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Política aqui entendida na concepção arentiana que compreende como algo fundamentado na
pluralidade de agentes, observando que a política trata da convivência entre os diferentes, assim: “a
política surge no entre-os-homens; portanto, totalmente fora dos homens” (ARENDT, Hannah. O que é
Política? Rio de Janeiro: Bertrand, 2006, p. 21-23).
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A práxis cidadã
Entende-se que a cidadania não pode ser compreendida como uma mera
conquista individual ou como algo concedido, um status. A lógica liberal individualiza
a cidadania e, desse modo, subtrai a força das ações coletivas, em especial as que
tenham um caráter de transformação social profunda e radical. Cria-se, assim, o
“cidadão privado”: uma contradição, pois os termos dizem respeito a formas
incompatíveis entre si, já que a cidadania pressupõe algo construído coletivamente na
história, enquanto o privado indica algo restrito, quando não individualizado.
(KOWARICK, 1995, p. 110-112).
Desse modo, falar em cidadania e, sobretudo, buscar sua plena realização é tratar
de um tema que incomoda as “oligarquias” acostumadas às regalias e vantagens, muitas
vezes, obtidas em uma relação de exploração que perpetua a desigualdade social e nega
a plena cidadania.
De certo modo, no senso comum, domina certa noção de que “o povo brasileiro
não luta por seus direitos”, contudo, ao observarmos o processo histórico da formação
do povo brasileiro, veremos algo muito diferente, encontraremos um povo que lutou por
seus direitos e que questionou os privilégios das “oligarquias” ao longo da história e que
segue buscando ampliar seus direitos de cidadania. A observação atenta da sociedade
nos permite perceber esse movimento e ao mesmo tempo ver o quanto é enganosa a
ideia de apatia social.
Como observa Maria da Glória Gohn (2003), a história das lutas e movimentos
sociais no Brasil é tão antiga quanto o processo de formação do país.
É possível notar uma intensificação dessas lutas a partir dos séculos XVIII e
XIX. Tais como:
Engana-se quem afirma que o Brasil é um país sem uma história de lutas
populares e movimentos sociais organizados. Não seria exagero afirmar que o país
concentrou a maioria dos movimentos nas últimas décadas em toda a América Latina,
certamente devido à sua extensão territorial, população numerosa e demandas sociais
diversificadas. Do início do século XX, com as lutas urbanas ganhando destaque devido
ao fortalecimento da industrialização até 1964, com o golpe militar, que instaurou uma
nova fase nas lutas sociais e na organização dos movimentos sociais, a sociedade
brasileira conviveu com uma centena de movimentos sociais dos mais diferentes
matizes políticos e ideológicos (GOHN, 2003, p. 15-60).
Entre 1964 e 1974, pode-se observar uma fase de resistência ao regime militar,
em que os movimentos sociais tiveram papel fundamental, essa fase corresponde à
limitação da liberdade imposta pelos militares e à violência do regime que crescia tanto
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no campo como na cidade. Com a dissolução dos partidos de esquerda (PCB, PC do B),
surgem diversos movimentos de resistência ao regime como: Aliança Libertadora
Nacional (ALN), o MR8, o Movimento de Libertação Nacional (MOLIPO), Ação
Popular (AP), Guerrilha do Araguaia (1967-74), Política Operária (POLOP). O
Movimento Estudantil (ME) experimenta uma grande efervescência nesse período como
espaço privilegiado de resistência à ditadura militar, mesmo tendo a UNE (União
Nacional do Estudantes) na clandestinidade e parte da sua liderança perseguida pela
repressão do Estado (GONH, 2003, p. 103-107).
De acordo com Eder Sader (1995), na história dos movimentos sociais em São
Paulo, os Clubes de Mães, ocupam um lugar de destaque. Nessas associações ligadas às
igrejas, as mulheres se organizavam para dar formação umas às outras ensinando
costura, bordados, trabalhos manuais, além de métodos de higiene, saúde e política. Um
dos desdobramentos mais importantes do movimento de clube de mães e da Teologia da
Libertação é o Movimento do Custo de Vida, que surge em diversas capitais do Brasil a
partir de 1972 e se configura juntamente com os clubes de mães num dos principais
movimentos populares dos anos 1970. A partir de 1979, o movimento passa a se chamar
Movimento contra a carestia.
d. Movimento das Favelas (1979), inicialmente lutando por água, esgoto e luz e
pela posse da terra. Data desse período, por exemplo, a organização da
Comunidade de Heliópolis em SP.
e. Movimento dos Sem Terra (1979), maior frente de luta pela reforma agrária que
se estruturou definitivamente em 1984, no congresso em Chapecó, e que,
atualmente, destaca-se como principal movimento social na América Latina,
pela força de sua atuação e amplitude de suas reivindicações: Terra, trabalho e
justiça social.
Considerações finais
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A práxis cidadã é ação criadora do homem novo, que inova frente às novas
realidades sociais, produzindo movimentos sociais capazes de uma ação reflexiva, que
extrapola a espontaneidade e objetiva a transformação das estruturas sociais que
alienam o homem do produto de seu trabalho. Essa cidadania da práxis (promotora dos
movimentos sociais) é a ação que gera a emancipação humana. Na sua estrutura,
portanto, existe a força libertadora que acrescenta a reflexão necessária às práticas
solidárias, possibilitando a superação das ações meramente assistencialistas.
No Brasil, a partir dos anos 1990, o que se observou foi o surgimento de “novos”
protagonistas nas lutas sociais e a diminuição da força do proletariado tradicional e dos
movimentos sociais encabeçados por eles.
Referências bibliográficas
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Passos, 1995.
GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais: a construção da cidadania
dos brasileiros. São Paulo, Loyola, 2003.
MACHADO, Eliel Ribeiro. Lutas e resistências na América Latina hoje. Londrina – PR,
UEL/GEPAL, Revista lutas e resistências, Nº. 1, set. 2006.
MORAES, João Quartim de. A democracia: história e destino de uma idéia. São Paulo: Revista
da OAB / Brasiliense, 1989.
SADER, Eder. Quando novos personagens entram em cena: experiências e lutas dos
trabalhadores da grande São Paulo (1970-1980). São Paulo, Paz e Terra, 1995.
SAES, Décio Azevedo. Cidadania e Capitalismo: uma abordagem teórica. São Paulo, Instituto
de estudos avançados da USP, Coleção documentos, 1997.
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VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da práxis, São Paulo, Paz e Terra, 1968.