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Serviço Técnico de Biblioteca
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
ISBN: 978-85-8089-141-6
CDD 711.52
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
Ana Cecília Mattei de Arruda Campos ……………………………...................................................................... 5
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SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E A CONSTITUIÇÃO DA FORMA URBANA
CONTEMPORÂNEA: produção e apropriação em Palmas-TO
Lucimara Albieri ………………….………………………………………………………………………………….…………….……… 199
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APRESENTAÇÃO
Nestas praticamente duas primeiras décadas do século XXI, intensas e prementes são as
transformações da urbanização brasileira. Segundo estimativas do IBGE, entre 2000 e
2017, a população cresce cerca de 23% e é majoritariamente urbana. Processos como a
implementação de loteamentos fechados e condomínios horizontais, de acesso
controlado, se intensificam apoiados na ampliação da rede viária e rodoviária.
Conjugam-se com maior mobilidade, deslocamentos pendulares, novas possibilidades de
organização do trabalho e consumo do espaço urbano. Centros de distribuição e logística,
núcleos empresariais, estruturas comerciais e de serviços de grande porte reorganizam
os espaços, escapam às classificações usuais e forçam novas reflexões. O próprio IBGE
abriu em 2017 discussão sobre o binômio rural-urbano, alterando seus critérios de
classificação.
Se por um lado há um aumento de renda das camadas mais baixas da população, por
outro mantem-se a desigualdade, expressa nos assentamentos precários por todo o País.
A segregação está muito além dos propalados muros e cercamento: está visível nas
distâncias percorridas diariamente por muitos, nas irregularidades fundiárias que
impossibilitam seu acesso a serviços básicos, na precariedade do sistema de espaços
livres resultante. As estruturas naturais sofrem a pressão da urbanização e a ampliação
das redes de esgotamento sanitário e abastecimento de água não é acompanhada na
mesma medida do processo de urbanização, assim são precários o tratamento de esgoto,
a despoluição de rios e a reciclagem de resíduos sólidos.
Com relação aos espaços livres, novos tipos como os parques lineares, qualificados ou
não, são realidade em inúmeras cidades e denotam a força do discurso ambiental
corroborado por legislação específica. Às tradicionais funções como lazer e recreação
realizadas em estruturas projetadas especificamente para estes usos, somam-se o
efêmero, o não controlado, a ação impulsionada por meio das redes sociais. Qual o
desenho destes espaços para os novos usos?
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Mesmo a mobilidade adquire outros contornos: aos modais motorizados, somam-se as
bicicletas, questiona-se a qualidade das calçadas, fala-se em cicloativismo e
caminhabilidade. Além dos deslocamentos em si, outros parâmetros de apropriação das
cidades entram em discussão.
A forma urbana pode ser analisada segundo abordagem interescalar dos elementos que
constituem os tecidos urbanos. Pode também ser aplicada à mancha urbana dos
aglomerados. Como define Queiroga em palestra no Colóquio da rede nacional de
pesquisa QUAPÁ-SEL (FAUUSP, outubro 2018) “a paisagem é processo (relação entre
processos sociais sobre as dinâmicas do suporte biofísico), a forma urbana é produto,
ainda que mutável e dinâmico, condição para que o urbano se realize”.
Aos autores foi solicitada a análise de itens específicos que balizam a produção dos
artigos: a relação da morfologia urbana com o suporte biofísico, o sistema de espaços
livres, o papel concreto dos agentes produtores dos espaços livres e edificados, os
padrões morfológicos e a legislação urbanística e ambiental pertinente. Estes itens
direcionaram a pesquisa desenvolvida nestes 5 últimos anos no projeto temático de
pesquisa intitulado Os sistemas de espaços livres na constituição da forma urbana
contemporânea no Brasil: produção e apropriação – QUAPÁ-SEL II, que se encerra neste
ano (2018). E que teve na realização de oficinas in loco seu ponto mais relevante
(reconhecimento por terra, sobrevoo com levantamento fotográfico, trabalhos em grupo
e síntese das oficinas em quatro temas: 1) o sistema de espaços livres existentes; 2) a
legislação e os espaços edificados e livres gerados; 3) a identificação dos agentes
produtores do espaço urbano e; 4) os padrões morfológicos existentes). O material
resultante foi muito aproveitado pelos autores dos trabalhos aqui apresentados.
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Com relação às transformações das cidades médias, a produção de petróleo e seus
impactos na urbanização recente são analisados por Danielly Cozer Aliprandi e Antonio
Leandro Crespo de Godoy em TRANSFORMAÇÃO E PERENIDADE: o legado dos royalties
do petróleo na paisagem de Campos dos Goytacazes/ RJ.
Os pesquisadores Karin Schwabe Meneguetti, Renato Leão Rego, Gislaine Elizete Beloto,
Izabela Bombo Gonçalves, Samara Soares Braga e Mayara Henriques Coimbra no artigo
TRANSFORMAÇÕES NA FORMA URBANA DE MARINGÁ-PR. O sistema de espaços livres e as
reconfigurações urbanas recentes cidade de Maringá partem do projeto inicial da cidade
onde a estruturação das formas urbanas se dá através do sistema de espaços livres,
adequando-os ao suporte natural, e verificando sua estrutura atual.
Lucimara Albieri analisa a constituição da forma urbana de Palmas a partir de seu projeto
urbanístico, evidenciando seus conflitos e contradições em SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES
E A CONSTITUIÇÃO DA FORMA URBANA CONTEMPORÂNEA produção e apropriação em
Palmas-TO.
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ESPAÇOS LIVRES E FORMA URBANA NO RIO DE JANEIRO: contrastes e contradições do
processo de estruturação do espaço e da paisagem, artigo desenvolvido pelos
pesquisadores Mariana V. Moreira, Bruno R. Mendonça, Marco B. Amorim, Alain L.
Flandes, Flora O. Fernandez, Carla G. Oliveira, Aydam de Paula, Camila C. Vianna,
Rogerio G. Cardeman e Vera R. Tângari, discorre sobre a dinâmica de ocupação e
apropriação do solo e a fragmentação urbana causada por processo desarticulado, com
impactos ambientais.
Por fim, Eneida Maria Souza Mendonça e Lorenzo Gonçalves Valfré desenvolvem seus
estudos sobre O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES NA CONSTITUIÇÃO DA FORMA URBANA DA
REGIÃO DE VITÓRIA, ES abordando a escala metropolitana da forma urbana.
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SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E MORFOLOGIA URBANA DE CAMPINAS
MERLIN, J. R. (1); BENFATTI, D. M. (2); SILVA, J. M. P. da (3); SANTOS JR, W. R. dos (4)
(1) Professor PUC Campinas, e-mail: jrmerlin@puc-campinas.edu.br
(2) Professor PUC Campinas, e-mail: deniobenfatti@puc-campinas.edu.br
(3) Professor PUC Campinas, e-mail: Jonathas.silva@puc-campinas.edu.br
(4) Professor PUC Campinas, e-mail: wilson@puc-campinas.edu.br
Introdução
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Caraterização geral: a inserção da cidade no território
O fato de Campinas estar inserida em uma região macro metropolitana dificulta sua
análise apenas na escala municipal. Sua dinâmica deve ser compreendida a partir do
entendimento das dinâmicas que ocorrem entre as regiões metropolitanas de São
Paulo, Sorocaba e da Aglomeração Urbana de Jundiaí. (Figura 01)
Figura 01: Inserção da região Metropolitana de Campinas na Macro metrópole Paulista. Fonte: autor
sobre bases da EMPLASA (2016)
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Figura 02: Estrutura de Caminhos Significativos Rodovias Paulistas: 1. Faria Lima; 2. Washington Luis;
3. Anhanguera; 4. Bandeirantes; 5. Marechal Rondon; 6. Fernão Dias; 7. Castelo Branco; 8. Dom
Pedro I; 9. Presidente Dutra/Carvalho Pinto; 10. Raposo Tavares; 11. Régis Bittencourt; 12
Anchieta/Imigrantes. Fonte: MANETI, 2013.
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Figura 03: Estrutura de Logística: Portos; Aeroportos; Portos Secos. Fonte: MANETTI, 2013.
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Figura 04. Delimitação das unidades morfo-territoriais por meio do uso do Google Earth em formato
*png. Fonte: MAGALHÃES 2015.
Figura 05: Delimitação das unidades de Paisagem considerando a dinâmica da mobilidade sócio
espacial da região. Fonte: SILVA, LIMA & MAGALHÂES, 2015.
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A análise na delimitação das unidades morfo-territoriais identifica um setor que está
fortemente relacionado ao eixo da rodovia Anhanguera, assim como, setores que
estabelecem relações com outros vetores de ocupação da região.
Figura 06: D1. Delimitação das áreas urbanizadas, D2. Limite do perímetro urbano. Fonte: Silva, 2013.
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que condicionaram a permanência ou a transformação dos grandes espaços livres
públicos.
Figura 07: Estrutura Urbana de Campinas: I) 1940; II) 1970; III) 2010. Fonte: Fonte: MANETTI, 2013
Figura 08: Configuração das Porções Territoriais: A. Quadrante de Ribeirão Preto/São José do Rio
Preto/Barretos; B. “Garfo” de Limeira; C. Compartimento Inter Metropolitano. Fonte: MANETTI, 2013.
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Suporte biofísico e morfologia urbana
Figura 09: Mapa síntese resultante da analise das legislações municipais. Destacam-se em verde as
áreas que constam diretrizes de preservação ou conservação ambiental. SILVA, 2012.
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urbanizadas. A paisagem é fortemente caracterizada pela dispersão urbana e
relações de fronteiras indefinidas entre áreas rurais e urbanas. Entretanto cabe
ponderar que esta dispersão é mais visível e legível quando se trata da região
metropolitana de Campinas, muito mais dispersa do que a região metropolitana de
São Paulo, se tornando mais onerosa ao erário público.
Figura 10: Reagrupamento dos dados do Censo 2010 e rede de infraestrutura: RMC água e esgoto.
Fonte: PERA, 2015.
Podem ser apontados alguns enclaves na área urbana como a fazenda do Exército ou
Fazenda Santa Elisa, entretanto, não são estes elementos que induzem a
descontinuidade urbana, mas sim o interesse do mercado em criar localizações onde
o solo urbano tem menor custo. Este fato afeta tanto as urbanizações ligadas ao
mercado de renda média e alta, como também no que concerne a implantação dos
conjuntos populares do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV).
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município, caracterizada como as Áreas de Proteção Ambiental (APAs), conforme
mostra a Figura 09, referenciada anteriormente.
Ainda com respeito às relações entre suporte físico e morfologia urbana, a rede
hídrica que corta o município, em função da legislação ambiental, gerou forte
influencia sobre a morfologia urbana. A cidade de Campinas está assentada sobre
cinco bacias hidrográficas: Jaguari, Atibaia, Anhumas, Quilombo, Capivari e Capivari
Mirim. Esses rios, de porte médio, são irrigados por uma densa rede de pequenos
afluentes.
De propriedade pública ou privada, as áreas lindeiras aos corpos d’água passam a ser
protegidas pela legislação ambiental. Isso implicou, para muitas cidades, em acréscimo
considerável de espaços livres de edificação no meio urbano. Assim, um novo e
importante conjunto de áreas não edificadas estaria sendo incorporado ao conjunto geral
de áreas que compõem o sistema de espaços livres da cidade. (BENFATTI, SILVA, 2013).
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LIMA, 2015). Por enquanto, temos na cidade de Campinas a preservação de espaços
com critérios e qualidades ambientais e paisagísticas, mas que ainda se apresentam
como espaços de possibilidades para o futuro.
Com relação à arborização, apesar da escassa arborização viária, ela é mais incidente
e visível na área central, composta basicamente até os anos 1950, e em alguns poucos
bairros já consolidados. É interessante notar que, em Campinas, mesmo nos
loteamentos populares implantados entre as décadas de 1970 e 1990 as calçadas têm
dimensões suficientes para compartilhar a circulação de pedestres com elementos
arbóreos. Portanto, pode-se afirmar que existe um potencial para qualificar a cidade
também quanto ao quesito arborização viária.
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Figura 11: Mapa síntese dos agentes produtores do espaço e a localização dos principais
empreendimentos. Fonte: Lab QUAPÁ
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Figura 12: Ensaio com índices da LUOS realizado na Oficina QUAPÁ Campinas, Rodoviária
(QUEIROGA, 2016).
Estes estudos tipo-morfológicos foram feitos como exemplos em dois lugares usando-
se a legislação pertinente, seguindo a legislação de uso e ocupação do solo (LUOS)
vigente, um na Z-17 perto da Rodoviária de Campinas (Figura 12) e outro na Z-11
perto do terminal de ônibus Campo Grande (Figura 13).
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Figura 13: Ensaio com índices da LUOS realizado na Oficina QUAPÁ Campinas-Campo Grande.
(QUEIROGA, 2016):
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O caráter histórico desta forma urbana compacta e regular, sofreu as intervenções
de transformação ocorridas na primeira metade do século XX, que reforçaram essa
tipologia. O plano Prestes Maia para Campinas (1937) pautou a transformação de
todo o centro ampliado da cidade reforçando esses parâmetros, bem como a
formação de um tecido urbano baseado na tipologia claramente diferenciada, em
que a relação entre espaço privado e espaço público apresenta-se, seguindo os
ditames do movimento moderno. A formação do tecido urbano sob esses parâmetros
ocorreu de forma predominante até os anos 1960, cujo ícone de época foi a “Praça
Lago dos Cisnes” (Figura 15) no interior do viaduto Miguel Vicente Cury, hoje
ocupado por um terminal de ônibus. Na porção da cidade de Campinas formada neste
período, o sistema de espaços livres tem como característica básica o espaço aberto
de uso e propriedade públicos, emoldurado e definido pelo espaço construído de
caráter e uso privado. Ruas, avenidas, praças, largos, alguns poucos parques,
definem de forma direta o espaço livre e aberto desta porção da cidade de Campinas.
Também nesta parte da cidade é possível constatar a maior quantidade e qualidade
dos espaços públicos, entre praças e parques.
Figura 14: Crescimento urbano da cidade de Campinas no decorrer do tempo: entre 1940 e 1989.
Fonte: Plano Diretor de Campinas, 2006.
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No caso da urbanização de características alargada e dispersa, as tipologias e as
características do sistema de espaços livres do período anterior não desaparecem
até que, a partir dos anos 1970, verifica-se a ocorrência de mudanças expressivas no
perímetro urbano. A malha urbana começa a perder seu caráter predominantemente
compacto e passa a se desenhar de forma mais independente, com grandes vazios
em seu interior (anos 1970 e 1980). Coincide com um período de grande crescimento
populacional, com a ocupação urbana associada à migração em direção ao vetor
sudoeste da cidade. Tipologicamente se continua a reproduzir, em parte, os
elementos da cidade tradicional, ao mesmo tempo em que os grandes conjuntos
habitacionais passam a fazer parte da paisagem, isolados nos extremos da malha
urbana. Nas expansões urbanas das décadas de 1970 e 1980, verifica-se, por um lado,
uma extraordinária dilatação da cidade decorrente dos vazios urbanos (Figura 14),
com paisagem agrária entremeada com a urbanizada.
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formada por unidades autônomas que se sucedem sem que se consiga construir uma
unidade, uma continuidade homogênea visível (TÂNGARI, BENFATTI, 2016).
Convém esclarecer também que nas raízes do acelerado processo de urbanização que
ocorre na Região Metropolitana de Campinas existem inúmeras causas, dentre as
quais o desenvolvimento do capital e sua pressão do mercado para a aplicação do
chamado “capital excedente” na era da globalização da economia. (HARVEY, 2009)
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de um espaço de encontro para a vida coletiva daquele núcleo urbano nascente,
evidenciando que os espaços para vida coletiva hoje estão bastante empobrecidos.
Figura 15: Lago dos Cisnes na década de 1960, hoje Terminal Central de Campinas. Crédito a
“Imagens de Campinas”. Acesso 10 jan. 2017. Disponível em < https://goo.gl/tKo4G9 > ou em
<https://goo.gl/Jzz382 >
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A globalização da economia e a veiculação da ideologia do verde, trazida
especialmente da forma de ocupação dos subúrbios nos Estados Unidos, têm
incentivado a dispersão urbana, amparada pelo uso intensivo do automóvel, pela
construção de rodovias de qualidade e pelo desenvolvimento da tecnologia da
informação. É um novo sistema pautado pelos objetos técnicos, comunicacionais e
informacionais sustentando um novo modo de vida na busca das amenidades do
campo com maior qualidade de vida para uma classe e possibilidade única de se
transformar em proprietário pelos mais pobres.
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As principais transformações urbanas de Campinas e padrões morfológicos
Figura 16: Alteração dos perímetros na Região Metropolitana de Campinas. Fonte: Pera, 2015.
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Figura 17: Transformação urbana de Campinas. Fonte: PEGORARO & MACEDO, 2016.
Campinas é composta por duas estruturas notáveis segundo PEGORARO & MACEDO
(2016). O mesmo estudo identifica que as empresas de base imobiliária
aparentemente estão vinculadas a maior quantidade de “áreas de transformação”.
Sendo que:
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A apropriação de áreas periféricas visando resolver o déficit habitacional segue
sempre um modelo típico. São adquiridas áreas maiores que as necessárias para a
construção do conjunto habitacional proposto, preferivelmente ao longo de uma via
oficial do município, entretanto o empreendimento começa a ser implantado no
lugar mais distante do centro, o que força o poder público a implantar infraestrutura,
passando pelo vazio deixado entre o conjunto e o centro da cidade, supervalorizando
a terra ali existente. É uma forma de especulação que socializa os ônus (investimento
em infraestrutura urbana paga pelos impostos) e privatiza os bônus (lucro da
valorização imobiliária).
Hoje, nas cidades observa-se uma grande parcela da população vivendo de modo ilegal,
entretanto, que tem sido tolerada pelo Estado, como forma de suavizar sua ineficiência
com a falta de infraestrutura e provimento do acesso legal a moradias. Esta ocupação
ilegal tem sido permitida somente em áreas em que não há interesse imobiliário, ou de
outro capital. É regra que em áreas onde há valor imobiliário, aplica-se a lei. Elas são
usadas conforme as circunstâncias, gerando uma segregação ainda maior da população,
para áreas mais distantes da cidade. (MERLIN; RIBEIRO, 2017)
(...) cada empreendimento ser de competência privada, ainda cabe ao setor público que
tais serviços sejam disponibilizados aos empreendimentos, como redes de distribuição de
água, energia elétrica, e telecomunicações sem os quais novos empreendimentos não
seriam viáveis. A dependência que o capital imobiliário tem do Estado fica ainda mais
clara quando se trata da produção do PMCMV, que para além de todas as condições de
acesso e serviços também depende do financiamento público. (PEGORARO & MACEDO,
2016).
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No caso de Campinas, a maioria dos conjuntos do programa MCMV tem sua
localização, quase que exclusiva, nos fundos das macrozonas 5 e 7, promovendo,
mais uma vez, a dilatação da ocupação urbana para áreas distantes e descontínuas
em relação ao tecido urbano existente. Apesar de muitos desses empreendimentos
serem formalmente abertos, a exemplo dos loteamentos fechados, esses conjuntos
habitacionais também se inserem como peças autônomas no fundo do território,
reforçando a segregação espacial (BENFATTI, 2016).
Figura 18: Região de Viracopos (2016), áreas em transformação. Fonte: Google Earth (2016).
Esta região,
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(...) apresenta em seu território um importante valor rural e ambiental por ser o último
espaço livre em escala metropolitana da porção sul do municipio, localizado entre a
rodovia Santos Dumont e as cidades de Indaiatuba, Monte Mor e os distritos do Campo
Grande e Ouro Verde, onde se encontram comunidades rurais e pequenos agricultores,
numa escala quase familiar e com posse antiga do território como é o caso das
comunidades do Fogueteiro e Friburgo, de descendentes de imigrantes suiços e alemães.
As perspectivas para esta área é a ocorrência de profundas transformações na morfologia
urbana e na paisagem. Nos últimos anos tem crescido o interesse do mercado imobiliário
em paralelo à divulgação de projetos e ações de requalificação da área circunvizinha ao
Aeroporto Internacional de Campinas. Tem sido anunciados investimentos por parte dos
programas de parceria público-privada coordenadas pelo Governo do Estado de São Paulo
e pela Prefeitura de Campinas, tornando a região atrativa, não apenas pelas vantagens
geradas pela localização próxima ao aeroporto, mas também decorrentes investimentos
em infraestrutura. (SANTOS JUNIOR, 2017)
Conjuntos habitacionais MCMV têm sido implantados sem áreas de lazer e seus
moradores invadem APPs, erodindo córregos cuja água é usada por proprietários
rurais produtores de frutas para exportação alocados pela antiga Reforma Agrária da
década de 1960, caso constatado perto de Viracopos, especialmente o conjunto
residencial Vila Abaeté. Resultantes da expansão dos assentamentos urbanos
precários sobre as áreas periféricas, alguns destes lugares que se formaram na
esteira da segregação sócioespacial da cidade de Campinas, mesmo gerando
conflitos, passam a ser objeto de atenção por parte do mercado imobiliário (SANTOS
JR; MACIEL; 2016).
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regiões sul e sudoeste do município. No entanto, estas obras de melhorias,
principalmente as relacionadas ao abastecimento de água e ao esgotamento
sanitário, que se caracterizam como um sério problema de ordem urbanística e
ambiental, embora fossem necessárias há bastante tempo, foram anunciadas
recentemente no bojo do crescente interesse dos agentes econômicos e imobiliários
pela área próxima aos eixos de acesso ao Aeroporto Internacional de Viracopos.
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Figura 19: Cidade tradicional. Centro de Campinas. Verticalização. Fonte: Acervo QUAPÁ-SEL.
Sobrevoo realizado por Jonathas Magalhães e Silvio Macedo (2016).
Figura 20: Campinas: área central e entorno verticalizado. Sobrevoo realizado por Jonathas
Magalhães e Silvio Macedo em 2016. Fonte: Acervo QUAPÁ-SEL.
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Figura 21: Condomínio Fechado Swiss Park, região sudoeste, ao lado da Rod. Anhanguera. Fonte:
Acervo QUAPÁ-SEL. Sobrevoo realizado por Jonathas Magalhães e Silvio Macedo em 2016.
Figura 22: Rodovia D. Pedro I, Unidades autônomas diversas Fonte: Acervo QUAPÁ-SEL. Sobrevoo
realizado por Jonathas Magalhães e Silvio Macedo (2016).
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Figura 23: Rodovia D. Pedro I. Shopping D. Pedro. Fonte: Acervo QUAPÁ-SEL. Sobrevoo realizado por
Jonathas Magalhães e Silvio Macedo (2016).
Figura 24: Centro de Campinas, áreas em transformação. Fonte: Acervo QUAPÁ-SEL. Sobrevoo
realizado por Jonathas Magalhães e Silvio Macedo (2016)
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Considerações finais
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Esta mescla não permite uma leitura homogênea e única, por formar um amontoado
de fragmentos distantes que resultam em paisagens com espaços urbanos e agrários,
com delimitações bastante imprecisas, impedindo a construção de uma unidade,
embora se constate que a cidade vai lentamente incorporando os espaços do campo.
A urbanização revista pelo Plano Diretor de 2006 propôs nove macrozonas que fariam
seus Planos Locais de Gestão Urbana, dentre os quais só foram elaborados três deles.
A Lei de Uso e Ocupação do Solo por tratar apenas do Coeficiente de Aproveitamento
(CA) e Taxa de Ocupação (TO) tem gerado espaços de baixa qualidade, como se
mostrou nas experimentações gráficas elaboradas na Oficina de Campinas em 2016,
quando foram analisadas uma área central e outra periférica.
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setores, pressionando as ações urbanísticas que buscam tratar do espaço como
atributo da cidadania e da forma adequada de desenvolvimento da convivência
humana.
Referências
HARVEY, David. A Liberdade da cidade. In: GEOUSP: Espaço e Tempo, São Paulo,
n°26, p.09-17, 2009. Disponível em:<https://goo.gl/WXgPvb>. Acesso em: 02 ago.
2017
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PEGORARO, R.L.; MACEDO, S. S. Transformação na Forma Urbana Brasileira: Estudo
de Dois Centros Urbanos. In: Anais do XI Colóquio QUAPÁ-SEL – Salvador, BA – UFBA,
2016.
QUEIROGA, E. F.; Relatório Oficina QUAPÁ-SEL Campinas. São Paulo: Lab QUAPÁ,
FAUUSP, 2016.
40
GALENDER, F.; DEGREAS, H. N.; AKAMINE, R.; MACEDO, S. S.; CUSTODIO, V.. (Org.).
Sistema de Espaços Livres: conceitos, conflitos e paisagens. São Paulo: FAUUSP,
2011, v. 1, p. 57-66.
SILVA, Jonathas M. P.; LIMA, F. C.; MAGALHÃES, Natália C. T.. Aplicação de Método
de analise em três diferentes escalas: padrões e tipos morfológicos da Região
Metropolitana de Campinas, SP, Brasil. Revista de Morfologia Urbana, v. 1, p. 105-
120, 2015.
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TRANSFORMAÇÃO E PERENIDADE:
o legado dos royalties do petróleo na paisagem de Campos dos Goytacazes-RJ
Introdução
A cidade estudada, de porte médio, tem por característica marcante o Rio Paraíba
do Sul, que a divide em dois territórios, Guarus e Campos, subdistritos do Distrito
Sede. Esta fronteira natural também marca a diferença no tratamento desses setores
urbanos. Historicamente, o subdistrito Campos recebeu mais investimentos sendo
foco de políticas e ações públicas, que o dotaram de maior infraestrutura e tendo,
com isso, suas áreas mais valorizadas. Porém, o desdobramento dessas ações
provocou a extinção de recursos hídricos, canalizados e aterrados, consolidando uma
planície sem obstáculos naturais à expansão urbana. Por outro lado, Guarus, carente
de ações de planejamento urbano, manteve grande riqueza nesse aspecto, possuindo
inúmeras lagoas e brejos com grande potencial para o lazer e a conservação. Esta
dicotomia entre investimento, preservação, transformação e permanência da
estrutura morfológica da paisagem urbana de Campos dos Goytacazes consolidou o
atual SEL, objeto deste estudo. Por meio de mapeamentos temáticos, seguindo
metodologias desenvolvidas pelos grupos SEL-RJ e QUAPÁ-SEL, apresentamos nossa
análise.
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Caraterização geral
Caetano (2000 apud Aliprandi, 2017) afirma que, a partir de 1995, a riqueza da Bacia
de Campos transformou-o no maior produtor de petróleo do País, 82% da produção e
40% do gás natural do País à época. Indústria, agropecuária e serviços são suas
principais atividades econômicas (IBGE, 2010). Como afirma Aliprandi (2017), esse
contexto atraiu diversas empresas à região, provocando movimento pendular de
trabalhadores, trazendo crescimento populacional e tornando as cidades de Campos
dos Goytacazes e Macaé pólos econômicos regionais.
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Embora, durante muito tempo, a economia do município tenha se baseado na
produção sucroalcooleira, o recorte deste estudo será a partir do advento dos
royalties do petróleo, estabelecido como marco temporal a lei 9.478/1997,
conhecida como lei do petróleo, que carreou significativo aumento da renda
municipal.
Figura 2: Espaços livres e mancha urbana - município. Aliprandi (2017), IBGE (2010), Crespo et al.
(2010), PDPCG (2008), Macedo et al. (2015, no prelo) e Google Earth (2016).
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Figura 3: Espaços livres e mancha urbana - cidade. Aliprandi (2017), IBGE (2010), Crespo et al. (2010),
PDPCG (2008), Macedo et al. (2015, no prelo) e Google Earth (2016)
Campos dos Goytacazes, por sua característica histórica, tem, nas mãos de poucos
proprietários de terra, grandes porções das áreas de expansão urbana, pois o núcleo
original de formação da cidade se expandiu, parcelando o solo nas antigas fazendas
de produção de cana-de-açúcar.
1
Entendemos como setor geográfico, segundo Souza (2013, p. 159): “[...] um conjunto de bairros com
características próprias e ‘personalidade’ definida”. O setor geográfico da Pelinca é composto pelos bairros:
Parques Maria Queiroz, Conselheiro Tomaz Coelho, Avenida Pelinca e Tamandaré.
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investimentos públicos e privados e do notório status social associado a ele
(ALIPRANDI, 2017).
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Figura 5: Foto aérea da cidade. Aliprandi (2015).
Este local, que, naquele período (década de 1960), figurava fora dos limites de interesse
da malha urbana, era ocupado apenas por canaviais, teve posteriormente a pavimentação
da Rodovia do Contorno, que redirecionou a BR-101 objetivando amenizar o trânsito do
centro da cidade. Atualmente, esta área é uma das mais cobiçadas pela especulação
imobiliária na cidade (...) (GODOY, 2015, p. 25).
2
A figura do loteamento fechado, que não era regulamentada pela legislação federal até 2017, integra dois
modelos de parcelamento: o condomínio e o loteamento. Com anuência do município, esses loteamentos são
parcelados seguindo a Lei Federal de Parcelamento do Solo nº 6766/79, e se tornam fechados por um Decreto
Municipal.
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Características gerais: suporte geobiofísico e morfologia urbana
O território da cidade é formado por extensa planície cortada pelo Rio Paraíba do
Sul, presença fundamental na formação de seu núcleo urbano, representando
elemento estruturante na instalação da Vila de Campos (como era chamada) e de
toda a vida que se deu nela e em seu entorno (ALIPRANDI, 2017). Esta fronteira
natural também divide o Distrito Sede em Guarus e Campos.
Esses autores ainda apontam que boa parte das bordas das lagoas são palco de
conflitos, considerando as tensões geradas pela ocupação de suas margens por
loteamentos irregulares e a política pública municipal de habitação, que tem por
escopo a remoção dessa população para conjuntos habitacionais.
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Figura 6: Relação ocupação e suporte geobiofísico. Aliprandi (2017), IBGE (2010), PDPCG (2008) e
Google Earth (2016).
Guarus, que não atrai grandes investimentos, possui suporte geobiofísico mais rico
em corpos hídricos e, portanto, áreas de conservação ambiental. Fica claro que a
desproporcionalidade dos investimentos e da atenção dos agentes produtores do
espaço urbano sempre mais voltada para a margem sul é cultural (GODOY E
ALIPRANDI, 2017).
Se, por um lado, este suporte geobiofísico apresenta diversas lagoas e espaços livres
com potencial para lazer e conservação, por outro lado, essas lagoas configuram
encraves naturais, que limitam a expansão, principalmente pela forma desordenada
como suas margens são ocupadas. Já na margem sul, as inúmeras drenagens e aterros
constituíram uma planície desprovida de obstáculos, e favoreceu o espraiamento da
mancha urbana.
49
O Sistema de Espaços Livres
Os espaços que compõem o SEL podem ser categorizados de acordo com a demanda
e o interesse do pesquisador. Neste estudo, foi utilizada a categorização do grupo
SEL-RJ: espaços livres de caráter ambiental, regulados por legislação ambiental; de
caráter urbano, inseridos no perímetro urbano e regulados por legislação urbanística;
de caráter rural, localizados fora do perímetro urbano, podendo ser regulados por
legislações federais e estaduais (TÂNGARI et al., 2012).
SÍTIOS
PRAIAS DO ES
PRAIAS SJB
PRAIA DE CAMPOS
SERRA ITAOCA
50
Figura 8: Espaços Livres públicos da cidade de Campos dos Goytacazes. Aliprandi (2017), IBGE (2010),
PDPCG (2008) e Google Earth (2016).
Também é preciso ressaltar os espaços livres de urbanização que, assim como o Rio
Paraíba do Sul, são fortes estruturadores da paisagem, por serem objeto de
especulação, acabam por determinar o ritmo e a direção da ocupação urbana.
Paradoxalmente, a norte, como já explicitado, os recursos hídricos limitam e
51
estruturam a ocupação desta porção do território, haja vista seu caráter de encrave
natural e os conflitos socioambientais existentes.
Campos dos Goytacazes viveu, desde o final da década de 1990, forte crescimento
do mercado imobiliário. São característicos os vetores de crescimento e os grandes
investimentos privados que alavancaram esse mercado e redesenharam sua
paisagem. Seguindo essa tendência, investimentos públicos configuram um reforço
desses vetores e uma sincronia com forças do capital imobiliário. Em contrapartida,
a cidade, que se faz desenhar, consolida a fragmentação, na medida em que a
segregação espacial se intensifica pelo movimento das populações de baixa renda
em evidente processo de periferização.
52
direitos dos munícipes. Este processo segue a dinâmica que ignora o planejamento
voltado para o bem comum, e orienta-se segundo o lucro imobiliário, como afirma
Maricato (2013, p. 20):
Há uma disputa básica, como pano de fundo, entre aqueles que querem dela melhores
condições de vida e aqueles que visam apenas extrair ganhos. A cidade constitui um
grande patrimônio construído histórica e socialmente, mas sua apropriação é desigual e
o nome do negócio é renda imobiliária ou localização, pois ela tem um preço devido aos
seus atributos. Isso tem a ver também com a disputa pelos fundos públicos e sua
distribuição (localização) no espaço.
53
habitacional social denominado Morar Feliz, além de obras de regularização
fundiária, em especial o programa Bairro Legal. Tais programas, se por um lado tem
o diferencial de um programa municipal com recursos próprios, por outro, em uma
constante dinâmica de remoções, intensifica a periferização e a segregação espacial.
Ao mencionar o Programa Bairro Legal, com início em 2010, Aliprandi (2017) aponta
um custo superior a R$200 milhões, contemplando bairros com pouca infraestrutura
urbana, visando à regularização urbanística e fundiária dos loteamentos irregulares
existentes. Esses recursos são essencialmente provenientes dos royalties, mas
também vêm do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Os bairros são, em
geral, localizados na periferia e são atendidos em apenas alguns trechos.
Dentre as políticas públicas que influenciam o uso dos espaços livres públicos de
Campos dos Goytacazes, em especial a praia, está o programa Cartão Campos
Cidadão, com o qual o munícipe paga apenas um real pela passagem e a prefeitura
subsidia a diferença, independente da região em que o cidadão reside. Entre 2009 e
2014 foram gastos cerca de R$185 milhões em subsídios nesse programa (CARVALHO,
2016), que resultaria em uma média de quase R$31 milhões ao ano. Embora tais
investimentos tenham aparência de grande vulto, é importante entender a escala
dos recursos municipais campistas, que entre 2009 a 2016, proveniente dos royalties
e participações especiais, foi de, em média, R$2.224.429.838,31 ao ano
(R$17.795.438.706,48 em oito anos), segundo dados do site inforoyalties da
Universidade Cândido Mendes (ALIPRANDI, 2017).
54
(ALIPRANDI, 2017). Estas e outras informações podem ser identificadas no mapa da
Figura 9.
Figura 9: Investimentos dos agentes produtores do espaço urbano. Aliprandi (2017), IBGE (2010),
PDPCG (2008) e Google Earth (2016).
O Governo Federal também deve ser considerado como importante agente produtor
do espaço urbano, pois atuou com investimentos que duplicaram grandes trechos da
BR-101, que liga Campos dos Goytacazes a Macaé, ao Rio de Janeiro e ao Espírito
Santo. Também é de grande relevância a atuação no fomento à exploração do
petróleo na Bacia de Campos e os investimentos do Programa Minha Casa Minha Vida.
A instalação do Complexo Portuário do Açu e do Complexo Logístico Farol-Barra do
Furado na região atraíram significativos investimentos, estimulando o crescimento
regional.
55
Incorporadoras, construtoras e investidores privados atuam como agentes neste
cenário, principalmente alavancados por ações governamentais. São desses agentes
as ações de: implantação de loteamentos fechados de alto padrão, construção de
hotéis, shoppings centers, hipermercados, concessionárias de veículos (grandes
edifícios horizontais na Figura 9) e equipamentos diversos voltados ao lazer.
56
Em relação à preservação ambiental, as áreas de proteção estão majoritariamente
ao norte do Rio Paraíba do Sul, compreendendo especialmente lagoas, brejos e seu
entorno. São áreas já protegidas por lei ou são de interesse para tal, sendo indicadas
pelo plano para criação de novas Áreas de Proteção Ambiental ou equipamentos
públicos, como parque urbano, por exemplo.
De forma geral, percebe-se o PDPCG como um “Plano Discurso”, nos termos usados
por Villaça (2003), pois possui um texto completo e que atende bem a muitas
questões, porém a maioria de suas diretrizes não se constitui em ações normativas,
focando apenas no discurso.
57
Quadro dos espaços livres na constituição dos padrões morfológicos
Figura 10: Padrões morfológicos. Aliprandi (2017), IBGE (2010), PDPCG (2008) e Google Earth (2016).
58
Os loteamentos fechados ao sul do rio atuam como encraves no tecido urbano, como
barreiras à livre circulação na cidade. A simples existência de loteamentos fechados
atentam contra o conceito de espaço público, pois seus espaços livres de circulação
e de lazer, que deveriam ser públicos, são contraditoriamente privatizados, sob a
tutela legal do município.
Considerações finais
Referências
59
ALIPRANDI, D. C.. O sistema de espaços livres da cidade de Campos dos
Goytacazes-RJ: carências e potencialidades. Tese (Doutorado em Arquitetura),
PROARQ/FAU/UFRJ, Rio de Janeiro, 2017.
PDPCG. Lei Municipal nº 7.972: Plano Diretor Participativo do Município de Campos
dos Goytacazes. 2008.
CARVALHO, S. M. G. de. Transporte público: uma análise da gestão no Município de
Campos dos Goytacazes. Monografia (graduação em Administração Pública),
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 2016.
CRESPO, M. P. et al. Contribuições para o planejamento urbano-ambiental na região
Norte Fluminense. Boletim do Observatório Ambiental Alberto Ribeiro Lamego,
Campos dos Goytacazes-RJ, v. 4 n. 1, p.113-126, jan. /jun. 2010.
GODOY, Antonio Leandro Crespo de; ALIPRANDI, Danielly Cozer. O Rio Paraíba do Sul
como fronteira no tratamento desigual dos espaços livres públicos na cidade de
Campo das Goytacazes/RJ. IN: Anais do XIII Encontro Nacional de Ensino de
Paisagismo em Escolas de Arquitetura e Urbanismo do Brasil: Paisagismo necessário
- verde social, Salvador/BA, p. 632-645, 2016.
GODOY, A. L. C. de. Arquitetura pública como ferramenta para a cidadania: uma
proposta alternativa à remoção e o caso da Favela da Margem da Linha em Campos
dos Goytacazes. Dissertação (Mestrado em Planejamento Regional e Gestão de
Cidades), UCAM, Campos dos Goytacazes, 2015.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados do Censo demográfico
de 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acessado em 19 fev. 2017.
MACEDO, Silvio Soares et al. (Org.). Os sistemas de espaços livres e a constituição
da esfera pública contemporânea no Brasil (no prelo). Coleção QUAPÁ, 2015.
MARICATO, Ermínia. É a questão urbana, estúpido. In: MARICATO, Ermínia et al.
Cidades Rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil.
São Paulo: Boi Tempo: Carta Maior, 2013. p. 19-34.
SOUZA, M. L. de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.
TÂNGARI, V. R. et al. Morfologia urbana, suporte geogeobiofísico e o SEL do Rio de
Janeiro/RJ. In: CAMPOS et al. Quadro do SEL nas cidades brasileiras. São Paulo:
FAUSUP, 2012, p.195-239.
TERCEIRAVIA. O Projeto ‘Morar Feliz’ em Campos dos Goytacazes. 2015. Disponível
em: <https://goo.gl/qbhTKC>. Acesso em: 10 set. 2016.
VILLAÇA, Flavio. A segregação urbana e a justiça (ou a justiça no injusto espaço
urbano). Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 11, n. 44, jul/set. 2003,
p.341-346.
60
CONSTITUIÇÃO DA FORMA URBANA DE GOIÂNIA
Da estrutura tipológica elementar ao Parque Macambira Anicuns
Introdução
Por outro lado, a análise mostrará que os espaços “potencialmente projetáveis” são
também inerentes à constituição da forma urbana, os quais são resultantes de
rupturas e descontinuidades do suporte biofísico no processo de urbanização –,
muitos deles fragmentos de espaços verdes na cidade formal e espaços verdes
residuais na cidade informal que foram transformados em “unidades de conservação”
no bojo das políticas socioambientais que de um modo ou de outro marcam Goiânia
como cidade contemporânea. Neste caso, veremos que o Programa Urbano
Macambira Anicuns (PUAMA) que reúne quatro parques contíguos, sendo dois
lineares, torna-se epítome deste padrão morfológico na constituição da forma
urbana.
1
Realização conjunta entre o curso de Arquitetura da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e Pontifícia
Universidade Católica de Goiás (PUC/Goiás).
2
Verificável no site da AMMA - http://www.goiania.go.gov.br/shtml/amma/parquesebosques.shtml
analisadas as configurações de quintais, calçadas, arborização nas ruas, parques, e
praças (Figuras 1.a e 1.b).
Destacou-se nas imagens aéreas, para além desses parques e bosques, grande
quantidade de áreas verdes fragmentadas remanescentes do entorno de rios e
várzeas – espaços residuais que sinalizam aspectos de segregação social e econômica.
Por outro lado, ressaltou-se o SEL oriundo do projeto urbano original de Goiânia.
Este, ao ser apropriado por seus moradores, conformou uma “cultura de morar”
configurada em parques, praças, rotatórias e avenidas.
Com este quadro geral, delimitamos um grupo tipológico e suas variações, e desse
modo foi possível desenvolver uma abordagem sobre o SEL/Goiânia. Ponderou-se
também que, pensar a forma como se configura essas doze regiões de Goiânia é
intrínseco a pensar a Grande Goiânia em seu espraiamento metropolitano conurbado.
Onde a tipologia dessa “cultura de morar” também se espraia interrelacionada com
os polos, linhas, e barreiras de crescimento, bem como com os subcentros na
conformação do “urbano”.
62
Figuras 2.a; b; c: Localização de Goiânia como entroncamento viário e rede urbana
Goiânia-Anápolis-Brasília. Fontes: Prefeitura de Goiânia e Medeiros (2016).
63
Em levantamento feito em 353 bairros entre 2000 e 2008 por Martins e Oliveira
(2010), é mais acentuada a expansão intraurbana em direção aos municípios vizinhos
a leste, norte e oeste, (Figuras 4a e 4b) mas é ainda visível em direção a sul, já que
a conurbação a sul é anterior aos anos 2000. Essa expansão intraurbana também
encontra dinamizadores externos: seja considerando-se a região metropolitana
criada pela Lei Complementar nº 27 de 30 de dezembro de 1999, seja considerando
a rede de desenvolvimento Goiânia/Anápolis/Brasília constituída ao longo dos anos.
Figuras 4.a; b: Nas quais se visualiza as expansões intraurbanas, mais acentuadamente nas direções
leste, norte e oeste. Fonte: Martins e Oliveira (2010: 4).
64
dinamizadores externos (ver Figuras 5.a, 5.b, 5.c e 5.d). Assim sendo, ao mesmo
tempo em que se processe a expansão intraurbana, tal como preconiza Villaça
(1998), a mesma também está ligada a fluxos regionais e estes interrelacionados aos
polos, linhas, e barreiras de crescimento da cidade.
65
Figuras 6.a; b; c: Área de implantação de Goiânia, localizada por Correia Lima entre os córregos
Botafogo e Capim Puba. Principal zona de contiguidade na origem dos elementos de análise
morfológica. Fontes: arquivos do autor; SEPLAM; MIS (Apud OLIVEIRA, 2015: 119).
66
Figuras 8.a; b: Processo de supressão e fragmentação da cobertura vegetal no ano de 1986
(STREGLIO, 2013: 192), e entre 1986 e 2011 – vermelhas suprimidas, verde, restantes (MARTINS
JUNIOR, 2013: 184).
Nestes quatro elementos tipológicos não há uma hierarquia entre si. Os parques,
como se pode ver na Figura 9, abaixo, foram incorporados por Correia Lima das
diversas áreas verdes existentes no suporte biofísico onde a cidade foi implantada.
67
Figura 9: Anteprojeto de Atílio Correia Lima (1933), onde se vê o sistema de espaços livres
integrando paisagismo e suporte biofísico. Fonte: MANSO, 2001: 68.
Figuras 10 a; b; c: Paisagísmo de Attílio Correia Lima para o Bosque dos Buritis; integração Parque
Botafogo com a Avenida Araguaia; Parque das Paineiras ao Sul. Fonte: DINIZ, 2007: 140; 142; 143.
68
Figuras 11.a; b; c; d; e 12 a; b: Projeto paisagístico de Correia Lima para avenidas comerciais e
residenciais, e avenida monumental Pedro Ludovico (atualmente Av. Goiás); Avenida Goiás (1958) e
atualmente. Fontes: Manso (2001: 114; 125; 127); Pires (2011: 30); Oliveira (2008) e Google Earth.
Então, temos com este aspecto que Graeff chama de “pitoresco”, o surgimento, do
segundo tipo na configuração das características gerais do SEL/Goiânia: as avenidas
arborizadas que foram sendo desenhadas desde os primeiros loteamentos
juntamente com os demais elementos da estrutura tipológica aqui apresentada. Tais
avenidas arborizadas foram sendo replicadas até os dias atuais (Figuras 13.a até
13.j). Isto não significa que todas as avenidas de Goiânia são arborizadas. Contudo,
como a implantação de eixos que articulam o sistema viário veio a posteriori da
estutura tipológica elementar (com o PDIG proposto por Jorge Wilheim em 1968,
como veremos adiante), podemos considerá-los nas partes não arborizadas como
descontinuidade de tais derivações.
Figuras 13.a; b; c; d; e; f; g; h; i; j: Avenidas Vera Cruz; GB05; Antônio M. Borges; 5ª Avenida; Canaã;
Rio Vermelho; Olinda; Alexandre de Moraes; V-003; Hermes Pontes. Fonte: Google Earth.
Graeff (1985) observou que, Correia Lima, ao transpor a visualidade barroca como
materialização da monumentalidade intencionada ao traçado da nova capital, fez
com que “aquelas avenidas que poderiam assumir a feição das esplanadas
69
monumentais, ao modo barroco, [fossem] francamente tratadas como verdadeiras
park-ways” (pág. 27).
Quando Graeff compôs este relato, muitos dos bairros atuais de Goiânia ainda não
existiam. Contudo, mostrando a validade daqueles estudos tipológicos feitos a trinta
e dois anos atrás bem como a atualidade da análise do autor, as mesmas constatações
70
ainda podem ser feitas: o SEL/Goiânia se reproduziu por ter sido apropriado pelos
seus moradores como “valores ambientais”, e não meros “cacoetes gráficos.”
Figuras 14.a; b; c: O escritório Coimbra Bueno replica os “asteriscos”, derivando desta tipologia
asteriscos como praças, rotatórias, compondo por vezes o paisagismo “pitoresco” com vias
arborizadas. Fontes: <https://goo.gl/27pMMd> (DAHER, 2003: 192); GRAEFF, 1985: 13).
71
Figuras 15.a; b; c; d; e: Asteriscos (rotatórias; praças; avenidas) anotados por Graeff (1985) sobre o
mapa de Goiânia; rotatórias no Jardim Curitiba/rua JC 10/Praça do CIOPS; no Parque
Amazônia/Rotatória (Praça Francisco A. de Oliveira) e via arborizada (Av. Antônio Fidelis); no Setor
Universitário (Praça Tenente Veríssimo de Souza; Av. Universitária); no bairro Cidade Jardim/vias
arborizadas/Praça Tiradentes. Fontes: GRAEFF 1985 (contracapa) e Google Earth e Street View.
Figuras 15.f; 15.g; 15.h e 15.i: Fotos aéreas do acervo QUAPÁ/SEL e do autor.
Em pelo menos dois casos de destaque, dentre muitos outros desde os anos de 2000
as rotatórias foram transformadas em viadutos. Nestes dois casos foram construídos
ícones da gestão municipal, apelidados posteriormente pelos moradores como
“espeto da avenida T-63” (Figuras 16.a; 16.b) e “espeto da Avenida 85” (Figuras
16.c; 16.d; 16.e).
Sobre as praças (Figuras 17.a; até 17.e), há uma interessante diversidade de usos e
também de apropriações empregados nesta tipologia do SEL/Goiânia. Nesta
diversidade, há as praças institucionais, as que mantém semelhanças com as praças
tradicionais (onde se tem espaços complementares com a sociabilidade da igreja),
as praças de esportes, dentre diversas outras que se configuram como espaços de
72
sociabilidade e convivência da vizinhança (Figuras 17.f; 17.g). Em muitas praças há
ainda o costume local do “Pit dog” (figuras 17.h;17.i;17.j).
Figuras 17.a até 17e: Fotos aéreas de algumas praças de Goiânia. Fonte e créditos: QUAPÁ/SEL.
Figuras 17.f; g – Espaços complementares de sociabilidade praça/igreja, até praças de esportes.
Fonte: QUAPÁ/SEL.; Acervo do auto. Figuras 17.h; i; j: Costume local do “Pit dog” na praça. Fonte:
Acervo do autor.
Figuras 17.l; m; n; o: Praças de Goiânia disposição espacial dos imóveis no entorno. Fonte: acervo do
autor e Google Earth.
Quanto aos espaços livres nas áreas de expansão urbana, é marcante a reprodução e
derivação destes quatro elementos tipológicos (parques, avenidas, rotatórias e
praças). Muito embora tenham surgidas novas tipologias, não abordadas no presente
texto, esses elementos, serão associados ao discurso de valorização da imagem
ambientalista da cidade, quando arborizados.
Desse modo, parques, avenidas, rotatórias e praças não são somente elementos
estruturantes do SEL/Goiânia. Aparecem de modo destacado nas transformações da
cidade contemporânea, em que as imagens dos parques ocuparão um lugar destacado
no quadro do paisagismo, como se verá a seguir.
73
Processo atual de produção dos espaços livres e edificados e seus agentes
Conforme dito acima, focalizamos a tipologia do parque, porque a esta foi dada mais
visibilidade na cidade contemporânea, tendo dela se apropriado tanto o poder
público quanto as iniciativas privadas, embora tenhamos notado também mudanças
importantes nas outras três tipologias. Têm-se no caso do Lago das Rosas
(atualmente Parque Educacional, juntamente com o Zoológico de Goiânia) o caso
pioneiro de apropriação por parte da população, de áreas públicas consideradas
como parque.
74
Assim, tanto o poder público quanto a apropriação por parte da população interagem
na produção do parque como importante elemento tipólogico do SEL/Goiânia. Por
outro lado, como o Lago das Rosas foi um espaço de apropriação popular, prefigurou
também a distinção de classes na produção do espaço urbano e na configuração do
SEL/Goiânia, já que a população de maior renda preferiu voltar-se para o lazer
privado do Jóquei Clube.
Assim como o Lago das Rosas, o Parque Mutirama foi intensamente apropriado pela
população. Manteve inclusive a distinção de classe: como diz Dumazedier (1974: 28),
uma concepção de lazer nascida da sociedade industrial, não suprime o trabalho;
antes o pressupõe. Por outro lado, a pesquisa empírica realizada por Ramos (1998)
nestes parques destinados à apropriação popular mostra que a concepção de “lazer”
será atualizada para a noção de “tempo livre”, esta mais propícia aos parques
contemporâneos.
Figuras 18.a; b; c: Parques Mutirama (anos 70) e Lago das Rosas (anos 50) o mapa de Goiânia.
Fontes: Acervo do autor; Oliveira (2008); <http://portalmapa.goiania.go.gov.br/mapafacil/>
75
que duram de uma a duas horas, os membros de classes altas entram em seus carros
particulares para retornar às suas casas, às vezes muito próximas” (Pág. 61).
Figuras 19.a até 19.h: Parque Cascavel / Abient Park Residencial / Parque Jerivá / Parque Leolidio
Ramos Caiado/Parque Flamboyant / Parque Areião / Parque Vaca Brava / Parque dos Buritis / Parque
do Lago das Rosas. Fontes: Acervo do autor e Google Earth.
Então, é possível perceber que, muito embora o poder público tenha sido o principal
agente na produção do SEL/Goiânia desde a fundação da cidade, dentre os agentes
atuais podemos constatar a inserção de incorporadores imobiliários agindo
diretamente. Por consequência, a apropriação (usos) desses parques
contemporâneos passa a requerer uma análise cujo corpus teórico aborde de que
modo é possível compreender a adaptação contemporânea de espaços livres,
sobretudo os parques, pela associação das áreas verdes com a temática ambiental,
76
mas há também exemplos em praças e rotatórias, ao “consumo da paisagem”,
“objetos de desejo” e “consumo do tempo livre”.
Dentre os parques contemporâneos de Goiânia, uma parte deles foi incorporada para
qualificar diversos empreendimentos imobiliários (Figuras 20.a; 20.b; 20.c). Assim
associa-se local de moradia/consumo da paisagem/objeto de desejo/consumo do
tempo livre, a este recurso tipplógico existente.
Figuras 20.a; 20.b; 20.c – Parques Flamboyant, Vaca Brava e Areião, tendo o seu entorno ocupado
por empreendimentos imobiliários.
Como se vê, há diversas formas de apropriação (usos) dos elementos tipológicos que
estruturam o SEL/Goiânia. Sendo que, dentre eles, mais se destacam os parques
contemporâneos, até porque são vistos como recursos de dominação e distinção. E,
dentre estes se destaca os parques que compõe o Programa Urbano Ambiental
Macambira Anicuns (PUAMA), conforme se verá mais adiante.
Projetada por Correia Lima para ser ocupada por 50 mil habitantes (Decreto Lei 90-
A, de 31 de julho de 1938), esse marco vai ser alterado no final da década de 1940
(Código de Edificações de Goiânia – Decreto-Lei n° 574, 12 de maio de 1947). Após
isso, no período que corresponde à construção de Brasília, viu-se o crescimento
vertiginoso, saltando aos olhos, por um lado, o déficit de planejamento urbano, e
por outro a prática de loteamentos. (Figuras 21.a até 21.d).
77
Figuras 21.a até 21.d – Alguns dos loteamentos aprovados nos anos de 1950: Santa Genoveva; Vila
Boa; Vila São José; Crimeia Leste: Crimeia Oeste. Fonte: Prefeitura de Goiânia
<http://portalmapa.goiania.go.gov.br/mapafacil/>
Em 1968, Jorge Wilheim pôs fim a este hiato urbanístico com o PDIG (firma SERETE
Engenharia S/A via SERFHAU/BNH – Leis nº 4523, de 31/12/1971; nº 2525 e 4526).
Em sua visão de conjunto da cidade e em suas diretrizes, Wilheim incorporou dois
elementos que podem ser considerados compatíveis com essa “cultura de morar”
consolidada no SEL/Goiânia, como estruturantes do PDIG: o sistema viário e as áreas
verdes (Figura 19).
78
Figuras 22.a e 22.b – Avenidas e integração com espaços livres e edificados como vetor a Oeste.
Figura 22.c – Mapeamento do sistema de áreas verdes pelo PDIG (1971), onde se destacam fundos
de vales. Fonte: SEPLAM e Prefeitura Municipal <http://www.goiania.go.gov.br/html/amma/>.
79
Figura 23 – Mapeamento das Unidades de Conservação de Goiânia. Fonte: SEPLAM. Disponível em:
<http://www.goiania.go.gov.br/html/amma/>.
80
Fica criado o Parque Linear Urbano Macambira Anicuns, que passará a ser denominado
Parque Linear Macambira Anicuns e os dois Parques Ambientais Urbanos, a serem
denominados Parque Macambira e Parque da Pedreira, todos integrantes do Programa
Urbano Ambiental Macambira Anicuns – PUAMA. (Capítulo I; Artigo 1º - Lei nº 9123, de
28 de dezembro de 2011).
A Lei Municipal nº 1923, consubstancia na forma legal tratativas que duraram seis
anos, entre 2003 e 2009, com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o
qual financiou sessenta por cento do valor total investido no PUAMA. Após isso, entre
2010 e 2012 os arquitetos Rosa Grena Kliass, Maria Cecília Barbieri Gorski, Michel
Todel Gorsk e o Escritório Grupo 4 elaboraram quatro projetos de parques
integrados, espacializando o referido Programa (Figura 25.a).
Figura 25.a; 25.b – Figuras retiradas do documento oficial do PUAMA. Localização dos quatro
parques, e abrangência destes integrados, na escala da cidade. Fonte: (GOIÂNIA, 2013). Disponível
em: <https://www.goiania.go.gov.br/download/puama/apresentacaonovo.pdf>
É possível questionarmos, como faz Villaça (1995) sobre os dilemas que as leis
urbanas suscitam – mais especificamente os planos diretores –, no que se refere a
efetivamente instituir ou moldar a forma urbana. “Tudo traçado em longas cartas de
princípios e intenções, sem nenhum rebatimento real na prática projetual e
consequentemente na cidade” (RIBEIRO, 2004: 148). O conflito entre a cidade ideal
81
e cidade real, se expressa como “cidade do pensamento único” (ARANTES, 2000),
onde a desigualdade é inerente à sociedade brasileira em sua formação histórica
mesma.
Porém, mesmo sendo desigual, seja na relação entre classes mais abastadas e de
menores rendas, ou na relação com a natureza, as potencialidades dos espaços livres
na constituições dos padrões morfológicos nos levam a convergir com o olhar poético
de Graeff:
Como no exemplo dado por Magalhães (IDEM: 176), em que a nova sede da Prefeitura
Municipal foi construída na parte sudeste da cidade, servindo de vetor de expansão
em uma área ainda não ocupada, promovendo, porém, rupturas com o tecido
consolidado no centro da cidade e outras áreas urbanizadas contíguas. Se nos
detivermos na análise deste vetor de expansão indutora, perceberemos nele o
82
quadro dos espaços livres na constituição deste padrão morfológico (Figuras 25.a;
25.b e 25.c).
Figuras 25.a; 25.b e 25.c: Expansão indutora. Equipamentos urbanos rompem o tecido consolidado,
tornando-se polo de crescimento. Fonte: Magalhães (2007: 176); Acervo QUAPÁ/SEL
Ou, como diz Carvalho (2017: 124) sobre o entorno dos parques que compõem o
PUAMA: “a dinâmica social e econômica das cidades contemporâneas favorece a
formação de regiões socialmente segregadas e o consequente enobrecimento ou
gentrificação de determinadas áreas”. Ou ainda o que diz Silva (2014: 11) sobre o
aspecto ambientalista e de sustentabilidade do PUAMA: “recomenda-se adotar uma
83
metodologia que realmente integre a proposta ambiental e social com aspectos que
propiciem uma qualidade de vida, através de investimentos em saúde, educação,
lazer, segurança, etc”.
Uma forma de compreender o modo como ocorre o padrão morfológico não linear, é
observando o rebatimento do pensamento projetual arquitetônico proposto por
Bernard Tschumi ao Parque La Villete. Neste, Tschumi rompe com o pensamento
linear “a forma segue a função”, e propõe a construção da paisagem não a partir de
um sistema, mas sim de três sistemas superpostos: sistema de superfícies; sistema
de linhas; sistema de volumes. Sendo fundamental observar que tais sistemas
superpostos não são apenas de ordem física (MOHR, 2003; ZONNO, 2017; GUATELLI,
2017).
84
Figuras 26.a; 26.b – Setores de projetos dos parques que compõem o PUAMA. Fonte: (GOIÂNIA,
2013). Disponível em: < https://www.goiania.go.gov.br/download/puama/apresentacaonovo.pdf >
Embora não haja qualquer proposta “disjuntiva” por parte dos autores dos projetos
que compõem o PUAMA, a experiência de quem percorre a espacialidade dos parques
é a de presenciar a superposição de três novos sistemas (linhas; superfícies; volumes)
sobre o SEL/Goiânia que anteriormente se expandiu de forma indutora. Desse modo,
podemos experimentar também a superposição de um dos quatro elementos, o
parque, que compõe a estrutura tipológica do SEL/Goiânia, sobre os demais. Além
disso, se sobrepõe também à pré-existências ambientais: além dos principais cursos
d’água, Córrego Macambira e Ribeirão Anicuns, há seis outros córregos que os
alimentam (verde na Figura 27), da malha urbana como um todo, e históricas, a parte
norte do parque linear integra-se à pré-existências históricas de Campinas e de
bairros antigos de Goiânia (cinza na figura 27).
85
Figura 27 – Pré-existências ambientais e da malha urbana. Adaptado do documento de apresentação
do PUAMA. Fonte: (GOIÂNIA, 2013). Disponível em: < https://goo.gl/8SGzNe >
86
Figuras 28.a; b; c; d – Contiguidades e/ou conexões entre caminhos e equipamentos ou edifícios
construídos, remanescentes da vegetação nativa e áreas reconstruídas – ilustrações dos projetos.
Fonte: (GOIÂNIA, 2013). Disponível em: < https://goo.gl/xX2H2W >
87
Figuras 29.e; f; g; h – Contiguidades e/ou conexões entre caminhos e equipamentos ou edifícios
construídos, remanescentes da vegetação nativa e áreas reconstruídas – fotos in loco. Fonte e
créditos: Unidade Executora do Programa (UEP).
Considerações finais
Sechi (2006: 88; 90) diz, que, paradoxalmente, a cidade contemporânea é o lugar da
não contemporaneidade, que nega o tempo linear, a sucessão ordenada das coisas.
Embora o pensamento de Tschumi remonte aos anos de 1970, o seu modo de
concepção do espaço construído nos serve como chave interpretativa para
88
analisarmos como surgem e como se compõem os padrões morfológicos
contemporâneos.
Assim sendo, podemos considerar que o modo como os padrões morfológicos são
delineados a partir de uma estrutura tipológica podem ser por expansão indutora,
ou por superposições. No caso aqui estudado, um elemento da estrutura tipológica
elementar, o parque, serviu para expressar diversos aspectos da sociedade
contemporânea, inclusive as políticas e gestões da municipalidade calcadas no
ambientalismo e sustentabilidade.
Por fim, se concordamos com Sechi que diz que a cidade contemporânea nega a
sucessão ordenada das coisas, sem qualquer ironia, no caso se Goiânia, a forma de
compreendermos o modo como ocorre o padrão morfológico não linear se deu a partir
do estudo de um parque linear, o Parque Macambira Anicuns.
Referências
ARANTES, O. VAINER, C. MARICATO, E. A cidade do pensamento único:
desmanchando consensos. 3ª. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
89
HARVEY, David. Condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1996.
90
OLIVEIRA, H. Eu vi Goiânia crescer: décadas de 50 e 60. Goiânia: Ed. do Autor,
2008.
O POPULAR. Viaduto Latif Sebba ganha cor lilás. Cidades – 04 de mar. 2015.
Disponível em <https://www.opopular.com.br/editorias/cidades/viaduto-latif-
sebba-ganha-cor-lil%C3%A1s-1.795032>. Acesso em: 10 out. 2017.
91
VILLAÇA, Flávio. A crise do planejamento urbano. São Paulo em Perspectiva, 9(2),
1995. Disponível em: <https://goo.gl/YB5goF>. Acesso em 20 jun. 2016.
92
MACEIÓ: SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E A FORMA URBANA
FARIA, Geraldo Majela Gaudêncio (1); CAVALCANTI, Veronica Robalinho (2);
Universidade Federal de Alagoas; Professor Titular, doutor, Maceió (AL);
e-mail: ggfaria@gmail.com
Universidade Federal de Alagoas; Professora Titular, doutora, Maceió (AL);
e-mail: vrobalinho@gmail.com
1
O MEP, vinculado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Ufal, integra a rede QUAPÁ-SEL desde a sua
constituição enquanto rede nacional de pesquisas sobre sistemas de espaços livres (SEL). O grupo de pesquisas
desenvolve estudos sobre a espacialização da esfera pública urbana e sobre as formas urbanas configuradas ao
longo do processo de urbanização do qual Maceió foi gerada. Um acervo digital de projetos de parcelamentos
registrados na Prefeitura e de mapas, um banco de dados descrevendo as características morfológicas dos
empreendimentos além de centenas de fotos aéreas da cidade feitas na ocasião das oficinas locais permitem
que outros estudos possam ser feitos sobre a dinâmica da forma da cidade, tanto sobre os espaços edificados
como sobre os espaços livres.
93
conhecimento, da climatologia à biologia e à economia urbana, além das disciplinas
das ciências sociais e engenharias, em especial as que têm por foco a concepção e o
projeto de espaços urbanos, como a arquitetura e o urbanismo.
2
As formas da cidade, enquanto complexos de objetos e espaços dispostos organizadamente de modo a
configurar ambientes habitáveis, configuram paisagens, no sentido que Milton Santos (1996) atribuiu ao
conceito.
94
que, além de “refletir” uma dada organização social, contribuem para organizá-la 3.
Esses padrões constituem modalidades de configuração e de disposição, no terreno,
dos objetos (meios materiais) minimamente indispensáveis a uma vida social
ordenada de acordo com suas “leis” de formação e de reprodução. Identificar ou
criar padrões espaciais é um modo genuinamente humano de organização, de
“estabilização” do espaço (da paisagem, das relações) num quadro de vida sempre
em movimentos de criação-recriação-transformação-degradação-destruição.
As formas urbanas dos espaços livres, portanto, definem-se desde o espaço imediato
e contíguo às edificações construídas para abrigar atividades humanas (os recuos
3
LADRIÈRE (1986) atribui função de “indutor existencial” a determinados espaços, ou seja, à semelhança da
indução eletromagnética, o espaço exerceria influências sobre o comportamento dos indivíduos.
95
intra-lotes, os pátios internos), aos espaços que propiciam a intermediação entre
edificações de maneira a permitir o inter-relacionamento e a articulação funcional
das atividades (ruas, praças, largos, estacionamentos), assim como aos espaços livres
apropriados para articulações intraurbanas e interurbanas (portos, aeroportos,
estradas, infraestruturas de modo geral), espaços livres naturais de suprimento de
matérias primas e de preservação de dinâmicas naturais importantes (mananciais,
canais, rios, parques, reservas). O modo como esses espaços livres são constituídos,
configurados e distribuídos pelo tecido urbano resulta das escolhas e decisões dos
indivíduos, instituições e empresas que habitam e gerenciam a cidade, segundo seus
interesses particulares que, com maior ou menor eficácia realizadora, exigem
requisitos paisagísticos de caráter técnico-funcional, simbólico, político, econômico.
A arbitragem do confronto de interesses no âmbito da esfera pública não é imune
aos poderes em confronto, como bem o demonstram os inúmeros casos de segregação
socioespacial e de distribuição desigual em quantidade e qualidade dos espaços livres
no processo de urbanização.
96
denominação do complexo industrial Brasken), a orla litorânea hoteleira, a “cidade
universitária”, o centro político-comercial, as periferias habitacionais.
Das funções pioneiras que deram impulso à sua formação, dois séculos passados,
restaram algumas toponímias que aos poucos vão perdendo seu significado original:
Bebedouro, Trapiche, Poço, Farol, Brejal, Jaraguá, do mesmo modo que acontece
com o nome da cidade, inicialmente atribuído em razão dos alagadiços de restinga,
todos eles aterrados ou drenados. Maceió, o núcleo pioneiro, virou bairro do
“Centro” à medida que o povoado foi se expandindo na direção dos arrabaldes
próximos, com estes se entrelaçando e avançando mais além, sempre seguindo os
principais eixos rodoviários de entrada e saída da cidade. As antigas funções
comercial-financeira e política do núcleo histórico se mantêm, porém, as funções de
centralidade e de moradia vêm, desde os anos 1980, dispersando-se, conformando
outras centralidades menores com acréscimos de novos ramos de atividades,
seguindo tendencialmente a forma não mais do “arruado”, mas de “corredores de
atividades múltiplas” (denominação oficial), isto é, comércio e serviços localizando-
se a margem dos principais eixos rodoviários. Algumas dessas localidades possuem
alta densidade de atividades (de lazer, de comércio popular ou de serviços mais
elitizados). Já o comércio de luxo tem preferido adotar o formato “shopping” (a
cidade possui três grandes empreendimentos desse tipo, dois na porção sul e um na
porção norte), salvo as exceções de estabelecimentos com letreiro-e-vitrine abertos
sobre a via pública que contribuem para manter a vitalidade dos espaços livres
urbanos, em alternativa ao modelo cultural mall-shopping. Os impactos ambientais
dessas duas modalidades devem-se aos estacionamentos: na primeira, a apropriação
de faixas das calçadas e a demolição de centros de quadras para abertura de
parkings; na segunda, a criação de imensas e desérticas áreas pavimentadas.
Maceió formou-se num estuário lagunar, com uma enseada oceânica propícia para
funções portuárias, elementos que conferiram vantagens locacionais para, em
poucas décadas, polarizar a economia da nova província das Alagoas 4. O sítio natural
é delimitado a leste e sul pelo Oceano Atlântico e a oeste pela laguna Mundaú,
4
Alagoas, em 2017, completou 200 anos de sua emancipação da Capitania de Pernambuco.
97
tomando, na sua totalidade, o aspecto aproximado de um triângulo com um dos
vértices voltado para o sul (Figura 1).
98
Figura 1: Maceió: Área urbana com a identificação dos principais “compartimentos” ambientais e
proposta de macrozoneamento. Fonte: Base cartográfica digital da Prefeitura Municipal de Maceió
(2000) e FARIA (2016)
5
A paisagem urbana de Maceió foi objeto de uma descrição detalhada em artigo intitulado “Sistema de
Espaços Livres da Cidade de Maceió”, publicado pela revista Paisagem e Ambiente, nº 26 (FARIA, CAVALCANTI.
2009).
99
urbana da margem lagunar onde prevalecem habitações de baixa renda 6; [2.3] as
encostas de falésias marcando fortemente a descontinuidade entre os dois planos
urbanos: a cidade alta e a cidade baixa; [2.4] as inúmeras ravinas, algumas ainda
florestadas, outras em avançado processo de urbanização precária por
assentamentos populares; [2.5] as paisagens extensivamente urbanas dos tabuleiros,
estruturadas pelos principais eixos de mobilidade e expansão da cidade; [2.6] a
cidade histórica parcialmente conservada no Centro, no porto (Jaraguá) e arrabaldes
pioneiros hoje reconhecidos afetivamente como bairros antigos; [2.7] a nova frente
de empreendimentos imobiliários para alta renda rumo ao litoral a nordeste; [2.8]
os novos, uniformes e gigantescos conjuntos “Minha-Casa-Minha-Vida” (MCMV),
expandindo a periferia norte.
Figura 2.1: Litoral com verticalização. Figura 2.2: Planicie lagunar e falésia.
Foto: J. Silva, 2014 Foto: S. Macedo, 2014
Figura 2.3: Falésia Santa Terezinha. Figura 2.4: Ravinas com ocupação.
Foto: J. Silva, 2014 Foto: S. Macedo, 2014
6
Inclusive duas antigas vilas operárias remanescentes do ciclo do algodão (séculos XIX e XX).
100
Figura 2.5: Urbanização dos tabuleiros. Figura 2.6: Centro histórico. Foto: S.
Foto: S. Macedo, 2014 Macedo, 2014
Todavia, ainda no esforço de síntese, pode-se dizer que as paisagens de orla são
socialmente identificadas como vocacionadas a um lazer diversificado, sendo
habitadas majoritariamente por população de maiores rendas. Essa porção urbana é
também identificada como o principal polo de empregos terciários urbanos e de
transformações da paisagem. A extremidade sudeste da planície abriga grandes
101
equipamentos coletivos como o estádio de futebol, o hospital geral, e um importante
núcleo de artesãos populares. Já as paisagens de tabuleiro, configuradas pela
sucessão de loteamentos e conjuntos estruturados pelos eixos viários, identifica-se
pela presença de alguns equipamentos importantes como complexos educacionais
públicos, complexo penitenciário, hospitais particulares, aeroporto, polo industrial,
rodoviária, instituições jurídicas. Nos tabuleiros não há uma centralidade marcante,
mas vários polos de atividades em formação, novos subcentros. São localidades
desprovidas de atrações culturais e de lazer, exceto pelos campos de “pelada” 7,
aeroporto, campus da universidade federal e um shopping center que propicia
alternativas de passatempo para os moradores próximos. A urbanização dos
tabuleiros ainda é marcadamente térrea ou de pequenos prédios de 3 a 4 andares,
porém já aparecendo edifícios de 20 andares. Os bairros oficialmente reconhecidos
nem sempre evidenciam claramente os seus limites; eles se prestam para uma
localização em grande escala na cidade, de modo que os nomes dos
empreendimentos imobiliários prevalecem como toponímias identificadoras e
orientadoras precisas dos “lugares” da cidade.
7
Inúmeros desses campos de futebol de várzea ou “racha” estão desaparecendo face os empreendimentos
imobiliários que expandem o tecido urbano sobre vastas áreas periféricas ou vazios centrais (SANTOS, 2009).
8
As duas oficinas do projeto QUAPÁ-SEL realizadas em Maceió (em 2007 e 2014) contribuíram para consolidar,
em Alagoas, os estudos e debates sobre a caracterização do sistema de espaços livres, em particular o
monitoramento e a avaliação das ações de apropriação e de produção desses espaços e dos parâmetros
urbanísticos utilizados na conformação da cidade. Quatro artigos resultantes desses estudos foram publicados,
sendo três deles em edições da revista Paisagem e Ambiente, referenciados no final deste texto. Outros tantos
artigos foram apresentados e publicados em anais de eventos nacionais e internacionais, especialmente nos
colóquios da rede QUAPÁ-SEL.
9
Esse texto, contendo também proposições de modos e formas de ocupação constituiu uma contribuição
profissional encaminhada através do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Alagoas para os debates da
revisão do Plano Diretor de Maceió. O texto está disponível em: <http://www.caual.gov.br/?page_id=6264>.
102
da cidade em adquirir uma conformação linear (Figura 3), em grande parte devido
à forte relação entre as formas do relevo (por uma parte a estreita e limitada faixa
de planície costeira, por outra parte os tabuleiros longitudinais separados por ravinas
estreitas de drenagem) e as direções de mobilidade, de expansão e de estruturação
do tecido urbano. Assim, Maceió vem gradativamente reforçando uma linearidade no
sentido sul-norte, estruturada pelos dois principais eixos rodoviários de entrada-
saída da cidade (BRs 104 e 316) que também são as principais vias de comunicação
pendular entre os bairros residenciais (tabuleiros) e os bairros que ofertam emprego
(orla e Centro). Problemas sérios de estrangulamento da mobilidade cotidiana vêm
impondo a necessidade de investimentos em transporte público de modo a adequar
o volume de viagens à capacidade limitada do sistema viário assim estruturado. Os
estudos sobre as formas das vias urbanas projetadas e sobre a legislação urbanística
em vigor apontam a persistência de parâmetros e concepções viárias anacrônicas
desde as últimas décadas do século XX.
Farol
Ponta Verde
Centro
Histórico
Jaraguá
PRINCIPAIS ~VETORES
Pontal CRESCIMENTO
103
de obras de macro e microdrenagem. As consequências aparecem temporariamente
nos períodos de chuva intensa com alagamentos. No longo prazo, com a drenagem
indiscriminada, a recarga dos aquíferos subterrâneos acaba sendo comprometida,
agravada com a intensa extração de água potável do subsolo por meio de inúmeros
poços de profundidade. Outra prática nociva são os sumidouros cloacais em razão da
inexistência da rede de esgoto em 75% dos domicílios. As iniciativas de contenção e
recarga desses aquíferos têm sido modestas e imediatistas, degradando áreas de uso
público (praças) com a implantação de lagoas de retenção sem nenhum tratamento
paisagístico.
Além dos imensos espaços livres das massas d’água e biomas dos complexos estuarino
e oceânico que definem os contornos meridional, oriental e ocidental de Maceió, a
cidade dispõe de espaços livres na periferia setentrional da área urbana utilizados,
a maior parte, para o cultivo extensivo da cana e do coco ou, residualmente, como
unidades de conservação privadas, muitas delas localizadas em ravinas impróprias
para a agricultura. Essas unidades funcionam como regularizadoras de mananciais
hídricos e como habitat-refúgio de espécies afugentadas da cidade e pela queima de
canaviais. No interior do perímetro urbano, as ravinas ainda não ocupadas por
assentamentos populares cumprem também alguma função ambiental; algumas são
mantidas por instituições públicas como reservas e parques.
10
O acesso ao litoral é dificultado aos moradores da periferia pela distância e custos de transporte.
104
A presença desses espaços faz com que os demais espaços livres urbanos
mencionados, naturais ou construídos, não sejam objeto de interesse público,
sujeitos à administração pública e à apropriação simbólica pelos habitantes, no
sentido de torná-los mais adequados para desempenharem funções econômicas e de
urbanidade.
105
função drenante, receber um tratamento paisagístico de modo a transformá-los em
parques de uso recreativo e de atrações para a periferia norte 11.
Desse modo, os espaços livres com alguma significação especificamente urbana são
aqueles criados no processo de urbanização: ruas, servidões, largos e praças. Na
primeira categoria são relevantes as grandes avenidas estruturantes (eixos viários)
da cidade, arborizadas uma parte delas. A quase totalidade do tecido urbano foi
projetada na forma de loteamentos e conjuntos habitacionais, de tamanhos variados
conforme a gleba original, porém semelhantes em vários aspectos. Praticamente
todos os parcelamentos, com algumas poucas exceções, geraram quadras com lotes
para habitações unifamiliares e ruas de dimensões adequadas aos fluxos vicinais,
estreitas (em média 12 metros de largura de caixa: 2 a 3 metros de largura de
calçada). Os esquemas viários foram projetados sem maiores intenções de
conectividade com empreendimentos vizinhos, de modo que globalmente resultou
em traçado labiríntico com ruas-sem-saída ou intersecção em “T”. A exiguidade das
áreas de circulação automotiva e a ocorrência de descontinuidades de traçado,
obviamente por omissão ou descaso na coordenação dos empreendimentos
imobiliários (e, também o descaso dos meios coletivos de transporte) têm, com o
aumento da frota de veículos, gerado pontos e trechos de congestionamentos
cotidianos do tráfego.
11
“Carta Aberta” nesse sentido –– redigida pelo MEP por delegação de mesa redonda do Congresso Acadêmico
que discutiu os “200 anos de Maceió, problemas e perspectivas”, foi entregue ao Prefeito, em 2014.
106
O papel dos agentes de produção dos espaços livres e edificados e
legislação
12
O texto resultou da oficina QUAPÁ-SEL realizada em maio de 2014.
13
Tem-se conhecimento de apenas um “master plan” encomendado para a abertura de uma nova frente de
expansão para o litoral nordeste.
107
obras “estruturantes” foram projetadas e iniciadas as suas implantações para
assegurar o acesso a essas novas frentes: avenidas Pierre Chalita, Márcio Canuto,
Josefa de Melo, Ecovia Norte, duplicação da avenida Gustavo Paiva, trechos de vias
paralelas à Fernandes Lima, via do vale do Reginaldo, via litorânea até Jacarecica,
faixa exclusiva de ônibus no corredor BR 104, viadutos do entroncamento das BRs
104 e 316, complementação do serviço de VLT até a área portuária, estudos para
implantação de VLT e de BRT nos eixos urbanos das BRs 104 e 316.
O maior efeito positivo da legislação sobre o sistema de espaços livres foi, repetimos,
propiciado pela lei de parcelamento fundiário (Lei 6766/79) que obrigou agentes
imobiliários e poder público a observar o percentual mínimo para estes equipamentos
de uso público nos novos empreendimentos. Por outro lado, os códigos de urbanismo
e de edificações mantiveram e até ampliaram, influenciados por estudos de
14
A cidade também possui glebas estaduais e federais, vazias ou de uso institucional, assim como trechos de
rodovias importantes sem controle eficaz da ocupação das faixas de domínio e das invasões.
15
Essa constatação é evidente tanto na historiografia como nos tempos presentes. Curiosamente, Maceió
“nasceu” obedecendo um plano ordenador (1821). Outros houveram, como o de 1864, o de 1932 e a sequência
de Planos Diretores dos anos 1970 até o presente. Entretanto, apenas o primeiro foi seguido à risca.
16
À exceção de algumas obras viárias executadas nos anos 1980: via Expressa, calçadão, vias de orlas litorânea
e lagunar, conectoras leste-oeste.
108
climatologia urbana 17 e eficiência energética 18 nas construções, os recuos
obrigatórios das edificações em relação às divisas dos lotes, no intuito de assegurar
padrões aceitáveis de áreas livres. Todavia, de um lado, os agentes do mercado para
altas rendas conseguiram introduzir exceções, tais como a possibilidade de ocupar
100% a superfície do lote com subsolos de garagem que, na prática, desvirtuam
algumas finalidades dos recuos. Por outro lado, a inadequada ou ausente fiscalização
pós-ocupação das edificações faz “vista grossa” aos “puxadinhos” (ampliações)
quase sempre construídos além do que é permitido e convencionado na legislação.
Outro impacto diz respeito aos parâmetros urbanísticos especiais atribuídos aos
“corredores de múltiplas atividades” 19, isto é, as vias de comércio e serviços,
ampliadas em número e em extensão. Para estas, liberou-se indistintamente
determinados parâmetros com impactos negativos sobre a qualidade dos espaços
livres. Um fator positivo limitador do laissez faire urbano foi, até recentemente 20, a
operação do sistema de balizamento noturno de navegação portuária e oceânica,
que obrigou os grandes empreendedores a manter o gabarito dos prédios da planície
com altura não superior a 8 andares, preservando assim, ainda que parcialmente, a
qualidade paisagística das praias urbanizadas com a limitação do perfil do skyline.
Assim como as funções urbanas que a cidade de Maceió desempenha na divisão inter-
regional do trabalho mudaram muito desde sua fundação, também as formas urbanas
e os modos de apropriação do espaço e de mobilidade experimentaram grandes
mudanças. Os tipos de moradia diversificaram bastante a partir da segunda metade
do século XX. A moradia burguesa e de altos e médios funcionários públicos que
animava intensamente sobrados e passeios do Centro Histórico dispersou-se,
migrando inicialmente para os calmos e segregados loteamentos e casarões, na orla
(Pajuçara, Avenida) e chalés, no tabuleiro mais próximo (Farol). Já nos anos 1970-
17
Ver, a propósito, BARBIRATO et al., 2015.
18
Inúmeros estudos sobre o ambiente urbano vêm sendo desenvolvidos por grupos de pesquisas da Fau/Ufal
que enfocam essas temáticas e em dissertações e teses no Programa de Pós-graduação em Arquitetura e
Urbanismo. Mais recentemente foram introduzidos procedimentos de certificação ambiental na construção civil
urbana.
19
Coincidentemente vias onde operam linhas de transporte coletivo.
20
Essa limitação já foi superada com novos dispositivos de balizamento.
109
1980, porém mais fortemente da década de 1990 em diante, implantam-se
“condomínios” fechados, tanto verticais (edifícios com oito pavimentos em média)
como horizontais (loteamentos de acesso restrito). O primeiro tipo, na cidade baixa,
por exiguidade de terras disponíveis, prenunciando o rápido adensamento
populacional que alterou completamente a paisagem e a funcionalidade viária da
orla. O segundo tipo, em amplas glebas de tabuleiro, com acesso praticamente
exclusivo, a uma distância segura dos principais eixos de mobilidade urbana,
margeando ravinas, espaços livres generosos e bem cuidados, ilhas de amenidades
cercadas de carências urbanísticas por todos os lados. O processo de verticalização
das moradias de médio e alto padrão segue concentrado na orla, ocupando lotes
vazios e glebas remanescentes ou ocupando, por substituição tipológica, o lugar de
casas térreas e sobrados pioneiros, porém já avança pelos tabuleiros conquistando
lugares com amenidades paisagísticas (beira de falésias com miradas ao horizonte)
ou próximas a corredores e centralidades. Nesse processo, a fachada oceânica
(waterfront) e o perfil (skyline) da cidade mudaram radicalmente nas últimas
décadas sob a ação do setor do mercado imobiliário e da construção civil.
A moradia dos estratos de baixa renda, que correspondem a mais de dois terços dos
maceioenses, também experimentou mudanças desde meados do século XX. As
formas tradicionais de moradia desses estratos resultam da ocupação de áreas sob
menor controle de apropriações. Das vilas operárias edificadas em Maceió, restam
duas, remanescentes de antigas manufaturas de tecidos, sendo que uma delas
(Fernão Velho) ainda conserva características e moradores. O colossal crescimento
populacional experimentado a partir dos anos 1970 exerceu uma pressão enorme
sobre o suporte físico, especialmente sobre as áreas de preservação permanente
(tais como trechos de faixas de marinha, de encostas de ravinas e de falésias,
margens de riachos) que deveriam permanecer livres de ocupação para cumprirem
suas funcionalidades naturais. Os impactos negativos dessas ocupações sobre os
recursos naturais e sobre as próprias condições de moradia são importantes,
particularmente quando se tem em conta a absoluta carência de infraestrutura
urbana que assegure saneamento, acessibilidade e amenidades. As espacializações
habitacionais desses estratos não apenas se estenderam sobre o território, ampliando
a periferia para bem além das áreas centrais, como experimentam um processo de
adensamento com a adição de lajes, “puxadinhos” laterais, frontais, de fundos, de
110
modo que a verticalização dos assentamentos precários é uma realidade (SANTOS,
2006). Ocorre também a invasão de logradouros públicos, toleradas e consolidadas.
Nesses casos os espaços livres são reduzidos ao indispensável. Uma outra parte das
moradias dos estratos de baixa renda, aqueles melhor inseridos na economia local,
conformaram loteamentos populares, vilas e conjuntos habitacionais, estes
construídos sob auspícios governamentais em diversas fases e programas, seguindo
as mesmas modalidades conhecidas em nível nacional.
Finalizando o quadro dos espaços livres de Maceió e dos padrões morfológicos aqui
esboçado, deve-se reter a rica diversidade dos ambientes naturais e a precariedade
dos espaços livres especificamente urbanos (vias, praças e parques), com suas
diferentes formas e inumeráveis ambientes configurados no processo de urbanização
cujas características e dinâmicas principais procuramos sucintamente descrever. De
modo geral, esses espaços carecem de adequação paisagística e, sobretudo, de
qualidade para as funções de mobilidade e de sociabilidade, mas, também, de
conforto, de segurança e de apuro estético. Deixou-se entrever essa carência como
sendo de natureza tanto gerencial (política) como econômica, dada a situação de
pobreza da maioria da população.
21
Conforme tivemos oportunidade de descrever em artigo publicado pela revista Paisagem e Ambiente (FARIA,
COSTA: 2011).
111
Referências
CAVALCANTI, Veronica R.; FARIA, Geraldo M. G.; COSTA, Viviane R.; SILVA, Luiz G.
O. da; MOURA, Luan R. D. de (2015). Empreendimentos e ações públicas e privadas
em Maceió /Al no início do milênio. In: Paisagem e Ambiente, nº 36. São Paulo:
FAUUSP, p. 11-33.
112
CONFIGURAÇÃO URBANA DE MANAUS ANALISADA A PARTIR DE SEU
SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES
PONTES, Taís Furtado (1); HEIMBECKER, Vládia Pinheiro Cantanhede (2);
(1) Universidade de Brasília – UNB, PPGFAU, Doutoranda; Brasília/DF
Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Professora Assistente,
Departamento de Arquitetura e Urbanismo; Manaus/AM;
e-mail: taisfurtado@gmail.com
(2) Instituto de Arquitetura e Urbanismo, IAU - USP, Doutoranda; São Carlos/SP;
Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Professora Assistente,
Departamento de Arquitetura e Urbanismo; Manaus/AM;
e-mail: vladiacantanhede@gmail.com
Introdução
1
A criação atípica da região metropolitana de Manaus foi motivada por razões político-administrativas, para fins
de planejamento e captação, por parte do governo estadual, de recursos federais. Conforme constatou Tiago
Veloso dos Santos, o caráter metropolitano limitado à capital é nela concentrado, ainda que a institucionalização
de uma região metropolitana tenha seguido os critérios utilizados para este fim, com a incorporação de
municípios adjacentes (SANTOS, 2015).
113
se fortaleceu ao longo do tempo, e marcadamente, com a instauração da Zona
Franca de Manaus.
2
IBGE @cidades. Estimativa 2017.
3
Canal fluvial onde se navega em canoas ou pequenas embarcações.
114
Além do mais, historicamente esta espacialidade tem sido objeto de inúmeras
disputas sociais, políticas e econômicas 4 (SILVA, 2011).
6
3
4 5
Rio Negro
Figura 1: Indicação de trecho do eixo de ligação da avenida beira rio, desde o Porto de Manaus,
situado ao sul da cidade, no centro histórico. Foto: Google Earth (Acesso em 05 de março de 2018).
Legenda: 1- Terminal do porto flutuante de Manaus; 2 – Catedral metropolitana de Manaus; 3 –
Mercado Municipal Adolpho Lisboa; 4 – Feira da Manaus moderna; 5 – Feira da banana; 6 – Igreja de
Nossa Senhora dos Remédios.
Figura 2: Muro de contenção da via situada em nível elevado em relação à parte do período de cheia
do rio Negro. Embarcações em formas livres de atracamento, acesso e ocupação de elementos
estruturais do muro. Foto: Jornal A Crítica, 24 de agosto de 2016. Matéria “Donos de marinas e de
embarcações cobram mais estrutura na Manaus Moderna”.
4
Tal intervenção compôs um conjunto de obras propostas pelo Governo do Estado do Amazonas durante a
segunda metade da década de 1980, que incluía a implantação de feira atacadista e o ordenamento dos fluxos e
atividades da região portuária da cidade no “Programa de melhorias físicas do município de Manaus-AM”, ou
comumente “Manaus Moderna”, uma “proposta do poder público estadual de adequação da cidade de Manaus
às exigências de um modelo de capitalismo que se impunha na região” (SILVA, 2011, p.112)
115
Para Norberg-Schulz (1980), quando um assentamento perde essa identidade com a
paisagem, ele é corrompido e o espaço perde nexos de coerência que possibilitam
a compreensão do lugar, perde assim seu “caráter”. O advento da ciência e da
tecnologia falsamente fez o homem imaginar que se veria livre da influência do lugar,
no entanto a necessidade de orientação e identificação é inerente à espécie humana
e os elementos da paisagem estruturam espacialmente e permitem identificar o local
ou arranjo espacial (LYNCH, 1981).
5
O autor descreve a origem do planejamento estratégico, sistematizado pela Harvard Business School.
116
Um exemplo é a concorrência entre as cidades para sediar os jogos da Copa do
Mundo, ocorrida em 2014. Manaus e Belém foram objetos de uma disputa na qual as
influências políticas e estratégias de marketing foram cruciais para a promoção das
cidades candidatas a sede do megaevento. Os governos das cidades ofereceram em
contrapartida não apenas suporte infraestrutural, mas uma imagem de estímulo ao
consumo, no caso de Manaus, sintetizada na floresta.
Figura 3: Problemas habitacionais urbanos afetam índios migrados à Manaus, ainda que organizados
em redes de agregação, partilhando de espaços de vivência, carências e aspirações, como na
comunidade consolidada wotchimaücü, composta por 68 indígenas Tikuna originários do alto
6
Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus, implantado pelo Governo do Estado do Amazonas na
cidade de Manaus a partir do ano de 2003.
117
Solimões que habita desde a década de 1990, terreno na zona leste, na “Cidade de Deus” (JIMENES,
2014). Por outro lado, movimentos sociais indígenas permanecem em disputa pela terra urbana,
como no Tarumã, cuja área habitada é alvo de disputa judicial desde o ano de 2014, entre
empresários e moradores locais. Foto: Jornal A Crítica de 22 de janeiro de 2017.
3
4 2
1
5 6 7
Figuras 4: Alguns dos condomínios acessados pela Avenida Efigênio Sales que concentra esta forma de
habitação em tipos verticais ou horizontais, conformando uma paisagem marcada por muros em
continuidade e guaritas voltadas à via. Foto: Google Earth (Acesso em 05 mar. 2018). Legenda: 1 –
Cond. Efigênio Sales; 2 – Cond. Greenwood Park; 3 – Cond. Vila Rica; 4 – Cond. Monte Líbano; 5 –
Cond. Mundi Resort Residencial; 6 – Residencial Florença Park; 7 – Cond. Parque dos Rios II.
2. Cond. Mundi
Figura 5: Condomínios de densidades variadas, em vista aérea. Foto: Google Earth (Acesso em 05
mar. 2018). Legenda: 1 – Cond. Efigênio Sales; 2 – Cond. Mundi Resort Residencial.
118
do espaço urbano, como de criação de parques urbanos, projetos de saneamento e
recuperação de igarapés realizados nas últimas décadas pelo poder público.
O modo como cidades crescem não obedece a padrões rígidos ou teoremas exatos e
está representado na materialidade dos planos físicos e feições que adquirem no
tempo. Das definições e princípios relacionados ao processo de análise do SEL, pela
sua adequabilidade ao caso em pauta, são destacados duas categorias conceituais,
de polo e eixos de expansão urbanos. A princípio, os polos são lugares singulares,
pelo caráter de origem, local de concentração e carga simbólica (PANERAI, 1999) e
remetem à existência de interseções e congregação de atividades ao seu redor
(PEREIRA COSTA & GIMMLER, 2015).
A cidade de Manaus nasceu com uma fortaleza, a de São José da Barra. Construída
em 1669, foi estratégica ao domínio territorial português, tendo em vista sua
localização privilegiada, na confluência de dois importantes rios navegáveis, o Negro
e o Solimões. A fortaleza foi elevada à categoria de vila em 1832 e à de cidade, em
1848.
7
As autoras fazem distinção entre período histórico e período evolutivo, sendo o primeiro marcado por
eventos específicos com características ideológicas importantes como os reinados, períodos republicanos,
entre outros; e o período evolutivo é definido por datas mais flexíveis e se baseia em características sociais,
econômicas políticas e culturais e pelas inovações que são refletidas na estrutura urbana (2015, p. 69).
119
Até o século XIX, a cidade manteve uma configuração de vila, com ruínas do antigo
Forte de São José da Barra do Rio Negro e a presença de uma igreja matriz. Os
igarapés entrecortavam platôs e estes, eram unidos por meio de pontes. A ocupação
inicial da barra do rio, ou margem, foi um processo primeiro de adaptação da cidade
amazônica ao sítio natural no qual certa atenção ao regime de cheias e vazantes,
bem como a necessidade de defesa, produziu uma característica primaz da
morfologia de Manaus.
Nesse momento inicial de formação, a Praça da Igreja dos Remédios e a Igreja Matriz
foram importantes espaços livres de Manaus e articulavam a principal rota de acesso
à cidade, pelo rio Negro, ao tecido urbano incipiente na terra firme. A partir de 1850
o crescimento urbano de Manaus refletiu a dinâmica econômica europeia de base
industrial, inclusas novas rotas comerciais transoceânicas e práticas de exploração
da Seringa na Amazônia. O ciclo econômico então iniciado equivale ao primeiro
período evolutivo adotado nesta análise, no qual a cidade adquiriu notórias feições
urbanas.
Sem a influência das águas, Manaus adquiriu uma nova feição, arraigada à terra
firme, foi sendo expandida sobre o platô. As novas ruas implantadas possuíam certa
regularidade ortogonal e posteriormente esse padrão foi imposto aos cursos de água,
alterando profundamente a paisagem. A estrutura primaz do tecido urbano de
Manaus foi então delineada com a ampliação do sistema viário e implantação das
principais vias. As quadras urbanas foram constituídas de estrutura volumétrica
horizontal sem afastamentos das divisas dos lotes, exceto as residências mais
abastadas que ocupavam tipologias denominadas de “palacetes” implantados em
grandes lotes. As praças e largos eram os elementos estruturantes do tecido urbano
e representavam o local de convívio e de práticas sociais tidas como civilizadas.
120
Um projeto de urbanização e melhoramentos, empreendido pelo governador Eduardo
Ribeiro 8, transformou a paisagem urbana de parte da cidade, com a abertura de
avenidas, aterro de igarapés e a instituição de um traçado regular, aos moldes dos
projetos de modernização urbana, como de Haussmann para Paris. Tal plano marca
a paisagem até o presente, em especial o centro histórico da capital.
Uma malha ortogonal que partia do rio Negro em direção ao interior do território
obedecendo ao sentido Sul-Norte foi a característica morfológica mais marcante
deste traçado regulador. Para a implantação do plano ortogonal foram adotadas
medidas extremas como no caso da Avenida Eduardo Ribeiro, construída sobre o
aterro do Igarapé do Espírito Santo. Em outros importantes igarapés como o do
Educandos, da Cachoeirinha, São Raimundo e o de Manaus foram instaladas pontes,
algumas ainda evidentes na paisagem.
8
Governador do Estado do Amazonas entre os anos de 1892 e 1896, responsável por encaminhar obras públicas
referenciais do período de prosperidade econômica experimentada na cidade de Manaus, nos quais “conseguiu
implementar uma grande variedade de projetos, que ainda hoje caracterizam a riqueza e a história do período”
(MESQUITA, 2005, p. 331-336)
9
PEREIRA COSTA & GIMMLER, 2015 sobre definição de fringe belts de M.R.G. Conzen da Escola Inglesa de
Morfologia Urbana.
121
1
2
Figura 6: Mapa da cidade de Manaus de 1893, Governo de Eduardo Ribeiro. (COSTA, 2006, p.82). A
formação do bairro de Educandos, ainda que não registrado no referido mapa, tem como marco o
ano de 1856, com a criação da escola de “Educandos Artífices” para formação profissionalizante, na
outra margem do igarapé da Cachoeirinha, atual igarapé do Educandos (Projeto de Lei n.044, 2014).
Figura 7: Legenda: 1 – Ponte do Educandos, construção iniciada em 1973; 2 – Bairro do Educandos; 3
– Penitenciária Desemb. Raimundo Vidal Pessoa; 4 – Igarapé do Educandos.
3
2
1 4 4
2 3
1
Figura 8: Alguns dos condomínios acessados pela Avenida Efigênio Sales que concentra esta forma de
habitação em tipos verticais ou horizontais, conformando uma paisagem marcada por muros em
continuidade e guaritas voltadas à via. Foto: Google Earth (Acesso em: 05 mar. 2018). Legenda:
1 – Ponte do Educandos (Padre Antônio Plácido de Souza), cuja construção foi iniciada em 1973; 2 –
Bairro do Educandos; 3 – Penitenciária Desembargador Raimundo Vidal Pessoa; 4 – Igarapé do
Educandos.
10
Muitas famílias que chegavam à cidade navegando, se fixaram sobre o rio Negro, em frente ao centro
histórico, ou às margens de igarapés como o São Raimundo e Educandos. A ocupação do rio Negro deu origem
à extinta cidade flutuante, que chegou a abrigar cerca de 30 mil famílias.
122
Segundo Benchimol (1977), um contingente de pessoas dos seringais e outros pontos
do interior migravam mais expressivamente para Manaus e sem que pudessem pagar
por suas habitações estabeleciam-se em “bairros distantes construindo suas favelas
e casas de palha” (p.76). Nesse processo, além das ocupações em margens de cursos
da água, foram consolidados bairros populares próximos ao centro, evidenciando na
paisagem o confronto entre o que fosse formalidade e informalidade. Muitas famílias
que chegavam à cidade navegando, se fixaram sobre o rio Negro, em frente ao centro
histórico, ou às margens de igarapés como o São Raimundo e Educandos. A ocupação
do rio Negro deu origem à extinta cidade flutuante, que chegou a abrigar cerca de
30 mil famílias.
Nas décadas de 1940 e 1950 não houve grande expansão da mancha urbana, mas sim
um processo de compactação do tecido antigo e outro de expansão e consolidação
dos fringe belts. Seria o fenômeno da industrialização, posteriormente à instalação
da Zona Franca de Manaus (ZFM) no final da década de 1970, que traria implicações
sobre a transformação substancial dos limites urbanos noutras direções
(HEIMBECKER, 2014).
A instituição legal da Zona Franca de Manaus em 1967, por meio do Decreto Lei no.
288 de 1967, do Presidente Castelo Branco, alterando a Lei no. 3.173 de 1957 que
regulava a Zona Franca de Manaus foi marco de um processo que catalisou o
123
surgimento de novas ocupações e a expansão dos limites urbanos, graças a um
incremento populacional sem precedentes. A produção da habitação popular pelo
Estado 11 e os investimentos em infraestrutura viária que acompanharam o processo
inicial de incentivo estatal à industrialização, foram associados a uma expansão que,
sob o discurso da modernização, fomentou a dispersão das aglomerações urbanas.
Tal crescimento não veio acompanhado de práticas de planejamento, o que
ocasionou uma série de externalidades ainda hoje manifestas nos espaços públicos
da cidade.
11
As práticas governamentais adotadas em Manaus no campo da habitação acompanharam as medidas
adotadas a partir de 1964 pelo Estado nacional (HEIMBECKER, 2014, p.32).
12
Financiamento estatal de habitações, intervenções em várias cidades brasileiras, geralmente ignorando
especificidades culturais e com ênfase na produtividade.
13
Como passaram a ser denominadas em âmbito local as ocupações subnormais ou favelas. A veiculação do
termo “favela” foi identificada junto a imprensa local nos anos de 1950 (HEIMBECKER, 2014, p.58).
14
Nesse período a ocupação da cidade avançou sobre a floresta com novos bairros, embora tenha mantido
grandes vazios urbanos desocupados no interior do território (HEIMBECKER, 2014, p.151)
124
“hiatos urbanos”, manchas de áreas verdes ou vazias intercaladas na mancha urbana
(PEREIRA COSTA & GIMMLER, 2015). Dessas áreas não ocupadas, são destacadas as
institucionais, implantadas entre 1960 e 1980, que hoje são importantes fragmentos
florestais urbanos. São estas, o Zoológico do CIGs (Centro de Instrução de Guerra na
Selva), o Campus da UFAM (Universidade Federal do Amazonas) e a Sede do INPA
(Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). 15 Além destas, a área da atual Reserva
Florestal Duke, com 10.000 ha, é outro importante fragmento de floresta tropical
úmida, doada ao INPA pelo Governo do Estado do Amazonas em 1962.
Até meados dos anos 1970 muitos espaços verdes no centro da cidade ainda estavam
preservados, quando então começaram a ser retalhados dando lugar a
estacionamentos, garagens e áreas edificadas, evidenciando uma paisagem em
transformação mais intensa. A ampliação das dimensões físicas da cidade, o novo
ritmo urbano, com o aumento expressivo do número de automóveis, a presença de
“favelas” e outras ocupações não ordenadas pelo poder público e os grandes
conjuntos habitacionais, são percebidos como componentes característicos dessa
paisagem em processo de transformação (HEIMBECKER, 2014, p.136).
15
O CIGs e o INPA mantém um parque aberto à visitação pública e pequenos zoológicos que incluem espécies
em extinção. A UFAM não oferece no Campus o uso recreativo ao público e ao longo dos anos perdeu parte de
sua área.
125
áreas centrais, seja por meio da verticalização ou da subdivisão de lotes no mercado
informal do solo. Por outro, a tendência de expansão pela dispersão do tecido
periférico na direção Norte e em direção ao município de Iranduba, ambos
estimulados pela construção de infraestruturas viárias. As Zonas Norte e Leste se
expandem formando um novo fringe belt externo.
Para a articulação dos acessos urbanos, eixos e polos são os elementos reguladores
determinantes de sua lógica estrutural em cidades. Os eixos são linhas, caminhos e
canais destinados ao fluxo, por onde acontecem viagens ou deslocamentos no meio
urbano, seja de pessoas ou coisas. Os polos são localizações fixas que atraem esses
fluxos e viagens, e concentram atividades diversificadas como comércio, serviços,
equipamentos urbanos, entre outras.
Eixos
126
uma cidade interior que pode crescer em todas as direções, ou 360 graus, Manaus
tem um crescimento em 180 graus.
As linhas de força que organizam o território de Manaus são: o Rio Negro; o traçado
regulador do século XIX, que introduz o eixo norte/sul 16; e o eixo que denominaremos
“sudoeste” representado pela ponte sobre o rio Negro. A BR 319, que ligaria Manaus
a Rondônia não é trafegável em toda a sua extensão e não possui acesso por ponte,
por isso não será considerada como um eixo estruturante.
Ao norte de Manaus, a BR-174 permite a conexão com a Venezuela, passando por Boa
Vista, capital do estado de Roraima. Nesse eixo a 120 km de distância de Manaus
está localizado o município de Presidente Figueiredo. Ao longo da rodovia e
extrapolando a zona urbana de Manaus estão implantadas áreas residenciais em
condomínios fechados de vários segmentos econômico sociais, além de um processo
de divisão de lotes rurais em urbanos.
16
Esse eixo foi fortalecido pela implantação das rodovias AM-010 e BR-174.
127
A AM-070 conecta Manaus a Manacapuru passando por Iranduba, na margem oposta
do rio Negro. Em virtude da construção de uma ponte de 3595 quilômetros de
extensão, essa rodovia pode ser considerada outro importante eixo de expansão da
mancha urbana. A referida ponte sobre o rio Negro, inaugurada em 2011, induziu
uma dinâmica urbana metropolitana com as cidades vizinhas de Manacapuru e
Iranduba 17. Nessa ocupação tem prevalecido a tipologia de condomínios e
loteamentos horizontais de baixa densidade, sem uma diretriz de ocupação
socialmente partilhada, configurando uma paisagem produzida junto à devastação
ambiental e do patrimônio arqueológico.
17
O processo de metropolização da Amazônia Ocidental está em curso desde 2007 quando foi instituída a
Região Metropolitana de Manaus (RMM).
128
Figura 10: Indicação das bacias hidrográficas e área urbana de Manaus. Mapa base com “Pontos de
coleta para a avaliação de balneabilidade das águas – Manaus/2001”. Fonte: IBAM/ DUMA sobre os
dados do INPA, 2002. In: Projeto GEO Cidades. Relatório Urbano Ambiental Integrado, Manaus, 2002,
p.81.
2
3
Figura 11: Foto: Google Earth (Acesso em: 05 mar. 2018). Legenda: 1 – Avenida Coronel Teixeira;
2 – Avenida do Turismo; 3 – Igarapé Tarumã-Açu.
Figura 12: Estrada do Turismo, ocupação horizontal Figura 13: Ponta Negra, encrave de verticalização
em grandes lotes. Fotografia: Eugenio Queiroga, 2015. urbana. Fotografia: Eugenio Queiroga, 2015.
129
oeste de Manaus, corredores urbanos 18 que incluem avenidas do Turismo e Coronel
Teixeira. A ocupação ao uso do solo é caracterizada por habitação de alta renda, no
primeiro caso em residências unifamiliares e no outro, edifícios de apartamentos. Na
avenida do Turismo, além desta, há serviços e comércios, predominantemente
voltadas a este eixo viário estruturador.
Polos e centralidades
Uma das principais centralidades de Manaus é exercida pela região do centro antigo,
juntamente com as subcentralidades do “centro expandido”, que compreende os
bairros Nossa Senhora das Graças, São Geraldo, Adrianópolis, Cachoeirinha, Praça 14
e Compensa. Nessa área estão localizados importantes equipamentos urbanos da
cidade, como shoppings, instituições de ensino, hospitais, entre outros.
18
Os corredores, como indutores de crescimento regulados pela legislação urbana, estruturam a expansão
territorial da cidade e os usos de solo. Nos exemplos apresentados, segundo a seção II, artigo 65, do Plano Diretor
Urbano Ambiental de Manaus, a avenida do Turismo é um corredor e a avenida Coronel Teixeira forma com a
avenida Brasil, um outro, nomeado “Corredor Avenida Brasil/ Ponta Negra”. Neles, segundo a seção III, subseção
I, artigo 90, inciso 1º, os corredores urbanos em questão estão inclusos na categoria de “áreas urbanas que
apresentam melhores condições de infraestrutura, com potencial de concentração de atividades de comércio e
serviços e maior capacidade de absorver o processo de verticalização e adensamento” (PDUA, 2014).
19
Via Beira Rio, situada ao sul da cidade, que interliga a região do centro ao Distrito Industrial, este, situado a
leste. O trabalho de Patrícia Rodrigues da Silva aborda este projeto, seu desenvolvimento nos anos de 1970 e
construção na década seguinte, pelo governo estadual, como intervenção modernizadora de adequação da
cidade às demandas da Zona Franca de Manaus. A tese parte de memórias de trabalhadores e de documentação
diversificada para discutir o espaço beira rio em disputa, por distintos grupos sociais (SILVA, 2011).
130
municipais, hospitais, feiras, foram instalados nessa via e a ponte Rio Negro exerce
influência direta sobre essa área. Outras subcentralidades são identificadas na Zona
Leste, em especial nas vias Autaz Mirim, Cosme Ferreira e Grande Circular. Essa
região se relaciona diretamente com o Distrito Industrial e concentra atividades de
comércio, serviço e equipamentos urbanos de grande porte.
Tipos morfológicos
Nas Zonas Leste e Norte prevalece o tipo morfológico horizontal com grandes lotes,
principalmente terrenos e glebas destinados ao uso industrial. Essa tipologia também
está presente na orla do rio Negro, onde estão instaladas grandes estruturas
portuárias e estaleiros. O parque industrial de Manaus, conhecido com o Distrito
Industrial, agora deixa de estar concentrado na zona leste e toma outras direções no
tecido urbano, ao longo dos eixos viários como Estrada Torquato Tapajós e Estrada
do Turismo. Assim, essa tipologia tem sido dispersada e utilizada para ocupação de
131
maiores proporções do território. Este tipo é caracterizado por incluir construções
horizontais em quadras pouco subdivididas, quando a quadra em si, equivale a um
lote (QUAPÁ/SEL, 2015).
Predominam nos bairros de baixa e média densidades os lotes com muros. Nos bairros
de formação mais antiga (primeiro período evolutivo) há tipologias edilícias com
testada voltada para a calçada e é comum a utilização do logradouro para lazer e
convívio coletivos. Os espaços livres na escala das quadras são geralmente privados,
constituem os quintais e afastamentos frontais, raramente arborizados.
Figura 14: Setores urbanos e bairros, localização do Japiim. In: Anexo II Plano Diretor Urbano
Ambiental de Manaus. Foto: Google Earth (Acesso em 05 de março de 2018).
132
Às margens de igarapés e entre os conjuntos habitacionais e condomínios fechados,
ocupações subnormais surgem como uma “amálgama” do tecido urbano. Não
contempladas no plano oficial, elas se instalam como resultado da lógica do mercado
e da necessidade. Para Pedro Abramo a produção das cidades latinoamericanas
resulta do funcionamento de duas lógicas modernas: Estado e mercado, mas além
dessas há uma terceira lógica, a da necessidade. E é assim, por meio das “invasões”
que o mercado informal do solo se consolida e promove a compactação do tecido
urbano movido pela lógica da necessidade por moradia (ABRAMO, 2009).
2
1 2
Figura 15: Legenda: 1 - Habitações construídas pelo Prosamim; 2 – Habitações subnormais, Betânia.
Foto: Google Earth (Acesso 05 mar. 2018).
133
Nos dois diagramas a seguir (figuras 16 e 17) são sintetizadas as informações
relativas à densidades e áreas de verticalização conforme previstas no Plano Diretor
Urbano Ambiental de Manaus.
Figura 16: Mapa de Densidades. Fonte: Diagrama Figura 17: Mapa de Verticalização. Fonte: Diagrama
gerado a partir do Plano Diretor Urbano e Ambiental de gerado a partir do Plano Diretor Urbano e Ambiental
Manaus (PONTES, 2017). de Manaus (PONTES, 2017).
134
poder público com remoção das famílias e saneamento dos cursos d’água. A segunda
se consolidou e hoje muitos dos bairros que começaram como invasões ou favelas
hoje são assentamentos populares informais (APIs) consolidados, onde o preço da
terra é elevado. O terceiro modelo vem sendo disseminado, inclusive para além do
território de Manaus, como resultado de uma política pública que induz um processo
de metropolização.
20
Não necessariamente em seu curso natural, mas também com a canalização de águas urbanas.
135
Os Parques Desembargador Paulo Jacob, com 40.357,27m² e Senador Jefferson Péres
com 52.000 m², relacionam o tecido urbano do sítio histórico e o Palácio Rio Negro
ao tecido da área portuária e mercado municipal. No igarapé do Quarenta foram
criados os Parques Residenciais Jefferson Péres, Mestrinho e Parque Mestre Chico,
este localizado no entorno da Ponte Benjamim Constant, ponte de ferro construída
no século XIX, marco histórico presente fortemente visível na paisagem urbana do
centro histórico de Manaus.
Nesses parques as obras de saneamento dos cursos d’água têm sido realizadas em
áreas habitadas. Moradores são removidos para que seja possível a implantação de
equipamentos paisagísticos como parques, praças ou a urbanização com passeios e
vias veiculares. A qualidade da água nos igarapés, foco primordial do referido
Programa, ainda é um problema a ser solucionado, que guarda relação direta com a
precariedade do sistema de saneamento e tratamento de esgoto de Manaus.
136
Figura 19: Parque Rio Negro, bairro São Raimundo. Fonte: Secretaria de Cultura do Estado do
Amazonas, 2017.
Figura 20: PROSAMIM. Fonte: PROURBI, palestra proferida na oficina QUAPÁ/SEL, Manaus, 2015.
Para além da região central de Manaus, no que diz respeito a outras áreas de
concentração de habitação de populares na cidade, bem como de áreas destinadas
a programas de habitação estatais, com afetação de elementos naturais, são
destacáveis duas outras zonas, a norte e a oeste.
O sistema viário que articula o tecido urbano de Manaus possui uma conformação
radial em 180 graus, na qual as principais vias ocorrem no sentido Norte/Sul. A
Avenida das Torres sugere a consolidação dessa estrutura promovendo a expansão do
tecido urbano na Zona Norte e AM-010. A porção Norte tem sido ocupada por
condomínios residenciais de média e baixa renda e tem sido destinada à implantação
de novos conjuntos habitacionais como o Minha Casa Minha Vida, o “Viver Melhor”,
e outros loteamentos e condomínios populares e de classe média.
137
A Zona Oeste, protegida pela Área de Proteção Ambiental (APA) Tarumã-Ponta
Negra, tem sofrido fortes pressões, frente aos conflitos e disputas judiciais pela
ocupação e posse de terras. Nessa região da cidade é possível identificar ocupações
por loteamentos fechados, e outras não regularizadas de grandes dimensões. No ano
de 2015 a remoção de mais de 3 mil famílias, cerca de 12 mil pessoas 21 em
assentamento subnormal na APA do Tarumã-Açu do “Cidade das Luzes”, por meio de
ação policial, foi um episódio de reintegração de posse sobre a área na qual a
Prefeitura Municipal aventa intervenção para implantação de parque público.
Figura 21: Cidade das Luzes, assentamento subnormal removido em 2015, APA Tarumã-Ponta Negra,
Manaus. Foto: Gonzalo R. N. Melgár, 2015.
Figura 22: Condomínio Eliza Miranda, construído em 2011 em fragmento florestal na Zona Leste.
Foto: Chico Batata, 2014.
21 FANTON, Hugo. "Cidade das Luzes: despejo violento em Manaus". Internacional Tribunal of Envictions.
Envictions Cases. Session on Brazil. Sd. Disponível em: < https://goo.gl/UkLevp > Acesso em 04 mar.2018.
138
Iniciativas governamentais em síntese
Nos últimos 30 anos algumas medidas foram adotadas para a implantação de parques
públicos abertos em Manaus e a recuperação de espaços públicos no centro histórico.
A realização de dois concursos públicos para a implantação de parques, a
desapropriação de áreas de Áreas de Preservação Permanente (APP) e a qualificação
de áreas verdes residuais, demonstram uma tendência de valorização dos cursos
d’água como componentes da paisagem urbana. Enquanto a recuperação de praças
históricas na área central resgata o caráter público desses espaços. Em ambos os
casos as iniciativas qualificam espaços livres para práticas de lazer e convívio social.
• 1982 – Instituição do decreto federal que cria o Refúgio da Vida Silvestre (RVS)
Sauim Castanheiras, uma Reserva Ecológica com o objetivo de proteger as
populações do Sauim-de-Manaus (Saguinus bicolor) e de Castanhas-do-Brasil
(Bertholletia excelsa). Em 2001 a prefeitura de Manaus assumiu sua gestão. O
refúgio conta com um Centro de Triagem de Animais Silvestres – CETAS e o
Serviço de Resgate de Animais.
139
do Sauim-de-coleira, com área de 330.000 m², como uma Unidade de
Conservação de Proteção Integral. O parque possui estrutura para eventos,
práticas de educação ambiental e grande extensão linear de área protegida,
equipamentos para lazer coletivo e prática de esportes e trilhas.
140
• 2006 – Início das obras do PROSAMIM e implantação do Parque Jefferson
Péres na área central de Manaus. Inaugurada uma nova fase de parques que
associam preservação dos igarapés e soluções de habitação de interesse
social.
• 2012 – Criação da APA UFAM, INPA, ULBRA, Lagoa do Japiim, Eliza Miranda
e Acariquara, por meio de decreto de lei. Localizada entre as zonas centro-
sul e leste é formada por grandes fragmentos florestais e desempenha papel
fundamental para a preservação da vida silvestre e para a manutenção de
corredores ecológicos na cidade. O Parque Lagoa do Japiim oferece estrutura
para uso de lazer e prática de esportes ao ar livre.
141
nas áreas de riscos às margens do Rio Negro, foi implantado um parque para
a contemplação da paisagem, práticas sociais e de lazer da comunidade.
Figura 23: Mapa de Sistema de Espaços Livres. Manaus – AM. Fonte: Elaborado pelas autoras a partir
do Plano Diretor Urbano e Ambiental de Manaus e fotografias aéreas do Google Earth e LAND SAT 8,
2017.
Figura 24: Mapa de Sistema de Espaços Livre: ampliação. Manaus – AM. Fonte: Elaborado pelas
autoras a partir de dados obtidos do Plano Diretor Urbano e Ambiental de Manaus e fotografias
aéreas do Google Earth, 2017.
142
Projeto de recuperação do centro histórico
Na década de 1990 foi desenvolvido o Programa Manaus Belle Époque pelo Governo
do Estado do Amazonas, com o objetivo de fomentar o turismo na cidade como parte
de uma estratégia de inserí-la no mercado global, como polo de atração de
investimentos (VAINER, 2013). O projeto partiu da intervenção na Praça de São
Sebastião, onde foi implantado um Largo, no qual se localizam edificações
representativas do século XIX como o Teatro Amazonas, o Palácio da Justiça e a
Igreja de São Sebastião, com a valorização da centralidade do Teatro na paisagem e
revitalização de seu entorno.
143
Figura 25: Presença de ambulantes no perímetro externo da praça da matriz, 2014. Fonte: IMPLURB,
oficina QUAPÁ/SEL, Manaus 2015.
Uma política pública por parte dos governos do estado e município voltada à
implantação de parques e recuperação de igarapés teve início na década de 1990.
Antes disso, as áreas verdes eram basicamente as intersticiais entre os aglomerados
residenciais e bairros, as áreas verdes 22 dos conjuntos e loteamentos e os grandes
fragmentos institucionais.
22
O PDLI (Plano Diretor Local Integrado) de 1975 definia percentuais diferenciados de áreas verdes levando em
conta a região da cidade em que o conjunto residencial estivesse localizado. Hoje, segundo o Plano Diretor de
144
A partir dos anos 2000 o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus
(PROSAMIM) promoveu uma grande transformação na paisagem urbana do centro
histórico da cidade de Manaus com a implantação de novos espaços públicos de lazer
e a reintrodução dos igarapés à paisagem urbana dessa região da cidade.
As ruas da área central de Manaus foram por muitos anos utilizadas para a prática do
comércio de ambulantes, o que dificultava o uso do espaço público a até mesmo a
apreensão da paisagem pelo transeunte. Atualmente, a administração municipal
intenta o deslocamento dos vendedores ambulantes para shoppings populares e
galerias comerciais. Ainda no centro da cidade, com outras obras relacionadas ao
PAC Cidades Históricas, praças e avenidas 23 tem sido objeto da intervenção do poder
público.
2014, são exigidos no mínimo 15%. A Pesquisa de COSTA, et al. (1991) constatou que cerca de 70% dos conjuntos
residenciais tiveram suas Áreas Verdes ocupadas indevidamente por invasões.
23
Praça Tenreiro Aranha, Praça do Relógio, Avenida Eduardo Ribeiro e Praça da Matriz.
145
alcançadas pelos investimentos públicos. Um exemplo dessa prática é a implantação
de habitações de interesse social, pelo programa federal “Minha Casa Minha Vida”
em Manaus. Um dos maiores condomínios implantados pelo programa foi o
“Residencial Viver Melhor”, na zona norte, com capacidade para receber até 55 mil
pessoas, com renda mensal familiar de até R$ 1,6 mil (faixa 1 do programa
habitacional).
Em 2014, Manaus sediou eventos da Copa do Mundo FIFA e foram construídos alguns
equipamentos desportivos, como centros de treinamento e a Arena da Amazônia que
substituiu o Estádio Vivaldo Lima, este, projeto do Arquiteto Severiano Porto. Tais
obras não trouxeram alterações significativas sistêmicas para a totalidade da
paisagem urbana. Dentre os investimentos previstos para a Copa do Mundo, muito
pouco foi realmente executado.
Deste modo, é possível inferir que o maior agente interventor na paisagem de Manaus
nos últimos anos foi o Governo do Estado por meio do Programa Social e Ambiental
dos Igarapés de Manaus (PROSAMIM). Além deste, a Superintendência da Zona Franca
de Manaus (SUFRAMA) é um importante agente na modificação da paisagem urbana.
Antes as indústrias se concentravam na Zona Leste de Manaus, na área do Distrito
Industrial. Hoje novas indústrias vêm sendo implantadas no eixo Norte, Estrada
Torquato Tapajós, AM-010, entre outras localidades, o que induz a ocupação
residencial no entorno desses equipamentos.
146
urbana desordenada de novas áreas. A Avenida, quando finalizada, representará um
novo eixo de caráter metropolitano, uma vez que incidirá diretamente na AM-010,
ligação importante para as cidades de Itacoatiara e Rio Preto da Eva.
Ao fim, a sociedade em geral, atua na produção de espaços livres urbanos, quer por
meio de ocupações informais em invasões de áreas centrais, quer pelo loteamento
de áreas periféricas. Além disso, a apropriação dos espaços públicos é outra
característica cultural do manauense, que utiliza a rua para o comércio alimentar
como café da manhã, churrasquinho e vendedores ambulantes. Além disso,
transformam o uso do solo por necessidade de adaptação, instalando o comércio no
térreo da edificação ou fazendo extensões, que por vezes invadem as calçadas.
Considerações finais
147
O segundo período foi marcado pela economia industrial e por uma política de
integração nacional que buscava modificar a posição da Amazônia no contexto do
sistema espacial brasileiro, do qual estava às margens (BECKER, et al. 1974). Nesse
segundo período os SELs deixaram de desempenhar papel estruturador da paisagem
e passaram a elementos coadjuvantes na conformação do espaço urbano. Tal espaço
adquiriu nesse período a feição de constelação, com fragmentos de conjuntos
habitacionais distribuídos na floresta primária, conformando a primeira fringe belt.
Planos de expansão urbana da época, que privilegiavam a expansão da rede viária,
não deram conta das fortes pressões migratórias e expansão urbanas que se
sucederam.
Um terceiro período que vai dos anos de 1980 até os dias de hoje, é marcado pelo
papel determinante do mercado no processo de coordenação social do uso do solo e
da produção da estruturação intraurbana, enquanto o Estado deixa de ser o principal
promotor de habitação e assume o papel de provedor de infraestruturas urbanas.
Nesse período o SEL da cidade de Manaus ganha novas feições, por um lado a
expansão urbana continua a um ritmo acelerado e tem início um processo “induzido”
de metropolização. Os espaços livres assumem novas caraterísticas e ganham
destaque, como em projetos de recuperação de igarapés, novos espaços livres
particulares promovidos pelo mercado imobiliário e por meio da criação de uma série
de parques e Unidades de Conservação.
A ponte sobre o rio Negro constitui, juntamente com a AM-070, um novo eixo de
expansão urbana na direção sudoeste rumo à outra margem do rio Negro. O município
de Iranduba, antes acessível apenas via fluvial, agora é quase um bairro de Manaus.
148
Sua área rural passa atualmente por um forte processo de subdivisão de lotes rurais
e de urbanização nas proximidades da ponte. O próprio governo do Estado impulsiona
esse processo de dispersão urbana na margem direita do rio ao propor a implantação
do campus universitário da Universidade Estadual do Amazonas – UEA.
Referências
AB’SÁBER, Aziz Nacib. Amazônia: do discurso à práxis. São Paulo: Edusp, 1996.
149
<http://www.anpur.org.br/revistas/rev_ANPUR_v9_n2.pdf>. Acesso em nov.2016.
COSTA, Lizit Alencar; HIGUCHI, Niro; PINHEIRO JUNIOR, José de Ribamar; GOMES,
Lenisa Nina. Avaliação das áreas verdes públicas da cidade de Manaus: situação em
1991. Caminhos de Geografia. Disponível em: <https://goo.gl/DHj8vw>. Acesso
em: 15 ago. 2016.
150
FANTON, Hugo. "Cidade das Luzes: despejo violento em Manaus". Internacional
Tribunal of Envictions. Envictions Cases. Session on Brazil. Sd. Disponível em:
<https://goo.gl/UkLevp> Acesso em 04 mar.2018.
LYNCH, Kevin. A boa forma da cidade. Tradução José Manuel Costa Almeida e
Pinho. Lisboa: Edições 70 , 1981.
151
PEREIRA COSTA, Staël de Alvarenga e GIMMLER NETO, Maria Manoela.
Fundamentos de morfologia urbana. Belo Horizonte: C/Arte, 2015.
Projeto GEO cidades. Relatório ambiental urbano integrado: informe GEO: Manaus/
Supervisão: Ana Lúcia Nadalutti La Rovere, Samyra Crespo; Coordenação: Rui
Velloso. Rio de Janeiro: Consórcio Parceria 21, 2002.
152
TRANSFORMAÇÕES NA FORMA URBANA DE MARINGÁ-PR
O sistema de espaços livres e as reconfigurações urbanas recentes
MENEGUETTI, Karin Schwabe (1); REGO, Renato Leão (2); BELOTO, Gislaine Elizete (3)
GONÇALVES, Izabela Bombo (4); BRAGA, Samara S. (4); COIMBRA, Mayara Henriques (4)
(1) Universidade Estadual de Maringá; Prof. Associada; Maringá(PR); ksmeneguetti@uem.br
(2) Universidade Estadual de Maringá; Prof. Titular; Maringá (PR); rlrego@uem.br
(3) Universidade Estadual de Maringá; Prof. Adjunta; Maringá (PR); gebeloto@uem.br
(4) Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo UEM/UEL. Mestrandas.
Introdução
153
O abandono das relações originalmente previstas entre espaços livres e edificados,
assim como do criterioso posicionamento desses espaços no tecido urbano, causou
um decréscimo na qualidade urbana. São mudanças de ordem estruturais e
tipológicas que vêm produzindo uma paisagem bastante distinta (e inferior) que
aquela percebida na parte central da cidade.
154
Figura 1. Borda fragmentada da cidade de Maringá. Figura 2. Mancha urbana de Maringá. Acervo dos
Acervo dos autores. 2009. autores. 2017.
155
Figura 3. Esquema dos principais eixos e zona comerciais, Maringá, 2017. Legenda: mancha em
vermelho - zona comercial central; linha vermelha contínua - espraiamento do comércio central;
linha vermelha pontilhada - espraiamento do comércio central ainda pouco ou nada evidente.
Elaborado por Mayara Henriques Coimbra.
O que se observa entre 2009 e 2017 é o espraiamento cada vez maior do comércio e
serviços de características centrais nas avenidas que conectam os bairros ao centro,
assim como a localização de grandes empreendimentos em vias de conexão regional.
Se, por um lado, estamos falando de um início de dissolução do centro tradicional,
por outro, estamos apontando para equipamentos potencializadores de “novas
centralidades urbanas”, como é o caso dos shoppings centers, hipermercados e
universidades (Figura 4).
156
Estes equipamentos, por sua vez, também definem vetores de expansão ou
adensamento urbano, sobretudo por meio da verticalização. O equipamento pode
variar, no entanto a conjugação com os edifícios verticais já pode ser observada,
como nas figuras 5 e 6.
157
Figura 7. Área industrial do plano original. Acervo dos autores. 2009.
Os padrões morfológicos
158
comparado entre as figuras 9 e 10) e a constituição de um tecido de borda, referente
às áreas de ocupação recente e formada por um tipo edilício geminado.
A nova verticalização
159
Nos últimos anos, mais especificamente desde 2015, há uma modificação de grande
importância na edificação de edifícios em altura na cidade. Por conta de uma
interpretação de cunho especulativo dos instrumentos do Estatuto da Cidade, a
legislação permite, em praticamente toda a cidade, a multiplicação por três (de 1,5
para 4,5) do Coeficiente de Aproveitamento e a edificação com altura ilimitada com
a compra do potencial construtivo através da Outorga Onerosa. Como consequência,
o que se vê atualmente na cidade é a inserção destes elementos de destaque na
skyline, em proporções inadequadas ao tamanho dos lotes e ao tecido urbano (Figura
12).
Note-se que a elevação das edificações em altura não produz uma melhor inserção
do edifício no terreno. Ao invés de se garantir mais espaço livre intralotes e
equilibrar espaço livre e espaço edificado, esses novos edifícios mantém a prática de
edificação de praticamente todo o lote em seu embasamento, com a ocupação de
áreas edificadas nos primeiros pavimentos para fins de comércio, recreação do
próprio edifício ou estacionamento.
160
Figura 11. Verticalização setor leste. Acervo dos Figura 12. Tipo Vertical “D”. Acervo dos
autores. 2017. autores. 2017.
161
localidades, este tipo é muito mais robusto que os demais e destaca-se pela altura.
São torres entre 30 e 40 pavimentos, ou seja, o dobro do que se vinha construindo
em altura até a primeira década dos anos 2000, o que provoca disparidades visuais
em zonas até então exclusivamente de ocupações horizontais. Por se tratar de
condomínios verticais que privilegiam a apropriação coletiva, o espaço livre intralote
é em torno de 30% na maioria destes novos empreendimentos.
Figura 13. Mapa da volumetria vertical intraquadra e esquemas dos tipos-morfológicos. Desenvolvido na II
Oficina SEL Maringá. Elaborado pelos autores. 2017.
162
O tipo horizontal geminado
Se esta já era uma realidade nas expansões a partir da década de 1990, com a
alteração da legislação, passou a ser a regra dos novos bairros (Figura 14). Deste
modo, as testadas dos lotes, na prática, passaram a ser de oito metros, o que,
considerando três metros para a entrada de veículos, resulta em pouquíssimo espaço
nas calçadas para as árvores, as faixas permeáveis vegetadas, a permanência de
pessoas, e a manutenção da paisagem urbana que era a característica da cidade.
163
(Figura 15). Surgem ruas de fachadas contínuas, em que a única aparição de verde
é a presença da arborização de acompanhamento viário, caso esta tenha sobrevivido
às obras.
Figura 14. Conformação do tecido urbano de borda. Acervo Figura 15. Tipo horizontal geminado. Acervo
dos autores. 2017. dos autores. 2017.
A permanência dos corredores vegetados de fundo de vale ocorre muito mais pela
força da lei do que por uma vontade social. Desde o plano diretor de 1967 as linhas
de fundo de vale são destacadas como áreas a serem mantidas e preservadas na
forma de parques lineares. A partir de 1979, por meio das Diretrizes Viárias Básicas,
foi instituída a “via paisagística”, que contorna os fundos de vale a uma distância de
60m de cada margem destes (MENEGUETTI, 2009). A faixa de 120m que se forma com
estas vias já foi destinada a chácaras com taxas de ocupação diferenciadas das
164
demais zonas residenciais e a obrigação de preservação dos primeiros 15 metros
junto ao rio com as matas ciliares. Nos últimos 10 anos, por lei, não é permitida a
ocupação nem o parcelamento desta faixa. Com isso, e os programas públicos de
reflorestamento, estes corredores se tornam mais evidentes na paisagem. A mata foi
adensada neste período, como pode ser comparado entre as figuras 16 e 17.
Figura 16. Fundos de vale em 2009. Acervo dos Figura 17. Fundos de vale em 2017. Acervo dos
autores. 2009. autores. 2017.
165
Nas áreas de expansão horizontal mais recente, a implantação do tecido urbano
tende a destacar a presença dos remanescentes florestais que foram preservados
desde a década de 1970 pelo Código Florestal (Figura 18). Os novos loteamentos,
impedidos de remover estas manchas florestadas, começam a tomar partido da
presença do verde como diferencial de qualidade urbana.
Considerações finais
O que este trabalho apresentou foi a transformação que vem ocorrendo na forma de
Maringá devido a duas significativas alterações na ocupação dos lotes urbanos que,
por sua vez, produzem uma paisagem ainda mais distinta do projeto original do que
a redução dos espaços livres vista nas décadas anteriores. Esta transformação é
visível em sua paisagem entre 2009 e 2017, datas das duas oficinas QUAPÁ-SEL
realizadas na cidade.
166
divisores de águas, que funcionam como linhas de expansão, substituindo as estradas
rurais.
Outro aspecto que se faz notável na cidade é a presença dos elementos naturais nas
áreas de expansão residencial. Tanto os corredores de fundo de vale quanto as
reservas florestais que foram preservadas nas áreas rurais, permanecem no tecido
agora urbanizado, destacando-se por comparação com o restante do tecido.
Quanto a esta presença marcante e positiva do verde nas áreas de expansão, cabe
alertar para uma grande potencialidade que estas áreas trazem de se incorporar os
espaços livres públicos a estas estruturas para possibilitar a soma das funções sociais
às funções ambientais e garantir espaços livres mais dinâmicos. A legislação
urbanística deve lançar mão das potencialidades do território e voltar a projetar a
cidade, em novas bases, mas com as antigas preocupações de construir espaços mais
habitáveis e amigáveis social e ambientalmente.
Referências
167
- Rede Lusófona de Morfologia Urbana. Morfologia Urbana: território, paisagem e
planejamento. Vitória, 2017.
MENEGUETTI, Karin Schwabe; BELOTO, Gislaine Elizete; REGO, Renato Leão. Tipo
como produto cultural em área de conurbação recente. In: Anais PNUM - Rede
Lusófona de Morfologia Urbana. Morfologia Urbana: território, paisagem e
planejamento. Vitória, 2017a.
MENEGUETTI, Karin Schwabe; REGO, Renato Leão; BELOTO, Gislaine Elizete. Type as
a cultural outcome of sprawl in Brazilian new towns. In: Anais 24th International
Seminar on Urban Form. City and territory in the Globalization Age. València,
2017b. p.353.
168
SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES NA CONSTITUIÇÃO
DA FORMA URBANA DE NATAL
ATAÍDE, Ruth (1); BRASIL, Amíria (2); BENTES SOBRINHA, Maria Dulce (3);
BEZERRA JUNIOR, Francisco (4); FURUKAVA, Camila (5), LIMA, Verônica (6);
SILVA, Alexsandro (7)
(1) Universidade Federal do Rio Grande do Norte; Prof. Associada; Natal (RN); e-mail: rataide_58@hotmail.com
(2) UFRN; Professora Adjunta; Natal (RN); e-mail: amiriabrasil@gmail.com
(3) UFRN; Professora Associada; Natal (RN); e-mail: dubentes@gmail.com
(4) UFRN; Professor Substituto; Natal (RN); e-mail: arqchicojunior@gmail.com
(5) UFRN; Doutoranda; Natal (RN); e-mail: camilafurukava@gmail.com
(6) UFRN; Professora Associada; Natal (RN); e-mail: verolima04@gmail.com
(7) UFRN; Professor Adjunto; Natal (RN); e-mail: alexsandroferreira@hotmail.com
Introdução
O presente artigo aborda esse tema a partir de pesquisas realizadas pelo grupo local
e da síntese das discussões da Oficina Quapá-SEL, que aconteceu em Natal em
setembro de 2016. O marco conceitual e o recorte espacial, embora tenham
estabelecido relações com o seu entorno metropolitano, consideram a cidade de
Natal. O artigo está estruturado em três partes: caracterização geral do município e
sua inserção no território; abordagem geral sobre a forma da cidade e seus espaços
livres; e por fim, reflexões acerca dos agentes que interferem na produção do espaço
e sobre a legislação incidente.
169
Caracterização da cidade de Natal – RN
Natal está localizada no litoral oriental do estado do Rio Grande do Norte, Nordeste
do Brasil e ocupa uma superfície equivalente a 167.264 Km2, com uma população de
877.662 habitantes 1. Considerada polo da Região Metropolitana de Natal – RMNatal
(Figura 1), a cidade possui quatro Regiões Administrativas – RAs.
Figura 1: Natal e Região Metropolitana. Produzido pelo grupo com base em Idema (2006). 2017.
As RAs Leste e Sul respondem por uma maior concentração de atividade turística e
um parque imobiliário destinado às faixas de renda média e alta, com destaque para
o distrito hoteleiro da Via Costeira e as áreas verticalizadas dos principais eixos
viários e da faixa litorânea do bairro Areia Preta e da Avenida Roberto Freire em
Ponta Negra. Contudo, verificam-se igualmente nesses bairros a presença de
assentamentos de origem informal, instituídos no regramento urbanístico como Áreas
Especiais de Interesse Social (AEIS), os quais configuram historicamente o tecido
urbano e a dinâmica de ocupação do solo, entre eles as comunidades de Brasília
Teimosa e Vila de Ponta Negra, além das Rocas e Mãe Luzia. Nas RAs Norte e Oeste,
embora também estejam sob intenso processo de transformação, ainda predomina o
padrão horizontal residencial unifamiliar, população com renda média de até três
salários mínimos e um histórico de ocupação marcado pela presença de conjuntos
170
habitacionais construídos desde os anos 1970, e de assentamentos precários de
origem informal (Figura 2).
Figura 2: Regiões Administrativas de Natal. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017)
e Fotos: Oficina Quapá 2016. 2017.
171
A inserção da cidade no território
Entre os 14 municípios da RMNatal, Natal, com seus 885 mil habitantes, representa
quase 60% de toda a população metropolitana (1,5 milhão de pessoas), com uma
economia (Produto Interno Bruto, para 2014) correspondente a 2/3 de toda a região.
Tal peso demográfico e econômico está concentrado no primeiro “arco
metropolitano”, definido pela contiguidade entre os municípios de Parnamirim, São
Gonçalo do Amarante e Extremoz, onde também ocorrem as dinâmicas sociais, do
mercado de trabalho e os conflitos e contradições do aglomerado metropolitano de
forma mais intensa. Um segundo arco de influência de Natal, na região, dá-se com
os municípios de Macaíba, Ceará-Mirim, São José do Mipibu e Nísia Floresta, com
menores relações funcionais com Natal, embora com crescente dinamismo social e
territorial. Por fim, um terceiro arco, mais externo, integra os municípios
recentemente incorporados à RMNatal (Maxaranguape, Vera Cruz, Monte Alegre,
Ielmo Marinho, Arês e Goianinha), cuja inserção se dá, principalmente, por
conveniências políticas (Figura 3).
Figura 3: Região Metropolitana de Natal e arcos de influência. Produzido pelo grupo a partir de
Idema (2006). 2017.
172
A maior concentração populacional da região, aproximadamente 90%, está em Natal
e no primeiro arco metropolitano, definindo a chamada “metrópole funcional”, fato
que, segundo Clementino e Ferreira (2015, p.26), “implica apontar o enorme
distanciamento entre a RM funcional e aquela institucionalizada, revelando a
ausência de uma governança urbana compartilhada, de diálogo entre atores políticos
na tomada de decisão de ações que deveriam ser conjuntas, visando a construção da
metrópole.”
173
Suporte biofísico e morfologia urbana
Figura 4: Suporte Biofísico de Natal. Produzido pelo grupo, a partir de dados da Semurb (2017). 2017.
174
Leste, Sul e Oeste, ora como barreira, ora como eixo indutor. Esses espaços ainda
marcam a paisagem urbana, por suas especificidades tipológicas e funcionais. Da
mesma forma, também ao sul e articulada ao entorno metropolitano, destaca-se a
presença de grandes espaços livres como a Barreira do Inferno, antiga área de
lançamento de foguetes, localizada na extensão do Morro do Careca com o município
de Parnamirim (ATAÍDE, ZAAR e SILVA, 2014).
Figura 5: Loteamentos e Conjuntos Habitacionais. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb
(2017) e Ferreira (1996). 2017.
2 Antes da Lei 6.766/79, que dispõe sobre o Parcelamento do Solo urbano (Brasil, 1979).
175
Apesar disso e da pressão imobiliária, a ocupação desses loteamentos também
encontrou barreiras no relevo e nas áreas ambientalmente frágeis, fato que permitiu
a manutenção dos grandes maciços naturais, como as Áreas de Proteção Permanente
(APPs) das Dunas e as atuais ZPAs. As áreas livres, reservadas nos conjuntos
habitacionais e em alguns loteamentos para implantação posterior de equipamentos
públicos foram, parte delas, apropriadas pelos próprios moradores, ou por
equipamentos públicos (saúde, educação, etc.), e as áreas verdes ainda existentes
localizam-se nas praças e, muitas delas, em terrenos privados.
A RANorte está delimitada pelo Oceano Atlântico e pelo rio Potengi, que a separa
das outras regiões. Apresenta uma configuração espacial com traçado regular,
sobretudo na porção central da região, resultante, principalmente, da construção
dos conjuntos habitacionais e loteamentos, bem como uma paisagem singular com
destacada presença de espaços naturais protegidos, de alta vulnerabilidade
ambiental, como dunas, lagoas, rios e mangues nas suas porções leste e sul.
Ao longo de um dos seus espaços naturais protegidos (ZPA9), nos limites com o
município de Extremoz, a RANorte encontra-se com a Área de Proteção Ambiental
de Genipabu (APA de Genipabu), ampliando a sensação da presença de grandes
vazios urbanos nessa direção. Por outro lado, a sua porção noroeste, mais próxima
aos conjuntos e loteamentos, e também com alguns espaços livres privados,
apresenta-se como área potencial para expansão urbana, cujas marcas já são visíveis
com alguns projetos do PMCMV e de eixos viários, decorrentes das demandas do novo
Aeroporto Internacional de Natal, localizado em São Gonçalo do Amarante.
As demais regiões (Leste, Sul e Oeste) possuem relevo, traçado e forma de ocupação
heterogênea. Os bairros da Cidade Alta e Ribeira, que deram origem à cidade
176
(RALeste), apresentam traçado bastante irregular, com ruas sinuosas, quadras e lotes
assimétricos. Parte da orla marítima (Areia Preta), do bairro de Petrópolis, e o eixo
que corta a cidade no sentido norte–sul, envolvendo os bairros de Tirol, Lagoa Nova,
Capim Macio e Ponta Negra são marcados pela verticalização, com poucos vazios
urbanos (Figura 6). Apesar das transformações, todos possuem traçado
marcadamente ortogonal, vias largas, quadras grandes e retangulares, e ainda
reúnem um tecido edificado bastante horizontal, com poucas áreas livres públicas e
verdes.
Figura 6: Eixo de Verticalização. 01) Petrópolis e Areia Preta; 02) Lagoa Nova; e 03) Ponta Negra e
Capim Macio. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017) e Fotos
da Oficina Quapá, 2016. 2017.
Esse eixo de ocupação, de alto e médio padrão, já transborda os limites sul de Natal,
ocupando parte de Parnamirim, com grandes condomínios horizontais (Alphaville e
Cidade dos Bosques) ou verticais (localizados na Av. Ayrton Senna, Av. Maria Lacerda
177
e Av. Abel Cabral), consolidando o bairro de Nova Parnamirim como extensão da
capital e fortalecendo a relação entre os dois municípios. Na última década, outros
municípios da RMNatal também sofreram impactos das atividades imobiliária e
turística, que transformaram a sua paisagem.
Figura 7: Espaços Livres. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017). 2017.
178
Quadro 1: Espaços Livres. Produzido pelo grupo. 2017.
179
crítico de degradação pela presença da carcinicultura, e na ZPA 9 o ecossistema de
lagoas e dunas do Rio Doce, com grande potencial paisagístico e turístico, e as
atividades agrícolas que caracterizam o lugar (Figura 9).
Figura 8: ZPAs 3, 4, 5 ,7, 8 e 10. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017).
e Fotos da Oficina Quapá, 2016. 2017.
Dessas unidades ambientais, oito estão localizadas nas RAs Leste, Sul e Oeste, e
outras duas na RANorte, nas suas franjas Norte e Sul 3. Entretanto, essa distribuição
espacial não reflete, na mesma proporção, a concentração dos espaços livres nelas
existentes. As duas unidades localizadas na RANorte (parte da ZPA 8 e ZPA 9)
envolvem uma superfície aproximada de 37,37% do total das ZPAs, e se caracterizam
pela baixa densidade construtiva e alta concentração de espaços livres contínuos, do
tipo mangues, dunas vegetadas ou não, rios e lagoas. As oito unidades localizadas
nas outras RAs apresentam forma de concentração de espaços livres distintas e com
menores superfícies. Contudo, ocupam juntas aproximadamente 29% do total das
ZPAs e, mesmo pressionadas pelo setor imobiliário para uma ocupação de maior
densidade construtiva, ainda mantêm destacada concentração de espaços livres.
180
Figura 9: ZPAs 8 e 9. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017),
Fotos da Oficina Quapá, 2016, e de UFRN/FUNPEC, 2012. 2017.
4O Plano Diretor (Natal, 2007) define Parque como “área verde com dimensões a partir de 10 (dez) hectares,
destinada ao lazer passivo, à preservação da flora e da fauna ou de outros atributos naturais que possam
caracterizar a unidade de paisagem na qual o parque está inserido, bem como promover a melhoria das
condições de conforto ambiental na cidade.”
181
Figura 10: ZPAs 1, 2 e 6. Produzido pelo grupo a partir de dados da Semurb (2017)
e Fotos da Oficina Quapá, 2016. 2017.
A unidade que abriga o Parque da Cidade envolve o campo dunar dos bairros do
Pitimbu, Candelária e Cidade Nova, correspondente à ZPA1, e cumpre a função de
principal área de recarga do aquífero subterrâneo do município (NATAL, 2008). O
Parque foi criado em 2006 5 e possui 136 hectares, interligando as RAs Sul e Oeste, e
sendo, entretanto, ainda pouco apropriado pela população. O Parque Estadual das
Dunas de Natal corresponde integralmente à ZPA 02, incluindo a área de Tabuleiro
Costeiro da Av. Roberto Freire, sendo quase totalmente coberto por vegetação de
5 O decreto de criação do Parque foi revisto em 2011 (Natal, 2011), redefinindo-o como Parque Natural Municipal
da Cidade do Natal, segundo a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC (Lei 9.985 /2000).
182
mata de duna litorânea, com predominância de espécies peculiares da Mata
Atlântica, e algumas espécies de caatinga e tabuleiro.
Entretanto, esses dois parques urbanos não dispõem de uma conexão física direta,
inclusive pela localização (extremo da RALeste e interior das RAs Oeste e Sul).
Também não existem corredores verdes, ciclovias ou faixas exclusivas para pedestres
que permitam caminhadas conectadas entre eles. Registre-se, por outro lado, que a
partir do Parque da Cidade existe um potencial urbanístico e paisagístico ainda não
explorado, nas faixas lindeiras da Av. Omar O’Grady, na extensão da Av. Prudente
de Morais sentido Parnamirim, possibilitando uma conexão entre este parque e a ZPA
03.
Entre os espaços livres de grande escala, cabe ainda destacar a presença das praias
na paisagem da cidade, cujas orlas, apesar da infraestrutura de apoio precária e da
acessibilidade insuficiente, e em alguns casos, inexistente, constituem os principais
espaços públicos de recreação com ocupação contínua por moradores e turistas.
Quanto aos espaços livres na pequena escala, cabe realçar, entre os públicos, as
praças ou áreas assim destinadas, as lagoas de captação, os campos de futebol e
quadras de esportes, os cemitérios públicos, entre outros, estando estes distribuídos
de forma desigual na cidade. As praças, por exemplo, e outros espaços públicos
similares, localizam-se principalmente nas RAs Leste (28,23%), Sul (35,29%) e Norte
(23,53%), ficando a RAOeste com apenas 12,95% (NATAL, 2016). Na RALeste, as
praças se concentram no centro histórico, com carências em outros bairros centrais
183
(Alecrim, Quintas, Lagoa Nova, Barro Vermelho, entre outros). Os espaços
localizados nas RAs Sul e Norte, estruturados ou não, estão concentrados em
conjuntos habitacionais e loteamentos regulares, realçando que ali reside 67% da
população de Natal, com a presença destacada de favelas e loteamentos clandestinos
que não possuem espaços livres.
No que diz respeito aos espaços privados, cabe destacar as médias e grandes frações
de espaços livres existentes nas áreas ocupadas pelos grandes equipamentos
institucionais, os encraves que marcam a paisagem da cidade, como: os militares,
localizados na RALeste (Alecrim, Tirol, Santos Reis), mas também ao sul (Ponta
Negra), a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o Centro
Administrativo do governo estadual e o Arena das Dunas, esses últimos em Lagoa
Nova (Quadro 1 e Figura 11). Em todos a relação com as áreas livres dos bairros
onde se inserem é alterada, na medida em que também se diferenciam no sentido
do público, por possuírem acesso rigidamente controlado, seja por sua natureza
semipública ou semiprivada (Arena das Dunas).
Figura 11: Enclaves. Produzido pelo grupo a partir de Ataide (2014) e dados da Semurb (2017). 2017.
184
Os vazios urbanos, entendidos como espaços livres não qualificados, localizados no
interior das quadras e decorrentes dos processos de loteamento e/ou da especulação
imobiliária, são encontrados em toda a cidade, com forte concentração nas bordas
das RAs Sul e Norte. A grande quantidade de vazios provoca o espraiamento da cidade
e o seu transbordamento para as franjas metropolitanas, aumentando as distâncias
e dificultando a permeabilidade do tecido urbano.
Com fraca economia industrial ou tecnológica, Natal e toda RMNatal apresentam uma
base pouco diversificada de setores produtivos que geram, por seu turno, maior
diversidade dos espaços funcionais, resultando na formação de agentes de produção
organizados em três eixos: produção, intermediação e comercialização do imobiliário
(formal e informal); setor de serviços, com ênfase nas atividades de lazer,
alimentação e turismo; e o setor público, em duas frentes: como mantenedor de
parcela importante da classe média local (funcionários públicos, autarquias,
Universidades, etc.), e como demandante de serviços, projetos e investimentos. Nas
vilas, favelas, loteamentos irregulares e demais assentamentos de origem informal,
também ocorrem dinâmicas socioespaciais que amplificam o quadro desigual dessa
produção.
185
2010). Nesse território, o planejamento urbano, expresso nas diferentes escalas, tem
reforçado a ideia de espaços predestinados ao investimento do capital turístico
referido.
Por outro lado, esse mesmo território já é ocupado por dinâmicas diversas
(habitacional, serviços, pesca, etc.) que atuam dando singularidade ao sítio, mas
também criando dificuldades sociais e ambientais para sua expansão. A constante
tensão entre o setor produtivo do turismo (entendido como dinamizador de certa
economia distribuidora de renda e geradora de lucro) e o passivo social e ambiental
existente dá a tônica dos conflitos entre turismo e meio ambiente sobre o território
ocupado.
A expressão espacial desse conflito dá-se na forma como esse litoral é construído por
diferentes agentes, não apenas pelo segmento produtivo, mas também nas
estratégias individuais (familiares e institucionais), como, por exemplo, as
sobreposições entre as Áreas de Preservação Permanente (APPs), áreas militares,
resorts e hotéis, equipamentos institucionais, moradia de alto e baixo padrão,
regulares ou irregulares, que podem ser encontradas no eixo que conecta Natal ao
município de Nísia Floresta, ao sul, até as praias de Ceará-Mirim, ao norte. Desse
modo, ainda que se possa atribuir isoladamente aos agentes do turismo a prevalência
de suas lógicas de ocupação territorial, destaca-se a sua dominância enquanto
capacidade de investimento e alteração da paisagem natural (dunas, restingas etc.),
em articulação com a paisagem artificial desenhada por outros agentes,
convertendo-se numa ocupação complexa, o “arco inicial de impacto do turismo”.
186
expansão horizontal do território, independente dos vazios urbanos em áreas
infraestruturadas e das perspectivas de obras públicas previstas para a área. Exemplo
disso é o loteamento em Emaús, entre Natal e Parnamirim, próximo ao Rio Pitimbu,
que modificou o traçado da ampliação da Av. Omar Grady/prolongamento da Av.
Prudente de Morais, definido desde 1950.
187
Parnamirim impulsionaram a dinâmica demográfica; por outro lado, significa a
preparação desse território, ampliado para constituir novas fronteiras do imobiliário
e do turismo.
Tais obras rodoviárias refletiram uma sobrecarga sobre o poder público para
ampliação das redes de infraestrutura, e também contribuíram para a configuração
de um novo circuito de mobilidade urbana, com eixo na mudança de localização do
aeroporto de Parnamirim para São Gonçalo do Amarante.
188
Produção dos espaços livres e edificados e impactos da legislação
Cabe ressaltar que essa divisão territorial, cujas bases conceituais foram inseridas
no Plano Diretor de 1994 9, orienta para uma ocupação do solo ajustada aos
condicionantes socioambientais e à oferta de infraestrutura. Assim, a ZA envolve
todos os bairros da RALeste (exceto a ZPA7 e o Parque das Dunas), alguns da RAOeste
(Quintas, Dix Sept-Rosado e Nordeste) e da RASul (Lagoa Nova e Nova Descoberta),
limítrofes à primeira, estando os demais classificados como ZAB e distribuídos nas
RAs Oeste, Sul e Norte (Figura 12). Para a ZA, aplicam-se parâmetros urbanísticos
que estimulam o aumento da densidade construtiva, admitindo potenciais
construtivos superiores ao aplicado à ZAB, que é de 1,2 10.
8 Áreas de Interesse Social, de Controle de Gabarito, de Interesse Histórico, de Agricultura Familiar, entre outras.
9 Observando determinações constitucionais (Art. 182 e 183), regulamentadas pelo Estatuto da Cidade (Lei
10.257/2001), as quais estabelecem que os Planos Diretores devem criar as condições para o cumprimento da
função social da propriedade e da cidade. Brasil, 1988 e Brasil, 2001.
10 Coeficientes de Aproveitamento (CA) entre 2,5 e 3,5 (Natal,2007, Anexo 1, Quadro 1).
189
Figura 12: Macrozoneamento e Áreas Especiais do Plano Diretor de Natal. Produzido pelo grupo, a partir de
dados da Semurb (2017) e Natal (2007). 2017.
Além disso, observando o princípio da multiplicidade de usos, esses parâmetros
também têm estimulado a instalação de atividades mais atraentes para o mercado
(shoppings, edifícios multifamiliares de alto padrão, entre outros), ainda que as
respostas estejam se concentrando em alguns bairros, como Tirol, Petrópolis e Lagoa
Nova, que têm, juntos, confirmado a tendência de verticalização, desenhada pelo
Plano. Por outro lado, as dinâmicas da ocupação do solo também têm revelado a
formação de outros territórios verticalizados em alguns eixos viários a exemplo da
BR 101 e da Av. Roberto Freire, e bairros inseridos na ZAB, entre eles Candelária,
Capim Macio e Ponta Negra, na RASul, e Planalto, na RAOeste.
190
remembramentos11, favorecendo a construção de edifícios multifamiliares ou mistos,
de alto e médio padrão (Figura 6).
Figura 13: Ocupação no bairro das Quintas, o permitido e o executado a partir de 1994.
Produzido na Oficina Quapá, 2016.
191
comércio e serviço e alta densidade (Figura 14). Do segundo Plano, vem a primeira delimitação
das ZA e ZAB, confirmada pelo Plano de 2007 12.
Ainda com relação aos padrões morfológicos resultantes dos parâmetros urbanísticos
estabelecidos pelo macrozoneamento, merecem destaque as ZPAs, definidas como
aquelas zonas que se destinam à “proteção, manutenção e recuperação dos aspectos
ambientais, ecológicos, paisagísticos, históricos, arqueológicos, turísticos, culturais,
arquitetônicos e científicos do município”13, e compreendem um tecido urbano
descontínuo, representado pelas dez frações referidas no item 2.3, estando
distribuído em todas as regiões administrativas do município.
12Este Plano estabeleceu a reinserção do bairro de Candelária e parte de Ponta Negra à ZAB, resultando na
redução do ritmo de verticalização que estava em curso nessas áreas.
13Natal, 2007, (Art. 21) As ZPAs não devem ser confundidas como Unidades de Conservação nos termos do
Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC (Brasil, 2000), mas alguns espaços nela inseridos,
classificados como de preservação permanente podem ser assim constituídos, observados os limites das
competências do município, as determinações do Plano Diretor e os limites das competências entre as esferas
de governo.
192
processos de regulamentação em curso, a pressão por ocupação ocorre de diferentes
formas e intensidades, algumas por se localizarem próximas à ZA, e outras por
abrigarem ou possuírem assentamentos precários (AEIS) em suas bordas (Quadro 3).
Quadro 03: ZPAs Natal. Produzido pelo Grupo a partir de Ataide, 2013. 2017.
No caso das AEIS, mais presentes nas RAs Oeste e Norte, as ZPAs ali existentes
apresentam uma configuração espacial do tipo orgânico, de alta densidade
construtiva, cujo regramento urbanístico estabelecido no Plano Diretor ainda
aguarda regulamentação. Tal configuração espacial mostra diferenças no
parcelamento e na forma de ocupação, as quais estão associadas ao tempo de
consolidação da ocupação e à relação com as amenidades ambientais e os interesses
do mercado. Algumas ZPAs também recebem reforço na proteção quando se
localizam próximo às Áreas Especiais de Controle de Gabarito (ACG), ao longo da orla
ou do próprio Parque das Dunas, nas suas franjas Leste e Oeste.
Outro aspecto a destacar diz respeito à relação das ZPAs de Natal com outros espaços
protegidos do seu entorno metropolitano, incluindo as APPs ali delimitadas. A
193
localização de algumas ZPAs nos limites do município possibilita a formação (e a
ampliação) de um contínuo natural com outros espaços protegidos dos municípios de
Extremoz (ZPA9), São Gonçalo do Amarante (ZPA8) e Parnamirim (ZPAs 5 e ZPA6).
Tal relação também amplia a percepção da prevalência de grandes espaços livres,
protegidos ou não, que estão dispostos no primeiro arco metropolitano e em parcelas
do interior do tecido urbano de Natal (Figura 15).
194
sem respeito aos recuos, situação observada em muitos bairros consolidados. Outra
relação pode ser encontrada em conjuntos verticais de múltiplos blocos, quando se
reservam áreas para atividades coletivas e de interesse dos condôminos.
Considerações Finais
Pode-se considerar que Natal e seu entorno metropolitano possuem um tecido urbano
essencialmente horizontal, embora apresente um processo de verticalização em
curso. As principais formas de ocupação da cidade, loteamentos (regulares e
irregulares) e conjuntos habitacionais, desenham o espaço de forma que o Sistema
de Espaços Livres (SEL) apresenta como características a existência de poucos
espaços livres (estruturados ou não); que estes se encontram dispersos e com
distribuição desigual no território, sem conexões e, portanto, não pensados como um
sistema. Com relação às áreas livres reservadas, dos conjuntos e/ou loteamentos,
muitas não se encontram vegetadas; as poucas existentes se reduzem a praças,
quintais e jardins dos terrenos privados.
195
Neste quadro, e a partir de pesquisas desenvolvidas pelo grupo 14, são sugeridas
algumas diretrizes para a estruturação do SEL-Natal: promoção de uma maior relação
entre espaços livres e edificados; criação de espaços articuladores, possibilitando as
conexões entre os elementos constituintes do sistema de diferentes escalas;
requalificação dos espaços que se encontram abandonados ou não estruturados;
resguardo dos corpos d’água (lagoas, rios, canais, etc.); proteção da vegetação mais
frágil com barreiras físicas ao crescimento urbano; manutenção dos processos
naturais nos espaços livres fortemente vegetados, para proteção da biota; afirmação
dos campos visuais mais significativos das paisagens e das continuidades perceptivas;
regulamentação das ZPAs para garantir a proteção dos espaços livres ali existentes;
limitação da ocupação de todos os espaços livres analisados, de modo a garantir a
permeabilidade do solo ajustada aos processos naturais. 15
Ressalte-se ainda ser essencial entender o SEL de uma cidade como protagonista da
estruturação do território, pois este desempenha funções fundamentais para a
qualidade de vida urbana, seja como lugares de respiro na massa construída, seja
como promotores de uma vida urbana mais saudável, seja como balizadores do
crescimento do território.
Referências
14 Referimo-nos à pesquisa intitulada “Os sistemas de espaços livres públicos e a urbanidade – um diagnóstico
da situação dos espaços livres na cidade de Natal”, coordenada pela professora Veronica Lima. Ver também
produtos científicos publicados pelo grupo sobre a evolução do tecido urbano de Natal e os espaços protegidos,
expressos em artigos e relatórios de pesquisas relacionadas, alguns referidos na bibliografia.
15 Texto extraído e adaptado de Lima e Medeiros, 2016, p.53.
196
Ciencias Sociales, Barcelona, vol. XVIII, núm. 493 (20), novembro 2014. Disponível
em: <http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn-493/493-20.pdf>.
BRASIL. Lei n. 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I,
II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza e dá outras providências. Brasília: MMA/SBF, 2000.
197
MEDEIROS, C. B. N. Entre o rural e o urbano: relações socioambientais da AEIS do
Gramorezinho e implicações na sua regulamentação. (Dissertação de Mestrado em
Arquitetura e Urbanismo). Natal: UFRN, 2017.
198
SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E A CONSTITUIÇÃO DA FORMA URBANA
CONTEMPORÂNEA produção e apropriação em Palmas-TO
ALBIERI, Lucimara (1)
(1) Universidade Federal do Tocantins (UFT); Professora Adjunta; Palmas (TO); lucimaraalbieri@uft.edu.br
1. Introdução
Palmas, capital do Tocantins, nasceu para abrigar a capital desse novo estado
brasileiro criado na Constituição Federal de 1988. Antigo norte de Goiás, o Tocantins
faz parte da nova fronteira agrícola que se expande no interior do Brasil.
1 Leme (1999) considera Belo Horizonte como a primeira experiência brasileira de planificação urbana em
grande escala. Teresina e Aracajú são anteriores ao Brasil República, enquadradas em um cenário político-
administrativo anterior. Cf. LEME, Maria Cristina (Coord.). O urbanismo no Brasil: 1895-1965. São Paulo: Studio
Nobel/FUPAM, 1999.
da cidade modernista 2. Do ponto de vista do Sistema de Espaços Livres, o projeto
busca categorizá-los pela diversidade de suas funções e incorporá-los ao desenho da
cidade.
2 Sobre condiçãomoderna de Palmas, cf. VELASQUES, Ana Beatriz Araújo. A concepção de Palmas (1989) e sua
condição moderna. 2010. 245p. Tese (Doutorado em Urbanismo), Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal do Rio de Janeiro – PROURB/UFRJ, Rio de Janeiro, 2010
3 O Lago de Palmas é um alargamento do Rio Tocantins resultante da instalação da Usina Hidrelétrica Luiz
Eduardo Magalhães, concluída em 2002.
4 O plano urbanístico de Palmas é de autoria dos arquitetos Luis Fernando Cruvinel Teixeira e Walfredo Antunes
de Oliveira Filho, sócios-proprietários do escritório GrupoQuatro com sede em Goiânia.
200
Figura 1: Croqui do macrozoneamento do projeto urbanístico de Palmas. Fonte: GRUPOQUATRO.
Plano Diretor de Palmas - TO. Disponível em: <http://www.grupoquatro.com.br/site/>.
Acesso em: 09 mai. 2014.
201
Figura 2: Acima, croqui com demarcação das avenidas estruturantes do projeto de Palmas. Abaixo,
simulação da ocupação. Fonte: GRUPOQUATRO. Plano Diretor de Palmas - TO. Disponível em:
<http://www.grupoquatro.com.br/site/>. Acesso em: 09 mai. 2014.
202
Figura 3: Croqui perspectivado: limites naturais a leste (serra) e a oeste (lago), e verticalização em
vermelho ao longo da Avenida Teotônio Segurado. Fonte: GRUPOQUATRO. Plano Diretor de Palmas -
TO. Disponível em: <http://www.grupoquatro.com.br/site/>. Acesso em: mai. 2014.
A grande área para a ocupação urbana foi definida em três porções. A primeira a ser
ocupada, para a qual foi desenvolvido o projeto urbanístico, teria capacidade de
abrigar até 1.500.000 habitantes que, acrescida de duas áreas de expansão futura
(ao norte e ao sul) passaria para 3.000.000 de habitantes (GRUPOQUATRO, 1989). As
duas expansões futuras não tiveram, a princípio, definições de traçado. Os autores
definiram um plano de ocupação do projeto urbanístico desenvolvido por fases. A
primeira fase de ocupação se daria na região central e conforme ela fosse sendo
ocupada, passar-se-ia à fase seguinte (figura 4).
Figura 4: Plano de ocupação de Palmas por fases, com destaque para a área do projeto urbanístico; a
primeira fase contém o centro cívico e o centro comercial. Fonte: Prefeitura Municipal de Palmas
(2005, p.12).
203
Desde a implantação da cidade, o plano de ocupação foi deturpado duplamente. Em
primeiro lugar, várias quadras em outras fases de ocupação foram disponibilizadas
pelo poder público estadual tanto para alocar os funcionários públicos quanto para
captação de recursos financeiros com sua venda ou troca por implantação de
infraestrutura com empreendedoras. Em segundo lugar, os trabalhadores que vinham
construir a nova capital foram alocados pelo governo estadual em um povoado
existente na expansão sul, chamado de Taquaralto, visando evitar a fixação de
população de baixa renda em Palmas. Esse povoado cresceu rapidamente e, somado
a ele, o próprio governo estadual criou os bairros Jardins Aureny’s, provocando ainda
maior inchaço na região sul, chamada atualmente de ‘Palmas Sul’ (figura 5).
Figura 5: Mapa de evolução da ocupação urbana nos primeiros anos da implantação de Palmas à
esquerda e mapa de densidade urbana à direita. Fonte: Prefeitura Municipal de Palmas (2005).
Adaptado pela autora e por Wanellyse Sousa Menezes.
204
Figura 6: Mapa geral das ações da prefeitura frente à política habitacional (destacando locais de
regularizações e implantação de habitação popular) concentradas em Palmas Sul, apresentado na II
Oficina QUAPÁ-SEL Palmas em 2015. Fonte: Secretaria Municipal da Habitação (2015).
A estimativa do plano para 2010 era que 500.000 habitantes estivessem ocupando
apenas as quatro fases da área do projeto urbanístico, porém o IBGE (2017) estimou
atualmente 286.787 habitantes na área urbana do município, a qual é composta por
aquela, somada a Palmas Sul, a expansão sentido norte (mais recente) e a dois
distritos. Segundo Bazolli (2011), há cerca de 9 hab/ha na cidade toda e 34 hab/ha
nas áreas residenciais, acarretando uma dispersão que implica em alto custo de
infraestrutura e serviços públicos e em diluição da esfera de vida pública. Essa
densidade está bem abaixo dos 300 hab/ha previsto pelo plano (figuras 5 e 7).
205
Figura 7: Mapas de densidade urbana à esquerda, em grande parte menos de 80 hab/ha, e mapa de
glebas urbanas não ocupadas à direita, apresentados pela Prefeitura Municipal de Palmas na II
Oficina QUAPÁ-SEL Palmas em 2015. Adaptado por autora e Letícia Bonatto.
206
1,17% de média dos municípios brasileiros, liderando o ranking. Seu crescimento
populacional entre 2016 e 2017 foi de 2,48%, a maior taxa entre as capitais brasileiras
(IBGE, 2017).
Palmas se situa na margem direita do Rio Tocantins e liga-se diretamente pela ponte
a Luzimangues, distrito de Porto Nacional, localizado na margem esquerda,
estabelecendo articulações relevantes com tal distrito (figura 9). Luzimangues é
considerado um distrito dormitório em franca expansão, uma vez que Porto Nacional
207
tem aprovado sequencialmente vários loteamentos nos últimos anos e seus poucos
moradores (com grande tendência de aumento) buscam emprego e serviços urbanos
em Palmas, gerando movimentos pendulares diários. A dificuldade de planejamento
inicia-se na estrutura político-administrativa, uma vez que pertencem a municípios
diferentes.
208
Figura 10: Imagem de satélite à esquerda e Mapa Síntese da identificação dos subcentros de Palmas.
Fontes: Google Earth (2018) e Oliveira, Cruz e Pereira (2014, p. 186).
Como o transporte coletivo principal trafegou por muitos anos entre essas duas centralidades
por uma via à leste da Avenida Teotônio Segurado, a porção leste do projeto urbanístico se
consolidou primeiramente, inclusive no centro da cidade (figuras 11 e 12). Com a duplicação
da Avenida Teotônio Segurado e a alteração do sistema do transporte coletivo em 2006 5,
iniciou-se um processo de ocupação da parte oeste da cidade, juntamente com outros
investimentos públicos e privados. Ainda assim, Palmas padece com a difícil consolidação e
articulação de suas centralidades frente à baixa densidade demográfica, às grandes distâncias
e aos vazios urbanos.
5 Em 2006 foi implantando o sistema troncal com linhas alimentadora em Palmas. Um dos eixos principais
passou a circular pela Avenida Teotônio Segurado, mais centralizada na malha urbana, o que possibilitou o
início de desenvolvimento da porção oeste da cidade.
209
Figuras 11 e 12: Diferença de consolidação entre quadras comerciais centrais: na porção leste da
Praça dos Girassóis (imagem à esquerda) e sua “gêmea” a oeste (imagem à direita). Fonte: Acervo da
autora (2015).
O município de Palmas é cortado por uma grande Área de Proteção Ambiental (APA
do Lajeado) em um platô elevado, na qual contém um parque estadual, um parque
municipal, duas pequenas reservas particulares de patrimônio natural e um dos
distritos de Palmas (Taquaruçu), famoso por suas cachoeiras e com exploração de
turismo ecológico (figura 13). Tal APA é contornada pela área rural, com um distrito
em seu extremo leste (Buritirana). A sede do município se localiza em sua borda
oeste, entre a APA e o Rio Tocantins. Tal rio obteve um incremento significativo em
sua largura após a construção da Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães em 2001, sendo
conhecido popularmente como Lago de Palmas, onde são desenvolvidas algumas
modalidades de esporte náutico.
210
Figura 13: Macrozoneamento do município de Palmas. Fonte: Fonte: GEOPALMAS / PREFEITURA
MUNICIPAL DE PALMAS. Arquivos diversos. Disponível em: <http://geo.palmas.to.gov.br/>. Acesso
em: 27 jun. 2017.
211
ortogonal com traços orgânicos, evidenciando os contornos que protegem suas águas.
As grandes avenidas teriam o papel de complementação dos corredores verdes
naturais para além de sua função viária, o que de fato tem se consolidado
paulatinamente.
212
Figura 14: Padrão morfológico da área do projeto urbanístico original com as quadras definidas pela
macromalha viária. Fonte: acervo LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
213
Figura 15: Padrão morfológico de Palmas Sul. Fonte: acervo LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
214
da cidade, o que precarizou o sombreamento nas calçadas, nas bordas das vias.
Recentemente, a gestão municipal tem tentado avançar quanto às ações voltadas ao
conforto do pedestre e ciclistas, implantando calçadas, ciclovias e arborização ao
longo de seus percursos. Porém, por ser uma cidade espraiada e segregada
socialmente, essas ações são onerosas e ocorrem de forma lenta e desigual na
cidade.
O parque mais antigo é o Cesamar, localizado na região central da cidade, com boa
infraestrutura e bastante frequentado. Seu potencial paisagístico e bom estado de
conservação implicam em uma valorização imobiliária, o que tem provocado mais
recentemente a construção de edifícios residenciais verticais de alto padrão em seu
entorno. Há o Parque Sussuapara na região norte, próximo a bairros populares de
menor renda, com estrutura extremamente precária e baixa utilização. Em 2017 foi
inaugurado o Parque dos Povos Indígenas na Unidade de Conservação que delimita a
região central da região norte de Palmas, suprindo em parte a carência da região.
Em Palmas Sul, não há nenhum parque significativo implantado.
Palmas possui várias praias nas margens do rio com estrutura de lazer, as quais são
bem frequentadas, mas a maioria de sua orla não está urbanizada. As praias com
melhor infraestrutura e manutenção são as de localização central.
Outros Espaços Livres significativos para práticas sociais, além das praias e parques,
são as praças de bairro (ou no interior das quadras 6), umas mais do que outras,
dependendo de sua inserção urbana. No âmbito do projeto original, seriam os
espaços livres de escala gregária (figura 16). Cada quadra possui basicamente uma
praça em seu miolo, implantada ou prevista, com precária articulação destas com as
bordas das quadras, o que reforça sua característica introspectiva e restringe a
apropriação de seus espaços públicos por pessoas advindas de outras localidades.
215
Figura 16: Croqui propositivo para as quadras. Fonte: Prefeitura Municipal de Palmas (2005, p. 09).
216
Figura 17: Uso do solo no centro comercial/cívico do projeto urbanístico original (à esquerda) e na
região comercial de Taquaralto em Palmas Sul (à direita). Fonte: Oliveira (2016, p.264 e 270).
A Praça dos Girassóis é o espaço iconográfico mais significativo por, pelo menos, três
motivos: sua dimensão, sua localização e sua função cívica (figura 18). Com 632.184
metros quadrados, abriga estrategicamente o centro cívico estadual, dando-lhe
visibilidade e compondo com as quadras comerciais ao seu redor o centro da cidade.
217
Figura 18: A Praça dos Girassóis ao centro da imagem aérea, interrompendo a Avenida Teotônio
Segurado. Fonte: Acervo LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
218
Figura 19: Imagem satélite de Palmas. Fonte: GoogleEarth (2017). Adaptado pela autora.
219
Frente ao cenário de segregação socioespacial e de diferenciação morfológica
evidente entre a área projetada originalmente e as demais ocupações, aquela
consegue manter as características previstas do SEL em seu plano, resguardando a
qualidade ambiental do espaço urbano sob diversos aspectos, enquanto outras
regiões são ocupadas sem as preocupações que nortearam o projeto original da
cidade. A região sul, de ocupação mais antiga e já consolidada, possui uma
quantidade significativamente menor de Espaços Livres públicos e apresenta invasões
em áreas de fragilidade ambiental. Ocupações irregulares estão surgindo nos últimos
anos com certa amplitude ao norte do plano urbanístico, caminhando para uma
consolidação urbana sem os cuidados ambientais pertinentes, sendo
recorrentemente alvo de regularização fundiária (figura 20). Apesar da precariedade
ambiental e urbanística de Palmas Sul, a intensidade das relações sociais que
ocorrem em seus Espaços Livres públicos parece se sobressair à qualidade projetual
de seus espaços (OLIVEIRA, 2016).
Figura 20: Ocupações urbanas ao norte de Palmas, extrapolando o perímetro urbano original
demarcado em vermelho. Fonte: Google Earth (2017). Adaptado pela autora.
220
A Segunda Oficina QUAPÁ-SEL de Palmas (2015) teve como um dos resultados a caracterização
do SEL de Palmas constante no Quadro 1 a seguir.
221
*Inserido posteriormente na tabela, o Parque dos Povos Indígenas foi inaugurado em 09/08/2017.
222
3. O papel dos agentes de produção dos espaços livres e edificados
223
Figura 21: Imagem aérea de loteamentos irregulares na beira do Rio Tocantins no extremo norte do
município de Palmas (à esquerda) e mapa destacando loteamentos clandestinos (em amarelo) e
irregulares (em vermelho) apresentado na II Oficina QUAPÁ-SEL Palmas em 2015 (à direita). Fonte:
Google Earth (2017) e Secretaria Municipal da Habitação (2015).
224
se nessa região o maior shopping da cidade, uma grande loja de departamentos,
edifícios residenciais de alto padrão e clínicas e hospitais particulares (figura 22).
O poder público continua com articulações junto à iniciativa privada que são
questionáveis aos olhos da função social da propriedade. Segue abaixo o Quadro 2
com síntese dos agentes de produção do espaço urbano elaborado conforme
discussões na II Oficina QUAPÁ-SEL Palmas (2015).
225
Quadro 2: Agentes de produção do espaço urbano de Palmas. Fonte: II Oficina QUAPÁ-SEL Palmas
(2015). Adaptado pela autora (2017).
226
Figura 23: Unidades de Conservação de Palmas. Fonte: Fonte: GeoPalmas / Prefeitura Municipal de
Palmas. Arquivos diversos. Disponível em: <http://geo.palmas.to.gov.br/>. Acesso em: 20 jun. 2017.
227
A Outorga Onerosa do Direito de Construir e de Mudança de Uso tem desencadeado
importantes mudanças na paisagem da cidade e também tem gerado polêmica, uma
vez que beneficia o capital com a valorização imobiliária em mudanças de uso do
solo de alguns lotes, além de estar estimulando uma verticalização desenfreada em
edifícios residenciais de alto padrão, sem contrapartidas sociais claras, sem uma
política de habitação concatenada a tal instrumento e sem a exigência de Estudo de
Impacto de Vizinhança ou de saturação da infraestrutura (OLIVEIRA, MENEZES, 2017).
A Política de Habitação Social tem avançado a passos muito lentos (com produção
bem abaixo do necessário) e sem profundidade quanto ao acesso à terra urbanizada
e bem localizada, tendo sido aplicada claramente nas franjas da cidade, tanto para
implantar unidades habitacionais quanto para regularizar invasões dentro e fora do
perímetro urbano.
228
paço municipal e urbanizará a orla, mas sem previsão de contrapartidas sociais
(PREFEITURA MUNICIPAL DE PALMAS, 2016).
Figura 24: Mapa síntese da II Oficina QUAPÁ-SEL Palmas (2015). Adaptado pela autora e Raíssa Sousa
e Silva (2017).
229
4. O quadro dos espaços livres na constituição dos padrões morfológicos
Figura 25: Avenida J.K. no centro de Palmas. Foto: acervo da autora (2015).
Figura 26: Avenida Tocantins em Taquaralto, Palmas Sul. Foto: acervo da autora (2015).
230
A região do projeto urbanístico original apresenta uma amplitude e organização
viária que define certa monumentalidade paisagística, o que não ocorre em Palmas
Sul. Embora ambas as regiões tenham predominância de edificações horizontais, a
do projeto original tem passado por um processo de verticalização que também a
difere de Palmas Sul, atribuindo-lhe ares de ‘modernização’ e de atualização
simbólica da paisagem em relação às demais capitais brasileiras. Não há uma
concentração de edifícios verticais, geralmente presentes em centros urbanos
(antigos ou novos), em contraste aos bairros horizontais. A verticalização é espalhada
e rarefeita, compondo-se com padrões horizontais. Isso se deve, dentre outras
coisas, aos desenhos internos das quadras que conjugam lotes uni e multifamiliares
(figura 27).
Figura 27: Skyline da área do projeto urbanístico original de Palmas com a Serra ao fundo.
Fonte: acervo de Yasmine Nery Gonçalves (2018).
231
Figura 28: O Palmas Shopping inserido em uma quadra de comércio e serviços. Fonte: acervo
LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
Figura 29: O Shopping Capim Dourado, à direita na imagem, incorporado à macromalha viária do
projeto original. Fonte: acervo LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
232
Os loteamentos fechados são padrões morfológicos recorrentes nas regiões
periféricas das capitais brasileiras e em cidades de grande e médio portes,
impactando significativamente em suas paisagens. Em Palmas, esses padrões foram
acomodados na macromalha viária, adaptando-se ao desenho estipulado (figura 30).
Figura 30: Condomínio fechado inserido na macromalha viária, configurando-se como uma quadra
com perímetro murado. Fonte: acervo LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
233
Figura 31: Loteamento fechado de alto padrão à esquerda da imagem, na área de expansão norte de
Palmas, à beira do Lago e ao lado de uma Estação de Tratamento de Esgotos. Fonte: acervo
LabQUAPÁ FAUUSP (2015).
234
5. Considerações finais
Palmas tem duas peculiaridades a serem destacadas: (i) ter nascido a partir de um
plano urbanístico de ampla abordagem em um momento histórico recente,
considerando-se o avanço do capitalismo e da globalização no Brasil, e em um
período de existência de análises e críticas intelectuais sobre exemplos anteriores
de novas capitais e amplas produções científicas na área do urbanismo; (ii) das terras
terem sido desapropriadas visando maior controle do Estado sobre a produção do
espaço urbano, o que teoricamente minimizaria a especulação imobiliária que gera
a segregação socioespacial e implica em mazelas urbanas, porém o efeito foi seu
inverso.
7
Sobre sistema de objetos e sistema de ações, cf. Santos, Milton. (1996). A natureza do espaço: técnica e tempo,
razão e emoção. 4.ed. 7.reimp. São Paulo: Edusp, 2012b. 392p. (Coleção Milton Santos, 1).
235
Referências
OLIVEIRA, Lucimara Albieri de. Centros urbanos e espaços livres públicos: produção
e apropriação em Palmas-TO. 2016. 338p. Tese (Doutorado em Arquitetura e
Urbanismo). Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2016, 338 p.
OLIVEIRA, Lucimara Albieri de; CRUZ, Suheid Neves; PEREIRA, Ana Paula Borges.
Identificação da estrutura espacial urbana: o caso de Palmas. In: KNEIB, Érika
Cristine (Org.). Projeto e cidade: centralidades e mobilidade urbana. Goiânia:
Gráfica UFG, 2014, p. 169-196.
236
ESPAÇOS LIVRES E FORMA URBANA NO RIO DE JANEIRO:
contrastes e contradições do processo de estruturação do espaço e da paisagem
MOREIRA, Mariana V.(1); MENDONÇA, Bruno R.(2); AMORIM, Marco B.(3); FLANDES,
Alain L. (4); FERNANDEZ, Flora O. (5); OLIVEIRA, Carla G. (6); PAULA, Aydam de (7);
VIANNA, Camila C. (8); CARDEMAN, Rogerio G. (9); TÂNGARI, Vera R. (10)
Introdução
238
Figura 3: Renda do Município do Rio de Janeiro . Fonte: Jonathas Magalhães Pereira da Silva, 2015.
239
principais vetores de crescimento vias urbanas que circundam os maciços e, em
alguns bairros, os cruzam, interligando-se a rodovias na direção do Estado de São
Paulo, a oeste, na direção do interior do Estado do Rio de Janeiro, a nordeste, e na
direção da orla litorânea de Niterói, a leste. As áreas de expansão localizam-se a
oeste, noroeste e nordeste, impulsionadas por investimentos representados por
complexos industriais (COMPERJ, CSA), portuários (Porto de Itaguaí) e de transportes
(Arco Metropolitano e vias urbanas expressas para transporte em ônibus-BRT).
A urbanização é uma das ações antrópicas que geram maiores impactos ambientais,
principalmente em grandes metrópoles e especialmente devido às consequências
advindas das mudanças geradas pela ocupação e uso do solo urbano. Na cidade do
Rio de Janeiro, a avaliação do incremento de domicílios e pessoas no período entre
os anos 2000 a 2010, demonstra que a população teve um crescimento de
aproximadamente 8% (IBGE, 2011). Em contrapartida, no mesmo período, o
incremento de domicílios foi consideravelmente mais acelerado, chegando à marca
de 18,7%. Ao analisarmos esses dados percebe-se uma discrepância da relação
extensão territorial versus incremento populacional. Chega-se então à conclusão de
que a cidade comportou, na década analisada, um número de 337.780 novos
domicílios distribuídos ao longo de seu território.
240
Dessa forma, o mapeamento realizado pelo Grupo de Trabalho 1 durante a Oficina
QUAPÁ-SEL é uma tentativa de compreender a maneira com que essa dinâmica de
ocupação e apropriação do solo acontece, quem são os principais agentes
responsáveis pela produção do espaço urbano, quais os produtos gerados e os
montantes de investimentos gastos por esses agentes. Esses atores materializam no
espaço os processos e os fenômenos sociais no local onde atuam. A grande
preocupação em torno dessa questão é a resultante fragmentação urbana causada
por esse processo desarticulado, que acarreta o aumento dos custos de implantação
e operação de serviços e infraestrutura, inviabilizando-os ou tornando-os
ineficientes, comprometendo a sustentabilidade. Apesar desta característica local,
o que se observa é a gradativa ocupação das áreas “intermediárias” de forma não
planejada, acarretando novos problemas urbanos e ambientais. O mapa síntese
elaborado (Figura 4) demonstra as intervenções realizadas e a distribuição espacial
dos agentes, que são confrontadas com as informações existentes de suportes físico,
social e ambiental.
Figura 4: Principais investimentos e seus agentes públicos e privados no Município do Rio de Janeiro.
Fonte: Participantes do Grupo Agentes de Produção do Espaço Urbano, 2016
241
Através dessa análise e do entendimento de atividades complexas como a gestão e o
planejamento do território e sua ocupação, é possível chegar a algumas observações.
Entre esses investimentos públicos temos a implantação do BRT (Bus Rapid Tansit),
Programa Minha Casa Minha Vida faixa 1 (responsabilidade do governo federal), além
de obras estruturantes para os megaeventos sediados na cidade. Com relação aos
investimentos privados, eles se distribuem na zona oeste e norte, primordialmente.
Para Argan o tipo seria a redução de uma série de variantes formais a uma suposta
estrutura comum (ARGAN, apud NESBITT, 2006), também definida por outros autores
242
como um padrão (TÂNGARI, 1999). Porém estas variantes formais podem representar
diversos aspectos, podendo-se separá-las por uso, forma, gabarito, ocupação do solo,
dentre outros aspectos. Nessa direção, Habraken afirma que para o estudo tipológico
é necessário sempre a eleição de um tema (HABRAKEN, 1998).
Para a oficina em debate, este tema foi definido pelo estudo realizado previamente
pelo laboratório QUAPÁ-SEL da FAUUSP, que estipulou os tipos pela leitura do bloco
urbano levando em conta a relação entre a volumetria, o parcelamento e os espaços
livres intra-quadra (Figura 5 a 12). Os tipos identificados são variações de padrões
pré-estabelecidos e são exemplificados em imagens de sobrevoo produzidas durante
a oficina.
243
Figura 6: Padrão horizontal/Tipo Horizontal 1: edificações horizontais, construídas em conjunto, com
um mesmo partido arquitetônico e, produzidas ao mesmo tempo, e separadas do seu entorno
imediato por muro e portarias, com uso residencial, comercial, industrial ou misto. Fonte: QUAPÁ-
SEL-FAUUSP, 2016
Figura 8: Padrão vertical/Tipo torre: configuração comum na grande e média cidade brasileira
contemporânea caracterizada pelo predomínio de construções com mais de quatro andares, de
funções diversas. Fonte: QUAPÁ-SEL-FAUUSP, 2016.
Figura 9: Padrão misto-tipo vertical/ horizontal: contido em quadras cujos lotes são ocupados por
diferentes tipos e portes de edificações, de prédios de apartamentos e escritórios, até casas térreas,
244
sobrados, lojas, vilas de pequeno porte, etc. sem nenhum predomínio aparente. Fonte: QUAPÁ-SEL-
FAUUSP, 2016
Figura 10: Padrão conjunto habitacional/Tipo bloco vertical: gerado tanto pela iniciativa privada
como pelo Poder Público, com implantação de edifícios com cerca de 4 ou 5 pavimentos, com
repetição de volumetria construída e disposição regular dos volumes. Fonte: QUAPÁ-SEL-FAUUSP,
2016.
Figura 11: Padrão condomínio/Tipo vertical: contendo duas ou mais torres residenciais, comerciais
ou de serviços, dispostas em terreno de grande porte isolado do tecido ao redor por muros e no
geral com não mais de dois acessos. Fonte: QUAPÁ-SEL-FAUUSP, 2016.
Figura 12: Padrão encrave tipo vertical/ horizontal: corresponde a um trecho de território urbano,
que pela sua dimensão equivale a áreas de diversas quadras tradicionais (adota-se como dimensão
padrão da quadra urbana 10.000m²). Sempre será uma porção do território da cidade que propicia
tipos diferentes de descontinuidade do tecido urbano ou da malha viária do entorno. Fonte: QUAPÁ-
SEL-FAUUSP, 2016.
245
(Figura 12); a cor verde representa os maciços montanhosos (Maciços da Tijuca, da
Pedra Branca e de Gericinó). Os desenhos de perfil e diagrama (Figuras 14 e 15)
auxiliam no entendimento da morfologia nesse escala de análise, complementando
o mapa síntese.
A síntese elaborada inclui o resumo dos padrões morfológicos com a análise de uma
possível tendência de expansão e retração destes (Figura 15). As cores azul e roxa
representam os tecidos urbanos mais verticalizados (basicamente o centro, a zona
sul e a zona norte) e sua tendência de ocupação nos perímetros do Parque da Tijuca
e na região das Vargens e algumas áreas da Baixada Fluminense. A cor amarela
representa os tecidos urbanos menos verticalizados (basicamente a Baixada
Fluminese e a zona oeste) enquanto a cor vermelha representa os encraves urbanos
de maior tamanho (a área do aeroporto do Galeão, a área do Exército em Realengo
e Guaratiba e o Porto de Santa Cruz).
246
Figuras 14 e 15 – Perfil e diagrama sínteses da análise de morfologia urbana.
Fonte: Grupo de Trabalho Padrões Morfológicos-SEL-RJ, 2016
247
Figura 16: Mapa síntese dos Espaços Livres Públicos.
Fonte: Grupo de Trabalho Espaços Livres/SEL-RJ, 2016
248
Figura 17: Maciços montanhosos e matas (cor verde) e áreas consolidadas (cor marrom).
Fonte: QUAPÁ-SEL e SEL-RJ, 2016
Figura 18: Unidades de análise quanto à distribuição de espaços livres. Fonte: SEL-RJ, 2016
249
1. Centro/ Tijuca: tecido consolidado, com média/alta densidade, com uma
oferta de parques urbanos maior do que nas outras áreas. A área sofreu
grandes intervenções hídricas de canalização. Há potencial de requalificação
dos corpos hídricos.
250
Possui uma organização diferente com uma concentração de praças menor,
porém um número de parques considerável. A orla marítima se configura como
um grande estruturador do sistema de espaços livres.
Quadro 1: Distribuição de espaços livres públicos por unidade de análise – Fonte: Fonte: QUAPÁ-SEL
e SEL-RJ, 2016.
A partir da análise dos mapas e tabelas foi possível realizar uma aproximação à escala
da cidade, e o melhor entendimento da distribuição dos espaços livres públicos no
Rio de Janeiro. Foi possível visualizar diretrizes na macro-escala urbana para o
planejamento de intervenções no sistema de espaços livres considerando as
251
necessidades, os problemas e as potencialidades de cada unidade de análise
observada.
Legislação Urbana
Planos diretores e demais figuras de lei oferecem um rico material que expressa a
leitura espacial do território municipal, onde se inscrevem os espaços livres de
edificação. A compreensão dos diferentes conceitos e parâmetros utilizados nessas
figuras de lei refletem uma forma de pensar e modelar a cidade, com repercussões
diretas e práticas na vida cotidiana (REGO et al., 2008).
Figura 19: Mapa com destaque as áreas mais representativas do território e seus principais
parâmetros urbanísticos. Fonte: QUAPÁ-SEL e SEL-RJ, 2016.
254
255
Quadro 2: Simulações urbanísticas . Fonte: QUAPÁ-SEL e SEL-RJ, 2016
Cabe destacar que os mecanismos propostos no Estatuto das Cidades também vêm
sendo cada vez mais utilizados. A região do Porto Maravilha, nesse contexto, se
coloca como um excelente estudo de caso de emprego desses instrumentos e, apesar
256
de a região necessitar uma análise mais aprofundada ao longo do tempo, para que
se verifique a real eficácia na prática desses parâmetros, pode-se dizer que há
potencial de recuperação da ‘mais valia’ do solo frente aos investimentos feitos em
obras públicas, caso o poder público municipal estabeleça um controle efetivo dos
mecanismos previstos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido à histórica pressão por ocupação de setores com elevado índice de valorização
da terra urbana, localizados em áreas servidas por infraestrutura e dotadas de
investimentos públicos em transporte, saneamento e serviços, foram crescentes as
pressões pela alteração de parâmetros da legislação urbanística, especialmente na
direção de investimentos em mobilidade urbana, em locais disponíveis à urbanização
por preços acessíveis ao mercado.
258
Referências:
HABRAKEN, J. Structure of the ordinary. Cambridge and London: MIT Press, 1998.
NESBITT, Kate (org.). Uma Nova Agenda para a Arquitetura. Antologia Teórica
1965-1995. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
TÂNGARI. Vera R. Um outro lado do Rio. (Tese de doutorado). São Paulo: FAUUSP,
1999.
259
O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E A FORMA URBANA DA CIDADE DE
SANTA MARIA-RS-BRASIL:
caracterização das dinâmicas espaciais e funcionais
PIPPI, Luis Guilherme Aita (1); GABRIEL, Letícia de Castro (2); GABRIEL, Helena Reginato (3);
COCCO, Renata Michelon (4); DE FREITAS, Ana Júlia Breunig de Freitas (5); COUTINHO, Letícia
de Fátima Durlo (6), WEISS, Raquel (7)
(1) Universidade Federal de Santa Maria; Professor Adjunto; Coordenador QUAPÁ-SEL Núcleo
Santa Maria; Santa Maria (RS); guiamy@hotmail.com;
(2) Universidade Federal de Santa Maria, Professora Assistente, Campus Cachoeira do Sul;
Professor Adjunto; Cachoeira do Sul, RS; leticia.gabriel@ufsm.br;
(3) Universidade Federal de Santa Maria; Graduanda; Santa Maria (RS);
helena.reginato@gmail.com;
(4) Universidade Federal de Santa Maria; Graduanda; Santa Maria (RS); E-mail:
renata.cocco@yahoo.com.br
(5) Universidade Federal de Santa Maria; Arquiteta e Urbanista; Santa Maria, RS; E-mail:
anajuliabrf@gmail.com;
(6) Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Graduanda; Porto Alegre (RS);
leticiadurloc@gmail.com;
Católica de Santa Catarina Professora Adjunta do Curso de Arquitetura e Urbanismo; Joinville, Santa
Catarina, RS; E-mail: rweissarqui@gmail.com;
Santa Maria é caracterizada como uma cidade de médio porte localizada na porção
central do Rio Grande do Sul. Destaca-se pela distribuição de bens e serviços e,
assim, se constitui como um importante polo militar, educacional, de saúde e
serviços para o interior do Estado. A cidade não possui conurbações, visto sua
expansão territorial ter se desenvolvido de maneira isolada e gradual em relação aos
demais municípios do entorno (estes cujo processo de urbanização amparou-se em
colônias de imigração europeia (italiana, judaíca e alemã), diferente das demandas
solicitadas no processo de formação da região metropolitana de Porto Alegre.
261
• Qual o tamanho (porte e tamanho), dimensões territoriais e número
populacional aplicável para a denominação da categoria de cidade média?
Segundo Brandão (2017, p. 100) “seria interessante pensar o papel que a cidade
média poderia cumprir, pelo seu porte, dimensão territorial, centralidade e escala
de complexidade, sobretudo no contexto regional interiorização do brasileiro, na
provisão e suporte de bens e serviços coletivos essenciais” para a construção de
cidadania, de direitos, de conservação dos recursos e também como promovedora da
funcionalidade e conectividade dos processos dinâmicos e interativos da paisagem e
do sistema de espaços livres intraurbanos.
262
2. Caracterização geral da paisagem de Santa Maria: suporte biofísico,
morfologia e usos urbanos
Santa Maria está localizada na região central do Rio Grande do Sul. O município
possui área de 1.781,8 km² (FEE, 2015), tendo perímetro urbano de 13.092 ha e
população total de 276.108 habitantes (IBGE, 2015). Dentre as características gerais
da paisagem urbana, em termos geomorfológicos, localiza-se na Depressão Periférica
Sul-rio-grandense, mas pela situação de transição em relação ao Planalto Meridional
Brasileiro, possui como característica marcante na paisagem os morros do Topo do
Planalto localizados ao norte do perímetro urbano, os quais atingem em torno de
400m de altitudes, abrangendo o norte da sede do município além dos distritos de
Boca do Monte, Santo Antão e Arroio Grande (Figura 1). Uma segunda unidade de
altitudes significativas situa-se no sentido centro-sudeste, composto por uma área
de transição entre o Planalto e a Depressão Central do Rio Grande do Sul.
Denominado Rebordo do Planalto, apresenta vales e morros, destacando-se os morros
testemunhos do Cerrito e Mariano da Rocha que atingem de 220 à 390m, conforme a
Figura 1. Demais áreas em sua maioria, incluindo o centro da cidade, tem seu sítio
entre 50 a 137m de altitudes.
264
Figura 2: Mapa de Declividade. Fonte: WEISS, 2012.
Modificado pelo Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2016.
265
Além disso, pela ocupação sobre essa zona com variações geomorfológicas, além de
suas próprias características físico-ambientais, Santa Maria apresenta diversos sítios
paleontológicos em seu perímetro urbano, zona rural e nas imediações regionais.
Apesar do reconhecimento científico e turístico deste patrimônio paleontológico, o
crescimento urbano de Santa Maria ocorreu sobre estas formações de rochas
sedimentares. Assim torna-se necessário a efetiva proteção dos vinte e um sítios
fossilíferos mapeados na área urbana, em especial os encontrados em propriedades
privadas, sujeitos, portanto, ao uso e ocupação do solo, e junto às faixas de domínio
das rodovias, as quais atualmente passam por um processo de duplicação.
Figura 4: Panorâmica da área urbana de Santa Maria com o Rebordo do Planalto ao norte.
Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2008.
Santa Maria também apresenta como destaque seus recursos hídricos, os quais
contribuem para rios representativos do Rio Grande do Sul (Rio Guaíba e Rio dos
Arroios Cadena, Ferrera tanto para o abastecimento de água de Santa Maria quanto
para a irrigação rural. Integrando esta bacia e incidentes na área urbana, estão as
sub-bacias dos Arroios Cadena, Ferrera, Passo das Tropas e Vacacaí-Mirim (Figura 5),
conformando uma vasta rede de nascentes e de drenagem. Todavia, visto
compreenderem quase 70% da área urbana e devido ao processo de urbanização, as
sub-bacias dos Arroios Cadena e Vacacaí-Mirim sofreram significativas
266
canalizações/retificações em seus cursos, dificultando o controle da qualidade das
águas superficiais, da conservação das áreas de preservação, da drenagem etc.
Figura 5: Mapa Hidrografia da área urbana de Santa Maria - RS. Fonte: WEISS, 2012.
Santa Maria apresenta diversos atributos ambientais, estes integrantes de uma rica
biodiversidade visto a variabilidade do meio físico e biológico. Todavia, é
fundamental reconhecer estes atributos como qualificadores paisagísticos e
ecológicos e entendê-los enquanto paisagem e um sistema de espaços livres
interdependentes do meio socioeconômico.
267
e índices urbanísticos específicos. Algumas características ambientais, somadas ao
peculiar desenvolvimento urbano, sofreram com a ação antrópica, em geral os
recursos hídricos e suas Áreas de Preservação Permanente (Figura 7) bem como a
região dos morros do Rebordo do Planalto (ao norte da área urbana) e seus
respectivos morros testemunhos (Morro Cechella, da Alemoa, Cerrito e Mariano da
Rocha).
Figura 7: Mapa do Sistema Viário Principal, Hidrográfico e Topográfico de Santa Maria e Aplicação da
Legislação Ambiental. Fonte: WEISS, 2012. Modificado pelo Grupo QUAPÁ-SEL, Santa Maria, 2016.
268
Nesse cenário as sub-bacias do Arroio Cadena e Vacacaí-Mirim que incorporam 70%
da zona urbana passaram pelas principais e mais impactantes mudanças nas suas
características morfológicas, como, por exemplo, a canalização de partes do arroio,
como ocorreu junto ao Parque Itaimbé, e modificações no curso d’água para a
retificação, como no Arroio Cadena, e para a contenção para o abastecimento
d’água, como na Barragem DNOS (WEISS, 2012). Além disso, sofrem com as
degradações decorrentes das ocupações urbanas e das áreas agrícolas que exercem
pressões sobre as áreas de preservação e sobre as áreas úmidas de influencias fluviais
de várzeas e banhados. Reiterando esse fato, de acordo com levantamento efetuado
por Weiss (2012), aproximadamente 63% das áreas de APPs dos rios do perímetro
urbano diagnosticam usos como campo, solo exposto e urbano, e apenas 37% ainda
preservam a mata ciliar.
Figura 8: Mapa de Uso do Solo e da Terra. Fonte: WEISS, 2012. Modificado pelo Grupo QUAPÁ-SEL
Santa Maria, 2016.
269
3. O Sistema de Espaços Livres (SEL)
Na categoria das Áreas de Lazer e Recreação (LR) foram identificadas conforme seu
tipo de utilização: público e/ou privado. Dessa forma, os ELIUs foram classificados e
categorizados conforme seu domínio público (parques, praças, ruas, passeios
públicos, campos de futebol/pelada e quadras poliesportivas) e privado (sedes
campestres, balneários, condomínios fechados, parques temáticos e centros
desportivos). No total foram registrados, levantados e analisados pelo grupo de
pesquisadores do núcleo QUAPÁ-SEL: 139 ELIULRs na cidade, sendo 80 públicos e 59
privados.
270
tendo como papel promover as unidades de vizinhança e um raio de atendimento de,
no máximo, 250 m, com recantos para o estar e pequenos playgrounds.
Em relação ao uso, pode-se inferir que os ELIULRs localizados na área central são
geralmente frequentados por toda a população santa-mariense devido à maior
facilidade de acesso. Já os localizados em bairros são utilizados pela população local
devido, principalmente, à função que exercem e por serem direcionados às
necessidades da comunidade na qual se inserem.
272
Na porção oeste da cidade, caracteriza-se pelo predomínio do uso residencial, de
serviços (29º Batalhão de Infantaria Blindado) e industrial (Distrito Industrial e Santa
Maria Tecnoparque), pela horizontalidade de suas edificações, sendo a maioria
habitações unifamiliares de um a dois pavimentos. Apresenta como condicionante à
configuração espacial, a demarcação das Áreas de Conservação Natural do Arroio
Ferreira (zona 17.a) e do Aquifero Arenito Basal (zona 18.d) sobre as quais o regime
urbanístico para o parcelamento do solo impõe área mínima dos lotes de 2400 m²
(para outras zonas na região oeste, exige-se área mínima dos lotes de 300 m²).
A zona Oeste é uma região ocupada por uma classe socioeconômica de baixa renda.
Porém, recentemente, vem sendo considerada como área de expansão urbana, visto
a incidência da macrozona do Corredor da Urbanidade nas margens da BR 287, a
implantação do Hospital Regional de Santa Maria e do Santa Maria Tecnoparque, o
que desencadeou um processo de parcelamento do solo nas imediações destes
empreendimentos de caráter privado e público. Ainda possui áreas potencialmente
significativas as quais deveriam ser planejadas, projetadas e implantadas pelo poder
273
público a fim de alcançar maior oferta e diversificação de categorias de espaços
livres para utilização da comunidade.
A porção norte é a região da área urbana que possui as maiores altitudes, sendo
conformada pela situação de transição de declividades dos topos e vales de morros
do Rebordo do Planalto a condições topográficas planas. As altimetrias acima de
200m revelam um relevo bastante íngreme, com declividades superiores a 45°, e
dotado de cobertura vegetal correspondendo à Reserva da Biosfera e morro
testemunho do Cechella. É uma região menos populosa (Salgado Filho, 9.801 hab.,
Chácara das Flores, 3.939 hab., Nsa. Sra. do Perpétuo Socorro, 6.151 hab., Itararé,
7.300 hab., Campestre do Menino Deus, 2.697 hab. e Carolina, 3.356 hab., IBGE,
2010), porém com densidade habitacional suficiente para incidir sobre os recursos
naturais de maior valor ambiental, patrimonial e simbólico da cidade.
As limitações ao crescimento urbano ao longo dos anos foram impostas pela linha
férrea, barragem do DNOS e pelas áreas alagáveis do Rio Vacacaí Mirim. Neste mesmo
sentido, o regime urbanístico previsto pelo PDDUA prevê faixas gradativas de
amortecimento à ação antrópica no ambiente natural, como a zona 15 que incentiva
somente os usos recreativos e institucionais e índices pouco permissivos como 0,2
para a ocupação e 0,3 para o aproveitamento. Para a zona 17.d (Área de Conservação
Natural sub-bacia do Rio Vacacaí Mirim), área limite ao parcelamento do solo, impõe
área mínima dos lotes de 2400 m² e índice de ocupação de 0,3. Ainda assim, apesar
das restrições das legislações urbana e ambiental, há uma ascensão, facilitada por
um sistema viário traçado de modo perpendicular às curvas de nível do terreno, de
ocupações irregulares, as quais expõem o ambiente às fragilidades de exposição do
solo a desmoronamentos.
A porção sul é delimitada pelo Arroio Cadena, pelo morro testemunho Mariano da
Rocha além de constituída por um grande estoque de áreas naturais e de preservação
permanente, as quais oriundas das APPs dos inúmeros cursos d’água, de áreas de
banhado contribuintes à recarga do aquífero e por usos agropastoris de caráter
rururbano, visto que apresenta características dos campos sulinos do Pampa Gaúcho,
através dos tipos morfológicos de sítios e chácaras. Caracteriza-se pelo predomínio
do uso residencial, sendo a maioria habitações unifamiliares de um único pavimento.
Trata-se da região menos populosa (bairros Tomazetti, 2.039 hab., Urlândia, 8.967
274
hab., Lorenzi, 5.621 hab., IBGE, 2010), ocupada por uma classe socioeconômica de
baixa renda, mas que também passou a ser considerada como área de expansão visto
a incidência da macrozona do Corredor da Urbanidade nas margens da BR 392 e pela
implantação do Shopping Praça Nova. Como condicionante à configuração espacial,
há o reconhecimento das características de uso do solo rural e urbana já existentes
pela demarcação da zona 18.b e 18.c sobre as quais o regime urbanístico para o
parcelamento do solo impõe área mínima dos lotes de 2400 m² (para outras zonas na
região sul, exige-se área mínima dos lotes de 300 m²). Salienta-se que não há ELIULRs
públicos significativos na zona sul, ao contrário de ELIULRs privados, tendo destaque
a Associação Tradicionalista Estância do Minuano.
Com relação a uma análise dos ELIUs privados, observa-se que representam um
domínio fortemente implantado para atender classes socioeconômicas de média a
alta renda, inicialmente disponibilizados por clubes e atualmente junto a
condomínios fechados de lotes. No entanto, esse tipo de medida, por vezes em nome
de conforto, segurança e privacidade, acaba por agravar uma situação de isolamento
dos espaços de lazer e recreação e de segregação socioespacial dos agentes sociais.
Dentre os principais espaços livres privados analisados até o momento, destacam-se
os diversos clubes fechados de acesso restrito e controlado, tais como as Sedes
Central e Campestre do Clube Recreativo Dores, AABB, ASSUFSM, APUSM, Avenida
Tennis Clube, Professor Gaúcho, além de espaços desportivos como campos de
futebol (Escola de Futebol Ronaldinho Gaúcho), pista de kart etc. Esses espaços livres
estão dispersos por toda a área urbana, oferecendo diferentes atividades aos
associados e/ou possíveis pagantes, e os deslocamentos podem ser feitos por ônibus,
veículos, motocicletas e bicicletas.
Dentre os conflitos encontrados nos ELIUs públicos estão: invasões, segregação social
e espacial; fragmentação; má distribuição; falta de planejamento, manutenção,
gestão e investimento; tendência de padronização e/ou pouca variabilidade
tipológica; inacessibilidade; falta de equipamentos e infraestrutura; baixa qualidade
estética; falta de vegetação; insegurança; poluição, degradação e poluição visual.
Com relação aos ELIUs privados, os conflitos encontrados foram: segregação espacial
e social, fragmentação da paisagem, falta de relação no âmbito da unidade de
vizinhança, não comportando usuários do(s) bairro(s) e/ou comunidade(s). Por outro
275
lado, a cidade apresenta grandes estoques de Áreas de Preservação Permanentes
(APPs), presença de vazios urbanos e não incremento de espaços livres públicos de
lazer e recreação de grande porte, bem como de conservação ambiental e
paisagística, fazendo-se imprescindível a implantação de parques e corredores
verdes de forma a garantir o seu atendimento socioambiental nas diversas áreas e
escalas da cidade, e assim potencializando a paisagem, os EL e a apropriação pela
comunidade.
276
Neste contexto, a efetivação do ordenamento territorial não considera as
necessidades de proteção das Áreas Especiais Naturais do município, sendo uma das
causas a não inserção do subsistema antrópico como agente de conservação por meio
de atividades geradoras de renda que possam perpetuar os princípios da
sustentabilidade socioambiental. Ressalta-se que, mesmo com problemas quanto aos
limites e a efetiva implantação, as Áreas Especiais Naturais estão contempladas,
visto a sua importância ambiental, no projeto RS Biodiversidade (área prioritária 1:
Região da Quarta Colônia e municípios de Santa Maria e Itaara) que define as áreas
prioritárias para conservação no Estado do Rio Grande do Sul (SEMA); no zoneamento
da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica que inclui a parte norte do município
(RBMA, 2008) e; em proposta lançada pelo IBAMA no ano de 2005, na criação de uma
Área de Proteção Ambiental (APA) no território de Santa Maria.
Com relação à categoria de espaços livres conforme a conectividade, por meio das
áreas de conservação, preservação e proteção dos recursos naturais, culturais e
históricos, a análise deve ser efetuada nas escalas macro, meso e micro,
compreendendo as esferas do âmbito local, municipal e regional. A conectividade
pode ser analisada e constatada em maior escala (macro e meso escalas), pelo estudo
de unidades e sub-unidades da paisagem, nas quais a estrutura da paisagem e seus
valores territoriais são mais expressivos (análises de matrizes, corredores e
manchas). Os espaços relacionados às análises de microescala (praças, jardins
residenciais, terrenos baldios remanescentes intra-lotes e corredores de alta
tensão), destacam mais os valores formais, estéticos e funcionais, e, geralmente,
não conformam espaços propícios de conectividade devido à fragmentação urbana.
O ideal seria a existência de um sistema conectado nas três escalas. Com o
entendimento e estudo de espacialização das unidades de paisagem e suas sub-
277
unidades, busca-se a valorização das matrizes naturais, minimizando a fragmentação
das mesmas, pelo fomento à criação de redes ecológicas e corredores que tragam
sua interligação efetiva, garantindo, assim, a manutenção e perpetuação dos
ecossistemas naturais envolvidos.
Com relação à categoria de espaços livres conforme a potencialidade, por meio das
áreas com potenciais de utilização, foram enumeradas áreas de uso especiais, como
os friches industrielles e urbaines. Os friches industrielles, termos oriundos das
teorias urbanas francesas, também conhecidos por brownfield nos EUA, não possui
uma clara tradução para o português, consistem em terrenos localizados dentro da
malha urbana que abrigavam indústrias e foram abandonados por essas, seja por
motivos de relocação, seja pelo cessar de suas atividades. Já os friches urbaines se
apresentam como terras livres e abandonadas, isto é, vazios urbanos inseridos no
tecido urbano, onde houve demolições de edifícios, fábricas ou instalações
provisórias, nas quais não há interesse maior em implantar novas construções nem
pelo cultivo e/ou utilização (públicas ou privadas) das terras. Apresentam-se como
exemplos de friches industrielles e urbaines em Santa Maria a Gare, assim como as
Oficinas do Km 3. Tais espaços apresentam alto potencial futuro para se tornarem
áreas de lazer e recreação.
278
4. Agentes de produção e transformação da paisagem urbana:
concentração de população x áreas de fragilidade ambiental emergentes
Com relação à Lei de Uso e Ocupação do Solo de Santa Maria (LUOS, Lei
Complementar Nº 72, de 2009), esta criou uma categoria adicional para as áreas
naturais e de preservação permanente. A seguir, estão mapeadas e listadas as Áreas
Especiais Naturais e as Áreas de Preservação Permanente de Santa Maria (Figura 11).
Figura 11: Mapa das Áreas Especiais Naturais – Anexo 12 – LUOS – PDDUA. Fonte: Prefeitura
Municipal de Santa Maria, 2006.
282
• Área de Conservação Natural – Reserva da Biosfera (REBIOS) (situada ao
norte do Distrito Sede e de áreas rurais, a partir da altura igual ou superior a
cota 100 m);
• Área de Recarga do Aquífero Arenito Basal Santa Maria (localizada no oeste
da área urbana e a sudoeste em área rural).
• Área Especial de Conservação Natural – Arroio Ferreira (situada no setor
oeste da cidade, conformada pelas áreas adjacentes à delimitação do
perímetro urbano; nascentes localizam-se próximas ao antigo depósito de lixo
da cidade e os cursos d’água apresentam-se impactados por efluentes
domésticos advindos de ocupações de classe socioeconômica de baixa renda);
• Área Especial de Conservação Natural – Arroios Cadena-Cancela
(conformada pelos Arroio Cadena e seu tributário Arroio Cancela, Parque
Itaimbé, Parque Municipal Ferroviário, Parque Medianeira e outros espaços
livres; a maior parte da rede hidrográfica localiza-se na área urbana da
cidade, o Arroio Cadena sofreu impacto ambiental pela alteração do seu leito
original, pelo aterro das suas áreas alagáveis adjacentes e ainda alteração da
drenagem por construções irregulares, além de poluição; já o Arroio Cancela
foi canalizado e fechado ao longo de 1,5 km de seu curso d’água sob o Parque
Itaimbé);
• Zona dos Morros (conformada ao leste pelos Morros Mariano da Rocha,
Cerrito, Alemoa e áreas adjacentes);
• Eco-Parque da Montanha Russa (constituída por área com largura mínima de
70 m medida a partir da faixa de 30 m de Preservação Permanente no entorno
do reservatório artificial da Barragem DNOS);
• Área da Sub-bacia do Rio Vacacaí Mirim (constituída por parte da área total
da sub-bacia, que compreende a porção norte e nordeste da zona urbana;
destaca-se pela existência de um reservatório artificial cujas nascentes do
Vacacaí Mirim, que se encontram no rebordo planalto, contribuem junto à
conformação topográfica para a drenagem das águas da barragem que
abastece 40% da cidade e também é utilizada para práticas esportivas de
caiaque, canoagem, stand uppaddle e natação);
• Área Natural de Camobi (constituída por áreas localizadas entre a Ferrovia e
a RS 287 que, por ainda não serem ocupadas em sua grande maioria, devem,
283
preferencialmente, ser destinadas a parques e loteamentos com exigência de
15% de destinação à área verde);
• Área de Preservação Permanente – Morros (Morros Testemunhos Cechella,
Cerrito e Mariano da Rocha, além do Morro do Monumento aos Ferroviários);
• Área de Preservação Permanente – Recursos Hídricos;
• Área de Preservação Permanente da Barragem do Rio Vacacaí-Mirim;
• Área Produtiva do Rio Vacacaí Mirim (constituída por áreas contíguas ao Rio
Vacacaí Mirim);
284
realização de atividades e/ou empreendimentos turísticos sustentáveis junto
às unidades de conservação natural.
Figura 12: Regime Urbanístico de um dos trechos do Corredor de Urbanidade na macrozona Oeste de
Santa Maria, junto à BR 287. Fonte: Anexo 8, LUOS, PDDUA. Fonte: Prefeitura Municipal de Santa
Maria, 2009.
285
Figura 13: Processo de Verticalização do Corredor de Urbanidade – Royal Plaza Shopping e
edificações multifamiliares em altura. Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2015.
Figura 14: Skyline Parcial de Santa Maria e simulação da verticalização do corredor de urbanidade.
Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2014.
287
Figura 15: Condomínio vertical do MCMV inserido na macrozona Centro sem a efetiva integração ao
tecido urbano pré-existente. Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2015.
Figura 16: Condomínios horizontais do MCMV na macrozona Leste em oposição à macrozona urbana
Centro e Corredor de Urbanidade. Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2015.
288
Figura 17: Sede Campestre do Clube Recreativo Dores e condomínio horizontal fechado de lotes com
estoque de APPs intramuros. Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2015.
289
Figura 18: Condomínio horizontal de lotes fechado e a constituição de enclaves urbanos. Fonte:
Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa Maria, 2015.
Com relação à macrozona Oeste, trata-se de uma área urbana na qual se encontram
o Distrito Industrial de Santa Maria e loteamentos horizontais populares aos moldes
das COHABs (Tancredo Neves e Santa Marta). Além disto, há significativa pressão,
seja via ocupações tanto regulares quanto irregulares, junto aos recursos naturais
tais como áreas alagáveis e APPs dos Arroios Ferrera e Cadena (Figura 19). Em
paralelo, porém intramuros, há glebas privadas do exército brasileiro as quais
representam grande estoque de espaços livres.
290
Figura 19: Arroio Cadena na porção oeste da cidade. Fonte: Acervo do Grupo QUAPÁ-SEL Santa
Maria, 2015.
Sendo assim, apesar do gravame legal, atualmente existe uma falta de efetividade
da aplicação de políticas públicas municipais em termos de proteção ambiental. Em
decorrência disso, as áreas em potencial da paisagem e do sistema de espaços livres
têm sido impactadas de forma negativa pelas ações antrópicas, já que estas zonas
de preservação e/ou conservação ainda não foram efetivamente demarcadas in loco,
como também ainda não há fiscalização e penalização ambiental. E mesmo que haja
um grande estoque representado pelos recursos hídricos, pelo bioma da Mata
Atlântica e pelo Aquífero Arenito Basal, só o planejamento, projeto e gestão da
paisagem e do sistema de espaços livres podem garantir o funcionamento
socioambiental e cultural nas diversas escalas da cidade e da comunidade.
291
ambientais como forma de suprir as necessidades dos habitantes, cabem ações
preventivas e reguladoras. Visto que o grau de desenvolvimento de uma cidade é
mensurado pela qualidade de vida da sua população, dessa forma, é imprescindível
que haja vigência e efetividade das políticas definidas pelo poder público local, como
as Áreas Especiais Naturais e Áreas de Preservação Permanente, de modo a garantir
a seguridade de seu território, valorização e preservação de seus bens naturais.
5. Considerações Finais
292
fragmentando áreas de conservação natural (entre Rebordo do Planalto e morros
testemunhos Cechella, Alemoa, Cerrito e Mariano da Rocha) e de preservação
permanente dos recursos hídricos (sub-bacias do Arroio Arroio Cadena e Vacacaí-
Mirim);
293
• Mitigar a fragmentação da paisagem;
• Considerar a estrutura morfológica e as funções da paisagem e do sel;
• Conectividade das áreas urbanas, rururbanas e naturais;
• Promover controle das ocupações e usos do solo a fim de garantir a
permeabilidade do solo e a recarga do lençol freático;
• Indicar as áreas em potencial ou prioritárias para a conectividade das
diferentes categorias tipológicas dos espaços livres intraurbanos e da
paisagem e suas sub-unidades via, por exemplo, a implantação de redes de
corredores ecológicos com usos multifuncionais.
6. Referências
294
MACIEL FILHO, C. L. Carta Geotécnica de Santa Maria. Santa Maria: Imprensa
Universitária – UFSM, 1990.
ROSA, Á. A. S. da. Sítios fossilíferos de Santa Maria, RS, Brasil. In: Ciência e
Natura, 26 (2), p. 75 - 90, 2004.
295
SEMA - Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul. Bacia
Hidrográfica dos rios Vacacaí – Vacacaí Mirim. Porto Alegre, 2011. Disponível em:
<http://www.sema.rs.gov.br>. Acesso em: 23 maio de 2016.
296
SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E SUA RELAÇÃO COM OS AGENTES
PÚBLICOS E PRIVADOS NA PRODUÇÃO DA FORMA URBANA DE
SÃO CARLOS, SP
1. Introdução
297
A cidade de São Carlos, que em seu plano original de meados do Século XIX, desenhou
no vale, junto ao Córrego do Gregório, seu primeiro conjunto de praças, cresceu
estabelecendo conflito com a presença de corpos hídricos e nascentes em seu
território. Ao longo do tempo, muitos foram canalizados, receberam obras de
retificação e avenidas marginais como parte da solução das questões de mobilidade
urbana. Além da excessiva impermeabilização ocorrida nesse processo que terminou
por tornar as áreas centrais no vale sujeitas a enchentes, no que diz respeito ao
conflito com o ambiente físico, a ocupação das áreas periféricas ocorreu ao Sul sobre
solos frágeis do ponto de vista geotécnico, numa prática que consolidou e acentuou
a sobreposição de fragilidades, ambiental e social. Por sua vez, as áreas rurais e as
áreas de mananciais de abastecimento de água, adjacentes aos limites urbanos, vem
sendo pressionadas crescentemente nos vetores de expansão, com a presença de
novos loteamentos, condomínios habitacionais, chácaras de recreio e eixos
comerciais e industriais.
Contudo, isso não significa que a cidade não tenha sido objeto de planejamento
urbano. Determinados processos históricos relacionados à gestão urbana de São
Carlos marcaram esforços voltados à regularização do uso e da ocupação do solo. Um
primeiro momento ocorreu na década de 1960, em um contexto no qual grande parte
das cidades médias paulistas apresentava um cenário de acentuada ilegalidade e
irregularidade urbanística. Foi nesse período em que a Prefeitura de São Carlos
elaborou um projeto de Plano Diretor e um Código de Loteamentos para o município.
Embora a estrutura almejasse contornar uma situação de ocupações e loteamentos
irregulares, o plano enfatizou o embelezamento da cidade, desconsiderando os
problemas relativos ao seu processo de expansão das periferias. Em 1962, seu
conteúdo foi finalizado, mas não foi aprovado nas instâncias legislativas.
298
Aos poucos, os loteamentos foram sendo regularizados e os bairros receberam
melhoramentos urbanos. No entanto, a lógica de geração de loteamentos afastados
não foi alterada e novos espaços periféricos foram se reproduzindo em localidades
ainda mais distantes e, muitas vezes, em locais com significativas fragilidades
ambientais.
Foi somente no ano de 2001 que a temática do Plano Diretor foi apresentada como
sendo uma das prioridades da gestão pública recém-eleita. Nessa época, as
informações básicas sobre a cidade eram raras e, tampouco, estavam compiladas.
As Áreas de Especial Interesse Ambiental tiveram seu foco na proteção das áreas de
fundo de vale como as Áreas de Preservação Permanente, nascentes e corpos d’água.
Foram priorizadas áreas próximas aos mananciais, áreas com vegetação significativa
e paisagens naturais notáveis, áreas de reflorestamento e de conservação de
parques. Outra categoria de AEIs associou dados, aproximando-se do debate
contemporâneo do significado de Ambiente, valorizando os atributos Turísticos,
Históricos e Ecológicos. Tais áreas procuraram incentivar a preservação de
propriedades históricas relacionadas ao ciclo cafeeiro localizadas em regiões com
características turísticas e ecológicas relevantes.
300
A principal qualidade do documento produzido em 2005 era sua potencial
organicidade. Em primeiro plano destacava-se a qualidade das cartografias e textos
produzidos, que procuravam expressar os dados de forma que não apenas
pesquisadores, gestores ou governantes pudessem ter acesso às informações, mas
que os cidadãos pudessem participar desse movimento de esclarecimento acerca de
sua cidade e município. A perspectiva era aquela na qual a geografia física, relevo,
hidrografia, vegetação e a ocupação urbana participavam do processo de leitura e
compreensão do território como informações relevantes, sendo transformados em
norteadores de decisões e políticas públicas relacionadas ao Município de São Carlos.
Havia, por parte desse documento, que expressa disposições de um agente público,
clara intenção de modelar a forma urbana. No que tange aos aspectos ambientais,
vale ressaltar que o processo de elaboração do Plano Diretor Municipal, (PDMSC,
2005) evidenciou importantes elementos para a proteção ambiental em escala
urbana e municipal.
Embora estivesse evidente a grande parte da opinião dos segmentos que atuam na cidade
essa presença inovadora de um controle legal sobre o território, as lacunas e
ambiguidades presentes e, em especial, a pressão exercida pelo poder econômico
ligado aos proprietários de terra provocou a retomada do poder pelos setores mais
comprometidos com o capital, o que resultou em um retrocesso na gestão do uso e
ocupação do solo de São Carlos.
301
Dez anos se passaram da aprovação do PD 2005 e a exigência de Revisão do Plano
Diretor Municipal, que se tornava evidente e necessária; o prazo máximo previsto
estava se extinguindo em acordo com o artigo 39 do Estatuto da Cidade (Lei Federal
10.257/2001). Contudo, nesse momento, o cenário da gestão pública era muito
diferente do relatado em 2005. Em 2015, as pressões dos setores ligados ao capital
imobiliário são mais intensas e os agentes privados se articularam para participar
ativamente do modelar da forma urbana.
O processo de revisão é iniciado uma vez mais e ocorrerá de fato, agora liderado
pela Prefeitura Municipal e seu corpo técnico. Contudo, seu desenvolvimento se
mostrou pouco comprometido com a totalidade dos cidadãos e, graças à pressão da
sociedade civil e do Ministério Público, medidas são tomadas para que ocorra de
forma participativa e pactuada. Este processo acarretou a formação do Núcleo
Gestor Compartilhado (NGC), instância representativa e participativa, que buscou
contribuir e qualificar o debate sobre o desenvolvimento e as consequências e
impactos socioambientais na paisagem urbana e municipal, tendo em vista aspectos
relacionados em especial à morfologia e ao sistema de espaços livres. Certamente
este foi um espaço de inúmeros conflitos e jogos de interesses ancorados por fortes
pressões dos setores do capital privado.
302
Esse trabalho procura analisar a qualidade desse movimento, tendo como fio
condutor o Sistema de Espaços Livres, (SELs), e sua relação com os agentes, públicos
e privados, na produção da forma urbana. Para compor, num primeiro momento,
esse quadro de análise crítica da cidade de São Carlos busca-se conhecer suas
características físicas e processos históricos e, a partir das interações, conflitos ou
convergências, entre a natureza física e a ocupação desse território construídas ao
longo do tempo, contextualizar e desvendar o desenvolvimento urbano aqui
recortado. Para tanto, alguns elementos-chave serviram de base para a investigação,
especialmente relacionados à gestão municipal e ao processo de Revisão do Plano
Diretor Municipal: 1. O Plano Diretor Municipal de 2005 (SÃO CARLOS, 2005); 2. O
documento produzido pelo Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de
São Paulo, IAU – USP, em parceria com técnicos da Prefeitura de São Carlos
(PMSC/FUSP, 2011 e 2012). 3. Os documentos produzidos pelo Núcleo Gestor
Compartilhado; 4. O Plano Diretor Municipal de 2016 (SÃO CARLOS, 2016).
2. Caracterização geral
Com altitudes médias variando entre 700 e 900 metros o Município tem seu território
localizado em um dos divisores de águas do Estado de São Paulo, sendo caracterizado
por importante rede hídrica. As qualidades físicas do território distinguem especiais
características de ocupação e revelam uma geografia que torna a paisagem desse
trecho do Estado uma experiência memorável. Importantes fragmentos de
303
preservação ambiental e áreas de turismo ecológico estão presentes na região, como
a Área de Proteção Ambiental Corumbataí, a Represa do Broa e Estações Ecológicas.
As formações vegetais encontram-se em área de transição entre o Cerrado paulista
e a Floresta Estacional Semidecidual. Nelas ocorrem diversas espécies de flora e
fauna ameaçadas de extinção, sendo que sua porção centro-sul foi classificada pelo
programa BIOTA/FAPESP como prioritária para a restauração e conservação de
biodiversidade no Estado de São Paulo (MMA, 2003).
Figura 02: Áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade, com destaque para a região de
São Carlos. MMA, 2003.
304
Figura 03: Bacias Hidrográficas do Município de São Carlos. PDMSC, 2005.
305
1970 2005
2017
Figuras 04, 05 e 06: Processo de ocupação da região sul da cidade de São Carlos em 1970, 2005 e
2017. Teia-casa de criação, 2002 e imagem Google Earth Pro, 2017.
306
Figuras 07 e 08: Padrões periféricos e transformações da paisagem: descontinuidade, vulnerabilidade
social e ambiental. Teia-casa de criação, 2002.
307
truncando a continuidade do traçado regular, contribuindo assim na conformação de
bairros com distintas ocupações.
308
O primeiro deles, a Sul, é um dos acessos à cidade, vindo pela Rodovia Washington
Luís numa situação de cumeeira: a Avenida Getúlio Vargas, que termina no que seria
uma das pontas da Avenida São Carlos. O segundo dos eixos, indo para Norte e numa
situação de vale, reúne a presença do Córrego do Gregório e suas marginais e a
sequência de praças históricas do desenho urbano original da cidade, que ainda
permanece como principal centralidade da cidade.
Figura 12: Em vermelho os principais eixos viários urbanos e periurbanos: 1. Rodovia Washington
Luiz (SP-310); 2. Rodovia Thales de Lorena Peixoto Júnior (SP-318) ; 3. Avenida São Carlos; 4. Linha
férrea; 5. Rodovia Luiz Augusto de Oliveira (SP-215) . Em amarelo os principais eixos estruturantes da
cidade de São Carlos: 1. Avenida São Carlos-Getúlio Vargas; 2. Córrego do Gregório; 3. Binário Rua
Carlos Botelho e Rua XV de Novembro; 4. Córrego Tijuco Preto; 5. Avenida Miguel Petroni.
Um nova centralidade distante da Avenida São Carlos que se consolidou nas últimas
décadas, e que estabelece uma ligação direta com o eixo do Córrego Tijuco Preto,
localiza-se em outro eixo viário composto pela Avenida Miguel Petroni que vem sendo
cada vez mais utilizada por fazer a única ligação com o principal vetor de expansão
noroeste da cidade, abrangendo o acesso a duas universidades (o do Campus 2 da
USP e a UNICEP), hipermercados, novos loteamentos e condomínios fechados.
Tendo em vista essa questão, por ocasião da feitura do Plano Diretor de 2005, PDMSC
2005, foi proposto um anel perimetral, que procurava realizar ligações sem passar
pelo centro. Esse anel foi construído parcialmente através de longas negociações,
uma vez que se articulava pelas marginais dos córregos da cidade. Trechos de sua
implantação foram inviabilizados pelo Ministério Público por ferirem a legislação
ambiental, sendo objeto de TACs, (Termo de Ajustamento de Conduta), que
resultaram em trocas de grande interesse para a cidade com projetos de parques e
a implantação de um deles, o Parque do Kartódromo.
310
Figura 13: Expansão Urbana e Áreas de Preservação. SÃO CARLOS, 2002.
Ainda o que se pode observar, a respeito dessa forma urbana que hoje se espraia e
expressa a ausência de um planejamento engajado às questões ambientais presentes
na urbanística contemporânea diz respeito à relação adensamento e morfologia.
312
Figura 14: Expansão da Área Urbana de São Carlos. TÃO, 2017.
313
O crescimento urbano a partir do traçado primeiro também parece ter seguido a
lógica de expansão da maior parte dos municípios brasileiros: glebas de terra postas
a parcelamento quando da proximidade com a cidade; trechos de terra deixados no
meio do caminho à espera de valorização para entrada no jogo urbano em melhores
condições de valor, (ROLNIK, 2003). As cidades sendo construídas pela decisão de
parcela da população, notadamente aquela que possui o poder e as terras,
(MARICATO,2000).
Porém, os fatos testemunham que outros problemas surgem no período das chuvas:
desastres, enchentes e alagamentos. A ação que resolvia os problemas de
mobilidade, criava outros relacionados às enchentes e drenagem. Essa realidade
mostra aos cidadãos que as águas ainda permanecem na cidade e que os modelos
adotados precisam ser revistos.
316
Figuras 18, 19, 20 e 21: Enchentes na área central em diferentes anos em São Carlos,
Fundação Pró Memória.
O que se pode observar em relação aos espaços livres em geral, que não os ligados
aos Córregos, protegidos pela legislação de Proteção Ambiental na cidade de São
Carlos é a constatação daquilo que é comum a muitas cidades brasileiras submetidas
ao processo de desenvolvimento em curso há décadas no País: a norma federal, (Lei
Federal no 6.766/1979), versa sobre a quantidade de espaços que devem ser
destinados a determinados usos.
Parece ser estratégico que a quantidade imposta pela Lei, seja desdobrada em
qualidade a partir de diretrizes específicas aos diferentes territórios urbanos:
diretrizes inclusive para que a disposição desses espaços na cidade possa receber um
olhar que os articule como um sistema. Desse modo as questões técnicas de
mitigação dos problemas poderia receber tratamento de maior fôlego, articulando
espaços e constituindo uma rede de lugares que operassem nas duas dimensões que
fundamentam o campo disciplinar da paisagem: infraestrutural e de convívio social,
fruição e contemplação.
317
O Plano Diretor aprovado em 2005 pretendia, a partir de seu discurso, inaugurar
novos modelos para os espaços livres na cidade: em termos de gestão pública
municipal houve a proposta da criação de um sistema de espaços verdes e
revalorização das águas urbanas, fazendo uso do instrumento relacionado às Áreas
de Especial Interesse Ambiental.
Essa perspectiva que pretendia instalar novos espaços verdes qualificados na cidade
procurava atenuar o impacto causado pela ocupação de fundos de vale com Avenidas.
Associados aos espaços verdejados estariam lugares de recreação e descanso, os
parques mencionados anteriormente, numa clara intenção de aliar lazer e
preservação. Contudo a efetividade dessa ação deveria contar com a manutenção
das ações implantadas e a construção dos projetos contratados, o que não se
consolidou.
Ruas e Avenidas compõe um sistema de espaços livres com foco no transporte viário
expressando o acompanhamento da lógica nacional de ampliação do uso de carros.
Esse uso estrutura a cidade, mas suas potencialidades ainda não estão plenamente
exploradas, especialmente em termos ambientais e socioculturais. Suas condições
de impermeabilização e arborização urbana, que vem ao longo dos anos sendo
suprimida, podem ser alteradas e associadas à rede de reservas ligadas aos Córregos
da cidade de modo a constituir um Sistema de Espaços Livres de maior complexidade
ambiental.
318
Figura 22: Avenida São Carlos. Oficina QUAPÁ, 2014.
O decreto cria a ideia, mas não instala os lugares, a exceção dos dois já existentes.
Há todo um trabalho de leitura das áreas e articulação, associada à investigação de
outras áreas necessárias para a consolidação do sistema que demandam intensa
pesquisa, especialmente no que diz respeito à programação dos lugares, a partir de
319
aptidões e demandas. Como desdobramentos desta iniciativa, foi criado o Grupo de
Trabalho de Planejamento dos Parques Urbanos, coletivo de voluntários ligados às
Universidades e instituições que procurará, sobretudo, elaborar uma proposta de
Sistema de Espaços Livres para São Carlos.
Municípios/
De 100.001
número de 35 57 83 124 162 193 245
a 500.000
população
Número de
municípios 1889 2766 3952 3991 4491 5507 5565
no Brasil
320
A participação do Estado de São Paulo no total da população nacional vem se
mantendo em torno de 21%, manutenção deste patamar associa a queda no ritmo de
crescimento na metrópole, ao aumento do crescimento nas cidades do interior, em
especial as com população entre cem e quinhentos mil habitantes.
O SENAI viria para São Carlos em 1951; a Universidade Federal de São Carlos seria
fundada em 1967, e o primeiro Parque Industrial da cidade data de 1972. Esse
desenvolvimento seria ampliado através do Plano Nacional de Cidades Médias de
1976, que fomentou a criação de uma rede de infraestruturas que procuraria
alicerçar e conduzir esse processo; o fomento incluía então, a ampliação e melhoria
da malha rodoviária; em nível urbano a disponibilização de verbas para a construção
de indústrias, pavimentação de ruas e criação de escolas técnicas.
321
pesquisa em energia limpa, pavilhão de exposições, centro de convenções e áreas
para cultivos experimentais destinados a testes de equipamentos e máquinas
agrícolas. Em 2008, o poder público participa da criação do São Carlos Science Park,
às margens da Rodovia Washington Luís.
322
opinião pública do município que procuraram exigir mecanismos necessários para os
poderes públicos intervirem nas atividades imobiliárias (ABREU, 2000).
Contudo isso não se dá forma linear, como não existia nenhum impedimento legal e
instrumento de controle até 1970, os loteamentos realizados próximos aos limites da
área urbana tornaram-se cada vez mais comuns, (LIMA, 2008). A omissão do agente
público através da não distinção de órgão competente para aprovação participou
ativamente na construção da forma urbana de modo vicioso.
Figura 23: Vista aérea da região central para o Sul da cidade de São Carlos. Oficina QUAPÁ, 2014.
323
O Plano Diretor Municipal, PDMSC, aprovado em 2005, apresentou estratégias e
instrumentos urbanísticos que procuravam valorizar as funções sociais da cidade e
da propriedade, bem como a promoção de um modelo de ocupação do solo que
considerasse aspectos ambientais no planejamento urbano.
Uma ação que pode ser relacionada à qualidade urbanística pretendida, uma vez que
implicava na gestão da terra urbana através de índices e análise do tipo de ocupação,
bem como na sua destinação social, foi aquela, relacionada ao incentivo à ocupação
de vazios urbanos e contenção do espraiamento territorial (instrumento
urbanístico outorga de alteração de uso do solo).
Outras duas ações podem ser ressaltadas, e que desempenharam importante papel
nas características ambientais do município: a primeira delas diz respeito à
contenção da ocupação de chácaras de recreios, cuja realidade demonstrava ser
potencialmente capaz de gerar novos bairros, afastados da malha urbana original. A
segunda delas procurava constranger a permissividade na lógica de implantação de
condomínios fechados, que até finais da década de 1990 eram poucos, mas que a
partir de 2000 tornam-se modelo de ocupação de grande procura.
325
Figura 24: Vista aérea da região Sul da cidade de São Carlos. PMCMV, faixa 1, conjuntos Abdelnur e
Zavaglia. Imagem trabalhada por Renan Santos Gomez a partir do Google Earth, 2017.
326
A percepção de que o Programa Minha Casa Minha Vida incorpora a lógica mercantil
à produção de Habitação Social inaugura um período de crítica às possíveis soluções
para o problema do seu planejamento e construção em nosso País: o Estado, e toda
uma ordem de razões, escolhe financiar e facilitar a atuação e fortalecimento de
incorporadores e construtores privados. A vinculação entre o Programa Minha Casa
Minha Vida e grandes empresas de âmbito nacional, a produção regional do programa
que engloba o território que vai das cidades de Ribeirão Preto a São Carlos revela o
protagonismo dos agentes públicos federais no planejamento, construção e expansão
da cidade; de fato, a vinculação das ações entre o governo e o Capital.
Figura 25: Espaços livres, PMCMV, faixa 1, região Sul da cidade de São Carlos.
Luciano Bernardino da Costa, 2017.
327
Em relação ao Sistema de Espaços Livres que vem sendo produzidos a partir desse
processo, alguns aspectos podem ser observados. As implantações realizadas na
periferia sul da cidade, constrói modelos bastante conhecidos da Habitação Social:
casas isoladas em pequenos lotes, ruas que se resumem ao leito carroçável. Aquilo
que aparece nos projetos como praça são espaços livres desqualificados a espera de
projeto ou construção. O principal fato geográfico desse território, em
descontinuidade com a cidade, desvela um vale vegetado de grande potencial
paisagístico, que remanesce à espera de um projeto de parque que reuniria, dada
sua escala, qualidades de conservação, desempenho infraestrutural e de recreação.
Uma das principais diretrizes do Plano Diretor de São Carlos, aprovado em 2005, foi
estabelecer uma cidade compacta que apresentava o adensamento com qualidade
urbana: essa estratégia se pautava em urbanística contemporânea e buscava
assegurar a proteção, a valorização e o uso adequado do meio ambiente natural e
construído e da paisagem urbana e rural. Passados dez anos dessa diretriz, uma
cidade menos espraiada e fragmentada territorialmente apareceria resultado da
aplicação de alguns instrumentos contidos no PD.
328
A análise realizada pelo documento de Revisão do Instituto de Arquitetura e
Urbanismo da USP – PMSC, (2012), demonstrou que, de fato, alguns processos de
ocupação mais pulverizados do território foram contidos e os vazios urbanos
começaram a ser ocupados por novos projetos de parcelamentos do solo
intraurbanos, evitando a dispersão da ocupação urbana.
Do conflito gerado por essa e outras ações à instalação por parte da Prefeitura do
Município do Núcleo Gestor Compartilhado (NGC), foram decorridos quase seis
meses, que comprometeram o cumprimento dos prazos previstos em lei. Desde esse
período, destaca-se a atuação do Ministério Público que contestou o processo
participativo proposto pela nova administração, assegurando o instalar de um Núcleo
Gestor Compartilhado (NGC) e a realização de um processo que congregaria diversas
representações da sociedade civil organizada.
330
construída coletivamente, o que gerou uma forte polarização dentro do Núcleo
Gestor. Após a realização de diversas reuniões, estabeleceu-se um pacto social
através de um processo de votação pública, no qual todos os representantes do
Núcleo elegeriam as propostas, estruturadas em quatro eixos estratégicos, que
seriam encaminhadas pelo executivo, como uma proposta coletiva de revisão do
Plano Diretor à Câmara Municipal de São Carlos.
331
Figuras 26, 27 e 28 - Localização de São Carlos e comparação entre as denominadas “zonas
urbanizáveis” dos Planos Diretores de 2005 e 2016 do município de São Carlos. PERIM, 2017.
332
Figura 29: Comparação das áreas relativas às “zonas urbanizáveis” do PD 2005 e 2016,
apontando um crescimento de 68,1%. PERIM, 2017.
Uma das questões fundantes que permeia todo o percurso que a cidade de São Carlos
viveu junto à Revisão do Plano Diretor é aquela que percebe nos limites entre o rural
e o urbano uma tensão que alimenta os processos de parcelamento. Fruto da
ausência de Políticas Públicas consistentes, a fragilidade dos pequenos proprietários
rurais termina por apresentar na solução do loteamento, a saída possível para a
condição de invasões, estagnação e impossibilidade de sustento.
333
Na fala dos incorporadores, proprietários de terra e mercado imobiliário, o
parcelamento periférico no setor sul garante a possibilidade de moradia para as
classes menos abastadas, uma vez que, argumentam, a terra ao norte e oeste está
nas mãos de poucos proprietários, o que gera especulação e aumento de preço. Além
disso, esses mesmos agentes alegam que a maior disponibilidade de terra urbanizável
nas bordas da mancha urbana existente tende a baixar os preços dos terrenos,
tornando a terra urbana mais acessível para a população de baixa renda.
A forma como vem sendo construído o espaço urbano em São Carlos, atrelado às
alianças entre os setores imobiliários e o poder público, sob o discurso da geração
de empregos e das oportunidades sociais, vem potencializando a segregação
socioespacial no território que foge ao conceito de justiça urbana e ambiental
preconizado pelo texto constitucional e pelo Estatuto da Cidade, (POLIS, 2002).
Esse é o momento que a cidade de São Carlos vive. A gestão eleita para o período de
2017 a 2020 têm em seus quadros parte dos proprietários de terra e incorporadores
que tiveram papel ativo durante a revisão.
5. CONCLUSÃO
334
conjunto de interesses internacionalizados que aprofundam a mercantilização da
cidade. É preciso repensar formas e estratégias, uma vez que os espaços de
participação foram esvaziados ao longo dos últimos anos.
Quando se explora a ideia dos potenciais agentes, públicos e privados, o que se tem
no horizonte é a produção social do espaço urbano, fato teoricamente consolidado a
partir de teóricos como Milton Santos, (1994; 1996) e David Harvey, (HARVEY, 2005),
e que relacionam mudança social, desenvolvimento econômico e urbanização. Os
desdobramentos dessas relações alcançam contemporaneamente complexidade
elevada, não apenas pelas alterações dos mecanismos estruturais do Capital, mas
também pela expressão que essas alterações têm na fisionomia dos territórios, em
suas paisagens, e, especialmente, na vida das populações.
335
ocorrências, e revelando a partir dessas formas concretas, camadas de informações
que se mostraram capazes de construir novos significados relevantes.
336
auxilia na qualidade de espacialização que o campo da Arquitetura e Urbanismo é
capaz de produzir: o horizonte é investigar e apresentar alternativas, de modo que
as ordens de razão se revelem e que as decisões sejam tomadas à luz dessas
alternativas.
As ações não estão dissociadas entre si, é justamente na construção desse processo
que se estabelece o desafio: a espacialização dos interesses e a defesa de um
desenvolvimento justo e equilibrado a partir dos Espaços Livres. Então, o modo de
planejar se coloca em primeiro plano, a proposição de planejar com a paisagem como
alternativa possível e sua dimensão política como pauta se apresentam como
contribuição fundamental.
6. Referências bibliográficas
337
LIMA R. P. Limites da legislação e o (des)controle da expansão urbana. São Carlos
(1857 – 1977). Edufscar, São Carlos, 2008.
MARICATO E. As ideias fora do lugar e o lugar fora das ideias. Planejamento urbano
no Brasil. In: A Cidade do Pensamento Único, desmanchando consensos. Vozes, São
Paulo, 2000.
338
SÃO CARLOS, Prefeitura Municipal de. Plano Diretor do Município de São Carlos. Lei
no 13.691 de 25 de novembro de 2005. São Carlos, 2005. 69p.
SÃO CARLOS, Prefeitura Municipal de. Plano Diretor do Município de São Carlos. Lei
no 18.053 de 19 de dezembro de 2016. São Carlos, Diário Oficial de São Carlos, 2016.
SOMEKH, N. & CAMPOS, C. M., (org). A cidade que não pode parar: planos
urbanísticos de São Paulo no século XX. Macpesquisa, São Paulo 2002.
339
DESDOBRAMENTOS DA PESQUISA QUAPÁ-SEL NA REGIÃO
METROPOLITANA DE SÃO PAULO
Espaços livres, apropriações e forma urbana na metrópole paulistana
Introdução
Caracterização geral
A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) (Figura 01, adiante) foi instituída por
lei federal de 1973, a partir de estratégia desenvolvimentista do governo militar,
que criou nove regiões metropolitanas brasileiras nesse período. É composta por
trinta e nove municípios divididos em sub-regiões, com o município de São Paulo,
principal metrópole nacional e uma das quatro maiores metrópoles do planeta,
integrando-a.
Figura 01: Região Metropolitana de São Paulo. Crédito/Fonte: Donoso (2017), a partir de mosaico de
imagens Google Earth (2016).
Com um Produto Interno Bruto (PIB) da ordem de 18% do PIB Brasileiro (EMPLASA,
2016), a RMSP abriga municípios com dinâmicas urbanas e econômicas variadas.
341
Enquanto isso, alguns municípios da RMSP têm economia predominantemente rural
ou mesmo se configuram como cidades-dormitório, com população que se desloca
diariamente para municípios vizinhos mais dinâmicos da própria RMSP. Como
representação da heterogeneidade demográfica da metrópole, dos trinta e nove
municípios da RMSP oito não chegam sequer a 50 mil habitantes, enquanto que
Guarulhos apresenta 1,3 milhões de habitantes (IBGE, 2016).
342
Retornando à RMSP, para os estudos do Lab QUAPÁ adota-se, por fins operacionais,
os estudos da metrópole observando a mancha urbana contínua, que envolve vinte
dos trinta e nove municípios da RMSP, de modo a observar principalmente a dinâmica
da principal aglomeração urbana e dos municípios que interagem fisicamente com a
capital.
343
A expansão urbana da RMSP se deu, sobretudo, ao longo do sentido Leste-Oeste, já
que as limitações físicas à Norte e Sul, com as Serras da Cantareira e do Mar,
respectivamente, limitam o processo de urbanização dos municípios, embora
também recebam impactos pela urbanização pouco adequada à sua paisagem.
344
Figura 02: Padrões morfólógicos. Fonte: Lab QUAPÁ, FAUUSP, 2016.
345
Também é possível observar concentração de edifícios em Guaianases, na zona leste
de São Paulo, correspondentes a conjuntos habitacionais populares e sociais.
São cerca de 200 parques de diferentes escalas na RMSP, mais de 90% deles
municipais, sendo muitos deles subaproveitados. Apesar do número expressivo, não
é possível falar em sistema de parques da metrópole, já que não há um planejamento
metropolitano para os espaços livres públicos.
Na capital estão 125 dos parques da metrópole1, enquanto que Mogi das Cruzes tem
apenas 3. A maioria desses parques foi criada a partir dos anos 1990, momento em
que as questões ambientais se faziam mais presentes nas discussões políticas, que
culminaram com legislação e agenda ambiental específica. Também nesse período
aumentou a demanda por espaços para atividades físicas e cultivo de um modo de
vida mais “saudável”.
Esse número de parques não é a porcentagem mais representativa dos espaços livres
da metrópole, e o maior porcentual de espaços livres de acesso público, nas cidades
brasileiras, é destinado ao sistema viário. Em São Paulo, apesar de grandes áreas de
conservação ambiental nos extremos do município, é no espaço de circulação que
está o maior percentual de espaços livres efetivamente. Os espaços livres públicos
somam 27,4% do território do Município de São Paulo, mas quase metade deste
percentual é destinado ao sistema viário (segundo levantamento realizado no Lab
QUAPÁ – FAUUSP). Tomando a área de todos os espaços livres de acesso público da
capital paulista, aí somados os cemitérios jardins, sejam de propriedade pública ou
privada (dado que sua acessibilidade ao público é bastante similar), o município
1 Dos 125 parques da capital paulista cem são municipais e os demais estaduais. Há controvérsias sobre o
número real de parques municipais, dado que algumas áreas são oficialmente assim denominadas, mas não
efetivamente implantadas. Cf. SAKATA (2018) e CASIMIRO (2018).
346
possui 41.695 ha de espaços livres de acesso público, distribuídos da seguinte
maneira:
347
Figura 03: Manifestação em apoio à presidente Dilma na Avenida Paulista,
São Paulo. Foto: Queiroga, 2016.
As áreas de praças, na cidade de São Paulo, são menos expressivas até que a área
total dos canteiros e rotatórias, possuem cerca da metade da área dos canteiros e
rotatórias, espaços que, via de regra, são utilizados apenas para orientar o tráfego
veicular, em que pese algumas rotatórias terem também importante papel como
referência urbana.
348
As praças paulistanas, em sua grande maioria possuem projetos e manutenção
bastante modestos, regra que se verifica também nos demais municípios da RMSP.
Encontram-se razoavelmente distribuídas pelas 32 subprefeituras da capital, ainda
que internamente a elas, nos seus 96 distritos, observe-se maior heterogeneidade na
presença ou ausência de praças. Fato este que se agrava diante da enorme
desigualdade socioespacial do município. As praças mais importantes da cidade são,
ao menos, centenárias, reafirmando sua importância simbólica e de uso para a
cidade, são objeto de novos projetos com grande recorrência, sobretudo devido o
alto grau de visibilidade que possuem como “obra pública”. Algumas poucas praças
em bairros nobres mais recentes (anos 1970 em diante, tais como a Praça Vinicius de
Moraes no Morumbi) são mais bem tratadas que suas congêneres dos bairros de
padrão médio, mas não se constituem em regra.
349
e pátios arborizados são exíguos, e subentende-se que há um excesso de
impermeabilização do solo urbano, inclusive na escala do lote, com pátios e quintais
pouco permeáveis. Tal limitação ocorre mesmo em bairros que concentram renda
mais elevada, ou lotes de maior dimensão para habitação, com quadras muitas vezes
ultrapassando os 50% de ocupação do lote.
350
Figura 04: Arborização intraquadra. Fonte: Lab QUAPÁ, FAUUSP, 2016.
351
O papel concreto dos agentes de produção dos espaços livres e edificados
Grande parte das mudanças na forma e produção das cidades se deve à ação do
Estado, a incentivos, como subsídios, e também normas e legislações específicas que
direcionam a produção dos espaços urbanos. Ao lado, está a ação e influência dos
agentes privados, como grandes corporações. Conjuntamente, Estado e iniciativa
privada atuam no processo de criação de novas formas urbanas e em grandes projetos
urbanos, como revitalizações, mudanças nos transportes, operações urbanas, e
outros.
• o Plano Diretor do Município de São Paulo de 2002 que conseguiu induzir, junto
com o zoneamento urbano de 2005, ao adensamento de áreas centrais e do
anel intermediário da capital;
• os financiamentos habitacionais, retomados principalmente entre os anos de
2006 e 2007; a capitalização de grandes incorporadoras, com abertura de
capital em bolsa de valores entre 2005 e 2007;
• o Programa Minha Casa Minha Vida e o novo marco regulatório do Sistema de
Financiamento Habitacional, com maior presença em municípios periféricos
da RMSP do que na cidade de São Paulo;
352
• A crescente valorização e aplicação da legislação ambiental desde a década
de 1990.
O boom imobiliário dos anos seguintes foi contido, com a tentativa de adensamento
de regiões e antigas zonas industriais, mas com um estoque de área construída que
se esgotou rapidamente, e também com operações urbanas regulamentadas em
áreas industriais, que limitaram o adensamento. Parte desse adensamento foi,
então, direcionado à periferia e às cidades do entorno imediato da capital, com uma
grande expansão de empreendimentos verticais, como condomínios clubes, em
terrenos com espaços livres murados e controlados.
Ao Plano Diretor de 2002 seguiu-se uma revisão iniciada em 2013, onde se procurou,
entre outras ações, conter o crescimento periférico e diminuir a mobilidade pendular
da periferia para os empregos centrais, através da geração de mais polos de
empregos e moradia próximos ao sistema de transporte estrutural. Também se
propôs concentrar o adensamento no entorno dos principais corredores de transporte
coletivo e em antigas áreas industriais.
353
Produção dos espaços livres e edificados e impactos da legislação
Faz-se relevante, para este artigo, ressaltar a participação do Lab QUAPÁ durante a
Revisão do PDE. O QUAPÁ teve a oportunidade de participar em algumas das
audiências públicas, apresentando algumas propostas de alteração para
aperfeiçoamento do Plano, que foram em parte consideradas. As propostas se
baseavam nos conceitos e leituras do SEL, propondo, entre outros aspectos: aumento
dos espaços livres de fruição pública e correlacionando-os ao aumento de densidades
demográficas e construtivas; maior controle da forma urbana em empreendimentos
de grande porte, garantindo uma urbanidade mais adequada entre os espaços de
propriedade privada (controlados) e os de propriedade e uso público.
354
O SEL da RMSP em síntese
O sistema viário é o subsistema do SEL mais significativo, tanto por sua coesão quanto
pela área que ocupa. Entretanto, pedestres e ciclistas tem, ainda, menos espaço que
automóveis e caminhões em todo o sistema viário.
Agradecimentos
355
de Doutorado concedida à autora e ao CNPq pela Bolsa de Produtividade em Pesquisa
concedida ao autor. Agradece-se também aos colegas do Lab QUAPÁ da FAUUSP pelas
interlocuções acadêmicas e trabalho de sistematização e cartografia de dados.
Referências
JACOBI, Pedro. O futuro do meio ambiente urbano. In: CAMPOS, Candido Malta;
GAMA, Lúcia Helena; SACCHETTA, Vladimir (Org.) São Paulo, Metrópole em trânsito:
Percursos urbanos e culturais. São Paulo: Editora Senac, São Paulo, 2004, p. 204-211.
SAKATA, Francine. Parques urbanos no Brasil: 2000 a 2017. 2018. Tese (Doutorado
em Arquitetura e Urbanismo), Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade
de São Paulo, São Paulo.
356
O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES NA CONSTITUIÇÃO DA FORMA
URBANA DA REGIÃO DE VITÓRIA, ES
Introdução
357
A região é marcada, historicamente, por uma variedade de padrões de expansão
de sua área de ocupação, devido aos distintos momentos em que tais ações
ocorreram. Consequência disso, a região apresenta forma urbana diversificada,
resultado das várias camadas de sua história urbana, iniciada, para efeito da
pesquisa, no século XVI, com a colonização portuguesa. A área de estudo
apresenta também, como característica, extensas áreas de espaços livres,
constituídos principalmente pelas áreas protegidas de relevo acentuado e faixas
de praia, sendo elementos marcantes na paisagem, além de representarem
importantes elementos constituinte da forma urbana. Nota-se, no entanto, que
estes espaços livres naturais, embora protegidos, vêm sofrendo risco de
ocupação urbana, pela característica do processo de urbanização em curso.
Caracterização geral
A inserção da cidade no território
358
comercial e de serviço, nota-se especialmente o polo de confecções do bairro
da Glória. Em Cariacica, registram-se as atividades comerciais do bairro de
Campo Grande e em suas proximidades o CEASA; enquanto na Serra, além do
centro administrativo na sede municipal, sobressaem a polarização de comércio
e serviço no bairro de Laranjeiras. A localização destas centralidades no
território metropolitano e a crescente dinamização das mesmas, contribuíram
ao longo do tempo para neutralizar o caráter hegemônico mantido pelo Centro
histórico até algumas décadas atrás e para propiciar melhor atendimento à
população residente distante deste Centro, na Região Metropolitana que se
configurou (MENDONÇA, 2005).
No que diz respeito à paisagem urbana, nota-se que Vitória é composta tanto
por parte insular quanto continental, além de agregar diversas ilhas menores
em seu entorno. A capital conta, também, com ilhas oceânicas, o arquipélago
de Trindade e Martim Vaz, que embora não participem da dinâmica urbana,
pertencem à delimitação político-administrativa municipal (VITÓRIA,2018a).
A ilha de Vitória apresenta relevo montanhoso (Figura 2), com destaque para o
Maciço Central e a Pedra dos Olhos; a área continental do município com o
predomínio de áreas planas, conta com praias a leste e sudeste e manguezal a
norte e noroeste. Este extenso manguezal abrange ainda, o norte da ilha, e os
municípios vizinhos de Cariacica e Serra, constituindo-se a Estação Ecológica
Ilha do Lameirão. (VITORIA, 2018b)
Figura 2: Vitória vista do Morro do Moreno, em Vila Velha. Fonte: Giovani Goltara, 2017.
359
Vitória e os municípios vizinhos conurbados contam então, com extensa área
litorânea e grande quantidade de maciços rochosos florestados, resultando em
diversas áreas de equilíbrio ambiental.
Cabe assinalar que até o final do século XIX, a ocupação da cidade se adequava,
de modo geral, aos limites naturais impostos pelo sítio, constituídos pelo Maciço
Central, as áreas alagadiças e o mar (KLUG, 2009). Com o tempo, tais limites
foram se flexibilizando e a expansão urbana aconteceu, portanto, por meio de
extensos aterros, como os do Centro de Vitória e da Enseada do Suá, entre
outros (FREITAS, 2004), e também, pela ocupação de áreas de manguezal, como
São Pedro em Vitória e Aribiri em Vila Velha, e de relevo acentuado, em muitos
casos, classificadas como de preservação ambiental, como o morro do Forte de
São João, em Vitória e o Morro do Moreno, em Vila Velha.
360
Também se apresentam verticalizadas e com elevada densidade de
construções, as centralidades antes comentadas, especialmente os Centros de
Vitória, Enseada do Suá e Praia do Canto, de Vila Velha e Campo Grande, em
Cariacica. A verticalização de construções vem se tornando um marco de outra
centralidade, como Laranjeiras, na Serra, mesmo que de modo menos
adensado.
Com base nos estudos realizados e tendo como principal referência Carneiro e
Mesquita (2000), os espaços livres da área em questão podem ser classificados
em três categorias: Espaços Livres de Equilíbrio Ambiental; Espaços Livres
Públicos de Práticas Sociais e Espaços Livres Potenciais (MENDONÇA et al., 2012)
(Figura 3).
361
Constituem os Espaços Livres de Equilíbrio Ambiental, as Unidades de Conservação,
como o Morro do Moreno (Figura 4, detalhe b), em Vila Velha e a reserva florestal de
Duas Bocas (Figura 4, detalhe a), em Cariacica, além de campi universitários, cemitérios
e espaços de valor paisagístico-ambiental. Mesmo considerando que tais áreas
devessem ter seus recursos naturais preservados, algumas delas vêm recebendo forte
pressão imobiliária, contribuindo para a perda do patrimônio paisagístico, bem como da
identidade local (MENDONÇA et al., 2012).
362
Figura 5: Convento da Penha. Fonte: Prefeitura Municipal de Vila Velha.
363
Os terrenos vazios, espaços livres associados a equipamentos de grande porte,
recantos e espaços de transição constituem a categoria dos Espaços Livres
Potenciais (MENDONÇA et al., 2012). Foram incluídos nessa categoria, entre
outros, dois grandes espaços livres privados. É o caso dos antigos parques
temáticos Yahoo Family Park, na Serra, e o Parque das Águas, em Vila Velha.
Atualmente estes espaços se encontram abandonados e de portas fechadas,
resultando, portanto, em áreas que guardam grande potencial para serem
integrados ao sistema de espaços livres de práticas sociais da região, podendo
também, por outro lado, receber algum tipo de empreendimento imobiliário.
Existem ainda, nesta categoria, extensos espaços livres, remanescentes da
implantação de grandes equipamentos industriais, que guardam importante
potencial, a depender do tratamento e do uso que venham receber, diante da
possibilidade de se integrarem de forma contínua ao sistema de espaços livres
da região (MENDONÇA, 2014).
364
Ainda assim, mesmo que de forma pontual e fragmentada, e portanto,
insatisfatória, é possível constatar, na legislação dos municípios da área de
estudo, alguma preocupação com a preservação das articulações paisagísticas
na Grande Vitória.
Figura 7: Av. Nossa Senhora da Penha, em Vitória, planejada visando a manutenção do visual
para o Convento da Penha. Fonte: Prefeitura Municipal de Vitória, s/d.
Deste modo, cabe dar destaque ao Plano Diretor Urbano (PDU) de Vitória,
instituído em 2006 pela Lei 6.705, ao apresentar, como um de seus objetivos,
a garantia de visibilidade para o Morro e Convento de Nossa Senhora da Penha
(Figuras 5 e 7) localizado em Vila Velha. Para tanto, o plano define modelos
urbanísticos específicos para a área considerada comprometida com esta
visibilidade, atingindo especialmente parte do bairro Enseada do Suá (VITÓRIA,
2006). O PDU prevê também, que as edificações a serem construídas em
determinadas zonas urbanas tenham seus projetos arquitetônicos submetidos
ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN-ES), para
análise e anuência‘’[...] quanto à sua volumetria e altura da edificação.’’
(VITÓRIA, 2006, p. 85). Dessa forma, a Enseada do Suá vem recebendo tanto
transformações de grande escala com edifícios de altura elevada, como
também, limitação do gabarito de edificações em parte do bairro, para alcançar
volumetria compatível à manutenção das articulações paisagísticas
mencionadas. A Figura 8 permite observar uma das edificações construídas com
o propósito de manter a visibidade do referido Convento, demonstrando o
mérito deste plano, mesmo que deixe de tratar de outras articulações
paisagísticas também relevantes.
365
Figura 8: Exemplo de edifício com volumetria de modo a manter articulações paisagísticas e
destaque para as edificações de baixa altura no limite do mar. Fonte: Skyscrapercity.
366
Figura 9: Zoneamento de Vitória proposto pelo Plano Diretor Urbano de 2006. Fonte:
Prefeitura Municipal de Vitória, 2006.
367
de Jacaraípe, ainda que não concluídas, “caracterizadas como redes viárias de
trânsito rápido, que conectam loteamentos imobiliários, shoppings e
empreendimentos logísticos. Identificou-se que na maioria dos casos, essas vias
percorrem terrenos estratégicos, grandes propriedades, contribuindo para
ampliar o valor da terra de latifundiários, figura presente na Grande Vitória”
(MENDONÇA et al., 2013, p. 22), com destaque para os municípios de Serra e
Vila Velha, onde a posse de grande parte das terras concentra-se sob o poder
de poucos, que detêm o domínio do território e exercem forte influência sobre
as decisões que recaem sobre uso e ocupação do solo.
368
localização relativamente próxima aos condomínios residenciais,
acompanhando lógica do mercado imobiliário de valorização da terra. Esta
lógica, entre outros aspectos, contribui para afastar continuamente os grupos
sociais mais pobres para as franjas urbanas, para as áreas ambientalmente
frágeis, e sem infraestrutura.
Figura 10: Alphaville Jacuhy, Serra (ES). Fonte: Google Earth, 2018.
369
Empresas de grande porte e parques industriais concentram-se ao norte de
Vitória e no município de Serra, “com destaque para a Vale (antiga Companhia
Vale do Rio Doce) e a Arcelor Mittal (antiga Companhia Siderúrgica de Tubarão
e antiga Belgo Mineira), fortemente atuantes na produção e na configuração
espacial da Grande Vitória, uma vez que necessitam de extensas áreas para
exercer suas atividades” (MENDONÇA et al., 2012, p. 23). Além disso, estas
empresas ocupam extensa dimensão contígua do território, e apesar de
representarem significativa parte da riqueza e de empregos da Grande Vitória,
são responsáveis também, por sérios danos ambientais, motivos de diversas
ações de órgãos fiscalizadores e de pressão popular, mas ainda, sem resultado
plenamente efetivo.
Moudon (1997), entre outros autores, afirma que a forma urbana é definida por
elementos físicos fundamentais: as construções e os espaços livres
remanescentes destas, as vias e os lotes e quarteirões. Ruas e, de modo geral,
todos os espaços livres de edificação, como lotes vazios e outros espaços
remanescentes de quadras, são considerados espaços livres, como definido por
Magnoli (1982). Dessa forma, é possível considerar os elementos constituintes
da forma urbana como uma conjunção entre espaços edificados e espaços
livres. O sistema de espaços livres, portanto, é importante fator na constituição
dos padrões morfológicos das cidades. Ainda segundo Moudon (1997), a forma
urbana só pode ser compreendida se analisada historicamente, já que seus
elementos constituintes estão em constante transformação e substituição.
370
Observa-se, na área objeto de estudo, que os espaços livres, além de
constituírem padrões morfológicos distintos, denunciam, e refletem, por
exemplo, a diversidade de períodos de ocupação da cidade.
Figura 11: Cheios e vazios do Centro de Vitória. Fonte: VALFRÉ e MENDONÇA, 2017.
371
do que no Centro. Tratam-se de bairros residenciais unifamiliares projetados,
com edificações e lotes amplos, mantendo amplas áreas livres, destinados à
população de alta renda e com previsão de espaços livres públicos de práticas
sociais.
372
diversos padrões e a expansão de outros, como os condomínios fechados. Nota-
se também, como comentado a partir de determinados exemplos, que relações
entre padrões morfológicos e espaços livres são diversificadas, do mesmo modo
como podem ser caracterizadas como de elevada e de baixa qualidade estética.
Neste sentido, deve-se observar que grande parte do conteúdo do quadro indica
características negativas. Isso porque são comuns a insuficiência de parques,
praças, além de falta de tratamento adequado, quanto aos projetos,
equipamentos e manutenção, em bairros de população de menor renda,
especialmente fora de Vitória.
Figura 12: Mapeamento dos padrões tipológicos da Grande Vitória. Fonte: Digitalizado por
Rossi, 2016, a partir de mapeamento realizado na 4ª Oficina Vitória (MENDONÇA et al., 2013).
373
Quadro 1, Parte 1: Padrões morfológicos da Grande Vitória. Fonte: ROSSI, 2016.
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Quadro 1, Parte 3: Padrões morfológicos da Grande Vitória. Fonte: ROSSI, 2016.
Considerações Finais
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detém o controle da posse da terra, configurando-a sempre de modo mais
rentável. Esta ocupação se revela sobre o formato de extensos condomínios
para alta renda ou para média e baixa renda em programa habitacional,
desarticulados do sistema de vias e distantes de serviços. Como parte desta
ação imobiliária, houve aumento do número de shopping centers. A
verticalização de edificações em determinados bairros da orla intensificou-se e
estendeu-se, realçando esta característica de cidades litorâneas. Por outro
lado, mantêm-se a localização periférica da população mais pobre, que também
ocupa morros e manguezais em áreas mais centrais.
Referências
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FREITAS, José Francisco Bernardino. Aterros e decisões políticas no município
de Vitória: efeito cascata. In: Anais do Seminário de história da cidade e do
Urbanismo. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2004. CD-ROM. p. 1-17.
377
OFICINA VITÓRIA. Os sistemas de espaços livres urbanos na constituição da
forma urbana contemporânea no Brasil: o caso de Vitória. Lab QUAPÁ da
FAUUSP e coordenação local do Núcleo de Estudos de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória: UFES, 2013.
378