Você está na página 1de 19

LEGÍTIMA DEFESA EXCULPANTE NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Venilson Fernande Batista1


Guilherme Dutra Marinho Cabral2

RESUMO

A legítima defesa é uma causa excludente de ilicitude e pode ser definida como a reação,
realizada moderadamente e com uso de meios necessários, contra uma agressão injusta, atual
ou iminente, para proteger direito próprio ou alheio. Quando a ação for motivada por intensa
perturbação psíquica, eliminando a capacidade do agente de se orientar conforme a norma, a
defesa empreendida contra o agressor, embora desproporcional, poderá excluir o crime, por
ausência de culpabilidade do autor. O presente trabalho, portanto, tem como objetivo analisar
a legítima defesa exculpante no direito penal brasileiro e os critérios que delimitam o seu
sentido e alcance na nossa legislação atual. Para tanto, utilizou-se doutrinas de autores
conceituados e estudiosos desta área do conhecimento. Ao final da pesquisa, foi possível
concluir que os afetos astênicos, como o medo, o susto e outras emoções insuscetíveis de
controle consciente constituem excessos exculpantes na legítima defesa, tornando o fato um
indiferente penal.

Palavras-chave: Legítima defesa. Excludente de ilicitude. Excludente de culpabilidade.


Excesso exculpante.

1 INTRODUÇÃO

A legítima defesa é homogênea na doutrina como sendo a repulsa de uma agressão


injusta a um bem juridicamente protegido, ou seja, definido em Lei, o que gera uma reação
com emprego dos meios necessários e uso moderado de tais para conter a conduta lesiva.
Já no que pertine ao excesso há que se verificar várias nuances, o que será detalhado
no decorrer da pesquisa, pois não há um rol taxativo com relação a este instituto. Sendo
tratado a cada caso, gerando, assim, algumas particularidades em fato concreto.
O excesso pode ser definido superficialmente como sendo tudo o que extrapola o
artigo 25 do nosso Código Penal, o qual exige os seguintes requisitos: a) meios
moderadamente necessários; b) injusta agressão; c) agressão atual ou iminente; d) agressão a
direito seu ou de outrem.
Ao contrário disso a legítima defesa é uma causa de exclusão da ilicitude, conforme
disposto no artigo 23, inc. II do Código Penal.

1
Acadêmico do Curso de Direito, da Universidade Vale do Rio Doce. Licenciado em Língua Portuguesa pela
FEM – Fundação Educacional de Machado. Correio eletrônico: venilson.fernande@gmail.com.
2
Professor Orientador do Curso de Direito, da Universidade Vale do Rio Doce. Graduado em Direito pela
FADIVALE – Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce e Especialista em Direito Penal e Criminologia pelo
Instituto de Criminologia e Política Criminal. Correio eletrônico: guilherme.cabral@univale.br
1
O fato motivador da legítima defesa e consequentemente ocorrendo o excesso, não
precisa necessariamente ser fato típico, ocorrendo também em uma conduta atípica, basta que
se amolde nas características do artigo em comento.
A legítima defesa exculpante pode ser definida como sendo o ato praticado por medo,
receio, temor de algum mal que possa acontecer com o agente que se julga irresistível, ou
perturbação, apreensão de alguma situação que talvez julga-se iminente, acompanhado de um
sentimento que se leva a pensar que deve-se vivamente evitá-lo.
A pesquisa em tela, tem por objetivo, analisar o instituto da legítima defesa
exculpante, se preocupando de maneira a aprofundar no assunto, expondo conceito,
esclarecendo como se caracteriza os excessos, procurando na legislação penal, pontos
controvertidos e relevantes sobre o aludido instituto, bem como os aspectos que constitui o
excesso em casos concretos e por fim diferenciar as suas várias modalidades, objetivando
apontar pontos relevantes sobre a temática disposta.
A relevância jurídica do tema reside no fato de que a delimitação do sentido e do
alcance da legítima defesa exculpante permite reforçar, tanto na comunidade acadêmica,
quanto nos órgãos integrantes do sistema de justiça criminal, as hipóteses gerais de aplicação
do instituto e, assim, evitar a condenação de pessoas por comportamentos desculpáveis e
carentes de prevenção criminal.
A metodologia utilizada para o desenvolvimento do estudo consistirá em técnicas de
investigação teórica, conceituais e normativas.
Serão analisados conteúdos doutrinários sobre o tema em comento, pesquisas
bibliográficas que envolvam o objeto deste estudo. Além destes, a internet será utilizada para
o levantamento de dados e subsidiará o trabalho em questão, todavia, esta será utilizada em
segundo plano, sendo principal conteúdo doutrinário.
Para discorrer sobre o tema dividiu-se o trabalho em vários tópicos, iniciando com a
parte processual histórica, sociedade e autotutela jurídica no direito penal. Em seguida uma
descrição de forma genérica da legítima defesa no direito penal brasileiro. Passando a frente,
fala-se sobre evolução histórica do instituto da legítima defesa e legítima defesa no direito
brasileiro no contexto histórico. Para ilustrar melhor, comentou-se também sobre o direito
positivo de outros países. Já na fase mais específica, comentou-se sobre fundamentos e
natureza jurídica da legítima defesa; diferenciação entre legítima defesa e estado de
necessidade; critérios legais e espécies de legítima defesa e por fim as modalidades de
excessos.
2
2 SOCIEDADE E AUTOTUTELA JURÍDICA NO DIREITO PENAL

Não existe sociedade sem direito, pois é ele que regulamenta e mantém o convívio em
sociedade. Na antiguidade, prevalecia a autotutela, onde cada um resolvia seus conflitos de
maneira individual, em forma de “vingança”, prevalecendo a lei do mais forte, fazendo justiça
com as próprias mãos.
O direito exerce na sociedade a função ordenadora, caracterizado pelo controle
sociológico, harmonizando os interesses pessoais, evitando as insatisfações e conflitos entre
seus membros. (GRINOVER, 2009)
Segundo Ada Pellegrini Grinover (2009, p. 28), “na autotutela, aquele que impõe ao
adversário uma solução não cogita de apresentar ou pedir a declaração de existência ou
inexistência do direito; satisfaz-se simplesmente pela força [...].”
A autotutela é uma das maneiras mais primitivas de resolução de conflitos que existe,
acompanhada da autocomposição.
Ainda discorrendo sobre o assunto, Marcus Orione Gonçalves Correira (2012, p. 19),
tece também alguns comentários sobre autotutela ou autodefesa:

Pela autodefesa um dos sujeitos do conflito impõe, por meio de uma ação própria, a
sua vontade sobre a do outro. É bom recordar que, a princípio, o direito repudia a
forma autodefensiva de solução dos conflitos, já que se trata de resquício da
indesejada “justiça pelas próprias mãos”. No entanto, há formas de autodefesa
excepcionalmente permitidas pelo direito. Nesse sentido, confira-se o direito de
greve, quando exercido dentro dos limites legais, ou mesmo a legítima defesa do
direito penal.

Nesse diapasão, pode-se verificar que a autotutela em alguns aspectos é repudiada pelo
modelo atual de sociedade, já que são vedadas pelo ordenamento jurídico pátrio algumas
formas adotadas por essa modalidade de resolução de conflitos.
A autocomposição é outra forma de resolução de conflitos, onde os sujeitos da
controvérsia, através de renúncia de direitos de ambos ou individuais, abrem mão de direitos
certos ou incertos.
E finalmente, o modelo atual, mais utilizado, de resolução dos conflitos através de
processo, onde as partes envolvidas transformam as controvérsias em lide, deixando que o
Estado-Juiz solucione o litígio.
Verifica-se que na antiguidade, não existia a figura do Estado para impor aos
particulares de forma incisiva a superação do sentimento primitivo, impondo assim, acima de
3
seus interesses, a resolução pacífica dos conflitos. Com a criação das Leis, o Estado chamou
para si, o jus punitions, ou seja, o Estado toma o lugar das partes e através da jurisdição,
resolve os conflitos.
A legítima defesa é um instituto regulado pelo Direito Penal, podendo ser definido
como autodefesa ou autotutela, acontecendo quando o indivíduo, devido a omissão do Estado,
se impõe de forma violenta ou não, fazendo valer seu direito, frente a uma agressão a um bem
juridicamente protegido.

3 DA LEGÍTIMA DEFESA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

A legítima defesa é praticamente aceita por todos os ordenamentos jurídicos do


mundo, apesar de não ter uma previsão legal uníssona. Independentemente das diversas
formas em que se encontra disciplinada, fundamenta-se no direito natural e constitui uma
causa de proteção individual e de afirmação do direito.
De maneira geral, o instituto da legítima defesa pode ser definido como a defesa
necessária de uma agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou alheio; mas,
para tanto, exige que seja utilizado meio moderadamente necessários, sem, no entanto,
extrapolar o limite.
Fernando Capez (2014, p. 300) considera o instituto como sendo:

Causa de exclusão da ilicitude que consiste em repelir injusta agressão, atual ou


iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.
Não há, aqui, uma situação de perigo pondo em conflito dois ou mais bens, na qual
um deles deverá ser sacrificado. Ao contrário, ocorre um efetivo ataque ilícito contra
o agente ou terceiro, legitimando a repulsa.

Acompanhando esse raciocínio, Bitencourt (2015, p. 422) assevera que:

A legítima defesa, um dos institutos jurídicos mais bem elaborados através dos
tempos, representa uma forma abreviada de realização da justiça penal e da sua
sumária execução. Afirma-se que a legítima defesa representa uma verdade
imanente à consciência jurídica universal, que paira acima dos códigos, como
conquista da civilização.

Por fim, Damásio de Jesus (1998, p. 264), além de definir o instituto da legítima
defesa, ainda salienta que não se deve confundi-la como causa de exclusão da culpabilidade e
sim de ilicitude, tendo em vista que não pode ser ilícita a afirmação do próprio direito.

4
Entendemos que a legítima defesa constitui um direito e causa de exclusão da
antijuridicidade. Não é certo afirmar-se que exclui a culpabilidade. Como dizia
Bettiol, afirmar que constitui uma causa de isenção de culpabilidade supõe
desconhecer o que há de mais característico na luta em que se vê o bem injustamente
agredido. Não pode ser considerada ilícita a afirmação do próprio direito contra a
agressão que é contrária às exigências do ordenamento jurídico. É uma causa de
justificação porque não atua contra o direito quem comete a reação para proteger um
direito próprio ou alheio ao qual o Estado, em face das circunstâncias, não pode
oferecer a tutela mínima.

A legítima defesa está expressamente prevista no artigo 23, inciso II do Código Penal
Pátrio e seu conceito decorre do artigo 25 do mesmo “Códex”, sendo tratada como uma causa
de justificação em repelir injusta agressão, atual ou iminente, direito próprio ou alheio, usando
moderadamente dos meios necessários.

3.1 CONTEXTO HISTÓRICO DA LEGÍTIMA DEFESA NO DIREITO BRASILEIRO

A Legislação reinol, também conhecida como as Ordenações e Leis do Reino de


Portugal, o Código Filipino previa a legítima defesa em seu Livro Quinto, Título XXXV,
assim dispondo:

Dos que matão, ou forem, ou tirão com Arcabuz, ou Besta. Qualquer pessoa, que
matar outra, ou mandar matar, morra por ello morte natural. Porém, se a morte fôr
em sua necessária defensão, não haverá pena alguma, salvo se nella excedeo a
temperança, que devêra, e podéra ter, porque não será punido segundo a qualidade
de excesso. E se a morte fôr por algum caso de malicia ou vontade de matar, será
punido, ou relevado segundo a sua culpa, ou inocência, que no caso tiver.
(LINHARES,1975, P. 52.).

Já no título XXXVIII se considerou lícita a morte da mulher ou do amante


surpreendidos em flagrante de adultério:

Do que matou sua mulher, pola achar em adultério. Achando homem casado sua
mulher em adulterio, licitamente poderá matar assi a ella, como o adulterio, salvo se
o marido for peão, e o adultero Fidalgo, ou nosso Dezembargador, ou pessoa de
maior qualidade. Porém, quando matasse algumas das sobreditas pessoas, achando-a
com sua mulher em adultério, não morrerá por isso mas será degradado para Africa
com pregão na audiência pelo tempo, que aos Julgadores bem parecer, segundo a
pessoa, que matar, não passando de tres annos. (LINHARES,1975, 52.).

Naquela época era lícita a morte da mulher ou do amante nos casos mencionados
acima, contudo deveria ser resguardado a temperança, sinônimo jurídico de moderação,
requisito sem a sua observação é considerado excesso apenado. (LINHARES,1975).

5
A legislação da república modificou o critério anterior, o primeiro código penal da
República parece ter achado mais judicioso emprestar à legítima defesa o caráter de causa de
excludente do crime.
O parágrafo segundo do art. 32, dispondo não ser limitada à proteção da vida,
compreendendo todos os diretos que podem ser lesados, julgava não criminosos os que
praticassem o crime em defesa legítima, própria ou de outrem.
Segundo a orientação da legislação estrangeira, o código penal de 1890 aceitou a
legítima defesa presumida, equiparado à defesa própria ou de terceiro o fato praticado na
repulsa dos que à noite entrassem ou tentassem entrar na casa de residência ou onde alguém
estivesse, nos pátios ou nas dependências dela, se fechadas, ressalvadas as hipóteses de
permissão legal; bem como o fato cometido em residência a ordens ilegais, não sendo
excedidos os meios indispensáveis para impedir-lhes a execução.
A redação dos arts. 32 a 35 foi mantida pela Consolidação das Leis Penais, aprovada
em 1932, por Decreto. (LINHARES,1975).
A legítima defesa no código de 1940 adotou a redação do seu art. 19 com a excelente
definição do art. 21, considerando a legítima defesa causa de exclusão da criminalidade: “Não
há crime quando o agente pratica o fato: ...II: em legítima defesa. ” (BRASIL, 1940).
E, “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios
necessários repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. ” (BRASIL,
1940).
O parágrafo único desse dispositivo, disciplinando o excesso na reação, está assim
concebido: “O agente que excede culposamente os limites da legítima defesa, responde pelo
fato, se este é punível como crime culposo. ” (BRASIL, 1940).
Os requisitos diferem, como se vê, dos que eram fixados na legislação pretérita.
(LINHARES,1975).
As reformas introduzidas no código penal de 1969 conservaram nos arts. 27 e 29 a
redação dos arts. 19 e 21.
Foi modificado o parágrafo único deste último artigo para regulamentar mais
casuisticamente e com maior clareza, o excesso na reação, mais tolerante quantitativamente
em apená-lo, e mais humano, prevendo como escusável e excesso decorrente do medo, da
surpresa ou da perturbação de ânimo em face da situação.
A nova fórmula é essa:

6
artigo 30: O agente que, em qualquer dos casos de exclusão do crime, excede
culposamente os limites da necessidade, responde pelo fato, se este é punível a título
de culpa.
Parágrafo 1º: Não é punível o excesso quando resulta de escusável medo, surpresa,
ou perturbação de ânimo em face da situação.
Parágrafo 2º: Ainda quando punível o fato por excesso doloso, o juiz pode atenuar a
pena. (BRASIL, 1969).

3.2 PREVISÃO LEGAL DO INSTITUTO EM OUTROS PAÍSES

A legítima defesa na Alemanha, Grécia e Itália se assemelham a brasileira, pois,


ambas possuem as características e requisitos, e, também a modalidade de excesso.
Pode-se notar no que tange aos excessos, se forem praticados por aspectos
psicológicos irresistíveis, o agente pode ser isento de pena.
Sendo assim, a seguir ver-se-á alguns textos positivados na Alemanha, Grécia e Itália
para melhor especificação do conteúdo.
Na Alemanha:

Alemanha – Art. 32. §1º: Quem comete um ato. Que foi exigido pela legítima
defesa, não age ilicitamente.
§2º: Legítima defesa é a defesa necessária para afastar, de si ou de outrem, uma
agressão atual e elícita.
Art. 33: Excesso de legítima defesa – se o agente excede os limites da legítima
defesa, por confusão, medo ou susto, então não é punido. (LINHARES, 1975, 43)

Na Grécia:

Grécia – Art. Art. 22: 1: O ato praticado em legítima defesa não é injusto.
2: Há legítima defesa quando uma pessoa se livra de um ataque necessário para
repelir uma agressão injusta e atual contra ela ou contra um terceiro.
3: A necessidade da legítima defesa é apreciada em razão do perigo que apresenta a
agressão, da natureza do dano possível, do processo e da gravidade da agressão, bem
como de outras circunstâncias da infração.
Art. 23: Excesso dos limites da legítima defesa: Aquele que excede os limites da
legítima defesa é punido com uma pena atenuada, se o excesso é praticado
intencionalmente; se é cometido por imprudência, o autor é punido em
consequência; mas esse excesso não lhe é imputado e não é punido se agir sob o
império de coação ou da confusão provocada pela agressão.
Art. 24: Legítima defesa culpável: Quem tenha provocado intencionalmente
agressão contra si mesmo a fim de cometer contra a pessoa assim provocada um ato
possível sob aparência de legítima defesa, não fica subtraído à pena estabelecida
pela lei. (LINHARES, 1975, P. 44-45)

Na Itália:

7
Itália – Art. 52: Não é punível quem tenha cometido o fato desde que constrangido a
defender seu direito ou o de outrem contra perigo atual de ofensa injusta e que a
defesa seja proporcional a ofensa.
Liechtenstein – Causas que excluem a intenção dolosa:
Art. 2: Um ato ou uma omissão não é imputável como crime:
[...]
g: Quando resulta de uma coação irresistível ou constitui um caso de legítima
defesa. (LINHARES, 1975, P. 45)

A legítima defesa não será admitida senão em razão da condição das pessoas, das
circunstâncias de tempo e lugar, da natureza da agressão, ou de outras circunstâncias, seja
fundado concluir que o autor se serviu unicamente dos meios de defesa necessários para
repelir ataque ilegítimo contra sua vida, sua liberdade, ou seus bens, ou os de terceiro, ou que
não tenha excedido dos limites senão por pavor, coação ou medo. Todavia, em tal excesso
poderá, segundo a natureza das circunstâncias, ser sancionado como uma infração por
negligência, conforme as disposições da segunda parte do presente código (arts. 355 e 431).
(LINHARES,1975)

3.3 FUNDAMENTOS DA LEGÍTIMA DEFESA NO BRASIL E SUA NATUREZA


JURÍDICA

A legítima defesa encontra na atualidade dois fundamentos, sendo o primeiro a


necessidade de defender bens jurídicos perante uma agressão injusta e o segundo, o dever de
defender o próprio ordenamento jurídico, que se vê afetado diante de uma agressão injusta.
Segundo Bitencourt (2015, p. 423) prevalecem duas teorias sobre o assunto:

As teorias subjetivas, que consideram a legítima defesa causa excludente de


culpabilidade, procuram fundamentá-la na perturbação de ânimo do agredido ou nos
motivos determinantes do agente. As teorias objetivas, por sua vez, consideram a
legítima defesa como excludente de antijuridicidade.

A natureza jurídica da legítima defesa é considerada como causa de exclusão da


ilicitude, afastando assim, a tipicidade da conduta. A legítima defesa possui natureza jurídica
de norma permissiva, ou seja, é autorização de praticar uma conduta em abstrato proibida,
constituindo uma das causas de justificação.

3.4 LEGÍTIMA DEFESA E ESTADO DE NECESSIDADE

8
No Código Penal Pátrio, precisamente no seu artigo 23, estão elencadas algumas
causas de exclusão da ilicitude, e, dentre elas, legítima defesa e estado de necessidade.
A legítima defesa ocorre quando o indivíduo defende seu patrimônio, a vida, a honra
sempre que forem ameaçadas ou atacadas de forma ilícita. Esse direito está disposto no
mesmo diploma em que estão definidas as outras condutas previstas como crime, ou seja,
Código Penal.
A legítima defesa acontece quando o agente se defende de uma agressão humana
injusta, atual (presente) ou iminente (prestes a ocorrer), utilizando-se de meios necessários
para repelir o injusto (moderação), tudo que ultrapassar, será excesso. Nesse caso não basta
ocorrer apenas uma das situações acima dispostas, sempre para ser considerada legítima
defesa, tem que preencher todos os requisitos e o afastamento de um deles será considerado
conduta típica e antijurídica.
Como na legítima defesa, o estado de necessidade deve preencher alguns requisitos,
tais como: a ameaça de direito próprio ou alheio; existência de perigo atual e inevitável;
inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado; não provocação voluntária do perigo; a
inexistência de dever legal de enfrentar o perigo e o conhecimento da situação de fato
justificante.
Fernando Capez (2014, p. 293-294) define estado de necessidade como sendo:

Causa de exclusão da ilicitude da conduta de quem, não tendo o dever legal de


enfrentar uma situação de perigo atual, a qual não provocou por sua vontade,
sacrifica um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou
alheio, cuja perda não era razoável exigir. No estado de necessidade existem dois ou
mais bens jurídicos postos em perigo, de modo que a preservação de um depende da
destruição dos demais. Como o agente não criou a situação de ameaça, pode
escolher, dentro de um critério de razoabilidade ditado pelo senso comum, qual deve
ser salvo. Exemplo: um pedestre joga-se na frente de um motorista, que, para
preservar a vida humana, opta por desviar seu veículo e colidir com outro que se
encontrava estacionado nas proximidades. Entre sacrificar uma vida e um bem
mate-rial [sic.], o agente fez a opção claramente mais razoável. Não pratica crime de
dano, pois o fato, apesar de típico, não é ilícito.

O estado de necessidade, diferente da legítima defesa, não precisa ser necessariamente


ação humana, podendo ser de coisas ou da natureza. Aqui o agente em uma situação de perigo
atual, ambos de interesses protegidos pelo Direito, pode agir para salvar um bem próprio ou
de terceiros, sempre com o sacrifício de um direito lícito e legítimo.

3.5 CRITÉRIOS LEGAIS DA LEGÍTIMA DEFESA

9
A legítima defesa está prevista no artigo 23 do Código Penal, segundo o qual:

Não há crime quando o agente pratica o fato, em estado de necessidade, legítima


defesa e estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito, sendo
punido apenas o excesso, tanto na modalidade culposa quanto dolosa. (BRASIL,
1984).

Já o artigo 25 do mesmo diploma legal dispõe que: “entende-se por legítima defesa
quem, usando moderadamente meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a
direito seu ou de outrem” (BRASIL, 1984).
Portanto, para que o agente seja amparado por esta excludente de ilicitude, deve
preencher todos os requisitos descritos na norma penal, ou seja, a inexistência de um dos
critérios ensejará em excesso, podendo ser doloso ou culposo. Os critérios que afastam a
tipicidade da conduta são:
 Injusta agressão – ameaça de lesão a bem juridicamente protegido, tendo que ser
necessariamente ação humana;
 Agressão atual ou iminente – o agente pode se defender de ação que está acontecendo
(presente), ou até mesmo, por acontecer, desde que haja um justo receio de ataque contra ele
(futuro próximo);
 Agressão a direito próprio ou alheio – no ordenamento jurídico brasileiro, qualquer bem
jurídico pode ser protegido, ou seja, bem pertencente àquele que se defende ou de um terceiro,
sendo essa conduta encontrando respaldo no princípio da solidariedade humana;
 Reação com meios necessários – meios necessários são aqueles que o agente tem a sua
disposição, para repelir a injusta agressão, tanto a direitos seus como de terceiros, de maneira
que a ação seja menos lesiva possível. Devendo ser analisado a cada caso concreto de forma
flexível;
 Uso moderado dos meios necessários – para a determinação do uso moderado dos meios
necessários, o magistrado utiliza-se do perfil do homem médio, ou seja, qualquer pessoa
naquele momento agiria da mesa maneira, levando em conta a cada caso concreto, a
gravidade da lesão e relevância do bem juridicamente protegido. Sendo o bem protegido de
igual valor ou superior ao lesado, podendo, se contrários, incorrer em excesso.

3.5.1 Situação justificante

10
A situação justificante na legítima defesa caracteriza-se pela ocorrência da agressão
injusta, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio.
Pode-se dizer que toda situação que preencher os requisitos acima expressos, será uma
situação justificante.
Então, diante de uma agressão humana, a um bem jurídico tutelado, sendo ela atual ou
prestes a acontecer, contra direito seu ou de terceiros, o agente estará amparado para agir em
sua defesa.
Na legítima defesa o agente não pode ser o causador da agressão, sendo necessário que
a agressão seja imotivada, ou seja, não provocada, pois, não há legítima defesa contra legítima
defesa.
Há também a atualidade do fato ou iminência, o agente só poderá agir se a agressão
estiver acontecendo ou na iminência de acontecer. Portanto não existe ação justificante contra
uma agressão agendada, ou futura, sendo assim, a agressão deve estar necessariamente no
intervalo entre a consumação formal e material da ação antijurídica.
Todos os direitos pessoais são suscetíveis de legítima defesa e em consequência disto
o de terceiros. (SANTOS, 2008)

3.5.2 Ação justificante

Ação justificada corresponde à análise das dimensões subjetiva e objetivas da ação do


agredido, que em tese é conduta típica, a primeiro momento, todavia com a verificação, agora
como sendo ação típica justificada.
Segundo Juarez Cirino dos Santos (2008, p. 239)

A ação de defesa do agredido é a mesma unidade objetiva e subjetiva examinada


como ação, em seguida como ação típica e agora como ação típica justificada.
Assim, a ação justificada na legítima defesa contém elementos objetivos e
subjetivos.

Os elementos objetivos da ação justificada consistem no emprego dos meios


necessários e moderados para deter a injusta agressão.
A necessidade dos meios de defesa é situação que é posta o agente em que ele tem que
excluir a agressão, contudo, com moderação, causando o menor mal possível ao agressor.
Enquanto existir agressão, há a necessidade e moderação. A partir do momento em
que cessou a agressão não será necessário o agente continuar com conduta. A não observância
11
disto ultrapassará a legítima defesa, pois, não será mais necessária e moderada a conduta do
agente.
Já no que pertine a ação subjetiva, é a vontade do agente de se defender da agressão
injusta, atual ou iminente, a bem jurídico próprio ou de terceiros. Afastando o elemento
subjetivo de defesa, significa que a ação foi dolosa, não havendo assim, elementos
justificantes da legítima defesa. (SANTOS, 2008)

3.6 ESPÉCIE DE LEGÍTIMA DEFESA

No ordenamento jurídico brasileiro são aceitas várias modalidades de legítima defesa,


sendo que apenas irá se tratar das principais como: a real, putativa, sucessiva e recíproca.
Legítima defesa real é a legítima defesa pura e simples, também chamada de legítima
defesa real, ou seja, é a legítima defesa que preenche todos os requisitos tratados no artigo 25
do Código Penal. Exemplo: “A” em um momento de fúria, parte na direção de “B”, seu
desafeto, com uma faca na mão; “B” por sua vez, ao perceber a atitude de “A”, toma a posse
de um pedaço de madeira, e profere apenas um golpe, atingindo “A” na cabeça, desarmando-
o.
Legítima defesa putativa é a legítima defesa em que o agente se defende de um fato
imaginário. Ele acredita friamente que está na iminência de ter sua integridade física lesada,
contudo, tal fato acontece somente em sua mente. A legítima defesa putativa sempre ocorre
por erro de tipo/erro de proibição. Exemplo: “A” enquanto participava de uma festa, percebe
que “B” seu desafeto, o qual já lhe ameaçou de morte por várias vezes, leva a mão na cintura
e caminha em sua direção, “A” o qual ao sair de casa naquele dia havia se armado com um
revólver, atira várias vezes em “B”, pensando antecipar uma atitude lesiva por parte de “B”,
matando-o, contudo, após os fatos verificou-se que “B” apenas estava pegando o celular.
Legítima defesa sucessiva se dá quando o agredido excede na sua repulsa, e, sendo
assim, também dá direito ao agressor de se valer do referido instituto, pois, ele não tem que
tolerar ser agredido sem ter sua integridade física lesada. Exemplo: “A” agride injustamente
“B” com um soco no rosto; “B”, para se defender, saca uma arma e começa a atirar na direção
de “A”; este último bate em retirada e é perseguido por “B”, que efetua novos disparos. Por
fim, “A” trava luta corporal com “B”, matando-o. (JAPIASSÚ, 2012)
Legítima defesa recíproca é cabível somente contra legítima defesa putativa, uma
vez que no segundo caso, o agente apenas acredita em seu imaginário que está se defendendo
12
de uma situação de perigo, mas isto não existe. Sendo assim, a defesa putativa não é legítima.
Não há que se falar em legítima defesa real versus legítima defesa real, uma vez que legítima
defesa é uma ação legítima, então, como não há uma agressão injusta, não há possibilidade
jurídica de acontecer tal situação. “A” caminha em uma área perigosa. De repente visualiza
“b” colocando a mão no interior de sua blusa, e, acreditado que seria assaltado, “A” saca uma
arma de fogo para matar “B”. Este último, entretanto, que iria apenas pegar um cigarro,
consegue se esquivar dos tiros, e, em seguida, mata “A” para se defender. (MASSON, 2014)
No ordenamento jurídico brasileiro também é pacífico quanto ao cabimento da
legítima defesa da honra; contudo, a discussão seria somente com relação a
proporcionalidade da conduta do agente.
Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 255-256) assevera que:

[...] é preciso verificar que a sociedade atual não coloca a questão da forma como,
idealmente, deveria fazer. Vê-se o cônjuge inocente e enganado como o maculado, o
frouxo, aquele que teve a sua reputação manchada, mormente se nada faz no exato
momento em que constata o flagrante adultério. Admissível, pois, em nosso
entender, que possa agir para preservar os laços familiares ou mesmo a sua honra
objetiva, usando, entretanto, violência moderada. Exemplo: pode expulsar o amante
da esposa de casa, mesmo que para isso deva empregar força física. Não deve
responder por lesões corporais. O que certamente não se deve tolerar jamais é a
prática do homicídio contra o cônjuge adúltero como forma de “reparar” a honra
ofendida, pois há evidente desproporcionalidade entre a injusta agressão e a reação.

Em seguimento, Nucci cita a posição de Jardim Linhares:

[...] taxativa no sentido de se acolher a legítima defesa da honra no contexto do


adultério, inclusive, se necessário, com a prática de homicídio contra o cônjuge
traidor: “Não nos parece censurável conceder-se a legítima defesa ao marido que,
surpreendendo a esposa em flagrante adultério, dentro do lar conjugal, fere ou mata
os amantes, ou qualquer deles”. Justifica sua linha de pensamento, alegando que há
profunda influência do ambiente e da herança na formação da alma das raças
humanas, motivo pelo qual seria preciso considerar a essência da concepção do
brasileiro médio acerca da honra conjugal, como valor absoluto, ressaltando que não
se legisla somente para o intelectual, ou para o homem que vive em uma metrópole,
mais tolerante quanto aos costumes, mas também para o espírito conservador do
homem médio. Destaca a pressão do meio contra o cônjuge traído, narrando que este
torna-se ridículo aos olhos da sociedade que o cerca se nenhuma providência tomar
ao deparar-se com adultério flagrante. “O homem de caráter para o brasileiro não
pode ser o tipo conjuntivo, manso e resignado, falho de emotividade, amorfo ou
apático da classificação de Heymans, ante o mundo circundante, que acaso aceite
compassivamente a cena de um flagrante adultério dentro de seu próprio lar. [...] não
é esse o tipo médio do brasileiro. O caráter que prevalece dentro de nossa
comunidade, compatível com a dignidade da pessoa humana, é o que resguarda com
a pronta reação o plano de valores espirituais e morais que esse universalismo
criou”. E termina sustentando que à mulher traída idêntico direito assistiria (1994, p.
232-249).

13
Considerando as opiniões dos ilustres estudiosos, prudentemente há que se concordar
com a conduta moderada, pois o precedente de violência nunca será a melhor maneira de se
resolver os conflitos em sociedade. Ainda levando em conta a valoração dos bens em choque:
“a vida” e “a honra”, sendo que, neste caso, entende-se a vida como sendo o bem mais preciso
que o ser humano possui; seria, portanto, descabido ceifá-la para preservar a honra.

3.7 EXCESSO NA DEFESA LEGÍTIMA

O excesso pode ser definido como sendo tudo o que extrapola o artigo 25 do Código
Penal Pátrio, o qual possui as seguintes características: Meios moderadamente necessários;
Injusta agressão; Agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem.
Ao contrário disso a legítima defesa é uma causa de exclusão da ilicitude, visto que,
está definido no artigo 23 do Código Penal.
O excesso na legítima defesa pode ser culposo ou doloso, então, frente a isso deve ser
analisada tanto no quesito objetivo (letra da lei) quanto no subjetivo (conduta específica de
cada caso concreto).
O fato motivador da legítima defesa e consequentemente ocorrendo o excesso, não
precisa ser necessariamente fato típico, ocorrendo também em uma conduta atípica, basta que
se amolde nas características do artigo em comento.
Segundo Rogério Greco (2012, p. 351-353) o excesso na Legítima Defesa pode ser
doloso ou culposo e sobre eles assevera que:

Diz-se doloso o excesso em duas situações:


a) quando o agente, mesmo depois de fazer cessar a agressão, continua o ataque
porque quer causar mais lesão ou mesmo a morte do agressor inicial (excesso doloso
em sentido estrito); e
b) quando o agente, também, mesmo depois de fazer cessar a agressão que era
praticada contra a sua pessoa, pelo fato de ter sido agredido inicialmente, em virtude
de erro de proibição indireto (erro sobre os limites de uma causa de justificação)
acredita que possa ir até o fim, mantando o seu agressor, por exemplo.
Ocorre o excesso culposo nas seguintes situações:
a) quando o agente ao avaliar mal a situação que o envolvia, acredita que ainda está
sendo ou poderá vir a ser agredido e, em virtude disso dá continuidade à repulsa,
hipótese na qual será aplicada a regra do art. 20 § 1º, segunda parte do Código
Penal; ou
b) quando o agente, em virtude de má avaliação dos fatos e da sua negligência no
que diz respeito a aferição das circunstâncias que o cercavam, excede-se em virtude
de um erro de cálculo quanto a gravidade do perigo quanto ao modus da reação
(excesso culposo em sentido estrito).

14
Tanto no excesso doloso quanto no culposo, o agente responderá por aquilo que
extrapolar do momento em que a agressão foi cessada.
O excesso exculpante na legítima defesa não se confunde com o excesso culposo e
tampouco com o doloso, vez que esse apesar de não ter previsão na legislação pátria é tratado
pela doutrina e na jurisprudência como causa supralegal de exclusão da culpabilidade.
Tanto o excesso culposo quanto o doloso, como já foi visto anteriormente são
previstos taxativamente pelo ordenamento jurídico.

3 8.1 Excesso justificante

O excesso justificante nada mais é do que as situações descritas na legítima defesa


putativa, causada por fatos definidos como erro de tipo/erro de proibição.
Situação imaginária em que o agente acreditava friamente que estava amparado por
um excludente de ilicitude. Ou mesmo, que estava agindo em conformidade com a Lei.
Em ambos os casos o agente responderá pelo crime na medida de sua culpabilidade,
ou seja, na modalidade culposa ou com uma redução de pena se o fato se amoldar a uma
conduta em que todos, naquela situação agiria daquela forma.

3.8.2 Excesso exculpante

O excesso exculpante pode ser definido como ação perpetrada por medo, perturbação
de ânimo, ou seja, o indivíduo se encontra em uma situação psicológica afetada (confusão
mental).
Rogério Greco (2012, p.357 ) ensina que:

[...] o pavor da situação em que se encontra envolvido o agente é tão grande que não
lhe permite avaliá-la com perfeição, fazendo com que atue além do necessário para
fazer cessar a agressão. Essa sua perturbação mental o leva, em alguns casos, a
afastar a culpabilidade. Dissemos em alguns casos porque, como regra, uma situação
de agressão que justifique a defesa nos traz uma perturbação de espírito, natural para
aquela situação. O homem, como criatura de Deus, tem sentimentos. Se esses
sentimentos, avaliados no caso concreto, forem exacerbados a ponto de não
permitirem um raciocínio sobre a situação em que estava envolvido o agente, podem
conduzir à exclusão da culpabilidade, sob a alegação do excesso exculpante.

Então, trata-se de um ato que não pode ser censurado, pois, se relaciona com uma
confusão, desordem, confusão mental e perturbação, assim, o estado normal de discernimento
15
é afetado.
Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 280) assevera que:

[...] excesso exculpante: trata-se de uma causa supralegal de exclusão da


culpabilidade. Essa modalidade é decorrente de medo, surpresa ou perturbação de
ânimo, fundamentados na inexigibilidade de conduta diversa. Ilustrando: o agente,
ao se defender de um ataque inesperado e violento, apavora-se e dispara seu revólver
mais vezes do que seria necessário para repelir o ataque, matando o agressor. Pode
constituir-se uma hipótese de flagrante imprudência, embora justificada pela
situação especial por que passava.

Portanto o excesso exculpante tende a eliminar a culpabilidade, deixando um fato


típico e antijurídico de ser culpável em virtude de no fato concreto, não poder ser exigida do
agente outra conduta que não seja aquela por ela adotada.
O excesso na legítima defesa, possui alguns aspectos de exculpação, sendo definido
como fatores astênicos e estênicos. O primeiro é determinado por medo, susto e perturbação,
ou seja, aspectos fracos e o segundo por ódio e ira, aspectos fortes. Admite-se a coexistência
dos dois aspectos em igualdade, todavia, a posição dominante é que deve prevalecer a dos
aspectos astênicos. Tal posição é considerada, pois, os estados afetivos de medo, susto ou
perturbação podem ensejar em uma redução dos controles, anormalidade psicológica, ou seja,
diminuem a culpabilidade, pois as emoções são insuscetíveis de controle consciente, então
fundamentam a exculpação do excesso da legítima defesa, independente de previsão legal.
(SANTOS, 2008)
Ainda nesta linha de raciocínio, o excesso da legítima defesa, do pondo de vista
subjetivo, podem ser conscientes ou inconscientes, as doutrinas majoritárias admitem-se tanto
o excesso consciente quando ao inconsciente sobre a égide da dificuldade de distinguir o dolo
e a imprudência da ação rápida, onde estão presentes as emoções como o medo, susto e
perturbação, pois eles, podem excluir ou diminuir a capacidade de compreensão e controle,
ensejando assim, excesso doloso ou imprudente. (SANTOS, 2008)
No ponto de vista objetivo, podem ocorrer o excesso intensivo e extensivo, sendo o
primeiro caracterizado pelo meio de defesa desnecessário.
Já no excesso intensivo de legítima defesa, segundo lição de Juarez Cirino dos Santos
(2008, p. 340 ) podem ocorrer as seguinte alternativas:

a) o excesso inconsciente determinado por afetos astênicos de medo, susto ou


perturbação (isolados ou em conjunto com afetos estênicos de ira ou ódio) é
exculpável; b) o excesso consciente produzido por aspectos astênicos e estênicos é,

16
igualmente, exculpável; c) o excesso consciente ou inconsciente produzido somente
por afetos astênicos de ira ou ódio é punível; d) o excesso consciente produzido pela
crença errônea na necessidade de defesa caracteriza hipótese de legítima defesa
putativa (a imprudência remanescente é punível, se prevista em lei).

Então, o excesso extensivo é caracterizado pelo uso imoderado de meios necessários,


se configurando na descoincidência temporal entre a defesa e a agressão.
Há que se esclarecer também a possibilidade de excesso na legítima defesa putativa,
na qual não existe agressão real, mais sim no imaginário do agente. Nesta modalidade de
legítima defesa é inexistente a agressão atual ou iminente a um bem jurídico próprio ou de
terceiros, no entanto, o autor representa a existência da agressão inexistente e, determinado
por fatores astênicos de medo, susto ou perturbação, utilizado assim, meio de defesa
desnecessário. (SANTOS, 2008)
A posição majoritária rejeita o excesso de legítima defesa putativa, sob a alegação que
se não existe uma situação justificante de legítima defesa real, então não existe limites
suscetíveis de serem excedidos. Todavia é uma posição bastante criticada por algumas
doutrinas, porque representação errônea de agressão inexistente produz efeitos psíquicos
iguais à representação correta de agressão existente. (SANTOS, 2008)
É notória a impossibilidade de exculpação nos casos de provocação da situação de
legítima defesa, todavia, a moderna dogmática tem procurado flexibilizar esse ponto de vista
sobre o argumento de possibilidade de desvio de defesa provocada. Se o provocador tem a
possibilidade de desvencilhar da defesa do agredido, fugindo do local, não há exculpação. Já
se não é possível o provocador se desviar da defesa provocada, então é possível admitir a
exculpação por ações inevitáveis de defesa, uma vez que ninguém pode ser obrigado a
renunciar ao direito de viver, sendo as alternativas deixar-se matar ou sofrer pena rigorosa.
(SANTOS, 2008)

4 CONCLUSÃO

Ao finalizar o estudo percebe-se que há a necessidade de três requisitos para que a


ação seja caracterizada como crime, são eles: fato típico, ilicitude do ato e a culpabilidade,
eliminando um destes requisitos não se configurará ato criminoso.
Sendo assim, o instituto da legítima defesa é uma das formas de exclusão da
ilicitude, se preenchidos todos os seus requisitos, o indivíduo que repele agressão injusta,
atual ou iminente, usando meios necessários e moderados poderá ser amparado por essa
17
excludente.
Tal instituto veio para auxiliar certa parcela da sociedade, no decorrer de toda
evolução humana, tendo em vista que a figura do Estado, o qual detém a autotutela, não pode
a todo momento proteger os indivíduos, então, a lei regulamentou formas de proteção
subsidiária.
A lei também previu modalidades de excessos, como: doloso e culposo, no qual o
agente será punido de acordo com sua conduta. Há também modalidades de excessos que não
serão considerados crime, pois, como no excesso exculpante, exclui a culpabilidade, então,
afastando um dos requisitos que compõe o crime, a ação do agente é considerada atípica.
O indivíduo só será punido a título de excesso, se durante a sua repulsa a injusta
agressão, extrapolar em sua defesa, passando assim, a ser vingança (afetos estênicos) e
consequentemente não será amparado por essa excludente de antijuridicidade.
Portanto, conclui-se que no instituto da legítima defesa os possíveis excessos devem
ser analisados minunciosamente, a cada conduta específica, com o objetivo de não tornar uma
modalidade de defesa em uma forma de autotutela privada, onde o indivíduo se aproveitando
da inércia do Estado, fará justiça com as próprias mãos, o que seria o mesmo que regredir no
tempo.

LA LEGÍTIMA DEFENSA SACADORA DE LA CULPA EN LO DERECHO PENAL


BRASILEÑO

RESUMEN

La legítima defensa es una causa de excluyente de ilicitud, puede ser clasificado como una
reacción, hecha con moderación y se valiendo de los medios necesarios, en contra de una
agresión injusta, actual o inminente, para buscar proteger el derecho propio o ajeno. Cuando
la acción es causado por grande perturbación psíquica, sacando la capacidad del agente de
orientar en acordó con la norma, la defensa hecha en contra el agresor, todavía aumentada,
podrá excluye el crimen, por la falta de culpabilidad del agente, este estudio tiene por objetivo
hacer la analices de la legítima defensa sacadora de la culpa en derecho Brasileño e los
delimitadores de la misma. Para tanto busco-se en la doctrina de conceptuados autores e
estudiosos del área. Al término de la pesquisa hubo la conclusión que los efectos asténicos,
como el miedo, susto e demás emociones sin controle consciente, constituyen excesos que
sacan la culpa en la legítima defensa, haciendo del fato, indiferente al derecho penal.
Palabras principales: legítima defensa, sacadoras de la ilicitud, sacadoras de la culpabilidad

REFERÊNCIAS

18
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 1 / Cezar. Roberto
Bitencourt. – 21ª. ed. rev., ampl. e atual. De acordo com a Lei n. 12.550, de 2011. – São
Paulo: Saraiva, 2015.

BRUNO, Anibal. Direito penal: parte geral. Tomo 1. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: (arts. 1º a 120) / Fernando
Capez. — 18ª. ed. — São Paulo: Saraiva, 2014.

CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Teoria geral do processo, 5ª ed.,São Paulo, Saraiva,
2012.

GREGO, Rogério. Curso de Direito penal, parte geral, 4ª ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2004.

GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo, 29ª ed., 2013, Malheiros.

JESUS, Damásio E. de, 1935 - Direito penal / Damásio E. de Jesus. São Paulo Saraiva, 1998.

LINHARES, Marcello Jardim. 1911 – L 728 L. Legítima defesa [por] Marcello J. Linhares.
São Paulo, Saraiva, 1975.

MASSON, Cleber. Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1 / Cleber Masson. – 8.ª
ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal / Guilherme de Souza Nucci. – 5ª. ed.
rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2009.

SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal – Parte Geral – 3ª ed., 2008, Lumen Juris.

SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso de direito
penal: parte geral. 1ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.

VadeMecum Saraiva. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Luiz
Roberto Cúria, Lívia Céspedes e Juliana Necoletti. 2.ª ed., 2013.

19

Você também pode gostar