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AULA 1

ASSISTÊNCIA PRÉ E PÓS-


CIRURGIA ONCOLÓGICA

Prof. Vitor Mocelin Zacarkim


INTRODUÇÃO

Aspectos históricos e evolutivos em cirurgia oncológica

Desde o século passado, o interesse científico na área oncológica tem


aumentado consideravelmente, em virtude de mudanças epidemiológicas que
contribuíram no aumento de doenças e agravos não transmissíveis, como o
câncer. Nesse contexto, aliada à quimioterapia e à radioterapia, a cirurgia é uma
das principais modalidades de tratamento oncológico.
Primordialmente, a cirurgia oncológica era vista como a única chance de
cura para o câncer, todavia seu papel sofreu drásticas mudanças nos últimos
séculos. Hoje suas atribuições vão além da ressecção de tumores com finalidade
curativa, uma vez que pode ser utilizada em todas as fases do tratamento, com
objetivos de diagnóstico, terapia primária, citorredução, prevenção, paliação,
suporte, reabilitação e reconstrução.
Na medida em que avanços e tecnologias transformam a abordagem de
tratamento do câncer, é natural que a área de cirurgia oncológica continue em
constante inovação. Modalidades de cirurgia, tais como cirurgias minimamente
invasivas, endoscópicas, intervenções radiológicas e cirurgias robóticas, têm
contribuído significativamente para a redução da morbimortalidade.
Desse modo, é de suma importância que você compreenda o contexto
histórico e as mudanças e evoluções na área da cirurgia oncológica, a fim de
desenvolver habilidades de etiologia técnica ou processual para contribuir no
tratamento e na melhora da qualidade de vida do paciente com câncer.

TEMA 1 – PRINCÍPIOS HISTÓRICOS DA CIRURGIA ONCOLÓGICA

A cirurgia é a modalidade de tratamento mais antiga para o câncer.


Apresenta-se ainda hoje como a melhor opção terapêutica para diversos tipos de
tumores. Os primeiros registros acerca do tratamento cirúrgico oncológico foram
descobertos em papiros egípcios que datam por volta de 1600 a.C. Esses foram
descobertos e traduzidos pelo egiptólogo americano Edwin Smith em 1862. Os
manuscritos descrevem procedimentos cirúrgicos utilizados para o tratamento de
tumores de mama e recomendavam uma ressecção cautelosa para evitar
morbimortalidade. Assim como os egípcios, Hipócrates (460-375 a.C.) também
tinha essa preocupação e era favorável de que a qualidade de vida seria melhor

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sem tratamentos cirúrgicos letais. Galeno (129-217 d.C.) acreditava que o câncer
era uma doença sistêmica que não poderia ser tratada com procedimentos
cirúrgicos (Davidson; Routt, 2014; Wyld; Audisio; Poston, 2015; Hoff et al., 2013).
A primeira descrição de uma cirurgia para remoção do câncer de maneira
adequada na perspectiva da oncologia foi no século I d.C., por Leonidas de
Alexandria. O médico descreveu a técnica de incisão gradual do tecido mamário
saudável adjacente a um tumor de mama, seguida de cautela até a ressecção
cirúrgica completa do tumor. Dessa forma, Leonidas descreveu o primeiro
princípio de cirurgia oncológica, que consiste na extirpação tumoral com uma
margem de segurança de tecido saudável (Wyld; Audisio; Poston, 2015).
Entretanto, as teorias que tratavam o câncer como uma doença sistêmica
não passível de tratamento cirúrgico permaneceram por mais de 1.500 anos.
Sendo assim, a cirurgia nesse período ficava reservada a lesões traumáticas,
tendo em vista que poucos optariam por procedimentos que causavam dor pela
ausência de anestésicos ou complicações agravantes, como a sepse, que
causava a morte da maioria dos pacientes. Sendo assim, apenas desalentados,
corajosos ou pacientes mal orientados eram submetidos a procedimentos
cirúrgicos, já que além de alta morbimortalidade as taxas de cura e sucesso eram
baixas (Davidson; Routt, 2014; Wyld; Audisio; Poston, 2015; Figueiredo; Monteiro;
Ferreira, 2013).
Na Idade Média cirurgiões passaram a reconhecer a possibilidade de tratar
tumores cirurgicamente por meio de procedimentos extirpativos radicais.
Considerado o pai da cirurgia alemã, Guilhelmus Fabricius Hildanus (1560-1624)
descreveu a aparente cura de um câncer de mama de crescimento lento por meio
da ressecção radical da mama com dissecção axilar (Hoff et al., 2013).
Os tratamentos cirúrgicos permaneceram raros até o surgimento de
avanços científicos em anestesia e assepsia. O advento da anestesia geral em
1846 pelo dentista William Thomas Green Morton e o pioneirismo em técnicas de
assepsia (1867) pelo médico e cirurgião britânico Joseph Lister tornaram a cirurgia
uma intervenção médica mais acessível, aceita e amplamente utilizada. Esses
avanços subsidiaram o desenvolvimento da cirurgia oncológica, com uma
expansão da terapêutica para além de lesões superficiais, como o tratamento do
câncer de mama e de neoplasias intra-abdominais (Wyld; Audisio; Poston, 2015;
Ganz et al., 2006; Lopez, 2005).

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Além de avanços em técnicas de anestesia a assepsia, o desenvolvimento
científico na área de patologia também impulsionou o interesse de pesquisadores
no tratamento do câncer. No século XVIII, patologistas descreveram as neoplasias
como uma ocorrência local que poderia se disseminar para outros sítios
anatômicos (Davidson; Routt, 2014; Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).
Na Idade Moderna, a expansão do conhecimento científico prosseguiu
ampliando a eficiência e progresso de procedimentos cirúrgicos no tratamento do
câncer. Posteriormente, foram descritas as primeiras gastrectomias,
prostatectomias, histerectomias, ressecções abdominoperineais, laringectomias e
esofagectomias. Apesar do desfecho oncológico satisfatório, entre os séculos XIX
e XX, a cirurgia oncológica ainda era associada a altas taxas de morbidade, e os
procedimentos resultavam em deformidades e incapacidades, causados pela falta
de recursos tecnológicos e diagnóstico tardio da doença, ocasionando redução
nas taxas de cura e de sucesso cirúrgico (Davidson; Routt, 2014; Figueiredo;
Monteiro; Ferreira, 2013).

TEMA 2 – PRIMEIROS PASSOS EVOLUTIVOS EM CIRURGICA ONCOLÓGICA

É evidente que o desenvolvimento da cirurgia oncológica foi impulsionado


pelo advento das técnicas emergidas no século XIX. Em 1809, Ephraim McDowell
removeu um tumor ovariano em uma paciente que sobreviveu por 30 anos após
o procedimento. Esse fato gerou interesse de profissionais na exploração de
cirurgias eletivas em oncologia. Entretanto, nesse período a cirurgia oncológica
ainda era restrita a amputações e cauterizações de lesões superficiais em
decorrência da restrição de técnicas anestésicas (Davidson; Routt, 2014;
Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).
A introdução dos princípios de Lister no manuseio cuidadoso de tecidos
com técnica cirúrgica meticulosa, desinfecção das mãos, de instrumentos e
campos cirúrgicos e o surgimento da anestesia inalatória com éter em 1846 foram
os principais marcos no desenvolvimento da cirurgia. Dessa forma, avanços
significativos na amplitude e na qualidade das cirurgias do câncer levaram à
diminuição das taxas de óbito e complicações infecciosas (Davidson; Routt, 2014;
Ganz et al., 2006).
Outros fatores cirúrgicos e não cirúrgicos também contribuíram
significativamente no desenvolvimento desta área: os princípios de ressecção
cirúrgica em bloco, advento da transfusão sanguínea, tratamentos hormonais,

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descoberta da radiografia, antimicrobianos e desenvolvimento da compreensão
da patologia e biologia tumoral (Crane; Selanders, 2017; Davidson; Routt, 2014;
Lopez, 2005).

2.1 Inovações em técnicas cirúrgicas

O médico escocês John Hunter (1728-1793) descreveu inúmeros conceitos


e princípios da oncologia cirúrgica. Hunter defendia a remoção radical do tumor
em conjunto com as áreas de potencial disseminação linfática e acreditava que o
câncer poderia ser um processo localizado com potencialidade de cura por meio
de tratamento cirúrgico (Ganz et al., 2006).
Nas próximas décadas, houve inúmeras descrições de técnicas
fundamentais para a cirurgia oncológica. Uma das maiores figuras dessa evolução
é Albert Theodor Billroth, conhecido por realizar a primeira gastrectomia parcial
em 1881 no tratamento do câncer. Além deste marcante fato, Billroth descreveu
ainda a primeira laringectomia total em 1873, seguida pela primeira
hemipelvectomia e a primeira ressecção de tumor de bexiga (Figueiredo;
Monteiro; Ferreira, 2013; Ganz et al., 2006).
Outros marcos importantes incluem a descrição de ressecção de tumor de
cólon, a histerectomia radical em oncologia, a primeira dissecção cervical radical,
a primeira ressecção abdominoperineal para câncer de reto e a mastectomia
radical em 1891 por William Stewart Halsted. Com a exemplificação da
mastectomia radical, Halsted elucidou os princípios da ressecção cirúrgica em
monobloco no final do século XIX (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013; Ganz et
al., 2006; Simões, 2018).
Apesar das ressecções radicais atingirem um controle local da doença
satisfatório, as taxas de sobrevida não sofreram grandes modificações. Por
exemplo, a mastectomia radical de Halsted atingiu uma taxa de recorrência local
de apenas 4%, porém, as taxas de mortalidade e sobrevida permaneceram
inalteradas, em decorrência da doença metastática prévia e do diagnóstico tardio.
Esse fator somente seria alterado nos anos seguintes, com o surgimento de novas
modalidades terapêuticas e diagnósticas (Wyld; Audisio; Poston, 2015; Hoff et al.,
2013; Ganz et al., 2006).
Inovações tecnológicas em outras áreas também auxiliaram na melhora da
qualidade de vida dos pacientes, eliminando a necessidade de alguns
procedimentos cirúrgicos. Todavia, até a metade do século XX a cirurgia

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oncológica manteve-se como base do tratamento do câncer. Tendo em vista que
os maiores avanços no tratamento do câncer neste período foram provenientes
da cirurgia, durante esse período a área tornou-se popular pelo potencial de cura
ou controle paliativo de sintomas (Fisher, 2008; Ganz et al., 2006).

2.2 Surgimento da hemoterapia

O advento da hemoterapia foi um dos marcos no desenvolvimento na área


da cirurgia oncológica. A primeira transfusão de sangue “moderna” foi realizada
por Reuben Ottenberg no Monte Nova York em 1907. Um dos principais marcos
nesse âmbito foi a descoberta dos tipos sanguíneos e a defesa do uso de
transfusões de sangue por Karl Landsteiner em 1930. Dessa forma, as
hemotransfusões viabilizaram as cirurgias radicais em oncologia, diminuindo a
probabilidade de mortalidade perioperatória (Fisher, 2008).

2.3 O surgimento das novas modalidades de tratamento

Algumas limitações da cirurgia oncológica foram supridas pelo surgimento


da radioterapia e das terapias sistêmicas. Após o surgimento de exames de
diagnóstico por imagem como o Raio-X, descoberto por Wilhelm Roentgen em
1895, foi permitida maior delimitação, extensão e localização de tumores,
subsidiando, assim, o planejamento em cirurgia oncológica. Embora os raios X
fossem inicialmente utilizados para examinar estruturas ósseas, posteriormente
seria aprimorada a visualização de tecidos moles por intermédio do uso de
contrastes (Wyld; Audisio; Poston, 2015; Crane; Selanders, 2017).
Após a divulgação dos trabalhos científicos de Roentgen na aplicação de
raios X em imagens médicas, a utilização da radiação no tratamento de tumores
foi brevemente iniciada. Na década de 1920, a radioterapia já havia se tornado
um tratamento muito mais aceito e viável na oncologia. Posteriormente, durante a
Segunda Guerra Mundial, a quimioterapia foi descoberta por meio do agente
alquilante de mostarda nitrogenada. Dessa forma, o campo da oncologia entrou
em franco progresso, uma vez que o tratamento oncológico poderia ser abordado
com mais de uma modalidade, estabelecendo-se uma abordagem
multiprofissional no tratamento do câncer (Crane; Selanders, 2017; Ganz et al.,
2006; Hoff et al., 2013).

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Com o surgimento de terapias multimodais, novos desafios emergiram na
área de cirurgia oncológica. Um desses é o aperfeiçoamento do controle local da
doença, com menores taxas de morbimortalidade possíveis. Esse desafio foi
superado ao combinar tratamentos quimioterápicos e radioterápicos
neoadjuvantes ou adjuvantes com técnicas cirúrgicas melhoradas, que trouxeram
maior segurança, eficácia, preservação da função e aumento da qualidade de vida
(Wyld; Audisio; Poston, 2015; Hoff et al., 2013).
Posterior ao advento de novas modalidades de tratamento, houve maior
contribuição destas no controle da doença microscópica, o que permitiu uma
abordagem cirúrgica mais conservadora. Sendo assim, atualmente é possível
tratar tumores com cirurgias menos radicais, com maior preservação de estruturas
e funcionalidade, já que é possível associar a cirurgia a outras modalidades de
tratamento com as mesmas chances de cura e/ou de sobrevida livre de doença
(INCA, 2008).
Dessa forma, observamos que os avanços na área da cirurgia oncológica
estão relacionados ao aumento da complexidade dos procedimentos, visando
minimizar danos sem comprometer o curso da doença. Além do controle local do
câncer, a cirurgia tem desempenhado sua função no tratamento da doença
metastática, realizando cirurgias paliativas e ressecções potencialmente
curativas, que geram aumento de sobrevida dos pacientes (Wyld; Audisio; Poston,
2015; Hoff et al., 2013).

TEMA 3 – AS NOVAS FINALIDADES DA CIRURGIA ONCOLÓGICA

A cirurgia é a terapia mais antiga de tratamento do câncer, sendo o primeiro


tratamento capaz de alterar o curso da doença e continua sendo uma das mais
eficientes e mais utilizadas. Estima-se que 60% de todos os pacientes oncológicos
necessitem de um procedimento cirúrgico durante seu tratamento (INCA, 2008;
Hoff et al., 2013).
Atualmente, além do papel curativo bem estabelecido historicamente, a
cirurgia oncológica também aborda as áreas de diagnóstico, estadiamento,
prevenção, reconstrução e cuidados paliativos. Nas seções a seguir, discutiremos
os avanços em domínios específicos da cirurgia oncológica e suas finalidades.

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3.1 Cirurgia preventiva

Baseada em evoluções na área de biologia tumoral e genética, hoje a


cirurgia oncológica também atua na prevenção de determinados tipos de câncer,
com base na história pessoal, familiar e no diagnóstico de síndromes genéticas.
Apesar de exames de triagem para rastreamento precoce do câncer serem
eficientes em grande parte da população, indivíduos com alto risco de
desenvolvimento de tumores podem se beneficiar de medidas preventivas mais
radicais, como as cirurgias preventivas para redução de risco (Davidson; Routt,
2014; Wyld; Audisio; Poston, 2015).
A descoberta da estrutura do ácido desoxirribonucleico (DNA) por Watson
e Crick, em 1953, foi um achado fundamental no que se refere às pesquisas na
área da oncologia e na compreensão do genoma humano. Esse fato gerou
drásticas mudanças em como os profissionais da saúde previnem e tratam o
câncer. Estudos recentes no campo da genética permitiram esclarecer que o
desenvolvimento de câncer relacionado a fatores genéticos não é determinante,
todavia, algumas mutações genéticas podem indicar alto risco para o
desenvolvimento de determinados tipos de tumores (Crane; Selanders, 2017;
Davidson; Routt, 2014).
Nesse contexto, é fundamental que o profissional de saúde compreenda o
papel da genética no desenvolvimento do câncer, realize a identificação de
pacientes em risco e encaminhe para testes genéticos ou exames preventivos.
Conhecer esses fatores de risco auxilia no monitoramento contínuo de pacientes,
subsidiando a detecção precoce e a possibilidade de encaminhamento para
cirurgias preventivas (Davidson; Routt, 2014; Wyld; Audisio; Poston, 2015).
A Oncologia Cirúrgica para redução de risco em oncogenética pode ser
indicada na ressecção preventiva de órgãos. Por exemplo, nas mastectomias e
ooforectomias profiláticas nas mutações hereditárias de BRCA1 e BRCA2; nas
colectomias na Polipose Adenomatosa Familiar (PAF) e câncer colorretal
hereditário. Além de cirurgias profiláticas na área genética, a oncologia cirúrgica
também atua na prevenção de tumores por causas não hereditárias, como a
ressecção de lesões precursoras com potencial para malignidade (Davidson;
Routt, 2014; Simões, 2018).

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3.2 Cirurgia diagnóstica

O diagnóstico anatomopatológico de tecidos é uma obrigatoriedade prévia


ao início do tratamento oncológico para a maioria das neoplasias, com raras
exceções. O papel diagnóstico da cirurgia consiste na remoção parcial ou total de
tecido encontrado em lesões ou massas com o objetivo de realizar exames
histopatológicos que determinarão se a doença é de origem benigna (não
maligna) ou cancerosa (maligna). Além disso, outros testes adicionais poderão
ser realizados no tecido removido: por intermédio da observação de
características celulares e genéticas que subsidiam o diagnóstico definitivo
(Davidson; Routt, 2014; Hoff et al., 2013).
As técnicas cirúrgicas mais comuns utilizadas no diagnóstico e/ou
estadiamento oncológico incluem: as biópsias endoscópicas, laparoscopias,
toracoscopias, mediastinoscopias, laparotomias, toracotomias, as biópsias por
agulha e as biópsias excisionais ou incisionais (ACS, 2015).

3.3 Tratamento primário e cirurgia curativa

Após o estabelecimento do diagnóstico e estadiamento da doença, a


cirurgia com finalidade curativa pode ser indicada para ressecção total do tumor
primário, bem como uma margem de tecidos saudáveis ao redor da massa
tumoral. Essa remoção do tumor também pode incluir a retirada de linfonodos,
vasos sanguíneos e outros órgãos ou tecidos adjacentes. Em grande parte dos
casos, as cirurgias de ressecção com margens livres (ausência de doença
microscópica nos tecidos adjacentes) têm potencial curativo. Entretanto, alguns
pacientes se beneficiam com tratamento adjuvante com radioterapia ou
quimioterapia (Davidson; Routt, 2014; Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).

3.4 Acessos vasculares

Com descoberta de novas modalidades de tratamento de doenças onco-


hematológicas, a cirurgia oncológica também é fundamental no implante de
acessos venosos centrais. A partir de avanços técnico-científicos, hoje é possível
implantar diferentes tipos de cateteres, com indicações variadas, reduzindo sepse
relacionada à infecção de corrente sanguínea e outras complicações associadas
ao implante (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).

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Dentre as principais indicações dos acessos venosos centrais em oncologia
e hematologia se destacam:

1. A promoção de acesso venoso para administração de hemocomponentes,


quimioterápicos, antibióticos e outros medicamentos.
2. Na Nutrição Parenteral Total (NPT), quando a nutrição por via fisiológica ou
enteral não é possível.
3. Na realização do Transplante de Medula Óssea, com a finalidade de
permitir a coleta e infusão de células tronco-hematopoiéticas,
administração das drogas e hemocomponentes necessárias durante o
condicionamento e manutenção do tratamento, e viabilizar a coleta de
amostras de sangue.
4. Na impossibilidade de acesso venoso periférico (Massumoto; Santos,
2017; Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).

Nesse contexto, é indicado que profissionais compreendam os tipos de


cuidados inerentes a cada tipo de cateter com o intuito de evitar complicações em
punção, manutenção ou retirada desses dispositivos. Recomenda-se a utilização
de protocolos e rotinas padronizadas a fim de minimizar infecções, hemorragias,
perda acidental do dispositivo, dentre outras complicações (Massumoto; Santos,
2017).

3.5 Reconstrução e reabilitação

Na medida em que cirurgias radicais de grande porte são realizadas com


finalidade curativa, seus efeitos podem prejudicar potencialmente aspectos de
funcionalidade, forma e imagem corporal, afetando diretamente na qualidade de
vida dos pacientes com câncer. Nesse âmbito, é fundamental que a cirurgia
oncológica ofereça tratamentos de reconstrução, reabilitação e reparo de
intercorrências decorrentes de procedimentos cirúrgicos (Davidson; Routt, 2014).
Inúmeros avanços na área de cirurgia plástica e cirurgias reconstrutivas na
oncologia permitem reparos estéticos e funcionais. Com a utilização de
microcirurgias, retalhos musculares, retalhos livres, enxertos ósseos,
transferência de tecidos, próteses e enxertos de pele, torna-se viável alterar
impactos funcionais e a reabilitação final (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013;
Davidson; Routt, 2014).

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3.6 Cirurgia oncológica em cuidados paliativos

Em oncologia, a cirurgia paliativa apresenta-se como uma modalidade de


tratamento responsável por fornecer benefícios no controle de sintomas e no
aumento da qualidade de vida em pacientes na ausência de possibilidades
terapêuticas. Dessa forma, a cirurgia paliativa não tem a cura como seu objetivo,
todavia, apresenta-se como uma estratégia terapêutica no aumento do conforto e
alívio do sofrimento (Davidson; Routt, 2014).
Dentre as técnicas cirúrgicas mais usuais neste contexto, estão a
descompressão, desvio do tumor e extirpação:

1. Cirurgias para descompressão: procedimento que visa diminuir a


pressão em uma estrutura, como a colocação de uma gastrostomia
descompressiva com a finalidade de remover o conteúdo gástrico na
obstrução da saída gástrica.
2. Desvio de tumor: um desvio pode ser realizado na obstrução de uma área
ou órgão, como a colocação de um stent esofágico nas estenoses
esofágicas, ou a confecção de uma colostomia na obstrução intestinal
maligna, por exemplo.
3. Cirurgias de extirpação: refere-se à remoção de um tumor volumoso ou
cirurgia citorredutora (Davidson; Routt, 2014).

Desse modo, a cirurgia oncológica em cuidados paliativos pode ser


utilizada na retirada de tumores que impedem as funções vitais e na promoção de
controle de sintomas e alívio da dor na doença avançada.

TEMA 4 – NOVAS TENDÊNCIAS NA ABORDAGEM CIRÚRGICA DO CÂNCER

Pacientes oncológicos são comumente submetidos a intervenções


cirúrgicas, desde o diagnóstico oncológico até a sua reabilitação.
Tradicionalmente, esses procedimentos e seus cuidados eram realizados
exclusivamente por cirurgiões. Uma equipe de suporte de multiprofissional
preparada é necessária na abordagem de toda a assistência perioperatória
(Davidson; Routt, 2014).
Na história da cirurgia oncológica, a abordagem cirúrgica aberta para
ressecções cirúrgicas era a técnica usual, por intermédio de grandes incisões
cirúrgicas, a fim de obter a visualização do tumor e de tecidos adjacentes. Essa

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técnica ainda é frequentemente utilizada e amplamente indicada. Entretanto,
atualmente a cirurgia oncológica dispõe de novas técnicas e abordagens que
viabilizam a ressecção tumoral com menores incidências de intercorrências,
incluindo distúrbios de cicatrização em grandes feridas operatórias (Davidson;
Routt, 2014).
Dessa forma, há uma tendência de que o número de cirurgias abertas
reduza, dando espaço a novas técnicas cirúrgicas minimamente invasivas.
Cirurgias laparoscópicas e robóticas auxiliam na rápida recuperação pós-
operatória e facilitam o retorno dos pacientes a suas atividades de vida diárias
(Davidson; Routt, 2014).

4.1 Cirurgia minimamente invasiva

A ampliação tecnológica e de ferramentas operacionais na área cirúrgica


permite ao cirurgião explorar cavidades e remover tumores por intermédio de
aparelhos laparoscópicos e robóticos. Essa modalidade era impensada
anteriormente, uma vez que se acreditava que eram necessárias grandes incisões
operatórias para explorar o crescimento e a invasão tumoral. No entanto, com
esses avanços, hoje o cirurgião consegue executar procedimentos com maior
destreza, facilitando a recuperação pós-operatória e aumento da qualidade de
vida de pacientes oncológicos (Davidson; Routt, 2014).
Posteriormente ao desenvolvimento da cirurgia laparoscópica nas duas
últimas décadas do século XX, não demorou para que novas tecnologias se
desenvolvessem, permitindo que os cirurgiões realizassem procedimentos
minimamente invasivos mais complexos. Nesse contexto, surgiu o primeiro
sistema de cirurgia robótica para uso em laparoscopia em 1994 nos Estados
Unidos. Esse sistema consistiu em um braço mecânico que proporcionava o
sustento de óticas laparoscópicas e podia ser controlada por intermédio de pedais
ou voz (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).
A partir da necessidade de melhorar as habilidades de cirurgiões em
procedimentos laparoscópicos, surgiu na metade da década de 1990 o sistema
robótico da Vinci ®. Esse sistema (Figura 1) trouxe como inovação a transmissão
de imagens em três dimensões através de uma câmera binocular com alta
definição, pinças cirúrgicas de tamanhos variados que se movem em eixos e
braços que podem ser controlados por um console. Essa tecnologia permite ao
cirurgião uma visão anatômica ampliada e tridimensional, maior mobilidade de

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movimentos, e filtração de tremores, viabilizando maior delicadeza e habilidade
na manipulação de tecidos (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013).

Figura 1 – Exemplificação de um sistema cirúrgico robótico

Crédito: Sentavio/Shutterstock.

Embora essa modalidade cirúrgica tenha sido criticada inicialmente,


estudos indicam que a cirurgia minimamente invasiva apresenta resultados
equivalentes ou muitas vezes até superiores às cirurgias abertas. Menores taxas
de complicações pós-operatórias como: infecções de ferida operatória, dor,
hemorragias, recuperação lenta da capacidade pulmonar pós-cirúrgica e longos
períodos de internamento fizeram com que esta abordagem se torna preferencial
no tratamento de diversos tipos de neoplasias (Figueiredo; Monteiro; Ferreira,
2013; Chang; Rattner, 2019).
Dentre as principais desvantagens dessa modalidade citadas pela literatura
se incluem: o alto custo e a necessidade de uma equipe altamente especializada.
Entretanto, acredita-se que no futuro um número maior de pacientes se
beneficiará das técnicas de cirurgia minimamente invasiva, tendo em vista a
perspectiva de ampliação de tecnologias e de procedimentos realizados nessa
modalidade (Figueiredo; Monteiro; Ferreira, 2013; Chang; Rattner, 2019).

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TEMA 5 – A CIRURGIA ONCOLÓGICA NA ATUALIDADE E PERSPECTIVAS
FUTURAS

Com o advento de inovações tecnológicas e científicas em especialidades


oncológicas e na compreensão com câncer em nível molecular, novas estratégias
de tratamento personalizado e individualizado estão em constante evolução. O
uso intraoperatório de corantes radioativos e isótopos na avaliação patológica de
neoplasias e suas variedades metodológicas estão em desenvolvimento e podem
se tornar um grande passo no tratamento cirúrgico do câncer (Wyld; Audisio;
Poston, 2015).
Devido ao surgimento e inovações dos procedimentos cirúrgicos robóticos,
laparoscópicos e cirurgias reconstrutivas, as ressecções radicais contemporâneas
estão viáveis com menores taxas de complicações e mortalidade. Dessa maneira,
o desafio atual e futuro da oncologia cirúrgica é a manutenção da forma, função e
aumento da qualidade de vida, sem alterar o desfecho oncológico dos pacientes
(Wyld; Audisio; Poston, 2015; Fisher, 2008).
Essas realizações abriram as portas para uma nova era da oncologia
cirúrgica que ainda está em seu início, uma vez que estudos apontam que em
breve a cirurgia robótica poderá substituir as técnicas atualmente executadas
(Wyld; Audisio; Poston, 2015; Fisher, 2008).
Avanços em técnicas atuais de diagnóstico por imagem, como fluoroscopia,
tomografia computadorizada e ressonância magnética, têm seu papel cada vez
mais amplo no planejamento e orientação cirúrgica. A modalidade de navegação
intraoperatória e impressão tridimensional (3D) também tem auxiliado no
planejamento cirúrgico, exploração do campo operatório e na precisão de
movimentos (Wang et al., 2015).
Pesquisas nas demais modalidades de tratamento oncológico, como
progressos na genética molecular e novos tratamentos imunoterápicos e
desenvolvimento de terapias-alvo estão em franco progresso. Todavia, o
desenvolvimento de outras modalidades dificilmente levará a cirurgia oncológica
à extinção, tendo em vista a heterogeneidade e a adaptabilidade do câncer (Wyld;
Audisio; Poston, 2015).
Nesse aspecto, é fundamental que você, profissional da saúde ligado à
área da oncologia, desenvolva sua prática assistencial baseada em evidências,

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otimizando resultados e contribuindo com o desfecho oncológico e com o aumento
da qualidade de vida dos pacientes.

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REFERÊNCIAS

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