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Um projeto estruturante
Paula Franco, Bastonária
ABRIL 2022 3
FICHA TÉCNICA SUMÁRIO
6
ANO XXII
REVISTA N.º 265 • ABRIL 2022
Propriedade
Ordem dos Contabilistas Publicidade
Certificados Departamento
de Comunicação
Avenida Barbosa e Imagem da Ordem
du Bocage, 45
1049-013 Lisboa Produção editorial
Contribuinte n.º 503 692 310 e revisão
Telefone: 217 999 700 Departamento
de Comunicação
Diretora e Imagem da Ordem
Paula Franco
Telefone:
Diretores adjuntos 217 999 715/17/18/19
Joaquim Jorge Barbosa Fax: 217 957 332
Cristina Pena Silva comunicacao@occ.pt Entrevista a Miguel Albuquerque
Manuel Teixeira
Helena Costa www.occ.pt
Álvaro Costa
38
Pedro Nuno Ferreira Impressão
LiderGraf
Redação
Jorge Magalhães Tiragem
Nuno Dias da Silva 10 001 exemplares
CONGRESSO
Design e paginação Depósito legal
Duarte Camacho N.º 150317/00
João Martins ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS
Sara Brás ISSN ALTICE ARENA · 21, 22 E 23 SETEMBRO 2022
1645-9237
Fotografia
Filipe Mendonça Organismos
Micaela Neto internacionais
Raquel Wise a que a Ordem pertence:
Secretariado
Raquel Carvalho
Inscrições abertas para o 7.º Congresso.
Colaboram nesta edição
Christina Oliveira
42
Eduardo Mendes Fonseca
Helena Saraiva
João Cabaços
Manuel Faustino
Paula Franco
Rui Portela
XVI
Encontro Nacional
dos Contabilistas
Certificados
9 julho 2022
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SUMÁRIO
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NOTÍCIAS
14 Apresentação pública do projeto de certificação de qualidade
19 I Encontro Insular dos Contabilistas Certificados
31 Conferência «Contabilidade e Tecnologia – Passado, presente e futuro»
37 Bastonária participou em webinar «Contabilista de sucesso»
38 7.º Congresso dos Contabilistas Certificados
39 Isenção de IVA – Esclarecimento da Autoridade Tributária | Formação sobre a Lei n.º 7/2021
40 SGPS – Inventário das partes de capital | Formação em contratação pública | Conferência dos colégios das especialidades
41 Conferência «A Contabilidade e Gestão na atividade agrícola», em Santarém | Proposta do OE 2022 – Análise da OCC |
Relato Integrado Intercalar | Atendimento técnico alargado
42 Inauguração da representação de Beja | XVI Encontro Nacional dos Contabilistas Certificados
43 Balanço do «Programa Empresas Turismo 360.º» | Reunião livre em Sernancelhe
44 Empossada nova presidente do CCISP | João Vieira Lopes reconduzido na CCP
45 Bastonária em conferência no ISCTE | Livro: «Impostos – Teoria geral»
46 Ordem nos media
FISCALIDADE
47 DAC 7 – Nova obrigação de informação para os operadores de plataformas digitais, inspeções conjuntas, relevância
previsível e outras modificações normativas
51 Racionalidade, ou falta dela, na evolução da tabela do IRS
53 A limitação da dedutibilidade fiscal em IRC e a aplicação de taxas de tributação autónoma sobre importâncias pagas ou
devidas a entidades submetidas a regimes de tributação mais favoráveis
COLABORAÇÃO ISCAC
64 O direito à desconexão do trabalhador na União Europeia e no ordenamento jurídico interno.
CONSULTÓRIO
69 Perguntas e respostas
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PERFIL
Miguel Albuquerque nasceu no
Funchal, a 4 de maio de 1961. Ad-
vogado de formação, atividade
profissional que exerceu entre
1986 e 1993, sucedeu na presi-
dência do Governo Regional da
Madeira ao histórico Alberto João
Jardim, após vencer as eleições
regionais com maioria absoluta,
em março de 2015. Foi reeleito
para novo mandato em setembro
de 2019. Antes de assumir a cadei-
ra do poder na Quinta Vigia, es-
teve praticamente duas décadas
como presidente da Câmara do
Funchal (1994-2013). Entre 1994 e
2002, foi membro do conselho
diretivo da Associação Nacional
dos Municípios Portugueses. Foi
ainda deputado, à Assembleia
Legislativa Regional, eleito pelo
PSD, entre 1988 e 1992.
ENTREVISTA
Contabilista – Disse que a propos- panorama, prosseguimos no caminho Madeira (RAM) ao abrigo da Lei das
ta do Orçamento do Estado (OE) do empobrecimento gradual, nomea- Finanças Regionais (LFR), o que
para 2022, entretanto chumbada damente face aos nossos principais corresponde a uma redução de 15
pela dissolução da Assembleia da competidores europeus. milhões face a 2021…
República, era «péssima». Que opi- M.A. – Creio que chegámos a um
nião tem sobre a proposta do OE Contabilista – Como é que se inver- beco sem saída. Ou o Estado assume
que está, atualmente, em debate no te este rumo? as responsabilidades constitucionais,
Parlamento? M.A. – Alterando a política, com o inclusive os custos de soberania nas
Miguel Albuquerque – As políticas Estado a dotar a sociedade dos instru- regiões – basta lembrar que até os
em Portugal estão ao contrário. O mentos necessários para o crescimen- subsistemas de saúde, neste momen-
que precisamos, neste momento, é de to económico e que passa pelo apoio às to, são suportados pelos contribuintes
apostar no crescimento económico e empresas, a captação de investimento da RAM – ou temos um problema.
na transição digital. Caso não o faça- estrangeiro, a qualificação e a inte-
mos teremos poucas hipóteses de sair gração das novas gerações na tran- Contabilista – E como se resolve?
deste círculo vicioso. A dívida públi- sição digital que, no fundo, constitui M.A. – Há dois caminhos: ou o Esta-
ca é praticamente de 130 por cento do – não me canso de repetir – a grande do comparticipa as áreas da educação
PIB, acumulamos, há mais de 25 anos, oportunidade para Portugal. e saúde na Região ou, em alternativa,
um crescimento medíocre e temos o passa a dotar a RAM dos instrumentos
problema que é o do Estado continuar Contabilista – Esta proposta de OE necessários para que possamos de-
a assumir responsabilidades e o ónus para 2022 contempla 217 milhões senvolver as nossas próprias políticas
sem ter receita para o fazer. Com este euros para a Região Autónoma da para a captação de receitas. Neste mo-
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ENTREVISTA
mento, é o que está em equação. Não mitação com a taxa dos impostos para para a economia digital. A sediação de
podemos é ter uma LFR que estran- a Região é de 30 por cento. Temos, empresas, plataformas e profissionais
gula e diminui as transferências, ano neste momento, o IRC a 14,7 por cento, em Portugal pode ser feita sem estar
após ano. que são os 30 por cento a menos dos 21 a onerar os custos de mobilidade de
por cento. A nossa ideia seria colocá- pessoas ou de bens e serviços. Esta é,
Contabilista – Depreende-se que -lo em 10 por cento. Presentemente, por isso, uma oportunidade que não
defende uma reforma da LFR... estamos a trabalhar para a redução podemos desperdiçar.
M.A. – A LFR precisa de ser mudada. gradual do IRS que, no próximo ano,
Todos os anos diminuem as receitas. ficará completa, nomeadamente no Contabilista – Pretende que a Ma-
Onde é que isto vai parar? que diz respeito aos primeiros qua- deira se torne uma espécie de Irlan-
tro escalões. O primeiro e o segundo da do Atlântico?
Contabilista – A Constituição da escalão já têm o diferencial de 30 por M.A. – O Centro Internacional de Ne-
República também devia merecer cento. O terceiro escalão 20 por cento gócios da Madeira (CINM) devia ser
algum ajuste? (era de 14 por cento) e o quarto escalão visto pela República e por quem pensa
M.A. – A Constituição devia ser revis- passou de 7 para 15 por cento. O que – se há alguém que pense neste país! –
ta. Existem um conjunto de matérias significa que, desde 2016, temos me- como uma sediação para as empresas
na Lei Fundamental que deviam ser nos 61 milhões de euros de IRS, com portuguesas. Não faz nenhum sentido
mudadas. É preciso não esquecer que as reduções dos escalões principais e que as principais empresas nacionais
a Constituição foi aprovada em 1976 e à volta de 14 a 15 milhões de euros/ano estejam localizadas na Holanda, em
se se olhar para a evolução do mun- menos com a redução no IRC. E temos vez de estarem em Portugal.
do nos últimos anos, é possível ver o também a redução dos 30 por cento
quanto está desfasada da realidade. A na derrama. O nosso objetivo é claro: Contabilista – E não estão porquê?
Constituição da República deve, por prosseguir esta redução fiscal, porque M.A. – Portugal não luta para criar as
isso, ser adaptada aos tempos mo- só assim é possível atrair empresas e mesmas condições de competitivida-
dernos. A economia mundial mudou captar capital estrangeiro. E isso só de no CINM, o que leva ao êxodo para
mais nos últimos 20 anos do que nos se concretiza criando um hub para a o estrangeiro das maiores e principais
últimos 200. Estou quase a cumprir 61 fixação das grandes multinacionais. empresas. É ridículo!
anos e devo confessar que gosto imen- O país está descapitalizado e precisa
so de falar com malta mais nova, para de criar empresas, preferencialmente Contabilista – É possível conciliar
perceber as mudanças. E o que temo com escala. Lamentavelmente, está o CINM e a RAM como uma zona
é que os decisores políticos em Por- tudo ao contrário. de baixa fiscalidade? São objetivos
tugal estejam presos a um conjunto compatíveis?
de conceitos e de vivências que já não Contabilista – Que erros aponta à M.A. – São objetivos que se comple-
existem. Os desafios mudaram, são estratégia que está a ser seguida? mentam muito bem. Nós tomámos a
outros. M.A. – Portugal devia ter uma estra- decisão de acabar com as atividades
tégia para ser o grande hub tecnoló- financeiras no CINM que, como é sa-
Contabilista – Disse que a Madeira gico da Europa. E temos condições bido, eram muito importantes para
não cobra IRC mais baixo porque para o fazer, porque a transição para o Centro e para Portugal. Em conse-
«as regras constitucionais neste a economia digital vai ser a grande quência, o Luxemburgo, Malta, a Ho-
país esquisito» não permitem. Esse oportunidade para o nosso país. Como landa e a praça financeira de Londres
é um instrumento fulcral para de- país periférico na Europa, Portugal atraíram as empresas que abandona-
senvolver a Região? só consegue esbater a ultraperiferia ram o CINM. É preciso perceber, de
M.A. – É um dos instrumentos. A li- física aproveitando a transformação uma vez por todas, que o Estado tem
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crescimento exponencial e o alcance ro e dívida para crescer. O que sucede uma linha política para permitir que
da acelerada transição tecnológica que é que estas duas tendências estão pa- conseguíssemos os nossos objetivos.
estamos a testemunhar. Relativamente tentes e constantes nas últimas duas
ao primeiro ponto, o cidadão comum décadas. Ninguém fala disto porque Contabilista – O alívio da carga fis-
não compreende porque estamos ha- estamos num surto de inflação, mas cal seria um dos caminhos para uma
bituados ao crescimento linear, que a tendência é a tecnologia contribuir nova estratégia?
é mensurável. O crescimento expo- para acelerar uma lógica deflacionária. M.A. – Em Portugal insiste-se em
nencial não é mensurável. Por outro tributar tudo o que mexe. Veja o caso
lado, de 18 em 18 meses, a capacidade Contabilista – Disse há momentos do alojamento local. Se há pessoas a
de computação no mundo duplica. Por que é preciso atrair grandes em- ganhar dinheiro com esta atividade,
isso, ou nos inserimos nessa acelera- presas. Mas estando a economia faz-se logo uma lei para acabar com
ção, lideramos, captamos e entende- nacional muito baseada nas micro e isso. Está tudo ao contrário. Não pode
mos o que se está a passar ou ficamos pequenas empresas, não estaremos ser. É uma cultura de taxas e taxinhas,
para trás. perante um obstáculo estrutural da mesquinhez e de repartir o que não
que inviabiliza esse objetivo? se consegue criar, com a qual discor-
Contabilista – E estamos mais pró- M.A. – É um erro que Portugal e a Euro- do frontalmente. E também há outra
ximos de ficar para trás ou entrar na pa vão pagar caro. As grandes empresas cultura muita enraizada na cabeça das
corrida? dão maior formação a colaboradores, pessoas, que é a ideia de que, para ter
M.A. – Temos duas tendências: as propiciam mais inovação e demons- segurança, é preciso ter emprego no
grandes empresas são todas platafor- tram mais capacidade de investiga- Estado.
mas. Isto é uma realidade recente. O ção, para além de pagarem melhores
crescimento nos últimos 20 anos tem salários. A comissária dinamarquesa Contabilista – O peso da receita
estado baseado na dívida e na emis- (NDR: Margrethe Vestager, Comissá- fiscal do CINM ronda cerca 100 mi-
são de moeda. Este segmento ou linha ria Europeia para a Concorrência) que lhões de euros. É um «mercado» que
económica está em confronto com ou- passa a vida a chatear as empresas, já está por explorar?
tra, que é a deflação. Por seu turno, a devia ter desaparecido! A ideia de que M.A. – Tem um grande potencial de
tecnologia permite tornar mais barato, o pequenino é que é bom, é um erro. E crescimento, mas para que isso acon-
e até gratuito, um conjunto de bens e está muito enraizada em Portugal pelo teça temos de remar todos para o mes-
serviços que estão ao simples alcance simples facto de não termos uma cul- mo lado. Nas negociações do próximo
do manuseamento do nosso telemóvel. tura empresarial. A Madeira, com as regime temos de fazer tudo para ofe-
A tendência atual é deflacionária. E te- limitações que tem e que nos impõem, recer melhores condições competi-
mos uma economia tradicional que se já é um polo de atração. Imagine o que tivas no Centro. Por exemplo, dispor
procura basear na emissão de dinhei- faríamos se existisse uma atitude e das mesmas condições que a Holanda
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«A Constituição
da República deve, por
isso, ser adaptada aos
tempos modernos.
A economia mundial
mudou mais nos últimos
20 anos, do que nos
últimos 200. »
apresenta. Seria muito favorável para a importância de a legislação sobre tem tudo, ao nível do shipping, para li-
Portugal, que poderia captar o inves- este assunto ser aprovada. E foi. Por- derar este processo. Infelizmente, sub-
timento de um conjunto de empresas tugal é das principais potências mé- sistem os obstáculos de sempre, como
muito importantes para o desenvolvi- dias marítimas da Europa. O Registo aqueles que lhes descrevi, que entra-
mento nacional. E é preciso esclarecer Internacional de Navios da Madeira, o vam o processo. Isto será muito bom
isto: para além dos benefícios decor- segundo do país, é um caso de sucesso para o CINM e também para Portugal,
rentes das empresas se instalarem no nacional. Em pouco tempo, atingimos enquanto país. Estou em crer que, se
nosso território, há que considerar o o 4.º maior registo internacional de na- na negociação do próximo regime,
know-how que isso adiciona ao país. vios na UE em termos quantitativos e conseguirmos reduzir as taxas para as
Portugal é um país ótimo a fazer planos o 3.º em tonelagem. Temos 26 milhões tecnológicas – talvez uns três por cento
e na retórica. de tonelagem de arqueação bruta aqui – atrairemos as grandes empresas nor-
registada e 828 grandes navios. Temos te-americanas.
Contabilista – Está com isso a que- ainda um protocolo com a Escola In-
rer que dizer que somos imbatíveis fante D. Henrique, para que os nossos Contabilista – Por falar nisso, este-
na teoria, mas pouco pragmáticos? jovens aí formados integrem, rapida- ve, recentemente, em Miami numa
M.A. – Aqui há uns tempos Portugal mente, os quadros das empresas de feira tecnológica – a Bitcoin 2022
fez um documento sobre um plano navegação aqui registadas. Já são mais – onde teve oportunidade de reunir
para o mar. Na altura, percebi que os de 10 mil. com diversos responsáveis destas
grandes armadores alemães estavam empresas…
a sair da Libéria, preferindo Malta e a Contabilista – Daqui se constata M.A. – Falei com as grandes empre-
Holanda. Ato contínuo, combinei um que o porfiar dá frutos… sas e expus aos meus interlocutores o
almoço em Lisboa com o embaixa- M.A. – Portugal é um país cheio de enorme potencial que o nosso país tem
dor da Alemanha e pedi ao diplomata confusões e preconceitos. Dou-lhes neste domínio. Por exemplo, a Madeira
que me indicasse quais as condições mais um exemplo: todos os navios que já está coberta com o 5G.
competitivas para que os armadores passavam ao largo da Somália tinham
germânicos escolhessem a ilha da Ma- autorização para ter uma guarda ar- Contabilista – A atração de empesas
deira. À boa maneira alemã, ao fim de mada para escolta por causa da pirata- tecnológicas podia ter reflexo visí-
três dias, fizeram-me chegar um do- ria. Portugal esteve dois anos para re- vel na criação de postos de trabalho
cumento com as condições todas. Me- solver este problema. Nem imaginam na RAM?
ti-me num avião e fui falar com o então o que passei para explicar aos alemães M.A. – Só o CINM tem cerca de quatro
primeiro-ministro, Passos Coelho, e que havia uma síndrome contra as ar- mil empregos, já para não falar das em-
depois cheguei à fala com o Presidente mas na Assembleia da República devi- presas ligadas às atividades de desen-
da República, sensibilizando-os para do à ação da “esquerdalhada”. Portugal volvimento do Centro. Sabem quanto
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um grande contributo para reforçar eletricidade a partir de renováveis pandemia, destinámos 232 milhões
essa união e para que os próprios eu- e em breve chegaremos aos 50 por de euros em apoios para as empresas
ropeus olhem para a importância da cento. As renováveis têm ainda o fa- da Região. E não tenho qualquer dú-
UE ser mais cada vez mais forte, coe- tor desperdício como handicap. Mas vida em afirmar que os contabilistas
sa e interventiva. é uma situação que no futuro será foram decisivos na boa canalização
melhorada, com a criação de bate- desses apoios para as empresas. Fe-
Contabilista – Permita-nos que in- rias para aumentar a capacidade de lizmente que os contabilistas certi-
sista: a distribuição de fundos do armazenamento. É preciso tempo. ficados são profissionais altamente
PRR está a ser a que desejava para A transição digital, no Estado, nas qualificados e são fundamentais
a Região? empresas e nas administrações pú- para auxiliar as empresas, de forma
M.A. – A grande fatia dos fundos do blicas, é outro setor fundamental. a darem o seu contributo para o te-
PRR está concentrada na transição Neste processo, Portugal tem de ga- cido económico da Região. Por isso,
digital e climática ou energética. O nhar escala e produtividade. Mas em julgo que estes profissionais devem
dossiê climático tem de ser gerido vários setores: nas escolas, nas uni- ser nossos parceiros nas questões de
pela Europa com alguma cautela. versidades, na sociedade, etc. Não desenvolvimento económico do país.
Fui a primeira pessoa em Portugal – chega a centralização do processo,
mesmo antes de a guerra estalar – a em que se metem computadores na Contabilista – Ao nível da admi-
chamar a atenção para a importância administração pública napoleónica… nistração regional tem havido in-
da criação de um mercado único de tegração destes profissionais?
energia, como forma de autonomi- Contabilista – Vivem ou traba- M.A. – Também tem funcionado. Mas
zar a Europa relativamente a estes lham na RAM cerca de um milhar quero realçar o seguinte: o futuro dos
recursos. A Europa é responsável de contabilistas certificados. Qual contabilistas certificados está dire-
apenas por oito por cento dos gases a importância destes profissionais tamente relacionado com o nível de
com efeito de estufa, sendo a Chi- para a afirmação económica e fi- crescimento económico do país. Se a
na e os Estados Unidos os grandes nanceira da Madeira? economia estiver em contração, não
emissores. Acredito que o futuro da M.A. – Tenho visitado algumas em- há trabalho para estes profissionais.
energia é solar, mas terá de haver al- presas de contabilidade da Madeira, Mas se a economia – como aquela
gum tempo para o desenvolvimento sobretudo as principais. E aproveitei que eu quero – estiver em expansão
científico e tecnológico. Na Madei- essas oportunidades para agradecer e inovação, então haverá mais traba-
ra já produzimos 40 por cento de o trabalho desenvolvido. Durante a lho e novas oportunidades.
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*Apesar de nomeada em janeiro a nova comissão de certificação de qualidade, tomou posse Galeria fotográfica
a 13 de maio.
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I Encontro Insular de Contabilistas Certificados | 22 e 23 de abril, na Madeira
Paula Franco, Miguel Albuquerque, Jorge Barbosa, Rogério Gouveia, Pedro Calado, João Ramos e Ana Brum
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outro lado, os custos da insularidade palavras, «as contas públicas têm que
e o facto de a fiscalidade poder ajudar ser transparentes e isso só é possível
a «compensar estes custos de contex- com uma boa contabilidade analítica,
to. Por isso, é positivo e é bom que o gestão de custos e uma boa consolida- do Sol, uma vez que o meu avô era natu-
Governo Regional da Madeira mante- ção. A RAM está no bom caminho e só ral dessa freguesia, tendo partido para
nha todos os incentivos fiscais, porque espero que a nível nacional se deem os o Brasil em 1911, ainda muito novo. Sou
acabam sempre por atrair quer pessoas passos necessários para fortalecer esta brasileiro e sou português madeirense»,
quer investimentos para a região.» via, para bem do futuro do nosso país», revelou o também diretor do Conselho
Da iniciativa privada para o setor pú- concluiu Paula Franco. Federal de Contabilidade (CFC).
blico, Paula Franco elogiou a RAM «por Depois de acrescentar que todos os
ser um exemplo em termos de contas IFAC, a voz global anos regressa à Madeira para passar
públicas. A RAM está à frente do res- dos contabilistas as suas férias, «onde descanso a minha
to do país no tocante à qualidade das A partir do Brasil, Idésio Coelho trouxe alma e o meu coração», Idésio Coelho
contas públicas», sublinhou a respon- a este encontro uma perspetiva diferen- clarificou: «Falo de mim mesmo apenas
sável máxima da OCC que lembrou te. Na sua intervenção por meios tele- para provar que um filho dessa terra
que esse processo pode ser melhorado máticos, o diretor da International Fede- pode sonhar e realizar. Sonhar grande
com a «obrigatoriedade de um conta- ration of Accountants (IFAC) relembrou ou pequeno, custa a mesma coisa. So-
bilista público. Um país que deseja ter as suas raízes portuguesas e, mais em nhem grande, para realizar grandes coi-
boas contas públicas, tem que possuir particular, madeirenses: «Considero-me sas.»
profissionais qualificados.» Por outras um filho da Madeira, um filho de Ponta Há cinco anos como diretor da IFAC, or-
ganização que representa mais de três
milhões de contabilistas certificados
e auditores em todo o mundo e possui
mais de 170 associados, sendo a OCC
«um dos membros ativo e relevante»,
o responsável brasileiro lembrou que
«a IFAC tem como missão representar
a voz global dos contabilistas e apoiar
o desenvolvimento saudável dos mer-
cados por meio da emissão de normas
de alta qualidade, sempre em benefício
do interesse público. Mais de 100 países
adotam essas normas, incluindo Portu-
gal.» Antes de terminar, Idésio Coelho
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tividade. O que corre bem na Madeira
em termos de internacionalização e
captação de investimento, é bom para
o nosso país e para a nossa região», re-
matou, afiançando que só dessa forma
poderá ser possível, por exemplo, fazer
com que as grandes empresas portu-
guesas, «sedeadas na Holanda, possam
estar aqui connosco.»
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ção de taxas significa menos receita, pode coesão territorial e ao combate à erosão a ser pequeno e por culpa nossa. Já não
ter o efeito contrário. É aqui que Portugal se demográfica, irão marcar o desempenho acredito que alguma vez se possa mudar o
tem que basear. Reduzir impostos com me- da nossa geração. São desafios cuja com- estado em que estamos», disparou o pre-
didas fiscais que se traduzam num aumento plexidade exige uma ação coordenada e sidente da Câmara Municipal do Funchal.
de competitividade que gere mais receita.» assertiva.» «Temos o único registo internacional de
Paula Franco confessou ainda ter «uma E a fiscalidade, defendeu Ana Brum, «as- navios que tem sido a base do crescimen-
grande expetativa de mudança com o novo sume aqui um desafio fundamental nas to do Centro Internacional de Negócios da
ministro das Finanças, Fernando Medina. respostas que possamos dar» mas, por Madeira e não há um único elemento do
Nestes próximos quatro anos, está tudo em si só, poderá não ser suficiente: «Se nos governo português que olhe para o CINM
causa. Ou vencemos ou saímos derrotados. questionarmos sobre o verdadeiro grau de com a responsabilidade que deveria ter.
Não há margem para errar e nós, Ordem, eficácia das medidas fiscais positivas ver- Não há um único governante português
queremos ser parte da solução.» sus programas comunitários do incentivo que venha defender os postos de trabalho
A sessão de encerramento contou também ao investimento, temos de concluir que que temos na região. Para além de não re-
com a presença de uma autarca (e CC) os problemas estruturais, como a erosão conhecerem isso, o governo anterior ain-
açoriana. Ana Brum, presidente da Câmara demográfica e a ausência do crescimento da quis criar um regime concorrencial ao
Municipal das Lajes do Pico, depois de refe- sustentado das empresas locais, da limita- nosso CINM. É assim que o nosso governo
rir que seria uma honra o seu concelho po- da capacidade de atração do investimento olha para as regiões autónomas. É assim
der receber o segundo encontro insular dos externo e disparidade económica entre que temos de lidar com o governo da Re-
CC, afirmou que «as regiões autónomas concelhos, concluímos que sendo uma pública», desferiu o autarca madeirense.
não usufruem de um efetivo acesso ao mer- medida importante, isoladamente acaba Olhando depois para as incongruências da
cado único europeu em pé de igualdade e a por não ter os resultados desejados e não Lei das Finanças Regionais, novos remo-
pandemia colocou-nos ainda numa situação evitou o agravamento das desigualdades ques vieram à luz do dia: «Se somarmos
mais vulnerável.» entre concelhos e entre ilhas.» todos os valores que foram distribuídos
O concelho a que preside, reiterou, é um através daquela lei para os Açores e Ma-
bom exemplo disso mesmo. Soluções? «Os «O nosso país vai continuar a ser deira, temos um acréscimo positivo para
pilares estratégicos para a mudança terão pequeno por culpa nossa» os Açores em mais de mil milhões de eu-
de assentar na diferenciação, qualidade, Autarca da cidade anfitriã do primeiro ros em relação à RAM. Nada disto tem a
transição digital, inovação e empreende- dia do Encontro Insular, Pedro Calado, ver com os Açores. Mas o que é que leva
dorismo. A capacidade de resposta aos também ele contabilista certificado, foi a RAA, com uma população muito seme-
desafios da sustentabilidade económica, à contundente: «O nosso país vai continuar lhante à da Madeira, a receber mais mil
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milhões de euros? Não há coragem polí-
tica para se fazer a revisão da Lei das Fi-
nanças das regiões autónomas? Porquê?
Enquanto não tivermos a coragem para
tocar nos pontos essenciais, não sairemos
daqui.»
Pedro Calado defendeu também alteração
urgente às leis laborais. «Temos atual-
mente na RAM uma taxa de desempre-
go a rondar os 6,6 por cento. São cerca
de 14 mil desempregados. Há ofertas de
emprego. Mas a mão-de-obra não quer
trabalhar porque ganha mais ficando em
casa...»
Depois de recordar que a RAM «não teve
um único cêntimo de ajuda do Estado por-
tuguês para combater a pandemia, Calado
terminou com um desafio a Paula Franco:
«Nos contactos que tiver a nível governa-
tivo, tente influenciar quem de direito para
algo que é cada vez mais importante na
nossa gestão pública: porque é que os de-
cisores políticos não têm que possuir for-
mação específica para exercer as respon-
sabilidades? Alguém que vai, por exemplo,
para ministro das Finanças ou secretário
regional das Finanças não deveria ter uma
formação específica e adequada para o
cargo que vai desempenhar?»
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Clotilde Celorico Palma
«Precisamos de uma ação firme e decisiva»
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Lina Camacho
«Legislação obsoleta e espartilhada»
exercício do «poder tributário próprio.» cento mais baixas do que as taxas nacio-
Camacho socorreu-se também da Lei das nais.» Ou seja, e a título de exemplo, uma
Finanças Regionais para lembrar que um empresa que pague no continente uma
dos seus princípios gerais é «incentivar o taxa de IRC de 21 por cento, na Madeira
investimento na Região e assegurar o seu pagará 14,7 por cento.
desenvolvimento económico e social, com a Depois de deixar um lembrete, em jeito
estrutura do sistema fiscal regional.» de apelo, aos contabilistas certificados
Por outro lado, referiu ainda a oradora, para não se esquecerem de «preencher
«há uma falta de resposta do Estado para o anexo C», a oradora trouxe à colação
com a RAM», existindo, em seu entender, o regime atualmente em vigor para o
uma «legislação obsoleta e espartilhada» CINM e a sua influência na receita fiscal
o que tem levado a «desvios de receitas em da região. Apesar do regime possibilitar
prejuízo da RAM.» Esses valores, sustentou a tributação através de uma redução de
Lina Camacho, por seu lado, apresentou a oradora, chegam aos cerca de 31,4 mi- taxa, a verdade é que em 2021 o peso no
uma radiografia da Autoridade Tributária lhões de euros. IRC rondou os 45 por cento. Ou seja, «o
da Região Autónoma da Madeira, falando Lina Camacho referiu ainda que o Go- CINM é essencial para efeitos de execu-
da política de recursos humanos, da pro- verno Regional iniciou, em 2016, o desa- ção da receita fiscal, ao nível do IRC.»
ximidade e da forma de atendimento ao gravamento fiscal às famílias madeiren- E em jeito quase de desespero, Lina Ca-
público em tempos de pandemia. Mas a ses através do IRS e às empresas, desde macho deixou uma mensagem bem clara
intervenção da diretora regional da AT ti- 2018, com especial atenção para as PME, para o executivo: «A Madeira não pode
nha outros focos. Por exemplo, falou sobre através do IRC. Nestes impostos, con- parar. Nós somos Portugal. Avancem com
o caminho já percorrido da autonomia fis- cluiu, «estão esgotadas todas as possibi- a norma legislativa que permite avançar
cal da RAM e do constante no artigo 227.º, lidades de descida de taxas que a lei nos com o licenciamento das empresas na
n.º 1, al. i) da Constituição, onde se fala do permite» e que podem ser de até 30 por zona franca da Madeira.»
Mário Fortuna
«Lei das Finanças Regionais protege o Orçamento do Estado»
Mário Fortuna debruçou-se sobre «A apli- reposto no máximo admitido nas taxas de
cação da adaptação fiscal nos Açores: li- IRS, IRC e IVA, com um impacto orçamental
mites e potencialidades», começando estimado em cerca de 50 milhões de eu-
por uma retrospetiva sobre o caminho ros», recordou Fortuna.
percorrido pelo regime fiscal açoriano, nem O presidente da Câmara de Comércio e
sempre coincidente com o seguido na Ma- Indústria de Ponta Delgada apresentou
deira. «Nos Açores as principais alterações um conjunto de dados em que foi possível
acontecem em 2014 como consequência da perceber a evolução das taxas aplicadas ao
revisão de 2013. Daí até 2021 foram sendo IVA. Numa comparação com outras regiões
feitas pequenas alterações diferenciando a ultraperiféricas, Mário Fortuna adiantou
redução do IRS por escalões e as taxas do que «têm praticamente todas um sistema
IVA que deixaram de ter o diferencial máxi- de IVA muito melhor que o nosso», leia-se
mo no escalão mais elevado. Em 2021, com com taxas bem mais baixas. «Não devía-
o governo de coligação, o diferencial fiscal é mos estar a usar taxas similares às outras
>>
ABRIL 2022 25
>>
regiões ultraperiféricas?», questionou. atual, do papel da fiscalidade para a re- sinal de que há algo que não está resol-
Fortuna salientou ainda que a criação capitalização das empresas.» vido. Alguma coisa está estruturalmen-
de impostos próprios tem sido irrele- Mais tarde, no breve período dedicado te errada. A Lei das Finanças Regionais
vante (exceto no caso da taxa turística, ao debate, e em resposta à questão protege atualmente o Orçamento do
em curso), concluindo que «a utilização colocada pelo CC Emanuel Brás, sobre Estado. O dinheiro que a República gas-
da capacidade de adaptação fiscal tem quais os aspetos que deveriam ser al- ta connosco está predeterminado. Tem
sido usada essencialmente para reduzir terados na Lei das Finanças Regionais uma base que só evolui em função do
impostos com o intuito de melhorar a para que as regiões pudessem receber crescimento da despesa pública ou do
competitividade, em prejuízo do orça- do Estado valores mais substanciais, PIB. Se o crescimento for negativo nós
mento público e benefício das famílias e Mário Fortuna foi claro: «Se os gover- somos penalizados, como já aconteceu.
das empresas.» Contudo, salientou, «há nos regionais da Madeira e dos Açores Isto protege o OE, não é uma resposta
ainda espaço de melhoria, no sistema estão sistematicamente a endividar-se é às necessidades efetivas das regiões.»
26 CONTABILISTA 265
I Encontro Insular de Contabilistas Certificados | 22 e 23 de abril, na Madeira
ABRIL 2022 27
estavam identificados com este adorno mais pequenos, pinturas faciais e brin-
em redor do pescoço. cadeiras com palhaços, sem esquecer os
jogos tradicionais. Para os mais deste-
Kart, zumba, futebol e… História midos, a escalada, uma prática despor-
São Pedro também quis associar-se à tiva que ganha cada vez mais adeptos
festa. O céu cor de chumbo, mas que em Portugal. Para os apreciadores de
permitia vislumbrar as ilhas Desertas no atividade física, também houve zumba,
horizonte, ameaçou sempre chuva. Mas com uma instrutora plena de dinâmica.
não passou disso mesmo, uma ameaça. Para os ases do volante, a pista de kart
A temperatura amena e o vento fraco do parque desportivo esteve sempre
tornaram as condições atmosféricas disponível para empolgantes momentos
praticamente perfeitas. O DJ Paulo Oli- de pilotagem. Os jogos de futebol tam-
veira animou com música todo o espaço bém foram muito procurados. Esta com-
e uma mestre de cerimónias procurou petição não teve direito a VAR, mas sim
mobilizar e dinamizar a assistência para a um árbitro implacável, sem tolerância
os diversos pontos de entretenimen- para com os infratores. Todas estas
to disponíveis. E eram muitos. Para os atividades tiveram a supervisão per-
28 CONTABILISTA 265
manente de elementos da corporação Tristão Vaz Teixeira, Bartolomeu Peres- elementos daquele agrupamento toca-
de bombeiros local. Não fosse o diabo trelo e Joao Gonçalves Zarco. ram e cantaram alguns dos temas mais
tecê-las. E não teceu. Salvo um apa- representativos do folclore da Região.
ratoso despiste de um condutor mais O obrigatório Bailinho E como festa sem bolo, não é festa, a
imprevidente e uma colisão na corrida da Madeira sobremesa contou com a abertura de
de karts, felizmente sem consequências, A desgastante atividade matinal exigia um alusivo ao evento. Só que desta fei-
não houve qualquer incidência de rele- a reposição de energia. Alimento, por- ta, e para algo completamente diferen-
vo a registar. Para os mais eruditos, e tanto. Espetada, milho frito, pudim de te, havia mais um bolo suplementar. De
que quiseram aliar o saber a uma ca- maracujá – com selo insular – e outras dimensões mais modestas, é certo, mas
minhada no parque, a organização pro- iguarias estiveram à disposição dos co- para assinalar o aniversário não de um,
videnciou uma professora de História, mensais. O início do repasto ficou mar- mas de dois contabilistas certificados: a
de uma escola do concelho de Machico, cado pela entrada em cena do Grupo Cristina e o Osvaldo. Dos discursos pas-
para falar sobre a descoberta do arqui- Folclórico e Etnográfico da Boa Nova, sou-se para a foto de família, coma pro-
pélago. Para avivar as memórias, dos instituição com 53 anos de atividade, messa que a próxima edição do encontro
mais e menos jovens, recorde-se que com centenas de atuações, em Portugal insular se realizará na Região Autónoma
a Madeira foi descoberta em 1419 por e além-fronteiras. Trajados a rigor, os dos Açores.
ABRIL 2022 29
Confiança, segurança e crescimento profissional
30 CONTABILISTA 265
NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
«Com as empresas
rem peso – «o ato de prestação de con- e os mercados assustados
tas torna-se cada vez mais fundamental com a instabilidade,
no caminho das empresas. Com as em- as luzes ao fundo do túnel
presas e os mercados assustados com a são apontadas pela
instabilidade, as luzes ao fundo do túnel contabilidade.»
são apontadas pela contabilidade.» Mas
a própria prestação de contas também Paula Franco
não escapa ao processo de transfor-
mação, refletindo, crescentemente, as
preocupações de sustentabilidade. Re-
invenção é, por isso, o inevitável desti-
no comum da ciência contabilística e do
exercício profissional dos contabilistas
certificados.
A tecnologia ao serviço
de uma missão pública
Apesar da sua vetusta idade, o Tribu- nova plataforma para a fiscalização aproveitou a oportunidade de estar na
nal de Contas (TC) tem dado mostras prévia, no que à submissão de contratos OCC para demonstrar «o quanto ad-
de estar na vanguarda na adoção de diz respeito. «É a tecnologia ao serviço miro o trabalho da Ordem e dos seus
soluções tecnológicas. Fã confesso da da missão pública do tribunal», referiu profissionais, na busca permanente pela
história da contabilidade, pese embora José Tavares, que revelou ainda que são qualidade na elaboração e prestação
a sua formação jurídica, José Tavares cerca de 6 500 as entidades que pres- de contas.» José Tavares acrescentou que
referiu que o TC tem vindo a introduzir tam contas a este órgão de soberania. «quem trabalha na área contabilística tem
sistemas de IA, que permitem avaliar e A articulação, entre o TC e o Ministério de prestar atenção às inovações tecnoló-
tratar o volume de informação numa das Finanças, na plataforma eletrónica gicas e estar consciente que o seu futuro
abordagem de pendor mais qualitativo, já existente, tem permitido, segundo depende dos meios digitais. O contabilista,
bem como os seus impactos na gestão José Tavares, «evitar duplicações de in- por ser também um analista, tem de possuir
pública. Para muito breve, está previs- formação e reduzir custos.» a capacidade de conhecer por dentro as
ta a entrada em funcionamento de uma O juiz conselheiro que preside ao TC suas organizações», referiu. José Tavares
enunciou depois os prós e os contras do im-
pacto da tecnologia na contabilidade. Pela
«Quem trabalha na positiva, a redução de custos, o aumento da
área contabilística tem produtividade, a melhoria do desempenho
de prestar atenção às dos profissionais e o mais próximo acom-
inovações tecnológicas panhamento das mudanças legislativas.
e estar consciente que Pelo lado negativo, apontou que «o mundo
o seu futuro depende digital tem muitíssimos perigos», ao nível
dos meios digitais.» da privacidade, da ética, da confidencialida-
de, da proteção de dados, sem esquecer, a
José Tavares cibersegurança.
32 CONTABILISTA 265
NOTÍCIAS
«A contabilidade
carreira académica em universidades bri- está no centro de uma
tânicas – nomeadamente em Manchester estreita relação entre
– assentou a sua intervenção no interface o conhecimento
entre a informação tecnológica e a história e a ação.»
da contabilidade. Profundo conhecedor da
cultura contabilística dos jesuítas, Quat- Paolo Quattrone
trone lembrou que para esta comunidade
«a contabilidade é uma ciência pragmá-
tica, que resolve problemas». Os jesuítas,
ao serem «percursores da contabilidade
de acréscimo», tinham uma grande pai-
xão pelos números, mas esta ciência era
entendida como um meio e não como um
fim. «Eles eram loucos pela contabilida-
de de dupla entrada, algo que se podia
assemelhar, na atualidade, ao big data e
aos algoritmos», precisou o orador tran-
salpino. Numa exposição longa, mas que
nunca deixou de prender a atenção da as-
sistência, Paolo Quattrone defendeu que, a ação». Sobre o papel dos profissionais, chegar até aos atuais dígitos, que tudo
uma vez confrontados com a complexi- Quattrone foi igualmente de clareza me- dominam, seja no mercado de valores,
dade, a ambiguidade e a incerteza, existe ridiana: «A contabilidade procura saber nos algoritmos e nas visualizações acu-
a tendência para «procurar conforto nos o que existe no centro e não nos extre- muladas nas redes sociais. Mas é em
números e na contabilidade.» Porquê? mos. Por isso, é que os contabilistas são plena revolução digital que «explode
«Porque os números têm poder», esclare- importantes para perceber o que existe a crença na transparência», «uma ilu-
ceu. E o poder dos números traduz-se em no meio.» Quattrone apresentou ainda são», segundo o orador, que exemplifica
«controlo, julgamento e sabedoria.» Para a evolução histórica da forma em que com o blockchain. Enquanto isso, simul-
o professor da Universidade de Manches- assenta a tomada de decisões: tudo taneamente, «o julgamento humano é
ter «a contabilidade está no centro de uma começou com os números, depois deu- reduzido ao mínimo», quase que subju-
estreita relação entre o conhecimento e -se a transição para os dados, para se gado pelos algoritmos. É também na era
pós-moderna que se instala, de forma
pujante, o ERP - o sistema integrado de
gestão empresarial.
«O trabalho
do contabilista está Inteligência Artificial
cada vez mais centrado não é esoterismo ou bruxaria
na interpretação Isabel Lourenço moderou a mesa-re-
da informação.» donda que aflorou diversas nuances do
impacto da tecnologia. Antes de passar
Isabel Lourenço a palavra aos oradores, sinalizou que o
trabalho do contabilista «está cada vez
mais centrado na interpretação da in-
formação», em detrimento do trabalho
de preparação. Paulo Novais rapida-
mente disse ao que vinha: «Ajudo pes-
soas a tomar decisões, desenvolvendo
sistemas no âmbito da IA que procuram
olhar para os dados.» Feita a apresen-
ABRIL 2022 33
NOTÍCIAS
Relatório de gestão,
o documento mais frágil
Maria da Luz Faria é juíza conselheira
do TC desde 2018, tutelando a pres-
tação de contas, área que também
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NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
Atrair e captar
novos talentos para a profissão
Texto Nuno Dias da Silva
A IT Insight e a
Bizdocs orga-
nizaram, a 28 de
nais - é outro fa-
tor que contribui
para transfigurar
abril, um webinar a profissão. «O
subordinado ao contabilista do
tema «Contabilista passado e o ex-
de Sucesso - Histó- cesso de tarefas
rias de vida, visões que tinha, muito
de futuro”, com o administra tivas
objetivo de debater e pouco desafia-
os atuais desafios doras, fazia com
de digitalização da que esta profis-
economia, da sim- são fosse muito
plificação e inova- cinzenta. Para
ção das atividades ser um contabi-
empresariais e de suporte à sua ativida- ria foi mudar esta visão», começou por lista certificado de sucesso é necessário
de. O evento decorreu de forma total- afirmar Paula Franco. O período mais minimizar as tarefas que não trazem
mente virtual e contou com a participa- agudo da pandemia, em que os conta- valor acrescentado. As tecnologias são
ção da bastonária da OCC, Paula Franco, bilistas foram chamados a intervir, com extremamente importantes para depois
do Presidente da Associação Industrial celeridade, para fazer chegar os apoios ajudar a parte empresarial, libertando
Portuguesa (AIP), José Eduardo Carvalho, às empesas, mudou, de alguma forma, o o papel e as tarefas rotineiras, utilizan-
de Carlos Latourrette, CEO da Bizdocs, e panorama. «A sociedade civil passou a do os mecanismos informáticos», disse.
de Henrique Carreiro, diretor da IT In- olhar-nos de outro modo. Mas ainda há É perante este novo contexto, que a
sight. Para além dos desafios colocados um longo caminho no elevar da contabi- bastonária acredita que será possível
à profissão de contabilistas certificados lidade para outro patamar», acrescen- «atrair e captar mais jovens talentos
e da relação com o Plano de Recupera- tou a bastonária. para a profissão.» Contudo, os obstá-
ção e Resiliência (PRR), o debate per- culos subsistem. E deu como exemplo a
mitiu ainda a partilha sobre o percurso Consultor e parceiro de negócio proposta de lei do Orçamento do Esta-
dos oradores, bem como das suas pers- A responsável máxima da Ordem dis- do para 2022 que prevê a diminuição do
petivas para o futuro da profissão. «A se ainda que o papel do contabilis- tempo de envio das faturas de dia 12
contabilidade é muito pouco respeitada. ta certificado de sucesso tem de ser, para dia 5, obrigação que, «apesar de
No âmbito das ciências económicas é, cada vez mais, o de um consultor, que não competir aos contabilistas», a sua
porventura, a profissão menos valo- acrescente valor às empresas. Ou seja, submissão acaba, muitas vezes, por fi-
rizada e com remunerações mais bai- é aquele que acompanha, um parceiro car a cargo destes profissionais.
xas. O que é um erro que a sociedade de negócio. A desmaterialização – com
pratica. Precisamente um dos objetivos a evolução rumo ao «zero papel», com
Transmissão integral
que levou a candidatar-me a bastoná- benefícios ambientais e organizacio-
da conferência
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CONGRESSO
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS
ALTICE ARENA · 21, 22 E 23 SETEMBRO 2022
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NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
à proposta do OE/2022
O call center do departamento de
consultoria da OCC, a exemplo de
anos anteriores, funcionará em ho-
Votação final global a 27 de maio rário alargado (até às 19 horas), nos
dias úteis, entre 2 de maio e 30 de
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NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
Balanço do «Programa
Empresas Turismo 360.º
Turismo de Portugal e Ordem organizam formação
para profissionais
Reunião livre
em Sernancelhe
Bastonária marcou presença
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NOTÍCIAS
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NOTÍCIAS
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ORDEM NOS MEDIA
71 975 GOSTOS
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FISCALIDADE
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FISCALIDADE
dos coletivamente através da des- a utilização da informação obtida trado na informação obtida junto dos
crição detalhada do grupo. através da DAC para outros fins não operadores de plataformas digitais.
Outra medida a destacar é que abre previstos na diretiva, não só com a Neste ponto, a relevância desta nova
a possibilidade de utilização da in- autorização individualizada e espe- área deve ser procurada na crescen-
formação obtida através dos ins- cífica do Estado-membro cedente da te importância das atividades eco-
trumentos de informação incluídos informação, mas também, será cons- nómicas que são intermediadas nas
na diretiva para impostos que, em truído um novo e voluntário sistema plataformas geridas por este tipo de
princípio, estão fora dela, como o IVA de lista de finalidades previamente operadores.
e outros impostos indiretos. Pode autorizadas pelos Estados-membros Em esquema:
tratar-se, afinal, dos primórdios da para que não seja necessário solicitar Em termos muito gerais, os operado-
aprovação de um Código Europeu uma autorização individualizada em res devem prestar à administração
de Cooperação Administrativa que cada caso de utilização fora das fina- tributária do Estado-membro «em
reúna, sistematize e torne coerentes lidades da diretiva. que estão registados», determina-
todas as modalidades de cooperação Relativamente ao segundo bloco, a das informações relacionadas com
administrativa que estão dispersas DAC 7 determina o estabelecimento as atividades económicas em que são
por diplomas avulsos 7. de um novo intercâmbio de informa- intermediários, pondo em contacto
Da mesma forma, será permitida ção entre os Estados-membros cen- os vendedores de bens ou prestadores
Plataformas
(Operadores)
Compradores Vendedores
Bens e serviços Bens e serviços
Da UE De Estados terceiros
No Estado da residência Em qualquer Estado-
membro da UE
48 CONTABILISTA 265
FISCALIDADE
de determinados serviços, denomi- do-membro de registo determina a clientes devem ser reportados, uma
nados «vendedores», e os usuários administração tributária a que a in- vez que existem vários vendedores
dessas plataformas. Subsequente- formação deve ser submetida. Nes- excluídos como entidades estatais
mente, a administração tributária te ponto, distinguem-se dois tipos e entidades cotadas. É criada uma
que receber a referida informação de operadores. Europeus, que são franquia por estabelecimento para
deve fornecer a mesma à adminis- aqueles em que concorre algum cri- vendedores ocasionais, desde que
tração tributária do Estado-membro tério de estabelecimento com a UE, realizem menos de 30 operações
de residência do vendedor e, no caso sendo o principal o de residência, o anuais na plataforma e o valor to-
de arrendamento de imóveis, tam- que significa que devem registar-se tal não exceda dois mil euros. Tam-
bém à administração tributária do no Estado onde o referido critério bém está prevista a exclusão para
território onde se situa o imóvel. for cumprido. Os restantes, ou seja, «grandes arrendatários» quando a
Para efeitos de obtenção das infor- aqueles que não cumprem nenhum intermediação se referir ao mesmo
mações que devem ser prestadas, critério localização na UE, poderão imóvel e se ultrapassem as duas mil
os operadores obrigados devem escolher livremente o Estado-mem- operações realizadas durante o ano.
cumprir uma série de regras e pro- bro para se inscrever.
cedimentos de due diligence aos Nem todas as atividades económi- Regulamentação
vendedores que estão obrigados a cas exercidas nas plataformas serão das «inspeções conjuntas»
transferir esses dados para os ope- objeto de prestação de informações. A última novidade desta Diretiva é
radores. Uma informação essencial Apenas as expressamente determi- a regulamentação das «inspeções
é esclarecer a residência fiscal do nadas pela DAC 7, que são: conjuntas», há muito previstas e
vendedor, pois determinará o Esta- -A locação de imóveis que já se vão realizado, que as ad-
do-membro para o qual, em última -A locação de meios de transporte; ministrações fiscais dos Estados-
instância, a informação deverá ser -A prestação de serviços pessoais; -membros podem efetuar relativa-
enviada. -A venda de mercadorias. mente aos contribuintes de interesse
O operador deve registar-se num Da mesma forma, nem todos os ven- comum.
Estado-membro, sendo esta obriga- dedores que utilizam estas platafor- Nesse sentido, um Estado-membro
ção essencial, uma vez que o Esta- mas digitais para contactar os seus pode dirigir-se a um ou mais Esta-
ABRIL 2022 49
FISCALIDADE
dos-membros para solicitar o iní- tes. O referido relatório será comu- 1977, relativa à assistência mútua das
cio de uma inspeção conjunta. Este nicado aos interessados. autoridades competentes dos Estados-
pedido deve ser respondido no pra- Conclusão: a DAC 7 continua a cor- -membros no domínio dos impostos
zo máximo de 60 dias e só pode ser porizar os enormes avanços de coo- diretos e dos impostos sobre prémios de
rejeitado por decisão devidamente peração entre administrações fiscais seguros.
fundamentada. na Europa, apostando na troca de 3
Não podendo deixar de ser "relembrar"
Em qualquer caso, as autoridades informações como um dos elementos que foram criados e estão em vigor mais
fiscais terão de acordar previamente essenciais para melhorar o cumpri- dois instrumentos de cooperação admi-
sobre a aplicação prática da inspe- mento fiscal. nistrativa, mas com espaços territoriais
ção conjunta, por exemplo, o regime diferentes: o FATCA, exclusivamente
linguístico aplicável. *Jurista aplicável aos Estados Unidos da América;
Os funcionários de um Estado- Árbitro no CAAD ea
-membro podem exercer as suas 4
O que evitaria múltiplas burocracias e
funções no outro Estado membro Notas algumas guerras "entre gato e rato".
onde as ações sejam realizadas 1
Não conta para a numeração sucessiva 5
O que evitaria trocas de informação,
no âmbito da inspeção conjunta, que vem sendo atribuída às diretivas que quer indevidas quer erróneas, qualita-
sempre respeitando a legislação alteram a DAC 1 - a diretiva 2011/16/UE tiva e quantitativamente, e as sequelas
do Estado-membro de acolhi- a diretiva 2020/876, uma vez que esta se que tais situações acabam por provocar.
mento, que será a regulamentação limitou, com justificação na pandemia 6
Lembramo-nos, por exemplo, da as-
aplicável. COVID, a diferir o cumprimento de cer- sistência administrativa em matéria de
Por fim, as conclusões derivadas da tos prazos. cobrança e, naturalmente, das disposi-
inspeção conjunta poderão ser reco- 2
A transpor para o ordenamento jurídico ções legislativas sobre a troca de infor-
lhidas num relatório final que deve- interno até 31 de dezembro de 2022. mação no domínio dos impostos indi-
rá ser tido em conta nos eventuais Até então, vigorou a Diretiva n.º 77/779/ retos, principalmente no que ao IVA diz
procedimentos internos subsequen- CEE do Concelho, de 19 de dezembro de respeito.
50 CONTABILISTA 265
FISCALIDADE
ABRIL 2022 51
FISCALIDADE
694 euros em 2019, 708 euros em e a taxa média desse aumento do IRS de existência», teriam, desde 2018,
2020 e 2021, 754 euros em 2022, pa- que subsistiu relativamente aos dois pago menos 94 euros em cada ano.
garam e vão pagar o mesmo imposto escalões desdobrados em 2018, parte Também os rendimentos enqua-
de 2017. Acresce que, paradoxalmen- da tabela que passou a vigorar: drados naquele que passaria a ser
te, enquanto o primeiro escalão não o terceiro escalão (+7 091 até 10 700
foi desagravado em 2018, nem o iria Rendimento Taxas euros) beneficiariam desta tabela,
ser em 2022, o terceiro escalão, que coletável (percentagens) com começo nos mesmos 94 euros,
(euros) Normal Média
já tinha sido beneficiado em 2018 (a montante que se desvanecia em 2,6
coleta de todos os rendimentos nele Até 7 091 14,50 14,500 por cento da parte que superasse os
incluídos reduziu-se em 198 euros, De mais de 7 091 7 092 euros.
23,00 17,367
até 10 700
em virtude do desdobramento, de Face à relativa relevância do acu-
que foram os principais favorecidos, mulado diferencial entre a tribu-
do então segundo escalão), seria de deveria ter dado lugar à seguinte: tação realizada e a que, à luz da
novo suavizado. equidade, se deveria ter processa-
Põe-se, agora, a questão de como, Rendimento Taxas do, julgo que se impõe a decorrente
em 2018, deveria ter sido desdobra- coletável (percentagens) interrogação: deverá o Orçamento
(euros) Normal Média
do o primeiro escalão, dando lugar a para 2022 albergar - precedendo
um novo degrau na tabela, manten- Até 3 128 11,50 11,500 medidas de desagravamento dos
do a taxa de 14,50 por cento naquele De mais de 3 128 escalões de rendimento, incluindo
14,50 13,177
até 7 091
que passaria a segundo e alterando a obviamente o primeiro - a restitui-
De mais de 7 091
taxa normal (23 por cento) dos rendi- 25,60 17,367 ção, aos milhares de afónicos traba-
até 10 700
mentos entre 7 092 e 10 700 euros, de lhadores e pensionistas, do que, em
forma a manter nesse escalão a taxa termos comparativos e desde 2018,
média de 17,367 por cento. A partir de Com esta lógica e justa tabela alter- lhes foi exigido pagar em excesso
tais pressupostos, e tomando como nativa, todos os rendimentos tribu- ou, em caso contrário, constituirá
referencial a tabela que vigorava an- táveis até 7 091 euros (7 112, na atua- este texto, de motivação exclusiva-
tes de 2013 - ano em que, dando lu- lidade, ou qualquer outro posterior mente técnica, apenas um memorial
gar ao enorme e célebre aumento do valor de limite no escalão), não de uma injustiça fiscal?
imposto, se verificou a aglutinação abrangidos pela redução ou isenção
dos escalões e a elevação das taxas - de imposto, por via do «mínimo *CC n.º 6 039
52 CONTABILISTA 265
FISCALIDADE
A limitação da dedutibilidade
fiscal em IRC e a aplicação de taxas
de tributação autónoma sobre
importâncias pagas ou devidas
a entidades submetidas a regimes
de tributação mais favoráveis
Este trabalho debruça-se sobre o enquadramento fiscal em IRC das importâncias pagas
ou devidas a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português
e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, abordando igualmente
a limitação da dedutibilidade fiscal.
Por Rui Portela*, João Cabaços** e Helena Saraiva*** | Artigo recebido em dezembro de 2021
P
retendemos neste artigo abor- tigative Journalists - ICIJ , na sigla raísos fiscais para evitar a tributação
dar o enquadramento fiscal em em inglês), denominada Pandora Pa- no país, cerca de um quarto do PIB,
imposto sobre o rendimento pers, que veio revelar que 35 líderes e, com isso, perdidas receitas fiscais
das pessoas coletivas (IRC) das im- mundiais (alguns atualmente ainda num valor equivalente a um por cen-
portâncias pagas ou devidas, a qual- nesses cargos) e mais de 330 políticos to do PIB.
quer título, a pessoas singulares ou e funcionários públicos, de 91 países Pode definir-se “paraíso fiscal”
coletivas residentes fora do território e territórios, esconderam fortunas de como «um país ou um território que
português e aí submetidas a um regi- milhares de milhões de dólares em atribua a pessoas físicas ou coletivas
me fiscal claramente mais favorável, offshores para não pagarem impostos vantagens fiscais suscetíveis de evi-
abordando a limitação da dedutibili- nos seus países de origem. tar a tributação no seu país de origem
dade fiscal das importâncias pagas ou Num dos Taxation Papers emitidos ou de beneficiar de um regime fiscal
devidas a essas entidades e as tributa- pela Comissão Europeia Vellutini et mais favorável», ou seja, um “paraí-
ções autónomas. al.(2019), estimou-se que residentes so fiscal” é um país onde existe um
A problemática destes regimes, tam- fiscais da União Europeia detinham sistema tributário que é mais favo-
bém designados de paraísos fiscais 1,5 biliões de euros em paraísos fis- rável para o contribuinte do que o do
, encontra-se na ordem do dia face cais offshore em 2016, o equivalente Estado onde tem a sua residência.
aos recentes casos noticiados em a cerca de 10 por cento do produto Os “paraísos fiscais” são uma rea-
diversos canais de comunicação na da UE, originando perdas de receita lidade que evolui com a sociedade,
sequência da publicação de uma in- fiscal na ordem dos 46 mil milhões tendo a globalização dos sistemas
vestigação do Consórcio Internacio- de euros em cada ano. Entre 2004 e financeiros, a não harmonização da
nal de Jornalistas de Investigação 2016, em Portugal terão sido desvia- matéria fiscal, a livre circulação de
(International Consortium of Inves- dos 50 mil milhões de euros para pa- pessoas e capitais, o surgimento de
ABRIL 2022 53
FISCALIDADE
novos instrumentos financeiros e o OCDE, têm vindo a adotar diversas tributária (LGT) aditado pelo artigo
desenvolvimento tecnológico, con- medidas antiabuso destinadas a pre- 214.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de
tribuído para o aumento da procura venir e sancionar os agentes que pra- dezembro (OE/2014), nomeadamen-
por estes territórios. ticam esse tipo de comportamentos te:
Embora a sua existência seja legal, e anular as vantagens fiscais ilegal- - Inexistência de um imposto de na-
e até defendida por alguns, nomea- mente obtidas. tureza idêntica ou similar ao IRC ou,
damente por proporcionarem in- Assim, vários países, incluindo Por- existindo, a taxa aplicável seja infe-
vestimentos às regiões desfavoreci- tugal, instituíram listas negras, onde rior a 60 por cento da taxa geral desse
das onde muitos deles se situam, é se incluem países, territórios ou re- imposto;
inegável que, devido às suas parti- giões, qualificados como “paraísos - As regras de determinação da ma-
cularidades, os paraísos fiscais são fiscais” ou sujeitos a regimes de tri- téria coletável sobre a qual incide o
também bastante utilizados com o butação privilegiada, no âmbito dos imposto sobre o rendimento divir-
intuito de realizar atividades ilícitas impostos sobre o rendimento e sobre jam significativamente dos padrões
e criminosas, como por exemplo a la- o património. As consequências da internacionalmente aceites ou pra-
vagem de dinheiro, as fraudes finan- inclusão nessa lista situam-se, prin- ticados;
ceiras e a constituição de instituições cipalmente, ao nível da aplicação de - A existência de regimes especiais
fantasmas. taxas de tributação agravadas, da li- ou de benefícios fiscais dos quais re-
Devido ao facto de alguns “paraí- mitação na dedutibilidade de gastos e sulte uma redução substancial da tri-
sos fiscais” serem utilizados como na instituição de tributações autóno- butação; e
mecanismos de elisão e evasão fis- mas sobre negócios realizados com - A legislação ou a prática adminis-
cal, são muitos os organismos que essas jurisdições, estando previstas trativa não permitir o acesso e troca
se erguem contra estes, sendo um normas específicas em diversos có- efetiva de informações relevantes
dos mais ativos a Organização para digos fiscais. para efeitos fiscais.
a Cooperação e o Desenvolvimento Os critérios gerais que Portugal defi- Adicionalmente, o n.º 5 deste artigo
Económico (OCDE). niu para inclusão de um país ou terri- contém uma cláusula que permite à
Nesse sentido, os Estados, frequente- tório nessa lista constam atualmente Administração Tributária, preen-
mente sob a égide das iniciativas da no n.º 2 do art.º 63.º-D da Lei Geral chendo os pressupostos nele refe-
54 CONTABILISTA 265
FISCALIDADE
ridos, poder considerar uma juris- gatoriedade de publicação do valor Combate à Fraude e Evasão Fiscais e
dição não incluída na referida lista anual das transferências realizadas. Aduaneiras e dados estatísticos que
como um paraíso fiscal. Ao invés, no Numa vertente iminentemente fis- demonstram a materialidade do va-
n.º 6 desse artigo está uma cláusula cal, desenvolveremos as cláusulas lor das transferências realizadas para
de salvaguarda que exclui do âmbito específicas antiabuso previstas no estas jurisdições e os ajustamentos
de aplicação desta base legal os paí- CIRC no que respeita à dedutibilida- fiscais que as empresas portuguesas
ses membros da União Europeia e, de em sede de IRC das importâncias têm declarado nas suas declarações
ainda, os países que fazem parte do pagas ou devidas, a qualquer título, a de rendimentos por via da aplicação
Espaço Económico Europeu com os pessoas singulares ou coletivas resi- destas normas aqui analisadas, se-
quais existam instrumentos vincu- dentes fora do território português e guido das conclusões gerais.
lativos de cooperação administrativa aí submetidas a um regime fiscal cla-
interestadual equivalentes aos exis- ramente mais favorável bem como a A lista dos países, territórios
tentes no quadro da União Europeia. tributação autónoma prevista para e regiões com um regime fiscal
Neste artigo, atendendo ao objetivo este tipo de fluxos financeiros. claramente mais favorável
definido, não iremos desenvolver es- Feito este enquadramento, analisa- No sistema fiscal português, a pri-
ses critérios, pelo que se aconselha a remos aspetos relacionados com a meira lista de países, territórios e
sua consulta. prova e processos a ela associados, regiões com um regime fiscal cla-
Iremos, no entanto, nos pontos se- com enquadramento jurispruden- ramente mais favorável surge com a
guintes, analisar as principais ques- cial, que os sujeitos passivos terão de Portaria n.º 377-B/94, de 15 de junho,
tões relacionadas com a temática ge- cumprir de forma a evitar que estas onde são identificadas 53 jurisdições.
ral deste trabalho, começando pela cláusulas antiabuso sejam aplicadas. A publicação desta portaria resul-
identificação da lista com os países, Também pela sua atualidade, a ques- ta do Decreto-Lei n.º 88/94 que re-
territórios e regiões com um regime tão da articulação destas normas in- gulamentou a isenção de tributação
fiscal claramente mais favorável. ternas com as CDT é contextualizada dos rendimentos de títulos da dívida
Depois abordaremos a obrigação le- face ao enquadramento dado pela pública detidos por não residentes,
gal da comunicação bancária à AT Autoridade Tributária e Aduanei- excluindo de tal isenção os auferidos
das transferências bancárias reali- ra (AT) e pelo Centro de Arbitragem por residentes em países, territórios
zadas para essas jurisdições, por nú- Administrativa (CAAD). ou regiões cujo regime de tributação
mero de contribuinte do ordenante Por último, apresentaremos o Rela- se mostre claramente mais favorável
e respetivo valor, bem como a obri- tório de Atividades Desenvolvidas de do que o correspondente à tributação
daqueles em território português.
Houve, entretanto, diversas altera-
ções a esta lista, publicadas através
de sucessivas portarias.
Atualmente, estes países, territórios
e regiões estão identificadas na Por-
taria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro,
com a alteração subsequente produ-
zida pela Portaria n.º 292/2011, de 8
de janeiro (na qual foram retirados
da lista o Chipre e Luxemburgo) e
Portaria n.º 309-A/2020, de 31 de
dezembro (na qual é retirado da lista
Andorra).
No quadro 1 identificam-se os países,
territórios e regiões com um regime
fiscal claramente mais favorável,
atualmente em vigor conforme por-
tarias referenciadas:
ABRIL 2022 55
FISCALIDADE
2) Anguilha; 24) Ilhas Fiji; 46) Maurícias; 68) Ilha de São Pedro e Miguelon;
3) Antígua e Barbuda; 25) Gâmbia; 47) Mónaco; 69) São Vicente e Grenadinas;
6) Ascensão; 28) Ilha de Guam; 50) Ilhas Natal; 72) Ilhas Svalbard;
9) Barbados; 31) Hong Kong; 53) Sultanato de Oman; 75) Trinidad e Tobago;
10) Belize; 32) Jamaica; 54) Ilhas Pacífico; 76) Ilha Tristão da Cunha;
11) Ilhas Bermudas; 33) Jordânia; 55) Ilhas Palau; 77) Ilhas Turks e Caicos;
12) Bolívia; 34) Ilhas Keslim; 56) Panamá; 78) Ilha Tuvalu;
13) Brunei; 35) Ilha de Kiribati; 57) Ilha de Pitcairn; 79) Uruguai;
14) Ilhas do Canal (Alderney, 36) Koweit; 58) Polinésia Francesa; 80) República de Vanuatu;
Guernesey, Jersey, Great Stark,
Herm, Little Sark, Brechou,
Jethou e Lihou);
15) Ilhas Cayman; 37) Labuán; 59) Porto Rico;
16) Ilhas Cocos e Kelling; 38) Líbano; 60) Quatar; 81) Ilhas Virgens Britânicas;
17) Revogado; 39) Libéria; 61) Ilhas Salomão; 82) Ilhas Virgens dos Estados
Unidos da América;
18) Ilhas Cook; 40) Liechtenstein; 62) Samoa Americana; 83) República Árabe do Yémen.
22) Emiratos Árabes Unidos; 44) Ilhas Marianas do Norte; 66) São Cristóvão e Nevis;
Comunicação bancária envio de fundos que tenham como termos do n.º 4 do artigo 63.º do
e publicação do valor anual destinatário entidade localizada em Código do IRC, sempre que a ins-
das transferências país, território ou região com regi- tituição de crédito, sociedade fi-
O n.º 2 do artigo 63.º -A da LGT me de tributação privilegiada mais nanceira ou entidade prestadora
prevê a obrigatoriedade de as ins- favorável que não sejam relativas de serviços de pagamento tenha ou
tituições de crédito, as sociedades a operações efetuadas por pessoas devesse ter conhecimento de que
financeiras e as demais entidades coletivas de direito público. aquelas transferências ou envios de
que prestem serviços de pagamento Esta obrigação de comunicação fundos têm como destinatário final
comunicarem à Autoridade Tribu- abrange igualmente as transferên- uma entidade localizada em país,
tária e Aduaneira (AT), até ao final cias e os envios de fundos efetua- território ou região com regime de
do mês de março de cada ano, atra- dos através das respetivas sucur- tributação privilegiada mais favo-
vés de declaração de modelo oficial, sais localizadas fora do território rável, tal como previsto no n.º 7 do
aprovada por portaria do membro português ou de entidades não re- artigo 63.º-A da LGT.
do Governo responsável pela área sidentes com as quais exista uma A referida comunicação é feita
das finanças, as transferências e situação de relações especiais, nos através da denominada «Declara-
56 CONTABILISTA 265
FISCALIDADE
ção de Operações Transfronteiras» ra está obrigada a publicar anual- Cláusulas específicas antiabuso
- modelo 38. O modelo que está mente, no seu sítio na Internet, o no CIRC relativas à dedutibilidade
em vigor foi aprovado pela Portaria valor total anual das transferên- de gastos e tributações autónomas
n.º 191/2017, de 16 de junho, sen- cias e envio de fundos, bem como Em matéria de imposto sobre o ren-
do utilizado para a comunicação de o motivo da transferência, por ca- dimento das pessoas coletivas, o le-
operações relativas a transferên- tegoria de operação e de acordo gislador nacional introduziu diver-
cias e envios de fundos efetuados a com a respetiva tipologia, quando sas cláusulas específicas antiabuso.
partir de 1 de janeiro de 2016 e anos tenham como destinatários países, Iremos aqui analisar as que constam
seguintes. territórios e regiões com regime de nos artigos 23.º-A e 88.º do código do
Nesta portaria clarificam-se as tributação privilegiada mais favo- IRC por entendermos serem aquelas
instruções de preenchimento no rável, tal como definido no n.º 3 que comummente se verificam.
sentido de terem de ser reportadas do artigo 63.º-A da LGT (obrigação Assim, decorre do artigo 23.º-A do
não apenas as transferências indi- que foi criada pela Lei n.º 14/2017, CIRC (com a redação atualmente em
viduais superiores a 12 500 euros de 3 de maio, que alterou este n.º 3 vigor):
mas também as operações fracio- do artigo 63.º-A da LGT). «1 - Não são dedutíveis para efeitos
nadas que no seu conjunto exce- Ou seja, a AT dispõe anualmente da da determinação do lucro tributá-
dam aquele montante, para todas identificação das pessoas singula- vel os seguintes encargos, mesmo
as jurisdições constantes do anexo res e coletivas que transferiram di- quando contabilizados como gastos
III do aviso do Banco de Portugal nheiro para estas jurisdições, bem do período de tributação:
n.º 8/2016. como o valor dessas transferências, (…)
Tendo por base esta informação, a analisando o cumprimento das r) As importâncias pagas ou devidas,
Autoridade Tributária e Aduanei- normas fiscais em vigor. a qualquer título, a pessoas singu-
ABRIL 2022 57
FISCALIDADE
lares ou coletivas residentes fora do pagas ou devidas, a qualquer título, a casos, visam-se operações não reais
território português e aí submetidas pessoas singulares ou coletivas resi- ou falsas, cuja veracidade seria sem-
a um regime fiscal a que se referem dentes fora do território português e pre de difícil contestação ao nível da
os números 1 ou 5 do artigo 63.º-D aí submetidas a um regime fiscal cla- prova pela Administração Fiscal; no
da Lei Geral Tributária, ou cujo pa- ramente mais favorável a que se refe- segundo, operações reais pretendi-
gamento seja efetuado em contas re o n.º 1 do artigo 63.º-D da Lei Geral das pelas partes, embora por vezes
abertas em instituições financeiras Tributária, ou cujo pagamento seja estruturadas de modo a obter uma
aí residentes ou domiciliadas, salvo efetuado em contas abertas em ins- vantagem fiscal indevida. Sendo que,
se o sujeito passivo provar que tais tituições financeiras aí residentes ou para ambos os casos, se determinou
encargos correspondem a operações domiciliadas, salvo se o sujeito passi- como sanção a não dedução de tais
efetivamente realizadas e não têm vo puder provar que correspondem a quantias para efeitos de determi-
um caráter anormal ou um montante operações efetivamente realizadas e nação do lucro tributável, salvo de-
exagerado. não têm um caráter anormal ou um monstração em contrário da previsão
(…) montante exagerado.» pelo contribuinte (inversão do ónus
7 - O disposto na alínea r) do n.º 1 De ressalvar que esta tributação au- da prova).»
aplica-se igualmente às importân- tónoma também se aplica aos sujeitos
cias indiretamente pagas ou devidas, passivos sob o regime simplificado As provas e a inversão
a qualquer título, às pessoas singu- de determinação da matéria coletá- do ónus da prova
lares ou coletivas residentes fora do vel, uma vez que a sua exclusão não Sobre esta temática da substância da
território português e aí submetidas está prevista no n.º 16 do artigo 88.º prova e inversão do ónus, importa
a um regime fiscal claramente mais do CIRC. analisar a jurisprudência existente.
favorável a que se referem os núme- Assim, resulta das normas apresen- Para tal, iremos apresentar extra-
ros 1 ou 5 do artigo 63.º-D da Lei Geral tadas que os princípios gerais de de- tos de dois Acórdãos, um do Cen-
Tributária, quando o sujeito passivo dutibilidade dos gastos, definidos no tro de Arbitragem Administrativa
tenha ou devesse ter conhecimento CIRC, são objeto de um dever acres- (CAAD) e outro do Tribunal Central
do seu destino, presumindo-se esse cido de fundamentação e comprova- Administrativo (TCA), que, pela sua
conhecimento quando existam rela- ção no caso de pagamentos a enti- importância, são, no entanto, refe-
ções especiais, nos termos do n.º 4 do dades não residentes em Portugal e renciados em muitas outras decisões
artigo 63.º, entre o sujeito passivo e as localizadas em países, territórios ou judiciais:
referidas pessoas singulares ou cole- regiões com um regime fiscal clara- Acórdão do CAAD
tivas, ou entre o sujeito passivo e o mente mais favorável, assim identi- «Conforme já amplamente discuti-
mandatário, fiduciário ou interposta ficados, como forma de obviar à ero- do no Acórdão relativo ao Proc. n.º
pessoa que procede ao pagamento às são da base tributável, não bastando 198/2017-T:
pessoas singulares ou coletivas. a comprovação formal da existência Trata-se duma dupla prova que in-
8 - A Autoridade Tributária e Adua- dos gastos mas a comprovação mate- cumbirá ao sujeito passivo produzir o
neira notifica o sujeito passivo para rial das operações e da normalidade qual, em primeiro lugar, tem de de-
produção da prova referida na alínea dos valores declarados, cabendo o monstrar que os gastos se materiali-
r) do n.º 1, devendo, para o efeito, ser ónus da prova ao sujeito passivo da zaram em atos efetivos, não bastando
fixado um prazo não inferior a 30 relação jurídica tributária. a mera existência formal tais como
dias.» Como explica Courinha (2004): contratos, faturas e transferências
Sendo sujeitas a tributação autóno- «Nestes casos, encontramo-nos bancárias e, em segundo lugar, que
ma, tal como previsto no artigo 88.º, diante de uma reação especial de esses gastos não são anormais ou
n.º 8 do CIRC (com a redação atual- caráter anti abusivo, que contempla excessivos, o que se poderá operar
mente em vigor): nitidamente situações de manifesta mediante a confrontação com situa-
«8 — São sujeitas ao regime dos nú- simulação fiscal – “operações efe- ções comparáveis de mercado num
meros 1 ou 2, consoante os casos, tivamente realizadas” – e outras de contexto de plena concorrência.»
sendo as taxas aplicáveis, respeti- planeamento abusivo – “operações Processo n.º 313/2019-T, do CAAD de
vamente, 35 % ou 55 %, as despe- (com) carácter anormal ou um mon- 4 de maio de 2020 que julgou um caso
sas correspondentes a importâncias tante exagerado”. No primeiro dos de desconsideração dos gastos com
58 CONTABILISTA 265
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os serviços prestados por empresas art.º.352 e seg. do C. Civil). ração dessas vantagens, mormen-
residentes em Hong-Kong e uma em No que diz respeito à prova da ve- te, por comparação com os custos
Malta. racidade da operação não bastará de serviços análogos no mercado.»
Acórdão do TCA - «A introdução da a exibição de documentos escritos, Acórdão proferido em 19 de feve-
solução da inversão do ónus da prova nomeadamente contratos celebra- reiro 2015, no processo 08126/14 no
ora em exame foi adotada por inspi- dos entre as partes, já que estes se Tribunal Central Administrativo do
ração do art.º 238-A, do Côde Géne- presumem simulados, nem a de- Sul (TCAS), que julgou um caso de
ral des Impôts francês. Trata-se da monstração do pagamento do pre- pagamento a entidades não residen-
aplicação da regra de não aceitação ço, pois tal não é posto em causa. O tes e sujeitas a um regime fiscal pri-
de encargos dedutíveis quando em que deve ser objeto de prova é an- vilegiado, evidenciando a impor-
causa estão pagamentos efetuados tes a efetiva prestação de serviços, tância da demonstração das provas,
a pessoas singulares ou sociedades ou o recebimento de um emprésti- em detrimento da forma.
instaladas em paraísos fiscais, a me- mo, ou seja, o facto comercial que
nos que o sujeito passivo faça prova esteve na origem do pagamento do Processo de produção de prova
dos vetores supra identificados: mesmo preço que surge como custo Sobre o processo de apresentação e
1 - Estarmos perante operações efeti- a deduzir em sede de IRC. Já quanto análise das provas, dispõe o n.º 8 do
vamente realizadas; à prova da inexistência do caráter artigo 23.º-A do CIRC, a AT notifica o
2 - Que não têm um caráter anormal anormal ou exagerado das despesas sujeito passivo para apresentação da
ou que o montante em causa não é esta deve passar pela demonstração prova, devendo para o efeito ser fi-
exagerado. de que o contrato, cuja veracidade xado um prazo não inferior a 30 dias.
Desde logo, se deverá referir que se provou, se apresenta equilibrado. Cabe ao sujeito passivo apresentar
não exige a lei qualquer formalis- Para esse efeito, o sujeito passivo os meios de prova da efetividade do
mo nestas provas, assim vigoran- deverá demonstrar qual a impor- gasto e do caráter normal e não exa-
do quanto às mesmas o sistema da tância real das vantagens auferidas gerado, competindo à AT avaliar se a
prova livre e podendo socorrer-se o pelo contrato em causa, tal como prova apresentada cumpre os requi-
sujeito passivo de todos os meios de fazer prova que os encargos estabe- sitos de efetividade, o caráter normal
prova permitidos pela lei (cfr. v.g. lecidos constituem a justa remune- e montante não exagerado.
ABRIL 2022 59
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60 CONTABILISTA 265
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análise não possam vigorar no or- o relatório detalhado sobre a evolu- tras áreas da Autoridade Tributária
denamento jurídico português. Isto ção do combate à fraude e à evasão e Aduaneira e de outras entidades
porque, relativamente a algumas ma- fiscais, deve incluir a evolução dos que colaboram no combate à fraude
térias (como a competência para tri- montantes de transferências e envio e evasão fiscais e aduaneiras relati-
butar determinados rendimentos ou de fundos quando tenham como des- vamente a esta matéria, designada-
as taxas a que esses rendimentos po- tinatários países, territórios e regiões mente quanto a número de inspeções
dem ser tributados em cada país), as com regime de tributação privilegia- realizadas, divergências detetadas,
normas convencionais primam sobre da mais favorável, nos termos do n.º 3 correções à matéria coletável, liqui-
o direito interno. No entanto, isto não do artigo 63.º-A. dação de imposto correspondente e
inviabiliza que Portugal possa aplicar Também devem ser incluídos os re- remessa ao Ministério Público.
normas que permitem a limitação da sultados da ação da inspeção tribu- Assim, no Relatório sobre o Com-
dedutibilidade fiscal de pagamentos tária, da justiça tributária, de ou- bate à Fraude e Evasão Fiscal e
realizados a entidades de jurisdições
de tributação mais favorável, ou a
Quadro 2: Transferências e envio de fundos - Modelo 38
aplicação de taxas de tributação au- valores em milhões de euros
tónoma mais elevadas, uma vez que
Modelo 38 2016 2017 2018 2019
são normas internas cuja aplicação
não está limitada pelas convenções N.º de transferências 93 654 102 305 113 906 105 361
em vigor.
Valor 10 552 10 381 8 963 5 985
Tendo por base a doutrina emana-
da pela AT e a decisão do CAAD, Fonte: Autoridade Tributária (outubro 2021).
ABRIL 2022 61
FISCALIDADE
Aduaneira (Autoridade Tributária, contencioso, com montante contes- portâncias pagas ou devidas a en-
2021: 104-105), consta a informa- tado global de 6,5 milhões de euros; tidades não residentes sujeitas a
ção apresentada no quadro 2, que - Foram proferidas sete decisões, sen- um regime fiscal privilegiado [art.º
apresenta o número de transferên- do cinco favoráveis ao Estado e duas 23.º-A, n.º 1, al. r)]» e campo 439
cias e respetivo valor, declaradas parcialmente favoráveis aos sujeitos «Importâncias pagas ou devidas a
na modelo 38. passivos. O valor global desfavorável entidades não residentes sujeitas a
A Inspeção Tributária tem vindo a uti- aos sujeitos passivos foi de 2,5 milhões um regime fiscal privilegiado [art.º
lizar com regularidade a informação de euros e o valor favorável foi de 0,15 88.º , n.ºs 1 e 8] residentes que não
disponibilizada por esta declaração na milhões de euros; exercem a título principal, atividade
identificação de sujeitos passivos de - Foram instaurados processos de in- comercial, industrial ou agrícola,
risco, tendo por base as transferências quérito pela prática do crime de frau- regime simplificado ou OIC abran-
que efetuaram. de fiscal na sequência de duas ações gidos pelo art.º 22.º, n.º 8 do EBF)»,
Consta nesse relatório que, em inspetivas. obtêm-se os dados constantes no
2020, foram realizados 204 proce- quadro 3 relativos às entidades que
dimentos inspetivos, com corre- Estatísticas do Portal das Finanças declaram nos campos referidos da
ções e regularizações voluntárias Através da análise dos dados es- declaração modelo 22.
de 13,3 milhões de euros de maté- tatísticos sobre as declarações Em seguida, analisando as tributa-
ria coletável e 11,8 milhões de eu- modelo 22 de IRC, publicados na ções autónomas declaradas, obtém-
ros de imposto. página da AT, no que respeita ao -se a informação constante no qua-
E ainda que, nesse mesmo ano: número de declarações com valo- dro 4.
- Foram instaurados 11 processos de res declarados no campo746 «Im- Os dados mostram que em 2020
62 CONTABILISTA 265
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foram realizadas transferências no cação de taxas de tributação autóno- - Publicações – Revista Contabilista –
valor total de 6 845 milhões de eu- ma mais elevadas, visam prevenir Bibliografia»)
ros (quadro 5), representando este práticas de evasão e fraude fiscais, Nota
valor uma variação de mais 14,3 por crescentemente de dimensão inter- 1
Não obstante a existência de alguma con-
cento relativamente ao ano anterior nacional, com vista a restringir a trovérsia na utilização da terminologia,
(cerca de 900 milhões de euros), deslocalização de rendimentos para neste artigo utilizaremos as expressões
tendo a maior parcela (4 832 mi- tais jurisdições. territórios e regiões com um regime fiscal
lhões de euros) sido realizada por No que respeita à dedutibilidade de claramente mais favorável e paraísos fiscais
residentes e o restante valor por não gastos, as disposições legais ana- com o mesmo alcance e significado.
residentes. lisadas no presente artigo transfe- 2
Disponível em https://ec.europa.eu/taxa-
Da análise aos dados obtidos, veri- rem para a esfera do sujeito passivo tion_customs/system/files/2019-10/2019-
fica-se que os principais destina- o ónus de prova associado à dedu- -taxation-papers-76.pdf.
tários identificados na Portaria n.º tibilidade em IRC dos gastos decla- 3
Abrange as jurisdições identificadas na
150/2004 foram as Bahamas (988,8 rados, cabendo àquele demonstrar: Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro
milhões de euros) e Hong Kong que as operações em causa são reais, com as alterações subsequentes e ainda:
(com 953,7 milhões de euros). não tendo natureza evasiva; que tais Cabo Verde; Chipre; Delaware; Egito; Fili-
operações são motivadas por razões pinas; Guatemala; Indonésia; Irão; Região
Considerações finais de mercado; que a importância paga Administrativa de Macau; Malásia; Ilhas
Conforme se infere do preâmbulo da ou devida não apresenta um mon- Menores (EUA); Mianmar; Nevada; Nigéria;
Portaria n.º 150/2004, de 13 de feve- tante exagerado. Oklahoma; Paquistão; S. Tomé e Príncipe;
reiro, a luta contra a evasão e fraude Noutra vertente analisada, o facto Ilhas Sandwich do Sul; Singapura; Suíça;
internacionais passa pela adoção de de Portugal ter assinado convenções Turquemenistão; Ucrânia; Usbequistão;
medidas antiabuso, traduzidas em para evitar a dupla tributação com Wyoming*Cabo Verde; Chipre; Delawa-
práticas restritivas no âmbito dos as jurisdições identificadas na “lis- re; Egito; Filipinas; Guatemala; Indoné-
impostos sobre o rendimento e sobre ta” não implica que normas fiscais sia; Irão; Região Administrativa de Macau;
o património, benefícios fiscais e como as que se encontram em aná- Malásia; Ilhas Menores (EUA); Mianmar;
imposto do selo, que têm como alvo lise não possam vigorar no ordena- Nevada; Nigéria; Oklahoma; Paquistão; S.
operações realizadas com entidades mento jurídico português. Tomé e Príncipe; Ilhas Sandwich do Sul;
localizadas em países, territórios ou Por último, a AT dispõe anualmente Singapura; Suíça; Turquemenistão; Ucrâ-
regiões qualificados como “paraísos da informação dos montantes trans- nia; Usbequistão; Wyoming
fiscais” ou sujeitos a regimes de tri- feridos e identificação dos respeti- 4
Portaria n.º 256/2017, de 14 de agosto re-
butação privilegiada. vos ordenantes, para os denomina- gulamentou a publicação pela Autoridade
Face às dificuldades em definir dos “paraísos fiscais”, cabendo-lhe, Tributária e Aduaneira da informação re-
«paraíso fiscal» ou «regime fis- dentro das suas competências, de- lativa às transferências e envios de fun-
cal claramente mais favorável», o senvolver os procedimentos de con- dos, a que se refere o n.º 3 do artigo 63.º-A
legislador nacional, no esteio das trolo e fiscalização dos valores de- da Lei Geral Tributária, no seu artigo 2.º,
orientações seguidas por outros or- clarados. bem como a informação relativa às trans-
denamentos jurídico-fiscais, optou, ferências e envios de fundos, que deve
pela identificação dessas jurisdições *Docente na Escola Superior de Tecno- ser incluída no relatório detalhado sobre
em portaria, sendo vulgarmente logia e Gestão - Instituto Politécnico da a evolução do combate à fraude e à evasão
designada como a «Lista», a qual Guarda e Inspetor Tributário da AT fiscais, a ser apresentado pelo Governo à
é suscetível de revisões periódicas **Docente na Escola Superior de Tecno- Assembleia da República, de acordo com o
atendendo aos critérios legalmente logia e Gestão - Instituto Politécnico da artigo 64.º-B da LGT, no seu artigo 3.º.
definidos. Guarda e Inspetor Tributário da AT 5
O Conteúdo da Informação está regu-
A criação de disposições antiabuso ***Docente na Escola Superior de Tecno- lamentado no artigo 3º da Portaria n.º
que permitem a limitação da dedu- logia e Gestão - Instituto Politécnico da 256/2017 de 14 de agosto.
tibilidade fiscal de pagamentos rea- Guarda 6
O Conteúdo da Informação está regu-
lizados a entidades de jurisdições de lamentado no artigo 3.º da Portaria n.º
tributação mais favorável, ou a apli- Bibliografia disponível em («A Ordem 256/2017 de 14 de agosto.
ABRIL 2022 63
COLABORAÇÃO ISCAC
O direito à desconexão
do trabalhador na União Europeia
e no ordenamento jurídico interno
Este artigo reflete sobre o regime do direito à desconexão e suas exceções e,
através de uma análise legal, doutrinal e jurisprudencial, esclarece sobre a importância
que este direito representa no âmbito dos direitos fundamentais do trabalhador.
64 CONTABILISTA 265
COLABORAÇÃO ISCAC
ABRIL 2022 65
COLABORAÇÃO ISCAC
lhadores têm direito a férias anuais mínimos para o trabalho remoto e dos. Este direito foi posteriormente
remuneradas. clarificar as condições de trabalho, transformado em lei a 8 de agosto de
De sublinhar ainda a diretiva so- horas e períodos de descanso. 2016 e está atualmente regulado pelo
bre a conciliação entre a vida pro- O projeto de diretiva define o direito artigo L.2242-17 do Código do Traba-
fissional e a vida familiar dos pro- à desconexão, como o «direito dos lho francês.
genitores e cuidadores . Pretende trabalhadores de não exercerem ta- A abordagem da França inspirou ou-
conciliar a vida profissional e a vida refas ou comunicações fora do horá- tros países da União Europeia. De
familiar exigindo que os Estados- rio de trabalho através de meios di- acordo com um relatório Eurofound
-membros adotem medidas que ga- gitais, como chamadas telefónicas, de 2021, Bélgica, França, Itália e Es-
rantam os direitos dos trabalhadores e-mails ou outras mensagens.» panha têm legislação que inclui o
em matéria de parentalidade. O projeto de diretiva exige que os direito à desconexão e as discussões
Também o Pilar Europeu de Direitos Estados- membros assegurem que as estão em curso noutros Estados-
Sociais, com a finalidade de alcançar entidades patronais tomem as me- -membros.
uma Europa mais social, justa e in- didas necessárias para proporcionar A lei italiana (Lei n.º 81/2017) reco-
clusiva, estabelece 20 princípios que aos trabalhadores os meios necessá- nhece o direito à desconexão dos
devem ser seguidos, destacando-se rios para exercerem o seu direito de trabalhadores remotos. Existem
o nono e o décimo relativos a am- desconexão, reiterando a necessida- também convenções coletivas seto-
bientes de trabalho saudáveis, segu- de de estabelecer um sistema «obje- riais e empresariais que preveem o
ros, com uma equilibrada política de tivo, fiável e acessível» para medir o direito à desconexão.
proteção de dados. Tal encontra-se tempo de trabalho diário. A lei espanhola reconhece este di-
intimamente relacionado com o di- Quanto aos passos dados por alguns reito ao abrigo da legislação em vigor
reito à desconexão. Estados-membros no sentido de im- sobre a proteção de dados no âmbi-
Foi aprovada, em 21 de janeiro de plementar o direito à desconexão, to da legislação laboral. O direito à
2021, uma Resolução pelo Parla- importa aludir ao caso pioneiro da desconexão foi introduzido no âm-
mento Europeu relativa ao direito à França. Já em 2013, um acordo inter- bito da implementação da legislação
desconexão. Apela-se à Comissão sectorial nacional sobre a qualidade europeia de proteção de dados em
a elaboração de uma diretiva que de vida no trabalho incentivou as 2018. A legislação espanhola estabe-
«que permita a quem trabalha digi- empresas a evitar qualquer intrusão lece um quadro jurídico para os par-
talmente desligar-se fora do seu ho- na vida privada dos trabalhadores, ceiros sociais acordarem no direito à
rário de trabalho.» A diretiva deve especificando períodos em que os desconexão nas convenções coleti-
igualmente estabelecer requisitos dispositivos deveriam ser desliga- vas setoriais ou empresariais.
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COLABORAÇÃO ISCAC
A proteção conferida balho estipula os limites ao período tro lado, o trabalhador tem direito a,
pelo ordenamento jurídico normal de trabalho: 8 horas diárias e pelo menos, um dia de descanso por
interno 40 semanais. O sentido que se deduz é semana sendo que, por instrumento
Em Portugal, existiram diversas ini- o de que fora destes períodos o traba- de regulamentação coletiva de traba-
ciativas legislativas sobre este tema lhador não deve estar disponível para lho ou contrato de trabalho, pode ser
para além de existirem normas cons- o empregador. instituído um período de descanso
titucionais e laborais que já impõem Os artigos 199.º, 214.º, 213.º, n.º 1, e semanal complementar, contínuo ou
este direito. 232.º, n.º 1 do Código do Trabalho descontínuo, em todas ou algumas
O recente Projeto de Lei n.º 1217/ referem-se ao período de descanso semanas do ano.
XIII/4.ª do Partido Socialista aprovou do trabalhador impondo períodos Com a aprovação e entrada em vigor
a Carta dos Direitos Fundamentais na mínimos de descanso ao trabalha- da Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro,
era Digital tendo esta iniciativa, po- dor. prevê-se expressamente o direito à
rém, caducado em 2019. Entre outros Nos termos dos artigos elencados, desconexão.
direitos, o artigo 15.º era relativo aos entende-se por período de descanso o O artigo 199.º - A do Código do Tra-
direitos digitais dos trabalhadores. que não seja tempo de trabalho sen- balho prevê que o empregador tem
O art.º 16.º referia-se expressamente do que, em regra, o trabalhador tem o dever de se abster de contactar o
ao direito de os trabalhadores desli- direito a um período de descanso de, trabalhador no período de descan-
garem os aparelhos digitais fora dos pelo menos, 11 horas seguidas en- so, ressalvadas as situações de for-
tempos de trabalho, excecionando-se tre dois períodos diários de trabalho ça maior. Deverá a regulamentação
os contactos a realizar pelo empre- consecutivos. O período de trabalho coletiva, bem como os tribunais de
gador em casos de urgência de força diário deve ser interrompido por um trabalho precisar o conceito concreto
maior ou no quadro de relações pro- intervalo de descanso, de duração desta exceção. Salienta-se, no entan-
fissionais de confiança pessoal. não inferior a uma hora nem supe- to, que se incluem aqui situações im-
As alíneas b) e d) do artigo 59.º da rior a duas, de modo que o trabalha- previstas e urgentes, como incêndios
Constituição da República Portugue- dor não preste mais de cinco horas de ou acidentes; situações externas à or-
sa consagram a conciliação entre a trabalho consecutivo, ou seis horas de ganização do trabalho.
vida pessoal e profissional. trabalho consecutivo caso aquele pe- Esta norma aplica-se a todos os traba-
O artigo 203.º, n.º 1, do Código do Tra- ríodo seja superior a 10 horas. Por ou- lhadores, em regime de teletrabalho e
ABRIL 2022 67
COLABORAÇÃO ISCAC
em regime presencial.
Constitui ação discriminatória qual-
quer tratamento menos favorável
dado a trabalhador, designadamente
em matéria de condições de trabalho
e de progressão na carreira, pelo facto
de exercer o direito ao período de des-
canso, nos termos previstos e consti-
tui contraordenação grave a violação
do preceituado.
Em matéria do regime jurídico do
teletrabalho prevê-se que o direito à
privacidade do trabalhador deva ser
respeitado, assim como o seu horário
de trabalho, períodos de descanso e
de repouso e da sua família. Sendo o
teletrabalho realizado no domicílio
do trabalhador, uma visita por parte
do empregador como forma de con-
trolo da atividade laboral, deve ter
lugar durante o horário de trabalho
do trabalhador.
Nos termos do artigo 169.º - B do Có-
digo do Trabalho e sem prejuízo dos
deveres gerais consagrados no Có-
digo, o regime de teletrabalho im-
plica, para o empregador, deveres
especiais, mormente e entre outros,
o dever de se abster de contactar o
trabalhador no período de descan-
so nos termos a que se refere o artigo
199.º-A, isto é, o dever de respeitar o
direito à desconexão do trabalhador. outubro de 2001, processo n°99-42.727. 6
A discussão sobre este direito teve início no
Paralelamente, urge enaltecer que a 2
Labor Chamber of the Cour de Cassation, 17 de nosso país através do partido Bloco de Es-
violação reiterada deste direito à des- fevereiro de 2004, processo n.° 01-45.889. querda que propôs o Projeto de Lei n.º 552/
conexão pode implicar uma situação 3
Diretiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu XIII/2ª com o objeto consagrar o dever de
de assédio moral no trabalho, previs- e do Conselho. de 4 de novembro de 2003 re- desconexão profissional, através da negocia-
ta e proibida nos termos do art.º 29.º lativa a determinados aspetos da organização ção coletiva. Também o Partido Socialista, no
do Código do Trabalho conferindo à do tempo de trabalho. Projeto de Lei n.º 644/XIII, admitiu exceções
vítima o direito a indemnização nos 4
Diretiva (UE) 2019/1158 do Parlamento Eu- para este direito fundadas em exigências im-
termos gerais. ropeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, periosas do funcionamento da empresa. Igual
relativa à conciliação entre a vida profissional previsão foi feita pelo Partido das Pessoas,
* Professora adjunta convidada, CBS- ISCAC; e a vida familiar dos progenitores e cuida- dos Animais e da Natureza, no Projeto de Lei
Pós-doutoranda no domínio do Direito Privado; dores e que revoga a diretiva 2010/18/UE do n.º 640/XIII/3ª e pelo grupo parlamentar os
Investigadora no Politécnico de Coimbra, Conselho. Verdes, no Projeto de Lei n.º 643/XIII/3ª. O
Coimbra Business School Research Centre/ISCAC. 5
Resolução do Parlamento Europeu, de 21 de mesmo sucedeu com os projetos de resolução
janeiro de 2021, com recomendações dirigi- n.° 1085/XIII/3ª do Partido Comunista Portu-
Notas das à Comissão sobre o direito à desconexão guês e n.º 1086/XIII/3ª do Partido do Centro
1
Labor Chamber of the Cour de Cassation, 2 de (2019/2181(INL). Democrático Social.
68 CONTABILISTA 265
CONSULTÓRIO
Isenção rogou, de facto, a vigência da Lei n.º abrangesse nesta disposição, igual-
de IVA em produtos 13/2020, de 7 de maio, mas apenas mente, face à Decisão (UE) 2020/491
para combater até 31 de dezembro de 2021. da Comissão, de 3 de abril de 2020,
a Covid-19 Todavia, chamamos a atenção de que o IVA devido nas importações, bem
esta vigência foi, mais recentemente, como os direitos aduaneiros, tendo
A isenção de IVA aplicável aos bens prorrogada através do artigo 10.º do sido, para o efeito, publicado o Ofício-
considerados necessários para com- Decreto-Lei n.º 119-A/2021, de 22 de -Circulado n.º 15 762/2020, de 22 de
bater os efeitos do surto de Covid-19, dezembro, que refere que: abril.
prevista na Lei n.º 13/2020, de 7 de «1 – A vigência do artigo 2.º da Lei n.º Poderá encontrar este Ofício Circu-
maio, foi prorrogada em 2022 ou ter- 13/2020, de 7 de maio, na sua redação lado através do seguinte link: https://
minou em 31 de dezembro de 2021, atual, é prorrogada até ao dia 30 de info-aduaneiro.portaldasfinancas.gov.
conforme a Lei n.º 33/2021? junho de 2022. pt/pt/legislacao_aduaneira/oficios_
O Ofício-Circulado n.º 15 872, de 28 2 – Para efeitos do disposto no artigo circulados_doclib/Documents/Of%-
de dezembro de 2021, da Direção de 5.º da Lei n.º 13/2020, de 7 de maio, C3%ADcio_circulado_15762_2020.pdf
Serviços de Regulação Aduaneira, na sua redação atual, é considerado o Mais recentemente, e tendo em con-
terá alguma relação com a isenção de período compreendido entre 30 de ja- ta a Decisão (UE) 2021/2313 da Co-
IVA prevista na Lei n.º 13/2020? neiro de 2020 e 30 de junho de 2022.» missão, de 22 de dezembro de 2021,
Relativamente à segunda questão, re- foi publicado o Ofício-Circulado n.º
fira-se o seguinte: 15 872/2021, de 28 de dezembro, já
As questões colocadas referem-se à Uma vez que a isenção de IVA prevista mencionado, que apenas prorrogou a
vigência da Lei nº. 13/2020, de 7 de no artigo 2.º da Lei n.º 13/2020 apenas vigência de tal disposição, igualmente,
maio, durante o ano de 2022. abarca as «transmissões e aquisições para 30 de junho de 2022.
Ora, tal como sugerido, o artigo 2.º da intracomunitárias», houve necessi-
Lei n.º 33/2021, de 28 de maio, pror- dade de doutrina complementar que Resposta de dezembro de 2021
ABRIL 2022 69
CONSULTÓRIO
A questão colocada refere-se à reversão procedimentos: da materialidade, é aferir se esse erro irá
de um ativo por imposto diferido reco- - Primeiro: o registo no período corrente influenciar a tomada de decisão dos utili-
nhecido em função do reconhecimento das respetivas correções nas respetivas zadores das demonstrações financeiras.
de um ajustamento do custo de inventá- contas de balanço, sendo que, quando Se considerar que esse erro influenciou
rios para o valor realizável líquido (perda esses erros tenham influenciado os re- essa tomada de decisão deve conside-
por imparidade) que não foi aceite em sultados do(s) período(s) anterior(es), a rar o erro como material, e proceder à
termos fiscais no período de tributação contrapartida será resultados transita- reexpressão retrospetiva, ou seja, refle-
em que foi reconhecida contabilistica- dos; tir na informação comparativa das de-
mente nos resultados. - Segundo: E, pela correção da informa- monstrações financeiras, a correção do
Com a venda dos bens de inventário ção comparativa das quantias compa- erro de modo a efetuar os ajustamentos
em causa, haveria que se ter anulado a rativas desse(s) período(s) anterior(es) necessários para que estas apresentem a
perda por imparidade reconhecida em apresentados nas demonstrações finan- informação como se o erro nunca tivesse
períodos anteriores, e nesse período an- ceiras do período corrente, até ao limi- ocorrido.
terior efetuar-se a reversão do ativo por te do período mais antigo apresentado, No período corrente, o efeito desse erro
imposto diferido. em que se deve reexpressar os saldos de material, com influência nos resultados
Se não foi efetuado esse procedimento, abertura dos ativos, passivos e capitais de períodos anteriores, passa a estar
tal constitui um erro contabilístico que próprios (resultados transitados). refletido nos resultados transitados, pois
deve ser objeto de correção. Tal erro A correção de erros materiais de perío- decorre da correção nos resultados des-
contabilístico afeta os resultados de pe- dos anteriores nunca deve ser reconhe- se período anterior.
ríodos anteriores. cida nos resultados do período corrente Se considerar que o erro é imaterial,
Esse erro contabilístico que afeta resul- em que se esteja a efetuar a correção. pode não aplicar a NCRF 4, e corrigir
tados anteriores, sendo considerado ma- A questão da avaliação, se uma deter- o erro, que afetou resultados de pe-
terialmente relevante, deve ser objeto de minada operação (facto ou transação) é ríodos anteriores, nos resultados do
correção nos termos da NCRF 4 – «Polí- material, ou não, deve ser efetuada pela período corrente (por exemplo, conta
ticas contabilísticas, alterações nas esti- entidade em causa, não dependendo ex- 6881 ou 7881 – «Correções relativas
mativas contabilísticas e erros». clusivamente dos montantes em causa, a períodos anteriores»).
De acordo com os parágrafos 32 a 39 mas também da natureza e dimensão Como se percebe, é muito diferente im-
da NCRF 4, a correção de erros mate- das operações, e da situação económica putar o erro a resultados de anos ante-
riais que afetem resultados de períodos e financeira da própria entidade, confor- riores (transitados) ou ao resultado do
anteriores deve ser efetuada através da me previsto nos parágrafos 29 e 30 da período, principalmente se tiver existido
reexpressão retrospetiva de acordo com estrutura conceptual do SNC. a alteração do órgão de gestão entre es-
o procedimento que se segue. O que a entidade deve verificar, para efe- ses dois períodos.
A reexpressão retrospetiva implica dois tuar esse juízo de valor na determinação Com certeza, se um gestor deteta um
70 CONTABILISTA 265
CONSULTÓRIO
erro nas contas de períodos anteriores, reexpressão retrospetiva desse resulta- ano de comparativo):
em que não detinha a gestão, não quer do líquido e do respetivo imposto sobre Este procedimento não implica qualquer
afetar os resultados do período que lhe o rendimento. registo contabilístico, mas a alteração
compete. Efetivamente, a aplicação do procedi- direta nas rubricas da informação com-
O objetivo principal da necessidade de se mento de correções de erros de resulta- parativa nas demonstrações financeiras
proceder à reexpressão retrospetiva de dos anteriores, através da reexpressão do período corrente.
erros materiais está fundamentalmen- retrospetiva, implica a alteração da in- No balanço de 31 de dezembro de 2022
te relacionado com a necessidade da formação comparativa (coluna N-1) das (na coluna do período comparativo
existência de comparabilidade na infor- demonstrações financeiras do período 31/12/2021):
mação financeira, nomeadamente entre presente em que se estará a corrigir o Ativo corrente
diferentes períodos. erro. Diminuição da rúbrica do ativo não cor-
No caso da correção de erros imateriais No caso em concreto, a não contabiliza- rente «Ativo por imposto diferido», pelo
não se aplicam os procedimentos de ree- ção da reversão do ativo por impostos valor do ativo por imposto diferido.
xpressão retrospetiva, não se devendo diferidos no período em que se veri- Capital próprio
proceder a qualquer reexpressão da in- ficou, pode ser considerada como um Diminuição da rubrica «Resultados tran-
formação comparativa das demonstra- erro, devendo ser objeto de correção sitados» pelos valores do ativo por im-
ções financeiras. nos termos da NCRF 4 caso seja um posto diferido, que já deveriam ter sido
Apenas quando se trate de correções erro materialmente relevante. revertidos antes de 1 de janeiro de 2021.
de erros materiais se deve proceder à Em termos práticos, o procedimento de E/ou diminuição da rubrica «Resultado
reexpressão retrospetiva da informação correção do erro material deve ser: líquido do período», pelos valores do
comparativa das demonstrações finan- Primeiro - Registo contabilístico no pe- ativo por imposto diferido, que deveriam
ceiras, sendo que essa correção de erros ríodo corrente: ter sido reconhecidos no período 2021.
deve ser líquida dos respetivos ativos Em 01/01/2022: Na demonstração de resultados do pe-
e passivos por impostos diferidos pela Pelo reconhecimento da reversão do ati- ríodo de 2022 (na coluna do período
existência de diferenças tributáveis ou vo por imposto diferido: comparativo – 2021):
dedutíveis temporárias relativas a essas - Débito da conta 56 – «Resultados tran- Diminuição do «Resultado líquido do
correções, conforme previsto no pará- sitados» por contrapartida a crédito da período», pelos valores do ativo por
grafo 4 da NCRF 4. conta 2741 – «Ativo por imposto diferi- imposto diferido, que deveriam ter sido
O reconhecimento desses impostos dife- do», pelo respetivo montante estimado. reconhecidos no período 2021.
ridos relativos a correções dos resulta- Segundo - Alteração da informação
dos do período anterior (N-1) implica a comparativa (pressupondo apenas um Resposta de janeiro de 2022
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CONSULTÓRIO
72 CONTABILISTA 265
CONSULTÓRIO
ABRIL 2022 73
CONSULTÓRIO
a) Estado, Regiões Autónomas e au- giões autónomas ou as autarquias locais donativos são obrigadas a:
tarquias locais e qualquer dos seus participem no património inicial. a) Emitir documento comprovativo dos
serviços, estabelecimentos e organis- 5 - São considerados gastos ou perdas montantes dos donativos recebidos dos
mos, ainda que personalizados; do exercício, até ao limite de 8/1000 seus mecenas, com a indicação do seu
b) Associações de municípios e de fre- do volume de vendas ou de serviços enquadramento no âmbito do presente
guesias; prestados, em valor correspondente a capítulo e, bem assim, com a menção de
c) Fundações em que o Estado, as Re- 130% para efeitos do IRC ou da cate- que o donativo é concedido sem contra-
giões Autónomas ou as autarquias lo- goria B do IRS, os donativos atribuídos partidas, de acordo com o previsto no
cais participem no património inicial; às entidades de natureza privada, pre- artigo 60.º;
d) Fundações de iniciativa exclusiva- vistas no n.º 1. b) Possuir registo atualizado das en-
mente privada que prossigam fins de 6 - Os donativos previstos nos n.ºs 4 tidades mecenas, do qual constem,
natureza predominantemente social, e 5 são considerados gastos em valor nomeadamente, o nome, o número de
relativamente à sua dotação inicial, correspondente a 140% do seu valor identificação fiscal, bem como a data e
nas condições previstas no n.º 9.» quando atribuídos ao abrigo de con- o valor de cada donativo que lhes tenha
No caso em concreto, a fundação foi tratos plurianuais que fixem objetivos sido atribuído, nos termos do presente
instituída pelo em 1989 e o artigo 5.º a atingir pelas entidades beneficiárias capítulo;
do diploma refere que o património da e os montantes a atribuir pelos sujei- c) Entregar à Direcção-Geral dos Impos-
fundação é constituído, entre outros, tos passivos.» tos, até ao final do mês de fevereiro de
«pelo imóvel designado por “x”, que No caso em concreto, salvo melhor cada ano, uma declaração de modelo
constitui a entrada do Estado, na sua opinião, a Fundação exerce a ativi- oficial referente aos donativos recebidos
qualidade de fundador.» dade de mecenato cultural, em que o no ano anterior.
Assim sendo, consideramos que o do- Estado participa no património inicial. 2 - Para efeitos da alínea a) do núme-
nativo atribuído à fundação poderá ser Nestes termos, considerando que o ro anterior, o documento comprovativo
enquadrado na alínea c) do n.º 1 do EBF. donativo será atribuído ao abrigo de deve conter:
Em termos de mecenato, de acordo contrato plurianual, a Fundação pode- a) A qualidade jurídica da entidade be-
com a alínea a) do n.º 1 do artigo rá ser enquadrada na alínea c) do n.º 4 neficiária;
62.º-B do EBF são consideradas enti- do artigo 62.º-B do EBF. Assim sendo, a b) O normativo legal onde se enquadra,
dades beneficiários do mecenato cul- entidade que o atribui, no apuramento bem como, se for caso disso, a identifi-
tural: «As pessoas previstas no n.º 1 do lucro tributável, poderá majorar em cação do despacho necessário ao reco-
do artigo 62.º e as pessoas coletivas 140 por cento o gasto com o donativo, nhecimento;
de direito público.» sem atender a qualquer limite. c) O montante do donativo em dinheiro,
Relativamente à majoração dos gas- De notar que, estando perante um do- quando este seja de natureza monetá-
tos, citamos as seguintes disposições nativo enquadrado no conceito de me- ria;
do artigo 62.º-B do EBF: cenato, a entidade beneficiária do dona- d) A identificação dos bens, no caso de
«4 - São considerados gastos ou per- tivo é obrigada a emitir um documento donativos em espécie.»
das do exercício, em valor correspon- comprovativo dos montantes dos dona- Face ao exposto, no caso em apreço,
dente a 130 por cento do respetivo tivos recebidos, a entregar à entidade tratando-se de um donativo e não de
total, para efeitos de IRC ou de cate- mecenas (artigo 66.º do EBF), devendo uma prestação de serviços, somos do
goria B do IRS, os donativos atribuí- tal documento conter a indicação do seu entendimento que a emissão da fatura
dos às entidades referidas no n.º 1, enquadramento como entidade benefi- no ano de 2021 não fará sentido. Na
pertencentes: ciária de donativos, de acordo com as perspetiva da entidade concedente do
a) Ao Estado, às regiões autónomas e definições estabelecidas nos artigo 61.º donativo o documento relevante será
autarquias locais e a qualquer dos seus e seguintes do EBF e, ainda com a men- o recibo de quitação ocorrido no ano
serviços, estabelecimentos e organis- ção de que o donativo será concedido de 2022 (período em que a entidade
mos, ainda que personalizados; sem contrapartidas, conforme conceito deve reconhecer o donativo como gas-
b) associações de municípios e fregue- estabelecido no artigo 61.º do EBF. to).
sias; Assim, em conformidade com o artigo
c) A fundações em que o Estado, as re- 66.º: «As entidades beneficiárias dos Resposta de abril de 2022
74 CONTABILISTA 265