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Este excerto apresentado consoante à estrutura interna corresponde à exposição e à estrutura externa corresponde ao Ato I, Cena I-IV,

onde são dadas informações sobre o passado das personagens.

FREI LUÍS DE SOUSA, de ALMEIDA GARRETT

Ato I - Passa-se numa “câmara antiga com todo o luxo e caprichosa elegância do século XVII”, no palácio de Manuel de Sousa Coutinho, em Almada.
Este espaço elegante pretende corresponder à felicidade e harmonia familiar que aí se vive.
Cena I - Monologo de Madalena
Madalena lê Os Lusíadas, no episódio de Inês de Castro.
Compara-se a Inês mas sente-se mais infeliz porque os terrores contínuos, os medos não a deixam viver um único instante de felicidade, nem sequer
breve… A linguagem e emotiva.

Refere a importância da primeira didascália.


A primeira didascália, através das referências temporais e espaciais, permite-nos situar a ação num tempo (século XVII) e num espaço (margem
esquerda do Tejo) precisos e caracterizar o espaço físico em que a mesma terá lugar. De salientar aqui a alegria que as porcelanas e as flores
conferem ao ambiente.

3. Os versos que D. Madalena lê referem-se ao episódio de Inês de Castro, situado no canto III de Os Lusíadas. Explica o motivo
que está na origem da analogia entre a personagem e a figura histórica.

A identificação da personagem com a figura histórica tem origem no facto do amor infeliz e trágico que uniu D. Pedro e D. Inês ser associado por D.
Madalena ao seu amor por Manuel de Sousa Coutinho pois, para ela, trata-se de um sentimento proibido.

Compara D. Madalena e D. Inês, interpretando o significado do “engano” que ambas experimentaram.

Para D. Madalena, o “engano” é consciente, por ter amado Manuel de Sousa ainda em vida de D. João; o sentimento de culpa persegui-la-á sempre.
Para D. Inês, o “engano” é “ledo e cego”, ou seja, alegre e inconsciente, por não querer saber das repercussões que isso irá ter na sua vida.
À semelhança de D. Inês, D. Madalena oscilará entre a efémera alegria e a cegueira exacerbada, não podendo fugir a um destino traçado. Em ambos
os casos, a paixão ser-lhes-á fatal.
Comenta a expressividade da pontuação.
O predomínio das reticências, das exclamações, das interjeições, das repetições e das frases curtas traduz a função emotiva da linguagem, isto é, o
estado de espírito de Madalena ( tristeza e prostração).
Cena II . Telmo, Madalena
Telmo conversa com Madalena e aflige-a com recordações do passado. Nesta cena, todas as personagens são apresentadas:
Manuel de Sousa surge desvalorizado em relação a D. João de Portugal.
Maria é sempre caracterizada positivamente – curiosa, compreende tudo, formosa, bondosa, viveza de espírito.
Telmo – escudeiro valido e fiel, familiar quase parente… Cheio de agoiros e pressentimentos.
Estrutura-se, nesta cena, uma analepse, onde as personagens recuam 21 anos – batalha de Alcácer Quibir (1578), mais sete anos de busca (1585)
-  2º casamento de Madalena, nascimento de Maria mais um ano (1599) – presente da ação.
Telmo confessa-se um crente no regresso de D. João e justifica a sua credulidade pelas palavras de uma carta escrita por d. João, onde esta garantia
que “vivo ou morto” haveria de voltar.
Madalena pede a Telmo que não fale a Maria em assuntos relacionados com a batalha e D. Sebastião… e ele promete que o fará.
Madalena está preocupada com a demora de Manuel de Sousa que foi a Lisboa, é tarde e não aparece. Pede a Telmo que vá saber noticias junto de
frei Jorge
1.
2. Esta cena – a mais longa da obra – constitui um momento de exposição em que, através das falas de Telmo e de Madalena, nos
são dadas informações sobre o passado das personagens.
Personagens caracterizadas por Telmo:
D. Madalena — “(...) tão nobre e honrada senhora que sois” ;
Manuel de Sousa Coutinho — “(. ..) acabado escolar (...)“ ; “(...) fidalgo de tanto primor (...) toda a Espanha.” ; “(...) é guapo cavalheiro (. . . )
português”;
Maria — “Tem treze anos (...) menina!” ; “Um anjo (...) coração!” ; “É delgadinha (...) inrijar.”
“E daí começou-me a crescer (...) bondade,” (ll.60-62) “Compreende tudo!”;
D. João — “(. . .) espelho de cavalaria (...) meu santo amo!”.

Personagens caracterizadas por Madalena:


D. Madalena — “(...) depois daquela funesta jornada de África(...)dezassete anos!”;
Manuel de S. Coutinho — “(...) tão bom mareante (...) Malta!” ; “Aquele carácter inflexível (. ..) contínuo.”;
Maria — “(...) tem crescido demais (...) meses últimos...” ; “. . . e em tantas outras coisas (...) muito forte.”; “Maria tem uma compreensão
“Abençoou-nos Deus (...) anjo...” ; “. . .não vês que (...) perspicaz!”;
Telmo — “Conheci-te de tão criança (…) amos...”.

3. Relaciona o vocabulário utilizado na caracterização de Maria com as preocupações de D. Madalena em relação à filha.
D. Madalena manifesta um medo constante pela fragilidade da filha, usa vocabulário em crescendo, excessivo, ligado a agouros.

“Telmo - … que lá isso! … acabado escolar é ele” Refere-te à força expressiva da partícula enfática “lá” quanto ao que revela do
conceito em que Telmo tem Manuel de Sousa.
A partícula enfatiza o facto de Telmo nunca ter visto Manuel de Sousa como seu verdadeiro amo; com este “lá”, abre exceção para deixar claro em
que medida o admira: apenas como mestre da língua portuguesa.
Compara as figuras de D. João de Portugal e de Manuel de Sousa Coutinho, do ponto de vista de Telmo.
Telmo hierarquiza-os:
- D. João continua a ser o seu amo, mantendo-se-lhe fiel; vota-lhe a maior admiração, sem restrições, como valente batalhador, como homem de
palavra, como nobre, como fiel amante da sua mulher.
- Manuel de Sousa merece-lhe, sobretudo, respeito como valoroso homem de letras, nunca lhe reconhecendo direitos de marido legítimo.
4.
5. Esta cena apresenta dois grandes momentos marcados por uma mudança radical na atitude por parte de Madalena. Transcreve
a didascália que marca essa transformação
Madalena (enxuga os olhos e toma uma atitude grave e firme). – p. 30
6. No primeiro momento, identifica:
A passagem que melhor põe em evidência a influência que Telmo exerce em Maria;(página 26)
A fala de Telmo em que este reconhece a evolução dos seus sentimentos por Maria;(página 27)
Os pedidos que Madalena faz a Telmo;8página 28)
As profecias e agouros de Telmo;(página 28)
As acusações que Telmo faz a Madalena.(páginas 28 e 29)
7.
8. No segundo momento, Madalena tenta convencer Telmo a não continuar a alimentar a já fértil imaginação de Maria. Para tal,
Madalena faz uma espécie de síntese do seu passado. Que aspetos da sua vida refere:
A altura da sua vida em que ficou só no mundo;
O papel que desempenha Telmo na sua vida;
As diligências que fez para encontrar D. João.

9. Nesta cena, são então apresentadas algumas informações sobre o passado das personagens.
Refere-as.
- D. Madalena casara em primeiras núpcias com D. João de Portugal; este desaparecera na Batalha de Alcácer Quibir (4 de Agosto de 1578);
- D. Madalena procurou o primeiro marido durante sete anos;
- D. Madalena casou com Manuel de Sousa Coutinho após esse período; esse casamento dura há catorze anos; deste enlace nasceu D. Maria, com 13
anos à data do início da acção.
Telmo é a personagem que impede a dissociação entre o passado e o presente.Justifica a afirmação.
Telmo não crê na morte de D. João e evoca a carta escrita por seu antigo amo na madrugada da batalha de Alcácer Quibir, na qual afirmava que
“vivo ou morto” apareceria ainda a sua esposa, o que motiva o terror de Madalena, alimentado pelos agouros de Telmo.

A que “quimera” e a “fantasma” se refere D. Madalena?


O “fantasma” é D. Sebastião” e a “quimera” é o sonho de que ele esteja vivo. Se isto viesse acontecer, poderia constituir uma desgraça para
Madalena, pois D. João poderia também estar vivo.

Interpreta o significado das sistemáticas interrupções das frases nas intervenções de Madalena.
As constantes interrupções das falas de Madalena, representadas pelas reticências, mostram as suas hesitações, os seus medos, o seu terror de falar
do seu passado, como que temendo que ao falar dele ele pudesse voltar.

Cena III – Madalena, Telmo e Maria


Maria evidencia a sua cultura e gosto pela leitura. Pede a Telmo o livro da ilha encoberta… mostra-se uma crente no sebastianismo.

Madalena tenta levar a filha a não acreditar nem em fantasmas nem em fantasias do povo.
Esboça-se um pequeno conflito de Maria com o pai e com a mãe, pois ambos não aceitam ouvir falar do regresso de D. Sebastião. Tal causa
estranheza em Maria.

Cena IV – Madalena e Maria


É feito o retrato físico e psicológico de Maria.
Maria não consegue entender nem compreender a perturbação e preocupação dos pais com ela.
D. Madalena não pode relevar a causa das suas preocupações…
Sem querer, Maria martiriza a mãe, afirmando que lê nos olhos, nas estrelas e sabe muitas coisas, mostrando-se portadora de uma forte imaginação.
Madalena não responde às questões da filha e tenta desviar de Maria, pedindo-lhe que fale do seu jardim.
As flores simbolizam a brevidade da vida.
As flores de Maria murcharam. Não será um presságio da sua morte?
Retrato físico de Maria: aspeto frágil; é doente havendo várias referências a sua saúde frágil. Teria provavelmente tuberculose, doença comum na
época (séc. XIX) da produção/escrita da obra. Lema das características atribuídas aos doentes era extraordinária capacidade auditiva. Maria era
capaz de ouvir sons que mais ninguém conseguia ouvir.
Retrato psicológico de Maria: é perspicaz, possuí uma intuição premonitória (prevê o futuro), que é alimentada pelos sonhos e pelas deduções a
partir do que vê, do que ouve e do que lê. É corajosa e destemida, idealista, utópica.

Cena V – Jorge, Madalena, Maria


Frei Jorge traz a notícia de que os governadores saíram de Lisboa e querem vir hospedar-se na casa de Manuel de Sousa, a noticia é dada
progressivamente.
Maria e Madalena reagem de formas distintas: Maria mostra-se entusiasmada, dá largas à sua imaginação, idealismo e patriotismo; Madalena revela
alguma ingenuidade, é individualista e não revela qualquer sentido patriótico
Novos sinais da doença de Maria: ouve a voz do pai e percebe que vem “afrontado”
Cena VI – Jorge, Madalena, Maria e Miranda
Miranda anuncia a chegada de Manuel de Sousa / confirmação dos sinais da doença de Maria.
Madalena e frei Jorge ficam preocupados e destacam a agudeza do ouvido de Maria. Chamam-lhe “Terrível sinal”.
Cena VII – Jorge, Madalena, Maria, Miranda, Manuel de Sousa

É noite fechada. Manuel de Sousa entra num tom precipitado e agitado, dando ordens aos seus criados.
Algo estranho se passa e Madalena preocupa-se.
Manuel de Sousa usa o seu latim nas suas falas – personagem culta = estatuto social elevado .Manuel de Sousa confirma as notícias trazidas por frei
Jorge na cena V e anuncia que é preciso saírem imediatamente daquela casa. Face a este anúncio, Maria reage de forma eufórica, intensa e
patriótica; Madalena fica assustada e tenta contrariar Manuel

Cena VIII – Madalena e Manuel de Sousa


Nesta cena contrasta a linguagem serena e decidida de Manuel de Sousa com a linguagem emotiva, hesitante e assustada de madalena.
Manuel mostra-se um herói clássico, racional, o homem presente, o patriota, de consciência limpa, nada teme e para ele não há razões que
justifiquem não mudar para o palácio que fora de D. João.
Madalena age pelo coração, é modelo da heroína romântica, assustada, ligada ao passado cheia de pressentimentos e crente que vai morrer, infeliz,
naquela casa.
Manuel de Sousa tenta chamá-la à razão e pede-lhe que atente na sua condição social, o ajude e apoie neste momento tão decisivo da sua vida.

Contextualiza a cena na estrutura interna e externa da obra em que se insere.


Relativamente à estrutura externa, o excerto insere-se no acto primeiro, cena VIII, da obra Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett; quanto à
estrutura interna, integra-se no conflito.
Nesta cena estão em confronto Manuel de Sousa e Madalena.
Organiza os substantivos da lista que se segue, em função das personagens a que eles se reportam.

 razão  determinaçã  emoção  honra


o
 lealdade  hesitação  terror
 patriotismo
 lucidez  passado  individualism
 presente o

Madalena: emoção, hesitação, passado, terror, individualismo.


Manuel de Sousa: razão, lealdade, lucidez, determinação, patriotismo, presente, honra.

Faz o levantamento dos argumentos que Manuel de Sousa Coutinho apresenta para convencer Madalena da necessidade de se
mudarem para a casa que foi de D. João.
Manuel de Sousa apresenta-se decidido, racional, tentando mostrar a Madalena que os receios que ela revela são apenas “caprichos”: “Não temos
outra casa para onde ir;”; “Eu não tenho ciúmes de um passado que me não pertencia.” ; “Não há senão um temor justo (...) das más acções que
fazemos”.

Baseando-te nas suas falas, explica por que razão podemos afirmar que Madalena de Vilhena é uma personagem dominada pela
emoção.
Madalena reage emocionalmente, de forma excessiva, à possibilidade de ter de mudar para a casa onde viveu com o primeiro marido. Revela-se
incapaz de argumentar de forma coerente, limitando-se a enunciar temores que não consegue fundamentar, a profetizar catástrofes que recairão
sobre a família, evidenciando a convicção de que o passado poderá regressar e abater-se sobre o presente. Reconhece mesmo que se trata de
loucura. A emoção perpassa ao nível do próprio discurso, pleno de hesitações, suspensões, frases exclamativas, interjeições e apelos pungentes.
Pelo contrário, de Manuel de Sousa Coutinho poderá dizer-se que se caracteriza pela racionalidade.
Refere todos os elementos que, no discurso desta personagem, fundamentem a afirmação anterior.
Manuel de Sousa Coutinho revela lucidez e capacidade de ajuizar sem se deixar perturbar pelas emoções. A sua primeira fala revela-o como um
homem que, embora respeite o passado, vive o presente, agindo de modo pragmático e determinado, de acordo com os seus valores,
nomeadamente o patriotismo e a honra: “Há-de saber-se no mundo que ainda há um português em Portugal.”
Na segunda fala, Manuel de Sousa Coutinho revela uma fé inquestionável, embora temperada pela lucidez que resulta da sua convicção na dignidade
humana e na responsabilidade individual de cada um pelos seus actos. É exactamente à fé que recorre como forma de aquietar D. Madalena,
afirmando que rezarão ambos pela alma da figura que Madalena tanto teme. O seu apelo final à esposa vai no sentido de ela recuperar a postura
digna que deve a si própria e aos seus antepassados e de não perturbar com receios injustificados uma acção que exige um empenho total de razão
e emoção — “que as preciso inteiras nesta hora.”
Identifica as linhas dominantes do retrato que Manuel de Sousa elabora de D. João de Portugal.
No retrato de D. João de Portugal elaborado por Manuel de Sousa predominam linhas semânticas que remetem para o conceito de santo: “aquela
santa alma que está no céu”, “santa batalha”, “pelejando por seu Deus”, “acabou mártir” são expressões que conferem a D. João de Portugal a
marca da santidade. Deste modo, Manuel de Sousa afasta D. João do mundo dos vivos, colocando-o num patamar de abstracção que o transforma
necessariamente num espectro, ou seja, lhe retira o estatuto de ameaça real, concreta, à felicidade da família,
Encontra indícios do final trágico da acção nas falas de D. Madalena.
Os indícios que anunciam o final trágico consistem na referência a D. João de Portugal como “sombra despeitosa”, expressão que remete para o
carácter pernicioso da sua presença — “sombra” — e para o receio da sua reacção de ciúmes, e ainda na descrição da sua figura como ameaçadora e
portadora de destruição — “com uma espada de dous gumes (...) que a atravessa no meio de nós, entre mim e ti e a nossa filha, que nos vai separar
para sempre” . As referências de Madalena à sua infelicidade e morte certas corroboram também a antevisão do desenlace trágico da família.
Estabelece uma ligação entre estas duas figuras e as características da cosmovisão romântica.
D. Madalena de Vilhena e Manuel de Sousa Coutinho apresentam como traço comum a afirmação sem peias da sua personalidade, característica
evidenciada na busca de felicidade através da realização amorosa e no valor que atribuem aos seus sentimentos e ansiedades, ou seja, na
valorização que fazem da sua própria subjectividade. Partilham ainda uma religiosidade essencial, que condiciona as suas vidas ao mais íntimo e
ínfimo pormenor e que será o impedimento final que encontrarão ao seu amor, valor que até aí tinham apresentado como absoluto. Estas são
algumas das características das personagens que permitem inseri-las na cosmovisão romântica.
Explica de que modo os conectores discursivos presentes na segunda fala de Madalena veiculam a sua instabilidade interior.
Os conectores “pois” e “mas” estruturam a fala da personagem em dois sentidos opostos. No primeiro caso, este veicula um carácter conclusivo, visto
que, para Madalena, se Manuel de Sousa quer, logo também ela quererá, característica que tem sido uma constante da relação de ambos. O conector
“mas” introduz na fala da personagem a sua divisão interior, a força dos seus receios, que a impedem de aderir incondicionalmente, como desejaria,
à decisão do marido.
Comenta o conteúdo da frase ‘vou dar um exemplo a este povo que os há-de alumiar” tendo em conta o conceito de pressuposição e
identifica as figuras de estilo aí presentes.
Atendendo a que a pressuposição é um processo inferencial que consiste na dedução, a partir de um enunciado, de informação não explicitada,
Manuel de Sousa Coutinho pressupõe que o domínio filipino impôs ao povo português uma espécie de escuridão (cegueira) que o seu gesto irá
dissipar [curar).
As figuras de estilo presentes são a metáfora e a ironia. A metáfora tem a ver com a identificação da luz com o conhecimento: Manuel de Sousa
protagonizará um gesto que irá criar luminosidade e essa luminosidade, simbolicamente, irá despertar as consciências dos seus contemporâneos para
a urgência de lutar pela pátria. Por outro lado, ao usar o termo “alumiar”, Manuel de Sousa fá-lo no sentido metafórico, mas querendo significar o
seu sentido literal, ou seja, eles serão realmente “alumiados” por labaredas reais.

GÉNERO DRAMA
Características que fazem da peça um drama romântico:
 peça escrita em prosa;
 acção apresentada em três actos;
 obra como expressão literária de um determinado estado social;
 à acção da peça está subjacente uma situação real;
 exaltação dos valores patrióticos;
a crença no sebastianismo;
a crença no aparecimento dos mortos, em Telmo;
a crença em agouros, em dias aziagos, em superstições;
as visões de Maria, os seus sonhos; a atitude que toma no final da peça ao insurgir--se contra a lei do matrimónio uno e
indissolúvel, que força os pais à separação e lhos rouba;
 exaltação dos valores religiosos – referência constante ao cristianismo e ao culto;
 o realismo psicológico que caracteriza os sentimentos de Telmo, dividido entre o amor por D. João e por D. Maria de Noronha;
 a projecção da experiência pessoal do autor, que possuía uma filha ilegítima, filha de Adelaide pastor Deville, por quem se
apaixonara, quando ainda casado com Luísa Midosi;
 a morte de Maria em palco.

Ao contrário da tragédia clássica, por regra escrita em verso, Frei Luís de Sousa foi composto em prosa.
Por outro lado, seguindo as regras da tragédia clássica, a linguagem das personagens centrais adequa-se ao estatuto social da
nobreza: assim domina o nível de linguagem elevado e, frequentemente, encontramos um léxico rico e até erudito («ignomínia»,
«opróbrio», «pejo», etc.).
As falas das personagens de Frei Luís de Sousa são marcadas por uma grande emotividade, fruto do seu estado de espírito
quando confrontadas com os acontecimentos intensos ou com os seus receios. No texto abundam marcas linguísticas que
traduzem os sentimentos das personagens: as interjeições (e as locuções interjetivas), as frases exclamativas e os atos ilocutórios
expressivos. Os melhores exemplos estão nas falas de D. Madalena e revelam a influência dos melodramas românticos com uma
linguagem demasiado retórica e emotiva.
Associados aos sentimentos e ao estado de espírito das personagens estão as frases suspensas (ou seja, interrompidas), que
pontuam as falas de diferentes personagens, exprimem as suas inquietações, perplexidades e hesitações. Por vezes, deixam no ar
alguns subentendidos cujo significado é partilhado pelas personagens (ver o diálogo da Cena II do Ato Primeiro). Telmo e D.
Madalena deixam por terminar as frases por não quererem mencionar o que receiam (o regresso de D. João, a desonra ou a
doença de Maria) ou por hesitarem em verbalizar certos factos (a possibilidade de D. João não ter morrido
As frases interrogativas, frequentes nas falas mais tensas, dão igualmente conta dos anseios e do desassossego das personagens,
mas também da sua desorientação ou da incerteza em relação ao futuro. Por outro lado, a frase curta (por vezes constituída por
uma única palavra: «Ninguém!») confere um tom incisivo aos diálogos e contribui para fazer crescer a tensão dramática.
Por fim, ainda a nível do vocabulário, encontramos certas personagens associadas a determinados campos lexicais. Frei Jorge e
os outros prelados glosam o campo lexical da religião; Telmo, o aio, recorre a termos associados às ideias de honra e servidão
(«senhor», «amo», «servidor»). As repetições de palavras são utilizadas para exprimir a ansiedade ou a inquietação, mas
frequentemente também o afeto entre os membros da família.

TEMPO A peça inicia-se com a apresentação dos antecedentes da ação, que abarcam um longo período temporal. Há referências à Batalha
de Alcácer-Quibir, que tivera lugar vinte e um anos antes, e a momentos ainda anteriores. Depois da batalha, e durante sete anos,
D. Madalena promoveu buscas para saber se D. João ainda está vivo. No fim deste período, e como a procura se revelou
infrutífera, acabou por casar-se com D. Manuel.
Em contrapartida, a ação da peça desenrola-se num breve período de tempo, sensivelmente uma semana. O segundo ato decorre
no dia do aniversário da Batalha de Alcácer-Quibir. Tendo em conta que esta batalha teve lugar no dia 4 de agosto de 1578, e que
D. Madalena afirmara que já haviam passado vinte e um anos desde a batalha, é possível localizar a ação deste ato no dia 4 de
agosto de 1599. Uma vez que estes acontecimentos se desenrolam oito dias depois dos do primeiro ato, podemos concluir que o
primeiro ato decorre no dia 28 de julho de 1599. Quanto ao terceiro ato, passa-se durante a noite do dia 4 de agosto.

ESPAÇO A ação de Frei Luís de Sousa desenrola-se em dois palácios de Almada. A cidade reveste-se de um forte valor simbólico pela
oposição a Lisboa: na capital está instalada a sede do governo de Portugal, que é controlado pela coroa espanhola. Daí que a
peste que se abateu sobre Lisboa sugira simbolicamente o estado de corrupção moral e política em que vivem aqueles que se
venderam ao rei de Espanha. Por seu turno, do outro lado do Tejo, longe da corrupção moral, Almada respira ares «saudáveis».
• O Ato Primeiro decorre no palácio de D. Manuel, numa sala ornamentada e luxuosa, sugerindo que este lugar é habitado por
personagens nobres. Se uma casa simboliza a estabilidade de uma família, este palácio transmite a ideia de conforto, bem-estar e
a união e o amor familiares. Por esse motivo, o incêndio que destrói o solar revela-se um presságio da desagregação do núcleo
familiar, consumada pela catástrofe que se abaterá sobre os seus membros.
• O espaço psicológico — domínio das vivências mentais de uma personagem: pensamentos, sonhos, sentimentos dessas — tem,
no texto dramático.
TEMAS RETRATADOS NA OBRA
A ação é marcada pela situação do País em fins do século XVI, época em que se encontra sob dominação de Espanha, e pelos
sentimentos de amor nacional das personagens. D. Manuel de Sousa Coutinho, Telmo e Maria desejam a independência do Reino e
O Patriotismo não aceitam a governação espanhola; D. Manuel recusa-se a colaborar com os governadores ao serviço do rei estrangeiro e a
afronta-os incendiando a sua própria casa.
O Reino perdeu a sua independência e espera recuperá-la com a chegada de D. Sebastião, que, na verdade, morreu na Batalha
de Alcácer-Quibir.
A família de D. Manuel de Sousa Coutinho representa simbolicamente a tragédia coletiva de Portugal. Os protagonistas, Maria e
Telmo, anseiam pela liberdade e pelo ressurgimento da pátria. Por isso Telmo deseja que o seu antigo amo, D. João de Portugal —
que representa simbolicamente D. Sebastião, esteja vivo e regresse.
Consiste, inicialmente, na crença de que o jovem rei, que morre em Alcácer-Quibir, regressará não só para recuperar a
independência de Portugal como também para dar um novo impulso ao Reino a fim de conseguir que este saia do estado de ruína
e marasmo em que se encontra.
Trata-se da crença que a salvação da pátria e de um povo está nas mãos de uma figura (histórica ou lendária) e que ela fará
renascer a Nação a partir das cinzas e a conduzirá num caminho glorioso. Com o passar dos tempos, o sebastianismo já não se
referirá ao regresso físico de D. Sebastião mas sim à chegada de uma personagem que assumisse esta função salvadora ou a uma
O ideia que desempenhasse esse papel.
Sebastianismo
Em Frei Luís de Sousa, D. João de Portugal não regressa de Alcácer-Quibir, é feito prisioneiro e só voltará vinte e um anos depois
à Pátria, com D. Madalena casada em segundas núpcias, desencadeando assim as consequências trágicas que se conhecem.
D. João alude simbolicamente a D. Sebastião, e o seu regresso serve para especular sobre as consequências do regresso do antigo
rei.
• Nesta peça de Garrett, o sebastianismo é perspetivado de forma crítica e negativa. Por um lado, porque a saudade deste velho
Portugal, que Telmo protagoniza, não traz a solução para o problema da Pátria.
PERSONAGENS
D. Madalena de Vilhena

Socialmente pertence à Nobreza: família e sangue dos Vilhenas (I,8)


Casou muito jovem com D. João de Portugal e enviuvou com 17 anos.
Procurou exaustivamente D.João, desaparecido na batalha de Alcácer Quibir, durante 7 anos
Casou depois com Manuel Sousa , de quem tem uma filha , Maria, e é profundamente apaixonada por ele, no entanto sente-se culpada por ter
casado, sem ter a certeza acerca da morte do primeiro marido;

D. Madalena de Vilhena é uma personagem psicologicamente afectada e que vive marcada por conflitos interiores pelo desaparecimento do primeiro
marido e não consegue viver o presente devido a esse “fantasma”, conseguimos deduzir isso na expressão “Mas eu! (…) este medo, estes contínuos
terrores que ainda me não deixaram gozar um só momento (…)”. Os sentimentos e a sensibilidade sobrepõe-se à razão e é uma mulher em
constante sofrimento. Os seus receios são alimentados pelas contínuas alusões de Telmo à iminente vinda daquele que considerava como o
verdadeiro amo.
A tensão nervosa em que vive mergulhada é também aumentada pelo pecado que lhe pesa na consciência: o facto de se ter apaixonado por D.
Manuel de Sousa Coutinho enquanto ainda era casada com D. João. Muito embora se tenha mantido fiel ao seu marido, considera que o facto de
amar secretamente D. Manuel era já uma traição.
Crê em agoiros, superstições, dias fatais (a sexta-feira) e Deus, pois este é referido em muitas falas dela “Oh, filha, filha!..(mortificada.) porque não
foi vontade de Deus: tinha de ser doutro modo. Tomara eu agora que ele chegasse a Lisboa! Com efeito, é muito tardar…Valha-me Deus!” entre
outros exemplos.
É uma sofredora e tem um amor intenso e uma preocupação constante com a sua filha Maria, contudo o mais importante para ela é a sua felicidade
e amor ao lado de Manuel  de Sousa pois até o seu amor à pátria é menor do que o que sente por Manuel. É muito influenciada por Manuel de Sousa,
sendo evidenciado no final da obra, pois esta aceita o convento como solução mas fá-lo seguindo Manuel “ele foi? Eu vou”. 
0 Romeiro/João de Portugal
É um nobre cavaleiro, que está ausente fisicamente durante o I e II acto da peça. Contudo, está sempre presente na memória, palavras e nas
esperanças de Telmo que paira sobre aquela família, na consciência (sombra das angustias) de Madalena, nas palavras de Manuel e na intuição de
Maria.
D. João é caracterizado direta e indirectamente, esta caracterização é tanto física como psicológica.
É sempre lembrado como patriota, digno, honrado, forte, fiel ao seu rei; quando regressa, na pele do Romeiro é austero e misterioso, representa um
destino cruel, é implacável, destrói uma família e a sua felicidade, mas acaba por ser, também ele, vítima desse destino. Resta-lhe então a solidão, o
vazio e a certeza de que ele já só faz parte do mundo dos mortos (é “ninguém”; madalena não o reconhece; Telmo preferia que ele não tivesse
voltado pois Maria ocupou o seu lugar no coração do velho escudeiro).
D. João é uma figura simbólica: representa o passado, a época gloriosa dos descobrimentos; representa também o presente, a pátria morta e sem
identidade na mão dos espanhóis, é também a imagem da pátria cativa.

Telmo
É um criado caracterizado como extremamente leal ao seu primeiro amo, D. João de Portugal, e acredita piamente no seu regresso “Mais muito mais.
E veremos: tenho cá uma coisa que me diz que antes de muito se há-de ver quem é que quer mais à nossa menina nesta casa”. Telmo é um velho
aio que não é nobre apesar da sua convivência lhe dar todas as características de um nobre (postura, fala, educação ,cultura...).
. Foi escudeiro de D. João I e de seu pai e acompanhou de perto o primeiro casamento de D. Madalena. Apesar desta se ter casado novamente
permaneceu a seu lado e tornou-se seu confidente , apesar de reprovar este casamento.
. nas palavras de D. Madalena, é “… o aio fiel de meu senhor D. João de Portugal…”, digno “… da confiança, do respeito, do amor e do carinho…” de
todos e “o escudeiro valido, o familiar quase parente, o amigo velho e provado de teus amos…”;
Telmo considerava Maria ilegítima e a prova de traição de D. Madalena a D. João. No inicio Telmo não conseguia suportar Maria nem olhar para ela ,
com o passar do tempo afeiçoou-se à menina amando-a tanto como se fosse seu pai.
Esta personagem é muito crítica, cria juízos de valor e é através dele que a consciência das personagens é fragmentada, este vive num profundo
conflito interior pois sente-se divido entre João e Maria, não sabendo o que fazer.

● Relação Telmo vs. D. Madalena

            Pelo que é dado ler nesta cena, a relação entre estas duas personagens supera em muito a tradicional ligação entre um criado e o seu
senhor. De facto, o escudeiro apresenta-se mais como um elemento da família de D. Madalena do que enquanto mero aio, graças aos longos anos
passados ao serviço da família (primeiro de D. João e depois de Manuel de Sousa). Quando ela enviuvou aos 17 anos, foi o seu amparo e quase um
pai, daí a liberdade de que goza quando lida com D. Madalena. Esta respeita-o e reconhece-lhe alguma autoridade sobre si, seguindo também os
seus conselhos como se fosse sua filha. De igual forma, ele respeita-a e aconselha-a, não obstante ter sido contrário ao segundo casamento.
            Assim sendo, é natural que a relação (que se foi estreitando ao longo dos anos) entre ambos seja de grande respeito, amizade, confiança e
abertura, como se comprova ao longo de todo o diálogo, que é motivado pelo pedido que D. Madalena quer fazer ao seu velho aio: acabar com as
conversas sobre o passado com Maria, ligadas à ideia de que de D. Sebastião está vivo e, por extensão, D. João, facto que, a ser verdade, acarretaria
consequências trágicas para Maria, reduzida então à condição de filha ilegítima.
            E é a questão do passado e da forma como este é alimentado em Maria pelo escudeiro que perturba a relação. Note-se como Madalena sofre
e chora quando Telmo afirma que a jovem deveria ter nascido “em melhor estado”, pois está claramente a sugerir que ela era merecedora de ter
nascido no seio de uma família constituída por pais casados legitimamente, sem qualquer sombra a pairar sobre ela, o que não sucede na perspetiva
do aio, dado acreditar que D. João ainda está vivo. A ser assim, a família seria destruída e Maria uma filha ilegítima, com todas as consequências ao
nível da mentalidade e das convenções sociais da época.
            Por isso mesmo, no final da conversa, Telmo reconhece que D. Madalena tem razão: se continuar a estimular o interesse de Maria pelo
passado, com as suas crenças e agouros, poderá levá-la a descobrir o passado da sua mãe. A ideia de que D. João de Portugal poderá estar vivo
despertaria nela a possibilidade da ilegitimidade e o receio de tal situação poderia agravar seriamente o seu estado de saúde já tão debilitado.

● Relação Telmo vs. Manuel de Sousa

            Telmo manifesta grande respeito e admiração por Manuel de Sousa, cujas qualidades elenca e elogia, mas não lhe dedica a mesma
consideração e estima que nutria por D. João de Portugal, visto que considera que não é digno de ocupar o lugar do seu antigo amo.

Maria de Noronha
É uma personagem fisicamente frágil e fraca “E eu agora é que faço de forte e assisada, que zombo de agouros e de sinas… para animar,
coitada!...que aqui entre nós, Telmo, nunca tive tanta fé neles. Creio, oh, se creio! Que são avisos que Deus nos manda para nos preparar. – E há…
oh! Há grande desgraça a cair sobre meu pai… decerto! E sobre minha mãe também, que é o mesmo.” Também apresenta um caracter puramente
inocente e angelical e sendo psicologicamente muito forte. Maria tem uma relação muito forte com Telmo devido à sua crença no regresso de D.
Sebastião.
É uma personagem nobre, de inteligência precoce, muito culta, intuitiva e perspicaz. Também é muito curiosa pois aparenta querer saber de tudo, e
uma romântica: é nacionalista, idealista, sonhadora, fantasiosa, patriota, crente em agoiros e uma sebastianista.
É a vítima inocente de toda a situação e acaba por morrer fisicamente, tocada pela vergonha de se sentir filha ilegítima (morre tuberculosa).

Manuel de Sousa Coutinho

É um nobre e honrado fidalgo que se orienta por valores universais como a honra, a lealdade, a liberdade, é um patriota, forte, corajoso, e decido,
mas não crê em agoiros. Contudo, esta personagem evolui de uma atitude interior de força e de coragem e segurança para um comportamento de
medo, de dor, sofrimento, insegurança e piedosa mentira no acto III quando teme pela saúde da filha e pela sua condição social .Os seus sentimentos
são muitas vezes sobrepostos à razão; normalmente deve-se á sua preocupação com doença da sua filha. Manuel de Sousa é um bom pai e um bom
marido, pois ao longo do texto demonstra muita preocupação para com estas personagens; como é demonstrado com os seguintes exemplos:
“Madalena, Maria, não vos quero ver aqui mais, já, ide, serei convosco em pouco tempo”, “Sentemo-nos aqui, filha e conversemos (toma-lhe as
mãos e sentam – se) tens as mãos tão quentes; (beija-lhe a testa) e esta testa, esta testa!...Escalda! Se isto está sempre a ferver! Valha-te Deus,
Maria! Eu não quero que tu penses”, e “Parti, Parti! As matérias inflamáveis que eu tinha disposto vão se ateando com espantosa velocidade. Fugi” e
consequentemente Maria demonstra também muita preocupação com o seu pai, pois responde-lhe: “ Meu pai, nós não fugimos sem vós”. Estes
exemplos mostram a preocupação que este tem com sua mulher e sua filha e demonstra que é um homem de valores. No final da obra demonstra-se
decido como noutros momentos, com o facto de abandonar tudo (bens, vida) para se refugiar no convento.
É de referir que Manuel de Sousa não sente ciúmes pelo passado de Madalena e considera-o um honrado fidalgo e um valente cavaleiro,
exemplificando com os seguintes enxertos “Aquele era D. João de Portugal, um honrado fidalgo, e um valente cavaleiro“ e “Eu estimei e respeitei
sempre a D. João de Portugal: honro a sua memória, por ti, por ele e por mim, e não tenho na consciência por que receei abrigar-me debaixo dos
mesmos tetos que o cobriram. Viveste ali com ele? Eu não tenho ciúmes de um passado que não me pertencia. E o presente, esse é meu, meu só,
todo meu, querida Madalena… Não falemos mais nisso; é preciso partir, e já “
A sua relação com Telmo é muito afastada, visto que, Telmo é um serviçal normal e não existe nenhuma intimidade, Telmo atreve-se a dizer coisas
a Madalena que não diz a Manuel de Sousa
Frei George
É uma personagem tipo e apenas tem a função de mostrar o que a igreja deveria de assumir. Frei George é irmão de Manuel de Sousa, representa a
autoridade de Igreja. É também confidente de Madalena, pois é a ele que ela confessa o seu “Terrível” pecado: amou Manuel de Sousa ainda D. João
era vivo. É uma figura moderadora, que procura harmonizar o conflito e modera os sentimentos trágicos. Acompanha sempre a família, é conciliador,
pacificador e impõe uma certa racionalidade, procurando manter o equilíbrio no meio de uma família angustiada e desfeita

.
Características da tragédia clássica (grega) presentes em Frei Luís de Sousa:

 existência de poucas personagens;

 personagens que se inserem num estrato social elevado;

 acção sintética: convergência progressiva de um número pouco significativo de acções para a acção trágica;

 cumprimento (ainda que incompleto) da lei das três unidades: unidade de acção;
 existe uma reminiscência do coro da tragédia clássica, sobretudo através de Telmo Pais;

 solenidade clássica e ambiente trágico.

Outros elementos da tragédia clássica:

Ananké (destino) – é o destino que propícia a ausência de D. João e que origina a mudança da família de Manuel de Sousa Coutinho para o palácio de D. João, pelo facto de
os governadores espanhóis terem escolhido a casa de Manuel de Sousa Coutinho para aí se instalarem, o que o leva a incendiá-la; é o destino que mantém D. João de
Portugal cativo durante vinte e um anos, findos os quais regressa ao lar (facto que dará origem à tragédia).

Hybris (desafio) – D. Madalena casa com Manuel de Sousa Coutinho, desafiando o destino, uma vez que não possui a certeza absoluta da morte do seu primeiro marido;
Manuel de Sousa Coutinho incendeia o palácio, desafiando as prepotências divinas e humanas.

Agón (conflito) – surge ao nível psicológico e revela-se nos conflitos interiores vividos pelas personagens; estes dilemas são, fundamentalmente, vividos por D. Madalena,
que se culpabiliza pelo facto de se ter apaixonado por Manuel de Sousa Coutinho quando ainda se encontrava casada com D. João de Portugal, e por Telmo, dividido entre
a fidelidade que deve a D. João e o amor que sente por Maria.

Anagnórisis (reconhecimento) – identificação do romeiro como D. João de Portugal.

Peripéteia (peripécia) – com o aparecimento de D. João, na figura de Romeiro, o casamento de D. Madalena e de Manuel de Sousa Coutinho torna-se ilegítimo, originando,
assim, a ilegitimidade de Maria e consequente “suicídio” do casal para o mundo (ambos se refugiam num convento).

Clímax (aumento da tensão emocional) – aumento progressivo da tensão emocional desde a primeira cena até atingir o clímax, no final do segundo acto.

Pathos (sofrimento) – as personagens sofrem devido às suas incertezas, devido à sua culpa (no caso de D. Madalena), devido à inconstância dos seus sentimentos (no caso
de Telmo), e, finalmente, devido à dissolução da família.
Katastrophé (catástrofe) – consiste na separação do casal e consequente “suicídio” para o mundo e na morte de Maria; Telmo vê-se esmagado pelo desgosto; para D. João
de Portugal, a catástrofe consiste no facto de, após vinte e um anos de cativeiro, encontrar a sua esposa casada com outro homem, na sua própria casa, e de ter consciência
de que já não tem lugar no mundo daqueles que conheceu e amou.

3. O drama romântico: características 3.1 O género de Frei Luís de Sousa

• Como introdução a Frei Luís de Sousa, Garrett apresenta uma «Memória ao Conservatório Real», texto ensaístico no qual reflete sobre questões centrais da sua obra
dramática — sobretudo sobre o seu género, as suas fontes e o que o levou a escrevê-la.

• Relativamente ao género da obra, há que sublinhar o facto de Frei Luís de Sousa ter sido escrito em pleno Romantismo, um período literário cuja estética dominante
rompia com os princípios da arte do período anterior — o Neoclassicismo. Coloca-se então a questão: este texto é uma tragédia clássica, de matriz greco-latina, ou um
drama romântico, género literário que nasce no Romantismo e que representa o espírito da época? Garrett defenderá que Frei Luís de Sousa é um drama romântico que
incorpora, a nível formal, características da tragédia (hibridismo de género). a) Marcas da tragédia clássica — Assunto digno de uma tragédia clássica, pela beleza, pela
simplicidade e pelo sublime (segundo Almeida Garrett, na «Memória ao Conservatório Real»); — Presença dos elementos da tragédia clássica (cf. páginas  36-37 deste livro);
— Ambiente carregado de presságios e sinais; — Tom grave e estilo elevado; — Linguagem cuidada; — Personagens de condição elevada; — Figuras que desempenham o
papel do coro grego (que tem a função de comentar a ação): Telmo e Frei Jorge. b) Marcas do drama romântico — Texto em prosa (e não em verso, como deveria suceder
na tragédia clássica); 000998 024-071.indd 39 07/03/16 17:33 40 Conteúdos literários — Não cumprimento da lei das três unidades (ação, espaço e tempo): na tragédia
clássica, todos os acontecimentos deveriam convergir para o desenlace trágico, desenrolar-se no mesmo espaço e durar apenas vinte e quatro horas. Em Frei Luís de Sousa,
não há, claramente, um cumprimento da unidade de tempo (a ação desenrola-se numa semana). Quanto à unidade de lugar, embora toda a ação se desenrole em Almada,
há, de facto, uma mudança de espaço. Finalmente, podemos considerar que temos unidade de ação. Apesar de alguns estudiosos afirmarem que esta unidade é quebrada
pela introdução do incêndio do palácio, evento que consideram que introduz uma ação secundária, a verdade é que o facto de D.  Manuel destruir a sua casa obriga as
personagens a mudarem-se para o palácio de D. João, local aonde este regressará; — O drama romântico dá conta frequentemente de um tema histórico, que trata com
liberdade literária; — Presença de temáticas marcadamente românticas: i. Liberdade individual — é visível na revolta de D. Manuel de Sousa Coutinho contra um governo
ao serviço de Espanha, revolta que é apoiada por Maria e por Telmo, bem como no discurso final desta última personagem, no qual a jovem se insurge contra as normas de
uma sociedade que lhe impõe a separação dos pais; além disso, a própria D. Madalena afirma a sua liberdade, ao casar-se com o homem que amava sem ter provas
irrefutáveis de que o seu anterior marido tinha morrido; ii. Patriotismo — é evidente não apenas na crença no comportamento de D. Manuel anteriormente referido, mas
também na esperança de Telmo e de Maria no regresso de D. Sebastião, que implicaria a libertação de Portugal do jugo estrangeiro; iii. Cosmovisão cristã — a religião tem
um papel fundamental em Frei Luís de Sousa: é graças a ela que D. Manuel e D. Madalena conseguem libertar-se da desonra que se abateu sobre eles com o regresso de D.
João de Portugal (o ingresso na vida monástica permitir-lhes-á expiarem o seu pecado e renascerem para uma nova existência); iv. Importância do oculto — a valorização
do inconsciente e da intuição característica do Romantismo é visível pela referência às premonições de Telmo, de D.  Madalena e de Maria (que, no caso desta última, se
associam à crença de que possui a capacidade de prever o futuro, através de elementos como os sonhos ou as estrelas); de notar que, à medida que a tensão dramática se
adensa, a visão racional do mundo defendida por D. Manuel e por Frei Jorge é cada vez mais posta em causa — até que, no desenlace, todos os presságios de catástrofe se
cumprem; v. Primazia dos sentimentos sobre a razão — além de comprovável pelo destaque conferido ao lado mais irracional do Homem (referido no tópico anterior), a
valorização das emoções é também visível na importância conferida ao amor: é ele que leva D. Madalena a casar com o homem que amava sem ter a certeza plena de que
o seu primeiro marido estaria morto; vi. Mitificação da figura de Camões — no Romantismo, o poeta é, muitas vezes, configurado como uma figura incompreendida e
desprezada pela sociedade, que não reconhece o seu génio; essa foi a imagem de Camões transmitida pelos românticos portugueses: a de um poeta que dedicou a sua vida
à pátria e que, em troca, apenas foi alvo de ingratidão.

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