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Educação
em
Vigilância
Sanitária
TEXTOS E CONTEXTOS
Caderno 1
Brasília – DF
2020
MINISTÉRIO DA SAÚDE
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Educação
em
Vigilância
Sanitária
TEXTOS E CONTEXTOS
Caderno 1
Brasília – DF
2020
2020 Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Esta obra é disponibilizada nos termos da Licença Creative Commons – Atribuição – Não Comercial –
Compartilhamento pela mesma licença 4.0 Internacional. É permitida a reprodução parcial ou total
desta obra, desde que citada a fonte.
A coleção institucional do Ministério da Saúde pode ser acessada, na íntegra, na Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da
Saúde: www.saude.gov.br.
Tiragem: 1ª edição – 2020 – versão eletrônica
Elaboração, distribuição e informações:
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Secretaria-Executiva
Departamento de Economia da Saúde,
Investimentos e Desenvolvimento
Coordenação-Geral de Programas e Edição e textos finais:
Projetos de Cooperação Técnica Eugênia Lacerda
Coordenação de Projetos de Cooperação Nacional Revisão:
Esplanada dos Ministérios, bloco G, 3º andar Rosaura Hexsel
CEP: 70058-900 – Brasília/DF
Tel: (61) 3315-2696 Colaboração:
E-mail: proadi-sus@saude.gov.br Ana Maria Alkmim Frantz
Clélia Parreira
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA Izabel Cristina Santullo Rocha Lima
SIA, Trecho 5, área especial 57 Maria de Fátima Ferreira Francisco
CEP: 71205-050 – Brasília/DF Patrícia Laboissiere Moreira
Tel.: (61) 3462-4247 Regina Célia Borges de Lucena
Site: portal.anvisa.gov.br
E-mail: asnvs@anvisa.gov.br Projeto gráfico visual:
Daniel Ledra Vasconcellos – Fiocruz Brasília
Organização:
Eugênia Lacerda Capa:
Rosaura Hexsel Daniel Ledra Vasconcellos – Fiocruz Brasília
Ficha Catalográfica
Brasil. Ministério da Saúde.
Educação em Vigilância Sanitária : textos e contextos : caderno 1 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Agência
Nacional de Vigilância Sanitária. – Brasília : Ministério da Saúde, 2020.
101 p. : il.
Modo de acesso: World Wide Web: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigilancia_sanitaria_textos_contextos_
caderno1.pdf
ISBN 978-85-334-2794-5
1. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 2. Educação Sanitária. 3. Promoção da saúde. I. Título. II. Agência
Nacional de Vigilância Sanitária.
CDU 614.3
Catalogação na fonte – Coordenação-Geral de Documentação e Informação – Editora MS – OS 2020/0026
Título para indexação:
Health Surveillance Education: texts and contexts: book 1
S
umário
7
Eis o Texto
9
Entendendo o Contexto
PARTE I - TEXTOS
As bases estruturantes para uma boa prática educativa
13
Articulando Saberes
19
Educação e Saúde - caminhos e percursos para uma vida saudável
27
A comunicação como ferramenta para promover a saúde – processo, direito e
desafio
33
Mobilização Social e Promoção da Saúde - caminhos que se cruzam
41
Educação e Saúde - uma aproximação oportuna e necessária para a promoção
da saúde
PARTE II - CONTEXTOS
Educação e Saúde - a dose certa para uma vida saudável
53
Educanvisa na prática escolar
57
Educanvisa - considerações para análise no contexto da Política de Saúde
Brasileira
63
Produção Editorial - Letra, som e imagem como ferramentas para promover a
saúde
71
Mobilização Social - O Encontro e a arte em busca da qualidade de vida da
comunidade
IMPRESSÕES E EXPRESSÕES
Avaliando o Encontro
81
O olhar dos participantes sobre o Encontro Educação e Saúde - a dose certa
para uma vida saudável
SUPLEMENTO ESPECIAL
87
Programação
89
Participantes do Encontro Educação e Saúde - a dose certa para a vida saudável - 2016
96
GALERIA EDUCANVISA
Eis o Texto
A
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa acredita que fortalecer
a atividade educativa da vigilância sanitária é trabalhar em direção ao incremento
do bem-estar social das comunidades e, neste sentido, a escola é um espaço
privilegiado. Por sua natureza formadora e potencializadora da assimilação de
valores e de comportamentos, a comunidade escolar cumpre uma função de
preparação para a vida e para o exercício da cidadania e assim, fazendo, torna-se
uma grande e indispensável aliada do projeto social de se promover saúde para
todos. Esta é a razão de ser do Projeto Educanvisa – Educação em Vigilância
Sanitária, que vem sendo realizado pela Anvisa, desde 2006.
7
Entendendo o
Contexto
A
Educação em Vigilância Sanitária é uma das estratégias da Anvisa para
operacionalizar sua missão de proteger a saúde da população. No conjunto
das ações institucionais, insere-se no eixo Gestão da Educação, por meio
do Programa de Educação para a Promoção da Saúde. Tem como propósito
desenvolver estratégias de educação e comunicação para a promoção da saúde
no contexto da vigilância sanitária.
O projeto, entre 2006 e 2015, já atendeu mais de 146 mil alunos de 1.163
escolas públicas brasileiras. Capacitou mais de 4.822 professores e cerca de 500
profissionais de vigilância sanitária, em quase 300 municípios brasileiros.
9
A cada dois anos, o Educanvisa realiza um encontro nacional a fim de
garantir a mobilização em torno da proposta ao tempo que possibilita tanto
a troca de experiências quanto a produção do conhecimento sobre as ações
desenvolvidas nas escolas municipais.
10
A Parte III, nomeada EXPERIÊNCIAS E VIVÊNCIAS – o Educanvisa nas
escolas, traz uma síntese dos relatos das experiências locais apresentadas
segundo os dois eixos de apresentação dos trabalhos: Produção editorial – letra,
som e imagem como ferramenta para promover a saúde; e Mobilização Social –
o encontro e arte em busca da qualidade de vida da comunidade.
11
PARTE I - TEXTOS
As bases estruturantes
para uma boa prática
educativa
N
ARTICULANDO SABERES
13
A educação, com potencial para De que concepções de educação e
continuar alavancando a formação de comunicação está-se falando?
de indivíduos mais conscientes e De quais estratégias de mobilização
mais comprometidos com a saúde social se fala quando se tem em mente
e com a vida, em sua totalidade; a a necessidade de promover saúde
comunicação, com capacidade para como “um recurso para a vida”?
ampliar o acesso à informação sobre
saúde e para fomentar o diálogo entre Os textos que seguem são
as instâncias gestoras do sistema de como faróis a iluminar caminhos.
saúde e a sociedade e, assim, abrir Tratando dos processos de educação,
perspectivas para uma ação política comunicação e mobilização social para
mais participativa e democrática, a promoção da saúde, eles apresentam
para uma ação verdadeiramente perspectivas para a integração de
cidadã; e, finalmente, a mobilização saberes que se faz necessária à
social, no âmbito comunitário, com transformação da complexa realidade
competência para convocar vontades, da saúde e, especialmente, da prática
identificando e disponibilizando da educação em vigilância sanitária
recursos econômicos, sociais, no país. Foram elaborados por
culturais e ambientais para a especialistas que participaram dos
construção de uma cultura de saúde. debates durante o Encontro Educação
e Saúde – a dose certa para uma vida
Passados cerca de trinta anos saudável, realizado em Brasília-DF
desde a proposição do novo enfoque nos dias 13 e 14 de dezembro de 2016.
sobre a saúde, cabe refletir o que
efetivamente está em andamento No primeiro deles, a
nestes campos e como o conceito de conferencista Clélia Maria Parreira
promoção da saúde tem permeado a apresenta o tema Educação e Saúde –
realidade das práticas de educação, caminhos e percursos para uma vida
comunicação e mobilização social em saudável, destacando a relação entre
saúde, e especialmente em educação educação e saúde e seus desafios
em vigilância sanitária no Brasil. hoje. Assinala a necessidade de se
Pode-se, então, perguntar: como levar em conta a natureza relacional
estes recursos estão sendo utilizados? e, portanto, subjetiva do trabalho
14
em saúde; a dimensão educativa tecnologias da informação e pelas
do cuidado, que implica traçar redes sociais. Enfatizam que esta
estratégias de promoção da saúde que conjuntura precisa ser considerada ao
considerem a realidade dos que vêm se propor estratégias de comunicação
em busca e dos que oferecem cuidado; para a promoção da saúde.
a importância da criação de vínculos
entre os profissionais de saúde e a Também destacam a
população; e de se considerar que não comunicação como direito,
se vive apenas para sofrer menos, especialmente no âmbito da saúde,
como está implícito nas estratégias de garantida pelo Sistema Único de
prevenção de doenças, mas para ser Saúde (SUS) não só na forma do
feliz de forma plena. Esses são alguns acesso às informações sobre saúde,
dos aspectos apontados que suscitam mas, sobretudo, da participação da
a reflexão sobre o modus operandi da sociedade na formulação das políticas
educação em saúde hoje. públicas e no acompanhamento da
gestão do SUS.
No artigo A comunicação
como ferramenta para promover a O terceiro texto aborda o
saúde: processo, direito e desafios, tema Mobilização e Promoção da
de Wagner Vasconcelos e Mariella de Saúde – caminhos que se cruzam.
Oliveira Costa, discute-se a estreita As autoras Olga Maria Albuquerque
relação entre comunicação e educação e Luiza de Marilac Barbosa abordam
em saúde a partir da compreensão de o assunto a partir da perspectiva dos
que a comunicação é intrínseca ao ambientes, que são vistos, por um
ato de viver e, portanto, ao cotidiano lado, como fatores que favorecem o
da saúde e, por isso, pode integrar- encontro, a convivência e, portanto, a
se às práticas educativas no setor. Os mobilização por meio do engajamento
autores definem a comunicação como das pessoas na realização de
processo contínuo e circular, no qual os mudanças que beneficiem as
participantes são, simultaneamente, comunidades e promovam cidadania.
emissores e receptores, atuando em E, por outro lado, como fatores
uma complexa teia de contatos e de influência sobre a formação de
compartilhamentos, facilitados pelas hábitos e comportamentos, que
15
devem ser considerados na definição O conjunto dos textos
de estratégias e ações de promoção da apresentados evidencia a convergência
saúde no âmbito da criação de estilos dos campos da educação, da
de vida mais saudáveis. comunicação e da mobilização social
para a promoção da saúde em pelo
No texto Educação e Saúde menos dois aspectos, que se encontram
– uma aproximação oportuna e na base de cada uma dessas diferentes
necessária para a promoção da estratégias: a necessidade de se criar
saúde, Clélia Maria Parreira e Júlia e ampliar espaços de diálogo entre
Bucher-Maluschke recolocam em profissionais de saúde e população; e
foco o binômio educação–saúde para a de se estabelecer uma escuta ativa e
destacar sua complexidade e constatar qualificada das experiências e saberes
a insuficiência das práticas educativas dos sujeitos e de suas comunidades, a
em saúde que objetivam mudanças fim de que haja o compartilhamento da
comportamentais de uma perspectiva compreensão sobre os determinantes
biológica e individualizante. As do processo saúde-doença e, a partir
autoras discutem o papel privilegiado dele, se construa, coletivamente,
da escola na promoção da saúde e alternativas mais saudáveis para a
a necessidade de se ampliar o olhar vida.
estritamente biológico sobre o
processo saúde-doença para outro Espera-se que as ideias aqui
que inclua suas diferentes dimensões: expostas operem como poderosos
a social; a comunitária; a ecológica; fertilizantes a fazer crescer com saúde
a psicossocial etc. Enfatizam que a semente do desejo de transformação
uma educação em saúde nas escolas plantada no coração de cada um
– coerente com os propósitos de que assumiu o compromisso com o
construção da saúde como um recurso Projeto Educanvisa – Educação em
para uma vida mais feliz e plena, Vigilância Sanitária. E que seus frutos
ou seja, a saúde em sua dimensão possam realimentá-los de coragem
positiva – precisa levar em conta as e criatividade para que seja levado
necessidades da própria comunidade sempre adiante a utopia de promover
escolar. saúde para todos!
16
Referência
BRASIL. Secretaria de Políticas de Saúde. Projeto Promoção da Saúde.
As Cartas da Promoção da Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2002.
Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartas_promocao.
pdf. Acesso em: 7 abr. 2018.
17
Clélia Maria de Sousa Ferreira Parreira
Pedagoga. Mestre em Educação;
Doutora em Psicologia e Pós-Doutora em Saúde Coletiva;
Professora Adjunta da Faculdade de Ceilândia/
Universidade de Brasília;
Membro do corpo docente do Curso de Graduação em Saúde Coletiva.
* Conferência Magna proferida pela professora Clélia Parreira, dando início aos trabalhos do Encontro Educação e Saúde - a dose certa para
uma vida saudável.
19
A ideia de caminho e de homem se recusou, justificando que
percurso esteve muitas vezes me não faria isso porque precisava lhe
tirando o juízo. Numa dessas vezes, mostrar algo, e que no caminho de
em que me obriguei a pensar de forma volta o vaso entenderia as razões que
mais profunda sobre isso, foi quando ele tinha para se recusar a atender
ouvi uma lenda indiana contada aquele pedido. No retorno, o homem
por uma grande amiga, por quem fez questão de pedir para o vaso olhar
nutro admiração e respeito, Júlia para o chão do seu lado e observar
Bucher. Estávamos em um congresso muito atentamente por todo o
para mais de três mil pessoas, e ela “Veja quantas flores,
trajeto.
começou sua conferência falando
hortaliças e legumes”, dizia o
sobre um homem que transportava
homem, orgulhoso da paisagem que
água todos os dias para a sua aldeia,
se destacava em apenas um dos lados
usando dois grandes vasos. Um deles
da estrada pela qual viajava fazia
bem mais velho que o outro, com
pequenas rachaduras; o outro, novo,
“eles só
tantos anos. E completou:
intacto. A água colocada no vaso cresceram nesse caminho
velho ia caindo no trajeto e quando porque foram sendo
o homem chegava ao seu destino, de regados por você!”
toda água nele depositada, restava
só a metade. Por anos seguidos, o A lenda contada por Júlia
homem fez esse mesmo caminho. naquele auditório imenso, lotado e
Diz a lenda que o vaso mais novo, silencioso, ganhou muitos sentidos. O
orgulhoso de não deixar cair uma só homem, o vaso novo e o vaso velho
gota da água que carregava todos os percorriam o mesmo caminho, mas
dias, olhava para o vaso mais velho o trilhavam de formas diferentes,
e percebia o quanto ele se frustrava concentrados em suas missões que
por não conseguir segurar a água, até podiam parecer, mas não eram
cumprir o que na concepção dele iguais.
era uma fácil e simples tarefa. Certo
dia, o vaso rachado resolveu pedir Hoje me lembro de estar ali
para seu dono substituí-lo, mas o sentada, ouvindo Júlia contar aquela
20
história de forma tão serena, sempre as que têm limitações, esperam
sorrindo, gesticulando, como quem descobrir novas funcionalidades;
faz traquinagem. Recordo-me que as que enfrentam algum tipo de
o evento era sobre deficiência. Hoje, adoecimento, buscam estar mais
o público é outro. Mas a lenda fala fortalecidas; e as que procuram ajuda,
sobre caminhos e percursos – que nos anseiam ser acolhidas.
são dados, que procuramos ou sobre
o que deles fazemos – e me pareceu No entanto, isso não é o
adequada para abrir esta conferência. bastante! Não se vive para sofrer
menos, funcionar melhor, enfrentar
Começo homenageando Júlia doenças ou ser reconhecida. Vive-se
Bucher porque ela é daquelas pessoas para ser feliz, de forma plena. Por
que carrega água e rega flores e isso, os que são da área da saúde
plantas ao mesmo tempo e por onde devem ter consciência de que é
quer que ela passe. Ela é um belo e preciso tomar como tarefa principal a
imponente vaso! Com sua ousadia e de regar, mais do que a de evitar que a
competência tem contribuído para água derrame, ainda que levar água a
que possamos pensar essa relação tão quem precisa, em alguns momentos,
singular e complexa entre educação e seja emergencial.
saúde como sendo capaz de resultar
em escolhas mais saudáveis. Desde esta perspectiva,
Em sua trajetória profissional e é possível afirmar que o
acadêmica, tem evidenciado que na trabalho em saúde não se
medida das circunstâncias – e para
fundamenta exclusivamente
além delas – somos educadores,
independentemente das profissões
na assistência, mas encontra
que temos e que, na saúde, assim como força e valor na dimensão
na educação, somos instrumentos de educativa posta em prática
transformação. no ato de cuidar.
21
o desafio de mediar processos, de própria produção de conhecimentos
interagir com outros profissionais, (PITTA, 2004). É o momento propício
de mobilizar grupos e de dialogar para assumirmos, como premissa,
com segmentos populacionais de que quaisquer processos educativos
diferentes culturas, com distintas ou comunicacionais deveriam estar
expectativas com relação a si e aos comprometidos com as mudanças
serviços de saúde, o que requer sociais que são demandadas pelo
práticas, fundamentalmente, de movimento histórico e legítimo de
caráter educativo. busca da democratização não somente
O fato é que o trabalho em das informações, mas dos saberes, e
saúde vem se complexificando, quer das diferentes culturas.
seja pelas novas modalidades de
organização do mundo do trabalho, São muitas as razões
pelos desafios da transdisciplinaridade
para afirmarmos que não se
na produção de conhecimentos ou pela
multiplicidade de lugares produtores
aprende por acumulação ou
do conhecimento no mundo atual por motivos utilitários, mas
(CECCIM; FEUERWERKER, 2004). por ganho de significado
e de sentido. Aprende-se, pois,
Hoje em dia, testemunhamos por processos mediados e que levam à
inúmeros avanços na produção e subjetivação de problemas concretos
circulação de informações, tornados e contextualizados, cujo conteúdo
possíveis em função dos diversificados fundamental é o motor da produção
e novos tipos e modos de uso de de conhecimentos necessários às
instrumentos e de tecnologias transformações das realidades vividas
(CASTELLS, 2000). Com isso, é preciso (BRANDÃO, 2008; STOTZ, 2005).
ter claro que tais instrumentos e
tecnologias deveriam favorecer ou Situamo-nos na área
resultar em maior redistribuição de fronteiriça, por vezes movediça,
poder e de recursos, além de favorecer entre a educação e a saúde. Por
a luta pela inclusão de segmentos isso, em alguns momentos, nos
pouco referidos, ou inseridos, na vemos com certa dificuldade para
22
assumirmos uma fala ou uma prática Climério Ferreira, em seu poema
como sendo educativa, como se isso sobre a paisagem e seu reflexo:
não fosse possível quando se está no
Uma coisa é a coisa e outra coisa é seu reflexo.
campo da saúde (PARREIRA, 2015). O modo de ver é determinado pelo ângulo
E existem semelhanças importantes Pelo lugar nenhum de cada um ao ver
entre o trabalho em saúde e aquele E a mesma coisa vira seu oposto, se afirma ou nega.
praticado na educação. Uma delas
é o fato de o profissional lidar com
Sobre as flores sabemos
seres humanos, sendo eles seu
pouco. Especializamo-nos em medir
objeto de trabalho, o que modifica
a quantidade de água derramada, de
a própria natureza e a atividade do
oportunidades perdidas, do não feito,
trabalhador – independentemente
do não dito, do não alcançado, do não
da ocupação, arte ou ciência, ofício
vivido. Mas em tudo há algo feito,
ou profissão – o que diz muito do
dito, escrito, alcançado e vivido. Não
trabalho em si (TARDIF, 2014). Ter
como objeto um ser humano confere
somos os primeiros a chegar,
ao próprio trabalho uma natureza que a fazer ou a pensar a respeito
é marcadamente relacional. das coisas. Somos os que
aqui estão, buscando realizar
Talvez, por isso, os caminhos na algo que faça diferença, de
educação em saúde sejam conhecidos. forma refletiva. E para nós, nesse
Muito já se escreveu sobre isso, há momento, é hora de mudar o ângulo
bases teóricas que os fundamentam, pelo qual miramos a vida e a saúde
há métodos mais adequados para dos sujeitos e suas coletividades!
percorrê-los. Mas resta o inusitado, o
singular, o específico. Sabemos pouco Um exemplo dessa nova mirada
sobre os percursos que têm sido feitos pode ser ilustrado por um depoimento
pelos outros. Temos nos concentrado que li em um blog chamado “Eis o que
na linha reta, mirado o chão ao não sei”, intitulado “Mais redes, por
caminhar, e não vemos as flores que favor”**. A blogueira, que não é da
nasceram porque alguém as regou. área de saúde ou de educação, chama
É como escreveu o poeta a atenção para uma matéria que
23
havia assistido em um canal de TV declaração, feita em tom de denúncia.
falando sobre transplantes de órgãos. Ao ser questionada, retrucou firme:
Embora distraída, como ela mesma ” – escola não é lugar para se fazer
relata, foi tocada pelo depoimento amigos!” “Como não?!”, indaguei.
de um paciente que, curado de um Que lugar é esse se não aquele espaço
câncer, deu de presente ao médico reservado para construirmos relações,
que o tratava uma rede. Sendo ela tecidas na cumplicidade e na partilha
nordestina, assumiu como sendo o diária de tantas vivências e interações
significado daquele presente um ato oportunizadas pelo ambiente escolar?
de gratidão e de retribuição, de igual Só pode ser um lugar que não acolhe,
valor. Ela escreve que “ao dar a rede que não cuida, que não é seguro, que
ao médico era como se o paciente não permite singularidades... Escola
dissesse: – O senhor cuidou de mim, assim, ela tem razão, não é mesmo
agora deixe eu cuidar um pouquinho lugar para se fazer amigos!
do senhor”.
E se pensarmos o mesmo com
Coisas desse tipo só ocorrem relação às unidades de saúde? Seriam
quando se estabelece um vínculo. É elas espaços que não acolhem, que não
a diferença entre ser referido como cuidam, que não são seguros, que não
o “médico do postinho” ou como reconhecem as tantas singularidades
“meu médico”; como um “cara que daqueles que sofrem? Se forem assim,
estudava na mesma escola que eu” elas também não seriam lugar de se
ou o “meu amigo desde os tempos fazer amigos. Mas, o cuidado pede
do colégio”. Existem afirmações, vínculo!
referências e comportamentos
que nos mandam mensagens Voltando ao blog, e talvez por ser
importantes que pedem maior nordestina, reconheço que uma
atenção de nossa parte. Sobre rede não é um presente que se dê a
isso, recordo-me de haver ouvido de uma pessoa qualquer. Então, esse
uma pré-adolescente que não tinha senhor, ainda que em situação
amigas na escola. Fiquei surpresa de vulnerabilidade em razão do
e procurei entender melhor aquela enfrentamento de uma doença grave,
24
fez um amigo. E isso é necessário. em conta o próprio tema gerador
Ouso dizer que precisamos de mais desse encontro, sugiro pensarmos
redes e de fazer mais amigos pelos se faria diferença mudarmos o
caminhos pelos quais passarmos, ângulo e passarmos a indagar se a
quaisquer que sejam os percursos dose certa a ser ministrada deveria
que tenhamos feito ou que viermos a tomar como referência a bula ou a
fazer. pessoa para quem ela está dirigida?;
a segunda, sobre nossos caminhos e
Mas, para isso, é necessário percursos, sugiro refletirmos sobre
reafirmar, constante e nossas trajetórias profissionais e
sistematicamente, que pensar contabilizarmos se chegamos até aqui
saúde e educação pede um dando mais do que ganhando redes.
determinado ângulo para que
não se veja apenas o seu reflexo.
Para que isso ocorra, nós temos que
avançar na compreensão da relação
entre tais campos e assumirmos que,
do mesmo jeito que historicamente
fomos sendo instruídos e ensinados
a compreender os processos de
adoecimento, é hora de começarmos
a aprender a pensar e agir desde
uma perspectiva salutogênica. Saber
o que mantém as pessoas saudáveis
ou como torná-las saudáveis é
tão importante quanto conhecer
sintomas, terapêuticas e classificação
de doenças. Isso é o que traz outras e
novas possibilidades de atuação.
25
Referências
ALVES, R. A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir.
Campinas, SP: Papirus, 2001.
26
Wagner Robson Manso Vasconcelos
Jornalista. Especialista em Comunicação e Saúde e em Comércio Exterior e Globalização;
Mestre em Ciência da Informação; Doutor em Ciências da Saúde;
Coordenador da Assessoria de Comunicação/Fiocruz Brasília;
Membro do Grupo de Estudos Comparados do Núcleo de Estudos sobre Saúde Pública (NESP)/UnB.
A
SAÚDE - PROCESSO, DIREITO E DESAFIO
27
comumente os temas sejam associados representados pela famosa tríade
ou usados como sinônimos. Mas emissor/mensagem/receptor. Este
cada uma tem suas peculiaridades e modelo estabelece uma hierarquia
complexidades. Para explicá-las é útil de poder entre quem detém a
recorrer a Nicholas Belkin, professor informação – o emissor – e quem
da Rutgers University, nos Estados não a detém – o receptor – ignorando
Unidos, conhecido pela criação do que, na contemporaneidade, com os
termo ASK, sigla em inglês para fluxos de informação cada vez mais
Anomalous State of Knowledge, ou rápidos e instantâneos, os agentes de
Estado Anômalo de Conhecimento. qualquer processo de comunicação
Tal estado, segundo ele, seria aquele devem ser considerados emissores e
que se tenta suprir sempre que se receptores da informação que, hoje,
busca uma informação, ou seja, pode ser construída coletivamente,
algo que permita construir um novo sem lugares exclusivos de fala ou
conhecimento ou modificar um saber posicionamentos mais ou menos
já existente. Pode-se, então, avançar importantes. Neste sentido,
para a definição de que informação compreende-se a comunicação para a
é um elemento basilar e essencial promoção da saúde como processo e
desde a construção de uma ideia ao como direito de cada cidadão.
desenvolvimento de uma estratégia.
Compreendendo a
Porém, informação não é comunicação como processo,
comunicação. Inegavelmente, sepultamos a linearidade, a
faz parte dela, sendo, até, hierarquização, a polaridade e
sua matéria prima, sua razão a unidirecionalidade dos fluxos
de existir. A diferença é que informacionais comumente
comunicação é processo, é confundidos com comunicação
contínuo e é circular. Com isso, e, de antemão, temos um ciclo
desfaz-se aquele ultrapassado ininterrupto. Ou seja, o envio de uma
modelo de comunicação que informação não encerra um processo
estabeleceu agentes estáticos no comunicacional. Ao contrário,
processo comunicacional, em síntese, enseja outro, ou, pelo menos, a
28
abertura de novas possibilidades influenciando e sendo influenciados
dialógicas de construção do por aquilo que compartilham (para
saber, de compartilhamento do além dos conteúdos curriculares,
conhecimento. É algo tão elementar inclusive).
quanto saber que, se alguém
compartilha um determinado saber No que se refere à comunicação
está, automaticamente, sujeito a como direito, é curioso observar
receber desse outro alguém um que diversos instrumentos e marcos
novo conhecimento. O ciclo que se legais estão postos para assegurar a
estabelece entre ambos, portanto, liberdade de expressão dos cidadãos.
torna-se potencialmente contínuo, Além deles, instâncias diversas –
cabendo aos sujeitos enveredar inclusive no Sistema Único de Saúde
por outros compartilhamentos e (SUS) – foram estabelecidas de forma
construções coletivas de saber. a garantir não apenas o acesso à
Importante observar esse processo informação, mas, especialmente,
permeado por diversos sujeitos e a participação da sociedade na
organizações, cujos conhecimentos formulação das políticas públicas e
se alicerçam no acúmulo de vivências no acompanhamento da gestão do
que experimentam ao longo da vida, sistema de saúde. Trata-se de algo tão
e não somente no conhecimento intrínseco aos regimes democráticos
acadêmico. Cada uma delas contribui que já estava impresso na Declaração
não só para a decodificação das Universal dos Direitos do Homem e do
mensagens que lhes chegam, mas para Cidadão, de 1789, que, em seu Artigo
a apropriação ou até mesmo rejeição 11, instituía “a livre comunicação das
de cada uma delas. No universo da ideias e opiniões como um dos mais
educação, a consciência da preciosos direitos do homem [...]”.
comunicação como processo Assim, é necessário compreender
a comunicação, e em especial a
é crucial e determinante para
comunicação em saúde, como um dos
que educadores e educandos símbolos de resistência democrática,
estejam em eterno processo sem limitá-la à simples transmissão,
de aprendizagem recíproca, difusão ou divulgação, mas processo
29
que privilegia as conversações e que, efetivamente, promova a
espaços de troca de informação e o saúde pressupõe que as pessoas
debate público. Esta compreensão é compreendam as informações como
uma premissa para se tentar garantir algo que faz sentido em seu contexto,
que cada cidadão tenha informação que é adequada a sua realidade.
suficiente não só para decidir sobre Somente a partir deste entendimento
sua saúde e fazer suas escolhas, mas cada indivíduo pode considerar a
também para ampliar a participação possibilidade de se comprometer com
das pessoas na própria política de esse ou aquele tema ou proposta, de
saúde. maneira a incorporar ou construir
novas formas de engajamento desse
A comunicação como um saber em seu cotidiano.
processo que promove a saúde não
pode exigir apenas a mudança de É importante que qual-
comportamento individual a partir quer ação de comunicação em
da culpabilização dos indivíduos saúde contemple a escuta das
por sua situação de saúde, mas se pessoas e grupos com os quais
nortear conforme a nova abordagem se quer dialogar, identificando
da promoção da saúde, que inclua no suas especificidades e diferen-
debate os determinantes sociais que ças culturais, econômicas e so-
influem diretamente nas condições de ciais. Não basta considerá-los como
saúde (e que, por vezes, são ignorados massa homogênea e investir apenas
pela gestão, pelos trabalhadores e nos meios de comunicação tradicio-
consequentemente, pelos cidadãos). nais, tais como rádio e televisão que,
além de caros, nem sempre permitem
Da mesma forma, não a troca de saberes e a construção co-
basta só disponibilizar informação letiva do conhecimento.
sobre saúde para a população, esta
informação deve ser compreensível Por exemplo, não é possível
para todos, para o exercício de se pensar a comunicação da
sua cidadania (BUSS, 1999; SILVA; mesma maneira para apresentar a
CRUZ; MELO, 2007). A comunicação importância de se realizar atividade
30
física para adolescentes de uma interface com a saúde, de maneira a
escola pública, idosos do grupo de promover a saúde dos cidadãos.
prevenção ao diabetes, universitários
da área de saúde ou mesmo donas de
casa com crianças pequenas em fase
de alfabetização. Uma comunicação
que busque promover a saúde
será pensada de maneira singular,
conforme cada um desses públicos
e suas realidades, e ouvindo esses
grupos e seu saber sobre este tema.
A simples difusão de informação,
centralizada em um único ponto,
órgão, veículo ou porta-voz é
enfraquecida em meio à pluralidade
de vozes, formatos e trocas possíveis
na sociedade em rede.
31
Referências
BUSS, P. Promoção e educação em saúde no âmbito da Escola de Governo em
Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública. Cadernos de Saúde Pública, Rio de
Janeiro, v. 15, p. 177-185, 1999. Sup. 2.
32
Olga Maria Ramalho de Albuquerque
Odontóloga. Professora da Faculdade Ceilândia/UnB;
Professora do Mestrado Profissional em Propriedade Intelectual e
Transferência de Tecnologia para Inovação no Ponto Focal/UnB;
Doutora em Saúde Coletiva.
A
“Mobilização Social é um
movimento para engajar pessoas,
cria as condições para ampliar
espaços de participação
cujo objetivo é a participação dessas ativa, com respeito à escuta
pessoas para atingir metas específicas qualificada dessas pessoas, a
com impacto para a sociedade mobilização gera autonomia,
mediante esforço autoconfiante” autoestima, cidadania,
CAMINHOS QUE SE CRUZAM
33
seu aspecto positivo de atendimento Isso acontece, especialmente, nas
às necessidades do sujeito e ao questões de saúde que estão ligadas
desenvolvimento de potencialidades às normas de comportamento, como
para enfrentar os desafios do é o caso do tabagismo, do alcoolismo
cotidiano no ambiente onde essas e das doenças não transmissíveis,
pessoas vivem, moram, estudam, tais como hipertensão, diabetes,
trabalham e se divertem (WHO, 1986). obesidade e síndrome metabólica.
Assim fazendo, o ambiente favorece Por essa razão, os programas
o encontro, aqui entendido, como de saúde pública deveriam
“junção de pessoas que se movem em priorizar o risco enfrentado
vários sentidos ou se dirigem para o pela população como um todo,
mesmo ponto” (HOUAISS, 2001). mesmo sendo um risco menor,
em lugar de buscar atingir
São cinco os campos de ação apenas aquelas pessoas com
para promover saúde: 1. a elaboração maior risco de ficar doentes
de políticas públicas saudáveis; 2. o (ROSE, 1985).
fortalecimento da ação comunitária;
3. o desenvolvimento de habilidades; Com base nessa reflexão,
4. a reorientação dos serviços; 5. a entende-se a fragilidade de inciativas
criação de ambientes favoráveis à para melhorar a saúde por meio
saúde (WHO, 1986). de ações voltadas às mudanças no
comportamento individual, mediante
Entendendo as razões da abordagem aquisição de conhecimento. Isso
ao ambiente como campo de ação da acontece porque atos aparentemente
promoção da saúde. mais simples se originam de hábitos
formados no curso da vida e estão
Em se tratando de doenças ligados a situações que associam
crônicas, sabe-se que um número esses hábitos ao estilo de vida. E
grande de pessoas com baixo risco de já que a saúde é determinada por
adoecer pode dar origem a mais casos fatores sócio-políticos, centrar os
de doença do que um número pequeno esforços em estilo de vida e em
de pessoas com alto risco de adoecer. comportamentos individuais, além
34
de ser uma forma de simplificação, é não se separam os hábitos e valores
também uma maneira de obscurecer da sociedade de seus “desviantes”, já
amplos determinantes de saúde e de que “um pertence ao outro, goste a
fugir de responsabilidades (TERRIS, sociedade ou não” (ROSE, 1990). Esse
1996). pensamento contradiz o senso comum,
segundo o qual a responsabilidade do
Ademais, na prática, os “desvio” é apenas do indivíduo, como
conceitos de “normalidade” e se o grupo social ao qual ele pertence
de “comportamentos social- não tivesse responsabilidade sobre
isso (CHOR, 1999). A partir dessa
mente desejáveis” influen-
reflexão, entende-se a fragilidade
ciam escolhas que aparente- das iniciativas com foco em estilo
mente são do indivíduo, mas de vida sem levar em conta a
na realidade estão fortemen- “inter-relação entre indivíduos”, o
te relacionadas aos costumes “caráter não racional das escolhas de
adotados pela comunidade. comportamento” e a interdependência
Como por exemplo, as doenças crô- entre as pessoas e seus ambientes.
nicas que estão relacionadas aos há- Especialmente aquelas escolhas que
bitos da sua família, de seus pares estão ligadas ao prazer, como o hábito
ou de sua região (ROSE, 1985; CHOR, de fumar, de beber, de comer, ou ao
1999). Um estudo desenvolvido em 32 comportamento sexual.
países, com 52 grupos populacionais,
estimou a alta correspondência entre Diante do que foi exposto, en-
o comportamento de cada um desses tende-se que ações educativas para a
grupos e de seus “desviantes”. Os re- mudança de comportamento devem
sultados dessa pesquisa evidenciaram identificar os fatores de risco da po-
que, a partir do consumo médio de ál- pulação como um todo. Além disso,
cool de determinado grupo, é possível é importante considerar os
prever a proporção de consumidores mecanismos gerados e man-
excessivos de álcool (ROSE, 1990). tidos pela cultura existente
na comunidade, pois estes fato-
De acordo com esse raciocínio,
35
res são indicadores de outros e estão bebidas açucaradas e lanches não
diretamente relacionados à estrutura saudáveis da cantina; e reduzir a
social (BLANE, 1985). Caso contrá- disponibilidade de alimentos pobres
rio, as atividades educativas podem em nutrientes nas lanchonetes das
acarretar na culpabilização dos “des- escolas.
viantes” (vítimas). Essa percepção
modifica a intervenção em saúde, que Outra contribuição com
passa a privilegiar mudanças nos va- enfoque no ambiente analisou a
lores que influenciam e sustentam implementação das práticas corporais
hábitos prejudiciais, com base em e da atividade física nas Escolas da
leis, normas e condições sociais que Coordenação Regional de Educação
protejam e valorizem a saúde e a vida. de Samambaia-DF, que aderiram ao
Programa Saúde na Escola (PSE). Os
Sabe-se que o resultados evidenciaram que não se
conhecimento é importante verificou o incremento das referidas
e necessário, mas não atividades no período estudado,
que era um dos objetivos do PSE. As
suficiente para mudar
autoras sugeriram que isso podia
comportamento. Por essa razão, estar associado ao ambiente que não
alguns estudos sobre obesidade
facilitava essas práticas. Uma dessas
infantil enfocaram no ambiente,
razões era a condição desfavorável
priorizando a escuta dos estudantes
das quadras que possivelmente
e educadores (ALBUQUERQUE et al.,
passou a influenciar, adversamente,
2014; 2016a; 2016b). Outras pesquisas
o comportamento da comunidade
construíram ambientes facilitadores
escolar em relação à educação física
de escolhas mais saudáveis (FOSTER,
(SILVESTRE et al., 2016).
2008; TAYLOR, 2008). Nesses casos,
as iniciativas implementadas ou
Em concordância com esta
sugeridas pelos próprios estudantes
linha de pensamento, Yen e Syme
foram: disponibilizar alimentos
(1999) admitem que uma forma de
saudáveis no cardápio; diminuir o
enfrentar questões relacionadas à
teor de gordura na merenda; retirar
saúde é focalizar no indivíduo que
36
precisa mudar seu comportamento Considerações finais
para reduzir o risco de adoecer. A outra
forma é voltar-se para o ambiente A mobilização social e a
por meio de intervenções dirigidas ao promoção da saúde caminham na
seu local e à sua estrutura. A meta a mesma direção. Suas iniciativas
ser alcançada é sempre a mudança de impulsionam a troca de saberes
comportamento, mas o alvo principal e o reconhecimento do valor das
não é o estilo de vida das pessoas, mas pessoas envolvidas; buscam atender
o ambiente no qual elas vivem e que às suas aspirações e as incluem nas
guia o comportamento individual. decisões; salientam o protagonismo
de sujeitos como agentes de mudança
De acordo com a proposta de sua própria realidade; e “apoiam
as iniciativas com
desse texto, o desenvolvimento de espaços de
a marca da mobilização produção social e ambientes favoráveis
social e da promoção da ao desenvolvimento humano e ao
bem-viver” (BRASIL, 2014). Assim
saúde trabalham com a
fazendo, valorizam o “planejamento
comunidade e não para de ações territorializadas, com base no
a comunidade, além de reconhecimento dos contextos locais,
envolverem o interesse pelo para construir espaços de produção
indivíduo e pelo ambiente. social e ambientes saudáveis”, o que
Tal abordagem pede um olhar corresponde a uma das diretrizes da
‘desarmado’ do promotor de saúde, Política Nacional de Promoção da
cujas ações propiciam a arte do Saúde (BRASIL, 2014, p.35).
encontro entre iguais no ambiente,
que se torna local de interação.
Isso confirma a promoção da saúde
como estratégia compartilhada entre
pessoas e ambiente para combinar
escolha pessoal e responsabilidade
social, tendo em vista um futuro com
mais saúde (NUTBEAN, 1996).
37
Referências
38
GUY, L. An introdution to community develoment: activation to evaluation,
1998. Disponível em: learn.preventconnect.org. Acesso em: 11 nov. 2016.
39
participação. Brasília: Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), 1996.
YEN, I. H.; SYME, S. L. The social environment and health: a discussion of the
epidemiologic literature. Ann. Rev. Public Health., v. 20, p. 287-308, 1999.
40
Clélia Maria de Sousa Ferreira Parreira
Pedagoga. Mestre em Educação;
Doutora em Psicologia e Pós-Doutora em Saúde Coletiva;
Professora Adjunta da Faculdade de Ceilândia/
Universidade de Brasília;
Membro do corpo docente do Curso de Graduação em Saúde Coletiva.
O
binômio educação-saúde
precisa ser compreendido, como já Isso sugere que as escolas
ensinou Hegel com a expressão Zeit carecem de orientações ou de
NECESSÁRIA PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE
41
singularidades dos sujeitos sociais Ao se referir à experiência
e suas representações sobre saúde e da implementação das Escolas
doença (PEDROSA, 2006). Promotoras de Saúde, em Portugal,
Precioso (2004) destaca outras três
Nesse sentido, limitar as dimensões a serem adotadas para a
práticas educativas nas escolas à consolidação das ações educativas em
oferta de conteúdos meramente saúde em ambientes escolares. São
higienistas, por exemplo, não elas: a dimensão ecológica, que permite
alcança as diferentes dimensões assegurar a preservação e melhoria
referidas, o que significa diminuir dos espaços nos quais se processam
ou desconsiderar as capacidades e a vida escolar, especialmente no
potencialidades que cada unidade e tocante à salubridade e segurança
rede escolar têm para transformar das condições e instalações; a
realidades sócio sanitárias. dimensão comunitária, que amplia
o compromisso e a responsabilidade
Para tanto, o conceito da escola com a comunidade que
ampliado de saúde, cuja a acolhe, assim como da própria
complexidade leva à comunidade com relação à escola; e
superação de uma perspectiva a dimensão psicossocial, na qual se
unicamente biológica, agrega busca criar ambientes mais solidários,
diferentes dimensões e assim como privilegiar esforços para
explicações relevantes para a superação ou mediação de conflitos.
a compreensão do processo
saúde-doença. Tal ampliação Mas para que haja condições
de saberes, também aumenta a da escola ser local de promoção da
quantidade e os tipos de ferramentas saúde, faz-se necessário que ela
para sua adequada abordagem. Esse adote tanto o conceito ampliado de
novo dimensionamento não somente saúde quanto passe a considerar,
traz outros desafios como abre igualmente, a educação em sua
novas possibilidades de trabalho, vertente transformadora.
de enfrentamento e superação de Andrade (2015), ao analisar as
problemas, antes considerados contribuições de Paulo Freire para a
alheios ao contexto escolar. consolidação da educação no campo
42
da saúde, chama a atenção para o fato Para Albuquerque e Stotz (2004,
de que, a despeito das distinções entre p. 260), a educação em saúde tem
os termos utilizados historicamente sido, tradicional e hegemonicamente,
para designar tais práticas educativas, “um instrumento de dominação, de
é possível localizar, do ponto de vista afirmação de um saber dominante, de
didático, diferenciações que contribuem responsabilização dos indivíduos pela
para a compreensão das bases sob as redução dos riscos à saúde” e não
quais cada uma delas se consolida. tem “construído sua integralidade
e pouco tem atuado na promoção
Recorrendo à Falkenberg da saúde de forma mais ampla”,
(2014), sintetiza: Educação e cuja maior expressão tem sido a
Saúde, como dizendo respeito à vertente denominada higienista, na
área de saber técnico, centrada na qual a educação assume um papel
instrumentalização e controle dos controlador (SILVA et al., 2010) e “suas
serviços e prevenção de doenças ações estiveram inseparáveis de
(STOTZ, 1993), sendo reconhecida certo papel educativo-coercivo
como, do ponto de vista de sua do Estado, que buscou realizar
identidade, sinônimo de educação em uma adequação entre o aparato
saúde; Educação para Saúde, cujos produtivo, a moralidade e
objetivos se voltam à disseminação os padrões de higiene das
de informações e ensinamentos para massas populares” (SOUZA;
a população para que mudem seus JACOBINA, 2009, p. 2541).
hábitos e sigam na direção de melhorias Diferentes autores têm
individuais e coletivas (FALKENBERG, destacado que as ações educativas no
2014); e Educação na Saúde, que se campo da saúde, ainda que analisadas
apresenta como dizendo respeito sob o ponto de vista de sua historicidade
à produção e a sistematização de podem ser mais claramente vistas
conhecimentos relativos à formação e como estando relacionadas a práticas
ao desenvolvimento para a atuação em normatizadoras ou libertárias
saúde, envolvendo práticas de ensino, (GOMES; MERHY, 2011; PARREIRA,
diretrizes didáticas e orientação 2015; PASSOS et al., 2007; SALCI et al.,
curricular (BRASIL, 2009). 2013; STOTZ, 2007).
43
De uma forma sintética, as que agrega tais características tem
abordagens normatizadoras são base freireana, possui identidade
caracterizadas por serem centradas problematizadora e transformadora,
no indivíduo, e por desconsiderarem e é denominada Educação Popular
o coletivo; por serem autoritárias, em Saúde (ALBUQUERQUE; STOTZ,
com predomínio de linguagens 2004; FLISCH, 2014; GOMES; MERHY,
imperativas; fragmentadas, por não 2011; STOTZ, 2007; VASCONCELOS,
considerarem o contexto e a dinâmica 2011; 2007; 1999; 1991). Ela vem
das mudanças nas realidades sociais; postulando que as práticas educativas
descontextualizadas, por adotarem sejam permanentes e “visem à
um discurso único sem levar em conta interpretação consciente do processo
questões, segmentos ou realidades histórico e do modo da sociedade
locais; acríticas, por não fazerem operar” (ASSUMPÇÃO, 2009, p. 37-
uma leitura política mais ampla 38).
e serem, acima de tudo, baseadas
exclusivamente em conhecimentos e Esta mesma discussão tem sido
no modelo biomédico. Contrariamente, feita no âmbito da América Latina,
as abordagens problematizadoras na qual existe consenso a respeito
levam em conta a compreensão do de seu delineamento estratégico.
desenvolvimento humano como Para Pelicioni e Pelicioni (2007, p.
processo não uniforme ou linear, 326) tais consensos podem ser assim
reconhecendo-o como constituído de relacionados: 1. Fortalecer as políticas
acordo com as condições concretas e as ações nos âmbitos comunitário e
de existência dos sujeitos, sendo, escolar; 2. Ampliar os vínculos com
pois, um fenômeno complexo que organizações não governamentais;
sofre influência de natureza sócio- 3. Fomentar a consolidação de pactos
histórico-cultural, estando sempre sociais, convênios e acordos com
aberto a interações e delas sofrendo diversos setores sociais; 4. Ampliar a
influências. investigação em educação para saúde;
5. Estabelecer alianças de trabalho com
Atualmente, a perspectiva os meios de comunicação de massa;
de educação no campo da saúde 6. Manter o ideário e os enfoques de
44
análise crítico-reflexiva e a educação é um exercício capaz de levar ao
popular; 7. Estabelecer garantias estabelecimento da clareza necessária
de continuidade e permanência dos acerca da pluralidade resultante da
programas e serviços de educação aproximação entre saúde e educação.
para a saúde; 8. Investir em ações de
formação e capacitação de recursos Os fatores que
humanos. determinam ou condicionam
a vida de sujeitos e
A saúde não se produz
coletividades nem sempre
isoladamente em cenários ou espaços
específicos do Sistema Único de
são ou estão sob o domínio
Saúde (SUS). Ela se produz nos ou controle individual. Existem
contextos e locais próprios de toda práticas ditadas por influência das
e qualquer convivência humana. famílias, da mídia, dos próprios
pares ou impostas pela realidade
Neste sentido, construir
socioeconômica vigente com as
uma agenda de saúde nas quais pouco se pode manejar.
escolas é participar do Hábitos socialmente aceitos em
desenho de uma política determinados períodos históricos
pública saudável. Reconhecer a ou localidades podem tornar-se,
complexidade e a transversalidade da em outro momento, intoleráveis e
saúde leva à priorização de conteúdos vice-versa. A noção sobre o que é
e à eleição de abordagens abrangentes prejudicial ou promotor de saúde
que situem os sujeitos ao invés de tem sido construída e desconstruída
simplesmente responsabilizá-los com o passar do tempo, a depender
individualmente por condições que das informações e dos conhecimentos
não lhes cabe responder. Estabelecer adquiridos e processados do ponto de
conexões entre a saúde, educação vista técnico, científico ou popular.
e outras áreas do conhecimento
humano (a exemplo da antropologia, Fatores estruturais são, em
psicologia, sociologia, economia, determinadas situações, mais
cultura, matemática e tantas outras) influentes na aceitação de certos
45
padrões de comportamento e dos acordos firmados no
nas escolhas da pessoa do que se âmbito do Programa Saúde
acreditava até muito recentemente. na Escola (PSE), é a busca
Condições financeiras podem por conhecimentos sobre
explicar a adesão a determinadas
as necessidades de saúde
recomendações clínicas ou serem
responsáveis pela dificuldade em
existentes na comunidade
realizar mudanças importantes para escolar. Levantar quais são os
a promoção da saúde. Da mesma assuntos de saúde emergentes e
forma, existem fatores produzidos no que precisam ser acolhidos como
âmbito das relações interpessoais que sendo estratégicos para a escola,
trazem prejuízos em ambas as áreas. sob risco de passarem a ser, ou a se
É o caso das relações discriminatórias, manterem, marginais, a ponto de não
preconceituosas, sexistas, serem tratados adequadamente ou se
homofóbicas ou de intolerância perderem dentre e junto a tantos tabus
religiosa vivenciadas tanto nos e mitos que precisam ser desvelados.
serviços de saúde quanto nas unidades
escolares. Isoladas ou combinadas, Os estudantes precisam
explícitas ou sutis, elas produzem encontrar espaços e interlocutores
fracasso escolar e adoecimento. São para expressarem suas angústias,
práticas que precisam ser enfrentadas inquietações ou curiosidades,
conjuntamente, em uma agenda sobretudo nos tempos atuais em que
integrada. Sua superação torna a se produzem e disseminam inúmeras
escola um ambiente seguro e saudável informações nem sempre verdadeiras
e faz com que os serviços de saúde se ou confiáveis.
transformem em espaços de cuidado
integral e acolhedor. Levando em conta que a saúde
do escolar é parte do que ele é, uma
vez que dele ela não se aparta para
O importante na
que ele possa estudar e avançar em
discussão da promoção da sua escolaridade, é possível afirmar
saúde na escola, para além que a incorporação da temática da
46
saúde na escola não representa a
aceitação de novas atribuições ou
o acréscimo de outros conteúdos
para o tão concorrido cotidiano do
professor ou da instituição escolar.
Afinal, existe uma relação
orgânica entre saúde e
educação que se materializa
no ato educativo. Cuidar de
si, assim como o ato solidário
de cuidar do outro, precisa
ser aprendido, resgatado e
vivenciado.
A despeito da importância
de assegurar o desenvolvimento
de hábitos de higiene pessoal nos
estudantes, cabe à escola contribuir
para a criação de ambientes saudáveis,
protegidos e acolhedores, livres de
violência e de drogas, orientados por
uma cultura de paz, de forma tal que
a escolha deliberada e consciente por
práticas promotoras de saúde seja
possível para todos.
47
Referências
ALBUQUERQUE, P .C.; STOTZ, E. N. A educação popular na atenção básica à
saúde no município: em busca da integralidade. Interface, Botucatu, v. 8, n. 15,
p. 259-274, ago. 2004.
48
FLISCH, T. M. P. et al. Como os profissionais da atenção primária percebem e
desenvolvem a Educação Popular em Saúde. Interface, Botucatu, v. 18, p. 1255-
1268, 2014. Suppl. 2.
49
PRECIOSO, J. Educação para a saúde na escola: um direito dos alunos que urge
satisfazer. O Professor, n. 85, p. 17-24, mar./abr. 2004.
50
VASCONCELOS, E. M.; CRUZ, P. J. S. C. Educação popular na formação
universitária: reflexões com base em uma experiência. São Paulo: Hucitec; João
Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2011.
51
PARTE II - CONTEXTOS
Educação e Saúde - a
dose certa para uma
vida saudável
EDUCANVISA NA PRÁTICA ESCOLAR
53
experiências pedagógicas que número cada vez maior de municípios
patrocina é determinante para as brasileiros. Afinal, essas práticas
mudanças almejadas na direção de também confirmam um grande fator
uma sociedade mais saudável e mais facilitador da inserção do Educanvisa
consciente na utilização dos recursos nos projetos pedagógicos das escolas
naturais que se dispõe. participantes: o fato de que ele não
se caracteriza por ser uma atividade
O evento Educação e Saúde a mais para os professores. Ao
– a dose certa para uma vida contrário, as atividades propostas
saudável propôs uma reflexão podem facilmente ser integradas às
sobre essas vivências. Sua riqueza atividades curriculares e, portanto,
revelou, mais uma vez, a imensa podem facilmente ser inseridas no
capacidade criativa da artesania planejamento pedagógico das escolas.
escolar de educadores, alunos e
parceiros integrantes do Educanvisa Da perspectiva da
nos municípios. A diversidade de vigilância sanitária, vislumbra-
propostas, a receptividade das se a potencialidade do grande
famílias e das comunidades locais encontro educação e saúde por
às atividades realizadas pelos meio do fortalecimento do papel
escolares, o entrelaçamento de saúde do profissional de saúde enquanto
e manifestações culturais, facilitando educador e promotor da cultura
a assimilação de conteúdos técnicos, de saúde e, entre outros de seus
a integração entre os setores de aspectos, como promotor do consumo
educação e saúde nas localidades, por consciente e cidadão.
exemplo, demonstram e confirmam o
potencial educativo e transformador
do Projeto Educanvisa.
54
Referência
CREMA, R. O poder do encontro: origem do cuidado. São Paulo: Tumiak
Produções: Instituto Arapoty: Unipaz, 2017. p. 25.
55
Regina Célia Borges de Lucena
Biomédica sanitarista. Mestre em Saúde Pública; Doutora em Política Social;
Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária/Anvisa.
EDUCANVISA - CONSIDERAÇÕES PARA ANÁLISE NO
N
assistenciais no campo da saúde, mas
também os modelos pedagógicos e
o planejamento e desenvolvimento de educação em saúde. De acordo
de ações educativas em saúde é com Pereira (2003, p. 1528), “não
importante levar em conta que há há um processo educativo asséptico
uma vinculação inevitável, tácita ou de ideologias dominantes, sendo
explícita, a determinadas concepções necessária a reflexão sobre o próprio
(ou interpretações) sobre o processo sentido e valor da educação na e para
saúde/doença. Essas interpretações, a sociedade”.
por sua vez, refletem diferentes visões
de mundo dentro de um processo Da mesma forma, diferentes
histórico. Sobre isso, Carlos Batistella visões de mundo determinam
diz que “a saúde é um constructo as políticas de saúde. No Brasil,
que possui as marcas de seu tempo” isso se concretiza por meio de
(BATISTELLA, 2007). dois projetos políticos em disputa
(BRAVO; MATOS, 2001): o Sistema
De fato, a humanidade, ao Único de Saúde (SUS) e o projeto
longo dos séculos, conheceu e se privatista. Nesse caso, trata-se de
utilizou de diferentes explicações um antagonismo relacionado ao
para o processo saúde/doença – contexto político e econômico em
desde a interpretação mágico- escala global onde, segundo Laurell
religiosa até a determinação social, (2016), “direito à saúde tornou-se
demarcadas por diferentes visões de tema de debate e de luta político-
mundo e projetos de sociedade. Essas ideológica”. Nesse embate, está em
interpretações atualmente coexistem jogo a saúde como direito universal
57
e de caráter público, em contraponto e subfinanciamento (PAIVA; COSTA,
com o processo de mercantilização 2016).
crescente de suas ações. Este texto
tem o objetivo de discutir elementos Três elementos fundamentais
teóricos que possibilitem a análise das experiências desenvolvidas no
das experiências desenvolvidas por âmbito do Educanvisa nos anos
meio do Projeto Educanvisa, no de 2015 e 2016 demonstram a
período de 2015 a 2016, no contexto de concepção de saúde e de educação a
disputa entre tendências ideológicas elas subjacentes: as metodologias e
e políticas nos campos da educação e estratégias; a interdisciplinaridade; e
da saúde. a intervenção sobre a realidade. Além
disso, são aspectos emblemáticos da
As experiências do Educanvisa 2015- disputa entre projetos no campo da
2016 – elementos teóricos para saúde brasileira.
análise
As metodologias e estratégias
As ações que integram utilizadas são baseadas numa
o Educanvisa correspondem educação dialógica e participativa,
a ações de promoção de o que representa uma ruptura com
o modelo tradicional de educação,
saúde e, portanto, partem
baseada na transmissão. No Brasil,
de um conceito ampliado de houve a incorporação no campo da
saúde e buscam a redução saúde, a partir da década de 1970, da
das desigualdades nesse concepção de educação desenvolvida
campo. Essas ações são contra por Paulo Freire, de pedagogia
hegemônicas, ou seja, elas estão crítica, voltada para a formação de
na contramão do projeto privatista consciência política e transformação
que vem sendo progressivamente da realidade. Assim, se iniciou um
fortalecido em detrimento do SUS. O movimento de educação popular na
fortalecimento desse projeto inclui o saúde, que parte da busca de diálogo
ataque ao SUS por meio de estratégias e troca de conhecimentos, de forma
como sucateamento, desqualificação a superar a relação vertical entre
58
profissionais de saúde e usuários. disciplinas, na perspectiva de superar
Assim, embora os diferentes modelos o processo histórico de fragmentação
de educação convivam, de forma do conhecimento. Conforme Pereira
por vezes conflituosa, no campo da (2017):
saúde, essa mudança de transmissão
Atualmente, a interdisciplinaridade
de conhecimento para a mudança de
continua seu caminho pela (re) construção
comportamento tem influenciado e do conhecimento unitário e totalizante do
determinado as ações de educação em mundo frente à fragmentação do saber. Na
saúde (SESC, 2006). escola, essa noção é materializada em práticas
e reflexões como a integração de conteúdos e
a interação entre ensino e pesquisa.
Nas experiências do
Educanvisa, essas metodologias
se concretizaram por meio do O conceito de promoção
desenvolvimento de estratégias
da saúde, central nas
horizontais, como oficinas, rodas
experiências do Educanvisa,
de conversa e debates. A produção
de material educativo foi realizada
leva em conta não apenas
de forma coletiva, envolvendo determinantes biológicos,
professores, alunos e, por vezes, a mas políticos, sociais,
própria comunidade. Verificou-se econômicos, ambientais e
também a utilização de gêneros da culturais, o que requer a
cultura popular, como fantoches, utilização de abordagens
ritmos regionais e literatura de educacionais amplas,
cordel, o que remete à construção do
que integrem os diversos
conhecimento por meio do diálogo
entre o saber popular e o científico,
conhecimentos. A busca pela
integração e interação entre as
a partir das experiências culturais e
diferentes áreas de conhecimento
cotidianas dos estudantes.
está expressa, nessas experiências,
na abordagem de temas relacionados
A interdisciplinaridade,
à vigilância sanitária em diferentes
segundo elemento destacado, parte
disciplinas de cada etapa de ensino da
da ideia de integração entre as
educação básica.
59
O terceiro elemento A vigilância sanitária, por
corresponde ao poder de intervenção sua vez, herdou uma tradição
sobre a realidade, como parte de normatizadora e cartorial em seu
um processo ensino-aprendizagem processo de trabalho que, por vezes,
problematizador, que busca a dificulta a adoção de abordagens
inserção dos educandos na realidade, educacionais abertas e inovadoras.
de maneira crítica e transformadora Por outro lado, as experiências
(CECCIM; FERLA, 2017). Neste do Educanvisa representam outra
caso, a ação direta sobre riscos à forma de atuação, na medida em
saúde incluiu, nas experiências do que correspondem a relatos de ações
Educanvisa, temas como os alimentos educativas que exigem o diálogo entre
industrializados, o uso de agrotóxicos saberes e, a partir disso, a construção
e o uso racional de medicamentos. de novos conhecimentos.
60
Referências
61
PARTE III - EDUCANVISA
Experiências e
Vivências
Produção Editorial - Letra,
som e imagem como
ferramentas para promover
a saúde
63
AUDIOVISUAL
FICHA TÉCNICA
64
AUDIOVISUAL
FICHA TÉCNICA
MEDICAMENTOS
65
IMPRESSOS
FICHA TÉCNICA
66
IMPRESSOS
FICHA TÉCNICA
67
IMPRESSOS
FICHA TÉCNICA
68
IMPRESSOS
FICHA TÉCNICA
69
IMPRESSOS
FICHA TÉCNICA
70
Mobilização Social - O
encontro e a arte em busca
da qualidade de vida da
comunidade
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EVENTOS
FICHA TÉCNICA
72
EVENTOS
T
MUDANÇAS RADICAIS PARA UMA SAÚDE IMEDIATA!
FICHA TÉCNICA
73
EVENTOS
R
SAÚDE : UMA RESPONSABILIDADE DE TODOS
FICHA TÉCNICA
Localização: Picos
Município: Oieras - Piauí
População: 34.538 habitantes
Coordenador local do Educanvisa: : Carleane de Souza Leal Albuquerque Sá
e Albina de Sousa Brandão
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EVENTOS
R
FESTA DAS NAÇÕES
FICHA TÉCNICA
75
EVENTOS
M
1ª MOSTRA DE PROJETOS DA EMEF JOÃO MARIA DE
FICHA TÉCNICA
76
ARTES CÊNICAS
FICHA TÉCNICA
77
ESTUDO DE CAMPO
M
HORTA ORGÂNICA
FICHA TÉCNICA
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FORMAÇÃO DE MULTIPLICADORES
FICHA TÉCNICA
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IMPRESSÕES E
EXPRESSÕES
Avaliando o Encontro
A
O OLHAR DOS PARTICIPANTES SOBRE O ENCONTRO EDUCAÇÃO
81
Tabela 1. Distribuição dos respondentes da avaliação, segundo região geográfica e estado
de origem
82
Gráfico 2. Avaliação dos participantes sobre o Encontro Educação e Saúde – a dose certa
para uma vida saudável
Questões
83
O novo formato do Educação e Saúde – a dose certa para uma vida saudável,
que pela primeira vez contou com a participação de especialistas em uma
conferência e em exposições dialogadas, também recebeu comentários positivos:
“agregou conhecimento/embasamento aos participantes e possibilitou repensar
as ações no município” e “possibilitou compreender melhor o amadurecimento
do projeto e enriqueceu teoricamente”. Um dos participantes ressaltou que a
metodologia foi “interativa e colaborativa, permitindo o compartilhamento de
ideias e experiências e a formação de uma rede de práticas e de aprendizagem,
ou seja, a construção de uma comunidade de aprendizagem”.
84
Sobre possíveis desdobramentos:
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SUPLEMENTO
ESPECIAL
PROGRAMAÇÃO
87
Nome Cidade UF
Ana Maria Alkmim Frantz Brasília DF
PARTICIPANTES DO ENCONTRO EDUCAÇÃO E SAÚDE
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Maristella Vieira dos Santos Goiânia GO
Sasse
Marta Rozângela Marinho da Goiânia GO
Costa
Adriana Cunha de Oliveira São José de Ribamar MA
Antônio Augusto da Silva Grajaú MA
Monteiro
Elisangela Rodrigues Ferreira Grajaú MA
Garleany de Lima Dourado Lago da Pedra MA
Gedeon
Iracilda Santos Silva São Luis MA
Joana Rodrigues Perreira São Luis MA
Juranildes Serejo Rocha São Luis MA
Karla Cristina Guimarães São Luis MA
Campos
Leanderson da Sila Ferreira São José de Ribamar MA
Letícia Carneiro Silva São José de Ribamar MA
Luzinete das Mercês França Paço do Lumiar MA
Carvalho de Azevedo
Maria Dalva Gonçalves Leite Dias Lago da Pedra MA
Maria José Silva Andrade São Luis MA
Maria Jucirene Carlos de Sousa Lago da Pedra MA
Maria Justina Santos Launé Santa Rita MA
Marissandra Santos Costa Santa Rita MA
90
Maura Silva Sousa Lago da Pedra MA
Míryan Fabianny Nunes Pinheiro São Luis MA
Sabrina de Oliveira Cunha Ramos São Luis MA
Sandra Maria Lopes Souza São Luis MA
Vladimara do Bom Parto Beserra Lago da Pedra MA
Costa
Andinéia Ferraz da Rocha Ninheira MG
Alexandra Dias de Freitas Alves Capim Branco MG
Ana Maria Mitleton Campos São Sebastião do MG
Paraiso
Ana Paula de Brito Pelucio São Sebastião do MG
Paraiso
Ana Paula Flores Capim Branco MG
Cardeque Soares Montes Claros MG
Carmem Silva Oliveira de Jesus Montes Claros MG
Carolina Mard Flores Capim Branco MG
Cecilia Aparecida Fernandes Coromandel MG
Silva
Célia Mendes Montes Claros MG
Cláudia Maria dos Santos Pirapora MG
Cristovão de Jesus Alves Montes Claros MG
Diana Ferrari Viana Ninheira MG
Daniele Maciel Lopes Montes Claros MG
91
Deusa Fátima de Oliveira Várzea da Palma MG
Elane Cristina Batista São Sebastião do MG
Paraiso
Elissandra da Silva Pereira e Pedro Leopoldo MG
Conceição
Gislene Antunes Xavier Athayde Montes Claros MG
Guilherme Honorato Pereira Coromandel MG
Ivone Aparecida Paes Fernandes Coromandel MG
João Érmenson Gomes Filho Várzea da Palma MG
Katia Bueno dos Santos Distrito Pantano MG
Kelly Fabiane dos Santos Gomes Capim Branco MG
Lucelia Aparecida de Aguiar São Sebastião do MG
Cardoso Paraiso
Silvânia Pereira Araújo Várzea da Palma MG
Simone Matos Silva São João do Paraiso MG
Soraia Santos de Morais Várzea da Palma MG
Sueli Fátima Pimenta São Sebastião do MG
Paraiso
Wederson Gonçalbes Coromandel MG
Débora Bortolotti Gevehr Lucas do Rio Verde MT
Erciana Santana Campos Lucas do Rio Verde MT
Eronice Norberto da Silva Lucas do Rio Verde MT
Laisa Michele Raabe Lucas do Rio Verde MT
Maria Simoni Lucas do Rio Verde MT
92
Valdir da Silva Moreira Lucas do Rio Verde MT
Albina de Sousa Brandão Neres Oeiras PI
Carlane de Sousa Leal Oeiras PI
Albuquerque
Eliana Barbosa de Carvalho e Oeiras PI
Silva
Eliana Gonçalves de Oliveira Oeiras PI
Cardoso
Maria Luzilene Silva da Costa Oeiras PI
Marta Romão Batista Oeiras PI
Ana Paula Von Rainer Zu Pinhais PI
Harbach
Cristiane Canestrado Coradin Colombo PI
Lucióla Eloina Dal Bem Curitiba PR
Maria Thereza Johnsson Campos Curitiba PR
Vicentine
Roselene Martins da Silva Curitiba PR
Alci Léia Dalmônico Padilha Rio do Oeste SC
Barbara Helfenstein Leite São Jose SC
Camila Rosália Antunes Baccin Lages SC
Célia Fuzaris de Oliveira Rio do Oeste SC
Daiane Michels Rio do Oeste SC
Daniela Cristina Aidar Castanho Florianópolis SC
Azevedo
93
Fátima Cristiane de Almeida Florianópolis SC
Coelho Losso
Giovana Simas Itajaí SC
Ivanilde Perini Pessatti Rio do Oeste SC
Lucilene Aparecida Rosa de Lages SC
Oliveira
Luisa Manoela Marian Lages SC
Maeve Fernanda Kuhnen Soares São José SC
Otilia Pereira Itajaí SC
Roseli Maria Berkenbrock Luiz Rio do Oeste SC
Valéria Perpetua Coutinho de Lages SC
Azevedo
Ana Estela Pafaro da Costa e Vinhedo SP
Silva
André Dias de Oliveira Itapetininga SP
Aparecida Gloreti Soares Pedro Vinhedo SP
Cristina da Silva Marins São Paulo SP
Edilson César Dias São Paulo SP
Edna Marques de Oliveira Roza Itapetininga SP
Eliana de Sales Almeida Itapetininga SP
Eliane Mitsure Kikuchi Campinas SP
Fermanda Poleto Nishiwaki São Bernardo do SP
Campo
94
Glaudia Demarchi de Almeida São Bernardo do SP
Campo
Glaudia Virginia Lopes de Souza Santo André SP
Bastos
José Flavio Von Zuben Filho Vinhedo SP
Karina Pavão Patricio Botucatu SP
Luciane Padavini Murer Vinhedo SP
Maria Aparecida Venancio Botucatu SP
Pagani Almeida
Maria Fátima Fonseca Itapatininga SP
Kurshinski
Milton Ricardo Ribolli Campinas SP
Nathália de Paula Santos da Itapetininga SP
Mota
Priscila Araujo Pinto São Paulo SP
Queli Cristina Américo Schmidt Botucatu SP
Regina Célia Soares Silva Botucatu SP
Rosana Cristina de Lara Marins Botucatu SP
Minharro
Sandra Maria Silva Itapetininga SP
Simone Delevedove Fávero Botucatu SP
95
Galeria
Educanvisa
97
98
99
MOSTRA
100
CULTURAL
101
Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde
www.saude.gov.br/bvs