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2.3.

OXIGÊNIO E NITROGÊNIO

Considerações gerais
O oxigênio e nitrogênio são os primeiros elementos do grupo 16 e 15 da tabela periódica,
respectivamente. Ambos, na sua forma elementar, apresentam-se como moléculas diatômicas com
fórmula O2 e N2. Em condições normais de pressão e temperatura, ambos, são gases incolores,
inodoros e insípidos. O oxigênio, tanto em estado líquido como em estado sólido, tem uma
coloração ligeiramente azulada e, em ambos os estados, é paramagnético, ou seja, é atraído por um
ímã. O nitrogênio é incolor e diamagnético.
O gás oxigênio e nitrogênio são os principais constituintes do ar atmosférico. Retirando-se
do ar os gases nobres, o gás carbônico e a água nele contida, cerca de 78% do volume restante
cabem ao nitrogênio e 21% ao oxigênio. Apesar de serem utilizados desde muito tempo, uma vez
que são de grande importância para vida, somente no século XVIII que químicos e outros cientistas
aprenderam a capturar e armazenarem os gases. Com o domínio dessas técnicas, tornou-se possível
isolar vários gases e estudar suas propriedades químicas e físicas. Foi nesse período que os gases
oxigênio e nitrogênio foram descobertos. O gás oxigênio foi descoberto pelo farmacêutico sueco
Carl Wilhelm Scheele em 1772, por meios do aquecendo do óxido de mercúrio (1) e diferentes
sais de nitrato. Em um experimento semelhante em 1774 o britânico Joseph Priestley, focando a
luz solar num tubo contendo óxido de mercúrio encontrou um gás que aumentava o brilho da luz
de uma vela.

HgO Hg + ½ O2 (1)

O crédito da descoberta do nitrogênio é dado ao médico e químico escocês Daniel


Rutherford, em 1772, porque ele foi a primeira pessoa a anunciar a sua descoberta e dar uma
descrição detalhada do gás nitrogênio. No mesmo período o Inglês químico Henry Cavendish
(1731-1810) descobriu o nitrogênio de forma independente, removendo o gás oxigênio do ar
atmosférico de diferentes maneiras.

Estrutura molecular do O2 e do N2
O modelo de ligação que melhor explica as propriedades das moléculas de oxigênio e
nitrogênio é descrito pela teoria dos orbitais moleculares (TOM). Nessa teoria, os orbitais
moleculares são formados pela sobreposição dos orbitais atômicos com energia e simetria
apropriadas e são representados por diagramas de energias que fornecem informações como:
estabilidade termodinâmica, propriedades magnéticas e espectroscopia. Para as moléculas de O2 e
N2 o diagrama de energia dos orbitais moleculares pode ser representado como na figura 2.3.1. A
energia relativa dos orbitais permite escrever a configuração do estado fundamental para o N 2,
(1)2(2*)2(1)4(3)2, que consiste com a observação diamagnética da molécula.

Figura 2.3.1. Diagramas de orbitais moeculares para as moleculas N2 e O2.

O modelo prediz que a molécula de nitrogênio (N2) tem três ligações, sendo uma  e duas
, o que é confirmado pela sua elevada energia de ligação 942 kJ mol-1 e curta distância de ligação
de 1,10 Ǻ. A estrutura de Lewis de N2 (2) é descrita com três ligações e dois pares isolados, que
em termos da TOM os dois pares isolados correspondem às configurações  (1 e 2*) e as três
ligações corresponde a dois orbitais , (1), e um orbital  (3).

Para o O2 a configuração eletrônica do estado fundamental é (1)2(2*)2(3)2(1)4(1*)2


e consiste com a observação paramagnética da molécula, com dois elétrons desemparelhados no
orbital antiligante *. Tal paramagnetismo não é previsto pela teoria dos octetos de Lewis, que
prevê uma estrutura mais simples com oito elétrons ao redor de cada átomo correspondendo a uma
molécula diamagnética (2). Mas, utilizando-se dos resultados da TOM essa aparente discordância
é explicada pelo aparecimento de dois elétrons desemparelhados nos orbitais π*. Assim, essa
ligação tem ordem 2 (uma ligação  e outra ) e é normalmente simplificada como uma dupla
ligação. A energia de ligação do O2 é 494 kJ mol-1 e o comprimento é 1,21 Å.
Outra característica interessante do oxigênio molecular é a absorção de luz na região do
vermelho, correspondendo a transição do estado natural, do estado tripleto O2 (3Σ-g), para o estado
excitado, singleto O2 (1Δg), quando os dois elétrons do orbital πp* se emparelham. Esta absorção é
evidente no oxigênio líquido, que é levemente azulado.
Por causa dessas diferenças nos estados eletrônicos, o oxigênio singleto e tripleto diferem
em suas propriedades químicas, sendo o estado singleto bem mais reativo que o estado tripleto. Na
natureza o estado singleto é geralmente formando durante a fotossíntese, que usa energia solar
para excitar a molécula. É produzido também na troposfera pela fotólise do ozônio com a radiação
ultravioleta e pelo sistema imune de humanos, como uma fonte de oxigênio ativo. Por isso acredita-
se que os carotenoides em organismos fotossintéticos (e possivelmente também em animais)
desempenham um papel importante na absorção de energia a partir de oxigênio singleto levando-
o para o estado fundamental antes que possa causar dano aos tecidos.
Ao contrário do oxigênio molecular, o nitrogênio molecular não tem absorção na região do
visível. A absorção mais baixa observada para o N2 ocorre em alta energia (próximo de 70.000
cm-1) referente transição →.

Alotropia do oxigênio e do nitrogênio


O alótropo mais comum do oxigênio na Terra é o O2 que é conhecido como oxigênio
molecular ou, simplesmente, oxigênio. Nesta forma, ele é naturalmente encontrado na atmosfera
na concentração de cerca de 21% (em volume). O outro alótropo conhecido é o trioxigênio (ozônio,
O3), que possuem três átomos de oxigênio com distâncias de ligação iguais 1,278 Å formando um
ângulo de 116,8o. Sua reatividade é muito superior à do oxigênio, reagindo destrutivamente com
diferentes materiais como a borracha e os plásticos, mas, principalmente, tecido pulmonar, sendo
prejudicial à saúde por longas exposições. O ozônio é um gás azul pálido que quando condensado
o líquido torna-se azul escuro. Ele é formado quando o ar atmosférico é submetido a uma descarga
elétrica, mas também, em menor quantidade, em locais que funcionam motores elétricos,
impressoras laser e fotocopiadoras, produzindo um cheiro acentuado semelhante ao cloro. O
ozônio é termodinamicamente instável e forma dioxigênio e oxigênio atômico por decomposição
com radiação UV em atmosfera superiores,

O3 O2 + O

O ozônio absorve fortemente na região do ultravioleta e funciona como um escudo para a


biosfera contra os efeitos nocivos dessa radiação emitida pelo Sol (figura 2.3.2).
Figura 2.3.2. Esquema do ciclo do oxigênio-ozônio.

Outro alótropo bem mais raro do oxigênio é o tetroxigênio, O4, que já tinha sua existência
sugerida desde 1900, mas só foi identificado em 2001 pela equipe do Professor F. Cacace da
Universidade de Roma [1]. A estrutura do O4 não foi resolvida, mas a equipe sugere duas
moléculas de O2 fracamente ligadas por forças de dispersão de dipolo induzido, na forma de dois
halteres alinhados, formando um quadrado (figura 2.3.3).

Figura 2.3.3. Sugestão de estrutura para a molécula O4.

Ao contrário do oxigênio, o nitrogênio possui somente um alótropo estável, o N2. Contudo,


alótropos instável de nitrogênio com mais de dois átomos de nitrogênio foram produzidos em
laboratório. É o caso do N3 e N4, que são produzidos na superfície de diamantes, sob elevada
pressão (1,1 milhões de atm) e temperatura (2000 K). Como é produzida nas superfícies de
diamante sua estrutura são semelhantes à do diamante, e ambos têm fortes ligações covalentes. Por
isso o N4 recebeu o apelido de "diamante de nitrogênio".

Abundância, distribuição e fontes naturais do O2 e N2


O oxigênio é o terceiro elemento químico mais abundante no Universo, depois de
hidrogênio e hélio. No planeta Terra o oxigênio é o elemento químico mais abundante, em massa,
na biosfera (ar, terra e mar). É o segundo constituinte mais abundante da atmosfera da Terra (21,0%
do seu volume e 23,1 em massa) e o principal na crosta terrestre (49,2% em massa) e dos oceanos
(90% em massa). O oxigênio é o principal componente dos minerais que ocorrem na forma de
óxidos, como por exemplo: hematita (Fe2O3), gibbsita (Al(OH)3), sílica (SiO2), etc. No sistema
solar a Terra é o único planeta que possui uma atmosfera rica em gás oxigênio: Marte e Vênus
têm, por exemplo, concentrações muito menores (figura 2.3.4).

Figura 2.3.4. Quantidade de gases na atmosfera de Vênus, Terra e Marte.

O nitrogênio é estimado como o sétimo elemento químico mais abundante, em massa no


Universo. No planeta Terra o nitrogênio é o maior constituinte da atmosfera (78,082% em volume
de ar seco, 75,3%, em massa do ar seco). O nitrogênio está presente em todos os organismos vivos,
principalmente, na forma de proteínas, ácidos nucléicos e outras moléculas. Ele compõe cerca de
4% da massa seca de material vegetal, e cerca de 3% da massa do corpo humano. É um grande
componente de resíduos animais, geralmente na forma de ureia, ácido úrico, compostos de amônio
e derivados nitrogenados, que são nutrientes essenciais para todas as plantas que não podem fixar
o nitrogênio atmosférico. O nitrogênio ocorre naturalmente, também, em alguns minerais, como o
salitre (nitrato de potássio), salitre do Chile (nitrato de sódio) e sal amoníaco (cloreto de amônio),
contudo é a menor fonte de nitrogênio.
Para entender melhor a abundância do nitrogênio na atmosfera, é importante compará-la
com a do oxigênio (o próximo elemento mais abundante na atmosfera). O nitrogênio é quatro vezes
mais abundante que o oxigênio na atmosfera. No entanto, essa proporção diminui
consideravelmente quando se leva em conta a composição da Terra (o oxigênio é
aproximadamente 10.000 vezes mais abundante que o nitrogênio). Esta abundância terrestre reflete
a maneira como o nosso planeta foi formado, bem como, explica porque a atmosfera terrestre é tão
rica em nitrogênio. Primeiramente, porque o oxigênio é um componente importante do solo
terrestre, que junto com os elementos Si, Mg, Ca e Na, formam compostos bastante estáveis,
enquanto o nitrogênio não forma compostos estáveis com esses elementos, assim não é
incorporado ao solo terrestre. A outra razão é que, ao contrário do oxigênio, o nitrogênio é muito
estável na atmosfera e não está envolvida em grande parte das reações químicas que ocorrem na
atmosfera. Assim, ao longo do tempo geológico, a atmosfera foi formada com uma quantidade
muito maior de nitrogênio do que oxigênio.

Papel biológico do O2 e N2
Tanto o O2 quanto o N2 têm associações imprescindíveis a vida na Terra. Ambos participam
em diferentes processos biológicos: na respiração, na estrutura, na composição e em reações das
mais várias. O nitrogênio é removido da atmosfera e depositado na superfície da Terra,
principalmente, por bactérias fixadoras de nitrogênio especializadas, e por meio de descargas
elétricas provocadas pelas tempestadas e precipitando na forma de óxido de nitrogênio. O oxigênio
é trocado entre a atmosfera e a vida através dos processos de fotossíntese e respiração. Toda essa
dinâmica é observada no ciclo do O2 e do N2.

Ciclo do O2
A concentração elevada de gás oxigênio na atmosfera da Terra é o resultado do ciclo do
oxigênio. Este ciclo biogeoquímico descreve a circulação de oxigênio no interior e entre os seus
três principais reservatórios da Terra: a atmosfera (os gases que envolvem a superfície da Terra),
a biosfera (os organismos vivos e o seu ambiente próximo) e a litosfera (a parte sólida exterior da
terra). As três principais fontes não vivas de átomos de oxigênio para os seres vivos são, portanto,
gás oxigênio (O2), gás carbônico (CO2) e água (H2O). As três moléculas estão constantemente
trocando átomos de oxigênio entre si, durante os processos metabólicos da biosfera.
O O2 é utilizado na respiração aeróbica das plantas e animais. Nesse processo, átomo de
oxigênio combina-se com átomos de hidrogênio, formando moléculas de água. A água formada
na respiração, chamada água metabólica é, em parte, eliminada para o ambiente através da
transpiração e da excreção. Dessa forma, seu átomo de oxigênio acaba incorporado à matéria
orgânica e podem voltar à atmosfera pela respiração e pela decomposição do organismo, que
produzem água e gás carbônico.
O CO2 atmosférico (também chamado de gás carbônico) é utilizado no processo de
fotossíntese. O carbono e o oxigênio presentes no gás carbônico passam a fazer parte da matéria
orgânica do vegetal, e tanto a respiração como a decomposição dessa matéria orgânica restituirão
o oxigênio à atmosfera, na forma de água e gás carbônico. A água utilizada pelas plantas na
fotossíntese é quebrada, e seus átomos de oxigênio são liberados para a atmosfera na forma de O 2.

Ciclo do N2
O nitrogênio da atmosfera não pode ser usado diretamente por plantas ou animais e deve
ser convertido para um estado de oxidação reduzido, a fim de ser útil para as plantas superiores e
animais. Precipitação de chuva geralmente contém quantidades substanciais de sulfato e nitrato de
amônio, produto da reação do nitrogênio com componentes do atmosférico pela ação de raios e
outros fenômenos elétricos. No entanto, a maior concentração de nitrogênio disponível para as
plantas é produzida por bactérias específicas (por exemplo, Trifolium Rhizobium), que possuem
enzimas nitrogenase que podem fixar o nitrogênio atmosférico formando íon amônio, que é
quimicamente útil para os organismos superiores. A maioria das plantas obtém o nitrogênio
necessário ao seu crescimento através do nitrato, que é obtido pela oxidação da amônia num
processo conhecido com nitrificação. Os animais recebem o nitrogênio que necessitam através das
plantas e de outra matéria orgânica, tal como outros animais (vivos ou mortos)

Produção Industrial do oxigênio e nitrogênio


Os gases oxigênio e nitrogênio são produzidos comercialmente pela destilação fracionada
do ar atmosférico. Dois importantes processos são empregados para produzir esses gases, diferindo
apenas na maneira em que a expansão do ar ocorre. O ciclo Linde é baseado no efeito Joule-
Thompson de um gás, o que significa que quando um gás se expande adiabaticamente de uma
região de alta pressão para uma região de pressão mais baixa, é acompanhada por um resfriamento.
Como alternativa, o processo de Claude emprega um motor de expansão fazendo trabalho sobre o
gás. A temperatura é reduzida por causa da remoção de calor do meio. Este processo é mais
eficiente do que o processo Linde.

Figura 2.3.5. Fluxograma resumido da destilação fracionada do ar atmosférico.


Em linhas gerais, o ar é primeiramente comprimido a aproximadamente 200 atm no
compressor e depois passando através das bobinas de condensação. Como resultado, o ar é
resfriado e água e CO2 são condensados e removidos. O ar seco é então passado através do tubo
em espiral que se expande para a câmara onde a pressão é de cerca de 50 atm. Como resultados o
ar é resfriado devido o efeito Joule-Thomson (figura 2.3.5). Esse processo é repetido várias vezes
até que finalmente o ar é resfriado a tal ponto que ele se liquefaz. O ar liquefeito é coletado na
parte inferior da câmara pode ser retirada. Nessas condições o nitrogênio, mais voláteis (P.E. =
- 196 oC) escapa no topo da coluna como gás, enquanto o oxigênio condensa (P.E. = - 183 oC)
parte inferior da coluna como um líquido.

Aplicação e uso do oxigênio e nitrogênio


O maior consumo do gás oxigênio é feito pela indústria, principalmente a indústria do aço.
Mais da metade do oxigênio produzido no mundo, 55%, é usado na fundição de minério de ferro
na produção de aço. Neste processo, a O2 é injetada através de um lança de alta pressão em ferro
fundido, que, remove as impurezas de enxofre e carbono em excesso, reagindo e formando os
respectivos óxidos, SO2 e CO2. Outros 25% do oxigênio produzido comercialmente é utilizada
pela indústria química. Como na oxidação do etileno a óxido de etileno, que é convertido em
etileno glicol, usado para fabricar uma série de produtos anticongelante, incluindo polímeros e
poliéster. Os 20% restante é usado em aplicações médicas, corte de metal e solda, como oxidante
em combustível de foguete e no tratamento de água. Outra aplicação, que tem ganhado espaço nos
últimos anos, é na geração de energia por termoelétricas, uma vez que possibilita o aumento da
eficiência de geração de energia utilizando a mesma quantidade de combustível.
A molécula de nitrogênio é relativamente inerte, devido à sua elevada energia de ligação,
por isso a capacidade de combinar ou fixar nitrogênio molecular é uma característica fundamental
da química industrial moderna, onde o nitrogênio e o gás natural são convertidos em amônia pelo
processo Haber. A amônia, não é usada diretamente como fertilizante, mas é usada na síntese de
derivados nitrogenados, como (NH4)2SO4, NH4NO3, HNO3, etc. Todos derivados importantes na
indústria de explosivos, adubos e fertilizantes.

Referências
1. F. Cacace, G. de Petris, A. Troiani, Experimental Detection of Tetraoxygen, Angew. Chem.
Int. Ed. 2001, 40, 4062-4065.

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