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PROJETO DE PESQUISA

Ateliê de História A MEMÓRIA DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA:


A CONTRIBUIÇÃO DE WALTEL BRANCO
PARA A MPB (1963-1988)
Palavras - chave:
Memória; Música Popular Thiago Rafael de Souza 1
Brasileira; Waltel Branco.
Jonas Wilson Pegoraro 2

INTRODUÇÃO
Resumo: A História da Música
Popular Brasileira passou por Dentro da rica história da música brasileira, inserem-se inúmeras figuras
diversas mudanças e contem-
plou muitos personagens que cheias de conceitos e prestígio que contribuíram para a popularização da Mú-
contribuíram para essa vasta sica Popular Brasileira. Muitos desses personagens mantêm-se na memória e
história. Um desses persona- no imaginário do povo brasileiro como grandes contribuintes para a música
gens é o músico e maestro popular.
paranaense Waltel Branco,
detentor de uma musicalidade Temas que relacionam História e Música são amplos e possibilitam inú-
plural, com um vasto currículo, meros recortes e reflexões, sobretudo se for denominada “música popular”,
composto por vários suces- carregando em si uma privilegiada visão sociocultural, ou pautado na fala de
sos da Música Popular Brasi-
leira. Os anos de 1963 e 1988
Marcos Napolitano, um “lugar de mediações, fusões, encontros de diversas
são dois pontos marcantes etnias, classes e regiões [...]” (NAPOLITANO, 2005, p. 07).
na carreira de Waltel Branco, A MPB trazia consigo um elemento cultural e ideológico que, segundo
pois são respectivamente os Marcos Napolitano, teve grande valor para a tradição e memória da popula-
anos de lançamento da trilha
mundialmente conhecida A ção, apresentou diferentes expressões de cultura coletiva, tanto do linguajar
Pantera Cor-de-Rosa com Hen- popular quanto das classes cultas, demonstrando traços da memória coletiva
ry Mancini e LP Ideologia de nacional (GRAMSCI, 1968, p. 73 apud NAPOLITANO, 2001, p. 12).
Cazuza, nos quais Waltel con- Tido como uma grande referência musical, Waltel Branco é um músico,
tribuiu musicalmente. Mesmo
com sua imensa contribuição maestro, compositor, regente, arranjador, diretor musical, violonista, guitar-
a MPB, o músico não é lem- rista, contrabaixista, cavaquinista, produtor musical e professor, especialista
brado por muitos e por vezes na composição de trilhas sonoras para novela e cinema e temas incidentais3,
sua carreira é relegada ao es-
quecimento frente ao grande
que tem em seu currículo trabalhos e colaborações musicais bem expressivas
público, processo que procu- Em 1963 a convite de Henry Mancini, Waltel mudou-se para os Estados
raremos entender por meio de Unidos para trabalhar como arranjador e integrar efetivamente o time de
suas obras e de sua trajetória músicos, na trilha sonora do filme A Pantera-Cor-de-Rosa. O filme é marcado
como músico. A discussão te-
órica que envolve o projeto por um personagem fictício - de animação -, que apareceu originalmente na
está ligada a questões de me- abertura do filme de Blake Edwards, que com o sucesso foi produzida uma
mória, através de apontamen- série animada com o cartoon da Pantera.
tos de autores como, Maurice Waltel ainda integrou o time de músicos da Rede Globo, sendo o um dos
Halbwachs e Michael Pollak e
questões que envolvem a in- responsáveis pelo departamento musical da emissora, fazendo trilhas inci-
dústria cultural, recorreu-se a dentais e temas para a programação da televisão4. Ainda nesse período, tam-
indicações de Theodore Ador- bém realizou trabalhos com diversos artistas nacionais como, João Gilberto,
no, Max  Horkheimer e Edgar
Morin, por fim para entender
Djalma Ferreira, Elizeth Cardoso e Moacyr Santos, Mariza Gata Mansa, Or-
algumas questões de ressenti-
mentos foram utilizadas a dis-
cussão de Pierre Ansart. Essas 1 Licenciado em História pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP); possui especialização latu sensu
em Patrimônio, Memória e Gestão Documental pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP); Mestre em
indicações e apontamentos
História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). E-mail: thiagorsouza1984@gmail.com
que nos ajudarão a entender 2 Orientador. Doutor em História pela UFPR. professor adjunto da Universidade de Brasília (UnB).
a trajetória de Waltel Branco 3 Música que acompanha uma obra teatral, uma cena cinematográfica, programa de televisão, e/ou
dentro da indústria cultural programa de rádio. Frequentemente chamada de trilha ou música de “fundo”.
brasileira. 4 Trabalhos que serão levantados e alguns estão relacionados na seção FONTES no projeto.

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landivo, Radamés Gnatalli, Luiz Carlos Vinhas, Dom um produto cultural com características particula-
Um Romão, Baden Powell, Flora Purim, J.T. Meirel- res, não somente pela proximidade que tem com
les e os Copa 5, Elis Regina, Dorival Caymmi, Maria os indivíduos, mas, sobretudo, pela sua capacidade
Creuza, Dom Salvador, Tim Maia, Roberto Carlos, de se difundir. Ao mesmo tempo, diferente das ou-
Alceu Valença, Antônio Carlos e Jocafi, Marcos Valle tras mercadorias da indústria cultural, a música pela
e Paulo Sérgio Valle, Toni Tornado, Odair José, Ba- sua interatividade, passou a funcionar como pano de
rão Vermelho, Kid Abelha e Cazuza, entre muitos fundo para diversos setores da produção cultural,
outros. Organizou, participou e produziu conjun- tais como: publicidade, cinema, teatro e a produção
tos de estúdios das principais gravadoras no Brasil, televisiva (TOLEDO, 2007, p. 03).
entre elas, Los Karabalis, Os Românticos de Cuba As canções retratam o que os indivíduos (au-
e o The Nilser All-Stars, conjuntos esses que eram tores/atores) protagonizaram em seus respectivos
montados em estúdios e gravadoras com o objetivo universos sociais, tornando-se descrições de uma
de vender discos. memória coletiva, ao estimularem a memória das
Também estampou capas de LPs e Compac- pessoas historicamente, contribuindo para garantir
tos, lançando-se com artista, entre sua discografia a identidade cultural.
podemos destacar os trabalhos, Guitarras em fogo Para o grande público, muitas vezes Waltel
(1962), Guitarra Bossa Nova (1963), Violão/recital e passa despercebido, talvez por seu nome não es-
Mancini também é samba (1965), Músicas do Século tar vinculado nas grandes mídias, ou talvez por ter
XVI ao Século XX (1974); e o atualmente valorizado realizado muitos trabalhos nos bastidores, ou ainda,
e cultuado LP Meu Balanço (1975). pelos diversos pseudônimos que utilizou em toda a
Em solos internacionais destacam-se trabalhos sua carreira.
como, em Cuba com a cantora Lya Ray, Mongo San- No interior do meio musical é inegável a contri-
tamaría, Pérez Prado e Chico O’Farrel, na Espanha buição artística e intelectual de Waltel Branco para
com o violonista Andrés Segóvia e Paco de Lucia. a música brasileira, pois participou ativamente da
Nos Estados Unidos tocou com Nat King Cole, Sal formação/estruturação da própria indústria musical
Salvador, Chico Hamilton, Dizzy Gillespie, Frank no país, desde a constituição do mercado voltado
Rosolino, Charles Mariano, Sam Noto, Mel Lewis, para a bossa nova, da criação de trilhas para as tele-
Max Benett, Kenneth Garret, Wallace Roney, Fran- novelas e séries televisivas até arranjos para muitos
çois Hardy, Andy Williams e Johnny Mathis (NETO, artistas nacionais e internacionais.
2004, p. 224). Ainda nos EUA estudou “composição Isto posto, a pesquisa de mestrado buscará
e técnicas de música incidental para cinema e te- compreender em que medida as obras de Waltel
levisão” com os maestros Dimitri Tiomkin e Staley Branco refletem as transformações e adaptações
Wilson, estudos que lhe renderam trabalhos com que ocorreram dentro da indústria cultural brasilei-
Quincy Jones e Henry Mancini. ra entre 1963 e 1988.
Em 1988, data que delimita a pesquisa, Waltel Ao cantarolarem a música tema da Pantera-
fez os arranjos para o disco Ideologia, terceiro da -Cor-de-Rosa ou o famoso “Lerê-Lerê” tema da te-
carreira solo do cantor Cazuza. Além de elaborar lenovela Escrava Isaura, a grande maioria da popu-
os arranjos e de tocar violão na faixa Faz parte do lação não sabe que a autoria e os arranjos musicais
meu show, Waltel foi o diretor musical do show de de ambas as trilha foram produzidas pela mesma
Cazuza, que levou o mesmo nome da faixa. pessoa e/ou que, The Pink Panther Theme tem a
Nessa temporalidade, diversas as mudanças contribuição de um músico brasileiro.
ocorreram no panorama da cultura popular brasilei- No universo da música popular brasileira,
ra, e a MPB passou por vários processos de reinven- diversos personagens se destacam com maior ou
ção e de readaptação, um ponto de muita riqueza e menor popularidade. Entre eles, Waltel Branco: um
alternativas estéticas e ideológicas, e vale ressaltar músico paranaense nascido em 22 de novembro de
que Waltel Branco participou ativamente de alguns 1929 – dia do músico – e residente na cidade de
processos de renovação da música no Brasil (SOU- Curitiba, que ao mesmo tempo em que apresenta
ZA, 2012, p. 25) a saber, pela fusão da Bossa Nova em seu repertório composições conhecidas mun-
e Jazz ou da concepção de trilha internacional de dialmente, é praticamente um desconhecido para
novelas. grande parte população. Nesse sentido, como gran-
Vale lembrar que a música se apresenta como de colaborador para a história da música, nota-se

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a importância de salvaguardar suas memórias e de OBJETIVOS


historicizá-las revelando ao grande público Waltel
Branco tanto como artista, nem como aquele que
Objetivo Geral
contribuiu em grande produção para a música brasi-
leira.
Compreender em que medida as obras de Wal-
Para se ter uma ideia os anos de 1963 (ano do
tel Branco refletem as transformações e adaptações
lançamento da trilha do filme A Pantera Cor-De-Ro-
que ocorreram dentro da indústria cultural brasilei-
sa) e 1988 (ano de lançamento do LP Ideologia de
ra entre 1963 e 1988.
Cazuza, com participação de Waltel na faixa titulo)
Waltel produziu inúmeros arranjos e composições,
somando aproximadamente 84 participações em
trilhas de novela e 40 temas, sendo que 16 foram Objetivos Específicos
aberturas de telenovelas da Rede Globo, entre elas - Analisar a trajetória de Waltel Branco dentro da
pode-se mencionar, Irmãos Coragem (1970), Sel- indústria cultural brasileira.
va de Pedra (1972), O Bem-amado e O Semideus
(1973), O Rebu e Supermanoela (1974) Escalada, - Identificar, catalogar e perceber a relevância das
Moreninha e Bravo! (1975), O Feijão e o sonho, A obras do músico.
Escrava Isaura e Vejo a lua no céu (1976), Dona Xepa
(1977), O pulo do gato (1978), Água Viva (1980) Ro- - Mapear o lugar que o artista este inserido na
que Santeiro, A gata comeu e Ti Ti Ti (1985). história da música brasileira.
Juntamente como João Araújo, Waltel criou a
concepção de trilha internacional de novela e foi
responsável pela modernização das trilhas nacionais, METODOLOGIA
com diversos pseudônimos, tais como: Magalhães
Patto, W. Blac, Bianco, W. Blanco, Willian Hammer, Por vezes expressando o que já passou e a in-
Airto fogo, Tito Velasquez (famoso pela trilha da tencionalidade de revisitar o passado, a memória é
novela TI TI TI). Waltel é um dos idealizadores da uma construção seletiva e representativa do tempo
concepção de trilha internacional de telenovela e passado e construída por um individuo inserido num
pela modernização das trilhas nacionais. Além das contexto social (MOREIRA, 2005, p. 01). Recente-
telenovelas, o maestro foi responsável por trilhas mente, alguns estudiosos discutem, de forma pro-
em programas e especiais da emissora, entre eles dutiva, as relações entre memória e história refletin-
estão, Os trapalhões, Vila Sésamo, Chico City, Sítio do sobre os conceitos e como ambas se relacionam
do Pica-pau amarelo, Pirlimpimpim, Noites Cario- e se diferenciam.
cas, Globo de Ouro, Cauby - Vida de Artista, Lam- Maurice Halbwachs produziu ainda no inicio do
pião e Maria Bonita. século XX, uma pertinente reflexão sobre memória
Assim, pode-se contatar que Waltel Branco tem e história, e que serviu de base para muitas outras
seu nome escrito dentro da história da música bra- reflexões. Em sua obra, o autor sustenta que a me-
sileira com grande contribuição e uma produção mória deve ser entendida como um fenômeno so-
inigualável, em especial para a música brasileira te- cial, que a memória individual é construída a partir
levisiva, sendo que, sua contribuição artística e inte- da memória coletiva. Em outras palavras, a memória
lectual compõe-se de um vasto patrimônio. é construção de um grupo social, pois apresentam
É dessa maneira, cheia de música, criada em di- traços de uma memória individual, o que nos leva
ferentes estilos, ritmos e gêneros, em diversas par- a entender que as lembranças são constituídas no
tes do mundo, com uma diversidade imensa, que interior de um grupo social ao qual o indivíduo faz
por muitos momentos se funde com a história da parte. Essa memória individual é construída a partir
música brasileira que podemos retratar a trajetória das referências e de lembranças de um grupo (CAR-
de vida do músico. Com isso, mediante a pesquisa VALHAL, 2006).
aqui proposta, há a possibilidade de recuperar sua Dessa maneira, o indivíduo acaba tendo suas
produção, bem como lançar luz sobre o “brilhantis- lembranças ligadas ao grupo social ao qual perten-
mo” e longevidade de sua carreira, tendo por obje- ce, embora seja o grupo que determina o que será
tivo observar as transformações em sua obra. lembrado. Portanto, os indivíduos têm uma identifi-

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cação com os acontecimentos mais relevantes para esse tipo de relação no interior do grupo e que são
o grupo. Inserido dentro de um contexto coletivo, a vividas pelo indivíduo, procurando entender as má-
memória do individuo passa a ter como característi- goas, rancores e sentimentos de vingança.
ca o sentimento de pertencimento dento do grupo, Ao tratar a memória como “seletiva”, Pollak
sendo ligado a um passado comum e que compar- afirma que nem tudo o que vivemos se tornará lem-
tilha as mesmas lembranças, assim, “é útil lembrar brança ou referência histórica. Considerando a me-
que os grupos sociais cultivam suas memórias de vá- mória uma construção e um processo passível de
rias maneiras, proclamam seus heróis e usam a pró- flutuações e mutações, é através dessas patologias,
pria música como “livro” de registro” (TRAVASSOS, esquecimento e silêncio, que podemos observar
2006, p. 01). momentos de continuidade e de ruptura, pois a me-
Halbwachs conceitua história como sendo uma mória é constituída de sentimentos (POLLAK, 1992,
parte dos grandes acontecimentos de um grupo, p. 205). Pollak será fundamental para entender o
sendo apenas uma síntese de fatos mais relevantes processo de esquecimento.
do grupo social, mas se encontra distante das per- A memória apresenta a intencionalidade de
cepções do indivíduo. A história tenta restabelecer a reconstruir o passado, como dito anteriormente,
continuidade entre passado e presente, começando propondo reviver o que já passou, deixando vir á
do ponto em que a tradição - e, portanto, a memó- tona as memórias e sentimentos. Com o objetivo
ria - acaba. de reconstrução do passado, podemos articular a
Dialogando com o texto de Halbwachs, Michel memória com a questão de identidade, pois a me-
Pollak também apresenta discussões em torno dos mória inspira os valores ligados à nacionalidade e de
conceitos de história e memória. Para Pollak, a me- identidade do individuo. Cabe nesse ponto ressaltar
mória deve ser compreendida também, e, sobretu- que, Waltel Branco teve um papel importante para
do, como um fenômeno coletivo e social, ou seja, a formação da identidade nacional no período de as-
construído coletivamente e submetido a flutuações, censão da música popular brasileira e da memória
transformações, mudanças constantes (POLLAK, televisiva.
1992, p. 202). Ainda para Pollak, percebe-se que Pierre Nora também foi outro autor que con-
não existe uma memória dada, pronta. A memória é ceituou História e Memória. Sendo que para ele os
uma construção, visto que o que guardamos do pas- conceitos se diferenciam por um fator natural, a
sado são pedaços de memórias. Pollak será funda- memória é mutável e vulnerável à manipulação, já
mental para entender o processo de esquecimento a história, é uma representação do passado a partir
no qual se enquadrará este estudo. de uma olhar de um historiador (BREFE 1996, p.
Pollak enfatiza importância dos ditos e dos não- 110 apud SOUZA, 2012, p. 17). Memória seria uma
-ditos para a construção de uma memória, mesmo operação afetiva, detalhada e com particularidades
sendo ela coletiva ou individual, além de ressaltar a e História é construída a partir de algo que não exis-
importância de manter viva a memória de um grupo te mais, mas fundamenta-se a partir da memória.
ou individuo, pois essas experiências vividas se tor- Nora também utiliza o conceito lugar de memó-
nam pontos de referência para estudos históricos, ria, que são lugares que têm ou adquiriram a função
“Principalmente quando os rastros, muitas vezes de manter viva a memória coletiva e são simbólicos,
esquecidos ou ignorados, revelam interpretações onde a memória coletiva se expressa e se revela,
distintas da oficial ou mesmo da que se acostuma e se apresentam como soluções para o problema
ouvir” (PAIVA, 2011, p. 01) – nesse caso a experiên- da perda de identidade dos grupos sociais (BREFRE,
cia vivida e as memórias de Waltel Branco se tornam 1996, p. 120).
a referência para este estudo acadêmico. Ainda pontuaremos questões que envolvem a
Para entender as razões quem levaram Waltel indústria cultural, pois o cenário televisivo e musi-
ser um músico desconhecido do grande público, a cal brasileiro das décadas de 1960 e 1970 tornou-
proposta deste projeto consiste em trabalhar os fe- -se uma instituição cultural, e possibilita trabalhar
nômenos chamados patológicos de esquecimento e pontos que discutem o debate estético-ideológico
silêncio, com os apontamentos dos textos de Michel do período e o valor que a MPB teve na formação
Pollak além dos ressentimentos, que como indica na tradição, identidade e popularização do país no
Pierre Ansart, que procura entender os ressenti- período estudado.
mentos e os elementos que fazem com que ocorra A partir dos apontamentos de Max Horkheimer

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e Theodor Adorno (ADORNO, 1986, p. 92), que es- na perspectiva de uma narrativa, trazendo represen-
boçaram o problema da cultura de massa, entendida tações desses atores que viveram e presenciaram fa-
como uma categoria de análise. Adorno identifica a tos históricos. Como fonte, a história oral possibilita
exploração comercial e a vulgarização da cultura, a investigação de fatos ou atores, que geralmente são
como também a ideologia da dominação, processo pouco visíveis ou foram excluídos nas documentações
que elimina a possibilidade de reflexão por parte do escrita (HALL, 1992. p. 157).
público sobre aquilo que lhe é oferecido como produ- Além de captar a experiência afetiva e vivida de
to cultural, transformando a mercadoria em cultura e um indivíduo, a história oral também pode captar
a cultura em mercadoria (SOUZA, 2010, p. 11). Esses tradições e mitos, narrativas e ficção, pois o narra-
apontamentos auxiliaram a entender os dois lados que dor transmite a sua experiência através do tempo,
Waltel Branco viveu, sendo um fornecedor de mate- reconstruindo na sua memória os acontecimentos e
riais para a indústria e ao mesmo tempo sendo um fatos que viveu ou presenciou, relatando de maneira
artista anônimo. oral tudo o que adquiriu em sua vivência.
Outra visão que poderemos ter sobre a indústria
cultural, é a partir do conceito de Edgar Morin, au-
tor que entende a indústria cultural como uma cultura FONTES
padronizada voltada ao mercado de consumo impos-
ta por uma criação industrial (MORIN, 1977, p. 304 Indicada esta perspectiva, a principal fonte que
apud SOUZA, 2010, p. 14). será utilizada nesse projeto são os relatos orais do
Adorno utiliza o termo estandardização, que é a próprio Waltel Branco. Em um primeiro momento,
padronização da indústria e a oferta da música como serão analisadas as entrevistas realizadas para um tra-
produto e Morin apresenta o termo padronização- balho anterior, e que obviamente serão novamente
-individualização, dizendo que a indústria não precisa analisadas com um olhar mais crítico, e consequente-
ser totalmente integrada a um sistema de produção mente, novas entrevistas serão realizadas com o mú-
industrial e o equilíbrio entre o padronizado e o indi- sico. Além dos relatos orais do artista, serão utilizadas
vidualizado faz com que a indústria se mantenha em entrevistas realizadas para as diversas mídias, como
produção, sem a obrigatoriedade de procurar por as da TV e Rádio E-Paraná, as de mídia impressa,
inovações, mas que se atenda ao aperfeiçoamento da como as da Poeirazine, do jornal O Globo e Gazeta
originalidade, mesmo que seja um falso individualis- do Povo, essas previamente levantadas e que podem
mo. Esses dão dois pontos quem podemos trabalhar ser encontradas em mídias/acervos digitais e na Bi-
com Waltel, pois ao mesmo tempo em que trabalhou blioteca Pública do Paraná.
desenvolvendo produtos para a televisão soube tra- Outros materiais impressos que serão utilizados
balhar também com produtos individualizados e com são os materiais diversos produzidos pela Fundação
diferentes estilos e gêneros, soube muito bem diversi- Cultural de Curitiba, principalmente os que foram
ficar seus trabalhos. produzidos para a comemoração do 80º aniversário
Serão analisados alguns autores e suas respectivas do musico, em principal o livro Obras para violão de
obras relacionadas à musica, tais como: Napolitano Waltel Branco organizado por Cláudio Menandro.
“História & Música” e “Cultura Brasileira: Utopia e Além dos impressos, o documentário de Ales-
Massificação (1950-1980)”, o texto de Arnaldo Con- sandro Gamo, Descobrindo Waltel, será utilizado
tier “Edu Lobo e Carlos Lyra: o nacional e o popular na como fonte e referência, justamente pelos relatos do
canção de protesto (os anos 60)”, José Ramos Tinho- próprio Waltel e de personalidades próximas ao artis-
rão “Pequena história da música popular” entre outros ta. O Documentário será de suma importância para
textos que tratam da música popular para pode facilitar mapear a cronologia de seus trabalhos, entender o
a compreensão das obras do mastro Waltel Branco. processo de criação das trilhas sonoras nacional/in-
Tomadas como fontes e instrumentos que au- ternacional de novela, além de auxiliar na compre-
xiliam a compreensão do passado e buscam manter ensão da criação dos muitos pseudônimos utilizados
a memória viva, a história oral é uma construção a por Waltel ao longo de sua carreira.
partir de relatos de atores anônimos, onde historia- Para auxiliar o levantamento das fontes sonoras e
dores procuram articular essas narrativas ao objeto discográficas, serão utilizados os relatórios de regis-
de pesquisa, produzindo um conhecimento histórico tro de fonograma através do ISRC5, um cruzamento

5 Abreviação de International Standard Recording Code, ou Código de Gravação Padrão Internacional. É o número de registro de uma música.

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de dados dos fonogramas registrado na ABRAMUS terial de divulgação de shows, apresentações e con-
(Associação Brasileira dos Músicos), SOCINPRO certos do maestro.
(Sociedade Brasileira de Administração e Proteção Como o objetivo geral da pesquisa é analisar a
de Direitos Intelectuais), COPYRIGHT (Registro e obra de Waltel Branco, grande parte das fontes de
Depósito de Direitos de Autor) e SBACEM (Socie- áudio, utilizarei de um arquivo pessoal que disponho
dade Brasileira de Autores e Compositores e Escri- e de material disponível na web, sendo em grande
tores de Música)6 por exemplo, que estão reunidas parte discos de vinil produzidos, de arranjados, par-
em 371 registradas no ECAD (Escritório Central ticipações e de composição do músico, e com esses
de Arrecadação e Distribuição), único órgão de fonogramas listados analisarei sua obra também.
cobrança de direitos autorais no Brasil. Todos os Juntamente com os relatos de Waltel, também
demonstrativos contendo os relatórios de musicas pretendo obter o relato de pessoas próximas ao
registrados em nome de Waltel Branco e de seus maestro, para poder entender o porquê de seu
pseudônimos, facilitando assim o levantamento das apagamento entre o grande público e também para
múltiplas obras do artista. enriquecer em alguns pontos a importância de sua
As demais fontes que serão usadas no trabalho obra para a construção da música brasileira.
são tanto de arquivo pessoal quanto as disponíveis Com as fontes citadas, através de um cruzamen-
no Museu de Imagem e do Som (MIS) e no Museu to de dados, pretendo alcançar os meus objetivos
do Som Independente (MUSIN)7. Ambas as insti- específicos e por fim, o meu objetivo geral. Listadas
tuições mantem em seus acervos documentações e organizadas, estas fontes terão objetivo de facilitar
sobre música paranaense, como por exemplo, ma- a compreensão passo a passo da minha pesquisa.

CRONOGRAMA

Descrição
de atividades
Nov

Nov
Dez

Dez
Out

Out
Mar

Mar
Ago

Ago
Abr

Abr
Mai

Mai
Fev

Fev
Set

Set
Jun

Jun
Jan

Jan
Jul

Jul
Período: 08/2016 a
07/2018
Créditos das X X X X X X X X X X X X X X X X X X
disciplinas
Revisão do Projeto. X X
Revisão da X X
Bibliografia.
Revisão das fontes. X X
Organização, análise
e interpretação dos X X X X
dados.
Elaboração do X
sumário provisório
Início da redação X X
Redação final X X X X X X X

6 Ao longo de sua carreira, Waltel passou por diferentes associações de músicos, maestros e compositores. As associações são responsáveis
pelo registo do fonograma e pelo repasse dos direitos autorais recolhidos pelo ECAD.
7 MUSIN – O Museu do Som Independente é uma instituição privada com sede em Curitiba e que tem em seu um acervo conteúdos relacionados
à história da música paranaense.

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