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Manuscrito a sair nos anais da VII Reunião de Antropologia da Ciência e da Tecnologia (VII ReACT)

Populismo digital, neoliberalismo e pós-verdade: uma explicação cibernética1

Letícia Cesarino

Introdução

Este capítulo avançará uma proposta de explicação cibernética (Bateson 1972) para
uma constelação emergente onde as mídias digitais podem ser pensadas como co-produzindo
o que se tem chamado de novos populismos (em especial, conservadores), neoliberalismo e
pós-verdade. Partindo dessa perspectiva, fenômenos que são normalmente vistos como
separados, e “causando” uns aos outros, passam a ser considerados como sendo diferentes
ângulos analíticos sobre um processo complexo que é, na prática, difícil de ser segmentado.
Para tanto, desenvolverei aqui uma articulação (meta)teórica entre, por um lado, noções da
cibernética e da teorias de sistemas e, por outro, elementos da teoria antropológica e da
teoria política contemporânea que operam numa escala analítica similar à da explicação
cibernética.

Meu pivô empírico seguirá sendo aquilo que venho chamando de populismo digital, a
partir de pesquisa online realizada em redes bolsonaristas antes e depois da eleição de
outubro de 2018 (Cesarino 2019; a sair a,b). Parto, porém, da suposição, implicada no
argumento de alguns autores contemporâneos (Mirowski 2019, Davies 2018, Zuboff 2018), de
que a ascensão dos populismos conservadores pelo mundo é apenas o componente “político”
de uma constelação muito mais ampla, que, a prosseguir como está, trará mudanças
significativas naquilo que entendemos por modernidade, ciência e democracia.

A primeira seção deste capítulo retoma as principais linhas do meu argumento sobre o
populismo digital, destacando as articulações possíveis entre autores e noções dos campos da
cibernética e teorias de sistemas, teoria antropológica clássica e teoria política
contemporânea. Busco com isso demonstrar por que penso que o plano da explicação
cibernética é especialmente produtivo para compreender a constelação empírica em tela. Na
segunda seção, discuto, de modo ainda incipiente, algumas das ressonâncias práticas e
epistêmicas entre o populismo digital, neoliberalismo e a arquitetura contemporânea das
mídias digitais. Concluo destacando como a pós-verdade, entendida enquanto exponencial
aumento da entropia informacional , pode ser pensada como efeito desses processos.

Populismo digital: uma explicação cibernética

O que entendo aqui por perspectiva cibernética opera num plano explicativo menos
usual nas ciências sociais, porém reconhecível em linhas clássicas como o estruturalismo lévi-
straussiano, a ecologia da mente de Gregory Bateson, ou a teoria de sistemas de Niklas

1
Versões anteriores deste argumento foram apresentadas na VII Reunião de Antropologia da Ciência e da
Tecnologia (VII ReACT), em maio de 2019, e em workshop organizado pelo Internetlab em julho do mesmo ano.
Agradeço aos meus interlocutores em ambos os eventos pelos ricos comentários recebidos, assim como aos
estudantes da disciplina “Neoliberalismo, mídias digitais e o político na contemporaneidade”, ministrada na UFSC
no primeiro semestre de 2019.
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Luhmann. No presente argumento, identifico essa perspectiva também com autores menos
explicitamente associados a ela, como Mary Douglas, Thomas Kuhn, Ernesto Laclau e Bruno
Latour (em Vida de Laboratório), além de derivações na psicanálise e no pós-estruturalismo. A
perspectiva cibernética não se associa nem ao pólo humanista-hermenêutico da antropologia,
nem a análises causais do tipo “explicação positiva” (Bateson, 1972). Ela também opera em um
“meio-termo” entre explicações qualitativas e quantitativas, e por isso tem, a meu ver, um
potencial especialmente promissor de articulação interdisciplinar – que, no caso dos estudos
contemporâneos sobre as mídias digitais, tem se mostrado cada vez mais necessária.

É sabido que o grupo original da cibernética, estabelecido sob a liderança de Norbert


Wiener nos anos 1940 através das Conferências Macy, com o tempo se fragmentou em linhas
muito distintas. É possível dizer que a principal cisão se deu em torno da ênfase em máquinas,
por um lado, e em organismos vivos, por outro. Muitos, inclusive o próprio Wiener,
enveredaram pela pesquisa tecnológica, apoiada por volumoso financiamento governamental
e industrial durante a Guerra Fria. Essa linha, bastante ligada à teoria da informação,
matemática e engenharias, eventualmente chegou ao computador analógico e, mais
recentemente, às tecnologias digitais. Outra linha, da qual Bateson foi um dos protagonistas,
seguiu com o interesse centrado na vida, e chegou a universos mais familiares à antropologia
como a autopoiese de Maturana e Varela e a teoria de Gaia de James Lovelock. A primeira
linha se ligou tradicionalmente à Big Science e à indústria; a segunda, aproximou-se por vezes
de epistemologias não-científicas, como o movimento contracultural dos anos 1960 e o
budismo. É possível que, hoje, as duas possam se reaproximar, porém num contexto bastante
distinto daquele que marcou a sua origem comum. Sugiro que o estudo das mídias digitais na
contemporaneidade se beneficiaria de uma reaproximação entre a cibernética das máquinas e
a cibernética da vida. O estudo da interface entre as tecnologias digitais e fenômenos
definidores da nossa época como neoliberalismo, neopopulismos e pós-verdade é uma
avenida bastante promissora neste sentido. Tentarei, neste capítulo, sugerir como.

Em outras oportunidades, detalhei, com base em pesquisa sobre a campanha


presidencial em mídias digitais nas eleições de 2018, o mecanismo de produção de hegemonia
política que chamei de populismo digital (Cesarino 2019; a sair,a,b). O foco empírico foi então
o WhatsApp, que tem se constituído como um problema à parte para muitos estudiosos das
relações entre política e mídias digitais no Brasil de hoje (Santos 2019; Vieira et al 2019). Essa
plataforma, que teve papel central nas últimas eleições brasileiras, oferece certas affordances
(Gibson, 1979) que a diferenciam de outras como o Facebook – protagonista do Brexit, da
eleição de Trump, e do escândalo da Cambridge Analytica. A partir de meus dados, delineei
cinco delas:

Capilaridade. O WhatsApp é provavelmente o aplicativo de mídia social mais presente


nos smartphones dos brasileiros. Os esquemas de zero rating das operadoras de telefonia
fazem com que, para muitos, ele seja a única fonte de acesso à internet – o que impossibilita,
notadamente, a checagem de fatos a partir de outras fontes. Na minha pesquisa, um dado
importante da capilaridade excepcional do WhatsApp é que ele propicia acesso a conteúdos
circulados em mídias sociais como o Facebook ou Twitter a usuários que não se encontram
registrados, ou que acessam pouco, essas plataformas. Nesse caso, o conteúdo já chega ao
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usuário final enviesado, filtrado através de múltiplas mediações tanto algorítmicas quanto
humanas.

Confiança. Durante as eleições, conteúdo relativo a política chegava aos usuários como
mensagens privadas através de redes de confiança, como parentes e amigos. Naquele
momento, nem o indicativo de “forwarded” existia, tornando difícil diferenciar aquilo que
havia sido digitado ou apenas encaminhado pelo emissor da mensagem. Além disso, por ser
um ambiente criptografado e peer-to-peer, o WhatsApp aparenta ser um ambiente seguro e
privado para os usuários.

Isolamento. O WhatsApp foi pensado sobretudo como como um aplicativo de troca de


mensagens privadas, e por isso é criptografado. Alguns têm questionado, contudo, se o seu
padrão de uso nas eleições e além – em especial, a importância de grandes grupos, tanto
públicos como fechados – não indicaria que esse aplicativo se tornou mais parecido com uma
mídia social pública como o Facebook (Vieira et al 2019). O aplicativo envolve, portanto, um
paradoxo emergente: conteúdos que deveriam circular na esfera pública, e serem assim
expostos ao contraditório e a contestações, circulam dentro do isolamento propiciado pelo
aplicativo, intensificando assim a formação de bolhas. Essa característica coloca o problema
regulatório do WhatsApp num patamar diferente das outras plataformas.

Ritmo. Outra característica do padrão de uso do WhatsApp é sua intensidade. Este


aplicativo é acessado e checado com uma frequência quotidiana muito maior que outros, uma
vez que desempenha funções não apenas de rede social, mas de comunicação pessoal e de
trabalho. Essa intensidade de acesso, que faz desse aplicativo um mediador essencial na vida
quotidiana dos brasileiros, talvez seja o principal fator da sua extraordinária capilaridade. Isso
permite, em contextos eleitorais, uma mobilização permanente da atenção que faz toda a
diferença num ambiente digital marcado por entropia organizacional crescente (Harsin, 2015).

Mas que conteúdos circulavam pelo aplicativo, e chegavam de modo tão capilar e
intensivo aos usuários? Durante o período eleitoral, a quantidade de conteúdo circulado no
WhatsApp foi absolutamente massiva, como já foi inclusive quantificado por plataformas de
monitoramento de grupos públicos em operação na época (Vieira et al 2019, Santos 2019). No
meu caso, durante a campanha estive sempre em entre três e quatro grupos pró-Bolsonaro ao
mesmo tempo. A cada dia, no total, centenas, às vezes milhares de mensagens – houve
momentos em que tive de deixar grupos, pois meu aparelho não conseguia acompanhar o alto
volume e frequência de compartilhamentos. Uma proporção ínfima desse volume se referia à
campanha oficial do candidato vencedor – o grosso consistia em conteúdo “informal”, mas, ao
que tudo indica, impulsionado por meios automatizados, cuja origem permanece em grande
parte obscura.

Assim, meu primeiro desafio de pesquisa foi organizar aquela quantidade massiva de
material empírico em algum tipo de tipologia qualitativa. O que parecia ser uma tarefa
intratável se mostrou, na realidade, bastante simples. Naquele momento, paralelamente à
coleta de dados eu li, pela primeira vez, A razão populista, obra seminal de Ernesto Laclau
publicada em 2005. Partindo da escala explicativa metalinguística proposta por este autor (que
coincide com a da explicação cibernética), a organização do material se deu de forma quase
automática. Rapidamente, consegui definir cinco funções metalinguísticas que esgotavam
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virtualmente a totalidade do conteúdo digital da campanha pró-Bolsonaro nas mídias digitais,


e em especial no WhatsApp. Mais precisamente, cada conteúdo circulado visava produzir um
ou mais dos seguintes efeitos:

1. fronteira antagonística amigo e inimigo


2. equivalência entre liderança e povo
3. mobilização permanente através de ameaça e crise
4. espelhamento do inimigo e inversão de acusações
5. produção de um canal midiático exclusivo

Todos esses enquadres discursivos são performativos: ou seja, visam não denotar uma
realidade externa ao emissor e receptor da mensagem, como num tipo de linguagem
referencial, mas gerar um certo efeito sobre o receptor – no caso, produzir um público onde
ele antes não existia. Dez anos atrás publiquei uma análise desse tipo de linguagem no caso
dos discursos da primeira posse do então presidente Lula – que hoje, depois de ler Laclau, eu
chamaria de populista num sentido preciso (Cesarino 2006). Mas o mesmo tipo de linguagem,
por vias digitais, opera de forma diferente, e aqui acredito que uma análise no plano
cibernético traga elementos novos.

A teoria do populismo de Laclau foi desenvolvida para fenômenos bem anteriores ao


surgimento da internet e das tecnologias digitais, notadamente o populismo de Juan Perón na
Argentina – país natal do autor. Não obstante, ela se mostra extremamente produtiva para
pensar os populismos digitais contemporâneos. Eu já havia notado, em outras ocasiões
(Cesarino 2019a, a sair,a), que parte importante do notável encaixe entre teoria e empiria
neste caso deriva do fato de o conteúdo digital que circulou nas campanhas formais e
informais de candidatos como Trump e Bolsonaro ter sido ele próprio estruturado através de
algum tipo de “ciência do populismo”. Mas há também o fato de as reflexões de Laclau se
desenrolarem fundamentalmente num plano estrutural ou sistêmico – ou, como venho
chamando aqui, cibernético. Muitos dos seus pilares teóricos centrais – de Ferdinand de
Saussure a Derrida, de Freud a Lacan – também podem ser pensados como operando neste
nível.

Em A razão populista, Laclau realiza uma torção analítica semelhante à de Lévi-Strauss


em Totemismo hoje: como o totemismo, o populismo não é um fenômeno empírico de um tipo
particular, mas evidencia princípios estruturais da própria ontologia do político. Como o
totemismo, o populismo não se define por um conteúdo específico (digamos, esquerda ou
direita), mas indica uma mecânica de construção de hegemonia política que tem ressonâncias
multiescalares: ou seja, com processos que ocorrem em outras escalas e domínios, como a
construção do self (notadamente, como o descreve Lacan) e processos elementares de
formação de grupo descritos para sociedades tribais – por exemplo, por Bateson para os
Iatmul da Melanésia em Naven, ou por Mary Douglas para os Lele na África e os hebreus do
Velho Testamento em Pureza e perigo. Essas improváveis coincidências entre sociedades
muito diferentes ocorrem porque o mecanismo populista, tal qual descrito por Laclau, opera
num plano extremamente elementar – poderíamos dizer, num sentido durkheimiano-
maussiano. É exatamente essa a base da sua excepcional eficácia agregadora, uma vez que é
capaz de mobilizar pessoas através de um espectro social extremamente amplo e
heterogêneo. Minha análise da memética da campanha Bolsonaro (Cesarino a sair,a) mostrou
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como o seu objetivo era, justamente, reduzir o discurso político a esse nível mais elementar,
potencialmente apreensível por qualquer eleitor, mesmo (ou especialmente) aqueles sem
nenhuma educação política num sentido convencional. Esse efeito aparece, para muitos, como
uma simplificação e moralização indevidas do debate político.

Outra característica chave do mecanismo populista descrito por Laclau (2005) que o
aproxima da explicação cibernética é a sua operação no plano encorporado dos afetos, e não
da racionalidade abstrata. Isso significa que, para funcionar, a mobilização política que o
populismo opera não precisa se apresentar de forma consciente ou reflexiva para o eleitor; por
isso, o debate político num sentido convencional aparece como irrelevante e mesmo obsoleto.
Como mostrei em detalhes (Cesarino a sair,a), o ressentimento e raiva pelo “inimigo” gerados
pelos padrões meméticos circulados digitalmente não precisavam nem ser transmitidos
através de palavras. Muitas vezes – na realidade, com muita frequência – o efeito político
desejado (no caso da campanha, a escolha eleitoral) era produzido por imagens, músicas,
padrões estéticos de beleza e feiura, ou associações muito simples com cores e números. Aqui,
como descrito por Mary Douglas (2002), simbologias de pureza e perigo eram mobilizadas para
produzir fronteiras rígidas entre grupos, que passavam a ser policiadas por afetos de
repugnância e repulsa mútuos. Muitos memes eram explícitos na redução discursiva que
pretendiam operar: “fácil decidir”, “simples assim”, “basta olhar”. Por isso, práticas político-
eleitorais tradicionais como debates públicos, consulta a especialistas e mesmo um plano de
governo detalhado e consistente mostraram-se irrelevantes para o resultado eleitoral.

Outro ponto de convergência nodal entre a teoria do populismo e o campo da


cibernética diz respeito à dialética da produção da ordem-desordem. Segundo Laclau, para que
uma irrupção populista ocorra, é preciso que ela apareça como solução anti-establishment
para um contexto de crise e desordem, tanto sociológica como cognitiva. A liderança populista
bem sucedida é aquela que logra articular, por meios discursivos (e Laclau segue Wittgenstein
ao pensar discurso em articulação com a prática), uma cadeia de equivalência longa o
suficiente para transformar uma plebs (multidão difusa, com demandas heterogêneas) em
populus (o “povo” como identidade coletiva bem definida, construída em contiguidade com o
líder). Ora, foi exatamente isso que ocorreu nos anos que antecederam a eleição de 2018: a
multidão heterogênea que foi às ruas nas jornadas de junho de 2013 – uma manifestação da
plebs – foi sendo paulatinamente estruturada enquanto populus e, em 2018, enquanto base
eleitoral de Jair Bolsonaro. Essa transformação progressiva pode ser visualizada na própria
estética das manifestações de rua ao longo do período: da confusão de cores e palavras de
ordem em 2013, ao verde-e-amarelo do movimento anticorrupção, que se desdobrou no
antipetismo que marcou o contexto pré-eleitoral de 2018. Tudo que Bolsonaro precisou fazer
foi se colocar como liderança carismática capaz de dar um rosto e uma unidade a essa
identidade popular emergente, cuja base antagonística (função 1 acima) já havia sido
estruturada: seja pela Lava Jato e pelo impeachment de Dilma Rousseff (o antipetismo), pelo
movimento evangélico (ideologia de gênero), ou pela indústria do punitivismo (a figura do
bandido como inimigo público número um).

Assim, se em 2013 as mídias digitais (na época, ainda representadas


fundamentalmente pelo Facebook) foram primariamente um fator de desordem e crise, em
2018 elas (agora, centradas principalmente no WhatsApp) foram um mediador central da
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promessa de resolução da crise e retorno da ordem. Boa parte da memética “positiva” da


campanha pró-Bolsonaro (função 2 acima) girava em torno de noções de ordem e segurança,
fundamentalmente encapsuladas no significante vazio (Laclau 2005) da nação e suas cores –
figura básica a qualquer mobilização do tipo populista, visto que a nacionalidade é um potente
articulador de cadeias de equivalência. Como na teoria de Laclau, as duas funções (que
correspondem ao eixo sintagmático e paradigmático de Saussure, respectivamente) operam
de forma necessariamente articulada: se o “povo” é o Brasil, o “inimigo” era constantemente
exortado a deixar o país, para Cuba ou Venezuela. Daí, também, um dos motes da campanha:
nossa bandeira nunca será vermelha.

Mas minha etnografia indicou que o WhatsApp teve ainda um outro tipo de papel
naquilo que Jean e John Comaroff (2004) chamaram de “dialética de produção e redução” da
desordem: “the productive conjuring of a world saturated with violence and moral ambiguity,
the threat of which they alone are able to reduce to habitable order” (824). Isso porque o
aplicativo era ele mesmo um meio de difusão da desordem, em vários sentidos. Em primeiro
lugar, está o fato mais óbvio de que a proliferação das mídias digitais tem levado à
desestruturação do sistema de peritos e da esfera pública moderna tal qual a conhecíamos,
pois consistem em uma infraestrutura de produção e difusão de informação muito mais
fragmentada que a broadcast media (Warner 2002).2

Porém, parte da produção da desordem também diz respeito aos conteúdos


circulados. Por um lado, como busquei mostrar (Cesarino a sair,a), parte importante da
campanha digital pró-Bolsonaro consistia em conteúdos alarmistas, conspiratórios, ou na
proliferação de narrativas e versões alternativas para todo fato político relevante – o que
defini acima como a terceira função metalinguística. Neste sentido, esse conteúdo visava a
produção e estabilização do mecanismo populista em si, que, por envolver uma construção
muito rápida e pouco orgânica do “povo”, se encontra sob risco constante desestruturação
repentina caso as pessoas não sejam interpeladas ininterruptamente. Esse já era o caso nos
populismos analógicos, mas na era digital ser bem sucedido numa economia da atenção
extremamente competitiva envolve um esforço especialmente intensivo (Harsin 2015). Não
por acaso, depois da posse Jair Bolsonaro e seu entorno precisavam continuar atuando
literalmente como influenciadores digitais: produzindo engajamentos constantes,
normalmente através de declarações polêmicas, sob pena de perderem influência – o que, no
seu caso, equivale à base de apoio popular do Executivo.

Há, finalmente, outro elemento que tem sido pouco notado, mas que venho
observando nos grupos de WhatsApp que frequento desde a campanha: a circulação de vídeos
e imagens contendo pornografia e violência explícita (torturas, mortes, estupros,
espancamentos), além de diversos esquemas fraudulentos e outras manifestações típicos das
economias ocultas que proliferam na contemporaneidade (Comaroff e Comaroff 2002). É
impossível saber qual a prevalência desse tipo de conteúdo nos celulares dos brasileiros. Mas
não é difícil supor que eles possam estar contribuindo para a produção da atmosfera de crise,
ameaça e pânico moral na qual os populismos conservadores e o punitivismo legal vicejam
(Wacquant 2009, Comaroff e Comaroff 2004).

2
A teoria do público e contrapúblico de Michael Warner mostra convergências notáveis tanto com a teoria do
populismo de Laclau quanto com a perspectiva de sistemas, inclusive em alguns dos paradoxos que ela aponta.
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Já a quarta função metalinguística indicada, referente à instituição de um mecanismo


de defesa eficaz baseado principalmente na inversão de acusações e no espelhamento dos
padrões estéticos e palavras de ordem do inimigo, tem produzido um tipo de polarização
condizente com o que Bateson (1972) descreveu como cismogênese. Este autor descreveu a
cismogênese simétrica como uma relação de oposição que consiste na reação à reação do
outro, assumindo um ritmo de escalada progressiva e crescente separação entre as partes que,
se não for de alguma forma “aliviada”, pode levar a uma ruptura definitiva entre elas. Como no
caso da corrida armamentista durante a Guerra Fria, a relação cismogênica persistente chega
ao ponto de o conteúdo da relação se tornar totalmente irrelevante – afinal, qual o sentido de
Estados Unidos e União Soviética produzirem ogivas nucleares suficientes para explodir o
mundo múltiplas vezes? A fronteira antagonística amigo-inimigo produzida pela campanha
Bolsonaro operou uma relação cismogênica análoga: os dois lados se tornaram
incomensuráveis, e o conteúdo do debate político, irrelevante, subsumindo-se inteiramente à
relação antagonística em si. Aí está o sentido, aparentemente irracional, de enunciados
frequentes como “se o PT é contra, eu sou a favor” – independente do conteúdo em questão.
Em outras palavras, a fronteira amigo-inimigo passa a se sobrepor a qualquer outra
consideração, inclusive àquelas relativas a processos de veridição e julgamento de evidências
factuais. Este é um dos modos pelos quais o populismo digital e pós-verdade se
retroalimentam.

Fica claro, portanto, que a estabilidade do mecanismo populista e do “povo” que ele
constrói depende do engajamento constante do opositor na relação cismogênica. Tanto antes
quanto depois da eleição, múltiplos adversários do bolsonarismo têm desempenhado esse
papel. E este papel – de uma oposição que vê Bolsonaro a partir da chave antagonística do
inimigo e não da perspectiva agonística de um adversário legítimo 3 – é, sem dúvida, esperado
por ele. Eu arriscaria mesmo a ir além: a esquerda tem se comportado, e mesmo mudado sua
auto-definição, cada vez mais de acordo com os padrões cismogênicos instituídos pela
gramática bolsonarista. Na medida em que esse padrão cismogênico continua em operação, é
possível defletir ou devolver qualquer acusação, pois o antagonimo subsume completamente
o conteúdo.

Um corolário dessa quarta função metalinguística é uma técnica bastante utilizada por
influenciadores bolsonaristas que poderíamos chamar de espelho invertido. Ela envolve a
produção de uma imagem simétrica e inversa de palavras de ordem, modus operandi e mesmo
padrões estéticos da esquerda, como demonstrei em outra ocasião (Cesarino a sair,a).
Desnecessário dizer, esse padrão envolve o estabelecimento de um universo dicotômico
exclusivo, com o esvaziamento e deslegitimação de posições políticas ambíguas ou terceiras
posições: é o caso, por exemplo, das acusações a Marina Silva e João Amoedo por posições
consideradas “em cima do muro”. A eficácia dessa estratégia cismogênica se apresentou ainda
no primeiro turno eleitoral, que foi marcado por um padrão de polarização binária
normalmente observado apenas no segundo turno.

A última função metalinguística indicada remete à produção de um canal midiático


exclusivo ligando liderança populista e “povo”. Durante a campanha, ela se cristalizou em

3
A diferenciação entre agonismo e antagonismo é de Chantal Mouffe (2000).
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conteúdos que atacavam principalmente três grupos: imprensa profissional; especialistas e


professores; e classe artística do mainstream (Cesarino a sair,a). O principal efeito pretendido
– que, em muitos dos memes, aparecia de modo explícito – era realizar uma inversão (Laclau
2005) onde a bolha bolsonarista passasse a ser considerada o lugar da verdade, e a esfera
pública e o sistema de peritos fossem vistos como o locus da mentira, da hipocrisia e da
manipulação. O carisma original do presidente, que se projetou enquanto candidato como
alguém “sem papas na língua”, aliou-se a uma cuidadosa encenação de precariedade
infraestrutural e espontaneidade ensaiada – notadamente nas lives, fotos e vídeos feitos em
sua casa na Barra da Tijuca.

Porém, o fator decisivo para o sucesso dessa estratégia parece ter sido o atentado à
faca sofrido pelo candidato ainda na campanha para o primeiro turno. A partir daquele dia, o
corpo físico da liderança carismática se retirou de cena por algumas semanas, e tomou seu
lugar aquilo que eu chamei, numa alusão a Kantorowicz (1998), do “corpo digital do rei”
(Cesarino 2019): o “exército” crescente de eleitores que passaram a fazer a campanha “de
graça” no seu lugar. Convenientemente, os autointitulados “marqueteiros do Jair” emergiram
no momento em que o jornal Folha de São Paulo noticiou os primeiros indícios de possíveis
ilegalidades no disparo de conteúdo através do WhatsApp – algo que, até o momento da
escrita deste texto, ainda não havia sido devidamente investigado pela justiça eleitoral.

Mas esse fenômeno foi além da produção de um canal midiático exclusivo e separado
da esfera pública mais ampla. Pois as affordances particulares das mídias digitais fizeram com
que o próprio mecanismo populista, tal qual o descrevi com base em Laclau (2005), fosse
fractalizado pela extensa rede digital formada que chamei, em outra ocasião, de bolsoesfera
(Cesarino, 2019, a sair,a). Em outras palavras, a topologia fractal da internet, e a excepcional
capilarização da campanha digital propiciada pelo smartphone e pelo WhatsApp, permitiram
replicar em todas as escalas da rede o mecanismo de mobilização populista originalmente
impulsionado pela candidatura Bolsonaro e seus aliados. Essa replicação, como o mecanismo
populista em si, se dá não no plano da consciência, mas no plano metalinguístico e
subconsciente do que Bateson (1972) chamou de deutero-aprendizado. Nesse sentido, o que
chamei da bolsoesfera não é um mero canal de comunicação entre líder e povo enquanto
entidades preexistentes – líder e povo só existem em e através desse canal midiático; ambos
são a infraestrutura digital que os mantém conectados, e não existiriam sem ela.

Uma das conclusões mais interessantes a que se chega com a análise cibernética do
populismo digital é, portanto, como ela problematiza um divisor que é central às discussões
sobre populismo no senso comum e mesmo na academia: aquele que opõe liberdade a
controle; espontaneidade a manipulação. Essa é uma questão que assombra o estudo de
fenômenos de massa desde ao menos fins do século XIX – e não por acaso, é a Gustave Le Bon
que Laclau dedica o primeiro capítulo de A razão populista. É como se ela tivesse sido colocada
em suspenso durante décadas de prevalência de pressupostos liberais na teoria política, que
contrapõem indivíduos autônomos a corpos coletivos; liberdade e autonomia a coerção e
controle. Ora, a cibernética avança justamente noções de “comando e controle” que operam
transversalmente a essas dicotomias – no que encontra precursores na teoria social como
Gabriel Tarde (2000), que trabalhou noções de imitação e contágio que são hoje centrais às
discussões não apenas sobre populismo, mas também sobre mídias digitais de modo mais
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amplo. Em sua exposição de princípios da antropologia digital, Miller e Horst (2012) também
notaram a centralidade da contradição aparentemente intratável entre liberdade e controle
nos estudos sobre a internet. É aqui que chegamos a algumas ressonâncias notáveis entre o
fenômeno populista e a arquitetura contemporânea das mídias digitais, assim como com o
modo como alguns autores conceituam neoliberalismo e o fenômeno emergente da pós-
verdade. A próxima seção será dedicada a apontar algumas delas.

Ressonâncias: linguagem, verdade, subjetividade, mediações e invisibilidade

Ao mesmo tempo em que analisava e descrevia o mecanismo do populismo digital, fui


percebendo outras recorrências no material encontrado no WhatsApp, mas que não pareciam
dizer respeito diretamente ao domínio da política tal qual costumamos entendê-lo. Algumas
delas, que já indiquei anteriormente (Cesarino, a sair,a), dizem respeito a domínios tão
diversos como a indústria do entretenimento, o etos futebolístico, o culto às celebridades,
religiões evangélicas, e uma pluralidade de elementos que associaríamos ao domínio
“econômico”. Essa constelação de sobreposições e ressonâncias chamou atenção para a faceta
neoliberal do fenômeno – algo que à primeira vista parecia afastar-se da retórica soberanista
defendida pelo então candidato.

A centralidade do “posto Ipiranga” Paulo Guedes na campanha e, posteriormente, no


governo Bolsonaro deixou clara a intimidade profunda entre seu populismo conservador e a
agenda neoliberal. Muitos já discutiram como a desorganização causada pela implementação
de políticas neoliberais desde os anos 1970 em diversos países tem gerado um desejo, tanto
prático quanto cognitivo, de ordem por parte da população. Wacquant (2009) e os Comaroffs
(2004) discutiram, por exemplo, como esse desejo tem se refletido num aumento do
punitivismo legal e do encarceramento em massa em países que vêm implementando políticas
neoliberais ao longo das últimas décadas. Há, aqui, uma recursividade importante: o aumento
da precariedade trabalhista e redução das proteções sociais alimentam a indústria do
punitivismo, e vice-versa. Não por acaso, os dois “superministros” do governo Bolsonaro,
Paulo Guedes e Sérgio Moro, representam justamente os dois pilares funcionalmente
articulados do neoliberalismo e do punitivismo legal.

Num outro plano está a aliança entre conservadores e neoliberais que, nos EUA, vem
ao menos desde os anos 1970 (Cooper 2015). Também aqui observa-se uma retroalimentação
fundamental, desta feita entre os planos das políticas de redistribuição e do reconhecimento
(Fraser 1997), onde a defesa da integridade da família aparece como funcionalmente
complementar à desestruturação das políticas do Welfare State. Em outras palavras: num
contexto de aprofundamento das reformas neoliberais, é à família – e não ao Estado – que o
indivíduo deverá recorrer quando estiver desempregado, velho ou doente demais para
trabalhar. Vemos exatamente o mesmo processo ocorrendo no Brasil nos últimos anos,
chegando ao seu extremo na adulação incondicional do atual presidente a certos setores do
movimento evangélico – mesmo não sendo, ele próprio, convertido.

Há, ainda, um modo menos evidente, porém possivelmente mais profundo, com que
identidades conservadoras e subjetividades neoliberais têm se articulado na direita emergente
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brasileira – que inclui o bolsonarismo, mas certamente não se resume a ele. Estou
desenvolvendo em outro lugar um argumento de que a separação “conservador nos costumes,
liberal na economia” é enganadora. A construção da identidade popular operada por
Bolsonaro tem como um de seus eixos principais uma gramática claramente neoliberal,
centrada na desqualificação moral da luta por direitos e proteções pelo Estado, por políticas de
redistribuição que supostamente cobririam a “livre iniciativa”, e pela regulação dos mercados
(inclusive, o das mídias digitais). Em outras palavras, a batalha conservadora de Bolsonaro
contra o “marxismo cultural” e o “socialismo” é, basicamente, a batalha neoliberal contra
regulações estatais. Neste sentido, o populismo de Bolsonaro deve ser visto como
essencialmente neoliberal: ou seja, operando de modo bivalente articulando reconhecimento
e redistribuição.

Mas há, ainda, um terceiro plano de co-produção entre populismos conservadores e


neoliberalismo, para o qual a perspectiva cibernética parece ser especialmente adequada.
Minha inspiração neste ponto vem sobretudo de autores contemporâneos que têm avançado
perspectivas menos ortodoxas sobre o neoliberalismo, como Philip Mirowski (2009, 2019),
Jean e John Comaroff (2000, 2004) e Will Davies (2018). Não obstante suas diferenças, esses
autores têm entendido o neoliberalismo como mais que um tipo de doutrina econômica, e
mesmo mais que uma ideologia ou cultura do capitalismo tardio: ele aparece como um tipo de
reestruturação das bases epistêmicas da modernidade. Mas o que significa pensar
neoliberalismo no plano epistêmico?

Concluirei aproximando essa questão através de cinco ressonâncias notáveis entre o


que se tem chamado de populismos conservadores, neoliberalismo, pós-verdade e o modus
operandi contemporâneo das mídias digitais (Marres 2018, Zuboff 2019). Essas ressonâncias
são tão estreitas a ponto de eu preferir considerar, hoje, que o que tem sido identificado como
fenômenos separados são, na prática, o mesmo processo.

Linguagem. De modo mais evidente, há o tipo de linguagem que perpassa toda a


constelação que vimos abordando. Eu já havia notado, em outra ocasião, afinidades
fundamentais entre a linguagem da memética e o discurso populista (Cesarino a sair,a).
Embora tenham se desenvolvido historicamente em separado, estes apresentam hoje uma
convergência clara em termos da sua linguagem simples, vaga, redundante e reducionista,
frequentemente binária (Cesarino 2006, a sair,a). Mas essas também são características de
habilidades neoliberais como auto-ajuda, coaching, e a linguagem empresarial e de auto-
empreendorismo hoje difundida em todos os domínios da vida (inclusive, nas redes sociais).
Embora essas últimas não contenham o componente antagonístico tão marcante nos
populismos conservadores, em todos os casos trata-se de uma linguagem essencialmente
performativa, com fortes componentes poéticos e afetivos, que visa gerar certos efeitos sobre
os interlocutores.

Para além da estratégia eleitoral por trás da mobilização desse tipo de retórica por
lideranças populistas contemporâneas (Cesarino 2019b), a própria arquitetura das redes
sociais tem contribuído para a proliferação desse tipo de linguagem. Talvez mais evidente seja
o caso do YouTube, cujos algoritmos demonstram uma forte afinidade com o tipo de conteúdo
conspiratório e alarmista que, como mostrei (Cesarino a sair,a), é uma das bases do populismo
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digital. De modo mais amplo nas redes sociais, abunda uma linguagem do combate e da
“lacração”, bastante diferente do que seria esperado de uma retórica política tradicional
baseada no debate respeitoso e impessoal, com um horizonte de construção de consenso,
evidenciação das complexidades do mundo real, etc (Davies 2018). Um terceiro ponto a ser
destacado é como, nas redes sociais de modo geral mas em especial nos contextos de hiper-
polarização política propositalmente induzidos pela retórica populista, a linguagem humana
vem se aproximando cada vez mais da linguagem maquínica gerada por algoritmos, como os
bots. Muitas vezes, em certos ambientes como o Twitter e o Facebook, é difícil diferenciar
enunciados humanos daqueles automatizados.

Verdade. A episteme neoliberal tal qual descrita por Mirowski (Mirowski e Plehwe
2009, Mirowski 2019) permite uma articulação nodal com os outros ângulos da constelação
em tela. Ao longo dos últimos anos, este autor tem avançado o argumento de que o “coletivo
de pensamento neoliberal”, inaugurado pela Sociedade Mont Pèlerin nos anos quarenta, criou
e refinou mais que uma agenda econômica: uma doutrina epistêmica, em larga medida para se
opor ao ímpeto planejador e intervencionista do socialismo e da social-democracia. Mirowski
chamou atenção para o pioneirismo de Von Hayek em ver o mercado não apenas como um
mecanismo eficaz de alocação de recursos, mas como um mecanismo cognitivo. De acordo
com essa proposta epistemológica, a verdade só pode emergir como um a posteriori, resultado
da livre interação dos agentes individuais no mercado. Esse pressuposto fundamental depende
de outro: nenhum indivíduo ou agência planejadora seria capaz de ter acesso privilegiado à
verdade – nem o Estado, nem as estatísticas, nem mesmo a ciência. Nesse sentido epistêmico,
o neoliberalismo seria não uma extensão ou aprofundamento da modernidade, mas
encamparia um projeto essencialmente anti-moderno e anti-iluminista.

Essa conclusão – uma glosa que eu faço da proposta de Mirowski – aproxima o


entendimento desse autor do modo como Jean e John Comaroff vêm abordando o tema do
neoliberalismo nas duas últimas décadas. Não por acaso, as discussões de Mirowski sobre o
avanço do neoliberalismo no campo tecnocientífico encontram ecos notáveis, e inusitados,
com a descrição dos Comaroffs sobre as “características enigmáticas da economia e sociedade
no entorno do ano 2000” (2002: 44) – por exemplo, a proliferação de estruturas de produção
de valor do tipo “esquema-pirâmide” (Mirowski 2012). O que o casal antropólogos chamou de
metafísica da desordem e da “segunda vinda” do capitalismo (Comaroff e Comaroff 2002,
2004) também encontram eco em múltiplos fenômenos hoje característicos da era digital:
temporalidades apocalípticas religiosas e seculares (como o Antropoceno), religiões
carismáticas, pseudo-ciências como terraplanismo, economias ocultas, esquemas-pirâmide e
outras modalidades de casino capitalism, fake news, assim como práticas epistemológicas
envolvendo rumores, teorias da conspiração e linchamentos morais que lembram fenômenos
há muito estudados por antropólogos, como bruxaria e feitiçaria.

Subjetividade. Ressonâncias mais evidentes entre mídias digitais e neoliberalismo


incluem o modo como as redes sociais têm funcionado como ferramentas pedagógicas de
auto-empreendorismo neoliberal (Mirowski 2019). O populismo digital, como vimos, também
envolveu um grau elevado de empreendorismo digital por parte dos “marqueteiros do Jair”.
Seria equivocado, contudo, aceitar sua auto-descrição como um trabalho gratuito
desvinculado de qualquer geração de valor econômico. Afinal, navegar nas redes digitais
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bolsonaristas no Brasil de hoje é transitar por múltiplas formas de monetização de clicks:


desde canais do YouTube buscando monetizar-se (que explodiram nos grupos de WhatsApp
depois da eleição) e click baits em sites de conteúdo político duvidoso financiados por interest-
based advertising, até ofertas de master classes, livros e coaching por parte de influenciadores
da nova direita.

Mais importante para a perspectiva cibernética me parece ser, contudo, o pressuposto


neoliberal do sujeito pouco confiável cognitivamente e portanto influenciável, pois ele faz
parte tanto da arquitetura digital contemporânea das redes sociais (Marres 2018) quanto do
neoliberalismo enquanto epistemologia (Mirowski 2019) e do mecanismo neopopulista tal
qual descrito por Laclau (Cesarino 2019). O que chamamos de pós-verdade talvez seja
simplesmente uma concretização e difusão desse pressuposto comum. Uma das minhas
hipóteses a esse respeito é que parte dos usuários das mídias sociais opera com pressupostos
de linguagem referencial num universo de linguagem essencialmente performativa. Aqui, cabe
uma comparação interessante com práticas epistêmicas não-modernas como a bruxaria, onde
o controle da entropia informacional se dá fundamentalmente através da “causa socialmente
necessária”, ou a “segunda lança” de que falou Evans-Pritchard (2005). Em outras palavras,
essas práticas de conhecimento, em seu contexto tradicional, logravam um equilíbrio dinâmico
entre enunciado e realidade (Latour e Woolgar 1997). Uma diferença importante com relação
à pós-verdade, contudo, é que as pessoas em sociedades permeadas pela bruxaria
reconhecem a sua própria vulnerabilidade, e sabem o que devem fazer para se proteger.4 Por
outro lado, no ambiente online de entropia informacional generalizada onde tudo pode ser
fake – ou não – muitos usuários não reconhecem a própria vulnerabilidade. Portanto, não
sabem se proteger, e muitas vezes sequer reconhecem a natureza do perigo. Somado a isso
está a crise do sistema de peritos: os sujeitos comuns vêm cada vez mais perdendo a confiança
em estruturas neguentrópicas tradicionais da modernidade, como o jornalismo profissional, os
especialistas e a própria ciência. No caso da política, essa desconfiança tem atingido
duramente o componente institucional do espectro democrático – resultando numa inflação
desmedida do componente da soberania popular no qual tipicamente se apoiam as lideranças
populistas (Mouffe 2000; Cesarino a sair,a).

Vale notar, a este respeito, que muito do que se associa à pós-verdade hoje, como o
terraplanismo, apresenta uma estrutura epistêmica-sociológica bastante similar à da mecânica
populista. Aqui também opera uma inversão muito parecida com a que descreve Laclau, onde
quem era o outsider, o ignorante, se torna alguém dotado de conhecimento superior e
exclusivo. Como os ufólogos antes da internet (Antunes 2015), terraplanismo tem envolvido
grupos fechados, baseados no compartilhamento de um segredo desconhecido (ou
acobertado) pela sociedade envolvente. O acesso se dá por meio de conversão às vezes
gradual, às vezes brusca, mas sempre envolvendo algum tipo de Gestalt switch. Relatos
anedóticos como o documentário Behind the Curve indicam que esse tipo de fenômeno tem
atraído sujeitos vulneráveis, em busca do reconhecimento e socialidade que não encontram na
sociedade mais ampla. Assim, como o populismo descrito por Laclau, o terraplanismo pode ser
visto como um significante vazio que articula processos de formação de grupo e uma
identidade coletiva anti-establishment. Significativamente, terraplanismo, olavismo e

4
Suzane Alencar Vieira, em mesa redonda no V Encontro de Antropologia da Política, em 2019.
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virtualmente todo o resto das epistemologias alternativas emergentes no campo do


conservadorismo têm se proliferado e adquirido influência por meios digitais. As diferentes
veias conspiratórias se contagiam e se reforçam mutuamente – o que vai ao encontro da
ênfase no user-generated content e padrões de mediações algorítmicas das tech giants
(Marres 2018).

Mediações. Talvez a principal característica comum da constelação em tela seja o


enfraquecimento de intermediários autorizados e “monopólios” de mediação que até então
estruturavam a produção e circulação de informação na esfera pública. Esse enfraquecimento
é parte constitutiva do momento neoliberal: à desestruturação do Welfare State tem
correspondido a fragilização de estruturas epistêmicas como o sistema de peritos e a
broadcast media. É novamente Mirowski (2019) que faz o argumento mais contundente sobre
o neoliberalismo nesses termos. Central à doutrina neoliberal está a aplicação da teoria da
informação à ciência econômica, baseada no pressuposto do mercado como o processador de
informação mais perfeito que poderia existir (e na premissa complementar dos indivíduos
como pouco confiáveis cognitivamente). No mundo digital de hoje, os algoritmos incorporam
de modo notável o tipo de mediação preconizado pelos neoliberais de Mont Pèlerin – é como
se a própria internet e as mídias digitais tivessem, décadas depois, propiciado a concretização
retrospectiva daquela doutrina.

Uma convergência notável neste sentido é o modo como populismo, livre-mercado,


mídias digitais e pós-verdade baseiam-se todos em mediações que produzem experiência de
não-mediação. Todo mecanismo populista visa a produção de uma contiguidade direta entre
líder e povo – efeito este hoje potencializado de modo inédito pelas affordances do digital
(Cesarino 2019, a sair,a). Nas redes bolsonaristas, a experiência de não-mediação torna-se
especialmente evidente na expectativa de que mensagens dos cidadãos comuns cheguem até
o smartphone do presidente. Como também fazem influenciadores digitais de modo geral, o
próprio presidente contribui estrategicamente para este efeito: por exemplo, ao justificar
decisões de governo com base em solicitações de seus eleitores feitas diretamente através de
redes sociais, notadamente no Facebook e Twitter. Do ponto de vista do cidadão comum, todo
o aparato do sistema representativo passa a parecer desnecessário, e até mesmo prejudicial
ao exercício da “soberania popular”.

Em sua versão vulgar, a ideologia do livre-mercado trabalha com a ideia de que basta
retirar entraves regulatórios estatais para que as relações fluam “naturalmente” na melhor
direção possível. É como se, na base da prática de livre-mercado, não houvesse distorções,
monopólios ou assimetrias, e como se a falta de regulação não levasse a concentrações e
oligopólios – como tem ocorrido, notadamente, com a indústria de TI. O modo como o modelo
de negócio de grandes empresas como Facebook e Google tem estruturado as mediações
online é, contudo, largamente invisibilizado: dos algoritmos à coleta de dados pessoais; das
múltiplas formas de monetização a todo o aparato que Zuboff (2019) sintetizou sob o rótulo de
surveillance capitalism.

O resultado da reestruturação epistêmica provocada pela universalização das


mediações digitais é o que tem sido chamado de era da pós-verdade. Com a crise do sistema
de peritos, tem-se observado a ascensão de epistemologias que pretendem operar sem
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mediações estruturadas, como aquelas baseadas na experiência imediata ou em elos causais


ocultos. Nos grupos de WhatsApp pró-Bolsonaro, é visível o modo como usuários que já
abandonaram o sistema da peritos e a imprensa profissional passam a se apegar a, além da
lógica antagonística, uma lógica do “ver para crer”. Entre os diferentes tipos de mídias
circulados, os vídeos em especial parecem ter adquirido um status epistemológico superior –
uma (aparente) segurança epistemológica que provavelmente será logo abalada pela
popularização dos chamados deep fakes.

Invisibilização. A proliferação de mediações que escondem a si próprias resulta no


obscurecimento de assimetrias e hierarquias, bem como no deslocamento da accountability.
Uma característica marcante dos novos populismos conservadores, por exemplo, tem sido o
deslocamento da disputa política para o plano das “guerras culturais” (Gallego et al, 2017) –
embora sejam eles mesmos, como sugeri acima, essencialmente bivalentes. Tanto a retórica
populista quanto a neoliberal deslocam a accountability para outro lugar que não o próprio
mercado, mobilizando no seu lugar significantes vazios do “inimigo” como o Estado (de Bem-
Estar), imigrantes, bandidos, corruptos, etc. As tech giants têm seguido a mesma linha de
auto-desresponsabilização (Zuboff 2019): preferem, por exemplo, se resguardar sob o rótulo
de empresas de tecnologia a reconhecer que atuam, de fato, como empresas de comunicação
– com todas as implicações regulatórias que isso poderia gerar.

Finalmente, em toda a constelação que vimos abordando, vemos a recorrente


mobilização daquilo que, na indústria digital, é chamado de user-generated content. No caso
do populismo, demonstrei como um dos fatores da eficácia do mecanismo digital de Bolsonaro
foi, justamente, sua fractalização (Cesarino, 2019, a sair,a). Ou seja, os próprios eleitores
passaram a compor e circular conteúdos estruturados segundo a mecânica discursiva da
campanha, visto que o formato digital permite a qualquer um replicar – de modo não
necessariamente consciente – uma técnica extremamente simples. A campanha Bolsonaro se
beneficiou amplamente da vontade de “viralizar” e da promessa de fama instantânea típicas
da dinâmica das redes sociais de modo mais amplo.

Mirowski colocou de modo sintético como se dá a retroalimentação entre


neoliberalismo e mídias digitais neste ponto, que se articula bem com os demais aqui
levantados:

Eles [o coletivo de pensamento neoliberal] não poderiam tê-lo antecipado nos anos
sessenta, mas a mercantilização da internet foi o apogeu da visão de Stigler de uma
ecologia da atenção das massas. Basicamente, o projeto político consiste não em
convencer diretamente da superioridade do mercado sobre a sociedade num sentido
didático, mas sim utilizar o mercado como um amplificador para reciclar as
vulgaridades, tolices, amenidades - em suma, todo o ruído - de volta para aqueles que
o produziram inicialmente, em um loop de retroalimentação cibernético, a ponto de as
pessoas perderem a noção do que se passa no seu próprio mundo.5

5
Tradução livre do original: “They could not have anticipated it back in the 1960s, but the marketization of the
Internet turned out to be the culmination of Stigler’s vision of an ecology of mass attention. Basically, the political
project is not to directly convince anyone of the superiority of the market for society in any didactic sense; it is rather
to use the market as an amplifier to recycle the vulgarity, twaddle, gibberish and overall noise back into the public
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Cabe notar, finalmente, que inovações tecnológicas têm propiciado a expansão desse
modelo de negócios baseado em inputs oferecidos pelo usuário para a economia off-line,
especialmente através da sharing economy de plataformas como Uber e AirBnb (Zuboff 2019).
Observa-se, nesta junção, a substituição progressiva de formas fordistas de trabalho e
mobilidade social por novas formas de empreendorismo individual (notadamente, digital),
além da financeirização e outras modalidades de “get-rich-quick schemes” típicas do momento
neoliberal (Mirowski, 2019; Comaroff e Comaroff, 2000). Afinal, o que o neoliberalismo tem
oferecido às pessoas em troca da precarização do trabalho e da vida é – nos termos de um dos
muitos parlamentares meteóricos eleitos pela nova direita em 2018 – a promessa de ganhar
muito dinheiro “sem trabalhar muito por isso”.6 Nesse ciclo de recursividades aparentemente
interminável e incontrolável, o neoliberalismo vai criando as condições para a sua própria
reprodução.

Considerações conclusivas

Desde seus primórdios, os estudos sociais da ciência e da tecnologia têm lidado com a
questão da estabilização dos fatos, ou daquilo que no ocidente se conhece como verdade. Boa
parte da literatura etnográfica e histórica neste campo tem se dedicado a mostrar como esse
processo envolve inúmeras mediações e intervenções no mundo “natural” (Kuhn 2006, Latour
e Woolgar 1997, Hacking 2012). Mas essa mesma literatura também mostra o quanto essas
mediações vinham se dando de forma organizada, em larga medida dentro de estruturas
relativamente fechadas como laboratórios (Latour e Woolgar 1997), ou, de modo mais amplo,
o tipo de “comunidade especial” que caracteriza as ciências (Kuhn 2006). O que parece
acontecer hoje – num contexto em que hegemonia neoliberal, mídias digitais e populismos
conservadores convergem em uma espécie de “tempestade perfeita” (Cesarino a sair,b) – é a
abertura aparentemente caótica dos processos de produção de verdade e sua pulverização por
uma paisagem digital cada vez mais ampla e pouco regulada. Porém, como nos atratores
estranhos descobertos por Lorenz – um dos ícones da teoria do caos – parece haver alguma
ordem por trás da aparente desordem; é o que busquei indicar aqui.

Cabe concluir notando que essa paisagem não é nem neutra, nem inevitável, mas tem
sido estruturada sobretudo pelos modelos de negócios das grandes corporações da tech
industry (Marres 2018). O sucesso econômico extraordinário do setor tem se baseado
fundamentalmente em dados e conteúdos gerados pelos usuários, e permanece escorregadio
à regulação por parte das estruturas legais do estado democrático de direito (Zuboff 2019).
Para utilizar a distinção heideggeriana que inspirou Laclau (2005):7 a ontologia da produção da
verdade – como a descreve, por exemplo, as teorias cibernéticas e de sistemas – não mudou; o

that generates it in the first place, in a cybernetic feedback loop, to such an extent that they have no clue what is
actually going on in their own world.”
6
Post de Ana Caroline Capagnolo no Twitter em 2012, “desenterrado” por usuários da plataforma depois que ela foi
eleita deputada estadual pelo PSL de Santa Catarina em 2018.
7
No caso de Laclau e Mouffe, o “político” refere-se à dimensão ontológica (ou seja, algo intrínseco à condição
humana e, poder-se-ia supor, de alguma forma presente em outras culturas), e a “política”, ao seu desdobramento
no plano ôntico de situações históricas particulares. Essa diferenciação ecoa formulações clássicas na antropologia
sobre estrutura e prática, sistema e história.
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que mudou foi seu desdobramento ôntico numa prática histórica radicalmente alterada com o
fim da Guerra Fria, a ascensão neoliberal e a explosão das mediações digitais por um mundo
cada vez mais desigual.

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