Você está na página 1de 70

CENTRO UNIVERSITÁRIO TIRADENTES - UNIT

CURSO DE PSICOLOGIA

CYNTHIA CAROLINA PESSOA CAVALCANTI


JULIANA CARVALHO NUNES

INTERAÇÕES EM TERAPIAS COGNITIVAS PARA TRANSTORNO


DE PERSONALIDADE BORDERLINE

Maceió
2016
Cynthia Carolina Pessoa Cavalcanti
Juliana Carvalho Nunes

INTERAÇÕES EM TERAPIAS COGNITIVAS PARA TRANSTORNO


DE PERSONALIDADE BORDERLINE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro


Universitário Tiradentes-UNIT/AL, Curso de Psicologia,
como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel
em Psicologia. Este documento segue a orientação da
Professora Esp. Nielky Kalliellanya Bezerra da Nóbrega e
foi realizado pelas alunas Cynthia Carolina Pessoa
Cavalcanti e Juliana Carvalho Nunes.

Maceió
2016
Cynthia Carolina Pessoa Cavalcanti
Juliana Carvalho Nunes

INTERAÇÕES EM TERAPIAS COGNITIVAS PARA TRANSTORNO


DE PERSONALIDADE BORDERLINE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro


Universitário Tiradentes-UNIT/AL, Curso de Psicologia,
como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel
em Psicologia. Este documento segue a orientação da
Professora Esp. Nielky Kalliellanya Bezerra da Nóbrega e
foi realizado pelas alunas Cynthia Carolina Pessoa
Cavalcanti e Juliana Carvalho Nunes..

Banca examinadora:

___________________________________________________
Profª. Esp. Nielky Kalliellanya Bezerra da Nóbrega
Orientadora

___________________________________________________
Profª. Dra. Andressa Pereira Lopes
Examinador interno

___________________________________________________
Prof. Ms. Dalnei Minuzzi Delevati
Examinador interno

Apresentado em: _____ / _____ / _____

Conceito __________

Maceió
2016
DEDICATÓRIA

“A todos aqueles que, dе alguma


forma, estiveram е estão próximos
dе nós, fazendo a nossa vida valer
cada vеz mais а pena”.

Cynthia Cavalcanti e Juliana


Carvalho
AGRADECIMENTOS – CYNTHIA CAVALCANTI

Aqui, concluo uma etapa fundamental na minha vida!


No início era apenas um sonho, um sonho guardado. Hoje, este sonho se concretizou
e virou um sonho realizado.
Agradeço imensamente ao meu marido, Luiz Cláudio, que sempre acreditou nos
meus sonhos e me incentivou a ir em busca deles, não permitindo que eu esmorecesse nos
momentos de dificuldades e tristezas. “Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando
se sonha juntos é o começo da realidade.” – Cervantes
Agradeço a Deus por todas as minhas conquistas e por não me deixar esquecer que
sou mais forte do que penso. “Agradeço todas as dificuldades que enfrentei; não fosse por
elas, eu não teria saído do lugar. As facilidades nos impedem de caminhar. [...]” Chico Xavier
Agradeço aos meus filhos Barbara Camila e Cauê Bernardo, vocês são a minha
fortaleza. Tudo o que faço é por vocês e para vocês.
Agradeço aos meus pais, Talvanis e Vitória, por estarem sempre presentes na minha
vida e nos meus projetos de vida, apoiando-me e incentivando. Em vocês sempre encontrei
acolhimento, amor e paz. Agradeço pela família linda e abençoada que vocês me deram.
Agradeço aos meus amigos e companheiros de curso, amizades verdadeiras que vou
levar por toda a minha vida, vocês deixaram marcas que jamais irão se apagar. Eu nunca me
esquecerei de vocês. De uma forma muito especial, quero agradecer a alguns anjos que Deus
me presenteou durante a graduação e que contribuíram muito durante a minha jornada, fosse
numa contribuição acadêmica, fosse numa amizade verdadeira, que são: Isabel Palmeira,
Daniela Maria, Walleska Vanderley e Denis Almeida. A vocês, meu muito obrigada!
Aos meus professores, que me inspiraram com toda dedicação, profissionalismo e
amor pela psicologia. Aos meus pacientes, pois os aprendizados que obtive na prática,
valeram tanto quanto todas as teorias estudadas da sala de aula.
A minha orientadora Nielky Nóbrega, e a minha dupla Juliana Carvalho pela
paciência, disponibilidade, conhecimento compartilhado, incentivo, críticas e sugestões
importantes e essenciais, para a construção e concretização deste trabalho.
AGRADECIMENTOS – JULIANA CARVALHO

Agradeço primeiramente a DEUS, Pai todo poderoso, por sempre estar presente em
todos os momentos da minha vida, me iluminando e me proporcionando fé, saúde, sabedoria,
esperança, força e coragem para encarar e superar todas as dificuldades e chegar ao fim desta
jornada.
A minha mãe Luciene e ao meu pai Luiz Gonzaga, pelo amor, incentivo, educação е
apoio incondicional durante essa jornada, pois sem eles nada disso seria possível. A minha
irmã Luciana por sua companhia diária, pela força, ajuda e incentivo que sempre me deste
para seguir em frente. Minha avó Maria, que sempre me ajudou e me incentivou durante essa
caminhada. Ao meu irmão de coração, Laércio, por sua luz que me estimula a seguir sempre
em frente. Ao meu namorado Isaac, meus tios, minha prima Tais, amigos e colegas de
faculdade que contribuíram positivamente na realização deste sonho.
A minha orientadora Nielky Nóbrega, e a minha dupla Cynthia Cavalcanti pela
disponibilidade, paciência, incentivo, orientações, críticas e sugestões importantes e
essenciais, para a construção e concretização deste trabalho.
Gostaria de agradecer a todos os professores da Unit, que fizeram parte dessa
jornada, repassando conhecimentos e experiências, contribuindo para o meu desenvolvimento
pessoal e profissional. Em especial a minha banca examinadora.
“Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo
nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta a
‘outra coisa’ porque eu mesma não posso.”

(Clarice Lispector)
RESUMO

A presente monografia consiste em uma revisão narrativa de literatura em torno da temática


do Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), com o objetivo de apresentar as
informações do tratamento acerca das interações da terapias cognitivas, apresentando as
crenças e os esquemas desadaptativos presentes nestes pacientes, compreendendo os critérios
diagnósticos, visto que, o TPB é uma grave condição de saúde mental que compreende grande
instabilidade em aspectos de funcionamento do indivíduo, incluindo relacionamentos,
autoimagem, afeto e comportamento. O tratamento é caracterizado como difícil; porém,
através da interação entre as psicoterapias cognitivas, foi possível estabelecer progresso e
sucesso no recurso terapêutico. Neste sentido, a interação se dá a partir do modelo cognitivo
comportamental, que influenciou o desenvolvimento de intervenções mais efetivas, tais como:
a terapia do esquema e a terapia comportamental dialética. Estes tratamentos possibilitaram a
minimização dos problemas apresentados pelo transtorno, assim como a compreensão do
sujeito acerca do seu funcionamento.
Palavras-chave: Transtorno de Personalidade borderline. Terapia Cognitivo
Comportamental. Terapia do Esquema. Terapia Comportamental Dialética. Tratamento.
ABSTRACT
The present monograph consists of a narrative review of the literature on the subject of
Borderline Personality Disorder (BTP), with the objective of presenting the information about
the treatment of interactions of cognitive therapies, presenting the beliefs and maladaptive
schemes present in these patients, Understanding the diagnostic criteria, since BPD is a
serious mental health condition that includes great instability in aspects of the individual's
functioning, including relationships, self-image, affection and behavior. Treatment is
characterized as difficult; However, through the interaction between cognitive
psychotherapies, it was possible to establish progress and success in the therapeutic resource.
In this sense, the interaction takes place from the cognitive behavioral model, which
influenced the development of more effective interventions, such as: schema therapy and
dialectical behavioral therapy. These treatments allowed the minimization of the problems
presented by the disorder, as well as the subject's understanding of its functioning.
Key words: Borderline Personality Disorder. Cognitive behavioral therapy. Scheme Therapy.
Dialectical Behavioral Therapy. Treatment.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11

METODOLOGIA................................................................................................................... 14

1. QUE É PERSONALIDADE ........................................................................................... 15

1.1. Transtorno de Personalidade .................................................................................. 17

2. TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE ........................................ 22

3. ESQUEMAS INICIAIS DESADAPTATIVOS NO TRANSTORNO DE


PERSONALIDADE BORDERLINE.................................................................................... 30

4. INTERAÇÕES EM TERAPIAS COGNITIVAS NO TRATAMENTO DE


TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE: TERAPIA COGNITIVA
COMPORTAMENTAL, TERAPIA DO ESQUEMA E TERAPIA
COMPORTAMENTAL DIALÉTICA. ................................................................................ 46

4.1. Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) .......................................................... 48

4.2. Terapia do Esquema (TE) ....................................................................................... 52

4.3. Terapia Comportamental Dialética (TCD) ........................................................... 61

CONCLUSÃO......................................................................................................................... 66

REFERÊNCIAS
11

INTRODUÇÃO

O transtorno de personalidade borderline (TPB) é uma grave condição de saúde


mental que compreende um padrão característico de instabilidade nas relações interpessoais,
na autoimagem, no afeto, assim como apresenta uma impulsividade acentuada. Segundo o
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, em sua 5º edição e mais recente,
este transtorno classifica-se diante de nove critérios diagnósticos, como serão descritos no
capítulo 2. No entanto, para diagnosticar o indivíduo com TPB é suficiente apresentar cinco
destes critérios. Dentre os transtornos de personalidade conhecidos, o TPB apresenta-se dentre
os mais graves e problemáticos (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
De forma geral, a instabilidade que estes indivíduos apresentam comumente
desestabilizam a vida familiar, social, profissional e a própria identidade do sujeito. Eles
sofrem e causam sofrimento e, por diversas vezes, de forma bem dolorosa e dramática.
A origem deste transtorno advém de alguns fatores, como: genético,
desenvolvimento neurobiológico e experiências traumáticas na infância. As experiências
vividas durante a infância são fundamentais para um adequado desenvolvimento do indivíduo,
onde as mesmas podem ser definidoras para o surgimento da patologia. Estas experiências são
responsáveis pelo desenvolvimento de esquemas iniciais desadaptativos (EIDs) e, estes, estão
presentes quase que em sua totalidade nos pacientes borderlines.
Foi Beck introduziu o conceito de esquemas na psicologia cognitiva, em termos
gerais, esquema é uma estrutura. Segundo ele, refere-se “a qualquer princípio organizativo
amplo que um indivíduo use para entender a própria experiência de vida” (YOUNG;
KLOSKO; WEICHAAR, 2008, p. 22). Jeffrey Young ampliou o modelo original de Beck
com a finalidade que eles funcionassem com os transtornos de personalidade, pois após
estudos realizados na época, ficou evidenciado que a terapia cognitiva de Beck era limitada
para o tratamento de pacientes difíceis e refratários, com transtornos da personalidade ou
outros mais severos, expandindo a ênfase dos esquemas anteriores. Para atender a estes
pacientes, Young forneceu novos conceitos e posturas terapêuticas para uma maior eficiência
com essa população de indivíduos. Neste contexto, esquemas são estruturas cognitivas que
organizam a experiência e o comportamento e referem-se às necessidades básicas do
indivíduo, sendo mantidos e desenvolvidos por relacionamento interpessoal. Young, Klosko e
12

Weichaar (2008), afirmam que os esquemas sãos construídos principalmente nas fases iniciais
da vida, podendo ser adaptativo ou desadaptativo, podem também ser formados em momentos
posteriores da vida.
Os esquemas constituídos em decorrência de eventos traumáticos durante a infância
podem estar no centro dos transtornos de personalidade. De acordo com Halperin e Carneiro
(2016, p. 41), “Os EIDs são padrões emocionais, cognitivos e emocionais relacionados à
representação de si e dos outros que se desenvolvem cedo na vida e se repete ao longo dela,
causando sofrimento e prejuízo em diversos contextos”. Os EIDs são destrutivos e, na maioria
das vezes, são causados por experiências nocivas e repetitivas durante a infância e
adolescência.
Young Klosko e Weichaar (2008, p. 28-31) apontam os 18 esquemas desadaptativos,
detalhados no capítulo 3. Apresentando em sua maioria os 18 esquemas, os pacientes com
TPB se mostravam pouco aderentes ao tratamento, dada a complexidade e a quantidade de
esquemas que apresentavam.
A complexidade de se trabalhar com TPB através da terapia de esquema apontou
para um desafio, dado que, como mencionado, estes pacientes apresentarem a maioria dos
esquemas e, além disso, a facilidade de permear de um esquema para o outro. Este desafio
motivou o presente trabalho, haja vista que visualizou-se a necessidade de se desenvolver uma
nova forma de compreender e trabalhar com estes pacientes, onde se pudesse abranger os
limites dessa permeabilidade, ou seja, trabalhando os esquemas de maneira conjunta.
Tomando essa complexidade como fundamento, Young desenvolveu os modos de esquemas.
Conceituando modos de esquemas, Young, Klosko e Weichaar (2008, p. 239) afirmaram que
“um modo é o conjunto de esquemas ou operações de esquemas – adaptativos ou
desadaptativos – que estão ativados no indivíduo em um dado momento”. Dentre os 10 modos
de esquemas postulados por Young, o paciente com TPB apresenta principalmente cinco
deles. Estes estão descritos no capítulo 3.
Pacientes com TPB são considerados desafiadores e difíceis de tratar, evidenciando,
inclusive, grande taxa de suicídio e parassuicídio1. No entanto, não há medicamento eficaz
contra o transtorno, mas existem auxílios farmacológicos, como os antidepressivos,
anticonvulsivante e antipsicoticos, que possibilitam o alívio de sintomas como a

1
Tentativas de suicídio reais e ferimentos contra si mesmo, incluindo comportamento automutilante
intencional com pouca ou sem intenção de causar morte.
13

impulsividade, agressividade e irritabilidade. Porém, nos últimos tempos, o tratamento com


tais pacientes vem adquirindo sucesso devido às modernas versões da terapia cognitivo
comportamental, desenvolvidas especialmente para atender aos problemas apresentados pelo
TPB.
A psicoterapia que inicialmente mostrou sucesso neste processo foi a Terapia
Cognitivo Comportamental (TCC), formulada por Beck, em 1960; que foi desenvolvida para
trabalhar a depressão, e contribuiu de forma relevante para a compreensão e o tratamento dos
transtornos psiquiátricos, como o TPB. Posteriormente, ao ampliar o modelo proposto por
Beck, Youg desenvolveu a Terapia do Esquema (TE) especialmente para tratar transtornos
caracterológicos crônicos. Em virtude disso, a TE contribuiu significativamente no tratamento
do TPB, ao valorizar a investigação das origens infantis, como as experiências traumáticas e
negativas que originam os problemas psicológicos. Por outro lado, a Terapia Comportamental
Dialética (TCD) proposta por Marsha (1990), torna-se relevante no tratamento ao ser
desenvolvida com a finalidade de tratar pacientes borderlines, e comportamentos suicidas e
parassuicidas.
Objetivou-se com esta pesquisa, agregar dados com o propósito de expor as
informações sobre o tratamento acerca das interações das terapias cognitivas, explorando e
identificando as contribuições que as terapias cognitivas de segunda e terceira onda podem
oferecer para o tratamento de pessoas com TPB, como também investigar as crenças e os
esquemas desadaptativos presentes nestes pacientes, compreender o TPB, critérios
diagnósticos, os possíveis tratamentos, além das implicações na vida do paciente.
O trabalho está estruturado em quatro capítulos. No primeiro, apresenta-se o conceito
de personalidade. No segundo capítulo, é abordado o TPB, apresentando conceitos, definições
e critérios diagnósticos. O terceiro evidencia os esquemas presentes no TBP, assim como
domínios esquemáticos, os modos de esquema e, apresentando também a teoria do apego. No
quarto capítulo, descreve-se sobre as terapias cognitivas, focando na sua forma de tratamento
para com o paciente TBP, bem como nas suas interações.
14

METODOLOGIA

O presente estudo foi desenvolvido por meio de revisão de literatura com intuito de
descrever a interação das terapias cognitivo-comportamental diante do Transtorno de
Personalidade Borderline (TPB).

De acordo com Botelho, Cunha e Macedo (2011), a revisão narrativa é usada com o
intuito de apresentar o estado da arte de um assunto específico, sob o ponto de vista teórico ou
contextual. Compõe-se, basicamente, da apreciação da literatura, da interpretação e exame
crítico pessoal do pesquisador. Desta forma, a revisão narrativa não utiliza critérios precisos e
sistemáticos para a busca e análise crítica da literatura. Não se faz necessário o esgotamento
das fontes de informações na busca pelos estudos. Não aplica estratégias de busca sofisticadas
e exaustivas. A seleção dos estudos e a interpretação das informações podem estar sujeitas à
subjetividade dos autores.

Para realização deste estudo, utilizaram-se seis passos distintos: identificação do


tema e questão de pesquisa para execução da revisão; determinação de critérios para inclusão
e exclusão dos artigos; delimitação das informações necessárias; avaliação dos textos na
íntegra; e interpretação dos resultados e; conclusão. Desse modo, foram listados os seguintes
critérios de inclusão para orientar a buscas pelos artigos: trabalhos que tratavam diretamente
do TPB os tipos de tratamentos das terapias cognitivas, estudos na íntegra disponíveis online,
artigos publicados em periódicos de língua portuguesa.
15

1. O QUE É PERSONALIDADE

A palavra “personalidade” tem origem latim, persona que se refere à máscara teatral
usada pelos atores romanos nos dramas para projetar um papel ou uma falsa aparência através
da máscara. Esta é uma visão superficial da personalidade, pois personalidade vai além do
papel que as pessoas desempenham (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015).
Existem várias definições possíveis para o termo personalidade e isto está vinculado
ao que cada teoria enfatiza, ou seja, qual o aspecto que o teórico considera que são os mais
relevantes para compreender a personalidade dos indivíduos. Assim sendo, não há uma
definição única, já que cada teoria evidencia um conceito de personalidade de acordo com a
ênfase adotada em seus próprios pressupostos fundamentais.
Diferentes linhas teóricas apresentam diversas definições sobre o tema, apresentando
argumentos que vão desde a biologia da espécie a fatores inconscientes. Pervin e John (2004)
propõem uma definição centralizadora. Para eles, a personalidade representa as características
da pessoa que explicam padrões consistentes de sentimentos, pensamentos e comportamentos.
De particular interesse, é a maneira como esses pensamentos, sentimentos e comportamentos
relacionam - se entre si para formar o indivíduo único e peculiar.
Provavelmente, o primeiro teórico da psicologia a enfatizar os aspectos dos
desenvolvimentos da personalidade foi o psicanalista Freud (1856-1939). Ele considerava que
a personalidade já́ estava formada ao final do quinto ano de vida, desenvolvendo-se em
resposta aos processos de crescimento fisiológico, frustrações, conflitos e (FEIST; FEIST;
ROBERTS, 2015).
Antes de Freud, não existia interesse pelas teorias da personalidade. As doenças
mentais eram consideradas como possessão alienígena ou demoníaca de indivíduos que, em
outros aspectos, eram considerados racionais e lógicos. Uma das maiores contribuições de
Freud foi evidenciar que os eventos mentais são conduzidos por regras e estrutura de causa e
efeito. Freud iniciou seus estudos pela utilização da técnica da hipnose como forma de acesso
aos conteúdos mentais no tratamento de pacientes com histeria. Em seus estudos, ele observou
os pensamentos e comportamentos irracionais e inconscientes de seus pacientes percebendo
que esses se ajustavam em certos padrões. Além disso, o autor reconheceu que a maioria dos
16

padrões de comportamento observada em pacientes neuróticos e psicóticos parecia ser


variante dos padrões mentais observados em pessoas normais (FADMAN; FRAGER, 2004).
Teóricos neofreudianos como Jung (1875-1961) e Adler (1870-1937),
desenvolveram suas ideias a partir das ideias de Freud. Na teoria de Jung, o inconsciente do
indivíduo inclui memórias pessoais, como também materiais do inconsciente coletivo de toda
a humanidade. Adler convergiu sua atenção no ego como um mecanismo de adaptação ao
ambiente interno e externo (FADMAN; FRAGER, 2004).
A visão da personalidade para a teoria cognitiva pode ser considerada avançada, por
expor variados aspectos além do comportamento, como os pensamentos e as emoções. De
acordo com Beck, Freeman e Davis (2005) temos que levar em consideração o papel da
história evolutiva na formação dos padrões de pensamento, sentimento e ação. Pode-se
compreender melhor as estruturas, funções e os processos da personalidade se examinar as
atitudes, os sentimentos e os comportamentos (BECK; FREEMAN; DAVIS, 2005).
O conceito de personalidade adotado por Beck, sugerida por Ross, em seu livro: “O
poder integrador da terapia cognitiva”, caracteriza os padrões específicos dos processos de
pensamento, reações emocionais e necessidades motivacionais, onde, para a perspectiva
cognitiva a definição de personalidade está agregada aos processos esquemáticos que
direcionam o funcionamento psicológico como um todo.

[...] um constructo composto que representa a soma total das ações, dos processos de
pensamento, das reações emocionais, e das necessidades motivacionais da pessoa,
através dos quais ela, como organismo biológico geneticamente programado,
interage com seu ambiente, influenciando-o e sendo influenciada por ele [...]
(BECK; ALFORD, 2000, p. 34).

As estratégias comportamentais predominantes em um indivíduo, seriam condizentes


com os padrões cognitivos e afetivos que, por sua vez, estão intimamente relacionadas às
crenças que produzem o comportamento, pu seja, a personalidade (BECK; FREEMAN;
DAVIS, 2005).
De maneira geral, personalidade se refere ao modo constante e peculiar de perceber,
pensar, sentir e agir do indivíduo. A definição tende a ser ampla e incluir habilidades, atitudes,
crenças, emoções, desejos, como também o comportamento de cada individuo. (FEIST;
FEIST; ROBERTS, 2015).).
17

O Manual Diagnóstico e Estático dos Transtornos Mentais (DSM-5), reitera e


complementa as demais definições ao mencionar que, os traços de personalidade são padrões
persistentes de percepção, relacionamento e pensamento sobre si e o ambiente, que são
expostos em uma gama de contextos sociais e pessoais. Os traços estabelecem transtorno da
personalidade somente quando são inflexíveis e mal-adaptativos, ocasionando prejuízo
funcional e sofrimentos significativos (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
2014).
Pode-se dizer que personalidade é um padrão de características físicas, fisiológicas,
psíquicas, morais, afetivas, cognitivas e únicas de cada individuo, que se interligam,
determinando seu modo de ser no ambiente em que está inserido. Assim, a personalidade é
caracterizada como transtorno, denominado como transtorno da personalidade quando esses
traços e padrões apresentam desajustes em seu desenvolvimento; que refletem em traços
irregulares duradouros e persistentes de alteração no funcionamento psíquico (LOUZÃ;
LOUZÃ NETO 2007).

1.1. Transtorno de Personalidade

Tipos de transtorno da personalidade têm sido relatados há milhões de anos,


conforme evidenciado pela descrição da teoria humoral de Hipócrates, entre o Século IV a.C.
e o Século XVII, dos quatro temperamentos: os sanguíneos (alegres expansivo, otimista,
irritável e impulsivo em consequência de excesso de sangue); os melancólicos (deprimidos,
tristes, nervoso e excitável, tendendo ao pessimismo, ao rancor e à solidão.); coléricos
(irritados, violentos, ambicioso e dominador, tendo propensão a reações abruptas e
explosivas) e os fleumáticos, (foram caracterizados como calmos, passivos, sonhador e dócil,
preso aos hábitos). Os quatros tipos de temperamento, como característica especifica,
evidenciava o equilíbrio adequado entre estes humores, determinando a saúde e o
desequilíbrio causaria a doença (transtorno) (MARI; KIELING, 2013).
De acordo com Skodol e Gunderson (2012), os pacientes com transtornos da
personalidade são clinicamente caracterizados como desafiadores e complexos. Alguns
indivíduos desejam relacionamentos intensos com outras pessoas, porém evitam por medo de
sofrer algum tipo de rejeição. Outros desejam admiração e são absorvidos por fantasias,
18

superpoderes, inteligência ilimitada ou amor ideal. Como também, há os que provêm de


autoconceitos distorcidos, muitas vezes, apresentando comportamento de automutilação e/ou
tentativa de suicídio. Indivíduos com transtorno de personalidade tendem a vivenciar tudo de
forma muito intensa.
Segundo a classificação da CID-10, Transtornos de Personalidade são condições do
desenvolvimento da personalidade que surgem na infância ou adolescência e perpetuam pela
vida adulta. Esta condição constitucional e biológica de desenvolvimento diferencia do
Transtorno da Alteração da Personalidade que ocorre durante a vida em consequência de
algum outro transtorno emocional, dependência química, traumatismo craniano, tumores,
infecções cerebrais. Ainda de acordo com a CID-10 os Transtornos de Personalidades são
perturbações graves da constituição do caráter e das tendências comportamentais, portanto,
não são adquiridas no meio tal como as Alterações da Personalidade.
O transtorno da alteração da personalidade pode ser exemplificado através do caso
do jovem Phineas Gage, que aconteceu nos EUA, em 1848. Onde uma barra de aço de 1
metro de comprimento e 2,5 cm de diâmetro entrou pela bochecha atravessando a parte frontal
do cérebro, saindo pelo topo do crânio. Apesar de sobreviver á lesão, alguns meses depois, o
mesmo apresentou mudanças significativas no humor e, consequentemente em sua
personalidade. O caso de Gage é considerado como uma das primeiras evidências científicas
que indicam que a lesão nos lóbulos frontais pode alterar a personalidade, emoções e a
interação social (DAMASIO et al, 1994).
O transtorno da personalidade, é definido no DSM 5 como um padrão de traços
disfuncionais persistentes da personalidade e comportamento, que se inicia na adolescência ou
no final da fase adulta (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). O aspecto
fundamental de um transtorno da personalidade é um padrão persistente de experiências e
comportamentos que se desvia acentuadamente da cultura do indivíduo e que se manifesta em
pelo menos duas áreas: cognição, afetividade, funcionamento interpessoal ou controle dos
impulsos. Os traços e comportamentos disfuncionais são expostos através de uma ampla
variedade de contextos e situações ou em resposta a determinado estímulo e ou pesso
(BASSITT e LOUZÃ NETO 2007).
O transtorno de personalidade se manifesta em pelo menos duas das seguintes áreas:
cognição, afetividade, funcionamento interpessoal e controle dos impulsos. O padrão é
19

inflexível e abrange ampla faixa de situações pessoais e sociais, provoca sofrimento ou


prejuízo no funcionamento social ou ocupacional do indivíduo (LOUZÃ; LOUZÃ NETO
2007).
Os transtornos da personalidade foram incluídos em todas as versões do Manual
Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM), inicialmente, no DSM I em 1952.
No entanto, alguns, foram acrescidos gradualmente em versões posteriores, enquanto outros
foram sendo suprimidos. (SKODOL; GUNDERSON, 2012).
Atualizações sobre as justificativas teóricas em relação às categorias de transtorno de
personalidade do DSM também mudaram com o transcorrer do tempo. Entretanto, em meados
de 1980, na terceira edição do DSM, os transtornos de personalidade foram estruturados em
eixo separado, confirmando a sua importância (SKODOL; GUNDERSON, 2012).
Na versão mais atualizada do DSM (Tabela 1), o DSM-5, os transtornos de
personalidade são categorizados a partir de grupos, que podem ser entendidos como
dimensões que representam um aspecto de disfunção da personalidade dentro de uma
sequência com outros transtornos mentais, como evidencia a tabela:

Tabela - 1. Transtornos da personalidade listados no DSM 5 (2014)


Descrição

Paranoide – Padrão de desconfiança e de suspeita tamanha, que as


A interpretações dos outros são interpretadas como malévolas.
Esquisitos ou Esquizoide – padrão de distanciamento das relações sociais e uma faixa
excêntricos restrita de expressão emocional.
Esquizotípica – padrão de desconforto agudo nas relações íntima distorções
cognitivas ou perceptivas e excentricidades do comportamento.

B Antissocial – Padrão de desrespeito e violação dos direitos dos outros.


Dramáticos, Borderline – Padrão de instabilidade nas relações interpessoais, na
emotivos ou autoimagem e nos afetos, com impulsividade acentuada.
erráticos Histriônica – Padrão de emocionalidade e busca de atenção em excesso.
Narcisista – Padrão de grandiosidade, necessidade de admiração e falta de
empatia.

C Evitativa – Padrão de inibição social, sentimentos de inadequação e


Ansiosos ou hipersensibilidade a avaliação negativa.
medrosos Dependente – Padrão de comportamento submisso e apegado relacionado a
uma necessidade excessiva de ser cuidado.
Obsessivo-Compulsivo – Padrão de preocupação com ordem, perfeccionismo
e controle.
Fonte: AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION - DSM 5 (Adaptado)
20

Além dos dez transtornos da personalidade listados no DSM 5, existem duas


categorias residuais. Mudança de personalidade devido à outra condição médica, outro
transtorno de personalidade especificado e transtorno de personalidade não especificados.
Essas categorias são destinadas a indivíduos com traços mistos ou atípicos, que não se
ajustam a uma categoria definida.

Os traços da personalidade são caracterizados como padrões de percepção,


relacionamento e pensamento sobre o ambiente e si mesmo que são exibidos em
uma ampla gama de contextos sociais e pessoais. Os traços de personalidade
constituem transtornos da personalidade quando são inflexíveis e mal-adaptativos,
causando prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativo [...] (DSM 5, p.
647).

Os traços da personalidade abarcam um leque menor de comportamentos. Os traços


permitem uma descrição mais precisa da personalidade porque cada traço se refere a um
conjunto mais focalizado de características, sendo frequentemente egossintônicos2 (FEIST;
FEIST; ROBERTS, 2015).
Assim como os traços, indivíduo com transtorno de personalidade apresenta
esquemas não adaptativos3, que ocasiona sofrimento a si e para outras pessoas. De acordo
com Beck, Freeman e Davis (2005), esquemas4 são estruturas cognitivas que organizam a
experiência e o comportamento, referindo às necessidades básicas do indivíduo, sendo
desenvolvidos e mantidos por meio de relacionamento interpessoal.
Pode-se dizer que, os transtornos de personalidade provêm de alguns fatores
envolvidos em sua etiologia, que vai desde a predisposição genética, somada a experiências
emocionais precoces, a fatores ambientais, mais precisamente, situações traumáticas
(ANDREASEN; BLACK, 2008).
De acordo com o DSM 5 (2014), o diagnóstico de transtorno de personalidade exige
uma avaliação precisa dos padrões de funcionamento do indivíduo e as características da
personalidade. Como também, avaliar a estabilidade dos traços de personalidade em várias

2
Falsa adaptação do ego as suas ações e sintomas apresentados, não sendo percebidos pelo sujeito. Esse termo
faz com que haja uma sintonia entre o ego e o sintoma, ou seja, não ocorre a percepção do sujeito que as suas
palavras, e principalmente os seus atos estão afetando o seu relacionamento com o mundo exterior, porque para
ele não parece haver nenhum problema.
3
Esquemas resultam pensamentos e comportamentos disfuncionais
4
Conjunto de crenças e sentimentos que o individuo possui sobre si ou sobre meio envolvente. Têm origem na
infância, construídos através de uma educação desadequada. Seu funcionamento é na maioria das vezes
inconsciente e constitui uma base central para o funcionamento intrapsíquico e comportamental.
21

situações ao longo do tempo. A avaliação pode ser complicada, pois os traços e características
que definem um transtorno pode não ser considerados como algo anormal para o indivíduo. O
diagnostico diferencial é de suma importância, pois o transtorno de personalidade só pode ser
diagnosticado a partir dos 18 anos de idade (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
2014).
22

2. TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE

Em algum momento da vida é comum que as pessoas apresentem tristeza, raiva


incontrolável, impulsividade, desespero, ciúmes, instabilidade de humor, medo de ser
rejeitado, apego afetivo, insatisfação pessoal ou descontrole emocional, gerando diversas
vezes prejuízos para elas mesmas e/ou para as pessoas ao que estão ao seu redor. No entanto,
se essas emoções e comportamentos disfuncionais apresentarem-se frequentemente, de forma
intensa, pode-se estar diante de um quadro complexo, confuso e desorganizado, denominado
transtorno de personalidade borderline (TPB).
Borderline, palavra de origem inglesa, que significa fronteiriço, limítrofe ou linha
que compõe a margem, um limite. “Foi o posicionamento do transtorno de personalidade
borderline, entre os campos da neurose e da psicose (e frequentemente com atuações do tipo
psicopático), que inspirou a designação de “fronteiriço” (SCHERER; HUTZ, 2016, p. 5).
O transtorno de personalidade borderline, ou transtorno de personalidade limítrofe,
como também é conhecido no Brasil, é um dos transtornos de personalidade que ocupa um
lugar de destaque devido a sua complexidade, heterogeneidade e dificuldade de tratamento,
dentre os diversos transtornos conhecidos. De acordo com Ribeiro, Cordás e Nogueira (2011),
sob o ponto de vista clínico, este transtorno é visto como o mais grave ou o mais problemático
dos transtornos de personalidade, acompanhado do antissocial. Linehan (2010) corrobora ao
mencionar que os pacientes borderlines apresentam problemas graves e sofrimento intenso,
sendo difíceis de tratar.
Para Linehan (2010), a primeiro autor a descrever o termo borderline foi o
psicanalista Adolf Stern, em 1938, quando descreveu um grupo de pacientes que não
melhoravam com a psicanálise clássica e apresentavam problemas que pareciam se situar
entre a neurose e a psicose. Este grupo de pacientes foi rotulado por Stern como portadores de
um “grupo borderline de neuroses”. Depois disso, o termo foi usado por muitos anos de
forma coloquial entre psicanalistas para descrever pacientes que, embora tivessem problemas
sérios de funcionamento, não se encaixavam em outras categorias diagnósticas e eram difíceis
de tratar com métodos analíticos convencionais. Os pacientes borderlines eram considerados
por diferentes teóricos como sendo o limite entre a neurose e a psicose; esquizofrenia e não
esquizofrenia e o normal e o anormal (LINEHAN, 2010, p. 18).
23

De acordo com Ribeiro, Cordás e Nogueira (2011), em 1968, antecedendo o Manual


diagnóstico e estatístico (DSM-III), Roy Grinker publicou o livro The Borderline Syndrome,
e definiu critérios para o diagnóstico de pacientes borderline: 1- Falha do senso de identidade;
2- Relacionamentos instáveis; 3- Sintomas de depressão, e não um quadro com todos os
critérios para transtorno depressivo; 4- Raiva inadequada ou intensa.
Gunderson e colaboradores, em 1975, citado por Ribeiro, Cordás e Nogueira (2011),
ao rever a literatura, distinguiram pacientes borderlines de pacientes com diagnóstico de
esquizofrenia.
Em 1978, Gunderson e Kolb utilizando conceitos da época e buscando aumentar a
confiabilidade diagnóstica, criaram a Diagnostic Interview for Borderline Patients (DIB),
uma entrevista específica para investigação diagnóstica de pacientes borderline. Em 1989,
com o intuito de facilitar a diferenciação entre o TPB e os outros transtornos de
personalidade, esta entrevista foi revisada (DIB-Revised) (RIBEIRO; CORDÁS;
NOGUEIRA, 2011, p. 112).
O conceito de TPB foi introduzido no Manual de Diagnóstico e estatístico dos
Transtornos Mentais pela American Psychiatric Association (APA) em 1980, na terceira
edição deste manual DSM-III (VENTURA, RODRIGUES E FIGUEIRA, 2011). De acordo
com Skodol e Gunderson (2012), foi quando o TPB começou a ser amplamente estudado em
decorrência das observações realizadas na época, e foi percebido que os pacientes
apresentavam uma forma atípica de transtorno de humor em vez de uma forma incomum de
esquizofrenia, como tinha sido pensado. “[...] Doze anos depois da inclusão no DSM-III, e
adaptado, o diagnóstico passou a fazer parte da décima edição da Classificação internacional
de doenças (CID-10) [...]” (RIBEIRO, CORDÁS e NOGUEIRA, 2011).
Na CID-10 o TPB pertence à classe dos transtornos específicos da personalidade,
sendo classificado como “transtornos de personalidade com instabilidade emocional” (F60.3).
Nesta classificação, o transtorno caracteriza-se por indivíduos que possuem uma
maneira de agir sem previsibilidade e sem consideração pelas consequências. São pessoas
com uma incapacidade de controlar a sua impulsividade; podendo ser briguentos, possuir
humor imprevisível, tendenciosos a entrar em conflito com as outras pessoas, principalmente
quando os atos impulsivos são censurados ou contrariados.
24

Dois tipos podem ser distintos: o tipo impulsivo caracterizado principalmente por
uma instabilidade emocional e falta de controle dos impulsos; e o tipo “borderline”,
caracterizado, além disto, por perturbações da auto-imagem, do estabelecimento de
projetos e das preferências pessoais, por uma sensação crônica de vacuidade, por
relações interpessoais intensas e instáveis e por uma tendência a adotar um
comportamento autodestrutivo, compreendendo tentativas de suicídio e gestos
suicidas [...] (CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE DOENÇAS, 2003, p. 53).

Beck, Freeman, Davis e Cols (2005), caracterizam o TPB como uma notável
instabilidade em muitos, senão em todos, aspectos do funcionamento da pessoa, incluindo
relacionamentos, auto-imagem, afeto e comportamento.
Linehan (2010), reorganizou os critérios diagnósticos para TPB, com base nos
descritos no DSM-IV e na DIB-R (Diagnostic Interview for Borderline – Revised).
Identificou-se que os indivíduos borderlines, em primeiro lugar, sofrem de desregulação
emocional, onde as respostas emocionais são muito reativas e o indivíduo geralmente vai ter
dificuldades com episódios de depressão, ansiedade e irritabilidade, além de problemas com a
expressão da raiva; em segundo lugar, apresentam desregulação interpessoal, os
relacionamentos que estes indivíduos se envolvem podem ser caóticos, intensos e marcados
por dificuldades. Apesar dos relacionamentos serem problemáticos, estes indivíduos
consideram extremamente difícil abrir mão deles; em terceiro lugar, a desregulação
comportamental, onde o indivíduo borderline apresenta comportamentos impulsivos extremos
e problemáticos e comportamentos suicidas e parassuicidas, são comuns nesta população
tentativas de se ferir, mutilar ou matar; em quarto lugar, uma desregulação cognitiva, com
formas breves e não psicóticas de desregulação do pensamento, incluindo despersonalização,
dissociação e delírios, muitas vezes, causados por situações estressantes, que geralmente
passa quando o estresse diminui; e em quinto lugar, a disfunção do self5, onde indivíduo com
TPB vai apresentar uma autoimagem e self instável, relatando frequentemente um vazio
crônico, baixa autoestima.
Desde a publicação do DSM IV, os transtornos de personalidade estão divididos em
três agrupamentos, com base em similaridades descritivas. O TPB pertence ao grupo B, junto
aos transtornos de personalidade antissocial, histriônica e narcisista. Indivíduos pertencentes a

5
Self – Eu. O “eu” é constituído por aspectos consciente e inconsciente de uma pessoa, sua personalidade,
cognições, pensamentos e sentimentos. Todas essas características ou aspectos se combinam na identidade
central da pessoa.
25

este grupo são emocionalmente exagerados, dramáticos, causando a impressão de não serem
verdadeiros (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 646).
O TPB é caracterizado no DSM-5 (2014) por um padrão difuso de instabilidade das
relações interpessoais, da autoimagem e de afetos e de impulsividade acentuada que surge no
começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com essa desordem
costumam apresentar comportamentos agressivos e impulsivos, além de atitudes
autodestrutivas, incluindo tentativas de suicídio, “[...] cerca de 10% morrem por suicídio [...]”
(BECK; FREEMAN; DAVIS; COLS, 2005, p. 167).
Frequentemente, estas tentativas de suicídio constituem-se em uma maneira de
chamar a atenção para o sofrimento emocional que vivenciam; não chegando a se constituir
risco real para que cheguem a óbito. Porém, toda tentativa de suicídio requer atenção
cautelosa e cuidados intensivos. No caso desses pacientes, essa atenção deve ser ampliada
devido ao risco potencial de automutilações, também denominados como comportamentos
parasuicidas e, evidentemente, à possibilidade de ocorrer efetivamente o suicídio (LINEHAN,
2010). Os prejuízos relacionados a este transtorno e o risco de suicídio são maiores nos
adultos jovens do que em outras faixas etárias, costumando desaparecer com o avançar da
idade (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 665).
O DSM-5 aponta nove critérios diagnósticos para o TPB, sendo suficiente que o
indivíduo apresente no mínimo cinco deles para a sua identificação (Tabela 2).

Tabela - 2. Critérios diagnósticos para Transtorno de Personalidade Borderline

Critérios Diagnósticos
1. Esforços desesperados para evitar abandono real ou imaginário.
2. Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos caracterizado pela
alternância entre extremos de idealização e desvalorização.

3. Perturbação de identidade: instabilidade acentuada e persistente da autoimagem ou da


percepção de si mesmo.
4. Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente autodestrutivas (ex., gastos,
sexo, abuso de substância, direção irresponsável, compulsão alimentar).
5. Recorrência de comportamentos, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento auto-
mutilante.
26

6. Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor (ex., disforia episódica,
irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas
raramente de mais de alguns dias).
7. Sentimentos crônicos de vazio.

8. Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controla-la (ex., mostras frequentes de


irritação, raiva constante, brigas físicas recorrentes).
9. Ideação paranóide transitória associada a estresse ou sintomas dissociativos intensos.
Fonte: American Psychiatric Association (adaptado)

Indivíduos com TPB realizam grandes esforços no sentido de evitar o abando real ou
imaginado (critério 1). Esses indivíduos vivenciam medos intensos de abandono e
experimentam raiva inadequada mesmo diante de uma separação de curto prazo realística ou
quando ocorrem mudanças inevitáveis de planos. Tais medos de abandono têm relação com
intolerância de ficar só e necessidade de ter outras pessoas ao seu redor. “[...] quando ocorre
uma separação iminente, evoca nesses indivíduos acentuado medo de abandono, no intuito de
diminuir esses medos e prevenir a separação, são reveladas acusações enfurecidas de maus-
tratos e crueldade e comportamentos autodestrutivos, gerando nos demais uma resposta
culposa, temerosa ou protetora [...]” (SKODOL; GUNDERSON, 2012, p. 875). Os esforços
desesperados para evitar o abandono podem incluir ações impulsivas como automutilação ou
comportamentos suicidas.
Apresentam padrões de relacionamento instáveis e intensos (critério 2). Eles
idealizam cuidadores ou companheiros potenciais em um primeiro ou segundo encontro,
mudam rapidamente de idealização a desvalorização, com sentimento que o outro não se
importa ou não está presente o suficiente (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
2014).
Pode ocorrer distúrbio da identidade caracterizado pelo sentimento de self acentuado
e persistentemente instável (critério 3), há alterações súbitas e dramáticas da autoimagem,
mudança repentina em opiniões, identidade sexual, valores e tipo de amigos (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
Segundo o DSM - 5 (2014), estes indivíduos mostram impulsividade em pelo menos
duas áreas potencialmente prejudiciais para si próprio (critério 4), como, por exemplo: gastos
financeiros, sexo desprotegido, abuso de substâncias, direção imprudente, comer
compulsivamente.
27

Reincidência de comportamentos, gestos ou ameaças suicidas, ou comportamento


automutilante (critério 5). “Suicídio ocorre em 8 a 10% de tais indivíduos, atos de
automutilação, como por exemplo: cortes ou queimaduras, e ameaças e tentativas de suicídio
são muito comuns” (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 664).
De acordo com o DSM – 5 (2014), os indivíduos com TPB podem demonstrar
instabilidade afetiva, devido a uma acentuada reatividade do humor (critério 6), como por
exemplo irritabilidade ou ansiedade intensa; este comportamento pode durar poucas horas ou
alguns dias, sendo raro isto acontecer.
Estes indivíduos podem ser perturbados por sentimento crônico de vazio (critério 7),
devido a sua facilidade em se entediar, estão frequentemente buscando fazer algo
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
Apresentam frequentemente raiva intensa e inadequada, ou dificuldade em controlá-
la (critério 8). A experiência e expressão de raiva podem ser particularmente difíceis para o
paciente borderline. Podem demonstrar explosões verbais ou amargura persistente, a raiva
geralmente é provocada quando o cuidador ou companheiro é visto como negligente ou como
alguém que abandona (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
Durante períodos de estresse podem ocorrer ideação paranoide ou sintomas
dissociativos transitórios (critério 9) (p. ex. despersonalização), podem desenvolver
alucinações e ideias de referência. Esses episódios podem ocorrer frequentemente em resposta
a um abandono real ou imaginado, Estes sintomas são passageiros, com duração de minutos a
horas.
A instabilidade presente nestes indivíduos frequentemente desorganiza a vida
familiar, profissional e o próprio senso de identidade do sujeito. “Os pacientes com TPB são
uma carga para os parentes, amigos e colegas, e o risco de que induzam psicopatologia na
prole é grande” (BECK; FREEMAN; DAVIS; COLS, 2005, p. 168). Muitas das pessoas com
TPB possuem evidentes talentos e inteligência, porém os problemas decorrentes do transtorno
as impedem de se desenvolverem. Há, ainda, os que encontram dificuldades para concluir os
estudos, que não trabalham ou tem empregos inferiores a sua capacidade (BECK;
FREEMAN; DAVIS; COLS, 2005).
O TPB acomete 1,6% da população geral, podendo chegar a 5,9% (5ª edição,
American Psychiatric Association, 2014). Alguns estudos apontam que este transtorno é mais
28

comumente identificado em mulheres do que em homens, no entanto, “[…] essa diferença


pode ser resultado de tendência de amostragem (i.e. mais mulheres procuram tratamento), por
que nenhuma distinção de gênero na prevalência foi encontrada […]” (SKODOL;
GUNDERSON, 2012, p. 875), até então.
Segundo Linehan (2010), estima-se que 11% de todos os pacientes psiquiátricos
ambulatoriais e 19% dos pacientes psiquiátricos internados preencham critérios para o TPB.
Entre pacientes com alguma forma de transtorno da personalidade, 33% dos pacientes
ambulatoriais e 63% dos internados parecem preencher critérios para TPB. Entretanto apesar
dos avanços nos tratamentos para estes pacientes, os comportamentos suicidas, parassuicidas
e o abuso de substâncias continuam sendo difíceis de tratar.
São diversos os fatores apontados para a origem deste transtorno. Pesquisas mostram
que além do forte componente genético, o desenvolvimento neurobiológico e experiências
traumáticas na infância, como: abandono, abuso físico e sexual precoce, negligência, dentre
outras, contribuem para o desencadeamento de tal patologia (SKODOL; GUNDERSON,
2012, p. 876). Pastore e Lisboa (2014), afirmaram que alguns estudos identificaram que 81%
dos indivíduos diagnosticados com TPB sofreram abuso físico e sexual na infância. Os
autores apontam as perdas na infância como um componente importante na determinação do
TPB, sendo que de 20% a 40% dos pacientes com o diagnóstico experimentaram separação
traumática de pelo menos um dos pais.
De acordo com Ribeiro, Cordás e Nogueira (2011), alguns estudos de imagem
cerebral de pacientes com TPB sugerem alterações tanto na estrutura quanto na função
cerebral, como volume reduzido da amígdala e do hipocampo, alteração na ativação da
amígdala, hipometabolismo hipocampal e alterações de lobo frontal.
De acordo com os dados apresentados fica evidente a grande incidência de pacientes
com este transtorno. O indivíduo com TPB convive com emoções intensas, impulsividade e
intensidade nos relacionamentos e, ainda, é provável que perdure a vida toda. No entanto,
pode-se dizer que os que se envolvem em diversos tipos de terapia costumam apresentar
melhoras. Por estas razões se faz necessário mais estudos acerca do tema, bem como suas
características, o seu diagnóstico, que, de acordo com Melo (2014), é bastante complexo, ao
colocar que “O TPB é um diagnóstico bastante complexo, no qual frequentemente são
29

encontrados diagnósticos adicionais. As comorbidades podem tornar a avaliação e o


tratamento consideravelmente mais complexos”, e os tratamentos existentes.
Em geral, o tratamento de pacientes borderline inclui intervenções cognitivo-
comportamentais e farmacológicas. Dentre as intervenções cognitivo-comportamentais,
podemos citar a Terapia cognitiva Comportamental de Aaron Beck, o modelo de Modo de
Esquemas de Young e a Terapia Comportamental Dialética de Linehan Marsha, onde serão
abordadas no capítulo quatro.
30

3. ESQUEMAS INICIAIS DESADAPTATIVOS NO TRANSTORNO DE


PERSONALIDADE BORDERLINE

O termo esquema é conhecido e utilizado há muito tempo e empregado em diversos


campos de estudo, como: na teoria dos conjuntos, na lógica, na educação, na geometria
algébrica, na análise literária e na programação de computadores. Nos primórdios da filosofia
grega, os lógicos estóicos, especialmente Crisipo (cerca de 279 a 206 a.C.), apresentaram, por
exemplo, princípios da lógica na forma de um “esquema de inferência” (NUSSBAUM, 1994
apud YOUNG, KLOSKO; WEICHAAR, 2008).
Na psicologia, de acordo com Young, Klosko e Weichaar (2008), a história dos
esquemas é muito rica, mais amplamente na área do desenvolvimento cognitivo. Neste
campo, um esquema é um padrão imposto à realidade ou à experiência para ajudar os
indivíduos a explicá-la, para mediar a percepção e guiar suas respostas. Em psicologia
cognitiva, pode-se também pensar um esquema como sendo um plano cognitivo abstrato que
serve de guia para interpretar informações e solucionar problemas. Ainda na terapia cognitiva
(TC), Aaron Beck, em seus primeiros trabalhos, referiu-se a esquemas, mas, no contexto da
psicologia e da psicoterapia, definiu em termos gerais, que qualquer princípio organizativo
amplo que um indivíduo use para entender a própria experiência de vida pode ser considerado
um esquema.
Young, Klosko e Weichaar (2008) afirmam que um conceito importante, com
relevância para a psicoterapia, é a noção de que os esquemas, constituídos principalmente em
etapas iniciais da vida tornam-se mais complexos e, depois, superpostos a experiências
posteriores, mesmo quando não são mais aplicáveis. Um esquema pode ser positivo ou
negativo, adaptativo ou desadaptativo, e podem ser formados na infância ou em momentos
posteriores da vida. O mesmo ainda coloca que alguns autores afirmam que para cada
esquema desadaptativo remoto, há um esquema adaptativo correspondente.
Ventura, Rodrigues e Fiqueira (2011) conceituam esquemas como estruturas
cognitivas que organizam a experiência e o comportamento e referem-se às necessidades
básicas do indivíduo, sendo desenvolvidos e mantidos por meio de relacionamento
interpessoal. Afirmam, ainda, que os pacientes com transtorno de personalidade apresentam
31

esquemas desadaptativos, que trazem sofrimento para ele mesmo e para as pessoas que estão
ao seu redor.
Diversos esquemas surgem na fase pré-verbal da criança, quando apenas memórias,
emoções e sensações corporais são arquivadas. Mais tarde, quando a criança começa a falar, é
que surgem as cognições e o desenvolvimento do pensamento (YOUNG et al, 2008 apud
WAINER, 2016 ).
Os esquemas são mantidos pelos processos de distorção cognitiva6, descritos por
Beck, e pelo comportamento de evitar o contato com os esquemas, pois o seu
desencadeamento é muito ansiogênico. Observa-se que indivíduos adotam comportamentos
contrários ao que se esperaria a partir de seus esquemas. Um exemplo desta observação é
visto nos indivíduos com necessidade de atenção e que procuram afastar-se das pessoas, pois
acreditam que ninguém conseguirá atender as suas necessidades (VENTURA; RODRIGUES;
FIGUEIRA, 2011, p. 552).
Young, Klosko e Weichaar (2008) formularam a hipótese de que alguns esquemas,
sobretudo os que se desenvolvem como resultado de experiências de infância danosas, podem
estar no centro de transtornos de personalidade, dos problemas caracterológicos mais leves e
de muitos transtornos do Eixo I7. Em decorrência desta ideia, foi proposto por eles um
subconjunto de esquemas, chamado de esquemas desadaptativos remotos (EDRs) ou
esquemas iniciais desadaptativos (EIDs). Neste trabalho, será utilizado o termo esquemas
iniciais desadaptativos (EID) ou somente esquema, como faz Young em seus textos.
Para Young, Klosko e Weichaar (2008), os EIDs são temas ou padrões psicológicos
amplos, difusos e fundamentais, formados por memórias, emoções e sensações corporais,
relacionados à percepção de si mesmo e dos outros. São denominados desadaptativos remotos
por terem início precoce na vida da criança, por se repetirem ao longo do tempo e por se
configurarem como padrões autoderrotistas de perceber e interpretar as experiências de vida.
Além disso, vão se tornando rígidos e inflexíveis (lutam por sua sobrevivência) de forma que
toda tentativa de mudar o esquema será vista como ameaçadora.

6
Distorções cognitivas são erros sistemáticos na percepção e no processamento de informações. As distorções
decorrem de regras e pressupostos, que são padrões estáveis adquiridos ao longo da vida do indivíduo.
7
O Eixo I fazia parte do modelo categórico (sistema multiaxial) introduzido desde a terceira edição do Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, atualmente no DSM 5, este modelo foi substituído pelo
modelo dimensional, extinguindo os eixos categóricos.
32

Wainer (2016) acrescenta que os EIDs são conjuntos de crenças nucleares referentes
a temas centrais do desenvolvimento emocional. Eles estabelecem padrões comportamentais,
cognitivos e emocionais para lidar com tais temas quando estiverem em pauta na vida do
indivíduo. Influenciam usualmente toda a vida do sujeito, trazendo sofrimento e/ou prejuízo
em diversos contextos.
Melo (2014) contribui colocando que os EIDs são desenvolvidos desde o início da
infância, a partir de uma combinação de fatores, tais como o temperamento inato da criança e
as práticas educacionais nocivas, principalmente dos pais e cuidadores, que falham em
atender às necessidades emocionais essenciais, como necessidade de vínculos seguros com
outros indivíduos; autonomia, competência e sentido de identidade; liberdade de expressão,
emoções e necessidades válidas; espontaneidade e lazer; limites realistas e autocontrole. Esses
EIDs desenvolvidos mais cedo e através de experiências inadequadas na família nuclear, sãos
os que tendem a se ativar com mais força causando assim mais prejuízos na vida do indivíduo
(YOUNG; KLOSKO; WEISHAAR 2008).
Ao formular em sua teoria sobre as necessidades emocionais de um indivíduo,
Young sofreu forte influencia advinda da Teoria do Apego, esta foi vista como uma
importante abordagem na construção da terapia do esquema, especialmente no
desenvolvimento de esquema de abandono8. Para Young, Klosko e Weichaar (2008), a teoria
do apego foi desenvolvida por John Bowlby e Ainsworth e formulada a partir dos modelos da
etologia, dos sistemas e da psicanálise.
Segundo Wainer (2016), Bowlby, entendeu que bebês precisam estabelecer um
relacionamento com seu cuidador para que, assim, possam se desenvolver. Essa vontade de
proximidade apresentada pela criança é chamada de apego e, inicialmente, exprime as
necessidades de segurança e proteção do recém-nascido. “Essas duas irão constituir os pilares
da saúde mental do infante, pois a forma como os pais desenvolvem esse vínculo inicial está
diretamente associada aos padrões de apego que a criança irá desenvolver” (RAMIRES;
SCHNEIDER, 2010 apud HALPERIN; CARNEIRO, 2016, p. 39).
Desta forma, tanto Bowlby quanto Young consideram que a relação com a família na
primeira infância tem um fator essencial para o desenvolvimento da personalidade.

8
Young apresentou 18 esquemas, dentre eles está o esquema de abandono/ instabilidade, os quais serão
abordados logo adiante.
33

Uma das contribuições mais importantes da teoria do apego para a terapia do


esquema9 foi a conceituação de representações cognitivas, que são maneiras de representar
internamente um modelo do mundo real. Para Wainer (2016), foi proposto por Bowlby, em
1979, que a forma como cada indivíduo irá se engajar nas relações interpessoais resulta das
representações cognitivas que ele tem de si e do outro, bem como da interação entre tais
representações – que aparecem a partir das vivências com a figura de apego e do tipo de
apego10 desenvolvido. “Essas estruturas cognitivas irão encaminhar a representação que a
criança terá de si mesma, dos outros e do mundo e, portanto, nortearão e darão forma a suas
experiências e emoções ao longo da vida” (EDWARDS; ARNTZ, 2012 apud HALPERIN;
CARNEIRO, 2016, p. 42). Quando o meio oferece boas condições sociais, desenvolvem-se
representações cognitivas saudáveis e adaptativas, principalmente no que se refere à qualidade
da relação afetiva com o cuidador. Acontece o mesmo com os esquemas, podendo se tornar
desadaptativos e disfuncionais se a relação com os cuidadores for permeada por descuido,
frieza, instabilidade e hostilidade (WAINER, 2016).
Young et al (2008) apud Wainer (2016) coloca que essas representações
cognitivas e o modelo de funcionamento interno, aproximam-se do conceito de esquema
cognitivo, de Aaron Beck, que serviu de base para a elaboração dos construtos da teoria dos
esquemas, de Jeffrey Young. Desta forma, tanto o apego, como os esquemas começam a se
formar através da relação com o cuidador ainda na primeira infância e irão conduzir como o
sujeito irá se relacionar no decorrer da sua vida.
Muitos estudos foram realizados ao redor do mundo entre as décadas de 1980 e 1990
sobre a relação existente entre apego inseguro e transtorno de personalidade [...]
(EDWARDS; ARNTZ, 2012 apud WAINER, 2016). Esses trabalhos se concentraram
especialmente no transtorno de personalidade borderline (TPB), que tem como principais
características a instabilidade nos relacionamentos pessoais, na autoimagem e nos afetos;

9
A Terapia do Esquema (TE) foi formulada por Jeffrey E. Young e colegas para ampliar e integrar os conceitos
cognitivo-comportamentais tradicionais, com a finalidade inicial de tratar indivíduos com transtorno de
personalidade, depressão e ansiedade recorrentes. Atualmente vem se mostrando eficaz no tratamento de
diversos problemas difíceis e/ou refratários – abuso de substâncias, transtornos alimentares, conflitos de casais e
agressores criminosos. A TE vem também sendo amplamente testada e confirmada em alguns países para o
tratamento de pacientes borderlines.
10
Em 1978, Mary Ainsworth, estudou e comprovou empiricamente a teoria de Bowlby, através de uma
experiência chamada “A situação estranha” e através dos resultados de tal estudo identificou categorias dos
padrões de apego sendo elas: do tipo seguro; inseguro ansioso/ ambivalente; e inseguro evitativo. Mas tarde
dando continuidade aos estudos de Ainsworth, Main e Solomon (1986) acrescentou um quarto tipo de apego: o
apego desorganizado (Wainer, 2016).
34

esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginado; padrão de relacionamentos


instáveis e intensos; impulsividade; instabilidade afetiva; dificuldades no controle e expressão
da raiva; e sentimento crônico de vazio (5ª edição, American Psychiatric Association, 2014).
Wainer (2016) coloca que o esquema de abandono considera muitas das reações das
crianças com apego inseguro, mostrando mais uma vez a ligação entre a teoria do apego e a
terapia do esquema, onde estas reações se assemelham a algumas características do TPB.
Deste modo, o autor acrescenta que a grande influência de Bowlby, com a teoria do apego, e
no trabalho de Young, na terapia de esquema, consiste exatamente na formulação desse EID e
da técnica desenvolvida para desativá-lo, chamada de reparação parental limitada. Para
pacientes com TPB (e com outros transtornos mais graves), a reparação parental limitada
oferece um antídoto parcial ao esquema de abandono do paciente: o terapeuta passa a
constituir a base emocional segura que o paciente nunca teve, dentro dos limites apropriados
de uma relação terapêutica (YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008).
A técnica de reparação parental limitada surge como um sustento aos esquemas do
paciente, suprindo as necessidades que apareceram ainda na infância, dentre elas, a de
constituir um vínculo seguro de apego, melhorar as representações que o paciente tem de si e
dos outros, aprimorar suas relações interpessoais e, assim, auxiliando-o a seguir em frente em
uma vida plena. O terapeuta poderá, por meio de atitudes empáticas e compreensivas, reparar
parcialmente as necessidades de vínculo, autonomia, espontaneidade e expressão das emoções
e das necessidades, sempre respeitando os limites da ética e da relação terapêutica
(ROEDIGER; ZARBOCK, 2014 apud WAINER, 2016).
Dessa forma, de acordo com Wainer (2016), os EIDs são criados pela interação entre
três fatores: o grau de gratificação das necessidades emocionais básicas de cada período do
desenvolvimento; as experiências sistemáticas com as figuras de afeto da infância e o
temperamento emocional (geneticamente herdado).
Cinco necessidades emocionais fundamentais dos seres humanos são postuladas por
Young, Klosko e Weichaar (2008):

1. Vínculos seguros com outros indivíduos (inclui segurança, estabilidade, cuidado e


aceitação). 2. Autonomia, competência e sentido de identidade. 3. Liberdade de
expressão, necessidades e emoções válidas. 4. Espontaneidade e lazer. 5. Limites
realistas e autocontrole.
35

Acredita-se que essas necessidades são universais: todas as pessoas as têm, mesmo
que algumas apresentem necessidades mais fortes do que outras. Um indivíduo
psicologicamente saudável é aquele que consegue satisfazer de forma adaptativa as
necessidades emocionais fundamentais.
Young, Klosko e Weichaar (2008) observaram quatro tipos de experiências no início
da vida que estimulam a obtenção de esquemas, são elas:

1. Frustração nociva das necessidades (ocorridas quando a criança tem poucas


experiências boas). Traumatização ou vitimação (quando a criança sofre algum
dano ou quando ela se transforma em vítima). 2. Grande quantidade de boas
experiências (quando o pai proporciona algo exageradamente bom, onde algo
moderado já seria o suficiente). 3. Internalização ou identificação seletiva com
pessoas importantes (A criança identifica-se seletivamente e internaliza
pensamentos, sentimentos, experiências e comportamentos de pessoas
importantes, como por exemplo os pais). Acreditasse que o temperamento
determine em parte se um indivíduo irá se identificar e internalizar as
características de uma pessoa importante.

O temperamento emocional é também um fator importante na formação de


esquemas. Cada criança tem uma “personalidade” ou temperamento singular e distinto desde
o nascimento. Young, Klosko e Weichaar (2008) colocam que o temperamento emocional
interage com eventos dolorosos da infância na formação de esquemas. Diferentes
temperamentos expõem, de forma seletiva, as crianças a diferentes circunstâncias de vida.
A terapia do esquema afirma que alguns EIDs, principalmente aqueles desenvolvidos
no início da infância e decorrentes de experiências negativas, são centrais no aparecimento de
transtorno da personalidade e em outras condições mentais (YOUNG, 2003 apud WAINER,
2016).
De acordo com Wainer (2016), tanto na terapia cognitiva, como na terapia do
esquema, os esquemas mentais na primeira e os EIDs na segunda, são estruturas que
armazenam crenças, suposições, regras e outras memórias. Porém, enquanto os esquemas
mentais propostos pela TC refletem frequentemente crenças condicionadas (por exemplo, se
me conhecerem, serei rejeitado), os EIDs têm conteúdos mais primitivos e que formam a base
inicial para o desenvolvimento da maioria de nossos outros esquemas mentais. Os EIDs são
vistos como completamente verdadeiros e são bastante refratários à avaliação lógica de seu
conteúdo.
36

Não necessariamente os EIDs se fundamentam em traumas ou maus-tratos na


infância, mas todos são destrutivos, e a maioria é causada por experiências nocivas repetidas
regularmente durante a infância e adolescência. Os efeitos de todas essas experiências danosas
relacionadas acumulam-se e, juntos, levam ao aparecimento de um esquema pleno (YOUNG,
KLOSKO e WEICHAAR, 2008).
A terapia do esquema identificou 18 esquemas iniciais desadaptativos, eles foram
agrupados em cinco categorias de necessidades emocionais não satisfeitas, chamadas de
domínios esquemáticos (DEs).
Wainer (2016) conceitua os DEs como intervalos temporais que vão do início da
infância ao começo da adolescência, onde se deseja que algumas demandas psicológicas
sejam supridas pelos cuidadores e pelo ambiente, para que a criança desenvolva esquemas
mentais básicos (esquemas iniciais) saudáveis. Estes, por sua vez, formarão as bases para o
desenvolvimento dos esquemas mentais dos diferentes papéis sociais e pessoais que o ser
humano utiliza na sua vida diária.
Wainer (2016) coloca que a infância e a adolescência podem ser muito conturbadas e
recheadas de situações aversivas. Esta afirmação é comprovada nas diversas estatísticas
mundiais sobre maus-tratos infantis. Percebe-se uma visão de grande vulnerabilidade da
população infantil aos mais diversos tipos de violência, os quais, de modo incoerente,
costumam ser atribuídos por aqueles que deveriam garantir sua segurança, os pais e
cuidadores.
As diversas formas de negligência e violência proveniente, principalmente, da
família e de pessoas que convivem próximo à criança, são os principais tipos de estresse
precoce aos quais as crianças são expostas. Dentre as negligências, pode-se citar as
pertencentes as necessidades básicas (alimentação, higiene, moradia, etc.), proteção, afeto e
empatia. O estresse precoce, seja na forma de negligência, de violência ou carência dos
cuidados e necessidades básicas, desenvolve sequelas psicológicas que crescem
significativamente as chances de crianças ou adolescentes desenvolverem comportamentos
psicopatológicos na vida adulta (MARTIN et al, 2011 apud WAINER, 2016). “Tais sequelas
consistem no estabelecimento de EIDs do DE em voga à época da vivência aversiva”
(WAINER, 2016, p. 25). Desta forma, se uma criança sofre descuido afetivo de seus pais
durante os primeiros dois a três anos de vida, quando estava passando pelo DE de aceitação e
37

pertencimento, esta poderá desenvolver EIDs de abandono, privação emocional,


defectividade, vergonha etc.
A tabela 3 mostra os domínios esquemáticos desadaptativos, bem como os EIDs
associados a eles.

Tabela - 3: Domínios esquemáticos desadaptativos, e esquemas iniciais desadaptativos de cada domínio


Domínio Esquemático
Domínio EIDs associados
Desadaptativo
1o Domínio Desconexão e rejeição Abandono/ instabilidade, Desconfiança/ abuso, Privação emocional,
Defectividade/vergonha e Alienação/ isolamento social.
2o Domínio Autonomia e desempenho Fracasso, vulnerabilidade, dependência/incompetência e
prejudicados emaranhamento
3o Domínio Limites prejudicados Autocontrole e autodisciplina insuficientes e
grandiosidade/merecimento
4o Domínio Orientação para o outro Subjugação, autossacrifício e busca de aprovação/reconhecimento
o
5 Domínio Supervigilância e inibição Inibição emocional, padrões inflexíveis/hipercriticidade,
negativismo/pessimismo e caráter punitivo
Fonte: Adaptado de Wainer (2016)

Young, Klosko e Weichaar (2008), definem os cinco domínios de esquemas.


O primeiro domínio recebeu o nome de desconexão e rejeição, e os EIDs
pertencentes a ele são os de abandono/instabilidade, desconfiança/abuso, privação emocional,
defectividade/vergonha e isolamento social/alienação. Pessoas com esquemas nesse domínio
caracterizam-se por incapacidade na formação de vínculos seguros e satisfatórios com outras
pessoas. Estas acham que suas necessidades básicas de cuidado, estabilidade, segurança,
empatia e pertencimento não serão atendidas. Em geral, esses pacientes sofreram com
experiências infantis traumáticas, pois as famílias costumam apresentar características de
instabilidade, abuso, frieza, rejeição ou isolamento do mundo exterior (YOUNG, KLOSKO e
WEICHAAR, 2008).
Chamado de autonomia e desempenho prejudicados, o segundo domínio leva a
dificuldades em perceber a habilidade de viver de forma independente. Os pacientes com
esquemas nesse domínio não conseguem se desenvolver com confiança, porque normalmente
são provenientes de famílias superprotetoras que para garantir a proteção da criança, acabam
prejudicando seu processo de independência. Os EIDs pertencentes a este domínio são:
dependência/incompetência, vulnerabilidade ao dano ou à doença, emaranhamento/self
subdesenvolvido e fracasso (YOUNG, KLOSKO e WEICHAAR, 2008).
38

O terceiro domínio é o dos limites prejudicados, que tem como característica as


dificuldades em compreender e respeitar os direitos das outras pessoas e no cumprimento de
metas e compromissos pessoalmente assumidos. Outro aspecto, é o egoísmo, a
irresponsabilidade e o narcisismo. Indivíduos com esquemas nesse domínio geralmente são
provenientes de famílias excessivamente permissivas, onde a imposição de limites foi falha,
contribuindo assim para falta de limites no cumprimento de regras, autodisciplina e respeito
aos direitos alheios. Os EIDs pertencentes a esse domínio são: arrogo/grandiosidade e
autocontrole/autodisciplina insuficientes (YOUNG, KLOSKO e WEICHAAR, 2008).
De acordo com Young, Klosko e Weichaar (2008), o quarto domínio, é chamado de
direcionamento para o outro, e tem como característica a excessiva preocupação com as
necessidades dos outros em lugar das suas próprias, estes indivíduos fazem isso no intuito de
receberem aprovação e evitarem retaliações. “Normalmente, a imposição de condições para a
troca afetiva (amor condicional) é o principal causador de déficits nesse DE” (WAINER;
RIJO, 2016, p. 50). Em geral, suas famílias estabeleceram relações condicionais, onde só
recebia aprovação e atenção caso a criança se comportasse da maneira desejada. Os pais
valorizavam muito mais as suas necessidades emocionais ou a aparência do que as
necessidades da criança. Estão inclusos nestes domínios os EIDs de subjugação,
autossacrifício e busca de aprovação/busca de reconhecimento.
Já o quinto domínio, Young, Klosko e Weichaar (2008), denomina de
supervigilância e inibição. Pessoas com esquemas nesse domínio reprimem seus sentimentos
e impulsos com o intuito de cumprir regras rígidas internalizadas, com relação a seu próprio
desempenho, à custa da sua própria felicidade, auto-expressão, relacionamentos íntimos e boa
saúde. Normalmente, as famílias têm características rígidas e repressoras, onde os sentimentos
não podem ser expressos de maneira livre e o auto-controle e a negação de si próprios
prevalecem sobre outros aspectos. Os EIDs desse domínio são: negativismo/pessimismo,
inibição emocional, padrões inflexíveis/postura crítica exagerada e postura punitiva.
De forma resumida, serão apresentados, na tabela 4, os 18 esquemas identificados
por Young, Klosko e Weichaar (2008), seus temas subjacentes de sofrimento que incentiva a
busca de terapia (GENDEREN et al, 2012; YOUNG et al, 2003 apud MELO, 2014), bem
como os sentimentos relacionados a tais EIDs (MELO, 2014).
39

Tabela - 4: Os EIDSs, seus temas subjacentes e os sentimentos relacionados


EID Temas Subjacentes Sentimentos
1. Privação emocional Expectativas de jamais atingir necessidades de Isolamento e solidão
apoio, cuidado, empatia e proteção

2. Abadono/ Instabilidade Expectativas de ser abandonado por pessoas Mágoa, ansiedade e raiva
importantes. Os outros são imprevisíveis e não
disponíveis
3. Desconfiança/ Abuso Expectativas de ser humilhado, prejudicado ou Estado de alarme, ansiedade, raiva
abusado
4. Isolamento Social/ Alienação Crença de estar de fora do grupo Ansiedade

5. Defectividade/ Vergonha Crença de ser defeituoso, mau e indigno/ Vergonha e ansiedade


inferior
6. Fracasso Senso de ser incapaz de desempenhar bem em Sentimento de ser estúpido e
relação aos pares medíocre
7. Dependência/ Incompetência Incapacidade de funcionar de forma autônoma, Ansiedade e tensão
como tomar decisões
8. Vulnerabilidade ao dano ou à Expectativas de ser devastado por catástrofes, Ansiedade
doenças bem como os parentes e de ser incapaz de
impedir
9. Emaranhamento/ Self Envolvimento e proximidade excessivos com Ansiedade
subdesenvolvido uma ou mais pessoas importantes;
incapacidade para desenvolver a própria
identidade
10. Subjugação Submissão aos outros por medo de conflito, Ansiedade, raiva
punição e abandono
11. Autossacrifício Foco excessivo nas necessidades dos outros, à Culpa, raiva
custa das suas, para evitar a culpa
12. Busca de aprovação/ Busca Busca excessiva de atenção, reconhecimento e Ansiedade
de reconhecimento aprovação

13. Inibição emocional Expectativa de que a expressão de sentimentos Inibições de emoções/


e a espontaneidade levam a embaraço e racionalidade excessiva
retaliação
14. Padrões inflexíveis/ Postura Busca excessiva de perfeição, hipercrítico com Ansiedade
crítica exagerada os outros e consigo, abandono do lazer em prol
das obrigações
15. Negativismo/ Pessimismo Foco excessivo nos aspectos negativos da Ansiedade e estado de alerta
vida, ignorando os positivos
16. Postura punitiva Expectativas de que os erros devem ser Irritabilidade
punidos. Agressividade, intolerância
impaciência
17. Arrogo/ Grandiosidade Crença de ser superior e de ter mais direitos do Raiva
que os outros
18. Autocontrole/ Autodisciplina Intolerância a frustração e incapacidade para Raiva
insuficientes controlar impulsos
40

Fonte: Adaptada de Melo (2014)

Melo (2014) apresenta um 19° EID, intitulado Indesejabilidade Social, e descreve


como tema subjacente crenças de não ser atraente fisicamente, socialmente incapaz, tolo e
chato, e sentimento de ansiedade. No entanto expõe que o mesmo ainda faz parte de estudos
recentes.
Wainer (2016) salienta que a abordagem mais geral da terapia do esquema tem
comprovado algumas dificuldades quando se trata de casos muito graves, onde o paciente
apresenta diversos EIDs, bem como processos esquemáticos (PEs11) muito enraizados. Para
estas condições, desenvolveu-se o trabalho com modos de esquemas (ME), que é uma forma
avançada da terapia do esquema. Estes modos têm apresentado resultados positivos no
tratamento de perturbações da personalidade severas.
De acordo com Young, Klosko e Weichaar (2008), a compreensão de ME surgiu
depois, no desenvolvimento da terapia dos esquemas. Ainda que fossem conseguidos
resultados positivos, percebia-se que alguns pacientes mais graves acabavam tendo
dificuldades em absorver todo o conhecimento sobre a estrutura e o funcionamento de suas
personalidades, em razão da enorme quantidade de EIDs e de sentimentos e comportamentos
decorrentes de cada um deles (WILSON, 2016), como no caso de pacientes com TPB, onde
os mesmos apresentam quase todos os 18 esquemas (VENTURA; RODRIGUES; FIGUEIRA,
2011).
Conceituando modos de esquemas, (YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008, p.
239) afirmaram que “um modo é o conjunto de esquemas ou operações de esquemas –
adaptativos ou desadaptativos – que estão ativados no indivíduo em um dado momento”.
Mary e Falcone corroboram com os autores citados acima, articulando que [...] “um modo de
esquema reflete uma constelação de esquemas e estilos de enfrentamento que estão ativos em
um determinado momento” (GENDEREN et al, 2012 apud MARY; FALCONE, 2014, p.
284).

11
“Os PEs são os mecanismos típicos que o organismo utiliza ao longo do tempo para perpetuar os EIDs”
(WAINER, 2016). Os PEs ocorrem de forma espontânea e são vistos pelo indivíduo como naturais e corretos. O
nível de consciência sobre esses processos altera muito, sendo alguns deles identificados racionalmente com
mais facilidade do que outros.
41

Beck et al. apoiam o conceito de modo de esquemas de Young e colaboradores ao


afirmar que “um modo de esquema é um padrão organizado de pensamento, sentimento e
comportamento, baseado em um conjunto de esquemas relativamente independente de outros”
(BECK et al, 2005, p. 176).
Os modos, em sua forma adaptativa, acontecem também com pessoas saudáveis e
não obrigatoriamente em indivíduos que apresente algum transtorno de personalidade. Em sua
forma adaptativa, os modos indicam o estado de humor dominante de alguém em um
determinado momento (MELO, 2014). Já quando se trata de pacientes com transtorno de
personalidade, os modos controlam o seu humor e os seus comportamentos (GENDEREN et
al, 2012 apud MELO, 2014).
Young, Klosko e Weichaar (2008) identificaram dez modos de esquemas, que são
agrupados em quatro categorias amplas, são elas: modos crianças, modos enfrentamento
desadaptativos, modos pais disfuncionais e modos adultos saudáveis. Alguns modos são
saudáveis ao indivíduo, enquanto outros são desadaptivos.
Pacientes com TPB mudam de modos frequentemente, em resposta a eventos
ocorridos em sua vida. Quando os modos destes pacientes são alterados, os outros parecem
desaparecer, ficando dissociados quase que completamente (YOUNG; KLOSKO;
WEICHAAR, 2008).
Young e colaboradores exemplificaram como um paciente TPB decorre de um modo
para o outro de forma rapidamente, como demonstrado abaixo:

[...] em um momento, está no modo criança abandonada, vivenciando o sofrimento


de seus esquemas; no momento seguinte, cambia para o modo criança zangada
expressando raiva; ele pode, então, cambiar para o modo pais punitivos, e punir a
criança abandonada; finalmente, recolhe-se ao modo protetor desligado, bloqueando
suas emoções e afastando-se das pessoas para proteger-se [...] (YOUNG; KLOSKO;
WEICHAAR, 2008, p. 52).

Como dito anteriormente, Young, Klosko e Weichaar (2008), identificaram quatro


tipos principais de modos, cada tipo se integra a certos esquemas (com exceção dos modos
adulto saudável e a criança feliz) ou incorpora determinados estilos de enfrentamento,
apresentados na tabela 5.
Tabela - 5: Modos Esquemáticos
MODOS CRIANÇA
Modo Descrição EIDs relacionados
42

Criança vulnerável Vivencia sentimentos disfóricos Abandono, desconfiança/abuso, privação


ou ansiosos, em especial medo, emocional, defectividade, isolamento social,
tristeza e desamparo, quando em dependência/incompetência, vulnerabilidade,
contato com esquemas emaranhamento, negatividade-pessimismo
associados.
Criança zangada Libera raiva diretamente em Abandono, desconfiança/abuso, privação
resposta a necessidades emocional, subjugação
fundamentais não satisfeitas ou
tratamento injusto relacionado a
esquema nuclear.
Criança impulsiva/indisciplinada Age impulsivamente, segundo Arrogo, autocontrole insuficientes
desejos imediatos de prazer, sem
considerar limites nem as
necessidades e os sentimentos
dos outros.
Criança feliz Sente-se amada, conectada, Nenhum
contente e satisfeita.
MODOS DE ENFRENTAMENTO DESADAPTATIVOS
Modo Descrição
Capitulador complacente Adota enfrentamento baseado em obediência e dependência.
Tem o propósito de evitar maus-tratos reais.
Protetor desligado Adota estilo de retraimento emocional, desconexão, isolamento e evitação
comportamental, podendo agir de modo robótico.
Utilizado para fuga de estados emocionais negativos.
Hipercompensador Estilo de enfrentamento caracterizado por contra-ataque e controle; pode
hipercompensar por meios indiretos, como trabalho excessivo.
Utilizado para fuga de estados emocionais negativos.
MODOS PAIS DISFUNCIONAIS
Modo Descrição EIDs relacionados
Pai/mãe punitivo-crítico Restringe, critica ou pune a si ou Subjugação, postura punitiva, defectividade,
aos outros. desconfiança/abuso (como abusador)
Pai/mãe exigente Estabelece expectativas e níveis Padrões inflexíveis, autossacrifício
de responsabilidade altos em
relação aos outros e pressiona-se
para cumpri-los.
MODOS ADULTO SAUDÁVEL
Modo Descrição
Adulto saudável Identifica suas necessidades e vulnerabilidades e busca supri-las considerando o
contexto social, podendo retardar a gratificação, se necessário.
Fonte: Adaptada de Young e colaboradores (2008) apud de Wilson (2016)

Detalharemos abaixo, mais um pouco sobre as quatro grandes categorias em que


estão alocados os 10 modos de esquemas em que Young, Klosko e Weichaar (2008)
identificaram em seus estudos.
A primeira categoria dos modos é denominada “modos de criança”, que se
desenvolvem quando algumas necessidades emocionais básicas não foram devidamente
43

atendidas na infância. São mais facilmente visualizados em pacientes com TPB, pois eles
próprios se assemelham muito a crianças (YOUNG, KLOSKO e WEICHAAR, 2008).
De acordo com Young, Klosko e Weichaar (2008), a segunda categoria de modos é
chamada de “enfrentamento desadaptativos”, refere-se às tentativas da criança de se adequar à
vida com necessidades emocionais não-satisfeitas em um ambiente prejudicial. Na infância do
paciente, esses modos foram adaptativos, mas costumam ser desadaptativos no mundo mais
amplo dos adultos.
Modos “pais disfuncionais” são a categoria de terceiro modo e refletem
comportamento internalizado dos pais em relação ao paciente como uma criança. Quando os
pacientes se encontra nos modos pais disfuncionais, eles se transformam em seus próprios
pais e tratam a si mesmos como os seus pais os trataram quando eram crianças (YOUNG,
KLOSKO e WEICHAAR, 2008).
Segundo Young, Klosko e Weichaar (2008), a quarta categoria de modo,
denominada “adulto saudável”, foi definida por Young e colaboradores como sendo a parte
saudável e adulta do self que cumpre uma função “executiva”12 com relação a outros modos.
O adulto saudável ajuda a atender as necessidades emocionais básicas da criança. A finalidade
global do trabalho com esta categoria de modo é construir e fortalecer o adulto saudável do
paciente para então assim trabalhar de forma mais eficaz com os outros modos. Raramente os
pacientes com TPB apresentam o modo adulto saudável, de forma que o terapeuta deve
aumentar ou auxiliar na criação de um modo tão pouco desenvolvido.
Ventura, Rodrigues e Fiqueira (2011) apontam cinco principais modos identificados
que caracterizam a personalidade borderline: criança abandonada; criança zangada e
impulsiva; pais punitivos; protetor desligado e adulto saudável. “A forma mais fácil de
distinguir os modos é pelo tom de suas expressões” (YOUNG et al, 2008 apud VENTURA;
RODRIGUES; FIGUEIRA, 2011, p. 562).
De acordo com Klosko e Young (2009), o modo criança abandonada é a criança
interior em sofrimento. Para Young, Klosko e Weichaar (2008), os pacientes parecem ser
frágeis e infantis neste modo. Parecem infelizes, frenéticos, assustados, não-amados e
perdidos. Sentem-se sozinhos e desamparados e estão constantemente em busca de uma figura
12
As funções executivas são processos multidimensionais de controle cognitivo que se caracterizam por serem
espontâneos e demandar um elevado esforço. Eles incluem a capacidade de avaliar, organizar e alcançar metas,
como também a habilidade de adequar o comportamento com flexibilidade ao ser confrontado com novos
problemas e situações. (RUEDA; ALONSO, 2013).
44

paterna que tomará cuidado deles. Esforçam-se muito para que os cuidadores não os
abandonem, muitas vezes as suas percepções de abandono ultrapassam o limiar de realidade.
No modo criança zangada e impulsiva, segundo Young, Klosko e Weichaar (2008),
estes pacientes expressam a sua raiva de forma inapropriada. Eles podem parecer
profundamente furiosos, exigentes, controladores, abusivos ou descuidados; também podem
manifestar tendências suicidas. Quando a intenção é satisfazer às próprias necessidades,
podem agir de forma impulsiva, podendo ser inclusive manipuladores e inescrupulosos.
Para Young, Klosko e Weichaar (2008), no modo pais punitivos representa
normalmente a raiva ou o ódio internalizados do pai, da mãe ou de ambos. Quando os
pacientes estão nesse modo, assumem o papel de seus próprios pais punitivos e rejeitador,
ficando bravos consigo mesmos por apresentarem necessidades normais que seus pais não
deixassem que expressassem. Eles castigam a si mesmos – por exemplo, cortando-se ou
passando fome – e falam de si mesmos em tom cruel e rigoroso, falando que são “maus”,
“sujos”, “malvados”.
No modo protetor desligado, o paciente desliga-se de todas as emoções, desprende-se
dos outros e comporta-se de modo submisso com a finalidade de não ser castigado. Os
pacientes quando estão neste modo, parecem normais, sendo “bons pacientes”, agindo de
forma adequada e fazendo tudo o que deveriam fazer, não representam e nem perdem o
controzle. Os terapeutas acabam que de forma equivocada reforçando este modo. O problema
é que, quando os pacientes estão nesse modo, baseiam sua identidade em obter a aprovação de
seus terapeutas. No entanto, não estão realmente conectados com ele. Pode acontecer de o
terapeuta passar todo o tratamento com um paciente TPB sem perceber que ele está no modo
protetor distanciado. Desta forma, ele não evolui de forma significante. Os pacientes mudam
para o modo de protetor distanciado quando a finalidade é desligar-se de seus sentimentos,
quando eles são provocados nas sessões (YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008; LEAHY,
2011).
Klosko e Young (2009), coloca que em pacientes com TPB, o quinto modo, adulto
saudável, é excessivamente fraco e insuficientemente desenvolvido, principalmente no início
do tratamento terapêutico. Isto é visto como um grande problema, pois os pacientes não
encontram um modo paterno tranquilizador que cuide deles e os acalme. A incapacidade de
aceitar a separação é diretamente influenciada por isto. “O terapeuta é o modelo de um adulto
45

saudável para um paciente, até que ele finalmente internalize as atitudes, as emoções, as
reações e os comportamentos do terapeuta como seus próprios” (KLOSKO; YOUNG, 2011,
p. 250).
Como foi exposto neste capítulo, o paciente TPB apresenta uma complexa estrutura e
funcionalidade de sua personalidade. Conhecer os seus modos de esquemas, bem como os
seus EIDs associados é extremamente importante para um tratamento psicoterápico mais
eficaz. Wilson (2016) coloca que um grande ganho para o paciente é o entendimento dos
objetivos terapêuticos a serem vencidos em relação a cada um dos modos de funcionamento
apresentados por eles, tanto nas sessões como fora delas.
46

4. INTERAÇÕES EM TERAPIAS COGNITIVAS NO TRATAMENTO DE


TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE: TERAPIA COGNITIVA
COMPORTAMENTAL, TERAPIA DO ESQUEMA E TERAPIA
COMPORTAMENTAL DIALÉTICA.

Atualmente, o número de indivíduos que preenchem os critérios diagnóstico de


acordo com o DSM 5 para o Transtorno da Personalidade Borderline (TPB) têm lotado
consultórios de profissionais clínicos da saúde mental. Quando diagnosticado, é necessário
realizar um tratamento farmacológico, associado a um tratamento psicoterápico. Ventura,
Rodrigues e Fiqueira (2011) pontuam que há sérias limitações nos estudos farmacológicos
para tratar pacientes com TPB. No entanto, tais estudos mostram que os medicamentos têm
um papel auxiliar no tratamento da TPB, tratando os sintomas, porém não trata o transtorno
em sua totalidade. Assim, não há uma medicação “anti-borderline”, havendo sim recursos
farmacológicos que permitem o alívio de sintomas-alvo incômodos cujo controle é relevante
para um melhor manejo psicoterápico. Skodol e Gunderson (2012) concordam e contribuem
afirmando que embora nenhum medicamento tenha demonstrado efeitos drásticos ou
previsíveis, estudos indicam que muitos fármacos podem diminuir problemas específicos
como impulsividade, labilidade afetiva ou distúrbios cognitivos e perceptuais intermitentes,
bem como irritabilidade e comportamento agressivo.
Contudo, é alta a tendência do indivíduo com TPB conviva com emoções intensas,
impulsividade e intensidade nos relacionamentos e, ainda, é provável que perdure a vida toda.
Apesar disso, pode-se dizer que os que se envolvem em diversos tipos de terapia costumam
apresentar melhoras dentro do primeiro ano de tratamento.
Estudos que acompanham indivíduos em tratamento indicam que após 10 anos, até a
metade deles já não apresenta um padrão de comportamento que feche critérios para o
diagnóstico de transtorno de personalidade borderline. Além disso, entre os 30 e 50 anos de
idade, grande parte dos sujeitos com o transtorno atingem estabilidade em seus
relacionamentos e vida profissional (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
Ventura, Rodrigues e Fiqueira (2011), o terapeuta precisa estar atento para intervir
em momentos de crises, como por exemplo, na presença de comportamentos parassuicidas, e
identificar estes momentos, uma vez que estes pacientes são bastante ricos no que se refere a
material para discussão na sessão com problemas que de acordo com eles precisam ser
resolvidos com urgência. “O terapeuta deve estar atento para estabelecer uma relação
47

terapêutica, procurando desenvolver um senso de ligação com o paciente. Para isso, é


importante que seja sempre consistente, sincero e interessado pelo paciente” (VENTURA;
RODRIGUES; FIGUEIRA, 2011. p. 556).
Os tratamentos para o transtorno de personalidade borderline tem se mostrado pouco
eficaz, no entanto tem-se percebido melhores resultados com intervenções cognitivo-
comportamental através da terapia do esquema e a terapia comportamental dialética, além de
uma necessidade de maturidade pessoal e experiência clínica por parte dos profissionais
(SKODOL; GUNDERSON, 2012, p. 877).
No início da década de 60, Aaron T. Beck desenvolveu a terapia cognitiva, na
Universidade da Pensilvânia, como uma psicoterapia breve, estruturada, orientada ao presente
para depressão, direcionada a resolver problemas atuais e a modificar os pensamentos e os
comportamentos disfuncionais.
Diante do modelo cognitivo, o pensamento disfuncional que influencia o humor e o
comportamento do individuo, é habitual a todos os transtornos psicológicos. Em seu modelo,
a avaliação e a modificação no pensamento acarretam na melhora do humor e do
13
comportamento. Através da modificação das crenças disfuncionais dos indivíduos, existe
uma melhora duradoura. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é conceituada como uma
linha psicoterapêutica de sucesso, especialmente para os transtornos de humor, ansiedade e
dependência química. Composto por avaliação, diagnóstico e plano terapêutico estruturado
em modelos cognitivos, tendo como suporte o achado neurobiológico. Porém, mostra-se com
certa limitação para o tratamento dos transtornos de personalidade, bem como para o
tratamento do TPB (BECK 1964 apud BECK, 2013).
Ao tentar superar obstáculos frequentes com pacientes caracterológicos, a partir da
integração dos conceitos e concepções centrais advindas da terapia cognitiva comportamental
(TCC) de Aaron Beck, Young construiu um modelo conceitual e de uma abordagem
psicoterápica inovadora e eficaz para diversos casos de transtornos da personalidade. Young
indicou pressupostos falhos propostos pela TCC, fornecendo novos conceitos e posturas
terapêuticas para uma maior eficácia com esses indivíduos (BECK 1964 apud BECK, 2013).

13
São ideias erronias que o individuo desenvolvem desde a infância sobre si, os outros e o mundo. Tornando-se
entendimentos que tão fundamentais e profundos para o individuo que os mesmos os consideram como verdades
absolutas.
48

Ventura, Rodrigues e Fiqueira (2011) coloca que o desenvolvimento da terapia dos


esquemas, por Jeffrey Young, teve um papel de grande importância para os pacientes com
TPB, como uma abordagem integrativa e sistemática que se expande a partir da TCC de Beck.
Esta terapia procura focar as experiências traumáticas e negativas primárias que originam
problemas psicológicos, em técnicas que utilizam a emoção, na relação terapêutica e em
estilos mal adaptativos de enfrentamento.
Pode-se dizer que as modernas versões das terapias cognitivas desenvolvidas a partir
do modelo de Beck, proporcionou melhores resultados quanto à eficácia no tratamento de
transtornos de personalidade, mais precisamente no tratamento com pacientes borderlines.
Em geral, o tratamento de pacientes borderline inclui intervenções cognitivo-
comportamentais e farmacológicas. Layden (1993) apud Ventura, Rodrigues e Fiqueira
(2011) pontua que há quatro tipos de intervenções importantes no manejo de pacientes com
TPB. São elas: o uso da relação terapêutica, as estratégias para intervenção em crises, o uso de
técnicas da terapia cognitiva padrão e a conceitualização focalizada no esquema (SKODOL;
GUNDERSON, 2012).
As intervenções de cada terapia serão pontuadas a seguir, porém tais terapias se
interligam em algumas técnicas, originadas da TCC, compartilhando também de pontos em
comum, como a importância que a aliança terapêutica tem no processo de tratamento do TPB.

4.1. Terapia Cognitivo Comportamental (TCC)

Ao desenvolver a terapia cognitiva em meados da década de 1960, para trabalhar


com a depressão, Aaron Beck contribuiu de forma relevante para a compreensão e o
tratamento dos transtornos psiquiátricos; contudo, seu plano sempre foi de que o modelo
cognitivo fosse adaptado para outros transtornos, e com isso mostrou sucesso especialmente
no tratamento para os transtornos de humor, ansiedade e dependência química (KNAPP;
BECK, 2008).
A TC identifica e trabalha três níveis de cognição: pensamentos automáticos (PA)14,
pressupostos subjacentes ou crenças intermediárias15 e crenças nucleares ou crenças centrais16.

14
São os pensamentos que vem automaticamente à mente, de maneira rápida e que muitas vezes não são
percebidos por quem os tem. Quando tais pensamentos são disfuncionais, eles atuam em cima das emoções e do
comportamento do indivíduo, podendo vir em forma de pensamentos ou também em forma de imagens.
49

É importante enfatizar que, todos nós temos crenças, pressupostos e PA tanto positivos quanto
negativos, e o trabalho se refere aos disfuncionais (KNAPP; BECK, 2008).

Pensamentos automáticos, pressupostos subjacentes, crenças nucleares e o impacto


do humor na cognição combinam-se para configurar um ciclo autoperpetuador
observável em todos os transtornos. Um indivíduo pode ter crenças disfuncionais
que o predispõem para a psicopatologia mesmo sem ter algum efeito perceptível, até
que surge uma situação relevante que ativa essas crenças. Estas, por sua vez, ativam
os PA, evocando um humor correspondente, cuja natureza depende deles. Esse
humor, então, leva o indivíduo a tendenciar as memórias de tal forma que ele
experiência mais PA disfuncionais, intensificando seu humor disfuncional (KANAP
et al, 2004 p. 26).

Beck enfatiza a importância em estabelecer o empirismo colaborativo com o


paciente, onde paciente e terapeuta irão trabalhar juntos para avaliar as crenças, verificando se
estão corretas ou não, e modificando-as de acordo com a realidade. Sendo também uma
terapia psicoeducativa no sentido de fornecer conhecimento ao paciente a: 1) monitorar e
identificar pensamentos automáticos; 2) reconhecer as relações entre cognição, afeto e
comportamento; 3) testar a validade de pensamentos automáticos e crenças nucleares; 4)
corrigir conceitualizações tendenciosas, substituindo pensamentos distorcidos por cognições
mais realistas; e 5) identificar e alterar crenças, pressupostos ou esquemas subjacentes a
padrões disfuncionais de pensamento (KNAPP; BECK, 2008).
Composto por avaliação, diagnóstico e plano terapêutico, a terapia cognitiva foi
revolucionária ao dar autonomia para o paciente praticar a terapia fora das sessões.
Fundamentada na hipótese de que a cognição exerce um papel de grande influência sobre as
emoções e comportamentos, a TCC busca a reestruturação cognitiva, a partir de uma
conceituação cognitiva do paciente e de seus problemas. Inicialmente, objetiva ao devolver ao
paciente a flexibilidade cognitiva, através da intervenção sobre as suas cognições, a fim de
promover mudanças nas emoções e comportamentos que o acompanham. No entanto, ao
longo do processo terapêutico atua diretamente sobre os esquemas e crenças do paciente a fim

15
Referem-se a padrões, atitudes, normas e regras impostas pelo individuo em situações vividas no dia a dia e
estão sempre associadas a uma condição, que sendo seguida á risca, transcorre tudo bem. O não cumprimento
dessas crenças pode ocasionar na ativação das crenças disfuncionais.
16
Formas de cognição mais internalizadas, consideradas verdades absolutas, percebidas de maneira rígida e
generalizada pelo individuo, pois estão relacionadas às construções adquiridas na infância sobre si, o outro e o
mundo. Tais construções são fortalecidas ao longo dos anos, no qual servem de modelo para a interpretação de
eventos ocorridos.
50

de promover sua reestruturação; ainda em paralelo à reestruturação cognitiva, o terapeuta


cognitivo utiliza a resolução de problemas. (BECK 1964 apud BECK, 2013).
De acordo com Beck (2013) conceitualização cognitiva é a formulação do caso,
embasada na concepção cognitiva dos transtornos emocionais do paciente. É a ferramenta
mais importante que o terapeuta cognitivo precisa dominar, pois, é crucial para um
planejamento adequado e eficaz da terapia, bom entendimento das distorções cognitivas e dos
consequentes comportamentos mal adaptativos do paciente.
Sem o entendimento cognitivo do paciente, todo o tratamento será apenas a aplicação
de técnicas cognitivas e comportamentais com carência de resultado. Assim, a
conceitualização melhorara o resultado do tratamento, auxiliando o terapeuta e o paciente na
obtenção de uma concepção mais ampla e profunda dos mecanismos cognitivos e
comportamentais do paciente; ajudando o terapeuta na escolha das intervenções e tarefas a
serem realizadas; reforçando o entendimento e o trabalho produtivo da própria relação
terapêutica, bem como ajuda a entender e lidar com possíveis problemas e fracassos ao longo
do tratamento, em vez de simplesmente vê o paciente como uma coleção de sintomas e
diagnósticos psiquiátricos (KANAP et al, 2004).
De acordo com Knapp e Beck (2008), o princípio fundamental da TC de Aaron Beck
é a forma como os indivíduos percebem e processam a realidade, já que nossas cognições têm
influencia controladora sobre nossas emoções e comportamento; como também o modo como
agimos e nos comportamos. A terapia cognitiva é uma abordagem ativa, diretiva e
estruturada, que tem foco no aqui e agora, mas que retorna ao passado quando for necessário
investigar, focando seu trabalho em identificar e corrigir padrões de pensamentos e crenças
disfuncionais, auxiliando nas soluções formais para produzir melhoras e mudança no
indivíduo.
As primeiras formulações de Beck para o transtorno de personalidade borderline,
destacavam o papel das suposições no transtorno, ou seja, pensamentos extremos por conta da
representação dicotômica de si e dos outros. Pretzer (1990) apud Beck, A. T., Freeman, e
Davis, (2005), considerava três suposições centrais no TBP: “o mundo é mau e perigoso”,
“sou inaceitável”, “sou incapaz e vulnerável”. A primeira suposição articulada com a segunda
leva o paciente a altos níveis de vigilância e desconfiança interpessoal, como também a
51

hipervigilância. A característica cognitiva do pensamento dicotômico é ocasionada pela


fragilidade em sua identidade, sendo um esquema mal articulado.
As três suposições chaves, trazidas por Pretzer (1990), como também as
características cognitivas, exercem a manutenção do TPB, ou seja, a crença do paciente em
ser frágil e incapaz, e suposições paranoides de que os outros não merecem confiança e são
malevolentes, alimenta o comportamento interpessoal instável e extremo do paciente,
ocasionando como pontos relevantes para ser trabalhados na terapia (BECK; FREEMAN;
DAVIS, 2005).

Os pacientes com TPB experimentam os acontecimentos comuns da vida como


ameaçadores por causa de sua sensibilidade, reagindo com afeto negativo, e
posteriormente enfrentam a situação através de comportamentos de autoderrota. A
vulnerabilidade desses pacientes se baseia em pensamento extremo, especialmente
por causa de representações dicotômicas de si mesmos e dos outros. As crenças
especificas incluem “O mundo é mau e perigoso”, “Não tenho poder algum” e “Sou
alguém inaceitável”. (BECK et al., 1990, 2004 apud KLOSKO et al. 2009. p. 246).

De acordo com o modelo de Beck, aplicado a pacientes com TPB, o tratamento é


voltado para a correção dos pensamentos dicotômico, do tipo “preto ou branco”; demostrando
ao paciente que é interessante a modificação dos mesmos; realizando experimentos
comportamentais pata testa a validade das suas crenças, recebendo treinamento de
assertividade (KLOSKO; YOUNG, 2009).

Uma vez que os pacientes com TPB inicialmente tem pouco conhecimento das
próprias emoções, pensamentos e comportamentos, uma parte importante do
tratamento é dedicada a ajuda-lo a compreendê-las. Perceber com clareza quais
esquemas (ou modos) subjacentes está agindo e vão ajudar o individuo a reduzir a
confusão e a obter certo controle sobre seu comportamento [...] (BECK;
FREEMAN; DAVIS, 2005 pag. 183).

O foco do tratamento como paciente TPB se da na reestruturação das crenças


disfuncionais dos pacientes, onde tal crença influência nas emoções e comportamentos
adotados pelo indivíduo. No trabalho com esses pacientes, o terapeuta instrui técnicas ao
paciente para identificar as suas características positivas, proporcionando sempre o feedback
positivo quando o paciente demonstra um enfrentamento eficaz. O role-play é uma técnica útil
para ensinar o paciente as habilidades interpessoais, como a assertividade e expressão de
52

sentimentos apropriadas em relação a alguém, como também experimentar novos


comportamentos. O estabelecimento de agenda, que tem como objetivo o foco nos problemas
a serem trabalhados e suas soluções, evitando possíveis desculpas do paciente para não aderir
ao processo; Cartão de enfrentamento é utilizado com intuito de o paciente lembrar o que foi
feito e alcançado na sessão, ajudando o mesmo a lutar contra pensamentos disfuncionais no
momento que for necessário, pois o cartão oferece uma visão funcional para lidar com os
problemas. O treinamento de habilidades sociais também é utilizado, já que esses pacientes
não possuem um repertório socialmente habilidoso para lidar com os problemas e com as
pessoas (KLOSKO; YOUNG, 2009).
Outro ponto importante é o empirismo colaborativo, ou melhor, a relação terapêutica,
onde terapeuta e paciente trabalham juntos como uma equipe investigativa, desenvolvendo
hipóteses sobre o valor de enfrentamento de uma série de cognições e comportamentos
disfuncionais. Eles então colaboram no desenvolvimento de um estilo mais saudável de
pensamento e de habilidades de enfrentamento e na reversão de padrões improdutivos de
comportamento. Durante as fases finais, o terapeuta se concentra especificamente na
prevenção da recaída ao ajudar o paciente a identificar problemas em potencial, os quais têm
uma alta probabilidade de causar dificuldades. Depois, são utilizadas técnicas de treinamento
para praticar maneiras eficazes de enfrentamento (KLOSKO; YOUNG, 2009).
Embora pacientes com TPB apresentem grande instabilidade em seus aspectos de
funcionamento, a intervenção realizada através da TCC, pode reduzir tais instabilidades,
modificando crenças e comportamentos disfuncionais (BECK; FREEMAN; DAVIS, 2005).

4.2. Terapia do Esquema (TE)

A terapia do esquema é uma proposta de terapia inovadora e integradora,


desenvolvida por Jeffrey Young e colegas em meados de 1990, que amplia significativamente
o modelo original da TCC de Beck. Desenvolvida para tratar pacientes com problemas
caracterológicos crônicos, os quais não estavam tendo sucesso no tratamento com a TCC
(YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008).

O enfoque dessa proposta mescla elementos das escolas cognitivo-comportamental,


de apego, da gestalt, de relações objetais construtivista e psicanalítica em um
53

modelo conceitual e de tratamento rico e unificador. A terapia do esquema


proporciona um novo sistema psicoterápico especialmente adequado a pacientes
com transtornos psicológicos crônicos arraigados, até então considerada difíceis de
tratar. (YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008 p. 13).

A proposta de Young ao desenvolver a terapia do esquema foi de uma abordagem


sistemática que amplia a terapia cognitivo comportamental. A terapia do esquema pode ser
breve, de médio ou de longo prazo, dependendo do paciente. Ela amplia a terapia cognitiva
comportamental tradicional ao dar ênfase muito maior à investigação das origens infantis e
adolescentes dos problemas psicológicos, às técnicas emotivas, à relação terapeuta-pacientes e
aos estilos desadaptativos de enfrentamento17. Sendo assim suas principais características
(YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008).
A terapia do esquema visa os temas psicológicos fundamentais típicos, ou seja, os
esquemas dos pacientes com transtornos caracterológicos. A terapia do esquema possibilita
aos pacientes à organização de tais esquemas como também a compreensão do problema.
(YOUNG et al, 2008).
De acordo Wainer (2016), a terapia do esquema vem demonstrando resultados
positivos no tratamento de transtornos de personalidade, em especial borderline, narcisistas e
antissociais. Pode-se dizer que a terapia do esquema é uma abordagem completa e integrada
ao desenvolvimento dos padrões comportamentais, emocionais, cognitivos e motivacionais
dos indivíduos.
O modelo proposto por Young identifica a trajetória dos esquemas disfuncionais
desde a infância até o presente, com ênfase particular nos relacionamentos interpessoais do
paciente. Usando o modelo, os pacientes obtêm a capacidade de perceber os problemas
caracterológicos como egodistônicos18 e, assim, se capacitar para abrir mão deles. O terapeuta
se alia aos pacientes para lutar contra os esquemas, usando estratégias cognitivas, afetivas,
comportamentais e interpessoais. Quando os pacientes repetem padrões disfuncionais
baseados em seus esquemas, o terapeuta os confronta, empaticamente, com as razões para a

17
Consistem nos mecanismos que os pacientes desenvolvem desde cedo em suas vidas para se adaptar a
esquemas, e resultam em perpetuação dos mesmos. Foram identificados três estilos de enfrentamentos
desadaptativos: resignação, evitação e hipercompensação. As respostas de enfrentamentos são os
comportamentos específicos por meio dos quais se expressam esses estilos de enfrentamento amplos. Há
respostas de enfrentamento comuns para cada esquema.
18
Aspectos do pensamento, impulsos, atitudes, comportamentos e sentimentos que contrariam e perturbam o
individuo.
54

mudança, oferecendo estabilidade para as necessidades que não foram atendidas


adequadamente na infância. (YOUNG et al, 2008).
De acordo com o modelo proposto por Young, o tratamento para Transtorno de
Personalidade Borderline contém três principais estágios: 1) vínculo e regulação emocional,
2) mudança dos modos e de esquema e 3) autonomia.

De acordo com Young; Klosko; Weichaar, (2008), na primeira etapa, o terapeuta


estabelece vínculos com o paciente, desvia do protetor desligado e se torna uma base estável e
carinhosa. O terapeuta tem que construir junto com o paciente um vínculo emocional seguro,
onde o terapeuta começa a realizar a restauração parental com o modo criança abandonada do
paciente, proporcionando segurança e instabilidade emocional. Ainda nessa etapa, o terapeuta
ensina ao paciente, técnicas de enfrentamento para controlar humores e suavizar o desconforto
causado pelo abandono, principalmente quando os sintomas do paciente forem graves (como
comportamentos suicidas e parassuicidas).
Na segunda etapa, o terapeuta apresenta um modelo de modo adulto saudável ao
fazer a reparação parental do paciente. O adulto saudável age para confortar e proteger os
modos de criança abandonada, para estabelecer limites à criança zangada, para substituir o
protetor desligado e para eliminar o pai/mãe punitivo. A última etapa, o terapeuta oferece
autonomia ao paciente em relação a escolhas adequadas de parceiros e ajuda a generalizar as
mudanças obtidas na sessão aos relacionamentos fora da terapia; Auxilia o paciente a
descobrir suas inclinações naturais e a segui-las em situações cotidianas e em decisões
importantes; O terapeuta vai desacostumando o paciente à terapia ao reduzir a frequência das
sessões. Essas etapas de tratamento esta associada ao panorama geral de tratamento a paciente
TPB. Essa fase se assemelha a prevenção de recaídas proposta por Beck em seu modelo
(YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008).
De forma mais especifica e detalhada, a Terapia do Esquema enfatiza as estratégias
de tratamento trabalhando cada um dos modos apresentados por Young a pacientes com TPB,
onde em cada modo, o trabalho se da através de técnicas cognitivas e comportamentais
semelhantes à de Beck, como também tarefas de casa e instrumentos de avaliação como o
inventario multimodal de histórico de vida; inventário parental de Young e o questionário de
esquemas de Young. Utilizam-se as técnicas de enfrentamento cognitivos (cartões lembretes e
o diário de esquemas, que se assemelha ao registro diário de pensamentos disfuncionais.
55

Sendo técnicas da terapia cognitiva), como também o treino de assertividade do paciente


(YOUNG; KLOSKO; WEICHAAR, 2008).
De acordo com Young (2008), existem cinco principais modos de esquemas que
caracterizam pacientes com TPB, sendo eles: 1) Criança abandonada; 2) Criança zangada e
impulsiva; 3) Pai/Mae punitivo; 4) Protetor desligado e 5) Adulto saudável. O modo criança
abandonada é a criança interior machucada; que sente a dor e o pavor associados à maioria
dos esquemas, como abandono, abuso, privação, defectividade e subjugação. O modo criança
expressa fúria em relação aos maus tratos e às necessidades emocionais não satisfeitas que
originaram os esquemas, ou seja, abuso, abandono, provação, subjugação, rejeição e punição.
O modo pai/mãe punitivo é a voz internalizada dos pais que critica e pune o paciente. Quando
ativado esse modo, o paciente torna-se um perseguidor cruel, de si mesmo. No modo protetor
desligado, ele recusa todas as emoções, desconecta de outras pessoas. O modo adulto
saudável é extremamente frágil e pouco desenvolvido na maioria dos pacientes com TPB,
principalmente no começo do tratamento; onde tal modo é o problema básico do paciente
borderline.
Dessa forma, o principal objetivo do tratamento identificar os modos, como também
fortalecer o modo adulto saudável do paciente para oferecer carinho e proteger a criança
abandonada, a fim de ensinar à criança zangada e impulsiva maneira adequadas de expressar
raiva e fazer com que suas necessidades sejam satisfeitas, bem como para eliminar p modo
pai/mãe punitivo e assim substituir progressivamente o protetor desligado. Assim o terapeuta
molda o adulto saudável ao paciente, como o objetivo de que o paciente internalize suas
atitudes, emoções, reações e comportamentos como seu próprio modo adulto saudável. Com
isso, a identificação dos modos é o centro do tratamento com pacientes TPB (YOUNG;
KLOSKO; WEICHAAR, 2008).

Cada modo possui uma emoção próprio característica. O modo criança abandonada
tem a emoção de uma criança perdida: triste, assustada, vulnerável e indefesa. O
modo criança zangada e impulsiva apresenta a emoção de uma criança furiosa e
impossível de controlar, gritando e atacando o cuidador que frustra suas
necessidades fundamentais, agindo impulsivamente para que suas necessidades
sejam atendidas. O tom do pai/mãe punitivo é duro critico e implacável. O protetor
desligado tem afetos pouco intensos, pouco emotivos e mecânicos. Por fim, o modo
adulto saudável apresenta a emoção de pais fortes e amorosos. O terapeuta
geralmente consegue diferenciar os modos, escutando o tom de voz do paciente e
observando a maneira como fala. O terapeuta do esquema torna- se especialista na
identificação do modo do paciente e desenvolve estratégias voltadas especificamente
ao trabalho com o modo em questão. (YOUN et al, 2008. p. 266).
56

Além dos três principais estágios presentes no tratamento de pacientes borderlines, a


TE, enfatiza o tratamento com cada um dos cinco principais modos presentes no TPB. O
trabalho acontece em quatro etapas, onde descreveremos a seguir como se dá o tratamento
com cada modo, de acordo com Young, Klosko e Weichaar, (2008):

1. Criança abandonada

 Relação terapeuta-paciente: Nesse modo, a relação terapêutica é central no tratamento,


onde através dela o terapeuta busca trabalhar para criar um ambiente de segurança, no
qual o paciente possa se desenvolver, passando de uma criança pequena a um adulto
saudável. O terapeuta se torna uma base estável sobre a qual o paciente constrói
gradualmente uma sensação de identidade e auto-aceitação. O terapeuta tenta suprir as
necessidades da paciente em termos de segurança, cuidado, autonomia, auto-expressão
e limites adequados, pois nesse modo o paciente esse encontra muito vulnerável. O
terapeuta lhe diz: “Pode contar comigo”, “Me preocupo com você̂”, “Não vou
abandoná- la”; com o intuito de estabelecer o papel do terapeuta como base estável e
carinhosa. Fazendo uso de elogios para ajudar a fortalecer a autoconfiança do
paciente.
 Trabalho vivencial: O terapeuta ajuda o paciente a trabalhar eventos de- agradáveis da
infância através de imagens mentais (imagens traumáticas de abuso ou negligencia),
onde o terapeuta dá carinho, empatia e protege a criança abandonada. Ou seja, o
terapeuta faz o que um bom pai ou uma boa mãe teria feito: retirar a criança da cena,
confrontar o autor do abuso, colocar-se entre os dois e fortalecer a criança para lidar
com a situação. Aos poucos, o paciente assume o papel de adulto saudável, entra na
imagem como adulto e faz a reparação parental da criança. Como também auxilia o
paciente a administrar situações desagradáveis na vida atual, trabalhando receios em
relação a uma dada situação.
 Trabalho cognitivo: O terapeuta educa o paciente em relação a necessidades de
desenvolvimento da criança, pois seus pais lhes ensinaram que até mesmo tais
necessidades eram “erradas”, ou seja, esses pacientes não sabem que é normal às
57

crianças necessitarem de segurança, amor, autonomia, elogio e aceitação. Trabalho


cognitivo.
 Trabalho comportamental: O terapeuta possibilita ao paciente a aprender técnicas de
assertividade. O paciente pratica essas técnicas durante as sessões, em exercícios com
imagens mentais e dramatização, e também como tarefa de casa. O objetivo é que o
paciente aprenda a controlar os sentimentos de forma produtiva e a desenvolver
relacionamentos íntimos com pessoas adequadas, nos quais possa ser vulnerável sem
sufocar o outro.

2. Criança zangada/impulsiva

 Relação terapêutica: Nesse modo, ter raiva do terapeuta é comum, para muitos
terapeutas, constitui o aspecto mais frustrante do tratamento. Onde o mesmo sente-se
esgotado, tentando atender às necessidades do paciente. Dessa forma, quando o
paciente se volta contra o terapeuta e diz “Você não se importa comigo, eu odeio
você̂”, é natural que o terapeuta sinta raiva. Desse modo, o passo aqui é definir limites
se a raiva do paciente for abusiva, seguindo quatro passos: liberar a raiva, empatizar,
realizar testagem da realidade e ensaiar.
 Trabalho vivencial: os pacientes liberam completamente a raiva em relação a
indivíduos representativos que os maltrataram em sua infância, adolescência ou vida
adulta. O terapeuta os estimula a liberar a raiva da forma que preferirem, mesmo
imaginando atacar pessoas que os magoaram. (A exceção, é claro, é o paciente
violenta: os terapeutas não devem estimular pacientes que tenham um histórico de
comportamento violento a imaginar fantasias violentas).
 Trabalho cognitivo: Como dito anteriormente, a educação em relação às emoções
humanas normais constitui uma importante parte do tratamento de pacientes com TPB.
Sendo assim, nesse modo é importante ensinar ao paciente o valor da raiva. “Os
pacientes com TPB tendem a pensar que toda a raiva é ruim”. Com isso, o terapeuta
reassegura que nem toda a raiva é ruim, e que sentir raiva e expressá-lá
adequadamente é normal e saudável, porem precisam aprender a expressar sua raiva
58

de maneira mais construtiva e eficaz, dessa forma, se faz uso de habilidades de


assertividade.
 Trabalho comportamental: O paciente pratica técnicas de controle da raiva e
assertividade, tanto por meio de imagens quanto de dramatizações, durante as sessões
e em tarefas de casa, entre sessões.

3. Pai/Mãe punitivo

 Relação terapêutica: O terapeuta se alia ao paciente contra o pai/mãe punitivo,


mostrando que o pai/mãe punitivo é falso e assim se ali ao paciente contra esse modo,
assumindo uma postura de confronto empático, enfatizando as dificuldades do
paciente. Ao transformar a parte autopunitiva da paciente, o terapeuta o ajuda a
desfazer o processo de identificação e internalização que criou o modo no inicio da
infância.
 Trabalho vivencial: O terapeuta ajuda o paciente a lutar contra o modo do pai/ mãe
punitivo através de exercícios com imagens mentais. Inicialmente o terapeuta auxilia a
identificar qual dos pais (ou outras pessoas) o modo realmente representa. A partir daí,
passa a chamar o modo pelo nome representativo, com isso o paciente se torna capaz
de se distanciar da voz punitiva do modo e assim de combatê-lo.
 Trabalho cognitivo: O terapeuta educa o paciente em relação ao sentimento de se
sentir merecedor de ser punido pelo que faz; O terapeuta ensina o paciente que a
punição não é uma estratégia eficaz de aprimoramento. Quando o paciente comete
erros, o terapeuta o ensina a substituir a autopunição por uma resposta mais
construtiva, que envolva perdão, compreensão e crescimento; Assumindo
responsabilidades sem se punir.
 Trabalho comportamental: Os pacientes com TPB tem a expectativa de que outras
pessoas os tratem da mesma forma que seus pais os trataram; Diante disso, o terapeuta
estabelece experimentos para testar essa hipótese, onde o proposito é demonstrar ao
paciente que expressar de forma adequada necessidades e emoções geralmente não
levaraḿ à rejeição ou retaliação por parte de pessoas saudáveis. Com isso, o terapeuta
e o paciente dramatizam a interação até que o mesmo se sinta confortável o suficiente
59

para tentar, depois realiza como tarefa de casa, e assim o paciente será́ recompensado
por seus esforços com uma resposta positiva.

4. Protetor desligado
 Relação terapêutica: O terapeuta auxilia o paciente a conter emoções carregadas,
acalmando-o para que o protetor desligado se sinta seguro ao lhe permitir que
experimente seus sentimentos. O terapeuta permite que o paciente expresse todos os
seus sentimentos dentro dos limites adequados, incluindo raiva com relação ao
terapeuta, sem puni-lo. O terapeuta começa atribuindo nome ao modo, ajudando o
paciente a reconhecer e identificar os sinais que o ativam. Logo após, o terapeuta
analisa o desenvolvimento do modo na infância do paciente e evidencia seu valor
adaptativo, ajudando-o a observar eventos que antecedem a ativação do modo fora da
terapia e as consequências do desligamento.
 Trabalho vivencial: É realizado através de exercício de imagens mentais da criança
vulnerável, que muitas vezes eles conseguem acessar imediatamente os sentimentos
por trás de seu personagem sem sentimento.
 Trabalho cognitivo: O terapeuta evidencia as vantagens de vivenciar emoções e de se
conectar com outras pessoas. Pois, viver no modo protetor desligado é viver como
alguém emocionalmente morto. E assim, a satisfação emocional verdadeira só está
disponível aos que se dispõe a querer sentir.
 Trabalho comportamental: O protetor desligado é de extrema resistência em se abrir
emocionalmente para com as pessoas, sendo assim, no trabalho comportamental, o
paciente tenta se abrir de forma gradual e em etapas, apesar da resistência, onde o
paciente pratica as imagens mentais ou dramatizações nas sessões com o terapeuta e,
depois, realiza tarefas de casa. Por exemplo, um paciente pode ter o objetivo de
compartilhar mais seus sentimentos sobre um assunto com um de seus amigos íntimos.
Ele pratica a expressão de seus sentimentos com esse amigo em dramatizações com o
terapeuta e depois o faz de verdade com o amigo na semana seguinte, como tarefa de
casa.
60

5. Adulto saudável

 E por fim chega ao ultimo modo, que é o principal objetivo do tratamento, onde o
terapeuta modela o adulto saudável ao paciente, aleḿ que ele internalize suas atitudes,
emoções, reações e comportamentos como seu próprio modo adulto saudável. E assim
fortalecer o modo adulto saudável do paciente para oferecer carinho e proteger a
criança abandonada, a fim de ensinar à criança zangada e impulsiva forma mais
adequado de expressar raiva e fazer com que suas necessidades sejam satisfeitas,
assim sujeito age e pensa de forma positiva para consigo, buscando relações e
atividades saudáveis.···.
 Ao se trabalhar os modos, terapia focada em esquemas se torna mais longa do que a
TCC, pois se dedica muito mais tempo para identificar e superar a levitação cognitiva,
afetiva e comportamental dos modos, com o objetivo de oferecer uma teoria que seja
simplificada e compreensível para os pacientes sobre seus esquemas e modos, e
principalmente o tratamento e adequação dos mesmos. Os elementos essenciais para o
sucesso da terapia de esquemas para pacientes borderlines são os limites oferecidos
pelos terapeutas, assim como o trabalho com os modos e o progresso terapêutico de
acordo com os estágios (YOUNG ET al. 2008).
 A terapia do esquema (TE) é uma abordagem em que o terapeuta necessita de preparo
emocional ao paciente durante o processo de psicoterapia, não apenas porque expõe as
fragilidades mais íntimas do indivíduo, mas porque a própria relação terapêutica torna-
se o agente da mudança. Como vista a importância do empirismo colaborativo na
abordagem de Beck, um dos pontos principais da TE é a relação terapêutica, pois essa
abordagem foi desenvolvida inicialmente para promover intervenções em pacientes
difíceis e resistentes, assim seu método central é a relação terapêutica, visto que é no
campo dos relacionamentos que os maiores prejuízos na vida desses indivíduos são
observados. Os modos desadaptativos dos pacientes serão ativados ao longo da relação
terapêutica, e estes irão reproduzir inúmeras vezes as interações disfuncionais que
estabeleceram por meio de seus esquemas iniciais desadaptativos, sendo essa a
oportunidade para repará-los (WAINER, 2016).
61

4.3. Terapia Comportamental Dialética (TCD)

Diante das dificuldades em tratar o Transtorno de Personalidade Borderline, no


inicio da década de 1990, Marsha Linehan desenvolveu a TCD inicialmente voltada para
tratar mulheres com níveis graves de TPB, e também, como estratégia orientada a modificar
comportamentos de suicídio e parassuícidio. (LINEHAN, 2010).
De acordo com Linehan (2010), o problema principal do TPB é o padrão invasivo de
regulação emocional. Com isso, todos os problemas comportamentais (autoautomutilante,
suicida e parasuicida), bem como a desregulação cognitiva (pensamento dicotômico, ideação
paranoide transitatoria) e os problemas interpessoais (instabilidade nos relacionamentos), são
ocasionados por esta desregulação emocional. Supostamente tal desregulação emocional seria
derivada e mantida por fatores biológicos. Porém, a predisposição biológica não seria
suficiente para o desencadeamento do TPB. De acordo com a autora, a invalidação das
necessidades emocionais da criança esta ligada ao surgimento das características borderlines.
Essa invalidação, ou melhor, ambiente invalidante é o ambiente onde a criança se percebe
punida por ser como é se comportar como se comporta e se sentir da maneira como se sente
(LINEHAN, 2010).
A Terapia Comportamental Dialética é, em sua maior parte, a aplicação de uma
ampla variedade de estratégias de terapia cognitiva e comportamental aos problemas do TPB,
mas também tem diversas características específicas que a definem. Como sugere o seu nome,
sua principal característica é a ênfase na dialética19, a qual envolve aceitação dos pacientes nas
suas atuais dificuldades; fornecendo meios práticos para paciente e terapeuta manterem
equilíbrio e flexibilidade ao longo do processo terapêutico, onde o terapeuta encontra e se
relaciona com as potencialidades do paciente, e não com sua fragilidade (LINEHAN, 2010).
A lógica dialética nesse transtorno envolve a aceitação dos pacientes nas suas atuais
dificuldades, por exemplo, pelo recurso a estratégias como o mindfulness20, ao mesmo tempo
em que faz uso das suas competências para a modificação dos comportamentos desajustados
por meio de um componente didático, análise metódica e interativa dos comportamentos,

19
Termo oriundo da filosofia que pode ter mais de um significado, dependendo do autor ou filosofo que a
emprega. Tal conceito pode ser um método de persuasão, visão de mundo e ou um conjunto de pressupostos
acerca da natureza da realidade. (MELO, 2014)
20
Praticada em diferentes terapias comportamentais e cognitivas, como forma específica de atenção plena –
concentração no momento atual, intencional, e sem julgamento.
62

entre outras estratégias; envolvendo terapia individual e de grupo. As sessões individuais são
utilizadas para ensinar novas competências ao paciente, e as sessões de grupo fornecem-lhe a
oportunidade de colocar essas competências em prática (LINEHAN, 2010).
No tratamento de tentativas de suicídio e automutilação, em geral, prepara-se um
protocolo, embora o objetivo seja prevenir a hospitalização, sendo útil em situação de crise.
Pode-se fazer um contrato que estabeleça claramente o papel do paciente e do terapeuta
quando houver ameaças e tentativas de suicídio. É feita uma análise para esclarecer as
respostas cognitivas e emocionais que levam as tentativas de suicídio, discutindo-se soluções
alternativas e reforçando-se respostas não suicidas (GABBARD; BECK; HOLMES, 2007).
Assim como a TE, a TCD utiliza técnicas em comum da TCC, como o Cartão de
enfrentamento, que são úteis para ajudar a lembrar, e para lutar com os esquemas patogênicos
em um dos lados são descritos o raciocínio patogênico e o esquema ativado, de modo que o
paciente possa compreender as emoções que causam esse esquema, no outro lado é oferecida
uma visão sadia, juntamente com uma maneira funcional de lidar com os problemas. O role-
play também é uma técnica da TCC, onde terapeuta e cliente se comportam imitando o
comportamento de alguma pessoa relevante no ambiente natural do sujeito ou fazendo uma
representação do comportamento do próprio sujeito em alguma situação social (Tavares,
2005). São úteis para ensinar aos pacientes habilidades interpessoais, como assertividade e
expressão de sentimentos apropriados em relação a alguém (BECK et al, 2005).
Os pacientes com TPB devem aprender a tolerar a experiência de emoções negativas
fortes, sem atuar com comportamentos que sirvam para evitar ou escapar da experiência.
Técnicas de exposição da terapia comportamental podem ser úteis, assim como exercícios de
escrever, uma carta para um abusador do passado (sem enviá-la), expressando todos os
sentimentos (BECK et al, 2005).
A TCD é uma abordagem de intervenção estruturada, onde o processo terapêutico
configura-se em duas linhas gerais de objetivos centrais construídos com o paciente: os
comportamentos que necessitam ser reduzidos e os comportamentos que necessitam ser
aumentados. O estabelecimento adequado das metas de tratamento é essencial para que o
trabalho tenha sucesso e assim obter bons resultados, como também o compromisso do
paciente é essencial. A TCD prioriza os problemas que devem ser trabalhados inicialmente de
acordo com a ameaça que oferecem a vida do paciente, onde o foco é listado por ordem de
63

importância. O compromisso com as metas primarias faz parte da estrutura de tratamento,


sendo denominada como pré-tratamento. A estrutura geral de tratamento na TCD acompanha
quatro estágios: (1) Estabilidade emocional e dos relacionamentos; (2) Trabalho sobre
processamento emocional do passado; (3) síntese de resolução de problemas; (4) Foco no
senso de completude (LINEHAN, 2010).
No primeiro estágio, o alvo são os comportamentos necessários para adquirir
expectativa de vida, controle das ações e vínculo suficiente para o tratamento. No segundo
estágio o foco é alcançar experiências não traumáticas e a conexão com meio ambiente, onde
o trabalho com as memórias traumáticas derivadas do ambiente invalidante e experiências
negativas do paciente, são prioridades nesse estágio. O terceiro, o paciente sintetiza o que foi
aprendido nos estágios anteriores, com ênfase no aumento do respeito próprio e permanente
sentido de conexão, bem como resolução de problemas de vida, onde os focos são: o auto
respeito, domínio das emoções, comportamentos, auto eficácia, senso de moralidade e
qualidade de vida. O quarto estágio foca no senso de incompletude (sentimento de
imperfeição e insuficiência) que muitos indivíduos borderlines experimentam após seus
problemas de vida tenham sido resolvidos (LINEHAN, 2010).
Assim como as estratégias gerais, existem estratégias especificas na abordagem TCD
que dão suporte específico ao plano de tratamento a pacientes TPB, como a estratégia de:
Penetrar no paradoxo (os pacientes são livres para escolher seus próprios comportamentos,
mas não podem permanecer na terapia se não tiver esforço para muda-lo, onde são ensinados
a obter independência, tornando-se mais habilidosos). O uso de metáforas (comportamentos
que interferem na terapia, comportamentos passivos, suicidas e evitação emocional), onde o
terapeuta utiliza metáforas para trabalhar tais comportamentos. Outra estratégia é o Advogado
do diabo (uso do exagero com base nas crenças do paciente, provocando a contra
argumentação do mesmo). Ativação da mente sabia (integração entre a mente racional e a
mente emocional). Fazer dos limões uma limonada, também é uma estratégia especifica da
TCD, onde se utiliza experiências traumáticas negativas da vida do paciente, como
experiências ricas em aprendizado e fortalecimento pessoal. E por fim, as estratégias de
ativação de mudanças naturais e avaliação dialética, onde a natureza da realidade é processo
de mudança e desenvolvimento e na ultima, se utiliza questionamentos referentes ao paciente
(LINEHAN, 2010).
64

É importante ressaltar que na TCD as metas e objetivos da terapia não se baseiam


apenas em extinguir comportamentos disfuncionais graves, e sim, em oferecer ao paciente
uma vida digna. Dessa forma, além das estratégias, a TCD utiliza intervenções através do
treino de habilidades, resolução de problemas, e validação (LINEHAN, 2010).
Segundo Linehan (2010), o treino de habilidades tem a função de desenvolver as
habilidades ausentes no paciente TBP; acompanhada por estratégias cognitivas e
comportamentais para minimizar comportamentos e emoções disfuncionais; dessa forma,
possibilita ao paciente, habilidades para a regulação das emoções, tolerar o sofrimento
emocional, ser mais efetivo nos conflitos interpessoais e assim desenvolver maior
estabilidade. A resolução de problemas é indicada para determinar o controle e para lidar com
os problemas; utilizando estratégias psicoterápicas da TCC, como a psicoeducação,
restruturação cognitiva, treino de habilidades sociais. Acompanhada ainda de
automonitoramento e a técnica de mindfulness, (que vem sendo muito utilizada com pacientes
TBP, utilizando atenção plena para auxiliar tais pacientes a desenvolverem a capacidade de
prestar atenção às próprias sensações e sentimentos). A validação é essencial para a mudança
dos padrões disfuncionais do paciente, principalmente referente à desregulação emocional. As
estratégias de validação na TCD são destinadas a comunicar e validar emoções do paciente,
bem como a dos seus pensamentos e ações.

O terapeuta cria um contexto de validação, mais do que de culpa, para o paciente, e,


nesse contexto, o terapeuta bloqueia ou extingue os maus comportamentos, busca os
bons comportamentos do paciente e descobre como fazer com que os bons sejam tão
reforçadores que o paciente dê continuidade a eles e interrompa os maus
comportamentos. (LINEHAN, 2010. p. 102).

Pacientes Borderlines frequentemente são acostumados a trazer suas próprias


respostas validas como invalidas, assim é importante que o terapeuta identifique tais
respostas, procurando pontos positivos no paciente, além de ensina-lo a se autovalidar.
A TCD tem como objetivo promover a eficácia interpessoal, regulação emocional,
tolerância a estresses e autocontrole. O tratamento é estruturado e planejado de acordo com as
habilidades emocionais e sociais positivas do cliente. A partir disso, o terapeuta ajuda o
paciente a identificar, aceitar e lidar com suas dificuldades emocionais. Através da validação
das emoções e da utilização de atividades, como análise de comportamento, meditação e
65

aplicação da atenção plena, o terapeuta usa estratégias a fim de diminuir os efeitos negativos
do estresse e promover a necessidade de mudança (LINEHAN, 2010).
Proposta por Marsha M. Linehan, a TCD tem um componente de psicoterapia individual e
outro de terapia em grupo. Seu fundamento teórico vem basicamente do Behaviorismo com
elementos do Cognitivismo. A terapia individual da TCD tende a ser bastante direta e confrontatória,
e busca abordar em uma sessão semanal os conteúdos que venham a se apresentar. A prioridade é
dada à atenção a comportamentos suicidas e autodestrutivos, e depois a comportamentos que
interfiram com a própria terapia. A seguir vêm assuntos ligados à qualidade de vida e à sua melhora;
as sessões de grupo fornecem-lhe a oportunidade de colocar essas competências em prática
(LINEHAN, 2010).
Diante disso, é visto que o tratamento para pacientes borderlines adquiriu sucesso
através da terapia do esquema e a terapia comportamental dialética, onde tais formas de
psicoterapias derivam da terapia cognitivo comportamental de Beck, enfatizando e
compartilhando de técnicas e estratégias em comum com a TCC, como algumas técnicas
cognitivas e comportamentais; e principalmente a relação terapêutica que cada abordagem
prioriza como fundamental no tratamento. Dessa forma é possível visualizar a interação entre
as terapias cognitivas, onde cada uma se fez a partir do modelo de Beck, sendo desenvolvida e
estruturada a partir das necessidades que não eram supridas pela TCC no tratamento do TPB.
66

CONCLUSÃO

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou um entendimento sobre o


transtorno de personalidade borderline, assim como seu desenvolvimento, características,
critérios diagnósticos e funcionamento. Além disso, foi possível perceber que mesmo sendo
considerado um transtorno complexo e difícil de tratar, as terapias cognitivas possibilitam um
tratamento mais preciso e eficaz.

Nesse enfoque, observamos a importância das interações entre as terapias cognitivas


da segunda e terceira onda, de modo que a partir do modelo de terapia de Beck, foram
desenvolvidas outras linhas terapêuticas especificas para trabalhar tal transtorno, porém se
evidenciou que as intervenções propostas por Beck não supriram as demandas apresentadas
pelo TBP. Desta forma, com o desenvolvimento da terapia do esquema (TE) e da terapia
comportamental dialética (TCD) aliadas à teoria de Beck, o sucesso no tratamento vem
apontando resultados promissores. No futuro, uma maior integração desses três modelos pode
levar a um modelo de tratamento para o TPB mais eficaz e conceitual.

Assim, foi possível perceber que o avanço promissor no tratamento TPB se deu a
partir do desenvolvimento da TE e TCD. Os seus objetivos não se diferem totalmente,
podemos dizer que, a TE prioriza a investigação das origens infantis, identificar a trajetória
dos esquemas desde a infância até o presente, com ênfase particular nos relacionamentos
interpessoais do paciente; a TCD tem como objetivo promover a eficácia interpessoal,
regulação emocional, tolerância a estresses e autocontrole.

Com isso, visualizamos que a evolução das terapias cognitivas é importante dentro
do universo do TPB, pois além de promover um tratamento efetivo, possibilita ao paciente
uma compreensão positiva acerca do seu funcionamento. Dessa maneira, o estudo possibilitou
entender e visualizar que, mesmo sendo considerado um transtorno complexo e difícil, o
tratamento, apesar de longo, é eficaz.

Este trabalho poderá subsidiar pesquisas futuras acerca do tema TPB, principalmente
no que se refere à difícil relação interpessoal destes indivíduos com os seus familiares,
companheiros (as) e amigos. Assim, cabe uma investigação mais aprofundada em torno destas
67

relações, dado que cada sujeito que se relaciona com o indivíduo com TPB pode estar
necessitando de suporte.
68

REFERÊNCIAS

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Transtornos de Personalidade. In: ______.


Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais DSM-5. Porto Alegre: Artmed,
2014

ANDREASEN, N. C.; BLACK, D. W. Introdução a psiquiatria. 4° ed. Porto Alegre, 2008.


p. 303-334.

BASSITT, D.P, LOUZÃ NETO. Transtornos de personalidade. In. LOUZÃ, M. R.; ELKIS,
H. Psiquiatria básica. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. p. 346-360.

BECK, A. T.; ALFORD, B. A. O poder integrador da terapia cognitiva. Porto Alegre:


Artes Médicas Sul. 2000. Disponível em: <http://www.docfoc.com/aaron-beck-o-poder-
integrador-da-terapia-cognitiva>. Acessado em: 18 set. 2016.

BECK, A. T.; FREEMAN, A. DAVIS, DENISE D. Terapia cognitiva dos transtornos da


personalidade. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 167-188.

BOTELHO LLR, CUNHA CCA, MACEDO M. O método da revisão integrativa nos


estudos organizacionais. Gest Soc. 2011 ago;5(11):121-36.

DAMASIO, H. et al. O retorno de Phineas Gage: pistas sobre o cérebro do crânio de um


paciente famoso. Ciência, v 264, n. 5162. 1994. p. 1102-1105.

FADMAN, J. FRAGER, R. Personalidade e Crescimento Pessoal. 5. ed. Artmed, 2004. p.


19-140
FALCONE, E. M. O. Terapia do Esquema In. MELO, W. V (org). Estratégias
psicoterápicas e a terceira onda em terapia cognitiva. Novo Hamburgo: SINOPSYS, 2016.
p. 264-288.

FEIST, J. FEIST, G. ROBERTS, T. A. Introdução a Teoria da Personalidade. In:______


Teorias da Personalidade. 8ª. Ed. Porto Alegre. Artmed. 2015. p. 4-8.

HALPERIN, C. F. CARNEIRO, J. C.R. A teoria do apego e as bases familiares da terapia do


esquema. In: WAINER, R.; PAIM, K. ERDOS, R.; ANDRIOLA, R. Terapia cognitiva
focada em esquemas: integração em psicoterapia. Porto Alegre: Artmed, 2016. p. 39-47.

KLOSKO, J. YOUNG, J. A terapia cognitiva do transtorno da personalidade borderline. In:


LEAHY, R. L. et al. Terapia cognitiva contemporânea: teoria, pesquisa e prática. Porto
Alegre: Artmed, 2009. p. 243-268.

KNAPP, P.; BECK, A.T. Fundamentos, modelos conceituais, aplicações e pesquisa da


terapia cognitiva Cognitive therapy: foundations, conceptual models, applications and
research. Rev Brasileira de Psiquiatria, v. 30, n. 2008. p. 554-564.
69

LINEHAN, M. M. Transtorno da Personalidade Borderline: Conceitos, Controvérsias e


Definições. In: ______Terapia cognitivo-comportamental para transtorno da
personalidade Borderline: guia do terapeuta. Porto Alegre: Artmed, 2009. p. 16-73.
______. Estratégias Básica de Tratamentos. In: ______Terapia cognitivo-comportamental
para transtorno da personalidade Borderline: guia do terapeuta. Porto Alegre: Artmed,
2009. p. 192-370.

MARI, J. J.; KIELING, C. Transtorno de personalidade. In: ______Psiquiatria na Prática


Clínica, 1º ed. Barueri, SP: Manole, 2013.

MELO, W. V (org). Terapia Comportamental Dialética. In:______ Estratégias


psicoterápicas e a terceira onda em terapia cognitiva. Novo Hamburgo: SINOPSYS, 2016.
p. 314-343.

NABINGER, A. B. Psicoterapia e neurobiologia dos esquemas. In: WAINER, R.; PAIM, K.


ERDOS, R.; ANDRIOLA, R. Terapia cognitiva focada em esquemas: integração em
psicoterapia. Porto Alegre: Artmed, 2016. p. 27-38

Organização Mundial da Saúde. CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças


e Problemas Relacionados à Saúde. 10a rev. São Paulo: Universidade de São Paulo; 1997.
vol.2. p. 339-360.

PASTORE, E.; LISBOA, C. S. M. Desempenho cognitivo em pacientes com Transtorno de


Personalidade Borderline com e sem histórico de tentativas de suicídio. 2012. p. 10-17.

PERVIN, L. A.; JOHN, O. P. Personalidade: Teoria e Pesquisa. 8° ed. 2004. p. 21-32.

POWELL, V. B, et al. Terapia cognitivo-comportamental da depressão Cognitive-behavioral


therapy for depression. Rev Bras Psiquiatria, v. 30, n. 2008. p. 573-580. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/rbp/v30s2/a04v30s2>. Acesso em: 29 nov. 2016.

RIBEIRO, H. L.; CORDÁS, T. A.; NOGUEIRA, F. C. Transtorno da personalidade


borderline. In: LOUZÃ, M. R. et al. Transtornos da personalidade. Porto Alegre: Artmed,
2011. p. 111-122.

SCHERER, P. F. Avaliação psicológica no transtorno de personalidade Borderline:


estudos brasileiros. 2016. p. 4-21. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10183/147087>.
Acesso em: 29 nov. 2016.

SKODOL, A. E. GUNDERSON, J. G. Transtornos da Personalidade. In: HALES, R. E.;


YUDOFSKT, S. C.; GABBARD, G. O. Tratado de Psiquiatria. 5. Ed. Artmed, 2012. p.
854- 894.

VENTURA, P; RODRIGUES, H.; FIQUEIRA, I. L. V. Transtorno de personalidade


borderline. In: RANGÉ, B et al. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo
com a psiquiatria. 2. Ed. Porto Alegre. Artmed. 2011. p. 551-567.
70

WAINER, R. O desenvolvimento da personalidade e suas tarefas evolutivas In:______


.Terapia cognitiva focada em esquemas: integração em psicoterapia. Porto Alegre:
Artmed, 2016. p. 15-26.

WAINER, R.; RIJO, D. O modelo teórico: esquemas iniciais desadaptativos, estilo de


enfrentamento e modos esquemáticos. In: WAINER, R.; PAIM, K. ERDOS, R.; ANDRIOLA,
R. Terapia cognitiva focada em esquemas: integração em psicoterapia. Porto Alegre:
Artmed, 2016. p. 47-65.

YOUNG, J. E.; KLOSKO, J. S.; WEISHAAR, M. E. Terapia do esquema: guia de técnicas


cognitivo-comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed, 2008. p. 17-317.

Você também pode gostar