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E prossegue:
a pedagogia libertadora realmente exige que o professor trabalhe na sala de
aula, que trabalhe com os limites do corpo, trabalhe tanto com esses limites
quanto através deles e contra eles (...). Temos que voltar a um estado de
presença no corpo para desconstruir o modo como o poder tradicionalmente
se orquestrou na sala de aula, negando subjetividade a alguns grupos e
facultando-a a outros.
1
Sublinho essa importante sugestão de leitura apresentada por Maíra Norton.
2
A ideia de que a identidade política tende a se resumir ao perfil virtual aparece em diferentes programas,
mas recomendo o Pornografia da indignação e impotência política, de maio de 2019, que foi o primeiro
em que assisti, após sugestão de Ingrid Xavier.
interação com os espaços intersubjetivos, aprender em movimento, aprender do
território, aprender no diálogo e no silêncio tácito, cúmplice de nossas humanidades e
inteligências que se reconhecem na distância não maior que a de uma troca de olhares.
Sentir e pensar
A recusa de virtualização pressupõe também o reencontro entre o sentir e o
pensar. Por acaso caiu em minhas mãos um livro de Pablo Fernandez Christlieb (2011)
chamado Lo que se siente pensar, o folheei por pouco tempo, numa casa que me
hospedei em viagem recente. Num dos capítulos ele dizia que o sentir é um pensar
próximo e o pensar seria um sentir distante, de modo que não haveria propriamente uma
cisão tão acentuada entre o sentir e o pensar. Não tenho o livro aqui para recuperar as
palavras de forma mais consistente. Mas é como se a proximidade das coisas nos
permitisse traduzir o pensar como sentir e que a projeção à distância nos permitisse
saltar do sentimento e dos sentidos de proximidade (tato, olfato, paladar) para o
pensamento mais abstrato, relacionado à audição e principalmente à visão. O
interessante é justamente esse continuum do sentir ao pensar, que recusa uma certa cisão
na maneira como apreendemos o mundo a nossa volta e, principalmente, por não
hierarquizar o sentir e o pensar, o corpo e a mente, a emoção e a razão.
Alguns autores buscaram formas de expressar essa indissociabilidade em termos
híbridos como o sentipensar3, que Orlando Fals Borda colheu da cultura anfíbia dos
pescadores de San Martín de La Loba, na Colômbia, o corazonar, que Patricio Guerrero
recolheu dos Kitu Kara, explorado por Boaventura de Sousa Santos em O fim do
império cognitivo (2018), ou a emorazão de Laflamme, citada por Milton Santos (1996)
num capítulo em que fala sobre a proximidade, cada um desses termos traz sua própria
origem e seu significado. Fico um termo que achei muito interessante ao ouvir de
Gustavo Esteva, a ideia mais simples de comover4, comoção, como um mover junto,
que seria diferente de promover, em que se move o outro, a quem se considera parado.
E isso vale nas relações políticas, mas também como uma política do conhecimento.
3
Ouvi o termo pela primeira vez de Carlos Walter Porto-Gonçalves, que me indicou a leitura de Fals
Borda. A explicação sobre a origem do termo é contada por Fals Borda numa entrevista disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=LbJWqetRuMo
4
Ver Conversa do Mundo entre Boaventura de Sousa Santos e Gustavo Esteva, no canal Alice Ces,
gravado em fevereiro de 2020. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=-
nbzKhSIhaA&t=7079s
Conhecimento tácito
Um outro autor, Michael Polanyi5, usou a metáfora da visão para falar sobre a
maneira como o conhecimento é produzido e transmitido. Quando se captura uma
imagem, temos a apreensão de um componente distal (focal) e outro proximal
(subsidiário), termos que Michael Polanyi toma emprestado da anatomia. Esse
componente focal permite algum grau de formalização para que seja transmitido. No
entanto, o conhecimento é composto por todo o campo que não está focado, isto é, o
componente subsidiário, que ao não ser focado, só pode ser apreendido como uma
experiência integral diante do conhecimento. O conceito que Polanyi utiliza é o de
conhecimento tácito, chamando atenção para a impossibilidade de um conhecimento
objetivo ou intersubjetivo que prescinda de uma dimensão pessoal, que só pode ser
adquirida num mundo de experiência que ultrapasse o que pode ser formalizado, aquilo
que cabe num canal de transmissão. Não sabemos o quanto o componente formal é
informado, habilitado, potencializado, por todo o não formalizado que o reveste.
Ficar somente à distância empobrece o campo do sentir-pensar e empobrece a
apreensão do conhecimento tácito que se produz na interação entre o focal e o
subsidiário, o formal e o informal, o verbal/visual e o sensível. O corpo, o sentimento e
o não-dito (as entrelinhas) são próprios da experiência presencial, mas mesmo em
nossas salas de aula muitas vezes nos afastamos, de diferentes maneiras, e por isso
desperdiçamos nossa co-presença. Então se me perguntam: quais atividades suspensas
eu gostaria que não fossem retomadas? Eu respondo: toda atividade presencial que
desperdice a oportunidade de experimentar a potência da presença e dê lugar a
mecanismos que boicotem os efeitos do corpo, do sentimento e do não-dito na maneira
como aprendemos e como produzimos conhecimentos. Há coisas que podem ser
transmitidas à distância, para todas as outras necessitamos de proximidade, estarmos
juntos. Diria até que muito da aprendizagem remota só é possível porque esta simula
relações dos ambientes presenciais, nos quais a maioria de nós nos formamos. A perda
da experiência presencial compromete a capacidade de simularmos esses ambientes em
rede, e essa perda tende a afetar principalmente aqueles que não consolidaram suas
formas presenciais de aprendizagem.
5
As ideias de Michael Polanyi são retiradas da leitura de O valor do conhecimento tácito: a
epistemologia de Michael Polanyi na escola, de Cláudio Saiani (2004, pgs. 53-58)
Outras tramas: reconstituindo a presença
Recentemente em Oaxaca, no México, fui a um lugar chamado Universidad de
la Tierra, à procura de uma conversa com Gustavo Esteva, por sugestão do Carlos
Walter. Em vez de conversa particular participei de um “conversatório” semanal aberto
a todos os interessados em “platicar”. Lá pude conhecer um pouco da proposta da
sociedade desescolarizada legada por Ivan Illich6 a vários que seguem inspirados por
suas ideias, em diálogo com uma concepção muito radical de autonomia que é muito
própria aos mexicanos, mas que se vê de diferentes formas na América Latina. Confesso
que foi um pouco difícil compreender e aceitar essa visão de autonomia - tanto quanto
me pareceu difícil explicar o conceito de "sem pimenta" aos mexicanos. O pressuposto
de Ivan Illich é o de que a crise das instituições não deveria ser respondida com a
tentativa malograda de salvá-las, de reformá-las, deixando-as mais aperfeiçoadas, isso
seria uma atitude vã. A crise deveria indicar a impossibilidade radical de que essas
instituições consigam cumprir sua promessa.
No caso das instituições de ensino, seria o caso de romper com a especialização
que elas promovem, com a supressão das diferentes formas de aprender que a
institucionalização da educação impõe e reproduz. O problema de aceitar essa
formulação é que levá-la às últimas consequências resultaria numa negação mesma do
profissional institucionalizado que nós somos. Logo, pareceria um pouco contraditório
defendê-la num contexto em que não abrimos mão dos poderes e da segurança que a
instituição universitária nos confere, mesmo diante dos ataques que também sofremos.
A questão, no entanto, é lançar uma luz de vela - para ver de perto. Lançar uma
provocação sobre a real razão de existir uma universidade. Aqui atento para o detalhe
que a Universidad de la Tierra não possui diploma, nem professores, nem alunos, nem
currículos, nem disciplinas. Mas mesmo assim se autodenominou "universidade". A
pergunta que procuro reter nesta experiência é: em que devemos apostar, insistir e
cultivar nesse espaço que também chamamos de universidade? Será toda a trama
institucional que nos assegura em nossas posições de poder e saber? Ou as tramas da
6
Alguns textos do Ivan Illich eu li em pequenas brochuras artesanais chamadas Cadernos para la
Imaginación, da Palapa Editorial. Destaco aqui o caderno Tramas de aprendizaje convivencial:
propuestas para ejercer la libertad de aprender e Aprendizaje en movimiento: rutas hacia la liberación
de la pedagogía, publicados em 2013. A coletânea Repensar el mundo con Iván Illich, organizada por
Gustavo Esteva (2013) também é uma importante fonte.
aprendizagem, para utilizar um termo de Ivan Illich, que percorrem caminhos os mais
diversos e imprevisíveis? Vivemos essa contradição, assim como vivemos a contradição
entre nosso corpo e nossa razão, entre o sentir e o pensar, entre o que explícito e o
tácito. A questão é: o que vamos fazer a partir disso, desta matéria prima, destes
ingredientes?
7
A palestra ocorreu na mesa redonda Perspectivas anticoloniais, dividida com Paulo Arantes, que se
realizou em março de 2020, no evento Mostra Internacional de Teatro de São Paulo. Disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=2tjX2VodDYs&t=2980s
"o fim do estudantado como forma de vida": "os estudantes não viverão mais na cidade
em que está sediada a universidade, antes cada um escutará as lições fechado em seu
aposento (...). As pequenas cidades, outrora sedes de universidades de prestígio, verão
desaparecer de suas ruas aquela comunidade de estudantes que frequentemente lhe
constituíam a parte mais viva" (AGAMBEN, 23 mai 2020). O vaticínio de Agamben
não aponta alguma possibilidade de reversão. Como o próprio texto diz, esse ambiente
ideal já estava corrompido e por isso tão facilmente pôde sucumbir. Mas diria ainda que
o próprio ideal de ambiente universitário, tal como apresentado por Agamben, talvez já
fosse ele mesmo problemático em seu modelo, uma vez que o acesso e a possibilidade
de usufruir desse ambiente é diferenciado.
A escola propicia, por um lado, uma suspensão do tempo e do espaço social e
familiar (MASSCHELEIN; SIMONS, 2017, p. 21-25). Por outro lado, fica a pergunta
sobre como esse tempo-espaço de suspensão se relaciona com as formas de
aprendizagem em tempo-espaços outros que não escola, considerando que o acesso a
cada um desses tempo-espaços é sempre diferenciado. Isso se coloca mais radicalmente
nesse contexto de suspensão do tempo-escola. A escola que suspendia o tempo-espaço
social e familiar, agora está suspensa. O dilema é: como suspender o tempo-espaço
social e familiar, mas fora da escola, para produzir um efeito de suspensão que conserve
o "tempo-espaço livre" da aprendizagem?
9
As referências sobre o projeto podem ser encontradas no livro Currículos diferenciados das escolas
indígenas, caiçaras e quilombolas: política e metodologia, de Domingos Nobre et. Al., 2019.
10
Ouvi de Laura dos Santos algumas vezes, em rodas de conversa. Tentei buscar alguma autoria, mas a
frase aparece em inúmeros contextos, quase como um ditado. Aqui não importa pra mim a originalidade,
mas o significado e a força que a ideia ganha ao nos ser transmitida por Laura dos Santos. Assistindo uma
aula no México alguém citou a mesma frase como uma fala dos zapatistas. Então pode existir outras
fontes.
11
Entrevista de Ailton Krenak ao site do Museu da Pessoa. Disponível em
http://ailtonkrenak.blogspot.com/2009/05/arquivo-2007-entrevista-de-ailton-ao.html
o nosso pé que ia lendo o chão pra gente. A gente estava aprendendo. Então,
nós aprendemos tateando. Tateando o mundo, tateando a terra. Sentindo o
cheiro do mato, sentindo o cheiro dos bichos.
Daria para desdobrar ainda mais. Na frase o corpo está cindido em duas partes,
cabeça e pés, em cima o pensamento e embaixo o chão, a terra, o território, como
queiram. Então a frase só faz sentido quando se orienta para a reconexão entre cabeça e
pés, considerando que o mais comum é pensar com a cabeça... fora do chão, nas nuvens,
numa razão universal que prescindiria de sua relação imediata, concreta, com as
circunstâncias corporais e espaciais em que o pensamento se dá. E esse pressuposto do
conhecimento universal só se realiza a partir da cisão entre corpo e mente, emoção e
razão, sentir e pensar. Somente o corpo reconstituído em sua integridade pode colocar
em ação, habilitar, reencantar, iluminar com luz própria, luz de vela, o chão como lugar
de conhecimento, fazendo de cada rincão um centro. Então aqui juntamos o cabeça-pés
e o rincão-centro.
12
Luiz Antonio Simas escreve em Pedrinhas miudinhas: ensaios sobre ruas, aldeias e terreiros. Rio de
Janeiro: Mórula, 2013. O argumento é desenvolvido em Encontro de Walter Benjamin e o Caboclo da
Pedra Preta: o espaço escolar a contrapelo, palestra proferida na Fundação Getúlio Vargas em 2017.
libertário dos anos 1990, chama-se Zona Autônoma Temporária13, em que Hakim Bey
afirma que uma “psicotopografia é capaz de desenhar mapas da realidade em escala
1:1” contra o “imperialismo psíquico” do Estado. Seria o caso de buscar ativamente os
espaços “com potencial de florescer como zonas autônomas – dos momentos em que
sejam relativamente abertos, seja por negligência do Estado ou pelo fato de terem
passado despercebidos pelos cartógrafos”. Um tempo-espaço próprio surge na ruína do
mapa 1 por 1, aquele que é inútil ao império, como diria Borges14. O mapa 1 por 1 é
também a metáfora da incomensurabilidade, aqui traduzida como o desafio de cada um
produzir uma diferença que não possa ser medida pela régua padrão de referência..
Namastê pedagógico
Como não podemos nos encontrar no mesmo espaço, precisamos utilizar alguma
tecnologia de comunicação que permita a proposição de experiências presenciais. Pode
ser uma mensagem, um bilhete, um áudio ou vídeo, ou um email, ou uma carta. Mas a
aprendizagem não é o que se dá no momento da transmissão da mensagem, esta deve
conter uma proposição de algo para alguém que está do outro lado experimentar,
vivenciar em seu próprio lugar, no raio de alcance de sua ação e de suas possibilidades,
com os recursos disponíveis, por mínimos que sejam. Então isso também garante uma
noção de equidade e tornaria até mesmo desnecessário todo o questionamento se os
alunos possuem ou não acesso aos meios tecnológicos para a recepção de conteúdos. A
questão seria: quais meios existem e como condicionaremos a comunicação aos meios
existentes. Pois as experiências de aprendizagem devem ser possíveis em qualquer
contexto e, no limite, até mesmo ser potencializadas em contextos de desconexão
virtual, próprios à reconexão com o presente e o próximo.
Uma tradução para namastê, termo sânscrito popularizado ao redor do mundo
como saudação do ioga, é "o divino que habita em mim saúda o divino que habita em
você". É uma tradução mais interessante do que outra que diz "eu me curvo a você". O
namastê pedagógico seria então o reconhecimento desse espírito interno, que podemos
chamar aqui de inteligência, que pode ser ativado de dentro para fora, sendo o papel do
13
O livro me foi enviado pela Ingrid Xavier pelo correio em 2014.
14
A leitura mais comum destaca uma inutilidade absoluta do mapa 1 para 1, mas esquece que Borges
afirma que esse mapa é inútil para o império, o que poderia nos levar à ideia de que pode ser útil para
outras finalidades que não as do império e, no limite, ser justamente útil contra o império.
professor, que ensina, o de saudar e reconhecer a inteligência que habita naquele que vai
experimentar a atividade proposta. Enquanto o ensino à distância é dependente do canal
de comunicação, aqui o canal é esvaziado, em favor do que cada um pode realizar em
seu próprio âmbito. E também o professor deveria, para se comunicar com a experiência
do aluno, experienciar a proposta em seu próprio âmbito. Cumprida essa condição, o
canal seria reabilitado como meio para a troca de experiências, para compartilhar os
feitos, mas sem a fetichização das tecnologias virtuais tão propalada nos últimos meses.
Há uma noção interessante que podemos recuperar do livro O mestre ignorante,
de Jacques Rancière, que é a de "revelar uma inteligência a ela mesma". Diz ele: "há
sempre alguma coisa que o mestre pode pedir que descubra, sobre a qual pode
interrogá-lo e verificar o trabalho de sua inteligência". Em outro trecho: "sempre se
pode, mesmo no fundo da loucura desigualitária, verificar a igualdade das inteligências
e prestar contas dessa verificação". É esse "verificar a igualdade das inteligências" que
se combina com a ideia do namastê.
Do-in epistemológico
Do-in é uma outra ideia interessante para nossa analogia. Significa em japonês o
"caminho da casa", sendo aí o corpo saudável uma casa. Mas o princípio que nos
interessa aqui é o de que uma automassagem realizada em pontos acessíveis do próprio
corpo possa afetar outros pontos que estão interrelacionados pelos circuitos internos. É
uma relação entre ativar um ponto acessível, próximo, para afetar algo inacessível e que
está distante do ponto ativado. Então se a sola do pé possui todo um mapa de acesso a
partes do corpo que podem ser afetadas pelo toque, o caso aqui é fazer de nosso âmbito
de proximidade a sola do pé.
Reequilibrar significa também inverter certas hierarquias do conhecimento. A
ideia de "do-in antropológico" foi utilizada na política dos pontos de cultura, no saudoso
ministério da Cultura do Gilberto Gil. Um dos sentidos era justamente romper com uma
certa centralidade da cultura em "âmbitos restritos e restritivos das concepções
acadêmicas ou dos ritos e da liturgia de uma suposta classe artística e intelectual", como
enunciado em seu discurso de posse (GIL, 2003). Os pontos de cultura foram
espalhados nos recônditos e periferias, com ação capilar, fragmentada e conectada ao
mesmo tempo. Embora não estejam tão distribuídas como os pontos de cultura, a
distribuição das universidades no território, para interiores e periferias, modificou a
relação entre os territórios e os saberes, possibilitando olhares próprios,
contextualizados, imersivos, ali onde o conhecimento científico apenas chegava por
meio de pesquisas esporádicas ou prática profissional de egressos das universidades. A
dispersão horizontal (pelas cidades e regiões) de professores doutores, pesquisadores,
turmas de graduação e pós-graduação propiciou pequenas revoluções cognitivas nos
novos lugares onde o encontro entre o acadêmico e o popular puderam se influenciar. O
mesmo podemos dizer em relação à inclusão vertical (dos oriundos das escolas públicas
e das cotas raciais), que permitiu que as periferias irrigassem com suas presenças as
universidades ainda muito elitizadas e concentradas espacialmente.
O do-in epistemológico aqui proposto recupera o sentido de ativação das
extremidades, das margens, da epiderme social como um meio de reequilibrar a relação
entre saberes e poderes, reconsiderando os lugares remotos, ermos, marginais,
periféricos, subalternos, silenciados, esquecidos e mais quaisquer adjetivos que se possa
usar, como lugares de conhecimento. Isso vale para os pés, o corpo, a emoção e o
sensível e seus conhecimentos, em sua inferioridade frente à cabeça, à mente e à razão,
vale para a casa, a rua, o campo e a comunidade em relação aos espaços institucionais,
vale para os espaços das mulheres em relação ao dos homens, dos negros e índios em
relação ao dos brancos, das periferias em relação aos centros, e por aí vai. Não vamos
resolver tudo isso numa tacada, aqui estamos somente pensando que ativar um tempo-
espaço outro que não escola/universidade para uma aprendizagem não-virtual de
proximidade pode afetar conhecimentos que são produzidos no tempo-espaço da
escola/universidade. Mas certamente todas as clivagens listadas acima podem ser
tensionadas ao se fazer esse deslocamento.
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*
Professor de Geografia Humana do Departamento de Geografia e Políticas Públicas da
Universidade Federal Fluminense (Angra dos Reis).