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ÍNDICE

Feel-Good Productivity
Créditos
Dedicatória
Nota do Editor
Introdução
PRIMEIRA PARTE — ENERGIZAR
Capítulo 1: Brincar
Capítulo 2: Poder
Capítulo 3: Pessoas
SEGUNDA PARTE — DESBLOQUEAR
Capítulo 4: Buscar clareza
Capítulo 5: Encontrar coragem
Capítulo 6: Começar
TERCEIRA PARTE — SUSTENTAR
Capítulo 7: Conservar
Capítulo 8: Recarregar
Capítulo 9: Alinhar
Uma palavra final: Pense como um cientista da produtividade
A próxima etapa da sua viagem…
Agradecimentos
Sobre este livro
Sobre o autor
Edição em formato digital: fevereiro de 2024

FEEL-GOOD PRODUCTIVITY:
COMO SER PRODUTIVO SEM STRESS — E APROVEITAR MAIS A VIDA
Título original: Feel-Good Productivity
How to Do More of What Matters to You
© 2023, Ali Abdaal
Todos os direitos reservados.

© desta edição:
2024, Penguin Random House Grupo Editorial, Unipessoal, Lda.
Publicada por acordo com
Penguin Random House UK, Londres

Vogais é uma chancela de


Penguin Random House Grupo Editorial
Rua Alexandre Herculano, 50, 3.º, 1250-011 Lisboa, Portugal
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fotográfico, eletrónico ou por meio de gravação, nem ser introduzido numa base de dados, difundido
ou de qualquer forma copiado para uso público ou privado, além do uso legal como breve citação em
artigos e críticas, sem a prévia autorização por escrito do editor.

Tradução: Pronto a Editar Atelier — Salomé Castro


Revisão: Inês Guerreiro
Capa: Adaptação de Wonder Studio / Ana Teixeira sob design de Harry Haysom

ISBN: 978-989-787-819-0

Composição digital: Simon and Sons ITES Services Private Limited


Composição digital PRHGE: Luís Gomes

Site: penguinlivros
Twitter: @PenguinLivrosPT
Facebook: penguinlivros
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Para Mimi e Nani — por todo o vosso amor,
apoio e sacrifícios
NOTA DO EDITOR
Feel-good é um sentimento de felicidade e bem-estar. Por se tratar de um conceito aplicado a um
método de produtividade, optou-se por se manter a expressão na sua língua original.
INTRODUÇÃO

«Feliz Natal, Ali. Tente não matar ninguém.»


Com estas palavras, o meu supervisor desligou o telefone
despreocupadamente, deixando-me sozinho a cuidar de toda uma ala
hospitalar, repleta de pacientes. Eu era um médico recém-formado e, três
semanas antes, cometera um erro de principiante: esquecera-me de
preencher um formulário a requisitar férias. Assim, ali estava eu, a gerir
uma ala hospitalar, sozinho, no dia de Natal.
As coisas começaram mal e pioraram rapidamente. Quando cheguei ao
hospital, fui recebido por uma avalanche de historiais de pacientes,
relatórios de diagnóstico e enigmáticas solicitações de exames que fariam
mais sentido para um arqueólogo experiente do que para o nosso
radiologista de serviço. Em poucos minutos, fui confrontado com a primeira
emergência do dia: um homem na casa dos 50 anos que desmaiara devido a
uma grave paragem cardíaca. Logo depois, uma das enfermeiras informou-
me de que um paciente precisava, urgentemente, de uma evacuação manual
(consegue imaginar…).
Às 10h30, olhei em redor da ala. A enfermeira Janice corria para lá e
para cá no corredor A, em pânico, com os braços a transbordar de soro
intravenoso e fichas clínicas. No corredor B, um paciente idoso e teimoso
exigia, em voz alta, a sua dentadura, que não se encontrava onde deveria
estar. O corredor C fora tomado por um exilado bêbedo proveniente do
serviço de urgência, que vagava pelo corredor e gritava «Olive! Olive!»
(nunca descobri quem era Olive). E, a cada minuto, alguém fazia uma nova
exigência: «Dr. Ali, pode verificar a febre da Sra. Johnson?»; «Dr. Ali, pode
ajudar com o nível elevado de potássio do Sr. Singh?».
Comecei a entrar em pânico rapidamente. A Faculdade de Medicina não
me preparara para algo assim. Até então, sempre fora um aluno bastante
competente. Sempre que as coisas se tornavam difíceis, a minha estratégia
era simples: trabalhar mais. Foi esse o método que me fez entrar na
Faculdade de Medicina sete anos antes. Também me garantiu um punhado
de publicações em revistas académicas. Até me possibilitou abrir um
negócio enquanto estudava. A disciplina era o único sistema de
produtividade que eu conhecia. E funcionou.
Só que agora não estava a funcionar. Desde que começara a exercer
Medicina, alguns meses antes, sentia-me como se estivesse a afogar-me.
Mesmo quando trabalhava até bastante tarde, não conseguia atender a
quantidade de pacientes exigida nem terminar a papelada necessária. O meu
humor também estava a sofrer. Embora tivesse gostado da formação em
Medicina, o trabalho em si parecia-me verdadeiramente deprimente, sempre
preocupado com a possibilidade de cometer um erro que mataria alguém.
Passei a não dormir bem, as amizades desapareceram, a minha família
deixou de ter notícias minhas. E eu continuei a trabalhar ainda mais.
Agora, era dia de Natal, e eu estava sozinho numa ala hospitalar, sem
conseguir aguentar o meu turno.
Tudo veio à tona quando deixei cair uma bandeja de suprimentos
médicos, fazendo seringas deslizarem pelo chão de linóleo. Ao olhar,
desolado, para o meu uniforme húmido, percebi que tinha de tentar
compreender o que se estava a passar — caso contrário, o sonho de me
tornar cirurgião escaparia por entre os meus dedos.
Naquela noite, pendurei o meu estetoscópio, peguei num pastel de carne
e abri o portátil. Já fui tão produtivo, pensei. O que me está a escapar?
Durante o meu primeiro ano na Faculdade de Medicina, fiquei obcecado
pelos segredos da produtividade. Fiquei acordado até tarde, noite após
noite, a fazer anotações em centenas de artigos, publicações em blogues e
vídeos que prometiam a chave para um desempenho ideal. Todos os gurus
enfatizavam a importância do trabalho árduo. Uma citação de Muhammad
Ali aparecia muito: «Odiei cada minuto de treino, mas disse: “Não desistas.
Sofre agora e vive o resto da tua vida como um campeão.”»
Com a noite de Natal a chegar ao fim, fiquei debruçado sobre as minhas
antigas anotações e perguntei-me se era aí que estava a errar. Será que só
precisava de recuperar a minha antiga ética de trabalho? Mas, quando voltei
ao trabalho, no dia seguinte, decidido a produzir mais, não fez diferença.
Embora tenha ficado na ala até à meia-noite — e mesmo recitando, para
mim mesmo, a frase de Muhammad Ali na casa de banho —, não conseguia
pôr a papelada em dia. Os meus pacientes continuavam a receber uma
versão cansada e ineficaz do Ali. E eu ainda demonstrava uma notável falta
de alegria natalícia.
No final do meu dia mais difícil, senti-me completamente assoberbado.
E então, do nada, lembrei-me de algumas palavras de sabedoria do meu
antigo orientador, o Dr. Barclay: «Se o tratamento não estiver a funcionar,
questione o diagnóstico.»
Lentamente, comecei a duvidar de todos os conselhos de produtividade
que havia aprendido. O sucesso realmente exigia sofrimento? O que era,
afinal, o «sucesso»? O sofrimento era sequer sustentável? Fazia sentido que
sentir-me sobrecarregado fosse bom para realizar as coisas? Teria de trocar
a minha saúde e felicidade por, bem, qualquer coisa?
Demoraria alguns meses. Mas estava no rumo certo para uma revelação:
tudo o que me disseram sobre o sucesso estava errado. Eu não podia forçar-
me a ser um bom médico. Trabalhar mais não me traria felicidade. E havia
outro caminho para a realização: que não fosse marcado por ansiedade
constante, noites sem dormir e uma dependência preocupante de cafeína.
Eu não tinha todas as respostas, nem de longe. Mas, pela primeira vez,
divisei o início de uma abordagem alternativa. Uma abordagem que não
dependia de um trabalho exaustivamente árduo, mas da compreensão do
que tornava o trabalho árduo mais agradável. Uma abordagem que se
concentrou primeiro no meu bem-estar e, em segundo lugar, usou esse bem-
estar para impulsionar o meu foco e a minha motivação. Uma abordagem a
que eu viria a chamar método Feel-Good de produtividade.

OS SEGREDOS SURPREENDENTES DO MÉTODO FEEL-


GOOD DE PRODUTIVIDADE

Na Faculdade de Medicina, a minha obsessão pela produtividade levou-me


a acrescentar mais um ano para me formar em Psicologia. Quando comecei
a juntar as peças do método Feel-Good de produtividade, lembrei-me de um
estudo em que fui testado — que envolvia uma vela, fósforos e uma caixa
de pioneses.

Imagine-se com estes três objetos diante de si. A sua tarefa é prender a
vela ao quadro de cortiça na parede para que, quando acesa, a cera não
pingue na mesa por baixo. Dá por si intrigado com estes objetos, virando-os
nas mãos. Consegue pensar na solução?
Diante deste problema, a maioria das pessoas considera apenas a vela,
os fósforos e os pioneses. Mas as mentes mais inovadoras reconhecem o
potencial da caixa de pioneses. A solução ideal para o enigma envolve ver a
caixa de pioneses não apenas como um recipiente mas como um castiçal.
Este é o «problema da vela», um teste clássico do pensamento criativo.
Desenvolvido originalmente por Karl Duncker e publicado, postumamente,
em 1945, desde então tem sido utilizado em inúmeros estudos que testam
tudo, desde a flexibilidade cognitiva às consequências psicológicas do
stress. No final da década de 1970, a psicóloga Alice Isen usou-o como base
de uma experiência influente1 para estudar como o humor afeta a
criatividade das pessoas.
Isen começou por dividir os seus voluntários em dois grupos. Um grupo
recebeu um pequeno presente — um saco de doces — antes de enfrentar o
problema da vela. O outro grupo iniciou a tarefa sem esse incentivo. A
teoria dizia que aqueles que recebessem os doces teriam um humor mais
positivo quando tentassem resolver o desafio. Isen descobriu algo
interessante: aqueles cujo humor melhorou subtilmente com o presente
tiveram significativamente mais sucesso na solução para o problema da
vela.
Quando li pela primeira vez sobre a experiência de Isen durante a minha
pós-graduação em Psicologia, achei-a interessante, mas não propriamente
transformadora. Pessoalmente, nunca senti a vontade irresistível de prender
uma vela à parede. Mas, voltando a isso como médico recém-formado,
percebi que a ideia de Isen era bastante profunda. Sugeria que sentir-se bem
não termina apenas com sentir-se bem. Na verdade, muda os nossos padrões
de pensamento e comportamento.
Sei agora que o estudo se tornou o pilar de uma onda de pesquisas que
estudam a forma como as emoções positivas afetam muitos dos nossos
processos cognitivos. Mostrou que, quando estamos de bom humor,
tendemos a considerar uma gama mais ampla de ações, a estar mais abertos
a novas experiências e a compreender melhor as informações que
recebemos. Por outras palavras, sentirmo-nos bem aumenta a nossa
criatividade — e a nossa produtividade.
Uma das primeiras pessoas a explorar exatamente como isso funciona
foi Barbara Fredrickson. Professora na Universidade da Carolina do Norte
em Chapel Hill, Fredrickson é uma das principais figuras da Psicologia
Positiva, um ramo relativamente novo da Psicologia que se concentra na
compreensão e na promoção da felicidade. No final da década de 1990,
Fredrickson propôs aquilo a que chamou teoria «ampliar-e-construir» das
emoções positivas.2
De acordo com a teoria ampliar-e-construir, as emoções positivas
ampliam a nossa consciência e constroem os nossos recursos cognitivos e
sociais. Ampliar refere-se ao efeito imediato das emoções positivas: quando
nos sentimos bem, as nossas mentes abrem-se, assimilamos mais
informações e vemos mais possibilidades ao nosso redor. Consideremos o
problema da vela: com um humor positivo, os participantes puderam ver
uma gama mais ampla de potenciais soluções.
Construir refere-se aos efeitos de longo prazo das emoções positivas.
Quando vivenciamos emoções positivas, construímos uma reserva de
recursos mentais e emocionais que podem ajudar-nos no futuro — recursos
como resiliência, criatividade, habilidades de resolução de problemas,
conexões sociais e saúde física. Com o tempo, estes dois processos
reforçam-se mutuamente, criando uma espiral ascendente de positividade,
crescimento e sucesso.

As emoções positivas são o combustível que impulsiona o


motor do desenvolvimento humano.

A teoria sugere uma forma totalmente nova de compreender o papel das


emoções positivas nas nossas vidas. Não são apenas sentimentos
passageiros que vêm e vão sem consequências. São essenciais para o
funcionamento cognitivo, para as relações sociais e para o bem-estar geral.
As emoções positivas são o combustível que impulsiona o motor do
desenvolvimento humano.

O MOTIVO PARA O MÉTODO FEEL-GOOD DE


PRODUTIVIDADE FUNCIONAR

Quando comecei a aprender sobre ampliar-e-construir, tive um vislumbre de


uma maneira diferente de pensar sobre a minha vida. Durante anos, pensei
que simplesmente esforçando-me mais poderia conseguir as coisas que
queria. Se eu quisesse ser um bom médico, a vida que teria pela frente seria
definida por um trabalho árduo e inexorável.
Agora, conseguia ver as coisas de outra maneira. A teoria de
Fredrickson sugere que as emoções positivas mudam a forma como o nosso
cérebro funciona. O primeiro passo é sentirmo-nos melhor. O segundo é
fazer mais daquilo que é importante para nós.
Mas porquê? — perguntei-me. Quanto mais leio, mais percebo que as
explicações são variadas… e, em alguns casos, permanecem obscuras. Mas
os cientistas começaram a encontrar algumas respostas.
Primeiro, sentirmo-nos bem aumenta a nossa energia. A maioria das
pessoas já sentiu uma energia que não é estritamente física ou biológica,
que não vem apenas do açúcar ou dos hidratos de carbono, mas de uma
fusão de motivação, foco e inspiração. É a energia que sente quando está a
trabalhar numa tarefa particularmente cativante ou cercado de pessoas
inspiradoras. Esta energia tem muitos nomes diferentes. Foi rotulada como
energia «emocional», «espiritual», «mental» ou «motivacional» por
psicólogos; «entusiasmo», «vitalidade» ou «entusiasmo energético» por
neurocientistas. Mas, se os investigadores não conseguem chegar a acordo
sobre o nome a dar-lhe, pelo menos concordam que ela nos torna
motivados, focados e inspirados para perseguir os nossos objetivos.
Então, qual é a fonte dessa energia misteriosa? A resposta curta:
sentirmo-nos bem. As emoções positivas estão ligadas a um conjunto de
quatro hormonas3 — endorfinas, serotonina, dopamina e oxitocina —, que
são frequentemente rotuladas de «hormonas da felicidade». Todas elas nos
permitem conseguir mais. As endorfinas são frequentemente libertadas
durante atividade física, stress ou dor e provocam sentimentos de felicidade
e diminuição do desconforto — e níveis elevados geralmente
correlacionam-se com o aumento de energia e de motivação. A serotonina
está ligada à regulação do humor, do sono, do apetite e com a sensação
geral de bem-estar; sustenta o nosso sentimento de contentamento e dá-nos
energia para realizarmos tarefas com eficiência. A dopamina, ou hormona
da «recompensa», está ligada à motivação e ao prazer, e a sua libertação
proporciona uma satisfação que nos permite concentrarmo-nos por mais
tempo. E a oxitocina, conhecida como a hormona do «amor», está associada
ao vínculo social, à confiança e à construção de relacionamentos, o que
aumenta a nossa capacidade de nos conectarmos com os outros, melhora o
nosso humor e, por sua vez, tem impacto na nossa produtividade.
Tudo isto significa que estas hormonas são o ponto de partida de um
ciclo virtuoso. Quando nos sentimos bem, geramos energia, o que aumenta
a nossa produtividade. E essa produtividade leva a sentimentos de
realização, que nos fazem sentir bem novamente.
Em segundo lugar, sentirmo-nos bem reduz o stress. Além da teoria
ampliar-e-construir, Barbara Fredrickson também desenvolveu o que os
psicólogos chamam de «hipótese de desfazer». Fredrickson e os seus
colegas estavam interessados em décadas de pesquisa que mostravam que
emoções negativas provocam a libertação de hormonas de stress4, como
adrenalina e cortisol. Isto não é um problema a curto prazo; é o mecanismo
que nos motiva a fugir do perigo. Mas, se experienciarmos estas sensações
negativas com demasiada frequência, somos dominados pela ansiedade, e a
nossa saúde física é prejudicada. A ativação contínua destas hormonas pode
até aumentar o risco de desenvolver doenças cardíacas e hipertensão. Não é
ideal.

Fredrickson questionou-se sobre o outro lado: se as emoções negativas


têm estes efeitos fisiológicos prejudiciais, então talvez as emoções positivas
possam revertê-los. Será que sentir-se bem pode «reiniciar» o sistema
nervoso e colocar o corpo num estado mais relaxado?
Para testar isso, Fredrickson elaborou um estudo bastante mauzinho. Os
investigadores disseram a um grupo de pessoas que tinham um minuto para
preparar um discurso que seria filmado e julgado pelos seus pares. Sabendo
que o medo de falar em público é praticamente universal, Fredrickson
levantou a hipótese de que isso elevaria os níveis de ansiedade e stress dos
sujeitos. E assim foi; as pessoas relataram sentir-se mais ansiosas e
sofreram aumentos na frequência cardíaca e na pressão arterial. Em
seguida, os investigadores designaram aleatoriamente os participantes para
assistir a um de quatro filmes: dois que evocavam emoções moderadamente
positivas, o terceiro neutras, e o quarto tristes. E, então, mediram quanto
tempo os participantes levaram a «recuperar» do stress.
As suas descobertas foram intrigantes. Os participantes que assistiram
aos filmes de emoções positivas levaram significativamente menos tempo
para regressar ao estado inicial em termos de frequência cardíaca e pressão
arterial. E aqueles que assistiram ao filme que evocava a tristeza
demoraram mais a voltar ao ponto de partida.
Esta é a «hipótese de desfazer»: que as emoções positivas podem
«desfazer» os efeitos do stress e de outras emoções negativas. Se o stress é
o problema, sentirmo-nos bem pode ser a solução.
Mas a implicação final, e talvez a mais transformadora, da
produtividade do bem-estar vai muito além de qualquer tarefa ou projeto.
Porque, em terceiro lugar, sentirmo-nos bem enriquece a nossa vida. Em
2005, uma equipa de psicólogos leu todos5 os estudos a que conseguiu ter
acesso sobre a complexa relação entre felicidade e sucesso. Investigaram
225 artigos publicados que envolveram dados de mais de 275 mil
indivíduos. A pergunta deles: O sucesso, como nos dizem sempre, torna-nos
mais felizes — ou poderá ser o contrário?
O estudo ofereceu evidências concretas de que tendemos a entender mal
a felicidade. Indivíduos que experienciam frequentemente emoções
positivas não são apenas mais sociáveis, otimistas e criativos. Eles também
realizam mais. Estas pessoas trazem uma energia contagiante ao seu
ambiente, mostrando-se mais propensas a desfrutar de relacionamentos
gratificantes, obter salários mais altos e realmente brilhar nas suas vidas
profissionais. Aqueles que cultivam emoções positivas no trabalho
transformam-se em melhores solucionadores de problemas, planeadores,
pensadores criativos e empreendedores resilientes. Estão menos stressados,
atraem avaliações mais elevadas dos seus superiores hierárquicos e
demonstram um maior grau de lealdade para com as suas organizações.

O sucesso não leva à felicidade. A felicidade leva ao


sucesso.

Simplificando: não é o sucesso que faz que se sinta bem. É o facto de se


sentir bem que o leva ao sucesso.

COMO USAR ESTE LIVRO

Naquele primeiro ano angustiante como médico, a maioria destas


descobertas ainda estava anos à minha frente. Eu trabalhava em turnos
intermináveis, tentando encaixar a minha pesquisa de produtividade nos
intervalos fugazes entre as consultas aos pacientes.
Mas mesmo as revelações básicas que descobri foram suficientes para
causar uma mudança dramática na minha relação com o trabalho. Quando
comecei a abandonar as minhas obsessões com a disciplina e a concentrar-
me em tornar o trabalho agradável, os meus horríveis turnos começaram a
ser mais fáceis. Logo, o meu humor começou também a melhorar. Lembro-
me de uma consulta com uma paciente idosa, alguns meses depois de
descobrir o método Feel-Good de produtividade. «Sabe, doutor», disse ela,
«é o único aqui que sorri a semana toda».
Estas novas perspetivas não alterariam apenas a minha abordagem
enquanto médico. Alterariam completamente o rumo da minha vida. Pela
primeira vez em anos, comecei a ver oportunidades além dos limites do
trabalho: as minhas amizades, a minha família e outras paixões que tinha
deixado de parte. E logo me vi a querer partilhar a minha descoberta. Há
alguns anos que tenho um canal no YouTube no qual partilho dicas de
estudo e análises de tecnologia. Agora, comecei a partilhar revelações
práticas que aprendi com a Psicologia e a Neurociência, usando-me como
cobaia, experimentando tudo o que aprendi e as estratégias que penso que
poderão funcionar.
À medida que a minha noção radical de que o sucesso não precisa de
estar vinculado ao sofrimento foi ganhando força, comecei a receber cada
vez mais e-mails dos meus subscritores. Alunos do ensino secundário
passaram com excelência em exames, empresários duplicaram os seus
rendimentos, pais conseguiram equilibrar melhor o trabalho e a vida
familiar, tudo aplicando as estratégias que eu estava a partilhar. Até
profissionais experientes, desgastados pela rotina da vida corporativa,
estavam a descobrir energia renovada, motivação e um novo rumo.
E eu também. Quanto mais lia, mais a minha filosofia se desenvolvia.
Por fim, seguindo os mesmos princípios e estratégias que estava a aprender,
percebi que queria fazer uma pausa na Medicina para procurar algo novo.
Foi quando soube que tinha de escrever este livro. O que está contido
nestas páginas não é apenas mais um sistema de produtividade para ajudá-lo
a fazer mais a qualquer custo. Trata-se de fazer mais daquilo que é
importante para si. Isso vai ajudá-lo a aprender mais sobre si mesmo, o que
ama e o que realmente o motiva.
O meu método tem três partes, cada uma das quais aborda um aspeto
diferente da produtividade Feel-Good. A Primeira Parte explica como usar
a ciência da produtividade Feel-Good para se energizar. Apresenta os três
«energizantes» que sustentam as emoções positivas — brincar, poder e
pessoas — e explica como integrá-los no seu dia a dia.
A seguir, a Segunda Parte analisa como a produtividade Feel-Good
pode ajudar-nos a superar a procrastinação. Aprenderá sobre os três
«bloqueadores» que nos fazem sentir pior — incerteza, medo e inércia — e
como superá-los. Ao remover estes bloqueadores, não superará apenas a
procrastinação; também se sentirá melhor.
Finalmente, na Terceira Parte, falaremos como a produtividade Feel-
Good pode sustentar-nos a longo prazo. Iremos aprofundar os três tipos
diferentes de «esgotamento» — esgotamento por sobrecarga, esgotamento
por exaustão e esgotamento por desalinhamento. E explicarei como
podemos aproveitar três «sustentadores» simples — conservar, recarregar e
alinhar — para nos sentirmos melhor não apenas durante dias e semanas
mas durante meses e anos.
Cada capítulo contém uma boa dose de dicas práticas. Mas o meu
objetivo neste livro não é apresentar-lhe uma extensa lista de tarefas. É
oferecer-lhe uma filosofia: uma nova maneira de pensar sobre
produtividade que pode aplicar à sua vida, à sua maneira. A minha
esperança é que termine este livro como «cientista da produtividade»
amador, encontrando alguns métodos que funcionam, descartando outros e
trabalhando com sabedoria para ver o que o ajuda a sentir-se bem e a
alcançar mais. É por isso que cada capítulo contém não apenas três ideias
simples, apoiadas pela ciência, que pode usar para repensar a produtividade,
mas também seis «experiências» que pode implementar na sua própria vida.
Se uma experiência funcionar para si, ótimo; se não funcionar, então essa
também é uma revelação útil. No final do livro, porém, deverá ter um kit de
ferramentas para aplicar a produtividade Feel-Good ao seu próprio trabalho,
relacionamentos e vida.
Só espero que funcione tão bem para si quanto funcionou para mim.
Porque, se há uma coisa que aprendi ao mergulhar na ciência da
produtividade do bem-estar, é que ela se aplica a todas as esferas.
Transforma tarefas assustadoras em desafios cativantes. Leva a conexões
mais profundas com os outros. Impulsiona interações significativas no que
faz, todos os dias.
Ao compreender e aplicar o que o faz sentir bem, não apenas
transformará o seu trabalho. Transformará a sua vida.
A produtividade Feel-Good é um método simples. Mas muda tudo.
Mostra que, se já se sentiu debaixo de água, não precisa de se contentar em
permanecer à tona. Pode aprender a nadar.
Vamos mergulhar.
1 Isen, A. M., Daubman, K. A., e Nowicki, G. P. (1987). «Positive affect facilitates creative problem
solving». Journal of Personality and Social Psychology, 52(6), 1122–1131.
2 Por exemplo, ver: Fredrickson, B. L., e Branigan, C. (2005). «Positive emotions broaden the scope
of attention and thought-action repertoires». Cognition & Emotion, 19(3), 313–332.
3 Ver este artigo para ter uma ideia geral das quatro hormonas da felicidade: Sethi, C., e Anchal, S.
(2021). «Happy Chemicals and How to Hack Them«. Classic Fitness Academy. Disponível online:
https://classicfitnessgroup.com/blog/happy-chemicals-and-how-to-hack-them
4 Este estudo realizado por Shelley Taylor foi um dos primeiros a apresentar os efeitos biológicos das
emoções negativas: Taylor, S. E. (1991). «Asymmetrical effects of positive and negative events: the
mobilization-minimization hypothesis». Psychological Bulletin, 110(1), 67–85.
5 Lyubomirsky, S., King, L., e Diener, E. (2005). «The benefits of frequent positive affect: does
happiness lead to success?». Psychological Bulletin, 131(6), 803–855.
PRIMEIRA PARTE

Energizar
CAPÍTULO 1

BRINCAR

Em teoria, tudo na carreira do professor Richard Feynman parecia perfeito.6


Com apenas 27 anos, já era aclamado como um dos maiores físicos da sua
geração — o homem com maior probabilidade de descobrir como
aproveitar o potencial da energia nuclear. Agora, fora nomeado um dos
professores mais jovens da Universidade Cornell, no estado de Nova
Iorque.
Havia apenas um problema. Estava entediado com a Física.
A questão surgira em meados da década de 1940. Sempre que se
sentava para pensar, sentia-se simplesmente cansado. Tudo começou
quando a mulher de Feynman, Arline, morreu de tuberculose em junho de
1945, meses antes do fim da Segunda Guerra Mundial, na América. Após a
morte dela, toda a música da vida do jovem professor desapareceu. As
ideias que tanto o animaram quando era estudante de doutoramento
pareciam enfadonhas e monótonas. Embora fosse bom a lecionar, o ensino
entediava-o. «Eu simplesmente estava esgotado», lembrou mais tarde.
«Eu ia muito à biblioteca e lia As Mil e Uma Noites», escreveu. «Mas
quando chegava a hora de fazer alguma pesquisa, não conseguia trabalhar.
Não tinha interesse.»
Descobriu que era bem fácil não fazer nada. Ainda gostava de dar aulas,
sentar-se na biblioteca a ler e divagar pelo campus. Mas não gostava de
trabalhar. Tão simples quanto isso. No final da década de 1940, Feynman
conformou-se com uma nova identidade: um professor de Física que não
exercia Física.
Até que um dia tudo mudou. Alguns anos depois dos seus problemas
terem começado, Feynman estava sentado no refeitório da universidade,
sozinho, em frente a um grupo de estudantes. Um deles atirava,
repetidamente, um prato para o ar. Feynman reparou em algo estranho.
Enquanto o prato estava no ar, oscilou. Mas o logótipo da Cornell gravado
no prato parecia oscilar mais rápido do que o próprio prato.
Curioso, pensou Feynman. Mas não era exatamente um pensamento
digno do prémio Nobel. Ele era o homem que ajudara a decifrar o código da
fissão nuclear; não devia estar a teorizar as características de louça lançada
pelo ar. Porém, este momento de curiosidade provocou uma pequena
epifania. Antes de mais, começou a refletir sobre o que o atraiu para o
assunto. «Eu costumava gostar de Física», lembrou-se, mais tarde.
«Porque é que gostava? Costumava brincar com ela. Costumava fazer
tudo o que me apetecia — não tinha que ver com se era importante para o
desenvolvimento da física nuclear, mas se era interessante e divertido para
mim.»
Depois de sair do refeitório, Feynman deu por si a relembrar como via o
mundo quando era adolescente. Quando estava no ensino secundário, as
coisas que mais o fascinavam no mundo pareciam mundanas para os outros.
Via a água ficar mais estreita à medida que se afastava da torneira e
perguntava-se se conseguiria descobrir o que determinava aquela curva.
«Eu não tinha de o fazer; não era importante para o futuro da ciência;
alguém já o tinha feito», disse ele. «Isso não fazia diferença: eu inventava
coisas e brincava com elas para o meu próprio entretenimento.»
«E se regressar a essa visão de mundo fosse a chave para encontrar
novamente a alegria na Física?», questionou-se. Abordar a Física, não como
um trabalho, mas como um jogo para se divertir? «Eu tenho essa nova
atitude», decidiu ele. «Assim como leio As Mil e Uma Noites por prazer,
vou brincar com a Física sempre que quiser, sem me preocupar com a sua
importância.»
Tudo começou com aquele prato oscilante. Feynman passou semanas a
tentar modelar as equações que explicavam como o prato se movia no ar.
Os seus colegas, perplexos, perguntaram-lhe porquê. «Por nenhum motivo
importante», respondeu-lhes Feynman, alegremente. «Faço isto por
diversão.»
Mas, quanto mais Feynman se envolvia nos pratos oscilantes, mais
fascinantes eles se tornavam. Pouco tempo depois, estava a ponderar se a
oscilação de um prato rotativo teria alguma semelhança com a oscilação dos
eletrões num átomo. Ou talvez com o funcionamento da eletrodinâmica
quântica. «Antes que eu desse conta (foi muito pouco tempo), estava a
“brincar” — a trabalhar, na verdade — com o mesmo velho problema que
tanto amava.» Só que, desta vez, o «trabalho» da Física não o esgotou.
O interesse do professor Feynman na rotação de pratos acabaria por lhe
valer o prémio Nobel da Física. O seu modelo para todas essas oscilações
ajudou a dar sentido à eletrodinâmica quântica, uma teoria que descreve
como a luz e as partículas minúsculas interagem no nível quântico. Para
visualizá-las, disse ele, é útil imaginar pratos a girarem rapidamente.
Feynman não estava sozinho. Que eu saiba, pelo menos seis vencedores
do Prémio Nobel atribuem o seu sucesso à brincadeira. James Watson e
Francis Crick, que descobriram a estrutura do ADN na década de 1950,
descreveram o processo generativo que utilizaram para criar a estrutura
como «construir um conjunto de modelos moleculares e começar a
brincar». Alexander Fleming, o cientista que descobriu o antibiótico
penicilina7, certa vez, descreveu o seu trabalho como «brincar com
micróbios». Donna Strickland, vencedora do Nobel da Física de 2018,
descreveu a sua carreira como «brincar com lasers de alta intensidade».
Konstantin Novoselov, que partilhou o prémio Nobel da Física de 20108 por
ajudar a descobrir o grafeno, disse de forma muito simples: «Se tentar
ganhar o Nobel, não o ganhará», refletiu. «A forma como trabalhávamos
era realmente muito divertida.»
Esta abordagem é apoiada por um conjunto crescente de pesquisas. Os
psicólogos acreditam, cada vez mais, que brincar é a chave para a
verdadeira produtividade, em parte porque proporciona uma sensação de
alívio psicológico. Como afirmou um estudo recente9: «A função
psicológica da brincadeira é restaurar o indivíduo fisicamente e
mentalmente fatigado através da participação em atividades que sejam
agradáveis e relaxantes.»

A vida é stressante. Brincar torna-a divertida.


Brincar é o nosso primeiro energizante. A vida é stressante. Brincar
torna-a divertida. Se conseguirmos integrar o espírito lúdico nas nossas
vidas, sentir-nos-emos melhor — e também faremos mais.

CRIE UMA AVENTURA

Trazer a brincadeira para as nossas vidas é mais fácil de dizer do que de


fazer, pode estar a pensar. Muitos de nós sabem que brincar na idade adulta
não é fácil.
Quando somos crianças, os nossos dias são repletos de uma sensação de
aventura. Exploramos cada centímetro do jardim, corremos pelas lojas,
subimos a árvores e balançamo-nos nos galhos. Não estamos à procura de
objetivos nem a tentar impulsionar o nosso currículo. Seguimos a nossa
curiosidade e aproveitamos as atividades sem nos preocuparmos com
resultados.
Contudo, à medida que envelhecemos, esse espírito de aventura vai-nos
abandonando lentamente. A menos que tenha pais particularmente
progressistas, provavelmente aprendeu que o primeiro grande passo para se
tornar adulto é parar de brincar e começar a levar a vida a sério. A vida
deixa de estar cheia de aventura e passa a uma existência mundana e
previsível.
Isto é um erro. Porque a aventura, ao que parece, é o primeiro
ingrediente importante da brincadeira — e talvez da felicidade.
Numa experiência de 2020 das universidades de Nova Iorque e
Miami10, os cientistas tentaram quantificar os efeitos de abordar o mundo
com um sentido de aventura. Recrutaram mais de 130 participantes e
obtiveram consentimento para rastrear a sua localização usando o GPS dos
seus telemóveis. Nos meses seguintes, os investigadores enviaram
mensagens aos participantes perguntando sobre as suas emoções: quão
felizes, entusiasmados ou relaxados se sentiam?
Os resultados foram reveladores. À medida que os dados de GPS e as
respostas às mensagens chegavam, ficou claro que aqueles que tiveram
experiências mais aventureiras — aqueles que viajaram para uma variedade
maior e mais aleatória de lugares, fosse seguindo um novo caminho para o
trabalho ou experimentando cafés diferentes, em vez de permanecer fiel ao
mesmo — sentiam-se mais felizes, mais animados e mais relaxados. A
conclusão deles: uma vida aventureira é a chave para desbloquear emoções
positivas.
Portanto, a primeira forma de aproveitar o potencial da brincadeira é
integrar a aventura nas nossas vidas. Mas como? Bem, com as ferramentas
certas, ainda podemos encontrar a emoção que tínhamos ao correr por
aquelas lojas e balançar naqueles galhos. O primeiro passo: escolher o seu
personagem.

EXPERIÊNCIA 1:

Escolha o seu personagem

Confissão: Eu era viciado em World of Warcraft (WoW).


WoW é um famoso jogo RPG11 online apreciado por verdadeiros nerds.
Começa-se por escolher o personagem — pode ser um Warlock, um
Warrior, um Paladin ou muitos mais — e explorar o mundo de fantasia de
Azeroth. Juntamo-nos a outros jogadores para voar pelo mundo, matando
demónios, atualizando as nossas armas e divertindo-nos muito.
Também é famoso por ser altamente viciante. Nos três anos após
descobrir o jogo, aos 14 anos, acumulei 184 dias de jogo. São 4416 horas.
Três horas por dia ou 25 por cento das minhas horas acordado. Foi muito.
Porque é que achei World of Warcraft tão viciante? Aos 14 anos, não há
nada mais emocionante do que matar monstros e participar em missões (na
verdade, como adulto, isso ainda me parece muito apelativo). Mas, se este
simples facto explica por que motivo as primeiras horas de jogo são
divertidas, provavelmente não justifica as milhares que se seguem. Para ser
sincero, após algum tempo, o funcionamento do jogo deixa de ser tão
divertido. Ser enviado em missões para resgatar o gato de um aldeão acaba
por perder a piada.
Cada vez mais, suspeito que não foi o funcionamento básico do WoW
que o tornou tão agradável; foi o escapismo. O WoW oferece um mundo
alternativo e vívido, onde se pode matar um exército de zombies com um
feitiço ou domar um dragão e voar no seu dorso. E, o mais importante, é um
mundo no qual se entra como um personagem. No WoW, nunca fui Ali
Abdaal, o aluno meio nerd, sem nenhuma habilidade desportiva e com
problemas de confiança. Sempre fui Sepharoth, o alto e bonito Blood Elf
Warlock com vestes roxas esvoaçantes e um exército de demónios sob o
meu comando.
Brincar permite-nos assumir diferentes papéis ou personae, seja
tornando-nos um personagem de WoW ou representando uma cena
imaginária com amigos no parque. Estes personagens permitem-nos
expressar diferentes aspetos de nós mesmos e transformar as nossas
experiências em algo mais agradável. Quando assume uma personalidade
diferente, começa a encontrar aventura.
Isto não é tão exagerado quanto parece. Escolher o seu «personagem»
não significa reinventar a sua personalidade da noite para o dia (nem fingir,
à frente dos seus colegas, ser um duende). Em vez disso, significa
identificar o tipo de jogo que mais se adapta a quem é, para que possa
escolher um género de jogador para incorporar.
O Dr. Stuart Brown passou a maior parte da sua carreira a estudar a
psicologia da brincadeira.12 Psicólogo clínico, começou a investigar os
benefícios da brincadeira depois de testemunhar os seus efeitos
transformadores nos pacientes. Acabaria por fundar o National Institute for
Play13 e tornar-se-ia professor clínico de Psiquiatria na Universidade da
Califórnia, em San Diego. Durante este período, conversou com mais de
5000 pessoas de todas as esferas da vida — desde artistas, camionistas e
vencedores do prémio Nobel — sobre o que brincar significava para eles.
No decorrer destas entrevistas, descobriu que a maioria tem tendência
para apenas um ou dois tipos específicos de representação de personagens.
Ao encontrar aqueles que mais nos agradam, podemos começar a assumir
uma «personalidade lúdica» que liberta o nosso sentido de aventura14. Estas
são as oito «personalidades lúdicas» que o Dr. Brown destilou através da
sua pesquisa.
1. O Colecionador adora reunir e organizar, desfrutando de atividades
como procurar plantas raras e vasculhar arquivos ou lojas de
antiguidades.
2. O Competidor gosta de jogos e desportos e tem prazer em dar o seu
melhor e vencer.
3. O Explorador gosta de passear, descobrindo novos lugares e coisas
que nunca viu, através de caminhadas, viagens rodoviárias e outras
aventuras.
4. O Criador encontra alegria em produzir coisas e pode passar horas,
todos os dias, a desenhar, pintar, fazer música, jardinagem e muito
mais.
5. O Contista tem uma imaginação ativa e usa-a para entreter os
outros. É atraído por atividades como escrita, dança, teatro e jogos
RPG.
6. O Palhaço esforça-se para fazer as pessoas rir e pode brincar
fazendo stand-up, improvisando ou apenas pregando partidas para
deixar alguém a sorrir.
7. O Realizador gosta de planear, organizar e liderar outras pessoas e
pode enquadrar-se em muitas funções e atividades diferentes, como
encenar atuações, administrar uma empresa e trabalhar na política
ou causas sociais.
8. O Acrobata encontra diversão em atividades físicas como
acrobacia, ginástica e corrida.

Aqui está o primeiro passo para abordar o seu trabalho — e a sua vida
— com um sentido de aventura lúdico. Pondere com qual destes
personagens mais se identifica e tente abordar o seu trabalho como se fosse
esse personagem. Se é «o Contista», isso pode implicar procurar maneiras
de transformar uma tarefa aborrecida (escrever um e-mail logístico e seco)
numa tarefa que aproveite o seu sentido de diversão (encontrar uma forma
de transformá-lo numa história, com um começo, um meio e um fim, e
talvez uma reviravolta inesperada). Ou, se for «o Criador», isso pode
significar transformar tarefas mundanas (preencher aquela aborrecida folha
de cálculo) em oportunidades de autoexpressão (transformando-a num
infográfico visualmente atraente e fácil de entender).
Identificar e explorar as nossas personalidades lúdicas ajuda-nos a
recuperar algumas das aventuras que definiram a nossa infância — uma
altura em que sentir-se bem era a norma, não a exceção. É um espírito que
ainda reside dentro de nós. Como diz Stuart Brown: «Lembrar o que é
brincar e torná-lo parte da nossa vida diária é, provavelmente, o fator mais
importante para ser um ser humano realizado.»

EXPERIÊNCIA 2:

Abrace a sua curiosidade

O que significa realmente o termo «dinossauro»?


Que música dos Beatles permaneceu no top da tabela de singles dos
Estados Unidos durante mais tempo?
Quem era o presidente dos Estados Unidos quando o Tio Sam15 teve
barba pela primeira vez?
Estas não são apenas perguntas de um quiz particularmente diabólico.
São três das dezanove referências usadas por investigadores16 do Centro
Davis de Neurociências da Universidade da Califórnia numa experiência
pioneira. Depois de fazer estas perguntas a um grupo de vinte e quatro
voluntários, pediram a cada um deles que avaliasse quanto se importavam
com as respostas de cada pergunta, de «baixa curiosidade» a «alta
curiosidade». Depois, deixaram as perguntas fervilhar na mente dos
participantes durante algum tempo. (A propósito, as respostas são «lagarto
terrível», Hey Jude e Abraham Lincoln.)
O objetivo era tentar investigar que efeito a curiosidade tinha na mente
das pessoas. Por um lado, os investigadores tinham um palpite de que,
quando as pessoas estavam curiosas sobre alguma coisa, se lembravam
melhor dos detalhes. Estavam certos. O estudo mostrou que as pessoas
tinham 30 por cento mais probabilidade de se lembrarem de um facto que
acharam interessante, em comparação com um facto que acharam
aborrecido.
Mas o que talvez tenha sido mais surpreendente foi o que se passava no
cérebro das pessoas no momento em que recordavam estes factos. Quando
sujeitos a um exame cerebral, a sua atividade neurológica era bem diferente
quando lhes era feita uma pergunta que os deixava curiosos: pareciam
receber uma dose de dopamina. A dopamina é uma das nossas hormonas da
felicidade e também ativa a parte do cérebro responsável pela aprendizagem
e formação de memórias. Assim, para os participantes do estudo, envolver-
se com a curiosidade fez que se sentissem bem — e eles, por sua vez,
tornaram-se melhores na retenção de informações.
Aproveitar a sua curiosidade é um segundo método para incorporar
aventura na sua vida. A curiosidade não torna as nossas vidas simplesmente
mais agradáveis. Também nos permite focar por mais tempo. Depois de
pesquisar meticulosamente as biografias de algumas das mentes mais
pioneiras da História, de Leonardo da Vinci a Steve Jobs, o escritor Walter
Isaacson resumiu as suas descobertas17 da seguinte forma: «Ser curioso
sobre tudo não só o torna mais criativo. Também enriquece a sua vida.»

A curiosidade não torna as nossas vidas simplesmente


mais agradáveis. Também nos permite focar por mais
tempo.

Então, como integramos um sentido de curiosidade nas nossas vidas?


Um método é procurar aquilo a que chamo «missões secundárias». Em
videojogos como The Legend of Zelda, The Witcher e Elden Ring, existem
dezenas de missões secundárias à espera de serem realizadas. Estas missões
não afetam a história principal do jogo, mas são movidas pela curiosidade
do jogador: o que acontece se eu entrar nesta caverna, ou tentar chegar ao
ponto mais alto desta área, ou nadar até ao fundo deste lago? Muitos dos
melhores segredos do jogo podem estar escondidos em cavernas, florestas e
aldeias que um jogador, apenas seguindo o enredo básico, não encontraria.
Muitas vezes, penso que a minha vida contém uma série de missões
secundárias. Todos os dias, quando me sento para trabalhar, olho para o
calendário e para a minha lista de tarefas e pergunto-me: «Qual será a
missão secundária de hoje?» Esta pergunta ajuda-me a mudar a minha
mentalidade das tarefas óbvias que tenho pela frente para os potenciais
caminhos alternativos a que elas podem levar-me. Pode impelir-me a sair do
gabinete e passar algumas horas a trabalhar num café local. Ou encorajar-
me a explorar novos softwares que possa usar para resolver o problema no
qual estou a trabalhar.
Ao adicionar uma missão secundária ao seu dia, cria espaço para a
curiosidade, a exploração e a diversão — e pode descobrir algo incrível e
completamente inesperado ao longo do caminho.

ENCONTRE A DIVERSÃO

Era uma noite estrelada no final da década de 1990, numa pequena


universidade, em Ohio. Um jovem assistente de investigação estava no
laboratório, a segurar um rato na palma da mão. Ele acariciou,
delicadamente, a barriga branca do rato com um pincel seco, esperando que
algo interessante acontecesse.
A princípio, nada. Mas então, de repente, o rato guinchou. Porém, não
assustado; na verdade, o rato parecia estar a rir.
Os cientistas não faziam cócegas nos ratos por diversão. Na verdade,
estavam a investigar os efeitos biológicos da brincadeira no cérebro
humano — aquilo a que o principal cientista, Jaak Panksepp18, chamou
«biologia da alegria». Naquela altura, a crença predominante na
comunidade científica era de que apenas os humanos experienciavam
emoções. Pensava-se que as emoções provinham da parte altamente
complexa do cérebro que é única em nós, o córtex cerebral. Mas a
descoberta de Panksepp de que os roedores podiam rir sugeriu uma
alternativa: que as emoções deviam vir de áreas muito mais primitivas do
cérebro, como a amígdala cerebelosa e o hipotálamo. Panksepp mostrou
que a alegria é uma experiência profundamente primitiva.
Uma das principais descobertas de Panksepp foi que os ratos adoram
brincar. Passou grande parte da sua experiência a gravar os sons produzidos
pelos ratos enquanto brincavam. Os ruídos eram alegres: «Parecia um
jardim infantil», disse ele mais tarde. Brincar liberta dopamina, que fazia os
ratos sentirem-se bem.
Podemos aprender uma ou duas coisas com esses roedores. Os ratos de
Panksepp mostraram que, se quisermos encontrar alegria naquilo que
fazemos, isso não dependerá somente das partes superiores e mais
complicadas do cérebro, aquelas associadas ao córtex cerebral. Também se
deve às partes mais antigas e básicas da nossa neurologia — as mesmas
hormonas da felicidade ativadas nesses ratos. Nós também podemos libertar
pequenas doses de dopamina que nos mantêm felizes e empenhados.
Mas como? A resposta pode ser encontrada estudando o que,
especificamente, provoca a dopamina. Como se escreve num artigo
publicado pela Harvard Medical School, a hormona é ativada por «sexo,
compras e cheirar biscoitos no forno»19 — por outras palavras, pelas
atividades que achamos divertidas.
Portanto, se quisermos aproveitar os efeitos revolucionários da
brincadeira, o nosso segundo passo é procurar diversão onde quer que
vamos. E isso começa com uma visita a uma versão disneyficada da cidade
de Londres eduardiana.

EXPERIÊNCIA 3:

O post-it mágico

Durante uma fase particularmente desgastante do trabalho como médico em


início de carreira, eu e a minha colega de casa, Molly, decidimos revisitar
um dos nossos filmes favoritos da infância: Mary Poppins. Esperávamos
que mergulhar num mundo de pássaros animados, sotaques londrinos
extremamente maus e sucessos musicais sobre o sufragismo proporcionasse
algum alívio, mesmo que apenas por algumas horas.
Na altura, eu lutava para encontrar motivação para estudar para os
exames de pós-graduação em Medicina. Quando combinados com o meu
trabalho no hospital, os prazos iminentes e a matéria complexa, pareciam
esmagadores. A ideia de me sentar a ler manuais no final do meu turno
parecia um pesadelo.
Contudo, ao rever Mary Poppins, algo inesperado aconteceu. O filme
não era apenas uma história frívola de uma ama peculiar com poderes
mágicos — continha uma verdade profunda. Uma das canções mais
famosas do filme é A Spoonful of Sugar, que Mary canta às crianças quando
elas reclamam das tarefas domésticas. Não me lembrava de quase nada da
letra desde a minha infância, a não ser do refrão: A spoonful of sugar makes
the medicine go down… in the most delightful way.20
Ao ver esta cena familiar, porém esquecida, vinte e poucos anos depois,
ouvi como a música começa.
In every job that must be done,
There is an element of fun.
You find the fun and snap!
The job’s a game.21

O resto da música descreve várias formas através das quais as cotovias,


os piscos e as abelhas tornam as suas tarefas tediosas mais agradáveis,
cantando enquanto trabalham. (Aparentemente, os piscos cantam a sua
«melodia alegre» para «fazer avançar o trabalho»; uma análise que,
posteriormente, fiquei triste ao saber que não é ornitologicamente precisa.)
Decidi aplicar essa ideia à minha própria vida. Numa explosão noturna
de inspiração, peguei num marcador e num post-it e escrevi seis palavras
simples: Como seria isto se fosse divertido?
Colei o post-it no monitor do meu computador e fui dormir.
No dia seguinte, quando o vi no meu monitor, já tinha esquecido que o
havia colocado ali. Tinha acabado de chegar do trabalho e ia recomeçar a
rever Bioquímica para o meu exame médico. Sentei-me com a minha
expressão habitual de sorrir-e-aguentar. Mas quando vi o post-it fiquei a
pensar. Como seria isto se fosse divertido?
A primeira resposta surgiu imediatamente: se isto fosse divertido,
haveria música. Percebi que memorizar matéria tediosa de bioquímica se
tornou magicamente muito mais interessante com a banda sonora de O
Senhor dos Anéis a tocar nos meus auriculares. De repente, a música
tornou-se um dos veículos mais importantes para trazer mais diversão ao
meu trabalho.
Também comecei a aplicar esse método no trabalho. Na altura, estava
no meu estágio de Medicina Geriátrica, e o consultório médico era uma sala
pequena e pouco decorada no canto da ala médica. Numa tarde
particularmente cansativa, quando estava sentado no consultório com uma
enorme lista de tarefas pela frente, decidi aplicar o método da «diversão
musical». Não tinha nenhuma coluna comigo, então fui buscar uma tigela
na cozinha e coloquei lá o telemóvel para usar como coluna improvisada.
Abri o Spotify e passei o resto do dia a fazer as minhas tarefas com a banda
sonora de Piratas das Caraíbas a tocar em volume baixo. Os efeitos foram
transformadores; senti-me simplesmente melhor.
«Como seria isto se fosse divertido?» tornou-se uma questão norteadora
na minha vida. E é surpreendentemente fácil de usar. Pense numa tarefa que
não quer fazer agora e questione como seria se fosse divertida? Poderia
fazê-la de uma maneira diferente? Poderia adicionar música, sentido de
humor ou criatividade? E se decidisse fazer a tarefa com amigos ou
prometesse um presente a si mesmo no final do processo?
Há alguma maneira de tornar esse processo esgotante um pouco mais
agradável?

EXPERIÊNCIA 4:

Aproveite o processo, não o resultado

Existe outra maneira de se divertir em tudo o que faz, e não envolve rever
filmes infantis de meados do século XX. Na verdade, um adolescente
espanhol de 1,70 metros de altura com cabelo loiro descolorado demonstra-
o na perfeição.
Em agosto de 2021, Alberto Ginés López subiu ao pódio como o
primeiro vencedor da medalha de ouro de escalada desportiva nos Jogos
Olímpicos de Verão de Tóquio. Nas semanas anteriores, o mundo assistiu,
petrificado, enquanto ele completava uma série de feitos físicos
surpreendentes nas paredes coloridas do Aomi Urban Sports Park, em
Tóquio. O mais impressionante de todos foi a escalada de velocidade —
onde se escala uma parede o mais rápido possível, como uma aranha. López
alcançou o topo da parede nuns impressionantes 6,42 segundos.
Mas enquanto as multidões observavam López e os seus colegas a
escalarem as paredes em velocidades vertiginosas, também notaram que
este era um desporto bastante incomum. Não apenas porque os participantes
tendiam a parecer mais boémios do que os comuns atletas de atletismo, com
mechas de cabelos tingidos e arneses de cores vivas, mas também porque
pareciam estar mais relaxados. Em vez de evitarem o contacto visual e
observarem, tensos, enquanto os seus adversários avançavam para as
paredes, muitos dos escaladores pareciam estar a conversar jovialmente ao
fundo, e mesmo a partilhar dicas. Quando avançavam para as paredes, os
seus rostos não exibiam a intensidade agonizante que a maioria dos
velocistas ou mesmo jogadores de futebol tende a exibir. Na verdade,
estavam claramente a divertir-se.
Esses alpinistas sugerem a nossa segunda maneira de encontrar a
diversão: enfatizando a alegria que vem, não do resultado, mas do processo
em si.
De acordo com o psicólogo húngaro-americano Mihaly
Csikszentmihalyi (pronuncia-se «chique-sente-mi-ai»), a maior diferença
entre escalar e, digamos, o futebol, é que a maioria dos escaladores está
completamente imersa no processo (escalar a parede) em vez de no
resultado (ganhar o jogo). Pioneiro do estudo do «fluxo» — aquele estado
em que estamos tão imersos numa tarefa que o resto do mundo parece
dissipar-se —, Csikszentmihalyi desenvolveu as suas teorias, pela primeira
vez, enquanto observava alpinistas nos Alpes quando era adolescente. Ele
argumentou que, se aprendermos a focar-nos no processo, e não no
resultado, teremos uma probabilidade substancialmente maior de gostar de
uma tarefa.
Mas como? Pode ser bastante fácil para escalada, que é inerentemente
divertida (para alguns, pelo menos), mas e se nos encontrarmos em
situações bem mais mundanas ou até desagradáveis?
Indiscutivelmente, é aqui que o poder de focar no processo se torna
ainda mais poderoso. Porque, com um pouco de pensamento criativo, pode
encontrar alegria em qualquer processo, por mais mundano que pareça.
Vejamos a história de Matthew Dicks, hoje famoso contador de histórias
e romancista bestseller. Anos antes de publicar o seu primeiro livro, Dicks
trabalhou no McDonald’s. E odiou. «Os dias pareciam intermináveis»,
disse-me uma vez. «Era a mesma rotina vezes sem conta. Receber pedidos,
virar hambúrgueres e distribuir batatas fritas. Não havia entusiasmo, nem
faísca, nem desafio.»
Então, Dicks decidiu ver se havia alguma alegria, não no resultado do
trabalho (o seu salário irritantemente escasso), mas no processo. Adotou
uma tática clássica: incrementar as vendas. «Em alguns dias eu decidia que
era o Dia do Molho Barbecue», lembra ele. «Então, durante o resto do dia,
eu acrescentava um breve discurso de vendas a cada pedido que atendesse.
O cliente pedia um Big Mac com batatas fritas, e eu perguntava se gostaria
de algum molho para acompanhar. Se ele respondesse que não, eu sorriria e
diria: “Bem, eu realmente recomendo o molho barbecue — não há nada
melhor.” Normalmente, neste ponto, eles ficavam um pouco surpresos e
diziam: “OK, então vou levar o molho.” Se ainda não mordessem o isco, eu
diria: “Tudo bem, mas não sabe o que perde.” A minha última cliente estava
relutante, mas quando experimentou o molho soube que tinha tomado a
decisão certa.»
Dicks diz que os efeitos dessas pequenas mudanças na sua rotina foram
inesperadamente significativos. Eram o tipo de minitarefas que poderiam,
nas suas palavras: «apenas tornar o dia do cliente um pouco melhor e,
definitivamente, fazer-me sentir mais energizado em dias que pareciam
estar a arrastar-se.» E funcionaram. Dicks estava ansioso pelos seus turnos,
ansioso por ver quantas pessoas conseguiria convencer a experimentar o
molho barbecue.
O processo não era inerentemente agradável. Mas Dicks criou uma
maneira de se divertir. E, ao fazer isso, encontrou diversão numa situação
pouco inspiradora.

BAIXE A FASQUIA

Se a aventura e a diversão promovem a nossa capacidade de brincar, existe


um fator relacionado, e igualmente potente, que reduz essa capacidade — o
stress. Para entender como, voltemos, uma vez mais, aos sujeitos
experimentais mais infelizes deste capítulo: os ratos brancos.
Infelizmente, estes ratos tiveram uma tarde menos agradável do que os
seus colegas com cócegas que conhecemos antes. Nesta ocasião, cientistas
da Universidade Columbia pegaram num grupo de ratos em diferentes
estágios de desenvolvimento22 e colocaram uma malha em cima de cada um
deles para que ficassem presos e não pudessem mover-se livremente.
Depois, deixaram-nos lá durante trinta minutos.
Não é de surpreender que isto tenha sido bastante stressante. Antes de
serem contidos, os ratos brincavam uns com os outros, fingindo lutar e
tocando nas nucas uns dos outros. Mas, depois de a malha ser retirada, os
investigadores descobriram que o comportamento lúdico dos ratos
desapareceu completamente. Em vez disso, ficaram amontoados em grupos,
sem brincar. (Felizmente, o comportamento lúdico voltou aos níveis iniciais
uma hora após a stressante experiência de restrição.)
Estudos em humanos, embora abençoadamente menos desagradáveis do
que aqueles em animais, encontraram resultados semelhantes. As crianças
são mais propensas a brincar quando estão num ambiente confortável23 e
não ameaçador. E estudos realizados com adultos no local de trabalho
descobriram que24 a sensação de relaxamento promove comportamentos
lúdicos, bem como favorece a criatividade e o bem-estar.
Esses estudos, e inúmeros outros, provam algo que a maioria das
pessoas sabe instintivamente ser verdade: quando estamos stressados, é
menos provável que sejamos brincalhões. E a nossa criatividade,
produtividade e bem-estar também tendem a sofrer.
Tudo isto sugere o nosso ingrediente final do jogo. Para que a
brincadeira prospere, não precisamos apenas de procurar aventura e
diversão. Também temos de tentar criar um ambiente de baixo risco e que
promova o relaxamento. E podemos começar a fazer isso reavaliando a
forma como pensamos sobre o fracasso.

EXPERIÊNCIA 5:

Reenquadre o seu fracasso

Em 2016, um engenheiro formado pela NASA25 chamado Mark Rober


recrutou 50 mil pessoas para experimentarem um novo desafio
computacional. Disse-lhes que queria provar que qualquer um poderia
aprender a programar. Então, lançou-os numa série de desafios de
programação relativamente fáceis.
Na verdade, a experiência era mais complicada do que Rober deixou
transparecer. A principal diferença ocorreu quando os participantes
cometeram um erro. Metade deles (grupo 1) recebeu uma mensagem de
erro quando escreveram um código que não foi executado corretamente:
«Falhou. Por favor, tente novamente.» A outra metade (grupo 2) recebeu
uma mensagem um pouco diferente: «Falhou. Perdeu cinco pontos. Agora
tem 195 pontos. Por favor, tente novamente.» Tudo o resto nos dois grupos
era idêntico.
Essa pequena distinção fez uma diferença surpreendente. O grupo 1, em
média, fez doze tentativas para resolver o enigma de programação e teve
uma taxa de sucesso de 68 por cento. O grupo 2, em média, fez apenas
cinco tentativas para resolver o enigma, com uma taxa de sucesso de 52 por
cento.
Na primeira vez que ouvi falar desta experiência fiquei surpreso.
Simplesmente porque havia uma «penalidade» arbitrária e sem sentido de
cinco pontos por falha, as 25 mil pessoas do grupo 2 (de todo o mundo)
fizeram, em média, menos de metade do número de tentativas do grupo 1.
Como deve ter adivinhado, a finalidade de Rober não era realmente
ensinar as pessoas a programar. Estava mais interessado em como pensamos
sobre o fracasso. O seu objetivo era mostrar que somos, enorme e
desproporcionalmente, influenciados por consequências negativas —
mesmo arbitrárias. E essas consequências fazem-nos ter medo do fracasso,
mesmo quando não precisamos.
Mas e se houvesse uma maneira diferente de encarar as falhas? Que nos
permitisse vê-las como inevitáveis e talvez até divertidas? É o que Rober
estava a tentar descobrir. Tendo trabalhado na NASA durante nove anos,
depois na Apple como designer de projetos, antes de mudar o seu foco para
se tornar um educador científico no YouTube, a experiência de Rober
provou o que ele já havia notado no mundo do trabalho: que o sucesso não
se resume a quantas vezes se falha. É sobre como enquadra os seus
fracassos.
Numa palestra onde partilhou as descobertas desta experiência, Rober
pergunta: «Se pudéssemos enquadrar o nosso processo de aprendizagem de
modo a não ficarmos tão preocupados com o fracasso, quanto mais
poderíamos aprender? Em que medida poderíamos ter mais sucesso?»
Rober sabia que fazer um programa informático funcionar requer,
invariavelmente, um processo de tentar, falhar e tentar novamente. Estes
supostos fracassos não são realmente fracassos, são «pontos de dados» de
que precisamos para descobrir como ter sucesso.
Ao escrever este livro, muitas vezes me senti tocado pela visão de
Rober. Porque o seu estudo oferece uma visão útil sobre como reduzir o
stress e, por sua vez, como criar um ambiente onde se possa brincar.
Imagine como seria a sua vida se recebesse cinco pontos por falhar, em vez
de perder cinco como na experiência. Imagine o que aconteceria se as
pessoas torcessem por si por um pequeno deslize, em vez de humilhá-lo.
Imagine como abordaria as coisas se as tratasse como experiências, onde o
fracasso seria tão valioso quanto o sucesso.
Consegue, agora, ver o jogo da vida de maneira um pouco diferente? De
repente, baixou a fasquia. E, de repente, pode brincar um pouco.
Se o seu objetivo é encontrar uma carreira gratificante e a sua hipótese é
de que uma função corporativa pode ser gratificante, então o seu processo
de recolha de dados pode ser a amostragem de carreiras através de estágios
e trabalhos temporários. Com uma mentalidade experimental, um estágio
que acaba por odiar não seria um «fracasso» ou uma «perda de tempo»;
seria apenas mais um dado para ajudá-lo a perceber que não é isso que
deseja.
Se o seu objetivo é construir um negócio de sucesso, então o seu
processo de recolha de dados pode envolver o teste de diferentes ideias de
negócios, produtos ou serviços. Com uma mentalidade experimental, o
lançamento de um produto que não atenda às expectativas não seria um
fracasso ou um desastre; seria apenas mais um dado para ajudá-lo a refinar
a sua estratégia e entender melhor o seu mercado-alvo.

Nenhum fracasso é apenas um fracasso. É um convite


para experimentar algo novo.

E, se o seu objetivo é desenvolver relacionamentos significativos, então


o seu processo de recolha de dados pode envolver encontros, participação
em eventos sociais e interagir com novas pessoas. Com uma mentalidade
experimental, um encontro que não leva a um segundo ou uma amizade que
não floresce não seria um fracasso; seria apenas mais um dado para ajudá-lo
a entender a sua compatibilidade.
Nenhum fracasso é apenas um fracasso. É um convite para experimentar
algo novo.
EXPERIÊNCIA 6:

Não seja sério. Seja sincero

Depois de reenquadrarmos as nossas falhas como pontos de dados, será


mais fácil eliminar o stress que nos impede de encarar a vida com um
sentido de diversão. Mas há um método final que é igualmente poderoso —
um que aprendi com o mais improvável guru budista do mundo.
Nascido em Chislehurst, Kent — uma banal zona suburbana do sul de
Inglaterra —, durante os primeiros anos de vida, Alan Watts parecia
destinado a tornar-se bancário ou talvez advogado. Desenvolveu um
interesse pela religião do Leste Asiático depois de ter um febril sonho
místico em criança. Isso mudaria a sua vida. Nos cinquenta anos seguintes,
tornou-se uma sumidade em filosofia oriental, publicando vários livros
bestsellers sobre o que o Zen e o Taoismo podem ensinar-nos acerca do
universo.
Quando, pela primeira vez, me deparei com as palestras de Watts,
alguns meses após iniciar a escrita deste livro, fiquei imediatamente
impressionado com a profundidade da sua maneira de ver o mundo e como
essa perspetiva se encaixava bem nas minhas teorias sobre a produtividade
Feel-Good. E, em particular, com uma frase simples pela qual ele ficaria
famoso: «Não seja sério. Seja sincero.»
Numa famosa palestra, intitulada «O Indivíduo e o Mundo», Watts
descreveu um erro fundamental que cometemos na compreensão do mundo.
Ele cita o escritor inglês do início do século XX, G. K. Chesterton: «Na
frivolidade há uma leveza que se pode elevar. Mas na seriedade há uma
gravidade que cai, como uma pedra.» Isto, disse ele, era verdade para
pessoas que entendiam o Zen. Ele resumiu isso como: «Há uma diferença
entre ser sério e ser sincero.»
O que é que ele quis dizer? Bem, considere jogar um jogo de tabuleiro
— Monopoly, por exemplo. Ninguém quer jogar Monopoly com alguém
que leva o jogo demasiado a sério. Todos nós já jogámos esses jogos; a
pessoa séria preocupa-se demasiado em vencer e suga a energia da sala. As
suas citações obsessivas das regras sobre se realmente tem permissão para
receber 200 euros por passar na casa de partida com uma carta de sorte
atrapalham a diversão de todos os outros.
Mas também não queremos jogar com alguém que é completamente
indiferente. Essas pessoas não se envolvem com o jogo e não fazem um
esforço ativo para jogar da melhor maneira possível. Não o felicitam
quando consegue sair da prisão, mesmo que se tenha recusado a pagar a
taxa de saída de 50 euros, e, em vez disso, tenha optado pela estratégia mais
ousada. Elas também não são divertidas.
Não, as pessoas mais divertidas para jogar são aquelas que jogam com
sinceridade. Elas levam o jogo a sério o suficiente para se envolverem
totalmente na experiência, mas não tão a sério a ponto de ficarem obcecadas
em ganhar ou perder. São capazes de rir e brincar, de não se deterem nos
seus erros e de desfrutarem da companhia dos amigos sem se apegarem de
mais à vitória (ou às regras).
Há muito a ganhar tratando o nosso trabalho e a nossa vida com esta
abordagem. Acho que nos momentos em que me sinto stressado, ansioso ou
esgotado com o meu trabalho, é fácil esquecer-me de ser sincero e passar a
ser muito sério. Nesses momentos, os riscos parecem esmagadores. Mas há
uma maneira de reduzi-los. O truque é simples: quando sentir que o seu
trabalho é cansativo ou avassalador, tente perguntar-se «Como posso
abordar isto com um pouco menos de seriedade e um pouco mais de
sinceridade?»
Se estivesse a abordar um projeto difícil no trabalho com sinceridade e
não com seriedade, poderia concentrar-se no processo de conclusão de cada
tarefa, em vez de ficar fixado no resultado final. Também pode procurar a
contribuição e a colaboração de outras pessoas, em vez de tentar resolver o
projeto sozinho. Ao fazer essas coisas, descobrirá que é mais fácil abordar o
assunto no espírito do jogo e que será mais capaz de manter o foco e a
motivação.
Se estivesse a abordar uma entrevista de emprego com sinceridade e não
com seriedade, em vez de ficar excessivamente nervoso e stressado com o
resultado, poderia concentrar-se em estar presente e empenhado. Também
pode tentar conectar-se com o entrevistador num nível mais pessoal, em vez
de simplesmente tentar impressioná-lo com os seus diplomas. Ao fazer isso,
terá mais possibilidades de abordar a entrevista com leveza e facilidade e de
sair da entrevista sentindo-se mais confiante e satisfeito com o seu
desempenho.
E, se pretende escrever um livro com sinceridade e não com seriedade,
pode decidir incluir uma homenagem detalhada ao World of Warcraft logo
no primeiro capítulo — revelando aos seus leitores que, mesmo ao criar
algo tão significativo quanto o seu primeiro livro, pode tratar o processo
com leveza. Ao fazer isso, espero que ajude o texto a criar um sentido de
diversão, mesmo enquanto fala sobre a ciência da produtividade. Pode
acabar por conseguir stressar menos e brincar mais.
Não sou o único médico a pensar assim. Na série Anatomia de Grey, o
Dr. Derek Shepherd, o atraente neurocirurgião interpretado por Patrick
Dempsey, tem um ritual no início de cada uma das suas cirurgias.
Cumprimenta a equipa, põe a tocar uma música animada e diz: «Está um
belo dia para salvar vidas. Vamos divertir-nos.»

RESUMINDO

• A seriedade é sobrestimada. Se deseja realizar mais sem


arruinar a sua vida, o primeiro passo é abordar o seu
trabalho com um sentido de diversão.
• Há três formas de incorporar o espírito lúdico na sua vida.
Primeiro, aborde as coisas com aventura. Quando assume a
«personalidade de jogo» certa, todos os dias estão repletos
de oportunidades de ver a vida como um jogo, cheio de
surpresas e missões secundárias.
• Segundo, encontre a diversão. Lembre-se de Mary Poppins:
há um elemento de diversão em cada tarefa, mesmo que
nem sempre seja óbvio. Tente perguntar-se como seria se a
tarefa fosse divertida e, em seguida, construa os seus
projetos em torno da resposta.
• Terceiro, baixe a fasquia. As falhas só são falhas quando
pensa que o são — e nem todos os problemas precisam de
ser abordados com uma cara tão séria. Então, o que
significaria abordar o seu trabalho com menos seriedade e
mais sinceridade?
6 História baseada em Feynman, R. P. (2021). Está a Brincar, Sr. Feynman! Aventuras de um
personagem curioso. Gradiva. Lisboa.
7 Maurois, A. (1959). The Life of Sir Alexander Fleming. Jonathan Cape. Londres.
8 Andre Geim e Konstantin Novoselov, citado in Bateson, P., e Martin, P. (2013). Play, Playfulness,
Creativity and Innovation. Cambridge University Press. Cambridge.
9 Petelczyc, C. A., Capezio, A., Wang, L., Restubog, S. L. D., e Aquino, K. (2018). «Play at Work:
an integrative review and agenda for future research». Journal of Management, 44(1), 161–190.
10 Heller, A. S., Shi, T. C., Ezie, C. E. C., Reneau, T. R., Baez, L. M., Gibbons, C. J., e Hartley, C. A.
(2020). «Association between real-world experiential diversity and positive affect relates to
hippocampal–striatal functional connectivity». Nature Neuroscience, 23(7), 800–804.
11 A sigla RPG significa «Role-Playing Game»; em tradução livre: Jogo de Interpretação de Papéis.
[N. T.]
12 Brown, S. L. (2009). Play: How it Shapes the Brain, Opens the Imagination, and Invigorates the
Soul. Penguin. Londres.
13 Em tradução livre: Instituto Nacional para a Brincadeira. [N. T.]
14 Play Personalities. National Institute For Play. Disponível online: www.nifplay.org/what-is-
play/play-personalities/
15 Tio Sam (Uncle Sam) é a personificação nacional dos Estados Unidos ou do seu governo. É um
símbolo popular desde o início do século XIX. [N. T.]
16 Gruber, M. J., Gelman, B. D., e Ranganath, C. (2014). «States of curiosity modulate
hippocampus-dependent learning via the dopaminergic circuit». Neuron, 84(2), 486–496.
17 Isaacson, W. (2019). Leonardo da Vinci. Porto Editora. Porto.
18 Zaborney, M. (2017). Jaak Panksepp: 1943–2017. The Blade. Disponível online:
https://www.toledoblade.com/Deaths/2017/04/20/Jaak-Panksepp-1943-2017-BGSU-researcher-
recognized-for-work-with-emotions-brain.html
19 Watson, S. (2021). Dopamine: the pathway to pleasure. Harvard Health Publishing. Disponível
online: https://www.health.harvard.edu/mind-and-mood/dopamine-the-pathway-to-
pleasure#:~:text=Dopamine%20can%20provide%20an%20intense,or%20a%20%22dopamine%20ru
sh.%22
20 Em português: Uma colher de açúcar torna o remédio mais fácil de engolir… da maneira mais
deliciosa.
21 Em português: Em cada trabalho que deve ser feito,/ Há um elemento de diversão./ Encontra a
diversão e trás!/ O trabalho é um jogo.
22 Klein, Z. A., Padow, V. A., e Romeo, R. D. (2010). «The effects of stress on play and home cage
behaviors in adolescent male rats». Developmental Psychobiology, 52(1), 62–70.
23 Tegano, D. W., Sawyers, J. K., e Moran, J. D. (1989). «Problem-finding and solving in play: the
teacher’s role». Childhood Education, 66(2), 92–97.
24 Mukerjee, J., e Metiu, A. (2021). «Play and psychological safety: an ethnography of innovative
work». Journal of Product Innovation Management, 39(3), 394–418.
25 Pode ver a fantástica palestra TED Talk de Mark chamada «The Super Mario Effect» in
https://youtu.be/9vJRopau0g0?feature=shared
CAPÍTULO 2

PODER

Em setembro de 2000, Reed Hastings e Marc Randolph tentaram vender a


sua empresa incipiente26, a Netflix, ao CEO da Blockbuster Video. Correu
extremamente mal.
A dupla apostou no que considerava um modelo revolucionário para
aluguer de vídeo. Os clientes podiam fazer log in num site, solicitar os
DVD, e recebê-los e devolvê-los por correio. Mas, embora tivessem
investido tudo o que tinham na empresa, estavam a perder dinheiro. Tinham
mais de cem funcionários, mas apenas 3000 clientes pagantes. E estavam a
caminho de perder 57 milhões de dólares antes do final do ano.
Eles queriam sair. Então, depois de meses a ligar e enviar e-mails,
finalmente conseguiram uma reunião com o patrão da Blockbuster, John
Antioco, na sede da empresa em Dallas. Era uma grande oportunidade: a
Blockbuster era uma empresa cotada na bolsa, com uma capital de 6 mil
milhões de dólares e mais de 9000 lojas em todo o mundo, e dominava o
mercado de vídeo americano. Mas a reunião descarrilou dramaticamente.
No início, Antioco e o seu conselheiro-geral, Ed Stead, foram amigáveis e
educados. Ouviram atentamente enquanto Hastings e Randolph explicavam
por que razão a Blockbuster deveria comprar a Netflix: um novo tipo de
aluguer de vídeos para um mundo online. Mas, então, Antioco fez a grande
pergunta: «Quanto?»
«Cinquenta milhões.»
Houve um momento de silêncio. Em seguida, Antioco começou a rir-se.
Dez anos depois, a Blockbuster Video abriu falência: incapaz de
acompanhar o ritmo da transição para o vídeo online, a empresa fechou
gradualmente a maioria das suas lojas antes de finalmente falir. Avançando
mais dez anos, a Netflix — agora um serviço de streaming online — foi
avaliada com uma capitalização de mercado de 300 mil milhões de dólares
e é universalmente aclamada como uma das empresas mais inovadoras do
mundo.
A transformação da Netflix de uma empresa que foi literalmente
ridicularizada pelo CEO da Blockbuster, numa das empresas mais valiosas
do planeta parecia improvável. Como é que eles fizeram isso? Bem, há
algumas respostas. Alguns dão crédito à visão de Hastings e à sua equipa.
Outros destacam o momento oportuno do lançamento, atendendo a que
coincidiu com o arranque em força da Internet. Mas a explicação mais
comum para o sucesso da Netflix é mais simples: cultura.
Quando a Netflix estava a arrancar, Reed Hastings contratou Patty
McCord como diretora de talentos da Netflix. McCord já trabalhara em
Recursos Humanos noutras empresas de tecnologia e não estava satisfeita
com a abordagem tradicional de gestão de pessoas. Ela queria criar uma
cultura onde os funcionários se sentissem capazes de assumir o controlo do
seu próprio trabalho. Hastings trabalhou com McCord para criar um
conjunto de valores que guiaria a cultura da empresa, incluindo o foco na
liberdade e na responsabilidade. Essa mudança subtil foi transformadora.
McCord liderou uma mudança radical na forma como a Netflix abordava a
sua equipa. Ela livrou-se de políticas tradicionais como dias de férias,
horários fixos de trabalho e avaliações de desempenho e deu mais
autonomia aos funcionários. Desde que os funcionários atingissem os seus
objetivos, poderiam fazer o que quisessem.
Esta abordagem foi recebida com algum ceticismo no início. Mas, à
medida que a empresa cresceu e prosperou, ficou claro que estava a
funcionar. A cultura da Netflix não só ajudou a empresa a atrair e reter os
melhores talentos mas também levou a melhores ideias: em vez de depender
de métodos tradicionais de pesquisa de mercado e grupos de foco, a Netflix
deixou as suas equipas criativas assumirem a liderança no desenvolvimento
e produção de novos programas e filmes. O resultado foram alguns dos
filmes e programas televisivos mais notáveis do nosso tempo.
McCord resumiu o seu foco na liberdade e na responsabilidade27 numa
palavra simples: poder. É um termo complicado e que pode ter conotações
negativas — evocando imagens de ditadores totalitários, chefes horríveis e
corredores sombrios onde as pessoas fazem tudo o que podem para agarrar
e manter o controlo sobre os outros. Alguns podem ver a palavra «poder» e
pensar: «Esse não sou eu.»
Se é uma dessas pessoas, quero que comece a pensar de forma diferente
sobre o poder. Quando McCord usou a palavra, quis dizer uma sensação de
empoderamento pessoal: a sensação de que o seu trabalho está sob o seu
controlo, a sua vida, nas suas mãos e de que as decisões sobre o seu futuro
são somente suas. Este poder não é algo que exercemos sobre os outros; é
algo que sentimos, a energia que nos faz querer gritar bem alto: «Eu
consigo!»
O poder é o nosso segundo energizante; um ingrediente fundamental
para se sentir bem e ser produtivo. E, o melhor de tudo, não é algo que tira
dos outros; é algo que cria para si mesmo.

AUMENTE A SUA CONFIANÇA

A nossa jornada pela ciência do poder começa num laboratório repleto de


dezenas de voluntários avessos ao exercício.
Este grupo de vinte e oito estudantes do sexo feminino28 foi reunido
precisamente porque não praticava exercício físico com muita frequência —
um facto que alguns cientistas da Universidade de Illinois Urbana-
Champaign consideraram que representava uma oportunidade de
investigação. No seu estudo, publicado no International Journal of
Behavioral Medicine, propuseram-se testar uma hipótese simples: a nossa
confiança nas nossas capacidades atléticas tem um enorme impacto sobre o
que essas capacidades realmente são.
No início da experiência, todas as vinte e oito alunas foram convidadas
a pedalar numa bicicleta estática por um período fixo de tempo enquanto
um dispositivo media a frequência cardíaca e o VO2 máximo (a quantidade
de oxigénio que o seu corpo pode absorver e usar durante o exercício).
Terminada a sessão de exercício, os investigadores dividiram as alunas em
dois grupos com base no desempenho na bicicleta estática. Após um breve
período para acalmar, disseram às alunas do grupo A (o grupo de «alta
confiança») que, em relação a outras mulheres da sua idade e experiência,
estavam entre as mais aptas. As alunas do grupo B (o grupo de «baixa
confiança»), por sua vez, foram informadas de que estavam entre as menos
aptas. Em seguida, os dois grupos de mulheres foram deixados de parte por
alguns dias.
A verdade é que tudo não passava de uma estratégia. O grupo de «alta
confiança» não foi realmente melhor nos exercícios, e o grupo de «baixa
confiança» não foi realmente pior. Na verdade, elas foram alocadas
aleatoriamente nos dois grupos, e o seu desempenho no teste de esforço não
teve nada que ver com a mensagem transmitida. O que realmente
interessava aos cientistas era a próxima etapa: três dias depois, as
participantes foram convidadas a regressar ao laboratório para se
exercitarem durante cerca de trinta minutos e a avaliarem quanto gostaram
dessa nova sessão.
Os resultados foram impressionantes. Os investigadores descobriram
que aquelas no grupo de «alta confiança» — que foram informadas de que
estavam em boa forma física — gostaram muito mais da sessão de exercício
do que o grupo de «baixa confiança», a quem foi dito que não eram
saudáveis. Isto era ainda mais verdadeiro para exercícios mais intensos e
desafiadores; quando foi pedido às participantes que pedalassem mais e por
mais tempo, a diferença entre os dois grupos tornou-se ainda mais
acentuada. Quando as coisas ficaram difíceis, aquelas que acreditaram que
poderiam fazê-lo — independentemente da sua capacidade — foram as que
realmente conseguiram. E, o que é mais importante, as alunas que foram
preparadas para serem mais confiantes acabaram por gostar muito mais do
exercício.
Este estudo explorava uma questão simples: Em que medida o nosso
nível de autoconfiança afeta o nosso desempenho? A resposta a esta
pergunta — juntamente com as de muitos estudos anteriores e posteriores
— é simples: muito. Sentirmo-nos confiantes sobre a nossa capacidade de
concluir uma tarefa faz-nos sentir bem quando a realizamos e ajuda-nos a
realizá-la melhor.
As origens dessa perceção remontam ao psicólogo Albert Bandura.
Nascido na pequena cidade de Mundare, Alberta, em 1925, aquando da sua
morte, em 2021, Bandura era um dos psicólogos mais influentes da
História. Essa influência deveu-se, em grande parte, a uma ideia29 que
introduziu em 1977 e que o tornaria famoso: a autoeficácia. Com base na
sua investigação da década anterior, Bandura argumentou que não são
apenas as nossas capacidades que são importantes no desempenho e no
bem-estar humanos; é como nos sentimos sobre as nossas habilidades.
Autoeficácia foi o termo que cunhou para descrever tais sentimentos,
referindo-se a quanto acreditamos que somos capazes de atingir os nossos
objetivos.

Acreditar que consegue é o primeiro passo para ter a


certeza de que realmente consegue.

Para simplificar um pouco, autoeficácia é uma gíria psicológica para


confiança. E tomar medidas para aumentá-la é a principal forma de
construirmos o nosso sentido de empoderamento. No meio século desde que
Bandura introduziu o conceito de autoeficácia, centenas de investigadores
demonstraram que, quanto maior a nossa confiança nas nossas próprias
capacidades — quanto maior a nossa autoeficácia —, maiores se tornam
essas capacidades. Em 1998, os psicólogos Alexander Stajkovic e Fred
Luthans conseguiram afirmar30 (com base em 114 estudos envolvendo
quase 22 mil participantes) que Bandura estava certo. Acreditar que
consegue é o primeiro passo para ter a certeza de que realmente consegue.

EXPERIÊNCIA 1:

A mudança de confiança

A ideia de autoeficácia é intrigante, mas talvez não muito surpreendente. É


claro que os nossos níveis de autoconfiança afetam as nossas habilidades,
pode estar a pensar. Qualquer pessoa que já tenha visto um egoísta espalhar
o seu charme numa sala, graças unicamente a uma fé inabalável no seu
próprio brilho, pode atestar isso.
Contudo, talvez, o mais surpreendente sobre a autoeficácia é quão
maleável ela é. Porque desde que Bandura começou a investigar a ciência
da confiança percebeu algo mais impressionante: que a autoeficácia é fácil
de ensinar. Após décadas de investigação, concluiu que confiança não é
algo com que se nasce; é algo que se aprende.
Nos anos seguintes à apresentação da sua ideia revolucionária, Bandura
continuou a identificar algumas ferramentas simples que podem ter um
impacto transformador na autoeficácia. Pense no poder da persuasão verbal.
Bandura gostava de apontar uma verdade simples sobre a autoeficácia: que
as coisas que diz muitas vezes se tornam as coisas em que acredita. Como
tal, o próprio ato de ouvirmos pequenas intervenções positivas, como «Tu
consegues!» ou «Estás quase!», pode ter um efeito notável nos nossos
níveis de autoconfiança.
Normalmente imaginamos que a fonte dessas frases edificantes serão os
nossos familiares, amigos, colegas ou personal trainers. O que é mais
intrigante é que também podemos transmitir essas mensagens a nós
mesmos.
Em 2014, cientistas da Universidade de Bangor31 publicaram resultados
de um estudo sobre o poder do diálogo interno. Cada participante foi
testado quanto ao seu «tempo até à exaustão» — ou seja, quanto tempo
conseguiam pedalar antes de se sentirem incapazes de continuar. Depois, tal
como o nosso grupo anterior de ciclistas exaustas, foram deixados a
ruminar durante duas semanas. Desta vez, porém, a segunda etapa foi
diferente. Quando voltaram para as bicicletas, foram divididos em dois
grupos. Um dos grupos recebeu uma intervenção sobre diálogo interno
positivo. Esta consistiu em que lhe fosse mostrada uma série de frases
motivacionais, como «Estás a ir bem!» e «Consegues superar isto!». De
seguida, cada participante escolheu quatro delas para repetir a si mesmo
enquanto pedalava. O outro grupo de ciclistas não recebeu tal indicação.
Claro que estes pequenos atos de automotivação não podiam, por si só,
transformar o desempenho dos participantes, pensaram os cientistas.
Contudo, afinal, podiam. O grupo que recebeu a «intervenção sobre diálogo
interno» específica acabou por reduzir significativamente o seu «índice de
esforço percebido» (ou quão difícil foi o ciclismo) na marca de 50 por cento
e melhorar visivelmente o seu «tempo até exaustão» ao pedalar. O outro
grupo teve um desempenho exatamente igual ao anterior.
Este estudo mostra que, ao tornar-se a sua própria claque, o leitor pode
influenciar dramaticamente a sua produtividade. Já depois de ter lido este
estudo, descobri algumas maneiras específicas de o fazer. O meu método
favorito envolve aquilo a que chamo «acionar o interruptor da confiança»;
por outras palavras, desafiar-se a comportar-se como se estivesse confiante
na sua tarefa, mesmo que não esteja.
O método é ainda mais simples do que parece. Da próxima vez que não
se sentir bem o suficiente para arriscar, simplesmente pergunte-se: «Como
seria se eu estivesse realmente confiante? Como seria se eu abordasse esta
tarefa sentindo-me confiante de que consigo realizá-la?»
Eu costumava usar este truque extensivamente quando trabalhava como
mágico em bailes e festas na universidade (sim, eu era esse tipo). O meu
trabalho era vestir um smoking, ir até grupos de pessoas e oferecer-me para
mostrar alguns truques de magia. Mesmo que tivesse praticado os meus
truques até à exaustão (basta perguntar a qualquer um dos meus amigos),
ainda estaria absolutamente apavorado com a ideia de abordar um grupo de
estranhos, interromper a conversa e tropeçar nas palavras enquanto me
oferecia para lhes mostrar o meu truque de cartas favorito. Naqueles
momentos de dúvida, eu respirava fundo e acionava internamente o botão
da confiança. Lembrava-me de que estava apenas a interpretar o papel de
um mágico confiante e, mesmo que não me sentisse nada confiante
internamente, agia como se fosse confiante e competente. Sem falhar, a
mudança na minha atitude fazia uma enorme diferença; aproximava-me de
grupos de estranhos com um sorriso e uma leve arrogância, as falas bem
ensaiadas, e saía de cada um deles sentindo-me aliviado porque a estratégia
tinha funcionado.
Muitas vezes, surpreendo-me com o quão impactante este método pode
ser. Só por um instante, é o suficiente para transformar um mágico amador
em profissional. Um péssimo músico amador num herói da guitarra. E um
orador nervoso no orador mais carismático.
Da próxima vez que sentir que uma tarefa ou projeto é particularmente
difícil, pergunte-se: «Como seria se eu estivesse realmente confiante?» O
simples ato de se colocar a pergunta vai fazer que se visualize a abordar
cuidadosamente a tarefa em questão. O interruptor foi acionado.

EXPERIÊNCIA 2:

O método do modelo social

A persuasão verbal não foi o único método que Bandura criou para
aumentar a autoconfiança. Também estava interessado na forma como
obtemos a confiança a partir das pessoas ao nosso redor.
O meu estudo favorito que mostra como isso funciona vem do
Laboratório ao Ar Livre da Universidade Clemson32. Note-se que este não é
um laboratório científico comum. Situado numa península arborizada perto
do lago Hartwell, na Carolina do Sul, o laboratório possui uma série de
cabanas de madeira, trilhos para caminhadas e equipamento para desportos
aquáticos — sem nenhuma placa de Petri à vista. Mas a máscara recreativa
do laboratório esconde a sua séria função científica. Ao longo dos anos, o
laboratório tem sido palco de muitas experiências psicológicas pioneiras.
Como o estudo de 2007, com trinta e oito crianças, com idades entre 6 e 18
anos, que foram convidadas a usar a parede de escalada da universidade.
Quando chegaram ao laboratório, os alunos foram informados de que o
objetivo do dia era chegar ao topo da parede de escalada (uma das
principais particularidades do laboratório ao ar livre de Clemson). Era uma
perspetiva assustadora; a maioria nunca tinha visto uma parede de escalada.
Os cientistas que conduziram o estudo estavam interessados em saber quais
os alunos que completariam a tarefa — e o que poderia torná-los mais
propensos a fazê-lo.
Sem o conhecimento das crianças, estas foram divididas em dois grupos
antes da sua chegada. O grupo 1 viu um pequeno vídeo de alguém a escalar
uma parede muito semelhante à do local, enquanto o grupo 2 não viu
nenhum vídeo. Em todos os outros aspetos, os grupos eram idênticos.
Surpreendentemente, apenas assistir ao vídeo teve um efeito dramático.
Embora ambos os grupos tenham recebido as mesmas instruções quando
chegaram à parede, o grupo que observou o escalador «modelo» subir a
parede que estavam prestes a enfrentar acabou por se sair muito melhor. Os
participantes sentiram-se mais confiantes nas suas habilidades de escalada,
apreciaram mais a atividade e tiveram melhor desempenho.
Porque é que essa pequena mudança fez uma diferença tão grande? Se
Albert Bandura comentasse, provavelmente atribuiria a diferença a algo
chamado «experiência de mestria vicária». É quando o leitor testemunha ou
ouve falar do desempenho de outra pessoa relacionado com a tarefa que irá
realizar. Vê os exemplos de outras pessoas, e isso aumenta a sua confiança.
A maioria das pessoas já experimentou a mestria vicária, mesmo que
não tivesse palavras para isso. Imagine isto: no seu emprego, está a debater-
se com um grande projeto de pesquisa. É a única pessoa a trabalhar na
tarefa, e isso parece assustador. Após alguns dias de improdutividade
alarmante, começa a concluir que não é apenas difícil — é impossível. À
medida que fica cada vez mais convencido de que o que está a tentar é
completamente inatingível, distancia-se cada vez mais do objetivo.
Agora, imagine a mesma tarefa, só que desta vez, antes de iniciar o
projeto, viu outra pessoa apresentar a sua pesquisa sobre um tema
semelhante. O conteúdo da apresentação é totalmente diferente do seu. Mas,
desta vez, sabe que esse tipo de tarefa não é impossível — acabou de ver
outra pessoa realizá-la. Ficou mais confiante de que a tarefa pode ser
dominada. Vicariamente.
Bandura argumentou que estar rodeado de outras pessoas que
demonstram persistência e esforço na superação de desafios pode aumentar
os nossos próprios sentimentos de autoeficácia, porque isso nos demonstra
que estes desafios podem ser superados. Nas palavras de Bandura: «Ver
pessoas semelhantes a nós terem sucesso através de um esforço sustentado
aumenta a crença dos observadores de que também eles possuem as
capacidades para ter sucesso em atividades comparáveis.»
Assim como o diálogo interno positivo, podemos integrar estas
experiências vicárias nas nossas vidas. A minha maneira favorita é
consumir diferentes formas de conteúdos criados pelos meus modelos.
Descobri que a minha confiança aumenta substancialmente quando leio
livros, ouço podcasts ou assisto a vídeos com histórias de pessoas que
tiveram sucesso nas áreas nas quais quero sentir-me mais fortalecido.
Por exemplo, enquanto trabalhava no hospital, a caminho do trabalho,
ouvia frequentemente o podcast RCP Medicine, produzido pelo Royal
College of Physicians. Ouvir como diferentes médicos abordam diferentes
diagnósticos e tratamentos dava-me um impulso de confiança que era
transferido para o meu trabalho.
Quando eu estava a construir o meu primeiro negócio online, passei
muito tempo a ouvir o podcast Indie Hackers, que apresentava entrevistas
com empreendedores que construíram incríveis negócios online individuais,
a partir dos seus quartos. Falavam sobre os desafios que enfrentaram e
como os superaram, o que aumentava a minha confiança quando se tratava
de lidar com desafios semelhantes.
E, na minha nova vida como escritor, descobri que ver, ouvir e mesmo
realizar entrevistas com autores de sucesso contribui para aumentar os meus
próprios sentimentos de «eu consigo fazer isto», mais do que quase
qualquer outra coisa.

Se eles conseguem, o leitor também consegue.


É um kit de ferramentas que qualquer pessoa pode utilizar. Encontre
pessoas que estão a passar pelos mesmos desafios que o leitor e passe
tempo com elas — ou encontre outras formas de ouvir as suas histórias. Ao
mergulhar no sucesso indireto, estará a construir uma história poderosa na
sua própria mente: se eles conseguem, também conseguirá.

MELHORE AS SUAS COMPETÊNCIAS

Anakin Skywalker começa a sua jornada aos 8 anos em Tatooine, pilotando


drones para tentar ganhar dinheiro suficiente para alimentar a família. Nos
três filmes seguintes de Star Wars, aprende a usar a Força, treina com o
sabre de luz e torna-se um dos Jedi mais poderosos da galáxia.
Katniss Everdeen começa a sua jornada aos 16 anos no Distrito 12, onde
caça ilegalmente para sustentar a mãe e a irmã mais nova. Depois de se
voluntariar para competir nos mortais Jogos da Fome, vemo-la tornar-se
uma estratega e arqueira habilidosa, formando alianças inesperadas e
liderando uma rebelião contra o opressivo Capitólio. Apesar de as
probabilidades estarem sempre contra ela, torna-se um símbolo de
esperança e resistência para toda a nação: o lendário mimo-gaio.
E num favorito meu, Avatar: O Último Airbender, o nosso protagonista,
Aang, começa como uma criança de uma pequena aldeia, esforçando-se
para controlar os seus poderes sobre o elemento ar. Ao longo da série,
explora o mundo; vemo-lo, por fim, transformar-se no poderoso Avatar,
com domínio sobre os quatro elementos (terra, ar, água e fogo). No final da
série, ainda salva o mundo da destruição num confronto épico com o
Senhor do Fogo Ozai.
Estes três arcos narrativos, entre milhares de outros em histórias e
contos ao longo de milénios, ilustram uma forma de aumentar a nossa
sensação de poder. Cada personagem principal começa a sua história como
um jovem aprendiz inexperiente. Com o tempo, vemos, lemos ou ouvimos
como superam obstáculos desafiadores e crescem como pessoas — com
cada um dos seus sucessos a contribuir para o seguinte, e o seguinte, e o
seguinte.
O nosso amigo Albert Bandura tem um nome cativante para a forma
como estas experiências de aprendizagem se combinam33 — experiências
de mestria ativa. Estas são o reverso da medalha da mestria vicária que
abordámos. Segundo Bandura, a mestria ativa refere-se ao processo de
aprender fazendo.
Aprender fazendo é uma das forças mais poderosas da psicologia
humana. É a segunda estratégia-chave se quisermos construir o nosso
sentido de poder. Porquê? Porque, quanto mais fazemos alguma coisa,
maior é a nossa sensação de controlo. Aprendemos. Melhoramos as nossas
competências. A nossa confiança cresce. E empoderamo-nos.

EXPERIÊNCIA 3:

A abordagem shoshin

O que há de mais interessante nestas experiências de aprendizagem é que


elas podem ser incorporadas na sua vida com relativa facilidade. Mesmo em
áreas onde sente que não está a fazer nenhum progresso, pode aproveitar o
potencial da mestria ativa.
Aprendi a minha forma favorita de o fazer com a história de Phil
Jackson. A maioria dos fãs de basquetebol já sabe um pouco sobre Jackson.
Talvez tenham conhecimento de que foi o treinador que transformou a
cultura dos Chicago Bulls na década de 1980. Devem saber que, enquanto
treinador principal, ele levou a sua equipa a vencer tantos campeonatos da
NBA na década de 1990 que começou a ficar um pouco embaraçoso. (Seis,
se estiver interessado em saber.) Ou talvez saibam também que foi Jackson,
mais do que qualquer outro treinador, quem ajudou a transformar Michael
Jordan numa lenda.
O que tendem, porém, a não saber é a origem improvável da filosofia
desportiva de Jackson: o Zen-Budismo.
Zen é um ramo do Budismo que enfatiza a prática da meditação como
meio para a iluminação espiritual. O Zen incentiva os indivíduos a olharem
para dentro e descobrirem o seu próprio caminho para a compreensão da
natureza da realidade. Foi, de acordo com Jackson, parte integrante de todo
o sucesso que já teve.
Um conceito Zen que surgiu repetidamente nas práticas de treino de
Jackson foi a palavra japonesa shoshin, que pode ser traduzida, livremente,
como «mente de iniciante». Shoshin refere-se a um estado de espírito no
qual abordamos cada tarefa e situação com a curiosidade, a abertura e a
humildade de um iniciante.
Pode parecer estranho que adotar uma mente de iniciante o ajude a
tornar-se mais especializado nessa área… Certamente um iniciante é
alguém que, por definição, não tem grande ideia do que está a fazer. No
entanto, o shoshin pode ter um impacto notável precisamente porque nos
permite ver as coisas numa nova perspetiva.
Pense numa habilidade que passou anos a aprender. Provavelmente tem
uma forma definida de a fazer; se gosta de desenhar, sabe por que área do
retrato prefere começar; se pratica desporto, provavelmente já decidiu há
muito qual a posição em campo que melhor se adapta aos seus talentos. As
suas experiências tornaram-no muito mais determinado nas suas formas de
fazer as coisas do que antes.
Um iniciante, por outro lado, não tem nenhuma dessas preconceções.
Um iniciante está mais disposto a experimentar coisas, mesmo que elas
falhem. Começará por qualquer parte do retrato de alguém. E um iniciante
ficará feliz em começar a jogar em qualquer posição no campo, mesmo que
possa fazer má figura. Está mais disposto a cometer erros, e esses erros são
exatamente o que é necessário para aprender.
Quando tentamos ver o mundo numa nova perspetiva, podemos manter
este processo de aprendizagem muito depois de ele habitualmente terminar.
Para os Chicago Bulls, isto significava abordar cada momento com a mente
aberta, livre de preconceções em relação a qualquer estratégia definida. E,
de acordo com Jackson, esta foi a base do sucesso da sua equipa.
Então, como podemos integrar esta perspetiva de iniciante nas nossas
vidas? A resposta começa com alguns lembretes simples.
Se está no mundo dos negócios, shoshin pode significar abraçar a
inovação e a experimentação, lembrando-se de que os «mestres» ficam
limitados pelas suas crenças no que foi feito e como foi feito, enquanto os
iniciantes procuram novas abordagens para a resolução de problemas e
exploram outros mercados ou oportunidades. Ou, se trabalha em áreas
criativas, como escrita ou música, shoshin pode significar manter,
deliberadamente, o seu interesse em diferentes técnicas e esforçar-se por
colaborar com pessoas de estilos diferentes. Os iniciantes não têm crenças
fortes sobre o que funcionará, apenas tentam.
Ao abandonarmos a ideia de que sabemos tudo ou que, de alguma
forma, deveríamos, na verdade sentirmo-nos mais poderosos. Desta forma,
o shoshin pode ajudar-nos a enfrentar os desafios com um maior sentido de
curiosidade, humildade e resiliência — e ajudar-nos a aprender.

EXPERIÊNCIA 4:

O efeito protégé

Enquanto estudava Psicologia, fiquei satisfeito ao saber que os irmãos mais


velhos tendem a ter, em média, um QI ligeiramente mais elevado do que os
irmãos mais novos. Perguntava-me, há já algum tempo, porque achava o
meu irmão mais novo tão chato quando éramos crianças. Agora sabia a
resposta.
Os cientistas tentaram encontrar várias explicações para este fenómeno
ao longo dos anos. Será que os pais tendem a investir mais tempo e energia
nos filhos primogénitos do que nos irmãos? Será que os primogénitos têm
maior probabilidade de interagir com os adultos, o que ajuda a desenvolver
o seu vocabulário? Ou será que é mais provável que os pais tenham
expectativas mais elevadas em relação ao primeiro filho do que em relação
a quaisquer filhos subsequentes, o que incentiva os primogénitos a
esforçarem-se mais na escola?
Ainda não há consenso, mas uma explicação interessante provém de um
estudo realizado por investigadores da Escola de Educação de Stanford, de
200934. Os investigadores levaram sessenta e dois alunos do 3.º ciclo para
uma aula de Biologia, onde foram aleatoriamente designados para um de
dois grupos. O primeiro foi instruído a estudar e aprender a matéria
normalmente, com o objetivo de ter um bom desempenho numa prova no
final da aula. O segundo grupo foi informado de que iriam ensinar a matéria
a um avatar gerado por computador e de que o seu desempenho seria
avaliado com base na forma como o «aluno» digital aprendesse a matéria.
No final da aula, ambos os grupos realizaram o mesmo teste para avaliar
o domínio da matéria. Estranhamente, os investigadores descobriram que os
alunos do segundo grupo, que ensinaram a matéria a um aluno gerado por
computador, aprenderam melhor do que os alunos do primeiro grupo, que
estudaram apenas para o teste. Em circunstâncias idênticas, com matéria
idêntica, as pessoas que tivessem de ensinar aos outros sobre um assunto
aprenderiam melhor a matéria. Os investigadores chamaram a esse
fenómeno «efeito protégé»35.
Nos anos que se seguiram, investigadores no campo da inteligência
humana sugeriram que talvez os irmãos mais velhos, em média, tenham QI
mais elevados e um desempenho melhor na escola36 do que os seus irmãos
mais novos devido a este mesmo fenómeno. Os irmãos mais velhos
assumem o papel de professor ou mentor dos irmãos: os irmãos mais velhos
(como eu) muitas vezes ajudam os mais novos (como o meu irmão) com os
trabalhos de casa, respondem às suas perguntas sobre o mundo e partilham
as suas próprias experiências e ideias, por mais dúbias que sejam.
O efeito protégé sugere outra forma de aumentar o número de
experiências de aprendizagem nas nossas vidas. Como disse o filósofo
Séneca, Qui docet discit — «Quem ensina aprende». Assim que entender o
poder do efeito protégé, torna-se surpreendentemente fácil assumir o papel
de «professor» em quase qualquer função.
Digamos que trabalha com desenvolvimento de software; pode oferecer-
se para orientar um novo funcionário ou estagiário. Ao explicar conceitos
complexos de programação e práticas recomendadas a outra pessoa, será
forçado a pensar mais profundamente sobre eles, levando a uma
compreensão mais profunda e a um melhor nível de competências.
Ou digamos que trabalha em vendas. Pode oferecer-se para treinar
novos vendedores ou realizar workshops para a sua equipa. Ao partilhar as
suas técnicas e estratégias com outras pessoas, poderá refinar as suas
próprias capacidades e obter novas revelações sobre o processo de vendas.
E também estará a ajudar a desenvolver as competências dos seus colegas, o
que acabará por beneficiar toda a equipa.

Não precisa de ser um guru.


Pode ser apenas um orientador.

E se o preocupa não ser suficientemente «qualificado» para ensinar


outra pessoa, vale a pena lembrar que as pessoas com quem aprendemos
melhor são, muitas vezes, aquelas que estão apenas um passo à nossa frente
na jornada. Portanto, qualquer pessoa pode tornar-se professor.
Não precisa de ser um guru. Pode ser apenas um orientador.
ASSUMA O CONTROLO DO SEU TRABALHO

A partir do início da década de 1970, o psicólogo Edward Deci ficou


intrigado com uma pergunta simples: O que motiva as pessoas a fazerem
coisas difíceis?
Este era um tema que o fascinava desde o início da sua carreira. Apenas
um ano depois de concluir o seu doutoramento na Universidade Carnegie
Mellon, em 1970, publicou um artigo influente no qual pedia às pessoas que
resolvessem um enigma intitulado Cubo Soma (um pouco como o Cubo de
Rubik). Ele descobriu que aqueles a quem foi oferecida uma recompensa
financeira por resolverem o enigma eram, estranhamente, menos propensos
a gostar da tarefa e mais atreitos a desistir de o resolver depois de a
recompensa ser eliminada, em comparação com aqueles a quem nunca foi
oferecido dinheiro.
A recompensa material parecia tornar as pessoas menos interessadas
numa tarefa, e não mais. Isto levou Deci a concluir que a oferta de uma
recompensa material pode, peculiarmente, diminuir a motivação.
Quando, em 1977, Deci conheceu outro jovem psicólogo, Richard
Ryan, a dupla embarcou numa relação profissional que transformaria a
forma como o mundo pensa sobre motivação. Nos vinte anos seguintes,
Ryan e Deci desenvolveram uma maneira completamente nova de pensar
sobre o motivo por que fazemos coisas difíceis. A sua contribuição
culminou em 1981 com a declaração da «teoria da autodeterminação».
Até então, a maioria dos cientistas pensava que a motivação era
impulsionada principalmente por incentivos como recompensas e punições.
Mas Deci e Ryan mostraram o contrário.
Encorajaram os leitores a ver a motivação num espectro, com
«extrínseco» numa extremidade e «intrínseco» na outra. A motivação
intrínseca vem de dentro: impulsionada pela autorrealização, curiosidade e
por um desejo genuíno de aprender. A motivação extrínseca vem de fora:
impulsionada por aumentos salariais, recompensas materiais e aprovação
social. Mas estas formas de motivação não eram iguais. De acordo com a
teoria da autodeterminação, a motivação intrínseca é substancialmente mais
poderosa do que a motivação extrínseca.37 A motivação duradoura vem de
dentro.
Mas não foi aí que terminou a teoria de Deci e Ryan. Porque também
mostraram que a motivação intrínseca pode ser criada. Já na década de
1980, demonstravam que a motivação intrínseca pode ser reforçada por um
punhado de forças, entre as quais se destaca o nosso sentido de
«autonomia». Em termos leigos, é um sentimento de controlo. E é o
contribuidor final para a noção de poder que nos energiza a nós, bem como
ao nosso trabalho.
Deci e Ryan argumentaram que, quando as pessoas sentem que têm
poder sobre as suas próprias ações, é muito mais provável que estejam
intrinsecamente motivadas para se envolverem nelas. É por isso que a
experiência do Cubo Soma descobriu que as recompensas monetárias
reduzem a motivação das pessoas. Elas não sentem que são totalmente
«donas» da tarefa, mas que a estão a realizar por alguma recompensa
externa. O seu sentido de controlo diminui, assim como o de motivação.
Isto soa verdadeiro nas nossas próprias vidas. A nossa necessidade de
controlo é a razão pela qual odiamos ser manietados pelos nossos chefes e
pais. A nossa necessidade de controlo é a razão pela qual adoramos decorar
os nossos quartos quando somos jovens (ou planear as nossas futuras casas
de adulto). E, quando o controlo sobre as nossas vidas é retirado — se
acabarmos na prisão ou presos a um trabalho de que não gostamos —, isso
pode ter consequências desastrosas na nossa saúde física e mental.
O problema é que assumir o controlo nem sempre é fácil. Claro, alguns
têm empregos nos quais exercem bastante controlo sobre a sua vida
quotidiana. Empreendedores de sucesso têm autonomia sobre a gestão dos
seus negócios. Os nómadas digitais são livres para viajar pelo mundo,
trabalhar em qualquer café que encontrem. Outros não querem e não
podem. O rececionista de um hotel tem de estar em pé na receção para
cumprimentar e dar as boas-vindas aos hóspedes — não pode simplesmente
optar por trabalhar em casa. Uma médica no hospital tem de atender todos
os pacientes com consulta marcada; não pode simplesmente decidir ignorar
os que são rudes com ela.
Mas o que torna o conceito de propriedade tão poderoso é que pode
integrá-lo em praticamente qualquer situação. Muitas vezes, quando nos
encontramos numa situação de que não gostamos, começamos a sentir-nos
fatalistas. «Não gosto de onde moro, mas não está em meu poder mudar-
me.» «Não gosto do rumo que este relacionamento está a tomar, mas não
está em meu poder alterá-lo.» «Acho este trabalho aborrecido, mas não está
em meu poder mudar isto.»
Às vezes, temos razão: não há nada que possamos fazer. Mas, muitas
vezes, temos mais arbítrio do que imaginamos — se não sobre toda a
situação, pelo menos sobre partes dela. Temos controlo mesmo quando não
sabemos disso.

EXPERIÊNCIA 5:

Domine o processo

O meu exemplo favorito da notável capacidade de os seres humanos


assumirem o controlo de situações más vem de FiletOfFish1066.38
Em junho de 2016, o cavalheiro por trás da conta do Reddit
FiletOfFish1066 fez manchetes por ter sido demitido. Trabalhava como
programador na sua empresa há seis anos, e o seu trabalho envolvia
principalmente testes de software no departamento de controlo de
qualidade. Era uma função profundamente aborrecida. Tudo o que fazia era
executar os mesmos testes no mesmo software, seguindo sempre o mesmo
guião.
Então, FiletOfFish1066 elaborou um plano. Sem alertar o chefe, passou
os seus primeiros oito meses de trabalho a programar software para
automatizar a sua função. A partir de então, os programas personalizados
que desenvolveu funcionavam em piloto automático, executando
perfeitamente os testes de controlo de qualidade. O seu chefe nunca o
controlou, porque tudo corria bem. Como ele escreveu num post no Reddit
após ser demitido: «De há cerca de seis anos para cá, não faço nada no
trabalho. Não estou a brincar. Durante quarenta horas por semana, vou para
o trabalho, jogo League of Legends no meu escritório, navego no Reddit e
faço o que me apetece. Nos últimos seis anos, talvez tenha cumprido
cinquenta horas de trabalho real. O que não é nada. E nunca ninguém
realmente se importou.»
Infelizmente para FiletOfFish1066, depois de mais de meia década do
seu plano engenhoso, alguém do departamento de informática descobriu o
que estava a acontecer e relatou a situação ao seu chefe. Ele foi demitido
por ter a audácia de automatizar o seu próprio trabalho.
Não estou a sugerir que FiletOfFish1066 fosse alguém com uma
estratégia de carreira impecável — nem que ele fosse um modelo ideal de
virtude. Mas suspeito que as ações de FiletOfFish1066 revelam a primeira
forma de como podemos construir o nosso sentimento de propriedade,
mesmo em situações em que temos pouca independência. Quando não
podemos assumir o controlo da situação, ainda podemos assumir o controlo
do processo.

Quando não podemos assumir o controlo da situação,


ainda podemos assumir o controlo do processo.

FiletOfFish1066 percebeu que talvez não tivesse propriedade sobre o


que fazia, pois tinha de executar o que o seu chefe dizia. Mas escolheu
assumir o controlo de como o fazia. Havia muitas coisas sobre as quais não
tinha influência: o software que estava a testar, as prioridades do chefe, a
quantidade de trabalho que recebia. Mas havia muitos aspetos que estavam
inteiramente nas suas mãos: como cumpria aquela lista de tarefas, como
administrava o seu tempo, como fazia uso das ferramentas que lhe eram
dadas. Foi assim que percebeu que o seu trabalho poderia ser automatizado,
e passou oito meses a construir sistemas e processos para fazer exatamente
isso.
Há uma lição aqui para todos nós. Quase sempre existe uma maneira de
assumirmos o controlo do processo de uma tarefa, mesmo quando o
resultado foi determinado por outra pessoa. Se trabalha no atendimento ao
cliente, pode não ter controlo sobre as políticas da empresa, mas pode
assumir o controlo de como interage com os clientes. Pode fazer um esforço
para ouvir as suas preocupações, ter empatia com as suas frustrações e
encontrar soluções criativas para os seus problemas.
Se é professor, pode não ter controlo sobre os programas curriculares,
mas pode assumir a responsabilidade de como ensina a matéria. Pode
encontrar formas inovadoras de envolver os seus alunos, criar atividades
divertidas que reforcem os conceitos e fornecer feedback personalizado que
ajude cada aluno a melhorar.
E, se trabalha numa fábrica ou linha de montagem, pode não ter
controlo sobre as metas de produção, mas pode assumir a responsabilidade
de como contribui para o processo. Pode encontrar formas de agilizar as
suas tarefas, identificar possíveis perdas de qualidade antes que se tornem
problemas e oferecer sugestões para melhorias de processos.
Há um poder extraordinário a ser obtido quando passa a fazer as coisas
à sua maneira. Mesmo nas circunstâncias em que possui menos capacitação.

EXPERIÊNCIA 6:

Domine a sua mentalidade

A última forma de construirmos o nosso sentido de motivação intrínseca é


aquela que desenvolvi enquanto trabalhava como médico estagiário.
Encontrei-a pela primeira vez no final de um longo turno no serviço de
obstetrícia e ginecologia. Quando estava a preparar-me para sair, uma das
enfermeiras parou-me e perguntou: «Dr. Ali, por favor, pode colocar este
cateter intravenoso na senhora da cama 4?»
O meu coração afundou. Sabia que seria difícil encontrar as veias da
paciente, e tentar colocar aquele cateter atrasaria, pelo menos meia hora, a
minha saída do hospital. Ao reunir o equipamento, senti uma onda de
ressentimento. Se tivesse saído alguns minutos antes, aquilo seria trabalho
do médico do turno da noite. Poderia estar já a caminho de casa, a comprar
um McDonald’s pelo caminho, enquanto ouvia um audiolivro. Agora, tinha
de ficar para trás e tratar da aborrecida tarefa.
Mas, então, ouvi uma paciente noutra ala a conversar com o marido. Ela
estava entusiasmada com quão maravilhosa fora a sua experiência no
hospital e mostrava-se grata pelos médicos e enfermeiros que cuidavam
dela. Isso fez-me parar. Eu estava prestes a usar a minha formação médica e
competências práticas para inserir um cateter intravenoso, para que
pudéssemos ministrar líquidos a uma jovem grávida de doze semanas do
seu primeiro filho durante a noite para a ajudar com as náuseas. Era para
fazê-la sentir-se muito melhor. E isso também ajudaria o bebé a crescer
dentro dela.
Como podia estar a reclamar disso? Fora aquele o trabalho que
escolhera. Passei por oito anos de formação médica para chegar ao ponto
em que pudesse ser útil a um paciente que sofria à minha frente. E agora
que, finalmente, tinha a oportunidade de fazer a diferença, estava a reclamar
de alguns minutos extra de trabalho.
Não podia escolher se inseria ou não o cateter. Mas podia mudar a
minha mentalidade. Recordo uma ideia com que me deparei numa
entrevista ao escritor Seth Godin. Andar por aí com a testa franzida e
pensar: «Porque é que tenho de fazer isto?» é uma decisão. E posso decidir
pensar sobre isto de outra maneira. «Eu escolho fazer isto» — posso dizer a
mim mesmo. «Tenho a oportunidade de fazer isto.» Ou mesmo: «Sou
abençoado por fazer isto.»
Com esta mudança de mentalidade — de «ter de» para «escolher» —,
aproximei-me da paciente rapidamente e com um sorriso no rosto, pronto
para ajudar a inserir o cateter intravenoso.
Não sou a primeira pessoa a recorrer a este método. Em 2021, um grupo
de académicos elaborou um conjunto engenhoso39 de estudos concebidos
para testar se a mera ideia de assumir controlo das próprias ações poderia
afetar as suas perceções e comportamentos. Metade dos participantes foi
aleatoriamente designada para um grupo onde foram convidados a escrever
sobre três escolhas que tinham feito no dia anterior, por exemplo: «Escolhi
acordar cedo ontem»; «Escolhi comer noodles ao almoço»; «Escolhi
levantar-me ao segundo toque do despertador e seguir em frente com o meu
dia». A outra metade dos participantes foi convidada a escrever apenas
sobre três coisas feitas no dia anterior: «Tomei o pequeno-almoço»; «Fui às
compras»; «Fui ao ginásio».
Depois de ambos os grupos terem concluído a tarefa de escrita, foi-lhes
pedido que refletissem sobre as suas vidas de forma mais ampla. Numa
parte do estudo, pediu-se aos participantes que se avaliassem em termos de
força física, respondendo a perguntas como «Quão musculoso é?»; «Quão
forte é fisicamente?» e «Quão boa é a sua constituição física?» numa escala
de cinco pontos. Aqueles que se lembraram das suas escolhas
subsequentemente classificaram-se como significativamente mais
musculosos, fortes e com melhor constituição física em comparação com o
grupo de controlo. Como afirmam os autores: «Aumentar a relevância da
escolha levou a uma sensação de autoinflação… uma sensação de ser
positivamente diferente, maior e mais forte do que os outros.»
Simplesmente mudando a mentalidade de «ter de» para «escolher»,
aumentaram o seu sentido de controlo, poder e, por sua vez, aquilo de que
eram capazes.
O leitor pode fazer o mesmo. «Ter de» é uma linguagem coerciva que o
faz sentir-se impotente. «Escolher» é uma linguagem de afirmação de
autonomia que o faz sentir-se poderoso. Sempre que sentir que tem de fazer
algo, pense novamente. Como é que as suas escolhas o levaram até esse
momento? E existe uma forma de transformar esse «ter de» num
«escolher»? E se está a fazer algo que realmente não escolheu, que escolhas
pode fazer em relação à sua abordagem?
Viktor Frankl, o psiquiatra austríaco e sobrevivente do campo de
concentração de Auschwitz durante a Segunda Guerra Mundial, expressou-
o magnificamente: «Tudo pode ser roubado a um homem, menos uma
coisa: a derradeira liberdade humana — escolher a sua atitude em qualquer
circunstância, escolher o seu próprio caminho.»

RESUMINDO

• «Poder» é uma palavra assustadora, mas não tem de o ser.


Quando dizemos que o segundo energizante é o poder, não
nos referimos a exercer controlo sobre os outros. Aqui,
queremos simplesmente dizer: sentir-se capacitado para
assumir o controlo do seu trabalho, da sua vida e do seu
futuro.
• Há três formas de aumentar a sua sensação de poder,
começando agora. Comece com confiança. Achamos que a
nossa confiança é fixa, mas na verdade é extremamente
maleável. Então, porque não tentar «acionar o interruptor da
confiança» — e desempenhar o papel de alguém que já
está cheio dela?
Em seguida, aprimore as suas competências. Pergunte-se:
• Se eu fosse completamente novo nesta tarefa, como seria?
E como posso começar a ensinar outras pessoas mesmo
ainda não sendo um especialista?
• Por fim, veja o que pode fazer para assumir o controlo,
mesmo em momentos em que não tem tanto controlo
quanto gostaria. Lembre-se: se não pode escolher no que
trabalhar, ainda poderá escolher como trabalhar. O
resultado nem sempre está nas suas mãos, mas o
processo, e, certamente, a sua mentalidade, muitas vezes
está.
26 Hastings, R., e Meyer, E. (2021). A Regra é Não Ter Regras: Netflix e a cultura da reinvenção.
Planeta. Lisboa. Randolph, M. (2021). Isso Nunca Vai Resultar: o nascimento da Netflix e a força
das ideias. Vogais. Lisboa.
27 McCord, P. (2019). Powerful: como construir uma cultura empresarial de liberdade e de
responsabilidade para responder aos desafios da gestão de talento. Sabedoria Alternativa Edições.
Lisboa.
28 Hu, L., Motl, R. W., McAuley, E., e Konopack, J. F. (2007). «Effects of self-efficacy on physical
activity enjoyment in college-aged women». International Journal of Behavioral Medicine, 14(2),
92–96.
29 Bandura, A. (1978). «Self-efficacy: toward a unifying theory of behavioral change». Advances in
Behavior Research and Therapy, 1(4), 139–161.
30 Stajkovic, A. D., e Luthans, F. (1998). «Self-efficacy and work-related performance: a meta-
analysis». Psychological Bulletin, 124(2), 240–261.
31 Blanchfield, A. W., Hardy, J., De Morree, H. M., Staiano, W., e Marcora, S. M. (2014). «Talking
yourself out of exhaustion: the effects of self-talk on endurance performance». Medicine & Science
in Sports & Exercise, 46(5), 998–1007.
32 Harrison, M. B., e McGuire, F. A. (2008). «An investigation of the influence of vicarious
experience on perceived self-efficacy». American Journal of Recreation Therapy, 7(1), 10–16.
33 Bandura, A., Adams, N. E., e Beyer, J. (1977). «Cognitive processes mediating behavioral
change». Journal of Personality and Social Psychology, 35(3), 25–139.
34 Chase, C. C., Chin, D. B., Oppezzo, M. A., e Schwartz, D. L. (2009). «Teachable agents and the
protégé effect: increasing the effort towards learning». Journal of Science Education and Technology,
18, 334–352.
35 O efeito protégé também é conhecido por «aprender ensinando». Foi desenvolvido por Jean-Pol
Martin nos anos 1980. Ver Stollhans, S. (2016). «Learning by teaching: developing transferable
skills». In Corradini, E., Borthwick, K., e Gallagher-Brett, A. (eds.) (2016). Employability for
Languages: a handbook. 161–164.
36 Kristensen, P., e Bjerkedal, T. (2007). «Explaining the relation between birth order and
intelligence». Science, 316(5832), 1717.
37 A teoria da autodeterminação é uma proposta extensa sobre aquilo que motiva o ser humano. Foi
desenvolvida pelos psicólogos Edward Deci e Richard Ryan no seu estudo de renome, Intrinsic
Motivation and Self-Determination in Human Behavior, publicado em 1985.
38 Stephens, L. (2016). «Reddit user claims he automated his job for 6 years, finally is fired, forgets
how to code». Interesting Engineering. Disponível online:
https://interestingengineering.com/culture/programmer-automates-job-6-years-boss-fires-finds
39 Nanakdewa, K., Madan, S., Savani, K., e Markus, H. R. (2021). «The salience of choice fuels
independence: implications for self-perception, cognition, and behavior». Proceedings of the
National Academy of Sciences, 118(30), e2021727118.
CAPÍTULO 3

PESSOAS

Já reparou que depois de passar tempo ou trabalhar com certas pessoas, se


sente pronto para enfrentar o mundo? Estas são as pessoas que elevam o seu
espírito e o enchem de energia. Quer estar perto delas.
Por outro lado, provavelmente também já encontrou pessoas que o
deixam a sentir-se esgotado e exausto após cada interação. É como se
lançassem uma sombra sobre o seu humor e a sua motivação. As pessoas
aprendem a evitá-las como se fossem uma praga. E elas aprendem rápido.
Uma amiga minha refere-se a este último grupo como «vampiros de
energia». Eles sugam a força vital de uma situação social, deixando
exaustos todos os que se encontram por perto. Quando ouvi pela primeira
vez a expressão «vampiro de energia», pensei que era um pouco duro e
demasiado sobrenatural. Mas ela tinha razão.
Os cientistas há muito estão conscientes daquilo a que chamam «energia
relacional»40: o facto de as nossas interações com os outros poderem ter um
efeito profundo no nosso humor. Num estudo realizado em 2003, os
professores de Psicologia41 Rob Cross, Wayne Baker e Andrew Parker
criaram o conceito de «mapa energético». Trabalharam com consultores e
gestores em algumas empresas de grande dimensão para estabelecer quem
trabalhava com quem e o impacto que qualquer pessoa tinha nos níveis de
energia de outras pessoas. A descoberta deles? Que havia um consenso
notável sobre quem era o energizante (e quem era o drenador), mesmo ao
nível das grandes organizações. Algumas pessoas são simplesmente um
completo pesadelo para se ter por perto.
Nos anos seguintes, a energia relacional tornou-se um dos conceitos
mais badalados da ciência organizacional. Definida como «o sentimento
positivo e a sensação de maior desenvoltura experimentada como resultado
direto de uma interação com outra pessoa», a energia relacional foi objeto
de apenas oito estudos em 2010; em 2018, o número estava próximo de
oitenta.
Portanto, a energia relacional fornece-nos o nosso energizante final: as
pessoas. Como mostrou o estudo de 2003, as pessoas podem melhorar o
nosso humor e tornar-nos mais produtivas. Mas isso não é um dado
adquirido. Requer uma reflexão profunda sobre como nos conectamos uns
com os outros. Neste capítulo, abordaremos várias formas através das quais
podemos cercar-nos de pessoas para nos sentirmos mais energizados e
fazermos mais coisas que importam.

ENCONTRE A SUA CENA

A nossa primeira visão sobre os efeitos do método Feel-Good das pessoas


vem do mundo do glam rock da década de 1970.
Era o início de uma nova década, e Brian Eno parecia estar a caminho
de uma vida de mediocridade satisfeita. Recém-formado na Escola de Arte
de Winchester, esteve envolvido em alguns projetos musicais de vanguarda
— tocando bateria numa banda de art rock e gravando uma música estranha
no seu velho gravador —, mas nada parecia fazer sucesso. Ele parecia
preparado para uma vida como um músico apreciado, mas secundário, no
mundo do rock londrino.
Então, um dia, em 1971, um encontro casual com um músico local
mudou tudo. Eno estava à espera do comboio quando encontrou um
conhecido, o saxofonista Andy Mackay, que o convidou para um clube
local onde tocava. Quando chegaram ao local, a atmosfera era eletrizante: o
público vibrava de entusiasmo, e a energia do espaço tomou conta de Eno.
Mais tarde, diria sobre o encontro casual com Mackay: «Se eu tivesse
parado dez metros à frente na plataforma, ou perdido aquele comboio, ou
entrado na carruagem seguinte, provavelmente agora seria professor de
Artes.»
Em vez disso, Eno viu-se no meio de uma cena musical vibrante e
emocionante. Nas semanas que se seguiram, conversou sobre música com
as pessoas que conheceu — e acabou por produzir a melhor arte da sua
vida. Com Mackay, fundaria a influente banda de glam rock Roxy Music —
e, por fim, tornar-se-ia um dos músicos e produtores mais importantes do
século passado.
Anos mais tarde, Eno refletiria sobre a importância daquela comunidade
musical única no lançamento da sua carreira. Percebeu que todos os
músicos mais inovadores e revolucionários do seu tempo não trabalhavam
isoladamente; faziam parte de uma cena maior de artistas, produtores e fãs
que se incentivavam uns aos outros para explorarem novos sons e novas
ideias. Eno descobriu a genialidade da cena coletiva. Ou, como ele lhe
chamava, scenius.
Eu experimentei os efeitos de scenius em primeira mão. Uma coisa de
que não gostei na Faculdade de Medicina foi da competição. Todos
tentavam tirar a nota mais alta, receber o prémio académico, conseguir a
melhor posição no internato. Alguns levaram essa mentalidade competitiva
um pouco longe de mais. Um tipo que eu conhecia requisitava vários
exemplares do mesmo livro na biblioteca para que outros não pudessem
consultá-lo. Tais ambientes encorajam as pessoas a encarar as suas vidas
como um jogo de soma zero: para elas ganharem, os outros têm de perder.
Mas acabei por aprender que há outra forma de pensar sobre o
relacionamento com os outros. A Faculdade de Medicina não era uma
competição. Fazíamos todos parte da mesma cena. Ao compreender esse
facto, conseguimos aceder a uma abundância de apoio que nunca teríamos
sozinhos.

EXPERIÊNCIA 1:

A mentalidade de camaradagem

Como podemos incorporar este sentido de scenius no nosso dia a dia? A


resposta começa com uma mudança subtil: reavaliar o que entendemos por
trabalho em equipa.
Quando alguém diz a palavra «trabalho em equipa», tendemos a
imaginar um certo conjunto de comportamentos — dividir o trabalho de
forma justa ou talvez ajudar alguém quando precisa de incentivo. Isso faz
parte, certamente. Mas há outra forma de entender o trabalho em equipa:
menos como algo para fazer e mais como uma forma de pensar.

O trabalho em equipa é tanto um estado psicológico


quanto uma forma de dividir tarefas.

De qualquer forma, esta é a sugestão dos professores da Universidade


Stanford, Gregory Walton e Priyanka Carr.42 Eles argumentaram que o
trabalho em equipa é tanto um estado psicológico quanto uma forma de
dividir tarefas. Num estudo publicado em 2014, dividiram trinta e cinco
participantes em grupos de três a cinco. Depois de os participantes se
conhecerem e apresentarem, foram levados para salas individuais. Em
seguida, os cientistas deram, a cada um deles, um enigma e disseram-lhes
que poderiam demorar o tempo que precisassem para resolvê-lo.
Depois de pensarem nos seus enigmas por vários minutos, todos os
participantes receberam uma dica manuscrita sobre como resolvê-los. Todas
as dicas eram iguais (e genuinamente úteis). Mas havia uma diferença
crucial. Quando alguns participantes receberam a dica, foram informados de
que ela tinha sido escrita para eles pelo cientista que conduzia o estudo.
Outros foram informados de que tinha sido escrita por um dos outros
participantes, que conheceram anteriormente.
Essa pequena diferença teve um impacto significativo na forma como os
participantes se sentiram em relação à experiência. Aqueles que foram
informados de que a dica era dos cientistas eram mais propensos a sentir
que estavam a trabalhar completamente separados dos participantes que
conheceram. Quando solicitados relativamente a descrever o que fizeram no
estudo, alguns responderam: «Tentei resolver um enigma individual,
enquanto outros resolveram o mesmo enigma.»
Em contraste, as pessoas que foram informadas de que a dica era de um
colega eram mais propensas a sentirem-se como se estivessem em equipa
com os outros; sentiram que estavam a «tentar colaborar com um parceiro
invisível para resolverem o problema, partilhando dicas um com o outro».
Quando questionados sobre como se sentiram durante o estudo, alguns
participantes escreveram: «Sentia-me obrigado a esforçar-me arduamente a
resolver o enigma para não desiludir outras pessoas.» Estavam a trabalhar
juntos.
Esta mudança subtil de mentalidade teve um efeito notável. Os
participantes do grupo «juntos» acabaram a trabalhar no enigma por 48 por
cento mais tempo. Desenvolveram aquilo a que chamo mentalidade de
camaradagem. E estavam a sair-se melhor com o resultado.
Esta diferença subtil — entre «trabalhar em paralelo» e «trabalhar em
conjunto» — pode parecer pequena. Mas sugere a primeira ferramenta que
podemos usar para aproveitar os efeitos energizantes das pessoas. Mesmo
que estejamos sozinhos na execução de uma tarefa, podemos convencer-nos
de que fazemos parte de uma equipa — e fazê-lo com notável facilidade.
O truque é pensar nas pessoas com quem trabalha como parte da sua
equipa. Veja a lista a seguir. O que seria necessário para desviar o seu foco
da coluna da esquerda para a da direita? Como seria se essas pessoas não
fossem concorrentes, mas camaradas? Se é funcionário, poderia recrutar
colegas para trabalharem consigo e contarem uns com os outros para apoio
moral? Se é estudante, poderia partilhar as suas anotações ou encontrar
formas de estudar em grupo?

Mentalidade de competição Mentalidade de camaradagem

«Você ganha, eu perco» «Você ganha, eu ganho»

«O meu sucesso» «O nosso sucesso»

«Progrido superando os outros» «Progredimos ao ajudar outros»

Como Walton concluiu: «Simplesmente sentirem-se como se fizessem


parte de uma equipa de pessoas a trabalhar numa tarefa torna as pessoas
mais motivadas à medida que enfrentam desafios.» Quando as coisas se
tornam difíceis, é melhor ter amigos em quem se apoiar do que inimigos
para dominar.

EXPERIÊNCIA 2:

Encontre sincronicidade
Naturalmente, há momentos em que pode ser difícil encontrar pessoas com
quem colaborar. Pode ser difícil forçar-se a pensar nas pessoas que
trabalham do outro lado do campus (quanto mais do mundo) como parte da
mesma equipa. Às vezes, os nossos colegas podem ser simplesmente
irritantes.
Nestes momentos, podemos recorrer a uma segunda ferramenta, que
encontrei pela primeira vez através de um estudo, surpreendentemente
inteligente, realizado por três académicos da Universidade Ryerson, no
Canadá. Num artigo de 2017, estes académicos reuniram43 um grupo de
cem estudantes para investigar a ciência do trabalho em equipa. Depois de
serem divididos em grupos de seis, os alunos receberam auscultadores, e
foi-lhes pedido que batessem com a mão na mesa ao som de uma toada
musical. Alguns grupos de seis receberam a mesma batida — por isso
tocavam em sincronia. Outros grupos de seis foram divididos em subgrupos
de três que receberam, cada um, a mesma música para tocar. Por fim, alguns
grupos receberam seis batidas sonoras completamente diferentes, por isso
não houve qualquer sincronia.
Depois disso, os auscultadores foram retirados e substituídos por novos
adereços. Cada participante recebeu dez fichas para distribuir, sendo
informados de que seriam convertidas em dinheiro real mais tarde. A quem
queriam entregá-las?
O que os cientistas estavam interessados em testar era o sentimento de
camaradagem entre os participantes que estavam «em sincronia». E
descobriram que o nível de sincronicidade musical mudou tudo. Quando os
participantes passavam algum tempo a bater os dedos em sincronia com o
trio, queriam distribuir o dinheiro pelo trio. Mas, se dois desses trios se
sincronizassem — formando um grupo de seis por alguns minutos —, os
membros teriam maior probabilidade de dar a todos os seis.

A sincronicidade faz-nos querer ajudar os outros. E faz-


nos querer ajudarmo-nos a nós mesmos.

O que é que isto tem que ver com os efeitos de satisfação de outras
pessoas? Bem, diz-nos algo poderoso sobre como criar um sentimento de
trabalho em equipa. Quando trabalhamos em sincronia com outras pessoas,
tendemos a ser mais produtivos. A sincronicidade faz-nos querer ajudar os
outros. E faz-nos querer ajudarmo-nos a nós mesmos.
As implicações são simples: se quiser aproveitar os efeitos de satisfação
das pessoas, tente encontrar pessoas com quem trabalhar em sincronia —
mesmo que não estejam a colaborar ativamente na mesma tarefa. Ao
escrever este livro, frequentei, com regularidade, o London Writers’ Salon,
que organiza um grupo de trabalho remoto e gratuito chamado Writers’
Hour. Todos os dias da semana, quatro vezes por dia, algumas centenas de
escritores (e alguns não escritores) reúnem-se numa videochamada por
Zoom. O facilitador passa cinco minutos a partilhar uma mensagem
motivacional e a pedir aos participantes que publiquem no chat online qual
será a sua intenção para a sessão de escrita. Então, durante cinquenta
minutos, todos minimizam a janela do Zoom e trabalham no computador.
Continuo a achar estas sessões de sincronização extremamente úteis
para me manter energizado. Embora todos trabalhemos em coisas
diferentes, trabalhar em conjunto com outras pessoas tem grandes efeitos na
minha capacidade de concentração e também me ajuda a sentir-me melhor.

SINTA A EUFORIA DE AJUDAR

Percebi algo mais nessas sessões virtuais de escrita. Com o tempo, fui
conhecendo as outras pessoas do meu grupo; em pouco tempo,
começaríamos a trocar mensagens pedindo apoio no Zoom. E isso acabaria
por me levar a outra dimensão da energia relacional: o efeito de dar e
receber ajuda.
É um efeito que Allan Luks entende melhor do que ninguém.44 Como
diretor do Big Brothers Big Sisters of New York City, Luks era responsável
por uma rede de milhares de voluntários e funcionários que se dedicavam a
melhorar a vida dos jovens na cidade de Nova Iorque. O trabalho pode ser
difícil e muitas vezes incómodo. A organização combinou mentores adultos
com crianças e adolescentes, que muitas vezes enfrentavam enormes crises
familiares — como prisão, vício e suicídio. Luks era apaixonado pela
importância da orientação e pelo impacto que ela poderia ter nos jovens.
Mas foi difícil.
E, no entanto, à medida que os seus meses no Big Brothers Big Sisters
se transformavam em anos, Luks começou a notar algo estranho. Sim, os
voluntários às vezes ficavam exaustos ou incomodados com o que
vivenciavam. Porém, com mais frequência, saíam extremamente
energizados mesmo das sessões de mentoria mais complicadas. Luks
começou a perceber que o ato de dar poderia transformar não apenas a vida
das pessoas ajudadas mas também a vida dos próprios voluntários.
Intrigado com este fenómeno, nos anos seguintes, entrevistou milhares
de voluntários que tinham experiência em ajudar outras pessoas. Todos
disseram que escolheram fazer este trabalho porque, em parte, isso os fazia
sentir-se bem. Ele descobriu que 95 por cento dos voluntários relataram
sentir-se mais felizes, mais realizados e mais energizados como resultado do
seu serviço.
Por que razão? A pesquisa de Luks mostrou que, quando ajudamos os
outros, os nossos cérebros libertam uma enxurrada de substâncias químicas
que criam uma euforia natural. Hormonas da felicidade, como a oxitocina,
percorrem os nossos corpos, criando uma onda de energia positiva que pode
durar horas — até dias — após o término da ajuda.
Luks percebeu que a «euforia de ajudar» não era apenas um sentimento.
Era uma ferramenta poderosa para o crescimento, a mudança social e, eu
acrescentaria, para a produtividade. É a segunda maneira pela qual podemos
usar os efeitos de satisfação de outras pessoas para fazermos mais daquilo
que é importante para nós.

EXPERIÊNCIA 3:

Atos aleatórios de bondade

Quando eu trabalhava como médico, sempre que tinha alguns minutos


livres entre os atendimentos aos pacientes, levantava-me para preparar uma
chávena de chá.
Por um lado, era um ato egoísta; sou, possivelmente, o maior
conhecedor de chá da Grã-Bretanha! Mas também estava de olho na equipa
em geral. A caminho da cozinha, enfiava a cabeça na sala dos enfermeiros e
perguntava se alguém queria que eu lhe preparasse uma chávena também.
Esse pequeno ato pareceu ter um efeito estranhamente significativo no
moral da equipa. Lembro-me, vividamente, de oferecer a Julie, uma das
enfermeiras, uma chávena de chá no auge da pandemia de covid-19; parecia
que tinha acabado de lhe oferecer um bilhete de lotaria premiado. Tudo por
causa de um simples saquinho de chá, água quente e um pouco de leite
(especificamente por esta ordem).
Estes atos aleatórios de bondade oferecem a primeira forma de integrar
a euforia de ajudar na nossa vida quotidiana. Ao parar o que está a fazer e
oferecer aleatoriamente ajuda às pessoas, pode aumentar os seus níveis de
endorfina e ajudar-se a trabalhar mais.
O chá não é o único ato de gentileza, claro. Pode integrar gentilezas
todos os dias, seja qual for a sua situação. Digamos que trabalha num
escritório. Notou que alguém ao seu redor parece entediado ou um pouco
esgotado? Porque não levar essa pessoa a almoçar em vez de ela ter de
comer uma sandes na sua secretária?
Ou talvez esteja no supermercado e alguém atrás de si pareça stressado
— talvez tenha filhos pequenos. Porque não deixá-lo passar à sua frente na
fila?
Ou digamos que alguém teve um ato de bondade para consigo, mesmo
que pequeno; realizou uma tarefa que lhe cabia a si durante uma altura mais
agitada. Porque não escrever uma mensagem personalizada de
agradecimento?
Há inúmeros destes atos aleatórios de bondade. Preparar uma bebida
para um colega. Escrever uma mensagem de agradecimento a um amigo.
Oferecer a um estranho o seu lugar na fila. Tudo subtil. Mas também tudo
subtilmente transformador.

EXPERIÊNCIA 4:

Pedir ajuda a outras pessoas

A euforia de ajudar também nos mostra que pedir ajuda aos outros pode, na
verdade, ser um presente para eles, e não o fardo que normalmente supomos
que será.
Esta foi uma epifania vivida pelo jovem Benjamin Franklin — o
polímata fundador dos Estados Unidos45, que, ao longo dos seus 84 anos de
vida, filosofaria sobre a natureza da política, fundaria o primeiro corpo de
bombeiros de Filadélfia e assinaria a Declaração da Independência dos
Estados Unidos. Em 1737, porém, tudo isso estava muito distante. Franklin
concorria à reeleição na Assembleia da Pensilvânia. Um legislador rival
dizia algumas coisas desfavoráveis sobre ele. Ele tinha opiniões
completamente opostas às de Franklin, e os dois viviam um relacionamento
tenso — muitas vezes glacial.
Franklin precisava, desesperadamente, de parar a campanha de
propaganda deste homem contra ele; corria o risco de destruir a sua
candidatura à reeleição. Mas como poderia conquistar alguém que não
concordava com ele em nada? A resposta, explicou ele na sua autobiografia,
envolveu pedir um livro emprestado. «Tendo ouvido dizer que ele tinha, na
sua biblioteca, um certo livro muito raro e curioso, escrevi-lhe um bilhete,
expressando o meu desejo de folhear aquele livro e solicitando que ele me
fizesse o favor de emprestá-lo por alguns dias», escreveu Franklin. Para
surpresa de Franklin, o seu inimigo enviou-o imediatamente. Quando
Franklin devolveu o livro, incluiu um bilhete expressando quanto gostara
dele.
Surpreendentemente, isto teve um impacto profundo no relacionamento
de ambos. «Quando nos encontrámos novamente na Assembleia, ele falou
comigo (o que nunca havia feito antes), e com grande civilidade», escreveu
Franklin. «E sempre manifestou disposição em me servir em todas as
ocasiões, de modo que nos tornámos grandes amigos, e a nossa amizade
perdurou até à sua morte.»
Este ato, aparentemente pequeno — pedir um livro emprestado —, teve
um efeito significativo no oponente de Franklin e no próprio Franklin. O
homem ficou tão surpreso com o gesto que começou a ver Franklin numa
nova perspetiva. Ele não conseguia conciliar o facto de ter ajudado alguém
de quem discordava. Como resultado, a atitude do homem em relação a
Franklin começou a mudar para melhor.
Este conceito é hoje conhecido como «efeito Benjamin Franklin». Isto
sugere que, quando pedimos ajuda a alguém, é provável que isso faça que
essa pessoa pense melhor de nós. É o outro lado dos efeitos transformadores
de ajudar os outros: podemos pedir que nos ajudem, o que também os
ajudará a sentirem-se melhor.
Assim, é uma pena que a maioria das pessoas seja péssima a pedir
ajuda. Podemos precisar de uma informação crucial de um colega, mas, em
vez de «incomodá-lo», tentamos descobrir sozinhos, perdendo tempo no
processo. Ou podemos estar a lutar com um problema específico na sala de
aula, mas não queremos pedir ajuda à pessoa ao nosso lado, ou mesmo ao
professor, por medo de parecermos estúpidos.
Então, como podemos aprender a pedir ajuda — de uma forma que nos
aproxime dos outros, em vez de afastá-los? Bem, há algumas maneiras.
Primeiro, precisamos de superar a nossa relutância em perguntar. A maneira
mais fácil de fazer isso é simplesmente adotar uma máxima: as pessoas
estão mais dispostas a ajudar do que imagina. Já vimos, repetidamente,
como pode ser estimulante fazer os outros sorrirem, ensinar e orientar. Não
obstante, muitos subestimam quanto as outras pessoas estão dispostas a
ajudar-nos. De acordo com os académicos Francis Flynn e Vanessa Bohns,
as pessoas tendem a subestimar em até 50 por cento a probabilidade de
outras pessoas concordarem em ajudá-las.46
Em segundo lugar, enquadre o pedido da maneira certa. Em particular,
faça o possível para pedir ajuda pessoalmente. Perguntar virtualmente torna
tudo mais difícil. Num estudo de 2017, Bohns descobriu47 que «os
requerentes de ajuda presumiam que fazer um pedido por e-mail seria tão
eficaz como fazer um pedido pessoalmente; na verdade, pedir ajuda
pessoalmente foi aproximadamente trinta e quatro vezes mais eficaz».
Por fim, certifique-se que usa a linguagem correta. Evite usar frases
negativas como: «Sinto-me muito mal por lhe perguntar isto…» e evite
transformar isso numa transação, dizendo coisas como: «Se me ajudar, farei
isto por si.» Vai pedir conselhos a essa pessoa específica: «Vi o seu trabalho
em X, Y, Z, e isso realmente teve um impacto em mim. Adoraria saber
como fez em A, B, C.» Ao enfatizar os aspetos positivos da pessoa que
admira, ela pensará que realmente valoriza a opinião dela — e terá maior
probabilidade de obter a sua ajuda.
Esta última revelação é fundamental. Quando enquadrado corretamente,
pedir ajuda faz que a pessoa a quem está a pedir se sinta tão bem quanto a
ajuda o faz sentir a si. Se quiser aproveitar o poder do efeito Benjamin
Franklin, deve fazer tudo o que puder para pedir, sem qualquer quid pro
quo.

SOBRECOMUNICAÇÃO
Quando lancei o meu negócio pela primeira vez, aquilo com que mais me
debati foi com a necessidade de comunicação. Para ser mais preciso, com
quanta era necessária.
Sabia que partilhar informações era importante, obviamente. O que não
tinha percebido era quanto eu precisava de comunicar. Acabei por perceber
— geralmente graças a dicas úteis da minha sofrida equipa — que o meu
medo de ser muito imperioso me fizera não comunicar o suficiente. Eu não
estava a dar o feedback positivo ou negativo que a maioria dos membros da
minha equipa realmente queria. Este é um fenómeno comum. É muito mais
provável que subestimemos a quantidade de comunicação que precisamos
de pôr em prática do que a sobrestimemos.

Quando pensa que comunicou bastante, é quase certo


que não o fez.

Portanto, enquanto a maioria dos livros sobre como unir as pessoas se


concentra na comunicação, aqui quero focar-me no poder da
sobrecomunicação. Quando pensa que comunicou bastante, é quase certo
que não o fez. Diferentes membros da equipa podem interpretar as
informações partilhadas de maneiras distintas ou ter diferentes níveis de
contexto ou compreensão. Sobrecomunicação significa ir deliberadamente
além do mínimo que acha necessário e, consequentemente, acabar por
partilhar exatamente a quantidade certa. Mas como?

EXPERIÊNCIA 5:

Sobrecomunicar o bom

Um provérbio sueco diz: «Uma alegria partilhada é uma alegria dupla; uma
tristeza partilhada é uma meia tristeza.» Quando uma pessoa partilha boas
notícias com outra, ambas ficam felizes. E, quando uma pessoa partilha
algo triste com outra, o ato de partilhar subtrai um pouco da tristeza.
Assim, a primeira tática para sobrecomunicar o que é bom é partilhar
notícias positivas — e reagir a notícias positivas de uma forma energizante.
Isto ajuda tanto quem partilha quanto quem reage. Para quem partilha, o
simples ato de partilhar notícias positivas aumenta as emoções positivas e o
bem-estar psicológico. Para quem reage, expressar orgulho e felicidade
pelas realizações da outra pessoa alimenta uma interação positiva e
fortalece o relacionamento.
Em Psicologia, esta forma de interação positiva que se autorreforça é
chamada capitalização. Um artigo sobre o assunto caracteriza a
capitalização como envolvendo dois componentes.48 A primeira parte
envolve alguém (quem partilha) a tentar conectar-se com outra pessoa
através de um evento positivo e das emoções positivas associadas a ele. Por
exemplo, pode ir até junto de um amigo e dizer: «Ei, finalmente consegui
aquele aumento que queria!» Na segunda parte, o destinatário da boa
notícia reage de forma positiva, com alegria e entusiasmo. Assim, pode
dizer: «Céus, isso é ótimo. Eu sei que tens trabalhado muito para
conseguires esse aumento!»

Simples, talvez. Mas não necessariamente claro. Porque, de acordo com


Shelly Gable, professora de Psicologia da Universidade da Califórnia, há
inúmeras formas de responder a boas notícias — e nem todas são tão
positivas. Podemos pensar nisso como estando sobre dois eixos. Primeiro,
se a sua resposta é ativa ou passiva e, segundo, se a sua resposta é
construtiva ou destrutiva.
Suponha que o seu colega de apartamento volta para casa um dia e lhe
diz que lhe foi oferecido um emprego para o qual tem trabalhado
arduamente. Veja como seriam estas quatro reações diferentes:

• Érica entusiasta: Uma resposta ativa e construtiva seria algo como:


«Uau, isso é ótimo! Tens trabalhado tanto para isso. Eu sabia que
conseguias!»
• Diana descontraída: Uma resposta passiva e construtiva seria
algum tipo de resposta discreta, como acenar gentilmente com a
cabeça, e sorrir, e depois dizer: «Isso é uma boa notícia.»
• Inácio invejoso: Uma resposta ativa e destrutiva seria algum tipo de
resposta que desvaloriza o sucesso do seu colega de apartamento:
«Ah, isso significa que vais estar demasiado ocupado para sair à
noite e aos fins de semana?»
• Eduardo egocêntrico: Uma resposta passiva e destrutiva
basicamente ignoraria as boas notícias do seu colega de
apartamento: «Bem, não vais acreditar no que me aconteceu hoje.»

Gable e colegas descobriram que responder às boas notícias de uma


forma ativa e construtiva torna aquele que partilha as boas notícias mais
feliz e fortalece a relação. Na verdade, num estudo de 2006, os
investigadores gravaram em vídeo setenta e nove casais de namorados49
para estudar como discutiam entre si boas e más notícias. Acontece que a
forma como os participantes responderam às boas notícias dos seus
parceiros foi o indicador mais forte de quanto tempo permaneceriam juntos
e quão felizes estavam nesses relacionamentos.
Portanto, ser capaz de comemorar as vitórias das pessoas é importante.
E a melhor maneira de o fazer é adotar uma abordagem ativa e construtiva a
todas as boas notícias.
Felizmente, isso é algo que podemos aprender. O primeiro passo é sentir
e demonstrar a sua alegria e entusiasmo pelas boas notícias do outro.
Experimente frases como: «Que boa notícia!» e «Estou tão feliz por ti!».
Em seguida, recorde a quem partilhou as boas notícias que o leitor
testemunhou, ativamente, o processo que levou a esse desfecho. Talvez
tenha visto quanto essa pessoa trabalhou para se preparar para aquela
entrevista de emprego, as semanas que estudou para o exame ou quanto
desejava aquele resultado.
E, acima de tudo, mostre o seu otimismo sobre como estas boas notícias
podem moldar o futuro dela (sem sobrecarregar o outro com grandes
expectativas). Se alguém acabou de conseguir o emprego dos seus sonhos,
partilhe como está entusiasmado com as oportunidades que terá pela frente.
Se alguém acabou de largar um emprego para começar o seu próprio
negócio, partilhe como está entusiasmado com as suas futuras conquistas.

A sobrecomunicação não irá apenas inspirar o outro. Irá


inspirá-lo a si também.

A cada passo, tente tornar a sua sobrecomunicação sobre o que é bom


tão positiva e edificante quanto possível. A sobrecomunicação não irá
apenas inspirar o outro. Irá inspirá-lo a si também.

EXPERIÊNCIA 6:

Sobrecomunicar o menos bom

Para realmente aproveitar os efeitos de satisfação de outras pessoas, não


precisamos apenas de comunicar boas notícias; temos também de aprender
a comunicar más notícias. Infelizmente, nem sempre somos muito bons
nisso.
O problema é que nós, humanos, somos demasiado bons a mentir. Não
só mentimos diariamente como mentimos a cada hora. De acordo com um
estudo de 2002 conduzido pelo psicólogo Robert Feldman, da Universidade
de Massachusetts, 60 por cento das pessoas mentem pelo menos uma vez
numa conversa típica de dez minutos.50
Nem todas as mentiras são criadas da mesma forma, naturalmente. A
maioria das mentiras são triviais e contadas com boas intenções — como
dizer a um amigo que adora as novas sapatilhas dele quando estas não
combinam com o seu estilo ou garantir à sua mãe que o frango assado não
está seco de todo.
Mas há uma desvantagem. Mentir — mesmo mentir com boas intenções
— tem um efeito fisiológico. Mentir está associado à ativação do sistema
límbico, a mesma área do cérebro que inicia a reação de lutar ou fugir.
Quando somos honestos, esta área do cérebro apresenta atividade mínima;
ao contar uma mentira, acende como fogo de artifício.
A razão para tanta mentira é que a honestidade, muitas vezes, parece
uma situação em que todos perdem. Perdemos se formos muito honestos
porque parecemos uns cretinos. Mas também perdemos se não formos
honestos, porque ficamos ressentidos por estarmos presos numa situação
com a qual não nos sentimos bem. Isto é complicado para quem adotou a
máxima da sobrecomunicação: temos de comunicar as coisas más sem
mentir desnecessariamente. Há alguma forma?
De acordo com a autora e CEO coach Kim Scott, a solução não é ser
honesto, mas sincero.51 No seu livro Radical Candor, Scott escreve que ser
radicalmente sincero significa importar-se pessoalmente (ou seja,
preocupar-se genuinamente com a pessoa com quem está a falar), ao mesmo
tempo que desafia diretamente o problema em questão. Ser radicalmente
sincero não significa tornar o assunto pessoal, não significa presumir que
sabe o que é melhor e não significa dizer o que lhe vem à cabeça. Significa,
sim, partilhar as suas opiniões diretamente, não falar mal das pessoas pelas
costas e dar aos seus colegas de trabalho uma ideia do que está a acontecer
na sua cabeça.
Escolher a palavra «sincero» em vez de «honesto» traz alguns
benefícios. Ser honesto implica que sabe a verdade. Muitas vezes, tem uma
conotação moral que pode desanimar as pessoas (a recordação do meu
amigo da escola James a insultar os meus truques de cartas com um
irreverente «Estou apenas a ser honesto, meu» assombra-me até hoje).
Quando dizemos: «Vou ser sincero contigo», é quase como se estivéssemos
a dizer «Esta é a verdade, e vou dizer-te qual é». Mas quando se trata de
dinâmica interpessoal, a verdade muitas vezes não é clara. O seu chefe pode
parecer-lhe um drenador, mas pode não ser verdade que essa pessoa seja um
chefe objetivamente mau. Pelo que sabemos, pode ser um bom chefe para
outras pessoas ou talvez esteja a passar por algo na sua vida pessoal que o
afete no trabalho.
Por outro lado, ser sincero não pressupõe que sabemos a verdade. O
espírito de ser sincero é mais parecido com: «Aqui está o que eu penso.
Podes ouvir-me ou ajudar-me? Podemos fazer isto juntos.»
Então, como podemos todos aprender a criar uma cultura de feedback
sincero, que forneça feedback negativo sem arruinar o dia de ninguém?
Bem, há alguns passos a seguir. Primeiro, baseie a sua análise em termos
objetivos e sem julgamentos. «Notei que interrompeu a Hermione algumas
vezes na reunião» é muito mais eficaz do que «Foi incrivelmente rude». Da
mesma forma, dizer «Está errado» ou «É incompetente» fará que essa
pessoa se sinta atacada e fique na defensiva — e é sempre subjetivo (para
não dizer, também um pouco rude). Limite-se aos factos.
Em segundo lugar, concentre-se nos resultados tangíveis do que correu
mal. Novamente, a subjetividade é sua inimiga. Por isso, simplesmente
destaque, factualmente, a consequência do que observou. Por exemplo:
«Notei que depois de ter interrompido o Ron na reunião, a troca de ideias
abrandou. É uma pena, porque eu realmente gostaria de ouvir o que os
outros tinham a dizer.»
Por fim, desvie a sua atenção do problema e direcione-a para a solução.
Forneça alternativas do que gostaria que acontecesse. Por exemplo: «Da
próxima vez, espere até que os outros terminem de falar antes de partilhar
as suas ideias». Ou: «Da próxima vez, talvez possa fazer perguntas aos
outros para mostrar que está interessado na opinião deles, mas pode não
concordar com eles. Sinto que fazer perguntas pode provocar uma melhor
reação da parte deles e, talvez, levar à colaboração.» Oferecer alternativas
concentra a discussão em possíveis soluções para o problema e ajuda a
outra pessoa a evitar sentir-se pessoalmente criticada.
Estas três etapas são uma forma simples de facilitar um pouco a
sobrecomunicação de notícias desagradáveis. Todas elas sugerem a noção
de que é possível unir as pessoas e fazê-las sentirem-se bem, mesmo
quando se dá más notícias. Sem uma mentira à vista.

RESUMINDO

• A vida é mais divertida com os amigos por perto. É por isso


que o nosso terceiro energizante são as pessoas. Há
algumas pessoas que aumentam naturalmente a nossa
energia — o truque é encontrá-las.
• Isso começa quando se torna um jogador de equipa. Tente
tratar as pessoas com quem trabalha como camaradas, e
não como adversários.
Construir conexões com as pessoas também significa
• ajudá-las. Isto funciona nos dois sentidos; não só raramente
ajudamos os outros como também raramente pedimos
ajuda. Então, questione: O que posso fazer para alegrar o
dia de outra pessoa?
• Por fim, lembre-se da verdade mais esquecida sobre a
interação humana: quando pensa que comunicou de mais,
provavelmente não comunicou o suficiente. Existe alguma
informação que está a guardar que possa melhorar a
semana de outra pessoa?
40 «Relational Energy: what it is and why it matters to organisations». The Oxford Review.
Disponível online: https://oxford-review.com/oxford-review-encyclopaedia-terms/relational-energy-
what-it-is-and-why-it-matters-to-organisations/
41 Cross, R., Baker, W., e Parker A. (2003). «What creates energy in organizations?». MIT Sloan
Management Review, 44(4), 51–56.
42 Carr, P. B., e Walton, G. M. (2014). «Cues of working together fuel intrinsic motivation». Journal
of Experimental Social Psychology, 53, 169–184.
43 Good, A., Choma, B., e Russo, F. A. (2017). «Movement synchrony influences intergroup
relations in a minimal groups paradigm». Basic and Applied Social Psychology, 39(4), 231–238.
44 Luks, A., e Payne, P. (2001). The Healing Power of Doing Good. iUniverse. Indiana.
45 «The Electric Ben Franklin». US History. Disponível online:
https://www.ushistory.org/franklin/autobiography/page48.htm
46 Flynn, F. J., e Lake, V. K. B. (2008). «If you need help, just ask: underestimating compliance with
direct requests for help». Journal of Personality and Social Psychology, 95(1), 128–143.
47 Roghanizad M. M., e Bohns V. K. (2017). «Ask in person: you’re less persuasive than you think
over email». Journal of Experimental Social Psychology, 69, 223–226.
48 Gable, S. L., e Reis, H. T. (2010). «Good news! Capitalizing on positive events in an interpersonal
context». Advances in Experimental Social Psychology, 42, 195–257.
49 Gable, S. L., Gonzaga, G. C., e Strachman, A. (2006). «Will you be there for me when things go
right? Supportive responses to positive event disclosures». Journal of Personality and Social
Psychology, 91(5), 904–917.
50 Feldman, R. S., Forrest, J. A., e Happ, B. R. (2002). «Self-presentation and verbal deception: do
self-presenters lie more?». Basic and Applied Social Psychology, 24(2), 163–170.
51 Scott, K. (2019). Radical Candor: Be a Kick-Ass Boss Without Losing Your Humanity. St.
Martin’s Press. Nova Iorque.
SEGUNDA PARTE

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CAPÍTULO 4

BUSCAR CLAREZA

Um dos vídeos mais estranhos que já vi intitula-se «Quanto deseja isso?»52.


Foi visto quase 50 milhões de vezes.
O vídeo conta a história de um jovem que procura um «guru» não
especificado e pede conselhos sobre como ficar rico. No dia seguinte,
combinam encontrar-se na praia para que o guru lhe responda.
Às 4 horas da manhã, o homem chega à beira-mar. «Caminhe pela
água», diz o guru. O jovem assim faz. «Caminhe um pouco mais», diz o
guru. O rapaz obedece. «Continue a caminhar», insiste o guru. Ele continua
a caminhar até que a sua cabeça fica completamente submersa. De repente,
o guru está ao lado do jovem, mantendo a sua cabeça abaixo da superfície.
O jovem debate-se violentamente, mas o velho segura-o, soltando-o apenas
quando está prestes a afogar-se. Enquanto o jovem arqueja com falta de ar,
o velho diz: «Quando desejar ter sucesso tanto quanto deseja respirar, então
terá sucesso.»
Há muita coisa a acontecer neste vídeo. Quem realmente é o guru (e
como é que, ao certo, conseguiu essa designação)? Porque é que o jovem
está tão disposto a entrar no mar a pedido do dito guru? Afinal, não
acabaram de se conhecer? O mais peculiar de tudo é o motivo por que há 20
mil comentários abaixo do vídeo, nos quais as pessoas dizem que ele
mudou completamente as suas vidas.
Hoje em dia, acho o vídeo surreal e um tanto deprimente. Mas, a
primeira vez que assisti, estava a passar por um ataque de procrastinação
debilitante e pensei que poderia ajudar. Quando lancei o meu negócio,
enquanto trabalhava como médico em início de carreira, parecia que, por
mais que tentasse, não conseguia libertar-me do ciclo de adiar as coisas e
lutar para recuperar o atraso. Eu não estava sozinho; a procrastinação
atormentou mentes muito maiores do que a minha. Veja Leonardo da Vinci.
Um contemporâneo que o viu pintar A Última Ceia escreveu que «ele
passava dois, três ou quatro dias sem tocar no pincel, mas demorava várias
horas por dia diante da obra, com os braços cruzados, a estudar e criticar as
figuras para si mesmo».
Nestes momentos, os três energizantes — brincar, poder e pessoas —
não são suficientes. Na Primeira Parte, explorámos como estas três forças
podem ajudar-nos a sentirmo-nos bem no trabalho e na vida, aumentando a
nossa energia e permitindo-nos fazer mais daquilo que é importante para
nós. Mas, por si só, não são a história completa. À medida que o meu
negócio crescia, percebi que, por mais que integrasse os energizantes na
minha vida, ainda podia ficar preso por causa da procrastinação.
Quando a procrastinação é um problema para mim, muitas vezes fico
tentado a recorrer a «truques» óbvios, como o daquele vídeo estranho. Se
está a procrastinar, diz o vídeo, é porque não está suficientemente motivado.
E, se tivesse motivação suficiente, se quisesse ter sucesso tanto quanto
queria respirar, ele aconteceria.
Chamo a esta solução para a procrastinação «método da motivação». É
muito comum. E é um absurdo total.
O problema com o método da motivação é muito simples. Muitos de
nós realmente querem fazer as coisas contra as quais lutamos. Sentimos que
temos motivação suficiente, mas existem barreiras que se interpõem no
nosso caminho — restrições de tempo e financeiras, responsabilidades
familiares, problemas de saúde física e mental, entre inúmeras outras coisas.
A motivação claramente não é suficiente. E dizer às pessoas para
simplesmente «se sentirem mais motivadas» não é apenas inútil, é
potencialmente prejudicial, contribuindo para a sensação de paralisia que
causou a procrastinação logo à partida.
Então, quando a motivação falha, para onde nos voltamos? Quando não
estamos obcecados com se estamos realmente motivados, muitos conselhos
recorrem a outro princípio: disciplina. Simplificando, disciplina é quando
fazemos coisas que não temos vontade de fazer. É o oposto da motivação; é
agir apesar de quão desmotivado está. Se estiver a tentar correr, uma
resposta motivada seria: «Tenho vontade de correr, porque quero vencer a
maratona mais do que quero descansar hoje.» Uma resposta disciplinada
seria: «Vou correr, independentemente de como me sinto a respeito disso.»
Esta é a doutrina da Nike para fazer as coisas — «Just do it» (Apenas faça).
Simpatizo um pouco mais com o método da disciplina do que com o
método da motivação. A disciplina pode ser útil. Às vezes, não tenho
vontade de ir trabalhar de manhã, mas vou de qualquer maneira. Talvez isso
seja disciplina.
Mas esta narrativa está incompleta. Se anda a adiar a redação de um
discurso planeado, isso não significa, necessariamente, que não seja
disciplinado o suficiente para se preparar para ele. Pode haver algo mais a
acontecer sob a superfície que o está a impedir, e a narrativa da disciplina
não se importa com o que seja. Isso só o faz sentir-se mal consigo mesmo.
Nas palavras do professor de Psicologia Joseph Ferrari53, «dizer ao
procrastinador crónico apenas faça seria como dizer a uma pessoa com
depressão clínica anime-se».
Motivação e disciplina são estratégias úteis, mas são pensos que cobrem
feridas mais profundas. Às vezes, podem funcionar para tratar os sintomas,
mas não alteram a condição subjacente.
Então, o que funciona na velha luta contra a procrastinação? É aqui que
entra a nossa terceira abordagem. Eu chamo-lhe «método do desbloqueio».
Embora o método da motivação nos aconselhe a ter vontade de fazer as
coisas, e o método da disciplina nos aconselhe a ignorar como nos sentimos
e a fazê-las de qualquer maneira, o método do desbloqueio incentiva-nos a
entender, logo à partida, por que motivo nos sentimos mal em relação ao
trabalho, e a enfrentar o problema.

O método do desbloqueio incentiva-nos a entender, logo


à partida, por que motivo nos sentimos mal em relação
ao trabalho.

Imagine que tem uma pedra no sapato que torna a corrida


particularmente dolorosa, mas tem de correr até casa do seu amigo a tempo
do jantar. Está dividido; quer chegar a horas, mas sabe que embarcar nessa
jornada vai doer. O que faz?
A primeira solução é a mais fácil. Não faz nada. Procrastina até que a
noite tenha sido desperdiçada. Perde o seu jantar e não será convidado
numa próxima vez.
A próxima solução baseia-se no método da motivação. Isso envolveria
convencer-se de que o jantar será emocionante e de que «vale a pena» a dor
de correr. Ignora a dor enquanto corre em direção ao seu destino, apenas
para cair na beira da estrada a meio do caminho. Mas não o preocupa ver
que o seu pé incha rapidamente. Afinal, quando estiver suficientemente
motivado, será capaz de superar qualquer obstáculo.
A terceira é o método da disciplina. Comprometeu-se com o jantar e é o
tipo de pessoa que mantém a sua palavra. Então, corre para casa do seu
amigo, com a pedra a ferir a delicada pele do seu pé e — espante-se —
consegue! Infelizmente, o jantar não pode acontecer porque o seu amigo
tem de o levar ao hospital por conta do seu pé em carne viva. «Disciplina é
liberdade», recita para si mesmo enquanto espera o atendimento médico.
Eu sugeriria, cuidadosamente, que as três soluções estão erradas. A
quarta (e melhor) solução envolve um pouco mais de pensamento crítico. E
se parasse um minuto para pensar: «Porque parece tão difícil chegar a casa
do meu amigo?» Tiraria o sapato, encontraria a pedra e removê-la-ia. E
então corria.
Este é o «método do desbloqueio» — e é o foco dos próximos três
capítulos. Aprenderemos que, normalmente, a procrastinação é causada por
sentimentos negativos — o inverso dos energizantes de satisfação que
encontrámos na Primeira Parte. Quando sentimentos negativos como
confusão, medo e inércia se interpõem no nosso caminho, adiamos as
coisas. Isso conduz a ainda mais maus sentimentos e, por sua vez, ainda
mais procrastinação. É um ciclo negativo de mau humor e estagnação.
Felizmente, o poder dos três bloqueadores emocionais pode ser
reduzido. Nas páginas seguintes, exploraremos como é que, ao certo, estes
sentimentos negativos nos afetam e esgotam a nossa energia. E usaremos a
ciência da produtividade Feel-Good para superar, estrategicamente, cada
um deles.

A NÉVOA DA INCERTEZA

O primeiro bloqueador para a produtividade Feel-Good é o mais simples,


mas também um dos mais difíceis de perceber. É tão comum que nem
notamos que está lá.
Imagine-se a conduzir numa noite de nevoeiro. Está a semicerrar os
olhos para ver a estrada à frente. Liga os máximos, mas o nevoeiro
simplesmente não está a dissipar-se. Por fim, percebe que precisa de parar,
pois o nevoeiro é debilitante.
Isto é um pouco como a sensação de procrastinar. Muitas vezes, a razão
pela qual não começamos é porque não sabemos o que deveríamos estar a
fazer — um nevoeiro misterioso instalou-se ao nosso redor. Chamo isso de
névoa da incerteza.
Este é um fenómeno bem estudado; algo a que os cientistas chamam
«paralisia da incerteza». Acontece quando ficamos oprimidos pelo
desconhecido ou pela complexidade de uma situação, levando à
incapacidade de agir. Essa paralisia impede-nos de avançar em tarefas,
projetos ou decisões. Atrapalha sentirmo-nos bem e a capacidade de fazer
as coisas.
A incerteza faz-nos sentir mal e, portanto, alcançar menos. Os seres
humanos têm uma aversão inata ao que desconhecem. Naturalmente
preferimos a previsibilidade e a estabilidade, que é o que nos permite ser
decisivos e eficazes. Mas, ao mesmo tempo, alguns de nós lidam melhor
com a incerteza do que outros. Psicólogos e psiquiatras medem isto usando
algo chamado «escala de intolerância à incerteza54». Desenvolvida por
Michel Dugas e pelos seus colegas na década de 1990, esta escala consiste
numa série de declarações que expressam tolerância à incerteza. Uma
afirmação diz: «Não saber antecipadamente o que vai acontecer é, muitas
vezes, inaceitável para mim.» Para medir quão tolerante se é à incerteza, os
psicólogos analisam até que ponto se concorda com cada afirmação e
agregam as suas respostas para criar uma pontuação geral.
A escala de intolerância à incerteza oferece a primeira dica sobre como
e porquê a incerteza leva à procrastinação. Pessoas com baixa tolerância à
incerteza tendem a ver situações incertas como ameaçadoras e provocadoras
de ansiedade, levando-as a adiar as coisas — especialmente em tarefas que
envolvam qualquer ambiguidade. Porquê? Bem, de acordo com um estudo
sobre a relação entre ansiedade e incerteza55, há vários processos que
reforçam o ciclo entre incerteza, ansiedade e paralisia.

1. Sobrestimamos o que está em jogo. Alguém que já é ansioso


pensará que o acontecimento incerto será pior do que já é.
2. Tornamo-nos hipervigilantes. Sentindo que algo negativo pode
acontecer, as nossas antenas de segurança ficam atentas ao sinal de
qualquer perigo potencial.
3. Deixamos de reconhecer sinais de segurança. Como estamos
hipervigilantes às ameaças, não conseguimos acalmar-nos quando
realmente não há perigo.
4. Tornamo-nos defensivos. Os nossos cérebros incentivam-nos a
adotar estratégias de evitação comportamental e cognitiva, para nos
tirar de lá o mais rápido possível.

Qualquer pessoa que já procrastinou reconhecerá pelo menos alguns


destes fatores. Considere uma fonte comum de incerteza, como a escolha de
uma carreira. Suponha que tem um emprego estável, mas está a pensar em
demitir-se por uma carreira menos estável, mas potencialmente mais
gratificante. A incerteza em torno do caminho menos estável pode
desencadear este processo da seguinte forma:

1. Sobrestimação. Sobrestima as consequências negativas de escolher


a carreira «errada», como, por exemplo, não ganhar dinheiro
suficiente.
2. Hipervigilância. Fica excessivamente atento aos sinais que podem
indicar o sucesso ou o fracasso de uma determinada escolha de
carreira, como estatísticas que sugerem que muitas pessoas se
arrependem de ter mudado de emprego.
3. Não reconhecimento. Para de identificar os fatores que
contribuiriam para um resultado bem-sucedido, como fazer
pesquisas sobre a empresa a que está a pensar juntar-se.
4. Evitação. Decide adiar completamente esta decisão de carreira —
afinal, pode não ser assim tão mau aguentar mais um ano no seu
atual emprego.

O resultado: experimenta reações emocionais intensas, como ansiedade


ou medo — e isso faz com que procrastine ainda mais a tomada de uma
decisão de carreira. Sente-se pior e, portanto, faz menos.
A maioria das pessoas já passou por lutas deste tipo. Mas a boa notícia é
que o ciclo pode ser quebrado, e a névoa da incerteza eliminada.
É uma simples questão de fazer as perguntas certas. Depois de
respondidas, o caminho a seguir torna-se muito mais claro.

PERGUNTE «PORQUÊ?»

A principal forma pela qual a incerteza impulsiona a procrastinação é


criando ambiguidade sobre o nosso propósito final. Se não sabemos por que
motivo estamos a embarcar num determinado projeto, é quase impossível
prosseguir com ele.
Esta, pelo menos, é a conclusão a que o Exército dos Estados Unidos
chegou em 1982 — o ano em que o Exército do país publicou uma versão
atualizada do seu Manual de Campanha 100-5, Operações, o principal guia
militar de «Como Combater». O manual delineou aos oficiais os métodos
com maior probabilidade de lhes trazer sucesso no campo de batalha. No
seu cerne estava um novo conceito — «intenção do comandante».
A intenção do comandante está enraizada na tradição militar alemã, que
remonta ao exército prussiano do final do século XIX. Os estrategistas
militares alemães perceberam que nenhum plano de batalha poderia prever
as realidades caóticas da guerra. «Nenhum plano sobrevive ao primeiro
contacto com o inimigo», como disse o marechal de campo Moltke, o Velho
— para ser preciso, este disse: «Nenhum plano de operações se estende com
certeza além do primeiro encontro com a força principal do inimigo.» Mas
isso não fica no ouvido!
Assim, em vez de ficarem obcecados com cada passo que os seus
soldados poderiam dar no campo de batalha, os oficiais alemães adotaram o
conceito de Auftragstaktik56 — táticas de missão —, uma filosofia que dava
prioridade a uma noção clara do porquê em detrimento de uma noção
excessivamente detalhada do como. A intenção do comandante, conforme
descrita no Manual de Campanha, consiste em três componentes cruciais,
todos desenvolvidos em torno do objetivo básico da missão:

1. O propósito da operação.
2. O estado final que o comandante pretendia.
3. As principais tarefas que o comandante considerou deverem ser
realizadas para atingir o objetivo.

A intenção do comandante sugeria que o objetivo dos generais é


responder apenas às questões do mais alto nível do tipo «porquê»:
identificar o objetivo por trás da operação e, no limite, esboçar vagamente o
tipo de fases que poderiam ser necessárias. As tropas tiveram, então,
flexibilidade para adaptar as suas decisões às novas circunstâncias na frente.
Esta abordagem transcende o campo de batalha. Compreender a
intenção do comandante pode ajudar a dissipar a névoa da incerteza,
identificando o propósito por trás do que está a fazer. Isso esclarece o
«porquê».

EXPERIÊNCIA 1:

Usar a intenção do comandante

Como podemos aproveitar a intenção do comandante nas nossas vidas? A


primeira resposta é ilustrada pelos acontecimentos de 6 de junho de 1944 no
Norte de França, mais conhecido como Dia D.
A invasão aliada da França ocupada tinha sido intrinsecamente
planeada. No primeiro assalto, 133 mil soldados deveriam desembarcar em
locais muito precisos nas praias da Normandia. Seriam apoiados por
regimentos de paraquedas, que deveriam pousar em cidades e vilarejos
específicos, libertá-los dos nazis e proteger pontes e estradas importantes.
Mas, desde a hora H, muita coisa correu mal.
Pouco depois de os paraquedistas atingirem o solo, a maioria descobriu
que aterrara no local errado. Nas horas seguintes, tornar-se-ia ainda mais
evidente que muitos regimentos se tinham misturado inexplicavelmente
durante a noite — os homens não tinham desembarcado ao lado das
unidades que conheciam e em que confiavam. Em vez disso, lutavam ao
lado de soldados com quem nunca tinham falado antes. Foi, nas palavras do
escritor de estratégia Chad Storlie, «um desastre militar»57.
Milagrosamente, em poucas horas, o Dia D voltou aos trilhos. Os
Aliados não tomaram as vilas que esperavam, mas algumas que cumpriam
os seus objetivos estratégicos. E as tropas que desembarcaram nas praias da
Normandia conseguiram avançar para o interior, conforme planeado.
Toda a saga foi uma vitória da intenção do comandante. As ordens
detalhadas dos generais militares não funcionaram. Os planos específicos
que eles traçaram correram mal. Mas porque comunicaram a intenção do
comandante, todos os envolvidos na operação sabiam o propósito. O
«porquê» era claro, e isso tornou possível elaborar um «como» alternativo.
Agora, aplico este conhecimento à minha vida todos os dias.
Anteriormente, quando embarcava num projeto, o meu instinto era seguir
em frente imediatamente, planeando cada passo, sem realmente pensar no
resultado final desejado. Mas este nível de planeamento obsessivo pode
revelar-se um obstáculo. Ficava tão concentrado em concluir tarefas
específicas que perdia a noção de qual era o objetivo final. Portanto, agora,
antes de embarcar num novo projeto, faço a primeira pergunta de intenção
do comandante: «Qual é o propósito por trás disto?» E construo a minha
lista de tarefas a partir daí.
Descobri que fazer esta pergunta simples pode ter um efeito notável.
Durante anos, não consegui atingir o meu objetivo de «abdominais
definidos». Todos os meses de janeiro, entusiasmava-me por ir ao ginásio.
Porém, algumas semanas depois, a motivação diminuía, e eu voltava à
estaca zero.
Quando apliquei o conceito de intenção do comandante, percebi que era
porque entendia o propósito — o grande «porquê» — de forma
completamente errada. Na verdade, eu não queria abdominais definidos; o
meu verdadeiro objetivo era manter um físico e um estilo de vida saudáveis
e equilibrados. Sim, havia alguma motivação estética, mas era
insignificante em comparação com o desejo de ser saudável e estar em
forma.
Pode aplicar esta abordagem a quase todas as questões. Aprenda
Francês. Pergunte a si mesmo: Qual é o propósito? Está a tentar entender os
complexos romances realistas do século XIX? Ou apenas a tentar sobreviver
à sua próxima visita a Paris? A seguir, analise que implicações isso tem
para o processo. Como vai aprender a língua — vai usar a aplicação
Duolingo, fazer um curso ou apenas assistir a imensos filmes franceses da
década de 1950?
Da mesma forma, digamos que quer abrir um negócio. Qual é o
propósito final? Está a tentar ganhar algum dinheiro extra por mês para
poder ir de férias? Ou almeja uma saída multimilionária para poder
reformar-se mais cedo? Ou está a construir algo que acha que ajudará as
pessoas e mudará vidas? Agora, pense no que isso significa para as suas
próximas etapas. Precisa de deixar completamente o seu emprego ou apenas
reservar algumas horas à noite? Seria melhor apressar-se na criação do
negócio ou primeiro tem de desenvolver as suas competências?

EXPERIÊNCIA 2:

Os cinco porquês

Precisa de se lembrar deste grande «porquê» todos os dias e a toda a hora.


Cada e-mail que envia, cada reunião que realiza, cada conversa durante um
café… em pequenas e grandes dimensões, devem aproximá-lo de realizar
esse propósito final.
No entanto, nem sempre é fácil. Já reparou que, a meio de um projeto,
fica tão detido em prazos curtos e em pequenas tarefas irritantes que perde o
controlo do seu objetivo final? Como redescobri enquanto escrevia este
livro, pode passar meses, ou até anos, a concentrar-se em tarefas
irrelevantes, mas urgentes, sendo o seu objetivo final (concluir um
manuscrito, por exemplo) vergonhosamente negligenciado.
Então, como podemos garantir que o nosso maior «porquê» esteja no
centro de todas as nossas escolhas? Uma sugestão vem das linhas de
produção do Japão do início do século XX. No Ocidente, Sakichi Toyoda é
mais conhecido por fundar a empresa que tem o seu nome: Toyota. Mas, no
Japão, ele tem uma reputação ainda mais elevada: primeiro, como o homem
que revolucionou a indústria têxtil do país no final do século XIX; e,
segundo, como o pai da revolução industrial japonesa.
Acima de tudo, Toyoda é famoso pelo seu foco obsessivo na eliminação
de erros nas suas fábricas, garantindo que todos estejam concentrados nas
coisas que importam. Toyoda sempre odiou o uso indevido de tempo e
recursos: primeiro ganhou fama ao projetar um tear manual que parava
automaticamente quando um fio se rompia, evitando o desperdício de mais
tecido. Esta ênfase na eliminação de desperdícios levou-o a desenvolver um
método, agora famoso, denominado «cinco porquês».
Na sua forma original, os cinco porquês ofereciam um método simples
para descobrir porque é que algo correu mal. Sempre que ocorria um erro
na linha de produção, a equipa da Toyota perguntava «porquê» cinco vezes.
Digamos que havia uma peça de maquinaria partida. Porquê? A
primeira resposta levá-los-ia à causa imediata. «Porque há um pedaço de
tecido preso no tear.» O próximo iria aprofundar um pouco mais. Porquê?
«Porque estavam todos um pouco cansados e não prestaram atenção.» No
quinto porquê, os funcionários teriam alcançado a verdadeira origem do
problema. «Porque, atualmente, o ambiente está péssimo, visto que o chefe
é um verdadeiro pesadelo.»
A minha variação no método de Toyoda é usar os cinco porquês não
apenas para explicar erros mas para determinar, logo à partida, se vale a
pena realizar uma tarefa. Sempre que alguém da minha equipa sugere que
embarquemos num novo projeto, pergunto «porquê» cinco vezes. A
primeira resposta geralmente está relacionada com a conclusão de um
objetivo de curto prazo. Mas, se valer mesmo a pena, todos esses porquês
deverão levá-lo de volta ao seu propósito final, conforme estabelecido na
sua intenção do comandante. Se isso não acontecer, provavelmente não se
deve incomodar com o projeto.
Acho este método útil para manter a minha atenção e a da minha equipa
no que é importante. Perguntar «porquê» repetidamente recorda-nos aquilo
em que realmente devíamos focar-nos — e permite-nos concentrar nisso.
De repente, essas tarefas urgentes e irrelevantes parecem menos
importantes. O maior propósito — o grande «porquê» — ganha destaque.

PERGUNTE «O QUÊ?»
Depois de identificar o seu «porquê», precisará de convertê-lo em algo um
pouco mais concreto. Afinal, um nebuloso sentido de propósito não é
suficiente para fazer um projeto descolar; também precisa de um plano de
ação detalhado, para saber por onde começar.
Mas identificar o que, na prática, deveria fazer, nem sempre é simples.
Veja um exemplo: A relação profissional entre Jim e o seu novo chefe,
Charles, não corria bem. Independentemente do que Jim fizesse, Charles
via-o como preguiçoso, pouco sério e insuficientemente profissional.
Simplesmente não conseguia causar uma boa impressão.
Certa manhã, Charles pediu a Jim que lhe disponibilizasse uma
«súmula» dos seus clientes. Infelizmente, Jim não fazia ideia do que era
uma súmula. Durante o resto do dia, Jim vagou pelo escritório tentando de
alguma forma descobrir o que lhe tinha sido pedido, sem admitir isso a
Charles. No final do dia, Jim não tinha nada. Entrou no escritório de
Charles, sentou-se e, por fim, completamente resignado com a reação do
chefe, perguntou: «O que é uma súmula?»
Estou a contar, claro, o enredo do episódio 23 da 5.ª temporada da
versão americana de The Office. É um dos mais vistos de sempre porque
retrata os horrores quotidianos do local de trabalho moderno com uma
precisão hilária: microgestão de chefes, políticas de escritório e, acima de
tudo, aquela perceção esmagadora de que não faz a mais pequena ideia do
que envolve a tarefa que tem pela frente.
Isto é o que quero dizer com incerteza sobre «o quê». Imagine que é um
estudante a tentar compreender uma tarefa, um funcionário confuso com
instruções vagas do seu chefe ou talvez esteja a tentar iniciar um projeto
pessoal, como aprender a tocar guitarra, mas não sabe por onde começar.
Em cada um desses cenários, a incerteza sobre o que exatamente deveria
estar a fazer pode funcionar como uma barreira assustadora até para
começar, uma barreira que esgota a sua energia e o deixa a sentir-se exausto
antes mesmo de começar.
A solução? Transformar o seu propósito abstrato num conjunto de metas
e ações concretas. Passar do «porquê» a «o quê».

EXPERIÊNCIA 3:

Metas NICE
O primeiro passo para transformar o seu propósito num plano envolve o
estabelecimento de metas. Deve saber qual é o seu «porquê» fundamental;
mas, sem um objetivo final claro, terá dificuldade em descobrir como
chegar lá.
Mas o estabelecimento de metas pode ser complicado. É claro que todos
concordam que as metas são importantes. O problema é que ninguém
consegue concordar sobre a forma que devem assumir.
Em 1981, George T. Doran, consultor e ex-diretor de planeamento
corporativo da Washington Water Power Company, introduziu o conceito de
metas SMART numa edição da Management Review. A sigla tem o
significado de Specific, Measurable, Assignable, Relevant, Time-related
(em português, Específico, Mensurável, Designável, Relevante, Datada) —
uma fórmula simples e memorizável que rapidamente ganhou força nos
círculos de gestão e desenvolvimento pessoal. Com o passar dos anos,
inúmeras outras siglas abordaram esta questão, cada uma com a sua
peculiaridade sobre o que torna uma meta eficaz. Estas combinações
incluíam FOCUSED (Flexible, Observable, Consistent, Universal, Simple,
Explicit, Directed — em português: Flexível, Observável, Consistente,
Universal, Simples, Explícito, Dirigido), HARD (Heartfelt, Animated,
Required, Difficult — em português: Sincero, Animado, Obrigatório,
Difícil) e até BANANA (Balanced, Absurd, Not Attainable, Nutty,
Ambitious — em português: Equilibrado, Absurdo, Inatingível, Maluco,
Ambicioso), para citar apenas alguns. (OK, confesso, inventei a última.)
Todas estas siglas têm algo em comum. Primeiro, enfatizam a
importância de cada objetivo ser claro e quantificável. Quer sejam
«específicos» ou «explícitos», os seus objetivos devem ser fáceis de
acompanhar e verificar. Em segundo lugar, são muito focados nos
resultados: a função de palavras como «mensurável» e «observável» é
permitir dizer, objetivamente, quando atingiu o estado final desejado.

Metas NICE58
Portanto, seria uma pena se a definição de objetivos altamente
verificáveis e orientados para os resultados acabasse por ser ineficaz. Às
vezes, metas deste tipo acabam por ser um obstáculo à produtividade, e não
a chave para ela.
Infelizmente, é precisamente isso que uma nova onda de pesquisas
parece indicar. Estudos descobriram que, embora metas específicas e
desafiadoras59 possam aumentar o desempenho de certos tipos de pessoas e
tarefas, também podem ter consequências negativas não intencionais.
Não queria acreditar quando encontrei este argumento pela primeira
vez. Passei anos a definir metas SMART. De repente, dizem-me que elas
não são tão úteis como todos me garantiram.
Mas a ciência está cada vez mais clara. Um problema é a visão limitada:
quando nos concentramos excessivamente em alcançar um objetivo final
muito específico, podemos perder de vista outros fatores-chave, como
permanecer fiéis aos nossos valores. Mas o maior problema é o efeito que
têm na nossa motivação: se ficarmos obcecados com uma meta, perdemos a
noção do prazer intrínseco que pode advir de uma tarefa. Em 2009,
investigadores das Universidades Harvard, Northwestern60, da Pensilvânia
e do Arizona colaboraram num artigo intitulado «Metas enlouquecidas: os
efeitos secundários sistemáticos da prescrição excessiva de metas».
Descrevem o estabelecimento de metas como um processo viciante e
corrosivo, um «medicamento com receita médica» que não deve ser
considerado um «tratamento benigno e de venda livre para a motivação».
Não estou a sugerir que todo o estabelecimento de metas seja mau ou
que metas SMART, ou adjacentes a SMART, não sejam eficazes.
Certamente funcionam para motivar o desempenho de certo tipo de pessoas
e para determinadas tarefas. Mas têm os seus efeitos secundários
prejudiciais. E, se luta contra a procrastinação, poderá beneficiar de uma
abordagem alternativa.
O meu método preferido não envolve a fixação num resultado ou
destino externo, mas, em vez disso, enfatiza a jornada da satisfação. É
baseado naquilo a que chamo metas NICE.

• Curto prazo: As metas de curto prazo garantem que estamos a


concentrar-nos nos passos imediatos que temos de dar ao longo da
nossa jornada. Ajudam-nos a evitar ficarmos sobrecarregados com o
panorama geral. Acredito que um objetivo diário ou semanal é o
limite de tempo mais útil.
• Baseado em informações: As metas baseadas em informações
enfatizam o processo, em vez de um objetivo final distante e
abstrato. Enquanto uma meta baseada em resultados se concentraria
no resultado final — «Perder cinco quilos até ao final do ano»,
«Chegar à lista dos mais vendidos com o meu livro» —, uma meta
baseada em informações concentra-se no que podemos fazer aqui e
agora — «Fazer uma caminhada de dez minutos todos os dias»,
«Escrever cem palavras todas as manhãs para o meu romance».
• Controlável: Queremos focar em metas que estão sob o nosso
controlo. «Gastar oito horas por dia no meu romance»
provavelmente não é algo que possa realmente fazer, uma vez que
muitos fatores externos teriam de se unir para que tal esforço fosse
possível. Definir uma meta mais genuinamente controlável (como
guardar vinte minutos por dia a uma tarefa) é muito mais realista.
• Energizante: Já discutimos muitos princípios e estratégias para
tornar os nossos projetos e tarefas mais energizantes. Existe uma
maneira de integrar diversão, poder e pessoas nas metas que
estabeleceu?

Pode até querer usar uma meta SMART para o seu objetivo de longo
prazo, mas uma meta NICE para o aqui e agora. Considere alguns
exemplos:

Meta SMART Meta NICE

Fitness Perder 20 quilos nos próximos três Praticar exercício 30


meses. minutos diariamente,
concentrando-se em
atividades que sejam
agradáveis e exequíveis.

Carreira Obter uma promoção para um cargo Dedicar uma hora por
de chefia dentro de dois anos. semana para melhorar
uma competência
importante ou estabelecer
contactos com
profissionais do setor.

Educação Concluir um mestrado em dois Passar 30 minutos por dia


anos. a rever a matéria do curso
e a trabalhar nas tarefas
em partes geríveis.

O resultado serão metas que aumentarão a sua energia, a sua


produtividade e que o farão sentir-se bem, mas que não arruínam a sua vida
caso não consiga cumpri-las.

EXPERIÊNCIA 4:

O método da bola de cristal

Com as suas metas NICE em vista, deverá ter uma noção mais clara daquilo
que precisa de fazer especificamente — o que deve facilitar o arranque.
Mas, antes de começar a sua jornada, pode beneficiar da deteção de
problemas.
Visualize-se daqui a uma semana. Esclareceu o que deseja fazer e por
que razão está a fazê-lo. No entanto, apesar de toda esta preparação, ainda
nem começou. O que correu mal?
Chamo a isto «método da bola de cristal», embora às vezes também seja
conhecido como «pre mortem». Oferece uma maneira de identificar os
grandes obstáculos ao seu objetivo antes que eles atrapalhem os seus
planos.
A ideia é simples. Ao analisar, na sua cabeça, o que pode correr mal,
reduz drasticamente a probabilidade de que isso realmente aconteça. Na
verdade, de acordo com um influente estudo realizado por Deborah
Mitchell, professora da Universidade da Pensilvânia, a «retrospeção
prospetiva» — processo de imaginar que um evento já ocorreu — aumenta
em 30 por cento a nossa capacidade de identificar o motivo por que as
coisas correm bem61 (ou mal).
Para mim, o método da bola de cristal é mais poderoso quando analisa
algumas perguntas simples — aquelas que comecei a fazer à minha equipa,
e que o incentivo a fazer também.

1. Imagine que já se passou uma semana e ainda não iniciou a tarefa


que pretendia. Quais são os três principais motivos por que não
conseguiu?
2. O que pode fazer para ajudar a mitigar o risco de esses três
principais motivos o atrapalharem?
3. A quem pode pedir ajuda para cumprir este compromisso?
4. Que medidas pode tomar agora para ajudar a aumentar as
probabilidades de realmente realizar a tarefa?

Este método funciona para quase todos os objetivos que possamos ter
dificuldade em alcançar. Porque a única coisa de que pode ter a certeza é de
que alguns planos não sairão conforme o planeado. Então, também o deverá
planear. Como disse o general Eisenhower: «Nenhuma batalha foi vencida
de acordo com o plano, mas nenhuma batalha foi vencida sem um plano.»

PERGUNTE «QUANDO?»

Quantas vezes já considerou embarcar numa tarefa e pensou: «Não sei


como arranjaria tempo?»
O tempo, nas palavras do escritor de filosofia Oliver Burkeman62, «já
está sempre a esgotar-se». Para alguns de nós mais rapidamente do que para
outros. Embora muitas vezes nos digam que todos temos as mesmas 24
horas por dia, isso obviamente não é verdade. Pode haver 24 horas todos os
dias, mas quantas dessas horas estão sob o seu controlo depende de muita
coisa. Uma celebridade que dispõe de um chef, um motorista, duas amas em
tempo integral e três assistentes pessoais tem mais das 24 horas para passar
como quiser. O resto das pessoas, meros mortais, tem de passar várias horas
todos os dias na manutenção geral da vida — ir para o trabalho, estar no
trabalho, regressar, cuidar dos filhos, cozinhar, limpar, fazer compras, lavar
roupa…
Tudo isto significa que o tempo parece cada vez mais escasso. Como
tal, as questões de gestão do tempo são o passo final para dissipar a névoa
da incerteza.
Até agora, analisámos como elaborar o nosso propósito geral,
perguntando o «porquê», e identificar objetivos finais e tarefas específicas,
perguntando o «quê». Mas há mais uma pergunta à qual não respondemos.
Se não sabe quando vai fazer algo, é provável que não o faça.

Se não sabe quando vai fazer algo, é provável que não o


faça.

Por um lado, perguntar «quando» significa aceitar as suas limitações. Se


tem apenas algumas horas livres na sua semana e não as utiliza ao máximo
de acordo com os ditames da «produtividade», não está necessariamente a
procrastinar; talvez esteja apenas a priorizar.
Mas quando se trata dos projetos com os quais realmente queremos
comprometer-nos, temos de encontrar algumas respostas difíceis para a
questão do «quando». E o nosso primeiro método para fazer isso teve
origem na Universidade de Boston, em meados da década de 2010.

EXPERIÊNCIA 5:

Intenções de implementação

No outono de 2015, começaram a aparecer panfletos em Boston dirigidos a


pessoas que «sentiam que não tinham tempo suficiente para fazer
exercício». O grupo de investigação responsável queria compreender as
formas mais eficazes de levar as pessoas a praticarem mais exercício.63
As pessoas que responderam foram convidadas a participar num estudo
onde foi estabelecida a meta de aumentar o número de passos que davam
em cada semana. Cada uma delas recebeu uma Fitbit, um dispositivo que
monitoriza métricas de saúde, como contagem diária de passos, e foi
instruída a usá-la durante cinco semanas.
Sem que os participantes percebessem, já tinham sido divididos em dois
grupos. O primeiro grupo recebeu a Fitbit sem mais instruções. O segundo
recebeu a Fitbit e uma série de instruções, começando com um pedido para
explicar quando acrescentariam passos ao seu dia. A partir de então, todas
as noites, receberam um e-mail a solicitar que revissem o seu plano para o
dia seguinte e identificassem o horário em que poderiam comprometer-se
com a atividade.
Os resultados desta pequena intervenção foram transformadores. No
final das cinco semanas, o primeiro grupo (que recebeu a Fitbit sem
instruções) não teve praticamente nenhuma mudança em relação à
contagem original de passos. Em contraste, o segundo grupo (que recebeu a
Fitbit com instruções específicas) aumentou os seus passos de uma média
de 7000 por dia para quase 9000.
Estes pequenos gatilhos para a ação são chamados «intenções de
implementação». E a ciência da mudança de comportamento indica que
estas intenções podem ser revolucionárias.
As intenções de implementação têm sido o foco da pesquisa de Peter
Gollwitzer, professor de Psicologia da Universidade de Nova Iorque. Elas
oferecem um método que incorpora momentos para o seu novo
comportamento na sua rotina diária, tal como as dicas daquele estudo de
Boston. Se decidir, antecipadamente, quando vai fazer algo, é muito mais
provável que o faça. De acordo com Gollwitzer, a melhor fórmula para
intenções de implementação é uma declaração condicional: «Se X
acontecer, então farei Y.»
Se deseja praticar mindfulness, ou atenção plena, mas não tem a certeza
de como encaixar esta prática na sua agenda, crie um gatilho: «Hoje,
quando me levantar para ir beber a minha habitual chávena de chá,
respirarei fundo cinco vezes antes de caminhar até à cozinha.»
Se quiser transformar o seu ato esporádico de comer fruta numa
mudança de comportamento de longo prazo, crie um gatilho: «Quando eu
entrar na cozinha, comerei uma maçã.»
Se quiser dedicar mais tempo à sua família a longo prazo, crie um
gatilho: «Quando chegar do trabalho, telefonarei à minha mãe.»
Estes pequenos gatilhos podem ter um efeito notável. Em 2006,
Gollwitzer coescreveu uma meta-análise envolvendo mais de oito mil
participantes em noventa e quatro estudos diferentes, mostrando que
gatilhos do tipo «se… então…» alteram fundamentalmente o
comportamento das pessoas a longo prazo.64 Concluiu que quando
definimos intencionalmente uma declaração «se… então…» para
seguirmos, estamos a fortalecer antecipadamente a nossa representação
mental da situação. Quando o gatilho acontece, é difícil ignorá-lo. Já faz
parte do modelo mental que usa para navegar uma situação.

Já não precisa de pensar em quando fará isso.


Simplesmente faz.

O resultado é notável. Já não precisa de pensar em quando fará isso.


Simplesmente faz.

EXPERIÊNCIA 6:

Bloqueio de tempo

Há uma maneira ainda mais óbvia de encontrar tempo para fazer as coisas
que valoriza. Mas, provavelmente, é o método menos utilizado que existe:
bloqueio de tempo.
O bloqueio de tempo é uma forma elegante de dizer: «Se quiser fazer
algo, ponha-o na sua agenda.» Mas não estou a falar apenas de reuniões;
estou a falar de tempo para trabalho intensivo, tempo para gestão pessoal,
tempo para correr. É bastante óbvio. E, no entanto, é a única ferramenta
simples que um grande número de pessoas não consegue utilizar.
Fico sempre espantado com a quantidade de pessoas que conheço que
são altamente organizadas, altamente motivadas e que têm objetivos de vida
claros, mas que não fizeram nenhum esforço para colocar na agenda as
coisas que mais valorizam. Isto surpreende-me. Aprendi da maneira mais
difícil que, se não colocar na agenda as coisas que desejo fazer, elas não
acontecerão.
Muitas vezes me perguntei por que razão as pessoas são tão resistentes a
fazer uso completo de uma agenda. Acho que as pessoas sentem um pouco
de resistência à ideia de estruturar o seu dia desta forma. Escrever «Ir ao
ginásio» ou «Escrever o meu romance durante uma hora» pode parecer
muito rígido e estruturado para coisas que não consideramos «trabalho».
Mas a verdade é que a estrutura lhe dá mais liberdade, e não menos. Ao
reservar períodos específicos para diferentes atividades garante que terá
tempo para tudo o que é importante para si: trabalho, passatempos,
relaxamento, relacionamentos. Não está apenas a reagir a tudo o que lhe
aparece à frente durante o dia. Em vez disso, está a planear a sua vida de
acordo com as suas prioridades.
Pense no bloqueio de tempo como um orçamento para o seu tempo.
Assim como reserva os seus rendimentos para diferentes categorias, como
renda da casa, alimentação, entretenimento e poupança, reserva as suas 24
horas para diferentes atividades. E, tal como o orçamento monetário lhe
pode dar liberdade financeira, o bloqueio de tempo pode dar-lhe liberdade
de tempo.
Se deseja começar a bloquear o tempo, criei um sistema de três níveis
para ajudá-lo a fazer isso.
O nível 1 é bloquear o tempo para tarefas específicas que tem evitado.
Neste nível, começa a abordar aquelas tarefas que estão na sua lista há
muito tempo. Pode ser qualquer coisa, desde limpar a sua caixa de entrada
do e-mail, organizar o seu espaço de trabalho ou finalmente tratar do
relatório que anda a adiar. E bloqueie um período específico de tempo para
estas tarefas na sua agenda. Pode bloquear das 9h às 10h de terça-feira para
limpar a sua caixa de entrada de e-mail. Trate esse bloco de tempo como
faria com qualquer outro compromisso. Quando chegar o tempo alocado a
essa tarefa, concentre-se somente nela.
O nível 2 consiste em bloquear o tempo na maior parte do dia. Depois
de praticar um pouco com tarefas individuais de bloqueio de tempo, deve
começar a sua manhã a criar um cronograma de bloqueio de tempo para o
dia inteiro. Imagine acordar e planear o seu dia assim: 7h às 8h para
exercício, 8h às 9h para o pequeno-almoço e tempo para a família, 9h às
11h para trabalho intenso no seu projeto mais importante, 11h às 11h30 para
responder a e-mails, e assim por diante.
Está, essencialmente, a transformar a sua lista de tarefas num horário.
Ao alocar intervalos de tempo específicos para cada tarefa, cria um plano
claro de quando e como o seu trabalho diário será realizado.
Finalmente, chega o nível 3, em que bloqueia o tempo da sua «semana
ideal». Aqui, não está a planear apenas um único dia; está a planear os sete
dias inteiros à sua frente. Certifique-se de que todos os aspetos da sua vida
recebem a atenção que merecem. Identifique todas as coisas que são
importantes para si: trabalho, família, passatempos, atividade física,
relaxamento, desenvolvimento pessoal, etc. Em seguida, reserve horários
específicos na sua semana para cada um deles.
Por exemplo, pode decidir que todos os dias da semana, das 18h às 19h,
são dedicados a atividade física, das 19h às 20h é a hora do jantar em
família e das 20h às 21h é para leitura. Da mesma forma, pode reservar as
manhãs de segunda e terça para trabalho profundo, as tardes de quarta para
reuniões de equipa e as de sexta para desenvolvimento pessoal. A chave é
criar um equilíbrio que funcione para si — a sua semana ideal, refletindo as
suas prioridades, ambições e circunstâncias pessoais.
Talvez nunca cumpra a sua semana ideal; daí eu referir-me a ela como
«ideal». Inevitavelmente, surgirão coisas que o vão desviar do caminho — e
tudo bem. O bloqueio de tempo não significa criar um horário rígido que
lhe provoque stress; trata-se de criar estrutura e garantir que haja tempo
dedicado ao que é mais importante para si.
Depois de conseguir isso, a névoa da incerteza ficará um pouco menos
densa.

RESUMINDO

• Entendemos mal a procrastinação. Muitas vezes,


abordamos a procrastinação tratando os sintomas e não as
causas subjacentes. E, frequentemente, essas causas estão
relacionadas com o nosso humor: quando nos sentimos
mal, alcançamos menos. Portanto, o método de desbloqueio
consiste em confirmar o que realmente está a bloquear o
seu bom humor — e encontrar uma maneira de eliminá-lo.
• A primeira barreira emocional é a mais simples: a incerteza.
A solução? Clarificar o que realmente está a fazer. Isso
envolve perguntar «porquê?» e depois usar isto para
descobrir o seu «como?».
• Em seguida, pergunte «o quê?». Isso significa uma
abordagem alternativa ao estabelecimento de metas.
Esqueça as metas SMART. Do que precisa é de metas
NICE (de curto prazo, baseadas em informações,
controláveis e energizantes).
• Por último, pergunte «quando?». Se não sabe quando vai
fazer algo, é provável que não o faça. Uma solução é usar
intenções de implementação — onde os seus hábitos
diários comuns se tornam gatilhos para as coisas em que
pretende trabalhar: por exemplo, quando escovar os dentes,
vou alongar os tendões da coxa.
52 Veja o vídeo aqui: https://youtu.be/lsSC2vx7zFQ?feature=shared
53 Blaschka, A. (2021). «You’re not lazy; you’re scared: how to finally stop procrastinating».
Forbes. Disponível online: https://www.forbes.com/sites/amyblaschka/2021/04/03/youre-not-lazy-
youre-scared-how-to-finally-stop-procrastinating/?sh=2753ed526dab
54 Para mais informação sobre a escala de intolerância à incerteza, ver:
www.psychologytools.com/resource/intolerance-of-
uncertainty/#:~:text=Intolerance%20of%20uncertainty%20involves%20the,about%20what%20will%
20happen%20next
55 Grupe, D. W., e Nitschke, J. B. (2013). «Uncertainty and anticipation in anxiety: an integrated
neurobiological and psychological perspective». Nature Reviews Neuroscience, 14, 488–501.
56 Para mais informação sobre o conceito de Auftragstaktik, ver:
https://smallwarsjournal.com/jrnl/art/how-germans-defined-auftragstaktik-what-mission-command-
and-not
57 Storlie, C. (2010). «Manage uncertainty with commander’s intent». Harvard Business Review.
58 NICE: Near-term, Input-based, Controllable, Energising [N. T.]
59 Höpfner, J., e Keith, N. (2021). «Goal missed, self hit: goal-setting, goal-failure, and their
affective, motivational, and behavioral consequences». Frontiers in Psychology, 12, 704970.
60 Ordóñez, L. D., Schweitzer, M. E., Galinsky, A. D., e Bazerman, M. H. (2009). «Goals gone wild:
the systematic side effects of over-prescribing goal setting». Academy of Management Perspectives,
23(1), 6–16.
61 Klein, G. (2007). «Performing a project premortem». Harvard Business Review, 85(9), 18–19.
62 Burkeman, O. (2023). 4000 Semanas: gestão do tempo para mortais. Objectiva. Lisboa.
63 Robinson, S. A., Bisson, A. N., Hughes, M. L., Ebert, J., e Lachman, M. E. (2019). «Time for
change: using implementation intentions to promote physical activity in a randomized pilot trial».
Psychology & Health, 34(2), 232–254.
64 Gollwitzer, P. M., e Sheeran, P. (2006). «Implementation intentions and goal achievement: a meta-
analysis of effects and processes». Advances in Experimental Social Psychology, 38, 69–119.
CAPÍTULO 5

ENCONTRAR CORAGEM

Alex Honnold agarrou-se à rocha pelas pontas dos dedos.


A centenas de metros abaixo, nas encostas arborizadas do vale de
Yosemite, os seus amigos assistiam em agonia. Nada o prendia a El
Capitan, a escarpa rochosa de 910 metros de altura que ele tentava escalar.
Mas não podia voltar para baixo, não agora. A única opção era continuar a
subir.
Free Solo, o documentário que retrata a tentativa recorde de Honnold de
escalar o El Capitan sem cordas, tornou-se um fenómeno quando estreou
em 2018. O filme convida-nos a refletir sobre uma pergunta que todos nós
já fizemos: Porque é que algumas pessoas se atrevem a fazer coisas com as
quais a maioria de nós nunca sonharia?
A resposta pode estar relacionada com uma faceta distinta da anatomia
de Honnold. Ele tem algo que o resto das pessoas não tem — ou melhor,
falta-lhe algo que as restantes têm. Numa cena, a equipa do documentário
segue Alex até um consultório médico, onde ele faz uma ressonância
magnética. O seu médico explica que uma parte do cérebro de Alex é
menos ativa em comparação com a da maioria das pessoas — uma pequena
estrutura chamada amígdala cerebelosa.
A amígdala cerebelosa é o «detetor de ameaças», responsável por gerar
emoções que nos ajudam a sobreviver — emoções como o medo. As
pessoas que têm um defeito nela não sentem medo, nem de falar em público
nem de andar no meio de uma estrada movimentada. Isso explica a
capacidade de Honnold se agarrar a uma escarpa rochosa vertical a mais de
900 metros de altura sem se sentir perturbado.
O bom da amígdala cerebelosa é que nos ajuda a sobreviver. Se não
tivéssemos essa parte do nosso cérebro que nos incentiva a evitar tigres,
cobras e veículos a alta velocidade, a espécie humana poderia não ter
durado tanto tempo. A má notícia é que também pode identificar ameaças
que são ilusórias. Os investigadores chamam a isto «sequestro emocional».
É o que acontece quando a amígdala cerebelosa nos diz para evitar e fugir,
mesmo quando não há ameaça grave à nossa segurança.
O sequestro emocional sustenta o nosso segundo maior bloqueador: o
medo. Quando confrontada com desafios que ameaçam a nossa sensação de
segurança — como encontrar um grupo de estranhos, assumir uma tarefa
que deve ser concluída dentro de um prazo iminente ou ter de passar num
exame importante —, a amígdala cerebelosa interpreta a tarefa como uma
ameaça. Mesmo que saibamos racionalmente que adiar a tarefa criará mais
stress no futuro, os nossos cérebros ainda estão preparados para se
preocuparem mais em eliminar a ameaça no presente. A forma mais simples
de conseguir isso? Não fazer nada.
Já hesitou em candidatar-se a um emprego ou promoção por medo de
rejeição? Ou desistiu de participar num evento social onde não conhece
muita gente? Ou não conseguiu iniciar um projeto criativo porque teme não
ter as competências necessárias? Isso é a sua amígdala cerebelosa a falar,
sempre.

Não é a falta de talento ou inspiração que está a impedi-


lo. É o medo.

O medo é outra emoção negativa que bloqueia a nossa produtividade.


Impede as nossas hormonas de felicidade e turva o nosso pensamento e
capacidade de resolver problemas. Face ao medo, a procrastinação é
natural?
E a solução? Encontrar coragem. Olhar para o nosso medo, reconhecê-
lo e superá-lo.
Porém, não me interpretem mal. O objetivo deste capítulo não é ajudá-
lo a «curar» ou «superar» magicamente as suas ansiedades e incertezas. A
menos que seja Alex Honnold, o seu medo nunca será completamente
banido. Não obstante, ao desenvolvermos a coragem de enfrentar os nossos
medos e compreendê-los, é possível superarmos as barreiras emocionais
que podem levar a uma vida inteira de procrastinação. Quando o medo
bloqueia as nossas habilidades, a coragem é a chave.

CONHEÇA O SEU MEDO

Demorei sete anos a lançar o meu negócio.


Desde 2010 que queria começar um canal no YouTube. Mas, sempre
que pensava em gravar aquele primeiro vídeo — mesmo depois de bloqueá-
lo na minha agenda e sentar-me para filmar —, sentia alguma força a
impedir-me de dar o primeiro passo. No início, pensei que estava a adiar
por causa do meu perfecionismo. Afinal, eu tinha padrões elevados. Não
queria produzir vídeos terrivelmente maus.
Contudo, olhando para trás, percebo agora que estava errado. Eu era
perfecionista em muitas coisas — exames, fazer amigos, nos meus truques
de magia —, mas isso não me impediu de as fazer. Outra coisa estava a
impedir-me: o medo. O medo do fracasso, o medo do julgamento, o medo
de não ser suficientemente bom. Durante anos, a voz do medo na minha
cabeça continuou a dizer «Não há maneira de isto funcionar» e «Não és
suficientemente bom para fazer isto acontecer, por isso, porquê
preocupares-te em tentar?». Acabei por só criar um vídeo em 2017.
Talvez a principal razão pela qual levei quase uma década a superar esse
medo foi porque não o entendia. Não tinha palavras para explicar o que me
impedia de filmar aqueles vídeos. Achei que estava apenas a ser preguiçoso
ou não empenhado o suficiente, e isso alimentou as minhas dúvidas e o meu
diálogo interno negativo. Mas, assim que comecei a compreender o papel
que o medo desempenhava na minha vida, fui capaz de identificá-lo como o
principal obstáculo entre mim e as minhas ambições.

Conhecer os nossos medos é o primeiro passo para


superá-los.
Conhecimento é poder. Conhecer os nossos medos é o primeiro passo
para superá-los. Se o fizer corretamente, até poderá consegui-lo em menos
de sete anos.

EXPERIÊNCIA 1:

O rótulo da emoção

A primeira forma de conhecermos o nosso medo foi bem demonstrada em


2016 por oitenta e oito aracnofóbicos, vários cientistas e uma tarântula-rosa.
Com o coração acelerado e as palmas das mãos suadas, o grupo de
voluntários aterrorizados fez fila para conhecer uma das maiores aranhas do
planeta. Um por um, aproximaram-se da tarântula de quinze centímetros,
com a envergadura das suas patas a lançar uma sombra sinistra na parede do
terrário. Até que, finalmente, chegou o momento mais emocionante de
todos: foi-lhes pedido que estendessem a mão e tocassem na aranha com a
ponta do dedo indicador.
Estes indivíduos não eram motivados pelo masoquismo. Eram
participantes num estudo inovador sobre a ciência do medo.65 Em
particular, estavam ali para explorar o misterioso poder de dar nome aos
nossos medos para ajudar-nos a superá-los.
Antes de conhecerem a tarântula, os participantes foram divididos em
vários grupos. Cada um foi preparado com algumas táticas simples pelo
cientista da Universidade da Califórnia em Los Angeles que conduziu a
experiência. Alguns foram instruídos a distraírem-se ou a pensarem na
aranha de uma forma menos negativa. Mas um grupo foi instruído a fazer
algo mais específico: rotularem as suas emoções enquanto enfrentavam a
tarântula, por exemplo: «Tenho medo de que a tarântula nojenta salte para
cima de mim.»
No final do estudo, todos os grupos relataram sentir-se angustiados com
a experiência. Mas alguns saíram-se melhor do que outros. E o grupo que se
saiu melhor foi aquele que expressou os seus medos em palavras. Eles eram
substancialmente mais propensos a aproximar-se da aranha. E relataram
sentir que os seus medos diminuíram gradualmente, sendo substituídos por
uma nova sensação de controlo. Essa sensação persistiu até uma semana
após o teste inicial.
Este estudo sugere uma forma poderosa de vermos os nossos medos
como eles realmente são. O objetivo aqui não é impedir por completo que a
sua amígdala cerebelosa funcione (o que aumentaria drasticamente a
probabilidade de ser atropelado por um camião), mas reconhecer quando
um sequestro emocional está a acontecer.
Esta técnica é chamada de «rotulagem afetiva». Simplificando, é o ato
de colocar em palavras os seus sentimentos, o que o obriga a identificar e
conhecer as sensações que está a vivenciar. Funciona de duas maneiras.
Primeiro, aumenta a nossa autoconsciência. Ao nomearmos e
reconhecermos os nossos medos, cultivamos uma autoconsciência mais
profunda que nos ajuda a compreender melhor os nossos padrões
emocionais. Em segundo lugar, reduz a nossa ruminação. Pensamentos
cíclicos sobre os nossos medos podem deixar-nos ainda mais convencidos
de que o medo é justificado. Quando rotulamos as nossas emoções,
tornamo-nos mais capazes de processá-las e libertá-las — e assim escapar
dos pensamentos cíclicos que nos fazem adiar as coisas.
O problema é que rotular as nossas emoções nem sempre é simples. Se
for como eu, até pode achar muito difícil identificar os medos e emoções
que talvez estejam a impedi-lo. Somos muito bons a racionalizar razões
«aceitáveis» para não fazer as coisas. «Não estou a adiar o início do meu
negócio porque tenho medo de alguma coisa, só ainda não encontrei a ideia
certa.» «Não estou bloqueado na escrita do meu romance por causa do
medo, simplesmente ainda não tive tempo.»
Então, como podemos adquirir o hábito de nomear os nossos medos —
e assim aprender a processá-los? Um método envolve fazer algumas
perguntas a si mesmo. Quando estiver a procrastinar, questione-se: «Do que
tenho medo?» As nossas principais vulnerabilidades e inseguranças estão
frequentemente no cerne da procrastinação. Para trabalhá-las, temos
primeiro de as identificar.
Em seguida, vá ainda mais longe e pergunte-se: «De onde vem esse
medo?» É uma razão «minha» ou uma razão «deles»? As razões «minhas»
são medos associados à perceção da sua capacidade. Por exemplo, ter medo
de não ser bom o suficiente ou não estar suficientemente bem preparado
para começar. As razões «deles» são medos associados à forma como as
outras pessoas reagirão ao que faz. Por exemplo, ter medo de que as pessoas
não gostem do seu trabalho ou de que o julguem por se expor. Em cada
caso, tente esclarecer internamente em que realmente consiste o seu medo e
de onde ele vem.
E se ainda estiver com dificuldades em decifrar o seu medo
calmamente? Uma estratégia que considero útil é contar a mim mesmo a
experiência pela qual estou a passar, mas como uma história sobre outra
pessoa. É claro que não estou com medo, digo a mim mesmo. Mas, se eu
escrevesse uma história fictícia sobre alguém como eu, na minha posição,
que está a procrastinar esta tarefa porque teme alguma coisa, do que é que
ele pode ter medo? Que medo pode estar a impedir este personagem fictício
de iniciar a sua tarefa?

EXPERIÊNCIA 2:

O rótulo de identidade

Às vezes, os nossos medos são sobre algo muito específico: iniciar um


projeto ou enfrentar aquela tarântula gigante. Mas, outras vezes, os nossos
medos são mais amplos: menos sobre problemas específicos, mais sobre as
nossas identidades em geral. Atribuímo-nos rótulos que nos deixam com
muito medo de começar: «Não sou um corredor.» «Tenho pavor de
matemática.» «Não gosto de tarefas criativas.»
Estas identidades podem deixar-nos com medo de começar, da mesma
forma que acontece com medos mais específicos. Na década de 1960, o
psicólogo Howard Becker sugeriu que os rótulos que a sociedade nos
atribui afetam profundamente a forma como nos comportamos. Na altura,
Becker estava concentrado em rótulos no contexto da criminalidade:
descobriu que as pessoas que são rotuladas como «criminosas» após um
primeiro crime têm muito mais probabilidade de se envolverem novamente
em comportamentos criminosos.
Na década de 1990, uma série de estudos demonstrou que este problema
não afetava apenas a criminalidade. Em todo o lado, desde escolas a centros
de detenção juvenil e até o exército, as pessoas que recebem rótulos
negativos têm muito mais probabilidade de repetirem comportamentos
problemáticos. Os rótulos que atribuímos a nós mesmos, mostrou Becker,
afetam o nosso comportamento.
Becker chamou à sua descoberta «teoria da rotulagem»66, sugerindo que
os rótulos se tornam uma profecia autorrealizável. Provavelmente já
experienciou isto. Tem um relacionamento mau e conclui que simplesmente
não é bom em relacionamentos. Falha num teste e rotula-se como um
fracasso académico para sempre. Falha um prazo e rotula-se de
procrastinador.
A boa notícia é que a rotulagem também pode funcionar no sentido
inverso. Tal como um rótulo negativo pode amplificar os nossos medos, um
rótulo positivo pode superá-los.
Por exemplo, quando duvido de mim mesmo, o meu rótulo favorito é
«eterno aprendiz». Este rótulo destaca a minha vontade de aprender e
evoluir. Também desvia o meu foco dos aspetos negativos da
procrastinação, como vergonha e arrependimento, e, em vez disso, dá-me
confiança para seguir em frente e continuar a aprender. Um eterno aprendiz
está constantemente à procura de novas formas de melhorar. Um eterno
aprendiz nunca ficaria preso à rotina da procrastinação por muito tempo.
Também pode recorrer a este método. Quando descobrir que está a adiar
as coisas, repare nos rótulos que usa. Está a identificar-se demasiado com o
problema? Com que frequência diz coisas como: «Sou um procrastinador
crónico» ou «Não posso prometer que chegarei a horas, pois procrastino
muito?» E qual poderia ser uma maneira mais positiva de se identificar?
Alguém que trabalha arduamente? Alguém que já conquistou muito?
Alguém que cumpre os seus prazos?
Parece uma pequena mudança. Mas não é! Os rótulos não são apenas
etiquetas inertes que outras pessoas nos colocam. São ferramentas que nos
ajudam a entender quem somos. Se conseguirmos mudar os nossos rótulos,
muitas vezes conseguimos mudar o nosso comportamento.

REDUZIR O MEDO

Quando Peter DeLeo chegou ao Ranch House Café em Olancha67, na


Califórnia, estava tão abatido que mal era reconhecível. Caminhava há nove
dias.
Quase duas semanas tinham passado desde que o seu avião monomotor
caíra na Serra Nevada. Milagrosamente, todos os três passageiros da
aeronave sobreviveram, mas apenas DeLeo começou a procurar ajuda.
Arranhado e dorido, começou a afastar-se dos destroços à procura de
alguém. Caminhar não foi, de todo, fácil: o avião caíra a uma altitude de
cerca de 2700 metros, e DeLeo teve de caminhar penosamente ao longo dos
cumes cobertos de neve das montanhas da Serra Nevada. Até que, por fim,
avistou luzes e cambaleou, no escuro, até à estrada, fazendo sinais a um
carro que passava.
Ao chegar ao café, DeLeo recusou tratamento médico. Era mais urgente
chamar uma equipa de resgate para procurar os seus dois passageiros.
Embarcou num avião e conduziu os investigadores de volta aos destroços.
Mas já era demasiado tarde — os amigos estavam mortos.
O que manteve DeLeo vivo na sua jornada em busca de ajuda, enquanto
os dois passageiros morreram onde esperavam? Esta é a pergunta que o
psicólogo de sobrevivência John Leach passou anos a tentar responder.68
«Na imprensa, os seus dois companheiros mortos não receberam mais do
que uma breve menção ao seu falecimento», escreveu Leach certa vez. «No
entanto, um desses homens não teve mais do que hematomas superficiais na
sequência do acidente. Então, porque morreu? Havia material para abrigo,
poderia fazer-se fogo, havia água disponível, e ele não teria morrido de
fome em onze dias.»
A pesquisa de Leach sobre como as pessoas reagem em situações de
catástrofe revela uma verdade fundamental sobre a natureza humana:
quando estamos com medo, ficamos paralisados. Durante uma catástrofe, as
vítimas geralmente apresentam paralisia cognitiva. O que significa este
distúrbio? Quer dizer que se tornam incapazes de pensar, tomar decisões ou
agir.
A boa notícia é que a paralisia cognitiva é algo que podemos reduzir.
Afinal, nem todos experimentam os efeitos incapacitantes do medo.
Algumas pessoas — como Peter DeLeo — parecem capazes de transformar
a adrenalina, que faz alguns de nós congelar, em algo mais poderoso: a
capacidade de escalar montanhas, procurar ajuda, seguir em frente. Com as
ferramentas certas, podemos diminuir o efeito que o medo tem sobre nós.

EXPERIÊNCIA 3:

A regra 10/10/10

A primeira forma de reduzir o poder que o medo exerce sobre nós é ganhar
alguma perspetiva.
Uma das razões pelas quais o medo é tão paralisante é termos uma
tendência catastrofista. Nas nossas cabeças, um pequeno contratempo torna-
se extremamente importante. Cada potencial fracasso tem a capacidade de
destruir toda a nossa vida e de nos definir para sempre. Atente no seguinte:

• É rejeitado por alguém de quem gosta. Como resultado, decide que


não merece ser amado e que passará a vida sozinho.
• Não é contratado para um emprego. Como resultado, decide que não
será contratado por nenhuma empresa e acabará desempregado e
sem teto.
• Reprovou no exame de condução. Como resultado, decide que é um
mau condutor e nunca mais conduzirá.

Quando der conta de que está a catastrofizar desta maneira, tente dar um
passo atrás e ter uma visão geral. Com o kit de ferramentas certo, podemos
perceber que as coisas não são tão más quanto parecem — e, assim, o medo
torna-se menos intenso.
O nome científico deste processo é «reavaliação cognitiva»:69 mudar a
interpretação de uma situação para que nos sintamos melhor
emocionalmente. O principal objetivo da reavaliação cognitiva é mudar a
nossa perspetiva sobre um evento, pensamento ou sentimento, permitindo-
nos experienciar uma resposta emocional mais positiva.
Uma maneira simples de colocar em prática a reavaliação cognitiva é
lembrar-se de que aquilo que o faz sentir-se tão mal provavelmente não terá
tanta importância no futuro. Pode pô-lo em prática colocando-se as três
perguntas a seguir, que se somam ao que chamo de regra 10/10/10. Pergunte
a si mesmo:

Vamos ver como isto funcionaria nos exemplos anteriores.


• Gatilho: É rejeitado por alguém de quem gosta. Isto terá
importância daqui a 10 minutos? Posso ainda sentir-me um pouco
deprimido e não querer pôr a vista em cima dessa pessoa. Isto terá
importância daqui a 10 semanas? Talvez, mas provavelmente nessa
altura estarei menos abalado. Tanta coisa poderá acontecer. Isto terá
importância daqui a 10 anos? Provavelmente não — conhecerei
muitas pessoas, de agora em diante, que poderão mudar
completamente a minha vida.
• Gatilho: Não é contratado para um emprego. Isto terá importância
daqui a 10 minutos? Provavelmente. Posso sentir-me muito
deprimido pelo resto do dia. Isto terá importância daqui a 10
semanas? Provavelmente não, porque até lá vou candidatar-me a
vários outros empregos. Isto terá importância daqui a 10 anos?
Definitivamente não. Poucas pessoas alcançam sucesso nas suas
carreiras sem contratempos, e aprenderei a ver isto como um
pequeno percalço.
• Gatilho: Reprovou no exame de condução. Isto terá importância
daqui a 10 minutos? Talvez. Terei de contar a novidade ao meu
instrutor e lidar com um pouco de constrangimento. Isto terá
importância daqui a 10 semanas? Provavelmente não. Terei
agendado outro exame e espero ter passado até lá. Isto terá
importância daqui a 10 anos? Definitivamente não. Provavelmente
esquecerei tudo sobre a vergonha e o constrangimento — poderá ser
apenas uma história engraçada, se me lembrar dela.

A regra 10/10/10 ajuda-nos a reconhecer a magnitude do problema com


o qual estamos stressados. Normalmente, descobrimos que os fracassos que
nos preocupam agora não são aqueles que nos definirão para sempre. E que
os medos que temos agora nem sempre terão tanto significado.

EXPERIÊNCIA 4:

A equação da confiança

O medo nem sempre assume formas tão dramáticas como «A minha vida
está arruinada para sempre», claro. Parte do medo que sentimos
corresponde ao sentimento desanimador e irritante de dúvida que se
interpõe entre nós e os nossos objetivos — o medo de, simplesmente, não
sermos bons o suficiente.
Muitas vezes, penso nesta forma de dúvida como uma espécie de morte
aparente. Estamos presos entre duas crenças mutuamente exclusivas. Parte
de nós pensa «Quero mesmo fazer isto», mas outra parte diz «Não consigo
de maneira nenhuma».
Por exemplo, quando procrastino escrever (o que acontece com
frequência), é porque estou suspenso entre dois ideais. Por um lado, há um
desejo genuíno de escrever o meu livro — de criar algo bonito, ajudar
pessoas — e, por outro, há uma pequena voz na minha cabeça a dizer:
«Qualquer coisa que eu escreva será lixo, então não há sentido em fazê-lo»
ou «Nem sequer sou um bom escritor, por que motivo hei de tentar?»
Certamente, há casos em que a dúvida é útil e justificada. Tenho muitas
dúvidas sobre a minha capacidade de pilotar um avião ou de projetar um
foguetão. Mas, na sua maioria, as nossas dúvidas são, geralmente, menos
racionais. Por norma, quando a dúvida causa procrastinação, não é porque
há algo real ali. É o resultado da perceção: a minha crença na minha
capacidade é menor do que a capacidade que acredito ser necessária. Se
aprecia equações matemáticas, pode escrever assim:

Autoconfiança = Perceção de Capacidade – Perceção de Padrões

Se acreditarmos que a nossa capacidade é superior ao padrão necessário,


então estamos confiantes. Se acreditarmos que a nossa capacidade é inferior
ao padrão necessário, teremos dúvidas.
Qual o significado disto na redução dos efeitos da dúvida? Bem, com as
ferramentas certas, pode reequilibrar a equação da confiança de uma forma
que estimule a ação. Falámos sobre aumentar a nossa confiança no capítulo
sobre poder, e essas dicas podem ajudar bastante a eliminar a dúvida.
Porém, mesmo sendo um autoproclamado guru da produtividade, continuo
a lidar diariamente com a procrastinação causada pela dúvida. Ao escrever
este livro, a dúvida tem sido o principal motivador do bloqueio criativo:
houve dias (até semanas!) em que senti que simplesmente não conseguia.
Nestes momentos, aumentar a sua confiança pode não ser a solução
mais fácil. Certamente é bom ter confiança, e isso torna mais fácil iniciar
uma tarefa. Mas se, simplesmente, deseja parar de procrastinar talvez
precise de uma saída mais simples.
No meu caso, isso muitas vezes envolve um método simples: não
superar milagrosamente a minha baixa confiança, mas transformá-la num
problema. O meu método favorito é elementar. Tente perguntar-se: «Quão
confiante realmente preciso de me sentir para começar isto? Posso
simplesmente começar, apesar de não me sentir confiante?» Na maioria dos
casos, a resposta é invariavelmente «sim». É claro que, se me pedissem para
realizar uma neurocirurgia, teria de me sentir bastante confiante nas minhas
competências para começar. Mas, realisticamente, para áreas do dia a dia
onde realmente tenho dúvidas — ir ao ginásio, trabalhar no meu negócio,
escrever este livro —, na verdade não preciso de me sentir confiante para as
começar.

Comece. Ainda tem muito tempo para ficar perfeito.

Posso começar, mesmo que esteja inseguro. Não preciso de me sentir


como um culturista ao estilo de Arnold Schwarzenegger para treinar
durante uma hora. Não preciso que a minha primeira tentativa de estratégia
de negócios seja uma obra de um génio visionário. E, definitivamente, não
preciso que o primeiro rascunho do meu livro seja uma obra-prima.
Quando está a tentar algo novo, a ideia de que só deve começar quando
se sentir confiante para começar é um bloqueador por si só. A solução?
Apenas faça, mesmo que sinta que está a fazer mal.
Comece. Ainda tem muito tempo para ficar perfeito.

SUPERE O MEDO

Quando o brilho das luzes do palco começou a iluminar a arena, Adele


percebeu que as palmas das suas mãos estavam húmidas de suor. Estava
prestes a enfrentar um mar de milhares de pessoas. Já o fizera algumas
vezes antes. Mas, desta vez, estava apavorada. O medo de se apresentar
diante de um público tão grande ameaçou engoli-la por completo.
Antes de Adele se tornar um ícone global, era uma artista talentosa que
se esforçava para vencer o seu medo de atuar. Foi durante um dos seus
primeiros concertos, quando a ansiedade ameaçou atrapalhar a sua carreira,
que ela se deparou com uma técnica para superar o medo que mudaria a sua
vida para sempre.
Adele inspirou-se em Beyoncé. Em 2008, Beyoncé deu ao seu terceiro
álbum de estúdio o nome do seu alter ego, Sasha Fierce. Beyoncé disse que
Sasha Fierce era uma persona que ela podia colocar em palco para se tornar
mais confiante, mais poderosa e livre de inibições. «Sasha Fierce é o lado
divertido, mais sensual, mais agressivo, sem rodeios70 e mais glamoroso
que surge quando estou a trabalhar e quando estou em palco», disse ela.
Inspirada por Beyoncé, Adele criou o seu próprio alter ego, Sasha
Carter71, uma amálgama de Sasha Fierce e da lendária cantora de música
country June Carter. Sasha Carter era tudo o que Adele aspirava ser no
palco: destemida, assumidamente ousada e a irradiar confiança. Ao assumir
a personalidade de Sasha Carter, foi capaz de se distanciar psicologicamente
dos seus medos e tornar-se a artista confiante e poderosa que sempre
sonhou ser.
O alter ego de Adele sugere a maneira final pela qual podemos superar
os efeitos paralisantes do medo. Uma das forças mais comuns que
impulsionam a nossa procrastinação é o medo de sermos vistos. Seja a
fazermos uma apresentação, a partilharmos, com estranhos na Internet, um
novo vídeo que gravámos ou a irmos a uma festa onde talvez não
conheçamos toda a gente, o medo de sermos vistos ou «descobertos» como
realmente somos pode impedir-nos de sair da nossa zona de conforto.
Mas o que tememos que os outros percebam em nós — os nossos erros,
pequenas falhas, as nossas piores qualidades — normalmente não é o que
notamos nos outros. Quando olhamos para nós mesmos, estas coisas
parecem muito maiores e mais importantes do que realmente são.
E isto exige uma forma final de superar os efeitos do medo. Até agora,
neste capítulo, falámos sobre conhecer os nossos medos e reduzir o seu
domínio sobre nós. Mas, para as tarefas mais difíceis, estes métodos podem
não ser suficientes. Não podemos erradicar todos os nossos medos.
Precisamos de superá-los.
Isso significa encontrar uma maneira de passar do medo à coragem. E
começa por mudar a forma como o leitor é visto pela pessoa mais
importante na sua vida: você.
EXPERIÊNCIA 5:

O efeito holofote

Para mim, este processo começou no jantar de festa do meu amigo Jake.
Era uma animada noite de sábado na casa de Jake, e a sala fervilhava de
gargalhadas e conversas efusivas. Jake planeava a festa há semanas. Era
importante para ele. Todos os convidados sabiam que ele se alimentava à
base de Uber Eats no dia a dia. Preparar um bufete de comida deliciosa para
os seus amigos era algo sem precedentes.
Eis a oportunidade para uma piada hilariante, pensei. Enquanto Jake
servia, esperei ansiosamente por uma pausa na conversa — e, enquanto ele
colocava os pratos gloriosos na mesa de jantar, vi a minha oportunidade.
«Obrigado por encomendares toda esta comida deliciosa do Uber Eats,
Jake», disse eu.
Houve um momento de silêncio. E, depois, muito mais silêncio.
Ninguém se riu. Depois, alguns tinidos de garfos e facas contra os pratos. O
meu rosto ficou vermelho e, de repente, senti calor. Aquilo não me tinha
corrido bem. Não foi engraçado e, pior, provavelmente ofendi o anfitrião,
que trabalhara como um escravo na cozinha durante horas.
Mais tarde, naquela noite, ainda paralisado de vergonha, tive uma leve
cena com a minha amiga Katherine. Humilhei-me completamente? Alienei
todos os meus amigos de uma só vez? Nunca mais ninguém me convidaria
para jantar? Ela olhou para mim com surpresa; nem percebera que eu tinha
contado uma piada. «Eu estava ocupada a servir-me da comida», disse ela.
«A comida dele é surpreendentemente boa, não é?»
A minha gafe imaginária ensinou-me uma lição poderosa. Sobrestimei o
grau em que os outros notaram e julgaram as minhas ações. À medida que a
noite continuava, olhei ao redor da sala e percebi que o mundo não estava
focado em cada movimento meu. Todos estavam demasiado ocupados a
cuidar das suas próprias preocupações, risadas e conversas.
Fui vítima de um fenómeno interessante conhecido como «efeito
holofote»72. Estamos altamente sintonizados com o que os outros pensam
de nós. Isto faz sentido — como criaturas sociais, a nossa amígdala
cerebelosa está sempre à caça de ameaças à nossa condição. Mas também
significa que passamos a vida a acreditar que um holofote está sempre
voltado para nós e que todos ao nosso redor estão constantemente a olhar
para nós, a analisar os nossos comportamentos e a julgar o nosso valor
como seres humanos.
Numa série de artigos publicados no início da década de 2000, o
professor de Psicologia Thomas Gilovich e os seus coautores provaram,
repetidamente, que os indivíduos têm uma tendência notável para
sobrestimar o grau em que os outros pensam sobre eles ou os julgam. «As
pessoas ficam frequentemente preocupadas com a forma como os mais
pequenos detalhes das suas ações e aparência podem ser percebidos pelos
outros», escreve ele. «Parte dessa ansiedade pode ser despropositada.
Muitos dos detalhes da nossa aparência ou desempenho provavelmente
passarão despercebidos ao público cujas opiniões cortejamos tão
assiduamente.»
A verdade é que todos estão sobretudo preocupados consigo mesmos e
com a forma como são vistos. Não gastam muito tempo (se é que gastam
algum) a pensar em nós.
O que isto sugere é que o efeito holofote pode ser reduzido com um
simples lembrete de que, bem, ninguém se importa. E quando o medo o
impede de fazer algo, pode ser profundamente libertador:

• Ninguém se importa se os meus primeiros vídeos no YouTube são


terríveis e embaraçosos.
• Ninguém se importa se escrevo posts um pouco confusos porque
não tenho muita experiência de escrita.
• Ninguém se importa se apareço na aula de salsa como iniciante, sem
parceiro.
• Ninguém se importa se o meu cinto não combina com os sapatos
quando vou a uma festa.

A mentalidade de «ninguém se importa» pode ser altamente


transformadora. É um dos métodos mais simples que identifiquei para
reduzir a minha procrastinação relacionada com a ansiedade.
Saliente-se que esta não é uma solução mágica. Lidar com o medo é um
esforço para toda a vida, e não espero que depois de ler este livro o seu
medo do que as outras pessoas vão pensar de si e do seu trabalho
desapareça completamente.
Mas há um nível saudável de medo. E depois há um nível que nos
paralisa. Compreender o efeito holofote significa que pode começar agora
mesmo. Além de si, ninguém se importa!

EXPERIÊNCIA 6:

O efeito Batman

Às vezes, lembrar-se de que ninguém se importa não é suficiente para


superar os nossos medos de humilhação pública. Quando Adele subiu ao
palco, provavelmente estava a passar-se porque, francamente, muitas
pessoas se importavam.
Nesses momentos, podemos seguir o exemplo de Sasha Carter. O
método de Adele para assumir um alter ego pode ser uma ferramenta
poderosa para superar o medo. Há até um nome científico divertido para
isso: «efeito Batman.»
O efeito Batman foi identificado pela primeira vez por uma equipa de
investigadores73 liderada pela professora Rachel White, da Universidade da
Pensilvânia. White e a sua equipa estavam curiosos para saber se a adoção
de um alter ego poderia melhorar a abordagem de uma criança em relação a
uma tarefa. Desenvolveram um estudo que envolveu um grupo de crianças
de 4 a 6 anos de idade. As crianças receberam uma tarefa que exigia que se
concentrassem e resistissem à tentação de se envolverem numa atividade
mais agradável nas proximidades.
As crianças foram divididas em três grupos. Um grupo não recebeu
instruções específicas. O segundo grupo foi convidado a refletir sobre os
seus próprios sentimentos e pensamentos. E pediu-se ao terceiro grupo que
se considerasse um super-herói ou um personagem que admirasse, como
Batman ou Dora, a Exploradora. As crianças foram então monitorizadas
enquanto tentavam completar a tarefa.
Estes investigadores tiveram uma revelação intrigante. As crianças que
foram convidadas a imaginarem-se como super-heróis ou outros
personagens exibiram autocontrolo, foco e perseverança significativamente
melhores do que as dos outros dois grupos.
Esta descoberta destaca o potencial do efeito Batman como uma
ferramenta para superar os nossos medos do fracasso — e, por sua vez,
superar a nossa procrastinação. Quando incorporamos as características de
um alter ego destemido e confiante, podemos explorar um reservatório de
coragem e determinação que talvez não sentíssemos que o nosso eu normal
possui.
Há anos que uso o efeito Batman para superar a minha própria
insegurança. Acho isto particularmente útil quando se trata de falar em
público. Frequentemente, sou atormentado pela insegurança e pelas dúvidas
e, embora já faça aulas e apresentações há anos, às vezes sinto o medo
associado ao facto de me expor. Neste contexto, o meu alter ego é o jovem
Charles Xavier (também conhecido como Professor X) dos filmes X-Men,
interpretado por James McAvoy.
O meu gatilho físico para assumir a identidade de Charles Xavier é
quando coloco os meus óculos falsos. É por isso que ainda uso óculos em
muitos locais públicos, apesar de ter feito uma cirurgia ocular a laser: eles
ajudam-me a adotar o alter ego profissional e intelectual de que preciso
para superar a síndrome do impostor que muitas vezes tenho ao fazer um
discurso.
Não precisa de ser um fã ávido dos X-Men para usar este método para
os seus próprios medos. Pense em algo que tem adiado devido a dúvidas:
começar um novo passatempo ou talvez lançar um negócio paralelo. Agora,
identifique um alter ego que não teria problemas com isso. Quem incorpora
as qualidades que deseja ter, qualidades como confiança, bravura,
determinação ou mesmo (atrevo-me a dizer) disciplina?
Em seguida, entre no seu alter ego. Encontre um espaço tranquilo onde
possa ficar sozinho e reserve alguns momentos para se visualizar a
transformar-se no seu «eu» alternativo. Imagine-se a adotar a sua postura,
voz e mentalidade. Quanto mais praticar, mais fácil será canalizar o efeito
Batman se precisar de superar o medo ou a procrastinação.
E, por fim, acho útil criar um mantra ou afirmação: uma frase curta e
fortalecedora que represente a mentalidade do seu alter ego. Repita esse
mantra para si mesmo quando precisar de um impulso de coragem ou
motivação.
Eu sou confiante.
Eu sou destemido.
Eu sou imparável.
Estes mantras podem parecer exagerados, mas são extremamente
eficazes. Lembram-nos de que nós (ou os nossos alter egos) temos reservas
de força que mal podemos imaginar.
RESUMINDO

• O nosso segundo bloqueador emocional é ainda mais


complicado: o medo. Se já adiou a candidatura a um
emprego assustador ou o convite a alguém de quem gosta
para um encontro, enfrentou este monstro em particular. A
solução não é livrar-se do medo — em vez disso, é
desenvolver a coragem para enfrentá-lo.
• Essa coragem vem de três fontes. A primeira é entender o
seu medo. Pergunte a si mesmo: Porque é que ainda não
comecei esta tarefa ou projeto? Do que tenho medo? De
onde vem esse medo?
• A segunda é reduzir o seu medo. Os nossos medos muitas
vezes são exagerados. Faça a si mesmo estas perguntas
para evitar que catastrofize: Isto terá importância daqui a 10
minutos? Isto terá importância daqui a 10 semanas? Isto
terá importância daqui a 10 anos?
• A terceira é superar o medo. Se tem medo do que as outras
pessoas pensam, lembre-se de que a maioria não está, de
facto, a pensar em si. Somos uma espécie muito consciente
de si mesma, mas geralmente não somos críticos dos
outros.
65 Kircanski, K., Lieberman, M. D., e Craske, M. G. (2012). «Feelings into words: contributions of
language to exposure therapy». Psychological Science, 23(10), 1086–1091.
66 Para mais informação sobre a teoria da rotulagem, ver:
https://www.simplypsychology.org/labeling-theory.html
67 Veja a reportagem realizada pelo LA Times sobre a história de DeLeo aqui:
https://www.latimes.com/archives/la-xpm-1994-12-10-me-7204-story.html
68 Leach, J. (2011). «Survival Psychology: they won’t to live». The British Psychological Society.
Disponível online: www.bps.org.uk/psychologist/survival-psychology-wont-live
69 McRae, K., Ciesielski, B., e Gross, J. J. (2012). «Unpacking cognitive reappraisal: goals, tactics,
and outcomes». Emotion, 12(2), 250–255.
70 Smith, R. (2022). «Why Did Beyoncé Create Alter-Ego Sasha Fierce — And Does She Still Use
It?» Mirror. Disponível online: www.mirror.co.uk/3am/celebrity-news/beyonc-create-alter-ego-
sasha-27894824
71 Ver adele.fandom.com/wiki/Sasha_Carter
72 O efeito holofote foi apresentado pelos psicólogos sociais Thomas Gilovich, Victoria Husted
Medvec e Kenneth Savitsky. Eles realizaram um conjunto de experiências no final dos anos 1990 e
no início dos anos 2000 que estudava em que medida os indivíduos acreditavam que as suas ações ou
aparência eram notadas e avaliadas pelos outros. Num desses estudos, pediram a voluntários para
vestir uma t-shirt notável e potencialmente embaraçosa e, depois, pediram-lhes que previssem
quantas pessoas no grupo teriam reparado na t-shirt. Os resultados demonstraram num nível
consistente que os voluntários sobrevalorizaram consideravelmente o número de observadores. Ver
Gilovich, T., Medvec, V. H., e Savitsky, K. (2000). «The spotlight effect in social judgment: an
egocentric bias in estimates of the salience of one’s own actions and appearance». Journal of
Personality and Social Psychology, 78(2), 211–222.
73 White, R. E., Prager, E. O., Schaefer, C., Kross, E., Duckworth, A. L., e Carlson, S. M. (2017).
«The «Batman Effect»: improving perseverance in young children». Child Development, 88(5),
1563–1571.
CAPÍTULO 6

COMEÇAR

Em 1684, Isaac Newton embarcou no seu trabalho mais ambicioso até


então. Durante os dezoito meses seguintes, trabalhou durante a noite, muitas
vezes renunciando ao sono e à alimentação, para completar a sua obra-
prima: Philosophiae Naturalis Principia Mathematica.
Quando Principia foi publicado, em julho de 1687, representou a
primeira tentativa científica de explicar como os objetos se movem no
espaço. No seu cerne estava uma observação simples, sucintamente
resumida na Primeira Lei do Movimento de Newton, muitas vezes chamada
lei da inércia: «Um objeto em repouso permanece em repouso, enquanto um
objeto em movimento permanece em movimento, a menos que seja
influenciado por uma força externa desequilibrada.»
Por outras palavras, se um objeto estiver parado, permanecerá parado;
se um objeto estiver em movimento, continuará em movimento, a menos
que outra força (como a gravidade ou a resistência do ar) o impeça de fazê-
lo.
Quando Newton morreu, quatro décadas depois, muitos dos seus
contemporâneos perceberam que Principia era uma obra-prima, a maior
tentativa de sempre de descrever as propriedades físicas do universo
natural. Mas o que eles provavelmente não perceberam é que a Primeira Lei
de Newton também descreve uma das principais curiosidades do
comportamento humano. Porque o problema é o seguinte: a lei da inércia
aplica-se tanto à produtividade quanto à física.
Até agora, encontrámos dois grandes bloqueadores que nos fazem sentir
pior e procrastinar mais: a incerteza, que nos deixa confusos sobre o que
precisamos de fazer para começar; e o medo, que nos deixa tão ansiosos
que não sentimos que conseguimos começar. Mas o nosso terceiro e último
bloqueador é talvez o mais complicado de todos: a inércia.
Como Newton reconheceu, é preciso muito mais energia para começar
do que para continuar. Quando não está a fazer nada, é fácil continuar
assim. E, quando está a trabalhar, é muito mais fácil continuar a trabalhar.
Quando sente que já tentou de tudo para se motivar, mas ainda está a
procrastinar, precisa de um impulso final para começar.
A inércia esbate a nossa paisagem emocional; faz-nos sentir
desamparados e presos e enfraquece as nossas emoções de satisfação. Mas
isto pode ser superado. Gosto de pensar no princípio da inércia como um
obstáculo literal na estrada. Imagine que está prestes a descer uma colina de
bicicleta. Tem o seu capacete, as suas engrenagens estão bem lubrificadas, e
está ansioso por começar. Há apenas um problema. Tem de pedalar um
pouco para cima antes de chegar à longa descida. Será necessária uma
explosão de energia para superar o obstáculo, e exercer essa energia pode
não ser a coisa mais agradável do mundo.
Mas depois de superá-lo estará a pedalar pela colina abaixo, com o
vento na cara, sentindo-se melhor do que nunca e a deslizar até casa.

REDUZIR ATRITO
Então, como podemos superar este obstáculo? O primeiro método envolve
olhar para o mundo ao nosso redor e tentar descobrir o que está a tornar tão
difícil o começo. Pode descobrir que pequenos ajustes no seu ambiente
fazem toda a diferença. Para entender o que quero dizer, podemos recorrer
ao trabalho de Marlijn Huitink, investigadora que liderou um estudo
neerlandês sobre a psicologia da compra de vegetais.74
Huitink e a sua equipa foram incumbidos por uma cadeia de
supermercados e por várias organizações públicas de encontrar formas
baratas de melhorar a saúde da população. Para o fazer, desenvolveram um
método simples para explorar como o nosso ambiente afeta as nossas
decisões de compra. Em alguns dias da semana (dias da abordagem), os
investigadores adicionaram um compartimento verde aos carrinhos de
compras que cobria metade do fundo. O compartimento verde indicava um
espaço onde os clientes colocariam os seus vegetais. Também trazia
impressa uma mensagem informando do que as outras pessoas do
supermercado fazem quanto à compra de vegetais. Uma mensagem dizia:
«Os três vegetais mais populares neste supermercado são o pepino, o
abacate e o pimento.» Outra dizia: «A maioria dos clientes escolhe pelo
menos sete vegetais.» Nos outros dias da semana (dias de controlo), os
investigadores removeram os compartimentos verdes.
Os investigadores queriam testar se estes ajustes subtis — e,
crucialmente, baratos — no nosso ambiente (como o compartimento verde e
a mensagem no carrinho de compras) mudariam o comportamento dos
compradores. E, de facto, mudaram! Nos dias com compartimentos verdes,
os compradores incluíam, em média, um acréscimo superior a 50 por cento
de vegetais, comparativamente com os dias sem compartimento.
Podemos pensar nestas mudanças como uma redução da quantidade de
energia necessária para iniciar uma tarefa. Elas eliminam o atrito que existe
entre nós e o objetivo que procuramos. Se é constantemente lembrado de
comprar vegetais, é preciso muito menos energia para se recordar de o
fazer. E, se lhe disserem quais são os vegetais mais populares na sua
comunidade, é preciso muito menos energia para decidir quais escolher.

EXPERIÊNCIA 1:

Reduza o atrito ambiental


A primeira forma pela qual estas fricções nos atrasam acontece no nosso
ambiente físico. Mesmo quando sabemos que realmente deveríamos fazer
algo, muitas vezes encontramo-nos em situações que tornam
desnecessariamente difícil o começo.
Em 2018, quando trabalhava em tempo integral como médico, esforcei-
me por implantar o hábito de praticar guitarra à noite. Ocasionalmente,
pensava: «Provavelmente devia praticar um pouco de guitarra.» Mas
acabava sempre a procrastinar. Ficava sentado no sofá da sala a navegar nas
redes sociais no meu telemóvel ou a ver televisão. A minha guitarra estava
escondida atrás da estante, no canto da sala, a tal ponto que quase nunca a
via. Foi só quando li o livro Hábitos Atómicos, de James Clear, que percebi
a solução óbvia: colocar a guitarra no meio da sala. De repente, pegar na
guitarra tornou-se drasticamente mais fácil.
Podemos pensar em ações como esta — ou no estudo neerlandês sobre
compras — como uma engenharia do nosso ambiente. O objetivo: reduzir o
atrito e assim facilitar o começo.
Em particular, isto envolve focar-se naquilo a que os cientistas
comportamentais chamam escolhas-padrão. Este é o resultado automático
se não fizer uma escolha ativa. No caso daqueles compradores
neerlandeses, o compartimento verde dedicado aos vegetais frescos tornou
os vegetais o padrão: não era preciso pensar muito para colocá-los no
carrinho.
Como é que isto acontece na prática? Bem, o truque é ajustar o seu
ambiente para fazer que o que deseja começar seja a decisão-padrão mais
óbvia. E, por sua vez, tornar as coisas que não quer na decisão mais difícil.
Considere alguns exemplos:

• Praticar guitarra: Mover o suporte da guitarra para a sala torna-a a


escolha-padrão. Agora a decisão óbvia é pegar no instrumento sem
pensar, sempre que precisar de uma pausa de dez minutos.
• Dificuldade em concentrar-se: Manter os seus materiais de estudo
ou de trabalho organizados e visíveis — por exemplo, tendo um
caderno ao lado do seu portátil — faz que o estudo seja a escolha-
padrão. Agora, a decisão óbvia é começar a estudar sempre que
estiver na sua secretária.
• Reduzir o uso do telemóvel: Desativar as notificações faz que a
escolha-padrão deixe de ser pegar no telemóvel. Agora, a decisão
óbvia já não é verificar o seu telemóvel.

Ajustar o ambiente ajuda a direcionar as suas ações para a decisão certa,


aquela que realmente deseja. E não a má decisão que toma sem pensar.

EXPERIÊNCIA 2:

Reduza o atrito emocional

É claro que não é apenas o ambiente que dificulta o início de uma tarefa. É
também o seu humor. Até agora, neste livro, falámos muito sobre os
grandes, e muitas vezes stressantes, obstáculos emocionais que nos
impedem de começar: ambiguidade sobre o que estamos a fazer, ansiedade
sobre o que uma tarefa implica. Mas há um obstáculo bem mais prosaico.
No meu país natal, a Grã-Bretanha, isto é normalmente referido como CBA
ou «cant’t be arsed»75.
Não existe, que eu saiba, nenhuma frase equivalente noutra língua que
capte esta ideia de forma tão contundente. O que é uma pena porque é uma
sensação muito comum. Eu CBA de escrever este ensaio. Eu CBA de
aprender a tocar guitarra. E eu realmente, realmente CBA de trabalhar no
meu livro.
O CBA é o obstáculo mais comum — e mais paralisante — para
começar. Mas pode ser facilmente resolvido, utilizando um dos truques de
produtividade mais sábios e antigos: a «regra dos cinco minutos».
A regra dos cinco minutos é uma técnica simples, mas poderosa, que o
incentiva a comprometer-se a trabalhar numa tarefa por apenas cinco
minutos. A ideia por trás desta regra é que dar o primeiro passo costuma ser
a parte mais desafiadora de qualquer tarefa. Durante esses cinco minutos,
concentra-se apenas naquilo que está a evitar, dedicando-lhe toda a sua
atenção. Depois de os cinco minutos terminarem, poderá decidir se deseja
continuar a trabalhar ou fazer uma pausa.
Na minha experiência, a regra dos cinco minutos é estranhamente
eficaz. Normalmente, imaginar-se a fazer aquilo que está a procrastinar por
apenas cinco minutos não é tão horrível como comprometer-se seriamente
com isso. Sobretudo quando, na nossa cabeça, esse compromisso parece
equivalente a «fazer aquilo para o resto da minha vida».
Cerca de 80 por cento das vezes, após esses cinco minutos, continuo.
Depois de começar a preencher papelada, abano a cabeça ao som de uma
cover de quarteto de cordas de «Concerning Hobbits» da banda sonora do O
Senhor dos Anéis e acabo por divertir-me — ou pelo menos percebo que
não é tão mau como achei que seria.
É crucial, no entanto, que não se force a continuar a trabalhar, caso
contrário a regra dos cinco minutos torna-se um nome inadequado. Então,
nos outros 20 por cento das vezes, realmente permito-me parar após cinco
minutos. Sim, pode significar que adiei o preenchimento da minha
declaração de IRS para outro dia. Mas, ei, pelo menos fiz cinco minutos de
progresso nisso.
E o facto de me permitir parar significa que não estou a mentir a mim
mesmo abertamente. Se eu dissesse a mim próprio que só faria algo por
cinco minutos e depois me sentisse obrigado a continuar, a regra dos cinco
minutos perderia a sua magia.

TOME UMA ATITUDE

A lista de clientes de Matt Mochary parece um Quem é Quem de Silicon


Valley. Sócios-gerentes da empresa de investimentos Y Combinator e CEO
de gigantes do setor como a OpenAI recorrem a ele para obter conselhos
sobre como concretizar o seu potencial. O CEO do Reddit, Steve Huffman,
credita a Mochary a adição de mil milhões de dólares ao valor da sua
empresa.
Embora eu tenha os meus próprios coaches de negócios há alguns anos,
sempre me perguntei como seria uma sessão de coaching (ridiculamente
cara, suspeito) com Mochary. Como se adicionam mil milhões de dólares ao
valor de uma empresa em apenas algumas sessões? Que dicas milagrosas e
transformadoras oferecerá nestas reuniões?
A resposta, presumi, era algum segredo enorme e revelador. Então,
quando ouvi a sua entrevista franca com o meu podcaster favorito, Tim
Ferriss76, fiquei um pouco desapontado. «Muitas pessoas me perguntam:
Matt, o que há de único em si?» — disse ele. «E tenho dificuldade em
responder porque acho que o que faço é muito simplista… Não vamos
terminar uma conversa sem que tenha pelo menos uma, duas ou três ações a
tomar».
«É só isso?», pensei. Será que arranjar «uma, duas ou três ações» é
realmente suficiente para recuperar um negócio? E, então, refleti sobre a
minha própria vida. Muitas vezes, a minha dificuldade em fazer as coisas
acontecerem reside em não ter um conjunto de passos simples e claros para
seguir. Daí a inércia. E daí a procrastinação.
Mochary chama ao seu princípio «propensão para a ação». Reconhece
que o tempo gasto com os clientes é precioso (tanto para ele quanto para
eles), e apenas contemplar pensamentos profundos sem transformá-los em
etapas viáveis seria um desperdício. Precisamos de passos claros e
concretos, em vez de objetivos abstratos e distantes. Caso contrário,
poderemos não fazer nada.
Esta propensão para a ação é a segunda forma de superar a inércia. Já
falámos sobre reduzir a energia necessária para começar, mas agora precisa
de dar um primeiro passo real. E, para identificar isso, podemos recorrer à
pesquisa do Dr. Tim Pychyl.

EXPERIÊNCIA 3:

Defina a próxima etapa de ação

Tim Pychyl conhece a procrastinação melhor do que ninguém.77


Ao longo de duas décadas, publicou mais de vinte e cinco artigos sobre
o assunto, e o seu Grupo de Pesquisa sobre Procrastinação na Universidade
Carleton, no Canadá, é indiscutivelmente a fonte mais influente do mundo
em termos de revelações científicas sobre por que motivo adiamos as
coisas. «Eu quase nunca procrastino», disse-me ele, «sou o exemplo vivo de
que, depois de se aprender algumas coisas sobre a procrastinação, é possível
reduzi-la se se quiser».
«Então, qual é o truque?», perguntei-lhe. Qual é o conselho que dá às
pessoas para ajudá-las a superar a procrastinação? A sua resposta foi
surpreendente. Pychyl disse-me que, sempre que se vê a procrastinar
alguma coisa, simplesmente pergunta-se: «Qual é a próxima etapa de
ação?» Por exemplo, quando sabe que está a procrastinar a prática de ioga,
a sua próxima etapa de ação é estender o tapete e ficar de pé sobre ele. É só
isso.
Esta abordagem parece suspeitamente simples, mas funciona. O método
de Pychyl é uma forma de transformar a tendência abstrata para a ação num
próximo passo concreto.
Pense em como isto pode verificar-se em diferentes situações:

• Se está a adiar os estudos para um exame, a sua próxima etapa de


ação é pegar no livro e abri-lo na página a partir da qual vai começar
a estudar.
• Se está a adiar a ida ao ginásio, a sua próxima etapa de ação é vestir
o equipamento de treino.
• E, se está a adiar escrever um livro, a sua próxima etapa de ação é
ligar o portátil e abrir o Google Docs.

Em todos os casos, este método tira os nossos olhos do objetivo de


longo prazo intimidante e enorme (escrever um livro) e concentra a mente
no objetivo mais alcançável (escrever as próximas palavras). Ajuda a
acalmar os nervos ao permitir, como descreve Pychyl, uma «camada de
autoengano». A dada altura, ainda terá de fazer o exame, subir para a
passadeira de corrida, escrever o livro. Mas não precisa de se preocupar
com isso agora.

EXPERIÊNCIA 4:

Monitorize o seu progresso

Como um dos romancistas de fantasia mais vendidos do mundo, Brandon


Sanderson não parece alguém que sofre de bloqueio de escritor. Leitor
ávido na infância, quando estava no ensino secundário começou a escrever
as suas próprias histórias de fantasia. E nunca mais parou. Em 2003,
Sanderson tinha escrito doze romances78 (a maioria enquanto trabalhava no
turno da noite na receção de um hotel) antes de assinar o seu primeiro
contrato de publicação. Desde então, publicou dezenas de obras, incluindo
romances, contos e bandas desenhadas.
Fiquei um tanto surpreso ao saber que Sanderson realmente sofre de
bloqueio de escritor — e com frequência. «O bloqueio de escritor para mim
é quando já escrevi alguns capítulos e a história não está a fluir, ou estou
algures no meio do livro e um capítulo simplesmente não está a funcionar»,
refletiu ele. Nesses momentos, a vontade de parar de escrever torna-se
irreprimível.
O que é que ele faz? Bem, ele sabe que a pior coisa a fazer seria parar
de escrever e esperar até ter vontade de recomeçar — uma receita para
nunca mais escrever nada. Em vez disso, monitoriza o seu progresso. Com
bloqueio de escritor ou não, Sanderson monitoriza a sua contagem de
palavras e não para de escrever79 até atingir 2000 palavras todos os dias. E
fica atento à contagem de palavras à medida que aumenta de 2000 para
4000, depois para 6000, e por aí em diante.
Um romance de fantasia de Brandon Sanderson pode ter até 400 mil
palavras. E, assim, ao focar-se no progresso constante em direção ao seu
objetivo, Sanderson faz que a jornada pareça fácil. Resultado: lança sempre
os seus romances exatamente quando diz que o fará, para um público fiel de
milhões de fãs em todo o mundo.
Esta monitorização do progresso pode ter um efeito profundo. Em 2016,
investigadores combinaram 138 estudos80 compostos por quase 20 mil
participantes para realizar uma meta-análise dos seus efeitos. Descobriram
que monitorizar o progresso, seja anotando metas de evolução (como, por
exemplo, se concluiu as sessões de treino que pretendia) ou anotando metas
de resultados (como o tempo que demorou a percorrer cinco quilómetros),
aumenta drasticamente as suas hipóteses de realmente atingir essa meta.
Porquê? Primeiro porque monitorizar o seu progresso ajuda a identificar
áreas onde pode estar a ficar para trás ou onde precisa de fazer ajustes. Ao
monitorizar o seu progresso, pode identificar padrões, hábitos ou obstáculos
que estão a atrapalhá-lo. Ao escrever este livro, gradualmente percebi que
precisava de ajustar os meus prazos: para alguns capítulos foi fácil atingir
as metas de contagem de palavras, para outros, nem por isso. Em segundo
lugar, a monitorização do progresso pode ajudá-lo a comemorar as suas
vitórias, grandes e pequenas. Por exemplo, sempre que acrescento mais
8000 palavras, permito-me uma recompensa: uma visita ao Dishoom, o meu
restaurante indiano favorito em Londres.
Acima de tudo, monitorizar o seu progresso fornece evidências
tangíveis de que está a avançar em direção aos seus objetivos. Vejo a minha
contagem de palavras a aumentar, palavra por palavra, e sei que estou cada
vez mais perto de ter um manuscrito finalizado. Esta sensação de progresso
ajudou-me a manter o ritmo e deixou-me mais empenhado em continuar. É
um impulso de motivação como nenhum outro.
Monitorizar o seu progresso fornece evidências
tangíveis de que está a avançar em direção aos seus
objetivos.

E não precisa de escrever um livro para que a monitorização do


progresso funcione. Na verdade, podemos monitorizar o progresso em todas
as áreas das nossas vidas.
Se o seu objetivo é ficar mais saudável, pode manter um registo de
exercícios. Anote o tipo de exercícios que fez, por quanto tempo os
executou e quaisquer outras anotações sobre como se sentiu durante o
treino. Vai ajudá-lo a percecionar que a sua força e resistência estão a
melhorar com o tempo.
Se estiver a aprender uma nova competência, pode acompanhar o seu
progresso mantendo um diário de aprendizagem para anotar o que está a
aprender, quaisquer dúvidas que tenha e quaisquer avanços ou momentos
«ah-ah!» que vivencie. Isto não apenas aumentará a sua motivação mas
também o ajudará a ter uma visão melhor do que ainda precisa de aprender.
E, se estiver a rever a matéria para um exame, pode acompanhar o seu
progresso colorindo um gráfico de barras com os módulos que estudou,
mostrando quão perto está de terminar a sua revisão. Isto oferece-lhe um
pequeno lembrete de que, por mais assustadora que a tarefa pareça, está
sempre a caminhar na direção certa.

APOIE-SE

Neste ponto do livro, deve ter notado que muitos dos meus conselhos sobre
a inércia são por antecipação. Existem muitas revelações sobre como evitar
a procrastinação no início, seja dando o primeiro passo ou reduzindo o
atrito. Mas forneci muito menos informações sobre como evitar a
procrastinação a longo prazo.
É normal. Passei grande parte da minha vida a começar bem um projeto
e a pensar que superei o problema da inércia, apenas para perder o impulso
muito rapidamente. Exemplo: este livro! Nos primeiros dois meses, escrevi
30 mil palavras. Nos doze meses seguintes, escrevi apenas 10 mil.
É por isso que a forma final de superar a inércia não está relacionada
com o começar, mas com a procrastinação que se instala mais tarde: aqueles
momentos em que o seu bom progresso se transforma num pântano espesso
onde não faz muita coisa. Nessas situações, precisa de uma forma diferente
de se manter motivado.
A solução é aprender a apoiar-se. Isto pode soar como uma noção vaga.
Mas, no contexto do combate à procrastinação, tem um significado muito
específico. O seu objetivo é encontrar formas de se encorajar enquanto
trabalha para atingir os seus objetivos. E, acima de tudo, responsabilizar-se
à medida que avança. Vamos começar com uma ferramenta simples mas
extremamente eficaz: encontrar um parceiro de responsabilidade.

EXPERIÊNCIA 5:

Encontre um parceiro de responsabilização

O fórum do Reddit r/GetMotivatedBuddies tem mais de 179 mil membros,


todos à procura de «encontrar parceiros de responsabilização para saúde e
fitness, estudo, trabalho e criação de hábitos saudáveis». Conecta parceiros
para se incentivarem mutuamente a irem ao ginásio e aprenderem a tocar
guitarra, reverem matéria para exames e aprenderem a programar, irem para
a cama a determinada hora e lembrarem-se de telefonar às mães.
Todas estas pessoas notaram uma característica intrigante da motivação
humana: começar algo sozinho é infinitamente mais difícil do que começar
juntos. Quando encontramos um parceiro que nos responsabilize, temos
muito mais probabilidade de superar a inércia.
Isto deve-se, de certa forma, aos efeitos energizantes das pessoas (que
encontrámos no Capítulo 3). As pessoas aumentam as nossas emoções de
satisfação e fazem-nos querer começar. A vida é melhor com amigos por
perto.
Mas os parceiros de responsabilização têm um segundo efeito, ainda
mais poderoso. Transformam o nosso sentido de dever numa arma. Os seres
humanos são criaturas sociais, e estamos desesperados para não nos
dececionarmos uns aos outros. Se pode faltar a uma sessão de ginásio
quando é a única pessoa envolvida, é muito mais difícil faltar quando o seu
amigo está à porta do seu apartamento de manhã cedo, a olhar iradamente
para o relógio.
Uma parceria de responsabilização é apenas um mecanismo que
transforma este facto social básico num sistema formal. O leitor e outra
pessoa concordam mutuamente em responsabilizar-se, num horário
acordado, por uma tarefa acordada. Isso pode envolver aquele colega de
ginásio a bater à sua porta às 6 horas da manhã. Pode significar que um
amigo lhe ligue num horário determinado para verificar se realmente está a
rever a matéria. Ou implicar que alguém vá a sua casa para verificar se
aprendeu aquela música na guitarra que prometeu que, garantidamente,
passaria a semana inteira a praticar. Em todos os casos, está a recorrer ao
seu sentido de obrigação social para superar a inércia.
Qual é a melhor maneira de estabelecer esta parceria de
responsabilização? Costumo dividir o processo em três etapas. Primeiro,
encontre o seu parceiro. Idealmente, alguém com uma visão partilhada — o
que significa que os seus amigos são um bom ponto de partida. Muitas
vezes, porém, os melhores parceiros são estranhos que partilham o mesmo
objetivo que o leitor. Quando se junta a alguém que partilha a sua ambição
de ir ao ginásio três vezes por semana ou aprender a tocar guitarra, não
encontrará apenas alguém que o responsabilize — encontrará alguém que
entende os seus problemas e aprecia os seus sucessos. E pode até fazer um
novo amigo no processo.
Depois do parceiro devidamente encontrado, cheguem a acordo sobre a
cultura de responsabilização que desejam criar. Há uma linha muito ténue
entre um amigo prestável e persistente e um amigo irritantemente
exasperante. Portanto, precisam de acordar algumas regras básicas. Como
seria uma abordagem positiva à responsabilização? De que quantidade de
contacto está à procura? Como é que ele pode ajudá-lo? Acho que os
melhores companheiros de responsabilização atendem a cinco critérios:
disciplinados (devem cumprir o que acordaram), desafiantes (sabem o que
significa ajudá-lo a passar para o nível seguinte), pacientes (não tiram
conclusões precipitadas nem o apressam a tomar decisões), solidários
(estão presentes com palavras de encorajamento) e construtivos (devem
saber como lhe dar feedback sincero e críticas construtivas).
Por fim, discuta o processo de responsabilização com um pouco mais
de detalhes. Como é que o seu amigo irá responsabilizá-lo e vice-versa? O
que fará especificamente e quando? Para alguns, a responsabilização pode
significar encontrarem-se uma ou duas vezes por semana para um ponto da
situação. Ou fazer um ponto da situação diário, sob a forma de mensagem
ou de vídeo sobre como está a correr o seu projeto. Ou apenas um encontro
mensal num café para ver o que corre bem e o que corre menos bem.
Importa menos o que ele realmente faz, e mais que concorde em fazê-lo de
forma consistente e nos horários acordados.
Porém, feito da maneira certa, um companheiro de responsabilização
explora gentilmente a pressão social com efeitos poderosos. Agora, tem
alguém com quem partilhar os seus triunfos e lamentar as suas desgraças. E,
assim, realmente sairá da cama quando disse que o faria.

EXPERIÊNCIA 6:

Perdoe-se

Em 2010, o psicólogo da Universidade Carleton, Michael Wohl81, notou


algo pouco surpreendente nos seus alunos do primeiro ano: adoravam
procrastinar.
Apesar da reputação (provavelmente injusta) de Ottawa como uma
cidade extremamente monótona, os estudantes de Wohl encontraram
milhões de coisas para fazer na cidade além de estudar: ir a bares, juntar-se
a associações, postar numa aplicação emergente chamada Twitter. Apesar
de tudo o que não sabiam sobre Psicologia, sabiam tudo sobre adiá-la.
Mas a procrastinação em si não era o problema, pensou Wohl. O
problema era a autoflagelação. Wohl percebeu que o ciclo prejudicial de
produtividade dos seus alunos era causado pela sua autodestruição. Sempre
que deixavam de estudar, passavam dias a dizer a si mesmos que eram maus
alunos. E essa vergonha tornava-os ainda menos propensos a estudar no
futuro.
Wohl decidiu testar uma hipótese: que culpar-se é um problema maior
do que a procrastinação jamais poderia ser. Imediatamente antes dos
exames intercalares dos alunos, pediu-lhes que avaliassem até que ponto se
perdoavam por não estudarem. Será que os alunos com altos níveis de
perdão a si próprios terão um desempenho melhor do que aqueles que
constantemente se preocupam com as suas falhas?
Os resultados foram claros. Tal como Wohl previu, os alunos que
disseram ser capazes de se perdoar por não estudar foram muito mais
produtivos. O perdão permitiu que os alunos se libertassem da culpa e da
vergonha pós-procrastinação. Conseguiam «superar o seu comportamento
inadequado e concentrar-se no próximo exame sem o fardo de atos
passados». O artigo de Wohl intitulava-se «Eu perdoo-me, agora posso
estudar».
Wohl descobriu a última maneira pela qual a inércia nos descarrila.
Quando não conseguimos manter o ímpeto numa tarefa, tendemos a culpar-
nos. Mas isso não ajuda ninguém. Na verdade, piora as coisas. A inércia
gera uma sensação de autoaversão. E esse sentimento de autoaversão torna-
nos ainda menos propensos a fazer algo frutífero.
Existe alguma forma de quebrarmos este ciclo de destruição? Como
Wohl e os seus colegas descobriram, o perdão a nós próprios é a saída de
emergência. Mas como? Talvez a minha forma favorita seja um método a
que chamo «Encontre a Vitória». Envolve celebrar algo, por menor que seja
e ainda que não relacionado com o seu trabalho. Gosto de usar o formato:
«Não fiz X, mas fiz Y.» Por exemplo:

• «Hoje não fui àquela sessão de treino matinal. Mas consegui uma
hora extra na cama e estou a sentir-me mais revigorado do que o
normal.»
• «Não terminei a última parte do relatório. Mas foi por um bom
motivo. Conversei com um colega na copa dos funcionários e
pusemos as novidades todas em dia.»
• «Não terminei aquela candidatura de emprego. Mas, em vez disso,
passei tempo com a minha avó, e isso é uma vitória por hoje.»

Pode concentrar-se nas pequenas derrotas. Ou pode


comemorar as pequenas vitórias.

A procrastinação não é algo que podemos sempre controlar. Perdoar a


nós mesmos é algo que podemos. Pode concentrar-se nas pequenas derrotas.
Ou comemorar as pequenas vitórias. Ao aceitarmos e perdoarmos a nossa
tendência inevitável para procrastinar — e, em vez disso, celebrarmos o que
conseguimos fazer —, podemos começar a derrotar o seu domínio sobre
nós.

RESUMINDO
• O nosso terceiro bloqueador emocional é o mais comum de
todos: a inércia. Quando não está a fazer nada, é fácil
continuar assim. E, quando está a trabalhar, é muito mais
fácil continuar a trabalhar.
• Mas existem algumas maneiras simples de a combater.
Procure os atritos na sua vida: Que obstáculos o estão a
impedir de começar? E como pode livrar-se deles?
• O melhor antídoto para não fazer nada é simplesmente
fazer alguma coisa. Pode agir definindo primeiro o seu
próximo passo e, depois, monitorizando o seu progresso,
para estar cercado de evidências tangíveis de que está a
avançar em direção aos seus objetivos.
• A etapa final é a mais gentil: criar sistemas que possam
ajudá-lo a apoiar-se a longo prazo. Acima de tudo, seja
tolerante consigo e comemore as pequenas vitórias.
74 Huitink, M., Poelman, M. P., Van Den Eynde, E., Seidell, J. C., e Dijkstra, S. C. (2020). «Social
norm nudges in shopping trolleys to promote vegetable purchases: a quasi-experimental study in a
supermarket in a deprived urban area in the Netherlands». Appetite, 151, 104655.
75 Em tradução livre: não me dou ao trabalho [N. T.]
76 Pode ver a transcrição da entrevista de Matt Mochary com Tim Ferriss aqui:
tim.blog/2023/03/03/matt-mochary-transcript/
77 Entrevistei o Dr. Pychyl no meu podcast Deep Dive, em 2022. Pode ouvir a entrevista aqui:
https://aliabdaal.com/podcast/tim-pychyl/
78 Pode ver a lista das obras de Brandon Sanderson aqui:
https://en.wikipedia.org/wiki/Brandon_Sanderson_bibliography
79 Brandon Sanderson fala dos seus objetivos de escrita aqui:
https://faq.brandonsanderson.com/knowledge-base/what-is-your-daily-wordcount-time-goal/
80 Harkin, B., Webb, T. L., Chang, B. P. I., Prestwich, A., Conner, M., Kellar, I., Benn, Y., e Sheeran,
P. (2016). «Does monitoring goal progress promote goal attainment? A meta-analysis of the
experimental evidence». Psychological Bulletin, 142(2), 198–229.
81 Wohl, M. J. A., Pychyl, T. A., e Bennett, S. H. (2010). «I forgive myself, now I can study: how
self-forgiveness for procrastinating can reduce future procrastination». Personality and Individual
Differences, 48(7), 803–808.
TERCEIRA PARTE

Sustentar
CAPÍTULO 7

CONSERVAR

Quando as pessoas dizem burnout, a imagem que vem à mente é a de um


banqueiro de investimentos a trabalhar dezoito horas por dia num edifício
em Manhattan ou de um progenitor a aguentar sete empregos para alimentar
cinco bocas famintas.
Então, quando dei por mim deitado de bruços no sofá, na véspera de
Natal de 2020, a dizer à minha mãe que não conseguia trabalhar nem mais
um dia, fiquei aborrecido e um pouco confuso.
Já se tinham passado três anos desde que deixara a Faculdade de
Medicina, dois anos desde o meu desastroso turno de Natal e alguns meses
desde que fizera uma pausa em Medicina para me concentrar nos meus
negócios. Alguns meses gloriosos que culminaram nisto: eu a conversar
com a minha mãe por FaceTime, na véspera de Natal, a reclamar da minha
vida.
Por esta altura, eu dava toda a atenção à minha empresa. Tinha o
emprego dos meus sonhos: gerir uma pequena equipa para criar algo que
adorava. As coisas deveriam estar a correr muito bem. Mas, de alguma
forma, não estavam.
Embora com o meu negócio estivesse a ganhar muito mais dinheiro do
que jamais ganharia como médico, sentia-me esgotado. Durante meses, foi
cada vez mais difícil motivar-me para manter as coisas a funcionar. O que
antes era muito agradável começou a parecer uma tarefa árdua. E, porque
andava a arrastar-me, o meu trabalho começara a sofrer.
O que estava a acontecer? Eu adorava o meu trabalho. Mas, agora,
ficava esgotado só de pensar nisso.
Então ali estava eu, a contar isto à minha mãe. No início, ela disse
exatamente o que eu esperava: «Devias ter continuado em Medicina, Ali.»
(Ela já usara esta antes.) E, depois, disse algo que eu não esperava: «Parece-
me que estás a passar por um burnout.»
O meu primeiro pensamento foi: «Claro que não.» Estava familiarizado
com a ideia de burnout, obviamente. Mas nunca pensei que a palavra se
aplicaria a mim. Não estava a trabalhar desesperadamente para sobreviver.
Nem estava a fazer nada particularmente intenso. Que direito tinha eu de
me sentir esgotado?
Mas, nos minutos seguintes, ouvi a minha mãe (uma psiquiatra) explicar
que o burnout não é algo que acontece apenas a pessoas sobrecarregadas de
trabalho em empregos stressantes. Pode acontecer a qualquer pessoa
quando o trabalho deixa de parecer significativo, agradável ou exequível.
Quando estamos esgotados, sentimo-nos sobrecarregados e desmotivados.
Sentimos que não conseguimos acompanhar o ritmo, não importa quanto
tentemos.
Depois de desligar, decidi finalmente seguir um conselho dela e
descobrir mais. Fiquei a saber que, no ano anterior, a Organização Mundial
da Saúde (OMS) redefinira o burnout.82 O burnout não é apenas uma
síndrome de stress associada ao trabalho excessivo; era muito mais comum
do que isso. De acordo com a definição da OMS, o burnout é um
«fenómeno ocupacional», caracterizado por «sentimentos de falta de
energia ou exaustão; aumento da distância mental ao trabalho ou
sentimentos de negativismo ou cinismo relacionados com o trabalho; e
redução da eficácia profissional». E, o que é mais importante, não está
relacionado com o número de horas que trabalha — trata-se de como se
sente.
Com o tempo, isto levar-me-ia a uma epifania sobre produtividade.
Durante alguns anos, estive ciente da importância de me divertir para fazer
as coisas. Desde os meus primeiros meses como médico, conhecia os
efeitos de satisfação de três coisas: diversão, poder e pessoas. E, nos anos
desde o lançamento do meu negócio, melhorei a capacidade de me
«desbloquear» — superando a incerteza, o medo e a inércia que outrora me
transformaram num procrastinador crónico.
Mas então percebi que faltava alguma coisa. Porque, quanto mais
diversão trazia para o meu dia, mais coisas fazia. E, quanto mais coisas eu
fazia, mais perto ficava do grande obstáculo final para a verdadeira
produtividade: o burnout. Se não conseguisse encontrar uma forma de fazer
o meu trabalho e a minha vida durarem, todas as minhas pesquisas sobre os
segredos da produtividade Feel-Good seriam em vão. Eu dominava os
fundamentos da produtividade, mas ainda não dominava a produtividade
sustentável.
Então comecei a ler. E, quanto mais lia, mais percebia que existem três
forças comuns que nos fazem sentir pior e, por sua vez, nos levam ao
burnout. Elas são fáceis de confundir umas com as outras. Mas são
fundamentalmente diferentes.
Em primeiro lugar, há o burnout que surge simplesmente por assumir
muito trabalho. O seu humor está a sofrer porque está a acumular muitas
coisas a cada dia. Chamo a isso esgotamento por sobrecarga.
Em seguida, há burnouts relacionados com uma abordagem errada ao
descanso. O seu humor está a sofrer porque não se deu os períodos de folga
mais profundos de que precisa — não apenas pequenas pausas ao longo do
dia, mas pausas mais longas que recarregam a energia da sua mente, corpo e
espírito. Chamo a isso esgotamento por exaustão.
Finalmente, existem burnouts relacionados com fazer as coisas erradas.
O seu humor está a sofrer por causa das semanas, anos ou décadas em que
colocou todos os seus esforços em algo que não lhe traz alegria ou
significado, e isso desgastou-o. Tem usado a sua energia da forma errada.
Chamo a isso esgotamento por desalinhamento.
Nos dias seguintes àquele FaceTime com a minha mãe, comecei a
perceber que estava a sofrer um pouco dos três. Estava a fazer demasiado.
Não estava a descansar bem. E muitas das coisas que fazia pelo meu
negócio já não me traziam significado. Em todos os casos, o meu humor
estava a sofrer — e a minha produtividade também.
Porém, alguns dias depois disso, percebi algo mais animador: que cada
um destes problemas tinha solução.

ESGOTAMENTOS POR SOBRECARGA E COMO EVITÁ-


LOS
Decidi começar por me concentrar na minha sensação de sobrecarga.
Percebi que já há algum tempo andava a assumir demasiado. No início, não
tinha muito bem a certeza do que fazer a respeito disso: afinal, não poderia,
pura e simplesmente, desistir do meu negócio. Mas, então, tive um
vislumbre da solução.
Pouco depois daquele colapso com a minha mãe, dei por mim a ouvir
uma entrevista entre Tim Ferriss e o mundialmente famoso jogador de
basquetebol, LeBron James. Nunca fui um grande fã de basquetebol, mas
dei por mim numa pesquisa dedicada, a ver vídeos dos LA Lakers no
YouTube. À medida que aprendia mais, tive uma ideia fascinante: é quase
como se existissem duas versões de LeBron James.
Primeiro, há LeBron, o velocista. O homem que consegue obter a posse
da bola numa das pontas do campo de basquetebol e, num abrir e fechar de
olhos, está junto ao cesto do adversário. O homem que consegue correr a 27
quilómetros por hora. O homem que é um dos jogadores mais rápidos da
história da NBA.
E depois há LeBron, o caminhante. O homem que vagueia
indiferentemente pelo campo quando não tem a posse da bola. E o homem
que não vê necessidade de correr quando a tem. Porque o haveria de fazer,
se costuma encestar a mais de 10 metros de distância?
Muitos comentadores pensaram que esse contraste explicava a
longevidade francamente estranha de LeBron. LeBron dominava a NBA
desde meados dos anos 2000. Num desporto onde os atletas no seu auge
jogam em média quatro anos e meio, e uma média de cinquenta jogos nas
suas épocas, LeBron joga em média mais de setenta jogos por época há
dezanove anos.
Como é que ele conseguiu sustentar a sua posição ao longo de uma
carreira de vários anos? A resposta, ao que parece, está relacionada com a
tal caminhada.
Analistas desportivos vasculharam resmas de dados, de dentro e fora do
campo, de LeBron e de outros jogadores da NBA, e descobriram a mesma
coisa: embora seja um homem que consegue correr à velocidade de um
carro que percorre uma zona residencial, LeBron é, em média, um dos
jogadores mais lentos da NBA. Na época de 2018, a sua velocidade média
durante os jogos foi de 6,2 quilómetros por hora (mais ou menos a
velocidade de caminhada); ficou entre os dez últimos jogadores que
jogaram pelo menos vinte minutos por jogo. Durante a época, passou 74,4
por cento do tempo a caminhar no campo, um tempo incomparável a quase
todos os outros jogadores da liga.
Inesperadamente, LeBron James deu-me a minha primeira dica sobre
como superar a minha sensação de cansaço. Percebi que o esgotamento por
sobrecarga vem das emoções negativas que surgem quando fazemos muito,
demasiado rápido. Aceitamos mais trabalho do que podemos e deixamos de
fazer as pausas necessárias no nosso dia de trabalho. Corremos
constantemente.

Faça menos para poder desbloquear mais.

A solução? Siga o exemplo de LeBron. Conserve a sua energia. Faça


menos para poder desbloquear mais.

FAÇA MENOS

Em 1997, só havia uma coisa que todos queriam perguntar a Steve Jobs: o
que aconteceu ao OpenDoc? Nos cinco anos anteriores, os engenheiros da
Apple trabalharam arduamente na plataforma de software que, segundo
eles, revolucionaria a forma como os utilizadores criavam, partilhavam e
armazenavam os seus arquivos. E, então, Jobs voltou como CEO da Apple e
acabou com o programa quase imediatamente.
Na altura, muitos pensaram que Jobs tinha cometido um erro histórico.
Mas ele justificou-o com frontalidade. «As pessoas pensam que foco
significa dizer sim àquilo em que precisa de concentrar-se»83, disse ele.
«Mas não é isso que significa. Significa dizer não às centenas de outras
boas ideias que existem… Inovação é dizer não a mil coisas.»
A mensagem de Jobs era clara: o não era tão importante quanto o sim.
«Na verdade, estou tão orgulhoso das coisas que não fizemos quanto das
coisas que fiz», disse Jobs.
Era a decisão certa. Ao longo da década seguinte, a Apple cresceria
cada vez mais; tornando-se, na altura da morte de Jobs, em 2011, a empresa
de capital aberto mais valiosa do mundo.
Esta lição também é importante para todos nós. Alguma das seguintes
situações lhe parece familiar?

• Um amigo pergunta se quer jantar na próxima semana. Nesse dia


termina o prazo para um grande projeto seu, mas tem a certeza de
que terminará até lá. O dia em questão chega e está muito atrasado
no seu trabalho — não pode ir.
• Um colega tenta agendar uma reunião aborrecida dentro de alguns
meses. Agora, o leitor definitivamente não tem tempo, mas até lá
garantidamente terá, certo? Até que, repentinamente, a reunião é já
amanhã — e isso atrapalha completamente todas as suas outras
obrigações.
• Um amigo pergunta se quer jogar o seu videojogo favorito agora.
Está a trabalhar numa tarefa de grande dimensão que sabe que
demorará semanas, mas ainda falta para acabar o prazo. Com
naturalidade, dá por si a jogar World of Warcraft durante seis horas.
Oito semanas depois, falhou o prazo.

Em todos estes casos, sofremos de um problema simples: excesso de


comprometimento. É a primeira maneira de nos colocarmos no caminho da
sobrecarga: dizemos sim às coisas do presente, mas, a longo prazo, elas vão
esmagar-nos.
É fácil perceber porquê. Comprometer-se de mais é simplesmente muito
fácil. Mas isso não significa que não possa resistir.

EXPERIÊNCIA 1:

O portefólio de investimentos de energia

O primeiro passo para resistir ao comprometimento excessivo é ter uma


noção clara de para onde a sua energia realmente vai. Antes de começar a
dizer «não», precisa de descobrir aquilo a que deseja dizer «sim».
A ideia do «portefólio de investimentos de energia» é simples. Pode
simplesmente criar duas listas. A Lista A é uma lista de todos os seus
sonhos, esperanças e ambições — coisas que gostaria de fazer em algum
momento, mas provavelmente não agora. A Lista B é uma lista dos seus
investimentos ativos — projetos nos quais está a investir ativamente energia
agora (ou deseja estar). E por agora quero dizer esta semana.
Esta é a aparência do meu portefólio de investimentos de energia:

Sonhos, esperanças, ambições Investimentos ativos

Aprender mandarim Ganhar músculos

Aprender a andar de moto Aprender a cozinhar

Praticar tiro com arco Jogar mais squash

Fazer uma viagem pelos Estados Unidos numa Organizar umas férias em
caravana Portugal

Organizar um retiro de glamping

Fazer wakeboard

Experimentar acroioga

Aprender a surfar

Fazer mergulho em Bali

Viver como um nómada digital

Obter abdominais definidos

A lista de sonhos pode ser tão longa quanto quiser — está limitado
apenas pela sua imaginação. A minha lista de investimentos ativos é uma
seleção de projetos pessoais nos quais estou a trabalhar atualmente. Gosto
da terminologia de investimentos porque estou a investir energia no projeto,
e o retorno é (espero) o valor que isso me traz.
A lista de investimentos ativos deve ser limitada com base em quanto
tempo e energia tem para investir neles. Isto será diferente de pessoa para
pessoa. Gosto de limitar a minha a cerca de cinco, mas, se tem filhos
pequenos ou uma carreira agitada, pode aceitar três investimentos ativos.
Ou dois, ou um. Em todos os casos, porém, é aconselhável manter os seus
investimentos ativos na casa de um algarismo.
Se deseja incluir um sonho na sua lista de investimentos ativos, precisa
de ter a certeza de que tem tempo e energia para investir nele. Quando tem
um grande grau de escolha sobre o que poderia fazer com o seu tempo, fica
muito mais difícil comprometer-se com algo num determinado intervalo de
tempo. O nosso cérebro está sempre a pensar: «Estou a trabalhar em X
agora, mas talvez pudesse estar a trabalhar em Y ou possivelmente até em
Z.» Isso é arriscado; se está a remodelar uma casa enquanto trabalha num
grande projeto no seu emprego, enquanto tenta aprender japonês, enquanto
procura fazer o seu blogue descolar, enquanto tenta treinar a equipa de
futebol dos seus filhos, tudo vai parecer muito mais stressante.
O portefólio de investimentos de energia é crucial para resistir à lógica
sedutora do excesso de compromissos. Tendemos a pensar que podemos
fazer tudo. É um mito. Produtividade sustentável significa reconhecer as
limitações do nosso tempo. Toda a gente as tem.

EXPERIÊNCIA 2:

O poder do não

Um problema comum é que, mesmo quando sabemos a importância de


dizer «não», pode ser difícil dizê-lo de facto. Como podemos forçar-nos a
rejeitar as ofertas para as quais, realisticamente, não temos tempo?
A minha ideia favorita vem do escritor e músico Derek Sivers, que ele
chama de «claro que sim ou não».84 O seu conselho é o seguinte: quando
está a pensar se deve assumir um novo projeto ou compromisso, tem duas
opções — «claro que sim» ou «não». Não há meio-termo.
Com esse filtro, começa a descobrir que 95 por cento dos compromissos
são aqueles que deveria rejeitar. Raramente as coisas são um «claro que
sim». Geralmente são do tipo: «Isso pode ser útil ou relativamente
interessante, por isso, sim, porque não?» Essas são justificações do seu
cérebro que tem de ignorar. Pense em tudo o que já está a fazer. Se não for
um «claro que sim», não vale a pena.

Se não for um «claro que sim», não vale a pena.

Um segundo método é ainda mais simples e envolve uma pequena


reformulação. Envolve pensar no que os economistas chamariam de custos
de oportunidade. Os custos de oportunidade refletem o facto de que cada
«sim» que dizemos é um «não» a qualquer outra coisa que poderíamos ter
feito com esse tempo e energia.
Suponha que um colega de trabalho lhe pede para realizar alguns
projetos extra. Se o seu objetivo é conseguir uma promoção ou aumento e
ajudar em projetos extra é uma forma de chegar lá, então pode estar mais
inclinado a dizer «sim». Mas isso não tem em consideração tudo o mais que
poderia estar a fazer. Lembre-se daquilo a que está a dizer «não». Brincar
no parque com os seus filhos? Encontrar-se com um amigo que não vê há
muito tempo? Uma boa noite de sono?
Finalmente, existe um método que vem de Juliet Funt85, uma das
maiores especialistas mundiais no poder do não. Conselheira de CEO e
líderes de empresas da Fortune 500, Funt é autora de Parar, Pensar, Agir,
um livro que argumenta que dar a si mesmo espaço para pensar pode ser o
segredo para a produtividade sustentável. Quando a entrevistei para este
livro, perguntei qual era a conclusão mais prática da sua pesquisa. Ela
contou-me sobre um conceito poderoso: a «armadilha das seis semanas». A
armadilha é quando olha para o seu calendário para daqui a seis semanas,
vê todo o espaço em branco e pensa: «Eu poderia dizer sim a isto.» À
medida que o tempo passa, o espaço que estava vazio seis semanas antes
começa a parecer mais e mais completo. Quando chega o dia, percebe que
realmente não devia ter aceitado o compromisso — mas fê-lo, e agora não
quer desapontar as pessoas.
A solução dela é colocar a si mesmo uma pergunta simples. Sempre que
receber uma solicitação para daqui a algumas semanas, pense: «Eu ficaria
entusiasmado com este compromisso se ele acontecesse amanhã? Ou estou
apenas a pensar em dizer “sim” porque é mais fácil tornar isto um problema
para o meu eu futuro?»
É tão tentador pensar: «Daqui a seis semanas, a minha agenda estará
totalmente desimpedida, por isso definitivamente terei tempo e energia para
fazer isto.» Mas não terá. Daqui a seis semanas, a sua vida estará tão
preenchida quanto hoje. Se não dissesse sim a algo que aconteceria amanhã,
não devia dizer sim a algo que acontecerá daqui a um mês ou mais.

RESISTIR À DISTRAÇÃO
A nossa próxima estratégia para a conservação de energia baseia-se em
duas ideias. A primeira é óbvia: que os humanos são maus em multitasking.
A segunda menos óbvia: que não somos maus nisso da forma como
imagina.
Aprendi isto num estudo realizado pelas cientistas informáticas Rachel
Adler e Raquel Benbunan-Fich86, em 2012. A dupla desenvolveu uma
experiência na qual as pessoas tinham de alternar entre seis tarefas: um
desafio de sudoku, um enigma que envolvia ordenar letras para formar uma
palavra, alguns problemas visuais para detetar o elemento a mais e assim
por diante. Em seguida, reuniram um grupo de pessoas e dividiram-nas em
dois grupos. No grupo sem multitasking, os participantes tiveram de realizar
cada uma das tarefas em sequência. Isto significa que tiveram de terminar a
tarefa de sudoku antes de passar à tarefa de ordenar letras. No grupo
multitasking, diferentes janelas digitais foram abertas para cada uma das
seis tarefas, e os participantes foram informados de que poderiam clicar
entre as janelas para alternar entre as tarefas.
O resultado foi surpreendente. É claro que as pessoas que estavam
extremamente distraídas — aquelas que mudavam incessantemente de uma
tarefa para outra — tiveram um mau desempenho. Mas não foram os
voluntários menos distraídos — aqueles que se concentravam numa tarefa
de cada vez — que tiveram melhor desempenho. Quando os investigadores
traçaram um gráfico de «produtividade» no eixo vertical em relação ao
número de alternâncias entre janelas no eixo horizontal, encontraram um
padrão em forma de U invertido. Havia um nível saudável de distração no
meio — os melhores desempenhos eram aqueles que, ocasionalmente,
alternavam entre tarefas, mas não exageravam.
Porque é que a distração tem este efeito? Por um lado, a erosão das
nossas capacidades quando mudamos de foco com demasiada frequência
resulta daquilo a que os cientistas chamam «custos de mudança». Estes são
os recursos cognitivos e temporais gastos durante a transição entre as
tarefas. Pense no esforço mental necessário para se desligar de uma tarefa,
reorientar-se para a nova atividade e depois ajustar-se às suas exigências.
Este foi o problema que afetou os voluntários do lado direito do gráfico. Por
outro lado, quando passamos muito tempo concentrados numa tarefa,
também é provável que gastemos os nossos recursos cognitivos — então, o
nosso foco também diminui. Este foi o problema que afetou os voluntários
do lado esquerdo do gráfico.
Portanto, o objetivo é passarmos a maior parte do tempo focados em
apenas uma tarefa, mas não nos aborrecermos se, ocasionalmente,
perdermos a concentração. Mas como?

EXPERIÊNCIA 3:

Adicionar atrito

A minha primeira resposta leva-nos de volta às leis da física. No Capítulo 6,


aprendemos sobre os atritos que nos impedem de iniciar as tarefas. Quando
coloca a sua guitarra num canto distante da sala, é muito menos provável
que pegue nela do que quando ela está à frente do televisor. Quando se trata
de evitar distrações, pode inverter esta lógica, criando obstáculos entre si e
as tarefas que não deseja que desviem a sua atenção. Pense nisto como
adicionar atrito.
Consideremos o exemplo do jornalista desportivo David Lengel. No
início da meia-idade, com dois filhos pequenos e um trabalho desgastante,
Lengel percebeu algo deprimente. Só passava algumas horas por noite87
com a mulher e os filhos — estando a maior parte do tempo ao telemóvel.
«É assim que tudo acaba?», deu por si a perguntar certa noite. «É isto que
faremos para o resto das nossas vidas?»
A sua solução foi comprar um Nokia. Não um Nokia moderno com
touch screen e dezenas de aplicações. Um Nokia 3310 da velha guarda, o
famoso aparelho «indestrutível», completo com o jogo 2D Snake e pixéis
gigantes.
Os efeitos foram dramáticos. No início, sentiu-se estranhamente nu —
toda a gente usava o Twitter a caminho do trabalho, enquanto ele apenas
ficava sentado ali, a torcer os polegares. Mas, com o tempo, essa sensação
diminuiu. «E então», escreveu ele, «a magia começou a acontecer».
«Vi programas de televisão interessantes sem desviar a atenção, li livros
de verdade sem deslizar o dedo e tive o prazer de partilhar mais
experiências com a minha mulher», lembrou Lengel num artigo do jornal
The Guardian sobre a sua experiência. «E, como bónus, pude meter-me
com ela enquanto ela navegava no Instagram.» Teve um impacto
transformador na sua capacidade de concentração — e de encontrar alegria
na sua vida.
O método de Lengel envolvia adicionar atrito ao uso da tecnologia. Mas
não precisa de um telemóvel-tijolo para se focar novamente. Comece com o
óbvio. Desinstale do telemóvel todas as redes sociais em que é viciado. Se
quiser aceder-lhes, deverá encontrá-las através do motor de busca. Essa
pausa momentânea fá-lo reconsiderar se realmente deseja passar algum
tempo no Twitter, em vez de o fazer impulsivamente. Se isso não funcionar,
saia da aplicação. Dessa forma, na próxima vez que aceder, será necessário
fazer login novamente, o que levará 30 longos segundos; muitas vezes, isto
por si só será suficiente para impedir que verifique o seu feed.
Em seguida, passe para os métodos antitecnologia mais radicais.
Aproveito muito as ferramentas que tornam a tecnologia dolorosamente
lenta. Graças à omnipresença da Internet rápida, a velocidade com que
podemos aceder a distrações que drenam energia aumentou
dramaticamente. Uma forma de contornar isto é instalar ferramentas que
aumentem artificialmente o tempo de carregamento de determinadas
aplicações, para que sinta que está nos anos 1990. Sempre que abro o
Twitter ou o Instagram, a aplicação que possuo mostra-me um ecrã que diz
«Respire fundo» e, após três segundos, dá-me a opção de abrir o Twitter ou
o Instagram.
Normalmente, é o tempo de que preciso para pensar: «Será que
realmente quero fazer isto agora?» Às vezes, a resposta é um sólido sim.
Frequentemente, a resposta é: «Definitivamente não, apenas cliquei na
aplicação por hábito e não porque realmente queria usá-la.»

EXPERIÊNCIA 4:

Correção de trajetória

Mas, como vimos, a distração nem sempre é o fim do mundo. Na verdade,


as pessoas mais produtivas tendem a ser aquelas que se distraem um pouco,
mas não permitem que isso atrapalhe a sua produtividade. Para as restantes,
pode não ser tão fácil.
Às vezes, gosto de usar uma metáfora aeronáutica. Imagine que está
num voo de Londres para Nova Iorque. Recebe um aviso a meio do voo que
diz: «Por causa dos ventos fortes e da turbulência, alteramos a nossa
trajetória em alguns graus.» Não há problema nenhum nisso, até que o
piloto continua a falar: «Por este motivo, decidimos abandonar o nosso
destino original e seguir em direção a Buenos Aires.»
Na maioria dos aspetos das nossas vidas, se as coisas correm
ligeiramente mal, não nos deixamos sair completamente da trajetória. O e-
mail irritante do seu colega significa que o projeto ficará um dia atrasado,
mas não será cancelado imediatamente. Feriu-se na perna a correr, por isso
tem de parar de se exercitar por uma semana, mas não para sempre. Os
fortes ventos fazem que aterre cinco minutos depois do planeado, e não que
se desvie para Buenos Aires.
No entanto, quando se trata dos nossos padrões de trabalho diários,
somos enredados por uma lógica perversa — a que o blogger Nate Soares
chama «falhar com abandono»:88

• «Passei cinco minutos nas redes sociais; podia muito bem continuar
a fazer isto nas próximas três horas.»
• «Falhei o meu treino matinal; acho que o dia de hoje está perdido e
vou apenas ver televisão em vez de fazer alguma coisa.»
• «Falhei um dia na minha sequência da aplicação de aprendizagem
de idiomas, por isso é melhor desistir completamente de aprender a
língua.»
Falhar com abandono é um motivo comum pelo qual desperdiçamos
grandes quantidades de energia. O truque é voltar à trajetória.
Novamente, a solução é uma simples reformulação. Como vimos, não é
possível erradicar completamente a distração. Então, tem de a permitir.
Pense na distração como um desvio temporário; não uma indicação de que é
hora de abandonar completamente os seus planos. Desde que corrijamos a
trajetória, ainda chegaremos ao destino pretendido.

Dê a si mesmo permissão para se distrair.

Para fazer isso, é útil recorrer a um conceito emprestado do mundo da


meditação. Os professores reconhecem que meditar é difícil e que a mente
tem tendência a divagar. Portanto, no minuto final de muitas meditações
guiadas e aulas de meditação, eles costumam dizer algo como: «Se não
conseguiu aprofundar-se na prática, tudo bem. Não se preocupe. Pode
simplesmente recomeçar.» Um minuto de foco é melhor do que nada.
Costumo recitar o mantra «Recomeça» quando me distraio. É um
lembrete poderoso. Não falhe com abandono. Independentemente de como
está a correr — ou de como acha que está a correr —, pode sempre voltar
ao que importa.

FAÇA MAIS PAUSAS

Em 2008, os psicólogos James Tyler e Kathleen Burns convidaram sessenta


estudantes universitários89 para o seu laboratório. Um por um, os alunos
receberam a indicação para virarem as costas ao investigador e iniciarem
uma tarefa exaustiva: ficarem numa única perna e contarem de sete em sete,
em sentido decrescente, a partir de 2000 (2000, 1993, 1986, 1979…),
durante seis minutos.
Os alunos talvez tenham pensado que estavam a ser testados em
aritmética. Na verdade, Tyler e Burns estavam muito mais interessados na
segunda parte da experiência. Após os seus esforços sobre uma única perna,
os alunos foram divididos aleatoriamente em três grupos. Um deles teve
uma pausa de um minuto antes de prosseguir para a próxima tarefa; outro
teve um intervalo de três minutos; e o grupo mais sortudo teve um intervalo
de dez minutos antes de prosseguir.
Em seguida, os investigadores pediram aos alunos que voltassem ao
laboratório principal. Uma vez mais, foi-lhes pedido que se virassem de
costas para o investigador. Porém, desta vez a tarefa foi diferente. Desta
vez, receberam um punho e foi-lhes pedido que o apertassem com a mão
não dominante o máximo que conseguissem. Ao fazerem isso, um
investigador cronometrou secretamente o tempo que conseguiam aguentar.
Pode pensar que segurar algo é apenas uma medida da força da mão.
Mas não foi isso que os investigadores descobriram. Na verdade, o principal
determinante do sucesso do aperto da mão foi a duração das pausas. Não
houve muita diferença entre os dois primeiros grupos: o grupo de um
minuto apertou o punho por 34 segundos em média, o grupo de três
minutos, por 43 segundos. O grupo de dez minutos foi diferente. Em média,
apertaram o punho por 72 segundos. A conclusão foi simples: adicionar um
intervalo de apenas dez minutos entre duas tarefas que exigem autocontrolo
parece ajudar a combater a sobrecarga
O estudo de Tyler e Burns sugere a última forma de conservar a nossa
energia. Até agora, aprendemos a importância de simplesmente dizer não e
eliminar distrações. Mas falta um ingrediente final. Porque a verdade é que
todos os dias precisa de tempo para pausas. E mais tempo do que imagina.
Na verdade, as pessoas que parecem fazer mais são, muitas vezes,
aquelas que transformaram o não fazer nada por longos períodos de tempo
numa bela arte. Num estudo, a empresa de software Draugiem Group
decidiu descobrir quanto tempo as pessoas gastavam em diversas tarefas e
como isso se relacionava com a produtividade de cada trabalhador. Os
trabalhadores mais produtivos não foram os que pareciam colados às suas
secretárias. Nem foram eles que se deram uma pausa saudável de cinco
minutos a cada hora. Os trabalhadores mais produtivos concederam-se uma
quantidade de tempo de folga quase inacreditável: uma proporção de
cinquenta e dois minutos de trabalho para dezassete minutos de descanso.
Portanto, o último passo para conservar energia é ainda mais simples do
que os dois primeiros: encontre e aceite momentos no seu dia de trabalho
para não fazer nada.

EXPERIÊNCIA 5:

Agende as suas pausas


A primeira forma pela qual podemos aproveitar o poder redentor da pausa é
diabolicamente simples: marque um tempo na sua agenda para não fazer
nada. E marque mais do que pensa.
A maior parte do trabalho de conhecimento que realizamos agora requer
algum elemento daquilo a que os psicólogos chamam «esforços de
autorregulação».90 Esta é a nossa capacidade de controlar o nosso
comportamento, pensamentos e sentimentos. Escrever este parágrafo agora
exige que me autorregule, resistindo à tentação de fazer algo mais fácil e
concentrando a minha atenção nas palavras desta página.
Os psicólogos acreditam que a nossa capacidade de autorregulação é um
recurso limitado, que se esgota facilmente. Quanto mais tempo fico sentado
nesta cadeira a escrever este livro, mais difícil é para mim ficar sentado e
continuar a escrever: já «esgotei» esse recurso. Para conservar os nossos
níveis de energia durante uma sessão de trabalho, precisamos de encontrar
formas de a repor.
Quando trabalhava no serviço de urgência, lembro-me de ter ficado
surpreendido com a ênfase dada a esse ponto. Nunca me vou esquecer de
estar no meu primeiro turno nas urgências, cinco horas após ter começado.
A sala de espera transbordava com mais de cem pacientes, alguns dos quais
estavam de pé porque não havia espaço para se sentarem. As alas
hospitalares estavam lotadas de pacientes em estado crítico, e tivemos de
atender alguns dos nossos pacientes no meio do corredor porque todos os
consultórios estavam ocupados.
Eu estava completamente perdido. O meu turno tinha começado às 8
horas, e já eram 13 horas. Senti-me culpado por trabalhar tão devagar em
comparação com os outros, por isso decidi ignorar o almoço e continuar a
trabalhar com os pacientes. Mas, enquanto eu olhava para a lista de espera
para ver quem era o próximo na fila para ser atendido, um dos médicos
especialistas, o Dr. Adcock, deu-me um toque no ombro.
— Ali, pelo que sei, ainda não fez uma pausa. Porque é que não sai
agora e almoça? — O Dr. Adcock ergueu uma sobrancelha e inclinou a
cabeça, com a sua característica expressão de «transmitir notícias sérias».
— Obrigado, mas estou bem — disse eu. — Não tenho fome, e há
muitos pacientes para atender, por isso fico feliz em continuar e beber um
café mais tarde.
Supus que ele me daria uma palmadinha no ombro e diria: «Muito bem,
é esse o espírito» e iria embora com maior respeito pela minha incrível ética
de trabalho. Não o fez. Em vez disso, estendeu a mão por cima do meu
ombro e desligou o monitor do computador.
Quando me virei para ele, um pouco confuso, ele sorriu.
— Olhe, sei que é o seu primeiro dia e aprecio que esteja empenhado.
Mas ando nisto há tempo suficiente para saber que os pacientes continuarão
a chegar. A menos que faça uma pausa, perderá o foco e poderá cometer um
erro. Isso não é bom para ninguém.
Olhei em volta para a desordem que me cercava. A campainha de
emergência tocava numa das salas do outro lado do átrio. Havia pessoas em
macas ao longo do corredor. Era um caos.
O Dr. Adcock seguiu o meu olhar.
— Não será útil a ninguém se estiver exausto, mas pode tomar decisões
mais eficazes se reservar um tempo para recarregar as baterias e concentrar-
se novamente — disse ele. — Ninguém vai morrer porque você foi almoçar.
Há sempre tempo para isso.
No meio do caos que é a medicina num serviço de urgência, esta era a
regra de ouro que todos os médicos seguiam. Tem de se fazer uma pausa a
cada quatro horas. Antes de trabalhar lá, pensei que seria como o Capitão
Barbossa descreve o «código dos piratas» em Piratas das Caraíbas —
«Mais o que se chama de sugestões do que verdadeiras regras».
Eu estava errado. O trabalho de um médico especialista era semelhante
ao de um general do exército, gerindo a movimentação das tropas no campo
de batalha. E grande parte disso era garantir que todos os médicos fizessem
uma pausa a cada quatro horas e que nenhuma área ficasse com falta de
pessoal por força dessa regra.
Até hoje, ainda penso naquela fatídica hora de almoço nas urgências.
Todos os dias, antes de começar a trabalhar, penso em quando estarei a
sentir-me mais sobrecarregado e marco quinze minutos nos horários em que
acho que mais precisarei de uma pausa. E sempre que me sinto tentado a
avançar, lembro-me da ciência da autorregulação — quanto mais se
trabalha, mais sobrecarregado se fica. E lembro-me da importância do
descanso — mesmo quando achamos que não precisamos dele.

As pausas não são um regalo especial. São uma


necessidade absoluta.
Lembre-se do Dr. Adcock. Mesmo que o seu objetivo seja salvar vidas,
as pausas não são um regalo especial. São uma necessidade absoluta.

EXPERIÊNCIA 6:

Aceite distrações energizantes

Porém, nem todas as pequenas pausas devem ser programadas na sua


agenda. Às vezes, descansos não planeados podem ser benéficos. Chamo-
lhes «distrações energizantes».
Comecei a pensar sobre o poder das distrações energizantes quando me
deparei com o trabalho do mestre Zen vietnamita Thich Nhat Hanh. Muitas
vezes descrito como o «pai do mindfulness», Thich Nhat Hanh nunca usou
o termo. Em vez disso, via o seu trabalho como uma introdução ao mundo
da antiga sabedoria dos ensinamentos budistas; algo que ele começou a
fazer depois de ser exilado do Vietname do Sul, na década de 1960, por se
recusar a apoiar a Guerra do Vietname.
Para mim, a mais poderosa das ideias de Nhat Hanh é o «sino do
despertar». Na tradição budista de Nhat Hanh, conhecida como Plum
Village, em homenagem ao Mosteiro de Plum Village que ele fundou em
França, em 1982, sinos são usados para marcar o início de uma sessão de
meditação. Mas, muitas vezes, também são tocados aleatoriamente durante
o dia. O inesperado «toque» do sino levava a que as pessoas parassem o que
estavam a fazer e se apercebessem de onde estavam. Encorajava-as a
estarem presentes.
Quando encontrei os ensinamentos de Thich Nhat Hanh, percebi que
nem todas as distrações são iguais. Claro, algumas distrações impedem que
alcance o que deseja — notificações do Twitter, e-mails urgentes e assim
por diante. Mas algumas distrações podem trazer energia positiva para as
nossas vidas, obrigando-nos a fazer uma pausa, refletir e levar as coisas a
um ritmo mais moderado.
Assim que comecei a pensar em algumas distrações como energizantes,
percebi que as usava há anos — sem ter percebido que eram isso. Quando
estava na universidade, decidi que os amigos sempre seriam uma distração
bem-vinda. Em vez de fechar a porta enquanto estudava, mantinha-a aberta
com um batente, o que significava que, sempre que um amigo passasse a
caminho do seu próprio quarto, poderia enfiar a cabeça e dar uma
espreitadela para uma rápida (ou não tão rápida) conversa. Sim, isso
provavelmente «desperdiçou» um pouco de energia e reduziu a minha
eficácia enquanto estudava. Mas proporcionou-me algo muito mais
energizante: momentos de qualidade com os amigos. Quando penso nos
meus tempos de universidade, não desejo ter trabalhado mais ou com mais
eficiência. Estou feliz por ter reservado um tempo para ter estas interações
fortuitas com os meus amigos.
Há uma alegria em algumas distrações. Pense nelas como convites
curtos e incisivos para uma pausa — como o sino do despertar de Thich
Nhat Hanh. A vida não é manter o foco o tempo inteiro. Trata-se de permitir
espaço para pequenos momentos de acaso e alegria.

RESUMINDO

• A maior causa do burnout não é a exaustão. É a falta de


ânimo. Se conseguir sentir-se melhor, não apenas
conseguirá mais — também durará mais.
• O nosso primeiro tipo de esgotamento surge da sobrecarga.
A solução: faça menos.
• Na prática, há três formas de fazer menos. A primeira é
evitar compromissos excessivos. Limite a lista de projetos
em que está a trabalhar e sinta-se confortável em dizer
«não». Pergunte a si mesmo: Se eu tivesse de escolher
apenas um projeto onde investir toda a minha energia, qual
seria?
• A segunda forma é resistir à distração. Pergunte a si
mesmo: posso desinstalar aplicações de redes sociais do
meu telemóvel para aceder a elas apenas através do
navegador de Internet? Como posso corrigir a trajetória e
reiniciar se (ou, mais realisticamente, quando) me distrair?
• A terceira forma é encontrar momentos, no seu dia de
trabalho, para não fazer nada. Pergunte-se: Estou a tratar
as pausas como um evento especial e não como uma
necessidade? E o que posso fazer para ter mais pausas?
82 Ver https://www.who.int/news/item/28-05-2019-burn-out-an-occupational-phenomenon-
international-classification-of-diseases
83 Pode ver o discurso de Steve Jobs aqui: https://www.youtube.com/watch?v=H8eP99neOVs
84 Aprenda mais acerca do livro de Derek Sivers aqui: https://sive.rs/n
85 Funt, J. (2022). Parar, Pensar, Agir: basta um minuto para mudar de direção. Matéria Prima.
Lisboa.
86 Adler, R. F., e Benbunan-Fich, R. (2012). «Juggling on a high wire: multitasking effects on
performance». International Journal of Human-Computer Studies, 70(2), 156–168.
87 Lengel, D. (2018). «I’ve decided to reclaim my life — by using an old Nokia phone». The
Guardian. Disponível online: www.theguardian.com/lifeandstyle/2018/mar/31/nokia-3310-t9-phone-
smartphone-iphone-reclaim-life
88 Pode ler mais informação sobre o conceito de Nate de fracassar com abandono aqui:
https://mindingourway.com/failing-with-abandon/
89 Tyler, J. M., e Burns, K. C. (2008). «After depletion: the replenishment of the self’s regulatory
resources». Self and Identity, 7(3), 305–321.
90 A autorregulação diz respeito ao processo pelo qual os indivíduos gerem os seus pensamentos,
sentimentos e comportamentos para alcançar objetivos pessoais. Implica um leque variado de
competências como o controlo de impulsos, o atraso de gratificação, a gestão de reações emocionais
e o foco contínuo nas tarefas. Para mais informação, pode ver https://positivepsychology.com/self-
regulation/
CAPÍTULO 8

RECARREGAR

O ano de 2020 foi difícil para os lexicógrafos da Oxford University Press.


Além da sua função principal — compilar o Oxford English Dictionary
(OED) —, todos os anos eles reúnem-se para nomear a Palavra do Ano, um
neologismo que captura a essência dos últimos doze meses. Durante anos,
as suas nomeações foram notícia por captarem a mundividência. 2008:
credit crunch91. 2013: selfie. 2015:.
Mas 2020 foi mais difícil do que nunca. À medida que a covid-19 se
espalhava, uma panóplia de novos termos irrompeu no léxico:
«confinamento», «distanciamento social», «supertransmissão». No final, o
OED não conseguiu contentar-se com apenas uma palavra.92 «Dada a
amplitude fenomenal da mudança e do desenvolvimento linguístico durante
2020», escreveram, «a Oxford Languages concluiu que este é um ano que
não pode ser perfeitamente acomodado numa única palavra».
Para mim, porém, a verdadeira palavra do ano estava escondida na
página seis do relatório do OED: «doomscrolling»93. Como a maioria das
pessoas, em 2020, passei grande parte do meu tempo de descanso a
recarregar, irrefletidamente, as redes sociais. «Devia estar a relaxar», dava
por mim a pensar. «E, no entanto, em vez disso, parece que ingeri 2500
tweets sobre os efeitos económicos do confinamento nos fabricantes de
velas de luxo em Vermont.»
A maioria das pessoas já experienciou os perigos do doomscrolling.
Após um longo dia de trabalho, acomoda-se no seu lugar preferido no sofá,
com o telemóvel na mão, pronto para alguns minutos de relaxamento. No
entanto, em vez da pausa pacífica que planeou, é sugado por um vórtice
interminável de negatividade, consumindo uma story, um tweet ou um
vídeo angustiante após outro. A primeira vítima: o nosso humor. Achamos
que estamos a descansar, mas não é o caso.
No capítulo anterior, falámos sobre a tendência de nos esgotarmos
devido à sobrecarga, prejudicando o nosso humor ao fazermos demasiado e
não realizarmos pausas suficientes no trabalho. A solução, aprendemos, é
conservar a nossa energia de forma mais eficaz. Mas também podemos
esgotar-nos durante o tempo fora do trabalho. Fazer doomscrolling, ver
programas de televisão compulsivamente, verificar e-mails ou notificações
do WhatsApp sem pensar — estas são as maneiras pelas quais sabotamos as
nossas emoções de satisfação durante o nosso tempo de inatividade.
As tensões resultantes contribuem para aquilo a que chamo esgotamento
por exaustão. Surge de não se dar tempo ou espaço suficiente para
realmente rejuvenescer.
Faça esta experiência simples. Defina um cronómetro para cinco
minutos e faça duas listas. A primeira é de coisas que tende a fazer quando
se sente sem energia. A segunda é de coisas que tendem a realmente
recarregar essa energia. Se for como eu, poderá descobrir que as duas listas
parecem muito diferentes.

Coisas que faço quando estou sem energia Coisas que faço e realmente
me energizam

Ver o Instagram Fazer uma caminhada

Ver o TikTok Tocar um pouco de guitarra

Deitar-me no sofá e procurar, incessantemente, um filme Falar com um amigo e sugerir


aleatório para ver na Netflix um jantar

Ver o Twitter, sentindo-me indignado com o que está a Fazer ioga ou alongamentos
acontecer no mundo

Encomendar comida pouco saudável Ir ao ginásio para um treino


rápido

Estas diferenças entre o que fazemos automaticamente quando nos


sentimos esgotados e o que realmente nos rejuvenesceria mostra que a
forma como descansamos raramente é repousante. E levanta uma questão:
Como podemos quebrar o doomscrolling/maratonas de séries/comida pouco
saudável e envolver-nos em atividades que realmente nos fazem sentir bem?
Parece óbvio, mas nem sempre usamos as pausas ou o tempo livre para
fazermos aquilo que nos permite sentir bem — são estas coisas que
realmente recarregam a nossa energia, ajudando-nos a evitar o burnout.

RECARREGUE CRIATIVAMENTE

Já ficou completamente imerso numa tarefa criativa — escrever um poema,


aprender uma música, fazer um desenho — e descobriu que, quando
terminou, havia esquecido completamente as suas preocupações?
De acordo com uma equipa de psicólogos da Universidade Estadual de
São Francisco e da Universidade Estadual de Illinois94, este é um fenómeno
cientificamente verificável. Argumentam que as atividades criativas têm
maior probabilidade de nos fazer relaxar. E apresentam quatro
características que são especialmente úteis para nos fazer sentir bem.
Primeiro, as atividades criativas desbloqueiam o nosso sentido de
aptidão. Aprendemos no Capítulo 2 que, quando sentimos que estamos a
adquirir novas competências, recebemos um impulso de energia. Bem, isso
é particularmente provável quando está a fazer algo criativo. Ao escrever
aquele poema ou compor aquela música, experimenta uma sensação de
evolução no seu trabalho. E assim a sua aptidão aumenta.

Em segundo lugar, as atividades criativas estimulam a autonomia. Este


conceito também foi introduzido no Capítulo 2, onde aprendemos que uma
sensação de propriedade sobre o nosso trabalho é altamente energizante. Da
mesma forma, quando nos envolvemos em atividades criativas, é provável
que sintamos a mesma impressão de autonomia que nos ajuda a
rejuvenescer. Por exemplo, se começar a pintar, terá controlo sobre o que
está a pintar e o modo como está a pintar.
Terceiro, as atividades criativas dão-nos um sentido de liberdade.
Ajudam-nos a desligar adequadamente do nosso trabalho; é difícil
permanecer em «modo trabalho» quando se está totalmente focado em
aprender a tocar guitarra. Isso dá-nos uma sensação de liberdade que nos
afasta do resto das nossas vidas profissionais.
E, finalmente, as atividades criativas ajudam-nos a serenar. Bem feitas,
as atividades criativas são descontraídas e de baixo risco. Praticar as suas
competências de tricô, fazendo uma camisola para o seu amigo com uma
música suave em fundo (em vez de, digamos, entrar com a camisola numa
competição de tricô de alto risco com dois mil rivais e um prazo iminente),
ajuda a escapar do stress do tempo de trabalho.
Portanto, tarefas criativas, realizadas corretamente, podem libertar a
nossa energia de pelo menos quatro maneiras. Mas isso levanta algumas
questões. Na prática, como podemos saber que tarefas criativas nos vão
acalmar? E como podemos integrá-las nas nossas vidas?

EXPERIÊNCIA 1:

Passatempos criativos

O ex-presidente dos Estados Unidos George W. Bush, o rei Carlos III de


Inglaterra e a sensação pop Taylor Swift têm mais em comum do que
imagina.
Existem semelhanças óbvias, claro. São todos absurdamente ricos. São
todos objeto de loucas teorias de conspiração. São todos propensos a fazer
digressões opulentas à volta do mundo. Mas também partilham algo
inesperado: o amor pela pintura. Bush pinta veteranos militares. O rei
Carlos pinta delicadas paisagens escocesas. Swift pinta de tudo —
paisagens marítimas, flores, folhagens —, geralmente em cores ousadas e
atmosféricas.
A pintura é, na minha opinião, a atividade criativa por excelência. Por
mais inexperiente que alguém seja quando começa a pintar, ao persistir,
continuará a ganhar aptidão com o tempo. Regra geral, tem-se autonomia
sobre o que se está a pintar e como se está a pintar. Provavelmente, não há
um vínculo com o trabalho diário, e, portanto, os pintores amadores
experienciam a sensação de libertação. E, normalmente, é uma atividade
suave e descontraída.
Mas o que torna a pintura particularmente importante é o facto de, para
quase todas as pessoas, ser apenas um passatempo. É algo de que desfruta
puramente nos seus próprios termos, sem um objetivo final à vista e sem
nenhum benefício monetário a ser encontrado.
Os passatempos são a primeira forma de integrarmos as atividades
criativas nas nossas vidas. O que principalmente define um passatempo é o
facto de envolver baixos riscos; simplesmente não há como ganhar ou
perder num passatempo, nem como transformá-lo num negócio. Muito
poucas pessoas descobrirão, na idade adulta, que somos pintores de padrão
profissional (especialmente George W. Bush).
Como podemos maximizar o potencial destes passatempos criativos? O
truque é garantir que permaneçam exatamente assim: distintos do seu
trabalho, sem um objetivo final claro e sem stress. Para esse fim, pode ser
útil garantir que o seu passatempo tenha limites claros. Estabeleça horários
específicos para a sua atividade criativa e diferencie-a do seu trabalho e
responsabilidades diárias. Experimente dedicar uma sala ou espaço
específico ao seu passatempo, desativando as notificações de trabalho
durante o período criativo ou estabelecendo uma programação regular para
quando realizará a atividade escolhida.
Em seguida, lembre-se, continuamente, de que o passatempo deve ser
aproveitado pelo processo, e não por qualquer tipo de objetivo de alto risco.
Ao pintar, jogar ou construir, lembre-se de que esta é uma arena em que a
qualidade não importa. Portanto, permita-se cometer erros, experimentar e
crescer ao seu próprio ritmo. O seu objetivo principal não é tornar-se um
especialista ou mestre. É aproveitar e recarregar.
Acima de tudo, resista ao impulso de transformar o seu passatempo em
«trabalho». Em 2017, George W. Bush publicou uma coleção das suas
pinturas intitulada Portraits of Courage. Na generalidade, os críticos
ficaram surpresos com a qualidade do seu trabalho, ainda que ele tenha
dado, a alguns dos seus sujeitos, características um tanto disformes. Mas
tornar público o seu passatempo desta forma — colocá-lo sob o olhar do
público ou mesmo tentar monetizá-lo — é arriscado. Significa que pode
deixar de ver o seu passatempo como uma verdadeira recreação e, em vez
disso, encará-lo como um trabalho secundário.
Se quiser recarregar as energias adequadamente, precisa de manter áreas
da sua vida nas quais o progresso pessoal não está em causa.

EXPERIÊNCIA 2:

Projetos criativos

Outra forma de recarregar energias de forma criativa é realizando um


projeto específico. Ao contrário de um passatempo aberto, um projeto tem
começo e fim definidos. Os projetos podem ser particularmente úteis na
construção do nosso sentido de aptidão e autonomia, pois dão-nos uma
impressão de realização quando atingimos o nosso objetivo.
Antes de começar a escrever este livro (e depois de superar o meu
colapso como médico), aprender sobre produtividade era o meu projeto
criativo. Durante meses, chegava a casa do trabalho, punha música a tocar e
lia sobre a ciência de conseguir fazer as coisas. Estava a desenvolver
competências porque aprendia constantemente sobre as mais recentes
pesquisas psicológicas. Tive autonomia porque pude fazer o que quisesse
durante esse período e explorar os métodos de forma criativa por conta
própria. Tive liberdade do meu trabalho diurno como médico, o que era
totalmente diferente da experiência de ser especialista noturno em
produtividade. E, na altura, os riscos pareciam baixos — então, sentia-me
relaxado e tranquilo enquanto lia. (Para ser sincero, quando assinei o
contrato para este livro, os riscos aumentaram um pouco.)
Um projeto criativo pode ser quase qualquer coisa criativa que tenha um
objetivo final claro. Pode começar a fotografar, estabelecendo a meta de
tirar uma foto todos os dias durante um ano. Pode aprender a programar,
estabelecendo o objetivo de criar um jogo RPG baseado em texto. Pode
aprender a fazer mantas de retalhos, estabelecendo o objetivo de criar um
presente para o próximo aniversário da sua mãe.
E, se quiser potenciar ainda mais os efeitos do seu projeto criativo,
considere incorporar pessoas nele. Como vimos no Capítulo 3, quando
realizamos uma tarefa com amigos ou como parte da nossa comunidade em
geral, aproveitamos a energia que provém da ligação humana. Prosperamos
em ambientes onde podemos aprender uns com os outros, trocar ideias e
celebrar juntos os nossos sucessos.
Se o seu projeto criativo envolve pintura ou desenho, pode participar em
aulas de arte ou integrar um grupo de pintura onde partilhar o seu
progresso. Se é apaixonado por escrever, pode fazer parte de um grupo de
escrita ou participar em workshops de escrita criativa, onde poderá evoluir
juntamente com outros escritores. Seja qual for o seu projeto, quando
constrói uma comunidade em torno dele, aproveita o poder de recarga das
pessoas.

RECARREGUE NATURALMENTE

Numa ala tranquila de um hospital suburbano da Pensilvânia, dois grupos


de pacientes recuperavam de uma cirurgia à vesícula biliar.95 Mas não
recuperavam à mesma velocidade.
Um grupo tinha quartos com janelas que davam para um sereno bosque
de árvores frondosas. O outro estava de frente para uma parede de tijolos
fria e sem vida. Roger Ulrich, iniciando a sua carreira como professor
assistente que investigava a estética ambiental, estava interessado em aferir
o efeito desta diferença. Para sua surpresa, descobriu que os pacientes cujas
janelas davam para a vegetação estavam a recuperar, em média, um dia
inteiro mais rápido, necessitando de significativamente menos analgésicos e
enfrentando menos complicações do que os pacientes que olhavam para a
parede.
Assim começou o fascínio de Ulrich pelo impacto da natureza no
processo de cura. Menos de uma década depois, este uniu-se a colegas do
Hospital Universitário de Uppsala, na Suécia, para testar, com mais rigor, os
efeitos da natureza na recuperação. A sua equipa concentrou-se em 160
pacientes de cirurgia cardíaca na unidade de cuidados intensivos. Os
pacientes foram colocados aleatoriamente numa de seis condições: um
quarto com uma «vista de janela» simulada, apresentando uma grande
fotografia da natureza, retratando ou uma paisagem ampla e arborizada com
um riacho ou uma cena sombria de floresta; um de dois quartos com
pinturas abstratas, um com um painel branco liso, e um com uma parede
branca. Portanto, não há muita diferença entre os quartos, pode pensar. E,
ainda assim, os efeitos foram impressionantes. Os pacientes que receberam
a cena tranquila da água e das árvores experimentaram significativamente
menos ansiedade e precisaram de menos doses de analgésicos potentes.
Aqueles que foram expostos à fotografia mais sombria da floresta, à arte
abstrata ou a nenhuma imagem tiveram resultados substancialmente piores.
Nos quarenta anos seguintes, a investigação de Ulrich sobre os efeitos
curativos da natureza teria um efeito transformador na arquitetura
hospitalar; é parte da razão pela qual jardins e espaços verdes são um traço
tão comum dos hospitais modernos em todo o mundo. A natureza, como
mostra a sua investigação, ajuda-nos a curar — com décadas de
investigação a indicarem que passar tempo na natureza desencadeia uma
resposta fisiológica que reduz os níveis de stress e rejuvenesce a nossa
capacidade de concentração.

A natureza reabastece as nossas habilidades cognitivas


e aumenta a nossa energia.

Portanto, aproveitar a glória do mundo natural é a nossa segunda


maneira de recarregar as energias adequadamente. A natureza reabastece as
nossas habilidades cognitivas e aumenta a nossa energia. A natureza faz-nos
sentir bem. Precisamos de uma forma de integrá-la no nosso descanso.

EXPERIÊNCIA 3:

Trazer a natureza

Pode muito bem estar a pensar: «Sim, Ali, todos nós gostaríamos de passar
mais tempo na natureza. Infelizmente, muitos de nós vivem em extensas
selvas de betão ou em subúrbios insípidos.» Encontrar a natureza é mais
fácil de dizer do que de fazer.
No entanto, para mim, é por isso que a investigação de Ulrich é tão
revolucionária. Lembre-se de que os participantes do estudo de Ulrich
apenas olharam para algumas fotos de árvores. As árvores nem estavam lá!
E, ainda assim, os efeitos foram significativos. A ciência é clara: conectar-
se com a natureza demora menos — e exige menos esforço — do que
pensa.
Essas conexões podem demorar menos de um minuto. Num estudo, os
investigadores reuniram um grupo de 150 estudantes universitários96 e
submeteram-nos a um teste concebido para medir a sua concentração. Antes
e depois do teste, os participantes fizeram uma «micropausa» de 40
segundos para ver um telhado verde ou um telhado de cimento. Os alunos
que tiveram um vislumbre do telhado verde cometeram significativamente
menos erros e mostraram um foco mais consistente na tarefa em questão,
em comparação com os seus colegas que viram o telhado de cimento.
Na verdade, estas conexões nem sequer precisam de envolver
estimulação visual. Um estudo publicado em 2018 pediu aos participantes
que fechassem os olhos97 e ouvissem paisagens sonoras naturais (canto dos
pássaros, sons de uma floresta tropical, de gaivotas, da chuva de verão).
Embora só tenham ouvido os sons naturais calmantes durante sete minutos,
relataram sentir-se mais energizados no seu trabalho durante horas.
Portanto, tirar energia da natureza não significa necessariamente
embarcar, ao ar livre, numa caminhada de sete horas. Uma maneira óbvia é
considerar a integração de um espaço verde em sua casa. Idealmente, isso
pode significar criar um pequeno jardim ou adquirir algumas plantas de
interior. Mas, se não tem tempo nem recursos, não tema: simplesmente
colocar uma foto do mundo natural na sua mesinha de cabeceira terá um
efeito de recarga.
Ou considere reservar algum tempo para ouvir sons naturais. Na
verdade, não precisa de embrenhar-se numa floresta tropical para convencer
o seu subconsciente de que está numa. Então, porque não passar cinco
minutos antes de dormir a ouvir os sons da floresta tropical no seu
telemóvel — apenas por tempo suficiente para relaxar até adormecer?

EXPERIÊNCIA 4:

Dar um passeio

Outra forma de recarregar energia é ainda mais simples do que descarregar


uma aplicação de sons da natureza: dê um passeio.
Figuras que vão de Steve Jobs a Virginia Woolf enfatizaram a
importância das suas caminhadas diárias para se sentirem verdadeiramente
descansados. O poeta e filósofo Henry David Thoreau disse, certa vez:
«Acho que não consigo preservar a minha saúde e o meu ânimo, a menos
que passe pelo menos quatro horas por dia — e geralmente é mais do que
isso — a passear pelas florestas e pelas colinas e campos, absolutamente
livre de todos os compromissos mundanos.»
Mais uma vez, porém, este conselho corre o risco de induzir um revirar
de olhos de proporções épicas. Thoreau conseguia passar quatro horas por
dia a caminhar porque o seu amigo, o poeta Ralph Waldo Emerson, teve a
gentileza de deixá-lo viver sem pagar renda na sua grande floresta em
Massachusetts durante grande parte da década de 1840. Nem todos temos
tanta sorte; quatro horas a divagar «absolutamente livre de todos os
compromissos mundanos» não é assim tão fácil de encaixar no seu dia,
entre trabalho, família e amigos. Alguns de nós têm de trabalhar para viver,
Henry.
Às vezes, sinto o mesmo em relação à máxima de que todos deveríamos
caminhar 10 mil passos por dia. Este número — agora adotado pela
Organização Mundial da Saúde, pela American Heart Foundation e vários
outros — está tão consolidado que dispositivos como o Apple Watch e a
Fitbit o adotaram. É quase tão omnipresente quanto a recomendação de
cinco porções de fruta e legumes por dia. No entanto, a origem real e a base
científica destes números são duvidosas. É como um equivalente moderno
das «quatro horas ou fracasso» de Thoreau. Algumas pessoas atingirão os
10 mil passos. Outras não. Mas não é totalmente claro porque é que este
tem de ser o objetivo.
Um estudo de 2011 mostra que as medidas tomadas podem não ser o
mais importante quando se trata de aproveitar os efeitos de uma boa
caminhada. Naquele ano, um grupo de psicólogos da Suécia e dos Países
Baixos98 investigou o efeito da caminhada na saúde mental. Recrutaram
vinte estudantes universitários para participarem numa experiência de
campo. Os resultados mostraram, sem surpresa, que caminhar fez as
pessoas sentirem-se melhor, menos ansiosas e menos pressionadas pelo
tempo. Mas também fizeram que os participantes fizessem duas caminhadas
de quarenta minutos em ambientes distintos (um parque versus uma rua) e
em diferentes contextos sociais (sozinhos versus com um amigo). As
descobertas destes investigadores foram inequívocas: os participantes
sentiram-se mais relaxados durante os passeios no parque do que na rua. E
sentiram-se mais revitalizados durante os passeios no parque quando
estavam sozinhos — talvez porque isso lhes permitisse assimilar melhor o
mundo natural —, mas mais revitalizados durante os passeios na rua
quando estavam com um amigo — provavelmente devido ao efeito das
pessoas nos nossos níveis de energia.
Se está à procura de uma forma simples e fácil de se sentir
rejuvenescido imediatamente, experimente fazer uma caminhada — sem
limite de tempo, sem distância para alcançar, sem nenhum lugar específico
onde ir. Se puder, dê um passeio num parque, num bosque ou apenas numa
rua particularmente verdejante. Se quiser, traga um amigo. Podem não ser
as quatro horas recomendadas por Thoreau, mas mesmo uma caminhada de
dez minutos pelo quarteirão durante uma pausa no trabalho pode ser
suficiente para mudar o seu dia — e a sua vida — para melhor.

RECARREGUE INCONSCIENTEMENTE

Até agora, neste capítulo, o nosso foco tem sido aquilo a que chamo recarga
consciente, como encontrar novos passatempos, comprar uma planta para a
casa ou dar um passeio por uma avenida arborizada. Todas estas abordagens
implicam envolvimento ativo. Reenergizam-nos porque investimos energia
no nosso descanso, como ligar um telemóvel a um carregador.
Como já deve ter adivinhado, no entanto, nem sempre fui o melhor a
concentrar-me nas minhas atividades de recarga ativa. E, em minha defesa,
há algo a ser dito sobre a recarga inconsciente.
Eu definiria recarga inconsciente como qualquer atividade que faz
quando não está a pensar muito em relaxar. Podem até ser algumas das
atividades que incluiu na primeira lista deste capítulo.
Embora estas atividades tendam a não ser estratégias particularmente
boas para recarregar a longo prazo, podem ser eficazes em pequenas doses.
Em alguns casos, a coisa mais energizante e produtiva que pode fazer é não
se concentrar intensamente em aprender uma nova música na guitarra. Pode
muito bem ser atirar-se para o sofá e assistir a algum reality show.
Atividades conscientes são ótimas, mas requerem demasiado da nossa
mente. Elas exigem que direcionemos conscientemente a nossa atenção
para coisas específicas. Isso significa que precisam de uma certa quantidade
de energia para serem eficazes.
Se tem energia, isso é ótimo. Mas, às vezes, temos dias em que
chegamos a casa do trabalho, de um dia intenso com os sogros ou de uma
tarde repleta de azar e nos sentimos tão esgotados que obrigarmo-nos a
pintar um quadro ou a procurar uma rua particularmente arborizada para
passear pode não ser divertido… e pode, na verdade, piorar as coisas.
Nesses casos, um tempo livre de culpa para não fazer muita coisa pode
ser exatamente aquilo de que precisamos. Mas aqui também há uma forma
correta de não fazer nada.

EXPERIÊNCIA 5:

Deixe a sua mente divagar

«Como as pessoas só matam as aranhas que veem, os humanos estão a agir


como agentes de seleção natural, fazendo que as aranhas sejam selecionadas
por reclusão e inteligência. Estamos a tornar as aranhas mais espertas.»
«Com base em quanto se pode relacionar com alguém por odiar a
mesma coisa, uma aplicação de encontros baseada em aversões
provavelmente seria bastante bem-sucedida.»
«A verdadeira medida da amizade é quão limpa a sua casa precisa de
estar antes que eles possam vir.»
Estas reflexões foram todas extraídas de uma das minhas páginas
favoritas na Internet, o fórum do Reddit r/Showerthoughts. É um espaço
para as pessoas postarem os pensamentos mais profundos e estranhos que
lhes ocorrem durante as suas abluções diárias.
É improvável que uma proporção particularmente grande de Redditors
que publicam na página perceba isso, mas, na verdade, estão a justificar
uma famosa teoria neurocientífica. Provavelmente já experimentou isso
sozinho. Entra no chuveiro, fica sob a água quente, os aromas do champô e
do sabonete embalam-no até um estado de relaxamento. De repente, os seus
olhos abrem-se — a solução para algum problema com o qual está a lutar é
milagrosamente clara! Talvez tenha descoberto exatamente o que dizer
naquele e-mail para o seu chefe. Talvez se lembre de onde deixou as chaves
do carro. O «princípio do chuveiro» não é apenas uma fantasia de um
Redditor. Quando o cérebro relaxa o suficiente, surgem soluções criativas.
Tudo se resume ao poder de um tipo particular de recarga inconsciente:
isto é, a divagação mental. De acordo com recentes pesquisas
neurocientíficas, mesmo quando «não estamos a fazer nada», os nossos
cérebros estão ativos. Em particular, existe uma região do cérebro chamada
«rede de modo padrão» (RMP) que governa os lugares estranhos para onde
vão as nossas mentes distraídas. A RMP ajuda-nos a recordar memórias99, a
sonhar acordado e a imaginar o futuro. E torna-se mais ativa quanto menos
envolvidos estivermos em tarefas mentalmente desgastantes.
O problema da vida moderna é que não somos muito bons a dar-nos
tempo e espaço para ativar o nosso RMP. Na verdade, a divagação mental
ganha má reputação, muitas vezes sendo equiparada a perda de tempo.
Como geralmente não conseguimos recordar aquilo em que estávamos a
pensar nos nossos devaneios, é difícil imaginar que algo benéfico possa
resultar disso. Imaginamos mal. Não fazer nada pode ser
surpreendentemente produtivo.
Como seria integrar o tempo para «nada» nas nossas vidas? Bem, a
maneira mais simples é programar ativamente momentos de «nada» na sua
semana. Em algumas noites, não precisa de dar um passeio ou pintar um
quadro; deve simplesmente distrair-se. Registe isso na sua agenda: uma
noite da próxima semana será a sua noite de oblívio.
Alternativamente, pode decidir que, enquanto estiver a fazer as suas
tarefas semanais — lavar a louça, pendurar a roupa ou ir ao supermercado
—, não ouvirá nada nos auriculares. É um método contraintuitivo para
entusiastas da produtividade e que, muitas vezes, tenho de me forçar a
adotar.
Pode parecer improdutivo. Mas, às vezes, é exatamente o tempo de que
o seu cérebro precisa para divagar — e assim resolver problemas com
perspetivas que não sabia que tinha.

EXPERIÊNCIA 6:

O princípio Reitoff

Mesmo agendar um tempo para divagar envolve fazer alguma coisa. O


leitor ainda está no modo de produtividade; acontece que a sua
produtividade será ativada fazendo o mínimo possível.
Às vezes, até isto é demasiado. Na altura em que eu equilibrava o meu
trabalho de tempo integral como médico com o crescimento do meu
negócio, às vezes voltava para casa cheio de energia, ansioso por começar a
filmagem e edição de vídeos. Mas, noutras noites, estava completamente
exausto depois de um dia cansativo no hospital, com cada fibra do meu ser
a desejar o conforto do sofá e o escapismo da Netflix.
Nesses dias, atirava-me para o sofá. «Tenho mesmo de filmar aquele
vídeo», pensava. «Levanto-me daqui a trinta minutos.» Mas, à medida que a
meia hora passava, filmar o vídeo parecia cada vez menos apelativo.
Às vezes, a minha colega de apartamento, Molly (também médica),
realizava uma intervenção. «Ali, se estás cansado, porque não esqueces isso
e descansas?» — perguntava ela.
As suas palavras plantaram uma semente na minha mente. E se ela
estivesse certa? Porque é que não podia simplesmente relaxar de verdade?
Ao lutar com este conflito interno, deparei-me com um termo que resumia
perfeitamente a minha nova perspetiva: o «princípio Reitoff».
O princípio Reitoff é a ideia de que devemos conceder-nos permissão
para cancelar uma tarefa e afastar-nos intencionalmente de alcançar alguma
coisa. Para muitos de nós, o desafio do descanso reside no ato de nos
afastarmos das coisas que achamos que deveríamos fazer. Estamos
condicionados para valorizar o autocontrolo, a coragem e a persistência.
Igualamos descanso a preguiça, fraqueza ou fracasso.
Aceitar o princípio Reitoff significa reconhecer que — às vezes — vale
a pena não fazer absolutamente nada. Não ter pensamentos profundos
durante o duche. Não fazer uma caminhada. Nada.
Hoje em dia, uso o princípio Reitoff para me ajudar a sentir-me menos
culpado por tirar uma folga. Quando me sinto esgotado, cansado e é difícil
encontrar energia para continuar, digo a mim mesmo que não há problema
em cancelar uma tarefa para poder fazer outras coisas sem culpa, como
jogar um videojogo e encomendar comida. Digo a mim mesmo que essa
«improdutividade» de curto prazo me dá tempo para reiniciar e recarregar.

Ao fazer menos hoje, pode fazer mais daquilo que é


importante para si amanhã.

Também me ajuda a perceber que, na realidade, provavelmente não


quero um dia de Reitoff todos os dias. Ao permitir-se ocasionalmente
premir o botão de pausa e afastar-se da pressão constante, cria espaço para
crescimento e criatividade. Ao fazer menos hoje, pode fazer mais daquilo
que é importante para si amanhã.
RESUMINDO

• O nosso segundo tipo de burnout está relacionado com o


tempo de descanso. O esgotamento por exaustão resulta de
não se dar tempo ou espaço suficiente para realmente
recarregar. A solução: entender como descansar de uma
forma que lhe dê energia.
• A melhor maneira de descansar é sentir-se calmo e criativo.
Encontre uma atividade ou projeto que o faça sentir-se
competente, autónomo, liberto e calmo.
• Uma segunda solução é passar tempo na natureza. Mesmo
uma pequena porção de verde pode ter um impacto
transformador. Por isso, dê um passeio, mesmo que curto. E
tente trazer a natureza para dentro de casa — seja uma
nova planta ou apenas o som do chilrear de pássaros.
• Porém, nem todo o descanso precisa de ser tão estratégico.
Às vezes, a coisa mais energizante que pode fazer é
absolutamente nada. Fazendo menos hoje, sentir-se-á
melhor amanhã.
91 Em português: escassez de crédito. [N. T.]
92 Pode descarregar o relatório do Oxford English Dictionary aqui.
93 Ler, obsessivamente, publicações nas redes sociais, à procura das mais recentes notícias
perturbadoras sobre a última catástrofe. [N. T.]
94 Eschleman, K. J., Madsen, J., Alarcon, G., e Barelka, A. (2014). «Benefiting from creative
activity: the positive relationships between creative activity, recovery experiences, and performance-
related outcomes». Journal of Occupational and Organizational Psychology, 87(3), 579–598.
95 Ulrich, R. S. (1984). «View through a window may influence recovery from surgery». Science,
224(4647), 420–421.
96 Lee, K. E., Williams, K. J. H., Sargent, L. D., Williams, N. S. G., e Johnson, K. A. (2015). «40-
second green roof views sustain attention: the role of micro-breaks in attention restoration». Journal
of Environmental Psychology, 42, 182–189.
97 Sona, B., Dietl, E., e Steidle, A. (2019). «Recovery in sensory-enriched break environments:
integrating vision, sound and scent into simulated indoor and outdoor environments». Ergonomics,
62(4), 521–536.
98 Johansson, M., Hartig, T., e Staats, H. (2011). «Psychological benefits of walking: moderation by
company and outdoor environment». Applied Psychology: Health and Well-Being, 3(3), 261–280.
99 Para ler um estudo pioneiro sobre a rede de modo padrão, ver Raichle, M. E., MacLeod, A. M.,
Snyder, A. Z., Powers, W. J., Gusnard, D. A., e Shulman, G. L. (2001). «A default mode of brain
function». Proceedings of the National Academy of Sciences, 98(2), 676–682.
CAPÍTULO 9

ALINHAR

O Pacific Crest Trail (PCT) não é para todos. Abrangendo mais de 4000
quilómetros de terreno montanhoso no Oeste dos Estados Unidos, abarca
toda a extensão da América, desde os desertos na fronteira mexicana até às
montanhas do Norte de Washington. É conhecido como um dos trilhos mais
árduos — e às vezes perigosos — da América.
Todos os verões, milhares de intrépidos caminhantes partem para o
trilho, começando na primavera e sabendo que só chegarão à fronteira
canadiana cinco meses depois. Para a maioria das pessoas, isso soa como
uma façanha infernal de resistência. Para Kennon Sheldon, professor da
Universidade do Missouri, parecia uma oportunidade perfeita para uma
experiência psicológica.
Sheldon é uma figura titânica numa recente onda de pesquisas sobre a
motivação humana. No virar do milénio, muitas pessoas pensavam que as
grandes questões sobre motivação tinham sido resolvidas. Como
aprendemos na Primeira Parte, desde a década de 1970 os cientistas tinham
consciência dos dois tipos de motivação: intrínseca e extrínseca. A
motivação intrínseca é quando faz algo porque isso é inerentemente
agradável. A motivação extrínseca é quando faz algo por causa de uma
recompensa externa — como ganhar dinheiro ou um prémio. Nos anos
desde que estas duas formas de motivação foram teorizadas, inúmeros
estudos demonstraram que, quando estamos intrinsecamente motivados
para fazer algo, somos mais eficazes e energizados ao fazê-lo; e que as
recompensas extrínsecas podem, a longo prazo, tornar-nos menos
motivados para fazer algo por si só. Motivação intrínseca = boa, extrínseca
= má. E era isso.
Não obstante, Sheldon tinha um palpite de que as coisas poderiam ser
um pouco mais complicadas. A partir da década de 1990, começou a
perguntar-se se estaríamos a falhar algo crucial sobre a ciência da
motivação. Sim, à primeira vista, parecia clara a evidência de que a
motivação extrínseca era «pior» do que a motivação intrínseca. Ao mesmo
tempo, porém, as nossas vidas estão repletas de casos em que somos
claramente motivados por recompensas extrínsecas — e bem motivados.
Imagine uma estudante (vamos chamar-lhe Katniss) a estudar para um
exame. Katniss não gosta do processo de estudo em si, por isso a sua
motivação para estudar não é intrínseca. Por enquanto, está motivada por
algo diferente da pura alegria de estudar e aprender.
Como é que Katniss pode estar a motivar-se para estudar? Eis algumas
opções:

• Opção A: Estou a estudar porque os meus pais me obrigam. Odeio a


matéria, mas, se não passar, ficarei um mês de castigo. Tenho de
estudar para evitar esse castigo terrível.
• Opção B: Estou a estudar por culpa. Odeio a matéria, mas sei que
os meus pais trabalharam muito para que eu possa frequentar esta
escola e sei que devia valorizar a oportunidade e obter um bom
resultado para poder entrar numa boa faculdade. Sinto-me ansiosa e
culpada quando não estou a estudar, por isso estou a dedicar
algumas horas de estudo para este exame todas as noites.
• Opção C: Estou a estudar porque realmente me preocupo com ter
um bom desempenho. Sim, odeio esta matéria, mas tenho de passar
neste exame para me qualificar para as aulas que realmente quero
frequentar no próximo ano. E estou a tentar obter um bom resultado
porque quero muito ir para a faculdade, alargar os meus horizontes e
talvez até inscrever-me na Faculdade de Medicina, um dia. Os meus
pais não estão a forçar-me a fazer nada disto. Sim, ficarão
desapontados se eu reprovar, mas não estou a estudar por eles. Estou
a estudar por mim.

Todas estas três opções cairiam na categoria de «motivação extrínseca»:


em cada caso, Katniss não está a estudar porque é algo inerentemente
agradável. Em vez disso, está a estudar para alcançar algum resultado
externo (evitar punições, eliminar a culpa ou entrar nas aulas desejadas).
Mas é claro que estas três opções representam atitudes muito diferentes em
relação ao trabalho e à vida. A opção C pode até ser uma forma bastante
saudável de motivação: incentiva a trabalhar em direção aos objetivos
valorizados, mesmo que o processo não seja intrinsecamente agradável.
O exemplo de Katniss demonstra que, na verdade, nem toda a
motivação extrínseca é inerentemente «má». Tal como Katniss estuda uma
matéria que odeia, todos nós, às vezes, temos de fazer coisas de que não
gostamos. E, mesmo quando começamos a gostar de alguma coisa, se
fizermos isso por tempo suficiente, haverá sempre períodos de dificuldades.
Nestes momentos, raramente é útil ouvir que, se estivéssemos a divertir-nos
mais, seríamos capazes de perseverar.

Nem toda a motivação extrínseca é inerentemente «má».

O que nos leva de volta a Sheldon e ao Pacific Crest Trail. Ele começou
a suspeitar que qualquer pessoa que embarcasse no PCT provavelmente
experienciaria, em algum momento, um colapso na motivação intrínseca. O
que os motivou a continuar? — perguntou-se.
Então, decidiu testar. Em 2018, Sheldon recrutou um grupo de
pessoas100 interessadas em caminhar no PCT. Este grupo representava uma
mistura de competências. Sete «nunca» tinham feito uma caminhada destas;
trinta e sete tinham feito «algumas vezes»; quarenta e seis faziam-no
«bastante»; e quatro já o faziam «desde sempre». Antes do início da
caminhada, Sheldon mediu a motivação deles fazendo com que os
participantes avaliassem a precisão das seguintes afirmações, cada uma
medindo um tipo diferente de motivação:
«Estou a caminhar no PCT porque…»

• …caminhar no PCT será interessante.


• …caminhar no PCT é pessoalmente importante para mim.
• …quero sentir orgulho em mim mesmo.
• …sentir-me-ei um fracasso se não completar o PCT.
• …pessoas importantes vão gostar mais de mim se eu completar o
PCT.
• …sinceramente, não sei por que motivo estou a caminhar no PCT.

Quando Sheldon analisou os dados, descobriu que praticamente todos


os caminhantes notaram quedas na motivação intrínseca durante o percurso.
Isto não é surpreendente — quando se caminha mais de 4000 quilómetros
num terreno gelado durante cinco meses, é difícil aproveitar genuinamente
cada passo.
Sheldon estava mais interessado na forma de motivação extrínseca a
que os caminhantes recorriam quando a sua motivação intrínseca
inevitavelmente diminuía. Em 2017, muitos cientistas começaram a
suspeitar que, tal como aconteceu com Katniss a estudar para o exame,
havia três tipos distintos de motivação extrínseca, além da forma puramente
intrínseca. Eles enquadram-se num espectro denominado «continuum de
autonomia relativa»:101

• Motivação externa. «Estou a fazer isto porque pessoas importantes


vão gostar de mim e respeitar-me mais se o fizer.» Pessoas que
atribuíram uma classificação elevada a esta afirmação têm alta
motivação externa.
• Motivação introjetada. «Estou a fazer isto porque me sentirei
culpado ou mal comigo mesmo se não o fizer.» Pessoas que
atribuíram uma classificação elevada a esta afirmação têm alta
motivação introjetada.
• Motivação identificada. «Estou a fazer isto porque realmente
valorizo o objetivo que está a ajudar-me a alcançar.» As pessoas que
atribuíram uma classificação elevada a esta afirmação têm uma alta
motivação identificada.
• Motivação intrínseca. «Estou a fazer isto porque adoro o processo
como um fim em si mesmo.» Pessoas que atribuíram uma
classificação elevada a esta afirmação têm alta motivação intrínseca.

Podemos traçar estas quatro formas num espectro que vai do menos ao
mais autónomo.
A motivação externa é a forma de motivação extrínseca menos
autónoma; em vez de sermos motivados por qualquer tipo de força interna,
estamos a ser controlados pelas opiniões, regras e recompensas oferecidas
por outros. Mais adiante no espectro, a motivação identificada é a forma
mais autónoma de motivação extrínseca. Mesmo que possamos estar a fazer
algo pela recompensa externa associada a isso, valorizamos essa
recompensa ou objetivo final — e, o que é crucial, esse valor foi
determinado por nós, e não imposto a nós por outros.
Usando esta perspetiva, Sheldon descobriu algo fascinante sobre os
caminhantes do PCT. O melhor preditor do seu desempenho foi o tipo
específico de motivação extrínseca a que recorreram quando a sua
motivação intrínseca diminuiu. Usando os dados que reuniu sobre a
motivação, o bem-estar e o desempenho dos caminhantes, mostrou que
aqueles que tinham níveis mais elevados de motivação introjetada e
identificada tinham muito mais probabilidade de completar o trilho.
Conseguiram aproveitar essas formas de motivação extrínseca para ajudar a
sustentar o seu progresso, mesmo quando as coisas ficaram difíceis.
Ao mesmo tempo, Sheldon perguntou a cada um dos caminhantes sobre
o seu humor durante a caminhada, usando uma série de testes bem
estabelecidos para bem-estar subjetivo, jargão psicológico para
«felicidade». Aí estava a sua segunda visão intrigante: o único tipo de
motivação extrínseca que correspondia a maior felicidade era a motivação
identificada. Ou seja, foram os caminhantes que se motivaram alinhando as
suas ações com o que realmente valorizavam que não só completaram o
trilho mas também se sentiram mais felizes no final dele. Sheldon não usou
o termo, mas pode dizer-se que estes caminhantes estavam a experienciar
uma produtividade Feel-Good.
Este estudo sugere a nossa visão final sobre como reduzir o risco de
burnout. Até agora, explorámos como evitar aquilo a que chamo
esgotamento por sobrecarga, que surge quando se assumem demasiadas
tarefas, e esgotamento por exaustão, o qual ocorre quando se trabalha
demasiado. Mas há um terceiro tipo de esgotamento: aquele a que chamo
esgotamento por desalinhamento.
O esgotamento por desalinhamento está ancorado nos sentimentos
negativos que surgem quando os nossos objetivos não são compatíveis com
a nossa noção de identidade. Sentimo-nos pior — e por isso alcançamos
menos — porque não agimos de forma autêntica. Nestes momentos, o nosso
comportamento é impulsionado por forças externas — e não por um
alinhamento mais profundo entre quem somos e o que estamos a fazer. Esse
alinhamento é algo que só a motivação intrínseca e identificada pode
oferecer.
A solução? Descobrir o que realmente importa para si — e alinhar o seu
comportamento com isso.
É um método transformador, que pode fazer-nos sentir
fundamentalmente melhor em relação às nossas vidas. Já explorámos que
todos temos de fazer coisas de que não gostamos e que os outros esperam
de nós. Eu, particularmente, não gosto de levar o carro à revisão, limpar a
casa de banho ou tratar do IRS. Há momentos em que podemos não gostar
da tarefa que estamos a realizar — e isso pode esgotar a nossa energia. Mas
podemos sustentar a nossa produtividade Feel-Good alinhando as nossas
ações atuais com um sentido mais profundo de nós mesmos.

O HORIZONTE DE LONGO PRAZO

Quando se trata de alinhar as suas ações com os seus valores, pode ser útil
pensar a longo prazo. A longo, longo prazo.
Consideremos como exemplo o terramoto de Los Angeles em 1994. A
17 de janeiro de 1994, um terramoto de magnitude 6,7 abalou a cidade —
matando cinquenta e sete pessoas e ferindo milhares. Entre os sobreviventes
estavam funcionários do Sepulveda Veterans Affairs Medical Center, um
hospital de veteranos de guerra, localizado a apenas dois quilómetros do
epicentro. O hospital sofreu danos consideráveis, e muitas das casas dos
funcionários do hospital também foram destruídas.
Um grupo de investigadores liderado pela professora Emily Lykins102,
da Universidade de Kentucky, usou esta experiência angustiante para
explorar um conceito simples: quando pensamos sobre a morte, temos uma
visão mais clara da vida.

Quando pensamos sobre a morte, temos uma visão mais


clara da vida.

Os cientistas pediram a setenta e quatro funcionários do hospital que


preenchessem dois questionários que perguntavam sobre a importância de
vários objetivos de vida, antes e depois do evento. Os objetivos foram
categorizados em intrínsecos (por exemplo, cultivar amizades e crescimento
pessoal) e extrínsecos (por exemplo, progressão na carreira e bens
materiais). Também fizeram perguntas aos participantes como «Em algum
momento durante o terramoto achou que poderia morrer?», para ter uma
ideia de quanto os participantes haviam experienciado a «ameaça de
mortalidade».
Os dados revelaram um padrão claro. Após o terramoto, os funcionários
relataram valorizar mais as metas intrínsecas do que as extrínsecas. Além
disso, quanto maior a sensação de ameaça de mortalidade que
experienciaram, maior a mudança em direção a objetivos intrínsecos. Por
exemplo, um funcionário que antes era movido, exclusivamente, pela
progressão de carreira e pela riqueza material viu-se, agora, a investir mais
tempo e energia na manutenção de relacionamentos próximos com a família
e os amigos. Outro funcionário, que anteriormente procurava validação por
meio de elogios externos, começou a procurar trabalho criativo e
crescimento pessoal por si só.
Os dados mostraram o motivo por que é útil pensar no horizonte de
tempo mais longo de todos, o fim das nossas vidas. Geramos motivação
identificada quando conectamos objetivos e ações ao nosso sentido de uma
existência significativa. O problema é que, se perguntasse a cinquenta
pessoas «Como é para si uma existência significativa?», teria sorte se duas
delas lhe dessem uma resposta clara. É uma pergunta difícil.
E é aí que entra o método identificado pelos cientistas de Los Angeles.
Pense no final da sua vida. E use isso para reavaliar o que importa aqui e
agora.

EXPERIÊNCIA 1:

O método do elogio fúnebre

Felizmente, não precisa de ser apanhado por um terramoto catastrófico para


encarar a sua vida com o fim em mente — como mostrou o obituário de
Leigh Penn.
«Leigh Penn, defensora da juventude em risco, morre aos 90 anos»103,
dizia uma descrição sobre a sua vida. «Leigh trabalhou veementemente para
eliminar as disparidades de oportunidades.» O texto descreve, vividamente,
o seu envolvimento em algumas das causas mais notáveis do seu tempo,
fosse liderando uma instituição de beneficência inovadora, que
proporcionou oportunidades educacionais a jovens de meios
desfavorecidos, ou ajudando a Marinha dos Estados Unidos a implementar
um programa para fornecer formação a comunidades necessitadas em toda a
América. Contudo, mesmo com uma carreira tão poderosa, ela nunca
perdeu de vista os seus relacionamentos. «Apesar de ter um MBA104 e ser
CEO, o título favorito de Leigh era Mãe», dizia o obituário.
Teve uma vida notável e «impactante». Houve apenas alguns
problemas. Primeiro, não alcançara realmente nenhuma das conquistas
listadas no obituário. Segundo, não vivera até à idade avançada de 90 anos.
E, terceiro, nem sequer tinha morrido.
Na verdade, Penn era aluna da Stanford Business School e estava a tirar
um curso famoso105, «Lives of Consequence» («Vidas de Consequências»).
Rotineiramente, o professor Rod Kramer incumbe os seus alunos de
escreverem os seus próprios obituários, como se tivessem vivido uma vida
ideal — a melhor que podem imaginar — até ao fim.
«O objetivo deste curso é mudar a forma como pensa sobre a sua vida e
o seu possível impacto no mundo», diz a descrição. Para muitos, incluindo
Penn, isto foi transformador. «Fez-me parar e questionar: Estou a dedicar
tempo suficiente às pessoas que amo? Ou estou excessivamente envolvida
na desenfreada corrida da carreira?», escreveu ela mais tarde. Refletir sobre
a morte elucida sobre como viver.
Muitas vezes, eu mesmo usei uma abordagem semelhante. Chamo-lhe
«método do elogio fúnebre». A minha iteração envolve focar-me, não no
obituário, mas no funeral. Simplesmente pergunte-se: «O que gostaria que
alguém dissesse no meu elogio fúnebre?» Pense no que gostaria que um
membro da família, um amigo próximo, um familiar distante, um colega de
trabalho dissesse no seu funeral.
Este método ajuda-nos a responder à questão «O que valorizo?», da
perspetiva de outras pessoas. No seu funeral, é improvável que mesmo os
seus colegas de trabalho digam: «Ajudou-nos a fechar muitos negócios
milionários.» Falariam sobre como era enquanto pessoa — os seus
relacionamentos, o seu caráter, os seus passatempos. E abordariam o
impacto positivo que o leitor teve no mundo, e não o dinheiro que ganhou
para o seu empregador.
Agora, aplique o que aprendeu na sua vida hoje. O que é que a vida que
deseja que as pessoas recordem daqui a algumas décadas significa para a
vida que deveria construir agora?
Agora, tendo começado desta forma jovial…, vamos tornar as coisas
um pouco mais íntimas.

EXPERIÊNCIA 2:

O plano da odisseia

No início da década de 1990, Bill Burnett passou vários anos a trabalhar na


Apple.106 A sua fama sempre esteve ancorada a ter ajudado a projetar o
design do primeiro rato da Apple. Mas, na verdade, Burnett trabalhou em
dezenas de projetos diferentes, tornando-se uma parte fundamental da
equipa de design. Foi durante este período que começou a desenvolver uma
compreensão afincada da interseção entre o bom design e as necessidades
humanas.
Um dia, teve uma ideia intrigante. Será que as ferramentas que usava
para projetar o design do melhor hardware do mundo também podiam ser
aplicadas à vida humana?
Nos anos seguintes, Burnett apresentaria um novo método para criar
uma existência mais feliz e gratificante, intitulada por ele de «designing
your life» («projetar a sua vida»). Ao aplicar o design ao desenvolvimento
pessoal, Burnett pensou que poderia ajudar as pessoas a viverem de uma
forma mais verdadeira e autêntica, uma abordagem que acabou por formar a
base do curso «Design Your Life» na Universidade Stanford.
Quando descobri o método Design Your Life, tive uma revelação.
Naquela altura, eu estava há alguns meses no segundo ano a trabalhar como
médico em obstetrícia e ginecologia e sentia-me algo encravado. Tinha uma
noção clara de quem era. Sabia que gostava de Medicina, adorava ensinar
estudantes de Medicina, tinha um círculo pequeno, mas próximo, de amigos
e gostava da rotina de passar as manhãs de sábado no meu café preferido no
centro da cidade de Cambridge. Mas o que queria exatamente da vida
escapava-me.
Foi quando um amigo me contou sobre um exercício específico do livro
epónimo Design Your Life. Prometia transformar as minhas ideias vagas
sobre o que eu desejava numa imagem clara, sustentada por evidências. A
abordagem era chamada «plano da odisseia».
No centro do exercício estava uma pergunta simples: Como quer que
seja a sua vida daqui a cinco anos? Nada particularmente profundo, pensei;
qualquer pessoa que tenha passado por uma entrevista de emprego já
pensou nisso. Mas a mentalidade de design de Burnett oferece uma forma
incomum de responder à pergunta. Ele convida-o a refletir sobre:

• O seu caminho atual: Descreva, detalhadamente, como será a sua


vida daqui a cinco anos se continuar no caminho atual.
• O seu caminho alternativo: Descreva, detalhadamente, como será
a sua vida daqui a cinco anos se seguir um caminho completamente
diferente.
• O seu caminho radical: Descreva, detalhadamente, como será a sua
vida daqui a cinco anos se seguir um caminho completamente
diferente, onde o dinheiro, as obrigações sociais e o que as pessoas
pensariam seria irrelevante.
A questão não é que um desses futuros seja, na verdade, o seu «plano
concreto» (há uma notável ausência de concreto quando se trata de
planeamento de vida). O objetivo é apenas abrir a sua mente para as
possibilidades.
Para algumas pessoas, a primeira opção é aquela que elas desejam
genuína e autenticamente. Se for o seu caso, ótimas notícias; já está
alinhado com o seu eu futuro. Mas, para muitas pessoas, ajuda-as a perceber
que o caminho em que estão não é o que realmente desejam.
No meu caso, escrever o plano da odisseia fez-me perceber que a vida
que eu estava a planear — ser médico em tempo integral — já não me
entusiasmava. A minha trajetória atual estava repleta de atividades como
«formação num programa de internato em anestesiologia no Reino Unido».
Ver isso escrito fez-me perceber que eu iniciara este caminho vários anos
antes, mas algo em mim tinha mudado durante esse tempo — a tal ponto
que esse futuro já não me parecia energizante.
Então, mudei de rumo. O plano da odisseia inspirou-me a focar no
crescimento do meu negócio, em vez de continuar no caminho de médico.
Até hoje, sempre que estou numa encruzilhada, repito este exercício. Ao
esboçar os possíveis caminhos, pode descobrir qual deles realmente deseja
seguir.

O HORIZONTE DE MÉDIO PRAZO


Pensar no horizonte de longo prazo é ótimo para descobrir o que
valorizamos em abstrato. Mas pode parecer um pouco nebuloso. Afinal, se
tem 20 ou 30 anos, o seu elogio fúnebre daqui a (espero) meio século pode
parecer distante. Como pode transformar estes planos de vida abstratos
numa estratégia coerente de como viver no próximo, digamos, ano?
A resposta vem de um método simples que os cientistas chamam de
«intervenções de afirmação de valores», um termo científico para
identificar os seus valores pessoais fundamentais neste momento e refletir
continuamente sobre eles. Na última secção, esboçámos alguns planos de
vida idealizados. Com estas afirmações de valores, podemos transformá-los
num conjunto de ideias concretas sobre o que pretendemos fazer no
próximo ano.
Estas intervenções são particularmente poderosas quando tem baixa
autoconfiança na sua capacidade de alcançar o que deseja a longo prazo.
Num artigo publicado na revista Science, um grupo de psicólogos107
utilizou intervenções de afirmação de valores para colmatar a disparidade
de desempenho entre homens e mulheres em Física, uma área fortemente
dominada por homens. Entre os 400 alunos da turma que Akira Miyake e os
colegas recrutaram, as alunas tendiam a ter um desempenho pior do que os
alunos; também acreditavam que os homens eram mais adequados para a
Física do que as mulheres.
A intervenção de Miyake foi um exercício clássico de afirmação de
valores. Cada aluno viu uma lista de doze valores possíveis:

1. Ser bom em arte


2. Criatividade
3. Relacionamentos com familiares e amigos
4. Política
5. Independência
6. Aprender e adquirir conhecimento
7. Habilidade atlética
8. Pertencer a um grupo social (como comunidade, grupo racial ou
clube escolar)
9. Música
10. Carreira
11. Valores espirituais ou religiosos
12. Sentido de humor

Pediu-se a metade dos alunos que escrevessem sobre os três valores que
eram mais importantes para eles e por que razão os escolheram. À outra
metade foi pedido que escolhesse os três valores menos importantes e que
escrevesse sobre o motivo por que poderiam ser importantes para outra
pessoa. Este simples exercício de escrita teve um enorme efeito no exame
intercalar: a intervenção reduziu significativamente a disparidade de género
nas notas dos exames e melhorou o desempenho das mulheres. E isto era
particularmente verdadeiro para as mulheres que tendiam a apoiar o
estereótipo de que os homens se saem melhor do que as mulheres em
Física.
Porquê? Uma possível explicação é que, ao afirmarem os seus valores,
essas mulheres conseguiram recordar o que mais importava para elas e
manter isso em mente durante o exame.

As afirmações de valores tornam reais os nossos ideais


mais abstratos. E aumentam a nossa confiança ao longo
do caminho.

Portanto, as afirmações de valores tornam reais os nossos ideais mais


abstratos. E aumentam a nossa confiança ao longo do caminho. A única
questão é como encontrar estes valores — e como usá-los.

EXPERIÊNCIA 3:

A roda da vida

Comecei a pensar sobre afirmações de valores no penúltimo ano da


Faculdade de Medicina. Lembro-me de estar sentado num auditório
apertado e sufocante num dia escaldante de verão, sentindo-me um tanto
descontente. Aquele deveria ser um momento de comemoração: os meus
exames do quinto ano tinham terminado, e todos os que ali estavam
deveriam viajar para diferentes países, para um estágio de dois meses para
aquisição de experiência médica em qualquer lugar do mundo. Eu e os
meus amigos Ben e Olivia íamos viajar, na semana seguinte, para o Centro
Cirúrgico Infantil em Phnom Penh, Camboja.
Mas, primeiro, tivemos algumas irritantes palestras adicionais durante
mais uma semana, incluindo uma intitulada «Como se tornar um médico de
sucesso». Parecia um pouco de mais… Quero dizer, não era isto que
tínhamos aprendido nos últimos cinco anos? Então, imagine a minha
surpresa quando o nosso orientador, o Dr. Lillicrap, revelou que a sessão
não era sobre as alegrias da carreira, mas sobre como poderíamos aprender
a definir «sucesso» para nós mesmos.
Lillicrap explicou que, para muitos estudantes de Medicina, o «sucesso»
frequentemente resultava de elogios académicos e cargos sofisticados. O
sucesso significa muito mais do que isso, enfatizou ele. E, então, começou a
distribuir algumas folhas de papel marcadas com um exercício simples: a
«roda da vida».
A roda da vida, explicou o Dr. Lillicrap, é uma estrutura de coaching
que poderíamos usar para definir o sucesso para nós mesmos. Começamos
por desenhar um círculo e dividi-lo em nove segmentos. Nas margens de
cada raio da roda, escrevemos as principais áreas da nossa vida. Abaixo
estão aquelas que o Dr. Lillicrap recomendou como ponto de partida,
embora também possamos criar as nossas. Há três para Saúde (Corpo,
Mente e Alma), três para Trabalho (Missão, Dinheiro, Crescimento) e três
para Relacionamentos (Família, Romance, Amigos).
A seguir, avaliamos quão alinhados nos sentimos em cada área da nossa
vida. A questão era: «Até que ponto sinto que as minhas ações atuais estão
alinhadas com os meus valores pessoais?» E, em seguida, pintamos o
segmento em consonância — se nos sentirmos realizados, preenche-se
inteiramente; se nos sentirmos completamente insatisfeitos, deixamos em
branco.
A minha roda da vida trouxe algumas revelações interessantes. Foi a
primeira vez que pensei sobre o que realmente queria da vida de uma forma
remotamente estruturada. Sempre tive um vago objetivo de me tornar um
médico que, paralelamente, faz algumas coisas de tecnologia, mas a roda da
vida deu-me o vocabulário para pensar na existência de forma mais
estratégica.
As minhas três áreas de alinhamento mais baixo eram romance (parte
dos relacionamentos), corpo (parte da saúde) e missão (parte do trabalho). E
isso levou-me a agir. Comecei a ter encontros. Comecei a fazer exercício
físico. E comecei a pensar seriamente em lançar o meu negócio; na verdade,
gravei os meus primeiros vídeos naquele destacamento no Camboja. Em
poucos minutos, a roda da vida deu-me clareza sobre o que eu mais
valorizava.

EXPERIÊNCIA 4:
A celebração dos doze meses

De certa forma, a roda da vida explica como transformar os seus valores


num conjunto de objetivos coerentes. Foi o que me inspirou a publicar
aquele primeiro vídeo. Também inspirou pelo menos dois dos meus colegas
a abandonar completamente a Medicina (o que pode não ter sido a intenção
do Dr. Lillicrap).
Mas ainda permanece distante: estamos a falar de valores abstratos e
não de etapas específicas. É aí que entra o nosso próximo método: a
«celebração dos doze meses». Este é o meu método favorito para converter
sonhos em ações. A ideia é simples. Imagine que daqui a doze meses está a
jantar com o seu melhor amigo. Estará a comemorar o progresso que fez
nas áreas da vida que são importantes para si no último ano.
Reveja os valores que identificou na roda da vida. Agora, escreva o que
gostaria de contar ao seu melhor amigo sobre o seu progresso em cada um
deles.

Categoria Celebração

Saúde Corpo: Nos últimos 12 meses, criei uma rotina de exercícios que
combina com o meu estilo de vida e preferências e perdi sete
quilos.
Mente: Nos últimos 12 meses, dei prioridade à minha saúde
mental iniciando terapia. Isso ajudou-me a tornar-me mais
autoconsciente e a gerir o stress de maneira mais eficaz.
Alma: Nos últimos 12 meses, comprometi-me com uma prática
diária de meditação e participei num retiro espiritual.

Trabalho Missão: Nos últimos 12 meses, consegui fazer a transição para


um novo emprego que aproveita os meus pontos fortes, tornando o
meu trabalho mais gratificante e agradável.
Dinheiro: Nos últimos 12 meses, paguei grande parte da minha
dívida de empréstimo estudantil e comecei a economizar para
pagar a entrada de uma casa.
Crescimento: Nos últimos 12 meses, concluí um curso online que
expandiu o meu conjunto de competências e me facilitou o acesso
a um emprego.

Relacionamentos Família: Nos últimos 12 meses, reservei mais tempo para a minha
família, agendando visitas e chamadas regulares.
Romance: Nos últimos 12 meses, fortaleci o meu relacionamento
com o meu parceiro através de uma comunicação mais aberta.
Amigos: Nos últimos 12 meses, fiz um esforço para voltar ao
contacto regular com velhos amigos e construir novas ligações,
levando a um círculo social mais diversificado e compreensivo.

Pense nisto como uma versão menos pessimista do método da bola de


cristal do Capítulo 4 (ver página 133). Lá, o foco estava em como tudo pode
correr mal. Aqui, o foco reside em como tudo pode correr bem. Pergunte-
se: «Se eu quisesse tornar realidade a celebração dos doze meses, o que
precisaria de fazer no próximo ano para chegar lá? E qual é a primeira etapa
de ação: Inscrever-me naquele ginásio ao fundo da rua? Aperfeiçoar o meu
curriculum vitae? Reservar tempo, na minha agenda, para uma conversa
semanal com a minha mãe?
De repente, os seus valores já não são sobre um futuro distante. São
sobre os seus passos nos próximos meses.

O HORIZONTE DE CURTO PRAZO

Para alguns, estas etapas para alinhar os seus objetivos com a sua vida ainda
podem parecer muito distantes. Quem será no próximo ano ainda pode
parecer assustadoramente distante. Tem de encontrar uma maneira de
alinhar o seu comportamento agora, hoje.
Aqui, o nosso objetivo é tomar decisões quotidianas que se alinhem
com o nosso sentido mais profundo de identidade. Isto não apenas nos faz
sentir à vontade como é um dos impulsionadores mais poderosos da
produtividade Feel-Good. Num estudo, Anna Sutton, da Universidade de
Waikato, na Nova Zelândia, analisou cinquenta e um estudos compostos por
mais de 36 mil pontos de dados108 para analisar as relações entre viver
autenticamente o dia a dia e o bem-estar geral. As suas descobertas
mostraram não apenas uma relação positiva entre autenticidade e bem-estar
mas também entre autenticidade e aquilo a que ela chamou «engajamento».
Foi uma descoberta impressionante. Quando as pessoas tomam decisões
que se alinham com os seus valores pessoais e o seu sentido de identidade,
não são apenas mais felizes; estão mais empenhadas nas tarefas que têm
pela frente.
Portanto, o ingrediente final do alinhamento envolve uma mudança de
mentalidade: de pensar nos nossos valores ao nível de anos e décadas para
pensar nos nossos valores ao nível das escolhas diárias.
A questão é como. Todos tomamos decisões diárias que nos afastam dos
nossos valores. A pessoa que valoriza a liberdade, mas permanece num
trabalho controlador, esperando que as suas ações sejam adquiridas. A
pessoa que valoriza relacionamentos próximos, mas passa a maior parte do
tempo a trabalhar e negligencia o tempo com a família e amigos. São casos
em que as decisões diárias não estão alinhadas com o que mais desejamos.

Com as ferramentas certas, podemos voltar subtilmente


às coisas que mais importam.

Mas com as ferramentas certas, podemos voltar subtilmente às coisas


que mais importam e, por sua vez, sustentar a nossa produtividade (e
enriquecer as nossas vidas) por mais tempo.

EXPERIÊNCIA 5:

As três missões de alinhamento

A minha forma favorita de integrar valores de longo prazo nas decisões do


dia a dia baseia-se num facto simples: os objetivos de curto prazo parecem
muito mais fáceis de alcançar do que os de longo prazo.
Isto é algo que os psicólogos entendem há décadas. Num estudo
famoso, os investigadores pediram a um grupo de crianças, entre os 7 e os
10 anos, que tinham dificuldades em Matemática109, que estabelecessem
metas para os dias seguintes. Elas foram divididas em dois grupos, e cada
um recebeu uma sugestão subtilmente diferente. O primeiro foi instruído a
tentar resolver seis páginas de problemas de Matemática em cada uma das
sete sessões seguintes; o segundo foi apenas instruído a resolver quarenta e
duas páginas de problemas até ao fim de todas as sessões.
É claro que estes dois conjuntos de alvos são apenas maneiras diferentes
de dizer a mesma coisa — em cada caso, as crianças acabaram por
completar todas as quarenta e duas páginas. E, no entanto, os efeitos da
concentração no objetivo imediato em detrimento do objetivo distante
foram notáveis. As crianças que tiveram a meta «próxima» não apenas
tiveram um desempenho melhor; tiveram um desempenho duas vezes
melhor do que as outras crianças, resolvendo corretamente 80 por cento dos
problemas contra 40 por cento do outro grupo. Além do mais, também
acabaram por se sentir mais confiantes — um dos nossos caminhos mais
importantes para nos sentirmos bem. Como resumiu a psicóloga
organizacional Tasha Eurich: «As metas proximais não ajudaram apenas as
crianças a resolver os problemas — mudaram a maneira como encararam a
Matemática.»
O que é que isso tem que ver com viver os seus valores? Bem, ajuda a
superar a distância entre onde estamos agora e onde queremos estar.
A ideia de uma celebração de 12 meses pode parecer um pouco
assustadora. Muitas vezes, luto para viver um único dia de acordo com os
meus valores, quanto mais um ano inteiro. Mas é aí que ajuda seguir o
exemplo daquelas crianças com mentalidade matemática. Todas as manhãs,
basta escolher três ações para o dia seguinte que o levarão um pequeno
passo mais perto de onde deseja estar daqui a um ano.
Pessoalmente, tenho a minha comemoração de 12 meses salva num
documento do Google Docs, marcada no navegador do meu computador.
Sempre que me sento para começar a trabalhar, abro o documento e leio-o
para me lembrar de como é a minha comemoração de 12 meses. Então, em
cada uma das áreas de saúde, trabalho e relacionamentos, escolho uma
subcategoria para me focar. Estas são as minhas três missões de
alinhamento esta manhã:

• S — Sessão de ginásio das 15h30 às 16h30


• T — Fazer progresso na escrita do Capítulo 9
• R — Ligar à Nani (a minha avó)

Este método não funciona apenas para fanáticos por


fitness/escritores/fãs de avós como eu. Digamos que o leitor é um estudante
universitário que deseja melhorar as suas notas, manter a sua forma física e
fortalecer as suas amizades. As suas três missões de alinhamento do dia
poderiam ser:
• S — Fazer uma corrida de 30 minutos depois da aula
• T — Passar uma hora extra a estudar para o exame de amanhã
• R — Conversar com a Katherine tomando um café após a sessão de
estudo

Ou é um progenitor que trabalha e lida com as demandas do seu


trabalho, a sua saúde e a sua vida familiar. As suas missões de alinhamento
podem incluir:

• S — Fazer uma caminhada de 15 minutos durante a hora de almoço


• T — Concluir o rascunho da proposta do projeto até à hora de
almoço
• R — Preparar um jantar saudável para a família e passar bons
momentos juntos

O benefício desta abordagem é que ela diminui a escala indutora de


terror do enorme objetivo de 12 meses. Ao focar-se nas etapas imediatas e
de curto prazo — em vez de no ano inteiro —, transforma a vivência dos
seus valores em algo imediato. E alcançável.

EXPERIÊNCIA 6:

Experiências de alinhamento

Quando comecei, há uma década, a minha pesquisa sobre a produtividade


Feel-Good, a revelação mais poderosa não foi nenhum estudo ou visão. Foi
um método. Tudo começou quando apliquei a forma científica de pensar
que aprendi na Faculdade de Medicina a questões de felicidade, realização e
produtividade.
Portanto, o meu exercício final fecha o ciclo e envolve aprender a
pensar sobre produtividade como um cientista. Para testar o que lhe traz
significado e usar essas experiências para informar as decisões que toma a
cada hora.
«Experiências de alinhamento» podem ajudá-lo a testar teorias sobre o
que pode aproximá-lo do alinhamento na sua tomada de decisões do dia a
dia. É um processo com três etapas.
Primeiro, identifique uma área da sua vida onde as suas ações parecem
particularmente insatisfatórias. Os resultados do seu método de elogio
fúnebre, plano da odisseia e exercícios da roda da vida podem ter ajudado
nisto. Mas, mesmo sem esses exercícios, pode experimentar uma sensação
de desalinhamento numa ou mais áreas da sua vida, seja no trabalho, nos
relacionamentos ou nos passatempos. Pense nisso — há alguma área em
que sinta que as coisas não estão a correr bem?
Pense numa advogada que passou anos a subir na hierarquia
corporativa, mas que percebeu que as longas horas de trabalho e o ambiente
de elevado stress estão a afetar a sua vida pessoal. Para ela, uma experiência
de alinhamento pode envolver a exploração de planos de trabalho
alternativos que se alinhem melhor com os seus valores. Ou imagine um
estudante universitário que escolheu um curso com base em expectativas
externas, como a pressão da família, e não nos seus próprios interesses
genuínos. Este pode dar por si com dificuldades em envolver-se nas aulas e
preocupado por não se encontrar no caminho certo para a sua futura
carreira. Neste caso, uma experiência de alinhamento pode envolver a
análise de percursos educativos alternativos.
Em segundo lugar, crie a sua hipótese. Estamos a pensar como cientistas
aqui, e isso significa adotar uma mentalidade experimental. Todos as
experiências científicas têm uma «variável independente», a única coisa que
muda para ver que efeito poderia ter. Se mudasse uma — apenas uma —
variável independente na sua vida, qual seria? E que efeito acha que isso
teria na sua situação?
Esta é a sua hipótese. A da nossa advogada desmotivada poderia ser:
«Ajustar o horário de trabalho levará a um melhor equilíbrio entre trabalho
e realização pessoal.» A hipótese do aluno stressado poderia ser: «Mudar
para um curso que se alinhe com os meus interesses e valores pessoais
levará a maior satisfação e motivação na minha vida académica.»
O terceiro passo é o mais crucial: executar. Fazer uma mudança. E, ao
fazer isso, ver o efeito que tem na sua situação — e no seu sentido de
alinhamento.
Para que isto funcione como uma experiência, é importante que a
mudança seja localizada. Se transformar dramaticamente todas as esferas da
sua vida, não saberá o que está a causar as mudanças no seu humor e no seu
sentido de alinhamento. Então, comece em pequena escala. Para a nossa
advogada, isso pode significar negociar um acordo de trabalho a tempo
parcial durante três meses, ou delegar atividades mais desgastantes, para se
concentrar em projetos energizantes — em vez de abandonar imediatamente
o seu emprego. Para o nosso aluno, pode implicar a matrícula em unidades
curriculares diferentes — em vez de tentar mudar radicalmente de curso.
No entanto, ao fazer isso, acompanhe os efeitos. Tente manter um
registo ou diário das suas experiências, anotando quaisquer desafios,
sucessos ou revelações que obtiver ao longo do caminho. Ao conduzir esta
experiência, terá a oportunidade de explorar um caminho alternativo — sem
ter de se comprometer com isso a longo prazo. Ainda não, pelo menos.
Estas pequenas experiências envolvem o reconhecimento de que a
jornada para o alinhamento não tem um objetivo final claro. É um processo
sem fim. À medida que navegamos no laboratório das nossas vidas,
devemos estar dispostos a abraçar a experimentação — e a aprender à
medida que avançamos.

RESUMINDO

• O desgaste por desalinhamento surge quando dedicamos


tempo a objetivos que não correspondem ao nosso sentido
de identidade. Superar o desalinhamento é uma tarefa que
dura a vida inteira; algo que exige que resolvamos
continuamente o que realmente nos importa e mudemos o
nosso comportamento em conformidade.
• Existem algumas formas surpreendentemente simples de
descobrir o que é importante para si hoje. Em primeiro lugar,
olhe para o seu futuro a longo prazo. Tente imaginar-se no
seu leito de morte. Por mais mórbido que pareça, esta é a
melhor maneira de obter uma visão mais clara do que
deseja da sua vida, agora.
• Em seguida, pense no seu futuro a médio prazo. Reflita
sobre que realizações gostaria de comemorar daqui a um
ano. Depois, pergunte-se: O que é que esta celebração de
doze meses significa para as minhas ações esta semana?
• Por último, deve estar pronto para pensar no seu futuro a
curto prazo. Porque a boa notícia é que pode dar um passo
em direção ao alinhamento agora mesmo. Quais são as três
ações de hoje que podem levá-lo um passo mais perto da
vida que deseja daqui a um ano?
100 Sheldon, K. M. (2020). «Going the distance on the Pacific Crest Trail: the vital role of identified
motivation». Motivation Science, 6(2), 177–181.
101 Sheldon, K. M., Osin, E. N., Gordeeva, T. O., Suchkov, D. D., e Sychev, O. A. (2017).
«Evaluating the dimensionality of self-determination theory’s relative autonomy continuum».
Personality and Social Psychology Bulletin, 43(9), 1215–1238.
102 Lykins, E. L. B., Segerstrom, S. C., Averill, A. J., Evans, D. R., e Kemeny, M. E. (2007). «Goal
shifts following reminders of mortality: reconciling post-traumatic growth and terror management
theory». Personality and Social Psychology Bulletin, 33(8), 1088–1099.
103 Esta história provém do maravilhoso artigo de Leigh Penn, disponível aqui:
https://medium.com/inspired-writer/the-most-powerful-writing-exercise-i-did-at-stanford-
c59ba6a6fa93
104 MBA (Master of Business Administration) é um grau de pós-graduação ministrado por escolas
especializadas em áreas de negócio e gestão. [N. T.]
105 Pode ver a descrição deste curso aqui: https://law.stanford.edu/nl-course/lives-of-consequence-
how-individuals-create-happy-meaningful-and-successful-lives/
106 Burnett, B., e Evans, D. (2016). Designing Your Life: How to Build a Well-Lived, Joyful Life.
Vintage Digital. Londres.
107 Miyake, A., Kost-Smith, L. E., Finkelstein, N. D., Pollock, S. J., Cohen, G. L., e Ito, T. A.
(2010). «Reducing the gender achievement gap in college science: a classroom study of values
affirmation». Science, 330(6008), 1234–1237.
108 Sutton, A. (2020). «Living the good life: a meta-analysis of authenticity, well-being and
engagement». Personality and Individual Differences, 153, 109645.
109 Pode ler mais sobre este estudo aqui: https://www.entrepreneur.com/growing-a-business/the-
science-behind-baby-steps-how-to-tackle-goals-big-and/245767
UMA PALAVRA FINAL: PENSE COMO UM CIENTISTA DA
PRODUTIVIDADE

O meu apartamento situa-se a dez minutos a pé de um dos maiores hospitais


em Londres.
Em certos dias, quando não me consigo focar tanto quanto desejava,
vagueio pelo lado Este — por entre as multidões nas lojas da Oxford Street
e além das grandiosas filas de casas vitorianas do bairro Marylebone — até
chegar ao assombroso átrio moderno. Peço um café na receção e passo
alguns minutos a observar a azáfama dos médicos, enquanto sobem e
descem os corredores. Penso em quanto tudo mudou desde aquele turno
fatídico do dia de Natal, quando deixei cair a bandeja dos suprimentos
médicos.
Ao observar os médicos nas suas batas — que, ao contrário das minhas
recordações do trabalho, parecem admiravelmente menos stressados —,
reflito no quanto aprendi desde esse dia. Quando me lembro daquela tarde
catastrófica, o meu primeiro feriado de serviço na ala do hospital, apercebo-
me agora de que o meu erro não estava naquilo que pensava sobre
produtividade. Estava em como pensava nela.
Na altura, o meu entendimento sobre as táticas básicas estava errado.
Em vez de olhar para a produtividade e entender o que me fazia sentir bem,
via-a como disciplina: quanta pressão era capaz de amontoar em mim para
fazer mais. Em vez de tentar integrar diversão, poder e pessoas em cada
turno, estava a remoer na minha sensação de aborrecimento, impotência e
solidão. E, em vez de tentar encontrar a felicidade naquela evacuação
manual iminente, passei horas a ruminar sobre quão terrível iria ser. (E, para
ser sincero, foi garantidamente terrível.)
Nos anos que se seguiram, tudo na minha vida mudou. Hoje, sei que a
produtividade não tem que ver com a disciplina; é sobre fazer mais daquilo
que nos deixa felizes, menos stressados e mais energizados. Também sei
que a única maneira de fugir à procrastinação e ao burnout é encontrar a
felicidade na situação — mesmo que tenha deixado cair 136 frascos de
gosma medicinal em cima de si.
Porém, o meu verdadeiro problema não eram as minhas táticas de
produtividade. Era a minha estratégia geral. Acreditava que me bastava
aprender todos os segredos da produtividade e ler todos os blogues para
alcançar aquilo por que ansiava. Era exatamente o oposto da abordagem de
que precisava: aprender a pensar como um cientista produtivo.
É por essa razão que queria que a última ferramenta deste livro fossem
as experiências de alinhamento. Uma vez que, a longo prazo, é apenas ao
adotar uma visão experimental da vida que pode esperar aprender os
segredos de uma produtividade Feel-Good. Neste livro, partilhei algumas
experiências que resultaram comigo. Algumas delas funcionarão consigo.
Outras não. E isso não tem mal.
Lembre-se de que este livro não é uma lista de tarefas. É uma filosofia
— um modo de criar o seu próprio conjunto de ferramentas de
produtividade. Algo que lhe permite colher todas as recompensas
maravilhosas de se sentir bem, diariamente e a longo prazo. Que consiste
em abordar os seus projetos e tarefas diários no espírito da experimentação.
Por isso, aconselho-o: experimente o máximo que conseguir, descubra o
que funciona e rejeite o resto. Pergunte-se em cada nova abordagem: Que
impacto é que isto tem no meu humor? Na minha energia? Na minha
produtividade? Não memorize o caminho para atingir a produtividade Feel-
Good. Experimente o seu próprio caminho.
No final de contas, é apenas através de uma avaliação contínua daquilo
que funciona consigo que perceberá como se sentir melhor a longo prazo. A
produtividade é uma área em desenvolvimento, e também o leitor se está a
desenvolver. Ainda há imenso para descobrir. Contudo, à medida que aplica
estes princípios à sua vida, irá desvendar os conhecimentos, estratégias e
técnicas que funcionam melhor consigo. Até poderão ser mais úteis do que
os meus, principalmente porque vieram de si.
Não memorize o caminho para atingir a produtividade
Feel-Good. Experimente o seu próprio caminho.

Portanto, aprecie o processo. E, à medida que avança, lembre-se de que


não se trata de tentar alcançar a perfeição. É sobre tropeçar
estrategicamente ao longo do caminho até chegar ao que funciona.
Aprender com os seus fracassos e celebrar os seus sucessos. Transformar o
seu trabalho de uma drenagem de recursos em fonte de energia.
É uma mentalidade difícil de adotar. Porém, quando o tiver feito, tudo
muda. Se conseguir aceder àquilo que o faz sentir mais energizado e vivo,
chegará a qualquer lado. E também pode aproveitar a viagem.
Mal posso esperar por ver onde a sua aventura o leva a seguir.
A próxima etapa da sua viagem…

Como agradecimento por ter lido este livro,


eis um presente gratuito para o ajudar
a alcançar a próxima etapa da sua jornada
até à produtividade Feel-Good ♥

www.feelgoodproductivity.com/gift
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, quero deixar os meus agradecimentos mais fervorosos a


si, o leitor, por ter pegado neste livro. Se alguma vez clicou, viu, ouviu, leu,
deixou gosto, comentou, subscreveu ou simplesmente me acompanhou
discretamente desde 2017, saiba que cada interação é uma dádiva. O facto
de prestar atenção àquilo que partilho tem um significado imenso para mim
e permite-me continuar a viver a fazer aquilo que adoro — aprender sobre
coisas fixes e partilhá-las com o mundo.
Agora, tenho uma longa lista de pessoas a quem agradecer. Um livro, tal
como tudo o que é bom na vida, é um esforço de equipa. Ainda que
normalmente só haja um nome na capa, por trás de cada livro existe um
grupo de pessoas. Estou orgulhoso de poder dizer que a equipa por trás de
Feel-Good Productivity tem sido absolutamente extraordinária.
Desejo começar por referir Rowan Borchers, o nosso editor na
Cornerstone Press, da Penguin Random House. Rowan, o teu primeiro e-
mail foi a faísca que ateou toda esta aventura. Nos últimos três anos ou
mais, tens sido um pilar de apoio incansável, aperfeiçoando as facetas
técnicas, logísticas, literárias e, sobretudo, emocionais para dar vida a Feel-
Good Productivity.
Depois, temos Ryan Doherty, o nosso editor na Celadon Books, uma
chancela da Macmillan Publishers. Ryan, apostou neste projeto e tornou-se
o nosso coração americano. O livro não teria o mesmo alcance sem o seu
incentivo.
Rachel Jepsen, outra editora fenomenal, obrigado por ter trazido os seus
anos de experiência para me ajudar. Ensinou-me imenso sobre como ser
escritor, e não poderia estar mais grato. Os seus empurrões gentis de
incentivo ajudaram-me a ser responsável e o seu ocasional carinho exigente
também foi útil. Ainda me recordo da conversa que tivemos quando me
perguntou: «Escrever este livro é realmente uma prioridade para si? Porque,
ao olhar para o seu calendário, não me parece…» No meio de toda a
confusão que ocorre na indústria, o seu compromisso com o projeto
manteve-se sempre. E o livro em si está imensamente melhor por conta do
seu envolvimento.
E não nos esqueçamos de Kate Evans, a minha extraordinária agente.
Kate, o seu encorajamento e as suas críticas têm sido uma estrela-guia. As
nossas conversas recarregaram as minhas baterias no preciso momento em
que começavam a esmorecer.
De seguida, um membro fundamental da minha equipa, Ines Lee, que
realizou um trabalho impressionante como investigadora principal do
projeto enquanto cumpria o seu papel de bolseira de investigação na
Universidade de Cambridge e, posteriormente, como docente na
Universidade de York. Ines, a tua capacidade de sintetizar um catálogo
enorme de conhecimentos científicos é surpreendente. E o facto de
contribuíres com trabalhos de grande qualidade não só para este livro mas
também para os nossos vídeos e podcasts continua a deixar-me
maravilhado.
Depois, temos Jack Edwards, cuja pesquisa foi essencial na fase inicial
do livro. Jack, o teu empenho é genuinamente apreciado, sobretudo por
teres estado, simultaneamente, a trabalhar no teu próprio livro, numa
empresa próspera e num império de redes sociais em expansão. O teu
contributo para a criação de um plano geral abriu o caminho para tudo o
que se seguiu.
E como poderia esquecer Lauren Razavi? A nossa relação poderá ter
começado aleatoriamente com uma mensagem privada na plataforma X
(antigo Twitter), mas o teu impacto tem sido gigantesco. Lauren, muito
obrigado pela orientação da escrita ao longo desta jornada, assim como pela
apresentação a Kate Evans e a Rachel Jepsen. Foi uma ligação inesperada
que moldou consideravelmente o trajeto deste livro.
Azul Terronez, meu coach de escrita, as tuas palavras foram uma
salvação na fase inicial do projeto. Frases como «Não é possível ler o rótulo
estando dentro da garrafa» guiaram-me durante as minhas primeiras crises
de síndrome do impostor e ajudaram-me a aceitar a jornada da escrita. E
não ignoremos o teu conselho incrível: «Não há problema em ser apenas
um guia em vez de um guru.» (Uma ideia que acabou por transparecer no
livro.)
David Moldawer, o seu carinho exigente durante a fase de proposta foi
precisamente aquilo de que este projeto necessitava. Rasgar o projeto
original forçou-me a ser inteiramente claro sobre a mensagem central do
livro. Também gostaria de agradecer ao meu amigo e colega autor Hasan
Kubba, cuja contribuição e realização de várias sessões de discussão de
ideias foram essenciais e ajudaram a moldar o panorama geral. E, claro,
temos o incrível Stefan Kunz, o ilustrador que permitiu que todos os
diagramas se destacassem. Stefan, o teu toque artístico deu aos elementos
visuais deste livro a delicadeza de que precisavam.
Gostaria, igualmente, de expandir a minha profunda gratidão aos
campeões não celebrados desta aventura: as equipas inabaláveis da
Cornerstone e da Celadon. Em primeiro lugar, um grande obrigado à equipa
da Cornerstone: Alice Dewing, Etty Eastwood, Sarah Ridley, Margarita
Suntzeva, Anouska Levy, Rose Waddilove e Ebyan Egal, assim como a
todos aqueles que trabalham nos bastidores.
Da mesma forma, deixo um reconhecimento sentido à equipa da
Celadon: Deb Futter, Rachel Chou, Jennifer Jackson, Jaime Noven, Anna
Belle Hindenlang, Christine Mykityshyn, Liza Buell, Faith Tomlin, Erin
Cahill, Anne Twomey e Rebecca Ritchey. Os vossos esforços permanentes
foram cruciais para tornar Feel-Good Productivity aquilo que é hoje. Por
fim, obrigado a Harry Haysom pela capa fantástica.
E obrigado a Alex Rayment e Lesley Wood, os nossos brilhantes
produtores de áudio na ID Audio, em Londres, por me ajudarem a criar o
audiolivro com tanta polidez e bom humor.
Ao longo dos anos que passei a escrever este livro, apercebi-me de que
o mundo literário é uma comunidade encantadora e carinhosa, e Feel-Good
Productivity beneficiou imensamente da sua família alargada. Um abraço
especial aos colegas escritores, criadores, empresários e, no geral, pessoas
extremamente simpáticas como Matthew Dicks, Derek Sivers, Ryan
Holiday, Cal Newport, James Clear, Mark Manson, Julie Smith, Tiago
Forte, Noah Kagan, John Zeratsky, Lawrence Yeo, Charlie Houpert, Nicolas
Cole, Scott Young, Nir Eyal, Anne-Laure Le Cunff, Pat Flynn, Khe Hy e
August Bradley. A vossa sabedoria coletiva, transmitida através de planos
gerais de livros, críticas de manuscritos, estratégias de marketing, chamadas
via Zoom ou apenas um bom encorajamento tradicional, foi preciosa.
Obrigado por verem algo em mim e por terem reservado algum tempo das
vossas agendas ridiculamente cheias para me ajudar.
E, depois, claro, temos a minha equipa: as pessoas que trabalham
comigo todos os dias para criar conteúdo inspirador e didático que permite
aos nossos leitores, espectadores e ouvintes construírem a vida que amam.
Primeiramente, Angus Parker, o meu manager geral e a pessoa em
quem confio para manter o negócio na linha. Angus, tens sido uma
máquina, mantendo a engrenagem da empresa bem oleada enquanto me
isolo na minha caverna proverbial, a ler e a escrever. Sem a tua gestão das
atividades diárias, não seria capaz de ter o espaço mental para me empenhar
totalmente neste projeto.
Bhav Sharma e Dan Anderton, ambos serviram como assistentes
perante diversas encruzilhadas, obrigado por implementarem ordem no caos
da minha vida pessoal e profissional. As vossas contribuições tornaram este
malabarismo muito mais maneável.
Um agradecimento sincero ao resto da minha equipa dedicada: Tintin,
Becky, Amber, Gareth, Jakub, Alison, Adi, Saf e a todos os incríveis
freelancers que também ajudam. Sem o vosso trabalho árduo e engenho
criativo, não teríamos chegado nem perto de causar o impacto que
provocámos. Um agradecimento também a Calum Worsley, Paul Tern,
Sheen Gurrib, Ahmed Zadi, Pablo Simko, Elizabeth Filips e Corey Wilks;
um obrigado genuíno a todos pelo vosso valioso feedback na fase inicial.
Não posso deixar de mencionar o meu pilar emocional durante grande
parte desta jornada, Izzy Sealey. O teu incentivo consistente para escrever e
o teu apoio emocional constante foram vitais, bem como as tuas
competências enquanto colega de discussão de ideias, durante momentos
mais desafiantes. Foste a voz da razão e a motivação que frequentemente
me manteve no caminho certo.
Uma menção especial ao meu irmão Taimur Abdaal e à minha cunhada
Lucia Coulter, que suportaram a minha desorganização e a minha energia
em alvoroço, principalmente durante o último ano em que vivemos juntos.
A vossa paciência foi mais do que um dever familiar; foi uma graça vital à
medida que o livro se aproximava da conclusão.
Mas é claro que nada disto seria possível sem o amor e apoio da minha
família. A minha avó, Nani, que me ensinou inglês e me incutiu a paixão
pela aprendizagem, merece uma menção especial. A tua inspiração, o teu
amor e o teu incentivo infindável têm sido pilares nos quais grande parte da
minha vida se apoia.
Por último, mas não menos importante, a minha mãe, Mimi: uma mãe
solteira que desenraizou a sua vida inúmeras vezes para fornecer, a mim e
ao Taimur, uma educação excecional. Os teus sacrifícios, ética de trabalho e
amor infinito são a base de tudo o que faço.
SOBRE ESTE LIVRO

O segredo para ser produtivo


não é a disciplina.
É a alegria.

Temos tendência a pensar que o segredo da


produtividade é o trabalho árduo. Mas, e se houver
outra forma? O Dr. Ali Abdaal — o especialista em
produtividade com mais seguidores a nível mundial —
descobriu um caminho mais simples e feliz para
alcançar o sucesso, não ancorado na disciplina, mas sim
na alegria.

Neste livro revolucionário, o autor revela-nos como a


ciência do método Feel-Good de produtividade pode
transformar a sua vida, dando a conhecer os três
«energizantes» ocultos que sustentam a produtividade aprazível, os três
«bloqueadores» que é preciso ultrapassar para bater a procrastinação, e os
três «sustentadores» que previnem o burnout e ajudam a alcançar uma
satisfação duradoura.

Recorrendo a histórias inspiradoras de empreendedores, atletas olímpicos e


cientistas galardoados com o prémio Nobel que personificam os princípios
deste método de produtividade, o Dr. Ali Abdaal dá a conhecer as
mudanças simples, mas transformadoras, que podemos fazer para nos
tornarmos mais produtivos e realizados no trabalho.

Sinta-se bem. Faça mais.


«O livro de que todos temos estado à espera.»
Julie Smith, autora de
Porque É Que Ninguém Me Disse Isto Antes?
SOBRE O AUTOR

Ali Abdaal é médico, empreendedor, ilusionista amador e o especialista em


produtividade com mais seguidores no mundo.

Ali sentiu-se intrigado pela ciência da produtividade quando tentava


equilibrar as exigências da formação médica, na Universidade de
Cambridge, com a criação do seu próprio negócio. Enquanto exercia
medicina no NHS (Serviço Nacional de Saúde), começou a documentar no
YouTube a sua jornada rumo a uma vida mais saudável, feliz e produtiva.
Desde então, os seus vídeos, podcasts e artigos sobre a mente humana
chegaram a centenas de milhões de pessoas em todo o mundo.

Em 2021, fez uma pausa na medicina para se dedicar a tempo inteiro à


divulgação do seu trabalho sobre a ciência do florescimento humano. Neste
livro, revela tudo o que descobriu numa década de estudo dos segredos que
nos levam a sentir melhor e sermos mais bem-sucedidos.
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