Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Manuel de Meneses
Nascimento c. 1565
Campo Maior
Morte 18 de
julho de 1628 (63 anos)
Lisboa
Nacionalidade português
Ocupação Militar
Cronista
Cosmógrafo
Vida
Segundo Diogo Barbosa Machado foi filho de "João de Meneses, filho de Manuel de
Meneses, Camareiro mór do Infante Duarte Duque de Guimarães (Duarte de Portugal)",
e de "Magdalena da Sylva, filha de Luiz da Silva Capitão de Tangere (Tânger), e de
Maria Brandão". Foi senhor do Reguengo da Maia, comendador das Comendas de S.
Salvador de Várgeas (Várzea) de Arouca e de S. Martinho de Freixedas da Ordem de
Cristo.[3]
Diogo Barbosa Machado diz que
"Foy duas vezes casado a primeira com Luiza de Moura, filha herdeira de Francisco de
Moura, e Maria de Castro de quem teve a João de Meneses que não deixou sucessão, e
a segunda com Maria de Castro filha de Antonio de Mendoça, comendador de Moura,
senhor de Marateca, e de Anna de Castro".
Quanto a António Caetano de Sousa diz que foi Luiza De Moura sua segunda mulher, de
quem teve
" Miguel, e Francisco De Menezes, que morrerão moços. Helena De Mendoça (...)",
e João Telo de Meneses [que] succedeo na Casa a seu pay, etc. "[4]
Desde cedo interessou-se por letras[5]
"Desde os primeiros annos cultivou com tanta aplicação as letras como que não havia
de manejar as Armas. Aprendeu as disciplinas Mathematicas com o P. Delgado discipulo
do infsgne P. Chriftovão Clavio em que fez admiráveis progressos a sua comprehensão."
O prólogo da sua carreira militar começou no apoio à pretensão do Prior do Crato D.
António, contra Filipe II de Espanha
quando na Armada Ingleza veyo embarcado em favor do Senhor D. António Prior do
Crato pertendente da Coroa Portugueza. Nesta jornada se habitou para quatro vezes
exercitar o posto de Capitão mór das Naos da India sendo a primeira no anno de 1581
em que triunfou heroicamente dos Malabares; a segunda no anno de 1609 capitaneando
cinco Galeoens; a terceira no anno de 1614 em que infelizmente arribou a Lisboa, e a
quarta no anno de 1616 em que depois de pelejar intrepidamente com quatro Naos
Inglezas, naufragou na Costa da Ilha de S. Lourenço donde surgio em Goa.
Enquanto embaixador de Filipe III esteve com o Duque de Pastrana nas negociações com
os franceses. Regressado, recebeu depois os lugares de Cronista-mor e Cosmógrafo-mor:
Retirado a huma dilatada quinta que possuia em Campo-Mayor solar da sua Casa
renovou os seus antigos estudos em premio dos quaes foy nomeado Chronista mór do
Reyno no anno de 1628, e do lugar de Cosmografo mór, que vagara por Manoel de
Figueiredo, discipulo do famoso Pedro Nunes.
Depois, enquanto General da Armada, celebrizou-se pela reconquista
da Bahia aos Holandeses em 1625
(...) governando com o posto de General da Armada que constava de vinte seis navios
guarnecidos de quatro mil homens, com a qual se restaurou no ano de 1625 a Bahia do
violento domínio dos Holandeses, em cuja heróica empresa adquiriu novos timbres ao
seu nome venerado por "vigilante Capitão", "valeroso Soldado", e "destro mareante".
Mas por outro lado, previu o insucesso de uma Armada que vinha da Índia em 1626
Sendo mandado no anno de 1626 conduzir as Naos, que vinhão da índia governadas pelo
Capitão mór Vicente de Brito de Menezes, sahio acompanhado de muita Fidalguia na
Capitania, e Almirante com os navios S. Jozé, San Tiago, S. Filippe, e S. Isabel, os quaes
todos com os dous que vinhaõ da índia naufragarão lastimofamente na Costa de França
em 15 de Janeiro de 1627. A fatalidade deste socesso vaticinou como experimentado
General escrevendo a ElRey huma carta em 25 de Dezembro na qual lhe dizia. «Com
tudo, Senhor, por seguir a estes cegos vou perderme com elles julgando ser assim maior
serviço de V. Magestade, e honra minha que escapar para ouvir sua triste forte, e dar a
V. Magestade (ainda que sem culpa) taõ ruim conta das armas, que me tem
encarregado».
Armadas da Índia
Frazão de Vasconcellos só reconhece três Armadas da Índia em que Manuel de Meneses
foi como capitão-mor:[6]
Volta
Diz Severim de Faria : "Depois destas vitórias, quis Deus que padecessem as nossas
armadas de algumas adversidades na volta, para que não atribuíssemos a nós a glória de
tantos vencimentos. Estava já a Baía nesse tempo bem fortificada e guarnecida de presídio
de mil homens Portugueses, debaixo da obediência de Dom Francisco de Moura, pelo que
se partiram as armadas a oito de Agosto de 1625, levando a rota de Pernambuco. Nesta
viagem lhe deu uma grande tempestade com que todos se dividiram, ficando a nossa Real
com quinze velas, entre portuguesas, e castelhanas, e não podendo o General [ Dom
Manuel ] tomar Pernambuco, se fez na via do Reino, com tantos ventos, que a catorze de
Outubro chegou a Lisboa só.[22][23]
Herói Barroco
"Despois do tempo muito entrado, recebeo em Madrid ordens Dom Manoel de Menezes :
Para que viesse servir seu posto, agora em a propriedade confirmado"[25] Em fins de 1626,
D. Manuel já se encontrava de novo no mar, General da Armada da Costa de Portugal.
Diz ele na sua "Relacion de la perdida de la Armada de Portugal del año 1626", que o 17
de Outubro (de 1627) encontrava-se "a oeste do Cabo Espichel, não longe da terra,
quando uma nave de Cascais me veio entregar uma carta do Governo de Portugal".
Cosmógrafo-mor
Obra escrita
"Parecer que deu a Felippe III de Portugal sobre a causa da perdição das Naos da
India, e o meyo que deve aplicarse para se aviar gente do mar para a
navegação". Diz Barbosa Machado que o livro começa da seguinta forma : "O
Marquez de Castello Rodrigo, Vice-Rey de Portugal, me escreveo do governo, etc."
e acaba : "Isto hé o que entendi, V. Magestade ordenará, e mandará o mais acertado,
e que mais convier a seu Real Serviço. Em Lisboa a 10 de Junho de 1611. Manoel de
Meneses." Continua Diogo Barbosa Machado : "O Original escrito em vinte e sinco
laudas de folha se conserva na Livraria do Illustrissimo e Excellentissimo Marquez
de Valença onde o vimos"…
"Relacion de la armada de Portugal del año 1626, que hizo y firmó de su nombre
D. Manuel de Menezes, general della". Lisboa, por Pedro Craesbeeck, 1627. 4.°
Traduzida em Francês por Georges Boisvert, sob o título de "Récit du naufrage de la
flotte de Portugal armée en 1626, fait & signé par Dom Manuel De Meneses son
capitaine-général", in Le Naufrage des Portugais, etc. Paris, Chandeigne, mars 2000
"Familias de Tellos, e Menezes". 2 tomos. Fol. "Esta obra escrita da sua própria
mão ficou em poder da sua segunda mulher Maria de Castro que a deu a seu Primo,
e cunhado Antonio Mascarenhas Commendador de Castello-Novo, e dos Maninhos
em a Ordem de Christo, hum dos primeiros Aclamadores da liberdade Portugueza em
o ano 1640, que casou com Isabel de Castro irmã de Maria de Castro" (Barbosa
Machado)
"Relação do Successo, e batalhas que teve com a Nao S. Julião com a qual sendo
Capitão mór daquella viagem se perdeo na Ilha do Comoro além
de Madagáscar, ou S. Lourenço no anno de 1616". Obra segundo Francisco
Manuel de Melo, escrita em Latim e Português, e imprimida. Nunca foi encontrado
nenhum exemplar.
Notas e referências
16. ↑ Navios de Fogo Havia -"quatro navios, presas que o inimigo tinha cheios de
artificio de fogo para que com vento em popa se chegar as capitanas, e abrasalas
para o que sempre estavam promptos de verga d'alto." - Manuel : "Logo a
primeira noite (…) tirando bombas, e coetes e asendendo-se imediatamente,
fizeram notavel aparencia de fumarada negra, espessa, e lavaredas grandes por
entre ella. Com tal vento e boas velas se chegaram tão depressa que estando tudo
prevenido, ancoras aboyadas para largar, correram risco a de Portugal, e a do
Estreito, e mayor suas almirantas. Jorge Mexia se vio quasy abordado, e muito
mais Roque Senteno, almirantes, fizeram-se todos a vela o a todos pareceu tarde
posto que estavam a ponto que não havia mais que desfraldar traquete, e cassar
escotas. Manuel se vio em grande aperto pela doença de Gouvea mestre da
cappitana, posto que asy acudio, com grande resolução animando a muitos.(…)
Dos ignorantes havia muitos que acresentavam à confusão. (…) Manuel acudia
sem poder a tudo. Pessoas houve que se deitavam ao mar nas chalupas e canoas
que tinham a bordo, outras acodiam às portinholas baixas pera se deitarem ; foy
o aperto como se pode imaginar. O navio se fez na volta de noroeste e logo ao
norte sempre com a senda na mão. Acudiram os capitães Diogo de Varajão,
e Cosmo do Couto. A este encarregou Manuel fosse ao navio de fogo que parecia
vinha seguindo, e lhe cortasse a falua que costumam trazer para se salvar quem
governava emquanto o fogo não esperta. (…) Como vio que o incendio tinha
declinado na maior força, mandou voltar sobre elle, e vendo tudo abrasado acudiu
a tomar o passo aos navios olandezos, se acaso fosse aquelle ardido pera se fazer
a vela ; e achando tudo quieto ocupou seu posto, e pela manhã estava sobre a
ancora que deixava, aboyada." Cenda na montanha - Manuel : "Vío com oculo
huma cenda apagada, que apenas aparecia huma parte della, por entre a rama que
veste a montanha sobre que está o mosteiro de S. Bento. Pareceu-lhe seria
caminho antigo. (…) Reconheceram o sitio a 5 de Abril. (…) A senda não passava
do meo do caminho (em que havia pedreira velha) começando do alto. Comtudo
se resolveram ao trabalho porque em voltas parece se podia subir com
bastimentos que hiam por S. Antonio, huma légua de mar, outra de terra por maus
caminhos. Puzeram-se as mãos da gente biscaynha a desmontar, rossar e esplanar,
foy-se mostrando o caminho airoso coberto de huma e outra parte de frondoso
arvoredo. Foi necessario em algum logar cortar eminencias, e n' outro encher os
baixos, atravessar outro com vigotas, e faxina com que tudo ficou de maneira que
se esperou : mais do que de antes se pretendia. Pareceu que por elle subiria a
artilheria para o quartel de S. Bento, vieram engenheiros acharam defeculdade
(trabalho perdido lhe chamavam) na subida, na desembarcação impossibilidades.
Afastaram-se penedos com facilidade, cortou-se outro pedaço de caminho,
desmontando-se bosque por onde podesse voltar a artilheria em cavalgada (…).
Mostrou o effeito o acerto da traça porque em menos de hora e mea se punham
em cima peças de vinte e sinquo libras. Com pressa notável subiam as munições
e bastimento. A facilidade de tudo dobrava o gosto de servir." -"Pareceu
conveniente que o forte de S. Antonio se artilha-se e presedia-se. Para isto tirou
Manuel da sua armada sete peças de artilheria e com o governador Francisco de
Valhesilha subiram em o dia cinco, e deixaram em cavalgadas e com ellas o
Condestabre que tinha ydo no navio S. João, e cinco artilheiros que lhe assistiam,
e as outras duas pera se porem ao outro dia em seus reparos."
17. ↑ Plataformas - Manuel: "Tendo Manuel de Meneses dado para o forte de S.
Antonio a artilheria que podia escusar de sua armada pela de Castela, pretendendo
fazer junto da praya huma plataforma donde prometia fazer grande dano a armada
inimiga. Sendo aprovado o seu intento se lhe levaram a terra duas peças de desoito
libras ; fez para estas huma plataforma em meia ladeira do monte, afundando-a
tanto que pela parte alta ficava huma pica, pela fronteira espalda natural imensa,
pera o ponente um parapeito para o mar, grossíssimo de tudo que se afundava, e
de toda a terra que se tinha tirado, não só segura de canhão, mas fora de todo o
receo. E reconhecendo outro posto mais a prepósito por mais vizinho ao mar, e
ao inimigo, fez outra semilhante em que pôs huma das peças ; e destas duas
plataformas se tirava com grande dano da armada inimiga. Vendo que seu
trabalho dava bom fruto, louvado de todos, se adiantou mais de cem paços e
comessou a esplanar, e pôr em ordem outra plataforma, que sendo cubiçada
por João Fajardo lha largou, reconhecendo na mesma hora outro posto adiante,
melhorado, aonde fez outra." -"Ao general Martim de Valhesilha, se devia maior
parte do facto deste trabalho, porque em tudo se achou sempre com Manuel,
ordenando, mandando e obrando por suas mãos, apontando com elle as peças com
arte e valor, amanhecendo e anoitecendo com elle muitas vezes nas plataformas,
aonde todos os dias acudia, sofrendo as calmas do Brazil, enterrado nos baixos
da plataforma." -"No posto de S. Bento que ocupava Francisco de Almeida, havia
menos gente de trabalho, comtudo se abriam trincheiras, com grande perigo, e se
fez huma plataforma para quatro canhões." "Índios de arco e frecha" - Manuel:
"Com a vinda de Salvador de Saá, que chegara pouco antes, de socorro do Rio de
Janeiro, com cento e oitenta pessoas, diziam que oitenta brancos, os mais indios
de arco e frecha (e todos passavam ao posto de S. Bento), houve novo género de
alvoroço, encarecendo muito a gente do Brasil, a industria e destreza daquelles
frecheiros, e a facilidade com que conseguiam qualquer bom effeito com as
canoas em que vinham."
18. ↑ - Manuel: "Como quer que fosse elegeram outro [ Hans Kyff ], e com elle se
resolveram a pedir tréguas para tratar de consertos. E segunda-feira 28 de
Abril comessando anticipadamente a disparar algumas peças de artilheria mui
espassadas, da plataforma dos dois sacres, logo em apontando o sol cayram sobre
hum luguar que parecia corpo de guarda (…). Os italianos que com grande
destresa se tinham adiantado muito com suas trincheiras sayram dellas ao
descoberto. Daquella parte de S. Bento que ficava à vista destes movimentos
acudiram ao foço, desordenados, os alferes Ignacio de Mendonça, e João do
Loureiro, entre os quais e italianos havia grandes competencias, e ciumes de
quem primeiro na ocasião subiria as trincheiras inimigas ; arremeteu com o seu
sargento, e noventa e dois soldados que tinha de guarda das plataformas, e
chegando a hum pequeno baluarte quasy no fim da palissada, o veio a encontrar
hum soldado mandado pelo capitão, que de cima lhe pedia se chegasse. Adiantou-
se o alferes com o sargento, João do Loureiro, e Condestabre João Ribeiro, e com
elles hum trombeta de Fadrique, que aquelle dia o tinha ido a visitar. -"O capitão
lhe disse que mandasse retirar sua gente pera dizer cousas de importancia, e de
segredo. Subio primeiro João do Loureiro e dando a mão ao alferes, e sargento
entraram todos três somente às oito horas que parecera da manhã. (…) Nem podia
ser outra cousa que trazer ordem pera tratar de paz, e asy queriam saber qual era
o general a quem se havia de acudir." -"A estas palavras mal entendidas se
respondeu que a Fadrique de Toledo, que alojava no quartel do Carmo." Depois
duma primeira troca de cartas :-"Aquelle dia como às dêz horas da manhã veo a
carta a Fadrique, e capítulos seguintes : À Su excelencia — Illustrissimo señor
aviendo recebido la carta de 28 de este y entendido la nobleza de V. S.a de cuia
persona nos confiamos, emos juntado nuestro consejo e resolvemos de entregar
la ciudad sobre las capitulaciones comprehendidas em los capítulos que com esta
van sobre los quales aguardamos respuesta de V. Ex.a cuia persona Dios guarde,
fecha en San Salvador a 29 de Abril de 625. El coronel etc.
19. ↑ Bandeira pintada - Manuel: "Quinta feira primeiro de Maio, às dez da manhã,
tirada a bandeira de Maurício, se plantou em seu lugar sobre a sée, a das armas
reaes de S. M. com castellos e leões. Matéria de notáveis descontentamentos entre
os Portuguezes, chamando aquillo, se foi inadvertencia, ódio nos Castelhanos à
nação portugueza, que em tudo se mostrava, e nunca em tão pública aparencia.
"Era aquela empresa de Portugal, dos cinco mil e oitocentos homens que
assistiram em campanha, os três mil e trezentos portuguezes, muitos fidalgos,
muita mais gente nobre, quasi todos aventureiros, e não da plebe de que as levas
se fazem ordinariamente. A nobreza que mais continuava nas trincheiras, no
desmontar mátas, carregar faxinas, calejar as mãos com a páa, e enxada, sendo
aqui a de Castella sem officio, ou cargo (…) "Querendo, Fadrique ([sendo]
portuguez) pudera meter com as de Portugal, as armas de Castella, com que as
quinas reaes dadas por Deos ao Reino, ficando muitas tintas, resplandecessem :
Sendo Castelhano ganhara grande classe, arvorando sómente as de Portugal ; que
injusta cousa era, sendo os capitães de infanteria, e fidalgos portuguezes dos
primeiros pera ocupar os postos de perigo, e pera todas as fações, queresse agora
estivessem privados de entrar na cidade que recuperaram, emquanto houvessem
que rapinar ; que os castelhanos estavam senhores da presa de mar e terra, e se
assertava hum soldado portuguez tomar hum ferro velho, ou outra coisa vil, logo
lhe era arrebatada, e às vezes com soberba ; que os italianos se lhes não permitia
que chegassem, nem ainda fizessem guarda a Fadrique, sendo elles os que tanto
luziram no trabalho das trincheiras, e plataformas (…) "Que não somente se
furtavam as fazendas e alfayas das casas que os olandeses conservavam, (…) mas
as portas se queimaram, havendo tantos bosques tam visinhos, os ferrolhos das
que ficavam se arrancavam, até as machas femeas, e aldrabinhas de nenhum
valor. De maneira que se aquella cidade fora olandesa, causara grande lastima aos
proprios que a roubavam e assolavam com tão excessiva crueldade ; que em
nenhuma outra cousa se cuidava, e se permittia estar a igreja mayor metropolitana
d'aquella provincia, polluta de sacrilégios de hereges, apostatas da fé, sem se
purificar, e sem se celebrar nella os officios divinos segundo os ritos catholicos
appostolicos romanos. "À queixa das armas acudio em parte
Fadrique, mandando pintar huma bandeira ordinária às armas de
Portugal no lugar acostumado" (cf "Guerra de tintas", na "obra escrita").
Depois de algumas contendas a propósito duma caravela que queria enviar D.
Manuel para anunciar a vitória, enquanto D. Fadrique enviava um pataxo "mui
ligeiro" no "13 de maio à noite em direitura a Cadiz" ( e por a caravela sêr
considerada mais rápida : "Dizem que hum portuguez dera informação a Fadrique
que a caravela era embarcação mui ligeira, que furava os mares e havia de
anticiparse, com a nova, à Espanha muitos dias"), ocuparam-se a prevenir a
armada holandesa de socorro.
20. ↑ Foy esta diligencia de Fadrique, executada por Cosme do Couto, de grandissima
importáncia". Conta Severim de Faria : "A 26 de Maio, chegou à Baía o socorro
da Armada Holandesa, que os cercados esperavam. Era de 33 velas, que, não
sabendo o que passava, lançaram ferro defronte do Forte S. António, saíndo logo
os nossos Generais a encontrá-la, indo na Vanguarda os Navios Portugueses.
Porém, impedidos do vento Norte, e da noite que sobrevinha, amainaram, tendo
já tocado um Galeão castelhano, que procurou dar volta muito junto a terra.
21. ↑ Manuel Severim de Faria : Relação Universal do Que Sucedeu em Portugal e
Mais Províncias do Ocidente e Oriente, Desde o mês de Março de 625 Até Todo
Setembro de 626. Lisboa. Impressa por Geraldo da Vinha, 1626
22. ↑ Os mais Navios dos nossos tiveram diversas sortes, porque a almirante e o navio
de Constantino de Melo foram presos de nove Galeões Holandeses, a que não
puderam resistir, e o mesmo aconteceu ao de António Soares. O Galeão Santa
Ana, Almirante Castelhano, em que vinha o Mestre do Campo João de Orelhana,
abalroando com um Holandês, tomou fogo, um e outro, e ficaram à vista da nossa
Real, que estava combatendo com outras duas velas holandesas, e salvou alguns
que deste miserável espectáculo escaparam. Dom Fadrique de Toledo Osório,
com a outra esquadra, teve a mesma adversidade, afundando-se-lhe alguns
navios, perdendo outros, e padeceu tanto por falta de água e mantimento, que
esteve em grande perigo. Ultimamente, com a força dos ventos, entrou pelo
estreito de Gibraltar, e foi surgir a Málaga com parte da Armada, tomando os
restantes diversos portos. Em Málaga desembarcaram, dos nossos, o Conde de
Tarouca, Dom Lopo da Cunha, Senhor de Santar, João da Silva Tello,
Dom Francisco de Faro, filho do Conde de Faro, e outros fidalgos, que vindo para
o Reino souberam, junto a Sevilha, como Cádis estava cercada pela Armada
Inglesa, e logo lá se foram, sendo os que levaram a Vanguarda do socorro que
nela entrou, onde assistiram até a retirada do inimigo. O mesmo fizeram
Dom Afonso de Noronha, António Moniz Barreto (Amiral), Enrique Enriquez e
Dom Afonso de Lencastre, posto que, por os tomar a nova mais tarde, chegaram
quando o inimigo se embarcava."" D. Manuel - : "Chegou emfim a hora da
partença segunda-feira quatro de Agosto em que se fizeram a vella quando rompia
o sol. Alguns dos navios com a aguada mal segura pelo mal adresso das vasilhas,
pouco vinho, escassos e maus os mantimentos e tanto como o que mais
necessitado os que se embarcaram os olandezes.
23. ↑ (…) ( "o mar todo sujo de navios (…) holandeses, [ estes ] tiravam-me de longe
donde ladravam, algum se me chegou de noite tão perto que me levou cargas de
mosquetaria. Quarta-feira oito de outubro (8 de Outubro de 1625) tivemos vista
de terra e por parecer Cabo de Espichel, e não se ter tomado o sol de tres dias,
discorremos aquella noite, mas era a Boca, e nos achamos pela manhã perto
da Berlenga donde não vieramos a este porto em muitos dias senão fora huma
trovoada de Oesnoroeste com que nos chegamos, e entramos a barra de Lisboa
terça-feira quatorze deste mez 14 de Outubro de 1625) . O tempo hé bonança de
todo (…) . Julgo que a frota de Brazil vira toda junta com a maior parte da armada
que não pode estar longe esperando em Deus que há de trazer tudo a salvamento
pera que o real serviço de V. M. se faça com a prosperidade que lhe desejão, e
procuram estes seus vassalhos." Severim de Faria : Quando os nossos chegaram
ao Reino, acharam que Sua Majestade [ Filipe III de Portugal ] , por uma sua
escrita ao nosso Conselho, havia por bem, por estar informado do valor com que
os Portugueses o serviram nesta ocasião, e que para morrer por seu socorro lhes
não faltara vontade e sobejara o ânimo, mandava que a cada um se desse o que
tivesse da Coroa para filhos ou herdeiros e lhes fizessem todas as mais mercês,
que ele, por outro decreto seu, tinha concedido aos que morressem nesta Empresa,
sem a nenhum ser necessário fazer sobre isto mais diligências, porque queria que
soubessem os Portugueses que para lhes fazer mercês não queria dessem mais
passos que os dados em seu socorro. Magnificência tão grandiosa que igualmente
recompensou o ânimo desinteressado com que a nobreza deste Reino se
embarcou, para esta jornada, sem nenhum pedir satisfação alguma, e que obriga
a todos se empregarem fervorosamente no socorro de Príncipe que tanto se
lembra de quem o serve." D. Manuel - : "ficou a este librito conforme a
preposiçam se não tem sido mais larga"
24. ↑ "Por esta carta, Sua-Magestade dava-me ordem de ir ao encontro das naus da
Índia por 44° de latitude." O que seguiu foi o maior desastre de Portugal depois
da derrota de D. Sebastião na batalha de Alcácer Quibir : A armada de Portugal
de Dom Manuel e a armadada Carreira da Índia envolvidas numa imensa
tempestade, sofreram o maior naufráfio da historia da marinha portuguesa, perto
das costas francesas de Saint-Jean-de-Luz e de Arcachon : 7 navios perdidos -
duas enormes naus da Índia de 1800 toneladas, carregadas de pedras preciosas e
especiarias, escoltadas por cinco galeões de guerra levando a melhor parte da
nobreza de Portugal -, 2000 mortos e só 300 a rescaparem…
25. ↑ D. francisco Manuel de Melo, Epanaphoras de vária Historia Portugueza,
Epanaphora trágica, Lisboa, António Craesbeeck. 1676
26. ↑ Amélia Polónia: Mestres e pilotos das Navegações Ultramarinas (1596-1648) -
Subsídios para o seu estudo, in Revista da Faculdade de Letras - Históricas", II
Série, Vol. XIII, Porto, 1995, pp. 135-217
27. ↑ estudo de Rita Cortez de Matos já citado
28. ↑ E Francisco Contente Domingos acrescenta: Defunto (Lavanha) em 1624,
sucedeu-lhe D. Manuel de Meneses em 1625, o "único cosmógrafo-mor com real
conhecimento e experiência da navegação prática" Aparece então que D. Manuel
de Meneses nunca chegou a exercer seu cargo de "cosmógrafo-examinador", que
não era aliás, como vimos, a única prerogativa do Cósmografo-Mór de Portugal.
Para esse officio, D. Manuel tinha certas disposições como a sua prática da
navegação, e seu interesse pelas matemáticas, e já uma das suas primeiras obras
de que temos conhecimento, escrita em 1611, intitulava-se : "Parecer que deu
a Felippe III de Portugal sobre a causa da perdição das Naos da India, e o meyo
que deve aplicarse para se aviar gente do mar para a navegação". Se não aparece
como examinador é certamente porque, pouco tempo ficou em Lisboa a partir da
sua nomeação que só pode ter ocorrido a partir de fins de Outubro de 1625, em
que chegou a Lisboa vindo da Bahía. Logo no ano seguinte vêmo-lo embarcado
perto das Costas portuguesas, à espera da armada da Índia
29. ↑ "Guerra de tintas"Como se confere, a relação de D. Manuel ficou manuscrita
até 1859. A não publicação da relação duma vitória que na época deu ocasião a
tão grandes regozijos (lembremos o quadro de Juan Bautista Maíno : "La
recuperación de Bahía", e a peça de teatro de Lope de Vega : "El Brasil
restituido"), vitória contada por um dos seus mais importantes capitães, tem algo
de estranho : a solução desse enigma encontra-se sem dúvida no que Carlos Ziller
Camenietzki e Gianriccardo Grassia Pastore chamaram a "Guerra de tintas". Diz
D. Manuel no princípio da viagem : "Estou como com ancia desejando chegar a
estas ilhas não para descansar do trabalho de escrever, hé a leitura breve posto
que cansativa, meúda e seca conforme ao nome entalada entre os limites rigorosos
da "verdade" que muitos verão e espreytarão". Insiste em dizer a verdade, como
se a verdade fosse ocultada, assim o fizeram os numerosos cronistas do
acontecimento, portugueses e espanhois, que não contaram a mesma coisa, daí a
denominação de "guerra de tintas":
"A expedição conjunta de espanhões e portugueses, sobre comando espanhol,
para recuperar uma praça portuguesa, deu lugar a uma rivalidade entre essas
duas nações. "A guerra de tintas não expressava um sentimento nacional
adormecido ou esmagado; ao contrário, expressou um mal-estar de fidalgos, e
tão somente dos membros da nobreza latu sensu. O objeto desse desconforto,
(…), era o lugar ocupado pelos vassalos portugueses no exercício de seu
"natural" e antigo papel na sociedade portuguesa : governar, defender o reino e
suas conquistas. (…) Pelo que foi exposto mais acima, pode-se imaginar que a
"guerra de tintas" não apresentava aos olhos de seus leitores o caráter de uma
disputa literária strictu sensu, estava diretamente em jogo a proeminência da
fidalguia de Portugal. (…)
Bibliografia