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ÃO PAULO EM PERSPECTIVA
AULO EM ERSPECTIVA, 17(3-4): 26-34, 2003
17(3-4) 2003
DISSEMINAÇÃO DA INFORMAÇÃO
E USUÁRIOS
Abstract: Dissemination is analyzed from the perspective of information transfer and how it affects the
reconfiguration of the notion of the citizen and his role in society. Emphasis is placed on the universe of
statistical information and the services and products of Seade in this regard.
Key words: statistical information; the end-user and the role of the individual in society; publicly available
statistics.
D
isseminar informação supõe tornar público a pro- Parte-se do princípio que é importante compreender o sig-
dução de conhecimentos gerados ou organizados nificado da disseminação contemporaneamente, que, afe-
por uma instituição. A noção de disseminação é tada pelo desenvolvimento dos meios de comunicação,
comumente interpretada como equivalente à de difusão, necessita observar a recepção de forma não monolítica.
ou mesmo de divulgação. Assume formas variadas, diri- Compreende-se como disseminação da informação
gidas ou não, que geram inúmeros produtos e serviços, governamental não só os resultados dos esforços e das
dependendo do enfoque, da prioridade conferida às par- iniciativas de divulgação à sociedade das atividades pró-
tes ou aos aspectos da informação e dos meios utilizados prias da administração pública, como também as ações que
para sua operacionalização. Em sua base existe um cen- visam a transferência de informações. Os dois tipos de
tro difusor – o produtor –, que, a despeito do controle exer- disseminação podem compreender ampla gama de infor-
cido sobre o que é disponibilizado, não tem garantias quan- mações que vão desde as políticas públicas adotadas até
to aos usuários atingidos, ao sucesso das operações de as que possam subsidiar os indivíduos e a sociedade civil
divulgação e à aplicação efetiva das informações. no desenvolvimento de suas tarefas ou mesmo no acom-
Teoricamente, pela disseminação, busca-se oferecer panhamento e cobrança da própria atividade pública. O
informações úteis, mas o conceito de utilidade nem sem- leque de informações disseminadas pelas instituições pú-
pre é bem definido. O debate sobre o uso, por sua vez, blicas varia conforme sua atividade básica, seus objeti-
remete pari passu não só ao próprio conceito de “infor- vos e percepção de necessidades da sociedade.
mação” como também ao de usuário e envolve problemas As tecnologias de informação permitem ampliar o uni-
de delimitação de públicos de linguagem. verso de disseminação das informações governamentais,
Neste artigo, pretende-se introduzir o debate sobre dis- mas é prudente verificar em que medida há efetivamente
seminação de informações em geral (englobando as duas transmissão de informação e como e se ela atinge efetiva-
distinções, mas enfatizando, sobretudo, o segundo senti- mente a sociedade. Pode-se afirmar que existe, hoje, um
do) para, em seguida, discuti-la na ação governamental. número maior de canais de informação à disposição das
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instituições e do público, mas não estamos seguros quan- para a assimilação, ocorre, segundo Barreto, modificação
to a seu alcance: qual é a parcela da população que tem do estoque de informações do indivíduo, razão pela qual
acesso à Internet? Quem utiliza as informações disponi- o autor sugere que ela seja concebida como uma “estrutura
bilizadas? Com que facilidade e nível de compreensão? significante” capaz de gerar conhecimento (Barreto, 1994).
Qual é o significado dessas informações para o público? Dito de outro modo, falar em transferência da infor-
Qual é a relação entre as informações divulgadas e as de- mação via serviços de disseminação de informações – dis-
mandas informacionais da população? Que aplicação é tribuição física ou virtual de documentos e dados – supõe
feita dessas informações? Perguntas do gênero devem ser considerar que os benefícios dessa ação se relacionam
feitas para que se possa aquilatar a extensão das realiza- diretamente às possibilidades de geração do conhecimen-
ções concretas de disseminação, e muitas delas são váli- to. Caso contrário, há apenas divulgação unilateral que
das mesmo nas situações em que são utilizados meios tra- atinge heterogeneamente o conjunto da sociedade. Se o
dicionais de disseminação. conhecimento é inseparável do indivíduo (sujeito do co-
nhecimento), as ações de disseminação para transferên-
INFORMAÇÃO E DISSEMINAÇÃO cia devem observar os requisitos que permitam adaptar as
informações e suas formas de acesso aos veículos, públi-
Não existe um conceito único de informação. Sua con- cos e contextos. Do mesmo modo, enfatizar os serviços
cepção varia de acordo com os aspectos selecionados. de disseminação de informações no emissor, ignorando
Numa abordagem pragmática, a informação pode ser dis- as características de seu público, ou concebê-lo em sua
tinguida, como: processo (que se relaciona à alteração de condição supostamente potencial valendo-se de referên-
um estado de conhecimento); conhecimento (o que é co- cias imaginadas ou idealizadas, não corrobora seu êxito.
municado, o que concerne a algum fato, evento ou assunto Enfrentar essas questões não é tarefa simples. Se, teo-
particular, o que reduz – ou aumenta1 – a incerteza); e “coi- ricamente, os vínculos entre a emissão e a recepção são
sa” (atributo de objetos – documentos ou dados referidos visualizados como necessários, sua operacionalização re-
como informação por serem considerados “informativos”) quer investimentos, a começar pela definição do usuário.
(Buckland, 1991). A informação, como processo, relacio-
na-se aos fluxos formais e informais que podem conduzir O USUÁRIO, O CIDADÃO
a alterações de estoques de conhecimento. Se, no entanto,
a ênfase for no conhecimento, ela será intangível, já que As atividades de disseminação formuladas pelos servi-
depende de crença, opinião, concepções e conhecimentos ços e produtos, em geral e, sobremaneira, governamentais,
anteriores, ou, enfim, de referências subjetivas. A infor- buscam, quase sempre, a “democratização da informação”.
mação como conhecimento pode depender da “coisa”, ou O conceito, porém, tem sido desgastado pelo uso, particu-
da existência de documentos informativos, mas não exclu- larmente quanto se verifica que as decisões sobre quais
sivamente. Nos sistemas de informação, ela, como conhe- informações e em que formato divulgá-las são permeadas
cimento, vincula-se a sua materialidade (coisa = documento, por julgamentos unilaterais. As instituições nem sempre
dado = informação), conferindo-lhe um estatuto tangível. se questionam sobre o que produzem, sobre a relação en-
A existência de fluxos informacionais e a materialidade tre seus produtos e as necessidades de informação, sobre
(ou tangibilidade), porém, não significam necessariamen- as formas de disponibilização utilizadas e, em especial,
te a geração de conhecimento. sobre seus públicos. E se o termo “democratização da in-
Originalmente referida com base no esquema tradicional formação” gradativamente desaparece dos discursos pú-
de comunicação – emissor, canal, mensagem, receptor –, blicos e é substituído pelos de “cidadão” ou “sociedade
o debate sobre disseminação da informação associado à civil”, tal fato não vem necessariamente acompanhado de
transferência sugere, atualmente, abandonar a unidi- uma análise quanto a seu significado efetivo.
recionalidade emissor-receptor para contemplar o usuário O conceito de cidadão, não raras vezes, é delimitado
numa dimensão mais ampla que o inclui como participante com base em referências hoje sob suspeita. Houve um
ativo do processo informacional. Essa perspectiva põe em tempo, bastante próximo, que o cidadão era incorpora-
destaque o significado da mensagem, cuja compreensão e do como “cliente”, embora essa prática caracterizasse
utilização dependem da forma como ela é veiculada e das menos as instituições públicas (por um certo cuidado ou
condições do receptor e da recepção. Quando há condições pudor humanista?) em reservar o termo para relacioná-
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lo a operações que envolviam lucro. Prevalece, todavia, conseqüências desse fato, destacamos a transformação do
a imagem de cidadão desenhada de acordo com um cri- conceito de cidadão, de um “representante de uma opi-
tério político-jurídico: a cidadania é reconhecida pelo Es- nião pública a um cidadão interessado em desfrutar uma
tado como um direito, principalmente em relação à igual- certa qualidade de vida” (Canclini, 1999:50). Mais do que
dade (mas não à diferença). querer participar do debate e da crítica, o novo cidadão
O conceito de cidadão como alguém que participa das transforma-se em um consumidor que prefere a fruição.
discussões e decide sobre assuntos de interesse coletivo é Essa é uma saída, a nosso ver, individual, e a despeito de
cunhado no séc. XVIII na Alemanha e na França. Seu al- seu significado distante do ideal cidadão iluminista que
cance era restrito, reservado àqueles que liam e partici- de certa forma também estava na base da cultura do “de-
pavam dos círculos ilustrados. Como revela Canclini mocratizar a informação”, é uma situação real que não
(1999), a condição de participação nos debates sobre o podemos ignorar. É notório verificar como a participação
interesse comum e sobre o estabelecimento de uma cultura cidadã (partidos, sindicatos, associações) perde sua força
“democrática centrada na crítica racional” e limitada diante da oferta da distribuição global de bens e de infor-
àqueles que podiam informar-se lendo, compreendia “o mação proporcionados, primeiramente, pela transnacio-
social a partir das regras comunicativas da escrita”. nalização da economia e, depois, pela globalização.
Segundo o autor, essa situação perdura até meados do A maior oferta de informação e de bens de consumo
século XX, quando os setores excluídos da esfera pública potencializada pelos meios eletrônicos e mais recentemente
burguesa – mulheres, operários, camponeses – eram pela Internet e a emergência de um parâmetro de “bem-
considerados, no melhor dos casos, virtuais cidadãos, cuja estar” e fruição não levam efetivamente ao exercício da
inserção nos círculos de debate dependia da assimilação cidadania, nem nos moldes tradicionais, nem no que res-
da cultura letrada. A alteração desse quadro é lenta, sendo taria desse modelo se ele pudesse ser revisado para con-
percebida por políticos e intelectuais (Bakthin, Gramsci, templar a diferença. A generalização de direitos, projeto
Raymond Willians e Richard Hoggart) e referida como iluminista, no projeto neoliberal esbarra em uma concep-
identificadora da existência de “culturas paralelas” que ção desigual de direito, já que “as novidades modernas
constituiriam uma espécie de “esfera pública plebéia aparecem para a maioria apenas como objetos de consu-
informal” (Canclini, 1999:49). Nos dias de hoje, tende-se mo, e para muitos apenas como espetáculo. O direito de
a reconhecer o papel dessas diferentes modalidades de ser cidadão, ou seja, de decidir como são produzidos, dis-
comunicação, mas o mesmo não acontece com o papel que tribuídos e utilizados esses bens, se restringe novamente
os circuitos populares demonstram no desenvolvimento às elites” (Canclini, 1999:54).
de redes diferenciadas de informação e aprendizagem, nas A aproximação das idéias de cidadania e de consumo
quais o consumo dos meios de comunicação apresentam impõe ver este último não estritamente vinculado à aquisi-
papel preponderante. ção do supérfluo, ao impulso primário e individual, mas
Como observa Canclini, as oportunidades criadas pe- como algo movido por escolha e reelaboração do sentido
los novos meios de comunicação são tão ou mais respon- social. Conseqüência da reorganização da vida social con-
sáveis pelas alterações do que as revoluções sociais ou temporânea em função dos meios massivos de comunica-
movimentos alternativos políticos e artísticos. “Foram ção, consumir passa a ser selecionar bens e apropriá-los
estabelecidas outras maneiras de se informar, de entender com base no que se considera publicamente valioso. O
as comunidades a que se pertence, de conceber e exercer processo que relaciona cidadania e consumo não se dese-
os direitos. Desiludidos com as burocracias estatais, par- nha mais pelo reconhecimento de um estado de direito –
tidárias e sindicais, o público recorre ao rádio e à televi- quando os contornos da noção de cidadão passavam pela
são para conseguir o que as instituições cidadãs não pro- idéia de nação, língua, etnia – mas às práticas sociais e
porcionam: serviços, justiça, reparações ou simples culturais que unem e separam as pessoas. “O princípio
atenção” (Canclini, 1999:50). Contra a lentidão dos ór- democrático acha-se então transferido de uma igualdade
gãos públicos, a rapidez (mas não necessariamente a efi- real, das capacidades, responsabilidades, e possibilidades
cácia) da televisão. sociais, da felicidade (no sentido pleno da palavra) para a
Os meios massivos de comunicação corroboram uma igualdade diante do objeto e outros sinais evidentes do êxito
reestruturação das articulações entre o público e o priva- social e da felicidade.” (Baudrillard, 1990:62). A congre-
do e a remodelação do consumo e da vida. Entre as várias gação de indivíduos não se atém a valores tradicionais, nem
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tampouco geográficos, ela se configura em comunidades sistem, de início, pela ausência de referenciais facilitado-
de interesse, nas quais os participantes se reconhecem res de busca e acesso. Muitos são, porém, os excluídos do
mutuamente (como, por exemplo, as tribos, conforme su- universo de usuários, por razões socioeconômicas e mes-
gere Maffesolli (1991), as minorias ou mesmo os grupos mo culturais. Existem certamente usuários cujas necessi-
esporádicos formados via Internet), apoiadas em uma di- dades informacionais não são cobertas ou mesmo iden-
versidade multicultural. A constituição de um novo modo tificadas. É claro que cada instituição tem um público mais
de ser cidadão está embasada no consumo. freqüente que compartilha do mesmo universo cultural e
simbólico e cujas necessidades informacionais convergem
CIDADÃO, CONSUMIDOR E PÚBLICO(S) aos objetivos institucionais, mas o uso de segmentações
DA DISSEMINAÇÃO DE INFORMAÇÕES tradicionais que ignoram a complexidade de formação de
vínculos compromete as ações de disseminação que vi-
Vê-se, pelo exposto, que as características socioespa- sam a transferência e a aplicação.
ciais que definiam a identidade e o cidadão passam a ser, Teixeira Coelho (1997:324, verbete público), referin-
com o processo de globalização, delimitadas por traços do-se às políticas culturais, menciona a preocupação em
sociocomunicacionais. A nova identidade cidadã forjada relação à formação do público, que pode ser estendida à
depois do modelo moderno e iluminista (jurídico-político, definição de políticas de informação. A formação do pú-
postulante do direito à igualdade) não é única, una ou ho- blico (ou para nós, dos públicos) passa pela homogenei-
mogênea, mas, ao contrário, difusa e múltipla. Ela se cons- zação de juízos de valor, reações e usos que atuam como
titui atravessando fronteiras territoriais e de classe, e se denominadores comuns entre as pessoas que o constituem.
conforma por agregações estabelecidas por vínculos de Ignorar as nuances que conformam os vários públicos é,
interesse pulverizados, fugidios e, muitas vezes, esporádi- na melhor das hipóteses, continuar a conceber o usuário
cos. O juntar/separar conhece o movimento imposto pelas moldado à semelhança da instituição veiculadora de in-
regras de um contínuo fazer e desfazer, pois os interesses formações, isto é, um modelo moderno e iluminista.
não são mais permanentes. Alternam-se momentos de agre- O esforço na identificação dos gêneros de usuários e
gação e desagregação de indivíduos pela precariedade de de suas necessidades tem, como implicação, a possibili-
sedimentação dos vínculos que os unem. Por conseqüên- dade da própria revisão de conteúdos disseminados ou
cia, perante esse novo estado de coisas, não se poderia fa- mesmo produzidos, cuja ignorância ou indiferença refor-
lar em usuário de forma genérica e todas as formulações ça o dirigismo e corrobora a estagnação.
de serviços de disseminação nascidos de políticas de in-
formação que ignoram os aspectos da pluralidade dos pú- DISSEMINAÇÃO QUE VISA A TRANSFERÊNCIA:
blicos têm seu âmbito de cobertura comprometido. AÇÃO PEDAGÓGICA OU CRIAÇÃO DE CONDIÇÕES
A rigor, não existe o usuário da informação pública DE FAMILIARIDADE COM A INFORMAÇÃO?
governamental, mas os de diferentes motivações, origem,
nível de instrução e idade. Pode haver, ao mesmo tempo, As políticas de informação e de disseminação correm
os eventuais e, sistematicamente, os que procuram por o perigo de ser desenvolvidas exclusivamente numa pers-
informação. Em face da gama de informações fornecidas pectiva orientada da emissão para a recepção. A modifi-
tradicionalmente, os distintos usuários escolhem determi- cação dessa situação pressupõe considerar as alterações
nados assuntos ou aspectos: alguns buscam informação já apontadas e, por conseguinte, observar o espectro mul-
utilitária, relacionada à satisfação de necessidades bási- tivariado de seus públicos. Não há, todavia, modelos para
cas; outros são motivados pela necessidade de conhecer enfrentar essa questão. Num primeiro momento, pode-se
para manter sua sobrevivência em determinados grupos; julgar que uma ação voltada à educação dos usuários seja
outros, ainda, procuram informação por vontade de auto- o caminho. A ação pedagógica, porém, é também marca-
realização (Lara et al., 2002). Variam, do mesmo modo, da pela moral moderno-iluminista, orientada por um de-
os níveis de especificidade e de profundidade relativos às sejo humanista que pretende salvaguardar determinados
informações desejadas e consultadas. Quanto à forma de princípios que considera, a seu modo, fundamentais. É a
apresentação das informações, alguns preferem as visuais, mesma moral que está na base da concepção da democra-
gráficas, outros textuais. Há os que são estimulados a voltar tização da informação e, de certo modo, das políticas de
a pesquisar (numa instituição ou num sítio) e os que de- inclusão. Supõe um processo claro, com início e ponto de
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chegada (numa paráfrase à situação que opõe a ação edu- inclusão. E se agora a obrigação não é mais ligarmo-nos
cativa à ação cultural, conforme sugere Teixeira Coelho aos outros, mas a nós próprios, há que se verificar que o
(1989:30). Não se dá conta da centralidade dessa visão abandono do dever não é necessariamente acompanhado
em torno de princípios apriorísticos, como não discute, do declínio das virtudes (Lipovetsky, 1994:15-18).
hoje, o significado que está latente no conceito de inclu- Uma ação formadora desenhada em torno desse confli-
são que pressupõe uma relação lógica de pertinência: in- to – individualismo e virtude – deve, para Lipovetsky, re-
cluir significa abranger e, por conseqüência, não compre- cuar o individualismo irresponsável e estimular um indi-
ende a diversidade. vidualismo responsável. Não há modelos, mas diante de
Há outro discurso que é de desesperança, cético em um moralismo insensível em relação ao individual e ao
relação a qualquer possibilidade de ação: não se acredita social, e um neoliberalismo que conduz à fratura da socie-
na possibilidade de estabelecer vínculos entre pólos tão dade reforçando a oportunidade de poucos, o autor pro-
distintos. Se o setor público responde formalmente por uma põe uma “ética inteligente”, dialogada, que procura equi-
orientação política determinada, que possibilidades haveria líbrios entre eficácia e eqüidade, voltando-se ao respeito
de uma ação que contemplasse a diversidade? ao indivíduo e ao bem coletivo. Se essa ética é menos exi-
Existirá um caminho alternativo que permita desen- gente para o indivíduo, menos categórica para os homens,
cadear uma política de informação que dê conta da nova deve ser mais imperativa para as organizações, numa aposta
reconfiguração do universo de usuários? Será contraditória na inteligência científica e técnica, política e empresarial
a perspectiva que procura buscar uma ação de dissemi- (Lipovetsky, 1994:23). Se ela é ainda teórica, vale ao me-
nação perante uma cultura notoriamente individualista? nos verificar o estado das políticas de disseminação públi-
Se essas questões não podem ser respondidas integral- cas para que, apoiada em sua análise, possa nascer uma
mente, convém ao menos enunciá-las para explicitar os reflexão que aponte algumas formas de trabalho.
limites de atuação das políticas de disseminação da
informação pública institucional. DA REFLEXÃO TEÓRICA AO EXAME DA
Qualquer ação de formação deve ser entendida com a PRÁTICA: O CASO DAS AGÊNCIAS PÚBLICAS
finalidade de renovação. A disseminação para transferên- DE ESTATÍSTICA
cia e utilização, diferentemente da disseminação como
“propaganda”, como divulgação ou como ato educacio- Há certamente uma distância entre a reflexão teórica e
nal dirigido, objetiva mais o processo do que o objeto, uma situação concreta de disseminação de informações.
pretende, antes de tudo, criar familiaridade com as infor- Vários fatores intervêm na formulação de propostas pragmá-
mações, para que os usuários sejam um pouco mais eles ticas, particularmente quando se trata de instituições
mesmos os motores de sua formação, numa analogia à governamentais. Ao trazer o debate para situações mais
proposta já citada (Teixeira Coelho, 1989; 1997). É, tam- concretas, é importante tecer algumas observações que
bém, uma aposta que poderá exigir alterações na própria possam auxiliar a definição de políticas de informação mais
oferta de informações produzidas. Como formulação teó- consistentes.
rica, está embuída de um humanismo que aspira transfor- Ao falar de disseminação de informações no Brasil e
mar a ação do dever moralista e aplacador de consciên- na América Latina, não se identificam políticas públicas
cias, numa conduta pautada numa “ética prudente” claras para o setor. Julio Cubillo aponta como principal
(expressão utilizada por Lipovetsky), que contenha, em responsável por essa ausência o vendaval neoliberal que
princípio, uma possibilidade de intervenção do Estado soprou a partir dos anos 90 e os modelos de gestão públi-
como promotor do desenvolvimento das pessoas. ca nele inspirados que afastaram o estado da coordenação
Para Lipovetsky, a adoção de uma ética prudente não dos projetos de mudança social (Cubillo, 2003). Ponde-
significa uma ruptura com as leis ou uma invenção de novos ra-se, entretanto, que em épocas anteriores a situação não
valores. Os princípios morais têm sido os mesmos ao longo era muito diferente. A falta de políticas de informação não
do tempo: as alterações relacionam-se mais aos pontos de é novidade, já que mesmo os discursos passados de de-
referência2 e é em relação a eles que se faz necessário, mocratização da informação ou de promoção da cidada-
agora, pensar as formas de ação. Se a moral laica manteve nia não eram sedimentados em bases claras e não encon-
da moral religiosa a noção de dívida e dever, compreende- travam eco suficiente nas instituições públicas. À exceção
se onde estão as raízes da ação educativa e mesmo da de iniciativas pontuais, as políticas de informação e de
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disseminação (se é que se pode concebê-las como políti- condições para a apropriação da informação e sua trans-
cas) tendiam (e tendem) a refletir as fronteiras fluidas de formação em conhecimento.
um marco teórico rarefeito. A emergência das novas tecnologias, ao mesmo tempo
Tomando o caso das agências públicas de estatística, de sua absorção muitas vezes desacompanhada de políti-
verifica-se que a situação é muito parecida. Não raras ve- cas de informação, insere também na esfera das discus-
zes, a disseminação é vista como uma conseqüência, um sões a questão da inclusão. Segundo levantamentos da
resultado natural da produção, mais ou menos como um International Telecommunication Union – ITU, 14,3 mi-
apêndice ao capítulo crucial dos levantamentos e pesqui- lhões de pessoas tinham acesso à Internet em 2002, no
sas que dão origem à informação. É como o final de uma Brasil. No mesmo ano, os indivíduos de 10 anos e mais no
maratona, no qual os atletas exauridos pelo esforço país somavam 138,5 milhões, o que significa que 89,7%
despendido nas etapas anteriores querem apenas chegar, da população nessa faixa etária estavam à margem do cau-
sem importar com a precisão ou elegância das passadas. dal de informações contidas na web. Em face dos custos
Prova disso, além da escassa literatura existente sobre o para se ter acesso à Internet, desde os preços dos equipa-
tema, é que os planos tabulares, a seleção dos recortes de mentos às elevadas tarifas da comunicação telefônica pri-
informações a serem divulgadas, as formas de saída dos vatizada, não é arriscado estabelecer uma relação direta
dados são quase que inteiramente pré-definidas, pratica- entre poder econômico e inclusão digital. Todavia, não é
mente à revelia da recepção. pertinente discutir a inclusão digital sem analisar, anterior-
Observa-se, ao mesmo tempo, que o debate sobre a dis- mente, a inclusão social. Ainda que não se questione o sig-
seminação é restrito, grande parte das vezes, às Tecnologias nificado de “incluir” (incluir em que, onde), há que se con-
de Informação e Comunicação – TICs. Sem desprezar sua siderar que, se verifica hoje uma exclusão digital, a exclusão
importância, há uma tendência em circunscrever a disse- social lhe é anterior. Saber ler ou ter acesso à informação
minação ao problema da melhor escolha e combinação entre não significa necessariamente a possibilidade do conheci-
hardware, software, quando a questão é principalmente de mento. Os números, portanto, devem ser interpretados como
conteúdo e de formas de instituição de elos com os públi- um potencial teórico. As afirmações sobre exclusão digi-
cos. Essa situação é, talvez, resultante do vazio criado pela tal, para serem interpretadas em profundidade, deveriam
falta de uma política sólida de informação que, preenchi- também ser comparadas ao alcance das tiragens de publi-
do apressadamente pelas TICs, passa a subordinar, a inte- cações, por exemplo. A correlação de resultados poderia
resses empresariais, o esforço das ações governamentais indicar uma situação mais próxima do real.
de fornecer informações que possam ser transformadas em No campo de ação da disseminação das informações
conhecimento. A tecnologia passa a pensar (e a limitar) a estatísticas, pode-se dizer que, de certo modo, as agên-
disseminação. Metafraseando a célebre frase sobre a guerra, cias disseminam para seus pares, de modo que seus atuais
cuja autoria é motivo de dúvidas, sendo atribuída ora a usuários estão no mesmo estamento social, têm voz, po-
Talleyrand, ora a Clemenceau ou Lloyd George: “a disse- dem realizar uma interlocução com os responsáveis pela
minação é uma coisa muito importante para ser deixada oferta da informação. Como quem não tem voz não recla-
nas mãos dos ‘informáticos’ ”. ma (ou mesmo que a tenha nem sempre possui os meios
A expansão vertiginosa da Internet, a economia de cus- para fazê-lo), não é preciso muito esforço para identificar
tos e agilidade que ela permite aliadas ao crescente fascí- de onde advém a impressão de que o acesso às informa-
nio das novas tecnologias têm levado as instituições a in- ções está universalizado, porque se entende que o “dever”
vestir maciçamente nessa mídia, deixando de resolver foi cumprido. Na realidade, porém, o universo de usuá-
problemas a ela anteriores concernentes às condições reais rios é dessa forma e não de outra, porque nem todas as
para a transferência da informação. Como tantos aqueles pessoas estão preparadas para receber informação (ou pelo
que atualmente alimentam, como aqueles que formam o menos a informação que está sendo divulgada e a sua for-
público cativo das informações conhecem e se utilizam ma), como nem sempre as informações divulgadas são as
da rede, cria-se entre esses atores a sensação do alcance que as pessoas desejam. Pode-se dizer, portanto, que as
universal da Internet. Em conseqüência, empalidece o pres- agências estatísticas nem sempre estão suficientemente
tígio de outras mídias, esquece-se de suas diferentes lin- atentas quanto ao universo de usuários potenciais. É aí que
guagens e apaga-se quase que definitivamente a discus- uma ação de formação de públicos, em sentido amplo e
são sobre o ponto nevrálgico da questão: a criação de renovado como já se sugeriu, pode fazer sentido.
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conhecimento se não estiverem coordenadas numa políti- encontrar com mais facilidade as informações e tenha os
ca de informação sólida. elementos necessários para sua compreensão, mesmo não
sendo iniciado nessas áreas de conhecimento.
DISSEMINAÇÃO DE INFORMAÇÕES Na imprensa, são divulgadas regularmente as prin-
NA FUNDAÇÃO SEADE cipais pesquisas da instituição e também estudos e
projetos especiais. A cobertura atinge todas as mídias,
O modelo de disseminação de informações adotado pela com preponderância dos grandes jornais diários, revistas
Fundação Seade é bastante semelhante aos utilizados pe- semanais, televisão e rádio. A divulgação é feita por press
las principais agências públicas de estatística, nacionais e releases e entrevistas coletivas, procurando-se sempre
internacionais. A seguir, faz-se um breve relato da situa- garantir a isonomia no acesso à informação para todos
ção atual dessa atividade e das formas e condições para os órgãos de imprensa, ou seja, não se fornecem infor-
obter informações da instituição. mações exclusivas para este ou aquele meio de co-
Os meios utilizados pela Fundação Seade para a municação.
realização da tarefa de disseminar informações são as O usuário pode dispor, ainda, de outras formas de aces-
publicações, a Internet e a imprensa. No caso das pri- sar as informações da Fundação Seade:
meiras, compreendem os resultados das pesquisas da ins- - atendimento presencial – na sede da instituição (Av.
tituição, dos registros administrativos e, mais raramente, Cásper Líbero, 478 – São Paulo/SP), das 9 às 17 horas,
de estudos especiais. Em virtude da política de contin- de segunda a sexta-feira, é possível consultar todo o acer-
genciamento de gastos a que estão submetidos os órgãos vo de informações existente (Internet, biblioteca, produ-
públicos em geral nos últimos anos, houve uma reorien- tos e bases de dados), seja oriundo de pesquisas próprias,
tação da política editorial nesse segmento. Além da seja produzido por outros órgãos afins. É possível, tam-
diminuição da quantidade de publicações, houve uma bém, a assessoria de técnicos especializados na busca de
migração do meio impresso para o eletrônico, ou seja, informações. A consulta é totalmente gratuita, mas cópias
do papel para o CD-ROM e para a Internet. Em tempos reprográficas, impressões, gravação de arquivos em
de contenção, as despesas com a produção gráfica e papel disquetes ou CD-ROM e publicações são pagas.
tornam-se significativas, quando comparadas com a - atendimento telefônico – no mesmo horário e dias da
confecção de mesmo conteúdo em meio eletrônico. semana, pelo Serviço de Orientação ao Usuário (SOU),
Assim, outra desvantagem adicional da mídia impressa no telefone (11) 3313-5777, no qual se obtêm referên-
é que elas precisam ser expedidas para que a informação cias sobre, onde e como estão disponíveis informações
chegue a seu destino, gerando novos custos, desta vez socioeconômicas, assistência técnica aos produtos da
com as tarifas postais. Fundação Seade, esclarecimento de dúvidas acerca de
Dessa forma, mas, evidentemente, também pelos moti- informações e produtos, encomenda de publicações e pre-
vos já apontados, a Internet foi conquistando preponde- parações de dados e ainda informações disponíveis na
rância e hoje é, de longe, o principal veículo de dissemi- Internet. Ou se preferir, a comunicação poderá ser feita
nação das informações da Fundação Seade. No site por fax (11) 3224-1700.
<www.seade.gov.br>, existe um grande número de infor-
mações organizadas em temas e produtos que respondem - correio eletrônico – pelo endereço <geadi@seade.gov.br>,
pela quase totalidade da produção da instituição. Entre as consegue-se os mesmos serviços prestados no atendimento
ausências mais significativas pode-se citar a Base de Óbi- telefônico. Todas as mensagens são respondidas em, no
tos por Causa e a revista São Paulo em Perspectiva. Uma máximo, 24 horas.
lacuna adicional é a falta de sistemas que permitam extra- Por meio de qualquer uma dessas entradas, o usuário
ir resultados dos microdados de pesquisas como a Pes- pode encomendar tabulações especiais, ou seja, constru-
quisa de Emprego e Desemprego – PED, Pesquisa de Con- ção de novos cruzamentos de informações e processamento
dições de Vida – PCV e da Pesquisa da Atividade de microdados em formatos por ele definidos, de acordo
Econômica Paulista – Paep. No entanto, existe uma tenta- com suas necessidades. Após fazer a demanda, o usuário
tiva, ainda modesta, de construir linguagens que permi- recebe orçamento e prazo de execução da tabulação. O
tam o relacionamento entre as diversas bases da institui- trabalho começa a ser executado após a aprovação do in-
ção com a inclusão de metadados, para que o usuário possa teressado e o prazo é rigorosamente respeitado.
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SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 17(3-4) 2003
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