Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Pesquisadora do CNPq
Introdução
1 Baseado no livro da mesma autora Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Malheiros, 2000 e palestra
proferida no XII CONAFISCO - Águas de Lindóia, nov/2001.
2 E-mail: limari@vento.com.br.
Os órgãos judicantes administrativos, embora com autonomia em relação à
Administração ativa e com representantes do fisco e da sociedade, hão de ser fortalecidos,
para agilizar a solução dos conflitos entre a Administração e os contribuintes, mantendo as
garantias e reduzindo os feitos tributários no Judiciário, ainda que a escolha do fórum perante
o qual deseja postular seus direitos fique a critério exclusivo do contribuinte. A opção pela via
administrativa é pertinente constitucionalmente e desejável pela vantagem de ser atrativa pela
gratuidade, dar efeito suspensivo dos recursos e com a certeza das garantias constitucionais.
Cabe demonstrar que o processo tributário tem que ser estruturado segundo os
princípios constitucionais, mas com uma vinculação em relação a outros princípios
processuais que atendem a natureza dessa relação obrigacional tributária e com a necessária
conexão entre o processo judicial e o administrativo.
Por último e não menos importante, está o fato do processo administrativo ter sido
elevado a um plano constitucional, na medida em que o próprio constituinte explicitamente
destacou a importância do processo administrativo tributário, ao exigir dele a necessidade de
respeito à ampla defesa e ao contraditório, dentre outros princípios que devem ser seguidos no
processo administrativo tributário.
De se destacar a idéia de que a tutela jurídica que está ligada ao interesse desse
instrumento, diz respeito à importância de que diante das relações sociais que se travam, em
particular nas relações fisco/contribuinte, é que deve estar prevista sempre a realização da
justiça, e de modo específico em matéria tributária. A proteção necessária e suficiente para
que se leve adiante a verdadeira tutela jurídica dos bens que estão envolvidos nas questões
tributárias. Por um lado, para se poder garantir e prevenir das medidas arbitrárias e ilegais que
são cometidas eventualmente pelos agentes públicos e por outro para que os contribuintes
cumpram suas obrigações tributárias exigidas pelo legislador em nome da sociedade.
Não há dúvida que a Fazenda Pública deve se preservar contra condutas ilegais
dos próprios contribuintes ou responsáveis pelo tributo. Então, se de um lado há a importância
que deve ser dada aos interesses da própria Faze nda Pública, por outro e não menos
importante é necessário que se prestigiem as questões dos particulares, principalmente quando
essas medidas ilegais e arbitrárias são cometidas em favor da arrecadação tributária.
Ainda dentro dessa teoria geral do processo administrativo, uma outra questão que
deve ser colocada é exatamente o fato de que deve existir um autocontrole. O controle da
legalidade é imprescindível para o bom andamento das questões nas relações tributárias
existentes entre o cidadão e o Estado.
José Afonso da Silva também destaca essa idéia na medida em que levanta a
questão da efetiva participação da sociedade em todos os aspectos da atuação do Poder
Público. Então é claro que na medida em que a sociedade participa do processo administrativo
tributário há melhores condições do exercício verdadeiro do Estado Democrático de Direito.
Cumpre afastar a idéia que alguns ainda fazem a respeito de que o processo
administrativo tributário estaria “desprezado”, insistindo assim em chamá-lo de procedimento.
Na verdade vê-se o processo a partir da existência de um procedimento, como sendo aquele
conjunto de atos sucessivos que se dão para atender uma finalidade. Pois bem, isso é
procedimento, mas processo existe a partir do momento em que se estabelece o contraditório,
explicitamente exigido pelo Constituinte, não havendo porquê se retirar do administrativo a
figura do processo apenas porque não está no âmbito do judiciário. Felizmente boa parte da
doutrina processualista vem entende ndo que estando presente o contraditório no processo
administrativo tributário, não há como considerá-lo apenas procedimento. Procedimento é,
por exemplo, o inquérito policial, em que não está presente o contraditório.
Ainda neste contexto geral, pode-se dizer também que há que se considerar a
visão maior que se pode ter para todos os aplicadores das várias áreas do direito, e não é
diferente no processo administrativo tributário - aquela idéia de sistema.
Não se pode deixar de lado essa visão sistêmica, em que estão presentes os
princípios, ou seja, aqueles nortes dados pelo constituinte, aquelas diretrizes estabelecidas
explícita ou implicitamente e que devem permear todo o processo administrativo tributário.
Então, é claro que tanto no que diz respeito ao conteúdo próprio do processo
administrativo tributário, que é de natureza instrumental, deve -se estar sempre levando em
conta a aplicação dos princípios. Os princípios gerais, como sendo aqueles que têm função
genérica, que se aplicam a todas as áreas, mas que dão apenas a orientação comum às várias
áreas do direito. Além deles, os princípios específicos, que são os que se dirigem de modo
particular, e têm a ver com as especificidades da área; nesse caso as especificidades do
processo administrativo tributário. Todos eles dão a ordem e a unidade necessárias a essa
visão sistêmica que se deve ter do direito como um todo, e não poderia ser diferente para os
operadores do direito, no caso específico, do processo administrativo tributário.
Em relação aos princípios específicos é claro que têm que estar presentes os
demais, relativos à administração pública, colocados explicitamente no art. 37 da Constituição
Federal (impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência). A moralidade, mais do que
ética, está explicitada na Constituição e há de ser levada em conta por todos e em particular
no processo administrativo tributário.
No que diz respeito à oficialidade, como sendo o princípio segundo o qual todos
os agentes devem promover o impulsionamento necessário à conclusão; ao desfecho do
próprio processo, em favor dessa agilidade que busca a justiça e a conciliação, pacificando o
conflito entre a administração e o contribuinte.
Tão logo seja proferida a decisão singular, e com ela não concordando o
contribuinte, há normalmente uma estrutura no sentido de que essa decisão seja submetida a
um recurso, que permite então uma revisão dessa decisão proferida pelo julgador
monocrático.
A doutrina não é pacífica em dizer que haja necessidade de que a estrutura dos
órgãos julgadores se dê na via administrativa com implementação de um órgão em segundo
grau. De toda forma tem surgido em quase todas as estruturas essa revisão por parte do órgão
de segundo grau, que permite a revisão no caso de uma decisão injusta ou até errada e
também pela própria natureza política de todos os órgãos que dizem respeito à implementação
legal que é a de que nenhum órgão fique imune e possa estar submetido aos necessários
controles.
Esse recurso tanto pode se dar de ofício, nos casos em que a própria lei
especificamente determinar, em que o próprio julgador deve levar adiante e promover o
recurso quando perdedora a Fazenda Pública, e por iniciativa ou recurso voluntário do próprio
contribuinte.
Também tem importância pela maior estabilidade que consegue levar adiante na
ordem social, pela própria possibilidade de antecipação da solução de eventuais controvérsias
que estão sendo sistematicamente colocadas a partir dessa complexidade das relações
fisco/contribuinte.
É necessário que o legislador tenha essa consciência e venha a criar alguns liames
que sejam capazes de proporcionar uma possibilidade de aproveitamento do processo em
busca de uma melhor utilização desses atos preparatórios e de todos os demais que são
levados adiante no processo administrativo tributário.
Dificilmente se ouve alguém falar em reforma tributária com uma visão mais
ampla, que dê condições à verdadeira efetividade do direito material, desde que ela traga junto
a instrumentalização necessária para a ativação desses direitos materiais. Então, qualquer
reforma tributária só pode ser bem sucedida se levar em conta questões relativas ao direito
material, se acompanhadas dos instrumentos processuais hábeis à efetivação desses direitos,
senão elas ficam sempre capengas e prejudicadas.
3
MARINS, James. Princípios Fundamentais do Direito Processual Tributário. São Paulo: Dialética, 1998, p.
121.
com foros de intangibilidade (já que não é imune ao controle do Poder Judiciário), é
instrumento essencial ao atendimento das premências instrumentais do Estado.”
Afirma José Arias Velasco4 que “É condição do Estado de Direito que as normas
que delimitam as faculdades e deveres da Administração com os particulares e as destes com
o Estado sejam respeitadas com a garantia de um procedimento em que devam se ajustar os
atos da Administração com os recursos e uma jurisdição encarregados de decidir, julgar e
falar sobre as questões que suscitam a interpretação ou aplicação daquelas normas.”
4
VELASCO, José A. Procedimientos Tributarios.6. ed. Madri: Marcial Pons, 1996, p. 521.
5
CRETELLA JÚNIOR, José. Controle Jurisdicional do Ato Administrativo. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1993, p. 332.
pouco com a sistematização processual. Além da carência de estudos nesse sentido, os
assuntos a eles relativos são tratados de forma isolada e pontual.
6
Op. cit., p. 15.
7
SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Questões Relacionadas à Chamada Coisa Julgada Administrativa em
Matéria Fiscal, in Processo Administrativo Fiscal. São Paulo: Dialética, v. 3, p. 11.
8
BUJANDA, Fernando Sainz de. Lecciones de Derecho Financiero, 7. Ed. Madri: Universidad Complutense,
1989, p. 362 e 363.
processo judicial. Essas garantias é que fazem idôneo o processo administrativo tributário
para a realização de seus precípuos fins.
9
MEDAUAR, Odete. Conselho de Contribuintes , IOB – Repertório de Jurisprudência 2/34. São Paulo, 1995. p.
34.
tributário e do processo judicial, como já defendia Rubens Gomes de Sousa, refletindo sobre a
Justiça Fiscal. Essa justiça, no âmbito do processo tributário, é o elemento propulsor da
aproximação e harmonização entre a fase administrativa e a judicial, para alcançar os fins
últimos do Direito – consecução e manutenção da paz jurídica e a realização da justiça.
10
MACHADO, Hugo de Brito. O Devido Processo Legal Administrativo Tributário e o Mandado de Segurança,
in Processo Administrativo Fiscal. São Paulo: Dialética, v. 3, p. 88 e 89.
11
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional, 15 ed., São Paulo: Malheiros Editores, p. 182.
12
ROCHA, Valdir de Oliveira. Processo Administrativo Fiscal, São Paulo: Dialética, 1996, p. 141.
estar, o desenvolvimento, a justiça, etc. como valores supremos da sociedade brasileira (tudo
conforme o Preâmbulo da Constituição)."
13
SOUSA, Rubens Gomes de. Idéias Gerais para uma Concepção Unitária e Orgânica do Processo Fiscal,
RDA 34/14-33, p. 27 e s.
características próprias dos interesses envolvidos nos litígios; como ensina Kelsen14 “não há
qualquer diferença entre a função de um tribunal que, no caso de furto, aplica uma pena de
prisão e, no caso de uma ofensa à dignidade, aplica uma pena de multa, e a função de um
órgão administrativo que, no caso de violação de preceitos fiscais, de sanidade ou de trânsito,
ordena a execução de sanções análogas. De resto, a execução da sanção, mesmo quando seja
ordenada por um tribunal, é um ato administrativo.”
Conclusões
14
KELSEN, Hans. Teoria Puro do Direito, 3. ed. São Paulo: Marins Fontes, 1991, p. 280.
O ideal seria que os conflitos tivessem pronta solução tão logo apresentados ao
Judiciário. Tal não é possível, pois ao lado da duração do processo, o seu custo e o
enfra quecimento do sistema constituem óbices à plenitude do cumprimento da função
pacificadora.
A legislação vigente não assinala com clareza nem regula de modo uniforme os
momentos capitais de cada uma das fases dos processos administrativos tributários. A
diversidade continua sendo a regra, o que gera insegurança e desorientação nas atividades das
partes junto aos atos processuais, querendo dizer que também nesse particular, como nas
situações levantadas, o campo se apresenta largamente aberto à reforma dessa legislação.
Este é outro fator a não permitir importação de legislação de outras áreas e países,
mas a exigir legislação específica que não seja aquela que soluciona conflitos de interesses
privados, porém que versem sobre os litígios de que participam sujeitos públicos.
15
O interesse público que domina todo o processo administrativo tributário não está relacionado à maximização
das receitas, mas à tributação de acordo com a lei, à determinação legal e exata do quantitativo da obrigação
tributária.
A edição de código de processo tributário permite, pois, que se apliquem ao
Direito Público soluções compatíveis, não com a abordagem de natureza privada, mas com
limitações aos excessos ou abusos em vista da concentração de competências no poder estatal,
evitando-se infringir os fundamentos do Estado Democrático de Direito, para o que se exige
submissão a um regime jurídico reservado para situações específicas que lhe são atinentes.
16
Só profissionais com formação jurídica têm a visão geral do sistema jurídico e de sua unidade. Afinal, o
Direito Tributário é de superposição e o aplicador deve interpretá-lo em toda a sua dimensão.
O processo administrativo tributário reduz as incertezas derivadas da
complexidade e da heterogeneidade das obrigações tributárias, cujo aprimoramento é
indispensável para harmonizar as relações fisco/contribuinte, na medida em que reforça a
transparência, a certeza e as segurança jurídicas, além da justiça fiscal, que são finalidades a
serem alcançadas na modernização da administração tributária.