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as outras Terras?
Tim Urban
26-35 minutos
Quando você está em algum lugar propício para admirar as estrelas, e se a noite estiver
especialmente boa para vê-las, é incrível olhar para cima e se deparar com algo
semelhante à imagem acima.
O físico Enrico Fermi também reagia diferente, e se perguntou: “cadê todo mundo?”
Os números
Um céu estrelado parece imenso, mas tudo o que estamos vendo é a nossa vizinhança.
Nas melhores noites estreladas, nós podemos ver até 2.500 estrelas (mais ou menos um
centésimo de milionésimo do total de estrelas em nossa galáxia). Quase todas estão a
menos de mil anos-luz de nós (ou 1% do diâmetro da Via Láctea). Então, na verdade
estamos olhando para isto:
Nosso céu noturno é formado por uma pequena parte das estrelas próximas e mais
brilhantes dentro do círculo vermelho.
Quando somos confrontados com o assunto de estrelas e galáxias, uma questão que
atormenta a maior parte dos humanos é: “há vida inteligente lá fora?” Vamos colocar
alguns números nessa questão; se você não gosta de números, pode ler só o negrito.
Nossa galáxia tem entre 100 bilhões e 400 bilhões de estrelas; no entanto, este é quase o
mesmo número de galáxias no universo observável. Então, para cada estrela da imensa
Via Láctea, há uma galáxia inteira lá fora. No total, existem entre 10^22 e 10^24
estrelas no universo. Isso significa que para cada grão de areia na Terra, há 10.000
estrelas no universo.
O mundo da ciência não está em total acordo sobre qual porcentagem dessas estrelas são
parecidas com o Sol (similares em tamanho, temperatura e luminosidade). As opiniões
tipicamente vão de 5% a 20%. Indo pela mais conservadora (5%) e o número mais
baixo na estimativa total de estrelas (10^22), isso nos dá 500 quintilhões, ou 500
bilhões de bilhões de estrelas similares ao Sol.
Então existem 100 planetas parecidos com a Terra para cada grão de areia do mundo.
Pense nisso na próxima vez que for à praia.
Daqui para a frente, nós não temos outra escolha senão sermos especulativos. Vamos
imaginar que, depois de bilhões de anos de existência, 1% dos planetas parecidos com a
Terra tenham desenvolvido vida (se isso for verdade, cada grão de areia representaria
um planeta com vida). E imagine que em 1% desses planetas avance até o nível da vida
inteligente, como aconteceu na Terra. Isso significaria que teríamos 10 quatrilhões, ou
10 milhões de bilhões de civilizações inteligentes no universo observável.
Voltando para a nossa galáxia e fazendo as mesmas contas usando a estimativa mais
baixa de estrelas na Via Láctea, estimamos que existem 1 bilhão de planetas similares
à Terra, e 100 mil civilizações inteligentes na nossa galáxia. (A Equação de
Drake traz um método formal para esse processo limitado que estamos fazendo).
Tipos de civilização
E tudo fica mais estranho. Nosso Sol é relativamente jovem em relação ao universo. Há
estrelas muito mais velhas, com planetas muito mais velhos e semelhantes à Terra, o
que em teoria representaria civilizações muito mais avançadas que a nossa. Por
exemplo, vamos comparar nossa Terra de 4,54 bilhões de anos com um hipotético
planeta X, com seus 8 bilhões de anos.
Se o planeta X tiver uma história similar a da Terra, vamos olhar para onde sua
civilização estaria hoje:
Hoje, o Planeta X estaria a 3,46 bilhões de anos de desenvolvimento além do que
temos hoje.
A tecnologia e o conhecimento de uma civilização mil anos à nossa frente poderia ser
tão chocante quanto nosso mundo seria para uma pessoa medieval. Uma civilização um
milhão de anos à frente poderia ser tão incompreensível para nós quanto a cultura
humana é para chimpanzés. E o planeta X está a 3.4 bilhões de anos à frente de nós…
Existe algo chamado de Escala Kardashev, que nos ajuda a agrupar civilizações
inteligentes em três grandes categorias, de acordo com a quantidade de energia que
usam:
uma Civilização Tipo I tem a habilidade de usar toda a energia de seu planeta.
Nós não somos exatamente uma Civilização Tipo I, mas estamos perto (Carl
Sagan criou uma fórmula para essa escala que nos coloca como uma Civilização
Tipo 0,7);
uma Civilização Tipo II pode colher toda a energia de seu sistema solar. Nosso
débil cérebro Tipo I mal consegue imaginar como alguém faria isso, mas nós
tentamos nosso melhor, imaginando coisas como a Esfera de Dyson.
uma Civilização Tipo III ultrapassa fácil as outras duas, acessando poder
comparável ao da Via Láctea inteira.
Se esse nível de avanço parece difícil de acreditar, lembre-se do planeta X e de seus 3,4
bilhões de anos de desenvolvimento além do nosso (cerca de meio milhão de vezes mais
do que o tempo que a raça humana existe). Se uma civilização no planeta X for similar à
nossa e foi capaz de sobreviver até chegar no Tipo III, é natural pensar que a essa altura
eles provavelmente já dominaram a viagem interestelar, possivelmente até mesmo
colonizando a galáxia inteira.
Mesmo sem alcançar nada perto da velocidade da luz, esse processo colonizaria a
galáxia inteira em 3,75 milhões de anos, relativamente um piscar de olhos quando
estamos falando de uma escala de bilhões de anos:
Nesta evolução exponencial, a galáxia estaria completamente colonizada em 3,75
milhões de anos. Fonte: J. Schombert, U. Oregon
Ainda não há uma resposta para o Paradoxo de Fermi. O melhor que podemos fazer é
conseguir “explicações possíveis”. E se você perguntar a dez cientistas diferentes qual o
palpite deles sobre a explicação correta, você terá dez respostas diferentes. Sabe quando
humanos de antigamente discutiam se a Terra era redonda, ou se o Sol girava em torno
da Terra, ou achavam que os raios aconteciam por causa de Zeus? Por isso, hoje eles
parecem primitivos e ignorantes; no entanto, esse é mais ou menos o ponto em que
estamos neste assunto.
A teoria do Grande Filtro diz que, em algum ponto entre o início da vida e a inteligência
Tipo III, há uma barreira. Há algum estágio naquele longo processo evolucionário que é
improvável ou impossível de ser atravessado pela vida. Esse estágio é chamado de O
Grande Filtro.
As linhas amarelas mostram saltos evolucionários comuns de serem alcançados. A
linha vermelha é o Grande Filtro. A linha verde representa uma espécie que, passando
por eventos extraordinários, consegue ultrapassar o Grande Filtro.
Se essa teoria for real, a grande questão é: quando acontece o Grande Filtro na linha do
tempo?
Esse cenário explicaria por que não existem Civilizações Tipo III… mas isso também
poderia significar que nós podemos ser uma das exceções, já que chegamos até aqui.
Isso significaria que há esperança para nós. Superficialmente, isso parece com as
pessoas de meio século atrás, sugerindo que a Terra é o centro do universo. Sugere que
nós somos especiais.
Mas se nós somos especiais, quando exatamente nos tornamos especiais? Isto é, qual
passo nós superamos, apesar de quase todo mundo ficar preso nele?
Uma possibilidade: o Grande Filtro pode estar no comecinho de tudo; pode ser
incrivelmente raro que a vida comece. Esse é um candidato porque demorou um bilhão
de anos para a vida na Terra finalmente acontecer, e porque nós tentamos
exaustivamente replicar esse evento em laboratórios e jamais conseguimos. Se este é
mesmo o Grande Filtro, isso significaria que não deve existir vida inteligente lá
fora – pode simplesmente não haver vida.
Outra possibilidade: o Grande Filtro pode ser o salto de células procariontes simples
para células eucariontes complexas. Após o surgimento das procariontes, elas
permaneceram dessa forma por quase dois milhões de anos antes de darem o salto
evolucionário para se tornarem complexas e ganharem um núcleo. Se esse é o Grande
Filtro, isso significaria que o universo está repleto de células procariontes simples e
quase nada além disso.
Há outras possibilidades. Alguns acham até que nosso salto evolucionário mais recente,
alcançando nossa inteligência atual, é um candidato a Grande Filtro. Ainda que o salto
de vida semi-inteligente (chimpanzés) até a vida inteligente (humanos) a princípio não
pareça um passo miraculoso, Steven Pinker rejeita a ideia de que a “escalada
ascendente” da evolução seja inevitável:
Uma vez que a evolução apenas acontece, sem ter um objetivo, ela usa a adaptação mais
útil para um certo nicho ecológico. O fato que, na Terra, até hoje isso levou a
inteligência tecnológica apenas uma vez, pode sugerir que essa consequência da seleção
natural é rara e, consequentemente, não é um desenvolvimento infalível da evolução de
uma árvore da vida.
A maioria dos saltos não se qualifica como candidatos a Grande Filtro. Qualquer
Grande Filtro possível deve ser algo que só acontece uma vez em um bilhão, onde uma
ou mais anomalias devem ocorrer para proporcionar uma enorme exceção.
Por esse motivo, algo como pular de uma vida unicelular para uma multicelular está
fora de questão como filtro, porque isso aconteceu pelo menos 46 vezes em incidentes
isolados, só no nosso planeta. Pela mesma razão, se nós encontrarmos uma célula
eucarionte fossilizada em Marte, ela iria tirar o salto “de-célula-simples-para-complexa”
da lista de possíveis Grandes Filtros (assim como qualquer outra coisa que esteja antes
desse ponto na cadeia evolucionária). Se isso aconteceu tanto na Terra quanto em
Marte, claramente não é uma anomalia.
Se nós formos mesmo raros, isso pode ser por causa de um acidente biológico, mas isso
também pode ser atribuído ao que se chama de Hipótese da Terra Rara. Ela sugere que,
ainda que existam muitos planetas similares a Terra, as condições particulares do nosso
planeta o tornam tão conveniente à vida — sejam as relacionadas a seu sistema solar,
seu relacionamento com a Lua (uma lua tão grande é incomum para um planeta tão
pequeno, contribuindo para as condições peculiares de nosso clima e nosso oceano), ou
algo sobre o planeta em si.
Para pensadores do Grupo 1, se já não tivermos passado pelo Grande Filtro, nossa única
esperança é que, do Big Bang até hoje, as condições no universo estão alcançando um
nível que permita o desenvolvimento de vida inteligente. Nesse caso, nós podemos estar
a caminho da super inteligência, mas isso ainda não aconteceu. Por acaso, nós
estaríamos na hora certa para nos tornarmos uma das primeiras civilizações super
inteligentes.
Da mesma forma, pode ser que o começo das existências no universo esteja cheio de
eventos cataclísmicos, como explosões de raios gama que incinerariam tudo à sua volta
de tempos em tempos, evitando que qualquer vida se desenvolva a partir de um certo
estágio. Talvez estejamos agora no meio de uma fase de transição astrobiológica, e essa
seja a primeira vez que qualquer vida tenha sido capaz de se desenvolver
ininterruptamente por tanto tempo.
Se nós não somos nem raros nem pioneiros, os pensadores do Grupo 1 concluem que O
Grande Filtro deve estar no nosso futuro. Isso implicaria que a vida frequentemente
evolui até onde estamos, mas alguma coisa impede, em quase todos os casos, que a vida
vá muito adiante e alcance a inteligência avançada — e dificilmente nós seremos uma
exceção.
É por isso que o filósofo Nock Bostrom, da Universidade de Oxford, diz que “boa
novidade é não haver novidade“. Se descobrirem vida em Marte, mesmo que simples,
isso seria devastador, porque eliminaria diversos potenciais Grandes Filtros no passado.
E se encontrarmos fósseis de vida complexa em Marte, Bostrom diz que “seria a pior
notícia já impressa em uma primeira página de jornal”, porque significaria que o Grande
Filtro está quase que definitivamente à nossa frente, condenando toda nossa espécie de
uma vez. Bostrom acredita que, quando se trata do Paradoxo de Fermi, “o silêncio do
céu noturno é ouro”.
Pensadores do Grupo 2 têm uma ampla gama de possíveis explicações para o Paradoxo
de Fermi. A seguir, eis as nove mais discutidas:
Uma civilização ainda mais avançada poderia ver todo o mundo físico como um lugar
horrivelmente primitivo, tendo há muito dominado sua própria biologia e feito upload
de seus cérebros para uma realidade virtual, um paraíso da vida eterna. Viver em um
mundo físico de biologia, morte, desejos e necessidades pode soar para eles da mesma
forma como nos soam as espécies primitivas vivendo no oceano escuro e gelado.
Possibilidade 4: há civilizações predatórias e assustadoras lá fora, e as formas de
vida mais inteligentes sabem que não devem transmitir sinais e divulgar sua
localização. Essa é uma ideia desagradável, mas que ajudaria explicar a falta de sinais
recebidos pelos satélites SETI. Ela também significaria que, ao transmitir nossos sinais
lá pra fora, estamos sendo novatos inocentes e descuidados. Há um debate
envolvendo METI (Mensagem às Inteligências Extraterrestes na sigla em inglês; o
inverso de SETI, que só escuta). Basicamente, deveríamos mesmo enviar mensagens
para o universo? A maioria das pessoas diz que não.
Stephen Hawking adverte: “se aliens nos visitarem, o resultado pode ser parecido com a
chegada de Colombo nas Américas, que não terminou bem para os nativos”. Mesmo
Carl Sagan, que geralmente acredita que qualquer civilização avançada o bastante para
viagens interestelares seria altruísta, não hostil, diz que a prática de METI
é “profundamente imprudente e imatura“, e recomendou que “as crianças mais novas de
um cosmo estranho e incerto deveriam ouvir em silêncio por um longo tempo,
aprendendo pacientemente e tomando notas sobre o universo, antes de gritar para uma
selva desconhecida que não conseguimos compreender”. Assustador.
Então não é que, usando nossa tecnologia, não sejamos capazes de receber os sinais do
planeta X. É que nós não conseguimos sequer entender o que são os seres do planeta X,
ou o que eles estão tentando fazer. É tão além de nós que mesmo se eles quisessem nos
esclarecer, seria como tentar ensinar às formigas sobre a internet.
Seguindo essa linha, essa pode ser uma resposta para “se existem tantas exuberantes
Civilizações Tipo III, por que ainda não entraram em contato conosco?”. Para responder
isso, vamos nos perguntar: quando Pizarro chegou ao Peru, ele parou um tempo em um
formigueiro e tentou se comunicar com ele? Ele foi magnânimo, tentando ajudar as
formigas? Ele foi hostil e atrasou sua missão original só para esmagar e destruir o
formigueiro? Ou, para Pizarro, o formigueiro era completa e absoluta e eternamente
irrelevante? Essa pode ser a nossa situação nesse caso.
Conclusão
Conforme continuamos em nossa possivelmente inútil busca por inteligência
extraterrestre, eu não tenho certeza o que queremos encontrar. Francamente, tanto faz
saber se estamos oficialmente sozinhos no universo ou se estamos oficialmente na
companhia de outros, ambas são opções assustadoras. É um tema recorrente em todos os
enredos surreais acima: qualquer que seja a verdade, ela é de enlouquecer.
E ainda temos mais outro golpe à autoestima com todo esse assunto de Civilizações
Tipos II e III. Aqui na Terra, nós somos os reis de nosso pequeno castelo, comandando
os rumos do planeta mais do que qualquer outra espécie. Nessa bolha, sem competição e
sem ninguém para nos julgar, é raro que sejamos confrontados com a ideia de sermos
uma espécie inferior a qualquer outra. Mas não somos nem uma Civilização Tipo I!
Dito isso, toda essa discussão é maravilhosa para mim. Sim, tenho minha perspectiva
de que a humanidade é uma órfã solitária em uma pequena rocha no meio de um
universo solitário. Mas as hipóteses apontam que provavelmente não somos tão espertos
como pensamos. Além disso, muito do que temos certeza pode estar errado. Tudo isso
me deixa esperançoso em conhecer e descobrir mais, nem que seja um pouquinho,
porque existem muito mais coisas do que nós temos consciência.
FONTE: https://gizmodo.uol.com.br/paradoxo-fermi/