Você está na página 1de 1

Aliados da ternura

“ Quando lhe peço para me escutar e você começa a me dar conselhos, sinto que não sou
escutado;
quando lhe peço para me escutar e você me coloca questões, apresenta seus argumentos,
tenta explicar o que estou sentindo ou não deveria sentir, tenho a impressão de ser agredido;
quando lhe peço para me escutar e você se apodera do pedido para tentar resolver o que
julga ser meu problema, por mais estranho que isso possa parecer, sinto-me ainda mais
perdido;
quando lhe peço sua escuta, estou lhe pedindo para estar presente, nesse instante tão frágil
em que estou à minha procura através de uma palavra, por vezes desajeitada, inquietante,
injusta ou caótica.
Tenho necessidade de ser ouvido,de tolerância e paciência , para exprimir o que me parece
ser o mais difícil, assim como o mais acessível.
Sim, simplesmente me escutar... sem escusas nem acusações, sem me desapossar de minha
palavra. Fique à minha escuta.Tudo o que peço é que você me escute. O mais pertinho de
mim. Simplesmente acolher o que tento lhe dizer, o que procuro me dizer.
Não interrompa meu murmúrio, não tenho medo de meus tateios ou imprecações.
Minhas contradições, assim como minhas acusações, por mais injustas que pareçam são
importantes para mim. Através de sua escuta tento exprimir ainda diferença; procuro,
sobretudo, escutar a mim mesmo, assim, tenho acesso a uma palavra própria, aquela de que,
durante muito tempo, fui desapossado.
Oh! Não, não tenho necessidade de conselhos. Posso agir por minha própria iniciativa e
também me enganar. Não sou incapaz; por vezes fico desarmado, desencorajado, hesitante,
o que não significa impotência. Se você pretende agir por mim, estará contribuindo para
conservar meu medo, acentuando minha inadequação e, talvez, reforçando minha
dependência.
Quando me sinto escutado, posso entrar em comunhão, construir pontes, passarelas incertas
entre minha história e minhas histórias,religar acontecimentos, situações, encontros ou
emoções para que tudo isso venha tornar-se a trama de minhas interrogações;para tecer
assim a escuta de minha vida. Sim, sua escuta é apaixonante. Por favor, escute-me e
entenda-me. E se, por sua vez, você quiser falar, espere um instante para que eu possa
terminar e ficarei, então à sua escuta em melhores condições, sobretudo porque me senti
escutado. ”

Texto extraído do livro “Cativando a ternura” do psicossociólogo francês Jacques Salomé,


da Editora Vozes.

Licenciado para - Julia Brandt Pedrollo - 03415033040 - Protegido por Eduzz.com

Você também pode gostar