LUÍS VAZ DE CAMÕES Vasco da Gama então conta para esse rei a história do povo
lusitano, traça a genealogia dos monarcas portugueses e aproveita para
“louvar dos meus a glória”. Fala do casamento entre “Anrique” (Henrique), um conde filho de um “Rei de Hungria”, com Teresa, filha do “Rei Castelhano” D. Afonso, casal que ganhou as terras hoje conhecidas como Portugal. O primeiro rei português teve um filho, o príncipe Afonso, que levava o nome do avô espanhol. Mais tarde, o jovem se tornou rei e empreendeu uma guerra vitoriosa contra os mouros. Sancho I sucedeu ao pai. Depois Afonso II, ambos reis gloriosos. Porém, o próximo rei, Sancho II, é descrito pelo narrador como “manso e descuidado”. A dinastia vai sendo mencionada por Vasco da Gama, com Por Carlos Eduardo Varella Pinheiro Motta Doutorado em Letras - Literatura e Língua Portuguesa (PUC-Rio, 2013) detalhes e façanhas de cada reinado, como o dos reis D. Dinis, Mestrado em Linguística, Letras e Artes (PUC-Rio, 2008) Fernando e Manuel, por exemplo. Por fim, ele conta as próprias Graduação em Jornalismo (PUC-Rio, 2001) aventuras até desembarcar ali e receber a hospitalidade do rei de Luís Vaz de Camões nasceu em Lisboa ou Coimbra, entre 1524 e Melinde. Terminada a narrativa, Gama continua viagem e atinge os 1525, filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá e Macedo. Na “mares da Índia”. juventude, alista-se no Exército da Coroa portuguesa, embarcando, em Porém, ainda precisa enfrentar a fúria do mar. E chega 1547, para a África como soldado, onde perde o olho direito em finalmente ao destino sonhado: a Índia. Lá, são recebidos com festa. Marrocos no combate aos ceutas. No entanto, o narrador revela que o propósito dos mouros era “deter Cinco anos depois, retorna a Portugal, vivendo na boemia, até ali os descobridores/ Da Índia tanto tempo que viessem/ De Meca as envolver-se em conflito com um funcionário real, que saiu ferido, o que naus, que as suas desfizessem”. o levou ao encarceramento. Em 1553, é enviado para a Índia, onde Gama fica sabendo da intenção dos mouros e parte rumo a participa de algumas expedições militares, chegando, três anos depois, Portugal, levando pimenta, noz, cravo e uma rota para a Índia. Antes de à China. Lá, trava contato com a jovem Dinamene, por quem se chegarem às terras lusitanas, os conquistadores param em uma ilha e apaixona. Tempos depois, Dinamene é vitimada por um naufrágio e são premiados pelos deuses com o amor de belas e sedutoras ninfas. termina se afogando. Reza a lenda que, apesar de estar a bordo, Camões não conseguiu salvar a amada, mantendo apenas o manuscrito Estrutura da obra Os Lusíadas de seu poema Os Lusíadas em uma das mãos, enquanto ocupava-se em “Os Lusíadas” é uma epopeia do escritor português Luís Vaz de nadar com a outra. Ademais, a tragédia leva à inspiração de vários Camões, que tem como assunto a viagem de Vasco da Gama às Índias. poemas, sendo o mais famoso o intitulado como A Saudade de Ser A Narrativa é dividida em dez cantos que são organizados em 1.102 Amado. estrofes, cada uma com oito versos, ou seja, 8.816 veros e todos decassílabos, com rima ABABABCC. Em 1570, parcialmente recuperado da perda, retorna à Lisboa, tendo em mãos o manuscrito de sua obra-prima, que seria publicado Canto I dois anos com a colaboração do monarca D. Sebastião. O sucesso As armas e os Barões assinalados absoluto de crítica e público o transforma rapidamente em um dos Que da Ocidental praia Lusitana mais importantes poetas da nação. Por mares nunca de antes navegados Em termos formais, a obra funde elementos épicos e líricos, Passaram ainda além da Taprobana, Em perigos e guerras esforçados fundindo a atmosfera do humanismo renascentista com a das Mais do que prometia a força humana, expedições ultramarinas portuguesas. A principal inspiração clássica é E entre gente remota edificaram A Eneida, de Virgílio, manifestada na narrativa dos fatos heroicos da Novo Reino, que tanto sublimaram; história de Portugal, principalmente a descoberta do caminho marítimo para as Índias por Vasco da Gama. Como escritor do século XVI, período da Inquisição na Europa, Quanto à história, o enredo é dividido em cinco partes, como Camões teve suas obras examinadas pela Igreja Católica, que tinha o manda a tradição clássica a uma epopeia. São elas: poder de autorizar ou proibir as publicações. Conforme o depoimento 1. Proposição - Apresentação da obra e síntese do assunto, de Frei Bartolomeu, religioso da época, a publicação de Os Lusíadas foi ressaltando o heroísmo, o antropocentrismo, o ufanismo, dentre autorizada, uma vez que a presença de figuras mitológicas do outras características do homem. paganismo não passava, segundo a interpretação eclesiástica, de um 2. Invocação das Tágides - É um pedido do autor às musas Tágides, recurso poético. ninfas do rei Tejo, para virem lhe dar inspiração. Apesar da consagração em vida, o autor lidava mal com a 3. Dedicatória ao Rei D. Sebastião - O rei é apresentado como um administração dos lucros das suas obras publicadas. Assim, em 10 de menino, aos 14 anos assumindo o trono, exaltando-o como jovem e junho de 1580, termina falecendo na capital em estado de absoluta esperança da pátria. miséria. Ainda assim, é considerado, junto à Fernando Pessoa, como o 4. Narração - Parte mais consistente da história, como já dito, foca-se maior nome da poesia portuguesa. Seus restos mortais encontram-se, em três pontos principais: a viagem de Vasco da Gama às Índias, a atualmente, em um mausoléu no Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa. narrativa da história de Portugal e as lutas e intervenções dos INFOESCOLA deuses do Olimpo. Ao mesmo tempo, o autor faz descrições de fenômenos como a tromba marítima, e disserta sobre a moral, o "Resumo da obra Os Lusíadas ouro, as riquezas, entre outros interesses do homem renascentista. Os marinheiros portugueses estão em alto mar e são 5. Epílogo - última parte, contém críticas do poeta, lamentações sobre comandados pelo heroico Vasco da Gama. Eles querem chegar até a a realidade, exortações ao rei, etc. O tom destas últimas 12 Índia, mas, antes, chegam à ilha de Moçambique. Acabam travando estrofes é pessimista, criticando a decadência do país, e reforçando uma batalha com os mouros. Depois, navegam até a ilha de Mombaça, a exaltação ao Rei D. Sebastião. cujo rei parece amigo. No entanto, Mercúrio, em sonho, adverte Gama sobre os planos A OBRA APRESENTA AS SEGUINTES CARACTERÍSTICAS: do rei de Mombaça, que planeja uma cilada contra os portugueses. O visão antropocêntrica; bucolismo; herói dá ordens aos marinheiros para içarem velas e fugirem. Em semipaganismo; idealização do amor; seguida, os heroicos portugueses aportam no Reino Melinde, cujo rei valorização dos temas da idealização da mulher; os recebe cordialmente. Antiguidade; rigor formal. equilíbrio e simplicidade; Em meio a todo esse elogio aos navegadores portugueses surge a voz de um ancião que se mostra contrário a viagem quando os bravos navegantes se despedem de seus familiares antes de partir. Segundo o velho, os portugueses são PRINCIPAIS EPISÓDIOS DA NARRATIVA insanos, pois vão se arriscar para buscar poder, fama, cobiça e ambição desmedida. Ilha dos Amores (canto IX, estrofes 68 a 95) Esse velho representa a mentalidade portuguesa feudal, contrariando os desejos da monarquia e da burguesia.
Inês de Castro (Canto III)
Quando a esquadra completa a viagem Vênus os
recompensa com um momento de descanso na Ilha dos Amores, paraíso natural que era a imagem que se tinha do Brasil, recém descoberto. É lá que a Máquina do Mundo é apresentada aos Vemos um drama amoroso. D. Pedro era casado com portugueses com inúmeras profecias. Constança e tinha como sua amante Inês de Castro. Sua paixão Neste canto acompanhamos o encontro do plano mítico dos foi descoberta pela corte portuguesa e todos reprovavam sua deuses com o plano histórico dos homens. Os portugueses são vida de amor dupla. Por isso, ele manda Inês para um castelo elevados à condição de deuses. distante, em Albuquerque. Nessa ilha eles encontram ninfas que foram flechadas pelo Com a morte de D. Constança em um trabalho de parto, D. cupido. Vendo os portugueses ficam apaixonadas. Eles recebem Pedro fica livre para trazer Inês de volta, e o faz. Com ela teve 4 também um banquete e cada um ouve a previsão para o seu filhos. futuro. Vênus mostra ainda, a Vasco da Gama, uma esfera Porém, o pai de D. Pedro, enquanto este estava fora em perfeita e mágica: a batalha, manda matar Inês. Seu filho ainda não tinha se casado com ela e seu pai não a queria para o filho, nem queria deixar o reina para algum dos 4 netos que já tinha. Máquina do Mundo. Quando D. Pedro voltou e viu sua mulher morta, mandou desenterrá-la, coroou-a e fez com que toda a corte beijasse a mão da nova rainha como forma de vingança. “Passada esta tão próspera vitória, Tornado Afonso à Lusitana Terra, A se lograr da paz com tanta glória Quanta soube ganhar na dura guerra, O caso triste e digno da memória, Que do sepulcro os homens desenterra, Aconteceu da mísera e mesquinha Que depois de ser morta foi Rainha.” Esse episódio na ilha dos Amores inspirou o poema “A Máquina do Mundo” de Carlos Drummond de Andrade. Neste nosso artigo temos uma análise de Claro Enigma de Drummond e lá está completo esse seu poema. Adamastor (Canto V) “Vês aqui a grande máquina do mundo, Etérea e elemental, que fabricada Assim foi do Saber alto e profundo, Que é sem princípio e meta limitada. Quem cerca em derredor este rotundo Globo e sua superfície tão limada, É Deus: mas o que é Deus ninguém o entende, Que a tanto o engenho humano não se estende.” Adamastor é o Cabo da Boa esperança, ou Cabo das O velho de Restelo (Canto IV) Tormentas. Por ter seduzido a ninfa Tétis, esposa do deus Peleu, foi por ele transformado em rocha como vingança. O Gigante prometeu destruir qualquer navio que passasse por ele. Por isso o local era representado com nuvem negra e tempestade. Nisso claramente vê-se a representação mitológica da obra. Quanto à lírica, é uma das passagens mais importantes, já que representa o medo dos portugueses de atravessarem o Oceano Índico e o Atlântico, representados por monstros, gigantes, penhascos e seres sobrenaturais. Vê-se também a impossibilidade do amor, já que vemos um amante rejeitado.