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Mestrado em Teologia ITG – Instituto Teológico Gamaliel


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I. O CONHECIMENTO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

1 - INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA SOCIEDADE – TEORIA E MÉTODO

• A revolução Industrial e o surgimento das ciências sociais


• As principais correntes teóricas e as possibilidades de análise científica dos
problemas sociais.
• As Ciencias Socias no Brasil

Sociologia é o estudo do comportamento social das interações e


organizações humanas. Todos nós somos sociólogos porque estamos sempre
analisando nossos comportamentos e nossas experiências interpessoais em
situações organizadas. O objetivo da sociologia é tornar essas compreensões
cotidianas da sociedade mais sistemáticas e precisas, à medida que suas
percepções vão além de nossas experiências pessoais.

A sociologia estuda todos os símbolos culturais que os seres humanos


criam e usam para interagir e organizar a sociedade; ela explora todas as
estruturas sociais que ditam a vida social, examina todos os processos sociais, tais
como desvio, crime, divergência, conflitos, migrações e movimentos sociais, que
fluem através da ordem estabelecida socialmente; e busca entender as
transformações que esses processos provocam na cultura e estrutura social.

Em tempos de mudança em que a cultura e a estrutura estão atravessando


transformações dramáticas. A sociologia torna-se especialmente importante
(Nisbet,1969). Como a velha maneira de fazer as coisas se transforma, as vidas
pessoais são interrompidas e, como conseqüência, as pessoas buscam respostas
para o fato de as rotinas e fórmulas do passado não funcionarem mais. O mundo
hoje está passando por uma transformação dramática: o aumento de conflitos
étnicos, o desvio de empregos para países com mão-de-obra mais barata, as
fortunas instáveis da atividade econômica e do comércio, a dificuldade de serviços
de financiamento do governo, a mudança no mercado de trabalho, a propagação
de uma doença mortal (AIDS), o aumento da fome nas superpopulações, a quebra
do equilíbrio ecológico, a redefinição dos papéis sociais dos homens e das
mulheres e muitas outras mudanças. Enquanto a vida social e as rotinas diárias se
tornam mais ativas, a percepção sociológica não é completamente necessária.
Mas, quando a estrutura básica da sociedade e da cultura muda, as pessoas
buscam o conhecimento sociológico. Isso não é verdade apenas hoje – foi a razão
principal de a sociologia surgir em primeiro plano como uma disciplina diferente nas
primeiras décadas do século XIX

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1.1 - O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA

No limiar do século XXI, estamos vivendo um momento da História que os


especialistas estão denominando de globalização. Uma das características
marcantes da globalização são os sistemas de comunicação que unem e
aproximam os espaços. A televisão, por exemplo, coloca um fato de um país
distante dentro de nossa casa no mesmo momento em que ele está acontecendo,
e tudo parece estar ocorrendo ali “na esquina de nossa casa”.

A tecnologia da comunicação imprimiu maior velocidade ao mercado


econômico, fazendo com que a mercadoria circulasse e fosse distribuída mais
rapidamente. Utilizando a expressão de McLuhan, o mundo se transformou em
uma aldeia global. Ianni (1922) e Souza Neto (1998) constatam que a
globalização não é um fato acabado, mas um fenômeno em marcha, que destrói
possibilidades e, ao mesmo tempo, cria outras. É um movimento que atinge todas
as esferas da vida social, individual e coletiva.

Em cada lugar ou cidade, a globalização toma uma diferente fisionomia, ou


seja, uma coisa é a interface da globalização com a cidade de são Paulo, outra
coisa é a mesma interface em Salvador, na Bahia. Na expressão de Castells
(1999), a sociedade hoje é a sociedade da informação, uma sociedade em rede,
que conecta e desconecta em qualquer momento e lugar. Uma sociedade em rede
ultrapassa as relações sociais e técnicas de produção, atinge a cultura e as
relações de poder.

Rifkin (1995) caracteriza o movimento da globalização como uma era de


mercados globais, de produção automatizada, o processo produtivo à vista
quase sem a presença do trabalhador da forma pela qual estamos
acostumados, as multinacionais buscando abrir as fronteiras e
transformando a vida de bilhões de pessoas para conquistar os mercados
globais. Ele constata que a dinâmica da globalização poderá conduzir a
humanidade a um porto seguro ou a um terrível abismo. Se de um lado o fim do
trabalho é a sentença de morte da civilização, poderá sinalizar também algumas
mudanças que provocarão um ressurgimento do espírito humano. Enfim, “o futuro
está em nossas mãos”.

Através dos tempos, o homem pensou sobre si mesmo e sobre o universo.


Contudo, foi apenas no século XVIII que uma confluência de eventos na
Europa levou à emergência da sociologia. Quando os antigos sistemas feudais
começaram a abrir caminho ao trabalho autônomo que promovia a indústria nas
áreas urbanas e quando novas formas de governo começaram a desafiar o poder
das monarquias, as instituições da sociedade - emprego e receita, planos de
benefícios, comunidade, família e religião - foram alteradas para sempre. Como era
de se esperar, as pessoas ficaram inquietas com a nova ordem que surgia e
começaram a pensar mais sistematicamente sobre o que as mudanças
significavam para o futuro (Turner, Beeghley e Powers, 1989)

O movimento intelectual resultante é denominado de Iluminismo ou Século


das Luzes, pois a influência da religião, da tradição e do dogma no pensamento
intelectual foi finalmente rompida. A ciência agora poderia surgir plenamente como
uma maneira de pensar o mundo; já a física e, mais tarde, a biologia foi capaz de

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superar a perseguição realizada pelas elites religiosas e estabeleceram-se como
um caminho para o conhecimento. Junto com o crescimento da influência da
ciência, veio uma avalanche de conceitos sobre o universo social. Muitos desses
conceitos, de caráter especulativo, avaliavam a natureza dos homens e as
primeiras sociedades infiltradas pela complexidade do mundo moderno. Parte
desses conceitos era moralista, mas não no sentido religioso. Com eles, o tipo
adequado de sociedade e de relações entre indivíduos (uns com os outros e na
sociedade) foi reavaliado com base nas mudanças econômicas e políticas
ocorridas com o comércio e, em seguida, com a industrialização. Na Inglaterra,
esse novo pensamento foi denominado de Era da Razão; e estudiosos, como
Adam Smith (1776), que primeiramente articulou as leis da oferta e da procura na
área de mercado, também avaliaram os efeitos, na sociedade, do rápido
crescimento populacional, da especialização econômica em escala, da comunidade
em declínio e dos sentimentos morais debilitados. Na França, um grupo de
pensadores conhecido como filósofos das luzes também começaram a expor
uma visão do mundo social que defendia uma sociedade em que os indivíduos
eram livres da autoridade política arbitrária e eram guiados por padrões morais
combinados e pelo governo democrático.

Ainda outra influência por trás do surgimento da sociologia – a Revolução


Francesa, de 1789 – acelerou o pensamento sistemático sobre o mundo social. A
violência da revolução foi um choque para toda a Europa, pois, se tal violência e
influência puderam derrubar o velho regime, o que houve para substituí-lo? Como a
sociedade poderia ser reconstruída a fim de evitar tais eventos cataclísmicos? É
nesse ponto, nas décadas finais do século XVIII e início do XIX, que a
sociologia como uma disciplina autoconsciente foi planejada.

1.2 – PRINCIPAIS PENSADORES DA SOCIOLOGIA

1.2.1 AUGUSTE COMTE - (1798-1857), o Fundador da Sociologia.

A herança francesa do Iluminismo e as ondas de choque da Revolução


Francesa levaram Auguste Comte em seu quinto volume do Curso de Filosofia
Positiva (1830-1842) a examinar a solicitação por uma disciplina dedicada ao
estudo científico da sociedade. Comte quis chamar essa disciplina de “física
social” para enfatizar que estudaria a natureza fundamental do universo social, mas
ele foi praticamente forçado a determinar o termo híbrido greco-latino, sociologia.

As múltiplas controvérsias entre os sociólogos praticamente


desaparecem quando se trata de determinar a “paternidade”
da sua disciplina. Quase todos eles concordam que a
Sociologia começa com a obra de Augusto Comte ( 798
– 1857). “Além de cunhar o nome da nova ciência, foi de
Comte a primeira tentativa de definir-lhe o objeto, seus
métodos e problemas fundamentais; bem como a primeira
tentativa de determinar-lhe a posição no conjunto das
ciências.” (GALLIANO, 1981, p.30)

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O problema central para a sociologia era aquele que tinha sido articulado pelos
pensadores mais antigos do Iluminismo: como a sociedade deve ser mantida unida
quando se torna maior, mais complexa, mais variada, mais diferenciada, mais
especializada e mais dividida? A resposta de Comte foi que as idéias e as crenças
comuns precisavam ser desenvolvidas para dar à sociedade uma moralidade
"universal”. Essa resposta nunca foi desenvolvida, mas a preocupação com os
símbolos e a cultura, como uma força unificadora para manter a essência do
conceito sociológico francês, existe até os dias de hoje.

Uma tática que Comte empregou para fazer com que a sociologia parecesse
legítima foi postular a lei dos três estados, na qual o conhecimento está sujeito,
em sua evolução, a passar por três estados diferentes. O primeiro estado é o
teológico, em que o pensamento sobre o mundo é dominado pelas considerações
do sobrenatural, religião e Deus; o segundo estado é o metafísico, em que as
atrações do sobrenatural são substituídas pelo pensamento filosófico sobre a
essência dos fenômenos e pelo desenvolvimento da matemática, lógica e outros
sistemas neutros de pensamento; e o terceiro estado é o positivo, em que a
ciência, ou a observação cuidadosa dos fatos empíricos, e o teste sistemático de
teorias tornam-se modos dominantes para se acumular conhecimento. E com o
estado positivo o conhecimento pode Ter utilidade prática a fim de melhora as
vidas das pessoas.

A sociedade como um todo, bem como o pensamento sobre cada domínio do


universo, evolui através desses três estágios, mas em velocidades diferentes: a
astronomia e a física, primeiro, depois a química e a biologia, e finalmente a
sociologia surge como o último modo de pensar para entrar no estado positivo. Na
visão de Comte, a análise da sociedade estava pronta para ser reconhecida como
ciência - uma reivindicação que era desafiada na época de Comte, assim como
ainda hoje. E como as leis da organização humana eram desenvolvidas, Comte
(1851-1854) acreditava que elas poderiam ser usadas para melhorar a condição
humana - novamente, um tema tão controverso hoje quanto na época de Comte.

Uma segunda tática legítima empregada por Comte foi postular a hierarquia
das ciências, na qual todas as ciências eram ordenadas de acordo com sua
complexidade e seu desenvolvimento no estado positivo. Na parte inferior da
hierarquia estava a matemática, a língua de todas as ciências mais altas na
hierarquia, e no topo, surgindo da biologia, estava a sociologia, que num momento
de êxtase Comte definiu como “ciência da humanidade”, coroamento de toda a
formação científica. Pois, se a sociologia foi a última ciência a surgir, era também a
mais avançada em relação a seu assunto, como um modo legítimo de
questionamento.

1.2.2 - HERBERT SPENCER: O Primeiro Sociólogo Inglês: (1820-1903)

Como Comte, Spencer acreditava que os agrupamentos humanos podiam ser


estudados cientificamente, e em seu notável trabalho “Os Princípios da
Sociologia” (1874-1896), ele desenvolveu uma teoria de organização social do
homem, apresentando uma vasta série de dados históricos e etnográficos para
fundamentá-la. Para Spencer, todos os domínios do universo – físico, biológico,

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social - desenvolvem-se segundo princípios semelhantes. E a tarefa da sociologia
é aplicar esses princípios ao que ele denominou de campo superorgânico, ou o
estudo dos padrões de relações dentre os organismos.

Spencer retorna a questão de Comte: o que mantém unida a sociedade quando


esta se torna maior, mais heterogênea, mais complexa e mais diferenciada? A
resposta de Spencer em termos gerais foi muito simples: sociedades grandes,
complexas desenvolvem: 1) interdependências dentre seus componentes
especializados; e 2) concentrações de poder para controlar e coordenar atividades
dentre unidades interdependentes. Para Spencer a evolução da sociedade
engloba o crescimento e a complexidade que é gerenciada pela interdependência e
pelo poder. Se os padrões da interdependência e concentrações de poder falham
ao surgir na sociedade, ou são inadequados à tarefa, ocorre a dissolução, e a
sociedade se desmorona.

Ao desenvolver resposta à questão básica de Comte, Spencer fez uma analogia


aos corpos orgânicos, argumentando que as sociedades, como organismos
biológicos, devem desempenhar certas funções-chave se elas quiserem
sobreviver. As sociedades devem reproduzir-se; devem produzir bens e produtos
para sustentar os membros; devem prover a distribuição desses produtos aos
membros da sociedade; e elas devem coordenar e regular as atividades dos
membros. Quando as sociedades crescem e se tornam mais complexas, revelando
muitas divisões e padrões de especialização, estas funções-chave tornam-se
distintas ao longo de três linhas: 1) a operacional (reprodução e produção), 2) a
distribuidora (o fluxo de materiais e informação), 3) a reguladora ( a concentração
de poder para controlar e coordenar).

Spencer é mais bem lembrado por instituir uma teoria na sociologia conhecida
como funcionalismo. Essa teoria expressa a idéia de que tudo o que existe em
uma sociedade contribui para seu funcionamento equilibrado; de que tudo o
que nela existe tem um sentido, um significado. A sociologia funcionalista
dessa maneira faz uma pergunta básica e interessante: o que um fenômeno
cultural ou social faz para a manutenção e integração da sociedade?

1.2.3 - ÉMILE DURKHEIM : A Tradição Francesa: (1858-1917)

O que marca a contribuição de Durkheim à sociologia é o reconhecimento de


que os sistemas de símbolos culturais - ou seja, valores, crenças, dogmas
religiosos, ideologias etc.- são uma base importante para a integração da
sociedade ( J. Turner, 1981). À medida que as sociedades se tornam complexas e
heterogêneas, a natureza de símbolos culturais, ou o que Durkheim (1893)
denominou de consciência coletiva, muda. Em sociedades simples, todos os
indivíduos têm uma consciência coletiva comum que regula seus pensamentos e
ações, ao passo que em sociedades mais complexas a consciência coletiva deve
também mudar se a sociedade deve manter-se integrada. Deve tornar-se mais
“generalizada” e “abstrata” a fim de fornecer alguns símbolos comuns dentre as
pessoas em atividades especializadas e separadas, ao passo que em outro nível

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se torna também mais concreta para assegurar que as relações entre, e
interiormente, as posições especializadas e organizações nas sociedades
complexas sejam reguladas e coordenadas. A condição social, entretanto, é
possível em sociedades grandes, complexas quando há alguns símbolos comuns
que todos os indivíduos partilham, juntamente com grupos específicos de símbolos
que guiam as pessoas em suas relações concretas com os outros (J. Turner,
1990). Se esse equilíbrio observado entre os aspectos abstrato e específico ou os
gerais e concretos da consciência coletiva não é observado, então várias
patologias se tornam evidentes (Durkheim, 1893,1897).

Durkheim (1912) estudou posteriormente a sociedade num nível mais


interpessoal, procurando entender a formação da consciência coletiva. Em seu
estudo sobre a religião dos aborígines australianos, Durkheim estava menos
interessado na religião do que nos processos interpessoais que produzem a
consciência coletiva. O que ele descobriu foi o significado da interação entre as
pessoas, como isso produzia o sentimento de que há uma “força” sobrenatural
acima e além delas. Ao compreender o poder dessa força que nascia da animação
e energia das interações, os aborígines construíram totens e se engajaram em
rituais para honrar as forças sobrenaturais, agora simbolizadas pelos totens. Dessa
observação, Durkheim concluiu que a adoração aos deuses e ao sobrenatural é, na
realidade, a adoração da própria sociedade e dos vínculos gerados pela interação
entre as pessoas. Assim, a “cola” que mantém unida a sociedade é sustentada
pelas interações concretas entre os indivíduos.

1.2.4 - KARL MARX (1818-1883)

Marx sentiu que cada época histórica era construída em torno de um tipo
específico de produção econômica, organização de trabalho e controle de
propriedade, revelando, assim, sua própria dinâmica. Para Marx, a organização de
uma sociedade num momento histórico específico é determinada pelas relações
de produção, ou a natureza da produção e a organização do trabalho. Assim, a
organização da economia é o material-base, ou, em seus termos, a infra-estrutura,
que descreve e dirige a superestrutura, que consiste de cultura, política e outros
aspectos da sociedade. O funcionamento da sociedade humana deve ser
entendido por sua base econômica (Marx e Engels, 1846).

Para Marx (1867), há sempre o que ele denominou de “contradições” próprias


na estrutura da base econômica. Por exemplo, no capitalismo ele viu que a
organização da produção ( em fábrica) se encontrava em contradição quanto à
propriedade privada de bens e à obtenção de lucro por poucos a partir do trabalho
cooperativo de muitos. Quais sejam os méritos desse argumento, Marx tem como
base da contradição nas sociedades humanas as relações entre aqueles que
controlam os meios de produção e aqueles que não. Argumentando dessa forma,
Marx tornou-se a inspiração para a linha de estudo da sociologia conhecida como a
“teoria do conflito” ou a “sociologia do conflito”. Desse ponto de vista, todas
as estruturas da organização social revelam desigualdades que levam ao
conflito, em que aqueles que detêm ou controlam os meios de produção

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podem consolidar o poder e desenvolver ideologias para manter seus
privilégios, enquanto aqueles sem os meios de produção eventualmente
entram em conflito com os mais privilegiados (Marx e Engels, 1848). No
mínimo, há sempre uma contradição ardente entre as relações de produção nos
sistemas sociais, e essa “luta de classes”, ou seja, conforme a percepção de
Marx quanto a essa questão, periodicamente explode esse conflito aberto e uma
mudança social.

A análise sociológica deve, portanto, concentrar-se nas estruturas de


desigualdade e nas combinações entre aqueles com poder, privilégio e bem-
estar material, por um lado, e os menos poderosos, privilegiados e
materialmente abastados, por outro. Para Marx e as gerações subseqüentes de
estudiosos do conflito, “a ação está” dentro da organização social humana.

Há ainda outra importante faceta do trabalho de Marx: a função militante do


sociólogo. O objetivo da análise é expor a desigualdade e a exploração em
situações sociais e, assim fazendo, desempenhar papel militante para superar
essas condições. Os sociólogos não devem apenas ficar na platéia; eles devem
trabalhar para mudar o mundo social de modo a reduzir as desigualdades e a
dominação de um segmento da sociedade pelo outro. Marx propõe a superação do
modo de produção capitalista e a uma nova forma de produção com base no
coletivismo. Esse programa permanece ainda como fonte de inspiração para
muitos sociólogos que participam como militantes no mundo social.

1.2.5 - MAX WEBER (1864-1920)

Weber enfatizava que a desigualdade é multidimensional e não


exclusivamente baseada na economia, que o conflito é contingente em
condições históricas e não é o resultado inevitável e inexorável da desigualdade,
e que a mudança poderia ser causada pelas “idéias” assim como a base material e
econômica de uma sociedade. Ele também realçou que a sociologia deve olhar
tanto para a estrutura da sociedade como um todo para os significados que os
indivíduos conferem para essas estruturas. Como Marx, ele duvidava de que
houvesse leis gerais da organização humana, mas, ao contrário de Marx, ele sentia
que é necessário que sejam isentas de juízos de valor, ou objetivas, na descrição e
análise dos fenômenos sociais.

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2 - A SOCIOLOGIA HOJE

A sociologia é agora uma área ampla e diversa que analisa todas as facetas da
cultura, da estrutura social, do comportamento e interação e da mudança social.

2.1 - AS PRINCIPAIS CORRENTES TEÓRICAS E AS POSSIBILIDADES DE


ANÁLISE CIENTÍFICA DOS PROBLEMAS SOCIAIS.

2.1.1 - TEORIZAÇÃO FUNCIONAL

• Vê o universo social como um sistema de partes interligadas (Turner e


Maryanski, 1979)
• As partes são analisadas em termos de suas conseqüências, ou funções
para o sistema maior;
• Uma parte é examinada com respeito a como se preenche uma necessidade
ou requisito do todo
• As teorias funcionalistas nos levam a ver o universo social, ou qualquer
parte dele, como um todo sistêmico cujos elementos constitutivos funcionam
em conjunto; ou seja, o funcionamento de cada elemento tem
conseqüências sobre o funcionamento do todo.

Problema: as teorias funcionalistas freqüentemente vêem as sociedades como


demasiadamente bem integradas e organizadas.

2.1.2 - TEORIAS DO CONFLITO

Expoentes: Karl Marx e Max Weber

• Vêem o mundo social segundo suas contradições


• Vêem os fatos sociais cheios de tensão e contradições (Collins , 1975)
• A desigualdade é a força que move o conflito
• O conflito é a dinâmica central das relações humanas
• As contradições se manifestam em formas distintas de conflito
• O conflito é uma contingência básica da vida social

2.1.3 - TEORIAS INTERACIONISTAS

• Os homens interagem emitindo símbolos – palavras, expressões faciais,


corporais ou qualquer sinal que “signifique” algo para os outros e para si
mesmos (Goffman)

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• Através de gestos simbólicos demonstramos nosso estado de espírito,
intenções e sentido de ação; e contrariamente, pela leitura dos gestos dos
outros, obtemos um sentido do que eles pensam e como eles de
comportarão.
• a vida social está mediada por símbolos e gestos ;
• Usamos esses gestos para nos entendermos uns com os outros, para
criarmos imagens de nós mesmos e das situações e construirmos uma idéia
de situações futuras ou desejadas.
• Para os interacionistas, a explicação da realidade social deve emanar da
investigação meticulosa do micro mundo dos indivíduos que mutuamente
interpretam os gestos, que constroem as imagens de si próprios e definem a
situações segundo certos princípios.
• As macros ou grandes estruturas da sociedade – o Estado, a economia, a
estratificação e similares – são construídos e sustentados por micro
interações.
• Para os interacionistas seria impossível entender o mundo social sem
investigar esses encontros no micro nível.

2.1.4 - TEORIAS UTILITARISTAS

• Vêem os homens como racionais até o ponto em que eles têm objetivos e
finalidades;
• Calculam os custos das várias alternativas para atingir esses objetivos e
escolher a alternativa que maximize seus benefícios (ou o que os
economistas chamam de utilidade e minimizar seus custos).
• Para os teóricos utilitaristas, todas as relações sociais são, em última
análise, trocas entre atores que incluem custos a fim de obter benefícios
uns dos outros, ou seja, que calculam a relação custo – benefício.
• A interação, a sociedade e a cultura são criadas e sustentadas porque elas
oferecem bons resultados para indivíduos racionais.

Esses resultados raramente são monetários; em geral, eles são “posses”


menos tangíveis – sentimentos pessoais, afeição orgulho, estima, poder, controle e
outras moedas “suaves” que estruturam a sociedade.
II. RELAÇÃO HOMEM/NATUREZA: A QUESTÃO DO
TRABALHO NA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA E
SOCIOLÓGICA

1 - A RELAÇÃO ENTRE O HOMEM E A NATUREZA NAS VÁRIAS


SOCIEDADES DA PERSPECTIVA DO TRABALHO E DA CULTURA.

• A questão do trabalho e as diversas sociedades.


• As várias formas de trabalho: escravo, servil e assalariada.
• As transformações recentes no mundo do trabalho.

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1.1 - A QUESTÃO DO TRABALHO E AS DIVERSAS SOCIEDADES.

A palavra trabalho vem do latim tripalium:

Tripalium era um instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes ainda
munidos de pontas de ferro, no qual os agricultores bateriam o trigo, as espigas
de milho, para rasgá-los, esfiapá-los. A maioria dos dicionários, contudo, registra
tripalium apenas como instrumento de tortura, o que teria sido originalmente, ou
se tornado depois. A tripalium se liga o verbo do latim vulgar tripaliare, que
significa justamente “torturar”.

Essa uma faceta da realidade evocada no termo trabalho, aquela que revela
à dureza, a fadiga, a dificuldade, irreversivelmente constitutiva da vida humana.
Talvez por isso não seja incomum encontrar no repertório simbólico de diversas
culturas tal percepção do trabalho como pena.

O único ser vivo capaz de agir além daquilo que seu equipamento biológico
permite de imediato é o homem. Ele não é provido de asas e de estrutura
óssea favorável ao vôo, mas voa inventando um avião. Ele não está equipado
para retirar oxigênio diretamente da água, mas isso não o impede de descer
ao fundo dos mares, seja em submarinos, seja por intermédio de
equipamentos apropriados como tanques de oxigênio, escafandros, máscaras,
etc. Tudo isso indica que o homem é um animal ímpar. Embora permanecendo
animal, livra-se dos laços que o prendem à natureza.

O trabalho é um fazer exclusivo do ser humano. Determinado materialmente


como corpo, como organismo, ele é dotado de vida. E a vida humana suplanta a
sua dimensão biológica, corpórea, orgânica e deixa de ser somente fato para ser
também um valor.

Os gregos dados às minúcias da intuição e aos refinamentos da razão,


deixaram reflexões argutas sobre a questão do trabalho e parecem menos
ingênuos do que os contemporâneos. É freqüente encontrarmos, nos textos da
Grécia clássica, formulações em que aparece o desprezo pelo trabalho e o culto da
única atividade digna do homem livre: o ócio dos filósofos. Embora tais idéias
expressem verdades, vale a pena tomar conhecimento das reflexões de uma
categorizada autora contemporânea, Hannah Arendt (1897:94-5), historiadora
norte-americana de origem alemã:

Ao contrário do que ocorreu nos tempos modernos, a instituição da


escravidão na Antigüidade não foi uma forma de obter mão-de-obra
barata nem instrumento de exploração para fins de lucro, mas sim a
tentativa de excluir o labor das condições da vida humana. Tudo o
que os homens tinham em comum com as outras formas de vida animal
era considerado inumano. (Essa era também, por sinal, a razão da teoria
grega, tão mal-interpretada, da natureza inumana do escravo. Aristóteles,
que sustentou tão explicitamente a sua teoria para depois, no leito de
morte, alforriar seus escravos, talvez não fosse tão incoerente como
tendem a pensar os modernos. Não negava que os escravos pudessem
ser humanos; negava somente o emprego da palavra homem para
designar membros da espécie humana totalmente sujeitos à

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necessidade.) E a verdade é que o emprego da palavra animal no
conceito de animal laborans, ao contrário do outro uso, muito discutível,
da mesma palavra na expressão animal rationale, é inteiramente
justificado. O animal laborans é, realmente, apenas uma das espécies
animais que vivem na Terra - na melhor das hipóteses a mais
desenvolvida.

Percebe-se que, para os antigos gregos, não estava presente a adesão


irrefletida à escravidão e uma rejeição do trabalho como algo indigno em si
mesmo. A se crer nas advertências de Hannah Arendt, eles produziram tal
interpretação da realidade humana do trabalho que o problema da tensão
entre liberdade da razão e a necessidade do labor se exprimia na
contradição entre o animal laborans e o animal rationale.

1.1.1 - AS VÁRIAS FORMAS DE TRABALHO: ESCRAVO, SERVIL E


ASSALARIADA.

A justificativa da escravidão , feita por Aristóteles em sua Política,


mais que exprimir a apologia da ascendência de uma homem sobre outro,
de um homem que se apropria de outro para explorá-lo, para auferir lucro,
aponta a percepção de uma contradição que perpassa todas as dimensões
da vida humana e que, no caso do trabalho, apresenta-se sempre como um
desafio entre liberdade e necessidade.

Os historiadores modernos, assumindo muitas vezes acriticamente os


reparos e as acusações que os renascentistas faziam à Idade Média,
generalizaram a concepção de que foi um período de trevas. Com tal
afirmação queriam indicar que, entre os séculos V e XV, o pensamento na
Europa ficou enclausurado pela necessidade que a Igreja tinha de submeter
o conhecimento à fé, de modo que o uso do argumento de autoridade
generalizou-se, impedindo que se pensasse em direção não-autorizada por
essa mesma fé.

O trabalho, que durante a Antigüidade grega se realizava sob forma geral


da escravidão, assume, na Idade Média, a forma geral da servidão. A queda
do Império Romano provocou mudanças na vida das cidades, com o conseqüente
enfeudamento. Por toda a Europa desenvolveu-se uma sociedade onde
contingentes populacionais punham-se sob a proteção de senhores da terra
prestando-lhes homenagem (promessa de fidelidade do vassalo ao senhor feudal).
As condições gerais dos exercícios da atividade produtiva eram, portanto,
análogas, isto é, sob certos aspectos, semelhantes às da Antigüidade grega.

Do ponto de vista intelectual, o panorama medieval foi dominado pelas duas


sínteses filosóficas das verdades cristãs elaboradas por Santo Agostinho, no
século V, e por Santo Tomás de Aquino, no século XIII. Essas sínteses
traduziam o credo cristão utilizando as referências filosóficas dos gregos,
respectivamente Platão e Aristóteles. Elas influenciaram as reflexões sobre o
homem, incluindo aquelas sobre o fazer humano, sobre o trabalho.

Durante a Antigüidade grega a preocupação em reafirmar a liberdade do

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homem no âmbito da necessidade levou a uma visão do trabalho que o
considerava indigno e servil, à medida que atava o homem ao reino da
necessidade.

Na Idade Média permanece a influência teórica de Platão e Aristóteles e, por


isso o problema é pensado mais ou menos nos mesmos termos, mas já com uma
diferença marcante.

Santo Tomás de Aquino considera o trabalho um bem. Um bem árduo,


mas um bem. Tanto que o papa João Paulo II utilizou o texto do teólogo medieval
como fonte de inspiração para fazer uma veemente e explícita afirmação da
intrínseca dignidade do trabalho humano.

Com o fim da Idade Média, irrompeu o Renascimento. Esse complexo


movimento de natureza filosófica, científica e artístico-cultural, ocorrido nos
séculos XV e XVI, revolucionou a Europa medieval e lançou as bases de uma
nova concepção do trabalho. Inaugurou uma era de inversão das concepções
sobre o trabalho humano que chegou ao auge nas proposições de
glorificação do trabalho próprias da modernidade.

Tal trajetória teve muitas fases diferenciadas, muitos meandros, muitos


desdobramentos, e se manifestou em diversos âmbitos da vida humana. Isso
desde o filosófico-cultural até o político-econômico e religioso, formando um
mosaico rico, variado e complexo e deixando suas marcas também na dimensão
técnico-científica. Isso se explica pelo fato de que a partir da revolução científica do
Renascimento e com uma retomada de ímpeto na Revolução Industrial, as
transformações sociais e econômicas foram cada vez mais céleres e amplas,
espalhando-se por todo o mundo e atingindo direta ou indiretamente um
contingente populacional maior.

Essas transformações encontram uma expressão vigorosa e diversificada no


plano religiosos a partir do desenvolvimento de uma ética religiosa do trabalho
na Reforma Protestante. Sua expressão mais forte está no calvinismo que
entende o sucesso no trabalho e nos negócios como provável índice da
predestinação para a salvação e, portanto, como sinal da benção divina. Para
João Calvino (1509-1564), o homem se salva independentemente de suas obras, e
deve viver o cristianismo no mundo através de uma moral rígida da simplicidade
do trabalho e da honestidade.

No que diz respeito ao campo econômico, o momento marcante dessa


inversão, cuja trajetória analisa-se agora, encontra-se nos séculos XVII e XVIII
com o desenvolvimento da economia política.

Os fisiocratas deslocaram o eixo da investigação econômica, pondo em


evidência a produção dos bens, e atribuíram, a criação de novos valores à
agricultura [François Quesnay ( 1694 – 1774) e Anne Robert Jacques Turgot
( 1727-1781)].

Os principais representantes da escola clássica sedimentaram uma


visão da economia segundo a qual o valor se identificava unicamente no
trabalho em geral, fosse agrícola ou industrial [ William Petti ( 1623-1697),

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Adam Smith (1723-1790) e Davi Ricardo (1772-1823)]. Posteriormente, Karl
Marx (1818-1830 foi além dos economistas clássicos quando elaborou a
teoria da mais-valia e identificou no trabalho não só a fonte de todo
valor, mas principalmente o seu caráter social através de uma minuciosa
rede de conceitos e distinções.

No terreno filosófico, a mais alta contribuição para a reviravolta na


concepção acerca do trabalho se exprimiu na filosofia de Georg W. Friedrich
Hegel ( 1770-1831). Ele dá ao trabalho uma importância capital no
processo pelo qual o homem toma consciência de si mesmo, pois essa
consciência apenas se desenvolve quando o homem se encontra com os
demais no processo de criação do próprio mundo. O trabalho aparece,
então, como lugar da conquista da subjetividade, da consciência em si.

Porém, antes que o homem chegasse ao mundo contemporâneo


ostentando uma nova concepção do trabalho, orgulhoso de sua obra de
domínio das forças naturais, embevecido com as maravilhas que ele vinha
alcançando e com o futuro de progresso e conforto que se avizinhava,
soaram alguns alarmes.

Exploração ou libertação

O ruído mais forte foi produzido por Karl Marx, que, ao analisar o modo de
produção capitalista, encontra um de seus fundamentos na alienação do
trabalho umbilicalmente ligada à existência da propriedade privada. Ele
denuncia o fetichismo da mercadoria, o alheamento do homem diante do que
produz, o fato de que as relações entre os homens se dão como relações
materiais entre coisas, enquanto as relações entre coisas se dão como
relações sociais entre pessoas.

Mas, desde o século XV e até o século XIX, século em que Marx viveu e
escreveu, várias obras e reflexões, tanto quanto tentativas de ação,
problematizaram a questão do trabalho e da vida humana, de modo a
revelarem as contradições que dilaceravam os homens, enquanto estes
produziam suas próprias condições de vida na sociedade que se
modernizava.

Tommaso Campanella (1568-1639), Thomas Morus (1478-1535), os


socialistas utópicos, François Marie Charles Fourier (1772-1837), Pierre Joseph
Proudhon ( 1809-1865), Claude Henry de Rouvroy Saint-Simon ( 1760-1825),
Robert Owen (1771-1859), o igualitarista François Noel Babeuf ( 1760-1797) foram
homens cujas ações e escritos agitaram o tempo em que viveram, tratando da
questão do trabalho, do poder, da vida social e econômica. Suas atividades
intelectuais e ações tragicamente críticas exprimiram a crença no trabalho
como “lugar” de libertação e não de alienação e exploração.

Como se vê, a concepção de trabalho desde os gregos até a Idade Moderna


é bastante diversificada. Aqui aparecem apenas algumas breves indicações
dessa trajetória.

A partir da modernidade, passando também pela valorização das artes

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mecânicas consagradas pelos enciclopedistas, pela crença na razão como
instrumento de domínio da natureza e como construtora da liberdade, do
progresso e da felicidade, chega-se ao mundo contemporâneo.

Mas, nem bem o homem havia vislumbrado um futuro promissor durante o


final do século XIX, pois tinha, então, diante de si, o horizonte do progresso e
do conforto que o trabalho criara, o início do século XX encarregou-se de dar-
lhe um grande susto. A ciência, cuja aplicação prometia um mundo em que o
homem caminharia a passos firmes para reduzir o âmbito da necessidade e
aumentar o espaço de liberdade , transformou-se em arma mortal. Veio a
Primeira Guerra Mundial, a crise de 1929, outra guerra mundial e, refeita do
susto, mas ainda temerosa, a humanidade no pós-guerra recuperou a
esperança de viver num mundo de estabilidade e progresso.

1.1.2 - AS TRANSFORMAÇÕES RECENTES NO MUNDO DO TRABALHO.

Hoje, (...), a humanidade encontra-se no meio de outra grande crise.


Um se seus aspectos mais preocupantes é a ameaça de “desemprego
estrutural”. Enquanto o homem avança para uma situação sempre tão
almejada, de Ter à disposição meios de reduzir a fadiga e esforço no
trabalho, vive a contradição de reduzir postos de trabalho numa velocidade
maior do que talvez as sociedades possam suportar sem criar sérios
desequilíbrios. Assim, a questão de se saber que direção dar a esse processo
e de encontrar uma adequada forma de ordenamento da vida , do trabalho e
da apropriação de seus frutos, obriga o homem a pensar na problemática das
relações humanas, que se tornam cada vez mais conflituosas.

À medida que se relaciona com os outros homens e com a natureza, o


homem constrói o seu mundo histórico e produz a sua existência. É neste aspecto
que ele se diferencia dos outros animais, ao adaptar a natureza às suas
necessidades, ou seja, diferencia-se pelo trabalho. Portanto, para o homem
continuar existindo, ele precisa produzir continuamente através do trabalho; assim,
a sua vida passa a ser dominada pelo modo como produz sua existência.

Com a consolidação do capitalismo no século XVIII, mais uma vez


tornou-se necessário dominar a natureza a favor do homem. E é na indústria que
deverá ser investido. Será preciso então incorporar a ciência no processo
produtivo.

Ainda durante o século XVIII, o movimento histórico impôs um


rompimento com a organização da sociedade baseada nos privilégios de
nascimento, em que a nobreza e o clero viviam, à custa de cargos do
aparelho do Estado. Para estas classes, especialmente para a nobreza, o trabalho
era indigno. O envolvimento em atividades mercantis e industriais significaria a
perda dos seus privilégios.
Neste sentido, à medida que a sociedade capitalista se desenvolve, rompe-se

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com a estratificação social e com a idéia de servidão, até então dominante. O
homem passa a ser livre para dispor , como quiser, da sua propriedade, que
significava, segundo o liberalismo nascente, a sua vida, a sua liberdade e os
seus bens. Assim, o trabalhador do campo, ainda preso à terra, pode considerar-
se proprietário da sua força de trabalho e vendê-la aos donos dos meios de
produção (proprietários); pois a sociedade que estava se consolidando era uma
sociedade de proprietários livres.

A sociedade se organizava a partir da indústria e incorporava a ciência


ao processo produtivo. A burguesia, então, procurava constituir-se como classe
hegemônica. Defendia uma sociedade igualitária, com escolarização obrigatória,
gratuita e universal, uma vez que a escola correspondia às necessidades do
progresso e à formação do cidadão. Até então, a educação era privilégio de
poucos.

Alguns teóricos perceberam o avanço para a modernidade. Adam Smith


(1723-1790), economista que viveu no século XVIII, foi um deles. Ele procurou
romper com o mercantilismo ( política econômica que norteava o comércio),
ainda predominante nesse século. Mostrou que a riqueza não se originava do
comércio , mas do trabalho. Contrariou desta forma, os privilégios do clero e
da nobreza, que desprezavam o trabalho. Afirmou também que, para o
trabalhador possuir um pensamento mais ágil e dar conta do processo
produtivo que a modernidade exigia, era necessária a educação básica para
todos, “instrução para os trabalhadores, porém, em doses homeopáticas”. Ou
seja, 0trabalhador precisava somente de um mínimo de instrução para que
pudesse produzir de forma eficiente, mas sem ultrapassar este mínimo.

Como estabelecer o limite deste mínimo que o trabalhador deve


dominar? Frederick Winslow Taylor (1856 – 1915) vai se ocupar desta
questão. Sua preocupação centrou-se em detectar um método científico para
aumentar a produtividade do trabalho, evitando a perda de tempo da produção.
Nas suas investigações, Taylor percebeu que, na fábrica, mesmo havendo a
separação entre o saber e o fazer, o trabalho era ensinado oralmente, pelos
próprios operários. Considerou, então, fundamental tornar científica esta prática.
Acreditava que cada movimento do operário possuía uma ciência que deveria
ser estudada por cientistas do trabalho, separando as fases de planejamento
e de direção da produção da execução. Ou seja, o saber do trabalhador deveria
ser apropriado pelo capital, garantindo a eficiência no processo de produção e
impondo ao operário o tempo e o ritmo do seu trabalho.

Taylor propôs que se tornassem científicos os movimentos do trabalhador,


controlados pela gerência. Henry Ford (1886-1947) avança as inovações
tayloristas, introduzindo as linhas de montagem nas quais a esteira e os
sistemas automáticos impõem o ritmo da produção.

O trabalhador não precisava se locomover, pois as peças iam até ele. O


operário se confundia com a própria máquina. Esse método exigia apenas uma
atividade motora e dispensava qualquer iniciativa própria.

O homem foi reduzido a gestos mecânicos. Charles Chaplin faz, no seu filme
Tempos Modernos , uma crítica aos métodos pensados por Taylor e Ford.

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1.1.3 - O TRABALHO NA ÉPOCA CONTEMPORÂNEA

Hoje, com a construção de um mundo sem fronteiras e com a globalização


da economia, impõe-se, revolucionariamente, a microeletrônica e a robótica
trazendo inovações a uma velocidade meteórica. Porém, ainda vivemos uma
transitoriedade para as novas tecnologias, pois o mundo da produção ainda
convive com os paradigmas tradicionais do taylorismo /fordismo. Por outro
lado, vivencia também a automação, a flexibilização e a integração.

De qualquer maneira, o que se verifica é que dos anos 70 ( séc. XX) em


diante, uma inovação tecnológica possuía uma duração de dois anos, hoje,
não dura seis meses e, dependendo da área do saber, dura alguns dias, ou,
às vezes, horas.

A ciência, que era dissociada do trabalho, torna-se força produtiva com as


novas tecnologias. Várias empresas, nos dias atuais, exigem que seus
funcionários leiam os jornais diariamente, justificando que quem não se
informa não consegue acompanhar ou resolver os problemas colocados pelo
cotidiano.

A bagagem de conhecimento que um profissional recém –formado adquiriu


na universidade estará defasada se ele não estudar constantemente. Em
outras palavras, o mundo do trabalho só absorverá quem for capaz de aprender
constantemente.

Perfil exigido do profissional hoje:


• Saber trabalhar em equipe;
• Ser estudioso;
• Ter uma visão global das coisas;
• Saber liderar mudanças;
• Ser flexível;
• Busca aprendizado contínuo
De uma época em que se cultuou o trabalho como meio pelo qual o
homem afirmava sua soberania perante a natureza, dominando-a e
construindo um novo mundo – a época moderna -, chegou-se a um tempo em
que o culto não é mais o do trabalho, mas o do lazer, do tempo livre – a época
contemporânea.

Tudo agora é interpretado em termos de eficiência, de eficácia, de


produtividade. O ideal de qualidade total, que se tornou uma das divisas da
contemporaneidade, significa exatamente isto: nenhuma atitude, nenhuma ação,
nenhum gesto que possa ser substituído por um outro em que a relação entre
esforço despendido versus resultado alcançado é mais favorável, deve
permanecer.

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Doravante todas as escolhas, seja a de uma opção de investimento, seja a


da escola de um filho, seja a de um médico, seja a de uma namorada, ou de
uma religião, ou mesmo de um representante no Congresso Nacional, devem
seguir o mesmo critério que orienta a escolha de um detergente ou sabão
em pó nas gôndolas de um supermercado, isto é, a relação custo/benefício.

Isso aconteceu e acontece, entre outros motivos, pelo transbordamento da


racionalidade técnica do mundo da industrialização para todas as outras
instâncias da vida. No mundo moderno, o homem potencializou o rendimento do
trabalho pelo aprendizado, pelo conhecimento das forças naturais e pela
multiplicação da capacidade de uso dos recursos que a natureza lhe oferece.
Mas os problemas daí advindos são as campainhas de um alarme que não
cessa de soar, indicando que o sucesso obtido pela humanidade no plano de
sua ação material de transformação da natureza não pode se dissociar da
reflexão sobre o homem e sobre as circunstâncias e a finalidade de sua
ação.

A experiência tem chamado a atenção para o fato de que , talvez, tentar


alcançar o objetivo da maximização do rendimento do trabalho em detrimento
da reflexão sobre o conteúdo humano desse processo pode levar a
humanidade a um malogro que, contraditoriamente, efetuar-se-ia exatamente
no momento em que ela chegasse ao ponto mais alto de domínio da natureza
vivenciado em sua história.

2- EVOLUÇÃO DO TRABALHO

Texto para Refletir

ALENCASTRO

A origem da palavra trabalho deriva do latim vulgar tripalium, que era o


nome de um instrumento formado por três paus aguçados, com o qual os
agricultores batiam o trigo, as espigas de milho, o linho, para rasgá-los, esfiapá-los.
A maioria dos dicionários, contudo, registra tripalium como um instrumento de
tortura, o que teria sido no início ou se tornado depois. O fato é que este termo
está ligado à idéia de tortura e sofrimento, sentido esse que se perpetua até hoje,
principalmente nos povos de língua latina.
De uma forma muito simplificada, podemos entender o trabalho como sendo
a aplicação da energia humana (física e mental) em uma atividade determinada e
útil. Pelo trabalho, como já dissemos, o homem se torna capaz de modificar a
própria natureza, colocando-a a seu serviço.

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O trabalho exercido de forma qualificada, mediante um preparo técnico-
científico, específico para determinada atividade é comumente chamado de
profissão. A profissão supõe continuidade e não uma atividade ocasional e também
status social. A atividade de um engenheiro, por exemplo, é uma profissão, pois
exigiu a capacitação de alguém para exercê-la.
Na linguagem bíblica, a idéia de trabalho também está ligada a do
sofrimento e de punição: "Ganharás o seu pão com o suor de seu rosto" (livro do
Gênese). Assim, é por um esforço doloroso que o homem sobrevive na natureza.
Os gregos consideravam o trabalho como a expressão da miséria do homem, os
latinos opunham o otium (lazer, atividade intelectual) ao vil negotium (trabalho,
negócio). Mas será que sempre foi assim?
Podemos dizer que, considerado o "potencial de mão-de-obra" de uma sociedade,
ou seja, suas forças produtivas, o trabalho usa para o desempenho de seu papel
elementos materiais como a terra, animais, metais, ferramentas, energia, máquinas
e outros insumos, também conhecidos como meios de produção. De acordo com a
estruturação da propriedade e da manipulação desses meios de produção na
sociedade em cada etapa histórica, configura-se o seu modo de produção, que, em
outras palavras, se funda no tipo de relacionamento ou relações de produção
existentes entre o trabalho e os detentores dos meios de produção.
Já nas sociedades primitivas o homem sentiu necessidade de lançar mão do
trabalho que, em sua função mais primordial, era a defesa da unidade do clã, numa
luta constante contra os perigos oferecidos pela natureza, seu clima hostil e os
animais selvagens.
Foi pelo trabalho, ainda na era Neolítica, que o homem descobriu que agia
melhor em comunidade do que sozinho ou em seu pequeno grupo familiar.
Constatou que era um ser social, e adotou um estilo de vida comunitário, com
fortes reflexos sobre a vida moral da época.
Há milênios, desde o surgimento da propriedade privada dos meios de
produção, a prática dominante nas relações de trabalho ocidentais foi o
escravismo, ou seja, o emprego do trabalho escravo na agropecuária, extração
mineral e comércio.
Os gregos antigos, desprezavam o trabalho, deixando-o para os escravos,
valorizando a única atividade considerada digna de um homem livre, que era o ócio
dos filósofos. Buscavam inclusive inúmeras justificativas éticas para a escravidão.
Para Aristóteles a diferença entre os homens era natural, não havendo
qualquer contradição na divisão existente, entre o trabalho manual e as atividades
intelectuais e políticas. Segundo o filósofo a superioridade dos cidadãos explicava-
se pelo fato de que eles definiam o sentido das coisas, fossem elas econômicas,
sociais ou políticas. O cidadão grego não exercia o trabalho braçal pois tinha de ter
tempo livre para se dedicar à filosofia e ao exercício da cidadania. Para que isso
fosse possível os escravos executavam todas as atividades inferiores
determinadas pela vontade das classes superiores.
Durante cerca de mil anos, período que foi da desagregação do Império
Romano à Idade Média, as relações de produção na Europa Ocidental evoluíram
do escravismo puro ao servilismo, ou seja abrandava-se a sujeição homem-
homem, passando-se a outra menos direta, transformadora do homem em "servo
de gleba", virtual prisioneiro da terra em que vivia, consumindo quase tudo que
produzia, e produzindo por suas próprias mãos quase tudo de que necessitava. A
Igreja Católica, pregando a adoração a Deus defendia o desapego às riquezas
terrenas. Preocupada em organizar e manter seu poder temporal, ela condenava o
trabalho como forma de enriquecimento. O trabalho era visto apenas como meio de

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subsistência, de disciplina do corpo e purificação da mente. Assim servia como
instrumento de dominação social e de condenação a qualquer rebeldia contra a
ordem estabelecida.
A ociosidade entre as classes senhoriais, assim como ocorrera na Grécia
antiga, não era sinônimo de preguiça, mas de abstenção às atividades manuais
para se dedicarem a funções mais nobres como a política, a guerra, a caça, o
sacerdócio e o exercício do poder.
A partir do século XI a sociedade medieval européia sofreu profundas
transformações. O renascimento do comércio e das cidades afetou e foi afetado
pelas transformações do trabalho e das relações de produção. Daí até os séculos
XVI e XVII a economia ampliou-se sucessivamente do restrito âmbito local ao
regional, deste ao nacional (com a formação dos chamados estados nacionais
modernos) e ao internacional: do quase nenhum mercado e escassa circulação
monetária da Idade Média, chega-se a economia do dinheiro e dos múltiplos
mercados dos séculos XVII-XVIII, com base no crescimento agrícola, na
exploração colonial da América-África-Ásia e na diversificação do artesanato, cada
vez mais se diferenciando em indústria.
A crise da ordem feudal, fundada na subsistência e na servidão, e o
desenvolvimento do comércio e das atividades manufatureiras deu origem a uma
nova estrutura social: a sociedade capitalista.
O crescimento do mercado não só irá conviver por algum tempo com antigas
formas de servidão, como fará renascer a escravidão: o trabalho compulsório de
africanos nas colônias da América.
Mas, para as elites que comandavam a implantação desse sistema, o
trabalho livre era a forma ideal.
Essa é por excelência a concepção burguesa da liberdade individual do
homem: ele é livre para usar a força de seu corpo como uma máquina natural e
para escolher de forma soberana o que deseja para si mesmo. Se ao escravo na
América não era dada a oportunidade da escolha, ao trabalhador europeu era
concedido o direito soberano da liberdade.
Porém a busca da produção de excedentes para a troca no mercado
mediante a introdução de novas técnicas de produção e de organização do
trabalho fazia desaparecer a propalada livre escolha. Afinal, como seria possível o
trabalhador sobreviver numa economia de mercado, senão submetendo-se às
imposições de quem detinha os recursos que o sistema exigia? Aquele artesão,
que na manufatura medieval detinha as ferramentas e uma autonomia no uso de
seu tempo, desaparece, submetendo-se ao capital.
Ocorre, portanto, a separação entre o trabalhador e a propriedade dos meios
de produção (capital, ferramentas, máquinas, matérias-primas, terras). Desse
modo, podemos afirmar que a essência do sistema capitalista encontra-se na
separação entre o capital e o trabalho.
Essa separação criou dois tipos de homens livres: o trabalhador livre
assalariado, que vive exclusivamente de seu trabalho, ou seja, da venda de sua
força de trabalho, e o burguês, ou capitalista, proprietário dos meios de produção.
A novidade em relação aos modelos anteriores de sociedade é que, ao conceder a
liberdade para todos os indivíduos, a sociedade estabeleceu uma espécie de
contrato social, em que ficavam definidos os direitos e deveres de cada parte.

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2.1 - A ÉTICA CAPITALISTA DO TRABALHO

Se o trabalho como fator de enriquecimento pessoal era proibido na Idade


Média, legitima-se agora, na ética da sociedade capitalista, como tábua de
salvação divina. A riqueza não é mais vista como pecado, mas como estando de
acordo com a vontade de Deus. Trata-se de uma vontade que se confunde com os
interesses do mercado e do lucro, e que valoriza o trabalho enquanto força
passível de gerar riqueza. Ele deixa de existir apenas para atender às
necessidades humanas básicas. Sua finalidade principal é produzir riqueza
acumulada.
Max Weber, em sua "Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo" diz que
esta necessidade de acumulação de riquezas ultrapassou os limites do bom senso
comercial e passou a ser um fim em si mesmo, uma concepção de vida, um ethos.
Deixemos que ele fale:

De fato, o summum bonum desta "ética", a obtenção de mais e mais dinheiro,


combinado com o estrito afastamento de todo gozo espontâneo da vida é, acima de
tudo, completamente destituído de qualquer caráter eudemonista ou mesmo
hedonista, pois é pensado tão puramente como uma finalidade em si, que chega a
parecer algo de superior à "felicidade" ou "utilidade" do indivíduo, de qualquer forma
algo de totalmente transcendental e simplesmente irracional. O homem é dominado
pela produção do dinheiro, pela aquisição encarada como finalidade última de sua
vida. A aquisição econômica não mais está subordinada ao homem como meio de
satisfazer as suas necessidades materiais. Esta inversão do que poderíamos
chamar de relação natural, tão irracional de um ponto de vista ingênuo, é
evidentemente um princípio orientador do capitalismo, tão seguramente quanto ela é
estranha a todos os povos fora da influência capitalista. Mas, ao mesmo tempo, ela
expressa um tipo de sentimento que está inteiramente ligado a certas idéias
religiosas. Ante a pergunta: Por que se deveria "fazer dinheiro do ganho dos
homens?" o próprio Benjamim Franklin, embora fosse um deísta pouco entusiasta,
responderia em sua autobiografia com uma citação da Bíblia, com que seu pai,
intransigente calvinista, sempre o assediou em sua juventude: "Se vires um homem
diligente em seu trabalho, ele estará acima dos reis". (WEBER, 1974, p.187)

A ociosidade, mesmo entre as classes abastadas, passou a ser sinônimo de


negação de Deus. Só se mostrava a verdadeira fé pelo trabalho incessante e
produtivo. O trabalho era a oração moral burguesa e capitalista. Quem se
resignasse à pobreza não merecia a salvação divina.

Teóricos do novo sistema descobriram no trabalho a fonte de toda riqueza


individual e coletiva. Em 1776, Adam Smith (1723-1790), afirmava que a riqueza de
uma nação dependia essencialmente da produtividade baseada na divisão do
trabalho. Por essa divisão, as operações de produção de um bem, que antes eram
executadas por um único homem (artesão), são agora decompostas e executadas
por diversos trabalhadores, que se especializam em tarefas específicas e
complementares.

Com a produção mecanizada, o trabalho é glorificado como a essência da


sociedade do trabalho. Não se concebe mais a possibilidade de existir ordem social
fora da moral do trabalho produtivo.

Segundo Adam Smith, uma das características do ser humano, capaz de


diferenciá-lo dos outros animais é uma certa propensão para trocar coisas. Essa
propensão torna necessária a divisão do trabalho.

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Outra diferença apontada por Adam Smith é que o homem, contrariamente a


maioria dos animais, que ao se tornarem adultos ficam auto-suficientes, é muito
dependente de seus semelhantes.

Existindo a necessidade de cooperação, mas tendo de conviver com seus


impulsos egoístas, as sociedades elaboraram regras e leis morais para regular as
ações humanas. As bases para a construção dessas regras são criadas a partir de
uma espécie de "jogo de interesses". Ou seja, se necessitamos da ajuda das
grandes multidões para vivermos e é impossível fazer amizade com todos eles
para obter sua benevolência, podemos então mostrar ao outro que lhe é vantajoso
nos dar o que precisamos, num sistema de trocas.

A ética capitalista defende a idéia de que o bem estar da coletividade é


melhor obtido se apelarmos não ao altruísmo das pessoas, mas à defesa de seus
interesses em relações de mercado. Desta forma o egoísmo (defesa do interesse
próprio) é apresentado como a melhor forma de solucionar os problemas de um
grupo social.

A eficácia econômica do sistema de mercado passou a ser o critério


supremo para todos os juízos morais. A eficácia (critério técnico) passou a ser o
critério ético fundamental. A ética capitalista é uma "ética" reduzida a uma questão
puramente técnica.

Também fica claro, que a revolução tecnológica dos séculos XVIII e XIX, mais do
que um progresso, significou a generalização de um projeto de controle social. As
teses das classes dominantes revelam que o desejo de expansão de mercado e de
aumento de suas riquezas passava pela necessidade da universalização dessa
nova ordem social.

O que estava em jogo era o fim da autonomia do trabalho artesanal e a


reunião e domesticação dos trabalhadores na fábrica. A divisão do trabalho
defendida por Adam Smith teria a função de destruir o saber-fazer do artesão,
subordinando-o à nova tecnologia da maquinofatura.

Para que essa sociedade voltada para o trabalho se viabilizasse, houve


necessidade de construir um corpo disciplinar que envolvesse todos os indivíduos
dentro e fora da fábrica. A ordem burguesa da produtividade tornava-se a regra
que deveria gerir todas as instâncias do social. Para isso, instituiu-se um discurso
moralizante que visava cristalizar no conjunto da sociedade a ética do tempo útil.
O tempo útil do trabalho produtivo deveria funcionar como um "relógio moral"
que cada indivíduo levaria dentro de si.

O uso do tempo que não de forma útil e produtiva, conforme o ritmo imposto
pela fábrica, passou a ser sinônimo de preguiça e degeneração. Só o trabalho
produtivo, fundado na máxima utilização do tempo dignificava o homem.

A empresa dos dias atuais é um imenso cosmos, no qual o indivíduo


nasce, e que se apresenta a ele, pelo menos como indivíduo, como
uma ordem de coisas inalterável, na qual ele deve viver. Obriga o
indivíduo, na medida em que ele é envolvido no sistema de relações

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de mercado, a se conformar às regras de ação capitalistas. O
fabricante que permanentemente se opuser a estas normas será
economicamente eliminado, tão inevitavelmente quanto o trabalhador
que não puder ou não quiser adaptar-se a elas será lançado à rua
sem trabalho. (WEBER, 1974, p.188)

Para tornar vitoriosa a nova ordem, procurou-se eliminar qualquer forma de


resistência. Impôs-se um modelo de sociedade em que só o trabalho produtivo
fabril imperava. Quem se encontrasse fora desse modelo era expurgado da
sociedade. A grande massa de europeus que imigraram para América no século
XIX pode ser tomada como exemplo desse expurgo.
Fonte: ALENCASTRO, M.A Importância da Ética na Formação de Recursos Humanos . Fundação Biblioteca Nacional, 1997

III. INDIVÍDUO, IDENTIDADE E SOCIALIZAÇÃO.

1 - A QUESTAO DA IDENTIDADE: INDIVIDUALISMO E SOCIALIZAÇAO.

• A questão da identidade nas várias sociedades


• A emergência do indivíduo/individualidade e do individualismo
• A diversidade do processo de socialização
• A questão da família e da escola na formação do indivíduo

1.1 - A QUESTAO DA IDENTIDADE NAS VARIAS SOCIEDADES.

1.1.1 – O INDIVÍDUO

Indivíduo ou ser individual significa o portador ou


sujeito concreto de uma essência em sua
peculiaridade não – comunicável. De indivíduo deriva
individuação, termo que designa a determinabilidade
individual, ou seja, aquilo que faz com que este
indivíduo seja precisamente este e se distinga de todos
os outros, por exemplo, este determinado ser - Pedro.
“(BRUGGER,1977, p. 230)

Durkheim em termos de representações coletivas e instituições tratam de separar o social do


individual como duas esferas independentes da realidade humana. Para ele, “a sociedade não é mera
soma de indivíduos; ao contrário, o sistema formado por sua associação representa uma realidade
específica que tem suas próprias características“, e é “na natureza dessa individualidade (...) que se
deveriam buscar as causas imediatas e determinantes dos fatos que lá aparecem”. A referência aos
fenômenos de “síntese criadora “na natureza serve-lhe para comprova, por analogia, a separação entre os
dois níveis de realidade.

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1.1.2 - INDIVIDUALISMO

De acordo com BRUGGER, este termo designa:

1. A acentuação do valor da personalidade do homem, o cultivo e desdobramento da mesma, em


oposição ao gregarismo humano, à massificação”; e isto entendido em sentido lato, isto é, não só
da personalidade individual, mas também de famílias e de outros grupos valiosos, nos quais se
cultiva e frutifica a consciência da própria classe e do próprio valor;

2. A superacentuação do indivíduo ou de grupos particulares;

3. uma concepção de sociedade que realça o indivíduo a o ponto de reduzir a sociedade a uma soma
de entes individuais.

1.1.3 - IDENTIDADE

“A identidade passa a ser qualificada como identidade pessoal (atributos


específicos do indivíduo) e/ou identidade social (atributos que assinalam a
pertença a grupos ou categorias).” (Jacques,1998, p. 161).

Os termos identidade e social sugerem, respectivamente, um conceito que "explique, por


exemplo, o sentimento pessoal e a consciência da posse de um eu..." (Brandão, 1990
p.37) privilegiando, de um lado, o indivíduo, e de outro lado, a coletividade, resultando numa
configuração na qual se capta o homem inserido na sociedade, bem como à dinâmica das
relações sociais. A importância dessa relação pode ser mais bem compreendida nessa citação
de Marx (1978a, p.9) “A sociedade é, pois, a plena unidade essencial do homem com a
natureza, a verdadeira ressurreição da natureza, o naturalismo acabado do homem e
o humanismo acabado da natureza”.

Hamelink (1989) refere que a identidade diz respeito a uma cultura determinada e opõe este conceito
ao de identidade cultural. A identidade de uma cultura referir-se-á às características que se podem atribuir a
uma cultura determinada, enquanto a identidade cultural são as características que um indivíduo ou grupo
atribui pelo fato de sentir que pertence a uma cultura definida.

Ibáñez (1990) considera a identidade a nível individual. Assim a identidade pessoal é basicamente
produzida pela cultura ou sub-culturas que nos socializam enquanto a identidade cultural é estabelecida com
base no sentido de pertença à comunidade.

A investigação sobre a identidade revela uma forma de conhecimento de nós próprios que
repousa sobre a interpretação da imagem que os outros têm de nós e que serve para consolidar a que
nós fazemos de nós próprios

1.1.4 - SOCIALIZAÇÃO

A socialização é um tipo específico de interação - que molda a natureza da personalidade humana


e, por sua vez, o comportamento humano, a interação e a participação na sociedade. Sem socialização,
nem os homens sem a sociedade seriam possíveis.

São facilmente perceptíveis as diferenças de costumes que existem de uma


sociedade para outra. Os primeiros pensadores sociais apontaram, com certa
razão, que estes costumes são diferentes em parte por causa da própria diferença
entre os meios físicos em que se encontram as sociedades: em um ambiente de
clima frio, as pessoas usarão mais roupas e provavelmente ficarão menos tempo
fora de suas casas; em um local com alimentos abundantes elas poderão trabalhar
menos e não terão de competir por comida. Mas como explicar, através desta idéia
de determinismo físico, que em certos lugares a manipulação da comida seja feita
com dois pauzinhos, em outros com diversos talheres e ainda em outros com as

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25
próprias mãos? Estas diferenças são resultados não da adaptação da sociedade
ao meio, mas da adequação dos indivíduos à vida em sociedade. É a este
processo de integração de cada pessoa aos costumes preexistentes que damos o
nome da socialização.

De maneira mais completa, define-se socialização como a internalização de idéias e valores


estabelecidos coletivamente e a assimilação de papéis e de comportamentos socialmente desejáveis. Significa,
portanto, a incorporação de cada homem a uma identidade maior que a individual: no caso, a incorporação do
homem à sociedade. É importante associar de maneira correta a socialização à cultura: esta se encontra
profundamente ligada à estrutura social, enquanto que a socialização pode ser resumida à transmissão de
padrões culturais.

O processo de socialização por excelência é a educação. Mas não somente aquela que adquire na
escola, a denominada educação formal que consiste, entre outros conhecimentos, no aprendizado da língua e
da história do próprio povo. Há uma outra educação, que aprendemos apenas no próprio convívio com as
outras pessoas e que corresponde ao modo como devemos agir em momentos-chave da nossa vida. É a
socialização através da família, dos amigos e até mesmo de desconhecidos. As famílias ensinam, a título de
exemplo, quais das suas necessidades devem ser atendidas pelo pai e quais devem ser atendidas pela mãe.
Com os amigos aprendemos os princípios da solidariedade e a importância da prática de esportes. Com
desconhecidos podemos aprender a aguardar a nossa vez em fila, sem atropelos, e a não falar alto em locais
como o teatro ou a sala de aula. Outro exemplo claro é o caso de um homem que muda de país e que tem de
aprender o idioma e as normas da nova sociedade em que se encontra, isto é, os padrões segundo os quais
seus membros se relacionam (v. Relação Social).

Vista dessa maneira, a socialização pode ser interpretada como condicionadora das atitudes e,
portanto, como uma expressão da coerção social. Mas a socialização, justamente por se realizar de maneira
difusa e fragmentada por diferentes processos, deixa alguns espaços de ação livres para a iniciativa individual
espontânea, como a escolha dos amigos, do local onde se deseja morar ou da atividade que se quer exercer.

Se existem diferentes processos de socialização, tanto entre sociedades quanto dentro de uma mesma, é possível
atribuir a eles limites e graduações. A socialização na esfera econômica induz ao trabalho, mas não a que tipo de trabalho.
Aprende-se a respeitar os mais velhos, mas nada impede a repreensão de um setuagenário que soltem baforadas de
charuto em alguém. Há a possibilidade de identificarmos indivíduos mais ou menos socializados, isto é, mais ou menos
integrados aos padrões sociais. Uma pessoa pode ser um ótimo arquiteto, ao mesmo tempo em que é alcoólatra. Uma
pessoa pouco socializada não absorveu completamente os princípios que regem a sociedade, causando freqüentemente
transtornos aos que estão à sua volta.

Mudanças não ocorrem amanhã. Acontecem agora, no momento em que


nos damos conta de nossa capacidade. A cada momento você toma decisões que
vão mudar sua vida. São essas pequenas decisões que definem como ela será. R.
SHINYASHIKI

2 - ESTRUTURA E ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL/ AS DESIGUALDADES SOCIAIS

• A relação entre a estrutura social e a estratificação: as castas, os estamentos


e as classes.
• As várias formas de desigualdades sociais e a diversidade das explicações
teóricas.

2.1 - ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL E ESTRUTURA DE CLASSE

2.1.2 - ESTRATIFICAÇÃO

Processo em que os indivíduos e grupos sociais mais amplos são hierarquizados


numa escala do inferior ao superior.

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26

a) As estratificações são universais e representam a distribuição desigual de


direitos e obrigações na sociedade.
b) A principal necessidade funcional da estratificação é a exigência de situar e
motivar os indivíduos na estrutura social.
c) A desigualdade social não é um artifício desenvolvido inconscientemente. Sua
função é estimular as pessoas a exercerem os diversos papéis necessários à
sobrevivência da sociedade. (Ex: os requisitos para ser presidente são maiores
do que para ser carteiro, logo, a sociedade determina como justo o salário de
um ser maior que o do outro).

Fatores que determinam à estratificação.

a) Importância funcional diferencial: importância do cargo (médico, jurista)


b) Escassez diferencial de pessoal: treinamento e talento demandados pela
sociedade (empresários, cientistas)

2.1.3 - MOBILIDADE SOCIAL

É um movimento significativo na posição econômica, social e política de um indivíduo ou de um


estrato. Mas o que mais se estuda é a individual, já que a de estrato tem mais a ver com mobilidade social.
Com isto, o conceito de mobilidade tende a mostrar que na sociedade ocidental o conflito de classes foi
suprimido.

Perguntas para reflexão:

1- Essas hierarquias existem realmente ou são construções abstratas?


2- Quais os critérios utilizados para estabelecer a estratificação? Qual o peso de
cada critério? Quais estão relacionados com a estrutura da sociedade?
3- Qual a unidade de estratificação: o indivíduo ou o grupo?

Posição de conflito: a sociedade de classes

a) As classes sociais constituem categorias analíticas, e os estratos constituem


categorias derivativas e estáticas.
b) As classes sociais mudam no decorrer da história e surgem a partir de
determinadas condições estruturais.
c) Definem-se as classes sociais pela relação dos homens com os meios de
produção.
d) As classes não existem isoladas, mas como sistema de classes: as relações
entre as classes são relações de oposição.
e) Os conflitos são expressões das contradições de sistemas sócio-econômicos
determinados.

2.2 – AS DESIGUALDADES SOCIAIS

2.1.1 - DESIGUALDADES SOCIAIS

A desigualdade em uma sociedade gira em torno da distribuição diferenciada de recursos de

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27
valor às variadas categorias de indivíduos - sendo as de classe, étnica e gênero as três mais
importantes.

A estratificação de classe existe quando a renda, poder, prestígio e outros recursos de valor
são dados aos membros de uma sociedade desigualmente e quando, com base nessa desigualdade,
variados grupos tornam-se cultural, comportamental e organizacionalmente distintos.

O grau de estratificação está relacionado ao nível de desigualdade, à


distinção entre as classes em nível de mobilidade entre as classes e à
durabilidade das classes.

2.1.2 - DESIGUALDADES SOCIAIS: EXPLICAÇÕES TEÓRICAS

Existem várias propostas para o estudo da estratificação:

a. Proposta Marxista: enfatiza que a propriedade dos meios de produção é a causa da


estratificação de classe e mobilização para o conflito, com subseqüente mudança nos padrões de
estratificação;

b. Proposta Weberiana : enfatiza a natureza multidimensional da estratificação (que gira em torno


não apenas da classe, mas de partido e grupos de status também);

c. Proposta Funcionalista: argumenta que a desigualdade reflete o sistema de recompensa para


encorajar os indivíduos a ocupar posições funcionalmente importantes e difíceis de preencher;

d. Proposta Evolucionista: argumenta que, a longo prazo, partindo das sociedades de caça e coleta, as desigualdades
aumentaram, como refletem as sociedades modernas.

A estratificação nos Estados Unidos e no Brasil é marcada por altos níveis de desigualdade com respeito a bem-
estar material e prestígio. A desigualdade na distribuição de poder é mais ambígua. Fronteiras obscuras entre as classes
sociais próximas existem nos Estados Unidos. A mobilidade é freqüente, mas a maioria das pessoas não consegue grande
mobilidade durante sua vida.

Estratificação étnica

Etnia é a identificação de um grupo como distinto em termos da biologia superficial,


recursos, comportamento, cultura ou organização; e a estratificação étnica existe quando alguns
grupos étnicos conseguem mais recursos de valor em uma sociedade do que outros grupos
étnicos.

A estratificação étnica é criada e sustentada pela discriminação que é legitimada pelas crenças
preconceituosas. A discriminação e o preconceito são embasados pela ameaça ( econômica, política, social) apresentada
de forma real ou imaginária por um grupo étnico-alvo e são ainda sustentados pelos ciclos de reforço que giram em
torno da identificação étnica, ameaça, preconceito e discriminação.

Estratificação de gênero

O gênero é a diferenciação entre homens e mulheres em termos de características


culturalmente definidas e status na sociedade. A estratificação de gênero existe quando os homens
e as mulheres em uma sociedade recebem efetivamente parcelas desiguais de dinheiro, poder,
prestígio e outros recursos.
A estratificação de gênero é sustentada pelos ciclos de socialização, que se reforçam mutuamente pela identidade
de gênero e por crenças relacionadas ao gênero, que, por sua vez, se tornam a base para discriminação e
crenças preconceituosas, frutos da ameaça ressentida pelos homens.

As relações de gênero estão mudando nos Estados Unidos, visto que esses
ciclos estão sendo quebrados pela participação das mulheres no trabalho e
na política e pelos ataques às crenças que colocam as mulheres em
desvantagem. Nosso país também é marcado por uma grande desigualdade social:

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poucos têm muito, muitos têm pouco.

Uma sociedade visivelmente heterogênea, onde nos vidros de carros


importados, crianças passando fome se refletem. Os problemas são muitos, mas
as soluções são quase inexistentes.

O desemprego no Brasil, uma das grandes causas dessa desigualdade vem


aumentando. De acordo com o IBGE o índice que em dezembro de 99 era de 6,3%
começou o ano 2000 em 7,6% . Muitos dos que já se encontram no mercado de
trabalho se submetem a salários de verdadeira miséria. O salário mínimo que nesse
ano de 2000 completa 60 anos é um dos mais baixos do Mercosul, pois seus R$
136,00 só ficam a frente dos salários do Uruguai e Bolívia. Vinte por cento dos
trabalhadores e sessenta por cento dos aposentados recebem somente um salário
mínimo por mês. Enquanto o governo estuda um irrisório aumento para o mínimo, o
teto salarial dos funcionários públicos chega às alturas, aumentando as diferenças
sociais já existentes.

Somam-se a estes fatores o enorme descaso com as crianças que em


grande número trocam as salas de aula pelo subemprego, segundo o IBGE
92,18% destas crianças não recebem nenhum rendimento. Só em Santa Catarina
já são 99 mil menores entre 10 e 14 anos trabalhando na produção de calçados,
olarias e madeireiras. Sabendo que 2,9 milhões de crianças entre 9 e 14 em todo o
Brasil trabalham para ajudar a família o governo criou o PETI (Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil) onde cada família que retirar sua criança da
atividade e levar à escola recebe R$40,00. Felizmente vem ocorrendo uma queda
do anafalbetismo no país, mas no nordeste, onde as desigualdades são maiores,
40% dos adolescentes na faixa de 15 a 17 anos têm menos de 4 anos de estudo.

3 - TODOS OS HOMENS SÃO IGUAIS

Texto para reflexão:

Dimas Floriani

O grande debate que os padres dominicanos espanhóis travavam entre si,


durante o século XVI, era se os indígenas da América possuíam ou não alma.
Rei Bartolomeo de las Casas, apelidado de “defensor dos povos indígenas”,
apoiava fervorosamente o princípio de Direito Natural que afirmava “serem
todos os homens iguais perante Deus”. Ora, este princípio era uma
declaração de importância fundamental para proteger os indígenas da matança
indiscriminada praticada pelos espanhóis e portugueses; reconhecia, assim,
que os povos indígenas pertenciam à espécie humana e eram, portanto,
portadores de uma alma. Nesse sentido, poderiam ser catequizados em nome da
verdade divina e da fé cristã e eram reconhecidos como humanos,
contrariamente às teses de outros teólogos que não reconheciam neles uma
condição humana, não sendo pecado escravizá-los nem exterminá-los.

O princípio da igualdade dos seres humanos, perante Deus, foi um

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29
importante passo para que dois séculos após se declarasse como
inalienável, inegociável e fundamental o princípio da igualdade entre os
homens. As revoluções norte-americanas (1778) e francesa ( 1789) consagrariam
esse princípio nos termos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Apenas substituíram o argumento de fundo, que dava suporte e legitimidade ao
princípio , isto é, humanizando a referência da igualdade, não mais em nome
de Deus, mas em nome da Lei (“todos os homens são iguais perante a
lei”). E esta lei deveria ser garantida pelo Contrato Social que os homens
selariam entre si, em sociedade, abdicando parcialmente de sua liberdade, em
nome da proteção e da segurança das instituições públicas, ou seja, do Estado
de Direito.

Devemos distinguir, portanto, dois aspectos ligados à questão da igualdade:


o primeiro, de caráter político-filosófico; o segundo, de natureza socioeconômica.

Não se pode deixar de mencionar uma dimensão histórica, como pano de


fundo, em relação a princípio de igualdade. Não se deve esquecer de que a
emergência da sociedade industrial foi impulsionada pelo surgimento de uma nova
classe social, a burguesia, defensora de valores e princípios, tais como:

• A liberdade de pensamento, de credo e de filiação política (a filosofia iluminista


e o racionalismo eram os principais apoios);
• A liberdade de comercializar, de trabalhar, de vender e comprar a força de
trabalho no mercado;
• A liberdade de ir e vir;
• O direito à igualdade social, sem distinção de origem social, e à crítica ao
privilégio social que diferenciava os homens em função de pertencerem a
uma elite.

Do ponto de vista socioeconômico, porém a sociedade de classes dificulta,


concretamente, a realização da igualdade entre os indivíduos de uma mesma
sociedade que se rebelou, justamente, contra a desigualdade social? Porque, do
ponto de vista do acesso aos bens materiais, há uma série de facilidades para
alguns indivíduos ( dotados de capital, de poder e de títulos escolares) e de
dificuldades para outros alcançarem o topo do sistema ( uma vez que não
são detentores de capital, nem de poder e de títulos escolares).

A contradição entre a declaração teórica da desigualdade e as dificuldades


práticas, de realização para todos, está presente ainda nas atuais sociedades de
classe. A frase de George Orwell, em seu livro “A Revolução dos Bichos”, não é apenas
válida para as sociedades socialistas, mas igualmente para as capitalistas, a saber:
“Todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”.

(Dr Dimas Floriani é professor da UFPR)

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IV. MUDANÇA/TRANSFORMAÇÃO SOCIAL
MOVIMENTOS SOCIAIS/ DIREITOS/ CIDADANIA

1 – MUDANÇA SOCIAL E MOVIMENTOS SOCIAIS

1.1 – MUDANÇA SOCIAL E AS DIFERENTES ABORDAGENS TEORICAS

• Mudança social e revolução: diferentes abordagens teóricas.


• Mudança tecnológica e mudança social.
• Movimentos Sociais. Os direitos civis, políticos e sociais. Os direitos e a
Democracia.
• Os “novos” movimentos sociais contemporâneos.

1.1.1 - MUDANÇA SOCIAL

O ritmo da mudança social vem se acelerando dramaticamente no último


século. A mudança pode ser cumulativa, mas a história das sociedades
humanas revela repentinas inversões. Esse foi, particularmente, o caso na era
agrária.
A mudança pode se originar de causas culturais, particularmente de:

a. Inovações tecnológicas;
b. Novas crenças ou expectativas;
c. Difusão de sistemas de símbolos.

Tais mudanças culturais estão intimamente ligadas às mudanças nas


estruturas, servindo para iniciar as mudanças na estrutura ou, no mínimo,
acelerando as mudanças já iniciadas.

As estruturas sociais revelam diversas fontes importantes de mudança,


incluindo:

a. Desigualdade e o conflito sobre os recursos;


b. Subculturas que buscam superar desvantagens; e
c. Instituições que revelam processos que geram suas próprias
transformações.

Processos demográficos são também um impulso para a mudança,


especialmente transformações no tamanho de uma população, nos padrões de
movimento populacional e em sua estrutura etária.

O estudo da mudança está no centro da análise sociológica, desde o início da


disciplina até o presente. Teorias e análises foram propostas para explicar a
mudança, incluindo:

a. Teorias cíclicas que enfatizam o movimento de sociedades entre os pólos opostos;


b. Análise dialética, que demonstra a dinâmica das mudanças inerentes às

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desigualdades;
c. Análises funcionalistas, que enfatizam a evolução das formas societárias simples
para as mais complexas como um esforço correspondente para preencher
novas necessidades e requisitos;
d. Perspectiva evolucionista, para a qual a desigualdade é a força motriz da
evolução e mudança social; e
e. Críticas, quer “pós-industrial” quer “pós-moderna”, sobre as influências da
tecnologia e sistemas de informações de ponta, na transformação da sociedade.

1.1.2 - MOVIMENTOS SOCIAIS CONTEMPORÂNEOS


De acordo com Ilse Scherer-Warren em seu artigo “Associativismo civil e interculturalidade na sociedade global
“, na década de 1960 a 1980 uma série de novos movimentos sociais - de gênero, ecológicos, regionais, étnicos e outros -
organizaram-se a partir da afirmação de identidades coletivas auto-construídas e de projetos específicos de auto-defesa. Em
nome destas especificidades se exigia reconhecimento, respeito às diferenças culturais e defendiam-se novos direitos. Nos
campos da pesquisa e educacional, novas áreas de conhecimento desenvolveram-se: estudos de gênero, negros, étnicos,
ecológicos e similares.

A partir da segunda metade da década de 1980, e, sobretudo na década de 1990, há uma crescente interação destes
movimentos entre si, ou uma penetração de seus ideais em movimentos mais clássicos, como o sindical e o de moradores.
As chamadas lutas específicas, contra a discriminação de gênero, racial, cultural, contra a degradação ambiental, a
exclusão social, econômica e política, como, por exemplo, as campanhas contra a pobreza ou pela qualidade de vida,
passam a ser consideradas relevantes no interior dos mais diversos movimentos sociais e organizações da sociedade civil.
Portanto, as lutas identitárias e pela autonomia cedem lugar aos movimentos sociais solidarísticos, onde a cooperação e
a complementaridade passam a ser palavras de ordem. Estes princípios remetem também para o ideário de construção de
uma esfera pública democrática, ampla, conectando iniciativas locais com outras mais globais. É neste contexto que a idéia
de parcerias se legitima.

• No plano político, as ONGs passam a lutar por um lugar de participação na


gestão da coisa pública. Surge nos cenários locais, estaduais, nacionais e
internacionais um grande número de parcerias entre organizações da
sociedade civil e organismos governamentais, como nos Conselhos
setoriais, Fóruns especializados, Agendas 21, etc.
• No plano da cultura, para além da defesa das identidades, passa-se a
valorizar a abertura à alteridade e à reciprocidade nas trocas. Duas
possibilidades se colocam neste processo interativo: a da hibridação cultural,
através de sincretismos, ecumenismos, etc.; a de formação de um movimento
cidadão sob a forma de redes e parcerias, onde a complementaridade se
constrói a partir do respeito às diferenças, não se impondo uma uniformização
no trabalho cooperativo.

Monoculturalismo: tem uma visão essencialista acerca da identidade dos


sujeitos coletivos. Os negros, índios e demais minorias têm suas identidades
determinadas objetivamente numa realidade específica.

Multiculturalismo: as identidades são construídas historicamente. Ex.: Muito


mais do que se nascer mulher ou com cor negra, torna-se mulher ou negra.

O que se denomina "construção da cidadania", é um valor cultural da


modernidade, que tem uma dimensão ética e política.

Na dimensão ética encontram-se os princípios da responsabilidade e da


solidariedade. Ainda que as desigualdades e as injustiças sejam legados históricos,
sua reprodução no presente pode ser assumida como uma responsabilidade da

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humanidade.

As injustiças do passado chegam até nós na forma de herança [...]


não herdamos a culpa de quem originou a injustiça, porém sim a
responsabilidade de fazer frente à injustiça passada [...]Nossa
responsabilidade não se circunscreve às desigualdades de nosso
Estado, mas as da humanidade". (Reys Mate, 1997, p.170).
O corolário da responsabilidade é a solidariedade. É através dela que se efetiva a responsabilidade pelo outro, em uma
comunidade local ou global. Nos movimentos sociais, a solidariedade tem sido utilizada amplamente como uma interpelação
aos indivíduos ou grupos para a ação comunitária ou de responsabilidade cidadã. Estes princípios éticos operam para a
construção de uma cidadania plena quando se associam a um conjunto de princípios de ordem política, a serem
incorporados nas práticas associativistas.

Na dimensão política merecem ser resgatadas as noções de reconhecimento, integração, participação e a conseqüente
idéia de constituição de uma esfera pública.

A negação mais absoluta destes princípios é a "exclusão" (social, cultural ou política). Muitos indivíduos ou grupos vivem
numa situação de apartheid sem o reconhecimento público de si ou do grupo como parte integrante da comunidade.

A construção da cidadania, somente poderá ser concretizada na medida


em que se associarem os princípios de responsabilidade e de solidariedade
com os princípios de integração social de todos os tipos de minorias, de
reconhecimento público das diversidades culturais e de legítima e igualitária
possibilidade de participação de todos nas esferas públicas referentes que
lhes dizem respeito.

2 – A QUESTAO DA POLITICA/ESTADO E A RELAÇAO COM O PODER

2.1 - POLÍTICA E PODER

O campo da política se configura na exist6encia do conflito entre a


dimensão privada e a pública, na medida em que o homem é um ser
social. Essa configuração inclui a realidade da intersubjetividade, posto que a
sociablidade não apaga a subjetividade , o caráter individual das
singularidades.

A ação desse homem, a um só tempo pública e privada, social e individual,


particular e comum, se exerce por meio de condutas não-naturais. Ao contrário,
regular a ação humana é obra do homem racional , consciente e livre.

2.1.1 - A QUESTÃO DO PODER

Em seu significado mais geral, a palavra poder designa a capacidade ou a


possibilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto pode ser referida a
indivíduos e a grupos humanos como a objetos ou a fenômenos naturais (
como nas expressões “poder calorífico” , “poder de absorção”)

Se o entendemos em sentido especificamente social, ou seja, na sua relação


com a vida do homem em sociedade, o poder torna-se mais preciso, e seu
espaço conceitual pode ir desde a capacidade geral de agir, até à
capacidade do homem em determinar o comportamento do homem: poder

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33
do homem sobre o homem. O homem é não só o sujeito, mas também o
objeto do poder social. É poder social a capacidade que um pai tem para dar
ordens a seus filhos ou a capacidade de um Governo de dar ordens aos
cidadãos. Por outro lado, não é poder social a capacidade de controle
que o homem tem sobre a natureza nem a utilização que faz dos
recursos naturais. (...)

O poder social não é uma coisa ou a sua posse : é uma relação entre
pessoas ( Stoppino, 1986: 933-4)

É impossível estudar uma sociedade sem fazer referência à política que a


organizou e a manteve. Da mesma forma, não existe a possibilidade de discorrer a
respeito da política sem esbarrar no conceito de poder.

Ter o poder é dispor de autoridade para governar. O poder supõe


consequentemente, a existência de dois elementos: de quem tem a autoridade
para exercer o poder e daquele sobre o qual se exerce o poder; do governante
e do governado; de quem manda e de quem é mandado; de quem dá as
ordens e de quem as cumpre. Assim, quem detém o poder político decide, em
última instância, a vida da coletividade, a nossa vida, a sua vida.

Segundo Georg W. F. Hegel (1770 – 1831) , o que leva o ser humano a desejar
o poder não é apenas a vontade de dominar os outros homens , mas
também a vontade de ser amado e reconhecido. Hegel, em seu livro
Fenomenologia do Espírito, nos ensina que o homem só se torna realmente humano
quando, além de satisfazer os desejos puramente animalescos - como
comer e beber - , lança-se à luta pela conquista do poder. O animal tem
por preocupação máxima a sobrevivência biológica; o homem, para conquistar a
liberdade (para não viver escravizado) luta pelo poder e coloca a sua vida
biológica em risco. A condição humana pressupõe dominar e ser reconhecido
como dominador.

A luta pelo poder tem sido, de uma forma ou de outra, a mola propulsora da
história das civilizações. A história dos povos é determinada pelos grupos, pelas
classes, pelos partidos, pelas personalidades que exerceram o poder.

Importante dizer aqui que o poder não nos é dado gratuitamente: ele tem de ser
conquistado. E após a sua conquista, a luta continua para que ele seja mantido.
Toda sociedade abriga interesses diversos e nela há governantes ( que
jamais renunciam ao poder espontaneamente) e governados ( entre eles,
muitos lutam para assumir o poder). Por decorrência, a luta pelo poder sempre
existirá.

A luta pela conquista do poder nos tem levado, ao longo da história, as duas
dimensões do ser humano: a animalidade (quando há violência) e a
racionalidade ( quando a conquista se dá por meios pacíficos).

Quando há violência na luta pelo poder, o homem se equipara aos animais que
se entredevoram para continuar sobrevivendo. Os assassinatos, as revoluções,

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os golpes de estado, as guerras (internas e externas) têm constantemente
manchado de sangue as páginas da história da humanidade.

John Fitzgerald Kennedy


Kennedy foi o primeiro presidente católico dos Estados Unidos da América.
Foiassassinado em Dallas, Texas, no dia 22 de novembro de 1963.

Martin Luther King


Luther King foi um dos principais dirigentes da campanha a favor do
reconhecimento dos legítimos direitos dos negros nos Estados Unidos.
Aconselhou a luta dentro da dignidade e da disciplina. Ganhou o Prêmio Nobel
da paz em 1964. Foi assassinado em 1968.

Mahatma Gandhi
Gandhi foi a alma do movimento da independência da Índia, pregando a ação
baseada no princípio da não – violência. Foi assassinado em 1948.

Júlio César
César, célebre general romano, foi um dos mais ilustres homens de guerra da
Antigüidade. Foi assassinado por seu filho Brutus nos idos de março de 44
a.C.

A dimensão racional do ser humano se coloca em evidência nos processos


pacíficos da luta pelo poder. Se até se pode justificar a necessidade de exercer a
autoridade, colocando as tropas na rua para que se mantenha a ordem
social, não é essa a condição para que o poder seja duradouro. Muito mais
importante que a força física e violenta, para haver poder - poder legítimo – há
necessidade de consentimento.

A luta sem violência para conquista do poder ocorre nos regimes livres -
democráticos - , em que todos os homens, em princípio, são considerados
iguais e, portanto, todos têm condições de participar do exercício do poder.

Apesar das deficiências que possam apresentar, as eleições são o processo mais
racional de luta pacífica pela conquista do poder. Pressupondo a liberdade da
defesa de ideais, do debate , da crítica, da oposição ... as eleições excluem a
violência. Pela manifestação livre da vontade do povo, o voto assegura a
legitimidade do poder.

Pelas eleições, num regime democrático, o poder político:


- Não é usurpado, mas consentido;
- Não é herdado nem vitalício, pois é exercido por representantes da
maioria por um tempo determinado;
- Por emanar do povo em geral, não é privilégio de poucas pessoas (de
um grupo ou de uma classe), pois todos os setores da sociedade
têm o direito de candidatar-se a ele;
- É transparente, porque as informações sobre as decisões
governamentais devem circular livremente;
- É legítimo, pois existem leis que o asseguram.

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“Alguns princípios de legitimidade do poder”:


• Nos Estados Teocráticos: o poder considerado legítimo vem da vontade de Deus;
• Força da Tradição: quando o poder é transmitido de geração em geração, como nas
monarquias hereditárias;
• Nos Governos Aristocráticos: apenas os melhores podem Ter funções de mando; é bom
lembrar que os considerados “melhores” variam conforme o tipo de aristocracia: os mais
ricos, ou os mais fortes, ou os de linhagem nobre, ou, até, a elite do saber;
• Na Democracia: vem do consenso, da vontade do povo.

A discussão a respeito da legitimidade do poder é importante na medida


em que está ligada à questão de que a obediência é devida apenas ao
comando do poder legítimo, segundo o qual a obediência é voluntária, e
portanto livre. Caso contrário, surge o direito à resist6encia, que leva à turbulência
social.” (ARANHA & MARTINS.1993: 180-1)

A antropologia evolucionista considera também que o Estado é uma simples


estrutura social total, resultante do crescente domínio do político sobre o
parentesco. Segundo as linhas estabelecidas por Edward Evans-Pritchard e Mayer
Fortes, temos que:

- Primeiro, detecta-se a existência de sociedades dominadas pelo parentesco, onde


a ausência do político, no entanto, não significaria a ausência de
distinção. Trata-se de sociedades muito pequenas onde a estrutura
política se confunde com a estrutura do parentesco.
- Surgem, em segundo lugar, sociedades onde o político domina o
parentesco, detectando-se a existência de grupos políticos, de
grupos que se definem pela base territorial. Contudo, nesta segunda
fase da evolução, se o político sobrepõe ao parentesco, estes laços
ainda são os dominantes. E isto porque faltam instituições
especializadas, com autoridade permanente, tendo como função a
manutenção da ordem social. Nestas formações sociais, ainda sem
hierarquia ou autoridade, o mecanismo de equilíbrio social surge de
uma liderança, ou leadership.
- Em terceiro lugar, dão-se o aparecimento de sociedades com uma
autoridade centralizada, um aparelho administrativo e instituições
judiciais, onde já é flagrante o domínio do político sobre o parentesco.
Agora, em lugar do equilíbrio, temos a hierarquia a marcar o novo
modelo organizacional. Surge também o sistema político que unifica no
mesmo nível de extensão territorial os antagonistas e realiza a
equivalência estrutural.

Para A. W. Southall há também um processo contínuo de complexificação


institucional desde as sociedades sem Estado até aos Estados unitários, através
do qual o poder se desloca para fora e acima da sociedade. Depois das
sociedades sem Estado, vêm as sociedades segmentares e, só a partir de então,
surgem os Estados segmentares. Dentro destes, haveria, aliás, que distinguir,
numa primeira fase, a chamada chefatura, onde o poder político ainda está no
seio da sociedade, para, numa segunda fase, surgir uma especialização do
poder e uma estruturação piramidal. Finalmente, surgiria o Estado unitário, onde
se dá a distribuição do poder através do centro, de forma hierárquica. Se

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Estado unitário é considerado como completamente desenvolvido, mas que
nunca se realizou, já no Estado segmentar, onde há uma estrutura
hierárquica de poder, notam-se as seguintes características fundamentais: —
a estrutura da soberania é limitada, esbatendo-se nas regiões afastadas do
centro; o governo central tem apenas um controlo relativo dos outros focos
do poder; há administrações especializadas tanto no poder do centro como
nos poderes das periferias; — o monopólio legítimo da força não é completo;
se as relações de poder se organizam de forma piramidal, há, porém,
diferentes níveis de subordinação; quanto mais periféricas são as
autoridades subordinadas, mais estas têm possibilidade de mudar de
obediência.

2.1.2 - ESTADO MODERNO: PODER E REPRESENTAÇÃO

Durante o Período Medieval, o interior do mundo feudal europeu era


politicamente fragmentado. Cada grande senhor feudal exercia em seus
domínios uma autoridade quase absoluta sobre pessoas e bens. Nesse
contexto, a Igreja Católica desempenhou o importante papel de órgão
conciliador das elites dominantes, procurando contornar os problemas da
fragmentação política e das rivalidades internas da nobreza feudal. Como
os nobres eram cristãos , a Igreja procurou desviar as tensões internas
do feudalismo, apontando como inimigos externos e comuns da
cristandade os árabes muçulmanos.

É preciso ressaltar que, além da autoridade religiosa, a Igreja também


conquistou poderes materiais para impor laços de união concreta entre
nobres de diversos países, na medida em que era proprietária de
aproximadamente um terço das terras cultiváveis. Assim, a Igreja estendia seu
manto de poder “universalista” sobre diferentes regiões européias.

No início dos tempos modernos, assistimos a uma série de grandes


transformações que atuaram na desestruturação do mundo feudal e,
também, se refletiram na diminuição do poder da Igreja: a expansão comercial
e marítima, o desenvolvimento da burguesia, o Renascimento e a Reforma
Religiosa. Entretanto, no plano propriamente político, o início dos tempos
modernos foi marcado pelo processo de fortalecimento das monarquias
nacionais. Aliado a importantes setores da burguesia e, mesmo, da nobreza,
os reis passaram a concentrar crescentes forças em suas mãos,
enfraquecendo os poderes locais da nobreza agrária e impondo-se
sobre os poderes universalistas da Igreja Católica.

No decorrer do processo de formação das monarquias nacionais, surgiu o


Estado Moderno, tendo as seguintes características gerias:

• Idioma comum: um dos elementos culturais que mais influenciou o sentimento nacionalista foi a
língua falada por um mesmo povo. Esse era um elemento que identificava origens, tradições e
costumes comuns;
• Território definido: eliminando-se, aos poucos, a fragmentação política do mundo feudal e o
predomínio das relações de vassalagem, cada Estado foi procurando definir suas fronteiras

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políticas, estabelecendo, enfim, o território comum da nação;
• Soberania: no mundo feudal, o poder estava baseado, em grande parte, na soberania. Aos poucos,
esse conceito foi cedendo lugar à noção de soberania, pela qual o governante tinha o direito de fazer
valer as decisões do Estado dentro do território nacional;
• Exército permanente: para garantir as decisões do governo soberano, era preciso a formação de
exércitos permanentes, controlados pelos reis. A sociedade estava dividida entre grupos rivais da
nobreza e da burguesia. O rei passou a alimentar essa divisão, enquanto foi concentrando uma grande
soma de poderes em suas mãos. Assim, os reis passaram a comandar exércitos, distribuir a justiça
entre os súditos, decretar leis e arrecadar tributos . Essa enorme concentração de poderes em torno
do rei caracterizou o absolutismo monárquico.

Vários pensadores formularam teses procurando dar fundamento teórico ao


absolutismo. Entre eles, destacam-se os seguintes:

• Nicolau Maquiavel (1469-1527): nascido em Florença, Maquiavel foi um ativo político e hábil
diplomata que defendeu a unidade italiana. É considerado um precursor da teoria política do
Estado Moderno, pois pregou a construção de um Estado forte, independente da Igreja e
dirigido de modo absoluto por um Príncipe dotado de inteligência e de inflexibilidade na
direção dos negócios públicos. Expondo com grande franqueza e objetividade suas idéias,
Maquiavel deu astutos conselhos aos governantes, rompendo com a religiosidade medieval e
separando a moral individual da moral pública. Em sua célebre obra O Príncipe, escreveu que “o
homem que queira em tudo agir como bom acabará arruinando-se em meio a tantos que não são
bons”. Daí porque “o Príncipe deve aprender a não ser bom e a usar ou não o aprendido, de acordo
com a necessidade”. O resultado das ações do Príncipe é o que conta, e não a maneira por ele
utilizada para conseguir os objetivos. Assim, para Maquiavel, os fins justificam os meios. Do nome
de Maquiavel surgiu o adjetivo maquiavélico, que tem o sentido figurado de pessoa astuta,
matreira e ardilosa;

• Jean Bodin (1530-1596): jurista e filósofo francês, defendeu, em sua obra A República, o conceito
do soberano perpétua e absoluto, cuja autoridade representava a vontade de Deus. Assim, todo
aquele que não se submetesse à autoridade do rei deveria ser considerado um inimigo da
ordem pública e do progresso social. Segundo Bodin, o rei deveria possuir um poder
supremo sobre o Estado, respeitando , apenas o direito de propriedade dos súditos;

• Thomas Hobbes (1588-1679): filósofo inglês, escreveu o livro Leviatã ( o título refere-se ao
monstro bíblico, citado no livro de Jó, que governava o caos primitivo), no qual compara o
Estado a um monstro todo-poderoso, especialmente criado para acabar com a anarquia da
sociedade primitiva. Segundo Hobbes, nas sociedades primitivas “o homem era o lobo do próprio
homem” , vivendo em constantes guerras e matanças, cada qual procurando garantir sua
própria sobrevivência. Só havia uma solução para dar fim à brutalidade: entregar o poder a um
só homem, que seria o rei, para que ele governasse todos os demais, eliminando a desordem
e dando segurança a todos.;

• Jacques Bossuet (1627-1704): bispo francês, reforçou a teoria da origem


divina do poder do rei. Segundo Bossuet, o rei era um homem predestinado
por Deus para assumir o trono e governar toda a sociedade. Por isso, não
tinha que dar justificativas a ninguém de suas atitudes; somente Deus
poderia julgá-las. Bossuet criou uma frase que se tornaria verdadeiro lema
do Estado absolutista: “ Um rei, uma fé, uma lei”.

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3 - ESTADO NACIONAL E MUNDO CONTEMPORÂNEO


A CRISE DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

Texto para reflexão


Osvaldo Luís Golfe

INTRODUÇAO
Quando falamos de neoliberalismo e globalização estamos falando de uma nova ordem mundial. Tal
ordem é capaz de tornar obsoleta a já existente: o Estado entra em crise, e é obrigado a redefinir o seu papel;
problemas sociais agravam-se cada vez mais e a desigualdade aumenta.

As conseqüências desta nova ordem mundial não demoram aparecer: "A renda dos brasileiros que
estão no topo da pirâmide social, os 10% mais ricos, é quase dez vezes maior que a soma dos rendimentos
dos brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza, cerca de 30% da população, na estimativa mais
otimista". Junto com o desemprego, esta é uma questão que deve ser o alvo principal de qualquer governo.

Não podemos negar que os planos de estabilização trouxeram uma relativa tranqüilidade, porém,
sucedido de recessão. Isto mostra que, em primeiro momento, tais planos não são duradouros. Quanto ao
futuro deles é bastante incerta qualquer previsão.

Sem dúvida, hoje, mais do que nunca estamos sujeitos às intempéries mundiais. A grande questão é:
"para quem deve o governo governar, para os mercados ou para a sociedade?" A resposta óbvia seria
governar para a sociedade, porém não é isto o que acontece. Os Estados nacionais muitas vezes não
conseguem governar para a sociedade porque grande parte do dinheiro é gasto com juros, etc.Com este
trabalho, embora não tenhamos ainda perspectivas claras sobre a "nova ordem mundial", queremos acenar
para esta crise que, sobretudo hoje, atinge o estado contemporâneo.

1.CRISE DO ESTADO CONTEMPRÂNEO

O marco inicial das sociedades contemporâneas é a Era das Revoluções Burguesas, que teve início
com a Revolução Inglesa na Século XVII, tendo como auge a Revolução Francesa em 1789. Para muitos
historiadores a Revolução Francesa faz parte de um movimento global que atingiu os EUA, Inglaterra, Irlanda,
Alemanha, Bélgica, Itália, etc., culminando com a Revolução Francesa em 1789. Esta é a revolução que marca
a passagem das instituições feudais do Antigo Regime para o capitalismo industrial. O que marca, basicamente
a passagem da Idade Moderna para a Contemporânea são as revoluções: Industrial, Americana e Francesa.

As conseqüências deste marco são irreversíveis para todo o mundo; as nações passaram a identificar o
poderio de um país com sue desenvolvimento industrial. Este processo difundiu-se pela Europa, Ásia e
América. Também os ideais da "Igualdade, Liberdade e Fraternidade" espalham-se por toda a parte, então, as
Revoluções Liberais, a independência das colônias...

A independência das colônias latino-americanas faz parte da crise do Antigo Regime e da crise do
sistema colonial que havia sofrido o primeiro abalo com a independência dos EUA em 1783. Os elementos
essenciais que desencadearam este processo são três: Revolução Industrial inglesa e a busca de mercados
consumidores, quebrando assim o monopólio (peça essencial do sistema colonial); desequilíbrio político
europeu resultante dos conflitos provocados pela Revolução Francesa e o Império Napoleônico;
desenvolvimento das colônias que entram em choque com a política mercantilista do sistema colonial.

No Brasil, o que pode ser considerado como fato decisivo no processo de independência é a liberdade
comercial que marca o fim do pacto colonial.

Desde a Revolução Industrial o capitalismo comercial estava sendo substituído pelo capitalismo
industrial. Para este o que interessa é o comércio livre, isto é, compra de matéria prima de quem quisesse e
venda de produtos onde lucrasse mais.
Não queremos nos aprofundar nesta questão, pois, não é nosso objetivo. Queremos apenas acenar para o
contexto da passagem da Idade Moderna para a Contemporânea e a nova ordem que este fato implantou.
Como nosso tema de estudo "A Crise do Estado Contemporâneo" é bastante amplo queremos nos deter,

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sobretudo, no projeto neoliberal, globalização e algumas conseqüências.

O projeto neoliberal

Dentre os projetos neoliberais, socialdemocrata e o democrático popular, o neoliberalismo está se tornando


ou já é um projeto hegemônico no Brasil e no mundo.

O liberalismo, em termos econômicos "prega" a não interferência do Estado na economia. Esta deve ter
como base o livre jogo das forças do mercado, por exemplo: os preços das mercadorias são definidos pela
concorrência entre os agentes econômicos e pela lei da oferta e da procura. Nesta perspectiva o esperado é
que o aumento da oferta seja causa da diminuição dos preços e vice-versa. Alguns pontos essenciais do
liberalismo são: a livre iniciativa de indivíduos e grupos; a livre concorrência entre eles e o livre acesso à
propriedade e ao lucro.

Depois de "um tempo em baixa", por causa do fortalecimento do Estado durante algum período do século
XX, nas últimas décadas, após o fim do socialismo no leste europeu, o liberalismo ressurge com novo vigor sob
o nome de neoliberalismo.

Os pontos básicos deste projeto neoliberal foram sistematizados no chamado "Consenso de Washington,
em 1989. Integrantes do Instituto de Economia Internacional e Washignton, do Banco Mundial, do Banco
Internacional de Desenvolvimento e do Fundo Monetário Internacional; também estavam presentes
representantes dos EUA, países da América Latina, Central e Caribe. Tal reunião teve como objetivo discutir a
economia do continente, que resultou em dez pontos: ajuste fiscal; redução do tamanho do Estado
(redefinição do seu papel; menor intervenção na economia); privatização; abertura comercial; fim das
restrições ao capital externo; abertura financeira; desregulamentação (redução das regras
governamentais para o funcionamento da economia); restruturação do sistema previdenciário;
investimentos em infra-estrutura básica; fiscalização dos gastos públicos e fim das obras faraônicas".

É evidente que esta reunião, da qual falamos, foi provocada por uma necessidade de discutir a economia de
uma forma global e porque os problemas são muitos e também globais. Estas medidas já estão sendo
implantadas também em alguns países latino-americanos, e, uma das críticas que já pode-se fazer é que tais
medidas não tem se preocupado, em primeiro lugar com os graves problemas sociais existentes.

Neoliberalismo e políticas públicas.

A tese central do liberalismo velho e novo continua sendo a mesma "o menos de Estado e de política
possível", isto é, o Estado deve intervir o mínimo possível na economia. Segue-se a isto os "dez pontos"
sistematizados pelo Consenso de Washington.

Um fator que impulsionou a expansão do neoliberalismo em todo o mundo foi a junção entre os ideais
neoliberais e o "movimento real do capitalismo na direção de um desregulamentação crescente e de
uma globalização econômica de natureza basicamente financeira". Este foi o mesmo caminho pelo qual o
neoliberalismo chegou ao Brasil e na maior parte da América Latina: um caminho econômico e o outro político.
Temos bem claro estes dois caminhos: primeiro, contexto de renegociação da dívida externa; segundo, faz
parte deste jogo a aceitação das condições e das políticas e reformas econômicas impostas pelo credor.

A razão, pela qual este projeto deve vigorar em todo o mundo é a de que uma economia nacional, no mundo
globalizado do ponto de vista financeiro, que não tenha moeda estável e um equilíbrio fiscal e não tenha
implementado o "tripé reformista", precisa de crédito junto aos "manda-chuvas" da economia mundial, isto é,
FMI, etc. (já citados acima). A não observação das regras pode resultar numa sanção por parte dos mercados
financeiros. Um ataque especulativo de tais mercados é capaz de destruir um governo e uma economia
nacional em poucas horas. Os mercados financeiros ditam as medidas que precisam ser adotadas pelos
governos. Assim, as políticas públicas nacionais estão "amarradas" a uma política internacional.

Quanto aos países que assumiram tardiamente este projeto, como o Brasil e muitos países latino-
americanos, que dizer a respeito do futuro das políticas públicas destes países?

Já falamos anteriormente que estes planos não têm resolvido os reais problemas sociais; os sucessos
iniciais dos planos de estabilização têm sido sucedidos pelo "aumento do desemprego, desaceleração
do crescimento e do aumento exponencial da dívida pública”.

Neste sentido, o que podemos esperar é um agravamento da crise provocada pela diminuição dos
recursos disponíveis para fazer políticas públicas de tipo social.

O novo papel do Estado frente à globalização

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Este subtítulo "O novo papel do Estado frente à globalização" induz a pensar que isto seja consenso
universal e que frente a ela o único papel a ser desempenhado pelo Estado é desenvolver uma política de
inserção no mundo globalizado, com eficiência.

A globalização está fundamentada, basicamente em três mitos: 1o.: "a globalização é uma resultante
exclusiva das forças de mercado". Se assim fosse, tratar-se-ia de uma nova ordem econômica e que
qualquer governo de bom senso deveria adotá-la. 2o.: "a globalização é um fenômeno universal, inclusivo e
homogeneizador". Neste sentido, globalização é uma nova ordem mundial, dinâmica, e, os países que não
aderirem a este projeto estão fadados a "nadar, nadar e morrer na praia". 3o.: "a globalização promove uma
redução pacífica e inevitável da soberania dos estados nacionais". Com isto muitos ideólogos mais
eufóricos prevêem a inutilidade do estado. Toda a raça humana estaria agregada às nações desenvolvidas.

Com relação a estes três mitos, percebemos que não só as forças de mercado, mas também determinações
políticas e ideológicas atuam ao lado da economia, abrindo assim as portas para um processo de globalização
restrito e excludente; um projeto que aumenta a polarização das riquezas entre os países e classes.

Enfim, na globalização também há contradições. O impacto produzido por ela é sentido diferentemente em
cada Estado Nacional e em cada classe social. O novo papel do Estado, das forças sociais e políticas internas
é adotar medidas para conter a crescente desigualdade social. Também cabe aos países "centrais", "pais do
neoliberalismo" preocupar-se em desenvolver programas que tenham por base a solidariedade para com os
países chamados "periféricos" que adotaram tardiamente o projeto neoliberal.

CONCLUSÃO

Quanto ao Estado assistimos a duas situações: 1o.: triunfo do Estado sobre os indivíduos (socialismo no
leste europeu); 2o.: é o triunfo de grupos econômicos sobre o resto do mundo. Com isto nem indivíduos e nem
nações tem seu direitos respeitados. Nações pobres são obrigadas à recessão, à não construção de escolas, à
baixos salários, à não cuidar da saúde pública, muitas pessoas são condenadas à morte por causa dos altos
juros pagos aos credores. Diante desta situação os governos perdem a autonomia, não conseguem realizar
uma política pública direcionada realmente ao bem comum de toda a nação.

A globalização é o triunfo de um grupo econômico sobre o mundo. Tal triunfo não se preocupa com os
problemas sociais que isto trás como conseqüência.

Este caminho, penso, é irreversível. O que precisamos é redimensinar a globalização: ao invés de ser
exploradora deveria ser uma globalização solidária.

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