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Núcleo de Educação a Distância

uu

História da
Música Brasileira:
Primeiros Séculos

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MÚSICA
SEMESTR
UNIVERSIDADE
Núcleo de Educação a Distância

Créditos e Copyright

                ANTONIO, Carlos C.


                História da Música Brasileira: Primeiros
Séculos. Unimes Virtual. Santos: Núcleo de Educação a
Distância da UNIMES, 2015.40p. (Material didático. Curso
de musica).
                 Modo de acesso: www.unimes.br
                  1. Ensino a distância.  2. Música.   3.História
da Música Brasileira: Primeiros Séculos. I. Título
                                                                                        
       CDD 780

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qualquer forma de expressão, em qualquer meio, seja ou não para fins didáticos.

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UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS


FACULDADE DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PLANO DE ENSINO

 
CURSO: Licenciatura em Música
COMPONENTE CURRICULAR: História da Música Brasileira: Primeiros Séculos
SEMESTRE: 5º
CARGA HORÁRIA TOTAL: 80 horas
 

EMENTA
Fundamentos da história da música brasileira abrangendo do período colonial até
tendências dos Séculos XX. Investigação e pesquisa em ritmos, elementos,
compositores, localidades, estilos, gêneros ou obras musicais selecionadas e seus
aspectos sociológicos.
 

OBJETIVO GERAL
Apresentar ao aluno um panorama histórico da música no Brasil, desde o
descobrimento até finais do século XIX e início do XX.
 OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

Unidade I
Transmissão, Recepção e Influência: Avaliar os processos de transmissão e
influências culturais distintas no desenvolvimento da música erudita e popular no
Brasil.

Unidade II
Música no Nordeste: Estudar a produção musical no nordeste brasileiro durante o
século dezoito.

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Unidade III
Musica Mineira e Paulista: O objetivo é analisar a recepção da música em estilo
galante/pré-clássico em Minas Gerais e São Paulo durante os séculos XVIII e XIX.

Unidade IV
A Corte no Brasil e o Classicismo: Estudar a produção musical no Rio de Janeiro
durante a presença da corte portuguesa e no período imperial.

Unidade V
O Nacionalismo no Brasil: Estudar os primeiros experiências musicais nacionalistas
durante o século XIX.

Unidade VI
Ópera no Brasil: Estudar a ópera no Brasil, desde o surgimento dos primeiros teatros
de Ópera até a música de Carlos Gomes.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO:
Unidade I
Música Brasileira: do descobrimento à Colônia; Música pré-cabraliana e indígena;
Música Européia nos trópicos; Os jesuítas e os primeiros séculos da música
brasileira; Modinha e Lundu; Estilo Antigo no Brasil; Italianização da música Luso-
Brasileira; Ensino musical no sec. XVIII; Música Religiosa no Brasil.

Unidade II
Música no Nordeste; Caetano de Melo de Jesus e a “Escola de Canto de Orgão”;
Luís Álvares Pinto.

Unidade III
A escola mineira no século XVIII; Música em São Paulo; André da Silva Gomes;
Jesuíno do Monte Carmelo.

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Unidade IV
A Corte no Brasil e o Classicismo; José Maurício Nunes Garcia; A música no
Império; Modinha no séc. XIX.

Unidade V
O Nacionalismo tupiniquim; Alberto Nepomuceno no Rio de Janeiro; As origens
sociais do choro no Brasil; Música como mediação cultural entre classes sociais ao
final do século XIX.

Unidade VI
A ópera no Brasil; A música de Carlos Gomes.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA:
KIEFER, B. História da música brasileira; dos primórdios ao início do século
XX. 3 ed. Porto Alegre: Ed. Movimento, 1982. 140p.
MARIZ, V. História da Música no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
NOGUEIRA, M. P. Muito além do melodrama: Os prelúdios e sinfonias das
Óperas de Carlos Gomes. São Paulo: Editora Unesp, 2006.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:
APPLEBY, David P. The Music of Brazil.Ed. Revisada. Estados Unidos:
Universityof Texas Press, 2014. (Disponível em: https://www.amazon.com.br/Music-
Brazil-David-P-Appleby-ebook/dp/B00KAHU8I2)
AZEVEDO, L. H. C. 150 Anos de Música no Brasil (1800-1950). Rio de Janeiro:
Livraria José Olimpio, 1956.
GROVE. Dicionário de música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 1994.
(Disponível [Inglês] em: http://www.oxfordmusiconline.com/public/)
MORAES, J. G. V.; SALIBA, E. T. História e Música no Brasil. São Paulo:
Alameda, 2010.

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PEREIRA, A.R. Música, sociedade e política: Alberto Nepomuceno e a república


musical. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007.

METODOLOGIA:
A disciplina está dividida em unidades temáticas que serão desenvolvidas por meio
de recursos didáticos, como: material em formato de texto, vídeo aulas, fóruns e
atividades individuais. O trabalho educativo se dará por sugestão de leitura de
textos, indicação de pensadores, de sites, de atividades diversificadas, reflexivas,
envolvendo o universo da relação dos estudantes, do professor e do processo
ensino/aprendizagem.

AVALIAÇÃO:
A avaliação dos alunos é contínua, considerando-se o conteúdo desenvolvido e
apoiado nos trabalhos e exercícios práticos propostos ao longo do curso, como
forma de reflexão e aquisição de conhecimento dos conceitos trabalhados tanto na
parte teórica como na prática e habilidades. Prevê ainda a realização de atividades
em momentos específicos como fóruns, chats, tarefas, avaliações a distância e
Prova Presencial, de acordo com a Portaria de Avaliação vigente. A Avaliação
Presencial, está prevista para ser realizada nos polos de apoio presencial, no
entanto, poderá ser realizada em home seguindo as orientações das autoridades da
área da saúde e da educação e considerando a Pandemia COVID 19.

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Sumário
Créditos e Copyright...............................................................................................................................2
Aula 01_Música Brasileira: do descobrimento à Colônia.......................................................................8
Aula 02_Música pré-cabraliana e indígena...........................................................................................11
Aula 03_Música Européia nos trópicos................................................................................................13
Aula 04_os jesuítas e os primeiros séculos da música brasileira..........................................................22
Aula 5_Modinha e Lundu 1..................................................................................................................24
Aula 06_Modinha e lundu 2.................................................................................................................28
Aula 07_Estilo Antigo no Brasil.............................................................................................................32
Aula 08_Música no Nordeste I.............................................................................................................39
Aula 09_Música no Nordeste II............................................................................................................42
Aula 10_Italianização da música Luso-Brasileira..................................................................................46
Aula 11_ O ensino musical no século XVIII em Portugal e sua função na transmissão do estilo..........50
Aula 12_Caetano de Melo de Jesus e a “Escola de Canto de Orgão”...................................................57
Aula 13_Luís Álvares Pinto...................................................................................................................60
Aula 14_ Luís Álvares Pinto II................................................................................................................67
Aula 15_ A escola mineira no século XVIII............................................................................................74
Aula 16_ A Corte no Brasil e o Classicismo...........................................................................................76
Aula 17_ José Maurício Nunes Garcia (Obra Profana)..........................................................................79
Aula 18_A música no Império...............................................................................................................85
Aula 19_A ópera no Brasil....................................................................................................................87
Aula 20_ A música de Carlos Gomes - temática brasileira, estilo italiano............................................90
Aula 21_Música em São Paulo.............................................................................................................92
Aula 22_André da Silva Gomes 1..........................................................................................................94
Aula 23_André da Silva Gomes 2..........................................................................................................98
Aula 24_Jesuíno do Monte Carmelo: Músico, Pintor e Arquiteto......................................................103
Aula 25_Música Religiosa no Brasil: Agentes musicais nas igrejas coloniais......................................108
Aula 26: Modinha no Século XIX.........................................................................................................112
Aula 27_O Nacionalismo tupiniquim..................................................................................................116
Aula 28: Alberto Nepomuceno no Rio de Janeiro...............................................................................118
Aula 29_O Álbum Pitoresco Musical..................................................................................................122

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Aula 30_Do Lunduao Maxixe..............................................................................................................128


Aula 31_As origens sociais do choro no Brasil....................................................................................134
Aula 32_Música como mediação cultural entre classes sociais ao final do século XIX.......................136

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Aula 01_Música Brasileira: do descobrimento à Colônia

 Múltiplas foram as influências que contribuíram, em cada período, para


o desenvolvimento da música brasileira. A base para esse entroncamento cultural
deu-se a partir da fusão das influências indígena, africana, e portuguesa, que
constituem o período de formação e caracterização, sendo o elemento europeu o de
mais forte influência.
A maioria dos estudos sobre história da música no Brasil apontam para
Portugal como a porta de entrada para a maior parte das influências que construíram
a música brasileira, erudita e popular, introduzindo a maioria dos instrumentos, o
sistema harmônico, a literatura musical e boa parcela das formas musicais
cultivadas no país ao longo dos séculos, ainda que diversos destes elementos não
sejam de origem portuguesa, mas genericamente, europeia.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)
 Geralmente, quando nos debruçamos sobre a chegada do homem negro no
Brasil no século no final do século XVI, para trabalhar nos campos como escravos e
outros serviços pesados, apesar da situação adversa imposta ao seu corpo e mente,
esse homem negro trouxe com sua memória a faculdade de conservar suas
heranças culturais, dentre as quais a luteria dos seus instrumentos e a afinação que
utilizavam, o que infelizmente pouco conhecemos hoje. Mesmo isso passou por um
processo de europeização, pelo abandono do conhecimento dos instrumentos
africanos, sua organologia africana para usarmos uma nomenclatura europeia,
abandonando boa parte de seu conhecimento para incorporar o modo de afinação
europeia e a técnica de aprender a tocar os instrumentos introduzidos pelo homem
europeu. Para alguns, as maiores contribuições do homem negro foram a

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diversidade rítmica, as danças e os instrumentos, que tiveram um papel maior no


desenvolvimento da música popular e folclórica, florescendo especialmente no
início do século XX. Para outros, o homem indígena praticamente não deixou traços
seus na corrente principal, salvo em alguns gêneros do folclore, sendo em sua
maioria um participante passivo nas imposições da cultura colonizadora.
Música Indígena

Padre Antonio Vieira

 As pesquisas sobre música indígena no Brasil ainda tendem a caminhar para
um estágio mais avançado, possibilitando conhecermos um pouco mais da
participação e influência do homem indígena como agente influenciador nas aldeias,
seja em torno do estado de São Paulo ou nas missões encrustadas nas fronteiras do
Brasil. A dificuldade em reunir e conhecer essa documentação que fale da música e
a participação do músico indígena é algo que ainda está por ser feito em torno da
documentação histórica musical.
O professor e pesquisador Marcos Holler tem nos revelado através da sua
pesquisa em documentação de arquivos, informações sobre a prática musical nas
reduções jesuíticas da América Portuguesa em 1549. A primeira missão, liderada
pelo Padre Manuel da Nóbrega, aportou na Bahia nessa data. Os padres
perceberam pela primeira vez a atração que a música exercia sobre os gentios,

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sendo mencionado em carta do padre, após sua chegada, descrevendo ele,


Nóbrega, que os meninos índios cantavam e tocavam instrumentos como cravo (que
deveria ser uma espécie de serafina utilizada pelos padres, um órgão pequeno e
pouco conhecido ainda) e as flautas surgem em relatos do século XVI.
Outras influências
Apesar da pequena importância, vivenciamos algumas outras influências com
o crescente intercâmbio cultural ocorrido no período com outros países além da
metrópole portuguesa, elementos musicais típicos de outros países como a
operística italiana e francesa e das danças como a zarzuela, o bolero e habanera de
origem espanhola, e as valsas e polcas germânicas, muito populares entre os
séculos XVIII e XIX.
Essa confluência de cultura desaguando no novo mundo tornou possível um
estilo musical que modificaria os rumos da música brasileira no século XX.

Site

CASTAGNA, Paulo Augusto. Fontes bibliográficas para a pesquisa da prática


musical no Brasil nos séculos XVI e XVII. Dissertação (Mestrado) - Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. São Paulo, 1991 3v.

DUPRAT, Régis.Garimpo Musical. São Paulo, Editora Novas Metas Ltda.,1985.181


p.

Referências
SOUZA, S. G., Tratado Descritivo do Brasil, Tip.João Ignácio da Silva, Rios.1879,
p.317.

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Aula 02_Música pré-cabraliana e indígena

A música indígena brasileira é parte do vasto universo cultural dos vários


povos indígenas que habitaram e habita o Brasil. A música indígena tem recebido
alguma atenção do ocidental desde o início da colonização do território, com os
relatos De Jean de Léry sobre alguns cantos tupinambás, em 1558, e de Antonio
Ruiz de Motoya, cujo extenso léxico inclui um universo de categorias musicais do
guarani antigo. Estudos recentes têm-se multiplicado a partir do trabalho de
pesquisa de Villa-Lobos e Mário de Andrade no século XX, e hoje a música indígena
é objeto de estudo e interesse de pesquisadores de todo o mundo.

As novas pesquisas em documentos do século XVIII mostram que as aldeias


indígenas em torno da vila de São Paulo estavam organizadas em guildas pelos
Jesuítas, onde determinadas aldeias tinham suas profissões definidas, como por
exemplo a de Mboy Mirim, que destacava-se pelo grande número de músicos
convidados para as festas na Vila de São Paulo.

  

Primórdios da música brasileira

Como qualquer música primitiva, a música dos gentios nos primórdios da


história do Brasil, foi essencialmente religiosa, ligada a cerimônias e atividades das
quais dependia a vida da tribo: cantos, danças de guerra, de caça, de pesca, de
invocação e homenagem, celebração da vida e da morte, a mística da tribo, entre
outras.
A importância social do canto e a dança entre os indígenas foram
percebidas pelo viajante europeu do século XVI, deixando o registro de que os
tupinambás são os maiores dançadores do mundo.
Mesmo com a chegada dos Jesuítas na América Portuguesa, tendo o
potencial da música para catequese para atrair os índios, sua atuação musical não
foi intensa quanto na América Espanhola. Ainda que não tenha sido tão intensa, a

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atuação musical dos jesuítas no Brasil foi de suma importância para moldar a cultura
brasileira.

Podemos reconhecer em relatos textuais a citação de personagens que


tiveram participação consistente na vida musical desse tempo como Francisco de
Vaccas, como mestre da capela, e Pedro da Fonseca, como organista, ambos ativos
na Sé de Salvador.
As Reduções do sul do Brasil, um século mais tarde, fundadas por Jesuítas
espanhóis, atingiram um requinte cultural exuberante, onde funcionaram verdadeiros
locais para iniciar a prática musical, e relatos de época atestam a fascinação do
índio pela música da Europa e sua competente participação tanto na luteria, como
na prática instrumental e vocal. Um retrato das reduções espanholas pode ser visto
no filme britânico The Mission (A Missão), de 1986.
A base para criar o estilo e a interpretação era naturalmente oriunda da
cultura da Europa, e o objetivo desta musicalização do gentio eram acima de tudo
catequético, com escassa ou nula contribuição criativa original de sua parte.

Apesar de não termos ainda registrado nenhuma partitura produzida por


compositores índios nas reduções jesuíticas portuguesas, podemos acreditar na
possibilidade de algum dia surgirem exemplos de um ou outro gentio que se
tornaram compositores eruditos, como um paraguaio que foi coautor de uma ópera
sacra sobre a vida de Inácio de Loyola, e um mexicano que compôs uma missa
completa em 1560. A maior parte das partituras compostas ou executadas nas
missões se perdeu após a dissolução destas, ainda que, no século XX, diversos
estudos especializados estejam alavancando informações significativas à luz das
novas pesquisas.

Com o passar dos anos, os índios remanescentes dos massacres e


epidemias foram se retirando para regiões mais remotas do Brasil, fugindo do
contato com o branco, e sua participação na vida musical nacional foi decrescendo
até quase desaparecer por completo.

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Aula 03_Música Européia nos trópicos

 
Na obra - A cidade em Portugal - José Ramos Tinhorão propõe demonstrar
como a passagem do feudalismo para o capitalismo favoreceu mudanças sociais e
culturais em Portugal, posteriormente transplantadas para o Brasil nos primeiros
duzentos anos de colonização.
Segundo o autor, a crescente monetarização da economia, a partir do
século XIV, estimulou a agricultura de exportação, transferindo o centro dos
interesses do campo para a cidade. A característica cultural desses indivíduos
colocados à margem da estrutura econômico-social - obrigados a aderir à
aventura das grandes navegações ou compor a arraia-miúda dos grandes centros
- será traduzida pelo individualismo. Na música, o alegre canto coletivo do homem
do campo será substituído pelo lamento individual do homem das cidades, pelo
canto solo acompanhado da viola, cuja difusão e vulgarização entre camadas
populares passará a simbolizar o distanciamento social.
 Mas que músicas trouxeram os portugueses ao chegarem ao Brasil, a partir
de 1500?
Na esquadra que trouxe Pedro Álvares Cabral vieram também, como
seus auxiliares, Frei Pedro Neto, corista, e Frei Maffeo, organista e músico. Segundo
o documento de 1908 "A Música no Brasil”, eles impressionaram os índios com sua
arte na celebração da primeira missa no Brasil. A partir de 1549 chegaram os
primeiros jesuítas ao Brasil. Eles utilizaram a música europeia para se aproximar dos
índios e catequizá-los.
Além da música religiosa trazida pelos jesuítas, os desbravadores também
trouxeram a música profana europeia.

O que acontecia na Europa durante esse período?

 No período da colonização brasileira acontecia na Europa um período


intenso de produção artística e científica. Esse período começou no século XIII e

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intensificou-se durante os séculos XV e XVI. Ficou conhecido como Renascimento


ou Renascença porque indicou o renascimento de culturas muito antigas (grega e
romana) e a valorização do homem como indivíduo que pensa, cria e procura novos
caminhos de desenvolvimento. O homem passa a se pensar mais no centro do
mundo, ao contrário da Idade Média, em que a vida do homem estava centrada na
figura de Deus. Esta configuração nova surge em torno da cidade de Florença, na
Itália, que ficou conhecida como o berço do Renascimento, devido ao investimento
dos comerciantes nas artes.

 A música renascentista era polifônica, isto é, com duas ou mais vozes.


Nesse período surgiram instrumentos musicais novos, como a família dos violinos,
dentre outros que se desenvolveram. Porém, muitos instrumentos da Idade Média
continuaram a ser utilizados. Foram compostas uma variedade de músicas para
canto, dança, além de músicas instrumentais.
 As formas musicais mais comuns que surgiram nesse período foram, além
do madrigal, a canção, o rondó, a suíte, o motete e diversas peças religiosas.
 Além do canto religioso, foi introduzida no Brasil a música popular
portuguesa, trazida pelos colonizadores. Os portugueses trouxeram não só a sua
própria música, mas a de toda a Europa.
As formas melódicas, a harmonia, os textos poéticos, as tonalidades ,
os ritmos, a canção, a moda, o fado, as cantigas infantis de roda e de ninar, além de
várias danças dramáticas como o Pastoril, a Folia de Reis, a Nau Catarineta, a
Marujada, o Bumba meu boi, foram trazidas pelos colonizadores.
Outros povos além dos portugueses também tiveram influência em
nossa música como os espanhóis, os holandeses, os franceses, os italianos, entre
outros. Muitas vezes, a música popular se misturava com a música religiosa, como
no caso das procissões de Corpus Christi realizadas pelos jesuítas. Eles enfeitavam
as ruas com ramos de árvores e incluíam todas as danças e invenções alegorias à
maneira de Portugal. Tinham verdadeiras alas e entre elas havia danças, coros,
músicas, bandeiras, personagens e etc. Essas folias eram desfiles dançantes típicos
da área rural em que os participantes percorriam grandes distâncias para chegar ao
local da festa, como acontece até hoje no interior do Brasil.

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Eles trouxeram vários instrumentos como o violão, a viola, o cavaquinho,


o violino, o violoncelo, a sanfona, a flauta, a clarineta e o piano, que foram criados
a partir da evolução de alguns instrumentos medievais.
 

Expedição Sul: a Língua Portuguesa e a música - Oncotô

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

"HISTÓRIA DA MÚSICA BRASILEIRA"

 A Formação da música brasileira A música do Brasil se formou a partir da


mistura de elementos europeus, africanos e indígenas, trazidos respectivamente por
colonizadores portugueses, escravos e pelos nativos que habitavam o chamado
Novo Mundo. Outras influências foram se somando ao longo da história,
estabelecendo uma enorme variedade de estilos musicais.

A música no tempo do descobrimento Você já se perguntou se na época


do descobrimento do Brasil havia música? O que será que os índios que por aqui
viviam cantavam? Será que eles tocavam algum instrumento? Como será que foi a
reação dos indígenas quando os primeiros portugueses chegaram em suas
"caravelas”, trazendo violas e outros instrumentos de Portugal? Os portugueses
realmente se espantaram com a maneira de vestir dos nativos e da maneira
como eles faziam músicas: cantando, dançando, tocando instrumentos (chocalhos,
flautas, tambores).
Pois então... Agora, use sua criatividade e desenhe uma cena do tempo do
descobrimento do Brasil, em que um português vê pela primeira vez um grupo de
índios tupis cantando e dançando.
 

Você poderá usar algumas informações:

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O maracá era um instrumento muito apreciado pelos índios tupis da costa do Brasil (veja a
figura acima).

Os índios costumavam dançar em círculos cantando e batendo os pés.

Os portugueses chegaram em "caravelas” (navios) e se espantaram com a


nudez dos nativos.

Um dos cantos dos tupis era dedicado a uma ave amarela, uma espécie de
arara, que eles chamavam "Canideioune” (ave amarela na língua tupi).

Os portugueses se vestiam com muita roupa, usavam barba, grandes


chapéus e provavelmente trouxeram violas (o ancestral do violão) na sua primeira
viagem.

E então? Vamos cantar essa história?

Chegança Antonio Nóbrega Sou Pataxó, Sou Xavante e Cariri, Ianonami,


sou Tupi Guarani, sou Carajá.

Sou Pancaruru, Carijó, Tupinajé, Potiguar, sou Caeté, Ful-ni-o, Tupinambá.

Depois que os mares dividiram os continentes Quis ver terras diferentes.

Eu pensei: "vou procurar Um mundo novo, Lá depois do horizonte, Levo a


rede balançante Pra no sol me espreguiçar".

Eu atraquei Num porto muito seguro,

Céu azul, paz e ar puro...

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Botei as pernas pro ar.

Logo sonhei Que estava no paraíso, Onde nem era preciso Dormir para se
sonhar.

Mas de repente Me acordei com a surpresa: Uma esquadra portuguesa Veio


na praia atracar.

De grande-nau, Um branco de barba escura, Vestindo uma armadura Me


apontou pra me pegar.

E assustado Dei um pulo da rede, Pressenti a fome, a sede, Eu pensei: "vão


me acabar".

Me levantei de borduna já na mão.

Ai, senti no coração, O Brasil vai começar.

Como nasceu a música brasileira?

A música brasileira mistura elementos de várias culturas,


principalmente as chamadas culturas formadoras: a dos colonizadores
portugueses (europeia), a dos nativos (indígena) e a dos escravos (africana). É difícil
estabelecer com certeza os elementos de origem, mas sabemos que alguns
instrumentos musicais, por exemplo, são tradicionais de certas culturas.

Instrumentos europeus

Flauta doce

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Violino e Viola (família de cordas)

Instrumentos de teclado (como o ancestral do piano,o cravo)

Violão

Instrumentos indígenas

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Flautas indígenas

Maracá (chocalho)

Instrumentos africanos

Berimbau

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Agogô

Atabaques

Cuíca (ou Puíta)

 Curiosidade: Os primeiros professores de música no Brasil foram os


padres Jesuítas, responsáveis pela catequese dos indígenas. No sul do Brasil, os
Jesuítas construíram as chamadas Missões, onde além de aculturar os índios
guaranis, ensinando a religião católica e a agricultura, ensinavam música vocal e
instrumental, criando orquestras inteiras só de guaranis. O mais famoso padre

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jesuíta foi o padre Anchieta, criador de muitos "autos”, espécie de peças de teatro
didáticas, que tinham a função de ensinar a religião de uma forma criativa e
espetacular aos índios.

Padre José de Anchieta"


Fonte: www.portaledumusicalcp2.mus.br

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Aula 04_os jesuítas e os primeiros séculos da música brasileira

 O brilhante trabalho da professora HelzaCamêu, Introdução ao Estudo da


música indígena Brasileira, é uma excelente fonte de referência para conhecermos
os primórdios da música brasileira. Recorrendo a relatos de cronistas e
pesquisadores, ela demonstra, através da documentação pesquisada, que “o som
musical era utilizado pelo índio muito antes da descoberta do Continente americano”
(CAMEU, 1977).

O canto é considerado o elemento mais litúrgico, mais imprescindível de que


podemos falar e que seja a entrada, o contato místico com o deus desmaterializado.
É ainda um fluído sonoro vital, que libera pela boca um material melodioso que
habita em nosso corpo. O teatro jesuítico trás no seu âmago, o canto místico dos
jesuítas, funcionava também como elemento de religião, isto é de religação, de força
unificadora, proporcionando aos índios um encantamento com a teatralização e
cantos, buscando incorporar os silvícolas ao interior da igreja católica.
Com os homens negros se deu semelhante dominação cultural através da
música, cuja cultura foi tão decisiva para a formação da música brasileira.
Se pensarmos que em 1538 navios negreiros aportaram nos ancoradouro
brasileiro transportando como “carga” os primeiros escravos trazidos da África
trazendo na sua memória as músicas, danças, idiomas, macumba e candomblé –
criando a base primordial de uma nova etapa fundamental na história inicial da
música brasileira.
Mesmo com a vinda de grandes contingentes de escravos da África a partir
do século XVI, sua raça era considerada inferior e desprezível demais para ser
levada a sério pela cultura oficial. Mas seu destino seria diferente do índio. Logo sua
musicalidade seria notada pelo colonizador, e sendo uma etnia mais prontamente
integrável à cultura dominante do que os arredios índios, grande número de negros
e mulatos passaram a ser educados musicalmente - dentro dos padrões
portugueses, naturalmente - formando orquestras e bandas que eram muito
louvadas pela qualidade de seu desempenho. Mas a contribuição autenticamente

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negra à música erudita brasileira teria de esperar até o século XX para poder se
manifestar em toda sua riqueza.
É importante assinalar ainda a formação de irmandades de músicos a partir
do século XVII, algumas integradas somente por negros e mulatos, irmandades
estas que passariam a monopolizar a escrita e execução de música em boa parte do
Brasil.
Antes de falarmos da Escola Mineira na música no século XVIII,
conheceremos um pouco do que a maioria do povo apreciava nos guetos longe da
censura da igreja e o olhar da Realeza.
Um dos maiores expoentes da Escola Mineira José Joaquim Emérico Lobo de
Mesquita, compositor de Música Sacra no Brasil Colonial.
 
 
Referência
ANDRADE,Mário. Pequena História da Música. Belo Horizonte: Editora Itatiaia
Limitada, 1980.

CAMEU, Helza. Introdução ao Estudo da música indígena Brasileira Conselho


Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais, 1977.

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Aula 5_Modinha e Lundu 1

 
Modinha:

“Modinheiros”: Fonte: http://musicabrasileira.webnode.com.br/estilos-musicais-brasileiros/modinhas/


 
Um gênero de música em especial assumiu um lugar de destaque nos
séculos XVIII e XIX: a modinha. Derivada da palavra “Mote” (motivo), logo adotou o
termo “Moda” e seu diminutivo “Modinha”. Originariamente portuguesa,
provavelmente surgida nas elites governantes no Brasil colônia a partir de elementos
da ópera italiana e foi citada pela primeira vez na literatura em 1779, por Nicolau
Tolentino de Almeida na “Sátira Oferecida ao Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor
Dom Martinho de Almeida”, embora seja ainda mais antiga.
Em Portugal, segundo o autor Mozart de Araújo, os termos “ária, romance e
moda” serviram, em meados do século XVIII, para designar genericamente os Ayres,
Tonos, Tonadilhas, Coplas, Seguidilhas e especialmente as Serranilhas, Rimances,
Soláus e Xácaras, todas formas de canções de períodos anteriores. Desta variedade
é natural que a Modinha tenha assumido formas musicais e poéticas variadas no
início.
A modinha é, em linhas gerais, uma canção suave, romântica e chorosa, de
feição bastante simplificada, muitas vezes de estrutura estrófica e acompanhamento
reduzido a uma simples viola ou guitarra (antecedente da guitarra portuguesa),
embora haja exemplos de modinhas do século XVIII com acompanhamento de baixo
contínuo e cravo, sendo de apelo direto às pessoas comuns. Presente
constantemente nos saraus da aristocracia, podendo ser mais elaborada e

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acompanhada por flautas e outros instrumentos e ter textos de poetas importantes


como Tomás Antonio Gonzaga, cuja obra Marília de Dirceu foi musicada uma
infinidade de vezes. A modinha, como canção elitista, era tão apreciada que também
músicos da corte compuseram algumas peças no gênero, como Marcos Portugal,
autor de uma série com letras extraídas da obra de Gonzaga, citada acima, e o
Padre José Maurício Nunes Garcia, autor da célebre "Beijo a mão que me condena".

Jornal de Modinhas com acompanhamento de Cravo:


1795
 

Guitarra (Portuguesa), presente no método “Estudo de


Guitarra” de Antônio da Silva Leite, de 1796

Enquanto a modinha, como gênero


musical, empolgava os salões da corte de D.
Maria I, nas ruas de Lisboa o ritmo dominante
era a “Fofa”, dança de origem brasileira, que embora não tenha persistido na sua
terra de origem, foi recebida e divulgada em Portugal a ponto de se tornar, segundo
relatos de viajantes, a “dança mais característica de Portugal”.
 

Algumas características da Modinha:

1. Uso poético de temas como ciúmes, dores da despedida e amores


desprezados;
2. Ausência da Negra ou Mulata, substituída pela musa branca e senhorial.
A morena é o padrão romântico da musa brasileira;

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3. Sensualidade dos temas;


4. Linha clássica das melodias;
5. Acompanhamento com baixo d’alberti, arpejado;
6. Uso de redondilhas menores, frases curtas em versos de 4 ou 7 sílabas;
7. Preferência por modo menor;
8. Compassos quaternários ou binários;
9. Ritmo anacrúsico ou acéfalo;
10. Uso da Dominante com sétima;
11. Acompanhamento de viola ou guitarra;
12. Letra despretenciosa;
13. Abundância de ornamentos melódicos.

Exemplo de modinha com acompanhamento de viola. Fonte: As Modinhas do Brasil, editada por
Edilson de Lima

 https://www.youtube.com/watch?v=N7MSFuQ-Ymw
 

Referência

OLIVEIRA, Olga M. F. A Modinha e o Lundu no Período Colonial. In: A Música no


Brasil Colonial (Coord: Rui V. Nery). Lisboa: Fundação CalousteGulbenkian, 2001.
p. 330-362

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Aula 06_Modinha e lundu 2

 
Lundu:
“Se não tens mais quem te sirva
O teu moleque sou eu
Chegandinho do Brasil
Aqui está que todo é teu”
(Domingos Caldas Barbosa)
 
A chegada do lundu (Londu, Landu, Lundum, Londum, Landum) ao Brasil se
deu através dos negros de Angola, mas por duas vias: passando por Portugal ou
diretamente da Angola para o Brasil. Em Portugal agregou o uso dos instrumentos
de corda, mas acabou proibido pelo rei, Dom Manuel por ser contrário aos bons
costumes. Já a vinda direta de Angola para o Brasil recuperou o acento jocoso,
mordaz e sensual que incomodara a sociedade lisbonense. Aparece no Brasil no
século XVIII como uma dança sem canto e de natureza licenciosa, para os padrões
da época. Nos finais do século XVIII, presente tanto no Brasil como em Portugal, o
lundu evolui como uma forma de canção urbana, acompanhada de versos, na maior
parte das vezes de cunho humorístico e lascivo, tornando-se uma popular dança de
salão.
A notícia mais antiga do lundu-canção é encontrada na coletânea de versos
musicados por Domingos Caldas Barbosa, intitulada “Viola de Lereno”, sendo o
primeiro volume publicado em 1798. Até então, o lundu era referenciado somente
como uma forma de dança de origem africana e ritmo sincopado. Durante todo o
século XIX, o lundu é uma forma musical dominante, e o primeiro ritmo africano a
ser aceito pelos brancos. Seus versos satíricos, maliciosos, cantando amores
condenados, muitas vezes não eram assinados pelos autores que, com medo de
perseguições, preferiam o anonimato. Mas outros compositores assumiam suas
obras, certamente mais brandas e adequadas ao gosto da classe dominante, como
Francisco Manuel da Silva, que compôs o Lundu Da Marrequinha.

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Apesar da influência do ritmo negro africano, a síncopa, muito mais clara e


sistematizada no lundu que na modinha, é utilizada principalmente nas vozes
cantadas, mantendo predominantemente o acompanhamento de viola arpejado e
com ritmo constante de semicolcheias.

Algumas características do Lundu no século XVIII:

1. Aceitação pessoal ou indireta do Negro;

2. Temas humorísticos, impregnados de ironia e mordacidade;

3. Pouco respeito aos valores da sociedade patriarcal;

4. Crítica velada ao papel de submissão exigido pela sociedade;

5. Sensualidade;

6. Louva a Negra e a Mulata;

7. Influência da percussão do batuque;

8. Compassos dos primeiros lundus: 3/8 e 6/8;

9. Uso da sincopa;

10. Acorde de sétima da Dominante;

11. Acompanhamento preferencialmente realizado por instrumentos de


cordas dedilhadas.

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Exemplo de Lundu com acompanhamento de viola. Fonte: Modinhas Lunduns e


Cançonetas, editada por Manuel Morais

https://www.youtube.com/watch?v=amF2ruZMEzY
 
Domingos Caldas Barbosa:

Um dos mais conhecidos modinheiros, considerado como um dos criadores


da gênero musical, é Domingos Caldas Barbosa. Mulato, nasceu provavelmente no
Rio de Janeiro, em 1739 ou Lisboa, 9 de novembro de 1800. Foi sacerdote, poeta e
músico, filho de um português com uma escrava angolana. Partiu para Portugal em
1763, para estudar em Coimbra. Posteriormente em Lisboa, celebrizou-se pelas
trovas improvisadas ao som da sua viola. Suas composições estão reunidas no livro
Viola de Lereno, pseudônimo que ele adotava. Foi soldado nas lutas na Colônia de
Sacramento. Levou uma vida de padre mundano, animando assembleias burguesas,
salões fidalgos e até serões do paço real. Em sua poesia tratou das peculiaridades

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afetivas do povo brasileiro. Procurou enfatizar temas românticos, diferenciando-a


das modinhas portuguesas.

Referência

OLIVEIRA, Olga M. F. A Modinha e o Lundu no Período Colonial. In: A Música no


Brasil Colonial (Coord: Rui V. Nery). Lisboa: Fundação CalousteGulbenkian, 2001. p.
330-362

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Aula 07_Estilo Antigo no Brasil

 
Estilo Antigo na Música Brasileira do século XVIII

1. Estilos “Antigo” e “Moderno”

Por estilo Antigo e Moderno, entende-se o primeiro tendo origem na música


polifônica, com uma escrita contrapontística mais restrita, muitas vezes sendo
relacionado na prática musical católica com o estilo polifônico de G. P. Palestrina. O
estilo moderno, por outro lado, é aquele que seguiu recebendo influência da música
dos Madrigais, Operística e Instrumental. Os dois estilos coexistiram, desde o início
do Período Barroco, na Europa e consequentemente nas Colônias. Segundo o
pesquisador Paulo Castagna, os estilos Antigo e Moderno não representam
“categorias estritas”, mas dois grandes “grupos estilísticos” que foram
simultaneamente cultivados no mundo católico até finais do século XIX.

Apesar de sua origem na música polifônica renascentista, como escrevem


os teóricos Manfred F. Bukofzer e Karl G. Fellerer, o Estilo Antigo foi uma invenção
do período barroco, no século XVII, e aos poucos ganhou características próprias,
se libertando do estilo renascentista, sendo identificado como uma forma tradicional
de escrita religiosa, tendo sido parte fundamental da formação dos compositores dos
séculos XVII e XVIII.

 
  Estilo Antigo Estilo Moderno
Outras Prima Prattica, Estilo Polifônico,SecondaPrattica, Estilo
Definições: StylusAntiquus. Concertante, Estilo Napolitano.
Características Utilização das regras doInfluência da Música Profana,
Musicais: contraponto renascentista. como Ópera e Madrigais.
  Declamação Uso de recursos operísticos,
predominantemente silábica,como árias, recitativos,
acentos rítmico-harmônicosintervenções corais.

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derivados da acentuação do
texto latino.
  Tendência para a homofonia ePrivilégio da textura vertical,
movimentos rígidos daharmônica, sobre o
homofonia. contraponto.
  Uso de sequencias musicais  
  Superposição de melodias em 
terças e sextas.
  Imitações motívicas limitadas, 
normalmente ao início das
composições.
  Utilização escolástica do 
cantusfirmus
 
 
2. Estilo Antigo na Península Ibérica

Segundo Paulo Castagna, em Portugal e Espanha, ocorreu uma situação


particular, onde o Estilo Moderno passou a ser adotado somente no final do século
XVII e transição para o XVIII. As possíveis razões deste fenômeno podem estar
ligadas à expulsão dos mouros da Península Ibérica e ao descobrimento das
Américas, que ligaram as coroas portuguesa e espanhola ainda mais a Roma e a
Igreja Católica. No caso das colônias, uma maior unidade religiosa e o risco dos
avanços do protestantismo, fez com que Portugal e Espanha se alinhassem aos
ideais católicos da contra-reforma, o que claramente influenciou a tradição musical
litúrgica destes países.

Segundo os pesquisadores Manuel Carlos de Brito e LuisaCymbron,


Portugal foi o único país católico no qual as decisões do Concílio de Trento foram
totalmente aplicadas. Os compositores Portugueses do século XVI também
mostravam pouco interesse com as inovações polifônicas e uso de temas profanos
dos Franco-Flamengos, o que auxiliou na assimilação das normas musicais
impostas pela contra-reforma. Estas razões levaram a uma produção musical
religiosa predominantemente em Estilo Antigo durante todo o século XVII, em

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Portugal. O Estilo Moderno começou a ser utilizado, neste período, somente em


gêneros musicais religiosos, não litúrgicos, como os Vilancicos.

3. Estilo Antigo em São Paulo e Minas Gerais

Tendo como base o repertório conhecido paulista e mineiro, dos séculos


XVIII e XIX, o pesquisador Paulo Castagna chegou a conclusão que coexistiram
diversas modalidades de estilos “Antigo” e “Moderno”, não sendo possível ligar um
único estilo a determinados períodos históricos ou locais. O pesquisador também
elencou uma série de fatores que distinguem os estilos “Antigo” e “Moderno” na
música paulista e Mineira, como descrevemos parte abaixo:

1. Predomínio da formação coral a 4 vozes, com exceções a 3 ou 8 vozes;

2. Emprego opcional de um instrumento grave dobrando o baixo vocal;

3. Utilização do Sistema Modal;

4. Extensão reduzida das partes vocais (normalmente até uma oitava), com
excessão do baixo;

5. Repouso por clausulas ou cadências;

6. Utilização de valores rítmicos largos;

7. Pouca variedade rítmica;

8. Estilo predominantemente silábico;

9. Sujeição do ritmo musical ao texto latino;

10. Movimento melódico normalmente por graus conjuntos;

11. Superposição freqüente de melodias por terças e sextas paralelas;

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12. Raras passagens a solo, duos ou trios, por m ovimentos paralelos;

13. Utilização do Cantus-Firmus (Cantochão) em determinados momentos


da liturgia católica;

14. Utilização de 4 texturas musicais, não mutuamente exclusivas:

a) Textura homofônica

b) Textura de fabordão (quartas e sextas paralelas)

c) Textura contrapontística;

d) Imitação ou seqüenciamotívica

15. Associação pouco freqüente do Estilo Antigo e Moderno em uma mesma


cerimônia religiosa.

3.1. Relações do Estilo Antigo e as cerimônias religiosas

            O pesquisador Paulo Castagna também percebeu uma ligação direta


do Estilo Antigo, não somente a questões puramente musicais, mas também à
função religiosa de cada composição. O uso do Estilo Antigo não era somente uma
escolha puramente estética de cada compositor, mas estava relacionada ao
momento litúrgico ou função religiosa. Segundo Castagna, de todo o repertório
pesquisado, um total de 83,5% das obras era destinado à Semana Santa, 8,3% ao
período da Quaresma e o restante para outras ocasiões.

            A concentração do Estilo Antigo na Semana Santa é explicada pelo


pesquisador aplicação das normas tridentinas para este período litúrgico que
originalmente previam a não utilização do canto polifônico ou instrumentos musicais.
Nestes casos fazia maior sentido o uso do Estilo Antigo em detrimento do Estilo
Moderno, impregnado de influência operística.

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Exemplos em Estilo Moderno

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Referência:

CASTAGNA, Paulo. O ‘estilo antigo’ no Brasil, nos séculos XVIII e XIX. I COLÓQUIO
INTERNACIONAL A MÚSICA NO BRASIL COLONIAL, Lisboa, 9-11 out. 2000.
Lisboa: Fundação CalousteGulbenkian, 2001. p.171-215. Disponível em:
https://archive.org/stream/OEstiloAntigoNoBrasilNosSculosXviiiEXix/2001-
EstiloAntigo#page/n0/mode/2up

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Aula 08_Música no Nordeste I

  
Nos primeiros séculos de colonização, com o enriquecimento devido ao ciclo
da cana de açúcar, o Nordeste Brasileiro passou por um período de
desenvolvimento cultural, procurando assimilar a prática musical portuguesa. A
prática musical foi centralizada principalmente nas maiores cidades da Bahia e
Pernambuco, como Salvador, Recife e Olinda, embora pudesse ser vista em outros
centros do Norte e Nordeste, como São Luís do Maranhão e Belém do Pará.
O Interesse pela música portuguesa criou um contato entre os músicos
portugueses e nordestinos, sendo que alguns dos últimos chegaram a viver por um
período em Portugal.
O primeiro que se tem notícia, foi Francisco Rodrigues Penteado,
pernambucano, que permaneceu por alguns anos em Portugal, até 1648, sendo que
posteriormente trabalhou no Rio de Janeiro e São Paulo, onde faleceu em 1673.
Compositores no Nordeste também levantaram interesse de autores e teóricos
portugueses, José Mazza, em seu Dicionário Biográfico, cita os seguintes músicos
do Nordeste: Caetano de Melo de Jesus (Bahia), Eusébio de Matos (Bahia), Manoel
da Cunha (Pernambuco), Inácio Ribeiro Noio (Pernambuco), Inácio Terra
(Pernambuco), Luís Álvares Pinto (Pernambuco) e o português Antão de Santo Elias
(trabalhou na Bahia).
A prática musical no Nordeste, na segunda metade do século XVII e durante
todo o século XVIII, assimilou rapidamente o gosto português, logo chegando ao
estilo barroco. A qualidade da música neste período era avaliada pela proximidade
com a cultural portuguesa, sendo que quanto mais “portuguesa”, melhor a música.
  
Bahia:
  
Segundo o pesquisador Paulo Castagna, uma das diferenças entre a prática
musical na Bahia e Pernambuco, foi uma presença maior da música profana na
Bahia. Salvador, capital da colônia até 1763, desenvolveu uma vida literária

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movimentada, desde a Prosopopeia de Bento Teixeira (1601) até às obras


acadêmicas do século XVIII.
Um exemplo desta música, que sobreviveu é o Recitativo e Ária para José
Mascarenhas (Cantata Acadêmica), composta por autor desconhecido. A obra tem
relevância para a história da música brasileira pelas seguintes razões: é uma peça
profana, cantada em português e o manuscrito possui a mais antiga data já
encontrada em documentos musicais brasileiros. O próximo compositor baiano do
qual se resgatou parte de suas obras foi Damião Barbosa Araújo (1778 – 1856), que
pelo período que viveu já se distancia do estilo barroco da Cantata Acadêmica. A
cantata possui um recitativo obbligato, comum na ópera italiana, no qual a orquestra
elabora pequenas seções entre o canto, podendo variar a complexidade entre
breves acordes até um ritornelo. A seção seguinte é uma Ária da Capo, com forma
ABA, marcada por um ritornelo.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)
Recitativo e Ária para José Mascarenhas – Recitativo
Recitativo e Ária para José Mascarenhas – Ária
  
A música religiosa teve grande importância na vida monasterial,
especialmente entre os Beneditinos que tiveram alguns importantes músicos, como
os frades Mauro das Chagas (? – 1629), Francisco da Gama (? – 1700/1715),
Joaquim de Jesus Maria (? – 1732), Alberto da Conceição (? – 1767), Manuel de
Jesus Maria (1777 – 1798) e José de Jesus Maria São Paio (1721 – 1810). Segundo
Paulo Castagna, “um Frei Félix (? – 1700/1715), que nasceu no Rio de Janeiro,
segundo o dietário da ordem, foi instrumentista e ‘trouxe muita solfa para o mosteiro
da Bahia, toda em letra redonda como se então se usava em Lisboa’”.
  
Importantes músicos baianos no período colonial:
1. Gregório de Matos (1633 – 1696), poeta, cantor e compositor de canções;
2. Eusébio de Matos (1629 – 1692), irmão do anterior, foi compositor de
música religiosa;

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3. Antão de Santo Elias (1680 – 1748), compositor nascido em Portugal;


4. Nicolau da Miranda (1661 – 1745), organista, atuou na Santa Casa de
Misericórdia de Salvador
 
O exemplo abaixo, com texto de Gregório de Matos, utiliza uma melodia
conhecida ibérica, que foi muito utilizada por compositores para guitarra barroca,
com nome de Marisapoles. Matos faz uma paródia, entituladaMarinícolas, sobre a
melodia.
Os Exemplos seguintes são gêneros musicais conhecidos no período de
Gregório de Matos, que foram mencionados em seus textos. É possível conhecer
exemplos destes gêneros musicais a partir de documentos musicais presentes na
Península Ibérica, especialmente Portugal.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)

Gregório de Matos  - Marinícolas


 Cumbé
 Tarantela
   
 
Referência

CASTAGNA, Paulo A. Música na América Portuguesa. In: História e Música no


Brasil (Orgs. José Geraldo Vinci de Moraes e Elias Thomé Saliba). São Paulo:
Alameda, 2010. p. 35-76

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Aula 09_Música no Nordeste II

 Pernambuco

O principal pesquisador sobre a música em Pernambuco, o Padre Jaime


Diniz, logrou recolher um grande número de nomes e registros de músicos que
atuaram no Estado no período colonial, apesar de muitas ou todas suas obras não
terem sobrevivido ao tempo.

Quase toda a produção musical foi perdida, mas as pesquisas de Diniz dão
uma perspectiva da vida musical pernambucana.

Conhece-se os Mestres de Capela da igreja matriz de Olinda, sendo que os


mais citados são:

1.  Gomes Correia (segunda metade do século XVI);

2. Paulo Serrão (primeira metade do século XVII);

3. José Nascimento (? – 1733);  

4. João de Lima (segunda metade do século XVII);

5. Antônio da Silva Alcântara (1711 - ?).

  

Dentre os músicos recifenses mais conhecidos e citados na documentação


de época, incluindo a portuguesa, estão:

1. Manoel da Cunha (1650 – 1734), compositor;

2. Inácio Ribeiro Noia (1688 – 1773), compositor;

3. Luís Álvares Pinto (1719 – 1789), compositor, teórico e professor de


primeiras letras;

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4. Joaquim Bernardo Mendonça Ribeiro Pinto (? – 1834), compositor;

5. Agostinho Gomes (1722 – 1786), organeiro, instalou orgão em Rcife.


Olinda, Salvador e Rio de Janeiro.

  

Dentre os músicos mencionados, o de maior destaque, também por


existirem exemplos musicais de sua obra, é Luís Álvares Pinto, do qual trataremos
em aulas separadas. Embora não se conheça nenhum exemplo de composição,
outro músico de destaque foi Antônio da Silva Alcântara, Mestre de Capela da igreja
matriz de Olinda.

  

Antônio da Silva Alcântara

Apesar de nenhum exemplo musical escrito pelo padre Antônio da Silva


Alcântara ter chegado ao nosso conhecimento, é possível verificar a importância de
sua atuação como Mestre de Capela da Sé de Olinda em, ao menos, três textos do
século dezoito: “Relação das festas que se fizeram em Pernambuco pela feliz
aclamação do mui alto, e poderoso Rei de Portugal D. José I” escrito por Felipe Neri
Corrêa (1753), “Desagravos do Brasil e Glórias de Pernambuco” por Domingos do
Loreto Couto (1757), e “Dicionário Biográfico de Músicos Portugueses” por José
Mazza (1794). Os dois primeiros textos foram certamente escritos durante a vida de
Antônio da Silva Alcântara. Até o momento, os três textos acima mencionados
permanecem como a principal fonte de informação acerca da atuação e obra de A.
S. Alcântara.
Consta na publicação de 1904 dos “Desagravos do Brasil...” que Antônio da
Silva Alcântara nasceu na vila do Recife em 19 de outubro de 1712, informação
conflitante à dada por Ernesto Vieira em 1900, onde o ano de nascimento é 1711,
com mesmo dia e mês. Tanto Antônio Mazza quanto Domingos do Loreto Couto
atestam a qualidade musical e mencionam o aprendizado precoce e autodidata do
músico pernambucano, a atuação como professor de música é lembrada por

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COUTO, enquanto MAZZA cita sua ida a Lisboa para estudar “rabecão pequeno”
(violoncelo) com Frei Francisco, religioso carmelitano calçado.
  
“Na idade juvenil estudou a arte da música, e saiu famoso professor
desta harmônica faculdade. Ainda não contava catorze anos de
idade, e sabia especulativamente compor diversas obras, que lhe
conciliarão universal aplauso. Ordenado de presbítero mostrou pela
integridade de vida, e modéstia do semblante, ser digno de tão
sublime estado. Foi convidado para mestre da catedral de Olinda,
sendo insigne tangedor de todos os instrumentos, e dos mais
celebres professores de música de seu tempo” (COUTO, 1904: p.
374).
“Presbítero Douto em muitas faculdades, e na Música estupendo,
soube contraponto sem ter Mestre, e compôs excelentemente como
certificam as suas obras, foi Mestre da Capela da Sé de Olinda em
Pernambuco, veio a Lisboa aprender a tocar rabecão pequeno com o
padre Frei Francisco Religioso Carmelitano Calçado, retirou-se do
Mestrado para Porto Calvo, onde vive exercendo muitas virtudes.”
(MAZZA, 1944-45: p. 18).
  
Dentre os biógrafos de Antônio da Silva Alcântara, MAZZA é o único que
indica um possível destino para o final da vida do músico pernambucano, tendo ele
se retirado para Porto Calvo, vila que no século dezoito pertencia à Capitania de
Pernambuco, hoje no estado de Alagoas.
Quanto à obra perdida de Antônio da Silva Alcântara, COUTO lista uma série
de composições religiosas, para teatro e instrumentais. As obras religiosas são duas
Missas; uma Ladainha a quatro vozes com trompas, violinos e violoncelloobligato;
dois Te Deum’s, o primeiro a quatro coros, que foi cantado no Carmo do Recife; e o
segundo Te Deum a dois coros, cantado na Misericórdia, além de antífonas de
Santa Cecília.
As obras instrumentais são Tercetos; Sonatas com trompas e oboés; Sonatas
para rabecas, cravo e cítara. COUTO também menciona “Três sonos para as
comédias reais, e a solfa toda para as ditas comédias” representadas no terreiro do
Palácio do Governador de Pernambuco, Luis José Corrêa de Sá, em 1752 (1904: p.
374-5).
Das obras listadas acima, Felipe Neri Corrêa descreve a apresentação do Te
Deum a quatro coros e das três comédias reais durante os festejos de aclamação de
D. José I, nos anos de 1751 e 1752. CORRÊA também menciona uma Serenata de
Antônio da Silva Alcântara, não citada por COUTO.

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“Formados em batalha, passaram Suas Excelências para a Sé, aonde se
achava o mais nobre, e luzido auditório [...] Estava aquele grande Templo
magnificamente adornado, e curiosamente guarnecido das mais vistosas
sedas, e ricos paramentos que permitia o país; no meio do Cruzeiro se via um
como trono levantado coberto de singulares alcatifas, sobre o qual havia um
faldistório em que Sua Excelência Reverendíssima rompeu o ato com um
admirável a e doutíssimo Sermão [...] Concluiu ultimamente o discurso,
entoando o Te Deum laudamus, a que com suaves harmonias, e agradável
melodia respondeu (e foi continuando o Hino) a música, que estava dividida
em quatro bem concertados coros a quem regia, e fazia compasso o R.P.M.
António da Silva Alcântara, insigne compositor, e Mestre da Capela da mesma
Sé, aonde ajuntou para essa função os mais destros instrumentos, e as
melhores vozes que havia em todo este continente, além dos Músicos do
partido, sendo ele o mesmo que tinha composto aquela solfa, de que teve
(pelo bom gosto dela ) um geral, e bem merecido aplauso. (CORRÊA, 1753: p.
9-11).
É o proceloso Inverno tão ingrato nesta Costa, que não permitiu que se
fizessem as comédias se não no ano de 1752, a primeira, e que era lasiencia
de Reynar; representou-se na noite do dia 14 de Fevereiro, a segunda Cueba
y Castillo de amor na noite de 16, e a terceira e última laPiedraPhylosophal na
de 18 do dito mês de Fevereiro de 1752. Representaram-se finalmente com
geral aplauso, e admiração, desempenhando os curiosos que entrarão nelas,
o acerto da eleição. [...] A solfa das comédias, era composta pelo mesmo
Autor da do Te Deum, e tão admirável como sua. [...] Concluiu-se o festejo
com três sucessivas noites de fogo, e na ultima se despediu o R.P.M.
Alcântara de Sua Excelência com uma boa serenata. (CORRÊA, 1753: p. 19-
21).
  
 
Referência

CASTAGNA, Paulo A. Música na América Portuguesa. In: História e Música no


Brasil (Orgs. José Geraldo Vinci de Moraes e Elias Thomé Saliba). São Paulo:
Alameda, 2010. p. 35-76

CORRÊA, Felipe Neri. Relação das festas que se fizeram em Pernambuco pela feliz
aclamação do mui alto, e poderoso Rei de Portugal D. José I. Lisboa: Oficina de
Manoel Soares, 1753.

COUTO, Domingos do Loreto. Desagravos do Brasil e glorias de Pernambuco. Rio


de Janeiro: Oficina Tipográfica da Biblioteca Nacional, 1904. p. 374-375.
MAZZA, José. Dicionário Biográfico de Músicos Portugueses. Lisboa: Editorial
Império, 1944-45. p. 18.

ROHL, Alexandre C. O. Os autos do concurso para Mestre Régio de Antônio da


Silva Alcântara, Mestre de Capela da Sé de Olinda. In:Anais do XXIV Congresso da
ANPPOM. São Paulo: ANPPOM, 2014.

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Aula 10_Italianização da música Luso-Brasileira

Vista Panorâmica de Lisboa, gravura sobre papel - Friedrich Bernhard Werner (1690-1776)
  
O século dezoito foi caracterizado por uma música com forte influência
italiana em Portugal. Este processo de italianização se inicia com a ascensão de D.
João V ao trono português, no ano de 1707. Com o intuito de elevar a qualidade
musical de sua Capela Real, o monarca passa a contratar músicos de alto nível
especialmente vindos da Itália e, em pouco tempo, já em 1730 contava com vinte e
seis cantores italianos em sua Capela.
Outra forma de apoiar as mudanças realizadas na Capela Real foi fundando,
em 1713, o Seminário da Patriarcal, uma escola de música com base religiosa. Esta
instituição foi a mais importante na formação musical portuguesa até ser substituída
pelo atual Conservatório, em 1835, e tinha seu ensino focado especialmente na
música religiosa de estilo concertante. Também eram concedidas bolsas aos alunos
mais dotados para aprimorarem seus estudos na Itália, mais precisamente em
Roma, como, por exemplo, Antônio Teixeira (1707 – 1769), Joaquim do Vale
Mexelim, Rodrigues Esteves (1700-1751) e Francisco Antônio de Almeida (1702-
1755).
Um dos músicos que participou deste processo foi o compositor italiano
Domenico Scarlatti (1685-1757), que em 1719 foi nomeado Mestre da Capela Real
de Portugal, em 1728. O compositor dispunha de sete violinos, duas violas, dois
violoncelos e um contrabaixo (todos estrangeiros); trinta a quarenta cantores e um

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vice-mestre da capela e organista, o conhecido português Carlos Seixas (1704 –


1742).
Em 1750, com a ascensão ao trono de D. José I, o modelo musical que
antes era Roma passa a ser Nápoles. Compositores como David Perez (1711-1778)
e NiccolòJommelli (1714-1774), passam a atuar em Portugal, o primeiro vivendo em
Portugal desde 1752 até 1778, ano de sua morte. Quanto a Jommelli, no ano 1762,
lhe foi oferecida uma pensão para escrever duas óperas por ano, sendo uma séria e
outra Buffa, para os teatros portugueses. Apesar de a ópera ser a maior razão
dessas mudanças, os compositores napolitanos também foram conhecidos por sua
produção religiosa. Tanto o MattutinideiMorti quanto a Missa de Réquiem compostas
por Perez e Jommelli, respectivamente, foram executadas com frequência em
Portugal.
Seguindo a política do Reinado anterior, são enviados para estudar na Itália
compositores como João de Souza Carvalho (1745-1798), Jerônimo Francisco de
Lima (1741-1822) e Braz Francisco de Lima (?-1813), sendo, agora, o destino de
seus estudos Nápoles.
Em meados do século dezoito, Nápoles já era considerada um dos principais
centros musicais europeus, como escreveu Charles de Brosses em 1739,
descrevendo a cidade italiana como a “Capital Mundial da Música”. Apesar da
posição privilegiada, Nápoles era reconhecida principalmente por sua produção
operística. O gosto local, treinamento e mesmo teoria intelectual, incentivavam a
produção musical vocal.
A cidade também era conhecida pela excelência no ensino musical,
possuindo quatro conservatórios, S. Maria di Loreto, S. Maria dellaPietà dei Turchini,
PoveridiGesù Cristo e S. Onofrio a Capuana, todos fundados no século dezesseis. O
conservatório de PoveridiGesù Cristo foi fechado em 1743. Era comum a nomeação
dos principais compositores como mestres nessas escolas, com aulas semanais. Os
conservatórios, inclusive, possuíam cláusulas contratuais, para evitar que os
importantes professores faltassem às suas classes, com penas de descontos no
salário dos mesmos. Apesar de serem originalmente destinados ao ensino de órfãos
da cidade de Nápoles, os conservatórios progressivamente passaram a aceitar
alunos de outras classes sociais, alguns pagando por seus estudos. Muitos dos

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estudantes pagantes vinham, cada vez mais, de fora de Nápoles e ainda no início do
século dezoito alguns vinham de outros países como Espanha e Alemanha.
Alguns dos principais compositores napolitanos surgiram desses centros de
ensino, entre eles, Domenico Sarri (1679-1744), NícolloPorpora (1686-1768),
Leonardo Vinci (1690/6?-1730), Leonardo Leo (1694-1744), Giovanni Baptista
Pergolesi (1710-1736), David Perez e NiccolòJommelli.
A influência italiana não se manteve somente em Portugal, mas chegou ao
Brasil, não apenas por meio de cópias de obras dos autores já mencionados, mas
também com a vinda de compositores portugueses como André da Silva Gomes
(1752-1844), Mestre da Capela da Sé de São Paulo, no período de 1774 a 1823 e
autor de um dos mais importantes tratados de música brasileiros, a “Arte Explicada
de Contraponto”. Desta obra, originalmente escrita em três volumes, apenas um
deles sobreviveu aos anos. Gomes teve sua formação musical no Seminário da
Patriarcal em Lisboa, onde teve aulas com compositores como José Joaquim dos
Santos (1748?-1801), o qual é mencionado em seu tratado, na Lição No 16,
especificamente no parágrafo onde trata das fugas com dois motivos ou passos.
Também importante foi a atuação de compositores nascidos no Brasil e que
estudaram em Portugal, como o pernambucano Luiz Álvares Pinto (1719-1789) que
estudou em meados do século dezoito em Lisboa e chegou a tocar violoncelo na
Capela Real portuguesa.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)

David Perez – Mattutino Dei Morti, primo noturno.

 NiccoloJommelli – Requiem, Pie Jesu

 Giovanni BattistaPergolesi – Missa a 5 vozes

 José Joaquim dos Santos – Te Deum a 8 Vozes

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Referência

ROHL, Alexandre C. O. A Fuga Dupla Luso-Brasileira Durante os Séculos XVIII e


XIX. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Instituto de Artes da UNESP, 2010.
Orientador: Paulo A. Castagna.

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Aula 11_ O ensino musical no século XVIII em Portugal e sua


função na transmissão do estilo

 
 A presente aula tem a função de apresentar a relação entre os métodos de
ensino musical no século XVIII, em Portugal e Brasil, e a transmissão do estilo
musical. Prática comum, vinda por influência dos conservatórios italianos, os
métodos de música não somente serviam como material para ensinar um
determinado conteúdo técnico (como solfejo, acompanhamento ou contraponto),
mas também eram utilizados como ferramenta de inicialização dos jovens
estudantes a características do estilo musical do período.

Segundo TRILHA, durante um período de cinco a dez anos, os alunos de


música dos conservatórios em Nápoles, eram instruídos na arte do partimento,
contraponto, composição e canto (2012, p. 420). Os partimenti, também conhecidos
em Portugal como solfejos de acompanhamento, eram exercícios de baixo contínuo
onde somente a parte do baixo era fornecida ao estudante, este por sua vez deveria
tocar o baixo com a mão esquerda enquanto com a mão direita resolvia o
acompanhamento, testando diversas combinações de acordes ou vozes
contrapontísticas. O domínio das lições era demonstrado quando o aluno era capaz
de realizar no baixo e acompanhamento, com ambas as mãos, uma série de
apropriados comportamentos estilísticos do começo ao fim do
partimento(GJERDINGEN: 2007, p. 465).

 
“Um jovem músico com a mente treinada para controlar um “tesouro
de frases memorizadas”, algumas delas aprendidas ao cantor e tocar
os solfeggi, poderia rapidamente aplicá-las às “oportunidades” em
um partimento.” (GJERDINGEN: 2007, p. 465)
 

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FedeleFenarolli: Exemplo de Partimento (solfejo de acompanhamento)


 
 Ao contrário da prática atual, onde os solfejos possuem apenas uma linha
melódica, os solfejos napolitanos se caracterizavam por uma linha melódica
acompanhada por um baixo instrumental, este último podendo ou não ser cifrado,
fazendo dos solfejos cantados uma extensão natural e indissociável da prática dos
partimenti (TRILHA: 2012, 420). Como base dos primeiros anos do ensino de
música, os solfejos acompanhados tinham também como função introduzir o aluno a
uma série de padrões melódicos e contrapontísticos que pela memorização criariam
um “léxico bastante amplo, e eficaz, capaz de habilitá-lo ao ofício de compositor”
(TRILHA: 2012, 420).
As afirmações dos pesquisadores Mário Trilha e Robert O. Gjerdingen
mostram que a importância dos solfejos, neste contexto, ia muito além do ensino do
canto e da leitura musical, sendo também fundamental para o aprendizado prático,
pela memorização de características e padrões deste estilo musical, galante, em
prática nos conservatórios musicais napolitanos durante o século dezoito.

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Luís Álvares Pinto: Músico e Moderno Sistema, Lição XX


 
  https://www.youtube.com/watch?v=VRqIA-qpTHQ

Luís Álvares Pinto: Músico e Moderno Sistema, Lições XX, XIX, XXII, XXIII e
XXIV (link do youtube)
 É de se supor que, devido à importância dada ao repertório italiano, seus 
métodos de ensino também tenham chegado a Portugal, junto com os músicos 
contratados durante os reinados de D. João V e D. José I, e assim disseminados 
pelo reino, como verifica TRILHA:

  “Não somente os solfeggi de mestres italianos, nomeadamente


Leonardo Leo, Giovanni Giorgi, MatteoCapranica, Giuseppe Aprile e
David Perez, foram adotados em Portugal como elementos
incontornáveis da formação, mas igualmente os solfeggi compostos
por músicos portugueses: Francisco Inácio Solano, Almeida Mota,
José António da Silva Policarpo e Marcos Portugal.
A utilização dos solfeggi, tal qual a do partimento, ocorreu em maior
escala no Seminário da Patriarcal e no Colégio dos Reis em Vila
Viçosa. Este fenômeno, tal como o do partimento, deve-se ao facto

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destas instituições emularem o sistema didático dos conservatórios


napolitanos.” (TRILHA: 2012, p. 422)

O Seminário da Patriarcal, uma escola de música com base religiosa, foi 


fundado em 1713 pelo rei D João V (CRANMER: 1994, p. 692), sendo a mais 
importante instituição na formação musical portuguesa até ser substituída pelo 
atual  Conservatório,  em  1835,  e  tinha  seu  ensino  focado  especialmente  na 
música  religiosa  de  estilo  concertante  (NERY:  1991,  p.  89). Segundo a
pesquisadora portuguesa Cristina FERNANDES, a história do Real Seminário  da 
Patriarcal  é  indissociável  do  investimento  que  presidiu  a instituição do 
Patriarcado de Lisboa em 1716 e à ação reformadora de D. João V no plano das 
artes e cultura (2013, p. 15). Usando como modelo o cerimonial existente na 
Capela  Papal,  no  Vaticano,  o  monarca  português  traz  para  sua Capela Real
diversos     músicos  italianos,  tanto  cantores  como  compositores,  que não
limitariam sua atuação à Capela Real e Patriarcal, mas parte teria importância 
considerável  como  mestres  no  Seminário  da  Patriarcal,  como foi o caso do 
renomado compositor Giovanni Giorgi.

“Reforçando a dimensão sacral da monarquia Absoluta, a Capela


Real e Patriarcal de Lisboa procurou emular e até ultrapassar os
modelos estéticos e cerimoniais do Vaticano, unindo numa lógica de
<obra de arte total> a pompa litúrgica e o cerimonial áulico. As artes
plásticas e a dimensão coreográfica e teatral do ritual sacro, o poder
retórico da palavra e da música. [...] A música e os músicos
constituíram um pilar fundamental da prodigiosa máquina cerimonial
que alimentava a Patriarcal, [...] através da adoção de modelos do
Barroco italiano, da contratação de cantores de alto nível e de
compositores tão ilustres como os já referidos Domenico Scarlatti e
Giovanni Giorgi.” (FERNANDES: 2013, p. 16)
 
Como  parte  do  investimento  na  formação  musical  portuguesa também
eram concedidas bolsas aos alunos mais dotados para aprimorarem seus estudos
na Itália, mais precisamente em Roma, como, por exemplo, Antônio Teixeira,
Joaquim do Vale Mexelim, João Rodrigues Esteves e Francisco Antônio de Almeida
(BRITO: 1989, p. 109). João Rodrigues Esteves assume função de mestre do Real

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Seminário em 1726, mesmo ano que retorna à Portugal de seus estudos.


(FERNANDES: 2013, p. 45).

Segundo FERNANDES, o tempo médio de estadia dos alunos no


Seminário era de oito anos, mas houve casos de permanência por
onze anos, sendo que a maioria dos alunos ingressava com sete ou
oito anos de idade (2013, p. 50). O ensino era dividido entre “lições
de solfa e cantar bem”, a “compostura, tocar órgão e acompanhar e
principalmente para o exercício de canto de órgão, ou de estante”
(FERNANDES: 2013, p. 30).

 Dentre as obras que pertenceram ao Seminário da Patriarcal, hoje


presentes na Biblioteca Nacional de Portugal, destacam-se as “Regras de
Acompanhamento” e solfejos com acompanhamento, tanto da autoria de
compositores italianos, especialmente napolitanos, quanto portugueses
(FERNANDES: 2013, p. 57). Para TRILHA, esse material didático produzido em
Portugal durante o século dezoito até início do dezenove é considerado como
“perfeitamente inserido no seu tempo, e ainda que a produção de partimentie
solfejos com acompanhamento de baixo contínuo não tenhaconhecido a profusão
dos conservatórios napolitanos, não foi, em termos qualitativos, inferior aos métodos
similares utilizados em Nápoles, no resto da Itália e no sul da Alemanha” (TRILHA
em FERNANDES: 2013, p. 58).
 O patrimônio musical do Seminário da Patriarcal, após sua extinção, foi
entregue ao recém-criado Conservatório Nacional, tendo ficado por um curto período
na Biblioteca Pública da Corte (RIBEIRO em FERNANDES: 2013, p. 58) e em 1995
foram transferidos para a Biblioteca Nacional de Portugal (FERNANDES: 2013, p.
59). Comparando um inventário manuscrito das partituras e métodos do Seminário
da Patriarcal, que data do período em que o material foi entregue ao Conservatório
Nacional; a “Relação dos volumes de Música que o Conservatório Real de Lisboa
recebeu da Biblioteca Nacional, pertencentes ao extinto Seminário da Patriarcal”, de
1841; o “Inventário
 Preliminar dos Livros de Música do Seminário da Patriarcal”, realizado em
1999 por Rui Cabral; e através da consulta direta dos manuscritos, foi verificado pela

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pesquisadora Cristina FERNANDES que a maior parte das obras registradas


sobreviveram até nosso tempo (2013, p. 58-59).
 Dentre as obras existentes no primeiro inventário mencionado,
FERNANDES localizou uma série de manuscritos de solfejos compostos por autores
como David Perez, Giovanni Giorgi, Leonardo Leo, Giuseppe Aprile e Francisco
Inácio Solano. Do último, consta no inventário de obras do Seminário da Patriarcal
os “Primeiros Elementos de Cantar”, obra desconhecida, a não ser que trate de uma
designação informal da “Nova Arte e Breve Compêndio de Música para Lição dos
Principiantes” ou uma versão anterior dos “Solfejos para Soprano do Sr. Francisco
Solano e do Sr. David Perez”, hoje na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
(2013, p. 62-63).

“Solfejos de Soprano” de Francisco Ignácio Solano: Página de rosto


 
 Também consta do inventário os “Solfejos de Itália”, coletânea de solfejos
com acompanhamento de diversos autores italianos, realizada por Bêche e
Levesque e impressa em Paris em 1772 pela Le Duc (FERNANDES: 2013, p. 65-
66).

Referência

BRITO, Manuel C. Estudos de história da música em Portugal. Lisboa: Editorial


Estampa, 1989.

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CRANMER, David. Opera in Portugal orPortuguese Opera?In: The Musical Times, v.


135, p. 692-696. Inglaterra: Musical TimesPublications. 1994. Disponível em:
<http//:www.jstor.org/stable/1003194>

FERNANDES, Cristina. Boa voz de tiple, sciencia de músicae prendas


deacompanhamento: O Real Seminário da Patriarcal, 1713-1834. Lisboa:
BibliotecaNacional de Portugal, 2013.

GJERDINGEN, Robert O. Music in the galant style. Nova Iorque: Oxford University
Press, 2007.

NERY, Rui Vieira; CASTRO, Paulo Ferreira. História da Música. Lisboa: Imprensa
Nacional-Casa da Moeda, 1991.

TRILHA, Mário. Os solfejos para uso de suas Altezas Reais. In: Marcos Portugal:
Uma reavaliação. David Cranmer (coord.). Lisboa: Edições Colibri/ CESEM, 2012. p.
419 a 430

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Aula 12_Caetano de Melo de Jesus e a “Escola de Canto de Orgão”

  

“Escola de Canto de Órgão” de Caetano de Melo de Jesus, 1759: Página de rosto, vol.1
  
Infelizmente, pouco se sabe sobre a vida e obra do teórico baiano Caetano
de Melo de Jesus, mas pelo que tudo indica, foi um Mestre de Capela Eminente e
considerado, em meados do século XVIII, em Salvador. As informações conhecidas
sobre sua vida são que ele nasceu no Arcebispado da Bahia, foi aluno de Nuno da
Costa e Oliveira (mestre de solfa da Misericórdia da Bahia, entre 1715 e 1717) e foi
ordenado sacerdote do hábito de São Pedro e exerceu o mestrado da capela da
catedral de São Salvador entre 1734 e 1760. Embora pouco conhecido, sua principal
obra, o tratado “Escola de Canto de Órgão”, faz com que o músico e teórico baiano
tenha importância única na história da música brasileira. Segundo as recentes
pesquisas da musicóloga portuguesa Mariana Portas de Freitas, a “Escola de Canto
de Órgão” é o “mais extensões um dos mais importantes tratados de Teoria Musical
escritos em língua portuguesa ao longo da história do período colonial.

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A “Escola de Canto de Órgão” é um tratado de música em quatro volumes,


onde somente os dois primeiros sobreviveram ao tempo, contudo, somente os dois
primeiros volumes possuem um total de 1157 páginas manuscritas escritas em
caligrafia miúda e também possuem um número considerável de diagramas
musicais como exemplos. Os quatro volumes foram originalmente divididos da
seguinte forma:

  

Vol I – Da Musica Theorica ou Methodo Doutrinal

Vol II – Numeral ou Arithmetica – Da Theorica dos Intervalos

Vol III – Dos Solfejos, methodo para o ensino dos Discipulos (perdido)

Vol IV – Do Contraponto e da Composiçaõ (perdido)

  

Após a conclusão dos dois primeiros volumes em 1759 e 1760,


respectivamente, o padre Caetano de Melo de Jesus enviou os manuscritos à Lisboa
com o objetivo de publicá-los, razão pela qual hoje eles se encontram na Biblioteca
Pública de Évora. Infelizmente sua publicação nunca foi concretizada. Segundo
FREITAS, o tratado destaca-se no panorama da teoria musical luso-brasileira e
ibérica do período colonial pela sua “extensão e envergadura, pela amplitude e
riqueza do conteúdo, denotando uma pretensão enciclopédica de abrangência e de
aprofundamento das matérias, bem como pela qualidade intrínseca e gráfica dos
nmerosos diagramas e esquemas musicais”

Um dos principais pontos de relevância da obra de Caetano de Melo de


Jesus é que seu tratado é o primeiro, em língua portuguesa, a mencionar a
existência do solfejo “francês” ou heptacordal, que utiliza as sete sílabas que hoje
conhecemos (Dó-Ré-Mi-Fá-Sol-Lá-Si). Até então, a prática do ensino musical
utilizava a solmização criada por Guido de Arezzo, que utilizava somente seis
sílabas (Ut – Ré – Mi – Fá – Sol – Lá). A prática da solmizaçãoaretina remonta à
Idade Média, quando foi criada, e continuou sendo praticada no mundo ocidental até
o século XVIII. Em Portugal, o solfejo com sete notas só será mencionado em 1778,

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por Bernardo da Conceição, no tratado “O Eclesiástico Instruído Cientificamente na


Arte do Cantochão”, quase 20 anos após Caetano de Melo de Jesus.

Apesar de elogiar as facilidades e praticidade do solfejo com sete notas,


como aponta a pesquisadora Mariana Portas de Freitas, o teórico baiano ainda
defende a permanência da solmizaçãoaretina (com seis notas) no ensino de música.
Tal prática seria contestada e alterada por outro músico nordestino, Luís Álvares
Pinto, poucos anos depois, em 1761, com seu método de solfejo “A Arte de Solfejar”.

  
“os Franceses, introduzindo sobre as nossas seis outra Voz,
chamada Si, cantão com sette, e facilitam muito a Musica; por que
por beneficio desta 7.ª Voz evitam o embaraço, e trabalho das
Mudanças, que nós fazemos por falta de huã Voz mais em cada
Dedução: Logo não seis, senãosette, como os Signos, parece que
com mayorrazaõdeviaõ ser as Vozes, eque he melhor o uso dos
Franceses.” (Melo de Jesus, vol. I, p. 203)
  
“[...]  para  noticia,  esta  vos  basta,  se  quizerdes  seguir  esta 
doutrina; que eu se naõ a sigo, naõhe por naõ louvar della a
facilidade; mas por parecer-me a de Guido mais perfeyta, e em
seosproprios termos mais bem fundada.” (Melo de Jesus, vol. I, p.
255)
 
Referência

FREITAS, Mariana P. A “Escola de Canto de Orgaõ” do Padre Caetano de Melo de


Jesus (Salvador da Baía, 1759-60): Uma súmula da tradição tratadística luso-
brasileira do Antigo Regime. In: Anais do XVI Congresso da ANPPOM. Brasília:
ANPPOM, 2006.

FREITAS, Mariana P. Entre o hexacorde de Guido e o solfejo “francês”: a Escola de


Canto de Orgaõ de Caetano de Melo de Jesus (1759) – primeira recepção da teoria
do heptacorde num tratado teórico-musical em língua portuguesa. In: Revista
Brasileira de Música, vol. 23/2. Rio de Janeiro: UFRJ, 2010. p. 45-71

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Aula 13_Luís Álvares Pinto

Padre José Caetano. Prospecto da Vila do Recife, 1759. Fonte: Arquivo Histórico do Exército, Rio de
Janeiro (do site: http://bairrodorecife.blogspot.com.br/2014/01/a-cruz-do-patrao.html)
  
Luís Álvares Pinto, músico mulato, considerado um dos principais
compositores do Nordeste brasileiro no século dezoito, teve sua vida e obra descrita
por autores dos séculos dezoito, dezenove e início do século vinte em Portugal e
Brasil, como José Mazza (Lisboa, antes de 1797), Antônio Joaquim de Mello (Recife,
1854), Francisco Augusto Pereira da Costa (Recife, 1882), Ernesto Vieira (Lisboa,
1900) e Euclides Fonseca (Recife, 1925). Na segunda metade do século passado, o
principal musicólogo que se ocupou da vida de Luís Álvares Pinto foi o Padre Jaime
Diniz, que além de compilar os relatos biográficos existentes sobre a vida do autor,
almejou transcrever uma série de documentos, até o momento desconhecidos, que
possibilitaram ampliar o conhecimento sobre o compositor pernambucano,
especialmente a partir do ano de 1761.

O primeiro relato que se tem conhecimento sobre Álvares Pinto foi incluído
no Dicionário Biográfico de Músicos Portugueses, escrito por José Mazza e
impresso em Lisboa em 1794. Apesar do verbete conter somente um breve
parágrafo sobre o músico, é importante ressaltar que o texto é o único escrito sobre
a vida de Álvares Pinto do século dezoito:

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“Luis Alvares Pinto natural de Pranambuco homem pardo, excelente


Poeta Portuguez e Latino, m.to inteligente na Língua Francesa, e
Italiana; acompanhava muito bem rabecão, viola, rabeca veio a Lx.ª
aprender contraponto com o selebre Henrique da Silva [Esteves
Negrão], tem composto infinitas obras com muito
asertoprincipalmt.eEcleziasticas; composultimat.ehumasexequias á
morte do Senhor Rey D. José I a quatro coros, e ainda em
composições profanas tem escrito com muito aserto.” (MAZZA: 1794,
p. 33)1   2

  
Antônio Joaquim de Mello, principal biógrafo de Luís Álvares Pinto do século
dezenove, publicou na edição de sete de março de 1854 do Diário de Pernambuco
um longo ensaio biográfico sobre o músico, que posteriormente se tornou uma das
principais referências acerca de Álvares Pinto, sendo base para a publicação
posterior de Augusto Pereira da Costa em 1882 e retomado por Jaime Diniz no
primeiro tomo do livro “Músicos Pernambucanos do Passado” de 1969. Mello é o
primeiro autor a fornecer dados mais específicos sobre os primeiros anos de vida do
compositor recifense, incluindo sua origem familiar, formação educacional e as
circunstâncias em que foi estudar em Portugal.

  
“Luís Álvares Pinto, Sargento-mór de Milicias, homem pardo, nasceu
na freguesia de Boa-Vista da Cidade do Recife da Província de
Pernambuco. Basílio Alves Pinto, e sua mulher Euzébia Maria de
Oliveira foram seus pais. Não se sabe o dia do seu nascimento, por
se não achar o assento do seu baptismo, nem outra alguma
lembrança. Traduzindo-lhe desde as primeiras letras grande
memoria, e talento, seus pais, bem que não fossem abastados,
empenharam-se a que aprendesse latim, retórica, e filosofia. Com
estes estudos foi juntamente o mancebo applicando-se á musica, em
cuja arte se lhe admiravam os prenúncios de um gênio luminoso [...].
Terminando o estudo destes preparatórios, alguns amigos, e
protetores seus, e de seu pai, especialmente João da Costa
Monteiro, se prestaram espontâneos a que fosse estudar a Portugal,
principalmente musica” (MELLO: 1854, p. 2)3

  
O local de nascimento indicado por Mello e posteriormente replicado por
Pereira da Costa, Freguesia da Boa Vista da cidade de Recife, foi corrigido por
Jaime Diniz, que em posse do manuscrito autógrafo da “Arte de Solfejar” de 1761,
pode confirmar o local de nascimento de Luís Álvares Pinto como sendo a Vila de

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Santo Antônio em Recife, informação que consta no frontispício do primeiro método


de solfejo conhecido escrito pelo mestre pernambucano:

“Arte de Solfejar./ Methodo mui breve, e facil, / pª se saber solfejar


em menos/ de hûmez; e saber-se cantar/ em menos de seis./ Seg.do
os Gregos, e pr.os Latinos./ Seu Autor./ Luis Alvares Pinto/ Natural da
villa de S.toAntonio/ em o Reciffe de Paranambuco. Anno de
M.D.CC.L.XI.” (PINTO: 1761, fol. 1f)4

  
A respeito da ida de Luís Álvares Pinto para Lisboa, que segundo o
musicólogo Jaime DINIZ5 deve ter ocorrido por volta de 1740, apesar de não ser
possível precisar a data (1969, p. 43-44), Antônio Joaquim de Mello acrescenta
novas informações que somam às previamente expostas por Mazza:

  
“[...] e chegando a Lisboa, deu-se primeiro Luís Álvares Pinto a
aprender as regras da composição, ou contraponto, de que fez
solene exame, com aprovação e louvores mui lisonjeiros. Mas os
suprimentos de Pernambuco começaram a escassear, e de todo lhe
faltaram, o que o obrigou a fazer vida de musico para ter o pão
quotidiano. Neste exercício, e trabalho tão conhecido, e bem-quisto
geralmente se fez por habilidade professional, porte grave, e
compassadas, e insinuantes maneiras, que foi recebido a ensinar em
algumas casas nobres. Não só tocando violoncelo, mas também
copiando, compondo alguma cousa, e mormente ensinando de sorte
lucrava, que pode permanecer naquela grande cidade (graças a
regularidade dos seus costumes!) sem ser pesado a ninguém, e de
suas economias tirou ainda os meios para poder regressar, quando
quis, a Pernambuco. Assevera-se, que foi um dos violoncelos da
Capela Real” (MELLO: 1854, p. 2)

  
Segundo Mello, Álvares Pinto, por necessidade da falta de recursos
provenientes de Pernambuco, teve uma vida profissional variada em Lisboa,
atuando como copista, compositor, dando aulas de música em “algumas casas
nobres” e mesmo tocando violoncelo na Capela Real. Apesar de Mazza também
mencionar a qualidade do músico como violoncelista, infelizmente não foram
encontrados até o momento qualquer documento que ateste a atividade profissional
ou mesmo a presença de Luís Álvares Pinto em Lisboa. Caso tenham existido,
possivelmente foram destruídos ou perdidos durante o terremoto que assolou Lisboa

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em 1755. Sobre a atuação de Álvares Pinto em Lisboa, as únicas fontes conhecidas


são secundárias, a partir de seus biógrafos dos séculos dezoito e dezenove.

Não é possível ter certeza do ano de seu regresso ao Brasil, mas é seguro
que em 1761 já se encontrava em Recife, casado com Ana Maria da Costa, ano do
manuscrito de seu método “Arte de Solfejar” (DINIZ: 1969, p. 45 – 46). Logo que
retorna à sua cidade natal Luís Álvares Pinto se volta ao ensino de música e
primeiras letras (DINIZ: 1969, p. 46). Além de autor de dois métodos de solfejo, “Arte
de Solfejar” e “Músico e Moderno Sistema Para Solfejar sem Confusão”, o
compositor pernambucano publicou em 1784 um “Dicionário Pueril”, para ensino de
primeiras letras, impresso na oficina de Luiz Ameno, em Lisboa. Segundo Francisco
Augusto Pereira da Costa, o compositor, em 1781, foi nomeado, através de carta
régia, “para interinamente reger a cadeira de primeiras letras do bairro do Recife,
com os vencimentos anuais de 90$000, sendo em 1785 provido no lugar de
substituto, com 150$000” (apud OLIVEIRA: 2010, p. 8)6.
Após seu regresso a Pernambuco, a atuação junto das irmandades
religiosas de Recife e Olinda de Álvares Pinto foi objeto de pesquisa do musicólogo
Jaime Diniz, que logrou localizar uma série de documentos da Confraria de Nossa
Senhora do Livramento, da Irmandade de Nossa Senhora de Guadalupe de Olinda,
Irmandade de São Pedro dos Clérigos, Irmandade do Senhor Bom Jesus das Portas
e Irmandade de Santa Cecília. Todas irmandades onde Luís Álvares Pinto
conhecidamente trabalhou como encarregado pela música em festas religiosas.
É na Igreja de São Pedro dos Clérigos, em Recife, que teve sua construção
concluída no início de 1782 (DINIZ: 1969, p. 50), onde é possível verificar uma maior
atuação musical do compositor pernambucano. Francisco Pereira da COSTA, nos
Anais Pernambucanos, de 1954 e 1958, escreve que na referida igreja, após sua
inauguração, foi criado o cargo de Mestre de Capela, sendo Álvares Pinto nomeado
para o mesmo (apud DINIZ: 1969, p. 50). O musicólogo Jaime Diniz acredita que a
informação dada por Pereira da Costa pode não ser precisa, considerando-se que
não há documento que comprove a criação do cargo de Mestre de Capela para a
Igreja de São Pedro dos Clérigos no ano de 1782. O musicólogo aponta que antes e
após a edificação da igreja, Álvares Pinto trabalhou com a Irmandade de São Pedro
dos Clérigos, como músico, sendo que somente em 1787 um documento presente

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no “Livro de Termos” da Irmandade, se refere ao compositor como “mestre de


Capella”, informação reforçada em 1788 onde ele é mencionado, no mesmo livro,
como “professor da capela”. Diante da documentação conhecida, DINIZ acredita
que, caso o cargo de Mestre de Capela tenha sido criado para a referida igreja, o
mesmo ocorreu tardiamente, provavelmente no ano de 1788, sendo ocupado
brevemente por Álvares Pinto, até seu falecimento em 1789. Até este momento,
acredita o musicólogo, Álvares Pinto trabalhou nas festividades da Irmandade de
São Pedro dos Clérigos à base de contrato (1969, p. 50-55).
Uma pequena biografia escrita por J. Lopes Netto (provavelmente um dos
primeiros proprietários do manuscrito) contida no Músico e Moderno Sistema, de
1776, acrescenta novas informações acerca da vida de Luís Álvares Pinto, desde a
sua formação até as motivações para o mesmo viajar a Portugal e sua carreira após
retornar ao Brasil, mostrando que sua ida a Portugal possivelmente não teve relação
direta com a formação e carreira musical, como apontam seus demais biógrafos. É
possível que tenha ido a Portugal com a intenção primeira de seguir estudos de
direito em Coimbra, e retornado a Pernambuco para assumir uma cadeira de
primeiras letras. Tal entendimento é corroborado na transcrição:

  

“Depois de se distinguir nas aulas preparatórias que havia na capital de


Pernambuco, Luís Alvares Pinto embarcou-se para Lisboa com intenção de estudar
direito na Universidade de Coimbra.

Ou por lhe faltarem os recursos com que contava, ou por se ter


deixado vencer dos passatempos, que o criavam naquela corte, viu-
se, em breve, forçado a procurar no trabalho próprio os meios de
acorrer às suas necessidades.
Aproveitando o seu talento musical e a pericia, com que tocava
vários instrumentos, então muito estimados, conseguiu a favor do
Min.º d’Estado Martinho de Mello [e Castro], que o chamou para
Mestre de música de suas filhas e o fez nomear Mestre, ou coisa que
o valha, da Capela Real.
Nesta posição, com quanto fosse agradável a um brasileiro, nas
circunstâncias de Luís Alvares, não o embaraçou de pensar na
pátria, cujas saudades o valeram, mesmo no palácio de seu
esclarecido Mecenas. Decidido a regressar a Pernambuco, que, para
ele valia mais que a Metrópole, Luís Alvares solicitou e obteve uma
cadeira de Primeiras Letras, que Martinho de Mello fez criar na freg.ª
da Boavista para arranjá-lo.

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Em Pernambuco, como em Lisboa, ensinou a musica com paixão e


talento. São dele todas as peças, que, ainda hoje, se cantão lá, nas
cerimônias religiosas. A mais notável delas, é uma musica fúnebre,
em quatro coros, que compôs para o funeral do Rei D. José I, cujo
Min.º foi Martinho de Mello [e Castro], seu protetor. Neste [...]
Faleceu no Recife e foi sepultado na Igreja de N. S. do Livramento”
(J. Lopes Netto)7

  
Em relação à ida de Álvares Pinto para estudar direito em Coimbra, em
pesquisa de campo realizada em 2014, não foi possível localizar uma referência
sobre o compositor pernambucano nos Livros de Matrículas da universidade de
Coimbra, indicando que, caso tenha sido esta a motivação de sua viagem, é pouco
provável que o mesmo tenha ido à Coimbra, se estabelecendo desde o início em
Lisboa. Apesar de não comprovada, a hipótese não pode ser totalmente descartada,
considerando a formação privilegiada que Álvares Pinto recebeu em sua juventude,
mencionada por mais de um de seus biógrafos. A escassez de recursos para se
manter, incluída anteriormente por Antônio Joaquim de Mello, volta a ser tratada
acima como uma das razões para o compositor começar sua atividade musical em
Portugal, como meio de se sustentar durante sua estadia.
O texto, escrito por Lopes Netto, menciona pela primeira vez o nome de um
possível mecenas de Álvares Pinto, sendo ele “Min.º de Estado Martinho de Mello”.
Esta notícia provavelmente se refere a Martinho de Melo e Castro (1716-1795), que
durante os reinados de D. João V e D. José I, ocupou importantes funções na corte,
sendo nomeado em 1739, por D. João V, como Cônego da Sé Patriarcal. Em 1751,
durante o reinado de D. José, Melo e Castro inicia sua carreira diplomática,
passando a representar Portugal na Holanda e em 1754 foi transferido para a Corte
de Londres, função que manteve até 1770, quando foi nomeado Secretário de
Estado da Marinha, e Domínios Ultramarinos, cargo que desempenhou até sua
morte em 1795 (VALADARES8: 2010, p. 37-41). Lopes Netto indica que Álvares
Pinto foi professor das filhas de Martinho de Melo e Castro e que o mesmo,
provavelmente na função de Cônego da Patriarcal o nomeou para “Mestre, ou coisa
que o valha, da Capela Real”. Estas informações são corroboradas por Antônio
Joaquim de Mello que menciona o músico brasileiro como professor de “algumas
casas nobres” e “que foi um dos violoncelos da Capela Real” (MELLO: 1854, p. 2).
Retornado a Recife, Lopes Netto indica a importância musical de Luís
Álvares Pinto, citando a composição das Exéquias para quatro Coros para o funeral
do rei D. José I, escrita possivelmente entre 1777 e 1778 (o rei D. José I de Portugal
faleceu em 24 de fevereiro de 1777), mencionadas também, já no século dezoito,
por José Mazza, como pode ser visto na citação presente no início da aula.

  

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Na próxima aula conheceremos um pouco de sua música e seu trabalho na


teoria musical luso-brasileira.

Referência
1 MAZZA, José. Dicionário Biográfico de Músicos Portugueses. Lisboa: Editorial
Império, 1944/45

2 Propositalmente a citação foi mantida em seu português antigo, do século XVIII,


assim o aluno pode se familiarizar com a variedade de materiais utilizados na
musicologia histórica.

3 MELLO, José Joaquim de. Biographia de Luiz Alves Pinto. In: Diário de
Pernambuco. Pernambuco: 7 mar. 1854, p. 2-3.

4 PINTO, Luís Álvares. Arte de Solfejar. Biblioteca Nacional de Portugal,


Reservados. Recife: 1761. Manuscrito.

5 DINIZ, Jaime C. Músicos Pernambucanos do Passado. Recife: Universidade


Federal de Pernambuco, 1969. p.43 a 100.

6 OLIVEIRA, Carla Mary da Silva. Música e primeiras letras no Brasil setecentista:


Luís Álvares Pinto, mulato, músico, mestre-da-capela e pedagogo. In: Anais do VIII
Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação. São Luis: Universidade Federal
do Maranhão, 2010, p.563-569.

7 Apud PINTO, Luís Álvares. Muzico e Moderno Systema para Solfejar sem
confuzão. Recife: 1776. Palácio Grão-Pará, Petrópolis. Manuscrito.

8 VALADARES, Virgínia Maria Trindade. Trajetória do homem e do estadista Melo e


Castro. Cadernos de História, Belo Horizonte, v. 3, n. 4, p. 36-46, nov. 2010.
Disponível em:
<http://periodicos.pucminas.br/index.php/cadernoshistoria/article/view/1690>

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Aula 14_ Luís Álvares Pinto II


 
A qualidade da obra musical de Luís Álvares Pinto é mencionada pelos seus
biógrafos desde José Mazza, no final do século dezoito: “tem composto infinitas
obras com muito acerto principalmente Eclesiásticas; [...] e ainda em composições
profanas tem escrito com muito acerto”. Infelizmente, uma de suas principais obras
eclesiásticas, referenciada tanto por José Mazza quanto por Lopes Neto, as
“Exéquias para D. José I a quatro Côros”, até o momento permanece desconhecida,
o que não diminui a importância das obras cuja autoria de Álvares Pinto pode ser
identificada.

Outras obras de Álvares Pinto, mencionadas por Antônio Joaquim de


MELLO são: três Hinos à Nossa Senhora da Penha; um Hino à Nossa Senhora do
Carmo; um Hino à Nossa Senhora Mãe do Povo; um Ofício da Paixão; Matinas de
São Pedro, com uma famosa “fuga imitativa do mar tempestuoso e revolto”; Matinas
de Santo Antônio; Novenas, Missas, Ladainhas e Sonatas” (apud DINIZ: 1969, p.
67)1. Pereira da Costa e Euclides Fonseca citam também um “Te Deum”, escrito por
Álvares Pinto, única obra que foi localizada dentre as mencionadas por seus
biógrafos (DINIZ: 1969, p. 68). Segundo Jaime Diniz, Euclides FONSECA
acrescenta uma crítica ao estilo musical de Álvares Pinto, onde afirma que:

 
“[...] embora fosse adepto do estilo italiano, florido, sensualista e
muito seguido por outros compositores de sua época, Luiz Alves
Pinto, em suas músicas, revelou inspiração fértil e por vezes original,
além de perfeito conhecimento dos recursos vocais e instrumentais
de sua arte.” (apud DINIZ: 1969, p. 68)
  
Segundo o musicólogo Jaime DINIZ, a descrição do estilo musical de
Álvares Pinto transcrita acima não pode ser aplicada ao “Te Deum Laudamus para
quatro vozes” localizado pelo pesquisador em 1967, no arquivo particular de Carlos
Diniz. A obra, com cerca de 550 compassos, não foi escrita em “estilo italiano”, a
ponto do crítico CALDEIRA FILHO apontar que, pelo “Te Deum”, Luís Álvares Pinto

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mostra-se “vacinado, em técnica e em qualidade temática, contra o vírus do “bel


canto” napolitano”, apesar de ter vivido em Lisboa durante o século dezoito (apud
DINIZ: 1969, p. 68).

A opção pela escrita polifônica, mais característica do estilo antigo,


encontrada no “Te Deum”, pode ser melhor compreendida a partir de uma referência
feita por Álvares Pinto ao “estilo italiano” e sua relação com a música religiosa, no
proêmio de seu método, o “Muzico e Moderno Systema”:

  “Ora, ninguém negará que são hoje os Italianos de gosto o mais


esquisito (belo) e delicado invento, que todas as outras Nações, na
composição Dramática; porém com esta composição tanto tem
contaminado o Canto Eclesiástico, que hoje mais parecem Arias os
Motetes e teatros os templos.” (PINTO: 1776, p. 4)2

Te Deum
https://www.youtube.com/watch?v=znaNaRQYLAc

Além do “Te Deum”, a única obra musical, com autoria confirmada por Jaime
Diniz, é um “Salve Regina” para três vozes, dois violinos e baixo. DINIZ descreve a
obra como “simples, apesar de algumas incursões da técnica da imitação e de
possuir uma certa dose de sugestividade no revestimento melódico do texto” (1969,
p. 70).
Antônio Joaquim de Mello descreve outra obra de Luís Álvares Pinto
(infelizmente perdida), esta na área cênica, onde o compositor é autor tanto da
poesia quanto da música, a comédia “Amor mal correspondido”, composta em três
atos com os seguintes personagens: Clorinda; Florisbello, Principe do Epiro;
Celauro, Príncipe de Atenas; Lanceta, criada; e Estojo, criado de Celauro. MELLO
descreve a trama conforme abaixo:
  
“Florisbelo e Celauro, aliados de Clorinda, marcham contra Troante,
tirano da Grécia, com forças suas e de Albania, a vingarem esta das
correrias e devastações de Troante nas fronteiras. [decide-se a
batalha] pelo duelo singular de Florisbello e Troante, no qual este é
morto [...[. Tudo isto é só narrado. De volta os príncipes em Albânia,

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namoram-se de Clorinda, que procuram tornar sensível à sua


ternura. [...] Clorinda declara-se em favor de Florisbello, a quem
assegura fidelidade, mas depois cativam-na os modos e simpatia de
Celauro, e despede a Florisbello do reino. Sabe este a causa da sua
despedida, a tempo que já Celauro também sciente da versatilidade
de Clorinda, [...] a detesta. Clorinda se quer tornar a Florisbello, mas
este, presente Celauro, lhe exprobra o vil procedimento. Celauro por
princípios de cavalheirismo a defende, do que resulta irem-se às
armas [...]. (MELLO: 1854, p. 2)3
  
MELLO completa sua crítica à comédia de Álvares Pinto apontando que o
“autor do Amor mal Correspondido não era um literato, era muito estudioso e
apaixonado da poesia, mormente dramática e lastimava que os poetas, seus
contemporâneos e patrícios, não compusessem para o teatro”. O crítico completa
que a comédia não pode ser considerada uma obra prima, o interesse é pequeno, o
enredo poderia ser mais forte e “talvez mesmo não há toda a conveniência relativa
aos caracteres dos altos personagens, mas não é absolutamente sem mérito, em
sua marcha e incidentes não perde o autor o feito de atingir e verificar o amor mal
correspondido, é toda em versos toantes e consonantes, notando-se alguma
harmonia imitativa, e a fábula é de pura invenção do poeta.” (MELLO: 1854, p. 2)
MELLO indica que os versos referentes à “harmonia imitativa” acima
mencionada são os seguintes, pertencentes à primeira cena do primeiro Ato: “Que
impelidas à vergonhosa fuga” e Celauro rompe com a cavalaria”, ambos recitados
por Clorinda (1854, p. 2).
Sobre as notícias das obras teórico musicais de Álvares Pinto, Antônio
Joaquim de Mello e Pereira da Costa mencionam uma “Arte pequena para se
aprender música”, e outra “Arte grande de solfejar” (ambas perdidas e a segunda
tendo sido supostamente traduzida para o francês) e Diniz também reconhece uma
terceira, a “Arte de Solfejar”, escrita em 1761 e localizada, com auxílio da
pesquisadora Cleofe Person de Matos na Biblioteca Nacional de Lisboa (DINIZ:
1969, 65).
Em 1977 Jaime Diniz publicou uma edição moderna da “Arte de Solfejar”.
Esta publicação, contendo também um estudo preliminar realizado pelo musicólogo,
traz à luz um método brasileiro do século dezoito, até então desconhecido e que se
encontra em um manuscrito na Biblioteca Nacional de Lisboa.

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O “Muzico e Moderno Systema” de 1776 foi mencionado pela primeira vez


por Clarival do Prado VALLADARES no livro Nordeste histórico e monumental
(1982, p. 18-19)4. O método permanece na biblioteca particular de D. Pedro Gastão
de Orleans e Bragança (Biblioteca da Família Real Imperial), em Petrópolis. Até o
presente momento, apenas os exemplos musicais dos solfejos e os “Divertimentos
Harmônicos”, série de cinco pequenos motetes incluídos ao final do tratado, são
conhecidos devido a uma transcrição manuscrita realizada pelo maestro Ernani
Aguiar em 1988 (AGUIAR: 1988)5e transcrições realizadas pelo musicólogo Paulo
Castagna e disponibilizadas para consulta em rede virtual6.
A partir do conhecimento de ambos os métodos, Arte de Solfejar e “Muzico e
Moderno Systema”, pode-se criar a hipótese (não comprovada) que os mesmos
sejam os dois métodos citados por Antônio Joaquim de Mello e Pereira da Costa,
“Arte pequena para se aprender música” e “Arte grande de solfejar”
respectivamente, considerando que o “Muzico e Moderno Systema” possui um
número consideravelmente maior de páginas que o método anterior de 1761.
Sobre os métodos de solfejo de Álvares Pinto, é importante ressaltar que
este autor foi o primeiro a defender a utilização do solfejo heptacordal em um texto
teórico luso-brasileiro. Este solfejo heptacordal se assemelha à prática atual,
utilizando as sílabas de DÓ a SI, mas devemos lembrar que no século XVIII ainda se
utilizava em Portugal e Brasil a solmizaçãohexacordal de Guido de Arezzo, na qual
se solfejava somente com seis notas, de UT(Dó) a LÁ. Na solmizaçãoaretina, para
cantar uma simples oitava, era necessário alterar o nome da nota, já que qualquer
semitom era cantado como MI-FÁ. O primeiro teórico a mencionar o Solfejo
Heptacordal em um texto em língua portuguesa, foi o também brasileiro, Padre
Caetano de Melo de Jesus, natura da Bahia, no tratado “Escola de Canto de Órgão”
escrito entre 1759 e 1760, apesar do mesmo ainda defender a utilização da
solmização de Guido de Arezzo.

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Exemplo 1. SolmizaçãoAretina e mutanças em escalas ascendente e descendentes.

Figura 2. “Arte de Solfejar” de Luís Álvares Pinto, 1761: Frontispício

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Figura 3. “Muzico e Moderno Sistema” de Luís Álvares Pinto, 1776: Frontispício

 Para o aluno que quiser se aprofundar sobre os métodos de solfejo de Luís


Álvares Pinto, recomendo a leitura dos seguintes artigos:

ROHL, Alexandre. Os métodos de solfejo de Luís Álvares Pinto: uma análise


comparada da Arte de solfejar e Muzico e moderno systema para solfejar
https://www.academia.edu/8383024/Os_m%C3%A9todos_de_solfejo_de_Lu
%C3%ADs_%C3%81lvares_Pinto_uma_an
%C3%A1lise_comparada_da_Arte_de_solfejar_e_Muzico_e_moderno_systema_par
a_solfejar
ROHL, Alexandre. O solfejo heptacórdico na obra teórica de Luís Álvares Pinto:
https://www.academia.edu/1906980/O_solfejo_heptac%C3%B3rdico_na_obra_te
%C3%B3rica_de_Lu%C3%ADs_%C3%81lvares_Pinto

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Referência

DINIZ, Jaime C. Músicos Pernambucanos do Passado. Recife: Universidade Federal


de Pernambuco, 1969. p.43 a 100.

PINTO, Luís Álvares. Muzico e Moderno Systema para Solfejar sem confuzão.
Recife: 1776. Palácio Grão-Pará, Petrópolis. Manuscrito.

MELLO, José Joaquim de. Biographia de Luiz Alves Pinto. In: Diário de
Pernambuco. Pernambuco: 7 mar. 1854, p. 2-3.

VALLADARES, Clarival do Prado. Nordeste Histórico e Monumental: Temas


nordestinos na música erudita contemporânea. Vol. 2. Brasil: Odebrecht, 1982. p. 18
e 19.

AGUIAR, E. [Carta.] Petrópolis, 12 dez. 1988, [para] Jaime Diniz, Recife. 16 f. Carta
contendo transcrições dos “Divertimentos Harmônicos” e quatro solfejos de Luís
Álvares Pinto. Instituto Ricardo Brennand, Recife, sem código. Manuscrito.
Disponíveis em: <http://imslp.org/wiki/5_Divertimentos_harm%C3%B4nicos_
%28Pinto,_Lu%C3%ADs_%C3%81lvares%29> e
http://imslp.org/wiki/Muzico_e_moderno_systema_para_solfejar_sem_confuz
%C3%A3o_%28Pinto,_Lu%C3%ADs_%C3%81lvares%29

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Aula 15_ A escola mineira no século XVIII

 
Durante o século XVIII acontece uma rica atividade musical, intensa em todas
as partes do país e dotada de estrutura institucional e educacional mais ou menos
estabilizada, formando um público apreciador em todas as classes sociais.
Durante a segunda metade do século ocorre um grande florescimento musical
conhecido como Escola Mineira ou Barroco Mineiro aconteceu na Capitania das
Minas Gerais, especialmente na região de Vila Rica (atual Ouro Preto), de Mariana e
do Arraial do Tejuco (hoje, Diamantina), onde a extração de grandes quantidades de
ouro e diamantes destinados à metrópole portuguesa atraiu uma população
considerável que deu origem a uma próspera urbanização. A vida musical, tanto
pública como privada, religiosa ou secular, foi muito privilegiada, registrando-se a
importação de grandes órgãos para as igrejas (incluindo um fabricado por
ArpSchnitger, hoje na Catedral de Mariana) e de partituras de Luigi Boccherini e
Joseph Haydn pouco tempo após sua publicação na Europa. No Tejuco existiriam
dez regentes em atividade, o que implicava em um corpo de músicos profissionais
de pelo menos 120 pessoas; em Ouro Preto teriam atuado cerca de 250 músicos, e
mais de mil em toda a Capitania de Minas Gerais, além de contar os diletantes, que
deveriam compor uma legião adicional, uma quantidade maior do que a que existia
na metrópole portuguesa na mesma época.
Neste período surgiram os primeiros compositores importantes nascidos no
Brasil, muitos deles descendente de negros (mulatos), escrevendo em um estilo com
elementos do Rococó, mas principalmente derivado de uma matriz Clássica.
Considerado por muitos o compositor mais importante do Barroco Mineiro,
José Joaquim Emerico Lobo de Mesquita nasceu na Vila do Príncipe (atual Serro)
por volta de 1746. Lá iniciou sua formação musical e suas atividades profissionais
como organista e compositor. Por volta de 1776, transferiu-se para o Arraial do
Tejuco, o centro urbano de maior importância na região enquanto centro de controle
da mineração. Sua atuação certamente incluía todas as obrigações de um Mestre da
Capela: compor as obras para as festas contratadas, arregimentar cantores e

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MÚSICA
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instrumentistas para a execução das obras, ensaiar, reger (provavelmente do


console do órgão, que era seu instrumento) e provavelmente ensinar (preparando
jovens para o exercício da profissão de músico). Transferiu-se para Vila Rica em
1798; dois anos depois transferiu-se para o Rio de Janeiro, tocando na Igreja da
Ordem Terceira do Carmo entre 1801 e 1805, quando faleceu.
Um de seus réquiens foi apresentado na vila de Caeté, MG, em 25 de janeiro
de 1827, em memória da Imperatriz Leopoldina, o que mostra que o compositor era
ainda reconhecido e lembrado mais de vinte anos depois do seu falecimento.
Até esse momento existem apenas três manuscritos autógrafos do
compositor, a Antífona de Nossa Senhora (1787) — que se encontra no Museu da
Inconfidência— a Dominica in Palmis (1782) e o Tercio que se encontra no Museu
da Música de Mariana (1783), mas há muitas cópias do restante de sua obra, em
cópias de fins do século XVIII e, em sua maioria, do século XIX.
(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de
Aprendizagem)
 Destacam-se entre os compositores que atuaram nesta região:
 Manoel Dias de Oliveira;
 Francisco Gomes da Rocha;
 Marcos Coelho Neto (pai);
 Marcos Coelho Neto (filho).
 
Compositores muito atuantes, embora poucas peças de suas produções
tenham chegado até nós.
Com a exaustão das minas no fim do século, o foco da atividade musical
distribuiu-se para outras localidades, especialmente Rio de Janeiro e São Paulo,
onde merece menção o compositor André da Silva Gomes, de origem portuguesa,
Mestre de Capela da Catedral da Sé de São Paulo, tendo deixado um número
considerável de obras.

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Aula 16_ A Corte no Brasil e o Classicismo


 
Fator crucial para a transformação da vida musical e estética brasileira seria a
chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808. O Rio de Janeiro até
então não se distinguia em nada de outros polos culturais do país, sendo mesmo
inferior a Minas Gerais e aos centros nordestinos, mas a chegada da corte modificou
essencialmente a vida e a situação, concentrando todas as atenções e servindo
como grande estímulo a outra pujança artística, já de forma claramente classicista.
Procurou Dom João VI trazer consigo a vasta biblioteca musical dos Bragança
- uma das melhores da Europa na época - e a presença de músicos de Lisboa foi
inevitável, chegando os castrastida Itália. Promoveu-se a reorganização da Capela
Real agora com cerca de cinquenta cantores e uma centena de instrumentistas, e
construi-se um suntuoso teatro, o chamado Real Teatro de São João.
A música profana contou com a presença de Marcos Portugal - nomeado
Compositor da Corte e Mestre de Música dos Infantes - e de SigismundNeukomm,
compositores que contribuíram com quantidade considerável de obras próprias,
além de também divulgarem na capital o trabalho de importantes compositores
europeus, como Mozart e Haydn.
Outras figuras interessantes desse período são: Gabriel Fernandes da
Trindade, compositor de modinhas e das únicas peças camerísticas remanescentes
do início do século XIX; e João de Deus de Castro Lobo, que atuou em Mariana e
Ouro Preto.
Sabemos, através da documentação encontrada em arquivos, que conflitos
entre os músicos europeus que aqui atuavam ocorriam com frequência, como
quando se negaram a interpretar as obras do Pe. José Maurício Nunes Garcia,
alegando ser o padre músico inferior por sua cor.
Neste ambiente conturbado por posições altamente egocêntricas e
preconceituosas, atuou o primeiro grande compositor brasileiro, o padre José
Maurício Nunes Garcia. Foi enviado para ser Mestre da Capela da Real Fazenda de

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Santa Cruz sendo afastado por Dom João VI em decorrência das intrigas do
compositor Marcos Portugal e dos castrati.
Nascido no Rio de Janeiro, o Mestre da Capela e multi-instrumentista Padre
José Maurício Nunes Garcia (1767- 1830) era filho de português com uma escrava,
e foi criado pela sua avó negra. Despertou para música muito novo e com apenas 16
anos de idade já havia composto “TotaPulchra” (Antífona) : uma pequena peça
religiosa, manifestando assim seu gosto e inclinação para a música. Além do solfejo
aprendido com o pardo de nome Salvador José, a sua educação nesta arte parece
ter sido inteiramente a de um autodidata.
Na história da música brasileira o Pe. José Maurício surge como o músico
mais importante do período colonial. Indivíduo de grande cultura, tendo em vista a
condição vigente na época, e sendo descendente de negros escravos. Foi um dos
fundadores da Irmandade de Santa Cecília no Rio de Janeiro, professor de muitos
alunos, Pregador Régio e Mestre da Capela Real da Sé de onde foi afastado
posteriormente para ser Mestre da Capela na Real Fazenda de Santa Cruz, onde
compôs para a Orquestra de Negros por ordem de Dom João VI.
Músico de singular importância para sua época, apesar de nunca ter saído do
Brasil, foi um grande precursor e fomentador do movimento musical em seu tempo.
Muito conhecido mesmo em vida, suas obras eram também noticiadas na Europa.
Após o regresso de D. João VI a Portugal, em 1821 o brilho da corte já não
era como antes e Pe. José Maurício não se sentiu mais estimulado, reduzindo a
quantidade de composições. A febre com que compunha provocou-lhe o
esgotamento cerebral relatado nos últimos tempos da sua vida.
Deixou uma extensa obra, de alta qualidade, em que se destacam a Missa
Pastoril, a Missa de Santa Cecília, o Ofício de 1816, e as intensamente expressivas
Matinas de Finados, para coro a Capella, além de alguma música instrumental e
obras teóricas.  
(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

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Referências

ALEMIDA, Renato. História da Música Brasileira. Rio de Janeiro: F.Briguiet, 1942.

TAUNAY, Visconde de. Uma Grande Glória Brasileira: José Mauricio Nunes Garcia
(1767-1830), São Paulo: Melhoramentos, 1930.

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Aula 17_ José Maurício Nunes Garcia (Obra Profana)

  Apesar de a maioria de sua obra ter sido religiosa, destinada à liturgia


católica, em especial nos anos em que foi responsável pela música da Sé do Rio de
Janeiro e da Capela Real, o compositor José Maurício Nunes Garcia é autor de
importantes obras profanas, tanto para canto quanto instrumentais.
 O pesquisador Bruno Kiefer realizou um apanhado sintético das obras
profanas compostas pelo padre carioca, sendo que uma parte delas são conhecidas
somente por notícias e relatos históricos, mas exemplos musicais preciosos destas
composições chegaram ao nosso tempo e foram devidamente localizados e
catalogados pela pesquisadora Cleófe Person de Mattos. Suas obras profanas
podem ser divididas em:
 
1. Música Sinfônica
2.  Música de Cena
3. Obras menores
4. Obras profanas perdidas
 
 1.  Música Sinfônica
 Sobre a música sinfônica, se conhece quatro aberturas orquestrais, sendo
que somente no caso da “Sinfonia Tempestade”, a documentação musical não está
completa. No caso de José Maurício, suas aberturas não necessariamente são
próprias de alguma ópera, provavelmente sendo obras orquestrais destinadas a
complementar espetáculos cênicos ou elogios dramáticos e no caso de sua primeira
sinfonia conhecida, a “Sinfonia Fúnebre”, possivelmente foi composta para algum
ato fúnebre ou comemorativo dele.
 A “Sinfonia Fúnebre foi composta aos 23 anos do compositor e, segundo
Kiefer, mostra, do ponto de vista formal, uma “mão insegura” do jovem compositor. A
sinfonia foi composta em um único movimento, Majestoso, não tendo aparente
associação com as conhecidas formas de aberturas francesa ou italiana.
 
Link para a partitura:

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http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm230_sinfonia_funebre.pdf
 
Youtube:
 https://www.youtube.com/watch?v=2jrMbUrC2GE
 
Composta em 1803, a abertura “Zemira”, em uma fase mais madura da vida
de José Maurício Nunes Garcia, possui estrutura formal de um Allegro de Sonata,
com dois temas distintos, desenvolvimento e reexposição. Sobre esta obra há a
curiosidade que o
compositor e maestro Leopoldo Miguez diz que em partes musicais por ele
conhecidas e que utilizou para preparar a partitura (infelizmente estas partes
encontram-se perdidas) havia o seguinte título: “Ouverture ou Introdução que
expressa relâmpagos e trovoadas”
 
Link para a partitura:
 http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm231_zemira.pdf
 
Youtube:
https://www.youtube.com/watch?v=DpqXhjozG1o
 
Da “Abertura em Ré”, só se conhecem as cópias realizadas por Manuel José Gomes
(pai de Carlos Gomes), hoje conservadas no Museu Carlos Gomes em Campinas. O
esquema da obra é dividido em dois movimentos Larghetto – Allegrovivo. Sendo que
a segunda parte está em forma sonata, possuindo dois temas distintos e um início
de desenvolvimento.
 
Link para a partitura:
http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm232_abertura_em_re.pdf
 
Youtube:
https://www.youtube.com/watch?v=G6ktBDBPB2Y
 

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  2.  Música de Cena

 Três obras para cena são conhecidas: Ulissea (1809), O triunfo da América
(1809) e um pequeno coro para um Entremês. As partituras autógrafas das duas
primeiras encontram-se no Arquivo do Palácio dos Duques de Bragança, em Vila
Viçosa (Portugal). A primeira traz o título no manuscrito de “Ulissea Drama
Eroicoposto em Muzica por Joze Mauricio Nunes Garcia em 1809 para o dia 24 de
junho A overturahe a da Trovoada Levantado logo o panno”. Possivelmente a
abertura que otítulo se refere é a “Zemira”, como indicado pela pesquisadora Cleofe
Person de Mattos, ou mesmo a “Sinfonia Tempestade”, perdida.
 O texto da Ulissea relata, antecipadamente, a vitória dos portugueses sobre
as tropas francesas de Napoleão:
 “Os dias de horros tornava a guerra
 Já Lísia não afetam
 
Podem os ricos baixéis entrar no Tejo
E os lusos lavradores
 
Os campos cultivar a seu desejo”
 
 O coro final canta:
 “Trazei lindas capelas
 De mil cheirosas flores
 E vinde vencedores
 Com elas coroar”
 
 Youtube (Coro Final):
 https://www.youtube.com/watch?v=vWXQ6zgEldk
 
 O “Triunfo da América” se enquadra no gênero de um elogio dramático,
sendo uma obra laudatória ao Príncipe Regente D. João VI, com texto de D. Gastão
Fausto da Câmara Coutinho. O material compreende um solo de soprano seguido
de um alegrettograziosoe um coro (allegrovivo).

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  Youtube (Coro):
 https://www.youtube.com/watch?v=-GHw2ZF3dHY
 
 No campo da música de cena, ainda se conhece do compositor carioca um
“Coro para o Entremês”, obra breve, composta para intercalar movimentos nos
intervalos de tragédias, dramas, farsas ou comédias. A peça em foi dedicada a
“Senhora Joaquina Lapinha”, cantora famosa nos palcos cariocas, cujo nome
completo era Joaquina Maria da Conceição.
 
  3.  Obras Menores

 São conhecidas do compositor José Maurício Nunes Garcia, uma peça para
piano, um quarteto de cordas (se refere a um arranjo de trechos da Missa em Si
bemol de 1801) e 3 modinha (sendo que duas são de autoria duvidosa). A peça para
piano foi considerada pela pesquisadora Cleófe Person de Mattos como sendo de
Nunes Garcia pelas características próprias do estilo de escrita do compositor,
sendo que a única partitura segue em posse da família do Visconde de Taunay, que
segundo relatos, executava esta obra “de ouvido”. A peça não chega a 50
compassos e segundo a pesquisadora é singela e delicada.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)

Link para a partitura:


http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm235_peca_para_piano.pdf
 
Áudio:
 http://www.josemauricio.com.br/mp3/cpm235_peca_para_piano.mp3
 
 Das modinhas, somente a de título: “Beijo a mão que me condena” é de
autoria certa de José Maurício Nunes Garcia, enquanto as modinhas “No momento

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da partida meu coração te entreguei” e “Marília, se me não amas” são de autoria


duvidosa. Segundo Kiefer, a primeira modinha citada pode ser considerada como
um prenúncio de nossa modinha romântica do século XIX. Segundo ele, alguns
aspectos típicos como as cadências femininas (com apojatura superior)
relativamente abundantes e os fragmentos melódicos curtos já estão presentes.
  
Link para a partitura (Beijo a mão que me condena):
 http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm226_modinha.pdf
 
Youtube (Beijo a mão que me condena):
https://www.youtube.com/watch?v=0XkSc_M5gcs
 
Link para a partitura (No momento da partida meu coração te entreguei):
http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm238_modinha.pdf
 
Youtube (No momento da partida meu coração te entreguei):
https://www.youtube.com/watch?v=0Mg6Y2TGOr8
 
Link para a partitura (Marília, se me não amas):
http://www.josemauricio.com.br/pdfs/cpm239_modinha.pdf
 
 O compositor carioca também é autor de um Método de Piano Forte de 1821,
dividido em duas partes com 12 lições cada e 6 fantasias ao final do método.
 
Youtube (lição 8, 1ª parte):
https://www.youtube.com/watch?v=TFEPNa6ueAs
 
Youtube (lição 2, 2ª parte)
 https://www.youtube.com/watch?v=TGKvA5gDI_I
 
Youtube (fantasias 2 e 6, cadência de autoria do intérprete Amaral Vieira)
 https://www.youtube.com/watch?v=8fFgV395Aqo

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Referência
 
KIEFER, Bruno. A música profana de José Maurício. In: MURICY, José C. de A, et
alii. Estudos Mauricianos. Rio de Janeiro: Funarte, 1983, p. 65-74.
 

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Aula 18_A música no Império


 

O apogeu da Corte portuguesa no Brasil não durou muito: D. João VI foi


obrigado a retornar a Lisboa em 1821 levando consigo a corte, esvaziando assim a
vida cultural no Rio de Janeiro. Apesar do entusiasmo de Dom Pedro I pela música,
sendo ele mesmo autor de algumas peças e da música do Hino da Independência, a
difícil situação financeira gerada pela independência não permitia muitos luxos.
A figura central nestes tempos difíceis foi Francisco Manuel da Silva, discípulo do
Padre José Maurício e seu sucessor como mestre na Capela. Sua obra refletiu a
transição do gosto musical do Classicismo para o Romantismo, quando o interesse
dos compositores nacionais recaiu principalmente sobre a ópera.
Nascido no Rio de Janeiro, Francisco Manuel da Silva foi compositor, maestro e
professor brasileiro. Além do padre José Maurício Nunes Garcia, foi aluno também
de SigismundNeukomm, com quem aprendeu violino, violoncelo, órgão, piano e
composição. Ainda um jovem escreveu um Te Deum para o então príncipe Dom
Pedro, que prometeu financiar seu aperfeiçoamento na Europa, mas não chegou a
cumprir a promessa. Em vez disso, nomeou-o para a Capela Real, onde foi bastante
ativo como diretor musical.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)

Em 1833 fundou a Sociedade Beneficente Musical, que teve um papel


importante na época e funcionou até 1890. Contando com a simpatia do novo
imperador Dom Pedro II, foi mestre-de-capela da corte em 1842. Talvez seu maior
mérito seja a fundação do Conservatório do Rio de Janeiro, a origem da atual Escola
de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Também foi regente
do Teatro Lírico Fluminense, depois transformado na Ópera Nacional.
Sua obra como compositor não é considerada de grande originalidade, embora
sejam interessantes a Missa Ferial e a Missa em mi bemol, mas foi o autor de uma

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única peça que se tornou célebre, a melodia do atual Hino Nacional Brasileiro,
considerado por muitos como um dos mais belos do mundo.
Ao contrário do seu grande prof. Pe. José Mauricio Nunes Garcia que faleceu pobre
e desemparado praticamente, Francisco Manuel da Silva veio a falecer com 70 anos
de idade, cercado da admiração e respeito. Seu corpo encontra-se sepultado no
Cemitério de São Francisco de Paula, no Catumbi, na cidade do Rio de Janeiro.
Aproximadamente no início do Segundo Reinado (1840-1860), o bel canto estava
em seu auge na Europa, e era apreciadíssimo no Brasil, especialmente no Rio de
Janeiro, mas também em Recife, São Paulo e Salvador. Há registro de inúmeras
representações. Em 1857 foi criada a Ópera Nacional, que logo passou a incorporar
ao repertório obras sérias brasileiras.
O efeito da ópera perduraria até meados do século XX e seria o motivo para a
construção de uma série de teatros importantes, como o Amazonas de Manaus, o
Municipal do Rio, o São Pedro em Porto Alegre, o da Paz em Belém e diversos
outros, todos de proporções majestosas e decorados com requintes de luxo. Neste
campo a maior figura foi sem dúvida Antonio Carlos Gomes, de quem falaremos
mais detalhadamente na próxima aula. Apesar da primazia da ópera, a música
instrumental também era praticada, sendo o piano o instrumento privilegiado.
Entre os meados do século XIX e o início do século XX tiveram um papel
importante através de sua produção com características progressistas alguns
compositores. Leopoldo Miguez, seguidor da escola wagneriana, será após o fim do
Império o autor da música do Hino à República, além de importante obra para piano.
Podemos destacar também Glauco Velásquez, de curta e brilhante aparição,
e Henrique Oswald, que empregava elementos do impressionismo musical francês.
(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de
Aprendizagem)

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Aula 19_A ópera no Brasil

 Falar de ópera no Brasil do século XVIII ao século XIX é falar do processo


de assimilação dessa tendência, apesar tardia, introduzida na década de 1730 com
a construção de teatros nos estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de
Janeiro e São Paulo. Esses teatros ficaram conhecidos como Teatros Coloniais e
designados como casas da ópera.
A primeira casa da ópera surgiu, pelo que se sabe, na cidade mineira de Sabará em
1730, destinanda a espetáculos de pequeno porte em que muitas vezes
apresentavam-se músicos que participavam das realizações de música religiosa. A
Casa de Ópera de Vila Rica, construída pelo Sr. João de Souza Lisboa em 1769 e
que teve sua inauguração no aniversário do Rei D. José I: 6 de junho de 1770, é a
mais antiga casa de ópera preservada no Brasil. Hoje, chamada de Teatro Municipal
de Ouro Preto.

Casa de Ópera de Vila Rica


(atual teatro Municipal de Ouro Preto)

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As representações dos espetáculos teatrais muitas vezes eram traduzidas


para o português até o século XIX. Com o passar dos anos, no século XVIII, as
Casas da ópera foram paulatinamente substituídas por construções mais modernas,
planejadas para abrigar um maior número de atores, cantores e instrumentistas além
de acomodar melhor os espectadores.

O Teatro do Padre Ventura, como ficou conhecido na cidade do Rio de Janeiro, em


1767, foi um dos primeiros a florescer e acabou homenageado pelo povo com o
nome de Ópera Velha na cidade carioca, sabe–se que esse teatro pegou fogo
durante a representação da peça "Os Encantos de Medea”, de Antônio José, o
Judeu.
Posteriormente surge o Teatro de Manuel Luís Ferreira conhecido como a Ópera
Nova, inaugurada por volta do de 1776. Apadrinhado pelo Vice-Rei Marquês de
Lavradio, Manuel Luís era natural de Lisboa e o teatro era sua vida: fagotista,
bailarino, ator, sempre teve sua vida ligada ao teatro. Quando a família Real veio se
instalar no Brasil, o Teatro da Ópera Nova funcionava com regularidade para
receber a corte portuguesa e tinha seu próprio elenco e músicos. O Teatro de
Manuel Luís recebeu o nome de Teatro Régio onde óperas do compositor Marcos
Portugal foram encenadas em 1812.
Em 12 de outubro de 1813 acontece o primeiro espetáculo do Teatro São João,
promovendo temporadas líricas. O hábito de ir a concertos foi se desenvolvendo ao
longo do século XIX, muitas vezes alternando-se com a ida à igreja.
Através da pesquisa da documentação existente, nos dias de hoje sabemos que a
Vila de São Paulo teve seu teatro também no século XVIII. No ano de 1789 a vida na
Casa da Ópera de São Paulo é paralisada com várias situações de insurreição
contra o então governador de São Paulo realizando várias mudanças, inclusive
destituindo o diretor musical da Casa da Ópera de São Paulo que também era
Mestreda Capela da Sé.
A histórica noite do dia 7 de setembro de 1822 inaugurava–se a Casa da
Ópera, em São Paulo para celebrar os acontecimentos ocorridos no Ipiranga, a
proclamação da independência do Brasil.

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No Teatro Santa Isabel, no Recife, se cultivava ópera com muito entusiasmo,


o mesmo ocorrendo na província da Bahia, onde o governo chegou a contratar, em
1839, músicos italianos como mestre de coros e também compositores.
Durante muito tempo o Brasil acompanhou de perto a vida europeia, assimilando o
gosto pela ópera.
Em 1824 houve a tentativa muito interessante de se implantar uma Ópera
Nacional, somente com produção brasileira e de autores brasileiros, iniciada com
“ANoite de São João”, de Elias Álvares Lôbo, sobre um libreto de José de Alencar.
Cabe relembrar a importância para a ópera da produção de Carlos Gomes, ilustrada
pelo fato de durante o século XIX, das vinte óperas brasileiras que foram
apresentadas, nove de sua autoria.

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Aula 20_ A música de Carlos Gomes - temática brasileira, estilo


italiano
 

O compositor Antonio Carlos Gomes nasceu em Campinas, São Paulo, em


11 de julho de 1836. Estudou música com o pai e fez sucesso em São Paulo com o
Hino Acadêmico e com a modinha Quem sabe? (1860).

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

Continuou os estudos no Conservatório do Rio de Janeiro, onde ocorreram as


apresentações de suas primeiras óperas: A noite do castelo (1861), com libreto de
Fernandes dos Reis, e Joana de Flandres (1863), com libreto de Salvador de
Mendonça.
Parte para Milão após receber uma bolsa de estudos, sendo aluno de Lauro Rossi e
diploando-se em 1866. Em 1870 estreou no Teatro Scala de Milão sua ópera mais
conhecida, Il guarany (O guarani), com libreto de Antônio Scalvini e baseada no
romance homônimo de José de Alencar. Encenada depois nas principais capitais
europeias, essa ópera o consagrou e deu-lhe a reputação de um dos maiores
compositores líricos da época. O sucesso europeu de Il guarany repetiu-se no Brasil,
onde Carlos Gomes permaneceu por alguns meses antes de retornar a Milão, com
uma bolsa de D. Pedro II, para iniciar a composição da Fosca, melodrama em quatro
atos em que fez uso do leitmotiv, técnica então inovadora, e que estreou em 1873 no
Scala. Mal recebida pelo público e pela crítica, essa viria a ser considerada mais
tarde como a mais importante de suas obras.
Depois de Salvatore Rosa (1874) e Maria Tudor (1879), Carlos Gomes
voltou ao Brasil e foi recebido triunfalmente, e a partir de 1882, passou a dividir seu
tempo entre o Brasil e a Europa.
Estreou Loschiavo (O escravo) em 1889 no Teatro Lírico do Rio de Janeiro,
ópera de tema brasileiro. Com a proclamação da república, perdeu o apoio oficial e a

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esperança de ser nomeado diretor da Escola de Música do Rio de Janeiro. Retornou


então a Milão e estreou “Condor” em 1891, no Scala.
Doente e em dificuldades financeiras, compôs seu último trabalho, Colombo,
oratório em quatro atos para coro e orquestra a que chamou poema vocal sinfônico
e dedicou ao quarto centenário do descobrimento da América. A obra foi encenada
em 1892 no Teatro Lírico do Rio de Janeiro.
Em 1895 chegou ao Pará, já doente, para ocupar a diretoria do
Conservatório de Música de Belém, onde morreu em 16 de setembro de 1896.
Com temática brasileira, a música de Carlos Gomes se enquadra no estilo italiano
da mesma época, inspirado basicamente nas óperas de Giuseppe Verdi, e assim
ultrapassou as fronteiras do Brasil e triunfou junto ao público europeu. Os
modernistas de 1922 desprezaram Carlos Gomes, mas o público brasileiro sempre
valorizou suas modinhas românticas, a parte mais autenticamente nacional de sua
obra, e a abertura ("protofonia") de Il guarany.

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Aula 21_Música em São Paulo

 
A prática musical em São Paulo se desenvolveu lentamente, junto com o
progresso econômico da região. Até meados do século XVII são poucas as notícias
da prática musical religiosa, resumindo praticamente a missas em cantochão e
festas religiosas urbanas. A partir da metade do século XVII iniciou-se a
reorganização da música na igreja matriz da Vila de São Paulo, cujo primeiro Mestre
de Capela, Manuel Pais de Linhares, já atuava em 1649.
A prática do canto de órgão (polifônico) pode ser vista a partir de um
inventário de Pascoal Delgado, de 1650, onde três livros de polifonia são descritos
(infelizmente perdidos). Segundo o pesquisador Paulo Castagna, a partir de então
notícias sobre esta prática de música polifônica com acompanhamento de um ou
mais instrumentos tornam-se frequentes.
O estilo musical da primeira metade do século XVIII pode, em parte, ser
conhecido a partir de um conjunto de manuscritos conhecidos como “Grupo de Mogi
das Cruzes”, constituído por um conjunto de obras em estilo antigo, sendo que uma
delas, “Matais de Incêndios”, é escrita em português. As peças foram copiadas por
Faustino do Prado Xavier, Mestre de Capela da matriz de Mogi das Cruzes, Ângelo
Xavier do Prado, irmão do anterior, Timóteo Leme e outros copistas não
identificados.

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de


Aprendizagem)
Matais de Incêndios
 
Segundo CASTAGNA, após a criação do bispado de São Paulo (1746), o
bispado passa a realizar uma organização mais rigorosa da música da Sé da capital
paulista, com a intenção de elevar a qualidade, acompanhando as demais regiões
brasileiras, como Minas Gerais e o Nordeste. A estrutura dos cargos responsáveis
pela música na catedral foi alterada, no entanto, como a qualidade da produção

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musical da Sé não teve a melhora esperada, o terceiro bispo da Sé, Dom Manuel da
Ressurreição, chegado em 1774, traz consigo seu próprio Mestre de Capela, o
experiente músico português André da Silva Gomes, do qual trataremos em aula
separada.
Outros músicos que tiveram destaque em cidades paulistas no século XVIII
e início do XIX foram Francisco de Paula Ferreira, nascido em Congonhas (MG),
mas transferiu-se para Guaratinguetá (SP) em 1777, onde atuou como Mestre de
Capela e professor de Gramática Latina e o Frei Jesuíno do Monte Carmelo (1764 –
1819), nascido em Santos, mudou-se para Itu, onde permaneceu até sua morte, do
qual também trataremos em aula separada.
  

  
Referência
CASTAGNA, Paulo A. Música na América Portuguesa. In: História e Música no
Brasil (Orgs. José Geraldo Vinci de Moraes e Elias Thomé Saliba). São Paulo:
Alameda, 2010. p. 35-76
 

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Aula 22_André da Silva Gomes 1

Antiga Catedral da Sé de São Paulo, demolida em 1911 para a construção da nova Catedral.

André da Silva Gomes foi o quarto Mestre de Capela da Sé de São Paulo,


nasceu em Lisboa no ano de 1752, batizado no dia 15 de dezembro. Pouco se sabe
de sua formação musical, mas a partir de uma breve informação existente na “Arte
Explicada de Contraponto” escrita por André da Silva Gomes, sabemos que foi aluno
de José Joaquim dos Santos, importante compositor e professor português na
segunda metade do século XVIII. O mesmo José Joaquim dos Santos foi mestre no
Seminário da Patriarcal, o que leva a crer que tenha sido local de formação de André
da Silva Gomes, em Lisboa. Como vimos na aula 11, o Seminário da Patriarcal era a
instituição de ensino musical mais importante de Portugal no século XVIII, sendo
fundamental na difusão e influência da música galante (pré-clássica) de origem
napolitana em Portugal.
André da Silva Gomes veio a São Paulo no início de 1774, junto com o
terceiro bispo da Sé, Dom Frei Manuel da Ressurreição. Com apenas 21 anos de
idade, o jovem compositor foi incumbido de reformar a prática musical da nova Sé
da cidade de São Paulo. Até o ano de 1745, no qual a igreja Matriz foi elevada a Sé,
São Paulo era administrativamente dependente. Sendo que após esta data, com a

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presença dos governadores, houve um incentivo ao aprimoramento da cultura


musical local, tanto profana quanto religiosa.
Segundo o pesquisador Régis Duprat, o primeiro governador de São Paulo,
Dom Luís de Sousa Botelho Mourão (o Morgado de Mateus), foi grande incentivador
da Casa de Ópera da cidade, que apesar de não manter uma periodicidade rígida de
suas apresentações, era utilizada, com apoio pessoal do governador, para os dias
festivos especiais. Segundo o mesmo pesquisador, a prática musical religiosa,
litúrgica ou não, se desenvolvia em um contexto musical pobre, contando com
poucos músicos profissionais que impulsionassem a qualidade artística musical.
Duprat aponta que a Vila de São Paulo de Piratininga estabilizou na segunda
metade do século XVIII em torno de apenas 2000 habitantes, sendo que em
princípio do século XIX a cidade contava, em censo, com apenas catorze músicos e
um em Cotia, dados que ajudam a falta de músicos na Sé.
Apesar de contar com somente um organista e três moços de coro no
momento de sua chegada em São Paulo e provavelmente com o próprio Mestre de
Capela cantando a quarta voz que faltaria ou a mesma sendo preenchida pelo
organista, a produção inicial de André da Silva Gomes foi intensa, provando que
“seus esforços organizativos iniciais foram coroados de pleno êxito” (DUPRAT,
1995: p. 63). Sua produção musical tinha um caráter funcional, para consumo
imediato, suprindo as necessidades litúrgicas da Igreja da Sé. Com seu ordenado de
$40.000 réis anuais, pagos pela Fazenda Real, André da Silva Gomes tinha a
obrigação de escrever a música e financiar a sua execução (contratando músicos se
necessário) com coro e eventualmente orquestra. Como maneira de suprir as
necessidades orçamentárias dos Mestres de Capela, era praticado em São Paulo o
“Estanco”. O “Estanco” era um mecanismo onde as autoridades religiosas locais
garantiam o monopólio musical da Vila ao Mestre de Capela, aumentando
consideravelmente seu ordenado, uma vez que o mesmo acabaria assumindo
funções musicais fora da Sé. Desta maneira, as atividade musicais complementares
de André da Silva Gomes, fora da Sé, não seriam mal vistas pelo Bispado, podendo
ser até mesmo incentivadas.
Como outros casos de Mestres de Capela, como o exemplo de Luís Álvares
Pinto em Pernambuco, André da Silva Gomes não se contenta com as funções de

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Mestre de Capela e consegue, em 1797, a cadeira de professor de gramática latina


da Vila de São Paulo, com um ordenado anual de $400.000 réis, dez vezes mais
que seu ordenado como Mestre de Capela. Em 1789 recebe a patente de Capitão,
sendo seguida em 1797 pela de Tenente-Coronel. Em 1801 André da Silva Gomes
se desliga de todas as suas funções musicais externas à Sé, sendo que em 1806 o
Mestre de Capela da Sé de São Paulo já era Joaquim da Silva, o que significa que
André da Silva Gomes manteve seu cargo por pouco mais de trinta anos. Pouco
após a independência o compositor português estava em Cotia, vila vizinha de São
Paulo, onde compôs suas duas últimas obras conhecidas: Jaculatórias de 1822 e
uma Missa de Natal de 1823, ambas escritas para a Igreja Matriz da vila. Faleceu
em 17 de junho de 1844, com 91 anos, sendo sepultado com enterro solene na
antiga Catedral da Sé, onde permaneceu até a demolição da igreja em 1911.
Além das obras compostas no Brasil, André da Silva Gomes trouxe consigo
cópias de peças de autores portugueses e italianos de Portugal, como parte de seu
acervo, como os portugueses José Joaquim dos Santos, João Cordeiro da Silva,
José Gomes Veloso e José Alves e os italianos Giovanni Biordi (Giorgi?) e Giuseppe
Porcari, todas preservadas no Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo. De
autoria de André da Silva Gomes são conhecidas mais de 130 obras, todas vocais e
religiosas, entre elas 16 Missas, 2 Paixões e 13 Ofertórios. Como nos
aprofundaremos na próxima aula sobre o autor, o estilo musical de sua obra é
vinculado ao pré-classicismo, mas mantém características tardias de um estilo
barroco.

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Frontispício autógrafo por André da Silva Gomes


https://www.youtube.com/watch?v=Op3-KQrVyjc
André da Silva Gomes - Hodienobis de caelo
https://www.youtube.com/watch?v=Tc4mCVybW6Q
André da Silva Gomes - Quem vidistis, pastores

Referência

DUPRAT, Régis. Música na Sé de São Paulo. São Paulo: Paulus, 1995.

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Aula 23_André da Silva Gomes 2

Antiga Catedral da Sé de São Paulo, demolida em 1911 para a construção da nova Catedral.

A obra conhecida de André da Silva Gomes se limita ao repertório religioso,


sua formação musical em Lisboa, no Seminário da Patriarcal, na segunda metade do
século XVIII, possibilitou ao jovem compositor assimilar o estilo musical dominante
na capital portuguesa no mesmo período. Sua obra religiosa dialoga diretamente
com a de compositores portugueses e italianos ligados direta ou indiretamente à
vida cultural portuguesa como José Joaquim dos Santos, David Perez, Giovanni
Giorgi, NicolloJommelli e G. B. Pergolesi. Apesar das limitações musicais existentes
na Sé de São Paulo no tempo da chegada do compositor português à colônia, como
vimos na aula anterior, é possível perceber em sua obra uma grande complexidade,
mantendo uma textura principalmente polifônica em sua obra, incluindo um grande
domínio de procedimentos fugais.
O estilo musical ligado ao compositor, de transição, é o pré-classicismo,
como dos compositores mencionados acima. Por esta razão algumas características
barrocas podem ser percebidas em sua obra, como o uso do baixo contínuo cifrado,
a textura polifônica (com uso de fugas em momentos determinados das missas,
como Christeeleisone o Cum SanctoSpirituda Missa a 5 vozes). Por outro lado, o
uso do Baixo deAlberti e a estrutura tonal Tônica – Dominante – Tônica, são
características posteriores do classicismo. Abaixo veremos uma breve análise da

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exposição das fugas presentes na Missa a 5 vozes. Esta missa, apesar do título, foi
escrita a 4 vozes, tendo somente no Gloria um divise de sopranos, gerando a quinta
voz. As duas fugas escritas estão a quatro vozes.
As duas fugas da Missa a 5 vozes são duplas, com dois sujeitos, ou temas.
Na tradição musical italiana e portuguesa do século XVIII, os dois temas de uma
fuga dupla são expostos simultaneamente, com uma pequena defasagem de tempo
na entrada de cada um deles, formando uma textura de dueto polifônico. O segundo
tema costuma ter uma melodia contrastante em relação ao primeiro e costuma ser
introduzido pouco após, podendo a diferença ser de um ou dois compassos, ou
mesmo uma fração de tempo. No caso de fugas com os textos “Christeeleison” e
“Cum SanctoSpiritu”, era comum fragmentar o texto entre os dois temas, como
veremos abaixo.
Na Missa a 5 vozes, o “Christeeleison” inicia com o texto “Christe” no
primeiro tema, enquanto o segundo tema inicia com “eleison”, um compasso após o
primeiro, fragmentando o texto na exposição. Apesar de ambos os temas possuírem
no inicio notas de valores similares o primeiro tema se destaca pelos saltos iniciais,
primeiro quinta descendente seguido de oitava ascendente.
Os temas, divididos em duas partes, onde a primeira até o oitavo compasso,
se mantém na região da tônica, mi menor, a segunda parte caminha em direção à
subdominante, lá menor, sendo assim uma fuga com imitação na quarta e não
quinta. Característica principal de ambas as partes é a suspensão por ligadura da
sétima no primeiro tema resolvendo na sexta, com exceção do décimo compasso
onde a resolução da sétima é realizada na terça, recurso previsto por Gomes em
seu tratado de contraponto, onde, em uma suspensão de sétima, ela pode ser
resolvida em uma terça quando a voz superior desce meio tom ou tom inteiro e a voz
inferior salta uma quarta ascendente.

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Ex. 1: André da Silva Gomes. Missa a 5 vozes (Christeeleison), exposição.


Como a resposta é regular, respeitando os intervalos apresentados na
exposição, ela cadencia na segunda parte para a região do sétimo grau ré menor,
fazendo necessário quatro compassos de adequação tonal (conciliatio), antes do
retorno à segunda exposição na tônica.

Ex. 2: André da Silva Gomes. Missa a 5 vozes (Christeeleison), resposta.


 
Apesar da missa ser a cinco vozes ambas as fugas apresentadas
“Christeeleison” e “Cum SanctoSpiritu” são somente a quatro vozes, com as
sopranos um e dois em uníssono. Em ambas as fugas a exposição também segue o
mesmo padrão descrito por Gomes no seu tratado de contraponto (veremos
adiante), onde as entradas são sempre das vozes mais agudas em progressão às
mais graves até a apresentação de todas as vozes. No Christeeleison as entradas
seguem a seguinte ordem: SA, AT, TB, BS, BA, TB, SB. No Cum SanctoSpiritu a
ordem é a seguinte SA, AT, TB, BS, BS, AB.
Os temas, com uma distância primitiva de um compasso, também
apresentam o texto fragmentado, o primeiro “Cum SanctoSpiritu” e o segundo “In
gloria Dei Patris”. Como no exemplo anterior Gomes utiliza saltos, agora de sextas
ascendentes e sétimas descendentes para diferenciar os temas e também utiliza a
suspensão, agora de segunda como uma das principais características da
exposição. Os temas divididos em duas partes, onde a primeira até o compasso 6 se
mantém na região da tônica, dó maior, e a segunda em progressão à dominante,
onde o segundo tema termina um compasso antes do primeiro tema na dominante

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da dominante, ré maior, e o primeiro tema encerra após o início da resposta. Apesar


de comum encontrar exemplos onde os temas terminam em momentos distintos, é
previsto nos tratados estudados o contrário.
A primeira metade, “Cum SanctoSpiritu in gloria Dei Patris”, em ambos os
temas apresenta motivos que são repetidos progressivamente de forma
descendente. Enquanto a segunda metade, “Dei Patrisamen”, apresenta uma
similaridade entre os dois temas com ambos utilizando o mesmo motivo em terças
paralelas. Com resposta regular essa fuga não apresenta necessidade de utilizar
uma conciliatio entre a resposta e a segunda exposição.

Ex. 3: André da Silva Gomes. Missa a 5 vozes (Cum SanctoSpiritu), exposição.


 
 Ambas as fugas possuem acompanhamento instrumental, onde as cordas
dobram as vozes. Como era comum na orquestração da música napolitana no
século XVIII, em parte das fugas as violas dobram a voz dos baixos, junto cm os
violoncelos, enquanto os violinos 1 e 2 dobram as vozes de soprano e contralto.
Com esta instrumentação característica do período, é normal perceber a voz de
tenor sem ter uma dobra instrumental específica.
  O áudio do “Christeeleison” e “Cum SanctoSpiritu” da missa a 5 vozes
estão disponíveis no sistema.
Além da obra musical, André da Silva Gomes também escreveu um tratado
de Contraponto entitulado: Arte Explicada de Contraponto. O tratado original era
previsto para ser dividido em trê tomos, mas somente o primeiro deles, sobre o
contraponto simples e figurado, chegou ao nosso conhecimento. O segundo tomo
seguinte, contendo os preceitos concernentes à pura composição e o terceiro, com
os exemplos musicais dos dois tomos anteriores, foram perdidos. O manuscrito que

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conhecemos do primeiro tomo, com 150 páginas, foi copiado em 1830 por Jerônimo
Pinto Rodrigues (1790 - ?) e pertenceu a Elias Álvares Lobo (1834-1901), que foi
aluno do anterior. O tratado é dividido em 19 lições, sendo que as treze primeiras
introduzem o estudo das espécies do contraponto, incluindo as espécies
dissonantes e ligaduras; s lição 14 trata de cláusulas e cadências; as lições 15 a 17
sobre fugas; lição 18 sobre modulações e a lição 19 sobre cânone. O tratado de
contraponto, junto com os escritos de Caetano de Melo de Jesus e Luís Álvares
Pinto, é fundamental para a compreensão da teoria e prática musical no Brasil
Colônia n século XVIII.

Referência
 
ROHL, Alexandre C de O. A FUGA DUPLA LUSO-BRASILEIRA DURANTE
OSSÉCULOS XVIII E XIX. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Instituto de Artes
daUnesp, 2010.

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Aula 24_Jesuíno do Monte Carmelo: Músico, Pintor e Arquiteto

  
Até os dias de hoje, a principal biografia sobre Jesuíno do Monte Carmelo foi
escrita por Mário de Andrade, publicada em 1945 pelo SPHAN (Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Jesuíno Francisco de Paula Gusmão (nome original) nasceu em Santos, no
dia 25 de março de 1764, mulato, foi um importante artista de São Paulo. Devoto de
Nossa Senhora do Carmo, iniciou sua formação musical entre os religiosos
carmelitas do convento de Santos, dos quais também recebeu sua primeira
encomenda como pintor, aos 14 anos de idade, aproximadamente. Em 1781 é
convidado a acompanhar o novo presidente do Hospício do Carmo de Itu, mudando-
se para a cidade na qual passaria a maior parte de seus anos. Ao final do século
XVIII, a cidade de Itu passava por um período de crescimento econômico e
consequentemente, artístico. Neste momento, boa parte da cidade estava em
reforma, como a recém inaugurada Igreja Matriz (1780), que ainda precisava ser
decorada.
Em Itu, Jesuíno passa a trabalhar com o artista José Patrício da Silva
Manso. Apesar de Mário de Andrade indicar que a relação de Manso e Jesuíno
tenha sido de Mestre e Aprendiz, respectivamente, novas pesquisas indicam que é
possível que Manso o tenha contrato como auxiliar na decoração da Matriz de Itu.
Esta hipótese se baseia no fato que José Patrício da Silva Manso foi contratado para
trabalhar a partir de 1787, momento em que Jesuíno já se encontrava a alguns anos
na cidade de Itu, inclusive com família constituída. O contrato de Manso com a
Matriz de Itu também indicava que seria de responsabilidade do pintor qualquer
incidente que pudesse acarretar o atraso da obra, o que reforça a ideia que Manso
tenha contratado Jesuíno como auxiliar, considerando a dimensão das tarefas.
Depois de 1790, provavelmente durante a encomenda de pintar a Igreja do
Carmo de Itu, que Jesuíno faz o pedido de entrar como irmão na Ordem Terceira do
Carmo, Pedido que foi negado devido a sua cor e origem bastarda (foi batizado com
pai desconhecido). Segundo Mário de Andrade, um dos anjos mulatos pintados na

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Igreja do Carmo pode ter sido uma “vingança” de Jesuíno. Entre 1794 e 1795,
provavelmente, é convidado para decorar as Igrejas Carmelitanas de São Paulo,
capital, onde realiza as seguintes obras: 1) teto da igreja do convento do Carmo; 2)
quadros em caixotões para o forro da capela de Santa Teresa, para as freiras
carmelitas; 3) teto da nave e da capela-mor da Ordem Terceira.
Tendo uma vida conventual entre os carmelitas de São Paulo, Jesuíno
recebe as ordens menores em 13 de setembro de 1797 e em 23 de dezembro do
mesmo ano recebe a ordem de presbítero, quando abandona o nome de batismo e
passa a ser nomeado como Jesuíno do Monte Carmelo. Embora ordenado, em seu
registro como padre consta o termo “exdefectunatalium”, devido a sua origem. Seu
último trabalho em São Paulo, antes de retornar para Itu, foi o teto do coro da Igreja
da Ordem Terceira.
No início do século XIX, junto com o padre Diogo Antônio Feijó (1784-1843),
Jesuíno do Monte Carmelo funda a Congregação dos Padres do Patrocínio, sendo
responsável também pelo projeto e construção da Igreja de Nossa Senhora do
Patrocínio de Itu. A Igreja é inaugurada no dia 8 de novembro de 1820, um ano e
pouco depois do falecimento do padre Jesuíno do Monte Carmelo (falecimento: 1º
de julho de 1819). Em 1820, o botânico francês, Auguste de Saint Hilaire, diz que a
Igreja do Patrocínio é a mais bonita, cuidada e de bom gosto de Itu.

Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio de Itu - Fachada


  

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Como pintor, Jesuíno do Monte Carmelo é considerado como um autodidata,


desprovido de maiores recursos técnicos e de estilo ingênuo, mas segundo a
pesquisadora Elza Ajzemberg, foram “justamente suas soluções plásticas toscas,
que nem sempre acompanhavam as leis da perspectiva, que acabaram criando um
estilo próprio, autêntico, encantador e caracterizador da pintura paulista do século
XVIII”.
 
Mário de Andrade divide a obra de Jesuíno em quatro fases:
1) Juventude e aprendizado com José Patrício da Silva Manso e obras na
Igreja Matriz de Itu. Período das oscilações de caráter, pecados contra os frades
carmelitas de Santos – caso do roubo das partituras e da construção do órgão;
2) Período da primeira plenitude – virilidade, “masculinidade profana”, alegria
da vida em família – felicidade pessoal, obras na Igreja do Carmo de Itu. É o período
da busca da beleza física em sua pintura;
3) Obras em São Paulo – viuvez, rotina carmelita, paz interior. Período do
refinamento estético de sua arte. Ocorre o desinteresse pela expressão psicológica
de suas imagens e um gradativo apreço aos elementos decorativos;
4) Retorno à Itu, período do “padre dramático”. Jesuíno é atormentado pelo
pecado do orgulho, pois se deseja irretocável em seu sacerdócio e, ao mesmo
tempo, não esquece a origem humilde e inculta; pretende ser o melhor padre, por
organizar a congregação do Patrocínio. A coleção de obras do Patrocínio reflete a
aspiração mística e a frustração do artista. As obras são dramáticas e
“confessionais”, como os sentimentos do artista.

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Banquete de Simão (óleo sobre tela) – Frei Jesuíno do Monte Carmelo


  
Como Músico, somente uma pequena quantidade de obras foram
recuperadas, Segundo o pesquisador Paulo Castagna, peças simples se
comparadas aos seus contemporâneos. Chama a atenção, no caso deste autor,
uma declaração manuscrita de 1815, onde confessa ter roubado de seu Mestre em
Santos “algumas poucas músicas que naquele tempo ele estimava, e que hoje nada
valeriam” e “ainda depois de me passar para esta Vila em que moro ainda mandei,
por um condiscípulo, copiar outras”. Segundo CASTAGNA, esta prática, hoje
associada à pirataria, foi comum na América Portuguesa, devido a alta competição
entre os profissionais da música do período. E foi graças a este mecanismo que
parte do repertório sobreviveu até os dias de hoje em cópias produzidas a partir dos
originais que foram perdidos.
Apesar da simplicidade de sua música, até os dias de hoje, ela é cantada na
cidade de Itu, na Procissão dos Passos, no período da quaresma, como o “Canto de
Verônica”, no vídeo abaixo:
(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de
Aprendizagem)
Frei Jesuíno do Monte Carmelo – PangeLingua
   
 

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Referência

 CASTAGNA, Paulo A. Música na América Portuguesa. In: História e Música no


Brasil (Orgs. José Geraldo Vinci de Moraes e Elias Thomé Saliba). São Paulo:
Alameda, 2010. p. 35-76

MURAYAMA, Eduardo Tsutomu. A pintura de Jesuíno do Monte Carmelo na Igreja


da Ordem Terceira do Carmo de São Paulo. Dissertação de Mestrado. São Paulo:
Instituto de Artes da UNESP, 2010. Orientador: Dr. Percival Tirapeli.

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Aula 25_Música Religiosa no Brasil: Agentes musicais nas igrejas


coloniais

Uma grande parte das aulas desta disciplina são relacionadas à música
religiosa no Brasil Colonial, isto ocorre não somente pela importância dela, mas
também pelo fato de os principais arquivos de música do século XVIII serem
religiosos. Apesar de existirem relatos documentais sobre a música não religiosa
setecentista e anterior, infelizmente poucos exemplos de música profana são
conhecidos no repertório brasileiro deste período. Por esta razão é importante
conhecer e compreender a função dos atores presentes na música religiosa. Para
isto vamos utilizar como exemplo os “Estatutos do Cabido Metropolitano do Rio de
Janeiro”1, de 1736, estatutos que descrevem a estrutura e organização da Sé
Carioca.

Estatutos do Cabido Metropolitano do Rio de Janeiro, 1736 (Capa e fol.7v)


 
A música da Igreja Católica era organizada e realizada por diferentes tipos
de pessoas, religiosos ou leigos, dependendo de suas funções, como: Chantre,

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Mestre Escola, Capelães, Moços de Coro, Mestre de Capela e Organista. Abaixo


vamos fazer uma breve descrição de cada um deles:
 
Chantre ou Cantor: sendo uma das maiores hierarquias da igreja (abaixo
somente do bispo e do Deão, na Sé do Rio de Janeiro), entre outras funções,
organiza a estrutura musical da igreja, sendo necessariamente um membro do clero.
Segundo os “Estatutos” referidos:
  
“Pertence ao Chantre guiar e reger o Coro pelo que respeita as
rubricas assim do Breviário, como do Missal[2], para que exatamente
se observem, assim no ofício como na missa solene [...]. Será
vigilante acerca da ordem de Salmodiar, advertindo que se cante em
voz alta, clara e distinta, e que se faça a devida e boa pausa no meio
dos versos [...] Obrigará ao dito Sobchantre e Capelães a irem a
estante de Cantochão e apontará os que não o fizerem, não
passando a multa de mais de quarenta réis para cada vez [...] e terá
também cuidado que os Moços de Coro sejam pontuai na assistência
da Sé [...] e porque se tem experimentado a falta de Capelães que
saibam Cantochão, terá o Chantre cuidado de assinar a hora na qual
todos os dias se juntem os Capelães com o Sobchantre na Sacristia
e aí se façam exercícios de Cantochão [...] (1736: fol.10r-10v).

2. Capelães: Membros do clero, cantam somente em cantochão. No caso da


Sé do Rio de Janeiro pode se ver que suas funções são bem determinadas,
descrevendo que partes da liturgia eles participavam:

  

“São obrigados os Capelães a assistir no Coro [...] dois deles,


começando pelos mais antigos regerão o coro em cada semana,
dizendo a estante o Invitatório, Martirológio, Lição breve da Prima
com o Jubedomne e também a de Completas, com o mais que
pertence aos da estante. Encomendarão as Antífonas, Matinas e
Laudes e mais horas aos que tocar, e levantarão os Salmos e dirão
os versos do Noturno, faltando Moços de Coro que os digam.
Os mesmos, e nas mesmas semanas, cantarão a Epístola e
Evangelho nas Missas Conventuais, porém nas Missas de Benesses
o farão outros por turno distinto.” (1736: fol.38r-38v)
  
3. Moços de Coro: jovens, até a puberdade, cantam em cantochão e quando
necessário também em canto de órgão (polifonia). Na Sé do Rio de Janeiro
possuíam funções diversas como assistentes nas cerimônias religiosas, e em

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relação à música propriamente: “Enquanto estiverem no Coro, dois deles estarão


junto à estante para virarem as páginas dos livros e dizerem os versos dos Noturnos
e Responsórios das horas menores.” (1736: fol.40r). Os Estatutos também
determinam que os Moços de Coro, quando não estiverem a serviço da Igreja,
devem se aplicar aos estudos, sob os cuidados do Mestre Escola, correndo o risco
de serem castigados quando não o fizerem (1736: fol.40v).
 
 4. Mestre Escola: Nos Estatutos da Sé do Rio de Janeiro, o Mestre Escola
aparece como quarta dignidade, abaixo do Tesoureiro Mor (terceira dignidade) e do
Chantre (segunda dignidade). Sua principal função era ensinar os meninos a ler,
escrever e cantar, além de “prever e emendar” os livros que servem na Igreja,
fazendo com que os Moços do Coro estudem gramática e cantochão (1736: fol.12v-
13r). Na falta do Mestre Escola, o ensino do canto poderia ser feito pelo Mestre de
Capela.
 
 5. Mestre de Capela: suas funções incluíam:
 
A)    Compor e dirigir a música para os ofícios religiosos;
B)    Contratar, quando necessário, músicos cantores e instrumentistas com
o objetivo de prezar pela qualidade dos ofícios religiosos.
C)    Ensinar música, onde os discípulos poderiam participar dos ofícios, sob
a supervisão do Mestre de Capela.
 
Nos Estatutos da Sé Carioca a descrição das funções do Mestre de Capela
são bastante simples, se limitando a indicar as ocasiões em que o mesmo tinha a
obrigação de participar das funções religiosas, inclusive indicando a possibilidade de
punições na falta de suas obrigações:
 
“Será obrigado o Mestre de Capela a cantar todas as Vésperas de
dias Clássicos de preceito e todas as Missas Solenes de Domingos e
dias Santos de preceito e nas mais solenidades que determinar o
Prelado ou Cabido. As Completas dos Sábados da Quaresma, e por
cada vez que não cantar Vésperas e Completas, será multado em
duzentos réis e faltando à Missa, será multado em quatrocentos réis
e se aplicarão estas multas para a Fábrica.

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Também é obrigado a assistir e cantar na noite de Natal e Semana


Santa, e não sendo a música destes dias suficientes, o Cabido o
multará segundo a qualidade da sua omissão.” (1736: fol.40v-41r)
 
6. Organista: Como o Mestre de Capela, nos Estatutos da Sé do Rio de
Janeiro, a descrição de suas funções se limitam aos momentos e cerimônias
específicas em que o mesmo deveria tocar. Um ponto a se destacar é que o órgão
não somente acompanhava a música vocal, sendo tocado também “quando o
prelado entra na Sé, ou sai dela, e todo o tempo antes de começar a Missa
Pontifical, ou outra alguma função sagrada” (1736: fol.41v).

  
  Referência

1
Estatutos do Cabido Metropolitano do Rio de Janeiro. 1736. Disponível em:
<http://www.acmerj.com.br/CMRJ_CRI_SD_Cx100_UD01.htm>
2
Breviário Romano e Missal Romano, são dois dos principais livros litúrgicos
da Igreja Católica, que também inclui: LiberUsualis, Kirial, Gradual, Antifonário.

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Aula 26: Modinha no Século XIX

Que fiz Eu à Natureza – José Maurício (Mestre de Capela da Sé de Coimbra)


Link Youtube:

(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

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No início do semestre já tivemos a oportunidade de estudar as origens e


características da Modinha e do Lundum que surgiram no Brasil e Portugal no século
XVIII. Segundo o pesquisador Gerhard Doderer, a evolução da modinha luso-
brasileira pode ser dividida em três fases no que diz respeito a suas características
musicais e sua importância e inserção social. A Modinha que estudamos até o
momento, existiu até finais do século XVIII, como uma canção de língua nacional,
influenciada pela música italiana setecentista, e que ganhou importância nos salões
da aristocracia luso-brasileira.
Segundo DODERER, nos finais do século XVIII surge um novo tipo de Modinha,
com influência da cultura musical da alta burguesia. Neste momento a Modinha se
transforma em uma canção de salão, com uma voz e ganha acompanhamento
também de forte-piano. A melodia do canto perde a sua simplicidade, tornando-se
mais diferenciada melódica e ritmicamente e devido a constante alternância dos
tempos fortes ganha a uma oscilação dos acentos.
A poesia, uma das principais características da Modinha, é mantida cheia de
sentimentalismo e de “penas de amor”, como se refere DODERER, reforçada por
uma melodia considerada na época como “doce e deliciosa”. Quanto às
características musicais, o texto poderia ser reforçado pelo contraste entre
tonalidades maiores e menores. Melodias e temas de óperas poderiam ser
adaptados para o gênero de Modinhas, ganhando textos em português. Nesta
segunda fase, este gênero musical era cultivado tanto na Metrópole Portuguesa
quanto no Brasil Colônia, sendo que no Brasil elas eram tocadas principalmente nos
salões da alta burguesia dos grandes centros urbanos, como Rio de Janeiro e São
Paulo.
Importantes compositores compuseram ou transcreveram modinhas, como José
Maurício (Mestre de Capela da Sé de Coimbra), Marcos Portugal, José Maurício
Nunes Garcia, SigismundNeukomm e posteriormente Carlos Gomes. Modinhas com
acompanhamento de violão também foram transcritas e arranjadas para
acompanhamento de piano, pelos pesquisadores e viajantes alemães Johann
vonSpix e Carl von Martius, que passaram pelo Brasil no início do século XIX. Já no
século XX, Mario de Andrade também foi responsável pela pesquisa e publicação de

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uma série de Modinhas Imperiais do século XIX para canto e acompanhamento de


piano.

Uma Mulata Bonita – Transcrição de Spix e Martius, 1817-1820


Link Youtube:

(Vídeos e áudios encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

Modinhas Imperiais recolhidas por Mario de Andrade:


Link para partituras das duas primeiras modinhas:

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http://musicabrasilis.org.br/partituras/anonimo-obras-compiladas-por-mario-
de-andrade-acaso-sao-estes
http://musicabrasilis.org.br/partituras/anonimo-obras-compiladas-por-mario-
de-andrade-escuta-formosa-marcia

DODERER completa que especialmente no Brasil, a Modinha torna-se a


forma mais popular de canção, fato possível de averiguar devido ao grande número
de coletâneas de Modinhas que foram impressas durante o século XIX. O gênero
deixa de ser cultivado somente pelos grandes compositores, renomados, do período,
tendo composições e arranjos de amadores e músicos leigos. Este fator, segundo
DODERER, fez com que, a partir de 1860/70, a Modinha, em sua terceira fase
exclusivamente brasileira, se tornasse um gênero de canção trivial.
Sem considerar questões estéticas e de gosto musical, é impossível deixar
de perceber a importância deste gênero musical para a formação dos estilos de
canções urbanas de finais do século XIX, tanto em Portugal quanto no Brasil, como
o Fado Português e a Moda Sertaneja ou até mesmo o Choro.

Referência

DODERER, Gerhard. Modinhas Luso-Brasileiras. Lisboa: Fundação


CalousteGulbenkian, 1984.

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Aula 27_O Nacionalismo tupiniquim

 
Com o destaque alcançado pela música de Carlos Gomes, o mundo cultural
passou a prestar mais atenção ao que poderia constituir uma música genuinamente
brasileira. Neste aspecto o rico folclore nacional foi o material que estimulou os
compositores a utilizar estes temas para elaborações eruditas, embora ainda
seguidoras, em linhas gerais, de escolas estrangeiras. Basílio Itiberê da Cunha foi
um dos precursores desta corrente, com sua rapsódia para piano A Sertaneja,
escrita entre 1866 e 1869.

(Vídeos e áudios encontram-se no Ambiente Virtual de Aprendizagem)

Outros nomes importantes são Luciano Gallet e Alexandre Levy, de escola


europeia, mas que de maneiras diferentes buscaram incorporar elementos
tipicamente nacionais em sua produção. O caminho estava aberto, e um sabor
definitivamente brasileiro pode ser encontrado na obra de Francisco Braga e
especialmente na obra de Alberto Nepomuceno. Este empregou largamente ritmos e
melodias do folclore em uma síntese inovadora e efetiva com as estruturas formais
de matriz europeia. A atuação de Nepomuceno também foi importante por ter ele
sido presidente da primeira associação brasileira dedicada a concertos sinfônicos
públicos.
Francisco Braga é o compositor do Hino à bandeira, com letra de Olavo Bilac:
Compositor, organista, pianista e regente cearense, Alberto Nepomuceno (1864-
1920) é considerado o pai da canção de câmara brasileira e do nacionalismo na
música erudita brasileira. Aprendeu música com o pai, o maestro Vítor Augusto
Nepomuceno, em Recife, PE, onde se tornou diretor musical do Clube Carlos
Gomes (1882). Após a morte do pai, mudou-se para o Rio de Janeiro, em 1884.
Completou seus estudos na Europa (1888) na Academia de Santa Cecília, em
Roma, onde estudou com Eugenio Terziani.
Teve aulas também com Theodor Lechetitzky, em cuja sala de aula conheceu a

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pianista norueguesa WalborgBang, com quem se casou em1893. Aluna de Edvard


Grieg, o mais importante compositor norueguês da época e representante máximo
do nacionalismo romântico. Após o casamento, Nepomuceno e Walborg vão morar
na casa de Grieg em Bergen. Esta amizade foi fundamental para que Nepomuceno
elaborasse um ideal nacionalista e, sobretudo, se definisse por uma obra atenta à
riqueza cultural brasileira.
Posteriormente, com bolsa de estudo do Governo Brasileiro, transferiu-se para
Berlim, onde estudou no Conservatório Stern. Também estudou órgão em Paris e
voltando ao Brasil (1895), iniciou suas atividades pedagógicas no Instituto Nacional
de Música do Rio de Janeiro. Em 1895, Nepomuceno realizou um concerto histórico,
marcando o início de uma campanha que lhe rendeu muitas críticas e censuras. Foi
apresentada pela primeira vez, no Instituto Nacional de Música, uma série de
canções em português, de sua autoria, deflagrando assim a guerra pela
nacionalização da música erudita brasileira. O concerto atingia diretamente aqueles
que afirmavam que a língua portuguesa era inadequada para o bel canto. A
polêmica tomou conta da imprensa e Nepomuceno travou uma verdadeira batalha
contra o crítico Oscar Guanabarino, defensor ardoroso do canto em italiano,
afirmando: "Não tem pátria um povo que não canta em sua língua".
O Garatuja, comédia lírica em três atos, baseada na obra homônima de José de
Alencar, é considerada a primeira ópera verdadeiramente brasileira no tocante à
música, ambientação e utilização da língua portuguesa, com ritmos populares como
o maxixe e a habanera.
No princípio do século XX, a realização do concerto de violão do compositor popular
Catulo da Paixão Cearense, no Instituto Nacional de Música, promovido por
Nepomuceno, causou grande revolta nos críticos mais ortodoxos. Ainda como
incentivador dos talentos nacionais, atuou para editar as obras de um controvertido
compositor que surgia na época: Heitor Villa- Lobos.

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Aula 28: Alberto Nepomuceno no Rio de Janeiro

 
 Para esta aula, utilizaremos como material básico o artigo da professora doutora
Mônica Vermes intitulado: Alberto Nepomuceno e o Exercício Profissional da
Música. Neste artigo a professora e pesquisadora busca mostrar como Nepomuceno
exerceu sua atividade musical no Rio de Janeiro no final do século XX, mas ao
mesmo tempo a pesquisadora vai além, apresentando um resumo claro da realidade
profissional da música na capital carioca no final do século XIX e início do século
XX. O artigo da professora estará disponível para a leitura completa, que é
requisitada para esta aula.
 Neste texto introdutório iremos dar um guia de leitura buscando direcionar o estudo
dos alunos, o artigo publicado pela professora, que está disponível online e na
plataforma do curso, é de leitura obrigatória.
 Na breve introdução de seu artigo, VERMES, após uma resumida biografia de
Nepomuceno e apontando a pluralidade de atividades que o mesmo exercia e a
aparente queda de produtividade do compositor durante seus anos no Rio de
Janeiro, aponta uma série de questões pertinentes sobre quais eram as
possibilidades de sustento de um músico na capital carioca na virada dos séculos
XIX e XX. Após a introdução, a pesquisadora passa a listar os espaços musicais da
cidade e o repertório comum em cada um deles. No final a professora mostra como
Nepomuceno se relacionou com esta realidade.
 
1. Teatros e Repertórios:
 
1.1.Teatro Eden-Lavradio: Subgêneros operísticos mais ligeiros, como óperas
cômicas, óperas cômico-fantásticas, e revistas.
 1.2.Teatro Apolo: óperas cômicas, operetas, revistas e comédias e seria o “preferido
das companhias portuguesas de revistas e operetas”.
 1.3.Teatro São Pedro de Alcântara: Incluía espetáculos de clowns, musicais e
óperas, recebeu também concertos sinfônicos.

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 1.4.Teatro Fênix Dramática: Reinaugurado em 1910 ou 1916 para funcionar como


cinema e music hall. Esse teatro foi dirigido desde 1869 por Henrique Alves de
Mesquita, que lá apresentaria suas “operetas sincopadas”.
 1.5.Teatro Lírico (antes Teatro Imperial D. Pedro II): Programação variada, recebia
zarzuelas, operetas e peças teatrais.
 1.6.Concerto Avenida do Pavilhão Internacional: Programação variada, que incluía
canto, dança, acrobacias e lutas de boxe.
1.7.Teatro Sant’Anna: Programação compreendia operetas, revistas e peças
teatrais.
 1.8.  Teatro Lucinda: Comédias, revistas e peças teatrais.
 1.9.  Teatro Municipal do Rio de Janeiro: Ópera.
 
 2. Repertório e Gêneros Musicais:
 
2.1.Gêneros Musicais mais ligeiros e populares: revistas, operetas, burletas
(distanciando da produção mais erudita, artística, calcada na música instrumental
europeia principalmente de tradição germânica).
 
 Segundo a autora, a polarização entre a música erudita e a de caráter popular,
traria consequências importantes ao modo de viver dos músicos, uma vez que os
concertos eruditos atraíam um público menor, não garantindo a subsistência dos
profissionais da música.
 
 3.  Orquestras e Sociedades de Concerto
 
 As sociedades de concerto que surgiram no século XIX, como a Sociedade
Filarmônica (posteriormente Sociedade Musical Campesina), Clube Mozart, Clube
Beethoven e a Sociedade de Concertos Clássicos, realizavam concertos de música
erudita, mas somente para seus associados. A Sociedade de Concertos Populares,
fundada por Carlos de Mesquita em 1887, é a primeira a fornecer concertos públicos
no Rio de Janeiro. Posteriormente outras sociedades com concertos públicos foram
criadas, como: Associação de Concertos Populares (1896-1897), dirigida por Alberto

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Nepomuceno; o Centro Artístico (fundado em 1893); o Clube Sinfônico de


Amadores, e Sociedade de Concertos Sinfônicos do Rio de Janeiro (1912-1932).
 
A autora do artigo mostra, por depoimentos, que estas sociedades e
orquestras não possuíam uma programação contínua e não tinham possibilidade de
contratar os músicos com regime de exclusividade, gerando um ressentimento da
classe musical, que aparentemente era percebido na qualidade dos grupos, já que
os músicos tinham a necessidade de dividir seu tempo com as orquestras populares,
para garantir seu sustento.
 
 4.  Músicos:
A multiplicidade de atividades exercidas por músicos, a fim de garantirem
seus sustentos é apontada pela autora do artigo, mostrando como era comum estes
casos, o mesmo também pode ser visto nas aulas anteriores deste curso, onde
estudamos diversos compositores que dividiam seu tempo com outras atividades
profissionais, musicais, de outras áreas artísticas e mesmo de áreas externas à vida
musical ou cultural.
 
A autora mostra também que muitos músicos eruditos eram criticados
quando se envolviam profissionalmente com gêneros musicais/artísticos populares,
o que levou alguns deles a adotarem pseudônimos com o objetivo de evitarem
prejudicar suas carreiras, o próprio Nepomuceno escreveria uma Opereta com o
pseudônimo de João Valdez.
 
 5.  Instituições de Ensino
 
 A principal escola de música era sem dúvidas o Instituto Nacional de
Música, que era uma instituição central para o exercício profissional da música, tanto
quanto um espaço para a construção de um projeto musical. Para um
músico/compositor, conseguir uma nomeação para o Instituto significava uma
tranquilidade para poder exercer suas atividades como compositor, como foi o caso
de Francisco Braga e Luciano Gallet.

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6. Alberto Nepomuceno no Rio de Janeiro


  
Mudou-se para a capital em 1885
integrou-se à vida musical da cidade, participando das atividades de
relevantes instituições.
Ministrou aulas de piano do Club Beethoven.
Em 1887 organizou um concerto com obras próprias.
Após tentar, em vão, apoio oficial para uma nova viagem de estudos para a
Europa, passa a depender do auxílio de amigos, como a família Bernardelli.
Em 1888 Nepomuceno empreendeu sua viagem de estudos à Europa, com
recursos próprios conseguidos com seus recitais. Permaneceu na Europa até 1895,
após conseguir uma bolsa por ter sido terceiro colocado no concurso para a escolha
do Hino da República.
1895, retorna à capital carioca e é nomeado como professor de Órgão do
Instituto Nacional (também foi professor de composição no mesmo Instituto, além de
dar aulas particulares de piano e aulas de música em escolas privadas).
Foi diretor do Instituto Nacional pela primeira vez entre julho de 1902 e maio
de 1903 e pela segunda vez entre outubro de 1906 a outubro de 1916.
1895 até 1906: Período produtivo como compositor.
Como diretor do Instituto Nacional, continua o trabalho de Leopoldo Miguez
no sentido de criar um ambiente musical profissional no Rio de Janeiro.
Possibilitando a criação de corpos estáveis temporadas regulares com o objetivo de
consolidar a atividade musical erudita na capital carioca.
Faleceu em 1920, no Rio de Janeiro.
 
Referência
 
VERMES, Mônica. Alberto Nepomuceno e o Exercício Profissional da Música. In:
Música em Perspectiva, V. 3, N. 1. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2010.
p. 7-32 Disponível em: http://revistas.ufpr.br/musica/article/view/20978/28619

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Aula 29_O Álbum Pitoresco Musical

Na segunda metade do século XIX a elite brasileira adquire o gosto pelas


Danças de Salão Europeias. Estas danças e gêneros musicais logo fariam parte dos
principais eventos sociais e bailes das classes mais altas durante o reinado de D.
Pedro II e mobilizariam grande parte dos músicos e compositores, que mesmo tendo
sua prática voltada para a ópera e música religiosa, também participariam desta
nova forma de diversão dos centros urbanos brasileiros.
O primeiro álbum de Danças de Salão impresso no Brasil, o “Álbum
Pitoresco Musical”, de 1856, já pode ser considerado como importante na
representação deste momento, por conter sete peças musicais que já incluíam as
seis principais danças de salão encontradas no repertório, sendo 2 Quadrilhas, uma
Polca, uma Valsa, uma Redowa, um Schottisch e uma Polca-Mazurka. Cada dança
recebe o nome de uma região do Rio de Janeiro e além da parte musical, o álbum
também inclui uma gravura das respectivas regiões como capa para cada uma das
danças.
Na segunda metade do século XIX estas danças seriam aos poucos
apropriadas pelas camadas mais populares dos centros urbanos, e recebendo a
influência dos gêneros musicais de origem negra, como o batuque e lundu, logo
tornariam base para danças como o Maxixe e posteriormente o Samba.
Abaixo iremos fazer uma breve descrição das danças representadas no
“Álbum Piroresco Musical”, a partir de dicionários musicais do próprio século XIX.
 
1: Quadrilha:
Formada por cinco números de dança, que segundo Ernesto Vieira, eram
repetidos diversas vezes. O mesmo autor também escreve que cada número era
escrito em compasso binário, Allegretto e cada número é formado por 2 ou 3
períodos. As duas Quadrilhas do “Álbum Pitoresco” correspondem à descrição de
Ernesto Vieira, cada uma composta por 5 números em compasso binário, variando
entre 2/4 e 6/8.

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2. Polca:
Ernesto Vieira descreve a Polca como sendo originária da Bohemia, em
compasso 2/4 e Allegretto, com caráter alegre, mas gracioso.  Segundo o autor, a
partir de 1840, se torna comum na Europa. Mario de Andrade acrescenta que a
primeira Polca dançada no Rio de Janeiro foi no Carnaval de 1846, pela atriz Clara
del Mastro.

Fig. 05 e 06 – Eduardo M. Ribas. Polca (em “Álbum Pitoresco Musical”).

3.Valsa:
Segundo Ernesto Vieira, a Valsa Moderna, diferente das Valsas alemãs do
século XVIII, é “em andamento muito vivo” e “se dança freneticamente nos salões”,
“com os três tempos do compasso sempre acentuados por um acompanhamento tão
uniforme que se torna monótono”.
Rafael Coelho Machado, em seu Dicionário Musical, descreve em parte sua
coreografia: “dança que duas pessoas executam volteando sobre si, ao mesmo
tempo que descrevem um grande círculo no lugar onde dançam”.

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Fig. 09 e 10 – Geraldo A. Horta. Redowa (em “Álbum Pitoresco Musical”).

5. Schottisch:
Ernesto Vieira descreve como: “Dança de sala, contemporânea da Mazurka e
da Polca.... Assemelha-se à Polca, com a diferença de ter um andamento mais
vagaroso. 

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6.Mazurka:

Não somente a Mazurka, mas o termo Polca-Mazurka que aparece no “Album


Pitoresco” é descrito da seguinte maneira por Ernesto Vieira em seu Dicionário
Musical:
“Dança nacional da Polônia, em compasso ternário, movimento moderado e
caráter gracioso.”
“Uma imitação simplificada desta dança foi, há cerca de cinquenta anos [final
da primeira metade do século XIX], admitida nos salões de Paris com o título de
Polka-Mazurka ou simplesmente Mazurka, vulgarizando-se depois em todos os
países onde as modas parisienses são adotadas.”

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Fig. 13 e 14 – J. J. Goyanno. Mazurka (em “Álbum Pitoresco Musical”).


 
Referência
MACHADO, Raphael Coelho. Dicionário Musical. Rio de Janeiro, B.
L. Garnier, Livreiro Editor, 1909.
VIEIRA, Ernesto. Dicionário Musical. 2.ª Edicção, Lisboa, Typ.
Lallemant, 1899.

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Aula 30_Do Lunduao Maxixe

O pesquisador Carlos Sandroni, em seu livro “Feitiço Decente”, demonstra, a


partir de pesquisas, partituras e registros fonográficos, as bases da formação do
gênero Maxixe, desde a influência das Danças de Salão europeias à síncopa dos
negros, presente no nosso Lundu.
   O Maxixe surgiu como uma dança popular, na segunda metade do século
XIX, no Rio de Janeiro. Desde o início foi considerado como vulgar, e sua criação é
atribuída aos habitantes do bairro carioca “Cidade Nova” (que surgiu por volta de
1860). Em 1872 o “Cidade Nova” já era o bairro mais populoso da cidade e
conhecido pelos divertimentos de “má fama”. Na citação abaixo, o termo “Samba” é
utilizado como sinônimo de festa, e ainda não o gênero musical.
“Bailes característicos da Cidade Nova, os assustados ou sambas[1], eram,
então, propriedade de um grupo sacudido, desempenado, que guardou no modesto
anonimato a glória dessa invenção... Era por esses grupos rebarbativos que o
maxixe aparecia a princípio, figura obrigada nos folguedos de antanho... E vós
todos, homens sisudos de agora, que transitastes pela via juvenil dos folguedos
cariocas, ao ouvirdes hoje um desses musicares trepidantes, sentireis nas pernas o
formigueiro saudoso dos bons tempos em que, pela calada da noite, íeis folgar
disfarçadamente nos sambas da Cidade Nova.” (Jota Efegê apud SANDRONI: 2001,
p. 62)

Fig. 01 e 02. Johann Moritz


Rugendas – Gravuras com
dança Lundu.

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Fig. 03 a 05 – Passos do Maxixe (Periódico Século XX, Maio, 1906). Do site:


http://www.pensario.uff.br/audio/1883-foi-grafada-imprensa-palavra-maxixe

Foi pelos clubes carnavalescos que o Maxixe passa a ascender do Bairro


Cidade Nova às classes altas, como uma nova maneira de “Dançar o Lundu”. A
nova maneira de dançar é uma das mais importantes mudanças do maxixe, e
também o que causou uma parte do “horror que o Maxixe inspirou” (SANDRONI:
2001, p. 66). O Lundu era uma dança de origem negra, como já vimos, com os pares
separados, enquanto no Maxixe os pares dançavam entrelaçados. Esta maneira de
dançar veio por influência das danças de salão europeias, como a polca e a valsa,
mas no Maxixe elas foram imitadas com liberdade, incorporando elementos
coreográficos do Lundu. Assim, o Maxixe foi um gênero de dança de salão popular
carioca que surgiu a partir da apropriação “indevida” de danças ocidentais que eram
consideradas como signos de distinção das elites (SANDRONI: 2001, p. 66). Desde
o início era comum ver o gênero Maxixe receber diversos nomes, como: polca-
brasileira, polca-lundu e mesmo de tango-brasileiro (caso de muitos dos tangos-
brasileiros de Ernesto Nazareth), associando a demais danças de salão.
                Além da influência das Danças de Salão europeias e do Lundu,
musicalmente (assim como o Tango Rio-Platense) o Maxixe foi possivelmente
formado também pela Habanera (originalmente de Cuba). Entendam que esta
influência não foi direta (Cuba-Brasil), mas indireta, pelo caminho Cuba-Europa-
Brasil. O padrão rítmico básico da Habanera consiste em uma colcheia pontuada,
uma semicolcheia e duas colcheias, onde a acentuação está na primeira e última

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colcheias e na semicolcheia. Se considerarmos somente os acentos, o ritmo se


torna o qual musicólogos cubanos identificaram como “tresillo”, que foi fundamental
na música da pequena ilha caribenha.

Fig. 07 – Tresillo
 
Georges Bizet – Ópera Carmen, Habanera:

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Os ritmos acima exemplificados, somados à síncopa característica do Lundu,


formam o ritmo de acompanhamento comum ao Maxixe:

Fig. 09 – Ritmo de Maxixe

Fig. 12 e 13 – NAZARETH, Ernesto. Dengoso (Maxixe)

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Fig. 12 e 13 – NAZARETH, Ernesto. Dengoso (Maxixe)

Fig. 12 e 13 – NAZARETH, Ernesto. Dengoso (Maxixe)

Ernesto Nazareth – Dengoso (Victor Military Band):

Ernesto Nazareth – Dengoso (Casal Irene e Vernon Castle dançando Maxixe):

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Referência

SANDRONI, Carlos. Feitiço Decente: Transformações do Samba no Rio de


Janeiro, 1917-1933. Rio de Janeiro: Jorge Zahar/UFRJ, 2001.

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Aula 31_As origens sociais do choro no Brasil

 
Antes do advento do choro no Brasil, em meados do século XIX, diversos
grupos urbanos, como os barbeiros e as bandas militares ou municipais, tiveram por
função o fornecimento de música instrumental para festas públicas. A partir da
década de 1870, no Rio de Janeiro, entra em cena uma série de tocadores advindos
da baixa classe média, contemporâneos  ao surto de desenvolvimento
proporcionado pela riqueza do café no Vale do Paraíba. Neste contexto, vemos
também os primeiros ensaios de industrialização e multiplicação de manufaturas do
Império. Com a intensa exportação do café,  Dom Pedro II pôde iniciar uma série de
melhorias urbanas na capital. A multiplicação de obras e negócios, ao implicar na
divisão do trabalho, iria alterar a simplicidade do quadro social herdado da colônia.
Aparecem os operários e os pequenos funcionários de servições públicos e
empresas particulares das áreas de transporte, gás e iluminação.
É neste contexto que torna-se necessário a criação de formas próprias de
participação social. A camada mais ampla de pequenos burocratas passava a
cultivar a diversão familiar das reuniões e bailes nas salas de visita, ao som da
música mais comodamente posta a seu alcance: a dos tocadores de valsas, polcas,
schottisches e mazurcas à base de flauta, violão e cavaquinho. Como eram bailes
mais modestos, que a sociedade ‘elegante’ olhava com certo desdém, receberiam o
nome depreciativo de forrobodó, maxixe ou xinfrim.  Surge esta prática musical de
uma classe média minimamente diversificada.
O choro começa não como um gênero musical, mas como uma forma de
tocar e de participar.  A época de esplendor dos conjuntos de música de choro
vindos do século XIX se estendeu até ao período em que a atração das revistas de
teatro, em primeiro lugar, e o disco e o rádio, depois, vieram já no século XX
oferecer à gente da moderna classe média das cidades novas e mais variadas
formas de diversão. No plano estético, pode-se identificar um processo de
adaptação da polca europeia, mais marcial e metricamente comportada, para uma
polca mais relaxada e sincopada. Importante ver que esta síncopa não é
simplesmente uma excessão no modelo europeu, mas uma adaptação das heranças
africanas de ciclos rítmicos de tamanhos diferentes, gerados pela sobreposição de

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tempos ímpares e pares. É na confluência de elementos de culturas diferentes que o


choro, como modo de tocar, foi desenvolvido, tendo por modelo principal a música
europeia.

 
 
 
REFERÊNCIAS

MORAES, José Geraldo Vince de. (org). História e Música no Brasil. São Paulo:
Alameda, 2010.

TINHORÃO, José Ramos. História Social da Música Popular Brasileira. São Paulo:
Ed. 34, 1998.

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Aula 32_Música como mediação cultural entre classes sociais ao


final do século XIX

  

Com a urbanização e a diversificação do trabalho na segunda metade do


século XIX, novas atividades sociais e culturais emergem e se cruzam.  Se o período
dos Impérios tinha como dependência econômica básica o capital inglês e como
fonte cultural principal as modas francesas (representadas, na música popular, pela
valsa,  a polca, a mazurca, a quadrilha etc), na nova República, a partir de 1889,
inicia-se uma certa dependência do capital americano, também com a importação
cultural de suas produções, especialmente no início do século XX (na música
popular, o ragtime, o one-step, o cake-walk, o two-step, o blackbottometc). 
Neste período de mudanças contínuas, várias tradições passam a se cruzar,
onde a divisão convencional entre o popular e o erudito perde seu sentido, mas
ganha outro.
O notório antropólogo Gilberto Freyre, um pouco mais tarde, verá na música
deste período um elemento de unificação das classes. Mas podemos dizer com mais
precisão que a música serviu de mediação entre elas, pois a noção de mediação
traz a ideia de trânsito, de troca entre realidades contrastantes e não a sua
pacificação e a sua harmonização. A polca, por exemplo, será um gênero europeu
que se cruzará com elementos africanos e se tornará um forte agente desta
mediação, sendo tocada em todo tipo de lugar, numa época em que o arrivismo (as
modas de fora) pretende, cada vez mais, ser usado como distinção social. É neste
período que podemos ver o compositor popular que vira clássico e o compositor
clássico que vira popular nas figuras, por exemplo, de Ernesto Nazareth e Henrique
Alves de Mesquita, respectivamente. Este trânsito entre o popular e o erudito é
comum neste período.
Por outro lado, a vida noturna da cidade passa a requerer uma vivência
musical mais diversificada.  O rápido crescimento dos grandes centros europeus
desde 1830, como Londres e Paris, havia levado à criação espontânea de locais
públicos de diversão para a massa urbana. Em tavernas de Londres ou cafés de

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Paris, um comércio de músicos e cantores começa a surgir.  Destas atividades


surgem os chamados cafés-concerto, cafés-catantes, e se unem a casas de chope,
circos e teatros de revista.  No Brasil, o café-cantante e a cançoneta surgiram em
1859, com o AlcazarLyrique. Há relatos de grandes escritores como Machado de
Assis e Joaquim Manoel de Macedo a respeito.   
Os artistas-cantores populares, especialistas em cançonetas adaptadas à
realidade brasileira, duraram até o período da Primeira Guerra Mundial. A produção
refletia um meio caminho entre a cultura popular das classes mais baixas e aquela
importada do exterior. Esta intimidade mínima entre componentes das classes
baixas e certos estratos da classe média emergente iria explicar dois fatos: primeiro,
o de que as primeiras músicas populares brasileiras saíram dos teatros vestidas por
maestros portugueses, segundo, que o primeiro gênero criado especialmente para a
massa urbana - o das marchinhas de Carnaval - foi resultado do abrasileiramento de
marchas portuguesas divulgadas em companhias de teatro de revista de Lisboa. 
Ouça uma canção dos compositores Pádua Machado e Domingos Correia,
provinda desta tradição urbana. Este último, também chamado de Boneco, trabalhou
numa casa de chope e se suicidou em 1912.
(Os vídeos e áudios desta aula encontram-se no Ambiente Virtual de
Aprendizagem)

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