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Regime de Informação - Construção de Um Conceito
Regime de Informação - Construção de Um Conceito
D
enunciados foram emitidos, mesmo com algumas
o ponto de vista histórico, uma das aparentes semelhanças, eles se inscrevem em
mais consistentes narrativas da política diferentes regimes de informação.
epistemológica ocidental, poderia ter Em trabalhos anteriores, temos considera-
como ponto de partida a projeção humanista de do que um regime de informação seria o modo in-
Paul Otlet e Henri La Fontaine, que idealizam formacional dominante em uma formação social,
uma rede universal dos conhecimentos, e hoje o qual define quem são os sujeitos, as organiza-
teria como expressão a eficiência enciclopédica ções, as regras e as autoridades informacionais
da máquina Google. A proposição dos pacifistas e quais os meios e os recursos preferenciais de
de Bruxelas, “Fazer do mundo inteiro uma única informação, os padrões de excelência e os mode-
cidade e de todos os povos uma única família” (citado los de sua organização, interação e distribuição,
por MATTELART, 2002, p.49), não deixa de enquanto vigentes em certo tempo, lugar e cir-
lembrar a expressão de Al Gore (1994), exaltando cunstância. Como um plexo de relações e agên-
as possibilidades de uma Global Information cias, um regime de informação está exposto a cer-
Infraestructure (GII), que permitiria “uma espécie tas possibilidades e condições culturais, políticas
de conversação global” de todas as mensagens, e econômicas, que nele se expressam e nele se
assim como “ligar todas as escolas, bibliotecas, constituem (ver GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2003,
hospitais, negócios e domicílios”.2 Longe de esquecer p. 3, entre outros). A partir dessas premissas, po-
demos afirmar que “cada nova configuração de um
regime de informação resulta de e condiciona diferen-
1 O trabalho é parte da pesquisa desenvolvida através dos projetos “Os
caminhos da Informação”, já concluído, e “Da validade da informação à tes modos de configuração de uma ordem sociocultural
validade dos conhecimentos. Inventariando recursos, normas e critérios”, em e política” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012, p. 31).
andamento, os dois desenvolvidos com apoio do CNPq.
2 Apresentação de Al Gore na reunião da International Telecommunication
O conceito de regime de informação pareceria
Union, ITU, em 1994, em Buenos Aires; texto citado por Gonzalez de ser uma ferramenta interessante para situar e anali-
Gómez, 1997.
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sar as relações de uma pluralidade de atores, práticas engagement (THEVENOT, 2001, 2007); regime
e recursos, à luz da transversalidade específica das of living (LAKOFF; COLLIER, 2004; COLLIER;
ações, meios e efeitos de informação; transversalidade LAKOFF, 2005), regime de temporalidade ou
que se estabelece na medida em que tais relações e regime de historicidade (HARTOG, 2006). Em
interações perpassam uma ou mais esferas da cul- nosso campo de pesquisa, encontramos modo de
tura, da economia, da educação, da comunicação, informação (POSTER, 1985) e regime de informação
da pesquisa científica e da vida cotidiana, e especifi- (FRHOMANN, 1995 et al). Caberia perguntar-nos
cidade que se constitui na medida em que o envio e como essas incidências de afinidades conceituais,
a direção dessa transversalidade pertencem as con- que acontecem entre diversos autores e
figurações contemporâneas da informação, e são re- abordagens, podem contribuir a esclarecer alguns
conhecidas como tais (e não como sendo da esfera da dos rumos atuais da pesquisa nas ciências sociais
saúde, do transporte ou da mídia). e especificamente, em Ciência da Informação.
Como uma de suas atribuições mais
frequentes, o regime de informação remete às 2 REGIME DE INFORMAÇÃO: a
relações informação-poder, relações que hoje
estariam alavancadas pela pressuposição de que
leitura transversal
a informação, como algo imerso nas tecnologias A primeira agregação de significados,
digitais e ubíquas, seria aquilo que nelas que permitiria reconstruir o domínio histórico e
circula e as dinamiza. É nessa abordagem que discursivo do conceito de regime de informação,
o entendimento do termo de “informação” vai poderia organizar-se e distribuir-se em torno
qualificar processos de transformação de longo de dois eixos principais: um, referente às
alcance, sendo incluído na composição de vários tecnologias de informação e comunicação; outro,
novos sintagmas, tal como economia da informação, referente ao estabelecimento, vigência e vigor de
modo de informação, infraestrutura de informação. determinados critérios de valor.
Nosso esforço de reconstrução do contexto Como operação de leitura de uma
histórico-discursivo do termo “regime de informa- transversalidade específica, em princípio, o
ção” seguirá dois caminhos. Num primeiro cami- regime de informação daria visibilidade à questão
nho, propomos situá-lo numa família de palavras dos critérios de valor associados à informação e
que, por suas vizinhanças semânticas e tempo- de modo geral, à dimensão simbólica da cultura.
rais, dariam visibilidade as redes conceituais Nessa direção, teríamos as abordagens que
que estimularam e deram ancoragem a sua for- associam a informação à estruturas semânticas,
mulação. Para reconstruir a família de palavras, à produção cultural de sentido e à comunicação
partimos dos conceitos de cadeia de produção científica, o que daria vigor as indagações acerca
de informação (information production chain), infra- da unicidade ou pluralidade dos critérios de
estruturas de informação, modos de informação, para verdade e credibilidade que pudessem aferir
chegar as construções do conceito de regime de a validade da informação. Do ponto de vista
informação, considerando em cada caso seus con- da especificidade dessa transversalidade, num
textos de uso e os principais domínios de referen- período que vai do século XX a este início do
cia, a saber, as esferas da política, da administra- século XXI, o regime de informação ficaria
ção e da economia, a partir da segunda década associado a uma ordem de acontecimentos que
do século XX (quadro 1). poderíamos caracterizar-se pelo fenômeno da
Um segundo caminho, que neste texto informacionalização (CARNEIRO LEÃO, 2003),
será brevemente apontado (e deixado em aberto que estaria ligado as lógicas produtivas de
para futuras análises), tem como foco o próprio tecnologias de informação, cujos efeitos de
conceito de “regime”, que junto ao de “modo”, transformação abrangem desde a produção do
compõem sintagmas nominais muito presentes conhecimento e da riqueza às manifestações
na literatura atual das ciências humanas e sociais: da vida e da palavra. Nesse sentido, ao mesmo
Latour, em seus últimos trabalhos, fala de regime tempo que aumentam as zonas de convergência,
de enunciação, apropriando-se logo do conceito de acreditamos que caberia diferenciar as leituras
modo de existência, com referências a Simondon dos regimes de informação de outras análises, que
e Sourieu (LATOUR, 2000, 2012); encontramos colocam maior ênfases em processos culturais
também as expressões regime of worth, regime of reprodutivos e de representação.
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Destruição
Acesso, busca e uso Recuperação Acesso à infraestrutura
Uso (exploitation by the user) Acesso Intelectual
Fonte: GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012.
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Desde a década de 1990 ao momento atual, exemplo, The Mos Beautiful Google Servers Center5
autores como Hanseth e Monteiro (1997, 2002), e o Google data center water treatment plant6).
Bowker (2000), Bowker (2006, et al), Hanseth e Qual é o melhor entendimento da questão?
Ciborra (2002), Lyytinen (2010), desenvolverão Será assim que a expansão ilimitada de associa-
numerosos estudos e pesquisas em torno dessas ções heterogêneas, que dariam lugar a dispositi-
infraestruturas que operam códigos e linguagens. vos como o Google, o Facebook ou mesmo a Web
Hanseth e Monteiro (2002) destacam 2.0, nos levam a construir “palavras-coletoras”
como traços das infraestruturas: a) perpassarem que operam como convenções, e remetem meta-
mais de uma comunidade de geração e uso; fóricamente a alguma medida de grandeza, sen-
b) envolverem componentes heterogêneos do esse o caso dos termos regime de informação ou
(sistemas, serviços, ferramentas, fluxos); infraestruturas de informação? Ou são os regimes
c) articularem-se por interfaces abertas ou de informação estabelecidos, num novo processo
padronizadas. de mundialização, os que provocam a mudança
Bowker et al. (2006) lembram os de escala, plurificam e encorpam os data centers,
diferentes tipos de infraestruturas: a) compostas lançam e controlam conectores e autorizam as me-
pela pluralidade de equipamentos coletivos trologias ?
necessários aos desenvolvimentos das atividades
humanas, incluídas as redes de transporte e
c) Modo de Informação
comunicação; b) configuradas por entidades
abstratas, como escolas, hospitais, corpos A diferença da base tecnológico-gerencial
de bombeiros, estruturas organizacionais e do conceito de infraestrutura, Poster desenvolve
institucionais; c) quando qualificadas pelo outro conceito, “modo de informação”, que ocu-
termo ‘informação’, são integradas por serviços paria o lugar discursivo prévio dos “modos de
computacionais, repositórios e dispositivos que produção”, para indicar as intrínsecas e inverti-
processam e transportam dados dentro e fora de das relações entre economia e cultura, à luz dos
fronteiras nacionais. avanços neocibernéticos. Para Poster, “modo de in-
Em sua definição atual, infraestrutura formação”, designava, “as novas experiências da lin-
seria uma categoria abrangente para referir-se à guagem do século XX, originadas em sua maior parte
dispositivos caracterizados por sua capilaridade pelos avanços na eletrônica e as tecnologias que lhe são
e penetração em diferentes ambientes e sistemas relacionadas” (POSTER, 1991, p.10).
(“pervasive enabling resources”), destacando O termo “modo de informação” é constru-
seu caráter relacional e sua capacidade de ído por analogia e à diferença do conceito mar-
reformular as infraestruturas epistêmicas prévias, xista de “modo de produção”. A principal ana-
especialmente em suas expressões modernas: “... logia estaria em que as duas abordagens visam
funding agencies, professional societies, libraries and analisar e dar visibilidade aos modos sociais de
databases, scientific publishing houses, review systems dominação. Seriam quatro as diferenças princi-
...” e as que caracterizariam a constituição de uma pais do “modo de informação”, em relação a te-
“big science”, “... orbiting telescopes, supercomputer oria marxista. A primeira, a perda da prioridade
centers, polar research stations, national laboratories, do trabalho como esfera principal da dominação,
and other research instruments of ‘big’ science” ... ainda que siga tendo um papel fundamental nas
(BOWKER et al., 2006, p.3-4). sociedades contemporâneas. A segunda, a elimi-
De fato, o conceito de infraestrutura nação de uma concepção teleológica da história
carrega certas ambiguedades: parece pesado ou de um “progressivismo”. A terceira diferença,
demais para as morfologias fluidas e mutantes diz respeito a substituição da centralidade dos
das redes digitais. Os “data center” das grandes sistemas de produção e de troca dos objetos que
empressas privadas do setor, como o Google ou satisfazem as necessidades humanas, pelo modo
o Facebook, porém, ocupam espaços territoriais como os signos são usados na produção e com-
bastante concretos, onde é possível ver como os
conectores abstratos ou semióticos se apoiam em
5 Youtube, <http://www.youtube.com/watch?v=L2et65sDny8&feature=relm
redes de tubos de aparencia muito consistente, e fu>. 10-10-2012.
os intercambios de energia requerem um alto e 6 Youtube, <http://www.youtube.com/watch?v=nPjZvFuUKN8&feature=
relmfu> e <http://www.google.com/corporate/green/datacenters/summit.
eficiente consumo de água (ver no Youtube, por html>).
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caráter contingencial do Estado na circulação das política em todas as atividades sociais, podendo
informações enquanto commodities, o que a seu melhor considerar-se como uma mudança de
ver converteria em ilusória a pretensão de uma figura da mesma relação.
disciplina acadêmica que tivera como assunto A dupla referência e acoplamento de uma
questões informacionais e políticas. De fato, se a das mais divulgadas teorias das mediações (a
política de informação era de preferência política teoria ator-rede), e uma concepção do poder sem
de Estado e de Governo, se o Estado deixa de ter mediações, de Foucault, requer certo esforço
um papel decisório no domínio dos fenômenos, crítico. Em primeiro lugar, efetuada a dissolução
recursos e serviços de informação, deixaria de crítica das possibilidades de construção de um
existir o campo de manifestação das políticas de objeto para os estudos das políticas, o autor faz
informação, e ficaria esvaziada a possibilidade a contraproposta de um objeto possível, denso
de um conhecimento que tivesse a figura dos e consistente, como domínio de exercício do
saberes do Estado. que denominará praticas informacionais: ele lhe
A própria proliferação de estudos de será oferecido pela noção de artefato híbrido ou
caráter técnico e instrumental priorizando quase-objeto, ao mesmo tempo natural, social e
a otimização do acesso a documentos discursivo, conforme elaborado pela teoria ator-
governamentais e a implementação de rede. No texto de 1995, para Frohmann, esses
tecnologias de informação nas esferas do híbridos ou quase-objetos tem como exemplares a
governo, gerariam um repertório de questões radio aberta ou a info-bahn; em textos posteriores,
mais próximas da gestão que da política. Uma seus híbridos ganham a formulação unificada
restrição, ainda mais significativa, pode inferir-se de “documentos”, agora objeto exemplar de um
das anteriores: que é a elisão das relações entre paradigma neo-documentalista. Nesse sentido
informação e poder: Frohmann propõe-se fazer uma releitura das
práticas documentárias análoga as reformulações
O foco em problemas instrumentais e
em questões epistemológicas envolvidas
que a teoria ator-rede fez com os estudos da
com a demarcação e policiamento das ciência.
fronteiras entre as disciplinas, desvia a O domínio do poder informacional deixa
atenção das questões de como o poder de ser o estado, o governo, as editoras ou as
é exercido em e através das relações bibliotecas, para ser a escrita e o discurso, os
sociais mediadas pela informação,
como o domínio sobre a informação
dispositivos complexos como os sistemas de
é alcançado e mantido por grupos rádio aberta ou a Internet, ou qualquer das
específicos, e como formas específicas constelações institucionais que intervenham
de dominação – especialmente de na construção categorial-documentária de
raça, classe, sexo e gênero – estão identidades oficiais, individuais e coletivas
implicadas no exercício do poder sobre
a informação. (FROHMANN, 1995, p.5,
(pensamos em categorias cartoriais tal como as
tradução nossa.) denominações de estrangeiro, aposentado, união
homoafetiva, entre outras).
Algumas das objeções apresentadas pelo Vemos assim que, em Frohmann, a
autor admitiriam algumas ponderações. No informação é substituída pelo documento depois
mesmo horizonte temporal e cultural no qual que o documentar fora alargado pela escrita,
as políticas da informação caracterizaram- a telemática, a estruturação jurídico-estatal de
se como estadocentricas,em todas as ciências categorias identitárias e positivadas em registros,
sociais predominaram premissas estadocentricas, muito além das instituições previamente
implícitas e encobertas sob o modelo funcional de autorizadas para sua definição, tratamento e
sociedade (INFORME GULBENKIAN, 1995), ou formatação. Esse Neo-documentalismo, proposto
explicitas e fortalecidas pela vigência de regimes por Frohmann se caracterizaria mais pela re-
estatais centralizadores (BOURDIEU,1996). significação foucalteana do documentar do que
O deslocamento das questões pela substituição da informação pelo documento.
informacionais da esfera político-estatal em Sandra Braman, estudiosa das políticas
direção as esferas da economia e do mercado, de comunicação e informação, no cenário atual,
não significaria, por outro lado, a anulação da propõe o conceito associado de regime global
relação intrínseca e permanente da economia e da emergente de informação.
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humano por duas vias: manipulando as (2009a, 2009b), em estudos que relacionam
bases informacionais do poder instrumental, informação e ação. Ekbia parte do conceito de
estrutural e simbólico, ou gerando novos meios regimes de valor [worth, grandeur], de Boltanski
de exercício do poder. O poder informacional e Thevenot (2006)7, para usar e reformular o
seria exercido sobre os outros poderes: sobre conceito de regime de informação. Ekbia, em
o poder instrumental, por exemplo, mediante trabalhos individuais ou em co-autoria, utiliza
o uso de inteligência artificial e robótica para o termo regime de informação associado ao
direcionar mísseis; sobre o poder estrutural, por conceito de regimes de valor, que conforme
exemplo, mediante o controle de direitos autorais Boltanski e Thevenot (2006) designaria diferentes
na Internet; e sobre o poder simbólico, tal como maneiras de avaliar pessoas e objetos. Numa
aconteceria com a Web-formatação das possíveis de suas pesquisas, de caráter empírico, associa
mensagens trocadas através do Twitter ou pelo diferentes regimes de informação às diferentes
Facebook. modalidades de gestão do uso da terra.
Cabe considerar que a taxonomia dos me- Na acepção de Ekbia, o regime de
canismos de poder proposta por Braman, é par- informação daria visibilidade a efeitos
te de uma proposta que visa a iuridificação e, informacionais resultantes das variações
portanto, ao controle normativo das ações de in- de experiência de quem agência ações de
formação, em suas novas escalas e condições de informação, em diferentes atividades e situações.
produção. Nessa taxonomia, a informação seria É nessas práticas situadas que a informação
incluída como variável dependente, como um se constitui, atendendo a diversos critérios de
dos meios do poder instrumental ou como domí- valor: o que é considerado medida de valor
nio de intervenção do poder estrutural (através nas atividades econômicas ou administrativas
de sua sujeição às regras in institucionais ou sistê- (eficácia, por exemplo), pode não ter prioridade
micas) e do poder simbólico (enquanto efeito ou no mundo de vida e nas relações familiares.
acontecimento da produção de sentido). Numa Ekbia, atualmente, encaminha sua
categoria específica, como poder informacional, pesquisa em duas direções. Numa delas, outorga
agiria como atrator e operador de convergências prioridade às práticas e a vida cotidiana, sem
seletivas, capaz de sobredeterminar e redistribuir remeter-las a macro contextos institucional nem a
meios, regras e significados. outras estruturas e figuras impessoais, de cunho
Nesse quadro, para Braman, ciência e administrativo e tecnológico, que formam plexos
tecnologia pareceriam ser issues de políticas, de relações de saber-poder. Nessa direção, Ekbia
como provavelmente o seriam a saúde ou a estabelece algumas semelhanças e diferenças
educação; num regime global emergente de de seu uso do termo regimes de informação e o
informação as áreas-tema da política estariam conceito de regimes de verdade, de Foucault.
sujeitas as mesmas demandas e condições
Foucault usa regimes de verdade
que afetam em geral a todas as formas de para discutir as grandes questões da
representação e de coordenação de programas circulação de conhecimento-poder,
de ação, tal como o crescente peso decisório de através dos comportamentos técnico-
agentes econômicos e corporativos, ênfase na científicos da sociedade contemporânea.
forma contratual dos vínculos, novos papeis das Regimes de informação, por outro
lado, lidariam com as práticas situadas
organizações sociais. Nesse quadro, para Braman na vida diária, envolvidas na criação e
o Estado plausível seria aquele que se constitui intercambio de informação. Além disso,
num plexo de relações triplicadas pelo governo, a as duas noções dissecariam a sociedade
governabilidade e a governança. em junções diferentes: a primeira
A ênfase de Braman na iuridificação das dentro das fronteiras institucionais (cf.
Ekbia & Kling, 2003), e esta última no
novas zonas de práticas e interações tecno- que Boltanski e Thevenot chamariam
informacionais, manifesta sua preocupação com “mundos” ou “Políticas.” Em suma, as
as possibilidades de controle dos poderes da duas noções diferem tanto na estrutura
informação, seja no Estado de direito, seja em como no escopo (EKBIA, 2009,
novas estruturas inter e trans-governamentais. tradução nossa).
O conceito de regime de informação será
7 Boltanski-Thevenot (2006) utilizam de modo preferencial de regime de
retomado, em outra direção, por Hamid Ekbia engagement, ao qual estaria associado um regime of worth ou de grandeur,
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A ética e a política, ao colocar o comum como cada vez mais atenção, fora daqueles que ficam
horizonte de reflexão, abrem outras questões so- invisibilizados pela frequencia e a duração de
bre as tendências generalizantes dos planos regu- seu uso, do “reloj internacional, el ohm, el metro,
latórios de dispositivos e regimes de informação. la contabilidad de doble entrada a la diseminacion de
Hope Olsson (apud LARA, 2012) reafirma a estandares ISO-9000” (LATOUR, 2008, p.324).
frustração de todo esforço de totalização pela repre- Indagar qual o papel desses marcos
sentação, lembrando que todo universo classificatório regulatórios e dos novos fóruns deliberativos e
encerra um território finito: não poderia incluir-se decisórios que compõem o entorno institucional
nele todos os casos já acontecidos, os atuais e os por da informação, qual o entendimento e o impacto
vir de qualquer assunto, agencia ou saber acerca do dessa crescente relevância dos códigos, dos
qual quiséramos reconstruir seu domínio universal. padrões, das normas e das metrologias, são sem
Kallinicos (2010), afirma que os objetos dúvida assuntos relevantes para a pesquisa,
digitais não tem bordas ou fronteiras (Digital objects associados a mais de uma linha investigativa
are borderless). Se comparamos um livro com o dos estudos da informação e da documentação:
prontuário eletrônico de um paciente, pareceria que organização do conhecimento, busca e
é bem mais fácil pensar um livro como entidade, apropriação de informação, avaliação científica,
produto dissociado de seu processo de produção, que políticas do conhecimento e da informação.
demarcar a unidade lógico-digital de um prontuário Estamos cientes que muitas questões e
eletrônico, traçada sobre uma rede híbrida cujos nós abordagens ficaram fora destas reflexões. De
e elos não só estão dispersos em consultórios médicos, fato, abordar os regime de informação tem
hospitais, laboratórios, mas também em bases de dados sido para nós um instrumento para fazer novas
estatísticas, imagéticas e textuais, e que alem de estar perguntas, mais que um recurso de provisão de
sendo produzido em muitos lugares, com diferentes respostas.
pontos de vistas e linguagens, pode mudar, em
qualquer momento e ponto de suas teias tecnológicas
de maneira sincrônica ou asincrônica, e em tempo real. AGRADECIMENTO
Não temos dúvidas que estamos frente a
uma questão importante que, conforme Latour,
só agora apareceria em todas sua magnitude e Agradecemos a Marcia Cavalcanti e a
relevância. Novos padrões (standards) demandam Luisa Rocha a revisão do texto.
INFORMATION REGIME:
construction of a concept
ABSTRACT: The concept of information regime could form part of a family of words that thematize the
settings of contemporary practices, media and information resources, where language
technologies, characterized by its pervasive and indefinite expansion, find its area of operation.
The information regime, as an analytical concept, refers to contemporary figures of power, but
calls into question the previous criteria of definition and recognition of what is along the order of
policy and information.
Key words: Information regime. Information – Chain of production. Information – Infrastructure. Mode information
– Patterns.
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