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A fabricação digital aplicada à construção industrializada: estado da arte e


perspectivas de desenvolvimento

Article · March 2017

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2 authors:

Paulo Fonseca de Campos Eduardo Lopes


University of São Paulo University of São Paulo
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J9;AGF9DAR9<9 =K;GD9KÜH9MDAKL9K
u industrialização da construção

A fabricação digital aplicada


à construção industrializada:
estado da arte e perspectivas
de desenvolvimento
PAULO EDUARDO FONSECA DE CAMPOS – PROFESSOR ASSOCIADO • EDUARDO IGNACIO LOPES – DOUTORANDO
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (FAUUSP)

1. INTRODUÇÃO

A
história da construção in-
dustrializada, especialmente
no campo da pré-fabrica-
ção, sempre lidou com questões rela-
cionadas à padronização e à produção
seriada, particularmente em programas
de larga escala para habitação social.
Foram várias as críticas a esse mo-
delo, que vinculava a pré-fabricação
seriada à rigidez e à uniformidade, para
definir um sistema construtivo desen-
volvido sem se pensar nas qualidades
intrínsecas de sua arquitetura e sua re-
lação com o entorno urbano: a cidade.
Esse cenário, porém, vem se modifi-
X)LJXUD
cando drasticamente nas últimas déca- (VFXOWXUDGH)UDQN*HKU\HPIRUPDWRGHSHL[HSURMHWDGDHH[HFXWDGD
das, com a introdução de tecnologias GLJLWDOPHQWHů3RUWR2O¯PSLFR%DUFHORQD(VSDQKD 
de produção capazes de oferecer solu- )RQWH % \7LOO1LHUPDQQ2ZQZRUN&&%<6$
ções cada vez mais flexíveis e versáteis,  KWWSVFRPPRQVZLNLPHGLDRUJZLQGH[SKS"FXULG  

inclusive no campo da pré-fabricação.


Acompanhando essa tendência, as metrias mais complexas, desafiando os uma conexão direta entre o que pode
tecnologias digitais de fabricação, uma princípios da padronização que, até en- ser concebido e construído. Os projetos
alternativa cada vez mais acessível ao tão, dominavam os meios de produção. de edifícios, atualmente, não só nascem
meio técnico e à sociedade em geral, Segundo Kolarevic (2003), a era di-
1
digitalmente, como são realizados digi-
incentivaram projetistas a explorar solu- gital reconfigurou radicalmente a relação talmente por meio de processos “file-to-
ções que estimulam a pesquisa de geo- entre concepção e produção, criando -factory”, que fazem uso de tecnologias

1
KOLAREVIC, B. ARCHITECTURE IN DIGITAL AGE; DESIGN AND MANUFACTURING. NEW YORK: SPON PRESS, 2003.

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de controle numérico computadorizado ção a partir do modelo tridimensional cessos distintos de manufatura que
(CNC) para fabricação. digital, que saiam de seu computador possuem o fato em comum de faze-
Gershenfeld (2005), por sua vez,
2
diretamente para a linha de produção. rem uso de equipamentos e máquinas
em seu icônico livro “FAB; The coming Embora o uso intensivo das ferra- de Comando Numérico Computadori-
revolution on your desktop – From per- mentas digitais para a concepção de zado (CNC).
sonal computers to personal fabrica- projetos seja relativamente recente, ao Em linhas gerais, os processos de
tion” pondera que, graças à convergên- contrário do que indica o senso comum, fabricação digital podem ser classifica-
cia da computação e fabricação, hoje as ferramentas de fabricação digital pos- dos como sendo aditivos, subtrativos
é possível converter bits em átomos, suem mais de 50 anos de existência. ou conformativos.
imprimindo objetos a partir de suas Em paralelo à disseminação dos Na manufatura aditiva, ou impres-
imagens ou modelagem virtual. computadores pessoais a partir do são 3D, o material de base é deposita-
Neste artigo aborda-se a fabricação começo da década de 1980, as tec- do por extrusão (filamentos termoplás-
digital aplicada à tecnologia do concreto nologias de fabricação digital passaram ticos ou materiais de base cimentícia),
e suas perspectivas de desenvolvimen- a ter um alcance ainda maior, com o processado por sinterização a laser ou
to, tomando-se como base os recentes advento de sistemas de prototipagem impresso por meio de aglutinantes apli-
avanços e desenvolvimentos que vêm rápida, como a estereolitografia (SLA), cados sobre material em pó, camada
ocorrendo em escala planetária. as cortadoras à laser e outros equipa- sobre camada, sucessivamente, for-
mentos de comando numérico, que mando assim o objeto final.
2. O ESTADO DA ARTE DA passaram por um processo exponen- Os processos subtrativos ocorrem
FABRICAÇÃO DIGITAL cial de miniaturização e incremento de quando a conformação final do objeto
Um dos primeiros projetos a ser seu potencial produtivo. é obtida pelo desbaste e retirada do
concebido e realizado digitalmente foi a Esse salto culminou, ao final dos material de base, como nos processos
grande escultura em formato de peixe anos 2000, com o aparecimento de tradicionais de usinagem. Fresadoras,
projetada por Frank Gehry em Barce- máquinas CNC cuja operação, di- cortadoras a laser, jato d’água e plas-
lona, no ano de 1992 (figura 1). Nessa mensões e custos eram muito mais ma são alguns dos equipamentos mais
época o arquiteto já testava os limites acessíveis, e passíveis de serem cha- utilizados nesse tipo de processo.
das ferramentas digitais na concepção madas de equipamentos de fabricação Já nos processos conformativos o
de seus projetos, mas ainda existiam pessoal (GERSHENFELD, 2005). material de base não sofre desbaste, adi-
muitas barreiras na transposição de mo- Analogamente à evolução no uni- ção ou transformação de estado físico,
delos digitais para o canteiro de obras. verso dos computadores, que em 1950 mas sua forma é alterada diretamente
A solução apareceu com a adoção ocupavam andares inteiros em edifícios pela deformação mecânica do material,
de um software poderoso, o CATIA, ini- e hoje são carregados no bolso, pode- utilizando-se para tanto uma calandra ou
cialmente desenvolvido pela Dassault -se dizer que as máquinas de comando braços robóticos, por exemplo.
Aviation para a construção do caça Mi- numérico que pesavam toneladas e se Em quaisquer dos processos de
rage. Como ferramenta de modelagem serviam de enormes “mainframes”, atu- manufatura digital, sejam eles aditivos,
baseada na curva de Bézier, o CATIA almente podem funcionar sobre a mesa subtrativos ou conformativos, a lógica é
oferecia uma capacidade de análise de de um escritório, conectadas a um sempre a mesma: um modelo virtual é
superfícies que não existia em outros computador pessoal como, por exem- gerado por computador (CAD-Computer
softwares, além de permitir a planifica- plo, uma impressora 3D. Aided Design ou Desenho Assistido por
ção de superfícies curvas com precisão. Computador) e nele são introduzidos os
Para a fabricação da escultura de Gehry, 2.1 Processos de fabricação parâmetros pertinentes à sua fabricação
um consultor permaneceu na fábrica em (CAM-Computer Aided Manufacturing ou
que foi produzida a estrutura metálica, A fabricação ou manufatura digital Manufatura Assistida por Computador).
onde desenvolvia desenhos de fabrica- é o termo genérico que engloba pro- Após essa etapa o programa gera uma

2
GERSHENFELD, N. FAB; THE COMING REVOLUTION ON YOUR DESKTOP - FROM PERSONAL COMPUTERS TO PERSONAL FABRICATION. CAMBRIDGE-MA, BASIC BOOKS, 2005.

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o número de robôs industriais em
operação. Em 2013, exatamente quaren-
ta anos depois, esse número alcançava
um milhão e seiscentas mil unidades.
O avanço desses números trouxe uma
inevitável queda de preços que, aliada ao
desenvolvimento de novas capacidades
da ferramenta, levou a uma ampla difusão
de seu uso em outras indústrias além da
automotiva, tais como: eletroeletrônica,
X)LJXUD química e de comunicação.
,OXVWUD©¥RGRVLVWHPDFRQVWUXWLYRŴ&RQWRXU&UDIWLQJŵEDVHDGRQDH[WUXVDѺ R Atualmente esses equipamentos,
GHPDWHULDOFLPHQW¯FLR
extremamente flexíveis, já não são vis-
)RQWH K WWSZZZDUFKGDLO\FRPQDVDWHFKEULHIDZDUGVFRQWRXUFUDIWLQJV tos exclusivamente em seu ambien-
 DXWRPDWHGFRQVWUXFWLRQPHWKRGRORJ\WRSKRQRUV 
te de origem, as linhas de montagem
automobilísticas. Grandes instituições
sequência de instruções numéricas, o dos robôs industriais não é derivada do de ensino e pesquisa na Europa, Ásia
G-Code3, que vai comandar um equipa- desenvolvimento de tecnologias recen- e Estados Unidos utilizam robôs indus-
mento controlado por computador (CNC) tes. Ainda em 1954 foi depositada a pa- triais de seis ou sete eixos em suas
de maneira a que ele execute todas as tente do que viria a se tornar, em 1959, pesquisas sobre a construção de geo-
diferentes tarefas necessárias para a o primeiro robô industrial, o Unimate metrias avançadas. ETH (Swiss Federal
fabricação de um determinado objeto. (The International Federation of Robo- Institute of Technology in Zurich), MIT
Diferentemente das máquinas uti- tics, 2012). Pesando duas toneladas e (Massachusetts Institute of Technology),
lizadas na manufatura tradicional em dotado de atuadores hidráulicos, o Uni- TU Delft (Delft University of Technology),
série, que são ajustadas — ou até mes- mate restringia-se a movimentar partes University of Cambridge, Tsinghua Uni-
mo fabricadas — para executar uma mecânicas entre linhas de montagem. versity (China), Universität Stuttgart e
mesma tarefa específica indefinidamen- Ainda no final da década de 1960 SCI-Arc (Southern California Institute of
te, uma máquina CNC pode produzir espalham-se pela indústria automotiva os Architecture) são apenas algumas refe-
objetos em uma escala da ordem de braços robóticos, cuja versatilidade, so- rências de uma longa lista de mais de
uma ou pouquíssimas unidades. Para mada à capacidade de seguir com pre- quarenta instituições onde o uso dessas
esse equipamento flexível, não existem cisão caminhos predefinidos no espaço, ferramentas já faz parte do dia-a-dia.
formas ou ajustes preestabelecidos; propicia o uso desses equipamentos em Apesar disso, uma das grandes
ele obedecerá as instruções contidas tarefas mais sofisticadas, como a monta- barreiras para a disseminação mais ge-
no G-Code correspondente, possi- gem e solda de componentes. A primeira neralizada do uso dessas ferramentas
bilitando assim um altíssimo grau de linha de montagem a adotar uma série de digitais, no caso específico dos robôs,
personalização ou customização. braços robóticos programáveis Unimate é o fato dessas máquinas ainda serem
foi a fábrica de automóveis da GM (Ge- relativamente perigosas e seu uso re-
2.2 Os robôs industriais neral Motors) em Lordstown (Ohio, EUA), querer uma série de precauções e prote-
onde em 1969 as máquinas assumiram o ções para que se evitem acidentes com
Da mesma forma que as demais lugar de trabalhadores humanos nas pe- seres humanos nas linhas de produção,
tecnologias e máquinas de comando rigosas tarefas de forja e fundição. os quais podem ser fatais.
numérico computadorizado, a invenção Em 1973 já passava de três mil Desde o começo dos anos 2010, o

3
G-CODE OU CÓDIGO G, EM PORTUGUÊS, É UMA LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO SIMPLES, CRIADA NO MASSACHUSETTS INSTITUTE OF TECHNOLOGY (MIT) E UTILIZADA DESDE A DÉCADA DE 1950 NO
CONTROLE DE MÁQUINAS DE COMANDO NUMÉRICO. EMBORA SEJA CHAMADA DE LINGUAGEM DE PROGRAMAÇÃO, SEU USO NÃO PERMITE MAIORES ENCADEAMENTOS LÓGICOS, COMO EM UMA LINGUAGEM
DE MAIS ALTO NÍVEL, RESTRINGINDO-SE A PASSAR PARA A MÁQUINA INSTRUÇÕES REFERENTES AO SEU POSICIONAMENTO NO ESPAÇO, VELOCIDADES, AVANÇOS E OUTRAS CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DO
EQUIPAMENTO UTILIZADO.

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emprego de robôs industriais vem cres- Segundo o próprio pesquisador maneira que a pesquisa desenvolvi-
cendo no setor da Construção Civil, em principal (KHOSHNEVIS, 2006), a da pelo grupo da Southern California
virtude do desenvolvimento de novas viabilização do sistema pressupõe um University, esse trabalho emprega um
tecnologias de visão computacional e tal desenvolvimento e integração da pórtico mecânico computadorizado,
de sensores, que aliadas a sistemas de indústria da construção e de todos utilizado como meio para a deposição
AI (Artificial Inteligence ou Inteligência os seus atores em torno desse novo das camadas de matriz cimentícia, com
Artificial), permitem o uso destes equi- sistema construtivo, que hoje é ainda precisão, no local desejado.
pamentos CNC em atividades conjun- inimaginável pensar em sua viabilidade Inspirada, particularmente, nas
tas com humanos, de maneira cada a curto prazo, embora a sua técnica técnicas tradicionais de impressão 3D,
vez mais integrada e segura. seja comprovadamente plausível. a pesquisa tem o apoio de importan-
Com a solução à questão de segu- tes atores do mercado da construção
rança em uso, vislumbra-se o dia em 3.2 “Freeform Construction” mundial, como o escritório de ar-
que esses equipamentos serão encon- (Loughborough University, quitetura Foster & Partners e o Buro
trados desempenhando suas tarefas Reino Unido) Happold, especializado em proje-
lado a lado com trabalhadores nos can- tos estruturais de alta complexidade
teiros de obra espalhados pelo mundo. Outra pesquisa de fundamental im- (BUSWELL et al., 2007).
portância acerca da manufatura aditiva Mais recentemente, em 2014, a
3. FABRICAÇÃO DIGITAL E utilizando materiais cimentícios teve Universidade de Loughborough fir-
TECNOLOGIA DO CONCRETO: origem na Universidade de Loughbo- mou um acordo de cooperação com
3D “CONCRETE PRINTERS” E rough, no Reino Unido. Da mesma um consórcio de empresas, liderado
PRODUÇÃO ROBOTIZADA

3.1 “Contour Crafting” (University


of Southern California)

É possível afirmar, apoiando-se


em pesquisas em bases de dados
de patentes4 e anais de congressos
especializados5, que a primeira pesquisa
que envolve a utilização de material de
matriz cimentícia e fabricação digital é
aquela realizada na University of Southern
California, intitulada “Contour Crafting”
(CC) (HWANG; KHOSHNEVIS, 2004).
O sistema consiste em uma tecnologia
de fabricação aditiva que utiliza o contro-
le computadorizado para criar superfícies
de forma livre. Um grande pórtico auto- X)LJXUD
,PSUHVV¥RGHHGLILFD©¥RSHORSURFHVVRŴ'&RQFUHWH+RXVH3ULQWHUŵGH
matizado, somado a um equipamento
$QGUH\5XGHQNR (8$ ůSULPHLUDLPSUHVVRUDGHFRQFUHWR'SRUW£WLO
de extrusão de material cimentício, pos- SDUDLPSUHVV¥RQRORFDO KWWSZZZWRWDONXVWRPFRP 
sibilitaria a construção da estrutura ou )RQWH K WWSVVRXUFHDEOHQHWZSFRQWHQWXSORDGVGFRQFUHWHMSJ 
edificação de maneira integral.

4
PATENTE US 7814937 B2, DEPLOYABLE CONTOUR CRAFTING. FONTE: GOOGLE PATENTS (22/06/2015).
5
ANAIS DO ISARC (INTERNATIONAL SYMPOSIUM OS AUTOMATION AND ROBOTICS IN CONSTRUCTION) DE 1984 ATÉ 2014. FONTE: WWW.IAARC.ORG (22/06/2015).
6
MATÉRIA DE JUSTIN MCGAR VEICULADA PELA REVISTA ELETRÔNICA SOURCEABLE INDUSTRY NEWS AND ANALYSIS SOB O TÍTULO “PARTNERSHIP SIGNED TO DEVELOP 3D CONCRETE PRINTING”, EM
10/12/2014 HTTPS://SOURCEABLE.NET/PARTNERSHIP-SIGNED-TO-DEVELOP-3D-CONCRETE-PRINTING/ (15/10/16)

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nas para horas”6. Acrescentou ainda:
“Nós esperamos alcançar um nível de
qualidade e eficiência jamais visto na
construção”. O objetivo final da inicia-
tiva, segundo a mesma matéria, é de-
senvolver o primeiro robô comercial do
mundo para impressão em concreto.
A principal diferença entre as duas
pesquisas (“Contour Crafting” e “Free-
form Construction”) é o fato de os ingleses
partirem do princípio do uso da técnica
para a execução de componentes cons-
X)LJXUD trutivos, e não da edificação inteira, o que
2PDLVDOWRHGLI¯FLRGRPXQGRH[HFXWDGRFRPWHFQRORJLDGHLPSUHVVDѺ R' parece ser bem mais razoável.
HPFRQFUHWRSHOD:LQ6XQů3DUTXH,QGXVWULDOGH6X]KRX &KLQD 
Essa abordagem, ao que tudo indica,
)RQWH K WWSZZZ\KEPFRPLQGH[SKS"P FRQWHQW F LQGH[ D VKRZ FDWLG  LG 
oferece algumas vantagens importantes
 
a serem consideradas, pois permite a
integração dos componentes a que dá
pela gigante mundial da construção na ocasião que a “impressão 3D em origem com os demais sistemas cons-
civil Skanska, com o objetivo de de- concreto, quando combinada com uma trutivos já existentes no mercado, sem a
senvolver o uso da impressão 3D em espécie de centro de pré-fabricação necessidade de grandes adaptações na
concreto. O engenheiro Rob Francis, móvel, tem um potencial para reduzir o cadeia produtiva da construção civil, par-
diretor de inovação e desenvolvimento tempo necessário para criar elementos ticularmente a pré-fabricação em concre-
da Skanska UK (Reino Unido) declarou complexos para os edifícios, de sema- to. Além disso, permite ao projetista uma
liberdade quase que irrestrita na criação
de formas complexas, uma vez que o sis-
tema também prescinde da utilização de
moldes para a execução dos elementos
pré-fabricados, possibilitando a concep-
ção de um sistema construtivo aberto,
passível de integração com os demais
subsistemas comerciais existentes.

3.3 “WinSun” (China)

Um dos mais recentes projetos envol-


vendo fabricação aditiva de concreto para
edifícios foi o desenvolvido pela empresa
de construção civil chinesa WinSun.
Causou espanto e se disseminou
rapidamente, não apenas na mídia es-
X)LJXUD pecializada, mas também em veículos
0RQWDJHPGHSDLQHOSUHғ  IDEULFDGRGHJUDQGHVGLPHQV·HVSURGX]LGRSRU de grande circulação, a notícia de que
PHLRGHPDQXIDWXUDDGLWLYDHPFRQFUHWR LPSUHVV¥R'
na China dez casas haviam sido “im-
)RQWH K WWSGSULQWERDUGFRPVKRZWKUHDGSKS"'3ULQWHG&RQFUHWH+RPHV,Q pressas” em concreto, em um período
 &KLQD)URP:LQ6XQ 
de menos de vinte e quatro horas.

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O sistema de produção e seus ma-
teriais são muito semelhantes aos de-
mais sistemas já comentados neste
artigo. Trata-se de um grande pórtico
mecanizado, munido de um bico extru-
sor que deposita a matriz cimentícia di-
retamente sobre o local desejado, sob
o controle de um computador.
Apesar dos poucos dados dis-
poníveis sobre a exata composição e
dosagem dos materiais utilizados – por
se tratar de uma empresa privada –
cabe aqui ressaltar que o fabricante de- X)LJXUD
clara fazer uso de agregados reciclados ([HFX©¥RGHVXSHUI¯FLHUHJUDGDHPPROGHGHSROLHVWLUHQRSRUPHLRGHILR
TXHQWHDFRSODGRDEUD©RUREµWLFRů')/)$83 3RUWXJDO
em seu processo de construção, o que,
em tese, caracterizaria um produto mais
amigável do ponto de vista ambiental. cio diretamente no canteiro de obras, o FAB LAB SP, primeiro laboratório de
Um aspecto relevante do sistema mas sim partes menores e componen- fabricação digital do Brasil vinculado à
construtivo proposto pela WinSun é o tes construtivos, que são produzidos rede mundial FAB LAB, liderada pelo
fato do mesmo estar baseado em gran- em uma instalação fabril, para posterior “Center for Bits and Atoms” do Massa-
des painéis portantes pré-fabricados, montagem no local da obra. chusetts Institute of Technology (MIT),
os quais cumprem, a um só tempo, as sob a direção do Prof. Neil Gershenfeld.
funções de estrutura e vedação. 3.4 Produção robotizada e as Especificamente no campo da ro-
Nesse caso, a impressão 3D em pesquisas em curso na FAUUSP bótica aplicada à construção, entre
concreto leva a uma extrema flexibilida- 2014 e 2015, a FAUUSP tomou parte
de de dimensões e formas das peças, Desde 2009 a FAUUSP vem pesqui- no projeto liderado pelo DFL-Digital Fa-
algumas delas constituindo pequenos sando a fabricação digital como tema vin- brication Laboratory da Faculdade de
elementos arquitetônicos ou mesmo culado à Industrialização da Construção. Arquitectura da Universidade do Porto
elementos apenas para vedação. A Em 2011 foi inaugurado na Facul- (FAUP), com quem segue desenvol-
grande impressora 3D é utilizada não dade de Arquitetura e Urbanismo da vendo novos projetos sobre robótica
para se executar a totalidade do edifí- Universidade de São Paulo (FAUUSP) e tecnologia do concreto. Trata-se de

X)LJXUD
3H©DVGHPLFURFRQFUHWRGHDOWRGHVHPSHQKR 0LFUR&$' SURGX]LGDVHPPROGHVGHSROLHVWLUHQRH[HFXWDGRVSRU
PHLRGHILRTXHQWHDFRSODGRDEUD©RUREµWLFRů)$8863 %UDVLO H')/)$83 3RUWXJDO

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pesquisa aplicada pioneira, com um lógico, onde os custos de aquisição dos pode chamar de convergência digital
horizonte de curto prazo, que faz uso robôs são significativamente mais baixos ou “continuum digital”, como os classi-
das qualidades da fabricação digital, e o grau de integração e usabilidade dos fica Kolarevic (KOLAREVIC, 2003). Uma
que permite uma maior liberdade for- programas de computador utilizados na ligação direta entre projeto e produção,
mal e um alto grau de personalização, concepção (CAD) e na manufatura (CAM) a qual se estabelece por meio das tec-
associadas aos materiais à base de ci- é significativamente maior. nologias digitais.
mento e concreto, amplamente utiliza- A fabricação digital é aqui encarada
dos e de baixo custo, com vistas à sua 4. CONCLUSÃO como um tema vinculado à Industrializa-
utilização na construção industrializada Já há algum tempo muito se comen- ção da Construção, uma nova alternati-
e, particularmente, na pré-fabricação. ta a respeito da fabricação digital como va tecnológica, com inúmeros conceitos
Essa pesquisa teve entre seus obje- sendo o prenúncio de uma Terceira Re- inovadores de projeto e produção a ela
tivos o desenvolvimento de elementos volução Industrial . Por certo pode-se
7
vinculados. Entretanto, não há porque
pré-fabricados leves, utilizando o micro- estar assistindo ao surgimento de uma enxergá-la como uma forma de ruptu-
concreto de alto desempenho (Micro- inovação disruptiva ou radical (The Inno- ra com o passado, mas sim como um
CAD) moldado em fôrmas de poliestire- vation Policy Platform, 2016), por esta meio de continuidade, uma possibilida-
no expandido, cortadas por fio quente representar uma oportunidade de que- de a mais que permite combinar concei-
(hotwire) acoplado a um braço robótico bra de paradigma, cujo impacto será tos aparentemente opostos: produção
de seis eixos. Por meio dessa técnica foi significativo sobre o mercado e a ativi- padronizada e produção flexível.
possível criar elementos modulares de dade econômica futura das empresas, Apesar de todo o potencial ofereci-
contenção para muros de arrimo, porém além de uma resposta ao esgotamento do por estas tecnologias, no entanto, é
altamente customizáveis e com geome- de um ciclo produtivo calcado, original- preciso reconhecer que seu desenvol-
trias complexas, que podem se adaptar mente, nos clássicos padrões fordistas. vimento e validação para uso no setor
melhor, por exemplo, à topografia do No setor da construção civil, e mais da construção civil dependem, em boa
terreno (MARTINS et al., 2015). especificamente no segmento da cons- medida, do conhecimento profundo
Pesquisa recente, que une a fabrica- trução industrializada, os saltos tec- das próprias especificidades desta in-
ção robótica e a tecnologia do concreto nológicos, habitualmente, se dão por dústria, sem o que se corre o risco de
reforçado com fibras de vidro ou Glassfi- meio de inovações incrementais, ou converter a fabricação digital em um
bre Reinforced Concrete (GRC), vem sen- seja, aquelas baseadas em produtos, hobby ou uma curiosidade.
do desenvolvida pelos autores deste arti- serviços, processos, organização ou A aproximação entre o setor privado
go, Arq. Eduardo Lopes, sob orientação métodos já existentes, cujo desempe- e o aparato de ciência e tecnologia, além
do Prof. Dr. Paulo Eduardo Fonseca de nho pode ser significativamente melho- dos investimentos em pesquisa, particu-
Campos. Essa tem como intenção reto- rado ou atualizado. Essa é a forma pre- larmente de forma consorciada, consti-
mar o processo de robotização da produ- dominante de inovação na indústria em tuem uma prática que já vem oferecendo
ção de elementos de GRC com a técnica geral, ainda que a natureza da inovação resultados tangíveis em países desenvol-
de spray-up (onde a matriz cimentícia é e da taxa de mudança tecnológica mui- vidos, como a Inglaterra, caso específico
projetada juntamente com fibras de vidro to possam diferir de um país para outro, da Universidade de Loughborough.
álcali-resistentes sobre um molde), inves- entre setores produtivos e quanto aos O ponto de partida deste esforço
tigação iniciada por Balaguer para a em- períodos de tempo envolvidos8. se dá com a geração de propostas
presa espanhola Dragados, na década de Os processos de projeto e fabrica- criativas e a identificação de oportuni-
1990 (BALAGUER et al., 1994). Visa ainda ção executados por meio dos sistemas dades, em um processo baseado na
trazer avanços à industrialização de base CAD, CAE (Computer Aided Enginee- aplicação de metodologias para inova-
digital na construção civil, suportada pelo ring ou Engenharia Assistida por Com- ção e planejamento em estágios mais
atual estágio de desenvolvimento tecno- putador) e CAM, integram aquilo que se avançados. A equipe multidisciplinar a

7
THE THIRD INDUSTRIAL REVOLUTION. MATÉRIA DE CAPA DA REVISTA “THE ECONOMIST”, 21-27 ABRIL 2012.
8
THE INNOVATION POLICY PLATFORM (IPP, 2016) - ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OECD) AND THE WORLD BANK
HTTPS://WWW.INNOVATIONPOLICYPLATFORM.ORG (6/10/16)

28 | CONCRETO & Construções


ser reunida em torno de um projeto de O concreto é, e ainda seguirá sendo, e flexível de que se dispõe na atualidade,
inovação radical pode abranger des- o material de construção mais conhecido com forte impacto no nível das condi-
de empresas produtoras de materiais e utilizado no mundo, com um crescente ções tecnológicas e humanas. O desafio
e componentes para construção, até apelo econômico, social e ambiental no que ora se coloca diz respeito à inovação
fabricantes de sistemas construtivos contexto desse setor produtivo. A fabri- como indutora do desenvolvimento sus-
industrializados, que aspirem se manter cação digital ou robótica, por sua vez, é a tentável e à visão de futuro que a constru-
inovadores e competitivos. tecnologia de manufatura mais avançada ção civil será capaz de planejar para si.

u REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[01] BALAGUER, C. et al. Automatic Robot Path Planning for a GRC Spraying Cell. In: Automation and Robotics in Construction, p. 579–586, 1994.
[02] BUSWELL, R. et al. Freeform Construction: Mega-scale Rapid Manufacturing for construction. In: Automation in Construction, v. 16, n. 2, p. 224–231, 2007.
[03] GERSHENFELD, N. FAB; The coming revolution on your desktop - From personal computers to personal fabrication. Cambridge-MA, Basic Books, 2005.
[04] HWANG, Dooil; KHOSHNEVIS, Behrokh. Concrete wall fabrication by contour crafting. In: ISARC 2004 21st International Symposium on Automation and Robotics in
Construction, 2004.
[05] IFR. History of Industrial Robots; From the first installation until today. Milestones of Technology and Commercialization. [s.l: s.n.]. Disponível em www.ifr.org/
fileadmin/user_upload/downloads/forms_info/History_of_Industrial_Robots_online_brochure_by_IFR_2012.pdf (6/10/16)
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CONCRETO & Construções | 29


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