isso.
Talvez só esteja sexualmente muito frustrada e minha atração por Caine seja
apenas física.
─ Não, Rachel. Professor West. ─ Ela apontou para o outro lado do bar. ─ Ele
chegou.
─ É melhor que ele goze mesmo para mim. Pode fazer quase um ano, mas acho
que ainda sei como usar minha vagina. ─ Pausei. ─ Você acha que minha
Caine estava parado ao lado da nossa mesa e fez aquela coisa idiota e sexy com
os lábios.
Ava era uma traidora. Caine perguntou se podia ficar uns minutos a sós comigo,
e eu disse que não ao mesmo tempo que ela disse que sim. Ela me lançou um
olhar de aviso imediatamente antes de se levantar da nossa mesa e dar espaço a
Caine.
─ Me certificando de que sou o único homem com quem você fala sobre gozar
enquanto está nesse estado intoxicado.
─ Davis me quer.
─ Meu ex. Bom… Mais ou menos. Jantamos juntos. Ele me quer de volta.
Havia pelo menos uma coisa boa sobre o álcool: ele me impedia de corar quando
eu deveria estar envergonhada. Na verdade, me impedia até de perceber que
deveria ficar envergonhada.
─ E daí? Você tem uma bunda dura. Isso não faz com que tudo comece e
termine em você. Eu mesma tenho uma bunda muito legal. Só que você é muito
burro para notar.
─ Quis dizer que pensa que não notei sua bunda muito legal.
A voz dele ficou rouca, e o som gutural me fez sentir algo entre as pernas.
─ Você tem uma cintura minúscula. Quando usa jeans, sobra um espaço nas
costas. Quando abaixa, consigo ver sua calcinha fio dental. Você gosta de
combinar com a camisa. Na quarta-feira, usou uma camisa azul com um fio
dental azul-bebê. No dia em que deu a aula e estava entregando os fones de
ouvido, você se inclinou de uma forma linda para distribuir para cada fileira. É
por isso que me levantei para ajudá-la com as caixas. Não pensou que eu
estivesse sendo cavalheiro, não é? Naquele dia, você estava com uma blusa
branca fina e uma calcinha branca de lacinho. Gostei mesmo daquele laço
branco.
─ Então está enganada se pensa que não reparei na sua bunda muito legal. Por
dois motivos: primeiro, não é uma bunda muito legal. É uma bunda espetacular
pra caralho. E, segundo, eu reparei. Todo maldito dia, desde que você saiu do
banheiro do bar. Na realidade, eu a observei balançar para um lado e para o outro
até sair da minha vista naquela noite… Mesmo depois de ter brigado comigo.
─ O que eu deveria ter falado, Rachel? Você é minha auxiliar, e eu sou seu
orientador. Além disso, mesmo que não fosse esse o caso, eu gosto mesmo de
você. Você não é uma foda casual para a qual eu pararia de ligar quando quisesse
terminar.
Aquilo foi pesado. Não queria pensar em Caine daquela forma. Mas então me
lembrei da reunião.
Se eles não estavam dormindo juntos, eu sabia que tinham um histórico. Podia
sentir pela forma como ela o tocava, o modo como olhava para ele e tremeluzia
seus cílios postiços.
─ Seu celular estava tocando. ─ Ava olhou para Caine. ─ Havia colocado na
minha bolsa para que ela não se arrependesse de falar alguma coisa para você.
Acho que deu certo. ─ Caine sorriu, e ela voltou a atenção para mim. ─ Estarei
no bar se precisar de mim.
No instante em que Ava saiu, meu celular começou a tocar. O nome de Davis
─ Precisa atender?
Parou de tocar, mas quando peguei o celular, vi que Davis também tinha
mandado mensagem. Queria ter certeza de que cheguei bem em casa.
─ Vou só mandar uma mensagem rápida para dizer que estou bem.
─ Mas talvez não tenha mesmo superado. Não faço… sabe… desde que
terminamos.
─ Sexo?
─ Sim.
Mesmo em meu estado alcoolizado, não acreditava que estava tendo essa
conversa.
Suspirei.
─ Talvez devesse escolher alguém no bar e transar. Então seria mais fácil decidir
se sinto falta de Davis ou só do sexo.
As pupilas nos olhos de Caine se dilataram ao ponto de sua íris ficar mais preta
do que marrom.
─ Por quê? Nunca escolheu alguém e levou para casa só para satisfazer suas
necessidades?
─ Bom, então por que você pode fazer isso, mas eu não?
─ Porque eu não faço isso para tentar solucionar um problema. ─ A voz dele
ficou sóbria. ─ Foder alguém não vai te ajudar a decidir se quer estar com outro
homem. Acredite em mim, Rachel.
Bufei.
Conversamos por uma hora depois que Caine voltou com as bebidas. Havia
ficado um pouco sóbria, mas ainda me sentia mais ousada que o normal.
Sorri.
Caine levou a cerveja que estava segurando aos lábios e me encarou por cima
Inclinei-me, e meu nariz ficou a não mais que alguns centímetros de distância do
dele.
─ Se eu não fosse seu professor e você não fosse uma garota legal, sua boceta
revirginada estaria dolorida pra caralho agora.
Capítulo 16
Rachel
Não me senti nada mal quando meu alarme tocou. Abri os olhos e me preparei
para a dor de cabeça latejante e a náusea que vinham com a ressaca. Em vez
disso, estava cansada, mas os efeitos típicos não pareceram me atingir. Após
beber uma garrafa inteira de água sem parar para respirar, resolvi voltar para a
cama por mais quinze minutos.
apartamento.
─ Coma tudo. Não funciona a não ser que acabe com tudo ─ ele dissera.
Tinha me esquecido de que Caine pedira para eu cobri-lo na aula daquela tarde.
Eu deveria trabalhar no turno do dia, mas Charlie não se importaria se saísse um
pouco mais cedo. Nunca tinha movimento no fim da tarde, de qualquer forma.
RACHEL: POSSO DAR SUA AULA. DESCULPE, ESQUECI QUE FOI ISSO
QUE DEU INÍCIO AO
CAINE: OBRIGADO.
As coisas entre mim e Caine haviam mudado na noite anterior. Nossa atração
era conhecida agora, então pensei que tudo bem ser um pouco atrevida.
RACHEL: ?
CAINE: FILHAS DA MINHA IRMÃ. ELA VAI FAZER UMA BIÓPSIA ESTA
TARDE E PRECISA
CAINE: OBRIGADO.
Depois que a aula terminou, sentei na cadeira de Caine por um tempo, esperando
os alunos saírem. Sentar em seu lugar, à frente da sala, de alguma forma fez com
que eu me sentisse mais próxima dele. Como estava pensando no
professor sexy, pensei em lhe enviar uma mensagem para ver como estava indo a
tarde de babá. Pensar em Caine brigando com duas menininhas me fez sorrir.
Imaginei se ele trocava fraldas – acho que precisava trocar para cuidar de duas
meninas com menos de quatro anos.
Fiquei bem surpresa quando Caine aceitou minha oferta de lhe dar uma mão
no hospital – até chegar lá. Eu menti, dizendo que era da família, para conseguir
entrar na sala de observação. Quando vi Caine, em um espaço com a cortina
aberta, do outro lado da mesa da enfermagem, parecia atipicamente assustado.
Ele balançava aquela que pensei ser sua sobrinha de dois anos no quadril,
enquanto ela chorava até os pulmões saírem. A mais velha estava deitada em
uma maca, assoprando uma luva de látex como uma bexiga.
─ Oi ─ eu disse.
Sorri para a menininha que estava no quadril dele, e ela parou de gritar para me
olhar.
Deduzi que a garota mais velha, deitada na cama, fosse a paciente, mas a
sobrinha que Caine estava segurando tinha uma vermelhidão no rosto e no
pescoço.
A menininha fofa assentiu, com o lábio inferior tremendo. Ela tinha cabelos
ruivos cacheados. Estiquei a mão e enrolei um cacho no dedo.
─ Adorei seus cachos. Eles me lembram a Merida. Você sabe quem é Merida?
Ela assentiu.
─ Você gostou?
─ Sou a Rachel… Uma amiga do seu tio Caine. Quer usar uma?
Seus olhos se iluminaram, e ela assentiu novamente, só que mais rápido dessa
vez.
Tirei duas pulseiras do meu braço e as segurei para ela. Ela sorriu e me deixou
colocá-las. Foi então que consegui ver melhor o que a pobrezinha estava
vestindo.
─ Humm… Caine? Por que a fralda dela está com uma fita adesiva?
─ Posso te pegar no colo? Talvez consiga consertar sua fralda e colocar sua
camisa do lado certo.
Caine franziu a testa ao olhar para a sobrinha. Obviamente ele não tinha
percebido que a camisa não estava do lado certo. Lizzy ficou apreensiva, mas,
depois de um tempinho, se inclinou em minha direção e eu a peguei dos braços
do tio.
─ Não. Saí de casa tão rápido que nem pensei nas fraldas. ─ Ele olhou para as
pernas nuas de sua sobrinha. ─ Ou nas calças, aparentemente.
Sorri.
─ Tudo bem. Tenho certeza de que a enfermeira pode nos dar uma.
Lizzy e eu fomos até a mesa da enfermagem, e uma das ajudantes foi legal o
─ Tudo certo. ─ Lizzy estava sorrindo agora. ─ E acho que a vermelhidão dela
já começou a sumir.
─ Tem razão. ─ Ele passou os dedos no cabelo. ─ Graças a Deus. A última coisa
de que minha irmã precisava hoje era chegar em casa e ver uma de suas filhas no
hospital. Ela teve câncer aos vinte anos e teve que tirar a tireoide. Na semana
passada, encontrou um nódulo inchado debaixo do braço. O médico acha
que não é nada, mas ela ficou assustada mesmo assim. Estão fazendo a biópsia
por precaução.
─ Uau. Sinto muito em saber disso. Espero que fique tudo bem.
Caine assentiu.
─ Obrigado.
Um médico chegou para avaliar Lizzy, e ela ainda estava em meus braços. Ele
puxou a cortina por todo o trilho no teto e transformou o espaço aberto em uma
sala particular de tratamento.
Caine respondeu.
Menos de uma hora mais tarde, fomos liberados com um monte de papéis na
mão. Fui até o carro de Caine e o ajudei a colocar as garotas nas cadeirinhas.
─ Minha irmã insistiu que eu levasse essas coisas no caso de ter que ir em algum
lugar com rapidez. Eu lhe disse que ela era maluca, não estava planejando ir a
nenhum lugar, mas ela as colocou aqui mesmo assim.
─ E ela vai jogar isso na minha cara até termos oitenta anos.
Depois que as meninas estavam seguras, Alley perguntou se eu podia voltar para
a casa do tio Caine a fim de brincar com ela. Eu tinha começado a falar que não
poderia, quando Caine interrompeu.
─ Eu faço um ótimo macarrão com queijo, se estiver com fome. Tem certeza
de que não consigo te convencer? Podemos ter outro incidente com a fralda, e a
fita adesiva está quase acabando. Posso precisar apelar para o Super Bonder.
Sorri. Fiquei tentada, mas quando a expressão de Caine ficou séria e, olhando
nos meus olhos, disse “Por favor?”, não havia como dizer não.
─ Vou te seguir.
Calma aí. Ele não está te convidando para um jantar romântico. Só quer que o
ajude com as sobrinhas. Que troque fraldas, não que tire suas roupas.
Tentei manter a racionalidade em meu coração durante todo o trajeto até a casa
de Caine. Acalmar a avalanche de empolgação que o seu convite tinha causado.
Mas não havia como racionalizar. Minha cabeça sabia da verdade, mesmo assim,
meu coração parecia não dar a mínima.
Capítulo 17
Rachel
Caine respondeu.
─ Esse é o Murphy. ─ Ele tentou fazer uma voz mais grossa. ─ Desça, garoto.
O cachorro o ignorou completamente e tentou se enterrar em meu corpo.
Fiz carinho atrás das orelhas de Murphy, enquanto ele me cheirava como um
louco.
─ É sua culpa. Ele nunca vai me obedecer com o cheiro que você tem.
Caine foi até onde o cachorro ainda estava me cheirando e deu um puxão firme
na coleira dele.
─ Verão. Você sempre tem cheiro de verão. ─ Deu um passo para trás e piscou.
─ Minha estação preferida.
─ Entre. Vou dar um petisco para Murphy, para distraí-lo do seu cheiro bom.
Segui Caine e rapidamente me esqueci de todo o resto assim que vi sua casa.
O apartamento de Caine era incrível. Achei que fosse ser bonito, mas não tão
bonito. No minuto em que entramos, as meninas atravessaram o corredor em
disparada para pegar um filme que queriam assistir, e olhei em volta, admirada.
Sem falar que ele tinha um hall. Um hall em Manhattan? Só aquela entrada
devia valer uns quinhentos dólares por mês. Caine viu minha expressão.
Menos eu. Mas herdei vinte e cinco por cento da empresa do meu avô. Paga um
─ Humm… um pouco? Eu que o diga. Você tem vista pro parque, caramba. ─
Quando me virei, Caine estava em pé na cozinha, que era aberta para a sala de
estar, e olhando para mim.
As meninas voltaram correndo para a sala com uma mochila. Elas pulavam
muito.
─ Acho que o Benadryl está causando o efeito oposto nela ─ Caine resmungou.
Alley abriu o zíper da mochila, virou-a de cabeça para baixo e jogou todo o
conteúdo no sofá de Caine. Parecia que ela tinha xícaras de chá e pires de
plástico para uma festa para vinte pessoas.
As garotas começaram a arrumar a mesa de centro, e fui até a cozinha de aço
inox de Caine.
Foi divertido vê-lo se sentar no chão e tomar chá com uma xícara minúscula.
Observando a maneira como as garotas interagiam com ele, podia ver que ele
passava boa parte do tempo com elas, mesmo que fosse incapaz de trocar uma
fralda.
─ Sou obrigado a brincar disso duas vezes por mês, quando vou jantar na minha
irmã.
─ Não. Moram em Chappaqua. Foi onde cresci. Minha irmã ficou lá para morar
perto da minha mãe.
Claro que ele estava sendo sarcástico, mas as meninas não entenderam e ficaram
animadas de qualquer forma. Nós quatro atravessamos o corredor até o quarto
dele.
A cama de Caine era enorme, com certeza era king size. O dossel com quatro
pilares de mogno esculpido a faziam parecer ainda maior. Também era
extremamente alta. O toque masculino dela parecia combinar com ele. Eu
conseguia imaginá-lo facilmente dormindo nu ali. De bruços. Com aquela bunda
dura que eu queria tanto morder fazendo volume debaixo do lençol.
Morder. Foi o fim. Era tudo de que precisava para o leve rubor no meu rosto
ficar mais forte, com uma adorável cor carmesim, tenho certeza. Caine me
olhou, e um sorriso malicioso apareceu em seu rosto lindo. Ele colocou Lizzy na
cama, ajudou Alley a subir, e voltou para a porta, onde eu ainda estava parada,
mexendo no relógio de pulso de um lado para outro.
─ Praticamente a única hora que essa coisa fica ligada é quando essas duas estão
aqui.
─ Não consigo dormir sem assistir um pouco de TV ─ disse a ele. ─ Você deve
ser uma dessas pessoas que dorme no segundo em que deita a cabeça no
travesseiro.
─ Não disse isso. Há outras coisas que prefiro fazer antes de dormir em vez de
ver televisão.
Devo ter parecido muito surpresa e desorientada, porque Caine deu risada.
quarto.
Cinco minutos depois, Caine retornou à sala de estar. Eu tinha acabado de lavar
o jogo de chá e estava secando as loucinhas antes de guardá-las de volta na
mochila das meninas.
Dei risada.
─ É, sei.
Fui até o sofá e procurei meu celular na bolsa, mas ele parou de tocar antes
─ Está.
Ele assentiu.
─ Não.
Ergui as sobrancelhas.
─ Você vai me ajudar a decidir se eu deveria dar outra chance para o meu ex?
─ Ok. Bom, ele tem vinte e nove anos, é divorciado e é gerente regional de
vendas em uma empresa de equipamentos duráveis de medicina nuclear.
Ele mostrou três dedos de uma mão e começou a tocar cada um ao falar.
─ Três motivos: um, tem vinte e nove anos e é divorciado. Tem alguma coisa
errada aí. Histórico ruim. Dois, vendedor. Bem aí tem uma bandeira vermelha.
Ele vende tranqueira para sobreviver. É só uma questão de tempo até ele te
vender uma linha de tranqueiras também. E três, o nome dele é Davis. ─ Deu de
ombros. ─ É um nome idiota.
mais grave do que cometer um erro quando se é jovem e se casa com a sua
namorada do ensino médio. Dois, você é músico. Todo mundo sabe que músicos
são playboys de péssima reputação. Ousaria dizer que o risco de traição dobre
para um músico em relação a um vendedor. E três, você leu a Bíblia? Caim não
era exatamente o filho bom.
Caine assentiu.
─ Acho que você é meio louco. Não pode conhecer o tipo de Davis só pela idade
e pela profissão. Ele é um cara legal, trabalhador, quer ter uma família um
dia, liga para a mãe todo domingo. Até tem um lado romântico… me levou a um
piquenique no parque uma vez.
Caine zombou.
─ Do que está falando? Claro que é romântico. Qual é a ideia que você tem
Caine andou da cozinha até o sofá onde eu estava parada. Deu um passo para
─ Não sou romântico ─ ele disse. ─ Prefiro foder como animais do que ir a
um piquenique no parque.
Caramba, por que estava sendo tão idiota?
Mais importante, por que eu gostava tanto disso? Minha pele ficou toda
arrepiada, e um calafrio passou por todo o meu corpo, causando um
formigamento entre minhas pernas. Sem mencionar que os meus mamilos
tinham ficado tão inchados que eu teria que recuar em um minuto se ele não me
desse um pouco de espaço. E, ao mesmo tempo que ele me excitava, também me
─ Se tudo nesse cara é tão bom, por que está demorando tanto para responder
à pergunta dele?
Ele tinha razão. Eu não deveria precisar pensar tanto. Mas se fosse ser sincera
comigo mesma, o motivo não tinha nada a ver com quanto Davis era ou não
bom. A única coisa que me impedia de dar ao cara outra chance era que ele não
era Caine.
Senti-me derrotada.
─ Você está certo. Realmente não há motivo para não jantar com ele amanhã à
noite. Quem sabe talvez a chama se acenda de novo. Nunca vou saber se não
tentar.
Caine recuou com uma expressão vazia e séria. Não importava que tivéssemos
uma química que eu nunca havia sentido ou que tivéssemos mais em comum do
que a maioria dos casais casados e felizes. Ele não estava interessado em mim.
Quanto mais o conhecia, mais percebia que toda aquela história de professor-
aluna era apenas uma desculpa. Caine West não era o tipo de homem que
deixaria alguma coisa atrapalhar se realmente quisesse.
Ele ficou quieto enquanto eu guardava o celular no bolso lateral da minha bolsa
e pegava minhas chaves antes de jogá-la por cima do ombro. Ele não se mexeu
quando passei por ele, mas, de repente, segurou meu braço, me impedindo de
andar.
─ Sou a última pessoa que deveria dar conselhos sobre relacionamentos. Mas
se não houver um sentimento, você não pode forçar. Assim como é impossível
não ceder quando se sabe que há alguma química rolando.
De novo, eu queria entender o que havia por trás de seu comentário. Precisava
parar de fazer isso.
─ Obrigada, Caine.
Capítulo 18
Ela deve ter sentido que alguém a observava, porque, depois de um minuto,
ergueu a cabeça e olhou em volta. Felizmente, olhou para o outro lado antes de
se virar para minha direção, me dando tempo de colocar a cabeça para trás do
pilar. Que porra estou fazendo? Estava me escondendo de uma garotinha que eu
tinha absoluta certeza de que vivia um tipo de ambiente abusivo em casa e
fingindo ser um padre para que eu pudesse… resgatá-la?
Curioso, segui diretamente para a cabine, mas estava do mesmo jeito que
encontrara nas últimas seis semanas. Havia a cadeira de veludo vermelho, uma
cruz dourada na parede… e era isso. Então, vi uma moedinha bem atrás da perna
esquerda da cadeira. Quase não vi. Inclinei-me e a peguei. Ela falou antes que eu
pudesse me sentar.
Seu humor estava melancólico naquela semana. Não tinha nenhuma história
engraçada para contar sobre Tommy e, apesar de ter ficado do outro lado por
longos vinte minutos, não tinha realmente falado muito.
─ Não.
─ Não.
─ Não sei. Ela fugiu na semana passada. Mas, antes de partir, ela me disse que
voltaria e me pegaria quando encontrasse um novo lugar para morarmos.
─ Fingi ir pela manhã e, então, voltei para casa depois que Benny saiu. Não
queria perdê-la se ela voltasse enquanto eu estivesse na escola.
─ Não. Ele grita muito com ela quando chega em casa do trabalho. Mas aí dorme
no sofá, que tem o cheiro dele.
─ Não sei…
Comecei a pensar se não era hora de ir à polícia. Mas o que eu diria? Oi. Sou um
falso padre, e vocês precisam procurar um cara chamado Benny e uma
menininha magricela que tem uma bicicleta azul?
O que quer que estivesse acontecendo na vida daquela garotinha, ela entrava
escondido para jogar moedas no chão para que o padre encontrasse e tivesse
sorte. Inacreditável.
Capítulo 19
Rachel
Concordei em jantar com Davis, apesar do mau humor com que estava lidando
nos últimos dias. Ou, talvez, não tivesse feito isso apesar de mim mesma, mas
mais provável apesar de outra pessoa. Porque me certifiquei de que essa outra
pessoa soubesse que eu tinha planos para aquela noite. Havia secado e alisado o
meu cabelo naturalmente enrolado, colocado um vestidinho sexy de verão e
sandálias de salto alto que tinham laços amarrados nas pernas. O conjunto fazia
minhas pernas parecerem compridas e a saia, ainda mais curta. Perfeito.
Todo o esforço adicional para me arrumar havia valido a pena. Caine não
conseguiu tirar os olhos de mim durante a aula inteira. Eu estava sentada na
primeira fileira daquela vez, no assento da ponta, para que pudesse cruzar
casualmente as pernas. Os olhos dele me aqueciam, e eu conseguia sentir o seu
toque na minha pele. Mas, ao fim da aula, percebi que estava ficando excitada e
me importando com um cara antes do meu encontro com outro. Era falta de
respeito com Davis, mesmo se ele nem tivesse ideia do que acontecia.
Então, quando a aula acabou, resolvi não ficar para conversar com Caine, como
fazia normalmente. Não era obrigatório que a auxiliar ficasse depois da aula, a
menos que tivesse plantão. Havia subido três degraus em direção à saída quando
a voz de Caine me fez parar.
Ele olhou para cima e observou os últimos alunos saírem da sala de aula.
─ Estou parada aqui esperando que me diga o que queria conversar comigo.
Não é óbvio?
A resposta dele não foi verbal. Em vez disso, os seus olhos começaram a me
medir dos pés à cabeça. Foi um olhar lento, intenso e quente, que me fez querer
me contorcer. Mas não o fiz. De alguma forma, consegui ficar ereta e até
coloquei os ombros para trás, para que meus seios ficassem mais proeminentes.
Quando seus olhos finalmente encontraram os meus, encarei-o, sem ceder nem
um centímetro. Eu estava orgulhosa demais de mim mesma.
─ Distrai os alunos.
Os olhos de Caine pairaram em meu peito. Eu podia não estar usando decote,
─ Está frio aqui. ─ Minha reação inicial foi querer me cobrir, mas… foda-se ele.
Empinei mais um pouco o peito. ─ Sabe de uma coisa? Suas calças estavam tão
justas algumas semanas atrás que eu conseguia ver a sua linha. Por que isso não
tem problema, mas ver a minha tem?
Não tenho ideia de onde estava vindo, mas eu queria continuar balançando um
Da forma como o peito dele estava subindo e descendo, pensei que fosse
explodir. Fez que me sentisse destemida e poderosa. Não quer ficar comigo?
Que bom. Mas é isso que está perdendo, professor West.
─ Não peça por algo que não quer, Rachel. Estou te avisando. ─ Ele se
aproximou mais, invadindo meu espaço.
Suas pupilas estavam dilatadas, e ele parecia mais bravo do que nunca. Mas
havia algo escondido logo atrás de seu olhar obscuro: desejo.
Preparei-me para isso… Esperava uma gama de xingamentos que eu jurava que
viriam antes de sua boca encostar na minha.
─ Professor West?
em uma hora ruim? ─ Ela apontou para a porta que estava atrás dela agora. ─
─ É sério?
Ele ergueu a maleta. O desejo que estava tão nítido há apenas dois minutos tinha
sido rapidamente desfeito. Ele falou baixinho.
Subi as escadas, com Caine a uma distância segura atrás de mim, e passamos
pela Professora Pink, só que naquele dia ela estava com um terno verde-água.
Aparentemente, Ginger gostava de cores. Meu palpite era que ela gostava de se
destacar em um mar de mulheres vestidas de preto em Nova York.
─ Adorei suas sandálias. Mas deve ser difícil andar pelo campus com esses
saltos.
─ Obrigada. Mas eu só tinha essa aula hoje. Estou usando para meu encontro.
─ Virei para Caine, ampliei meu sorriso e lhe dei uma chance de ver meus
dentes. ─ Vejo você na sexta, professor West. Não quero deixar Davis esperando.
Não lhe dei a satisfação de um segundo olhar antes de passar pela porta.
Capítulo 20
Rachel
exatamente onde sentamos da última vez que fomos ali. Se havia alguma dúvida
de que Davis estava tentando recuperar o clima que uma vez tivemos, a mesa
pela qual ele chegou cedo para guardar confirmou suas intenções. Era, na
verdade, meio fofo da parte dele lembrar de tantos detalhes de onde jantamos.
Esse era Davis… fofo e cuidadoso. O total oposto de Caine, que era amargo e
descuidado.
Eu nem sabia por que estava comparando os dois. Não parecia justo com Davis,
embora ele fosse ganhar em quase todas as categorias se eu colocasse no papel e
analisasse. O problema era que Caine me fazia sentir alguma coisa que não
poderia ser inserida em uma categoria – alguma coisa que eu nem conseguia
descrever. E, por um motivo que eu não entendia bem, aquele sentimento idiota
superava toda a maravilhosidade de Davis.
Mas aquela tarde havia realmente aberto os meus olhos. Eu tinha praticamente
me jogado pra cima de um cara que estava atraído fisicamente por mim, mas
detestava estar. Não havia nada de bom em provocar um homem que não tinha
Não percebi o quanto sentia falta de um abraço. Sim, sentia falta da gratificação
sexual de estar com um homem… mas ser abraçada e me sentir querida era
muito maravilhoso. Lá no fundo, eu sabia que estava carente depois da rejeição
de Caine, porém enterrei isso e me permiti aproveitar o abraço de Davis. Ele
demorou um tempo para me libertar e, quando o fez, deu um passo para trás,
segurando minhas mãos e olhando para mim.
─ Obrigada.
Aquela em que eu estava com a beca e você estava usando meu capelo torto com
um sorriso bobo?
─ O quê?
Dei risada.
─ Eu ia dizer que às vezes acordo e olho para a foto, mas não tem comparação
ver você ao vivo. ─ Seus olhos se voltaram para os meus lábios. ─ Sinto falta do
seu sorriso bobo. Só isso.
Havia tanto carinho em seu olhar. Parecia ser contagioso, porque senti minhas
entranhas amolecerem um pouco. Por que eu tinha pensado que aquela noite
seria uma má ideia? Naquele instante, não conseguia pensar em um único
motivo.
─ Coca diet?
Assim que a garçonete desapareceu, Davis ergueu uma sobrancelha. Ele sabia
da minha opinião sobre bebida. Também teve que lembrar daquela noite em que
─ Há muito tempo.
nos comportando como os antigos Davis e Rachel. Falei para ele sobre as minhas
aulas, e ele perguntou como minha irmã estava. Nunca gostei muito de falar
sobre mim mesma, então joguei a conversa de volta para ele.
─ Não, passo três quartos do meu tempo na estrada. Mas eles me deram uma
permissão para comprar um carro melhor, então comprei um novo divertido para
curtir enquanto dirijo.
─ Gostaria muito de fazer isso. Você pode até dar uma volta dirigindo, se quiser.
─ Obrigada. ─ Zombei. ─ Caine não me deixaria dirigir o carro dele. Pensa que
eu acabaria com seu precioso carro.
─ Caine?
─ É verdade. Você falou sobre ele na outra noite no O’Leary. Ainda está
trabalhando seis dias da semana lá?
─ Na verdade, nas últimas semanas, não. Entre dar aula e plantões, reuniões
Durante o jantar, conversamos como amigos de longa data. Davis era uma boa
companhia, e nossa intimidade me deixava bem confortável – Davis sempre me
dava uma sensação de conforto. Quando havia um intervalo na nossa conversa,
eu podia ver que ele estava pensativo. Parecia estar evitando dizer alguma coisa.
─ Fale ─ eu disse.
Ele riu.
─ Além de eu mal ter tempo para respirar e de que a maioria dos homens do
─ Você saiu com alguém desde… você sabe… que ficamos juntos?
─ Será que conta um cara que era um idiota em quem Charlie havia quase batido
com um taco de beisebol?
─ Não. Terminamos.
─ O que aconteceu?
Abri três vezes a boca para responder, mas fechei, percebendo que não sabia
realmente o que dizer. Davis flagrou minha expressão perplexa e pareceu achar
graça.
─ Não precisa falar nada. Na verdade, não fale. Me deixe terminar, certo?
─ Certo… ─ Consegui dizer uma palavra… uma única palavra, mas foi
suficiente.
─ Primeiro de tudo, não foi assim que havia planejado conversar sobre esse
assunto com você. Meu plano era jantar esta noite, encantá-la, lembrando de
como as coisas eram ótimas entre nós e, então, levar você para sair mais algumas
vezes antes de pôr tudo na mesa.
─ Ciúme. Do quê?
─ Me conte.
noite, e então falou sobre estar no carro dele há um tempo, imaginei você…
Minha mente começou a divagar. Pensei que talvez estivesse saindo com ele ou
algo assim.
Zombei, negando.
─ Definitivamente, não.
Mas o tom de ênfase em minha voz fez até com que eu não acreditasse.
─ De qualquer forma, meu plano era, depois de lembrá-la como era bom
ficarmos juntos, te dizer que nunca deixei de pensar em você. ─ Ele parou, olhou
para mim com uma expressão tímida e vulnerável. ─ Tentei seguir em frente,
mas toda pessoa com quem começo a sair, independentemente do quanto seja
ótima, tem um defeito que não consigo superar. Elas não são você.
Uau. Só. Uau. Fui pega tão de surpresa por sua seriedade. Também fiquei um
pouco confusa.
─ Mas não entendo. Quando paramos de nos ver, você disse que não estava
pronto para um relacionamento. Entendi totalmente por causa do que você tinha
acabado de passar. Precisava de tempo e espaço. Ainda assim, começou a sair
com uma pessoa não muito tempo depois disso. Então você não precisava
mesmo de tempo? Só precisava de um tempo sem mim?
Davis passou os dedos pelo cabelo curto. Era um pouco mais longo que o corte
militar, mas ainda bem curtinho. De novo, pensei em Caine. Ele sempre passava
os dedos por seu cabelo grosso e indisciplinado quando eu me esforçava ao
máximo para deixá-lo frustrado.
eu não sabia ir devagar. Conseguia ver um futuro com você, e isso me assustava
muito, porque estava acabando de sair de um relacionamento no qual tinha visto
futuro em certo momento. Enquanto namorava Stacey por aqueles poucos meses,
não conseguia ver as coisas a longo termo, não via um futuro, então me sentia
confortável com ela.
─ Então ficou com uma mulher por alguns meses porque não conseguia ver um
futuro com ela. Mas fugiu de uma depois de apenas algumas semanas porque
sabe que não consegue evitar de comer o bolo inteiro, você não compra um no
mercado.
Quando Davis e eu paramos de sair, fiquei chateada, embora o meu lado racional
entendesse que ele estava certo. Mas sempre acreditei que ele tinha sido sincero
comigo, que precisava de liberdade. Pensei que, se fosse para acontecer, algum
dia voltaríamos um para o outro. E ali estávamos.
Eu não tivera nenhum relacionamento para contar, então seria fácil continuar de
onde paramos.
Só que…
Meus pensamentos estavam tão bagunçados que não percebi que tinha ficado
─ Finalizar?
Ele riu.
─ Não se preocupe. Não tem muito mais. ─ Davis pegou minha mão. ─
Cometi grandes erros na vida, mas o maior que já cometi foi te deixar. Sei que
isso parece vir do nada, mas juro que não. Não passei um único dia sem que
você estivesse em meus pensamentos. Eu apenas enfim admiti a verdade.
Tudo que ele disse era exatamente o que eu queria ouvir… há quase nove meses.
Só que agora não tinha certeza se Davis era a pessoa certa para mim. Se era, por
que não fiquei mais devastada quando tudo acabou? Por que consegui esquecer?
Minha mente continuava pensando em Lydia e Umberto. Ela não o esquecia nem
agora, quando ele não se lembra de quem ela é e pensa que está apaixonado por
outra mulher.
Mas talvez o fato de não consumir meus dias com pensamentos sobre Davis
fosse meu mecanismo de defesa. Talvez eu tivesse enterrado os meus
sentimentos para que não me magoassem. Quem sabe. Só me sentia
sobrecarregada e confusa.
─ Você já disse isso ─ ele zombou, com um sorriso de moleque. ─ Que tal dizer
que vai pelo menos pensar? Não diga não. Ainda não, pelo menos. Pense
um pouco.
─ Ok.
─ Vou. Mas não consigo pensar direito neste momento. Depois de beber e de
tudo que você acabou de dizer, minha mente não está em seu juízo perfeito para
Quando o jantar acabou, fiquei feliz por ter ido de carro em vez de dei-xá-lo me
pegar – como ele tinha sugerido. Isso nos poupou do momento bizarro em que
eu me sentia grosseira por não o convidar para subir, mas ficava desconfiada
pelo que poderia parecer se eu o convidasse para entrar. No entanto, embora eu
tivesse prevenido aquele momento bizarro, o momento em que ele me levou até
o carro também não foi fácil.
─ Posso te ligar daqui a uns dias? Talvez possamos combinar de tomar um café
ou algo assim?
Sorri.
me mexer antes que ele invadisse meu espaço, e encostou os lábios suavemente
nos meus.
Com a nebulosidade das últimas duas horas, entrei no carro e Davis fechou a
porta. Esperou que eu ligasse o carro e foi para o dele. Precisava de alguns
minutos antes de dirigir, então peguei meu celular na bolsa e verifiquei as
chamadas perdidas e as mensagens de texto ainda com o carro ligado. A primeira
coisa que apareceu foi uma mensagem de Caine. Deve ter chegado durante o
jantar.
Que irritante! O cara realmente pensava que o mundo girava em torno dele. A
CAINE: ISSO É.
Centenas de respostas cruéis passaram pela minha cabeça. Mas então vi Davis
esperando por mim antes de deixar o estacionamento do restaurante. Deus, eu
era tão idiota. Joguei meu celular na bolsa, forcei um sorriso e acenei de novo
para ele antes de entrar na rua.
faria o percurso em cinco minutos, mas, de repente, tive que enfiar o pé no freio
para evitar bater na traseira de um Honda que parou no sinal vermelho. Eu
estava tão brava, tão desconcentrada, que não tinha visto o grande e brilhante
sinal vermelho ou as duas toneladas de ferro à minha frente obedecendo a lei.
quase acidente. Meu coração estava palpitando como louco no peito. Tive que
parar por temer que meu próximo quase incidente não parasse no quase.
Má ideia.
PRECISAMOS CONVERSAR.
Fiquei furiosa. Ele não apenas pensava que tudo era sobre ele, como pensava
Sabe de uma coisa? Ele estava certo. Precisávamos mesmo conversar. Mas eu
que iria falar o tempo todo, e seria de acordo com os meus termos.
Meus pneus cantaram quando saí da guia e dei a volta para ir em direção a
Manhattan. Aquela conversa que ele queria aconteceria naquele instante.
Capítulo 21
Rachel
Se você procurasse instável no dicionário, tenho quase certeza de que minha foto
estaria lá.
caloroso que Caine tinha dado quando o incitei a me tocar, brava e vazia quando
ele me dispensou, como se não estivesse lá comigo, e então confusa, mas
lisonjeada, quando Davis me disse que queria reatar. Depois, no instante em que
o jantar acabou e Caine começou a discutir comigo por mensagens de novo,
voltei a ficar brava.
Agora eram quase onze da noite, e eu estava parada a uma distância de dois
Por que eu estava ali? Para brigar com Caine, falar para ele um pouco do que eu
pensava sobre o seu comportamento quente-e-frio desdenhoso. Claro que eu
queria brigar com ele. Mas sabia que não era realmente isso que eu queria.
Sentada no carro ainda quente, peguei meu celular e reli as suas mensagens.
Ele não estava errado. Minhas escolhas ─ me vestir horas antes do jantar para ir
à aula, aparecer com uma roupa sexy, até decidir ir ao jantar com Davis sozinha
─, todas elas tinham a ver com Caine… e a maioria delas foram idiotas.
Soltei um suspiro pesado e exagerado. Aquela visita era uma má ideia. Bati a
testa contra o volante algumas vezes, tentando fazer com que meu cérebro
voltasse a ter um pouco de senso. Toda essa instabilidade emocional estava
cobrando pedágio de uma vez, e eu estava cansada. Realmente cansada. Olhando
uma última vez para o prédio de Caine, liguei o carro e voltei para casa, no
Brooklyn.
Encontrar uma vaga para estacionar no meu bairro depois das oito era quase
Quando cheguei ao meu quarteirão, estava xingando meus saltos altos, e também
o departamento de manutenção da cidade pelas calçadas horríveis e quebradas
pelas quais tinha que andar. Quase caí três vezes. Finalmente chegando ao meu
prédio, subi tremendo cada degrau alto da escada. Resmunguei para mim mesma
ao abrir a porta para o vestíbulo, percebendo que estava novamente destrancada.
Qualquer um poderia entrar.
Apertei o peito.
─ Que porra está fazendo? Tentando me matar de medo?
─ Desculpe. Não quis te assustar. Mas a porta estava aberta, então entrei.
─ É. Eu prefiro uma foda rápida, vir para casa e dormir na minha própria cama.
─ Vamos subir e conversar, Rachel. Não quero ter essa conversa no saguão do
seu prédio.
─ Que conversa? Já entendi, Caine. Você não está interessado. Bom, seu pau
Sentia os olhos de Caine em mim, mas me recusava a olhar para qualquer lugar
que não fosse para a frente. Quando o elevador guinchou ao parar, foi como um
sinal para começar o próximo round de boxe. Round nove, começando.
Meu apartamento era pequeno, mas, de repente, parecia uma caixa de sapato.
Deixei minha bolsa na cozinha e, quando estava prestes a libertar meus pés
latejantes dos torturantes saltos altos, parei para pensar melhor. Precisava ficar
mais alta, o mais próximo que conseguia dos olhos de Caine.
forma como deixamos as coisas. Mas já que estou muito atrasado, talvez eu
devesse ir.
Caine olhou intensamente para mim. Seu maxilar estava tão tenso que pensei
que pudesse quebrar um dente. Vê-lo irritado me fez sentir mais forte, me
recarregou. Eu me sentia como uma viciada, buscando qualquer sinal de que ele
fosse estourar de raiva para saciar o meu vício. Eu continuava querendo mais.
com Davis que não têm nada a ver com o fato de você ser um babaca. Vamos
ver… ─ Contei nos dedos. ─ Um, ele é sincero consigo mesmo. Não inventa
desculpas para evitar a verdade. Dois, ele admite quando está errado, como hoje,
quando me disse o quanto sente minha falta e que me quer de volta.
Prendi a respiração quando ele pegou meu cotovelo por trás e me girou.
─ Você acha que ser sincero e ser bom de cama andam lado a lado? Então aqui
está uma coisa que vai comprovar por que me chama de babaca. Você está
aqui em pé me dizendo que transou com outro cara, e tudo no que consigo
pensar é no quanto você me odiaria amanhã se eu lhe mostrasse como é transar
de verdade. Não de um jeito gentil. Mas de um jeito que você seja colocada
contra a parede, enquanto eu te como e chupo sua pele intensamente, a ponto de
deixar marcas, para, na próxima vez que tirar as roupas para se vingar de mim, o
Esse era o momento da verdade. Mantendo os meus olhos nos dele, engoli meu
orgulho e sussurrei:
outro por muito tempo, absorvendo tudo, e então seu aperto me libertou.
Primeiro, pensei que estivesse me rejeitando de novo. Então, vi sua mão no seu
cinto.
Olhei para ele em dúvida, tão sem palavras até mesmo para emitir um som.
─ A parede. ─ Ele abriu a fivela do cinto e fez um som de chicote ao tirá-lo por
completo em apenas um movimento. ─ Segure firme.
Parecia que eu estava tendo uma experiência fora do corpo quando me virei e
─ Esse vestidinho… ─ O tecido mal cobria minha bunda naquela posição, mas
ele ergueu a saia até estar sobre minha cintura, expondo toda minha bunda.
Não pensei que ele realmente esperasse uma resposta, nem sabia se era capaz
Assenti.
Sua mão tocou minha bunda com um barulho alto. Ele me deu um tapa. Forte.
dedos passaram por debaixo do meu fio dental e deslizaram pelas minhas pernas
até ele ajoelhar, levando minha calcinha aos pés.
─ Abra mais.
Ele mergulhou e subiu com sua boca diretamente entre minhas pernas. Gemi e
torci para que meus joelhos não cedessem quando ele enterrou o rosto inteiro na
minha boceta. Não foi gentil. Foi desesperado e bruto. Ele chupou forte meu
clitóris e lambeu minha excitação como se estivesse faminto e eu fosse sua
última refeição. Senti meu orgasmo se formar mais rápido do que nunca, e
pensei que talvez não conseguisse manter o equilíbrio.
─ Doce pra caralho… ─ Caine gemeu. ─ Molhada pra caralho pra mim. ─
Gemi.
─ Caine.
─ Tão apertada.
Ele respondeu se levantando e inclinando sobre mim de novo. A mão que não
estava dentro de mim puxou meu rosto para o lado, e sua boca beijou a minha.
Seus dedos não pararam, sua língua se juntou em uníssono. Foi tudo tão rápido –
até demais. Sua excitação empurrava o lugar quente que sua mão tinha deixado
na minha bunda, seus dedos se mexiam dentro de mim, sua boca, sua língua, seu
cheiro, tudo. Meu orgasmo me atingiu de forma violenta, uma série de
choramingos engolidos por Caine, enquanto ele continuava até eu mal conseguir
respirar.
Nós dois ofegávamos de modo selvagem, ele ainda inclinado em mim. A cada
Ele riu.
Caine deve ter lido a minha mente. Ele beijou os meus lábios e me pegou no
colo.
Capítulo 22
Rachel
─ Sabe, você podia me ajudar um pouco e tirar a roupa enquanto eu tiro a minha.
─ É mesmo?
Caine ergueu um lado do lábio, e sua mão foi para o zíper da calça. Ele a
abaixou e a tirou. Meus olhos pairaram em sua cueca boxer, ou melhor, na
protuberância grande à mostra. Eu sabia que ele estava me observando, mas eu
não conseguia tirar os olhos dali.
Como eu estava gostando muito do show, Caine deve ter decidido que me daria
um. Sua mão envolveu sua excitação grossa, e ele a acariciou para cima e para
baixo por cima de sua cueca.
─ Se vou dar aula sem camisa, posso também trabalhar sem as calças. ─ Ele
Lambi os lábios.
Usando seus dentes e uma mão, Caine abriu uma camisinha que eu não tinha
percebido que ele segurava e a colocou, antes de apoiar um joelho na cama para
subir.
Caine pegou a bainha do meu vestido e o puxou por cima de minha cabeça.
Como já estava sem calcinha há muito tempo, agora eu usava apenas o sutiã e os
sapatos. Colocando o braço atrás de mim, ele abriu o sutiã com uma mão. No dia
seguinte, provavelmente, eu ficaria obcecada pelo fato de ele ter mais
experiência em remover um sutiã do que eu, mas, naquele momento, apenas
estava feliz por ele não perder tempo sendo desastrado.
─ Você é linda. ─ Ele segurou um dos meus seios, acariciando o mamilo com
Ele abaixou a boca para o meu seio e o açoitou com a língua antes de chupar
fundo meu mamilo com sua boca quente. Olhou para mim enquanto lambia e
mordiscava, nossos olhos travados, enquanto ele registrava exatamente o que
causava diferentes reações. A atenção intensa de Caine estava finalmente me
fazendo contorcer por motivos muito mais gostosos.
O ar frio atingiu os meus mamilos endurecidos quando ele colocou sua boca
no meu pescoço. Ele chupou a pele sensível abaixo da minha orelha enquanto
minhas mãos exploravam seu corpo. Quando ele mordeu o lobo da minha orelha,
ao mesmo tempo que beliscou meu mamilo extremamente duro, cravei as unhas
Caine gemeu.
─ Vamos chegar lá. Assim que eu acabar com você, vamos explorar a
intensidade que você gosta. Aposto que gosta que puxe seu cabelo enquanto está
de quatro, com a bunda vermelha e o meu pau preenchendo essa bocetinha doce.
─ A mão de Caine baixou, e ele correu dois dedos por meu centro umedecido
antes de enfiá-los em mim. ─ Molhada. Você gosta dessa ideia, não gosta?
Como eu não respondi, não consegui responder, Caine curvou os dedos lá dentro
e acariciou um lugar que eu sabia que me libertaria. Eu já não era mais capaz de
responder verbalmente, então estiquei o braço entre nós e envolvi
Sua língua se agitava sobre meus lábios, instruindo-os a abrir, então ele enfiou a
língua para encontrar a minha. Fiquei completamente perdida no beijo, sentindo-
o em todo lugar pelo meu corpo. Havia um desejo que eu nunca tinha sentido
antes. Eu não tinha limitação. Queria dar a ele tudo que ele estava prestes a
tomar de mim e mais.
Caine se ergueu um pouco, o suficiente para conseguir olhar para mim, mas
nossos corpos ainda estavam se tocando. Nossos olhos travaram-se enquanto ele
roçava seu comprimento para cima e para baixo na minha entrada, cobrindo-o
com a minha umidade. Então, começou a empurrar para dentro. Apenas alguns
─ Abra os olhos, Rachel. ─ Caine tirou uma mecha que vagueava em meu rosto
e sussurrou: ─ Não achei que conseguiria ficar ainda mais bonita. Mas seu rosto
comigo dentro de você é… não tenho palavras…
Esticando o braço para baixo, ele colocou uma mão atrás da minha perna,
sugerindo que eu a flexionasse e permitisse que ele afundasse ainda mais dentro
de mim.
─ Eu sei…
Ele começou devagar, mas a intensidade começou a crescer. Cada estocada era
fora de mim por muito tempo depois – movimentos preguiçosos e sem pressa
enquanto recuperávamos a respiração e trocávamos sorrisos fáceis. Em certo
momento, contudo, ele precisou parar para tirar a camisinha. Quando se levantou
da cama e caminhou até o banheiro, um calafrio passou pela minha pele úmida.
Torci para que não fosse um sinal de que, assim que o calor passasse, as coisas
com Caine fossem esfriar de novo.
Capítulo 23
Rachel
Caine me surpreendeu ao voltar para a cama com uma toalha de rosto morna e
gentilmente me limpar. Nenhum homem nunca tinha sido tão gentil comigo
depois da transa. O modo como ele passava a toalha em minha pele sensível era
tão íntima e cuidadosa, que fez meus ombros – que tinham ficado tensos quando
ele se levantou – relaxarem de novo.
─ Sim. Obrigada.
Ele desapareceu de novo no banheiro, e ouvi a água correr por alguns minutos.
Então, ele saiu novamente. Ficou quieto ao pegar suas roupas, colocar a cueca e
a calça. Talvez eu tivesse relaxado um pouco cedo demais.
─ O que está fazendo? ─ Tentei não parecer muito mandona, mas não consegui
muito bem.
Ele estava olhando para baixo, fechando o zíper, e parou para olhar para mim.
─ Me vestindo.
Caine franziu as sobrancelhas. Percebi que ele nem tinha pensado no que estava
fazendo. Estava no piloto automático.
─ É isso que você faz toda vez depois de… ficar com uma mulher, não é?
─ Está tarde.
Desviei o olhar, sem querer que ele visse a decepção que eu sabia que era
impossível disfarçar na minha cara. O ruído das roupas me irritava mais a cada
segundo. Cinco minutos antes ele havia sido tão doce e gentil, e agora tinha
voltado a ser o Professor Babaca.
─ Acredito que tenha me dito isso antes, então, sim, tenho consciência de que
sou mesmo um babaca. Mas estou surpreso que você não tenha consciência disso
tanto quanto eu, mas, mesmo assim, continua me lembrando de meu status de
babaca.
Aquele homem conseguia me deixar muito brava. Era como um interruptor que
ligava e desligava dentro de mim e eu me transformava em um tipo de doida que
não reconhecia.
─ Não acho que você seja uma prostituta, Rachel. Na verdade, acho que é
exatamente o oposto… é uma garota legal. Esse é o problema.
te magoar.
Ele zombou.
Lá no fundo, uma parte de mim sabia que ele tinha razão. Mas eu não podia
─ Você é tão cheio de si, que já decidiu que vai partir meu coração. Já parou para
pensar que talvez seja eu que parta o seu coração algum dia? Talvez eu só esteja
usando você pelo seu corpo.
Caine ergueu as sobrancelhas. Eu estava mentindo um monte, claro, mas ele não
precisava saber disso. Tudo o que ele precisava fazer era ficar. Eu não estava
pronta para ele me deixar. Não naquela noite… ainda não.
Quando os seus olhos desceram para os meus seios, me lembrei de que a única
coisa que Caine não conseguia negar era sua atração por mim. Então, eu teria
que tirar proveito disso até poder descobrir o resto. Erguendo as mãos, segurei os
seios e dei um bom aperto. Uma luxúria descontrolada brilhou nos olhos de
Caine, e o controle mudou naquele quarto. Se o sexo era o caminho naquele
momento, que fosse.
Descendo uma mão por meu corpo da forma mais sedutora que consegui, fechei
os olhos e toquei entre minhas pernas. Quando os abri e vi a forma como Caine
estava me olhando, eu sabia que tinha ganhado essa, mesmo que fosse uma
pequena batalha no que eu achava que seria uma longa guerra.
─ Nem um pouco.
Enquanto ele estava tirando rapidamente as roupas, eu ajoelhei na cama. Ele
quinze minutos. Na realidade, parecia ainda maior agora. Se eu não estivesse tão
excitada, talvez tivesse ficado com um pouco de medo daquela coisa.
─ Acredito que tenha dito algo sobre meu cabelo e sobre me querer de quatro?
Eram duas da manhã quando terminamos os rounds dois e três. Ou eram três e
quatro, já que tecnicamente o primeiro tinha começado na sala mais cedo?
Enfim, aprendi uma coisa sobre Caine naquela noite: sua luta para me evitar
perdia força quando ele estava fisicamente exausto. Levando em consideração
que o método para o deixar fisicamente exausto era bem espetacular, eu diria que
era uma descoberta prazerosa.
Estava com a minha cabeça apoiada no peito dele enquanto ele acariciava meu
─ Caí de uma árvore quando era criança e levei alguns galhos comigo na queda.
─ Eu contava a mesma história por tanto tempo quando alguém via minha
cicatriz funda com três centímetros de largura que eu quase acreditava que era
verdade.
─ Ai.
─ Não foi tão ruim. Cicatrizou rápido. E você? Tem alguma cicatriz?
Entendia esse sentimento mais do que ele imaginava. Dei um beijo suave em
seu peito, logo acima de seu coração. Depois disso, nós dois ficamos quietos por
um tempo, e eu imaginei se ele estava pensando em suas cicatrizes.
que você sugou toda minha força. Literalmente naquela última rodada.
Alguns minutos se passaram, e pensei que ele pudesse ter dormido, então
sussurrei:
─ Está dormindo?
─ Não.
Eu não estava olhando para ele, mas sabia que estava sorrindo quando falou.
─ Do quê?
─ Acho que você torna as coisas mais difíceis do que precisam ser.
Ele suspirou.
corpo quente. Você é minha auxiliar e eu sou seu orientador. Nunca tive um
relacionamento que não terminou mal. Não é um simples sim ou não.
Doía ser lembrada de que eu não era o primeiro mergulho que Caine dava na
piscina acadêmica. Fiquei quieta, e ele deve ter sentido que eu estava carente.
─ Nunca passei a noite com ninguém da faculdade. ─ Ele fez uma pausa. ─ E
antes de você tirar conclusões precipitadas, eu nunca estou cansado demais para
me levantar e ir embora. Mesmo agora.
─ E este corpo quente é muito bom. Agora durma um pouco. Pode me interrogar
mais enquanto faz o café da manhã para mim.
Alguns minutos mais tarde, a respiração de Caine se acalmou quando ele caiu
no sono. Beijei seu peito e fechei os olhos para segui-lo para a terra dos sonhos.
Peguei a primeira peça que encontrei na gaveta cheia de roupas de ficar em casa,
coloquei uma camiseta vintage dos Rolling Stones e fui para a cozinha
precisando muito de um café. Parei de repente quando vi Caine próximo ao meu
fogão. Suas costas estavam viradas para mim, e ele não parecia ter me ouvido,
então fiquei parada na porta, observando-o, meio atordoada com o que estava
vendo e meio surpresa por ver que ele ainda estava ali.
Caine estava… dançando? Bom, não tecnicamente dançando, acho. Mas com
certeza estava se balançando com a batida de alguma coisa, enquanto virava as
panquecas em uma panela e mexia a linguiça na outra. Hum. E a comida
cheirava muito bem também.
─ Quer um pouco de café enquanto fica aí parada? ─ ele perguntou sem se virar.
─ Eu sei. ─ Ele foi até o armário, pegou uma caneca e colocou café para mim.
Caine terminou de fazer meu café e, por algum motivo, fiquei na porta da
cozinha. Ele me trouxe a caneca e beijou a ponta do meu nariz antes de entregá-
la a mim.
─ Eu não sabia que ainda estava aqui. Por que não me acordou?
manhã.
─ Sente.
Caine veio em minha direção de novo e colocou uma mão em cada lado da
minha cabeça na parede.
─ É diferente.
─ Não é, não. – Ele baixou a cabeça, contendo uma risada. ─ Que tal tomarmos
café da manhã sem brigar?
─ Certo. Vou sentar. Mas só porque o cheiro está muito bom e não porque você
mandou.
Assim que coloquei o garfo na boca, percebi que estava morrendo de fome.
─ Não mexi nas suas gavetas. Olhei as fotos penduradas na parede. Não acho
brilhando. Davis.
Os olhos de Caine se voltaram para os meus. Ignorando-o, terminei de lavar a
louça.
Enquanto eu limpava a mesa, Caine voltou para a parede da sala de estar com
outra caneca de café. Juntei-me a ele quando terminei. Ele estava parado em
frente a uma foto em que estávamos eu e os meus três colegas de quarto e que
tinha sido tirada há um ano, uma semana antes de todos nos mudarmos e
seguirmos caminhos diferentes. Nosso sofá de dois lugares tinha um
comprimento de dois metros, com três grandes almofadas, mas nós quatro
estávamos sentados apertados em um lado. Havia muitos sorrisos naquela foto.
─ Percebi.
Você, seu idiota. Eu quero você. Eu sabia que ele estava um pouco inquieto sobre
o que acontecera na noite anterior, então respondi com cautela, fingindo não dar
muita importância para o assunto.
─ Não me importaria de fazer um pouco mais do que fizemos ontem à noite.
Caine enfiou a mão debaixo da minha camiseta e viu que eu não estava usando
nada por baixo. Segurou minha bunda e apertou.
─ Não.
Ele pegou o café que eu estava segurando e foi até a cozinha, deixando nossas
duas canecas na mesa. Quando voltou para mim, se inclinou, me levantou e me
Trocamos sorrisos e olhares, mas, na maior parte do tempo, nenhum de nós disse
nada. Ele só me olhava, enquanto eu terminava de hidratar o rosto, passar um
creme diferente nas pernas e braços e, então, escovar o meu cabelo molhado.
─ Já escutou alguma música pela primeira vez, sem saber a letra, mas que lhe
pareceu familiar?
─ Claro. Como “All Summer Long”, de Kid Rock, na qual ele usa partes de
─ Não. Uma música original que você escuta pela primeira vez, mas parece que
a conhece mesmo assim?
─ Acho que sim. Quer dizer, todas as músicas têm uma coisa em comum. Um
verso, um acorde, um solo, um tom comum ou timbre. Nosso cérebro parece
internalizar todas essas pequenas coisas, então quando escutamos algo temos
essa sensação de familiaridade, mesmo assim não conseguimos descobrir de
onde vem. Por quê?
─ Você é essa música. Não sei a letra, mas o tom é muito familiar.
Entendi exatamente o que ele quis dizer. Também havia sentido uma conexão
desde a primeira vez em que nos vimos. Não queria assustá-lo, mas o que quer
que acontecesse entre a gente sempre foi maior que eu – maior que nós.
Acho que é aquela com quem aquele jogador de futebol americano é casado.
Caine sorriu.
─ Essa mesma. Meu corpo? É uma cópia do da esposa dele. E meu coração,
─ É mesmo?
─ Mmm-humm.
─ Deve ser isso. Preciso ir, Madre Teresa, e você precisa trabalhar. Te vejo
amanhã na aula. Serei aquele na frente da sala, ignorando você e tentando não
olhar para o seu corpo.
─ Ok. ─ Fiquei na ponta dos pés e o beijei. ─ E eu serei aquela que você sabe
que está sem calcinha.
Capítulo 24
Caine – Quinze anos atrás
Ela não apareceu na semana anterior e eu deveria ter ficado feliz por isso.
Olhei para cima, para a cruz da igreja, e resmunguei para mim mesmo antes
Como de costume, a igreja estava vazia, e eu tinha uma música para aprender,
então fui para o meu lugar de sempre para me distrair, em vez de ficar esperando
do lado de fora. Novamente, Liam tinha escrito uma de suas músicas enquanto
estava bêbado, depois de uma farra. Porém, depois do último fiasco, quando ele
apenas conseguira se lembrar de metade de uma música legal, todos juntamos
dinheiro e compramos um gravador digital portátil. A coisa era menor que um
celular e conseguia gravar vinte horas de música apertando um só botão. Deu
muito certo. Quando ele apareceu de ressaca no ensaio naquela manhã, depois da
típica sexta à noite de bebedeira e composição de música, não conseguia se
lembrar de merda nenhuma. Mas tudo o que precisamos fazer foi um upload.
Ficamos felizes por Liam ter se lembrado de ligar a maldita coisa. Só que,
infelizmente para nós – e para ele –, não tinha se lembrado de desligar durante a
noite toda. Nós definitivamente teríamos que encontrar um jeito de colocar em
uma faixa, no futuro, os grunhidos que ele emitia enquanto batia uma durante a
noite.
Fiquei sentado no confessionário escuro por quase meia hora, com os fones no
ouvido. Embora ela não tivesse aparecido, pelo menos eu tinha aprendido a letra
que Liam havia escrito. Quando terminei, me afundei no assento de veludo
vermelho almofadado, fechei os olhos e coloquei Bob Dylan. O som de
“Blowin’
Não sabia há quanto tempo ela estava ali quando abri os olhos e a vi. Tirei um
fone do ouvido, não entrei no modo padre e deixei minha personalidade de
dezesseis anos tomar conta.
Não poderia dizer a ela que estava ouvindo Dylan. Isso não fazia muito o estilo
padre.
─ Uns louvores.
Sorri. A menina conhecia Dylan. Não era à toa que eu gostava tanto dela.
Baixei a voz.
─ Ok.
─ Falando em segredos, o que tem para mim hoje? Tem sido uma boa
cordeirinha?
─ Para te pegar?
─ O que aconteceu?
─ Ela estava ficando na cabana de caça do pai de uma amiga dela ao norte.
Bebeu todo o uísque dele em uma noite, saiu andando para encontrar um
mercado e se perdeu. A polícia a trouxe para casa depois que ela vomitou na
parte de trás do carro deles.
─ Conversaram com Benny. Escutei da porta do meu quarto. Ele mentiu para
a polícia, disse que ela bebe o tempo todo e foge com garotos, e que ela faz isso
há um tempo.
Merda.
─ Da garagem?
─ É.
─ Não podia deixar minha irmã sozinha. Benny estava muito bravo com ela
depois que a polícia a levou para casa. Ele ficou bebendo e gritando muito por
dias.
─ Ele a machucou?
Ela ficou quieta por muito tempo. Eu tinha resolvido que, se ela fosse embora,
ou eu a seguiria para casa ou nós dois finalmente nos veríamos cara a cara. O
─ Ela não me conta. Mas eu o vi saindo do quarto dela de manhã, e ela me disse
que eu tinha que trancar a porta à noite, porque ele tinha jurado que não me
incomodaria se ela fosse legal com ele a partir de agora.
─ Espere! ─ gritei.
─ Confio.
─ Ok.
─ Quando ele sair para o trabalho, venham para cá. Quero falar com você e com
sua irmã. Juntas.
Ela ficou quieta por um tempo. Quando finalmente falou, sua voz não foi
convincente.
─ Ok.
─ Vou tentar.
fechar. Provavelmente ela demoraria uns minutos para destrancar sua bicicleta, e
eu sabia a direção de onde vinha.
A última coisa que eu queria era assustá-la, quando a seguisse até sua casa.
Mas, se ela não aparecesse no dia seguinte, eu precisava saber aonde iria.
Capítulo 25
Rachel
Fazer sexo arrebatador tinha suas consequências. Não eram nem nove horas da
noite, nem metade do meu turno, e eu já estava arrastando a minha bunda pelo
bar. Até aquele pensamento, entretanto, me fez sorrir. Estou arrastando minha
bunda. A bunda em que Caine colocou as mãos na noite anterior… e nesta
manhã.
─ Consigo ver na sua cara. Você normalmente é toda… ─ Ela apontou para o
próprio rosto enquanto o enrugava para fazer parecer que estava com dor ─ …
tensa. Agora você não está. ─ Ela bateu as costas da mão contra o cara que bebia
sua cerveja e perguntou sua opinião. ─ Estou certa? Ela com certeza transou.
─ Por favor, ignore-a. ─ Fui até a outra ponta do bar onde não havia ninguém
sentado. Ava me seguiu e se sentou em um banquinho.
Suspirei e parei.
─ O que foi?
─ Eu sabia que tinha acontecido alguma coisa. Você está com aquele olhar de
Eu esperava que fosse a segunda opção que me desse o frio na barriga toda vez
que pensava em Caine West, porque tinha certeza de que a primeira não era uma
boa ideia. Ava interpretou meu olhar brilhante e penetrante como sendo a
segunda opção.
─ O sexo cai bem em você.
prateada, sem prestar atenção, quando a voz de Ava me surpreendeu. Ela falou
daquela forma cantada que a maioria das garotas aprende desde que começa a
usar sutiã.
Olhei para cima e vi Davis no fundo do bar, tirando a jaqueta. A culpa bateu na
minha cara. Droga. Por que eu não tinha respondido às mensagens dele naquela
tarde? Ele acenou, e eu fiz sinal de que iria até ele em alguns minutos.
Não havia nada que me impedisse de ir até lá, então precisei inventar motivos.
Servi cerveja para um cliente e conversei com ele o máximo que consegui,
depois me ofereci para fechar a conta para um cara que nem estava perto de ir
embora. Aqueles eram os clientes que eu tinha, então já estava quase sem
desculpa quando vi Ava vindo em direção ao bar. Felizmente, ela tinha um
pedido de bebida.
─ Vá fazer um intervalo. Vou cobrir você. ─ Ela deu uma piscadinha. ─ E não
tenho nenhum motivo para entrar no estoque, caso você queira ter um pouco de
privacidade.
A culpa abasteceu o meu pânico. Quando olhei para o bar, Davis sorriu e eu
fiquei tão desesperada que as minhas axilas ficaram molhadas e me senti um
pouco enjoada.
─ Claro.
─ Apenas vá.
─ Certo.
Humm.
─ É lógico. Só preciso ver uma coisa lá atrás. O que posso pegar para você
beber? Quer o de sempre?
─ Volto já.
─ O que está havendo? Você estava nas nuvens até dez minutos atrás, e agora
parece infeliz desde que Davis apareceu? Presumo que não estava esperando por
ele.
Andei de um lado para o outro.
─ Não, foi.
─ Ok…
Esfreguei a testa.
─ Davis e eu saímos para jantar. Foi bom, mas eu estava confusa, então
terminamos cedo e fui para casa.
─ Você estava.
Assenti.
─ Jantei. E depois fui para casa. Mais cedo, naquele dia, Caine e eu havíamos
discutido na faculdade… um pouco. Quando cheguei em casa, depois do meu
encontro com Davis, Caine estava me esperando. Ele queria conversar.
Discutimos de novo e…
Ava sorriu.
─ Ele não sabe de nada que aconteceu além de você ter ido para casa e dormido
depois do jantar, certo?
Obviamente, ela nunca tinha feito sexo com Caine. Fingir que não aconteceu
─ Então, não minta. Se ele tentar falar algo sobre vocês dois, só diga que está no
trabalho e que prefere não conversar aqui. Adie a conversa até você estar pronta.
E, mesmo quando estiver, se só quiser ser amiga de Davis, não precisa contar
mais nada para ele.
Respirei fundo.
─ Tem razão. Estou agindo como uma idiota. Me sinto culpada, e é por isso
─ Não tem por que se sentir culpada. Você é uma mulher adulta e solteira.
tudo bem. Você não fez nada de errado. Espere um ou dois minutos e, então,
volte lá e aja como uma mulher que não fez nada errado.
─ Ok.
─ Tudo bem?
Ela estava totalmente certa. Eu não tinha por que me sentir culpada, e Davis não
fazia ideia do que tinha acontecido na noite anterior. Eu consigo fazer isso. Não
pensar em Caine por um tempinho não era tão difícil.
Até que…
Olhei para Davis e vi um homem sentado ao seu lado. Aquele homem era Caine.
Ava me viu paralisada na porta e foi até mim. Seus olhos estavam arregalados.
─ Não. Acho que ambos resolveram me fazer uma surpresa. Porra. O que eu
vou fazer?
─ Ok. Vamos pensar. Você ainda continua não tendo feito nada errado.
─ Com certeza.
Balancei a cabeça.
─ E Caine?
─ Ele sabe quem Davis é pela foto na parede do meu apartamento. Acho que
─ Graças a Deus.
─ Você vai ter que ir até lá e agir como se não houvesse nada errado.
─ O único que você tem. Vá para o fundo do bar e diga oi, e então vou ficar
Meus olhos se agitaram para onde os dois estavam sentados no mesmo instante
em que Caine olhou para mim. Sua expressão era indecifrável. Eu estava
enjoada. Queria ir para trás do bar, pegar uma garrafa de qualquer coisa, abri-la
e sair pela porta dos fundos.
─ Podemos beber quando isso acabar. Só tome coragem e vá até lá. Pode não
─ A mesa três quer algum drinque fru-fru. Vai te manter ocupada lá atrás do
Ava sorriu.
─ Se você soubesse a diferença entre azul e marrom, eu não teria brigado com o
cara errado naquela noite. Caine e eu poderíamos não ter começado as coisas do
jeito que começamos, e poderíamos ter mantido as coisas no nível profissional.
oposto ao que Davis e Caine estavam sentados. Evitei olhar para lá o máximo
que consegui, mas, às vezes, a curiosidade ganhava e eu via os dois me
observando misturar o drinque.
Depois enxuguei o balcão e perguntei aos únicos outros dois clientes se queriam
pedir alguma coisa. Sem mais nada para fazer e com quatro olhos em mim, não
tive escolha a não ser encarar o inevitável.
Respirei fundo e fui até a outra ponta do bar. Como eu já tinha cumprimentado
Davis, olhei para Caine primeiro.
Merda.
deu risada.
─ É, este lugar pertence a um cara velho. Fica vazio à noite. Só vim pela
garçonete bonita.
O músculo do maxilar de Caine ficou tenso.
─ Gostaria de outro?
─ Claro. ─ Ele apontou para Caine. ─ E vou pagar um para o meu amigo aqui
também.
─ Não, obrigado. Pensando bem, acho que já vou embora. ─ Ele se levantou
─ O que esse cara tem? Presumo que ele venha sempre aqui.
─ O que aconteceu?
─ Então, ele acaba de te deixar sozinha para passar a noite com um cara com
quem ele sabe que você teve um relacionamento antes e que quer tentar mais
uma vez?
Eu sabia que ela não tinha intenção de me magoar, mas ela tinha razão, e a
verdade doía. Foi exatamente isso que tinha acontecido. Caine tinha caído fora.
Ele não queria se envolver em briga. Não queria se envolver em nada exceto no
que tínhamos – sexo. Qualquer outra coisa que eu havia criado na cabeça era
apenas meu desejo.
Capítulo 26
Rachel
A aula nem tinha sido dada em um prédio em que Caine lecionava. E eu nem
tinha me atrasado.
Ele me encarou.
pouco depois, se tem que trabalhar até tarde ou qualquer coisa assim.
Foi o qualquer coisa assim que me fez ver através da máscara neutra que ele
usava.
Semicerrei os olhos.
─ Estava me procurando esta manhã por um motivo ou só estava me
vigiando?
Caine tinha se virado de costas para mim, enquanto guardava suas coisas, mas
parou para me olhar. Seus olhos estavam escuros.
─ Aqui não. Essa não é uma conversa para se ter na minha sala de aula.
─ Está terminando comigo? É isso que está tentando me dizer? Porque prefiro
que seja direto. Se estiver terminando, pode simplesmente dizer.
Nos encaramos por um breve instante, e eu sabia que estava provocando sua
─ Sete horas ─ ele disse. ─ Irei à sua casa depois da minha última aula.
─ Trabalho no turno do dia até as oito da noite hoje. Vou para a sua casa depois.
Não fazia ideia do que me fez dizer isso. Por que eu iria querer dirigir de
Manhattan até o Brooklyn, chateada, no meio da noite? Mas meus sentimentos
estavam tão descontrolados que me agarrei a qualquer coisa para ter uma ilusão
de controle.
─ Combinado. Mas eu vou te buscar. Não quero que dirija à noite cansada.
dissesse que o que tivemos foi puramente sexo. Toda a lógica do mundo não
conseguia evitar que meu coração se apaixonasse.
Caine o cumprimentou.
─ Isso mesmo.
─ Nenhum motivo. Só gosto de saber com quem minha garota está saindo.
Revirei os olhos.
─ Ignore Charlie. Ele foi policial por vinte anos. Todo mundo é suspeito até que
prove ser inocente. Vou me trocar, já volto.
fora, pela janela. Quando chegamos ao prédio de Caine, ele deu a volta para
abrir a minha porta, mas eu já estava saindo do carro. Ele franziu a testa e
segurou o meu cotovelo para me ajudar a me equilibrar enquanto eu saía do
carro pequeno e baixo. Mais silêncio no elevador até o seu apartamento. Só
quando entramos que um de nós falou.
─ Desça, garoto.
Caine trouxe uma garrafa de água para mim e uma taça de vinho para ele. De
novo, eu estava olhando para fora, pela janela. Tivera o dia inteiro para pensar
no que diria, mas desde que a hora havia chegado, toda a minha raiva e
frustração reprimidas haviam desaparecido. Eu estava apenas triste e me sentia
derrotada e cansada.
─ Não convidei Davis para ir ao O’Leary. Não tínhamos planos nem nada.
─ Eu sei.
Meus olhos se moveram para o reflexo de Caine. Ele estava parado atrás de
mim.
─ Como sabe?
─ Porque você não faria isso. Não é o tipo de mulher que sai da cama com um
─ Você não pode determinar com quem eu fico. Não pode simplesmente me
─ Rachel…
Seu tom era um alerta. Mas era eu que deveria o estar alertando. Porque, de
repente, fiquei furiosa. Minha frustração tinha se transformado em raiva. O fato
de ele estar ali tão calmo me deixava muito irritada. Não era justo que não
estivesse chateado. Eu precisava que ele ficasse magoado, como eu estava.
─ Não me venha com essa! Você tem razão. Estou melhor com Davis. Pelo
menos ele é sincero comigo sobre o que sente. E era muito bom de cama
também.
─ Acabou?
─ Não acabei, não. Só estou começando. Acho que vou transar com o garoto
do gorro também. Talvez ele possa desenhar nudes melhores depois de ver a
imagem de perto e ao vivo.
Arregalei os olhos.
─ Você acabou de falar para eu calar a porra da boca?
Caine abaixou a cabeça, então ficamos olhos nos olhos. Ele falou entre os dentes
cerrados.
─ Não quero ouvir você falando sobre transar com outros homens. Então, sim,
─ Não. Eu posso…
Minha arfada de surpresa foi engolida pelo seu beijo. As mãos dele subiram para
segurar o meu rosto, e ele rosnou de novo quando inclinou minha cabeça para
onde queria, aprofundando o beijo. Minha reação inicial foi lutar, me soltar de
seus braços e correr para a direção contrária. Porém, aquele pensamento se
esvaiu no segundo em que a língua dele entrou e encontrou a minha. Em vez
disso, eu o beijei com toda a raiva reprimida dentro de mim.
Não havia ninguém falando que eu estaria melhor com outro homem.
Aquele beijo.
Nós.
seu corpo firme mantinha o meu no lugar. Estávamos famintos um pelo outro.
Não havia mais luta em mim. Minha cabeça estava girando, e eu era incapaz de
formar um pensamento coerente, até que o nosso beijo selvagem finalmente
acabou.
Consegui assentir.
─ Que bom. ─ Seus braços se apertaram em mim, mas ele se afastou o suficiente
para me olhar nos olhos. ─ Eu disse que você estaria melhor com ele do que
comigo. Mas você não me deixou terminar.
─ Fui embora ontem à noite, achando que era a coisa certa a fazer. Nunca estive
em um relacionamento que durasse mais do que alguns meses, e ferrei com tudo
de bom à minha volta.
Caine cobriu os meus lábios com dois dedos, me silenciando. Ele fechou os
olhos e balançou a cabeça. Abrindo-os, deu risada.
─ Deus, você nunca cala a porra da boca. ─ Então, encostou a testa na minha.
─ Me deixe terminar.
Eu assenti.
─ Você estaria melhor com ele do que comigo, mas eu sou um egoísta
desgraçado. E eu sou egoísta o suficiente para não me afastar, quando sei que
deveria, e ainda pedir que fique comigo até eu foder com tudo. Até eu fazer com
que você corra para o outro lado.
Olhando nos olhos dele, percebi que ele acreditava em cada palavra que dizia.
Qualquer que fosse o motivo, ele pensava que não valia a pena lhe dar uma
chance – que as coisas terminariam, inevitavelmente, mal. Uma sensação que
corroía a boca do meu estômago me alertava de que eu iria me machucar, mas eu
a abafei.
─ Você vai me dizer por que acha que vai foder com tudo?
─ Então vamos aprender com ele. Mas não posso fazer isso se não souber o
Uni as sobrancelhas.
─ Babaca?
Não me preocupei em lhe dizer que já tinha planejado dizer a Davis que não
estava interessada. Deixei que ele pensasse que era sua vitória.
─ Vou.
A voz dele era baixa, e precisei tirar a orelha do seu coração para conseguir
escutar. Virei a cabeça e apoiei o queixo no topo das minhas mãos. A sala estava
escura, embora os meus olhos tivessem se ajustado o suficiente para vê-lo
enquanto falava. Nós dois estávamos nus, e eu estava me sentindo bem satisfeita.
─ Dezessete.
─ Bom, ainda acho que era jovem. Ela era mais velha e deveria ter sido mais
esperta.
cinco meses quando resolvi tirar um semestre de folga e fazer uma turnê com a
minha banda. Faríamos os shows de abertura de uma banda que não era muito
maior que a nossa, mas pensávamos que seríamos estrelas do rock. Essa foi a
minha primeira experiência com fãs. Acho que não a traí, tecnicamente. Depois
de sete semanas na estrada, liguei para ela e disse que deveríamos sair com
outras pessoas. Ela pensou que eu estivesse apenas solitário, então, algumas
noites depois, voou para Seattle para me fazer uma surpresa e assistir ao nosso
show. Ela assistiu, sim, a um show, mas foi no camarim e envolvia a mim e duas
mulheres.
Franzi o nariz.
─ Eu nem tinha visto que Abby estava lá. Aparentemente, quando ela entrou,
uma das garotas a convidou para se juntar a nós, mas eu estava muito ocupado
para perceber.
─ Isso é meio nojento.
─ Abby ficou brava, bebeu demais e acabou caindo de uma escada de concreto
no seu hotel. Com a queda, ela torceu o tornozelo e quebrou o nariz.
─ Isso é horrível. Apesar de não ter certeza se foi mesmo sua culpa. Parece que
você tentou fazer a coisa certa terminando com ela.
Caine ficou quieto por bastante tempo. Quando falou de novo, sua voz tinha
um pouco de dor.
doze anos. Ele era um compositor bem incrível. O único problema era que
escrevia as melhores coisas quando estava drogado.
─ Li que Dylan escreveu a maior parte de seus melhores trabalhos depois que
usava heroína.
ano em que as coisas começaram de fato a dar certo para nossa banda, foi o ano
em que o hobby de Liam de usar drogas também aumentou. Primeiro, ele bebia
alguns Red Bulls para ficar acordado e tocar ou compor músicas… depois os
Red Bulls se transformaram em Adderall, porque é mais fácil tomar um remédio.
Além disso, tocávamos perto dos campi de faculdades, e os alunos tomavam isso
como se fossem M&M’s. Mas o Adderall te mantém acordado por vinte e quatro
horas e, então, quando você precisa dormir, toma outro remédio para ajudar a
acalmar.
─ Está falando sobre Liam ou sobre você?
─ Eu usava, mas não como Liam. Na época, eu não enxergava tão claramente
como agora. Acho que pensava que era normal. Eu e os outros caras demoramos
um tempo para perceber que as coisas tinham ficado ruins. Então, certa noite,
tentamos acordá-lo para um show e não conseguimos. Quando o hospital limpou
seu estômago, havia tanta droga lá dentro, e não apenas remédios, que foi um
milagre ele ter sobrevivido. Eu não fazia ideia de que o Adderall tinha se
transformado em coca e meta.
─ Não. Mas não precisava aumentar o estresse. Não deveríamos ter aceitado
aquele acordo e pressionado Liam.
─ O que aconteceu não foi culpa sua. Viciados procuram motivos para justificar
o que estão fazendo. Se não fosse isso, teria sido outro motivo.
Caine suspirou.
─ Não tenho um bom histórico, Rachel. Mesmo quando tento fazer a coisa certa,
fodo com tudo de algum jeito. Não te contei nem metade das escolhas erradas
que fiz. Sobre a namorada de Liam, que era jovem demais para estar na estrada
com uma banda, mas deixei isso acontecer. Sobre quando eu tinha dezesseis anos
e conheci uma garota…
Tinha ouvido o bastante. Assim como ele tinha feito comigo mais cedo, o
silenciei, pressionando dois dedos em seus lábios.
Subi por seu corpo e fiquei sobre seus quadris, soltando o lençol que estava
enrolado em mim.
Capítulo 27
Rachel
As coisas entre mim e Caine haviam mudado na noite anterior. O esforço que
fazia sempre que estava comigo pareceu ter desaparecido. O amanhecer de um
novo dia trouxe uma versão mais leve, até mais feliz, de Caine.
Depois de expulsá-lo do chuveiro para que partes além dos meus seios e entre
minhas pernas pudessem ser lavadas, fiquei alguns minutos refletindo sobre tudo
que havia acontecido. A água corrente massageou meu pescoço enquanto fechei
os olhos.
Caine havia se aberto comigo. Ele carregava muita culpa e peso nas costas,
muito do que parecia não merecer. Mesmo assim, eu não havia compartilhado
muito do meu passado com ele. Não sabia se algum dia estaria pronta para falar
sobre isso.
Encontrei Caine sentado à mesa da sala de jantar com uma pilha de papéis e
seu notebook aberto. Ele estava usando aqueles óculos que eu amava como
ficavam nele e olhou para cima para me observar caminhar pelo corredor.
─ O que foi?
─ Por que não os corrige agora? Vou te bolinar enquanto você lê a redação sobre
a arte do ritmo.
minha língua. E do meu pau. Queria ter mais partes para colocar aí dentro. Eu
nunca sairia.
─ O quê? Era isso que eu estava tentando fazer. Aquecer você para te alimentar.
─ Isso está muito bom. Mas é a mesma coisa que você fez na minha casa. ─
─ Não, Sabichona. Sei fazer um monte de pratos. Só não faço sempre porque
─ Não sou tão boa em fazer comida, mas sei fazer doces e bolos muito bem.
─ Ah, é?
─ Rose, minha tia que nos criou, era confeiteira. Assim que nos mudamos, o
jeito que ela encontrou de se aproximar de mim e da minha irmã foi preparar
docinhos conosco o tempo todo.
─ Não. Rose não podia ter filhos. Eles foram, na realidade, pais adotivos por
muito tempo. Depois que adotaram minha irmã e eu, pararam de adotar outras
crianças. Ficaram bem ocupados comigo e com Riley.
─ Você mencionou que passou por uns anos rebeldes. Gostaria de ter visto isso.
adolescentes já são bem ruins sem um motivo para piorar o inferno. Eu não era
nenhum anjo, mas minha irmã era bem pior.
Terminar de comer foi minha desculpa perfeita para me levantar e tentar mudar
de assunto. Eu não era uma boa mentirosa, e era só questão de tempo até Caine
fazer uma pergunta que eu não estava pronta para responder. Levei nossos pratos
para a pia e resolvi lavá-los, em vez de colocá-los na lava-louça.
─ Aonde?
─ É surpresa.
Sorri.
─ Ok.
─ Arrume-se.
─ Quão arrumada?
─ O quanto quiser.
Não conseguia me lembrar da última vez que sentia tudo tão certo. Caine viu
─ O que foi?
─ Parece. Por mais que eu tenha lutado, e seja contra todas as regras no trabalho,
nada parece tão certo em muito tempo. Talvez o motivo de eu não ter conseguido
parar de pensar em você seja que é para você estar em minha mente.
Arrumei a cama, enquanto ele vestia jeans e uma polo e escovava os dentes.
─ O quê?
─ As camisinhas.
─ No criado-mudo. Mas pode deixar aí fora se quiser. Vou acabar com elas logo.
Sorri ao abrir a gaveta e guardei a caixa lá dentro, mas uma foto pequena em um
porta-retratos prateado me chamou a atenção. Curiosa, peguei-a para analisar.
Era uma foto da antiga banda de Caine. Ele provavelmente tinha vinte e poucos
anos e estava abraçado com outro cara da mesma idade. O resto da banda estava
atrás, ao fundo da foto.
─ Era?
Fiquei aliviada por ele não se chatear pelo fato de eu ser xereta. Batendo os
─ Bom, agora você está velho e maduro, então é mais bonito do que sexy.
─ É mesmo?
apartamento, havia dias em que passava pela foto da minha mãe e ficava triste.
Mas me acostumei e, com o tempo, comecei a sorrir para ela toda manhã.
─ Fica mais fácil se deixar para fora. Quando você guarda, está enterrando, e a
ferida nunca se fecha.
Caine olhou para mim e assentiu em silêncio. Então, fechou a gaveta do criado-
mudo e colocou a pequena foto em cima do móvel.
─ Está pronta?
Tive que me conter para não demonstrar minha empolgação por ter aceitado o
meu conselho. As primeiras vezes que ele olharia para a foto provavelmente
seriam difíceis, mas talvez fosse a hora. Além disso, eu torcia para estar por
perto e ajudá-lo a se sentir melhor quando ele se deitasse para dormir toda noite.
Peguei a minha bolsa na sala de estar e andei pela casa procurando o meu
celular, enquanto Caine colocava os sapatos. Havia umas moedas perdidas ao
lado do meu celular, o que me deu uma ideia – uma coisa que eu não fazia há
muito tempo.
Voltando para o criado-mudo, dei uma última olhada na velha foto de Caine e
Liam antes de fechar os olhos e fazer um pequeno desejo. Então, joguei as duas
moedas de cobre que estavam na minha mão no chão, para que Caine as
encontrasse depois.
Satisfeita, sorri e me virei para voltar para a sala. Não esperava encontrar Caine
na porta, então pulei de susto quando o vi parado ali. Minha mão apertou o peito.
─ Você me assustou.
Capítulo 28
Caine
Q ue porra foi aquela?
Rachel, depois de deixá-la. Ela sabia que havia alguma coisa errada, sabia que eu
mentia quando disse que estava com um começo de enxaqueca. Nem tenho
enxaquecas, mesmo assim, tinha quase certeza de que a pulsação em minha
cabeça iria iniciar uma.
Passei as mãos pelo cabelo. Pense, West, pense. Qual era o sobrenome do pai
daquela garotinha?
cara com a página amarelada, parecia que o meu escritório tinha sido saqueado.
Nelson. Eu achava que ao descobrir que não era o sobrenome de Rachel ficaria
aliviado, mas, em vez disso, só fiquei com mais perguntas.
A mãe da menininha havia morrido no ano anterior. Isso significava que ela teria
uns nove ou dez anos quando a perdeu. A mesma época em que Rachel perdeu a
mãe.
Porra.
Aquela sensação. Aquela maldita sensação que tive desde o dia em que a
conheci. Eu sabia que a conhecia de algum lugar, mas não conseguia definir de
onde. O que era aquilo que fazia me sentir daquela forma? Eu nunca tinha visto a
menininha de perto ─ só um flash de um rosto de dez anos de idade do outro
lado da igreja e através da treliça, há mais de quinze anos. Nada era claro.
Porra.
Rachel tinha dito que foi criada por sua tia. Nunca mencionara um padrasto.
Por outro lado, se o meu padrasto fosse um molestador de crianças, esse não
seria exatamente um assunto do qual eu falaria durante um encontro.
Queimou a garganta quando desceu, mas foi bom, como se eu estivesse pegando
fogo no momento.
Rachel tinha dito que crescera em uma cidade longe de mim. Pleasantville é uma
cidade minúscula, dá pra ir de St. Killian até lá com uma bicicleta azul e
pequena.
Outro gole.
Os anos da adolescência em que ela saiu de controle… Viver com aquele otário
do Nelson com certeza deixaria alguém na merda, tentando esquecer.
Acabei com o resto da bebida e olhei para fora pela janela, tentando trazer a
imagem da garotinha para minha mente. Mas foi há tanto tempo e estava muito
distante.
Finalmente sentindo o álcool ser absorvido pelo meu sangue, deitei no sofá e
descansei a cabeça no braço, olhando para o teto.
Porra!
POOOORRA !
Capítulo 29
Rachel
Sem saber o que vestir, fiquei enchendo Caine até ele me dizer aonde íamos.
Nunca tinha ido a uma ópera e pensei que era gentil da parte dele querer me
levar, sabendo o quanto aquilo significava para mim, por causa da minha
pesquisa com Umberto.
Não tinha nada chique o suficiente para vestir, então peguei emprestado de Ava
um vestido preto simples, transpassado na frente e que se prendia na nuca.
Havia deixado a porta do meu apartamento entreaberta depois que Caine tocou o
interfone, e ele bateu antes de entrar.
─ Rachel?
─ Já vou em um segundo!
─ Fique à vontade.
Dei uma última olhada no espelho e gostei do que vi. Respirei fundo antes de
sair para cumprimentar Caine. Estava nervosa ─ fora da minha zona de conforto
e toda elegante para ir a uma ópera.
─ O que acha? ─ Fiz toda aquela coisa de rodopiar como uma menininha…
A expressão no rosto de Caine quando se virou não tinha preço. Ele ficou
boquiaberto e precisou pigarrear para falar.
Ele vestia um terno de três peças, com corte slim e escuro, que parecia ter sido
feito sob medida. Ao ver a forma como abraçava seus ombros largos e bíceps,
percebi que provavelmente tinha mesmo. Pura elegância. Estava em toda a
forma como ele vestia o terno, e o efeito que tinha em mim devia ser similar ao
que uma lingerie causa em um homem. De repente, eu estava quente em meu
vestido sem manga que mal tinha tecido na parte de cima.
Caine ficou no lugar, seus olhos medindo todo o meu corpo, e esperou que eu
fosse até ele. Com meu stiletto de quinze centímetros de altura, não precisei ficar
na ponta dos pés para cumprimentá-lo, para variar.
─ Gosto de você com terno formal. Provoca efeitos em minhas partes femininas.
Ele sorriu.
que uma boca safada e um terno sexy. Caine segurou minha nuca e me beijou
selvagemente, sem se importar que estivesse borrando meu batom.
─ Amei o vestido, mas mal posso esperar para tirá-lo mais tarde.
Em meu quarto, consertei o batom, aplicando uma camada nova em meus lábios
inchados do beijo, depois peguei em meu armário uma clutch minúscula preta
com pedraria e coloquei o essencial lá dentro.
─ Pronto?
É porque não tive muitos bons momentos dos quais poderia me lembrar.
─ Não há muitas. ─ Dei de ombros. ─ Sabe, segunda filha e tal.
─ A maioria delas está com a minha irmã. Mas acho que posso encontrar
alguma.
Ele assentiu.
Do lado de fora, fiquei surpresa por ele não estar dirigindo. Tinha alugado um
carro para nos levar e, quando nos aproximamos, um motorista saiu e abriu a
porta de trás. Senti-me mesmo como a Cinderela nesse instante.
Caine sorriu, mas pareceu meio desligado. Eu não conseguia definir o que era,
mas não estava parecendo ele mesmo. Nossas conversas eram normais; qualquer
pessoa que olhasse de fora não veria nada além de um casal a caminho de uma
noite maravilhosa. Mesmo assim, por algum motivo, eu estava com uma
sensação esquisita.
Dentro do teatro, ainda faltava meia hora para a apresentação começar, então
fomos para o bar do lobby e pedimos bebidas. Pedi o refrigerante diet de sempre,
e Caine pediu uma dose dupla de uísque.
─ Nada.
Depois que ele terminou o primeiro uísque, foi para o segundo. Só porque eu
evitava beber não significava que estranhasse que outros o fizessem. Mesmo
assim, de novo, as duas doses duplas e o silêncio de Caine enquanto
esperávamos eram estranhos.
Olhando em volta, disse a mim mesma, mais uma vez, que, provavelmente,
estava apenas me sentindo um peixe fora d’água. Embora gostasse da música, o
pensamento de ir a uma ópera de verdade sempre me pareceu pretensioso. O
lugar estava todo decorado, e sorri ao pensar que não haveria nenhum camelô do
lado de fora vendendo camisetas, como no último show a que fui.
Caine deve ter percebido que eu olhava as pessoas à nossa volta e se inclinou.
A mulher que estava sentada do outro lado de Caine o fitou, então lancei um
esperava.
─ Obrigada por me levar. Fiquei feliz por ter essa experiência com você.
Caine sorriu.
─ Sinceramente, não sei como explicar. Me fez sentir algo que nunca havia
experimentado. Fiquei consumida pelas emoções… como se eu não conseguisse
─ Pode parecer esquisito, mas acho que o que senti foi alguma forma de amor.
Pelo menos a sensação que estar apaixonada lhe causa… Sabe, toda essa
sensação de plenitude e de estar totalmente consumida?
Foi nesse momento que percebi. Eu sabia o que era o sentimento porque estava
me apaixonando por Caine. Assim como a ópera, ele havia me deixado
deslumbrada desde o dia em que o conheci. Era uma conexão inexplicável,
embora eu estivesse com medo de admitir minha descoberta em voz alta.
Dei de ombros.
─ Li sobre isso.
Senti como se ele pudesse ver dentro de mim, então mudei de assunto e voltei à
sua pergunta original sobre o que mais gostei.
─ Acho que minha cena favorita foi aquela em que a mãe morre. É meio
mórbido, não é?
─ A forma como o marido dela cantou depois. Havia tanta dor e emoção em
sua voz que eu simplesmente sabia que ele nunca encontraria outro amor em sua
vida. ─ Levei a mão ao coração, sentindo-me triste só de pensar na cena. ─ Me
fez lembrar de Umberto e Lydia… da devoção que ela tem por ele. Pelo menos
eles tiveram mais de cinquenta anos juntos, mas esse cara era tão jovem, e o
amor da sua vida se foi. Foi de partir o coração, mas lindo.
Caine assentiu e pareceu refletir sobre o meu comentário enquanto olhava para o
trânsito pela janela. Quando voltou seu olhar para mim, sua expressão estava
séria.
─ A sua mãe nunca se casou de novo depois de seu pai? Você nunca mencionou
um padrasto antes de ser adotada.
Mas esse sentimento não durou muito, porque, de repente, Caine esticou o braço,
ergueu a minha mão do banco ao lado dele e me colocou sentada em seu
colo. Não era uma posição muito educada para uma mulher, levando em conta o
vestido chique que eu estava usando, mas não me importava. Seu humor sério
havia sido substituído pela brincadeira. Ele sorriu amplamente, e isso causou um
frio na minha barriga.
Dei risada.
─ Não faço ideia do que seja isso, mas saiu da sua boca e tem a palavra sexo,
então estou dentro.
Capítulo 30
Rachel
Sua respiração quente fez cócegas em meu pescoço quando sussurrou em meu
ouvido:
─ Você confia em mim?
─ Sim.
─ Feche os olhos.
Segui suas instruções sem hesitar. As mãos dele deixaram meus braços, e eu o
senti se mexendo atrás de mim, mas ele permaneceu de frente para as minhas
costas. Um barulho alto me fez arfar. Ele havia retirado a gravata e, então, senti a
seda em meu rosto.
─ Vou privá-la de seus sentidos para que consiga se concentrar apenas no que
estou fazendo com você.
Mal ouvi minha própria voz, minhas palavras estavam presas na garganta.
─ Ok.
Caine tampou meus olhos com sua gravata, amarrando-a como uma venda.
Nem tentei abrir os olhos, estava muito ansiosa para sentir o que ele queria que
eu sentisse.
Assenti.
Ele abriu lentamente o zíper do meu vestido nas costas. Eu não sabia se era a
ansiedade ou se a minha audição realmente estava mais apurada por estar
vendada, mas o som do zíper descendo devagar fez o meu corpo todo queimar.
Caine desceu o meu vestido lentamente, usando o material sedoso para acariciar
minhas curvas, enquanto me guiava para fora dele. O ar frio atingiu minha pele
quando ele se afastou, me deixando sozinha com nada a não ser a
lingerie e os stilettos. Ouvi um barulho no quarto, mas não tinha ideia do que ele
estava fazendo. Quando seu calor retornou para as minhas costas, seus dedos
seguraram os meus quadris e me puxaram contra ele. Ele havia tirado a camisa, e
pude sentir seu peito firme contra as minhas costas. Através de suas calças, o
comprimento grosso de seu pau empurrava minha bunda. Ele beijou todo meu
pescoço até chegar à orelha.
─ Você é tão linda. Mal posso esperar para estar dentro de você. Quero ter você
nua… sem nada entre nós esta noite. Tudo bem assim?
─ Conectei você à minha playlist. Vou colocar a música baixinho, para que possa
se acostumar a ela, e aumentar o volume lentamente.
Depois que um blues instrumental começou a tocar, Caine tirou o meu sutiã e a
minha calcinha. Então tirou o restante de sua roupa e ficou em pé, atrás de mim,
com o pau duro apertado entre seu abdome e o topo da minha bunda. Ele
ergueu um dos fones e a música que estava tocando foi substituída por sua voz
rouca.
─ Os sapatos ficam.
da cama com a sensação erótica de ser tocada sem aviso, de sucumbir à vontade
dele sem questionar. Em vez de me sentir cativa por não conseguir ver ou ouvir,
tive o sentimento contrário, de total e completa liberdade.
A ansiedade pelo que ele poderia fazer em seguida era diferente de tudo que
eu já havia sentido. Cada beliscão, lambida, afago e carícia em meu corpo me
fez ficar muito mais desesperada por ele. Eu estava ofegante com desejo, mesmo
que não conseguisse me ouvir.
De repente, ele parou de me beijar e seu corpo se afastou do meu. Percebi que
ele havia se levantado. Não conseguia vê-lo, mas sabia que estava se ajoelhando
sobre mim, observando meu corpo. Imaginei seus olhos dilatados, suas narinas
inflando e seu desejo queimando em seu rosto lindo. O fato de estar deitada
esparramada, sem ver nada à minha volta, deveria ter me feito sentir vulnerável,
mas, em vez disso, me senti poderosa.
Estiquei o braço, sabendo que ele estava ali, embora não conseguisse enxergar, e
o puxei gentilmente para mim. Os lábios de Caine passaram pelos meus,
enquanto ele cobria meu corpo com o dele. Debaixo de seu peso, abri as pernas o
máximo que consegui, convidando-o a entrar. Senti seu gemido vibrar na minha
pele quando ele moveu sua ereção para cima e para baixo, pela umidade entre
minhas pernas. O volume nos fones aumentou, e Caine entrou em
mim.
A música retumbava.
Ele esperou que eu falasse, mas não era fácil. Cada centímetro de energia havia
sido drenado de meu corpo.
O lábio de Caine subiu, o que eu amava por algum motivo inexplicável. Ele tirou
o cabelo úmido do meu rosto.
─ É.
Franzi as sobrancelhas.
─ Não.
Fiquei boquiaberta.
Ele riu.
─ Nós?
─ Juntos. Simplesmente dá certo. Senti isso na primeira noite em que nos vimos.
Só não queria admitir.
Ele tinha razão. A conexão entre nós estivera ali desde o nosso primeiro
encontro ─ uma chama na qual poderíamos pisar e tentar apagar ou fazê-la se
espalhar com um sopro.
─ Merda. ─ Apoiei-me nos cotovelos e dei de cara com uma faixa de luz
diretamente nos olhos. Semicerrei os olhos, desanimada com as cortinas abertas
que permitiam que o sol entrasse e iluminasse meu criado-mudo e meu celular.
Chamada perdida brilhava na tela do celular quando o peguei. Verifiquei o
registro de chamadas, olhei a hora e me virei para Caine, deitada em sua barriga.
─ Caine? ─ sussurrei.
─ Humm?
─ Não tenho, não. Minha auxiliar vai dar aula por mim hoje.
Sorri.
─ Não estava na agenda que sua auxiliar daria aula hoje e ela precisa estar em
seu outro emprego ao meio-dia.
Ele resmungou.
Segurando minha cintura, ele me puxou de volta para a cama e ficou por cima
─ Você está…
─ Duro.
─ É, isso.
─ É de manhã, e acabei de acordar com você nua ao meu lado. Meu corpo quer
te cumprimentar apropriadamente.
─ Não temos tempo. Você vai demorar, no mínimo, trinta minutos para tomar
Arregalei os olhos.
A mão de Caine deslizou por meu corpo, seu polegar encontrou meu clitóris e
começou a massagear.
─ Eu posso me atrasar. São meus alunos e minha auxiliar que não podem.
─ Isso é hipocrisia da sua parte ─ eu disse, embora já tivesse perdido a luta para
seus dedos.
Quinze minutos mais tarde, Caine já havia nos dado um orgasmo e tinha tomado
banho. Eu estava curtindo a visão dele pegando suas roupas enquanto não vestia
nada além de uma toalha, quando o meu celular tocou.
Sorri e atendi.
─ Oi.
─ Oi ─ ela disse. ─ Estava começando a achar que teria que mandar uma
patrulha te procurar. Não tenho notícias suas há tanto tempo.
─ Ogro?
Havia esquecido que a última vez que conversara com Riley havia sido no
primeiro dia como auxiliar de Caine. Olhei para cima e para os olhos dele,
enquanto abotoava a camisa.
─ Ah, que bom. Fico feliz que esteja dando certo ─ ela comentou. ─ Você não
Balancei a cabeça, demonstrando a Caine que estava mentindo, e ele deu risada
enquanto terminava de vestir a camisa.
─ Ok.
─ Certo. Te vejo mais tarde. Preciso entrar no chuveiro para não me atrasar para
o trabalho. ─ Estava prestes a desligar quando tomei uma decisão de última hora.
─ Espere. Tudo bem se eu levar alguém?
─ É novidade.
─ Não sei se ele vai poder ir ou não. Te mando mensagem daqui a pouco. Ok?
─ Lógico.
Caine terminou de se trocar e pegou seu celular. Havia chamado um Uber depois
de sair do banho.
Eu ainda estava sentada na cama, nua na parte de cima com o lençol enrolado
na cintura. Ele andou até mim e passou os nós dos dedos contra meu mamilo ao
se inclinar para me beijar.
─ Eu quero.
Fiquei sorrindo por muito tempo depois de ele ter saído. Ele não fazia ideia do
quanto o fato de concordar em ir comigo sem precisar insistir era importante
para mim. Senti que havíamos ingressado em um novo caminho juntos, e mal
Capítulo 31
Caine
mais cedo. Fazia menos de doze horas que eu estivera dentro dela e, mesmo
assim, senti meu corpo reagir ao vê-la.
─ Usa drogas?
─ Sem drogas.
─ Já foi fichado?
Estava basicamente sendo interrogado por um policial ─ não havia motivo para
contar algo que havia acontecido há anos e a que ninguém mais tinha acesso.
─ Sem ficha.
Charlie formou um V com seu indicador e dedo médio e apontou para seus
olhos, depois para mim.
quando tentou completar a volta. Deveria ter ficado na terceira até o técnico
permitir. Certo, professor?
─ A mesa três está quase pronta para fechar ─ Rachel disse a Charlie. ─ Falei
para eles trazerem a conta para você. ─ Olhou no relógio. ─ Ava ainda não
chegou. Quer que eu espere? A mesa cinco pediu petiscos e ainda não decidiu o
jantar.
─ Tem certeza?
─ Vão. Saiam daqui. Não quero que as pessoas vejam seu amigo professor aqui
e pensem que o lugar está sendo frequentado por mauricinhos.
Dei risada.
A irmã da Rachel morava no Queens, e o trânsito ainda estava lento por causa do
horário de pico. Quando nos aproximamos da autoestrada, percebi que Rachel
estava mais quieta do que o normal.
─ Tudo bem.
─ Ela é viciada em drogas. Bom, está em recuperação. Mas acho que isso ainda
a torna uma viciada, porque, uma vez viciado, sempre viciado. É a mesma coisa
que alcoólatra, certo? Ainda pode se chamar de alcoólatra mesmo se não bebe
por cinco anos. Há realmente uma hora em que a pessoa para de se referir a si
mesma assim? Tipo como aquelas fichas que te dão… uma deve significar que
está sóbrio? Todas aquelas fichas têm significados diferentes? Pensei que fossem
suas conquistas ao longo do tempo… tipo um por mês, e outro por ano? Mas
talvez…
Ela ainda não tinha parado para respirar. O fato de emendar frases uma atrás da
outra mostrava que estava nervosa. Então, interrompi:
─ Rachel?
─ O quê?
─ Você está balbuciando. Não me importo que sua irmã seja viciada. Nem me
importaria se sua irmã não estivesse em recuperação. Não vou julgá-la. Estou
indo ao jantar porque você quis que eu viesse. Ainda quer que eu vá junto?
─ Quero.
Estiquei o braço e peguei a mão dela, levando para cobrir o câmbio debaixo
da minha.
Da minha visão periférica, vi seus ombros relaxarem um pouco. Ela olhou para
fora da janela, parecendo perdida em pensamentos, depois se virou para mim.
Seu ex-marido a deixou alguns anos atrás e levou o filho dela com ele.
─ Não. É uma longa história. Mas ela teve Adam quando era jovem.
Apesar de ter sido sincero quando disse que não julgava a irmã dela, eu havia
imaginado que ela fosse totalmente diferente. Esperava ser recebido por uma
viciada, magra e despenteada, em um apartamento pequeno, talvez com dentes
estragados, quando chegássemos. Mas a mulher que nos recebeu não era nada
disso. Era uma versão mais velha de Rachel. Saudável e sorridente, nos
recebendo em sua casa com um abraço.
─ É tão bom te conhecer. Minha irmã não me contou absolutamente nada sobre
você.
Rachel riu.
─ Já gostei dele.
Riley estava mexendo uma panela no fogão e apontou para o fim do corredor.
─ Claro. Passe pela sala, no fim do corredor, primeira porta à esquerda. Moro
basicamente em um corredor, então não dá para se perder.
Vi uma parede cheia de quadros, parecida com a que Rachel tinha em seu
apartamento, mas não parei para olhar antes de ir ao banheiro. Na volta, observei
que a maioria das fotos eram do mesmo menininho loiro em várias fases do
crescimento. Presumindo que fosse o filho de Riley, Adam, não quis parar e
chamar atenção para isso, no caso de ser difícil falar sobre ele.
Havia passado por quase toda a fileira de fotos do corredor quando uma foto
Parei para olhar a mais jovem mais de perto. A foto era antiga e estava em baixa
resolução, mas alguma coisa nela acendeu uma luz dentro de mim. Minha
─ Ela sempre insistia em prender seu próprio rabinho. Sempre ficava torto, mas
teimava em fazê-lo sozinha. ─ Riley veio para o meu lado junto à parede de
fotos e me entregou um copo. ─ É chá gelado.
Peguei sem desviar os olhos. Havia algo muito familiar na foto. É claro que seria
familiar para mim, considerando que Rachel não mudara muito, mas era mais
que isso. Meus olhos passaram por toda a parede.
─ Você pediu para ver uma foto minha quando pequena outro dia. ─ Ela bateu
Acho que assenti, mas não tenho certeza. Minha mente ainda estava focada na
─ Venha, vou lhe mostrar como minha irmã era gordinha quando bebê. Nossa
mãe gostava de tirar fotos dela pelada enquanto lhe dava banho na pia. Rachel
tinha covinhas, mas não no rosto.
Nós três nos sentamos no sofá, uma irmã de cada lado de mim. Riley apontou
para uma foto, que presumi ser ela segurando Rachel recém-nascida.
─ Detestei Rachel quando mamãe a trouxe para casa. Ela roubou toda minha
atenção.
Rachel a reprimiu.
─ Minha mãe disse a ela para manter objetos pequenos longe de mim porque
─ Não tem muitas fotos de nós depois que Rachel fez uns cinco ou seis anos.
Riley assentiu.
morte, antes de morarmos com os Martins, não foram bons para querermos
guardar em fotos.
─ Não sabia que não tinham ido morar com seus tios logo depois que a mãe
Rachel e Riley olharam uma para a outra. Houve uma troca de silêncio antes
de Rachel falar.
─ Não. Depois que a minha mãe morreu, nós continuamos a morar com o nosso
padrasto.
─ Pensei que tivesse dito que sua mãe não havia se casado de novo.
─ Nós gostamos de fingir que ele nunca existiu. ─ Ela se levantou. ─ Vou olhar
meu molho.
─ Sinto muito. Não quis mentir para você. É só que… minha irmã está certa.
É mais fácil fingir que não houve nenhum Benny. ─ Ela falou baixinho: ─ Ele
Benny.
O porra do Benny.
Não sabia se conseguiria aguentar o jantar. Ficava olhando para Rachel e, cada
vez que o fazia, via a menininha do confessionário. Estava mais claro que a luz
do dia agora, apesar de eu não ter enxergado antes. De repente, não conseguia
tirar da cabeça a única visão nítida dela que consegui ter, do outro lado da igreja,
todos aqueles anos antes. Quando olhava para ela, via seu rostinho doce de dez
anos de idade.
Permiti-me sair desse devaneio e, por fim, notei Rachel me olhando com
preocupação. De maneira abrupta, me levantei e me afastei da mesa.
Voltei para o banheiro e encarei meu reflexo no espelho. Gotas de suor haviam
se formado na minha testa e no topo do meu lábio superior. Nunca havia tido um
ataque de pânico, mas tinha certeza de que era exatamente assim. Meu coração
ricocheteava contra a parede do meu peito, e o simples ato de respirar era um
esforço. Inclinei-me sobre a pia e me concentrei em inspirar e expirar por alguns
minutos antes de jogar água no rosto.
Não sabia quanto tempo tinha ficado trancado no banheiro, mas, quando saí,
─ Você está bem? ─ Colocou a mão na minha testa úmida. ─ Não parece muito
bem.
─ Na verdade, não estou. Não me sinto muito bem. Começou na aula hoje, e
pensei que fosse o calor, mas deve ser algum tipo de virose.
─ Oh, sinto muito. O que posso fazer? Quer um chá de gengibre ou um pano
─ Oh. Certo. Entendo. Deixe eu só falar para Riley, e vou pegar minha bolsa.
─ Não?
─ Você deveria ficar. Não quero estragar sua noite. Sua irmã pode te levar para
casa?
─ É, tudo bem.
Enquanto suas palavras diziam que estava tudo bem, a expressão de Rachel
mostrava algo totalmente diferente. Não tinha certeza se ela acreditara que eu
estava passando mal, mas precisava sair logo dali.
Perguntei-me se era uma boa ideia dirigir, senti que não tinha condições para
isso. Quando cheguei em casa, percebi que, com certeza, aquilo tinha sido uma
má ideia. Não me lembrava de dirigir da casa da irmã da Rachel até a minha.
Peguei uma bebida forte e andei de um lado para o outro por um tempo,
lembrando da última vez que tinha visto a garotinha da igreja, o dia em que a
havia seguido até sua casa. Depois de tudo que acontecera, meus pais haviam
entrado em ação para me proteger, pedindo favores para todo mundo, para
políticos locais e para a polícia. Agora, não conseguia me lembrar muito bem do
que aconteceu naquele dia, exceto um detalhe. Eu havia mentido para a
garotinha que agora sabia que era Rachel por meses, em vez de fazer o que podia
para tirá-la daquele inferno o mais rápido possível.
Capítulo 32
Rachel
estômago. Ele ainda não havia respondido à mensagem que eu mandara na noite
anterior, quando cheguei da casa da minha irmã, apesar de conseguir ver que ele
a tinha lido.
Dei aula por um tempo, depois fiz uma pausa para tocar algumas músicas que
A princípio, estava preocupada que Caine tivesse passado muito mal, talvez até
ido ao hospital ou algo assim. Mas se ele podia ler minhas mensagens, por que
não conseguiria responder?
Passada quase uma hora da aula de noventa minutos, eu estava tão distraída que
a encerrei mais cedo. Caine não ficaria feliz com isso, porém essa não era minha
principal preocupação. Ansiosa, liguei para ele antes mesmo de a sala ter se
esvaziado por completo. Tocou uma vez e caiu na caixa-postal.
Quando alguém não consegue atender, toca várias vezes até cair na caixa-postal.
Deixei uma mensagem: “Caine, é a Rachel. Estou preocupada com você. Não
responde minhas mensagens e não apareceu para dar aula. Pode, por favor, me
falar se está tudo bem para eu não começar a ligar para os hospitais como uma
maluca?”
Quis ir até seu apartamento e ver como ele estava, mas precisava estar no
trabalho em uma hora, então não haveria tempo suficiente para ir e voltar. A
terça também era o único dia em que eu trabalhava sozinha. Abria o bar para
Charlie porque ele ia ao mercado e visitava o túmulo de sua esposa toda semana,
como um relógio. De jeito nenhum eu ia interromper isso porque meu namorado
Ele é mesmo meu namorado? Durante todo o trajeto até O’Leary, me peguei
discutindo comigo mesma sobre tudo e qualquer coisa em relação a Caine. Um
As horas se arrastaram depois disso. Ava apareceu às quatro ─ uma hora antes de
seu turno iniciar ─ para me ver, e eu estava prestes a ter uma explosão verbal.
─ Então você ainda está viva? ─ ela perguntou. ─ Pensei que talvez tivesse sido
fodida até a morte pelo professor bravo.
Ava deu uma olhada na minha cara e sua expressão ficou triste.
─ Ah, não. O que aconteceu? Aquele babaca te traiu? Ele é casado? Porque vou
sair atirando na bunda dele.
Suspirei.
─ Então o que é?
─ Gostaria de saber.
Então, continuei a vomitar tudo para minha pobre amiga, contando todos os
detalhes dos últimos dias. Bom, nem todos os detalhes ─ as partes do sexo
incrível guardei para mim ─, mas contei tudo que poderia ser relevante.
─ Acha que ele ficou com o pé atrás porque o levou para a casa de Riley?
Alguns homens têm esse medo ridículo de conhecer a família, porque acham
que é o último passo antes de você arrastá-lo para a igreja.
─ Imagino que poderia ser… apesar de não achar que seja isso. Ele não hesitou
ou mostrou qualquer preocupação sobre ir comigo, e nos primeiros dez
─ Nada mesmo. Repensei sobre isso várias vezes. Estávamos sentados na sala
Olhei para o vazio ao visualizar nós três ─ eu, Riley e Caine ─ sentados no sofá.
Fotos. Rabinhos de cavalo. Mamãe morrendo. Benny. Devia saber que algo daria
errado só de mencionar aquele homem. Então tive uma ideia. Caine poderia ter
ficado irritado porque menti sobre ter um padrasto? Era tão insignificante que
não conseguia imaginar que fosse isso.
─ Bom, então talvez ele estivesse mesmo doente? Talvez tenha ido ao banheiro
de sua irmã, ficado com caganeira e não quisesse entupir a privada.
Enruguei o nariz.
─ Quer que eu justifique o fato de ele ter fugido para que você finja que ele não
tem problemas com compromisso ou não?
Capítulo 33
Essa era a quarta vez que ela parava para colher flores do lado da estrada, a
caminho de casa. Sua vida parecia um amontoado de merda, e ela ainda via
beleza no meio das ervas daninhas e do mato alto.
Permaneci pelo menos dois quarteirões para trás, e ela não parecia ter notado.
Isso me lembrou de que precisava ter uma conversa séria com minha cordeirinha
sobre estar consciente do que acontece ao redor. Qualquer psicopata poderia
segui-la sem que ela percebesse.
Enfim…
Depois de uns bons três quilômetros, ela finalmente virou em uma travessa. A
casa era na verdade bem legal. Eu tinha imaginado que ela morava em um trailer
detonado, no fim de uma rua comprida e suja, com lençóis pendurados para
esconder as janelas e uma moita enorme para camuflar qualquer sinal de vida ─
Fiquei ali, olhando em volta por mais ou menos meia hora depois disso. Pela
primeira vez, questionei se ela poderia estar inventando tudo. Ela poderia ter
uma imaginação fértil. A semente da dúvida foi plantada, mas minha intuição
dizia que ela não estava inventando uma história. Olhei uma última vez para
aquela casa antes de ir embora. Pelo menos não precisaria esperar muito para
descobrir ─ somente até ela aparecer com a irmã no dia seguinte.
Esperei por seis horas. Um pouco depois da uma da tarde, me convenci de que
ela não apareceria naquela manhã. Antes de segui-la até em casa no dia anterior,
eu não tinha nenhuma dúvida de que alguma coisa estava acontecendo. Mas
agora, depois de ver a casa comum, em um bairro normal, a dúvida pairava sobre
mim. Por outro lado, Ted Bundy, o assassino em série, também parecia normal
pra caralho. Resmunguei e me levantei do banco dos fundos, onde tinha ficado
ouvindo a três bandas naquela manhã, enquanto olhava para a porta. Não tinha
ideia do que fazer, mas sabia para onde iria.
Também precisava bolar um plano, então fiz uma parada em um posto com uma
loja de conveniência e entrei para pagar. Minha mão estava na maçaneta da porta
quando, de canto de olho, vi alguma coisa que chamou minha atenção. Parado ao
lado do posto estava um carro que era muito familiar ─ o mesmo modelo e
marca daquele parado na garagem da garotinha no dia anterior.
Fui até lá e dei uma olhada na parte de trás do carro. Com certeza, havia um
símbolo de peixe de Jesus. Olhando para a loja de conveniência, vi uma garagem
de duas portas anexada a ela. Uma delas estava fechada, mas a outra estava
aberta com uns dois metros de altura. As luzes também estavam acesas.
─ Fecha ao meio-dia hoje. Mas acho que Benny ainda está lá.
Minha respiração se tornou mais profunda a cada passo, enquanto eu seguia para
a garagem escura. Havia uma chave de fenda em cima de uma caixa vermelha de
ferramentas. Peguei-a e a guardei no bolso de trás da minha calça.
─ Olá?
A garagem tinha quatro carros, mas parecia que não havia ninguém lá.
Um homem apareceu com a cabeça debaixo do capô de um dos carros na outra
garagem e quase me matou de susto.
em minha direção.
Suas garotas.
─ Você é o Benny?
─ Por quê?
Estávamos parados um de cada lado do carro, mas ele começou a dar a volta
em minha direção.
─ Está querendo a minha filha? Deixe eu te dar um conselho. Você quer uma
garota boa. Aquela ali… ela não é boa. Quinze anos e nada além de problema.
─ Acha que sabe alguma coisa? Por que não vai em frente e fala tudo de uma
vez?
Ele semicerrou os olhos, seu olhar ficou penetrante, parecia que tentava montar
um quebra-cabeça. Ao entender tudo pela primeira vez, um sorriso sarcástico
aumentou em seus lábios. Seu tom combinava com a expressão diabólica.
─ Você tem alguma coisa a ver com o fato de elas terem feito as malas e
planejado fugir, não tem?
─ Elas não vão fugir para lugar nenhum depois de ontem à noite. Ensinei uma
lição a elas, assim como vou ensinar a você.
Capítulo 34
Caine
─ Caramba. Seu bafo fede, amigão. ─ Pelo menos pensei que fosse do Murphy.
Era possível que na verdade fosse o meu.
Fechei meu notebook e tirei os óculos para esfregar os olhos. Como eu ia contar
para ela? Estive enclausurado em meu apartamento por dois dias, não tinha
tomado banho, mal tinha comido, e me sentia completamente derrotado.
Rachel deve ter entendido a deixa de que eu a estava ignorando, já que não havia
mais mandado mensagem desde o dia anterior.
Percebi o quanto estava louco por ela quando debati comigo mesmo pela
centésima vez que nunca iria contar. Não seria uma decisão difícil se não tivesse
tanto a perder. E eu a perderia. Como ela poderia confiar em mim depois de
descobrir que nos conhecemos há quinze anos? De saber que eu havia mentido
para ela por meses? Que eu tinha tomado algo sagrado dela ─ a amizade de um
Mas se não contasse para ela, tudo que tivemos e tudo que viríamos a ter seria
baseado em ainda mais mentiras.
Eu estava sendo egoísta tentando justificar o fato de nunca contar para ela,
dizendo a mim mesmo que a magoaria duas vezes se falasse tudo. Eu sabia que
ela se importava comigo. Estaria reabrindo feridas antigas que duvidava que ela
quisesse relembrar. Por que não deixar tudo adormecido?
Havia uma coisa que eu não conseguia suportar ─ não queria ser outro homem
a decepcioná-la. Ela merecia mais que isso. Caralho. Ela merecia alguém melhor
que eu. Puxei meu cabelo depois de passar as mãos por ele.
Mentir na cara dela e tentar seguir em frente com aquela mentira sempre entre
nós.
Apesar de eu ter perdido dois dias debatendo essa questão, no fundo, sabia que
não havia uma escolha de verdade. Eu não conseguiria continuar mentindo
para ela.
O único consolo era que, assim que passasse a me odiar, seria mais fácil para ela
seguir a vida. Pelo menos, seria mais fácil para um de nós. E se eu resolvesse
seguir com aquela mentira, apenas estaria sendo egoísta.
Peguei o celular ao mesmo tempo que ele se iluminou. Não havíamos tido
contato em mais de vinte e quatro horas, então o timing da mensagem dela foi
impecável.
Olhei para o meu celular por um tempo, hesitante. Uma coisa era viver no
corredor da morte, mas outra era ter a data da sua execução marcada. Antes que
eu conseguisse ter colhões para responder, uma segunda mensagem chegou.
RACHEL: SAIO DO TRABALHO ÀS OITO.
Não queria que ela dirigisse à noite quando estivesse brava ou chateada. Era hora
de eu ter colhões.
Depois de tomar um banho, resolvi levar Murphy para uma longa caminhada
Murphy balançou o rabo, então presumi que fosse sim. Se eu ficasse mais
enclausurado no apartamento, iria enlouquecer. Precisava sair e clarear a mente.
─ Você não faz ideia. Isso vai fazer o dia dele… Provavelmente o ano. Não
importa onde a cabeça dele esteja, ele nunca esquece do maldito cachorro. ─
─ É claro. ─ Ofereci a guia e meu braço a Lydia. Ela pegou ambos, e seguimos
para fora, caminhando sob o céu azul.
─ Um jovem bonito como você com um cachorro fofo, as mulheres devem cair
aos seus pés.
Nunca tinha sido o tipo de pessoa que falava de uma mulher com quem estava
─ Há uma mulher na minha vida, mas fiz uma coisa idiota e estraguei tudo.
─ Oh? Sinto muito. Quer falar sobre isso? Tenho experiência de mais de
cinquenta anos. Talvez possa ajudar a consertar as coisas.
Estive tentando evitar a resposta para essa pergunta. Mas mentir para Lydia era
mais difícil do que mentir para mim mesmo. Assenti.
Ela sorriu.
─ É assim que acontece. Você se vira um dia e o amor te atinge na cara, como se
estivesse ali o tempo todo e você estivesse cego demais para ver. Esse é o
segredo do amor verdadeiro… Nunca vemos o começo ou o fim.
Ótimo. Sem fim à vista. Exatamente do que eu precisava ouvir antes de Rachel
me dar um pé na bunda.
Lydia deve ter percebido minha cara de merda. Ela apertou meu braço.
─ Não se preocupe, querido. Vai dar tudo certo. Quando se está amando, os erros
podem ser consertados.
Balancei a cabeça.
─ Para ser sincero, estou evitando-a por alguns dias, porque sei que, quando
contar a verdade, ela vai ficar magoada.
─ Bom, infelizmente, a verdade dói às vezes. Outra mulher faz meu marido feliz
agora, depois de mais de cinquenta anos de casamento. Nem sempre é fácil.
Mas, na longa caminhada, é melhor magoar alguém com a verdade do que fazê-
lo feliz com mentiras. Porque ela pode tomar a decisão de seguir em frente com
a verdade. As mentiras te mantêm preso.
Lydia não estava brincando quando disse que aprendeu uma ou duas coisas com
seus mais de cinquenta anos de casamento. A janela da dúvida sobre contar a
verdade para Rachel finalmente se fechou. Estiquei o braço e apertei a mão de
Lydia.
─ Umberto é um homem muito sortudo.
A expressão de Umberto ao ver Murphy deve ter sido uma das melhores coisas
que já testemunhei na vida ─ embora, mentalmente, eu estivesse me torturando
por não ter ido com Rachel. Ela teria adorado. E eu teria adorado ver o sorriso
em seu rosto.
A outra mulher de Umberto não estava em nenhum lugar naquele dia. Com
Lydia acocorada ao seu lado, Umberto sorriu e deu risada ao acariciar a cabeça
de Murphy. Meu amigo infiel de quatro patas roubou toda a atenção. Fiquei
afastado e tirei um momento para observar os três. Então, dei-lhes um pouco de
privacidade. Pelo menos uma decisão boa eu tomei naquele dia.
fiquei pensando sobre aquela noite. Deixei Murphy em casa, tomei um banho e
ensaiei o que iria dizer ─ como iria explicar o que tinha feito sem parecer um
babaca completo.
Tinha até me convencido de que Rachel conseguiria esquecer, até que cheguei
Era como se eu tivesse descoberto tudo de novo. Tudo que tinha pensado, as
palavras nas quais refletira cuidadosamente, tudo isso pareceu fugir de mim
enquanto eu estava parado do lado de fora do meu carro, olhando para cima, para
a janela dela.
Era uma noite estranhamente quente de outono, com uma brisa legal, então sua
janela, no terceiro andar, estava aberta. A luz do seu quarto estava acesa, suas
persianas quase inteiramente abaixadas, e eu não conseguia fazer nada a não ser
ficar parado e observar. Meu coração quase parou quando sua silhueta apareceu.
Ela estava de perfil, olhando para longe de onde estava. Primeiro, ela não se
mexeu, só encarou o vazio, mas depois vi uma mão segurar seu punho, e ela
começar a brincar com o relógio.
É, também estou nervoso, Estressadinha. Desculpe por tê-la feito se sentir assim
nesses últimos dias.
Eu precisava acabar com essa merda para o bem de nós dois. Respirando fundo,
finalmente segui para seu prédio. O elevador demorou para chegar e demorou
mais ainda para subir ao terceiro andar. No instante em que saí dele, estava
transpirando na testa. Andei até sua porta com uma dificuldade excruciante.
Bati e esperei com as mãos nos bolsos, olhando para baixo, para os meus
sapatos. Baixinho, fiz uma oração ─ não deixei escapar a ironia daquilo.
Ergui meu olhar para encontrar o dela, e meu coração bateu sem controle. Me
apaixonei por ela. Naquele momento, eu não queria mais nada além de lhe dizer
isso. Mas não queria que a primeira vez que dissesse aquelas palavras fosse
abafada pela conversa que estávamos prestes a ter. Eu só esperava que pudesse
dizê-las algum dia.
─ Olá, Rachel.
Capítulo 35
Rachel
─ Oi.
─ Caine?
─ Obrigada.
Dei um passo para o lado para que ele entrasse, notando que ele não tinha se
inclinado para dar um beijo. Tentei ignorar, mas isso elevou o meu nervosismo
para um nível que beirava pânico total.
Caine entrou, e as coisas ficaram ainda mais bizarras ─ pior que um encontro às
cegas. Eu estava parada em um cômodo onde aquele homem tinha feito café
Caine assentiu e enfiou as mãos nos bolsos. Depois de outro minuto de silêncio
bizarro, ele pigarreou.
─ Ok. Por que não nos sentamos? Posso pegar alguma coisa para você beber?
Ele me seguiu para a sala. Sentei em uma ponta do sofá, o que deixou bastante
espaço vazio para ele se juntar a mim. Mas ele escolheu se sentar na cadeira ao
lado.
Caine olhou para os pés, depois passou uma mão pelo cabelo. Embora ele ficasse
muito lindo com aquele visual despenteado, tive a sensação de que estava
fazendo muito isso nos últimos dias, e não tinha nada a ver com estilo. Ele
expirou alto antes de começar a falar.
estava acontecendo com Caine. Fiquei enjoada. Mas me recusava a deixar que
aquele homem horrível tirasse mais alguma coisa de mim.
─ Desculpe por ter mentido. É só que… não é fácil, para mim, falar sobre isso.
nervoso.
─ Eu disse que não tive um padrasto porque queria não ter tido um. Tento fingir
que ele nunca existiu. Não era um cara legal. Ele começou a abusar de mim e de
minha irmã assim que minha mãe morreu.
─ Não era do mesmo jeito comigo e com minha irmã. Ele… ─ Mesmo quinze
Balancei a cabeça.
─ Graças a Deus.
quarto e encontrou a mala que eu tinha feito. Ele ficou louco e começou a nos
chutar com suas botas de bico de ferro. Foi isso que deixou a cicatriz nas minhas
costas.
Fui teimosa demais por muitos anos para me permitir chorar por tudo que
aconteceu. Mas as lembranças daquela noite ainda estavam vívidas sempre que
eu falava sobre elas. Podia ver minha irmã entrando escondido no meu quarto,
depois que Benny desmaiou, para cuidar do meu corte. Minhas lágrimas estavam
frias, escorrendo pelo meu rosto quente.
pontos.
Caine veio se ajoelhar aos meus pés. Baixei a cabeça até ele, enterrando o
Uma vez que a torneira se abriu, eu não conseguia impedir que a água parasse de
sair. Enquanto Caine me abraçava, eu me senti segura pela primeira vez em
muito tempo ─ segura para chorar. E foi o que fiz. Chorei muito, me permitindo
desabafar. Não sabia de onde vinha tudo aquilo, mas o choro se transformou em
uma choradeira feia ─ que me fazia arfar. Caine se sentou e me abraçou em
silêncio, acariciando meu cabelo e se desculpando repetidamente. Quando
finalmente me acalmei, me endireitei e o vi com lágrimas enchendo seus olhos.
─ Desculpe por desabar assim. Nunca contei a ninguém sobre aquela noite,
exceto para a assistente social que foi nos buscar no dia seguinte. Nunca nem
disse em voz alta que minha irmã foi abusada sexualmente. ─ Olhei nos olhos de
Caine. ─ É por isso que menti para você e disse que minha mãe nunca tinha se
casado de novo. É mais fácil fingir que ela nunca mais se casou e que aqueles
anos nunca existiram.
─ Na verdade, ela veio até nós. Benny se envolveu em uma briga na garagem
no dia seguinte, então a polícia veio nos encontrar com uma assistente social.
─ Uma briga?
─ É. Ele tinha muita raiva. Gostaria que isso tivesse acontecido antes, para o
bem da minha irmã. Nós duas tínhamos muito medo de contar a alguém. Mas a
assistente social soube que alguma coisa não estava certa quando nos conheceu.
Benny estava no hospital, e nós fomos levadas para ficar com minha tia. Um dia,
minha irmã contou à assistente social o que estava acontecendo, e Benny foi
preso enquanto ainda estava hospitalizado. Um mês depois, ele morreu do
coração quando estava sob custódia. ─ Dei de ombros. ─ E a vida apenas seguiu.
─ Pare de dizer isso. Não é culpa sua. Eu só queria explicar por que menti,
porque sei que ficou chateado por causa disso. E agora gostaria de voltar a fingir
que Benny nunca existiu. Podemos fazer isso?
Parecia que Caine iria discutir. Sua boca se abriu para falar, depois fechou, e
abriu de novo. Mas, em certo momento, ele assentiu.
melhorado meu humor, parecia que eu tinha transferido o peso para ele.
necessitada, mas já tinha ficado duas noites sem dormir e sabia que continuaria
se ele fosse embora sem conversarmos.
Encostei a cabeça contra a porta fechada depois que ele saiu. Ao mesmo tempo
que o sentimento era bom, principalmente depois de tudo que
Capítulo 36
Caine
Não tive coragem de contar a Rachel depois de ela ter desabado ─ pelo menos,
era isso que eu dizia a mim mesmo. Estava omitindo dela para seu próprio bem,
não porque eu era um babaca egoísta e covarde.
Porém, após passar uma semana meio presente e meio aéreo, percebi que estava
fazendo a mesma coisa que tinha feito quando ela era criança: dando-lhe corda,
toda semana, e não tomando nenhuma atitude porque estava inseguro sobre mim
mesmo.
homem. Com certeza não estava agindo muito como um. Tinha evitado Rachel
quase todas as noites daquela semana, exceto na aula, quando eu não tinha
escolha a não ser encará-la. Ela sabia que havia algo errado.
─ O que está havendo com você? ─ minha irmã perguntou quando pegou meu
prato.
Ela tivera outra consulta com o médico naquela tarde, então eu tinha ficado de
babá. Evelyn deve ter ficado bem desesperada por me usar de novo,
considerando que quase matei uma de suas filhas da última vez.
─ Nada de mais.
Ela foi até a cozinha e colocou meu prato na pia para voltar com seu
interrogatório.
─ Como?
─ Para começar, ainda está aqui. Normalmente, quando peço para ficar de babá,
você vai embora no minuto em que eu chego, como se ter uma família fosse
contagioso ou algo assim.
Acho que ela tinha razão. Tentei brincar como se não fosse nada.
Ela me analisou.
─ Cadê a mulher que estava com você na última vez? As meninas falaram dela
por uma semana. Rachel, não é?
─ Não me venha com essa. Sua cara mudou assim que toquei no nome dela.
Rachel.
─ Acho que deveria adicionar um psiquiatra àquela lista de médicos a que está
indo.
─ Ou ela te deu um fora, ou você fez alguma coisa errada. Sei disso. Está se
lamentando. E já que geralmente fica bravo quando alguém ferra com você, vou
arriscar e dizer que você ferrou alguma coisa.
─ Na verdade, não.
─ Você a traiu?
─ Olha, irmãozinho, você carrega muito peso pelas coisas que pensa que são
sua culpa e não são. Você assume a responsabilidade. Tem certeza de que
realmente fez algo muito ruim?
Minha irmã era sempre parcial quando o assunto era eu. Quando não respondi,
─ Você é um bom homem. O que quer que esteja acontecendo, sei que vai saber
fazer a escolha certa. Não consigo imaginar você gostando de alguém e
magoando essa pessoa de propósito.
Minha irmã estava certa em uma coisa. Nunca pretendi magoar Rachel. Ou
Liam, por falar nisso. Mas tinha feito um monte de escolhas ruins ao longo dos
anos, e outras pessoas sofreram as consequências. Tinha errado com Liam ─ não
percebi que a pressão era demais, que a banda e o contrato com a gravadora
eram mais que ele podia suportar até ser tarde demais. Com Rachel, eu deveria
ter contado a alguém do que eu suspeitava no dia em que ela entrou no
confessionário. Mas, em vez disso, menti para uma garota inocente, fingindo ser
um padre, durante meses. Ela tinha cicatrizes causadas pelos meus erros. Eu
tinha feito o suficiente para prejudicá-la.
Detestava ver seus olhos brilhando quando a convidei para tomar um café depois
da aula no dia seguinte.
Tínhamos pedido dois cafés e nos sentamos a uma mesa tranquila no fundo da
cafeteria. Rachel estava tentando agir como se não houvesse nada de errado, mas
ouvi o tremor em sua voz e percebi a forma como ela girava seu relógio para a
frente e para trás.
ainda me sentiria fisicamente atraída por você caso engordasse trinta quilos,
ficasse careca e de repente estivesse desempregado. Minha caneta estava
pairando sobre a resposta certa, mas então me lembrei de que você gosta de me
vendar, de qualquer forma. ─ Ela sorriu e, porra, isso doeu.
Como não falei nada, Rachel pensou que eu tivesse ficado ofendido.
Assenti e limpei a garganta. Parecia que minhas bolas estavam presas ali,
enquanto eu tentava falar as palavras que precisava.
Seu sorriso esmoreceu. Ela sabia do que eu estava falando e, mesmo assim,
encontrou um jeito de se agarrar à esperança.
─ O quê? Andar juntos pelo campus? Ninguém acha isso estranho. Vejo
auxiliares e professores juntos o tempo todo.
─ Não quis dizer sobre ficarmos juntos no campus. Quis dizer ficar juntos em
qualquer momento. Não podemos mais sair.
Depois de conversar com minha irmã na noite anterior, eu havia decidido que
não tinha por que contar a ela sobre a igreja, algo de quinze anos atrás. Por que
─ Você é minha aluna. O que aconteceu entre nós não deveria nem ter
começado.
A tristeza se transformou em raiva no rosto dela.
─ Mentira. Você não liga para isso. Além disso, o semestre está quase acabando.
─ Desculpe. ─ Olhei para baixo, porque era muito difícil mentir para seu rosto
lindo. ─ Nunca deveria ter acontecido.
─ Vá se ferrar.
─ Vou continuar como seu orientador. É minha culpa e não deveria te afetar de
nenhum jeito.
─ Rachel…
Ela se levantou.
─ Sabe de uma coisa, Caine? Por muito tempo senti que não merecia o amor,
Por instinto, segurei seu braço quando ela passou por mim. As lágrimas enchiam
seus olhos, e eu sabia que ela queria ir embora antes que eu as visse cair, não
queria que eu a visse chateada. Deus, eu queria voltar e apagar tudo que tinha
acabado de falar. Mas, em vez disso, soltei seu braço e a deixei ir. Era a melhor
coisa que poderia fazer por ela, mesmo que não sentisse isso naquele momento.
Não consegui me virar e vê-la indo embora. Fechei os olhos apertados, ouvi o
som de seus passos se tornarem cada vez mais distantes, até não conseguir ouvir
mais nada.
Rachel estava certa sobre uma coisa ─ ela era meu arrependimento. Só não do
Capítulo 37
Rachel
Olhando ao redor da sala, sorri ao ver uma carteira vazia ao lado do sr.
Ludwig. Deixaria que ele tivesse uma visão de perto do meu corpo para que
pudesse desenhar ─ alguém poderia muito bem gostar.
A temperatura estava na casa dos vinte e cinco graus naquele dia, mas meu
vizinho de carteira ainda usava seu gorro.
─ Oi. ─ Ele sorriu para mim. ─ O Professor Cuzão te deixou escolher? Pensei
que teria que me mudar de lugar só para conseguir perguntar se quer tomar um
café depois da aula algum dia.
─ Você precisa de ajuda com alguma coisa? Não tem vindo nos meus plantões.
Senti uma presença atrás de mim. Ao ver seus olhos de paquera saírem dos meus
seios, irem para cima de meus ombros e sua expressão atrevida desaparecer, eu
sabia quem era.
Continuei ignorando-o, torcendo para que ele entendesse a deixa. Não tive essa
sorte.
─ Rachel. ─ Caine pigarreou. ─ Posso falar com você depois da aula, por favor?
Fechei os olhos. Queria responder “ Vá se ferrar ” , mas não iria lhe dar a
satisfação de tal reação. Nem iria me deixar transformar em um dos boatos que
tinha ouvido do professor West antes de conhecê-lo.
─ É claro, professor.
Estava determinada a mostrar a ele que eu estava bem. Mas o que vi quando
olhei para cima apagou meu sorriso falso. Caine estava horrível. Seus olhos
brilhantes estavam vermelhos, sua pele naturalmente bronzeada parecia fria, e
sua aparência estava desgrenhada ─ não do tipo intencionalmente estiloso. Não,
parecia que Caine estivera em uma bebedeira que acabara há algumas horas ou
que estava doente como um cachorro e tinha arrastado seu corpo não saudável
para fora da cama pela primeira vez em dias, a fim de aparecer para a aula.
Apesar de estar brava com ele, esperava que fosse a segunda opção.
Caine assentiu e seus olhos se moveram para o aluno ao meu lado. Flagrei a
leve tensão em sua mandíbula quando ele encarou o sr. Ludwig um pouco mais
Durante os noventa minutos seguintes, evitei olhar para Caine, preferi fingir que
fazia anotações enquanto minha mente viajava. Quando a aula finalmente
acabou, esperei em minha carteira até os últimos alunos saírem e, então, desci
para a frente da sala. Fiquei em pé a dez metros de Caine, me sentindo
terrivelmente esquisita. Ele estava guardando as coisas.
─ Eu gostaria de privacidade.
─ Eu gostaria de um monte de coisa, mas parece que não consigo tudo, agora
podemos?
Ele assentiu.
Ele esperou, presumindo que eu fosse parar, em algum momento, de brincar com
meu celular e lhe dar total atenção. Mas presumiu errado. Depois de alguns
minutos, ele entendeu e começou a falar de qualquer forma.
─ E?
─ Não tem necessidade. Você já está quase no fim e, se não quer passar tempo
comigo, podemos resolver a maior parte por e-mail.
─ Não quero suas opiniões no meu trabalho. E não quero ensaiar minha defesa
─ Rachel.
Recuei.
─ Não me toque.
durante a aula, então por que ter todo esse trabalho pedindo um novo orientador?
A maioria dos professores vai querer colocar o próprio toque no seu trabalho, e
você vai acabar reescrevendo por meses.
─ Acho que você prefere colocar o seu toque no meu trabalho de um jeito
diferente.
Pelo seu tom, eu sabia que Caine estava perdendo a paciência. E era exatamente
o que eu queria. Queria irritá-lo… Queria fazê-lo reagir de algum jeito. Nosso
término tinha sido muito frio. Fez-me sentir que nunca mereci sua energia. E isso
era um saco.
Endireitei as costas.
─ Desculpe por te magoar, Rachel. Não sei como consertar as coisas e fazer
─ Nunca fomos amigos, Caine. E, por mais que conserte as coisas, são
necessárias duas pessoas para qualquer relacionamento dar certo. Não podemos
consertar nada, porque só um de nós sabe o que aconteceu. ─ Minha voz se
abaixou. ─ Ainda não entendo o que aconteceu.
A falha na minha voz nas últimas palavras fez Caine olhar em meus olhos. Eu
queria encará-lo, lançar raios de irritação nele, mas quando olhei no fundo de
seus olhos, tudo que vi foi dor.
dia e no outro…
que quero.
Aguardei, curiosa para ver o quanto seria importante para ele me manter no
lugar.
Doeu tudo de novo quando ele simplesmente me soltou.
─ Pense nisso, Rachel. Não tenha trabalho extra só porque está brava comigo.
─ Converse comigo.
Charlie apoiou os cotovelos no bar. Já tinha dado sua hora, mas ele ainda estava
por ali. Havia desconfiado que ele estava esperando os atrasados irem embora.
─ Não me venha com essa, mocinha. Você sabe do que estou falando.
─ Você está viajando há uma semana. O que está havendo? Problema com o
namorado?
Charlie era durão por fora, mas manteiga derretida por dentro. Era uma das
minhas coisas preferidas nele.
está mentindo.
─ Como pode saber quando alguém está mentindo? Quero dizer, quais são os
─ Há uma linguagem corporal na maioria das pessoas que pode te dar uma ideia,
se prestar atenção.
─ Tipo o quê?
─ Bom, tem as óbvias: a pessoa não te olha nos olhos, fica agitada, toca a boca
ou o rosto. Embora a maioria dos mentirosos saiba desses sinais e tente controlá-
los. Os menores sinais são os melhores. Para iniciantes, seus ombros às vezes se
erguem um pouco. É porque sua respiração fica mais superficial quando
mentem, e essa é a reação natural do corpo à mudança na respiração. Alguns
ficam rígidos. Quando as pessoas estão falando, têm um balanço natural do
corpo. Mas quando mentem, perdem esse conforto natural. Além disso, há sinais
no discurso, como dizer as mesmas palavras ou frases repetidamente. “Não fui
eu. Não fui eu.”
─ Interessante.
─ Ninguém. Ninguém.
─ Sabichona.
Charlie se importava comigo, e eu sabia que ele não xeretaria muito, como Ava
fazia, então fui sincera com ele.
─ O cara com quem estava saindo terminou tudo. Tenho a sensação de que ele
─ É.
─ Você quer saber se ele ainda te ama ou não? Está pensando que tem alguma
merda na cabeça dele que não harmoniza com o que está dentro do peito?
Assenti.
─ Qual é?
─ Siga sua vida sem ele. Um homem cai na real bem rapidamente quando pensa
que você não está mais esperando por ele.
Capítulo 38
Caine
Eu estava mentindo.
Só que desta vez estava mentindo para mim mesmo também. O chefe do
departamento me mandou um e-mail pedindo que eu fizesse um relatório com
minhas observações sobre o projeto de Rachel para passar para outros
professores e ajudá-la na solicitação de um novo orientador. Estive enrolando
para lhe dar uma chance de reconsiderar, e agora estava usando isso como
motivo para vê-la ─ fingindo que precisava entregar o relatório rapidamente
quando, na verdade, não tinha intenção de fazê-lo.
As férias de meio de semestre tinham começado, e seis dias sem ver Rachel
eram o máximo que eu conseguia aguentar. Se alguém soubesse a que recurso
apelei, pensaria que eu tinha ficado louco ─ e talvez estivesse certo, mas eu não
dava a mínima após seis dias.
Na revista Rolling Stone daquele mês havia um daqueles testes pelos quais
Rachel era obcecada. Havia visto enquanto a folheava há duas semanas e
colocado de lado para que ela pudesse responder. Ao sentir falta dela naquela
manhã, talvez tenha respondido eu mesmo.
O que sua música diz sobre sua vida amorosa fazia uma série de perguntas
baseadas em quais músicas você mais se identificava. Quando somei os pontos, a
predição dada ao meu futuro era, é claro, totalmente errada. Curioso, li as outras
predições de qualquer forma. Uma me chamou atenção, só que eu não tinha
somado entre 52 e 68 pontos. Aquela resposta em particular só poderia ter sido
mais perfeita para Rachel ler hoje se eu mesmo tivesse criado aquele teste. Lia-
se:
Você já encontrou seu destino! Embora talvez não saiba. Você é uma alma
antiga que se conecta com pessoas em um nível cósmico. Confiança pode ser
problema para você, e que costuma evitar relacionamentos porque segue sua
cabeça, e não sua intuição, às vezes de maneira cega. Quando apaixonada, às
vezes precisa jogar fora a cautela e mergulhar de cabeça.
Você conhece sua alma gêmea há muito tempo, mas apenas recentemente
O teste era uma série de quinze perguntas. Eu o refiz, só que desta vez respondi
como Rachel o faria. Bebendo um uísque com gelo, mexia o gelo no copo
enquanto somava as respostas dela. Sua pontuação daria entre 40 e 43.
Bebendo o resto do uísque, vi que ela precisava de uma soma de dezoito a vinte
pontos para se inserir seguramente onde deveria estar. Escolhi as quatro
perguntas em que eu tinha mais certeza das respostas dela e alterei manualmente
a classificação dos pontos para aumentar em cinco cada.
─ Bem melhor.
Decidi que não lhe mandaria uma mensagem antes de ir, para evitar que ela
sugerisse que eu enviasse um e-mail com as coisas sem importância que eu
estava fingindo serem importantes o suficiente para ela dar uma olhada. O
pensamento de que a veria logo me deixou com o humor melhor do que sentira
nas últimas duas semanas. Assobiei junto com a música no trajeto de carro.
Ava estava atrás do balcão do bar quando entrei. Lembrei de Rachel falando
Sentei-me no bar para esperar, optando pelo lado mais vazio, oposto ao que Ava
estava, ainda de costas para mim, conversando com um cliente. Com bom
humor, tamborilei os dedos no balcão ao som de “Better Together”, de Jack
Johnson, que tocava dentro da minha cabeça.
Infelizmente, meu bom humor foi para o saco quando olhei em volta no
restaurante. Rachel estava em uma mesa, só que não era servindo comida.
Meu primeiro instinto foi andar até lá e descobrir o que estava havendo. Até me
levantei e dei alguns passos. Porém, algo que vi me fez congelar no lugar.
Rachel jogou a cabeça para trás, rindo. Instantaneamente, passei de bravo para
uma mistura esquisita de sentimentos de dor e de culpa. Ela estava sorrindo de
novo, em vez de parecer triste. Não era isso que eu estava querendo o tempo
todo?
Em conflito, assisti de longe até não conseguir mais aguentar. Então, me virei e
saí do bar em silêncio. Eu estava bravo, embora soubesse que não tinha direito
nenhum de estar. E minha raiva se misturava com uma sensação de
arrependimento.
Eu era culpado por ela estar dando a mão a outro cara. Tinha me afastado porque
não merecia tê-la, mas, mesmo assim, ninguém mais a merecia. Meus
pensamentos não tinham lógica. De alguma forma, no entanto, eu tinha
consciência de que ninguém entenderia as decisões que eu tomara. Então,
guardei para mim mesmo, apesar de ter que falar em voz alta sobre o que eu
estava passando.
Minha única atividade diária, além de ir à academia, era ouvir música. Se eu não
ficasse pelo menos algumas horas fora de casa, havia uma boa chance de Rachel
receber uma fita gravada com músicas. Eu estava afeminado nesse nível.
Sozinho e sem nada para fazer, decidi dirigir. Deixaria a estrada e meu carro me
levarem aonde quisessem. Não precisava ir trabalhar até segunda. Sair da cidade
por uma ou duas noites poderia ser exatamente do que eu precisava.
Dando meia-volta, segui para a ponte, em vez de ir para a avenida que me levava
de volta ao meu apartamento. Sinceramente, não tinha nenhum destino certo em
mente. Então, apenas dirigi. Por horas. E, quando cheguei, percebi que estava
exatamente onde precisava estar.
As escadas tinham sido substituídas. O tijolo vermelho gasto se transformara em
um mármore branco. Alguns dos arbustos eram novos, e a cerquinha que
rodeava a estátua da Virgem Maria não existia mais. Mas, exceto por essas
mudanças, a igreja St. Killian estava exatamente como da última vez em que
entrei por suas portas, há quinze anos. Ainda me lembro daquela visita. Eu tinha
saído escondido de casa, porque estava sendo punido depois da merda que
acontecera com Benny na semana anterior. Eu sabia que ela havia sumido. Meus
pais tinham me contado apenas isso, já que eu me recusava a conversar sobre
qualquer coisa que tinha acontecido até saber se ela estava segura. Mas não me
importava. Eu precisava estar ali naquele sábado no caso de, por algum motivo,
ela voltar para falar comigo. Eu queria explicar por que tinha feito aquilo.
Claro que ela nunca apareceu ─ tinha partido há muito tempo. Percebi que teria
que conviver com a culpa de ter traído sua confiança e torcer para que ela
seguisse a vida.
Percebi a ironia de estar ali mais uma vez depois de vê-la seguir a vida hoje.
Lá dentro, a igreja estava vazia. Eu não fazia ideia de por que havia ido lá ou o
que iria fazer quando chegasse. Meus olhos foram direto para o confessionário,
que ainda estava ali, mas eu não ia sentar lá dentro. Em vez disso, sentei no
banco dos fundos e olhei em volta. Era uma noite tranquila. O cheiro de incenso
embolorado aqueceu meus sentidos. Fechei os olhos e respirei fundo algumas
vezes, abri os braços por sobre o banco e abaixei a cabeça.
Demorou um minuto para eu entender seu sotaque e perceber que tinha apenas
Sorri.
─ Estou bem. Espero que esteja tudo bem por aqui.
─ Sem cadeados nas portas. Somos muito sortudos. Pouquíssimas igrejas podem
dizer isso. Ótima comunidade aqui. Podes vir quando quiseres.
─ Obrigado.
─ Não quero ofender, padre, mas é uma mulher… Não sei se é sua
especialidade.
─ Posso ser casado com o Senhor, mas tenho uma mãe e quatro irmãs. ─ Ele
ergueu quatro dedos. ─ Quatro irmãs. Nenhuma delas cala o inferno da boca,
então conheço bastante as mulheres.
Dei risada.
─ Acho que nunca ouvi um padre dizer inferno a não ser que esteja se referindo
à condenação eterna.
Ele sorriu.
pouco daquela série The Real Housewives quando vou à casa da minha irmã
Mary. Ela é viciada naquela coisa.
─ Parece uma penitência.
─ Então o que te traz nesta noite boa? Não me lembro de ter te visto nas missas.
És novo por aqui?
─ Não, na verdade, cresci aqui. A St. Killian era minha igreja quando eu era
criança.
─ Ah. ─ Ele assentiu. ─ Voltaste para a cidade para visitar a família, então?
─ Não. Meu pai morreu há anos. E minha mãe não mora mais aqui. Eu só…
Eu estava… ─ Não tinha como mentir para um padre. ─ Pensei em dirigir para
─ Às vezes o caminho é criado para nós, e a única coisa que podemos fazer é
segui-lo.
─ Rachel.
Ele assentiu.
─ Do livro de Gênesis.
─ Se você diz…
─ Todos nós cometemos erros, filho. Às vezes, tirar isso do peito ajuda.
Não havia nada a perder, exceto o respeito dele. Eu já não tinha nenhum por
mim mesmo. Talvez uma confissão oficial fosse uma coisa que já devia ter feito
há muito tempo.
─ Nem me fale.
─ Vamos começar pelo começo. O que fizeste todos esses anos atrás… por mais
que possa ter começado pelos motivos errados, não fazendo o trabalho direito,
escondendo-se no confessionário, tu voltaste mesmo depois de não precisar mais
estar aqui.
─ É.
─ Eu sabia que tinha alguma coisa errada. A menininha… Rachel, quero dizer.
Ela estava assustada. Parecia que realmente precisava de alguém com quem
conversar sobre o que quer que estivesse acontecendo.
─ Queria. ─ Essa era a verdade. Eu queria ajudar. ─ Mas não fui pelo caminho
certo. Devia ter contado a alguém no primeiro dia, envolvido a polícia quando
fiquei desconfiado. Em vez disso, brinquei de detetive e a machuquei.
─ Ela estava assustada, quase aterrorizada. Eu não tinha certeza de que minha
suspeita era certa. Tinha medo de espantá-la e de ela não confiar em mais
ninguém depois disso.
Balancei a cabeça.
─ Talvez tivessem dito a verdade e sido tiradas mais cedo daquele inferno.
Muitos adolescentes não teriam abdicado de suas tardes de sábado para ser
amigo de uma garotinha.
─ Não sei.
Fazia muito tempo que eu não ia à igreja, mas isso não mudou minha fé. Por
mais infeliz que eu estivesse, e por mais que tivesse estragado minha conexão
com a igreja, ainda acreditava em uma força maior.
─ Acredito.
─ Isso é bom. Precisas se atentar ao destino que Ele escolheu para ti. E a única
forma de honrar isso é aceitá-lo e abraçá-lo com a verdade.
extraordinária de eventos que não têm conexão plausível. Mas sempre há uma
conexão. Deus sempre é a conexão.
Eu estava cético.
─ Acho. ─ Ele foi rápido na resposta. ─ E ainda mais importante, acredito que
Deus os colocou juntos de novo por um motivo.
─ Isso ─ Ele apontou um dedo para mim. ─ é para tu descobrires. Parece que
Ele está te dando uma segunda chance. O que farás é escolha tua.
─ Obrigado, padre.
─ Vou te deixar sozinho para que possas fazer o que veio fazer aqui… pensar.
Nos cumprimentamos.
─ Obrigado.
Fiquei sentado sozinho no fundo da igreja por quase uma hora, pensando. Em
certo momento, resolvi que era hora de ir. Mas conforme seguia para a saída, não
resisti em dar uma olhada, retornando à cena do crime.
Tantas perguntas me rodeavam. Seria verdade que Rachel e sua irmã poderiam
ter negado tudo se eu tivesse contado a alguém na época? Será que
Mesmo se pudesse, será que Rachel já tinha virado a página? Será que era
melhor assim? Vê-la mais cedo com Davis ─ o olhar feliz em seu rosto quando
riu ─ me magoou demais. Eu queria ser a pessoa a fazê-la sorrir. Talvez aquele
fosse meu ato de fé, parte de minha penitência de sacrifício.
Eu não sabia o que deveria fazer. Era possível que eu estivesse mais confuso
agora do que quando entrei ali. Sei que fui um paroquiano horrível, mas um sinal
seria legal.
Sentindo-me derrotado, abri os olhos e olhei para o carpete gasto. Uma moeda
brilhante me encarou, com a cara para cima. Dei risada e me abaixei para pegá-
la. Mesmo depois de todos esses anos, ainda conseguia ouvir a voz dela.
Eu poderia deixá-la ir fisicamente. Mas ela levaria todo o meu coração consigo.
Precisava pelo menos falar a verdade e deixá-la decidir o que fazer com isso.
Assim como eu tinha feito antes, quando sentava nessa cadeira, girei a moeda de
cobre repetidamente entre meu polegar e o indicador. Segurei-a na palma da mão
depois de um minuto e olhei para a cruz.
Capítulo 39
Rachel
Isso era difícil de aceitar. Mesmo que Caine não tivesse me dado motivo para ter
esperança, eu ainda tinha. Porém, nesta noite, senti como se qualquer coisa a que
eu estivesse me agarrando finalmente tivesse se rompido.
Havíamos acabado de trancar o O’Leary no fim da noite. Como não havia muito
movimento, eu fizera tudo que precisava antes de fechar, exceto fechar o caixa, o
que estava fazendo no momento. Parei de contar e olhei para minha amiga.
─ Talvez você não devesse ter dito a Davis que não estava interessada. Ele é um
cara legal. Poderia te ajudar a superar o monte de merda.
Sorri. Ava era do time do Caine até o momento em que lhe contei que ele
terminou tudo. Agora ela tinha uma seleção ampla de nomes para ele, e nenhum
deles descrevia Caine.
─ Só não entendo por que ele veio aqui hoje.
─ Caine? Não sei. Mas ele não parecia feliz. Encarou vocês dois sentados
naquele banco ali e não me escutou chamá-lo. Pensei que fosse ir até lá e dar um
soco no Davis.
Embora pudesse ser decepcionante, se ele tivesse feito isso teria, pelo menos, me
mostrado que se importa. Nenhum homem vê a mulher pela qual nutre
sentimentos e vai embora. Principalmente no instante em que Caine tinha
entrado. Descobrir que ele tinha ido ao O’Leary e saído quando me viu dar as
mãos para Davis me fez sentir que enfim estava terminado. Eu havia imaginado
ter visto algo que ainda estava nos olhos dele. Mas Charlie estava certo: se você
quer saber se o coração de um homem ainda está na sua, mostre que virou a
página. Eu estava vendo o que queria ver em vez de enxergar a verdade.
─ Bom, ele não foi. E isso diz mais do que qualquer coisa.
No trajeto para casa, tive uma conversa animada comigo mesma. Estava cansada
de Caine West ─ não tinha realmente me apaixonado por ele. Era apenas desejo.
Meu feitiço de nove meses na seca me fez confundir os dois. Eu precisava sair
mais, talvez sair com pessoas da minha idade. Era melhor assim.
Adeus, Caine West. O amanhã chega com ou sem você, então não preciso de
você para continuar.
Receitei minha própria terapia musical a caminho de casa. Escutar “Fight Song”,
de Rachel Platten, me fez sentir não apenas que ficaria bem, mas que na verdade
estava melhor sem Caine. Estou animada por estar solteira, pensei comigo
mesma, rindo.
para o meu prédio. Olhei por cima do ombro, do outro lado da rua, para cima e
para baixo do quarteirão ─ durante todo o tempo sentindo uma forte onda de
ansiedade. Aquela sensação aumentou quando comecei a andar mais rápido para
casa. O motivo da minha ansiedade se fez presente quando abri a porta externa
do meu prédio.
Sua mão foi para seu rosto, onde eu havia acabado de socá-lo.
─ É, vou ficar bem. Não se preocupe. Não quis te assustar. Eu estava tocando a
campainha. Imaginei que estaria em casa agora já que o O’Leary fecha à meia-
noite.
Ele mexeu a mão, e pude ver sua face já começando a ficar vermelha e inchada.
Quando a onda de adrenalina começou a se esvair, percebi que minha mão estava
doendo, muito. Abri e fechei, pensei que poderia ter quebrado alguma coisa.
─ É, mas é sua culpa por me assustar. De novo. Por que está aqui me esperando,
de qualquer forma?
Segurei-a no ar. Não estava cortada nem nada assim, mas os nós dos dedos
médio e indicador tinham começado a ficar inchados. Caine pegou minha mão
na dele e delicadamente passou o polegar pelos nós dos meus dedos. Um raio de
eletricidade passou por mim e não tinha nada a ver com meu machucado. Puxei
─ Machucou?
Menti.
─ Sim.
Ouvi-lo dizer nós me fez lembrar que ele não deveria nem estar ali, para
começar.
Caine olhou para baixo, depois para mim. Sua beleza acelerou a minha pulsação
de novo. Ele parecia cansado e estressado, e tinha um inchaço crescendo no
rosto, onde eu o socara e, mesmo assim, ainda estava absolutamente lindo. O
tipo de beleza que nunca envelhece porque a cada vez você fica maravilhado
com o efeito que causa em você.
─ Está tarde.
Quando hesitei antes de abrir a porta, ele entendeu aquilo como um sinal de que
talvez eu não estivesse confortável para convidá-lo.
Vinte minutos antes, eu estava cantando brava “Fight Song” no carro, desejando
que o homem tivesse uma boa vida, e agora eu estava retomando as esperanças
porque ele tinha aparecido na minha porta. Eu era patética. O que ele estava
fazendo ali? Tinha bebido? Era melhor que não pensasse que tinha aparecido
para transar. Sexo com Caine. Xinguei minha libido por apenas pensar nisso.
Coloquei calças de ioga e uma blusinha regata, penteei o cabelo e lavei o rosto.
Posso até talvez ter espirrado um pouco de perfume. (Não me julgue.) Quando
eu estava prestes a voltar à sala, percebi que ainda não estava no meu normal.
Peguei meu iPhone, abri a playlist e procurei até achar uma música que mudasse
meu humor, deixando-me irritada novamente. Parei em “I hate everything about
you”, de Three Days Grace.
Vai servir.
─ Quer beber alguma coisa? ─ Passei por ele e fui para a cozinha pegar uma
garrafa de água, embora realmente pudesse ter escolhido algo mais forte.
─ Não, obrigado.
Abri a tampa e bebi um longo gole enquanto seus olhos seguiam cada
movimento meu.
─ Podemos sentar?
cadeira à frente dele de propósito para que não acabássemos muito perto.
Depois que ele se sentou, juntou as mãos, apoiou os cotovelos nos joelhos e
baixou a cabeça, encarando os pés. Eu nunca tinha visto Caine tão nervoso.
Passados mais ou menos dois ou três minutos, que pareceram uma eternidade,
Caine soltou o ar. Quando ele finalmente ergueu a cabeça para me olhar, seus
olhos estavam vidrados e cheios de dor. Eu queria muito tocá-lo, mas tinha que
me proteger. O que quer que o estivesse machucando, logo iria me machucar.
Havia apenas uma resposta quando uma pessoa parecia tão perturbada quanto
Caine.
Ele assentiu.
─ É por aí que deveria ter começado semanas atrás. ─ Ele buscou meus olhos.
─ Sei que você não me deve nada, mas pode me prometer uma coisa?
─ O quê?
─ Ok…
─ No bar? Sim.
─ Eu disse que você parecia familiar para mim. Pensou que eu estivesse te
cantando. Na hora, eu não consegui ligar as coisas, mas depois de descobrir que
você frequentou o Brooklyn College, eu fiz as contas.
Franzi o cenho.
─ Na igreja.
─ Na igreja?
Caine passou os dedos pelo cabelo e me encarou. O olhar em seu rosto estava
─ Você se lembra de ir à St. Killian para conversar com um padre todo sábado?
Acho que eu estava em choque. Não entendia o que estava sentindo. Não estava
chateada ou brava ─ só estava meio… adormecida, como se estivesse perdida
em uma neblina densa e não conseguisse pensar que caminho seguir.
Uma onda de tontura misturada com náusea me lavou, e me segurei nas laterais
da cadeira.
─ Rachel?
Provavelmente era melhor eu ter feito isso, considerando como me sentia, mas
precisava de respostas.
─ Quando descobriu que era eu?
Caine deu um sorriso triste e enfiou a mão no bolso. Quando a tirou, abriu-a para
me mostrar uma dúzia ou mais de moedas.
─ Guardei todas. Não faço ideia do porquê. Mas guardei. Todos esses anos.
─ São…
Ele assentiu.
─ São as que você costumava jogar no confessionário para que eu tivesse sorte.
─ Você as guardou?
─ Sinceramente, mesmo na época, eu sabia que estava fazendo algo errado, mas
depois de perceber que você acreditava na sorte apesar de toda a merda à sua
volta, não conseguiria ter ido embora, mesmo se quisesse. Não sei por que as
guardei, mas quando vi que jogou moedas no chão do meu quarto há algumas
semanas, me deu esse estalo.
─ Não tinha certeza. Acho que uma parte de mim não queria acreditar que era
você, que você tinha morado com aquele monstro do caralho. Eu precisava ter
certeza. Jogar moedas podia ter sido apenas uma coincidência estranha. Então,
na oportunidade seguinte que tive, perguntei se sua mãe tinha se casado
novamente.
Baixei a cabeça.
Caine assentiu.
─ Mais?
─ Sei.
─ Não foi um cliente. Fui eu. Naquele sábado, depois de ter te pedido para me
encontrar na manhã seguinte, segui você até em casa, só para saber onde morava,
caso resolvesse não aparecer. Então, quando não apareceu na igreja no domingo,
eu saí para te ver. A algumas quadras da sua casa, parei para abastecer, e vi
estacionado no posto o mesmo carro que estava na sua casa no dia anterior. Parei
no lugar em que ele trabalhava, completamente por coincidência.
─ E o que aconteceu?
─ Disse a ele para ficar longe de você e da sua irmã. Ele disse umas coisas
horríveis, depois veio para cima de mim com uma chave inglesa.
─ Ele te machucou?
─ Sinto tanto, Rachel. Por tudo. Por mentir para você todos esses anos. Por não
ter ido à polícia e pedido ajuda logo. Por ter te machucado. Se eu não tivesse dito
a você para vir me encontrar, aquele animal não teria te flagrado arrumando a
mala, e ele… ─ A dor na voz de Caine era agonizante. ─ Ele não teria te
machucado. Sinto muito.
Por mais que me deixasse triste ver Caine perturbado, eu precisava ficar sozinha.
Precisava de tempo para pensar. Era demais para absorver de uma vez.
por ter escondido pelo que estava passando por tanto tempo, e me sentia
responsável por não interromper logo o que estava acontecendo com minha irmã.
Ele ficou quieto por um instante, enquanto continuei olhando para o nada.
Capítulo 40
Rachel
Eu tinha desejado voltar por tantos anos. Mas essa parte da minha vida estava
em uma caixa trancada, e eu tinha receio de abri-la por medo de encontrar coisas
lá dentro que não conseguiria pôr de volta. Mesmo assim, pelos últimos quatro
dias, desde que Caine revelara tudo, a chamada para voltar tinha sido tão forte
que não conseguia mais ignorar.
Não havia nenhuma missa, mas, nos últimos dez minutos, as pessoas haviam
Uma mulher com uma criança entrou e se sentou. A menininha devia ter uns dez
anos, não muito mais velha que eu quando comecei a ir lá aos sábados.
e disse alguma coisa à garotinha antes de entrar para a vez dela. Lembrei-me de
quando costumava ir com minha mãe, antes de ela ficar doente. Fechei os olhos
e vi minha mãe e eu sentadas naqueles bancos há vinte anos.
─ Sabe quando você está com dor de estômago ou febre e vai ao médico? ─
ela disse, enquanto esperávamos chegar sua vez de entrar na salinha estranha.
─ Sei.
─ Bom, é aqui que você vem quando alguma coisa está te incomodando aqui
─ Pneumonia, e não. Não no peito. O que está dentro de você que te faz sentir
de um jeito específico.
Franzi o nariz.
─ Sua alma. É a coisa que você não consegue nomear. É a verdade do que a
torna você.
Dei risada.
─ Não entendo.
Mamãe sorriu.
─ Não precisa entender agora. Só se lembre de que este é um lugar que pode vir
para conversar com Deus sobre qualquer coisa.
Nem tinha percebido que estava chorando até uma lágrima cair nas minhas mãos
unidas. Abri os olhos, olhei para onde a menininha estava sentada, e os bancos
estavam todos vazios. Ela tinha ido embora, assim como sua mãe. Elas haviam
partido sem que eu notasse. A porta aberta do confessionário chamou minha
atenção. Olhei em volta e percebi que só havia restado eu na igreja. Meu peito
tinha uma sensação esmagadora dentro dele pelas lembranças antigas de minha
mãe.
─ Bom, é aqui que você vem quando alguma coisa está te incomodando aqui
dentro.
Era surreal entrar ali depois de todos esses anos. Eu poderia ter vinte e cinco
agora, mas foi uma garota de dez anos que se sentou. Nada havia mudado. A
salinha parecia a mesma da última vez que eu entrara. Consegui ouvir uma
respiração do outro lado do confessionário ─ o padre estava aguardando. E desta
vez eu o tinha visto entrar. Sabia que era realmente o padre.
Em certo momento, depois de pensar em sair várias vezes, respirei fundo e abri a
janela de madeira que cobria a tela.
─ Me abençoe, padre, porque eu pequei. Faz quinze anos que não me confesso.
Exceto por alguns comentários, como continue e me conte mais, o padre tinha
ficado relativamente quieto. Depois de um início engessado, quando não sabia
como começar ou o que dizer, estava miraculosamente tagarelando por quase
meia hora. Era o máximo que já tinha falado com alguém sobre minha mãe,
minha irmã, minha culpa, ou os anos em que passei me sentindo envergonhada
Embora tivesse ido até ali pela confusão com Caine, nós realmente não
havíamos conversado muito sobre ele. Percebi que o que me incomodava tinha
Acho que padres ouviam de tudo, porque, depois que acabei minha história
maluca, ele não pareceu nem um pouco chocado.
─ Bom, faz mesmo muito tempo, então tenho certeza de que tenho muita coisa.
Falo palavrão frequentemente.
─ Para sua penitência, quero que rezes uma ave-maria e um pai-nosso e realizes
dois atos de perdão.
─ Ok.
Levantei-me e olhei para a tela. O padre estava olhando para a porta, e eu podia
apenas definir um perfil vago.
─ Rachel?
─ Sim?
─ O primeiro ato de perdão deve ser fácil. Você não fez nada errado. Precisa se
perdoar.
Depois de rezar, voltei para o carro. Somente no meio do caminho para casa,
algo me fez pensar. Eu não tinha dito meu nome para o padre, mesmo assim, ele
havia me chamado de Rachel.
Na volta, pensei muito. Decidi parar no O’Leary e pedir uns dias de folga.
Minha cabeça não estava boa, e eu precisava trabalhar na minha tese. Era fim de
tarde e o bar estava calmo, com apenas alguns clientes regulares – ex-policiais –
─ Claro, docinho. É muito mais agradável olhar para você do que para esses
Sentei-me na outra ponta do balcão, e Charlie encheu um copo com Coca Diet
─ Tudo bem se eu tirar uns dias de folga? Posso pedir para Ava me cobrir.
─ Claro. É lógico. E não se preocupe em pedir para Ava te cobrir. Vou cobrir
seus turnos.
─ Aham. Eu te disse que ia verificar os caras que se interessam por vocês a partir
de agora. O cara é fichado por agressão. É antigo, e estava selado porque ele era
adolescente. Mas não são muitos criminosos que mudam seu caráter.
Era surreal ler um relatório de polícia que envolvia Caine e Benny. A primeira
metade era tudo de cadastro ─ nome, data, local, hora do incidente. No fim da
página, havia uma seção chamada “Narrativa do Incidente”, e um parágrafo
havia sido escrito com uma letra horrível de um policial:
Por mais que eu já soubesse de tudo que estava lendo, de alguma forma, ler tudo
no papel, fiquei sensibilizada. Caine havia colocado minha irmã e eu antes de si
mesmo, certificando-se de que tivéssemos a atenção de que precisávamos antes
até de pensar no que poderia acontecer consigo. Fizera a mesma coisa de novo
há algumas semanas ─ ou pelo menos ele pensou que tinha feito ─, escolhendo
sacrificar a própria felicidade pela minha quando terminou tudo a fim de evitar
trazer o passado à tona.
Fechei os olhos. A lembrança que tivera de minha mãe enquanto estava sentada
na igreja hoje inundou de novo os meus pensamentos. Ela tinha me dito para ir à
igreja se um dia precisasse conversar, e Deus ouviria.
De repente, tudo ficou claro. Não era Caine que eu precisava perdoar. Ele nunca
tinha feito nada além de tentar me proteger. Eu precisava me perdoar para que
pudesse aceitá-lo em meu coração. Eu podia fugir para o outro lado, mas era
tarde demais, ele já tinha meu coração.
─ Você está bem? ─ Ele apontou para o envelope rasgado no balcão e os papéis
que eu estava lendo.
Capítulo 41
Caine
RACHEL: NÃO.
Eu sabia que ela costumava sair rápido para trabalhar às terças depois da aula.
Não conseguiria dormir naquela noite. Estava ansioso demais. Claro que minha
mente começou a me trolar, imaginando todo tipo de merda ─ como por
que ela tirara uma semana de folga. Imaginei-a sentada em um avião, viajando
para algum destino exótico com aquele mala do Davis. Apesar de bastante tempo
ter se passado desde nossa última mensagem, peguei o celular na tentativa de
descobrir algo que pudesse me ajudar a relaxar.
Quando cheguei à casa dela, percebi que era bem tarde. Sem querer assustá-la
tocando a campainha às onze horas da noite, resolvi mandar mensagem primeiro.
RACHEL: SIM.
AULA AMANHÃ?
CAINE: AGORA.
─ Está brincando?
─ Sou eu.
Não conseguia ver se ela estava feliz ou chateada por eu ter aparecido assim,
sem avisar ─ sua expressão estava mais para chocada.
─ Estou.
Ela ficou parada na porta, vestindo uma camiseta fina de algodão e shorts. O
─ Posso entrar?
─ Pode. Claro.
No trajeto para lá, tinha decidido que, antes de ela falar o que quer que
Enquanto Rachel pegava água para mim, olhei em volta e vi a parede de fotos
que sempre chamava minha atenção. Meus olhos se fixaram na foto de Rachel e
seus colegas de quarto. Davis, para ser mais específico. Eu precisava saber.
─ Não.
─ Eu sei.
─ Você me viu?
─ Não. Ava te viu. Por que não ficou para conversar comigo se foi até lá?
Baixei a cabeça.
─ Deixar você ficar com alguém melhor para você do que eu. Ir embora.
Suspirei.
─ Não entendo.
Esperei até ela olhar em meus olhos e decidi dizer o que deveria ter dito semanas
antes.
de você ter uma cicatriz nas costas. Você tem zero motivos para querer confiar
em mim ou me dar outra chance, mas preciso tentar. ─ Respirei fundo. ─ Preciso
tentar porque eu te amo, Rachel. Estou desesperadamente apaixonado por você.
─ Não te culpo por nada do que aconteceu, Caine. Não é por isso que não
consegui te ver por um tempo. Não consegui te ver porque não conseguia olhar
para você. Tenho tanta vergonha de tudo que aconteceu.
─ Vergonha? Do que está falando? Não tem por que ter vergonha.
Coloquei a mão sob o queixo de Rachel e o ergui, obrigando-a a olhar para mim.
Meu coração se partiu quando vi lágrimas escorrendo por seu rosto.
─ Você não fez nada errado. Não tem motivo para ter vergonha de nada.
Nada.
─ Eu deveria ter…
─ Você deveria ter sido uma garota de dez anos de idade que saía e andava de
bicicleta sem preocupação. É isso que deveria ter feito. A única pessoa que fez
alguma coisa errada para sua irmã foi Benny. Você tinha dez anos, estava com
medo e nem entendia direito tudo que estava acontecendo. E mesmo naquela
época você tentou contar a alguém. Contou para mim. Eu era mais velho.
─ Você ajudou. Se não fosse você, não sei por quanto tempo tudo aquilo teria
continuado.
─ O quê?
─ Ela me disse que, se Ele estivesse ocupado, um de Seus anjos iria escutar.
─ Sua mãe parece ter sido uma pessoa muito especial, bem espiritualizada.
─ Ela era. E ela também tinha razão, Caine. Você não vê? Deus estava ocupado,
então Ele me mandou um anjo. Meu próprio anjo da guarda. Deus me
enviou você.
Inclinando-me, segurei seu rosto lindo e a beijei com todo meu ser. Sua face
estava vermelha quando a soltei.
─ O quê?
Rachel deu um passo para trás e ergueu a camiseta. Não estava usando sutiã, e eu
não consegui esconder a expressão que fiz.
Ela se virou e olhou para mim por cima do ombro. Na parte inferior esquerda
─ O que aconteceu?
─ Tire a fita. Mas tire com delicadeza porque ainda está um pouco dolorido.
Quando comecei a tirar a bandagem, percebi que a área que ela tinha coberto
Ela sorriu.
são aquelas que você não consegue ver… as mais difíceis de se fechar.
Ergui a camiseta, e fiquei sem palavras ao ver o que ela tinha feito. Não
conseguia mais ver a cicatriz comprida que havia marcado sua pele linda. Estava
coberta por uma tatuagem de anjo.
─ É você ─ ela disse. ─ Tinha enterrado bem fundo para que não tivesse que
lidar com sentimentos antigos. Tudo que veio à tona agora não foi fácil, mas
finalmente sinto que estou do outro lado daquelas lembranças. Elas sempre
estarão ali, mas consigo vê-las pelo espelho retrovisor agora, em vez de à minha
frente.
Rachel se virou para me encarar. Seus seios eram grandes e redondos pra caralho
e não consegui evitar de ser distraído por eles.
─ Caine?
─ Só tem um problema.
─ Qual?
Inclinei-me e a peguei nos braços. Segurando-a no meu colo, fui até o quarto.
Coloquei Rachel sentada na beira da cama, tirei seus shorts e sua calcinha, e
comecei a me despir. Quando cheguei à cueca boxer, enganchei os dedos nas
laterais e olhei para ela enquanto a baixava. Meu pau estava dolorosamente duro.
─ Não, baby, você vai escolher a primeira posição. Vamos fazer todas elas.
Amanhã você estará tão dolorida que vai doer quando se sentar na minha aula. E
Seu rosto ficava muito sexy com aquele sorriso diabólico. Subi na cama, me
Ela assentiu.
─ Caralho ─ gemi quando ela começou a se abaixar em meu pau. Ela era tão
Fazia apenas algumas semanas que estivemos juntos, mas eu estava faminto por
ela como se fossem anos.
Ela se ergueu e se abaixou algumas vezes, facilitando cada vez mais a entrada,
até estar sentada comigo completamente dentro dela, e sua bunda pressionada
sobre minhas bolas. Quando ela começou a rebolar, pressionei o polegar em seu
clitóris e acariciei em pequenos círculos, ao mesmo tempo que segurava seu rabo
de cavalo com a outra mão.
Ela gemeu, então empurrei um pouco mais. Com sua cabeça para trás, seus seios
magníficos estavam bem na minha linha de visão. Observei-os balançarem
para cima e para baixo, tirando os olhos apenas para me inclinar para a frente e
chupar um mamilo ─ um, depois o outro. A velocidade de Rachel aumentou ─
Ficamos assim por um bom tempo, ela sentada em meu colo, eu acariciando
seu rosto.
─ Acho que a morte de professor Clarence teve algo a ver com isso.
─ Talvez. Mas se não fosse por você, eu poderia nem ter descoberto o poder
da música como terapia. Todos esses anos atrás, você me deu seus fones e me
disse para ouvir música… para me concentrar nas palavras quando estivesse
chateada. Eu escutei, e ajudou mesmo. Foi assim que realmente me interessei
pela música.
Refleti.
─ Não. Nem sei o que aconteceu com ela. Acho que foi jogada fora quando
fomos morar com minha tia e meu tio.
─ Não me lembro exatamente. Mas sei que te agradeci por conversar comigo
toda semana.
Parecia que faltava alguma coisa toda vez que eu ia e você não estava lá.
volta a você.
─ Não, não trouxe, Rachel. Você sempre teve meu coração, e nunca mais o
quero de volta.
Epílogo
Rachel
─Se vai banir o sexo, precisa começar a usar sutiã pela casa ─ Caine resmungou
enquanto se inclinava e plantava um beijo casto em meus lábios. Também enfiou
a mão por baixo da minha camiseta e beliscou meu mamilo. Forte.
─ Aii.
adorava o fato de ele ficar mais irritado a cada dia, desde que o cortei há quase
duas semanas.
Meus olhos se suavizaram quando olhei para ele.
─ Talvez não até as seis. Preciso verificar todas as notas que minha auxiliar com
cocô no cérebro deu antes de entregar as notas finais.
Caine estava extremamente infeliz com a auxiliar que lhe fora atribuída naquele
ano. Eu sorri.
─ Você era uma boa auxiliar. Porém, posso ter sido influenciado por sua ótima
assistência ao professor. Estive pensando, já que não está me dando essa
assistência agora, você deveria pelo menos trabalhar como auxiliar e dar minhas
notas.
─ Não posso, professor. Tenho um dia cheio pela frente. Preciso terminar de
encaixotar as últimas coisas esta manhã. Sua irmã e eu vamos levar as meninas
para escolher os vestidos e depois sair para almoçar. Depois disso, preciso ver o
padre McDonald, para lhe dar os nossos votos e as escolhas musicais. Então
você vai ter que cuidar das coisas sozinho.
Levantei-me da cadeira onde estava bebendo meu café matinal e fiquei na ponta
dos pés ao abraçar Caine no pescoço.
─ São só mais dois dias. Pense no quanto será mais empolgante quando
finalmente formos para a cama no sábado à noite, depois que a festa acabar. E da
próxima vez que fizer amor comigo, serei a sra. Caine West.
restaurante?
de o padre dizer que você está presa a mim pelo resto da sua vida.
Caine riu.
De uma vez, ele colocou a mão nas minhas costas e apertou minha bunda ao
Depois que ele deixou o apartamento, resmungando por não transar, olhei em
volta para as poucas coisas que tinham restado para arrumar. Havíamos decidido
que eu me mudaria para a casa de Caine; então, no último mês, estávamos
levando as coisas para lá. Só faltava encaixotar as fotos emolduradas da minha
parede, meus livros e alguns artigos pessoais do banheiro. Peguei os livros
primeiro e depois fui para a parede.
Tinha acrescentado algumas fotos novas ao meu mural no último ano: Caine e
Sentia falta de trabalhar no O’Leary, mas adorava meu novo emprego como
terapeuta musical. Eu trabalhava como autônoma para uma escola, fazendo
terapia individual com crianças autistas. Era um emprego que mais parecia uma
gratificação do que um trabalho. Caine e eu jantamos com Charlie toda semana
no O’Leary. Ele pode não ser mais meu chefe, mas era o mais próximo que eu
tivera de uma figura paterna desde que meu tio faleceu. Na verdade, Charlie iria
me levar ao altar em dois dias. Suspeitava que Caine receberia uma boa encarada
dele no altar.
Embora tivesse acabado minha pesquisa e minha tese tivesse sido publicada,
Enchi duas caixas com as fotos, ficando sentimental à medida que embalava
cada lembrança com plástico-bolha. A última que embalei foi a foto de minha
mãe no balanço em nosso jardim. Passei os dedos por seu rosto lindo através do
vidro. Obrigada, mamãe. Sem seu conselho de buscar a igreja, eu poderia nunca
ter conhecido Caine.
Era menos desenvolvida e mais bagunçada do que agora, mas era minha. E eu
sabia exatamente o que era ─ a carta que havia escrito para o padre falso há
dezesseis anos. Até aquele momento, não tinha me lembrado de ter colocado
atrás da foto de mamãe. Equilibrei-me e respirei fundo antes de ler o que tinha
escrito.
Querido padre,
descobriu que íamos fugir e ficou bem bravo. Disse que, se algum dia pegasse a
pessoa que estava ajudando a gente, iria bater nela. Então, não posso mais
conversar com você aos sábados, porque não quero que ele te machuque. Mas
queria dizer obrigada. Obrigada pelos fones e por me dizer
para escutar música para melhorar tudo. Obrigada por me ouvir quando eu
estava com muito medo de falar. Mas, o mais importante, obrigada por ser
meu anjo quando Deus estava muito ocupado. Espero que te veja de novo
algum dia.
Rachel
Encarei a folha. E li a carta uma segunda vez. Depois uma terceira. Mamãe
Dois dias depois, caminhava pelo corredor para me casar com o amor da minha
vida. Minhas novas sobrinhas, Lizzy e Alley, eram as daminhas das flores.
Entraram na minha frente, jogando pétalas de rosa. Quando chegaram ao altar,
Alley olhou para trás com um sorriso enorme, e assenti, indicando que era hora
de jogar as outras coisas que eu tinha colocado em sua cesta. Ela olhou para o
tio, depois jogou duas moedas aos seus pés. Ambas caíram com a cara para
cima.
Charlie me levou pelo corredor ao som de uma versão popular de uma música
antiga de Gene Clark, “Full Circle”. Havia lágrimas nos olhos de Caine quando
cheguei ao seu lado no altar. Ele pegou minha mão quando a música acabou e,
juntos, sorrimos e nos viramos para trás, a fim de olhar para nosso
confessionário. Assim como a letra dizia, demos uma volta completa. Tínhamos
seguido caminhos diferentes para voltar aonde havíamos começado, mas
havíamos terminado. Agora era o primeiro dia do resto de nossas vidas, e eu mal
podia esperar para começar.
Agradecimentos
Como sempre, tenho uma enorme gratidão pelos meus leitores maravilhosos.
Obrigada por permitir que meu mundo se torne parte do seu mundo. Fico
honrada por tantos de vocês estarem comigo em muitos livros, e só posso torcer
para que tenhamos muitos mais anos juntos.
À Penelope ─ a jornada não seria a mesma sem você viajando ao meu lado.
À Luna ─ seu apoio e sua amizade são um presente. Eu escrevo a história, mas
você a traz à vida com sua imaginação. Obrigada por tudo o que faz, e mal posso
esperar para outubro!
dois. Mal posso esperar para ver o que a vida nos trará!
À Elaine e à Jessica ─ obrigada por todo o trabalho duro para trazer todo o
potencial para esta história.
Obrigada! Obrigada!
Vi
Document Outline
Capa Página
Página de Título
Direitos Autorais Página
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Epílogo
Agradecimentos