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O Malho e o Cinzel na construção

do templo interior
Confesso que desconhecia o significado das palavras malho e cinzel. E isso me fez sentir,
de certa forma, ignorante. Humildemente, reconheço e abraço esta minha ignorância e me
dedico a transformá-la em combustível para o meu desenvolvimento. Compartilho com
vocês que desenvolver este e os outros trabalhos, despertou algo que estava
relativamente adormecido em mim: a curiosidade, a vontade de entender mais sobre o que
está ao meu redor, principalmente na maçonaria.

O despertar da curiosidade me fez imediatamente ser remetido ao dia da minha iniciação,


quando fui questionado se o que me motivava a entrar para a maçonaria era “a
curiosidade”. Eu respondi: “’Não!”, sincera e prontamente. Não estava contaminado pela
curiosidade simples, no sentido pejorativo, do mundo profano. Mas aqui, desafiado e
também estimulado pelos meus irmãos, vejo e sinto que os descobrimentos me trazem um
sentimento bom, nobre, oposto à ignorância que senti inicialmente.

De acordo com o autor maçônico Jules Boucher, em sua obra “A Simbólica Maçônica”,
Malho significa Massa ou Martelo, e sua origem vem do latim Malleus. Já Cinzel
representa cortar, e sua derivação também é do latim, de Cisellus.

Na maçonaria, o Malho e o Cinzel são os instrumentos usados pelos aprendizes, onde o


Malho é o elemento ativo e o Cinzel é um elemento passivo. São atribuídos ao malho,
diferentes significados e qualidades: força material, trabalho, força de vontade, inteligência.
Ah! A inteligência, que leva ao movimento e à ação, à perseverança, dirigindo o
pensamento à incessante busca pela verdade. Nas lojas, o malho representado pelo
malhete, é insígnia do VM e dos vigilantes.

Como simples instrumento, o malho tem ligações místicas com os deuses, como o
germânico Donar, o celta Sucellos e o escandinavo Thor. Costumava ser feito de bucho,
uma espécie de madeira escolhida especialmente por sua dureza e que é símbolo de
firmeza. No mundo profano, à mão de um juiz, é usado como ferramenta para controle,
sempre à mão da maior autoridade no recinto.

Já ao cinzel, são atribuídos outros significados: beleza, perfeição, juízo, escultura e


arquitetura. O cinzel, sem o malho, é considerado um instrumento praticamente nulo. O
malho, sem o cinzel, é basicamente força que rompe, não constrói. Quando empregados
em conjunto, na medida certa, produzem os melhores e mais importantes efeitos. E sobre
qual objeto ambos devem ser empregados? Sobre a pedra bruta. Com que objetivo?
Desbastá-la, transformá-la.

No mundo profano, a pedra muitas vezes serve de adorno. De acordo com a história,
Michelangelo por muito tempo planejou esculpir a famosa estátua de Davi. Pesquisou,
procurou, encontrou e, enfim, escolheu uma pedra, grande e aparentemente perfeita para
sua escultura. Ela oi transportada ao seu atelier. Após fazer o primeiro desenho da
escultura, começou a dar suas primeiras marteladas no mármore. A princípio sem forma, a
pedra começou a ganhar os traços desejados por Michelangelo. Já a certa altura do
trabalho, a pedra lasca onde não deveria… então Michelangelo desvia do seu
planejamento original, define um novo desenho para a estátua, objetivando aproveitar a
mesma pedra e retoma o seu trabalho.

Novas marteladas vão refinando a obra, definindo ainda mais a sua forma. Passam-se
alguns meses de trabalho e, subitamente, é feita outra lasca em lugar indesejável. Mais
uma vez Michelangelo muda seu projeto original e novamente retoma seu trabalho. Mais
alguns meses se passam e uma nova lasca é provocada, desta vez fatal. Sem nenhuma
condição de corrigir a obra, Michelangelo abandona, totalmente frustrado, aquela pedra.
Ele faz novas experiências na sequência, todas fracassadas. O artista não desiste, avança
em seu trabalho em nova pedra. Da pedra bruta começam a surgir algumas formas
humanas até que, ao final, surge uma das obras de arte mais belas da humanidade, a
estátua de Davi.

Localizada ao pé do primeiro vigilante, a pedra bruta sobre a qual o aprendiz maçom


simbolicamente deve trabalhar é como as diversas pedras esculpidas por Michelangelo.
Não há um caminho definido, um manual para que cada um trabalhe suas arestas, suas
imperfeições. Decide-se começar a partir da sua percepção do que deve ser trabalhado.
Meses e meses podem passar até que você perceba que o caminho que se está seguindo
não faz mais sentido e é preciso um replanejamento, um desvio. E mais uma vez, assim
como Michelangelo, pode ser necessário recomeçar, a partir do zero. Isso não deve trazer
desânimo, pois se existe o objetivo maior, o retrabalho nada mais será que a apreciação
de passar por um novo caminho, com novos aprendizados, que fatalmente irão preparar
melhor aquele que o percorrer. O importante é aproveitar a jornada e aprender com ela.

Concluo que o malho e o cinzel simbolizam, em resumo, o equilíbrio. Força e direção,


lógica e intuição, razão e sentimento. Um é o oposto do outro e, quando usados em
conjunto, aplicando o que um faz de melhor ao outro, com equilíbrio e visando um objetivo
pré-definido, podem trazer resultados excepcionais. Se um é aplicado de forma extrema,
sem levar em consideração o outro, o resultado pode ser desastroso. E assim é a nossa
vida, profana ou maçônica, pois há tempo de ouvir e falar, de ser assertivo e hesitante,
agressivo e calmo. É preciso buscar o equilíbrio, mais ou menos como diz o poema de
Nathalie Richter:

“Imagino um novo equilíbrio no planeta. Penso que é como a organização que fiz em casa
esse final de semana: “Pra arrumar a gente tem que bagunçar”, essa bagunça que o
mundo hoje se encontra pode ter um bom propósito se agora servir pra tirar tudo o que
não serve e deixar apenas aquilo que é útil, apenas o que precisamos. Desapegar da
escuridão”

Referências:

Livro: Maçonaria 100 Instruções de Aprendiz – Raymundo D’ella Júnior – Editora Madras
Livro: A Simbólica Maçônica – Jules Boucher
Site: https://pt.scribd.com/document/99384776/A-Simbolica-Maconica-Jules-Boucher
Site: http://www.lojamad.com.br/index.php/eventos/item/184-o-painel-do-grau-de-aprendiz
Site: http://www.revistauniversomaconico.com.br/simbologia/a-pedra-o-maco-e-o-cinzel/
Site: https://www.pensador.com
Autor: David de Freitas Neto

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