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Harmônicos esféricos

R. Casana

1 Harmônicos esféricos
Seja a equação de Laplace
∇2 Φ (r) = 0 (1)
com a seguinte condição de fronteira ou de contorno sobre uma esfera de raio a

Φ (~r) = f (θ, φ) .

r=a

Seja um sistema com simetria esférica, então, a equação diferencial acima é separável num sistema
de coordenadas esféricas: r → (r, θ, φ) tal que

Φ (r) = U (r) Y (θ, φ) (2)

O operador Laplaciano em coordenadas esféricas é

∂2
   
2 1 ∂ 2 ∂ 1 ∂ ∂ 1
∇ = 2 r + 2 sin θ + 2 2 (3)
r ∂r ∂r r sin θ ∂θ ∂θ r sin θ ∂φ2
Assim temos
 
1 1 d 2d
0 = r U (r)
U (r) r2 dr dr
1 ∂2
   
1 1 1 ∂ ∂
+ 2 sin θ Y (θ, φ) + Y (θ, φ)
r Y (θ, φ) sin θ ∂θ ∂θ sin2 θ ∂φ2

 
1 d 2d
0 = r U (r)
U (r) dr dr
| {z }
λ
1 ∂2
 
1 1 ∂ ∂
+ sin θ Y (θ, φ) + Y (θ, φ)
Y (θ, φ) sin θ ∂θ ∂θ sin2 θ ∂φ2
| {z }
−λ

Assim obtemos a equação radial


 
d 2d
r U (r) − λU (r) = 0 (4)
dr dr

1
Resolvemos a equação angular
1 ∂2
 
1 ∂ ∂
sin θ Y (θ, φ) + Y (θ, φ) + λY (θ, φ) = 0
sin θ ∂θ ∂θ sin2 θ ∂φ2
∂2
 
∂ ∂
sin θ sin θ Y (θ, φ) + λ sin2 θ Y (θ, φ) + 2 Y (θ, φ) = 0
∂θ ∂θ ∂φ
podemos expressar a função Y (θ, φ) = Θ (θ) T (φ)
1 d2
 
sin θ d d
sin θ Θ (θ) + λ sin2 θ + T (φ) = 0 (5)
Θ (θ) dθ dθ T (φ) dφ2
| {z } | {z }
2 2
m −m
para obter as seguintes equações diferenciais
d2
T (φ) = −m2 T (φ) (6)
dφ2
e
m2
   
1 d d
sin θ Θ (θ) + λ − Θ (θ) = 0 (7)
sin θ dθ dθ sin2 θ
A solução da equação (6) é
Tm (φ) = eimφ , (8)
considerando que a densidade de probabilidade seja uma função unı́voca ou monódroma da variável
angular φ, então, a função deve satisfazer a condição de periodicidade

Φ (φ + 2π) = Φ (φ) (9)

com isso obtemos que ei2πm = 1, assim m deve ser um numero inteiro: m = 0, ±1, ±2, · · · .
Agora, analisamos a equação (7). Fazendo a mudança de variável x = cos θ, temos
d d
= − sin θ (10)
dθ dx
com isso a EDO resulta em
m2
   
d 2 d
sin θ Θ (x) + λ − Θ (x) = 0
dx dx sin2 θ
m2
   
d 2
 d
1−x Θ (x) + λ − Θ (x) = 0 (11)
dx dx 1 − x2
 d2 m2
 
2 d
1−x Θ − 2x Θ + λ − Θ=0 (12)
dx2 dx 1 − x2
que é conhecida como a EDO das funções associadas de Legendre para λ e m arbitrários.
As soluções são finitas em x = ±1 (θ = 0, π) se λ = ` (` + 1) com ` = 0, 1, 2, ... e m =
−`, ..., −1, 0, 1, ..., `,e são chamadas de funções de Legendre associadas
m/2 dm
P`m (x) = 1 − x2 P` (x)
dxm
1 d` 2
`
P` (x) = ` x − 1
2 `! dx`
2
ou
x → θ ⇒ P`m (x) → P`m (cos θ)
O conjunto {P`m (cos θ)} é ortogonal
Z π
m m 2 (` + m)!
hP` |P`0 i = dθ sin θ P`m (cos θ) P`m0 (cos θ) = δ ``0
0 2` + 1 (` − m)!

A solução Tm (φ) = eimφ na coordenada angular φ também forma um conjunto ortogonal
Z 2π Z 2π ∗ 0
hTm |Tm0 i = dφ Tm∗ (φ) Tm0 (φ) = dφ eimφ eim φ = 2πδ mm0
0 0

Definimo os harmônicos esféricos como sendo o conjunto ortonormal {Y`m (θ, φ)}
s
2` + 1 (` − m)! m
Y`m (θ, φ) = P (cos θ) eimφ
4π (` + m)! `
D E Z 2π Z π
0 0
Y`m |Y`m
0 = dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) Y`m
0 (θ, φ) = δ ``0 δ mm0
0 0
Os harmônicos esféricos geram um espaço vetorial de funções na esfera unitária, tal que, quaisquer
função f (θ, φ) nesse espaço é expressa por
∞ X
X `
f (θ, φ) = f`m Y`m (θ, φ)
`=0 m=−`

com Z 2π Z π
0
f`m = hY`m |f i = dφ dθ0 sin θ0 Y`m∗ (θ0 , φ0 ) f (θ0 , φ0 )
0 0

∞ X
X ` Z 2π Z π 
0 0 0 0 0 0 0
f (θ, φ) = dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ , φ ) f (θ , φ ) Y`m (θ, φ)
`=0 m=−` 0 0
"∞ ` #
Z 2π Z π X X
= dφ0 dθ0 sin θ0 Y`m∗ (θ0 , φ0 ) Y`m (θ, φ) f (θ0 , φ0 )
0 0 `=0 m=−`
| {z }
δ(cos θ−cos θ0 )δ(φ−φ0 )

Assim a relação de completeza dos harmônicos esféricos é


∞ X
X `
Y`m∗ (θ0 , φ0 ) Y`m (θ, φ) = δ (cos θ − cos θ0 ) δ (φ − φ0 ) (13)
`=0 m=−`

Y`−m (θ, φ) = (−1) Y`m∗ (θ, φ)

3
Lista dos primeiros harmônicos esféricos:
s
2` + 1 (` − m)! m
Y`m (θ, φ) = P (cos θ) eimφ
4π (` + m)! `

1
Y00 (θ, φ) = √

r
3
Y10 (θ, φ) = cos θ

r
1 3
Y1 (θ, φ) = − sin θ eiφ

r  
5 3 1
Y20 (θ, φ) = 2
cos θ −
4π 2 2
r
15
Y21 (θ, φ) = − sin θ cos θ eiφ

r
1 15
Y22 (θ, φ) = sin2 θ ei2φ
4 2π

r  
7 5 3
Y30 (θ, φ) = 3
cos θ − cos θ
4π 2 2
r
1 21
Y31 (θ, φ) = sin θ 5 cos2 θ − 1 eiφ


4 4π
r
1 105 2
Y32 (θ, φ) = sin θ cos θ ei2φ
4 2π
r
1 35
Y33 (θ, φ) = − sin3 θ ei3φ
4 4π

4
Voltamos à solução do problema
∇2 Φ (~r) = 0, (14)
A parte angular satisfaz a EDO (λ = ` (` + 1) ,
 
d 2d
r U (r) − ` (` + 1) U (r) = 0 (15)
dr dr

cujas solução é
B`
U (r) = A` r` +
r`+1
E a solução para a parte angular, os harmônicos esféricos formam uma base ortonormal. Assim,
a solução geral ao problema é
∞ X `  
X B`m
Φ (~r) = Φ (r, θ, φ) = A`m r + `+1 Y`m (θ, φ)
`

`=0 m=−`
r

com a condição de fronteira ou de contorno sobre uma esfera de raio a



Φ (~r) = f (θ, φ) . (16)

r=a

Os coeficientes A`m e B`m são determinados pelas condições de contorno.

1.1 Solução dentro da esfera (0 ≤ r ≤ a)


A solução deve ser finita dentro da esfera logo o coeficiente B`m = 0, assim,
∞ X
X `
Φ (r, θ, φ) = A`m r` Y`m (θ, φ)
`=0 m=−`

usando a condição
∞ ` 0

0 0
X X
Φ (~r) = f (θ, φ) = A`0 m0 a` Y`m (θ, φ) (17)

0
r=a
`0 =0 m0 =−`0

∞ ` 0
Z 2π Z π Z 2π Z π
`0 0
X X
dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) f (θ, φ) = A`0 m0 a dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) Y`m 0 (θ, φ)
|0 0
{z } `0 =0 m0 =−`0
|0 0
{z }
hY`m |f i hY`m |Y`m0 0 i=δ``0 δmm0
(18)
hY`m |f i = A`m a`
hY`m |f i
A`m =
a`
X∞ X `  r `
Φ (r, θ, φ) = hY`m |f i Y`m (θ, φ)
`=0 m=−`
a

5
1.2 Solução fora da esfera (r ≥ a)
A solução deve ser finita nula no infinito, logo o coeficiente A`m = 0, assim,
∞ X `
X B`m m
Φ (r, θ, φ) = Y (θ, φ)
`=0 m=−`
r`+1 `

usando a condição
∞ 0
`
X X B`0 m0 m0
Φ (~r) = f (θ, φ) = Y 0 (θ, φ) (19)

r=a
`0 =0 m0 =−`0
a`0 +1 `
∞ ` 0
2π π
B`0 m0 2π
Z Z Z Z π
0
X X
dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) f (θ, φ) = `0 +1 dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) Y`m 0 (θ, φ)
0 0 0 0 0
a 0 0
| {z } ` =0 m =−` | {z }
hY`m |f i hY`m |Y`m0 0 i=δ``0 δmm0
(20)
B `m
hY`m |f i = `+1
a
B`m = a`+1 hY`m |f i
X∞ X `  a `+1
Φ (r, θ, φ) = hY`m |f i Y`m (θ, φ)
`=0 m=−`
r

2 Exemplo 2
Seja a equação de Laplace
∇2 Φ (~r) = 0 (21)
com as seguinte condições de fronteira

Φ (~r) = f (θ, φ) ,

r=a

Φ (~r) = g (θ, φ) ,

r=b

com a < b. Calcular a solução na região a < r < b.

2.1 A solução geral é


∞ X `  
X B`m
Φ (~r) = Φ (r, θ, φ) = A`m r + `+1 Y`m (θ, φ)
`

`=0 m=−`
r

2.1.1 Usando a condição de contorno em r = a :


∞ `0  
X X
`0 B`0 m0 0
Φ (~r) = f (θ, φ) = A`0 m0 a + `0 +1 Y`m (θ, φ)

0
r=a
`0 =0 m0 =−`0
a

6
Fazendo o produto escalar
Z 2π Z π ∞ `0   Z 2π Z π
m∗
X X
`0 B`0 m0 0
dφ dθ sin θ Y` (θ, φ) f (θ, φ) = A`0 m0 a + `0 +1 dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) Y`m
0 (θ, φ)
0 0 `0 =0 m0 =−`0
a 0 0
| {z } | {z }
hY`m |f i hY`m |Y`m0 0 i

∞ `0   ∞ `0  
X X
`0 B`0 m0 D m m0 E X X `0 B`0 m0
hY`m |f i = A`0 m0 a + `0 +1 Y` |Y`0 = A`0 m0 a + `0 +1 δ ``0 δ mm0
0 0
` =0 m =−` 0
a 0 0
` =0 m =−` 0
a
B`m
hY`m |f i = A`m a` + (22)
a`+1

2.1.2 Usando a condição de contorno em r = b :


∞ `0  
X X
`0 B`0 m0 0
Φ (~r) = g (θ, φ) = A`0 m0 b + `0 +1 Y`m (θ, φ)

0
r=b
`0 =0 m0 =−`0
b
Fazendo o produto escalar
Z 2π Z π ∞ `0   Z 2π Z π
X X
`0 B`0 m0 0
dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) g (θ, φ) = A`0 m0 b + `0 +1 dφ dθ sin θ Y`m∗ (θ, φ) Y`m
0 (θ, φ)
0 0 0 0 0
b 0 0
| {z } ` =0 m =−` | {z }
hY`m |f i hY`m |Y`m0 0 i

∞ `0   ∞ `0  
X X
`0 B`0 m0 D m m0 E X X `0 B`0 m0
hY`m |gi = A`0 m0 b + `0 +1 Y` |Y`0 = A`0 m0 b + `0 +1 δ ``0 δ mm0
0 0
` =0 m =−` 0
b 0 0
` =0 m =−` 0
b
B`m
hY`m |gi = A`m b` + (23)
b`+1
As equações (22) e (23) formam um sistema de equações que determinam os coeficientes A`m e
B`m

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