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EDITORIAL

O melhor de dois mundos


Paula Franco, Bastonária

H á um célebre aforismo que diz «depressa e bem,


não há quem». É só mais um ditado que revela a
sabedoria popular em todo o seu esplendor, mas como
que possível, a rede de apoio, traduzida em condições
de trabalho e auxílio técnico e jurídico prestado aos
seus membros, estejam eles onde estiverem. Aliás, para
em tudo na vida, há sempre exceções à regra. A inau- muito breve será feita a inauguração da representação
guração da nova representação permanente da Ordem, de Viana do Castelo, que completará a cobertura que a
em Braga, no passado dia 6 de julho, foi a prova inequí- Ordem faz de todo o território nacional.
voca de que é possível executar rápido e com qualidade,
num curto espaço de tempo. O negócio para a aquisi- **
ção do espaço de 10 hectares da Quinta do Pinheiro foi
concluído em tempo recorde e realizado com capitais Aproxima-se, a passos largos, o maior acontecimento
próprios da Ordem. Em rigor, a nova casa dos conta- do ano para os contabilistas certificados portugueses.
bilistas certificados abriu portas apenas 14 dias após a Não há como evitar: a ansiedade começa a apoderar-
assinatura da escritura, graças ao esforço inexcedível -se de todos aqueles que, direta ou indiretamente, es-
dos colaboradores da OCC. Foi comovente testemu- tão envolvidos no 7.º Congresso, que decorrerá nos dias
nhar a reação dos membros do distrito de Braga (e não 21, 22 e 23 de setembro. O ritmo das inscrições está a
só) quando se depararam com a beleza do espaço que, ultrapassar as melhores expectativas alguma vez aca-
a partir daquele dia, também passa a ser seu. A Quin- lentadas. Pelo feedback que temos tido de colegas com
ta do Pinheiro é um verdadeiro tesouro e um segredo quem dialogamos, dos mais jovens aos mais veteranos,
bem guardado que agora é oferecido aos profissionais. são muitos os que não escondem o seu desejo de esta-
Esta propriedade tem o condão de conseguir associar rem presentes na Altice Arena.
o melhor de dois mundos: a componente profissional Queremos que este Congresso seja exemplar como mo-
e recreativa. Ou seja, é possível apresentar condições mento de afirmação e manifestação de orgulho de uma
para os profissionais terem formação, fazerem reuniões profissão que representa cada vez mais para o nosso
e trocarem pontos de vista e, em simultâneo, desfru- País. Também aqui queremos que este evento seja a
tarem de um luxuriante espaço verde, que convida ao conjugação do melhor de duas realidades: o simbolismo
descanso e à tranquilidade. da entrega das medalhas aos membros que atingiram o
Mas o projeto não termina aqui. Como foi anunciado, número redondo de 25 anos de profissão e a pertinência
está prevista a construção de um moderno auditório e modernidade de um tema – a sustentabilidade e o re-
capaz de albergar mais de 600 pessoas. Este investi- lato não financeiro – que vai marcar, indelevelmente, o
mento é a demonstração de que a Ordem e os respeti- trabalho de todos nós nos anos vindouros.
vos responsáveis não estão fechados nos seus gabinetes As inscrições continuam abertas, mas é possível que
da Avenida Barbosa du Bocage, em Lisboa. O propósito nos primeiros dias de setembro fiquem esgotadas. Por
mantém-se inalterado desde 2018: melhorar, sempre isso, apresse-se. Vamos todos fazer história, juntos! 

JUNHO 2022 3
FICHA TÉCNICA SUMÁRIO

6
ANO XXII
REVISTA N.º 267 • JUNHO 2022

Propriedade Publicidade
Ordem dos Contabilistas Departamento
Certificados de Comunicação
e Imagem da Ordem
Avenida Barbosa
du Bocage, 45 Produção editorial
1049-013 Lisboa e revisão
Contribuinte n.º 503 692 310 Departamento
Telefone: 217 999 700 de Comunicação
e Imagem da Ordem
Diretora
Paula Franco Telefone:
217 999 715/17/18/19
Diretores adjuntos Fax: 217 957 332
Joaquim Jorge Barbosa comunicacao@occ.pt
Cristina Pena Silva Entrevista a Tiago Pitta e Cunha.
Manuel Teixeira www.occ.pt
Helena Costa

32
Álvaro Costa Impressão
Pedro Nuno Ferreira LiderGraf

Redação Tiragem
Jorge Magalhães 10 001 exemplares
Nuno Dias da Silva
Depósito legal
Design e paginação N.º 150317/00
Duarte Camacho
João Martins ISSN
Sara Brás 1645-9237

Fotografia Organismos
Jorge Gonçalves internacionais
Micaela Neto a que a Ordem pertence:
Raquel Wise

Secretariado
Raquel Carvalho
Alexandre Sousa Pinheiro na conferência «A lei do Whistleblowing».
Colaboram nesta edição
António Bentes de Oliveira

42
Cecília Duarte
Cristina Góis
Davide Ribeiro
Eduardo Sá e Silva
Miguel Gonçalves
Paula Franco
Tiago Mariz

Os artigos publicados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores.


Divulgado relato integrado intercalar - primeiro semestre 2022

4 CONTABILISTA 267
SUMÁRIO

25

Cerca de 250 profissionais estiveram presentes na inauguração da nova casa dos contabilistas, em Braga.

NOTÍCIAS
18 7.º Congresso dos Contabilistas Certificados
20 Conferência «A Contabilidade e Gestão na atividade agrícola»
25 Inauguração da nova representação permanente de Braga
32 Conferência «A lei do Whistleblowing»
36 Conferência dos colégios das especialidades
42 Dever de cumprimento de 30 créditos | Simulador de incentivo fiscal à recuperação | Relato integrado intercalar
43 Bastonária em mesa-redonda sobre o futuro da contabilidade | IPSASB Public Sector Forum | Resultados dos exames |
Formação eventual com 9 300 presenças | Tomada de posse na ESTG/IPP44 Conferência do Sindicato dos Trabalhadores dos
Impostos | Vice-presidente em webinar sobre o «Contabilista de sucesso»
45 Livro «Saúdo-vos – Crónicas da vida do autor» | Apresentação do plano de transição digital da Segurança Social
46 10 anos de Conselho das Finanças Públicas | Sistema previdêncial de Segurança Social em livro | Tomada de posse do reitor
da Universidade do Porto | ISCAC com novo presidente
47 Ordem nos media

COLABORAÇÃO ISCAC
48 O Código de Boa Conduta de Prevenção e Combate ao Assédio Laboral – Obrigação legal patronal

COLABORAÇÃO ISCAP
50 Prestação de contas

COLABORAÇÃO ISCA-UA
54 Atividade agrícola: alguns apontamentos relacionados com o tratamento contabilístico e fiscal

CONTABILIDADE
68 Uma questão de orgulho para a profissão: os primeiros contabilistas certificados em Portugal (1770)

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PERFIL

Foram as palavras de um professor de


mestrado em Inglaterra, em 1993, que
mudaram o curso da sua vida. O do-
cente aconselhou Tiago Pitta e Cunha
a seguir Direito do Mar porque sabia do
potencial da ZEE portuguesa, uma das
maiores da Europa. O resto da histó-
ria já todos conhecem. Pitta e Cunha,
nascido em Lisboa, em 1967, é uma das
personalidades mais reconhecidas e
relevantes – em Portugal e no plano
internacional – na luta pela necessária
mudança de atitude das sociedades
humanas em relação aos assuntos do
mar e do oceano. Atual administrador
executivo da Fundação Oceano Azul,
foi conselheiro de Cavaco Silva na Pre-
sidência da República, para assuntos
do Ambiente, Ciência e Mar. Em 2021
venceu o “Prémio Pessoa”, o corolário
e reconhecimento pelo trabalho desen-
volvido, nomeadamente como legisla-
dor na área das políticas do oceano nas
Nações Unidas e na Comissão Europeia.
ENTREVISTA

Tiago Pitta e Cunha, administrador executivo da Fundação Oceano Azul

«A contabilização do capital
natural vai competir aos
contabilistas certificados»
Distinguido na última edição do “Prémio Pessoa”, Tiago Pitta e Cunha antecipa a
sua participação no 7.º Congresso, em setembro, com reflexões pertinentes sobre a
posição geográfica marítima do país e a imperiosa necessidade de preservar as espécies
marinhas do oceano. O administrador executivo da Fundação Oceano Azul, que faz
da defesa dos mares uma causa de vida, defende que «o sistema fiscal ainda não
está ao serviço da sustentabilidade ambiental» e acredita que o capital natural,
especialmente o marinho, vai fazer parte da riqueza das nações, cabendo aos
profissionais da contabilidade a sua contabilização.

Entrevista Nuno Dias da Silva Fotos Raquel Wise

Contabilista – Esta entrevista um símbolo do posicionamento de é significativo e importante.


está a ser realizada no Oceanário, Portugal e de Lisboa na sua rela-
no escritório da Fundação que ção com o mar e esta relação pas- Contabilista – From the ocean’s
gere este espaço por concessão sa, essencialmente, pela inovação, point of view («Do ponto de vista
do Estado. É uma das maiores pela ciência e pela biodiversidade, do oceano»), é o mote da Funda-
atrações turísticas da capital e o mesmo é dizer, a preservação ção Oceano Azul, na qual é o ad-
do país, um legado da “Expo’98”. das espécies. E este último campo ministrador executivo. Pode des-
Para além de ser um símbolo de é uma área onde o Oceanário de- construir esta mensagem?
uma grande realização nacional senvolve muitos trabalhos, em par- T.P.C. – Existiu, desde que a Fun-
deve ser entendido, igualmente, ticular sobre literacia e educação. dação foi criada, uma grande preo-
como uma referência central de cupação em procurar influenciar
respeito e de proteção pelo mar? Contabilista – O Oceanário é um o discurso sobre a relação de Por-
Tiago Pitta e Cunha – Sim, sem dos locais mais visitados da capi- tugal com o mar. Esse discurso,
dúvida. No ensaio que escrevi para tal, superando monumentos his- especialmente entre 2011 e 2017,
a Fundação Francisco Manuel dos tóricos como o Castelo de S. Jor- foi excessivamente dominado pela
Santos (FFMS) referi que o Ocea- ge e a Torre de Belém… economia do mar. Como costumo
nário está, em Lisboa, para o sé- T.P.C – Sim, muito mais. Nós te- dizer, nesta nossa república demo-
culo XXI como a Torre de Belém mos muito mais visitantes que a crática contemporânea, o mar tem
esteve, em Lisboa, para o século Torre de Belém e os Jerónimos. O sido tudo menos economia. Porque
XVI e XVII, nomeadamente com os Oceanário, em 2019, registou um o mar está presente na nossa lite-
“Descobrimentos”. O Oceanário é milhão e meio de visitantes. O que ratura, está vivo no nosso imaginá-

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ENTREVISTA

entretanto, o futuro chegou. Neste


momento, o oceano é um enorme
património do presente de Portu-
gal. É perigoso e um erro enorme
continuarmos a ouvir dizer que é
preciso proteger o oceano por cau-
sa do nosso futuro. Porquê? Por-
que adulteramos de tal maneira o
oceano… O slogan da “Expo’98” foi
fundamental porque correspon-
deu a uma rutura estética da re-
lação dos portugueses com o mar.
A exposição mundial foi o marco
que terminou com a tal ligação do
mar no Estado Novo, assente nos
feitos históricos, nos heróis do
rio coletivo e está presente na nossa ecossistema para a espécie humana. mar, das estátuas, das caravelas,
gastronomia. Mas não esteve parti- É isso que explica que os principais das moedas e dos nomes das ruas,
cularmente ativo na nossa econo- recursos da Fundação tenham sido etc. Emergiu a estética da biodi-
mia. Os grandes grupos económicos investidos em conservação pura versidade do Oceanário de Lisboa,
não investiram no mar no pós-25 de e dura do oceano, nomeadamente que prevalece como o ex-libris da
abril. Isso era algo que acontecia no nas áreas e linhas protegidas. “Expo’98” e da relação de Portugal
paradigma anterior, no Estado Novo, e dos portugueses com o mar.
em que o mar se assumia como um Contabilista – Há 24 anos o lema
elemento fundamental da política e da “Expo’98” era «Oceanos, um Contabilista – Em que medida é
da economia desse regime. Com a património para o futuro». É que essa transformação estéti-
revolução de abril, o mar foi coloca- uma mensagem mais atual do ca mudou a nossa relação com o
do na gaveta pelos anti-imperialistas que nunca? mar?
e passámos a ter uma economia do T.P.C – Até já se encontra desatua- T.P.C. – A “Expo’98” contribuiu
mar de segundo plano. Mas apenas lizada. Nessa altura, perspetivá- para uma revolução estética, mas
economia também não chega. Por vamos o oceano como sendo um não foi acompanhada por uma
isso, a Fundação entende que é pre- património para o futuro, mas, verdadeira revolução estratégica.
ciso preservar o sistema oceânico –
que suporta e permite a vida na Ter-
ra – e sem o qual não conseguimos
manter a nossa economia ortodoxa
tradicional. O objetivo fundamental
é mudar a visão antropocêntrica (as-
sente na economia do mar, de cima
para baixo, ou seja, da atividade hu-
mana para o mar) para o ponto de
vista do oceano, onde emerge a ri-
queza da espécie marinha.

Contabilista – A Fundação Ocea-


no Azul rejeita a visão antropo-
cêntrica do mar?
T.P.C. – Situamo-nos numa posição
diametralmente oposta a essa: do

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ENTREVISTA

Infelizmente, o nosso país não foi


particularmente ativo nos últi-
mos 24 anos – desde a exposição
mundial até agora – a conservar o «A fiscalidade verde está ainda a dar os primeiros passos.
seu oceano e a preservar os ecos- Mas os incentivos não são apenas de natureza fiscal,
sistemas marinhos. A prova disso também deve haver uma política tributária sobre todas
é que nós não fazemos uma área
aquelas atividades que contribuem para delapidar o
marinha protegida, com significa-
nosso património natural.»
do, na área continental portugue-
sa, desde o Parque Luíz Saldanha,
em Sesimbra, nos anos 90. Ou seja,
não fazemos uma área marinha
protegida há mais de 25 anos. Sim- concretos no tempo e no espaço. Temos uma geografia marinha que
plificando um pouco mais, desde o Insistimos muitas vezes em obje- desconhecemos, porque tudo o
século passado. tivos muito genéricos que tanto que vemos é a superfície do mar.
servem para Portugal como para Apreender a diversidade do nosso
Contabilista – Qual tem sido o os outros países do mundo. Quer mar vai ser de extrema importân-
contributo da Fundação Oceano exemplos? «Evoluir para uma eco- cia para as nossas apostas econó-
Azul para mudar este estado de nomia mais competitiva e com micas de futuro.
coisas? trabalho mais qualificado». Isto
T.P.C. – A Fundação veio alterar o é ótimo para Portugal, como é Contabilista – O mar é um dos
discurso para «From the ocean’s ótimo para a Itália e o Vietname. mais poderosos motores de de-
point of view» e hoje em dia o dis- «Desenvolver a base científica na- senvolvimento económico. Numa
curso do mar já não é puramente cional» também é um argumento entrevista recente, afirmou que
económico. Entrou profundamen- que é válido para todos. São todos «o mar vai ser uma carta funda-
te na consciencialização dos deli- objetivos louváveis, mas que não mental no século XXI». Se fosse
beradores e opinion makers sobre obrigam a opções e a escolhas ver- um baralho de cartas, a nossa
o mar que a conservação do ocea- dadeiramente clarificadoras para posição geográfica equivaleria a
no é primordial relativamente à o país. um às?
sua exploração económica. Gosta- T.P.C – Seria um às, seguramente.
ria ainda de destacar os ganhos de Contabilista – Quer dar um exem- Aquilo que é verdadeiramente de-
causa muito importantes no traba- plo dessas escolhas e opções? finidor de um país como Portugal
lho que temos desenvolvido com T.P.C. – Reconhecer, de uma vez é a sua geografia avassaladoramen-
outros parceiros, no sentido de por todos, a nossa geografia como te marítima.
criar áreas marinhas protegidas, uma das principais prioridades
no Algarve – uma das zonas mais político-económicas. Portugal, Contabilista – Mas ao falarmos
delapidadas em termos marinhos ainda hoje, desconhece o país que reiteradamente da nossa locali-
–, na Madeira e nos Açores. é. Continuamos a olhar para nós zação periférica face à Europa,
como o retângulo ocidental da Pe- não estamos a colocar-nos de
Contabilista – Diz que somos um nínsula Ibérica, uma área exígua costas para o mar?
país de «objetivos gerais e abstra- no contexto da península e face ao T.P.C. – Isso acontece porque não
tos». Perante a falta de desígnios território europeu. Mas nós somos percebemos a nossa geografia. En-
nacionais estratégicos, o mar muito mais do que isso. É preciso quanto nos perspetivarmos como
pode ser um deles? não perder de vista que somos um o retângulo ibérico seguramente
T.P.C. – A sociedade nacional, que Estado quase arquipelágico e que continuaremos a ser, juntamente
para mim é a soma da sociedade beneficia de um enorme ecossis- com Helsínquia e Atenas, as capi-
civil e do Estado, não conseguiu, tema biofísico que é a Macaroné- tais mais periféricas relativamente
durante esta república democráti- sia, que inclui as ilhas da Madei- a Bruxelas. Continuar a conside-
ca contemporânea traçar objetivos ra, Açores, Canárias e Cabo Verde. rar-nos uma exígua parcela do ter-

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ENTREVISTA

ritório europeu é um dos pecados públicas e prioridades relacionadas se desresponsabilizar. Isso é errado.
da nossa república democrática com esta geografia. Se compreen- A pretexto disso desenvolveu-se o
contemporânea. Em termos maríti- dêssemos a nossa geografia, o co- que costumo chamar o «Síndrome
mos, o máximo da jurisdição nacio- rolário de uma nova atitude podia do Luxemburgo».
nal – que inclui a Zona Económica passar, por exemplo, pelo aumento
Exclusiva (ZEE) portuguesa – temos do peso da Marinha no cômputo das Contabilista – O que é o «Síndro-
praticamente dois milhões de qui- forças armadas e defesa nacional. me do Luxemburgo»?
lómetros quadrados. Somos um dos T.P.C. – Corria o ano de 2011, duran-
dois gigantes europeus do mar, na Contabilista – Admite que não é te a crise económica e a intervenção
companhia da Noruega. Os nórdicos adepto da conversa de políticos da troika, quando um aluno meu
dispõem de uma ZEE mais extensa sobre o país pequeno, pobre e ir- questionou-me sobre o motivo pelo
do que a nossa, mas a plataforma responsável. Falta a ambição de qual um país pequeno como o Lu-
continental de Portugal consegue pensar em grande e incorporar o xemburgo era rico e bem-sucedido
ser mais vasta. Por isso, lideramos mar e o oceano num novo modelo e Portugal, uma nação igualmente
no que à jurisdição sobre o leito ma- económico? pequena, estava sempre a debater-se
rinho diz respeito, ou seja, o solo e T.P.C. – Não me queria referir con- com imensos problemas. Para aque-
o subsolo do oceano. Estes dados cretamente aos políticos, até porque le estudante, Portugal assemelhava-
deviam a mudar a nossa perceção. considero extremamente populista -se, em dimensão, a um microestado
Se a geografia entrasse nos nossos fazer a divisão entre a sociedade e os como o Luxemburgo. E isso é um
objetivos estratégicos, seguramen- políticos. Mas reconheço que exis- erro profundo e que resulta de um
te este seria um país com objetivos tem e existiram decisores políticos enviesamento que se calhar resul-
mais concretos e concretizáveis. No- portugueses que, com o argumento tou do desaparecimento do império
meadamente, a adoção de políticas de apequenarem o país, acabam por e dos territórios ultramarinos. No

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ENTREVISTA

fundo, de uma certa megalomania riquezas do país está seguramente – e ponencial de zonas desoxigenadas,
do Estado Novo. Atenção que não assim continuará nas próximas duas temos de nos começar a preocupar
sou defensor de uma nova megalo- ou três décadas – no capital natural. seriamente na forma como aceder a
mania e de pensar de uma maneira O capital natural vai ser parte da ri- serviços que tínhamos em mente que
desequilibrada relativamente ao queza das nações e a sua contabiliza- eram gratuitos e infinitos. E é esta re-
país. Mas o que precisa de ser inte- ção vai competir também aos conta- volução mental que temos de come-
riorizado é que Portugal é um país bilistas certificados. çar a equacionar. E em alguns setores
de dimensão média europeia. ela é contabilizável.
Contabilista – No próximo mês de
Contabilista – Pela experiência setembro será orador no 7.º Con- Contabilista – O capital natural é
que teve na Comissão Europeia, gresso dos Contabilistas Certifi- mensurável?
essa é uma recorrente postura de cados, na Altice Arena. Escolheu o T.P.C. – É mensurável, já hoje em dia,
inferioridade manifestada por tema: «O oceano e o capital natu- em alguns dos serviços ecossistémi-
Portugal no estrangeiro? ral azul. Contabilizável?» Pode le- cos. É preciso abrir novos quadros
T.P.C. – Tive uma experiência con- vantar a ponta do véu sobre o que mentais e começar a fazer escolhas
creta quando trabalhei no gabine- vai falar? de longo prazo, enquanto socieda-
te do comissário europeu de Malta. T.P.C. – Ainda há muito trabalho a de. Por existirem muitas políticas de
Quando os malteses negoceiam com realizar por parte das escolas de eco- curto prazo é que acabamos por hipo-
a Alemanha e com a França julgam nomia do ponto de vista dogmático. tecar o futuro. É isso que explica que
que são do tamanho de Portugal. A teoria dos extra market values tem exploremos os recursos naturais do
Pelo contrário, Portugal quando ne- origem no século passado, especial- Planeta como se não houvesse ama-
goceia com a Alemanha e a França mente em grandes universidades nhã ou como se não tivéssemos des-
parece que é do tamanho de Malta. É norte-americanas. O capital natural, cendentes.
este tipo de enviesamento cultural e hoje em dia, já se encontra generali-
complexo de inferioridade que tem de zado na Europa, e foi particularmente Contabilista – Mas, como refere
ser profundamente alterado uma vez desenvolvido a partir do mundo an- repetidamente, a natureza é es-
que limita muitíssimo as aspirações glo-saxónico. A natureza é um bem cassa…
da nossa sociedade. O país desenvol- tão escasso, mas ao mesmo tempo é T.P.C. – A natureza nos dias de hoje
veu-se muito nos últimos 20 anos do aquilo que suporta tudo aquilo que é é extremamente escassa. Tornou-se
século passado e nestas últimas duas a nossa própria economia. É sabido um bem escasso. De acordo com as
décadas ficou, de alguma forma, sen- que nenhuma atividade económica teorias da economia ortodoxa do
tado “à sombra da bananeira”. Falta – e inclusive a própria sociedade - encontro da oferta e da procura, a
uma exigência maior, por exemplo, sobrevive sem oxigénio ou sem água natureza tornou-se um bem mais
com as atividades e as profissões. Não potável. Se continuarmos a queimar valioso. O que acontece é que va-
raro, deparamo-nos com situações florestas, adulterarmos profunda- mos necessitar de uma verdadeira
de falta de brio, de bem fazer e isso mente o oceano, com o aumento ex- revolução cultural na forma como
acaba por se repercutir em toda a so-
ciedade.

Contabilista – Sem nos desviarmos «Se as florestas europeias continuarem a arder


do tema do oceano, onde é que po- como este ano, em 2050 não vão existir florestas na
demos aspirar a ser líderes?
Europa. Vamos ter árvores nos jardins botânicos e, em
T.P.C. – Portugal pode beneficiar
consequência, a qualidade do ar no “velho” continente
muito da conservação do oceano na
medida em que somos o país da di-
será muito pior do que é hoje.»
versidade biológica. E esta mensagem
interessa-me passar sobremaneira
aos destinatários desta entrevista: os
contabilistas certificados. Uma das

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ENTREVISTA

«De uma vez por todas, temos de interiorizar que a


natureza é o último e mais valioso recurso e ativo
económico. Tal levaria a que alguns elementos deste
capital natural possam vir a ser, verdadeiramente,
as novas moedas do século XXI, as denominadas
currencies of the future. A água potável já é uma delas.»

enquadramos a natureza neste sé- fugindo dos grandes predadores, formada em madeira. Uma árvore
culo XXI, para conseguir migrar dos incêndios e das tempestades, imóvel não vale dinheiro porque
da economia ainda hoje prevale- para, de alguma forma, explorar a não contabilizamos, ainda, o ser-
cente, com origens no século XX, e natureza com o início da revolução viço ecossistémico da árvore. Na
que se caracteriza por ser extrativa, agrícola há dez mil anos. Os gran- verdade, até já o fazemos, na me-
linear e predadora do Planeta e da des predadores terrestres já esta- dida em que já existe legislação em
extinção maciça de outras espécies. vam, praticamente, todos extintos. Portugal porque o proprietário de
A crise de biodiversidade existe Já tínhamos tido os mamutes, as uma parcela de terreno numa flo-
precisamente porque promovemos preguiças gigantes, os grandes fe- resta obtém uma renda pelos servi-
uma economia predadora dessas linos. E iniciou-se a dominação da ços ecossistémicos dessa floresta, já
espécies. O atual modelo de desen- natureza pelo homem, com o quei- que está, pelo menos, a contribuir
volvimento económico é pernicioso mar de florestas, o secar dos pânta- para gerar oxigénio e absorver CO2.
e urge migrar para um novo para- nos e o desviar dos cursos de alguns E aqui entra a problemática do capi-
digma, assente na economia verde. rios. Aquando da revolução indus- tal natural. Se as florestas europeias
As ameaças existenciais provoca- trial e da ciência, no século XVII, o continuarem a arder como este ano,
das pelos grandes desequilíbrios domínio da natureza transita para a em 2050 não vão existir florestas na
aos grandes sistemas de suporte de fase seguinte: a da colonização por Europa. Vamos ter árvores nos jar-
vida do Planeta vão obrigar a uma parte dos humanos. Deixámos de dins botânicos e, em consequência,
mudança drástica nas nossas prio- ser parte do ecossistema, para nos a qualidade do ar no “velho” conti-
ridades políticas e económicas. situarmos num patamar superior. nente será muito pior do que é hoje.
Agora estamos confrontados com a E aqui é que o papel da contabilida-
Contabilista – E no que é que se necessidade de alterar isso, mas tal de é fundamental.
traduzirá esse novo paradigma? obriga a mudar os nossos principais
T.P.C – Depois do período da revo- institutos civilizacionais. Contabilista – Fale-me de alguns
lução industrial, no século XVIII, ativos intangíveis gerados, por
iniciado com as luzes e o advento da Contabilista – A que institutos ci- exemplo, no ecossistema mari-
ciência, é tempo agora de inaugurar vilizacionais se refere? nho…
uma nova era de sustentabilidade T.P.C. – A religião, a ética, a eco- T.P.C. – O oceano produz muitos
ambiental, equilíbrio da natureza e nomia e o direito são institutos serviços ecossistémicos, que dividi-
respeito pelas outras espécies. Pro- civilizacionais que desvalorizam mos entre bióticos e abióticos. Mas
curar perceber não só o que é bom profundamente a natureza e hiper- para além dos serviços do oceano
para nós, mas o que é bom para as valorizam o homem, enquanto es- que não são da biologia, temos tam-
outras espécies, sejam elas animais pécie dominadora do Planeta. Por bém a biomassa gerada. O oceano
ou vegetais. A revolução cultural exemplo, no domínio da ética am- gera uma biomassa e que é apropria-
que se exige explica-se pelo seguin- biental, o sofrimento animal não é da pela nossa economia ortodoxa
te: a existência do homem na Terra é algo que seja tido como importante. tradicional que a designa por stocks
uma luta contra a natureza. Come- Na economia uma árvore vale di- pesqueiros. A partir daqui essa bio-
çámos por ser vítimas da natureza, nheiro quando é cortada e trans- massa passa a integrar a economia.

12 CONTABILISTA 267
ENTREVISTA

Mas a biomassa não é contabilizada.


Quando compramos um peixe não
pagamos a biomassa, mas sim a or-
ganização dos fatores produtivos da
empresa de pesca, como as horas
trabalhadas, os apetrechos de pes-
ca, o custo e o combustível do na-
vio, etc. Mas a realidade é que não
pagamos, verdadeiramente, pelo
pescado.

Contabilista – Isso deve-se aos


tais institutos civilizacionais que
desprezam a natureza?
T.P.C. – A biomassa não vale di-
nheiro porque o Direito ainda hoje
considera que a natureza é algo sus-
cetível de apropriação por parte de
quem a apanhar. É aquilo a que os
romanos designavam por res nullius,
coisa de ninguém. O peixe apanha-
do por um pescador pertence a to-
dos: a nós, espécie humana e ao Pla-
neta. É importante que se diga que
se o peixe não for apanhado e não
for parar ao nosso prato, é uma uni-
dade móvel de retenção de carbono
e está a fazer um serviço ecossisté-
mico ao Planeta. Esse peixe é pre-
cioso porque foi gerado pelo prin-
cipal sistema de suporte de vida na
Terra que é o oceano. É nesse sen-
tido, que temos de passar a mone-
tizar o capital natural. O transporte
marítimo é fundamental porque 90
por cento do comércio mundial via-
ja pelos mares. A revolução logísti-
ca do transporte marítimo permitiu
que tenhamos bens de consumo a
preços impensáveis. Atualmente, o
custo de transporte de um televi-
sor fabricado no Oriente e que vem
para a Europa é incomparavelmen-
te inferior ao de há 20 ou 40 anos.
O transporte marítimo apresen-
ta uma enorme vantagem sobre os
outros tipos de transporte, como
o aéreo, o ferroviário e o terres-
tre: no mar consegue-se transpor-

JUNHO 2022 13
ENTREVISTA

tar muito mais massa, com menos criado pela guerra da Ucrânia não a guerra na Ucrânia passamos a ter
energia. Explico: ao navegarem no vem facilitar essa transição, mas não uma razão adicional: a segurança de
oceano, os navios são sustentados pode, de maneira alguma, travar essa fornecimento de energia. Por isso,
por esse serviço ecossistémico que transição. Temos duas espadas sobre são várias as razões objetivas para
é produzido pelo oceano. Esse ser- a nossa cabeça: a do défice energético mudar as nossas fontes energéticas,
viço ecossistémico abiótico que é o europeu e a da destruição das flores- o que para Portugal pode ser uma
transporte de mercadorias por mar tas europeias a curto prazo. Estas são oportunidade muito grande. Somos
é contabilizável? Portugal consegue duas preocupações que têm de andar um país rico em energias renováveis
faturar com os corredores de trá- em paralelo com a destruição dos re- e fomos sempre destituídos quer de
fego que tem ao largo da sua costa cifes de corais. carvão, quer de petróleo e gás natu-
e por onde passam mais de 60 por ral. Nos últimos 200 anos procurá-
cento das frotas de marinha mer- Contabilista – O verão que estamos mos acompanhar o passo dos países
cante da União Europeia? A respos- a viver é mais uma machadada na ocidentais da Europa mais desenvol-
ta a ambas as questões é não. É este mancha verde florestal de Portugal? vidos, mas sem sucesso. É aquilo que
serviço ecossistémico do capital na- T.P.C. – Portugal já não tem flores- denomino um período de escuridão
tural do mar que poderia ser susce- tas. Destruiu-as. Um dos casos mais das fontes energéticas tradicionais.
tível de apropriação económica, de flagrantes aconteceu com a floresta Por isso, entendo que a transição para
monetização e, consequentemente, de Monchique, no Algarve. Primeiro, uma economia verde pode ser a opor-
de contabilização. com os incêndios no início do sécu- tunidade de que Portugal precisa para
lo e, posteriormente, nos fogos de agarrar o século XXI.
Contabilista – A covid-19 e a guer- 2018. O que temos são plantações de
ra da Ucrânia relançaram a temá- árvores, desordenadas, extensíveis Contabilista - Temos recursos e
tica dos recursos energéticos e da demais, que por sua vez vão alimen- competência para tal?
sua escassez. Este contexto vai au- tando novos incêndios. Se já tínha- T.P.C. – Portugal pode ser um país
mentar a apetência pelo oceano? mos necessidade de migrar do petró- de charneira nesta nova economia
T.P.C. – Não é possível escondê-lo, leo e do gás natural por uma questão da descarbonização e aproveitando
a situação geopolítica que vivemos é de sustentabilidade energética, com a nossa invejável posição geográfi-
extremamente prejudicial para este
paradigma de evolução para uma
economia verde. O pacto ecológico
europeu é o elemento político, jurí-
dico e institucional mais redefinidor
do que é o papel e a estratégia de
crescimento sustentável da União
Europeia e aquilo que serão as nos-
sas sociedades e as nossas econo-
mias no século XXI. Temos de cana-
lizar os nossos recursos (humanos,
financeiros e organizativos) para
migrar, da dita economia extrativa
linear do século XX para uma nova
economia ambientalmente susten-
tável, circular e descarbonizadora
do século XXI.

Contabilista – Mas o conflito no


leste da Europa pode ser um travão
a essa transição?
T.P.C. – O problema geopolítico

14 CONTABILISTA 267
ENTREVISTA

mensão e a seriedade do problema.

Contabilista – A recente Confe-


«O capital natural vai ser parte da riqueza das rência dos Oceanos, que decor-
nações e a sua contabilização vai competir reu no final de junho, em Lisboa,
também aos contabilistas certificados.» foi mais um toque a reunir para a
humanidade agir de modo célere.
Contudo, sabemos que não é uma
conferência que vai resolver to-
dos os males do mundo marinho.
ca marítima sermos contribuintes um travão a esse desregramento, Continua a faltar uma governança
para o resto da Europa, por exem- porque ele continua. Os incentivos mundial que passe das palavras
plo, de energia eólica offshore flu- continuam a ser delineados nes- aos atos?
tuante. se sentido. Enquanto o IMI for um T.P.C. – Continua. Sou absoluta-
grande incentivo ao financiamen- mente taxativo e afirmativo nessa
Contabilista – A eólica flutuante to das nossas autarquias locais, a resposta. Com 24 anos de atraso re-
offshore pode e deve substituir construção e a criação de novos lativamente ao Protocolo de Quioto,
as instalações eólicas que desfi- fogos habitacionais e residenciais é estamos, finalmente, a conseguir ter
guram as paisagens das nossas uma escolha económica racional. uma agenda concreta para as alte-
serras? rações climáticas. Essa agenda ain-
T.P.C. – Para ser sincero, estou mais Contabilista – Está a tocar na da não existe para o oceano, porque
preocupado com as maciças insta- questão fiscal. Os incentivos fis- este esteve à margem de todas as
lações fabris de indústria de ener- cais vão no sentido errado? decisões significativas tomadas pela
gia fotovoltaica com mais de mil T.P.C. – O nosso sistema fiscal é comunidade internacional – leia-se,
hectares nas planícies do Alentejo. praticamente inoperante do ponto pelos Estados-membros das Nações
Mas é preciso não esquecer que a de vista ambiental e seria desejável Unidas (ONU) – durante as últimas
paisagem é um dos principais ativos que sofresse uma mudança. O sis- duas décadas. O oceano manteve-se
do capital natural. Para um país já tema fiscal ainda não está ao servi- à margem dos holofotes das grandes
com poucas florestas, como é o nos- ço da sustentabilidade ambiental, decisões da ONU. Prova disso é que
so caso, a paisagem é um dos últi- pura e dura. Nem o nosso, nem o da a palavra «oceano» aparece somente
mos ativos do nosso capital natural maior parte dos países do mundo. A uma vez no preâmbulo do Acordo de
que resta. Portugal perdeu muito fiscalidade verde está ainda a dar os Paris para as alterações climáticas,
do seu capital natural nos últimos primeiros passos. Mas os incentivos quando 60 ou 70 por cento do plano
40 anos. De várias maneiras: atra- não são apenas de natureza fiscal, das alterações climáticas está dire-
vés do desordenamento urbano as também deve haver uma política tamente relacionado com o oceano.
nossas cidades cresceram para cima tributária sobre todas aquelas ati- Para que fique registado: o oceano
de solos agrícolas ricos, construção vidades que contribuem para dela- absorve mais de 90 por cento do ex-
desregrada nas falésias e nas cos- pidar o nosso património natural. cesso de calor gerado pelo aqueci-
tas atlânticas, os incêndios que têm Temos grandes problemas macro mento global. Se tal não acontecesse,
destruído as florestas nacionais e, ao nível do equilíbrio do oceano, as nossas sociedades já seriam, por-
como tal, os ecossistemas, as espé- da atmosfera, da biodiversidade e ventura, inviáveis, fruto do terrível
cies e os habitats naturais. dos recursos naturais e procuramos calor atmosférico.
resolvê-los, muitas vezes, com pe-
Contabilista – A realidade que quenos exercícios micro, como aca- Contabilista – Esse papel regula-
descreve obrigaria a uma reflexão bar com as palhinhas, acabar com dor do oceano também o acaba por
e a medidas práticas de combate a os copos de plástico, etc. É quase prejudicar, nomeadamente com o
essa evolução? infantil a forma como nos propo- aquecimento da água do mar…
T.P.C. – Naturalmente. É imperioso mos combater esses problemas, im- T.P.C. – Isso é um serviço ecossisté-
valorizar mais a natureza e colocar pedindo-nos de compreender a di- mico e uma parte do capital natural

JUNHO 2022 15
ENTREVISTA

do oceano. Vamos lá contabilizar tima, em 2022, em Lisboa. cativa desse nosso papel. Estive na
isso, porque é contabilizável. Há cimeira da ONU em Nova Iorque e
estudos que demonstram a quan- Contabilista – É relevante ter ou posso garantir que essa sessão teve
tidade de energia que depositamos, não ter uma COP? um décimo do tamanho do evento
todos os anos, através do aumen- T.P.C. – Faz toda a diferença. Exis- de Lisboa. Isto porque a sociedade
to de temperatura, no oceano. O te um Painel Intergovernamental civil despertou, nos últimos cinco
maior protagonismo que agora é sobre Mudanças Climáticas (IPCC), anos, para a questão do oceano,
dado ao clima deve-se, precisa- mas não existe, por exemplo, um nomeadamente com o mediatiza-
mente, ao facto de se ter criado um painel idêntico para o mar. Falta, do alerta da poluição dos plásticos
sistema de governação para as al- por isso, o valor acrescentado da no mar. A este ritmo, em 2050, se
terações climáticas, assente numa ciência para promover as decisões continuarmos com sobrepesca ex-
convenção quadro e na realização políticas. Falta um painel que afira cessiva dos recursos pesqueiros, a
de Conferências das Partes (COP) e meça a dimensão da deteriora- tal biomassa, vamos ter mais mas-
do clima, onde intervêm especia- ção que está a acontecer. Portu- sa de plástico no nosso oceano do
listas de órgãos técnico-jurídicos e gal tem-se afirmado na liderança que biomassa gerada pelo oceano,
científicos. Por seu turno, os ocea- na discussão de questões relacio- ou seja, peixe, trocado por miúdos.
nos não têm COP e só tiveram duas nadas com o oceano na ONU e na Caso lá cheguemos, não haverá
cimeiras, a primeira em 2017 e a úl- UE e a recente cimeira foi signifi- maior demonstração de estupidez

16 CONTABILISTA 267
ENTREVISTA

humana! De uma vez por todas, te- Contabilista – Basicamente, o que com «um papel significativo na
mos de interiorizar que a natureza está a dizer é que temos de, defi- vida cultural e científica do país»,
é o último e mais valioso recurso e nitivamente, olhar para o capital o júri quis sinalizar e mediatizar
ativo económico. Tal levaria a que natural como um dos nossos trun- uma causa que deve ser de todos?
alguns elementos deste capital na- fos para as próximas décadas… T.P.C. – Acho que foi essencialmente
tural possam vir a ser, verdadeira- T.P.C. – Podemos, claramente, ser isso, visto que não sou propriamente
mente, as novas moedas do século um país muito mais valioso no sécu- um homem da ciência e da cultura. O
XXI, as denominadas currencies of lo XXI do que fomos no século passa- prémio é muito maior do que eu e foi
the future. A água potável já é uma do ou no anterior. É com estas refle- atribuído à compreensão por parte
delas. O próprio banco inglês HSBC xões que gostaria de desinquietar as do júri do “Prémio Pessoa” de que a
anuncia na publicidade que faz, mentes dos membros da Ordem dos sociedade portuguesa devia, verda-
por exemplo, em diversos aeropor- Contabilistas Certificados para que deiramente, focar-se nestes temas. E
tos que water is the new currency. pensem out of the box, saindo da sua antes da minha distinção, é preciso
Mas há mais. A capacidade de os zona de conforto, atentando nas me- referir que já existiu outra sinaliza-
sistemas naturais reterem carbo- todologias de contabilização de ca- ção prévia. Foi o caso do geógrafo
no vai ser outra mais-valia com- pital natural já existente em outros Miguel Bastos Araújo, vencedor em
petitiva para as nações e, no caso países ou em escolas de economia 2019, que trabalha nesta área, no-
português, temos no estuário do para que possam dar o seu contribu- meadamente na biodiversidade e na
Tejo um dos maiores armazéns de to. Não tenhamos dúvidas: a legis- sustentabilidade do território. Este
carbono da Europa. Para além dis- lação e a taxonomia financeira vão prémio tem a particularidade de
so, temos um dos principais bancos evoluir neste sentido. coincidir com um novo período de
mundiais de carbono azul. Ou seja, visualização concreta de como o país
para Portugal é altamente estraté- Contabilista – Na manhã do pas- pode ser mais pertinente no século
gico que esse capital natural venha sado dia 17 de dezembro tocou o XXI, compreendendo que a ligação
a ser mainstream economics tão cedo telefone em sua casa e recebeu a ao oceano pode ser fundamental
quanto possível. Por sermos um notícia que tinha sido distingui- neste novo paradigma. Espero que
país rico em capital natural e pobre do com o “Prémio Pessoa” 2021. não cheguemos atrasados a este
em capital manufaturado iremos Para além de enaltecer e reconhe- novo paradigma, como aconteceu no
beneficiar muitíssimo disso. cer a atividade de um português século XX e XXI.

«A situação geopolítica que vivemos


é extremamente prejudicial para este
paradigma de evolução para uma
economia verde.»

JUNHO 2022 17
NOTÍCIAS

CONGRESSO
ORDEM DOS CONTABILISTAS CERTIFICADOS
ALTICE ARENA 21, 22 E 23 SETEMBRO 2022

Programa fechado, inscrições


recorde, três dias inesquecíveis

T rês dias que prometem ser inesquecíveis


ou, por outras palavras, tudo a postos
para o grande evento do ano. A 21, 22 e 23
tembro assentará arraiais na zona oriental
de Lisboa. Vamos por partes.
Dia 1, dia 21, Dia do Contabilista. Este arris-
de setembro de 2022, na Altice Arena, em ca-se a ser o dia em que mais contabilistas
Lisboa, a Ordem organiza o 7.º Congresso certificados se reúnem debaixo do mesmo
dos Contabilistas Certificados e preparou um teto. No final da primeira semana de agosto,
programa recheado de novidades. Da presen- estavam inscritos cerca de 6 200 membros,
ça de Marcelo Rebelo de Sousa – é a primeira um número que crescerá ainda nas próximas
vez que um Presidente da República participa semanas. Como este é o dia em que serão
num evento organizado exclusivamente pela entregues as medalhas a todos quantos com-
Ordem - ao jantar de gala com o concerto pletaram 25 anos de inscrição na Ordem
de Mariza; da sessão com Pedro Abrunhosa, dos Contabilistas Certificados não restam
esse mesmo, o compositor e cantor, mas que dúvidas de que estamos diante de um dos
neste congresso aparecerá na pele de moti- grandes momentos desta edição, o que levou
vador, a Tiago Pitta e Cunha, Prémio Pessoa mesmo a que seja permitido a todos quan-
2021 e entrevistado neste número da revista; tos não queiram participar nos trabalhos do
dos ministros das Finanças (Fernando Me- Congresso a sua inscrição apenas para ir re-
dina), da Economia (António Costa e Silva) ceber a medalha. O espaço da Altice Arena é
e do Trabalho (Ana Mendes Godinho) a D. finito e como a procura tem sido muito ele-
Américo Aguiar, bispo auxiliar de Lisboa ou vada, como os números o demonstram, caso
Francisco Assis, presidente do Conselho Eco- ainda não o tenha feito, inscreva-se o quanto
nómico e Social, para além de um conjunto antes!
vasto de especialistas em diversas áreas que, Para o dia 2, dia 22, teremos a abertura ofi-
de uma forma ou de outra, vão encaixar-se cial do congresso. Será o dia mais intenso,
debaixo do grande tema do Congresso – A dada a abrangência do programa. A partir
sustentabilidade e o relato não financeiro – daqui entrar-se-á, propriamente, na discus-
existem motivos mais do que suficientes para são e reflexão sobre a sustentabilidade e o
que se junte à grande família dos contabilis- relato não financeiro, com a presença de es-
tas certificados que por aqueles dias de se- pecialistas diversos que apresentarão visões

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NOTÍCIAS

e desafios suscetíveis de abrirem novos hori- da IFAC, o 7.º Congresso encerrará com cha-
zontes e acrescentarem motivos para novas ve de ouro: Marcelo Rebelo de Sousa, Presi-
reflexões (e preocupações). dente da República.
Neste dia é igualmente dado a conhecer o O programa está definido, mas pode sempre
novo projeto formativo da Ordem, o "CCClix", sofrer ajustes pontuais, por imprevistos de úl-
bem como será apresentado e distribuído o tima hora. Sugere-se, por isso, a consulta re-
«Livro da Contabilidade», uma obra gigan- gular do microssítio. As inscrições entraram
te, a rondar as mil páginas, que se pretende na segunda fase, encontrando-se agora no
constituir como um manual de referência para valor intermédio: 35 euros até 31 de agosto,
todos quanto lidam com as questões conta- passando para os 50 euros para quem se ins-
bilísticas. Ainda há fôlego? Terá que existir, crever em setembro. Tenha sempre presente
porque o dia só terminará com o jantar de que as inscrições são limitadas e, se ainda
gala (já esgotado) e com o concerto da fadis- não o fez, reserve o seu lugar o quanto antes.
ta Mariza que poderá ser visto e ouvido por Como aqui se demonstrou, há muitos motivos
todos os congressistas ou inscritos no jantar. para não faltar.
Dia 3, 23 de setembro, último dia do congres- De referir, por fim, que no âmbito do regula-
so. A sustentabilidade continuará a ser objeto mento de formação profissional contínua são
de discussão na primeira parte da manhã. De- atribuídos 15 créditos.
pois, tempo para o lançamento da certificação Caso pretenda, pode remeter a sua dúvida ou
de qualidade e para um espetáculo cénico de pedido de esclarecimento para o email oficial
música e dança, que terá como tema «História do evento: viicongresso@occ.pt.
da profissão – passado e futuro».
A fechar, e para além das presenças da basto-
Microssitio
nária Paula Franco e Alan Jonhson, presidente

JUNHO
JUNHO2022
2022 1919
NOTÍCIAS

Jorge Sobrado, José Palha, Francisco Pavão e Filipa Xavier de Basto

Conferência «A contabilidade e gestão na atividade agrícola», Santarém, 6 de junho

A digitalização como via


para o crescimento
Texto Jorge Magalhães | Fotos Sérgio Marques

A pós dois anos de interregno, a ha-


bitual conferência que a Ordem
dos Contabilistas Certificados (OCC)
primeira vez, o evento foi transmitido
em direto através do canal da Ordem
no Youtube.
funcionar», garantiu o secretário-geral
da CAP.
Contudo, a evolução poderá seguir a
e a Confederação dos Agricultores de «O tema desta feira é a inovação e tec- diferentes velocidades. «Só o Estado é
Portugal (CAP) realizam no decurso da nologia e, como todos sabemos, esse é que parece não se conseguir adaptar.
Feira Nacional da Agricultura (FNA) re- um fator determinante no trabalho dos A digitalização obriga a repensar pro-
gressou, a 6 de junho, ao auditório do contabilistas certificados», começou cessos. O Estado tem no Plano de Re-
Centro Nacional de Exposições (CNE- por anotar Luís Mira, no início da ses- cuperação e Resiliência (PRR) uma ver-
MA), em Santarém. Em 2020 e 2021, são. «Existe no presente um conjunto ba enorme para a digitalização. Já tive
devido à pandemia, esta iniciativa, que de ferramentas muito avançadas. Um oportunidade de perguntar ao primeiro-
conheceu a sua 12.ª edição, migrou amigo meu dizia-me há uns dias que os -ministro quantos funcionários iria dis-
para os canais digitais, voltando ago- nossos telemóveis têm mais inteligência pensar e não obtive resposta...»
ra ao formato presencial. Um regresso do que a NASA tinha há 30 anos. Es- Outra questão que não sofrerá altera-
saudado e assinalado pelos responsá- tas aplicações são também usadas na ção, desconfia este responsável da CAP,
veis das duas organizações e que este agricultura. A digitalização vai obrigar é a que diz respeito a impostos e taxas.
ano contou com uma inovação: pela a adaptarmo-nos a esta nova forma de «Para o desenvolvimento da atividade

20 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Paula Franco Luís Mira

agrícola e pecuária, existem 1 229 ta- formação não é fácil, mas quem não Coordenação e Desenvolvimento Regio-
xas diferentes. É inacreditável! Isto de- acompanhar esta evolução dificilmente nal do Norte.
monstra bem o padrão atual em que nos terá o mesmo sucesso.» Uma inevitabi- Para testemunhar a forma como a tec-
encontramos. Às vezes, até para pagar lidade que, no caso dos contabilistas, é nologia está presente no dia-a-dia dos
estas taxas é difícil.» já bem conhecida e que deverá conhe- agricultores, José Palha, presidente da
Antes de passar a palavra a Paula Fran- cer novos passos: «A integração dos Associação Nacional de Produtores de
co, Luís Mira abordaria ainda a impor- processos contabilísticos é importante, Cereais, apresentou o exemplo de uma
tância dos subsídios concedidos aos sendo agora necessário evoluir para das suas explorações, no caso da Her-
agricultores em resultado da Política a abolição do papel. A informação fi- dade de Santo Isidro, em pleno Ribatejo.
Agrícola Comum (PAC) e que ajuda a nanceira é importante, mas só o será Com cerca de 550 hectares, a gestão da
que os produtos cheguem aos consumi- verdadeiramente se for fornecida em propriedade assenta em três vetores:
dores a preços mais comportáveis. «A tempo real.» sustentabilidade ambiental, eficiência e
PAC é uma política para todos os consu- Aqui chegados, falta juntar um parcei- rentabilidade, dedicando-se sobretudo
midores. Todos os que estão nesta sala ro fundamental ao processo. «Para que à exploração florestal, pecuária e agri-
beneficiam da PAC.» tudo isto evolua da forma natural é ne- cultura (cereais e alguma horta indus-
A bastonária da OCC, depois de re- cessária a ajuda do Estado. É preciso trial, sobretudo ervilhas).
forçar a importância da parceria com que o Estado simplifique processos, dê Desde o uso de sensores que fazem o
a CAP, lembrou precisamente que a respostas atempadas, esteja presente mapa da condutividade elétrica do solo,
questão destes subsídios (e não só) na quando realmente é necessário. É neces- passando por tratores equipados com
atividade agrícola «exige uma dedica- sário que crie um "Simplex" a sério, sem o sistema autotrack, de condução autó-
ção e interligação mais profunda entre complicações», defendeu a bastonária, noma, que aplicam os adubos de acor-
estes empresários e os contabilistas acrescentando ainda que «o Estado tem do com as necessidades detetadas ou
certificados. Os empresários dificil- que ser um fator facilitador deste cres- o uso de drones para verificar o vigor
mente conseguem andar sozinhos sem cimento e não um parceiro que coloque vegetativo das plantas ou mapear, por
os contabilistas e estes necessitam dos pedras na engrenagem.» exemplo, a invasão por parte de ervas
empresários», sintetizou a responsável infestantes, esta propriedade deita mão
máxima da OCC. Agricultura a uma panóplia de equipamentos tecno-
Porque nesta conferência, e na FNA em com tecnologia de ponta lógicos de última geração.
geral, um dos motes era precisamente a «A gestão da atividade agrícola na era Porque as questões ambientais não
transformação tecnológica, Paula Fran- digital – desafios para o contabilista». podem ser descuradas, a Herdade de
co defendeu que «todos os empresários Foi este o mote lançado para o primei- Santo Isidro, garantiu o empresário,
agrícolas, tal como os contabilistas, es- ro painel, moderado por Jorge Sobrado, «tem um balanço energético zero. Toda
tão a viver grandes desafios. Esta trans- assessor do presidente da Comissão de a energia consumida é produzida na

JUNHO 2022 21
NOTÍCIAS

exploração, através do uso de painéis recebemos muita informação por email Xavier de Basto é a CEO do grupo Your
solares.» Afinal, rematou José Palha, ou whatsapp, o que facilita o contacto Finance e contabilista certificada.
socorrendo-se de uma frase de Ghandi: com os nossos contabilistas.» A oradora fez a ligação do mundo agrí-
«O futuro dependerá daquilo que fizer- Afinal, defendeu este responsável as- cola com a importância da digitalização,
mos no presente.» sociativo, «tem de existir uma relação referindo que «a transformação digital
Francisco Pavão, presidente da Associa- muito próxima entre o agricultor e o é uma inevitabilidade de qualquer ativi-
ção de Produtores e Proteção Integrada contabilista, de forma que as decisões dade, mas na atividade agrícola permite
de Trás-os-Montes e Alto Douro, cen- sejam tomadas tendo por base a ges- uma melhoria de processos, aumento da
trou-se na interligação e sinergias que tão.» eficiência e produtividade, maior vanta-
a sua corporação tem com os contabi- Pavão confessou ainda que «a digitali- gem competitiva, redução de custos e
listas. zação é fundamental para a tomada de controlo de gestão.»
Composta por cerca de mil e 400 agri- decisão imediata, mas também para a Porque a digitalização tem dado empur-
cultores, muito focalizados no olival, tomada de decisões no futuro», reve- rão decisivo para os tempos que se vi-
amendoal, vinha e castanheiro, bem lando que a associação a que preside vem, Filipa Xavier de Basto revelou que,
como nas pastagens, esta associação está integrada «num conjunto de pro- na sua organização, «a transformação
criou, «há cerca de dez anos, um gabi- jetos de inovação e investigação muito digital na contabilidade levou a que
nete que tem dois contabilistas certifi- ligados à digitalização na agricultura e exista um lema: “Temos que passar de
cados que apoiam os nossos associados à forma de a tornar mais acessível aos contabilistas a consultores”. Num con-
naquilo que são as decisões de gestão, nossos produtores.» texto destes, os processos de digitaliza-
mas também na contabilidade», referiu Escutados estes empresários agrícolas, ção são fundamentais. Se não tivermos
o orador, que fez questão de recordar tempo para ouvir outra empresária, processos ágeis, não conseguimos dar
que «no caso dos jovens agricultores já mas do ramo da contabilidade. Filipa informação atempada aos gestores.»

Cláudia Afeto Dias, António Nabo e Pedro Pinheiro

22 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Conferência OCC/CAP teve, pela primeira vez, transmissão em direto.

Outro aspeto importante prende-se o conceito de subsídio/subvenção, bem exceções. Entre elas, «de acordo com o
com o conhecimento do negócio por- como os tipos de subsídios e a tributa- artigo 16.º n.º 5 al. a) do CIVA, um sub-
que, «o relato financeiro não são só os ção em sede de IVA. sídio/subvenção será incluído no valor
números, apesar de os números terem Afeto Dias lembrou que «não existe um tributável das operações, e consequen-
que estar certos, mas também toda a conceito de “subsidio/subvenção”, quer temente tributado, caso tenha a natu-
atividade que envolve determinada en- no plano do Direito da União quer no reza de subsídio/subvenção diretamente
tidade. É um fator capital», anotou a Direito interno». Contudo, decorren- conexa com o preço de operações tribu-
empresária. te de vária jurisprudência comunitária táveis», referiu a oradora. Também «to-
Na sua alocução, Filipa Xavier de Bas- pode entender-se como a «atribuição das as ajudas concedidas no âmbito do
to deixou ainda alguns desafios para o a um sujeito passivo, por parte de um POSEIMA são sujeitas a IVA.» De referir
contabilista, garantindo que «se os pro- organismo internacional ou de um orga- ainda que a diretiva IVA prevê a possi-
cessos estiverem a ser feitos de forma nismo público nacional, de uma presta- bilidade de tributação das subvenções,
mais automática, a libertação das pes- ção de caráter patrimonial, assumindo como consta do seu artigo 73.º.
soas para o processo de análise pode o sujeito passivo subvencionado o com- A apresentação da diretora dos servi-
criar aumento de sinergias e produtivi- promisso de adotar uma determinada ços do IVA terminaria com a chamada
dade. Teremos uma tomada de decisão conduta, prosseguir um dado objetivo de atenção para o caso particular de di-
mais informada e consciente.» ou realizar um certo projeto ou tarefa, reitos RPB – Regime de pagamento base
de que a entidade que concede a sub- (art.º 17.º da Portaria n.º 57/2015),
IVA, subsídios e subvenções venção não é a direta beneficiária ou referindo que a relevância das ativi-
Após o intervalo, o segundo painel destinatária, mas que visa a satisfação dades que são exercidas «devem estar
apontou baterias para «Os subsídios e de uma necessidade coletiva ou ir ao atualizadas ao nível do cadastro, com
apoios na atividade agrícola», que teve encontro de um interesse público consi- o correto enquadramento em sede de
como moderador António Nabo, conta- derado relevante.» IVA porque essa informação influencia
bilista certificado. No que toca à tributação em sede de o resto, como a própria atribuição dos
Cláudia Afeto Dias, diretora de serviços IVA, garantiu Cláudia Afeto Dias, «em subsídios ou subvenções.»
do IVA da AT, abordou o «Enquadramen- princípio, os subsídios/subvenções con-
to de subsídios e subvenções em sede de sideram-se fora do campo do imposto, Relato integrado
IVA». Na sua alocução, centrou-se nas e, como tal, não sujeitos a IVA, dado como inevitabilidade
atividades exercidas, no respetivo en- corresponderem, por regra, à atribui- Pedro Pinheiro, presidente do Instituto
quadramento em IVA, abordando depois ção gratuita de fundos.» Há, contudo, Superior de Contabilidade e Adminis-

JUNHO 2022 23
NOTÍCIAS

tração de Lisboa (ISCAL), debruçou-se rendimentos, já não há diferenciação»,


sobre os «Aspetos contabilísticos dos alertou.
subsídios e outros apoios das entida-
des públicas», começando por chamar O sumo de laranja
a atenção para a importância da «au- e a contabilidade
ditabilidade da informação», sendo A digitalização e a sua importância
obrigatório «ter cuidado com a infor- voltariam à liça. Paula Franco, no final,
mação que é prestada, devendo a mes- recuperou a sua metáfora do sumo de
ma estar organizada, ter devidamente laranja e da contabilidade, referida nas
estruturado aquilo que é o suporte à intervenções de Jorge Sobrado, como
transação.» moderador e, posteriormente, de Pedro
«Grupos profissionais interessados em Pinheiro, para dizer que fazer um sumo Eduardo Oliveira e Sousa
serem responsáveis pela certificação de laranja de forma manual dava muito
da informação relacionada com a res- trabalho para a quantidade de líquido do apoio à gestão dada pelo exército
ponsabilidade social, é o que não falta. que se conseguia obter. Ora, lembrou a de contabilistas certificados junto das
Existem muitas entidades com interesse bastonária, e transpondo a ideia para empresas e dos empresários os já di-
em que esta nova área de negócio não a contabilidade, «este sumo era muito fíceis momentos vividos passariam a
seja uma tarefa dos contabilistas cer- pouco aproveitado pelos utilizadores dramáticos e mais colapsos teriam cer-
tificados. Em minha opinião, deve ser da informação. Com a evolução e o tamente acontecido. No setor agrícola,
e deve ser porque estamos a falar de advento da era digital, se temos uma que nunca parou, essa ligação à conta-
prestação de contas», defendeu Pedro máquina para fazer a contabilidade e bilidade é fundamental para superar as
Pinheiro, numa altura em que chama- ajudar na integração, sabemos que isso dificuldades avolumadas. Só através de
va a atenção para a importância de os nos facilita o caminho, assim como o profissionais conhecedores da realida-
CC não descurarem o relato integrado, que acontece com as máquinas que fa- de empresarial e de uma atividade cer-
uma vez que «não é uma questão de zem de forma rápida um sumo de laran- tificada, se pode confiar na excelência
“se”, é uma questão de quando é que ja. Com a digitalização, a informação é que se exige.» Para este responsável, a
vai ser obrigatório para todos.» mais rápida e serve mais utilizadores.» relação do empresário agrícola com o
O orador lembrou que esta ligação com Por outro lado, referiu ainda Paula contabilista «tem de ser uma relação de
a atividade agrícola é cada vez mais Franco em adenda ao que fora avan- partilha, confiança e intimidade.»
importante, uma vez que «uma parte çado por Pedro Pinheiro, «o Estado é Centrando-se depois na realidade in-
dos subsídios que lhe são destinados tão exigente em relação a tanta infor- terna, Oliveira e Sousa defendeu uma
passam por questões relacionadas com mação que com as laranjas quer fazer «redução do nível de tributação das
a contabilidade e com a prestação de uma salada de frutas. E isso é muito empresas para que o país se torne mais
contas.» Contudo, alertou o orador, complicado quer para os contabilistas competitivo. É uma urgência. Sem que
«do ponto de vista do reconhecimento certificados quer para os empresários. tal aconteça, não quebraremos este
é preciso algum cuidado na forma como Com os níveis de digitalização, a simpli- vício de ‘pescadinha de rabo na boca’,
os mensuramos ou reconhecemos.» ficação deveria ser cada vez maior. Se limitando a capacidade de as empresas
Aqui chegados, o orador lembrou a esta salada de frutas é para beneficiar criarem. Quanto mais tempo demorar-
«distorção que existe desde início» a economia e o país, estamos de acor- mos a alterar este estado de coisas
entre a norma internacional de conta- do. Se for para trazer mais obrigações, mais nos afastaremos dos países que
bilidade e o preconizado pelo SNC em mais informação repetida, é algo que lideram o crescimento na UE.» 
matéria de subsídios. «Em Portugal op- teremos de contrariar.»
tou-se por levar os subsídios a capital O encerramento desta 12.ª conferên- Transmissão integral da conferência
próprio, enquanto na norma internacio- cia ficou a cargo de Eduardo Oliveira e
nal isso seria reconhecido como rendi- Sousa. Numa breve retrospetiva dos úl- Apresentações disponíveis na
mento diferido.» No entanto, «quando timos dois anos e dos períodos contur- Pasta CC
passamos para os subsídios relaciona- bados que se viveram, Oliveira e Sousa
dos com os subsídios relacionados com foi claro: «Não fosse a competência Galeria fotográfica

24 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Inaugurada a nova representação permanente de Braga

Queridos membros,
mudamos de casa!
Textos Nuno Dias da Silva | Jorge Magalhães | Fotos Jorge Gonçalves

A distância que separa a Praça Ca-


milo Castelo Branco, número 37,
da Rua Frei José Vilaça, número 280 é
relógio. A azáfama nos dias prévios ao
grande dia assemelhou-se a um conhe-
cido programa televisivo que, num ápice,
lizada na freguesia de Ferreiros, Paula
Franco começou por referir ser este
«um dia muito feliz, que marca o início
de aproximadamente 2,7 quilómetros. transfigura casas antiquadas em lugares de um novo percurso com os contabi-
O primeiro endereço refere-se à mora- modernos e acolhedores. listas certificados de Braga.» Apenas
da durante quase 22 anos (desde 16 de 14 dias após a assinatura da escritura,
dezembro de 2000) da representação «Envolvência profissional a nova representação de Braga abre
da Ordem, em Braga, nas imediações e recreativa» portas, fruto do «trabalho inexcedível»
da estação de caminhos de ferro, na Eram 17 horas e 39 minutos quando a dos colaboradores da OCC. «Este pro-
freguesia de Maximinos. A segunda mo- bastonária Paula Franco e o presidente jeto acontece graças a todos vós, ao
rada, também conhecida por Quinta do da Câmara Municipal de Braga, Ricar- vosso empenho e contributo. Trata-se
Pinheiro, corresponde à propriedade que do Rio, descerraram a placa relativa à de um espaço muito especial e que terá
é, desde 6 de julho passado, a nova casa inauguração da representação perma- diversas finalidades: reuniões livres
dos contabilistas certificados na cidade nente da Ordem, em Braga. Mais de 250 quinzenais, colóquios, conferências ou
dos arcebispos, na freguesia de Ferrei- membros deslocaram-se, no tórrido fi- até reuniões entre os membros e os
ros. O negócio, a escritura, a mudança nal de tarde de 6 de julho, à Quinta do seus clientes. No fundo, escolhemos
e as necessárias obras de requalificação Pinheiro. Após ter guiado o autarca da este espaço porque permite uma maior
foram realizadas em autêntico contrar- cidade dos arcebispos pela quinta, loca- envolvência profissional e recreativa»,

Paula Franco e Ricardo Rio no momento do descerramento da placa alusiva à inauguração.

JUNHO 2022 25
NOTÍCIAS

acrescentou Paula Franco. «Este espa-


ço só faz sentido se for vivido e usado
pelos contabilistas certificados da re-
gião», reforçou.
José Roriz recordou que «as reuniões
livres de Braga foram, durante vários
anos, as sessões mais participadas,
inclusive superando as realizadas em
Lisboa e Porto.» Membro da Assem-
bleia Representativa eleito pelo círculo
de Braga, Roriz referiu que a cidade
«merecia uma representação condig-
na» que, fez questão de sublinhar, foi
«comprada com receitas próprias.»

Paula Franco: «Este espaço


só faz sentido se for vivido
e usado pelos contabilistas
certificados da região.»

Auditório projetado
O autarca bracarense foi o último a
usar da palavra. Ricardo Rio declarou
que a abertura da representação cor-
responde «a um reforço do compro-
misso da Ordem com os membros da
região.» Rio não regateou elogios ao
«espaço notável» da Quinta do Pinhei-
ro, que «já merecia esta valorização.»
O presidente da edilidade minhota
acredita que o projeto em carteira ain-
da valorizará mais este espaço com
uma área de 10 hectares. «O proje-
to em carteira», acrescente-se, diz
respeito a um auditório envidraçado,
com capacidade máxima para 600/700
pessoas, e um estacionamento subter-
râneo, capaz de acolher todos os que
pretendam assistir aos eventos que ali
se realizem.

Crença no projeto
O pavilhão central da Quinta do Pi-

26 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

nheiro é constituído pela sala principal,


com capacidade para cerca de 200 lu-
gares sentados, uma sala contígua, de
menor dimensão, com capacidade para
50 lugares, e uma pequena sala, propí-
cia a acolher pequenas reuniões. Ricar-
do Rio mostrou a sua disponibilidade
para estar presente, na condição de
presidente da câmara de Braga, caso a
inauguração do futuro auditório acon-
teça até ao final do seu mandato. Se
assim não for, disse, virá na condição
de «convidado.»
O autarca concluiu a sua breve inter-

Ricardo Rio: «Esta inau-


guração corresponde a um
reforço do compromisso da
Ordem com os membros da
região.»

venção com os argumentos que expli-


cam a recetividade dos profissionais
bracarenses a esta iniciativa: «Primei-
ro, acreditam neste projeto. Depois,
percebem que este é um espaço que
lhes é útil. Finalmente, a vitalidade
deste setor é a vitalidade do setor
económico de Braga e do acompanha-
mento próximo que têm dado a muitos
projetos e a muitos investidores, em
particular no período tão difícil como
foi o da pandemia.»
Feita a inauguração e proferidos os
discursos que a ocasião impunha, ao
bater das 18 horas era tempo de vol-
tar ao trabalho, para a reunião livre
quinzenal, a primeira no novo espaço,
ministrada por José Roriz, Rui Bastos e
Conceição Soares. 

Transmissão integral

Galeria fotográfica

JUNHO 2022 27
NOTÍCIAS

Um investimento que se justifica, possibilitando combinar, no mesmo espaço,


trabalho, natureza e lazer. Os membros dizem de sua justiça
sobre a nova representação de Braga.
TESTEMUNHOS
José Vaz, Braga
«É um investimento justificado. O espaço está bem localizado – nunca pensei
que isto fosse propriedade da Ordem – e valoriza a cidade e a instituição. Pode
até servir para outros eventos que a Ordem pretenda organizar. Aparentemen-
te, dispõe de muito mais condições e poupa-nos o trabalho de estar a ir para o
seminário ou para a Universidade do Minho. Aguardamos ansiosamente a cons-
trução do auditório, para 600 pessoas, que a bastonária anunciou. Os membros
têm muito interesse pela formação, porque permite-nos estar sempre em dia
com a legislação e outras novidades.»

Elisabete Parente, Braga


«Sou frequentadora habitual das reuniões livres e considero magnífico passar-
mos a ter à nossa disposição um espaço como este. Esta aposta da Ordem é
boa para a cidade e para os profissionais. Já o conhecia pelos eventos de passa-
gem de ano que faziam aqui, mas nunca imaginei estar neste sítio, agora, como
sendo da OCC. Gosto muito de natureza e esta envolvência permitirá certa-
mente criar uma atmosfera propicia tanto a convívio como ao desenvolvimento
dos conhecimentos profissionais. O nosso trabalho é muito solitário. Podermos
sair ao final do dia para vir até cá é muito bom. Vai, certamente, trazer benefí-
cios, tanto do ponto de vista mental como profissional.»

Ludovina Fonseca, Vila Nova de Gaia


«Gostei imenso. É um espaço espetacular. Vou passar a vir aqui, em vez de ir ao
Porto, visto que lá não há estacionamento. Já me estou a ver, um dia, quando
for velhinha, e se for essa a opção dos dirigentes da Ordem, ficar aqui numa
espécie de lar dos contabilistas. Braga é uma cidade maravilhosa, que já ado-
rava, e agora com a Ordem instalada nesta quinta é a cereja no topo do bolo.»

Ana Lucas, Porto


«Desafiei duas colegas contabilistas a virem passar o dia à cidade de Braga, es-
colhida em 2021 como a melhor da Europa. Estou a gostar muito do espaço.
Foi uma escolha fantástica. Vai ser benéfico para os profissionais bracarenses
e também para os membros dos concelhos limítrofes, como é o caso do Porto.
São 30 minutos de carro, o que não é nada. Nunca tinha vindo a estas reuniões a
Braga e é uma experiência que penso repetir. Pelo menos no verão, é um convite
irrecusável. Penso que vai ser muito útil para estimular o convívio entre colegas. E
para além do lazer, é possível melhorar os nossos conhecimentos.»

28 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Natália Sousa, Braga


«Este dia significa muito. Na verdade, a anterior representação era muito pe-
quena. Este espaço é fantástico e proporciona grandes condições, até para os
contabilistas cá virem apenas para passear ou descansar. As reuniões livres da
Ordem em Braga são muito vivas e acredito que este espaço, até pela envol-

TESTEMUNHOS
vência natural que propicia, ainda pode resultar melhor no esforço de maior
interação entre colegas. E isso pode estreitar os laços entre nós, criando, quem
sabe, novas amizades através de eventos lúdicos ou jantares à margem da con-
tabilidade para promover o aprofundar de relações entre profissionais. Pode
ser atrativo até para outras profissões, como economistas e administradores
de insolvência, por exemplo.»

Pedro Teixeira, Braga


«É um dia histórico para Braga. As instalações existentes não eram, de facto,
as melhores. Sendo os membros desta região tão participativos nas reuniões
livres, fazia todo o sentido este tipo de investimento no distrito. Braga também
faz parte, por assim dizer, do ordenamento nacional. A descentralização dos
serviços faz todo o sentido e acredito que vai fazer com que tudo corra pelo
melhor. O enquadramento natural pode, inclusive, ajudar a fomentar a troca de
ideias entre contabilistas. Para além disso, as potencialidades do espaço podem
permitir que ele seja aproveitado não só para fins profissionais, mas também
com objetivos de natureza lúdica, por exemplo. Podemos vir ao fim de semana
com a família para conhecer o espaço, etc.»

Armindo Leite, Lixa


«Apesar de morar na Lixa, normalmente costumo vir às reuniões livres em Bra-
ga. Frequentar as formações, neste local, ainda me fará sentir mais realizado.
Penso que estão reunidas todas as condições para haver mais conforto para os
contabilistas. Creio que este é um investimento que se justifica. Primeiro, por-
que Braga é um local onde as pessoas participam e depois porque, tal como eu,
algumas veem de fora do concelho, como é o caso de Viana do Castelo, Barcelos
e, inclusive, Montalegre. No meu caso, ida e volta, faço cerca de 100 quilóme-
tros. Mas vale a pena, até pela qualidade dos formadores. Já existe uma certa
confiança no conhecimento que eles nos transmitem. As reuniões livres aqui em
Braga são sempre muito animadas. Existe uma grande sede de conhecimento.
Mesmo as perguntas que os colegas fazem são úteis para a minha vida diária
de profissional.»

Reportagem 1

Reportagem 2

JUNHO 2022 29
NOTÍCIAS

A quinta dos amores perfeitos


A(s) história(s) da nova casa dos contabilistas

É cada vez mais comum ouvir-se que


«já não há relações como antigamen-
te», longas e perenes no tempo. A histó-
de 1890, altura em que Maria Rita Perei-
ra de Sá Sottomayor, avó de Ana Maria,
adquiriu a Quinta do Pinheiro. Localiza-
nham casar à minha propriedade pes-
soas de Cascais e Lisboa. Era um espaço
agradável e bem-sucedido», afirma Ana
ria associada à Quinta do Pinheiro, em da na freguesia bracarense de Ferreiros, Maria Sottomayor. Tudo corria de forma
Braga, confirma, de forma inequívoca, este espaço, com cerca de 10 hectares, florescente, até que a crise financeira,
esta teoria. Precisamente porque esta passou de geração em geração. Após a coincidindo com a entrada da troika em
união tem 50 anos de existência. Corria morte da avó, foi o pai de Ana Maria - Portugal, retraiu o negócio. No final de
o ano de 1972, quando no dia em que fi- um amante da natureza - que ficou com 2017 foi oficialmente declarado o seu
zeram juras eternas de amor – na saúde a responsabilidade de tomar conta do encerramento. Desde então, a cobiça
e na doença – Ana Maria e o seu marido terreno e cultivá-lo. Muitas árvores de imobiliária foi intensa, sucedendo-se as
Tiago colocaram um ramo de era bran- fruta vieram das quintas de personalida- tentadoras propostas de vários emprei-
ca junto a uma pereira. A era foi cres- des conhecidas, como é o caso do Presi- teiros. A todas Ana Maria disse que não,
cendo e, meio século depois, ainda por dente da República Bernardino Machado resistindo aos projetos de faustosos con-
lá se mantém, robusta e cada vez mais e do escritor Aquilino Ribeiro. «A quinta domínios para o local, por entender que
fortalecida, como a cumplicidade deste chegou a ter 1 200 árvores», algumas «destruiriam» a ligação sentimental que
casal. «Jardim dos amores perfeitos» foi delas hoje centenárias, como é o caso de mantém à propriedade.
a sugestão da bastonária da OCC, após duas pereiras com mais de um século, re- Passado o período mais agudo da pan-
escutar tão comovente história de amor, corda Ana Maria Sottomayor. Para além demia, novos investidores surgiram, com
da qual nasceram dois filhos. disso, ocupou-se do restauro da casa, arrojadas ofertas pecuniárias. Mas fo-
associando o traçado antigo a linhas ar- ram os argumentos da bastonária que
Casamentos, batizados quitetónicas mais modernas. Já no sécu- a convenceram. A família cedeu, espe-
e festas corporativas lo XXI, a quinta esteve durante 11 anos cialmente após o compromisso assumido
A ligação da família Sottomayor a esta a acolher casamentos, batizados, festas pelos responsáveis da OCC que «a histó-
propriedade remonta ao longínquo ano corporativas e de passagem de ano. «Vi- ria e as histórias da quinta eram para ser

30 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

mantidas. Pareceram-me pessoas sensibi-


lizadas para as questões da preservação
da natureza e foi isso que me cativou,
muito para além da proposta financeira»,
refere Ana Maria Sottomayor.

Um ponto de encontro familiar


A agora ex-proprietária aceitou vender
o espaço, mas na quinta permanecerão
memórias de uma vida que não se apa-
gam com o trespasse. Magnólias, japo-
neiras, glicínias, castanheiros, carvalhos
e pinheiros – que dão o nome à quinta
– terão, certamente, muitos episódios
para contar. «Os meus filhos andavam
pendurados como “Tarzans” em cima
das árvores, com os seus amigos», afir-
ma, nostálgica. Uma permanente «casa
de família e um ponto de encontro»
onde se reuniam os entes queridos es-
palhados por vários pontos do mundo e
que ali regressavam para os convívios
de Natal, de Páscoa, já para não falar
das sardinhadas e patuscadas com ami-
gos, sempre acompanhadas pelo vinho
produzido na adega e as compotas fei-
tas com os frutos da terra.
É com mágoa e desgosto que Ana Maria
recorda um dos momentos mais tristes
da quinta. A inauguração da saída da
A3 para a cidade de Braga acabaria por
expropriar uma importante parcela do
terreno da Rua Frei José Vilaça n.º 280.
«As obras foram um verdadeiro calvá-
rio e a indemnização que nos deram foi
irrisória. Para ter uma ideia, deu para
substituir o telhado do salão», lamen-
ta a ex-proprietária. Ana Maria, aos 81
anos, encerra um capítulo de meio sécu-
lo, em que aqui viveu com a sua família
- a partir de 1972 com o seu marido -
mas toda a sua vida está (e estará) um-
bilicalmente ligada a esta propriedade.
Uma verdadeira quinta dos amores per-
feitos, que agora tem outros inquilinos,
mas também alimentados pela dedica-
ção, entrega e abnegação à profissão
que escolheram.

JUNHO 2022 31
NOTÍCIAS

Conferência sobre a «A Lei do Whistleblowing»

Uma lei bem-intencionada, com


dificuldades práticas de aplicação
Texto Nuno Dias da Silva | Fotos Raquel Wise

É uma legislação aguardada com gran-


de expetativa, mas que tem associa-
da dúvidas e incertezas que importa
legislação estabelece o regime geral de
proteção de denunciantes de infrações,
que transpõe a Lei do Whistleblowing –
bre matérias novas, que vão suscitar
preocupações e relativamente às quais
os contabilistas certificados devem es-
dissipar. A oportunidade não podia, Diretiva UE 2019/1937, do Parlamento tar a par, mesmo que não tenham de
por isso, ser a mais apropriada para Europeu e do Conselho da Europa, de aplicar a legislação no terreno», come-
debater e identificar eventuais lacunas. 23 outubro 2019 – relativa à proteção çou por referir Paula Franco. A basto-
«A Lei do Whistleblowing. O papel e a dos denunciantes, para a ordem jurídica nária acrescentou ser «preciso agir com
proteção do denunciante. O que muda portuguesa. mais regras e procedimentos, passando
no ordenamento jurídico português?» A disposição legal, que surgiu no con- a dispor de mecanismos para atuar pe-
foi o título escolhido para a conferên- texto da estratégia anticorrupção apro- rante comportamentos menos legíti-
cia organizada pela Ordem no auditório vada pela Assembleia da República, mos.» A responsável máxima da Ordem
António Domingues de Azevedo, em Lis- introduziu um elenco muito variado de reconheceu, contudo, temer uma «ba-
boa, no passado dia 21 de junho. direitos para os denunciantes e obriga- nalização da denúncia», fazendo, por
Três dias antes, ou seja, a 18 de junho, ções e procedimentos obrigatórios para isso, um apelo para a «necessidade de
entrara em vigor a Lei n.º 93/2021, pu- as empresas. equilíbrio, justiça e bom senso, em espe-
blicada a 20 de dezembro último. Esta «Esta é uma conferência diferente, so- cial a quem faz a receção e gestão das

32 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

segredo religioso e dos jornalistas, o


que acabaria por ser transposto para
«É preciso agir com mais regras e a legislação nacional. Prosseguindo a
procedimentos, passando a dispor sua análise sobre os segredos protegi-
de mecanismos para atuar perante dos e outros não protegidos, o orador
comportamentos menos legítimos.» manifestou a sua estranheza pelo facto
Paula Franco de o sigilo dos psicólogos e dos solicita-
dores de execução não estar protegido,
criticando a forma «desorganizada» e
«incoerente» como o artigo 3.º da nova
legislação está redigido. «A título pes-
soal, considero que o segredo profissio-
nal dos contabilistas certificados deve
ser incluído em “outros regimes”, tal
como acontece com outras profissões»,
sustentou.

Preparação e sensibilização
dos operadores de informação
denúncias.» Paula Franco salientou, ain- Pinheiro enfatizou as diferenças entre a Entrando no âmbito da figura do denun-
da, o «papel de dever ético e de rigor» versão da diretiva europeia e a versão ciante, Alexandre Sousa Pinheiro de-
que cabe aos contabilistas certificados aprovada no Parlamento português, em clarou que o canal de denúncia interno
em prol do «interesse geral e de uma vigor desde 18 de junho. Esta legislação deve garantir a «confidencialidade e o
sociedade melhor.» visa a proteção do interesse público, anonimato». Já quanto aos respon-
mas nem tudo é meio para a sua prosse- sáveis pelo canal, defendeu que deve
«Incoerências» cução, como é o caso do sigilo profissio- prevalecer a «isenção e o princípio da
na legislação nacional nal de certas profissões. Por exemplo, independência», evitando-se, a todo o
Alexandre Sousa Pinheiro é um dos a diretiva de Bruxelas não menciona o custo, os «conflitos de interesses.» Por
maiores especialistas em matérias rela-
cionadas com a proteção de dados, sen-
do mesmo o encarregado neste domínio
no Ministério das Finanças. O professor
«Os dados pessoais que manifestamente
universitário recordou que no princípio
não forem relevantes para o tratamento
do presente século surgiu legislação
da denúncia e não são conservados, de-
para o combate à fraude e corrupção,
vem ser imediatamente apagados.»
especialmente com origem nos Estados
Alexandre Sousa Pinheiro
Unidos, sendo a Lei Sarbanes-Oxley,
datada de 2002, a mais emblemática.
Sousa Pinheiro preencheu uma boa par-
te da sua extensa intervenção com o
âmbito de aplicação da nova legislação,
tendo realçado que à margem desta lei
ficam os casos de assédio, seja de natu-
reza moral ou sexual. O orador desta-
cou a importância dos casos envolvendo
a contratação pública, «uma área onde,
ciclicamente, existem problemas de
fraude e corrupção.» Alexandre Sousa

JUNHO 2022 33
NOTÍCIAS

seu turno, o recurso a canais de denún-


cia externa deve ser feito «sempre que
não haja canal de denúncia interna ou «O equilíbrio desta lei está na defesa
que tenha motivos razoáveis para crer do interesse público e no combate à
que a infração não pode ser eficazmen- corrupção.»
te conhecida ou resolvida no nível inter- Filipa Matias Magalhães
no ou que existe risco de retaliação.»
O tratamento de dados pessoais é
sempre uma matéria de grande sensi-
bilidade. «Os dados pessoais que ma-
nifestamente não forem relevantes para
o tratamento da denúncia e não são
conservados, devem ser imediatamente
apagados», afirmou. Contudo, Sousa
Pinheiro não escondeu algum ceticismo:
«Oxalá esteja enganado, mas os canais
de denúncia vão ter muita informação
que nada tem que ver com a proteção
da legalidade e a preservação comum»,
pelo que apelou à «preparação e sen-
sibilização» dos operadores da infor- sanções e eventuais questões crimi- Proibida a prática
mação. Mas as inquietações do orador nais». Para finalizar, o orador admitiu de atos de retaliação
não se ficam por aqui, identificando que tenha existido «precipitação em le- Filipa Matias Magalhães é advogada e
problemas que devem ser solucionados. gislar para aprovar o diploma até o final especialista em leis laborais. A conheci-
A formação é um deles, visto tratar-se de 2021, de modo a cumprir o prazo de da formadora de várias entidades, entre
da «única maneira de ficar com uma transposição da diretiva». No horizon- as quais da Ordem, após ter defendido
visão mais precisa sobre esses temas te, acrescentou, vão estar «dificuldades que «o equilíbrio desta lei está na de-
cumprindo, deste modo, a lei e evitar práticas na aplicação deste regime.» fesa do interesse público e no comba-
te à corrupção», debruçou-se sobre as
condições de proteção do denunciante.
Para que este possa beneficiar desta
«Nenhuma organização está imune proteção legal, exige-se que a denúncia
ao risco e a conduta de uma organi- ou a divulgação pública da infração seja
zação de excelência exige esforço de feita, de boa-fé e sem dolo, segundo os
adaptação comportamental e proce- termos previstos na lei e que no mo-
dimental.» mento da denúncia ou divulgação pú-
Teresa Almeida blica o denunciante tenha fundamento
sério para crer que as informações são
verdadeiras. Para além disso, está proi-
bida a prática de atos de retaliação de
qualquer natureza contra o denuncian-
te. A lei enumera os atos que, se pra-
ticados até dois anos após a denúncia
ou a divulgação pública, se presumem
constituir retaliação (por exemplo, a
avaliação negativa de desempenho, a
não renovação de contrato a termo ou
o despedimento). Igualmente, presume-

34 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

-se abusiva qualquer sanção disciplinar suspeitas, mas o certo é que o legislador apresentada pelo governo», o que refor-
aplicada ao denunciante nesse período nacional não os dispensou, no quadro do ça o efeito dissuasor pretendido pelo le-
de dois anos. Filipa Magalhães salientou interesse público das funções que desem- gislador. A saber, entre mil e 25 mil euros
que o autor da denúncia, no seguimento penham, do dever de comunicar «obriga- para pessoas singulares e entre 10 a 250
da mesma, «não tem que carrear provas ções suspeitas, desconformes ou de ori- mil euros para pessoas coletivas. «Daqui
para o processo», mas se existe prote- gem duvidosa», esclareceu a formadora. se constata que a mensagem que se pre-
ção para o denunciante, o mesmo acon- Nesse sentido, a Ordem já alertou o tendeu passar é que “isto é para levar a
tece com a pessoa visada pela queixa, presidente do comité executivo da Co- sério!”, sendo o interesse público perspe-
numa espécie de in dubio pro reo. missão de Coordenação de Políticas de tivado como um bem maior, prevalecen-
Prevenção e Combate ao Branqueamen- do uma nova cultura organizacional»,
Contabilistas to de Capitais e ao Financiamento do esclareceu Teresa Almeida.
querem tratamento igualitário Terrorismo que a transposição da dire- Ainda de acordo com a oradora, «nenhu-
Teresa Almeida começou por identificar tiva «carece de revisão». Para Teresa ma organização está imune ao risco e a
«questões» que precisam de ser «es- Almeida, os contabilistas certificados conduta de uma organização de excelên-
clarecidas» na transposição da diretiva devem juntar-se aos advogados e aos cia exige esforço de adaptação compor-
europeia para o Direito nacional. A as- solicitadores que foram «dispensados de tamental e procedimental.» Enquanto
sessora da bastonária da Ordem, entida- concretizar comunicações obrigatórias os esclarecimentos e as clarificações não
de que por ser uma associação pública de operações suspeitas». Teresa Almeida chegam, a lei já se encontra em vigor e
já tem em funcionamento um canal de concorda com a promoção de uma cultu- o anglicismo whistleblowing promete dar
denúncia interno e externo, para além ra de denúncia e transparência, mas ao muito que falar e… denunciar. 
de prestar aconselhamento gratuito aos mesmo tempo defende que se impõem
seus membros, apontou que a presente «clarificações».
lei «não considera o segredo profissio- No que às coimas diz respeito, por in- Transmissão integral da conferência
nal dos contabilistas certificados, nem frações na gestão e tramitação das de-
a lei de combate ao branqueamento de núncias e à proteção do denunciante, a Apresentações disponíveis na
capitais e ao financiamento do terro- oradora salientou que as penalizações Pasta CC
rismo.» A diretiva 2015/849 isentou os «foram elevadas no Parlamento portu-
profissionais de comunicarem operações guês relativamente à proposta inicial Galeria fotográfica

JUNHO 2022 35
NOTÍCIAS

Conferência realizou-se em Lisboa, a 3 de junho

Colégios das especialidades:


Um «filão de oportunidades»
Texto Nuno Dias da Silva | Fotos Micaela Neto

H á mais de dois anos que não se rea-


lizava no auditório António Domin-
gues de Azevedo, em Lisboa, um evento
importância do «impulso» e «dinamiza-
ção» dado aos colégios das especialida-
des, de modo a «lançar reflexões para o
que é «esperada uma grande procura»
para os colégios do Procedimento Tribu-
tário Gracioso e da Segurança Social.
que preenchesse todo o dia. Aconteceu, futuro e poder contribuir para o desen-
no dia 3 de junho, com a conferência dos volvimento de uma profissão, que precisa A «paixão»
colégios das especialidades da Ordem, de aprofundar o estudo e a investigação, pelo procedimento tributário
subordinada ao tema «Novas tendências apresentando soluções e caminhos.» A O primeiro dos oito colégios a desfi-
contabilísticas e tributárias». Ao longo bastonária pormenorizou as especifici- lar pelo palco do auditório da Ordem
das seis horas e meia de duração, os di- dades e características de cada colégio, e a avançar com pistas e propostas de
versos intervenientes lançaram apelos ressalvando que o novo estatuto define, trabalho para futuros especialistas foi
generalizados para que os contabilistas pela primeira vez, que o acesso a estes precisamente o do Procedimento Tribu-
certificados se associem e concorram a grupos se faz através de trabalhos de tário Gracioso. Profundo conhecedor do
esta possibilidade consagrada no estatu- investigação e não, como anteriormente, funcionamento da máquina fiscal, Jesuí-
to da Ordem, sublinhando o aspeto ine- através da realização de exames. Por se- no Alcântara Martins referiu que «é no
rente da «valorização profissional». rem os mais recentemente criados, a res- contexto do procedimento tributário que
Paula Franco começou por destacar a ponsável máxima da Ordem acrescentou emerge toda a conflitualidade tributá-
ria.» O moderador do painel acrescentou
que «um adequado e bom conhecimento
da LGT e do CPPT é essencial a todos os
profissionais que projetam a sua ativida-
de no domínio do Direito Fiscal e da fis-
calidade, como é o caso dos contabilistas
certificados.»
Foi precisamente para estes profissio-
nais que Alcântara Martins deixou uma
mensagem: «Se se apaixonarem pelo
procedimento tributário os vossos pro-
blemas diminuirão», justificando que tal
acontecerá pelo tempo despendido para
o estudo da LGT.
«A conta-corrente entre os contribuintes
e o Estado» foi o tema que coube a Abí-
lio Sousa. O consultor fiscal debruçou-se
sobre um diploma recente, em vigor a
partir de 1 de julho (Lei n.º 3/2022 – 4
Paula Franco: «Profissão precisa de aprofundar o estudo e a investigação.» de janeiro), argumentando dar «pano

36 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Fernandes que, nas palavras iniciais,


admitiu que «a Contabilidade Pública
ainda se encontra numa fase incipiente
em termos da vontade política do seu
reconhecimento», tendo, contudo, enal-
tecido o «impulso» dado pela OCC. A
presidente do Instituto Politécnico do
Cávado e do Ave (IPCA) lembrou as
reformas operadas nesta área nos últi-
mos anos, com especial destaque para
a introdução do SNC-AP, em 2015, sa-
lientando que a lei em vigor deve ser in-
tegralmente cumprida, o mesmo é dizer
que a Contabilidade Pública deve ficar
Colégio da Especialidade do Procedimento Tributário Gracioso: nas mãos dos profissionais mais quali-
Jesuíno Alcântara Martins, Abílio Sousa e Paulo Anjos
ficados para o efeito, os contabilistas
certificados.
para mangas para estudo e investiga- A última abordagem foi sobre a relação Pedro Mota e Costa pegou na deixa e
ção.» O conhecido formador da Ordem dos contabilistas com o planeamento lamentou que a figura do contabilista
mostrou-se ainda crítico da forma como fiscal, com o orador a enfatizar o papel público esteja longe de se encontrar im-
a legislação obteve luz verde: «Tenho que estes podem desempenhar «no meio plementada, o que faz com que «licen-
receio das leis aprovadas na especiali- profissional e empresarial», acrescen- ciados em Sociologia e Direito passem
dade, nos últimos dias de funcionamento tando valor e contribuindo para o dese- a ser responsáveis pela área adminis-
da Assembleia da República. Ainda para jado salto nesta atividade. trativa e financeira das câmaras, sem
mais, neste caso, pouco antes da disso- precisar de qualquer formação específi-
lução do Parlamento. Creio que esta lei À boleia da digitalização ca.» Isto quando, sublinhou, «o Tribunal
terá sido uma boa intenção, mas como O segundo colégio a ser apresentado de Contas já exige que as autarquias e
muitos diplomas, parece-me que não foi o da Contabilidade Pública. A mo- as freguesias identifiquem os respon-
passará daí.» deração coube à presidente, Maria José sáveis pela prestação de contas.» Este
Paulo Anjos encarregou-se das normas
antiabuso referindo que «visam regula-
mentar o comportamento evasivo e frau-
datório dos sujeitos passivos em matéria
fiscal. É um instrumento legal de que a
AT dispõe para garantir o cumprimento
do princípio da igualdade na repartição
da carga tributária e na arrecadação da
receita pública.» Este contabilista certi-
ficado do Porto falou, posteriormente,
sobre a CGAA (cláusula geral antiabu-
so), apontando que, conforme a doutri-
na dominante, esta «levanta diversos
problemas, não podendo a AT aplicar o
seu livre-arbítrio, sob pena de lesar os
direitos dos contribuintes.» Para Paulo
Anjos, «a CGAA opera numa linha ténue
que separa o planeamento fiscal lícito da Maria José Fernandes, Ambrósio Teixeira e Pedro Mota e Costa - Colégio
da Especialidade de Contabilidade Pública
elisão fiscal.»

JUNHO 2022 37
NOTÍCIAS

consultor na área das autarquias lo- de decisão, a qualidade da prestação dada pela digitalização. Para rematar,
cais, apontou ainda que neste domínio de contas, as boas práticas na gestão Robalo aconselhou «as entidades for-
da administração pública falta «dar o de processos e eliminar redundâncias. madoras a investirem em formação de
passo para a contabilidade de gestão», contabilidade em contextos de tecno-
no sentido de «tomar decisões oportu- Contabilistas certificados: logias digitais.»
nas e dotar a informação produzida de scorekeepers ou business Apesar de entrar na conferência por
maior qualidade.» partners? via remota, o tema chamado à colação
«A reforma das finanças e a contabili- José António Moreira preside ao colé- por Luís Monteiro foi, porventura, dos
dade pública: a transição digital» foi a gio da especialidade da Contabilidade mais atuais de todos quantos passa-
proposta que Ambrósio Teixeira trouxe de Gestão e coube-lhe a moderação ram pelo auditório da Ordem: o au-
da Madeira, onde coordena a unida- do terceiro painel. O professor da Fa- mento do preço das matérias-primas,
de de implementação da reforma das culdade de Economia da Universidade na construção civil, fruto da pandemia
finanças públicas na secretaria regio- do Porto desafiou «os contabilistas a e da guerra na Ucrânia. Diretor-geral
nal das Finanças. O orador sustentou educarem o pessoal das empresas e os de contabilidade num grupo da espe-
que a transição digital só se concretiza gestores para a importância da conta- cialidade, Luís Monteiro debruçou-se
assente em quatro pilares: processos, bilidade de gestão», até porque, justi- sobre o disparar de preços sem pre-
resultados, tecnologia e pessoas. ficou, «de pouco vale aos profissionais cedentes, nomeadamente na aquisição
Para Ambrósio Teixeira a reforma do estarem a produzir informação se ela do alumínio, vidro e transportes, bem
processo orçamental e financeiro «só não for útil à tomada de decisão.» como o seu impacto nas demonstra-
se faz com as pessoas» e «orientada Rui Robalo avançou com uma pergunta ções financeiras. Sendo fundamental
para os resultados», com a capacidade de partida para discussão: na era digi- o papel do contabilista/controlller de
para mudar o paradigma de gestão e tal o papel dos contabilistas certifica- gestão na produção de informação, o
os processos administrativos. É neste dos é mais de scorekeepers ou business orador destacou ainda a importância
particular que se deve procurar envol- partners? O professor coordenador do de isolar os efeitos dos acontecimentos
ver os contabilistas no apoio às entida- Instituto Politécnico de Santarém con- presentes e perspetivar o futuro nes-
des, bem como todos os colaboradores cluiu que há uma «coabitação» de am- ta «nova normalidade.» Ou seja, urge
da administração pública. Ambrósio bos: o profissional não abandona o seu adotar uma contabilidade e uma infor-
Teixeira concluiu referindo que «só um papel tradicional de «monitor financei- mação de gestão «tecnicamente mais
sistema de informação contabilístico e ro», mas envolve-se mais como parcei- adequada e focada na organização que
fiável» permitirá melhorar o processo ro estratégico, muito devido à boleia estamos a representar.»

Jorge Barbosa, vice-presidente da OCC, moderou painel do Colégio da Especialidade de Impostos sobre o Rendimento
tendo como oradores Joaquim Alexandre, Pinheiro Pinto e António Dias

38 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Colégio da Especialidade de Contabilidade de Gestão: José Impostos sobre o Património: Vasco Valdez moderou; Carlos
António Moreira, Rui Robalo e Luis Monteiro (à distância) Lobo, José Mendes e Vítor Campos (à distância) intervieram

Quem para a obsessão da AT nhecido contabilista da “velha guarda”, também o pecador», preconizou Antó-
contra os contribuintes? no âmbito da sua apresentação sobre nio Dias, que defendeu que, «o Estado,
O colégio da especialidade de Impostos «IRC – depreciação e regime fiscal das como pessoa de bem, deve rever as tri-
sobre o Rendimento foi o último antes mais-valias e das menos-valias de via- butações autónomas», alterando o seu
da pausa para almoço. Jorge Barbosa, turas ligeiras de passageiros.» Talvez «caráter punitivo.» «Punir todos, de
vice-presidente da OCC, referiu ser este por ter passado pelos serviços da AT forma cega, é um contrassenso, sobre-
«um imposto que está nas nossas mãos é um crítico impiedoso da postura do tudo quando aplicada a despesas que
(dos contabilistas) todos os dias.» Cer- fisco, acusando-o de «má-fé e falta de são fiscalmente dedutíveis, necessárias
tamente antecipando o que se seguiria, transparência», tendo partilhado com à atividade empresarial e à procura de
o moderador lançou perguntas oportu- a plateia casos concretos. «Quem é obtenção de rendimentos», disse.
nas, nomeadamente sobre a justiça das que para esta obsessão da AT contra
taxas aplicadas e a justiça tributária, os contribuintes? Quem não nos trata O fim das fábricas
num plano mais global. Os intervenien- bem, também não merece ser bem tra- de pouco valor acrescentado
tes responderiam a essas e a outras tado», sentenciou. O colégio de especialidade de Conta-
questões com a clarividência que se ob- As tributações autónomas foram as ver- bilidade Financeira inaugurou a sessão
servará. dadeiras protagonistas da intervenção vespertina. Na moderação, Carla Car-
«Regime de transparência fiscal – que seguinte. António Dias, o primeiro espe- valho referiu que, no âmbito do impacto
futuro?» foi a proposta de José Alberto cialista deste colégio, já lá vão 12 anos, da transição digital nesta área, os «con-
Pinheiro Pinto. O conhecido professor partilhou reflexões sobre a tributação tabilistas certificados não estão sensi-
e contabilista certificado lembrou que, autónoma em tempos de crise, desde bilizados para a necessidade de alterar
em 1989, com as taxas de tributação as origens à atualidade. O professor da procedimentos mais rotineiros, dedican-
aplicáveis, «o regime de transparência Universidade de Trás-os-Montes e Alto do-se a acrescentar valor ao seu clien-
fiscal era favorável aos contribuintes.» Douro (UTAD) referiu-se a este impos- te.» A professora da Universidade de
Contudo, atualmente, o panorama mu- to como sendo «no mínimo, híbrido.» Aveiro mostrou-se partidária que a
dou. «Com as atuais taxas de tributa- Recaindo, na sua esmagadora maioria importância do relato não financeiro
ção já não é claro que assim seja. Nem sobre viaturas, este imposto deverá ter seja reforçada junto dos profissionais
vantajoso ou desvantajoso para os su- um aumento «previsível e significativo», até porque, referiu, «este é apenas um
jeitos passivos e para o próprio Esta- fruto do disparar da inflação e dos pre- dos filões de oportunidades que temos
do», resumiu. Tudo acaba por depender ços ao nível dos combustíveis, fatores à nossa disposição.»
das taxas de tributação em vigor para o produtivos e taxas de juro. «As empre- «A transformação digital e a robotiza-
IRC e o IRS. sas em dificuldades vão pagar mais tri- ção na contabilidade financeira» foi o
Apesar de já reformado, Joaquim Ale- butações autónomas e o que acontece tema que trouxeram Rui Almeida e Jor-
xandre é a voz autorizada de um reco- é que acaba por pagar o justo e paga ge Carvalheiro. O professor do ISCAL

JUNHO 2022 39
NOTÍCIAS

Contabilidade Financeira: Carla Carvalho moderou; Ana Isabel Neves Raimundo (à distância), Clotilde Palma, Jorge Louro e José
Lopes, Rui Almeida, Paulo Ribeiro e Jorge Carvalheiro (à distância) Roriz: Colégio da Especialidade dos Impostos sobre o Consumo

lembrou que a Covid-19 acelerou ten- projeto.» desfraldar uma bandeira sua que não
dências e a preponderância da interven- Paulo Ribeiro apresentou o caso prático é de agora: a urgente reforma da tri-
ção das máquinas, tendo sentenciado da empresa OLI. Sediada em Aveiro, di- butação do imobiliário. O também an-
«o fim anunciado das fábricas de fazer vulga, de forma voluntária, desde 2015, tigo secretário de Estado dos Assuntos
tarefas de pouco valor acrescentado.» informação não financeira e o relato Fiscais admite que «os impostos sobre
A intervir à distância, Jorge Carvalhei- integrado e de sustentabilidade. «As o património são o “patinho feito” do
ro, docente no ISCAL e na Universidade áreas da sustentabilidade e da inovação sistema fiscal, mas é preciso e possível
Católica, identificou soluções de auto- sempre fizeram parte do nosso ADN discutir e evoluir para termos um país
matização disponíveis «não tão dis- industrial», declarou o contabilista e mais moderno e eficiente.» Para come-
pendiosas» como no passado e deu o diretor financeiro desta empresa com çar, reformando o que está «obsoleto e
exemplo de empresas que monitorizam, 68 anos de história e que se dedica ao ultrapassado no nosso sistema fiscal»,
com a ajuda de robôs, os seus clientes fabrico e comercialização de artigos sa- como é o caso, afirma, do imobiliário ur-
que entrem em insolvência. Se for este nitários. bano e rústico. Conhecedor da dinâmica
o caso, a máquina envia, de imediato, tributária, Lobo finalizou apontando ao
uma notificação. Reformar Estado a criação, no domínio tributário,
A tendência acentua-se: as entidades a tributação do património de sucessivas «ineficiências, entropias e
reguladoras e os stakeholders preten- É o colégio da especialidade que con- custos excessivos.»
dem saber, cada vez mais, informa- tabiliza apenas um especialista, pre- Como único especialista deste colégio,
ção não financeira sobre as empresas. cisamente José Mendes, um dos in- José Mendes lançou um apelo para no-
Pressão social para conhecer mais so- tervenientes. Está bom de ver que os vas candidaturas, referindo que uma
bre o histórico de negócios, os efeitos Impostos sobre o Património não são especialização neste domínio possibi-
no meio ambiente, o bem-estar social, propriamente dos mais populares e litaria aos contabilistas «um melhor
a governance, a ética, a corrupção e a atrativos para os contabilistas, mas a aconselhamento aos seus clientes e
gestão do risco são os múltiplos pilares verdade é que os temas para discussão também a particulares.» Presente de
que apontam nesta direção, segundo estão longe de ser escassos. Bem pelo forma telemática, Vítor Campos mos-
Ana Isabel Lopes. contrário. Vasco Valdez Matias, anti- trou-se cauteloso perante grandes
A professora do ISCTE Business School go secretário de Estado dos Assuntos reformas, sustentando que «devemos
acrescentou que ainda está por definir Fiscais, moderou o debate, tendo nas pensar, antes de avançar para qualquer
se o contabilista será o preparador da palavras introdutórias identificado «os alteração.» Sobre o estado da arte do
informação não financeira ou se apenas receios dos sucessivos governos em património, Campos advogou que «te-
contribuirá para ela. Contudo, o profis- avançar com uma reforma da proprie- mos cadastro a mais para a proprieda-
sional possui «conhecimento e capaci- dade rústica.» de em Portugal e depois temos insufi-
dade para participar, em pleno, neste Por seu turno, Carlos Lobo voltou a ciência de informação relativamente ao

40 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

património rústico.» zadas através do comércio eletrónico. O e cujo trabalho – em especial durante
orador debruçou-se ainda sobre o MOSS a pandemia – desencadeou o reconhe-
Portugal, um «paraíso fiscal» (Mini One Stop Shop), uma iniciativa da cimento público de várias entidades. A
das criptomoedas Comissão Europeia que entrou em vigor consagração das “férias contributivas”
O penúltimo colégio a entrar em cena foi em janeiro de 2015, tendo como objeti- no Orçamento do Estado para 2022,
o dos Impostos sobre o Consumo, tendo vo a simplicidade, o mínimo de encargos pela primeira vez em pleno neste verão,
sido moderado por José Neves Raimun- no cumprimento das obrigações e a re- representou mais um sinal.
do, histórico contabilista certificado do colha adequada de impostos. «O estatuto dos profissionais da área
Alto Alentejo. «O IVA e as criptomoe- José Soares Roriz abordou «Os novos da Cultura» foi a abordagem a cargo
das» foi o tema escolhido por Clotilde regimes do balcão único», tendo co- de Suzana Fernandes da Costa. O setor,
Celorico Palma que abordou, nos 15 meçado por referir-se à legislação co- que emprega 131 mil pessoas, passou a
minutos que lhe estavam destinados, munitária aplicável sobre o pacote IVA beneficiar, desde 2022, de um estatu-
o «novo mundo» das divisas virtuais. do comércio eletrónico. O ex-diretor de to próprio, criando um regime especial
«Portugal é um “paraíso fiscal” das Finanças de Braga incidiu a sua análise para os trabalhadores por conta de ou-
criptomoedas por não haver tributação sobre a diretiva (UE) 2017/2455, em trem, para os trabalhadores indepen-
de mais-valias em sede de IRS. Por seu particular sobre os três regimes espe- dentes e para as entidades beneficiárias
turno, a Espanha e os Estados Unidos ciais: o Regime da União, o Regime Extra na área da Cultura com regras próprias
tratam a moeda virtual como proprie- União e o Regime de Importação – cuja em matérias de Segurança Social, Direi-
dade», declarou a presidente do colégio. inscrição está disponível no Portal das to do Trabalho e de Direito Fiscal. Para
O entendimento da AT sobre as cripto- Finanças. o próximo dia 1 de outubro estão pre-
moedas remonta a 2016 e mantém-se vistas entrarem em vigor as novas taxas
inalterado, facto que tem atraído bas- Um investimento e obrigações contributivas.
tantes investidores, o que se intensificou que vale a pena Na presença do trio que integrou a co-
com a guerra na Ucrânia. Perante este The last, but not the least, o colégio da missão organizadora da conferência
contexto, Clotilde Palma acredita ser especialidade da Segurança Social en- – composto por Clotilde Celorico Pal-
provável que a AT «altere o enquadra- cerrou o desfile de intervenções. Amân- ma, Helena Saraiva e António Dias – a
mento legal.» dio Silva, assessor da bastonária e mo- bastonária procedeu ao encerramento
Jorge Louro veio falar sobre «O IVA no derador do painel, lembrou que este da sessão, não ocultando o seu regozijo
comércio eletrónico online», estimando- colégio foi introduzido na última altera- pelo desenrolar dos trabalhos. «Foi um
-se que, fruto de um «crescimento impa- ção aos estatutos da Ordem, sendo uma dia memorável, de elevação, reflexão e
rável deste fenómeno», até 2040 cerca «matéria que está cada vez mais pre- de conhecimento para os contabilistas
de 95 por cento das vendas sejam reali- sente nas atribuições dos contabilistas» certificados. Todos devemos investir
nos colégios das especialidades porque
se tratam, na verdade, de uma mais-
-valia», sintetizou Paula Franco. Após
mais de dois anos suspenso por causa
da pandemia, o estudo, a análise e a
investigação das matérias da Contabi-
lidade e da Fiscalidade retornaram em
força. Fica apenas por aferir a resposta
e a mobilização dos profissionais aos
reiterados apelos lançados nesta con-
ferência. 

Transmissão integral da conferência


Amândio Silva e Suzana Fernandes da Costa
- Colégio da Especialidade da Segurança Social
Galeria fotográfica

JUNHO 2022 41
NOTÍCIAS

Derrogação parcial do dever


de cumprimento de 30 créditos
No âmbito da formação profissional contínua

O conselho diretivo da Ordem delibe-


rou derrogar parcialmente o dever
de cumprimento de realização de 30 cré-
duração da limitação à normal organiza-
ção de formações presenciais, implica que
os contabilistas certificados com inscrição
Na referida mensagem, a bastonária jus-
tifica que «nos primeiros meses do ano,
a Ordem viu-se impossibilitada de dispo-
ditos de formação profissional contínua ativa na Ordem e que exerçam a ativida- nibilizar aos membros qualquer formação
durante o ano de 2022. Em comunicado de profissional nos termos do artigo 10.º presencial, na qual se incluem reuniões li-
divulgado a 27 de julho, a bastonária re- do Estatuto, apenas tenham de cumprir vres, formações segmentadas, recorrentes,
fere que «esta derrogação, proporcional à com 20 créditos de formação em 2022.» conferências, congressos e seminários.» 

Simulador de incentivo fiscal à recuperação


Ferramenta para auxiliar os profissionais

A Ordem disponibilizou, a 19 de julho,


o simulador de incentivo fiscal à re-
cuperação, relativo a 2022. Trata-se de
mais uma ferramenta que tem por objeti-
vo ajudar os contabilistas certificados. Na
página criada para o efeito pode encontrar
diversos simuladores, no âmbito do IRC,
IRS, Segurança Social e retenção na fonte
(de IVA e Segurança Social).

Relato integrado intercalar


Foi publicado a 15 de julho o relato inte-
Primeiro semestre de 2022
grado intercalar referente ao primeiro se-
mestre do ano. Na nota prévia do docu-
mento pode ler-se que «a total clareza de
processos na divulgação de informação
económico-financeira da instituição é um
cunho indissociável do atual conselho di-
retivo, tendo em vista construir uma nova
era na nossa profissão, uma era de maior
rigor, mais transparência e mais eficiên-
cia na gestão de recursos.» Deste modo,
a Ordem reitera o compromisso assumido
com todos os contabilistas certificados e
a sociedade em geral no âmbito de uma
boa prestação de contas.. 

42 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Reter talento Resultados


dos exames
e valorizar a profissão
Bastonária em mesa-redonda sobre o futuro da contabilidade

A bastonária participou, a 25 de ju-


lho, na abertura da mesa-redonda
«Futuro da Contabilidade», promovida

Foto Cristina Bernardo | Jornal Económico


pelo «Jornal Económico», com o apoio
da PLMJ. Já se encontram disponíveis os re-
Paula Franco considerou de fulcral re- sultados, os enunciados e a respetiva
levância para os profissionais o cres- grelha de correção dos exames de
cimento da importância dos requisitos avaliação profissional realizados a 23
ambientais, sociais e de governança de julho, a nível nacional. A data da
(ESG) no tecido empresarial mundial, cerimónia de entrega dos certifica-
um tema que estará também em des- dos aos novos membros será revelada
taque no 7º Congresso da OCC. Apesar oportunamente. Os membros apro-
disso, atrair e reter talento permanece vados serão contactados pela Ordem
como um desafio acrescido na área, sar, até porque se não tivermos boas através de email 
defendendo, por isso, uma maior valo- demonstrações financeiras não temos
rização da profissão. análises», declarou a bastonária.
As baixas remunerações que ainda são Sobre o processo de digitalização, Formação: OE/2022
praticadas constituem um paradigma Paula Franco referiu que «falta um com 9 300 presenças
que, na opinião de Paula Franco, tem caminho grande a percorrer», nomea-
de ser alterado. «Este é um problema damente junto dos micro e pequenos As 32 sessões do ciclo de formação pro-
gravíssimo que teremos de ultrapas- empresários.  movido pela Ordem sobre o Orçamento
do Estado 2022, realizadas a nível na-
cional, registaram cerca de 9 300 parti-

IPSASB Public Sector Forum cipantes, entre contabilistas certificados


e seus colaboradores. Porto registou

- Cascais, 19 e 20 de setembro 1350 presenças; Lisboa 1 345; Braga


956 e Santa Maria da Feira 877.

Evento tem o apoio da Ordem


Tomada de posse
O IPSASB (International Public Sector SASB 2.0: Taking it to the Next Level», é
na ESTG-IPP
Accounting Standards Board) promove o tema genérico do 4.º Forum da espe-
nos dias 19 e 20 de setembro de 2022, cialidade. O IPSASB tem como objetivo O vice-presidente Jorge Barbosa mar-
no Hotel Mirage, em Cascais, o Public melhor o relato financeiro público em cou presença, a 18 de julho, na tomada
Sector Forum. todo o mundo, na sequência da adoção de posse de Luís da Costa Lima, o novo
O evento, que conta com o apoio da das IPSAS e das normas internacionais presidente da Escola Superior de Tecno-
Ordem dos Contabilistas Certificados, de contabilidade de acréscimo, usadas logia e Gestão do Instituto Politécnico
será uma oportunidade para debater os pelos governos e outros organismos pú- do Porto (ESTG-IPP).
desafios e as oportunidades com enti- blicos. As inscrições são grátis, median-
dades públicas de todo o mundo. «IP- te registo prévio.

JUNHO 2022 43
NOTÍCIAS

«Litigância entre a AT
e os contribuintes é muito elevada»
Conferência do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, em Braga

Paula Franco participou, a 22 de ju- sob o tema «Trabalhadores da Auto- -la para que a Autoridade Tributária
nho, em Braga, numa conferência su- ridade Tributária e Aduaneira - Que (AT) se dedique ao que é «verdadei-
bordinada ao tema «Que futuro no futuro?» Na ocasião, a bastonária ramente importante». Por outro lado,
combate à fraude e evasão fiscal e defendeu que a litigância com os con- mostrou-se ainda preocupada com o
aduaneira», promovida pelo Sindicato tribuintes continua «muito elevada» elevado número de funcionários da
dos Trabalhadores dos Impostos (STI), e «muitas vezes sem justificação», AT que nos próximos anos atingirão a
no âmbito de um ciclo de encontros considerando ser necessário diminuí- idade da reforma.

«O contabilista do futuro não vai perder


tempo com registos»
Vice-presidente participou em webinar

O vice-presidente da Ordem participou vai perder tempo com os registos, vai sim
a 21 de julho na 2.ª edição do webinar ocupar-se da análise desses registos, para
«Contabilista de sucesso - Histórias de as empresas tomarem decisões atempa-
Vida, Visões de Futuro», organizado pela das. Vai, por isso, ser um parceiro cada
Bidzocs e a IT Insight. Jorge Barbosa fez vez mais próximo da gestão da empresa»,
uma evolução histórica nas últimas déca- declarou o vice-presidente da OCC. Na
das da profissão de contabilista certifi- primeira edição deste ciclo de conferên-
cado. A transformação digital, responsá- cias digitais, que tem como objetivo com-
vel pela automatização dos processos e preender tendências do presente e futuro
pela maior dedicação do profissional ao nas empresas, num quadro de mudança
apoio à gestão das empresas, foi outro económica e tecnológica, sem esquecer
dos tópicos abordados pelo responsável os desafios da digitalização, participou a
da Ordem. «O contabilista do futuro não bastonária da Ordem, Paula Franco.

44 CONTABILISTA 267
NOTÍCIAS

Crónicas da vida de um contabilista certificado


Livro apresentado na biblioteca da Ordem

Decorreu, a 15 de julho, na Biblioteca Ordem poder apresentar uma obra de astrofísica» e uma terceira parte voltada
da Ordem dos Contabilistas Certifica- um CC» e destacou a família como mo- para a infância e adolescência. Contudo,
dos, em Lisboa, a apresentação do livro tivo inspirador. «Escrever é um ato que referiu José Custódio, «o mais importan-
«Saúdo-vos – crónicas da vida do au- nos permite deixar a nossa marca para te é a família. É o elo que liga todas estas
tor». Saída da pena e das vivências de a posteridade», referiu ainda Paula Fran- histórias.» Jorge Molder, por seu lado,
José Custódio, contabilista certificado, co antes de se ouvir, do autor, uma bre- autor da fotografia de capa, referiu que
esta obra revela, nas palavras de Paula ve resenha da obra, composta por três «é de louvar e realçar que uma pessoa
Franco «uma coragem assinalável para partes: um primeiro período entre 2015 que está a viver um período negativo na
partilhar momentos difíceis da sua vida e 2018; segunda parte mais dedicada às sua vida, consiga transformar esse sofri-
com todos os leitores.» A bastonária sub- ciências sociais, dando especial atenção mento numa atividade criativa.» A obra
linhou o facto de ser um «orgulho para a à astronomia e «com laivos também de tem a chancela da editora Europa.

Apresentado Plano
de Transição Digital da Segurança Social
No Museu da Eletricidade, em Lisboa

Paula Franco, bastonária da OCC, esteve processo, assumindo-se como parceiro


presente na apresentação do Plano de fundamental: «A Ordem e a sua basto-
Transição Digital da Segurança Social nária estiveram sempre connosco para
(“Clic”) que decorreu a 20 de junho, no identificar os problemas e tentar encon-
Museu da Eletricidade, em Lisboa. trar soluções à medida das necessidades
Ana Mendes Godinho, ministra do Tra- reais das empresas e das pessoas, aju-
balho, Solidariedade e Segurança Social, dando-nos também, em muitas situa-
no encerramento da cerimónia, elogiou ções, a fazer a ponte entre as medidas
o papel que a Ordem dos Contabilistas que estavam a ser criadas e a sua difu-
Certificados desempenhou em todo este são junta das empresas.»

JUNHO 2022 45
NOTÍCIAS

Tomada de posse 10 anos do Conselho


do reitor da U. Porto
das Finanças Públicas
Efeméride assinalada com conferência

Cristina Pena Silva, diretora da OCC,


representou, a 20 de junho, a Ordem na
conferência que assinalou os 10 anos do
Conselho das Finanças Públicas (CFP).
A iniciativa decorreu no Auditório 2 da
Fundação Calouste Gulbenkian, em Lis-
Pedro Nuno Ferreira (primeiro da es- boa, e contou na sessão de abertura com
querda para a direita), diretor da Ordem, a presença de António Costa, primeiro-
esteve presente, a 22 de junho, na ceri- -ministro e de Marcelo Rebelo de Sousa,
mónia de tomada de posse de António de Presidente da República, na sessão de
Sousa Pereira (da esquerda para a direita, encerramento.
segundo na foto) como reitor da Univer- Na foto, a diretora da Ordem, surge
sidade do Porto. O ato solene decorreu acompanhada por Nazaré da Costa Ca-
no Salão Nobre da Reitoria daquela uni- bral, presidente do CFP.
versidade.

ISCAC com novo Sistema previdencial


presidente
de Segurança Social em livro
Apresentação em Coimbra, a 8 de julho

O vice-presidente da Ordem, Jorge


Barbosa, participou, a 17 de junho, na
tomada de posse de Alexandre Gomes
da Silva, como presidente do Instituto
Superior de Contabilidade e Adminis- Os diretores da Ordem, Manuel Teixeira e e coordenado por diversas personalidades
tração de Coimbra (ISCAC) do Instituto Álvaro Costa, estiveram presentes a 8 de Na foto, Manuel Teixeira (à esquerda) e Ál-
Politécnico de Coimbra. julho, na apresentação do livro «Código varo Costa (à direita) surgem acompanha-
dos Regimes Contributivos do Sistema Pre- dos por Suzana Fernandes da Costa, uma
videncial de Segurança Social - anotado e das coordenadoras da obra, e Tiago Pregui-
comentado», com a chancela da Almedina ça, diretor-geral da Segurança Social.

46 CONTABILISTA 267
ORDEM NOS MEDIA

Entidades contratantes - Taxa


alargada será cobrada a partir
de 2024
«(…) Já Amândio Silva, assessor ju-
rídico da bastonária da Ordem dos
Contabilistas Certificados (OCC), tem
outra interpretação: os empresários
em nome individual passam a estar
abrangidos, "ainda que o cálculo da
contribuição sejam só os serviços", e
não as vendas (…)»

Jornal de Negócios Capitalização de empresas


Fisco continua a aplicar coimas apesar do justo impedimento. em máximos no início do ano
Declarações da bastonária, Paula Franco, na edição de 23 de junho de 2022.
«"A autonomia financeira tem uma
curva extraordinariamente positiva,
REDES SOCIAIS
ou, pelo menos, surpreendentemen-
te positiva", analisa Anabela Santos,
5 436 487 VISUALIZAÇÕES consultora da Ordem dos Contabilis-
30 271 SUBSCRITORES 34 067 FOTOS
tas Certificados. “Provavelmente, re-
flete a saída de operadores do mer-
cado que estavam a contaminá-lo.
Portanto, ficaram os mais aptos, com
72 831 GOSTOS mais lucros (…)”»
2017 SEGUIDORES
79 475 SEGUIDORES

8346 SEGUIDORES 294 SEGUIDORES


CONTAS & IMPOSTOS
O novo incentivo fiscal
à recuperação
Artigo de Bruno Chotas, consultor
NOVIDADES DE ÂMBITO TÉCNICO * da Ordem

Normativo contabilístico
Pareceres técnicos mais vistos em junho Artigo de Sónia Lucas, consultora
da Ordem

IVA - serviços de nutrição


∞ IRS - Rendimentos de categoria A ∞ IRC - Benefícios fiscais
prestados em ginásios
∞ IVA – Isenções para as IPSS ∞ IRS - Tributação autónoma
Artigo de Eulália Pereira,
∞ IRC - Benefícios fiscais ∞ IRC - Representante fiscal
consultora da Ordem
∞ IRC - Declaração modelo 22 ∞ IVA – Dedução
∞ IRS - Mais-valias ∞ IRS - Rendimentos empresariais e profissionais

*Mais informação em: https://www.occ.pt/pt/noticias/pareceres-tecnicos/

JUNHO 2022 47
COLABORAÇÃO ISCAC

O Código de Boa Conduta


de Prevenção e Combate ao Assédio
Laboral – obrigação legal patronal
A lei não o exige, mas parece ser evidente que só a publicação do Código de Boa Conduta
no âmbito das organizações poderá garantir o conhecimento do seu teor a trabalhadores e
chefias e permitirá prosseguir o efeito preventivo pretendido.

Por António Luís Bentes de Oliveira* e Tiago Mariz** | Artigo recebido em maio de 2022

E m 2015 1 , estudos referiam que,


em Portugal, 16,5 por cento da
mão de obra teria sofrido assédio
radores de clima social negativo;
tendo um objetivo final ilícito ou
eticamente reprovável (submeter a
ção) como justa causa de resolução
por iniciativa do trabalhador; prote-
ção do denunciante/assediado e suas
moral (e 12,6 por cento assédio se- vontade da vítima, penalizá-la ile- testemunhas (em processos discipli-
xual). Tais valores, muito superiores gitimamente, induzir ao abandono nares ou contraordenacionais) face a
aos existentes em média na Europa ou resolução do contrato, ou aceitar represálias disciplinares patronais;
segundo a Eurofound, levou a que, prejudicar-se nas suas condições ou consideração como abusivo o des-
associado à potencial gravidade das relação de trabalho) resultando em pedimento ou processo disciplinar
afeções na saúde física e mental e na consequências ao nível da sua dig- aplicado até um ano após denúncia
dignidade da pessoa do trabalhador, nidade (e/ou saúde); quer no acesso ou exercício de direitos; imputação
o legislador regulasse este fenómeno ao contrato de trabalho, quer na sua de contraordenação muito grave sem
desde o Código do Trabalho de 2003, execução, podendo ter na base fa- prejuízo de responsabilidade penal;
reforçando de forma crescente e por- tores discriminatórios como o sexo, por fim, o ónus da prova de assédio
menorizada a proteção às potenciais orientação sexual, raça, ideologia, não discriminatório recai sobre o/a
vítimas. filiação sindical, religião, naciona- assediado/a (342.º/1), e do assédio
O artigo 29.º do CT proibiu o assé- lidade, etc. discriminatório (25.º/5) a vítima
dio moral, o qual se cifra, segundo Leal Amado 3 aponta as seguintes aponta quem foi favorecido, cabendo
Monteiro Fernandes 2 num: compor- consequências: o direito à vítima a prova do contrário ao empregador.
tamento indesejado, incómodo, in- ser indemnizada pelos danos patri-
justo, prejudicial para a vítima com moniais e não patrimoniais sofridos; O Código de Boa Conduta PCAL
certa duração; revestido de uma caso resulte em doença profissional A Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto,
intenção de pressionar moralmente a Segurança Social reparará os da- consagrou a obrigação que impende
o outro aproveitando maior debili- nos em primeira linha, ficando sub- sobre os empregadores de elabora-
dade, maior dependência económi- -rogada nos direitos do trabalhador rem um código de boa conduta de
ca, menor resistência psicológica; com juros perante o empregador; prevenção e combate ao assédio mo-
causalidade adequada entre esse poder-dever patronal de exercer ral no seio da sua organização em-
comportamento e os efeitos intimi- ação disciplinar sobre trabalhador presarial 4 , desde que tenha, pelo me-
datórios, perturbadores, constran- que assedie; consideração da condu- nos, sete trabalhadores ao serviço 5, nos
gedores, hostis, desestabilizadores ta assediante do empregador (ou com termos do disposto no artigo 127.º/1/k,
ou atentatórios da dignidade ou ge- seu conhecimento sem que haja rea- do Código do Trabalho sob pena de

48 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCAC

prática de uma contraordenação nização garantirá o conhecimento 10.º/1/2.ª parte/b), e do artigo 140.º, da Lei
grave. do seu teor a trabalhadores e chefias n.º 110/2009, de 16 de setembro) até porque
Apesar de a lei não ter densificado o e permitirá prosseguir o efeito pre- lhe são aplicáveis os direitos de personali-
conteúdo destes códigos, parece in- ventivo (geral e especial) a alcançar dade, igualdade e não discriminação. Por
suficiente que se limitem a reprodu- a sua finalidade 8 .  fim, é a doutrina unanimemente crítica
zir a letra da lei, pois de outra forma do critério de obrigatoriedade do código
tal tornaria quase desnecessária a *Inspetor da ACT (Autoridade para as Condi- de conduta caso existam sete trabalhado-
obrigação legal em análise 6 . ções do Trabalho); res (ou mais), já que o legislador ignorou a
Antes de mais, este código deverá **Professor especialista do ISCAC – Coimbra tipologia dos empregadores constante do
conter uma declaração de compro- Business School artigo 100.º do CT.
misso dos representantes legais na 6
Poderá ser relevante para qualificar a
promoção de uma política “oficial” Notas intenção do empregador e refletir-se na
preventiva e repressiva do assédio 1
A http://cieg.iscsp.ulisboa.pt/inves- moldura contraordenacional. Outra opção
moral. Deverá ainda definir assédio, t i g a c a o/proj eto s/proj eto s- c on clu i do s/ poderia ter sido consagrar a mera afixa-
tipos (moral, sexual; vertical - entre item/120-assedio-moral-e-sexual-no-lo- ção completa em lugar bem visível, no(s)
superiores hierárquicos e subordi- cal-de-trabalho. local(ais) de trabalho, dos preceitos legais/
nados, horizontal – entre colegas), 2
Direito do Trabalho, 19.ª Edição, atualiza- informação relativos ao assédio, confor-
consequências do mesmo, desti- da e aumentada Almedina, Coimbra, 2019, me sucede com os direitos e obrigações
natários da denúncia, forma de co- p 301 e ss. de igualdade e não discriminação (art.º
municação e responsável pelo pro- 3
Contrato de Trabalho, noções básicas, 3.ª 24.º/4, do CT), parentalidade (art.º 127.º/4,
cedimento no seio da organização; Edição, 2019, Almedina, Coimbra, 2019, do CT), ou informação sobre os direitos e
garantia de sigilo quanto a testemu- p.218-220. obrigações dos sinistrados e responsáveis
nhas e denunciante (whistleblower), 4
Apesar da Lei será de aplicar-se e a qual- (art.º 177.º/1, da Lei 98/2009, de 4 de se-
medidas cautelares para salvaguar- quer entidade patronal pessoa coletiva ou tembro). Palma Ramalho alvitra que o as-
da destes e consequências de denún- (empresário em nome) individual. sédio constasse expressamente no dever de
cias infundadas. Ademais, afigura- 5
Parece curial que o critério ocupacional proporcionar boas condições de trabalho e
-se pedagógico que estes códigos abrangesse: trabalhadores cedidos ocasio- fosse incluído nas causas de despedimen-
contenham exemplificativamente nalmente (artigo 289.º e seguintes do CT), to, Tratado de Direito, Parte II, Situações
condutas suscetíveis de ser conside- prestadores de (serviço)/independentes Laborais Individuais, 7.ª Edição. Revista
radas assédio, como as mencionadas sem subordinação jurídica mas depen- e atualizada, 2019, Almedina, Coimbra,
pela CITE 7, na sua página web. dentes economicamente (artigo 10.º, do p.200.
Pese embora a lei não o exija, é pa- CT, quando exerçam a sua atividade em 7
Vide https://assedio.cite.gov.pt/ onde
tente que só a publicitação do Código mais de 80 por cento para um mesmo be- consta também um guia para a elabo-
de Boa Conduta no âmbito da orga- neficiário/contratante, conforme o artigo ração do código de conduta https://
c i te .g ov.p t/d o c u m e n t s/14 3 3 3/19 3 2 3 8/
Guia+para+a+elabora%C3%A7%C3%A3o+
do+c%C3%B3digo+de+boa+conduta+para+
a+preven%C3%A7%C3%A3o+e+combate+a
o+ass%C3%A9dio+no+trabalho/395a274d-
7df7-4cd8-a6a8-b917f90b19d4.
8
Pedro Barrambana Santos “Do assédio
laboral. Pelo reenquadramento do assé-
dio laboral no ordenamento jurídico por-
tuguês”, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra,
2019, preferia a solução de este “código”
ser um regulamento interno (artigo 99.º,
do CT), que careceria necessariamente da
publicitação do seu conteúdo, e seria dota-
do de eficácia contratual.

JUNHO 2022 49
COLABORAÇÃO ISCAP

A prestação de contas
A prestação de contas é o meio pelo qual uma entidade apresenta aos seus detentores
de capital e terceiros a atividade desenvolvida e os resultados obtidos durante
o período de relato. É um momento nobre na vida de uma empresa
ou instituição que terá de obedecer a diversos requisitos.

Eduardo Sá e Silva* | Artigo recebido em junho 2022

A contabilidade é uma ferramenta


ou um sistema que recolhe e re-
gista informação sobre as operações
tual do SNC, o objetivo das demons-
trações financeiras é o de proporcio-
nar informação:
minar se os seus empréstimos, e os
juros que a eles respeitam, serão pa-
gos quando vencidos.
realizadas numa entidade, informa- • Acerca da posição financeira; Os fornecedores e outros credores
ção que pode ser económica, finan- • Do desempenho; e comerciais estão interessados em in-
ceira ou de gestão e que, depois de • Das alterações na posição finan- formação que lhes permita determi-
sistematizada, é disponibilizada aos ceira de uma entidade que seja útil a nar se as quantias que lhes são devi-
seus utilizadores um vasto leque de utentes na toma- das serão pagas no vencimento.
As necessidades de informação são da de decisões económicas. Os clientes têm interesse em infor-
diversas: De acordo com a estrutura concep- mação acerca da continuação de uma
• Para prestar contas; tual, os utentes das demonstrações entidade, especialmente quando
• Para dar cumprimento às obriga- financeiras podem ser diversos. En- com ela têm envolvimentos a prazo,
ções fiscais; tre eles, estão incluídos: ou dela estão dependentes.
• Para melhoria de processos de – Os investidores (atuais ou poten- O Governo e seus departamentos es-
produção, definir preços, otimizar ciais); tão interessados na alocação de re-
os recursos; ou – Os empregados; cursos e, por isso, nas atividades das
• Informação estratégica para apoio – Os mutuantes; entidades. Também exigem informa-
à tomada de decisões, por exemplo, - Os fornecedores e outros credo- ção a fim de regularem as atividades
para novos investimentos ou ex- res comerciais; das entidades, determinar as políti-
pansão para novos mercados. – Os clientes; cas de tributação e como base para
A prestação de contas é a principal – O Governo e seus departamentos estatísticas do rendimento nacional
fonte de informação financeira das e o público. e outras semelhantes.
entidades. Os investidores necessitam de in- Realce-se, todavia, que os gestores
Assim, uma entidade deve preocu- formação para avaliar o risco do in- são os primeiros e os mais impor-
par-se em que as suas demonstrações vestimento e ajudar a determinar se tantes utilizadores da informação
financeiras sejam completas, fiáveis devem comprar, deter ou vender, ou contabilística. Por essa razão, as de-
e compreensíveis sem, no entanto, ainda sobre a capacidade de a entida- cisões devem ser baseadas em infor-
perder de vista o objetivo de serem de pagar dividendos. mação atempada e credível. A maio-
atuais. Os mutuantes estão interessados em ria das decisões-chave são baseadas
De acordo com a estrutura concep- informação que lhes permita deter- nos dados contabilísticos.

50 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCAP

Elementos da prestação de contas passivo nos três primeiros meses como uma descrição dos principais
A prestação de contas é o meio pelo do ano imediato (n.º 1, artigo 65.º, riscos e incertezas com que a mesma
qual uma entidade apresenta aos seus CSC). se defronta, devendo incluir, quando
detentores de capital e terceiros a ati- Assim, os membros da administra- adequado, uma referência aos mon-
vidade desenvolvida e os resultados ção devem elaborar e submeter aos tantes inscritos nas contas do exercí-
obtidos durante o período de relato, órgãos competentes da sociedade cio e explicações adicionais relativas
bem como a posição financeira no o relatório de gestão, as contas do a esses montantes.
final desse período, apresentando exercício e demais documentos de Deve abranger tanto os aspetos fi-
ainda os valores obtidos no período prestação de contas previstos na lei. nanceiros como, quando adequado,
anterior. Os elementos de prestação de contas referências de desempenho não fi-
A obrigação de apresentar contas de- são constituídos por: nanceiras relevantes para as ativi-
corre do cumprimento de diversa re- • Relatório de gestão; dades específicas da sociedade, in-
gulamentação, nomeadamente: • Anexo ao relatório de gestão (apli- cluindo informações sobre questões
– Código Comercial; cável a sociedades anónimas); ambientais e questões relativas aos
– Código das Sociedades Comer- • Balanço; trabalhadores.
ciais; • Demonstração dos resultados por O relatório de gestão deve indicar em
– Sistema de Normalização Conta- naturezas; especial:
bilística (SNC); • Demonstração dos resultados por – Condições do mercado, investi-
– Normalização Contabilística para funções – facultativa; mentos, custos, proveitos e ativi-
Microentidades (NCM); • Demonstração de fluxos de caixa; dades de investigação e desenvol-
– Legislação avulsa. • Demonstração das alterações no vimento;
Realce-se que a Informação Empre- capital próprio; – Os factos relevantes ocorridos
sarial Simplificada (IES) não substi- • Anexo. após o termo do exercício;
tui a elaboração do relatório de ges- – A evolução previsível da socieda-
tão e das demonstrações financeiras O relatório de gestão de;
das entidades. A IES decorre do re- De acordo com o artigo 66.º do Có- – As aquisições de ações próprias;
latório de gestão e contas aprovadas. digo das Sociedades Comerciais, o – Dívidas à Segurança Social e Es-
De acordo com o artigo 62.º do Códi- relatório da gestão deve conter, pelo tado;
go Comercial: menos, uma exposição fiel e clara da – As autorizações concedidas a ne-
• Todo o comerciante é obrigado evolução dos negócios, do desempe- gócios entre a sociedade e os seus
a dar balanço anual ao seu ativo e nho e da posição da sociedade, bem administradores;

JUNHO 2022 51
COLABORAÇÃO ISCAP

– Uma proposta fundamentada de


aplicação de resultados;
– A existência de sucursais da so-
ciedade;
– Os objetivos e as políticas da so-
ciedade em matéria de gestão dos
riscos financeiros próprias.
O relatório de gestão e as contas do
exercício devem ser assinados por
todos os membros da administração.
A recusa de assinatura por qualquer
deles deve ser justificada no docu-
mento a que respeita e explicada pelo
próprio perante o órgão competente
para a aprovação, ainda que já tenha
cessado as suas funções (n.º 3, artigo
65.º, CSC).
As contas do exercício são elaboradas
e assinadas pelos gerentes ou admi-
nistradores que estiverem em fun-
ções ao tempo da apresentação, mas
os antigos membros da administra-
ção devem prestar todas as informa-
ções que para esse efeito lhes forem
solicitadas, relativamente ao período Exemplo de relatório de gestão 11. Aquisição de ações próprias;
em que exerceram aquelas funções Apresenta-se um exemplo de relató- 12. Negócios entre a sociedade e os
(n.º 4, artigo 65.º, CSC). rio de gestão: seus administradores;
As sociedades anónimas, devem ain- 1. Introdução; 13. Proposta de aplicação de resulta-
da prestar a seguinte informação, re- 2. Enquadramento macroeconómico, dos;
lativamente a cada um dos membros externo, interno e do setor da empre- De acordo com o n.º 5, artigo 65.º do
do órgão de administração e fiscali- sa; CSC, o relatório de gestão e as contas
zação (artigos 447.º e 448.º do CSC): 3. Análise da atividade da empresa: do exercício devem ser submetidos
• Número de ações e de obrigações a) Rendimentos e gastos; aos órgãos competentes:
da sociedade de que são titulares; b) Ativo, passivo e situação líquida; • Três meses, a contar da data de en-
• Todas as aquisições, onerações ou c) Investimento; cerramento; ou
cessações de titulares por qualquer d) Participações financeiras; • Cinco meses, quando se tratar de
causa, e de ações e de obrigações e) Atividades de investigação e de- sociedades que devam apresentar
da mesma sociedade com as quais senvolvimento; contas consolidadas ou apliquem o
aquela esteja em relação de domínio f) Principais riscos e incertezas. método da equivalência patrimo-
ou de grupo. 4. Questões ambientais; nial.
• Lista dos acionistas que, à data de 5. Questões relativas aos trabalhado- Nas sociedades por quotas (artigos
encerramento, forem titulares de res; 248.º, 263.º do CSC), a competência
ações ao portador não registadas 6. Existência de sucursais; para convocar a assembleia geral é de
representativas de, pelo menos, um 7. Situação perante a Segurança So- qualquer dos gerentes. Deve ser fei-
décimo, um terço ou metade do ca- cial e Estado; ta por carta registada, expedida com
pital de uma sociedade, bem como 8. Factos relevantes ocorridos após o antecedência mínima de 15 dias. A
dos acionistas que tenham deixado termo do exercício; partir do dia em que seja expedida,
de ser titulares das referidas frações 9. Perspetivas futuras; o relatório e contas devem estar dis-
do capital. 10. Gestão dos riscos financeiros; poníveis para consulta por parte dos

52 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCAP

sócios. É desnecessária quando todos nistradores/gerentes, os membros do De acordo com o artigo 33.º do CSC
os sócios sejam gerentes e todos eles conselho fiscal ou do conselho geral não podem ser distribuídos aos só-
assinem as contas, salvo quanto a e de supervisão, e os revisores ofi- cios os lucros do exercício que sejam
sociedades sujeitas a revisão legal de ciais de contas que tenham exami- necessários para cobrir prejuízos
contas. nado as contas. transitados ou para formar ou re-
Nas sociedades anónimas (artigo De acordo com o artigo 63.º do CSC, a constituir reservas impostas pela lei
377.º do CSC), as assembleias ge- ata deve conter, pelo menos: ou pelo contrato de sociedade, ou en-
rais são convocadas pelo presiden- - A identificação da sociedade, o lu- quanto as despesas de constituição,
te da mesa ou, nos casos especiais gar, o dia e a hora da reunião; de investigação e de desenvolvimen-
previstos na lei, pela comissão de - O nome do presidente e, se os hou- to não estiverem completamente
auditoria, pelo conselho geral e de ver, dos secretários; amortizadas, exceto se o montante
supervisão, pelo conselho fiscal ou - Os nomes dos sócios presentes ou das reservas livres e dos resultados
pelo tribunal. Quando sejam nomi- representados e o valor nominal transitados for, pelo menos, igual ao
nativas todas as ações e o contrato das partes sociais, quotas ou ações dessas despesas não amortizadas.
social permita, pode substituir-se de cada um, salvo nos casos em que Igualmente de acordo com o artigo
a publicação: por cartas registadas; a lei mande organizar lista de pre- 32.º do CSC não podem ser distribuí-
ou por correio eletrónico com recibo senças, que deve ser anexada à ata; dos aos sócios:
de leitura, em relação aos acionistas - A ordem do dia constante da con- • Bens de sociedade quando a situa-
que comuniquem o seu consenti- vocatória, salvo quando esta seja ção líquida desta, tal como resulta
mento. anexada à ata; das contas elaboradas e aprovadas
De acordo com o n.º 1, artigo 54.º do - Referência aos documentos e rela- nos termos legais, for inferior à
CSC, podem os sócios, em qualquer tórios submetidos à assembleia; soma do capital e das reservas que a
tipo de sociedade, tomar delibera- - O teor das deliberações tomadas; lei ou o contrato não permitem dis-
ções unânimes por escrito e bem - Os resultados das votações; tribuir aos sócios ou se tornasse in-
assim reunir-se em assembleia ge- - O sentido das declarações dos só- ferior a esta soma em consequência
ral, sem observância de formalida- cios, se estes o requererem. da distribuição.
des prévias, desde que todos estejam O registo comercial (depósito) das • Os incrementos decorrentes da
presentes e todos manifestem a von- contas consubstancia-se na entrega aplicação do justo valor através de
tade de que a assembleia se constitua da Informação Empresarial Simplifi- componentes do capital próprio,
e delibere sobre determinado assun- cada (IES) e respetivo pagamento do incluindo os da sua aplicação atra-
to. depósito, até ao 15.º dia do 7.º mês - 15 vés do resultado líquido do exercí-
O n.º 1, artigo 376.º do CSC especifica de julho. cio, apenas podem ser distribuídos
as deliberações da assembleia geral: O registo das contas fora do prazo aos sócios quando os elementos ou
- Deliberar sobre o relatório de ges- previsto implica o pagamento dos direitos que lhes deram origem se-
tão e as contas do exercício; valores em dobro. Por seu turno, a jam alienados, exercidos, extintos,
- Deliberar sobre a proposta de falta de registo obsta ao registo de liquidados ou, também quando se
aplicação de resultados; outros factos sobre a entidade, com verifique o seu uso, no caso de ati-
- Proceder à apreciação geral da ad- exceção: de registos de designação e vos fixos.
ministração e fiscalização da socie- cessação de funções, dos membros Refira-se que as seguintes reservas
dade e, se disso for caso e embora dos órgãos de administração e de fis- não podem ser distribuídas aos só-
esses assuntos não constem da or- calização; de atos emanados de au- cios (artigos 295.º e 296.º do CSC):
dem do dia, proceder à destituição, toridade administrativa; das ações, – Reserva legal
dentro da sua competência, ou ma- decisões, procedimentos e providên- – Prémios de emissão (ágios) de
nifestar a sua desconfiança quanto cias cautelares; a falta de registo du- ações ou quotas;
a administradores; rante dois anos consecutivos é moti- – Reservas de reavaliações mone-
- Proceder às eleições que sejam da vo para ser instaurado oficiosamente tárias;
sua competência. pelo conservador um procedimento – Importâncias correspondentes a
Na assembleia geral devem estar pre- administrativo de dissolução da em- doações. 
sentes os sócios/acionistas, os admi- presa/entidade. *Docente do ISCAP

JUNHO 2022 53
COLABORAÇÃO ISCA-UA

Atividade agrícola: alguns


apontamentos relacionados com o
tratamento contabilístico e fiscal
Reconhecimento e mensuração dos ativos biológicos; reconhecimento e mensuração de
ativos biológicos de produção; contabilização das principais operações relacionadas com
ativos biológicos no regime geral do SNC ou aspetos de natureza fiscal são algumas das
questões que pode ver tratadas neste trabalho.

Por Davide Ribeiro* | Artigo recebido em março de 2022

N a norma contabilística e de re-


lato financeiro 17 (NCRF 17)
– Agricultura, encontram-se pres-
mais especificamente:
- Ativos biológicos (consumíveis e
de produção);
produto agrícola, que é o produto co-
lhido dos ativos biológicos da entida-
de, somente no momento da colheita
critos os aspetos relacionados com o - Produto agrícola no ponto da co- (entendendo-se colheita como a se-
tratamento contabilístico e a apre- lheita; e paração de um produto de um ativo
sentação das demonstrações finan- - Subsídios de entidades públicas biológico ou a cessação dos processos
ceiras relativas à atividade agrícola. relacionados com ativos biológi- de vida de um ativo biológico). Após
Atividade agrícola, de acordo com a cos, conforme parágrafos 34 e 35 isso (logo após a colheita), de acordo
norma, é a gestão por uma entidade da norma. com o parágrafo 4, é aplicada a NCRF
da transformação biológica e a co- Esta norma é aplicada também ao 18 - Inventários, ou uma outra norma
lheita de ativos biológicos para ven-
da ou para conversão, em produtos Figura 1: Atividade agrícola e transformação biológica de acordo com a NCRF 17
agrícolas ou em ativos biológicos adi-
cionais, abrangendo uma variedade
de atividades, tais como, criação de
gado, silvicultura, safra anual ou pe-
rene, cultivo de pomares e de planta-
ções, floricultura e aquacultura (in-
cluindo criação de peixes).
A transformação biológica com-
preende os processos de crescimen-
to natural, degeneração, produção
e procriação que causem alterações
qualitativas e quantitativas num ati-
vo biológico, sendo que para efeitos
da NCRF 17 ativo biológico é um ani-
mal ou planta vivos.
A NCRF 17 aplica-se na contabiliza-
ção dos itens seguintes, quando se
relacionem com a atividade agrícola, Fonte: Gomes (2010)

54 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

contabilística e de relato financeiro Reconhecimento e mensuração aquando da aquisição, nascimento


aplicável. dos ativos biológicos - Aspetos ou desmama.
Em consequência, esta norma não gerais Os benefícios económicos futuros
trata do processamento do produto Cumprida a definição de ativo são normalmente estimados pela
agrícola após colheita; por exemplo, a estabelecida na estrutura conceptual mensuração dos atributos físicos
transformação de uvas em vinho por (parágrafos 52 a 58), o parágrafo 11 significativos.
um vitivinicultor que tenha cultiva- da NCRF 17 estabelece ainda que uma Relativamente ao justo valor, o
do a vinha e colhido as uvas. Se bem entidade deve reconhecer um ativo mesmo surge como o critério de
que tal processamento possa ser uma biológico ou produto agrícola quando excelência na mensuração dos ativos
extensão lógica e natural da ativida- e somente quando: biológicos (sempre que possa ser
de agrícola e os acontecimentos que - A entidade controle o ativo como determinado fiavelmente), sendo que
tenham tido lugar possam ter algu- consequência de acontecimentos de acordo com o parágrafo 30, parte-
ma similitude com a transformação passados; se do pressuposto de que o justo valor
biológica, tal processamento não é - Seja provável que benefícios poderá sempre ser mensurado com
incluído na definição de atividade económicos associados ao ativo fiabilidade.
agrícola nesta norma (parágrafo 4). fluirão para a entidade; e A norma define justo valor como
O quadro que se apresenta em se- - O justo valor ou custo do ativo sendo a quantia pela qual um ativo
guida, retirado do parágrafo 5, for- possa ser fiavelmente mensurado. pode ser trocado ou um passivo
nece exemplos de ativos biológicos, Na atividade agrícola, o controlo liquidado, entre partes conhecedoras
produto agrícola e produtos que são pode ser evidenciado, por exemplo, e dispostas a isso, numa transação
o resultado de processamento após pela posse legal do gado e pela em que não exista relacionamento
colheita. marcação a quente ou de outro modo, entre elas (parágrafo 9).

Quadro 1

No âmbito da NCRF 17 Fora do âmbito da NRCF 17

Produtos resultantes de proces-


Ativos biológicos Produto agrícola
samento após colheita
Carneiros Lã Fio de lã, carpetes

Árvores numa plantação florestal Troncos Madeira

Plantas Algodão, cana colhida Fio de algodão, roupas, açúcar

Gado produtor de leite Leite Queijo

Porcos Carcaças Salsichas, presuntos curados

Arbustos Folhas Chá, tabaco curado

Vinhas Uvas Vinho

Árvores de fruto Árvores de fruto Frutos processados

JUNHO 2022 55
COLABORAÇÃO ISCA-UA

Figura 2: Regra geral na mensuração (inicial e subsequente) dos ativos biológicos havido uma alteração significativa
nas circunstâncias económicas
entre a data dessa transação e a do
balanço;
- Os preços de mercado de ativos
semelhantes com ajustamento para
refletir diferenças; e
- Referências do setor tais como o
valor de um pomar expresso por
contentores de exportação, hectare
Fonte: elaboração própria. ou outra unidade de medida do
setor e o valor do gado expresso em
Assim, de acordo com o parágrafo biológicos de uma entidade deve ser quilo de carne.
13, um ativo biológico deve ser mensurado pelo seu justo valor menos Em alguns casos, os preços ou
mensurado, no reconhecimento os custos de vender no momento da valores determinados pelo mercado
inicial e em cada data de balanço, colheita. Tal mensuração é o custo podem não estar disponíveis para
pelo seu justo valor menos os custos nessa data aquando da aplicação da um ativo biológico na sua condição
de alienação (que são os custos NCRF 18. atual. Nestas circunstâncias, na
incrementais diretamente atribuíveis Para a determinação do justo valor, a determinação do justo valor, uma
à alienação de um ativo, excluindo os NCRF 17 aponta várias soluções, tais entidade usará o valor presente dos
gastos de financiamento e os gastos como: fluxos de caixa líquidos de um ativo,
de impostos sobre o rendimento). - Se existir um mercado ativo para descontados a uma taxa pré-imposto
Na situação em que exista uma um ativo biológico ou produto determinada no mercado corrente
incapacidade de mensurar agrícola, o preço cotado nesse (parágrafo 20).
fiavelmente o justo valor (caso mercado é a base apropriada para O objetivo do cálculo do valor presente
descrito no parágrafo 30), o que determinar o justo valor desse ativo de fluxos de caixa líquidos esperados
poderá ocorrer quando não estão (as cotações oficiais de mercado é o de determinar o justo valor de
disponíveis por exemplo preços disponibilizadas pelo SIMA - um ativo biológico no seu local
cotados de mercado e cujas Sistema de Informação de Mercados e condição atuais. Uma entidade
mensurações alternativas do justo Agrícolas são um exemplo) . 1
considerará isto na determinação
valor estão determinadas como sendo - No caso de não existir um de uma taxa de desconto apropriada
claramente pouco fiáveis, então, mercado ativo: a ser usada e ao estimar os fluxos de
nesse caso, esse ativo biológico deve - O preço mais recente de transação caixa líquidos esperados.
ser mensurado pelo custo menos no mercado, desde que não tenha Em seguida abordaremos de uma
qualquer depreciação acumulada
e qualquer perda por imparidade Figura 3: Tipos de ativos biológicos
acumulada.
Note-se que o pressuposto de que
o justo valor pode ser mensurado
com fiabilidade para um ativo
biológico pode ser refutado apenas no
reconhecimento inicial de um ativo
biológico. Quando o justo valor desse
ativo biológico se tornar fiavelmente
mensurável, uma entidade deve
mensurá-lo pelo seu justo valor
menos os custos estimados do ponto
de venda.
O produto agrícola colhido dos ativos Fonte: elaboração própria

56 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

forma mais detalhada os aspetos Figura 4: Reconhecimento e mensuração dos ativos biológicos de produção
relacionados com o reconhecimento
e mensuração dos ativos biológicos
bem como do produto agrícola no
ponto de colheita. Note-se que
os ativos biológicos poderão ser
classificados como de produção ou
consumíveis.

Ativos biológicos de produção


(reconhecimento e mensuração)
Os ativos biológicos de produção
(animais ou plantas vivas),
suportam a produção agrícola
para a colheita, sendo utilizados
na atividade agrícola. São ativos
não disponíveis para venda, sendo Fonte: elaboração própria

classificados como ativos não


correntes, atendendo ao referido no biológico de produção deverá Após o reconhecimento inicial,
parágrafo 14 da NCRF 1 - Estrutura ser mensurado pelo custo menos na data de balanço, deverá existir
e conteúdo das demonstrações qualquer depreciação acumulada uma atualização do justo valor
financeiras. Os ativos biológicos e qualquer perda por imparidade dos ativos biológicos de produção
de produção não são um produto acumulada. que se mantenham em atividade,
agrícola, tendo como característica De acordo com o parágrafo 33, ao resultante de variações de preços
serem auto regenerativos. determinar o custo, depreciação de mercado que possam ocorrer ou
De acordo com o parágrafo 37, temos acumulada e perdas por imparidade de transformação biológica, sendo
como exemplos deste tipo de ativos acumuladas, uma entidade toma em estes montantes incluídos nos
o gado do qual pode ser obtido leite, consideração a NCRF 18, a NCRF 7 – resultados do período.
gado reprodutor, vinhas, pomares Ativos fixos tangíveis e a NCRF 12 — De acordo com os parágrafos 26 a 29,
com árvores de fruto e árvores a Imparidade de ativos. um ganho ou uma perda proveniente
partir das quais se obtenha lenha Note-se que a presunção do do reconhecimento inicial ou de
por desbaste enquanto essas árvores parágrafo 30 (de que o justo alterações do justo valor (menos
permanecem vivas, entre outros. valor pode ser mensurado com os custos de alienação) dos ativos
Um ativo biológico de produção deve fiabilidade para um ativo biológico) biológicos de produção que resultem
ser mensurado, no reconhecimento somente pode ser refutada no da variação de preços de mercado à
inicial e em cada data de balanço, reconhecimento inicial. Uma data de balanço, de transformação
pelo seu justo valor menos os entidade que tenha previamente biológica (nascimento, crescimento,
custos de alienação, exceto no caso mensurado um ativo biológico pelo degeneração ou morte), de venda ou
descrito no parágrafo 30 em que o seu justo valor menos custos de de abate, deverão ser reconhecidas
justo valor não pode ser fiavelmente alienação continuará a mensurar o no resultado líquido do exercício do
mensurado (parágrafo 13). ativo biológico pelo seu justo valor período em que ocorram.
Assim, e de acordo com o parágrafo menos os custos de alienação até à
30, no caso de não ser possível sua alienação. Ativos biológicos consumíveis
estimar fiavelmente o justo valor Quando o justo valor desse ativo (reconhecimento e mensuração)
(quando o valor de mercado não biológico se tornar fiavelmente De acordo com o parágrafo 37, os ativos
possa ser determinável e as outras mensurável, uma entidade deve biológicos consumíveis são os que es-
alternativas de determinação do mensurá-lo pelo seu justo valor tejam para ser colhidos como produto
justo valor também não sejam menos os custos estimados do ponto agrícola ou vendidos como ativos bioló-
fiáveis), então nesse caso, o ativo de venda. gicos. São exemplos de ativos biológicos

JUNHO 2022 57
COLABORAÇÃO ISCA-UA

consumíveis o gado destinado à pro- Figura 5: Reconhecimento e mensuração dos ativos biológicos consumíveis
dução de carne, gado detido para ven-
da, peixe em aquacultura, colheitas tal
como milho e trigo e árvores que este-
jam em desenvolvimento para obtenção
de madeiras.
Conforme estipulado no parágrafo 13,
no reconhecimento inicial de um ativo
biológico consumível, quer seja por nas-
cimento ou por aquisição, este deverá
ser reconhecido no ativo pelo respetivo
justo valor menos custos de alienação.
No final do período ou na data de balan-
ço, dever-se-á efetuar nova mensura-
ção, dos ativos biológicos consumíveis,
Fonte: elaboração própria
pelo seu justo valor (menos custos de
alienação) a essa data.
A aplicação do justo valor é a melhor Não é aplicável aos ativos biológicos Entende-se por colheita quer a separa-
medida de mensuração sempre que consumíveis a mensuração ao custo ção de um produto de um ativo bioló-
possa ser fiavelmente determinada con- prevista no parágrafo 30 da NCRF 17 gico (por exemplo a colheita de fruta)
forme refere o parágrafo 30 da NCRF 17, atendendo que esta possibilidade só é quer a cessação dos processos de vida
pelo que existe um pressuposto de que o aplicável aos ativos biológicos não cor- de um ativo biológico (vitelas abatidas
justo valor pode ser mensurado com fia- rentes. para produção de carne). São exemplos
bilidade para um ativo biológico. de produtos agrícolas o leite, as uvas,
De acordo com os parágrafos 26 a 29, um Produto agrícola cortiça, laranjas, entre outros.
ganho ou uma perda proveniente do re- (reconhecimento e mensuração) O produto agrícola colhido dos ativos
conhecimento inicial ou de alterações do A NCRF 17 é aplicada ao produto agrí- biológicos de uma entidade deve ser
justo valor (menos os custos de aliena- cola colhido dos ativos biológicos da mensurado pelo seu justo valor me-
ção) dos ativos biológicos consumíveis entidade no momento da colheita. nos os custos de vender, no momento
que resultem da variação de preços de Após este momento, é aplicada a NCRF da colheita. Tal mensuração é o custo
mercado à data de balanço, transforma- 18 – Inventários, ou uma outra norma nessa data aquando da aplicação da
ção biológica, venda ou abate, deverão contabilística e de relato financeiro NCRF 18 - Inventários, ou uma outra
ser reconhecidas no resultado líquido do aplicável, conforme referido no pará- norma contabilística e de relato finan-
exercício do período em que surjam. grfao 4 da NCRF 17. ceiro aplicável.

Quadro 2: Síntese do âmbito da NCRF 17 e critérios de reconhecimento e mensuração aplicáveis

Âmbito: NCRF 18
Âmbito: NCRF 17 - Agricultura
- Inventários

Produtos resultantes de processa-


Ativos biológicos Produto agrícola
mento após colheita
Mensuração inicial e à data do balanço: Mensuração inicial e à data do balanço: Mensuração:
Justo valor - custos estimados no ponto de Justo valor - custos estimados no ponto de NCRF 18 (custos de produção industrial)
venda (exceção se a mensuração não for venda, no momento da colheita
fiável: Custo – amortizações acumuladas –
Perdas por imparidade acumuladas)

Conta 37 - Ativos biológicos Conta 34 - Produtos acabados e intermédios


Conta 3314 - Matérias-primas - produtos agrícolas

58 CONTABILISTA 267
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A contabilização das principais operações relacionadas com ativos biológicos no regime geral do SNC

Ativos biológicos de produção - Contabilização dos ativos biológicos de produção ao justo valor

- Pela aquisição dos ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 271x – Fornecedores de investimentos ou Pelo valor de aquisição do bem
1 - Meios financeiros líquidos

- Em situações normais, na data da compra o valor de aquisição corresponde ao justo valor. No entanto, caso
tal não se verifique, dever-se-á proceder ao ajustamento no reconhecimento inicial para o justo valor. Nesse
caso, no momento da compra, também deverá ser registado o ajustamento da seguinte forma:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 774 – Ganhos por aumentos de justo valor Pela variação do justo valor face ao custo
de aquisição (se positiva)

664 – Perdas por redução do justo valor 372 – Ativos biológicos de produção Pela variação do justo valor face ao custo
de aquisição (se negativa)

- Nascimento de ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 774 – Ganhos por aumentos de justo valor Pelo justo valor no momento do nasci-
mento

- Ajustamentos da mensuração a cada data de balanço:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 774 – Ganhos por aumentos de justo valor Pelo ajustamento em cada data de balan-
ço (aumento do justo valor)

664 – Perdas por redução do justo valor 372 – Ativos biológicos de produção Pelo ajustamento em cada data de balan-
ço (diminuição do justo valor)

- Alienação de ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

7871 – Rendimentos e ganhos em investi- 372 – Ativos biológicos de produção Pelo ajustamento em cada data de balan-
mentos não financeiros por alienação de ço (aumento do justo valor)
ativos biológicos de produção, ou

6871 – Gastos e perdas em investimentos


não financeiros por alienação de ativos
biológicos
21 – Clientes / 1 – Meios financeiros 7871 – Rendimentos e ganhos em investi- Pelo valor da venda
líquidos mentos não financeiros por alienação de
ativos biológicos de produção, ou

6871 – Gastos e perdas em investimentos


não financeiros por alienação de ativos
biológicos

JUNHO 2022 59
COLABORAÇÃO ISCA-UA

- Abate de ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

6873 – Gastos e perdas em investimentos 372 – Ativos biológicos de produção Pelo desreconhecimento do ativo biológico
não financeiros - Abates - Ativos biológicos de produção por abate

Contabilização dos ativos biológicos de produção pelo método do custo

- Pela aquisição dos ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 271 – Fornecedores de investimentos e/ou Aquisição de ativos biológicos de produ-
745 – Trabalhos para a própria entidade - ção mais, se for relevante, o somatório de
ativos biológicos de produção todos os custos necessários à sua aquisi-
ção e colocação em condições e no local
pronto a ser usado (gastos já registados
em contas da classe 6)

- Pelo reconhecimento de ativos biológicos de produção nascidos na produção


por aplicação do método do custo:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

372 – Ativos biológicos de produção 745 – Trabalhos para a própria entidade - Somatório de todos os custos necessários
ativos biológicos de produção ao seu nascimento e que já foram regista-
dos em contas da classe 6

- Registo da depreciação em função da vida útil do bem

Conta a débito Conta a crédito Descrição

644 – Gastos de depreciação e de amor- 3728 – Depreciações acumuladas – Ativos Pelo registo da depreciação do ativo bio-
tização – Ativos biológicos de produção biológicos mensurados ao custo lógico de produção mensurado ao custo
mensurados ao custo

- Registo da perda por imparidade atendendo ao preconizado na NCRF 12 - Imparidades

Conta a débito Conta a crédito Descrição

659 – Perdas por imparidade – Ativos bio- 3729 – Imparidades acumuladas – Ativos Pelo registo da imparidade do ativo bioló-
lógicos de produção mensurados ao custo biológicos mensurados ao custo gico de produção mensurado ao custo

- Alienação de ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

3728 – Depreciações acumuladas – Ativos 7871 – Rendimentos e ganhos em investi- Pelo desreconhecimento das depreciações
biológicos mensurados ao custo mentos não financeiros por alienação de registadas
ativos biológicos de produção, ou
6871 – Gastos e perdas em investimentos
não financeiros por alienação de ativos
biológicos

60 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

3729 – Imparidades acumuladas – Ativos 7871 – Rendimentos e ganhos em investi- Pelo desreconhecimento de eventuais
biológicos mensurados ao custo mentos não financeiros por alienação de imparidades registadas
ativos biológicos de produção, ou
6871 – Gastos e perdas em investimentos
não financeiros por alienação de ativos
biológicos
7871 – Rendimentos e ganhos em investi- 372 – Ativos biológicos de produção Pelo desreconhecimento do ativo biológico
mentos não financeiros por alienação de de produção
ativos biológicos de produção, ou
6871 – Gastos e perdas em investimentos
não financeiros por alienação de ativos
biológicos
21 – Clientes/1 – Meios financeiros líquidos 7871 – Rendimentos e ganhos em investi- Pelo valor da venda
mentos não financeiros por alienação de
ativos biológicos de produção, ou
6871 – Gastos e perdas em investimentos
não financeiros por alienação de ativos
biológicos

- Abate de ativos biológicos de produção:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

3728 – Depreciações acumuladas – Ativos 6873 – Gastos e perdas em investimentos Pelo desreconhecimento das depreciações
biológicos mensurados ao custo não financeiros por alienação de ativos registadas
biológicos
3729 – Imparidades acumuladas – Ativos Pelo desreconhecimento de eventuais
biológicos mensurados ao custo imparidades registadas

6873 – Gastos e perdas em investimentos 372 – Ativos biológicos de produção Pelo desreconhecimento do ativo biológico
não financeiros por alienação de ativos de produção
biológicos

Contabilização dos ativos biológicos consumíveis

- Pela aquisição dos ativos biológicos consumíveis:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

313 – Compra de ativos biológicos 22 – Fornecedores / 1 – Meios Financeiros Pelo valor de aquisição
Líquidos

613 – Custo das mercadorias vendidas 313 – Compra de ativos biológicos Pelo reconhecimento do custo das com-
e das matérias consumidas de ativos pras (lançamento a efetuar no momento
biológicos2 da compra, se estivermos a utilizar o
sistema de inventário permanente, ou no
final do período, se estivermos a utilizar o
sistema de inventário intermitente)
371 – Ativos biológicos Consumíveis 774 – Ganhos por aumentos do justo valor3 Pelo reconhecimento do ativo biológico
(lançamento a efetuar no momento da
compra, se estivermos a utilizar o sistema
de inventário permanente, ou no final do
período, se estivermos a utilizar o sistema
de inventário intermitente)

- Reconhecimento de ativos biológicos nascidos na exploração (animais ou plantas):

Conta a débito Conta a crédito Descrição

371 – Ativos biológicos consumíveis 774 – Ganhos por aumentos de justo valor Pelo reconhecimento em ativos biológicos
consumíveis ao justo valor

JUNHO 2022 61
COLABORAÇÃO ISCA-UA

- Ajustamentos de mensuração a cada data de balanço:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

371 – Ativos biológicos consumíveis 774 – Ganhos por aumentos de justo valor Pelo ajustamento em cada data de balan-
ço (aumento do justo valor)

664 – Perdas por redução do justo valor 371 – Ativos biológicos consumíveis Pelo ajustamento em cada data de balan-
ço (diminuição do justo valor)

- Alienação de ativos biológicos consumíveis:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

21 - Clientes ou 1 Meios financeiros 71 – Vendas Pelo valor da venda


líquidos

664 – Perdas por redução do justo valor4 371 – Ativos biológicos consumíveis Pelo desreconhecimento do valor do ativo
biológico vendido

- Abate de ativos biológicos consumíveis mensurados ao justo valor

Conta a débito Conta a crédito Descrição

664 – Perdas por redução do justo valor 371 – Ativos biológicos consumíveis Pelo desreconhecimento do valor do ativo
biológico vendido

Contabilização do produto agrícola

- Pelo reconhecimento aquando da colheita, se não incorporarem um processo produtivo:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

345 – Produtos acabados e intermédios - 774 - Ganhos por aumentos de justo valor Pelo reconhecimento do produto agrícola
produtos agrícolas5 – Em ativos biológicos ao justo valor menos custos estimados no
ponto de venda

- Pelo reconhecimento aquando da colheita, se forem para incorporar num processo produtivo:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

3314 - Matérias-primas -produtos agrí- 774 - Ganhos por aumentos de justo valor Pelo reconhecimento do produto agrícola
colas – Em ativos biológicos ao justo valor menos custos estimados no
ponto de venda

- No caso de produtos agrícolas que resultam de cessação de processo de vida de um ativo biológico, no caso
de não serem para incorporar num processo produtivo:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

345 - Produtos acabados e intermédios – 387 - Reclassificação e regularização de Pela passagem de ativo biológico para
produtos agrícolas ativos biológicos produto agrícola ao justo valor menos
custos estimado no ponto de venda

62 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

- Pela venda do produto agrícola:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

21 – Clientes 71 – Vendas Pelo valor da venda do produto agrícola

- Saídas de produtos acabados: no final do período (no caso de sistema de inventário intermitente) pelo apu-
ramento do custo das vendas:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

731 - Variação nos inventários de produção 345 – Produtos acabados e intermédios - Pelo apuramento do custo da venda do
produtos agrícolas produto agrícola

- No caso dos produtos agrícolas que vão incorporar um processo produtivo, no final do período (no caso de
sistema de inventário intermitente) pelo apuramento do custo das matérias-primas (produtos agrícolas) in-
corporadas:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

612 - Custo das matérias consumidas 3314 – Matérias-primas – produtos Pelo apuramento do custo no final do
agrícolas período pelas matérias-primas incorpo-
radas.

- Reconhecimento dos produtos em curso no final do período (em sistema de inventário intermitente):

Conta a débito Conta a crédito Descrição

36 - Produtos e trabalhos em curso 73 - Variações nos inventários de produção Mensurado ao custo de produção acumu-
lado até essa fase de produção, apurado
através de contabilidade de custos ou
analítica (com recurso à digrafia) ou com
recurso à concentração de gastos em
centros de custo e respetivo tratamento
posterior - Neste custo também estão
refletidos os produtos agrícolas incorpo-
rados.

- Entradas por produção – registo dos produtos acabados no final do exercício:

Conta a débito Conta a crédito Descrição

34 - Produtos acabados 73 - Variações nos inventários de produção Mensurado ao custo de produção acumu-
lado até essa fase de produção, apurado
através de contabilidade de custos ou
analítica (com recurso à digrafia) ou com
recurso à concentração de gastos em
centros de custo e respetivo tratamento
posterior.
Neste custo também estão refletidos os
produtos agrícolas incorporados.

JUNHO 2022 63
COLABORAÇÃO ISCA-UA

Aspetos de natureza fiscal surados ao custo menos qualquer delo 22, sendo acrescidas no cam-
- Ativos biológicos de produção depreciação acumulada e qualquer po 713 ou deduzidas no campo 759.
Modelo do custo - A introdução perda por imparidade acumulada, Note-se, no entanto, que de acor-
dos ativos biológicos no elenco a depreciação será aceite do ponto do com o n.º 3 do artigo 45.º-A do
dos elementos passíveis de serem de vista fiscal de acordo com o de- CIRC (alteração decorrente da Lei n.º
depreciados para efeitos fiscais foi finido no CIRC e no Decreto Regu- 2/2014 de 16 de janeiro), o custo de
efetuada com a Lei do Orçamento lamentar n.º 25/2009. aquisição dos ativos biológicos não
do Estado para 2012 (Lei n.º 64- Modelo do justo valor - No caso consumíveis, que sejam subsequen-
B/2011, de 30 de dezembro). dos ativos biológicos de produção temente mensurados ao justo va-
No caso de os ativos biológicos de serem mensurados ao justo valor, lor, é aceite como gasto para efeitos
produção serem mensurados pelo em termos fiscais, os ajustamen- fiscais, em partes iguais, durante o
modelo do custo, as depreciações tos contabilísticos decorrentes da período de vida útil que se deduz da
praticadas serão fiscalmente de- aplicação desse justo valor (quer quota mínima de depreciação que
dutíveis, na medida em que, do no reconhecimento inicial, quer seria fiscalmente aceite caso esse
elenco dos ativos sujeitos a de- nos períodos subsequentes por ativo permanecesse reconhecido ao
perecimento para efeitos fiscais variações do justo valor) não con- custo de aquisição.
(n.º 1 do artigo 1.º do Decreto Re- correm para a formação do lucro Neste caso deduz-se no Q07 este
gulamentar n.º 25/2009 de 14 de tributável, conforme o disposto no montante (campo 792), aceitando-se
setembro e artigo 29.º do Código n.º 9 do artigo 18.º do CIRC, sendo a existência de uma “depreciação”
do IRC (CIRC)), constam os ativos apenas considerados como ren- fiscal mesmo não existindo depre-
biológicos não consumíveis (ou dimentos ou gastos no período de ciação contabilística.
seja, aqueles em relação aos quais tributação em que o ativo biológi-
é permitida a aplicação do modelo co for vendido ou abatido. Mais e menos-valias de ativos
do custo). Assim, as variações negativas ou biológicos de produção
Assim, no caso de os ativos bio- positivas do justo valor são corri- Nos termos do art.º 46.º n.º 1 a) e
lógicos de produção serem men- gidas ao nível do quadro 07 da mo- art.º 48.º ambos do CIRC, as vendas

64 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

de ativos biológicos não consumí- Ativos biológicos consumíveis equivalente à percentagem que a ex-
veis (de produção), originam, a ní- Relativamente aos ativos biológicos tração efetuada no período de tribu-
vel fiscal, uma mais ou menos-valia consumíveis, o justo valor releva tação represente na produção total
fiscal, sujeita ao regime das mais e para efeitos fiscais. Assim, os gan- do mesmo produto, e ainda não con-
menos-valias fiscais (art.º 46.º, n.º hos e perdas resultantes da aplica- siderada em período de tributação
1) relativamente à qual poder-se-á ção do justo valor nos ativos bioló- anterior, podendo ainda ser atuali-
aproveitar do benefício do reinves- gicos consumíveis concorrem para zada de acordo com a aplicação dos
timento dos valores de realização a formação do lucro tributável, con- coeficientes de correção monetária.
previsto no art.º 48.º do CIRC. forme alínea g) do n.º 1 do artigo 20.º Assim, os gastos e os rendimentos
No caso da tributação das mais-va- e alínea k) do n.º 1 do artigo 23.º do das atividades silvícolas só serão
lias fiscais, a mesma será tributada CIRC. reconhecidos para efeitos fiscais no
a 100 por cento ou, se manifesta- No entanto, encontram-se excecio- ano da venda, aplicando-se aos gas-
da a intenção de reinvestir o valor nadas do referido anteriormente, as tos a correção monetária prevista no
de realização, será tributada ape- explorações silvícolas plurianuais, 47.º do CIRC.
nas em 50 por cento, cumpridas as cujo tratamento fiscal se encontra
condições do artigo 48.º do CIRC, estabelecido no artigo 18.º n.º 7 do Produto agrícola
nomeadamente se valor de realiza- CIRC, o que significa que para efeito Nos termos do artigo 26.º, n.º 1, alí-
ção correspondente à totalidade dos da determinação do lucro tributável nea d) do CIRC, os produtos agrí-
referidos ativos seja reinvestido na em IRC o justo valor, dos ativos bio- colas colhidos de ativos biológicos,
aquisição, produção ou construção lógicos consumíveis de atividades são mensurados ao preço de venda
de ativos fixos tangíveis, de ativos silvícolas, não é aceite fiscalmente. no momento da colheita, deduzi-
intangíveis ou, de ativos biológicos De acordo com o artigo 18.º do CIRC, do de custos estimados no ponto de
não consumíveis, no período de tri- os gastos das explorações silvícolas venda, excluindo os de transporte e
butação anterior ao da realização, no plurianuais podem ser imputados outros necessários para colocar os
próprio período de tributação ou até ao lucro tributável tendo em con- produtos no mercado.
ao fim do segundo período de tribu- sideração o ciclo de produção, caso Temos nesta situação uma coinci-
tação seguinte. em que a quota-parte desses gastos, dência entre as regras da fiscalidade

JUNHO 2022 65
COLABORAÇÃO ISCA-UA

e o respetivo tratamento contabi- produto o capítulo 11 - Inventários A NCRF-PE pressupõe que, para um
lístico, permitindo que os ganhos e da NRCF-PE. ativo biológico ou para um produto
perdas resultantes da aplicação do Um ativo biológico deve ser men- agrícola no ponto de colheita, o seu
justo valor concorram para a forma- surado, no reconhecimento inicial justo valor pode ser mensurado com
ção do lucro tributável. e em cada data de balanço, pelo seu fiabilidade, com as cotações oficiais
justo valor menos custos de aliena- de mercado, designadamente as dis-
A atividade agrícola ção, exceto no caso descrito no pa- ponibilizadas pelo SIMA. Contudo,
e o regime das pequenas entidades rágrafo 20.10 em que o justo valor se esse pressuposto não se verificar,
e microentidades não pode ser fiavelmente mensura- esse ativo biológico ou produto agrí-
Regime das pequenas entidades - O do. cola colhidos dos ativos biológicos
capítulo 20 da norma contabilística O produto agrícola colhido dos ati- deve ser mensurado pelo custo me-
e de relato financeiro para pequenas vos biológicos de uma entidade deve nos qualquer depreciação acumula-
entidades (NCRF-PE) - Agricultura, ser mensurado pelo seu justo valor da e qualquer perda por imparidade
trata a contabilização dos ativos bio- menos custos de vender no momen- acumulada. Quando o justo valor
lógicos, do produto agrícola colhido to da colheita. Tal mensuração é o desse ativo biológico ou produto
dos ativos biológicos da entidade custo nessa data aquando da aplica- agrícola se tornar fiavelmente men-
somente no momento de colheita, e ção do capítulo 11 – Inventários da surável, deve ser mensurado pelo
dos subsídios das entidades públicas NCRF-PE. seu justo valor menos os custos de
relacionados com ativos biológicos. A NCRF-PE considera como justo alienação.
Este capítulo é aplicado também ao valor fiavelmente mensurável as Ao determinar o custo, depreciação
produto agrícola, que é o produ- cotações oficiais de mercado, desig- acumulada e perdas por imparidade
to colhido dos ativos biológicos da nadamente as disponibilizadas pelo acumuladas, uma entidade toma em
entidade, somente no momento da Sistema de Informação de Mercados consideração os capítulos 7 – ativos
colheita. Após isso, é aplicado a esse Agrícolas (SIMA)6. fixos tangíveis e 11 – inventários da

66 CONTABILISTA 267
COLABORAÇÃO ISCA-UA

NCRF-PE, bem como, se for o caso, a da conta 313 - Ativos biológicos. Note-se balanceamento entre os gastos e os rendi-
NCRF 12 – Imparidade de ativos. que o lançamento preconizado respeita o mentos.
Regime das microentidades - No estabelecido nesta nota de enquadramento, Assim, concluem que tendo em conta que o
caso das microentidades a mensu- apesar de no nosso entender não traduzir reconhecimento dos ativos biológicos está
ração dos ativos biológicos é feita a realidade das operações, na medida em a ser feito pela aplicação do justo valor e
pelo método do custo (não sendo que é reconhecido um gasto na conta 613 não pelo balanceamento de gastos já regis-
aplicável o justo valor). e um rendimento na conta 774, quando na tados, então o que está em causa é um au-
De acordo com o parágrafo 7.2 da realidade apenas ocorreu uma operação de mento do justo valor pelo que a aplicação da
norma contabilística para microen- compra. conta 774 – Ganhos por aumento do justo
tidades (NC-ME), os ativos biológi- 3
Note-se que no registo dos rendimentos valor e consequentemente a apresentação
cos de produção, são reconhecidos associados a ganhos de valor dos ativos que na demonstração de resultados na rubrica
como ativos fixos tangíveis, estando se encontrem valorizados ao justo valor e de aumentos/reduções do justo valor en-
sujeitos a depreciações conforme as cuja variação de valor deve ser reconhe- quadra do ponto de vista conceptual a ope-
regras gerais definidas para os ati- cida em resultados, não é utilizada a conta ração corretamente.
vos fixos tangíveis (capítulo 7 da 73 - Variação de inventários de produção, 4
Não é usada a conta 73 Variação de inven-
NC-ME). atendendo que os ativos não são valoriza- tários de produção atendendo que os ativos
Já de acordo com o parágrafo11.2 da dos pelo método de custeio de produção. não são valorizados pelo método de custeio
NC-ME, os ativos biológicos consu- Saliente-se, no entanto, que existem auto- de produção.
míveis e os produtos agrícolas são res que nesta situação, bem como em outras 5
A movimentação direta da conta 345 -
reconhecidos como inventários, ou apresentadas em seguida e a que faremos Produtos acabados e intermédios - pro-
seja, mensurados em função dos referência, procedem ao registo dos ativos dutos agrícolas, quer em inventário per-
critérios previstos no capítulo 11 – biológicos consumíveis por contrapartida manente quer em inventário intermitente,
Inventários da NC-ME, pelo que na da conta 73 – Variação dos inventários de poderá na prática trazer algumas dificul-
sua mensuração aplica-se o custo ou produção. dades, perdendo-se informação relevante.
o valor realizável líquido entre os Admitindo outras opiniões, neste trabalho Assim, no sentido de existir detalhe e his-
dois o mais baixo.  optaremos também por não utilizar a con- tórico das operações, por questões de con-
ta 73 – Variação dos inventários de produ- trolo interno, ou no sentido de ser possível
*Professor adjunto convidado ção nessas situações, atendendo também o preenchimento de algumas declarações
do ISCA-UA ao preconizado por Franco e Pena (2020, fiscais (por exemplo o quadro dos inventá-
CC n.º 38 114 p.146), que referem que a utilização da rios da IES), poderá ser conveniente a utili-
ROC n.º 1 544 conta 73, não vai ao encontro do preconi- zação da conta 387 - Ativos biológicos, que
zado nas NCRF, na medida em que a conta registará, de acordo com as notas de en-
Bibliografia disponível em («A Ordem 73 – Variação nos inventários de produ- quadramento, as reclassificações de ativos
– Publicações - Revista Contabilista – ção inclui a diferença entre os inventários biológicos para inventários.
Bibliografia») no fim e no início do período dos produtos 6
A Comissão de Normalização Contabi-
acabados e intermédios, dos subprodutos, lística, em resposta à Confederação dos
Notas resíduos e refugos e dos produtos e traba- Agricultores de Portugal, refere que existe
1
A informação do SIMA está disponível no lhos em curso, valorizados pelo método de a possibilidade de serem usadas outras co-
site do Gabinete de Planeamento, Políticas custeio de produção. tações disponíveis, desde que sejam cota-
e Administração Geral (GPP): http://www. As autoras referidas sustentam esta opção, ções oficiais, eventualmente as estabeleci-
gpp.pt/sima.html podendo os preços dos referindo que o procedimento contabi- das em bolsas regulamentadas de produtos
produtos agrícolas ser consultados por data lístico relativo ao registo da variação dos agrícolas internacionais, efetuados que
e mercado. inventários de produção não se encontra sejam os devidos ajustamentos de compa-
2
De acordo com as notas de enquadramen- expresso em nenhuma NCRF (não se en- rabilidade. Não existindo cotação oficial
to ao Código de Contas, constante da Por- contra na NCRF 17 nem na NCRF 18 nem disponível deverá, nos termos do parágrafo
taria n.º 218/2015 de 23 de julho, a conta na NCRF 20). A necessidade da utilização 20.10, esse ativo biológico ou produto agrí-
613 - Ativos biológicos (compras), recolhe dessa conta, como uma conta de balancea- cola ser mensurado pelo custo menos qual-
as aquisições de ativos biológicos consumí- mento resulta do parágrafo 93 da estrutura quer depreciação acumulada e qualquer
veis efetuadas durante o ano, transferidas conceptual onde se refere a necessidade de perda por imparidade acumulada.

JUNHO 2022 67
CONTABILIDADE

Uma questão de orgulho


para a profissão:
os primeiros contabilistas
certificados em Portugal (1770)
De forma inédita, este artigo dá-lhe a conhecer o nome e a entidade patronal
dos primeiros contabilistas certificados em Portugal, 100, no total, que, depois
do ano de 1770, procederam à sua matrícula na Junta do Comércio, entidade
pública reguladora da profissão de guarda-livros no tempo de Pombal.

Por Miguel Gonçalves*, Cecília Duarte* e Cristina Góis* | Artigo recebido em junho 2022

M uito antes de 1996, ano em que


os técnicos oficiais de con-
tas passaram a ter de se inscrever
fazia as vezes do atual Ministério
da Economia, grosso modo. A Junta
do Comércio havia sido fundada em
2022).
Por estes motivos, residem na Car-
ta de Lei de 30 de agosto de 1770 o
obrigatoriamente na Comissão de 30 de setembro de 1755 por Pombal 2
gérmen e as bases da primeira regu-
Inscrição da Associação dos Técni- (Gonçalves, 2017; Duarte, Gonçalves lamentação (Pimenta, 1934; Guerra,
cos Oficiais de Contas (ATOC) para e Góis, 2020). 1948; Brito, 1953; Carvalho, 1953;
poderem exercer a profissão, e de Nestes termos, a iniciativa legislati- Rodrigues e Gomes, 2002; Rodri-
1963, data em que o Código da Con- va do Marquês de Pombal conducen- gues, Gomes e Craig, 2003; Guima-
tribuição Industrial (CCI), criando a te à obrigatoriedade de inscrição dos rães, 2005, 2009; Coelho, 2016) que.
figura jurídica do técnico de contas guarda-livros na Junta do Comércio mais tarde, em 1995, irá ditar as di-
para as empresas contribuintes do concretizou-se por intermédio da retrizes da profissão de contabilista:
grupo A da contribuição industrial e Carta de Lei de 30 de agosto de 1770. habilitações académicas, organiza-
obrigando à sua inscrição na antiga Com efeito, este diploma legal espe- ção colegial e inscrição obrigatória
Direção-Geral das Contribuições e cificava, à luz do parágrafo 4, a obri- em organismo regulador.
Impostos (DGCI), houve, em Portu- gatoriedade de matrícula na Junta Como se aflorou, a Carta de Lei de 30
gal, há mais de 250 anos, uma ins- do Comércio, em livro próprio, dos de agosto de 1770 é um documento
crição obrigatória de profissionais guarda-livros dos organismos pú- abundantemente citado na história
ligados à contabilidade (isto é, os blicos e privados nacionais. A Carta da contabilidade portuguesa como
guarda-livros) em organismo regu- de Lei de 30 de agosto também fixa- sendo a primeira regulamentação
lador da profissão . 1
va em letra de lei os empregos para legal da profissão de contabilista
Esta inscrição surgiu em 1770 no rei- os quais era necessária a aprovação no nosso país, mas, tanto quanto
nado de D. José I (1714-1777) (r. 1750- dos estudos da Aula do Comércio se sabe, desconhece-se a verdadei-
1777). Idealizada pelo seu principal de Lisboa, uma escola pública de ra execução prática deste articu-
secretário de Estado, o Marquês de contabilidade e comércio criada em lado, ou seja, existe uma lacuna na
Pombal (1699-1782), a inscrição te- 1759 e na qual obrigatoriamente se literatura relacionada com o nome
ria de ser efetivada na Junta do Co- aprendia contabilidade por parti- dos agentes que se matricularam
mércio, a entidade que, à época, das dobradas (Gonçalves, 2017, 2019, na Junta do Comércio, bem como as

68 CONTABILISTA 267
CONTABILIDADE

instituições económicas nas quais, à A legislação principal: a Carta do Erário Régio, Junta do Comércio,
época, exerciam a profissão. de Lei de 30 de agosto de 1770 companhias monopolistas de co-
Em consequência, com recurso a da- A legislação em epígrafe era com- mércio (com especial saliência para
dos primários (fontes manuscritas) posta por 18 parágrafos. Como an- a Companhia Geral do Grão-Pará e
de arquivo localizados no Arquivo tedito, veio estabelecer a obriga- Maranhão e para a Companhia Ge-
Nacional da Torre do Tombo (ANTT), toriedade de matrícula na Junta do ral de Pernambuco e Paraíba) e Real
em Lisboa, o presente artigo tem Comércio, em livro próprio, dos Fábrica das Sedas, isto apenas para
como objetivo preencher a lacuna de guarda-livros dos organismos pú- citar os exemplos mais paradigmá-
investigação detetada, apresentan- blicos e privados nacionais, sob ticos e mais contemporaneamente
do pela primeira vez à comunidade pena de nulidade das suas escritura- conhecidos.
portuguesa da história da contabi- ções, contas e pareceres técnicos em No sentido de evitar ordenados de-
lidade, a relação dos guarda-livros, casos de contencioso judicial; quem sajustados, tanto para as casas de
portugueses e estrangeiros, matri- assim não procedesse não poderia comércio portuguesas, como para
culados na Junta do Comércio por integrar o corpo geral do comércio os guarda-livros formados pela Aula
força da Carta de Lei de 30 de agosto nem concorrer a empregos públicos do Comércio de Lisboa, o legislador
de 1770, profissionais a quem a ini- (parágrafo 4 da «Carta de Lei de 30 fixou o montante da retribuição
ciativa legislativa assegurava uma de agosto de 1770»). anual a ser paga nos três primeiros
reserva de mercado, típica da socie- Os interessados teriam de se matri- anos de atividade à categoria pro-
dade corporativista do Antigo Regi- cular entre o período temporal de 30 fissional de caixeiros: 72$000 réis,
me português. de agosto a 31 de dezembro de 1770 96$000 réis e 120$000 réis, respeti-
Estruturado em quatro secções, o (parágrafos 1 e 4 da «Carta de Lei de vamente (parágrafo 12 da «Carta de
texto desenvolve-se da seguinte for- 30 de agosto de 1770»). De 1770 em Lei de 30 de agosto de 1770») 3 . Para
ma. Depois da introdução, a segun- diante, o exercício da profissão de além deste ordenado anual, obriga-
da secção centra a sua atenção nos guarda-livros seria restringido aos va-se a entidade patronal a forne-
preceitos legais presentes na Carta diplomados pela Aula do Comércio cer ao guarda-livros, casa, cama e
de Lei de 30 de agosto de 1770. A ter- de Lisboa, sendo-lhes assegurada mesa (parágrafo 12 da «Carta de Lei
ceira secção dá a conhecer a princi- uma reserva de mercado (parágrafos de 30 de agosto de 1770»). A partir
pal fonte primária da pesquisa, o li- 5 a 11 da «Carta de Lei de 30 de agos- do terceiro ano, as partes ficavam
vro 340 da Junta do Comércio, o qual to de 1770»). Os privilégios assegu- livres para negociar o salário anual
se encontra à guarda do ANTT, como rados para os diplomados diziam do guarda-livros (parágrafo 13 da
se fez notar. O trabalho encerra com respeito a empregos nas contado- «Carta de Lei de 30 de agosto de
uma breve conclusão. rias (repartições de contabilidade) 1770»).
De um ponto de vista global, a fis-
calização dos aspetos relacionados
com o cumprimento da Carta de
Lei de 30 de agosto de 1770 cabia ao
lente da Aula do Comércio de Lisboa
(parágrafo 17 da «Carta de Lei de 30
de agosto de 1770»), o professor suí-
ço, naturalizado português, Alberto
Jaquéri de Sales (1731-1791) 4 (à data
da publicação desta Carta de Lei).
Os privilégios estipulados pela Car-
ta de Lei de 30 de agosto de 1770
vigoraram até à Implantação do Li-
beralismo em Portugal, concreta-
mente até à promulgação do Código
Comercial de 1833, cujo autor-líder
foi José Ferreira Borges (1786-1838).

JUNHO 2022 69
CONTABILIDADE

Figura 1: Título do livro 340 da Junta do Comércio.


A fonte manuscrita primária:
o livro 340 da Junta do Comércio
A literatura portuguesa sobre história
da contabilidade há bastante tempo que
sinaliza a Carta de Lei de 30 de agosto de
1770 como parte da legislação contabi-
lística pombalina, que, no seu conjunto,
revolucionou positivamente a contabi-
lidade em Portugal no arco cronológico
1755-1777 (Silva, 1984; Duarte, Gon-
çalves e Góis, 2022). Todavia, um vazio
permanece por preencher no tocante
à execução prática deste articulado, na
justa medida em que até ao presente
momento a historiografia não criou co-
nhecimento contabilístico novo sobre a
legislação em análise, desconhecendo-
-se, inclusivamente, se a lei não teria
sido eventualmente letra morta no que
se prende com a matrícula dos guarda-
-livros que a mesma exigia. Fonte: ANTT, Junta do Comércio, livro 340.

Dito de outro modo: de jure, ou seja,


pela lei, existia essa obrigatoriedade de Figura 2: Informação constante do fólio 1 do livro 340 da Junta do Comércio.
matrícula, o que a literatura existente
já profusamente evidenciou, mas de
facto, isto é, na prática, essa obrigato-
riedade confirmou-se? A pergunta de
investigação que se acaba de formular
tem resposta à luz da análise de um dos
muitos centos de livros que compõem
a documentação da Junta do Comér-
cio existente no ANTT, em Lisboa: o
livro 340, denominado «Matrícula dos
Guarda-Livros Empregados nas Diver-
sas Estações de Comércio desta Praça
de Lisboa» (português modernizado).
Veja-se, para este efeito, a figura 1.
O referido livro 340, no fólio 1, a abrir,
possui a seguinte informação: «A Junta
do Comércio destes reinos e seus do-
mínios, em execução da Lei de 30 de
agosto do corrente ano de 1770, tem por
seus despachos aprovados por guarda-
-livros do comércio desta Praça de
Lisboa, as pessoas que se acham matri-
culadas neste livro» (ANTT, Junta do
Comércio, livro 340, fólio 1; português
modernizado). Observe-se, nesta sen-
da, a figura 2. Fonte: ANTT, Junta do Comércio, livro 340, fólio 1.

70 CONTABILISTA 267
CONTABILIDADE

Isto dito, a tabela 1, constituindo-se contabilistas matriculados na Junta da matrícula, exerciam o ofício de
num contributo inédito da presente do Comércio sob a égide da Carta de guarda-livros. A listagem dos guarda-
investigação, mostra, pela primeira Lei de 30 de agosto de 1770, bem como -livros da tabela 1 segue a ordem de
vez na literatura da história da con- evidencia as instituições económi- matrícula no livro 340 da Junta do Co-
tabilidade portuguesa, o nome dos cas portuguesas em que eles, na data mércio. Consulte-se, assim, a tabela 1.

Tabela 1: Os primeiros contabilistas certificados em Portugal (1770), 100 no total.

Entidade Guarda-livros matriculados na Junta do Comércio, de acordo com a


Carta de Lei de 30 de agosto de 1770 Fonte
empregadora (nome e apelidos modernizados)

Nicolau Júlio Cortinovis5


Contadoria da Pedro António Avenente ANTT, Junta do
Junta do Comércio António Francisco Simões Comércio, livro
João António Maria Verciane (ausente) 340, fólio 2.
João Rebelo Frant
António Ferreira Seixas
António Aires de Andrade (fora da Companhia)
Bento José dos Santos Cabral
Contadoria da Filipe Damásio de Aguiar
João Baptista Dourneau 6 ANTT, Junta do
Companhia Geral do
João de Almeida Garandela Comércio, livro
Grão-Pará e Maranhão
José Inácio da Silva Franco 340, fólio 3.
Luís António Ferreira de Araújo
Marçal Inácio Monteiro
Paulo Xavier Pincete

Domingos Roche Macragh7


José Ferreira da Cunha
Joaquim Gauveine
José António Montanhas
José Jaques Letavoet
Contadoria da
José Paulo dos Santos Viana ANTT, Junta do
Companhia Geral de Per-
José Alexandre da Cruz Comércio, livro
nambuco e Paraíba
Pedro Vital da Cunha 340, fólio 4.
Vicente José da Silva Brito
Vicente Diogo Letavoet
Henrique Francisco da Mata (no presídio de Angola por nomeação da dita Com-
panhia)
Manuel José da Cruz
António Saidottio
Estevão dos Santos Filipe
Francisco da Costa Ribeiro Magalhães
Francisco José Buonarotti
José António de Figueiredo
Contadoria do ANTT, Junta do
João Morezzi
Contrato do Tabaco Comércio, livro
José Feliz Venâncio Coutinho 8
340, fólio 5.
Leonardo José Maria Saltier
Miguel José Rodrigues
Pedro José Paganino
Paulo Manuel Paganino
Vicente Orlandi
António Joaquim Firmo
Contadoria da ANTT, Junta do
Luís Manuel de Mendonça
Real Fábrica das Sedas Comércio, livro
Luciano António Teixeira
340, fólio 6.
Luís José Madeira de Montalvão
Joaquim José Escopezi
ANTT, Junta do
Impressão Régia Comércio, livro
340, fólio 7.

JUNHO 2022 71
CONTABILIDADE

Entidade Guarda-livros matriculados na Junta do Comércio, de acordo com a


Carta de Lei de 30 de agosto de 1770 Fonte
empregadora (nome e apelidos modernizados)

António Raspai ANTT, Junta do


Companhia Geral das
Joaquim Ambrósio Martins Comércio, livro
Carnes
340, fólio 8.
Alberto Patrone, de Francisco Nicolau Roncon
Ângelo Maria de Martini, de Francisco Manuel Calvet
Alberto Caetano dos Santos, de Miguel Rodrigues Colaço
Anastácio José da Costa, de António Soares de Mendonça
Alexandre Joaquim da Silva, de Alberto Luís Pereira
António Alexandre Baiardo, de Dionísio Chevalier
Agostinho Rodrigues de Oliveira, de seu irmão António Rodrigues de Olivei-
ra
ANTT, Junta do
António José Gonçalves de Castro, da Real Fábrica das Caixas, por Despa-
A Comércio, livro
cho de 6 de março de 1777
340, fólio 9.
Ângelo da Costa, de Manuel Gonçalves Ramos
Manuel José da Cruz, da Contadoria da Junta da Administração da Compa-
nhia Geral de Pernambuco e Paraíba
Antrácio Antunes, de D. Rita Joaquina da Fonseca, viúva de Joaquim Leocá-
dio da Fonseca
André José Rodrigues Viana, de António Centazzi, Guarda Livros de Comér-
cio por Despacho de Tribunal de 25 de fevereiro de 1823

Bernardo Maria Levaratti, de Anselmo José da Cruz ANTT, Junta do


B Bartolomeu Antunes de Barros, de Florêncio Teixeira de Azevedo Comércio, livro
340, fólio 10.
Carlos Durão, de Inácio Pedro Quintela
ANTT, Junta do
Constantino de Araújo Ferreira, de Manuel José Cardoso de Castro
C Comércio, livro
Cristóvão Marcos Targini, de Lázaro Maria Cambiasso
340, fólio 11.

Firmino de Barros Pereira, de José da Silva Leque ANTT, Junta do


Guarda-livros dos F Francisco José Gomes Monteiro Júnior, de Francisco José Gomes Monteiro. Comércio, livro
Negociantes da Praça 340, fólio 15.
do Comércio de Lisboa Henrique Francisco de Andrade, das Pescarias do Algarve ANTT, Junta do
H Comércio, livro
340, fólio 17.
João António Gorri, de Anselmo José da Cruz
João Afonso Viana, de Policarpo José Machado
João Álvares de Miranda, de Francisco Manuel Calvet
João Jefson, de José da Silva Leque
João Baptista Huges, de Custódio Ferreira Góis
João Álvares de Carvalho, de Diogo Pereira Soares
João José Lourenço Sarmalho, de Silvério Luís Serra
João Anselmo de Faria, de Marcos Gonçalves de Faria
João Baptista Ginioux, de Manuel Gomes Costa
José Manuel Rodrigues, de Francisco Simões Pereira
João Lourenço Peres, de Vale e Peres
João Caetano de Sousa, de António José de Oliveira Porto
ANTT, Junta do
José Luís Nogueira Basto, de Matias Lourenço de Araújo
J Comércio, livro
Joaquim Pereira Henriques, de Manuel Pereira de Faria
340, fólios 18-19.
João Ferreira Lima, de Ambrósio Ribeiro Neves
João Gil, de João Afonso Viana
João Batista da Costa, de seu pai Ângelo da Costa, por Despacho de Tribu-
nal de 15 de setembro de 1806
José Joaquim Pinira, de Manuel José Fernandes Silva, por Despacho do
Tribunal de 26 do corrente, Lisboa 27 de maio de 1810
Joaquim Pinheiro Silva, matriculado em Guarda-Livros da Praça da Ilha
erceira, ou de outra qualquer Praça do Reino, por Despacho do Tribunal de
16 de outubro de 1821.
João Baptista Figueira, matriculado Guarda-Livros de Guilherme Purvis e
Companhia, Negociante estabelecido nesta Praça, por Despacho do Tribunal
de 10 de abril de 1823.

72 CONTABILISTA 267
CONTABILIDADE

Entidade Guarda-livros matriculados na Junta do Comércio, de acordo com a


Carta de Lei de 30 de agosto de 1770 Fonte
empregadora (nome e apelidos modernizados)

Luís Saunier, de José D’Espie.


Luís Pedro Lecór, de João Jorge. ANTT, Junta do
L Luís da Costa Couto, da Administração do Provimento das Munições de Comércio, livro
Boca. 340, fólio 20.

Manuel Pereira Viana de Lima, de Domingos de Basto Viana


Manuel António de Araújo, de Francisco Peres de Sousa
Manuel Inácio Bernardes de Araújo, da Casa da Moeda
Manuel da Silva de Macedo, de Ambrósio Ribeiro Neves ANTT, Junta do
Guarda-livros dos M Manuel de Novais Soares, da Administração do Provimento das Tropas da Comércio, livro
Negociantes da Praça Corte em Alcântara 340, fólio 21.
do Comércio de Lisboa Manuel José da Costa Pereira, de seu tio João da Costa Maia
Manuel José de Miranda Mascarenhas, de António José da Silva Freire

Pedro Dhoudain, de José de Sousa e Abreu.


ANTT, Junta do
Pedro Gonçalves das Neves, de João Martins Pereira.
P Comércio, livro
340, fólio 24.

Tomás Caetano Fornier, de Munições de Boca. ANTT, Junta do


T Comércio, livro
340, fólio 25.

Guarda-livros de Comércio da Ponciano José Maria da Costa, matriculado por Despacho de 11 de janeiro ANTT, Junta do
Praça da cidade de Angra da Ilha de 1816. Comércio, livro
Terceira 340, fólio 30.

O livro 340 estava rubricado por An- tela (1715-1775), José da Silva Leque centralizador das finanças públicas
tónio Álvares de Aguiar, deputado da (1718-1798), Manuel Pereira de Faria portuguesas, o Erário Régio. Esta
Junta do Comércio desde 1767, pelo (?-1787), Policarpo José Machado circunstância indicia que a execu-
menos. O provedor (isto é, presiden- (1716-1792) ou Silvério Luís Serra, to- ção da Carta de Lei de 30 de agosto
te) da Junta do Comércio aquando da dos eles pertencentes à elite dos 100 de 1770 não foi plena. Ademais, tam-
promulgação da Carta de Lei de 30 de maiores grandes negociantes do pe- bém se sabe que a contadoria da Real
agosto de 1770 era Joaquim Inácio da ríodo pombalino (cf. Pedreira, 1995, Fábrica das Sedas era composta por
Cruz (1725-1781), também, em 1770, pp. 164-167). um maior número de guarda-livros
tesoureiro-mor do Erário Régio, em Os fólios do livro 340 da Junta do do que aqueles que efetivamente se
acumulação (Duarte, Gonçalves e Comércio mostram os guarda-livros apresentaram matriculados no re-
Góis, 2020). das repartições de contabilidade das ferido livro da Junta do Comércio
Salta à vista na tabela 1 que alguns principais instituições económicas (Duarte, Gonçalves e Góis, 2021).
nomes foram acrescentados poste- nacionais, nomeadamente, a Junta
riormente a 1770. Ainda assim, a lis- do Comércio, as companhias mono- Conclusão
tagem dos 100 nomes mostrados na polistas de comércio, a Impressão O presente documento permitiu co-
tabela 1 permite observar também o Régia, o Contrato do Tabaco, a Real locar sob as luzes da ribalta um ma-
nome de alguns dos maiores capita- Fábrica das Sedas, a Companhia Ge- nuscrito setecentista português, o
listas e homens de negócios da Praça ral das Carnes e, bem assim, os guar- livro 340 da Junta do Comércio, cujo
de Lisboa no tempo de Pombal, como da-livros das casas de negócio dos conteúdo consiste num tesouro con-
sejam Anselmo José da Cruz (1728- comerciantes por grosso da Praça de tabilístico nacional que convém pre-
1802), António Soares de Mendonça, Lisboa. Porém, nesta listagem de im- servar no acervo patrimonial da Or-
Domingos de Basto Viana, Francis- portantes instituições portuguesas dem dos Contabilistas Certificados, a
co Manuel Calvet, Francisco Nicolau da segunda metade do século XVIII mais representativa das associações
Roncon (?-1789), Inácio Pedro Quin- destaca-se a ausência do organismo públicas profissionais portuguesas.

JUNHO 2022 73
CONTABILIDADE

O artigo revelou os primeiros con- A terminar, um voto: que este traba- 1435 até 1911 e que o seu plural se denomi-
tabilistas certificados inscritos em lho possa vir a contribuir para a va- nava réis. O cifrão ($) indicava a quantia de
1770 no organismo regulador da pro- lorização e reconhecimento nacional mil réis, seguido de três casas decimais. A
fissão na época de Pombal, a Junta dos contabilistas portugueses, um título exemplificativo, a importância de 72
do Comércio. Esta contribuição, des- grupo profissional que tem desem- mil réis escrevia-se 72$000. Aquando da
vendando um mistério com mais de penhado um papel decisivo para o necessidade de identificar um milhão de
250 anos, permitiu adicionar conhe- desenvolvimento de Portugal, so- réis (ou um conto de réis) recorria-se ao
cimento contabilístico àquele que é bretudo na sua vertente económica. símbolo “:”. Assim, para designar 3 contos
designado na historiografia portu- de réis ou 3 milhões de réis, a expressão nu-
guesa da história da contabilidade Dedicatória: mérica correspondente era 3:000$000. Ve-
por período de ouro da contabilidade À Ordem dos Contabilistas Certificados. ja-se, para o assunto relativo a esta nota de
nacional (1755-1777) (veja-se, com rodapé, Gonçalves, Lira e Marques (2013).
este sentido, Gonçalves, 2019). * ISCAC - Coimbra Business School 4 Sales ocupou o cargo de lente da Aula do

A Carta de Lei de 30 de agosto de 1770, Comércio de Lisboa de 16 de janeiro de 1762


legislação promotora da matrícula Bibliografia disponível em («A Ordem até 11 de outubro de 1784 (Santana, 1974)
dos guarda-livros, está assim mais – Publicações – Revista Contabilista – 5 Nicolau Júlio Cortinovis foi o guarda-li-

bem estudada, especialmente no que Bibliografia») vros que instituiu a contabilidade por par-
se filia com a sua execução prática, tidas dobradas na segunda administração
a qual, registe-se novamente, não Notas (1745-1747) da Companhia da Fábrica das
foi efetivada com plenitude. Como 1 O CCI estipulava o seguinte: «Na contri- Sedas (Carvalho, Rodrigues e Craig, 2007).
se viu, a iniciativa da matrícula não buição industrial haverá três grupos: o gru- Ele era de Veneza e filho de Lorenzo Corti-
partiu de uma associação privada de po A, com tributação incidente nos lucros novis, cônsul de Veneza em Lisboa (Gonçal-
profissionais, mas de um organismo efetivamente obtidos pelos contribuintes, ves, 2017).
estatal – a Junta do Comércio –, o e determinados através da sua contabili- 6 João Baptista Dourneau era francês; ele

que reforça a ideia de que em Por- dade; o grupo B, com tributação sobre os foi o guarda-livros principal da Companhia
tugal, pelo menos até 1945, ano da lucros que presumivelmente os contribuin- Geral do Grão-Pará e Maranhão, tendo sido
fundação da Sociedade Portuguesa tes obtiveram; e o grupo C, com tributação também o responsável pela adoção inicial
de Contabilidade, a contabilidade baseada nos lucros que os contribuintes das partidas dobradas na contabilidade da
se desenvolveu sobretudo graças ao normalmente podiam ter obtido (cf. artigo empresa em 1755 (Ratton, 1813; Oliveira,
Estado e não tanto por intermédio do 6.º do Código da Contribuição Industrial). 2009; Gonçalves, 2016, 2017).
associativismo dos profissionais. Ao grupo A pertenciam, por exemplo, as 7 Domingos Roche Macragh era irlandês,

Apoiada em fontes primárias de in- sociedades anónimas, as instituições de havendo sido o guarda-livros principal da
vestigação, a informação inédita crédito, empresas de seguros, e as demais Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba
aqui aduzida traduz-se numa ques- sociedades com capital social superior a 3 e o tecnocrata responsável pela introdução
tão de orgulho evidente para a pro- 000 contos. Apenas os técnicos de contas das partidas dobradas na contabilidade da
fissão contabilística portuguesa, responsáveis pelas contabilidades de em- companhia em 1759 (Gonçalves, 2017). O
seja porque atesta com verdade his- presas contribuintes do grupo A teriam de seu antropónimo era Dominic.
tórica a máxima contemporânea de proceder à inscrição junto da DGCI. 8 José Feliz Venâncio Coutinho (1739-18--)

que a contabilidade corresponde a 2 O nome original do Marquês de Pombal foi aluno do 2.º curso da Aula do Comércio
uma profissão de interesse público, era Sebastião José de Carvalho e Melo. Em 6 de Lisboa e foi para sua instrução que em
seja porque permite desenvolver, de junho de 1759, foi agraciado com o título 1765 se copiara o manuscrito Arte da Escri-
aprofundar e ampliar a identidade nobiliárquico de Conde de Oeiras e, em 17 tura Dobrada que Ditou na Aula do Comér-
profissional dos contabilistas portu- de setembro de 1770, com o de Marquês de cio João Henrique de Sousa Copiada para
gueses, mormente no que concerne à Pombal (Gramoza, 1882). Instrução de José Feliz Venâncio Coutinho
consolidação do sentimento de per- 3 A título comparativo, em 1759 um profes- no ano de 1765, cuja autoria diz respei-
tença a um dos grupos ocupacionais sor do ensino público de latim em Lisboa ou to precisamente a João Henrique de Sousa
com mais história e prestígio no pa- no Porto ganhava anualmente 100$000 réis (1720-1788), primeiro professor da Aula do
norama das ciências empresariais do (Maxwell, 2004). Cumpre esclarecer que o Comércio de Lisboa, em 1759 (Carqueja,
nosso país. real foi a unidade monetária utilizada de 2010).

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