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Antônio Renato G msso

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ISrO R ICO de

Para estudantes òa Bíblia

III I
í

SAVins
ANTÔNIO RENATO GUSSO

PANORAMA
HISTÓRICO
DE ISRAEL
PARA ESTUDANTES DA BÍBLIA

CURITIBA
2006
Copyright©2003 por
Antônio Renato Gusso.
Todos os direitos em língua
portuguesa reservadospor:
Capa:
A. D. Santos Editora Ijmaua Marinho
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

GUSSO, Antônio Renato.


Panorama Histórico de Israel para Estudantes da Bíblia /
Antônio Renato Gusso —Curitiba: A. D. SANTOS EDITORA, 2003. 254 p.
ISBN - 978-85-7459-075-2
1. Bíblia. História dos eventos bíblicos 2. História de Israel
CDD- 221.83

3®Edição: Março/2007: 2.000 exemplares

Proibida a reprodução total ou pardal,


p or quaisquer meios a não ser em dtações breves,
com indicação da fonte.

Edição e Distribuição:

SANTOS
EDI TORA
S u m á r io

1. INTRODUÇÃO............................................................. 1
2. A PRÉ-HISTÓRIA DE ISRAEL...............................3
2.1. O Mundo Bíblico Antes dos Patriarcas.............3
2.1.1. A Vida Social em Canaã..............................5
2.1.2. A Vida Social na Mesopotamia.................6
2.1.3. A Vida Social no Egito...............................7
2.2. O Período Patriarcal.............................................. 9
2.2.1. Os Patriarcas na Mesopotamia.................9
2.2.2. Os Patriarcas em Canaã..............................11
2.2.3. Os Patriarcas no Egito................................12
2.3. Genealogia dos Patriarcas.....................................14
2.4. Para Complementar................................................15
2.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período....................................................... 15
2.4.2. Questões Para Revisão................................15
3. A FORMAÇÃO DA NAÇÃO.....................................17
3.1. Os Descendentes de Jacó Saem do Egito.........17
3.2. Deus Estabelece um Pacto com os
Descendentes de Jacó............................................ 21
3.3. Israel no Deserto.....................................................22
3.3.1. O Motivo que os Levou ao Deserto....... 22
3.3.2. Os Acontecimentos no Deserto...............23
3.4. Para Complementar................................................25
3.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................25
3.4.2. Questões Para Revisão................................25
4. A CONQUISTA DE CANAÃ.....................................27
4.1. A Situação Cananéia.............................................. 27
4.1.1. Composição Social e Política em
Canaã..........................................................................28
4.1.2. A Religião Cananéia.....................................30
4.1.2.1. O deus E l....................................................31
4.1.2.2. O deus B aal............................................... 31
4.1.2.3. As deusas Asera, Astarte e Anate..........32
4.2. A Invasão Israelita...................................................33
4.2.1. A Entrada na Terra Prometida.................34
4.2.2. O Desenrolar da Conquista...................... 35
4.3. Para Complementar................................................37
4.3.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................37
4.3.2. Questões Para Revisão....................................... 37
5. O PERÍODO DOS JU ÍZES........................................ 39
5.1. O Sistema De Governo Teocêntrico.................39
5.2. Como Surgiram os Problemas............................ 41
5.2.1. A Explicação Teológica..............................42
5.2.2. A Explicação Natural..................................43
5.3. A Atuação dos Libertadores.................................45
5.4. Para Complementar................................................54
5.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................54
5.4.2. Questões Para Revisão................................54
6. OS PRIMÓRDIOS DA MONARQUIA...................55
6.1. O Estabelecimento da Monarquia...................... 56
6.1.1. O Primeiro Rei de Israel............................ 56
6.1.2. A Decadência de Saul..................................57
6.2. O Reinado de D avi.................................................59
6.2.1. Como Davi Chegou ao Poder..................60
ii
6.2.2. A Política Expansionista de Davi.............62
6.2.3. Os Problemas da Sucessão de Davi........ 62
6.3. O Reinado de Salomão.......................................... 63
6.3.1. Como Salomão Firmou-se no Trono..... 64
6.3.2. As ReaÜ2ações de Salomão....................... 65
6.3.3. A Decadência Espiritual de Salomão...... 67
6.4. Para Complementar................................................69
6.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................69
6.4.2. Questões Para Revisão................................69
7. A DIVISÃO DO REINO............................................. 71
7.1. Motivos que Levaram à Divisão......................... 72
7.1.1. A Explicação Teológica..............................73
7.1.2. A Explicação Natural..................................75
7.2. Como Ficou Dividido o Reino........................... 78
7.2.1. A Parte Norte................................................79
7.2.2. A Parte Sul.....................................................80
7.2.3. Quadro Explicativo do Reino Dividido.. 81
7.3. Resultados da Divisão........................................... 82
7.3.1. As Conseqüências Religiosas.................... 82
7.3.2. As Conseqüências Políticas....................... 83
7.4. Para Complementar................................................84
7.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................84
7.4.2. Questões Para Revisão................................84
8. O REINO DE ISRA E L.................................................85
8.1. A Situação Política de Israel................................. 85
8.2. A Situação Econômica e Social de Israel...........87
8.3. A Situação Religiosa de Israel.............................. 88
8.4. O Fim do Estado de Israel...................................90
8.5. Os Principais Líderes de Israel............................ 92
iii
8.5.1. Os Profetas de Israel...................................92
8.5.2. Os Reis de Israel.......................................... 95
8.6. Para Complementar................................................101
8.6.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................101
8.6.2. Questões Para Revisão................................101
9. O REINO DE JU D Á .....................................................103
9.1. A Situação Política de Judá...................................103
9.2. A Situação Econômica e Social de Judá...........105
9.3. A Situação Religiosa de Ju d á................................106
9.4. O Fim do Estado de Judá.....................................108
9.5. Os Principais Líderes de Ju d á ..............................110
9.5.1. Os Profetas de Judá.....................................111
9.5.2. Os Reis de Judá............................................ 115
9.6. Para Complementar................................................123
9.6.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................123
9.6.2. Questões Para Revisão................................124
10. O CATIVEIRO BABILÓNICO...............................125
10.1. Os Dominadores...................................................126
10.1.1. Nabopolassar.............................................. 126
10.1.2. Nabucodonosor......................................... 127
10.1.3. Evil-Merodaque......................................... 128
10.1.4. Neriglissar....................................................129
10.1.5. Labashi-Marduque.....................................129
10.1.6. Nabonido e Belsazar.................................129
10.2. A Diáspora............................................................. 130
10.2.1. O Significado do Termo Diáspora....... 131
10.2.2. Como Aconteceu a Diáspora.................. 131
10.2.3. A Importância da Diáspora..................... 133
10.3. A Cidade de Babilônia......................................... 134
iv
10.4. As Condições do Povo Cativo.......................... 138
10.4.1. A Condição Social.....................................139
10.4.2. A Condição Religiosa................................140
10.4.3. A Condição Política..................................143
10.5. A Duração do Cativeiro...................................... 145
10.6. Para Complementar............................................. 148
10.6.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................148
10.6.2. Questões Para Revisão............................ 148
11. A COMUNIDADE PÓS-EXÍLICA........................ 149
11.1. Os Novos Senhores............................................. 150
11.1.1. Os Persas Chegam ao Poder...................151
11.1.2. A Política Persa Para Com os
Deportados............................................................... 152
11.1.3. Os Líderes do Império Persa..................154
11.2. Os Grupos que Voltaram P araju d á................156
11.2.1. O Grupo de Zorobabel........................... 157
11.2.2. O Grupo de Esdras...................................159
11.2.3. O Grupo de Neemias...............................160
11.3. As Condições Gerais da Comunidade
Põs-Exflica................................................................ 162
11.3.1. A Situação Política.....................................163
11.3.2. A Situação Religiosa..................................164
11.3.3. A Situação Econômica-Social.................166
11.4. Para Complementar............................................. 168
11.4.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................168
11.4.2. Questões Para Revisão.............................169
12. O PERÍODO GREGO................................................171
12.1. O Surgimento de um Novo Império...............172
12.2. O Auge do Período Grego.................................173
v
12.3. A Divisão do Império Grego............................ 176
12.3.1. Os Ptolomeus............................................. 177
12.3.2. Os Selêucidas.............................................. 178
12.4. Questões Para Revisão........................................ 182
13. O PERÍODO DOS MACABEUS.............................183
13.1. A Revolta Contra os Selêucidas........................ 183
13.1.1. A Situação Desesperadora
dos Judeus Fiéis.......................................................183
13.1.2. A Deflagração da Revolta........................ 185
13.2. As Conquistas de Judas Macabeu..................... 186
13.3. O Período de Prosperidade Advindo da
Independência........................................................ 189
13.4. A Decadência da Nação......................................191
13.5. Para Complementar............................................. 194
13.5.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................194
13.5.2. Questões Para Revisão.............................194
14. SOB O DOMÍNIO DE ROMA................................195
14.1. A Administração Romana...................................196
14.2. Os Imperadores.....................................................198
14.2.1. Augusto........................................................198
14.2.2. Tibério..........................................................199
14.2.3. Calígula.........................................................200
14.2.4. Cláudio.........................................................200
14.2.5. Néro.............................................................. 201
14.2.6. Galba - Otão - Vitélo................................201
14.2.7. Vespasiano...................................................202
14.2.8. T ito ............................................................... 202
14.2.9. Domiciano...................................................202
14.2.10. Nerva..........................................................203
14.2.11. Trajano.......................................................203
vi
14.2.12. Adriano......................................................203
14.3. A Atuação dos Herodes......................................204
14.4. A Atuação dos Governadores........................... 206
14.5. As Religiões no Império Romano.................... 207
14.6. A Guerra com os Judeus.....................................208
14.7. Para Complementar............................................. 211
14.7.1. Algumas Informações Bíblicas
Sobre o Período.......................................................211
14.7.2. Questões Para Revisão............................ 211
15. CONCLUSÃO............................................................... 213
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................... 214
ANEXO - RESENHAS DE LIVROS SOBRE
HISTÓRIA DE ISRAEL....................................................225
Uma Visão Geral da História de Israel...................... 225
História de Israel para Estudantes de Teologia...... 227
Israel e as Nações........................................................... 229
Uma Visão Crítica da História de Israel.................... 230
As Religiões de Israel.....................................................232
Uma Visão Conservadora da História de Israel...... 235
Esboço Histórico de Israel........................................... 237
História Política dos Judeus......................................... 239
Confusão de Gêneros....................................................242

v ii
viii
Panorama Histórico de Israel 1

1 . INTRODUÇÃO

Escrever a história de Israel é uma tarefa fora do co­


mum. Quem se lança a esta dura empreitada logo vai enfren­
tar o desafio de perguntas importantes e difíceis, quando não
impossíveis de serem respondidas, que vão surgindo no de­
correr do trabalho. As dificuldades já aparecem no momen­
to em que se procura definir o significado do próprio termo
“Israel” e delimitar a época de seu surgimento e de seu desa­
parecimento. Parece simples, mas apontar com certa mar­
gem de exatidão o nascimento de Israel e deixar claro o que
este termo exprime é algo muito complicado. Afinal, a pró­
pria palavra Israel, na Bíblia, é utilizada com, pelo menos,
nove sentidos diferentes.1
A tarefa de apresentar um panorama histórico para
estudantes da Bíblia, como é o caso neste trabalho, também
não é simples. Não é fácil decidir, entre tanta riqueza de de­
talhes, o que deve constar e o que deve ficar de fora do rela­
to. Contudo, dentro do possível, aqui serão abordados, de
forma geral e resumida, todos os pontos que sejam indispen­
sáveis para ajudar o leitor a ter uma compreensão mais clara
dos acontecimentos narrados na Bíblia. Minúcias que dizem
respeito a acontecimentos paralelos e nações vizinhas, ainda
que importantes, serão evitados ao máximo, mas, havendo
interesse, poderão ser encontrados na bibliografia apresen­
tada.
Como a história de Israel, da mesma forma que a de
outros povos, não surge em um vácuo, para que haja uma
melhor compreensão dos seus inícios, a primeira parte deste

* GUSSO, A. R. Como entender a Bíblia?: orientaçõespráticaspara melhor compreender as Escrituras Sagradas.


Curitiba : A. D. Santos Editora, 1998. p. 66-70.
2 Antônio Renato Gusso

panorama estará apresentando uma análise do que pode ser


chamado de “Pré-História de Israel”, o período que está li­
gado a Israel mas que ainda não faz parte dele, pois este
povo, ou nação, não existia naquela época. Nela será visto
como estava se desenvolvendo a vida social em Canaã, Egito
e Mesopotâmia, locais extremamente importantes na histó­
ria bíblica, antes e durante a existência dos chamados, na atu­
alidade, “Patriarcas”, os antepassados de Israel.
Em seguida, o relato estará apresentando como que a
nação foi formada. Feito isto, seguirá em uma ordem crono­
lógica que passará pela conquista de Canaã, o chamado Perí­
odo dos Juizes, os primórdios da monarquia, a divisão do
reino e o desenvolvimento individual de cada uma das par­
tes, Reino do Norte, Israel, e Reino do Sul, Judá, desde os
seus primeiros passos até o desaparecimento como estados
independentes, conquistados, respectivamente, pela Assíria
e Babilônia.
Também será visto, na seqüência, como foi a vida do
povo cativo na Babilônia e, logo após, como aconteceu o re­
torno para Judá e como se desenvolveu a comunidade pós-
exüica, debaixo do poderio persa, grego e romano, com o
breve intervalo de independência na época dos Macabeus.
No decorrer do texto algumas passagens bíblicas
serão apresentadas. Sempre que isto ocorrer, estará sendo
utilizada a Edição Revista e Atualizada no Brasil, traduzida
em português por João Ferreira de Almeida, e publicada pela
Sociedade Bíblica do Brasil em 1969. Quando aparecer
alguma citação bíblica na língua hebraica ela estará sendo
feita da Bíblia Hebraica Stuttgartensia.
Panorama Histórico de Israel 3

2 . A PRÉ-HISTÓRIA DE ISRAEL
Israel, assim como as outras nações, não surgiu do
nada, tem uma rica pré-história que deve ser analisada com
atenção para que se possa entender melhor as suas caracte­
rísticas. Por isso, ainda que o objetivo deste trabalho seja
apresentar uma visão geral da História de Israel propriamen­
te dita, neste capítulo inicial, serão dadas informações gerais
a respeito de algumas nações ou regiões além de pessoas
que, mesmo existindo antes de haver uma nação, ou mesmo
um povo, com este nome, acabaram por influenciar de uma
ou outra forma na existência posterior desta.
Em seguida, então, será apresentado, em linhas ge­
rais, como era a vida social nas regiões do chamado Mundo
Bíblico ainda antes dos Patriarcas; como viviam os Patriar­
cas; como aconteceu a entrada do futuro Israel no país do
Egito; como foi a permanência neste lugar e como consegui­
ram sair e formar uma nova nação.

2.1. Q Mundo Bíblico Antes dos Patriarcas__________

Muitos ao lerem o Livro de Gênesis na Bíblia ficam


com a impressão de que os Patriarcas surgiram ainda no iní­
cio da humanidade, mas isto não passa de um engano. Não
foi algo intencional da parte do autor ludibriar seus leitores,
contudo, isto acaba acontecendo pela maneira breve como o
livro descreve (em apenas onze capítulos - Gn 1-11) a cria­
ção do universo, a queda do homem de seu estado original
por causa do pecado, a degeneração da raça e a destruição do
mundo antigo pelo dilúvio, antes de, em seguida, passar a
tratar de forma bem mais detalhada (em trinta e nove capítu­
4 Antônio Renato Gusso

los - Gn 12-50), um período de tempo comparativamente


breve apresentando os ascendentes mais famosos de Israel.
Quando se pensa em Israel, ou em seus antepassados,
os Patriarcas, não se deve pensar, então, no alvorecer da hu­
manidade, como tem sido o costume de alguns; é preciso le­
var em conta que o ser humano, com as características
atuais, já existia muito tempo antes. Como afirma Bright,
existe um período de tempo muito maior separando o surgi­
mento dos Patriarcas no cenário mundial e início da civiliza­
ção no Oriente Próximo do que o qual o separa da época
atual/Em outras palavras, para ficar claro, o período que vai
do surgimento da humanidade até o de Abraão, que aparece
pela primeira vez no final de Gn 11, é bem maior do que o
período aproximado de 4000 anos que vai deste até os nos­
sos dias, que aos olhos do estudante moderno está tão dis­
tante.
Os pontos que seguem, após os gráficos representan­
tes da relação tempo/narrativa em Gênesis, mostrando um
pouco da vida social em Canaã, Egito e Mesopotâmia, pode­
rão deixar mais claro aquilo que foi dito acima, e lançar luzes
à compreensão da História de Israel como um elemento nas­
cente em meio a um mundo altamente civilizado e não em
uma fase primitiva da humanidade.
GÊNESIS 1-11 GÊNESIS 12-50
Espaço de Tempo Espaço de Tempo

Narrativa Narrativa

Inicio
da ■■■ ► Abraão ■ ► Atualidade
Humanidade Espaço de tempo + ou —4 000 anos
desconhecido

^ BRIGHT, J. História de Israel. São Paulo : Edições Paulinas, 1985. p. 16.


Panorama Histórico de Israel 5

2.1.1. A Vida Social em Canaã

As evidências arqueológicas têm demonstrado que


por volta do ano 8000 a.C., ou seja, 6000 anos antes da época
atribuída às peregrinações de Abraão e sua família pelos ter­
ritórios de Canaã, esta região já estava ocupada por comuni­
dades bem desenvolvidas. A “sociedade natufiana”, assim
denominada porque seus indícios foram encontrados, pela
primeira vez, nas cavernas próximas do Wadi en-Natuf, dão
testemunho desta realidade/ Ela era formada por pessoas
que estavam passando do sistema de vida em cavernas para
os aldeamentos.
Ainda que esta sociedade tenha existido por volta de
5000 anos antes da escrita, pelo menos de acordo com as
descobertas divulgadas até o momento, acabou deixando
para a posteridade um testemunho claro de sua forma social
por meio dos objetos que utilizava.4 Eles continuavam,
como seus antepassados, vivendo principalmente da caça,
pesca e da pilhagem, mas a presença de foices e vasilhas de
pedra e osso, além de outros indícios, demonstram que havi­
am aprendido a cultivar e, também, a domesticar certos ani­
mais.5
A cidade de Jericó tem seus inícios ligados à este dis­
tante VIII milênio. E evidente que, desde a sua fundação, se
é que assim pode ser chamado o seu início, se passaram vári­
os séculos até que pudesse vir a ser classificada como uma
cidade. Por volta do VII e VI milênio isto é evidente. Ela era
protegida por uma fortificação de pedras e possuía casas
construídas de tijolos de barro. Seus moradores, em alguns
casos, pintavam suas casas, utilizavam esteiras de junco para
cobrir os pisos, fabricavam pequenas estátuas de pessoas e
animais, já haviam domesticado cães, porcos, ovelhas e bois.
3 Ibid.„ p. 17.
CAJ.J .AWA Y, I, A. :1 //iíA>/A/. Rio de Janeiro ;JUERP, 1$8‘6, p- fW>.
5 BRIGHT, op. citi p. 18,
6 Antônio Renato Gusso

Infere-se, pelo tamanho da cidade e pela dificuldade de se


encontrar terras aráveis nas proximidades, que seus habitan­
tes se utilizavam de alguma forma de irrigação para ajudar no
plantio, e a presença de instrumentos fabricados com mate­
riais procedentes da Anatólia, do Sinai e do litoral, podem
estar revelando que havia um razoável intercâmbio comerci­
al com regiões consideravelmente distantes para a época.6
Jericó não é um caso isolado em Canaã. Descobertas
recentes têm demonstrado que por volta do VII milênio
existiam outras inúmeras vilas e aldeias permanentes, espa­
lhadas por toda a região. Quando Abraão deixou a sua terra
natal, a Mesopotâmia, e partiu para peregrinar em Canaã,
obedecendo à ordem de Deus, esta região já contava com
uma história de mais de cinco mil anos como civilizada7, o
que demonstra que ela já estava bastante avançada. Com
Abraão, então, pode-se dizer que estava começando a Pré-
história de Israel, em um período social bem desenvolvido,
mas as particularidades do início da História da Humanida­
de, por esta mesma época, já estavam perdidas nos tempos
remotos.

2.1.2. A Vida Social na Mesopotâmia________________

Mesopotâmia é um nome grego que significa “Entre


Rios”. A região tomou esta nomenclatura por estar localiza­
da entre os rios Eufrates e Tigre. Nela podem ser atestados a
presença de aldeamentos, ainda que rudimentares, desde o
VII milênio. Era o princípio organizacional de futuras cida­
des estados que viriam a surgir nos milênios posteriores.
Seus templos, suas construções, seus documentos, escritos,
que surgiram nos últimos séculos do IV milênio8, demons­
trando o grau de civilização que haviam alcançado, têm im­
6 BRIGHT, ap. çit, p. 19-20.
^ Ibid.,p. 20.
8 Ibid, p. 22-27.
Panorama Histórico de Israel 7

pressionado estudantes e pesquisadores de todas as épocas,


e nos apresentam um povo bem superior àquele que geral­
mente se tem em conta quando se pensa no início da Histó­
ria de Israel.
Não há nenhuma dúvida que Abraão e seus familiares
são originários de uma região rica, onde havia, por sua épo­
ca, cidades bem urbanizadas, construções espetaculares, um
comércio bem desenvolvido e intensa atividade política, bé­
lica, religiosa e cultural.

2.1.3. A Vida Social no Egito_______________________

No Egito, os indícios mais antigos de uma sociedade


que vivia em aldeamentos têm sido datados da última parte
do V milênio, seguramente há mais de dois mil anos distan­
tes, no tempo, da época de Abraão. Depois desta época vári­
as culturas têm sido identificadas de forma ininterrupta
tanto no Alto quanto no Baixo Egito. Comparadas com as
que se desenvolveram na Mesopotamia, pela mesma época,
elas podem ser consideradas atrasadas mas, mesmo assim,
era a base para uma sociedade altamente desenvolvida que
viria logo.9
No IV milênio, o Egito, já havia estabelecido algum
tipo de governo unindo as diversas aldeias. Eles empreendi­
am trabalhos de drenagem e irrigação, conheciam e utiliza­
vam o cobre, e mantinham algum tipo de intercâmbio
internacional com Canaã e Mesopotâmia, o qual pode ser
atestado pelos tipos de cerâmicas destas regiões encontradas
em seus sítios arqueológicos.10
Este intercâmbio com a Mesopotâmia deve ter cessa­
do por volta do século XXIX, mas existem indícios claros de
que o Egito continuou a manter relações com a Região de
9 BRIGHT, op. cif, p. 30-31.
10 Ibid., p .'31.
8 Antônio Renato Gusso

Canaã e com a Fenícia nos séculos seguintes.11 Além disto,


está comprovado que por volta do ano 2650 a.C., os egípcios
já tinham capacidade e condições de construírem obras tão
espetaculares como a pirâmide de degraus do rei Djoser,12
isto a mais de 600 anos antes do aparecimento dos antepas­
sados famosos de Israel.
A foto da pirâmide de degraus do rei Djoser, a seguir,
é uma boa amostra do que os egípcios daquela época eram
capazes de fazer em matéria de construções. Olhando para
ela e tentando desvendar os mistérios que envolvem uma
construção tão complexa em época tão remota, não se pode
duvidar que sua edificação é fruto da engenhosidade e criati­
vidade de um povo bastante avançado na arte de construir.

Pirâmide de Degraus do Rei Djoser - Data estimada: 2650 a.C.

Apenas concluindo este ponto é importante destacar,


uma vez mais, que os Patriarcas não surgiram no meio de um
vácuo histórico. Antes deles, a humanidade civilizada já pos­
suía uma longa trajetória que se perde no tempo. Hoje em
dia é de conhecimento e aceitação geral que, por volta de
8000 a.C., ou não muito distante disto, os homens estavam
realizando grandes feitos como, por exemplo, em Canaã, a
construção de Jericó, uma fortaleza militar; na Mesopotâ-
11 Ibid., p. 32.
12 KITCHEN, K. A. jEgito. São Paulo : Edições Vida Nova, 1983. p. 465-466.
Panorama Histórico de Israel 9

mia, entre o V e IV milênios, construções de grandes tem­


plos, e, no Egito, próximo a 2700 a.C., pode-se atestar a
construção de grandes pirâmides.1’

2.2. O Período Patriarcal__________________________

Pode-se dizer que o Período Patriarcal, na narrativa


bíblica, vai do surgimento de Abraão 110 capítulo 11 do Li­
vro de Gênesis até o primeiro capítulo do Livro de Exodo, o
qual apresenta uma lista dos filhos dejacó, antes de começar
a narrar um novo período da história. Não se pode ser dog­
mático em questão de datas para um estágio tão distante no
tempo como este, mas, uma data aproximada, mesmo ha­
vendo muitas diferenças nas opiniões apresentadas pelos es­
tudiosos da questão, pode ser estipulada. Gottwald propõe
um período que vai no máximo do ano 2300 a.C. até o ano
1300 a.C.14, Thompson, por sua vez, procurando ser mais
preciso, sugere que ele seja colocado entre 1900 e 1600 a.C.15
Tomando como base estes dois estudiosos, talvez seja pru­
dente ficar dentro dos seguintes limites: 2300 - 1900 para o
início do período e 1600 - 1300 para o término.
A seguir será apresentada, em linhas gerais, como
transcorreu a trajetória dos Patriarcas, a qual começou na Me-
sopotâmia, mais especificamente em Ur dos Caldeus, passou
por Canaã e terminou no Egito, como a Bíblia a descreve.

2.2.1. Os Patriarcas na Mesopotâmia_________________

A história dos Patriarcas tem o seu início ligado à ci­


dade de Ur dos Caldeus. Nela vivia Terá e seus filhos, dentre
os quais se destacaria, mais tarde, Abraão, como aquele que

^ CROATO, J. S. História da Salvação. Caxias do S u l: Edições Paulinas, 1968. p. 33-34.


^ GOTTWALD,N. K. Introdução SociokteráriaàBíbkaHebraica. São Paulo: Edições Paulinas, 1.988. p. 66-67.
15 'THOMPSON, J. A. Era Patriarcal São Paulo ; Edições Vida Nova, 1983. p. 1213.
10 Antônio Renato Gusso

receberia algumas promessas de Deus e, por crer incondicio­


nalmente nelas, se tornaria conhecido como o Pai da Fé.
A narrativa bíblica não explica o por que, mas Terá
resolveu deixar Ur dos Caldeus e partir para a terra de Canaã.
Esta viagem nunca foi concretizada. Terá e os seus chega­
ram à Harã e lá permaneceram. A viagem só continuou de­
pois da morte de Terá, quando Abraão, nesta época ainda
conhecido como Abrão, recebeu um comunicado divino
para partir, ao qual atendeu prontamente levando consigo
sua esposa Sarai, a qual, mais tarde, seria chamada de Sara,
seu sobrinho Ló, bens e várias pessoas que o serviam ou,
como sugere Francisco, que o seguiram pela sua causa, her­
dar uma terra prometida por Deus16 (Gn 11:26-12:5).
A Mesopotâmia desta época estava enfrentando uma
grande confusão política17, o que pode ter motivado Terá, por
questão de prudência, a partir de sua cidade. Inclusive, existem
indícios de que ela foi destruída, pelos elamitas, por volta de
1950 a.C. Sua permanência em Harã pode ser explicada pela se­
melhança desta com Ur. Elas eram ambas cidades bem desen­
volvidas e centros de adoração do deus lua18, o qual Terá deve
ter adorado, já que a Bíblia o apresenta como idólatra (|s 24:2).
Ainda que não se possa determinar, com exatidão, o
motivo que levou Terá e seus familiares a deixarem Ur e parti­
rem para Canaã, em um primeiro momento, e mesmo que as
viagens realizadas pelos nômades e seminômades daquela épo­
ca estejam relacionadas, principalmente, com questões políticas
e econômicas, não se deve esquecer que o caso de Abraão é es­
pecial. Ele saiu de sua terra atendendo à uma necessidade espi­
ritual. Está claro que o seu objetivo era religioso19. Ele deixou
seus parentes e seu lar atendendo a uma chamada divina.

10 FRANCISCO, C. T. Genesis, Rio de Janeiro : JUERP, 1988. p. 214.


17 BRIGHT, op. cit., p. 57.
^ KIDNER, D. Genesis: introduçâo e comentärio. Säo Paulo : Ediçoes Vida Nova, 1991. p. 104.
* DANA, H. E. O mundo do Novo Testamente: um estudo do ambiente histôrico e cultural do Novo Testamento. Rio de
Janeiro: JUERP, 1980. p. 138-139.
Panorama Histórico de Israel 11

2.2.2. Os Patriarcas em Canaã

Abraão havia recebido a promessa divina de que pos­


suiria a terra de Canaã (Gn 13:14-18) mas, de fato, ele mes­
mo nunca a possuiu, isto ficou para os seus descendentes
muitos séculos mais tarde. Ele acabou por ser proprietário,
apenas, de um pedaço de terra em Hebrom, o qual comprou
por preço justo para sepultar sua esposa Sara (Gn 23). Lá
também foram sepultadas Rebeca e Lia, além dele mesmo
(Gn 25: 8,9), seu filho Isaque (Gn 49:31), e seu neto Jacó
(Gn 50:12,13).
Em Canaã Abraão teve vários filhos de suas esposas e
concubinas, os quais foram, depois de receberem presentes
do pai, mandados embora, antes de sua morte, para que Isa­
que o filho da promessa ficasse livre da presença deles (Gn
25:1-6). Ainda que aos olhos do cristão moderno esta atitude
possa parecer incoerente é bom pensar que isto pode ter evi­
tado problemas quanto à chefia do grupo depois da morte de
Abraão. Assim, pode-se dizer que sua atitude radical ao
mandar os filhos embora foi, no máximo, um mal necessá­
rio. Algo desagradável mas que deveria ser feito.
Isaque não foi uma figura de grande destaque na tradi­
ção bíblica 1, contudo, aparece como o herdeiro das promes­
sas divinas feitas a seu pai Abraão. Conseguiu aumentar a sua
riqueza pessoal e chegou a agir como uma espécie de chefe de
estado ao fazer aliança com os filisteus (Gn 26). Seus filhos
foram Esaú e Jacó, sendo este chamado mais tarde de Israel.
Foi ele quem se destacou como o receptor das promessas di­
vinas que iriam ser cumpridas em sua descendência, as cha­
madas tribos de Israel, oriundas de seus doze filhos.

^ DATTLER, F. Gênesis. São Paulo : Edições Paulinas, 1984. p. 146.


12 Antônio Renato Gusso

As promessas divinas que não se cumpriram literal­


mente nos Patriarcas podem deixar o leitor moderno confu­
so. Para que se possa entender melhor a aparente resignação
por parte dos Patriarcas quanto a isto, é bom lembrar que
eles não viam a vida após a morte como o cristão a vê na atu­
alidade. Eles não esperavam muita coisa para si mesmos de­
pois que morressem a não ser a continuidade da vida em
seus descendentes. Sendo assim, na mentalidade deles,
quando o descendente recebesse o cumprimento da pro­
messa também o seu ascendente a receberia.
Antes de encerrar esta parte, também, é preciso desta­
car que os antepassados de Israel, os Patriarcas, não eram os
únicos a peregrinarem em Canaã por aquela época. Certamen­
te, muitos outros povos estavam nas mesmas condições que
os descendentes de Abraão. Deve-se ainda dizer que eles nun­
ca viveram como beduínos livres no deserto; se apresentam
como seminômades, criadores de gado miúdo, e podem ter se
dedicado ao comércio, o que os pré-dispunha a manter a paz e
relações amistosas com os que estavam próximos.21

2.2.3. Os Patriarcas no Egito_______________________

Jacó depois de roubar a bênção que Isaque iria dar


para Esaú precisou fugir para não ser morto pelo seu irmão.
Passou vários anos na região de Harã de onde voltou rico,
com esposas e filhos (Gn 28-33). Na volta, depois de fazer as
pazes com seu irmão, procurou se estabelecer em Siquém
onde comprou uma propriedade, provavelmente com a in­
tenção de fixar residência naquela região.22 Não conseguiu
realizar o seu desejo devido à atuação inconveniente de seus
filhos Simeão e Levi que, para vingar a honra de Diná, irmã
deles que havia mantido relações sexuais com um homem

21 FRANCISCO, C. T. Giittm. Kio de Janeiro :JUBRP, 1988. p. 214.


a2 BRIGHT, op. ctaf p. 57.
Panorama Histórico de Israel 13

que tinha o mesmo nome da cidade, mataram os homens do


local e saquearam tudo o que puderam, levando, inclusive,
mulheres e crianças cativos, se fazendo, assim, odiosos aos
olhos dos povos vizinhos (Gn 34). Desta forma, Jacó voltou
a peregrinar em Canaã até que foi, com toda a sua família
para o Egito, fugindo da fome que arrasava a terra. Foi para
lá a convite de seu filho José o qual, por intrigas dentro da fa­
mília, havia sido vendido pelos seus irmãos, mas, que no
momento, se encontrava em posição privilegiada, desenvol­
vendo a função de Administrador deste país.
O Faraó da época, desconhecido dos historiadores
modernos, agradecido a José pelos bons serviços que este vi­
nha prestando à nação, acolheu muito bem a Jacó e sua famí­
lia. Recebeu pessoalmente a Jacó e uma comitiva formada
por parte de seus filhos em uma entrevista e deu-lhes a região
de Gósen para que habitassem (Gn 47).
José, antes deste encontro de sua família com Faraó,
já os havia orientado como deveriam proceder durante a
conversa que teriam com o soberano, demonstrando que
eram pastores a muito tempo, para que se estabelecessem na
terra de Gósen. Ela era uma região fértil, próxima do rio
Nilo, e ficava em uma das fronteiras do Egito em direção à
Canaã, local apropriado para uma saída rápida do país se fos­
* • 23
se necessário.
Na opinião de muitos, os Patriarcas entraram no Egi­
to na época em que este era dominado pelos hicsos. Isto ex­
plicaria, em parte, a benevolência demonstrada para com
Jacó e seus filhos, pois existe a possibilidade destes conquis­
tadores, semelhante aos antepassados do povo de Israel, se-
1 • ' • 24
rem de origem semítica.
Como pôde ser visto até aqui, a trajetória dos Patriar­
cas teve o seu início na Mesopotâmia, passou por Canaã e

.FRANCISCO» ep. eit, p; 349.


34 BRIGHT, op. r it , p. 70-73.
14 Antônio Renato Gusso

terminou no Egito, de onde saíram os descendentes de Jacó


para formar a nação de Israel.
A seguir, será apresentado um gráfico demonstrando
de forma lógica a genealogia dos Patriarcas, baseado nas in­
formações presentes no livro de Gênesis.
Panorama Histórico de Israel 15

2.4, Para Complementar__________________________

2.4.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) Todo o Livro de Gênesis;


b) Livro de Êxodo 1:1-6;
c) Livro de 1 Crônicas 1:1 -2:2;
d) Livro de Jó2’;
e) Salmo 105:1- 23.

2.4.2.Questões Para Revisão________________________

a) Por que é difícil de apresentar uma história de Israel?


b) Qual o motivo de, muitas vezes, termos a impressão de
que os Patriarcas surgiram já no início da humanidade?
c) Quais regiões formavam o mundo bíblico na época dos
Patriarcas?
d) Qual foi a promessa que Abraão recebeu, em relação à
Canaã, e quem a herdou?
e) Como explicar o não cumprimento imediato da pro­
messa envolvendo Canaã e a aceitação disto pelos Pa­
triarcas?
f) Como que os Patriarcas foram parar no Egito?
g) Descreva a seqüência da trajetória dos Patriarcas.

A data de escrita do Livro de Jó é assunto de extrema dificuldade e grandes discórdias, mas A. Bentzen, em
seu livro Introdução ao Antigo Testamento, no volume 2, na página 201, ao discorrer sobre isto, não teme
afirmar: “é óbvio que o poeta descreveu o Seu herói como pertencendo à era patriarcal”.
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 17

3. A FORMAÇÃO DA NAÇÃO___________________
No capítulo anterior foi visto que a trajetória patriar­
cal teve seu final com a entrada de Jacó e sua família no Egi­
to. Ainda que isto não possa ser provado por evidências
arqueológicas concretas, o testemunho na tradição de Israel
é tão eloqüente que seria incoerência descartar esta possibili­
dade, como alguns historiadores o têm feito, concluindo que
Abraão, Isaque e Jacó não passaram de figuras imaginárias
representativas de determinados clãs. Toda a história poste­
rior de Israel vai contra esta idéia, pois entre as tribos havia
uma consciência clara de sua história, a qual estava ligada aos
patriarcas e à escravidão no Egito de onde Deus os tirou.
Aqui será visto de que forma os descendentes de Jacó
saíram do Egito, firmaram um pacto com o Deus que os li­
bertou, se tornando uma nação, e passaram longos anos pe­
regrinando pelo deserto, antes de conquistarem a terra que
lhes havia sido prometida.

3.1. Os Descendentes de Jacó Saem do Egito________

Muitos anos se passaram depois que Jacó e sua famí­


lia entrou no Egito antes que de lá saíssem. No início e, até
mesmo, por séculos, eles se desenvolveram e viveram bem
com aqueles que os haviam acolhido, mas, com o passar do
tempo, não só os patriarcas morreram, também, a situação
política sofreu alterações. O primeiro capítulo do Livro de
Êxodo informa que assumiu o poder um novo rei que não
conheceu a José. Isto é, não sabia, ou não reconhecia, o que
este antepassado dos filhos de Israel havia feito pelo bem do
Egito. Na realidade, por esta ocasião, uma nova dinastia
18 Antônio Renato Gusso

pode ter assumido o poder sobre o Egito. Uma dinastia real­


mente egípcia, a qual teria expulso os dominantes anteriores
que, possivelmente, eram de origem estrangeira.26
Não se sabe ao certo o que aconteceu na área política,
porém, pela tradição bíblica é reconhecido que os descen­
dentes de Israel, de hospedes, foram transformados em es­
cravos, o que acabou por levá-los a saírem da terra que os
acolhera por tantos séculos e deve ter influído sobremaneira
na formação da nova nação que viria a surgir daquele grupo
de pessoas.
Há uma boa possibilidade de que Ramsés II tenha
sido o faraó da opressão. Ele foi um grande construtor e lan­
çou mão do trabalho forçado de inúmeros escravos27, entre
os quais podem ter estado os antepassados de Israel. Tam­
bém é importante notar que no Egito há escassez de pedras e
de mármores, o que reflete muito bem a situação dos des­
cendentes de Jacó como a Bíblia os apresenta, fazendo tijo­
los para suprir os projetos de construção do governo.28
Depois de muito sofrimento, retratado em poucas li­
nhas no relato bíblico, surge o libertador. Ele era Moisés: ho­
mem culto, descendente de Levi, criado pela filha do faraó.
Não se apresentou como libertador por vontade própria, ti­
nha certeza de que era um enviado de Deus para libertar o
seu povo e cumpriu a sua missão com a ajuda de seu irmão
Arão.
Isto aconteceu depois de uma impressionante de­
monstração de poder por parte de Deus a faraó e seus súdi­
tos em um período indeterminado, mas que não se deve
imaginar como sendo muito breve, pela natureza das pragas
que afligiram o Egito. A observação da relação das pragas
que sobrevieram sobre o Egito ajudam a perceber que o pe-

26 C O LE , R. A. E xwlo: introdução e comentário. São Paulo : Edições Vida N ova, s/d. p. 52..
27 JO H N SO N , P. H istória dos Judeus. Rio de Janeiro : Imago Editora, 1989. p. 36.
R A V A SI, G. È xodo. São Paulo : Edições Paulinas, 1985. p. 50.
Panorama Histórico de Israel 19

ríodo foi longo. Veja o que aconteceu: 1) as águas foram


transformadas em sangue; 2) rãs se reproduziram em abun­
dância; 3) os homens e o gado foram infestados por piolhos;
4) enxames de moscas invadiram o Egito; 5) os animais fo­
ram atingidos por uma peste; 6) os homens e animais foram
atingidos por úlceras e tumores; 7) uma grande chuva de pe­
dras atingiu as plantações; 8) gafanhotos invadiram o Egito;
9) o Egito foi envolto em trevas; e 10) foram mortos todos
os primogênitos dos egípcios e de seus animais. Para que
tudo isto tenha acontecido deve ter se passado um tempo re­
lativamente longo.
Só depois da décima praga é que faraó permitiu que o
povo liderado por Moisés partisse, contudo, ainda não era o
fim. Ele haveria de tentar evitar uma vez mais que seus escra­
vos fossem libertos. Perseguiu-os e acabou por ser derrota­
do, definitivamente, quando procurou cruzar o Mar dos
Juncos29, da mesma forma que os fugitivos o haviam feito,
depois que este, milagrosamente, foi aberto dando passagem
A

ao povo (Ex 14).


Como se poderia esperar, toda está história, tão im­
pressionante, da saída dos descendentes de Jacó do Egito,
não possui nenhuma linha sequer escrita nas narrativas egíp­
cias. Seria demais para eles narrarem em suas memórias, que
costumeiramente só apresentavam vitórias, tamanha derrota
para um grupo de escravos. Como bem salienta Bright, espe­
rar encontrar a narrativa destes acontecimentos nos anais do
Egito seria o eqüivalente a encontrar os relatos a respeito da
crucificação de Cristo nas narrativas do Imperador Romano.
Para ele, o acontecido não possuía nenhuma importância.
Mas, seja como for, o testemunho bíblico é tão forte que não
deixa a menor dúvida quanto à esta libertação.30 Mais tarde,
por várias vezes, os profetas de Israel e também os salmistas,
C O L E , op. cit., p.p. 42-44 c 113.
B R IG H T , |. A H istória <ie Isra el São Paulo : Edições Paulinas, 1985. p. 156.
20 Antônio Renato Gusso

evocaram a saída do Egito como o maior dos milagres acon­


tecidos em sua história. Tanto que este fato foi relembrado
periodicamente por meio da festa da Páscoa.31
Também pode ser aceito como uma evidência extra-
bíblica da estada de Israel no Egito a utilização de nomes
egípcios nos primeiros tempos da nação. Isto ocorre especi­
almente entre membros da tribo de Levi. Alguns deles são:
Moisés, Finéias, Merari, Ofini e, talvez, o próprio Aarão, ir­
mão de Moisés.32 Não haveriam muitas razões para que se
utilizassem nomes egípcios em Israel se eles não estivessem
vivendo no Egito.
Também não é fácil apresentar uma data exata para
estes acontecimentos envolvendo Israel no Egito. A Bíblia
não se preocupa em fornecê-la. Contudo, Fohrer, baseado
no fato de que o Egito estava sendo apertado por inimigos
que vinham de várias direções nas proximidades dos anos
1234 - 1230, sugere esta época como sendo propícia para a
fuga.33 Shultz, sendo mais maleável, afirma que poucos eru­
ditos modernos se arriscariam a apontar uma data fora do
período de 1450 - 1200 a.C.34 Bright, por sua vez, defende
que todas as evidências têm apontado para o século treze, o
que coloca Setos I, o restaurador de Avaris, como sendo o
possível faraó da opressão e Ramsés II o da época do êxo­
do.35 De fato, Israel aparece, pela primeira vez como povo,
em uma inscrição datada como sendo de 1220 a.C., onde o
faraó Mernepta conta suas vitórias. A vitória pode não ter
acontecido, pois os faraós apresentavam até derrotas como
triunfos, mas a citação prova que Israel já estava fora do Egi­
to por esta época.36

SH U LT Z , S. ] . A H istória de h r a e l no A n tigo Tesltm euto. S ã o Paulo : Edições Vida N ova, 1988. p. 43.
32 B R IG H T , op. c it , p. 154.
33 FO H R E R, G. Hixíórid í!íí ReUgiUo íle lsrvei. São Paulo : Edições Paulinas, 1982. p. 79.
34 SH U LT Z , op. c it , p. 46.
35 BRIG H T, op. cit., p. 158.
M |OI IN SO N , op. cit., p. 36.
Panorama Histórico de Israel 21

3.2. Deus Estabelece um Pacto com os Descendentes


de Jacó

Não é de concordância geral a maneira como Israel se


tornou uma nação. Johnson, por exemplo, opina que o nas­
cimento da nação aconteceu no exato momento em que Jacó
teve seu nome mudado, por Deus, para Israel,37 conforme
está narrado em Gênesis 32:22-32. Este acontecimento,
contudo, ainda que seja de extrema importância para a futu­
ra nação, pois aí surgiu o nome Israel, não deve ser tomado
como o início. Eles, ainda que numerosos, por esta ocasião,
não passavam de uma família ou clã que viria a se tornar um
povo em especial.
Deus, quando se revelou a Moisés, chamando-o para
tirar os descendentes de Jacó do Egito, e levá-los à terra que
havia sido prometida a tanto tempo atrás ao patriarca Abra­
ão, demonstrando assim que ela continuava válida para a sua
posteridade, já se referiu a eles como um povo. Ele disse:
“certamente vi a aflição do meu povo, que está no Egito”
(Ex 3:7). Mas, isto não significa que Israel já era uma nação
organizada. Ao que parece, isto aconteceu no momento em
que Deus, utilizando Moisés como intermediário, estabele­
ceu um pacto com eles, três meses depois que saíram do Egi­
to (Êx 19).
A partir daquele momento, depois de confirmado o
pacto, eles passariam a ser um reino de sacerdotes, uma na­
ção santa, ou separada para Deus. Deixavam de ser um aglo­
merado de pessoas ou de clãs, sem muitas ligações, como
eram, e passavam a ser um estado, ainda que não nos moldes
modernos, organizado em torno de seu rei exclusivo: Iavé.
Não passaram a ter nenhum governo humano cen­
tral, contudo, por uns duzentos anos, enfrentando as mais
severas condições adversas, Israel conseguiu manter intacta
37 JO H N SO N , op. cit., p. 31.
22 Antônio Renato Gusso

a sua identidade como um povo. Isto não se explica de outra


maneira a não ser pelo sentimento que tinham de estar liga­
dos por um pacto solene, o qual fazia deles um povo gover­
nado por um mesmo Deus.38

3.3. Israel no Deserto____________________________

Era de se esperar agora, depois de Israel ter se toma­


do uma nação, que logo se concretizaria a promessa de her­
dar a terra de Canaã. Mas não foi isto o que aconteceu.
Parece que a nação, ainda jovem, não estava preparada para
esta conquista. Próximo do monte Sinai eles completaram o
primeiro ano de libertação e, um mês depois, levantaram
acampamento e partiram para a ocupação da terra prometi­
da. Porém, poucos dias mais tarde, tiveram que adiar a inva­
são que só foi reiniciada trinta e oito anos depois (Nm
33:38).39

3.3.1. O Motivo que os Levou ao Deserto_____________

Estava tudo pronto para a invasão de Canaã. O taber­


náculo, que pode ser considerado uma espécie de santuário
portátil, o qual serviria como um lugar de revelação, onde se
buscava a orientação divina para as questões difíceis40, estava
pronto, garantindo assim a presença e ajuda de Deus. O
povo já havia sido contado, dando aos líderes uma boa no­
ção da força que possuíam, e as tribos estavam dispostas em
posições estratégicas para a marcha, mas o relatório apresen­
tado por parte dos espiões que foram fazer um levantamen­
to no local a ser invadido foi desanimador.

38 B RIG H T, op. cit., p. 192.


S! U Jl.rZ , op. cit., p. 73.
40 1 OHRLÍR, op. cit., p. 95.
Panorama Histórico de Israel 23

Eles reconheceram que a terra, assim como constava


da promessa, realmente era boa. Contudo, julgaram-se inca­
pazes de enfrentar povos tão poderosos como aqueles que já
habitavam em Canaã. Por isso desanimaram o povo. Eles fo­
ram tão convincentes ao descreverem Canaã como uma ter­
ra impossível de ser conquistada, que o povo em geral
pensou em retornar para o Egito e quase apedrejaram a Jo­
sué e Calebe, dois dos espiões que discordavam dos demais e
estavam prontos para a invasão (Nm 13-14).
Esta rebeldia resultou em um castigo imediato. A na­
ção foi condenada a permanecer no deserto até que todos
aqueles que tinham vinte anos para cima estivessem mortos
e, para que isto fosse confirmado imediatamente, os espias
infiéis morreram de praga, sobrando apenas os dois que fo­
ram fiéis.41

3.3.2. Os Acontecimentos no Deserto_________________

Quando se fala em deserto na Bíblia, não é necessário


imaginar uma região arenosa impossível de se viver por mui­
to tempo. Talvez uma expressão melhor, em português, fos­
se “lugar desabitado”, pois foi, principalmente, por lugares
assim que o povo de Israel vagou antes de partir, pela segun­
da vez, para Canaã.
Certamente, muitas coisas importantes aconteceram
neste período de tempo em que Israel ficou aguardando o
momento de invadir Canaã. Contudo, as informações sobre o
ocorrido são escassas. Elas estão limitadas ao Livro de Núme­
ros, o qual no original é chamado de bembbar (""Q"T0Ü3) que
significa “no deserto”, nome este que o descreve melhor que
o tradicionalmente utilizado nas versões em português.

^ YVENHAN, G. J. N úm eros: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1991. p, 129.
24 Antônio Renato Gusso

Este livro mostra, entre outras coisas, algumas das di­


ficuldades enfrentadas no deserto, como a rebelião de Coré,
Data e Abirão (ver capítulo 16 de Números), a morte de Mi-
riã e Arão (capítulo 20), vitórias em batalhas (capítulo 21) e
uma lista pormenorizada das localidades em que Israel se
acampou (capítulo 33), porém não passa de uma pálida
amostra daquilo que deve ter ocorrido em todos aqueles anos.
Na verdade não há como descrever com segurança o
que aconteceu no deserto. Os fatos devem ter ocorrido de
forma muito mais complexa do que o Livro de Números
apresenta, além do que, poucos dos lugares mencionados na
Bíblia podem ser identificados com segurança nos dias atuais.
Contudo, pode-se afirmar que este foi um tempo muito im­
portante para Israel. Não há dúvida de que foi neste período
que ele se firmou como povo e desenvolveu a sua religião.42
Ainda que em dificuldades no deserto, foi ali que Isra­
el passou a agir como nação. Era agora um povo organizado,
que agia em conjunto e estava ligado por um líder: Moisés,
mas, estava unido, principalmente, pelo mesmo Deus que
adoravam. Só faltava mesmo a terra para se estabelecerem.
Como conseguiram conquistá-la será visto no capítulo se­
guinte.

42 IJ R IG irr, op. c it.,p . 158-159.


Panorama Histórico de Israel 25

3.4. Para Complementar_________________________

3.4.1 .Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de Êxodo;
b) O Livro de Levítico;
c) O Livro de Números;
d) O Livro de Deuteronômio;
e) O Salmo 105:23-43;
f) O Salmo 106:1-33;
g) O Salmo 136.

3.4.2. Questões Para Revisão________________________

a) Explique a falta de evidências arqueológicas a respeito


de Israel no Egito, no período que vai de José até Moi­
sés.
b) Como se supera a falta de evidências arqueológicas so­
bre Israel no Egito, neste período?
c) Quando “nasceu” a nação de Israel?
d) C om o foi organizado o primeiro governo de Israel?
e) Por que foi adiada a entrada de Israel em Canaã?
f) Por quanto tempo foi adiada a entrada de Israel em Ca­
naã?
g) Como era o deserto no qual Israel habitou por tantos
anos?
h) Cite dois fatos importantes que aconteceram enquanto
Israel estava no deserto.
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 27

4. A CONQUISTA DE CANAÃ
Depois de tantos anos no deserto, finalmente, se
aproxima o momento tão esperado de entrar na terra pro­
metida. O grande líder Moisés, avisado da proximidade de
sua morte, transfere a liderança para Josué, um dos que havi­
am visitado Canaã, como espiões, a quase quarenta anos
atrás, e dá suas últimas instruções ao povo, antes da invasão,
conforme se encontram no Livro de Deuteronômio. A hora
era chegada. A promessa estava para se cumprir. Porém, a
terra que os esperava, manando leite e mel, conforme figura
de linguagem utilizada na Bíblia para descrever a sua fertili­
dade extrema, não estava despovoada. Lá habitavam vários
povos que não estavam dispostos a ceder os seus territórios
aos invasores. Os israelitas teriam que lutar muito ainda por
aquilo que almejavam.
Neste capítulo, com a intenção de se deixar mais claro
como foi que ocorreu a conquista de Canaã por parte de Is­
rael, serão apresentados dois pontos fundamentais. O pri­
meiro estará demonstrando como estava a situação política,
social e religiosa dos povos que lá habitavam, e o segundo
tratará da invasão propriamente dita. Estarão sendo respon­
didas as seguintes questões: como foi iniciada a invasão,
como se desenvolveu e até onde conseguiu chegar.

4.1. A Situação Cananéia_________________________

Antes de prosseguir utilizando o nome Canaã, parece


bom esclarecer ao que se refere este termo, pois é normal
nos dias de hoje aludir à esta região, que aqui está sendo tra­
tada, empregando-se o nome Palestina. A intenção do uso
28 Antônio Renato Gusso

de Canaã, neste trabalho, no lugar do termo Palestina, mais


popular na atualidade, é evitar um anacronismo. O Antigo
Testamento sempre se referiu à esta região como sendo Ca­
naã e ele está correto também nesta questão. O nome Pales­
tina é relativamente moderno e deriva da palavra “Filistia”, a
qual poderia ser traduzida como país dos filisteus (Felisttm -
□ 'n t ^ S ) .43 Somente mais tarde na história de Israel é que
este povo vai se destacar, e muito mais tarde ainda é que a re­
gião vai tomar este nome.
Ainda não está totalmente claro quando e por que a
região passou a ser chamada pelo nome de Palestina, uma re­
ferência direta aos filisteus, inimigos históricos de Israel,
mas é certo que em 135 d.C. os romanos assim a chamar
vam.44 Esta nomenclatura para a região pode não passar de
uma afronta por parte dos romanos contra os descendentes
de Israel que, mesmo frágeis, comparativamente, tantas difi­
culdades causaram para o grande império.
Desta forma, o nome Canaã, neste trabalho, está sen­
do utilizado para a mesma região atualmente tratada por
muitos escritores como Palestina, a faixa de terra que vai das
proximidades do deserto do Egito até às fronteiras da Síria.

4.1.1. Composição Social e Política em Canaã_________

Canaã, ainda que habitada por vários povos, formava


uma unidade cultural. Suas cidades eram bem construídas,
fortificadas e, em alguns casos, bem planejadas, possuindo
sistema de esgoto e de abastecimento de água retirada de
fontes cavadas em rochas, como em Jerusalém, para enfren­
tar os períodos de dificuldades durante os cercos dos inimi­
gos. Os líderes das cidades, contrastando em muito com a
grande massa de liderados, moravam em casas de boa quali­
^ B E E K , M. A. H istória <k Isra el Rio de Janeiro: Z ahar Editores, 1967. p. 15.
44 Ibid.
Panorama Histórico de Israel 29

dade e dominavam o comércio que se estendia muito além


de suas fronteiras, chegando ao Egito, Mesopotâmia e luga­
res mais distantes.45
Ainda que unidos por uma cultura comum, o povo de
Canaã, pela ocasião da invasão israelita, não estava organi­
zado em um forte sistema político, pelo contrário, eles se or­
ganizavam em cidades-estado independentes, ou semi-inde-
pendentes, em sua maioria vassalos do Egito. Se uniam-
apenas quando enfrentavam algum perigo externo para faze­
rem frente ao inimigo comum, como foi, em parte, o caso de
Israel.46 Esta fraca unidade de Canaã, que nunca conseguiu
se tornar um império coeso, pode ser explicada pelos fatores
geográficos e pelas pressões das grandes nações vizinhas que
se utilizavam de seu território como se fosse um estado tam­
pão.47
As cidades, em sua maioria, eram pequenas. O gover­
no era exercido por um rei leal a faraó. Este rei, juntamente
com uma classe de nobres hereditários, dominava a maioria
da população formada por camponeses, pode-se dizer,
meio-livres. Não havia uma classe média expressiva e os po­
bres e escravos eram em grande número. A situação para es­
tes era muito difícil. Eles estavam sempre à disposição para a
guerra e, sobrecarregados de impostos, trabalhavam apenas
para sobreviver. A situação se agravava, ainda mais, quando
o Egito procurava ignorar as intermináveis discórdias que
haviam entre as lideranças das cidades, deixando-as se abate­
rem mutuamente.48 Pode-se imaginar que o descontenta­
mento por parte dos menos favorecidos era geral, o que os
enfraquecia por ocasião da necessidade de defesa.
Um outro fator complicador era a presença de gran­
des grupos de salteadores formados por elementos sem tra-

4^ B RIG H T, J. H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 150.


^ SW ULTZ, S. ]. A H istória d e Israel //o A ntigo 'Testamento. S ã o Paulo: Edições Vida N ova, 1988. p. 89.
47 SH U LTZ , op. c it , p. 89.
48 B R IG H T , ]. H istória de Isra el São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 176-177.
30 Antônio Renato Gusso

dição ou lugar fixo na sociedade estabelecida. Verdadeiros


bandos de “piratas”, que recebiam mercenários desconten­
tes, escravos fugitivos e marginalizados em geral, como seus
membros. Estes, chamados ‘Apiru, causavam problemas
constantes para a sociedade organizada. Nas cartas de Amar-
na são encontrados os apelos, desesperados, que os gover­
nantes locais faziam ao Egito pedindo ajuda para
combatê-los.49 Israel, quando entrou em Canaã, pode ter
sido confundido pelos moradores locais como se fosse mais
um destes grupos e, realmente, existe a possibilidade de que
eles tenham sido os ‘Apiru mencionados nas cartas de
Amarna50.
Por ocasião da invasão israelita o Egito havia perdido
a sua influência sobre as cidades-estado de Canaã, ficando
estas sem nenhum tipo de poder central. Muitos dos reis
destas cidades, aproveitando a ocasião, procuraram ampliar
os seus domínios combatendo e conquistando os seus vizi­
nhos. Fator este que gerou uma desunião maior ainda da
qual já havia e pode ter ajudado em muito a infiltração de Is­
rael na região.51

4.1.2. A Religião Cananéia__________________________

Quando se começa a estudar a religião praticada em


Canaã se percebe com mais clareza os motivos pelos quais
Israel deveria destruir todos os povos que lá habitavam.
Muitos eram os deuses e deusas dos cananeus e possuíam
em seus cultos, como elemento de destaque, a atividade se­
xual, o que é próprio de uma comunidade agrícola. Como
dependiam da boa produção, buscavam nos deuses, por
meio do culto da fertilidade, a garantia de boas colheitas.
Como era de se esperar, a atividade cultual envolvendo a
49 Ibid. p. 177.
AIICIII -R, )r., G. I.. M erece Confiança o A ntigo Testamento? São Paulo: Rdições Vida N ova, 1986. p. 192.
^ M H'r/GI\R, M. H istória de Israel. Sào Leopoldo: lid ito ra Sinodal, 1972. p. 17.
Panorama H istórico de Israel 31

“prostituição sagrada” se confundia, facilmente, com a pros­


tituição secular.52
Um ambiente religioso tal como este era, sem dúvida,
um fator de risco muito elevado para a moral do povo de Is­
rael. Eles não poderiam conviver com tamanhas aberrações
e, ao mesmo tempo, serem fiéis ao Deus moral e santo que
os havia resgatado da terra do Egito. Uma descrição das ca­
racterísticas principais de alguns dos deuses adorados em
Canaã, como segue, poderá ajudar o leitor a ter uma visão
melhor desta realidade religiosa e da necessidade que Israel
tinha de permanecer separado dos demais povos.

4.1.2.1. O deus El_________________________________

Ainda que a palavra El possa se referir tanto ao Deus


verdadeiro quanto para ídolos, na forma de título, ele surge
nos tabletes de Ras Shanra como um nome próprio emprega­
do para um dos deuses adorados em Canaã.53 Este é o nome
do deus-pai que, mesmo inativo e desempenhando papel se­
cundário no culto, nominativamente ocupava a primeira posi­
ção no panteão.54 Ele era esposo da deusa Asera, com a qual,
se cria, gerou mais setenta deuses e deusas. Também era con­
siderado o criador, conhecido como pai-touro e representado
à semelhança de um touro entre um rebanho de vacas.55

4.1.2.2. O deus Baal_______________________________

A palavra Baal significa senhor, possuidor ou marido.


Ela era empregada como título de diversas divindades locais
espalhadas por Canaã. Em cada localidade havia um Baal,
um “senhor”, por isso aparece muitas vezes, na Bíblia, em
^ FOI1RUR, G. í liilóriii th R eligião ile Israel. São Paulo: lúiições Paul mas, 1982. P, 48-65-
^ B R U CIl, K F. De/i.i. SSo Paulo: Kdições Vida Nova, 1983. p. 409.
B R IG J ÍT , «p. cit., p. 151.
55 SC H U L T X , op- cit., p. 90.
32 Antônio Renato Gusso

sua forma plural, baalins, (no original: be‘alim —ÍT b iH ) além


de aparecer precedendo um nome próprio como: Baal-Peor,
Baal-Zefon e outros, descrevendo uma certa divindade
relacionada com um local. Com o passar do tempo, porém, a
palavra foi se tomando o nome próprio utilizado para o
grande deus da fertilidade dos cananeus.56
Este Baal principal, que acabou assumindo o título
geral como seu nome próprio, era o deus Hadade, conside­
rado o filho mais velho de El e Asera. Era ele quem, na mito­
logia canaanita, governava os deuses e controlava os céus e a
terra, sendo o responsável pelas chuvas, tempestades e, con­
sequentemente, pela fertilidade e vegetação.57
A morte e a ressurreição de Baal eram aspectos im­
portantes da religião de Canaã. Isto correspondia à morte e
ressurreição da natureza. Pensava-se que as forças da nature­
za seriam reativadas por meio dos rituais praticados pelos
adoradores. Rituais estes que envolviam relações homosse­
xuais, prostituição sagrada e outras práticas orgíacas.58
Como um último e extremo argumento contra a ado­
ração e a permissão ao culto a Baal pode ser citado o Livro
de Jeremias, o qual mostra a influência deste deus em época
bem posterior à entrada de Israel em Canaã. Em Jeremias
19:5 está escrita uma acusação de Deus contra Israel, que
diz: “...edificaram os altos de Baal, para queimarem seus fi­
lhos no fogo em holocaustos a Baal; o que nunca lhes orde­
nei, nem falei, nem entrou no meu pensamento”.

4.1.2.3. As deusas Asera, Astarte e Anate_____________

Estas três deusas, consideradas por alguns como se


fosse apenas uma que se confunde por causa dos nomes59,
~'C' I'AYNI:’,, D. K B üíj/. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. \l(i.
57 SH U LT Z , op. cit., p. 90.
58 B R IG H T , op. cit., p. 152.
5<J A1.LEN, 11. B. A shimt. São Paulo: Rdiçõcs Vida N ova, 1998. p. 1190.
Panorama Histórico de Israel 33

eram bastante semelhantes a Baal e surgiam como divinda­


des de várias localidades. Eram deusas do sexo e da guerra,
representadas, por seus devotos, com características sexuais
exageradas e como praticantes de um sadismo depravado.
Como se pode ver, quando os israelitas passavam a adorar
algum dos deuses cananeus, a sua falta era muito grave, pois
as práticas realizadas nestes cultos: prostituição masculina e
feminina, homossexualismo e sacrifícios humanos, entre ou­
tras brutalidades, se opunham claramente à sua própria reli­
gião.60 Quando agiam assim, se colocavam como traidores
de seu Deus e iam contra a base de sustentação da nação.

4.2. A Invasão Israelita___________________________

Agora que já foram analisadas as condições de Canaã


nas proximidades do século XIII a.C., fica mais fácil de se
compreender como aconteceu a invasão israelita. Contudo,
também este assunto não é matéria de consenso entre os es­
tudiosos da questão. Só para se ter uma idéia da complexida­
de da matéria é bom informar que, como a própria Bíblia dá
margem para duas interpretações, pois mostra em um qua­
dro Israel unido conquistando tudo rapidamente e em outro
uma ocupação, que parece lenta, efetuada por tribos indivi­
duais, alguns chegam mesmo a pensar que a invasão unifica­
da não passa de uma idealização do autor.61 Porém, como
será visto a seguir, esta interpretação extremada não pode
mais se sustentar diante das evidências arqueológicas encon­
tradas na região. A verdade é que Josué, ainda que liderando
um exército inferior àqueles que os aguardavam em Canaã,
deve ter conseguido muitas vitórias aproveitando-se do ele­
mento surpresa, pois suas armas eram insuficientes diante de
inimigos tão poderosos. Eles, provavelmente, lutavam com
<’*1 A JJ .ü N , R. B. A sttíwf. São Paulo: LúJições Vida N ova, 1998. p. 1189-1190.
61 B lllG IIT , op. c it, p. 165.
34 Antônio Renato Gusso

lanças, paus, flechas e algumas poucas espadas, contra povos


que possuíam até mesmo carros para combate62.

4.2.1. A Entrada na Terra Prometida__________________

Depois de longos anos no deserto, finalmente, Israel


está às portas da terra que lhe foi prometida. Faltava um ter­
ritório para que se firmasse como uma nação e este seria,
agora, conquistado com muita luta.
A entrada em Canaã não poderia ter sido mais glorio­
sa. Ela aconteceu nas proximidades da cidade de Jericó
acompanhada por um evento extraordinário, que Israel só
poderia mesmo considerar um milagre efetuado por Deus
que lhes estava dando a terra: as águas do rio Jordão pararam
para que eles pudessem passar.
Este fato está narrado no capítulo 3 do Livro de Josué
e seus detalhes, é claro, nunca poderão ser confirmados pe­
las evidências extra-bíblicas. Mas, parece importante menci­
onar que no ano 1927 de nossa era, na localidade de Adã,
atualmente identificada pelo nome de Damieh, situada a 24
km de distância do local da travessia, o rio Jordão, que nesta
parte é ladeado por penhascos de pedra calcária, teve o seu
curso interrompido durante vinte e uma horas e meia, como
resultado da queda de um grande bloco de pedra, com cerca
de 45 m de altura, em seu leito.63
Tenha sido algo semelhante ou não, ao que foi narra­
do acima, que aconteceu a Israel, quando da invasão de Ca­
naã, a verdade é que eles conseguiram entrar na terra de uma
forma especial e, corretamente, creditaram este feito a Deus.
Logo em seguida, deram início às conquistas e deixaram um
rastro de destruição que, no geral, pode muito bem ser ates­
tado pelas evidências arqueológicas da região. Ainda que
62 W llIG H T , G. U. arqueologia Bíblka. M adrid: Edicioncs Cristandad, 1975. p. 101.
63 SU U LT Z , op. cit., p. 92.
Panorama Histórico de Israel 35

muitas das cidades destruídas por Israel, conforme o relato


bíblico, não tenham sido identificadas pelos arqueólogos até
o momento, outras o foram e confirmam tanto a destruição
violenta quanto a ocupação por um povo de hábitos mais
simples, apontando assim para os israelitas.64

4.2.2. O Desenrolar da Conquista____________________

Para se compreender como ocorreu a conquista e


harmonizar os relatos de Josué e Juizes, Wright chama a
atenção para dois grupos de dados arqueológicos. Um deles
mostra que Canaã, por volta de 1300 a.C., sofreu uma per­
turbação violentíssima e teve muitas de suas cidades comple­
tamente destruídas, e outro, mostra que várias das cidades
escavadas foram reconstruídas e destruídas novamente, de
uma a quatro vezes, no decorrer dos séculos XII e XI a.C.
Desta constatação poder-se-ia deduzir que: primeiramente
houve uma onda irresistível de conquistas como bem mostra
o Livro de Josué, levada a efeito por todas as tribos em con­
junto, e que, posteriormente, foi necessário travar uma luta
constante para manter e reconquistar as posições de cada tri­
bo individualmente.65 Assim se explica a aparente contradi­
ção no relato bíblico.
Além disso, as muitas provas das terríveis destruições
ocasionadas em Betei, Laquis, Eglon, Debir e Hasor, duran­
te o século XIII a.C., sugerem que aconteceu uma campanha
bem planejada de conquistas naquela região, a qual pode,
muito bem, ser relacionada com a ordem descrita nos capí­
tulos 10 e 11 do Livro de Josué. A intenção clara destas cam­
panhas foi a de, primeiramente, ocupar territórios, para,
provavelmente, mais tarde, estabelecer a nação66.

w B R I G irr , op. cie., p. 166-169.


V llI G I IT, Ci. E. A rqueologia Bíblica. Madrid: Edicioncs Cristandad, 1975. p. 100-101.
Ibid. p. 120.
36 Antônio Renato Gusso

Também parece estar estabelecido nos dias atuais que


Israel, inicialmente, ocupou as regiões montanhosas de Ca­
naã.67 Enquanto isso, permaneceram nas partes planas gran­
des cidades, fortes demais para serem conquistadas. Elas
continuaram por um bom tempo ainda com um sistema feu­
dal, dependentes do Egito. Muitas cidades-estado, depois da
chamada invasão dos “povos do mar”, entre os quais deveri­
am estar os filisteus, se organizaram em monarquias e, sem
dúvida, estavam melhor preparados para dominar a região
do que Israel, que se mantinha unido por uma confederação
de cunho religioso, sem nenhuma figura política forte para
organizar a nação68. O próximo capítulo vai estar tratando
destas dificuldades que ocorreram em seguimento às con­
quistas iniciais do grupo de Josué, no chamado Período dos
Juizes.

^ C LE M E N T S, R. E. 0 M undo do A ntigo Isra el São Paulo: P aulus, 1995. p. 74.


68 W R IG H T , op. cit, 126-128.
Panorama Histórico de Israel 37

4.3. Para Complementar________________________

4.3.1 .Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de Deuteronômio (Composto, principalmen­


te, por discursos de Moisés preparando o povo para a
conquista de Canaã)
b) O Livro de Josué;
c) O Livro de Juizes 1:1- 2:10.

4.3.2. Questões Para Revisão________________________

a) Por que não é correto utilizar o termo Palestina para


descrever a região de Canaã na época da conquista?
b) Como eram as cidades de Canaã neste período da con­
quista?
c) Dê uma breve descrição da organização política em Ca­
naã na época da conquista.
d) Como você descreve a influência do Egito em Canaã
na época da conquista?
e) Quem eram os “Apiru”?
f) Escreva a respeito da religião praticada em Canaã quan­
do da conquista.
g) Explique quem era Baal.
h) Como aconteceu a invasão israelita de Canaã?
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 39

5. O PERÍODO DOS JUIZES


O período dos Juizes foi marcado por muitos proble­
mas. Israel havia se estabelecido em Canaã, nos lugares que
lhe foi possível e, naturalmente, levando-se em conta o seu
sistema tribal, dividiu as suas forças, dando oportunidade
para que os povos vizinhos se recuperassem e, até mesmo,
servissem como uma ameaça séria à continuidade do siste­
ma. Nesta época, depois de um período inicial de assenta­
mento, eles estiveram muito perto de deixar de existir como
povo independente.
Neste capítulo, para que se entenda melhor este perío­
do, será apresentado o sistema de governo praticado por
Israel, analisada a raiz dos problemas que surgiram e amea­
çaram a nação, verificada como aconteceu a atuação dos li­
bertadores e demonstrado o por quê e como esta forma de
liderança deixou de existir. E bom lembrar que a maioria das
informações, conhecidas até o momento, a respeito desta
época da história de Israel, procedem do Livro de Juizes.
Como ele não apresenta os acontecimentos em uma seqüên­
cia cronológica, fica muito difícil de se estabelecer com cer­
teza a trajetória do povo nesta época.69

5.1. O Sistema de Governo Teocêntrico_____________

Israel diferia muito de seus vizinhos quanto ao mode­


lo de governo. Enquanto estes possuíam um sistema de go­
verno formal com reis e príncipes na liderança dos negócios
do estado, pode-se dizer que, Israel não possuía nem estado.
^ I3RIGIÍT, ]. H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 226.
40 Antônio Renato Gusso

Não havia nada que pudesse lembrar ou sugerir uma admi­


nistração estatal organizada. Os clãs, ou tribos, permaneci­
am independentes, unidos apenas pelo vínculo religioso.
Este sistema, chamado por Bright de anfictionia, não
foi algo exclusivo de Israel, ele pode ser encontrado em vári­
os outros locais como, em período um pouco posterior, na
Itália e na Grécia, de onde recebeu este nome. Inclusive, al­
gumas das anfictionias conhecidas, semelhantes a de Israel,
também eram formadas por doze participantes.70 O que fa­
zia a diferença desta liga tribal e das outras era o fato exclusi­
vo da aliança realizada entre Israel e seu Deus, que o havia
tirado da escravidão no Egito.71
Israel levava muito a sério este sistema governamen­
tal. Eles se consideravam como vassalos de Iavé e não admi­
tiam a idéia de ter um rei humano dizendo-lhes o que
deveriam fazer. Isto seria traição, iria contra o tratado de vas­
salagem estabelecido por Deus. Ainda que com o passar do
tempo, diante das dificuldades oriundas da falta de um go­
verno semelhante aos das outras nações, alguns tenham pro­
curado mudar o sistema, e mais tarde foi mudado, neste
período, a idéia de monarquia era totalmente abominada pe­
los israelitas de coração, como pode ser visto na reação de
Gideão quando alguns pensaram em fazer dele o primeiro
rei de Israel (Jz 8:22-23).
Como Liga Tribal, que era, e não uma unidade nacio­
nal propriamente dita, Israel não tinha uma capital, nem um
estafe para desempenhar as funções governamentais. Isto
poderia caracterizar alguma espécie de governo central o que
iria contra as estipulações da Aliança feita com Iavé. Eles
eram regidos pelas leis feitas por Deus e, sendo assim, na
prática, enquanto estivessem debaixo destas leis, por Ele
eram governados.72 Contudo, a confederação tinha o seu
™ B RIG H T, J. H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 210-211.
71 CU N D A LL, A. E. Jui-~es: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1992. p. 36.
jO H N SO N , P. H istória dos Judeus. Rio de janeiro: Editora Imago, 1989. p. 50.
Panorama Histórico de Israel 41

ponto focal no local de adoração onde se encontrava a Arca


da Aliança. Aí eles se reuniam nas épocas de festas, não só
para adorar mas, também, para resolverem os diversos pro­
blemas de interesse geral que afligiam ou interessavam às tri­
bos. Provavelmente, por estas ocasiões, as tribos eram
representadas por seus líderes.73 Seria inconcebível imaginar
uma reunião completamente aberta para todos os membros
das comunidades envolvidas nesta liga.
Parece que por esta época dos juizes, de forma mais
exata no período de Eli, o santuário central em Silo é que
mantinha as tribos unidas. A Bíblia não é clara, quanto a isto,
mas deixa margem para se concluir que este local foi destruí­
do pelos filisteus, quando da morte em campo de batalha
dos filhos de Eli. Este acontecimento deve ter forçado algu­
mas mudanças e levou Samuel, considerado o último dos jui­
zes, a cumprir os seus deveres religiosos em vários locais
como Mispá, Ramá, Gilgal, Belém e outros, conforme a ne­
cessidade surgia.74Ainda que ele fosse um líder reconhecido
por todos, não desempenhava suas funções em um lugar ex­
clusivo, evitando, com esta atitude, a cristalização de um
ponto de poder no território desta ou daquela tribo, o que
poderia colocar em cheque a igualdade de direitos e obriga­
ções que havia entre os membros da Liga e igualá-lo aos go­
vernantes de outras nações.

5.2. Como Surgiram os Problemas_________________

Não faltavam problemas para Israel neste período.


Foi uma época de adaptações, na qual precisaram aprender a
ser nação ao mesmo tempo em que se esforçavam para so­
breviver diante dos desafios que surgiam. Isto fica evidente
quando se percebe que Israel, depois de um período de con-
73 B RIG H T, op. cit-, p- 210.
SH U LT Z , J . S. A H istória de Israel no A ntigo Testamento. São Paulo : Edições V ida N ova, 1988. p. 118-119.
42 Antônio Renato Gusso

quistas, no qual as tribos, certamente, atuaram em conjunto


(de outra forma não teria sido possível chegar aonde chega­
ram, ao menos sem a ajuda de um milagre de Deus), passa a
um período de guerras defensivas, no qual lutavam, deses­
peradamente, pela sobrevivência.
A seguir, será analisado de duas formas, separadas
mas semelhantes, o por quê de terem surgido tantos proble­
mas para Israel. Em primeiro lugar será vista a explicação
teológica desta realidade e logo depois a possível argumenta­
ção natural. As duas se complementam e são insepatáveis.

5.2.1. A Explicação Teológica_______________________

A explicação teológica a respeito das dificuldades en­


frentadas por Israel está na Bíblia. O autor do Livro de Juizes
não teve dificuldades para enxergar nos altos e baixos da na­
ção o castigo de Deus por causa da desobediência aos pre­
ceitos do pacto que havia sido estabelecido por Iavé. Da
mesma forma, via no livramento o resultado do arrependi­
mento do pecado nacional e do retorno a estes mesmos pre­
ceitos. Por isso, ele escreve a parte principal de seu livro
enfatizando um círculo de episódios, que se repetem por seis
vezes, demonstrando a trajetória do povo que se resume em:
pecados, sofrimentos, súplicas e livramentos.
Para ele, todas as vezes que Israel pecava, quebrando
os preceitos da Aliança, que exigiam a sua permanência de­
baixo do domínio de seu Deus-Rei e que não tivesse ne­
nhum contato com divindades rivais,75 sofria justas punições
do Deus soberano. Quando se arrependia e clamava supli­
cante pelo perdão, acabava por ser agraciado, da parte de
Deus, com o livramento da dificuldade ou perigo que o esta­
va ameaçando.

75 B R IG H T , op. cit. p. 199.


Panorama Histórico de Israel 43

Já nos primeiros capítulos do Livro de Juizes fica evi­


dente que Israel está sofrendo por causa da desobediência.
Eles não destruíram todas as nações que Deus havia manda­
do destruir (Jz 1:27-36); acabaram por fazer alianças com o
povo da terra, atitude esta que não poderiam tomar, pois ti­
nham sido proibidos por Deus (Jz 2:2); acabaram por ser in­
fluenciados pela religião dos povos de Canaã e passaram a
adorar aos deuses cananeus (Jz 2:13) e a se misturarem com
os antigos moradores da terra através de casamentos, o que
também lhes estava proibido (Jz 3:6). O resultado de toda
esta desobediência foi o castigo de Deus, a quem eles, como
súditos que eram, deviam obediência.

5.2.2. A Explicação Natural________________________

A explicação natural da razão por que Israel enfrentou


tantos problemas nesta fase de sua existência conta com vári­
os fatores. O primeiro mostra que aconteceu algo muito inte­
ressante com o povo de Israel. Ao mesmo tempo em que eles
conquistaram foram conquistados. Israel unido demonstrou
grande força ao entrar em Canaã, como as evidências arqueo­
lógicas têm atestado, mas culturalmente eles eram bem inferi­
ores aos seus conquistados. Muitas das cidades destruídas por
eles foram reconstruídas, em seguida, demonstrando um ní­
vel cultural bastante inferior ao dos predecessores.76
Este fato deve ter levado Israel a depender de seus vi­
zinhos, daqueles que não foram destruídos, em muitas áreas
da vida quotidiana. Daí o por que acabaram por se misturar e
até mesmo a assumir, em parte, ainda que não oficialmente,
aspectos da religião de Canaã. Como observa Bright: “Foi
inevitável que alguns israelitas vissem a religião agrária como
parte necessária da vida agrária, e começassem a fazer sacrifí­
cios aos deuses da fertilidade. Outros, sem dúvida, acomo-
76 CU N D A LL, op. cit., 34.
44 Antônio Renato Gusso

daram a adoração de Iahweh com a adoração de Ba‘al, e


começaram até mesmo a confundir os dois”.77 E claro que
este envolvimento de Israel com povos de outras culturas e
religiões acabou por enfraquecê-lo. Aspectos culturais e reli­
giosos, que os distinguiam como uma unidade, um grupo es­
pecial, separados por Deus dos demais, foram afetados.
Um outro fator que dificultou a ação por parte de Isra­
el como uma unidade, no período seguinte ao estabelecimen­
to na terra, e os enfraqueceu sobremaneira, foram as posições
geográficas que assumiram. Eles não possuíram uma unidade
territorial perfeita. Ocuparam, principalmente, as áreas mon­
tanhosas de Canaã, pois não conseguiram desalojar muitos
dos povos que viviam nas planícies e se mostravam fortes,
lançando mão de carros para o combate enquanto eles se limi­
tavam a combater a pé e com armamento inferior.78
A faixa costeira ficou fora do controle deles e os pou­
cos que nela se estabeleceram foram feitos súditos ou se in­
corporaram aos povos locais. Mesmo nas regiões
montanhosas permaneceram grupos inimigos por muito
tempo, como é o caso clássico dos Jebuseus, na cidade de Je­
rusalém, que só foram desalojados, ou dominados, na época
do rei Davi, criando dificuldades enormes para Israel, que
não podia permanecer unido enquanto nações inimigas e
empecilhos naturais, como, por exemplo, o profundo vale
do Jordão que estava entre as tribos orientais e ocidentais,
separava-os uns dos outros.79
Para complicar ainda mais a situação havia grande riva­
lidade entre as tribos, e algumas vezes acabavam em guerras
absurdas, como a que está registrada em Juizes 12:1-6. Ou,
ainda, se colocavam uma contra a outra por causa de crimes
cometidos por um membro de uma tribo contra o de outra. Se
mostravam incapazes de resolver problemas desta natureza
77 B R IG H T , op. c it , p. 229.
78 B R IG H T , op. c it, p. 226.
79 Ibid. p. 227.
Panorama Histórico de Israel 45

de forma sábia e desapaixonada. Nenhuma das tribos se


dava por vencida e, para defender o seu membro, ainda que
infrator, acabavam por partir para a luta armada, agravando
o problema em vez de fazer justiça (Juizes 19 e 20).8H
Diante de tudo o que foi exposto até aqui, só dá para
pensar que Israel continuou, razoavelmente unido por tanto
tempo (na opinião da maioria dos eruditos modernos cerca
de duzentos anos81), porque tinha uma profunda consciência
de sua origem comum e da Aliança que haviam feito com
Deus. Quanto aos seus problemas, sem dúvida, possuem
boas explicações naturais, mas nenhuma que vá contra a ex­
plicação teológica apresentada pelo autor do Livro de Juizes,
pois não há como separar o Deus de Israel da História de Is­
rael, pois Ele se revelou na história. Se Israel tivesse seguido
as ordens estipuladas na Aliança os problemas naturais teri­
am sido evitados e a história da ocupação teria sido outra,
bem diferente da que aconteceu.

5.3. A Atuação dos Libertadores___________________

Ao que parece, alguns dos juizes atuaram ao mesmo


tempo só que em regiões diferentes. O Livro de Juizes, a
principal fonte de informações deste período, seguindo uma
tendência normal de sua época, não se preocupa em narrar
os fatos em ordem cronológica, e, com isso, acaba passando
ao leitor moderno uma idéia errada quanto à duração da épo­
ca assim denominada. Portanto, se forem feitos os cálculos,
baseando-se nas evidências internas do livro, se chegará a
um período muito maior do que ele o foi na realidade. Al­
guns, utilizando este método, têm encontrado um período
de aproximadamente 400 anos, o que não bate com as evi­
dências externas que apontam para um período bem mais
curto, como já foi visto.

80 B R IG H T, op. cit., p. 233.


81 CU N D A I.L, op. c it, p. 30-31.
46 Antônio Renato Gusso

Shultz, prepara um quadro, basicamente, como se­


gue, apenas com pequenas modificações na posição dos ele­
mentos e uma correção em um dos itens,82 demonstrando a
cronologia que pode ser observada, no texto bíblico, para a
era dos juizes. Mas, alerta que têm sido propostos entre qua­
renta e cinqüenta métodos diferentes para se determinar a
abrangência do período, o que bem mostra a dificuldade de
se chegar à alguma conclusão baseando-se apenas no texto.
Seja como for, é interessante observar a cronologia possível
de se deduzir do texto bíblico. Ela pode ficar assim:
8 anos Opressão mesopotâmica
- - 3:8
40 anos -
Otniel - livramento e descanso - 3:11
18 anos Opressão moabita
- - 3:14
80 anos -
Eúde - livramento e descanso - 3:30
20 anos Opressão cananéia - Jabim
- 4:3
40 anos Débora e Baraque - livramento e
-
descanso 5:31
7 anos - Opressão midianita .. 6:1
40 anos - Gideão - livramento e descanso - 8:28
3 anos - Abimeleque - rei títere - 9:22
23 anos - Tola - período de judicatura - 10:2
22 anos - Jair - período de judicatura - 10:3
18 anos - Opressão amonita - 10:8
6 anos - Jefté - livramento e descanso - 12:7
7 anos - Ibsã - período de judicatura - 12:9
10 anos - Elom - período de judicatura - 12:11
8 anos - Abdom - período de judicatura - 12:14
40 anos - Opressão filistéia - 13:1
20 anos - Sansão - feitos e período de - 15:20
judicatura
410 anos no total.83

^ Schultz atribui ao período dc judicatura dc Klom 19 anos, mas o texto bíblico registra, apenas, 10 anos.
83 SC H U LTZ , op. cit., p. 100
Panorama Histórico de Israel 47

O termo juizes, quando se refere aos líderes desta


época em evidência, é uma tradução não muito adequada
para a palavra hebraica shôfetím Neste caso, seria
mais apropriado traduzi-la por “libertadores”84, pois a
grande maioria destas pessoas atuaram desta forma em mo­
mentos que parte da nação sofria opressão externa. Este
sentido fica claro em Juizes 2:16 onde está escrito: “Mas o
Senhor suscitou juizes {shôfetím - □ ’’ÈDSEj), que os livraram da
mão dos que os despojavam”. A função de julgar, ainda que
na opinião de alguns possa ter sido praticada pelos juizes
chamados menores85, talvez, tenha sido exercida, apenas,
por Débora (Jz 4:4-5) e, mais tarde, por Samuel e seus filhos
(1 Sm 7:15-17; 8:1-3).
Os juizes que aparecem no Livro de Juizes, normal­
mente são chamados de maiores e menores. Isto não se ba­
seia em suas qualidades ou importância mas se deve,
simplesmente, à extensão das narrativas sobre seus feitos.
Aqueles que recebem maior atenção no Livro de Juizes, ocu­
pando maior espaço na narrativa, são chamados de maiores,
os que aparecem em pequenas informações são os menores.
Eles eram pessoas carismáticas, revestidas pelo Espírito de
Iavé para desempenharem a função de líderes diante do
povo que estava sendo oprimido pelos inimigos. De certa
forma, eles foram os precursores dos reis e, nas horas de difi­
culdades, em sua maioria, conseguiram unir o povo para lu­
tar em conjunto contra o inimigo comum.86
Segue um breve histórico dos personagens que po­
dem ser considerados juizes nesta fase de Israel. A ordem
em que serão apresentados não deve ser tomada como cro­
nológica, ela estará baseada na seqüência bíblica:

^ FRAN C ISC O , C. T. Introdução ao A ntigo Testamento. Rio de Janeiro : JU E R P , 1979. p. 75.


B RIG H T, op. cit., p. 241.
SE LLIN , E. Introdução ao A n tigo Testamento. São Paulo : Edições Paulinas, 1978. p. 290.
48 Antônio Renato Gusso

1 - Otniel: Era filho de um homem chamado Que-


naz, o qual era irmão do famoso Calebe, o outro espia que,
juntamente com Josué, estava pronto para invadir Canaã
desde o primeiro momento, logo depois da saída de Israel
do Egito. Assim como seu tio, Otniel também era um valen­
te guerreiro e uma de suas aventuras foi registrada duas ve­
zes na Bíblia, em Josué 15:13-19 e Juizes 1:11-15. Pela sua
atuação destemida neste episódio ganhou de prêmio a filha
de seu tio como esposa. Ele libertou o povo que estava sen­
do oprimido, por 8 anos, pelo desconhecido Cusã-Risataim,
rei da Mesopotâmia e, segundo o relato bíblico, atuou como
juiz por 40 anos (Jz 3:7-11).
2 - Eúde: Os poucos versículos que falam dele o
apresentam como um homem de fé e muita coragem. Ele era
um homem canhoto, da tribo de Benjamim, e atuou como lí­
der libertador depois de ter matado Eglom, o rei dos moabi-
tas, a quem estavam pagando tributo. Suas ações levaram à
morte cerca de 10.000 soldados de Moabe e proporcionaram,
um período de 80 anos de paz (Jz 3:15-30).
3 - Sangar: Pouco se sabe sobre Sangar. Seu nome
não era hebreu, pode ser de origem hitita ou hurriana, o que
levanta a possibilidade dele ser cananeu ou, ao menos, um
elemento resultante da miscigenação de Israel com os povos
locais. Ele é chamado de Filho de Anate, fato este que pode
estar apontando para a sua ascendência, como tendo alguma
ligação com a deusa conhecida por este nome, ou para uma
cidade da região da Galileia.87Ele lutou contra os filisteus (Jz
3:31) e foi citado no cântico de Débora (Jz 5:6).
4 - Débora e Baraque: A atuação destes dois está re­
gistrada no Livro de Juizes no trecho que vai de 4:4 até 5:32.
Débora, a única mulher no grupo dos juizes, é apresentada
como juíza, profetiza e poetisa, sem dúvida uma pessoa de
muita capacidade. Ela convocou Baraque para lutar contra
B7 CU N D A I.L, op. c it, p.79-80.
Panorama Histórico de Israel 49

Sísera, general de Jabim, chamado rei de Canaã, provavel­


mente por ser o rei de Hazor, a principal cidade cananita e
por estar liderando uma liga de cidades-estado da região.88
Ele contava com um exército profissional que fazia uso de
novecentos carros de ferro, preparados para a guerra. Pode-
se imaginar, por este detalhe, a aflição que os israelitas esta­
vam passando por aquela época.
5 - Gideão: Era da tribo de Manassés e livrou Israel
da opressão dos Midianitas. Depois de conseguir uma gran­
de vitória com um pequeno grupo de soldados, recebeu uma
proposta para que reinasse sobre Israel. Não aceitou o con­
vite, demonstrando que tinha consciência de que Iavé era o
rei de seu povo. Contudo, o nome de um de seus filhos, Abi-
meleque, significando “meu pai é rei”, pode estar demons­
trando que ele era visto pelo povo como um tipo de rei. Ele
teve muitas mulheres e muitos filhos e, infelizmente, ainda
que aparentemente sem intenção, Gideão acabou levando o
povo à idolatria, quando confeccionou um objeto, ainda não
identificado com precisão, chamado de “estola sacerdotal”.89
6 - Abimeleque: Sua história esta registrada em Jui­
zes 9:1-57. Ele era filho de Gideão com uma concubina e
matou quase todos os seus irmãos para assumir o comando
regional. Acabou sendo proclamado rei pelos habitantes de
Siquém e dominou por apenas 3 anos. A extensão de seu rei­
nado era limitadíssima. A Bíblia só cita Siquém, Bete-Milo,
Arumá e Tebes como estando debaixo de seu poder.90 Seu
breve governo de terror acabou quando, ferido por uma pe­
dra lançada de uma torre de defesa, por uma mulher, pediu
que seu escudeiro o matasse. Ele não foi um libertador e, por
isso, alguns nem o consideram entre os juizes, foi um opres­
sor nacional que governou de forma tirana uma pequena

88 Ibid. p. 90-81.
89 CU N D A LL, op. c it, p. 118-119.
911 Ibid. p. 123.
50 Antônio Renato Gusso

porção do povo de Israel. Aparece nesta lista por ter gover­


nado parte de Israel neste período.
7 - Tola: Não se sabe praticamente nada deste juiz
que é citado de passagem em Juizes 10:1-2. Ele era da tribo
de Issacar, julgou Israel por 23 anos e foi sepultado na cidade
de Samir, que possui localização incerta,91 na região monta­
nhosa de Efraim.
8 - Jair: Era da tribo de Gileade. Atuou como juiz por
22 anos e alcançou grande prestígio.92 Isto se deduz do texto
(Jz 10:3-5) que afirma que ele tinha trinta filhos que possuí­
am trinta cidades, chamadas Vilas de Jair,93 e cavalgavam em
trinta jumentos. Foi sepultado em Camom, local que foi
identificado com as ruínas que estão a 1600 metros de dis­
tância, ao noroeste, da moderna Qumên.94
9 - Jefté: O que se sabe dele pode ser visto em Juizes
capítulos 11 e 12. Seu pai se chamava Gileade, o mesmo
nome do neto de Manassés que deu origem ao clã que assim
era conhecido, e sua mãe foi uma prostituta. Sendo hostili­
zado pelos meio-irmãos, devido à sua condição de ilegítimo,
separou-se da família e acabou por formar um grupo de
bandidos. Isto deu a ele condições de se firmar como um lí­
der de certa importância. Mais tarde, em um momento de di­
ficuldades, os anciãos de Gileade recorreram a ele para
poderem fazer frente aos Amonitas que os estavam opri­
mindo. Jefté conseguiu derrotar os Amonitas mas, nesta
mesma ocasião, acabou por fazer um voto insensato o qual
levou sua filha única a ser sacrificada. Este acontecimento,
registrado no Livro de Juizes, tem sido discutido a séculos, e
continua a ser um problema para autores modernos. Cun-
dall, porém, diz que “todos os primitivos comentaristas e
historiadores concordaram em que Jefté verdadeiramente

'n Ibid. n. 132.


M Jb,d.
^ IJL L F .Y , J. P. U. H avotc-jair. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 696-697.
94 CU N D A LI., op. cit., p. 132.
Panorama Histórico de Israel 51

ofereceu sua filha em sacrifício de fogo. Não foi senão na


Idade Média que surgiram tentativas bem intencionadas,
mas erradas, para suavizar o significado claro do texto”.95
Alem deste erro grave, Jefté acabou por se envolver em uma
guerra civil contra os efraimitas. A não intervenção das ou­
tras tribos neste acontecimento pode estar demonstrando
que a união entre elas, por esta ocasião, estava bastante debi­
litada.
10 - Ibsã: O Antigo Testamento dedica apenas três
versículos a este juiz (Jz 12:8-10). Pela informação de que ele
tinha trinta filhos e trinta filhas pode-se deduzir que era uma
pessoa rica. Seus filhos e filhas se casaram com pessoas de
fora de seu clã e, depois de atuar como juiz por sete anos (o
que pode ser um número simbólico), morreu e foi sepultado
em Belém. Como a tribo dejudá, no Período dos Juizes, pra­
ticamente está separada da vida intertribal, seria melhor pen­
sar nesta localidade, Belém, como sendo uma cidade de
Zebulom que ficava a aproximadamente 16 quilômetros ao
norte de Megido, e não na conhecida Belém de Judá.96
11 - Elon: Este só aparece em Juizes 12:11-12. Era de
Zebulom e atuou por dez anos como juiz. Foi sepultado em
uma cidade chamada ’Ayalon (p > K ) ou ’Eylon f ll^ N ),
transliterada na maioria das versões bíblicas modernas para
o português como Elon, seu próprio nome, já que o texto bí­
blico original, sem os sinais massoréticos,97 aponta para esta
possibilidade, onde se observa a mesma forma hebraica
para ambos os termos.
12 - Abdon: Sua carreira está descrita, resumidamen­
te, em apenas três versículos da Bíblia (Jz 12:13-15). Seu pai
se chamava Hilel e era oriundo da localidade de Piratom.
55 O JN D A L L , op. cit., p. 142.
96 Ibid. p. 146
97 Sinais m assoréticos são sím bolos que foram colocados no T exto H ebraico do Antigo Teslnm ento para ajudar
na leitura, já que no original ele não possuía vogais, era com posto só por consoantes;, o que era uma grande
dificuldade para quem não conhecia bem as palavras.
58 CU N D A LL, op. cit., p. 146.
52 Antônio Renato G usso

Atuou como líder durante oito anos e, pela referência bíblica


sobre seus filhos, em número de quarenta, e netos, em nú­
mero de trinta, formando um grupo formidável de setenta
membros que cavalgavam setenta jumentos, pode-se con­
cluir que era uma pessoa de grande prestígio e riqueza.99
13 - Sansão: A história deste, que muitos pensam não
poder ser classificado como juiz, pois suas atitudes destoam
fortemente dos demais, ocupa quatro capítulos do Livro de
Juizes (Jz 13 -16). Ele era filho de um homem chamado Ma-
noá, oriundo da tribo de Dã, e sua mãe o concebeu de forma
milagrosa, pois ela era estéril, cumprindo-se nele uma pro­
messa de Deus feita através de seu anjo. Ele começou a li­
vrar Israel da opressão dos Filisteus (Jz 13:5). Foi um
personagem polêmico, nazireu, misto de super homem e de­
linqüente juvenil que, sem a ajuda de seu povo, criou muitos
problemas para os filisteus. Não há muito que se possa dizer
sobre ele, é um personagem difícil de se entender, mas “suas
histórias refletem autenticamente a situação da fronteira .dos
filisteus antes do desencadeamento da guerra. Pode muito
bem ser que os incidentes de fronteira desta espécie tenham
em grande parte incitado os filisteus a uma ação agressiva
contra Israel”.100
Para encerrar este capítulo ainda merece destaque a
informação de que o Livro de Rute possui este período
como pano de fundo e que Eli, o sacerdote do santuário de
Silo, Samuel e seus filhos Joel e Abias, ainda que não sejam
mencionados no Livro de Juizes, também foram juizes. Em
1 Samuel 4:18b está escrito que Eli “julgou” a Israel por um
período de quarenta anos, em 1 Samuel 7:15 está a informa­
ção, ainda que exagerada se interpretada literalmente, de que
Samuel “julgou” a Israel durante todos os dias de sua vida, e
em 1 Samuel 8:1-3 nota-se que Samuel, em sua velhice, cons-

99 Ibid. p. 146.
w o B R IG H T , op. c it , p. 232-233.
Panorama Histórico de Israel 53

tituiu seus filhos Joel e Abias por juizes sobre Israel, em Ber-
seba. Estes, contudo, foram rejeitados, com a acusação de
que aceitavam suborno e não eram justos em seus julgamen­
tos.
54 Antônio Renato Gusso

5.4. Para Complementar

5.4.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de Juizes;
b) O Livro de Rute;
c) O Livro de 1 Samuel 1-8;
d) O Salmo 106:34-48.

5.4.2. Questões Para Revisão________________________

a) Qual é a maior fonte histórica a respeito do Período


dos Juizes?
b) Explique como era o sistema de governo de Israel du­
rante o Período dos Juizes.
c) Como foram explicados, teologicamente, os problemas
enfrentados por Israel no Período dos Juizes?
d) Como podem ser explicados de maneira natural os
problemas de Israel no Período dos Juizes?
e) Qual título ficaria melhor para os Juizes de Israel neste
período?
f) Qual é o tempo aproximado que cobre o Período dos
Juizes?
g) Por que alguns juizes são chamados de maiores e ou­
tros de menores?
h) Cite os nomes de, pelo menos, cinco juizes de Israel.
i) Qual livro da Bíblia apresenta Eli, Samuel e seus filhos,
Joel e Abias, como juizes em Israel?
Panorama Histórico de Israel 55

6 . OS PRIMÓRDIOS DA MONARQUIA__________

Depois de aproximadamente dois séculos de existên­


cia o sistema Teocentrico de Governo utilizado por Israel
chega ao fim. Eles não podiam mais continuar a fazer frente
aos seus adversários, que se desenvolviam cada vez mais e os
procuravam conquistar, sem um elemento político unifica­
dor de suas forças. Não podiam ficar esperando que surgisse
um “libertador” a cada investida das nações vizinhas. Era
necessário um sistema que lhes desse segurança permanente,
com um exército profissional, e viram na Monarquia, forma
utilizada por seus agressores, a única saída para este proble­
ma.
A transição não foi feita de maneira muito fácil. Pedir
um rei era o equivalente a duvidar do cuidado e proteção de
Iavé, o verdadeiro Rei de Israel. Por isso, o profeta Samuel,
ao ser procurado pelos líderes para que constituísse um rei
sobre eles, demonstrou todo o seu desagrado. Só concordou
com a idéia depois de ter certeza da permissão divina, mas
mesmo assim mostrou ao povo algumas das desvantagens
que teriam ao servirem a um rei além de deixar claro que a
atitude deles era pecaminosa (1 Sm 8-12).
Assim mesmo eles levaram adiante o plano e deram
início à uma instituição que sobreviveria por mais de quatro­
centos anos em Israel. Aqui, neste capítulo, será apresentado
um resumo do que aconteceu nos primórdios da monarquia,
o período que vai desde o estabelecimento da monarquia,
com seu primeiro rei, ainda uma época de transição, até o fi­
nal do reinado de Salomão, quando Israel atingiu o seu po­
tencial máximo como estado.
56 Antônio Renato Gusso

6.1. O Estabelecimento da Monarquia

O estabelecimento da monarquia em Israel aconteceu


em um momento de grave crise, e não poderia ser diferente,
a necessidade é o que impulsiona a busca de novas alternati­
vas. Os filisteus que haviam chegado em Canaã quase ao
mesmo tempo que Israel, depois de passarem praticamente
todo o Período dos Juizes em conflito com eles, se tornando
cada vez mais perigosos, parece que atingiram o auge e, de­
pois da vitória estrondosa que conseguiram em Silo, algum
tempo depois de 1050 a.C., inclusive levando a Arca do Con­
certo para a Filistia, estavam colocando a existência de Isra­
el como um todo em risco.101
Samuel, um dos últimos guardiões da Liga Anfictiôni-
ca estava velho e seus filhos não seguiam os seus passos. Al­
guma coisa precisava ser feita para salvar a integridade das
tribos de Israel. Era hora de mudanças, não dava mais para
continuarem desorganizados e separados diante de inimigos
tão poderosos.

6.1.1. O Primeiro Rei de Israel_______________________

Saul foi o primeiro rei de Israel. Chegou à esta posi­


ção através da indicação do profeta Samuel, e firmou-se nela
depois de vencer uma batalha contra os amonitas, quando
demonstrou possuir dons carismáticos da mesma forma que
alguns dos juizes, os libertadores, os possuíam.102
Seu reinado se apresenta como um estágio de transi­
ção entre o período dos juizes e a implantação do estado. Ele
atuou de forma semelhante a dos juizes, porém à frente de
todas as tribos e não de apenas uma, ou algumas. Foi um mi­
litar que pouco fez em termos de política interna, chamado

B R IG H T , 1. H istória àe ísrael. São Paulo: lu liçõ es Paulinas, 1085. p. 238-241.


102 Ibid. p. 243-244.
Panorama Histórico de Israel 57

para resolver problemas com a opressão estrangeira.103Jun­


tamente com seu filho Jônatas demonstrou grande habilida­
de nas batalhas. Conseguiram, com poucos soldados,
libertar a parte central de Canaã, que estava no poder dos fi­
listeus, dando ânimo aos hebreus, bem como aos cananeus
que sofriam com o inimigo comum.104
O tipo de monarquia desenvolvida por ele foi dife­
rente da praticada por seus vizinhos, tanto cananeus quanto
filisteus. Certamente, não era moldado no sistema de cida-
de-estado feudal como os demais, continuou semelhante à
antiga ordem anfictiônica, só que agora com um líder acla­
mado como rei.105
Saul não efetuou nenhuma modificação drástica à es­
trutura interna de Israel. Não desenvolveu nenhuma máqui­
na administrativa ou burocrática e deixou a organização
tribal da mesma maneira que a encontrou. Não possuía um
grande harém nem contava com oficiais para o auxiliarem,
com exceção de Abner, seu parente, que esteve à frente do
exército que era recrutado dentre as tribos. Morava em uma
fortaleza e não em um palácio e se preocupava em formar
uma força militar permanente (1 Sml4:52), pois durante
todo o seu reinado esteve em guerra.106

6.1.2. A Decadência de Saul_________________________

A história do primeiro rei de Israel não é de muitas


glórias. Depois de determinado tempo de reinado, que havia
começado tão bem, Saul passou a agir de forma muito estra­
nha demonstrando, várias vezes, estar fora de seu juízo nor­
mal.

FOI IRKR, G. H istoria da Religião de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 148.
^ BKHK, M. A. H istória de Isra el Rio dc (aneiro; Xahar Editores, 1967. p, 55.
105 BRIG HT, op. c it , p. 245-246.
106 B RIG H T, op. cit., p. 247.
58 Antônio Renato Gusso

Parece que as dificuldades começaram assim que ele


perdeu o apoio do profeta Samuel. Em 1 Sm 13:4b-15, Saul é
apresentado como usurpador da função sacerdotal, enquan­
to que, no capítulo 15, do mesmo livro, “está escrito que ele
violou o herem - uma característica da lei sagrada, relativa à
Guerra Santa”.107 Sem o apoio de Samuel, que demonstra
querer continuar mantendo o essencial da antiga ordem
como era feito com os juizes, e tendo que demonstrar cons­
tantemente ser um líder carismático para manter o seu gru­
po, se tornou uma pessoa depressiva,108 que em
determinados momentos apresentou verdadeiros atos de
loucura que a Bíblia credita como resultado da atuação de
um espírito maligno que se apossava dele (1 Sm 19:8-11).
A situação de Saul piorou muito quando ele veio a se
sentir ameaçado pela popularidade de seu genro Davi. Ven­
do que este era um herói nacional e que o povo o admirava
mais do que ao próprio rei, pois até seu filho Jônatas era seu
amigo leal, procurou de várias formas tirá-lo de seu cami­
nho. Não hesitou em tirar a vida dos sacerdotes que atuavam
em Nobe, por terem ajudado a Davi em uma de suas fugas,
e, com este ato marcou a separação completa entre seu go­
verno e a ordem anfictiônica. A atitude foi tão absurda que
nem seus servos, colocando as suas vidas em risco, pois já
conheciam o temperamento do rei, quiseram atender à or­
dem de execução dos sacerdotes (1 Sm 21-22). Para compli­
car ainda mais a situação, Saul acabou deixando de lado a
luta com os filisteus para continuar a gastar energias procu­
rando Davi que havia formado um grupo de guerreiros, le­
vando, assim, a nação a se precipitar em um cisma que só
traria dificuldades.109

107 Ibid. p. 249.


11,8 Ib ,d
109 B RIG H T, p. 251.
Panorama Histórico de Israel 59

Logo o esperado se concretiza. Os filisteus, provavel­


mente, percebendo a fraqueza do rival que estava dividido,
inclusive, pensando que podiam contar com a ajuda de
Davi, ou ao menos com a sua não intervenção, pois aparen­
temente havia passado para o lado deles e estava a serviço de
Aquis, rei filisteu da cidade de Gate (1 Sm 27), se lançaram à
batalha para conquistar os territórios de Israel. Foram vitori­
osos e levaram Saul e seus filhos Jônatas, Abinadabe e Mal-
quisua à morte (1 Sm 31:2), abrindo a oportunidade para o
estabelecimento de um novo rei em Israel.

6.2. O Reinado de Davi___________________________

Com a vitória conseguida pelos filisteus no monte


Gilboa a situação de Israel parecia sem esperanças. Mais
uma vez os filisteus se instalaram nas montanhas centrais de
Canaã e, ainda que não se aventurassem até a Transjordânia,
nem muito para o interior da Galiléia, passaram a dominar
grande parte da região. Com isto, conseguiram ocupar, apro­
ximadamente, a mesma extensão de terras que ocupavam
antes das ações militares de Saul. Contudo, Davi iria reverter
esta situação e colocar o seu povo, em pouco tempo, na van­
guarda das outras nações.110
Muitas coisas poderiam ser ditas a respeito do reina­
do de Davi, o mais importante rei de todos os tempos para
Israel, mas, devido ao objetivo deste escrito, nas próximas li­
nhas serão apresentados, apenas, três pontos básicos de sua
carreira: A maneira como chegou ao poder, algum tempo
perto de 1000 a.C.; como desenvolveu sua política expansio-
nista; e que problemas ocorreram quando da sua sucessão.

110 Ibid. p. 254.


60 Antônio Renato Gusso

6.2.1. Como Davi Chegou ao Poder

Davi era por assim dizer o candidato natural à suces­


são de Saul. Ele era um herói nacional, amado por muitos. Já
havia demonstrado grande capacidade militar à frente de
parte do exército de Saul (1 Sm 18:12-16) e tinha sido ungido
rei de Israel pelo profeta Samuel, quando Saul ainda vivia.
Mesmo assim, não passou a dominar sobre todas as tribos
imediatamente, precisou aguardar o momento certo e fazer
uso de suas habilidades políticas.
Na verdade, quando aconteceu a morte de Saul, em
campo de batalha, seu reino ficou dividido. Davi, seu genro,
acabou sendo proclamado rei de Judá, e Isbosete, filho de
Saul, sucedendo ao pai, se tornou rei de Israel, a parte norte
da região onde estavam estabelecidos.111 Esta divisão, de cer­
ta forma, nunca mais deixaria de existir. A partir daquele mo­
mento dois estados estavam nascendo.
Os filisteus a esta altura, com grande poder na região,
devem ter permitido a Davi assumir tal posição, provavel­
mente, pelo fato dele ser um de seus vassalos e, também,
porque o antigo reino de Saul, agora dividido em duas partes
era do interesse deles.112 O arrependimento por esta decisão
errada não deveria demorar para vir aos filisteus. Este era o
primeiro passo de Davi para assumir a liderança de todo o
Israel e transformá-lo em um grande Império.
O segundo passo aconteceu quando da morte de Is-
bosete. Ele esteve no poder, reinando sobre Israel, as tribos
do norte, por apenas dois anos (2 Sm 2:10). Não teve a força
de Saul e, depois de perder seu general Abner, o qual foi
morto logo após ter se passado para o lado de Davi com a in­
tenção de transferir-lhe o reino, acabou sendo assassinado
por dois de seus oficiais. Após o que, os anciãos de Israel,

^* * M E TZG E R, M. H istória fie Israel. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1972. p. 62-65.
^ BRUCE, I7. F. Israelatui the Nations. Grand Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1983. p. 28.
Panorama Histórico de Israel 61

vendo que não havia outro em condições de reinar, procura­


ram Davi em Hebrom e pediram-lhe que os governasse.
Davi, é claro, aceitou o pedido e passou a ser rei de
Judá e de Israel ao mesmo tempo e tomou algumas medidas
importantes para a união e consolidação de seu reino. Entre
elas está a escolha de sua nova capital. Ele optou por Jerusa­
lém, que era uma cidade habitada por jebuseus. Além da ci­
dade ser fortificada estava em lugar estratégico, por nàõ
pertencer a nenhuma das tribos de Israel. ísto ajudou a nao
causar sentimento de inveja, como poderia acontecer se
houvesse escolhido uma dentre elas.113
Johnson observa que toda a operação levada a efeito
por Davi para transferir sua capital para Jerusalém foi uma
ação política. Segundo ele, interpretando o texto de 2 Samu­
el 5:6, Davi utilizou, apenas, as tropas profissionais para esta
conquista, a parte do exército formada pelas tribos ficou de
fora. Assim, foi Davi e seus homens quem conseguiram a vi­
tória, nenhuma tribo poderia alegar que teve participação na
conquista da cidade que viria a ser a capital. Este ato, inclusi­
ve, deve ter influído na maneira como ela passou a ser cha­
mada: “Cidade de Davi”.114
A hipótese levantada por Johnson é bastante viável,
está de acordo com outras ações de Davi que sabia se condu­
zir muito bem no campo político. Contudo, deve ser levado
em conta também, que em 1 Crônicas 11:4 a conquista de Je­
rusalém, aparentemente, está sendo descrita como uma ação
conjunta de todo o “Israel”. A questão ainda não está total­
mente esclarecida.

113 B E E K , M. A. H isfm a de Isra el Rio d t Janeiro: Zahar E ditores, 1967. p. 60.


JO H N SO N , P. H istoria dosjude/ts. Rio de Janeiro: Im ago Editora, 1989. p. 65.
62 Antônio Renato Gusso

6.2.2. A Política Expansionista de Davi

O novo estado teve que partir para a luta imediata­


mente. Os filisteus perceberam logo que as tribos de Israel
novamente unidas eram um perigo, e que elas não continua­
riam mais debaixo do poder deles. Davi tinha que ser destru­
ído. Contudo, foi exatamente o contrário que aconteceu. Os
filisteus foram derrotados de tal forma que Israel se apossou
de vasto território que lhes pertencia e, mais tarde, como evi­
dência da supremacia israelita, e do fim do poder filisteu,
pode-se encontrar contingentes de seus combatentes pres­
tando serviço mercenário para Davi, aquele a quem eles que­
riam derrotar.115
Com os filisteus derrotados Davi leva a Arca da Ali­
ança para a cidade de Jerusalém, o que deve ter servido de fa­
tor positivo para a união das tribos e passa a realizar várias
conquistas. Definitivamente, Israel deixava de lutar guerras
de sobrevivência ou defesa e passava para uma época de ex­
pansão nunca vista igual antes ou depois de Davi. Com rapi­
dez impressionante se transformou em uma potência que
não ficava devendo nada, em poder, às outras de sua épo­
ca.116Basta dar uma olhada na relação de vitórias de Davi em
2 Samuel 8:1-14, onde aparecem Edom, Moab e Síria, entre
outras nações, para comprovar esta afirmação.

6.2.3. Os Problemas da Sucessão de Davi_____________

Como tudo na vida passa, Davi, depois de tantas con­


quistas, também passou. Quando da sua velhice o império
estava estabelecido e Israel, com uma nova fisionomia, já ti­
nha abandonado quase todos os antigos costumes da época
dos juizes. Contudo, algumas coisas permaneciam, entre elas

115 B RIG H T, op. c it, p. 258-260.


116 Ibid. p. 26(1-267.
Panorama Histórico de Israel 63

o desejo de ver um carismático à frente da liderança do


povo. A sucessão dinástica ainda não havia sido utilizada.
Com isto estava criado um problema para a sua sucessão:
Quem assumiria a coroa no lugar de Davi que mostrava si­
nais de cansaço?
Pelo menos dois dos filhos de Davi procuraram mos­
trar ao povo que tinham estes dons e, portanto, estavam ap­
tos e desejavam o lugar do rei. Isto aconteceu com Absalão
que liderou uma revolta armada contra Davi (2 Sm 15-18) e
com Adonias, mais tarde, que se declarou rei quando seu pai
estava em seus últimos dias (1 Rs 1).
Não dava mais para esperar e, antes que algo pior
acontecesse, Davi passou o comando para seu filho Salo­
mão. Este, herdando um império bem estruturado, comple­
taria a obra do pai, incrementando ao máximo a estrutura
estatal. Contudo, em termos de extensão territorial, Israel
havia chegado ao máximo, a partir daqui só viria a diminuir
as suas possessões.

6.3. O Reinado de Salomão_______________________

Salomão deve ter iniciado o seu reinado por volta do


ano 970 a.C. e pode ter seguido no poder até, aproximada­
mente, 930 a.C.,117 quando faleceu.118 Foi uma trajetória de
glória, paz e muito progresso material para o estado, porém
com um alto preço social a ser pago por grande parte da po­
pulação.
Salomão é uma figura extraordinária e muito tem sido
escrito a respeito de sua pessoa. Contudo, para este trabalho,
basta mostrar como foi que ele se firmou no trono, tão am­
bicionado, do império formado por Davi; quais foram algu­
mas de suas principais realizações e como, depois de toda a
117 H U BBA RD , JR ., I'irsf & Second Kingx. Chicago: Moody Press, 1991. p. 20.
1,8 B R IG H T, op. cit., p. 276.: sugere que Salom ão tenha reinado do ano 961 A .C sue 922 A XI
64 Antônio Renato Gusso

sua contribuição positiva para o estado, acabou sendo um


péssimo exemplo para o seu povo, decaindo em sua vida es­
piritual.

6.3.1. Como Salomão Firmou-se no Trono____________

O início da carreira de Salomão foi bastante contur­


bado. Ele sabia que haviam outros pretendentes ao trono e,
no momento preciso, após a morte de Davi, quando se viu
só no poder, agiu com todo o rigor necessário. Não poupou
nenhum daqueles que o colocavam em risco. Um a um, con­
forme surgiam as possibilidades politicamente favoráveis,
foram sendo removidos de seu caminho, deixando-o livre
para governar com autoridade e liberdade de ação.
O primeiro a ser eliminado foi seu irmão Adonias.
Ele já havia tentado usurpar o trono quando Davi ainda era
vivo. Mas, quando soube que o rei tinha estabelecido Salo­
mão em seu lugar, voltou atrás, temendo por sua vida, e co­
locou-se como servo, pedindo clemência. Salomão aceitou o
seu pedido e prometeu que não lhe faria nenhum mal, desde
que nele não viesse a ser achada alguma maldade (1 Rs
1:50-53). Pouco tempo após a morte de Davi, Adonias, por
intervenção de Bate-Seba, mãe de Salomão, pediu Abisague,
concubina de Davi, para ser sua mulher. Este fato pode pa­
recer irrelevante para o leitor moderno, mas, com esta atitu­
de, ele estava indicando “que ainda não desistira de
reivindicar o trono”,119pois a posse do harém real era um si­
nal do poder de governar (2 Sm 3:8; 12:8; 16:20-22).120 Isto
foi suficiente para que Salomão o condenasse à morte.
Ao que parece, Adonias estava sendo apoiado em sua
intenção de golpe de estado por Joabe, antigo general de
Davi, e também pelo sacerdote Abiatar. Salomão agiu rápido

119 B R IG H T , op. cit., p. 276.


120 IIU BBARD , JR „ op. cit., p. 30.
Panorama Histórico de Israel 65

e se livrou dos dois. Mandou matar a Joabe e colocou Be-


naia, em seu lugar, como comandante do exército, e substi­
tuiu o sacerdote Abiatar por Zadoque, exilando aquele na
cidade de Anatote (1 Rs 2:26-35).
Restava ainda um homem que significava perigo para
o seu reino: Simei, o parente de Saul que se atreveu a amaldi­
çoar a Davi, publicamente, quando este fugia de Absalão (2
Sm 16:5-14). Havia, inclusive, um pedido de Davi a Salomão
para que Simei não morresse de forma pacífica (1 Rs 2:8-9).
Não demorou muito e também este foi executado. Inicial­
mente Salomão designou-lhe uma espécie de exílio. Ele não
poderia sair da cidade de Jerusalém para nenhum outro lugar
sob pena de perder a vida se desobedecesse. A desobediên­
cia aconteceu três anos depois quando ele foi até à cidade de
Gate à procura de alguns de seus escravos que haviam fugi­
do. Como Salomão o havia advertido fez; mandou que Joia-
da o executasse sem piedade, e assim o reino foi firmado sob
o seu domínio (1 Rs 2:36-46).

6.3.2. As Realizações de Salomão____________________

Depois de firmado no comando geral da nação, Salo­


mão se mostrou um excepcional estadista. Acabou levando
Israel a atingir um estágio econômico e social nunca alcança­
do antes e que não se repetiria jamais.
Salomão não demonstrou grande interesse por con­
quistas militares. Havia recebido um vasto império de seu
pai Davi e tinha como missão organizá-lo e desenvolvê-lo.
Daí praticou um programa excelente de política externa, fa­
zendo alianças que garantiram-lhe a paz necessária para me­
lhor explorar o potencial da nação. Entre as alianças pode sc
destacar a feita com o rei do Egito, de quem ele recebeu uma
das filhas em casamento, fato este que bem mostra o seu po
der, bem como a decadência do Egito, já que não era cosiu
66 Antônio Renato Gusso

me dos faraós da época do Império darem suas fühas nem


mesmo aos reis da Babilônia ou Mitanni, que foi um podero­
so império que dominou a Alta Mesopotamia por muitos sé­
culos, atingindo seu auge por volta de 1450 a.C., quando
Tutmósis III reinava no Egito.121
Outra aliança importante foi feita com Tiro. Ela que
havia sido iniciada por Davi foi desenvolvida e trouxe gran­
des benefícios para os dois países em matéria de exportação
e importação de produtos como trigo e óleo de oliva, que
eram mandados para Tiro, e madeira-de-lei, que ia para Isra­
el para ser utilizada nos projetos de construção de Salomão.
Além disto, esta aliança abriu novos caminhos para o comér­
cio e a industria de Israel.122
Salomão, ainda que tenha desenvolvido um reino de
paz, também reforçou a defesa nacional preparando um
grande exército profissional que passou a se utilizar de car­
ros de combate, arma nunca utilizada antes em Israel. Sabe-
se que ele construiu quatro mil estábulos, possuía mil e qua­
trocentos carros e tinha doze mil homens aptos para dirigi-
los.123 Estes carros eram adquiridos no Egito, o melhor
construtor da época, e os cavalos vinham da Cilicia, conheci­
da como a terra dos melhores cavalos. Ele não apenas adqui­
riu carros e cavalos para o seu exército mas, percebendo que
era o controlador das rotas de comércio entre Egito e Síria,
veio a se tornar o intermediário de um negócio muito lucrati­
vo. Só era possível adquirir carros egípcios com cavalos da
Cilicia através de sua agência. Sem dúvidas, este importante
monopólio lhe trouxe muitos lucros.124
Salomão também ficou conhecido por suas constru­
ções maravilhosas. Elas foram espalhadas pelo império mas
se destacaram sobre tudo na cidade de Jerusalém onde esta-
121 B R IG H T , on. cit., p. 138, 278.
122 Ibid.
123 Ibid. p. 279.
124 Ibid. p. 284.
Panorama Histórico de Israel 67

vam as principais instalações militares, os palácios e, princi­


palmente, o templo, que foi construído por um arquiteto da
cidade de Tiro.125 Quanto ao modelo do templo que muitos
defendiam ser algo exclusivo de Israel, tem sido provado pe­
las escavações efetuadas na Síria, em 1936, pela Universida­
de de Chicago, de que se trata de um tipo de arte e
arquitetura comum no século X a.C. Portanto, deve ser cre­
ditado aos estrangeiros que dirigiram a obra, ao menos, os
planos finais da construção.126 Ele não era o único local de
adoração de Iavé no reino, além dele, haviam outros santuá­
rios espalhados pela nação, contudo, o de Jerusalém, bem
como seu sacerdócio, veio a ter preeminência sobre os ou­
tros das zonas rurais.127
Também é importante destacar que o reinado de Sa­
lomão foi um propulsor para o desenvolvimento da cultura
de forma geral. A escrita deve ter sido utilizada em larga es­
cala, devido ao desenvolvimento natural da burocracia esta­
tal e a música e a salmodia tomaram grande impulso com a
construção do templo. O próprio Salomão passou a ser co­
nhecido, internacionalmente, pela sua sabedoria e habilida­
de como compositor de provérbios.128

6.3.3. A Decadência Espiritual de Salomão____________

A vida de Salomão, depois de tudo o que ele fez para


o estado e religião de Israel, termina de uma maneira impres­
sionante e, de certa forma, inexplicável. Tanto que alguns
pensam que o relato bíblico a respeito de seus últimos dias
(1 Rs 11) não é digno de confiança, ou que é contraditório.129
Realmente, não é fácil de se compreender como que um ho­
mem tão sábio e que atingiu tanto sucesso veio a falhar,
125 B R IG H T , op. c it , p. 285-286.
126 SH U LT Z , S. J. A H istória de Isra el no A ntigo Testamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1988. p. 143-144.
*^ FO H RE R, G. H istória da Religião de Israel São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 258.
128 BRIG H T, op. c it , p. 287-289.
129 SH U LT Z , op. c it , p. 147.
68 Antônio Renato Gusso

como ele falhou, em pontos básicos, ao final de sua vida.


Mas, a Bíblia, de forma muito clara e corajosa, mostra o que
aconteceu.
O erro inicial de Salomão foi o de se envolver com
mulheres estrangeiras. Além da filha de faraó, a egípcia, ele
tomou mulheres moabitas, amonitas, edomitas, sidônias e
hetéias, o que era expressamente proibido pela Lei de Moi-
A

sés (1 Rs 11:1-2; Ex 34:16), já se prevendo as conseqüencias


espirituais destes relacionamentos. Não se sabe exatamente
o por que, se por motivos diplomáticos ou para ultrapassar
soberanos de outras nações em uma demonstração de gran­
diosidade, mas ele acabou formando um harém com sete­
centas esposas e mais trezentas concubinas, as quais
serviram de influência negativa para a sua vida espiritual.
Infelizmente, observa-se que ao final de sua carreira,
Salomão se tomou um idólatra. A Bíblia informa que ele ser­
viu a Astarote que era uma deusa dos sidônios e que, assim
como havia construído o templo para Iavé, Deus de Israel,
também construiu um santuário, ainda que não nos mesmos
moldes, deve ter sido um local a céu aberto, para Camos,
deus de Moabe e outro para Moloque, deus de Amom (1 Rs
11:5-7), ao qual eram oferecidas crianças em sacrifício.130 As
conseqüências negativas destas ações absurdas não tardari­
am a aparecer, como se verificam claramente pela ocasião de
sua sucessão.

13(1 H U B B A RD , J R , op. c it , p. 68.


Panorama Histórico de Israel 69

6.4. Para Complementar__________________

6.4.1.Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de 1 Samuel 8-31;


b) O Livro de 2 Samuel;
c) O Livro de 1 Reis 1-11;
d) O Livro de 1 Crônicas 3, 10-29;
e) O Livro de 2 Crônicas 1-9;
f) Grande Parte do Livro de Salmos;
g) O Livro de Provérbios;
h) O Livro de Cantares.

6.4.2._Questões Para Revisão_________________

a) Por que Israel pediu um rei?


b) Quem foi e como atuou o primeiro rei de Israel?
c) Como Davi chegou a ser rei?
d) Explique o provável motivo de Davi ter escolhido Je­
rusalém como capital.
e) Escreva a respeito da sucessão de Davi.
f) Como Salomão se firmou no trono?
g) Descreva em poucas palavras como foi o reinado de
Salomão.
h) Escreva a respeito da decadência espiritual de Salo­
mão.
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 71

7.A DIVISÃO DO REINO


Davi havia reinado sobre Judá e Israel, ao mesmo
tempo, por um longo período, mas quando chegou o mo­
mento de ser sucedido por seu filho Salomão, estas duas par­
tes principais do Império, ainda, demonstravam uma certa
independência entre elas. Tem-se a impressão de que se tra­
tavam de dois estados governados pelo mesmo rei, unidos,
em certo sentido, entre outras coisas, pela tradição em co­
mum, pela ascendência e pela religião, porém separados pe­
las fronteiras territoriais e tendências políticas. É
significativo para esta interpretação perceber que Salomão,
semelhante a Davi, acabou por se tornar rei sobre Israel e
Judá (1 Rs 1:35), e não sobre uma unidade denominada Is-
rael-Judá, ou algo semelhante, e que, ao final de seu reinado,
por ocasião de sua morte, logo surgiram líderes da parte de­
nominada Israel pleiteando diante do sucessor do trono im­
perial melhores condições para o estado deles (1 Rs 12:1-4).
Não havia mais como permanecerem unidos. As duas
partes que já tinham suas diferenças e possuíam ambições
políticas contraditórias, com a falta de alguém com a capaci­
dade e o carisma de Davi, ou a sabedoria de Salomão, só po­
deriam mesmo tomar rumos diferentes, e foi isto o que
aconteceu. Se tornaram dois estados independentes, ainda
que irmãos, separados, que em algumas ocasiões se ajuda­
ram e em outras se portaram como verdadeiros rivais se en­
frentando em guerras.
Realmente, a situação do reino ou dos reinos que tive­
ram as suas origens na Aliança Anfictiônica é algo muito in­
teressante. Quando estavam unidos, debaixo do poder de
Davi e Salomão, estavam divididos por alguns motivos, mas
72 Antônio Renato Gusso

quando se encontraram separados, continuaram unidos por


outros, havia, principalmente, um forte laço espiritual e um
sentimento de parentesco entre as duas partes. Isto transpa­
receria durante toda a continuidade de suas histórias, princi­
palmente nas mensagens de seus profetas.
Seja como for, houve a divisão política e territorial e,
nas próximas linhas, será apresentado como isto aconteceu.
Serão discutidos os motivos que levaram à esta divisão, do
ponto de vista teológico e também do natural, descrita a
constituição das duas partes, aqui chamadas de Parte Norte e
Parte Sul, e analisados os resultados deste acontecimento
que mudou a história dos descendentes de Jacó.

7.1. Motivos que Levaram à Divisão_______________

Não são poucos os leitores apressados da Bíblia qué


lamentam profundamente a divisão que houve no reino dei­
xado por Salomão, pensando que se uma outra pessoa tives­
se assumido a coroa, e não Roboão, a situação haveria de ter
sido diferente. Muitas vezes, esta divisão tem sido creditada
apenas à atitude insensata de Roboão, o filho sucessor de Sa­
lomão. Mas, esta é apenas uma parte da história. A própria
Bíblia mostra que a questão é mais complexa e que existem
outros personagens importantes envolvidos nela.
Para que o assunto fique mais claro, aqui serão apre­
sentadas duas explicações básicas para o ocorrido, sendo
que elas não se excluem, pelo contrário, se complementam.
Será analisada, em primeiro lugar, a explicação teológica para
os fatos e, a seguir, em segundo lugar, o que pode ser chama­
do de explicação natural, pois se trata do levantamento das
conseqüências lógicas que resultam das atitudes tomadas pe­
los envolvidos na questão.
Panorama Histórico de Israel 73

7.1.1. A Explicação Teológica_______________________

A explicação teológica pode ser tirada, principalmen­


te, dos capítulos 11 e 12 do Primeiro Livro dos Reis, que te­
rão alguns de seus versículos aqui transcritos, e dos capítulos
10 e 11 do Segundo Livro das Crônicas. Ela aponta, antes de
tudo, para o culpado pela divisão. Este ônus enorme recai
sobre o sábio Salomão.
Como diz Baxter: “embora Deus possa conferir mui­
tos privilégios, Ele jamais concede o privilégio de pecar -
não, nem mesmo para alguém tão especial como Salo­
mão”.131 As atitudes erradas deste monarca, que não seguiu
o exemplo dado por Davi seu pai quanto à lealdade ao seu
Deus, atraiu a ira divina sobre si, o que veio a resultar, mais
tarde, na divisão do reino. O texto bíblico a seguir, 1 Rs 11:9-13,
mostra isto claramente:
v.9 “Pelo que o Senhor se indignou contra Salomão,
pois desviara o seu coração do Senhor Deus de Israel,
que duas vezes lhe aparecera.
v.io E acerca disso lhe tinha ordenado que não seguis­
se a outros deuses. Ele, porém, não guardou o que o
Senhor lhe ordenara.
v.ii Por isso disse o Senhor a Salomão: Visto que as­
sim procedeste e não guardaste a minha aliança, nem
os meus estatutos que te mandei, tirarei de ti este rei­
no, e o darei a teu servo.
v.i 2 Contudo não o farei nos teus dias, por amor de
Davi, teu pai; da mão de teu filho o tirarei.
v.i3 Todavia não tirarei o reino todo; darei uma tribo a
teu filho, por amor de Davi, meu servo, e por amor de
Jerusalém, que escolhi.”
Ao mesmo tempo em que a explicação teológica
apresenta o rei Salomão como o culpado pela divisão, apre-
^ ' B AX TER, ]. S. E xaminai as llscrihtra s: Juizes a lit/er. São Paulo : Edições Vida N ova, 1993. p. 113-114.
74 Antônio Renato Gusso

senta Deus como o autor da mesma. Portanto, antes de se la­


mentar pela divisão em si, que foi causada por Deus, talvez
fosse melhor deplorar as atitudes erradas de Salomão, que
acabaram por levar à esta ruptura.
O texto de 1 Reis 11:29-33 não dá margens à dúvidas.
Na opinião do escritor desta parte da Bíblia, Deus mesmo é
quem divide a nação. Segundo ele, Deus já havia dado a Jero-
boão, um servo de Salomão, enquanto este rei ainda era
vivo, a promessa, por meio de um profeta, de que ele reinaria
sobre a maior parte das tribos. Isto aconteceu assim:
v.29 “Sucedeu nesse tempo que, saindo Jeroboão de
Jerusalém, o encontrou o profeta Aias, o silonita, no
caminho; este se tinha vestido de uma capa nova, e es­
tavam sós os dois no campo.
v.3o Aias pegou na capa nova que tinha sobre si, ras­
gou-a em doze pedaços,
v.3i e disse a Jeroboão: Toma dez pedaços, porque as­
sim diz o Senhor Deus de Israel: Eis que rasgarei o
reino da mão de Salomão, e a ti darei dez tribos,
v .32 Porém ele terá uma tribo, por amor de Davi, meu
servo, e por amor de Jerusalém, a cidade que escolhi
de todas as tribos de Israel.
v.33 Porque Salomão me deixou e se encurvou a Asta-
rote, deusa dos sidônios, a Camos, deus de Moabe, e a
Milcom, deus dos filhos de Amom; e não andou nos
meus caminhos, para fazer o que é reto perante mim,
a saber, os meus estatutos, e os meus juízos, como fez
Davi, seu pai.”
Nesta história toda, explicada teologicamente, Jero­
boão e Roboão não passaram de instrumentos de Deus.
Nem um nem outro, nos textos bíblicos a este respeito, leva
a culpa do ocorrido. Jeroboão, recebeu de Deus as tribos do
norte, como castigo para a dinastia davídica, por causa dos
pecados de Salomão, e Roboão, agiu de forma insensata por
influência divina. Assim explica o autor de 1 Reis as atitudes
Panorama Histórico de Israel 75

incoerentes e de verdadeiro “suicídio político” de Roboão,


filho de Salomão, ao deixar de lado os conselhos de seus sá­
bios e seguir os de seus amigos, o que resultou na divisão (1
Rs 12:1-14): “O rei, pois, não deu ouvidos ao povo; porque
este acontecimento vinha do Senhor, para confirmar a pala­
vra que havia dito por intermédio de Aias, o silonita, a Jero­
boão, filho de Nebate” (1 Rs 12:15). Para ele estava
explicado: Deus dividiu o reino, por culpa de Salomão, pela
instrumentalidade de Roboão e Jeroboão.

7.1.2. A Explicação Natural_________________________

Como já foi dito, a explicação natural a respeito de


como aconteceu a divisão do reino não é contraditória à teo­
lógica, uma complementa a outra. Assim como na teológica
se percebe que Salomão foi o culpado pelo cisma, também
na natural chega-se a uma conclusão semelhante. Salomão
levou a nação ao máximo. Ele organizou o Estado de uma
forma que jamais seria superado, mas o povo pagou um alto
preço por estas conquistas e assim que foi possível procura­
ram modificar a situação.
Salomão modificou completamente o sistema que
unia as tribos umas às outras. Elas deixaram de fazer parte de
uma aliança anfictiônica, onde deviam lealdade mútua com
base em um compromisso feito diante de Deus, e passaram a
dever lealdade ao Estado que mantinha, inclusive, o culto
oficial. Foram divididas em doze distritos administrativos,
nem sempre respeitando os territórios das antigas tribos e
assimilando a população cananita, cada um com um gover­
nador (1 Rs 4:7-19). Naturalmente, foram surgindo classes
sociais dentro do novo sistema. Ele acabou por dividir a po­
pulação em proprietários, trabalhadores, assalariados e aris­
tocratas, além de criar na corte uma geração nascida na
riqueza que considerava o povo simples como verdadeiros
76 Antônio Renato Gusso

objetos que poderiam ser manipulados conforme o desejo


dos dominadores.132
Os projetos espetaculares de Salomão que trouxeram
tanto orgulho para a nação, também trouxeram muitas difi­
culdades para aqueles que tinham que pagar a conta. Apesar
de toda a sua genialidade no campo do comércio, as constru­
ções que levou a efeito, a manutenção de seu exército profis­
sional, a burocracia administrativa, os gastos extraordinários
com o culto e a vida de luxo na corte, entre outras despesas,
parece que formavam um conjunto de gastos maior do que a
receita, criando um problema financeiro crônico, o qual pro­
curava amenizar sobrecarregando os súditos com impostos.133
Como apenas os impostos não eram suficientes para
fazer frente aos ambiciosos planos de construção do rei, Sa­
lomão acabou por lançar mão da corvéia, ou seja, obrigou
que pessoas de seu povo trabalhassem gratuitamente para o
Estado. Este expediente era largamente utilizado no mundo
antigo, mas em Israel foi Salomão quem o introduziu. Davi
já havia se utilizado da mão de obra escrava de seus conquis­
tados (2 Sm 12:31), Salomão também se utilizava do traba­
lho da população cananita de seu império (1 Rs 9:20-22),
mas a obrigação estendida aos israelitas, como foi feito (1 Rs
5:13-14), era uma novidade, diga-se de passagem, extrema­
mente desagradável e impopular. A antiga e orgulhosa união
dos clãs havia perdido toda a sua força.134
Este quadro exposto acima deve ter criado um clima
de grande insatisfação em boa parte dos súditos de Salomão.
Até que, em determinado momento, Jeroboão filho de Ne-
bate, um efraimita, incentivado pelas previsões feitas pelo
profeta Aias, que lhe prometia a parte norte do reino para
depois da morte de Salomão, não querendo esperar mais, se

152 B R IG H T, f. H istória de I s m d São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 290-294.


133 Ibid. p. 289-290.
134 Ibid. p. 291-292.
Panorama Histórico de Israel 77

rebela contra o rei. Contudo, Salomão estava muito bem fir­


mado no trono, não seria fácil destituí-lo. Jeroboão precisou
fugir para o Egito, preservando a sua vida, e por lá ficou até
que se apresentassem condições mais favoráveis para a sua
atuação, o que aconteceu no momento da morte de Salo­
mão, o qual foi sucedido pelo insensato e inexperiente Ro­
boão (1 Rs 11:26-40).
Jeroboão foi chamado do Egito por líderes de Israel,
parte norte do reino, e atuou como porta voz destes diante
do rei Roboão. Este fato, por si só, demonstra que Jeroboão
havia ficado conhecido como um líder capaz quando se co­
locou contra Salomão, atitude que lhe rendeu o exílio no
Egito, para evitar a morte, e, ao mesmo tempo, revela a fra­
queza da posição política do novo rei, que se dispôs a nego­
ciar com um perigoso rebelde.135
Pior do que ter que negociar com um rebelde foi a in­
sensatez demonstrada no decorrer das negociações. A situa­
ção era delicada, mas ainda poderia ter um final menos
drástico, se é que as reivindicações eram legítimas e não ape­
nas um artifício para se iniciar a revolta. Jeroboão, em nome
das tribos do norte, estava reivindicando uma diminuição da
carga que Salomão havia imposto sobre os ombros de seus
súditos. As palavras registradas em 1 Reis 12:4 bem demons­
tram a que ponto chegou a tirania de Salomão. Nelas, Jero­
boão diz a Roboão: “teu pai fez pesado o nosso jugo; agora,
pois, alivia tu a dura servidão de teu pai e o seu pesado jugo
que nos impôs, e nós te serviremos”.
Diante de tal pedido, Roboão demonstrou todo o seu
despreparo político. Consultou, em primeiro lugar, a opinião
dos sábios que aconselhavam a Salomão, sem dúvida uma
atitude louvável. Mas, ao invés de seguir os conselhos dados
por eles, que alertavam para a necessidade de ceder um pou­
co naquele momento, ele optou por seguir a opinião de seus
^ IIU B B A RD , JR ., R. L. lu r s t & Seam d K ingr. Chicago : Moody Press, 1991. p. 74.
78 Antônio Renato Gusso

amigos, com os quais havia crescido na opulência, desco­


nhecedores das realidades que envolviam o povo. Com isto,
ameaçou ser mais rígido ainda do que Salomão havia sido,
dando aos líderes das tribos do norte bons motivos para que
prosseguissem com o movimento de separação.

7.2. Como Ficou Dividido o Reino_________________

Roboão não aceitou passivamente a divisão de seu


reino, logo reuniu um grande exército, com soldados das tri­
bos de Judá e de Benjamim, para tentar reaver o seu domí­
nio. Pela narrativa bíblica se percebe que ele só não deu
continuidade a este plano devido aos apelos insistentes de,
um profeta chamado Semaías. A mensagem dele, falando
em nome de Iavé, que evitou o confronto, foi a seguinte:
“Assim diz o Senhor: não subireis, nem pelejareis contra
vossos irmãos, os filhos de Israel; cada um volte para a sua
casa, porque eu é que fiz isto...” (1 Rs 12:24).
Também se pode imaginar que não teria sido pruden­
te da parte de Roboão dar continuidade aos seus planos ain­
da que assim o desejasse. Ele se encontrava enfraquecido
politicamente e em condições inferiores as de seu adversá­
rio,136 uma ação militar naquele momento poderia ter sido o
fim de seu reinado. Não havia mais como evitar: o reino es­
tava dividido! Daqui para a frente, nas narrativas apresenta­
das na Bíblia, geralmente, a não ser que o contexto mostre o
contrário, e em muitas ocasiões o faz, será empregado o
nome de Israel para a parte norte do que era o reino unido e
Judá para a parte sul. Na seqüência serão apresentados maio­
res detalhes de como ficou esta divisão.

CíIBIZRT, P. O s I J r tv s d e S am uele dos Reis: da len dapara a história. São Paulo: lídiçò cs Paulinas, 1987. p. 50.
Panorama Histórico de Israel 79

7.2.1. A Parte Norte

O sistema tribal há muito tempo estava modificado,


com os elementos de umas totalmente integrados em outras
(1 Rs 12:17), contudo, a terminologia tribo continuou a ser
utilizada. Sendo assim, a Bíblia informa que a parte norte,
governada por Jeroboão, ficou composta por dez tribos (1
Rs 11:31). Ela tomou para si o nome de Israel e comumente
é chamada de Reino do Norte na literatura atual que trata das
questões que a envolvem.
Um outro nome dado para o Reino do Norte é
“Efraim”. Este era o nome da tribo de Jeroboão, que liderou
o movimento separatista. Como ela estava localizada próxi­
ma de Benjamim e Judá representava a oposição a estas e,
muitas vezes, seu nome foi utilizado para designar todas as
tribos do norte.137
Inicialmente a capital da parte norte foi estabelecida
em Siquém/ Depois passou para Penuel e, em seguida, para
Tirza.138 Esta permaneceu, nesta condição, por algumas dé­
cadas, até que perdeu a posição para Samaria, a qual foi cons­
truída, como propriedade real, em um local neutro adquirido
por Onri, quinto rei de Israel. Com esta atitude, ele, de forma
semelhante a utilizada por Davi no passado, em relação a Je­
rusalém, abrandou as relações entre israelitas e a parte dos
cananeus que haviam sido incorporados ao seu reino.139
A parte norte, Israel, atuou como uma unidade políti­
ca por mais ou menos duzentos e nove anos, cobrindo o pe­
ríodo que vai, aproximadamente, do ano 931 até 722 a.C.,
quando foi conquistada pela Assíria. Dezenove reis de nove
dinastias diferentes estiveram no poder, o que demonstra a
grande instabilidade política que prevaleceu na maior parte
do tempo de sua existência.
SC H U LTZ , S. J. A H istória de Israel no A ntiga Testamenlo. São Paulo: Edições V ida N ova, 1988. p. 151-152.
jyj. A. H istória de Israel. Rio de Janeiro: Z ahar E ditores, 1967. p. 78.
^ M E TZG E R, M. H istória de Israel. São Leopoldo: E ditora Sinodal, 1972. p. 82-84.
80 Antônio Renato Gusso

7.2.2. A Parte Sul

A parte sul do reino, a que ficou sendo governada por


Roboão, filho de Salomão, tomou para si o nome de Judá.
Inicialmente este nome havia sido utilizado para um dos fi­
lhos de Jacó, depois foi empregado para toda uma tribo for­
mada por descendentes deste personagem e então, quando
da divisão do reino, passou a designar a parte sul do mesmo,
formada pelas tribos de Judá e Benjamim.
Na literatura atual que trata do período da monarquia,
muitas vezes, esta parte sul, o reino de Judá, é chamada de
Reino do Sul, para diferenciá-la da parte norte, Israel, tam­
bém conhecida como Reino do Norte.
Judá se mostrou muito mais estável, politicamente fa­
lando, do que Israel. Em todo o período de sua existência,
como monarquia autônoma, que foi das proximidades do
ano 931 até, mais ou menos, 586 a.C., quando foi totalmente
subjugado pela Babilônia, contou com apenas uma dinastia a
frente do governo. Foram, aproximadamente, 345 anos de
governo exercido ininterruptamente por vinte descendentes
de Davi.
A capital também permaneceu sempre a mesma. Je­
rusalém nunca perdeu esta condição, provavelmente, garan­
tida pela presença do templo e da Arca da Aliança em seu
território, elementos de forte poder de união do povo. Tanto
que foi um fator de preocupação para o rei Jeroboão que, te­
mendo pela diminuição de seu poder, pois havia a possibili­
dade de seus súditos irem à Jerusalém para cultuarem,
providenciou algo semelhante, ainda que inferior, no Reino
do Norte (1 Rs 12:27-29).
Para que se possa gravar melhor como que ficou divi­
dido o reino, a seguir, será apresentado um “quadro explica­
tivo do reino dividido”, resumindo os pontos básicos
referentes à parte norte e à parte sul. Para uma melhor com­
Panorama Histórico de Israel 81

preensão da história posterior a este acontecimento, evitan­


do confusões, inclusive, seria melhor para o estudante ter
estes dados na memória.

7.2.3. Quadro Explicativo do Reino Dividido

AS DUAS APARTE
A PARTE SUL
PARTES NORTE
NOME
Israel Judá
BÍBLICO
NOME
Reino do Norte Reino do Sul
MODERNO
Siquém/Penuel/
CAPITAL Jerusalém
Tirza/Samaria
PRIMEIRO Jeroboão Roboão
REI (930-910 a.C.) (931-913 a.C.)
QUANTIDADE
Nove Uma140
DE DINASTIAS
Vinte: sendo 12 até a
NÚMERO época da queda de
Dezenove
DE REIS Samaria e mais 8 até o
Cativeiro Babilónico
PERÍODO
APROX. DE 931-722 931-586
EXISTÊNCIA
QUANTIDADE
209 345
DEANOS
CONQUISTADOS
Assíria Babilônia
POR
Oséias Zedequias
ÚLTIMO REI
(731-722 a.C.) (597-587 a.C.)

H ouve apenas um a breve interrupção no dom ínio da fam ília de D avi quando A tália, filha de jezabel, no ano
de 841 a.C.> se apossou do trono (2 Rs 11 e 2 Cr 22-23).
82 Antônio Renato Gusso

7.3. Resultados da Divisão

A divisão do reino acabou por trazer várias mudanças


e graves conseqüências para ambas as partes. Não há possi­
bilidade, em um trabalho como este, de se fazer uma análise
pormenorizada de todas as implicações deste fato mas, na
seqüência, serão apresentadas algumas das influências que se
fizeram sentir em duas das áreas de maior importância: a reli­
giosa e a política.

7.3.1. As Conseqüências Religiosas__________________

Logo depois da divisão político territorial acabou por


acontecer, também, uma divisão religiosa, entre Judá e Isra­
el. Jeroboão, rei de Israel, temendo que seus súditos, ao irem
adorar no templo em Jerusalém, fossem influenciados a to­
marem posição ao lado do rei de Judá, providenciou dois
santuários para que rivalizassem com este. Um foi edificado
na cidade de Betei e o outro em Dan (1 Rs 12:26-29).
O temor de Jeroboão não era sem fundamento, de
fato, ao ir adorar em um templo que pertencia oficialmente
ao rei de Judá, onde se pregava que a dinastia de Davi havia
recebido o direito de reinar eternamente sobre todo o Israel
(o conjunto formado por Israel e Judá), o adorador corria o
risco de ser influenciado a deixar de considerar Jeroboão
como um rei legítimo. Portanto, inicialmente, a sua atitude
foi um passo importante para a consolidação de seu reino.
O problema maior na atitude de Jeroboão foi que ele
acabou por instituir um culto nos moldes praticados pelos
cananeus. Ao fazer dois bezerros de ouro e colocá-los nos
locais de culto, ele deu início a um processo de sincretismo
que se tornaria crescente até atingir o auge na época do rei
Acab, principalmente pela influência da rainha Jezabel, prin­
cesa fenícia de Sidom. Com o passar do tempo, estes bezer-
Panorama Histórico de Israel 83

ros que eram símbolos do deus da fertilidade, Baal, passaram


a representar a Iavé,141 indo contra a Lei de Moisés, desfigu­
rando, assim, a religião que haviam recebido dos seus ante­
passados. Inevitavelmente, a partir disto, entraram em um
declínio religioso, e uma confusão tal, que se refletiu de for­
ma negativa em grande parte da população. Muitos, em Isra­
el, sem saber como agir, ainda na época do profeta Elias
estavam indecisos, procurando servir ora a Baal ora a Iavé,
ou aos dois ao mesmo tempo (1 Rs 18:21).

7.3.2. As Conseqüências Políticas____________________

As conseqüências políticas resultantes da divisão, como


não poderiam deixar de ser, foram desastrosas. O império des­
moronou rapidamente. Nem Israel nem Judá, ocupados com
os seus problemas internos, tinham forças ou vontade para evi­
tar a ruína. Os países que antes estavam debaixo do poder do
reino unido, aproveitam a ocasião e vão se tomando indepen­
dentes. Em alguns casos, passaram até mesmo a ser uma amea­
ça para os novos reinos, como aconteceu com Damasco que
colocou em perigo a parte norte de Israel.142
O grande império conquistado a duras penas pelo re
Davi e desenvolvido ao seu potencial máximo, debaixo do
governo do sábio rei Salomão, se desintegrou rapidamente.
Dele restaram duas partes que formaram dois estados de se­
gunda categoria, com pouquíssima influência internacional,
muitas vezes tributários, e em constante perigo de serem in­
vadidos pelas potências da época.
Pode-se presumir, ainda, que a situação econômica
resultante desta divisão política foi catastrófica. O não re­
cebimento dos tributos que os países outrora vassalos lhes
pagavam, a perda do monopólio das rotas comerciais ao longo

l"tl RAVAvSI, G. F. A ntko T esla m n to: in tm iu ^ onc. Italia: A m oldo M ondatori Editore S.p.A., 1993. p. 115-116.
142 B RIG H T, op. a t ., p. 305-306.
84 Antônio Renato Gusso

da costa e através da Transjordânia e as lutas internas, que se


estenderam por muitos anos, devem ter ievado os dois novos
estados a passarem por momentos de grandes dificuldades.143
No próximo capítulo serão abordados de forma mais
específica os dois reinos e seus líderes. Disto poderão surgir
mais alguns esclarecimentos quanto às conseqüências religi­
osas, políticas, econômicas e outras oriundas desta divisão.

7.4. Para Complementar_________________________

7.4.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de 1 Reis 11-12;


b) O Livro de 2 Crônicas 9-11.

7.4.2. Questões Para Revisão________________________

a) Explique se na época de Salomão assumir o reino havia


ou não algum indício de divisão entre Israel e Judá.
b) Qual é a explicação teológica para a divisão do Reino?
c) Qual é a explicação natural para a divisão do reino?
d) Escreva a respeito das conseqüências religiosas oriun­
das da divisão do reino.
e) Escreva a respeito das conseqüências políticas oriundas
da divisão do reino.
f) Como se chama na Bíblia o Reino do Norte?
g) Como se chama na Bíblia o Reino do Sul?
h) Escreva a respeito da estabilidade ou instabilidade polí­
tica em ambos os reinos.

m B R IG H T , op. cit., p. 306-307.


Panorama Histórico de Israel 85

8 . O REINO DE ISRAEL

Ainda que os dois reinos, Israel e Judá, tenham se


desenvolvido lado a lado por um bom período e possuam
muitas coisas em comum, pois eram estados irmãos, oriun­
dos do mesmo núcleo, neste livro, por questão de clareza,
evitando-se quebrar o ritmo da narrativa passando de um
para o outro a cada instante, serão tratados em capítulos di­
ferentes. Aqui será apresentada uma visão geral do que foi o
Reino de Israel, que teve uma história mais breve, e no capí­
tulo seguinte o Reino de Judá, que continuou a existir, como
estado independente, ou semi-independente, pois foi tribu­
tário durante grande parte de seu tempo de existência, por
mais de 130 anos após o desaparecimento de Israel como na­
ção autônoma.
Muitos detalhes precisarão ser omitidos, mas, aqui,
serão apresentadas importantes informações a respeito da
situação política, econômica, social e religiosa do Reino de
Israel, bem como chegou ao seu fim, além de um breve resu­
mo da atuação de seus principais líderes.

8.1. A Situação Política de Israel__________________

Um dos fatores políticos que mais se destaca no Rei­


no de Israel é a instabilidade interna. Só nos primeiros cin­
qüenta anos de sua existência o trono foi tomado pela força
por três vezes. Isto mostra que em Israel não era reconheci­
da a sucessão dinástica. A tradição vinda da época dos juizes,
que requeria do líder dons carismáticos, ainda estava viva,144 e

1,1 BRIG H T, J. H istória de Israel. São Paulo: Hdições Paulinas, 1985. p. 315-316.
86 Antônio Renato Gusso

neste ponto assim permaneceu por muito tempo, tanto é


que nove dinastias se revezaram no poder do Estado duran­
te o seu período histórico.
A estabilidade política para o Reino de Israel só foi
conseguida a partir do reinado de Onri que ocorreu no curto
período que vai do ano 885 a 874 a.C.145 Ele deu início a uma
dinastia que conseguiu se manter no poder até a terceira ge­
ração, o que levou Israel a restaurar suas forças e começar a
trilhar um caminho de prosperidade no exato momento em
que forças externas, como o reino arameu de Damasco, co­
locavam a segurança nacional em perigo. Sua política mode­
lada na de Davi e Salomão que buscava paz interna, relações
amigáveis com Judá e íntimas relações com os fenícios, além
de mão forte contra os arameus, foi continuada por seu filho
Acab, tornando Israel uma nação de certa importância no
cenário internacional, fato este que adiou o seu desapareci­
mento.146
Mais a frente, Jeú, em uma carnificina sem igual, aca­
bou com a dinastia de Onri, e sua própria dinastia ocupou o
trono por quase um século, período nunca igualado por ou­
tra em Israel. O golpe de estado praticado por ele levou Isra­
el a uma situação difícil, perdendo, inclusive, por esta
ocasião, território para seus vizinhos agressivos. A nação foi
restabelecendo-se aos poucos e durante o reinado do quarto
monarca desta dinastia atingiu o seu auge. Jeroboão II foi o
autor desta proeza. Ele conseguiu levar a nação a gozar de
grande prestígio internacional e a uma época de prosperida­
de sem igual, desde os dias de Davi e Salomão. Contudo, cer­
ca de três décadas depois, toda esta pompa seria levada ao
esquecimento pela ação da Assíria que avançava cada vez
mais.147

^ S C H U L T Z , |. S. A H istória de Isra el no Atiiigo'l'e<Uimento. São Paulo: Hdiçõe.s Vida N ova, 1988. p. 150,169.
146 B R IG H T, op. cit., p. 318-323.
1^7 SCMU1.T'/, |. S. A H istória de Isra el no A n tigpT eshm en to. São Paulo: Kdições Vida N ova, 1988. p. 185-188.
Panorama Histórico de Israel 87

8.2. A Situação Econômica e Social de Israel________

Não é fácil descrever a situação econômica e social


de Israel, como um todo, sem apresentá-la fase por fase. As
condições variavam de acordo com as tendências políticas
do momento e, sendo assim, uma hora estavam bem en­
quanto em outra, não muito depois, estavam em sérias difi­
culdades. Seja como for, aqui serão apresentados alguns
exemplos tirados dos momentos de prosperidade da nação,
a época da dinastia de Onri e a do reinado de Jeroboão II.
No restante do tempo, quando Israel se encontrava em séri­
as dificuldades internas ou externas, as condições econômi­
cas e sociais, naturalmente, também eram difíceis.
As evidências são claras em apresentar o reinado da
família de Onri como um período de prosperidade para Isra­
el. A construção da cidade de Samaria é um dos principais
testemunhos deste fato. A arqueologia tem demonstrado
que esta cidade, iniciada por Onri e concluída por Acab, pos­
suía fortificações excelentes, sem paralelo na região. Tam­
bém é notório que o progresso não se limitou à Samaria.
Outras cidades-chave receberam atenção semelhante e ar­
mas ofensivas foram aperfeiçoadas. Dentre elas se destaca a
força composta por carros e cavalos para combate. Em Me-
gido foram encontrados estábulos que, de início, se pensou
haverem pertencidos ao rei Salomão, mas que agora se sabe
são do século IX, com capacidade de abrigar cerca de 450 cava­
los, o que demonstra vim poder considerável para a época.148
Estas evidências de riqueza e força, contudo, não in­
dicam que todos em Israel tinham vida confortável. Os tex­
tos dos Livros dos Reis parecem mostrar que a situação das
pessoas comuns do povo não era das melhores. Os pobres
surgem como vítimas de um sistema grosseiro que os colo­
cava à mercê dos ricos. Em determinadas ocasiões eram
' IB URIGHT, op. c it, p. 323-324.
88 Antônio Renato Gusso

obrigados a tomar empréstimos a taxas elevadas o que aca­


bava por comprometer as suas terras os seus filhos e os seus
próprios direitos de liberdade, podendo o devedor até se
tornar escravo do credor (2 Rs 4:1).
O início do século VIII foi difícil para Israel. Depois
do período próspero da dinastia de Onri as dificuldades vol­
taram e foram se agravando até chegarem ao ponto de levar
Israel a pagar tributo para a Assíria, para que pudessem se li­
vrar da pressão dos arameus de Damasco, que não lhes da­
vam descanso. A prosperidade acabou por chegar no
reinado de Jeroboão II. O comércio com os fenícios aumen­
tou sensivelmente as riquezas da nação, contudo, foram di­
vididas de forma muito desigual, o que gerou fortes
protestos por parte dos profetas, principalmente de
Amós.150
Mais uma vez a nação estava bem em termos de eco­
nomia estatal enquanto grande parte da população passava
necessidades e era explorada pelos mais ricos. Os ricos ti­
nham condições de possuir diversas casas (Am 3:15), se inte­
ressavam por móveis caros (Am 6:4), e gozavam a vida em
prazeres físicos (Am 3:12, 4:1, 6:6), enquanto os pobres
eram extorquidos desavergonhadamente, e desconsiderados
pelos administradores da lei (Am 5:10,12) sempre se saiam
mal.151 Não foi por pouco que a ênfase da mensagem de
Amós, um dos profetas desta época, foi a justiça social. Ela
estava esquecida nesta fase da história de Israel.

8.3. A Situação Religiosa de Israel_________________

A situação religiosa de Israel não poderia ser pior.


Aquilo que começou como um expediente político por parte

l _J Ibid. p. 324-325
ASU RM K N D I, ). A m ó seO sêia s. São Paulo: Hdições Paulinas, 1992. p. 7.
^ M O TYE R, I- A. A M ensagem àe Amós. Sao Paulo: ABU Editora, 1991. p. 1.
Panorama Histórico de Israel 89

de Jeroboão, quando da divisão do reino, para evitar que


seus súditos tornassem a servir a casa de Davi, evoluiu para
um culto altamente sincretista e idólatra, que tinha pouquís­
sima relação com a religião oficial praticada na época do rei­
no unido.
Como já foi mencionado neste trabalho, a crise religi­
osa chegou ao seu ponto máximo durante o reinado de Acab
(874-853 a.C.). Este havia se casado com Jezabel, filha de
Etbaal, rei dos sidônios, a qual se mostrou uma adoradora e
divulgadora incansável de Aserá e, principalmente, do deus
Baal Melcart. Ela conseguiu que fosse construído um tem­
plo para Baal na capital do reino, Samaria, e sustentou cente­
nas de profetas com os recursos do governo, para que estes
estivessem trabalhando entre o povo.152 Com estas e outras
atitudes procurou, claramente, estabelecer a adoração a Baal
como religião oficial do estado, desprezando completamen­
te a tradição espiritual de sua pátria adotiva.153
Durante este período a religião de Iavé correu o risco
de desaparecer do Reino de Israel. Ainda que Acab perma­
necesse nominalmente como adorador de Iavé, ele permitiu
que Jezabel levasse a efeito uma terrível campanha de perse­
guição e extermínio contra aqueles que se opunham à sua
política religiosa. Isto de forma obvia, colocou em risco to­
dos os verdadeiros seguidores de Iavé, que não poderiam
concordar com o culto rival, e levou os seguidores não tão
fervorosos a mudarem o alvo de sua adoração.
De forma especial a ira da rainha se voltou contra os
profetas de Iavé. Ou eles passavam para o seu lado, pregan­
do apenas o que a realeza queria ouvir, ou eram mortos sem
piedade, se não se escondessem para escapar de seu furor
(1 Rs 18:4). A situação chegou a tal ponto que o profeta Eli­
as, desanimado, diante das evidências, concluiu que estava
1.2 SC H U LTZ , np. cit., p. 1(19-170.
1.3 B R IG H T, op. cit., p.325-326.
90 Antônio Renato Gusso

só na tarefa de oposição a este culto. Ele fornece um resumo


sombrio da situação religiosa da época quando declara em
1 Rs 19:10: “...Tenho sido zeloso pelo Senhor, Deus dos
Exércitos, porque os filhos de Israel deixaram a tua aliança,
derribaram os teus altares, e mataram os teus profetas à es­
pada; e eu fiquei só, e procuram tirar-me a vida.”
Parecia ser o fim da religião de Iavé e a consagração
total de Baal em Israel, mas nem tudo estava definido. Jeú,
mais tarde, com um golpe-de-estado, conseguiu tomar o po­
der e eliminar Jezabel juntamente com todos os membros da
família real e aqueles que tinham relações com a côrte. Além
disso, destruiu o templo de Baal e assassinou a todos os seus
profetas, devolvendo, com isto, a posição de Deus de Israel
para Iavé.154 Contudo, o culto continuou a ser prestado de
forma irregular. O estrago estava feito e suas conseqüências
seriam notadas até o final do reino. O sincretismo e o paga­
nismo não mais deixariam a religião de Iavé em Israel, que
voltou a florescer, porém, fora do padrão original. Basta ler
o Livro de Amós para se perceber o quão longe dos precei­
tos da Aliança estava o culto de sua época, com a ênfase no
ritual, dissociado da vida moral e justiça social, e no Livro de
Oséias, para perceber que o povo estava tão confuso, em seu
sincretismo, que chegava a chamar Iavé pelo nome de Baal
(Os 2:16).

8.4. O Fim do Estado de Israel____________________


Logo depois da morte dejeroboão II, em 753 a.C., Is­
rael, entrou em uma fase de decadência que o levaria ao fim.
A rápida e violenta sucessão de seis reis em um breve espaço
de tempo, cerca de trinta anos, já aponta para o desespero da
situação interna da nação. Para piorar ainda mais, no cenário
internacional, a Assíria estava estendendo os seus domínios
154 BRIG H T, op. cit., p. 333-334.
Panorama Histórico de Israel 91

e tinha grande interesse em toda a região da Síria, vizinha que


estava situada próxima, ao norte de Israel, Canaã e Egito.
Não demorou muito e Tiglate-Pileser III, também
conhecido como Pul, em uma campanha que se desenrolou
de 743-738 a.C.,155impôs tributos a vários estados destaregi-
ão, incluindo Hamat, Tiro, Biblos, Damasco e Israel. Em sua
política expansionista, no que foi seguido por seus sucesso­
res, não se contentava em apenas receber tributos, este era o
primeiro passo para uma conquista total e definitiva. Assim
que houvesse qualquer esboço de reação por parte dos tribu­
tários, ele reprimia prontamente, deportando os culpados e
anexando suas terras às províncias do império.156
Quando o poderoso Tiglate-Pileser III faleceu, em
727 a.C., o rei Oséias de Israel, pensando que o sucessor do
trono imperial, Salmanaser V, não teria capacidade para
manter os seus domínios, e confiando no apoio do Egito, o
qual não era suficiente, se rebelou e deixou de pagar os tribu­
tos exigidos. Foi um erro fatal! Salmanaser V tomou provi­
dências imediatas e marchou com seus exércitos contra
Samaria. A cidade resistiu ao assédio por três anos, mas não
tinha como se salvar e acabou capitulando.157
Alguns têm atribuído a conquista de Samaria a Sargão
II,158 mas, ainda que ele se vanglorie várias vezes de ter exe­
cutado este ato, a Bíblia está correta em afirmar que Salma­
naser foi o autor deste feito. Sargão II, logo após se apoderar
do trono da Assíria, por ocasião da morte de Salmanaser V,
apenas regularizou a situação da cidade de Samaria como
uma província do império, debaixo da direção de um gover­
nador assírio.159
Nesta ocasião, final do verão ou outono de 722/721
a.C., Israel deixou de existir como nação independente. Mais
SC H U LTZ , op. cit., p. 189.
156B R IG !JT ,o p . cit., p. 362.
157 S C H U l.T Z .o p . cit., p. 190-191.
1^ Mi n ZGKR, M. A H istória de Israel. São Leopoldo: iidito ra Sinodal, 1972. P. 101.
1,5 BR1G IÍT, op. cit., p. 368-369.
92 Antônio Renato Gusso

tarde, muitos cidadãos de Samaria foram deportados para


outras partes do Império Assírio, na Alta Mesopotâmia e
Média, ao mesmo tempo em que pessoas de outras regiões
conquistadas foram levadas para a região de Samaria. Disto
resultou uma mistura muito grande de povos, costumes e re­
ligiões que, em conjunto com os restantes de Israel, mais tar­
de, vieram a dar origem aos conhecidos samaritanos.160

8.5. Os Principais Líderes de Israel________________

Não foi possível, nas linhas anteriores, ao ser apre­


sentada a trajetória de Israel, falar algo a respeito de vários
dos líderes que estiveram atuando no período. Por isso, nes­
te ponto, quase como um apêndice ao capítulo, mas fazendo
parte dele, com o objetivo de dar uma visão mais ampla do
que aconteceu, e providenciar informações para futuras pes­
quisas, será apresentado um resumo que mostra os princi­
pais profetas e os reis da nação.

8.5.1. Os Profetas de Israel__________________________

Os profetas não são exclusivos do meio de Israel e


Judá, ou da religião de Iavé. Na verdade, é algo comum en­
tre, praticamente, todos os povos do Antigo Oriente Médio.
Só no Egito ainda não foi confirmado de todo esta prática.
Semelhante aos profetas de Iavé, também os profetas dos
deuses entravam em êxtase, procuravam prever o futuro e
levavam mensagens de exortação ao povo e aos governan-
tes. 161
Em Israel, ao lado de grande número de profetas pro­
fissionais que estavam ligados ao culto ou a serviço de algum
rei, haviam os profetas individuais. Estes eram em pequeno
160 ibid.
pO H R E R , G. H istória àa R eligião fie Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 273-279.
Panorama Histórico de Israel 93

número, mas, com o passar do tempo, foram reconhecidos


como aqueles que estavam certos. Eles falavam em nome de
Iavé e estavam comprometidos única e exclusivamente com
Ele.162 Alguns destes é que serão apresentados aqui.
1 - Aias; Conhecido como o silonita, morador de Silo,
Profetizou que o reino seria dividido em dois, depois da mor­
te de Salomão, ficando dez tribos debaixo do poder de Jero-
boão (1 Rs 11:26-40). Mais tarde, já no final de sua vida, previu
a morte do filho de Jeroboão, o desaparecimento de sua di­
nastia e a futura destruição do Estado de Israel (1 Rs 14:1-19).
2 - Elias: O ministério de Elias está registrado em
1 Rs 17-19, 21 e 2 Rs 1,2. Seu nome significa “Iavé é Deus”,
o que bem descreve a sua função de mostrar ao povo de Israel,
confuso com o culto a Baal, praticado e imposto pela mo­
narquia, principalmente por Jezabel, quem era o Deus verda­
deiro. Ele atuou, no século IX a.C., na época dos reis Acabe
e Acasias e deve ter sido transladado em época próxima a da
ascensão de Jeorão ao trono de Israel. Ele seguia a tradição
da profecia de êxtase que vinha desde a época de Samuel e,
ao que parece, estava de certa forma ligado ao movimento
das escolas de profetas que continuavam a existir em sua
época (2 Rs 2:3-7).163
3 - Eliseu: Filho de um homem de boas posses cha­
mado Safate, foi servo e sucessor do profeta Elias no século
IX a.C. Seu nome significa “Deus é Salvação” e, provavel­
mente, era natural de Abel-meolá. Seu ministério, levado a
frente das escolas de profetas, foi marcado por sinais e mara­
vilhas e, se contado desde a sua chamada, se desenvolveu
durante os reinados de Acabe, Acazias, Jeorão, Jeú, Jeoacaz
e Joás em um período que cobre mais de cinqüenta anos. As
narrativas a respeito de suas ações se encontram em 1 Rs 19
e 2 Rs 2-9.164
162 Ibid. p. 291.
^ SM IT II, B. L. Mlias. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 491-493.
SM ITI I, B. I,. }LHsett. São Paulo: Kdíções Vida N ova, 1983. p. 494-496.
94 Antônio Renato Guaso

4 - Micaías: Profetizou a morte de Acabe em bata­


lha, quando este, juntamente com Josafá, rei de Judá, le­
varam a efeito uma campanha militar em Ramote-Gileade.
Ele fez isto contrariando as previsões de vários outros
profetas que afirmavam ser a vitória garantida (1 Rs 22:5-28
e 2 Cr 18:4-27).
5 - Tonas: Só existe uma referência no Antigo Testa­
mento sobre este profeta, fora do livro que leva o seu nome.
Ela se encontra no Segundo Livro dos Reis 14:25. Era filho
de Amitai, originário de Gate-Hefer, cidade da Galiléia, e
profetizou a respeito das ações bem sucedidas do rei Jerobo-
ão II. O livro com o seu nome possui várias evidências de
que foi escrito por outra pessoa e não por ele mesmo, em
época posterior.165 Seu nome significa “Pomba”.
6 - Amós: O que se sabe deste profeta originário de
Judá mas que exerceu seu ministério profético em Israel está
no livro que leva seu nome. Ele pregou em época de prospe­
ridade material, provavelmente entre 760-750 a.C., próximo
ao final do reinado de Jeroboão II,166 e criticou duramente o
culto que se praticava desvinculado dos preceitos da Aliança,
reprovando, principalmente, a injustiça social que imperava.
Seu nome tem o significado de “Sustentado”, e ele vivia em
uma cidade do Reino do Sul chamada Tecoa, onde exercia as
funções de criador de gado e cultivador de sicômoros.167 Foi
expulso de Israel, por causa de suas mensagens que estavam
contra os interesses do governo, e deve ter voltado para sua
terra onde não se tem notícias que tenha profetizado.
7 - Oséias: Pouco se sabe a respeito do profeta
Oséias. Seu nome é uma variante da forma Josué e tem o su­
gestivo significado de “Iavé Salva”,168 ou “Salvação”.169 Seu
pai se chamava Beeri, sua esposa Gomer e seus filhos:
FRAN CISCO , C. T. Introdução a o A ntigo Testamento. Rio dc Janeiro: JU E R P, 1979. p. 123.
SliL Í.ÍN , R. Introdução a o A nrigoT estam ento. São Paulo: lidiçõ es Paulinas, 1978. p.652.
167 FRAN C ISC O , op. cit. p.127.
í68 H U BBARD , D. A. O séias: introdução e comentário. São Paulo: Kdições Vida N ova, 1993. p. 64.
ARCM BR, Jr., M erece C.onjiança o A ntigo í estam ento?. São Paulo: Iidiçõcs Vida N ova, 1986. p. 252.
Panorama Histórico de Israel 95

Jezreel, Lo-Ruamá e Lo-Ami, isto se os nomes que estão re­


gistrados no livro bíblico que traz o seu nome não forem
apenas simbólicos. Ele deve ter começado a profetizar em
condições bastante semelhantes às enfrentadas por Amós,
um pouco antes ou um pouco depois do final do ministério
deste,170 e deve ter prosseguido até bem próximo da queda
de Samaria em 722/721 a.C.171
8 - Oded: Repreendeu o exército de Israel, na época
do rei Peca, quando este levou prisioneiros de Judá para a ci­
dade de Samaria. Foi atendido, e os prisioneiros foram trata­
dos, vestidos, alimentados e libertados (2 Cr 28:1-15).

8.5.2. Os Reis de Israel_____________________________

Como são muitos os reis de Israel e o objetivo deste


livro não é se alongar em detalhes a respeito dos mesmos,
aqui serão apresentados alguns pontos essencialmente bási­
cos sobre eles, como: nomes, descendência, tempo de reina­
do (baseado na cronologia proposta por Beek)172, um ou
outro feito e os principais textos bíblicos em que aparecem.
A intenção é fornecer subsídios para futuras pesquisas e dar
uma visão geral de quem foram eles, indo um pouco além de
um simples quadro.
1 - Jeroboão (931-910 a.C.): (1 Rs 12-14) - Foi o pri­
meiro rei de Israel. Era filho de um homem chamado Neba-
te. Havia sido servo de Salomão e assumiu o reino logo após
a morte deste, quando dividiu o reino que esteve unido sob o
poder de Davi e Salomão, com Roboão, que ficou sendo o
primeiro rei de Judá. Seu nome provavelmente signifique “O
Povo Aumenta”. Ele edificou santuários em Dã e Betei, para
rivalizarem com o templo de Jerusalém, onde colocou dois

CR A BT RE E , A. R. O U r ro de Oséias. Rio dc Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1961. p .l 1.


H U BBA RD , D. A. O séias: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1993. p. 25.
^ BEEK , M. A. H istória de Israel. R io de Janeiro: Z ahar Editores, 1967. p. 80-112.
96 Antônio Renato Gusso

bezerros de ouro. Com isto, acabou por incentivar a idolatria


e o sincretismo religioso em Israel.173
2 - Nadabe (910-909 sl.C .Y . (1 Rs 14:20 e 15:25-28) -
Era filho de Jeroboão. Seu nome significa “Generoso” ou
“Nobre”. Reinou por apenas dois anos e foi assassinado por
Baasa, quando participava de uma campanha contra Gibe-
tom, que pertencia aos filisteus.174
3 - Baasa (909-886 a.C/l: (1 Rs 15:27-16:7) - Seu pai
se chamava Aias e era de família humilde. Exterminou os
descendentes de Jeroboão, esteve durante todo o seu reina­
do em atrito com o Reino de Judá, e deu prosseguimento à
política religiosa implantada por Jeroboão.175
4 - Elá (886-885 a.C.^: (1 Rs 16:8-14) - Seu nome si­
gnifica “Terebinto”.176 Chegou ao trono sucedendo seu pai
Baasa e reinou menos de dois anos. Quando se encontrava
embriagado na casa de seu mordomo, Arsa, foi assassinado
por Zinri, comandante da metade dos carros de guerra de Is­
rael, que passou a reinar em seu lugar.
5 -Zinri (885 a.C/>: (1 Rs 16:8-20) - Reinou, se assim
se pode dizer, por apenas sete dias. Assumiu o poder assassi­
nando o rei Elá e todos os descendentes de Baasa. Quando
percebeu que o golpe de estado tinha sido frustrado, pois
Onri, o comandante do exército, também foi feito rei assim
que recebeu a notícia da morte de Elá, depois de cercado em
Tirza, se fechou em um palácio e o queimou sobre si, mor­
rendo no incêndio.
6 - Onri (885-874 a .O : (1 Rs 16:15-28) - Ainda que
a Bíblia dedique a ele tão poucos versículos, foi um dos prin­
cipais reis de Israel, estabelecendo a dinastia de maior influ­
ência. Ele construiu a capital Samaria e levou Israel a ter um
bom relacionamento internacional. Firmou alianças com a

H U B B A RD , D. A. Jeroboão. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 803.


174 D O U G LA S, J. D. N adabe. São Paulo: Ediçõe.s V ida N ova, 1983. p. 1092.
W A IT E , J. C. J. Baasa. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 177.
17í* D O U G LA S, ]. D. E/a. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 484.
Panorama Histórico de Israel 97

Fenícia, deve ter conseguido algum contato com a Assíria, o


que lhe garantiu a não agressão por parte da Síria, subjugou
Moab e viveu em paz com Judá. Seu reinado foi uma época
de prosperidade material acompanhada por decadência reli­
giosa.177
7 - Acab (874-853 a.C/): (1 Rs 16:29-22:40) - Seu
nome significa “O Irmão é Pai”. Era filho de Omri, a quem
sucedeu no trono de Israel, e foi casado com Jezabel, filha
de Etbaal, rei de Sidom. Manteve relações amistosas com
Judá e morreu em batalha contra a Síria. Durante seu reina­
do, por influência de Jezabel, que procurou impor a adora­
ção a Baal, a religião de Iavé esteve perto de ser banida do
país. O profeta Elias, que atuou neste período, foi o grande
opositor à sua política religiosa.178
8 - Acazias (853-852 a.Q: (1 Rs 22:52-2 Rs 1:18) -
Era filho e sucessor do rei Acabe. Ainda que traga em seu
nome, que significa “Iavé Agarrou”, lembranças da religião
original de Israel, provavelmente influenciado por sua mãe
Jezabel, era adorador de Baal. Durante seu breve reinado
teve que amargar a rebelião de Moabe (2 Rs 1:1) e um fracas­
sado projeto marítimo em conjunto comjosafá, rei de Judá
(2 Cr 20:35-37). Acabou morrendo em conseqüência dos fe­
rimentos que sofreu quando caiu pelas grades de um quarto
alto na cidade de Samaria.179
9 - Torão (852-841 a.C.): (2Rs 1:17-9:29) - Seunome
significa “Iavé é Exaltado”. O relato de sua história, na Bí­
blia, esta misturado com histórias a respeito do profeta Eli-
seu. Ele também era filho de Acabe e Jezabel e foi sucessor
de seu irmão Acasias porque este morreu sem ter filhos.180
Acabou sendo assassinado por Jeú que, por ordem do profe­
ta Eliseu, havia sido ungido rei sobre Israel.
177 S C H U i;rZ , op. cit., p. 167-169.
W ISK M AN , D. I. A cabe. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. n. 25-26.
170 ' .
W A IT H J. C. J. A ca ba s. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 28.
W A IT E .J. C. J. Jorõo. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 858-859.
98 Antônio Renato Gusao

10 - Teú (841-814 a.C.): (2 Rs 9-10) - Seu nome tem


significado incerto, possivelmente se trate de uma abrevia­
ção que pode ser traduzida como “Iavé é Ele”. Ele era cha­
mado de filho de Ninsi, que era de fato seu avô. Seu pai se
chamava Josafá. Ele foi o fundador da mais duradoura di­
nastia de Israel. Assassinou o rei Jorão para assumir o seu lu­
gar e promoveu uma onda de massacres em Israel para
firmar o seu reino. Mandou matar Jezabel e a todos os profe­
tas de Baal. Foi pressionado pela Síria e, a partir das poucas
informações extra bíblicas a respeito de sua pessoa, deduz-se
que tenha se submetido a Salmanaser III para garantir o
apoio da Assíria contra este país vizinho (Síria) e seu rei Ha-
zael.181
11 - Jeoacaz (814-798 a.C.^: (2 Rs 13:1-9) - Seu nome
significa “Iavé Tem Segurado”. Assumiu o governo no lugar
de seu pai Jeú e administrou com muita dificuldade.182 Foi
duramente oprimido pela Síria a ponto de lhe restarem, em
seu exército, apenas, cinqüenta cavaleiros, dez carros de
combate e dez mil soldados de infantaria.
12 - Teoás (Toás) (797-782 a.C.): (2 Rs 13:10-14:15) -
Era filho de Jeoacaz a quem sucedeu no trono. Aproveitou a
fase de decadência pela qual passava a Síria para estabilizar o
seu governo e fazer uma boa administração. Levou a efeito
uma campanha contra Judá, aceitando um desafio do rei
Amazias, da qual saiu vitorioso. Saqueou Jerusalém, o tem­
plo e os tesouros reais de Judá e os levou, juntamente com
alguns cativos, para a cidade de Samaria.183
13 - Teroboão II (781-753 a.C/>: (2 Rs 14:23-29) -
Foi um dos mais notáveis governantes de Israel. Reinou por
quarenta e um anos, sendo doze destes em co-regência com
seu pai Jeoás, e conseguiu levar Israel a gozar de uma pros-

181 W A IT E , J . C. J. Jm . São Paulo: Edições Vida Nova, 1983. p. 824-825.


182 W A IT E , J. C. J. Jeoa ca z Sâo P!lulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 792.
183 D O U G LA S, J. D. Joãs. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 847.
Panorama Histórico de Israel 99

peridade nunca vista desde os tempos de Salomão. Com a


prosperidade veio a imoralidade, a injustiça social e o culto
desvinculado dos preceitos da Aliança, o que levou Amós e,
mais tarde, Oséias a pregarem contra esta situação.184
14 - Zacarias (753-752 a.C/); (2 Rs 15:8-12) - Assu­
miu o reino em lugar de seu pai, Jeroboão II, e conseguiu rei­
nar por apenas seis meses, pois foi assassinado por Salum
filho de Jabes. Ele foi o último governante da dinastia de Jeú.185
15 - Salum (752 a.C^: (2 Rs 15:10-15) - Dele foi o
segundo mais breve reinado em Israel.186 Depois de assassi­
nar Zacarias e tomar o seu lugar, só conseguiu ficar no poder
durante um mês. Foi assassinado por Menaém, filho de
Gade, que tomou o seu lugar no trono.
16 - Menaém (752-742 a.C/l: (2 Rs 15:13-22) - Seu
nome significa “Consolador”. Era um militar que chegou ao
trono matando o usurpador Salum. Para fortalecer sua posi­
ção no governo acabou pagando tributo para a Assíria que
estava sendo governada na época pelo poderoso Tiglate-Pi-
leser III).187
17 - Pecaías (741-740 a.C/>: (2 Rs 15:22-26) - Reinou
como sucessor de seu pai Menaém. Foi assassinado no se­
gundo ano de seu governo por Peca, comandante de seu
exército. Ao que parece esteve, assim como seu pai, debaixo
do poder da Assíria durante todo o seu reinado. O seu nome
significa “Iavé Abriu”.188
18 - Peca (739-732 a.C/1: (2 Rs 15:23-16:9) - Seu
nome significa “Abertura”. Ele era filho de um homem cha­
mado Remalias e assumiu o governo no lugar de Pecaías, a
quem assassinou. Se aliou a Rezim, rei da Síria, para fazer
frente ao poder Assírio. Juntamente com seu colega da Síria

184 SC IIU LT Z , OP. CIT., p. 187-188.


m Ibtd. p. 188.
1K6 Ibid.
^ D O U G LAS, ]. D. M enaêm. São Paulo: Kdições Vida N ova, 1983. p. 1024-1025.
^ M ILLARD , A. R. Pecaias. São Paulo: Hdições Vida N ova, 1983. p. 1239.
100 Antônio Renato Gusso

procurou, em vão, forçar os reis de Judá, Jotão e seu suces­


sor Acaz, a fazerem parte da aliança. Teve o país invadido
pela Assíria, ocasião em que cedeu mais da metade da nação,
e logo depois, foi assassinado por Oséias filho de Elá, prova­
velmente com o apoio de Tiglate-Pileser que tinha interesse
em ter um aliado no governo de Israel.189
19 - Oséias (731-723 a.C/>: (2 Rs 15:30,17:1-6) - Foi
o último rei de Israel. Subiu ao poder, assassinando Peca,
com o apoio da Assíria mas, quando da morte de Tiglate-Pi­
leser, procurou, com o apoio do Egito, se livrar da carga de
tributos que tinha de pagar. Em sua época, Salmaneser V,
sucessor de Tiglate-Pileser, não querendo perder sua posses­
são, invadiu Israel, cercou Samaria por três anos e acabou
com o Estado de Israel que foi incorporado ao Império As­
sírio.190

189 W ISE M A N , D. J. Pica. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 1234.
190 SC H U LTZ , op. cit., p. 190-191.
Panorama Histórico de Israel 101

8.6. Para Complementar________________________

8.6.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de 1 Reis 12-22;


b) O Livro de 2 Reis 1-17;
c) O Livro de 2 Crônicas 10,13,16-18, 25;
d) O Livro de Amós;
e) O Livro de Oséias.

8.6.2. Questões Para Revisão_______________________

a) Por que provável motivo, no início de Israel, o trono


era tomado à força?
b) Escreva algumas linhas a respeito do reinado de Onri.
c) Quem exterminou com a dinastia de Onri e por quanto
tempo durou a dinastia que a sucedeu?
d) Apresente um breve resumo do reinado de Jeroboão
II.
e) Escreva a respeito da situação econômica de Israel.
f) Escreva a respeito da situação religiosa de Israel.
g) Como aconteceu o desaparecimento do estado de Israel?
h) Cite o nome de quatro dos profetas de Israel.
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 103

9. O REINO DE JUDÁ
No capítulo anterior foi apresentada uma visão geral
da trajetória do Reino do Norte, chamado Israel, desde o seu
início, quando da divisão do reino que havia sido governado
por Salomão (931 a.C.), até o seu final, como estado, quando
foi anexado ao Império Assírio (722 a.C.). Neste, de forma
semelhante, será apresentada a trajetória da outra parte do
reino dividido, o Reino do Sul, conhecido na Bíblia como
Judá.
Sendo assim, seguindo o mesmo esquema do capítulo
anterior, mas abrangendo um período maior, que vai da divi­
são do reino (931 a.C.) até o fim do Estado de Judá (586
a.C.), quando passaram a fazer parte do Império Babilónico,
aqui serão analisadas: a situação política, a situação econômi­
ca e social, e a situação religiosa de Judá. Além disto, será vis­
to como foi que Judá chegou ao fim e apresentado um
resumo da atuação de seus principais líderes, alguns de seus
profetas de mais destaque e todos os seus reis.

9.1. A Situação Política de Judá___________________

Judá, assim como Israel, com a divisão do reino, se


tornou um estado relativamente fraco e logo despertou o de­
sejo de governantes estrangeiros ávidos por maiores con­
quistas. Susac, rei do Egito, que já estava envolvido
indiretamente com a divisão entre Israel e Judá, pois havia
hospedado a Jeroboão quando este precisou fugir de Salo­
mão por ocasião da primeira tentativa de se apoderar do rei­
no, não esperou muito para tirar vantagens da nova situação.
Ele invadiu os domínios de Judá e, ainda que pelo relato bí­
104 Antônio Renato Gusso

blico se tenha a impressão de que o ataque foi dirigido so­


mente à Jerusalém e que Roboão evitou maiores estragos
pagando um pesado tributo, segundo o próprio relato de Su-
sac, confirmado por evidências arqueológicas, nesta ocasião,
foram tomadas mais de 150 localidades do novo reino. O es­
trago só não foi maior porque Susac, com problemas inter­
nos no Egito, precisou abandonar as suas conquistas.191
Isto era apenas o início das dificuldades com potên­
cias estrangeiras. Com o passar dos anos, o perigo de serem
obrigados a se submeter a esta ou aquela nação, através de
acordos defensivos, pagamento de tributos e mesmo depen­
dência plena, seria constante. Tanto o Egito, quanto a Síria, a
Assíria e a Babilônia viriam, em épocas diferentes, tirar van­
tagens da fraqueza de Judá.
O relacionamento político com Israel, o Reino do
Norte, foi instável. Em alguns momentos lutaram entre si,
em outros fizeram alianças e combateram inimigos comuns,
além de desenvolverem projetos comerciais em conjunto.
Na época do rei Jorão, de Israel, os reinos estavam tão ache­
gados que Jeorão, filho de Josafá, rei de Judá, recebeu Atáüa,
filha ou irmã de Acabe, como esposa (2 Rs 8:18,26, 2 Cr 21:6;
22:2)192. No geral, ainda que as duas nações possuíssem mui­
tas diferenças, elas eram tratadas como irmãs e, como é pos­
sível notar pela atuação e pregação de alguns profetas, a
separação entre elas era parcial. Ezequiel, mais ou menos
cento e trinta anos depois que Israel havia deixado de existir
como Estado, ainda chamava sua capital, Samaria, de irmã
de Jerusalém, capital de Judá (Ez 23).
Quanto à política interna no Reino de Judá, ainda que
tenha enfrentado turbulências diversas, pode-se afirmar que
foi desenvolvida de uma forma muito mais tranqüila do que
a praticada em Israel. Em Israel, ao que parece, havia uma di­

B R K iI íT , f, H istória de Isra el São Paulo: fidiçõcs Paulmas, 1985. p. 308-310.


192 lillIG H T , op. eu., p. 320-321.
Panorama H istórico de Israel 105

ficuldade muito grande em se aceitar o princípio da sucessão


dinástica natural, a qual foi interrompida por várias vezes.
Isto colocava os governantes em constante perigo e alerta,
pois poderiam, a qualquer momento, ser substituídos por al­
gum revolucionário aventureiro. Em Judá não havia este
problema. Era de aceitação, aparentemente geral, que o tro­
no pertencia à família de Davi, fato este que proporcionava
uma certa estabilidade, não dando oportunidade para que
surgissem outros pretendentes ao governo. Na realidade, a
sucessão dinástica só foi quebrada uma vez, e por poucos
anos, quando Atália, esposa estrangeira de Jeorão, depois da
morte do rei Acazias, seu filho, matando a quase todos os
herdeiros naturais, assumiu a liderança da nação (2 Cr
22:7-12).

9.2. A Situação Econômica e Social de Judá_________

A situação econômica no Reino de Judá teve suas fa­


ses fortes e fracas. Não há dúvidas que no início do novo es­
tado, depois de Roboão ter sido obrigado a pagar um pesado
tributo ao Egito, o país tenha passado por um grave proble­
ma econômico e ficado em posição de inferioridade materi­
al em relação ao Reino de Israel. Na opinião de Ellison,
evidências sugerem que Judá precisava de Israel prospero
para que também gozasse de prosperidade.193 Se isto está
correto, a situação econômica dos dois era bastante parecida.
Digno de nota, quanto à expansão econômica, foi o
reinado de Uzias (791-740 a.C.). O rei se interessava pela
agricultura e criação de animais, e providenciou condições
favoráveis, escavando poços em regiões desérticas e cons­
truindo torres de proteção, para que a produção nacional se
desenvolvesse cada vez mais. Também reconquistou as mi-

^ E L IJS O N , [f. L. jrnlá. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p- 874.
106 Antônio Renato Gusso

nas de ferro e cobre em Elate e conseguiu o controle de im­


portantes cidades e rotas comerciais que davam acesso ao
Egito e à Arábia. O que trouxe grande desenvolvimento para
seu estado, que continuou mesmo depois do período de
abundância vivido por Israel sob o comando de Jeroboão II.194
Quanto às condições sociais em Judá é importante
destacar que houve uma certa homogeneidade notável entre
a população por muito tempo. Ainda no final do século oita­
vo as cidades de Judá não apresentavam, com regularidade,
casos extremos de riqueza ou de pobreza. Nisto eles diferi­
am em muito do Reino do Norte, Israel. Contudo, eles não
estavam livres deste mal, e, como Isaías e Miquéias mostram,
com o avanço do paganismo sob Acaz, deixando-se de lado
as estipulações da Aliança com Iavé, destacaram-se as dife­
renças e os pobres sofreram injustiças e foram oprimidos
pelos ricos (Is 3:13-15; Mq 3).195

9.3. A Situação Religiosa de Judá__________________

Naturalmente, a religião de Iavé em Judá sofreu me­


nos intervenções externas do que a praticada em Israel. O
seu relativo isolamento e a falta de outros santuários princi­
pais, são conhecidos apenas os de Hebrom, Berseba e Gi-
beom, aumentou em muito a influência da cidade de
Jerusalém e de seu templo,196 centro religioso da nação, cri­
ando uma certa unidade de crença religiosa, além de política.
Contudo, as condições religiosas da nação andaram muito
distantes do que se poderia chamar de ideal.
Como a monarquia, da mesma forma que nas outras
nações, era uma instituição sagrada197 e fazia do rei o seu
principal líder religioso, as condições espirituais variavam
1 )_1 SCH U LTZ, S. |. A H istória de Israel no A ntigoT esíam euto. São Pauto: I klições V ida N ova, 1988. p. 196-198.
1,5 BRIG H T, op.'cit., p. 372.
I% E U JS O N , op. cit., p. 876.
197 BRIG H T, op. cit., p. 276.
Panorama Histórico de Israel 107

conforme a política seguia o seu rumo. Quando o rei era um


verdadeiro adorador de Iavé tendia a levar a nação, em gran­
de parte, também a ser, como foi o caso de Ezequias e Josias,
que efetuaram reformas religiosas importantes. Quando o
rei se voltava para a idolatria, automaticamente, levava mui­
tos do povo com ele. Um exemplo claro disto está na vida de
Manassés. O autor do Segundo Livro dos Reis afirma que o
povo não deu atenção à Lei de Moisés e se desviou dos cami­
nhos propostos por Iavé seguindo a seu líder Manassés. Es­
tas são as palavras exatas: “Eles, porém, não ouviram; e
Manassés de tal modo os fez errar, que fizeram pior do que
as nações, que o Senhor tinha destruído diante dos filhos de
Israel” (2 Rs 21:9).
Em determinadas épocas o comportamento religioso
atingiu níveis extremamente baixos. Alguns dos reis, como
foi o caso de Acaz, na época da opressão, ou da aliança, da
Assíria, partiram para a idolatria e o sincretismo. Acaz não
teve escrúpulos em colocar um altar pagão no recinto do
templo em Jerusalém (2 Rs 16:10-17), certamente por man­
do de Tiglate-Pileser rei da Assíria, nem de oferecer sacrifí­
cios a deuses estrangeiros (2 Cr 28:22-25) e, mesmo, de
oferecer seu filho em sacrifício (2 Rs 16:1-4).
Com o passar dos anos a religião oficial de Judá, base­
ada, principalmente, nas promessas de Iavé feitas ao rei
Davi, foi se desvinculando das obrigações morais e sociais
da Aliança do Sinai e se tornando paganizada. Foi surgindo
um sentimento errado de que Iavé, como protetor de Judá,
em troca de um culto meticuloso em seus detalhes rituais,
deveria abençoar a nação independentemente do comporta­
mento moral e da atitude em relação ao sincretismo e a idola­
tria de seus adoradores (Is 1:10-20).198 Isto só poderia
mesmo levar ao caos como levou.

1,8 Ibid. p.386.


108 Antônio Renato Gusso

Nota-se que na época próxima ao fim da monarquia


havia um sentimento religioso de pura superstição. Ainda
que o profeta Jeremias alertasse a nação quanto à impossibi­
lidade de se resistir ao inimigo, na ocasião a Babilônia, afir­
mando ser a invasão resultado da desobediência ao Deus
nacional, muitos esperavam que Iavé interviesse a qualquer
momento para salvá-los, pois confiavam cegamente nas pro­
messas feitas a Davi e na presença do templo, praticamente
como um grande amuleto entre eles (Jr 7:1-15), que os prote­
geria independentemente de suas ações estarem ou não em
acordo com os preceitos da Lei Mosaica.

9.4. O Fim do Estado de Judá_____________________

Com o declínio do poder da Assíria surge a Babilônia


como potência dominadora mundial. Depois de algumas
conquistas, no ano 605 a.C., sob o comando de Nabucodo-
nosor, filho do rei Nabopolassar, os babilónicos se lançaram
em uma campanha vitoriosa contra o Egito em Cárque-
mis.199 Esta primeira intervenção babilónica na região não
causou muitas mudanças políticas em Judá. Eles que já há al­
guns anos vinham sendo vassalos do Egito, simplesmente
passaram a estar submissos à Babilônia.200 O rei Jeoaquim,
de Judá, teve que entregar tesouros retirados do templo de
Jerusalém e permitir que alguns reféns fossem levados para a
Babilônia201 (2 Rs 24:1; Dn 1:1). No mais, a vida continuou
normal. Contudo, o fim estava se aproximando rapidamen­
te, era apenas uma questão de tempo.
Em dezembro de 598 a.C. o rei Nabucodonosor re­
tornou com seu exército ao ocidente. Segundo Josefo, o rei
Jeoaquim foi surpreendido pois pensava que os babilónicos

Ibid. p. 440.
20()BRUCE,F. F. Israeland the Nations. Grand Rapids, Michigan: William B. Ecrdnwis Publishing Company, 1983. p. 86.
201 SC H U LTZ , op. cit., p. 222.
Panorama Histórico de Israel 109

marchavam contra o Egito e não contra sua nação. Contudo,


estava claro que o alvo agora era Jerusalém. Certamente,
Jeoaquim havia parado de pagar o tributo exigido pelos babi­
lónicos, se voltando para os egípcios, ainda que alertado pelo
profeta Jeremias do perigo desta política. Não podendo re­
sistir ao poderio do inimigo, em março de 597 a.C., Jerusa­
lém se rendeu. Como Jeoaquim morreu em 6 ou 7 de
dezembro de 598 a.C., quem se rendeu, de fato, foi seu filho
e sucessor, que reinou apenas três meses, Joaquim.202
Por esta ocasião, a segunda intervenção babilónica
em Judá, além dos tesouros do templo e da casa do rei, fo­
ram levadas muitas pessoas para a Babilônia. Entre os cati­
vos estavam o próprio rei, sua mãe, suas mulheres, seus
oficiais, artífices, ferreiros e soldados. No lugar de Joaquim,
Nabucodonosor estabeleceu como rei em Judá a Matanias,
tio paterno do rei cativo, mudando o seu nome para
Zedequias (2 Rs 24:8-17).
A Crônica Babilónica, que se encontra no Museu Bri­
tânico, se referindo a estes fatos citados acima relata: “No
sétimo ano, no mês de kislev, [Nabucodonosor] revistou
suas tropas e, havendo marchado para a terra de Hatti, sitiou
a cidade de Judá, e no segundo dia do mês de Adar tomou a
cidade e capturou o rei. Designou ali um rei de sua própria
escolha, recebeu seu pesado tributo e [os] enviou para a Ba­
bilônia”.203
Zedequias também veio a se rebelar contra Nabuco­
donosor e, em resultado disto, Jerusalém, mais uma vez, foi
sitiada. O cerco da cidade começou em janeiro de 588 a.C. e
alcançou sucesso em agosto de 586 a.C., quando começou a
destruição final de Jerusalém no período do Antigo Testa­
mento. O rei tentou fugir mas foi capturado. Levado para
a cidade de Ribla, diante do rei da Babilônia, assistiu à execu-
SC H U LTZ , op. cit., p. 223-224.
JO H N SO N , P. H istöria d osJn d m s. Rio de Janeiro: Im ago Editora, 1989. p. 85.
21,4 SC H U LTZ , op. cit., p. 224.
110 Antônio Renato Gusso

ção de seus filhos. Depois teve seus olhos vazados e foi le­
vado cativo para a Babilônia onde morreu (2 Rs 24:18-25:7).
Assim chegava ao fim o Estado de Judá no período
do Antigo Testamento. Nabucodonosor não colocou outro
rei no lugar de Zedequias. Gedalias, filho de Aicão, um alto
funcionário de Judá que havia ajudado Jeremias em situa­
ções de dificuldades, foi estabelecido como governador.
Mas, dentro de pouco tempo foi assassinado por Ismael, lí­
der de um movimento contra a Babilônia. A partir deste mo­
mento em diante não são mais conhecidas as ações de
Nabucodonosor em relação a Judá. Não se sabe se ele colo­
cou outro governador no lugar de Gedalias ou, se simples­
mente, levou Judá a fazer parte de Samaria, como os Persas o
fizeram no período posterior.205
No Livro de Jeremias ainda há uma breve informação
a respeito de uma quarta leva de prisioneiros para a Babilô­
nia, que aconteceu no ano vinte e três do reinado de Nabu­
codonosor, o que eqüivale, aproximadamente, ao ano 582
ou 581 a.C.206 Porém, não se encontram nela maiores deta­
lhes de como e porque foi que isto aconteceu (Jr 52:30).

9.5. Os Principais Líderes de Judá_________________

Seguindo o mesmo esquema do capítulo anterior,


onde foi tratado dos principais líderes de Israel, aqui serão
apresentados alguns dos principais líderes de Judá. A inten­
ção é fornecer um resumo bastante breve, dos líderes seleci­
onados, que possa ajudar em pesquisas posteriores e dar
uma visão geral do trabalho deles, indo um pouco além de
um simples quadro cronológico.

M E TZG E R, M. H istória de Israel. São Leopoldo: Editora Sm odal, 1972. p, 120.


2<l^ IJA R R ISO N , R. K. Jem m a s elM wentaçÕ es: introduçãoe comentário. São Paulo: Edições Vida N ova, 1980. p. 152.
Panorama Histórico de Israel 111

9.5.1. Os Profetas de Judá

Durante a época do reino unido, e mesmo antes, os


profetas já atuavam como portadores da mensagem de
Deus, e quando o reino foi dividido lá estavam eles para lem­
brarem à nação de suas obrigações. Eles foram figuras de
grande importância, pois influíam diretamente sobre a vida
do povo e os destinos do reino. Como “rei e religião - são in­
separáveis nas sociedades antigas”207, estes foram os dois
principais problemas que eles tiveram que enfrentar.
Aqui serão apresentados alguns destes heróis que ar­
riscavam suas vidas em nome de Iavé, indo, muitas vezes,
contra uma sociedade corrupta e reis impiedosos.
1 - Sem aías: É o primeiro profeta, na Bíblia, a atuar
no recém nascido Reino de Judá (931 a.C.). Falando em
nome de Iavé ele evitou a guerra que Roboão estava deter­
minado a travar contra Israel, para manter a sua soberania
sobre todas as tribos e, também, predisse a vitória de Sisa-
que, rei do Egito, sobre Judá. Ainda registrou, por escrito,
parte da história do primeiro rei de Judá. Estas informações
se encontram em 1 Rs 12:21-24, no texto paralelo de 2 Cr
11:1-4 e em 2 Cr 12:1-15.
2 - Ido: É chamado de profeta e vidente, termos in-
tercambiáveis no Antigo Testamento, e atuou como escritor
dos atos dos reis Roboão e Abias (2 Cr 12:15 e 13:22).
3 - Azarias: Seu nome significa “Iavé tem Ajudado”.
Era filho de um homem chamado Odebe e atuou como in-
centivador do rei Asa, em sua reforma religiosa (2 Cr 15).208
4 - H anani:Também atuou durante o reinado do rei
Asa. Repreendeu o rei por ter feito uma aliança com Ben-
Hadade, rei da Síria, contra Baasa, rei de Israel que o estava
combatendo. O profeta acabou sendo lançado no cárcere

2(17 ASU RM EN D 1, J . 0 P ro fetim o : das origens à època rnoâertm■ São Paulo: Edições Paulinas, 1988. p. 21.
200 N O RM A N , J. G .G . A barias. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983 p. 174.
112 Antônio Renato Gusso

por causa desta intervenção nos negócios do rei (2 Cr


16:1-10).
5 - Jeú: Repreendeu o rei Josafá por ter ajudado o rei
Acabe, de Israel, a combater a Síria (2 Cr 19:1-3). Era filho de
Hanani e registrou os feitos de Josafá em um livro (2 Cr
20:34).
6 - Taaziel: Encorajou o povo e o rei Josafá, durante
uma reunião no templo, quando precisaram enfrentar uma
investida de Moabe e Amom em conjunto, contra Judá (2 Cr
20:1-30).
7 - Eliezer: Seu nome significa “Iavé é Minha Aju­
da”. Era filho de um homem chamado Dodava. Profetizou
ao rei Josafá que sua frota de navios que estava em Eziom-
Geber iria naufragar, como punição divina pelo fato dele ter
feito aliança com o perverso rei de Israel, Acazias (2 Cr
20:35-37).209
8 - Obadias: Pouco se sabe a respeito deste profeta e
da época exata em que ele exerceu o seu ministério. A pilha­
gem da parte de Edom, contra Judá, conforme está registra­
da no livro que leva o seu nome, tem sido datada, pelo
menos, de cinco formas diferentes, 926, 845, 790, 597 e 587
a.C., o que bem mostra a dificuldade do assunto. Seu nome
significa “Servo de Iavé” e sua mensagem é altamente nacio­
nalista, não criticando em nada a sua nação.210
9 - Toei: Quase nada se sabe a respeito deste profeta.
Ele era filho de um homem chamado Petuel Q11:1), que si­
gnifica Engrandecido de Deus, e tem algumas de suas profe­
cias registradas no livro que leva o seu nome. Quanto à
época de seu ministério é assunto de grande controvérsia; ao
mesmo tempo que alguns eruditos concluem ser ele um dos
primeiros profetas clássicos, que atuaram no século IX, ou­
tros pensam que ele é do período Pós-Exílico.211
209 K IT CH E N , K. A. Elk^er. São Paulo; Edições V ida N ova, 1983. p. 494.
C O E LH O FILHO , I. G. Ohastias e Sofonias: nossos contemporâneos. Rio de Janeiro: JU E R P , 1993. p. 9-11.
211 R. A. U r ro de Joel. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 849.
Panorama Histórico de Israel 113

10 - Zacarias: Era filho de um sacerdote chamado


Joiada, não deve ser confundido com o profeta Pós-Exílico,
filho de Berequias, que tinha o mesmo nome e tem um Livro
da Bíblia com suas profecias. Censurou o rei Joás por causa
da idolatria deste, e , em conseqüência foi morto, apedrejado
no pátio do templo, por ordem do rei (2 Cr 24:17-22).
11 - Isaías: Sem dúvida, foi um dos principais profe­
tas de Judá. Seu ministério se desenvolveu por um período
que foi desde o reinado de Uzias, passou pelo de Jotão e
Acaz, e se encerrou no de Ezequias. Era filho de um homem
chamado Amoz, que a tradição, sem provas concretas,
aponta como sendo irmão do rei Amasias. Ele atuou direta­
mente junto à nobreza, em Jerusalém. Seu nome significa
“lave deu Salvação” e tem muito haver com a sua mensagem
de confiança exclusiva em Deus para livrar a nação do poder
de seus inimigos,212 principalmente da Assíria, que era a
grande ameaça externa para Judá em sua época.
12 - Miquéias: Foi contemporâneo de Isaías, pois
atuou na época dos reis Jotão, Acaz e Ezequias, só que des­
envolveu o seu ministério no interior e não na capital. Seu
nome é uma pergunta muito significativa e soa, praticamen­
te, como um desafio. Ele significa: “Quem é como Iavé?”.
Ainda que fosse originário do Reino do Sul, ele pregou tanto
contra os pecados do povo de Judá como os de Israel. Preo­
cupado com os problemas sociais, atacou de forma dura os
desmandos dos poderosos e a corrupção na justiça.213
13 - Naum: A raiz do nome deste profeta tem o sen­
tido de “consolar”. O livro que traz o seu nome o apresenta
como natural da cidade de Elcós, localidade desconhecida
até o momento, mas que deve ser situada em Judá. Os dados
históricos que transparecem em seu livro, queda de Tebas,
destruição de Nínive e poder assírio intacto, apontam para a
^ R ID E RBO S, J. Isaias: introdução e comentário. SSo Paulo: Edições Vida N ova, 1990. p. 9-10.
213 CO E LH O FILHO, I. G. M iqnêias, nosso contemporâneo. Rio d ejan eiro : |UERP, 1995. p. 11-13.
114 Antônio Renato Gusso

época do reinado de Manassés, na metade do século VII,


como seu período de atuação. Uma das épocas mais desas­
trosas para a religião de Judá.214
14 - Sofonias: Ainda que apareça na introdução do
Livro de Sofonias os nomes de quatro de seus ascendentes,
ele é pouco conhecido. Seu nome, que significa “Iavé Ocul­
tou”, só aparece uma vez na Bíblia e não há certeza de quem
ele era. Só para que se tenha uma amostra das dificuldades
para identificá-lo melhor, basta informar que alguns estudio­
sos o classificam como de origem humilde, de escravos mes­
mo, enquanto outros, em completo contraste, defendem
que ele era descendente da família real. O que se pode dizer
com segurança é que ele profetizou em algum período da
época do reinado de Josias (640 - 609 a.C.), provavelmente
antes da reforma religiosa promovida por este, pois, ainda
combate o culto a ídolos em seu livro (Sf 1: 4-5).
15 - Teremias: Ele é um dos profetas mais conheci­
dos da Bíblia. Deve ter nascido durante o reinado de Manas­
sés, em Anatote e começou a pregar por volta de 626 a.C., no
décimo terceiro ano do reinado de Josias. Seu ministério se
estendeu até à época do cativeiro babilónico (587 a.C.) e che­
gou a ministrar, de Jerusalém, por carta, aos exilados na Ba­
bilônia. Era de família sacerdotal, provavelmente
descendente da linhagem de Abiatar, que foi exilado em
Anatote pelo rei Salomão. Patriota fervoroso, teve um mi­
nistério muito difícil, pregando o castigo de Deus à nação
corrompida. Seu nome significa “Iavé Ajuda”.215
16 - Hulda: Foi uma profetiza, esposa de Salum, mo­
radora de Jerusalém, que foi consultada a favor do rei Josias,
no ano de 621 a.C., quando foi encontrado o “Livro da Lei”
no templo. E digno de nota ela ter sido consultada em uma

214 A M SL R R , S. O r P rofetas e os U rro s Proféticos. São Paulo: Edições Paulinas, 1992. p. 148.
2^ FR A N C ISC O , C. T. Introdução ao A ntigo T eslam nto. Rio de janeiro: JU liR P , 1979. p. 169.
Panorama Histórico de Israel 115

época onde Jeremias e Sofonias estavam profetizando.216Ela


deveria ser uma pessoa de muita influência.
17 - Habacuque: Não se sabe praticamente nada a
respeito da vida particular de Habacuque. Sua profecia, que
está registrada na Bíblia, pode ser datada entre o período que
vai do ano 612 ao 605 a.C. Seu nome significa “Afeto” ou
“Abraço” e ele se mostra preocupado com o fato dos cal­
deus, povo de uma nação mais ímpia do que Judá, estar ser­
vindo de instrumento divino para castigá-los.217

9.5.2. Os Reis de Judá______________________________

No ponto anterior foram apresentados alguns dos


profetas de Judá. Outros existiram e fazem parte dos relatos
bíblicos, enquanto outros ainda, que certamente atuaram
durante a época do reino dividido, não nos são conhecidos
hoje em dia. Quanto aos reis, em menor número e tendo
seus feitos preservados nas crônicas oficiais, há um volume
maior de informações. Contudo, aqui serão apresentados
resumidamente nos mesmos moldes do capítulo anterior.
A apresentação será feita em ordem cronológica e es­
tará fornecendo alguns dos dados principais de cada um dos
reis que atuaram no Reino do Sul, Judá, desde o seu início até
o fim, com o cativeiro babilónico. Constará do resumo: o
nome do rei; o período de reinado (baseado na cronologia
proposta por Beek)218, textos bíblicos onde podem ser en­
contradas outras informações e alguns dos feitos, positivos
ou negativos, mais marcantes.
1 - Reoboão (Roboão) (931-915 a.C.V (1 Rs 12:1-24;
14:21-31; 2 Cr 9:31-12:26) - Foi o último governante do Rei­
no Unido, ainda que tenha reinado por pouco tempo, e o
primeiro de Judá, posição em que se manteve por dezessete
G RAY, M. Hulda. São Paulo: Edições Vidn N ova, 1983. p. 727.
217 FRAN C ISC O , op. cit., p. 165.
BE EK , M. A. Ilib a ria de Isra el Rio de Janeiro: Zahar E ditores, 1967. p. 80-112.
116 Antônio Renato Gusso

anos. Era filho de Salomão com uma princesa amonita cha­


mada Naamá. Seu reino, depois de dividido, foi composto
pelas tribos de Judá e Benjamim, enquanto as outras forma­
ram o Reino de Israel, governadas por Jeroboão. Governou
com muita dificuldade, esteve envolvido em guerras com o
Reino do Norte, foi oprimido por Sisaque, rei do Egito e,
ainda que a princípio seu povo tenha sido fiel à religião de
Iavé, com o tempo passou a praticar a idolatria. Seu nome si­
gnifica “Que o Povo se Expanda”.219
2 - Abias (Abião) (914 - 912 a.C.): (1 Rs 15:1-8; 2 Cr
13:1-22) - Era filho de Reoboão. Reinou em lugar de seu pai,
depois da morte deste, por um período de três anos. Deu
continuidade à política de seu pai e ativou a guerra crônica
com Israel, com o que conseguiu debilitar o Reino do Norte,
conquistando Betei, Efrom, Jesaná e territórios vizinhos.220
Apesar de ter um nome que significa “Meu Pai é Iavé”, a Bí­
blia condena sua conduta religiosa.
3 - Asa (911 - 871 a.C.): (1 Rs 15:9-24; 2 Cr 14:1­
16:14) - Era filho de Abias e o sucedeu no trono. Incentiva­
do pelo profeta Azarias, filho de Odede, executou uma re­
forma religiosa de grandes proporções em Judá. Chegou, até
mesmo, a depor sua mãe Maaca da posição de rainha-mãe,
pelo fato dela ter feito uma imagem de Aserá. Ameaçado por
Baasa, rei de Israel, se aliou ao rei Ben-Adad, da Síria, o que
lhe rendeu um duro protesto da parte do profeta Hanani,
que via nesta aliança uma demonstração de falta de fé. De­
pois de um longo reinado, faleceu acometido de uma grave
enfermidade nos pés.
4 - Tosafá (870 - 849 a.C.): (1 Rs 22:41-50; 2 Cr
17:1-21:1) - Sucedeu a seu pai Asa no trono de Judá. Foi um
administrador hábil, que edificou fortalezas e construiu cida-
des-armazéns. Atuou como um religioso piedoso, preocupa-

219 D O U G LA S, J. D. Reoboão. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 1392-1393.


220 SC H U LTZ , S- J. A H istória de Israel no A ntigo Testamento. São Paulo: Edições Vida N ova, 1988. p. 178-179.
Panorama Histórico de Israel 117

do em ensinar a Lei de Moisés a seu povo (2 Cr 17:5-9) e


acabou com a inimizade que havia de longa data entre Judá e
Israel, fazendo alianças com Acabe e Jorão. Mais tarde, estas
alianças trariam dificuldades enormes para o seu reino e para
a dinastia de Davi, que por pouco não foi exterminada por
Atália. Seu nome significa “Iavé Tem Julgado”.221
5 - Teorão (Torão) (848 - 842 a.C.): (2 Rs 8:16-24; 2
Cr 21:1-20) - Era casado com Atália, da casa de Onri, dinas­
tia de Israel, mulher dominadora e adoradora de Baal. Já no
início de seu reinado, Jeorão, matou a todos os seus irmãos,
possivelmente, querendo eliminar qualquer oposição futura.
Ainda que não exista nenhuma prova concreta, a respeito
disto, é bem possível que ele tenha tomado esta atitude san­
guinária orientado por sua esposa. Seu reinado foi breve.
Morreu de uma terrível infecção intestinal que muitas dores
lhe causou por um período de dois anos.222 O estado caótico
de seu reinado pode ser descrito pelas palavras do autor de
Crônicas que diz: “se foi sem deixar de si saudades” (2 Cr
2 1 : 20 ).
6 - Acazias (841 a.C.): (2 Rs 8:25-29; 2 Cr 22:1-9) -
Reinou por pouco tempo, cerca de um ano. Também é co­
nhecido por outros dois nomes na Bíblia; é chamado de Jeo-
acaz em 2 Cr 21:17, e de Azarias em 2 Cr 22:6. Aconselhado
por sua mãe Atália e seu tio Jorão, rei de Israel, deu continui­
dade à política religiosa de seu pai.223 Aliou-se com Israel
para lutar contra a Síria e morreu assassinado por Jeú, usur­
pador do trono de Israel, pela ocasião de uma visita que fez a
Jorão.
7 - Atália (841-835 a.C.V. (2 Rs 11:1-21; 2 Cr
22:10-23:21) - Ainda que seu nome transmita uma mensa­
gem favorável à religião de Iavé, ele significa “Iavé é Exalta-

W A IT E , ]. C. J. Josajà. SÃo Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 861-862.


222 BRIG H T, op. c it, p. 336.
223 SC H U LTZ , op. cit., p. 184.
118 António Renato Gusso

do”,224 suas atitudes a negavam totalmente. Tomou posse do


trono, após a morte de seu filho Acazias, assassinando a to­
dos os possíveis herdeiros do reino. Só escapou o pequeno
Joás, um de seus netos, que foi escondido por Jeoseba, uma
tia do bebê. Implantou um reinado de terror no qual exaltou
ao máximo o baalísmo. Foi a única pessoa fora da linhagem
de Davi a assumir o trono de Judá, também a única mulher,
e, ainda que tenha reinado de forma soberana, não recebe na
Bíblia o título de rainha.225
8 - Toás (Teoás) (835-796 a.C.): (2 Rs 12:1-21; 2 Cr
23-24) - Quando tinha sete anos de idade, depois de ter pas­
sado seis anos escondido, foi proclamado rei de Judá pela
ação do sacerdote Joiada. Nesta mesma ocasião foi morta a
sua avó, a rainha usurpadora do trono, Atália. Enquanto o
sacerdote Joiada era vivo, o rei, certamente orientado por
este, desenvolveu um bom governo e restaurou, em grande
parte, a religião de Iavé emjudá. Após a morte de Joiada, po­
rém, permitiu a idolatria e acabou mandando matar o profe­
ta Zacarias, filho de Joiada, que lhe fez oposição. Acabou
sendo assassinado por seus próprios servos quando se en­
contrava em sua cama enfermo. Foi enterrado em Jerusalém
mas não nos sepulcros dos reis. Seu nome significa “Iavé
tem Dado”.226
9 - Amazias (795-767 a.C.): (2 Rs 14:1-22; 2 Cr
25:1-28) - Era filho de Joás a quem sucedeu no trono de
Judá. Assim que se firmou no governo matou a todos os par­
ticipantes do assassinato de seu pai. Conseguiu reunir um
grande exército e conquistar os edomitas, mas ao levar os
deuses deste povo para Jerusalém, aos quais passou a adorar,
atraiu sobre si a oposição. Desafiou o rei de Israel, Jeoás, por
quem foi vencido e feito prisioneiro, trazendo grandes difi-
224 G R A Y , M. A lalia. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 167.
22í’ CLEM EN T’S , R. E. O M undo do A ntigo T estam ento:perspectivas sociológicas, an tn p ológica s epoli/icas. S ã o P a ulo:
Paulus, 1995. p. 355.
22í* D O U G LA S, J . D. foás. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 846-847.
Panorama Histórico de Israel 119

culdades para seu país. Foi vitima de uma conspiração em Je­


rusalém. Fugiu para Laquis onde foi perseguido e morto por
seus inimigos. Seu nome significa “Iavé é Poderoso”.227
10 - Uzias (Azarias) (766-739 a.C/>: (2 Rs 15:1-7;
2 Cr 26:1-23) - Foi conhecido por dois nomes diferentes. O
primeiro, Uzias, significa “Iavé é Minha Força” e o outro,
Azarias, “Iavé tem Ajudado”. Assumiu o trono aos dezesseis
anos de idade por ocasião da morte de seu pai Amazias. O
reino de judá experimentou uma época de grande prosperi­
dade durante sua administração e, aproveitando-se do declí­
nio temporário da Assíria, alcançou algumas vitórias
importantes contra os filisteus, os árabes e os amonitas. Ata­
cado de lepra, ao final de seu reinado, quando tentou quei­
mar incenso no altar do templo, atribuição dos sacerdotes,
afastou-se da vida pública enquanto seu filho Jotão cuidou
dos negócios do reino.228
11 - Totão (739-735 a.C.): (2 Rs 15:32-38; 2 Cr 27:1-9) -
Era filho do rei Uzias e sua esposa Jerusa, filha de Zadoque.
Começou a reinar com a idade de vinte e cinco anos e deu se­
qüência à boa administração de seu pai. Seu nome significa
“Iavé é Perfeito”.229
12 -Acaz (735-716a.C.V. (2Rs 16:1-20;2 C r28:1-27) -
Era filho de Jotão. Seu nome é uma forma abreviada de
Jeoacaz. Peca, rei de Israel, e Rezim, rei da Síria, procuraram
substituí-lo no trono por um rei títere, com a intenção de
formar uma força única para resistirem ao poder da Assíria.
Acaz, ignorando os conselhos do profeta Isaías que pregava
a confiança em Iavé, pediu auxílio a Tiglate-Pileser, rei da
Assíria, e foi livre de seus opressores, que foram conquista­
dos nesta ocasião. Porém, a aliança com a Assíria iria custar-
lhe muito caro. Por exigência do rei da Assíria retirou tesou-
W A IT R , }. C. J- A m a d as. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 57.
22fi VTAITu, J . C. J. U^va.r. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 1644.
229 D O U G LAS, J. D. Jotão. São Paulo: Kdições Vida N ova, 1983. p. 872.
120 Antônio Renato Gusso

tos do templo em Jerusalém e introduziu cultos estrangeiros.


Chegou a um nível tão baixo em sua vida religiosa que, se­
guindo costumes pagãos, ofereceu alguns de seus filhos em
sacrifícios.230
13 - Ezequias (716-686 a.C.): (2 Rs 18:1-20:21; 2 Cr
29:1-32:33) - Foi um dos mais notáveis reis de Judá. Era filho
de Acaz e pode ter reinado juntamente com ele em um perí­
odo de co-regência, antes de assumir o governo total. Sacu­
diu o jugo assírio e procurou recolocar o culto a Iavé no seu
lugar de direito, promovendo uma reforma religiosa, reati­
vando e purificando o templo e pondo os levitas em seus
postos de trabalho. Foi acometido por uma doença incurá­
vel mas recebeu a promessa divina, por intermédio do profe­
ta Isaías, depois de ter orado, de que seria curado e ainda
teria mais quinze anos de vida. Seu nome significa “Iavé é
Minha Força”.231
14 - Manassés (696-642 a.C.): (2 Rs 21:1-18; 2 Cr
33:1-20) - Seu nome significa “Fazendo Esquecer-se”.232
Começou a reinar com a idade de doze anos, provavelmente
em co-regência com seu pai. Era filho do rei Ezequias e He-
fzibá e esteve no comando da nação, contando o período em
companhia do pai, por longos cinqüenta e cinco anos. Foi
um dos piores reis de Judá. Ignorou a religião de seu pai e
passou a promover todo tipo de cultos estranhos à fé em
Iavé. Era adivinho, praticava feitiçaria, colocou imagens de
escultura para serem adoradas no templo de Jerusalém e ofe­
receu, como oferta queimada ao deus Moloque, alguns de
seus filhos. Próximo ao final de seu reinado foi levado cativo
à Babilônia, pelo rei da Assíria, onde arrependeu-se de suas
ações e se voltou para Iavé. Depois de libertado reassumiu o
comando de Judá e promoveu uma reforma religiosa, mas

SC H U LTZ , op. c it , p. 199-200.


231 W A IT E , J . C. J . Ezequias. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 583-584.
232 SC H E RIFFS, R. J . A. M anassés. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 990.
Panorama Histórico de Israel 121

esta não foi suficiente para reparar os estragos que ele mes­
mo já havia causado.
15 - Amom (642-640 a.C.): (2 Rs 21:18-26; 2 Cr
33:20-25) - Parece que, em seu curto reinado, desfez as últi­
mas obras de seu pai Manassés levando a nação a retornar à
idolatria. Acabou sendo morto por seus próprios servos, ví­
tima de uma conspiração, em sua casa.
16 - Tosias (640-609 a.C.): (2 Rs 21:24-23:30; 2 Cr
34:1-35:27) - O povo que vingou a morte do rei Amom tam­
bém elevou seu filho, Josias, com a idade de oito anos, ao
trono. Seu nome significa “Iavé Sustenta” e sua mãe se cha­
mava Jedida. Ele foi um dos mais piedosos reis de Judá. Se
rebelou contra o jugo da Assíria, negando as honrarias que
eram prestadas aos seus deuses em Judá, por aquela época, e
desenvolveu uma reforma religiosa em toda a nação, atingin­
do, até mesmo, partes do extinto Reino do Norte, como a re­
gião da Galiléia. Acabou morrendo, no auge de sua carreira,
de uma forma trágica em batalha contra o exército de Neco,
rei do Egito, quando tentava evitar que este atravessasse suas
terras para ir em ajuda dos assírios que resistiam às forças ba­
bilónicas em Harã.233 O profeta Jeremias, na ocasião, com­
pôs uma lamentação em homenagem ao rei Josias (2 Cr
35:25).
17 - Jeoacaz (Salum) (609 a.C.): (2 Rs 23:30-34; 2
Cr 36:1-4) - Com a morte de Josias sobrevem um pesadelo
sobre Judá. Jeoacaz, também conhecido por Salum (Jr
22:11), filho de Josias, foi feito rei, mas esteve no governo
por apenas três meses. Faraó Neco, aproveitando a sua vitó­
ria sobre Josias, vai até Jerusalém, prende o rei Jeoacaz e o
leva para o Egito onde, mais tarde, viria a morrer; coloca um
irmão deste em seu lugar e impõem um pesado tributo à
Judá.

233 W A ITE , J. C. J. Josias. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 868-869.
122 Antônio Renato Gusso

18 - Eliaquim (Teoaquim) (609-598 a.C.): (2 Rs


23:35-24:7; 2 Cr 36:5-8) - Era irmão de Jeoacaz, filho de Josi­
as, e foi colocado no comando da nação pelo Faraó Neco.
Seu nome original era Eliaquim (“Deus estabelece”)234 e foi
mudado pelo Faraó, como sinal de vassalagem, para Jeoa-
quim (“Iavé Tem Estabelecido”).235 Continuou vassalo do
Egito até que, em 605 a.C., a Babilônia se assenhoreou da re­
gião e, levando alguns cativos como reféns, o fez tributário.
Ele m e s m o c h e g o u a ser levado para a Babilônia, mas deve
ter retornado depois de ter assumido compromissos com o
novo senhor (2 Cr 36:6). Mais tarde, pensando que a Babilô­
nia estava enfraquecida, deve ter se rebelado e deixado de
pagar o tributo. Isto atraiu as forças babilónicas que sitiaram
Jerusalém. Eliaquim morreu durante este cerco, talvez em
batalha.236
19 - Joaquim (Jeconias) (597 a.C.): (2 Rs 24:8-17; 2
Cr 36:9-10) - O jovem Joaquim começou a reinar, em lugar
de seu pai, Eliaquim, com apenas dezoito anos. Sua adminis­
tração durou só três meses, ao fim do que foi levado para a
Babilônia, juntamente com sua mãe e muitos outros cativos,
líderes da comunidade.
20 - Matanias (Zedequias) (597-586 a.C.): (2 Rs
24;18-25:7; 2 Cr 36:11-21) - Último rei de Judá. Seu nome
original era Matanias (“Dom de Iavé”) e foi mudado pelo rei
da Babilônia, Nabucodonosor, para Zedequias (“Justiça de
Iavé”), quando o colocou como vassalo no trono de Judá em
lugar de seu sobrinho Joaquim. Ignorando os avisos do pro­
feta Jeremias acabou se rebelando contra a Babilônia, o que
levou a nação à derrocada total. Depois de pelo menos de­
zoito meses de cerco o exército da Babilônia invadiu Jerusa­
lém, destruiu a cidade e levou muitos cativos, entre eles o

234 y o u N G , E. ]. lilia qu im . São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 491.


^ W ISE M A N , D. J. Jeoacpdm . São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 792.
236 SC H U LTZ , op. c it , p. 214-215.
Panorama Histórico de Israel 123

próprio Zedequias que após ter assistido à execução de seus


filhos teve seus olhos furados.237
Era o fim da monarquia e do Estado de Judá. Zede­
quias foi substituído, pela intervenção de Nabucodonosor,
por um governador e não por outro rei, ficando claro o re­
baixamento do status de Judá no Império Babilónico. O
novo líder, imposto pelo dominador, se chamava Gedalias,
como já foi visto em ponto anterior, e esteve por pouco tem­
po administrando o que sobrou de Judá, pois logo foi assas­
sinado por um grupo liderado por Ismael, que era da família
real. Com medo de represálias, boa parte do povo e mesmo
os líderes que ainda havia no meio dele, fugiram para o Egi­
to, deixando a região praticamente abandonada. Com este
grupo que partiu para o Egito foi levado, contra à sua pró­
pria vontade, o profeta Jeremias. As últimas notícias a res­
peito dele mostram que deve ter passado lá os últimos dias
de sua vida, pregando a mensagem de Iavé, também, para os
habitantes desta nação (Jr 43:8-13).

9.6. Para Complementar_________________________

9.6.1.Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de 1 Reis 12-22;


b) O Livro de 2 Reis 8-25;
c) O Livro de 2 Crónicas 10-36;
d) O Livro de Obadias;
e) Talvez o Livro de Joel;
f) O Livro de Isaías 1-39;
g) O Livro de Miquéias;
237 W AITK, J . C. J . Zedequias. São Paulo: Edições V ida N ova, 1983. p. 1675-1676.
124 Antônio Renato Gusso

h) O Livro de Naum;
i) O Livro de Sofonias;
j) O Livro de Jeremias;
k) O Livro de Lamentações de Jeremias
1) O Livro de Habacuque.

9.6.2.Questões Para Revisão________________________

a) Quais são os anos que marcam o início e o fim do Rei­


no de Judá?
b) Por que a política interna de Judá foi mais tranqüila do
que a de Israel?
c) Quem foi a pessoa que colocou em risco a dinastia de
Davi em Judá?
d) Escreva a respeito da situação social de Judá.
e) Qual foi o império que acabou com o Estado de Judá?
f) Como aconteceu o desaparecimento do Estado de
Judá?
g) Cite os nomes de quatro dos profetas de Judá.
h) Escreva, de forma resumida, como foi o reinado de Jo­
sias.
i) Cite os nomes do primeiro e do último rei de Judá.
j) Descreva em poucas palavras o ministério do profeta
Jeremias.
Panorama Histórico de Israel 125

1 0 . O CATIVEIRO BABILÓNICO

O cativeiro babilónico surgiu como uma conseqüên­


cia natural para Judá que, separado do outrora poderoso im­
pério liderado por Davi e Salomão, da mesma forma que
Israel, o Reino do Norte, se tomou um pequeno e fraco país
entre nações fortes e ávidas de expansão territorial. Mais
cedo ou mais tarde, se dependesse apenas de suas habilida­
des para sobreviver, inevitavelmente, isto aconteceria como
aconteceu.
Sendo assim, sem muitas surpresas, o Estado de Judá,
seguindo o mesmo caminho trilhado por Israel, havia chegado
ao fim. Contudo, a história de seu povo ainda teria lances
surpreendentes, continuaria a se desenvolver independente­
mente da existência ou não de um país organizado de forma
soberana como tal. Era o início da transição de um estágio
de nação para uma comunidade de fé que, mais tarde, se es­
palharia pela face da terra.
Aqui serão abordados alguns pontos básicos para
uma melhor compreensão do período. Sob o título de “Os
Dominadores” serão apresentados os líderes que comanda­
ram o chamado “Império Neobabilônico”, desde sua im­
plantação até à sua derrocada total diante do poder Persa,
liderado por Ciro. Também será visto: como aconteceu, o
que é e qual a importância da “Diáspora” para a religião dos
descendentes de Jacó, além de serem apresentadas algumas
informações a respeito do local e duração do cativeiro e das
condições social, religiosa e política do povo que lá esteve.
126 António Renato Gusso

10.1. Os Dominadores

O Império Neobabilônica foi de curtíssima duração.


Cerca de vinte e cinco anos depois de ter arrasado com Judá
e deportado parte de sua população para a Babilônia, após a
morte do grande líder'Nabucodonosor, começava a sua de­
cadência.238 Corroído pela instabilidade política criada pela
falta de um governante capaz de unir as diferentes facções,
mais uma vez o domínio das nações trocaria de mãos. Como
tudo na vida também ele passou.
No curto período de sua existência (626 - 539 a.C.), o
Império Neobabilônico, contou com o governo de sete so­
beranos. São eles: Nabopolassar; Nabucodonosor; Evil-Me-
rodaque; Neriglissar; Labashi-Marduque; Nabonido e
Belsazar. Com a intenção de apresentar um breve resumo
de sua história, nas linhas que seguem, cada um destes go­
vernantes será apresentado individualmente.

10.1.1. Nabopolassar_______________________________

Nabopolassar foi o fundador do Império Neobabilô­


nico.239 Em 626 a.C., após ter resistido a um cerco por parte
dos assírios, contra os quais havia se rebelado, assumiu o tro­
no da Babilônia. Era o início da mudança de poder mundial.
Logo os caldeus da Babilônia, que eram um grupo forte de
procedência araméia, dominariam várias partes do Oriente
Próximo tomando o lugar da Assíria no comando das na­
ções.240
Este grande líder foi quem deu rumo à política inter­
na e externa da Babilônia que seguiu por aproximadamente
um século. Enfrentou algumas derrotas no campo militar
mas se mostrou, sobretudo, um diplomata de muito sucesso,
B R IG H T , |. H istória de Israel. São Paulo: lidíçõ cs Paulinas, 1985. p. 475.
23* D O W , |. L. Di-^jonario delia Bibbia Milano: G arzanti Editorc s.p.a., 1993. p. 269.
D O N N R R , H. H istória de Israel e dos P oros Vi-^inhos. São Leopoldo: Sinodal, 1997. p. 388,410,413.
Panorama Histórico de Israel 127

aproveitando-se do bom modelo administrativo que já havia


sido utilizado pelos assírios. Destacou-se, ainda, como cons­
trutor, dedicando-se, especialmente, à tarefa de restaurar
templos babilónicos.241
Quando morreu, em agosto do ano 605 a.C.,242 dei­
xou para seu filho Nabucodonosor, com quem dividia a fun­
ção de comandante das forças babilónicas, o caminho aberto
para a conquista total do Oriente Antigo. O mais difícil ele
mesmo havia feito, faltava apenas a consolidação do império
que agora era uma questão de tempo.

10.1.2. Nabucodonosor_____________________________

Nabucodonosor ao assumir o lugar de seu pai no tro­


no não teve muito trabalho para levar o Oriente Antigo a se
tornar babilónico. Tirando a batalha de Cárquemis, na qual
derrotou os egípcios, e uma tentativa frustrada contra o mes­
mo Egito, no inverno de 601/600 a.C., as demais campanhas
na Síria não encontraram resistência que venha a merecer
grande destaque, incluindo sua atuação contra Judá.243 Não
havia quem pudesse medir forças com seu exército.
Ele é muito citado na Bíblia pelo fato de ter sido o
conquistador que levou Judá para o cativeiro. Existe a possi­
bilidade de que seu nome signifique “Nabu protegeu os di­
reitos de sucessão”. Isto pode estar apontando para algum
risco que ele correu de ser preterido como príncipe herdeiro,
ao mesmo tempo em que mostra a sua devoção à esta divin­
dade, para a qual construiu templos.244Os nomes, na antigüi­
dade, não necessariamente acompanhavam a pessoa por
toda a vida, como nos dias atuais, eles podiam ser, e eram,
mudados conforme as circunstâncias.

241 D O N N E R, op. cit., p. 413.


242 BRIG H T, op. cit., p. 44U.
243 D O N N E R, op. c it , p. 414.
244 W ISE M A N , D. J. K übum lonm or. São Paulo: Edições Vida Nova, 1983. p 1086, 1087.
128 Antônio Renato Gusso

Nabucodonosor era um homem bastante religioso e


serviu a vários deuses. Construiu e reparou templos também
a Marduque, e providenciou vestes e ofertas regulares para
as estatuas divinas, além de levantar um zigurate e providen­
ciar um caminho para procissões sagradas na própria cidade
da Babilônia. Cidade esta que foi embelezada seguindo-se
várias sugestões de sua esposa Amitis.245
Quanto à sua loucura, conforme registrada no Livro
de Daniel, no capítulo quatro, ainda não foi encontrada ne­
nhuma evidência'texterna que a possa corroborar. Contudo,
deve ser levado em conta que, infelizmente, pouco se sabe a
respeito dos últimos trinta anos de reinado deste poderoso
líder.246 Sabe-se, porém, que ele não teve a felicidade que seu
pai teve de deixar um herdeiro à altura de tal império. En­
quanto viveu a Babilônia gozou de estabilidade, mas logo de­
pois de sua morte teve início a decadência.247 Nos sete anos
que se seguiram o trono foi ocupado por três monarcas dife­
rentes, o que bem aponta para a instabilidade política que se
instalou com a morte de Nabucodonosor.248

10.1.3. Evil-Merodaque____________________________

Evil-Merodaque, também conhecido como Avil-Mar-


duque, era filho de Nabucodonosor e reinou no lugar deste,
após a sua morte, a partir do ano 561 a.C., quando Joaquim,
rei de Judá, completava trinta e sete anos de cativeiro.249
Ele é pouco conhecido, e não poderia ser diferente,
pois reinou por apenas dois anos, os quais foram suficientes
para Flávio Josefo classificá-lo como um governante áspero.
Teve um fim trágico. Foi assassinado por seu cunhado Neri-
glissar, que assumiu o seu lugar no trono da Babilônia.250
245 W ISE M A N , op. c i t , p. 1086, 1087.
246 IbkI.
247 A M SLE R, S. O s P rofetas e os U r ro s Proféticos. São Paulo: Edições Paulinas, 1992. p. 31 )4.
248 B R IG H T , op. c it , p. 476.
24^ H U B B A RD , ]r., R. L. F irst Seam dK ings. Chicago: M oody Press, 1991. p. 238-239.
2^ SC H U L T Z , S. |. A H istória de Isra el no A ntigo Testamento. São Paulo: Edições Vida N ova, 1988. p. 225.
Panorama Histórico de Israel 129

10.1.4. Neriglissar_________________________________

Provavelmente, Neriglissar seja o mesmo Nergal-Sa-


rezer que aparece como oficial de Nabucodonosor no relato
do Livro de Jeremias no capítulo trinta e nove. Ele também
não reinou por muito tempo, morreu quatro anos após ter se
apossado do trono.251 Era filho de um homem rico, proprie­
tário de muitas terras e deve ter conseguido se firmar no tro­
no por ter liderado uma revolução com o auxílio do exército
e o apoio dos sacerdotes ou, ainda, por direito de sucessão,
por ser esposo de uma filha de Nabucodonosor. Como seu
nome aparece em documentos babilónicos desde 595 a.C.,
ele deveria ser de meia idade, ou mesmo um tanto idoso,
quando começou a reinar, o que fez de forma bastante agres­
siva.252

10.1.5. Labashi-Marduque__________________________

Foi um rei sem expressão para o império babilónico.


Ele era filho de Neriglissar e governou no lugar deste por
apenas alguns meses. Logo foi deposto e assassinado dei­
xando o trono para o usurpador Nabonido.253 Ainda não se
sabe se ele teve tempo de fazer algo digno de nota para o rei­
no. Ao que parece, pela falta de evidências, não foi possível
fazer nada. A Babilônia estava sofrendo com a escassez de lí­
deres capazes.

10.1.6. Nabonido e Belsazar_________________________

As carreiras destes dois governantes ainda estão en­


voltas em um certo mistério. Documentos têm mostrado
que Nabonido foi o último governante da Babilônia, mas a
251 B RIG H T, op. cit., p. 477.
252 SC H U I.TZ , op. cit., p. 225-226.
253 Ibid. p. 226.
130 Antônio Renato Gusao

Bíblia, no Livro de Daniel, apresenta Belsazar como aquele


que governou até a conquista dos medos e persas.
Isto se explica pelo fato de Nabonido, forçado pelas
circunstâncias, ter deixado seu filho Belsazar como regente
na Babilônia enquanto se retirou para a cidade de Tema na
Arábia, onde demonstrou interesse no comércio com cara­
vanas e em promover o culto à deusa-lua.254Ele foi obrigado
a se retirar por ter caído em desgraça diante dos comercian­
tes da cidade da Babilônia e dos sacerdotes de Marduque,
que deixaram de lucrar com o culto a este deus a partir do
momento em que o rei passou a se esforçar em honrar outra
divindade. Ele chegou, claramente, a tentar colocar a deusa
lua, Sin, na posição mais alta do panteão babilónico,255 o que
atraiu sobre si a ira dos que adoravam Marduque ou lucra­
vam com o culto dirigido a ele.
Seu reinado chegou ao fim em 539 a.C., quando as
tropas do conquistador persa Ciro invadiram a Babilônia e
foram bem recebidas pela população descontente e ansiosa
por mudanças. Seu filho Belsazar foi executado por esta oca­
sião, mas o rei Nabonido, ao que parece, mesmo tendo sido
feito prisioneiro, deve ter sido solto mais tarde e tratado de
forma favorável.256

10.2. A Diáspora________________________________

Para tratar deste assunto de forma completa seria ne­


cessário um livro à parte. Não é esta a intenção neste ponto.
Mas, também, não seria sensato passar adiante sem aprovei­
tar a oportunidade e dar uma palavra a respeito deste aconte­
cimento tão importante que veio a ser um dos principais
fatores de influência na forma futura da religião judaica. Por

0 4 SC H U LTZ , op. c it , p. 227.


255 B RIG H T, op. c it, p. 477.
256 SC H U LTZ , o p c it , p. 228.
Panorama Histórico de Israel 131

isso, aqui serão abordados três itens importantes sobre o as­


sunto: Será explicado o significado do termo “ diáspora” \feita
uma apresentação de como ocorreu e qual a sua importân­
cia.

10.2.1. O Significado do Termo Diáspora_____________

Como é fácil de se perceber, o termo “diáspora” não


fazia parte do vocabulário corrente dos exilados na Babilô­
nia. A língua grega, à qual pertence esta palavra, ainda levaria
muitos anos para se tornar importante para os povos do
mundo. Sendo assim, a utilização dela, à esta altura dos
acontecimentos, deve ser tomada como um anacronismo
necessário para se explicar o início de um fenômeno que se­
ria descrito por este termo no faturo.
Diáspora (SiaOTTOpá), literalmente, significa disper­
são257 e descreve, inicialmente, o movimento populacional
dos habitantes de Judá, saindo de sua terra, por vários moti­
vos, e se estabelecendo em outras nações, porém sem perder
os vínculos com a terra natal, principalmente com a religião
que manteve o seu ponto central em Jerusalém. Não só os
que saíram de Judá, mas, ainda os descendentes destes, que
continuaram a viver em comunidades como seus antepassa­
dos, entre outros povos, ligados religiosamente à Jerusalém,
receberam esta designação.

10.2.2. Como Aconteceu a Diáspora__________________

Pode-se dizer que o cativeiro imposto pela Babilônia


levou o povo de Judá à diáspora. O Reino do Norte, Israel,
há muito tempo havia sido misturado entre as nações, mas
não conseguiu manter as suas características peculiares, pas­
sando, então, a ser assimilado por outros povos. O que aca­
^ CíINGRICM, P. W . L éxico do N ovo Testamento grego/português. São Paulo: Hdiçõcs V ida N ova, 1984. p. 55.
132 Antônio Renato Gusso

bou acontecendo até mesmo na própria pátria como


resultado da política ocupacional da Assíria que levou es­
trangeiros para habitarem no meio dos que ficaram em Israel.
Com Judá a situação se desenrolou de forma diferen­
te. Foram para o cativeiro mas puderam viver em comunida­
des, ou colônias, mantendo antigas tradições e o desejo
natural de um dia voltar para a terra natal, o que os manteve
com uma identidade própria.
Depois que Nabucodonosor levou parte significativa
da população de Judá para a Babilônia, a qualidade de vida
dos que ficaram deve ter sofrido uma grande queda. A maio­
ria dos líderes, intelectuais e outros especializados em ativi­
dades importantes para a nação, haviam sido levados,
deixando uma grande lacuna no país. Para fugir da situação
caótica, e também da ira do rei babilónico, depois do assassi­
nato de Gedalias, o governador colocado por este sobre os
que permaneceram em Judá, muitos partiram para o Egito.
Lá foram bem recebidos e deram continuidade à suas vidas
em colônias onde, aparentemente, chegaram a prosperar.258
Provavelmente, vários outros grupos, além daquele
que obrigou o profeta Jeremias a acompanha-lo, se dirigiram
para o Egito conforme a situação exigia. Também é possível
presumir que eles procuraram outros lugares para se refugia­
rem. Pelo texto do Livro de Jeremias nota-se que muitos, fu­
gindo dos babilónicos, foram para Moab, Edom e Amom,
de onde voltaram quando a situação melhorou (Jr 40:11 -12).
Contudo, deve ser levado em conta a real possibilidade de
muitos terem permanecido nestes países, ou terem retorna­
do para eles assim que as condições voltaram a ser desfavo-
• 25 9
raveis.
Nesta época ainda não é possível de se falar em uma
diáspora em toda a terra, mas era o início de uma tendência

M R ST liR , H. I. The H eart ofH ebrew H istory; a study ofth e QldTestament. Nashville: Broadman Press, 1980. p.251.
BRIG H T, J. H istória de Israel. São Paulo: EdiçÒes Paulinas, 1985. p. 468-469.
Panorama Histórico de Israel 133

irreversível. Israel estava tomando uma nova forma. Não es­


taria mais limitado por uma área geográfica ou por algum
poder político. Não havia mais possibilidade de voltar, de
forma completa, ao antigo padrão260, apenas como nação,
estava se tornando uma comunidade de fé entre as nações.

10.2.3. A Importância da Diáspora___________________

A importância da diáspora é incalculável. Ela não só


preservou a base da religião de Iavé, que era praticada em
Judá, entre seus membros, mesmo depois do desapareci­
mento do Estado propriamente dito, e longe da cidade de Je­
rusalém, como acabou preparando o caminho para o
cristianismo que viria mais tarde. O Novo Testamento teste­
munha claramente a atuação do apóstolo Paulo em locais
fora da Judéia, principiando o seu trabalho pelas sinagogas
que serviam como locais de culto para os judeus da diáspo-
ra.2('' Eles estavam dispersos por toda a terra e por meio de
sua religião, com base no Antigo Testamento, sem saber, es­
tavam fazendo um trabalho que seria fundamental para a ex­
pansão rápida da religião Cristã. Estavam preparando o
caminho para a vinda do cristianismo.
Algumas colônias espalhadas pelo mundo, como por
exemplo a estabelecida em Elefantina, no Egito, acabaram
por preservar uma religião muito semelhante com a que era
praticada em Jerusalém. Os desta localidade chegaram, até
mesmo, a construir um templo bastante parecido ao que ha­
via sido destruído pelos babilónicos. Outros, porém, estabe­
lecidos próximos ao rio Nilo, deixaram Iavé de lado e
acabaram se tornando idólatras.262
Seja como for, não há dúvidas, se não fosse a diáspora,
a dispersão de grupos oriundos de Judá para outras nações,

/íl" B R IG H T , op. c it, p. 469.


261 W A LLS, A. K Dispersão. São Paulo: Edições Vida Nova, 1983. p. 433.
262 H E STE R, op. c it , p. 251.
134 Antônio Renato Gusso

mas que permaneceram vivendo em comunidades, pratican­


do a mesma religião e ligados ao antigo país de onde saíram
seus antepassados, por laços religiosos, a história de Israel
poderia ter terminado com a conquista de Judá pela Babilô­
nia. Não haveria como reconstruir uma nação daquilo que
sobrou e, quem sabe, a própria história do cristianismo teria
de ser outra, pois as duas estão intimamente ligadas.

10.3. A Cidade de Babilônia_____________________

Ainda que muito das descrições antigas a respeito da


famosa cidade de Babilônia, capital do império de Nabuco-
donosor e de seus sucessores, possam ter sido exageradas,
não há dúvidas de que se trata de uma das mais belas metró­
poles da antigüidade. O povo que foi levado da comparati­
vamente pequena Jerusalém e seus arredores para lá, deve ter
ficado impressionado com a beleza e o poder que viram na­
quele lugar.263 Ela estava em um estágio de progresso, gran­
diosidade e beleza, muito além do que poderia ser imaginado
pelos cativos oriundos de Judá.
Na atualidade, muito do que era esta grande cidade já
foi revelado e tem confirmado a sua fama. Ela foi localizada
por arqueólogos modernos à cerca de 80 km da atual cidade
de Bagdá no Iraque. Sua área de ocupação urbana possuía
uma forma triangular e ocupava um espaço de 13 km qua­
drados de superfície atravessados pelo famoso rio Eufrates e
rodeado, em toda a sua extensão, por dois cinturões de mu­
ralhas que atingiam a impressionante altura de 25 metros.264
A entrada na cidade era possível através de oito por­
tões, ou grandes e esplêndidas portas que eram conhecidas
pelos seguintes nomes: Porta de Adad, Porta de Lugalgirra,
Porta de Ishtar, Porta de Sin, Porta de Marduk, Porta de Za-
263 H E ST E R, op. cit. p. 251-252.
26"* I J\PPLB, A. A Bibfia Hoje: doainimtação de história, geogmfia, arqueologia. São Paulo: Edições Paulinas, 1984. p. 102.
Panorama Histórico de Israel 135

bara, Porta de Enlil, Porta de Minurta, Porta de Urash e Por­


ta de Gula.265 Seus nomes são uma demonstração clara do
politeísmo que reinava no local, pois na maioria, senão to­
dos, reverenciavam diferentes deuses que eram adorados na
cidade.
Veja na foto a seguir um pouco da beleza destas por­
tas.

266
Réplica da porta de Ishtar na Babilônia

fÜ Ib‘d
266 Foto tirada de: http://www.angelfire.com /m e/babiloniabrasil/ em 13/08/2002.
136 Antônio Renato Gusso

Existem informações de que a cidade era composta


por mais de seiscentos quarteirões que possuíam, cada um
deles, um jardim em seu centro.267 Nela também havia um
grande monumento, em forma de torre de degraus, recober­
ta com azulejos azuis, com aproximadamente noventa me­
tros de altura, conhecido como Zigurate Etemenanki,
construída em homenagem ao deus Marduk. Ele marcava o
centro da cidade268 e demonstra bem a capacidade deste
povo nas áreas da engenharia e arquitetura.
A beleza de seus templos, palácios, praças, ruas e mo­
numentos, além dos famosos jardins suspensos, deram à ci­
dade o privilégio de ser colocada entre as “Sete Maravilhas
do Mundo”. Com certeza, o texto do Livro de Daniel que
mostra Nabucodonosor orgulhoso de sua cidade, é uma
amostra real do sentimento de glória que ela evocava em seu
principal benfeitor. Nele está escrito: “Ao cabo de doze me­
ses, passeando sobre o palácio real da Babilônia, falou o rei, e
disse: Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a
casa real, com o meu grandioso poder, e para glória da minha
majestade?” (Dn 4: 29-30).
As evidências arqueológicas têm apresentado um Na­
bucodonosor, aparentemente, mais humilde, todo reverente
aos deuses que adorava mas, assim mesmo, bastante orgu­
lhoso dos feitos que havia executado na cidade. Um exem­
plo está nas inscrições encontradas nas pedras calcárias,
polidas e recobertas com asfalto, utilizadas na pavimentação
de uma rua com 900 metros de extensão, especialmente feita
para a procissão religiosa em homenagem ao deus Marduk.
Em cada pedra foi colocada a seguinte mensagem: “Eu sou
Nabucodonosor, rei de Babilônia, filho de Nabopolassar.
Fui eu quem pavimentou as ruas de Babilônia com blocos de
pedra tirados das montanhas, para a procissão do supremo
Senhor Marduk. Que Marduk me conceda a vida eterna!269

HESTF.R, op. cit., p.251,252.


268 LÃ PPLE , o p . c i t , p . 102-105.
269 I b id .p .l0 4 .
Panorama Histórico de Israel 137

Também foi encontrado nos escombros do templo


dedicado ao deus Marduk, edifício que é conhecido pelo
nome de Esagila, um tijolo contendo uma inscrição de Na-
bucodonosor. Ela é mais uma prova de que este soberano
foi um dos personagens principais nas obras de embeleza­
mento da cidade. Neste tijolo está escrito o seguinte:
“Nabucodonosor, rei de Babilônia, que venera os
grandes deuses... sou eu.
Já que Marduk, o supremo Senhor, levantou minha
cabeça, eu, cheio de temor, louvo a Marduk, o deus,
meu criador. (E) a torre de degraus de Babilônia, Ete-
menanki, com asfalto e azulejos azuis, eu a fiz res­
plandecer como o dia. Para sua cobertura usei cedros
(em abundância?). Marduk, meu Senhor, volve seu
olhar propício sobre estas minhas obras e dá-me a
vida dos dias eternos! Etemenanki, recorda sempre
na presença de Marduk, meu Senhor, a (minha) pie­
dade!”.270
As poucas informações aqui apresentadas são sufici­
entes para demonstrar a grandiosidade de Babilônia e levar o
leitor a fazer um certo julgamento das reações dos exilados
ao chegarem neste local, ainda que a maioria deles tenha vi­
vido em colônias próximas da cidade e não propriamente
nela. Não existem registros, mas é possível inferir de tudo o
que foi dito neste ponto, que os exilados ficaram surpresos
com o que encontraram em Babilônia e, provavelmente,
muitos devem ter chegado à pensar que os deuses daquele
povo eram mais poderosos do que Iavé. Estava na hora de
serem reformulados alguns conceitos teológicos populares
entre o povo de Judá, para desfazer estes mal entendidos, e
os profetas que atuaram no cativeiro se encarregariam disto.
Como será visto, mais adiante, a crise e o choque religioso-

2711 L À PPI.E , op. c it , p. 105.


138 Antônio Renato Gusso

cultural acabariam por trazer crescimento espiritual para os


verdadeiros adoradores do Deus de Israel.

Maquete representando a cidade da Babilônia'

10.4. As Condições do Povo Cativo_________________

As condições do povo que foi levado para o cativeiro


na Babilônia, muitas vezes, têm sido interpretadas de forma
parcial e errada por alguns que fazem uma leitura superficial
da Bíblia e que, além disso, não procuram outras fontes de
informação além dela mesma. Como a Bíblia, corretamente,
apresenta este cativeiro como sendo um castigo da parte de
Deus contra seu povo rebelde, logo se pensa em algo pareci­
do com campos de concentração como na era moderna e em
pessoas acorrentadas, prestando serviços forçados, debaixo
das ordens cruéis de feitores implacáveis.
^ Foto retirada de: http://ww\v.angelfirc.com/me/babÍlonÍabn\sil/ em 13/08/2002.
Panorama Histórico de Israel 139

Para que esta imagem falsa não permaneça, neste


ponto, será apresentado um relato das condições do povo
cativo. Sem muitos detalhes, serão abordados os aspectos
social, religioso e político vivenciados pelo povo de Judá na
Babilônia, o que demonstrará que a situação não era tão difí­
cil quanto normalmente se imagina.

10.4.1. A Condição Social__________________________

Não é mais possível estabelecer o número exato dos


cativos que foram levados para a Babilônia. Mas parece que
eram poucos se comparados com os que ficaram em Judá,
ou fugiram para outros países. Porém, é notório que estes
cativos foram tirados da camada superior da população.272
Eram políticos, nobres, comerciantes, sábios, artesãos, pro­
fetas, sacerdotes e outros bem qualificados. Isto deve ter
sido de fundamental importância para a relativamente boa
estadia dos mesmos no cativeiro. Era um grupo seleto, não
uma multidão desorientada. Eles estavam aptos para sobre­
viver e manter a própria identidade cultural e social como o
fizeram. Eram pessoas com potencial para influenciar àque­
les que com eles conviviam e provaram isto ao se desenvol­
verem mesmo em condições adversas.
Hoje está claro que o sofrimento do povo cativo era
mais interno, saudades da pátria e orgulho ferido, do que ex­
terno. Eles foram assentados à força emxolônias na.Babilô-
nia mas não levavam vida de escravos Tinham relativa
liberdade, construíam casas, cultivavam, praticavam o co­
mércio e continuaram organizados em famílias.273 As condi­
ções de vida não eram das piores. Ainda que não existam
documentos descrevendo a situação de forma completa, os
poucos indícios são favoráveis. Um destes indícios são as
2?2 FO H RE R, G. H istória da Religião de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 381.
D O N N E R , H. H istória de Israel e dos P ovos Vizinhos. São Leopoldo: E ditora Sinodal; Petrópohs : E ditora
V ozes, 1997. p. 435,436.
140 Antônio Renato Gusso

plaquetas encontradas em Nippur. Elas mostram que um


dos mais importantes bancos da época pertencia a uma das
famílias para lá deportadas. Os documentos, inclusive, vão
além da época do cativeiro, o que pode estar apontando para
o fato deles terem permanecido espontaneamente na Babi­
lônia depois da libertação,274 ou autorização para o regresso.
Na verdade, muitos aproveitaram as oportunidades
oferecidas pelo cativeiro e se tornaram pessoas ainda mais ri­
cas. O contraste entre aqueles que moraram na Babilônia e
os pobres que permaneceram em Judá se tornou enorme e
não poderia ter sido diferente. Em Judá ficaram, em sua mai­
oria, os pobres e com pouco preparo, em um país arrasado
pela guerra. Para a Babilônia foram os ricos e preparados de
encontro com as oportunidades oferecidas pela capital da
maior potência da época. Deixando-se de lado os inconveni­
entes e o orgulho ferido, para muitos, o cativeiro pode ter
sido um bom negócio.
Também é bom notar que foi no cativeiro que os he­
breus passaram a fazer uso da Língua Aramaica, que viria a
se tornar a sua própria língua oficial pelos séculos que se se­
guiriam até à Era Cristã. Ela foi uma herança das tribos ara-
méias que há muito tempo haviam penetrado na Babilônia e
se tornado o elemento principal da população. Ainda que
não se possa exagerar a contribuição desta troca de idiomas,
deve ser levado em conta que eles passaram a fazer uso, nor­
malmente, de uma língua internacional, utilizada largamente
na diplomacia.

10.4.2. A Condição Religiosa_______________________

A deportação da camada social mais elevada de Judá


para a Babilônia pode ter causado uma crise muito séria na

BE EK , M. A. H istória de Isn iel Rio de Janeiro: Z ahat Editores, 1967. p. 114.


SC H U LTZ , S. J. A H istória de Israel no A ntigo Testamento. São Paulo: Hdições V ida N ova, 1988. p. 238.
Panorama Histórico dc Israel 141

religião deste povo. Em primeiro lugar, não havia mais tem­


plo e, para a maioria do povo, ele era a morada de Iavé. Além
disso, para alguns, restava a impressão de que seu Deus ha­
via se mostrado mais fraco do que os deuses da Babilônia,
principalmente do que o deus Marduk, o principal deles, do
qual se pensava que os babilónicos haviam recebido a vitó­
ria. Esta situação pode ter levado muitos dos exilados a ado­
tarem as divindades do conquistador.276
Mesmo aqueles que desejavam ser fiéis a Iavé, en­
quanto cativos na Babilônia, enfrentaram dificuldades espi­
rituais. Para muitos, assim como ocorria com os vizinhos de
Judá: Edom, Moabe e outros, a atuação de Deus se restringia
à sua terra, ao seu país. Na mente deles, Iavé atuava em Judá,
não havia como ser adorado na Babilônia. A seguinte frase:
“Como porém, haveríamos de entoar o canto do Senhor em
terra estranha?” (SI 137:4) pode ser reflexo desta forma de fé
em Deus, reformulada pelos ensinos do profeta Ezequiel
que alertou o povo para a onipresença de Iavé, o Deus que,
diferente dos demais deuses, poderia ser adorado em qual­
quer lugar.277
Segundo Fohrer, foi nesta situação de cativeiro e crise
que a religião de Israel acabou por mostrar a sua verdadeira
força, atraindo várias pessoas de outros povos para o seu
meio. Para este autor, foi nesta época que surgiu a noção de
Israel ser enviado à todas as nações. Foi neste ambiente que
surgiu no coração dos que ficaram firmes na religião de Judá,
o sentimento de missão.278 Ficou claro que a religião deveria
ultrapassar os limites da nação que no momento nem existia
como tal. Nesta época, e logo após, devem ser buscadas as
origens do Judaísmo.279

276 BO H RER, G. H istória da Religião de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 385-386.
277 H E STE R, H. I. The H eart o f H ebrew H istoty: a study oj/he O ld Testament. Nashville: Broadm an Press, 1980. p. 254.
278 FO H RE R, op. c it , p. 388.
B R IG H T , J . H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 463.
142 Antônio Renato Gusso

Isto estava de acordo com a narrativa de Ezequiel a


respeito da partida da glória de Deus de seu templo em Jeru­
salém. Uma nova realidade espiritual estava sendo revelada
aos adoradores de Iavé. O Deus deste povo não estava limi­
tado a uma cidade ou a um templo. Ninguém poderia “do­
mesticá-lo”, limitando a sua esfera de ação. Ele estava no
meio de seu povo, livre e soberano, inclusive com a possibi­
lidade de abandoná-lo de vez se a resposta à sua oferta de
vida fosse rejeitada.280
Infelizmente, não é de conhecimento, na atualidade,
exatamente como se organizou a prática da religião no cati­
veiro. O que existem são suposições baseadas em poucas
evidências. Provavelmente foi no cativeiro babilónico que
surgiu, ainda que de forma primitiva, o culto na sinagoga,
mas não há nada que comprove de forma cabal esta prática.
Pois nem o Antigo nem o Novo Testamento, e nem mesmo
os Livros Apócrifos, dão qualquer informação que possa si­
tuar de forma clara a origem dela.
Também não se sabe o que aconteceu com os canto­
res, sacerdotes, levitas e outros servidores do templo. O que
se tomou prática importante, ainda que já era exercida antes
do exílio, foi a intensificação da guarda do sábado e do ritual
da circuncisão.282 Como não havia maneira de continuar
com a pratica de sacrifícios pela ausência do templo, local
próprio para estes rituais, a ênfase religiosa foi mudando na­
turalmente e deve ter culminado em uma procura maior pela
prática da Lei de Moisés.
Como pode ser visto, os cativos enfrentaram uma
nova realidade religiosa, mas ela não foi de todo má, até mes­
mo foram esclarecidos alguns conceitos errôneos a respeito
de Deus e do culto que lhe era devido. Eles estavam no cati-

ASU RM E N D I, (. O P m jeüsm o: das origens à época moderna. São Paulo: Edições Paulinas, 1988. p. 73.
^ F E N SIIA M , C. F. Sinagoga. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 1531.
D O N N E R, M. H istória de Israel e dos P ovos Vizinhos. São Leopoldo: E ditora Sionodal; Petrópolis: Editora
Vozes, 1997. p. 437,438.
Panorama Histórico de Israel 143

veiro mas possuíam liberdade para praticar a sua religião.


Não havia mais como praticá-la em seus detalhes, como era
feito em Jerusalém. Por isso, orientados pelos profetas Eze-
quiel, Jeremias, ainda que por carta desde a terra natal, e por
outros líderes religiosos anônimos, como o chamado “Dêu-
tero-Isaías”, puderam se adaptar à nova situação e dar conti­
nuidade à religião de Iavé.

10.4.3. A Condição Política_________________________

Ainda que Judá tenha deixado de ser um estado, com


a conquista babilónica, e passado a fazer parte de uma pro­
víncia do conquistador, as atividades políticas não cessaram
totalmente. Mesmo que enfraquecidos, os líderes continua­
ram a influenciar o povo em suas decisões e, até mesmo, a
fazer política na própria Babilônia. O Livro de Daniel, inde­
pendente da data de sua escrita, é uma amostra desta possibi­
lidade.
O fato de Nabucodonosor ter levado cativo e manti­
do na Babilônia o reijoaquim (Jeconias), antes do golpe fatal
para o estado de Judá, deve ter sido um fator de enfraqueci­
mento político para o país. Ainda que outros tenham reina­
do neste período, é evidente que muitos continuavam a
considerar o rei exilado como o legítimo soberano de Judá.
Porém, embora isto tenha se refletido negativamente na ter­
ra natal, no cativeiro pode ter sido um fator positivo. Os exi­
lados contavam com a presença de um líder reconhecido
oficialmente, até mesmo pelo inimigo.
Judá chegou a ter dois reis no exílio ao mesmo tempo.
Também o rei Zedequias foi levado para a Babilônia, o que
deve ter causado uma situação bastante estranha para Judá
que tinha dois reis no cativeiro e nenhum reinando de fato.
Zedequias foi mantido no cárcere até o dia de sua morte
(Jr 52:11) ainda durante o reinado de Nabucodonosor mas,
144 Antônio Renato Gusso

ao que parece, manteve o status de rei pois, segundo Josefo,


por ordem do imperador, foi sepultado “a maneira dos
reis”.283
Existem indícios de que alguns judeus no exílio se en­
volveram em distúrbios contra o governo da Babilônia, o
que atraiu represálias sobre seus líderes (Jr 29) e, provavel­
mente, o próprio rei Joaquim (Jeconias), mesmo tendo sido
recebido bem pela corte babilónica, após alguns anos deve
ter se rebelado. Ele acabou sendo preso, ao que tudo indica,
por causa de seu envolvimento ou suspeita de envolvimen­
to, com movimentos de libertação.284
Quando Evil-Merodaque assumiu o trono da Babilô­
nia, em lugar de seu pai Nabucodonosor, libertou o rei Joa­
quim da prisão e deu-lhe uma pensão (2 Rs 25:27-30). Isto,
além de estar narrado no Antigo Testamento, é confirmado
por fontes babilónicas. Também Flávio Joséfo, ainda que
não se possa aceitar tudo o que ele escreveu, afirma que
Evil-Merodaque, além de dar muitos presentes a Joaquim,
deu-lhe o cargo de “grão mordomo de seu palácio”.285 Este
fato mostra que, mesmo no estrangeiro, ele tinha uma consi­
derável atuação política, inclusive na corte babilónica. Con­
tudo, não se sabe, atualmente, qual foi o verdadeiro papel
deste entre os exilados. A liderança de fato parece que era
exercida pelos profetas e pelos anciãos.286 Estes últimos, in­
clusive, aparecem, no Antigo Testamento, reunidos, aparen­
temente com liberdade, na casa do profeta exilado Ezequiel
(Ez 8:1).
Os dados disponíveis na atualidade a respeito deste
assunto, e de todos os outros envolvendo o cativeiro babiló­
nico, são extremamente escassos, mas apontam para uma
atuação política ativa, mesmo nas condições adversas. Mos­
J O SE FO , K H istória dos H ebreus: obra m npleta. Rio de J aneiro: CPAD , 1990. p. 250.
B R IG H T ,J. H istória de Jsrael. Sao Paulo; Kdições PauHnas, 1985. p. 467.
283 | 0 S F .F 0 , op. C ít.p . 254.
28^ SE LT Z E R, R. M. Povo Judeu, Pensamento Judaico I. Rio de Janeiro: A. K oogan editor, 1990. p. 25.
Panorama Histórico de Israel 145

tram que os judeus não se alienaram politicamente e, ainda


que em tetra “estranha”, cultivavam o sonho de voltar a ser
uma nação.

10.5. A Duração do Cativeiro_____________________

O período de tempo que o povo levado de Judá, e


seus descendentes, passaram no Cativeiro Babilónico, apa­
rentemente, não deveria ser matéria de dúvida. Afinal, é uma
questão, apenas, de datas, e estas podem ser bem estabeleci­
das nesta época. Contudo, a matéria não é tão simples assim.
Para algumas pessoas, o tempo que este povo perma­
neceu como cativo tem sido um grande problema. Isto devi­
do à dificuldade de conciliar o período, facilmente datado,
com a declaração de Jeremias, falando em nome de Deus,
que disse: “Assim diz o Senhor: Logo que se cumprirem para
Babilônia setenta anos atentarei para vós outros e cumprirei
para convosco a minha boa palavra, tornando a trazer-vos
para este lugar” (Jr 29:10).
Tomando-se como literal a promessa feita por inter­
médio de Jeremias, e muitos o fazem, o povo deveria voltar
para a terra de Judá depois de, exatamente, setenta anos de
cativeiro. Se eles voltaram antes de se cumprir este período a
profecia de Jeremias não está correta. Partindo-se desta
“verdade” assentada, que são setenta anos literais, muitos
voltam-se para novos cálculos, procurando conciliar as datas
com aquilo que pensam ser a promessa da Bíblia.
Hester, querendo mostrar que a profecia de Jeremias,
dando um período de setenta anos literais para o cativeiro
está correta, apresenta duas possibilidades de cálculos para
se chegar a este número. Na primeira, o profeta tinha em vis­
ta a data da primeira leva de cativos para a Babilônia em
607/6 a.C. e o primeiro grupo que retornou à Jerusalém em
536 a.C. Na segunda, toma-se como base de cálculo a con-
146 Antônio Renato Gusso

quista e destruição de Jerusalém em 586 a.C. e a data do iní­


cio da reconstrução do templo, em 516 a.C., depois da volta
do último grupo de exilados, o que daria o tempo de setenta
anos. Contudo, declara que, muitas vezes, o tempo é conta­
do em apenas cinqüenta anos, iniciando em 587 a.C. e termi­
nando em 537 a.C..287
Harrison, mostrando-se um pouco mais flexível em
suas considerações, afirma que o número setenta, no Livro
de Jeremias, é arredondado, contando a partir de 605 a.C.
até, mais ou menos, 536 a.C.288 Mas, ao que parece, o mais
prudente mesmo é tomar este número setenta como simbó­
lico, o que é outra opção bastante viável. Neste caso, ele es­
taria indicando um longo período de servidão289 e não a
exatidão do período.
Deixando-se a questão da profecia de Jeremias de
lado, não querendo harmonizá-la com qualquer data que
seja. O que está muito claro é que no ano de 605 a.C. foram
levados os primeiros cativos, como reféns, para a Babilônia e
no ano 538 a.C, sessenta e sete anos depois, Ciro, no primei­
ro ano de seu reinado sobre o império da Babilônia, procla­
mou um decreto ordenando que a comunidade dos judeus e
o culto em Jerusalém fossem restabelecidos.290 Oficialmente
era o fim do cativeiro, embora não fosse o aval para volta­
rem a ser uma nação.
Como foi visto nas linhas anteriores, este período da
História de Israel ainda se encontra um tanto obscuro. Nem
poderia ser diferente. Esperar que um povo cativo, não or­
ganizado em estado, tivesse tempo, forças e vontade para re­
gistrar em detalhes os acontecimentos de sua época, seria
esperar demais. Portanto, até o momento, é preciso se con-

287 I IESTER, H. I. The Heart o f! Ie b iw Histo y: a study of the Old '\estament. Nashville: Broadman Press, 1980. p. 253-254.
2^ H A R R ISO N , R. K. Jerem ias e la m en ta ções: introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida N ova, 1980. p. 101).
CRAICíIE, P .C et a). Wore! h ib im ! Commentary. Dallas; Word Books, Publisher, 1991. p. 366.
2')<1 B R IG H T , J . H istória de Israel São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 440, 489.
Panorama Histórico de Israel 147

formar com as informações encontradas nos registros babi­


lónicos e os poucos indícios extraídos da Bíblia.
Contudo, fica claro, pelo que aqui foi exposto, que o
Cativeiro Babilónico foi um fator de transformação radical
para Judá e sua religião. Eles nunca mais seriam os mesmos.
O processo era irreversível. Deixaram de existir como Esta­
do mas continuaram como comunidade de fé, o que foi fun­
damental para o desenvolvimento posterior da religião
judaica e, mesmo, do cristianismo que viria bem mais tarde.
Como pode ser visto, mesmo sendo apresentado
pela Bíblia como um castigo da parte de Deus, contra seu
povo desobediente, o Cativeiro Babilónico acabou por se
tomar um fator positivo para o progresso da religião de Iavé.
Nele foram deixados de lado alguns conceitos incompatíveis
e lançados os alicerces para uma nova etapa, onde Deus pas­
sa a ser entendido de uma forma mais clara. Assim, aquilo
que parecia ser totalmente negativo para Judá, acaba por ser
transformado em um fator fundamental para a apresentação
de Deus ao mundo.
148 Antônio Renato Gusso

10.6. Para Complementar

10.6.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) O Livro de Jeremias
b) O Livro de Ezequiel
c) O Livro de Daniel
d) O Livro de Isaías 40-66

10.6.2. Questões Para Revisão_______________________

a) Quem foi o fundador do Império Neobabilônico?


b) Qual o nome do rei da Babilônia que levou cativo o
povo de Judá?
c) Qual o significado do termo diáspora?
d) Escreva a respeito da importância da diáspora.
e) Descreva como era a cidade da Babilônia quando os ca­
tivos de Judá foram levados para lá.
f) Descreva a condição social dos cativos na Babilônia.
g) Descreva a condição religiosa dos cativos na Babilônia.
h) Descreva a condição política dos cativos na Babilônia.
i) Explique a questão da duração do cativeiro babilónico.
Panorama Histórico de Israel 149

1 1 . A COMUNIDADE PÓS-EXÍLICA

Depois de ter se passado, aproximadamente, meio sé­


culo desde a destruição do templo em Jerusalém, levando ao
desaparecimento do Estado de Judá, quando parecia não ha­
ver mais possibilidade alguma de retorno para aqueles que ha­
viam sido levados para o cativeiro na Babilônia, a situação do
povo judeu começou a mudar. Mais uma vez a liderança mun­
dial estava mudando de “mãos e, com isto, renasceram as es­
peranças de um recomeço para Judá. Ainda estava longe o
momento de voltar a ser uma nação independente, mas os pri­
meiros passos estavam sendo dados. Pessoas com grande po­
tencial de liderança estavam voltando para a terra natal, deles
ou de seus pais no caso daqueles que já haviam nascido na Ba­
bilônia, com o firme desejo de reorganizarem a vida social,
econômica e religiosa da antiga pátria. O que parecia impossí­
vel a algum tempo atrás, desde cerca de dez anos após o início
do cativeiro291 (Ez 37:1-13), repentinamente, estava se tornan­
do realidade, cumprindo as profecias a este respeito.
Para que haja uma melhor compreensão daquilo que
ocorreu neste período da História de Israel, aqui serão anali­
sados três aspectos básicos da nova situação enfrentada pe­
los judeus. Em primeiro lugar será visto, sob o título de “Os
Novos Senhores”, como foi que ocorreram as mudanças
mundiais que permitiram o chamado retorno do cativeiro e,
logo em seguida, verificado quem foi que realmente voltou,
destacando-se os grupos que retornaram com os líderes Zo-
robabel, Esdras e Neemias. Depois disto, então, serão verifi­
cadas as condições econômica, religiosa e política da
comunidade pós-exüica durante o Período Persa.
^ TA Y L O R , J. B. H^equiek introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida N ova, 1984. p. 210.
150 Antônio Renato Gusso

A ênfase maior, como não poderia deixar de ser em


um trabalho como este, será dada à comunidade estabelecida
em Judá, o palco principal dos acontecimentos bíblicos.
Contudo, ainda que de forma mais superficial, também se­
rão abordadas algumas questões que dizem respeito às co­
munidades espalhadas por outras partes do vasto império
comandado pelos persas.

11.1. Os Novos Senhores__________________________

O Império Neobabilônico, como é de conhecimento


geral, foi de curta duração, cobrindo um espaço de tempo
de, aproximadamente, oitenta e sete anos, desde sua funda­
ção pelo poderoso Nabopolassar, em 626 a.C., e sua extin­
ção, em 539 a.C., quando era comandado pelo pouco
conhecido Nabonido, em conjunto com seu filho Belsazar.
Por falta de líderes que fossem capazes de dar continuidade à
política de Nabopolassar e seu famoso filho Nabucodono-
sor, os caldeus, depois de terem alcançado o topo da lideran­
ça mundial, logo deixaram o poder escapar de seu controle,
sendo obrigados a dar lugar para os persas, os quais viriam a
ser, a partir de então, pelos próximos dois séculos, os novos
senhores da maior parte do mundo conhecido na época.
A seguir será visto em destaque: 1) como que os per­
sas chegaram ao poder mundial; 2) qual a política destes no­
vos senhores em relação aos cativos que haviam sido
levados de seus territórios para outros, tanto pelos assírios
quanto pelos babilónicos que os precederam na liderança
dos povos que agora lhes estavam sujeitos; e 3) quais foram
os líderes que governaram este novo império.
Panorama Histórico de Israel 151

11.1.1. Os Persas Chegam ao Poder__________________

Ao que parece, o grande culpado pelo fim do Império


Babilónico foi Nabonido. Ele, com uma política desastrada,
recheada de inovações religiosas, procurando abertamente
colocar a deusa Sin na posição de maior destaque no panteão
babilónico, deixando em posição inferior o deus Marduk,
conseguiu atrair sobre si a inimizade de seu povo e, particu­
larmente, dos influentes sacerdotes de Marduk, os quais so­
friam pesados prejuízos com a política adotada pelo rei.2y2
Este e outros acontecimentos, como o fato de ter se ausenta­
do da capital por um período de mais ou menos dez anos,
deixando a administração aos cuidados de seu filho Belsazar,
acabou por trazer uma certa instabilidade interna para o im­
pério. A queda era apenas uma questão de tempo, o qual não
demorou a passar. Quando ele percebeu que estava em uma
situação delicada procurou mudar a sua política, retornando
à cidade de Babilônia e reverenciando o deus Marduk. Os es­
forços foram em vão, a Babilônia já estava dividida e muitos
só esperavam o momento certo para aclamar outro rei no lu­
gar de Nabonido.
Por esta mesma época (550 a.C.), surgia também um
perigo externo para a Babilônia. Seu mais temível adversário,
o estado Medo, mudou de mãos, quando Ciro, o persa, um rei
vassalo da Média, e unido a ela por laços familiares, coman­
dou uma revolta bem sucedida que acabou por transferir-lhe
o comando do Império Medo. Os feitos deste novo conquis­
tador não parariam por ai. Logo passou a expandir as suas
conquistas chegando a formar um império como nunca havia
sido formado antes. Babilônia, ainda que tenha sobrevivido
por mais alguns anos, não tinha como enfrentar tamanho po­
derio. Sua queda já estava sendo esperada por muitos.293

2)2 B RIG H T, J . H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 477.
293 B RIG H T, op. cit., p.478'479.
152 Antônio Renato Gusso

Finalmente, nos últimos meses do ano 539 a.C., as


tropas de Ciro sitiaram a cidade de Babilônia.294 O general
babilónico Gobrias, que havia passado para o lado de Ciro,
entrou na cidade com suas tropas sem precisar lutar e, pou­
cos dias mais tarde, o próprio Ciro foi recebido pelo povo na
capital como um libertador e não como um conquistador.
Nabonido, inicialmente conseguiu escapar, mas depois foi
preso e Ciro assumiu o trono do Império Babilónico como
rei legítimo.295

11.1.2. A Política Persa Para Com os Deportados_______

Ciro foi um homem de extrema habilidade política.


Ele procurou governar de forma pacífica tratando seus con­
quistados com grande consideração. Para um líder daquela
época de tantas atrocidades, era um homem de espírito ge­
neroso.296Não só os babilónicos usufruíram desta nova ma­
neira de governar mas, também, todos os povos que
passaram para o seu comando quando o Império Babilónico
foi conquistado. A forma como ele é tratado no Livro de Isa-
ías, sendo chamado de pastor e ungido de Iavé (Is 44:28 e
45:1) é uma boa amostra de suas qualidades e de quão eleva­
da era a sua reputação, inclusive, entre o povo judeu.
Sua maneira diferente de dominar se destacou, princi­
palmente, pelo tratamento que dispensou aos povos que fo­
ram deportados de suas pátrias para a Babilônia. Ele
permitiu que cada um voltasse para o seu próprio lugar de
origem, se assim o desejassem, e levassem com eles o s deu­
ses que haviam sido “presos” anteriormente, por seus ante­
cessores no trono. A inscrição que se encontra em um
cilindro de cerâmica mandado fazer por ele, é uma boa
amostra de sua política para com os que haviam sido levados
294 STEINMANN, J. 0 Bvro da co>colação de Israele os profetas da i vita do exílio. São Paulo: Edições Paulinas, 1976. p. 157.
295 B R IG H T , op. cit., p. 487-488.
296 H E ST E R, H. 1. 7 'he heart o fh eb m v history: a study ojth e Qld'Vestament. N ashville: Broadman P ress, 1980. p.258.
Panorama Histórico de Israel 153

cativos para a Babilônia e para com os seus deuses que tam­


bém haviam sido transferidos para lá. Algumas de suas li­
nhas dizem o seguinte:
“Eu, Ciro, o rei do império mundial, o grande e poderoso rei,
o rei de Babel, o rei da Suméria e o rei de Acade (...), por cujo
governo Bei e Nabu se afeiçoaram e cujo reinado desejavam
para alegrar seu coração - depois de entrar pacificamente em
Babel, sob júbilo e alegria, estabeleci a sede régia no palácio do
soberano (...) Marduque, o grande senhor, alegrou-se com mi­
nhas [boas] ações. Ele abençoou graciosamente a mim, Ciro,
o rei que o venera, e Cambises, meu filho biológico, assim
como todas as minhas tropas. Em bem-estar nós [vivemos]
alegremente diante dele (...) Sob a ordem de Marduk, o grande
senhor, mandei que os deuses da Suméria e de Acade, os quais
Nabonid havia trazido para Babel, causando a ira do senhor
dos deuses, ocupassem em bem-estar uma morada agradável
em seus santuários. Que todos os deuses que levei para suas
cidades falem, dia após dia, diante de Bei e Nabu em favor do
prolongamento de meu tempo de vida, que digam palavras
em meu favor e falem a meu senhor, Marduk: Em favor de
Ciro, o rei que te venera, e seu filho Cambises (...)”297
Os judeus, já no primeiro ano do reinado de Ciro ob­
tiveram permissão para retornar a Judá. Seu decreto permi­
tindo este retorno pode ser encontrado em 2 Cr 36 e
também no Livro de Esdras. Assim está escrito na versão de
Esdras 1:2-4:
“Assim diz Ciro, rei da Pérsia: O Senhor Deus dos
céus me deu todos os reinos da terra, e me encarregou de lhe
edificar uma casa em Jerusalém de Judá. Quem dentre vós é
de todo o seu povo, seja seu Deus com ele, e suba a Jerusa­
lém de Judá e edifique a casa do Senhor, Deus de Israel: ele é
o Deus que habita em Jerusalém. Todo aquele que restar em
alguns lugares em que habita, os homens desse lugar o ajudarão
297 In: D O N N IiR, H. Históriaât IsradeàospmosiT^jnbos. São Ix‘opoldo: Sinodal; Petrópoli.s: Vozes, 1997. p. 444-445.
154 Antônio Renato Gusso

com prata, ouro, bens e gados, afora as dádivas voluntárias


para a casa do Senhor, a qual está em Jerusalém.”
Em uma rápida leitura desta passagem da Bíblia, des­
considerando-se as evidências externas a respeito deste mo­
narca, pode-se ter a impressão de que ele era um convertido
ao Deus de Israel. Porém, como pode ser visto, inclusive, na
inscrição do cilindro citado acima, Ciro era extremamente
politeísta ou, ao menos, assim se mostrava, procurando
agradar a todos os povos e seus deuses na tentativa de obter
para si os seus possíveis favores. Seja como for, esta caracte­
rística de sua política foi o que permitiu que os judeus voltas­
sem para Jerusalém e dessem início à reconstrução do
templo e, mesmo, da nação.
Tanto Ciro quanto a maioria de seus sucessores lan­
çaram mão desta nova fórmula de governo. A maior parte de
seus oficiais eram medos ou persas dando, quando possível,
atribuições de responsabilidades para príncipes locais, sem­
pre respeitando as tradições de cada um dos povos subjuga­
dos, ao mesmo tempo em que mantinham um controle
firme do Império por meio de uma burocracia complexa.298

11.1.3. Os Líderes do Império Persa__________________

A tarefa de alistar em ordem cronológica os reis que


governaram o Império Persa, em alguns casos, se torna bas­
tante complicada. Por exemplo, a história tem mostrado de
forma clara que o primeiro comandante do Império, o qual
conquistou a Babilônia, foi Ciro. Contudo, o texto bíblico de
Daniel 5:31, tratando da mudança de mãos do poder babiló­
nico, afirma que um soberano chamado Dario se apoderou
do reino. Isto tem levado os estudiosos da questão à várias
tentativas de solução, mas sem uma definição totalmente sa­
tisfatória. Alguns têm deduzido que Dario foi um governa­
2,8 BRIO.HT, op. cit., p. 490.
Panorama Histórico de Israel 155

dor ao lado de Ciro299, outros que ele era um general persa


chamado Gubaru, colocado por Ciro para comandar o reino
da Babilônia300 mas, ao que parece, até o momento, aqueles
que defendem que Ciro e Dario, desta época, pois mais tarde
outros adotaram este nome, não são duas pessoas mas', sim,
dois nomes diferente para um mesmo líder, ainda que com
dificuldades, têm boas possibilidades de estarem corretos.
Segue uma relação dos governantes e dos períodos
aproximados em que estes governaram, elaborada por Her­
bert Donner.301 Não se defende aqui que ela esteja totalmen­
te correta. A questão é mais complicado do que possa
parecer a princípio e, em alguns detalhes, precisa continuar
aberta. Mas ela serve como um ponto de partida para auxílio
do estudante.
Governantes do Império Persa

Governantes Período
Ciro II 559-530
Cambises II 530-522
Dario I Hystaspes 522-486
Xerxes I 486-465/4
Artaxerxes I Longimanus 465/4-425
Dario II 424-404
Artaxerxes II Mnemon 404-359/8
Artaxerxes III Ochos 359/8-338
Arses 338-336
Dario III Codomanos 336-331

299 F R A N C ISC O , C. T. Introdução ao Vetíjo Testamento. Río de Janeiro: JU E RP, 1979. p. 285.
M E RRJL, E. H. H istória de Isra el no A ntigo Testamento: o reino de sacerdotes que D eus colocou entre a s nações. Rio de J a ­
neiro: CPAD , 2001. p. 514.
D O N N E R, op. cit., p. 444.
156 Antônio Renato Gusso

Na relação defendida por Bright, além de aparecerem


algumas diferenças nos períodos de governo, aparece um
Xerxes II, entre Artaxerxes I Longimanus e Dario II, o qual
teria reinado em um breve período no ano 423 a.C.302 Com­
plicando ainda mais a situação, em Esdras e Ester, surge um
rei persa ch a m a d o A ssuero. Kidner, tentando resolver o
problema, explica que Assuero é a forma hebraica de
khshctyarsha, o qual, em grego, resulta na forma Xerxes. As­
suero, então, seria o mesmo Xerxes I.303
Também é importante destacar, neste ponto, que de­
pois do ano 445 a.C. não aparece nenhum registro a respeito
das relações entre os governantes persas e os judeus. Sabe-se
apenas que continuaram debaixo do poder destes até que trans­
feriram a lealdade, automaticamente, para Alexandre o Grande,
em 331 a.C., quando este conquistou o Império Persa.304

11.2. Os Grupos Que Voltaram Para Judá__________

Com certeza grande parte das pessoas que foram le­


vadas para o cativeiro babilónico morreram nele. O período
de tempo que ele durou (entre 50 e 70 anos) deve ter sido o
suficiente para que a maioria dos deportados tenha morrido
sem ver a libertação. Boa parte daqueles que não morreram
já estavam com idade avançada, tendo dificuldades para fa­
zer uma viagem tão longa, quando Ciro permitiu que voltas­
sem. Portanto, quando se fala da volta do cativeiro, deve-se
ter em mente que os grupos de viajantes eram formados, em
sua maior parte, por pessoas que nunca haviam estado em
Judá. Para muitos deles não se trata exatamente de uma vol­
ta, mas da ida para a terra dos antepassados em busca de uma
nova perspectiva de vida econômica, social e religiosa.

302 B R IG H T, op. c it, p. 648.


K ID NHR, D. E sdras e N eeniias: introdução e com ntário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 54.
B A N W E LL, B. O. Pérsia, persa. São Paulo: Edições Vida N ova, 1983. p. 1276.
Panorama Histórico de Israel 157

A história nunca poderá responder, com certeza, qual


foi o número de pessoas que partiu para Judá em busca desta
nova vida. A maior parte permaneceu vivendo na Babilônia
e em outros locais do império, onde estavam bem estabeleci­
dos, tratando de seus negócios e unidos às suas famílias. O
que se sabe, é que ao menos três grupos distintos, em épocas
diferentes, fizeram esta viagem. Outros grupos menores, ou
familiares, naturalmente, também devem ter feito o mesmo,
porém não se conhecem os registros destes movimentos.
Aqui serão apresentados os grupos conhecidos que
“retornaram” com os líderes Zorobabel, Esdras e Neemias.
Será visto sob que condições voltaram e como enfrentaram
as adversidades para levar a efeito a viagem e as dificuldades
encontradas na nova terra.

11.2.1. O Grupo de Zorobabel_______________________

O primeiro grupo a deixar a Babilônia e partir para


Judá foi o liderado por Zorobabel (Ed 2:2). Este homem era
neto do rei Joaquim e deve ter se tornado o líder natural do
povo, quer a sua missão tenha sido oficial, ou seja, em nome
do governo persa, ou oficiosa, por livre iniciativa.305 Como o
Livro de Esdras, em seu primeiro capítulo, apresenta uma
outra pessoa encarregada por Ciro de levar os objetos do
templo até Jerusalém, alguns têm concluído que, inicialmen­
te não era Zorobabel o líder dos que voltaram do cativeiro,
mas sim um tal de Sesbazar, o qual pode ter sido seu tio.306A
questão é difícil e ainda não está totalmente esclarecida, ha­
vendo, inclusive, quem pense que se tratam de dois nomes
diferentes (Sesbazar e Zorobabel) para a mesma pessoa. Mas
a opinião de Kidner parece sensata. Depois de debater cada
ponto de vista atual a respeito do problema da identidade de
Sesbazar ele conclui dizendo:
305 D. Ex/ras e N eem ias: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 38.
W IN W A R D , S. P. A gu id e to the prophets. London: H odder and Stoughton, 1968. p. 190.
158 Antônio Renato Gusso

“Restam-nos, conforme parece, apenas duas alterna­


tivas viáveis: ou ele era um oficial estrangeiro (se o título
príncipe de Judá pode significar legitimamente governador,)
ou, a despeito do silêncio da narrativa, Sesbazar era o nome
oficial de Zorobabel, cuja linhagem é citada somente quando
é mencionado com seu próprio nome.
Tenho dificuldades em escolher entre estas alternati­
vas, mas pela margem de probabilidade sou atraído pela pri­
meira.”307
Ainda que não possa haver uma certeza absoluta da
posição política de Zorobabel em um primeiro momento,
fica claro pelo texto de Esdras 2:2 que ele estava à frente do
primeiro grupo que retornou à Judá e, que alguns anos mais
tarde, em 520 a.C., o profeta Ageu se dirigia a ele chaman­
do-o pelo título de governador (pehâh —PinSl) de Judá (Ag
1:1). O termo pehâh, utilizado naquela ocasião “é uma pala­
vra emprestada do acadiano, um lembrete de que Zorobabel
fora nomeado por um rei persa.”308
Ninguém deve imaginar que esta primeira volta ocor­
reu da noite para o dia, às pressas. Isto não era necessário,
como foi na época da saída do Egito, nem viável. Eles preci­
savam de um certo tempo, e o tinham, para se organizarem
para uma mudança como esta. O fato comprovado de que
eles foram liberados já no primeiro ano do reinado de Ciro
não quer dizer que tenham partido no mesmo ano. Seria
mais viável pensar em alguns anos de preparativos e acertos
gerais antes de se lançarem a esta aventura.309
Seria bom pensar na composição deste primeiro gru­
po que partiu para Judá, como a união de dois tipos de pes­
soas. Ele, provavelmente, era formado por aqueles idealistas
que, independentemente da situação em que se encontra-

307 Ibid. p. 161.


3Í)S BALDW IN , J. G. Ageu, ZacariaseM alaqm as: introdução e em entário. São Paulo: HdiçÕes Vida Nova, 1991. p. 29-30.
3<l') D O N N E R, H. H istória de Israel e dos p o vo s vizinhos. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: V ozes, 1997. p. 465.
Panorama Histórico dc Israel 159

vam na Babilônia, desejavam partir para a terra dos antepas­


sados e formar o verdadeiro Estado de Israel, dentro dos
moldes exigidos por Deus, como deveria ter permanecido
desde a antigüidade, e por aqueles que ainda não haviam
conseguido se estabelecer de forma adequada no país do exí­
lio. Para estes o retorno era uma chance de recomeço, quem
sabe conseguindo reaver as antigas propriedades da família,
ou reassumindo suas tradicionais posições de liderança na
sociedade como era o caso dos sacerdotes e outros possíveis
servidores do templo que no exílio haviam perdido suas fun­
ções.
O grupo que retornou não era muito grande, mas era
expressivo, ao que parece cerca de cinqüenta mil judeus.310
Vontade de trabalhar certamente não lhes faltava e assim
que retornaram deram início às reformas necessárias. En­
contraram um país em ruínas e adversários desejosos de im­
pedir a sua restruturação. Depois de enfrentarem muitas
dificuldades, com o incentivo dos profetas Ageu e Zacarias,
líderes fundamentais neste período de recomeço, consegui­
ram reconstruir o templo de Jerusalém, mais de vinte anos
depois de terem recebido a permissão de Ciro para este em­
preendimento (Ed 1-6).

11.2.2. O Grupo de Esdras__________________________

Esdras, descendente do primeiro Sumo-Sacerdote de


Israel, Arão (Ed 7:1-5), ele mesmo sacerdote e escriba, peri­
to nas escrituras (Ed 7:6), foi o líder de um outro grupo de
judeus que partiu da Babilônia para Jerusalém. Uma leitura
rápida do livro bíblico que leva seu nome pode dar a impres­
são de que isto aconteceu logo em seguida à conclusão do
templo, sob a direção de Zorobabel e Josué. Contudo,
deve-se ter em conta que isto ocorreu cerca de sessenta anos
310 (^OCLHO FILH O , I. G . A geu nosso m ik m pom n m . Rio dc jan eiro . (UF.RP, 1991. p .17.
160 Antônio Renato Gusso

mais tarde. Este é o período que separa o capítulo seis do ca­


pítulo sete de Esdras.311
O grupo de pessoas que acompanhou Esdras nesta
viagem foi muito menor do que o grupo dos pioneiros com
Zorobabel. Mas, também era um grupo respeitável. Pelos re­
gistros do Livro de Esdras percebe-se que o grupo era for­
mado por cerca de mil e oitocentos homens, sem contar as
esposas filhas e servos.312
Eles partiram com a autorização e certa ajuda do rei
da Pérsia, Artaxerxes I, por volta do ano 457 a.C.. Se reuni­
ram antes da partida próximo a um rio chamado Aava, hoje
de localidade desconhecida, e depois dos últimos preparati­
vos que envolveu um jejum pedindo a ajuda de Deus para a
jornada, iniciaram a viagem de aproximadamente 1600 km,
que fizeram em um tempo de quatro meses (Ed 7:7-9).
Esdras, entre outras atividades, atuou em Judá de forma
decidida contra o pecado dos casamentos mistos que estavam
sendo praticados pelo povo e, inclusive, pelos seus líderes.
Com muita determinação levou-os a voltarem atrás, apesar de
todas as conseqüências sociais envolvidas no problema. Sua
atuação foi fundamental para Judá, a ponto de ele ter sido con­
siderado pela tradição como um segundo Moisés. Conforme
Josefo, a atuação de Esdras foi reconhecida pelo seu povo
como de grande valia, o que lhe proporcionou um enterro, de­
pois de boa velhice, com grandes honras em Jerusalém.313

11.2.3. O Grupo de Neemias________________________

O historiador Flávio Josefo afirmou que Neemias


partiu para Jerusalém somente após a morte de Esdras.314
Evidentemente, isto não passa de um engano deste escritor

31 * K.IDNER, D. Eíí/ra.( e N eemias: introdução e comentário. São Paulo-. Edições Vida N ova, 1989. p. 66.
^ BAX TER, J . S. Exa/ninai a s escrituras: E ^ eq nida Nlalaquias. São Paulo: Edições Vida N ova, 1995. p. 294.
JO SEFO , F. H istória dos b ebm ís: obra completa. Rio dc Janeiro CPAD , 1990. p. 265.
3 u ‘lbid. p. 265.
Panorama Histórico de Israel 161

do passado. O próprio Livro de Neemias testemunha que os


dois foram contemporâneos e mostra que estavam traba­
lhando juntos na reforma religiosa (Ne 8) assim como na de­
dicação dos muros da cidade de Jerusalém, reconstruídos
pelo povo liderado por Neemias (Ne 12:36).
Partindo do texto bíblico não há como duvidar que
os dois atuaram, pelo menos em determinada época, ao mes­
mo tempo em Jerusalém. Contudo, eruditos modernos têm
questionado a seqüência bíblica para a ida dos dois para
Judá. Eles defendem que a ordem deve ser Neemias-Esdras
e não Esdras-Neemias, como está na Bíblia.315 Mas, Kidner,
analisando as hipóteses levantadas por estes estudiosos con­
cluiu escrevendo o seguinte:
“Parece razoável dizer que nenhuma das objeções,
maiores ou menores, à ordem bíblica dos eventos é compul­
siva, e indicam que nada mais forte do que a probabilidade é
realmente alegada pela maioria dos estudiosos para qualquer
uma das reconstruções sugeridas. Sendo este o caso, a narra­
tiva que já possuímos certamente deve ter precedência sobre
as narrativas que não temos. E à parte do direito prioritário
do real sobre o hipotético, nada daquilo que discutimos tem
peso suficiente para contrabalançar a vasta improbabilidade
de que nosso autor, tão dedicado nos pormenores, e com
acesso aos registros das suas personagens principais, escritos
na primeira pessoa, não tinha idéia de como estes homens se
relacionavam entre si, ou deixaram de se relacionar, nem de
quem antecedeu a quem”.316
Não há como verificar na atualidade quantas pessoas
acompanharam a Neemias neste empreendimento. Certa­
mente não foram muitas. Mas ele chegou a Jerusalém acom­
panhado de oficiais do exército e cavaleiros, a seu serviço,
além de cartas do rei para os governadores das regiões vizi-
^ D O N N Iill, II. I lis/ona d e Israel e dos p ovo s vizinhos. São l.xjopoldo: Hditora Sinodal; Petrópolis : I '.ditorzi
V ozes, 1997. p. 473-475.
316 D. U niras t introdução e comentário. São Paulo: li-dições Vida N ova, 1989. p. 179.
162 Antônio Renato Gusso

nhas, apresentando-o como o novo governador de Judá. O


grupo deve ter sido pequeno mas seleto, provavelmente es­
colhido pelo próprio Neemias e, sob a sua liderança, foi de
fundamental importância para implementar as reformas que
se faziam necessárias. Entre elas, uma das mais impressio­
nantes, foi a reconstrução dos muros da cidade em apenas
cinqüenta e dois dias (Ne 6:15), depois de estarem destruí­
dos a cerca de cento e trinta anos.

11.3. As Condições Gerais da Comunidade Pós-Exílica

Quando se fala em comunidade pós-exílicas é melhor


pensar no conjunto das “comunidades judaicas” espalhadas
pelo Império Persa e não apenas no grupo que vivia em
Judá. Como já foi visto, relativamente poucos voltaram para
a terra de seus antepassados. A maioria estava bem estabele­
cida no exílio e permaneceu onde estava. Por isso, ainda que
Ciro tenha permitido que os judeus se deslocassem para a
antiga pátria, é bom lembrar que eles continuaram “espalha­
dos”, em comunidades, por vários locais.
Como a babilônia permaneceu como um centro da
vida judaica por séculos, é possível deduzir que lá continuou
existindo uma forte comunidade. Também existem algumas
evidências de uma comunidade judaica, pouco conhecida, em
Sardis, na Asia Menor e no Baixo Egito, além da razoavel­
mente conhecida comunidade de Elefantina, situada junto à
primeira catarata do rio Nilo.317Não é possível aqui, e nem em
outros locais onde se possa usar mais espaço, descrever em
detalhes a situação destas comunidades, pois elas são pouco
conhecidas. Mas nesta parte serão dadas algumas informações
gerais a respeito da situação política, religiosa e econômica-so-
cial dos judeus que viveram debaixo do domínio persa.

^ BRIG M T, ). H istória de lírae/. São Paulo: KdiçÕcs Paulinas, 1985. p. 511).


Panorama Histórico de Israel 163

11.3.1. A Situação Política__________________________

A situação política dos judeus não era melhor do que


a dos outros povos que estavam sendo dominados pelos
persas. Não é por que lhes foi permitido voltar para Judá que
se pode falar em autonomia política jDara este período. Isto
teria que esperar ainda muito tempo. A volta não significou
independência mas sim permissão para que eles fossem para
a terra de seus antepassados, agora domínio persa, e restau­
rassem um local de interesse do império. Não era a volta do
Estado de Judá, ainda que muitos assim devem ter pensado,
principalmente por causa da liderança de Zorobabel que era
descendente do rei Davi. Naturalmente, os profetas Ageu e
Zacarias, chegaram a ver nele a possibilidade de se cumprir a
promessa do Messias que levaria Israel à uma nova era.318
Mas isto não se concretizou, Judá era uma província da Pér­
sia e assim permaneceria até passar para os gregos quando
estes assumissem o comando.
Ainda que em algumas ocasiões, nem sempre, judeus
estiveram governando a província de Judá, como foi o caso
de Zorobabel e Neemias, não há dúvidas que eles represen­
tavam o governo central e estavam ocupando este cargo,
principalmente, para defenderem os interesses persas. De
fato, em alguns períodos, Judá foi até mesmo administrada
pelos líderes de Samaria, com a ajuda dos sumo sacerdotes,
os quais cuidavam das questões locais.319 Isto é uma boa
amostra da condição política limitada que eles possuíam.
Como povo, os judeus não tiveram grande participa­
ção política no Império Persa, era mais um grupo de subju­
gados entre tantos outros mas, como indivíduos, alguns
conseguiram galgar postos importantes dentro da estrutura
estatal. Esta foi a situação de Daniel, Neemias, Ester, Mar-

318 BA LD W IN , J . G. Ageu, '/.acarias t M alaqnias. São Paulo: l ídições Vida N ova, 1991. p. 42.
319 B RIG H T, J . 'o p, c it , p. 512.
164 Antônio Renato Gusso

doqueu e provavelmente outros menos conhecidos ou total­


mente desconhecidos dos historiadores modernos. Sem
entrar em detalhes a respeito destes personagens conhecidos
na atualidade, os quais devem ser procurados na bibliografia
atual que trata diretamente dos livros bíblicos, é importante
dizer que eles ilustram bem as possibilidades que um judeu
poderia ter dentro do sistema político do império.
Estas possibilidades de ascensão, é claro, não estavam
limitadas aos judeus, como é possível notar no Livro de Ester.
Hamã, um provável descendente de Agage, rei amalequita,
inimigo de Israel na época de Saul,320 também conseguiu, ain­
da que por breve período, ser uma pessoa de grande destaque
no Império Persa, a ponto de conseguir do rei permissão para
executar todo o povo judeu espalhado pelo império (Et
3:7-11). Aqueles que interessavam ao governo, por uma ou
outra razão, foram bem aproveitados na administração.

11.3.2. A Situação Religiosa________________________

A situação religiosa dos judeus no período pós-exíli-


co, sob o domínio persa, não era das melhores e variava con­
forme a época e localização da comunidade. Se por um lado
alguns obtiveram uma compreensão mais elevada de Iavé e
sua religião, outros acabaram optando por um culto alta­
mente sincrético. Este foi o caso da comunidade de Elefanti-
na. Contrariando claramente as determinações do Livro de
Deuteronômio construíram um templo dedicado a Iavé
onde lhe ofereciam sacrifícios e o adoravam ao lado de ou­
tras divindades também cultuadas. Eram judeus, do mesmo
sangue que seus parentes de Judá ou outras localidades, mas
praticavam uma religião, ainda que em alguns aspectos se­
melhante, com pontos totalmente contrários à religião histó-
i
rica de seu povo. 321
,2<) BA LD W IN , J. Ci. Mster. introdução e comentário. São Paulo : F.dições Vida N ova, 1986. p. 64
^ B RIG H T, \. H istória de Isra el São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 510-511.
Panorama Histórico de Israel 165

Certamente, entre aqueles que partiram para Judá,


quando liberados por Ciro, haviam muitos adoradores since­
ros de Iavé, esta era a maior motivação para que enfrentas­
sem o desafio do recomeço. Mas mesmo assim, logo foi
necessário que os profetas Ageu e Zacarias os estivessem in­
centivando a fazer aquilo que deveriam fazer em nome da re­
ligião. Basta ler o primeiro capítulo do Livro de Ageu para
perceber que Iavé já havia passado para segundo plano na
lista de prioridades daqueles que haviam deixado a Babilônia
para restaurarem o culto correto a Iavé em Jerusalém. A per­
gunta que o profeta faz aos líderes e ao povo de Judá: “Acaso
é tempo de habitardes vós em casas apaineladas enquanto
esta casa permanece em ruínas?” (Ag 1:4), revela o descaso
com que eles estavam tratando o principal símbolo de Iavé
em Jerusalém, seu templo, a morada de Deus.
A pregação destes profetas surtiu um bom efeito e
logo a comunidade de Judá respondeu de forma favorável.
Em poucos anos reconstruíram o templo em Jerusalém. Po­
rém, ainda que não se possa datar com muita precisão a épo­
ca dos fatos narrados no Livro de Malaquias, ele é uma forte
testemunha da apostasia, falta de respeito e desinteresse dos
sacerdotes e do povo em geral quanto à Lei de Moisés, que
ocorreu não muito depois da construção do chamado, atual­
mente, segundo templo.322 Ao que parece isto ocorreu pelo
não cumprimento das promessas feitas por Ageu e Zacari­
as,323 as quais foram interpretadas como prestes a ocorrerem
mas que, realmente, apontavam para um futuro não muito
próximo.
Mais tarde, ou conforme alguns, ainda na época dos
fatos narrados em Malaquias,324 com a atuação de Esdras e
Neemias, a religião de Judá passa por mais alguns ajustes e
322SC H U I.TZ , S. J. A história de Israel no A utigo 7 'estamento. São Paulo: Kdiçôes Vida N ova, 1988. p. 399-400.
323 yA'1'1 -!S, K. M. I j >sp ro jeta s deiA n tign o T estam ento:proclam ando sus m en sa jesp ara e ld ia de hoy. N ashville: Casa
Hautista de P ublicaciones, 1984. p. 303.
32<* BALDW IN . J. G. Ageu, 'Zacarias e M alaquias: introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida N ova, 1991. p. 178.
166 Antônio Renato Gusso

acaba por se tornar o germe do judaísmo nascente.325 Foi


dado um valor cada vez maior à Lei, diminuindo a ênfase
cultual e profética. À medida em que o valor da Lei foi cres­
cendo a fé profética foi diminuindo.326 Estas mudanças con­
tribuíram para uma maior popularidade da religião de Judá.
Ela, ainda que mantendo o seu ponto central no templo e na
cidade de Jerusalém, cada vez mais se desprendia de um de­
terminado local, dando oportunidade para que os judeus de
outras partes do Império, ainda que longe da terra berço de
sua religião, também pudessem participar efetivamente da
vida religiosa da comunidade de fé que agora ultrapassava as
fronteiras.

11.3.3. A Situação Econômica-Social_________________

Assim como nos outros povos espalhados pelo Im­


pério Persa, também entre o povo judeu existiam pessoas ri­
cas e pobres, as quais participavam de dois grupos cada vez
mais distintos. Fora da Judéia, em termos gerais, os judeus
ocupavam uma boa posição na sociedade e tinham posses
suficientes para que não desejassem partir para a terra natal
de seus antepassados em busca de uma nova vida. Eles esta­
vam em condições, inclusive, de ajudar aqueles que retornas­
sem (Ed 1:4). Na Judéia, nota-se uma grande diferença entre
aqueles que haviam retornado do cativeiro e aqueles que ha­
viam permanecido na terra de Judá. Afinal, quando Judá foi
levado ao cativeiro ficaram os pobres na terra que havia sido
arrasada (Jr 52) e aqueles que voltaram consideravam-se o
verdadeiro “Israel”.327
O Livro de Neemias é uma boa amostra das condi­
ções sociais e econômicas do povo de Judá em sua época.
Neemias, quando trabalhava na capital do império, na cidade
D O N N E R, H. H istória d e Isra el e d os p o r o s n in h o s . São Leopoldo: SinodaJ; Petrópoíis: V ozes, 1997. p. 488.
326 G. H istória da religião de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. p. 448-449.
327 j^ j^ N E R , D. E sd n ii e N eew ias: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p.
Panorama Histórico de Israel 167

de Susã, recebeu notícias da Judéia por intermédio de seu ir­


mão Hanani que de lá havia chegado. Ao perguntar como es­
tavam aqueles que não foram para o exílio recebeu a seguinte
resposta: “...Os restantes, que não foram levados para o exí­
lio e se acham lá na província, estão em grande miséria e des­
prezo; os muros de Jerusalém estão derribados, e as suas
portas queimadas a fogo.” (Ne 1:3). Esta ainda era a situação
daqueles que não foram para o exílio, não daqueles que vol­
taram do exílio, isto cerca de oitenta anos depois de terem
obtido de Ciro a permissão para reconstruírem Jerusalém.
Ainda no Livro de Neemias fica claro o abismo que
havia sido aberto entre os ricos e os pobres. Os pobres esta­
vam passando fome e pegavam dinheiro emprestado para
pagar os seus impostos, enquanto os ricos aproveitando a si­
tuação difícil, desconsiderando a Lei de Moisés, ganhavam
mais dinheiro, cobrando juros, aumentando a aflição de seus
compatriotas desfavorecidos, tomando-lhes, até mesmo, os
filhos como escravos em pagamento das dívidas. Nada po­
deria mostrar esta situação tão dramática, entre pessoas que
se diziam irmãs, como o texto bíblico que relata a queixa do
povo diante de Neemias. Eles diziam, acusando os ricos:
“...Nós somos da mesma carne como eles e nossos filhos são
tão bons como os deles; e eis que sujeitamos nossos filhos e
nossas filhas para serem escravos, algumas de nossas filhas já
estão reduzidas à escravidão. Não está em nosso poder evi­
tá-lo; pois os nossos campos e as nossas vinhas já são de ou­
tros.” (Ne 5:5).
Fica como destaque da comunidade pós-exílica, no
período persa, a sua condição de universalidade. Ou seja, é
vima comunidade que não está limitada por fronteiras. Ainda
que existissem grupos diferentes, em várias partes do impé­
rio, alguns até destoando claramente dos demais na prática
do culto, como a comunidade de Elefantina, havia um senti­
mento de união. Existia um vínculo racial e religioso, ainda
168 Antônio Renato Gusso

que em linhas gerais, que continuava a uni-los mesmo em


condições adversas. Era um povo entre os povos que cada
vez mais desaprendia a ser nação e aprendia uma nova forma
de comunhão, a comunidade de fé, a qual se expandiria so­
bremaneira nos próximos séculos e teria a sua base na cidade
“Santa”, Jerusalém.
No mais, fica claro que a volta para Judá não signifi­
cou o seu renascimento como estado, isto não seria permiti­
do pelo rei persa. Foi um primeiro passo que iria ser
complementado pelos Macabeus, mais tarde, já sob o domí­
nio grego. Por enquanto, o máximo que eles conseguiriam é
que Judá fosse uma das províncias da Pérsia, algumas vezes,
nem sempre, governada por um judeu seguindo as orienta­
ções do Império.
Também é bom destacar que o período que vai até o
reinado de Dario II (424-404 a.C.) é o máximo no qual se po­
dem encontrar evidências das relações dos judeus com o go­
verno persa. Depois desta época não se sabe praticamente
nada, a não ser que passaram para o domínio grego quando
Alexandre o Grande conquistou o Império Persa. Aí, então,
começava uma nova fase da história.

11.4. Para Complementar________________________

11.4.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

a) 2 Crônicas 36:17-23
b) O Livro de Esdras
c) O Livro de Neemias
d) O Livro de Ester
e) Daniel 5:29-6:28; 9-11
f) O Livro de Ageu
Panorama Histórico de Israel 169

g) O Livro de Zacarias
h) O Livro de Malaquias

11.4.2. Questões Para Revisão_______________________

a) Como foi que Ciro conquistou a Babilônia?


b) Escreva a respeito da política de Ciro para com os po­
vos subjugados e seus deuses.
c) Quanto tempo, mais ou menos, depois da destruição
do templo de Jerusalém por Nabucodonosor aconte­
ceu o início da volta dos cativos da Babilônia?
d) Explique a conversão, ou não, de Ciro ao Deus verda­
deiro.
e) Escreva a respeito da função de Zorobabel em Judá.
f) Destaque os nomes dos líderes dos três grupos que re­
tornaram para Judá, de acordo com o relato bíblico.
g) Por quanto tempo, aproximadamente, ficaram destruí­
dos os muros de Jerusalém antes de serem reconstruí­
dos na época de Neemias?
h) Escreva a respeito das condições políticas de Judá e
dos judeus neste Período.
i) Escreva a respeito das condições religiosas das comu­
nidades judaicas no Período Persa.
j) Escreva a respeito das condições sociais dos habitantes
de Jerusalém no Período Persa.
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 171

12. O PERÍODO GREGO


Quando o leitor iniciante da Bíblia deixa o Antigo
Testamento e passa para o Novo fica perplexo. Parece que
tudo mudou. Não reconhece mais o ambiente onde os fatos
estão se desenrolando. Inexplicavelmente não se fala mais
em Pérsia, surgem personagens estranhos, como fariseus,
saduceus e outros. Os profetas praticamente desapareceram
e os sacerdotes possuem grande autoridade. Fala-se muito
em sinagoga, algo totalmente desconhecido no Antigo Tes­
tamento,328 a teologia está bem mais desenvolvida e perce-
be-se que agora o mundo é dominado pelo poder de Roma e
pela cultura grega. O que aconteceu? Esta é a pergunta nor­
malmente feita pelo leitor em busca de uma solução para a
abrupta ruptura entre as duas partes da Bíblia.
Aconteceu que o tempo passou! Entre os escritos dos
dois Testamentos há um espaço aproximado de 400 anos, o
chamado Período Intertestamentário, e para que haja um en­
tendimento melhor do Novo Testamento é necessário co­
nhecer, ainda que superficialmente, algumas das mudanças
ocorridas nesta época. Caso contrário muitos textos perma­
necerão enigmáticos.
Na tentativa de amenizar este impacto para o estu­
dante da Bíblia é que nestes últimos capítulos deste livro se­
rão apresentados os períodos do domínio grego, da
independência, com os macabeus e, novamente, de domínio
sob os romanos, em ordem cronológica. O primeiro, então,
como segue, é o período grego, destacando-se o seu início

328 A lguns sugerem que no Salm o 74:8 existe um a referência à Sinagoga no A ntigo T estam ento, porém não é
esta a palavra que está lá, no texto grego da LXX, nem seu equivalente im ediato hebraico no T exto M assorético.
N a verdade não há um a evidência clara a respeito da existência de tais construções nesta época. V eja a opinião de
K ID N E R, D. Sabaos 73-150: introdução e comentário. São Paulo: Edições V ida N ova, 1992. p. 296.
172 Antônio Renato Gusso

com Filipe da Macedônia, o auge sob Alexandre o Grande, e


a caminho do fim com os Ptolomeus e Seleucidas, sempre
destacando os pontos importantes relacionados com o povo
judeu, sem dar muita importância para outras questões, tam­
bém importantes, mas não relacionadas diretamente com
este povo e com o objetivo deste livro.

12.1. O Surgimento de um Novo Império___________

Como tudo na vida passa a glória da Pérsia e seus reis


também passou. Por volta do ano 400 a.C. o poder mundial
começa, mais uma vez, a mudar de mãos. Os persas vão
saindo do cenário e dando lugar para os gregos que mais tar­
de também, por sua vez, seriam substituídos pelos romanos.
O começo do fim do Império Persa aconteceu na
época de Artaxerxes II Menemon, que reinou entre 404 e
358 a.C. Seu reinado foi marcado pela revolta do Egito, que
conseguiu sua independência em 401 a.C., e pela revolta in­
terna encabeçada por Ciro, o Moço, irmão do rei persa. Fa­
tos estes que incentivaram o surgimento da chamada
“Revolta dos Sátrapas”, ou seja, dos governantes. Rebelião
que acabou sendo controlada e não conseguindo derrubar o
império, mas que o enfraqueceu sobremaneira.329
Depois da morte de Artaxerxes II assumiu Artaxer­
xes III Ochus. Ele conseguiu dar ainda um pouco de vida ao
império acabando com seus possíveis rivais internos, seus ir­
mãos e suas irmãs, e sufocando as revoltas que surgiam por
todos os lados. Chegou inclusive a reconquistar o Egito, que
já estava independente por um período de aproximadamen­
te sessenta anos. Mas, quando tudo parecia caminhar para
uma época de tranqüilidade, ele foi morto por envenena­
mento. O mesmo aconteceu com seu filho e sucessor Arses,

329 B R IG H T , j . H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 554-555.


Panorama Histórico de Israel 173

que conseguiu se manter no poder por apenas dois anos


(338-336). Acabou assumindo o poder Dario III Codoma-
nus, que conseguiu permanecer por apenas mais cinco anos
(336-331 a.C.), sendo morto por um de seus governadores
(sátrapas) quando tentava fugir do grego Alexandre O Gran­
de que, com seus soldados, entrava triunfante nas principais
cidades controladas pelos persas.330

12.2. O Auge do Período Grego___________________

Ao mesmo tempo em que Artaxerxes III desenvolvia


seu governo sobre a Pérsia, Filipe II da Macedônia ia, gradu­
almente, consolidando cada vez mais seu poder sobre os es­
tados gregos. No ano da morte de Artaxerxes III, 338 a.C.,
ele conseguiu colocar todos debaixo de seu governo. Con­
tudo, pouco tempo depois, em 336 a.C., assassinado, deixou
o cargo para seu filho Alexandre,331 de apenas 20 anos de ida­
de, que levaria o Império Grego ao auge em pouco tempo.
Alexandre era uma pessoa muito culta, sedenta de
conquistas. Foi educado pelo famoso filósofo Aristóteles e,
de forma obcecada, desejava levar sua influência a todos os
países conhecidos. Aproveitando-se da momentânea fra­
queza dos medos-persas deu início às suas campanhas vitori­
osas que só pararam com sua morte, aos 32 ou 33 anos de
idade, treze anos após ter assumido o poder.
As informações sobre Alexandre e suas ações são
bastante confusas, por vezes envoltas em lendas, mas atri­
bui-se a ele a fundação de setenta cidades, todas moldadas
conforme o estilo grego. Também é certo que ele e seus sol­
dados, no afa de disseminar a cultura grega, conhecida como
helenismo, casaram-se com mulheres orientais, misturando
assim as culturas.332
Ibid. p. 553-563.
331 B R IG H T , ]. H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 556.
332 ->
G U N D RY , R. Panoram a d o N ovo Testamento. São Paulo: Edições Vida N ova, 1981. p. 4.
174 Antônio Renato Gusso

Com as vitórias de Alexandre contra os persas passou


para ele o domínio de todo o antigo Oriente Médio e, a partir
daí, o mundo nunca mais foi o mesmo. A cultura grega, que
já vinha a tempos sendo propagada pelos comerciantes e co­
lonizadores gregos, com estas conquistas e ações receberam
um forte impulso, e causaram mudanças profundas na ma­
neira de viver de todos os povos subjugados. Entre as conse­
qüências desta influência está a utilização da língua grega que
passou a ser utilizada no comércio, na diplomacia e, mais tar­
de, na época do Novo Testamento, seria falada pela maioria
das pessoas até mesmo nas ruas de Roma.333 A contribuição
desta língua universal para a expansão do cristianismo é ób­
via. Sem ela, a mensagem cristã encontraria muito mais difi­
culdades em sua propagação.
As informações a respeito das relações dos judeus
com os gregos, na época de Alexandre, não são muitas e,
além disso, fica difícil de separar o falso do verdadeiro entre
elas. Mas, algumas das informações, vindas do historiador
Flávio Josefo, ainda que duvidosas em seus detalhes, devem
ser levadas em consideração nas suas linha gerais.
Segundo Josefo, o primeiro contato de Alexandre
com os judeus não foi muito proveitoso. Durante a campa­
nha de conquista de Damasco, Tiro e Sidon, Alexandre es­
creveu ao Sumo-sacerdote dos judeus, Jado, pedindo-lhe
auxílio, comércio livre com seu exército, e a mesma lealdade,
para com ele, como vinha sendo demonstrada, até o mo­
mento, para com Dario, o rei da Pérsia. Mas, para surpresa
dele, recebeu uma resposta negativa, acrescida da alegação
de que havia uma promessa de lealdade feita com juramento
a Dario, e que não poderia ser quebrada. Resposta esta que
em muito o contrariou e resultou em sérias ameaças para os
judeus.334

‘ ‘ Ibid. p. 4-5.
JO SE F O , F. H istória do ( hebreus: obra completa. Rio de Janeiro: CPAD , 1990. p. 273.
Panorama Histórico de Israel 175

Conta ainda Josefo que, Alexandre, depois de ter


conquistado Tiro, precipitou-se contra Jerusalém. Ocasião
em que o Sumo-sacerdote judeu, em um sonho, teria recebi­
do uma revelação divina a respeito de como deveria tratar o
conquistador. Foi-lhe revelado que as portas deveriam ser
abertas para ele e flores deveriam ser espalhadas por toda a
cidade, enquanto o próprio Sumo-sacerdote, revestido com
seus trajes especiais de ofício, acompanhado dos demais sa­
cerdotes, vestidos de branco, deveria ir ao encontro de Ale­
xandre, sem temor.335
Assim foi feito, segundo este historiador judeu, e a re­
ação de Alexandre foi extremamente favorável. Pois ele, ao
ver o Sumo-sacerdote e sua comitiva, reconheceu na cena
um de seus antigos sonhos, quando, ainda na Macedônia,
preocupado em como poderia fazer para conquistar a Ásia,
viu Jaso, em suas vestes sacerdotais e recebeu dele uma pala­
vra de ânimo e certeza de que venceria os persas. Diante dis­
so, Alexandre abraçou o Sumo-sacerdote e outros
sacerdotes e, entrando em Jerusalém, foi até o templo sacri­
ficar a Deus, segundo orientações de Jaso.336
Jaso aproveitou a boa vontade do conquistador e su­
plicou-lhe que fosse permitido aos judeus, tanto os que mo­
ravam na Judéia como na Babilônia e Média, viverem
segundo as suas leis, além de serem isentados do tributo no
sétimo ano, pagando apenas nos outros seis. Ao que Alexan­
dre respondeu de forma positiva, além de estender a possibi­
lidade de participação de judeus em seus exércitos, com a
liberdade de praticarem sua religião.337
Mesmo que detalhes deste testemunho de Josefo não
devam ser levados em consideração, por faltarem outros tes­
temunhos históricos que os comprove, fica claro que, no ge-
115 Ibid. p. 553-563.
336 jo SE F O , F. H islóría d os hebreus: obra completa. Rio de Janeiro: CPAD, 1990. p. 274.
337 Ibid.
176 Antônio Renato Gusso

ral, as relações entre Alexandre e os judeus foram boas. Eles


que vinham já ha muitos anos sendo leais aos dominadores
persas, com quem também tinham boas relações, na ocasião
passaram a ser leais aos gregos. Não deve ter havido muitas
mudanças na situação política e religiosa que vinham viven-
ciando. Praticamente, só mudaram os dominadores. Judá
continuou a ser uma província, não possuindo rei nem auto­
nomia política, tendo o Sumo-sacerdote como autoridade
máxima de seu povo.

12.3. A Divisão do Império Grego_________________

Logo após a morte prematura de Alexandre o Gran­


de, na Babilônia, causada por doença, seu império começa a
desmoronar. Como não deixou herdeiros capacitados para o
governo, seus generais passaram a disputar o controle do
império, o que resultou em uma inevitável divisão.
Quatro dos generais de Alexandre acabaram herdan­
do partes significativas de seu império. Foram eles: Ptolo-
meu, Seleuco, Lisímaco e Cassandro. Destes, são
importantes para a história aqui narrada, Ptolomeu e Seleu­
co. Eles tiveram influência direta sobre Judá, que estava lo­
calizada entre o Egito dos Ptolomeus e a Síria dos
Selêucidas, tornando-se assim um lugar estratégico para os
dois novos impérios que viriam a se tornar rivais.
As lutas constantes entre os dois e seus sucessores
deixaram Judá em situação bastante difícil. Ambas as partes
queriam a posse deste território que servia de corredor para
as tropas e, com isto, Judá mudou de mãos várias vezes em
curto espaço de tempo. Aquilo que na antigüidade havia sido
positivo para enriquecer a antiga nação de Israel, sob o co­
mando de Salomão, sua posição geográfica especial ligando
importantes pólos comerciais, neste período foi fator de
desgraça, atraindo sobre a província a cobiça dos conquista­
dores.
Panorama H istórico de Israel 177

12.3.1. Os Ptolomeus

O Império Ptolomeu teve seu foco central no Egito,


com Alexandria como capital. Seu domínio durou muitos
anos e a famosa rainha Cleópatra, que morreu em 30 a.C., foi
o último membro da dinastia dos Ptolomeus.338
Sob os Ptolomeus, os judeus tiveram uma relativa li­
berdade. Muitos, ainda que deportados para o Egito, na épo­
ca do primeiro Ptolomeu, souberam e puderam aproveitar
bem as oportunidades comerciais e condições de trabalho
que tiveram. As condições acabaram sendo favoráveis a tal
ponto que outros foram por vontade própria tentar a vida
nas cidades gregas que estavam sendo fundadas. Em especi­
al, muitos foram para a cidade de Alexandria, onde forma­
ram uma grande colônia. Lá os Ptolomeus fundaram uma
grande biblioteca com obras antigas preciosas, cuidadas por
bibliotecários que se tornaram notáveis, iniciando o estudo
da gramática grega e dando atenção especial à crítica de tex-
tos. 339
Na Judéia, na época dos Ptolomeus, o sumo sacerdo­
te era o governador. Ele trabalhava em conjunto com o con­
selho de sacerdotes e anciãos fazendo com que as leis
fossem cumpridas. O Templo de Jerusalém era o centro da
vida religiosa dos judeus, que podiam celebrar suas festas re­
ligiosas com normalidade, recebendo, inclusive, peregrinos
vindos de todas as partes. Foi dada ênfase especial à Lei nes­
te período e a interpretação foi bastante desenvolvida. O que
não estava bem, na Judéia desta época, era a situação econô­
mica. As guerras, a imigração e o pagamento dos impostos
empobreceram a população.340

^ G U N D R Y , R. P anorama do N ovo Testamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 4.


33J ’fE N N E Y , M. C. O N ono Testamento: sua origem e análise. São Paulo: Edições Vida N ova, 1989. p. 55-57.
^ T E N N E Y , M. C. O N ovo Testamento: sua origem c análise. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 56.
178 Antônio Renato Gusso

Foi na época dos Ptolomeus, mais especificamente


no período de Ptolomeu Filadelfo (285-246), que começou a
tradução do Antigo Testamento Hebraico para a língua gre­
ga, a chamada Septuaginta (LXX). O trabalho foi feito no
Egito, ao que parece, para beneficiar os judeus que já com­
preendiam melhor o grego do que o hebraico e, ainda que a
tradição e as lendas que envolvem esta versão da Bíblia, afir­
mem que a tradução foi realizada por judeus da Judéia, espe­
cialmente levados para o Egito para desempenhar este
trabalho, alguns defendem que é provável que tenha sido re­
alizado por egípcios mesmo.341
Ainda que os detalhes a respeito do surgimento desta
versão não possam ser esclarecidos até o momento, e que
muito sobre este assunto venha sendo considerado como
lenda, o que é incontestável é a grande contribuição que ela
deu à disseminação do judaísmo e, mais tarde, do cristianis­
mo, que assumiu este trabalho como sua primeira Bíblia. Na
época de Cristo ela já estava espalhada entre os judeus da
dispersão e pode-se imaginar o quanto foi útil aos primeiros
missionários esta Bíblia escrita em linguagem universal. As
várias citações dela feitas no Novo Testamento, inclusive,
são um forte testemunho de sua importância.

12.3.2. Os Seleucidas______________________________

Após muitas tentativas fracassadas da parte dos Se-


lêucidas para conquistarem a Judéia, por meio de invasões
ou alianças matrimoniais, Antioco III, finalmente, ao derro­
tar os Ptolomeus do Egito, em uma batalha junto às nascen­
tes do rio Jordão, em 198 a.C., consegue anexá-la aos seus
domínios.342 A partir daí a situação dos judeus começaria a
mudar de forma drástica.

G U N D RY , R. Panoram a th Not-v Testamento. São Paulo: Edições Vida N ova, 1981. p. 5.


B R IG H T , J. H istória ih lsm eL São Paulo; Edições Paulinas, 1985. p. 566.
Panorama Histórico de Israel 179

Inicialmente os judeus receberam bem os novos do­


minadores. Até mesmo lutaram ao lado deles contra os exér­
citos dos Ptolomeus. Provavelmente, eles esperavam ver o
fim da guerra e ter melhor sorte sob os Selêucidas e, inicial­
mente, foi isto mesmo o que aconteceu. Antíoco III tratou-
os muito bem. Entre outros benefícios, ordenou que os re­
fugiados voltassem para suas terras; que os escravizados fos­
sem libertos; que houvesse redução nos impostos; que
tivessem liberdade de culto; que fossem isentados de taxas
todos os trabalhadores do templo, os escribas e os membros
do conselho dos anciãos; e que fossem abolidas as taxas em
Jerusalém por três anos, para que a cidade pudesse se recu-
perar economicamente. 343 •

Antíoco III, em poucos anos, 187 a.C., depois de se


envolver em guerras com os romanos e ser derrotado, aca­
bou sendo morto ao saquear um templo em Elão, com a in­
tenção de conseguir dinheiro para cobrir as exigências de
Roma. Em seu lugar assumiu seu filho, Seleuco IV, que re­
sistiu no poder até 175 a.C.,344 quando foi assassinado por
seu tesoureiro Heliodoro, em uma tentativa de tomada de
poder. Contudo, quem passou a reinar foi o irmão de Seleu­
co IV, Antíoco IV (Epifânio), que havia estado como refém
em Roma e de lá voltava pronto para tentar unir o Império
impondo o politeísmo grego como religião do Estado.345
Começava o triste caminho para o final do Império Selêuci-
da e vislumbravam-se dificuldades e mais dificuldades para
os judeus.
Antíoco IV, seguindo seus planos de helenização do
povo que lhe estava subjugado, destituiu Onias III de seu
cargo de sumo sacerdote, em Jerusalém, e colocou Jasom
em seu lugar. A missão deste era transformar Jerusalém em

m Ib id p. 566, 567.
344 Ib id p. 570.
H ALE, D. B. /fitmdiiçíio ao estudo do N om Testamento. Rio de Janeiro: JU E R P , 1983. p. 13.
180 Antônio Renato Gusso

uma cidade grega. Nesta época foi construído um ginásio na


cidade, onde jovens judeus se exercitavam despidos, no esti-
1° grego, e cultos a deuses pagãos eram realizados antes das
competiçoes/146• ~

Os costumes estavam sendo transformados. A fre­


qüência aos teatros gregos, a adoção de roupas gregas, a utili­
zação de cirurgias para que fossem removidas as marcas da
circuncisão, e a adoção de nomes gregos, em lugar de judeus,
se tornavam cada vez mais populares. Aqueles que se opu­
nham a esta paganização da cultura eram tratados como Ha-
sidim, que significa algo equivalente a puritanos.347
A situação que estava ruim ainda iria piorar muito.
Antíoco IV substituiu mais uma vez o sumo sacerdote em
Jerusalém. Tirou o cargo de Jasom, que ele mesmo havia co­
locado nesta posição, e deu-o a Menelau, uma pessoa que,
provavelmente, nem tenha pertencido a alguma família sa­
cerdotal, mas que ofereceu-lhe um tributo mais elevado. Tal
“negociata” envolvendo este cargo tão importante deve ter
desgostado profundamente os judeus piedosos.348
Depois disso Antíoco IV partiu para o Egito na tenta­
tiva de conquistá-lo. O que ele não esperava é que neste epi­
sódio seria humilhado por Laenus, um embaixador Romano
que se encontrava no Egito, aliado de Roma na época. Con­
ta-se que este embaixador romano fez um círculo ao redor
de Antíoco IV e exigiu que ele prometesse, antes de pisar
fora do círculo, se retirar do Egito, juntamente com suas tro­
pas. O que ele, conhecendo o poderio romano, resolveu fa-
zer. 3 4 9
Neste meio tempo, Jasom, o sumo sacerdote deposto
para ceder o lugar a Menelau, recebeu a falsa notícia da mor­
te de Antíoco IV. Imediatamente deixou seu exílio, foi para

G U N D RY , R. Panorama d o N o r o Ttslamenlo. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 5.


547 Ibid.
348 Ibid. p. 7
349 Ib,d.
Panorama Histórico de Israel 181

Jerusalém e retomou seu ofício, depondo Menelau. Atitude


esta interpretada por Antíoco como um ato de revolta.
Amargurado pela vergonha passada no Egito, Antíoco IV
não teve dúvidas, enviou seu exército para Jerusalém reinte­
grando assim Menelau no cargo de sumo sacerdote. O pro­
blema maior é que foram além disto. Aproveitaram a ocasião
para saquear a cidade e matar muitos dos judeus.350
Dois anos mais tarde, em 168 a.C., Antíoco enviou,
mais uma vez, seus soldados até Jerusalém. Eles foram co­
mandados pelo general Apolônio e chegaram com a missão
de coletar tributo, declarar ilegal a prática da religião judaica
e estabelecer o paganismo à força. Como resultado a cidade
foi saqueada, muitos foram mortos, mulheres e crianças fo­
ram escravizadas, manuscritos do Antigo Testamento foram
destruídos, um altar a Zeus foi colocado no templo, animais
considerados impuros pela Lei de Moisés foram sacrificados
no altar do templo351 e muitas outras abominações foram co­
metidas. A situação para os judeus praticantes da religião fi­
cou insustentável. Uma reação a tudo isto, naturalmente, iria
acontecer.

350 G U N D RY, R. Panorama do N ovo Tet/amen/o. São Paulo: 1klições V ida N ova, 1981. p. 7.
351 Ibid- p. 7-8.
182 Antônio Renato Gusso

12.4. Questões Para Revisão

a) Qual o tempo aproximado entre os acontecimentos do


Antigo e do Novo Testamento?
b) Qual o nome e que idade tinha o sucessor de Filipe II
da Macedônia?
c) Descreva, em poucas linhas, a vida e os ideais de Ale­
xandre O Grande.
d) Escreva um breve relato sobre as condições gerais dos
judeus sob Alexandre.
e) Qual era o principal cargo político-religioso na Judéia
no Período Grego?
f) Como ocorreu a divisão do Império Grego?
g) Qual foi a condição da Judéia sob o domínio dos Ptolo-
meus?
h) O que é e quando surgiu a Septuaginta?
i) Qual o último membro da dinastia dos Ptolomeus?
j) Qual foi a condição da Judéia sob o domínio dos Selêu-
cidas
Panorama Histórico de Israel 183

13. O PERÍODO DOS MACABEUS


Conhecer algumas informações a respeito do Período
dos Macabeus é indispensável para melhor compreender a
Bíblia, principalmente porque nele podem ter acontecido o
cumprimento de várias promessas divinas feitas a Judá
como nação no Antigo Testamento. Como será visto, em
ordem cronológica, neste período a Judéia passou por gran­
des dificuldades, conseguiu vitórias impressionantes, lidera­
da por Judas Macabeu, e chegou a gozar uma época de
próspera independência para, em seguida, mais uma vez, en­
trar em decadência.

13.1. A Revolta Contra os Selêucidas_______________

Como foi visto no capítulo anterior, os Selêucidas,


sob a liderança de Antíoco IV, Epifânio (chamado por al­
guns de Epimanes, que significa “o louco”)352, colocaram os
judeus que desejavam permanecer leais à sua religião em
uma situação bastante difícil. Chegou o momento em que
eles não tiveram outras escolhas, simplesmente pereceriam
ou lutariam por suas vidas e pela religião que professavam.
Segue um breve relato a respeito da situação desespe-
radora dos judeus nesta época e como foi a deflagração da
revolta.

13.1.1. A Situação Desesperadora dos Judeus Fiéis_____

A situação na Judéia não era difícil para todos. Haviam


aqueles que aceitavam passivamente e até desejavam a
352 T O G N IN I, E. O p eríod o interinblico. São Paulo: Louvores do Coração, 1987. p. 87.
184 Antônio Renato Gusso

paganisação de sua cultura e religião, enquanto outros, por


questão de fé, não conseguiam conviver com a influência
dos deuses gregos. Os primeiros, é claro, sentiam-se bem
com as inovações, mas os outros não podiam aceitar o que
lhes estava sendo imposto.
Antíoco IV, em sua vontade de helenizar a Judéia,
não compreendendo o porquê dos judeus piedosos não se
submeterem à sua política, ultrapassou todos os limites do
bom senso e a cada momento só aumentava o ódio destes.
Ele acabou implantando uma guarnição militar em uma ci­
dadela grega murada dentro de Jerusalém. Ela era conhecida
pelo nome de Acra e, mais do que uma guarnição militar,
para os judeus fiéis à religião, era um símbolo odioso do do­
mínio estrangeiro, e vima colônia de pagãos e judeus renega­
dos, dentro da cidade santa.353
Percebendo que a resistência judaica estava baseada
em sua religião, Antíoco, fez o que pode para destruí-la.
Além de proibir a sua prática, sob pena de morte, implantou
altares em várias partes do território para que animais impu­
ros fossem sacrificados sobre eles. Os pagãos foram obriga­
dos a cooperar no esforço de levar os judeus a participarem
dos cultos idólatras, e muitos judeus piedosos foram obriga­
dos a comer carne de porco e a praticar ritos considerados
por eles como abomináveis.354
Além de tudo isso os judeus passaram a ser forçados a
participar de uma festa em honra ao deus Dionísio (o mes­
mo Baco), e do sacrifício mensal que era feito em homena­
gem ao aniversário do rei. Como se fosse pouco, em
dezembro de 167 a.C., foi introduzido no templo de Jerusa­
lém o culto ao deus Zeus Olímpico. Lá foi erigido um altar a
esta divindade e, provavelmente, também construída uma

BR IG H T , I. H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p.575.


354 Ibid. '
Panorama Histórico de Israel 185

imagem dela355 que, poucos dias depois, recebeu o sacrifício


de uma porca,356 em ato de culto, elementos altamente ofen­
sivos aos adoradores de Iavé.
Diante de situação tão difícil como esta não havia
muito o que fazer. Ou os judeus fiéis pereciam em nome da
fé, ou, como outros haviam feito, renegavam a religião de
seus pais e assim seriam absorvidos pela religião e cultura
grega imposta pelo dominador, com o objetivo de unir o seu
império, ou lutavam pelos seus ideais. Mesmo em desvanta­
gem a luta foi a escolha.

13.1.2. A Deflagração da Revolta____________________

A deflagração da revolta partiu de um velho sacerdote


chamado Matatias, filho de Simão, neto, ou bisneto,357 de
Hasman, que vivia em Modim, um pequeno lugar entre Jeru­
salém e Jope. Ele era descendente direto do famoso primei­
ro sacerdote de Israel, Arão, irmão de Moisés,358 e tinha
cinco filhos, João, Simão, Judas, Eleazar e Jônatas, que mui­
to o ajudaram.
Este homem, Matatias, sendo o principal de sua vila,
foi procurado por emissários do rei selêucida para que desse
exemplo aos demais moradores do lugar oferecendo um sa­
crifício público aos deuses gregos. Ele que vinha lamentan­
do diante de seus filhos a deplorável situação da Judéia, e
defendendo que seria melhor morrer pela defesa da religião
herdada de seus pais do que viver sem honra, teve a oportu­
nidade de mostrar a sua fé. Respondeu aos emissários que
não se sujeitaria ao pedido que lhe estavam fazendo e que
nem ele nem seus filhos trairiam a religião de seus antepassa­
dos.359
^ B RIG H T, J . H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p.575.
356 'PENN EY, M. C. 0 N ovo Testamento; sua origem e análise. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 59.
^ G U N D RY, R. H. Panoram a d o N ovo Testamento. Sào Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 9.
358 t o G N I N I , e . O p eríod o interhíblim. São Paulo: Louvores do Coração, 1987. p. 88.
jO S E F O , F. H istória dos htb m ts. o b ta com pleta. Rio de jan eiro : C P À D , 1990. p. 288.
186 Antônio Renato Gusso

Diante da negativa de Matatias, um outro judeu, cer­


tamente temendo pelas duras conseqüências que viriam so­
bre o povo por causa do ato de desobediência, adiantou-se
para sacrificar conforme o pedido do rei, mas o ato não foi
concluído. Matatias, em uma reação surpreendente, em
companhia de seus filhos, matou o judeu bem como Apeles,
o oficial do rei, e seus soldados. Feito isto, destruiu o altar,
conclamou os demais à luta e fugiu em companhia de famíli­
as inteiras de simpatizantes para a região montanhosa.
Como informa Bright, também juntaram-se a eles ou­
tros judeus que fugiam da perseguição e bom número de Ha-
sidim, pessoas religiosas que viriam a dar origem aos
conhecidos fariseus do Novo Testamento e aos essênios,
que produziriam os famosos Papiros do Mar Morto na co­
munidade de Qumran.360 Estava começando a Revolta do
Macabeus.
Matatias, alguns meses depois de ter dado início à re­
volução que era não só uma luta contra os exércitos da Síria,
governada por Antíoco IV, mas também uma guerra civil
contra os judeus que haviam abraçado a cultura e religião
dos gregos, adoece e morre. Antes de morrer, porém, passou
o comando de seu grupo a seu filho chamado Judas, também
conhecido como Macabeu, nome que significa malho, ou
martelo. Este, com a ajuda de seus irmãos, levaria a nação à
independência.

13.2. As Conquistas de Judas Macabeu____________

A história confirma que Judas era a pessoa certa no


lugar certo para fazer frente aos inimigos dos judeus naquela
ocasião. A atuação dele comandando os rebelados foi tão
marcante que o episódio como um todo ficou conhecido

3íi<) G U N D RY, R. H. Panorama d o N o ro Testamento. Sao Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 9.
Panorama Histórico de Israel 187

como a Revolta, ou a Guerra, dos Macabeus, em uma alusão


clara ao herói deste período.
A primeira vitória dos “Macabeus” liderados por Ju­
das foi contra uma parte dos exércitos de Antíoco comanda­
da pelo general Apolônio, chamado por Josefo de
governador de Samaria,361 que pode ser o mesmo que esteve
à frente do saque a Jerusalém um ou dois anos antes. Ele par­
tiu de Samaria e foi derrotado e morto em um lugar desco­
nhecido da Judéia.362
Com certeza, esta primeira vitória foi importante não
só para confirmar Judas como um bom comandante mas
também para ajudá-lo na tarefa de armar melhor o seu exér­
cito. O despojo conseguido com o saque efetuado ao acam­
pamento dos vencidos deve ter providenciado armas e
mantimentos para os soldados de Judas.
Uma segunda força foi mandada à Judéia com a tarefa
de deter o movimento dos Macabeus. Era um grupo ainda
maior de soldados, na ocasião comandados por Serão. Se­
gundo Josefo, o general Serão era governador da Baixa Síria.
Assim como o primeiro, também este exército foi derrotar
do,363 dando a Judas e seus comandados a auto-confiança
necessária e a impressão de que ninguém mais os poderia de­
ter. Enquanto Antíoco, ocupado em uma campanha contra
os partos, não podia mandar seu exército principal contra a
Judéia,364 a popularidade de Judas crescia e, com ela, o núme­
ro daqueles que se alistavam em seu exército de libertação.
Antíoco, então, instruiu Lísias a tomar frente da ques­
tão com Judas. Lísias enviou para a Judéia uma força consi­
derável, comandada por três generais, Ptolomeu, Nicanor e
Górgias. Estes, mesmo em superioridade numérica e de ar­
mamentos, também não resistiram às táticas do Macabeu.
361 JO SE F O , F. H istória d os hebreus: obra com pleta. Rio de Janeiro: CPA D , 1990. p. 289.
B R IG H T , J . H istória de Israel São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p.581.
365 JO SE F O , F. H istória d os hebreu.?. obra com pleta. Rio de jan eiro : CPA D , 1990. p. 289.
364 B RIG H T. j . H istória de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p.581.
188 Antônio Renato Gusso

Antes de ser atacado, aproveitando-se do elemento surpresa,


Judas atacou. Derrotado, no próximo ano, o próprio Lísias,
com um exército ainda maior, se apresentou para combater
Judas e seus soldados365 mas, sendo batido, retirou-se em
fuga com os que lhe restaram. Foi para Antioquia onde pre­
parou outro grupo para fazer frente ajudas.366
Aproveitando-se da momentânea desarticulação da
Síria, Judas e seus soldados marcharam para Jerusalém. Lá
chegando dominaram a guarnição selêucida que estava insta­
lada na cidadela Acra e passaram a retirar do templo os deu­
ses e o próprio altar que havia sido profanado. No lugar dele
construíram outro. Recolocaram os sacerdotes fiéis em seus
cargos ministeriais e reconsagraram o templo com muita fes­
ta. Isto aconteceu, provavelmente, em dezembro de 164, ou
165 a.C. (existe uma incerteza de um ano para as datas dos
selêucidas), três anos após o templo ter sido profanado. Esta
data marca o início da conhecida festa judaica de Hanukah
(consagração),367 que relembra o dia em que o templo foi re-
consagrado por Judas Macabeu.
Judas não parou por aí. Continuou lutando, inclusive
contra os idumeus, Amonitas, Moabitas, Samaritanos, Gali-
leus, Árabes, Filisteus e outros. Semelhante ao rei Davi, Ju­
das subjugou todos os seus inimigos das nações vizinhas,368
garantindo assim a independência da Judéia. Por seu lado,
Antíoco IV morreu em desespero, logo após receber a notí­
cia das vitórias de Judas, deixando a continuação da guerra
para seu filho e sucessor,369 ainda menor, Antíoco V, que foi
tutelado por Lísias.370
Na continuidade, Judas chegou a pedir ajuda aos ro­
manos mas, ainda que tenha recebido uma resposta amigá-
365 íbid.
366JO SE F O , f . op. cit., p. 290.
367 B R IG H T .J. op. c it, p.582.
3fi8 X O G N IN I, E. O p eríod o intetiríblico. São Paulo: Louvores do Coração, 1987. p. 92.
^ T E N N E Y , M. C. O N o v o Testamento: sua origem e análise. São Paulo: Edições Vida N ova, 1989. p. 59.
370'rO C'.NINI, E. o p .à f.t p. 93.
Panorama Histórico de Israel 189

vel, auxílio de fato nunca recebeu.371 Só conseguiu com isto


desagradar parte de seus seguidores que o abandonaram, re­
duzindo seu exército de forma drástica, segundo alguns a
cerca de apenas 3000 soldados.372 Este grande herói judeu
acabou morrendo, em combate, no ano 160 a.C. e, sepultado
em Modim, foi sucedido por seu irmão Jônatas. A guerra
ainda continuou até 143 a.C. quando outro irmão de Judas,
Simão, foi reconhecido por Demétrio, que era um preten­
dente ao trono da Síria. No ano 142 a.C. Simão conseguiu de
Demétrio a isenção de todos os impostos e a liberdade polí­
tica. Então terminavam as lutas dos Macabeus e a Judéia, fi­
nalmente, ganhava a sua independência total,373 que duraria
até o ano 63 a.C.

13.3. O Período de Prosperidade Advinda da


Independência__________________________________

Judas e Jônatas juntos, estiveram à frente da nação


por aproximadamente 30 anos. Simão, sozinho, por sua vez,
teve mais tempo para trabalhar. Ele esteve liderando seu
povo por um período igual à soma do período de liderança
de seus irmãos, mais 30. Em sua época a Judéia experimen­
tou um progresso a muito tempo não visto.374 Ele conseguiu
um tratado com Roma que reconhecia a independência da
Judéia e recomendava o estado judáico aos amigos, súditos e
aliados do Império Romano. Com isto, as condições econô­
micas da nação melhoraram, a justiça passou a ser adminis­
trada por tribunais, e a religião voltou ao seu curso normal,
passando por um despertamento.375

171 T E N N IÍY, M. C. <p. iA , p. 59-60.


,7 2 T O G N IN I, II »p. d l , p. 88.
373 THNNKY, M. C. tp. d l., p. 60.
374 T O G N IN I, E. op. d !., p. 97.
3"75 t e n N E Y , M. C. O N o t T eslíiim nlo: s m origtm t análise. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 60.
190 Antônio Renato Gusso

Um dos mais tocantes testemunhos do progresso


desta época, e que faz o leitor se lembrar de promessas divi­
nas feitas a Judá no Antigo Testamento, está registrado no
Primeiro Livro dos Macabeus. Como a maioria dos leitores
evangélicos da Bíblia não conhecem a passagem, pois este li­
vro não faz parte daqueles que compõem as versões da Bí­
blia Evangélica, mas apenas das de origem Católica, vale a
pena citá-la por completo como segue.
v.4 “Na Judéia reinava paz, enquanto vivia Simão.
Procurou o bem-estar de seu povo, e este se agradou
do seu poder e reputação.
v.s Com toda a glória que ele adquiriu, tomou Jope
como porto e construiu um acesso para as ilhas do
mar.
v.6 Alargou as fronteiras de seu povo e estendeu sua
autoridade sobre todo o país.
v.7 Ajuntou muitos dos judeus prisioneiros do estran­
geiro, apoderou-se de Gazara de Betsur e da cidade
de Jerusalém que purificou de suas manchas, e nin­
guém ousava opor-lhe resistência.
v.8 Os que cultivavam a terra trabalhavam em paz; o
solo dava suas colheitas e as árvores dos campos seus
frutos.
v.9 Os velhos assentavam-se nas praças públicas e en-
tretinham-se com o bem comum; os jovens revesti­
am-se com troféus e com equipamentos de guerra,
v.io Forneceu víveres às cidades e tomou resoluções
para edificar praças fortes, de modo que, em toda a
parte, até às extremidades da terra, celebrava-se seu
nome.
v. ii Estabeleceu a paz em seu país, e todo o Israel
exultava de alegria.
v .12 Cada um podia assentar-se sob sua parreira ou fi­
gueira, sem recear o inimigo.
Panorama Histórico de Israel 191

v.i3 Não houve ninguém para atacá-los, e os reis, nes­


ta época, foram abatidos.
v.u Protegeu os humildes entre seu povo, Zelou pela
lei e exterminou os ímpios e os perversos.
v.i5 Contribuiu para o esplendor do templo e enrique­
ceu o tesouro.” (1 Macabeus 14:4-15)
Como se vê, os judeus da época foram grandes deve­
dores de Simão. Esta paz e prosperidade foram o resultado
de uma administração sábia, baseada, principalmente, na di­
plomacia.

13.4. A Decadência da Nação______________________

No final da vida de Simão, e no período que segue, o


perigo para a Judéia não vinha de fora mas de dentro, das lu­
tas internas pelo poder. O próprio Simão e dois de seus fi­
lhos, foram assassinados por seu genro Ptolomeu, no ano
135 a.C. O filho que restou, João Hircano, agindo rápido,
conseguiu se apoderar de Jerusalém e fazer com que Ptolo­
meu fugisse para o Egito, desistindo de tomar o poder. O
próprio João tornou-se sumo sacerdote e chefe de estado. 376
Seguindo o exemplo do pai, João Hircano sabiamen­
te, não tomou para si o título de rei, mas apenas de príncipe,
para não provocar a ira dos tradicionais que defendiam ser o
cargo real apenas para descendentes de Davi, como as Escri­
turas Sagradas mostravam. Mesmo tomando este cuidado
acabou por se desentender com o partido político-religioso
dos Hasidim (fariseus) ao ter sua condição de sumo sacerdo­
te questionada. Isto veio por meio de uma falsa acusação que
dizia ter sido a mãe dele prisioneira de guerra, o que o des­
qualificava para o cargo. Contrariado, isto o levou a apoiar o
partido dos helenistas (saduceus).377

^76 Y i^ N K Y , M. C. O N o v o T esta m n to: u k j origem e análise. São Paulo: lídiçÕes Vida N ova, 1989. p. 60-61.
D AN A , H. H. 0 m undo d o N ovo Testamento: um estudo do am biente histórico e cultural do N ovo Testamento. Rio dc
Janeiro : JU U R P , 1980. p. 70.
192 Antônio Renato Gusso

Mais tarde, quando da morte de João Hircano, ficou


claro que os ideais dos Macabeus já haviam ficado para trás,
eles tinham dado lugar a projetos particulares ambiciosos de
poder. João deixou o comando da nação à sua esposa e ao
seu filho mais velho, Judá Aristóbulo. Mas este, não queren­
do dividir as glórias do poder, acabou prendendo tanto sua
• • i 378
mãe quanto seus irmãos, e passou a governar sozinho.
Segundo Josefo, ele não só prendeu sua mãe mas fez
com que ela morresse de fome. Também acabou matando
seu irmão Antígono, que lhe era fiel, e que a princípio havia
sido convidado por ele mesmo para dividir o poder. Prova­
velmente não cometeu mais absurdos porque morreu antes,
doente e desgostoso da vida, tendo reinado por apenas um
ano. 3 7 9
A viúva de Aristóbulo, Salomé Alexandra, casou-se
com seu cunhado mais velho, Alexandre Janeu, que gover­
nou com dificuldades, enfrentando vários distúrbios.380 Ele
desprezou os fariseus e atraiu sobre si o ódio deles. Chegou a
ser atacado por eles, em determinada ocasião, quando minis­
trava no templo. Em seu revide matou seis mil patriotas em
Jerusalém, o que só aumentou a oposição. Foram tantas as
dificuldades que ele teve com os fariseus que aconselhou sua
esposa Salomé Alexandra a se aliar com eles depois que o su­
cedesse. Isto ela fez assim que assumiu, levando-os ao po­
der.381
De acordo com Josefo, Alexandre Janeu, matou tam­
bém um de seus irmãos, que havia demonstrado pretensões
ao trono, enquanto a outro tratou bem, pois contentou-se
em levar uma vida comum, longe do poder.382 Com certeza
os ideais religiosos dos Macabeus haviam desaparecido.
378 T E N N E Y , M. C. 0 N ovo Testamento: sua origem e análise. São Paulo: Edições V ida N ova, 1989. p. 61.
379 JO SE F O , F. H istória d os hebrvm : obra com pleta. Rio de Janeiro : CPAD , 1990. p, 314-315.
380 T E N N E Y , M. C. op. á t., p. 61.
D A N A , H. E. 0 m undo do N ovo Testamento: um estudo d<>ambiente histórico e cultural do N ovo Testam ento. Rio de
janeiro: JU E R P , 1980. p. 71.
IH2. jQ si |,> H úfária dos hebreitsr. obra com pleta. Rio de Janeiro; CPAD , 1990. p. 315.
Panoram a Histórico de Israel 193

Com a morte de Salomé Alexandra, Aristóbulo II, an­


tecipando-se a seu irmão mais velho Hircano II, que possuía
o direito de sucessão, assumiu o poder. Logo, aliando-se aos
saduceus, ele também destituiu do sacerdócio a seu irmão
Hircano II que contava com o apoio dos fariseus e, com
isso, deflagrou o reinicio da guerra civil. Movimento este que
chamou a atenção de Roma.
Por aquela época o general romano Pompeu foi até
Damasco para receber homenagens e presentes dos reis da
Ásia. Os irmãos rivais, então, aproveitaram a ocasião para
pedir apoio cada um para a sua causa. Aristóbulo, querendo
agradar, mandou uma videira de ouro para Pompeu. Pelo
lado de Hircano, compareceu diante do general romano seu
representante Antípater. Ambos desejavam o apoio de
Roma para poderem governar. Depois de muita indecisão,
finalmente, Roma optou tomar o partido de Hircano e reco­
locá-lo no sacerdócio, bem como dar-lhe o governo civil,
ainda que, na prática, quem governou mesmo foi Antípater.
Contudo, esta “vitória” de Hircano e Antípater, aliados aos
fariseus, custou a vida de milhares de judeus que resistiram
em Jerusalém e a independência da Judéia. A partir daquele
momento a Judéia passava a pagar tributo a Roma e, logo,
anexada à Síria, passaria a fazer parte de mais uma província
■JOl

romana.
Aristóbulo acabou sendo levado para Roma em com­
panhia de um significativo grupo de prisioneiros de guerra.
Estes devem ter formado o núcleo da colônia judaica que,
mais tarde, viria a dar início a igreja cristã na capital do impé­
rio.

."583 7'O G N IN I, E. Ü períod o interínblico. São Paulo: Louvores do C oração, 1987. p. 104-105.
194 Antônio Renato Gusso

13.5. Para Complementar

13.5.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período384

a) O Livro de Daniel (Ainda que a história de Daniel te­


nha se passado no cativeriro Babilónico, entrando no
período dos persas, alguns eruditos têm defendido que
ele foi escrito no período dos Macabeus)
b) O Livro de Judite
c) O Primeiro Livro dos Macabeus
d) O Segundo Livro dos Macabeus

13.5.2. Questões Para Revisão_______________________


a) Descreva, em poucas palavras, a situação dos judeus
sob o domínio de Antíoco Epifâneo.
b) Como aconteceu a deflagração da Guerra dos Macabeus?
c) Apresente um breve resumo das campanhas de Judas
Macabeu.
d) Qual o significado do nome Macabeu?
e) Como a Judéia conseguiu sua independência?
f) Como foi o governo de Simão?
g) Qual o nome do livro que melhor descreve a situação
da Judéia na época de Simão?
h) Resuma a situação da Judéia após a morte de Simão.
i) Quais eram os partidos político-religiosos aliados a
Aristóbulo e Hircano na disputa do poder na Judéia?
j) Em que resultou o pedido de ajuda a Roma, da parte
das duas facções rivais da Judéia, comandadas por Hir­
cano e Aristóbulo?
Os livros de Ju d ite, P rim eiro e Segundo M acabeus, não fazem parte da B íblia aceita pelos evangélicos. Eles se
encontram , apenas, nas versões da B íblia Católica, onde são considerados com o parte do cham ado Segundo
OAnon, ou seja, cjue foram incorporados mais tarde à lista de livros considerados inspirados.
Panorama Histórico de Israel 195

14. SOB O DOMÍNIO DE ROMA


Roma, fundada no século VIII a.C., e organizada
como república no século V, foi expandindo cada vez mais
os seus domínios territoriais, conquistando Cartago, a cida­
de rival da África do Norte, a parte oriental da bacia do Me­
diterrâneo, com as investidas de Pompeu, e a Gália, com as
vitórias de Júlio César. Depois da morte de Júlio Cesar, Otá­
vio venceu as forças de António e Cleópatra, no ano 31 a.C.,
em uma batalha naval na Grécia, e com isto passou a ser o
primeiro imperador romano, levando Roma a um período
de paz garantido pela força, conhecido como Pax Romana,
que muito contribuiu para a expansão do cristianismo que
nasceria nos anos posteriores.
A história deste poderoso império é fascinante, muito
rica em detalhes e merece ser tratada com atenção mas, aqui,
levando-se em consideração o objetivo deste livro, só pode­
rão ser abordados aqueles pormenores que ajudam direta­
mente na melhor compreensão de textos da Bíblia. Portanto,
em linhas gerais, será abordado a seguir, a forma de adminis­
tração romana, seus imperadores relacionados com o perío­
do bíblico, seu domínio pela instrumentalidade dos
Herodes, alguns dos governadores, e a guerra com os ju­
deus. Outros temas relacionados, também importantes, po­
derão ser encontrados em livros de introdução ao Novo
Testamento ou que descrevam o pano de fundo deste perío­
do.

G U N D RY, R. H. Panoram a d o N o r o Testamento. São Paulo: Bdiçôes V ida N ova, 1981. p. 11.
196 Antônio Renato Gusso

14.1. A Administração Romana

Teoricamente o imperador romano era um funcioná­


rio público sujeito à vontade do povo, representada pelo se­
nado. Mas, na prática, a situação era bem outra. Ele possuía
poderes ilimitados, inclusive o poder de veto sobre as deci­
sões do senado que era formado por pessoas ricas e influen­
tes e não por representantes escolhidos pelo povo. Assim, o
senado, ainda que possuísse um certo poder, muitas vezes
não passava de um fantoche nas mãos do imperador que era,
de fato, o supremo chefe da nação.386
Quanto ao Império em si, para ser administrado, foi
dividido em onze províncias mas, mesmo assim, foi dada
certa liberdade de ação para os países conquistados. Cada
um podia, por exemplo, ter seu rei local, desde que em con­
cordância com o governo central, ainda que, ao mesmo tem­
po, também permanecia nele um governador, juiz ou
procônsul, romano, além de um grupo de “publicanos”, fun­
cionários públicos que tinham a tarefa de cobrar os impostos
do povo subjugado. As questões locais poderiam ser resol­
vidas no próprio país, e as de suma importância eram levadas
para serem resolvidas em Roma,387 como foi o caso do julga­
mento de Paulo.
Os impostos arrecadados eram vários. O principal
era o territorial, mas muitos outros pessoais suplementares
também existiam, chegando-se ao ponto de cobrar imposto
até daqueles que desejassem permanecer solteiros. Eles
eram pagos em mercadorias ou moedas e sua maior parte era
utilizada como benefício para a administração local e obras
de melhoramento público. Outra parte ia para Roma. Parte
dos impostos das províncias senatoriais iam para a adminis­
tração da província da Itália e para cobrir as despesas e per-
,Wl D AN A , 11. E. O m undo do N ovo Testamento: nm estudo d o am biente histórico e cultural do N ovo Testamento. Rio de
Janeiro: JU U R P , 1980. p. 132-133.
^ T O CiN IN I, li. O p erío d o interinblico. São Paulo: Louvores do Coração, 1987. p. 114.
Panorama H istórico de Israel 197

mitir o funcionamento do senado. Das províncias imperiais


iam para a administração e o melhoramento da cidade de
Roma, para as despesas pessoais do imperador e para o sus­
tento do exército388 que, presente em todas as nações con­
quistadas, garantia a manutenção da paz.
A intenção da divisão do Império Romano em pro­
víncias era impedir que os procônsules romanos adminis­
trassem as nações aos seus cuidados visando o lucro próprio.
Como visto acima, eram dois os tipos de províncias, as sena­
toriais e as imperiais. As primeiras, as senatoriais, estavam
sob a guarda do senado romano. Era o senado quem nomea­
va os procônsules, normalmente pelo período de um ano, e
quem cobrava a prestação de contas da parte deles. As se­
gundas, as imperiais, como o nome já indica, eram governadas
por procuradores nomeados diretamente pelo imperador.
Estes tinham exércitos permanentes à disposição deles e
exerciam a autoridade civil e militar. Prestavam contas ao
próprio imperador.389 Tanto os procônsules, como os pro­
curadores, e ainda outros funcionários públicos atuantes na
administração, eram popularmente chamados de governa­
dores.
Nas províncias imperiais maiores, ou mais importan­
tes, o procurador era um ex-membro do senado, já nas me­
nores o governador era escolhido entre os oficiais da
cavalaria. A Judéia estava entre as menores, imperiais. Ela
era uma província procuratória sob a administração Síria. O
governador da província não estava só na administração lo­
cal. Ele dispunha de um concílio composto por magistrados
e cidadãos de influência.390

D A N A , H. E. O m undo do N ovo Testamento: um estudo do ambiente histórico e cultural do N ovo Testam ento. Rio de
laneiro: JU E R P , 1980. p. 135.
G U N D RY , R. H. Panorama do N ovo Testamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 11.
D A N A , í I. E. O m undo do N ovo Testamento: um estudo do ambiente histórico e cultural do N ovo Testam ento. Rio de
Ja n e iro :JU E R P , 1980. p. 132-133.
198 Antônio Renato Gusso

14.2. Os Imperadores___________________________

Aqui serão apresentadas algumas informações a res­


peito dos imperadores que atuaram no período bíblico. A
apresentação será feita em ordem cronológica e destacará,
principalmente, os eventos relacionados com a Bíblia, o
povo judeu e o cristianismo. Outros detalhes serão evitados
ao máximo.

14.2.1. Augusto (27 a.C. - 14 d.C.)___________________

Augusto foi o primeiro imperador. Ele conseguiu o


poder máximo no ano de 31 a.C., mas não utilizou o odioso
título de rei, insistindo em ser chamado de “imperator”, pala­
vra latina que significa comandante-em-chefe.391 Alguns
anos depois de assumir o poder, em 27 a.C., recebeu oficial­
mente do senado a função de comandante-chefe das forças
armadas do império. Mais tarde, em 23 a.C., o mesmo sena­
do o declarou governador vitalício, de forma que seus pode­
res sobre o império tinham base constitucional.
Durante seu governo muitas reformas foram feitas.
Foram excluídos alguns membros indignos do senado, foi
desmobilizado parte do exército, soldados veteranos licenci­
ados foram colocados em colônias, foi criado um exército
profissional regular que se tornou uma escola de cidadãos,
foram dados bônus a alguns veteranos que passaram a morar
nas províncias se tornando guias da comunidade em relação
à lealdade a Roma, procurou-se melhorar a moral do povo,
foi renovada a religião do Estado, foi introduzido o culto im­
perial nas províncias, tentou-se restaurar a vida familiar, foi
realizado censo da população, organizada a polícia e os servi­
ços contra incêndio na cidade de Roma. Em resumo, dentro

391 D A N A , H. 11 op. d l., p. 140.


Panorama Histórico de Israel 199

das condições da época, ele conseguiu colocar o império em


ordem, promovendo paz e prosperidade.392
Foi no período de governo de Augusto que ocorreu o
nascimento de Jesus. O nome dele é citado em Lucas 2:1, in­
formando de onde partiu a ordem para o recenseamento li­
gado a este acontecimento que levou Maria e José até Belém.

14.2.2. Tibério (14 - 37 d.C)_________________________

Com a morte de Augusto assumiu o imperium (poder


para governar), aos cinqüenta e seis anos de idade, seu filho
adotivo Tibério. Político experiente, viveu a maior parte de
sua vida envolvido com os negócios do Estado, de início de­
monstrava ter plenas condições para desenvolver um bom
trabalho. Contudo, se tornou um homem amargurado, soli­
tário, altivo, temido e odiado, nunca chegando a ser popular.
Sua morte trouxe um certo alívio ao senado,393 e também a
outros cansados de suas crueldades.394
Tibério foi quem colocou Pôncio Pilatos como go­
vernador da Judéia. Ele Protegeu Herodes Antipas e teve
desavenças com Agripa I que, em certa ocasião, foi demitido
por ele e, em outra, foi encarcerado. Parece que a projeção
do cristianismo, em sua época, foi muito pequena, a ponto
dos cristãos lhe passarem despercebidos.395 Mas, é impor­
tante lembrar que seu nome é Citado no Novo Testamento
(Lucas 3:1-2) e que neste período Jesus desenvolveu seu mi­
nistério, morreu e ressuscitou.

3.J2 T E N N E Y , M. C. 0 N oro Tesfam ii/o: m a origem e análise. São Paulo: Edições V ida N ova. 1989. p. 34.
393 Ibid. p. 35.
D A N A , H. E. 0 m undo do N ovo Testamento: tan estudo do am biente histórico e cultural do N ovo Testamento. Rio de
Ja n e iro ;JU E R P , 1980. p. 141.
‘ ^ D A N A , H. E. 0 m undo d o N ovo T estamento: um estudo do am biente histórico e cultural do N ovo Testamento. Rio de
Ja n e iro :JU E R P , 1980. p. 141.
200 Antônio Renato Gusso

14.2.3. Calígula ( 37- 41 d.C.)

Calígula foi um dos mais cruéis imperadores roma­


nos.396 Eleito pelo senado como sucessor de Tibério, no iní­
cio de seu governo foi tão popular quanto Tibério havia sido
impopular. Conseguiu isto anistiando presos políticos, redu­
zindo impostos e promovendo festas públicas. Com o pas­
sar do tempo, talvez afetado pela própria popularidade,
mostrou sinais de fraqueza mental fazendo-se adorar como
um deus. Chegou, inclusive, a mandar colocar uma estátua
sua no templo de Jerusalém, o que só não aconteceu porque
ele morreu antes, assassinado por um de seus tribunos.397
Não é difícil de se imaginar o quão dura foi a vida de judeus e
cristãos convictos nesta época.

14.2.4. Cláudio (41 - 54 d.C.)________________________

Com a morte de Calígula foi levantada no senado a


idéia de ser restaurada a república, mas a guarda pretoriana
aclamou Tibério Cláudio Germânico como imperador. Ele
assumiu e passou a administrar o império de uma forma bas­
tante burocrática, utilizando-se de juntas e secretários. Em
sua época os judeus foram expulsos da cidade de Roma por
causa de tumultos instigados por um tal de Chrestus. Existe
dúvida se Chrestus era mesmo o nome de algum líder revo­
lucionário ou se é uma outra forma para o nome Cristo, o
que poderia estar indicando que os distúrbios foram causa­
dos pela pregação a respeito de Jesus como o Cristo.398
Uma provável alusão a este acontecimento está regis­
trada no livro de Atos onde diz: “Depois disto, deixando
Paulo Atenas, partiu para Corinto. Lá encontrou certo judeu
chamado Aqüila, natural do ponto, recentemente chegado
-y " Ibid.
'^ T I L N N E Y , M. C. O N oro Testamento: sna orin tn e análise. São Paulo: Lidições V ida N ova. 1989. p. 35-36.
* » l t * d . P. 36.
Panorama H istórico de Israel 201

da Itália, com Priscila, sua mulher, em vista de ter Cláudio


decretado que todos os judeus se retirassem de Roma...” (At
18:1- 2).

14.2.5. Néro (54 - 68 d.C.)__________________________

Nos cinco primeiros anos de governo, Néro, filho


adotivo de Cláudio e legítimo de Agripina, sua quarta mu­
lher, orientado pelo filósofo Sêneca, um de seus conselhei­
ros, até que governou bem. Depois, cansado das
intervenções de sua mãe no governo mandou matá-la, e par­
tiu para uma época de extravagâncias e opressões jamais vis-
tas no império.
Entre as suas vítimas estiveram os cristãos. Acusados
do incêndio causado por ele mesmo em Roma, os cristãos
foram mortos aos milhares. Diz a tradição que nesta época
foram executados os apóstolos Pedro e Paulo.
Néro, depois de enfrentar várias revoltas e acabar
sendo condenado pelo senado, fugiu de Roma procurando
salvar a própria vida. Quando percebeu que não havia como
continuar fugindo, pediu que um de seus servos o matasse.

14.2.6. Galba (68 d.C.) - Otão (69 d.C.) - Vitélio (69 d.C.)

Após a morte de Nero houve um certo vácuo de po­


der. O exército percebeu que tinha força para determinar
quem seria o imperador, independentemente do senado. O
problema era chegar à um consenso a respeito de quem ocu­
paria o cargo. Os generais Galba, Otão e Vitélio, nesta se­
qüência, em um período de dois anos, assumiram a função.
Contudo, logo foram destronados pagando com as vidas a
pretensão de serem imperadores.

399 P E N N E Y , M. C. O N ovoT estam enfo: sua origem e análise. São Paulo: Edições V ida Nova. 1989. p. 37.
202 Antônio Renato Gusso

14.2.7. Vespasiano (69 - 79 d.C.)

Vespasiano, comandante do exército do oriente, foi


proclamado imperador, pelos seus soldados, quando estava
ocupado com um cerco à cidade de Jerusalém, procurando
abafar uma revolta dos Judeus. Ao ser proclamado impera­
dor, deixou o restante do trabalho em Jerusalém sob a res­
ponsabilidade de seu filho Tito e foi cuidar de outros
assuntos do império.

14.2.8. Tito ( 7 9 - 8 1 d.C.)___________________________

O governo de Tito foi muito breve e não lhe deu tem­


po para grandes realizações. Mas, mesmo assim, Tito foi um
dos imperadores mais populares da história de Roma. Os di­
vertimentos públicos e sua generosidade para com o povo
garantiram sua popularidade e, até mesmo, acalmaram o se­
nado, desconfiado que ele seguiria os desmandos de seu pai.
Em seus dias aconteceu a grande catástrofe da destruição
das cidades de Pompéia e Herculano, na baia de Nápoles, ví­
timas das erupções do vulcão Vesúvio.400

14.2.9. Domiciaiio (81 - 96 a.C.)_____________________

Domiciano era irmão de Tito. Chegou ao poder elei­


to pelo senado e procurou levantar o nível moral do povo
restringindo as corrupções do teatro e combatendo a prosti­
tuição pública. Ele construiu templos às antigas divindades
romanas e suprimiu as religiões estrangeiras. Tinha um espe­
cial cuidado contra aquelas que procuravam conquistar
adeptos, como é o caso do cristianismo. Exigiu que lhe fosse
prestada adoração e, ainda que faltem documentos compro­
vando, foi atribuída a ele uma grande perseguição contra os

T E N N E Y , M. C. O N ovo T csta m n to: sua origem e análise. São Paulo: Edições Vida Nova. 1989. p. 39.
Panorama Histórico de Israel 203

cristãos. Nem os familiares se sentiam seguros diante dele,


muito menos o senado. Acabou, como outros, sendo assas­
sinado.401
A escrita do livro de Apocalipse pode ter como pano
de fundo as perseguições de Domiciano e a tradição tem
apontado a morte do apóstolo João neste período.

14.2.10. Nerva ( 9 6 - 9 8 d.C.)________________________

Nerva teve pouco tempo para governar e não há mui­


to o que dizer a respeito dele e da relação com cristãos ou ju­
deus. Sua administração foi livre de dificuldades internas.
Seu maior feito foi preparar Trajano como um sucessor que
pudesse manter o Governo com mão forte.402

14.2.11. Trajano (98- 117 d.C.)______________________

Trajano era espanhol de nascimento. Homem deter­


minado, soldado de profissão. Com várias expedições alar­
gou as fronteiras do império. Em sua época, mais
precisamente 115 d.C., foi suprimida uma revolta dos Ju ­
deus.403

14.2.12. Adriano (117 - 1 3 8 d.C.)____________________

Adriano provocou a ira dos judeus proibindo o rito


da circuncisão e ordenando que fosse construído um santuá­
rio ao deus romano Júpiter no local exato onde antes estava
o templo de Jerusalém, que foi destruído no ano 70 d.C. Isto
levou a uma revolta, abafada em 135 d.C., que resultou no
fim da possibilidade de existência de um estado judaico.404

401 Ibid. p. 39-40.


402 TE N N EY , M. C. O N oro Testamento: sua origem e análise. São Paulo: Edições Vida N ova. 1989. p. 40.
m Ibid.
G U N D RY , R. I I. Panorama do N oro T tstaw tnio. São Paulo: E dições V ida N ova, 1981. p. 16.
204 Antônio Renato Gusso

Depois de Adriano a História de Roma ainda conti­


nua, e também a de seus imperadores. Mas, já não diz respei­
to ao período bíblico, assunto de interesse neste livro.
Assim, aqui é encerrada a descrição dos imperados que mais
interessam ao estudante da Bíblia.

14.3. A Atuação dos Herodes______________________

Como já foi mencionado, os romanos permitiam que


governantes locais também exercessem uma parte do poder,
desde que estivessem cumprindo aquilo que lhes era deter­
minado pelo poder central. Na Judéia, este poder foi exerci­
do pela dinastia de Herodes, que chegou ao poder por meio
de Antípater, um idumeu (provindo de Edom), conselheiro
de Hircano, pai de Herodes O Grande.
Herodes então, aos olhos dos judeus, era um estran­
geiro. Teve inclusive que assumir o poder à força, depois de
ter sido designado pelo senado romano como rei dos judeus.
Iniciou seu reinado aos 22 anos de idade em 37 a.C. e perma­
neceu firme, cometendo todo tipo de crimes, inclusive ma­
tando filhos e esposas, até sua velhice, quando morreu
doente no ano 4 d.C.
Ainda que tenha embelezado o templo de Jerusalém,
tornando-o uma verdadeira obra de arte, não participava da
fé dos judeus. Seus propósitos eram políticos e a maneira
como se utilizava dos sacerdotes para seu benefício irritava
os religiosos sinceros. Um pouco a respeito de seu péssimo
caráter aparece no relato de Mateus 2:1-18, quando manda
matar as crianças na esperança de, com elas, executar tam­
bém o pequeno Messias que havia nascido.
Com a morte de Herodes O Grande, o imperador
Augusto resolveu dividir o reino entre seus filhos. Arquelau
foi nomeado etnarca da Judéia, Samaria e Iduméia; Felipe
passou a ser o tetrarca da Ituréia, Traconites, Gaulanites,
Panorama Histórico dc Israel 205

Auranites e Batanéia; e Antipas, se tomou tetrarca da Gali-


léia e Peréia.405
Como destaque nos textos bíblicos aparece Herodes
Antipas, que foi repreendido por João Batista por ter se di­
vorciado de sua esposa para se casar com Herodias, mulher
de um seu meio irmão. Repreensão esta que custou a vida de
João Batista (Mc 6:17-29 e Mt 14:3-12). Também é digno de
nota ter Jesus o chamado de raposa (Lc 13:32) e, o encontro
dele com Jesus, por ocasião do julgamento de Cristo (Lc
23:8-12).
Herodes Antipas, depois de tantos erros, acabou sen­
do deposto pelo imperador Calígula, em 39 d.C., e desterra­
do para a Gália, para onde foi acompanhado pela
Herodias.406
Arquelau, por causa de seus excessos, acabou sendo
removido do cargo pelo imperador Augusto, em 6 d.C. José
e Maria, ao regressarem do Egito, para onde tinham fugido
de Herodes O Grande, com Jesus, ao saberem que Arquelau
estava reinando na Judéia, acabaram indo para a Galiléia, por
temerem este homem (Mt 2:19-23).
Filipe, mencionado no Novo Testamento apenas em
Lucas 3:1, parece ter sido melhor do que seus irmãos, tratan­
do o povo com justiça. O nome da cidade de Cesaréia de Fi­
lipe, mencionada em Mateus 16:13 e Marcos 8:27, é uma
homenagem a ele e ao imperador. Morreu em paz no ano 34
d.C. Depois de um período sob o comando romano da Síria,
por ordem do imperador Calígula, sua tetrarquia foi passada
para Agripa I, seu sobrinho.407
Agripa I foi quem mandou matar Tiago, filho de Ze-
bedeu, além de prender o apóstolo Pedro e outros cristãos
da época (At 12), e Agripa II, seu filho, foi quem ouviu Paulo

^ G U N D R Y , R. I I. P anoram a do N ora '!'estamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 15.
406 X O G N IN I, E. O p erío d o Ínteri)íblÍco. São Paulo: Louvores do Coração, 1987. p. 126.
T E N N E Y , M. C. O N ovo Testamento: sua origem e análise. São Paulo: Edições V ida N ova. 1989. p. 66.
206 Antônio Renato Gusso

quando estava preso e, para salvar a vida, apela para o tribu­


nal de César (At 25 e 26).

14.4. A Atuação dos Governadores_________________

Após a remoção de Arquelau o território passou a ser


administrado por governadores romanos. Somente no perí­
odo de 41-44 d.C. é que foi governado pelo rei Herodes
Agripa I, que administrou a Judéia bem como o restante da
região depois conhecida como Palestina.408 Quatorze gover­
nadores atuaram na região entre os anos 6 e 70 d.C. Destes,
somente três são mencionados no Novo Testamento.
O primeiro que aparece na Bíblia é Pôncio Pilatos.
Ele foi nomeado pelo imperador Tibério e permaneceu no
cargo por um longo período (26-36 d.C.) devido a política
deste imperador. Na opinião de Tibério, era conveniente
que os governadores ficassem mais tempo no cargo, assim
seria menor a tentação de saquear os seus súditos com a in­
tenção de se enriquecerem no curto período de governo.409
Pilatos teve papel importante no julgamento de Jesus, dei­
xando que ele fosse morto às mãos do povo, mesmo con­
vencido de sua inocência (Mt 27:11-26, Mc 15:1-14, Lc
23:1-25, João 18:28-19:16).
Outros que aparecem no Novo Testamento são, An­
tônio Félix e Pórcio Festo, como está registrado no livro de
Atos 23-26, envolvidos com as questões do julgamento de
Paulo. Também é importante destacar, ainda que não seja ci­
tado no Novo Testamento, o governador Géssio Floro
(65-73), pois ele, ao pilhar o tesouro do templo de Jerusalém
levou o povo à revolta, que viria a resultar na destruição da
cidade em 70 d.C.
G U N D RY , R. H. Panoram a do N ovo Testamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 16 e 19.
D A N A , II. E. O m undo do N ovo Testamento: um estudo do am biente histórico e cultural do N oto Testamento. Rio de
jan eiro : JU E R P , 1980. p. 141.
Panorama H istórico de Israel 207

É bom lembrar que durante todo o tempo em que os


judeus foram governados pela família de Herodes e por ou­
tros estrangeiros, boa parte da administração local, envol­
vendo as questões diárias do povo, continuou sendo
realizada pelos sacerdotes e pelo Sinédrio, uma espécie de
Supremo Tribunal Judaico, presidido pelo sumo sacerdote.

14.5. As Religiões no Império Romano______________

Não cabe aqui uma descrição das muitas religiões


existentes no Império Romano, o que pode ser encontrado
com facilidade nos livros de introdução ao Novo Testamen­
to, mas se faz necessário uma palavra geral a respeito de
como elas eram tratadas, quer fossem nacionais ou estran­
geiras.
Roma sabia bem do valor da religião, por isso permi­
tia e incentivava o culto aos numerosos deuses nacionais.
Muito do dinheiro público era empregado na adoração dos
deuses de interesse nacional, que eram encarados como fato­
res de desenvolvimento do império, e de quem se esperava
boa fortuna para a nação e para o lar.410
O interesse do Estado na religião não era moral nem
espiritual mas, apenas utilitário. Enquanto uma religião ser­
via bem o propósito de ajudar o progresso do império era
bem vista, quando deixava de fazer isto era tratada com indi­
ferença pelo imperador e, se por ventura, mostrasse ser um
fator negativo para o desenvolvimento dos interesses do Es­
tado atraia sobre si a ira imperial.411 O culto ao imperador é
uma boa amostra do interesse prático do Estado Romano na
religião. A participação, ou não, neste culto, era uma prova
de lealdade ao imperador.
D A N A , H . \l. O m undo do N oro Testamento: um estudo do ambiente histórico e cultural do N ovo Testamento. Rio de
Janeiro: JU liR P , 1980. p. 137.
'4U Ib id p- 138.
208 Antônio Renato Gusso

Roma era bastante tolerante com as religiões estran­


geiras, tanto é assim que ocorreu um “sincretismo” em larga
escala entre os deuses gregos e romanos. Mas, tolerância não
significava liberdade. O próprio Estado arrogava-se o direito
de determinar que deus podia ou não podia ser adorado e
classificava as religiões em duas categorias: a) lícitas, que ti­
nham a aprovação e se fosse preciso a proteção do governo, e
b) não ilícitas, que não eram proibidas, ou consideradas ile­
gais, mas que não recebiam a aprovação nem a proteção do
governo.412 O cristianismo, a princípio foi considerado
como apenas uma facção do judaísmo, religião lícita e, assim,
nas primeiras décadas escapou da observação mais atenta do
Estado. Mais tarde, quando ficou clara a sua autonomia, pas­
sou a ser uma religião ilícita e, na época de Domiciano, devi­
do ao seu crescimento e força alcançados, passou a ser
temido como uma ameaça ao império e foi considerado
como uma religião fora da lei.

14.6. A Guerra com os Judeus_____________________

Para encerrar este panorama histórico é necessário


destacar ainda que sempre existiram judeus inconformados
com a dominação romana. Muitos não aceitavam o jugo e,
quando viam uma oportunidade se revoltavam. Grande par­
te destes estavam entre os fariseus e, principalmente, entre
os zelotes, nacionalistas extremados, sempre prontos para
morrer e matar, fosse quem fosse, pela liberdade da pátria,
na esperança de que Deus lhes viria em socorro na hora de
dificuldade nacional.
Homens assim é que acabaram levando a nação ao fi­
nal de sua história, em duas grandes e desesperadas revoltas.
A primeira foi na época do governador Géssio Floro, quan­
do este, depois de incitar o povo contra o império romano
**^ D AN A , I I. E. O m undo do N ovo Testamento: um estudo do ambiente histórico e cultural do N ovo Testamento. R io de
Jan eiro :JU K R P , 1980. p. 138-139.
Panorama Histórico dc Israel 209

cometendo todo tipo de injustiças, tentou saquear o templo,


levando os patriotas a se rebelarem.
A revolta trouxe sobre eles o exército do general ro­
mano Vespasiano, que foi proclamado imperador durante o
trabalho de acabar com a revolta dos judeus. Como Vespa­
siano precisou tratar de outros assuntos do império, por cau­
sa da nova função que passou a exercer, deixou seu filho
Tito com a tarefa de levar adiante o fim da revolta dos ju­
deus. Isto ele fez com muita firmeza, destruindo a cidade de
Jerusalém e também o seu templo, no ano 70 d.C.,413 cum­
prindo assim a profecia de Jesus que se encontra em Mc
13:1,2; Mt 24:1,2 e Lc 21:5-9.
A outra grande e última revolta foi no período de
132-135 d.C. Os sacrifícios e a adoração no templo, cessa­
ram no ano 70 d.C., com a destruição da cidade de Jerusa­
lém. Mas muitos do povo ainda resistiam seguindo sua
religião e seus costumes. Os rabinos, em uma medida substi­
tutiva, criaram uma escola na cidade costeira de Jamnia,
onde pudessem ser feitos estudos mais profundos da lei do
Antigo Testamento e, assim, a situação incerta continuou até
a época do Imperador Adriano. Quando este determinou
que fosse construído um santuário a Júpiter no terreno do
templo destruído, nova rebelião teve início.414
O líder da rebelião foi Bar Cochba, que chegou a ser
saldado por muitos, entre eles pelo mestre fariseu Akiba,
como se fosse o próprio Messias.415 Os romanos não tolera­
ram a atitude dos judeus. Em 135 d.C. já haviam abafado a
rebelião. Em seguida, reconstruíram a cidade de Jerusalém
em estilo romano, baniram todos os judeus que viviam nela,
e os proibiram de entrar na cidade,416 colocando assim um
ponto final no estado judaico.

G U N D R Y , R. I I. P anoram a do N ovo ’['estamento. São Paulo: Edições V ida N ova, 1981. p. 13.
414 Ibid p. 16.
B R IG T H , J. H istória de Israel. São Paulo: Edições Pauhnas, 1985. p. 632.
G U N D R Y , R. H. P anoram a do N ovo 'Testamento. São Paulo: Edições Vida N ova, 1981. p. 16.
210 Antônio Renato Gusso

Como foi dito no início do livro, é difícil de se chegar


a uma conclusão segura de onde começa e onde termina a
história de Israel. Para alguns ela ainda não terminou, conti­
nua com o moderno Estado de Israel. Mas, deste ponto em
diante, após o banimento dos judeus da cidade de Jerusalém,
não existindo mais um estado judaico, parece ser melhor
passar a falar da história do que surgiu de Israel e não dele
mesmo. Ou seja, a história do judaísmo, a religião dos judeus
que nasceu no cativeiro babilónico, se desenvolveu no perí­
odo intertestamentário, continuou a existir depois do fim do
estado, e continua na atualidade, com muito vigor, e do cris­
tianismo, que surgiu dentro do judaismo do primeiro século
e assumiu a posição de “O Israel de Deus” (G1 6:16).
Panorama Histórico de Israel 211

14.7. Para Complementar_______________________

14.7.1. Algumas Informações Bíblicas Sobre o Período

Todo o Novo Testamento

14.7.2. Questões Para Revisão_______________________

a) Quem foi o primeiro imperador romano?


b) Descreva a administração das províncias romanas.
c) Escreva a respeito dos impostos cobrados por Roma.
d) Qual o significado da palavra latina imperator?
e) Como foi para os cristãos e judeus o período de gover­
no do imperador Cláudio?
f) Na época de qual imperador, segundo a tradição, foram
mortos Pedro e Paulo?
g) Descreva a maneira como Vespasiano chegou ao poder
imperial.
h) Apresente um resumo do governo de Herodes o Gran­
de.
i) Quais são os governadores romanos citados na Bíblia?
j) Que ato do governador Géssio Floro levou os judeus à
revolta?
k) Descreva a situação das religiões no Império Romano.
1) Como aconteceu o fim do estado judaico?
Antônio Renato Gusso
Panorama Histórico de Israel 213

15.CONCLUSÃO
Chegando-se ao fim deste panorama da história de Is­
rael para estudantes da Bíblia, percebe-se que o assunto é de
extrema complexidade e que a compreensão do mesmo,
pelo menos em suas linhas gerais, é indispensável para aque­
les que pretendem obter uma interpretação mais acurada das
Escrituras Sagradas. Todo esforço em relação a isto será re­
compensado com uma melhor compreensão dos textos da
Bíblia.
Os pontos que aqui foram abordados são suficientes
para dar ao leitor uma visão geral dos acontecimentos, obe­
decendo-se a seqüência cronológica dos fatos, facilitando
com isto a contextualização das narrativas bíblicas e, conse­
qüentemente, uma intrepretação mais perto da realidade.
Este foi o objetivo principal do livro e por isso muitos por­
menores, de propósito, foram deixados de lado. Mas, dese­
jando-se informações mais precisas, ou melhor, mais
detalhadas, sobre qualquer dos assuntos apresentados, o lei­
tor deverá recorrer à bibliografia selecionada. Nela existem
livros, como o de John Bright, por exemplo, que discutem a
fundo detalhes de Israel e das nações envolvidas em sua his­
tória, que não poderiam ser tratados em um escrito como
este.
O início da caminhada foi dado, mas aquele que dese­
ja conhecer a fundo a Palavra de Deus ainda tem muito ter­
reno para percorrer. Prossigamos, então, para o alvo, na
certeza da recompensa que haveremos de receber, uma me­
lhor compreensão do tesouro chamado Bíblia.
214 Antônio Renato Gusso

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Panorama Histórico de Israel 225

ANEXO - RESENHAS DE LIVROS SOBRE


HISTÓRIA DE ISRAEL

Uma Visão Geral da História de Israel_____________

BEEK, M. A. História de Israel. Trad. Jorge E. M. Fortes. Rio


de Janeiro: Zahar Editores. 1967. 184 p.
O autor deste livro, M. A. Beek, não é muito conheci­
do no Brasil. As poucas informações a seu respeito se en­
contram na própria obra aqui resenhada. Nela, mais
precisamente nas notas apresentadas pelos editores, na con­
tra capa, os leitores descobrem ser ele um erudito holandês
que, na época da publicação, atuava como professor da Uni­
versidade de Amesterdã.
A versão deste livro, em português, é uma tradução
de tradução, o que pode ter influído de forma negativa em
sua qualidade. A obra original se chama Geschiedenis Van Isra­
el e tem registrado o seu Copyright inicial no ano de 1957, de­
mostrando, assim, que foi publicada em português dez anos
após o seu lançamento. A versão portuguesa foi traduzida da
edição inglesa, publicada em 1963 por Hodder & Stoughton
Ltd., de Londres, que levou o seguinte título: A ShortH istoy
o f Israel, from Abraham to Bar Cochba.
O título utilizado na versão inglesa está mais de acor­
do com o conteúdo do livro do que o título em português.
Este promete uma história completa, o que não tem no livro,
e aquele, de antemão, concordando, inclusive, com a pro­
posta que o autor faz em sua introdução, avisa que a obra
está limitada a um resumo histórico que vai, descrito em
poucas páginas, da época dos patriarcas até à revolta contra
226 Antônio Renato Gusso

o poderio romano, liderada por Bar Cohba, em aramaico,


que significa “Filho da Estrela”.
O linguajar utilizado nesta versão é um tanto quanto
antiquado, e nem poderia ser diferente, pois já tem mais de
trinta anos. Termos arcaicos como deputação, talvez uma
tradução literal do termo inglês “deputation”, onde atual­
mente se usa delegação, e o uso de algarismos romanos, para
indicar os capítulos dos textos bíblicos citados, onde na atu­
alidade se usam os arábicos, podem causar algum descon­
forto ao leitor moderno, porém, nada que não possa ser
superado com um pouco de paciência.
A obra é apresentada de forma breve e relativamente
simples, em vinte e quatro capítulos que não possuem sub­
divisões. Ela é simples mas bem documentada. O autor cita
várias autoridades no assunto, como: J. Bright, G.E. Wright,
A. Alt, G. von Rad, H.H. Howley, M. Noth, A. Parrot e ou­
tros, não tão conhecidos como estes, para confirmar as in­
formações fornecidas e dar peso às suas propostas.
Ainda que seja um livro importante, também, contém
algumas falhas graves. Uma delas é que o autor procurou dar
uma quantidade muito grande de informações em pouco es­
paço. Não são poucas as ocasiões em que um personagem é
introduzido na narrativa sem ser apresentado antes. Isto difi­
culta a compreensão daqueles que não estão familiarizados
com o assunto e, pelo visto, são justamente estes que o au­
tor pretende alcançar, já que sua obra é um resumo histórico.
Outra é o movimento de vai e vem que acontece, principal­
mente, do capítulo 17 em diante, quando o autor avança e re­
trocede, várias vezes, na seqüência cronológica ao narrar os
fatos. Por questões de clareza do assunto teria sido melhor
seguir a ordem dos acontecimentos, desviando-se, apenas,
em casos de grande necessidade.
Para finalizar, pode-se dizer que o livro é bom para
aqueles que já estão familiarizados com a história de Israel e
Panorama Histórico de Israel 227

pretendem apenas recapitular os pontos principais. Para os


principiantes na matéria não será tão útil quanto outro, do
mesmo assunto, que trate os pontos principais de forma
mais clara e objetiva.

História de Israel para Estudantes de Teologia______

BRIGHT, John. História de Israel 3. ed. Trad. Euclides Carnei­


ro da Silva. São Paulo: Edições Paulinas, 1985. p. 692.
Este livro é uma tradução da 2? edição do original, re­
vista e atualizada pelo próprio autor, que foi escrito em in­
glês e publicado por “The Westminster Press", em Filadélfia, no
ano de 1972, com o título de “A. History o f Israel”.
Não se encontram na versão em português, infeliz­
mente, maiores informações a respeito do autor. Porém, ele
se mostra um conhecedor profundo não só da história de Is­
rael mas, também, daqueles povos antigos que mantiveram
algum tipo de contato importante com esta nação. Por outra
fonte, informação pessoal do teólogo católico romano An­
tônio Quirino de Oliveira, um de seus ex-colegas de expedi­
ções, é sabido que o professor John Bright é cidadão
americano, de fé evangélica, que trabalhou em escavações
arqueológicas em Israel.
A obra é apresentada em seis partes, como seguem,
sub-divididas em várias outras:A 1) Antecedentes e Primór-
dios, a Idade dos Patriarcas; 2) Exodo e conquista; 3) A Mo­
narquia de Israel, Período da Auto-Determinação Nacional;
4) A Monarquia (cont.), Crise e Decadência; 5) A Tragédia e
Depois da Tragédia - Os Períodos Exüico e Pós-Exüico; e 6)
Período de Formação do Judaísmo. Todas elas são discuti­
das em detalhes, dando ao leitor uma carga bastante grande
de informações, muito úteis, para se compreender o todo e
as minúcias das questões envolvidas.
228 Antônio Renato Gusso

O livro, propositadamente, não apresenta nenhum


mapa, e se mostra limitado na descrição de áreas territoriais.
O autor pressupõem que o leitor estará acompanhando a lei­
tura com um atlas a seu alcance e sugere para isto o uso do
Atlas Histórico da Bíblia de Westminster. Por outro lado, apre­
senta, no final da obra, além das referências bíblicas que apa­
recem no texto e um vasto índice analítico, uma série de
quadros cronológicos que cobrem o período que vai de an­
tes do ano 2000 a.C. até o ano 150 d.C., onde, na opinião
dele, pode-se dizer que termina a “História de Israel como Is­
rael - para ser continuada na história do judaísmo” (p. 626). A
informação que aparece na ficha catalográfica, então, infor­
mando que o livro trata da história até o ano 70 d.C., não é
verdadeira.
John Bright não se contenta em apenas relatar fatos
históricos, ele está sempre dando a sua interpretação destes
acontecimentos. Isto, em alguns pontos, o torna antipático
para o leitor acostumado com a narrativa bíblica, pois, nem
sempre sua opinião está de acordo com a deste ou daquele
escritor da Bíblia. Um exemplo disto, entre vários outros,
pode ser visto na maneira como ele apresenta Davi como al­
guém que é bem sucedido por causa de suas habilidades po­
líticas, enquanto nas narrativas bíblicas ele surge como
vencedor por ser totalmente dependente de Deus.
Seja como for, é um livro de grande importância. Tal­
vez o mais completo do gênero editado no Brasil. Foi escrito
especialmente para estudantes de teologia e deve ser lido
com atenção e ter presença garantida na biblioteca, para con­
sultas periódicas, de todos aqueles que se interessam, espe­
cialmente, pelo Antigo Testamento, e querem estar bem
informados sobre os detalhes da História de Israel, para
compreendê-lo melhor.
Panorama Histórico de Israel 229

Israel e as Nações

BRUCE, F. F. Israel and the nations:from the Exodus to thefa li o f


the second temple. Grand Rapids, Michigan : William B.
Eerdmams Publishing Company, 1983, 254 p.
Frederick F. Bruce, M.A.(Cantab.), D.D.(Aberd.), é
apresentado no próprio livro como professor de Exegese e
Criticismo Bíblico na Universidade de Manchester, na Ingla­
terra, e autor e editor de vários livros na área de teologia. No
Brasil, em português, existe um livro de sua autoria com o
seguinte título: “Merece Confiança o Novo Testamento?”, o
qual foi publicado pela Edições Vida N ova, em uma primei­
ra edição no ano de 1960 e outra em 1990.
A particularidade deste livro a respeito da História de
Israel, que tem o seu Copyright em 1963, como proposta no
título, é a maneira como o autor apresenta as relações desta
nação com as outras que a dominaram, foram dominadas
ou, mesmo, se aliaram a ela. Em suma, ele não apresenta Is­
rael de forma isolada mas, sim, em seus relacionamentos
com os povos com quem tinha contato.
A obra é dividida em 28 breves capítulos sem nenhu­
ma outra subdivisão. Os 11 primeiros capítulos cobrem os
períodos que ele chama de Princípio de Israel até o Exílio
Babilónico e ocupam, apenas, 84 páginas. O restante, em
170 páginas, cobre o período da Volta do Cativeiro até à des­
truição do segundo templo pelos romanos. O autor gasta
mais tempo e espaço com esta segunda parte por entender,
exatamente, que ela é a menos conhecida dos interessados
na História de Israel.
Para tornar a mensagem mais atraente, seguindo a su­
gestão de seus editores, nesta edição, F.F. Bruce, adicionou à
obra várias ilustrações, fotografias de moedas, de monu­
mentos e de inscrições, além de mapas e quadros cronológi­
cos e genealógicos dos reis de Israel e outras nações, bem
230 Antônio Renato Gusso

como de Sacerdotes e procuradores que estiveram ligados


ao comando da nação. Ainda que a maioria destes acessórios
tenham sido adicionados mais tarde e surjam no livro nem
sempre nos locais mais adequados, podem ser muito úteis e
interessantes para os estudiosos destas questões.
O livro é superficial em alguns pontos, como não po­
deria deixar de ser pela vastidão da matéria, e profundo em
outros. Apresenta, baseado na própria Bíblia, em descober­
tas arqueológicas e reflexões particulares, detalhes de grande
importância, principalmente para quem está interessado no
período Intertestamentário.
Para encerrar a apreciação vale dizer que esta obra de
Bruce mereceu a seguinte observação, nas palavras do co­
nhecido historiador John Bright: “Este livro apresenta um
excelente esboço da história de Israel... escrito com esplen­
dida clareza”. Uma avaliação como esta, feita por tão emi­
nente estudioso, bem mostra o valor do livro. Ele será de
grande utilidade na biblioteca de professores e pregadores
que necessitam de um conhecimento geral do assunto para
melhor compreenderem e exporem as mensagens da Bíblia.

Uma Visão Crítica da História de Israel____________

DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinhos.


Trad. Cláudio Molz e Hans A. Trein. São Leopoldo e
Petrópolis: Editora Sinodal e Vozes, 1997. 535p. 2v.
Herberter Donner é um erudito alemão que estudou
com Albrecht Alt e Siegfried Morenz. Seu livro, em dois vo­
lumes, aqui resenhado, foi editado pela primeira vez em
1983, com o título original de Geschichte des Volkes Israel und
seiner Nachbarn in Grund^ügen: Teil 1: Von den Anfängen bis %ur
Staatenbildungs^eit. A tradução para a Língua Portuguesa foi
feita a partir da 2 ! edição alemã, datada de 1994.
Panorama Histórico de Israel 231

O próprio autor se encarrega de explicar no prefácio


de sua primeira edição, para que não surjam dificuldades de
interpretação, que o título “História de Israel e dos povos vi­
zinhos” não é de todo adequado. Ele não tem a intenção de
reconstruir a História de Israel e, paralelamente, ainda em
detalhes, as histórias do Egito, Síria, Filistéia e outras nações
próximas a Israel. Isto seria impossível. O que ele pretende é
mostrar que a História de Israel não pode ser tratada dentro
de um vácuo. Ela precisa ser analisada à luz de seus relacio­
namentos com as outras nações.
A História proposta por Donner está baseada firme­
mente na crítica veterotestamentária das últimas décadas.
Em alguns casos ele simplesmente ignora o que os textos bí­
blicos apresentam de forma clara e trabalha em cima das opi­
niões dos críticos. Um exemplo é a maneira como ele
classifica a história dos bezerros de ouro em Êxodo 32,
como uma etiologia criada para combater a utilização dos
outros bezerros de ouro mandados fazer por Jeroboão I, rei
de Israel (p. 121). Acaba tratando, ainda, a passagem bíblica
que narra a história de como Saul saiu a procurar algumas ju­
mentas e voltou para casa como rei ungido, em pé de igual­
dade com os contos de fada (p.206); e apresenta a
reconstrução de Jericó como não sendo verdadeira, mas
apenas uma tentativa feita por um revisor deuteronomista,
de comprometer o rei Acabe (p.317).
O livro foi escrito em uma linguagem difícil. Para en­
tendê-lo é necessário ter um conhecimento razoável dos
problemas críticos do Antigo Testamento além de vasto vo­
cabulário técnico. Um exemplo desta dificuldade é a utiliza­
ção da palavra “etnogênese” na p.97, sem nenhuma outra
explicação, como se fosse um termo comum, bem conheci­
do para os leitores brasileiros. A utilização de muitas figuras
de linguagem também complicam. Elas não são adequadas
232 Antônio Renato Gusso

para uma obra técnica como esta. Talvez este problema seja
fruto do trabalho dos tradutores.
O segundo volume traz o seguinte subtítulo: “Da
época da divisão do reino até Alexandre Magno”. Isto faz
com que o leitor imagine que a matéria está limitada a este
período. De fato, ela vai mais longe. Ainda que seja em for­
ma apenas de conclusão, são tratados, superficialmente, os
períodos dos Macabeus e do domínio Romano até o ano 135 d.C.
A obra apresenta alguns mapas, um quadro cronoló­
gico que vai de 1730 a.C. até 106 d.C. e uma vasta bibliogra­
fia, a qual é de pouca utilidade para o estudante brasileiro.
Isto devido à dificuldade da língua, pois a grande maioria dos
livros que fazem parte dela estão escritas em alemão, alguns
em inglês, e pela impossibilidade de encontra-las em biblio­
tecas nacionais. Em suma, é uma obra difícil, porém impor­
tante. Leva o leitor a pensar e questionar os conceitos
preestabelecidos, além de apresentar uma outra alternativa
para a interpretação da História de Israel, a baseada na crítica
veterotestamentária. Deve ser lida por todos aqueles que,
possuindo uma boa base a respeito da crítica do Antigo Tes­
tamento, desejam conhecer algumas das possibilidades de
interpretação da História de Israel deste ponto de vista.

As Religiões de Israel____________________________

FOHRER, Georg. História da Religião de Israel. Trad. Josué


Xavier, São Paulo: Edições Paulinas, 1982. 513 p.
Georg Fohrer é erudito conhecido internacionalmen­
te. Entre suas muitas obras publicadas estão: História de Is­
rael, Estudos Sobre a Profecia Veterotestamentária, Estudos
Sobre a Teologia e a História Veterotestamentária, Tradição
e História do Êxodo, Estruturas Teológicas do Antigo Tes­
tamento e, ainda, Introdução ao Antigo Testamento, que é
Panorama Histórico de Israel 233

uma atualização da obra de Emst Sellin publicada pela pri­


meira vez em 1910.
A obra objeto desta resenha foi escrita originalmente,
e publicada, em alemão, no ano de 1969, com o título de:
Geschichte der israelitischen Religion. Ela foi dividida em
quatro partes principais compostas por vários capítulos cada
uma. Pela própria divisão têm-se a impressão que Georg Fo­
hrer não pensa em apresentar a história da religião de Israel,
mas, sim, a história das religiões de Israel. Isto se percebe já
na nomenclatura de cada parte como pode ser visto a seguir:
1) “A Religião do Período Antigo”; 2) “A Religião da Mo­
narquia”; 3) “A Religião do Período Exílico”; 4) “A Religião
do Período Pós-Exílico”.
Da maneira como as partes foram apresentadas fica
difícil de se pensar que a religião praticada no período antigo,
por exemplo, seja a mesma do período pós-exílico, apenas
evoluída. Elas são extremamente diferentes tanto na forma
de culto quanto em suas teologias. Parece que as condições
sócio-culturais foram fatores que influenciaram as religiões,
ou a religião, de cada período.
Nota-se que alguns pressupostos básicos foram fun­
damentais para a descrição desta história por Georg Fohrer,
que foge do chamado convencional. Em primeiro lugar, ele
considera como certa a teoria que defende a não estada de
Israel como um todo no Egito. Sendo assim, quando trata
do Javismo Mosaico, esta falando da religião de um pequeno
grupo vindo com Moisés do Egito e não de uma religião co­
mum a todas as tribos de Israel. De forma muito natural,
como não poderia ser diferente, isto influi em sua interpreta­
ção da História, a qual passa a ser diferente e, em muitos
pontos, contraditória ao relato normal da Bíblia como se en­
contra hoje em sua forma final.
Outro fator de influência é a sua posição de aceitação
total dos documentos J,E,D e P. Fazendo uso indiscrimina­
234 Antônio Renato Gusso

do de textos de um mesmo livro, produzidos em datas muito


diferentes, para confirmar ou apoiar algum ponto de sua in­
terpretação histórica, pode acabar por confundir àqueles que
não estão acostumados com as datas de cada possível docu­
mento. Parece que faltou, ao menos, uma explicação intro­
dutória de como seria utilizada esta teoria no decorrer da
obra, com o objetivo de facilitar a compreensão dos leitores.
A obra não é de fácil leitura, nem poderia ser, o assun­
to é bastante profundo. Ela é fruto de um trabalho árduo por
parte do autor que demonstra grande erudição na área em
que se propôs a escrever bem como nas áreas afins, como te­
ologia, exegese e hermenêutica do Antigo Testamento. De
fato, neste livro, se percebe que Fohrer não consegue se li­
vrar de sua bagagem intelectual a respeito de outras áreas e
permanecer somente no campo da história, como o seu títu­
lo promete. Em determinadas partes o leitor fica em dúvida
se a matéria tratada é realmente História ou Teologia. Isto se
confirma, em parte, pela própria editora da obra no Brasil
que apresenta no índice para catálogo sistemático o seguinte:
“1. Antigo Testamento: Teologia”, “2. Judaísmo: História”.
Em alguns casos, também, principalmente quando
está tratando dos profetas Amós, Oséias, Isaías, Miquéias,
Sofonias e Jeremias, dentro da divisão “A profecia israelita
nos séculos VIII e VII a.C.”, nas páginas 289-327, o autor,
age como um comentarista bíblico, indo a detalhes do texto
em foco e apresentando várias passagens dos livros proféti­
cos aqui citados.
A bibliografia apresentada é bastante vasta, dando uma
amostra da seriedade com que o autor trabalhou e da profun­
didade em que ele abordou a questão. A maioria dos livros ci­
tados foram publicados em alemão ou inglês e, infelizmente,
grande parte, estão fora do alcance dos estudantes brasilei­
ros, não só pela dificuldade das línguas mas, principalmen­
te, pela inexistência dos mesmos em bibliotecas nacionais.
Panorama H istórico de Israel 235

Este livro deve ser lido com paciência e senso crítico.


Tem grande valor teológico e histórico e pode ajudar a com­
preender melhor alguns pontos relevantes da Palavra de
Deus. Contudo, deve ser levado em conta que o autor, quan­
do atua como historiador, pois a obra é histórico-teológica,
seguindo as tendências da história científica moderna, pro­
cura deixar Deus de fora da mesma, como se este não agisse
na história, contraditando claramente a narrativa bíblica que
mostra Deus se relacionando na história com o homem e o
mundo.
A leitura não é apropriada para iniciantes. Ela é indi­
cada para os níveis de pós-graduação, por exigir do leitor
constante raciocínio e conhecimentos gerais de teologia, crí­
tica, exegese e história do Antigo Testamento, para um me­
lhor aproveitamento.

Uma Visão Conservadora da História de Israel______

MERRIL, Eugene H. História de Israel no Antigo Testamento: o


reino de sacerdotes que Deus colocou entre as nações. Trad. Ro-
mell S. Carneiro. Rio de Janeiro: CPAD, 2001. 577 p.
Eugene H.Merril é professor de Antigo Testamento
no Seminário Teológico de Dallas. Ele é autor de vários arti­
gos publicados, entre outros, nos seguintes periódicos: Jour­
nal o f Evangelical Theological Society, Westminster Theological
Journal e Journal o f Northwest Semitic Languages. Também é au­
tor de vários livros, destacando-se entre eles um comentário
sobre os livros proféticos de Ageu, Zacarias e Malaquias e
um Panorama histórico do Antigo Testamento.
Seu livro aqui resenhado é uma tradução feita da pri­
meira edição em inglês, publicada nos Estados Unidos da
América pela editora Baker Books, no ano de 1987, com o tí­
tulo original “Kingdom o f Priest/’ (Reino de Sacerdotes). O tí­
tulo original, por si só, já aponta para algo mais do que
236 Antônio Renato Gusso

apenas um relato histórico a respeito de Israel, mais do que


isto, ele contempla uma interpretação teológica que se desta­
ca no decorrer da obra. Por outro lado, o título em portu­
guês descreve bem os limites da obra na questão histórica.
Ela fica praticamente restrita ao Antigo Testamento, seguin­
do a ordem canônica de seus livros, tendo seu início em Gê­
nesis e o seu final com uma palavra a respeito da época de
Malaquias.
O autor apresenta, no geral, um ponto de vista bas­
tante conservador a respeito da História de Israel mas, tam­
bém, não dispensa algumas das posições um pouco mais
liberais desde que estejam bem confirmadas. Como exemplo
pode ser visto a sua declaração de que o povo de Israel ao
sair do Egito, no êxodo, cruzou o “Mar dos Juncos” e não o
“Mar Vermelho”, como a tradição, em alguns setores, ainda
procura sustentar. Ele demonstra ter um gosto especial pelas
questões de cronologia, e suas observações, ainda que um
pouco cansativas e longas, podem ser de grande proveito
para aqueles que se preocupam com estas questões.
O livro posuí nove tabelas cronológicas, dezenove
mapas, um índice de textos bíblicos citados e um índice de
temas, abordando principalmente nomes de pessoas e locali­
dades, que podem ser úteis para algumas pesquisas. Ele está
escrito em letras médias e linhas separadas por espaços bas­
tante agradáveis para a leitura. O vocabulário as vezes se tor­
na um pouco pesado e até grosseiro pela utilização de
palavras estrangeiras sem a devida tradução (como flashback,
p. 145; termini a quo e ad quem, p. 149; cul-desac, p. 144 etc.) e
outras fora do uso normal em português como o termo “ma­
cho” se referindo a pessoas do sexo masculino (p.51 e 107),
além de algumas figuras de linguagem pouco apropriadas
para este tipo de literatura (“Moisés era morto e o manto de
mediador da aliança agora repousava sobre os ombros de Jo ­
sué”, p. 90; ou “A vara de Yahweh”, p. 468). Estas e, talvez,
Panorama Histórico de Israel 237

outras falhas do gênero, como a utilização de “Jeova” para


indicar o nome de Deus nos primeiros capítulos e a troca
dele por “Yahweh” nos demais, sem nenhuma explicação,
poderiam ter sido evitadas com uma revisão mais acurada da
tradução em foco.
O livro é de agradável leitura e muito útil para estu­
dantes do Antigo Testamento que desejam entender melhor,
principalmente, as questões cronológicas envolvendo a his­
tória de Israel, especialmente de um ponto de vista conser­
vador.

Esboço Histórico de Israel________________________

METZGER, Martin. História de Israel. Trad. Nelson Kirst e


Silvio Schneider. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1972.
p. 213.
Este livro de autoria de Martin Metzger foi publicado,
primeiramente, em língua alemã. Seu título original é: Grun-
driss der Geschichte Israels e foi colocado à disposição do públi­
co no ano de 1963, levando nove anos para ser lançada a
versão portuguesa objeto desta resenha.
Dividindo a matéria em dez capítulos, o autor, pro­
curou apresentar uma visão geral da história de Israel. Isto
ele fez muito bem discorrendo sobre os seguintes temas que
foram divididos em vários pontos: 1) A época anterior à vida
sedentária; 2) A tomada da terra; 3) Israel no período pré-es-
tatal; 4) O primeiro período do reinado em Israel; 5) Os esta­
dos autónomos de Israel e Judá; 6) A supremacia da Assíria;
7) Sob o poder da Babilónia; 8) O Decreto de Ciro e a re­
construção do santuário de Jerusalém; 9) O período helenís-
tico; e 10) O período romano.
238 Antônio Renato Gusso

O livro foi escrito, ou ao menos traduzido, em uma


linguagem de fácil entendimento, tornando-se uma ferra­
menta útil ao alcance não apenas do especialista em teologia
ou na história de Israel mas, também, para os leigos no as­
sunto.
Uma outra vantagem colocada ã disposição dos leito­
res são as ajudas que ele apresenta para esclarecer os aconte­
cimentos narrados. São apresentados dois mapas chamados
de : “Palestina na Época do Antigo Oriente” (p.77) e “Pales­
tina no Período Helenístico Romano”(p.l46), além de várias
gravuras de moedas e representações que espelham as con­
dições sociais e outros detalhes das épocas aqui tratadas,
além de quadros e tabelas cronológicas apresentando a estir­
pe dos hasmoneus, os reis da Assíria e os reis de Israel e Judá.
A bibliografia apresentada no decorrer de todo o li­
vro é farta, porém de pouca utilidade para o estudante brasi­
leiro. Em sua maioria é composta por obras escritas em
alemão, apenas algumas em inglês, antigas e raras no brasil.
Isto diminui o valor do trabalho de Metzger para os brasilei­
ros pois, segundo palavras dele mesmo, em seu prefácio, ao
fornecer a bibliografia pretendeu “apontar o caminho para
vim estudo mais aprofundado dos problemas abordados.
Foram selecionadas, sobretudo, obras de fácil acesso, de im­
portância fundamental e que, de uma maneira instrutiva, in­
formem a respeito dos diversos problemas da época”.
Alguns erros aprecem na versão aqui analisada, mas o
próprio contexto onde se encontram acaba por revelá-los
não comprometendo, assim, a mensagem pretendida pelo
autor. Um exemplo deste tipo de erro está na página 201
onde é tratada a destruição de Jerusalém pelos romanos em
70 d.C. Nela se encontra a seguinte afirmação: “A partir do
momento em que se destruiu o templo, surgiu a sinagoga”.
Ora, é de conhecimento geral que a sinagoga já existia muito
antes deste acontecimento, e o próprio contexto onde se en-
Panorama Histórico de Israel 239

contra esta afirmação errônea fala disto. Só pode ter sido


uma falha dos tradutores.
Só resta dizer que o livro é muito importante para to­
dos aqueles que desejam obter um conhecimento a nível mé­
dio da história de Israel. Não é uma obra profunda, o autor
não se propôs a isto, mas também não é superficial. Fica em
um meio termo se tomando ideal para quem necessita ir um
pouco além dos conhecimentos básicos sobre esta disciplina.

História Política dos Judeus______________________

PAUL, André. Ojudaísmo tardio: história política. Trad. Bênoni


Lemos. São Paulo: Edições Paulinas, 1983. 211 p.
Este livro é a primeira parte de uma obra em dois to­
mos. Nele é abordado de forma minuciosa e atraente a His­
tória Política dos Judeus. O autor informa que o segundo
volume é dedicado à história literária.
Para apresentar o assunto, André Paul o divide em
quatro partes. Na primeira é feita uma retrospectiva dos fa­
tos políticos relacionados com os judeus, desde as conquis­
tas de Alexandre Magno, em 336 a.C., até Adriano, em 138
d.C. Ele chama esta seção de “O Filme dos Acontecimen­
tos” e, realmente, este título descreve bem a seqüência em
seguida apresentada. Partindo de Alexandre é narrada sua
conturbada sucessão, a condição da Palestina mudando de
“donos” por diversas ocasiões, e as conseqüências que leva­
ram à insurreição dos Macabeus. “O Filme” não pára e segue
mostrando os sucessos dos Macabeus: como que eles conse­
guiram chegar ao sumo-sacerdócio e a tornarem-se reis As-
moneus, antes de serem arruinados pelas lutas internas e
chegarem ao fim debaixo do poderio romano. Também é
descrito como surge no cenário político a família de Hero-
des, a qual foi um instrumento helenístico nas mãos do Im-
240 Antônio Renato Gusso

pério até a época dos procuradores e apresentadas, em notas


anexas, diversas narrativas do historiador Flávio Josefo.
Na segunda parte, Paul, apresenta a “diáspora” como
sendo a situação dos judeus dispersos pelo mundo, porém
unidos pela existência de um templo central em Jerusalém.
Ele dá uma vista geral do que é a diáspora, como começou,
qual a sua condição estabelecida em terras estranhas e qual a
sua influência na política mundial da época. Afirma, ainda,
que em vários locais, a diáspora chegou a criar excelentes
condições de autonomia para os judeus, a ponto de adminis­
trarem verdadeiros estados dentro do Estado, tendo, inclusi­
ve, uma espécie de governador intitulado etnarca. Ele
defende ainda que a diáspora foi grandemente favorecida
pelo processo de urbanização implantado por Alexandre
Magno e seus sucessores e, para fortificar esta posição, apre­
senta um breve relato de cada cidade grega da Ásia e de ou­
tras localidades, enfatizando a forma de vida comunitária
dos judeus, os quais se distinguiam do restante da popula­
ção.
A terceira parte leva o nome de “A Terra Nacional”.
Ela descreve de forma geral a Judéia colonizada, mostrando
as dificuldades que passou por estar localizada entre os rivais
ptolomeus e selêucidas. A influência grega foi tão grande
que a própria cidade de Jerusalém chegou a ser chamada
pelo nome de Antioquia.
Neste ponto é retomado o tema da guerra civil e soci­
al à qual terminou com a luta pela independência levada
avante pelos Macabeus. Também é visto como estes, após a
independência, partiram para as conquistas, terminando na
confrontação com o Império Romano, já na época dos reis
Hasmoneus.
Paul mostra também como estavam as condições das
cidades gregas na Palestina desta época. Como que elas fo­
ram subjugadas pelos nacionalistas e a tomada de posição fa-
Panorama Histórico de Israel 241

vorável delas ao lado de Roma na guerra de 66. Por último


descreve a resistência nacionalista contra Roma. Esta, apesar
da má vontade de grande parte da população que não queria
guerra, foi levada adiante pelos idumeus, sicários, zelotes, Si-
mão Bargiora, João de Giscala e seus seguidores. Descreve
como ocorreu a esmagadora derrota mas alerta que o judaís­
mo não acabou aí. Ele continuou através daqueles que se
opunham à guerra e teve seu grande líder em Johanam bem
Zakkai, o qual saiu de Jerusalém antes da derrota e conseguiu
se establecer em paz na cidade de Jamnia.
A quarta e última parte se refere à “sinagoga”. Com o
desaparecimento do templo em Jerusalém, que era a base
para o Estado Judeu, caem por terra as esperanças da nação.
Sem ele não existia mais Estado Judáico, e nem diáspora,
mas apenas uma comunidade chamada “sinagoga”. Para o
autor, a partir desta mudança, cessa a história política dos ju­
deus e passa a existir a história do judaísmo, a religião que os
identifica.
Com o declínio das condições políticas e sociais dos
grupos judeus da Palestina e do Egito, destaca-se a influência
do grupo babilónico. E no terceiro século, surge a figura do
“exilarca”( o chefe do exílio), o qual teve muito poder, tendo
sua autoridade se espalhado por todos os lugares onde havi­
am judeus. Ele foi uma espécie de “papa” da “Sinagoga Uni­
versal”, que era a nova situação dos judeus.
Concluindo, o autor nos mostra que, surpreendente­
mente, dos escombros do sistema de Estado Judeu, com sua
base no templo, surge a Comunidade e a Doutrina, “Sinago­
ga e Torá”. Não mais uma nação mas uma comunidade e re­
ligião.
O livro é de fácil leitura e seu conteúdo uma ótima
fonte de informações a respeito da história política dos ju­
deus no Período Intertestamentário.
242 Antônio Renato Gusso

Confusão de Gêneros

SCHULTZ, Samuel J. A História de Israel no Antigo Testamento.


Trad. João Marques Bentes. São Paulo: Sociedade Re­
ligiosa Edições Vida Nova, 1988. 413 p.
Não foi possível obter informações atuais do Dr. Sa­
muel J. Shultz, mas, na época em que terminou de escrever
este livro, em Janeiro de 1960, atuava como professor, por
mais de dez anos, no Wheaton College em Illinois, Estados
Unidos da América. Sua formação na área de Antigo Testa­
mento contou com a influência do Dr. Robert H. Pfeiffer da
Universidade de Harvard e dos Drs. Allan A. MacRae e R.
Laird Harris do Faith Theological Seminary.
Este trabalho do Dr. Shultz, em sua forma original,
foi publicado, primeiramente, por Harper e Row, Pu­
blishers, em New York. Ele foi escrito em Inglês e recebeu o
seguinte título: “The Old Testament Speaks”, o qual deixa
claro qual é a fonte principal do material apresentado, o pró­
prio Antigo Testamento.
O assunto é tratado em vinte e cinco capítulos nem
sempre em seqüência muito lógica. Depois de uma breve in­
trodução enfatizando o Antigo Testamento em si, destacan­
do-se, em linhas gerais, a origem e o conteúdo, como
ocorreu a transmissão do Texto Hebraico, quais são as ver­
sões de maior importância e qual o significado desta parte da
Bíblia, o autor discorreu, baseado principalmente no texto
do Antigo Testamento, sobre os acontecimentos marcantes
acontecidos desde o que ele chamou de Período dos Come­
ços, antes ainda da Era Patriarcal, até o Período Pós-Exílico,
quando despontaram as figuras dos profetas Ageu, Zacarias
e Malaquias. Sendo assim, a informação que aparece em sua
contracapa, dando conta que o autor tentou “fornecer ao lei­
tor um quadro claro dos alicerces - geográficos, arqueológi­
cos, históricos e lingüísticos - das idéias que emergiram do
Panorama Histórico de Israel 243

pacto de Deus com o Seu povo, desde os tempos de Abraão,


até à vinda do Messias”, é falso. Ele não percorreu o chama­
do Período Intertestamentário nem a época da vinda do
Messias, parando, exatamente, onde o Antigo Testamento
pára.
Há uma certa confusão quanto ao gênero que se po­
deria classificar este livro. Ainda que o autor, como afirma
no prefácio, tenha procurado apresentar um esboço do An­
tigo Testamento, não conseguiu deixar claro do que se trata­
va. Em algumas partes o livro parece ser de História, em
outras, assemelha-se à obras de introdução, e em outras, ainda,
foi escrito como um comentário bíblico ou como resenhas
de diversos livros do Antigo Testamento, especialmente os
Proféticos.
A não observância da ordem cronológica, em alguns
casos, pode confundir o leitor menos preparado na área do
Antigo Testamento. Por exemplo, a apresentação dos Livros
Proféticos, que vai do capítulo XVIII até o XXV, após ter
tratado da volta do Cativeiro Babilónico no capítulo XVI,
coloca toda esta parte do livro fora de seu contexto criando
confusão na mente do leitor. Teria sido de maior proveito
tentar apresentar os livros em uma ordem cronológica, ao
menos básica.
A linguagem empregada nesta versão é bastante sim­
ples o que se destaca como ponto positivo. Também merece
menção o uso, pelo autor, de gráficos e mapas que se encon­
tram espalhados por todo o livro, dando uma melhor visão
daquilo que foi explicado. Outras ferramentas úteis são os
índices das passagens bíblicas, dos mapas e de nomes e as­
suntos, anexas ao final do livro. Eles são bem detalhados e,
desta forma, de grande valia para os interessados nos assun­
tos tratados na obra.
Não é um livro que se aprofunda em nenhuma das
questões importantes do Antigo Testamento, mas é uma
244 Antônio Renato Gusso

obra útil para aqueles que precisam obter informações gerais


e introdutórias, do ponto de vista evangélico tradicional, a
respeito desta literatura. Leitura recomendada para leigos
interessados em ter uma visão panorâmica dos assuntos de
história e introdução e, no máximo, para o nível de Bacharel
em Teologia, como informações preliminares.
PanoRam a
H is r Ó R iC O de

1SRAGL
Para estudantes da Bíblia
Quem deseja compreender melhor as mensagens da Bíblia, seja do Antigo
ou do Novo Testamento, obrigatoriamente, precisa conhecer os pontos
principais da história de Israel. Neste livro, Antônio Renato Gusso, de uma
forma simples e coerente, sem deixar de ser profundo, partindo da Pré-história
de Israel e passando por todas as suas fases até a destruição de Jerusalém
pelos romanos, no primeiro século, abordando inclusive o chamado Período
Intertestamentário, tema pouco tratado em livros do gênero, apresenta o
indispensável sobre o assunto, sem se perder em detalhes, também importantes
mas de pouca ajuda para o estudante da Bíblia.
O livro possui, ao final dos capítulos, questionários que ajudam a fixar o seu
conteúdo. Como anexo ele apresenta, também, resenhas de livros sobre a
história de Israel, que servem de orientação àqueles que pretendem se
aprofundar mais na matéria. Ele foi escrito, como o título revela, pai a estudantes
da Bíblia e será uma ferramenta importante para professores e alunos de
Faculdades e Seminários Teológicos, para pastores, professores de EBD, e
outros que buscam uma compreensão melhor da Bíblia. E útil, ainda, pela
forma didática em que é apresentado, para cursos especiais em igrejas.
Antônio Renato Gusso, após ter cursado Ciências Contábeis, pela UFPR,
voltou seu interesse para a área Bíblia. É Bacharel em Teologia pela
Faculdade Teológica Batista do Paraná, onde leciona nos cursos de Bacharel
e Mestrado, matérias relacionadas ao Antigo Testamento, História de Israel,
Hermenêutica, Hebraico e Grego, por mais de doze anos.
E Mestre e Doutorando em Antigo Testamento pelo Seminário Teológico
Batista do SuL do Brasíl/RJ e atua também, como professor e Deão
Acadêmico no Seminário Teológico Batista de Ijuí/RS.

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