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FINCLASS
ed. especial João
JoãoLuiz
LuizBraga
Braga e-B/01
e-B/01
2
ed. especial João Luiz Braga e-B/01
e-B/01
CAPÍTULO I

João Luiz Braga


O caminho até o
diferencial competitivo

ed. especial

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e-B/01
TIMELINE

1994 Com 14 anos de idade, vivendo em Goiânia,


foi escolhido para ser beta tester da internet no
Brasil por meio da Embratel.

Lembro-me que eram 500 vagas para


trinta e cinco mil inscritos. E com 14
anos de idade, fui um dos escolhidos.

João Luiz Braga


1997 Aprovado em engenharia elétrica
na Escola Politécnica da USP.
Mudança para São Paulo.

Eu sempre quis ser engenheiro,


tinha esse sonho.

2003 Ingresso em emprego no back


office do Banco Garantia.

Foi quando descobri que a engenharia é a


arte de RESOLVER PROBLEMAS.
ed. especial

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e-B/01
2004 Início como Analista de Bolsa na Hedging-Griffo, no
time de Luis Stuhlberger, em momento de incertezas
e desconfiança no mercado com a posse
do Presidente Lula.

Pouca gente fazia Bolsa no Brasil.


Costumo brincar que sou filhote da
"Carta aos Brasileiros".

João Luiz Braga


2006 Torna-se sócio da Hedging-Griffo.

Eu sou muito grato e muito


feliz por fazer Bolsa.

2009 Começo de carreira como gestor, ainda


na Hedging-Griffo.
ed. especial

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e-B/01
2015 Entra na XP Investimentos como gestor
de fundo de ações.

Quando comecei [na XP], todo mundo se


conhecia, as áreas eram pequenas, todo
mundo construindo e me apaixonei pela
empresa. Porque era um caso de pessoas
muito jovens querendo construir,
batalhar, fazer junto.

João Luiz Braga


2019 Atinge a gestão de 7 bilhões de reais
nos fundos geridos na XP.

2020 Decide criar sua própria gestora de investimentos: a


Encore Asset Management.
ed. especial

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e-B/01
“Depois de todos esses eventos muito legais, tomei uma de-
cisão de realizar um sonho com 40 anos de idade. Com um
pouco mais de experiência, um pouquinho de cabelo bran-
co, resolvi construir a própria asset, com a cabeça voltada
para princípios, que acreditamos muito, como por exem-
plo, a preocupação com os vieses cognitivos para criar
uma vantagem competitiva, com uma análise quantitativa
bem forte, capacidade de banco de dados computacional;
tudo para ajudar os analistas e com muita gente olhando
para poucas empresas e assim conseguindo fazer uma aná-
lise bem profunda”.

João Luiz Braga


Meu nome é João Luiz Braga e vou te mostrar
vantagens competitivas, ensinando vieses
para que você não se torne seu próprio inimigo
no mercado. Essa é a minha Finclass.

“Pessoas são diferentes em relação aos vieses. Tem gente


que naturalmente lida bem com um viés, com o qual você
lida mal. Tem gente que é loiro, tem gente que é moreno;
tem gente com olhos claros, gente com olhos escuros. Tem
gente que tem facilidade de mudar de opinião e tem gente
ed. especial

que não muda nunca”.

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e-B/01
CAPÍTULO II

João Luiz Braga


Pensando além
dos demais

ed. especial

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e-B/01
RACIONALIDADES E
VIESES PLURAIS

Até bem recentemente a academia econômica, era muito


voltada ao fato de que o ser humano tomava decisões ra-
cionais; no gráfico de oferta e demanda, o preço era exata-
mente o cruzamento das duas linhas. Desde, especialmen-
te, Daniel Kahneman1, behaviorista2 que ganhou um Prêmio
Nobel, a academia se abriu ao fato de que o ser humano é
previsivelmente irracional.

João Luiz Braga


Ele toma decisões não necessariamente ótimas,
porque o cérebro aponta para que essa a¢ão seja
tomada.

1 Daniel Kahneman - professor emérito de psicologia da Universidade de


Princeton e professor emérito de psicologia e relações públicas da Woodrow
Wilson School of Public and International Affairs de Princeton, vencedor do
ed. especial

Prêmio Nobel da Economia em 2002. É autor de Rápido e Devagar: duas formas


de pensar, publicado pela Companhia das Letras.

2 Behaviorista - abordagem voltada à análise do comportamento. Corresponde


a uma tradição que veio da psicologia e que gerou desdobramentos em diversos
campos do conhecimento.

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e-B/01
Por quê? Como?

Temos duas formas de pen-


sar, dois raciocínios.

Um raciocínio mais curto-


prazista (curto prazo), mais
intuitivo; e um raciocínio
que se detém para pensar,
por exemplo: quanto é 43 ve-
zes 36? É difícil fazer conta Só de olhar para alguém na

João Luiz Braga


com intuição. Então, pro- sua frente, pode responder
vavelmente, você vai ligar o se está feliz ou brava? Não
seu sistema 2, o sistema len- precisa parar para pensar, o
to, e fazer a conta, e pensar, sistema 1 respondeu. Se a
e tomar uma decisão ou tirar pessoa estiver sorrindo, vai
uma conclusão. achar que está feliz.

É difícil fazer
conta com in-
tui¢ão.

Existem várias explica¢ões de porque o


nosso cérebro cai nesses vieses, que são
ed. especial

completamente darwinistas.

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e-B/01
Os vieses trouxeram a gente até aqui, somos quem somos
porque os vieses permitiram. Quando estávamos na floresta,
há centenas de milhares de anos e ouvíamos um barulho
nas árvores, já saíamos correndo. 0,1% das vezes o barulho
poderia ser uma onça, poderia ser algum perigo e ter o viés
de fugir em 0,1% salvou a nossa vida.

O viés de hindsight bias, faz com que o cérebro traia você,


mesmo que pense uma coisa que não era o que você acha-
va antes. Por que isso é estranho? Porque o cérebro faz você
realmente acreditar, você não é uma pessoa mentirosa, você
vai realmente acreditar que pensava daquela maneira, por-
que o cérebro alivia a sua barra.

João Luiz Braga


O cérebro fala "cara, calma, você pensava assim
mesmo, você é um cara legal, um cara bom".

Você é
um cara legal!

ed. especial

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e-B/01
E aí você não vai entrar em constante depressão, vai viver
bem. “Efeito manada”, como no exemplo do barulho na árvo-
re, se vir o pessoal correndo, vai correr sem saber o porquê.
Talvez isso salve a sua vida. Então, é melhor correr junto.

João Luiz Braga


Todos os vieses têm uma causa que remonta a
quem fomos há muito tempo.

O cérebro ali-
via a sua barra. ed. especial

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e-B/01
O CONCURSO DE
BELEZA: A TEORIA

Existe uma experiência muito famosa, que vários estudiosos


do comportamento relatam, como James Montier, Richard
Thaler, é a chamada “Teoria Beuty Contest” (Teoria do Con-
curso de Beleza). O concurso de beleza é uma experiência
maravilhosa, tem tudo a ver com o mercado e mostra como
a decisão não necessariamente é ótima.

Suponha um experimento com centenas de pessoas, em

João Luiz Braga


que cada um deve escolher um número inteiro entre 0 e
100, que represente o resultado de dois terços da média
de todas as respostas.

Pergunto: Qual é esse número?

Pense um pouquinho. Qual é a sua resposta? As respostas


variam entre 1 e 100, na média 50. Dois terços da média é 33.

As pessoas que responderam 33, são os que chamamos first


level thinkers3. Eles fazem a conta, “a pergunta vai para vá-
rias pessoas, as respostas estão distribuídas de 1 a 100, mul-
tiplicado por dois terços, igual a 33.” 33 é a primeira resposta
de alguém com algum nível de pensamento, o primeiro ní-
vel.
ed. especial

3 First level thinker – é o pensador de primeiro nível, pressupondo níveis


de pensamento em uma hierarquia na qual cada nível corresponde a uma
elaboração maior do raciocínio, tendo na sequência o segundo (second level
thinker) e o terceiro (third level thinker) nível.

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O second level thinker vai
pensar que todo mundo vai
fazer a média dos 0 aos 100.
Se 50 é a média, dois terços
da média será 33; se todo O third level thinker vai pen-
mundo respondeu 33, então sar muita gente falou 22 e a

João Luiz Braga


a resposta correta é dois ter- resposta já não é mais 22. Vai
ços de 33, que será 22. para 13, 14. E por aí vai. Qual é
o equilíbrio nesse jogo? Qual
resposta é matematicamen-
te correta? Se eu jogasse o
jogo com mil máquinas, qual
seria a resposta? Zero.
O 33 é a pri-
meira resposta
de alguém com
algum nível de
pensamento, o
primeiro nível.
ed. especial

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EXPERIÊNCIAS

Convido você para fazer esse jogo com 10 amigos, que es-
tão ao seu redor e ver qual será a resposta. Fiz essa pergun-
ta em uma rede social de que participo e tive mais de qui-
nhentas respostas e comparei com o resultado que o James
Montier e o Richard Thaler tiveram, e não foi muito diferente.

Eles fizeram a pergunta em grandes universi-


dades americanas e a resposta foi bem parecida

João Luiz Braga


com a minha.

Uma ou outra resposta foi 50 ou até acima de 50, que são


pessoas que talvez não tenham entendido a pergunta. Exis-
te uma pequena concentração de respostas nos 50. Porque
são pessoas que só pensam na média e esqueceram de
dois terços. Você vê uma grande concentração de respostas
no 33, que é o first level thinker e aí, curiosamente vão apare-
cendo as considerações dos 22, os second level thinker. Se a
pessoa já pensou que deveria dividir por dois terços, quando
foi para 33, por que já deu mais um passo e foi lá para os 13,
14. Existe uma concentração de respostas entre os 13 e 14.
E uma ou outra resposta no zero, que é quem pensa como
ed. especial

uma máquina, que deve ter pensado: o Equilíbrio de Nash é


zero. Só que não pensou que pelo menos uma pessoa não ia
concordar, e isso ia tirar a média do zero. A resposta no meu
caso foi 19.

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A média das pessoas com quem fiz o exercício,
deu algo entre second e third level thinker.
E o que isso tem a ver com o mercado? O que isso
tem a ver com os vieses?

João Luiz Braga


A resposta fugiu da resposta do homo economicus4, fugiu
da lógica, da resposta matematicamente ideal. Por quê?
Porque as pessoas não são máquinas. As pessoas não che-
gam nessa linha de pensamento, mesmo que pensem nos
outros, e pensem na probabilidade de que a resposta não
vai ser 33, porque quando chegar em 33, vai seguir um pou-
co mais.

As pessoas não
são máquinas.
ed. especial

4 Homo economicus - conceito que pressupõe um homem que age idealmente


guiado pela racionalidade e pelo cálculo, buscando as escolhas ótimas, acerta-
das.

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e-B/01
Nesse exercício também
acontece isso, a pessoa pen-
sa, se eu for inteirando vai
para zero, mas nem todo
mundo vai inteirar. Então vou
tentar acertar. Vou falar 17,
vou falar que é 23 e por aí vai.

João Luiz Braga


E também vai ter sempre No meu exercício a resposta
uma pessoa que vai tentar foi 19, e de 600 pessoas, só
acertar o comportamen- duas falaram neste número.
to do ser humano. Essa é a Além do fato de o mercado
beleza do mercado. A gente ser um concurso de beleza,
fala que o mercado também tem uma outra lição, muito
é um concurso de beleza. importante, nesse estudo:
Você não tem Você não tem que acertar tentar ser sempre um second
que acertar quem vai ser a mais bela, ou third level thinker. Se você
quem vai ser a mas sim acertar quem os ou- ficar travado no primeiro ní-
mais bela, mas tros vão achar que é a mais vel de pensamento, prova-
sim acertar bela. velmente vai errar.
quem os outros
vão achar que é
a mais bela.
ed. especial

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e-B/01
APLICAÇÃO NO
MERCADO: DIFERENÇA
COMPARATIVA

Vamos dar uma aplicação prática para um primeiro nível de


pensamento. Um dia você abre o Valor Econômico e lê “o
banco X Y Z teve lucro recorde”. Seu primeiro nível de pen-
samento será: a ação vai subir, liga para o corretor e fala que
quer comprar o banco X Y Z. Você pode comprar e a ação
abre e cai 5%. Mas como a ação está caindo 5% se teve um

João Luiz Braga


lucro recorde?

Na verdade, o segund level thinker pensa: o que o mercado


esperava? Às vezes o mercado esperava lucro ainda maior
e aquele lucro, que foi sim recorde, frustrou as expectativas
do mercado. E, sim, merece cair.

Se quiser aumentar suas chances de ganhar no


mercado você tem que come¢ar como um first le-
vel thinker. Você tem que come¢ar estudando.
Tem que come¢ar analisando notícia, anali-
sando fundamento, o gráfico, o que você quiser
analisar.
ed. especial

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e-B/01
Tente sempre ir para o second level thinker, que é o mais le-
gal. O que eu tenho na mão? O que é que o mercado está
achando? O que eu tenho de diferencial? Em que eu dis-
cordo do mercado?

Se quiser au- O QUE TENHO NA MÃO?


mentar suas
O QUE O MERCADO
chances de ga-

João Luiz Braga


ACHA DISSO?
nhar no merca- SEMPRE QUE RECEBER
UMA INFORMAÇÃO,
do você tem que QUESTIONE-SE:
O QUE TENHO DE
DIFERENCIAL?
come¢ar como
um first level EM QUE DISCORDO
DO MERCADO?
thinker.

Aí, sim, você realmente vai conseguir ter uma diferenciação


em relação ao mercado, que pode te dar o que eu chamo de
hedge5, uma vantagem para você de fato conseguir ganhar
dinheiro.
ed. especial

5 Hedge - pode ser compreendido como canto, beira ou fronteira, no sentido


de se estar num espaço diferenciado daquele espaço comum compartilhado
pelos demais.

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e-B/01
CAPÍTULO III

João Luiz Braga


Amplie o campo
de visão

ed. especial

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ENFRENTANDO
DEBATES

João Luiz Braga


Chamo a atenção aqui para uma coisa que todo mundo faz
todo dia, que é o debate, o bate-papo. Às vezes o debate
é anti-humano. Você deve ter um amigo que discorda de
tudo o que você fala. Às vezes quando você entra numa
rede social, fica extremamente irritado? Já se pegou falan-
do, nossa, esse cara é um imbecil, só por que ele discorda
de você?

Tudo isso pode ser resumido num viés. O debate é de fato


humano e, há milênios, pessoas, muito mais inteligentes
que eu, estudam essas técnicas. Se você voltar a Sócrates,
Platão, já estudavam o debate pela verdade, ou o debate
pelo debate em si.
ed. especial

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e-B/01
Mais recentemente, Dale Carnegie6 em “Como Fazer Amigos
e Influenciar Pessoas” ou Arthur Schopenhauer7 em “A Arte
de ter razão, 38 estratagemas para vencer um debate” (mes-
mo sem ter razão, que considero antiético). Ele não escreveu
isso para você usar contra outra pessoa e, sim, para saber
quando estão usando contra você. Tudo isso tem a ver com
os vieses do ser humano.

O que o Dale Carnegie não conta é que o livro é basicamen-


te sobre técnicas de debate. Ele dá dicas excelentes.

João Luiz Braga


Por exemplo, cite sempre o nome da outra pessoa, porque
ele adora ouvir. Se uma pessoa tem uma opinião e você diz
que ela está completamente errada, acabou ali, ela não vai
mais te ouvir. Ela vai travar o cérebro.
Se uma pessoa
tem uma opi-
nião e você diz
que ela está
completamente
errada, acabou
ali, ela não vai
mais te ouvir.
Ela vai travar
o cérebro. 6 Dale Carnegie (1888-1955) - escritor estadunidense autor de obras célebres
ed. especial

como “Como falar em público e influenciar pessoas no mundo dos negócios” e


“Como evitar preocupações e começar a viver”, fundador de organização mul-
tinacional de treinamentos empresariais que leva o seu nome.

7 Arthur Schopenhauer (178-1860) – filósofo alemão autor de “O mundo como


vontade de representação”. Lecionou na Universidade de Berlim.

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REAÇÕES DO
CÉREBRO

Tudo isso são vieses. E o Carnegie sabia muito bem disso.

João Luiz Braga


Explicou como você faz para deixar o cérebro da outra pes-
soa, tranquilo, feliz, para ela gostar de você e virar sua ami-
ga. Se você quiser, você influencia.

Já percebeu que quando lê algo numa rede social, num li-


vro, no jornal, que você concorda, seu cérebro fica quenti-
nho, gostoso? E quando você discorda, o seu cérebro sente
algo ruim? Você quer ignorar. Você não quer aceitar.

São dois vieses que tornam o debate praticamente anti-hu-


mano, dificílimo. Por quê?

Porque você tende a ouvir, tende a reconhecer, a gostar


dos argumentos com os quais concorda; e você tende a
bloquear, a isolar os que você discorda.
ed. especial

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e-B/01
WYSIATI

Isso é bom ou ruim para quem está no mercado financeiro?


Se eu disser: John é um cara muito inteligente, estudou em

João Luiz Braga


Harvard e é muito trabalhador. Você vai achar que ele pode
ser um bom CEO8?

Kahneman sempre faz essa pergunta quando fala num dos


conceitos mais brilhantes do livro que é o WYSIATI9 (what
you see is all there is). Simplificando, qualquer decisão que
vai tomar na vida, você toma baseado no que está vendo.

ed. especial

8 CEO – sigla em inglês referente ao Diretor Executivo da Empresa (Chief Exe-


cutive Officer).

9 WYSIATI – sigla que significa, em tradução livre: o que você vê é tudo o que
existe.

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e-B/01
CONFIRMATION
BIAS E DISSONÂNCIA
COGNITIVA
Voltando para a pergunta, John, é um bom CEO? Sim ou não?
Se respondeu sim, muito provavelmente seu cérebro já vai
travar nesse detalhe e vai ser muito difícil se convencer que
não. Se dissermos que ele foi acusado de homicídio, é extre-
mamente centralizador e usa drogas, para dar um exemplo
extremo; você pode pensar, se ele mata pessoas provavel-
mente não é um bom CEO. Essas idas e vindas no pensa-
mento chamamos de Dissonância Cognitiva.

João Luiz Braga


Se eu conto uma coisa com a qual você discorda, o seu
cérebro vai querer recusar a informação. Se dermos a in-
formação que John conseguiu excelentes empregos, você
pode dizer: essa informação é legal, eu quero.

Este viés é o Viés da Confirmação (Confirmation Bias)10. E


isso é o que a gente mais vê nas redes sociais. Isso a gente
vê nos fóruns de debate.

Voltando ao WYSIATI, de um jeito que não é bem o que Kah-


neman usa, mas nós usamos na ENCORE (empresa em que
sou sócio e analista de investimento), que é aumentar o
WYSIATI. Para tomar a melhor decisão possível precisamos
tentar ver mais, estudar mais.
ed. especial

E qual a melhor forma de fazer isso?

10 Confirmation Bias - é o viés de confirmação, refere-se à tendência de preferir


os argumentos e opiniões similares aos nossos próprios entendimentos, evi-
tando dissonâncias cognitivas.

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e-B/01
VALORIZANDO
DISCORDÂNCIAS

Tentando minimizar a dissonância cognitiva que existe ao


procurar pessoas que discordam de nós e não quem con-
corda. Quem concorda você já sabe, já está no seu cérebro.
Precisamos procurar gente que discorda, que é exatamen-
te o oposto do que a gente faz.

Existe uma fábula antiga, da raposa e das uvas. A raposa es-

João Luiz Braga


tava andando e viu uma parreira bonita, as uvas muito altas e
ela estava com fome. Tenta alcançar as uvas e nada. No fim,
desanimada, a raposa diz: quer saber? As uvas devem estar
verdes. O que a raposa faz é reduzir a sua dissonância cog-
nitiva, por não ter conseguido comer as uvas.

No fim, desani-
mada, a raposa
diz: quer saber?
As uvas devem
estar verdes.
ed. especial

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e-B/01
Esse é um exemplo claro de
dissonância cognitiva. Já o
viés de confirmação é tão Ele não está preocupado
forte, que os que progra- em aumentar o seu WYSIA-

João Luiz Braga


mam as redes sociais sa- TI, está procurando ter mais
bem e tendem a jogar, em acessos à rede social dele.
seus algoritmos, pessoas Tente fazer o exercício de
que concordam, que têm seguir, conversar e procurar
opiniões parecidas, que gente que discorda de você.
gostam dos mesmos inte- E assim você aumenta o seu
resses. Acreditam que isso WYSIATI e provavelmente
vai fazer com que você aces- vai tomar decisões melho-
se mais a rede do igual. res.

ed. especial

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e-B/01
APLICAÇÃO PRÁTICA
NO MERCADO

Indo para a prática, o nosso dia a dia, na ENCORE, é super-


-horizontal, porque todo mundo pode perguntar para todo
mundo; não existe pergunta burra; burro é não perguntar.

João Luiz Braga


Porque se alguém faz uma pergunta, pode ser que o analis-
ta não tenha pensado, vai estudar, aumentar o WYSIATI.

E temos um time Quanti11 para fazer a abordagem “quanta-


mental”, combinando análise do fundamento de empresas
com ferramentas quantitativas. A gente sempre se preocupa
em tentar ver algo que o mercado não está enxergando – e
o time quanti vai ajudar, por ser uma máquina; mas ainda
tem um viés porque é um ser humano programando a má-
quina. Com essa máquina a gente consegue pegar liquidez,
consegue pegar vários dados, aumentando o WYSIATI.
ed. especial

11 O time quanti é especialista em uma área de análise quantitativa de dados, tec-


nológica.

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e-B/01
Seguimos na ENCORE um
framework12, que todo ano
tem de ser preenchido para
todas as empresas. É bem
longo, com todas as pergun-
tas para cada uma das análi- Depois se discute se está
ses. Uma das partes do fra- certo ou está errado. E eu
mework é a minimização de não quero só que você vá
dissonância cognitiva, por- atrás, quero que me descre-

João Luiz Braga


que você tem que ir atrás de va o que fez para ir atrás. Qual
pessoas que discordam de foi o seu esforço para ir atrás,
você, e não queremos sua porque o seu cérebro não vai
opinião em relação à opinião querer que faça esse esfor-
da pessoa que discorda, mas ço, é difícil, é uma forma de
sim a opinião dela. minimizar a distância cogni-
tiva, minimizar o viés de con-
Depois se discu- firmação, e tentar aumentar
te se está certo o WYSIATI para tomar a me-
ou está errado. lhor decisão possível.

ed. especial

12 Framework – significa um modelo ou padrão de trabalho, no caso a aplicação de


um questionário de análise.

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e-B/01
OS ANALISTAS DE
MERCADO E A TOMADA
DE DECISÃO

João Luiz Braga


No mercado existem dois tipos de analistas:

Os críticos de buy side, que ficam nos fundos, que operam


direto o dinheiro próprio dos clientes;

E tem o que chamamos de sell side, que todo mundo co-


nhece, são aqueles analistas que fazem o mesmo trabalho
que os analistas de buy side, mas também analisam as em-
presas. Eles não compram e vendem as ações diretamen-
te, eles produzem relatórios muito bacanas que ajudam os
clientes e as corretoras, a tomarem as melhores decisões.
ed. especial

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e-B/01
É normal em qualquer mesa
de operação, quando che-
ga um relatório no sell side
discordando da posição do
gestor, do analista, o ges-
tor pode dizer: esse analis-
ta é ruim demais, como ele
manda vender essa ação?
Se há dissonância cognitiva,
ele deve pegar o relatório Toda vez que você estiver
e ler os argumentos do ou- comprando uma ação, toda

João Luiz Braga


tro analista. Mesmo que não vez que você tiver muita
concorde, no mínimo, vai co- convicção numa ação; toda
locar na sua análise, testar vez que você achar que é
essas hipóteses, para am- uma ação da vida, procure
pliar o que você está vendo a pessoa que discorda de
e o ajudar a tomar uma deci- você. Isso vai te ajudar a to-
são melhor. mar a decisão melhor.

E obviamente, como todos


os vieses, isso não vale só
para ação, vale para todos
os ativos; vale para um carro;
vale para uma criptomoeda;
vale para um apartamento; e
vale para várias coisas pes-
ed. especial

soais também.

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e-B/01
DIVERSIDADE
NO TIME

Um dos pontos que ajudam a aumentar o WYSIATI é expan-


dir a diversidade de seu time, ou dos seus amigos, ou do seu
grupo de bate-papo, ou do seu grupo de discussão política;
obviamente do fórum de investimento que você gosta de
participar. Quanto mais diversidade melhor, porque pesso-
as trarão ideias. Trarão um conceito que você não pensará

João Luiz Braga


sozinho.

Um dos pontos
que ajudam a
aumentar o
WYSIATI é ex- Para mim, é muito difícil conhecer sozinho uma empresa
pandir a diver- como a Arezzo, porque não vou saber exatamente como é
sidade de seu que as mulheres, que adoram sapatos, estão interessadas
time na disposição dos sapatos na vitrine, ou na coleção nova.
Num IPO da Arezzo, fiz uma pesquisa com 200 mulheres,
ed. especial

sobre a marca, sobre o estilo, sobre o que elas gostavam ou


não. E isso certamente aumentou o meu WYSIATI. E ter uma
mulher no time, fez toda a diferença para trazer uma visão
que eu não tinha.

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e-B/01
Se eu tivesse os mesmos perfis de engenheiros, que vieram
de Goiânia, da classe média, no meu time, será que iríamos
ter mais sucesso ou menos sucesso? Uma coisa que sem-
pre buscamos dos nossos debates é buscar a diversidade.

Uma das formas para aumentar o WYSIATI é a cultura do


debate. É ter um debate franco, aberto, poder perguntar e

João Luiz Braga


poder questionar; discordar é muito relevante. Como já vi-
mos isso é anti-humano, por causa da dissonância cognitiva
e do viés de confirmação.

Quanto mais
diversidade me-
lhor, porque as
pessoas trarão
ideias.
ed. especial

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e-B/01
GENTEBONICE E
COMPETÊNCIA

João Luiz Braga


A maioria das empresas no Brasil, quando vão contratar
alguém, só se preocupam com o eixo da competência. Eu
também me preocupo com esse eixo, também quero con-
tratar gente competente; mas tem um outro eixo que pouca
gente se preocupa e que já tentei pensar num nome bonito
e nunca achei.

Chamo esse tipo de gentebonice, contratar gente boa no


sentido mais leve da palavra, mesmo: uma pessoa agradá-
vel.
ed. especial

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e-B/01
Um estudo realizado na Universidade Harvard, mostra que
as pessoas estão divididas em quatro quadrantes:

COMPETÊNCIA

João Luiz Braga


COMPETENTE COMPETENTE
MALA GENTE BOA

INCOMPETENTE INCOMPETENTE GENTE BONICE


CHATO GENTE BOA

ed. especial

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e-B/01
1 3
A pessoa é o incompetente e Tem o competente mala.
chato, com ele não precisa- Esse é um ponto chave e eu
mos perder muito tempo. vejo muita gente assim no
mercado, muita gente as-
sim na vida; é um cara que
é bom, competente, mas é
chato. Ele não se preocupa
com os outros, não conse-
gue debater. Ele acha que

João Luiz Braga


está sempre certo. A gente
evita ao máximo contratar
essas pessoas.

2 4
É o incompetente legal, o Nós buscamos o COMPE-
incompetente gente boa. TENTE GENTE BOA.
Esse incompetente gente
boa é uma pessoa que você
tem que tomar muito cuida-
do, porque você gosta dele.
ed. especial

36
e-B/01
A pessoa que é mala, na se-
gunda vez que discordar por
discordar de você, se você
Por que procuramos essas quer algo mais catártico, o
pessoas? Geralmente quan- WYSIATI diminui. Se você
do contamos essa história as tem pessoas agradáveis ao
pessoas acham que é para seu lado, o debate é bom,
ter um clima bom, um clima o debate flui. Você discorda
agradável, pois passamos numa boa e sai para tomar
tanto tempo no escritório, cerveja e depois o WYSIAT
mas na verdade o primei- aumenta e provavelmente
ro, e principal, motivo para vai performar melhor.
procurar essas pessoas é o
Dito isso, é óbvio que tam-
WYSIATI, é aumentar a per-
bém têm consequências óti-

João Luiz Braga


formance.
mas, têm externalidades po-
As pessoas gente-boas dis- sitivas muito boas, como por
cutem melhor o tema, fazem exemplo o clima ser bom. Eu
você ficar mais amigo, você quero que o pessoal chegue
consegue discordar, você segunda-feira para traba-
consegue debater. lhar de manhã e pense: “que
legal, vou encontrar meus
amigos, encontrar as pesso-
as que eu gosto”.
Se você tem pes-
soas agradáveis
ao seu lado, o
debate é bom, o
debate flui.
ed. especial

37
e-B/01
REDUZINDO O
TURNOVER

Tem mais uma externalidade positiva muito interessante.


Um negócio de pessoas, precisa ter turnover13 baixo. A rota-
ção de pessoas precisa ser a menor possível, o ideal é que
seja zero, as mesmas pessoas sempre, que vão acumulando
experiência, conhecimento e discussão ou debate.

Eu adoraria ter um nome para isso. Eu sei que eu não vou

João Luiz Braga


conseguir, mas eu adoraria ter um turnover zero na corte, na
história da corte.

Se você trabalha de pessoas legais, gente boa, pessoas de


quem você gosta, mesmo se tentarem levar alguém do nos-
so time pagando mais, não sei se ela vai. Ela no mínimo vai
parar pra pensar: “poxa, eu estou aqui, estou bem, estou fe-
liz, estou com meus amigos e por que que o risco?”

Isso também ajuda no turnover. São tantos efeitos e exter-


nalidades positivas, sendo a primeira a performance, para
você se preocupar com uma coisa que é simples: contratar
pessoas legais, gente boas. A gente leva isso muito a sério
lá na Encore.
ed. especial

13 Turnover - refere-se à elevada rotatividade de trabalhadores em uma empre-


sa, o que pode se relacionar a vários motivos, entre eles a insatisfação com o
ambiente de trabalho.

38
e-B/01
CAPÍTULO IV

João Luiz Braga


Vieses sobre informação

ed. especial

39
e-B/01
ANCORAGEM

Agora um pouquinho so-


bre como uma informação
dada, uma fala, dependen-
do de como ela é colocada,
pode alterar totalmente sua
decisão. Você já se sentou vale 100 mil reais e começa
para negociar um carro, uma a falar que acha que o car-
casa, um apartamento, e o ro vale 105 mil. Se você foi

João Luiz Braga


dono falou um valor tão fora o primeiro a falar, provavel-
de realidade, que você quis mente a próxima estimati-
levantar da mesa na hora e va, a resposta do possível
nem começar a discutir? comprador, deve estar mais
perto dos 105 mil reais, que
É a chamada ancoragem. é próximo dos 100 mil reais
É quando uma informação, que você queria pelo seu
ANCORAGEM é seja ela qual for, muda todo carro. Agora se você falasse
quando uma o curso da estimativa futu- 150 mil reais seria um grande
informa¢ão, ra. Por exemplo, ancoragem erro de negociação. A pes-
seja ela qual em negociação pode ser soa vai se levantar da mesa,
for, muda todo o considerado um acerto ou desistir de responder, dado
curso da esti- um erro. Vamos supor que a sua estimativa tão fora do
mativa futura. queira vender o carro, que valor de mercado.
ed. especial

40
e-B/01
PROVANDO O
FENÔMENO

João Luiz Braga


O Daniel Kahneman fez um teste para provar como a anco-
ragem é um viés extremamente forte e interessante. Eu vou
contar de uma outra forma, bem direta e foi o que ele provou
de forma estatística, com processo científico.

Imagine uma roleta. Nessa roleta só caem o número 80


ou 20. Eu rodo a roleta, que é completamente aleatória e
em seguida pergunto algo também aleatório, por exemplo
quantos países existem na ONU, logo depois de a roleta cair
no 80. O resultado da roleta ancora as respostas perto do
valor 80, mesmo sendo eventos completamente aleatórios
entre si. E se a roleta cair em 20, ancora as respostas para
ed. especial

perto de 20.

41
e-B/01
Olha que coisa curiosa des- Ele chamou vários correto-
coberta por Kahneman, você res e, para a metade deles,
quer vender o seu aparta- fez os proprietários sugeri-
mento e não sabe quanto rem o valor de $ 1,5 milhão,
vale um apartamento. Se enquanto para outros, colo-
você é médico, é dentis- cou o valor mais baixo, de $
ta, não entende disso. Você 1 milhão.
chama é um corretor de

João Luiz Braga


imóveis, que é quem deveria O que ele provou? Se no
saber exatamente o valor de exemplo da roleta, com
um apartamento nessa re- eventos independentes,
gião, neste andar. completamente aleatórios,
as respostas estavam anco-
radas, imagina nesse! O ex-
pert, o especialista, alterava
sua resposta de acordo com
a proposta inicial do cliente.
Mesmo que a pessoa seja
uma especialista ela sofre a
ancoragem e altera sua res-
posta.
ed. especial

42
e-B/01
VIÉS RETROSPECTIVO
E ainda na questão das infor-
mações, têm outros dois vie-
ses que afetam muito a nos-
sa forma de pensar, um tema teceu o oposto do que ele
de “bias”14, também conheci- pensava e ele nega. “Não,
do em português como viés não, óbvio que não. Eu sa-
retrospectivo. É um viés que bia, eu tinha certeza que iria
você certamente já viu acon- acontecer aquilo”. O viés re-
tecer. Depois de um debate trospectivo é o famoso “viés
qualquer com o seu amigo, do Galvão”, do “eu já sabia”.
aconteceu uma coisa dife- Mas você não sabia, não ne-

João Luiz Braga


rente do que ele falava, você cessariamente sabia. O fato
vai dar aquela provocada no é que nosso cérebro faz com
seu amigo. Diz que acon- que a gente esqueça os nos-
sos erros e foque nos nossos
acertos.
Porque se você
pensar que sem-
pre erra, não Às vezes você pensa em cinco hipóteses para um deter-
seria uma vida minado fato. Quando vem o fato, uma das suas hipóteses,
muito legal de você esquece que estava em dúvida entre cinco e pensa:
viver eu acertei. Esquece das outras hipóteses que errou. Esse é
o hindsight bias15. É um viés que acredito que seja muito
darwinista; o viés que te faz não ser eternamente deprimido.
Porque se você pensar que sempre erra, não seria uma vida
muito legal de viver.
ed. especial

14 Bias - do inglês, pode ser definido aqui como viés

15 Hindsight bias - é o viés que faz com as pessoas avaliem eventos no passado
como mais previsíveis do que realmente eram no momento pretérito.

43
e-B/01
LIMITAÇÃO
DESSE VIÉS

João Luiz Braga


Só que isso pode ser muito ruim. Pense sobre a sua moti-
vação no emprego, no dia do seu bônus, no dia do seu fee-
dback, vai bater um papo com o chefe e só vai lembrar das
coisas boas que fez. E o chefe diz que o bônus vai ser me-
nor porque teve aquele erro e você não vai gostar. Aquilo
vai frustrar suas expectativas, quando, na verdade, é justo, é
honesto.

ed. especial

44
e-B/01
VIÉS
RECENTE

Há mais um último viés da informação. Esse outro viés é o


recency bias ou o viés recente. A gente tende a dar muito

João Luiz Braga


mais peso para as últimas informações que ouviu agora,
do que para uma informação que ouviu faz tempo, que já
está na memória. Isso pode ser muito ruim para sua toma-
da de decisão em investimentos. Todos nós somos bombar-
deados por notícias o tempo todo, boas e ruins. Se a gente
sempre reagir à última notícia e esquecer todo o resto da
análise, muito provavelmente vamos fazer besteira em in-
vestimento. E isso acontece.
O mercado reage
mais do que de-
via às notícias,
por causa do
viés recente.
ed. especial

45
e-B/01
COMO EVITAR OS
VIESES NA INFORMAÇÃO?

Como é que eu faço para Por exemplo, tenho um ca-


evitar essa armadilha de dar derno para cada empresa.
muito valor para as notícias Se sai uma notícia qualquer,
de agora? Ou como evitar a primeira coisa que faço é
achar que estava sempre agir à notícia ou abrir o meu
certo, por causa do viés modelo? Abro o meu cader-
retrospectivo? Como faço no sobre aquela empresa
para realmente agir o mais leio tudo, me lembro, de o
intelectualmente possível? porquê tenho aquela posi-

João Luiz Braga


ção; e assim tento minimizar
esse viés recente.

E na hora de saber se acertei


ou não uma análise vou achar
A dica dos grandes pensado- que sempre acertei, sempre
res do comportamento hu- pensei o correto, por causa
mano é: mantenha um diário do viés retrospectivo. Antes
e anote tudo. Eu uso o Ever- de pensar assim, vou ao ca-
note. Existem várias ferra- derninho e vejo o que anotei
mentas hoje em dia, online, na época. E assim consigo
que podem ser usadas, com
Mantenha um melhorar o meu processo de
acesso em diversos disposi-
diário e anote investimento: ora, isso aqui
tivos, em que você sempre
tudo. estava errado, a lembrança
anota tudo o que está pen- do que anotei estava errada,
sando.
ed. especial

da próxima vez, vou pensar


de outra forma...

46
e-B/01
ELIMINANDO O FATOR
SORTE NA TOMADA
DE DECISÃO

A forma mais importante de você tentar ganhar dinheiro


no mercado, é ter um processo e tirar o fator sorte na sua
tomada de decisão. E só tem uma forma de você testar se o
seu processo é bom ou não. Fazendo várias vezes e checan-

João Luiz Braga


do como foi executado.

Um grande erro que as pessoas cometem é julgar o pro-


cesso pelo resultado. Se a ação subiu, se caiu; se a cripto-
moeda subiu ou caiu; ou qualquer ativo que esteja operan-
do. Quem vê o resultado, erra. Pode ter caído ou subido por
fatores que não estavam no processo. A famosa sorte, que
acontece muito no nosso meio. São muitas as variáveis que
alteram o preço de um ativo. Como é que você faz? Você
ignora o resultado e volta para o processo.

Depois de um tempo, você anotou tudo (se não adotou não


vai conseguir), abre o diário e confere, para ver o que pen-
sou, se a forma foi correta, se exagerou. E assim você melho-
ra e melhora o seu processo.
ed. especial

47
e-B/01
REGISTRE
TUDO

Anote tudo, porque às vezes só a posição da informação


(pode ser verdadeira ou falsa, pode ser recente ou não, pode

João Luiz Braga


ser a primeira que você ouve), pode alterar completamente
a sua tomada de decisão.

No caso da ancoragem, ao invés de tomar uma decisão ba-


seada na ação que negociou a tal valor no passado, tem que
analisar daqui para frente; compor o maior número de infor-
mações possíveis, aumentar o WYSIATI; anotar tudo no seu
processo, para evitar o recency bias, e assim tomar a melhor
A nossa opinião decisão de investimento.
não pode ser
construída ou A nossa opinião não pode ser construída ou alterada por um
alterada por um dado do passado que já não pode representar nada; ela tem
dado do passado que mudar se a premissa muda, se as informações mudam.
que já não pode Não use argumentos como: essa ação já foi negociada a
representar tanto; o múltiplo daquele ativo já foi tal. Isso não é um argu-
nada. mento.
ed. especial

48
e-B/01
DIVERSIFICAÇÃO E
CONFIANÇA EXTREMA

João Luiz Braga


Tem vários exemplos de ações ou empresas que foram a
zero e com elas você teria perdido todo o seu patrimônio.
Aliás, esse é um dos bons motivos para pensar em diversifi-
cação. E para diversificar, você tem que evitar um outro viés
que é o da confiança extrema. Você não pode ter confiança
extrema. Você não pode ter confiança extrema, porque não
sabe tudo o que pode acontecer no mercado.

ed. especial

49
e-B/01
CAPÍTULO V

João Luiz Braga


Pensando fora
da casinha

ed. especial

50
e-B/01
VIÉS DO
STATUS QUO

Por que às vezes mudar de opinião é o melhor que se pode


fazer? Por que às vezes o nosso lar não é o melhor lugar?
Vamos ver alguns vieses em relação a mudar de opinião.

O viés do status quo. Qualquer mudança em relação ao


status quo é percebida pelo ser humano como uma perda,
como algo ruim. E isso leva a um arrependimento maior, o
arrependimento que você não devia ter. Exemplo: você tinha

João Luiz Braga


uma ação, um ativo, que subiu 20% e você vendeu, e o ativo
subiu mais 100%. Você vai sofrer mais por ele ter subido de-
pois que se livrou dele, do que se você nunca o tivesse tido.
Você ter aberto mão, ter alterado o status quo te faz arre-
pender-se mais. Tem lógica isso? Não sei, mas é um viés, é
do ser humano.

Temos que minimizar esse tipo de viés, porque a partir do


momento que você começa a perceber toda mudança como
uma perda, você para de mudar. Você deixa de mudar e às
vezes mudar de opinião, mudar de relacionamento, pode
ser a melhor coisa que pode acontecer na sua vida, para
a sua felicidade, para a sua renda. Tem diversas formas de
tentar minimizar o viés de status quo.
ed. especial

A primeira, é lembrar que o passado importa menos do que


deveria. No caso de um fundo, quanto estavam as ações no
passado importam zero, pois já estão na cota. Só importa
daqui para frente.

51
e-B/01
Temos que minimizar esse tipo de viés, porque a partir do
momento que você começa a perceber toda mudança como
uma perda, você para de mudar. Você deixa de mudar e às
vezes mudar de opinião, mudar de relacionamento, pode
ser a melhor coisa que pode acontecer na sua vida, para
a sua felicidade, para a sua renda. Tem diversas formas de
tentar minimizar o viés de status quo.

A primeira, é lembrar que o passado importa menos do que


deveria. No caso de um fundo, quanto estavam as ações no
passado importam zero, pois já estão na cota. Só importa
daqui para frente.

João Luiz Braga


Manter o Status Quo é basicamente se manter na sua “zona
de conforto”, evitar uma decisão que pode trazer resultados
que você não consegue mensurar.

A ZONA DE CONFORTO
NÃO EXISTE!

zona de
conforto?

SUCESSO
ed. especial

52
e-B/01
EXERCÍCIO
DIÁRIO

Na ENCORE, tenho um hábito para minimizar o viés de sta-


tus quo que é o seguinte: todo dia à noite imagino que ven-
Assim, deixo mi-

João Luiz Braga


demos todas as ações da carteira e trocamos por dinheiro.
nha carteira É só uma imaginação! Se não, iria pagar muita corretagem!
sempre limpa do Imagino que vendi todas as ações e no dia seguinte ganhei
viés de status uma asset de presente e devo fazer uma carteira do zero.
quo. É óbvio que eu não mudo as posições todos os dias. Aliás,
pelo contrário, mudo bem pouco. Sou investidor de longo
prazo, mas sempre faço esse exercício, porque penso: será
que as ações estão do tamanho certo? Será que tem alguma
posição aqui? Será que se eu ganhasse uma asset do zero,
teria essa opinião, esse papel? Assim, deixo minha carteira
sempre limpa do viés de status quo.

A carteira que a gente tem é sempre aquela que quer ter


naquele momento, evitando ter um ativo só por ter.
ed. especial

53
e-B/01
EFEITO POSSE

Vamos falar um pouco agora sobre um outro viés que é o

João Luiz Braga


endowment effect16 ou o efeito de posse. Você compraria um
vinho de três mil reais? Bom, eu conheço pouquíssima gente
que toparia pagar três mil reais uma garrafa de vinho.

Vamos supor que tenha comprado uma garrafa de vinho por


200 reais, guardou na adega e esqueceu dela. Quando acor-
dou, três anos depois, viu que aquele vinho deu 100 pontos
no Robert Parker, que é um cara que julga vinhos. Esse vinho
hoje vale três mil reais. Esse vinho é super raro, você com-
prou numa viagem. Eu pergunto agora: você venderia essa
garrafa por três mil reais?
ed. especial

16 Endowment Effect - ou viés de posse, é um viés cognitivo ligado a uma ten-


dência de valorizar objetos pessoais determinados mais do que seu valor real
de mercado.

54
e-B/01
Se você respondeu que não compraria uma garrafa de vi-
nho por três mil reais e não venderia por três mil reais agora,
você está sofrendo o efeito de posse. Porque na verdade
não há nenhuma diferença entre você usar o dinheiro para
comprar uma garrafa de vinho ou deixar de vender uma gar-
rafa de vinho que você pagou 200 e vale três mil agora. Não

João Luiz Braga


existe nenhuma diferença, as duas podem ser trocadas por
garrafas de vinho ou dinheiro a qualquer momento.

Pela lógica deveria ser exatamente a mesma coisa, mas sa-


bemos que não somos seres tão lógicos como imaginamos.

Esse é outro grande erro que vemos acontecer diversas ve-


zes no mercado, a pessoa se preocupar com o preço que
pagou na compra, que na verdade não importa mais para o
preço atual.

ed. especial

55
e-B/01
TESTANDO ESSES
VIESES

Como é que você testa para Dois dias depois esse dó-
ver se está caindo num efei- lar bateu R$5,20. Eu pensei,
to de posse ou mesmo no poderia ter vendido, ganha-
viés de status quo. É o teste ria um dinheiro. Se tivesse

João Luiz Braga


reverso. vendido esse dólar a R$5,40
recuperaria nos R$5,20. Na
Vou contar um exemplo que verdade, eu estava caindo
aconteceu comigo (também no efeito de posse. E tam-
caí nesse viés). bém na ancoragem. Eu esta-
va olhando para o passado,
O dólar subiu e recentemen- sendo que o passado não
te bateu R$5,50. Estava na importava em nada na equa-
época olhando para os da- ção.
dos da balança comercial,
olhando para dados de fluxo.
Eu achei que o Real deveria
se valorizar, o dólar deveria
cair, e o dólar foi de R$5,50
para R$5,45. E eu não ven-
di, sei lá por qual motivo.
ed. especial

Bobeei!

56
e-B/01
PREÇO MÉDIO

Tem um termo famoso no mercado financeiro que é o tal do


“preço médio”. As pessoas vão comprando as ações e geral-

João Luiz Braga


mente a ação vai contra, vai caindo. Aí a pessoa compra mais
e pensa: “estou melhorando meu preço médio”. Porque ago-
ra, botando em números, por exemplo, eu comprei a ação
a $100,00 e depois comprei a $80,00, então na verdade o
valor agora é $90,00. As pessoas se fixam nesses pontos,
inclusive para tomar decisão.

Eu queria passar um recado aqui. Isso é endowment effect


e viés do status quo purinhos. Tirando para fins tributários,
pouquíssimo importa quanto você pagou, pouquíssimo
importa seu preço médio e certamente não deveria entrar
no seu processo de tomada de decisão.
ed. especial

57
e-B/01
Só existe pre¢o de tela, só existe pre¢o
atual, porque qualquer decisão que você toma
- comprar, vender ou manter - e manter é uma
decisão - você toma a pre¢o de tela!

João Luiz Braga


Então, só existe preço de tela. Não adianta você pensar que
a ação estava 100 e agora está 80. Tudo bem, o preço médio
era 60. Não importa o preço médio, tem que analisar se a 80
vale a pena ou não comprar, vender ou manter.

No preço médio estão inseridos diversos vieses. Está inse-


rido o viés do status quo, porque você está com aquela po-
Tem um termo sição só porque comprou ou vendeu pelo preço anterior. O
famoso no mer- endowment effect, porque, no exemplo do vinho, você pagou
cado financeiro 200 no vinho, agora está a 3 mil e você não vende e não se
que é o tal do importa em trocar por dinheiro, porque você tem uma visão
"pre¢o médio". ancorada no preço que pagou.
ed. especial

58
e-B/01
FICA A DICA

Uma recomendação forte, nunca leve em consideração o


preço de compra ou de venda de seus ativos quando for
"prefiro o lu-

João Luiz Braga


tomar decisão de venda futura. Leve só em consideração o
cro tributá- preço de tela, e leve em consideração a sua opinião, se é
vel ao prejuízo uma boa comprar, vender ou manter naquele preço. Não es-
isento" queça de considerar a parte tributária.

Eu gostaria de lembrar a frase de um sócio da Hedging Griffo,


que é uma das frases preferidas do (Luís) Stuhlberger, que
foi meu chefe: “prefiro o lucro tributável ao prejuízo isento”.

Existe uma forma simples de você ver se você está caindo


nesses vieses. Quando estiver em dúvida se vale a pena ou
não, pergunte: se eu não tivesse, compraria? Fazendo um
exercício simples você descobre se está caindo no viés do
status quo ou no endowment effect.
ed. especial

59
e-B/01
CAPÍTULO VI

João Luiz Braga


Framing e efeito halo

ed. especial

60
e-B/01
DISTORÇÕES NOS
VALORES

Já percebeu que sua opinião sobre um assunto muda con-


forme o assunto é contado?

Se uma empresa se apresenta para o mercado de uma for-

João Luiz Braga


ma ou de outra, isso também acaba mudando a opinião
das pessoas, mesmo sendo a mesma empresa.

Quero falar sobre alguns vieses que são muito curiosos, pois
esses vieses ainda são exacerbados em número quando a
ação é pequena, como nos IPOs.

Vamos falar sobre dois vieses nesse sentido, o “framing”17 e


o “efeito halo”.

ed. especial

17 Framing – significa molde, forma.

61
e-B/01
FRAMING

O framing se refere à forma. A forma como o problema ou


a proposta é colocada na mesa altera a sua forma de pen-

João Luiz Braga


sar.

Veja este exemplo: Kahneman fez uma pesquisa com mé-


dicos. Pensa numa doença fatal, a pessoa tem três meses
de vida. Perguntam se a pessoa prefere o remédio A, com o
qual há 90% de chance de sobreviver; ou o remédio B, com
o qual 10% das pessoas que o tomam, morrem. Foi estatisti-
camente comprovado que as pessoas preferem o remédio
A, sendo que na verdade são exatamente a mesma coisa.
Tomando o remédio A ou tomando remédio B, 90% das pes-
soas sobrevivem, porque quem não sobrevive, morre. A ma-
neira de colocar o ponto, 90% sobrevive, uma coisa positiva,
faz a pessoa preferir o remédio A, em relação aos 10% que
morrem, uma coisa negativa.
ed. especial

62
e-B/01
Pense bem, quando está len- curtos, com boa informa-
do um formulário de referên- ção, que é importante ler,
cia, um livro da empresa que com informação condensa-
você está cobrindo, um press da em slides. E tem os do-
release, se aquela informa- cumentos mais densos, que
ção está sendo colocada de são requeridos pela CVM
uma forma que pode induzi- como o ITR19, que são as in-
-lo a pensar melhor sobre a formações trimestrais, os
informação do que de fato formulários de referência.
é, se não é uma coisa mais Obviamente os que são pre-
neutra, e por aí vai. parados pela empresa, do
jeito que ela quiser, para os
Todas as empresas são obri- investidores, e não da forma
gadas a divulgar diversos que a CVM quer, pode sofrer
documentos regulatórios

João Luiz Braga


um efeito de frame. Então,
para a CVM , por exemplo,
18
evite ler só os documentos
há os press releases tam- que a empresa prepara para
bém. É muito normal que a os acionistas e para os inves-
empresa preste contas todo tidores. Vá atrás de mais in-
trimestre. formação, tente aumentar o
WYSIATI, vá atrás do ITR, vai
Existem dois tipos de do-
A forma como o atrás do formulário de refe-
cumento: os documentos
problema ou a rência.
preparados para os mais
proposta é co- “preguiçosos”, que eu brin-
locada na mesa co, são os documentos mais
altera a sua
forma de pen-
sar.
ed. especial

18 CVM - é a Comissão de Valores Imobiliários, fundada pela Lei n. 6.385/76


visando fiscalizar, normatizar, disciplinar e desenvolver o mercado de valores
mobiliários no Brasil.

19 ITR - é o formulário de informações trimestrais, exigido pela CVM.

63
e-B/01
EFEITO
HALO

O efeito halo é quando o nosso cérebro faz com que a gen-


te tenha uma conclusão por um assunto não relacionado,
e que faz a gente tirar uma conclusão precipitada.

Por exemplo, porque a pessoa fala bem, alguém pode achar

João Luiz Braga


que ela é muito competente. Na minha opinião, se a pessoa
fala bem, a única conclusão que dá para tirar é que ela
fala bem. Se ela é competente ou não, é um outro assunto.

Esse viés está muito presente num monte de coisas das


nossas vidas. Analisando o lado comercial, falar bem e ven-
der bem é extremamente importante. Em outro lugar, na po-
lítica, quantas vezes a gente não pensa que o tal político pa-
rece bom. Na verdade, ele fala bem, debate bem, não quer
dizer que suas ideias sejam boas ou ruins.

Esse efeito halo vale também para a apresentação de


uma empresa. Você vê a pessoa apertando bem o botão, os
slides são bonitos. Os gráficos são editados de uma forma
legal e você acha que a empresa é boa por causa disso.
ed. especial

64
e-B/01
Por que você acha que uso uma camisa para gravar um ví-
deo? Porque passa mais credibilidade. Se usar uma camise-
ta regata talvez você pensasse, o Braga não deve entender
desse assunto, como assim? O fato é que o Braga é Braga,
não importa se de regata ou de camisa.

Por que você


acha que uso
uma camisa

João Luiz Braga


para gravar um
vídeo? Porque
passa mais cre-
dibilidade.

Esse é um dos vieses mais poderosos e mais usados nas


habilitações das companhias e especialmente nos IPO’s.
Porque nos IPO’s, por definição você tem pouca informação
para analisar. Porque a empresa não tem muito histórico ou,
se tem algum, pela legislação tem que mostrar os últimos
anos. Tendo pouca informação, o jeito como vai apresentar
a informação passa a ter muita relevância.
ed. especial

65
e-B/01
IMPORTÂNCIA
DO IPO

Só para alinhar, o que que é um IPO? É quando uma empre-


sa vem a mercado e se torna pública. Significa initial public
offering. É quando ela lista suas ações. Para os gestores e
analistas significa mais material para análise, mais material
para tentar ganhar dinheiro. Enfim, mais opções de investi-
mento para quem quiser investir na Bolsa.

João Luiz Braga


INITIAL PUBLIC OFFERING

o que que é um
IPO? É quando
uma empresa
vem a mercado e
se torna públi-
ca. Significa
Initial Public É por isso que gosto tanto, porque IPO é tão importante para
Offering. a economia como um todo? É uma fonte muito boa de cap-
ed. especial

tação de recursos para as empresas. Do dinheiro dos inves-


tidores em Bolsa no patrimônio líquido da companhia, que
leva adiante o caixa para ela crescer, investir, contratar, cres-
cer. É por isso que são tão importantes para o país.

66
e-B/01
EFEITOS HALO E
FRAMING EM IPO’S

Na história, tivemos diversos


exemplos de IPO que foram
muito bem colocados em
relação a framing e ao efeito
halo, inclusive de operações,
que eram completamente
pré-operacionais, eram basi-

João Luiz Braga


camente uma apresentação,
um PowerPoint, de efeito
tão bonito no começo, que
o mercado não só comprou
como valorizou.

Você deve lembrar de algu- Agora, imagine uma empre-


mas de que estou falando. sa vindo ao mercado com
Inclusive já citei anterior- poucos dados para você
mente. analisar, mas com uma his-
tória linda, um líder caris-
mático, que fala bem e pro-
mete um sonho! É normal,
como seres humanos, a gen-
te pegar amor pelas nossas
ed. especial

posições, que é a soma de


vários vieses. É o viés do sta-
tus quo, o endowment effect,
o framing e o efeito halo.

67
e-B/01
ESCAPANDO DO
FRAMING E DO EFEITO
HALO
E como a gente faz para evitar cair no efeito halo? Como fa-
zer para evitar cair no framing e se apaixonar por uma his-
tória que é só uma história, que na verdade, não tem muito
conteúdo por trás?

Sabe como? WYSIATI. WYSIATI. Não se prenda só à história

João Luiz Braga


que você ouviu. Não se prenda só a um conceito. Aumente
o WYSIATI, pesquise mais. Você quer saber sobre uma em-
presa? Não fale só com a empresa. Fale com o concorrente,
fale com um cliente, fale do fornecedor, fale com todo mun-
do que está envolvido, em todas as etapas da empresa, com
os funcionários. Só assim você consegue buscar um pouco
mais da verdade e fugir do efeito halo ou do framing.
Não se prenda só
a um conceito.
Aumente o WY-
SIATI, pesquise
mais. Você quer
saber sobre uma
empresa?
ed. especial

68
e-B/01
CAPÍTULO VII

João Luiz Braga


Aversão às perdas e
pensamento para frente

ed. especial

69
e-B/01
TEORIA DO
PROSPECTO

João Luiz Braga


Você toparia jogar o seguinte jogo? Cara ou Coroa, moeda
simples; deu cara, você ganha 150 reais; deu coroa, você
perde 100 reais. Topa?

Muita gente, não vai querer jogar ou vai querer se jogar infi-
nitas vezes. Uma vez, é raro.

ed. especial

70
e-B/01
Kahneman, em uma de suas teorias mais importantes, que o
levou a ganhar o Nobel, pesquisou o que ele chama de Te-
oria do Prospecto. Essa teoria estuda a aversão às perdas.
Ele chegou a uma conclusão muito interessante, que é: o
ser humano, em termos de utilidade de dor ou prazer, tem
muito mais dor em perder X de dinheiro do que prazer de
ganhar os mesmos X. Às vezes, a dor de perder 100 é muito
maior do que o prazer de ganhar 150. Por isso você não topa
jogar e ele fez isso de forma estudada com processo cientí-
fico, com estatística.

A Teoria do
Prospecto estu-
da a aversão às

João Luiz Braga


perdas.
Será que a gente não consegue imaginar o tanto de con-
sequência que a aversão à perda tem no mercado?

PERCEPÇÃO DE VALOR

100

100
PERDAS GANHOS
ed. especial

Figura 1: Valor psicológico para perdas e ganhos

71
e-B/01
CIRCUIT
BREAKER

Imagina que você tem R$100,00. Cada vez que se joga a mo-
eda, você vai dobrar se der cara ou vai perder tudo se der
coroa. De lambuja, digo que ela cai 90% das vezes na cara.
Você jogaria esse jogo? E quantas vezes você jogaria esse
jogo?

Se as pessoas reagem muito pior às perdas do que aos ga-


nhos, você acha que em grandes crises como a de 2008 ou

João Luiz Braga


a de COVID19, não foram afetadas pela Teoria do Prospec-
to? Certamente foram.

Ter um circuit breaker20 tem a ver com isso. Tem a ver in-
clusive com todos os vieses mencionados antes. A Bolsa
começa a cair, as pessoas começam a entrar no modo pâ-
nico, começam a vender a qualquer preço. Ou seja, o preço
descola totalmente de qualquer fundamento. E a Bolsa de-
cide em um certo nível que a gente deve parar agora. Para,
pensa, raciocina. Você quere continuar vendendo?

ed. especial

20 Circuit breaker - é um mecanismo que interrompe as operações de compra


e venda de ativos em mercados em momentos extraordinários de excesso de
volatilidade.

72
e-B/01
EFEITO MANADA E
OPORTUNIDADE NAS
CRISES

Eu comparo a situação com o “efeito manada”. Imagina que


você é uma girafa e está na floresta com amigas girafas e
uma lá sai correndo. Sai todo mundo correndo junto. No

João Luiz Braga


“efeito manada” você começa a se desesperar.

Imagina se na floresta existisse o circuit breaker: Ô, girafas,


parem por meia hora e vejam se realmente tem um leão
perseguindo vocês. Olha não tem! Então, podem ficar para-
das aqui. Ou não, tem sim um leão. Então vamos continuar
correndo.

O princípio da aversão à perda te leva a querer sair corren-


do, te leva a querer fugir.

Provavelmente, as pessoas que conhecem esse viés e que


são mais calmas, vão parar para analisar, vão ver isso como
oportunidade, como geralmente as crises são.
ed. especial

73
e-B/01
SUPERANDO A TEORIA
DO PROSPECTO

Como a gente faz para tentar lidar com o problema da Te-


oria do Prospecto no nosso dia a dia, como investidor?

Primeiro, a gente sabe que o nosso cliente sofre a Teoria do


Prospecto, logo se eu perder 10%, para ele vai doer mais
do que se eu ganhar os mesmos 10%. Então, a gente tenta

João Luiz Braga


sempre correr riscos assimétricos, para cima. Esse é um dos
pontos mais importantes que entram na nossa análise.

as pessoas que
conhecem esse
viés e que são
mais calmas,
vão parar para
analisar, vão
ver isso como
oportunidade,
como geralmen-
te as crises
são.
ed. especial

74
e-B/01
Segundo, sempre buscamos hedges21 baratos, que vão re-
duzir o meu ganho, mas se o problema acontecer, perco
bem menos. Beleza, ganho menos, mas se cair também, cai
bem menos e vou sofrer menos. Tento dar uma ajustada na
relação de utilidade entre perda e ganho.

João Luiz Braga


Sempre penso: e se eu estiver errado? Perder é muito ruim.
Temos sempre que trabalhar com essa questão para evitar
que nossos próprios clientes não sofram um problema na
perda e com isso fiquem inseguros em relação a seus inves-
timentos.

Queremos dei-
xar o cliente
seguro.

ed. especial

21 Hedge - se refere a uma estratégia adotada no mercado para mitigar riscos


de um investimento.

75
e-B/01
BUSINESS DE
SOBREVIVÊNCIA

É por isso que eu falo que nosso business é um business de


sobrevivência. Se você sobreviver no longo prazo, vai com-
pondo resultados, chega lá na frente, certamente indo bem.

João Luiz Braga


Pensa: beleza! já caiu, já aconteceu, já fiquei triste, meditei,
estou bem, minimizei o viés de status quo. Refaz a conta.
nosso business Nesse nível de preço, sem ser afetado por emoção, sem ser
é um business de afetado pela queda, sem ser afetado por quanto já perdi. E
sobrevivência aí você toma a melhor decisão.

Cuidado, às vezes a decisão pode ser vender, mesmo ten-


do perdido. Mas a decisão deve ser afetada o mínimo por
efeitos psicológicos ou por emoções. É possível porque
isso aqui é investimento e em investimento, quanto mais
ed. especial

emoção é pior.

76
e-B/01
COMPORTAMENTOS
CONFORME O
MOMENTO

Uma consequência do comportamento dos clientes, se-


res humanos, que vejo claramente no meu dia a dia, é que
quando a Bolsa
quando a Bolsa está bem está subindo o mercado está em
está bem, está
alta. Os fundos de mais risco, como os nossos de ações, co-
subindo, o
meçam a captar mais dinheiro, começa a entrar mais dinhei-
mercado está

João Luiz Braga


ro de cliente, então o fundo cresce.
em alta.

Quando tem um ciclo de baixa, quando a Bolsa começa a


cair, mesmo que o fundo esteja melhor do que a Bolsa, o
quando a Bol- mercado começa a ficar pior. Vejo clientes saindo para res-
sa come¢a a gatar porque são avessos a perdas. É a Teoria do Prospecto.
cair, mesmo que
o fundo esteja
melhor do que
a Bolsa, o mer-
cado come¢a a
ficar pior.
ed. especial

77
e-B/01
E o que acontece quando você compõe no longuíssimo
prazo o retorno do fundo? Existem diversos estudos em
fundos americanos atestando isso e eu mesmo já fiz esse
estudo. A performance do fundo é melhor do que a perfor-
mance média dos clientes, porque os clientes geralmente

João Luiz Braga


saem quando deveriam se animar. Por causa do prospecto,
por que ele fica com medo. Quando a Bolsa cai, ele pen-
sa: não, agora não é a hora de entrar, o mercado está ruim,
quando na verdade deveria ser o oposto. Caiu, estamos em
um momento ruim do ciclo, é momento de aplicar.

E quando está
tudo bem é o
oposto. O clien-
te se anima fica
eufórico e quer
comprar e ga-
nhar.
ed. especial

78
e-B/01
LONGO PRAZO

João Luiz Braga


É muito comum ver essa situação no mercado e, na verdade,
o segredo é o longo prazo. O segredo é compor resultados
ao longo de um bom tempo.

Existe o movimento de alta, de baixa, porque somos seres


humanos e a economia é cíclica. Se tudo fosse eficiente,
mais parecido com o lógico, como as máquinas, não exis-
tiriam ciclos econômicos, a economia seria uma coisa mais
linear. Mas somos seres humanos e é por isso que aconte-
cem os ciclos. Esses ciclos são refletidos nos preços dos
ativos.
ed. especial

79
e-B/01
PENSAR PARA
FRENTE

Como se proteger então da Teoria do Prospecto?

Evite pensar para trás, sei que é muito difícil, sei porque pas-
sei por muita crise na minha vida. Tente ser calmo quando
está todo mundo em pânico, medite, vá correr, vai fazer um

João Luiz Braga


esporte, sai da tela. Evite pensar no que você já perdeu. Evi-
te olhar para trás, minimize o viés de status quo e pense
para frente.

Tente ser cal-


mo quando está
todo mundo em
pânico, medite,
vá correr, vai
fazer um espor-
te, sai da tela.
Pergunte: esse nível de preço de tela o investimento é bom
ed. especial

e ruim? E assim você minimiza um pouco os efeitos muito


nocivos da Teoria do Prospecto.

80
e-B/01
CAPÍTULO VIII

João Luiz Braga


Enfrentando crises

ed. especial

81
e-B/01
A CRISE DE 2008

João Luiz Braga


Em 2008, vivi uma das experiências mais difíceis em minha
carreira no mercado financeiro. Claro que olhando hoje, é
sempre bem mais fácil, e posso ver vários vieses em que
eu caí, vários vieses pelos quais o mercado passou, e quero
compartilhar aqui.

Para chegar à mesa onde eu sentava, um aquário no final


da sala, eu passava por bastante gente, pelo pessoal do
comercial, e uma das minhas especialidades na época era
2008 foi uma análise de bancos. 2008 foi uma crise essencialmente finan-
crise essen- ceira, vivi bem na pele. No Brasil, existem bancos peque-
cialmente fi- nos, médios, e os servidores distribuem CDBs, títulos, de
nanceira. todos esses bancos.
ed. especial

82
e-B/01
Consegui ter um termôme-
tro da crise de acordo com
as perguntas que recebia.
João, o banco X Y Z, que é
um banco médio ou peque-
no, não tem risco de que-
brar? E a cada dia que eu
passava na frente do pessoal
do comercial, o banco que
eles me perguntavam era o

João Luiz Braga


banco o maior. Até chegar, li- Os bancos começaram a
teralmente, ao terceiro maior cair, e existia muita incer-
banco privado da época. É teza sobre o que tinha no
uma história que foi bem balanço patrimonial dos
tensa e que, graças a Deus, bancos. Existia a questão de
teve um final feliz. uma dívida que chamava du-
plo indexador, não quero ser
muito técnico, mas o pessoal
não tinha muita ideia do ta-
manho disso no balanço dos
bancos. A coisa piorava bas-
tante e era alavancada con-
forme o dólar subia (saiu de
1,80 para 2,20).
ed. especial

83
e-B/01
O ALERTA
DISPARADO

A condução do banco central em relação à crise foi até mui-


to boa. Teve só uma coisa que deixou o mercado com medo,
que foi a notícia que o banco público poderia comprar ban-

João Luiz Braga


co privado, que até então não podia. Como é que o mercado
leu essa informação?

Meu Deus, tem alguém quebrando!


O mercado tem
o Recency Bias,
que coloca sem-
pre muito peso
nas notícias,
que sempre so-
frem de assime-
trias de infor-
ma¢ão, então, a
condu¢ão desse
tipo de notícia
é difícil.
ed. especial

84
e-B/01
E numa sexta-feira, um da-
queles dias de circuit bre-
aker, que tudo caia 10%, e
os bancos grandes estavam
caindo na média 8%. Um
desses bancos começou a
sofrer um ataque especu-
lativo. As pessoas começa-
ram a achar que este banco

João Luiz Braga


era o tal banco que poderia
ter problema. Eu tinha ação Aquilo seria muito sério, pois
deste banco na carteira. Via era uma sexta-feira, que se
a ação desse banco cair 8, realmente se confirmasse
9, 10, 11, 12, 15%. E os outros qualquer problema, pode-
bancos caindo 8%. E o mer- ria gerar o que no mercado
cado começa a pensar, que chama de profecia autor-
o que está acontecendo? realizável. O fato levantava
Olha a manada! Têm três nas pessoas dúvidas. Sába-
gazelas correndo ali, é bom do, domingo, notícias. Pode-
correr também. ria chegar na segunda-feira
a uma corrida bancária. Ima-
gine o tamanho da crise que
poderíamos ter no Brasil.
ed. especial

85
e-B/01
A CAVALARIA
ATUANDO

O banco, em questão, foi ex- O clima na nossa sala lá na


tremamente enérgico em asset era de velório.
atuar contra esse ataque
especulativo. E começou a O banco chegou até o seu
recomprar a própria ação limite de recompra, soltou
agressivamente e pela pró- um resultado para recom-
pria corretora do banco. prar mais, aumentou o po-
Você conseguia der de recompra. Até que no

João Luiz Braga


Ainda bem, isso foi um dos
ouvir os mouses motivos para a crise não ser meio da tarde (o mercado
clicando. Nin- pior ainda, no Brasil. buscando informação que
guém entenden- não vem, e artilharia com-
do nada. Uma maneira de o banco prando sem parar), o preço,
dizer, como gente brinca no então começou a voltar, 25,
mercado: é a cavalaria atu- 24, 23.
ando. Talvez um pouquinho
de efeito halo. O mercado Os próprios especuladores
continuou atuando, chegou que estavam jogando o peso
a cair 25%, se não me enga- para baixo, que fazem as
no, enquanto os outros eram operações de venda a des-
8%. coberto, o short selling, eles
mesmos começaram a ter
que recomprar. Começou a
voltar e fechou a noite cain-
ed. especial

do os mesmos 8% dos outros


bancos.

86
e-B/01
PERCEPÇÃO
DESCOLADA DA
REALIDADE

É óbvio que tinha risco. Qual o efeito de um banco? Às ve-

João Luiz Braga


zes um banco saudável quebra porque, por algum motivo,
a ação cai 25%, e isso levanta questionamentos, corrida ban-
cária, resgates, bancos sempre trabalha alavancado, não
consegue cumprir com os resgates e quebra. Este era seu
E foi assim que risco.
um dos três
maiores ban- Agora, se banco estava recomprando a própria ação, para
cos privados do mostrar que estava líquido, que conseguia enfrentar esse
Brasil evitou ataque especulativo, talvez a percepção sobre o risco es-
uma possível tivesse grande demais.
corrida bancá-
ria, que levaria A primeira coisa que fiz no sábado e no domingo foi acordar
a crise para e ir à banca de jornal para ver se tinha alguma notícia sobre
um nível muito isso. Zero notícia. Segunda-feira, vida normal, as ações acor-
pior. daram mais tranquilas.
ed. especial

87
e-B/01
Você viu o efeito manada, viu
a Teoria do Prospecto; ima-
gine quantas pessoas não
saíram vendendo, porque
não sabiam o que estava
acontecendo.

Os avessos à

João Luiz Braga


perda vende-
ram a qualquer
pre¢o.
Você viu o efeito halo, o
efeito framing, o jeito de ter
uma recompra pelo banco
que está sendo especula-
do.

Você viu um WYSIATI baixo,


porque ninguém estava ven-
do, ninguém entrou saben-
do que o que estava acon-
tecendo, nem tinha muito
como saber.
ed. especial

88
e-B/01
EVIDÊNCIAS
IGNORADAS

Quem estuda, Foram diversos vieses que


quem conhece o se você conseguisse com-
banco, não es- bater, por exemplo, quando Consegue imaginar que
tava vendo tan- estava caindo 25 ou 20, ou provavelmente o banco em
to indício para mesmo 15% e fizesse a per- questão tem mais informa-
algo tão ruim gunta: será que a análise ção do que os especula-
acontecer. está completa o suficiente dores que estavam agindo

João Luiz Braga


para ocorrer a assimetria? contra a própria cultura do
Talvez teria ganhado um di- banco? Então, essa era uma
nheiro, e aproveitar para ir informação relevante.
contra o efeito manada.
Você pode pensar, calma eu
estou vendo a manada, es-
tou perdendo dinheiro, sou
avesso à perda (Teoria do
Mas tem um in-
Prospecto), estou sofrendo
dicativo aqui:
bastante.
a corretora do
banco está com-
prando, e com-
prando muito
agressivamen-
te.
ed. especial

89
e-B/01
Será possível saber a informação, saber que o movimento

João Luiz Braga


está sendo exagerado e está sendo causado por vieses?

Crises como
essa, e isso é
uma má notícia,
nós vamos en-
frentar muitas. ed. especial

90
e-B/01
LIÇÕES DAS
CRISES

Estou no mercado desde o começo dos anos 2000. Já pas-


sei por 2002, que foi muito ruim; passei pela bolha do Nas-
daq em 2001; passei por 2008, que foi péssimo; 2015/16 foi
muito ruim também. Em 2020 a COVID-19. Sei que ainda vou
passar por várias. E sempre quando você está numa crise,
por causa dos vieses ela sempre vai parecer:

João Luiz Braga


1) Muito maior do que ela é;
2) A pior crise que já viveu na vida.
ed. especial

91
e-B/01
E crises passam. O recado aqui é:

- agir com bastante calma;


- checar se você não está sendo afetado
pelo sentimento de perda (pela Teoria do
Prospecto); e

João Luiz Braga


- analisar se naquele pre¢o se naquela
situa¢ão não existe uma assimetria, uma
assimetria que você tem que aproveitar.

E exatamente para tomar a melhor decisão


possível, você não pode deixar os vieses te
controlarem.

ed. especial

92
e-B/01
CAPÍTULO IX

João Luiz Braga


Lições de uma
experiência

ed. especial

93
e-B/01
O CASO VIA
VAREJO

Vou contar um caso real, na prática, de quando eu fazia ges-


tão dos fundos da XP, que é o caso de Via Varejo.

Esse caso é muito legal, porque tem acertos em domar

João Luiz Braga


bem os vieses, mas também tem erros. Sei que cometi er-
ros por cair em vieses, e sabendo que estava caindo, que
estava sofrendo e procurando conforto cognitivo onde
não deveria, para manter uma posição errada, de um ta-
manho errado.

No começo de 2019, tinha uma empresa chamada Via Vare-


jo, para a qual o mercado tinha olhos muito ruins. Ela tinha
um controlador francês, que assumidamente não gostava
do business, que preferia o business de supermercado, que
falava em vender a companhia, que já tinha colocado a sua
posição à venda de pouco em pouco, mas que ainda contro-
lava a empresa.
ed. especial

94
e-B/01
O MERCADO DE
ELETROELETRÔNICOS

A empresa operacionalmente não crescia, estava perdendo


market share22. Em 2012, ela vendia mais e faturava mais do
que os seis próximos colocados. Ela vendia mais que a soma
de todos. Ainda em 2019, ela vendia aproximadamente 50%

João Luiz Braga


a mais que a segunda colocada. Era uma posição compe-
titiva, ainda forte, mas cedente. Estava abrindo mão de
market share em todo este período.

O business de eletroeletrônico, no varejo, é um business


de margens muito baixas. Qualquer pequena vantagem na
compra, em termos de preço, é importante. Fizemos uma
pesquisa intensiva com vários fornecedores de como seria a
relação comercial entre eles e os competidores. Chegou-se
à conclusão que para a maioria deles, em média, a Via Varejo
tinha uma vantagem de compra de algo entre 3 a 5% (num
business de margem pequena, é extremamente relevante).
ed. especial

22 Market share - é a fatia ou quota de mercado que uma empresa detém em um


setor específico.

95
e-B/01
Aquele era o último ano, em que teriam vantagem na com-
pra. Ela estava cedendo market share, não crescia e os con-

João Luiz Braga


correntes, especialmente o segundo colocado - Magazine
Luiza - estavam crescendo fortemente. Em questão de um
ou dois anos essa vantagem acabava. O Magazine Luiza é,
ainda, muito melhor operacionalmente, já vinha fazendo seu
turn around23 desde 2014, e certamente passaria a Via Varejo
e a colocaria em uma situação ainda pior.

ed. especial

23 Turn around - no mercado corporativo significa uma guinada drástica de es-


tratégia da empresa.

96
e-B/01
OPORTUNIDADE
DE MERCADO

A empresa não gerava caixa, tinha prejuízo, indo mal opera-


cionalmente, indo mal mesmo tendo vantagens.

A gente olhou para aquilo e viu uma oportunidade. Tam-

João Luiz Braga


bém poderíamos ver o status quo: a empresa está indo mal,
deve continuar no mal.

Preferi ver como uma chance de virada e, junto


com meu time, fui atrás de uma família que
não era quem controlava, tinha uma posi¢ão
relevante na empresa, mas não podia fazer muita
coisa, porque havia o controlador francês. ed. especial

97
e-B/01
Falei: a empresa está indo
mal, você está vendo seu pa-
trimônio ir mal; além de tudo
são mais de 310 lojas aluga-
das, para a própria compa-
nhia, quer dizer que além das
ações irem mal, há também
o risco nos seus aluguéis. sa ideia. Obviamente, só
funcionaria se tivesse uma
E se a gente ajudasse de al- mudança na gestão da

João Luiz Braga


guma forma a fazer o con- companhia, se assumissem
trolador sair? Fazer o con- boas práticas de governan-
trole virar difuso, é claro, ça; de gestão de pessoas;
é um volume, um cheque em relação à digitalização
grande, eram dois bilhões da companhia; várias coisas
de reais, e ele gostou des- que ele, como assessor de
referência, tinha a obrigação
de pensar e que foi pensado
bem feito.

Com essas informações na


mão, existia um possível ne-
gócio, que não tinha aconte-
cido ainda, que era um so-
nho.
ed. especial

98
e-B/01
DESCONFIANÇA

Cheguei a conversar com alguns amigos de outras áreas e


imaginar a Via Varejo na mão de outro controlador ou sem
controle; ou com um management competente para fazer
um turn around. Será que não vale a pena? Foi engraçado,

João Luiz Braga


ninguém quis falar comigo. Ninguém topou! É muito arrisca-
do, o business é ruim, é chato.

Nessa hora, falamos, a ideia é boa, vamos colaborar com


um cheque de tamanho relativamente grande, longe de
ser todo o dinheiro que precisa, mas a gente está fora, não
conseguimos fazer do jeito fácil. Se vocês quiserem fazer
do jeito difícil, vamos fazer através do investment bank, que
vocês contratam. Foi o que eles fizeram e acabou dando
certo.
O deal acabou
saindo no final
de junho de 2019
ed. especial

99
e-B/01
Acabou tendo tanto suces-
so que o mercado comprou
toda a oferta. Essa própria
família controladora não
precisou colocar muito di-
nheiro, o mercado já havia
feito a oferta.

João Luiz Braga


Para isso, de fato, eles fize-
ram um road show24, con- Muita gente ficou bem res-
tando a história. Eu contan- sabiada, muita gente só viu
do, como investidor, é uma uma oportunidade de cur-
coisa; eles como empresa, to prazo. Era 4,90 reais por
fazendo uma apresenta- ação, na época, e acabou
ção, com estudo de caso; a que a gente entrou grande
história vira outra. E acabou na ação e a nossa história
que deu certo. com a Via Varejo começou.

ed. especial

24 Road show - é a prática recorrente no mercado financeiro de realização de


eventos para divulgar projetos, programas de uma empresa.

100
e-B/01
INCENTIVOS CERTOS
PARA PESSOAS CERTAS

Depois disso fui convidado para virar conselheiro, pelo


pessoal do board. Aceitei. Como estava na composição da
Se você der o in- chapa foi uma experiência muito bacana, aprendi muito tra-

João Luiz Braga


centivo certo, balhando e ajudando no trabalho por dentro. Foi muito ba-
a coisa vai por cana.
um lado. Se você
der o incentivo Seguramos o nosso investimento e a empresa começou a
errado, para as fazer uma transformação grande. A empresa mudou toda a
mesmas pessoas, diretoria, mudou bastante vários níveis, e principalmente os
a coisa vai para incentivos.
o outro.
De novo, estamos falando sobre o comportamento do ser
humano. O ser humano reage a incentivos. Se você der o
incentivo certo, a coisa vai por um lado. Se você der o in-
centivo errado, para as mesmas pessoas, a coisa vai para o
outro. Dando o incentivo certo para as pessoas certas, eles
conseguiram atrair um time excelente.
ed. especial

101
e-B/01
Toda a diretoria é muito boa. Eu cito algumas pessoas como
o Helison, que é a pessoa que foi tocar a parte digital, um
gênio que ficou 17 anos no Mercado Livre, um cara muito bri-
lhante. A Ilka, no marketing, que era da concorrente; o Abel.
Um time bom alinhado e com mato alto gigantesco, nos
pareceu uma excelente oportunidade.

É claro que essa oportunidade, esse conhecimento, eram in-

João Luiz Braga


formações públicas, até enquanto eu não era do Conselho
da empresa.

Fomos à busca
incessante por
dissonância
cognitiva e por
opiniões con-
trárias.
Eu via muita gente inteligente falar: será? Conheço essa em-
presa há tanto tempo, será que dá para mudar? Será que dá
ed. especial

para acreditar? E era bom ouvir essas pessoas.

102
e-B/01
LENTA SUPERAÇÃO
DE VIESES

E não era para eu mudar de opinião e sim para corroborar


a minha opinião. Porque os problemas que eles veem na
companhia, estão relacionados ao passado, o viés de status
quo, a ancoragem. Estão ancorados no que a companhia
foi no passado e deixam de ver o potencial da companhia
no futuro.

E eu me animava mais com o caso. E ação saiu de 4,90, ba-

João Luiz Braga


teu 5, bateu 6, e foi até 16 reais. Foi muito rápido e aí ao longo
deste caminho muita gente me perguntava, e a Via Varejo?
Como é que é? E era fácil explicar, porque o caso da Via Va-
rejo, que eu contava, era o mesmo caso que eu tinha visto
e estudado desde antes de entrar na ação. O que estava
acontecendo era a implementação de um programa que era
factível. Só que os vieses são tão fortes que as pessoas não
acreditavam. E a ação foi subindo e as pessoas passaram a
enfrentar outros vieses: agora já subiu! Ancoragem de novo.

Enfim, foi o caso que acabou subindo muito rápido, ainda


com pouco institucional comprado na tese, depois teve a
COVID, caiu. Vou falar depois sobre o meu erro, e até hoje
o pessoal deve ter um pouco de pé atrás, a empresa ainda
negocia em múltiplos e em valuations muito menores que
ed. especial

seus peers25, então talvez exista uma assimetria.

25 Peers – são os pares da empresa, outras empresas competidoras em situa-


ção próxima no mercado.

103
e-B/01
NICHO COMPETITIVO E
ASSIMETRIA DO CASO

João Luiz Braga


Tem chance de
dar errado?
Claro que tem e
não é pequena, Os competidores são excelentes e nada pior para qual-
mas é um nicho quer ação da Bolsa, para qualquer empresa, do que com-
difícil, muito petição. Então, é óbvio que tem risco de dar ruim. É óbvio,
competitivo. que tem chance de começar a piorar. Já não faço mais parte
do conselho, mas estou acompanhando a cada trimestre, os
resultados, e monitorando a mesma coisa, que monitorava
desde antes de comprar a ação, que é se a evolução do turn
around (continuar crescendo e construindo uma empresa
mais digital, mais relacionada a tecnologia), vai continuar
acontecendo. Se acontecer, me parece um caso assimétrico.
ed. especial

104
e-B/01
De novo, daqui a dez anos a gente pode ver o caso e ver que
a Via Varejo quebrou. Não tem problema, é por isso que não
coloco todos os ovos numa cesta só. Meu nível de convicção
na empresa, ainda mais com a liquidez alta, poderia me dar
uma posição bem grande, mas eu não tinha. Cheguei a ter
um tempo; foi um erro, e comentarei daqui a pouco.

João Luiz Braga


é por isso que
não coloco to-
dos os ovos numa
cesta só
E é por isso que no nosso business, a gente compõe um
portfólio diversificado, também para evitar as consequên-
cias da Teoria do Prospecto, de aversão ao risco, aversão
às perdas. Então, não tem problema se der errado lá atrás.
ed. especial

105
e-B/01
APEGO E
IMPERMANÊNCIA

E por fim, lembrando, e esse é um outro viés, temos muito


amor, muito apego por nossas posições, por causa do status
quo.
Mudar de opi-
nião nos custa
muito caro.
Uma maneira que uso para diminuir esse meu problema

João Luiz Braga


cognitivo, é sempre acreditar que sou pago para mudar de
opinião. Talvez amanhã, ou depois, de ter escrito este livro,
vá mudar de opinião; e infelizmente, não vou voltar aqui para
contar. Aos olhos de hoje, se o trabalho que está sendo feito,
resultado entregue e um resultado bom; em alguma hora o
mercado pode perceber essa empresa mais como uma em-
presa digital e aí o valuation vai colar nas outras, duas, três,
quatro vezes mais caro. Ou vai colar em algumas caindo, ou-
tras subindo, ou no meio do caminho.

É isso que fazemos no nosso dia a dia:

estudamos, tentamos ver diferente do consenso,


tentamos fugir dos vieses, tentamos virar
ed. especial

a assimetria e nos colocamos em um tamanho


certo para aquela posi¢ão

106
e-B/01
EQUÍVOCOS PELO
CAMINHO

Mas nem tudo são flores na história, também houve erros


no meio do caminho, também por causa dos vieses, exa-
tamente a questão do tamanho da posição, a qual estava
me referindo.

Resumidamente, costumo dizer que o nosso business é de

João Luiz Braga


sobrevivência. Temos que sobreviver. Se conseguirmos so-
breviver por quarenta anos, muito provavelmente vamos
ganhar dinheiro. Só que para sobreviver, um dos aspectos
muito importante é o tamanho da posição que a gente faz.

Porque se erramos uma posição pequena a gente sobrevi-


ve, se a gente erra uma posição grande, a gente morre. Já
aconteceu, já passei perto de morrer inúmeras vezes minha
vida; com a COVID; em 2008, no caso do banco que eu con-
tei aqui; no caso de uma empresa de saúde em 2018. Sobre-
vivi a todas, por um motivo:

só estou aqui para contar essa história porque


ed. especial

o tamanho da minha posi¢ão é ajustado ao risco


que topava correr.

107
e-B/01
POSIÇÃO ELEVADA
DEMAIS

E aí vem o erro com o Via Va-


rejo. Quando a gente mon-
tou a posição, era nove por
cento do fundo. Que é uma
posição grande, mas bem

João Luiz Braga


tolerável. Mais que 15 eu não
durmo; entre 10 e 15 tem que
ter muita convicção e uma Quando montamos a posi-
empresa bastante líquida. ção da Via Varejo, no leilão
Bom mesmo numa posição que falei antes, compramos
grande é 10, talvez um pou- uma posição a 9% do fundo.
quinho mais que isso, mas Só para metrificar, dava mais
não muito. ou menos 8% da empresa,
da Via Varejo. Os nossos fun-
dos, que na carteira eram 9%,
e o resto os outros 91% eram
outras posições, representa-
va aproximadamente 8% da
companhia.
ed. especial

108
e-B/01
Depois que compramos a 4,90, a ação subiu muito, e o que
era 9% do fundo começou a crescer em relação à proporção
da carteira. Ainda era 8% da empresa obviamente, mas isso
em relação ao fundo bateu 15, bateu 20, e aí eu não dormia
mais.

Lembrando, qual o exercício que eu faço todo dia?

João Luiz Braga


Antes de dormir imagino que vendi toda a
carteira; no dia seguinte, acordo e ganho uma
asset de presente e tenho que montar a carteira
do zero.

Se tivesse montando uma carteira, ali do zero, eu ia ter 20%


da Via Varejo? Não, eu não ia ter, porque é uma ação muito
grande em relação ao risco.

Lembra que estamos aqui para sobreviver. Essa é regra


número 1, olha o erro...
ed. especial

109
e-B/01
AJUSTES
NECESSÁRIOS?

Começamos a vender, estávamos incomodados e começa-


mos a vender aos poucos. Primeiro erro. No mercado finan-
ceiro não tem essa de fazer as coisas devagar. Você tem que
se ajustar rápido, porque não sabe o dia de amanhã. Este
é um outro viés, que chamamos no mercado financeiro de
ficelar26.
No mercado fi-
nanceiro não

João Luiz Braga


tem essa de
fazer as coisas
devagar
A ação só subia, eu vendia. O que era 8% da empresa ficou
mais ou menos 5 e pouco, que na carteira ainda era muito,
16%. Esse foi um grande erro.

João você é um cara que adora o estudo dos vieses, fala


sobre isso todo dia, repete o tal do WYSIATI como se fosse
uma religião, como você mesmo caiu?

Eu busquei um conforto cognitivo: tudo bem, sei que estou


fazendo um exercício de minimização do viés do status quo.
Eu sei que esse conforto cognitivo confunde com foco, tipo
não comprei 16% ou 20%, comprei nove que virou 20, e estou
vendendo. Na derivada eu estou vendendo, devagarzinho,
ed. especial

mas estou vendendo, está em 16.

26 Ficelar – expressão da língua portuguesa que vem do carteado, quando um


jogador adota artimanha para iludir os demais, usa-se também “filar”.

110
e-B/01
O CISNE NEGRO

Erro feio! Eu devia ter sido E quando veio esse “Cisne


mais agressivo nessa venda, Negro”, esse evento que nin-
eu devia ter voltado para 9, guém esperava, minha posi-
e o que aconteceu? ção era de 16%, ou seja, exa-
geradamente grande. Devia
ser de 9, 10 no máximo, que

João Luiz Braga


ainda seria grande.

O conforto cognitivo que


achei (que a posição cres-
ceu de forma passiva), foi
Veio a pandemia e um erro que me traiu, fez
aconteceu o que, com que eu não fosse fiel a
certamente, não uma coisa repito desde que
estava em nenhum virei gestor: todo dia à noite
dos modelos das você imagina que vendeu
estimativas ou tudo. Todo dia de manhã
das expectativas você imagina que ganhou
de analistas, que uma asset de presente. Eu
é acordar com manteria essa posição? Teria
todas as lojas essa carteira? E eu mesmo
ed. especial

fechadas. caí nessa.

111
e-B/01
TRAIÇÃO
COGNITIVA

Veja como o nos-


so cérebro con-
segue nos trair
Eu sabia do viés, sabia que estava caindo no viés, mas meu
cérebro achou um jeito de me fazer ficar confortável.

João Luiz Braga


Fui caindo em derivadas de vieses, um dos motivos de o
fundo ter ido mal à época, na verdade não foi o único, fo-
ram vários motivos ao mesmo tempo, mas foi certamente o
motivo que contribuiu para uma performance ruim, em um
período, em que você tem a obrigação de performar bem,
porque está tudo muito ruim.

Por que a obriga¢ão de performar bem? Por


causa da Teoria do Prospecto
ed. especial

112
e-B/01
Porque eu gostaria que meu
cliente ficasse tranquilo
quando eu fosse mal e não
ficasse ainda mais preocu-
pado.

João Luiz Braga


Foi um erro na minha carrei-
ra de gestor. A gente tinha essa preocupação, de sem-
um histórico ótimo defender pre tentar comprar hedge, e
quedas. A gente tem de fato tudo baseado na Teoria do
Esse erro vou Prospecto. Um viés que vi-
tentar não vemos no dia a dia e, na pior
cometer mais, das crises, acabei cometen-
não dá para ter do. Por causa de uma traição
certeza, porque do meu cérebro, em relação
o nosso cérebro ao qual tenho ficado sempre
nos engana e, preocupado.
de novo, acabei
sendo inimigo
de mim mesmo.
ed. especial

113
e-B/01
APRENDIZADO DA
EXPERIÊNCIA

A história afinal, foi muito bonita, a gente ganhou muito


dinheiro com esta posição. Logo depois ela voltou para os
16 chegou a bater 20. A posição ainda era muito relevante
no fundo, então o líquido da história como um todo, é cer-
tamente um ganho muito bom, é um caso muito bonito. Foi

João Luiz Braga


muito legal entrar na empresa e conhecer e participar deste
turn around.

Foi um aprendi-
zado em rela¢ão
a vieses para
todos os lados,
tanto pelo lado
bom, quanto pelo
lado ruim
A principal conclusão dessa história é que você tem que
estudar muito os vieses, ter o hedge, de fato conseguir ter
vantagem em relação à média de mercado. Óbvio que meu
hedge foi positivo, que ajudou a não ancorar em empresa
ed. especial

ruim, ajudou a ver o status quo, olhar sempre para frente,


ajudou a operar bem em alguns momentos, mas também
erros que custaram um dinheiro bom.

114
e-B/01
A conclusão é que o estudo do comportamento
humano é tão importante, que mesmo que conhe¢a
bem, pode sofrer os impactos negativos de ser
afetado pelos vieses.

João Luiz Braga


É ficar relembrando: incorporar a questão comportamen-
tal em seus processos e sempre ficar checando, checando
e checando. Não se basear em resultado. De novo, se a ação
tivesse subido e não caído, ainda seria um erro, porque eu
não deveria ter me permitido cair naquele comportamento,
naquele viés.

E você checando e checando o processo por ele mesmo,


incorporando os comportamentos nele, tem mais chance
de ir melhor.
ed. especial

115
116
CAPÍTULO X

Mente aberta

ed. especial João Luiz Braga e-B/01


e-B/01
ENTENDENDO
A ILUSÃO

Quando você sai de um filme qual a sensação que perdura?


A do início, do meio ou do final do filme? Daniel Kahneman,
traz no final do seu livro, por acaso, um outro viés curioso,
que pouca gente fala no dia a dia de mercado. É o que ele
Quando você
chama de Ilusão de Pico-fim. Vou contar à minha maneira,
sai de um filme
o que foi feito com rigor estatístico, com processo científico.
qual a sensa¢ão
que perdura?
A do início, do

João Luiz Braga


meio ou do final
do filme?
Kahneman separou dois grupos; o grupo A colocava a mão
em um recipiente com água a 15° Celsius, por dois minutos.
É muito desconfortável, acredite. O grupo B, a mesma expe-
riência, nos mesmos dois minutos, só que depois do tempo
regulamentar, a cada 10 segundos ele aumentava a tempe-
ratura um grau, até ficar agradável.

Pergunta: quem sofreu mais, o grupo A ou o grupo B? Obvia-


mente, em termos lógicos, foi o grupo B, que sofreu igual os
mesmos dois minutos regulamentares e continuou sofren-
do menos e menos e menos até parar de sofrer e só aí tirar a
mão. Quando questionou os participantes, majoritariamente
eles preferiram a experiência B.
ed. especial

Kahneman descobriu aí, que o final da experiência tem


mais importância na sua memória, na sua lembrança,
como boa ou como ruim, do que a experiência como todo.

117
e-B/01
NA RECEITA DE
HOLLYWOOD

Hollywood sabe muito bem, é por isso que o final dos filmes
tem aquele impacto, algo positivo para você sair do filme e
falar: “Caramba, esse filme é muito bom”. O fim da experiên-
cia tem muita importância.

Às vezes você vai ao restaurante, a comida é maravilhosa,


No mercado fi- você pede a conta e demora mais do que você esperava. Vai
nanceiro não achar que o restaurante é muito ruim. Só porque o finzinho

João Luiz Braga


tem essa de da experiência foi ruim. Se você quiser agradar seu cliente,
fazer as coisas lembre-se, se preocupe com fim da experiência. Porque,
devagar provavelmente, a pessoa vai ter uma lembrança como um
todo daquela experiência alterada por esse final.

ed. especial

118
e-B/01
A ILUSÃO NO
MERCADO

E o que isso tem a ver com o mercado? Vi muita gente numa


posição qualquer, comprando uma posição e acha que tem
que vender porque a posição está caindo 3% na hora. Se
pensar em segurar um pouquinho, entra na torcida, porque
você não sabe o vai acontecer depois. E no dia seguinte cai
mais três: meu Deus do céu, tenho que vender! Depois de
um tempo, sobe 3%, a pessoa vende e acha que fez o certo.

João Luiz Braga


Não! Ela tinha que ter vendido lá atrás, no primeiro dia.

Tinha que tirar Isso é algo que vejo constantemente no mercado, e é pura
a mão da água torcida.
gelada na hora,
não continuar Como é que resolvemos esse problema? Uma das formas
sofrendo até é a famosa minimização de viés de status quo. Se todo dia
melhorar um você parar e pensar: gostaria de ter essa ação na minha car-
pouquinho. teira? Sim ou não? Independente da condição do passado,
aquele preço, naquela premissa, naquela situação, eu gos-
ed. especial

taria de ter aquela ação? Não? Vende na hora. Não espere


para ver se amanhã pode ser melhor, porque amanhã pode
ser pior.

119
e-B/01
ENTENDENDO
A ILUSÃO
O mercado tem uma frase famosa: “as pessoas são avessas
ao risco quando estão ganhando e adoram o risco quando
estão perdendo”. Tipo, se começou a perder, a pessoa fica
mais segura, por quê? Porque, isso é basicamente torcida.

"as pessoas são avessas ao risco quando estão


ganhando e adoram o risco quando

João Luiz Braga


estão perdendo".

No caso de a perda ser grande, no caso da Teoria do Pros-


pecto, a pessoa fica corajosa, espera subir para vender. E
isso é basicamente Ilusão de Pico-fim, a pessoa quer termi-
nar a experiência do trade ou do investimento, de um jeito
positivo. A qualidade da experiência inteira vai ser deter-
minada pelo fim , isso é um grande erro no mundo dos in-
vestimentos.
A ilusão de Pi-
co-fim acontece Um relacionamento de 20 anos que terminou mal, não ne-
em todos os as- cessariamente foi ruim; o emprego de 10 anos, que no final
pectos da vida teve um problema não foi necessariamente uma experiên-
cia ruim; você faz um caminho muito bonito, mas no final
ed. especial

chega a um lugar feio, não significa que todo o caminho foi


feio.

120
e-B/01
A ILUSÃO NO MUNDO
DOS INVESTIMENTOS

Um exemplo de Ilusão de Pico-fim, em investidores de fun-


dos, que vejo acontecer, é quando, em um fundo qualquer
que vai mal, a pessoa não resgata na hora, espera voltar
um pouquinho, mas também não aplica mais; e só resgata

João Luiz Braga


quando chega na cota que não está mais perdendo, só para
não realizar uma perda.

E às vezes esse fundo perdeu, porque têm mil motivos para


um fundo ir mal (perdeu o time, o time mudou, o gestor tá
desmotivado), e a pessoa segura só para o final da experiên-
cia não ser ruim. E se você fez a análise e, por algum motivo,
o fundo é diferente e ficou pior, deve realizar o resgate mes-
mo com prejuízo.

Para o mundo do investimento, não espere o finalzinho ser


legal para achar que a experiência inteira foi; se você qui-
ser comprar uma ação ou vender, não importa como foi no
passado, tem que ser preço de tela: se você quer vender,
mas está caindo, se esperar um pouquinho você virou torce-
dor e não é bom ser torcedor no mundo dos investimentos.
ed. especial

121
e-B/01
LÁ NOS IDOS DE
ROOSEVELT

Negotiation Gennius é o meu livro preferido de negociação.


O autor, Deepak Malhotra27, é professor da Harvard Business
School, e fala de exemplos práticos e teorias da administra-
ção, sempre cita os vieses, cita Kahneman.

Uma das histórias, que vou contar do meu jeito, é sobre a


campanha de Franklin Roosevelt em 1932. Depois de im-
primir 3 milhões de santinhos com uma foto de Roosevelt,

João Luiz Braga


descobriram que não tinham a autorização do fotógrafo.
Houve um custo, e poderia custar três vezes mais se hou-
vesse litígio, no caso de alguma ação na justiça contra o uso
não autorizado da imagem.

Se você fosse o chefe da campanha de Roosevelt o que


faria? Iria negociar com fotógrafo, que poderia ser o autor
de ação sobre o uso não autorizado da imagem?

ed. especial

27 Deepak Malhotra – professor e pesquisador da Harvard Business School,


autor do premiado livro Negotiating the Impossible, além da obra Negotiation
Genious.

122
e-B/01
Qual seria a sua negociação? Contar para ele? Pensar que
tem um risco de uns três milhões de dólares e ancorado por
esse valor, negociar qualquer quantia entre um e dois mi-
lhões de dólares? Oferecer um valor qualquer?

Pois é, o chefe foi mais astuto, não deixou a situação ruim


ancorá-lo, foi mente aberta, mandou telegrama para alguns
fotógrafos dizendo: sua foto foi pré-selecionada em um
concurso para virar 3 milhões de santinhos da campanha
de Roosevelt, quanto você pagaria para ter a sua foto di-

João Luiz Braga


vulgada? O fotógrafo em questão falou: pago 250 dólares.
Fechado!

Teve uma receita com o erro, porque ele é


obviamente um gênio da negocia¢ão, acredite!

Já fiz essa brincadeira com muita gente, ninguém teve a ideia


de receber um dinheiro. Ele teve mente aberta para escapar
dos vieses; lembra lá no começo quando disse que certas
pessoas já nascem com a chavinha dos vieses desligadas?
Esse cara, provavelmente, é uma delas.
ed. especial

123
e-B/01
COMO VENCER NOSSA
MENTE NO COTIDIANO?

E agora, vamos falar um pouco mais sobre como, no dia a


dia, a gente faz para evitar os vieses. Como vencer a nossa
mente? Como fugir dos vieses? É muito difícil!

João Luiz Braga


A primeira coisa, tem que ter mente aberta, humildade
intelectual, saber que você pode estar caindo em vieses.
Com a mente aberta, conhecendo todos os vieses, prati-
cando com recorrência a leitura contra o conceito deles,
saber como eles impactam.

ed. especial

124
e-B/01
Eu leio, pelo menos uma vez a cada semestre, um livrinho
pequeno, The Little Book of Behavioral Investing, de James
Montier28, que recomendo fortemente (o audiobook tem
seis horas). Ele conta um pouquinho dos vieses. Com mente
aberta, conhecendo seus vieses e sempre tendo alguém
ao seu lado para contar, te mostrar: será que você não
está caindo numa overconfidence29? Você está contando
história de uma forma muito bonita, será que não está muito
efeito halo? Será que não vale a pena checar mais?

João Luiz Braga


E ouvir a outra Precisa ser humilde, tem que pedir, querer ouvir. E é o que
pessoa pode tra- fazemos no dia a dia da ENCORE. Todo mundo é convidado
zer o problema para contar, para ler, para estudar, conversar sobre os vie-
da dissonância ses. Para que outras pessoas mostrem que você está con-
cognitiva fiante demais.
ed. especial

28 James Montier – especialista em comportamentos nas finanças, autor de vá-


rios livros como Value Investing, Behavioural Investing e do best-seller The little
book of behavioural investing: how not to be your own worst enemy.

29 Overconfidence - o excesso de confiança do investidor em determinada po-


sição.

125
e-B/01
DA ANÁLISE DO
MERCADO PARA A
CARTEIRA
Quando estiver
nos seus fó-
runs de debate,
sempre busque
opiniões con-
trárias e seja
aberto a elas
Exemplo prático: imaginar todos os dias que vende toda a

João Luiz Braga


carteira à noite e recompra no dia seguinte, para minimizar
o viés de status quo; toda terça-feira à noite, temos a reu-
nião de gestão, o time inteiro, inclusive o time Quanti, todo
mundo na sala vai discutir um case, lá a gente vai ver nosso
universo de cobertura.

A última coisa que vamos fazer é olhar para


nossa carteira
ed. especial

126
e-B/01
Por que? Porque senão vamos enviesar, só falar sobre aque-
les papéis. Melhor deixar de lado, ver o seu universo de co-
bertura inteiro, porque às vezes surge uma discussão. Você
viu sobre aquele papel? Ele caiu 20% nos últimos dias, o que
aconteceu?

João Luiz Braga


Talvez a discussão preliminar seja o princípio de uma
ideia, que pode virar um investimento. Se começar a aná-
lise pela sua carteira, se só discutir a sua carteira, você se
fecha num grupo muito reduzido de ações.

Em gestão, sempre começamos pelo universo inteiro, às ve-


zes tentamos mudar a ordem, para não chegar na quinta,
sexta reunião discutindo muito os primeiros papéis e pouco
os últimos; é importante embaralhar e mudar a ordem com
o tempo.

ed. especial

127
e-B/01
HORIZONTALIDADE
Outra coisa que fazemos para tentar minimizar os vieses é
deixar a empresa horizontal. Eu não sou gestor, sou analis-
ta generalista, e tem outro analista generalista, nove ana-
listas especialistas, aqueles que olham setor por setor, e
dois analistas quantitativos.

Esperamos que esse time cres¢a ao


longo do tempo.

João Luiz Braga


Por que falo que não sou gestor? Por que falo que sou ana-
lista generalista? Porque se o time tiver a impressão que sou
gestor, vão pensar: é ele que toma a decisão. E isso vai en-
viesar, vai fazer com que o pessoal discorde menos de mim,
e não quero isso, quero que eles discordem bastante.

HORIZONTALIDADE E VERTICALIDADE

X
ed. especial

a “diferença” é a diferença.

128
e-B/01
O mais relevante para aumentar o WYSIATI é
ter um debate aberto, então todo mundo é igual,
a empresa é horizontal, todo mundo participa
da discussão.

A gente tenta buscar consenso (não necessariamente) para


os nossos investimentos, se inteirando dos processos e
mudando as posições para sair do muito burocrático. Um
processo muito burocrático pode engessar e ser ruim, então

João Luiz Braga


evitamos.

Qualquer um pode fazer perguntas e costumamos receber


visitas na reunião de gestão e a única exigência é que tem
que participar, perguntar, opinar, não pode ficar de ouvinte,
no canto. Porque assim a gente aumenta o WYSIATI.

No mercado financeiro o seu maior inimigo não


é o bancão, não é a corretora, não é o político,
não é o gringo, não é o tubarão; é você mesmo e
só tem uma forma para vencer a si mesmo: tendo
a mente aberta.
ed. especial

129
e-B/01
CAPÍTULO XI

João Luiz Braga


Maximização do WYSIATI
na prática

ed. especial

130
e-B/01
O BUSINESS DA
REDECARD

Vamos tratar agora de outro caso prático, bastante curioso.

Pegamos uma perna short, que significa ganhar dinheiro


vendido, e depois a perna long. Foi um caso de muito estu-
do, que chamamos de um caso de maximização de WYSIA-
TE. Tínhamos só informação pública, mas o nosso diferencial

João Luiz Braga


foi pensar fora da caixa, conhecer outras coisas, falar com o
regulador, falar com o concorrente, falar com o cliente, fazer
pesquisa de campo, que trouxe um ganho quase perfeito,
conseguimos pegar todo o movimento short depois todo
movimento long. Foi com a Redecard.

o nosso diferencial foi pensar fora da caixa,


conhecer outras coisas, falar com regulador,
falar com o concorrente, falar com o cliente ed. especial

131
e-B/01
A Redecard foi o primeiro Hoje em dia tem adquirente
IPO das adquirentes, depois que vai adiante, dá as tecno-
veio a Visanet, que se tornou logias, alguns serviços ban-
a Cielo. A Redecard e a Cielo cários, algum controle de
não competiam, elas eram estoque, alguma coisa assim
dois monopólios. Se você para o cliente ter uma pre-
era um lojista e que queria ferência para o uso daquela
aceitar cartão MasterCard, maquininha.
era obrigado a ter uma ma-

João Luiz Braga


quininha da Redecard. No Pepsi e Coca são agressi-
Brasil existe um conceito vas uma com a outra, exa-
que só vejo no Brasil, que é o tamente para não deixar
do parcelado sem juros, uma entrar um terceiro na briga.
substituição do famoso che- No caso da Redecard e Cie-
que pré-datado lá de trás, do lo nem era isso e eram ex-
nosso passado de inflação. A tremamente lucrativos, com
adquirente pode antecipar o crescimento por causa da
esse dinheiro para o lojista bancarização, o uso de car-
em troca de um juro, e ga- tão crescendo entre a popu-
nha dinheiro na taxa que lação. Eram ações que nego-
cobra pelo uso da maqui- ciavam múltiplos altos.
ninha e algumas outras for-
mas, como por exemplo na
antecipação de recebíveis.
ed. especial

132
e-B/01
O CONTEXTO DE NOSSA
BOLSA DE VALORES

Os dois IPO’s foram bem hots (quentes), bem demandados


na linguagem no mercado, já chegaram subindo. São ações
que pagam dividendos e têm que ter todo um ajuste, mas a
preço ajustado eram uns 35 reais.

Ao estudar o caso, ficamos com bastante medo das ques-


tões regulatórias, das questões de competição. Recomen-
do nesse ponto um livro maravilhoso chamado Competition

João Luiz Braga


Demystified, de Judd Kahn e Bruce Greenwald30. A pior coisa
que pode acontecer para uma empresa na Bolsa é o medo
de competição, é a essência do capitalismo.

Esse é um dos motivos de a Bolsa no Brasil


ir bem mesmo com o PIB indo mal. Lembre-se:
Bolsa não é Ibovespa!
ed. especial

30 Judd Kahn tem longa carreira de docente no ensino superior e experiência


em Asset Management na Hummingbird Management; Bruce Corman Norbert
Greenwald é professor da Graduate School of Business da Columbia University
e atua como consultor da First Eagle Investment Management. Ambos escre-
veram juntos o livro Competition Demystified: a radically simplified approach to
business strategy e Value investing from Graham to Buffet and beyond.

133
e-B/01
A OGX, só para citar um
exemplo, tirou mais ou me-
nos 300% do índice. Ela ti-
nha uma posição média, nos
seus 50 mil pontos do índice,
de 4 mil pontos e ela tirou
12.000 pontos no índice. Na
época era fácil bater o índi-
ce. PDG também tirou uns

João Luiz Braga


150%. Foi uma época fácil pouca tecnologia. Você con-
de bater o índice e o pessoal segue montar uma carteira
olhou e falou nossa, Iboves- facilmente na Bolsa brasilei-
pa é um ativo ruim, “a Bolsa” ra, então não confunda Bolsa
é ruim. Não! O Ibovespa era com o Ibovespa.
ruim, tanto que a própria Bol-
sa mudou a metodologia do Na China é o contrário, o PIB
índice em 2016 e o Ibovespa vai bem e a Bolsa vai mal,
voltou a ser mais difícil bater. porque lá é tudo muito com-
petitivo e aqui quando as
Então, não pense que a Bol- empresas vão bem, se tor-
sa é o Ibovespa! O Ibovespa nam meio que oligárquicas
hoje, é uma carteira concen- e acaba sendo ruim para o
trada em bancos, concentra- ‘Main Street’, mas bom para
do em commodities, e com nossa ‘Wall Street’.
ed. especial

134
e-B/01
ESTIMANDO OS
RISCOS DO IPO

Voltando, a Redecard era uma empresa de alguns bancos,


depois tornou-se empresa independente, que fazia serviços
relacionados a cartão de crédito, mas não a emissão que
era feita pelos bancos, junto com as bandeiras (Visa, Master-
card). O que a adquirente fazia era a parte da infraestrutura,
da tecnologia para as lojas, para distribuição da aceitação
desse cartão, é a famosa maquininha.

João Luiz Braga


Fui mais de 10 vezes para Brasília para falar com o regulador
do Banco Central que, no caso, soltou notas públicas sobre
como estavam incomodados com a questão da interopera-
bilidade das maquininhas.

Era um risco grande, mas que o pessoal de


certa forma negligenciava, sabia do risco,
mas não sabia quais seriam as consequências
da abertura do mercado. ed. especial

135
e-B/01
Até que um dia o próprio
auto regulador do setor de-
cidiu caminhar para aber-
tura, porque sabia que faria
isso por bem ou por mal.
Com medo, fizemos pesqui-
sa de campo, falamos com
lojistas, falamos sobre a situ-
ação de como seria se abris-
se o mercado. Já existia au-

João Luiz Braga


tomação, especialmente nas
redes muito grandes, seria
fácil trocar uma adquirente
por outra, seria facílimo fazer
a competição.

Não existia o tal do switching cost, que seria


o custo de trocar de uma para outra. Pensamos:
se abrir o mercado vai ser uma briga de foice
no escuro.
ed. especial

136
e-B/01
A EFETIVA ABERTURA
DO MERCADO

E aí, ficamos com o short dessas ações que eram muito va-
lorizadas, o valor era caro, mas todo mundo gostava, eram
meio que ‘queridinhas’ e a gente “shorteou” a Redecard a

João Luiz Braga


uma posição de um tamanho bem relevante.

O fato é que quando o mercado abriu, o preço/taxa que o


adquirente cobrava do lojista para passar a maquininha des-
pencou! Algo perto de cinquenta por cento.

Obviamente com isso, caiu o faturamento, caiu a lucrativida-


de, e as ações começaram a desabar, tanto da Visanet (que
não sei se já tinha mudado para Cielo) quanto da Redecard.
Foram de 35 para 18.

De-sa-bou!
ed. especial

137
e-B/01
Mais ou menos em 22, a gente já não achava o risco retorno
de ficar vendido nessa ação bom, então zerou o short e ela
continuou caindo.

João Luiz Braga


A lembran¢a de um viés cognitivo aqui, não
importa! Minimiza¢ão de viés de status quo.
Meu Deus, eu zerei o short e continuou caindo,
deveria ter sofrido porque eu mudei o status
quo, não!

ed. especial

138
e-B/01
DESDOBRAMENTOS

Foi quando saiu o primeiro resultado das duas empresas


sem queda de preço, uma situação um pouco mais amigável
na competição, que até então era a briga de foice no escuro.

O estopim foi que a Redecard trocou o CEO, trocou algu-


mas pessoas, e deu muitos sinais públicos de ter havido
um cessar-fogo. Uma bandeira branca. Se fosse verdade,
ainda com o crescimento da penetração de cartão de cré-

João Luiz Braga


dito, com preços estáveis de MDR31, que é a taxa que as ad-
quirentes cobram, mais com crescimento da antecipação de
recebíveis, outro business, a ação estaria sim, de fato, muito
barata naqueles 18 reais, muito barato!

Foi uma histó- Eu tinha que ter uma confiança que aquela briga tinha aca-
ria legal com bado mesmo, não quis correr o risco logo na largada, porque
a Redecard, houvesse algum resultado com guerra de preços, a ação
pegamos dos 35 ainda teria muito para cair. Esperamos!
aos 22, zeramos
A ação foi subindo devagarzinho, quando bateu 22 reais,
e depois dos 22
mais ou menos, sem resultado de novo aumento de pre-
aos 35 compra-
ço, com confiança, montamos uma posição comprada. E a
do.
ação subiu, subiu, quando chegou mais menos 31, 32 reais,
o próprio Itaú fez uma OPA (Oferta Pública de Ações) para
comprar a RedeCard a 35,00.
ed. especial

31 MDR - é a taxa que o adquirente paga ao emissor do cartão, taxa que é dedu-
zida do pagamento que o emissor faz ao adquirente.

139
e-B/01
A ESTRATÉGIA
ADOTADA

Qual foi o diferencial? Que viés tentamos minimizar?

Para comprar uma ação com que você ganhou dinheiro


vendido por um tempo razoável, tem que minimizar um
monte de ancoragens, um monte de vieses de status quo.

João Luiz Braga


Você tem que A empresa era excelente, mas estava passando por um
saber mudar de processo de competição e de possível aumento de regu-
opinião lação. Quando essas coisas saem da frente e você fica com
fundamento, crescimento, aumento de base; tem que mu-
dar de opinião, tem que ser forte na mudança de opinião,
você não pode ser ancorado.

Por isso, sempre repito: eu sou pago para mudar de opinião,


gosto de repetir, dá conforto cognitivo de mudar de opinião.
ed. especial

Se você me vir na rede social falar bem de alguma coisa, de


que já falei mal no passado, é isso mesmo, sou pago para
mudar de opinião. Um bom conforto cognitivo, mudar de
opinião é glorioso, no investimento e na vida.

140
e-B/01
eu sou pago Acabou sendo um dos ca-
para mudar de sos, em que tenho mais fe-
opinião, gosto licidade de ter conseguido
de repetir, dá mudar de opinião, de ter
conforto cogni- conseguido fazer o WYSIA-
tivo de mudar de TI, através de muito estu-
opinião do e muita pesquisa, muito
chão de fábrica, muita via- O fato é quanto mais você
gem. estuda para tentar aumen-
tar o WYSIATI, mais você

João Luiz Braga


Uma abordagem bem com- conversa com pessoas que
plexa: conversando com discordam de você (tirar
muita gente, conversando a dissonância cognitiva),
com quem discordava de mais você vai para campo
mim; fazer um bom investi- conversa com concorrente,
mento nas duas pontas em com cliente, com regulador
um prazo de tempo relativa- (minimização de framing e
mente curto. efeito halo).

Quanto mais você faz essas coisas, maior a sua


chance de ganhar dinheiro com investimentos
ed. especial

141
e-B/01
CAPÍTULO XII

João Luiz Braga


Mente em movimento

ed. especial

142
e-B/01
UM CONSELHO
DE VIDA

A essência do meu trabalho é, com muito estudo, nesse


business muito competitivo, com muitas horas trabalhadas,

João Luiz Braga


muita gente discutindo e debatendo, conseguir preserva-
ção de capital em um prazo menor e crescimento de capital,
de apreciação de capital, em um prazo maior, com bastante
calma. ,

Meu conselho:

Invista no seu futuro, a taxa de desconto da sua vida tem


que ser alta, o seu futuro tem muito valor. Assim como
uma empresa, ou um título público, se você o desconta
com taxa baixa, ele tem muito valor no presente, e aprecia
pouco no futuro; se você descontar uma taxa alta, vai ter
pouquinho valor no presente e muito valor no futuro, a sua
vida é assim!
ed. especial

143
e-B/01
Invista no seu futuro, seja paciente, não
queira as coisas para o curto prazo.

João Luiz Braga


Acertou? Não pense que Acho que as pessoas não
você é muito bom, estude, estão prestando atenção,
estude, estude. O valor tem quando se trata do merca-
que ser gerado devagar e do, quão pequeno ele é, es-
sempre, que aí nada é mais pecialmente no Brasil. Mui-
bonito que o juro composto. ta gente acha que já cresceu,
olha como era em 2002 e o
tamanho hoje. Bovespa ne-
gociando 30, 40 bi reais por
dia. Quando eu entrei eram
centenas de milhões. E ain-
da é minúsculo perto do que
pode ser.
ed. especial

144
e-B/01
LONGEVIDADE

O que mais me preocupa em relação ao meu futuro? É ser


feliz, é trabalhar de um jeito legal, ganhar longevidade.
Vou querer trabalhar cada vez mais e por mais tempo, com
uma família muito bacana como suporte. Sempre fazer as
coisas de um jeito legal.

Trazendo para empresa, acho que o que me preocupa é não


cometer erros que já cometi no passado, é ser muito cal-
mo, é ser muito paciente e sempre preservar a cultura de
debate, de pessoas gente boa, que chegam segunda-feira

João Luiz Braga


animados para trabalhar, que tenham muito feedback, com
uma cultura de feedback, todo mundo conversando, sendo
aberto com outro. Sempre visando a longevidade porque,
de novo, o que importa é longo prazo.

o que me preocu-
pa é não cometer
erros que já co-
meti no passado, Não tenho a menor dúvida de que meus maiores ganhos de
é ser muito cal- mercado vieram de emoção. Perdi oportunidades por causa
mo, é ser muito de razão e já fui muito cauteloso com algumas coisas. Se me
paciente arrependo?

Me arrependo menos de atitudes emocionais, que


ed. especial

custaram mais do que deveria.

145
e-B/01
PRINCÍPIOS
FUNDAMENTAIS

Os dois princípios mais importantes para mim


são: a honestidade (aqui entram transparência,
foco no cliente) e a humildade

João Luiz Braga


A humildade é muito im- Eu me recuso a trabalhar
portante para ter um gru- com gente que não é humil-
po unido, coeso, gente de e que não é honesta, que
boa; é muito importante são as coisas mais impor-
para aprender. O que amo tantes para mim. Com quem
na nossa profissão é que a eu não confio, com gente que
gente sempre tem o que pega um ambiente e deixa
aprender, sempre tem o ele pior; com gente que fala,
que estudar de diferente. nossa que perguntinha burra
Ah… e você só é aberto para essa! Com esse tipo de gen-
estudar essas coisas se tem te não quero mais trabalhar.
humildade. Então, de novo,
honestidade, humildade.
ed. especial

146
e-B/01
UM EXEMPLO
DE VIDA

Eu tive um chefe que mudou minha vida. Todo mundo sabe


que é o Luiz Sthulberger é o cara mais brilhante que conhe-

João Luiz Braga


ci. Fiquei dez anos com ele. O que pessoal fala sobre ele é
pouco, ele é mais.

Então, a res- O Luis tinha viajado uma vez e conversou com o George
posta dele é a Soros, que estava com mais de oitenta anos. Na volta, me
melhor que eu chamou para conversar e falou: “João, lembra que você me
poderia dar! perguntou sobre a aposentadoria. Deixa eu contar uma
Também não que- coisa, vendo Soros atuante, trabalhando, pensando como
ro parar nunca ele pensa, tenho certeza que não quero parar é nunca”!

ed. especial

147
e-B/01
O nosso trabalho é muito legal e me faz até ser enviesado no
bom sentido pela paixão no que eu faço. Ter um brain train,
um treinamento constante do cérebro, me faz sempre estu-
dar, sempre ler uma coisa diferente, sempre falar com uma
pessoa inteligente, por exemplo CEOs de empresas.

É muito desafiador e com pouca rotina, então acho muito


apaixonante e quero continuar fazendo, porque se eu con-

João Luiz Braga


tinuar exercitando o cérebro, não será diferente do bíceps,
certo? Ele vai treinando e vai ficando melhor.

Até brinco: quero trabalhar para o resto


da vida para diminuir as chances de ter
Alzheimer.
ed. especial

148
e-B/01
PRAZERES DA
PROFISSÃO

Disparado, o que
eu mais gosto
no que eu fa¢o é
análise inves-
tigativa.
Ir atrás de pequenas informações, debates e papos que iso-
ladamente não são materiais, sem problema nenhum você
conseguir, ir atrás do Big Data na internet, por exemplo, uma

João Luiz Braga


reunião com o concorrente estrangeiro ou interno, que faça
algo parecido, mas juntando todas as informações.

Você tem uma conclusão legal quando come¢a a


juntar os caquinhos e fala: caramba, isso está
fazendo sentido. Cara isso aqui é muito legal,
vamos, vamos.

ed. especial

149
e-B/01
E a outra coisa de que gosto muito na nossa profissão, brin-
co, que a gente é pago para falar com gente muito inteli-
gente né, que são CEOs das maiores empresas do Brasil,
algumas melhores do mundo.

Quando sento para falar com o CEO da Suzano, que é um

João Luiz Braga


dos que mais entende de celulose no mundo, e ele me re-
cebe por uma hora, para eu fazer o que quiser de pergunta,
penso:

e eu ainda sou pago para isso? Eu deveria pagar


para falar com ele, não receber. Amo a minha
profissão

ed. especial

150
e-B/01
O BOM GESTOR

Não existe verdade absoluta no mundo de investimento, es-


cuto perguntarem, por exemplo: Qual que é a caracterís-
tica de um bom gestor? Essa pergunta bem difícil porque
já vi tudo; já vi gestor que gosta de trabalhar com time pe-
queno e vai super bem; já vi gestor que é mais o meu estilo,

João Luiz Braga


que gosta de trabalhar com um time bem grande e muito
específico (e se Deus quiser vamos bem); já vi fundo que não
tem nenhum gestor, é um computador operando e vai bem.
Então, acho que não tem uma resposta exata para isso.

Gosto de atuar com muita troca de


conhecimentos, de maneira extremamente
horizontal e visando longo prazo

ed. especial

151
e-B/01
ROTINAS E HÁBITOS

Tenho poucas rotinas, alguns Para conseguir focar, tem


hábitos que converto em ro- uma técnica que eu chamo
tinas para me tornar uma de pomodoro (é tomate em
pessoa melhor, com mais italiano, e recebeu o nome
foco. Gosto fazer esporte por causa do cronômetro
pela manhã, porque se faço de cozinha que parece um
à noite, durmo mal; mas se tomatezinho). Recomendo
faço de manhã, chego mais fortemente, é simples, uso
acelerado ao trabalho, mais muito.
focado.

João Luiz Braga


É só colocar 25 minutos no
Tenho alguns hábitos que cronômetro e fazer uma ta-
me ajudam no trabalho. Sou refa, ler o e-mail, escrever
hiperativo, não consigo parar a carta do fundo, fazer um
de me mexer. Tenho uma di- modelo de uma empresa.
ficuldade gigantesca para Depois de 25 minutos, tem
ler textos. Então criei o há- cinco minutos de break, para
bito de colocar um fone de WhatsApp, ir no banheiro e
ouvido e, por cima, aqueles tal. Assim você vai quebran-
abafadores de aeroporto. do o seu dia. E tem alguns
Desligo as telas e deixo só o long breaks, para descansar.
texto que quero ler. Só fazendo esse tipo de coi-
sa consigo parar, focar.
ed. especial

Rotina, mesmo, é acordar e ler as notícias do


dia, e cada dia é um dia.

152
e-B/01
CAPÍTULO XIII

João Luiz Braga


O projeto ENCORE

Vou contar um pouquinho sobre o que queremos construir e


como é o caminho até a chegada

ed. especial

153
e-B/01
O NOME ENCORE

O nome Encore, vem do francês que


significa “de novo”. Por que isso? A
nossa ideia é ser muito focada em ter
processos muito robustos, sempre
checando o processo por ele mesmo
e não pelo resultado. Vamos melho-
rando e melhorando o processo.

Qual que é o segredo? No longo prazo, fazendo de novo, e


de novo, e de novo. Por isso, o próprio símbolo é um “E”, uma

João Luiz Braga


seta voltando nela mesma. Também tem um outro motivo.
Quem me conhece sabe que sou apaixonado por música e
encore, na música, é o bis. É o final do show, o último ato.

No longo prazo, fazendo de novo, e de novo, e de


novo. Por isso, o próprio símbolo é um "E", uma
seta voltando nela mesma

E mais, não foi Esse é um business de pessoas, e o ideal é que o turn over
fácil chegar a seja zero, que as mesmas pessoas fiquem no longo pra-
um nome de que zo; queremos que a Encore seja um lugar legal, um lugar
gostássemos. bacana, que quem está lá (e todo mundo é elegível para
ed. especial

ser sócio), literalmente tenha o último ato sendo sócio; que


seja nosso final do show. Afinal, as bandas deixam o melhor
para o final, para o bis.

154
e-B/01
AMBIÇÃO DA ASSET

Qual que é o princípio? Quando falamos sobre as assets,


existe uma intersecção muito grande entre elas. Obviamen-
te, todo mundo quer ter um fundo que vá bem, que renda
bem, então nem vale a pena perder muito tempo falando
isso.

A nossa forma é com muito estudo, fundamentalista, que


a gente chama de botton-up, analisando do micro para o
macro e não tomando decisões só pelo macro.

João Luiz Braga


Qual é o nosso diferencial competitivo? Nosso greed32?
Qual é a nossa eterna busca?

Nossa eterna busca é por hedge, é por


diferenciais, é por vantagens que nos fa¢a
ter diferen¢a em rela¢ão ao consenso,
diferen¢a em rela¢ão ao que o mercado está
pensando. Só assim que a gente vai atrás
o dinheirão. O dinheirão está quando você
discorda do consenso.
ed. especial

32 Greed - significa a ambição ou o desejo muito forte de alcançar algo maior. No


caso o autor está tratando como a busca da Asset Managment.

155
e-B/01
CONHECER E AGIR
CONTRA OS VIESES
Queremos realmente ser diferentes. Todo o motivo desse
desse e-book é um axioma na ENCORE: se o ser huma-
no reage aos vieses e às questões comportamentais, co-
nhecê-los e agir nos coloca com alguma vantagem. Isso
é incansável lá dentro, sempre focar na questão comporta-
mental; e não é só para investimento, é também para o com-
portamento, é para motivação.

Quando falei de hindsight bias, por exemplo, de todo mundo

João Luiz Braga


“se achar”, claro que os analistas da Encore também passam
por isso, e quando vão ser remunerados, podem pensar: eu
fui melhor, acertei aquilo...

Fazemos todo o time conhecer esse aspecto, tem técnica,


que é fazer um exercício de “soma cem”, de como a pessoa
distribuiria o bônus; e assim quando ela tem que somar para
todo mundo, vê que é mais difícil do que pensava. Talvez te-
nha um pouco de minimização do efeito do hindsight.

Quando falei de hindsight bias, por exemplo, de


todo mundo "se achar", claro que os analistas
da Encore também passam por isso
ed. especial

Outra coisa: todo mundo anota tudo, então quando alguém


fala: achei isso, está fácil de consultar; vamos nos cadernos
e procuramos.

156
e-B/01
RECRUTAMENTO
CUIDADOSO

Atas, temos atas para tudo, para nos ajudar a ter um hedge.
Temos sempre como pilar: só contratar pessoas que, além
de competentes, sejam gente boa. Porque com gente boa
você tem três consequências ótimas:

1. o debate fica melhor (aumenta o WYSIATI,

João Luiz Braga


melhora a performance);

2. quero que todo mundo chegue segunda-feira


achando "que legal que vou trabalhar aqui, o
sonho da minha vida". Um dia me questionaram:
ouve numa rodinha de pessoas falarem sobre a
Encore, e não percebem você, o que você queria
ouvir? Eu queria ouvir: o meu sonho era
trabalhar na Encore.

3. o fato de contratar pessoas gente boa ajuda


a minimizar o turn over, as pessoas ficam. É
o que a gente quer. Queremos ser uma empresa
horizontal, que as pessoas trabalhem por um
longo período de tempo.
ed. especial

157
e-B/01
CULTURA DE
FEEDBACK

Temos a cultura muito forte de feedback,


fazemos seis rodadas de feedback por ano, com
perguntas, inclusive anônimas, para sermos
100% abertos, para ninguém ter medo de falar

João Luiz Braga


Acredito muito na teoria do equilíbrio estável. É da física.
Se você não fala com a pessoa, se tem alguma coisa que
uma pessoa faz que a outra não vai gostar, então ela não
fala, cria uma dinâmica de equilíbrio instável.

Imagine a curva de Gauss, a bolinha está lá em cima. Se


você empurrar a bolinha, ela nunca mais volta ao equilí-
brio, ela vai embora.
Queremos criar
a cultura do fe-
edback, do equi-
líbrio estável.
Imagine a curva de Gauss espelhada para baixo. A bolinha
fica no centro, quando você a empurra para o lado, ela volta
para o meio. Nunca chega o ponto em que o cristal quebra,
você sempre traz de volta para o equilíbrio estável.
ed. especial

158
e-B/01
CULTURA DE
ESCANCARAR ERROS

Outra coisa
forte que te-
mos é a cultura
de escancarar
erros
No nosso negócio a maioria das decisões não são tomadas
no acerto, são tomadas no erro. Quando você tem uma opi-
nião sobre uma empresa, chega o resultado e vem o que já
tinha, você acertou, dificilmente vai tomar a decisão; você vai

João Luiz Braga


manter uma decisão que já tinha tomado antes. Tem mais a
ver com manutenção.

Se vem algo diferente do que esperava, se errou, você pro-


vavelmente vai tomar uma decisão. Por que que errei? A re-
ceita veio maior, 10% maior do que tinha? Porque a venda foi
melhor e eu não esperava. E é recorrente? É. É bacana? É.
Vale apena comprar? Então, vamos tomar uma decisão.

Os erros têm que ser encarados, porque é onde


vamos evoluir, vamos tomar decisão, tentar
ganhar mais dinheiro.
ed. especial

Escancarar mesmo os erros mais corriqueiros, todos têm


que saber e as pessoas têm que saber aceitar isso.

159
e-B/01
CULTURA DE
INCENTIVOS
Falei sobre comportamento do ser humano e em algum mo-
mento citei que o ser humano reage a incentivos.

Incentivos im-
portam muito!
A forma de remunerar as pessoas, de trazê-las como sócias,
é muito importante para a motivação, para que elas entre-
guem o que todo mundo quer, para que elas sejam unidas.
Não é só a performance individual, claro que é importante

João Luiz Braga


ter um pouco, não só; mas também é importante ter um
uma curva de evolução ao longo do tempo e tempo de
casa. Se ficarem mais na empresa, diminui o turn over.

Também, talvez principalmente, com a performance do time,


a pessoa tem que ser incentivada a ajudar o colega, a traba-
lhar com um colega. Então, a performance do colega tem
que influenciar na remuneração dela; se não, ela não vai se
preocupar com o colega. As pessoas reagem a incentivos.

Sempre levamos em conta: a performance individual, o tem-


po de casa e a performance do grupo como todo.

Assim, conseguimos ter pessoas unidas, que


ed. especial

vão em busca do mérito e querem ficar por


muito tempo

160
e-B/01
O FRAMEWORK
DE ANÁLISE

Por fim, algo muito importante que fizemos: é um framework


de análise, que todo analista tem que preencher pelo me-
nos uma vez por semestre (idealmente uma vez por tri-
mestre) de todas as suas empresas.

Trata das principais empresas que os analistas cobrem, que


são mais ou menos umas 10 por analista. Esse framework
contém vários pontos que o analista tem que ir passando, e
garanto: é o mínimo que ele tem que fazer, mas é tão den-

João Luiz Braga


so que se um analista passar por todos esses pontos, já
vai ter feito um bom trabalho. E já conhece a empresa bem
mais que a média; não quer dizer que vai acertar o investi-
mento, não quer dizer que vai ganhar dinheiro com a ação;
mas quer dizer que o analista vai ter passado por diversos
pontos que vão desde porque a oportunidade existe, até
todas as métricas de valuation; até como é a competição,
questões de ISD³³ (especialmente as de impacto grande); a
questão da dissonância cognitiva (quem discorda de você e
porque); como o resto do time ajuda. Um monte de coisas
que não só o analista tem que preencher, como tem que
registrar no caderno e que a gente consegue checar se for
feito.
ed. especial

33 ISD - significa Índice de Social Disclosure, que se liga à comunicação, trans-


parência e evidenciação de informações sobre atividades das corporações
voltadas a questões sociais, incluindo questões de direitos humanos e até am-
bientais.

161
e-B/01
Com uma recorrência boa, daqui a dez anos a
gente consegue checar a evolu¢ão da empresa
ao longo do tempo, e nada melhor do que a
consistência nas entregas para fazer um
investimento de longo prazo bom

João Luiz Braga


Esperamos deixar público algum dia o framework, que é
curioso, tem basicamente tudo pelo que o analista tem que
passar, e dá trabalho passar; por isso gostamos de ter bas-
tante gente olhando para poucas empresas cada um.

ed. especial

162
e-B/01
O TIME
QUANTITATIVO

Um outro diferencial que queremos ter no Encore, que tem a


ver com aumentar o WYSIATI, tem a ver com criação de hed-
ge, é o nosso time quantitativo. O time quantitativo, a ciência
de dados, a busca de Big Data, o uso de tecnologia, incrivel-
mente ainda está engatinhando no Brasil. Lá fora algo super
comum.

Nós queremos fazer de um jeito bem diferente. Vejo mui-

João Luiz Braga


ta gente fazendo investimento numa área quantitativa, mas
tratando como área de TI. Tratando essa área, a nossa gale-
ra inteligente da tecnologia, como quem faz lista de coisas
para o analista. Não queremos ter essa abordagem.

Os nossos analistas da parte quantitativa


participam da gestão, sentam na mesa de
reunião (aliás sentam na minha frente), vivem
e respiram aquele ar da análise. ed. especial

Às vezes, você mal sabe o que vai pedir à essa turma, mas
eles vendo você fazer o seu trabalho, têm a ideia: isso aí eu
consigo automatizar, consigo pegar os dados de tal lugar e
trazer uma correlação;

163
e-B/01
então é super legal unir as duas áreas, e temos
como meta transformar em ferramenta que
chamamos quantamental, que pode ajudar muito
na cria¢ão de hedge

Além disso, o time quantitativo junto com o time de risco,


nos ajuda a monitorar diversos aspectos da carteira, por-

João Luiz Braga


que você só consegue melhorar o que você monitora.

Por exemplo, como monitora fatores de risco, liquidez, es-


tresse? Conseguimos monitorar também as nossas carteiras
em relação a fatores de estilo. Como é que a gente está em
relação a vallium, momentum; como é que é o dendograma
da carteira? Como é que a relação entre as correlações da
carteira? Vamos dar tal investimento por outro, tal ação por
outra ação, será que isso realmente muda a carteira? Ou na
verdade a correlação é tão alta que será pouca alteração?

ed. especial

164
e-B/01
Esse tipo de análise, que ajuda muito no monitoramento da
carteira, também é feito pelo pessoal do time quanti junto
com o pessoal de risco. E é um diferencial que queremos
criar.

João Luiz Braga


Tudo que descrevi até aqui (a cultura do debate,
a cultura do escancarar o erro, o time quanti,
a minimiza¢ão de viés), é visando aumentar o
WYSIATI.

Se você for nos visitar vai ver - WISIATI - escrito na parede


da agência.
ed. especial

165
e-B/01
Espero que você tenha gostado deste e-book. Para mim foi
um prazer gigantesco falar sobre o meu tema preferido.
Ler o livro Rápido e Devagar, duas formas de pensar, do Da-
niel Kahneman, literalmente mudou a minha vida, e estou es-
crevendo para você sobre isso, porque li esse livro, há vários
anos, me apaixonei e percebi que, apesar de não ser um livro
sobre o mercado, mudou a forma de eu pensar e trabalhar
no mercado.

João Luiz Braga


Acabamos de fazer uma viagem pelos principais
vieses, pelos quais a gente passa todos os dias.
Lembre-se, não basta conhecê-los, tem que
treinar, tem que ter mente aberta, tem que fazer
uma série de processos para ir se inteirando.
Só assim você deixa de ser o seu pior inimigo.

Obrigado por participar dessa jornada comigo. Meu nome é


João Luiz Braga e essa foi a minha Finclass.
ed. especial

166
e-B/01
Todos os direitos deste livro são reservados e protegidos
pela Lei 9.610 de 19/02/1998.

Nenhuma parte deste guia poderá ser reproduzida ou


transmitida sem autoriza¢ão prévia da marca Finclass.

João Luiz Braga

FINCLASS
ed. especial

Copyright ©️ 2021
©️ FINCLASS | Todos os direitos reservados

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