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PRZEWORSKI, Adam. Social democracia como fenômeno histórico In Revista Lua Nova.

São
Paulo: CEDEC, vol 4, nº 3, 1988.

pp. 41
Quando emergiu, ao redor de 1850, o socialismo era um movimento que completaria a revolução
iniciada pela burguesia, disputando o “poder social”, assim como a burguesia tinha conquistado o
poder político. O tema constante do movimento socialista desde então tem sido esta noção de
“prolongar” o princípio democrático do campo político para os social, de fato primariamente
econômico.

pp.41-42
O projeto dos primeiros socialistas – os comunitários – era construir uma sociedade dentro da
sociedade onde consumidores e produtores viveriam em completa interdependência em relação ao
mundo burguês superando a ordem capitalista e industrial.

pp.42-43
Tão logo a sociedade capitalista desenvolvesse suas instituições políticas a postura de
interdependência não poderá se sustentar. Desta forma a escolha veio ser a ação “direta” e
“política”, uma confrontação entre o mundo dos trabalhadores e o mundo do capital. Por isso Max
defendia a organização dos trabalhadores em partidos políticos que deveriam conquistar o poder.
Mas na democracia política o voto já era uma arma nas mãos dos trabalhadores. Deveria esta arma
ser descartada? Os anarquistas descartavam essa arma por que entendiam que qualquer
envolvimento na sociedade burguesa destruiria o próprio movimento socialista. Alex Danielsson um
dos fundadores da socialdemocracia afirmava que mudaria o socialismo para um movimento
meramente parlamentar criando condições reformistas que destruiriam os interesses dos
trabalhadores.

pp.43
Na Primeira Internacional os novos partidos socialistas abraçaram os princípios da ação política e da
autonomia dos trabalhadores. A atitude dos partidos socialistas com relação a participação eleitoral
era ambígua. A questão era se a burguesia respeitaria a sua própria ordem legal em caso de triunfo
eleitoral socialista. Desta forma a revolução não seria inevitável?

pp.44
Os socialistas entraram cautelosamente nas políticas eleitorais mais como forma de estabelecer uma
propaganda e recusavam a aceitar qualquer compromisso com outros partidos.

Capitalismo Democrático e Participação Política


pp.45
Enquanto uma competição democrática oferecer a vários grupos uma oportunidade para melhorar
alguns aspectos de seus interesses a curto prazo, qualquer partido político que procura mobilizar
trabalhadores deve valer-se dessa oportunidade.

pp.46
A democracia política constitui oportunidade para os trabalhadores assegurarem alguns de seus
interesses. Além do mais, como cidadãos podem interferir na própria organização da produção e na
alocação dos lucros. Ideais revolucionários podem mover a história, mas nem alimentam nem
abrigam. Se for para se utilizar da oportunidade oferecida pela democracia, os trabalhadores devem
organizar-se como participantes, ela pode conduzir a outras formas de luta, inclusive a confrontação
direta com os capitalistas, ainda mais em tempos que insurreições armadas se tornam impraticáveis
dada as mudanças tecnológicas na arte bélica
pp.47
As experiencias comuns de derrotas e repressões tinham efeito decisivo quanto a direcionar os
partidos socialistas para táticas eleitorais. A representação parlamentar era necessária para proteger
o movimento. São necessárias por que massas de indivíduos podem sofrer consequências políticas
se não estarem organizadas. O fato é que as instituições que tiveram maior duração foram aquelas
que optaram por se envolver nas instituições burguesas.

Participação eleitoral e organização de classe


pp.47
A controvérsia está em se o ato de “tomar parte” neste sistema particular modela o movimento para
o socialismo e sua relação com os trabalhadores como uma classe.

pp.48
A participação imprime uma estrutura particular sobre a organização dos trabalhadores como classe.
Um traço característico da democracia capitalista é a individualização das relações de classe ao
nível de processo político e ideologia – todos aparecem como “indivíduos” ou “cidadãos”. A
participação relega as relações dentro da classe tornam-se estruturadas como relações de
representação. As massas não agem diretamente na defesa de seus interesses, mas delegam essa
defesa o que leva a desmobilização das massas.

pp.49
O dilema organizacional: a criação de um aparato permanente leva o movimento a se engajar
atividades econômicas em sua própria lavra – os militantes se tornam burocratas ou ocupações
burguesas.

A promessa de eleições
pp. 51
A participação de eleições era baseada na crença de que a democracia não é apenas necessária,
mas suficiente para se alcançar o socialismo. Socialistas participaram de eleições por que
precisavam se preocupar com melhorias imediatas das condições de vida dos trabalhadores., mas
tinham que tornar o socialismo realidade.

pp. 53
De fato, enquanto aqueles que eventualmente tornaram-se comunistas viam na Revolução Russa a
prova de uma bem sucedida revolução é sempre possível para os socialdemocratas a necessidade
de confiar a revolução de uma minoria significa apenas as condições para os socialismos ainda não
estão maduras.

pp.54
A prática confirmava a teoria. De eleição em eleição as forças do socialismo cresciam em vigor.

Democracia social e a classe trabalhadora


pp. 54
O partido socialista deveria ser a classe trabalhadora organizada.

pp. 55
O capitalismo é um sistema em que trabalhadores competem uns com os outros se não estão
organizados como classe. Igualdade de classe não resulta necessariamente em solidariedade.
Interesse de classe não significa interesse de cada trabalhador como indivíduo. Os partidos
socialistas deveriam ser organizações de forma a limitariam as competição dentro da classe.
pp. 56
O universalismo é a ideologia natural da burguesia que como classe se põem a representar o
interesse de todos. Por isso a burguesia postula uma básica harmonia de interesses entre
indivíduos-cidadãos.
As instituições políticas burguesas expressam essa visão da sociedade. Para o movimento socialista
o abstrato do processo político justapõe uma imagem representando o conflito de interesses numa
sociedade dividida em classes. Na realidade existe homens condutores da sociedade e outros ficam
a revelia deste processo.

pp. 57
Os trabalhadores não são indivíduos da sociedade burguesa, são uma classe distinta, dentro de uma
sociedade dividida em classes. A dificuldade inicial dos socialistas era convencer os trabalhadores,
uma vez que esses se mostravam desconfiados de qualquer influencia oriunda de fora de sua
classe. O socialismo era uma experiência abstrata e estranha em relação a sua experiência diária.

O dilema eleitoral
pp. 58
O proletariado não era e nunca se tornou a maioria numérica dos eleitores em qualquer sociedade. A
previsão de a classe média desalojada e desempregada se tornassem proletários nunca se
concretizou. Os que estavam excluídos de atividades renumeradas não se tornavam proletários de
reserva. Aposentadorias compulsórias, exércitos permanentes, impedimentos efetivos as mulheres
reduziram a entrada no proletariado.

pp.59
As regras do jogo democrático demonstram que para um partido governar sozinho, sem o óbice das
alianças moderadoras, leva a necessidade de uma maioria acima dos 50%. É impossível a vitória de
uma minoria isolada. Essa condição impõe escolhas aos partidos socialistas: manter-se homogêneo
em sua expressão classista, condenado a derrotas eleitorais, por sua natureza minoritária, ou diluir
seu caráter de classe. Para atingir seus objetivos os partidos socialistas precisariam buscar o apoio
de outras classes.

pp. 61
A inclinação de diversos partidos socialdemocratas, no pós-guerra, na direção das camadas médias
foi um reflexo das mudanças da estrutura de classes na Europa ocidental. Neste momento podemos
falar de “novas classes médias, a busca por aliados é inerente ao eleitoralismo. No entanto, os
partidos social-democratas nunca obtiveram os votos das pessoas que realmente foram as urnas na
proporção que precisavam.

pp. 62
Os partidos socialdemocratas pareciam condenados a minoria enquanto representante de uma
classe e igualmente relegados quando buscavam ser um partido de massa. A razão esta que
enquanto partido de massa, os trabalhadores não se identificam como classe, mas se diluem nos
conceitos de “massa”, “povo”, “cidadãos”, “pagadores de impostos”.

pp. 63
A diluição dos interesses de classe repercute agudamente em conflitos políticos na sociedade
capitalista, uma vez que se estabelece uma visão não classista de política. A medida que a
identificação de classe menos evidente, os partidos socialdemocratas perdem sua atração sobre os
trabalhadores.
pp. 64
Os socialdemocratas não tiveram êxito em transformar as eleições em um instrumento em prol da
visão socialista.
Reforma e Revolução
pp.64-65
Os socialistas sempre participaram das eleições com objetivos finais. Por esses objetivos não
estarem ao alcance se insistia em esperar pelo dia que finalmente seria possível realiza-los.

pp. 65
Por isso a reforma do sistema democrático com o objetivo de torna-lo mais justo foi uma opção
natural. Esta orientação dirigida a melhoria, nunca foi vista por seus arquitetos como um afastamento
de seus objetivos finais. Os objetivos finais se realizariam por que a história estava ao lado do
socialismo.

pp. 67
As reformas seriam degraus no sentido de uma completa reestruturação da sociedade. Reforma e
revolução dentro da visão socialdemocrata não exclusivas entre si.

Projetos econômicos e realidades políticas


pp. 67-68
A necessidade da “revolução social” se estabelecia por que o capitalismo era irracional e injusto. E a
causa primordial desses males é a propriedade privada dos meios de produção.

pp. 68
Ela gera uma distribuição injusta das riquezas materiais por ela gerada. Dada essa análise a
socialização ou a nacionalização dos meios de produção seria a principal forma de se alcançar os
objetivos socialistas. A Primeira Guerra Mundial destruiu a ordem pré-estabelecida e abriu as portas
para a participação governamental.

pp. 69
Uma verdadeira ordem constituinte ocorreu após a Primeira Guerra Mundial. Todos buscavam a
elaboração de um modo de combinar a racionalização da sociedade com todo o controle do operário
sobre a produção. A explosão da atividade teórica chegou em atraso em relação as exigências da
prática política.

O Compromisso
pp.70
O fato é que além de buscar a melhoria de vida dos trabalhadores, até a década de 1930, os
socialdemocratas não tinham uma política econômica própria.

pp.71
Tal alternativa surgiu em resposta a Grande Depressão. Os socialdemocratas logo descobriram nas
ideias de Keynes algo que necessitavam urgentemente. A “revolução Keynesiana” muniu a
socialdemocracia de uma meta e de uma justificativa governamental e ao mesmo tempo transformou
o significado ideológico das políticas distributivas que favoreciam a classe trabalhadora. O Estado se
transformou numa instituição pela qual a sociedade poderia regular as crises, mantendo o pleno
emprego.

pp.72
A virada keynesiana logo levou os socialdemocratas a desenvolver a ideologia abrangente do
“estado de bem estar social” Os socialdemocratas abandonaram os projetos de nacionalização e
assumiram seu novo papel na transformação da sociedade.
pp.73
Em vez do controle direto, o Estado poderia atingir seus objetivos socialistas influenciando o setor
privado a se comportar de acordo com os interesses gerais.
O abandono do reformismo
pp.74
Nesta nova função o Estado ocupa-se das atividades econômicas necessárias a economia como um
todo (crédito, carvão, ferro, aço...) e vende seus produtos e serviços principalmente para as
empresas privadas. Supõem-se que o Estado fique limitado a prover os chamados “bens públicos”,
aqueles que são indivisíveis e que, se fornecidos, os são para todos. O Estado assume aquilo que
não é lucrativo para a empresa privada, mas é necessária ao conjunto da economia.

pp.75
A intervenção do Estado na economia deve ser guiada pela eficiência. Assim a política
socialdemocrata consiste geralmente, em mitigar os efeitos da distribuição dos recursos, visando não
transformar os sistemas econômicos, mas corrigir os efeitos de sua operação.

As bases econômicas da conciliação de classes


pp. 77
A eficiência dos socialdemocratas, neste caso, depende da lucratividade do setor privado e das
operações capitalistas. O compromisso com o capital é, portanto, uma expressão da própria
estrutura da sociedade capitalista.

pp.78
No capitalismo os lucros de hoje são a condição para investimentos e, portanto, para a produção, o
emprego e o consumo de amanhã. As crises do capitalismo não interessam aos assalariados, uma
vez que nele, elas caem sobre suas costas. É por isso que os socialdemocratas trocam a abolição
da propriedade privada dos meios de produção pela cooperação capitalista em aumentar a
produtividade e distribuir os ganhos.

A Socialdemocracia e o Socialismo
pp. 78
Os socialdemocratas não conduziram a sociedade ao socialismo.

pp. 81
Defrontados com a crise econômica, ameaçados com a perda de apoio eleitoral, preocupados com a
possibilidade de uma contrarrevolução fascista, os socialdemocratas abandonam o projeto de
transição ou ficam à espera de tempos mais auspiciosos. Dispõem-se ao compromisso, e a defender
os trabalhadores, ainda que cientes que diante de certas condições é melhor aderir ao sistema do
que criar uma situação que se vire contra eles.

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