Nesta oportunidade, daremos continuidade ao nosso estudo
bíblico no Credo Apostólico, que temos iniciado em janeiro do corrente ano. Como para alguns de vocês este é o primeiro contato com este estudo, se fazem necessárias algumas explicações, a título de introdução.
Cremos que no decorrer da história foram elaborados diversos
documentos onde a doutrina cristã pôde ser sintetizada. No formato de credos e confissões, estes documentos possuem o propósito de simplificar e facilitar a compreensão do pensamento cristão e proteger os crentes das heresias.
O Credo Apostólico, ou Símbolo dos Apóstolos, provavelmente
remonta-nos às origens do Cristianismo. Segundo alguns comentaristas, o Credo era parte fundamental na profissão pública de fé dos candidatos ao batismo, sendo o fundamento da instrução dos catecúmenos. Estudar o Credo Apostólico, portanto, é ir até nossa herança cristã e dela extrair ensinamentos que fizeram muito por nossos irmãos no passado, reconhecendo que esta reflexão pode trazer benefícios aos cristãos dos dias atuais. Apropriando-nos da metáfora de C. S. Lewis em “Cristianismo Puro e Simples”, poderíamos dizer que o Credo é como um hall de entrada em uma casa de vários cômodos. Os cômodos, no caso, representariam as denominações (como o presbiterianismo, o metodismo, a igreja batista, os pentecostais etc.). O corredor, ou hall principal corresponderia às crenças comuns a toda cristandade, o que em nosso caso equivaleria aos ensinos do Credo Apostólico. Assim, em nosso estudo do Credo não estamos nos detendo em questões próprias do presbiterianismo, mas às crenças comuns a todo o Cristianismo.
O Credo principia com as seguintes afirmações:
“Creio em Deus, o Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra. E em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor”
Em nosso presente estudo, examinaremos esta parte específica
do Credo, onde Jesus Cristo é descrito como nosso Senhor. Portanto, gostaria de ler um texto nas Escrituras, em Atos 2.36: “Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo”.
Pedro está proclamando o evangelho no dia de Pentecostes, de
forma que seu argumento central é de que Jesus, aquele homem que há pouco tempo havia caminhado entre os judeus e que fora morto por suas mãos é o cumprimento das promessas feitas no tempo da Antiga Aliança, no Velho Testamento. Os dois títulos mencionados no v. 36, a saber, Senhor e Cristo, são bastante significativos. Percebamos que estes títulos não foram dados a Jesus pela Igreja Cristã no primeiro século, mas pelo próprio Deus Pai. Jesus Cristo é o Senhor, disso não deve haver nenhuma dúvida, é o que Pedro afirma: “esteja absolutamente certa”.
I. O QUE SIGNIFICA A EXPRESSÃO “SENHOR”
Algumas expressões costumam perder o sentido com o passar do tempo. Uma delas é a palavra “Senhor”. Dificilmente você irá abrir uma página do Antigo Testamento e deixar de encontrá-la. Ela é empregada muitas e muitas vezes referindo-se a Deus. Algo semelhante acontece em o Novo Testamento, quando a palavra “Senhor” aparece claramente como uma referência a Deus. Leiamos, por exemplo, Mateus 22.37. No entanto, há um novo e importante desdobramento após a morte e ressurreição de Jesus: Ele mesmo passa a ser chamado de “o Senhor” pelos apóstolos. Leiamos Cl 2.6. O conteúdo da confissão de Cristo como Senhor é a essência do Evangelho. Paulo afirma: “Se com tua boca confessares Jesus como Senhor e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo” (Rm 10.9). Confessar Jesus como Senhor é um ato de submissão a Deus. Quando alguém não tem a Cristo como Senhor, esta pessoa está (nos que a Bíblia afirma) morta em pecados e em desobediência, andando sob o domínio de Satanás, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos. Mas a graça de Deus se manifesta na vinda de Jesus Cristo ao mundo, morrendo pelos pecados dos homens, sendo Ele mesmo o único acesso a Deus. Render-se ao Evangelho é acreditar nesta mensagem, que proclama o senhorio de Cristo. É abraçar pela fé a Jesus Cristo como Salvador e Senhor; é arrepender-se de seus pecados, vivendo em novidade de vida perante Deus e perante os homens. E aqui vale ressaltar o que a Bíblia chama de fé: a fé que agrada a Deus não consiste em um pensamento religioso positivo, numa espécie de confissão triunfalista que afirma “vai dar tudo certo”. A fé, nos termos bíblicos consiste na entrega pessoal da vida e da confiança a Deus; a fé salvífica traz consigo o elemento da rendição total e completa ao Senhor Jesus Cristo.
II. DESDOBRAMENTOS PRÁTICOS DO SENHORIO DE
CRISTO Gostaria de apontar pelo menos três aspectos práticos que devem nortear a vida humana no sentido do senhorio de Cristo.
Em primeiro lugar, gostaria de afirmar que o senhorio de Cristo
não é um ensinamento que possui desdobramentos apenas para os cristãos. Há clareza nas Escrituras para afirmarmos que todos os seres humanos um dia irão confessar o senhorio de Cristo.
Portanto, precisamos ler o que Fp 2.9-11 nos informa. Quando
Jesus retornar em glória, todos irão adorá-Lo. Os anjos eleitos e os homens redimidos farão isto com enorme prazer, mas os condenados o farão com enorme tristeza e dor. Céus, terra e inferno irão se dobrar perante Jesus Cristo; com júbilo, os salvos irão prestar-Lhe louvor eternamente por Sua graça, mas os perdidos cairão apavorados de joelhos diante do Senhor dos Senhor. Isto não significa que todos serão salvos: Somente aqueles que confessam Jesus Cristo como Senhor agora, no tempo presente, serão salvos eternamente.
Quanto àqueles que somente alegam servir a Cristo, vale um
segundo desdobramento prático da doutrina do senhorio de Cristo. Há muitos em nossos dias que pensam que terão um lugar nos céus simplesmente porque um dia aceitaram um apelo feito em uma igreja. Estas pessoas acreditam que por terem feito a conhecida “oração do pecador” e terem orado para que Jesus entrasse em seu coração, isto já seria o bastante. Se você insiste em comportamento pecaminoso e ainda alega ser salvo, sua compreensão do ensinamento de Cristo está equivocada. Jesus Cristo não pode ser o seu Salvador sem ser Senhor sobre Sua vida. A salvação é uma obra de Deus, da graça de Deus, concedida gratuitamente a todos os que são eficazmente chamados pelo Evangelho. Todavia, o amor de Deus revelado na cruz do Calvário é de sobremodo constrangedor, ao ponto de levar o salvo a viver no caminho de boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que andássemos nelas. Deus não tem filhos perdidos por aí no mundo vivendo de modo irresponsável, sem arrependimento. Repito: a salvação é um ato livre da graça de Deus, mas que nos constrange a obedecê-Lo. A Bíblia descreve a salvação como o novo nascimento, o que significa ter novos apetites, novas inclinações, novas prioridades. Quando Deus realiza nosso nascimento espiritual, ele não permite que nada extinga essa vida. Pelo contrário, aqueles que Deus vivifica, ele os preserva e os mantém vivos, para que, um dia, atinjam o alvo para o qual ele os regenerou.
Por fim, e não menos importante, eu gostaria de aplicar o
entendimento do senhorio de Cristo na vida daqueles que, de fato, seguem a Jesus. Vivemos dias de muita informação: canais de notícias com sinal aberto 24h, internet, redes sociais, conversas pessoais. E no meio de tanta informação, nos sentimos um pouco “confusos”: parece que a ciência não dialoga com a política, que por sua vez não conversa com a saúde, que por sua vez parece estar em choque com a economia. Dias como os nossos são extremamente estressantes, pois de forma geral parece o mundo está como um barco à deriva. O que será de nós, de nossas vidas, de nossas existências, de nosso sustento? São perguntas legítimas que fazemos. Mas antes que isso cause em nós uma ansiedade doentia, lembremo-nos do senhorio de Cristo: Ele reina sobre a política, sobre a ciência, sobre a economia, sobre a saúde. Ainda que exista conflito entre estas esferas, Ele se mantém soberano sobre todas as coisas. Medite no Evangelho com esta ótica, percebendo que Ele exerceu e exerce o domínio, a autoridade sobre todas elas. Ele governa todo o universo, colocando cada estrela em seu lugar; Ele governa os reinos, os povos e as nações; estão debaixo de seu senhorio todas as coisas, nos céus e na terra, sejam anjos, principados, potestades, mas sejam também homens, animais, vermes, bactérias e vírus.