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ESPECIAL 03
TEMA: A DIFÍCIL INCLUSÃO DIGITAL NA TERCEIRA IDADE
TEXTO 01 TEXTO 02
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TEXTO 04
Fonte: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/23445-pnad-continua-tic-
-2017-internet-chega-a-tres-em-cada-quatro-domicilios-do-pais
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1. (UNCISAL/2019) os astros
Algumas comidas curam, outras condenam o me- os mortos
tabolismo. Inúmeras enfermidades estão associa- as ideias
das aos vários tipos de alimentos. Assim como o o sonho
sal é proibitivo para quem sofre de problemas car- o passado
o mais que futuro
diovasculares e o açúcar é fatal para o diabético,
leites e derivados, por exemplo, embora naturais,
Escolhe teu diálogo
vêm se mostrando diretamente relacionados a
e
doenças crônicas e prosaicas, como a asma. Ma- tua melhor palavra
nifestada a doença, o passo seguinte é consumir ou
remédios para neutralizar sua ação. Para a química teu melhor silêncio
Conceição Trucom, que estuda temas voltados à Mesmo no silêncio e com o silêncio
alimentação natural, esse é um caminho perigoso: dialogamos.
“A doença nos indica que algo está errado. Deverí-
amos enxergá-la não como uma inimiga que deve (Carlos Drummond de Andrade. Discurso de primavera e algumas
sombras, 1977.)
ser combatida, mas sim como uma amiga sincera,
que tem coragem de nos dizer que alguma coisa
O silêncio é a matéria significante por excelência,
está errada”. Quando a doença aparece, é hora de um continuum significante. O real da comunicação
entender a quais fatores ela está relacionada e fa- é o silêncio. E como o nosso objeto de reflexão é
zer uma investigação minuciosa da alimentação. o discurso, chegamos a uma outra afirmação que
Disponível em: http://planetasustentavel.abril.com.br. Acesso em: 1 sucede a essa: o silêncio é o real do discurso.
nov. 2018 (adaptado). O homem está “condenado” a significar. Com ou
sem palavras, diante do mundo, há uma injunção
No texto anterior, garante a progressão textual à “interpretação”: tudo tem de fazer sentido (qual-
quer que ele seja). O homem está irremediavelmen-
a) a comparação da doença a uma amiga. te constituído pela sua relação com o simbólico.
b) a estruturação do texto em um único parágrafo. Numa certa perspectiva, a dominante nos estudos
c) o emprego das aspas para destacar a fala da dos signos, se produz uma sobreposição entre lin-
química. guagem (verbal e não-verbal) e significação.
d) o emprego das expressões “Assim como” e “o Disso decorreu um recobrimento dessas duas no-
passo seguinte”. ções, resultando uma redução pela qual qualquer
e) a menção a uma pessoa de referência na área de matéria significante fala, isto é, é remetida à lingua-
conhecimento tratada no texto. gem (sobretudo verbal) para que lhe seja atribuído
sentido.
2. (UNIFESP/2013) Nessa mesma direção, coloca-se o “império do ver-
bal” em nossas formas sociais: traduz-se o silêncio
O constante diálogo em palavras. Vê-se assim o silêncio como lingua-
gem e perde-se sua especificidade, enquanto ma-
Há tantos diálogos téria significante distinta da linguagem.
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Ao ler “Mercado Público”, pode-se dizer que
3. (G1 – IFSC/2011 - Adaptada)
a) no texto, o termo “manezinhos”, refere-se àque-
Mercado Público les visitantes que vêm do interior para visitar o
Mercado Público e a capital do Estado.
A totalidade da construção conta com 140 boxes, Rap: uma linguagem dos guetos
onde encontramos roupas, utensílios, alimentos e
trabalhos de artesanato em cerâmica, palha e vime. Entre as vozes que se cruzam na cacofonia urbana
O prédio, com os diversos bares do vão central, é da sociedade globalizada, há uma que se sobres-
um ponto de encontro, tanto para os nativos, quan- sai pela sua radicalidade marginal: o rap. A moder-
to para os turistas, bem como palco de manifesta- na tradição negra dos guetos norte-americanos é,
ções populares. hoje, cantada pelos jovens das periferias de todos
os quadrantes do globo. Mas diferentemente das
Lá, o visitante pode se deliciar com diversos pratos estereotipias produzidas pela nação hegemônica e
da gastronomia local, com destaque para a porção difundidas em escala planetária, a cultura hip-hop
de camarão e de peixe frito, sempre acompanhado costuma ser assimilada como uma fala histórica
de um chope gelado. Este, inclusive é um dos pro- essencialmente crítica por uma juventude com tão
gramas mais populares entre os manezinhos que, escassas vias de fuga ao sempre igual. Quando,
frequentemente, se encontram no local para cur- por exemplo, jovens de uma favela brasileira incor-
tir uma tarde animada com muito samba e pago- poram esta linguagem tornada universal, por mais
de, discutir política, jogar dominó ou apenas bater que a sua realidade seja diferente daquela dos mar-
papo com os amigos e conhecidos. ginalizados do país de origem, a forma permanece
associada a um conteúdo crítico – uma visão de
Dizem que o Mercado Público é um dos espaços mundo subalterna e frequentemente subversiva.
mais democráticos da Ilha, talvez pelo fato de reu- 1O rap é hoje uma forma de expressão comunitá-
nir em um só endereço artistas, políticos, boêmios ria, por meio da qual se comunicam e afirmam sua
e pessoas simples, sem distinção. O vão do Mer- identidade habitantes dos morros e comunidades
cado Público também é usado para apresentações populares. /.../
folclóricas. Em uma visita ao local, o visitante pode O surgimento do movimento hip-hop nos remete
se deparar com boi de mamão, maricota, maracatu ao contexto no qual estavam inseridos os Estados
e muitas outras expressões da cultura regional. Unidos dos anos 60 e 70, no auge da Guerra Fria.
Foram anos de tensão e muita agitação política. 2O
Fonte: Guia Floripa. Disponível em <http://www.guiafloripa.com. descontentamento popular com a guerra do Vietnã
br/turismo/patrimonio/mercado.php3>. Acesso em: 19. jul. 2010
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somava-se à pressão das comunidades negras se- tes (consumismo, individualismo e exaltação da
gregadas, 3submetidas a leis similares às do apar- vida privada), como a maioria das canções ditas
theid sul-africano. O clima de revolta e inconfor- “de massa”.
mismo tomava conta dos guetos negros.
/.../ (COUTINHO, Eduardo Granja, ARAÚJO, Marianna. Rap: uma lin-
Na trilha da agitação política ocorriam inovações guagem dos guetos. In: PAIVA, Raquel, TUZZO, Simone Antoniaci
(Orgs.). Comunidade, mídia e cidade: possibilidades comunitárias
culturais. Nos guetos, o que se ouvia era o soul,
na cidade hoje. Goiânia: FIC/UFG, 2014.)
que foi importante para a organização e conscien-
tização daquela população. /.../ No mesmo perío-
Considerando o contexto em que foi empregada, a
do surge uma variedade de outros ritmos, como
expressão “cultura de rua” (ref. 8) pode ser defini-
o funk, marcados por pancadas poderosas que
da como
causavam estranhamento aos brancos, letras que
invocavam a valorização da cultura negra e 4de-
a) conjunto de ritmos musicais típicos dos guetos
nunciavam as condições às quais eram submetidas
negros dos anos de 1960 e 1970.
as populações dos guetos. O soul e o funk foram
b) dança apresentada nas ruas, cujos movimentos
as bases musicais que permitiram o surgimento do
lembram os passos de um robô.
rap, que virá a ser um dos elementos do movimen-
c) conjunto de artes (música, dança e grafite) que
to hip-hop.
se expressa no espaço público, na rua.
5Por essa época ou um pouco antes, jovens negros
d) linguagem artística que mistura vários ritmos,
já dançavam [o break] nas ruas ao som do soul e
como o funk, o samba e a embolada.
do funk de uma forma inovadora, executando pas-
e) mainstream, bastante ouvida pela burguesia e
sos que lembravam ao mesmo tempo uma luta e os
pelos chamados hipsters.
movimentos de um robô. /.../
Finalmente, 6além da música e da dança, propaga-
5. (ENEM – PPL/2016)
va-se pelos guetos, ainda, o hábito de desenhar e
escrever em muros e paredes. /.../ Nesse contexto
Argumento
de efervescência político-cultural, grafiteiros, bre-
akers e rappers começaram a se reunir para realizar
Tá legal
eventos juntos, 7afinal suas artes estavam relacio-
Eu aceito o argumento
nadas a uma experiência comum, a 8cultura de rua.
Mas não me altere o samba tanto assim
/.../
Olha que a rapaziada está sentindo a falta
9Por volta de 1982, o rap chegou ao Brasil, fixando-
De um cavaco, de um pandeiro e de um tamborim
-se, sobretudo, em São Paulo. /.../
Nos últimos anos da década de 90, o rap brasilei-
Sem preconceito
ro ultrapassou os limites da periferia dos grandes
Ou mania de passado
centros e chegou à classe média. /.../ 10O rap de
Sem querer ficar do lado
caráter mais comercial passou então a ser ampla-
De quem não quer navegar
mente difundido pelo país, ao mesmo tempo em
Faça como o velho marinheiro
que, em sua forma marginal, a linguagem continua-
Que durante o nevoeiro
va a se desenvolver nos espaços populares.
Leva o barco devagar.
Há que se destacar o caráter inovador do rap na-
cional, que reelabora, de forma criadora, a partir PAULINHO DA VIOLA. Disponível em: www.paulinhodaviola.com.
de tradições populares brasileiras, a linguagem dos br. Acesso em: 6 dez. 2012.
guetos norte-americanos, mesclando o ritmo do
Bronx a gêneros como o samba e a embolada. Na letra da canção, percebe-se uma interlocução.
/.../ A posição do emissor é conciliatória entre as tradi-
Não se trata, no entanto, de idealizar o hip-hop ções do samba e os movimentos inovadores desse
como forma de conhecimento. 11O movimento, se- ritmo. A estratégia argumentativa de concessão,
guramente, não é homogêneo: possui tendências nesse cenário, é marcada no trecho
mais ou menos politizadas, mais ou menos enga-
jadas e críticas. Há, por assim dizer, uma vertente a) “Mas não me altere o samba tanto assim”.
cuja tônica é a denúncia, a agitação e o protesto. b) “Olha que a rapaziada está sentindo a falta”.
Outra, espontânea, sem uma linha política coeren- c) “Sem preconceito / Ou mania de passado”.
te e definida. 12E outra ainda, talvez hegemônica, já d) “Sem querer ficar do lado / De quem não quer
assimilada pelo mercado, que reproduz o modelo navega”.
de comportamento, aspirações e ideais dominan- e) “Leva o barco devagar”.
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6. (ENEM PPL/2016) Ao ler a canção, pode-se inferir que
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velas se fazem com saberes exatos sobre tecidos, navega pelos mares. Nos porões estão os remado-
cordas e ventos, instrumentos de navegação não res. Remam com precisão cada vez maior. A cada
informam mais ou menos. Assim, eles se tornaram novo dia recebem novos, mais perfeitos. O ritmo da
cientistas, especialistas, cada um na sua – juntos remadas acelera. Sabem tudo sobre a ciência do
para navegar. remar. A galera navega cada vez mais rápido. Mas,
perguntados sobre o porto do destino, respondem
Chegou então o momento de grande decisão – os remadores: O porto não nos importa. O que im-
para onde navegar. Um sugeria as geleiras do sul do portada é a velocidade com que navegamos.
Chile, outro os canais dos fiordes da Noruega, um
outro queria conhecer os exóticos mares e praias C Wright Mills usou esta metáfora para descrever
das ilhas do Pacífico, e houve mesmo quem quises- a nossa civilização por meio duma imagem plásti-
se navegar nas rotas de Colombo. E foi então que ca: multiplicam-se os meios técnicos e científicos
compreenderam que, quando o assunto era a es- ao nosso dispor, que fazem com que as mudanças
colha do destino, as ciências que conheciam para sejam cada vez mais rápidas; mas não temos ideia
nada serviam. alguma de para onde navegamos. Para onde? So-
mente um navegador louco ou perdido navegaria
De nada valiam, tabelas, gráficos, estatísticas. Os sem ter ideia do para onde. Em relação à vida da
computadores, coitados, chamados a dar seu pal- sociedade, ela contém a busca de uma utopia. Uto-
pite, ficaram em silêncio. Os computadores não pia, na linguagem comum, é usada como sonho im-
têm preferências – falta-lhes essa sutil capacidade possível de ser realizado. Mas não é isso. Utopia é
de gostar, que é a essência da vida humana. Per- um ponto inatingível que indica uma direção.
guntados sobre o porto de sua escolha, disseram
que não entendiam a pergunta, que não lhes im- Mário Quintana explicou a utopia com um verso: Se
portava para onde se estava indo. as coisas são inatingíveis... ora!/ não é um motivo
para não querê-las... Que tristes os caminho, se não
Se os barcos se fazem com ciência, a navegação fa- fora/ A mágica presença das estrelas! Karl Man-
z-se com sonhos. Infelizmente a ciência, utilíssima, nheim, outro sociólogo sábio que poucos leem, já
especialista em saber como as coisas funcionam, na década de 1920 diagnosticava a doença da nos-
tudo ignora sobre o coração humano. É preciso sa civilização: Não temos consciência de direções,
sonhar para se decidir sobre o destino da navega- não escolhemos direções. Faltam-nos estrelas que
ção. Mas o coração humano, lugar dos sonhos, ao nos indiquem o destino.
contrário da ciência, é coisa preciosa. Disse certo
poeta: Viver não é preciso. Primeiro vem o impreci- Hoje, ele dizia, as únicas perguntas que são feitas,
so desejo. Primeiro vem o impreciso desejo de na- determinadas pelo pragmatismo da tecnologia (o
vegar. Só depois vem a precisa ciência de navegar. importante é produzir o objeto) e pelo objetivis-
mo da ciência (o importante é saber como funcio-
Naus e navegação têm sido uma das mais pode- na), são: Como posso fazer tal coisa? Como posso
rosas imagens na mente dos poetas. Ezra Pound resolver este problema concreto em particular? E
inicia seus Cânticos dizendo: E pois com a nau no conclui: E em todas essas perguntas sentimos o
mar/ assestamos a quilho contra as vagas... Cecília eco intimista: não preciso de me preocupar com o
Meireles: Foi, desde sempre, o mar! A solidez da todo, ele tomará conta de si mesmo.
terra, monótona/ parece-nos fraca ilusão! Quere-
mos a ilusão do grande mar / multiplicada em suas Em nossas escolas é isso que se ensina: a preci-
malhas de perigo. E Nietzsche: Amareis a terra de sa ciência da navegação, sem que os estudantes
vossos filhos, terra não descoberta, no mar mais sejam levados a sonhar com as estrelas. A nau na-
distante. Que as vossas velas não se cansem de vega veloz e sem rumo. Nas universidades, essa
procurar esta terra! O nosso leme nos conduz para doença assume a forma de peste epidêmica: cada
a terra dos nossos filhos... Viver é navegar no gran- especialista se dedica com paixão e competência,
de mar! a fazer pesquisas sobre o seu parafuso, sua polia,
sua vela, seu mastro.
Não só os poetas: C. Wright Mills, um sociólogo sá-
bio, comparou a nossa civilização a uma galera que Dizem que seu dever é produzir conhecimento. Se
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forem bem-sucedidas, suas pesquisas serão publi- 9. (ENEM LIBRAS/2017)
cadas em revistas internacionais. Quando se lhes
pergunta: Para onde seu barco está navegando?,
eles respondem: Isso não é científico. Os sonhos
não são objetos de conhecimento científico.
E assim ficam os homens comuns abandonados
por aqueles que, por conhecerem mares e estrelas,
lhes poderiam mostrar o rumo. Não posso pensar
a missão das escolas, começando com as crianças
e continuando com os cientistas, como outra que
não a da realização do dito poeta: Navegar é preci-
so. Viver não é preciso.
É necessário ensinar os precisos saberes da nave-
gação enquanto ciência. Mas é necessário apontar
com imprecisos sinais para os destinos da navega-
ção: A terra dos filhos dos meus filhos, no mar dis-
tante... Na verdade, a ordem verdadeira é a inversa.
Primeiro, os homens sonham com navegar. Depois
aprendem a ciência da navegação. É inútil ensinar
a ciência da navegação a quem mora nas monta-
nhas.
O meu sonho para a educação foi dito por Bache-
lard: O universo tem um destino de felicidade. O
homem deve reencontrar o Paraíso. O paraíso é o
jardim, lugar de felicidade, prazeres e alegrias para
os homens e mulheres. Mas há um pesadelo que
me atormenta: o deserto. Houve um momento em Essa tirinha revela que um dos impactos sociais
que se viu, por entre as estrelas, um brilho chama- provenientes do uso das Tecnologias de Informa-
do progresso. Está na bandeira nacional... E, qui- ção e Comunicação tem como consequência o(a)
lha contra as vagas, a galera navega em direção
ao progresso, a uma velocidade cada vez maior, e a) falta de percepção da realidade.
ninguém questiona a direção. E é assim que as flo- b) crítica da sociedade aos poderes midiáticos.
restas são destruídas, os rios se transformam em c) contestação das informações disponibilizadas.
esgotos de fezes e veneno, o ar se enche de gases, d) questionamento sobre a reputação das grandes
os campos se cobrem de lixo – e tudo ficou feio e mídias.
triste. e) indignação do telespectador com os meios de
comunicação.
Sugiro aos educadores que pensem menos nas
tecnologias do ensino – psicologias e quinquilha- 10. (G1 – CFTMG/2017 - Adaptada)
rias – e tratem de sonhar, com os seus alunos, so-
nhos de um Paraíso. O Facebook é, de longe, a maior rede da história
da humanidade. Nunca existiu, antes, um lugar
Obs.: O texto foi adaptado às regras do Novo Acor- onde bilhão de pessoas se reunissem – e milhões
do Ortográfico. entrassem todo santo dia (só no Brasil, milhões).
Metade de todas as pessoas com acesso à internet,
No remate do texto, o autor insinua que as tecno- no mundo, entra no Facebook pelo menos uma vez
logias de ensino com que tanto de preocupam os
por mês. Ele tem mais adeptos do que a maior das
educadores devem ser
religiões (a católica, com bilhão de fiéis), e mais
a) ignoradas. usuários do que a internet inteira tinha dez anos
b) idealizadas. atrás. Em suma: é o meio de comunicação mais
c) desprezadas. poderoso do nosso tempo, e tem mais alcance do
d) relativizadas. que qualquer coisa que já tenha existido. A maior
e) glorificadas. parte das pessoas o adora, não consegue conce-
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ber a vida sem ele. Também pudera: o Facebook bem-estar de seus familiares, por meio de um con-
é ótimo. Nos aproxima dos nossos amigos, ajuda tato direto com os profissionais que os assistem.
a conhecer gente nova e acompanhar o que está c) se aproximem mais dos especialistas de sua
acontecendo nos nossos grupos sociais. Mas essa confiança, podendo tirar dúvidas e conferir os ser-
história também tem um lado ruim. Novos estudos viços oferecidos em seu plano de assistência médi-
estão mostrando que o uso frequente do Facebook co-hospitalar, sem sair de casa.
produz alterações físicas no cérebro. Quando esta- d) compartilhem os resultados das investigações a
mos nele, ficamos mais impulsivos, mais narcisis- que foram submetidas, e até mesmo o tipo sanguí-
tas, mais desatentos e menos preocupados com os neo nas redes sociais, para que sejam orientadas
sentimentos dos outros. E, de quebra, mais infeli- quanto aos melhores tratamentos e a quem podem
zes. recorrer.
e) socializem com sua rede de amigos uma lista
SANTI, A. Superinteressante, ed. 348, jun. 2015. Disponível em: de personagens renomadas na área médica e de
<http://super.abril.com.br/tecnologia/>. Acesso em: 27 de set. sistemas de saúde que são considerados os mais
2016. (Fragmento).
atualizados.
11. (EBMSP/2017)
a) possam acompanhar, de forma mais sistemática, Texto adaptado. Disponível em: <http://noticias.band.uol.com.br/
a sua saúde, tendo acesso mais rápido e prático cidades/noticia/100000816630/medico-debocha-depaciente-
aos seus médicos e seus exames. -na-internet-e-e-demitido-de-hospital.html>. Acesso em: 07 nov.
b) tenham maior possibilidade de estar atentas ao 2016.
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A língua varia no tempo, no espaço e em diferentes Que eu penso
classes socioculturais, assim, a atitude do médico Me parecem iguais
demonstra Oh! Oh! Oh!
Texto II
14. (UFJF-PISM/2017)
Texto I
Estorvo (fragmento)
A televisão
Vejo tumulto defronte ao edifício do meu amigo.
(Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Belloto)
Aglomeração, um camburão, duas joaninhas, um
rabecão, vários carros de reportagem, guardas des-
A televisão
viando o trânsito. No meio do povo, compreendo
Me deixou burro
que houve um crime, alguém morreu esfaqueado
Muito burro demais
e estrangulado. Vem chegando a sirene de um se-
Oh! Oh! Oh!
gundo camburão, e o empurra-empurra acaba por
Agora todas coisas
10
me levar ao miolo do acontecimento. Uma corda Os textos I e II possibilitam a reflexão sobre a TV
vermelha isola a calçada do velho prédio, forman- como meio de comunicação. Os enfoques de cada
um desses textos são, respectivamente, sobre:
do uma espécie de ringue. A televisão entrevista
a) a recepção e a produção.
o zelador sob a marquise da portaria. Deve estar b) o canal e o referente.
ruim de filmar, pois o zelador olha para o chão e c) o código e a mensagem.
não fala direito, parece um condenado. Penso que d) o sinal e a recepção.
é ele o criminoso, mas em seguida me convenço e) o símbolo e a entrevista.
de que está somente muito envergonhado pelo seu
edifício. O repórter pergunta se a vítima costumava 15. (ENEM-PPL/2016)
receber rapazes, e o zelador faz sim com a cabe-
Baião é um ritmo popular da Região Nordeste do
ça, mais confessando que assentindo. A entrevista
Brasil, derivado de um tipo de lundu, denomina-
é prejudicada por uma baixinha com cara de ín-
do “baiano”, cujo nome é corruptela. Nasceu sob
dia e lenço na cabeça, que se desvencilha de um a influência do cantochão, canto litúrgico da Igre-
policial e investe contra o zelador, gritando “diga ja Católica praticado pelos missionários, e tornou-
que conhece meu filho, miserável!”. O policial le- -se expressiva forma modificada pela inconsciente
vanta a índia baixinha e deposita-a fora do cordão influência de manifestações locais. Um dos gran-
de isolamento. Ela passa outra vez sob o cordão e des sucessos veio com a música homônima, Baião
agora se dirige ao público. Diz “não tem televisão (1946), de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.
aí?” e diz “ninguém vai me entrevistar?”. Um rapaz CASCUDO, C. Dicionário do folclore brasileiro. Rio de Janeiro:
que se apresenta como repórter do Diário Vigilante Ediouro, 1998 (adaptado).
pergunta o que fazia o suspeito no local do crime.
Ela diz “que suspeito o quê” e “que local do cri- Os elementos regionais que influenciaram cultural-
mente o baião aparecem em outras formas artísti-
me o quê”, e diz “meu filho veio me ver, foi detido
cas e podem ser verificados na obra
entrando no prédio, se fosse suspeito estaria fu-
a)
gindo”, e diz “onde é que já se viu suspeito fugir
para dentro?”. Sem mais nem mais, começo a ficar
a favor da mãe índia. O do Diário Vigilante vai fa-
zer outra pergunta, mas ela o interrompe e diz que
trabalha no 204 há quinze anos, que todo mundo
sabe quem ela é, que aquele miserável ali conhece
o filho dela e não o defende porque tem precon-
ceito de cor. Vai atacar de novo o zelador, mas é
suspensa pelo policial. Outro repórter de tevê in-
daga ao zelador se a vítima era homossexual. O
b)
zelador resmunga “isso aí eu não sei porque nunca
vi”. A índia responde à Rádio Primazia que pren-
deram o filho porque ele estava sem documento.
Diz “meu filho estava voltando da praia, não é cri-
me ir na praia, ninguém vai na praia com carteira
de trabalho metida no calção”. Um sujeito atrás de
mim diz que também é de jornal e pergunta “afi-
nal a bichona era artista ou o quê?”. Ela responde
“a bichona sei lá, parece que era professor de gi-
nástica”. Aproxima-se o repórter da TV Promontó-
rio dizendo “ouvimos também a mãe do principal
suspeito”. Aí a índia perde a razão, agarra as lape-
c)
las do repórter e desata a chorar no microfone e
berrar “ele não é criminoso!, meu filho é um moço
decente!”, mas o cameraman, que está trepado no
capô da camionete, grita “não valeu, não gravou
nada, troca a bateria!”. A índia para de chorar, olha
para o setor da imprensa e diz “imagine meu filho,
que até é doente, estrangulando um professor de
ginástica”. Volta o repórter da TV Promontório e
pede-lhe para repetir a fala anterior, que ele achou
bem forte.
BUARQUE, Chico. Estorvo. São Paulo: Cia. das Letras, 1991.
11
d) 17. (G1 – CMRJ/2018)
e)
12
19. (UFPE/2005) gua está aí, inteira: a estrutura gramatical não mu-
dou, a pronúncia é ainda inteiramente nossa, e o
TEXTO 1 vocabulário é mais de 99% de fabricação nacional.
Uma atitude mais construtiva é, pois, reconhecer
A língua do Brasil amanhã os fatos, aceitar nossa língua como ela é, e des-
frutar dela em toda a sua riqueza, flexibilidade, ex-
Ouvimos com frequência opiniões alarmantes a pressividade e malícia.
respeito do futuro da nossa língua. Às vezes se diz (Mário A. Perini. A língua do Brasil amanhã e outros mistérios. São
Paulo: Parábola Editorial, 2004, pp. 11-24. Adaptado).
que ela vai simplesmente desaparecer, em bene-
fício de outras línguas supostamente expansionis-
TEXTO 2
tas (em especial o inglês, atual candidato número
um a língua universal); ou que vai se misturar com
Não há dúvida que as línguas se aumentam e al-
o espanhol, formando o “portunhol”; ou, simples-
teram com o tempo e as necessidades dos usos e
mente, que vai se corromper pelo uso da gíria e das
costumes. Querer que a nossa pare no século de
formas populares de expressão (do tipo: o casaco
quinhentos é um erro igual ao de afirmar que a sua
que cê ia sair com ele tá rasgado). Aqui pretendo
transplantação para a América não lhe inseriu ri-
trazer uma opinião mais otimista: a nossa língua,
quezas novas. A esse respeito, a influência do povo
estou convencido, não está em perigo de desapa-
é decisiva. Há, portanto, certos modos de dizer, lo-
recimento, muito menos de mistura. Por outro lado
cuções novas, que de força entram no domínio do
(e não é possível agradar a todos), acredito que
estilo e ganham direito de cidade.
nossa língua está mudando, e certamente não será
Mas isto é um fato incontestável, e se é verdadeiro
a mesma.
o princípio que dele se deduz, não me parece acei-
O que é que poderia ameaçar a integridade ou a
tável a opinião que admite todas as alterações da
existência da nossa língua? Um dos fatores, fre-
linguagem, ainda aquelas que destroem as leis da
quentemente citado, é a influência do inglês - o
sintaxe e a essencial pureza do idioma. A influência
mundo de empréstimos que andamos fazendo
popular tem um limite; e o escritor não está obri-
para nos expressarmos sobre certos assuntos.
gado a receber e a dar curso a tudo o que o abuso,
Não se pode negar que o fenômeno existe; o que
o capricho e a moda inventam e fazem correr. Pelo
mais se faz hoje em dia é surfar, deletar ou tratar
contrário, ele exerce também uma grande parte de
do marketing. Mas isso não significa o desapareci-
influência a este respeito, depurando a linguagem
mento da língua portuguesa. Empréstimos são um
do povo e aperfeiçoando-lhe a razão.
fato da vida, e sempre existiram. Hoje pouca gente
Feitas as exceções devidas, não se leem muito os
sabe disso, mas avalanche, alfaiate, tenor e pingue-
clássicos no Brasil. Entre as exceções, poderia eu
-pongue são palavras de origem estrangeira; hoje
citar até alguns escritores cuja opinião é diversa da
já se naturalizaram, e certamente ninguém vê ame-
minha neste ponto, mas que sabem perfeitamente
aça nelas.
os clássicos. Em geral, porém, não se leem, o que é
Quero dizer que não há o menor sintoma de que os
um mal. Escrever como Azurara ou Fernão Mendes
empréstimos estrangeiros estejam causando lesões
seria hoje um anacronismo insuportável. Cada tem-
na língua portuguesa; a maioria, aliás, desaparece
po tem seu estilo.
em pouco tempo, e os que ficam se assimilam. O
(Machado de Assis)
português, como toda língua, precisa crescer para
dar conta das novidades sociais, tecnológicas e cul-
Pela compreensão global do texto, podemos admi-
turais; para isso, pode aceitar empréstimos - ravióli,
tir, como conclusão geral, que
ioga, chucrute, balé - e também pode (e com maior
frequência) criar palavras a partir de seus próprios
a) existem línguas passíveis de serem assimiladas e
recursos - como computador, ecologia, poluição -
de se tornarem línguas universais.
ou estender o uso de palavras antigas a novos sig-
b) a influência do inglês é frequentemente reco-
nificados - executivo ou celular, que significam hoje
nhecida como fator de mudança.
coisas que não significavam há vinte anos.
c) são inconsistentes as previsões negativas acerca
Mas isso não quer dizer que a língua esteja em pe-
do futuro da língua portuguesa.
rigo. Está só mudando, como sempre mudou, se
d) o fenômeno dos empréstimos linguísticos se na-
não ainda estaríamos falando latim. Achar que a
turaliza e pode passar despercebido.
mudança da língua é um perigo é como achar que
e) o latim teria sobrevivido historicamente, se fosse
o bebê está “em perigo” de crescer.
uma língua mais rica, mais flexível e expressiva.
Não estamos em perigo de ver nossa língua sub-
mergida pela maré de empréstimos ingleses. A lín-
13
20. (UEG GO/2018 - Adaptada) em mundo datado como o nosso, a explicação do
O mundo como pode ser: uma outra globalização acontecer pode ser feita a partir de categorias de
uma história concreta. É isso, também, que permi-
Podemos pensar na construção de um outro mun- te conhecer as possiblidade existentes e escrever
do a partir de uma globalização mais humana. As uma nova história.
bases materiais do período atual são, entre outras, SANTOS, Milton. Por uma outra globali-zação. 13. ed. São Paulo:
Record, 2006. p. 20-21. (Adaptado).
a unicidade da técnica, a convergência dos mo-
mentos e o conhecimento do planeta. É nessas
O processo argumentativo do texto é construído
bases técnicas que o grande capital se apoia para
de modo que
construir uma globalização perversa. Mas essas
mesmas bases técnicas poderão servir a outros ob- a) são expostas, de forma detalhada, duas conse-
jetivos, se forem postas a serviço de outros funda- quências econômicas de um determinado modelo
mentos sociais e políticos. Parece que as condições de organização de produção.
históricas do fim do século XX apontavam para esta b relata-se o conjunto de ações desenvolvidas por
última possibilidade. Tais novas condições tanto se uma instituição pública como fundamento e justifi-
dão no plano empírico quanto no plano teórico. cativa de um projeto de lei.
Considerando o que atualmente se verifica no pla- c) elabora-se um quadro comparativo, no qual se
no empírico, podemos, em primeiro lugar, reconhe- apresentam a aproximação e os contrastes de dois
cer um certo número de fatos novos indicativos tipos de pesquisa social.
d) faz-se a explanação dos dados de um relatório
da emergência de uma nova história. O primeiro
técnico-científico de uma pesquisa desenvolvida
desses fenômenos é a enorme mistura de povos,
por dois cientistas sociais.
raças, culturas, gostos, em todos os continentes. e) são apresentadas, de forma paralela, duas di-
A isso se acrescente, graças ao progresso da in- mensões teórico-conceituais como argumentos
formação, a “mistura” de filosofia, em detrimento em defesa de uma tese.
do racionalismo europeu. Um outro dado de nossa
era, indicativo da possibilidade de mudanças, é a 21. (G1 – CPS/2017 - Adaptada)
produção de uma população aglomerada em áreas
cada vez menores, o que permite um ainda maior Um patrimônio cultural é uma referência para um
dinamismo àquela mistura entre pessoas e filoso- grupo de pessoas.
fias. As massas, de que falava Ortega y Gasset na
primeira metade do século (A rebelião das mas- No Brasil, o Instituto do Patrimônio Histórico e Ar-
tístico Nacional (IPHAN), órgão do Ministério da
sas, 1937), ganham uma nova qualidade em virtude
Cultura, é um dos organismos que identificam es-
de sua aglomeração exponencial e de sua diversi-
ses referenciais – que podem ser materiais ou não
ficação. Trata-se da existência de uma verdadeira – e também os divulgam, por meio de ações que
sociodiversidade, historicamente muito mais sig- possibilitam o reconhecimento e a preservação de
nificativa que a própria biodiversidade. Junte-se a tais referenciais.
esses fatos a emergência de uma cultura popular No ano de 2010, o IPHAN registrou como patrimô-
que se serve dos meios técnicos antes exclusivos nio imaterial o sistema de agricultura do Alto Rio
da cultura de massas, permitindo-lhe exercer sobre Negro, na região amazônica, reconhecendo assim
esta última uma verdadeira revanche ou vingança. os saberes de mais de vinte povos indígenas sobre
É sobre tais alicerces que se edifica o discurso da as formas apropriadas de cultivo e manejo flores-
escassez, afinal descoberta pelas massas. A popu- tal.
lação, aglomerada em poucos pontos da superfície A difusão desses conhecimentos é fundamental
para que a sociedade brasileira possa aprender a
da Terra, constitui uma das bases de reconstrução
desenvolver atividades agrícolas menos danosas
e de sobrevivência das relações locais, abrindo a
ao meio ambiente.
possiblidade de utilização, ao serviço dos homens,
do sistema técnico atual.
De acordo com o texto, é possível inferir que
No plano teórico, o que verificamos é a possiblida-
de de produção de um novo discurso, de uma nova
a) o sistema agrícola do Alto Rio Negro permitiu a
metanarrativa, um grande relato. Esse novo discur-
conservação de áreas de mata nativa da caatinga
so ganha relevância pelo fato de que, pela primei-
brasileira, constantemente ameaçadas por inunda-
ra vez na história do homem, se pode constatar a
ções.
existência de uma universalidade empírica. A uni-
b) o registro desses conhecimentos indígenas
versalidade deixa de ser apenas uma elaboração
como patrimônio e a sua divulgação possibilitam o
abstrata na mente dos filósofos para resultar da
aprendizado e a prática de técnicas agrícolas sus-
experiência ordinária de cada pessoa. De tal modo,
tentáveis.
14
c) as tecnologias de agricultura sustentável de ex- 23. (FUVEST/2020)
portação foram implantadas a partir dos conheci-
mentos desses povos indígenas do Centro-Sul do Os textos literários são obras de discurso, a que
Brasil. falta a imediata referencialidade da linguagem cor-
d) os conhecimentos agrícolas dos povos indí- rente; poéticos, abolem, “destroem” o mundo cir-
genas do Maranhão, registrados há décadas pelo cundante, cotidiano, graças à função irrealizante
IPHAN, permitiram conter o desmatamento da flo- da imaginação que os constrói. E prendem-nos na
resta amazônica. teia de sua linguagem, a que devem o poder de
e) o IPHAN reconheceu como danosas à natureza apelo estético que nos enleia; seduz-nos o mun-
as práticas agrícolas realizadas nas últimas déca- do outro, irreal, neles configurado (...). No entanto,
das pelos povos indígenas do Alto Rio Negro, re- da adesão a esse “mundo de papel”, quando re-
comendando a adoção de outras. tornamos ao real, nossa experiência, ampliada e
renovada pela experiência da obra, à luz do que
22. (ENEM/2011) nos revelou, possibilita redescobri-lo, sentindo-o
e pensando-o de maneira diferente e nova. A ilu-
Guardar são, a mentira, o fingimento da ficção, aclara o real
ao desligar-se dele, transfigurando-o; e aclara-o já
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la. pelo insight que em nós provocou.
Em cofre não se guarda coisa alguma. Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por O argumento de Benedito Nunes, em torno da na-
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela ilumina- tureza artística da literatura, leva a considerar que
do. a obra só assume função transformadora se
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por a) estabelece um contraponto entre a fantasia e o
ela, mundo.
isto é, estar por ela ou ser por ela. b) utiliza a linguagem para informar sobre o mun-
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro do.
Do que um pássaro sem voos. c) instiga no leitor uma atitude reflexiva diante do
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se pu- mundo.
blica, d) oferece ao leitor uma compensação anestesian-
por isso se declara e declama um poema: te do mundo.
Para guardá-lo: e) conduz o leitor a ignorar o mundo real.
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema: 24. (G1 – IFPE/2017)
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar. UM DOADOR UNIVERSAL
MACHADO, G. In: MORICONI, I. (org.). Os cem melhores poemas Tomo um táxi e mando tocar para o hospital do
brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. Ipase. Vou visitar um amigo que foi operado. O mo-
torista volta-se para mim:
A memória é um importante recurso do patrimô- - O senhor não está doente e agora não é hora de
nio cultural de uma nação. Ela está presente nas visita. Por acaso é médico? Ultimamente ando sen-
lembranças do passado e no acervo cultural de um tindo um negócio esquisito aqui no lombo...
povo. Ao tratar o fazer poético corno uma das ma- - Não sou médico.
neiras de se guardar o que se quer, o texto Ele deu uma risadinha.
- Ou não quer dar uma consulta de graça, hein,
a) ressalta a importância dos estudos históricos doutor? É isso mesmo, deixa para lá. Para dizer a
para a construção da memória social de um povo. verdade, não tem cara de médico. Vai doar sangue.
b) valoriza as lembranças individuais em detrimen- - Quem, eu?
to das narrativas populares ou coletivas. - O senhor mesmo, quem havia de ser? Não tem
c) reforça a capacidade da literatura em promover mais ninguém aqui.
a subjetividade e os valores humanos. - Tenho cara de quem vai doar sangue?
d) destaca a importância de reservar o texto literá- - Para doar sangue não precisa ter cara, basta ter
rio àqueles que possuem maior repertório cultural. sangue. O senhor veja o meu caso, por exemplo.
e) revela a superioridade da escrita poética como Sempre tive vontade de doar sangue. E doar mes-
forma ideal de preservação da memória cultural.
15
mo de graça, ali no duro. Deus me livre de vender Em relação à linguagem, podemos afirmar que o
meu próprio sangue: não paguei nada por ele. Es- texto
cuta aqui uma coisa, quer saber o que mais, vou
doar meu sangue e é já. a) embora se apresente escrito, possui uma lingua-
Deteve o táxi à porta do hospital, saltou ao mesmo gem mais informal e próxima da oralidade, pouco
tempo que eu, foi entrando: preocupada com a rigidez da norma culta.
b) foi escrito com total respeito à norma culta da
- E é já. Esse negócio tem de ser assim: a gente
língua portuguesa, não sendo possível encontrar-
sente vontade de fazer uma coisa, pois então faz e
mos trechos em desacordo com as variedades de
acabou-se. Antes que seja tarde: acabo desperdi- prestígio.
çando esse sangue meu por aí, em algum desastre. c) embora apresente expressões coloquiais como
Ou então morro e ninguém aproveita. Já imaginou “capenga”, “de graça”, “no duro”, a abordagem do
quanto sangue desperdiçado por aí nos que mor- assunto “doação de sangue” dá ao texto um tom
rem? sóbrio e científico
- E nos que não morrem? - limitei-me a acrescentar. d) apresenta uma linguagem técnica, porém, de fá-
- Isso mesmo. E nos que não morrem! Essa eu gos- cil compreensão, uma vez que associa elementos
tei. Está se vendo que o senhor é moço distinto. coloquiais a termos formais no decorrer do texto.
Olhe aqui uma coisa, não precisa pagar a corrida. e) expõe o preconceito linguístico praticado pelo
Deixei-me ficar, perplexo, na portaria (e ele tinha motorista ao chamar o passageiro de “moço dis-
tinto”, discriminando a variedade linguística falada
razão, não era hora de visitas) enquanto uma se-
por ele.
nhora reclamava seus serviços:
- Meu marido está saindo do hospital, não pode an- 25. (ENEM - PPL/2012)
dar direito...
- Que é que tem seu marido, minha senhora? Em 1697, publicou–se, em Lisboa, “A arte da língua
- Quebrou a perna. de Angola”, a mais antiga gramática de uma língua
- Então como é que a senhora queria que ele an- banto, escrita na Bahia, para uso dos jesuítas, com
dasse direito? o objetivo de facilitar a doutrinação de negros an-
- Eu não queria. Isto é, queria... Por isso é que estou golanos. Os aportes bantos ou “bantuismos”, pa-
dizendo - confundiu- se a mulher. - O seu táxi não lavras africanas que se incorporaram à língua por-
está livre? tuguesa no Brasil, estão associados ao regime da
- O táxi está livre, eu é que não estou. A senhora escravidão (senzala, mucama, banguê, quilombo).
A maioria dessas palavras está completamente in-
vai me desculpar, mas vou doar sangue. Ou hoje
tegrada ao sistema linguístico do português brasi-
ou nunca.
leiro, formando derivados da língua com base na
E gritou para um enfermeiro que ia passando e que raiz banto (esmolambado, dengoso, sambista, xin-
nem o ouviu: gamento, mangação, molequeira, caçulinha, qui-
- Você aí, ô, branquinho, onde é que se doa sangue? lombola).
Procurei intervir: CASTRO, Yeda P. de. Das línguas africanas ao português brasileiro.
- Atenda a freguesa... O marido dela... Revista eletrônica do IPHAN. Dossiê Línguas do Brasil, nº 6 – jan/
- Já sei: quebrou a perna e não pode andar direito. fev. 2007. Disponível em: . Acesso em: 09 fev.2009 (adaptado).
- Teve alta hoje. - acudiu a mulher, pressentindo
simpatia. Dado o fato histórico-linguístico de incorporação
- Não custa nada – insisti. - Ele precisa de táxi. A de “bantuismos” na língua portuguesa, conclui-se
esta hora... que
- Eu queria doar sangue - vacilou ele. - A gente não
pode nem fazer uma caridade, poxa! a) os grupos dominantes recusam a cultura de se-
- Deixa de fazer uma e faz outra, dá na mesma. tores menos favorecidos da sociedade.
Pensou um pouco, acabou concordando: b) a língua é um fenômeno orgânico e histórico
- Está bem. Mas então faço o serviço completo: vai cuja dinâmica impossibilita seu controle.
de graça. Vamos embora. Cadê o capenga? c) os jesuítas foram os responsáveis pela difusão
Afastou-se com a mulher, e em pouco passava de da língua banto no Brasil.
novo por mim, ajudando-a a amparar o marido, que d) o idioma dos escravos tinha prestígio social, a
se arrastava, capengando. ponto de merecer um estudo gramatical no século
- Vamos, velhinho: te aguenta aí. Cada uma! XVII.
Ainda acenou para mim, de longe, se despedindo. e) os vocábulos portugueses derivados das línguas
banto evidenciam a ocorrência de uma ruptura en-
SABINO, Fernando. Um doador universal. Disponível em: <<http:// tre essas línguas.
www.otempo.com.br/opini%C3%A3o/fernando-sabino/fernando-
-sabino-um-doador-universal-1.538>>. Acesso: 08 maio 2017.
16
26. (UPE-SSA 3/2017) xícara. A imagem ficou tão famosa que se tornou
uma espécie de cartão-postal do movimento tro-
Em 1971, Tonico e Tinoco elogiaram os militares, picalista.
cantando os versos “um governo varonil/vamos Adaptado de f508.com.br.
O álbum de músicas Tropicália ou Panis et circen- a) utópico, por ser um objetivo desejado
sis foi lançado em 1968. A fotografia que estampou b) distópico, por ser uma antítese da utopia
sua capa foi realizada na casa de Oliver Perroy, fo- c) dialético, defendendo a luta de classes
tógrafo da Editora Abril, em São Paulo. Cada um d) fenomenológico, voltado aos estudos empíricos
levou seus apetrechos, até um penico, comicamen- e) existencial, em que o bem comum prevalece nas
te usado por Rogério Duprat como se fosse uma relações sociais
17
30. (G1 – CFTMG/2017 - Adaptada) A base dessas influências seria o
31. (ESPM-2017)
18
A tirinha e o poema “Estas mãos”, embora perten- 34. (G1 – IFCE/2014)
çam a gêneros textuais diferentes, são semelhan-
tes no que se refere
DE ONDE VEM A EXPRESSÃO “SERÁ O BENEDI- Entendendo-se que os gêneros textuais são os
TO”? textos correntes na sociedade, no gênero aviso da
placa acima
De Minas, uai.
Em 1933, Getúlio Vargas estava indicando novos a) a compreensão da mensagem foi totalmente
governadores, e chefes políticos mineiros temiam prejudicada por conta dos desvios gramaticais.
que o presidente nomeasse alguém indesejado. b) o termo “do zoto” corresponde ao “dos outros”,
Para não desagradar seus apoiadores, dizia-se que reportando, assim, apenas a um desvio de concor-
o escolhido de Getúlio seria Benedito Valadares, dância entre artigo e substantivo.
jornalista, político local e candidato neutro. Mui- c) caso permutasse a expressão jogar lixo por a jo-
tos, surpresos com a provável escolha, que acabou gada de lixo, nada afetaria em termos de concor-
acontecendo, perguntavam-se: “Será o Benedito?”. dância com o substantivo “proibido”.
Assim, a questão ficou conhecida por expressar d) a linguagem do texto está inapropriada para a
contrariedade, surpresa, desalento e perplexidade linguagem do gênero “aviso”.
frente a acontecimentos inusitados. e) a forma como se encontra a palavra “Zoto” pa-
rece ser um substantivo próprio, referindo-se ao
MARQUES, E. De onde vem a expressão “Será o Benedito?”. Dis- nome do dono da casa proibida de jogar lixo.
ponível em: <http://super.abril.com.br/blog/oraculo/de-onde-
-vem-a-expressao-sera-o-benedito/>. Acesso em: 09 maio 2017.
35. (EBMSP/2017)
Os gêneros textuais apresentam finalidade comu-
Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque
nicativa e organização recorrentes. Podemos afir-
não passava de nove horas da manhã. Foi, pois,
mar que o texto “De onde vem a expressão ‘será o
uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto
Benedito’?” consiste em um(a)
voo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcan-
çar a murada do terraço. Afinal, numa das vezes em
a) crônica, já que parte da narração e da descrição
que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a.
de um fato para explicar o significado de uma pa-
Entre gritos e penas, ela foi presa. Em seguida car-
lavra ou expressão.
regada em triunfo por uma asa através das telhas
b) artigo de opinião, já que o autor se utiliza de
e pousada no chão da cozinha com certa violência.
estratégias argumentativas para explicar o sentido
Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos
de uma expressão.
roucos e indecisos. Foi então que aconteceu. De
c) notícia, uma vez que a tipologia narrativa é utili-
pura afobação a galinha pôs um ovo. Só a menina
zada para explicar o sentido de uma expressão por
estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal, po-
meio de uma história real.
rém, conseguiu desvencilhar-se do acontecimento,
d) verbete de dicionário, pois apresenta o conceito
despregou-se do chão e saiu aos gritos:
ou significado de uma palavra ou expressão atra-
vés da tipologia injuntiva.
– Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela
e) texto informativo, pois se utiliza principalmente
pôs um ovo! Ela quer o nosso bem! Inconsciente
da tipologia expositiva para explicar o sentido de
da vida que lhe fora entregue, a galinha passou
uma palavra ou expressão.
a morar com a família. Uma vez ou outra, sempre
19
mais raramente, lembrava de novo a galinha que de Janeiro. O conto se desenvolve em treze breves
se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes capítulos, ao longo dos quais o alienista vai fazen-
a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões do suas experimentações cientificistas até que ele
com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às mesmo conclua pela necessidade de seu isolamen-
fêmeas cantar, ela não cantaria, mas ficaria muito to, visto que reconhece em si mesmo a única pes-
mais contente. Embora nem nesses instantes a ex- soa cujas faculdades mentais encontram-se equili-
pressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, bradas, sendo ele, portanto, aquele que destoa dos
no descanso, quando deu à luz ou bicando milho demais, devendo, por isso, alienar-se.
– era uma cabeça de galinha, a mesma que fora
desenhada no começo dos séculos. Capítulo IV
UMA TEORIA NOVA
Até que um dia mataram-na, comeram-na e passa-
ram-se anos. 1
Ao passo que D. Evarista, em lágrimas, vinha bus-
cando o Rio de Janeiro, Simão Bacamarte estudava
LISPECTOR, Clarice. Uma galinha. Laços de Família. Rio de Janei- por todos os lados uma certa ideia arrojada e nova,
ro: Rocco, 1998, p. 30. Disponível em: <http://www.releituras.com/ própria a alargar as bases da psicologia. 2Todo o
clispector_galinha.asp>. Acesso em: 20 set. 2016. Adaptado.
tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Ver-
de era pouco para andar na rua, ou de casa em
No fragmento adaptado do conto “A galinha”, de
casa, conversando as gentes, sobre trinta mil as-
Clarice Lispector, o elemento figurativo “ovo” tor-
suntos, e virgulando as falas de um olhar que metia
na-se marco importante na narrativa, pois
medo aos mais heroicos.
Um dia de manhã, – eram passadas três semanas,
a) traz para aquele grupo familiar o valor dessa ave
– estando Crispim Soares ocupado em temperar
doméstica, uma vez que ela viva poderia continuar
um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista
dando alimento para todos.
o mandava chamar.
b) é um momento de epifania para a menina, que
– Tratava-se de negócio importante, segundo ele
percebe o quanto o animal poderia transformar a
me disse, acrescentou o portador. 3Crispim empa-
realidade de sua vida, atribuindo-lhe outro signifi-
lideceu. Que negócio importante podia ser, se não
cado.
alguma notícia da comitiva, e especialmente da
c) se caracteriza como a simbologia de uma nova
mulher? 4Porque este tópico deve ficar claramen-
existência, contribuindo para tornar o viver de sua
te definido, visto insistirem nele os cronistas; Cris-
espécie ainda mais insignificante.
pim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca
d) se constitui como um elemento fundamental
estiveram separados um só dia. 5Assim se explicam
para a mudança da percepção da galinha pela fa-
os monólogos que fazia agora, e que os fâmulos
mília, passando aquela a ter, por algum tempo, uma
lhe ouviam muita vez: – “Anda, bem feito, quem te
nova condição existencial.
mandou consentir na viagem de Cesária? Bajulador,
e) se transforma no acontecimento revelador para
torpe bajulador! Só para adular ao Dr Bacamarte.
a própria ovípara, que nota a sua incapacidade de
Pois agora aguenta-te; anda; aguenta-te, alma de
reagir, mediante a crença de que nasceu para ali-
lacaio, fracalhão, vil, miserável. Dizes amém a tudo,
mentar o ser humano.
não é? Aí tens o lucro, biltre!”. – E muitos outros
nomes feios, que um homem não deve dizer aos
36. (IME - 2020)
outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar
o efeito do recado é um nada. 6Tão depressa ele o
A primeira publicação do conto O Alienista, de Ma-
recebeu como abriu mão das drogas e voou à Casa
chado de Assis, ocorreu como folhetim na revista
Verde.
carioca A Estação, entre os anos de 1881 e 1882. 7
Simão Bacamarte recebeu-o com a alegria própria
Nessa mesma época, uma grande reforma educa-
de um sábio, uma alegria abotoada de circunspe-
cional efetuou-se no Brasil, criando, dentre outras,
ção até o pescoço.
a cadeira de Clínica Psiquiátrica. É nesse contexto
– Estou muito contente, disse ele.
de uma psiquiatria ainda embrionária que Macha- 8
– Notícias do nosso povo?, perguntou o boticário
do propõe sua crítica ácida, reveladora da escas-
com a voz trêmula.
sez de conhecimento científico e da abundância
O alienista fez um gesto magnífico, e respondeu:
de vaidades, concomitantemente. A obra deixa ver 9
– Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma ex-
as relações promíscuas entre o poder médico que
periência científica. 10Digo experiência, porque não
se pretendia baluarte da ciência e o poder político
me atrevo a assegurar desde já a minha ideia; nem
tal como era exercido em Itaguaí, então uma vila,
a ciência é outra coisa, Sr. Soares, senão uma inves-
distante apenas alguns quilômetros da capital Rio
20
tigação constante. Trata-se, pois, de uma experiên- soluta confiança no sistema. 24Verdade, verdade,
cia, mas uma experiência que vai mudar a face da nem todas as instituições do antigo regime mere-
terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era até ciam o desprezo do nosso século.
agora uma ilha perdida no oceano da razão; come- – Há melhor do que anunciar a minha ideia, é pra-
ço a suspeitar que é um continente. ticá-la, respondeu o alienista à insinuação do boti-
11
Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do cário.
boticário. 12Depois explicou compridamente a sua E o boticário, não divergindo sensivelmente deste
ideia. No conceito dele a insânia abrangia uma vas- modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor co-
ta superfície de cérebros; e desenvolveu isto com meçar pela execução.
grande cópia de raciocínios, de textos, de exem- 25
– Sempre haverá tempo de a dar à matraca, con-
plos. 13Os exemplos achou-os na história e em Ita- cluiu ele.
guaí mas, como um raro espírito que era, 14reconhe- Simão Bacamarte refletiu ainda um instante, e dis-
ceu o perigo de citar todos os casos de Itaguaí e se:
refugiou-se na história. Assim, apontou com espe- – Suponho o espírito humano uma vasta concha, o
cialidade alguns célebres, Sócrates, que tinha um meu fim, Sr. Soares, é ver se posso extrair a pérola,
demônio familiar, Pascal, que via um abismo à es- que é a razão; por outros termos, demarquemos
querda, Maomé, Caracala, Domiciano, Calígula etc., definitivamente os limites da razão e da loucura. A
uma enfiada de casos e pessoas, em que de mis- razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculda-
tura vinham entidades odiosas, e entidades ridícu- des; fora daí insânia, insânia e só insânia.
las. 15E porque o boticário se admirasse de uma tal O Vigário Lopes, a quem ele confiou a nova teoria,
promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a declarou lisamente que não 26chegava a entendê-
mesma coisa, e até acrescentou sentenciosamente: -la, que era uma obra absurda, e, se não era ab-
16
– A ferocidade, Sr. Soares, é o grotesco a sério. surda, era de tal modo colossal que não merecia
– Gracioso, muito gracioso!, exclamou Crispim Soa- princípio de execução.
res levantando as mãos ao céu. – Com a definição atual, que é a de todos os tem-
17
Quanto à ideia de ampliar o território da loucura, pos, acrescentou, a loucura e a razão estão perfei-
achou-a o boticário extravagante; mas a modés- tamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e
tia, principal adorno de seu espírito, não lhe sofreu onde a outra começa. Para que transpor a cerca?
confessar outra coisa além de um nobre entusias- 27
Sobre o lábio fino e discreto do alienista roçou a
mo; 18declarou-a sublime e verdadeira, e acres- vaga sombra de uma intenção de riso, em que o
centou que era “caso de matraca”. Esta expressão desdém vinha casado à 28comiseração; mas nenhu-
não tem equivalente no estilo moderno. 19Naquele ma palavra saiu de suas egrégias entranhas.
tempo, Itaguaí, que como as demais vilas, arraiais e A ciência contentou-se em estender a mão à teolo-
povoações da colônia, não dispunha de imprensa, gia, – com tal segurança, que a teologia não soube
tinha dois modos de divulgar uma notícia: ou por enfim se devia crer em si ou na outra. Itaguaí e o
meio de cartazes manuscritos e pregados na porta universo à beira de uma revolução.
da Câmara, e da matriz; – ou por meio de matraca.
Eis em que consistia este segundo uso. 20Contrata- ASSIS, Machado de. O Alienista. Biblioteca Virtual do Estudan-
va-se um homem, por um ou mais dias, 21para andar te Brasileiro / USP. Disponível em: <http://www.dominiopubli-
co.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_
as ruas do povoado, com uma matraca na mão.
obra=1939>. Acesso em: 12/08/2019.
De quando em quando tocava a matraca, reunia-
-se gente, 22e ele anunciava o que lhe incumbiam, –
“Crispim empalideceu. Que negócio importante
um remédio para sezões, umas terras lavradias, um
podia ser, se não alguma notícia da comitiva, e es-
soneto, um donativo eclesiástico, a melhor tesoura
pecialmente da mulher? Porque este tópico deve
da vila, o mais belo discurso do ano etc. O sistema
ficar claramente definido, visto insistirem nele os
tinha inconvenientes para a paz pública; mas era
cronistas;” (ref. 3)
conservado pela grande energia de divulgação que
possuía. Por exemplo, um dos vereadores, – aquele
A oração “visto insistirem nele os cronistas’’
justamente que mais se opusera à criação da Casa
Verde, – desfrutava a reputação de perfeito edu-
a) evidencia que o narrador inventou completa-
cador de cobras e macacos, e aliás nunca domes-
mente a história do alienista.
ticara um só desses bichos; mas, tinha o cuidado
b) indica que o autor, Machado de Assis, baseou-
de fazer trabalhar a matraca todos os meses. 23E
-se em cronistas da época para elaborar o conto O
dizem as crônicas que algumas pessoas afirmavam
Alienista.
ter visto cascavéis dançando no peito do vereador;
c) anuncia que os temores de Crispim foram abor-
afirmação perfeitamente falsa, mas só devida à ab-
dados de forma superficial pelos cronistas.
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d) mostra que o narrador do conto se baseou nas 38. (UFRGS/2017)
crônicas da cidade de Itaguaí para contar a história
de Simão Bacamarte. Leia o poema José, de Carlos Drummond de
e) revela que o conto O Alienista se encontra nas Andrade.
crônicas de época de Itaguaí.
E agora, José?
37. (FUVEST/2020) A festa acabou,
a luz apagou,
Cantiga de enganar o povo sumiu,
a noite esfriou,
(...) e agora, José?
O mundo não tem sentido. e agora, você?
O mundo e suas canções Você que é sem nome,
de timbre mais comovido que zomba dos outros,
estão calados, e a fala Você que faz versos,
que de uma para outra sala que ama, protesta?
ouvimos em certo instante e agora, José?
é silêncio que faz eco
e que volta a ser silêncio Está sem mulher,
no negrume circundante. está sem discurso,
Silêncio: que quer dizer? está sem carinho,
Que diz a boca do mundo? já não pode beber,
Meu bem, o mundo é fechado, já não pode fumar,
se não for antes vazio. cuspir já não pode,
O mundo é talvez: e é só. a noite esfriou,
o dia não veio,
Talvez nem seja talvez. o bonde não veio,
O mundo não vale a pena, o riso não veio,
mas a pena não existe. não veio a utopia
Meu bem, façamos de conta. e tudo acabou
De sofrer e de olvidar, e tudo fugiu
de lembrar e de fruir, e tudo mofou,
de escolher nossas lembranças e agora, José?
e revertê-las, acaso
se lembrem demais em nós. (...)
Façamos, meu bem, de conta
– mas a conta não existe – Se você gritasse,
que é tudo como se fosse, se você gemesse,
ou que, se fora, não era. se você tocasse,
(...) a valsa vienense,
se você dormisse,
Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma. se você cansasse,
se você morresse....
Em Claro Enigma, a ideia de engano surge sob a Mas você não morre,
perspectiva do sujeito maduro, já afastado das ilu- você é duro, José!
sões, como se lê no verso-síntese “Tu não me en-
ganas, mundo, e não te engano a ti.” (“Legado”). O Sozinho no escuro
excerto de “Cantiga de enganar” apresenta a rela- qual bicho-do-mato,
ção do eu com o mundo mediada sem teogonia,
sem parede nua
a) pela música, que ressoa em canções líricas. para se encostar,
b) pela cor, brilhante na claridade solar. sem cavalo preto
c) pela afirmação de valores sólidos. que fuja a galope,
d) pela memória, que corre fluida no tempo. você marcha, José!
e) pelo despropósito de um faz-de-conta. José, para onde?
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Assinale a alternativa correta sobre o poema. a) maldição e inocência.
b) confusão e poesia.
a) O diálogo com José, interlocutor, pode ser lido c) santidade e poesia.
como uma forma de o sujeito-lírico refletir sobre o d) maldição e poesia.
desamparo existencial. e) poesia e santidade.
b) O poema em versos curtos apresenta o caminho
para superação dos impasses de José. 40. (PUCCAMP/2017)
c) As repetições indicam a monotonia da existên-
cia do trabalhador comum, José, em crise com sua José de Alencar retratou o seu herói goitacá em
condição operária. prosa, a exemplo do que o escocês Walter Scott
d) O sujeito-lírico, na ausência de respostas, não havia feito com os cavaleiros medievais na célebre
consegue decifrar para onde José marcha, embora novela Ivanhoé. Para evocar um mítico passado na-
este saiba seu caminho. cional, na falta dos briosos cavaleiros medievais de
e) A expressão “e agora, José?” põe em relevo a Scott, o índio seria o modelo de que Alencar lança-
indignação do sujeito-lírico com seu interlocutor, ria mão. (...) O índio entrara como tema na literatu-
incapaz de se definir. ra universal por influência das ideias dos filósofos
iluministas e especialmente, da obra de Jean-Jac-
39. (UNIFESP/2007) ques Rousseau (...). As teses de Rousseau sobre o
“bom selvagem”, por sua vez, bebiam na fonte das
Leia versos da primeira e da quarta estrofe de po- narrativas de viajantes do século XVI, os primei-
ema de Hilda Hilst, publicados no livro Do desejo ros europeus que haviam colocado os pés no chão
em 1992. americano. Foram esses viajantes os responsáveis
pela propagação do juízo de que, do outro lado do
I oceano, existia um povo feliz, vivendo sem lei nem
Porque há desejo em mim, é tudo cintilância. rei (...).
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado (NETO, Lira. O inimigo do Rei. Uma biografia de José de Alencar.
Surdo à minha humana ladradura. São Paulo: Globo, 2006. p. 166-167)
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