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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Número do 1.0000.20.563003-1/003 Númeração 5014551-


Relator: Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes
Relator do Acordão: Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes
Data do Julgamento: 29/03/2022
Data da Publicação: 04/04/2022

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - OBRA


DE INFRAESTRUTURA PARA EXTENSÃO DE REDE ELÉTRICA - IMÓVEL
RURAL - EXECUÇÃO GRATUITA - REQUISITOS - AUSÊNCIA DE PROVA
DE FATO IMPEDITIVO DO DIREITO DO AUTOR. Demonstrado de forma
inequívoca que a autora é possuidora do imóvel rural, aliado ao fato de a
previsão da carga instalada ser inferior a 50kw, na forma dos requisitos
previstos na Resolução ANEEL n. 414/2010, cabe à concessionária
proceder, gratuitamente, a obrigação de realizar as obras de infraestrutura de
extensão da rede elétrica para atendimento da propriedade da consumidora,
sobretudo quando ausente prova de fato impeditivo do direito invocado em
juízo.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.20.563003-1/003 - COMARCA DE MONTES


CLAROS - APELANTE(S): COMPANHIA ENERGETICA DE MINAS GERAIS-
CEMIG - APELADO(A)(S): LUZIA LAUREANA GUIMARAES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de


Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. EDILSON OLÍMPIO FERNANDES

RELATOR

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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

DES. EDILSON OLÍMPIO FERNANDES (RELATOR)

VOTO

Trata-se de recurso interposto contra a sentença proferida nos autos da


Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais ajuizada por
LUZIA LAUREANA GUIMARÃES contra a CEMIG DISTRIBUIÇÃO S/A, que
julgou parcialmente procedente o pedido para determinar que a ré proceda,
gratuitamente, à ligação de rede elétrica no imóvel da autora; diante da
sucumbência recíproca, condenou cada parte ao pagamento de 50% das
custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em 20% sobre o
valor da causa atualizado, ficando suspensa a exigibilidade da autora em
virtude da concessão dos benefícios da justiça gratuita (documento n. 47).

A apelante sustenta que se fosse comprovado o devido registro da


parcela de solo, aquela descrita no documento de posse, por meio do devido
registro do imóvel, com a obtenção de informação do número de matrícula do
imóvel descrito em Certidão de Registro de Imóvel, registrado em Cartório de
Registro de Imóvel, o atendimento poderia ser classificado sem ônus para a
apelada se comprovadas as demais condições previstas na Resolução
ANEEL n. 414/2010. Afirma que a falta de apresentação da documentação
comprobatória da propriedade evidencia tratar-se de segundo ponto para
atendimento de parcelamento de solo. Destaca que existe um ponto de
atendimento em nome do Sr. Bento Argolo dos Santos, que foi o responsável
pela venda de parte do imóvel rural à recorrida, por isso deve haver sua
participação financeira para execução da obra de extensão da rede elétrica.
Assinala que deve seguir rigorosamente as determinações legais sobre quais
as condições para custear uma obra de extensão de rede como a pretendida
pela apelada.

Argumenta que o Programa Nacional de Universalização do Acesso e


Uso da Energia Elétrica, regulamentado pela Resolução ANEEL n.

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414/2010, dispõe que ser atendido apenas o primeiro ponto de energia


elétrica da propriedade e com carga instalada limitada a 50kW. Salienta que
a ausência de documento capaz de comprovar que houve o
desmembramento de terras, formalmente o imóvel da parte contrária está
dentro de outro imóvel já atendido, restando caracterizado um segundo ponto
de energia elétrica, o que não se enquadra nos critérios estabelecidos em lei,
fazendo-se necessário, portanto, o aporte financeiro por parte da recorrida
para atendimento à sua solicitação. Defende a observância do princípio da
supremacia do interesse público sobre interesse privado em caso de conflitos
de interesses. Pugna pelo provimento do recurso (documento n. 49).

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cuidam os autos de ação de obrigação de fazer em que a apelada


pretende obrigar a CEMIG a efetuar a instalação da rede de energia elétrica,
sem nenhum ônus para a autora, no endereço denominado Inhuma da União
- Fazenda Santo Antônio, Zona Rural do Município de Claro dos Poções.

Para comprovar o seu direito, a apelada instruiu a inicial com o


Formulário de Solicitação de Atendimento Rural - Ligação Nova, bem como o
Protocolo de Atendimento n. 2284275874, o qual demonstra a solicitação
realizada em 19.06.2020 e que o prazo estabelecido para resposta foi de um
mês (documentos n. 09/10).

A apelante alega como fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito


invocado em juízo a necessidade de a consumidora comprovar que é
proprietária do imóvel em que se pretende a instalação da extensão da rede
elétrica, pois, do contrário, deve suportar com o custeio desta obra, visto se
tratar de um segundo ponto, cuja gratuidade não é abrangida pela lei de
regência, e por isso deve pagar a quantia de R$ 5.645,88 (cinco mil,
seiscentos e quarenta e cinco reais e oitenta e oito centavos).

Ao tratar das obras de responsabilidade da Distribuidora a

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Resolução ANEEL n. 414/2010 dispõe que:

"Art. 40. A distribuidora deve atender, gratuitamente, à solicitação de


fornecimento para unidade consumidora, localizada em propriedade ainda
não atendida, cuja carga instalada seja menor ou igual a 50 kW, a ser
enquadrada no grupo B, que possa ser efetivada:

I - mediante extensão de rede, em tensão inferior a 2,3 kV, inclusive


instalação ou substituição de transformador, ainda que seja necessário
realizar reforço ou melhoramento na rede em tensão igual ou inferior a 138
kV; ou

II - em tensão inferior a 2,3 kV inclusive instalação ou substituição de


transformador, ainda que seja necessário realizar reforço ou melhoramento
na rede em tensão igual ou inferior a 138 kV; ou

II - em tensão inferior a 2,3 kV, ainda que seja necessária a extensão de rede
em tensão igual ou inferior a 138 kV.

Art. 41. A distribuidora deve atender, gratuitamente, à solicitação de aumento


de carga de unidade consumidora do grupo B, desde que a carga instalada
após o aumento não ultrapasse 50 kW e não seja necessário realizar
acréscimo de fases da rede em tensão igual ou superior a 2,3 kV"
(destaquei).

Por sua vez, a norma de regência também prevê a possiblidade das


obras serem de responsabilidade do Interessado quando se tratar de
"infraestrutura básica das redes de distribuição de energia elétrica internas
aos empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras" (inciso V do
artigo 44 da Resolução ANEEL n. 414/2010).

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Após minuciosa análise dos autos, observo que a apelada efetuou o


cadastro do imóvel no Cadastro Ambiental Rural - CAR, nele constando a
identificação de se tratar de proprietário e/ou possuidor do terreno
(documento n. 32).

Por sua vez, o Laudo de Avaliação de Carga Instalada elaborado pela


Engenheira Civil Cissa T. F. Guimarães (CREA/MG n. 252.481) concluiu que:

"O presente Laudo Técnico apresentou a análise da carga de demanda para


uma instalação elétrica em uma propriedade rural. Constatou-se que a
propriedade demanda uma carga instalada de 13,45 KW" (documento n. 15 -
destaquei).

Diante desse quadro, forçoso admitir que a documentação que integra o


conjunto probatório assegura a apelada a execução, de forma gratuita, da
obra de infraestrutura para a instalação da rede de distribuição de energia
elétrica em seu imóvel rural.

Ademais, a resolução normativa da ANEEL em comento não exige a


regularização do imóvel, dispondo efetivada a solicitação do interessado de
fornecimento de energia elétrica, basta apresentar "documento, com data,
que comprove a propriedade ou posse do imóvel" (alínea 'h, do inciso II do
artigo 27), tal como demonstrado no caso concreto.

Como se vê não há necessidade de regularização de imóvel junto à


serventia imobiliária para fins de concessão de energia elétrica a ser
custeada pela concessionária, conforme já decidiu este egrégio Tribunal de
Justiça ao apreciar casos análogos:

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"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.


TUTELA DE URGÊNCIA. CEMIG. IMÓVEL RURAL. OBRAS PARA
INSTALAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA. ARTS. 27, 40 E 41, REN
ANEEL 414/2010. DOCUMENTO COMPROBATÓRIO PROPRIEDADE OU
POSSE DO IMÓVEL. FORNECIMENTO. SERVIÇO ESSENCIAL. ART. 300
DO CPC/2015. REQUISITOS. DEMONSTRAÇÃO. PRECEDENTES DESTE
TJMG. I. (...). II. Hipótese em que os elementos presentes nos autos
demonstram que a recorrida apresentou os documentos comprobatórios da
posse do imóvel solicitados pela distribuidora de energia elétrica, não sendo
apontado pela empresa recorrente qualquer óbice específico à realização
das obras de forma gratuita, conforme o previsto nos art. 40 e 41 da REN
ANEEL 414/2010, inexistindo, portanto, motivos para a modificação da
decisão agravada que determinou a ligação de rede de energia elétrica no
imóvel rural da autora." (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv n.
1.0000.21.052529-1/001, Relator(a): Des.(a) Washington Ferreira, 1ª
CÂMARA CÍVEL, julgamento em 13/07/2021, publicação da súmula em
16/07/2021)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER -


CEMIG - INSTALAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA -
PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA DO CONSUMIDOR - IMPOSSIBILIDADE -
INSTALAÇÃO GRATUITA - RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANNEL - RECURSO
NÃO PROVIDO. - A distribuidora de energia elétrica poderá cobrar a
participação financeira do consumidor para o atendimento de novas ligações,
acréscimos ou decréscimos, quando demonstrado que a unidade
consumidora não se enquadra na hipótese de instalação gratuita da rede de
energia elétrica. - Ausente aos autos provas que indiquem que a unidade
consumidora não se enquadra na hipótese do art. 40 da Resolução 414/2010
da ANNEL, observa-se que a manutenção da decisão que determinou a
instalação gratuita da rede de energia elétrica no imóvel do agravado é
medida que se impõe. - Recurso não provido." (TJMG - Agravo de
Instrumento-Cv n. 1.0000.20.596443-0/001, Relator(a): Des.(a) Carlos
Roberto de Faria, 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 13/05/2021, publicação
da súmula em 19/05/2021 - destaquei)

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Forçoso concluir que demonstrado de forma inequívoca que a autora é


possuidora do imóvel rural, aliado ao fato de a previsão da carga instalada
ser inferior a 50kw, na forma dos requisitos previstos na Resolução ANEEL n.
414/2010, cabe à concessionária proceder, gratuitamente, a obrigação de
realizar as obras de infraestrutura de extensão da rede elétrica para
atendimento da propriedade da consumidora, sobretudo quando ausente
prova de fato impeditivo do direito invocado em juízo.

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO e majoro os


honorários advocatícios, devidos pela apelante, para 15% sobre o valor
atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo
Civil.

Custas recursais, pela apelante.

DES. JÚLIO CEZAR GUTTIERREZ - De acordo com o(a) Relator(a).

DESA. SANDRA FONSECA - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."

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