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PUIF Nº 0013211-67.2012.4.01.3800 (2012.38.00.

955221-6)/MG

RELATOR: JUIZ FEDERAL TALES KRAUSS QUEIROZ


RECORRENTE: JOÃO LUIZ PIRES BERTO
ADVOGADO: TIAGO LUIS COELHO DA ROCHA MUZZI (OAB/MG 71.874)
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

EMENTA-VOTO

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL. PREVIDENCIÁRIO. MÉDICO


EX-CELETISTA. CONTAGEM RECÍPROCA. ATIVIDADE CONCOMITANTE.
FRACIONAMENTO DE CERTIDÃO. POSSIBILIDADE. INCIDENTE PROVIDO.
Caso: o autor é médico e desde a década de oitenta trabalha concomitantemente para
município e fundação estadual. Nas duas atividades o regime era celetista e foi transformado
em estatuário/próprio. O INSS expediu CTC de 01/02/84 a 31/07/90 para ser averbado na
fundação estadual e de 04/04/83 a 31/01/84 e de 01/08/90 a 30/06/99 para ser averbado no
município. O autor ajuizou ação para fracionar o tempo concomitante, de modo que o período
de 01/02/84 a 31/07/90 pudesse ser aproveitado no município e na fundação. A 2ª TR/BH
reformou a sentença de procedência argumentando que o inc. III do art. 96 da Lei 8.213/91
veda a utilização de um mesmo tempo de serviço/contribuição para dois regimes próprios. O
incidente foi admitido com base em paradigmas de outras turmas de Belo Horizonte/MG.
Razões do voto: o regime geral não permite o fracionamento do dia de trabalho. Se o
segurado trabalha em dois turnos, manhã e tarde, para empregadores distintos, considera-se
como tempo de serviço/contribuição um dia, e não dois. Por esse motivo, no regime geral, o
trabalho concomitante não gera duas aposentadorias (inc. II do art. 124 da Lei 8.213/91), mas
apenas a majoração da renda mensal (art. 32 da Lei 8.213/91).
Nessa linha, o INSS, na contagem recíproca, não emite certidão que permita a contagem
duplicada e desmembrada do tempo de serviço/contribuição. O INSS parte do pressuposto do
tempo único e segue o comando do inc. III do art. 96 da Lei 8.213/91, que impede que o
tempo de serviço contado por um sistema seja utilizado para a concessão de aposentadoria de
outro sistema. Há um pressuposto lógico nessa proibição que é o de não admitir para outro
sistema o que não é permitido no seu próprio sistema. E essa lógica é financeira, na medida
em que, nos termos da Lei 9.796/99, a conta, na compensação dos regimes de previdência,
fica com o regime de origem.
No entanto, a jurisprudência admite o fracionamento/desmembramento. Seguem precedentes
do STJ e da TNU:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONTAGEM RECÍPROCA. REGIMES


DIVERSOS. CONTRIBUIÇÕES PARA CADA SISTEMA. DUAS APOSENTADORIAS. POSSIBILIDADE. I - É assente na
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que "a norma previdenciária não cria óbice a percepção de
duas aposentadorias em regimes distintos, quando os tempos de serviços realizados em atividades concomitantes sejam
computados em cada sistema de previdência, havendo a respectiva contribuição para cada um deles" (AgRg no REsp
1.335.066/RN, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 23/10/2012, DJe 6/11/2012). II - Agravo
interno improvido. (AgInt nos EDcl no REsp 1598405/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado
em 07/03/2017, DJe 10/03/2017)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA - COMPUTO TEMPO DE SERVIÇO - CONTAGEM RECÍPROCA -
PERIODO CONCOMITANTE COM CONTRIBUIÇÃO PARA O MESMO REGIME - OBJETO DA CONTROVÉRSIA SOBRE
QUESTÃO DE DIREITO MATERIAL - POSSIBILIDADE DE SOMAREM-SE TEMPOS DE
CONTRIBUIÇÃO CONCOMITANTES VERTIDAS AO MESMO REGIME DE PREVIDÊNCIA - PROCESSO CONHECIDO
POR MAIORIA - VENCIDO O RELATOR QUE NÃO CONHECIDA DO INCIDENTE NOS TERMOS DAS  QUESTÕES DE
ORDEM N. 22 E 35. NO MÉRITO, NÃO HÁ VEDAÇÃO AO CÔMPUTO, EM AMBOS OS REGIMES (GERAL E PRÓPRIO),
RESPECTIVAMENTE, DE ATIVIDADES CONCOMITANTES VINCULADAS AO RGPS, QUANDO UMA DELAS FOR
POSTERIORMENTE, POR TRANSFORMAÇÃO DO EMPREGO EM CARGO, VINCULADA AO RPPS E NELE
APROVEITADA. VOTAÇÃO UNÂNIME.Acordam os membros da TNU - Turma Nacional de Uniformização, por maioria
CONHECER O PRESENTE INCIDENTE, vencido o Relator, e, no mérito,  por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO PEDIDO
DE UNIFORMIZAÇÃO interposto pela parte autora, nos termos do voto do Relator reajustado para acompanhar o Voto-Vista
apresentado pela  Juíza Federal LUISA HICKEL GAMBA. (Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 5000940-
63.2013.4.04.7213, RONALDO JOSE DA SILVA - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.)

PEDIDO NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONTAGEM RECÍPROCA. ATIVIDADES


CONCOMITANTES VINCULADAS AO RGPS. ALTERAÇÃO DO REGIME JURÍDICO TRABALHISTA DE UMA DAS
FUNÇÕES PARA ESTATUTÁRIO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DAS ATIVIDADES NO RGPS E NO RPPS. ACÓRDÃO
EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA TNU. INCIDENTE PROVIDO.A Turma Nacional de Uniformização,
por maioria, decidiu DAR PROVIMENTO AO INCIDENTE interposto pela parte autora, nos termos do voto do Juiz Relator.
Vencido o Juiz Federal Atanair Lopes que negava provimento. (Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 5002719-
04.2013.4.04.7003, JOSÉ FRANCISCO ANDREOTTI SPIZZIRRI - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.)

VOTO-EMENTA VENCEDOR INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADES


CONCOMITANTES VINCULADAS AO RGPS, SENDO QUE UMA DELAS É POSTERIORMENTE VINCULADA A RPPS.
POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DAS ATIVIDADES, RESPECTIVAMENTE, NO RGPS E NO RPPS. DESPROVIMENTO.
Peço vênia ao eminente Relator para divergir. Com efeito, entendo que os precedentes desta Turma Nacional não entram na minúcia
do caso concreto (ambas as atividades concomitantes vinculadas ao RGPS, sendo uma delas posteriormente transformada e
vinculada a RPPS), o que impede a aplicação da questão de ordem 13. O paradigma indicado pelo recorrente é apto a ensejar o
conhecimento do incidente. O objeto do presente incidente, portanto, é a uniformização sobre a possibilidade de computar, nos dois
regimes de previdência (geral e próprio), períodos considerados como atividades concomitantes no mesmo regime (RGPS), quando
uma delas tiver sido realizada em emprego público posteriormente transformado em cargo público sob Regime Próprio de
Previdência do Servidor (RPPS). A jurisprudência federal oscilou sobre a matéria e mais recentemente firmou o entendimento sobre
a legalidade do cômputo, no âmbito do RGPS, do tempo de atividade privada e autônoma, concomitante com contribuição para
RGPS posteriormente aproveitada pelo Regime Próprio de Previdência. Neste sentido, decisão monocrática proferida em
13/02/2015, no Agravo em REsp n. 600.848 - DF (2014/0271034-2), pelo Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, pela qual
restou mantida a decisão que negou seguimento ao Recurso Especial interposto pelo INSS e que objetivava a reforma de acórdão do
e. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, assim ementado: PREVIDENCIÁRIO E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO.
ATIVIDADES CONCOMITANTES ANTES DA IMPLANTAÇÃO DO RJU. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO
PRESTADO NA INICIATIVA PRIVADA. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 96, II, DA LEI Nº 8.213/91. 1. A
controvérsia matriz deste feito se refere ao alegado direito de averbação do tempo de serviço dos associados da impetrante na
atividade privada que era exercida concomitantemente com o labor prestado como médicos do INSS. 2. Tal pretensão merece
acolhimento, visto que a inteligência do art. 96, II, da Lei nº 8.213/91, invocado na sentença como impediente da averbação
almejada, é no sentido de se evitar a soma de duas atividades desempenhadas durante o mesmo período, impedindo-se o indevido
aumento do tempo de serviço final. 3. De fato, tratando-se de atividade desempenhada apenas no âmbito do RGPS essa dobra
indevida já é afastada pela regra presente no art. 32 da Lei nº 8.213/91. Entretanto, quando um dos vínculos é prestado no serviço
público, tal ditame não se aplica, eis porque foi editada a regra restritiva do referido art. 96, II, para assim se impedir que o segurado
que tenha laborado simultaneamente em duas atividades - uma pública e outra privada - possa ter somado o tempo de serviço de
cada uma delas para ao final contá-lo em dobro. 4. Ocorre que não é esta a hipótese dos autos, pois a associação impetrante não
pretende que se somem, ou seja, que a partir de uma adição se contem como um só, os tempos referentes ao labor público e ao
privado, para fins de concessão de um mesmo benefício. Na verdade, a pretensão trazida a exame tem por escopo que o tempo de
serviço referente a trabalho desempenhado como médico do INSS seja utilizado para a aposentadoria estatutária concedida por esta
Autarquia, enquanto o tempo vinculado às atividades privadas, ainda que concomitantes aquela, possa ser utilizado para o fim de
concessão de benefício custeado pelo RGPS, inexistindo na legislação previdenciária qualquer óbice à adoção de tal procedimento
(precedente do STJ). 5. Ademais, a determinação de compensação prevista no art. 247 da Lei nº 8.112/90 reforça o direito da
averbação pretendida, isto porque a instituição de um regime próprio e único de previdência para os servidores federais impôs à
Previdência Social a obrigação de compensar os valores que recebeu daqueles que eram celetistas e que foram alcançados pelo art.
243 da referida norma. 6. Entretanto, e aí reside a questão, apenas os valores que desses servidores recebeu nessa condição é que
foram passíveis de compensação. É saber, os valores que os associados da impetrante recolheram para a Previdência Social no
período anterior à lei nº 8.112/90 em razão das atividades privadas que exerceram não foram utilizados para fins de cálculo do
benefício estatutário que passaram a fazer jus e (em razão da recusa neste feito questionada) tampouco estão sendo aproveitados
para fins previdenciários referentes ao RGPS. 7. Ocorre que a apropriação das contribuições previdenciárias pretéritas ao RJU sem
nenhuma contraprestação fere, de um só golpe, o princípio da contributividade previdenciária e o princípio da vedação ao
enriquecimento sem causa. 8. Apelação provida. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no julgamento dos Embargos
Infringentes n. 2007.70.09.001928-0 pela Terceira Seção, Relator para o Acórdão o Des. Ricardo Teixeira do Valle Pereira,
pacificou o entendimento de que, com a convolação do emprego público para cargo público, e a previsão para compensação
financeira, nada impede o aproveitamento das contribuições vertidas ao RGPS como empregado público para fins de obtenção de
aposentadoria em regime próprio, e simultaneamente o aproveitamento das contribuições vertidas concomitantemente para RGPS
em decorrência de atividade privada, estas para fins de obtenção de aposentadoria no Regime Geral. Veja a ementa do acórdão em
tela: ATIVIDADES CONCOMITANTES PRESTADAS SOB O RGPS. CONTAGEM PARA OBTENÇÃO DE
APOSENTADORIA EM REGIMES DIVERSOS. POSSIBILIDADE. 1. Transformados os empregos públicos em cargos públicos,
o tempo anterior celetista foi automaticamente incorporado ao vínculo estatutário, mediante compensação entre os sistemas. Houve
modificação da natureza jurídica do vínculo, mas não ocorreu solução de continuidade, tendo inclusive o Supremo Tribunal Federal
reconhecido, como sabido, o direito dos servidores federais ao aproveitamento, no regime estatutário, sem restrições, do tempo
anterior celetista. 2. Com a convolação do emprego público para cargo público, e a previsão para compensação financeira, nada
impede o aproveitamento das contribuições como servidor público pelo demandante para fins de obtenção de aposentadoria no
regime próprio. A situação em apreço não é a de dupla consideração da mesma atividade e das mesmas contribuições, e sim, de
concomitância de atividade de como autônomo e professor, com recolhimentos distintos, cabendo salientar que é inclusive permitida
a acumulação de cargos públicos (art. 97, CF/67, art. 37, XVI, CF/88). 3. Hipótese em que não há se falar, pois, em rigor, de
contagem de tempo de serviço em duplicidade ou sequer de contagem recíproca, mas, tão-somente, de possibilidade de

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aproveitamento, em Regime próprio, de tempo de serviço público celetista referente a emprego público que foi convolado em cargo
público, com a previsão de compensação financeira, não se subsumindo o presente caso à hipótese prevista no art. 96, II, da Lei
8.213/91. (TRF4, EINF 2007.70.09.001928-0, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão RICARDO TEIXEIRA DO VALLE
PEREIRA, D.E. 28/01/2013) Dessa forma, proponho que seja uniformizado o entendimento de que não há vedação ao cômputo, em
ambos os regimes (geral e próprio), respectivamente, de atividades concomitantes vinculadas ao RGPS, quando uma delas for
posteriormente, por transformação do emprego em cargo, vinculada ao RPPS e nele aproveitada. O acórdão recorrido está em
consonância com a uniformização proposta, impondo-se o desprovimento do incidente de uniformização. Pelo exposto, CONHEÇO
E NEGO PROVIMENTO ao pedido de uniformização.Após o voto do Juiz Relator não conhecendo do incidente, pediu vista,
antecipadamente, a Juíza Federal LUISA GAMBA (Sessão de 30.03.2017). Prosseguindo o julgamento, a Turma, por maioria,
conheceu do incidente de uniformização e lhe negou provimento nos termos do voto do(a) Juiz(a) Federal LUISA GAMBA que
lavrará o acórdão. Vencido o(a) Juiz(a) Relator(a), que não conhecia do incidente. (PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE
INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL 05175145920144058400, JUÍZA FEDERAL LUISA HICKEL GAMBA, DJE
19/10/2017.)

Há no caso a particularidade de que o autor é médico, logo, profissional da saúde, que pode
acumular cargo/emprego público (alínea ‘c’ do inc. XVI do art. 37 da CF/88). Há aqui uma
exceção ao princípio da unicidade de filiação, a ensejar que um mesmo tempo conte para mais
de um regime. O §12 do art. 130 do Decreto 3.048/99 prevê ser “vedada a contagem de tempo
de contribuição de atividade privada com a do serviço público ou de mais de uma atividade no
serviço público, quando concomitantes, ressalvados os casos de acumulação de cargos ou
empregos públicos admitidos pela Constituição”.  A jurisprudência interpreta este §12 como
um reforço à tese da possibilidade de certidão fracionada de tempo concomitante. Na
condição de médico do município e da fundação, o autor contribuiu para o regime geral
porque não existiam à época os regimes próprios correspondentes. Se os regimes fossem
próprios desde o início, havendo contribuições para os dois regimes, não haveria dúvidas de
que teria direito a duas aposentadorias.
Ressalvando meu entendimento pessoal, que coincide com a premissa lógica adotada pelo
INSS (Lei 9.796/99), cabe seguir a jurisprudência.
Conclusão: diante do exposto, dou provimento ao incidente do autor para julgar procedente
o pedido da inicial, revigorando-se a sentença de primeiro grau.

ACÓRDÃO

Decide a Turma Regional de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais dos


Juizados Especiais Federais da Primeira Região dar provimento ao incidente, nos termos do
voto do juiz relator. Uberlândia/MG, 24 de maio de 2019.

Tales Krauss Queiroz,


juiz federal relator

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