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BRASILEIRA
AULA 6
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Podemos dizer, portanto, que esse novo escopo estético da música
popular brasileira, com o despontar da Bossa Nova, funcionaria como uma
espécie de índice da brasilidade, ampliando o campo que antes era ocupado
pelo samba. Nesse sentido, esse novo estilo acabou por concretizar um produto
até então inédito e que favoreceu ao diálogo entre a tradição vigente do samba,
com outros projetos musicais, não necessariamente nacionais (Poletto, 2010, p.
36).
Duas figuras da música seriam fundamentais nesse projeto de afirmação
da música popular brasileira ao longo das décadas de 1960 e início da seguinte:
Tom Jobim (1927-1994) e Francisco Buarque de Hollanda, mais conhecido como
Chico Buarque (1944-). Os dois representaram para a música popular brasileira,
cada um a seu modo, o espírito desse novo momento da música no país,
antenados com as principais tendências e sua aplicabilidade na produção
musical.
A geração da qual fazem parte Tom Jobim e Chico Buarque está
circunscrita à construção da música popular brasileira enquanto demarcação
histórica e intervenção cultural, a partir da absorção, da síntese de elementos
musicais do samba e de novas interações com o produto internacional. Desse
processo resulta, do mesmo modo, a seleção do público consumidor, a partir do
aparato estético elaborado: harmonias sofisticadas, recursos literários e arranjos
considerados avançados contribuíram para a delimitação de um produto a ser
apreciado por um nicho social específico. Como vimos, a música popular
brasileira da década de 1960 foi amplamente consumida e divulgada nos meios
da classe média universitária, elevando esse produto musical a um patamar de
relevância cultural e política.
De acordo com Poletto (2010), as contribuições de Tom Jobim para a
consolidação da estética relacionada à música popular, que angariou a atenção
dos musicistas de então, não devem ser subestimadas. O compositor contribuiu
para o arcabouço das reflexões sobre forma, harmonia, construção melódica,
arranjo e interpretação que constituíram marco paradigmático do movimento
(Poletto, 2010, p. 40), ao capitanear o estilo interpretativo convencionado por
João Gilberto e demais compositores do período, e disseminá-lo em um
repertório orgânico e bem-sucedido no cenário comercial. Dessa soma de
fatores vem o reconhecimento de Tom Jobim como o papa da música brasileira
moderna (ibid, p. 41).
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Após o início da carreira musical em casas noturnas de Copacabana, em
1950, Tom Jobim passou a estudar orquestração e arranjo visando a ampliar
suas possibilidades. Nesse sentido, orientado pelo compositor Radamés Gnatalli
(1906-1988), em 1953 iniciou sua trajetória no rádio e, no ano seguinte, compôs
sua primeira obra de sucesso nesse meio de comunicação (Tereza da praia).
Antes mesmo da eclosão da Bossa Nova, o compositor já tinha respaldo
garantido no cenário musical nacional, quando verificamos o sucesso de obras
anteriores ao movimento, tais como Por causa de você, Sucedeu assim, Foi a
noite ou ainda Eu não existo sem você. De seus sucessos consagrados,
destacamos Samba de uma nota só, Água de beber, Wave e Garota de Ipanema.
Após reconhecimento nacional, sua consagração se deu na permanência
nos Estados Unidos após o icônico evento no Carnegie Hall para uma noite de
Bossa Nova, cuja finalidade consistia na apresentação do gênero para o público
norte-americano. Nos Estados Unidos, gravou álbuns como The Wonderful
World of Antonio Carlos Jobim, além do álbum dividindo espaço com Frank
Sinatra interpretando obras suas e de outros autores nacionais. Seria possível
indicar, a partir da internacionalização da carreira de Tom Jobim, que ele
personificou a sonoridade da música popular elaborada no Brasil do período,
especificamente àquela veiculada pela mídia com forte apelo comercial,
amplamente aceita no cenário nacional, conforme mencionamos anteriormente.
Chico Buarque, outro ícone desse momento da história da música
brasileira, é revelado na visibilidade oportunizada pelos Festivais da TV Record.
Depois da vitória com a música A banda, no Festival de 1966, sua imagem foi
amplamente veiculada como personificação dos festivais, tanto que, um dia após
a apresentação de sua música, “pelo menos Rio e São Paulo inteiros cantavam
A banda” (Zappa, 2011, p. 137). Era visto como o bom moço dos festivais; com
seus olhos azuis e sua jovialidade, acabou concentrando torcidas organizadas
ao seu redor, bem como uma multidão de fãs (ibid).
A obra de Chico Buarque tem facetas bastante distintas em que são
retratadas cenas cotidianas (exemplos: Cotidiano, Valsinha, Deixe a menina), e
a representação da mulher naquele contexto (exemplos: Olhos nos olhos; Com
açúcar, com afeto; Mil perdões). Além disso, poderíamos citar a presença, em
sua obra, da ideia do malandro boêmio (exemplos: Vai trabalhar vagabundo, Até
o fim, Quando o carnaval chegar), além do retrato da sociedade (exemplos: Bye
bye Brasil, Pivete, O meu guri, Construção).
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Para além dessas temáticas, Chico Buarque faz parte de uma geração de
compositores que incluiu o engajamento político em suas obras como prioridade,
se lembramos o contexto das canções engajadas. O compositor produziu obras
representativas que traduzem parte da oposição frente à ditadura e que
acabaram se convertendo em verdadeiros hinos de resistência, o que pode ser
visto em Apesar de você, Cálice, Meu caro amigo, O que será (a flor da terra),
Samba de Orly, Roda viva etc.
Por fim, poderíamos indicar que cada compositor, à sua maneira,
procurou se inserir no contexto de produção musical estabelecido
(estabelecimento que ajudaram a concretizar) do seu tempo. Enquanto, por
vezes, Tom Jobim era criticado pela ausência de preocupações políticas
evidentes em suas letras, já que estava preocupado com um contexto mais
global de criação (basta lembramos que durante boa parte da década de 1960
ele esteve produzindo nos Estados Unidos), Chico Buarque representou a
encarnação da canção de protesto. Como produto, a música, integrada ao
projeto estético e político, poderia ser entendida como a crítica “tanto da
mercantilização da cultura de modo geral quanto da transformação crítica social
e política em fórmulas prontas com objetivos comerciais” (Coelho, 2011, p. 123).
Aproveitaremos para estudar neste tópico o rock como estilo musical, sua
emancipação na década de 1970 e seus respectivos desdobramentos no Brasil
dos anos 1980. Há um potencial imenso de análise da produção do rock como
contracultura frente à estabelecida música popular brasileira de então.
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juvenil, às temáticas e à instrumentação que eram largamente criticadas pelos
intelectuais vinculados à MPB nacionalista. Além disso, visualizamos a Tropicália
e sua aura de rebeldia e liberdade na utilização de guitarras distorcidas e
estruturas formais que muito remetem ao rock como estilo. Portanto, seria
sensato dizer que, no Brasil, o rock não seria inaugurado na década de 1970,
pois vemos as inúmeras incoerências de estilos que acompanham a tendência
internacional desse produto musical.
Durante a década de 1960, o mercado juvenil de consumo cultural esteve
vinculado à produção musical nativa, bem como pelas ideologias nacionalistas
que se mobilizavam para caracterizar um cenário voltado à música popular
brasileira como ideário, além da própria rejeição, à época, da juventude de classe
média pelo rock (Ortiz, 1988). Além disso, as próprias classes consumidoras
ainda se consolidavam como público apreciador de determinados estilos
musicais, o que problematizava o estabelecimento coeso de cenários musicais
estáveis como o rock, à época considerado alienado.
É importante mencionar que, entre a crise discográfica do fim da década
de 1970 e o advento do rock dos anos 1980, o cenário do rock travou contato
direto com movimentos experimentais em que vários nomes de peso são
ressaltados: Mutantes, Secos e Molhados e chegando até mesmo nas
derivações instrumentais dos Novos Baianos. O rock no Brasil mostrou
efetivamente a que veio nessa transição para os anos 1980, firmando suas bases
no decorrer da década, bebendo na fonte do punk inglês e seu movimento de
contracultura contra o mainstream, traduzido pela música popular brasileira, que
à época havia se tornado artigo de consumo refinado divergente do contexto
social urbano.
A juventude da década de1980, entretanto, já não se via representada no
discurso nacional da música popular brasileira e, do mesmo modo, essa
juventude urbana já não tinha vínculo com aquela dos movimentos estudantis,
da esquerda, dos festivais, da canção engajada e da oposição contra a ditadura.
Eram jovens desenraizados de valores e obrigações nacionalistas e da
politização da cultura, conforme Ortiz (1994). Além disso, a crise oportunizada
pelo fim do governo militar, seguida da baixa internacional do mercado
fonográfico, encontrou na juventude desenraizada a oportunidade de um novo
público alvo para o rock como produto.
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Com esse cenário de um público promissor, o rock acaba sendo
incorporado como estilo musical pela população jovem brasileira. De acordo com
Groppo (2013, p. 174), seria possível dimensionar duas fases específicas do
ápice do rock nos anos 1980: a primeira compreendida entre os anos de 1983 e
1985. Esse momento, centrado no Rio de Janeiro, tem como característica a
acanhada adoção dos grupos pelas grandes gravadoras, receosas do sucesso
mercadológico e que, consequentemente, acabavam lançando LPs compactos.
Essa fase se traduz na abordagem de um rock mais leve, alegre e vestido em
cores vivas, então chamado de new wave brasileira (ibid). Desse grupo
poderíamos destacar bandas como Barão Vermelho e Blitz. Também é preciso
o Circo Voador enquanto espaço do fazer musical, assim como a Rádio
Fluminense e suas transmissões que contribuíram na divulgação do movimento.
A segunda fase compreende os anos de 1985 a 1987, momento de
consolidação do movimento, caracterizado pela mudança para o eixo São Paulo
– Distrito Federal. Deste período são destaques as bandas Titãs, RPM (em São
Paulo) e Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial (em Brasília). Com letras
retratando a realidade juvenil do período, por vezes com aguçadas críticas ao
contexto social, essas bandas estabeleceram o marco do rock nacional em um
momento impulsionado pelo consumo do brasileiro no Plano Cruzado, em sua
aquisição de aparelhos toca-discos e fitas cassete. A banda RPM aproveitou
esse momento da economia brasileira para, com shows modernos para a época
(equipamentos de áudio e iluminação), estabelecer turnês com milhões de
espectadores e o recorde de vendas de LPs.
O punk rock, derivação da corrente inglesa iniciada entre 1976-1977, no
Brasil ficou relegado à marginalia da corrente principal do rock comercial, um
impulso contra toda forma de repressão, ambicionando a liberdade contra toda
forma de controle. Na década de 1980, o lema “faça você mesmo”, incentivando
a criação de bandas (inclusive com certa despretensão estética e de
musicalidade), contribuiu para uma nova fase do punk nacional, autêntico em
relação às correntes internacionais. Pela marginalidade em relação ao rock
midiático, vários membros do movimento se desarticularam buscando refúgio no
rock em voga do período (Titãs, por exemplo) e, ainda hoje, o punk parece não
ter atingido um público mais geral. Destaque para a banda carioca Coquetel
Molotov.
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Vale ressaltar, do mesmo modo, os movimentos em São Paulo vinculados
ao meio universitário, produzindo uma mescla entre o rock, a música de concerto
e as novas propostas internacionais. Em uma espécie de senso de continuidade
das mesclas oportunizadas pelo Tropicalismo da década anterior, vinculando a
música popular, a música de concerto e o rock (Groppo, 2013, p. 175), podemos
citar Arrigo Barnabé e os artistas vinculados ao circuito estudantil de colégios e
faculdades, dentre os quais destacamos Itamar Assunção e o grupo Isca de
Polícia.
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feiras, da emissora de televisão Cultura. A ideia era dar espaço na rede televisiva
ao gênero e atingir, desse modo, um novo e abrangente público.
O mercado fonográfico de samba entrava em declínio na segunda metade
da década de 1970, e com isso certo vazio no mercado de música popular
acabou sendo gerado. O choro foi um estilo abraçado como produto de consumo
para esse momento, a partir da gravação dos artistas então em atividade, dentre
os quais citamos Abel Ferreira, Joel Nascimento, Paulo Moura e o conjunto de
Radamés Gnatalli (o mesmo maestro com quem Tom Jobim havia iniciado sua
carreira). Além disso, foi um momento oportuno para novas tiragens de discos
de gravações de choros de décadas anteriores, aquecendo, em certa medida, o
mercado e reinserindo o estilo nas rádios e na televisão (jingles, telenovelas).
De acordo com Valente (2014), vários grupos de choro formados por
gerações mais jovens passaram a divulgar o movimento, dentre eles Fina Flor
do Samba, Anjos da Madrugada, Os Carioquinhas e Galo Preto. Esses teriam
sido responsáveis pelo impulso em relação ao choro da década de 1970, alguns
deles tendo, inclusive, gravado discos para perpetuar o momento do estilo no
cenário nacional. Some-se a isso o espaço oportunizado pelos clubes do choro
que começaram a ser difundidos no país, uma espécie de local para apreciação
e mesmo iniciação no estilo, contando com shows, festivais, rodas de choro e
mesmo aulas.
Os encontros nacionais de choro contribuíram para consolidar e trazer
novamente o choro enquanto elemento definitivo no mercado musical brasileiro
da década de 1970. No Rio de Janeiro ocorreram três festivais, a partir de 1977,
com premiações para obras inéditas, e em São Paulo, a emissora Bandeirantes
elaborou dois festivais entre os anos de 1977 e 1978. Desses eventos, seria
possível destacar mais o aquecimento do cenário musical em torno do estilo, do
que propriamente um sentido de renovação do gênero, uma abordagem
tradicionalista, com poucos exemplos de inovação estética (Valente, 2014).
Quando falamos do jazz produzido no país, precisamos ter em mente que
a própria definição passa por delimitações, tensões e relaxamentos
característicos, em especial quando um gênero, já polivalente em seu país de
origem, passa a sofrer influência estilística do país em que será ressignificado.
Entretanto, Bezerra (2001) considera ser restritivo nomear o estilo como simples
execução das derivações jazzísticas norte-americanas com sotaque brasileiro.
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Em um primeiro momento, seria possível delimitar o jazz brasileiro como
a música instrumental brasileira contemporânea, executada por grupos
instrumentais concentrados no eixo São Paulo/Rio de Janeiro/Minas Gerais a
partir da década de 1970. Outro caminho seria apontar para uma música
improvisada segundo uma sintaxe jazzística com inflexão e ritmos brasileiros.
Entretanto, levando essa proposta em questão, deveríamos, do mesmo modo,
incluir o choro nessa estrutura, que desempenha papel semelhante, na cultura
instrumental brasileira, ao jazz nos Estados Unidos.
É fato que, ao levar o estilo em consideração, é preciso acatar a ideia de
uma somatória de concepções, abraçando um conceito de jazz brasileiro mais
aberto e menos restritivo. De acordo com Bezerra (2001), uma vez que o estilo
está calcado na intersecção de múltiplas influências, suas origens apontam para
diversas direções, dos antigos chorões, passando por Pixinguinha, e mesmo nas
orquestras de baile da década de 1940, por exemplo. Por fim, a indicação geral
aponta mais para um fator de brasilidade presente na prática instrumental dos
intérpretes e, mais importante, uma cadeia de influências existente entre os
musicistas associados ao estilo em si, a partir da interação e das consequentes
trocas.
Ao lembrar de alguns dos nomes importantes do jazz nacional, é
importante mencionar que a lista é significativa e conta com compositores de
renome. Citamos Hermeto Pascoal (1936) e Egberto Gismonti (1947) como
exemplos representativos desse senso de brasilidade, dessa busca pela mescla
e pela adaptação das práticas musicais com vias a uma ressignificação estética,
membros desse grupo em que é praticamente impossível rotular um único estilo
composicional e uma única prática instrumental. A obra desses dois
representantes da música instrumental brasileira do período é significativa e
merece apreciação cuidadosa por parte da comunidade musical, uma vez que
transitam, às vezes sem as demarcações precisas, entre os campos da música
popular, do jazz, da música de concerto e das experimentações livres.
Outra característica importante a ser destacada se relaciona com a
própria noção da formação instrumental: a prioridade na utilização,
historicamente consolidada, de certos instrumentos contribui para a delimitação
das formações instrumentais disponíveis que serão estabelecidas. A tradição
brasileira se dá pela utilização larga de instrumentos de sopro (sobretudo os
metais), assim como piano, violão e percussão, e diverge, portanto, de regiões
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do globo onde os instrumentos de arco são recorrentes nos ensembles
jazzísticos.
A última consideração de Bezerra (2001) reside no campo da elaboração
estética da produção jazzística no país. De acordo com o autor, nota-se certa
concisão, uma economia de meios no que toca ao processo criativo das obras,
traduzida em melodias breves e claramente desenhadas. O prolixo e o
ornamentado em excesso não são característicos da música brasileira pensada
para a formação instrumental jazzística.
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Com a emancipação do rádio como meio de comunicação e divulgação
musical, novos intérpretes de música rural passaram a ser incluídos nas
gravações e divulgados em vários polos da sociedade brasileira, dentre os quais
destacamos Alvarenga e Ranchinho, Caçula e Mariano. É importante ter em
mente o processo citado acima de negociações no campo da produção musical
do contexto, que pode ser visualizado na substituição do caráter essencialmente
regional da música rural para que esta se tornasse comercial, com a inclusão de
outros elementos musicais que a dotassem de elementos minimamente
reconhecíveis no cenário urbano. Tais tensões garantiram, de certo modo, a
divulgação da música sertaneja rural em um cenário mais abrangente ao longo
das décadas seguintes.
A década de 1960 vê surgir duplas representativas e que contrastam, em
certa medida, nas propostas e na temática, enfatizando, novamente, essa
divergência no processo de negociações em torno do gênero. Enquanto de um
lado temos duplas como Tião Carreiro e Pardinho e Tonico e Tinoco, cantando
as coisas da terra, do interior, acompanhados quase sempre da viola, de outro
encontramos a dupla Milionário e José Rico – atuantes no início da década de
1970 – cujo estilo se aproxima mais da realidade urbana, com instrumentação
que no sertanejo se assemelha ao country norte-americano, com temáticas
caras às décadas seguintes. Tratam-se de canções românticas e
melodramáticas que delimitaram concisamente a produção que seria referência
no mercado fonográfico brasileiro a partir dos anos 1980, representadas por
duplas como Xitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano, Leandro e
Leonardo, Jean e Giovani, dentre outras (Zan, 2005).
Há aqui o chamado projeto de modernização da música sertaneja, não
somente da instrumentação, associada ao quadro da música pop do período,
com bateria, baixo, teclados e guitarra, além dos arranjos associados à música
de massa, assim como na própria imagem das duplas intérpretes. A
modernização do sertanejo pode ser visualizada, do mesmo modo, na
significativa alteração da imagem do sertanejo caipira, que antes usava o chapéu
de palha e andava mal vestido e agora se vê usando roupas de grife e sendo
disputado pelas grandes gravadoras de disco. Todo esse cenário de forte apelo
comercial tem como objetivo atingir o consumidor final, cada vez mais ávido por
novidade, um público suscetível à modernização da música sertaneja (Zan,
2005).
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Do período de 1980 até a década seguinte, essa seria a fórmula de
sucesso do sertanejo urbano, alinhado aos principais meios de comunicação,
angariando ampla aceitação da sociedade brasileira. Em meados da década de
1990, entretanto, surge um movimento de revitalização e novas negociações
com sertanejo rural, dessa vez com elementos diversificados à cultura musical
do cenário urbano. No eixo Rio/São Paulo temos o surgimento de grupos que
alinham o formato bando com elementos da música sertaneja rural, utilizando,
para tanto, gêneros como a moda e viola, a catira e o jongo.
Desse contexto, podemos destacar grupos como Matuto Moderno (a
própria denominação do grupo já indica a presença do vocabulário caipira, o
matuto, equivalente ao indivíduo esperto, experiente), mesclando elementos dos
ponteios de viola, além de obras tradicionais do repertório de música rural.
Outros grupos paulistas, como Mercado de Peixe, Sacicriolo e Caboclada,
mesclaram elementos da música rural como o movimento mangue beat, então
em voga na época.
Entretanto, é preciso indicar que a exemplo do punk no movimento do rock
nacional da década de 1980, esses conjuntos se agruparam em movimento
secundário, afastados do circuito das grandes gravadoras e dos meios de massa
e grande alcance. A produção e divulgação dos trabalhos desse movimento de
ressignificação da música sertaneja rural esteve vinculada, em grade medida,
aos selos independentes e ao cenário underground.
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recessão pré-redemocratização, em somatória com a abertura do país para
relações econômicas internacionais. A busca pelo reestabelecimento de uma
conjuntura de recuperação do dinamismo comercial buscava, nesse período,
ampliar um cenário industrial que necessitava ser competitivo. Entretanto, esse
processo de modernização industrial indiscriminada (somado à sobrevalorização
cambial a partir de 1994 com o Plano Real) acabou por contribuir ainda mais
para a deterioração do já desgastado mercado de trabalho nacional (Mello;
Novais, 1998).
Essa conjuntura, somada ao inchaço das cidades, levou ondas de
migrantes e cidadãos estabelecidos à categoria de subempregados e
desempregados. Do mesmo modo, à multiplicação de empregos de pior
qualidade somou-se a violência de ocupações promovidas pelo baixo
crescimento, agora combinado com a modernização da sociedade. Taxas de
desemprego crescentes acompanham, de maneira inversamente proporcional,
o decrescente quadro de mobilidade social, um cenário de desgaste do tecido
social, já fragilizado (Henrique, 1999, p. 178).
O movimento hip hop (união da dança – break; das artes plásticas –
grafite; e da música – rap) pode ser considerado um movimento que, apesar da
coesão e unificação verificado no movimento norte-americano da década de
1970, tem como base comum a difusão em outros polos ao longo dos anos
seguintes. Isso se dá em função da sua imersão no cenário local como referência
para a experiência artística, uma resposta às necessidades e reivindicações
desses grupos no contexto social. Exatamente com essa perspectiva, podemos
visualizar esse movimento cultural enraizado em realidades carentes, como é o
caso da periferia dos grandes centros urbanos no Brasil.
De acordo com Silva (1998), o desenvolvimento do rap paulistano tem
esses elementos intrínsecos ao contexto social, consequência da ação de jovens
descendentes da geração de migrantes residentes nos bairros periféricos. Esses
indivíduos experienciaram novas formas de exclusão em meio ao processo de
reestruturação econômica brasileira do período, que foi traduzida em
desemprego, consequente violência policial e racismo.
Na São Paulo dos anos 1980, o movimento hip hop ganhou espaço ligado,
naturalmente, às comunidades de periferia. Nelson Triunfo pode ser considerado
um dos pioneiros do movimento, um pernambucano que dançava break nas ruas
do centro da capital; nos bailes de periferia, os jovens ouviam James Brown,
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dançavam break e passaram a ter contato com o rap norte-americano. É na
permanência das práticas vinculadas aos bailes black music do final dos anos
1970 que percebemos, em certa medida, a continuidade que resultou no
movimento hip hop (Carmo, 2001). É nessa retrospectiva que vemos surgir
grupos como Thaíde e Dj Hum, bem como os Racionais Mc’s.
Com temática impactante, os jovens produtores do rap como
manifestação musical narram situações cotidianas vivenciadas pelo grupo social
a partir do vernacular utilizado nos morros, nas ruas e favelas. Poderia ser
entendido como uma reação dos jovens de periferia aos processos sociais nos
quais estão inseridos, retratando espaços fragilizados, cenários de baixa
escolaridade e violência, locais onde ainda hoje o Estado não efetivou políticas
sociais de inclusão.
Em relação ao estilo musical, indicamos a aproximação musical do rap
com o funk – bases eletrônicas, samples, influência da música negra norte-
americana. No movimento hip hop, a música (em especial as letras) transforma-
se em veículo de informação e denúncia. Apesar da semelhança quanto à origem
das influências, o rap se torna específico à medida que oportuniza a inserção
dos jovens da periferia na sociedade por meio de um discurso politizado e crítico,
elaborando ações sociais de protesto e construção para além da exclusiva
denúncia das estruturas vigentes.
Por fim, é possível indicar que a cultura hip hop da década de 1990
contribuiu para a criação de uma identidade jovem negra delimitada e com sólido
alicerce em valores tradicionais, introduzindo conceitos como os de cidadania e
de perspectiva de construção do futuro. De maneira geral, as letras dos rappers
orientam para a criação desse cenário construtivo, de outros caminhos para além
da frágil realidade visualizada cotidianamente. Um dos depoimentos de MV Bill
são esclarecedores nesse aspecto, já que, de acordo com ele, os negros
precisam entender que é possível lutar pelo estudo, além da ideia de que, para
ser bem-sucedido sendo negro, as únicas alternativas são a prática do futebol
ou da arte. “Eles têm que conseguir ocupar o espaço que agora é só do playboy”
(Carmo, 2001, p. 187).
NA PRÁTICA
FINALIZANDO
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REFERÊNCIAS
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VALENTE, P. Transformações no choro no século XXI: estruturas,
performance e improvisação. 2014, 343f. Tese (Doutorado em Música)
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.
ZAPPA, R. Para seguir minha jornada: Chico Buarque. Rio de Janeiro: Editora
Nova Fronteira Participações S.A., 2011.
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