Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
RESUMO: Propomo-nos examinar neste estudo os ABSTRACT: The purpose of this study is to provide
diferentes significados do conceito de autonomia a comparative perspective regarding the various
privada à luz do Direito Comparado. Interessa-nos meanings attributed to the concept of private
averiguar, em especial, se a autonomia privada autonomy. The paper is particularly concerned,
pode considerar-se dotada, nas famílias jurídicas on the one hand, with determining whether
contemporâneas, de um significado unívoco e se private autonomy has a univocal meaning across
constitui nelas o fundamento exclusivo da força contemporary legal systems and, on the other,
obrigatória dos contratos de Direito Privado. whether it provides the sole ground for the
enforceability of private contracts.
PALAVRAS-CHAVE: Autonomia privada – Direito com- KEYWORDS: Private autonomy – Comparative
parado – Familias jurídicas contemporâneas – Con- law – Contemporary legal systems – Contracts –
tratos – Força obrigatória. Enforceability.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
I. POSIÇÃO DO PROBLEMA
1. Cfr. International Institute for the Unification of Private Law. Unidroit Principles of Interna-
tional Commercial Contracts. 3. ed. Roma, 2010. Existe tradução do articulado em língua
portuguesa, disponível em: [www.unidroit.org].
2. Cfr. Commission on European Contract Law. Principles of European Contract Law. Parts I
and II. Haia/Londres/Boston, 2000; Part III, Haia/Londres/Nova Iorque, 2003.
3. Cfr. BAR, Christian von; CLIVE, Eric; SCHULTE-NÖLKE, Hans (org.). Principles, Defini-
tions and Model Rules of European Private Law. Draft Common Frame of Reference (DCFR).
Outline Edition, Munique, 2009.
4. Documento COM (2011) 635 final, de 11.10.2011, disponível em: [http://eur-lex.europa.eu].
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
5. Por meio da qual se têm geralmente em vista instrumentos reguladores das relações eco-
nómicas internacionais sem caráter normativo, mas nem por isso desprovidos de eficá-
cia. Esta derivaria, designadamente, da sua incorporação em contratos de Direito Pri-
vado e da aplicabilidade de sanções informais ao seu incumprimento. Sobre a natureza
jurídica dos instrumentos referidos no texto, vejam-se, com posições muito diferencia-
das, CANARIS, Claus-Wilhelm. Die Stellung der “Unidroit Principles” und der “Prin-
ciples of European Contract Law” im System der Rechtsquellen. In: BASEDOW, Jürgen
(org.). Europäische Vetragsrechtsvereinheitlichung und deutsches Recht. Tubinga, 2000.
p. 5 e ss.; BONELL, Michael Joachim. Towards a Legislative Codification of the Uni-
droit Principles?. Uniform Law Review. 2007. p. 233 e ss.; e DESSEMONTET, François.
The application of soft law. Halakha and Sharia by International Arbitral Tribunals. The
American Review of International Arbitration. vol. 23. 2012. A Tribute to Professor Hans
Smit, p. 545 e ss.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
2. TRIUNFO DE UM IDEAL?
À luz destas disposições, dir-se-ia que a autonomia privada conquistou, nos
instrumentos jurídicos em apreço, a sua máxima extensão possível: acolhe-se neles
não só a liberdade de celebração e estipulação do conteúdo de contratos internacio-
nais, mas também a liberdade de conformação do próprio regime normativo aplicá-
vel a estes contratos, o qual pode ser, de acordo com as suas disposições, escolhido
pelos interessados sem sujeição necessária a qualquer Direito estadual.6
A ser isto exato, a autonomia privada constituiria neste domínio uma verdadeira
faculdade de autorregulação (self-governance ou self-regulation) pelos próprios inte-
ressados das relações jurídicas de que estes são partes. O contrato teria, assim, a
fonte exclusiva da sua eficácia jurídica na vontade das partes.
Mas será realmente assim?
A resposta a este quesito pressupõe uma breve digressão pelos principais sis-
temas jurídicos nacionais, de cujos princípios comuns os instrumentos interna-
cionais a que aludimos se apresentam como uma espécie de restatements. É o que
faremos em seguida.
6. Alude-se, a este propósito, à doutrina do “contrato sem lei” ou “sem lei estadual”, de cujas
incidências na arbitragem internacional nos ocupámos em Da arbitragem comercial inter-
nacional. Direito aplicável ao mérito da causa. Coimbra, 1990. p. 190 e ss.
7. Sobre o contrato como ato de autonomia privada vejam-se, na doutrina portuguesa: AS-
CENSÃO, José de Oliveira. Direito civil. Teoria geral. 2. ed. Coimbra, 2003. vol. 2, p. 77 e
ss.; FERNANDES, Luís Carvalho. Teoria geral do direito civil. 5. ed. Lisboa, 2010. vol. 2,
p. 32 e ss.; OLIVEIRA, Nuno Pinto. Princípios de direito dos contratos. Coimbra, 2011.
p. 147 e ss.; e CORDEIRO, António Menezes. Tratado de direito civil. 4. ed. Coimbra, 2014.
vol. 2, p. 56 e s.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
8. Cfr. o art. 2 (1) da Lei Fundamental alemã, segundo o qual: “Todos têm o direito ao livre
desenvolvimento de sua personalidade, desde que não violem direitos de outrem e não
atentem contra a ordem constitucional ou a lei moral”. No sentido do texto, vejam-se as
decisões do Tribunal Constitucional Federal alemão de 12.11.1958, Entscheidungen des
Bundesverfassungsgerichtshofes, 8. p. 274 e ss. (p. 328), e de 13.05.1986, idem, 72. p. 155
e ss. (p. 170). Entendem que a liberdade contratual está compreendida no direito funda-
mental ao livre desenvolvimento da personalidade: BROX, Hans; WALKER, Wolf-Dietrich.
Allgemeines Schuldrecht. 39. ed. Munique, 2015. p. 28.
9. Haja vista ao art. 26.º, n. 1, da Constituição, segundo o qual: “A todos são reconhecidos
os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil,
à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da
vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”.
Pronunciam-se pela inclusão da autonomia privada no âmbito da tutela conferida por este
preceito: RIBEIRO, Joaquim de Sousa.. O problema do contrato. As cláusulas contratuais
gerais e o princípio da liberdade contratual. Coimbra, 1999. p. 145 e ss., n. 350; e PIN-
TO, Paulo Mota. O direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Portugal-Brasil ano
2000. Tema Direito. Coimbra, 1999. p. 149 e ss. (p. 214). O Supremo Tribunal de Justiça
português reconheceu no acórdão de 09.07.1998, Boletim do Ministério da Justiça, vol. 479.
p. 580 e ss., que o princípio da autonomia privada é tutelado constitucionalmente.
10. “Les conventions légalement formées tiennent lieu de loi à ceux qui les ont faites”.
11. Cfr. os arts. 1.091 do Código Civil espanhol (segundo o qual: “Las obligaciones que nacen
de los contratos tienen fuerza de ley entre las partes contratantes, y deben cumplirse a
tenor de los mismos”) e 1372, n. 1, do Código Civil italiano (que estabelece: “Il contratto
ha forza di legge tra le parti. Non può essere sciolto che per mutuo consenso o per cause
ammesse dalla legge”).
12. Ver, para uma exposição e crítica deste entendimento: ROUHETTE, Georges. The Obli-
gatory Force of Contract in French Law. In: HARRIS, Donald; TALLON, Denis. Le contrat
aujourd’hui: comparaisons franco-anglaises. Paris, 1987. p. 38 e ss.; e GHESTIN, Jacques.
Traité de droit civil. La formation du contrat. 3. ed. Paris, 1993. p. 31 e ss.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
13. Cfr. o art. 1.108 do CC: “Quatre conditions sont essentielles pour la validité d’une conven-
tion: le consentement de la partie qui s’oblige; sa capacité de contracter; un objet certain
qui forme la matière de l’engagement; une cause licite dans l’obligation”.
14. Art. 1.131 do CC: “L’obligation sans cause, ou sur une fausse cause, ou sur une cause illi-
cite, ne peut avoir aucun effet”.
15. “Les conventions obligent non seulement à ce qui y est exprimé, mais encore à toutes les
suites que l’équité, l’usage ou la loi donnent à l’obligation d’après sa nature”.
16. Cfr. o art. 6 do CC: “On ne peut déroger, par des conventions particulières, aux lois qui
intéressent l’ordre public et les bonnes mœurs”.
17. Rouhette, est. Op. cit., p. 31.
18. Ghestin, Jacques. Op. cit., p. 41 e s.
19. Cfr. FABRE-MAGNAN, Muriel. Droit des obligations. Contrat et engagement unilatéral. Pa-
ris, 2008. vol. 1, p. 55 e ss.
20. Ver RIPERT, Georges. La règle morale dans les obligations civiles. Paris, 1949.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
21. Haja vista ao art. 1322, n. 1, do CC, que dispõe: “Le parti possono liberamente determina-
re il contenuto del contratto nei limiti imposti dalla legge”.
22. Art. 1.372 do CC: “Il contratto ha forza di legge tra le parti. Non può essere sciolto che per
mutuo consenso o per cause ammesse dalla legge. Il contratto non produce effetto rispetto
ai terzi che nei casi previsti dalla legge”.
23. Cfr. o art. 1.325 CC, segundo o qual: “I requisiti del contratto sono: 1) l’accordo delle
parti; 2) la causa; 3) l’oggetto; 4) la forma, quando risulta che è prescritta dalla legge sotto
pena di nullità”.
24. Art. 1.322, n. 2, do CC.
25. Cfr. Diritto privato. 16. ed. Pádua, 2013. p. 250.
26. I.é, aquelas cláusulas que “apesar da boa fé, implique, em prejuízo do consumidor, um
significativo desequilíbrio dos direitos e obrigações decorrentes do contrato” (art. 1469-bis
do CC).
27. Diritto civile. Il contratto. 2. ed. Milão, 2000. vol. 3, p. 33.
28. Ver, por exemplo, LARENZ, Karl. Richtiges Recht. Grundzüge einer Rechtsethik. Munique,
1979. p. 60.
29. Cfr. Die Geschichte des Rechts. Von den Frühformen bis zur Gegenwart. 3. ed. Munique,
2006. p. 457.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
30. Para uma síntese acerca do tema, veja-se UNBERATH, Hannes. Vertragsfreiheit. In: BA-
SEDOW, Jürgen; HOPT, Klaus J.; ZIMMERMANN, Reinhard (org.). Handwörterbuch des
Europäischen Privatrechts. Tubinga, 2009., vol. 2. p. 1692 e ss.
31. Cfr. Allgemeiner Teil des Bürgerlichen Rechts. Das Rechtsgeschäft. 4. ed. Berlim, etc., 1992.
vol. 2, p. 4.
32. Ver Wandlungen des Schuldvertragsrechts – Tendenzen zu seiner “Materialisierung. Ar-
chiv für die civilistische Praxis, 2000. p. 273 e ss.
33. Decisão de 19.10.1993, Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichtshofes, 89, p. 214 e ss.
(p. 234).
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
34. Entretanto incorporados no BGB. Vejam-se, designadamente, os §§ 305 a 310, 312a a 312f
e 346 a 359.
35. Neste sentido, CORDEIRO, António Menezes. Op. cit, p. 54.
36. Haja vista, designadamente, aos arts. 236.º e 239.º do CC.
37. Cfr. os arts. 283.º e 437.º do CC.
38. Art. 405.º, n. 1, do CC.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
39. Cfr. a Lei 134, de 28.08.1999, que proíbe as discriminações no exercício de direitos por
motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica; a Lei 18, de 11.05.2004,
que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de ori-
gem racial ou étnica, com o objetivo de estabelecer um quadro jurídico para o combate à
discriminação baseada em motivos de origem racial ou étnica, transpondo para a ordem
jurídica interna a Diretiva 43/CE, do Conselho, de 29.06.2000; e a 14, de 12.03.2008, que
proíbe e sanciona a discriminação em função do sexo no acesso a bens e serviços e seu
fornecimento, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 113/CE, do Conselho,
de 13.12.2004.
40. No sentido de que a função social do contrato, no caso particular da autonomia privada,
significa que “o reconhecimento e o exercício desse poder, ao realizar-se na promoção da
livre circulação de bens e de prestação de serviços e na autorregulamentação das relações
disso decorrentes, condicionam-se aos efeitos sociais que tal circulação possa causar, ten-
do em vista o bem comum e a igualdade material”, veja-se AMARAL, Francisco. Direito
civil. Introdução. 8. ed. Rio de Janeiro, 2014. p. 93.
41. Cfr. GODINHO, Adriano Marteleto. A lesão no novo Código Civil brasileiro. Belo Horizonte, 2008;
e GLITZ, Frederico, Contrato e sua conservação. Lesão e cláusula de hardship. Curitiba, 2012.
42. Ver, sobre o regime brasileiro da onerosidade excessiva, ASCENSÃO, José de Oliveira.
Alteração das circunstâncias e justiça contratual no novo Código Civil. Revista CEJ, 2004.
p. 59 e ss.; KHOURI, Paulo Roque. A revisão judicial dos contratos no novo Código Civil,
Código do Consumidor e Lei n. 8.666/93. A onerosidade excessiva superveniente. São Paulo,
2006; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: autonomia privada
e teoria da imprevisão. São Paulo, 2006; BARROS, André Borges de Carvalho. A onerosi-
dade excessiva como fundamento da revisão ou resolução do contrato no Código Civil e
no Código de Defesa do Consumidor. In: HIRONAKA, Giselda; TARTUCE, Flávio. Direito
contratual. Temas atuais. São Paulo, 2007. p. 315 e ss.; e FRANTZ, Laura Coradini. Exces-
siva onerosidade superveniente: uma análise dos julgados do STJ. In: MARTINS-COSTA,
Judith (org.). Modelos de direito privado, São Paulo, 2014. p. 215 e ss.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
43. Em sentido convergente, veja-se GÁNDARA, Rocío Caro. En la secular búsqueda europea
de un paradigma de justicia contractual: el enfoque de justicia relacional. In: LORENZO,
Sixto Sánchez (org.). Derecho contractual comparado. Una perspectiva europea y transnacio-
nal, cit., 2013. p. 53 s. (p. 84).
44. Cfr. Teoria da confiança e responsabilidade civil. Coimbra, 2004. p. 666.
45. Haja vista, designadamente, ao art. 230.º, n. 1, do CC, que consagra o princípio da irrevo-
gabilidade da proposta de contrato.
46. Cfr. o art. 236.º, n. 1, do CC, que consagra nesta matéria a doutrina da impressão do des-
tinatário.
47. No Código Civil, a tutela da confiança explica, por exemplo, a responsabilidade do decla-
rante que haja culposamente emitido uma declaração sem consciência dela: art. 246.º.
48. Veja-se, designadamente o art. 227.º do CC.
49. Ver MARTINS-COSTA, Judith. A boa fé no direito privado. Critérios para a sua aplicação.
São Paulo, 2015. p. 230 e ss., sublinhando, a este propósito, a relação de interdependência
entre os princípios da autonomia privada e da confiança.
50. Art. 112 do CC.
51. Art. 147 do CC.
52. Art. 187 do CC.
53. Art. 422 do CC.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
Na doutrina alemã, não falta quem tenha procurado fundar na confiança a efi-
cácia da declaração de vontade54 ou do contrato em geral.55 Uma orientação mais
matizada vê nos princípios da autonomia e da proteção da confiança o fundamento
da eficácia obrigatória do contrato.56 A tutela da confiança encontrou acolhimento
normativo expresso na cláusula geral da boa-fé consignada no § 242 do BGB.57
Nela se funda o substancial alargamento do escopo obrigatório do contrato levado
a cabo pela jurisprudência alemã ao longo de um século e acolhido no Código Civil
pela Lei de Modernização do Direito das Obrigações: é a tutela da confiança que
justifica, designadamente, a imposição aos contraentes de certos deveres acessórios
de conduta perante a contraparte, tanto nos preliminares como na execução dos
contratos, assim como a inclusão de terceiros na esfera de proteção do contrato.58
c) Avulta ainda neste domínio uma ideia de justiça comutativa, expressa nome-
adamente nas regras que visam assegurar o equilíbrio das prestações: nos contratos
onerosos comutativos, à prestação de cada um dos contraentes deve corresponder,
por parte do outro contraente, uma prestação de valor proporcional.
Embora a conceção que esteve na raiz do BGB colocasse o acento tónico na de-
nominada “justiça processual” ou “formal” do contrato, traduzida, v.g., na ausência
de vícios da vontade, a evolução registada no Direito Civil alemão ao longo do
século XX, culminando na Modernização do Direito das Obrigações, denota uma
crescente preocupação com a “justiça material”, ou “substantiva”. Dela são expres-
sões, por exemplo, a consagração da figura da “perturbação da base do negócio”
(“Störung der Geschäftsgrundlage”) no § 313 do BGB59 e o controlo do conteúdo
54. Cfr. EICHLER, Hermann. Die Rechtslehre vom Vertrauen. Privatrechtliche Untersuchungen
über den Schutz des Vertrauens. Tubinga, 1950. p. 106 e s.; e CRAUSHAAR, Götz von. Der
Einfluss des Vertrauens auf die Privatrechtsbildung. Munique, 1969. p. 35 e ss. e 58.
55. ZWEIGERT, Konrad; KÖTZ, Hein. Einführung in die Rechtsvergleichung. 3. ed. Tubinga,
1996. p. 318.
56. Cfr. ZIPPELIUS, Reinhold.echtsphilosophie. 3. ed. Munique, 1994. p. 220.
57. Ver, neste sentido, WOLF, Manfred; NEUNER, Jörg. Allgemeiner Teil des Bürgerlichen
Rechts. 10. ed. Munique, 2012. p. 112.
58. Declara-o expressamente o § 311 (3) do BGB, segundo o qual pode constituir-se uma re-
lação obrigacional integrada pelos deveres de consideração pelos direitos, bens jurídicos
e interesses alheios a que alude o § 241 (2) em relação a pessoas que não sejam partes no
contrato, mas em quem haja sido depositada particular confiança e que, dessa forma, ha-
jam influenciado consideravelmente as negociações ou a conclusão do mesmo.
59. Segundo o qual: “(1) Quando as circunstâncias que constituíram a base do contrato se
houverem alterado severamente depois da conclusão deste, e se as partes não o tivessem
concluído ou o tivessem concluído com outro conteúdo caso tivessem previsto essa al-
teração, pode ser exigida a adaptação do contrato, desde que, tendo em conta todas as
circunstâncias do caso concreto, em especial a repartição contratual ou legal do risco, não
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
seja exigível a uma das partes a vinculação ao contrato inalterado. (2) É equiparada a uma
alteração de circunstâncias a situação em que se revelem erradas representações essenciais
que tenham estado na base do contrato. (3) Quando a adaptação do contrato não seja
possível ou exigível a uma das partes, pode a parte lesada resolver o contrato. Nas relações
obrigacionais duradouras, opera o direito de denúncia em lugar do direito de resolução”.
60. Que dispõe: “São ineficazes as estipulações constantes de cláusulas contratuais gerais que
prejudiquem o cocontratante do predisponente de forma desproporcionada e contrária às
exigências da boa-fé”.
61. Cfr. Richtiges Recht cit., p. 79.
62. Cfr. Allgemeiner Teil des deutschen Bürgerlichen Rechts. 7. ed. Munique, 1989, p. 48.
63. Ver, neste sentido, DUARTE, Rui Pinto. O equilíbrio contratual como princípio jurídico.
Escritos jurídicos vários 2000-2015. Coimbra, 2015. p. 685 e ss., que observa a este respei-
to: “o princípio não exige que os valores das prestações sejam iguais, mas antes limita a
desigualdade, por um lado, em função do seu grau e, por outro, em função da correspon-
dência desses valores com a vontade das partes”.
64. Cfr., neste sentido, NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas, cit., p. 154
e ss.
65. Cfr. Contrat. In: ALLAND, Denis; RIALS, Stéphane (org.). Dictionnaire de la culture juri-
dique. reimpr. Paris, 2007. p. 276 e ss. (p. 280). Ver ainda, no mesmo sentido, GHESTIN,
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
Jacques. La notion de contrat. Recueil Dalloz Sirey, 1990. p. 147 e ss. (p. 149 s.); ______.
Traité de droit civil. La formation du contrat cit., p. 42 e 203 e ss.; e GHESTIN, Jacques;
JAMIN, Christophe. Le juste et l’utile dans les effets du contrat. In: MONTEIRO, António
Pinto (coord.). Contratos: actualidade e evolução. Porto, 1997. p. 123 e ss.
66. Cfr. FOUILLEE, Alfred. La science sociale contemporaine. 5. ed. Paris, 1910. p. 410.
67. Neste sentido, FU, Junwei. Towards a Social Value Convergence: a Comparative Study of
Fundamental Principles of Contract Law in the EU and China. Oxford University Compar-
ative Law Forum, 2009, p. 3.
68. Ver XIE, Huaishi. Contract Law in the Far East – China and Japan. International Encyclo-
pedia of Comparative Law, vol. 11. Tubinga/Haia, vol. 7, capítulo 6. p. 35 e ss.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
72. Neste sentido, TIMOTEO, Marina. Il contratto in Cina e Giappone nello specchio dei diritti
occidentali. Pádua, 2004. p. 332.
73. A conclusão é de FU, Junwei. Op. cit., p. 17.
74. Neste sentido, SCHACHT, Joseph. An Introduction to Islamic Law. reimpr. Oxford, 1982.
p. 144. Ver também, sobre o tema, YASSARI, Nadjma. The concept of freedom of contract in
Western and Islamic Legal Cultures. Innsbruck, 1999. p. 109 e ss.
75. Ver VOGEL, Frank E. Contract law of Islam and the Arab Middle East. International Ency-
clopedia of Comparative Law. Tubinga/Haia, vol. 11, vol. 7, capítulo 7. p. 28 s.
76. Está nesse caso, designadamente, a proibição da venda de bens futuros, que o Direito mu-
çulmano consagra. Cfr., sobre o ponto, DAU-SCHMIDT, Nicholas C. Forward contracts
– Prohibitions on risk and speculation under islamic law. Indiana Journal of Global Legal
Studies, 2012. p. 533 e ss.
77. Vejam-se ainda os versículos 2:276, 2: 278, 3:130, 4:161 e 30:39.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
78. Ver, sobre o tema, SIDDIQI, Mohammad. Riba. Bank Interest and the Rationale of its Prohi-
bition. Jeddah, 2004.
79. Cfr. a decisão proferida pela Câmara dos Lordes em 1778 no caso Rann vs. Hughes [1778]
101 E.R. 1014, em que Lord Skynner afirmou: “The law of this country supplies no means
nor affords any remedy to compel the performance of an agreement made without suffi-
cient consideration”.
80. Consagra esta ideia o § 79 do Restatement (Second) of Contracts ao dispor: “If the require-
ment of consideration is met, there is no additional requirement of (a) a gain, advantage,
or benefit to the promisor or a loss, disadvantage, or detriment to the promisee; or (b)
equivalence in the values exchanged (...)”.
81. Cfr. On Liberty. Londres, 1859. p. 194 s.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
Não faltou, é certo, quem visse na evolução do Direito dos Contratos ocorrida
em Inglaterra ao longo do século XX um declínio progressivo da liberdade contra-
tual: é este o cerne da tese de Patrick Atiyah originariamente publicada em 1979.82
E nos Estados Unidos chegou a ser anunciada, também nos anos 1970, a “morte do
contrato”: neste sentido se pronunciou Grant Gilmore.83
A verdade, porém, é que na sua essência o Direito inglês se manteve fiel – sobre-
tudo no domínio comercial – a uma perspetiva marcadamente liberal dos contratos;
e outro tanto se dirá do Direito norte-americano. O seu ex libris é o princípio da
sanctity of contracts, por força do qual só em situações excecionais é permitido ao
devedor exonerar-se das suas obrigações contratuais.84 Por outro lado, a imputação
de efeitos ao contrato não expressa ou tacitamente queridos pelas partes, como
aqueles que na Alemanha e em Portugal decorrem dos deveres acessórios de con-
duta decorrentes da boa-fé, só em limitada medida é admitida na lei e na jurispru-
dência, que procuram assim preservar o mais possível a vontade dos contraentes.
Pode, a esta luz, dizer-se que a autonomia privada encontra contemporanea-
mente a sua consagração mais ampla nos Direitos inglês e norte-americano.
b) É certo que também nesses Direitos tiveram eco as teorias que procuram fun-
dar a força vinculativa dos contratos na ideia de tutela da confiança. Esta é tida ne-
les como essencial ao funcionamento regular de uma economia baseada no crédito,
que necessariamente depende de as expetativas induzidas nos agentes económicos
através de promessas contratuais não serem defraudadas.85 É, designadamente, na
tutela da confiança que se funda o reconhecimento, no Direito norte-americano, de
certos efeitos às promessas contratuais não negociadas (unbargained-for promises)
82. Cfr. The Rise and Fall of Freedom of Contract. 3. ed. Oxford, 1988. reimpr. O autor viria
posteriormente a reconhecer uma certa recuperação da liberdade contratual durante o
consulado de Margareth Thatcher como Primeira-Ministra: ver An introduction to the law
of contract. 5. ed. Oxford, 1995. p. 27.
83. Cfr. The Death of Contract. 2. ed. Columbus, 1995 (a 1.ª ed. data de 1974).
84. Sobre a sanctity of contracts como ideia-força de uma conceção individualista do Direito
dos contratos ver ADAMS, John N.; BROWNSWORD, Roger. The ideologies of contract.
Legal Studies, 1987. p. 205 e ss., esp. p. 208 e ss.
85. Na doutrina norte-americana, avulta a este respeito o influente estudo de Lon Fuller e
William Pardue, publicado em 1936, The Reliance Interest in Contract Damages.Yale Law
Journal, 1936. p. 52 e ss. e 373 e ss. (sobre o qual pode ver-se uma recensão em língua
portuguesa por Ruy de Albuquerque, Ciência e Técnica Fiscal, 1962. p. 544 e ss.). Em
Inglaterra sobressai, em defesa da relevância da confiança como fundamento da eficácia
dos contratos, Atiyah, An introduction to the law of contract cit., p. 35, que, repercutindo e
desenvolvendo as ideias de Fuller e Perdue, aponta como primeiro propósito do Direito
dos Contratos “the desire to enforce promises and to protect the reasonable expectations
which are generated both by promises and by other forms of conduct”.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
86. Dispõe esse preceito: “A promise which the promisor should reasonably expect to induce
action or forbearance on the part of the promisee or a third person and which does induce
such action or forbearance is binding if injustice can be avoided only by enforcement of
the promise. The remedy granted may be limited as justice requires”.
87. E na correlativa responsabilidade pela violação de tais deveres in contrahendo, cominada
designadamente pelos Direitos alemão, italiano, português e brasileiro: cfr. o nosso Da
responsabilidade pré-contratual em direito internacional privado. Coimbra, 2001. p. 239 e ss.
88. [1992] 2 WLR 174.
89. Cfr. HAYEK, F. A. Law, Legislation and Liberty. reimpr. Londres, 1993. vol. 1. p. 102 e s., e
vol. 2, p. 124 e s.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
92. Cfr. Summa Theologica, parte II-II, questão 77, art. 1: “Se o preço exceder a quantidade
do valor da coisa ou se, inversamente, a coisa exceder o preço, desaparece a igualdade da
justiça. Por onde, vender mais caro ou comprar mais barato do que a coisa vale é em si
mesmo injusto e ilícito”.
93. Nesse sentido CABRILLAC, Rémy. Droit européen comparé des contrats. Paris, 2012. p. 23.
94. Reconhece-o, por exemplo, GORDLEY, James. The Philosophical Origins of Modern Con-
tract Doctrine. Oxford, 1991. p. 146 e ss. e 201 e ss.
95. Cfr. The Common Law. reimpr., Boston, etc., 1963. p. 5: “The life of the law has not been
logic: it has been experience”; e p. 32: “Every important principle which is developed by
litigation is in fact and at bottom the result of more or less definitely understood views of
public policy”.
96. Cfr. An Introduction to the Philosophy of Law. New Haven/Londres, 1982. p. 47: “I am con-
tent to think of law as a social institution to satisfy social wants – the claims and demands
and expectations involved in the existence of civilized society”.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
obrigações das partes, mas antes como o ponto de partida de uma relação de negó-
cios em permanente adaptação, podendo o mesmo, designadamente, ser renegocia-
do sempre que as circunstâncias em que foi celebrado se alterarem.
Nos sistemas muçulmanos, as restrições impostas à liberdade contratual fun-
dam-se na natureza revelada da Xaria e na visão teocêntrica da vida em sociedade
que lhe subjaz, à qual é alheia a noção ocidental de que os indivíduos são os me-
lhores juízes dos seus próprios interesses e de que lhes pertence, por conseguin-
te, uma certa esfera de autodeterminação. No mesmo sentido concorre a ética de
solidariedade própria do Islão, que proscreve todo o ganho injusto à custa alheia.
97. Ver, sobre esse conceito, SANTOS, António Marques dos. As normas de aplicação imediata
no direito internacional privado. Esboço de uma teoria geral. Coimbra, 1991, com amplas
referências bibliográficas e jurisprudenciais.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.
Tais normas devem ser aplicadas, na medida em que as regras pertinentes de Direi-
to Internacional Privado assim o determinem.
O CESL não consagrou, é certo, uma regra análoga. Pelo contrário, no art. 11.º
da proposta de regulamento que visava adotá-lo dizia-se: “Se as partes acordarem
de forma válida na aplicação do direito europeu comum da compra e venda a um
determinado contrato, apenas este direito comum pode reger as questões abrangi-
das pelas suas disposições”. A circunstância, porém, de o art. 6.º, n. 2, do Regula-
mento de Roma I sobre a lei aplicável às obrigações contratuais98 estabelecer que a
escolha pelas partes da lei aplicável ao contrato não pode ter como consequência
privar o consumidor da proteção que lhe proporcionam as disposições não derro-
gáveis por acordo da lei do país em que o consumidor tem a sua residência habitual
implica que as disposições do CESL não seriam aplicáveis aos contratos celebrados
por consumidores sempre que oferecessem a este uma proteção inferior à da lei do
país da sua residência habitual.99 E ainda que assim não fosse, o CESL apenas seria
aplicável mediante uma escolha expressa das partes (aliás de duvidosa plausibilida-
de tanto no que respeita aos consumidores como relativamente às empresas),100 na
falta da qual os Direitos dos Estados-Membros da União Europeia permaneceriam
aplicáveis aos contratos de compra e venda internacionais abrangidos por esse ins-
trumento, retirava a essa disposição muito do seu aparente alcance uniformizador.
Justamente por isso, o sistema de opting-in adotado no projeto mereceu severas
críticas na doutrina europeia,101 às quais não terá sido alheio o seu abandono pela
Comissão Europeia.102
10. CONCLUSÃO
Não há, em suma, na matéria que nos ocupou neste estudo, um modelo único,
nem os textos de fonte internacional que aqui examinámos representam qualquer
mínimo denominador comum entre as diferentes tradições jurídicas nacionais. Pelo
contrário: o significado da autonomia privada varia, sempre variou e continuará
muito provavelmente a variar no tempo e no espaço, não obstante todos os esforços
envidados, aos mais diversos níveis, no sentido de unificar o Direito dos Contratos.
PESQUISA DO EDITORIAL
103. Cfr. Filosofia do direito. 20. ed. São Paulo, 2002. p. 217 e ss. e 300 e ss.
104. Cfr. a Encíclica Caritas in Veritate, de 29.06.2009, n. 26.
VICENTE, Dário Moura. A autonomia privada e os seus diferentes significados à luz do direito comparado.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 8. ano 3. p. 275-302. São Paulo: Ed. RT, jul.-set. 2016.