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Philippe Lacadée1
Tradução: Ana Lydia Santiago e
Renata Nunes Vasconcelos
Freud já havia constatado que, pelo fato de não proporcionar a vontade de viver, o
liceu não preencheria sua função, não ofereceria sempre a seus alunos uma sustentação, um
ponto de apoio necessário a uma época da vida onde eles são obrigados a estender suas
relações a casa dos pais e aos familiares. Para ele, em vários pontos, a escola hipnotizava
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LACADEÉ, Philippe, MONIER, Françoise (orgs). Le pari de la conversation. Institut du
Champs Freudien: CIEN Centre interdisciplinaire su l´Enfant. Paris, 1999/2000. brochure
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por sua função normativa identificadora, permanecendo aquém dessa tarefa, que é a de
oferecer um substituto da família e de despertar para cada sujeito um interesse pela vida
exterior para o mundo.
A instituição para Freud, enquanto ela é estruturada como uma linguagem, vem se
substituir ao real colocada em jogo pelo traumatismo do mal entendido do nascimento,
como diz Lacan. Ela oferece a construção de uma ficção necessária e o encontro de um
saber sobre os quais a criança pode se apoiar para dar conta de uma perda crucial de gozo
no lugar da linguagem.
Na manutenção dessa função, Freud vai fazer um comum dever, um dever
interdisciplinar, aos professores e aos psicanalistas: "A escola não deve reivindicar por sua
conta o inexorabilidade da vida, ela não deve querer ser mais do que um jogo de vida” .
Projeto sempre inédito para a escola é esse de se colocar no jogo da vida de um
sujeito, lá onde, muito cedo atualmente a vida parece de uma maneira tal um jogo de uma
maneira tal, que a inibição escolar lhe oferece sempre a via do fracasso ou da exclusão,
porta de entrada no mundo da segregação. Freud indica que a escola tem que suportar um
certo mal entendido. É a partir deste mal entendido que um laboratório do CIEN toma in
situ sua função e pode operar, estabelecendo uma prática da conversação. Para isso, nós nos
orientamos em Freud que propunha introduzir uma necessária elaboração clinica ligada a
uma fonte ética, fazendo uso do traço subjetivo particular a cada criança contra o ideal da
norma, tal que ele aparece mais freqüentemente em um detalhe da língua ou do
comportamento, enquanto ele é para cada um, acordeão de seu fantasma, — acrescentando
como diz Lacan , " o gozo ao lugar central na historia das comunidades". Subverter a norma
ideal identificatória pela relação particular de cada um a questão do objeto pulsional em
jogo do fato de sua inscrição na linguagem, eis a subversão freudiana.
Freud abre assim como conseqüência do laço lógico que se estabelecerá entre a
unificação do ideal e a pulsão de morte. Ele não aceitou que o sujeito deve aceder a cultura
para entrar no rangue, e que seria a solução pedagógica. Ele indica ao contrario, uma
solução que supõe o tempo necessário, tempo lógico, próprio de cada um, para que se
desenlace a relação que cada um entretém com o inexorável. Ele propõe a introdução de
uma dimensão ética, como Hegel, mas, a ele se interessa a elaboração clinica.
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Liceu na organização da escola francesa poderíamos considerar o ensino médio no caso
brasileiro freqüentado por jovens de 15 a 18 anos.
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A verdadeira novidade da educação moderna, dizia ela em 1954, tem a ver com a
crise da autoridade na educação, ligada ela mesma com a crise da tradução, ou seja, a crise
de nossa atitude em direção a tudo o que toca o passado. Esta crise deixa numa posição
ruim o educador, aos quais cabe-lhes fazer o laço entre o antigo e o novo.
individualismo moderno que tornam difícil a inscrição numa comunidade? Como operar
sobre as práticas de gozo particular a partir de corpo vivo? Como agarrar o gozo, o rela do
corpo, com a palavra?
Os trabalhos do laboratório mostram a importância do momento que chamam os
adolescentes hoje. Os adolescentes os mostram, de forma espetacular e provocante, os
traços de uma mudança de paradigma, a passagem da era industrial a era da informática.
Eles nos mostram, sobretudo as soluções inéditas que eles tem inventado para viver num
mundo onde o Outro não existe, dentro da globalização, da ruptura de ideais, de
esmagamento do eixo vertical das identificações, tempo de fim do homem moderno ou pós-
industrial. Os laboratórios permitem aprender em que consiste a experiência desses jovens.
2. Os resultados obtidos
Nós desejamos até aqui colocar em evidencia os temas maiores que foram extraídos
das conversações que nós tivemos com as crianças, os laços escolares, onde nós nos
encontramos. Cada tema merece um maior desenvolvimento. Nós vamos simplesmente
indicar algumas pistas de reflexão depois de dois anos de trabalho nos laboratórios do
CIEN.
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Cantor de hip hop francês. Filho de imigrantes de Cabo Verde, desde criança manifestou
problemas com a autoridade em geral. Hoje escreve musicas com esses temas.
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nós lavamos nossas mãos em relação ao destino de vocês". Ele atribui aos pais o
consentimento como grande pessoa e não de tratar suas crianças como adultos. A
autoridade autêntica é a possibilidade de ter influencia sobre alguém porque dizemos coisas
que fazem interpretação para ele, que isso lhe dá a impressão que, atrás disso, você conhece
uma luz. Essa transmissão orienta as crianças na direção de um “saber e fazer”. Eles vão,
então, procurar o saber no Outro. Como nos dizia uma jovem: "Ser professor é uma grande
responsabilidade. A criança é que constrói a pessoa que se tornará mais tarde. É uma
pesada tarefa quando se tem que construir tantas pequenas pessoas. Isso contribui
enormemente a aprendizagem da construção da pessoa, pois eles sabem e fazem" .
O pai hoje aparece sempre na posição de exceção, ele aparece sempre nas
conversações no lugar dos objetos de consumo reduzido, no lugar de um objeto inútil. Isso
é contemporâneo do declino de sua autoridade autêntica, fundamento da função paterna. O
pai não é mais este modelo, esta exceção demonstra como ele sabe fazer com a vida, com o
gozo, com a mulher. Ele foi substituído pela modernidade técnica (é em todo caso o
diagnóstico de nossas conversações) que condensa os ideais e apaga o respeito à autoridade.
Nós constatamos neste o efeito que representa a exigência de respeito do adolescente que
não acha mais o ideal para localizar sua questão e seu ser de onde ele se veria, por ele
mesmo, digno de ser amado, e até amar.
Noção bem moderna, não é mais a solidão como queixa, depressão, mas ela
concerne a falta do ser. Ela é colocada em evidencia pelas conseqüências do encontro com
a não relação sexual, atualizada quando do despertar do desejo sexual que se encontra
sempre, como tinha precisado Lacan, a partir do sonho. As conversações revelaram a
importância do sonho para os adolescentes no ponto de enigma onde eles tinham
dificuldade a realizar a parte da causalidade subjetiva que lhes incumbe. Os sonhos vieram
ocupar um lugar preponderante mostrando que, “se entre o homem e a mulher há o amor,
entre o homem e amor há o muro da linguagem" (Lacan), há o sonho entre o adolescente e
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pratica de conversação. Ao final de um tempo, sobre essa proposição de nos falar de suas
rimas e seus ritmos — o movimento Hip-Hop — nós criamos com eles o laboratório
Linguagem e Segregação, para falar dos problemas de violências entre turmas. Este
laboratório é em seguida, transformado em outro, Linguagem e Civilização, que se debruça
sobre o Hip-Hop como resposta inventada a diferentes problemas.
Há, por meio do Hip-Hop, a constituição de uma língua que permite ao adolescente
de hoje obter sua invenção no dizer, sua invenção de ser, para uma prática de palavra
inédita que não existia antes: o Rap. É uma invenção precisa de alojar seu ser na língua e de
colocar sua voz aí para uma prática de enunciação que constrói um tipo de linguagem
particular. É uma língua fecunda que permite a definição de uma comunidade. Na França,
isto contribuiu para um alargamento da linguagem e renovando a tradição do francês
popular. Esta linguagem foi também o grande veículo e o instrumento de uma integração
fundamental. Graças ao movimento Hip-Hop, os adolescentes da cidade souberam criar,
inventaram uma sociedade civil na qual, eles podem viver civilizadamente numa civilidade
digna e respeitosa, humana e fraterna (daí o titulo de nosso laboratório Linguagem e
civilização). O Hip-Hop impulsiona a estabilização de uma língua e a integração de práticas
de expressão aí onde antes havia práticas de rupturas, de exclusão e de rejeição.
Os significantes de reconhecimento desta comunidade construíram um modo
original de linguagem onde, traços políticos e traços de gozo vêm se fundar em um insigne:
DJ ( Disc Jockey) ou MC (mestre de cerimônia). O grafite, o Rap servem de ponte de união
a toda juventude em mal de identificações. O Rap, para muitos, instaura um ponto de
ancoragem, como eu já tinha demonstrado num trabalho para um colóquio sobre violência
infantil em Curitiba4. Um ponto de identificação que Lacan chama um significante mestre
— Eu faço Rap, por isso existo — que lhe serve de apoio.
A vista do CIEN é ter uma relação direta com os SI que estes jovens souberam criar
e de entrar em conversação com ele. O Rap é então uma prática de discurso objetivando um
modo de tratamento do gozo. Ele implica um SI irredutível, e um SI que da o contexto no
qual o significante mestre se aplica.
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Sobre a linguagem, um equivalente do ato, publicado na Lettre mensuelle, n º 178
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cultura, então olhem-nos. Vocês vêem quem é e como nós somos. E nossa maneira de nos
vestir, nossa maneira de falar, e nosso ser de espírito, são as coisas que nos fazemos. É
assim que nós podemos comunicar. “O estilo livre é a expressão de uma poesia em
movimento. É um modo de vida estruturando uma comunidade, uma fraternidade fundada
sobre um modo de gozo particular e não mais sobre os significantes idéias. É uma maneira
particular, muito precisa, de atar o gozo do corpo vivo à palavra”.
Para concluir, nós diremos que se trata de uma prática de conexões, de atar
r(entrelaçar) entre os corpos e a palavra. Os momentos da conversação nos mostram
segundo eles, as modalidades de resposta que eles inventam, a esperança, e até o fermento
novo que eles sabem encontrar ai onde o pior os esperava, isto é, lá onde se realiza uma
grande proximidade com o real do fato e a conseqüência ultima do Outro que não existe e
do declínio da função paterna. Eles inventam pela poesia, pela escritura, uma nova prática
de discurso, lhes permitindo, a partir de seu lugar de descrédito, de repulsa, de recuperar o
respeito. Esta demanda de respeito, que é a demanda real do adolescente de hoje,
testemunha de preocupação de uma certa dignidade para “ fazer bem com o pior” como o
disse bem, Amadou Ba, um jovem adolescente da rua em Dakar. Mas também do desejo
por um discurso, uma escrita de se inscrever num laço ao Outro, a fim de ser reconhecido.
Na minha intervenção, portanto, seguramente longa demais, o detalhe ficou detalhe,
porque dar o detalhe das conversações, isto fizeram uma brochura que eu vou convido a
comprar e depois a ler. Vocês aí encontrarão sob o duplo titulo A aposta na conversação e a
Escola da conversação, o menu de todas as conversações das quais o CIEN se fez parceiro
ano passado nas diferentes escolar de Bourdeaux.