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www.iengenharia.org.

br #643 / 2020

ISSN 0013-7707
00643

9 770013 770009

R$ 39,00

OS CAMINHOS DO
SANEAMENTO NO BRASIL
Professor Paulo Ferreira explica como Para o secretário de Saneamento,
a engenharia, nos seus diversos ramos, Pedro Ronald Maranhão Braga
pode contribuir para o desenvolvimento Borges, Marco Regulatório dará segurança
do tratamento de água e esgoto no país jurídica para avançar nas metas do Plansab

Estudos Bons exemplos Novo Rio Pinheiros


TÉCNICOS APONTAM COMO CURITIBA, SÃO PAULO E JOÃO INVESTIMENTOS E PRAZO
REDUZIR A POLUIÇÃO E O MAU PESSOA LIDERAM RANKING DE PARA A DESPOLUIÇÃO DO RIO
CHEIRO NOS RIOS PAULISTAS SANEAMENTO NO BRASIL PINHEIROS SEGUEM MANTIDOS
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EDIÇÃO ESPECIAL • MAIO 2020

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 3


Sumário

PALAVRA DO PRESIDENTE 06

DIVISÕES TÉCNICAS 09

PALAVRA DO LEITOR 12

CURTAS 14

PINGUE-PONGUE 32

ARTIGO 54

POR DENTRO 78

BIBLIOTECA 80

MEMÓRIAS 82

ENGENHO E ARTE 84

CRÔNICA 86

Editada desde 1942 COMISSÃO EDITORIAL Design Gráfico: Guaraná Digital;


www.iengenharia.org.br Diretor: Rui Arruda Camargo Administrativo: José Abílio dos Santos.
REVISTA ENGENHARIA – ISSN 0013-7707 Secretário: Aléssio Bento Borelli Impressão e Acabamento: Gráfica Referência.
Órgão oficial do Instituto de Engenharia Alfredo Eugenio Birman; Ana Paula Capuano; A edição 643 da REVISTA ENGENHARIA é
Antonio Maria Claret Reis de Andrade; Aristeu publicação da Imprensa Editorial Ltda.
Zensaburo Nakamura; Eduardo Ferreira Lafraia; CNPJ 02.172.775/0001-70 – Caixa postal
Débora Sanches de A. Marinello; Flávia 72022 Cel. (55 11) 98204-0002
Bartkevicius Cruz; Henrique José Boneti; Ivan
Metran Whately; Jefferson D. Teixeira da A REVISTA ENGENHARIA é distribuída aos
Costa; Jerônimo Cabral Pereira Fagundes Neto;
João Ernesto Figueiredo; José Eduardo W.A. sócios do Instituto de Engenharia, assinantes
Cavalcanti; José Fiker; Marco Antônio Gullo; e engenheiros brasileiros que desenvolvam
Maurílio Luiz Vieira Bergamini; Miguel Lotito atividades nas áreas de engenharia,
Neto; Miguel Prieto; Miracyr Assis Marcato; projeto, construção e infraestrutura.
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Neto; Ricardo Henrique de A. Imamura; de Engenharia e IMPRENSA não se
Roberto Bartolomeu Berkes; Roberto Kochen; responsabilizam por conceitos emitidos em
Theóphilo Darcio Guimarães. artigos assinados. Eles não representam,
MAIO – 2020 – ANO 76 – Nº 643 necessariamente, o pensamento da revista.
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Miriana Pereira Marques Projeto Gráfico: Eduardo Magno; Comissão Editorial da REVISTA ENGENHARIA.

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ENTREVISTA 16

Para Paulo Ferreira, professor da Escola de


Engenharia da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, para vencer o desafio do saneamento
é preciso continuidade de investimentos

LINHA DE FRENTE 22

Secretário nacional de Saneamento Básico,


Pedro Ronald Maranhão Braga Borges, diz que
Marco Regulatório dará segurança jurídica
para investimentos em saneamento básico

BALANÇO 28

Obras do projeto Novo Rio Pinheiros


já estão em curso e conclusão da
despoluioção do tradicional rio segue
mantida para dezembro de 2022

RANKING 36

Três melhores capitais no Ranking do


Saneamento Básico 2020, do Instituto Trata
Brasil, trabalham com planejamento a longo
prazo e constância nos investimentos

MARCO REGULATÓRIO 42

Em discussão no Congresso, o Marco


A MISSÃO DO INSTITUTO DE ENGENHARIA Regulatório pretende ampliar a participação
dos investimentos privados para atingir
Promover a engenharia em benefício do as metas de cobertura do Plansab
desenvolvimento e da qualidade de vida
da sociedade. Realizar esta missão por
meio da promoção do desenvolvimento e
da valorização da engenharia; promoção ESTUDOS 48
da qualidade e credibilidade de seus
profissionais; prestação de serviços
Estudos técnicos mostram tecnologias
à sociedade, por meio de fóruns e
debates sobre problemas de interesse disponíveis para eliminar o mau cheiro
público, análise e manifestação de e reduzir a turbidez das águas
opiniões políticas, programas e ações dos rios Tietê e Pinheiros
governamentais, elaboração e estudo
de pareceres técnicos e propostas para
o poder público e para a iniciativa
privada; e prestação de serviços para
seus associados. Suas ações estão
dirigidas para a comunidade em geral;
os orgãos públicos e organizações não
governamentais; as empresas do setor
industrial, comercial e de serviços; as
empresas de engenharia, engenheiros e os
profissionais de nível superior em geral;
os institutos de pesquisas e escolas de
engenharia; e os estudantes de engenharia.

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Palavra do presidente

INSTITUTO DE
ENGENHARIA
EM TEMPOS
DE COVID-19
Eduardo Ferreira Lafraia

A
pandemia do Covid-19 afetou cada Brasil. Outra novidade que estava em vias de
um de uma maneira diferente, mas ser lançada e frente a esse momento desafia-
certamente seus reflexos terão um dor, antecipamos o lançamento do modelo
impacto duradouro em nossa socie- de associação digital, que vai permitir que
dade. Apesar do momento ser extremamente nossa comunidade de engenheiros avance
desafiador, acredito na resiliência do brasilei- para todo o Brasil.
ro e na engenharia como um meio essencial
do Brasil superar esse e outros desafios rumo
a um futuro mais promissor. DEBATES SOBRE OS DESAFIOS
DA ENGENHARIA PARA
Dentro do Instituto de Engenharia estamos SUPERAR ESSE MOMENTO
focados em demonstrar como, a comunidade
que engloba profissionais de engenharia de Outra novidade neste período foi a orga-
diversas áreas, podem se unir – independen- nização de especialistas renomados em uma
temente da localização ou circunstância – para série de webinars altamente relevantes sobre
lidar com um dos desafios mais importantes os desafios desse momento e as perspectivas
de nossas vidas. Temos um papel no IE que futuras, abrindo discussões e estudos sobre
é de apoiar nossos associados, cuidarmos de políticas públicas que podem mudar o ce-
nossos colaboradores, unirmos aos nossos nário brasileiro. Nos webinars são discutidas
parceiros e ajudar nossas comunidades. maneiras de como a engenharia pode apoiar
o País a superar seus desafios atuais e futuros.
ÁGIL ADAPTAÇÃO, TRANSPARÊNCIA
E OFERTA DE CONTEÚDO RELEVANTE PESSOAS SÃO O CENTRO DA
Entendo que precisamos apoiar os esforços RAZÃO DA ENGENHARIA
do isolamento social. No IE, adotei rapida- Neste momento precisamos fazer tudo que
mente o trabalho remoto dos colaboradores for do nosso alcance para proteger as pes-
e indiquei para que os associados traba- soas, que são o centro da razão da engenha-
lhassem de suas casas. Como sabem, den- ria. Por isso nesse momento da pandemia, o
tro do Instituto temos muitos eventos, mas IE está voltando seus esforços para contribuir
nos adaptamos rapidamente para continuar com novos olhares para a infraestrutura no
proporcionando esse ensino e trabalho, to- Brasil, no saneamento básico e no combate
talmente a distância, apostando na transpa- ao déficit habitacional, pois acredito que fa-
rência e no aprimoramento do conhecimen- zendo isso, vamos ter geração de empregos
to, com a oferta de conteúdo relevante, por e consequentemente, consumo de insumos
exemplo, com a Mentoria aberta para todo o da indústria nacional.

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FALTA DE SANEAMENTO mente, melhoria do bem estar social, das
DEIXA A POPULAÇÃO MAIS condições de saúde e de vida da população.
VULNERÁVEL A COVID-19 A partir desse cenário da Covid, analistas tem
Um ponto que sempre me preocupou e me apontado que as diferenças sociais extremas
sensibiliza neste momento é a falta de sanea- devem ser combatidas fortemente. Entendo
mento, que deixa a população brasileira mais que o começo desse processo deveria ser
vulnerável a Covid-19. Nesta linha, aprovei- pela inadequação da moradia – famílias que
tamos o momento e lançamos o caderno es- dividem a mesma casa, moram em cortiços,
pecial “Diretrizes para Universalização do Sa- favelas. Reforço que por meio da construção
neamento no Brasil”, que foi feito pela Divisão civil e da diminuição do déficit habitacional
Técnica de Engenharia Sanitária, Recursos Hí- seja possível diminuir a desigualdade social,
dricos e Biotecnologia do IE. Estudo de suma gerar empregos, arrecadar impostos e o au-
importância e que chega em um momento mentar o consumo de insumos nacionais.
crucial no qual a disseminação da Covid seria
minimizada sensivelmente com medidas de RETRIBUINDO COM SOLIDARIEDADE
saneamento ambiental. ÀS COMUNIDADES
Em tempos de incerteza, o IE tem um papel
OS PROJETOS DE ENGENHARIA importante de dar visibilidade a todos os atos
SÃO O MOTOR DE RETOMADA de solidariedade que surjam na comunidade
ECONÔMICA E ESSENCIAIS PARA da engenharia. Cito alguns casos, como a
AUMENTAR A TRANSPARÊNCIA campanha em nosso site, junto com os asso-
NA CONTRATAÇÃO DE OBRAS ciados e seguidores, de doação em dinheiro
Entendo que cada engenheiro é um poten- para fabricação de 10 mil máscaras (modelo
cial multiplicador de empregos e que a en- “face shield”) para o Hospital Universitário da
USP. Outra doação feita foi a de cestas bási-
genharia é um motor essencial da retomada
cas a comunidades carentes e instituições be-
econômica e da ampliação da transparência
neficentes do bairro de Vila Mariana.
no País. Defendo de imediato, sem aumento
de riscos relacionados à pandemia, que os es- Reforço que vamos continuar a direcionar
tudos e projetos de engenharia para implan- esforços de nossa comunidade ao combate
tação de empreendimentos possam ser con- à ameaça e aos impactos do Covid-19. O IE
tratados e desenvolvidos, utilizando recursos vai fazer isso baseado nos princípios que nos
financeiros e jurídicos disponibilizados pelas guiam ao longo da nossa história. Precisamos
medidas adotadas em função do estado de estar juntos para superar esse desafio e cres-
calamidade pública. Os projetos de enge- cermos mais próximos.
nharia são documentos imprescindíveis para Por fim, acredito que essa realidade nos im-
aumentar a transparência dos processos de põe a necessidade de ações em duas frentes:
contratação de obras, evitando desvios e até combater e amenizar os efeitos da pandemia
mesmo ilegalidades, sempre possibilitando e viabilizar a retomada da economia. Vamos
execução segura por preços justos. superar os desafios, atualizando todos, e os
preparando para novos tempos. Agradeço o
DESIGUALDADE SOCIAL E O apoio de nossos voluntários, o esforço dos
DÉFICIT HABITACIONAL comitês, e convido cada engenheiro do Brasil
Acredito que as engenharias possam apoiar a fazer parte da nossa comunidade.
o País em várias frentes de combate à pobre-
za, por exemplo, saídas para o recorde histó- Eduardo Lafraia
rico de déficit habitacional, enfrentada atual- Presidente do Instituto de Engenharia

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Instituto de Engenharia 2020

PRESIDÊNCIA CURSOS AQUINO SARMENTO JOÃO BAPTISTA FLÁVIA BARTKEVICIUS CRUZ


DIRETOR REBELLO MACHADO FRANCISCO ARMANDO
PRESIDENTE DIRETORA REGIONAL JOSÉ EDUARDO FRASCÁ
MARCOS ANTONIO GULLO NOSCHANG CHRISTOVAM
EDUARDO FERREIRA DE LONDRES/UK POYARES JARDIM
m.a.gullo@mgconsult.com.br
ANA FLÁVIA CELINO HABIB GEORGES
LAFRAIA JOSÉ ROBERTO JARROUGE NETO
presidencia@iengenharia.org.br VICE-DIRETORA BERNASCONI
VICE-PRESIDÊNCIA DE ISMAEL JUNQUEIRA COSTA
ENY KAORI UONO SANCHEZ LAWRENCE CHUNG KOO
PRIMEIRO DIRETOR ASSUNTOS INTERNOS IVAN METRAN WHATELY
eny@uonosanchez.com.br LUIZ FELIPE PROOST
SECRETÁRIO JERÔNIMO CABRAL P.
VICE-PRESIDENTE DE SOUZA
IVAN METRAN WHATELY FAGUNDES NETO
REVISTA ENGENHARIA MIRIANA PEREIRA MARCELO ROZENBERG
iwhately@terra.com.br JOÃO ANTONIO
MARQUES MARCOS DE CARVALHO MACHADO NETO
DIRETOR RESPONSÁVEL
SEGUNDO DIRETOR miriana.marques@terra.com.br GERIBELLO
RUI ARRUDA CAMARGO JOÃO BAPTISTA
SECRETÁRIO MARCOS MOLITERNO REBELLO MACHADO
ruicamargo@uol.com.br DIRETOR DE ASSUNTOS
ALFREDO VIEIRA DA CUNHA UNIVERSITÁRIOS ODÉCIO BRAGA DE JOÃO ERNESTO FIGUEIREDO
eng.alfredo.v.cunha@uol.com.br SECRETÁRIO LOUREDO FILHO
VITOR MARQUES JORGE PINHEIRO JOBIM
ALESSIO BENTO BORELLI RAFAEL TIMERMAN
vitinho1991@terra.com.br JOSÉ EDUARDO FRASCÁ
ASSESSORIA DE alessio.bento@gmail.com RICARDO HENRIQUE DE POYARES JARDIM
COMUNICAÇÃO DIRETOR DE ASSUNTOS ARAÚJO IMAMURA
JOSÉ GERALDO BAIÃO
VICE-PRESIDÊNCIA DE ACADÊMICOS ROBERTO BARTOLOMEU
DIRETOR RELAÇÕES EXTERNAS BERKES JOSÉ OLÍMPIO
ANGELO SEBASTIÃO ZANINI
GEORGE PAULUS RODRIGO DE FREITAS DIAS DE FARIA
zanini.angelo@gmail.com
george@salaviva.com.br VICE-PRESIDENTE BORGES FONSECA JOSÉ PEREIRA MONTEIRO
RICARDO KENZO DIRETORIA DE RUI ARRUDA CAMARGO JOSÉ ROBERTO
JORNALISTA MOTOMATSU ASSOCIAÇÕES DE BERNASCONI
TATIANA LOURENÇO
ISABEL CRISTINA DIANIN ricardo.kenzo@gmail.com EX-ALUNOS MACHADO JOSÉ ROBERTO CARDOSO
site@iengenharia.org.br
DIRETOR DE RELAÇÕES DIRETORA VICENTE ABATE KLEBER REZENDE CASTILHO
EXTERNAS FLÁVIA BARTKEVICIUS CRUZ VITOR MARQUES LOURIVAL JESUS ABRÃO
CÂMARA DE MEDIAÇÃO
E ARBITRAGEM MIRACYR ASSIS MARCATO flavia.b.cruz@gmail.com LUIZ FELIPE PROOST
DO INSTITUTO DE energo@terra.com.br CONSELHO CONSULTIVO DE SOUZA
ENGENHARIA VICE-DIRETOR
DIRETOR REGIONAL PRESIDENTE LUIZ FERNANDO PORTELLA
OSWALDO BOCCIA JUNIOR
DIRETOR DE SALVADOR/BA ANDRE STEAGALL MAÇAHICO TISAKA
obocciajr@gmail.com GERTSENCHTEIN
SUPERINTENDENTE CARLOS ALBERTO MARCELO ROZENBERG
STAGLIORIO DIRETORIA CULTURAL MARCOS MOLITERNO
ANDRÉ STEAGALL SECRETÁRIO
GERTSENCHTEIN stagliorio@stagliorio.com.br PERMINIO ALVES M. MIRIANA PEREIRA
camara@iengenharia.org.br DIRETOR AMORIM NETO MARQUES
DIRETOR REGIONAL DE
BELO HORIZONTE/MG NESTOR SOARES NELSON AIDAR
TUPINAMBÁ ADOLFO BOLIVAR SAVELLI
VICE-PRESIDÊNCIA MARCELO GERALDO NEUZA MARIA TRAUZZOLA
DE ADMINISTRAÇÃO nstupinamba@uol.com.br ALBERTO PEREIRA
BATISTA RODRIGUES OZIRES SILVA
E FINANÇAS maguolobr@gmail.com DIRETOR DE VISITAS ALFREDO MÁRIO SAVELLI PAULO FERREIRA
VICE-PRESIDENTE DIRETOR REGIONAL TÉCNICAS ALFREDO PETRILLI JUNIOR PAULO SETUBAL NETO
ARLINDO VIRGÍLIO DE FORTALEZA/CE SOKAN KATO YOUNG AMÂNDIO MARTINS PEDRO MÁRCIO GOMES
MACHADO MOURA LAWTON PARENTE sokan@chinatur.com.br ANDRÉ S. GERTSENCHTEIN DOS SANTOS
arlindo.moura@planova.com.br DE OLIVEIRA ANGELO SEBASTIÃO ZANINI PERMÍNIO ALVES M.
engeterra.ce@ CONSELHO DELIBERATIVO AMORIM NETO
DIRETOR FINANCEIRO ANTONIO GALVÃO
construtoraengeterra.com
JOÃO ERNESTO FIGUEIREDO PRESIDENTE A. DE ABREU PLÍNIO OSWALDO
DIRETOR REGIONAL EDUARDO FERREIRA ANTONIO HÉLIO ASSMANN
joaoefigueiredo@uol.com.br LAFRAIA
DE CURITIBA/PR GUERRA VIEIRA RENATO MATTOS ZUCCOLO
DIRETOR FINANCEIRO BERNARDO LEVINO VICE-PRESIDENTE ARLINDO VIRGILIO RICARDO ALBERTO
VICTOR BRECHERET FILHO MACHADO MOURA
FERNANDO BERTOLDI levinobernardo@gmail.com C. LA TERZA
CORRÊA SECRETÁRIA CAMIL EID RICARDO KENZO
DIRETOR REGIONAL DE TATIANA LOURENÇO
fernando@herjacktec.com.br MACHADO CARLOS COTTA RODRIGUES MOTOMATSU
WASHINGTON DC/USA
CARLOS EDUARDO ROBERTO BARTOLOMEU
DIRETOR DE TI CÍCERO SALLES ALFREDO EUGENIO BIRMAN BERKES
M. GONÇALVES
ABRAM BELK salles.cicero@gmail.com ALFREDO MÁRIO SAVELLI CARLOS PEREIRA DE ROBERTO KOCHEN
abram@tqs.com.br ANGELO SEBASTIÃO ZANINI MAGALHÃES NETO
DIRETOR REGIONAL DE RUI ARRUDA CAMARGO
SUPERINTENDENTE ESTOCOLMO/SWE ANTONIO MARIA CLARET CLÁUDIO A. DALL’ACQUA SONIA REGINA FREITAS
FELIPE SALGADO REIS DE ANDRADE CLÁUDIO ARISA
ADRIANO SILVÉRIO TOMAZ EDUARDO
felipesalgado.materiais@gmail.com BEATRIZ VIDIGAL XAVIER CLORIVAL RIBEIRO N. CARVALHO
superintendente@iengenharia.org.br DA SILVEIRA ROSA
DIRETOR REGIONAL DARIO RAIS LOPES TUNEHIRO UONO
ADMINISTRATIVO CARLOS COTTA RODRIGUES
DE LISBOA/PT DIRCEU CARLOS DA SILVA VICENTE ABATE
FINANCEIRO CARLOS PEREIRA DE
JOSÉ ANTONIO FÉLIX FILHO MAGALHAES NETO EDEMAR DE SOUZA VICTOR BRECHERET FILHO
SUELI CABALLERIA AMORIM
jfelixfilho@yahoo.com CLÁUDIO AMAURY
MESQUITA CONSELHO FISCAL
DALL’ACQUA EDGARDO PEREIRA
financeiro@iengenharia.org.br DIRETOR REGIONAL MENDES JR.
FERNANDO BRECHERET ALFREDO PETRILLI JUNIOR
DE BELÉM/PA EDSON JOSÉ MACHADO
VICE-PRESIDÊNCIA DE FLÁVIA BARTKEVICIUS CRUZ MARCELLO KUTNER
NELCI DE JESUS B.
ATIVIDADES TÉCNICAS FRANCISCO ARMANDO EDUARDO FERREIRA NELSON NEWTON FERRAZ
MARGALHO LAFRAIA
nelci.margalho@uol.com.br NOSCHANG CHRISTOVAM
VICE-PRESIDENTE GEORGE PAULUS ENIO GAZOLLA DA COSTA SUPLENTES DO
JERÔNIMO CABRAL DIRETOR REGIONAL PEREIRA DIAS ETTORE JOSÉ BOTTURA CONSELHO FISCAL
PEREIRA FAGUNDES NETO DE BRASÍLIA/DF HABIB GEORGES FERNANDO BERTOLDI DÉBORA SANCHES
jcmijs@terra.com.br WELLINGTON DE JARROUGE NETO CORREA DE A. MARINELLO

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Divisões técnicas

Premiação reconhece o
trabalho das Divisões Técnicas
O Instituto de Engenharia é atual- feitas pelos grupos de WhatsApp,

Fotos: divulgação
mente dividido em Departamentos seja nas reuniões técnicas, todo com-
e suas respectivas Divisões Técnicas partilhamento e troca de conheci-
(DTs), que compõem uma estrutura mento são bem-vindos.
organizacional com os principais Como forma de reconhecimento
segmentos da engenharia. a esses profissionais, há mais de 50
Os objetivos dessas áreas são o anos o Instituto de Engenharia reali-
estudo, o debate e a divulgação de za a premiação das Divisões Técnicas,
assuntos técnicos em geral, promo- no mês de dezembro, na comemora-
vendo o desenvolvimento e a quali- ção do Dia do Engenheiro.
dade de vida da sociedade por meio Segundo o vice-presidente de
da engenharia. Atividades Técnicas do Instituto de
Fazem parte dessa estrutura os Engenharia, Jerônimo Cabral, são participa ativamente; para nós, é
associados voluntários, que durante muitas as contribuições recebidas ao importante levar ao conhecimento
o ano desenvolvem atividades por longo do ano, todas focadas em pro- da sociedade estudos técnicos de
meio de palestras, cursos, seminá- mover o conhecimento, a pesquisa e relevância para o desenvolvimento
rios e debates inseridos nas princi- o aprimoramento de temas impor- do Brasil e da sociedade em geral,
pais iniciativas e programas do IE. tantes para a sociedade brasileira. e isso é possível participando da
Consideradas o “coração” da Casa, “Dentro do IE temos engenheiros premiação”, afirma.
as Divisões Técnicas também são e engenheiras que produzem estu- Em 2020, um dos protagonistas
a porta de entrada para o Instituto dos técnicos de altíssima qualida- da nossa festa pode ser você. Se não
de Engenharia. Qualquer associado de. Tanto para quem é associado ao é associado, venha fazer parte do
pode se candidatar a participar ativa- IE e está no dia a dia da Casa, quan- Instituto de Engenharia, ainda dá
mente das DTs. Seja nas discussões to para aquele associado que não tempo!

VEJA COMO PARTICIPAR


As inscrições dos trabalhos nharia.org.br, em língua portuguesa, – Melhor Trabalho Técnico do Ano;
para o prêmio são abertas no e estar acompanhados do currículo do – Melhor Trabalho do Ano Analisando
segundo semestre. Para parti- autor ou dos autores. Temas de Interesse do Setor Público;
cipar, os concorrentes deverão Conforme o Regimento das Divisões – Melhor Trabalho do Ano Analisan-
estar associados ao Instituto de Técnicas, Departamento de Engenharia do Temas Ligados ao Exercício da Pro-
Engenharia há pelo menos 90 dias. e Colegiado Técnico, poderão ser ins- fissão.
Os trabalhos deverão ser encaminha- critos até dois trabalhos por autor para Na ocasião, também são premiadas
dos ao vice-presidente de Atividades concorrer em cada uma das seguintes a Divisão Técnica mais Atuante e a com
Técnicas pelo e-mail: divtec@ienge- categorias: a Melhor Avaliação Qualitativa.
Divisões técnicas

Veja quais foram os trabalhos


técnicos premiados e as Divisões
Técnicas vencedoras em 2019
MELHOR TRABALHO DO ANO DIVISÃO TÉCNICA COM
ANALISANDO TEMAS LIGADOS A MELHOR AVALIAÇÃO
AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO QUALITATIVA
Situação da gestão de riscos na Divisão Técnica de Segurança do Trabalho
construção civil – Avanços e desafios Departamento de Engenharia do Ha-
Autor: Engenheiro Carlos Williams bitat e Infraestrutura
Carrion “Vocês não podem
se acomodar.
Tenham como
exemplo as Divisões
Técnicas que foram
Carlos Carrion (à esq.) – Melhor Trabalho
Da esq. p/ dir.: Theophilo Darcio premiadas, são
Guimarães e Jefferson Deodoro Teixeira
do Ano Analisando Temas Ligados ao da Costa recebem a premiação do pessoas que estão
Exercício da Profissão VP de Atividades Técnicas, Jerônimo
Cabral, de Divisão Técnica com a Melhor se atualizando
Avaliação Qualitativa – DT de Segurança
DIVISÃO TÉCNICA MAIS ATUANTE do Trabalho constantemente e,
Divisão Técnica de Estruturas PRÊMIO INSTITUTO DE também, ajudando
Departamento de Engenharia do Ha-
bitat e Infraestrutura
ENGENHARIA JORNALISMO no desenvolvimento
NACIONAL
Reportagem “Mantido ritmo, Brasil do Brasil"
vai atrasar em 30 anos meta de sa-
neamento universal” Eduardo Lafraia,
presidente do
Instituto de
Engenharia
Roberto Kochen, Natan Jacobsohn
Levental, Rafael Timerman e Thomas
Carmona recebem de Jerônimo Cabral
(2° à dir.), VP de Atividades Técnica, A jornalista da Folha de S. Paulo, Natália
a premiação da Divisão Técnica mais Cancian (à dir.) recebeu a premiação da
Atuante – DT de Estruturas vice-presidente Miriana Marques, que
também conduziu a cerimônia

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Divisões técnicas

PRESIDENTE – EDUARDO FERREIRA LAFRAIA

VICE-PRESIDENTE DE ATIVIDADES TÉCNICAS – JERÔNIMO CABRAL PEREIRA FAGUNDES NETO

DIRETOR PROGRAMAÇÃO

DEPTO. DE ENGENHARIA DE ENERGIA E TELECOMUNICAÇÕES DEPTO. DE ENGENHARIA DO HABITAT E INFRAESTRUTURA


Diretor.: Aléssio Bento Borelli Diretor: Roberto Kochen
Divisão de Geração e Transmissão Vice-diretor: Habib Georges Jarrouge Neto
Coord.: Antonio Lambertini
Divisão de Construção Sustentável e Divisão de Estruturas
Vice-coord.: Luiz Sergio Mendonça Coelho Assessor Especial.: Natan
Meio Ambiente
Divisão de Distribuição de Energia Coord.: José Manoel de Oliveira Reis Jacobsohn Levental
Coord.: Carlos Costa Vice-Coord.: Daniele de Coord.: Rafael Timerman
Divisão de Telecomunicações A. Villarim Lima Vice-Coord.: Thomas Carmona
Coord.: Flavia Bartkevicius Cruz Secretário: Henrique Dias de Faria Secretário: Douglas Couto
Vice-Coord.: Maria Vanessa Sobral Nonato Divisão de Engenharia Sanitária, Divisão de Geotecnia e Mecânica dos
Secretário: Ogelson Dias de Fonseca Recursos Hídricos e Biotecnologia Solos e Fundações
Coord.: Paula Fernanda Morais Coord.: Francisco José
Divisão de Instalações Elétricas Andrade Rodrigues
Coord.: Paulo Barreto Pereira de Oliveira
Vice-coord: Felipe Geribello F. Cabral
Secretário: Oswaldo Boccia Junior Divisão de Acústica
Secretário: Rafael Homem de Mello Coord.: Schaia Akkerman
Divisão de Controle e Automação
Coord.: Aurea Lúcia Vendramin Georgi Divisão de Segurança no Trabalho Vice-Coord.: Maria Luiza
Coord.: Jefferson D. Teixeira da Costa Rocha Belderrain
Vice-Coord.: Gabriela Caetano dos Santos
Vice-Coord.: Theophilo Secretário: Ricardo Santos Siqueira
DEPTO. DE ENGENHARIA DE ATIVIDADES INDUSTRIAIS E DE SERVIÇOS Darcio Guimarães

DEPTO. DE ENGENHARIA QUÍMICA


Divisão de Manutenção
Divisão de Equipamentos para Transporte de Carga e Urbano de Passageiros Vice-Dir.: Maurílio Luiz Vieira Bergamini
Divisão de Materiais
Coord.: Cláudio Ricardo Hehl Forjaz
Divisão de Equipamentos para o Agronegócio DEPTO. DE ENGENHARIA DE MOBILIDADE E LOGÍSTICA
Divisão de Equipamentos Automotores
Diretor: Ivan Metran Whately
Vice-Dir.: Neuton Sigueki Karassawa
Secretário: Fernando José de Campos Marsiglia
DEPTO. DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Diretora: Débora Sanches de A. Marinello Divisão de Transportes Divisão de Logística
Vice-Dir.: Constanzio Facci Ticeu Metropolitanos Coord.: José Wagner Leite Ferreira
Coord.: Flaminio Fichmann Divisão de Transporte Ativo
Divisão de Gerenciamento de Divisão de Patologias das Divisão de Trânsito Coord.: Reginaldo Assis de Paiva
Empreendimentos Construções Coord.: Maria da Penha P. Nobre
Coord.: Sérgio Luiz Azevedo Rezende Coord.: Stella Marys Della Flora Vice-Coord.: José Ignácio
Vice-Coord.: Vanderlei Coffani Sequeira de Almeida
Divisão de Avaliações e Perícias Vice-Coord.: Odair dos
Coord.: Ricardo Henrique Santos Vinagreiro
de Araujo Imamura DEPTO. DE ENGENHARIA DE AGRIMENSURA E GEOMÁTICA
Divisão de Informática
Vice-Coord.: Miriana Pereira Marques Diretor.: Miguel Prieto
Coord.: Marcelo Nonato Santos
Secretário.: Alfredo Vieira da Cunha Vice-Dir.: Aristeu Zensaburo Nakamura
Secretária: Miriana Pereira Marques Secretário.: Osiris Monteiro Blanco
Divisão de Qualidade e
Divisão de Engenharia de Incêndio
Produtividade Divisão de Cadastro Urbano e Rural
Coord.: Carlos Cotta Rodrigues
Coord.: Everardo Ruiz Claudio Coord.: Fátima Alves Tostes
Vice-Coord.: José Félix Drigo
Vice-Coord.: Tatiana Divisão de Sistemas de Informação Geográfica
Lourenço Machado Secretária.: Ana Paula de Coord.: Aristeu Zensaburo Nakamura
Camargo Kinoshita
Divisão da Planejamento e
Engenharia Econômica Divisão de Compliance
Coord.: Vitor Platero Distasi Coord.: Milene Costa Facioli
DEPTO. DE TECNOLOGIA E CIÊNCIAS EXATAS
Vice-Coord.: Rogério Carvalho Vice-coord.: Ricardo
Henrique de A. Imamura Divisão de Sistemas e Inovação
Ribeiro Nogueira
Secretária: Adriana Araujo Secretário: Wilson Abramovick Costa Coord.: Ricardo Luiz Martinez

DEPTO. DE ENGENHARIA DE AGRONEGÓCIOS


DEPTO. DE ARQUITETURA
Diretor.: Henrique José Boneti
Diretora: Ana Paula Capuano Vice-Dir.: Marcio Lacerda Gonçalves
Secretário: Olavo Suniga Secretário.: Paulo Bonini Boneti
Divisão de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural da Engenharia
Coord.: Fernando Bertoldi Corrêa DIRETORIA DE CURSOS
Vice-coord: Gilberto Ferraz Kfouri Diretor.: Marco Antonio Gulllo
Vice-Dir.: Eny Kaori Uono Sanchez

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Palavra do leitor

A controversa do a intensificação da desregulamentação


da indústria de energia elétrica visando um
revisão da mercado competitivo, inovador e totalmente
dedicado aos consumidores, cujos interes-
Resolução ses são o fator determinante para o êxito do
negócio.

Normativa Além das questões regulatórias, o avanço


tecnológico das diversas formas de obtenção

nº 482/2012
de energia e a redução dos custos destas tec-
nologias têm tornado a geração distribuída
mais vantajosa frente aos grandes sistemas
da Aneel centralizados.
A geração distribuída constitui uma im-
portante mudança no mercado consumidor
• Aléssio B. Borelli, Antonio Lambertini* de energia e provoca, ainda, alterações no
mercado de distribuição, por vários moti-

O
vos, a saber:
• Redução das perdas técnicas e aumento
Brasil, país de dimensões continen-
na eficiência;
tais, conta com um grande sistema
de energia interligado, marco de • Aparecimento de novas tecnologias inteli-
referência da engenharia nacional. gentes (do inglês, smart grid) que permitem
Nele, cerca de dois terços de toda a oferta é a flexibilização da GD e seu uso isolado;
originada em usinas hidrelétricas que se en- • Possibilidade de uso de insumos regio-
contram distantes dos grandes centros de nais para geração de energia;
consumo. Com o avanço de outras fontes de • Incentivo da GD ao uso de fontes alternati-
geração renovável, como a eólica e a solar, a vas;
composição da matriz de geração tende a se • Restrições técnicas e ambientais para a ex-
alterar de modo significativo a médio prazo, pansão do mercado de distribuição de ener-
particularmente considerando-se a geração gia;
distribuída (GD), objeto da Consulta Pública
(CP) nº 025/2019. • Aumento das exigências ambientais no
controle e na diminuição das emissões de
Com a exploração de geração hidrelétrica poluentes;
em larga escala no sistema interligado nacio-
nal e a expectativa de crescimento do merca- • Busca pela redução tarifária;
do consumidor, observa-se a necessidade de • Universalização do sistema elétrico, per-
implantação de novas alternativas de geração mitindo que as comunidades isoladas pos-
de eletricidade. Tais alternativas devem consi- sam ter acesso à energia;
derar a distribuição geográfica da produção, • Necessidade de sistemas elétricos mais
a confiabilidade e a flexibilidade da geração, resilientes.
a disponibilidade e os preços de combustí- Neste contexto, com o advento das instala-
veis, os prazos de instalação e construção, as ções domésticas, de micro e minigeração dis-
condições de financiamento e o licenciamen- tribuídas, principalmente pelo uso de placas
to ambiental, entre outros fatores. fotovoltaicas, a Aneel formalizou a Resolução
Em vários países do mundo está ocorren- Normativa (REN) 482/2012, que prevê a com-

12 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


pensação da energia injetada na rede de dis- • Diferenciar GD local de GD remota, tratan-
tribuição pelos consumidores que dispõem do a geração distribuída remota de modo
desse tipo de instalações e produzem em de- que permita a economia de escala nos in-
terminado momento mais energia do que sua vestimentos e que a GD local se utilize de
própria demanda (sistema net metering). mecanismos que possibilitem novos mode-
A metodologia adotada levou ao abatimen- los de negócio;
to de componentes da tarifa que têm caráter • Incentivar a expansão da GD, o que po-
de custo fixo, provocando uma redistribuição deria ocorrer por meio de aportes ou in-
dos custos entre os demais usuários da rede. centivos fiscais (prazos e volumes de recur-
Desse modo, gerou-se um subsídio implíci- sos definidos) para mitigar o impacto da
to para os consumidores que optassem pela revisão da REN 482/2012 em um período
geração distribuída e onerava-se, de maneira de transição;
injusta, os demais. • Implementar mecanismos de mercado
A agência reguladora, com a revisão da REN que permitam soluções sustentadas na ex-
482/2012, pretende acertar as distorções ori- pansão da GD como:
ginadas pelo sistema atualmente em vigor, o • Venda de excedente produzido, prin-
que decerto causa um desequilíbrio no pu- cipalmente nos grandes centros consu-
jante mercado de instalações de geração dis- midores;
tribuída, além de comprometer a importante • Viabilização de novas formas de asso-
contribuição que a energia gerada pode dar ciação entre consumidores e outras mo-
ao abastecimento da demanda nacional. dalidades de negócio, com o objetivo
A CP 025/2019 se propõe, então, a reduzir de auferir ganhos de escala;
os impactos adversos sobre os consumidores • Atribuição à GD de alguns benefícios
que não possuem mini ou micro GD, mas não que já existem para outros geradores,
apresenta alternativas para incentivar a ex- como os autoprodutores, por exemplo;
pansão da GD. Essa falta de incentivos deve • Utilização de incentivos semelhantes
reduzir as perspectivas de emprego para um aos empregados no Programa de Incen-
grande número de profissionais do setor nos tivos a Fontes Alternativas de Energia
próximos anos e também impactar de modo (Proinfra), que foram importantes para
negativo a produção da indústria de equipa- viabilizar a expansão da energia eólica,
mentos do segmento, além das áreas de ser- por exemplo.
viços correlacionados.
*Aléssio B. Borelli é diretor do Departamento de Engenharia de Energia
Com isso, nossa proposta é:
e Telecomunicações.
• Calcular o subsídio de forma explícita para *Antonio Lambertini é pós-graduado em energia pela USP e coordena-
cada distribuidora; dor da Divisão Técnica de Geração e Transmissão.

Textos para esta seção podem ser enviados para o e-mail: revistaengenharia@iengenharia.org.br

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Curtas

Descoberta de ressonância elétrica Projeto da Poli


nuclear pode revolucionar a ciência permite construir
Engenheiros quânticos da Univer- tações de átomo único sem a neces- ventiladores
sidade de Nova Gales do Sul (UNSW), sidade de qualquer campo magnético pulmonares a
em Sidney, Austrália, resolveram um oscilante para sua operação”, afirmou
enigma que foi sugerido pela primei- Andrea Morello, engenheiro quântico
baixo custo
ra vez em 1961. Eles conseguiram da UNSW.
controlar o núcleo de um átomo com Esses avanços podem ajudar no Pesquisadores da
campos elétricos. desenvolvimento de computadores e Escola Politécnica
“Essa descoberta significa que ago- sensores quânticos e revolucionar a (Poli) da USP de-
ra temos um caminho para construir física e a medicina, que utiliza a resso- senvolveram um
computadores quânticos  usando ro- nância magnética nuclear. ventilador pulmonar

Fabio Lage
mecânico de baixo custo
para ajudar no combate à Covid-19,
Engenheiros produzem máscaras doença causada pelo coronavírus.
O Inspire, como foi chamado o
em impressoras 3D aparelho hospitalar, poderá ser pro-
Inspirados em iniciativas de com- duzido de forma rápida e com menor

Divulgação
bate ao novo  coronavírus  em outros custo por fabricantes autorizados.
países, 16 pessoas, entre alunos de Enquanto um respirador convencio-
graduação, mestrado e professores de nal tem um preço mínimo de cerca
engenharia, desenho industrial e me- de R$ 15 mil, o projeto da Poli per-
dicina, trabalham no desenvolvimen- mitirá produzir o equipamento a um
to de máscaras do tipo face shield (es- valor em torno de R$ 1 mil.
cudo para o rosto, em tradução livre) e “Por suas características, o projeto
prolongadores de respiradores mecâ- irá viabilizar a construção de alguns
nicos, que tornam os equipamentos tamos produzindo a máscara com ABS, milhares de ventiladores a partir de
adaptados a serem utilizados por até o mesmo plástico que geralmente é três semanas e ter milhares produzi-
dois pacientes por vez.  utilizado na produção de painéis de dos em cinco semanas”, afirma o en-
Os protótipos das máscaras  foram automóveis, e que pode ser higienizado genheiro Raul Gonzalez Lima (foto),
testados por um grupo de médicos do e reutilizado várias vezes, sem nenhum coordenador de um grupo de cerca de
Hospital Universitário Antônio Pedro perigo”, diz o engenheiro Marcio Catal- 40 pessoas que estão envolvidas na
(Huap), em Niterói, Rio de Janeiro. “Es- di, um dos coordenadores do grupo. iniciativa.

Queniano cria luvas que convertem linguagem de sinais em voz


O engenheiro elétrico queniano Roy dedo e processam os sinais. A inspira-
Brett Eloff/Royal Academy of Engineering

Allela, 25 anos, criou luvas que conse- ção de Roy foi a sua sobrinha, que tem
guem converter a linguagem de sinais surdez congênita.
em som e facilitar a comunicação de Graças à invenção, Roy, que trabalha
pessoas com problemas de fala. para professores da Intel e da ciência
As luvas são conectadas a um apli- da informação na Universidade de Ox-
cativo via bluetooth, que vocaliza as ford, foi um dos 16 indicados ao prê-
letras, e possuem sensores flexíveis mio da Royal Academy of Engineering
que quantificam a dobra de cada Africa em 2019.

14 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


Estudo da CBIC Em home office, engenheiros da Nasa usam
trata dos efeitos óculos 3D para controlar sonda em Marte
da pandemia em
Sem acesso aos computadores

Pixabay
obras públicas poderosos da Nasa, por conta do iso-
lamento causado pela Covid-19, os
Freepik
engenheiros do Laboratório de Pro-
pulsão a Jato (JPL) em Pasadena, Ca-
lifórnia, voltaram a usar a tecnologia
3D de antigamente para navegar a
rover Curiosity em Marte.
Apesar de não serem tão realistas, sas funcionarem. Marte não está pa-
os óculos em azul e vermelho têm rado para nós; seguimos explorando”,
funcionado bem. “Essa é a essência da disse Carrie Bridge, a líder da equipe
Nasa. Nos deparamos com um proble- de operações científicas, em uma pos-
ma e descobrimos como fazer as coi- tagem no blog da agência espacial.

A necessidade de isolamento so-


cial, a indisponibilidade de materiais
de construção e o aumento de preço
deles afetaram significativamente
os contratos de obras públicas, cau-
sando a oneração de seus custos de
produção e, consequentemente, a
Decreto estabelece utilização
desaceleração ou a descontinuidade do BIM em obras públicas
de sua execução, segundo o estudo
“O impacto da pandemia do coronaví-

Pixabay
rus nos contratos de obras públicas”,
da Câmara Brasileira da Indústria da
Construção (CBIC).
“Uma série de medidas podem e
devem ser tomadas pelos contratados
e pelas administrações com vistas a
adequar o contrato às novas circuns-
tâncias, o que poderá abranger a
suspensão de sua execução, a repro-
gramação dos prazos, o reequilíbrio
econômico financeiro e até mesmo a
sua rescisão, em casos mais críticos”,
diz o advogado Fernando Vernalha,
responsável pelo parecer. O governo federal estabeleceu, por pelos órgãos e pelas entidades da ad-
meio do decreto nº 10.306, de 2 de ministração pública federal.
abril de 2020, a utilização do  BIM O decreto estabelece que a imple-
(Building Information Modelling)  na mentação se dará de forma gradual,
execução direta ou indireta de obras sendo que a primeira fase será inicia-
e serviços de engenharia realizados da em 1º de janeiro de 2021.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 15


Entrevista

“DEVEMOS

Arquivo pessoal
URGENTEMENTE
PRIORIZAR OS
INVESTIMENTOS”,
DIZ PAULO
FERREIRA,
ESPECIALISTA EM
SANEAMENTO Paulo Ferreira é professor da Escola de Engenharia da

BÁSICO
Universidade Presbiteriana Mackenzie

• Por Leandro Haberli ca de profissionais, pesquisadores e empre-

P
sas do setor.
Na conversa a seguir, Ferreira discorre so-
rofessor da Escola de Engenharia da
bre os principais entraves para o avanço do
Universidade Presbiteriana Mackenzie,
saneamento básico no país, como má gestão,
com mestrado e doutorado pela Esco-
crise fiscal e aperto nos cofres públicos.
la Politécnica da USP, o engenheiro civil
Paulo Ferreira já exerceu os cargos de secre- Ele também se debruça sobre a visão po-
tário-adjunto do Meio Ambiente do Estado lítica imediatista que viceja em parte signifi-
de São Paulo, diretor de Controle de Poluição cativa das autoridades brasileiras, argumen-
da Companhia Ambiental do Estado de São tando que ela inviabiliza os longos ciclos de
Paulo (Cetesb), secretário nacional de Sanea- investimento em saneamento de que o país
mento do Ministério das Cidades e coorde- necessita.
nador, superintendente e diretor técnico na Outro ponto importante é a descrição das
Companhia de Saneamento Básico do Esta- principais novidades em processos e tecnolo-
do de São Paulo (Sabesp).  gia de coleta e tratamento de esgotos, como
Nesta edição especial sobre saneamento o uso de membranas e nanofiltração.
básico, a Revista Engenharia fez uma entrevis- Ferreira analisa também questões-chave na
ta abrangente, que revela um pouco de sua área de abastecimento, que, com a coleta e
visão sobre o que leva o Brasil a ter metade o tratamento, formam o tripé do saneamento
da população sem acesso à rede de esgoto, básico. Dentre elas, destacam-se temas como
embora o país conte com a excelência técni- as perdas na rede de distribuição e a necessi-

16 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


dade de um plano de ocupação do solo, a ser "Temos capacidade e
seguido pelas diversas cidades do país.
condições de vencer
Este último aspecto contempla a questão
das enchentes nos grandes centros urbanos, esse desafio, mas
outro problema que o engenheiro aborda
usando seu cabedal técnico para expor for- precisamos de uma visão
mas que a engenharia, em suas diferentes es- política que garanta
pecialidades, pode contribuir.
O entrevistado ainda faz uma análise do a continuidade dos
novo Marco Legal do setor de saneamento
básico do país, em vias de ser aprovado no investimentos"
Congresso, que ampliou o caminho para os
investimentos privados no setor.
Para concluir, Ferreira sintetiza os principais
investimentos estratégicos feitos nas últimas
décadas no setor de saneamento básico do
estado de São Paulo, o mais rico do país, além
de apontar a importância da continuidade do
investimento no projeto de despoluição do DE FAVORECER O DESENVOLVIMENTO DO
rio Tietê.   SANEAMENTO NO BRASIL? 
  O saneamento no Brasil tem uma grande
SANEAMENTO BÁSICO CUSTA MUITO CARO capacidade técnica. Nossas empresas têm
E É COMUM OUVIRMOS QUE ESSE TIPO DE capacidade para acompanhar a evolução que
INVESTIMENTO NÃO GERA TANTOS DIVI- ocorre nos países mais desenvolvidos, incluin-
do o planejamento, os projetos, a fabricação,
DENDOS POLÍTICOS/ELEITORAIS. VOCÊ
a construção e a operação dos sistemas mais
CONCORDA? EM QUE MEDIDA ESSAS CON-
sofisticados. No campo de tratamento das
DIÇÕES ATRAVANCAM AS OBRAS DE SANE- águas têm sido implementadas diversas tec-
AMENTO DO PAÍS?  nologias, a depender da qualidade da água
Não concordo. Em pleno século XXI é uma a ser tratada, como as membranas e a nano-
falácia dizer que o saneamento, por ser um filtração, além de análises físico-químicas e
tipo de empreendimento que não aparece, bacteriológicas em laboratórios modernos.
não gera dividendos políticos. Há, evidente- No campo de tratamento de esgotos, a tec-
mente, alguns menos envolvidos com as as- nologia tem sofrido grandes e promissores
pirações populares, que desviam sua aten- avanços, que resultam em maior eficiência no
ção para outros interesses. O que trava os tratamento e na economia de energia, além
investimentos públicos  no saneamento é a de melhor qualidade nas fases líquida e sóli-
condição econômica que o país atravessa e da. Eles também propiciam o reúso da água
a crise fiscal dos últimos dez anos. e a obtenção de subprodutos da fase sólida.
Importantes desenvolvimentos têm ocorrido
nos processos construtivos das obras, dos
QUE TIPOS DE PROCESSOS, MATERIAIS, materiais plásticos e em suas diversas varian-
EQUIPAMENTOS E TÉCNICAS FORAM DE- tes, ferro dúctil e aço com tubos de parede
SENVOLVIDOS NO CAMPO DA ENGENHA- fina, e implicam em novos métodos construti-
RIA NOS ÚLTIMOS ANOS, COM POTENCIAL vos, como os diversos meios não destrutivos.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 17


Entrevista

MAIS DE 34 MILHÕES DE PESSOAS NÃO


"Se o Brasil pretende ser TÊM ÁGUA TRATADA NAS TORNEIRAS E ME-
TADE DA POPULAÇÃO NÃO POSSUI ACES-
desenvolvido, há que investir SO À COLETA DE ESGOTO. SANEAMENTO E
pesado na recuperação da ÁGUA TRATADA CHEGARÃO AOS BOLSÕES
MAIS POBRES?
capacidade técnica das nossas Esse desafio é imenso e esses fatos nos en-
consultorias. Caso contrário, vergonham. Temos capacidade técnica, em-
presas competentes, gestores experientes,
seremos meros caudatários mas falta-nos a necessária articulação políti-
ca para sensibilizar nossos governantes. Há
dos projetos de prateleira necessidade de ter visão de longo prazo e
existentes no exterior" investimentos constantes, não a visão imedia-
tista de inaugurar obras. Temos capacidade e
condições de vencer esse desafio, mas pre-
cisamos de uma visão política que garanta
a continuidade dos investimentos. Os muni-
cípios são extremamente dependentes de
repasses federais, e a verba por saneamento
QUAL É A IMPORTÂNCIA DA ENGENHARIA compete por recursos com outras áreas.
NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
DE SANEAMENTO? 
OS INVESTIMENTOS EM SANEAMENTO TÊM
Não há saneamento sem engenharia, nos
CAÍDO AO LONGO DOS ÚLTIMOS ANOS. A
seus diversos ramos: civil – especialmente
META PREVISTA NO PLANSAB [PLANO NA-
nas especialidades sanitária e ambiental –,
mecânica, elétrica, eletrônica, material e ar- CIONAL DE SANEAMENTO BÁSICO] DEVE
quitetura. Todos esses ramos representam as SER REVISTA?
áreas fundamentais para o desenvolvimento Não me parece que a meta do Plansab deva
do saneamento. O lamentável é que, com a ser revista. O que precisamos é quantificar os
crise de investimentos no setor, nossos pro- recursos necessários para atingi-la no tempo
fissionais se deslocaram para outros campos. que resta. Vamos ter que pagar o preço pelo
É o caso, em particular, das áreas de projetos, atraso que criamos. Ainda temos 13 anos
que representam a essência dos trabalhos para atingir a meta. Temos capacidade? Te-
de engenharia. Nesse aspecto, o prejuízo da mos prioridade? Estamos engajados, poder
redução dos investimentos no Brasil é de va- político e sociedade? Quão prioritário os ad-
lor incalculável. Tínhamos uma engenharia ministradores colocam o saneamento para as
consultiva de primeiro mundo, que acompa- populações sob sua gestão?
nhava pari passu o estado da arte do conhe-
cimento em saneamento. Se o Brasil preten-
de ser desenvolvido, há que investir pesado NA SUA OPINIÃO, O MAIOR PROBLEMA
na recuperação da capacidade técnica das PARA UNIVERSALIZAR O SANEAMENTO É A
nossas consultorias. Caso contrário, seremos FALTA DE INVESTIMENTO OU A GESTÃO? 
meros caudatários dos projetos de prateleira  São os dois. Ao solucionar o primeiro, o se-
existentes no exterior. gundo fica mais fácil.

18 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


"A correta disposição de
CRIADO EM 2013, O PLANSAB ESTÁ PRES- resíduos sólidos urbanos
TES A SER MODIFICADO. NA SUA OPINIÃO,
O QUE DEVERIA MUDAR? 
também ajudaria nas
Nada.  É muito comum, para postergar um consequências sanitárias
problema, criar condições para revisar o pla-
no. O que devemos, urgentemente, é priori-
das enchentes, e preservaria
zar os investimentos, a recapacitação técni- muito a qualidade das
ca, os novos modelos de gestão e caminhar
para frente. águas de nossos rios"

NO CASO DA CRISE HÍDRICA, UM DOS


GRANDES PROBLEMAS SÃO AS PERDAS NO
SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO, MUITAS VEZES
OCASIONADAS POR MATERIAIS DE TUBU- TEMPO POR DIFERENTES FATORES, COMO
LAÇÃO OBSOLETOS. QUAIS SÃO OS MA- ANOMALIAS NO CLIMA E ALTA CONCEN-
TERIAIS INDICADOS HOJE PARA REDES DE TRAÇÃO DA POPULAÇÃO. É POSSÍVEL SE
ABASTECIMENTO E COLETORAS? PREPARAR PARA EVITAR PASSAR POR CRISES
COMO AS QUE ACONTECERAM RECENTE-
As perdas em nossos sistemas de distribui-
ção de água realmente são muito grandes. MENTE EM SÃO PAULO, BRASÍLIA E RIO DE
Em primeiro lugar, devemos sistematizar o JANEIRO?
conceito de perdas para todo o território, Sim, é possível. A primeira providência é
usando o mesmo referencial, para poder fa- que as nossas cidades tenham um efetivo pla-
zer comparações e extrair resultados úteis. no de uso e ocupação do solo, o que evitaria
Há sistemas de distribuição com tubulações a ocupação desordenada das margens dos
muito antigas, que devem ser substituídas. córregos e rios, deixando-as para sua efeti-
Hoje temos materiais e métodos mais mo- va função de absorver parte das enchentes.
dernos do que quando elas foram construí- Não conheço nenhuma [cidade] no Brasil que
das. O Japão há muito tempo usa o aço ino- tenha um plano. A correta disposição de re-
xidável para as ligações domiciliares. Temos síduos sólidos urbanos também ajudaria nas
condições de pagar esse custo? É claro que consequências sanitárias das enchentes, e
há perdas que dependem somente de ges- preservaria muito a qualidade das águas de
tão, como as comerciais, os "gatos" etc. Estas nossos rios.  
devem ser atacadas sempre. Mas, primeiro,
temos que vencer nossas prementes neces- O NOVO MARCO LEGAL, QUE ESTÁ SEN-
sidades e atender as carências da população. DO DISCUTIDO NO CONGRESSO, PREVÊ
Num segundo momento, vamos atacar as ou- ABERTURA AO SETOR PRIVADO. COMO O
tras perdas, que serão uma prioridade inexo- SENHOR AVALIA ESSA MEDIDA, CONSIDE-
rável, pois são recursos desperdiçados que RANDO QUE O INVESTIMENTO PRIVADO
não podem ocorrer. ATINGE CERCA DE 6% DOS MUNICÍPIOS
HOJE NO BRASIL?
A CRISE HÍDRICA TORNOU-SE UM DOS PRIN- O novo Marco Legal, que está para ser edi-
CIPAIS PROBLEMAS URBANOS DO NOSSO tado, representa uma esperança para o se-

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 19


Entrevista

"Cada bilhão de reais


investido em saneamento OS INVESTIMENTOS PARA COLETA E TRATA-
MENTO DE ESGOTO, PRINCIPALMENTE, SÃO
gera 14,5 mil empregos MUITO ELEVADOS. COMO FAZER ESSES IN-
VESTIMENTOS SEM MEXER NAS TARIFAS?
diretos e 8,7 mil
O que é um investimento elevado? Os cus-
empregos indiretos" tos são definidos pela complexidade dos tra-
balhos em cada caso, pelo bom projeto, pela
correta construção, pela eficiente operação.
Quanto custam as internações hospitalares
por falta de saneamento? Os estudos do Ban-
co Mundial de, pelo menos, dez anos [atrás]
definiram o quanto se economiza em saúde
executando as obras de saneamento. A rela-
ção é um para quatro em água e de um para
seis em esgoto. Além disso, o saneamento é
tor. Há pontos importantes, como a abertura um grande gerador de empregos. Cada bi-
maior para a participação do setor privado. lhão de reais investido em saneamento gera
Sou otimista em relação a esse aspecto. Não 14,5 mil empregos diretos e 8,7 mil empre-
entendo a dicotomia de só público ou só pri- gos indiretos. Estimativas recentes indicam
vado. O setor tem capacidade e condições de que para universalizar o saneamento seriam
conciliar as duas condições. Há locais em que necessários 700 bilhões de reais em 13 anos,
é imperativa a participação do setor privado. o que propiciaria a geração de cerca de 800
Há outros em que a performance da empresa mil empregos diretos anualmente. Já a tari-
pública é eficiente e com bons resultados fa tem que expressar a capacidade de paga-
técnicos e financeiros. Nesses casos, se as em- mento da população e manter a economici-
presas atingirem as metas do Plansab, tanto dade do empreendimento. As camadas mais
faz para a população se empresa é pública ou desfavorecidas devem ser tratadas pelo go-
privada. O centro da questão, na minha opi- verno através de subsídio.
nião, reside num robusto e eficiente sistema
de regulação: modicidade tarifária, qualida- O ESTADO DE SÃO PAULO, O MAIS RICO DO
de dos serviços, eficiência operacional, atrati- PAÍS, INVESTIU PESADO NAS ÚLTIMAS DÉ-
vidade para a empresa privada e cumprimen- CADAS EM SANEAMENTO E DESPOLUIÇÃO
to de metas. Há situações em que o público e
DO RIO TIETÊ. NA SUA VISÃO, O QUE DEU
o privado convivem na mesma empresa. É o
CERTO E O QUE DEU ERRADO NESSA ES-
caso das PPPs (Participações Público-Privada),
que devem ser observadas com muito cuida- TRATÉGIA? COMO O CASO PAULISTA PODE
do, pois muitas vezes os propósitos iniciais AJUDAR NA ESTRATÉGIA DE AVANÇAR O
são distorcidos, com projetos inadequados, SANEAMENTO NO PAÍS?
operação deficiente e não cumprimento dos O Estado de São Paulo sempre teve uma vi-
compromissos.  são estratégica em relação ao saneamento. Na

20 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


década de 70, a Região Metropolitana de São
Paulo (RMSP) recebeu grandes investimen- "Não tenhamos ilusões:
tos, que culminaram com a entrada em ope-
ração do Sistema Cantareira e a implementa- mantidos os atuais níveis
ção dos planos de tratamento de esgotos. O
sistema financeiro do antigo BNH (Banco Na-
de investimentos,
cional da Habitação) foi o grande fornecedor
dos recursos e o Planasa (Plano Nacional de
levaremos ainda um
Saneamento) foi o norte do planejamento, es- bom tempo para ver
tabelecendo metas de performance. Na dé-
cada de 80 houve redução de investimentos, nosso principal rio da
mas no período 1995-2000 (governo Mário
Covas) a Sabesp, que apresentava situação RMSP despoluído"
financeira muito complicada, empreendeu
uma extraordinária revolução na gestão, aus-
teridade financeira e profundas alterações
administrativas e organizacionais, e apresen-
tou em curto prazo extraordinária capacidade
de recuperação, retomando os investimentos
e alterando a sua estrutura de capital, abrin-
do-se ao mercado de capitais. O Projeto Tie-
tê, que foi impulsionado pela sociedade civil,
especialmente pela ONG SOS Mata Atlântica
e pela rádio Eldorado, do grupo Estado de
São Paulo, fazia parte dos planos diretores de
esgotos da RMSP. O investimento que havia zemos hoje significa a retirada de cerca de
sido projetado na primeira fase, de cerca de 1 470 toneladas/dia de carga poluidora do rio
bilhão de dólares, foi executado e totalmente Tietê. Isso representa cerca de 37% do total
concluído, com a implantação de intercepto- estimado. É preciso lembrar dos percalços
res, coletores-tronco, redes e três Estações políticos que até recentemente nortearam
de Tratamento de Esgotos (ETEs) – ABC, São a visão estreita de alguns administradores
Miguel, Novo Mundo –, além da ampliação da RMSP, especialmente na região do ABC
da ETE-Barueri. Outra obra de importância e de Guarulhos, que só recentemente per-
fundamental, também concluída em dezem- ceberam o erro que estavam cometendo. O
bro do mesmo ano, foi o EM1 – Interceptor Pi- Projeto Tietê é uma aspiração da população
nheiros-Leopoldina e sua estação elevatória, de São Paulo, não só da RMSP, que não pode
com capacidade final de 16 m3/s. O que se ser frustrada. Mas não tenhamos ilusões:
pode criticar é que não houve a continuida- mantidos os atuais níveis de investimentos,
de dos valores investidos no período 95-99. levaremos ainda um bom tempo para ver
É um projeto de longo prazo, com grandes nosso principal rio despoluído. A lição que
investimentos. Se mantivermos a continuida- devemos aprender é que vale a pena investir
de, os resultados logo começam a aparecer. continuamente no saneamento, para o bem
O tratamento de 18 m3/s de esgoto que fa- do nosso desenvolvimento.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 21


Linha de Frente

“POR QUE NÃO HÁ TANTO


INVESTIMENTO PRIVADO NO
SANEAMENTO, COMO TEM NA
ENERGIA E NA COMUNICAÇÃO?
PORQUE NÃO TEMOS UM
MARCO REGULATÓRIO”
PEDRO RONALD MARANHÃO BRAGA BORGES, SECRETÁRIO NACIONAL
DE SANEAMENTO BÁSICO, FALA SOBRE O CENÁRIO E OS ENTRAVES
PARA AS MELHORIAS DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL

• Por Marília Marasciulo

L
inha Cristal, pequena vila de colonos A primeira lei com diretrizes nacionais para
italianos na Serra Gaúcha, precisava de o setor é do mesmo ano do filme de Furtado.
uma fossa para o tratamento de esgoto. Em 2013, o Plano Nacional de Saneamento
A prefeitura reconheceu a necessidade Básico, o Plansab, criou metas para alcançar
da obra, mas informou que não havia verba a universalização de saneamento até 2033.
para fazê-la. O que existia eram 10 mil reais Mas a realidade está muito distante disso. Se-
para a produção de um filme, sobra de um gundo a Confederação Nacional da Indústria
orçamento do governo federal, que, se não (CNI), um ano após a edição do plano, os ce-
fosse usado, seria devolvido. Os moradores nários estabelecidos ficaram obsoletos, muito
decidiram usar o dinheiro para fazer a obra e por causa das diferenças de índices previstos
rodar um filme sobre ela. de inflação e do crescimento do PIB – os an-
Essa história, na verdade, é o enredo do fil- tes R$ 304 bilhões de investimentos previstos
me “Saneamento Básico”, de 2007, do diretor em 20 anos se transformaram em ao menos
Jorge Furtado. Mas a ficção (ao menos a par- R$ 600 bilhões. No cenário atual, chegaría-
te da necessidade de obras de saneamento) mos à universalização do abastecimento de
se aproxima muito da realidade brasileira: água somente em 2043 e de esgoto em 2054.
segundo os resultados do último ranking de Para tentar reverter esse cenário, desde
saneamento, elaborado pelo Instituto Trata 2018, está em discussão a criação do cha-
Brasil e divulgado em março de 2020, o país mado novo Marco Regulatório para o sanea-
ainda tem 35 milhões de pessoas sem acesso mento básico. Um dos principais pontos do
à água tratada e mais de 100 milhões sem co- projeto é abrir caminho para a participação
leta de esgoto. da iniciativa privada no setor, ao exigir a obri-

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gatoriedade de haver concorrência nas con-

Divulgação
tratações de serviços na área. No fim de 2019,
o PL nº 4.162/2019 foi aprovado na Câmara e
agora aguarda votação no Senado. A seguir,
o secretário nacional de Saneamento Básico,
do Ministério do Desenvolvimento Regional,
Pedro Ronald Maranhão Braga Borges, fala
sobre o cenário do saneamento básico no
Brasil e o que deve mudar com o novo Marco
Regulatório.

OS RESULTADOS DO RANKING DO SANEA­


MENTO DO TRATA BRASIL MOSTRARAM
QUE OS AVANÇOS SÃO INSUFICIENTES
PARA QUE O PAÍS CUMPRA COMPROMIS-
SOS INTERNACIONAIS DE SANEAMENTO.
QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS ENTRAVES PARA
QUE O PAÍS MUDE ESSE CENÁRIO?
Os principais entraves são o orçamento e o
financiamento. Mas há também ineficiência,
que é muito grande, e isso inclui má gestão,
entre outras coisas que fizeram com que não
se avançasse no modelo que tínhamos. Isso
é antigo, vem de muitos anos. Veja a questão Pedro Maranhão defende o novo marco regulatório
da água, por exemplo. Ela é municipal, mas
criaram-se as empresas estaduais porque
muitos municípios não tinham condições. Só
A ATUAL CRISE PROVOCADA PELO NOVO
que boa parte dessas companhias perderam
CORONAVÍRUS ESCANCAROU A NECESSI-
a capacidade de investimento. E aí vai fican-
do um déficit, de ano para ano, que cada vez DADE DE SE LEVAR ÁGUA E ESGOTO PARA
vai aumentando. AS COMUNIDADES E PERIFERIAS. QUE ME-
DIDAS SERÃO ADOTADAS PARA RESOLVER
A QUESTÃO?
EM UM PAÍS CONTINENTAL COMO O BRA-
Primeiro, estamos organizando o setor. Se-
SIL, QUAIS OS MAIORES DESAFIOS EM IN-
gundo, teremos o Marco Regulatório, mas a
FRAESTRUTURA, LOGÍSTICA E GEOGRAFIA discussão atual não é mais nem levar água e
PARA IMPLANTAR AS MEDIDAS NECESSÁ- esgoto, a preocupação é como evitamos um
RIAS DE SANEAMENTO? colapso do setor, se todo mundo está dizen-
Precisamos de pelo menos R$ 600 bilhões do para não pagarem as contas. Isso é preo-
para atingir a universalização até 2033. O cupante. Até lá, quem tem água tem. Quem
principal é alavancar esses investimentos. O não tem, a gente está atendendo de acordo
maior déficit hoje está no Norte e Nordeste, com os recursos disponíveis. O trabalho con-
tanto na questão de resíduos sólidos quanto tinua o mesmo, avançando aos poucos, mas
nas de água e esgoto. O que tentamos é di- avançando. Por exemplo, foi liberado o orça-
recionar os investimentos para essas regiões mento agora para as obras voltarem, para não
mais carentes. ficar nada parado, isso tudo está sendo feito.

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Linha de Frente

"A falta de investimento nas


timentos, e organizaram mais o setor. Mas
empresas públicas fez com que por que não tem tanto investimento [priva-
do] no saneamento, como tem na energia e
cada ano fosse aumentando na comunicação? Porque a gente não tem
o déficit de água e esgoto um Marco Regulatório. Essas leis foram um
embrião, mas hoje, com o avanço das tecno-
tratados e destino adequado logias e aumento populacional, elas ficaram
ultrapassadas e é necessário um Marco.
para os resíduos sólidos"
POR QUE A NECESSIDADE, AGORA, DE
UM MARCO LEGAL PARA O SANEAMENTO
BÁSICO?
A falta de investimento nas empresas pú-
blicas fez com que cada ano fosse aumen-
tando o déficit de água e esgoto tratados e
destino adequado para os resíduos sólidos.
A necessidade de atrair capital privado torna
QUAIS MODELOS OU CASOS DE SUCESSO
importante um Marco para trazer segurança
GLOBAIS PODEM SERVIR DE INSPIRAÇÃO E
jurídica, fazer parcerias e avançar nas metas
SEREM REPLICADOS AQUI? do Plansab.
Existem vários modelos, mas cada lugar tem
uma forma diferente de fazer o saneamento.
Nós teremos uma reunião em breve com a PODE RESUMIR BREVEMENTE COMO O
Alemanha, com quem possuímos uma parce- MARCO FOI PENSADO E ELABORADO E O
ria, para discutir sobre as necessidades que QUE DEVE MUDAR?
eles têm lá e o que estão fazendo. Mas não Ele foi pensado justamente para atrair capi-
tem um case que seguimos, estamos tentan- tal de investimento. Os setores da infraestru-
do construir o nosso. Acreditamos que a par- tura de transporte, de concessão de estradas,
tir do Marco Regulatório teremos um avanço de rodovias, de postos e de energia foram
muito grande. privatizados ou fizeram parcerias públicas,
mas o saneamento ficou de fora. Porque o
saneamento não dá a segurança para um in-
ALÉM DA LEI DE SANEAMENTO BÁSICO,
vestidor colocar o capital. Hoje o saneamen-
APROVADA EM 2007, TEMOS TAMBÉM O
to é aproximadamente 96% público, só 4%
PLANO NACIONAL DE SANEAMENTO BÁSI- ou 5% são privados, e tem capital no mundo
CO, DE 2013. EM QUE PONTOS ELES ACER- para investir neste tipo de projeto. Mas não
TARAM E NO QUE FALHARAM? é investido porque falta segurança jurídica.
A legislação foi costurada durante 20 anos Isso não significa que o público vai ser substi-
e, quando finalmente veio, foi uma revolu- tuído pelo privado, eles vão caminhar juntos.
ção, porque não tinha nada. Foi um avanço Vamos buscar parcerias no que dá para fazer
muito grande. É como o Marco Regulatório junto. Não existe no mundo hoje uma cesta
está sendo hoje. Nesse início, essas foram as de investimento maior do que está se abrin-
primeiras coisas feitas na área de saneamen- do no Brasil. O capital está ávido para investir
to que deram certa segurança para os inves- no saneamento aqui.

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"Quando a empresa é
O PRINCIPAL PONTO DO NOVO MARCO LE-
GAL DO SANEAMENTO É A ABERTURA PARA eficiente, não importa se
A INICIATIVA PRIVADA. QUAIS OS ATRATI- ela é pública ou privada"
VOS PARA O SETOR PRIVADO INVESTIR EM
UMA ÁREA COM TANTOS DESAFIOS?
O principal atrativo é a segurança jurídica,
de que o investimento não vai correr risco
quando mudar o gestor público, ele pode fa-
zer um contrato de longo prazo. Porque no
setor esses contratos são de pelo menos 20,
30 anos, e o investidor não pode ficar a bel- Agora mesmo, para os contratos que vão ven-
-prazer de que quando mudar o gestor pú- cer agora, se as empresas cumprirem alguns
blico ele vá ter que renegociar. E o capital só itens de investimentos, de perdas, entre uma
vai aonde dá retorno. Hoje tem empresas no série de coisas, elas podem ter um novo con-
mundo inteiro que fazem isso, e eles se ba- trato por 30 anos.
seiam nelas. Aqui já temos empresas privadas
com concessões de água, esgoto e aterro sa- HÁ UMA TENDÊNCIA MUNDIAL DE REMUNI-
nitário que são de capital privado. CIPALIZAÇÃO DA GESTÃO DOS SERVIÇOS
DE SANEAMENTO BÁSICO, COM CERCA DE
E COMO FICARÃO OS ATIVOS DAS EMPRE- TREZENTOS CASOS EM CIDADES NA EU-
SAS QUE INVESTIRAM NO SETOR ATÉ HOJE? ROPA, AMÉRICA LATINA E ÁFRICA. O NOVO
Isso é uma discussão prolongada. Porque MARCO LEGAL DO SANEAMENTO NO BRA-
terá que ser feita uma avaliação pelo órgão SIL, PORÉM, PROPÕE O OPOSTO. QUAL
regulador, que será a Agência Nacional de O MOTIVO DA APOSTA NESTE CAMINHO
Águas (ANA), e aí a discussão vira quase que CONTRÁRIO?
comercial. É ver os ativos da empresa e ava- Nós não estamos no caminho contrário. Isso
liar se já foram remunerados ou não, se já es- [remunicipalização] está acontecendo em al-
tão com 10, 15 anos e não houve novos in- guns países, mas o que já ficou comprovado
vestimentos. Será uma discussão caso a caso. é que o setor público não tem condições de
Acho que não vai ter uma lei geral, porque o arcar com esses investimentos, tanto é que te-
Brasil é muito diferente e a questão é a auto- mos esse déficit todo por falta de investimen-
nomia municipal. A outorga é do município, tos do setor público no saneamento. Quando
faremos só a coordenadoria geral. a empresa é eficiente, não importa se ela é
pública ou privada. Nós temos alguns proble-
mas no Brasil, como a pobreza e o fato das
A PRIVATIZAÇÃO PODERÁ SER FEITA ATÉ
pessoas não entenderem que o saneamen-
QUANDO? O QUE VAI ACONTECER COM to deva ser remunerado, pois nunca foi. Isso
OS CONTRATOS ATIVOS? fez com que empresas passassem por muitos
Os contratos que estiverem ativos vão conti- problemas e perdessem a capacidade de in-
nuar. À medida que forem vencendo, abrem- vestimentos. E nossos exemplos de privatiza-
-se novas licitações. Isso ficará a cargo da ou- ção no país são de sucesso, nós temos essa
torga do município. Os contratos geralmente experiência já de que na área de infraestrutu-
são de 20, 25 anos, mas há alguns de 30 anos. ra a parceria-público privada vai muito bem.

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Linha de Frente

seja, pega a carne e o osso também. É meio


"No saneamento, estamos pejorativo, mas ajuda a explicar. Nos aero-
portos daqui, fizeram isso. Havia um conjunto
estudando a montagem de aeroportos e não era possível pegar só o
de blocos com municípios “filé-mignon”. Em São Paulo, houve um exem-
plo na questão dos parques. Quem pegou o
pequenos e grandes, dentro Ibirapuera também ficou com um parque lá
do Grajaú, ou da Vila do Carmo. É feito um
de um consórcio. E o que acordo no qual ganha aqui, aplica lá e, no fi-
nal, tem retorno ao capital. No saneamento,
ficar isolado, que não tiver estamos estudando a montagem de blocos
jeito, o poder público tem com municípios pequenos e grandes, dentro
de um consórcio. E o que ficar isolado, que
que ajudar e entrar" não tiver jeito, o poder público tem que aju-
dar e entrar. Não tem jeito.

OUTRO PONTO QUE É ALVO DE CRÍTICAS É


A DETERMINAÇÃO E O CONTROLE DAS TA-
OS CUSTOS PARA UNIVERSALIZAR O ACESSO RIFAS PELOS SERVIÇOS. EM PAÍSES COMO
AOS QUATRO SERVIÇOS DO SANEA­MENTO O REINO UNIDO, O MODELO PRIVADO FA-
É ESTIMADO EM CERCA DE R$ 508 BILHÕES, LHOU AO PERMITIR QUE AS TARIFAS FOS-
SEGUNDO O PLANSAB, NO PERÍO­DO DE SEM AJUSTADAS PARA MUITO ALÉM DA IN-
2014 A 2033. ALÉM DA INICIATIVA PRIVADA, FLAÇÃO. COMO O CONTROLE SERÁ FEITO
QUE OUTROS MEIOS O PAÍS PODERIA BUS- POR AQUI?
CAR PARA ARRECADAR ESSES RECURSOS? Isso será feito pelas agências reguladoras,
Muito difícil, não saberia nem responder. do mesmo modo que a tarifa de energia é dis-
Mais dinheiro é mais imposto, é complicado... cutida pela Agência Nacional de Energia Elé-
trica (Aneel), a do transporte é pela Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a
UMA DAS CRÍTICAS À ABERTURA PARA A do petróleo pela Agência Nacional do Petró-
INICIATIVA PRIVADA É A DIFICULDADE DE leo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). No
ASSEGURAR A HOMOGENEIDADE DA PRES- caso do saneamento, além da ANA, há várias
TAÇÃO DOS SERVIÇOS, HOJE JÁ BASTAN- agências nos estados, as subnacionais. São
TE DESIGUAL – NA DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA elas, em conjunto com a ANA, que vão discu-
TRATADA, ENQUANTO O NORTE TEM 57% tir e acompanhar essa questão tarifária.
DA POPULAÇÃO ABASTECIDA, NO SUDES-
TE, O PERCENTUAL CHEGA A 91%. COMO PELO NOVO MARCO, A AGÊNCIA NACIO-
GARANTIR QUE TODOS CHEGUEM A UM NAL DE ÁGUAS (ANA) PASSARÁ A REGULAR
PATAMAR DE EQUIDADE E QUE MESMO TODO O SETOR DE SANEAMENTO BÁSICO.
MUNICÍPIOS ISOLADOS OU MUITO PEQUE- O QUE VAI MUDAR NO PAPEL DA ANA?
NOS SEJAM ATENDIDOS DENTRO DESSE A ANA vai ter um papel fundamental, vai ser
NOVO MODELO? um órgão de parâmetro nacional. O que não
Temos vários exemplos de consórcios e blo- puder ser resolvido nas outras agências na-
cos que podem ser feitos, nos quais o inves- cionais irá para a ANA. E ela já está se organi-
tidor pega o que chamamos de “bisteca”, ou zando para isso. Ela vai pegar todo o setor de

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Divulgação
Controle de cheias na bacia do Rio Palmital, Pinhais – PR

saneamento, que será maior do que é hoje, e organizando essa parte de financiamento
então está se estruturando, aprovando mais para avançar nas metas.
cargos, mais funcionários e técnicos.

E, FINALMENTE, QUAIS AS PERSPECTIVAS


TEMOS EXPERIMENTADO, NOS ÚLTIMOS DE TRAMITAÇÃO E VOTAÇÃO NO SENADO?
ANOS, REPETIDAS CRISES DE ABASTECI-
HÁ ESTIMATIVA DE QUANDO O NOVO MAR-
MENTO DE ÁGUA E CRISES HÍDRICAS. COMO
CO SERÁ IMPLEMENTADO?
RESOLVER ESSES PROBLEMAS? QUE ALTER-
NATIVAS TERÍAMOS PARA A FALTA DE ÁGUA? Antes do coronavírus, estava combinado
para que se votasse em abril. Os senado-
Isso está sendo bastante estudado, mas o
res entenderam que não teriam que mudar
que se mostra muito fundamental é o reúso.
nada que alterasse o mérito, para não pre-
Há outras formas e alternativas de armazena-
cisar voltar para a Câmara. Se tivesse algo
mento, mas o reúso seria algo importante. É
para ser ajustado, seria feito através de ve-
uma questão também econômica. O investi-
dor pode pegar a água de reúso para ativida- tos ou de emenda de redação. Agora, com
des que não sejam para consumo humano e o coronavírus, não se sabe, mas isso é uma
destinar a potável só para consumo humano. prioridade. Idealmente, era ser aprovado
em abril para poder ir para a sanção presi-
dencial e começar logo. Por aqui, o minis-
O NOVO MARCO MANTÉM A META DE UNI- tro já criou comissões para avançar, porque
VERSALIZAÇÃO ATÉ 2033. O QUE SERÁ FEI- sabemos que 80% do que está no projeto
TO PARA GARANTIR QUE AS NOVAS PRES- será aprovado. Assim, no dia em que for
TADORAS CUMPRAM AS METAS? aprovado, já queremos estar com os decre-
Haverá muita fiscalização. Nós ficaremos tos prontos, com as regulações prontas e
em cima trabalhando, ajudando, fomentando não perder tempo.

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Balanço

DESPOLUIÇÃO DO
RIO PINHEIROS
SEGUE SEU CURSO
MESMO COM A COVID-19, OS INVESTIMENTOS E OS PRAZOS SEGUEM MANTIDOS
E OS TRABALHOS CONTINUAM OBSERVANDO TODAS AS MEDIDAS DE SEGURANÇA

• Por Marcus Ribeiro

A
s obras do projeto Novo Rio Pinhei- extensa se olharmos para as intervenções no
ros, que tem o objetivo de despoluir entorno do rio, com os seus córregos, linhas
o tradicional rio que corta a cidade de esgoto (muitas delas em construção) e as
paulistana e foi tema da reportagem comunidades que vivem em suas margens ou
de capa da edição 641 da Revista Engenha- mesmo interagem com as águas que rumam
ria (ver QR Code), já foram iniciadas e estão a para o Pinheiros.  
pleno vapor, mesmo diante dos desafios e da “Mesmo com a pandemia, seguimos com
paralisação de São Paulo e do mundo em ra- os contratos já em vigor e com as tratativas
zão da crise gerada pela Covid-19. Entretan- para a definição de novos contratos que se-
to, a expectativa de Marcos Penido, secretário rão licitados. Estamos em conversação com
de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado as empresas parceiras para que elas possam
de São Paulo, é de que a sequência do proje- fazer frente ao momento e tenham caixa para
to siga inalterada, bem como a sua conclusão seguir com os trabalhos”, aponta Penido. Dos
prevista para dezembro de 2022.  15 contratos de tratamento de esgoto previs-
Até lá, o território do rio Pinheiros, que tem tos no projeto, quatro estão em execução e
aproximadamente 25 quilômetros de exten- os demais ainda serão licitados. 
são, 85 metros de largura e 4,5 metros de pro- As  ações previstas de saneamento, de-
fundidade, será despoluído. Essa área é mais sassoreamento, coleta e destinação dos re-

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Divulgação
Acesse a edição 641
da revista Engenharia

do rio”, explica Penido. Isso completa as  es-


tações de tratamento de esgoto – com capa-
cidade de 180 mil litros a 360 mil litros – e
os coletores. Serão feitas, no total, 500 mil
ligações, das quais 80 mil eram irregulares,
clandestinas. Ao todo, serão 180 mil litros por
segundo de esgoto que estavam antes di-
recionados aos córregos e que agora fazem
parte do projeto. 
Marcos Penido, secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente Além da Companhia de Saneamento Bá-
do Estado de São Paulo sico do Estado de São Paulo  (Sabesp), que
cuida dos contratos de esgoto, outras em-
presas públicas estão operando de forma
coordenada no projeto, como as vinculadas
síduos sólidos, revitalização das margens e
à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambien-
educação ambiental vão beneficiar  3,5 mi-
te:  Companhia Ambiental do Estado de São
lhões de pessoas de forma direta, sem con-
Paulo (Cetesb), Departamento de Águas e
tar os demais paulistanos que trafegam pela
Energia Elétrica (DAEE) e Empresa Metropo-
Marginal Pinheiros, importante artéria de
litana de Águas e Energia (Emae), que reali-
transporte da cidade.
zam, respectivamente, a análise da qualidade
 Todas as obras do programa Novo Rio Pi- da água, o controle da vazão e o desassorea-
nheiros nas  sub-bacias  dos córregos Ponte mento e desaterro das margens do rio.  
Baixa/Socorro, Aterrado/Zavuvus, Pedreira/
Para Marcio  Rea, diretor-presidente da
Olaria e Corujas/Rebouças já se iniciaram e
Emae em exercício, o comando do secretário
estão dentro do cronograma previsto. Neste
Marcos Penido foi importante para esse pro-
último, estão em andamento obras para mo-
cesso de integração. “Foram adotadas me-
dernização e ampliação do sistema de esgo-
didas conjuntas que se tornaram um grande
tamento sanitário já existente.
diferencial do projeto e têm se mostrado o
Nas três outras sub-bacias, as obras vão am- ponto-chave para o sucesso do Novo Rio Pi-
pliar a coleta e o envio para o tratamento de nheiros”, garante. 
esgoto dos imóveis daquelas localidades.  O
Desde o início do projeto, a Emae, em par-
secretário aponta que como esses contratos
ceria com a secretaria, vem empreendendo
são por desempenho, por metro cúbico en-
ações para a revitalização do rio e de suas
caminhado para tratamento, as empresas têm
margens. O trabalho de retirada de detritos
sido velozes na execução para apresentar os
que chegam ao Pinheiros foi intensificado,
resultados, o que também explica por que os
alcançando a marca de 11.710 toneladas
trabalhos não serão parados. 
– contabilizadas do início de 2019 até o final
de março deste ano.  
Melhor água Isso foi possível com a adoção de  ecobar-
“As unidades de qualidade da água, na ju- reiras flutuantes, que contribuíram para maior
sante (o sentido de deslocamento da água) eficácia no trabalho de retirada. Todo esse
das comunidades, em áreas de ocupação ir- material tem como destino os aterros sanitá-
regulares, estão sendo feitas abaixo do leito rios oficiais. 

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Balanço

remos algo mais inteligente para que o lixo


Penido revela que não chegue ao rio Pinheiros, algo que possi-
está em conversa com bilite reciclagem e que não traga impacto em
dias de chuvas pesadas”, completa. 
a Associação Brasileira da De acordo com a Sabesp, além das obras
Indústria de Máquinas e estruturais de implementação de redes, inter-
ceptores e coletores-troncos, o projeto Novo
Equipamentos (Abimaq) Rio Pinheiros também inclui ações para en-
gajamento da sociedade. As iniciativas dessa
para a produção de soluções frente, cujo conteúdo é de trabalho social,
alternativas que evitem a prevê o relacionamento com a população
do entorno dos córregos, principalmente em
colocação de comportas nos áreas que ainda estão na informalidade. “Co-
locaremos pequenas caçambas nas comu-
córregos. “Queremos algo mais nidades, mas o trabalho casa em casa ex-
inteligente para que o lixo não plicando e educando ambientalmente será
importante”, admite Penido.
chegue ao rio Pinheiros, algo Em um primeiro momento, pré-Covid-19,
que possibilite reciclagem e foram feitas visitas de avaliação nas comu-
nidades. Em seguida, paralelamente ao tra-
que não traga impacto em balho de educação e conscientização, foi
realizada a ligação de esgoto, com base na
dias de chuvas pesadas” análise de viabilidade técnica.

Meio ambiente e futuro


A sensibilização ambiental é valorizada
também pelo projeto Pomar Urbano, com a
realização de eventos e campanhas que bus-
cam chamar a atenção da população para a
Soluções e inovações  necessidade de cada um cuidar do rio e de
seus afluentes. A Semana da Água de 2019
Também foi contratado o serviço de desas-
levou essa temática à população, assim como
soreamento do rio e desaterro de bota-foras.
ações como a expedição “Por uma São Paulo
Até o momento, já foram retirados 215.682 m³
Navegável”, que levou moradores de comu-
de desassoreamento e 351.237 m³ de desaterro,
nidades para navegar em um trecho do rio,
o que equivale a cerca de 33 mil caminhões. No despertando a consciência para o cuidado
total, devem ser retirados 1,2 milhão de metros com o meio ambiente. 
cúbicos de materiais do leito e das caixas de
 Outra ação prevista é a revitalização e a re-
bota-fora ao longo do Pinheiros até meados
qualificação  das margens, realizadas a partir
deste ano – um investimento de R$ 70 milhões. 
de estudos do material urbano, como o que
Penido revela que está em conversa com foi feito na antiga Usina da Traição – atual Usi-
a  Associação Brasileira da Indústria de Má- na São Paulo –, com a remoção e a mudança
quinas e Equipamentos (Abimaq) para a pro- de lugar dos transformadores  para que seja
dução de soluções alternativas que evitem a criada e entregue à população da cidade
colocação de comportas nos córregos. “Que- uma área de 17 mil metros quadrados. 

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Quando o processo de despoluição esti- projeção realista, mas, claro, depende da
ver concluído, o projeto deve evoluir para a credibilidade que poderemos passar para
requalificação e revitalização do entorno do os investidores. Temos que ter resultados
rio por meio de uma parceria público-priva- até lá no processo de despoluição. O mais
da (PPP), que pode gerar investimento de importante é que todos entendam que esse
R$ 1,2 bilhão. Essa etapa deve começar a é um projeto de governo, não de gestão”, fi-
sair do papel no início de 2021. “Essa é uma naliza o secretário.

A definição dos consórcios


São quatro os projetos cujos parceiros privados dos • Construtora Passarelli Ltda. (empresa líder)
consórcios de obras estão definidos:  • Vita Ambiental Comércio e  Prestação  de Serviços
de Engenharia Ltda.
 1º - Córrego Ribeirão Aterrado/Zavuvus: o primei-
ro contrato assinado está sendo executado pelo consór- • Companhia Brasileira de Projetos e Empreendimento
cio Verdagg, formado pelas empresas: Ltda. (Cobrape)
• Enops Engenharia S/A (empresa líder)  3º - Córrego Ponte Baixa/Socorro: está em anda-
• Vitalux – Ecoativa Projetos Sustentáveis  mento a implementação de coletores-troncos, em espe-
• Aliter Construções e Saneamento Ltda.  cial os do núcleo do Vale do Ribeira e do núcleo Petro-
bras/Felicidade.
• Globalsan Saneamento e Construções Ltda.
Depois de concluído, será possível realizar as interli-
• Gerentec Engenharia Ltda.
gações. No total, esse contrato fará a ligação de 14.773
• Construtora Rezende Ltda. economias.
• Deep – Juliana Almeida Dutra O programa Se Liga na Rede também está sendo im-
No total, esse contrato prevê a ligação de 15.869 eco- plementado e o projeto é executado pelo Consórcio do
nomias. Outras obras lineares também estão em anda- Ponte Baixa, formado pelas empresas:
mento, como redes coletoras de esgotos e interligações, • Vita Ambiental Comércio e  Prestação  de Serviços
além da implantação do programa Se Liga na Rede.  de Engenharia Ltda.
2º - Córrego Pedreira/Olaria: estão em andamento • Complexa Construções
a implementação do coletor-tronco Pedreira/Olaria e a • CRA Engenharia
execução de interligações. No local também está sendo • SR Consultoria
executado o programa Se Liga na Rede. 
O foco é a construção do coletor-tronco Pedreira/Ola- 4º - Córrego dos Corujas: estão em andamento a
ria e de suas interligações, para permitir que, em se- ampliação e a modernização do sistema de esgotamen-
guida, sejam realizadas as ligações do esgoto que vai to sanitário na região. O consórcio responsável é o Cole-
para tratamento. No total, o contrato prevê a ligação de tor Pinheiros, formado pelas empresas:
13.969 economias.   • Augusto Velloso
O projeto é executado pelo Consórcio Performance • Trail Infraestrutura
Sul, formado pelas empresas: • VAD

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Pingue-pongue

O MAIOR DESAFIO DO
NOVO RIO PINHEIROS É
LEVAR SANEAMENTO PARA
AS ÁREAS INFORMAIS

B
• Por Marcus Ribeiro

enedito Pinto Ferreira Braga Júnior, QUAIS AS AÇÕES PRINCIPAIS DESENVOLVI-


ou apenas Benedito Braga é um dos DAS PELA EMPRESA?
principais nomes do projeto de des- O desafio do projeto é implementar solu-
poluição do rio Pinheiros, Diretor- ções que garantam condição aeróbia no rio
-presidente da Companhia de Saneamen- Pinheiros. Para isso, definimos duas linhas de
to Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) atuação. A primeira é ampliar a coleta e o afas-
desde 2019, é graduado em engenharia civil tamento do esgoto gerado em 16 sub-bacias
pela Escola de Engenharia de São Carlos da dos córregos afluentes ao Pinheiros, para tra-
Universidade de São Paulo (USP) – e conhe- tá-lo na estação de Barueri, com a continuida-
ce profundamente o tema, pois é mestre de das ações estruturantes do Projeto Tietê e
em  hidrologia pela Universidade Stanford a intensificação de ações operacionais – es-
e em hidráulica pela USP, além de ser PhD copo dos 15 pacotes de licitação realizados.
em recursos hídricos, também pela Univer- Atualmente, estão em execução cinco contra-
sidade Stanford. Veja a seguir alguns deta- tos que atuam em sete sub-bacias: Pirajuçara,
lhes importantes da participação, de suma Ponte Baixa, Socorro, Corujas, Rebouças, Ater-
importância, da Sabesp no projeto. rado/Zavuvus e Pedreira/Olaria. Os demais
dez contratos já foram licitados e estão em
COMO A SABESP TEM TRABALHADO NO fase de formalização para assinatura e início
de execução nas próximas semanas. Em maior
PROJETO DE DESPOLUIÇÃO DO RIO PI-
ou menor escala, dependendo da situação
NHEIROS? de esgotamento sanitário de cada região, os
Estamos trabalhando para despoluir o Pi- contratos preveem a ligação de imóveis às re-
nheiros por meio de ações nas bacias hidro- des coletoras, a complementação de redes e
gráficas dos seus principais afluentes, com de coletores-tronco secundários para coleta
esgotamento sanitário e forte atuação para e condução do esgoto aos coletores-tronco
engajar a população das comunidades ca- principais, que estão conectados aos inter-
rentes, algo fundamental para o sucesso do ceptores construídos nas duas margens do rio
projeto. Essa é a parte de responsabilidade Pinheiros na segunda etapa do Projeto Tietê.
da Sabesp dentro do Novo Rio Pinheiros, Dentro dos contratos, estão previstos ainda
que é um projeto complexo e que englo- a varredura e o diagnóstico do sistema exis-
ba vários outros órgãos do governo, sob a tente para identificar e solucionar anomalias e
coordenação da Secretaria de Infraestrutura para melhorar o sistema operacional, além de
e Meio Ambiente.   ações de comunicação social. A segunda linha

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de atuação são as intervenções diretas em cór-

Divulgação
regos, com a implantação de unidades de re-
cuperação da qualidade da água de córregos
(URQ) para tratar o esgoto de áreas de ocupa-
ção irregular, onde ele acaba lançado nos cór-
regos porque a ocupação não deixou espaço
para a instalação da infraestrutura de coleta.
Estão previstas cinco URQ, que são objeto de
três licitações atualmente em andamento.

A OPERAÇÃO DA SABESP LIGADA AO PRO-


JETO SOFREU ALGUM TIPO DE PROBLEMA
POR CONTA DA PANDEMIA, SEJA EM RELA-
ÇÃO A PESSOAS, SEJA EM CONTINGÊNCIA
DE RECURSOS FINANCEIROS?
A Sabesp priorizou esse projeto e mantém
sua prioridade durante a pandemia. Temos
procurado diálogo com as empresas contra-
tadas no sentido de avaliar a situação de cada
contrato e enfatizar a importância da implan- Benedito Braga diretor-presidente da Sabesp
tação das intervenções, tanto com relação
aos reflexos na saúde pública como na gera-
QUANTAS PESSOAS SERÃO ATINGIDAS E
ção de emprego. A pandemia e a consequen-
QUAL A ABRANGÊNCIA DO PROJETO, NO
te quarentena provocaram, a princípio, dois
efeitos importantes e contraditórios de certa QUE DIZ RESPEITO À SABESP, NO TRABA-
forma. Por um lado, o contato necessário com LHO REALIZADO NO ENTORNO DO PRÓ-
a população ficou mais restrito. Por outro, as PRIO RIO PINHEIROS?
obras para implantação de redes e coletores Evitar que o esgoto chegue até o Pinheiros
nas vias públicas estão mais livres do tráfego e levá-lo para tratamento é algo que trará be-
e, portanto, podem fluir com menos obstácu- nefício não só para o rio Pinheiros em si ou
los, observando, é claro, todas as precauções para quem está próximo dele, em seu entor-
e recomendações do governo do Estado de no. Toda a população que vive em sua bacia
São Paulo e das autoridades de saúde na pro- será beneficiada, já que isso será bom para
teção dos trabalhadores. o meio ambiente, para a qualidade de vida
e para a saúde das pessoas. Estamos falando
em cerca de 3,3 milhões de pessoas, que mo-
O PRAZO PARA O TÉRMINO DO PROJETO
ram em locais abrangidos pela bacia do rio
SERÁ AFETADO POR CONTA DA PANDE- Pinheiros. É uma área de 271 km² que inclui
MIA? SE FOR, EM QUANTOS MESES? bairros nos municípios de São Paulo, Embu
O Novo Rio Pinheiros está planejado para ser das Artes e Taboão da Serra. As obras da Sa-
concluído em 2022. Estamos passando por um besp também vão movimentar áreas impor-
momento único no Brasil e no mundo. A situa- tantes da economia, com geração de empre-
ção causada pela pandemia deve ser avaliada gos em setores como a construção civil e a
dia a dia. A Sabesp está fazendo gestão diutur- indústria de materiais de construção. Só nas
na junto às empresas contratadas no sentido obras do Novo Rio Pinheiros serão cerca de
de manter o cronograma dos contratos. 3,7 mil empregos diretos e indiretos.

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Pingue-pongue

QUAL O MAIOR DESAFIO DO PROJETO? A O PASSO SEGUINTE DO GOVERNO DO ES-


NECESSIDADE DE MUDANÇA DE CULTURA TADO SERIA A DESPOLUIÇÃO DO RIO TIETÊ.
DAS PESSOAS COM O TRATO DO PRÓPRIO COMO ESSE PROJETO SERÁ DESENVOLVI-
RIO PODE SER A MAIOR BARREIRA? DO E QUAL O PRAZO PARA QUE ELE TERMI-
O maior desafio do Novo Rio Pinheiros é NE? O QUE É POSSÍVEL FALAR NO MOMEN-
levar saneamento para as áreas informais. A TO DOS PROCEDIMENTOS JÁ REALIZADOS?
cidade cresceu de forma desordenada ao Esse projeto já vem sendo desenvolvido:
longo dos anos e há ocupações irregulares o Projeto Tietê. O Novo Rio Pinheiros é par-
onde é praticamente impossível implantar te dele, já que o Pinheiros faz parte da bacia
um sistema tradicional de esgotamento sa- do Tietê e, naturalmente, a melhoria das con-
nitário. É difícil instalar tubulações nessas dições do Pinheiros terá impacto direto na
áreas, porque a ocupação sem planejamento qualidade do Tietê. Os dois são projetos de
não deixou mais espaço. Em alguns pontos, saneamento muito grandes e que vão trazer
as casas estão praticamente em cima do cór- benefícios para grande parte da Região Me-
rego. Outra questão é que a legislação bra- tropolitana. O Projeto Tietê existe desde 1992
sileira não permite que se implante infraes- e já trouxe benefícios diretos para 11 milhões
trutura de saneamento em áreas irregulares de pessoas, que passaram a ter o esgoto cole-
sem que haja autorização de órgãos compe- tado e tratado. É algo muito expressivo. Outro
tentes. Por isso, estamos adotando soluções resultado é a curva de tendência de redução
alternativas e inovadoras, como tratar a va- da mancha de poluição do rio nesse perío-
zão de esgoto nos afluentes com URQ. do no interior, na região do Médio Tietê, de
aproximadamente 70% ao que se via no início
OS PROJETOS E A IDEIA DE DESPOLUIÇÃO dos anos 1990. Esse resultado é decorrente
da infraestrutura construída nesse período, de
DO RIO EXISTEM HÁ DÉCADAS. QUAIS AS
4,5 mil quilômetros de coletores-tronco, inter-
RAZÕES PARA QUE O PROJETO ATUAL
ceptores e redes coletoras de esgoto, execu-
CONSIGA TER O EFEITO DESEJADO? O QUE ção de 1,8 milhão de ligações domiciliares de
ESSE PROJETO TEM DE DIFERENTE DOS AN- esgoto e quase triplicada a capacidade ins-
TERIORES? talada de tratamento, com a construção das
Eu destacaria a forma de contratação por ETEs ABC, Parque Novo Mundo e São Miguel
performance, que incentiva o empreende- e ampliação da ETE Barueri, maior estação da
dor a terminar a obra o mais rápido possível, América do Sul. No projeto já foram investidos
e a Sabesp pagando pelo resultado (DBO US$ 3 bilhões desde 1992 em grandes obras
dentro de padrões estabelecidos). Além dis- como a ampliação da Estação de Tratamento
so, na bacia do Pinheiros, o Projeto Tietê já de Esgoto Barueri e o Interceptor Tietê 7 (ITi-
entregou todo o sistema de interceptores 7), um supertúnel de 7,5 km de extensão por
nas duas margens do rio Pinheiros e grande baixo da Marginal Tietê, entregue em fevereiro
parte das redes coletoras e coletores-tronco deste ano. Antes da pandemia e consequente
principais. Isto possibilita que todas as obras crise econômico-financeira de nosso país e Es-
que serão complementadas agora sejam tado de São Paulo, a estimativa de se ter um
imediatamente conectadas a um coletor- Tietê aeróbio era o ano de 2030. Essa previsão
-tronco já construído, que está conectado ao poderá ser mantida ou revista em função da
interceptor, que irá conduzir o esgoto direta- recuperação econômica de nosso Estado nos
mente à estação de Barueri. próximos anos após a solução dessa pandemia.

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Ranking do saneamento

MELHORES CAPITAIS
EM SANEAMENTO
SÃO INSPIRAÇÃO
PARA O PAÍS
• Por Viviane Raimundi

E
m meio às dificuldades que a maior Enquanto a média nacional para o forneci-
parte dos municípios brasileiros en- mento de água encanada é de 83,6%, as três
frenta para universalizar o saneamento capitais se destacam por levar esse serviço a
básico para a população, os avanços praticamente 100% de seus moradores e ter
conquistados por algumas capitais podem bons indicadores de coleta de esgoto – Curi-
servir de inspiração para gestores país afora. tiba e São Paulo estão próximas da universa-
Em março deste ano, o Instituto Trata Bra- lização desse atendimento, e os indicadores
sil lançou o Ranking do Saneamento Básico de João Pessoa para o serviço estão bem aci-
2020, que traz a análise dos dados dos cem ma da média nacional. Na capital paraibana,
maiores municípios do país. Entre eles, as três 79,3% da população tem rede de esgoto, ao
capitais mais bem posicionadas são Curitiba passo que a média nacional é de 53,2%.
(PR), São Paulo (SP) e João Pessoa (PB), cida- Para chegar a resultados tão positivos em
des com realidades geográficas e populacio- comparação com o resto do país, as cidades
nais completamente diferentes, mas com al- têm estratégias específicas, mas todas tra-
guns indicadores similares. balham com planejamento a longo prazo e
O estudo foi elaborado a partir dos dados constância nos investimentos.
fornecidos pelos próprios municípios ao Sis- “A boa evolução dos indicadores sempre
tema Nacional de Informações sobre Sanea- envolve três dimensões – planejamento,
mento (SNIS – base 2018). regulação e operação. E há um ponto tam-
“Em comum, estas três capitais possuem bém: investimentos sendo feitos há muito
bons indicadores de atendimento de água tempo. Existem o planejamento, a regu-
e coleta de esgoto, mas ainda têm desafios. lação e a operação, mas também há uma
São Paulo e João Pessoa precisam melhorar constância em ter companhias saudáveis,
o tratamento do esgoto e todas ainda têm o que investem, e se preocupam com a ges-
desafio de diminuir as perdas de água”, expli- tão. Acho que os resultados são um pouco
ca o economista e pesquisador Pedro Scazuf­ desta combinação”, diz Scazufca. O sanea-
ca, do GO Associados, parceiro do Instituto mento básico das três capitais é gerenciado
Trata Brasil na elaboração do ranking. por companhias estaduais.

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Maurílio Cheli
Curitiba
A capital com os melhores índices é a do Pa-
raná. Desde 2011, Curitiba é apontada como a
melhor capital em saneamento básico do país.
Além da universalização do fornecimento de
água e da coleta de esgoto, 94,27% do esgoto
é tratado, mais do que o dobro da média na-
cional, que é de 46,3%.
“É uma longa história de planejamento”, afir-
ma o engenheiro civil Antônio Carlos Gerardi,
gerente-geral da Companhia de Saneamento
do Paraná (Sanepar) na Região Metropolitana
de Curitiba e litoral. Ele conta que os primei- Usina de captação solar Passauna em Curitiba, PR
ros sistemas de abastecimento de água e de
tratamento de esgoto de Curitiba foram inau-
gurados em 1908. Gerardi destaca que hoje
os investimentos nos sistemas seguem planos
diretores revisados e atualizados. “São planos
com horizontes de 30 anos”, diz. Os primeiros sistemas
O sistema de abastecimento de água é in- de abastecimento de
tegrado, atendendo 12 municípios da Gran-
de Curitiba. “O nosso sistema integrado tem água e de tratamento de
quatro grandes barragens [represas] e é com-
plementado por poços e um manancial super-
esgoto de Curitiba foram
ficial, o rio Miringuava”, explica Gerardi. Atual- inaugurados em 1908
mente, o sistema já é flexível, mas o diretor da
Sanepar afirma que o desafio da companhia é
ampliar ainda mais essa flexibilidade, melho-
rando a operação, ampliando os índices de
reservação e buscando permanentemente a
redução do índice de perdas. considerado um grande desafio para a com-
“Hoje, se há uma dificuldade de abasteci- panhia, avalia o gestor. A obra permitirá que
mento em uma região, eu posso atender por a capacidade da Estação de Tratamento de
outro sistema. Claro que com certas restrições Água (ETA) Miringuava dobre, melhorando
de transporte pelas adutoras, mas a rede é in- o abastecimento de parte de Curitiba e aten-
tegrada. No plano diretor que seguimos agora, dendo ao crescimento futuro da Região Me-
essa integração vai melhorar ainda mais. Esta- tropolitana. “A construção termina daqui um
mos também construindo uma quinta barra- ano e são necessários mais seis meses para
gem, que é a do rio Miringuava”, diz. Em áreas o enchimento do lago. A ETA Miringuava já
de invasão ou irregulares, onde é proibido le- existe, tem capacidade para tratar de 2 mil
var rede de água, por questões de saúde públi- litros por segundo, mas só trata mil litros por-
ca, são disponibilizadas torneiras comunitárias. que faz a captação apenas do rio”, diz. O in-
Finalizar a barragem do rio Miringuava é vestimento no projeto é de R$ 107 milhões.

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Ranking do saneamento

Na área de esgotamento sanitário, o muni- NÚMEROS DE CURITIBA


cípio também busca alcançar 100% de trata-
População – 1.917.185
mento. “Em 1980 foi inaugurada uma estação
de tratamento grande, a ETE Belém, que ain- Investimento em cinco anos – R$ 648,8 milhões
da funciona e está em processo de amplia- Atendimento de água – 100%
ção”, completa. A obra está sendo realizada Ligações ativas de água – 487.207
ao custo de R$ 63 milhões, com previsão de Economias ativas* – 816.585
entrega em 2021. A estação trata 1,5 mil litros Extensão da rede de água – 7.383,19 km
de esgoto por segundo e vai passar a tratar Atendimento de esgoto – 99,99%
2.520 litros. O projeto prevê a duplicação do
Ligações ativas de esgoto – 449.285
sistema de entrada e a implantação de quatro
Economias ativas de esgoto – 776.069
tanques de tratamento. Na década de 1990,
Curitiba chegou a ter 83 microssistemas de Extensão da rede de esgotos – 6.274,53 km
tratamento de esgoto. Ao longo do tempo, Esgoto tratado x água consumida – 94,27%
porém, esses sistemas foram desativados e * Economia é uma unidade autônoma de consumo. Pode ser
redirecionados para cinco estações de tra- de um único imóvel ou a subdivisão de um imóvel, caso de
tamento de esgoto, incluindo a ETE Belém, edifícios de apartamentos, por exemplo. Uma ligação de água
agora em ampliação. pode ter mais de uma economia

Fonte: SNIS 2018 e Ranking do Saneamento Básico 2020 do Instituto Trata Brasil

Ciete Silvério
São Paulo
A maior cidade do país é a segunda capital
mais bem posicionada no Ranking do Sanea-
mento Básico 2020. Mesmo com o forneci-
mento de água e a coleta de esgoto pratica-
mente universalizados, São Paulo tem desafios
gigantescos para superar, principalmente no
que diz respeito ao tratamento do esgoto.
“A cidade apresenta situações complexas,
como o crescimento desordenado ou a ocu-
pação irregular do solo. Sabemos que existem
ações a serem feitas, mas, se considerarmos a
grande dimensão da cidade e sua complexi-
dade, podemos dizer que temos alcançado
bons resultados”, avalia o diretor-presidente
da Companhia de Saneamento Básico do Es-
tado de São Paulo (Sabesp), Benedito Braga. Estação de tratamento de esgoto de Barueri, SP.

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central do município. O projeto beneficia di-
Dos recursos aplicados em retamente 350 mil pessoas e melhora o siste-
ma que atende diretamente 2,2 milhões de
obras de saneamento nas pessoas. O conjunto tem quatro obras princi-
pais: o Interceptor Tietê 7 (ITi-7), um supertú-
capitais brasileiras nos nel de 7,5 km de extensão, 3,4 m de largura e
últimos cinco anos, São 2,65 m de altura construído embaixo da Mar-
ginal Tietê; a Estação Elevatória de Esgoto Pi-
Paulo concentrou 47,7% queri; o novo Coletor-Tronco Anhangabaú; e
o Interceptor Tamanduateí (ITa-1J).
“Ambos são grandes projetos de saneamen-
to, que vão beneficiar não só a cidade de São
Paulo, mas boa parte da Região Metropolita-
na, com reflexos também em municípios mais
distantes”, afirma Braga.
Para o engenheiro civil, que também é mes-
tre em engenharia hidráulica e em hidrologia
e doutor em recursos hídricos, o grande de-
O gestor afirma que o resultado da capital safio da Sabesp na cidade de São Paulo é le-
paulista pode ser atribuído a uma série de var saneamento às áreas informais. “Além da
ações integradas, incluindo o reforço dos sis- dificuldade em si, em construir redes numa
temas de abastecimento e esgotamento e os área em que não sobrou mais espaço para
programas para levar água tratada e coleta isso, a legislação brasileira não permite que
de esgoto a quem não tem, como aos mora- seja implantado saneamento em áreas irregu-
dores de comunidades. lares”, lembra. A companhia busca soluções
A boa colocação no ranking também é alternativas, como o próprio projeto Novo Rio
atribuída ao grande volume de investimento Pinheiros e o Programa Água Legal, premiado
que a cidade tem recebido. Dos recursos apli- em 2019 pela Organização das Nações Uni-
cados em obras de saneamento nas capitais das (ONU). “Com permissão das autoridades,
brasileiras nos últimos cinco anos, São Paulo o programa faz ligações de água em regiões
concentrou 47,7%. A capital paulista está no de alta vulnerabilidade social, como as ocu-
topo do ranking em investimentos por habi- pações irregulares. Desde 2017, 115 mil liga-
tante, com R$ 173,30 per capita – atrás ape- ções de água foram regularizadas pelo Água
nas de Palmas (TO) –, 2,5 vezes a média nacio- Legal, o que beneficiou aproximadamente
nal (R$ 67,91). 400 mil pessoas”, relata.
O índice mais preocupante da cidade A regularização das ligações contribui para
apontado pelo ranking é o de tratamento de solucionar outro problema da maior cidade
esgoto: 64,66%. Segundo Benedito Braga, do país, a perda de água. “No ano passado,
para melhorar o indicador, São Paulo depen- registramos no município de São Paulo índice
de de grandes ações e investimentos, como o de 31,9%, dado mais atualizado do que o do
Projeto Tietê e o projeto Novo Rio Pinheiros. ranking [35,4%], que é de 2018. Temos desde
Recentemente, a Sabesp entregou um con- 2009 o Programa Corporativo de Redução de
junto de obras que faz parte da quarta etapa Perdas, que tem como objetivo reduzir as per-
do Projeto Tietê e contribui para a despolui- das de forma consistente e a longo prazo. Para
ção dos rios Tamanduateí e Tietê, ao levar isso, são feitas diversas ações de melhoria ope-
para tratamento o esgoto gerado na região racional e de manutenção, além de ações de

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 39


Ranking do saneamento

renovação e melhoria da infraestrutura, como


a troca de tubulações, ramais domiciliares e
hidrômetros, a inspeção das tubulações para João Pessoa
identificar vazamentos e fraudes e a redução A capital da Paraíba deu um salto no ranking
das pressões de operação”, lembra Braga. do Instituto Trata Brasil nos últimos anos. Em
Na área de abastecimento, o diretor-presi- 2017, a cidade estava na nona posição entre
dente da Sabesp destaca dois projetos que as capitais e, em 2020, passou para terceira.
melhoraram a segurança hídrica na capital e Entre as cem maiores cidades do país, o sal-
Grande São Paulo: o Sistema São Lourenço, to do município é ainda mais expressivo: da
que ampliou a oferta de água tratada em uma 42ª colocação para a 26ª. João Pessoa tem
área antes abastecida principalmente pelo a distribuição de água universalizada, mas
Sistema Cantareira; e a interligação Jaguari- ainda não levou a rede de esgoto a 100% de
-Atibainha, uma conexão entre duas represas seus moradores.
de bacias diferentes, a Atibainha (do Canta- A boa evolução dos indicadores, segundo
reira) e a Jaguari (na bacia do rio Paraíba do mostram os dados, é resultado da melhoria
Sul). Ambos os projetos entraram em opera- no trabalho de combate às perdas, tanto as
ção em 2018, contribuindo para o bom índice físicas – na distribuição de água – quanto as
da cidade no Ranking do Saneamento Básico de faturamento, bem como da expansão da
2020 do Instituto Trata Brasil. rede e tratamento dos esgotos.
Para se ter uma ideia, em João Pessoa, o
NÚMEROS DE SÃO PAULO índice de perdas de faturamento sofreu, em
População – 12.176.866 cinco anos, redução de 17,75%, alcançan-
do 21,02%, sendo que a média nacional é
Investimento em cinco anos – R$ 10.938,75 bilhões
37,6%. “Começamos a diminuir a perda de
Atendimento de água – 99,30% faturamento em 2015”, afirma o presidente
Ligações ativas – 3.130.232 da Companhia de Água e Esgoto da Paraíba
Economias – 4.993.136 (Cagepa), Marcus Vinícius Fernandes Neves.
Extensão da rede de água – 21.766,31 km “Ampliamos a instalação de hidrômetros, não
Atendimento de esgoto – 96,30% só colocando o equipamento onde precisava,
mas também trocando os com maior idade.
Ligações de esgoto – 2.755.478
Isso melhorou a eficiência. Fizemos uma me-
Economias de esgoto – 4.545.081
lhoria significativa na leitura, criando a leitura
Extensão da rede de esgoto – 17.531,73 km e a entrega simultâneas da conta. Tivemos um
Esgoto tratado x água consumida – 64,66% combate à fraude muito forte e conseguimos
Fonte: SNIS 2018 e Ranking do Saneamento Básico 2020 do Instituto Trata Brasil maior agilidade na cobrança dos inadimplen-
tes”, acrescenta o engenheiro civil, que tam-
bém é bacharel em direito e presidente da
Associação Brasileira das Empresas Estaduais
de Saneamento (Aesbe).
No combate às perdas físicas, a Cagepa im-
plantou em João Pessoa várias ações conjun-
tas e conseguiu, em cinco anos, uma redução
de 7,15%, chegando a 31,35%, valor inferior
à média nacional (38,5%). “Obviamente, é
uma questão que envolve a intensificação da
retirada de vazamentos. Implementamos me-

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79,3% da cidade, ou seja, pouco mais de 20%
da população pessoense não é atendida por
"A preço de hoje, precisamos tubulação de esgoto.
de cerca de R$ 1 bilhão para “Lógico que temos um desafio aí. A preço
de hoje, precisamos de cerca de R$ 1 bilhão
universalizar o esgoto em para universalizar o esgoto em João Pessoa”,
afirma o presidente da Cagepa, acrescentan-
João Pessoa", diz Marcus do que a zona sul da cidade ainda é carente
do serviço. A companhia, porém, pretende
Vinícius Fernandes Neves chegar a 81% do esgoto de João Pessoa tra-
tado em 2021. “A gente está ampliando a ETE
de Mangabeira, criando o quarto módulo de
tratamento. E prevemos a ampliação da ETE
lhorias nas estações de tratamento de água na divisa de João Pessoa com Conde, que vai
e ampliamos as equipes de monitoramento coletar a sede do município do Conde e boa
de rede. Num sistema via WhatsApp, criamos parte da região sul de João Pessoa”, diz. A
o grupo Feedback, que fica rodando onde expectativa é de que a ampliação da ETE de
tem vazamento e passando via radioescuta”, Mangabeira seja entregue em 2021, ao custo
exemplificou. de R$ 7 milhões. Além da ETA de Mangabeira,
A companhia também aposta na recupera- a cidade conta ainda com a ETE Baixo Roger.
ção de ativos da cidade. A ETA Marés, cons- A companhia também trabalha com ações
truída na década de 1970, por exemplo, está para combater ligações irregulares de esgoto.
recebendo investimento de R$ 5 milhões. “Em Na Campanha Praia Limpa, a Cagepa visita re-
Marés, estamos recuperando a estrutura física sidências para verificar se os esgotos estão li-
de concreto, fazendo toda a reformulação de gados corretamente à rede oficial. Além disso,
filtro e decantador (recuperação estrutural), a companhia investiu R$ 1 milhão na compra
refazendo todo sistema hidropneumático e de equipamentos como o JetScan, uma câme-
automação da estação, mexendo em quadro ra de vídeo para inspeção robotizada que per-
elétrico, para modernizar”, detalhou. mite a identificação de ligações clandestinas
Outra ação é a troca de redes antigas, de de esgoto com mais rapidez e eficiência.
ferro, por novas, de PVC. Além de combater
perdas, a troca de redes melhora o forneci- NÚMEROS DE JOÃO PESSOA
mento de água para toda a cidade. “Todo População – 800.323
ano a gente quer investir em João Pessoa em
Investimentos em cinco anos – R$ 131 milhões
torno de R$ 10 milhões em recuperação de
Atendimento de água – 100%
tubulação de rua. É substituição de rede ve-
lha, que tem seção mais fechada, com incrus- Ligações ativas de água – 206.994
tamento, e retirada de rede clandestina, com Economias – 277.718
a colocação da rede oficial”, diz. Extensão da rede de água – 1.030,55 km
Já na área que envolve cobertura e trata- Atendimento de esgoto – 79,30%
mento de esgotos, mesmo com ótimos avan- Ligações ativas de esgoto – 148.614
ços nos últimos anos, João Pessoa ainda tem Economias ativas de esgoto – 217.412
um longo desafio. Em cinco anos, a cober- Extensão da rede de esgoto – 649,53 km
tura foi ampliada em 7,54% e o tratamento,
Esgoto tratado x água consumida – 83,25%
em 12,44%. Hoje todo esgoto coletado na
cidade é tratado, mas a rede alcança apenas Fonte: SNIS 2018 e Ranking do Saneamento Básico 2020 do Instituto Trata Brasil

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Marco Regulatório

OS DESAFIOS DO
MARCO REGULATÓRIO
DE SANEAMENTO
• Por Juca Guimarães

Fotos: Pixabay
oferta de água de qualidade e o Pela proposta do governo, a Agência Na-
tratamento de esgotos são desafios cional de Águas (ANA), que atualmente é res-
para o desenvolvimento do país. Em ponsável pelos recursos hídricos do país, vai
2018, segundo os registros do De- assumir a gestão do setor criado pelo Marco
partamento de Informática do Sistema Único Regulatório.
de Saúde (DataSUS), foram 233 mil registros “Estamos nos preparando para fazer as nor-
de internações no SUS por conta de doenças mas de referência. É uma uniformização para
associadas à falta de saneamento básico. É ser seguida pelas agências subnacionais,
um panorama presente em todas as regiões dando maior previsibilidade para o mercado
do país. O Estado de São Paulo, o mais rico e maior robustez regulatória e segurança ju-
do país, registrou 7% do total de doenças re- rídica”, disse Chistianne Dias, diretora-presi-
lacionadas ao déficit de saneamento. dente da ANA.
O Marco Regulatório, em discussão no Con- O Marco foi criado com a participação de
gresso, pretende ampliar a participação dos in- entidades do setor e substitui duas tentativas
vestimentos privados para atingir as metas de anteriores, feitas por medidas provisórias,
cobertura dos serviços de saneamento básico. que caducaram antes de serem avaliadas
A iniciativa já foi aprovada na Câmara dos pelo Congresso.
Deputados e está em análise no Senado. Entre “Foram quase dois anos de conversa, des-
as principais mudanças estão a criação de uma de o governo Temer, para avaliar os pontos
agência reguladora federal e a divisão dos ser- do Marco Regulatório. Ele deve resolver mui-
viços de água e esgoto em blocos de cidades, tas das carências que existiam na lei anterior
onde poderão atuar empresas privadas, par- [11.445/07]. O saneamento precisa ter inves-
cerias público-privado e empresas estatais. timentos novos e uma nova linha de trabalho”,
Atualmente, os serviços são ofertados por disse Édison Carlos, presidente do Instituto
contrato de programa, que é negociado pe- Trata Brasil, uma das organizações que parti-
las prefeituras com companhias estatais ou ciparam da elaboração do Marco Regulatório.
com uma pequena parcela de empresas pri- No ano passado, segundo o Painel do Sa-
vadas. A fiscalização e a regulação são regio- neamento, acompanhamento feito pelo Insti-
nalizadas. tuto Trata Brasil, foram 2.180 mortes no país

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em decorrência da falta de saneamento. O ção ambiental, má qualidade na execução.
estudo também relaciona a falta de tratamen- Em São Paulo, por exemplo, algumas empre-
to dos esgotos com a desigualdade social. sas tiveram que paralisar as obras e a Sabesp
Nas áreas sem saneamento, a renda média é precisou fazer novas licitações, mas, no geral,
de R$ 501,21 e a escolaridade dos adultos, o PAC foi importante”, disse o presidente do
5,6 anos. Já nos locais com saneamento, a Instituto Trata Brasil.
renda é de R$ 2.328,50 e o tempo médio de Segundo um levantamento do Fundo das
educação formal, de 9,7 anos. Nações Unidas para a Infância (Unicef) com
O Marco Regulatório anterior foi criado no a Organização Mundial de Saúde (OMS), em
conjunto de propostas de desenvolvimento 1990, 17% da população brasileira não tinha
da infraestrutura do Brasil, no governo Lula, acesso a um banheiro. Em 2015, o percentual
com o Programa de Aceleração do Cresci- caiu para 2%. Pelos dados do Sistema Nacio-
mento (PAC). “Os investimentos do PAC fo- nal de Informações sobre Saneamento (SNIS),
ram importantes, alguns projetos estão em em 2018, 53% dos brasileiros tinham coleta
implantação. O Instituto Trata Brasil acompa- de esgoto e apenas 46% dos esgotos coleta-
nhou mais de R$ 22 bilhões de investimentos dos eram tratados.
em obras de saneamento por todo o Brasil. A privatização dos sistemas e a entrada de
Uma pena que nem todos os projetos foram empresas podem contribuir para a expansão
feitos, tiveram atrasos, problemas com licita- dos serviços, segundo o Instituto Trata Brasil.

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Marco Regulatório

“Têm empresas privadas operando com Várias cidades no mundo, como Paris, Ber-
lucro em municípios pequenos, com 10 mil lim, Atlanta, Joanesburgo, Buenos Aires, Ja-
ou 20 mil habitantes. Precisa ser revisto este carta, Kuala Lumpur, Indianápolis, La Paz, Val-
pensamento de que o saneamento não dá ladolid e Turim, que tentaram a privatização
lucro em cidades pequenas, depende do do setor de saneamento, acabaram voltando
sistema e da tecnologia. Existem estações atrás e reestatizando o serviço após a piora
compactas de água e esgoto, que são mais na qualidade de vida da população.
baratas do que as estações grandes, siste- Para Adalgisa, o Marco Regulatório como
mas individuais ou semicoletivos, que dis- está proposto tira a autonomia das prefei-
pensam a construção de grandes redes. A turas na escolha do melhor modelo de sa-
engenharia vem justamente para resolver neamento, que hoje é feito pelos contratos
esses problemas”, disse Carlos. de programa, além de poder acabar com o
A presidente da Associação dos Profissio- subsídio cruzado no valor dos serviços. “Mui-
nais Universitários da Sabesp (APU), Francis- tas cidades pequenas não têm como pagar
ca Adalgisa, aponta que o Marco Regulatório as obras de saneamento. Com a criação dos
pode gerar problemas por conta das privati- blocos de cidades o custo não poderá ser
zações. Ela cita como exemplo a privatização compensado entre os municípios maiores e
da Companhia de Saneamento do Estado menores, pois a lógica de mercado direciona
do Amazonas (Cosama), em 2000. “A estatal as empresas privadas para os segmentos que
foi comprada por uma empresa francesa que vão dar lucro”, disse.
não cumpriu os contratos, mesmo com di- Outro ponto destacado pela presidente da
versas alterações e ampliações das metas. O APU é a criação de novas tarifas para os serviços
exemplo de Manaus traz à tona uma série de previstos no Marco Regulatório. As empresas do
incertezas quanto à eficácia da privatização setor poderão atuar na coleta de lixo e na drena-
como meio de universalização dos sistemas gem da água das chuvas e cobrar por isso. “As
de abastecimento, coleta e tratamento dos pessoas terão que pagar por serviços que atual-
esgotos”, disse. mente já são pagos nos impostos”, disse.

Luiz Gonzaga Souza

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O que é o Marco Regulatório
Tentativas do governo Aprovação na Câmara
Em 2018, o governo federal editou duas medidas O governo, então, elaborou um projeto de lei que
provisórias, de vigência automática, com novas regras foi apresentado na Câmara dos Deputados no início de
para criar um sistema nacional de saneamento básico, agosto de 2019.
para melhorar a coleta e o tratamento do esgoto e os A proposta foi aprovada no final de dezembro de
serviços de fornecimento de água. Essas medidas per- 2019, com apoio de 53% dos parlamentares.
deram a validade porque não foram confirmadas pelo
Congresso Nacional.
A ideia do governo é ampliar modelos de privatização Discussão no Senado
e estabelecer metas de cobertura. As prefeituras não A proposta está no Senado, onde será discutida em
poderão fazer novos contratos para o setor. As licitações audiência pública e pode sofrer alteração no texto.
serão fiscalizadas por uma agência reguladora.

Entenda o caminho
Um projeto de lei precisa ser aprovado na Câmara dos Deputados, que tem 513 parlamentares, e no Senado, que
tem 81 senadores. Se o texto sofrer alguma alteração, ele precisa voltar para a casa legislativa anterior.

COMO ERA
1. Não existia um órgão nacional para fiscalizar
os serviços de saneamento básico no Brasil.
2. Empresas públicas regionais faziam a
gestão do saneamento. Empresas privadas
podiam fazer contratos de concessão ou
de serviços direto com os municípios.
3. As empresas de saneamento
eram responsáveis só pelas ações
do setor de água e esgoto.
4. A política de preços e serviços era
definida pelas empresas do setor. A
decisão sobre os recursos investidos no
setor dependia dos municípios e Estados,
por meio das agências reguladoras.
5. Não havia uma agência federal
para acompanhar a meta nacional e a
ampliação da cobertura dos serviços.

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Marco Regulatório

COMO FICA
1. Será criada uma agência reguladora para o
setor dentro da Agência Nacional de Águas
(ANA), que atualmente cuida da gestão
e do monitoramento dos projetos que
envolvem os recursos hídricos do país.
2. Empresas privadas e novas parcerias entre
empresas públicas e privadas poderão assumir
os serviços de saneamento e esgoto nas cidades.
3. O Marco Regulatório permite a criação de
projetos em algumas áreas de manutenção
e limpeza das cidades, como a captação
da água das chuvas, construção de aterros
sanitários, coleta de lixo, poda de árvores
e ampliação da rede de esgoto. 
4. Os novos serviços e o tratamento do esgoto
poderão ser tarifados com subsídios (preço
menor) para a população de baixa renda.
5. O serviço de saneamento poderá ser
regionalizado em blocos de cidades,
com metas de cobertura.

METAS
Até o final de 2033, a meta é de que 90% da população tenha coleta e
tratamento de esgoto e 99% da população do país receba água potável.
Em 2018, segundo o Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento,
53,2% da população teve o esgoto coletado, dos quais 42% foram
tratados; e 83,6% da população recebeu água potável em casa.
Ao todo, são 5.571 cidades no Brasil. Entre as 100 maiores cidades,
36 têm menos de 60% do esgoto tratado atualmente.

DADOS POR REGIÃO


(quem tem coleta de esgoto)
Norte 10,49%
Nordeste 28,01%
Sudeste 79,21%
Sul 45,17%
Centro-Oeste 52,89%
Fontes: Senado, Câmara dos Deputados, Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento e Instituto Trata Brasil.

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ENGENHARIA I

94 engenharia 639 / 2018 www.brasilengenharia.com


Estudos

REDUZIR A POLUIÇÃO
DOS RIOS PINHEIROS E TIETÊ

É POSSÍVEL
TECNOLOGIAS DISPONÍVEIS MELHORAM A QUALIDADE DAS ÁGUAS, ELIMINANDO
O MAU CHEIRO E REDUZINDO SIGNIFICATIVAMENTE A TURBIDEZ

• Por Cláudio Marques

C
omo as águas limpas, o passado glo- fedidos o maior tempo possível durante o
rioso dos rios Pinheiros e Tietê ficou ano e que seja possível haver alguma navega-
para trás. Já foram fonte de vida e ção com pequenos barcos, especialmente no
diversão. Hoje, encravados na pai- Tietê”, diz. Zuccolo lembra que mesmo o rio
sagem urbana da cidade, recebem grande Tâmisa, que corta Londres e passou por pro-
quantidade de esgotos e são mais conheci- cesso de despoluição, ainda exala mau odor
dos por suas águas escuras e poluídas e pelo em alguns dias do ano. “Mas foi feito um pro-
mau cheiro que delas exala. Mas a majestade jeto equilibrado, que permite andar de barco,
ainda não está totalmente perdida. O Pinhei- sem que haja um cheiro agressivo. Em Paris,
ros atravessa áreas que se tornaram nobres e aconteceu a mesma coisa: vê-se pessoas to-
valorizadas com arranha-céus no seu entorno mando sol às margens do Sena, mas ninguém
e ainda ilustra fotos de cartão-postal. se banhando.”
Renato Zuccolo, engenheiro civil, especialis- Vários estudos apontam ser possível reduzir
ta ambiental e um dos autores do livro “Águas a poluição e o fedor nos dois rios paulistas.
do Alto Tietê”, juntamente com Marco Anto- Um deles foi realizado pela Verus Ambien-
nio Palermo e Arnaldo Sergio Kutner, diz que tal, especializada em remediação ambiental,
é possível fazer muita coisa para melhorar os em parceria com a Engeform Engenharia,
rios. Com mais de cinquenta anos de experiên- que possui experiência na construção de es-
cia em engenharia sanitária, especialmente a tações de tratamento de água e esgoto e na
relacionada a águas pluviais, ele reconhece, interligação de represas. O trabalho atendeu
porém, as limitações existentes para aumentar ao chamamento público “Apresentação de
os investimentos em saneamento. Por isso, de- Tecnologias para Testes de Alternativas para
fende soluções equilibradas. Tratamento da Poluição canal Pinheiros”, feito
“Precisamos colocar o Pinheiros e o Tietê em 2013 pela Secretaria de Estado do Meio
em uma condição em que se tornem menos Ambiente.

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Fotos: arquivo pessoal Renato Zuccolo
Córrego Aricanduva canalizado, com faixa de área verde que
a população educada ambientalmente tem ajudado a manter
desde 1982, e "Fusca Rolha" obstruindo entrada de galeria de
aflluente da bacia do rio Pinheiros.

Metropolitana de Águas e Energia (Emae)


“O grande diagnóstico do rio Pinheiros é
na Usina da Traição, na zona sul da capital
que ele não tem oxigênio. E para restaurar a
paulista. Foram construídos seis canais expe-
vida no rio é preciso oxigenar. A nossa pro-
rimentais de 30 metros de comprimento, 1
posta foi, além de oxigenar o rio, acrescentar
metro de largura e 0,6 metro de altura cada
um remediador ambiental, que tem um pa-
um, destinados às empresas que atenderam
pel complementar na biodegradação. Hoje,
ao chamamento. À Verus/Engeform coube o
o rio é degradado principalmente por bac-
canal número 3. A vazão de entrada de água
térias anaeróbias, que liberam gás sulfídrico
do rio no canal era de 102,4 L/h, a fim de
e metano, que resultam no mau odor do rio”,
obter tempo de detenção hidráulico seme-
diz Renato Abucham, sócio-proprietário da
lhante ao do Pinheiros.
Verus Ambiental.
“O que nos propusemos fazer foi trans-
formar a biodegradação atual do rio de Ar e biorremediador
anaeróbia para aeróbia”, acrescenta. A bac- O trabalho consistiu na aeração e na apli-
téria anaeróbia não necessita de oxigênio cação do produto Accell 3, biorremediador
e luz para se reproduzir, diferentemente da fabricado pela empresa norte-americana
aeróbia. “Para esta bactéria aeróbia se mul- Advanced BioCatalytics Corporation, que,
tiplicar, comer aquela matéria orgânica que por sua vez, o desenvolveu em conjunto
está no rio, inclusive no lodo de fundo, é com a Universidade da Califórnia, em  Ir-
preciso oxigenar abundantemente”, explica vine. Licenciado pelo Ibama, o produto é
Abucham. Nesse processo, ela se reproduz biodegradável e, de acordo com Abucham,
mais rapidamente que a anaeróbica, absor- reduz fortemente a tensão superficial da
vendo matéria orgânica, ou seja, limpando água. “A sua tensoatividade é potencializada
o rio, sem deixar o mau cheiro resultante da por uma proteína que foi extraída de fermen-
degradação anaeróbia. to de fazer pão, chamada de Saccharomyces
O teste feito naquele ano pela Verus/Enge- cerevisiae”, diz Abucham.
form teve duração de trinta dias e foi exe- Para avaliar a eficácia das tecnologias, fo-
cutado em uma área cedida pela Empresa ram feitas a coleta e a análise em sete pontos

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Estudos

do canal. Para aeração, foram instalados dois


difusores de bolhas de ar, com vazão máxima O relatório aponta que o
de 0,110 m³/min em dois pontos do canal. A nível de oxigênio disponível
solução de Accell 3 foi dosada na entrada do
canal e operou continuamente a 5,2 mL/min. (OD) ficou acima da exigência
durante todo o teste
Oxigênio e turbidez
De acordo com as empresas, o canal expe-
rimental permitiu a reprodução de diversos
nitrogênio amoniacal, sendo convertido em
aspectos inerentes ao fluxo do rio Pinheiros. O
nitrito (NO2) e nitrato (NO3). “Uma eficiência
resultado, segundo o relatório feito pela Enge-
de 58,40% na conversão”, segundo o relatório.
form, foi que a quantidade de oxigênio dissol-
Outro resultado relatado aponta que a toxida-
vido (OD) obtido no canal foi de  5 mg/L, mais
de do rio se manteve estável.
do que o dobro exigido, enquanto nas águas
coletadas nos afluentes do canal a quantidade As empresas afirmam que foi observada
de OD era próxima a 0 mg/L em quase todo o uma redução de 95,21% de sulfeto no efluen-
período de teste – somente em uma ocasião te final em relação à concentração presente
chegou a 1mg/L. A recomendação legal de nas águas provenientes do rio. A diminuição
OD em rios classe 4, como o Pinheiros, é de foi registrada já nos primeiros 15 metros do
2 mg/L. O relatório aponta que o nível de OD canal, resultando na ausência de mau cheiro.
ficou acima da exigência durante todo o teste. “Começamos os testes em uma segunda-fei-
ra e já na quinta-feira não havia mais o cheiro
Em relação à turbidez, foi obtida uma redu-
ruim”, afirma Abucham. O sulfeto, ou gás sulfí-
ção média de 70,7% nos primeiros 15 metros
drico, é o responsável pelo mau cheiro do rio.
do canal e redução global de 72,6%. Quanto
Outro dado apurado refere-se à redução mé-
aos sólidos suspensos totais e sólidos sus-
dia de 69% de surfactantes no efluente final,
pensos volúveis, houve redução de 70,87%
um resultado capaz de impedir a formação de
e 43,54%, respectivamente. Segundo o rela-
espuma no rio.
tório, houve boa capacidade de remoção de
sólidos, o que também se refletiu na baixa da
turbidez apresentada ao longo do período de Tensão superficial
testes. O relatório final sobre os testes também
Durante o teste, o pH da água ficou entre destaca que a redução de concentração de
7,51 e 7,81, dentro do intervalo exigido pelo nitrogênio registrada indica menor potencial
Conselho Nacional do Meio Ambiente, que de eutrofização (crescimento de plantas aquá-
é de 6 a 9. Outro dado apurado foi o índice ticas) e ressalta que a redução da tensão su-
de carbono orgânico total (COT). Trata-se de perficial do rio impediu que mosquitos pou-
um parâmetro para avaliar a contaminação sassem na água do canal experimental.
da água por impurezas orgânicas. Segundo o “Reduzir a tensão superficial permite que os
texto do relatório, “com a aplicação do Accell gases se dissolvam mais no rio – inclusive os
3 nas águas poluídas do rio Pinheiros, obtive- odoríficos, que vêm do lodo de fundo – e deixa
mos redução de 54,7%”. o oxigênio mais presente, em maior concentra-
Ao mesmo tempo, a taxa de fósforo ficou es- ção, dentro do rio. O ar da superfície entra mais
tável, sem variações significativas ao longo do fundo, porque há menos resistência. Começa a
canal e na saída dele. De acordo com o texto, criar uma camada aeróbia na parte de cima do
observou-se também significativa redução do rio, sem ter que gastar energia para aerar”, diz

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Abuham.  O aumento da degradação da maté-
ria orgânica foi da ordem de 54,7%.
Com base nos resultados obtidos, a conclu-
são do estudo é a de que o uso do produto
em conjunto com a aeração traz benefícios
ambientais. “A ausência do mau odor, o bai-
xo potencial de assoreamento, a significativa
redução na concentração de sólidos e bai-
xíssima turbidez asseguram, integralmente,
a destinação das águas do rio Pinheiros para
navegação e harmonia paisagística, conforme Mutirão popular para construção de canalização
determinado para os rios classe 4, na seção I
item V da Resolução Conama 357”, diz o texto.
diz João Carlos Gomes de Oliveira, da DT En-
genharia.
Despoluição com flotação “A segunda etapa de despoluição do Canal
A ideia de despoluir o Pinheiros continua Pinheiros com escoamento natural para o rio
em pauta. Em dezembro passado, a Secretaria Tietê consiste no tratamento 6,2 m³/s, contem-
de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado plando projeto, implantação e operação de
fez um novo chamamento com esse objetivo. quatro UTRs Flotflux nos principais córregos
Em resposta, a DT Engenharia apresentou um afluentes do Canal Pinheiros Inferior (Dreno
projeto de flotação por meio de sua tecnolo- do Brooklin, Morro do “S”, Zavuvus e Pedreira)
gia Floatflux. A empresa tem mais de quarenta e sete TRs nos córregos de menor vazão, com
anos de experiência no desenvolvimento de bombeamento para as UTRs mais próximas,
tecnologias patenteadas e já participou de propiciando a despoluição de toda extensão
testes no rio com a mesma finalidade. Atua do Canal Pinheiros.”
nos segmentos de saneamento, meio ambien- A empresa esclarece que a colocação dos
te, entretenimento e recreação, além de cons- equipamentos nos córregos afluentes segue
trução civil. a opção do governo do Estado.  No entanto,
Flotflux é um processo de flotação em flu- de 2007 a 2010, a DT Engenharia participou
xo utilizado para diversas finalidades, como a de um teste com Floatflux no Pinheiros e, di-
despoluição de corpos hídricos, o tratamento ferentemente do projeto agora proposto, as
de água e esgoto e a criação de parques bal- UTRs  foram instaladas dentro do próprio rio,
neários, conforme informação obtida no site em trecho de cinco quilômetros na região de
da empresa. Interlagos, conforme o que foi solicitado na
“A primeira etapa de despoluição, com es- época. O objetivo era efetuar o tratamento da
coamento natural para o rio Tietê, consiste no vazão total do rio com bombeamento para a
tratamento 3,9 m³/s, contemplando projeto, represa Billings. De acordo com a empresa, fo-
implantação e operação de duas unidades de ram obtidos bons resultados.
tratamento de rio (UTRs) Flotflux, nos principais “Com relação aos testes já realizados no rio
córregos afluentes do Canal Pinheiros Inferior Pinheiros em escala 1:1, com vazões de trata-
(Jaguaré e Pirajuçara) e de quatro tomadas de mento de até 18.000 L/s, os resultados obti-
rio (TRs) nos córregos de menor vazão (Belini, dos foram excelentes, como ficou evidencia-
Corujas, Verde I e Verde II), com bombeamen- do, por exemplo, pelos relatórios da Cetesb e
to para as UTRs mais próximas, propiciando a da Fundação Centro Tecnológico de Hidráuli-
despoluição de boa parte do Canal Pinheiros”, ca (FCTH) da USP”, afirma o texto.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 51


Estudos

reduções da turbidez, nos processos de flota-


Outros ganhos seriam a ção com ar ambiente e com oxigênio foram
das mesmas ordens de grandeza e, na maioria
redução do nível de toxicidade dos dias, superiores a 90% com valores má-
da água e a diminuição ximos na faixa dos 97/98%”. Em outro trecho
afirma que a redução média das concentra-
da poluição na Billings se ções de fósforo foi de 96,60% na flotação com
ar ambiente e de 97,40% na flotação com oxi-
houver necessidade de um gênio. Essa redução impede a proliferação de
eventual bombeamento do algas no rio. A DT afirma que, de acordo com
os testes, a remoção de E. coli foi de 99%.
Pinheiros para lá como forma
de controle de cheias Previsão
Com base na sua experiência, a DT afirma
que o projeto agora apresentado ao gover-
no pode trazer diversas vantagens, entre elas
a saturação e até a supersaturação de oxigê-
Dados históricos nio dissolvido na água, evitando as reações
Segundo a empresa, as concentrações de anaeróbias causadoras do odor e “permitindo
oxigênio dissolvido (OD) obtidas ficaram pró- o retorno da macrovida aquática”, e a redução
ximas a 5 mg/L, como exigido. Um relatório da significativa da quantidade de E. coli, o que,
Cetesb afirma: “O Reservatório Billings acusou conforme a empresa, “confere à água tratada
melhora do IQA devido à reversão de parte qualidade, com alternativa até de possibilida-
dos esgotos domésticos de sua bacia de dre- de de balneabilidade”. O tratamento também
nagem, bem como aos testes do sistema de promove a remoção de sedimentos antes
flotação do rio Pinheiros, que operou entre de chegarem ao canal do Pinheiros em con-
2007 e 2009”. sequência da instalação de caixas de areia a
Em outro relatório, referente a 2007, ano ini- montante nos córregos afluentes.
cial do projeto, a Cetesb já apontava que “os Outros ganhos seriam a redução do nível
dados apresentados mostraram-se eficientes de toxicidade da água e a diminuição da
na redução de fósforo total e da turbidez”. poluição na Billings se houver necessidade
Também dizia que os níveis de nitrogênio de um eventual bombeamento do Pinheiros
amoniacal caíram em 24% para 13mg/L, aten- para lá como forma de controle de cheias.
dendo aos padrões estabelecidos. Haveria também aproveitamento das águas
De acordo com a DT, em 2013, ela participou do canal Pinheiros e seus afluentes para reú-
de outros testes por sessenta dias envolvendo so urbano em indústrias, irrigação, lavagem
o rio Pinheiros. Com relação aos resultados, de ruas, avenidas, praças, entre outros, além
o Diário Oficial do Estado publicou em 18 de de um eventual uso das águas para navega-
março de 2014, na página 41, que a remoção ção recreacional e de transporte público, “in-
de sulfetos (gás sulfídrico) foi total. “Embora clusive com a instalação de intermodais junto
as concentrações de entrada não tenham sido às estações de trem”.
elevadas, as de saída, durante toda a fase de A apresentação ainda menciona a redução
testes, ficaram abaixo do limite de detecção da concentração de poluentes no rio Tietê e
do método analítico”, diz a publicação.  da mancha de poluição no interior do Estado,
Ainda de acordo com o exposto no D.O.: “As em consequência da diluição da poluição pe-

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las águas tratadas do canal Pinheiros. É um re- químicos e resíduos sólidos, entre outros. De-
sultado que evoca a lembrança de um Tietê de positados no solo, são carregados pelas águas
tempos não tão antigos assim. da chuva para córregos e rios.
O engenheiro defende que, juntamente
No Tietê, saneamento com maior incentivo à continuidade do pro-
Esse passado deslumbrante do rio ainda grama de despoluição (com expansão do
vibra na memória do engenheiro Zuccolo, tratamento de esgoto) que a Sabesp possui,
hoje com 83 anos. Ele sempre se recorda poderia ser empreendido um programa con-
de sua época de menino, quando brinca- sistente de educação ambiental. “No Instituto
va nas “lagoas” formadas pelas águas do de Engenharia (IE), há uma proposta para o
rio. “Tenho uma ligação afetiva muito forte saneamento brasileiro pela qual todo o con-
com o rio”, admite.  As “lagoas”, na verdade, trato, seja para coleta de lixo ou coleta e trata-
eram cavas feitas na terra, perto da margem mento de esgoto, tivesse uma pequena parte
na região da Barra Funda, para retirada de do seu valor total aplicada exclusivamente, e
material destinado a olarias. Com as cheias, organizadamente, em educação ambiental
principalmente no verão, os buracos eram para as populações beneficiadas pela obra
preenchidos pelo rio. ou serviço”, diz Zuccolo, que representa o IE
“Depois, na minha mocidade, ainda cheguei na Comissão de Segurança Hídrica da Prefei-
a remar no rio”, conta. Hoje, é no Alto Tietê, tura de São Paulo.
área que coincide com a Região Metropolita- “Há um efeito fantástico quando se faz al-
na, onde a mancha urbana mais sufocou com guma obra e se educa ambientalmente.” Ele
sua poluição, esse curso de água importante próprio já testemunhou esse resultado em
para a cidade desde sua fundação. Na visão atividades da qual participou, como duran-
de Zuccolo, tem sido feito um esforço grande te a canalização de um trecho do rio Arican-
de despoluição no Tietê. “A partir de 1970, a duva, de 1980 a 1984. O pessoal envolvido
coleta e o tratamento de esgoto são realizados no projeto ia a escolas, igrejas, associações,
em um ritmo bastante palpável, mas talvez pu- fábricas e várias outras entidades, passando
desse ser feito ainda mais.” conceitos de educação ambiental. Segundo
A proposta de Zuccolo para a despoluição conta, o resultado foi muito bom, com os mo-
se concentra em três medidas: expansão do radores da avenida zelando ativamente pela
saneamento, evitando que a maior parte da preservação da área verde de cerca de 15
sujeira orgânica chegue às águas, construção metros de largura mantida ao longo das mar-
de reservatórios (os chamados piscinões) nos gens da área canalizada e para evitar que se
afluentes para ajudar na contenção de rejeitos jogasse lixo nas águas.
sólidos e reduzir a poluição difusa no Tietê e Seguindo com a expansão do saneamento,
muita educação ambiental. o engenheiro prevê que o rio vai melhorar.
A poluição difusa é provocada  por diver- “Com todos os programas de saneamento
sas fontes resultantes da atuação do homem, que têm sido feitos e continuados, com uma
como resíduos de pneus, de pinturas em geral, porção de críticas, é verdade, a mancha de po-
ferro, zinco, cobre e alumínio de materiais de luição vem diminuindo e a cerca de 100 km
construção, deposição seca e úmida de parti- da capital, por volta da bacia de Barra Bonita,
culados de hidrocarbonetos, restos de vegeta- as águas estão melhores. Continuando esses
ção, derramamentos, erosão, fuligem, poeira, programas, acredito que em uns trinta anos
enxofre, metais, pesticidas, nitritos e nitratos, vamos ter o Tietê com um aspecto  bom [na
cloretos, fluoretos silicatos, cinzas, compostos Região Metropolitana]”, afirma Zuccolo.

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Artigo

AERAÇÃO POR
NANOBOLHAS
• Pedro Caetano Sanches Mancuso, Doron Grull, Luiz Francisco Mancuso, Murilo
Damato, Samar dos Santos Steiner, Marcelo Bárbara e Edson Luiz Oliveira*

INTRODUÇÃO E OBJETIVOS tempo em água e não explodem de uma só


Bolhas são cavidades cheias de gás dentro vez, como as microbolhas. Além disso, elas
de líquidos e sólidos. Em líquidos, elas têm têm menor flutuabilidade, ou seja, não têm
pressão de equilíbrio interna igual à do am- propensão a subir em solução: bolhas meno-
biente externo. Cada bolha é cercada por res que 5 μm de diâmetro não sobem.
uma interface que possui propriedades dife- Ushikubo et al. (2010) observaram o efeito
rentes da solução em massa. da composição da bolha (ar ou O2) e também
Elas podem ser produzidas por diferentes a concentração de O2 dissolvido na água na
métodos e têm sido utilizadas para solubili- estabilidade de nanobolhas. Esses autores
zação de lamas, purificação de água, trata- relataram a presença de nanobolhas de O2no
mento de águas residuais, administração de meio mesmo após 15 dias de sua produção
fármacos e como agente de contraste junta- em água contendo 36,9 mg x L-1 de O2.
mente com ultrassons, conforme os trabalhos A conclusão desses autores é de que a su-
desenvolvidos por Agarwal et al. (2011). persaturação de gás na água diminui a taxa
Microbolhas e nanobolhas são peque- de transferência do gás da bolha para o líqui-
nas bolhas com diâmetro entre 10-50 mm e do, aumentando sua estabilidade. Contudo,
< 200 nm e têm sido exploradas em várias esse fator não deve ser o único a explicar a
aplicações, apresentando características que estabilidade das nanobolhas, já que se ob-
as fazem especiais em relação às bolhas ordi- servou sua existência mesmo próximo ou de-
nárias, ou macrobolhas, devido ao seu redu- pois de se atingir o equilíbrio de saturação.
zido diâmetro. Nesse sentido, Meegoda et al. (2018) estu-
Entre essas características citam-se as suas daram a influência de diversos fatores, como
elevadas áreas superficiais (área de superfície pH, composição do gás e concentração de sal
em relação ao volume) e a grande estagna- (NaCl), na distribuição do tamanho das nano-
ção em fase líquida, o que aumenta a disso- bolhas formadas e no seu potencial zeta. Os
lução dos gases. Além disso, diversos auto- resultados desse estudo mostraram que o ta-
res relatam que, quando as bolhas colapsam, manho, assim como o potencial zeta das bo-
ocorre a geração de radicais livres devido à lhas, depende das propriedades do gás, prin-
alta densidade de íons na interface gás-líqui- cipalmente de sua solubilidade em água. O
do, imediatamente antes do colapso. nitrogênio, gás menos solúvel, apresentou os
Segundo Takahashi e Chiba (2007), as na- menores tamanhos de bolha, enquanto o ozô-
nobolhas permanecem longos períodos de nio, mais solúvel, produziu as maiores bolhas.

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As bolhas de gases, em particular ar, oxi-
gênio e ozônio, são tradicionalmente empre-
gadas em diversos processos e operações
unitárias de tratamento de água e esgoto.
Separação por flotação e aeração visando
tratamento biológico ou degradação de po-
luentes orgânicos são métodos amplamente
conhecidos por sanitaristas.
O objetivo da pesquisa relatada neste texto
foi estudar o impacto da aplicação de nano-
bolhas de ar em corpos de água superficiais
bastante poluídos.

Foto 2. Vista lateral do contêiner mostrando as tubulações de


MATERIAIS E MÉTODOS entrada e saída no gerador de nanobolhas SBNANO2
A pesquisa foi realizada pelo Centro de
Apoio à Faculdade de Saúde Pública da Uni-
versidade de São Paulo (CEAP) e pela em- Na figura 1 é apresentado o fluxograma es-
presa SB Geologia e Engenharia Ltda., que quemático do sistema piloto empregado.
desenvolveu um processo inovador de pro-
dução de nanobolhas de ar, ou de gases de
uma forma geral, sendo a primeira tecnolo-
gia de geração de nanobolhas patenteada no
Brasil (reator SBNANO2).
Para a pesquisa, foi concebido um sistema
piloto de tratamento, montado em um contêi-
ner de fácil transporte que foi instalado junto
a um corpo hídrico superficial bastante poluí-
do e operou durante oito meses, trabalhando
oito horas por dia. As fotos 1 e 2 mostram o
sistema piloto utilizado na pesquisa.
Figura 1. Fluxograma do sistema de tratamento piloto, com
indicação dos pontos de monitoramento.

De acordo com essa figura, a água bruta do


rio é captada por uma bomba que a recalca
para um reservatório. Outra bomba capta a
água nesse reservatório, fazendo-a passar
por um filtro grosseiro e, a seguir, pelo rea-
tor SBNANO2, onde é submetida ao proces-
so de geração de nanobolhas de oxigênio e
ozônio.
Uma segunda bomba instalada nesse reser-
vatório tem sua linha de recalque dividida em
Foto 1. Equipamento SBNANO2 instalado em um contêiner duas correntes:

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 55


Artigo

• na primeira, a água é submetida a uma Embora tanto P2 como P3 referirem-se à


filtração grosseira e posteriormente ao tra- água da corrente 1 após tratamento, a distân-
tamento pelo reator SBNANO2, que nela cia entre esses pontos foi considerada impor-
aplica oxigênio na forma de nanobolhas e, tante a ponto de ser feita a diferenciação en-
opcionalmente, ozônio, também produzido tre eles, por exemplo, na análise de oxigênio
nesse equipamento. A seguir, essa corren- dissolvido (OD) e potencial de oxirredução
te passa por dois tanques construídos em (POR).
série: tanque de contato 1 e tanque de con-
tato 2, ambos com tempo de detenção hi-
RESULTADOS
dráulica de três horas.
Os dados mostrados nas tabelas 1, 2, 3 e 4
• a segunda corrente é encaminhada ao
decorrem de exames laboratoriais efetuados
tanque de mistura 3, ou blend (também
nas amostras coletadas nos pontos acima es-
com tempo de detenção hidráulica de três
pecificados. Nessas tabelas, foram utilizados
horas), com 70% de água sem nanobolhas e
os seguintes símbolos:
30% de água com nanobolhas.
n – número de amostras;
Os pontos de amostragem são:
ẍ – quando não indicado, trata-se de média
• P1 – Água bruta (na saída do reservatório
aritmética amostral;
de água bruta).
xMÁX. – valor máximo dentro da amostra;
• P2 – Imediatamente após o tratamento.
xMÍN. – valor mínimo dentro da amostra.
• P3 – Entrada do tanque de contato 1.
A tabela 1 mostra as taxas de remoção de
• P4 – Saída do tanque de contato 1 e entra-
sólidos totais, nos pontos P2, P4, P5, P6 e P7,
da do tanque de contato 2.
em relação à água bruta do rio, permitindo
• P5 – Saída do tanque de contato 2. observar o teor e a redução de sólidos totais
• P6 – Entrada do tanque de mistura com no processo. Chama-se a atenção para o fato
70% de água bruta e 30% de água tratada. de que se trata de coleta de amostras não
• P7 – Saída do tanque de mistura 3 ou emparelhadas.
blend.

SÓLIDOS TOTAIS (mg/L)


Remoção média
Ponto n xMÁX. xMÍN. ẍ
(%)
P1 19 2700 60 550 ------
P2 10 310 160 220 60%
P3 ------ ------ ------ ------ ------
P4 18 480 40 210 62%
P5 7 240 110 206 63%
P6 11 410 5 198 64%
P7 18 365 70 215 61%

Tabela 1. Redução e teor dos sólidos totais (mg/L)

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No sentido de complementar a interpreta- Esses dados mostram uma redução em tor-
ção do teor e da remoção de sólidos totais no de 70% na turbidez da água após o trata-
apresentada na tabela anterior, a turbidez mento. Essa redução aponta para uma dimi-
também foi avaliada. A tabela 2 mostra a re- nuição nas concentrações de sólidos, o que
dução desse parâmetro em relação à água certamente contribuirá para a qualidade do
bruta do rio nos pontos P2, P4, P5, P6 e P7. efluente final.
Por outro lado, a emanação de mau cheiro
pelo rio em determinados trechos e épocas
Turbidez (NTU) do ano está relacionada à má oxigenação de
Redução sua água e da consequente formação de gás
Ponto n xMÁX. xMÍN. ẍ média sulfídrico (em condições anaeróbicas).
(%) Esse fenômeno, provocado por microrga-
P1 80 240 25 78 ------
nismos anaeróbios, só ocorre em águas na-
turais onde o OD é muito baixo e o POR é
P2 80 38 17 25 68% reduzido para faixas negativas.
P3 ------ ------ ------ ------ ------ Assim sendo, a elevação do OD e do POR,
P4 80 41 15 24 69% resultado da aplicação de nanobolhas, eli-
mina o problema. A tabela 3 mostra como o
P5 80 32 14 23 71% tratamento com nanobolhas eleva o OD e o
P6 80 37 13 25 68% POR, acabando com os odores provenientes
da formação de gás sulfídrico.
P7 80 36 9 24 69%

Tabela 2. Redução e teor da turbidez (NTU)

OD (mg/L) POR (mV)

Ponto n xMÁX. xMÍN. ẍ Variação n xMÁX. xMÍN. ẍ Variação

P1 300 4,9 0,2 1,5 --- 280 262 162 15 ---

P2 304 29,0 5,0 15,0 900% 280 288 26,0 169 1227%

P3 211 34,0 3,6 18,8 1153% 208 268 8,6 151 1107%

P4 305 26,5 3,3 17,0 1033% 280 870 29,2 178 1287%

P5 36 20,0 10,0 15,0 900% 36 186 1,6 124 927%

P6 289 15,6 3,4 9,0 500% 264 277 1,0 139 1027%

P7 289 18,0 2,5 8,5 467% 264 280 24 142 1047%

Tabela 3. Oxigênio dissolvido (mg/L) e potencial redox (mV)

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Artigo

DBO (mg/L) DQO (mg/L) COT (mg/L)

Redução Redução Redução


Ponto n xMÁX. xMÍN. ẍ n xMÁX. xMÍN. ẍ n xMÁX. xMÍN. ẍ
média (%)  média (%)   média (%)  

P1 22 370 10 76 --- 22 820 30 180 --- 10 60 20 45 ---


P2 12 60 20 30 61% 12 160 50 91 49% 10 42 12 27 40%
P3 --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- --- ---
P4 20 105 5 32 58% 20 220 15 85 53% 10 43 11 24 47%
P5 21 54 15 32 58% 21 135 44 80 56% 20 38 10 27 40%
P6 12 60 5 31 59% 12 140 12 85 53% 10 45 12 30 33%
P7 22 65 10 32 58% 22 160 28 82 54% 20 46 9 26 42%
Tabela 4. Reduções e teores de DBO (mg/L), DQO (mg/L) e COT (mg/L)

Os parâmetros demanda bioquímica de oxi- O resultado da análise dessa amostra apon-


gênio (DBO), demanda química de oxigênio ta para um potencial de remoção de toxicida-
(DQO) e carbono orgânico total (COT) tam- de aguda e crônica em corpos de água muito
bém apresentaram bons resultados, como poluídos e contaminados. A remoção da to-
mostrado na tabela 4. xicidade crônica sugere também a possibili-
Embora não tenha sido o objetivo da pes- dade do emprego dessa tecnologia para eli-
quisa, um resultado importante, ainda que minação e/ou diminuição dos contaminantes
obtido com uma única amostra, é o do índice emergentes eventualmente presentes.
de toxicidade da água do rio (tabela 5). De acordo com Fan et al. (2010), para atin-
gir tais níveis de tratabilidade é necessária a
produção de uma alta concentração de nano-
28/10/2019 P1 P2 P5 bolhas – menores que 300 nanômetros – faixa
na qual elas se comportam como partículas e
IC50 não apresentam flutuabilidade.
14,16% ND ND
Toxicidade aguda Durante o experimento foram realizadas
determinações laboratoriais da concentração
EC20
41,49% 30,07% ND e das características das nanobolhas geradas.
Toxidade crônica
De forma a obter resultados comparativos,
Tabela 5. Toxicidade da água foram realizadas medições tanto nas águas
do rio como nos canais de água tratada.
A análise dos resultados dessa amostra de- Os resultados apresentados corroboram
monstrou que a toxicidade aguda foi removi- o descrito por Etchepare (2014): águas sem
da no P2 e que a toxicidade crônica (de maior tratamento apresentam concentrações entre
tempo de duração) foi totalmente removida 106 (para águas limpas) e 108 (para águas de
ao final do segundo canal do P5. A resolução maior turbidez). Nas amostras de água trata-
Conama 357 (2005) estabelece que rios de da pelo sistema testado foi possível obser-
classe 3 devem estar livre de toxicidade agu- var a geração entre 8 e 12 bilhões de nano-
da para Vibrio fischeri (Microtox). bolhas por mL.

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Diâme- do comparados a tecnologias tradicionais,
Concentra- Diâmetro
ção tro ocupam áreas diminutas e são montados
Moda Média em contêineres, podendo ser removidos e/
(partículas/
mL) (nm) (nm) ou transferidos de local facilmente;
• em termos de qualidade de água no
Rio bruto 8,21E+08 67 136
efluente tratado, alguns parâmetros têm
P2 1,2E+10 87 152 resultados imediatos (remoção de odores,
P4 8,80E+09 125 17 oxigenação, remoção de sólidos totais e re-
moção de turbidez).
P5 7,30E+09 117 178
Após 30 dias 5,89E+09 102 217 Coordenador da pesquisa
Tabela 6. Concentração de nanobolhas menores que 300 nm Pedro Caetano Sanches Mancuso, engenheiro industrial, modalidade
química, professor doutor da Faculdade de Saúde Pública da Univer-
sidade de São Paulo, conselheiro do Centro de Apoio à Faculdade de
Saúde Pública da Universidade de São Paulo (CEAP).
CONCLUSÃO
Pesquisadores do CEAP
Em que pese o fato de que alguns parâme- Doron Grull, engenheiro civil.
tros, como as determinações de toxicidades Luiz Francisco Mancuso, engenheiro eletricista.
agudas e crônicas, referirem-se a uma única Murilo Damato, biólogo e professor doutor.
amostra (que ocorreu por falta de recursos
Pesquisadores da SB Geologia e Engenharia Ltda.
financeiros), é inegável que se trata de uma Samar dos Santos Steiner, geólogo, doutor, diretor da SB Geologia e
pesquisa fortemente embasada em um nú- Engenharia Ltda.
mero significativo de análises de campo e de Marcelo Bárbara, geólogo, diretor da SB Geologia e Engenharia Ltda.
laboratório. Edson Luiz Oliveira, engenheiro de produção mecânico da SB Geologia
Esse fato permite concluir que a tecnologia e Engenharia Ltda.
é extremante viável do ponto de vista técni-
co e também do ponto de vista de custos. No REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
caso estudado, foi calculado um custo opera- AGARWAL, A.; NG, W. J.; LIU, Y. Principle and applications of microbubble
cional de R$ 0,09 por metro cúbico de água and nanobubble technology for water treatment. Chemosphere, v. 84, n.
tratada. 9, p. 1175-1180, Aug. 2011.
Em resumo, as conclusões propiciadas pela ETCHEPARE, R. G. Geração, caracterização e aplicações das nanobolhas na
pesquisa são as seguintes: remoção de poluentes aquosos e reúso de água por flotação. 2016.132 f.
Tese (Doutorado em Engenharia) – Escola de Engenharia, UFRGS, Porto
• diminuição dos sólidos totais e não forma-
Alegre, 2016.
ção de lodo;
FAN, M.; TAO, D.; HONAKER, R.; LUO, Z. Nanobubble generation and its ap-
• taxas de dissolução de oxigênio acima do plication in froth flotation (part I): nanobubble generation and its effects
ponto de saturação; on properties of microbubble and millimeter scale bubble solutions.
• aumento imediato do potencial de oxirre- Min. Sci. Technol. v. 20, n. 1, p. 1-19, Jan. 2010.
dução; MEEGODA, J. N.; HEWAGE, S. A.; BATAGODA, J. H. Stability of nanobubbles.
• não utilização de qualquer tipo de produ- Environ. Eng. Science, v. 35, n. 11, p. 1216-1227, Nov. 2018.
to químico, os únicos insumos utilizados são TAKAHASHI, M.; CHIBA, K.; LI, P. Formation of hydroxyl radicals by collaps-
energia elétrica e ar; ing ozone microbubbles under strongly acidic conditions. J. Phys. Chem.
• não requer grandes estruturas de constru- B, v. 111, n. 39, p. 11443-11446, Sept. 2007.
ção civil, com possibilidade de rápida im- USHIKUBO, F. Y.; FURUKAWA, T.; NAKAGAWA, R.; ENARI, M.; MAKINO, Y.;
plantação; KAWAGOE, Y.; SHIINA, T.; OSHITA, S. Evidence of the existence and the
stability of nano-bubbles in water. Colloids Surfaces A: Physicochem. Eng.
• os equipamentos de alta vazão, quan- Asp. v. 361, n. 1-3, p. 31-37, May 2010.

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DESAFIOS NA MUDANÇA
DE COMPORTAMENTO
• Igor Borges Cipriano Saraiva*

INTRODUÇÃO Desenvolvimento
O presente trabalho tem como proposta Um eletricista profissional decide não se-
analisar a importância da presença da lide- guir as premissas básicas de segurança e
rança (diretor, gerente de área, supervisores, não utiliza a manta isolante para executar um
encarregados de turma) no local de trabalho serviço em uma rede de distribuição ener-
para a disseminação de comportamento se- gizada, mesmo ciente de que essa decisão
guro entre os funcionários operacionais das pode lhe custar a vida. Por que ele, treinado
empresas que trabalham no setor elétrico de e com experiência em realizar atividades de
distribuição de energia. manutenção em redes aéreas energizadas,
Dois critérios básicos nortearam este artigo decide tomar essa decisão? Por que, mes-
e levaram aos seguintes questionamentos: mo ciente da ocorrência de acidentes fatais
e quase fatais com colegas de trabalho, não
- Comportamento seguro – Um acidente
considera a possibilidade de que ele pode
ocorrido com um colega de trabalho é mo-
ser a próxima vítima?
tivo para que o restante da equipe trabalhe
com mais segurança? Situações como a descrita acima são mais
comuns do que gostaríamos de acreditar. Há,
- Capacitação técnica – Treinamentos e pa-
provavelmente, uma grande parcela de sorte
lestras são suficientes para que o funcionário
na maioria dos serviços executados no setor
internalize um comportamento seguro?
de manutenção de redes de distribuição de
Diante dessas indagações, é importante energia. Ninguém, em sã consciência, gostaria
analisar os motivos que levam um funcionário de tornar-se vítima de descarga elétrica.
a tomar uma decisão errada, e seus impactos
Quando uma pessoa sofre um choque elé-
em sua vida e na de seus companheiros. Além
trico, as consequências podem ser diversas,
disso, o papel da liderança no acompanha-
entre elas queimaduras e contrações muscu-
mento das atividades diárias pode ser funda-
lares. A exposição a descargas elétricas pode
mental, objetivando encontrar possíveis me-
ainda afetar o sistema nervoso e órgãos vitais,
lhorias no desempenho das equipes, além de
como o coração e o pulmão, levando a vítima
mostrar aos colaboradores que há preocupa-
a falecer se não for socorrida imediatamen-
ção na forma como as atividades são executa-
te, pois o músculo do diafragma poderá ficar
das, tanto em relação à parte técnica quanto
“congelado” em um estado de tétano por
aos procedimentos de segurança e saúde.
corrente elétrica, conforme informa a Abraco-
Para alcançar os objetivos propostos, utili- pel (Associação Brasileira de Conscientização
zou-se como recurso metodológico a pesqui- para os Perigos da Eletricidade).
sa bibliográfica realizada a partir da análise de
Além disso, a descarga, em muitos casos,
trabalhos já publicados em livro e de artigos
leva a sequelas indesejáveis, como amputa-
científicos divulgados em meio eletrônico.
ção de membro por causa de queimaduras

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de 3º grau (realizada com a finalidade de di- meiro Anuário Estatístico. Na publicação, de
minuir a probabilidade de infecção e dimi- maio de 2019, foram registrados 1.424 aci-
nuir a quantidade de toxinas e mioglobina dentes de origem elétrica, além de 622 mor-
liberadas pelo tecido lesado, que poderiam tes, todos ocorridos em 2018 no Brasil. Desse
ser absorvidas pela corrente sanguínea). Mas, montante de acidentes, 836 foram causados
mesmo com a divulgação de notícias sobre por choques elétricos, 537 incêndios por so-
acidentes fatais ou quase fatais, o comporta- brecarga ou curto-circuito e 51 por descargas
mento de muitos funcionários não considera atmosféricas. Houve um aumento de 2,67%
os riscos. em comparação a 2017 e de 37,2% em rela-
Com o objetivo inicial de conscientizar a ção a 2013.
população sobre a importância de renovar Abaixo são informados dados da distribui-
as instalações elétricas residenciais e comer- ção de acidentes fatais por choque elétrico,
ciais, a Abracopel publicou, em 2013, seu pri- divididos por edificação ou logradouro:

Figura 1: Morte por choque elétrico por tipo de edificação ou logradouro


Fonte: Anuário Estatístico Abracopel: Acidentes de Origem Elétrica, 2019, p. 32.

Segundo o anuário, em 2018, os acidentes do à frente de todos os outros ambientes onde


fatais ocorridos na rede aérea de distribuição ocorreram acidentes, como residência unifami-
totalizaram 172, aproximadamente 28% do to- liar – casa; área rural externa; sítio, chácara ou
tal de acidentes levantados na pesquisa, fican- fazenda; e comércio de pequeno porte.

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Ainda de acordo com o anuário, entre os da são capacete de segurança, óculos, luvas
acidentes fatais registrados durante o ano, isolantes e de cobertura, botina de seguran-
quatro ocorreram com eletricistas funcioná- ça com solado isolante, cinto paraquedista e
talabarte, linha de vida e uniforme especial
rios de empresas de energia, conforme grá-
antichama.
fico abaixo:
Apesar dos EPIs, dos treinamentos neces-
sários para execução dos serviços, dos Diá-
logos Diários de Segurança (DDS) e da fisca-
lização, há muitos casos de negligência, tanto
do eletricista executor do serviço quanto do
restante da equipe, inclusive do chefe de tur-
ma/encarregado.
A negligência da equipe poderá ser evitada
se for seguida a Norma Regulamentadora nº
10 (Segurança em instalações e serviços em
eletricidade). No subitem 10.5.1, são descri-
tos alguns procedimentos e a sequência cor-
reta em que devem ser cumpridos para que
o Sistema Elétrico de Potência (SEP), que é
Figura 2: Choques elétricos fatais em redes aéreas o conjunto das instalações e equipamentos
Fonte: Anuário Estatístico Abracopel: Acidentes de Origem Elétrica, 2019, p. 35. destinados à geração, à transmissão e à dis-
tribuição de energia elétrica até a medição,
seja considerado desenergizado e liberado
Mesmo em quantidade menor, comparado para trabalho. A lista de tais procedimentos
com outras profissões (29 pedreiros/operá- é chamada popularmente de Regras de Ouro
rios/ajudantes; 23 pintores/ajudantes, por (CEMAR):
exemplo), chama a atenção o fato de todo o
- Abrir os circuitos elétricos usando disposi-
conhecimento que o exercício da profissão
tivos de seccionamento com corte visível;
requer não ser suficiente para que os aciden-
tes não ocorram. - Bloquear o equipamento de seccionamen-
to dos circuitos elétricos, ou seja, impossibi-
Nas concessionárias de energia há equipes
litar fisicamente a união de seus contatos ou
especializadas para executarem serviços de
imobilizar o comando do aparelho. No caso
manutenção em rede energizada, de acordo
de chaves fusíveis, o bloqueio caracteriza-se
com a demanda necessária em cada região.
Cada equipe recebe o treinamento adequa- pela retirada dos bastões;
do, sendo todos os funcionários instruídos a - Testar e comprovar a ausência de tensão
seguirem as diretrizes do manual de “Proce- no local de abertura dos circuitos e onde se-
dimentos Operacionais”, que descreve as eta- rão realizados os trabalhos com detector de
pas para a eficiente execução das atividades. tensão. Para esse reconhecimento do local,
Nesse manual, além da descrição dos servi- deve-se agir como se a instalação estivesse
ços, há a relação de Equipamentos de Prote- energizada, ou seja, usar equipamento de
ção Individuais (EPIs) a serem utilizados e as proteção adequado, manter distância de se-
regras a serem obedecidas em prol da segu- gurança e comprovar ausência de tensão em
rança da equipe. todos os condutores;
Os principais EPIs que um eletricista deve - Instalar os conjuntos de aterramento tan-
utilizar ao trabalhar em uma rede energiza- tos quanto forem necessários, em pontos ad-

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jacentes ao local de trabalho, a fim de formar rem e exigirem de seus colaboradores que os
a chamada zona controlada; usem, existe uma cultura enraizada no âmbito
- Sinalizar/Instalar a placa de sinalização organizacional de que o colaborador que se
“Não opere este equipamento” em local visí- acidenta “teve azar”. Há muitos casos de aci-
vel e próximo aos dispositivos de secciona- dente de trabalho em que os equipamentos
mento. estavam à disposição, mas o colaborador de-
Observação: A sequência das cinco regras cidiu por não usá-los, por pressa ou por julgar
de ouro pode ser alterada para os casos de que não fosse necessário.
distâncias consideráveis entre a chave fusível Diante de tudo que foi mencionado, vale
e o trecho a se trabalhar. A alteração seria a conhecer a definição de comportamento, se-
seguinte: o 5º passo (sinalização) pode ser gundo Bley (2011):
executado após o 2º passo (bloqueio). "[...] o comportamento pode ser entendido
Ainda de acordo com a NR nº 10, no item como um conjunto de relações que se esta-
10.13.4, cabe aos trabalhadores: belecem entre aspectos de um organismo e
- Zelar pela sua segurança e saúde e a de aspectos do meio em que ele atua e as conse-
outras pessoas que possam ser afetadas por quências da sua atuação, sendo o meio carac-
suas ações ou omissões no trabalho; terizado como máquinas, ferramentas, relação
- Responsabilizar-se junto com a empresa com colegas e supervisores, normas e proce-
pelo cumprimento das disposições legais e dimentos, entre outros." (p. 16)
regulamentares, inclusive quanto aos proce- Juliana Bley, psicóloga autora da obra
dimentos internos de segurança e saúde; e “Comportamento Seguro: A Psicologia da
- Comunicar, de imediato, ao responsável Segurança do Trabalho e a Prevenção de
pela execução do serviço as situações que Doenças e Acidentes”, simplifica a própria
considerar de risco para sua segurança e saú- definição:
de e a de outras pessoas. "[...] comportamento é um conjunto de fe-
A norma apresenta também uma disposi- nômenos que acontecem ao mesmo tempo,
ção fundamental para evitar, em casos de dú- no ato ou na ação, e também debaixo da
vida, a execução do serviço. Trata-se do direi- pele de cada um de nós. Comportamento
to de recusa, que assegura ao trabalhador a seguro consiste em identificar e controlar os
interrupção de uma atividade de trabalho por riscos da atividade que a pessoa está reali-
considerar que ela envolve grave e iminente zando no presente para que isso resulte na
risco para sua segurança e saúde ou de ou- redução da probabilidade de uma ocorrên-
tras pessoas. cia indesejável. Um comportamento seguro
Além disso, o preenchimento da Análise não garante que um acidente não vá acon-
Preliminar de Risco (APR, formulário destina- tecer, mas reduz muito a probabilidade. O
do a identificar antecipadamente elementos foco do comportamento seguro é cuidar de
e fatores que possam representar risco) an- si e do outro."
tes da execução de qualquer serviço, após Torna-se necessário, então, o estudo do
delimitada e sinalizada a área de trabalho, é comportamento seguro para entender me-
obrigatório, assim como a utilização de todos lhor e chegar ao centro da problemática dos
os equipamentos de proteção individuais e acidentes de trabalho, principalmente dos
coletivos necessários. que levam ao óbito.
Quanto aos equipamentos de proteção Um estudo que corrobora esses conceitos
(EPIs e equipamentos de proteção coletivos – e os dados informados anteriormente é a pi-
EPCs), apesar das empresas os disponibiliza- râmide de desvios, criada por Herbert Wil-

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liam Heinrich, na década de 1930, atualizada lizações/visitas em campo poderá tornar tal
na década de 1960 por Frank Bird (popular- ocorrência um hábito adquirido pela equipe.
mente conhecida como Pirâmide de Bird) e
incrementada pela empresa DuPont no final
da década de 1990: CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que um aci-
dente deveria ser motivo para que a equi-
pe saísse da zona de conforto e agisse com
mais segurança. Era esperado também que a
existência de tantas normas e procedimentos
coibisse a ocorrência de acidentes. Contudo,
não é isso que se vê. Há, inclusive, casos de
eletricistas que trabalham em empresas que
prestam serviços para concessionárias de
energia e veem um colega de trabalho mor-
rer ou ser mutilado e, poucos meses, ou até
dias depois, realizam procedimentos inade-
Figura 3 - Pirâmide de desvios da DuPont quados durante a execução da atividade.
Fonte: http://falandodeprotecao.com.br/piramide-de-desvios Além disso, treinamentos e palestras não
são suficientes para que o funcionário inter-
nalize um comportamento seguro. Assim, é
Segundo a pirâmide, cada 30 mil desvios
necessário analisar de forma bem criteriosa a
levam a 3 mil incidentes, 300 acidentes sem
qualidade dos treinamentos e a objetividade
afastamento, 30 acidentes com afastamento e
das palestras, para que o aprendizado não
um acidente fatal. A pirâmide tem como prin-
seja algo passageiro. Conforme Bley:
cipal objetivo prevenir e encontrar medidas
para minimizar e/ou eliminar os acidentes de "Conhecer como acontece o ensino da pre-
trabalho. Percebe-se que pequenos desvios, venção é importante para que as organizações
muitas vezes considerados insignificantes, possam desenvolver estratégias que contri-
podem levar a uma fatalidade, seja pela con- buam para aumentar a efetividade das inter-
fiança extrema durante a execução da ativi- venções educacionais." (p. 55).
dade, seja pela negligência em seguir regras Junto com a melhora da qualidade de trei-
básicas de segurança. namentos e palestras deve ser proposta a fre-
Para ajudar nesse processo, é fundamental quente visita da liderança, não só dos fiscais,
que as empresas ministrem treinamentos, for- durante as atividades em campo. Tais visitas,
neçam os equipamentos de proteção indivi- quando realizadas de forma surpresa, servem
dual adequados e deem todo o suporte para tanto para que o funcionário perceba que há
que os trabalhadores exerçam suas funções fiscalização constante quanto para mostrar
diárias da forma mais segura possível. a preocupação com a saúde da equipe e a
Além disso, a interação dos líderes é im- qualidade do serviço realizado. Durante as vi-
portante para que o funcionário, no papel do sitas, é importante também que haja um diá-
eletricista, perceba que toda a hierarquia da logo, parabenizando pelo serviço prestado
empresa tem interesse na realização segu- e criticando quando houver alguma atitude
ra das atividades em campo. Mesmo que o fora dos padrões de segurança.
serviço seja realizado corretamente apenas Cabe à empresa investir no funcionário, seja
na presença do gestor, a frequência de fisca- por meio de treinamentos, palestras, equipa-

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mentos de boa qualidade, seja por meio de BLEY, J. Conceito de comportamento seguro – livro – #2 de 6. Disponível
uma maior interação entre os níveis hierárqui- em: https://www.youtube.com/watch?v=YCcTkuXQ0Sc. Acesso em: 20
cos, com a liderança mais presente em campo. maio 2019.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Norma Regulamentadora nº
* Igor Borges Cipriano Saraiva é engenheiro civil, com experiência 10, de 7 de dezembro de 2004. Segurança em Instalações e Serviços em
em elaboração de projetos hidrossanitários, orçamento e planeja- Eletricidade. Disponível em: http://www.guiatrabalhista.com.br/legisla-
mento de obra, gestão de custos, execução e fiscalização de obras de cao/nr/nr10.htm. Acesso em: 28 maio 2019.
pequeno e médio porte.
CEMAR. Regras de ouro. Disponível em: http://falaparceiro.cemar116.
REFERÊNCIAS com.br/areas/seguranca/regras-de-ouro. Acesso em: 28 maio 2019.

ABRACOPEL. Anuário estatístico Abracopel: acidentes de origem elétrica DUPONT. A evolução da pirâmide de desvios. Disponível em: http://falan-
– 2019 – ano base 2018. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: http:// dodeprotecao.com.br/piramide-de-desvios/. Acesso em: 14 jul. 2019.
abracopel.org/wp-content/uploads/2019/05/Anu%C3%A1rio-ABRACO- ERPLAN. Pirâmides de Desvios: incidentes, perdas, diagrama de Pareto
PEL-2019.pdf. Acesso em: 1º abr. 2020. e prevenção. Disponível em: http://www.erplan.com.br/noticias/pira-
ABRACOPEL. Em 2019 as estatísticas continuam aumentando. 7 maio mides-de-desvios-incidentes-perdas-diagrama-de-pareto-e-prevencao.
2019. Disponível em: http://abracopel.org/abracopel/2019-estatisticas- Acesso em: 25 jul. 2019.
-aumentando. Acesso em: 23 maio 2019. LEONARDI, D. F.; LAPORTE, G. A.; TOSTES, F. M. Amputação de membro por
ABRACOPEL. Você conhece as consequências do choque elétrico no corpo queimadura elétrica de alta voltagem. In: Revista Brasileira de Queima-
humano? Disponível em: http://abracopel.org/blog/consequencias-cho- duras. Disponível em: http://rbqueimaduras.org.br/details/60/pt-BR/
que-eletrico. Acesso em: 23 maio 2019. amputacao-de-membro-por-queimadura-eletrica-de-alta-voltagem.
Acesso em: 26 maio 2019.
ANEEL. Regulação dos Serviços de Distribuição. Disponível em: http://
www.aneel.gov.br/regulacao-dos-servicos-de-distribuicao. Acesso em: TUIUTI EQUIPAMENTOS DE SEGURANÇA. Pirâmide de Heinrich: entenda
14 jul. 2019. como funciona a teoria dos desvios. Disponível em: https://www.epi-
-tuiuti.com.br/blog/seguranca-do-trabalho/piramide-de-heinrich-enten-
BLEY, J. Comportamento seguro: a psicologia da segurança no trabalho e
da-como-funciona-teoria-dos-desvios. Acesso em: 26 maio 2019.
a educação para a prevenção de doenças e acidentes. Curitiba: Editora
Sol, 2011. E-book.

QUE LICENCIAMENTO
AMBIENTAL QUEREMOS?
• Simone Marques dos Santos Nogueira*

INTRODUÇÃO
no inciso I do artigo 2º da Lei Complemen-
A pergunta do título deste artigo tem o ob-
tar nº 140/2011 como “procedimento admi-
jetivo de fazer com que o leitor exercite seu
nistrativo destinado a licenciar atividades ou
pensamento crítico. O que é licenciamento
empreendimentos que utilizam recursos am-
ambiental? Por que temos o direito de esco-
bientais, efetiva ou potencialmente poluido-
lher o modelo que queremos?
res ou capazes, sob qualquer forma, de cau-
O licenciamento ambiental, um dos instru- sar degradação ambiental”.
mentos da política ambiental1, foi definido
Ressalva-se que, embora a legislação uti-
1 Art. 9 da Lei nº 6938/81. Outros instrumentos seriam, por exemplo, o lize o termo “licenciar”, a doutrina entende
zoneamento industrial e a auditoria ambiental. que, devido às suas características, o ato

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administrativo pelo qual a administração cedimento do licenciamento relacionam-se à


pública libera determinada atividade ou confusão e à sobreposição de competências
empreendimento não se trata de licença, (quem deve licenciar o que e quem deve se
mas, na verdade, de autorização. “Licencia- manifestar a respeito do que2), ao conteúdo
mento” e “licença ambiental” são, portanto, do licenciamento (o que deve ser, de fato,
inovações terminológicas amparadas por lei discutido no procedimento), à demora na
e não traduzem o conceito jurídico de “licen- apreciação e emissão de licenças por con-
ça” (MACHADO, 2014, p. 321). ta de exigências burocráticas, algumas sem
Sendo o licenciamento ambiental o pro- fundamentação técnica e jurídica, à falta de
cedimento que tem por finalidade liberar padronização e transparência e, finalmente,
atividades ou procedimentos com potencial à judicialização3 das questões atinentes ao
poluidor ou degradador do meio ambiente, licenciamento, que tornam o processo ainda
incide o preceito do artigo 225 da Constitui- mais moroso e ineficiente.
ção Federal: São também alvos de críticas4 os processos
Todos têm direito ao meio ambiente ecolo- de comunicação com a sociedade, considera-
gicamente equilibrado, bem de uso comum dos pontuais e ineficazes; o modelo de audiên-
do povo e essencial à sadia qualidade de cias públicas, eventos isolados e passíveis de
vida, impondo-se ao poder público e à co- manipulação por grupos de pressão favoráveis
letividade o dever de defendê-lo e preser- ou contrários ao empreendimento; a politiza-
vá-lo para as presentes e futuras gerações. ção dos cargos gerenciais do setor público,
com reflexos sobre a qualidade da gestão que
A Constituição Federal reconhece que é de acaba se pautando por interesses setoriais; in-
todos o direito ao meio ambiente ecologica- fluência e pressão da mídia; entre outros.
mente equilibrado. A todos, portanto, foi atri- É justamente a busca por maior eficiên-
buída a titularidade e o interesse para a sua cia no procedimento de licenciamento am-
defesa, bem como a responsabilidade por biental o mote principal do Projeto de Lei nº
sua preservação. Por esse motivo, também é 3729/2004. Por isso, é importante analisar al-
de todos, e não apenas dos empreendedores guns de seus aspectos a fim de verificar de
ou do poder público, o interesse e o poder de que maneira essa melhoria está sendo pro-
escolha pelo procedimento de licenciamento posta, tendo em mente que buscar eficiên-
ambiental mais adequado e que atenda aos cia não significa eliminar este ou aquele em-
anseios da coletividade. preendimento criando privilégios indevidos
Licenciamento ambiental desejável não é e injustificados; não significa afrouxar o licen-
aquele que inviabiliza a atividade econômica ciamento retirando a abrangência de alguns
em prol da natureza nem tampouco aquele de seus conceitos. A eficiência se alcança por
que sacrifica o meio ambiente em benefício meio de regras claras e objetivas, padroniza-
da atividade econômica. O licenciamento ção e racionalidade nos procedimentos.
ideal seria aquele que atentasse para o me-
lhor equacionamento do binômio equilíbrio 2 A Lei Complementar nº 140/2011 minimizou tais conflitos, embora não
ambiental x crescimento econômico, na bus- os tenha definitivamente resolvido.
ca pelo desenvolvimento sustentável. Esse é, 3 A judicialização é um fenômeno complexo que pode ser definido como
portanto, o desafio a ser enfrentado. utilizar o acesso ao Poder Judiciário para levar ao seu conhecimento ma-
téria que não foi resolvida como deveria pelo Poder Executivo ou pelo
No caso do licenciamento ambiental no
Poder Legislativo.
Brasil, reclamações e descontentamentos
não faltam. De acordo com Carvalho (2016) 4 Vide, por exemplo: http://www.brasil-economia-governo.org.br/2013/
03/25/por-que-o-licenciamento-ambiental-no-brasil-e-tao-complicado-
e Nusdeo (2017), as principais críticas ao pro-
-parte-i/. Acesso em: 2 abr. 2020.

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ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS DO REGRA DE TRANSIÇÃO
PROJETO DE LEI Nº 3729/20045 Está previsto no artigo 3º, § 2º (além de ou-
Apesar de sempre terem feito parte dos tros dispositivos) que, até que sejam definidas
grandes debates ambientais, as discussões as tipologias de empreendimentos sujeitos ao
acerca do procedimento de licenciamento licenciamento ambiental, caberá à autoridade
ambiental voltaram à pauta do Poder Legisla- licenciadora definir, caso a caso e sem qual-
tivo após o período de instabilidade política quer critério, o que será aplicado. Essa pro-
que se instalou desde o rompimento da bar- posta rompe com a prática sempre adotada
ragem da Samarco, em novembro de 2015. para regras de transição, consistente na apli-
Em vez de se destacarem propostas que as- cação das normas então vigentes até a edição
segurem a proteção ambiental, o que se tem do novo regramento. Atribuir excessivo po-
visto é a pressão de determinados grupos de der discricionário a tal agente público pode
empreendedores pela flexibilização do pro- gerar distorções irreparáveis na aplicação da
cedimento em favor de seus interesses pró- lei em todo o território nacional, além de inse-
prios, resultando em projetos de lei polêmi- gurança jurídica e judicialização (no caso, por
cos, que foram reunidos no PL 3729/2004. exemplo, de um mesmo tipo de atividade ou
Os principais pontos polêmicos desse pro- empreendimento ser aceito em determinado
jeto de lei são: regra de transição que dá à Estado, mas não em outro).
autoridade licenciadora o poder de definir os
empreendimentos sujeitos ao licenciamento; LICENCIAMENTO SIMPLIFICADO
a previsão genérica e vaga de condições para
Além da tradicional modalidade trifásica6,
licenciamento simplificado; licença autodecla-
no projeto de lei foi contemplada a previsão
ratória e inaceitáveis isenções de licenciamen-
formal de procedimento simplificado de li-
to; espaço para que os Estados promovam
cenciamento, que poderá ser realizado de
ainda maior flexibilização da regulamenta-
três formas7: bifásica – duas licenças em uma
ção ambiental; licenciamento corretivo para
única fase (LP com a LI ou LI com a LO8); fase
empreendimentos irregulares em condições
única – LAU; por adesão ou compromisso.
brandas; a desnecessidade de autorização
dos órgãos responsáveis pela unidade de Como se trata de instrumento que tem por
conservação, terra indígena e território qui- finalidade buscar agilidade, não criando mo-
lombola para empreendimentos que afetam dalidades de licença, mas promovendo ape-
essas áreas protegidas ou sua zona de amor- nas uma simplificação de rito, sendo inclusive
tecimento; aumento do prazo de validade das já praticado em alguns casos, a consagração
licenças ambientais; renovação automática de da aglutinação de fases na modalidade bifási-
licenças e redução do espectro das audiências ca e única9 em lei geral é uma medida que pa-
públicas; e uma estranha e indevida inserção
6 Artigo 13 do Projeto de Lei 3729/2004.
de disposição que revoga artigo que trata da
necessidade de EIA/RIMA para empreendi- 7 Artigo 13 do Projeto de Lei 3729/2004.
mentos em zona costeira sem qualquer men- 8 Artigo 15 do Projeto de Lei 3729/2004. Em âmbito federal, a aglutinação
ção ou explicação que justifique tal exclusão. bifásica já é prevista, por exemplo, para licenciamento ambiental de ce-
mitérios – Resolução Conama 335/2003. Existe também o Licenciamen-
5 Foi utilizado como material de apoio o texto “Principais pontos críticos to Simplificado, nos termos da Resolução Conama 279/2001.
do Projeto de Lei nº 3729/2004: substitutivo do deputado Mauro Pereira 9 Em relação aos casos de licenciamento em fase única, que compreende
de 29.08.2017”, produzido pelo Instituto Socioambiental (ISA). Disponí- a emissão de uma única licença reconhecendo a viabilidade ambiental,
vel em: https://www.socioambiental.org/sites/blog.socioambiental.org/ permitindo a instalação e a operação do empreendimento, além de
files/nsa/arquivos/principais_pontos_criticos_-_pl_de_licenciamento. aprovar as ações de controle e monitoramento ambiental e estabelecer
pdf. Acesso em: 2 abr. 2020. condicionantes ambientais para a sua operação e até mesmo para sua

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rece benéfica, desde que os procedimentos como de baixo potencial poluidor, nos casos
para obtenção de licenças sejam transparen- em que os impactos ambientais da tipologia
tes, objetivos e padronizados. Isso ainda será e as características ambientais da área de
feito por meio de normatização específica de instalação são conhecidos previamente.
cada órgão licenciador se não houver leis fe-
derais, estaduais e municipais regulamentan-
LICENCIAMENTO
do especificamente esses procedimentos de
AUTODECLARATÓRIO
licenciamento. Nesse sentido, é falha a pro-
posta do Projeto de Lei nº 3729/2004 que se No entanto, por conta da relevância da
apresenta vaga e genérica e, por isso, deveria matéria ambiental, não é adequada a possi-
ser aperfeiçoada. bilidade de licenciamento “autodeclaratório”
sem o necessário e imperioso controle prévio
No caso específico do licenciamento em
por parte do poder público.
fase única, o artigo 16 está vago demais e
pode gerar discussões. Talvez ele deves- Esse tipo de licenciamento já vinha sendo
se indicar que essa modalidade é cabível aplicado na Bahia, nos termos do art. 45, VIII,
apenas para empreendimentos de menor da Lei Estadual nº 10.431/2006, e foi tema de
potencial poluidor/degradador e cuja locali- ADI nº 5014, sendo que tal experiência mos-
zação seja ambientalmente viável, deixando trou-se malsucedida11. Infelizmente, não se
para as normas específicas o papel de deli- pode contar apenas com a boa-fé ou o co-
mitar tais situações. nhecimento técnico dos empreendedores.
Até onde foi possível averiguar, adotando
tais procedimentos, a Bahia tem conseguido VALIDADE DAS LICENÇAS
resultados positivos em relação à agilidade Ainda na busca por celeridade e eficiência,
para obtenção de licenças10. parece que o projeto de lei caminhou bem ao
Já o licenciamento por adesão ou termo estabelecer, no artigo 5º, prazos mínimos de
de compromisso consistiria de forma sintéti- validade mais extensos para algumas licen-
ca na emissão de licença ambiental a partir ças porque esse é, de fato, um elemento rele-
da disponibilização, pelo empreendedor, de vante de segurança jurídica e até mesmo de
informações sobre o empreendimento e da viabilidade econômica do empreendimento.
adesão a compromisso e critérios preestabe- Mas, tal como no caso do licenciamento sim-
lecidos pelo órgão ambiental competente. A plificado, fica a ressalva de que a lei regu-
validação dessas informações seria feita pos- lamenta essa modalidade de forma clara e
teriormente pelo poder público. precisa, inclusive apontando casos nos quais
Ressalva-se que esse tipo de licenciamen- essa extensão pode ser revogada em caráter
to seria aplicável às tipologias identificadas punitivo, por exemplo.

desativação quando necessário, modelos semelhantes são adotados no


Estado da Bahia – Licença Unificada (LU): art. 45, VI da Lei Estadual nº 11 Segundo relatório técnico da Associação dos Servidores de Meio Ambien-
10.431/2006 – e no Estado do Rio de Janeiro – Licença Ambiental Sim- te e Recursos Hídricos da Bahia (ASCRA), “no período de 01/08/2012 até
plificada (LAS): art. 12 do Decreto Estadual nº 44.820/2014 Essa moda- 04/09/2015 foram formados 1.596 processos de LAC - Licenças Ambientais
lidade somente seria possível para atividades de pequeno porte e baixo por Adesão e Compromisso no Sistema Estadual de Informação Ambiental
potencial poluidor. No Rio de Janeiro, aplica-se para oficinas, lavagem de (SEIA), a grande maioria para postos de gasolina. Desse total, a equipe de
veículos, marmorarias e outros. do INEMA-sede fiscalizou apenas 152 licenças, apenas 9% de todas as LAC
10 Fonte: https://www.valor.com.br/brasil/5237369/ba-lidera-ranking-de- registradas. Das 152 licenças fiscalizadas, 89% (135) apresentaram pen-
-licenca-ambiental. Acesso em: 2 abr. 2020. dências ou irregularidades e foram notificadas e/ou autuadas.”.

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DISPENSAS DE LICENCIAMENTOS sociedade todos os ônus decorrentes de tais
Já o artigo 7º isenta do licenciamento am- atividades econômicas.
biental o agronegócio, a pecuária extensiva e Ademais, a dispensa de licenciamento para
a silvicultura de florestas plantadas, que são atividades agrossilvopastoris já foi declarada
atividades de alto impacto ambiental. Não foi inconstitucional pelo STF na ADI 1086-7/SC13.
localizada justificativa ponderada e plausível Se a questão cerne do projeto de lei é dar
para tal isenção. celeridade ao procedimento de licenciamen-
Essa dispensa seria aplicada, inclusive, a to, beneficiando a todos – a lei é de caráter
atividades agrossilvopastoris consideradas geral como inclusive salientado no projeto de
“em regularização” perante o Cadastro Am- lei –, a isenção de determinados empreendi-
biental Rural (CAR)12, empreendimentos que mentos que atualmente devem ser licencia-
estariam meramente inscritos nesse cadastro dos não é, com certeza, a via correta.
cujas informações são autodeclaratórias e
pendentes de análise. EXCLUSÃO DE MODALIDADE
Tais atividades geram influências positi- CULPOSA NOS CASOS DE PRÁTICA
vas, como o desenvolvimento regional, mas CRIME DE CONCESSÃO INDEVIDA
também geram impactos negativos, como DE LICENÇA AMBIENTAL
a modificação da forma de uso e ocupação Outra inovação que chama a atenção está
do solo, a erosão ou compactação do solo, a no artigo 51, primeira parte. É a revogação
contaminação química por defensivos agríco- do parágrafo único do artigo 67 da Lei nº
las, desmatamento, perda de biodiversidade, 9605/9814, que trata da modalidade culposa
estresse de recursos hídricos, entre outros. do crime de concessão indevida de licença
Retirando tais empreendimentos do rol do ambiental.
licenciamento (art. 7, I e II), a lei revoga o Ane- Pelo projeto de lei, o funcionário público
xo I da Resolução Conama 237 e, além de que por imprudência, negligência ou imperí-
privilegiar esses empreendimentos em rela- cia conceder licença ambiental indevida não
ção aos demais, contraria o pensamento am- será punido criminalmente. Essa já é uma an-
biental que vem sendo construído desde final
dos anos 1960. Apenas para esses empreen- 13 EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 182, §
dimentos específicos o licenciamento deixa 3º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ESTUDO DE IM-
de ser um problema a ser resolvido, ficando PACTO AMBIENTAL. CONTRAIEDADE AO ARTIGO 225, § 1º, IV, DA CARTA
transferidos para o meio ambiente e para a DA REPÚBLICA. A norma impugnada, ao dispensar a elaboração de es-
tudo prévio de impacto ambiental no caso de áreas de florestamento ou
12 Art. 42 do PL: “Para fins do disposto no inciso I do art. 7º, considera-se: reflorestamento para fins empresariais, cria exceção incompatível com o
disposto no mencionado inciso IV do § 1º do artigo 225 da Constituição
I – imóvel, propriedade ou posse rural regular: aquele que não possui pen-
Federal. Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade
dência em relação ao cumprimento das obrigações previstas na Lei nº
do dispositivo constitucional catarinense sob enfoque.
12.651, de 2012;
(ADI 1086, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em
II – imóvel, propriedade ou posse rural em regularização:
10/08/2001, DJ 10-08-2001 PP-00002 EMENT VOL-02038-01 PP-00083)
aquele cujo titular ou possuidor esteja cumprindo as obrigações assumi-
14 Art. 67. Conceder o funcionário público licença, autorização ou permis-
das no termo de compromisso perante o órgão competente integrante
são em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras
do Sisnama, nos termos da Lei nº 12.651, de 2012; ou aquele cujo titular
ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público:
ou possuidor tenha inscrição no CAR no prazo legal da Lei nº 12.651, de
2012, e tenha requerido e finalizado a Proposta de Adesão ao Programa Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
de Regularização Ambiental – PRA, com emissão de documento compro- Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de
batório pelo Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural – SICAR. detenção, sem prejuízo da multa.

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tiga reivindicação de técnicos do setor, sob [...]


alegação de que tal dispositivo faz com que Assim, o projeto de lei em análise afasta,
o excesso de zelo, por receio de imputação de maneira obscura, a necessidade de EIA/
de conduta criminosa, atravanque o procedi- RIMA para empreendimentos realizados
mento do licenciamento. em áreas ambientalmente sensíveis, afron-
tando não apenas a boa técnica legislativa,
DISPOSIÇÃO CONTIDA NO mas também os princípios da transparên-
ARTIGO 51: TENTATIVA DE cia e a lealdade que devem nortear a con-
INDEVIDA DISPENSA DE duta dos agentes públicos no exercício de
PROCEDIMENTO LICENCIATÓRIO suas funções.
Ainda em relação ao artigo 51 existe uma Seria correto, portanto, afastar tal revoga-
indevida revogação do §2º do artigo 6º da ção, ou expor os motivos que a justifiquem
Lei nº 7661/8815, que trata do gerenciamento do ponto de vista do interesse público (que,
costeiro. Tal revogação, indevidamente inse- na verdade, parece inexistir) e realizar sua in-
rida em artigo que não trata do tema e nem serção no projeto de lei de forma a obedecer
sequer lhe faz qualquer alusão, afronta as re- às regras legais de redação legislativa.
gras de redação legislativa trazidas pela Lei
Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de FLEXIBILIZAÇÃO DE NORMAS
1998 em relação à sua clareza e ordem lógi- PELOS ESTADOS
ca, como segue: Finalmente, sob a justificativa de estar con-
Art. 11. As disposições normativas serão tribuindo para alterar e restringir as compe-
redigidas com clareza, precisão e ordem tências no processo licenciatório (questão
lógica, observadas, para esse propósito, as que é fonte de diversas críticas), o projeto de
seguintes normas: lei apenas mantém as atribuições previstas
[...] pela Lei Complementar nº 140/2011.
III – para a obtenção de ordem lógica: Na verdade, a lei permite aos Estados flexi-
[...] bilizar ou deturpar o licenciamento ambiental
em seus territórios, sem que sejam previstos
b) restringir o conteúdo de cada artigo da
critérios para isso, autorizando o uso do licen-
lei a um único assunto ou princípio;
ciamento ambiental para atrair investimentos
c) expressar por meio dos parágrafos os as- para os Estados mais “flexíveis”, bem como
pectos complementares à norma enuncia- distorções na aplicação da lei em todo o terri-
da no caput do artigo e as exceções à regra tório nacional, causando insegurança jurídica
por este estabelecida; e aumento da judicialização.
É certo procurar permitir que os Estados
15 Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, tenham a possibilidade de complementar e
construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades, com adequar o licenciamento conforme suas pe-
alterações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, culiaridades regionais, mas não sem critérios,
além do disposto nesta Lei, as demais normas específicas federais, es- de forma ampla e genérica, como previsto
taduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerencia-
pelo projeto de lei.
mento Costeiro.
Da forma como foi proposta, a autonomia
[...]
dos Estados em relação ao procedimento li-
§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável
cenciatório poderá ter efeitos negativos para
pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresen-
o meio ambiente, uma vez que determinados
tação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, devidamente
aprovado, na forma da lei.
Estados, para atraírem investimentos, pode-

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rão usar dispensas ou exageradas flexibiliza- leridade e segurança jurídica ao procedimen-
ções do procedimento licenciatório. to licenciatório, não atendendo, portanto, aos
anseios da coletividade, incluindo os em-
preendedores que não fazem parte do setor
CONCLUSÃO
agrossilvopastoril e os empreendimentos em
Os pontos que mais chamam a atenção no zonas de gerenciamento costeiro.
Projeto de Lei 3729/2004 são: dar à autorida-
Tal como propostas, as modificações analisa-
de licenciadora o poder de dizer, caso a caso,
das não trazem contribuições efetivas para a
quais atividades ou empreendimentos es-
melhoria do procedimento de licenciamento.
tão sujeitos ao licenciamento; a instauração
do Licenciamento por Adesão ou Termo de
Compromisso sem as devidas precauções; a *Simone Marques dos Santos Nogueira é mestre em Planejamento
exclusão indevida de alguns empreendimen- e Gestão do Território pela UFABC, especialista em Direito Ambiental
tos de alto impacto do rol de atividades po- pela USP, bacharel em Direito pela USP e professora e advogada em
luidoras/degradadoras (artigo 7); a exclusão São Paulo.
da necessidade de entrega de EIA/RIMA em
casos de gerenciamento costeiro sem a de- REFERÊNCIAS
vida justificativa (artigo 51, segunda parte); a CARVALHO, V. C. F. de. Judicialização do licenciamento ambiental: estudo
restrição da comunicação com a sociedade sobre as suas motivações no caso do Porto de São Sebastião – São Paulo.
no lugar de se buscar promover seu aperfei- 2016. Dissertação (Mestrado em Ambiente, Saúde e Sustentabilidade)
çoamento16. – Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2016.
Diante do exposto, conclui-se que o Proje-
INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Principais pontos críticos do projeto de lei
to de Lei nº 3729/2004 defende abertamente
nº 3729/2004: substitutivo do deputado Mauro Pereira de 29.08.2017.
não o aperfeiçoamento do procedimento de
Disponível em: https://www.socioambiental.org/sites/blog.socioam-
licenciamento ambiental, mas, na verdade, a biental.org/files/nsa/arquivos/principais_pontos_criticos_-_pl_de_li-
sua flexibilização de maneira a causar prejuí- cenciamento.pdf. Acesso em: 16 jul. 2018.
zos e retrocesso das conquistas ambientais MACHADO, P. A. L. Direito Ambiental Brasileiro. 22. ed. São Paulo: Malhei-
obtidas ao longo do tempo. ros, 2014.
A flexibilização tampouco trará eficácia, ce- NUSDEO. A. M. de O. Desafios atuais do licenciamento ambiental. JOTA,
15 abr. 2017. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/
16 E é justamente a falha na comunicação com a sociedade, incluindo o artigos/desafios-atuais-do-licenciamento-ambiental-15042017. Acesso
Ministério Público, nas diversas fases do licenciamento, é justamente em: ago. 2018.
um dos fatores que acabam por acarretar o aumento da judicialização
RIBEIRO, B. S. O excesso de leis e sua inefetividade social. Âmbito Jurídico,
(CARVALHO, 2016).
Rio Grande, XIV, n. 87, abr. 2011. Disponível em: http://www.ambito-ju-
ridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_
id=9332. Acesso em: ago. 2018.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 71


Instituto de Engenharia

PROPOSTA DE MÉTODO PARA


APLICAÇÃO DAS FERRAMENTAS
DA QUALIDADE NA TRATATIVA
DE UMA NÃO CONFORMIDADE
REINCIDENTE EM INDÚSTRIA DE
PRODUTOS AGROPECUÁRIOS
• Amanda Cordeiro Dalla Villa e Aline Souza Salumb*

INTRODUÇÃO Em um ambiente corporativo, modificar uma


A qualidade é vital para a sobrevivência de cultura enraizada é desafiador, pois há resis-
todo empreendimento. Não buscar soluções tência em aceitar e adaptar-se a mudanças tan-
para não conformidades que geram ineficiên- to no setor produtivo quanto na alta diretoria.
cias e retrabalho pode significar a perda de Entretanto, se forem apresentados benefícios,
confiabilidade, desempenho, conformidade resultados satisfatórios e comprometimento,
e qualidade percebidas, as quais são dimen- adquire-se confiança e novas rotinas de pro-
sões do conceito de qualidade. cessos podem ser vistas como melhoria, em
vez de burocratização, por exemplo.
As ferramentas da qualidade, se bem apli-
cadas, são fortes aliadas no sistema de ges- Um dos procedimentos internos que faz parte
tão e fazem parte da estratégia estipulada da aplicação de ferramentas da qualidade é o
para estar à frente da concorrência. Empresa de tratativa de não conformidades, que busca
e cliente estão ligados pelo produto ou ser- justamente essa mudança e também o aumento
viço de qualidade que atenda às necessida- da qualidade de produtos e processos. Sua ges-
des deste. Para ter qualidade, é necessário o tão é realizada pelo setor de Garantia de Quali-
comprometimento de todos, e, para isso, é dade, que, por meio de treinamentos e análises,
preciso sincronizar as equipes. deseja eliminar a crença de que a não conformi-
Uma opção eficiente é realizar treinamen- dade é um problema e que a medida paliativa é
tos, pois nem todos possuem conhecimen- suficiente para sanar um desvio.
tos sobre as ferramentas da qualidade e sua O estudo foi feito com uma empresa que
aplicação. É comum que recursos como fer- atua no ramo de suplementação animal há
ramentas da qualidade não sejam do enten- mais de 25 anos, com cerca de 20 mil pos-
dimento de todos dentro de uma empresa; tos de venda por todo o território nacional,
portanto, o modelo de gestão ideal é aquele confiando aos seus 160 funcionários metas
que estimula a participação dos funcionários, ambiciosas, como o alcance mundial. Por se
proporcionando soluções criativas. tratar de uma instituição familiar, sua estrutu-

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ra organizacional é diferente da de grandes As ferramentas estão presentes na rotina
empresas, nas quais o contato com a alta di- de profissionais que buscam alcançar resul-
retoria é limitado, dificultando a troca de in- tados melhores. Mesmo assim, alguns su-
formações e a aceitação a mudanças. bestimam a efetividade delas e até relutam
Em empresas menores, como a que foi em utilizá-las, pois é um trabalho constante
avaliada neste estudo, esse contato é mais e com respostas lentas, mas os resultados
frequente, criando, de certa forma, um am- podem melhorar processos e tornar nula a
biente mais acolhedor, acessível, com menor ocorrência de desvios.
tempo de espera nas tomadas de decisões. Para que as ferramentas da qualidade se-
Entretanto, modificar ou implantar um novo jam usadas de forma efetiva, é fundamental
método é igualmente desafiador. Por vezes, que os profissionais envolvidos sejam capa-
as decisões são tomadas de forma instintiva citados e compreendam a importância delas.
e nem sempre assertiva, sem uma análise de A implantação das ferramentas pode variar,
impacto estruturada para auxiliar a aprovação dependendo do contexto em que elas estão
da mudança ou aquisição de algum item. Isso inseridas, da necessidade apresentada e do
acontece devido à pressa em obter resulta- objetivo esperado. A ordem das ferramentas
dos e minimizar “burocracias desnecessárias”. utilizadas e as técnicas empregadas podem
variar conforme o objetivo que se quer al-
Nesse contexto, sugere-se o método mais
cançar (7, 8).
adequado para a aplicação das ferramentas
da qualidade em uma empresa, no qual a não
conformidade é observada desde o momen- FLUXO SUGERIDO PARA TRATATIVA
to do seu relato até o cumprimento das ações DE NÃO CONFORMIDADE
definidas na reunião de tratativa.
DEFINIÇÃO DE GRAU
METODOLOGIA A não conformidade ocorre quando um
As empresas estão cada vez mais cientes de processo não é executado conforme um re-
que a forma de alcançar os melhores resulta- quisito preestabelecido. O relato de não con-
dos é ter a equipe integrada e unida buscando formidade é encaminhado para a diretoria,
oportunidades de melhoria e, quando um erro que define seu grau de gravidade levando
ocorrer, assumir o compromisso de corrigir e em consideração os seguintes quesitos:
evitar reincidências negativas. Tem-se como Grau 1 (G1): Precisa ser resolvido de ime-
regra a utilização do mínimo de recursos pos- diato, pois se agrava rapidamente, inviabiliza
sível, criando metas e estimulando o compro- o uso do produto, afetando sua segurança e
metimento e o trabalho em equipe. Para que qualidade, e pode colocar em risco a saúde
esse processo ocorra e bons resultados apare- do consumidor.
çam, é necessário que os profissionais se pre- Grau 2 (G2): Pode ser resolvido em um prazo
parem e as empresas forneçam suporte (1, 6). maior do que o G1. Piora ao longo do tempo,
Algo muito mencionado na teoria, mas que tem defeito impactante e denigre a imagem
vem sendo deixado de lado, é o uso das fer- da empresa, porém não inviabiliza o produto.
ramentas da qualidade. Elas devem ser utili- Grau 3 (G3): Pode ser resolvido em um pe-
zadas na busca da melhoria contínua na pro- ríodo mais longo e não piora ao longo do
dução de produtos, na prestação de serviços tempo. O defeito é pequeno e o setor de
e na execução de processos, identificando os Controle de Qualidade consegue detectá-lo,
problemas, estudando-os e definindo a me- porém passa despercebido aos olhos do con-
lhor forma de eliminá-los. sumidor.

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Instituto de Engenharia

REUNIÃO PARA TRATATIVA DE fossem ao maquinário para visualizar a não


NÃO CONFORMIDADE (RNC) conformidade. Assim ocorreu e uma solução
No momento da reunião, as ferramentas simples e com custos satisfatórios foi sugeri-
Brainstorming, 5W2H e PDCA são aplicadas da, executada e o prazo de eficácia compro-
e o plano de ação é elaborado. Cada partici- vou que a medida tomada tinha sido acertiva.
pante sabe que precisa realizar sua tarefa e Essa situação demonstrou que, mesmo uti-
comunicar a todos. Com as ações cumpridas, lizando ferramentas do século passado, é
o prazo de eficácia é analisado, a ação é imple- possivel extrair o melhor dos processos e das
mentada e, se necessário, um procedimento pessoas. A dificuldade é mantê-las engaja-
é escrito e treinamentos são realizados para das. Uma solução é tornar o processo de tra-
padronização. Após isso, auditorias de verifi- tativa de não conformidade algo flexivel, com
cação e novos relatos de não conformidade o mínimo de burocracia possível.
garantem que o novo processo foi entendido Opções para manter esse e outros proces-
e está sendo executado corretamente. sos funcionais: relembrar ou apresentar o
Em resumo, a Figura 1 detalha bem o pro- processo de tratativa de não conformidade
cesso do início ao fim. e a utilização das ferramentas da qualidade;
oferecer treinamentos anualmente e no mo-
mento da admissão de novos colaboradores;
promover projetos que incentivem e apre-
sentem melhorias; utilizar meios de comuni-
cação internos, como o jornal e o informati-
vo, por meio dos quais é possível relembrar
algumas regras e rotinas que são essenciais
para melhoria de processos e do ambiente.

CONCLUSÃO
Um requisito, ou qualidade, predefinido é o
Figura 1 – Fluxograma interno do processo de tratativa de não que o cliente deseja de determinado produ-
conformidade, baseado no ciclo PDCA. to. Meta de melhoria é o que fará a diferença
Fonte: As autoras (2019). entre produtos do mesmo segmento. Meta
padrão é o que garante a sobrevivência de
RESULTADOS uma empresa. Com isso e a análise das infor-
Foi detectada uma não conformidade e, en- mações levantadas, foi possível concluir que
tão, convocada uma reunião para analisar a um sistema de tratativa de não conformida-
causa raiz e criar um plano de ação. A primei- des engessado ou inflexível pode compro-
ra reunião ocorreu, as ações foram cumpri- meter a resolução dos desvios, fazendo o que
das, mas a ocorrência de não conformidade as empresas mais repudiam, que é burocrati-
continuou. Foi convocada nova reunião e zar os processos internos.
o resultado, mais uma vez, foi frustante. As Manter uma linha de diálogo direta com os
ações foram consideradas inviáveis pelo setor colaboradores, deixando-os à vontade para dar
financeiro, o que desmotivou os envolvidos, sugestões e participar de alguma forma, pode
que não queriam comparecer a outra reunião ser um forte aliado. Outra opção que apresenta
para falar de algo “impossível” de solucionar. bons resultados é divulgar as melhorias, ressal-
Até que um colaborador da equipe de ma- tando a importância da contribuição das equi-
nutenção sugeriu que todos os participantes pes na solução das não conformidades.

74 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


Foi possível observar que os maiores obstácu- ISHIKAWA, K. Controle da qualidade total: a maneira japonesa. Rio de Janei-
los para a solucionar a não conformidade com ro: Editora Campus, 1993.
maior agilidade e eficiência foram a falta de fa- JUNIOR, I. M.; CIERCO, A. A.; ROCHA, A. V.; MOTA, E. B.; LEUSIN, S. Gestão da
miliaridade com a estrutura e com os processos Qualidade. 9. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2008.
produtivos e a padronização engessada de um LEAL, A. A.; VAL, P. J. S. F.; SILVA, M. O.; VASQUEZ, R. Utilização do procedimen-
modelo de tratativa de não conformidade que to “5W2H” em saúde animal: planejamento de ações. Revista de Educação
dificultou a solução do desvio relatado. Continuada em Medicina Veterinária e Zootecnia do CRMV-SP, São Paulo,
Quando um plano de ação não ocorrer da v. 14, n. 2, 2016.
maneira esperada, deve-se fazê-lo de forma LISBÔA, M. da G. P.; GODOY, L. P. Aplicação do método 5W2H no processo
diferente. No presente trabalho, foi preciso sair produtivo do produto: a joia. IJIE, Santa Catarina, v. 4, n. 7, 2012.
da zona de conforto, que no caso era a sala de LUCINDA, M. A. Qualidade: fundamentos e práticas para cursos de gradua-
reuniões com temperatura controlada e café, ção. Rio de Janeiro: Bradsport, 2010.
para visualizar o cenário da não conformida-
MACHADO, S. S. Gestão da Qualidade. Inhumas: IFG; Santa Maria: Universi-
de. Gerentes e supervisores se paramentaram
dade Federal de Santa Maria, 2012.
para buscar um resultado no “chão de fábrica”.
MANIAES, C. A.; FRANCISCATO, L. S. Uso de ferramentas da qualidade para
Todas as ferramentas expostas podem ser
redução de perdas de produtos na movimentação em centros de distribui-
aplicadas para atingir excelência na gestão de
ção. REASP, Redenção (PA), v. 2, 2017.
qualquer ramo industrial. Para uma gestão efi-
ciente é essencial estar integrado com as fer- MEIRELES, M. Ferramentas administrativas para identificar, observar e ana-
ramentas da qualidade, pois elas garantem a lisar problemas: organizações com foco no cliente. São Paulo: Editora Arte
tomada de decisões assertivas, a melhoria em & Ciência, 2001.
processos, a organização, entre outras. E a uti- OLIVEIRA, O. J. et al. Gestão da qualidade: tópicos avançados. São Paulo: Cen-
lização de metodologias visuais em reuniões gage Learning, 2009.
que precisem da atenção de todos para atingir PEDRO FILHO, Flávio de S.; MADEIRA, M. J. A.; ARENHARDT, V.; ALMEIDA, M.
os melhores resultados mostrou-se vital na tra- G.; JÚNIOR MIRANDA, J. J. S. Aplicação do ciclo PDCA na gestão da quali-
tativa da não conformidade observada. dade da produção. Revista Interdisciplinar Científica Aplicada, Blumenau,
v. 11, n. 2, 2017.
*Amanda Cordeiro Dalla Villa, UniOpet (Centro Universitário UniOpet –
RODRIGUES, A. da L.; SANTOS, M. S.; SERRA, M. C.; PINHEIRO, E. M. A utili-
Curitiba – PR), amandacordeirodallavilla@yahoo.com.br
zação do ciclo PDCA para melhoria da qualidade na manutenção de Shuts.
Aline Souza Salumb, UniOpet (Centro Universitário UniOpet – Curitiba
IJIE, Santa Catarina, v. 9, n. 18, 2017.
– PR), alinesalum@ymail.com
SHEWHART, W. A. Statical method from the viewpoint of quality control.
REFERÊNCIAS Washington, D.C.: Graduate School of the Department of Agriculture,
1939.
AGUIAR, S. Integração das Ferramentas ferramentas da Qualidade qualidade
ao PDCA e ao Programa Seis Sigma. Belo Horizonte: Editora INDG, 2006. SILVA, A. C. A. de M.; ALMEIDA, D. L. de. Gerenciamento da qualidade através
de uma metodologia de aplicação de ferramentas da qualidade em uma
CAMPOS, V. F. Gerenciamento da rotina do trabalho do dia a dia. 8. ed. São
Paulo: Editora Falconi, 2004. empresa de plásticos. Simpósio de Engenharia de Produção, Pernambuco,
2017.
COELHO, F. P. de S.; SILVA, A. M. da; MANIÇOBA, R. F. Aplicação das ferramen-
tas da qualidade: estudo de caso em pequena empresa de pintura. REFAS, SILVA, D. M. I.; FERNANDES, D. C.; RODRIGUES, D. de S. S.; SOUSA, J. de C. A
São Paulo, v. 3, n. 1, 2016. efetividade nos resultados apresentados como uso do ciclo PDCA na gestão
COSTA NETO, P. L. de O.; CANUTO, S. Administração com qualidade: conheci- de resultados em uma instituição financeira, . Braz. J. of Develop. Curitiba,
mentos necessários para gestão moderna. São Paulo: Blucher, 2010. v. 4, n. 7, 2018.

DANIEL, E. A.; MURBACK, F. G. R. Levantamento bibliográfico do uso das TOLEDO, J. C.; BORRÁS, M. A.; MERGULHÃO, R. C.; MENDES, G. Qualidade:
ferramentas da qualidade. Gestão & Conhecimento: revista do curso de gestão e métodos. Rio de Janeiro: LTC, 2017.
Administração da PUC-MG, Poços de Caldas, 2014. WERKEMA, M. C. C. Ferramentas estatísticas básicas para o gerenciamento
FACHIN, O. Fundamentos da metodologia. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. de processos. Belo Horizonte: Fundação Cristiano Ottoni, 1995.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 75


Cadernos

DIRETRIZES PARA
UNIVERSALIZAÇÃO DO
SANEAMENTO NO BRASIL
• Por Mário Ernesto Humberg e Paula Fernanda Morais Andrade Rodrigues

S
aneamento é pauta de políticas públicas O projeto foi iniciado em março de 2019, sen-
e de pesquisas de técnicos especialistas do entrevistados no decorrer do estudo mais de
no segmento, não apenas pela urgência vinte renomados especialistas*, internos e exter-
e magnitude do tema, mas também devi- nos ao Instituto. Tais especialistas dedicaram-se
do às propostas que visam alterar o marco regu- às diferentes áreas do saneamento durante a tra-
latório do saneamento básico brasileiro (Projeto jetória profissional e suas indicações, sugestões
de Lei n. 4.162/2019). e opiniões foram fundamentais para a elabora-
Com o intuito de contribuir nesse âmbito, o ção do documento.
Instituto de Engenharia, por meio da Divisão Também foram entrevistados representantes
Técnica de Engenharia Sanitária, Recursos Hídri- de instituições como: Secretaria de Saneamen-
cos e Biotecnologia, elaborou o estudo “Diretri- to e Recursos Hídricos do Estado de São Pau-
zes para Universalização do Saneamento no Bra- lo; Associação Brasileira das Concessionárias
sil”, que expressa a visão do Instituto, elencando Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgo-
as prioridades e os caminhos para a superação to (Abcon); Associação Nacional dos Serviços
das deficiências nas quatro áreas-chave do sa- Municipais de Saneamento (Assemae); Asso-
neamento: ciação Brasileira de Empresas de Tratamento
de Resíduos e Efluentes (Abetre); Secretaria
• abastecimento de água potável ou sani-
de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA);
tariamente segura (desde sua captação até
além de consultores que atuam (ou atuaram)
sua distribuição);
no Banco Mundial, no Comitê de Bacia do
• coleta, tratamento e destinação correta de Alto Tietê, na Trata Brasil, na Agência Nacional
esgotos; de Águas (ANA), na Companhia Brasileira de
• coleta, transporte, tratamento e destina- Projetos e Empreendimentos (Cobrape), na
ção de resíduos sólidos; Companhia de Saneamento Básico do Estado
• drenagem urbana e manejo de águas plu- de São Paulo (Sabesp), no Departamento de
viais. Infraestrutura (Deinfra) da Federação das In-
dústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), entre
O estudo tem como horizonte de tempo um
outras entidades.
prazo de 20 anos (até 2040) até a completa im-
plantação do saneamento básico no país e 40 A diversidade de instituições e de pessoas ou-
anos (até 2060) para a resolução de todas as vidas almejou a imparcialidade do estudo e a
questões ligadas à drenagem. Este é o prazo coleta abrangente de opiniões.
máximo para se chegar ao patamar dos países Os objetivos da proposta do Instituto de En-
que compõem a Organização para a Coopera- genharia são:
ção e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de • Reduzir, especialmente em áreas ocupadas
forma realista e considerando as deficiências e por populações de baixa (ou nenhuma) renda,
peculiaridades brasileiras. a mortalidade infantil e os custos emprega-

76 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


Acesse os
cadernos
no site do IE

dos para o tratamento de doenças (muitas das Como pode-se notar, a lista de objetivos é ex-
quais de veiculação hídrica). tensa, o que reflete a complexidade das ações
• Contribuir para a melhoria das condições que devem ser tomadas e a diversidade de ato-
ambientais do país por meio da remediação res necessários à implementação dessas deman-
de corpos hídricos contaminados, como cór- das. Por isso, são pontuados no projeto as res-
regos, rios, lagos, e da costa marítima, que re- ponsabilidades de cada parte envolvida. Além
cebe os efluentes desses corpos hídricos. Isso disso, as medidas foram divididas em diretrizes
levará à valorização das áreas hoje poluídas, de curto, médio e longo prazos. Dessa maneira,
estimulando o crescimento do turismo e da gestores dos governos municipais, estaduais e
oferta de empregos por ele gerados, além de federal, bem como a mídia e as diversas entida-
possibilitar a cobrança, pelas prefeituras, de des (como universidades e institutos de pesqui-
taxas de contribuição de melhoria. sa), podem entender seu papel nesse contexto e
• Criar condições para a retomada dos pro- implementar estratégias de ação.
gramas de investimento público paralisados – Universalizar o saneamento no Brasil depen-
como os projetos do Programa de Aceleração derá de um esforço conjunto do governo e dos
do Crescimento (PAC), da Caixa Econômica três poderes para modernizar as estruturas pú-
Federal e da Fundação Nacional de Saúde blicas, legais e operacionais do setor.
(Funasa) – por questões técnicas, legais ou fi- Tão importante quanto a ação governamental
nanceiras, criando condições para maior pre- é a participação da iniciativa privada – seja em
sença e investimento de empresas privadas. concessões, seja em parcerias público-privadas
• Mudar a percepção da sociedade e dos –, que deve investir na instalação e moderniza-
órgãos internacionais sobre a situação sani- ção dos sistemas de saneamento básico, na bus-
tária e ambiental do país a partir do estabe- ca por novas tecnologias e no adequado trata-
lecimento de indicadores comparáveis aos mento e disposição de resíduos.
dos países da OCDE e de prazos claros para É imprescindível também a atuação da mídia,
se atingir os níveis desses países. das escolas e das entidades sociais na cons-
• Otimizar a aplicação dos recursos nos mu- cientização da sociedade, enfatizando a impor-
nicípios menos populosos, o que permitirá tância do saneamento. Com foco na atuação
a rápida melhoria dos índices de saneamen- educacional e informativa, o Instituto de Enge-
to dessas cidades, com possível atração de nharia propõe para 2021 a inclusão, no sistema
novos empreendimentos e negócios. escolar, de informações sobre saneamento bá-
• Estimular, para o setor de saneamento, a pro- sico e sua relação com a saúde, o que ajudará a
dução nacional de equipamentos, sistemas, mobilizar a sociedade para pleitear esse servi-
acessórios e insumos. Isso acarretará o surgi- ço às autoridades.
mento de novas empresas e novos empregos O Instituto de Engenharia espera que, em
no segmento, aumentando a demanda por um futuro previsível, o país se torne referência
serviços técnicos e de engenharia especializa- na gestão e tratamento de resíduos sólidos e
dos e propiciando a criação e a expansão de efluentes, na administração eficiente e sustentá-
empresas que prestam os mais variados tipos vel de recursos hídricos e na equidade do acesso
de serviço, como consultoria, licenciamento, à água potável e sanitariamente segura, garantin-
planejamento e elaboração de projetos, cons- do, assim, a segurança hídrica no Brasil.
trução, operação, gestão, formação e treina-
mento de mão de obra especializada.
O documento, embora resultante de consulta aos especialistas cita-
• Promover debates e seminários sobre sa- dos, é de inteira e exclusiva responsabilidade do Instituto de Engenha-
neamento, buscando melhores práticas e ria, não expressando, necessariamente, as opiniões dos consultados
inovações no país e no exterior. acerca do assunto.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 77


Biblioteca

DIAS, André A.; CALIL to no dia a dia das pessoas. A principal NABAIS, Rui J. S.
JÚNIOR, Carlito; consequência do processo de desma- (organizador)
LAHR, Francisco A. R.;
terialização da moeda é a criação da Manual básico
MARTINS, Gisele C. A.
plataforma “Banco como um Serviço” de engenharia
Estruturas (Bank as a Service – BaaS). ferroviária
de Madeira São Paulo – SP,
Em outras palavras, é de fundamental
– Projetos, Oficina de Textos, 2014, 349 p.
importância que o início dos traba-
dimensionamento e
lhos seja focado na identificação dos Reunindo o conhecimento de profis-
exemplos de cálculo
seus componentes e na determinação sionais com anos de experiência em
Rio de Janeiro – RJ,
do custo total atual do dinheiro físi- estudos operacionais, projeto, manu-
Elsevier, 2019, 186 p.
co. O custo da utilização do dinheiro tenção e material rodante, o “Manual
A madeira encontra muita resistência físico como meio de pagamento está básico de engenharia ferroviária”
ao seu uso na construção civil, princi- distribuído nas etapas de: supre a carência de materiais de con-
palmente devido aos poucos cursos (i) produção e emissão; sulta atualizados e abrangentes em
ministrados na engenharia civil e na transporte ferroviário.
(ii) custódia;
arquitetura.
(iii) distribuição para o atacado e varejo; e A obra aborda de maneira prática e
Neste livro são apresentados os cri- detalhada os conceitos básicos, as
térios de dimensionamento de ele- (iv) transações realizadas.
principais noções sobre equipamen-
mentos estruturais de madeira à luz tos, operação e manutenção da via
da nova ABNT NBR7190/2019, além RODRIGUES, Roberto
permanente e todas as etapas de um
(organizador)
de exemplos de cálculo, fundamen- projeto de ferrovia, englobando estu-
tal para os profissionais de projeto e Agro é paz dos operacionais, básicos e de infraes-
cálculo dessas estruturas. Os capítulos São Paulo – SP, trutura, além de projeto de obras de
estão divididos em partes com a fina- Esalq, 2018, 412 p. arte especiais, de sistemas e de obras
lidade de identificar as diversas fases O mundo espera que o Brasil assuma complementares. Uma importante
de projeto e dimensionamento dos um papel cada vez mais proeminen- referência para estudantes, empresas
elementos estruturais de madeira. te na missão que a humanidade tem operadoras ferroviárias e profissionais
de enfrentar do século XXI em diante: em engenharia ferroviária.
MANSUR, Ricardo compatibilizar a oferta de alimentos
Blockchain e seguros a toda a população do pla- WOISCHNIK, Jon
Distributed neta com a preservação dos recursos Democracia,
Ledger naturais. diálogo e
Technologies Não se trata de desafio trivial, mas cooperação
(DLTS): desafios também não é missão impossível de Rio de Janeiro – RJ,
e oportunidades ser vencida. Com uma estratégia bem Konrad Adenauer
Rio de Janeiro – RJ, Editora articulada entre o público e o privado, Stifung, 2019, 223 p.
Ciência Moderna, 2019, 247 p. a fome será eliminada e a paz mun- A Fundação Konrad Adenauer (KAS) é
O projeto de digitalização da moeda dial, garantida: porque não haverá uma fundação política alemã. Através
soberana de uma nação é um esforço paz enquanto houver fome. do seu escritório central na Alemanha,
que exige a identificação e comunica- Este livro aponta alguns caminhos gerencia mais de 200 projetos, abran-
ção dos benefícios tangíveis da inicia- para essa estratégia a partir da visão gendo mais de 120 países. Os proje-
tiva, por causa do seu elevado impac- de grandes especialistas brasileiros. tos, os debates e as análises visam ao

78 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


desenvolvimento de uma forte base SOUZA, Giselle C. a interpretação mais adequada das
democrática para ação política e coo- Um estudo exigências, acrescentando exemplos
peração. sobre as origens práticos quando cabível.
No Brasil, as atividades da fundação da lógica
concentram-se no diálogo de segu- matemática BENITE, Anderson;
Natal – RN, Editora da TANIGUTI, Eliana;
rança internacional, educação política,
GONZALEZ, Pedro
estado de direito, funcionamento de UFRN, 2012, 232 p.
Manual da
instituições públicas e seus agentes, A coleção “Arquivo para a história da
sustentabilidade
economia social de mercado, política teoria dos números e da lógica” reú-
da construção
ambiental e energética, assim como ne trabalhos originais e traduções de
em aço
as relações entre o Brasil, a União Eu- obras clássicas referentes à história
Rio de Janeiro – RJ,
ropeia e a Alemanha. das referidas áreas da matemática.
CBCA, 2019, 84 p.
A coleção pretende apresentar recur-
MACHADO, Edson sos para a delineação do desenvol- Com o objetivo de disseminar in-
vimento histórico das duas mencio- formações técnicas e as melhores
Engenharia de
nadas áreas, o esclarecimento das práticas relacionadas à construção
software com em aço, o Manual da Sustentabili-
Access VBA relações existentes entre elas e a in-
vestigação de como se inseriram nos dade da Construção em Aço discute
Rio de Janeiro – RJ, o assunto sob a ótica da operação do
contextos históricos, não somente da
Editora Ciência edifício, com foco na gestão de facili-
Moderna, 2020, 214 p.
matemática em geral, mas também
nos contextos históricos das culturas dades, como economia de energia e
O avanço da tecnologia nos tem feito gerais das quais faziam parte nos vá- de água na operação do edifício.
deslumbrar um mundo novo de pos- rios estágios do seu desenvolvimento. A partir das questões levantadas, es-
sibilidades, novas formas de acesso a pera-se que ampliar a visão das apli-
dados. Hoje, temos a tecnologia touch MORENO, Hilton cações do aço e de seus benefícios
screen, a robótica, a biometria digital em prol da sustentabilidade.
Cabos elétricos
e a ocular. Mas todas elas têm o mes- para instalações
mo fundamento – a programação. fotovoltaicas FIKER, José
A ferramenta de programação mais São Paulo – SP, Manual prático
acessível e dinâmica é o Access VBA. Cobrecom, 2019, 69 p. de direito das
Entre os temas apresentados no pri- construções
A obra é uma compilação de trechos
meiro volume estão o desenvolvi- de materiais já publicados pelo autor
São Paulo – SP –
mento da função da Torre de Hanói Leud, 2018, 149 p.
em artigos, revistas, seminários, inter-
(Progressão Geométrica) e as aplica- net e outras fontes, além de muitos Com texto facilmente assimilável e
ções e o desenvolvimento de barra de textos inéditos que complementam com o auxílio de interessantíssimas
progresso para discriminar dados e as informações. gravuras, a obra trata daquilo que é
percentuais em aplicativos. Este documento é totalmente basea- juridicamente essencial na construção
No segundo volume, o livro aborda a do nos requisitos das várias normas civil: noções de direito, ações envol-
sequência de Fibonacci, gráficos de técnicas que envolvem o mundo dos vendo perícias, direito de vizinhança,
barra a partir de funções logarítmicas condutores elétricos existentes na desapropriação, mediação e arbitra-
e matrizes (Arrays) para exibição de época da sua publicação e procura, gem e teoria geral dos contratos.
vídeos e imagens simultaneamente. na medida do possível, disponibilizar

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 79


Por Dentro

Acorda, Brasil: Shigeaki Ueki Acordo de


sugere ações para mudar o país cooperação com
a WRI Brasil
Fotos: divulgação

O IE assinou um acordo de coope-


ração com o World Resources Institu-
te (WRI) Brasil, filial do instituto no
país. O pacto se baseou na discussão
Educação, Reformar para Mudar, do IE e ressaltou a necessidade de de projetos estratégicos para grandes
projetos estratégicos do IE e os gran- um olhar mais objetivo sobre educa- cidades, com a sugestão de desenvol-
des desafios da sociedade foram os ção, ciência, tecnologia e engenharia ver propostas para a capital paulista.
temas predominantes do encontro, como estimuladoras de mudanças. Da casa participaram: o presidente,
promovido pelo presidente da Casa, “Precisamos apoiar ações e atividades Eduardo Lafraia; a VP de Assuntos In-
Eduardo Lafraia, com Shigeaki Ueki, que ajudem o Brasil a mudar e dentre ternos, Miriana Marques; o coordena-
ex-ministro e ex-presidente da Petro- elas destaco a educação, custo Brasil, dor do Departamento de Mobilidade
bras, na sede do instituto. Ueki conhe- legislação trabalhista, reforma admi- e Logística, Ivan Whately; e o superin-
ceu os projetos e as ações estratégicas nistrativa e energia renovável”, disse. tendente, Adriano Silvério.

Instituto debate
a Linha 13-Jade da
CPTM e o Expresso
Aeroporto
Soluções para a Linha 13-Jade da
CPTM e para o Expresso Aeroporto fo-
ram debatidas em encontro mediado
por Eduardo Lafraia, presidente do IE,
Jurandir Fernandes, presidente da ciação dos Engenheiros e Arquitetos as etapas seguintes do projeto.
União Internacional de Transportes de Metrô (AEAMESP); Vicente Abate, Entre os representantes do IE esta-
Públicos (UITP) – Divisão América Lati- presidente da Associação Brasileira vam Ricardo Kenzo, VP de Relações
na, e Clodoaldo Pelissioni, ex-secretá- da Indústria Ferroviária (Abifer); e Externas; Ivan Whately, diretor do De-
rio dos Transportes Metropolitanos do Jean Pejo, secretário-geral da Asso- partamento de Logística e Transporte;
Estado de São Paulo. ciação Latino-Americana de Ferrovias o conselheiro Fernando Portella; e
Participaram também da conversa (Alaf). Nas próximas semanas, o gru- Flaminio Fichmann, coordenador da
Pedro Machado, presidente da Asso- po deve voltar a discutir para alinhar DT de Transportes Metropolitanos.

80 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


Senador Major O intuito da reunião foi disponibi- IE se reúne com
lizar o Instituto para assessorar pos-
Olimpio é recebido síveis trabalhos que envolvam enge- representantes
pela diretoria do IE nharia e tecnologia. Major Olimpio se da FNQ
propôs a levar ao Congresso assuntos
que já são tratados e pesquisados pelo
IE. “Esse encontro é uma oportunida-
de de juntarmos as esferas política e
técnica”, salientou José Félix Drigo, da
DT de Incêndio do IE.
Participaram do encontro: o pre-
sidente do IE, Eduardo Lafraia; o VP
de Administração e Finanças, Arlindo
Representantes da Fundação Na-
Moura; o VP de Relações Externas,
cional de Qualidade (FNQ) se reuni-
Ricardo Kenzo; a VP de Assuntos Inter-
ram com diretores e coordenadores
Sérgio Olimpio Gomes, major da nos, Miriana Marques; o coordenador
do IE para propor a aplicação de
reserva da Polícia Militar de São Paulo e o vice da DT de Incêndio, respectiva-
seu Modelo de Excelência da Ges-
e senador pelo mesmo estado, foi re- mente, Carlos Cotta Rodrigues e José
tão (MEG), em parceria com a DT
cebido pela diretoria do IE na sede da Félix Drigo; e também a consultora
de Qualidade e Produtividade. O
Instituição. jurídica Júlia Corrêa Lourenço.
MEG tem como princípio o estímu-
lo do alinhamento, da integração,
do compartilhamento e do direcio-
namento em toda a organização de
uma empresa, para que atue com
excelência na cadeia de valor e gere
Secretário de Saneamento visita o IE resultados a todas as partes interes-
sadas. Participou da reunião o presi-
dente do Instituto, Eduardo Lafraia,
acompanhado do VP de Relações
Externas, Ricardo Kenzo; da vice-
-coordenadora da DT de Qualidade
e Produtividade, Tatiana Lourenço
Machado; e do superintendente,
Adriano Silvério.
O secretário Pedro Paranhos (ao para colaborações. Do instituto, es-
centro), da Secretaria Nacional de tavam presentes o VP de Administra- Confira os cursos, palestras
Saneamento, foi recebido pelo presi- ção e Finanças, Arlindo Moura; o VP e eventos do IE e faça sua
dente da entidade, Eduardo Lafraia. de Relações Externas, Ricardo Kenzo; inscrição pelo site
Durante o encontro, foi apresentado a coordenadora da DT de Engenharia
ao secretário o mais novo Caderno Sanitária e Recursos Hídricos e Bio- www.institutodeengenharia.org.br/site/agenda

Especial do IE, cujo tema central são tecnologia, Paula Fernanda Rodri-
as diretrizes para a universalização gues; e o consultor Celso Matsuda.
do saneamento no Brasil. O IE se Também participaram do encontro
prontificou a ajudar Paranhos com o secretário nacional de Mobilidade
sua agenda de saneamento, e este Urbana, Jean Pejo, e o jornalista Ma-
deixou várias possibilidades abertas rio Humberg.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 81


Memórias da Engenharia

A ME M Ó R I A V I VA D E
SHIGEAKI UEKI
• Por Kassia Nobre

S
higeaki Ueki lembra-se com detalhes estudava contabilidade, fui trabalhar no es-
da infância e da adolescência na cida- critório de engenharia e construção de um
de de Bastos, no interior de São Pau- profissional famoso na época. Passei pratica-
lo, até os momentos áureos da des- mente a minha vida no Largo São Francisco.
coberta de petróleo na Bacia de Campos da Trabalhava no escritório de engenharia du-
Petrobras. rante o dia e à noite estudava”, lembra.
Aos 85 anos, relata com detalhes sua traje- Após o término do curso técnico, estudou
tória, que se iniciou na escola pública Ginásio direito na Pontifícia Universidade Católica de
São José de Bastos. São Paulo (PUC-SP).
“Bastos, apesar de ser uma cidade muito “Depois de me formar, trabalhei no setor
pequena, tinha escola pública com excelen- do comércio e de produção. Pratiquei advo-
tes professores. Devo aos bons professores cacia por uns três anos, mas depois comecei
todo o meu preparo. Obviamente que os a trabalhar com empresários. Cheguei a par-
meus melhores professores foram os meus ticipar de indústrias que produziam gram-
pais”, conta. pos para cabelo, alfinetes, lanterna de mão.
Aos 15 anos, em 1950, mudou-se para a ci- Depois, fundei uma fábrica de lâmpadas elé-
dade de São Paulo, para concluir os estudos. tricas para painéis de controle de veículos e
“Na época, para fazer o segundo ciclo do co- aviões. Chegamos a ter quatro fábricas, mas,
legial, era preciso fazer exame de admissão. infelizmente, todas estas atividades perde-
Eu e meus amigos conseguimos entrar nas ram competitividade na década de 90. Aca-
melhores escolas de São Paulo. Resolvi fazer bamos fechando.”
curso técnico de contabilidade.”
Ueki ingressou no curso técnico de conta- A trajetória no governo
bilidade da Fundação Escola de Comércio A amizade com Paulo Egydio Martins, ex-
Álvares Penteado (Fecap), entidade da qual -governador de São Paulo e ex-ministro da In-
hoje é presidente e há 30 anos é membro do dústria e Comércio do governo Castelo Bran-
Conselho de Curadores. co, foi fundamental para o início da carreira
“Escolhi um curso técnico pelo fato de ser de Ueki no setor público.
o primeiro filho e o meu pai dizer que não te- “Foi o Paulo Egydio quem me apresentou
ria condições de me manter em São Paulo só ao presidente Ernesto Geisel, o que mudou
para estudar. Eu teria que trabalhar”, conta. toda a minha história. Fiquei do governo Cas-
O seu primeiro emprego foi no Banco Mo- telo Branco até o fim do governo João Figuei-
reira Salles, aos 16 anos. “Depois, enquanto redo. Foram 20 anos no setor público”, relata.

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“A história da Petrobras nesse
período é de sucesso e deixamos
uma herança muito boa”

Arquivo pessoal
Shigeaki trabalhou ainda para uma indús-
tria petroquímica na produção de polietile- Shigeaki Ueki, presidiu a Petrobras e foi ministro de Minas e
no. “A atuação na indústria petroquímica me Energia
obrigou a estudar muito sobre o setor do
petróleo”.
Durante o governo Costa e Silva, com 32
anos, Ueki recebeu o convite para trabalhar
na Organização dos Estados Americanos
(OEA), em Washington. “Casado e com dois
filhos resolvi largar tudo. Convenci a minha
mulher a me acompanhar e fomos morar em A descoberta de petróleo
Washington”, conta. Como ministro de Minas e Energia, Shigeaki
Após um período nos Estados Unidos, de- acompanhou a descoberta, pelo geólogo
cidiu voltar ao Brasil. Ao chegar, em 1969, Carlos Walter Marinho Campos, de petróleo
foi convidado por Ernesto Geisel, então pre- na Bacia de Campos, localizada entre o lito-
sidente da Petrobras do governo de Emílio ral sul do Espírito Santo e o norte do Rio de
Médici, para assumir a diretoria comercial e Janeiro.
financeira da estatal. “A minha alegria era tão grande que falei
“O que me ajudou muito foi todo o meu uma bobagem numa entrevista. Falei que es-
passado de aprendizado na contabilidade tava tão feliz que ia me fantasiar de barril de
industrial. Na área comercial, já tinha tido petróleo para sambar na Praça dos Três Pode-
experiência com vários produtos e não foi res durante o Carnaval”, relembra.
difícil assumir esta responsabilidade.” Ueki comenta a mudança na história da pro-
Assim que Ernesto Geisel se tornou presi- dução de petróleo no país, que passou a ser
dente da República, Ueki assumiu o Ministé- exportador do produto, por causa da desco-
rio de Minas e Energia. berta. “A história da Petrobras nesse período
“Quando o Geisel se tornou presidente, o é de sucesso e deixamos uma herança muito
primeiro convite foi para eu ser ministro da boa”, orgulha-se.
Agricultura. Depois, o presidente decidiu que Hoje em dia, Shigeaki se dedica ao setor
eu seria ministro da Indústria e Comércio. Mas, químico (pine química) com participação em
ao final, decidiu que eu seria ministro de Minas empresas nos estados de Santa Catarina, São
e Energia. Sobre minas eu não entendia quase Paulo e Minas Gerais, além da Malásia, no ex-
nada, mas estudei muito. Energia eu já estava terior. “Felizmente, apesar das dificuldades,
bem familiarizado e não foi nada difícil.” estamos sobrevivendo”, conclui.

Nº 643 / 2020 www.iengenharia.org.br | ENGENHARIA 83


Engenho e Arte

ÁUSTRIA, BERÇO DE VINHOS


COR DE ESMERALDA
• Ivan Carlos Regina*

A
Áustria é um pequeno país locali- Os Grüner Veltliner podem apresentar a ele-
zado na Europa Central, cuja língua gância e finura dos Rieslings, mas normalmente
principal é o alemão. Foi o primeiro fornecem aromas e sabores de pimenta bran-
país a ser invadido pela Alemanha ca, tabaco, legumes e, ocasionalmente, toranja.
nazista na Segunda Guerra. Tem uma produ- Ambas as variedades são encorpadas e
ção de vinho bastante pequena, ocupando o têm estrutura ácida, fazendo delas um ótimo
19ª lugar no ranking, abaixo até do Brasil, que acompanhamento para vários pratos.
ocupa a 14ª posição.
Os vinhos feitos com as uvas Pinot Blanc
A origem de seus vinhedos remonta ao Im- (chamada Weissburgunder na Áustria), Pinot
pério Romano, cujos habitantes estabelece- Gris (Grauburgunder) e Sauvignon Blanc têm
ram-se lá por volta de 15 a.C. e fundaram a pureza de fruta e sabores delicados, raramen-
província romana de Nórica. te passam por madeira e não chegam ao ní-
Em 788, a região foi conquistada por Car- vel qualitativo dos vinhos feitos com as uvas
los Magno, introduzindo o cristianismo. Reza Riesling e Grüner Veltliner.
a lenda que o imperador adorava vinho bran- Os vinhos tintos feitos com as castas au-
co, pois o tinto lhe manchava a copiosa bar- tóctones  Blaufrankisch e St-Laurent (ou com
ba ruiva, prejudicando sua imagem. A seu resultado do cruzamento de ambas, a Zwei-
comando foram introduzidas uvas brancas na gelt) e as variedades exógenas Pinot Noir e
região da Borgonha, e, em sua homenagem, Cabernet Sauvignon apresentam estilo mais
passou-se a produzir, com a uva Chardonnay, leve, sendo próprios para serem consumidos
o fantástico vinho branco da apelação Cor- durante as refeições.
ton-Charlemagne.
A classificação de qualidade lembra um
Na Áustria, os vinhos mais importantes são pouco a legislação alemã. Na base da pirâmi-
os brancos. Feitos com a uva autóctone Grüner de ficam os vinhos de mesa e de país. Depois,
Veltliner, a mais plantada, e a Riesling, eles são vêm os vinhos de qualidade, intitulados Qua-
semelhantes aos vinhos alemães, com os quais litatswein (Steinfeder para a região de Wa-
são muitas vezes injustamente confundidos. chau), seguidos, em ordem ascendente, dos
As principais regiões produtoras ficam nas Kabinett (Federspiel para Wachau), que não
ondulações ao longo do rio Danúbio, a oeste recebem chaptalização (adição de açúcar no
de Viena, com vinhedos muitos bonitos em mosto), e dos Spatlese, que na região de Wa-
Kremstal, Kamptal e Wachau. chau recebem o nome de Smaragd devido ao
Os Rieslings austríacos se assemelham aos lagarto verde que habita as vinhas.
alemães, pois também apresentam frutas cí- Ainda existem os termos Ausbruch, vinho
tricas, pêssegos e algumas tropicais, mas são doce feito com as uvas atacadas pelo fungo
mais secos, minerais e encorpados, talvez apre- Botrytis cinerea, e Strohwein, que significa, li-
sentando mais semelhança com os Rieslings teralmente, vinho de palha, feito da mesma
franceses da Alsácia. forma que seu homônimo francês.

84 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


Os austríacos têm importante participação
na produção de vinhos doces, que acom-
panham magnificamente suas inesquecí-
veis sobremesas. Os melhores vinhos são
encorpados, aristocráticos, maravilhosos ao
beber, com gosto e aromas que lembram
frutas, solo, pedras e temperos exóticos.
A culinária austríaca remonta ao tempo que
era a joia da coroa do Império Austro-Hún-
garo, com influência de Hungria, Eslovênia,
Romênia, Polônia, Itália, Morávia e Boêmia.
Após a Primeira Guerra Mundial, a Áustria
perdeu sua saída para o mar, mas sua cozi-
nha mantém viva as lembranças dessa época,
sem esquecer-se de seu principal ingredien-
te: o porco.
Os pratos mais populares são o goulash, de
influência húngara, as panquecas e os Kno-
del, bolinhos cozidos feitos com farinha de
batata e recheados com inúmeras carnes.
O toicinho é sempre a primeira escolha de
gordura dos austríacos, não só para compor
pratos, mas também para fritar, em forma de
gordura (banha).
Os vinhos feitos com a Grüner Veltliner, por
sua notável acidez, servem magnificamente
para acompanhar pratos mais gordurosos.
Os Rieslings vão melhor com pratos mais
delicados, à base de peixes, frutos do mar e
carne de porco com sabor menos intenso.
Se quiser degustar uma sobremesa austría-
ca tremendamente saborosa, experimente
um cálice de vinho doce acompanhado de
Apfelstrudel (torta de maçã) ou da irresistível
Sachertorte (torta de chocolate recheada de
geleia de damasco).
Saúde aos habitantes de boa vontade de
todo o mundo! Ergamos nossa taça neste
brinde universal.

*Ivan Carlos Regina é engenheiro do setor de transporte público,


associado do Instituto de Engenharia e autor dos livros "Vinho, o
Melhor Amigo do Homem" e "Harmonizando Vinho & Comida".
E-mail: ivanregina@terra.com.br

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Crônica

SUPÉRFLUOS

Pixabay
& PECADOS
• Por Miguel Fernández y Fernández*

R
ecentemente, os jornais noticiaram coisas pecaminosas), para os que dependem
declaração do ministro Paulo Gue- dos empregos que supérfluos e pecados ge-
des sobre criar um imposto do “peca- ram, não tem graça nenhuma.
do”. Segundo o noticiário, o ministro se A Acobar vive dizendo, com proprieda-
referiu a cigarros, bebidas alcoólicas, açúcar de, que a construção de barcos de recreio
(!) etc. Não citou artes, livros, sexo e sacana- é supertaxada no Brasil porque se estabele-
gem, mas preocupei-me. ceu que ter um barco é luxo, esquecendo os
Camisinha passará a ser taxada como pe- milhares de empregos que gera, não só na
cado ou como supérfluo? Está tudo orques- construção, mas também na operação e na
trado! Foi combinado com Damares que, ao manutenção desses barcos de recreio, e que,
propor a abstinência, transforma a camisinha assim como os cassinos, a turma acaba tendo
em pecado e em supérfluo ao mesmo tempo. barcos lá fora e jogando lá fora (literalmente)
E dizem que o governo está batendo cabeça. recursos e empregos que poderiam ser nos-
Lembrei-me de uma frase que vi pichada no sos, além de afastar a classe média desses
banheiro do restaurante Alvaro’s, no Leblon, mercados e transformar idas a outros países
em meados dos anos 70, quando o então em um desejo coletivo permanente.
ministro Mário Henrique Simonsen criou um É possível que a ideia de Guedes não passe
imposto sobre “supérfluo” que atingia, entre no Congresso, já que o pecado da luxúria e
outras coisas, o uísque, o cigarro e barcos de da sacanagem vai acabar taxando o Judiciá-
recreio. A frase era: “O poder embriaga, aí o rio, o Legislativo e o Executivo; e ninguém dá
uísque é supérfluo, assinado M. H. Simonsen”. tiro no pé de propósito, ficando aqui o aviso.
Como o Simonsen era um inveterado fu- E, suprema ironia, presidentes ditos milita-
mante e conhecido apreciador de uísque (en- res (Bolsonaro & Geisel) com ministros ditos
tre outras coisas), a gozação era sensacional, liberais (Guedes & Simonsen). 
e estar no banheiro era o deboche supremo Não vai dar nem deu certo ou há e houve
(a censura não deixaria na imprensa). Nunca muita mentira. Compatibilidade de militar
me esqueci disso. com liberais é pouco crível. Ou não é milico,
Pecados e supérfluos podem ser supérfluos ou não é liberal.
e pecados para quem não os curte ou não
precisa, mas, para aqueles que vivem disso, *Engenheiro, cronista e liberal (autêntico). 
de produzir coisas ditas supérfluas (agora www.engenheiromiguelfernandez.com.br.

86 ENGENHARIA | www.iengenharia.org.br Nº 643 / 2020


MAIS DE TRINTA MIL
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da mídia e seu amadurecimento. A partir de 2016, em comemoração aos seus 30 anos,
passou a publicar edições especiais e temáticas.
Entre os temas já abordados estão democracia, economia, liberdade de imprensa, sociedade,
diversidade, cultura, educação, sustentabilidade, agronegócio, tecnologia, longevidade, esporte e mobilidade.
Mais de trinta mil páginas resgatam os principais fatos da imprensa brasileira.
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