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G1 Constitucional - Sistematizada
G1 Constitucional - Sistematizada
Sumário
1. TEORIA GERAL DO ESTADO......................................................................................................5
6B. Federalismo. Concepções e características. Classificações. Sistemas de repartição de
competência. Direito comparado.............................................................................................5
3A. Divisão de poderes. Conceito e objetivos. História. Independência e harmonia entre
poderes. Mecanismos de freio e contrapesos..........................................................................8
14A. Democracia. Conceito. História. Fundamentos. Democracia representativa e
participativa. Teorias deliberativa e agregativa da democracia. Instrumentos de democracia
direta na Constituição de 1988..............................................................................................11
2. FILOSOFIA POLÍTICA...............................................................................................................13
11A. Liberalismo igualitário, comunitarismo, procedimentalismo e republicanismo. Suas
projeções no domínio constitucional.....................................................................................13
25A. Pluralismo jurídico. As fontes normativas não estatais..................................................16
3. CONSTITUCIONALISMO..........................................................................................................18
1A. Constitucionalismo: trajetória histórica. Constitucionalismo liberal e social.
Constitucionalismo britânico, francês e norte-americano......................................................18
14C. A evolução do constitucionalismo brasileiro: constituições de 1824, 1891, 1934, 1937,
1946, 1967, 1969. A ditadura militar e os atos institucionais. A assembleia constituinte de
1987/88..................................................................................................................................27
24A. Neoconstitucionalismo. Constitucionalização do Direito e judicialização da política.....32
4. PODER CONSTITUINTE............................................................................................................36
5A. Poder Constituinte originário. Titularidade e características...........................................36
6A. Poder constituinte derivado. Limitações à reforma constitucional. Cláusulas pétreas
expressas e implícitas. As mutações constitucionais..............................................................38
8A. Poder constituinte estadual: autonomia e limitações......................................................40
13A. Direito Constitucional Intertemporal. Teoria da recepção. Disposições constitucionais
transitórias.............................................................................................................................41
5. NORMAS CONSTITUCIONAIS..................................................................................................43
9B. Norma jurídica e enunciado normativo. Características da norma jurídica......................43
4B. Normas constitucionais. Definição. Estrutura. Classificações. Princípios e regras.
Preâmbulo. Efeitos das normas da Constituição brasileira de 1988.......................................47
6. INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL.......................................................................................49
2C. Hermenêutica e Teorias da argumentação jurídica..........................................................49
21B. Interpretação jurídica. Métodos e critérios de interpretação........................................51
12B. Critérios clássicos de resolução de antinomias jurídicas................................................54
1
17B. A metodologia jurídica no tempo. A Escola da Exegese. Jurisprudência dos conceitos,
jurisprudência dos interesses e jurisprudência dos valores. O realismo jurídico.
Neoformalismo. O pós-positivismo jurídico...........................................................................56
22A. O papel das pré-compreensões no Direito. Interpretação, moralidade positiva e
moralidade crítica...................................................................................................................61
4C. Lacunas e Integração do Direito: analogia, costumes e equidade....................................63
7C. Os Princípios gerais de direito..........................................................................................65
10A. Interpretação constitucional. Métodos e princípios de hermenêutica constitucional.. .66
2A. Constituição e Cosmopolitismo. O papel do direito comparado e das normas e
jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição............................................69
11C. Colisão entre normas constitucionais. Ponderação e juízo de adequação. Princípios da
Proporcionalidade e da Razoabilidade...................................................................................71
7. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE.................................................................................75
12A. Controle de constitucionalidade: evolução histórica do sistema brasileiro. Direito
comparado. Legitimidade democrática..................................................................................75
16C. Controle concreto de constitucionalidade. O Recurso Extraordinário...........................78
18C. Controle abstrato de constitucionalidade: Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação
Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Ação Declaratória de Constitucionalidade e
Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.......................................................82
22B. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Técnicas decisórias na jurisdição
constitucional.........................................................................................................................95
25B. Inconstitucionalidade por omissão. Ação Direta e Mandado de Injunção.....................98
8. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.............................................................................101
6C. Direitos fundamentais. Concepções. Características. Dimensões Objetiva e Subjetiva.
Eficácia vertical e horizontal.................................................................................................102
20C. Limites dos direitos fundamentais. Teorias interna e externa. Núcleo essencial e
proporcionalidade. Os "limites dos limites".........................................................................107
16B. Os princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade..............................109
22C. Direito fundamental à moradia e à alimentação..........................................................111
23A. Direitos fundamentais culturais. Multiculturalismo e interculturalidade. Direito à
diferença e ao reconhecimento...........................................................................................114
19A. Liberdade de expressão, religiosa e de associação. O princípio da laicidade estatal. Os
direitos civis na Constituição de 1988..................................................................................117
17C. Direitos sexuais e reprodutivos....................................................................................122
13C. Princípio da isonomia. Ações afirmativas. Igualdade e diferença. Teoria do impacto
desproporcional. Direito à adaptação razoável....................................................................124
23C. Direitos fundamentais processuais: acesso à justiça, devido processo legal,
contraditório, ampla defesa, vedação de uso de provas ilícitas, juiz natural e duração
razoável do processo............................................................................................................126
15A. Controle jurisdicional e social das políticas públicas. Serviços de relevância pública. O
papel do Ministério Público..................................................................................................130
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9. DIREITOS SOCIAIS.................................................................................................................132
12C. Princípios Constitucionais do Trabalho. Os Direitos Fundamentais do Trabalhador....132
4A. Direitos sociais: enunciação, garantias e efetividade. Princípio da proibição do
retrocesso. Mínimo existencial e reserva do possível..........................................................134
10.NACIONALIDADE.................................................................................................................137
10B. Nacionalidade brasileira. Condição jurídica do estrangeiro.........................................137
11.DIREITOS POLÍTICOS............................................................................................................140
15B. Direitos Políticos. O papel da cidadania na concretização da Constituição..................140
12.FEDERAÇÃO BRASILEIRA......................................................................................................141
7B. União Federal: competência e bens...............................................................................141
3C. Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens.........................................................143
5C. Município: criação, competência, autonomia. Regiões metropolitanas.........................147
10C. Intervenção federal nos Estados e intervenção estadual nos Municípios....................152
13.ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA..................................................................................................153
11B. Princípios constitucionais sobre a Administração Pública............................................153
14.PODER LEGISLATIVO............................................................................................................156
1B. Poder Legislativo. Organização. Atribuições do Congresso Nacional. Competências do
Senado e da Câmara. Legislativo e soberania popular. A crise da representação política.. .156
15C. Regime constitucional dos parlamentares. Imunidades e incompatibilidades.............160
24B. Estatuto constitucional dos agentes políticos. Limites constitucionais da investigação
parlamentar. Crimes de responsabilidade. Controle social, político e jurisdicional do
exercício do poder. O princípio republicano........................................................................164
7A. Processo legislativo. Emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei
delegada, medida provisória, decreto legislativo e resolução. O processo de incorporação
dos tratados internacionais. Devido processo legislativo.....................................................168
15.PODER EXECUTIVO..............................................................................................................172
2B. Poder Executivo. Histórico. Presidencialismo e Parlamentarismo. Presidencialismo de
coalizão. Presidente da República: estatuto. Competências. Poder normativo autônomo,
delegado e regulamentar. Ministros de Estado....................................................................172
16.PODER JUDICIÁRIO..............................................................................................................176
3B. Poder Judiciário: organização e competência. Normas constitucionais respeitantes à
magistratura. O ativismo judicial e seus limites no Estado Democrático de Direito.............176
5B. Supremo Tribunal Federal: organização e competência. Jurisdição constitucional........185
23B. Súmula vinculante. Legitimidade e críticas. Mecanismos de distinção........................188
25C. Conselho Nacional de Justiça. História, composição, competência e funcionamento. 189
17.FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA.........................................................................................192
1C. Ministério Público: História e princípios constitucionais. Organização. As funções
constitucionais do Ministério Público..................................................................................192
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21A. Conselho Nacional do Ministério Público. História, composição, competência e
funcionamento.....................................................................................................................195
24C. As funções essenciais à Justiça: Advocacia privada e pública. Representação judicial e
consultoria jurídica da União, dos Estados e do Distrito Federal. A Defensoria Pública.......198
18.DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS................................................200
8C. Defesa do Estado e das instituições democráticas. Estado de defesa. Estado de sítio.
Papel constitucional das Forças Armadas.............................................................................200
9C. Segurança Pública na Constituição. O papel das instituições policiais...........................202
19. FINANÇAS PÚBLICAS...........................................................................................................206
20A. Finanças Públicas na Constituição. Normas Orçamentárias na Constituição...............206
18A. Orçamento público: controle social, político e jurisdicional.........................................209
20. ORDEM ECONÔMICA..........................................................................................................212
21C. Ordem constitucional econômica. Princípios constitucionais da ordem econômica.
Intervenção estatal direta e indireta na economia. Regime constitucional dos serviços
públicos. Monopólios federais e seu regime constitucional.................................................213
13B. Regime constitucional da propriedade. Função socioambiental da propriedade.
Desapropriação e requisição................................................................................................216
8B. Política Agrária na Constituição. Desapropriação para Reforma Agrária........................218
21.ORDEM SOCIAL...................................................................................................................221
14B. Previdência social e assistência social..........................................................................221
19C. Direito à Saúde. Sistema Único de Saúde na Constituição. Controle Social. O Direito de
Acesso às Prestações Sanitárias...........................................................................................223
16A. Direito fundamental à educação. A educação na Constituição Federal.......................227
9A. Comunicação social. A imprensa na Constituição. Liberdades públicas, acesso à
informação e pluralismo......................................................................................................231
17A. Proteção constitucional à família, à criança, ao adolescente e ao idoso......................235
18B. Direitos das pessoas portadoras de deficiência. A Convenção da ONU sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo....................................................238
22.ÍNDIOS, QUILOMBOLAS E MINORIAS..................................................................................243
20B. Índios na Constituição. Competência. Ocupação Tradicional. Procedimento para
Reconhecimento e Demarcação dos Territórios Indígenas. Usufruto..................................243
19B. Direitos das comunidades remanescentes dos quilombos e de comunidades
tradicionais...........................................................................................................................248
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1. TEORIA GERAL DO ESTADO
1.1 Federalismo. Concepções e caracterı ́sticas. Classificações. Sistemas de repartição de
competência. Direito Comparado. (6.b)
1.2 Divisão de poderes. Conceito e objetivos. História. Independência e harmonia entre
poderes. Mecanismos de freios e contrapesos. (3.a)
1.3 Democracia. Conceito. História. Fundamentos. Democracia representativa e participativa.
Teorias deliberativa e agregativa da democracia. Instrumentos de democracia direta na
Constituição de 1988. (14.a)
I. Noções Gerais
Segundo José Afonso da Silva, para que haja autonomia federativa, são necessários os
seguintes elementos: 1. órgãos próprios de cada entidade (união, estados e municípios); e 2.
posse de competências exclusivas de cada entidade.
União. A União, pessoa jurídica de direito público, possui uma visão interna, relativa aos
demais estados federados, e uma visão externa, em face dos demais Estados estrangeiros.
Internamente, age a União em pé de igualdade com os outros entes da Federação, sendo
detentora de deveres e obrigações. No âmbito externo, ela representa todo o Estado Federado
na figura da República Federativa do Brasil, como se fosse ele unitário, já que o direito
internacional não reconhece a personalidade jurídica dos estados-membros e municípios,
naquele âmbito. Neste sentido, vide art. 29 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.
Estados federados. São coletividades regionais autônomas, sem soberania, porém autonomia.
Entre os Estados e a União não há hierarquia, convivendo todos num mesmo nível jurídico. A
autonomia define-se como condição “de gerir os negócios próprios dentro dos limites fixados
por poder superior”, caracterizando-se pela capacidade de autogoverno, auto-organização,
autolegislação, autoadministração e autonomias tributária, financeira e orçamentária.
5
participam da vontade federal, visto que não têm representantes no Senado; b) não mantêm
um Poder Judiciário, como ocorre com os estados –membros e União; c) a intervenção nos
municípios situados em estado-membro está a cargo deste; d) a competência originária do STF
para resolver conflitos entre entes federativos não abrange os casos em que os municípios
estão em um dos polos da lide. Grande parte da doutrina, acompanhada da jurisprudência, no
entanto, sustenta os municípios são entes feederativos (federalismo de 3º grau). Possuem os
municípios, autonomia política, administrativa e financeira, sendo detentores das capacidades
acima delineadas para os Estados, guardadas as peculiaridades.
Distrito Federal. Antes considerado uma autarquia territorial, foi erigido pela CF/88 à condição
de pessoa política, integrante da federação. Sua autonomia está consagrada no art. 32 da CF,
que lhe confere as capacidades de auto-organização, autogoverno, autolegislação e
autoadministração, embora sofram limitações em questões essenciais, como as dos incisos XIII
e XIV do art. 21 (ex. compete a União organizar e manter o TJ/DFT, MP/DFT e DP/DFT). A
competência legislativa do DF compreende as que são atribuídas aos Estados e Municípios, o
Poder Legislativo é exercido pela Câmara Legislativa (no regime anterior o era pelo Senado
Federal), o Poder Executivo pelo Governador e o Poder Judiciário na verdade não é dele, mas
da União.
Territórios. São pessoas jurídicas de direito público interno com capacidade administrativa e de
nível constitucional, ligadas à União e tendo nela a fonte de seu regime jurídico
infraconstitucional. Não são pessoas políticas (não legislam), possuindo mera capacidade
administrativa (natureza jurídica de meras autarquias ou descentralizações administrativo-
territoriais). Não integram a federação. Compete ao Congresso Nacional disciplinar sua
atividade e organização administrativa e judicial, e é o governador escolhido pelo Presidente da
República. Conforme Novelino, “a criação de territórios, disciplinada pela LC n. 20/74 e
recepcionada parcialmente pela CF/88, poderá ocorrer em duas hipóteses. A primeira pelo
desmembramento de parte de Estado-membro já existente, no interesse da segurança
nacional. A segunda quando a União nela executar plano de desenvolvimento econômico ou
social, com recursos superiores, pelo menos, a um terço do orçamento de capital do Estado
atingido pela medida. A criação de território federal a partir do desmembramento de um
Estado necessita de aprovação da população interessada, mediante a realização de plebiscito
(CF, art. 18, §3⁰). A CF/88 transformou os territórios existentes em Estados, à exceção de
Fernando de Noronha, que foi reincorporado a Pernambuco (ADCT, artigos 14 e 15)”.
O Estado Federal expressa um modo de ser do Estado (daí se dizer que é uma forma de
Estado) em que se divisa uma organização descentralizada, tanto administrativa quanto
politicamente, erigida sobre uma repartição de competências entre o governo central e os
locais, consagrada na Constituição Federal, em que os Estados federados participam das
deliberações da União, sem dispor do direito de secessão. No Estado Federal, de regra, há uma
Suprema Corte, com jurisdição nacional (lembrete: STF e STJ são órgãos de superposição) e é
previsto um mecanismo de intervenção federal, como procedimento assecuratório da unidade
física e da identidade jurídica da Federação.
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podem legislar sobre assuntos de interesse local (ex.: competência dos municípios para legislar,
fundamentadamente, sobre direito ambiental, conforme decidido pelo STF no ARE 748206
AgR/SC, DJ 14.03.17 – Info 857). A autonomia política dos Estados membros abrange também a
capacidade de dotar-se de uma Constituição própria (lembrete: Poder Constituinte Derivado
Decorrente), sujeita embora a certas diretrizes impostas pela Constituição Federal.
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Na repartição vertical de competências, realiza-se a distribuição da mesma matéria
entre a União, os Estados- membros e, eventualmente, os municípios. Essa técnica, no que
tange às competências legislativas, deixa para a União os temas gerais, os princípios de certos
institutos, permitindo aos Estados-membros afeiçoar a legislação às suas peculiaridades, além
de autorizar os municípios a legislar sobre assuntos de interesse local. A técnica da legislação
concorrente estabelece um verdadeiro condomínio legislativo e é adotada no art. 24 da CRFB.
Prova oral – 26º CPR: Em termos de direito comparado, nosso sistema se aproximaria mais de
que sistema jurídico internacional? Direito norte-americano, alemão? Você já ouviu a
expressão “federalismo dual”? O dual se coloca muito mais, na atualidade, em contraposição
ao cooperativo. O dual significa uma distribuição rígida de competências... Em termos de
federalismo cooperativo, o artigo 24 da Constituição, ele encerra uma modalidade exatamente
de cooperação no âmbito legislativo. Você poderia me dizer como é que funciona esse
sistema? E os municípios, tem essa competência? Você conhece o entendimento do Supremo a
respeito da possibilidade ou não de os Estados legislarem, no âmbito dessa competência
legislativa concorrente normas mais protetivas, de meio ambiente, saúde, do que as normas
gerais editadas pela União?
Oswaldo Costa
I. Noções Gerais
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O tema da divisão dos poderes está relacionado com a Teoria Geral do Estado e com o
Direito Constitucional, já que cabe à Constituição estabelecer as normas estruturais de um
Estado.
Dispõe o artigo 2º da Constituição Federal que “São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Nesse contexto, a Constituição
detalha, com especial menção ao Título IV, a organização dos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, sem prejuízo de outras regras constitucionais que tratam do tema ao longo do corpo
normativo constitucional.
É oportuno lembrar que a divisão dos poderes possui íntima relação com o
constitucionalismo moderno e com os direitos fundamentais, pois o artigo 16 da Declaração
de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 já dizia que “A sociedade em que não esteja
assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem
Constituição”.
II. Conceito
Para ser real o respeito da Constituição e dos direitos individuais por parte do Estado,
“(...) é necessário dividir o exercício do poder político entre órgãos distintos, que se controlam
mutuamente. A cada um desses órgãos damos o nome de Poder: Poder Legislativo, Poder
Executivo e o Poder Judiciário. A separação dos Poderes estatais é elemento lógico essencial
do Estado de Direito”. (SUNDFELD, p. 42, 2003).
III. Objetivos
Analisando a Constituição Portuguesa, afirma José Joaquim Gomes Canotilho que “(....)
é legítimo afirmar-se que o modelo de separação constitucionalmente consagrado visa, em
princípio, identificar o órgão de decisão ajustado, estabelecer um procedimento de decisão
justo e exigir um fundamento materialmente legítimo para as tomadas de decisão” (p. 708,
1993).
IV. História
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No liberalismo, a separação de funções entre os órgãos independentes deveria ser
bastante rígida, mas mesmo Montesquieu já previa que o constante movimento dos órgãos
os compele a atuar em concerto, harmônicos, e as faculdades de estatuir (p.ex., aprovar um
projeto de lei) e de impedir (veto presidencial) são prenúncios dos mecanismos de freios e
contrapesos desenvolvidos posteriormente. A rígida separação de poderes do liberalismo foi
inicialmente inserida nas constituições das ex-colônias inglesas na América, que seguiam a
Declaração de Direitos de Virginia, de 1776. Após, constituição dos EUA, art. 16 da Declaração
Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão e constituições francesas seguintes,
espalhando-se pelo “ocidente”.
Benjamin Constant teorizou um quarto poder neutro, que faça com os demais o que o
poder judiciário faz com os indivíduos, que seria exercido pelo rei. A 1ª constituição do Brasil
criou o “poder moderador” do Imperador; porém, distorceu a teoria ao atribuí-lo também ao
executivo (para Constant, o poder neutro não poderia jamais coincidir com um dos demais).
Hoje, existe uma tendência de se considerar que a teoria da separação dos poderes
construiu um mito. Este mito consistiria em um modelo teórico redutível à teoria dos três
poderes rigorosamente separados: o executivo (o rei e os seus ministros), o legislativo (l.a
câmara e 2.a câmara, câmara baixa e câmara alta) e o judicial (corpo de magistrados). Cada
poder recobriria uma função própria sem qualquer interferência dos outros. Foi demonstrado
por ElSENMANN que esta teoria nunca existiu em Montesquieu, como já mencionado acima. A
interdependência é, porém, uma interdependência dinâmica necessariamente atenta aos
aspectos político-funcionais do sistema.
a) a investidura e a permanência das pessoas num dos órgãos não dependem da confiança
nem da vontade dos outros;
b) no exercício das atribuições que lhe sejam próprias, não precisam os titulares consultar os
outros nem necessitam de sua autorização;
c) na organização dos respectivos serviços, cada um é livre, observadas apenas as disposições
constitucionais e legais.
Por outro lado, a harmonia entre os poderes primeiramente se verifica pelas normas
de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente
todos têm direito. Ainda, nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua
independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um
sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da
coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do
outro e especialmente dos governados (SILVA, p. 110, 2005).
(a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma
função; assim, às assembléias (congresso, câmaras, parlamento) se atribui a função legislativa;
ao executivo, a função executiva; ao judiciário, a função jurisdicional;
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(b) independência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário
que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios
de subordinação.
II. Fundamentos.
A questão tocante aos fundamentos da democracia é absolutamente complexa e não
admite resposta única. Depende, em verdade, da teoria que se adote, razão pela qual apenas
se esboça uma proposta sobre o tema.
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democrático a Assevera que a regra da maioria direito somente tem
vontade do Estado. permite que cada cidadão possua legitimidade quando surge
Assevera que, direito de voto proporcional à sua da formação comunicativa
efetivamente, na posição no jogo democrático, o que da opinião e do
democracia o que implica, em certos casos, a assentimento dos cidadãos
vigora para a tomada desigualdade de votos quando que, em uma relação de
de decisões é o aplicada a regra da maioria para igualdade, possuem os
princípio majoritário. decisões coletivas mesmos direitos
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2. FILOSOFIA POLÍTICA
2.1 Liberalismo igualitário, comunitarismo, procedimentalismo e republicanismo. Suas
projeções no domı ́nio constitucional. (11.a)
2.2 Pluralismo jurı ́dico. As fontes normativas não estatais. (25.a)
Rawls (em “Uma Teoria da Justiça”) propõe dois princípios: i) o das liberdades públicas;
e ii) o da igualdade substancial. O primeiro teria prioridade sobre o segundo, mas nele não
estão inseridas as liberdades econômicas, o que possibilita a adoção de medidas
redistributivas. Para o autor, o primeiro princípio de justiça deveria ser inserido na
Constituição, ao passo que o segundo deveria ser realizado no plano legislativo.
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Outra projeção é a que discute a extensão e intensidade da exigência de separação
entre Estado e religião, à luz da laicidade (Sarmento). A visão liberal igualitária enfatiza a
exigência de absoluta neutralidade estatal no campo religioso, em nome da garantia do igual
respeito às pessoas de todas as crenças, ateus e agnósticos, enquanto visões mais
comunitaristas, ao valorizarem as tradições na interpretação constitucional, podem ser mais
lenientes em relação às medidas dos poderes públicos que favoreçam religiões hegemônicas
ou majoritárias, notadamente o catolicismo.
III Comunitarismo:
Vale ressaltar que o comunitarismo não rejeita o pluralismo: há, aqui, somente uma
mudança de perspectiva, pois enquanto o liberalismo valoriza o pluralismo a partir das
várias visões individuais, o comunitarismo o faz a partir das várias concepções culturais de
cada comunidade.
→ Para Sarmento, por mais que a CRFB/88 possua aberturas para o comunitarismo
(i.e., proteção da cultura e consagração dos direitos transindividuais), a ênfase dada à
proteção das liberdades públicas não autoriza que se diga ter ela aderido à filosofia
comunitarista.
IV) Procedimentalismo:
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sustentam a legitimidade dessas decisões substantivas enfeixadas nas Constituições, em
especial quanto aos direitos fundamentais.
V) Republicanismo:
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de cada pessoa de eleger os seus próprios planos de vida e de viver de acordo com eles, desde
que não ofenda direitos alheios.
Com o Iluminismo e Kant destaca-se a filosofia da razão, que busca subsumir o real a
certas categorias e, portanto, persegue a unidade, as grandes sínteses homogeneizadoras.
Esse racionalismo idealista fundamenta a noção de Estado-nação nos termos definidos pela
Revolução Francesa: uma identidade cultural e integradora, em determinado espaço e em
comunidade linguística (“O que é o Terceiro Estado?”; Sieyès). Neste contexto, o direito era
uma ferramenta para que a identidade do povo parecesse natural e originária.
Assim, o sujeito de direito abstrato e universal era uma falácia na busca pela
totalização. O plano jurídico era pautado, na realidade, pelo sujeito de direito branco,
masculino, adulto, proprietário, etc. Os vários movimentos reivindicatórios, como o
feminismo, começaram a expor e a alterar essa face hegemônica do Direito, que acabou sendo
superada pela ideia de que toda elaboração e aplicação jurídica devem levar em conta que o
Estado é pluriétnico e multicultural.
16
A Constituição Federal de 1988 representa grande clivagem em relação ao paradigma
anterior, pois protege expressamente os diversos modos de criar, fazer e viver dos diferentes
grupos formadores da sociedade brasileira (art. 216, caput e inc. II, CF). Essa proteção abrange,
inclusive, a posse/propriedade da terra tradicionalmente ocupada (art. 231, índios, art. 68
ADCT, quilombolas, CF).
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Esta observação pode parecer um pouco fora de contexto, mas como se trata de autor de predileção da examinadora, citada por
ela em diversas palestras, achei interessante incluir esse trecho.
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atuação do Estado deve ser antecedida por uma “tradução”, feita pela mediação
antropológica, que torne o outro “inteligível”.
c) Quanto à solução de controvérsias: devem ser utilizadas as formas de resolução de
conflitos tradicionais dos grupos minoritários, assim como seu ordenamento jurídico, sempre
que possível
Exemplos:
a) em ações possessórias contra índios deve ser levada em conta a diferença na definição de
“posse” entre as partes contrapostas; há comunidades que creem que a mera permanência no
território seria “posse”, motivo pelo qual mesmo desalojados procuram permanecer na área,
inclusive trabalhando nas roças do homem branco.
b) os yanomami acreditam que a “vida” se inicia apenas depois que a mãe, sozinha na floresta,
pega em seus braços a criança recém-nascida. Desta forma, não seria infanticídio se essa mãe
a abandonasse na floresta e não retornasse com ela à aldeia.
c) já houve Tribunal do Júri que não aplicou pena a indígena que matara outro indígena, pelo
fato de que ele já fora julgado e condenado segundo os costumes da comunidade.
d) os índios Kaingang punem certas condutas com a pena de transferência (espécie de
banimento), que incide não apenas no indivíduo, mas também na sua família. Tal medida deve
ser respeitada, na medida em que for compatível com o sistema jurídico nacional e com os
direitos humanos (Questão 93 de Direito Penal do 26º CPR, elaborada por Ela Wiecko).
3. CONSTITUCIONALISMO
3.1 Constitucionalismo: trajetória histórica. (1.a)
3.2 Constitucionalismo liberal e social. Constitucionalismo Britânico, francês e norte-
americano. (1.a)
3.3 A evolução do constitucionalismo brasileiro: constituições de 1824, 1891, 1937, 1946,
1967, 1969. A ditadura militar e os atos institucionais. A assembléia constituinte de 1987/1988.
(14.c)
3.4 Neoconstitucionalismo. Constitucionalização do Direito e judicialização da polı ́tica. (24.a)
Renan Lima
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TRAJETÓRIA HISTÓRICA: Embora o surgimento das Constituições seja considerado um
fenômeno relativamente recente, pois as primeiras manifestações formais têm origem no final
do século XVIII com as “Revoluções Liberais”, não se pode afirmar que a ideia de um conjunto
de normas que discipline a atuação do Estado seja exclusiva da modernidade. De fato, tal
como afirmou Ferdinand Lassale, todo ente estatal possuiu ao longo de sua trajetória uma
Constituição real e verdadeira, sendo que o privilégio atribuído aos períodos mais recentes é o
do nascimento de Constituições escritas em folhas de papel.
A propósito, deve-se destacar que na antiguidade já existiam leis que organizavam, ainda que
de maneira incipiente, o próprio poder. Tais leis foram evoluindo e formaram a base para o
desenvolvimento do constitucionalismo.
Segundo BARROSO, o termo constitucionalismo data de pouco mais de 200 anos, sendo
associado aos processos revolucionários norte-americano e francês, em oposição ao
Absolutismo. Todavia, as ideias centrais do constitucionalismo remontam à antiguidade
clássica, no ambiente da polis grega, por volta do século V a.C.
Para SARMENTO: “A ideia de Constituição, tal como a conhecemos hoje, é produto da
Modernidade, sendo tributária do Iluminismo e das revoluções burguesas dos séculos XVII e
XVIII, ocorridas na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França. Ela está profundamente
associada ao constitucionalismo moderno, que preconiza a limitação jurídica do poder
político, em favor dos direitos dos governados”.
SARMENTO divide, didaticamente, a evolução história do constitucionalismo da seguinte
forma: 1) Constitucionalismo antigo e medieval; 2) Constitucionalismo Moderno; 3)
Constitucionalismo pós-moderno. Por sua vez, o Constitucionalismo Moderno foi construído
sob três versões (inglesa; francesa; norte-americana). Ademais, no Constitucionalismo
Moderno, além do estudo das 3 versões, destacam-se 2 fases (fase do Estado liberal-burguês
e fase do Estado Social). Na contextualização temporal, é preciso ter em mente que as três
versões acima mencionadas (inglesa; francesa e norte-americana) instauraram-se no seio do
Estado Liberal-burguês e desenvolveram-se com a transição para a fase do Estado Social, de
modo que é possível distinguir duas fases: constitucionalismo moderno do Estado Liberal-
burguês e constitucionalismo moderno do Estado Social. Por fim, um novo modelo de
constitucionalismo tem despontado: o constitucionalismo pós-moderno. Vejamos cada um
deles:
1) CONSTITUCIONALISMO ANTIGO OU MEDIEVAL: remonta ao período da antiguidade clássica
até final do século XVIII, quando surgem as primeiras constituições escritas, com
predominância do jusnaturalismo. As experiências mais importantes na antiguidade são: a)
Hebreus: era Teocrático, influenciado pela religião, os dogmas religiosos atuavam como limites
ao poder do soberano. b) Grécia: vivenciou a democracia direta, com o início da racionalização
do poder. Havia um regime político que se preocupava com a limitação do poder das
autoridades e com a contenção do arbítrio. Contudo, esta limitação visava antes a busca do
bem comum do que a garantia de liberdades individuais. A liberdade, no pensamento grego,
cingia-se ao direito de tomar parte nas deliberações públicas da cidade-Estado, não
envolvendo qualquer pretensão a não interferência estatal na esfera pessoal. Não se cogitava
na proteção de direitos individuais contra os governantes, pois se partia da premissa de que as
pessoas deveriam servir à comunidade política, não lhe podendo antepor direitos de qualquer
natureza. Tal concepção se fundava numa visão organicista da comunidade política: o cidadão
não era considerado em sua dignidade individual, mas apenas como parte integrante do corpo
social. O cidadão virtuoso era o que melhor se adequava aos padrões sociais, não o que se
distinguia como indivíduo. A liberdade individual não era objeto da especial valoração inerente
ao constitucionalismo moderno. c) Roma: Para Ihering, “Nenhum outro Estado foi capaz de
conceber a ideia de liberdade de uma forma tão digna e justa quanto o direito romano”. Em
Roma já despontava a valorização da esfera individual e da propriedade, concomitante à
sofisticação do direito privado romano e ao reconhecimento de direitos civis ao cidadão de
Roma (direito ao casamento, à celebração de negócios jurídicos, à elaboração de testamento e
à postulação em juízo). Ademais, algumas instituições do período republicano romano já
19
prenunciavam a concepção moderna de separação dos poderes, notadamente a sua repartição
por instituições como o Consulado, o Senado e a Assembleia, representativas de estamentos
diferentes da sociedade, de forma a propiciar o equilíbrio entre eles. Apesar disso, não se
cogitava de um constitucionalismo em sentido moderno (como fórmula de limitação do poder
político em favor da liberdade dos governados); d) Idade Média, iniciada com a queda do
Império Romano, correspondeu a um período caracterizado pelo amplo pluralismo político.
Não havia qualquer instituição que detivesse o monopólio do uso legítimo da força, da
produção de normas ou da prestação jurisdicional. O poder político fragmentara-se por
múltiplas instituições, como a Igreja, os reis, os senhores feudais, as cidades, as corporações de
ofício e o Imperador.
É importante destacar que, durante a idade média, foram celebrados alguns pactos
instituidores de direitos e limitadores do poder, que influenciaram decisivamente o posterior
surgimento do constitucionalismo moderno. Os exemplos mais citados são: Magna Charta
Libertatum (1215) e o Petition of Rights (1628). Além destes, também são citados: o Habeas
Corpus Act (1679), o Bill of Rights (1689) e o Act of Settlement (1701).
20
constitucionalismo inglês é a de respeito às tradições constitucionais, não havendo um texto
constitucional único que os consolide e organize. Inexiste, portanto, uma Constituição escrita
na Grã-Bretanha. Ademais, entende-se que as normas constitucionais não decorrem apenas
dos referidos textos esparsos, mas também de convenções constitucionais e de princípios da
common law, desenvolvidos pelos tribunais.
A ideia do exercício do poder constituinte, por meio de ruptura com o passado, com a
refundação do Estado e da ordem jurídica, é estranha ao modelo constitucional inglês, que se
assenta no respeito às tradições imemoriais. Nesse sentido, o constitucionalismo britânico é
historicista, já que baseia a Constituição e os direitos fundamentais nas tradições do povo
inglês. Em outras palavras, a evolução do constitucionalismo inglês é gradual e histórica, não
abrupta ou revolucionária. Desenvolveu-se na Inglaterra o princípio constitucional de
soberania do Parlamento, segundo o qual o Poder Legislativo pode editar norma com
qualquer conteúdo. Não há a possibilidade de invalidação das suas decisões por outro
órgão. Contudo, há na Inglaterra contemporânea uma tendência à alteração deste modelo de
soberania irrestrita do Parlamento, pelo menos em matéria de direitos fundamentais. A mais
importante expressão desta inflexão foi a aprovação, em 1998, do Humans Rights Act, que
possibilitou ao Judiciário britânico a declaração de incompatibilidade de leis editadas pelo
Legislativo com os direitos previstos naquele estatuto. Tal declaração não acarreta a
invalidação da lei, mas cria um relevante fato político, gerando forte pressão para a revogação
da norma violadora de direitos humanos.
2.2. O modelo francês de constitucionalismo: Tem como marco inicial a Revolução Francesa,
iniciada em 1789, sendo a constituição escrita consagrada em 1791. Sob a perspectiva da
teoria constitucional, a vontade de ruptura com o passado se expressou na teoria do poder
constituinte, elaborada originariamente pelo Abade Emanuel Joseph Sieyès, em sua célebre
obra Qu’est-ce que le Tier État?. Por essa teoria, o poder constituinte exprimiria a soberania
da Nação, estando completamente desvencilhado de quaisquer limites impostos pelas
instituições e pelo ordenamento do passado. Ele fundaria nova ordem jurídica, criando novos
órgãos e poderes — os poderes constituídos — que a ele estariam vinculados. OBS.: destaca-
se que o fundamento utilizado foi a “soberania da Nação”, que difere da “soberania do povo”.
Para Sieyés, a detentora do poder era a nação, e não o conjunto dos nacionais. Sendo a Nação
a detentora do poder e sendo essa uma concepção etérea/ideal, a resposta para a aparente
incoerência entre a “igualdade” defendida e a exclusão dos iguais pelo voto censitário e
masculino era justificada pelo argumento de que só podem exercer direitos políticos, na
perspectiva liberal, aqueles que compõem o melhor da Nação (homens mais instruídos, de
melhor condição social, reuniriam as condições que lhes permitiriam expressar, por meio do
seu voto, a vontade da Nação).
A Constituição deveria corresponder a uma “lei” escrita, não se confundindo com um
repositório de tradições imemoriais, ao contrário da fórmula inglesa. Ela pode romper com o
passado e dirigir o futuro da Nação, inspirando-se em valores universais centrados no
indivíduo. O protagonista do processo constitucional no modelo constitucional francês é o
Poder Legislativo, que teoricamente encarna a soberania e é visto como um garantidor mais
confiável dos direitos do que o Poder Judiciário. Isto levou, na prática, a que a Constituição
acabasse desempenhando o papel de proclamação política, que deveria inspirar a atuação
legislativa, mas não de autêntica norma jurídica, que pudesse ser invocada pelos litigantes nos
tribunais. Tal pensamento vem sendo superado. Foi aprovada em 2008 (regulamentada em
2010), na França, a chamada “Questão Prioritária de Constitucionalidade”, permitindo que as
partes aleguem incidentalmente a inconstitucionalidade de lei, por ofensa a direitos e
liberdades fundamentais garantidos pela Constituição francesa, no âmbito de processos
judiciais e administrativos. A questão deve ser encaminhada à Corte de Cassação ou ao
Conselho de Estado que, por sua vez, podem provocar o Conselho Constitucional.
21
2.3. O modelo constitucional norte-americano: O fato de a colonização dos Estados Unidos ter
sido realizada em boa parte por imigrantes que escapavam da perseguição religiosa na Europa
contribuiu decisivamente para que se enraizassem na cultura política norte-americana ideias
como a necessidade de limitação do poder dos governantes e de proteção das minorias diante
do arbítrio das maiorias. A Constituição dos Estados Unidos foi aprovada pela Convenção da
Filadélfia, em 1787, e depois ratificada pelo povo dos estados norte-americanos, vigorando
desde então. Inovou ao instituir o presidencialismo e o sistema de freios e contrapesos,
associado à separação de poderes. A plasticidade das cláusulas constitucionais mais
importantes abriu a possibilidade de atualização daquela Constituição pela via interpretativa,
para adaptá-la às novas demandas e valores que emergiam. O modelo constitucional dos
Estados Unidos representa a tentativa de conciliação entre dois vetores. De um lado, o vetor
democrático, de autogoverno do povo, captado pelas palavras que abrem o preâmbulo da
Carta americana (We, the People of the United States...). Do outro, o vetor liberal, preocupado
com a contenção do poder das maiorias para defesa de direitos das minorias. Uma ideia
essencial do constitucionalismo estadunidense, derivada da sua matriz liberal, é a concepção
de que a Constituição é norma jurídica que, como tal, pode e deve ser invocada pelo Poder
Judiciário na resolução de conflitos, mesmo quando isto implique em restrição ao poder das
maiorias no Legislativo ou no Executivo. Desenvolveu-se no direito norte-americano a noção
de que os juízes, ao decidirem conflitos, podem reconhecer a invalidade de leis que contrariem
a Constituição, deixando de aplicá-las ao caso concreto. Esta posição, sustentada por Hamilton
no Federalista nº 78, foi formulada na jurisprudência da Suprema Corte pelo Juiz John
Marshall, no célebre julgamento do caso Marbury v. Madison, em 1803. Em suma, no modelo
constitucional dos Estados Unidos, a supremacia da Constituição não é apenas uma
proclamação política, como na tradição constitucional francesa, mas um princípio jurídico
judicialmente tutelado. O modelo não é livre de críticas. O controle judicial de
constitucionalidade das leis (judicial review) sofre até hoje contestações nos Estados Unidos,
sendo frequentemente apontado como um instituto antidemocrático, por transferir aos juízes,
que não são eleitos, o poder de derrubar decisões tomadas pelos representantes do povo, com
base nas suas interpretações pessoais sobre cláusulas constitucionais muitas vezes vagas, que
se sujeitam a diversas leituras. Contudo, a jurisdição constitucional não apenas criou profundas
raízes no Direito Constitucional daquele país, como também acabou se disseminando por todo
o mundo, sobretudo a partir da segunda metade do século XX.
22
impostos pelo Estado à ação dos indivíduos. Ademais, o foco centrava-se mais sobre as
liberdades econômicas do que sobre as liberdades existenciais.
2.2) Constitucionalismo Social: No final do século XIX e início do século XX, a extrema
exploração da classe trabalhadora tornou-se insustentável. Na Europa Ocidental, a
industrialização acentuara dramaticamente o quadro de exploração humana, que o Estado
absenteísta não tinha como equacionar. A pressão social dos trabalhadores e de outros grupos
excluídos, aliada ao temor da burguesia diante dos riscos e ameaças de rupturas
revolucionárias inspiradas no ideário da esquerda, levaram a uma progressiva mudança nos
papéis do Estado, que ensejou a cristalização de um novo modelo de constitucionalismo. Fica
evidente que a suavização do capitalismo foi uma clara posição estratégica para evitar uma
revolução da classe operária. Sobre o contexto, Lênin afirmou que preferia o capitalismo
selvagem ao estado do bem estar social, pois este tirava a energia necessária para a eclosão de
uma revolução. No plano das ideias, despontavam o pensamento marxismo, o socialismo
utópico e a doutrina social da Igreja Católica. A progressiva extensão do direito de voto a
parcelas da população até então excluídas do sufrágio também contribuiu para a mudança de
cenário. A democratização política, ao romper a hegemonia absoluta da burguesia no
Parlamento, abrira espaço também para a democratização social. De mero garantidor das
regras que deveriam disciplinar as disputas travadas no mercado, o Estado foi se convertendo
num ator significativamente mais importante dentro da arena econômica, exercendo
diretamente muitas atividades de produção de bens e serviços, como a realização de grandes
obras públicas. No plano teórico, a sua atuação passa a ser justificada também pela
necessidade de promoção da igualdade material, por meio de políticas públicas redistributivas
e do fornecimento de prestações materiais para as camadas mais pobres da sociedade, em
áreas como saúde, educação e previdência social. A proteção da propriedade privada é
flexibilizada, passando a estar condicionada ao cumprimento da sua função social. É
relativizada a garantia da autonomia negocial, diante da necessidade de intervenção estatal
em favor das partes mais débeis das relações sociais. Há uma mudança, ainda, na leitura dos
direitos, sendo desenvolvida a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Emergem os direitos de segunda geração, prestacionais, para efetivação da igualdade material.
Sobre o discurso da igualdade formal, Anatole Frances escreve: “A majestosa igualdade das
leis, que proíbe tanto o rico como o pobre de dormir sob as pontes, de mendigar nas ruas e de
roubar pão.” A mudança no perfil do Estado refletiu-se também na sua engenharia
institucional: a separação de poderes foi flexibilizada. A separação dos poderes estática,
vigente no constitucionalismo liberal-burguês dá espaço à separação de poderes dinâmica,
que se atenta para além da liberdade, para a efetividade, possibilitando uma atuação mais
forte dos poderes públicos na seara social e econômica. O arranjo federalista também muda:
as complexas tarefas assumidas pelo Estado não são exequíveis por um federalismo formal. É
necessário o desenvolvimento de um federalismo cooperativo, com a participação de todos os
entes federados. É preciso, aqui, diferenciar o Estado Social do Constitucionalismo Social: A
necessidade de construção de um Estado mais forte, para atender às crescentes demandas
sociais, foi utilizada como pretexto para aniquilação dos direitos individuais e das franquias
democráticas. Este fenômeno foi intenso nas décadas de 1930 e 1940, com a instauração de
regimes totalitários (Alemanha e Itália), ou autoritários (Brasil, no Estado Novo). Nestas
situações, pode-se falar em Estado Social, mas não em constitucionalismo social. O
constitucionalismo social não renega os elementos positivos do liberalismo (preocupação com
os direitos individuais e com a limitação do poder), mas pugna por conciliá-los com a busca da
justiça social e do bem-estar coletivo.
Houve 2 fórmulas diferentes de recepção do Estado Social no âmbito do constitucionalismo
democrático: 1ª) Exemplificada pela evolução do Direito Constitucional norte-americano a
partir dos anos 30, os valores de justiça social e de igualdade material não foram formalmente
incorporados à Constituição. Essa, no entanto, deixou de ser interpretada como um bloqueio à
introdução de políticas estatais de intervenção na economia e de proteção dos grupos sociais
23
mais vulneráveis. 2ª) Ilustrada pelas constituições mexicana, de 1917, e a alemã, de Weimar,
de 1919. Elas não se limitam a tratar da estrutura do Estado e da definição de direitos
negativos, pois se imiscuem na disciplina de temas como a economia, as relações de trabalho e
a família; moradia, saúde e previdência social. A maior parte das constituições elaboradas a
partir da segunda metade do século passado seguiu, com maior ou menor sucesso, dita
fórmula.
É inegável que o constitucionalismo social enfrenta crise desde as décadas finais do século
passado, relacionada aos retrocessos que ocorreram no Welfare State (Estado de Bem-estar).
A globalização econômica reduziu a capacidade dos Estados de formular e implementar
políticas públicas para atender aos seus problemas sociais e econômicos, sob a influência do
pensamento neoliberal, que preconiza a redução do tamanho do Estado, a desregulação
econômica e a restrição dos gastos sociais. A população envelheceu e cresceu, demandando
maiores gastos com previdência social, saúde e educação. A partir da década de 80, começam
a se tornar hegemônicas propostas de retorno ao modelo de Estado que praticamente não
intervinha na esfera econômica. Sob o estímulo da globalização da economia, se inicia um
processo de reforma do Estado que alcança escala mundial. Reduzem-se as barreiras
alfandegárias e não alfandegárias ao comércio internacional e ao fluxo de capitais. Os Estados
diminuem ou eliminam a proteção que reservavam à empresa nacional. “Desterritorializa-se” o
processo produtivo. A nova dinâmica da produção global estimula os Estados a flexibilizarem
suas relações de trabalho, com o intuito de atrair investimento produtivo e de alcançar maior
competitividade no mercado global. Ameaçados pela inflação, que leva à necessidade de
redução dos gastos públicos, os Estados privatizam suas empresas e extinguem monopólios
públicos. A atuação direta do Estado na economia é significativamente reduzida.
No que toca aos direitos sociais, o fim do constitucionalismo social seria moralmente
inaceitável em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, caracterizados por grande
injustiça social e desigualdade material.
Sobre a transição do constitucionalismo liberal para o social, Carlos Ayres Britto sustenta, na
ADI 4246, que: “Naquela assentada, ainda deixei explícito ser a Defensoria Pública uma
instituição especificamente voltada para a implementação de políticas públicas de assistência
jurídica, assim no campo administrativo como no judicial. Pelo que, sob este último prisma, se
revela como instrumento de democratização do acesso às instâncias judiciárias, de modo a
efetivar o valor constitucional da universalização da justiça (inciso XXXV do art. 5º da CF/88).
Fazendo de tal acesso um direito que se desfruta às expensas do estado, de sorte a se
postarem (as defensorias) como um luminoso ponto de interseção do constitucionalismo
liberal com o social. Vale dizer, a Defensoria Pública faz com que um clássico direito individual
de acesso à Justiça se mescle com um moderno direito social; isto é, os mais pobres a
compensar a sua inferioridade econômica com a superioridade jurídica de um gratuito bater
às portas do Poder Judiciário ou da própria Administração Pública. O que já se traduz na
concreta possibilidade de gozo do fundamental direito de ser parte processual, ora no âmbito
dos processos administrativos, ora nos processos de natureza judicial. [...] Numa frase,
aparelhar as defensorias públicas é servir, sim, ao desígnio constitucional de universalizar e
aperfeiçoar a própria jurisdição como atividade básica do Estado e função específica do Poder
Judiciário.”
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em que ela foi implantada em 1890 e incorporada à Constituição de 1891 — o controle de
constitucionalidade não desempenhava um papel relevante na cena política ou no dia a dia
dos tribunais. Tal quadro começou a se alterar ao final da II Guerra Mundial na Europa,
mediante as gravíssimas violações de direitos humanos perpetradas pelo nazismo, que
demonstraram a importância de criação de mecanismos de garantia de direitos que fossem
subtraídos pelas maiorias de ocasião. Na Alemanha, a Lei Fundamental de 1949, instituiu
diversos mecanismos de controle de constitucionalidade e criou um Tribunal Constitucional
Federal, que se instalou em 1951 e passou a exercer um papel cada vez mais importante na
vida alemã. Na Itália, a Constituição de 1947 instituiu uma Corte Constitucional, que começou
a funcionar em 1956. Na própria França, berço de um modelo de constitucionalismo avesso à
jurisdição constitucional, o cenário se modificou substancialmente sob a égide da atual
Constituição de 1958, que instituiu um modelo de controle de constitucionalidade
originalmente apenas preventivo, confiado ao Conselho Constitucional, e hoje envolve
também o controle repressivo. Na década de 70, Portugal e Espanha se redemocratizaram,
libertando-se de governos autoritários, e adotaram constituições de caráter mais normativo,
garantidas por meio da jurisdição constitucional.
Nesse contexto, “Uma das características marcantes do constitucionalismo contemporâneo
reside na judicialização da política, verdadeira consequência do modelo constitucional adotado
em diversos países ocidentais, e que deflui diretamente do constitucionalismo democrático
construído, principalmente, a partir da segunda metade do século XX: Na ponta oposta, a
emergência do constitucionalismo democrático no segundo pós-guerra, reforçada pela
redemocratização, nos anos 70, do mundo ibérico europeu e americano, trazendo consigo a
universalização do judicial review e afirmação das leis fundamentais que impõem limites à
regra da maioria, é percebida como uma ampliação do conceito de soberania, abrindo para os
cidadãos novos lugares de representação de sua vontade, a exemplo do que ocorre quando
provocam o Judiciário para exercer o controle das leis. (VIANNA, Luiz Werneck. BURGOS,
Marcelo. Revolução processual do direito e democracia progressiva. – extraído do Manual
prático de Direitos Humanos Internacionais).
O que se observa atualmente é uma tendência global à adoção do modelo de
constitucionalismo em que as constituições são vistas como normas jurídicas autênticas, que
podem ser invocadas perante o Poder Judiciário e ocasionar a invalidação de leis ou outros
atos normativos. E, muitas destas novas constituições que contemplam a jurisdição
constitucional são inspiradas pelo ideário do Estado Social. A conjugação do constitucionalismo
social com o reconhecimento do caráter normativo e judicialmente sindicável dos preceitos
constitucionais gerou efeitos significativos do ponto de vista da importância da Constituição no
sistema jurídico — ela assumiu uma centralidade outrora inexistente —, bem como da partilha
de poder no âmbito do aparelho estatal, com grande fortalecimento do Poder Judiciário, e,
sobretudo, das cortes constitucionais e supremas cortes, muitas vezes em detrimento das
instâncias políticas majoritárias. Sobre o tema, ver item 24.a (Neoconstitucionalismo).
Para finalizar, além da história do constitucionalismo, é preciso pontuar para onde ele
caminha. O constitucionalismo moderno foi erigido a partir de um pressuposto fático, que hoje
já não se verifica plenamente o Estado nacional soberano, detentor do monopólio da
produção de normas, da jurisdição e do uso legítimo da força no âmbito do seu território, que
não reconhece qualquer poder superior ao seu. O Estado continua sendo o principal ator
político no mundo contemporâneo. Porém, com a globalização, atualmente, o Estado nacional
perdeu em parte a capacidade que tinha para controlar os fatores econômicos, políticos,
sociais e culturais que atuam no interior das suas fronteiras, pois esses são cada vez mais
influenciados por elementos externos, sobre os quais os poderes públicos não exercem quase
nenhuma influência. No mundo contemporâneo, os Estados nacionais, sozinhos, não
conseguem enfrentar alguns dos principais problemas com que se deparam em áreas como a
economia, o meio ambiente e a criminalidade. Em paralelo, surgem novas entidades
internacionais ou supranacionais, no plano global ou regional, que exercem um poder cada vez
maior e tensionam a soberania estatal e a supremacia constitucional. Ao lado disso, se
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desenvolve na sociedade global, desde o final da II Guerra Mundial, um “ cosmopolitismo
ético”, que cobra dos Estados mais respeito aos direitos humanos, não aceitando a invocação
da soberania ou de particularismos culturais como escusa para as mais graves violações à
dignidade humana.
Nesse cenário, surgem fontes normativas e instâncias de resolução de conflitos alheias ao
Estado, que não se subordinam ao Direito estatal, inclusive ao emanado da Constituição. O
constitucionalismo em rede ou multinível toma o lugar da tradicional pirâmide Kelseniana; a
emergência do Direito Comunitário, sobretudo no contexto europeu; o fortalecimento do
Direito Internacional dos Direitos Humanos; e a difusão global de uma lex mercatoria,
composta por práticas aceitas pelos agentes do comércio internacional, que se situam às
margens dos ordenamentos estatais; o conflito entre o universalismo dos direitos
fundamentais e o respeito às diferenças culturais, são exemplos de questões colocadas à
frente do constitucionalismo. Para que o constitucionalismo estatal não se torne autista,
Marcelo Neves sustenta o transconstitucionalismo para manutenção do diálogo constitucional
entre diferentes esferas, permitindo que as respectivas imperfeições e incompletudes sejam
percebidas e eventualmente corrigidas. Esses são alguns dos desafios a serem enfrentados
pelo constitucionalismo pós-moderno.
Questões Objetivas
MPF\26 – Para o neoconstitucionalismo, todas as disposições constitucionais são normas
jurídicas e a Constituição, além de estar em posição formalmente superior sobre o restante
da ordem jurídica, determina a compreensão e interpretação de todos os ramos do direito –
assertiva correta.
(27º CPR) Deborah Duprat - Queria que você, rapidamente, me falasse sobre as principais
características do constitucionalismo britânico, norte-americano e francês.
(28º CPR) Deborah Duprat - Você diria, então, que nossa Constituição - você me disse que as
razões religiosas não podem entrar no debate público, mesmo elas tendo essa filtragem que as
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transformam em razões públicas – essa é uma posição marcadamente liberal. A questão
religiosa é uma questão de foro íntimo, uma questão reservada ao espaço doméstico, ao
espaço privado, não tem lugar no espaço público. Você acha que a Constituição de 88 é uma
constituição marcadamente liberal?
(28º CPR) Deborah Duprat: Deixa eu te fazer uma pergunta, sempre problematizando. Para
uma determinada comunidade amazônica, na sua cosmologia, todos os seres da natureza são
humanos. Eles estão, temporariamente, encarnados em plantas, bichos, mas, a qualquer
momento, eles podem se transformar em humanos. Então, a noção de família passa por esses
seres também – as árvores, os peixes, enfim, tem uma família extensa que não abrange
somente as pessoas que estão agora encarnadas, mas naquelas que podem vir a ser
encarnadas... Você acha que uma pretensão desse tipo, de reconhecimento de uma família
que não é apenas antropocêntrica, você acha que isso pode ser trazido para o debate público,
ou essa é uma visão que se aproxima de uma visão religiosa?
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR; Direito Constitucional (teoria, história e métodos de trabalho) Daniel Sarmento.
As eleições eram indiretas: os votantes escolhiam os eleitores (eleição de primeiro grau), que,
por sua vez, elegiam os titulares dos cargos disputados (eleição de segundo grau). A forma de
Estado adotada foi a unitária e o território dividido em províncias.
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era editada uma “lei autorizadora” para na legislatura seguinte aprovar (ou não) a reforma
pretendida. Não havia qualquer limite material ao poder de reforma.
O Poder Judiciário também foi organizado pela Constituição em bases federativas, com uma
Justiça Federal e outra Estadual. O STF fora criado um ano antes, pelo Decreto nº 510, foi
constitucionalizado. Detinham direitos políticos os cidadãos brasileiros maiores de 21 anos,
excluindo-se os analfabetos, os mendigos, os praças militares e os integrantes de ordens
religiosas que impusessem renúncia à liberdade individual. Manteve-se a abolição do voto
censitário (Decreto nº 200-A). Não houve qualquer referência restritiva expressa às mulheres
no texto constitucional, mas a discriminação de gênero era tão enraizada que sequer se
discutia se elas podiam ou não votar ou se candidatar.
No plano dos direitos individuais revelou sua inspiração liberal, com vasto elenco de liberdades
públicas e diversas garantias penais e processuais. Foi constitucionalizado o habeas corpus, o
qual não se circunscrevia a tutela da liberdade de locomoção, o que abriu espaço para o
desenvolvimento no STF da doutrina brasileira do habeas corpus, ampliando essa garantia para
outras situações de arbitrariedade estatal, fora o direito de ir e vir.
Foi criada a justiça do trabalho, que foi inserida no âmbito do executivo. O federalismo passou
a adotar o modelo cooperativo, inspirado na Constituição de Weimer. A Justiça Eleitoral ganhou
assento constitucional. Uma novidade foi a previsão de direitos sociais, em especial os direitos
trabalhistas. Trouxe pela primeira vez o mandado de segurança e a ação popular. Inaugura a
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disciplina constitucional da economia, com possibilidade de intervenção do Estado na seara
econômica. O nacionalismo era um traço marcante no regime então estabelecido.
Constituição de 1937 (Estado Novo): A filosofia geral da Carta de 1937 baseava-se numa
rejeição às técnicas da democracia liberal: (i) o sufrágio direto foi desprezado; (ii) a separação
de poderes também foi relegada a segundo plano, pois se considerava que o desenvolvimento
e a modernização nacionais deveriam ser perseguidos por um governo forte, capitaneado por
um Presidente em contato direto com as massas, sem os entraves da política parlamentar e
partidária. Apesar disso, ela impunha limites significativos ao exercício do poder.
O que teve lugar durante o período foi, porém, a manifestação do poder sem a observância de
limites jurídicos. Até 1945, o país viveu sob estado de emergência, com o Congresso fechado,
numa genuína ditadura. Foi decretado estado de emergência por tempo indeterminado no
país, com a suspensão de inúmeras garantias constitucionais. Os atos praticados pelo governo
durante o estado de emergência eram imunes ao controle jurisdicional (art.170).
Enquanto não fosse eleito o novo Parlamento, caberia ao Presidente da República expedir
decretos-leis sobre todas as matérias da competência legislativa da União. O Presidente tinha
ainda o poder de confirmar ou não o mandato dos governadores dos Estados, nomeando
interventores nos casos de não confirmação. O MS perdeu seu status de garantia
constitucional, passando a ser disciplinado apenas pela legislação ordinária, e a Constituição
vedou ao Judiciário conhecer de questões exclusivamente políticas.
O poder judiciário tinha estrutura muito simplificada. A constituição não aludia à justiça
eleitoral e a justiça federal de 1º e 2º graus foram suprimidas. A justiça do trabalho continuava
no âmbito do executivo. Manteve o controle difuso de constitucionalidade, mas o presidente
poderia submeter a norma ao parlamento, que se a confirmasse por 2/3 dos membros de cada
uma das casas, ficaria sem efeito a declaração de inconstitucionalidade. A constituição podia
ser alterada por iniciativa do presidente ou do parlamento e não havia em nenhuma das
hipóteses qualquer limite material expresso ao poder de reforma. Como o Parlamento não
funcionou durante o Estado Novo, o Presidente da República arvorou-se à condição de
constituinte derivado, modificando unilateralmente a Carta de 1937, por meio da edição de
“leis constitucionais”. Portanto, na prática, a Carta de 1937 funcionou como uma Constituição
flexível.
Admitia a pena de morte em diversas situações que tangenciavam o crime político, previa a
censura prévia da imprensa. Consagrou as liberdades públicas tradicionais, mas não
contemplou a proteção do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada.
Também cuidou da família, educação e cultura. Quanto à ordem econômica, seguiu a linha
intervencionista e nacionalista da constituição de 1934.
29
Constituição de 1967: A sua elaboração refletiu o propósito do grupo moderado das Forças
Armadas — hegemônico durante o governo de Castelo Branco, que era um dos seus maiores
líderes — de reconstitucionalizar o país. Um dos traços característicos da Constituição de 1967
foi a concentração do poder, tanto no sentido vertical — centralização no pacto federativo —,
como no horizontal — hipertrofia do Executivo. Houve preocupação com a preservação de uma
fachada liberal, que se verifica, por exemplo, no extenso capítulo de direitos e garantias
individuais. Manteve-se o federalismo bidimensional. As eleições presidenciais eram indiretas,
por maioria absoluta, realizadas por colégio eleitoral formado pelo Congresso Nacional e por
delegados das Assembleias Legislativas, sem possibilidade de reeleição para o mandadto
consecutivo. O Poder Legislativo seguia o modelo bicameral, composto pela Câmara dos
Deputados e pelo Senado. Quanto ao Poder Judiciário, não houve mudanças significativas em
relação à Constituição de 1946, com as alterações impostas pelo AI-2. As garantias da
magistratura foram preservadas, mas foram conservadas as cláusulas que excluíam da
apreciação judicial os atos praticados pelo “Comando Supremo da Revolução”, dentre os quais
os expedidos por força dos atos institucionais. A sistemática de controle de
constitucionalidade, com as mudanças introduzidas pela Emenda nº 16/65, foi mantida.
Constituição de 1969: Fruto do trabalho da “linha dura” das Forças Armadas. A Constituição de
1969 foi outorgada pela Junta Militar que governava o Brasil, sob a forma de emenda
constitucional: era a Emenda Constitucional nº 1. Invocou-se, como fundamento jurídico da
outorga, o AI-5 e o AI-16. O primeiro estabelecia, no seu art. 2º, §1º, que, enquanto o
Congresso estivesse em recesso, o Presidente poderia legislar sobre todas as matérias; e o
segundo dispunha, no seu art. 3º, que, até a posse do novo Presidente da República, a Chefia
do Executivo seria exercida pelos Ministros militares. Para justificar a medida, afirmou-se, nos
consideranda da Carta outorgada, que, tendo em vista os referidos atos institucionais, “a
elaboração de emendas à Constituição, compreendida no processo legislativo (art. 49, I), está
na atribuição do Poder Executivo Federal”. O sistema e as principais instituições da Carta de
1969 coincidem, no geral, com as da Constituição de 1967, com algumas alterações, tais como:
a) o Vice-Presidente deixou de cumular sua função com a de Presidente do Congresso, como
ocorria na Constituição de 1967; b) o Congresso seria presidido pelo Presidente do Senado
Federal; c) restrição à imunidade parlamentar material; d) introdução de hipótese de perda de
mandato por infidelidade partidária; e) retrocessos no campo dos direito fundamentais; f)
retirada da iniciativa das Assembleias Legislativas. Manteve-se expressamente o AI-5, bem
como seus atos complementares (art. 182). Daniel Sarmento entende que não se tratou de
simples emenda, mas de Constituição — se é que merece esse nome uma norma editada de
forma tão ilegítima. Isto não apenas pela extensão das mudanças promovidas, como também
pelo seu fundamento de validade. É que as emendas, como emanação de um poder
constituinte derivado, têm o seu fundamento na própria Constituição que modificam. Porém, a
assim chamada Emenda nº 1 não foi outorgada com fundamento na Constituição de 1967, mas
sim com base no suposto poder constituinte originário da “Revolução vitoriosa”, que se
corporificava, mas não se exauria, nos atos institucionais editados pelos militares.
A ditadura militar e os atos institucionais. A formalização do golpe deu-se por meio do Ato
Institucional nº 1 (AI- 1), editado em 9 de abril de 1964, e assinado pelos comandantes das
Forças Armadas. Com base nos poderes excepcionais concedidos pelo AI-1, o governo passa a
perseguir os adversários do regime, realizando tortura e prisões arbitrárias. No Congresso,
cinquenta parlamentares tiveram o seu mandato cassado. Com a edição do AI-5, desfez-se a
expectativa de que a Constituição pudesse institucionalizar o regime. Tornara-se claro que o
governo militar só seguiria a Constituição se e quando isso lhe conviesse. Com base no AI-5,
abriu-se um amplo ciclo de cassações de mandatos e expurgos no funcionalismo, que atingiu
em cheio as universidades. Três Ministros do STF foram cassados.
30
A censura aos meios de comunicação se institucionalizou, atingindo também a atividade
artística. Nada mais podia ser publicado ou veiculado que pudesse desagradar ao governo, ou
que ameaçasse a moral tradicional e conservadora (de que os militares se faziam porta-vozes).
Embora não houvesse no AI-5 nenhuma autorização legal para tortura, desaparecimento
forçado de pessoas ou assassinatos, tais práticas tornaram-se os métodos corriqueiros de
trabalho das forças de repressão. Foram editados outros doze atos institucionais até a outorga
da Constituição de 1969 — do AI-6 ao AI-17 —, impondo medidas diversas, como a mudança
do número de Ministros do STF de 11 para 16 (AI-6) e a suspensão de eleições (AI- 7).
Em agosto de 1969, o Presidente Costa e Silva sofre um derrame que o deixa paralisado. Era
necessário substituí-lo, mas os ministros militares não cogitavam em seguir as regras do jogo,
que indicavam a sua sucessão pelo Vice-Presidente Pedro Aleixo - que, além de civil, deixara de
ser confiável, ao votar contra a decretação do AI-5. A solução veio por meio da decretação do
AI-12, que investiu os Ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica na Chefia do
Executivo, “enquanto durar o impedimento temporário do Presidente da República” (art. 1º).
Desfechava-se um verdadeiro golpe dentro do golpe. Dias depois, a Junta Militar decretou
outros dois truculentos atos institucionais: o AI-13, possibilitando o banimento de brasileiro
que se tornasse “inconveniente, nocivo ou perigoso à Segurança Nacional”, e o AI-14,
estendendo a possibilidade de aplicação da pena de morte à guerra “psicológica adversa”,
“revolucionária ou subversiva”.
O Congresso, que estava de recesso desde a decretação do AI-5, foi convocado às pressas para
referendar o nome do General Emílio Garrastazu Médici — mais um da “linha dura” — que os
militares já haviam escolhido.
31
facilitar o contato com as respectivas populações. Finalmente, em 22 de setembro de 1988,
ocorreu a derradeira votação da Assembleia Nacional Constituinte, que apreciou o texto final
da Constituição de 1988, depois das mudanças ocorridas no âmbito da Comissão de Redação. A
nova Constituição foi aprovada por 474 votos contra 15, contando-se 6 abstenções. Em 5 de
outubro de 1988, em clima de comoção, a Constituição de 1988 foi finalmente promulgada.
32
formação do Estado Constitucional/Democrático de Direito, cuja consolidação se deu ao
longo das décadas finais do século XX. O Estado Moderno Liberal - institucionalizado com a
Revolução Francesa -, em que se buscou limitar o poder estatal e privilegiar as liberdades
negativas, revelou-se insuficiente diante da proteção da igualdade meramente formal. As
desigualdades sociais do Estado Mínimo ensejaram a decadência do liberalismo clássico e
adesão ao Estado do Bem Estar Social (welfare state), em que o Estado passa de mero
respeitador de direitos individuais (posição omissiva), para assumir o papel de condutor do
desenvolvimento e efetivador de direitos (posição ativa), daí se falar em direitos de cunho
prestacional, a fim de corrigir as diferenças entre os indivíduos (igualdade material - caráter
distributivista). No entanto, o Estado Social e sua intensa interferência no locus privado serviu
de palco também para o fortalecimento de Estados totalitários, como a Alemanha nazista e a
Itália fascista. A legalidade herdada do Estado Liberal continuou sendo pregada, mas seu
conteúdo restou afastado de considerações morais, de forma que as atrocidades do início do
século XX estavam amparadas pelo ordenamento jurídico vigente nos Estados Sociais. Assim,
no pós guerra cresceu a defesa da criação ou fortalecimento da jurisdição constitucional, de
forma que os direitos fundamentais fossem protegidos até mesmo ante o legislador. No Brasil,
o neoconstitucionalismo começa a ser desenhado a partir da CF88, fruto do processo de
redemocratização, em substituição ao regime político ditatorial.
Como marco filosófico, tem-se o pós-positivismo, ante a superação do legalismo
estrito do positivismo jurídico, com a reaproximação do Direito aos postulados da Ética e da
Moral, marcantes no jusnaturalismo, mas sem o abandono do direito positivo. O Iluminismo
ocasionou a mudança do paradigma do direito natural para o positivismo jurídico (do
teleológico para o racional), de modo que houve a supervalorização da razão humana. Auguste
Comte defendia que o único conhecimento válido era aquele que carregasse o status
científico. Assim, o objeto da ciência jurídica passou a ser a norma positiva, distanciada de
considerações morais, cujo fundamento de validade era a mera observância de seu
procedimento formal de criação (teoria pura do direito – Kelsen), independentemente do
conteúdo. Todavia, isso possibilitou as barbáries da 2ª guerra mundial e verificou-se que a
validade da norma deve ser aferida a partir de valores fundamentais.
E, por fim, como marco teórico, cita-se o reconhecimento da força normativa da
Constituição (Konrad Hesse), a expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de
uma nova dogmática da interpretação constitucional. Desse conjunto de fenômenos resultou
um processo extenso e profundo de constitucionalização do Direito (Constituição invasora), eis
que todos os ramos jurídicos passam por um processo de filtragem constitucional.
Abandonou-se a concepção da Constituição como documento meramente político, repositório
de promessas dependentes da atuação do legislador, para ser vista como verdadeira norma
jurídica e locus para a consagração de direitos fundamentais, o que acarretou, por
conseguinte, a expansão da jurisdição constitucional e uma nova hermenêutica, pois, em que
pese ser norma jurídica, a densidade axiológica da CF exige métodos específicos de
interpretação (abandono do formalismo interpretativo).
A partir da maior aproximação do Direito com a Moral, o homem ganhou assento
como centro de preocupação das normas. Como defendido a partir do imperativo categórico
kantiano, o homem não pode ser considerado instrumento para consecução de objetivos
outros, mas como fim em si mesmo. Não mais se admite que o Direito se resuma a questões
de validade formal. Os operadores do Direito devem observar se o resultado de sua operação
é compatível com a tutela de direitos fundamentais. O mínimo existencial surge como instituto
a ser observado pelo intérprete, pois encerra o rol mínimo de prestações necessárias à
manutenção digna do homem (necessidades físicas, biológicas, espirituais e intelectuais) e
abrange a livre participação do indivíduo na construção democrática do Estado e a capacidade
de se desenvolver conforme seu próprio entendimento. Não obstante, a dignidade da pessoa
humana, como epicentro axiológico da CF, impõe a ideia de respeito ao homem como fim
último do direito e do estado.
33
O neoconstitucionalismo pode ser visto pelos seguintes prismas/vertentes: a) como
modelo constitucional: conjunto de mecanismos normativos e institucionais; e b) como teoria,
ideologia e método
do direito. b.1) como teoria, limita-se a descrever os resultados da constitucionalização.
Caracterizado por uma constituição ‘invasora’, catálogo de direitos fundamentais, onipresença
de princípios e regras, peculiaridades na interpretação/aplicação das suas normas. Afasta a
estatalidade, o legicentrismo (a constituição passa a ser norma jurídica vinculante) e o
formalismo interpretativo. Mantém o método positivista com objeto parcialmente modificado
ou propõe uma mudança radical de método (pós-positivismo); b.2) como ideologia, põe em 1º
plano a garantia dos direitos fundamentais, em detrimento do objetivo da limitação do poder
estatal (traço do constitucionalismo ‘clássico’), porque o poder estatal passa a ser aliado e
necessário à implementação dos direitos fundamentais. Não se limita ao juízo descritivo (como
o direito é), pois há sobreposição com o juízo prescritivo, na medida em que se valora
positivamente o direito e defende sua ampliação (como deveria ser); b.3) como metodologia,
especialmente em Alexy e Dworkin com a ponderação, traz a conexão necessária entre direito
e moral (leitura moral da constituição), entronização de valores na interpretação jurídica com
o reconhecimento da normatividade dos princípios, reabilitação da razão prática e da
argumentação jurídica.
Daniel Sarmento argumenta que o cenário atual abre espaço tanto para visões
comunitaristas, que buscam na moralidade positiva e nas pré compreensões socialmente
vigentes o norte para a hermenêutica constitucional, endossando na seara interpretativa os
valores e cosmovisões hegemônicos na sociedade, como para teorias mais próximas ao
construtivismo ético, que se orientam para uma moralidade crítica, cujo conteúdo seja
definido através de um debate racional de ideias, fundado em certos pressupostos normativos,
como os de igualdade e liberdade de todos os seus participantes.
II - Constitucionalização do Direito. A ideia de constitucionalização do Direito está
associada a um efeito expansivo das normas constitucionais, cujo conteúdo material e
axiológico se irradia, com força normativa, por todo o sistema jurídico. Os valores e fins
públicos contemplados nos princípios e regras da Constituição passam a condicionar a validade
e o sentido de todas as normas do direito infraconstitucional. Como explica Sarmento, tal
fenômeno não se esgota no tratamento constitucional de temas anteriormente disciplinados
pela legislação ordinária, pois envolve a filtragem constitucional, ou seja, a interpretação de
todas as normas à luz da CF, buscando a exegese que mais promova seus objetivos.
A constitucionalização repercute sobre a atuação dos três Poderes. Repercute,
também, nas relações entre particulares. Relativamente ao Legislativo, a constitucionalização
(i) limita sua discricionariedade ou liberdade de conformação na elaboração das leis em geral e
(ii) impõe-lhe determinados deveres de atuação para realização de direitos e programas
constitucionais. No tocante à Administração Pública, além de igualmente (i) limitar-lhe a
discricionariedade e (ii) impor a ela deveres de atuação, ainda (iii) fornece fundamento de
validade para a prática de atos de aplicação direta e imediata da Constituição,
independentemente da interposição do legislador ordinário. Quanto ao Poder Judiciário, (i)
serve de parâmetro para o controle de constitucionalidade por ele desempenhado (incidental
e por ação direta), bem como (ii) condiciona a interpretação de todas as normas do sistema.
Por fim, para os particulares, estabelece limitações à sua autonomia da vontade, em domínios
como a liberdade de contratar ou o uso da propriedade privada, subordinando-a a valores
constitucionais e ao respeito a direitos fundamentais.
III - Judicialização da política. Sarmento ensina que, como boa parcela das normas
mais relevantes da CF caracteriza-se pela abertura e indeterminação semânticas, a sua
aplicação pelo Poder Judiciário resultou em uma nova hermenêutica jurídica, ante a
necessidade de resolver tensões entre princípios constitucionais colidentes, o que deu espaço
para a técnica da ponderação e tornou frequente o recurso ao princípio da proporcionalidade
na esfera judicial. Assim, houve o desenvolvimento de diversas teorias da argumentação
jurídica, que buscam a melhor resposta para os casos difíceis. Neste contexto, cresceu a
34
procura e importância do Poder Judiciário, pois com frequência cada vez maior questões
polêmicas e relevantes para a sociedade passaram a ser decididas por juízes e sobretudo pela
Corte Constitucional (ex. aborto de feto anencéfalo, fixação do rito de impeachment,
suspensão da indicação de Ministro de Estado, uniões homoafetivas, alteração de nome sem a
necessidade de cirurgia de mudança de sexo, concessão de LOAS a estrangeiros residentes,
custeio de medicamentos de alto custo pelo SUS, etc), muitas vezes em razão de ações
propostas pelo grupo político ou social perdedor em âmbito legislativo. A expansão da
jurisdição constitucional contribuiu para esse fenômeno e o Judiciário deixou de ser mera boca
que pronuncia a palavra da lei.
Barroso assevera que a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e
tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de
participação da sociedade. O fenômeno tem causas múltiplas, como o reconhecimento da
importância de um Judiciário forte e independente, como elemento essencial para as
democracias modernas. Outra causa envolve certa desilusão com a política majoritária, em
razão da crise de representatividade e de funcionalidade dos parlamentos em geral. Há,
ainda, o fato de que atores políticos, muitas vezes, preferem que o Judiciário seja a instância
decisória de certas questões polêmicas, em relação às quais exista desacordo moral razoável
da sociedade. Com isso, evitam o próprio desgaste na deliberação de temas divisivos, como
uniões homoafetivas, interrupção de gestação ou demarcação de terras indígenas.
Ademais, Barroso salienta que a “judicialização e o ativismo judicial são primos”, mas
não têm as mesmas origens. A judicialização “decorre do modelo de Constituição analítica e
do sistema de controle de constitucionalidade abrangente adotados no Brasil, que permitem
que discussões de largo alcance político e moral sejam trazidas sob a forma de ações judiciais.
Vale dizer: a judicialização não decorre da vontade do Judiciário, mas sim do constituinte”, e o
“ativismo judicial, por sua vez, expressa uma postura do intérprete, um modo proativo e
expansivo de interpretar a Constituição, potencializando o sentido e alcance de suas normas.
Assim, a emergência do constitucionalismo democrático no segundo pós-guerra é
percebida como uma ampliação do conceito de soberania, abrindo para os cidadãos novos
lugares de representação de sua vontade, a exemplo do que ocorre quando provocam o
Judiciário para exercer o controle das leis. O que se observa é uma tendência global à adoção
do modelo de constitucionalismo em que as constituições são vistas como normas jurídicas
autênticas, que podem ser invocadas perante o Poder Judiciário e ocasionar a invalidação de
leis ou outros atos normativos. A conjugação do constitucionalismo social com o
reconhecimento do caráter normativo e judicialmente sindicável dos preceitos constitucionais
gerou efeitos significativos do ponto de vista da importância da Constituição no sistema
jurídico — ela assumiu uma centralidade outrora inexistente —, bem como da partilha de
poder no âmbito do aparelho estatal, com grande fortalecimento do Poder Judiciário, e,
sobretudo, das cortes constitucionais e supremas cortes, muitas vezes em detrimento das
instâncias políticas majoritárias.
Logo, a judicialização é fenômeno que apresenta dois componentes: (1) um novo
"ativismo judicial", com a expansão das questões sobre as quais devem ser formados juízos
jurisprudenciais (muitas até recentemente reservadas ao tratamento dado pelo Legislativo ou
pelo Executivo); e (2) o interesse de políticos e autoridades administrativas em adotar (a)
procedimentos semelhantes ao processo judicial e (b) parâmetros jurisprudenciais em suas
deliberações.
Tal "expansão" do poder das cortes judiciais seria o resultado de diversas
características do desenvolvimento histórico de instituições nacionais e internacionais e de
renovação conceitual em disciplinas acadêmicas. Assim, por exemplo, a reação democrática
em favor da proteção de direitos e contra as práticas populistas e totalitárias da II Guerra
Mundial na Europa; a influência da atuação da Suprema Corte americana; a tradição europeia
(kelseniana) de controle da constitucionalidade das leis; os esforços de organizações
internacionais de proteção de direitos humanos, sobretudo a partir da Declaração Universal
dos Direitos Humanos da ONU, de 1948.
35
Do ponto de vista do processo político como um todo, a judicialização da política
contribui para o surgimento de um padrão de interação entre os Poderes (sintetizado no
conflito entre tribunais constitucionais e o Legislativo ou Executivo) que não é
necessariamente deletério da democracia. A ideia é, ao contrário, que democracia constitui
um "requisito" da expansão do poder judicial. Nesse sentido, a transformação da jurisdição
constitucional em parte integrante do processo de formulação de políticas públicas deve ser
vista como um desdobramento das democracias contemporâneas.
A judicialização da política ocorre porque os tribunais são chamados a se pronunciar
onde o funcionamento do Legislativo e do Executivo se mostram falhos, insuficientes ou
insatisfatórios. Sob tais condições, ocorre uma certa aproximação entre Direito e Política e, em
vários casos, torna-se mais difícil distinguir entre um "direito" e um "interesse político", sendo
possível se caracterizar o desenvolvimento de uma "política de direitos". Essa condição
institucional de introdução da jurisdição (sobretudo a das cortes constitucionais) no processo
de formulação de políticas públicas é em parte auxiliada pelas regras orgânicas dos tribunais
ou do Poder Judiciário como um todo. Assim, regras referentes ao recrutamento, composição,
competências e procedimentos dos diversos órgãos e poderes, e especialmente do tribunal
constitucional, são importantes para a judicialização da política. Na França, por exemplo, o fato
de que os nove membros da Corte Constitucional sejam nomeados, em partes iguais, pelo
Presidente da República, pelo Presidente da Assembleia Nacional e pelo Presidente do Senado,
auxiliou na politização da justiça.
Daniel Sarmento destaca que, diante da vagueza e abertura de boa parte das normas
constitucionais, quem as interpreta também participa do seu processo de criação. Daí a crítica
de que o viés judicialista subjacente ao neoconstitucionalismo acaba por conferir aos juízes
uma espécie de poder constituinte permanente, pois lhes permite moldar a CF de acordo com
as suas preferências políticas e valorativas, em detrimento daquelas do legislador eleito. Além
disso, Sarmento afirma que uma ênfase exagerada no espaço judicial pode levar ao
esquecimento de outros terrenos importantes para a concretização da CF e realização de
Direitos, gerando um resfriamento da mobilização cívica do cidadão. A judicialização se
justifica a partir de uma visão muito crítica do processo político majoritário, mas que ignora as
inúmeras mazelas que também afligem o Poder Judiciário, Aa partir de visões românticas e
idealizadas do juiz. Aponta-se, ainda, a ausência de mandato popular conferido ao STF, mas,
por outro lado, é importante sua atuação contramajoritária. Sarmento não nega o fenômeno
da judicialização da política, mas prefere outra linha teórica, que, apesar de reconhecer o
papel importante do Judiciário na defesa dos direitos fundamentais e proteção da democracia,
afirma a centralidade dos movimentos sociais e da sociedade civil na arena constitucional. Não
se trata de apenas afirmar que tais atores podem participar da jurisdição constitucional ( amici
curiae ou audiências públicas), mas de reconhecer que há muito Direito Constitucional fora dos
tribunais. Destaca-se a decisão do caso Raposa Serra do Sol, na parte em que impôs
condicionantes às futuras demarcações de terras indígenas: o STF careceria de legitimidade,
pois praticamente atuou como legislador e impôs graves restrições a direitos básicos de uma
minoria étnica vulnerável, que estão em total desacordo com o texto constitucional e com a
normativa internacional sobre direitos humanos.
4. PODER CONSTITUINTE
4.1 Poder Constituinte originário. Titularidade e caracterı ́sticas. (5.a)
4.2 Poder Constituinte derivado. Limitações à reforma constitucional. (6.a)
4.3 Poder constituinte estadual: autonomia e limitações. (8.a)
4.4 As mutações constitucionais. (6.a)
4.5 Cláusulas pétreas expressas e implı ́citas. (6.a)
4.6 Direito Constitucional Intertemporal. Teoria da Recepção. Disposições constitucionais
transitórias. (13.a)
36
5A. Poder Constituinte originário. Titularidade e características.
Oswaldo Costa
I. Conceito e Titularidade
II. Características
Classificação: o poder constituinte originário pode ser dividido em histórico (seria o verdadeiro
poder constituinte originário, estruturando, pela primeira vez, o estado) e revolucionário
(seriam todos os posteriores ao histórico, rompendo por completo com a antiga ordem e
instaurando um novo estado).
37
f) permanente – o poder constituinte originário não se esgota com a edição da nova
constituição, sobrevivendo a ela e fora dela como forma de expressão da liberdade humana,
em verdadeira ideia de subsistência (Sarmento relativiza todas essas características. P. ex.:
inicial? Normalmente não se manifesta em um cenário de completa ruptura. Incondicionado?
Podem ser estabelecidas regras prévias sobre o seu funcionamento – sobre a elaboração da
própria constituição).
Formas de expressão: o poder constituinte originário pode ser expressar através da outorga
(imposição – quando não há um “verdadeiro momento constitucional”, segundo Sarmento) ou
da promulgação (forma democrática) da nova constituição. Para que seja reconhecido como
legítimo, o poder constituinte deve se manifestar democraticamente e instituir um regime
político comprometido com o respeito aos direitos humanos (Sarmento).
Prova oral – 27º CPR: Características do poder constituinte originário.
Caio Kusaba
38
E. Princípio da irrepetibilidade (art. 60, § 5º, da CF): matéria constante de
proposta de emenda rejeitada ou prejudicada não pode ser objeto de nova PEC
na mesma sessão legislativa – 02 de fevereiro a 22 de dezembro (art. 57 da CF).
Obs.: alguns autores classificam esse limite como temporal;
2. Limites temporais: não há em relação às emendas;
3. Limites circunstanciais (art. 60, § 1º, da CF): não pode haver emenda em (a) estado
de defesa; (b) estado de sítio; e (c) intervenção federal.
4. Limites materiais ou cláusulas pétreas: podem ser:
A. Explícitos (art. 60, § 4º, da CF): não será objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir: (a) a forma federativa de Estado; (b) o voto direto,
secreto, universal e periódico; (c) a separação dos Poderes; e (d) os direitos e
garantias individuais.
A expressão “tendente a abolir” significa, por óbvio, que uma emenda à
Constituição não pode abolir uma cláusula pétrea. Porém, uma emenda à
Constituição pode restringir um instituto protegido como cláusula pétrea,
desde que não seja violado o seu núcleo essencial.
Núcleo essencial, apesar de difícil definição, pode ser conceituado como o
conjunto das características sem as quais um instituto deixaria de existir.
Como se nota do inc. IV do § 4º, os direitos e garantias individuais são
cláusulas pétreas, não havendo menção aos direitos sociais. Dessa feita, há
divergência sobre a imutabilidade dos direitos sociais:
a. 1ª corrente: entende que as normas disciplinadoras de direitos sociais não
são cláusulas pétreas, por dois motivos: (a) não estão previstos
expressamente no rol de cláusulas pétreas e (b) por serem direitos a
prestação, estão na dependência de condições variadas no tempo dos
recursos disponíveis, não podendo ser afirmados como imodificáveis;
b. 2ª corrente: defende que as normas estabelecedoras de direitos sociais
também são cláusulas pétreas, uma vez que são instrumentos para a
implementação da dignidade da pessoa humana e dos demais
fundamentos da República. Desse modo, os direitos fundamentais sociais
da essência da concepção de Estado acolhida pela CF, devendo ser
considerados cláusulas pétreas.
Uma emenda constitucional NÃO pode ampliar o rol de cláusulas pétreas,
uma vez que o Poder Reformador recebe a sua autoridade do constituinte
originário. Logo, o Poder Reformador só pode ser limitado pelo constituinte
originário, de maneira que o Poder Reformador de hoje não pode inserir novos
limites ao Poder Reformador de amanhã.
Por outro lado, o Poder Reformador pode inserir novo instituto que é
abrangido por uma das hipóteses de cláusula pétrea existente. Ex.: Poder
Reformador inserir no texto constitucional novo direito individual.
Quanto à questão sobre esse novo direito individual, inserido por emenda à
Constituição, ser protegido como cláusula pétrea, existem duas posições:
a. Favorável: o novo direito vira cláusula pétrea, em razão de dois motivos:
i. Quando o constituinte originário colocou no rol de cláusulas pétreas os
direitos e garantias individuais, ele não diferenciou se esses direitos
seriam somente os originários, ou se também poderiam ser direitos
inseridos por emenda;
ii. Princípio da vedação do retrocesso (evolução reacionária ou efeito
cliquet), segundo o qual, se direitos fundamentais alcançaram um
determinado nível de conquistas, não se poderia abolir tais conquistas
porque isso implicaria um retorno a uma situação pior;
39
b. Desfavorável: o novo direito não vira cláusula pétrea, uma vez que isso
seria a imposição de novos limites ao Poder Reformador os quais não
foram previstos pelo constituinte originário;
B. Implícitos:
a. Titularidade do poder: a titularidade do poder pelo povo não pode ser
alterada;
b. Vedação à dupla reforma ou dupla revisão : dupla reforma é a alteração de
um limite ao Poder Reformador para permitir posterior modificação
daquilo que outrora era vedado.
Dessa forma, pode-se dizer que os limites explícitos ao poder de reforma –
limites procedimentais, circunstanciais e materiais explícitos – são, eles
próprios, limites implícitos ao Poder Reformador, porque eles próprios não
podem ser abolidos;
c. República: a matéria é controvertida, mas existem dois argumentos
favoráveis a tese de que a República é uma cláusula pétrea implícita:
i. A República é fruto de uma escolha popular direta, logo, não poderiam
os representantes do povo modificar a forma de governo. Contudo, é
possível que o próprio povo decida pelo fim da República em um novo
plebiscito;
ii. O art. 60, § 4º, II, da CF traz que é cláusula pétrea o voto periódico, e a
periodicidade do exercício do poder é um elemento essencial da
República, afinal o monarca não exerce mandado eletivo.
40
Existe a figura da mutação constitucional inconstitucional, a qual consiste em atribuir a
uma norma constitucional uma nova interpretação que seja contrária aos valores consagrados
pela Constituição. Para evitar que a mutação constitucional seja inconstitucional, a mutação
constitucional tem limites:
1. Próprio texto: não se pode atribuir ao texto um sentido que seja contrário às suas
possibilidades semânticas;
2. Sistema de valores constitucionais: a interpretação não pode levar a um resultado
contrário aos valores defendidos pela Constituição. Exemplos próprios de violações são
as práticas políticas consolidadas e as omissões do poder público em efetivar a
Constituição (o que gera uma interpretação de inefetividade da Constituição).
Caio Kusaba
O Poder Constituinte Derivado Decorrente (PCDD) é o poder que os Estados têm para a
elaboração da própria Constituição. Esse poder não é inicial nem incondicionado nem
ilimitado. O PCDD se subdivide em:
A doutrina majoritária entende que, nos Municípios, não há PCDD, pois eles possuem
Lei Orgânica, a qual não possui natureza constitucional. Existe corrente minoritária que
defende que a Lei Orgânica tem natureza constitucional, havendo a seguinte divisão do Poder
Constituinte:
1. Poder Constituinte de 1º Grau: Constituição Federal;
2. Poder Constituinte de 2º Grau: Constituição Estadual, o qual deve observância à
CF;
3. Poder Constituinte de 3º Grau: Lei Orgânica, a qual deve observância à CF e à CE.
41
Estadual como de Lei Orgânica municipal. No ponto referente a matérias de Constituição
Estadual, a Lei Orgânica do Distrito Federal tem natureza constitucional.
Caio Kusaba
i) Revogação: a Constituição nova revoga a Constituição anterior. Essa é a regra, podendo ser a
revogação expressa ou tácita;
ii) Vacatio Constitutionis: segue a mesma lógica da vacatio legis. Trata-se de um período no
qual a Constituição nova ainda não entrou em vigor, sendo mantida a vigência da Constituição
anterior. Esse fenômeno também só ocorre se for expresso. A vacatio constitutionis pode ser
parcial, com apenas alguns dispositivos não entrando em vigor imediatamente. Isso ocorreu na
CF/88, conforme o artigo 34 do ADCT (Art. 34. O sistema tributário nacional entrará em vigor a
partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido,
até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda nº 1, de 1969, e pelas
posteriores). Esse fenômeno da vacatio constitutionis, sobretudo quando parcial, também é
chamado de recepção material da Constituição anterior.
42
matéria, fazendo com que o CTN fosse recepcionado com status de lei
complementar;
B. Norma materialmente incompatível: ela não é recepcionada pela nova
Constituição. Prevalece no âmbito do STF que a norma anterior é revogada
pela nova Constituição.
Por outro lado, pode ocorrer de a norma infraconstitucional anterior não ser
compatível com a Constituição anterior, sendo, portanto, inconstitucional. Essa
mesma norma pode não ter sido declarada inconstitucional naquela época, porém,
com a edição de uma nova ordem constitucional, percebe-se que ela é compatível
com a Constituição nova. Nessa situação, a norma não pode ser declarada
constitucional com base na nova Constituição, pois ela nasceu inconstitucional.
Assim, NÃO há o fenômeno da constitucionalidade superveniente;
43
As disposições constitucionais transitórias são previstas no Anexo de Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCT) e tratam da aplicabilidade de outras normas. Ou seja,
normas que visam a situações temporárias, provisórias.
Cumpre ter presente que, por vezes, o dispositivo do ADCT é estatuído pelo
constituinte originário para excepcionar hipóteses concretas da incidência de uma norma
geral, integrante do corpo principal da Constituição, ou então, volta-se especificamente para
atribuir um regime mais vantajoso a um grupo concreto de destinatários (ex.: art. 19 do ADCT).
Apesar desses objetivos e de os artigos do ADCT seguirem uma numeração própria, as
normas constitucionais transitórias possuem natureza constitucional, servindo de parâmetro
normativo para o controle de constitucionalidade.
5. NORMAS CONSTITUCIONAIS
5.1 Norma jurı ́dica e enunciado normativo. Caracterı ́sticas da norma jurı ́dica. (9.b)
5.2 Normas constitucionais. Definição. Estrutura. Classificações. Princı ́pios e regras. Preâmbulo.
Efeitos das normas da Constituição de 1988. (4.b)
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR. Direito Constitucional (teoria, história e métodos de trabalho) Daniel Sarmento.
O Edital utilizou o termo “enunciado normativo” como equivalente a “texto legal”, dito isto,
“norma jurídica é a significação que obtemos a partir da leitura dos textos do direito positivo.
Trata-se de algo que se produz em nossa mente [...] Por analogia aos símbolos linguísticos
quaisquer podemos dizer que o texto escrito está para a norma jurídica tal qual o vocábulo
está para sua significação. Nas duas situações, encontraremos o suporte físico que se refere
algum objeto do mundo (significado) do qual extratamos um conceito ou juízo (significação)
[...] a norma é um juízo hipotético-condicional (se ocorrer o fato X, então deve ser a prestação
Y)” (Barros Carvalho:2007, 8-9). Segundo a concepção clássica, “a norma funciona como
esquema de interpretação [...].
Sarmento afirma que apesar da sua importância, o texto nunca se confunde com a norma
jurídica. O texto é o significante, e a norma o seu significado. A norma jurídica é o que resulta
da interpretação de um texto, sendo o texto o invólucro da norma, a sua aparência exterior. É
certo, contudo, que nem toda norma jurídica está consagrada em um texto específico, pois
existem normas implícitas. Por outro lado, há hipóteses em que a norma jurídica só é obtida
pela conjugação de vários textos (dispositivos) diferentes.
44
que lhe é apresentado com uma pré-compreensão, que já envolve uma antecipação provisória
da resposta, que poderá ser ou não confirmada ao final do processo hermenêutico.
A teoria da norma, para o positivismo jurídico, se baseia na Teoria Coativa do Direito, em que o
direito é um conjunto de normas coativas; na Teoria da Lei como Fonte do Direito, que tem a
lei como fonte hierarquicamente superior às demais, recebendo a qualificação jurídica; e, por
fim, a Teoria Imperativa da Norma Jurídica, em que a norma jurídica tem a estrutura de um
comando, proveniente de alguém investido de autoridade e destinado a impor-se de modo
subordinante, sob pena de sanção. A Teoria do Ordenamento Jurídico defende a coerência e
completude das normas jurídicas, visando conferir unidade, com uma unidade formal, e em
caso de conflitos deve uniformizar por meio dos critérios de hierarquia, cronologia e
especialidade (regras).
Qual a importância dessa distinção? Qual a sua razão? Ela vai realçar papéis da ciência jurídica
e dos órgãos jurídicos (ordem jurídica). A ciência jurídica tem por missão conhecer de fora o
direito e descrevê-lo com base no seu conhecimento. Os órgãos jurídicos têm autoridade
jurídica e, em razão desta, eles têm por missão produzir o direito. Ciência jurídica visa
conhecer o direito, ao passo que os órgãos jurídicos têm por missão produzir o direito para
que ele possa ser conhecido e discutido pela ciência jurídica. Então, Kelsen identifica o dever-
ser da norma jurídica como sentido prescritivo e o dever-ser das proposições jurídicas como
sentido descritivo.
Herbert Hart considera a visão de Kelsen como limitada àqueles enunciados que preveem
sanção, contemplando o direito exclusivamente do ponto de vista de descumprimento da lei,
esquecendo que o normal é que estas sejam cumpridas espontaneamente. Ademais, no
ordenamento jurídico existe um importante número de normas que não preveem sanção.
Nem todos os enunciados que compõem o direito tem esta mesma estrutura, existindo outros
que conferem autorizações ou ordens. Existem dois tipos de regra: (i) o tipo básico ou primário
que prescreve que os seres humanos façam ou omitam certas ações, impondo deveres. As
regras do outro tipo (ii) são as secundárias, que estabelecem que os seres humanos podem
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extinguir ou modificar regras anteriores, ou determinar de diversas maneiras o efeito delas, ou
controlar sua atuação. Conferem faculdades, públicas ou privadas. Dentre as regras
secundárias, para Hart, destacam-se as regras de conhecimento, as regras de alteração e as
regras de julgamento.
A regra de conhecimento criaria um critério formal (critério da fonte) para decidir quando uma
regra é válida e obrigatória ou não. A regra de alteração definiria o procedimento e as pessoas
competentes para criar novas regras e revogar as antigas. Por fim, a regra de julgamento ou
aplicação definiria as pessoas dotadas de autoridade e responsáveis por julgar controvérsias
entre membros da comunidade, bem como do poder de imporem suas decisões, se necessário,
mediante o uso de uma coerção organizada, limitada e regulada. Para Hart, as regras
secundárias (conhecimento, alteração e julgamento) resolveriam os três problemas (incerteza,
caráter estático e ineficácia das regras) das comunidades que se tornaram grandes e
complexas demais para serem reguladas apenas por regras primárias. (COELHO, 2011).
Realidade dúplice das normas: Hodiernamente, a norma é vista sob uma realidade dúplice:
“Alexy afirma que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior
medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, ao passo que as regras
são normas que podem ser cumpridas ou não, uma vez que, se uma regra é valida, há de ser
feito exatamente o que ela exige [...] Os princípios apresentam razões que podem ser
superadas por razões opostas. A realização dos princípios depende das possibilidades jurídicas
e fáticas, que são condicionadas pelos princípios opostos, e assim exigem consideração dos
pesos dos princípios em colisão segundo as circunstâncias do caso concreto” (Marinoni: 2010,
p. 49-50); “em suma, os princípios são mandados de otimização que se caracterizam pelo fato
de poderem ser cumpridos proporcionalmente às condições reais e jurídicas existentes”
(Edilsom Farias:2004, p. 48).
Ronald Dworkin considera que o direito não é composto unicamente por normas, mas também
e, fundamentalmente, por princípios. Rafael Simioni observa que, para Dworkin, “Os princípios
abrangem tanto os princípios morais quanto os objetivos políticos do governo. Assim, dentro
do gênero princípios, Dworkin (1978) observa inicialmente que existem duas espécies muito
importantes na prática das decisões judiciais e que são bastante recorrentes nas decisões
sobre casos difíceis: o uso de argumentos baseados em princípios morais e o uso de
argumentos baseados na conformidade da decisão com os objetivos das políticas públicas do
governo – que Dworkin (1978, p. 22) chama de policies.” (p. 208). Portanto, “Ao contrário de
Castanheira Neves, Alexy (1993) e outros, os princípios, em Dworkin, não são espécies do
gênero norma. Os princípios são questões de fundamento e não precisam estar
necessariamente positivados em leis – ou em precedentes, para o caso do common law.” (p.
206).
As normas jurídicas possuem as seguintes características:
Bilateralidade: essa característica tem relação com a própria estrutura da norma, pois,
normalmente, a norma é dirigida a duas partes, sendo que uma parte tem o dever jurídico, ou
seja, deverá exercer determinada conduta em favor de outra, enquanto que, essa outra, tem o
direito subjetivo, ou seja, a norma concede a possibilidade de agir diante da outra parte. Uma
parte, então, teria um direito fixado pela norma e a outra uma obrigação, decorrente do
direito que foi concedido.
Generalidade: é a característica relacionada ao fato da norma valer para qualquer um, sem
distinção de qualquer natureza. Ela obriga a todos que se achem em igual situação jurídica.
Essa característica consagra um dos princípios basilares do Direito: igualdade de todos perante
a lei.
Abstratividade: a norma não foi criada para regular uma situação concreta, mas para regular
de forma abstrata, abrangendo o maior número possível de casos semelhantes. A norma vai
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tão somente formular os modelos de situação, com as características fundamentais, sem
mencionar as particularidades de cada caso.
Imperatividade: a norma, para ser cumprida e observada por todos, deverá ser imperativa, ou
seja, impor aos destinatários a obrigação de obedecer. É obrigatória. Não depende da vontade
dos indivíduos. Norma não é conselho, mas ordem a ser seguida. a) são cogentes as normas
que excluem “qualquer arbítrio individual. São aplicadas ainda que pessoas eventualmente
beneficiadas não desejasse delas valer-se” (Venosa:2010, p. 13), não podendo ser derrogadas
pela vontade das partes; (b) as normas dispositivas podem ser permissivas, quando delegam
aos beneficiados o regramento integral da questão por convenção particular; ou supletivas em
relação a eventual omissão das partes, caso em que estas normas assumirão caráter de
obrigatoriedade, como que reproduzindo uma vontade presumida em razão da omissão. Obs.:
(1) a distinção por vezes depende da objetividade jurídica; (2) uma das características do
fenômeno da publicização do direito civil refere-se à imperatividade.
Classificação quanto à sanção ou autorizamento: (a) são perfeitas as normas que importam
em sanção de nulidade ou de anulação do ato jurídico; (b) são mais que perfeitas quando
estabelecem tanto a nulidade absoluta ou relativa (que possibilitam o retorno ao “status quo
ante”), como importam em aplicação de pena ao infrator, como é o caso dos ilícitos civis que
constituem infração penal; (c) menos que perfeitas “são as que autorizam, na sua violação, a
aplicação de uma sanção ao violador, mas não a nulidade do ato” (Gagliano e Pamplona:2004,
p. 15); (d) as leis imperfeitas “prescrevem uma conduta sem impor sanção. Não existe nulidade
para o ato, nem qualquer punição [...] exemplo é o das dívidas prescritas e de jogo (obrigações
naturais). Essas dívidas devem ser pagas, porém o ordenamento não concede meio jurídico de
obrigar o pagamento” (Venosa:2010, p. 15). Obs.: O art. 166, VII, do CC, estabelece hipótese de
nulidade virtual quando a lei “proibir-lhe a prática, sem cominar sanção”.
Oswaldo Costa
I. Normas constitucionais. Definição. Estrutura
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primeiras aquela que dispõe sobre a ordenação dos poderes do Estado, sua estrutura,
competência, articulação recíproca e o estatuto dos seus titulares; as outras, as que definem
os direitos fundamentais dos jurisdicionados.” (MENDES, COELHO e BRANCO, 2008: 30).
48
“(...) não prescrevem comportamentos, mas modos de raciocínio e de argumentação
relativamente a normas que indiretamente prescrevem comportamentos.” (Idem). Para Ávila,
são exemplos de postulados a ponderação, a concordância prática e a proibição de excesso,
bem como a igualdade, razoabilidade e proporcionalidade.
IV. Preâmbulo
(a) Recepção: as normas que forem incompatíveis com a nova Constituição serão revogadas
por ausência de recepção. A contrario sensu, a norma infraconstitucional que não contrariar a
nova ordem será recepcionada, podendo, inclusive, adquirir uma nova “roupagem”. Pode
ocorrer de forma expressa ou tácita
(b) Revogação: nos casos de normas infraconstitucionais produzidas antes da nova
Constituição, incompatíveis com as novas regras, não se observará qualquer situação de
inconstitucionalidade, mas, apenas de revogação da lei anterior pela nova constituição, por
falta de recepção.
(c) Represtinação: normas infraconstitucionais elaboradas (e em vigor) sob a base de um
ordenamento constitucional não são recepcionadas por um novo ordenamento constitucional
(ocorrendo a revogação o normativa) e, posteriormente, em virtude de uma nova Constituição,
essas normas voltariam a vigorar. Os requisitos para essa possibilidade seriam: (i) não
contrariedade à nova Constituição; (ii) disposição expressa do poder constituinte, já que, a
represtinação não poderia ocorrer de forma automática (defesa da segurança jurídica).
49
6. INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL
6.1 Hermenêutica e Teorias da argumentação jurı ́dica. (2.c)
6.2 Interpretação jurı ́dica. Métodos e critérios interpretação. (21.b)
6.3 Critérios clássicos de resolução de antinomias jurı ́dicas. (12.b)
6.4 A metodologia jurı ́dica no tempo. A Escola da Exegese. Jurisprudência dos conceitos,
jurisprudência dos interesses e jurisprudência dos valores. (17.b)
6.5 O realismo jurı ́dico. Neoformalismo. O pós-positivismo jurı ́dico. (17.b)
6.6 O papel das pré-compreensões no Direito. Interpretação, moralidade positiva e moralidade
crı ́tica. (22.a)
6.7 Lacunas e integração do Direito: analogia, costumes e equidade. (4.c) Os princı ́pios gerais
do direito.(7.c)
6.8 Interpretação constitucional. Métodos e princı ́pios de hermenêutica constitucional. (10.a)
6.9 Constituição e cosmopolitismo. O papel do direito comparado e das normas e
jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição. (2.a)
6.10 Colisão entre normas constitucionais. Ponderação e juı ́zo de adequação. Princı ́pios da
Proporcionalidade e da Razoabilidade. (11.c)
Oswaldo Costa
O que normalmente se entende hoje por teoria da argumentação jurídica tem sua
origem numa série de obras dos anos 50 (século XX), origem esta que estava conectada com o
problema das relações entre o direito e a sociedade. As três concepções mais relevantes como
precursoras das atuais teorias da argumentação jurídica são: a tópica de Viehweg; a nova
retórica de Perelman e a lógica informal de Toulmin. Estas, embora diferindo entre si em
diversos aspectos, têm em comum a rejeição do modelo da lógica dedutiva. No entanto, as
três concepções deixam a desejar quanto ao seu desenvolvimento. Mas, seu papel
fundamental consistiu em ter aberto um relativamente novo campo de investigação e, ter
servido como precursoras das atuais teorias da argumentação jurídica elaboradas por
MacCormick e Robert Alexy, os quais representam o que se denomina de “teoria padrão da
argumentação jurídica”.
A) MACCORMICK
MacCormick trata de construir uma teoria que dê conta tanto dos aspectos dedutivos
da argumentação jurídica quanto dos não-dedutivos, dos aspectos formais e dos materiais,
que se situe a meio caminho entre uma teoria ultra-racionalista do Direito (existência de uma
única resposta correta para o caso) e uma irracionalista (decisões jurídicas são produtos da
vontade e não da razão). Para ele não se trata unicamente de mostrar em que condições uma
decisão jurídica pode ser considerada justa; ele pretende, além disso, que as decisões
jurídicas, de fato, se justifiquem precisamente de acordo com esse modelo.
50
MacCormick parte da consideração de que, pelo menos em alguns casos as
justificações que os juízes articulam são de caráter estritamente dedutivo (raciocínio lógico
dedutivo). Mas, a justificação dedutiva obedece a pressupostos e limites.
O primeiro pressuposto é que o juiz tem o dever de aplicar as regras do direito válido.
O segundo pressuposto é que o juiz pode identificar quais são as regras válidas.
A teoria de MacCormick foi objeto de algumas críticas, dentre outras podemos citar:
B) ROBERT ALEXY
Alexy, pelo contrário, parte de uma teoria da argumentação prática geral que ele
projeta, depois para o campo do Direito. O resultado a que ele chega consiste em considerar o
discurso jurídico, a argumentação jurídica, como um caso especial do discurso prático geral.
Isto é, do discurso moral. Essa abordagem diferente faz com que a concepção de Alexy esteja,
de certo modo, mais distante da prática geral da argumentação jurídica que a de MacCormick.
Mas, em troca, trata-se de uma teoria mais articulada e sistemática.
Alexy entende que uma teoria da argumentação jurídica teria de ser capaz de unir
dois modelos diferentes do sistema jurídico: o sistema jurídico como sistema de
procedimento e o jurídico como sistema de normas (regras e princípios).
51
violação a determinado direito (ou princípio), em favor de outro que venha com ele colidir,
que encontramos o ponto nodal do postulado da proporcionalidade.
Alexy sob à égide da razão prática, procurou desenvolver uma análise mais apurada
sobre a incidência dos princípios na resolução dos conflitos.
Teoria prescritiva da argumentação: Robert Alexy apresentou uma vasta teoria prescritiva da
argumentação. Ele distingue entre regras de justificação interna de uma sentença e regras de
justificação externa. Na justificação interna, trata-se de saber se a sentença é o resultado
lógico das premissas mencionadas na fundamentação da sentença. Na justificação externa,
devem ser formuladas as regras que devem garantir a correção das premissas (interpretação
semântica, histórica e teleológica).
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR. Direito Constitucional (teoria, história e métodos de trabalho) Daniel Sarmento.
Lógico: parte-se do pressuposto de que a conexão de uma expressão normativa com as demais
do contexto é importante para a obtenção do significado correto.
52
Sistemático: é fruto da ideia de unidade do ordenamento jurídico. A CF deve ser interpretada
como um todo harmônico, em que nenhum dispositivo deve ser considerado isoladamente.
Teleológico: procura revelar o fim da norma, o valor ou bem jurídico visado pelo
ordenamento com a edição de dado preceito. “A ideia do fim não é imutável. O fim não é
aquele pensado pelo legislador, é o fim que está implícito na mensagem da lei. Como esta deve
acompanhar as necessidades sociais, cumpre ao intérprete revelar os novos fins que a lei tem
por missão garantir.” (NADER, fl. 280). De acordo com Müller, “a interpretação histórica e a
interpretação genética são subcasos da interpretação sistemática.” Ademais, “tanto a
interpretação sistemática quanto a interpretação teleológica têm por escopo a combinação de
vários, quando não todos os elementos de concretização sob a designação 'sistemáticos' ou
'teleológicos'.” (MÜLLER, p. 78) Por fim, não há hierarquia predeterminada entre os diferentes
critérios.
Na mesma linha, leciona Müller: “Por razões ligadas ao Estado de Direito, o possível sentido
literal circunscreve, não em último lugar no Direito Constitucional, o espaço de ação de uma
concretização normativamente orientada que respeita a correlação jusconstitucional das
funções. O teor literal demarca as fronteiras extremas das possíveis variantes de sentido, i.e,
funcionalmente defensáveis e constitucionalmente admissíveis. Outro somente vale onde o
teor literal for comprovadamente viciado.” (MÜLLER, p. 74).
Conflitos aparentes de normas e os critérios para sua solução: o conflito aparente de normas
resolve-se pela aplicação dos critérios da hierarquia, temporalidade e especialidade. Esses
critérios decorrem da interpretação sistemática, que compreende o ordenamento jurídico
como um todo dotado de unidade, evitando contradições internas. Critério hierárquico: norma
superior prevalece sobre a inferior. Critério cronológico: norma mais recente revoga a norma
mais antiga. Critério especialidade: norma especial não revoga a norma geral, mas cria uma
situação de coexistência, sendo aplicada no que for específica.
53
Antinomias de segundo grau (conflitos entre os critérios): a) entre o hierárquico e o
cronológico, prevalece o primeiro; b) entre o da especialidade e o cronológico, prevalece o
primeiro; c) entre o hierárquico e o da especialidade, não há uma prevalência a priori, porém,
“segundo Bobbio, dever-se- á optar, teoricamente, pelo hierárquico, uma lei constitucional
geral deverá prevalecer sobre uma lei ordinária especial, pois se se admitisse o princípio de que
uma lei ordinária especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princípios
fundamentais do ordenamento jurídico estariam destinados a esvaziar-se, rapidamente, de seu
conteúdo. Mas, na prática, a exigência de se aplicarem as normas gerais de uma Constituição
a situações novas levaria, às vezes, à aplicação de uma lei especial, ainda que ordinária, sobre
a Constituição. A supremacia do critério da especialidade só se justificaria, nessa hipótese, a
partir do mais alto princípio da justiça: 'suum cuique tribuere', baseado na interpretação de
que 'o que é igual deve ser tratado como igual e o que é diferente, de maneira diferente'.”
(DINIZ, p. 475-476).
Jurisprudência dos conceitos: até início do sec XX, buscava construir um ordenamento
sistemático e unitário, sem deixar espaço para a criação judicial do Direito. Porém, a criação do
sistema não caberia ao legislador, mas à ciência do direito, por meio da formulação de
conceitos jurídicos altamente abstratos. Ênfase no direito privado.
Jurisprudência dos interesses: após início do sec XX, sustentava a necessidade de proteção dos
interesses materiais subjacentes às normas, mas sem se afastar do positivismo, abria mais
espaço para o desenvolvimento do direito diante das necessidades sociais. Ênfase no direito
privado.
Virada Kantiana: foi o retorno da ética normativa ao campo das reflexões dos pensadores. A
primeira metade do século XX foi marcada pelo relativismo ético. Com o crescente pluralismo
da sociedade passaram a coexistir diferentes concepções sobre justiça. O relativismo passou a
ser questionado após a 2ª guerra, assim, a preocupação com a justiça nas relações políticas e
sociais se dissemina, sobretudo com a consagração de direitos humanos e formulação de
princípios abstratos de justiça, sem apelo ao discurso religioso ou metafísico.
54
Giro linguistico: provocou uma mudança profunda na maneira como se concebe o
conhecimento, envolvendo uma ruptura com o modelo cartesiano, que se baseava numa
rígida separação entre sujeito e objeto. O foco, antes centrado na consciência do sujeito, se
desloca para a comunicação intersubjetiva, mediada pela linguagem.
No cenário atual, são diversas as correntes que buscam fornecer métodos ou critérios para a
busca da melhor resposta em cada caso jurídico controvertido. Esta é uma característica do
pós-positivismo, expressão genérica que congrega uma série de concepções jurídicas
diferentes, que tem em comum a rejeição, tanto ao formalismo, como ao reconhecimento da
plena discricionariedade do intérprete nos casos difíceis.
No novo marco, a interpretação jurídica se abre para a influências de outros domínios, como a
filosofia, política, sociologia e economia. Ela se torna mais complexa incorporando novos
instrumentos, como as teorias da argumentação (procedimentos baseados na comunicação
intersubjetiva para busca de melhores soluções), a ponderação de interesses e a reabilitação
da razão prática (razão voltada para a ação).
Já há, porém, uma reação do formalismo a essas concepções diante da hegemonia dessas
posições pós-positivistas na interpretação jurídica. Trata-se, no entanto, de um formalismo
mais sofisticado, que entende que intérpretes mais disciplinados, que não se enveredem nas
complexas operações intelectuais preconizadas pelas teorias do pós-positivismo, podem gerar,
no cômputo geral, soluções melhores e por isso, o formalismo deve ser adotado, pelo menos
em determinados contextos.
55
corpo normativo da CR/88. O conflito entre princípios constitucionais não pode ser reputado
uma singela antinomia jurídica. É que a teoria das antinomias jurídicas foi desenvolvida com
base na interpretação jurídica tradicional, que tem como principal instrumento de trabalho a
figura normativa da regra. Com efeito, os critérios clássicos de resolução das antinomias
jurídicas foram desenvolvidos para solucionar o problema do conflito entre regras jurídicas, e
não entre princípios jurídicos.
Com relação ao critério cronológico, é óbvio não se prestar à solução das tensões
constitucionais, uma vez que as normas da CR são editadas em um único momento, com a
promulgação da Lei Maior. A única exceção possível é representada pelas emendas
constitucionais, que são editadas após o advento da Constituição. É possível que uma emenda
introduza um novo princípio constitucional, que se afigure total ou parcialmente incompatível
com outro princípio albergado no texto originário da Lei Maior. Nesse caso, o novo princípio
poderá revogar, no todo ou em parte, o cânone anterior com ele inconciliável, desde que este
não consubstancie cláusula pétrea. Caso, porém, trate-se de cláusula pétrea, prevalecerá,
para a solução do caso, o critério hierárquico, o que desencadeará a rejeição, por
inconstitucionalidade, do princípio instituído pela emenda constitucional.
56
todas as regras e princípios que albergados na norma fundamental, ainda que potencialmente
conflituosos entre si.
Por fim, a solução de uma antinomia real é feita pelo intérprete autêntico, com a
utilização da analogia, dos costumes, dos princípios gerais de Direito e da doutrina, nos termos
do art. 4 da Lei de Introdução ao Código Civil. Defende-se, ainda, no caso de princípios
constitucionais, a utilização da técnica de ponderação de interesses.
a) FORMALISMO JURÍDICO (século XIX): marcado pela concepção mecanicista do Direito, pela
qual a interpretação jurídica seria uma atividade acrítica de subsunção. Pregava o apego à
literalidade do texto legal e à intenção do legislador, e via com desconfiança o Judiciário, ao
qual não reconhecia a possibilidade de qualquer atividade criativa. Exemplos do formalismo
jurídico foram a ESCOLA DA EXEGESE (França) e a JURISPRUDÊNCIA DOS CONCEITOS
(Alemanha).
b) REAÇÃO ANTIFORMALISTA: capitaneada por Rudolph von Ihering, para quem a verdade
subjacente aos conceitos jurídicos era relativa. Dentre os movimentos desenvolvidos sob esse
estandarte podem ser citados: o Movimento para o Direito Livre, na Alemanha, e o REALISMO
JURÍDICO, nos EUA e na Escandinávia. Essas Escolas de pensamento tinham como
características comuns: a) reação à crença de que o Direito poderia ser encontrado
integralmente no texto legal e nos precedentes judiciais; b) rejeição da tese de que a função
jurisdicional seria meramente declaratória, reconhecendo que em diversas situações o juiz
desempenha um papel criativo; c) reconhecimento da importância dos fatos sociais, das
ciências sociais e da necessidade de interpretar o Direito de acordo com a evolução da
sociedade e visando à realização de suas finalidades.
c) POSITIVISMO JURÍDICO: aparece na virada do século XIX para o XX. Com a pretensão de
criar uma ciência do Direito objetiva e neutra, o positivismo compartilhou muitas das
premissas teóricas do formalismo, caracterizando-se pela separação entre o Direito e a Moral,
entre a lei humana e o direito natural. Nada obstante, nas formulações mais sofisticadas
desenvolvidas ao longo do século XIX, como a Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, e O
conceito de Direito, de Herbert Hart, afastou-se da perspectiva estritamente mecanicista.
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Assim, mostra-se como um ponto intermediário entre o formalismo jurídico e o anti-
formalismo.
Nas palavras de Daniel Sarmento, “Segundo essa Escola, todo o Direito estaria
compreendido no sistema composto pelas normas ditadas pelo legislador, e o papel do
intérprete se resumiria a fazer com que a vontade legislativa, gravada nos textos legais,
incidisse nos casos concretos. Não se concebia, portanto, que a interpretação operasse
construtivamente”.
Formulada por Puchta, para quem a norma escrita deve refletir conceitos, quando de
sua interpretação. Derivada do formalismo jurídico, foi a precursora da ideia de que o direito
provém de fonte dogmática, imposição do homem sobre o homem e não consequência
natural de outras ciências ou da fé metafísica. Entre as principais características da
jurisprudência dos conceitos estão: o formalismo, com a busca do direito na lei escrita; a
sistematização; o Direito deveria, prevalentemente, ter base no processo legislativo. Sarmento
explica que “A Jurisprudência dos Conceitos também buscava construir um ordenamento
sistemático e unitário, sem deixar espaço para a criação judicial do Direito. Porém, a
construção do sistema não caberia ao legislador, mas à Ciência do Direito, por meio da
formulação de conceitos jurídicos altamente abstratos.
Para essa Escola, a norma escrita deve refletir interesses, quando de sua interpretação.
Seu principal representante foi Philipp Heck. Na jurisprudência dos interesses, interpreta-se a
norma, basicamente, tendo em vista as finalidades às quais esta se destina. É uma teoria de
interpretação do direito que, sem superar o positivismo (Questão nº 4, prova objetiva do 29º
CPR), busca a proteção dos interesses materiais subjacentes à norma. “Neste quadro, a
tendência na hermenêutica jurídica foi de superação do formalismo, com a adoção de novas
perspectivas, como a “jurisprudência dos interesses” (Interessenjurisprudenz), de Philipp Heck,
58
que sustentava a necessidade de proteção dos interesses materiais subjacentes às normas,
com maior atenção para o mundo real, dedicando atenção a temas como as lacunas do
ordenamento e a sua integração. Assim, sem se afastar do positivismo, a jurisprudência dos
interesses abria mais espaço para o desenvolvimento do Direito diante das necessidades
sociais. Outras correntes do pensamento jurídico iam ainda mais longe, rompendo
radicalmente com o formalismo e adotando posições diametralmente opostas às suas."
SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional. Teoria, história e
métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 394. (Pág 324 Livro em PDF)
Por esses motivos, Habermas conclui que: "A transformação conceitual de direitos
fundamentais em bens fundamentais significa que direitos foram mascarados pela teleologia,
escondendo o fato de que em um contexto de justificação, normas e valores têm diferentes
papéis na lógica da argumentação. Porque normas e princípios, em virtude do seu caráter
deontológico, podem pretender ser universalmente obrigatórios e não apenas especialmente
preferíveis, eles possuem uma maior força de justificação que os valores. Valores devem ser
postos em uma ordem transitiva com outros valores, caso a caso. Como não há padrões
racionais para isso, esse sopesamento acontece arbitrariamente ou sem maior reflexão, de
acordo com os padrões e hierarquias costumeiras. A partir do momento em que uma corte
constitucional adota a doutrina de uma ordem objetiva de valores e fundamenta seu processo
de decisão em uma forma de realismo ou convencionalismo moral, o perigo de decisões
irracionais cresce, porque os argumentos funcionais ganham precedência sobre os normativos.
Certamente, há vários princípios ou bens coletivos que representam perspectivas cujos
argumentos podem ser introduzidos em um discurso jurídico em casos de colisão de normas
[...]. Mas argumentos baseados em tais bens e valores coletivos apenas contam na mesma
medida que as normas e princípios pelas quais esses objetivos podem, a seu turno, ser
justificados. Em última instância, apenas direitos podem ser invocados em um jogo
argumentativo. [...] Um julgamento orientado por princípios precisa decidir qual pretensão e
qual ação em um dado conflito é correta - e não como ponderar interesses ou relacionar
59
valores. [...] A validade jurídica do julgamento tem o caráter deontológico de um comando, e
não o caráter teleológico de um bem desejável que nós podemos alcançar até um certo nível."
VII. Neoformalismo
60
documentos repletos de normas impregnadas de elevado teor axiológico, que contêm
importantes decisões substantivas e se debruçam sobre uma ampla variedade de temas que
outrora não eram tratados pelas constituições, como a economia, as relações de trabalho e a
Família.
Para o neoconstitucionalismo, não é racional apenas aquilo que possa ser comprovado
de forma experimental. A ideia de racionalidade jurídica aproxima-se da ideia do razoável, e
deixa de se identificar à lógica formal das ciências exatas. A leitura clássica do princípio da
separação de poderes, que impunha limites rígidos à atuação do Judiciário, cede espaço a
outras visões mais favoráveis ao ativismo judicial em defesa dos valores Constitucionais. No
lugar de concepções estritamente majoritárias do princípio democrático, são endossadas
teorias de democracia mais substantivas, que legitimam amplas restrições aos poderes do
legislador em nome dos direitos fundamentais e da proteção das minorias, e possibilitem a sua
fiscalização por juízes não eleitos.
Ao invés de uma teoria das fontes do Direito focada no código e na lei formal, enfatiza-
se a centralidade da Constituição no ordenamento, a ubiquidade da sua influência na ordem
jurídica, e o papel criativo da jurisprudência. Ao reconhecer a força normativa de princípios
revestidos de elevada carga axiológica, como dignidade da pessoa humana, a igualdade e
solidariedade social, o neoconstitucionalismo abre as portas do Direito para o debate moral. É
aqui que reside uma das maiores divergências internas no neoconstitucionalismo.
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR; Direito constitucional (teoria, história e métodos de trabalho) Daniel Sarmento.
61
Daniel Sarmento argumenta em artigo (“O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e
possibilidades”) que o Direito brasileiro vem sofrendo mudanças profundas nos últimos
tempos, relacionadas à emergência de um novo paradigma tanto na teoria jurídica quanto na
prática dos tribunais, que tem sido designado como "neoconstitucionalismo", e sintetiza como
um dos fenômenos a reaproximação entre o Direito e a Moral, com a penetração cada vez
maior da Filosofia nos debates jurídicos.
Diz o mesmo autor: “Neste cenário, há espaço tanto para visões comunitaristas, que buscam
na moralidade positiva e nas pré-compreensões socialmente vigentes o norte para a
hermenêutica constitucional, endossando na seara interpretativa os valores e cosmovisões
hegemônicos na sociedade, como para teorias mais próximas ao construtivismo ético, que se
orientam para uma moralidade crítica, cujo conteúdo seja definido através de um debate
racional de idéias, fundado em certos pressupostos normativos, como os de igualdade e
liberdade de todos os seus participantes.”
Pré-compreensões: Envolve não apenas a concepção particular de mundo do intérprete, mas,
sobretudo, os valores, tradições e preconceitos da comunidade em que ele está inserido. É o
ponto de partida para o ingresso no circulo hermenêutico, em que o intérprete antecipa uma
solução. Sarmento critica corrente que defende a fidelidade à pré-compreensão como
caminho para busca da melhor resposta, recusando qualquer recurso ao método, por 3 razões:
1) mundo contemporâneo é plural, com diferentes concepções de mundo conflitantes, 2) as
tradições e práticas sociais estão impregnadas de opressão e assimetria, 3) o método é
indispensável para controle do arbítrio do intérprete. Assim, reconhece a pré-compreensão
como integrante de qualquer atividade interpretativa, mas os intérpretes devem exercer
permanente crítica às tradições e autocrítica em relação as respectivas cosmovisões.
Hans-Georg Gadamer, importante filósofo alemão (em sua obra Verdade e Método, publicada
pela primeira vez em 1960, na qual o autor desenvolve uma hermenêutica filosófica – em
contraposição à Shleiermacher), apresentou uma nova visão da hermenêutica, a denominada
hermenêutica contemporânea, que não se subjuga a regras metódicas das ciências humanas, e
tece uma perspectiva crítica da metafísica (aquilo que se encontra além daquilo que é físico,
palpável, acima do sensível). De acordo com Gadamer, a hermenêutica é um campo da
filosofia, que além de possuir um foco epistemológico, também estuda o fenômeno da
compreensão por si mesmo...”.
Em sua obra, Gadamer afirma que: “E mesmo aquele que ‘compreende’ um texto (ou mesmo
uma lei) não somente projetou-se a si mesmo a um sentido, compreendendo – no esforço do
compreender – mas que a compreensão alcançada representa o estado de uma nova liberdade
espiritual”. Para o autor, ao interpretar um texto, o intérprete investiga a sua pré-
compreensão tanto quanto o texto em si, ou seja, insere-se pré-conceitos erigidos da atual
sociedade, afastando-se apenas duma interpretação textual. O processo de interpretação
envolve não somente as pré-compreensões do intérprete, exigindo também que este interaja
com o que está sendo interpretado, em suas palavras: “O intérprete, pois, deve permitir que o
texto lhe diga algo por si, sem lhe impor a sua pré-compreensão”.
62
De acordo com a teoria de Gadamer, as pré-compreensões – preconceitos – são condições
para a compreensão e devem ser analisadas em sua dimensão positiva. Não se pode dissociar
a ciência e a tradição histórica, não havendo possibilidade de existir ciência desprovida de
preconceitos. Refere o autor que: “Toda vivência implica os horizontes do anterior e do
posterior e se funde, em última análise, com o continuum das vivências presentes no anterior e
posterior na unidade da corrente vivencial”. Com a compreensão atingida com a análise das
pré-compreensões, possibilita-se a quebra de paradigmas e a efetivação da permanente
renovação do saber. O Supremo Tribunal Federal tem superado algumas pré-concepções
permitindo o aborto de fetos anencéfalos - sendo que no voto vencedor afirma-se que não se
trata de aborto propriamente dito -, a união homoafetiva, e a utilização de células tronco em
pesquisas e etc.
Moral positiva: para Hart, é aquela moralidade compartilhada pela maior parte dos indivíduos
que formam uma sociedade determinada. Em linhas gerais, essa moral possuiria diferentes
formas de aplicação, como (a) formas de se vestir, dormir, etc, que são habituais; (b)
atividades como o jogar e o se divertir, que são aleatórias no tempo. Algumas normas morais
positivas, quando transgredidas, podem dar lugar a uma advertência, a uma censura, à
exclusão ou ao desapreço coletivo.
Outro conceito é a nomenclatura sugeria por John Austin em 1832, para o qual "moralidade
positiva" é o conjunto de ideias, valores, e práticas morais de uma determinada sociedade, em
uma época de terminada. A moralidade positiva se distingue da lei positiva, na medida em que
ela não é estabelecida por uma autoridade política. Ela diz respeito, antes, ao sentimento de
aprovação ou desaprovação de uma determinada comunidade com relação a certos tipos de
comportamento.
Por outro lado, a moralidade positiva se distingue também da lei divina (ou lei natural), na
medida em que ela diz respeito a um conjunto de regras efetivamente adotadas por uma
comunidade, independentemente do fato de essas regras estarem ou não de acordo com a lei
divina. Segundo Austin as leis da moralidade positiva são denominadas de “leis” no sentido
“impróprio” deste termo. Trata-se de um sentido impróprio, pois falta às leis da moralidade
positiva uma instância superior com o poder de impor algum tipo de penalidade no caso da
violação deste tipo de lei.
A moralidade positiva é um corpo de doutrinas, a que um conjunto de indivíduos adere
geralmente, que dizem respeito ao que é correto e incorreto, bom e mau, com respeito ao
caráter e à conduta. Os indivíduos podem ser os membros de uma comunidade (por exemplo,
a ética dos índios Hopi), de uma profissão (certos códigos de honra) ou qualquer outro tipo de
grupo social.
Moral crítica (ou ideal): para Hart, se refere aos princípios obtidos racional ou reflexivamente
para criticar às próprias ações ou as ações coletivas (a moral positiva). Diferente da moral
positiva, a mor al crítica corresponde ao raciocínio moral da pessoa, de modo que não é guiada
por reações sociais. Muitos usam a distinção entre “moralidade positiva” e “moralidade
crítica” para marcar a diferença fundamental entre o que a maioria entende como moralmente
correto e aquilo que uma versão crítica e reflexiva da moralidade existente poderia defender.
Identificar e descrever uma certa moralidade não implica em aceitá-la acriticamente. Um
exemplo eloquente é a vedação constitucional da pena de morte no Brasil. Não seria absurdo
supor que a maioria da população brasileira apoiaria uma lei propondo a pena capital. Mas o
poder do legislador (e da soberania popular) está limitado pela cláusula constitucional. Mesmo
63
se houvesse comprovação empírica dos benefícios de tal pena extrema (coisa que não existe),
o princípio constitucional prevaleceria sobre o poder legislativo.
A moralidade positiva, evidentemente, pode estar ela própria subordinada à crítica moral, pois
frequentemente endossamos, reconsideramos, ou mesmo abandonamos inteiramente as
ideias, valores, e práticas morais de épocas passadas. Hart diz que o legislador, ao ditar a lei,
deve valorar racionalmente quais são os fundamentos da moral positiva vigente, e em seu caso
atuar contra o majoritariamente desejado. Se não for assim, deduz Hart, se confundiria a
democracia como forma de governo com um populismo moral, segundo o qual a maioria da
população teria direito a estabelecer como devem viver os demais.
Sarmento afirma que o discurso constitucional não pode se divorciar completamente dos
valores comunitários, sob pena de perda de legitimidade da Constituição, porém, numa
sociedade ainda hierárquica, racista e homofóbica como a nossa, prescrever para o intérprete
a obediência cega aos valores comunitários significaria chancelar o status quo, contra o qual o
constitucionalismo democrático deve se insurgir. Por isso, propõe que o intérprete não ignore
as tradições e a moralidade positiva, mas busque os elementos mais emancipatórios dessas
fontes (aporte reconstrutivo), para que sejam lidas sob a sua "melhor luz". Reconhece que a
maior permeabilidade da interpretação constitucional a juízos morais envolve riscos, sendo o
maior deles, que os juízes imponham os seus próprios valores aos poderes eleitos e ao povo.
Destaca 2 maneiras de minimizar esse risco: 1) recusar a ideia de monopólio interpretativo
judicial ao Supremo; 2) cobrança de maior rigor metodológico na interpretação constitucional.
Oswaldo Costa
A Constituição é uma norma fragmentaria, que não trata de todos os temas, mas tão
somente daqueles escolhidos pelo poder constituinte, pela sua singular importância, ou por
outras razões atinentes à conveniência de seu entrincheiramento. Mesmo nestes temas, a
Constituição, no mais das vezes, não exaure a respectiva disciplina, mas apenas fixa as suas
principais coordenadas normativas, deixando a complementação para o legislador.
II. Analogia
64
A analogia consiste em técnica para colmatação de lacunas por meio da qual se aplica à
hipótese não regulada uma norma jurídica que trata de questão similar. A norma em questão
não seria inicialmente aplicável ao caso, que não está compreendido na sua hipótese de
incidência. Mas, diante da lacuna, ela incide, para resolvê-lo. O principal fundamento da
analogia é a igualdade, pois se parte da premissa de que hipóteses simulares devem receber o
mesmo tratamento do ordenamento.
III. Costumes
O costume também é uma fonte do Direito, que não se esgota nas normas jurídicas
produzidas pelo Estado. O costume contribui para a abertura do sistema jurídico,
intensificando a sua conexão com a realidade social subjacente. A doutrina, em geral,
caracteriza o costume jurídico pela confluência de dois elementos: o elemento objetivo, que é
a repetição habitual de um determinado comportamento; e o elemento subjetivo, que é a
consciência social da obrigatoriedade desse comportamento. A doutrina aponta como exemplo
de costume constitucional no Brasil a aprovação de algumas leis, de caráter mais consensual,
por meio do chamado “voto de liderança”.
IV. Equidade
65
Esta reticência do nosso legislador infraconstitucional em relação à equidade se explica
diante do predomínio, até não muito tempo atrás, de uma concepção jurídica formalista.
Contudo, ao longo do século passado, floresceram, em diferentes contextos históricos e com
impostações político-filosóficas heterogêneas, várias correntes que valorizaram ao extremo a
liberdade decisória do juiz na busca da solução mais justa ou adequada para casa caso, como a
Escola do Direito Livre na França, o realismo jurídico norte-americano, a tópica jurídica alemã,
e, no Brasil, algumas versões do movimento conhecido como “Direito Alternativo”. Tais
correntes, contudo, incorreram em excessos, por não atribuírem a importância devida à
exigência de previsibilidade e segurança jurídica, inerente ao Estado de Direito, nem tampouco
à necessidade de legitimação democrática do processo de criação do Direito.
I. Introdução
Nas palavras de Chaves e Rosenvald, “toda vez que o intérprete não localizar no
sistema jurídico norma aplicável ao caso concreto, verifica-se uma lacuna que necessita de
preenchimento, colmatação. É que tem guarida entre nós a vedação ao non liquet. A própria
lei (LINDB, art.4⁰), partindo da real possibilidade de omissão normativa, indica os meios pelos
quais serão supridas as lacunas”. Note-se que, “a integração das normas serve para colmatar
as lacunas do sistema, mas não tem caráter normativo (obrigatório), não vinculando outras
decisões em casos análogos”.
66
decisões contrárias a seus postulados fundamentais”.
“Dos velhos princípios gerais do Direito Romano (suun cuique tribuere, honeste vivere
e neminem laedere, isto é, dar a cada um o que é seu, viver honestamente e não lesar
ninguém) extrai-se um substrato mínimo do que o ordenamento reputa fundamental em
termos axiológicos, independentemente de expressa previsão legal. São os chamados
princípios informativos que inspiram todo o sistema jurídico sem prender-se ao texto
normativo”.
Finalmente, “a previsão para a aplicação dos princípios gerais de direito, na omissão da lei,
vem encartada em diversos ordenamentos jurídicos, como no Direito português (CC, art. 1⁰),
no Direito espanhol (CC, art. 1⁰) e no Direito argentino (CC, art. 16)”.
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR; Direito Constitucional (teoria, história e métodos de trabalho), Daniel Sarmento.
Meio gramatical: o primeiro ao qual se recorre. Leva em conta o sentido das palavras (via de
regra, seu sentido ordinário; em alguns casos, seu sentido técnico/científico), ex: "imposto",
"licitação", "direito adquirido".
Meio sistemático: leva em conta o ordenamento jurídico como um todo, partindo da premissa
de que ele é harmônico e lógico. Ex.: “quem pode mais, pode menos”. O "sistema" é uma
construção hermenêutica, apoiada nos princípios constitucionais fundamentais que lhe
proveem bases moralmente sustentáveis. Dá origem, no campo constitucional, aos postulados
da unidade da constituição e da concordância prática (Sarmento).
Meio histórico: intenção do legislador ao elaborar a lei. Sarmento informa que a importância
do elemento histórico é inversamente proporcional ao tempo decorrido desde a edição da
norma constitucional.
Meio teleológico: Busca a finalidade subjacente ao preceito a ser interpretado.
67
otimização, devendo ser aplicados na maior intensidade possível. Podem ter (a) eficácia direta
– positiva, simétrica, quando se aplica sobre os fatos à semelhança de uma regra;
(b) eficácia interpretativa – para fixar a correta interpretação das normas em geral; (c) eficácia
negativa – invalidade da interpretação contrária;
Colisões entre normas constitucionais – o intérprete cria a norma jurídica para a resolução do
caso a partir dos dados fáticos e das balizas normativas por meio de ponderação, em que fará
concessões recíprocas – concordância prática – procurando preservar ao máximo o conteúdo
dos interesses em conflito; ou, no limite, escolherá qual prevalecerá no caso, à luz da
razoabilidade (que normalmente é um “instrumento para a medida”, a par de às vezes
fornecer um critério material). Esquema da ponderação: (a) Selecionar as normas relevantes e
identificar eventuais conflitos; (b) examinar os fatos e sua interação com os elementos
normativos; (c) ponderar os pesos a serem atribuídos aos elementos normativos e fáticos
envolvidos para decidir qual grupo de normas deve prevalecer no caso e, se for possível,
graduar a intensidade da solução escolhida. A ponderação é vista como integrante da
proporcionalidade ou como princípio autônomo;
Argumentação jurídica – quando é feita ponderação, aumenta-se a exigência de rigor na
argumentação (justificação), segundo uma “razão prática”, ou seja, a argumentação deve ser
racional levando-se em conta o caso concreto a ser resolvido. Para tanto, deve o intérprete: (a)
fundamentar-se em norma jurídica; (b) manter a integridade do sistema (poder generalizar a
norma criada para casos equiparáveis); (c) considerar as consequências práticas no mundo
fenomênico (Barroso, 2010).
68
Método jurídico-estruturante: a norma não se confunde com o seu texto, mas tem a sua
estrutura composta também pelo trecho da realidade social em que incide, sendo esse
elemento indispensável para a extração do significado da norma. Não é o teor literal da norma
(seu texto) que efetivamente regulamenta um caso concreto, mas sim o órgão legislativo, o
órgão governamental, o funcionário da administração pública, os juízes e todos aqueles que
elaboram, decidem e fundamentam a decisão reguladora do caso concreto.
Razões públicas: a ideia de razões públicas, desenvolvida por John Raws, tem origem na
filosofia kantiana. Informa que na esfera pública só são admissíveis argumentos independentes
de doutrinas religiosas ou metafísicas controvertidas, que possam ser racionalmente aceitos
pelos demais. O argumento (ex religioso), para adentrar o debate deve primeiro ser traduzido
para "razões públicas".
Cosmopolitismo: ideias constitucionais migram entre os países, devendo ser levadas em conta
na interpretação (embora não sejam vinculantes). Sarmento afirma que tal princípio impõe
que se atribua o devido peso argumentativo a fontes transnacionais na interpretação da
constituição.
Presunção graduada de constitucionalidade: a lei passa por diversos filtros antes de ser
aprovada, de modo que há a presunção relativa de sua constitucionalidade.
69
Além da interpretação constitucional, há a lacuna constitucional, que deve ser preenchida
(processo de integração, e não de interpretação). Isso ocorre quando há reserva de
constituição, ou seja, um determinado assunto pode ser tratado apenas pela Constituição.
Ante o non liquet, cabe ao juiz preenchê-la, pelos seguintes meios:
Analogia: aplica-se à situação não regulada norma jurídica que trata de questão similar.
Costume constitucional: Há a prática e a crença de que esta é vinculante. Ex.: voto de liderança
(o líder vota pela bancada inteira) para a aprovação de leis. Isso não está previsto na CF. É
judicialmente exigível e pode fundamentar o controle de constitucionalidade.
Convenção constitucional: existem práticas que são consideradas obrigatórias, mas estas não
são judicialmente exigíveis. As consequências pelo descumprimento são políticas.
Equidade: não pode gerar a anulação de certas normas. A equidade é uma dimensão da
razoabilidade, por meio da qual se adapta o direito vigente, buscando retificar injustiças ou
inadequações mais graves. Pode ser usada para colmatar lacunas ou temperar,
excepcionalmente, o rigor das regras constitucionais.
Por fim, ressalte-se que os métodos de interpretação e integração constitucional não podem
ser hierarquizados e não se excluem. Pelo contrário, devem ser utilizados de forma adequada a
cada situação, para se buscar a melhor solução ao caso concreto
Oswaldo Costa
I. Cosmopolitismo
70
Häberle sustenta a canonização da comparação constitucional como um quinto
método de interpretação constitucional, além dos quatro desenvolvidos por Savigny
(gramatical, lógico, histórico e sistemático). Para ele, a interpretação dos institutos se
implementa mediante comparação nos vários ordenamentos jurídicos. Assim, o Estado
constitucional cooperativo deve substituir o Estado constitucional nacional. Para isso, o
recurso ao direito comparado e às normas e jurisprudência internacionais deve ser empregado
como método de interpretação, de modo a promover a abertura da sociedade para fora. Eis o
que requer a interpretação pluralista da Constituição, para moldar uma cidadania que combina
a igualdade de oportunidades com respeito à diferença, superando a cidadania
homogeneizante e negadora das diferenças: abertura para dentro, isto é, o reconhecimento da
sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – todos os que vivem a norma, e não só os
juízes constitucionais, acabam por interpretá-la ou pelo menos co-interpretá-la – abertura ao
mundo (ou cooperação), isto é, a interpretação do texto constitucional como aberto,
cooperante e integrante de uma rede de outros textos constitucionais e internacionais com o
mesmo propósito (especialmente no âmbito dos direitos fundamentais).
V. Interconstitucionalismo
71
constitucionais “migram”. Há uma positiva troca de experiências, conceitos e ideias entre
cortes nacionais e internacionais, com a possibilidade de aprendizado recíproco entre as
instâncias envolvidas nesse diálogo – fertilização cruzada.
De ser percebido, ainda, que as colisões podem envolver tipos de normas constitucionais
diferentes: há colisões entre princípios, entre regras, e entre princípio e regra, apresentando,
cada uma dessas hipóteses, singularidades próprias.
No que diz respeito aos princípios, são determinações para que específico bem jurídico seja
satisfeito e protegido na maior medida que as circunstâncias permitirem. São mandados de
otimização, já que impõem que sejam realizados na máxima extensão possível. A
normatividade dos princípios é, nesse sentido, provisória, potencial, com virtualidades de se
adaptar à situação fática, na busca de uma solução ótima. Por tal razão, tem-se por factível
que um princípio seja aplicado em graus diferenciados, conforme o caso que o atrai, sendo
perfeitamente possível a coexistência, ainda que aparentemente conflitantes.
72
2. Tipos de Colisão
3. A ponderação.
Conceito: técnica destinada a resolver conflitos entre normas válidas e incidentes sobre um
caso, que busca promover, na medida do possível, uma realização otimizada dos bens jurídicos
em confronto. Consiste em uma técnica de decisão jurídica aplicável a casos difíceis (hard
cases), em relação aos quais a subsunção se mostrou insuficiente, sobretudo quando uma
situação concreta dá ensejo à aplicação de normas de mesma hierarquia que indicam soluções
diferenciadas. Assim, a técnica em questão envolve a identificação, comparação e eventual
restrição de interesses contrapostos envolvidos numa dada hipótese fática, com a finalidade
de encontrar uma solução juridicamente adequada.
Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento sustentam que os parâmetros utilizados para
fins da aplicação da ponderação devem ser inferidos do sistema constitucionais e não da mera
discricionariedade do intérprete, a partir do que destacam os seguintes:
2 Ex: decisão de dois grupos adversos de realizar uma demonstração na mesma praça pública.
4 Ex: concessão de auxílio aos hipossuficientes, indaga-se sobre a dimensão fática ou jurídica do princípio da igualdade.
5 Ex: Colisão entre a liberdade de informação jornalística e o direito à intimidade de um preso que não queira ser identificado pelo repórter policial.
73
Quem efetiva a Ponderação: contrariamente ao senso comum, que não é apenas o Poder
Judiciário que realiza ponderações entre interesses constitucionais contrapostos. O Legislativo
e a Administração Pública também o fazem, e até mesmo particulares, quando têm de
resolver, no âmbito das suas atividades, colisões entre normas constitucionais. De fato, numa
democracia, quem tem a primazia na ponderação é o legislador que, ao regulamentar as mais
diferentes matérias, deve levar em consideração as exigências decorrentes de normas e
valores constitucionais por vezes conflitantes e que, dentro da margem que possui, a decisão
do legislador não deve ser invalidada pelo Judiciário.
No que diz respeito à ponderação em âmbito judicial, pode ocorrer em três contextos
diferentes. No primeiro, o Poder Judiciário é provocado para analisar a validade de uma
ponderação já realizada por terceiros – em geral, pelo legislador – o que pode ocorrer tanto
em sede de controle abstrato de normas quanto na análise de caso concreto. No segundo,
existe um conflito entre normas constitucionais, mas não há nenhuma ponderação prévia
realizada por terceiros. Na terceira hipótese, o próprio legislador infraconstitucional remete ao
Judiciário a tarefa de avaliar, em cada caso concreto, a solução correta para o conflito entre
interesses constitucionais colidentes, seguindo determinadas diretrizes, pressupostos e
procedimentos que ele fixou.
Segundo passo - exame dos fatos, das circunstâncias concretas do caso e sua interação com
os elementos normativos.
Terceiro passo - diante da certeza da existência de normas em tensão no caso, ganha azo a
fase da ponderação propriamente dita, cujo fio condutor a ser empregado para a sua
realização é o princípio da proporcionalidade com os seus três subprincípios.
4. O Princípio da Proporcionalidade
74
O princípio da proporcionalidade não é útil apenas para verificar a validade material de atos do
Poder Legislativo ou do Poder Executivo que limitem direitos fundamentais, mas também para,
reflexivamente, verificar a própria legitimidade da decisão judicial, servindo, nesse ponto,
como verdadeiro limite da atividade jurisdicional. O juiz, ao concretizar um direito
fundamental, também deve estar ciente de que sua ordem deve ser adequada, necessária (não
excessiva e suficiente) e proporcional em sentido estrito.
6
O Supremo Tribunal Federal utilizou o critério da necessidade para limitar a utilização de algemas pelas autoridades policiais,
editando a Súmula Vinculante nº 11 com esse propósito, tendo entendido que o uso de algemas seria “excepcional, somente
restando justificado ante a periculosidade do agente ou o risco concreto de fuga”.
75
Assim, quando o Estado se abstiver, total ou parcialmente, de adotar alguma medida que
favoreceria a promoção ou a proteção de um determinado direito fundamental ou objetivo de
envergadura constitucional, caberá a verificação da observância dos subprincípios acima
abordados.
7. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
7.1 Controle de constitucionalidade: evolução histórica do sistema brasileiro. Direito
comparado. Legitimidade democrática. (12.a)
7.2 Controle Concreto de Constitucionalidade. O Recurso Extraordinário. (16.c)
7.3 Controle abstrato de constitucionalidade: Ação Direta de Inconstitucionalidade. Ação
Direta de Inconstitucionalidade por omissão, Ação Declaratória de Constitucionalidade e
Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. (18.c)
7.4 Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Técnicas decisórias na jurisdição
constitucional. (22.b)
7.5 Inconstitucionalidade por omissão. Ação Direta e Mandado de Injunção. (25.b)
76
para o exercício de controle: 1. Supremacia da Constituição; 2. Rigidez da Constituição; 3.
Órgão competente para exercer o controle.
No Brasil:
Modelo americano (difuso e concreto) sob forte influência de Rui Barbosa. Dizia
1891 Rui Barbosa: “a judicial review é matéria de hermenêutica e não de legislação”
como forma de afastar o controle abstrato, que conferiria ao juiz um papel de
legislador.
77
após o golpe de 64, no que o PGR realizava, além da função de MP, a função da
AGU de hoje e era exonerável ad nutum: sendo assim, ele só proporia as
representações de inconstitucionalidade no interesse da União.
78
respondidas: a lei contrária é nula, o exame dever ser feito no caso concreto e
cabe ao judiciário resolvê-lo.
Austríaco Hans Kelsen sustentava que o controle de constitucionalidade significa o
exercício do papel de “legislador negativo” – controle político -, o que não
poderia ser realizada por qualquer juiz, mas por um órgão específico: o
Tribunal Constitucional. Tratava-se de controle concentrado e abstrato. Neste
sistema, vigia o “princípio da anulabilidade”, porque, para Kelsen, o sistema
não possui contradições, razão pela qual a decisão era constitutiva.
Francês Inicialmente, não havia controle: se uma lei é fruto do parlamento, é fruto dos
representantes do povo, é fruto da vontade majoritária do povo e é, por
natureza, democraticamente legítima, não cabendo ao juiz, que não é eleito,
invalidá-la. Posteriormente, foi instituído o controle político preventivo
através do Conselho Constitucional, que se dá sobre o Projeto de Lei – ainda
hoje realizado.
Muito recentemente, entre 2008 e 2010, surgiu a denominada “questão
prioritária de constitucionalidade”, que nada mais é do que a remessa de
questão para controle pelo Conselho Constitucional, uma vez admitida na
Corte de Cassação [Direito Privado] ou Conselho de Estado [Direito Público]. É
hipótese de controle político, incidental e repressivo.
79
16C. Controle concreto de constitucionalidade. O Recurso Extraordinário.
Origem: também denominado de controle difuso ou incidental, tem origem datada de 1803,
nos Estados Unidos, a partir do
prcedente “Marbury vs. Madison”,julgadopelo magistrado Marshal, no qual se compreendeu
que o judicial review compete a qualquer magistrado, diante de um caso concreto, com
decisão de efeitos ex tunc (retroativos). Em contraponto, o controle concetrado-abstrato, a
partir da formulação de Hans Kelsen, concebeu uma Corte Constitucional especializada para
exercer a função, invalidando a norma impugnada com efeitos apenas prospectivos (ex nunc).
No Brasil foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto n° 848/1890,
que criou a Justiça Federal, sendo, em seguida, consagrado na Constituição da República de
1891 e mantido em todas as constituições seguintes. Trata-se da incorporação do modelo
norte-americano em solo pátrio, a partir dos ensinamentos de Ruy Barbosa. Era, até a
Constituição da República de 1988, o controle predominante no sistema brasileiro.
Conceito: o controle difuso, repressivo ou posterior, é também chamado de controle pela via
de exceção ou incidental ou de defesa, sendo realizado por qualquer juízo ou tribunal do poder
judiciário. Verifica-se em um caso concreto, e a declaração de inconstitucionalidade dá-se de
forma incidental (incider tantum), prejudicialmente ao exame do mérito (a alegação de
inconstitucionalidade será a causa de pedir processual). A inconstitucionalidade pode ser
questionada em qualquer ação, desde que seja a causa de pedir e não o pedido da demanda.
Após algum dissenso, tal entendimento foi confirmado inclusive no que toca à Ação Civil
Pública, sendo reafirmado em diversos julgados das cortes superiores (ex. STJ, Resp
1.487.032/2015 - “É firme o entendimento do STJ no sentido de que a inconstitucionalidade
de determinada lei pode ser alegada em ação civil pública, desde que a título de causa de pedir
- e não de pedido –, como no caso em análise, pois, nessa hipótese, o controle de
constitucionalidade terá caráter incidental”). A questão da constitucionalidade deve ser
suscitada pelas partes ou pelo ministério público, podendo, ainda, vir a ser reconhecida de
ofício pelo juiz ou pelo tribunal.
Cláusula de reserva de plenário: originada na Constituição de 1934, impõe que, perante o
tribunal, a declaração de inconstitucionalidade somente poderá ser pronunciada pelo voto da
maioria absoluta de seus membros ou dos membros do órgão especial (art. 97, CF/88). É
também denominada de cisão funcional horizontal da competência, ou seja, o plenário apenas
aprecia a questão envolvendo a inconstitucionalidade e devolve o processo para o órgão
fracionário julgaro mérito; a decisãodo plenário é irrecorrível e vincula o órgão fracionário no
caso concreto, incorporando-se ao julgamento do recurso ou da causa como premissa
inafastável. Daniel Sarmento aduz que uma das justificativas para a referida cláusula é o
Princípio da presunção graduada de constitucionalidade dos atos normativos.
Súmula Vinculante 10: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão
fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei
ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte"; O mesmo
procedimento deve ser adotado no caso de interpretação conforme e de declaração parcial de
nulidade sem redução de texto. Entretanto, dispensa-se a remessa ao órgão especial ou pleno
do Tribunal correspondente se já houver pronunciamento destes ou do STF (art. 481, PU, CPC).
E, no caso do STF, há precedente no sentido de que a ele não se aplica o art. 97: “O STF exerce,
por excelência, o controle difuso de constitucionalidade quando do julgamento do recurso
extraordinário, tendo os seus colegiados fracionários competência regimental para fazê-lo sem
ofensa ao art. 97 da CF.” (RE 361.829-ED, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJE de 19-3-
2010).
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Participação do amicus curiae: o CPC, no art. 482, admite a manifestação, no incidente de inc
onstitucionalidade, do Ministério Público, das pessoas jurídicas responsáveis pela edição do
ato e dos titulares do direito de propositura de ADI. Faculta-se ao relator a possibilidade de
admitir, por despacho irrecorrível, a manifestação de outros órgãos ou entidades. A mesma
norma é reproduzida ainda em dispositivo legal que disciplina especificamente o controle
difuso de constitucionalidade, como é o caso do RExt – o CPC estabelece que o relator poderá
admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador
habilitado (art. 543-A, §6º).
Parâmetro de controle: o controle concreto de constitucionalidade pode se exercido em
relação a normas emanadas dos três níveis de poder, de qualquer hierarquia, inclusive as
anteriores à Constituição. (RE 148.754 e RE 269700)
Efeitos: A declaração de inconstitucionalidade no controle difuso produz efeitos, em regra, ex
tunc e inter partes. A inconstitucionalidade declarada como questão prejudicial não transita
em julgado (limite objetivo da coisa julgada), nem afeta terceiros estranhos ao processo (limite
subjetivo). A doutrina majoritária no Brasil situa a inconstitucionalidade no campo da nulidade,
em razão da supremacia da constituição. A decisão que a reconhece tem natureza
declaratória, e retroage até o nascimentodo ato viciado.Entretanto, o STF tem admitido, em
casos excepcionais, mitigação da retroação de efeitos, mediante ponderação de princípios e
aplicação analógica do art.27 da Lei 9868/99 (modulação temporal). Ex. Caso Mira Estrela. RE
197.917.
Abstrativização do controle difuso (objetivação, abstração, dessubjetivação das formas
processuais): o procedimento designado abstrativização do controle concreto, expressão
cunhada pelo doutrinador Fredie Didier Júnior, por ocasião da análise das transformações
ocorridas no Recurso Extraordinário, consiste na possibilidade de conferir efeitos erga omnes
adecisões proferidas em sede de controle difuso/concreto de constitucionalidade. Essa
possibilidade encontra amparo, inclusive, na própria Constituição:
(a) artigo 52, X, CRFB/88: compete privativamente ao Senado, por resolução, suspender a
execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do
Supremo Tribunal Federal; tem prevalecido o entendimento no sentido de que a resolução
tem eficácia ex nunc, embora Barroso sustente que deveria ser ex tunc, porque a norma é
inconstitucional desdeo início.
(b) ECn° 45/04 – art. 103-A,CRFB/88: após reiteradas decisões acerca da validade,
interpretação ou eficácia de uma norma sobre a qual paire controvérsia atual, judicial ou
administrativa, o STF pode editar súmula vinculante pelo voto de 2/3 dos seus membros, que
vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública. OBS: o STF não fica
vinculado à súmula, podendo, inclusive deofício,revisá-la ou cancelá-la.
(c) o STF importouprincípio de controleconhecido como transcendência dos motivos
determinantes (os motivos que fundamentam a declaração de inconstitucionalidade
extrapolam os limites da demanda para alcançar situações idênticas ou semelhantes). OBS. O
STF não adota essa Teoria, apesar de o Ministro Gilmar Mendes ser um de seus expoentes.
(d) repercussão geral (art. 102, §3°, CR): com a EC 45/04 (Reforma do Judiciário) mudou
radicalmente o modelo decontrole incidental, uma vez que os recursosextraordinários terão
de passar pelo crivo da admissibilidade referente à repercussão geral. Assim, com a adoção
desse novo instituto haverá uma maximização da feição objetiva do recurso extraordinário,
que passou a ser um instrumento de molecularização de julgamento em massa.
Art. 52, X, da CF/88 e mutação constitucional (Recl. 4335): Após uma sucessão de votos-vista
e quase sete anos, o STF concluiu em março de 2014 o julgamento em que se propôs a
rediscutir o papel do Senado Federal no domínio do controle incidental de constitucionalidade.
Confrontado com a decisão de um juiz que se recusava a seguir a orientação do STF em tema
relevante, mas fixada em habeas corpus, o relator, ministro Gilmar Mendes, propôs uma
releitura da matéria: o artigo 52, X teria passado por uma mutação constitucional, de modo
que todas as decisões tomadas pelo Plenário do STF no exercício da jurisdição constitucional
teriam, por si mesmas, eficácia geral e vinculante; a atribuição do Senado deixaria de ser a
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ampliação da eficácia e passaria a ser, tão somente, uma forma de conferir publicidade ao que
restou decidido. Tal orientação foi acompanhada pelo ministro Eros Grau, mas foi rejeitada
pelos ministros Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa, que endossavam a compreensão
tradicional. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Ricardo
Lewandowski, cujo voto posterior juntou-se à divergência e foi seguido por novo pedido de
vista, agora do ministro Teori Zavascki. Na retomada do julgamento, o ministro Teori procurou
construir um meio-termo. De início, destacou a importância dos precedentes, sobretudo do
STF, e a necessidade de que sejam observados pelas instâncias inferiores, sob pena de a corte
deixar de cumprir a sua função institucional de guardiã da Constituição. Por outro lado,
considerou impossível abrir a via da reclamação para a garantia de todas as decisões do STF, o
que acabaria transformando-o em um tribunal executivo, encarregado da implementação
capilarizada das suas decisões. Linha semelhante foi adotada pelo ministro Luís Roberto
Barroso, que ressaltou a importância de se criar, no Brasil, uma cultura de respeito aos
precedentes e destacou o mérito teórico da interpretação proposta pelo ministro Gilmar
Mendes, mas considerou que ela seria incompatível com os limites semânticos do artigo 52, X.
Com ligeiras variações, tal orientação foi reiterada nos votos subsequentes. Ao fim e ao cabo,
portanto, manteve-se o convencimento convencional, pontuado pela mensagem institucional
de que o respeito à jurisprudência dos tribunais, e do Supremo em particular, é pressuposto
para a efetividade e racionalidade do acesso à Justiça.
ATENÇÃO: Se uma lei ou ato normativo é declarado inconstitucional pelo STF,
incidentalmente, essa decisão, assim como acontece no controle abstrato, também produz
eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Assim, se o Plenário do STF decidir a
constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ainda que em
controle incidental, essa decisão terá os mesmos efeitos do controle concentrado, ou seja,
eficácia erga omnes e vinculante. Houve mutação constitucional do art. 52, X, da CF/88. A
nova interpretação deve ser a seguinte: quando o STF declara uma lei inconstitucional,
mesmo em sede de controle difuso, a decisão já tem efeito vinculante e erga omnes e o STF
apenas comunica ao Senado com o objetivo de que a referida Casa Legislativa dê publicidade
daquilo que foi decidido (STF. Plenário. ADI 3406/RJ e ADI 3470/RJ, Rel. Min. Rosa Weber,
julgados em 29/11/2017 (Info 886)). Indagação de João Paulo Lordelo, em seu site: O STF
acaba de adotar a teoria da transcendência dos motivos determinantes ou a abstrativização do
controle difuso? O caso foi de evidente atribuição de eficácia vinculante sobre a
fundamentação de decisão em controle concentrado. Houve, portanto, transcendência dos
motivos determinantes, pois foi conferido efeito vinculante a uma declaração incidental, que
se encontrava na fundamentação do acórdão em duas ADIs. Não houve exercício de controle
difuso. A abstrativização do controle difuso é algo diverso. Transcendência dos motivos
determinantes: imprime efeito vinculante à ratio decidendi, ou seja, à parte
da fundamentação necessária e suficiente à conclusão do julgamento. Teoricamente, pode
ocorrer em controle difuso ou concentrado, mas o STF não vem adotando a técnica,
aparentemente por uma questão política: o incômodo que seria julgar um volume grande de
reclamações ajuizadas diretamente lá; Abstrativização do controle difuso: consiste em dar ao
controle difuso o tratamento do controle concentrado, conferindo eficácia vinculante e erga
omnes ao dispositivo, para além das partes (o que pode ocorrer em Recurso Extraordinário e
HC, por exemplo). O STF já fez isso em alguns casos, sendo essa técnica mais aceita que a
transcendência. Veja: essa técnica consiste apenas na aproximação dos dois meios de controle,
mas isso não gera necessariamente a vinculação da inconstitucionalidade reconhecida de
forma incidental, pois o STF não reconhece tradicionalmente a vinculação da fundamentação
no controle concentrado. O que o Plenário do STF fez foi conferir efeito vinculante a uma
declaração de inconstitucionalidade incidental em controle concentrado, reconhecendo uma
mutação do papel do Senado quanto ao art. 52, X, da CRFB/88. A Corte não deixou claro se isso
se aplicaria também ao controle difuso - embora o Min. Gilmar Mendes tenha transparecido
isso de forma indireta, citando o art. 535, §5º, do CPC -, cabendo lembrar que o difuso pode
ser realizado por suas turmas. Imagine que uma das turmas do STF, por uma maioria de
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apenas três ministros, reconheça, de forma incidental, a inconstitucionalidade de uma lei em
sede de recurso extraordinário, reconhecendo o direito subjetivo do recorrente. Essa
declaração incidental vincula todas as demais pessoas já de forma automática? Não ficou claro
no julgado e não há essa previsão no rol de precedentes obrigatórios do NCPC. Tampouco
ficou claro se o STF adotará a transcendência dos motivos determinantes para os casos
futuros, embora isso tenha ocorrido no julgamento. Basta lembrar que, poucos dias antes do
julgamento em questão, a Segunda Turma decidiu que não cabe o uso de reclamação com
base na transcendência dos motivos determinantes (Rcl 22012/RS, rel. Min. Dias Toffoli, red.
p/ ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 12.9.2017, precedente anterior, mas só
divulgado no informativo n. 887). Levando em consideração a completa falta de instabilidade e
coerência na aplicação dos precedentes no Brasil, é bem provável que a jurisprudência
continue na mesma linha.
II. Recurso Extraordinário
Aline Morais
CONTROLE CONCENTRADO: É controle repressivo realizado, via de ação – ADI, ADO, ADC e
ADPF – intentada por legitimados específicos enumerados em rol taxativo. Funda-se na
supremacia e rigidez da Constituição. O processo é objetivo e tem como características:
generalidade, impessoalidade e abstração. A finalidade é proteger a supremacia da
constituição. O objetivo principal é a declaração da (in)constitucionalidade que é reconhecida
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e declarada no dispositivo da sentença, pelo STF (parâmetro CRFB e objeto lei/ato normativo
federal ou estadual) ou pelo TJ (parâmetro CE, objeto lei/ato normativo estadual ou municipal)
Não há prazo em dobro para recorrer ou contestar; não incide prescrição ou decadência; não
se admite intervenção de terceiros e assistência – exceto “amicus curiae”; a desistência é
vedada; a decisão irrecorrível (salvo ED, indeferimento da petição inicial pelo relator que
admite agravo regimental), não admite rescisória e não há vinculação à tese jurídica (causa de
pedir aberta).
NÃO PODEM SER OBJETO DE CONTROLE CONCENTRADO: a) Súmulas: por não possuírem grau
de normatividade qualificada pela generalidade e abstração, mesmo no caso de súmula
vinculante. No caso de SV, há procedimento de revisão. b) Regulamentos ou decretos
regulamentares expedidos pelo Executivo e demais atos normativos secundários : por não
estarem revestidos de autonomia jurídica. Trata-se, no caso, de questão de legalidade, por
inobservância do dever jurídico de subordinação normativa à lei. Decreto que não
regulamente lei alguma: poderá haver ADI para discutir observância do princípio da reserva
legal. c) Normas constitucionais originárias: presunção absoluta de constitucionalidade. No
caso de conflito entre si, deve haver harmonização, segundo caso concreto (princípio da
unidade, concordância prática). d) Atos estatais de efeitos concretos: por não possuírem
densidade jurídico-material (densidade normativa) –) Respostas emitidas nas consultas ao TSE:
por se tratar de ato de caráter meramente administrativo, não possuindo eficácia vinculativa
aos demais órgãos do Poder Judiciário; e) Atos normativos já revogados ou de eficácia
exaurida: porque a sua eventual declaração teria valor meramente histórico. OBS: Se a
revogação ou a perda de vigência da lei ou ato normativo ocorrer já no curso da ação de
inconstitucionalidade: STF entende pela perda do objeto, com a prejudicialidade da ação,
devendo os efeitos residuais concretos que possam ter sido gerados pela aplicação da lei ou
ato normativo não mais existente ser questionados na via ordinária, por intermédio do
controle difuso de constitucionalidade. Exceções: fraude processual; repetição em outra
norma de igual conteúdo; não ter sido o STF informado antes do julgamento. Gilmar Mendes
tem posição diferente sobre a regra: princípios da máxima efetividade e da força normativa da
CRFB; ATENÇÃO: e) Normas anteriores à Constituição: se incompatíveis são revogadas (não-
recepcionadas), não se podendo falar em inconstitucionalidade superveniente. (Conflito de leis
no tempo, e não hierárquico). Pode caber ADPF para, de forma definitiva e com eficácia geral,
solver controvérsia relevante sobre a legitimidade do direito ordinário pré-constitucional em
face da nova Constituição.
ROL DE LEGITIMADOS (CONTROLE PELO STF) – mesmo para todas: art 103CRFB
ESTATAL - SEM advogado NÃO ESTATAL - necessita de
já possui capacidade postulatória advogado com poderes específicos
Presidente da República
Conselho Federal da OAB
Procurador-Geral da República
LEG ATIVA UNIVERSAL
Mesa da Câmara dos Deputados Partido Político com representação no CN
(TODA A COLETIVIDADE)
(momento da propositura:mín 1 em CD ou SF
Mesa do Senado Federal
Representado Diretório Nacional ou Executiva
Confederação Sindical (min 3 Federações)
Governador do Estado/DF
LEG ATIVA ESPECIAL Admite associação de associação
(PARCELACOLETIVIDADE Entidade de classe de âmbito nacional:
Mesa da Assembleia Legislativa/
) "PERTINÊNCIA a) representante de uma categoria;
Câmara Distrital
TEMÁTICA": b) presente em pelo menos 9 UF (1/3)
Mês do CN não pode
exceto se restrita a uma área menor (ex: Sal)
PGR - no controle de constitucionalidade, atua na condição de custus constituitionis, ou seja,
como fiscal da supremacia da Constituição (art. 103, § 1º, da CR). Segundo o STF deve emitir
parecer, inclusive quando autor e pode opinar pela improcedência do pedido feito por ele
mesmo.
ROL DE LEGITIMADOS (CONTROLE PELO TJ) – definidos em Constituição Estadual, sendo
vedado pela CRFB que seja atribuída legitimação a apenas uma pessoa. (art 125 §2ª CRFB)
EFEITOS DA DECISÃO: vinculante (para o Poder Judiciário e para a Administração Pública) ,
“erga omnes” (oponível a todos) e via de regra, “ex tunc”.
84
1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. (Leí nº 9.868/99 e art102, I, “a”, primeira
parte CRFB e 169 a 178 RISTF ) CONCEITO: Tem por objeto principal a própria declaração de
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo em tese – federal ou estadual. OBJETO: a) Leis
(art. 59 da CRFB): emendas constitucionais (por emanarem do poder constituinte derivado
reformador), leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias (por
terem força de lei, mas desde que em plena vigência, ou seja, não convertidas ainda em lei ou
não tendo perdido a sua eficácia por decurso de prazo), decretos legislativos e resoluções
(esses dois últimos somente se estiverem revestidos de generalidade e abstração). b) Atos
normativos: qualquer ato revestido de indiscutível caráter normativo, como as resoluções
administrativas dos Tribunais, os regimentos internos dos Tribunais, as deliberações
administrativas dos órgãos judiciários, as deliberações dos Tribunais Regionais do Trabalho
(salvo as convenções coletivas de trabalho) etc. c) Tratados internacionais: sejam com status
de EC, Supralegal ou lei ordinária; d) Políticas públicas: desde que configurada hipótese de
evidente e arbitrária abusividade governamental, em violação à concretização dos direitos
mínimos existenciais do ser humano (direitos sociais, econômicos e culturais), devendo ainda
se verificar, no caso concreto, a razoabilidade da pretensão, bem como a disponibilidade
financeira do Estado para a implementação da referida política pública.
OBS: Lei – utilizada em conceito amplo: a) todo ato normativo primário (art. 59, CRFB/88); b)
EC - desde que: (i) viole uma das limitações; (ii) apenas as que versem sobre cláusulas pétreas;
(iii) poderes implícitos; c) lei orçamentária (tem admitido com freqüência – a controvérsia tem
que ser suscitada em abstrato.(ADI 5930); d) decreto presidencial, desde que autônomo - art.
84, VI, CRFB/88; e) tratado internacional - ADI 1480. Ato normativo (todo aquele que vincula
ou obriga um determinado grupo): a) ADI 1694 - TCU – consulta; b) parecer AGU aprovado
pelo Presidente da República; c) resolução do CNJ que interprete diretamente a Constituição -
ADC 12 - ADI - férias coletivas - ADI 3367; d) Resolução do TSE; LEGITIMIDADE (art. 103, CR).
COMPETÊNCIA: STF: Lei ou ato normativo federal ou estadual (incluindo distrital no exercício
de competência estadual) em face da CR; TJ local: Lei ou ato normativo estadual ou municipal
em face da CE (inclui Lei Orgânica do DF); tramitação simultânea de ações (lei estadual
perante a CR no STF e perante a CE no TJ local - norma da CR repetida na CE: suspender a ação
no TJ local até o julgamento da ADI no STF. Caso haja repetição de norma da CRFB na CE:
possível controle perante o TJ local, confrontando lei municipal em face da CE que repetiu
norma da CRFB. Não cabe ADI no STF em face de lei municipal. O acesso direto só é possível via
ADPF. Na análise de compatibilidade de lei municipal com a Lei Orgânica do Município, o
controle é de legalidade. PROCEDIMENTO: art. 103, §1º e 3°, art. 103, CRFB; arts. 169 a 178,
RISTF; Lei n° 9.868/99 - Quando imprescindível advogado, procuração com poderes especiais,
indicando objetivamente lei ou ato normativo atacados pela ADI; Pode haver indeferimento
liminar pelo relator, atacável por agravo, caso a petição sofra de vício insanável. São casos de
inépcia: (i) não indicar dispositivo da lei ou ato normativo impugnado, (ii) não for
fundamentada ou (iii) manifestamente improcedente. Não havendo indeferimento liminar,
relator pede informações aos órgãos ou entidades das quais emanou a lei ou ato normativo
impugnado, que devem ser prestadas em 30 dias do recebimento do pedido. Após
informações, ouvidos, sucessivamente, o AGU e o PGR, que devem se manifestar, cada qual,
em 15 dias. PAPEL DO AGU – art. 103, §3º, CRFB diz que AGU será citado para defender o ato
impugnado (Guardião da Presunção de Constitucionalidade das Leis), mas hoje se diz que há
direito de manifestação, sem obrigatoriedade de defesa do ato impugnado. Não precisa
defender quando: a) já houver caso análogo em que o STF tenha entendido que a norma era
inconstitucional - ADI 1616; b) subscrever a ADI; c) norma impugnada ferir interesses da
União; ADI 3916 e 4309. Ademais, a CRFB não prevê sanção para o caso de o AGU não
defender o ato impugnado (ADI 3916). Gilmar Mendes: AGU não deve ser entendido como
parte, mas sim como instituição chamada para se manifestar, podendo dizer o que entende
(um parecer concorrente ao do PGR). Relator pode solicitar informações aos Tribunais
85
Superiores, aos Tribunais Federais e Tribunais Estaduais acerca da aplicação da norma
impugnada no âmbito de sua jurisdição.
Caso haja necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato; ou de notória
insuficiência das informações existentes nos autos: pode relator requisitar informações
adicionais, designar perito ou comissão de peritos ou fixar data para ouvir depoimentos em
audiência pública (art. 20, §1º a 3º, Lei 9.868/99). Possível excepcionalmente, manifestação de
outros órgãos ou entidades, se relator considerar relevante a matéria e a representatividade
dos postulantes para pluralizar o debate e promover legitimação social. Ocorre por meio da
admissão de Amicus curiae (ingresso até a entrada do processo na pauta) que tem direito de
apresentar sustentação oral, nos termos do RISTF, mas não pode recorrer. QUÓRUM PARA
JULGAMENTO E DECISÃO – voto da maioria absoluta dos membros do STF (mínimo de 6),
observado quorum para a instalação da sessão de julgamento (mínimo de 8). Arts. 22 e 23, Lei
9.868/99. CAUSA DE PEDIR ABERTA: não fica o STF condicionado à causa petendi apresentada
pelo postulante, mas apenas ao seu pedido, motivo pelo qual ele poderá declarar a
inconstitucionalidade da norma impugnada por teses jurídicas diversas. MEDIDA CAUTELAR
NA ADI: será concedida, salvo no período de recesso, por decisão da maioria absoluta dos
membros do STF, observado o quorum mínimo para a sua instalação, após audiência (exceto
nos casos de excepcional urgência) dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato
normativo impugnado, que se pronunciarão no prazo de 5 dias. Ouvidos AGU e PGR, no prazo
de 3 dias cada, se relator julgar indispensável (Art. 10, caput e §§, Lei 9.868/99). Facultada
sustentação oral aos representantes judiciais da parte requerente e dos órgãos ou autoridades
responsáveis pela expedição do ato, na forma do RISTF. EFEITOS DA MEDIDA CAUTELAR:
eficácia contra todos (erga omnes) e efeito ex nunc, salvo se o Tribunal entender que deva
conceder-lhe eficácia retroativa (ex tunc). Ademais, a concessão da medida cautelar torna
aplicável a legislação anterior acaso existente ( efeito repristinatório tácito), salvo expressa
manifestação em sentido contrário (Artigo 11, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.868/99). PROCEDIMENTO
“SUMÁRIO” (art. 12): em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a
ordem social e a segurança jurídica: poderá o relator, após a prestação das informações, no
prazo de 10 dias, e a manifestação do AGU e do PGR, sucessivamente, no prazo de 5 dias,
submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a
ação. Art. 12 da Lei nº 9.868/99. EFEITOS DA DECISÃO: Ação de caráter dúplice/ambivalente,
nos termos do artigo 24 da Lei nº 9.868/99 “Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á
improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a
inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação
declaratória. Regra geral, possui os seguintes efeitos: (a) erga omnes (b) ex tunc (c) efeito
vinculante em relação aos demais órgãos do Judiciário e à Administração. – MODULAÇÃO
DOS EFEITOS, por motivos de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o
STF, por manifestação qualificada de 2/3 de seus membros (8 Ministros), declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo sem a pronúncia de sua nulidade, restringindo os
efeitos da referida declaração ou decidindo que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito
em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado, ou seja, atribuindo-lhe efeito ex
nunc, nos termos do artigo 27 da Lei nº 9.868/99, que só terão início a partir do trânsito em
julgado da decisão (e não a partir da publicação da ata de julgamento no DJU). Possível:
Interpretação conforme a Constituição; Declaração de nulidade parcial sem redução de texto
(v. tópico 12.a). RECLAMAÇÃO: finalidade de garantir a autoridade da decisão proferida em
sede de ADI pelo Supremo Tribunal Federal. (serve também para reafirmar a competência da
Corte e exigir observância de súmulas vinculantes). Não cabe reclamação contra ato judicial
que tenha transitado em julgado. Recl 1880: ampliou legitimados para a propositura de
reclamação, não mais se restringindo ao rol constante no artigo 103 da CRFB e no artigo 2º da
Lei nº 9.868/99, para considerar todos aqueles que forem atingidos por decisões dos órgãos do
Poder Judiciário ou por atos da Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual, municipal e distrital contrários ao entendimento firmado pela Suprema Corte em ADI
(Art. 28, §ú, Lei 9.868/99; art. 102, § 2º, CRFB). Natureza jurídica da reclamação: Há
86
controvérsia na doutrina (ação; sucedâneo de recurso; remédio incomum; incidente
processual; medida de Direito Processual Constitucional; medida processual de caráter
excepcional). STF: como instrumento de caráter constitucional, com dupla finalidade:
preservar a competência e garantir a autoridade das decisões; Ada Pelegrini: simples direito de
petição (5º, XXXIV). STF adotou esse entendimento ao permitir a reclamação no âmbito
estadual (TJ). Reclamação no âmbito estadual: é possível, desde que haja previsão da CE, pois
se trata de direito de petição.
PROCEDIMENTOS
MÉRITO CAUTELAR SUMÁRIO
Petição Inicial Petição Inicial Petição Inicial
Informações
Informações (30d) Informações (5d)
(10d)
Amicus AGU (15d) AGU/PGR(3d): ouvidos apenas se Relator AGU (5d)
Curiae PGR (15d) considerar necessário; PGR (5d)
Perícias,Audiências
Públicas,Informações - -
adicionais - ADI 855
Julgamento
Julgamento: Constitucional
Julgamento Constitucional a) Deferida: ef vinculante; requisitos – Incons
Inconstitucional 1) norma aparentemente inconstitucional; titucional
Efeitos: vinculantes, “erga omnes” e 2) aplicação geraria insegurança. Efeitos:
“ex tunc” b) Indeferida - sem efeito vinculante, vinculantes,
não quer dizer que a norma seja inconstitucional. “erga omnes” e
“ex tunc”
2. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO. (art 103, §2º e art 12-A a 12-H
Lei 9868/99) CONCEITO: a ação pertinente para tornar efetiva norma constitucional em razão
de omissão de qualquer dos Poderes ou de órgão administrativo. OMISSÃO
INCONSTITUCIONAL: ausência de norma ou ato infraconstitucional que impeça a ampla
aplicação da norma constitucional de eficácia limitada. Viola princípios da proibição do
retrocesso; garantia do mínimo existencial e dignidade da pessoa humana. FINALIDADE: tornar
efetiva norma constitucional de eficácia limitada, não regulamentada por omissão do Poder
Público ou órgão administrativo. TIPOS DE OMISSÃO: pode ser a) total (não há cumprimento
do dever constitucional de legislar; Ex.: Art. 37, inciso VII, da CRFB); ou b) parcial (há lei
infraconstitucional integrativa, porém insuficiente). b1) Omissão parcial propriamente dita: lei
existe, mas regula de forma deficiente (Ex.: Art. 7º, inciso IV, da CRFB); b2) Omissão parcial
relativa (ou “exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade”):lei existe,
outorgando determinado benefício a uma certa categoria, deixando de conceder a outra que
também deveria ter sido contemplada (Ex.: Súmula 339 do STF). MI x ADI por omissão: a) MI é
restrito, pois trata apenas de direitos que envolvam cidadania, direitos fundamentais, etc.; b)
qualquer pessoa pode propor MI; e c) os efeitos do MI são inter partes. Não há fungibilidade
entre ADI por Omissão e Mandado de Injunção: diversidade de pedidos. OBJETO: amplo – a)
inércia do Legislativo em editar atos normativos primários; b) inércia do Executivo em editar
atos normativos secundários, como regulamentos e instruções; c)inércia do Judiciário em
editar os seus próprios atos. STF: perda de objeto da ADI por omissão pendente de
julgamento se: norma que não tinha sido regulamentada é revogada; é encaminhado projeto
de lei ao Congresso Nacional sobre a referida matéria (desencadeado o processo legislativo,
não há que se cogitar de omissão inconstitucional do legislador). Contudo, a inercia
deliberandi das Casas Legislativas pode ser objeto da ADI por omissão : STF reconhece a mora
do legislador em deliberar, declarando a inconstitucionalidade por omissão. COMPETÊNCIA:
(Art. 103, § 2º, CRFB, c.c., analogicamente, art. 102, I, “a”, CRFB) - STF. Gilmar Mendes:
Inconstitucionalidade por omissão de órgãos legislativos estaduais em face da CRFB/88 - STF.
LEGITIMIDADE: São os mesmos legitimados para a propositura da ação direta de
inconstitucionalidade (Art. 103 da CRFB), inclusive, com as observações sobre a pertinência
87
temática para alguns deles. PROCEDIMENTO: Lei 9868/99: praticamente idêntico ao da ADI,
com peculiaridades: a) relator poderá solicitar a manifestação do AGU, a ser encaminhada em
15 dias (art. 12-E, §2º), após a manifestação das autoridades responsáveis pela omissão.
Citação do AGU não é obrigatória. MEDIDA CAUTELAR:excepcional urgência e relevância da
matéria podem ensejar tal concessão, após audiência das autoridades responsáveis pela
omissão inconstitucional, que deverão se pronunciar em 5 dias. Poderá consistir em:
suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo questionado, no caso de omissão parcial;
suspensão de processos judiciais ou de procedimentos administrativos; outra providência a
ser fixada pelo Tribunal. Em caso de omissão de órgão administrativo: providências deverão
ser adotadas no prazo de 30 dias, ou em prazo razoável estipulado excepcionalmente pelo
Tribunal. Em caso de omissão do Poder Legislativo: a) Teoria não concretista: o Poder
Judiciário não pode regular a matéria pois, se o fizesse, estaria invadindo a competência do
Poder Legislativo - MI 712; b) Teorias Concretistas: b1) direta: de plano Judiciário regula a
matéria; b2) intermediária: primeiro constitui em mora o legislador para, após, regular a
matéria, dividindo-se em: b2.1) geral: a regulação feita pelo Judiciário vale para todos -
adotada pelo STF; e b2.2) individual: regulação feita pelo Judiciário vale para o indivíduo ou
grupo. Admite-se ainda a figura do amicus curiae na ADC (mesmo tendo sido vetado art. 18, §
2º, Lei 9.868/99) em aplicação analógica do art. 7º, § 2º, Lei 9.868/99, considerando que ADI e
ADC são ações dúplices (ou ambivalentes). EFEITOS DA DECISÃO: tradicionalmente, STF
entendia que ADI por omissão serve para comunicar ao Congresso o dever de legislar; isso vem
mudando: ex. caso da criação dos Municípios, em que se fixou um prazo. Caso da criação dos
Municípios (art. 18, § 4º): Congresso não editou LC necessária para criação de Municípios.
Muitos foram criados de forma inconstitucional. Houve várias ADIs contra leis que criaram
Municípios, e ADI por omissão em relação ao art. 18, §4º, CRFB. STF declarou omissão
inconstitucional e inconstitucionalidade, sem pronúncia de nulidade, das leis municipais (com
modulação de efeitos). Fixou prazo de 18 meses para a LC, e 24 meses para a subsistência das
leis municipais. Raciocínio: criada a LC, as leis municipais poderiam ser criadas no prazo.
Congresso não criou a LC, mas fez EC para ratificar a criação dos Municípios. FUNGIBILIDADE
(Gilmar Mendes):há certa fungibilidade entre ADI por omissão parcial e ADI. Diferença são as
técnicas de decisão: na primeira, será determinada complementação; na segunda, declarada a
nulidade.
3. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. (EC 03/93 - que alterou Art. 102 e 103
CRFB - e Lei 9868/1999) CONCEITO: Ação que tem por finalidade confirmar a
constitucionalidade de uma lei federal, impedindo que a lei não seja questionada por outras
ações., FINALIDADE: declarar constitucionalidade de lei ou ato normativo (apenas federal),
transformando presunção relativa (iuris tantum) em absoluta (iure et iure), afastando quadro
de incerteza sobre a validade ou aplicação da aludida lei. COMPETÊNCIA: originária do STF
(art. 102, I, a, CRFB). LEGITIMIDADE: mesmos para a ADI. PROCEDIMENTO: praticamente
mesmo da ADI, com observações: petição inicial deve indicar: a) dispositivo da lei ou ato
normativo questionado e fundamentos jurídicos do pedido; b) pedido, com especificações; c)
existência de controvérsia judicial relevante sobre aplicação da disposição objeto da ADC
(ADC 1: controvérsia judicial relevante: a) STF: controvérsia dentro do Poder Judiciário
(jurisprudencial); b) Gilmar Mendes: controvérsia jurídica. Como a lei possui presunção de
constitucionalidade, se alguns juízes a tem declarado inconstitucional, já está caracterizada a
controvérsia; c) relevância: possibilidade de ocasionar insegurança jurídica em boa parte do
território nacional). Deve conter cópias do ato normativo questionado e dos documentos
necessários para comprovar procedência do pedido de declaração de constitucionalidade (art.
14, da Lei nº 9.868/99). Petição inicial será liminarmente indeferida pelo relator se for: inepta,
não fundamentada, ou manifestamente improcedente. Contra essa decisão cabe agravo. O
AGU não será citado, pois não há ato ou texto a ser defendido. Vista dos autos ao PGR, para se
pronunciar em 15 dias (art. 19, Lei nº 9.868/99). Havendo pedido cautelar, decisão sobre a
liminar pode ser antes da manifestação do PGR. Caso haja necessidade de esclarecimento de
88
matéria ou circunstância de fato; ou de notória insuficiência das informações existentes nos
autos: pode relator requisitar informações adicionais, inclusive, a Tribunais Superiores,
Tribunais federais e estaduais acerca da aplicação da norma questionada no âmbito de sua
jurisdição, designar perito ou comissão de peritos ou fixar data para ouvir depoimentos em
audiência pública (art. 20, §1º a 3º, Lei 9.868/99). QUÓRUM - Decisão será dada pela maioria
absoluta dos membros do STF (6), presente o número mínimo de 2/3 dos ministros (8).
MEDIDA CAUTELAR – suspensão do julgamento de ações que envolvam aplicação da lei objeto
da ação até o seu julgamento definitivo (art. 21, Lei 9.868/99). Suspensão perdurará apenas
por 180 dias, contados da publicação da parte dispositiva de decisão no DOU, sendo esse
prazo definido pela lei para que STF julgue ADC. Gilmar Mendes: a despeito da lei não prever
prorrogação do prazo da cautelar, se a questão não tiver sido decidida no prazo prefixado,
poderá o STF autorizar a prorrogação do prazo. Decisão de deferimento da medida cautelar
será dada pela maioria absoluta dos membros do STF (6) e terá efeito vinculante e erga omnes
(entendimento majoritário), em vista do poder geral de cautela inerente ao poder jurisdicional,
cabendo reclamação. EFEITOS DA DECISÃO: Regra geral, decisão proferida em ADC será: (a)
erga omnes(contra todos); (b) ex tunc; (c) vinculante em relação aos demais órgãos do Poder
Judiciário e à Administração Pública, direta ou indireta, federal, estadual, municipal e distrital.
Lei pode ser ABSTRATAMENTE CONSTITUCIONAL, mas no caso concreto ser tida como
INCONSTITUCIONAL, assim o julgamento abstrato de constitucionalidade não impede que
em determinado caso concreto haja reconhecimento da inconstitucionalidade (ADI 223 -
plano Collor). Gilmar Mendes: tese da DUPLA REVISÃO JUDICIAL OU DUPLO CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE: mesmo após o controle concentrado de constitucionalidade, ainda
persiste espaço para controle difuso de constitucionalidade pelas instâncias judiciárias
inferiores. Ex. ADC/04: reconheceu constitucionalidade da lei que proíbe antecipação de tutela
contra fazenda pública, mas tribunais vêm entendendo que em determinados casos concretos
pode existir inconstitucionalidade pela proibição de antecipação de tutela contra a fazenda.
PROCEDIMENTO ADC
MÉRITO CAUTELAR
AMICUS Petição Inicial Petição Inicial
CURIAE: PGR (15d) PGR (3d) - se o relator considerar necessário
ingresso s/
previsão Perícias, audiências públicas. -
legal
Julgamento: caráter dúplice: declara constitucional
Julgamento: tanto concessão quanto denegação
ou não
tem efeito vinculante
Efeitos Vinculantes, “erga omnes” e “ex tunc”.
89
usados. Admite-se também o controle de leis revogadas. HIPÓTESES DE CABIMENTO:
arguição autônoma (art. 1º, caput, da Lei nº 9.882/99) preventiva ou repressiva e arguição por
equivalência ou equiparação (1º, p.u. Lei nº 9.882/99). ADPF autônoma: para lei ou ato
normativo (subsidiariedade) - não há necessidade de se demonstrar controvérsia judicial
relevante. ADPF incidental: caso concreto - necessidade de se demonstrar controvérsia judicial
relevante; pode ser ato não normativo. Art. 102, §1º, CRFB/88:
PRECEITO FUNDAMENTAL: Constituição e lei regulamentadora deixaram de conceituar.
Englobam os direitos e garantias fundamentais da Constituição, bem como os fundamentos e
objetivos fundamentais da República, de forma a consagrar maior efetividade às previsões
constitucionais. Segundo a doutrina: preceitos que informam sistema constitucional,
estabelecendo comandos basilares e imprescindíveis à defesa dos pilares da Constituição
originária, veiculando princípios e servindo de vetores de interpretação das demais normas
constitucionais. Como exemplo: princípios fundamentais dos artigos 1º a 4º; cláusulas
pétreas do artigo 60, §4º; princípios constitucionais sensíveis do artigo 34, inciso VII; direitos
e garantias individuais dos artigos 5º a 17. STF analisa casuisticamente. Não pode atacar ato
político, como o veto. COMPETÊNCIA: STF (Art. 102, §1º, CRFB). LEGITIMIDADE: mesmos
legitimados para a propositura da ADI. E ainda qualquer interessado - pessoa lesada ou
ameaçada por ato do poder público (inciso II vetado do art. 2º da Lei nº 9.882/99), mediante
representação, solicitando a propositura da ação ao Procurador-Geral da República, que,
examinando os fundamentos jurídicos do pedido, decidirá acerca do cabimento de seu
ingresso em juízo (a legitimada, na realidade, é a PGR). PETIÇÃO INICIAL: além dos requisitos
do art. 319 do CPC, deve conter: a) indicação do preceito fundamental que se considera
violado; b) indicação do ato questionado; c) prova da violação do preceito fundamental; d)
pedido e suas especificações; e) se for o caso, comprovação da existência de controvérsia
judicial relevante sobre a aplicação do preceito fundamental que se considera violado; f)
instrumento de mandato de advogado, nos casos nos quais sua presença é obrigatória. Petição
inicial será indeferida liminarmente pelo relator, quando não for o caso de ADPF, quando
faltar algum de seus requisitos, ou quando ela for inepta, sendo cabível contra essa decisão a
interposição de agravo, no prazo de 5 dias. Art. 4º, caput e §2º, Lei 9.882/99. CARÁTER
SUBSIDIÁRIO: Para caber ADPF, não pode haver outro meio de controle em processo objetivo.
Se couber MS, RE, pode caber a ADPF, pois ela gera eficácia geral, ao passo que os outros têm,
em princípio, eficácia inter partes. Ex: ADPF 33 – piso salarial de servidores – lei pré-
constitucional revogada – decidiu-se que o princípio da subsidiariedade legitimava a
apreciação da ADPF, pois a existência de pendências judiciais não é bastante para resolver o
caso na amplitude da ADPF. ADPF CONHECIDA COMO ADI - se o pedido principal for de
declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo por ofensa a dispositivos
constitucionais. PROCEDIMENTO - Após apreciação da medida liminar, o relator solicita
informações às autoridades responsáveis pela prática do ato questionado , no prazo de 10 dias.
– cabível amicus curiae, perícia etc. - O Ministério Público, na condição de custos constitutionis,
tem vista do processo, por 5 dias, após o decurso do prazo para as informações (Art. 7º,
§único, Lei 9.882/99). QUÓRUM E VOTAÇÃO - A decisão deve ser tomada pelo voto da maioria
absoluta dos membros do STF (no mínimo 6), presentes2/3 dos ministros (no mínimo 8).
Tratam-se, respectivamente, do quorum de julgamento (art. 97 da CRFB), e de instalação da
referida sessão (art. 8º da Lei nº 9.882/99). Cabe reclamação contra o descumprimento de
decisão proferida, em sede de ADPF. MEDIDA LIMINAR – pedido será deferido por decisão da
maioria absoluta de seus membros (6 ministros). Caso de extrema urgência ou perigo de lesão
grave ou, ainda, em período de recesso (que é distinto de férias), poderá a liminar ser deferida
apenas pelo relator, ad referendum do pleno (Art. 5º, caput e §1º, Lei 9.882/99). Relator
poderá ouvir, ainda em sede de liminar, os órgãos ou autoridades responsáveis pelo ato
questionado, bem como o AGU ou o PGR, no prazo comum de 5 dias (Art. 5º, § 2º, Lei
9.882/99). Liminar poderá determinar que juízes e tribunais suspendam o andamento de
processo ou os efeitos de decisões judiciais, ou de qualquer outra medida que apresente
relação com a matéria objeto de arguição de descumprimento de preceito fundamental, salvo
90
se decorrentes da coisa julgada. EFEITOS DA DECISÃO: decisão na ADPF é imediatamente
auto-aplicável (art. 10, §1º, Lei 9.882/99). Possui eficácia contra todos (erga omnes) e efeito
vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público (art. 10, §3º, Lei 9.882/99). Em
regra tem efeitos retroativos (ex tunc). Exceção: MODULAÇÃO DOS EFEITOS nos casos em
que, por razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, o STF decida, por
maioria qualificada de 2/3 de seus membros, restringir os efeitos da declaração ou decidir que
ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ( ex nunc) ou de outro momento que
venha a ser fixado (Art. 11, Lei 9.882/99). Pet 1365: ADPF pode servir a casos que não
chegariam ao STF, apesar de violar preceitos fundamentais. Ex: leis revogadas, leis anteriores à
CRFB/88, leis municipais;
PROCEDIMENTO ADPF
MÉRITO CAUTELAR
Petição Inicial Petição Inicial
Informações (10d)
AMICUS AGU, na autônoma (5d), na incidental (5d), a Informações/AGU/PGR (5d) prazo
CURIAE critério do relator comum
PGR (5d), se não tiver proposto a ADPF
Perícia, audiência pública, informações adicionais -
Julgamento – efeitos erga omnes, vinculante, ex tunc Julgamento
SÚMULAS
Súmula 642, STF: Não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei do Distrito Dederal
derivada da sua competência legislativa municipal.
JURISPRUDÊNCIA
907/STF – A alteração do parâmetro constitucional, quando o processo ainda está em curso,
não prejudica o conhecimento da ADI. Isso para evitar situações em que uma lei que nasceu
claramente inconstitucional volte a produzir, em tese, seus efeitos. STF. Plenário. ADI 145/CE,
Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 20/6/2018.
905/STF - Procuração com poderes específicos para o ajuizamento de ADI. O advogado que
assina a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade precisa de procuração com
poderes específicos. A procuração deve mencionar a lei ou ato normativo que será
impugnado na ação. Caso esse requisito não seja cumprido, a ADI não será conhecida. Vale
ressaltar, contudo, que essa exigência constitui vício sanável e que é possível a sua
regularização antes que seja reconhecida a carência da ação. STF. Plenário. ADI 4409/SP, Rel.
Min. Alexandre de Moraes, julgado em 6/6/2018
900/STF - Cabimento de ADI contra Resolução do TSE. É cabível ADI contra Resolução do TSE
que tenha, em seu conteúdo material, “norma de decisão” de caráter abstrato, geral e
autônomo STF. Plenário. ADI 5122, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 3/5/2018.
899/STF - Cabe ADI contra Resolução do CNMP. A Resolução do CNMP consiste em ato
normativo de caráter geral e abstrato, editado pelo Conselho no exercício de sua competência
constitucional, razão pela qual constitui ato normativo primário. STF. Plenário. ADI 4263/DF,
Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 25/4/2018.
O Estado-membro não possui legitimidade para recorrer contra decisões proferidas em sede
de controle concentrado de constitucionalidade, ainda que a ADI tenha sido ajuizada pelo
respectivo Governador. A legitimidade é do próprio governador. Os Estados-membros não se
incluem no rol dos legitimados. STF. Plenário. ADI 4420 ED-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso,
julgado em 05/04/2018.
91
892/STF - É possível celebrar acordo em ADPF. SIM. desde que fique demonstrado que há no
feito um conflito intersubjetivo subjacente (implícito), que comporta solução por meio de
autocomposição. Vale ressaltar que, na homologação deste acordo, o STF não irá chancelar ou
legitimar nenhuma das teses jurídicas defendidas pelas partes no processo. O STF irá apenas
homologar as disposições patrimoniais que forem combinadas e que estiverem dentro do
âmbito da disponibilidade das partes. A homologação estará apenas resolvendo um incidente
processual, com vistas a conferir maior efetividade à prestação jurisdicional. STF. Plenário.
ADPF 165/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 1º/3/2018.
890/STF - Alteração da Lei impugnada antes do julgamento da ADI. O autor da ADI deverá
aditar a petição inicial demonstrando que a nova redação do dispositivo impugnado apresenta
o mesmo vício de inconstitucionalidade que existia na redação original. Se o autor não fizer
isso, o STF não irá conhecer da ADI, julgando prejudicado o pedido pela perda superveniente
do objeto. STF. Plenário. ADI 1931/DF, Rel Marco Aurélio, julgado 7/2/2018.
O que acontece caso o ato normativo que estava sendo impugnado na ADI seja revogado
antes do julgamento da ação? Regra: haverá perda superveniente do objeto e a ADI não
deverá ser conhecida (STF ADI 1203). Exceção 1: "fraude processual", (STF ADI 3306). Exceção
2: conteúdo do ato impugnado foi repetido, em sua essência, em outro diploma normativo.
(STF ADI 2418/DF). Exceção 3: caso o STF tenha julgado o mérito da ação sem ter sido
comunicado previamente que houve a revogação da norma atacada. (STF. ADI 951 ED/SC).
Conversão da MP em lei antes que a ADI proposta seja julgada, esta ADI não perde o objeto e
poderá ser conhecida e julgada. Como o texto da MP foi mantido, não cabe falar em
prejudicialidade do pedido. Isso porque não há a convalidação ("correção") de eventuais vícios
existentes na norma, razão pela qual permanece a possibilidade de o STF realizar o juízo de
constitucionalidade. Neste caso, ocorre a continuidade normativa entre o ato legislativo
provisório (MP) e a lei que resulta de sua conversão. ADI 1055/DF
ADC e controvérsia judicial relevante A Lei 9.868/99, ao tratar sobre o procedimento da ADC,
prevê, em seu art. 14, os requisitos da petição inicial. Um desses requisitos exigidos é que se
demonstre que existe controvérsia judicial relevante sobre a lei objeto da ação. Mesmo a lei
92
ou ato normativo possuindo pouco tempo de vigência, já é possível preencher o requisito da
controvérsia judicial relevante se houver decisões julgando essa lei ou ato normativo
inconstitucional. O STF decidiu que o requisito relativo à existência de controvérsia judicial
relevante é qualitativo e não quantitativo. (ADI 5316 MC/DF).
QUESTÕES
Concursos anteriores - Obj 29CPR 3 - ASSINALE A ALTERNATIVA INCORRETA:
a) Lei distrital editada no exercício de competência municipal não é passível de controle
abstrato de constitucionalidade no âmbito do STF. FALSO.
É passível caso se trate de ato normativo municipal que reproduza norma da Constituição
Federal de observância obrigatória pelo Estados, pois nesta hipótese cabe Recurso
Extraordinário ao STF Além disso, cabe ADPF, que é controle concentrado, contra atos
normativos municipais. Provavelmente motivou a questão: recentíssima repercussão geral
julgada um mês antes da prova, com a seguinte tese: “Tribunais de Justiça podem exercer
controle abstrato de constitucionalidade de leis municipais utilizando como parâmetro normas
da Constituição Federal, desde que se trate de normas de reprodução obrigatória pelos
estados”. STF, RE650.898-RS, julgado em 01/02/17.
b) É possível, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, a invalidade de uma norma
que se extrai, a contrario sensu, de um texto legal, mas que não está contida em qualquer
fragmento linguístico. VERDADEIRO.
“O controle de constitucionalidade, afinal, recai sobre a norma jurídica, e não sobre o texto
legal, como comprova a possibilidade de declaração parcial de inconstitucionalidade sem
redução de texto (CRFB. art. 28, Parágrafo único, da Lei 9.869/99). “
c) Nas chamadas “sentenças aditivas de princípio” ou “sentenças delegação”, a Suprema Corte,
em decisões no controle abstrato de constitucionalidade, exorta o legislador a agir, delineando
as diretrizes que deve seguir. VERDADEIRO.
“As decisões no controle de constitucionalidade em que o Tribunal exorta o legislador a
agir,mas delineia diretrizes que deve seguir, são chamadas de “sentenças aditivas de princípio”
ou “sentenças-delegação”, afigurando-se frequentes, em especial, na Corte Constitucional
Italiana”.
d) A coisa julgada, em controle abstrato de constitucionalidade, significa que a decisão
permanecerá eficaz sobre hipóteses idênticas, salvo se o STF adotar nova compreensão sobre
o tema ou o Legislativo vier a editar lei em sentido contrário ao entendimento adotado
naquela decisão. VERDADEIRO.
Trata-se do ativismo congressual ou reação legislativa, abordados por Daniel Sarmento em
“Direito Constitucional - Teoria, História e Métodos de Trabalho”, Ed. Fórum, 1a ed., 2012: as
decisões do STF em matéria constitucional são insuscetíveis de invalidação pelas instâncias
políticas. Isso, porém, não impede, no nosso entendimento, que seja editada uma nova lei,
com conteúdo similar àquela que foi declarada inconstitucional. Essa posição pode ser
derivada do próprio texto constitucional, que não estendeu ao Poder Legislativo os efeitos
vinculantes das decisões proferidas pelo STF no controle de constitucionalidade (art. 102, §2o,
e 103-A, da Constituição). Se o fato ocorrer, é muito provável que a nova lei seja também
declarada inconstitucional. Mas o resultado pode ser diferente. O STF pode e deve refletir
sobre os argumentos adicionais fornecidos pelo Parlamento ou debatidos pela opinião pública
para dar suporte ao novo ato normativo, e não ignorá-los, tomando a nova medida legislativa
como afronta à sua autoridade. Nesse ínterim, além da possibilidade de alteração de
posicionamento de alguns ministros, pode haver também mudança na composição da Corte,
com reflexos no resultado do julgamento”.
93
PROVA ORAL: 1) Antigamente, as ações de controle concentrado eram verdadeiros “processos
sem rosto”, genuinamente objetivos. Hoje já não é mais assim. Por quê? 2) Diferença entre
ADPF e ADI/ADC. Espécies de ADPF. Legitimados para a ADPF. Cabe ADPF em caso de ofensa
reflexa à CRFB? 3) ADPF. Origem, objeto, legitimados, modalidades, conceito de controvérsia
constitucional. Diferenciar ADPF autônoma de ADPF incidental. 4) Diferenças entre ADI por
omissão e mandado de injunção. A finalidade da ADO, totalmente diversa da do Mandado de
Injunção, é assegurar a supremacia da CR e a efetividade das normas constitucionais (note que
o art. 103, § 2º, fala em “tornar efetiva norma constitucional”). O Mandado de injunção, por
sua vez, tem por finalidade precípua proteger o exercício de direitos constitucionalmente
consagrados. A própria localização na CR, dentre os direitos individuais (art. 5º, LXXI) reafirma
esse entendimento. O Mandado de Injunção pressupõe um direito que necessita de norma
regulamentadora (de eficácia limitada, precipuamente), sem a qual ele não poderá ser
exercido. Por essa razão, trata-se de um instrumento de controle concreto de
constitucionalidade (utilizado incidentalmente no caso concreto). A CR não diz quais são os
efeitos do Mandado de Injunção, mas, de certa forma, delimita o parâmetro: “direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania”. Na ADO, a CR fala dos efeitos da decisão, mas não delimita seu parâmetro.
742- No que consistem os modelos introverso e extroverso de legitimidade para fins de ADI
estadual? a) um modelo introverso, em que se dá legitimidade apenas a órgãos públicos; b) ou
então um denominado modelo extroverso, em que se dá legitimidade também a entidades de
caráter privado, como as entidades de classe, o que ocorre na Carta Magna.
94
em razão da expressa referência a elas feita, o ‘corpus’ constitucional dessa unidade política da
Federação, o que torna possível erigir-se, como parâmetro de confronto, para os fins a que se
refere o art. 125, § 2.o, da Constituição da República, a própria norma constitucional estadual
de conteúdo remissivo” (Rcl 10.500, j. 18.10.2010, CRFB. Inf. 606/STF).
384-Cabe liminar em ADI interventiva? Muitos não sabem, mas existe um diploma legislativo
que trata especificamente da ADI Interventiva: é a Lei no 12.562/11. O art. 5o dessa lei prevê
expressamente que o Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus
membros, poderá deferir pedido de medida liminar na representação interventiva. Tal liminar
poderá consistir na determinação de que se suspenda o andamento de processo ou os efeitos
de decisões judiciais ou administrativas ou de qualquer outra medida que apresente relação
com a matéria objeto da representação interventiva.
354-Constituição Estadual pode trazer artigo que assevera que no controle concentrado
estadual deve-se remeter para o parlamento suspender a execução da lei? É inconstitucional!
No controle concentrado, não se pode ter tal previsão, apenas no controle difuso. O art. 52, X,
da CRFB trata do tema.
298-Eventual decisão em ADPF pode atingir a coisa julgada? não, consoante entendimento do
STF, por ser o meio cabível previsto legalmente para tanto a ação rescisória(que possui prazos
específicos e hipóteses também específicas).
95
razão, no processo constitucional objetivo a conexão entre as ações ocorrerá apenas quando
houver identidade quanto ao objeto impugnado.
96
Segundo o art. 52, X, CR/88, cabe ao Senado suspender a lei declarada inconstitucional
pelo STF em controle difuso, no todo ou em parte, conferindo eficácia erga omnes à decisão.
Pela doutrina majoritária, o Senado não está vinculado à decisão do STF, existindo um campo
de discricionariedade para decidir pela suspensão ou não da norma e sua extensão. O Senado
tem competência para suspender norma federal, estadual e municipal.
Contudo, nas ADIs 3406/RJ e 3470/RJ (Amianto), julgadas em 29.11.17, o STF passou a
acolher a tese da mutação constitucional do art. 52, X, da CRFB/88, segundo a qual a mera
declaração de inconstitucionalidade realizada pelo STF, ainda que em controle difuso de
constitucionalidade, produziria, por si só, efeitos vinculantes erga omnes, cabendo ao Senado
Federal tão só o papel de dar publicidade ao que foi decidido (Informativo 886/STF).
(a) artigo 52, X, CRFB/88: depois de reiteradas decisões do STF em controle difuso o Senado
pode, após ser comunicado, suspender no todo ou em parte a eficácia da lei através de uma
Resolução (passa a valer para todos). Tem prevalecido o entendimento no sentido de que a
Resolução tem eficácia ex nunc, embora Barroso sustente que deveria ser ex tunc, porque a
norma é inconstitucional desde o início. Atualmente, contudo, parece estar superada a
necessidade de atuação do Senado para que as decisões em controle difuso produzam efeitos
erga omnes e vinculantes (vide abaixo);
(b) EC n° 45/04 – art. 103-A, CRFB/88: após reiteradas decisões acerca da validade,
interpretação ou eficácia de uma norma sobre a qual paire controvérsia atual, judicial ou
administrativa, o STF pode editar súmula vinculante pelo voto de 2/3 dos seus membros, que
vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública. OBS: o STF não fica
vinculado à súmula, podendo, inclusive de ofício, revisá-la ou cancelá-la (hipótese de
overruling– superação da jurisprudência).
(c) o STF importou a teoria conhecida como transcendência dos motivos determinantes (os
motivos que fundamentam a declaração de inconstitucionalidade extrapolam os limites da
demanda para alcançar situações idênticas ou semelhantes). OBS. Atualmente, o STF não
adota essa teoria;
(d) repercussão geral (art. 102, §3°, CR): com a EC 45/04 (Reforma do Judiciário) mudou
radicalmente o modelo de controle incidental, uma vez que os recursos extraordinários terão
de passar pelo crivo da admissibilidade referente à repercussão geral. Assim, com a adoção
desse novo instituto haverá uma maximização da feição objetiva do recurso extraordinário,
que passou a ser um instrumento de molecularização de julgamento em massa;
(e) Nas ADIs 3406 e 3470(Amianto), julgadas em 29.11.17, o STF julgou, incidentalmente, que
o art. 2º da Lei nº 9.055/95 é inconstitucional. Contudo, afirmou que, mesmo sendo incidental,
tal decisão teria efeitos vinculantes e erga omnes, independentemente de resolução do
Senado Federal. Acolheu, assim, a tese da abstrativização do controle difuso, afirmando a
mutação constitucional do art. 52, X, CRFB/88 (Informativo 886);
97
(f) Nos REs 567.985/MT e 580963/PR, o STF realizou, expressamente, a reinterpretação de sua
própria decisão na ADI 1.232/DF (Amparo Social – LOAS). Dessa forma, a decisão dada nos REs,
por ter alterado decisão anterior proferida em sede de controle concentrado, teria também
eficácia erga omnes e vinculante, independentemente de manifestação do Senado Federal.
Como regra, possui efeitos erga omnes, isto é, eficácia contra todos e efeitos ex tunc,
decorrente do princípio da nulidade, salvo exceções. Aqui há também a situação do efeito
repristinatório da decisão. Não se trata de repristinação, pois, diante da inconstitucionalidade
da lei L2 revogadora, a L1 revogada sempre esteve em vigor, não tendo sido revogada em
momento algum. O STF pode, contudo, mediante requerimento, evitar que a lei L1 volte a
vigorar e evitar, assim, a represtinação indesejada.
No campo dos efeitos, pode ocorrer a chamada modulação dos efeitos da decisão (art.
27 da Lei nº 9.868/99). Os Ministros podem, diante de um caso concreto em que haja razões
de segurança jurídica ou que acarrete excepcional interesse social, modular os efeitos da
decisão do Supremo, de forma a que ela tenha efeitos ex nunc. Esta técnica flexibiliza o
princípio da nulidade, aproximando-o da teoria da anulabilidade. O quorum para decidir pelo
efeito ex nunc é 2/3 ou 8 dos Ministros.
d) Efeito vinculante
Além disso, pela teoria extensiva do efeito vinculante, a coisa julgada além da parte
dispositiva, abrangendo os fundamentos determinantes da decisão (também chamada de
teoria da transcendência dos motivos determinantes). Em geral, os autores entendem que o
fundamento determinante é aquele que não pode ser modificado sem alteração da parte
dispositiva. É a ratio decidendi (razões de decidir) – elemento básico da decisão. Distingue-se
do obter dictum (questões paralelas). A lógica que inspira o efeito vinculante é a de reforço da
posição da corte constitucional. Assim, a corte formula uma regra geral (contida nos
fundamentos determinantes) que não pode ser descumprida. Assim, fixa-se um modelo, cujo
descumprimento enseja a reclamação. Atualmente, contudo, não se tem admitido a utilização
de tal teoria, nem a reclamação fundada na transcendência dos motivos determinantes do
acórdão com efeito vinculante. (STF, Rcl 22012/RS, DJ 12.09.2017).
A medida cautelar suspende o ato impugnado, com efeito vinculante, podendo até
restabelecer o direito anterior. Tem eficácia ex nunc, salvo disposição em sentido contrário. Em
caso de rejeição de liminar, não há efeito vinculante, em regra.
98
particularmente a ADI, na qual a decisão pode adquirir maior complexidade. A declaração de
nulidade arrima-se na premissa de que o ato inconstitucional reveste-se de nulidade ipso iure.
Mas a decisão poderá dar pela procedência da demanda de inconstitucionalidade sem declarar
nula a norma.
iii) Técnica da decisão manipulativa de efeitos aditivos, a qual para Gilmar Mendes,
possibilitou definitivamente a superação do dogma kelseniano do legislador negativo, na
medida em que o tribunal atua como legislador positivo, acrescentando novos efeitos jurídicos
na sua decisão, como no caso da ADPF 54, quando o STF criou nova hipótese de excludente de
punibilidade ao crime de aborto, no caso do feto padecer de anencefalia.
Nessas sentenças, por uma série de fatores (políticos, econômicos, jurídicos), há uma
relativa transação ou relativização do princípio da supremacia da constituição, fixando-se um
parâmetro transitório de controle, em razão do contexto social. A doutrina (José Adércio Leite
Sampaio, Bernardo Gonçalves Fernandes) enumera as seguintes espécies de sentenças
transitivas:
99
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade. Essa espécie é geralmente aplicada nos
casos que envolvam “exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade”, ou
seja, quando diante da inconstitucionalidade por omissão parcial relativa.
ii) Sentença de inconstitucionalidade com ablação diferida: dá-se nas hipóteses de modulação
dos efeitos temporais da sentença (art. 27, Lei n. 9.868/99), quando se decide que a declaração
de inconstitucionalidade não produzirá efeitos ex tunc.
iv) Sentenças de aviso: sinalizam uma mudança na jurisprudência da Corte no futuro, mas tal
mudança não surtirá efeito para o caso sub judice. Temos o que a doutrina intitula de
prospective overruling, ou seja, uma mudança jurisprudencial futura.
a) Teoria não concretista: Judiciário apenas informa Legislativo quanto à sua mora
b) Teoria concretista: Judiciário estabelece as condições para exercício do direito, até que
sobrevenha a norma do Legislativo. Pode ser (i) concretista intermediária (é dado prazo ao
Legislativo para agir) ou (ii) concretista direta.
2. Objeto (Daniel Sarmento). A doutrina tradicional é criticável, pois afirma que somente é
cabível ADIO na ausência ou insuficiência de regulação de normas constitucionais de eficácia
limitada. Ocorre que a CF e a Lei 9.868/99 não fazem essa restrição (art. 103, §2º, CF “medida
para tornar efetiva norma constitucional”; art. 12-B, I, Lei 9.868/99 “dever constitucional de
legislar ou adoção de providência de índole administrativa”). Assim, para Daniel Sarmento,
100
seria possível ADIO mesmo no caso de normas de eficácia plena (e.g. direito à moradia; seria
possível ADIO para apontar a insuficiência de providências administrativas necessárias à
efetivação desse direito).
4. Legitimidade. Mesmos legitimados da ADI (art. 103, CF c/c Art.12-A da Lei 9.868/99).
6. Medida Cautelar. Pode ser suspensão da aplicação da lei ou ato normativo questionado
(omissão parcial), bem como suspensão de processos judiciais/procedimentos administrativos
(omissão total), ou ainda outra providência a ser fixada pelo Tribunal (art.12-F, Lei 9.868/99).
7. Efeitos da decisão.
No caso de omissão total:
(a) se a omissão for de um Poder, haverá ciência para adoção de providências (art. 12-H, §1º,
Lei 9.868/99); a lei não estabelece prazo, mas houve casos em que o STF já estabeleceu (ADI
3682, procedimentos para criação de novos Municípios)
(b) se a omissão for de órgão administrativo, o prazo será de 30 dias (regra) ou superior
(exceção conforme as circunstâncias do caso) (art. 12-H, §1º, Lei 9.868/99).
No caso de omissão parcial: órgãos estatais não podem praticar qualquer ato fundado na lei
inconstitucional. É caso de declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade,
que suspende a aplicação da norma defeituosa ou incompleta.
8. Fungibilidade. O STF já admitiu a fungibilidade entre ADI e ADIO (ADI 875, não
estabelecimento dos critérios de rateio do Fundo de Participação dos Estados).
3. Legitimidade passiva. Poder, órgão ou autoridade com atribuição para editar a norma
regulamentadora (art. 3º, Lei 13.300/16).
PR, Congresso, Câmara, Senado, STF, Tribunais Superiores, TCU (art. 102, I, q, CF);
STF
CNJ, CNMP (Jurisprudência)
101
Órgão/entidade/autoridade federal, excetuados casos do STF, da Justiça especializada e da Justiça
STJ Federal (art. 105, I, h, CF).
Essa competência residual do STJ acaba restringindo-se, na prática, apenas aos Ministros de Estado.
Demais órgãos/entidades/autoridades federais.
Justiça Federal
E.g. autarquias e agências reguladoras, como CADE, BACEN, IBAMA, ANATEL, CONTRAN.
Justiça Estadual Competência será definida nos termos da Constituição Estadual (art. 125, §1º, CF)
STF
(102, II, 1, a,
Julgar em
recurso HC MS HD
M decididos em única instância
pelos Tribunais
superiores, se
CF) ordinário
I denegatória a decisão
102
ADIO MI
Controle Concentrado ou Abstrato. Logo: Controle Difuso ou Concreto. Logo:
Efeitos são erga omnes Efeitos, em regra, são inter partes
Processo é objetivo (não há partes) Processo é subjetivo (há partes)
Não se admite desistência nem intervenção de
Admite-se desistência e intervenção de terceiros
NATUREZA JURÍDICA terceiros (exceto amicus curiae)
E CONSEQUÊNCIAS Podem ser considerados argumentos não trazidos Análise deve restringir-se aos argumentos
pelos proponentes (causa de pedir aberta) trazidos pelas partes
Não se aplicam regras de impedimento e suspeição Aplicam-se regras de impedimento e suspeição
Pode ser declarada inconstitucionalidade por Decisão deve restringir-se às normas
arrastamento de normas não impugnadas impugnadas
LEGITIMADOS ATIVOS Presidente da República, Governador
Mesa do Senado, da Câmara ou da Assembleia
ADIO: art. 103, CF Legislativa
PGR Ministério Público
MI individual: pessoas Partido com representação no Congresso Partido com representação no Congresso
naturais ou jurídicas Confederação sindical ou entidade de classe
Organização sindical ou entidade de classe
titulares do direito nacional
(art. 3º, Lei 13.300/16) Conselho Federal da OAB
Defensoria
MI Coletivo: art. 12, Associação constituída há 1 ano, dispensada
Lei 13.300/16 autorização especial de seus membros
MEDIDA CAUTELAR Cabe (art. 12-F, Lei 9.868/99) Não cabe
Como esteio lógico à ideia de direitos fundamentais, podem ser apontados, basicamente, dois
princípios: o Estado de Direito e a dignidade humana.
103
Direitos fundamentais são direitos ou posições jurídicas que investem os seres humanos,
individual ou institucionalmente considerados, de um conjunto de prerrogativas, faculdades e
instituições imprescindíveis a assegurar uma existência digna, livre, igual e fraterna a todas as
pessoas. Compõem um núcleo intangível de direitos dos seres humanos submetidos a uma
determinada ordem jurídica. São cláusulas pétreas e estão previstos no art. 5º da CF/88, sendo
que, segundo o STF, estão espalhados em diversos artigos da Carta Magna.
É usual que se diga serem os direitos fundamentais universais. Porém, tal afirmação deve ser
encarada com ressalvas, uma vez que alguns direitos fundamentais são voltados a
destinatários específicos (veja-se, por exemplo, o direito à nacionalidade).
Digno de nota o fato de que a Corte Suprema tem um entendimento bastante ampliativo dos
direitos fundamentais. Considera-se que tal espécie de direitos é aplicável até mesmo a
estrangeiros fora do país, caso sejam atingidos pela Lei brasileira (Caso “Boris Berezowski”).
104
Humanos, estendem a todos, estrangeiros residentes ou não, a titularidade dos direitos
humanos.
7
Vide assertiva verdadeira (adaptada) do concurso para Auditor de Controle Interno – Planejamento e Orçamento
do SEAP-DF de 2014, banca FUNIVERSA: Para os defensores da teoria interna dos direitos fundamentais, toda
limitação ao âmbito de proteção do direito fundamental importa automaticamente na sua violação, porque toda
limitação de um direito é, ao mesmo tempo, interferência na parte integrante da determinação do seu conteúdo
definitivo.
Vide também questão do 28º, assertiva verdadeira: Pela teoria interna, o conflito entre direitos fundamentais e
meramente aparente, na medida em que é superado pela determinação do verdadeiro conteúdo dos direitos
envolvidos.
105
• Indivisibilidade - Os direitos fundamentais são um conjunto, não podem ser analisados de
maneira separada, isolada (o desrespeito a um deles é, na verdade, o desrespeito a todos).
OBS1: A Teoria das Gerações/Dimensões de Direitos: doutrina concebida por Karel Vasak,
jurista francês, para classificar os direitos fundamentais conforme os temas da Revolução
Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade). Muito embora haja divergência na doutrina,
prefere-se o uso da expressão “dimensões” dos direitos fundamentais, ante a ideia de
complementaridade entre elas e não substituição. Ademais, divergem os juristas, também, em
relação a quantas seriam tais dimensões.
1) status passivo (subjectionis): o indivíduo está subordinado aos poderes estatais – ordens e
proibições;
106
2) status negativo (negativus ou libertatis): ao indivíduo é reconhecida uma esfera individual
de liberdade imune à intervenção estatal;
OBS: A decisão proferida em 1958 pela Corte Federal Constitucional da Alemanha no caso Lüth
é citada como o marco histórico a partir do qual se desenvolveu a teoria da dimensão objetiva
dos direitos fundamentais. Nesta decisão, ficou consignado que os direitos fundamentais
também “constituem decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, com
eficácia em todo o ordenamento jurídico e que fornecem diretrizes para os órgãos legislativos,
judiciários e executivos”.
• Eficácia vertical - A História aponta o Poder Público como o destinatário precípuo das
obrigações decorrentes dos direitos fundamentais. A finalidade para a qual os direitos
fundamentais foram inicialmente concebidos consistia, exatamente, em estabelecer um
espaço de imunidade do indivíduo em face dos poderes estatais. Tal proteção, expressada nas
relações entre os cidadãos (posição de inferioridade) e os poderes públicos (posição de
superioridade), tem sido denominada de eficácia vertical dos direitos fundamentais.
• Eficácia horizontal - Com a evolução dos direitos fundamentais, fica óbvio que os
particulares também precisam respeitá-los, o que leva à eficácia horizontal: o reconhecimento
de que os direitos humanos também incidem nas relações entre particulares (também
8
Status negativo, nas palavras de Jellinek.
107
chamada de eficácia privada ou externa ou drittwirkung - Direito alemão). Contudo, quanto à
aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas, há duas teorias:
2) eficácia direta ou imediata: Alguns direitos fundamentais podem ser aplicados às relações
privadas sem que haja a necessidade de intermediação legislativa para a sua concretização,
posto que seriam oponíveis erga omnes. Resultaria na aplicação direta dos preceitos
constitucionais. Essa foi a tese que prevaleceu no Brasil, na doutrina e, inclusive, no STF 9 e no
STJ.
• Eficácia Diagonal - Surgida mais recentemente, fala-se atualmente em eficácia diagonal dos
direitos fundamentais, que constituiria um tertium genus cunhado pelo jurista chileno Sergio
Gamonal Contreras, pelo qual, ao lado das garantias constitucionais do cidadão frente ao
Estado (eficácia vertical) e frente aos próprios particulares (eficácia horizontal), surge a
necessidade de proteção nas relações entre particulares, notadamente caracterizadas pelo
desequilíbrio ou desproporcionalidade (assimetria substancial). No ordenamento positivo, a
eficácia diagonal se expressa nas relações onde estão pressupostas a vulnerabilidade, inerente
a todo consumidor (art. 4º, I, CDC), e nas relações trabalhistas, com o intuito de atenuar a
hipossuficiência pressupostamente havida pelo empregado na relação de trabalho que
estabelece com o seu empregador.
20C. Limites dos direitos fundamentais. Teorias interna e externa. Núcleo essencial e
proporcionalidade. Os "limites dos limites".
RE 201.819, julgado em 11 -10 -2005, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes (DJ de 27/10/2006); RE 161.243,
Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 19/12/1997; RE 158.215-4, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ de 07/06/1996.
108
lei ordinária promulgada com fundamento imediato na própria Constituição (restrição
mediata). (Gilmar Mendes, fl. 229)
A teoria interna prega que um direito fundamental existe, desde sempre, com seu
conteúdo determinado e, por isso, o direito fundamental já nasce com seus limites. Assim,
“eventual dúvida sobre o limite do direito não se confunde com a dúvida sobre a amplitude das
restrições que lhe devem ser impostas, mas diz respeito ao próprio conteúdo do direito”.
(Gilmar Mendes, fl. 226). Do ponto de vista lógico, a restrição seria desnecessária e até
impossível, já que o alcance do direito fundamental, pela teoria interna, já seria determinado
de antemão. Não há, dessa forma, separação entre o âmbito de proteção do direito e seus
limites, o que permite a inclusão de considerações sobre outros bens dignos de proteção,
aumentando o risco de restrições arbitrárias de liberdade.
Com relação à teoria externa, André de Carvalho Ramos entende que esta adota a
separação entre o conteúdo do direito e limites que lhe são impostos do exterior, oriundos de
outros direitos. Devem ser observados dois momentos: 1º) Deve ser delimitado o direito
prima facie envolvido; 2º) Investigar se há limites justificáveis impostos por outros direitos, de
modo a impedir que o direito prima facie seja considerado um direito definitivo. A chave
mestra para a teoria externa seria o uso do critério da proporcionalidade. É a teoria adotada
preferencialmente pela doutrina e pela jurisprudência.
Aproxima-se dessa teoria a posição de Hesse, para quem os conflitos entre direitos
fundamentais podem ser resolvidos pela concordância prática (os direitos de estatura
constitucional podem ser equilibrados entre si, gerando uma compatibilidade na sua aplicação,
mesmo que no caso concreto seja minimizada a aplicação de um dos direitos envolvidos.
Contudo, essa restrição deve ser limitada. É o chamado “limites dos limites”. A
concepção dos limites dos limites decorre da teoria absoluta, do núcleo essencial, segundo a
qual o núcleo essencial dos direitos fundamentais estaria protegido de qualquer intervenção
do Estado, independentemente da situação concreta. Assim, haveria uma parte do conteúdo
do direito fundamental suscetível a limitações pelo legislador e outra parte seria insuscetível a
limitações, representando um verdadeiro “limite do limite” para a própria ação legislativa. Essa
ideia se contrapõe àquela defendida pelos adeptos da teoria relativa, segundo a qual o núcleo
essencial seria aferido caso a caso, mediante processo de ponderação entre meios e fins, com
base no princípio da proporcionalidade. O núcleo essencial seria aquele insuscetível de
restrição com base nesse processo. Ambas as teorias buscam assegurar maior proteção dos
direitos fundamentais contra ação legislativa desarrazoada. Críticas: teoria absoluta traz
dificuldade em identificar abstratamente a existência desse mínimo essencial do direito
fundamental, podendo-se sacrificar aquilo que se busca proteger. Teoria relativa pode conferir
excessiva flexibilidade aos direitos fundamentais. Os limites são os seguintes:
109
a) O ato normativo que pode restringir um direito fundamental é a lei em sentido formal (ou
emenda constitucional);
b) A norma deve ser geral e abstrata. Conforme André de Carvalho Ramos, a restrição pode ser
feita através de uma reserva legal simples (autorização dada pela Constituição a edição
posterior de lei que adote determinada restrição a direito fundamental, não fixando
previamente os requisitos, condições ou parâmetros. Ex: Art. 5º, VI –é inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida,
na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias) ou de uma reserva legal
qualificada (a Constituição, além de estabelecer a reserva de lei, ainda estipula os requisitos e
condições que a lei deve observar. Ex: Art. 5º, XIII –é livre o exercício de qualquer trabalho,
ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
Conceitos extras:
Reserva legal subsidiária situação em que direitos são previstos na Constituição sem
qualquer menção à lei restritiva, mas podem ser regulados pelo legislador em face dos demais
valores constitucionais;
Reserva geral de ponderação todos os direitos fundamentais estão a ela submetidos, uma
vez que estão sujeitos à ponderação com outros valores previstos na Constituição,
relacionados a outros direitos fundamentais em colisão.
c) Proporcionalidade.
Núcleo essencial seria a parcela do conteúdo do direito sem a qual ele perde sua
mínima eficácia. Forma de evitar ou contornar o esvaziamento do conteúdo dos direitos
fundamentais pelo legislador. Apesar de vedar expressamente qualquer proposta de emenda
tendente a abolir direitos fundamentais (art. 60, §4º), CRFB/88 não traz de forma expressa a
garantia do núcleo essencial, ao contrário da Lei Fundamental alemã e das Constituições
portuguesa e espanhola. Ainda assim, o princípio de um núcleo essencial decorre do modelo
garantístico da CRFB/88. STF tem usado o princípio em vários julgados (HC 82.959, Rel Min.
Marco Aurélio, DJ 1º.09.2006, Voto Ministro Peluzo no caso de vedação à progressão de
regime em cumprimento de pena de crime hediondo: atinge o núcleo do princípio da
individualização da pena).
110
adequada e eficaz). O STF utiliza princípio da proporcionalidade como instrumento para
solução de colisão entre direitos fundamentais (HC 76.060, Rel. Min Sepúlveda Pertence).
Duplo controle de proporcionalidade e controle de proporcionalidade in concreto:
qualquer medida administrativa ou judicial com base na lei aprovada pelo parlamento que
afete direitos fundamentais também se submete ao controle de proporcionalidade.
Oswaldo Costa
I. Princípio da dignidade da pessoa humana.
Natureza jurídica: tanto nos diplomas internacionais quanto nacionais, a dignidade humana é
inscrita como princípio geral ou fundamental, mas não como direito autônomo. De fato, a
diginidade humana é uma categoria jurídica que, por estar na origem de todos os direitos
humanos, confere-lhes conteúdo ético (ACR, Curso de direitos humanos, 2014, p. 74).
111
Positivado na Constituição, o princípio da dignidade da pessoa humana costura e unifica
todo o sistema pátrio de direitos fundamentais e “representa o epicentro axiológico da
ordem constitucional, irradiando seus efeitos sobre todo o ordenamento jurídico e
balizando não apenas os atos estatais, mas também toda a miríade de relações privadas
que se desenvolvem no seio da sociedade civil e no mercado” (SARMENTO).
Considerações: a dignidade da pessoa humana constitui um valor que atrai a realização dos
direitos fundamentais do homem, em todas as suas dimensões. É um valor fundamental que
se viu convertido em princípio jurídico de estatura constitucional, seja por sua positivação em
norma expressa seja por sua aceitação como mandamento jurídico extraído do sistema.
Serve, assim, tanto como justificação moral quanto como fundamento normativo para os
direitos fundamentais. O princípio da dignidade da pessoa humana pode ser classificado, de
acordo com a modalidade de eficácia, em três categorias: direta (incide à semelhança de
uma regra), interpretativa (os valores e fins nele abrigados condicionam o sentido e o alcance
das normas jurídicas em geral) e negativa (implica na paralisação de qualquer norma ou ato
jurídico que com ele seja incompatível).
112
locus da concorrência entre indivíduos isolados, perseguindo projetos pessoais antagônicos,
mas sim um espaço de diálogo, cooperação e colaboração entre pessoas livres e iguais, que
se reconheçam como tais.
Realidade brasileira: em nosso ordenamento, a Constituição da República quando estabelece
como um de seus objetivos fundamentais a construção de “uma sociedade justa, livre e
solidária”, expressa um princípio jurídico que, apesar da abertura e indeterminação
semântica, é dotado de algum grau de eficácia imediata e que pode atuar, no mínimo, como
vetor interpretativo da ordem jurídica como um todo, e não em mero e vago programa
político ou algum tipo de retoricismo.
113
enfim, de um espaço essencial para viver com um mínimo de saúde e bem
estar, certamente a pessoa não terá assegurada a sua dignidade, aliás, a
depender das circunstâncias, por vezes não terá sequer assegurado o
direito à própria existência física, e, portanto, o seu direito à vida. Aliás, não
é por outra razão que o direito à moradia, tem sido incluído até mesmo no
elenco dos assim designados direitos de subsistência, como expressão
mínima do próprio direito à vida e, nesta perspectiva (bem como e função
de sua vinculação com a dignidade da pessoa humana) é sustentada a sua
inclusão no rol dos direitos de personalidade”.
Quanto aos desafios, o Relator especial da ONU para moradia adequada, Miloon
Kothari, em seu informe apresentado em 13 de fevereiro de 2008, considerou como um dos
principais obstáculos à realização desse direito, por inúmeros segmentos das sociedades
nacionais, o fato de se considerar a morada, a terra e a propriedade como produtos
comercializáveis, e não direitos humanos. Esta compreensão é igualmente reafirmada por
Deborah Duprat na NT nº 4/2017-PFDC.
Daniel Sarmento relembra que, diferentemente do que acontece com saúde e
educação, a Constituição Federal não dedica um título específico para a moradia, mas são
encontrados diversos institutos no texto da Constituição a ela ligados, tal como o usucapião
especial rural e urbano, regras sobre função social da propriedade - tanto no art. 5º quanto no
art. 170 -, regra sobre desapropriação, etc. E é muito importante ressaltar que o direito de
moradia não é o direito a casa própria; exige-se, sim, segurança jurídica, mas isto não implica
propriedade. A moradia é um direito de feição positiva e negativa: a faceta negativa da
moradia vem à baila nas situações em que a pessoa em geral tem uma moradia, mas há
alguma ação do Estado ou do particular para privá-la ou restringi-la. Aqui temos uma questão
de cultura jurídica superimportante. A positiva é justamente a perspectiva prestacional.
Importante: o site da PFDC contém uma aba específica para o tema moradia adequada, na
qual são discriminadas, dentre outras informações, a atuação do MPF (ofício requerendo
informações sobre o andamento de processo licitatório para a construção de moradias
populares e TAC celebrado com município para realocação de moradores desalojados, por
exemplo), decisões judiciais (ACP no caso Pinheirinho) e notícias diversas quanto ao tema.
114
monoculturas, que favoreceu a concentração das empresas e do capital, cada vez mais
internacionalizados.
Muitos países, regiões e municípios, também dentro do Estado brasileiro, vivem sem
soberania alimentar e outros tantos vivem com sua soberania alimentar ameaçada pelos
fatores supramencionados. Nesse contexto, a soberania alimentar significa o direito dos países
definirem suas próprias políticas e estratégias de produção, distribuição e consumo de
alimentos que garantam a alimentação para a população, respeitando as múltiplas
características culturais dos povos em suas regiões. 10
No Comentário Geral n° 12, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
sobre o Direito Humano à Alimentação Adequada – interpretando o art. 11 do PIDESC – fixou
que o conteúdo essencial do direito à alimentação adequada consiste: a) A disponibilidade do
alimento, em quantidade e qualidade suficiente para satisfazer as necessidades dietéticas
das pessoas, livre de substâncias adversas e aceitável para uma dada cultura; b) A
acessibilidade ao alimento de forma sustentável e que não interfira com a fruição de outros
direitos humanos.
No Brasil, a alimentação e nutrição estão presentes na legislação recente, com
destaque para a Lei 8080/1990, que entende a alimentação como um fator condicionante e
determinante da saúde e que as ações de alimentação e nutrição devem ser desempenhadas
de forma transversal às ações de saúde, em caráter complementar e com formulação,
execução e avaliação dentro das atividades e responsabilidades do sistema de saúde.
Houve, ainda, a incorporação da alimentação como um direito social pela Emenda
Constitucional n° 64. Nesse sentido, o Estado Brasileiro, pretendendo concretizar o dispositivo,
publicou a Lei 11.346/2006 – Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional e o Decreto
7272/2010 - Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
Consoante o Manual de Atuação da ESMPU (mencionado no quadro abaixo): o
direito humano à alimentação está também presente em várias normas infraconstitucionais
nacionais, a exemplo da complexa legislação sobre a água, o aleitamento materno, o controle
de qualidade dos alimentos, da produção e do consumo, a importância da alimentação para a
saúde do ser humano etc.
Importante 1: a PFDC possui uma aba em seu site sobre alimentação adequada, bem como
possui um grupo de trabalho sobre o tema desde 2004. Malgrado a aba não possua
conteúdo relevante, quanto ao grupo de trabalho é possível colacionar as suas linhas de
atuação: Resgatar, divulgar e multiplicar iniciativas institucionais pelo direito à alimentação
adequada;
Ampliar o conhecimento e acompanhar a implantação de políticas públicas relacionadas ao
direito à alimentação adequada; Realizar, com a PFDC, atividades extrajudiciais de
acompanhamento e fiscalização do Programa Bolsa Família (PBF) e do Programa Nacional da
Alimentação Escolar (PNAE), na perspectiva da superação de barreiras ao acesso, com
atenção à populações vulneráveis; Estudar e propor formas de atuação pelo acesso à água,
priorizando as populações vulneráveis e pela redução do excesso de sódio nos alimentos
industrializados; Acompanhar e debater Projetos de Lei relacionados ao tema; Acompanhar
a regulamentação e implantação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(SISAN), previsto na Lei Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – a LOSAN; Interagir
com órgãos públicos, conselhos, organismos internacionais e com a sociedade civil
organizada; Acompanhar o funcionamento do SISVAN – Sistema Nacional de Vigilância
Alimentar e Nutricional; Apoiar a participação dos representantes do MPF em Comissões e
Conselhos.
Importante 2: a ESMPU possui um Manual de Atuação sobre o Direito à Alimentação
10
Análise crítica disponível em: http://www4.planalto.gov.br/consea/comunicacao/artigos/2014/direito-
humano-a-alimentacao-adequada-e-soberania-alimentar e
http://www4.planalto.gov.br/consea/comunicacao/artigos/2014/direito-humano-a-alimentacao-
adequada-e-soberania-alimentar
115
Adequada, que trata de aspectos gerais do direito, bem como dos vieses específicos
(crianças, gênero, populações tradicionais, migrantes e diversos outros) e contém no Anexo
I peças processuais de atuação na temática, as quais são as mais variadas possíveis – desde
Recomendação para a concessão de bolsa alimentação a ação civil pública para obrigar a
aposição de determinadas informações em alimentos industrializados.
Oportuno salientar que, para José Adércio, é possível identificar uma dimensão
cultural do constitucionalismo democrático. Isso porque o constitucionalismo democrático
exige a retomada da fraternidade como força de ligação entre a liberdade e a igualdade. Ela
demanda uma reconsideração de identidades que se formam em ambiente de alteridade e
respeito. As “identidades nacionais” devem ser consideradas não como fator de exclusão das
diferenças, ou como resultado da tensão entre amigos e inimigos, mas como expressões
culturais que têm a humanidade por substrato e fim.
O constitucionalismo democrático abre-se, assim, para dentro, positivando normas de
promoção da cultura, e para fora, com o reconhecimento da continuidade constitutiva das
diversas manifestações culturais que acabam por revelar a convergência da atitude humana de
dar sentido às coisas e a si. Essa exteriorização pode se dar pela celebração de tratados de
116
direitos culturais e de proteção do patrimônio cultural, bem como pela declaração expressa
dos próprios textos constitucionais, autorizando-se falar em um “constitucionalismo da
cultura”.
Dessa forma, no âmbito da cultura a interpretação das normas deve levar em conta o
pluralismo, a possibilidade de convivência e o menor sacrifício possível, tendo em vista as
exigências de um regime democrático, preocupado com a proteção das minorias.
Devem ser respeitados e oferecidos espaços às diversas concepções culturais, inclusive
a “cultura popular”, caracterizada por manifestações culturais das classes não hegemônicas,
que estão fora das instituições oficiais e que existem independentemente delas.
117
Os marcos do constitucionalismo latino-americano são as constituições do Equador
(2008) e da Bolívia (2009). Há algumas características basilares deste constitucionalismo: a) a
ampla participação popular na elaboração e alteração da constituição; b) o respeito às
tradições indígenas; c) a existência de Estados plurinacionais; d) o rompimento com o
colonialismo constitucional europeu e norte-americano; e e) a igualdade material/fraternal.
Para viabilizar as premissas da igualdade material e multiculturalismo, o Estado poderá
se valer de vários instrumentos, como, i.e., a composição das cortes constitucionais e do
parlamento com a presença obrigatória de indígenas, além da observância da igualdade de
gênero; e a consulta prévia prevista na Convenção 169 da OIT.
Trata-se, portanto, de relevante quebra de paradigma no tocante ao
constitucionalismo, costumeiramente estudado a partir da história da Europa e dos Estados
Unidos. Esta ainda é uma realidade bastante presente nos países que outrora foram
colonizados. O novo constitucionalismo latino-americano é, portanto, uma grande evolução no
resgate da identidade dos seus povos originários.
118
difamado habitualmente em interações cotidianas ou representações públicas estereotipadas).
É sob esta ótica que deve ser enxergado o direito à diferença e ao reconhecimento.
O pano de fundo dos debates sobre reconhecimento é a existência de sociedades
globalizadas e complexas, nas quais a convivência instável de múltiplas visões de mundo
colocou em xeque as hierarquias sociais tradicionais. Ademais, a crise do Estado-nação e das
formas clássicas de democracia representativa reforçou a geração de poderosas identidades
coletivas voltadas ora à transformação (ecologistas, hip-hop, vegetarianos, transexuais), ora à
conservação da ordem tradicional (organizações que pregam o “orgulho branco”, a
interpretação literal da bíblia ou o “retorno aos valores da família”, por exemplo).
1. Liberdade de Expressão
A garantia da liberdade de expressão tutela, ao menos enquanto não houver colisão com
outros direitos fundamentais e com outros valores constitucionalmente estabelecidos, toda
opinião, convicção, comentário, avaliação ou julgamento sobre qualquer assunto ou sobre
qualquer pessoa, envolvendo tema de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou
não, sendo certo que, num Estado baseado na concepção de democracia livre e pluralista, não
se diferencia entre opiniões relevantes ou sem maior importância.
Trata-se de típico direito de abstenção do Estado, e como tal, será exercida, em regra, contra o
Poder Público, não ensejando, ordinariamente, uma pretensão a ser exercida em face de
terceiros.
119
• liberdade de informação (liberdade de expressão em sentido amplo), que engloba o direito
individual de comunicar livremente fatos e ao direito difuso da cidadania de ser deles
adequadamente informado (assuntos de interesse geral - comunicação de fatos noticiáveis,
cuja caracterização vai repousar, sobretudo, no critério da sua veracidade);
• liberdade de imprensa, que engloba o direito-dever de os meios de comunicação social
divulgarem fatos e opiniões, envolvendo tanto a liberdade de informação como a de expressão
(dimensão eminentemente coletiva do direito).
Para além do tratado, importa salientar que a liberdade de expressão, enquanto gênero, é de
suma importância em qualquer regime que se pretenda democrático. É a sua garantia que
possibilita que a vontade coletiva seja formada através do confronto livre de ideias, em que
todos os grupos e cidadãos tenham a possibilidade de participar, seja para exprimir seus
pontos de vista, seja para ouvir os expostos por seus pares. E é a sua projeção institucional – a
liberdade de imprensa – que confere maior transparência ao funcionamento do Estado,
permitindo o controle dos governantes pelos governados.
OBS: Tendo em vista assuntos cobrados no concurso 28CPR, de ser destacada a visão de
Gustavo Binenbojm, que assevera que alguns direitos individuais relacionados no art. 5º da
CRFB/88 mitigam a dimensão puramente negativa da liberdade de imprensa (art. 220, § 1º).
Dentre eles, merecem destaque especial o direito de resposta (art. 5º inciso V) e o direito de
acesso à informação (art. 5º XIV).
Na visão do autor, uma leitura sistemática dos diversos dispositivos constitucionais antes
aludidos, à luz de uma noção de democracia deliberativa inerente ao moderno Estado
democrático de direito, permite concluir não apenas pela constitucionalidade de uma versão
nacional da fairness doctrine, como pela existência de um mandamento constitucional no
sentido da sua implantação.
120
A liberdade de expressão encontra limites previstos diretamente pelo constituinte 11, como
também descobertos pela colisão desse direito com outros de mesmo status, lembrando que
em que caso de ponderação, os direitos ora abordados ocupam preferred position (prioridade
prima facie).
A restrição mais radical, sempre excepcional e não prevista explicitamente pelo constituinte
em nenhum ponto do texto de 1988, é a proibição prévia da publicação ou divulgação do fato
ou da opinião. Essa é uma modalidade de restrição que elimina a liberdade de informação
e/ou de expressão, reservando-se tal aos raros casos em que não seja possível a composição
posterior do dano que eventualmente seja causado aos direitos da personalidade.
3. Liberdade Religiosa
A proteção constitucional à liberdade religiosa não se refere à tutela a uma corrente de ideias
ou pensamentos, mas à compreensão de um direito mais amplo de liberdade de consciência,
que assegura a autodeterminação existencial e ética dos indivíduos, que se desdobra em
diversos campos, como o filosófico, o ideológico e o religioso.
O Estado brasileiro não é confessional, mas tampouco é ateu! Por isso, são permitidos, por
exemplo, o ensino religioso em escolas públicas de ensino fundamental, para os alunos
11
Art. 220, §§ 1º, 3º, II e 4º da CRFB e, ainda, previstos no art. 5º da CRFB: vedação ao anonimato (final
do art. 5º, IV); direito de resposta (inc. V); direito à indenização por dano material ou moral à intimidade,
à vida privada, à honra e à imagem das pessoas (inc. X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou
profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (inc. XIII); direito ao resguardo do
sigilo da fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inc. XIV).
121
interessados, bem como, admite-se que o casamento religioso produza efeitos civis, na forma
do disposto em lei.
A invocação da liberdade religiosa não pode servir, contudo, de pretexto para a prática de atos
que se caracterizam como ilícitos penais. Nessa linha, o STF decidiu que o curandeirismo não
se inclui no âmbito da liberdade religiosa.
O Estado brasileiro é laico! Contudo, tal laicidade do Estado não significa inimizade com a fé.
Não impede a colaboração com confissões religiosas, para o interesse público.
Assim, ainda que indigitado princípio imponha a neutralidade estatal em matéria religiosa, tal
premissa não é incompatível com a colaboração entre o Poder Público e representantes das
igrejas e cultos religiosos que vise à promoção do interesse público.
A laicidade estatal revela-se princípio que atua de modo dúplice: a um só tempo, salvaguarda
as diversas confissões religiosas do risco de intervenção abusiva estatal nas respectivas
questões internas e protege o Estado de influências indevidas provenientes de dogmas, de
modo a afastar a prejudicial confusão entre o poder secular e democrático e qualquer doutrina
de fé, inclusive majoritária.
Segundo Daniel Sarmento, laicidade não se confunde com laicismo, já que este representa
verdadeira animosidade do Estado para com a religiosidade, enquanto aquela configura
apenas relação de neutralidade e imparcialidade estatal para com todas as manifestações
religiosas, de maneira a assegurar o exercício igualitário da liberdade religiosa, em um
ambiente de pluralismo religioso e mundividencial. Por isso mesmo, deve o Estado, em alguns
casos, adotar comportamentos positivos, com a finalidade de afastar barreiras e sobrecargas
que possam impedir ou dificultar determinadas opções em matéria de fé.
Cumpre ressaltar que, quanto à adoção de feriados religiosos pelo Estado brasileiro, justifica-
se tal atitude sob o ponto de vista cultural.
122
Questão 1 – III - O ateísmo, na sua negativa da existência de Deus, é também uma posição
religiosa que não pode ser privilegiada pelo Estado.
VERDADEIRO. “Na verdade, o ateísmo, na sua negativa da existência de Deus, é também uma
posição religiosa10, que não pode ser privilegiada pelo Estado em detrimento de qualquer
outra cosmovisão”. Inicial da ADI 4439 (ensino religioso).
5. Liberdade de Associação
Sob a expressão, estão abarcadas distintas faculdades, tais como (a) a de constituir associações
(e cooperativas), que não dependam de autorização, (b) a de ingressar nelas, (c) a de
abandoná-las e de não se associar, e, finalmente, (d) a de os sócios se auto-organizarem e
desenvolverem as suas atividades associativas. Merece destaque, ainda, o direito negativo que
surge das previsões constitucionais, consistente na impossibilidade de o Estado limitar a
existência da associação ou pretender interferir em sua vida interna, não podendo, inclusive,
dissolvê-la em definitivo, sob qualquer pretexto, sem que, para tanto disponha de decisão
judicial transitada em julgado.
Quanto à representatividade prevista no art. 5º, XXI, da CRFB, entendeu o STF que a atuação
da associação se dá por intermédio de representação, exigindo, pois, autorização expressa dos
representados, por autorizações individuais específicas ou por ata de assembleia, desde que
os estatutos da associação prevejam, como uma das finalidades da entidade, a representação
em juízo dos associados.
Para o STF, a associação não dispõe de legitimidade para promover interpelação judicial em
defesa da honra de seus filiados, já que o bem juridicamente tutelado, na hipótese, é
personalíssimo.
123
IGUALDADE DE GÊNERO: A igualdade de gênero está formalmente expressa na
Constituição, erigida a direito fundamental, sendo o primeiro direito fundamental expresso no
rol do art. 5° da CR/88 (inc. I: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição”). De outro lado, a legislação está repleta de leis específicas
que buscam dar a esta igualdade de gênero formalmente reconhecida na Carta, um
conteúdo material, tornando-a efetiva. Por ex., a legislação que regula as relações de trabalho
(CLT), que tenta tornar efetiva a igualdade de gênero. Nos arts. 372 e ss da CLT há dispositivos
especialmente protetivos à mulher trabalhadora, buscando extirpar as diferenças
injustificáveis existentes entre homens e mulheres nas relações de trabalho. Corroborando
essa proteção que busca a igualdade material, a Lei 9.029/95 que proíbe a exigência de
atestados de gravidez e esterilização e outras práticas discriminatórias para efeitos
admissionais ou de permanência nas relações de trabalho. Igualmente, no âmbito
internacional, o Brasil é signatário da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de
discriminação contra a mulher, promulgada pelo Decreto 4.377/02. Também é válido
mencionar a Lei Maria da Penha, como mais um instrumento de dignidade da mulher, que
busca dar concretude material ao comando constitucional mencionado. FORO ESPECIAL
PARA A MULHER: “O inc. I do art. 100 do CPC, com redação dada pela Lei 6.515/1977, foi
recepcionado pela CF/88. O foro especial para a mulher nas ações de separação judicial e de
conversão da separação judicial em divórcio não ofende o princípio da isonomia entre homens
e mulheres ou da igualdade entre os cônjuges, RE 227114, Min. Joaquim Barbosa DIREITOS
SEXUAIS - BARSTED, 2010: “O controle da sexualidade sempre esteve presente no
ordenamento jurídico brasileiro como garantidor da constituição da família heterossexual e da
procriação legítima (..). Tal controle levou à criminalização de um conjunto de
comportamentos considerados ‘atentatórios’ à família (adultério), à saúde (contágio de
doença venérea) e liberdade sexual, assim como acarretou a criminalização da prática do
aborto, exceto quando resulta de violência sexual [...] O direito brasileiro, em linhas gerais,
apresenta duas possibilidades no que refere ao exercício da sexualidade: um exercício
estimulado para procriação e constrangido ao âmbito familiar, e um exercício proibido e,
por consequência, criminalizado.” Essa realidade sofreu, e sofre, questionamentos por
parte de movimentos feministas e LGBTs, passando o Estado, paulatinamente, a incorporar
nas políticas públicas cuidados com temas como a prevenção e promoção da saúde, contra o
contágio de DSTs; a aprovação de lei de planejamento familiar (Lei 9.263/96) e ao
acolhimento, pelo Ministério da Saúde e pelo SUS, da cirurgia de mudança de sexo, fruto de
ACP movida pelo MPF, que resultou na edição da Portaria do Ministério da Saúde nº
1.707/08, fixando que a cirurgia para mudança de sexo (transgenitalização) faria parte da
lista de procedimentos do SUS. “Em relação especificamente às mulheres, a Constituição
Federal de 1988 as discriminações na vida familiar e, em 2003, o novo Código Civil suprimiu as
referências ‘as expressões ‘comportamento desonesto da filha’ e ‘ virgindade da mulher’,
inseridas no Código Civil de 1916. [...] No campo da proteção contra violação de direitos, a
ratificação de diversas convenções internacionais, como a Convenção de Belém do Pará para
prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (...). A partir de 2003, novas demandas
por proteção foram introduzidas na legislação penal, que implicaram o reconhecimento da
ilicitude do assédio sexual, do tráfico de pessoas, da tipificação explícita do estupro marital e
de maior severidade para os crimes sexuais.” (Idem). “Em 2005, a Lei 11.106 alterou diversos
artigos do CP, na maioria claramente discriminatórios. Assim, por ex., o art. 5º dessa lei declara
revogados os incisos VII e VIII do art. 107, que considerava extinta a punibilidade do
estuprador que se casasse com a vítima. [...] No terreno da descriminalização, os avanços
foram poucos. Assim, a legislação penal restringiu-se apenas à descriminalização do adultério,
deixando de fora a demanda pela descriminalização do aborto
voluntário
Segundo PIOVESAN, quatro princípios devem orientar direitos sexuais e reprodutivos:
(a) universalidade (b) indivisibilidade (c) diversidade e (d) democrático.
124
DIREITOS REPRODUTIVOS: SIEGEL afirma que “(...) a abordagem baseada na igualdade
de gênero para direitos reprodutivos considera o controle sobre quando ser mãe como crucial
para o status e bem-estar das mulheres”. Nos termos do art. 226, § 7.º, fundado nos princípios
da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é de
livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para
o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais
ou privadas. De acordo com o art. 2.º da Lei n. 9.263/96 (regula o § 7.º do art. 226 da CF/88),
entende-se por planejamento familiar “... o conjunto de ações de regulação da fecundidade
que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo
homem ou pelo casal”. Nesse sentido, destacamos duas ações do Estado: a) distribuição de
preservativos: não só no carnaval, mas durante todo o ano, o que materializa o comando do
art. 226, § 7.º; b) distribuição da “pílula do dia seguinte”: A pílula anticoncepcional de
emergência é um recurso anticoncepcional para evitar uma gravidez indesejada. Não é
abortiva, pois não interrompe uma gravidez estabelecida e seu uso deve se dar antes da
gravidez. Os estudos disponíveis atestam que ela atua impedindo o encontro do
espermatozoide com o óvulo, seja inibindo a ovulação, seja espessando o muco cervical ou
alterando a capacitação dos espermatozoides. Portanto, o seu mecanismo de ação é
basicamente o mesmo de outros métodos anticoncepcionais hormonais (pílulas e injetáveis).
(Nota Técnica do Ministério da Saúde).
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E REPROPOSITURA DA AÇÃO: STF reconheceu
repercussão geral na possibilidade da repropositura de ação de investigação de paternidade,
quando anterior demanda idêntica entre as mesmas partes foi julgada improcedente por falta
de provas em razão da parte interessada não dispor de condições econômicas para realizar o
exame de DNA e o Estado não ter custeado a produção dessa prova. Há relativização da coisa
julgada estabelecida nesses casos. Não devem ser impostos óbices de natureza processual à
busca da identidade genética (direito fundamental), que emana do direito de personalidade, e
envolve a efetividade do direito à igualdade entre os filhos, do princípio da paternidade
responsável. Hipótese em que não há disputa de paternidade de cunho biológico, em
confronto com outra, de cunho afetivo. Busca-se o reconhecimento de paternidade com
relação a pessoa identificada. (RE 363889, Dias Toffoli, 2.6.11, Plenário)
ADPF 54: Inf. STF 661: “inescapável o confronto entre, de um lado, os interesses
legítimos da mulher em ver respeitada a sua dignidade e de outro, os de parte da sociedade
que desejasse proteger todos os que a integrariam, independente da condição física ou
viabilidade de sobrevivência. [...]o tema envolveria a dignidade humana, o usufruto da vida, a
liberdade, a autodeterminação, a saúde e o reconhecimento pleno de direitos individuais,
especificamente os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres”. Ao final, o STF julgou
procedente a ADPF para dar aos dispositivos do CP que proíbem o aborto, interpretação
conforme, impendido qualquer leitura dos aludidos dispositivos da lei penal, que pudessem
entender como criminosa a conduta da mulher que promove a interrupção terapêutica do
parto em face da anencefalia do feto devidamente diagnosticada. É importante frisar ainda
que a questão conta com parecer de DEBORAH DUPRAT pela procedência da demanda.
Quanto à questão da autonomia reprodutiva da mulher, consignou a examinadora que “a
questão em debate nestes autos envolve a autonomia reprodutiva da mulher, que tem como
fundamento constitucional nos direitos à dignidade, à liberdade e à privacidade. É evidente
que essa autonomia não é de natureza absoluta. Entendo que a ordem constitucional também
proporciona proteção à vida potencial do feto – embora não tão intensa quanto à tutela da
vida após o nascimento -, que deve ser ponderada com os direitos humanos das gestantes para
o correto equacionamento das questões complexas que envolvem o aborto”.
125
I. Princípio da isonomia. Igualdade e diferença.
2ª fase: igualdade material - prevaleceu no constitucionalismo social. Igualdade na lei (no seu
conteúdo). Exemplo clássico de luta em torno da igualdade: direitos do trabalhador. É a ideia
de desigualar, de forma a equiparar os econômica ou culturalmente mais fracos aos mais
privilegiados. Há mudança profunda acerca do conceito de pessoa. Tratam-se desigualmente
os desiguais, observado o princípio da proporcionalidade.
3ª fase: igualdade como reconhecimento - segundo essa visão, há direito a ser igual quando a
desigualdade inferioriza. Fala-se em um direito à equiparação. Por outro lado, há o direito a ser
diferente quando a igualdade descaracteriza. Aqui está, por exemplo, o fundamento da
proteção dos índios: tratá-los como iguais descaracteriza sua cultura.
Muitos dos preceitos relacionados com a igualdade foram redigidos de forma a denotar
a necessidade de ação. A própria Constituição, aliás, consagrou expressamente políticas de
ação afirmativa em favor de segmentos sociais em situação de maior vulnerabilidade. Para
citar os dois exemplos mais evidentes, o art. 7º, XX, da Carta (incentivo para inserção da
mulher), bem como o seu art. 37, VIII (reserva de vagas a pessoas com deficiência).
Cotas para negros nas universidades: há 2 teses: (i) as cotas promovem a isonomia
porque são uma reparação por injustiças históricas. Além disso, há necessidade de promoção
de igualdade de oportunidades; (ii) as cotas estimulam o ódio racial; o critério meritocrático é
o que envolve o acesso à universidade pública; como definir quem é negro?
O fato de haver uma única raça não significa que o racismo não existe. Isso porque ele
remanesce a partir de concepções sociais, culturais e políticas. Promoção do pluralismo:
vivemos em um país que tem como uma das suas maiores riquezas a diversidade étnica e
cultural. Porém, para que todos se beneficiem dessa valiosa riqueza, é preciso que haja um
contato real e paritário entre pessoas de diferentes etnias. É necessário romper com o modelo
informal de segregação, que exclui o negro da universidade, confinando-o a posições
126
subalternas na sociedade, especialmente no ensino. As políticas de ação afirmativa baseadas
em critérios raciais no ensino superior também são positivas na medida em que quebram
estereótipos negativos.
Ativismo judicial: quando o Judiciário se depara com normas e medidas que visam a
favorecer grupos minoritários e hipossuficientes, a sua postura deve ser diferente. Não deve o
Poder Judiciário frear as iniciativas inclusivas, convertendo-se no guardião de um status quo de
assimetria e opressão, a não ser quando haja patente afronta à Constituição.
Em 2014, foi editada a Lei nº 12.990, estabelecendo a reserva de vagas para pessoas
negras nos concursos da Administração Pública Federal. Em 2016, foi proposta ADC pela OAB,
julgada procedente pelo STF. Na ocasião, a Corte enfrentou a questão das cotas raciais nos três
planos do direito à igualdade, tal como compreendido na contemporaneidade: a) formal; b)
material; e c) como reconhecimento (ADC 41/DF, Info 868, STF). Decidiu, ainda, que a lei
aplica-se aos concursos do MPU e da DPU, mas não incide nos concursos realizados pelos
Estados, DF e Municípios. Obs.: Foi o tema da dissertação de direito administrativo e ambiental
do 29ºCPR.
Essa teoria (“disparate impact doctrine”) é muito utilizada por Daniel Sarmento e
Deborah Duprat em ações ajuizadas pelo MPF. A teoria atua no plano da aplicação do Direito, e
não no plano propriamente do conteúdo das normas. As violações à igualdade não são tão
flagrantes, por isso precisamos aguçar nossa percepção para perceber se uma norma tem
conteúdo genérico e abstrato, mas sua aplicação desfavorece sistematicamente uma minoria
estigmatizada. Em outras palavras, a teoria do impacto desproporcional prega a necessidade
de se analisar os efeitos concretos de certos atos que, em princípio, seriam neutros, mas que
revelam, indiretamente, discriminação contra minorias.
Na ADIN 1946, o STF, embora sem citar diretamente a teoria, entendeu que o teto da
Previdência em relação a benefícios previdenciários, embora fosse, a princípio, neutro,
prejudicaria as mulheres ao ser aplicado à licença- maternidade. Isso desestimularia a sua
contratação, pois os empregadores teriam que arcar com a diferença salarial enquanto a
empregada usufrui do benefício.
127
acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de
assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais”.
23C. Direitos fundamentais processuais: acesso à justiça, devido processo legal, contraditório,
ampla defesa, vedação de uso de provas ilícitas, juiz natural e duração razoável do processo.
128
onda de acesso caracterizou-se pelo fomento às medidas de efetivação de direitos por meio de
mecanismos alheios à estrutura judicial do Estado, resgatando os meios extrajudiciais de
composição dos conflitos (arbitragem, juízos de conciliação, mediação).
Como medidas concretas para a garantia de acesso à Justiça merecem assento: a)
assistência técnica jurídica, inclusive por meio de gratuidade; b) simplificação dos
procedimentos; c) padronização de formulários para proposituras de determinadas ações; d)
rápida colheita de provas; e) medidas de gestão de processos (ex: prioridade de tramitação); f)
fomento à adoção de formas alternativas de resolução de conflitos; g) difusão de informação e
conhecimento, notadamente em relação às vítimas de atos criminosos; h) estímulo às formas
próprias de justiça na resolução de conflitos surgidos no âmbito da comunidade indígena; i)
utilização de termos e estruturas gramaticais simples e compreensíveis nas
intimações/notificações; j) garantia de assistência por pessoal especializado (profissionais em
Psicologia, Trabalho Social, intérpretes, tradutores) e segurança pessoal; l) proteção à
intimidade (imagem e dados) das pessoas em situação de vulnerabilidade; m) colaboração
entre os atores intervenientes no processo judicial; n) adoção de medidas de cooperação
internacional, inclusive com Organizações Internacionais e Agências de Cooperação; o)
utilização de manuais de boas práticas setoriais/ p) uso de novas tecnologias (ex: processos
eletrônicos).
1.2. Devido processo legal
Possui origem na previsão contida na Magna Carta de João Sem Terra, de 1215, que
utilizava a expressão “law of the land”, tendo surgida a expressão “due process of law” para
designar o devido processo legal somente em lei inglesa do ano de 1354. Foi na CRFB/88 que o
termo “devido processo legal” foi cunhado, constitucionalmente, pela primeira vez no Brasil.
O devido processo legal encerra a ideia de um processo em conformidade com o
direito como um todo, com a lei em sentido amplo, abrangendo a CF. É uma cláusula geral,
estando previsto no artigo 5º, LIV, da CF.
Trata-se de supraprincípio/princípiobase/protoprincípio, norteador de todos os
demais que devem ser observados no processo, além se aplicar atualmente como fator
limitador do poder de legislar da Administração Pública, bem como para garantir o respeito
aos direitos fundamentais nas relações jurídicas privadas.
É percebido sob duas óticas: devido processo substancial (“substantive due process”)
e devido processo legal formal (“procedural due process”).
No sentido substancial, diz respeito ao campo de elaboração e interpretação das
normas jurídicas, evitando-se a atividade legislativa abusiva e irrazoável e ditando uma
interpretação razoável quando da aplicação concreta das normas jurídicas. No sentido formal,
encontra-se a tradicional definição constitucional do princípio, dirigido ao processo em si,
obrigando-se o juiz no caso concreto a observar os princípios processuais na condução do
instrumento estatal oferecido aos jurisdicionados para a tutela de seus direitos materiais.
Contemporaneamente, o devido processo legal vem associado à ideia de um processo justo,
que permite a ampla participação das partes e a efetiva proteção de seus direitos.
Processo para ser devido deve ser: adequado, leal, efetivo, público, paritário,
tempestivo.
Como um dos corolários do direito em tela, tem-se o contraditório, entendido em dua
dupla dimensão (formal e substancial). A dimensão formal do princípio do contraditório é a
que garante as partes o direito de participar do processo; é o direito de ser ouvido (de
participar). Em uma acepção material, substancial, o contraditório é o poder de influência, a
qual garante às partes o direito de intervir/influenciar no conteúdo da decisão, não basta mera
participação.
Assim, o contraditório se revela como a necessidade de se dar conhecimento da
existência da ação e dos atos do processo ou procedimento às partes ou interessados, bem
como a possibilidade de ofertarem reação aos atos que lhe sejam desfavoráveis, de maneira
que tenham a possibilidade de influenciar a decisão do magistrado.
129
No tocante à ampla defesa, que corresponde ao aspecto substancial do contraditório,
tem-se como o conjunto de meios adequados ao exercício deste. Expressa-se pela defesa
técnica (efetuada por profissional) e pela autodefesa (realizada pelo próprio imputado e
consiste em direito de audiência, ou seja, ser ouvido, e direito de presença aos atos. No
processo Penal ela é mais veemente) – que se complementam, uma não suprindo a outra.
Ademais, integra a ampla defesa: - o direito de conhecer a argumentação da parte
contrária; o direito de contra-argumentar; - o direito de provar a contra-argumentação; - o
direito de recorrer, no caso de não acolhimento da contra- argumentação.
1.3. Vedação de uso de provas ilícitas
A ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de poder perante a qual
se instaure, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios
ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia constitucional do due process of law, que
tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas
projeções concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo.
No direito brasileiro o uso de prova ilícita é vedado, tanto em sede constitucional (art.
5°,LVI), quanto legal (art. 157 do CPP), visando, sobretudo a segurança jurídica ao processo,
além de proteger as garantias fundamentais do indivíduo, tendo, inclusive, delimitado quais
tipos de provas poderiam ser aceitas no processo.
Embora não haja positivação a respeito, a doutrina costuma traçar a seguinte
diferenciação: provas ilícitas são aquelas que violam disposições de direito material ou
princípios constitucionais. Por outro lado, provas ilegítimas são as que violam normas
processuais e princípios constitucionais da mesma espécie.
Assim, a regra é a inadmissibilidade da prova ilícita em forma de garantia
constitucional. Contudo, não se pode sustentar que a garantia constitucional à prova ilícita seja
ilimitada e absoluta, na medida em que existem hipóteses extremas e excepcionais onde, com
a aplicação da ponderação, e a consequente proporcionalidade, poderá ser suprimida, como
nos casos de Legítima Defesa e Estado de Necessidade.
Para reforçar a ideia da admissibilidade excepcional da prova ilícita, o Estado deve
exaltar o princípio de valor máximo da ordem jurídica brasileira, que é o da dignidade da
pessoa humana, bem como dos direitos fundamentais, que podem variar diante do caso
concreto.
Ademais, tem-se que o princípio da liberdade probatória não é absoluto. A Carta
Magna, no seu art. 5º, inciso LVI, traz o principal obstáculo, consagrando a inadmissibilidade,
no processo, das provas obtidas por meios ilícitos. A prova é taxada como proibida ou vedada
toda vez que sua produção implique violação da lei ou de princípios de direito material ou
processual.
Teorias sobre o tema provas ilícitas: 1. Teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits
of the poisonous tree): O meio probatório que, não obstante produzido validamente em
momento posterior, encontra-se afetado pelo vício da ilicitude originária, que a ele se
transmite contaminando-o por efeito de repercussão causal. 2. Teoria da fonte independente
(independent source doctrine): se o órgão da persecução penal demonstrar que obteve
legitimamente novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova, que
não guarde qualquer relação de dependência, nem decorra da prova originariamente ilícita,
com esta não mantendo vínculo causal, tais dados probatórios são admissíveis, pois não
contaminados pelo vício da ilicitude originária. Essa teoria é aplicada pelo STF (HC 83.921) e
pelo STJ (RHC 90.376). 3. Teoria da descoberta inevitável: aplicável caso se demonstre,
concretamente, que a prova derivada da ilícita seria produzida de qualquer maneira,
independentemente da prova ilícita originária. Sustenta-se que sua previsão legal estaria no
art. 157, § 2º, CPP. 4. Teoria do nexo causal atenuado: opera-se quando um ato posterior,
totalmente independente, retira a ilicitude originária. 5. Teoria do encontro fortuito de provas
(serendipidade): aplica-se quando a autoridade policial, cumprindo uma diligência,
casualmente encontra provas que não estão na linha de desdobramento normal da
130
investigação. Se esse encontro for casual, a prova será lícita; se houver desvio de finalidade, a
prova será ilícita (veja-se, no STF, o HC 83.515).
Segundo o STF são consideradas ilícitas as provas produzidas a partir da quebra dos
sigilos fiscal, bancário e telefônico, sem a devida fundamentação.
1.4. Juiz natural
É extraído do devido processo legal e dos incisos XXXVII e LIII, do art. 5º, da CF.
O processo, para ser devido, deve ser conduzido por um juiz natural, que é aquele
independente, imparcial e competente, de acordo com critérios objetivos e abstratos
previamente estabelecidos em lei.
Pode ser analisado sob duas dimensões: formal e material.
dimensão formal – juiz natural é aquele pré-constituído e individualizado e com
competência previamente estabelecida em lei, com base em critérios objetivos e abstratos.
Implica em duas vedações: i) poder de comissão (art. 5º, XXXVII, CRFB) – criação de juízos ou
tribunais excepcionais e extraordinários para o julgamento de determinado caso; ii) poder de
avocação ou evocação (art. 5º, LIII, CF) – alteração/derrogação de regras pré-determinadas de
competência.
OBS: Não é vedado o poder de atribuição, sendo legítima e corriqueira a criação de justiças e
juízos especializados para julgamento de matérias ou atos determinados, visto serem
previamente instituídos e com competência pré-definida.
dimensão material – juiz natural é aquele imparcial e independente, que atua livre
de quaisquer pressões ou influências, sujeitando-se apenas ao ordenamento jurídico.
Admais, conforme decidido pela jurisprudência, não viola o princípio do juiz natural,
se instituído em lei e conforme a Constituição:
i) definição de competência por prerrogativa de função;
ii) instituição de câmaras de férias nos tribunais;
iii) convocação de juiz de primeira instância para atuar em tribunal e os conseqüentes
julgamentos, ainda que a maioria do Colegiado reste integrado por magistrados de primeiro
grau convocados.
1.5. Duração razoável do processo
Trata-se de conceito aberto e indeterminado.
A Corte Europeia dos Direitos do Homem que erigiu os critérios que devem nortear a
determinação do que seria um lapso de tempo razoável para a duração do processo a ser
aplicada em cada casuísmo concreto, quais sejam: a) complexidade do assunto; b) o
comportamento dos litigantes e de seus procuradores ou da acusação e da defesa no
processo; c) a atuação do órgão jurisdicional. Tal doutrina é denominada de doutrina do não
prazo.
Há defensores da doutrina do prazo, a partir da qual haveria a fixação legal de prazos ,
razoáveis e proporcionais, para a prática de atos processuais.
A partir da EC nº 45/04, erigiu o princípio em tela a direito fundamental explícito na
CRFB, estendendo, inclusive, aos processos administrativos a sua incidência.
De fato, o processo não precisa necessariamente ser célere, mas deve demorar o
tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional.
Assim, o processo, para ser devido, precisa de tempo para realizar-se – tempo
adequado e necessário para que se assegurem as garantias mais basilares de nosso Estado
Democrático de Direito - , ou seja, para que as partes se defendam, produzam provas, valham-
se dos recursos de lei, obtenham decisões fundamentadas etc., mas sem excessos e
desproporcionalidade.
Com efeito, a proporcionalidade é que balanceia os valores do tempo necessário x
aceleração necessária perseguindo os resultados justos e efetivos, cuja ponderação resulta no
que se espera ser o tempo razoável de duração do processo!
131
15A. Controle jurisdicional e social das políticas públicas. Serviços de relevância pública. O
papel do Ministério Público.
Oswaldo Costa
132
STF, ADPF n. 45-9, Min. Celso de Mello, - “não se inclui, ordinariamente, no âmbito das
funções institucionais do P. Judiciário e nas desta Suprema Corte, em especial – a atribuição
de formular e de implementar políticas públicas (José Carlos Vieira de Andrade, ‘Os Direitos
Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, p. 207, item n.05, 1987, Almeida,
Coimbra), pois nesse domínio, o encargo reside, primeiramente, nos Poderes Legislativo e
Executivo. Tal incumbência [...] poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando os órgãos
estatais competentes, por descumprirem os encargos políticos-jurídicos que sobre eles
incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de
direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que
derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. Cabe assinalar, presente esse
contexto – consoante já proclamou esta Suprema Corte – que o caráter programático das
regras inscritas no texto da Carta Política ‘não pode converter-se em promessa constitucional
inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas
pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável
dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria
Lei do Estado”. O Poder Judiciário poderá interferir em políticas públicas, quando
provocado, mas a intervenção requer, como um imperativo ético-jurídico, a presença dos
seguintes requisitos: (a) o limite fixado pelo mínimo existencial a ser garantido ao cidadão;
(b) razoabilidade da pretensão individual/social deduzida em face do Poder Público; (c) a
existência de disponibilidade financeira do Estado para tornar efetivas as prestações positivas
dele reclamadas.
Gustavo Binenbojm: Fala que o controle judicial da administração pública deve ter em vista
os “graus de vinculação à juridicidade”: regras – alto grau de vinculação à juridicidade;
conceitos jurídicos indeterminados – vinculação média; princípios – baixa vinculação
(controle deve ser exercido em razão do atingimento ou não dos das finalidades expressas
pelo princípio). Nessa lógica se incluem as políticas públicas. Além, disso, o controle deve
observar também a complexidade técnica da questão: “Com efeito, naqueles campos em
que, por sua alta complexidade técnica e dinâmica específica, falecem parâmetros objetivos
para uma atuação segura do Poder Judiciário, a intensidade do controle deverá ser
tendencialmente menor”.
SERVIÇOS DE RELEVÂNCIA PÚBLICA: segundo o art. 129 (inc. II) da CF, são funções
institucionais do MP: “II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
133
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas
necessárias a sua garantia”. A expressão em tela qualifica os serviços que, embora não
prestados diretamente pelo Estado (ou, pelo menos, não necessariamente pelo Estado), são
marcados pela importância, necessidade e essencialidade para o Poder Público e para a
sociedade. Ex: saúde, educação, etc. (ainda que haja divergência doutrinária a respeito).
9. DIREITOS SOCIAIS
9.1 Princı ́pios Constitucionais do Trabalho. Os direitos fundamentais do trabalhador. (12.c)
9.2 Direitos sociais: enunciação, garantias e efetividade. Princı ́pio do não-retrocesso. Mı ́nimo
existencial e reserva do possıv́el. (4.a)
134
Capítulo II, do Título II, da Constituição compõem o denominado catálogo de direitos
fundamentais previstos na Carta Magna. O direito a um trabalho digno caracteriza-se como um
direito fundamental de segunda dimensão, exigindo, para a sua implementação, uma atuação
positiva por parte do Estado (caráter prestacional). E foi justamente com essa finalidade, qual
seja, a de assegurar o direito a um trabalho digno, que a Constituição estabeleceu uma série de
princípios aplicáveis à relação de trabalho. De acordo o Ministro do TST Maurício Godinho
Delgado, os princípios constitucionais do trabalho podem ser classificados em três grandes
grupos: O primeiro rol diz respeito a efetivos princípios constitucionais do trabalho. Trata-se de
diretrizes afirmativas do labor humano na ordem jurídico cultural brasileira: a da valorização do
trabalho, em especial do emprego; a da justiça social; a da submissão da propriedade à sua
função socioambiental; a diretriz da dignidade da pessoa humana. O segundo rol diz respeito a
princípios constitucionais de amplo espectro, não exatamente originados em função da ideia e
realidade do trabalho, mas que hoje também atuam, de modo importante, no plano
justrabalhista. Não se construíram e se desenvolveram, é certo, em função do temário
juslaborativo, elaborando-se, originalmente, em torno de matérias distintas daquelas
específicas ao ramo especializado do Direito do Trabalho. Contudo, por diferentes razões,
passaram a ter influência no campo trabalhista contemporâneo, afetando, muitas vezes com
significativa força, sua realidade normativa. Trata-se, em especial, das diretrizes da
proporcionalidade, da não discriminação e da inviolabilidade do direito à vida. O terceiro rol
abrange, finalmente, os princípios clássicos do Direito do Trabalho, preexistentes à Carta de
1988, mas que foram por ela absorvidos. Na medida dessa absorção, tais diretrizes adquiriram
status constitucional, fortalecendo seu poder de projeção na ordem jurídica do País. Esse grupo
de princípios diz respeito não somente à dimensão coletiva, como também à individual
trabalhista. Trata-se dos princípios da liberdade e autonomia associativas e sindicais e da
interveniência sindical na negociação coletiva, no plano do Direito Coletivo do Trabalho. No
plano do Direito Individual do Trabalho, os princípios da norma mais favorável, da continuidade
da relação de emprego e da irredutibilidade salarial. Verifica-se, portanto, que a Constituição,
ao estabelecer uma série de princípios informadores da relação de trabalho, procura proteger a
parte hipossuficiente na relação empregatícia (o empregado), visando atenuar, no plano
jurídico, o desequilíbrio existente no plano fático.
135
também com o art. 205 (tratando da educação), além dos arts. 225 e 227, que tratam das
garantias a crianças e adolescentes no País (em acréscimo à regra protetora já lançada no art.
7º, XXXIII, da mesma Constituição). Os direitos fundamentais do trabalho estão dados também
pelos tratados e convenções internacionais subscritos pelo Brasil, “[...] naquilo que não
reduzam o patamar de garantias asseguradas internamente no próprio pais” (art. 5º, § 2º,
CF/88). Tais direitos fundamentais do trabalho também constam, evidentemente, da legislação
heterônoma estatal, a qual completa o padrão mínimo de civilidade nas relações de poder e de
riqueza inerentes à grande maioria do mercado laborativo próprio ao capitalismo (caput do art.
7º, CF/88).
Eficácia diagonal dos direitos fundamentais: as relações privadas nem sempre se apresentam
de forma igualitária, sendo bastante comum encontrar situações em que os particulares estão
em posições bastante desiguais. Os maiores exemplos estão nas relações de trabalho e de
consumo onde o poder econômico das pessoas jurídicas pode ocasionar violações aos direitos
fundamentais dos trabalhadores/consumidores, estes que são a parte fraca da relação. A partir
destas relações, o autor Sergio Gamonal desenvolveu a teoria da eficácia diagonal dos direitos
fundamentais que consiste na necessária incidência e observância dos direitos fundamentais
em relações privadas (particular-particular) que são marcadas por uma flagrante desigualdade
de forças, em razão tanto da hipossuficiência quanto da vulnerabilidade de uma das partes da
relação. Trata-se de uma eficácia diagonal por que, em tese, as partes estão em situações
equivalentes (particular-particular), mas, na prática, há um império do poder econômico, razão
por que se defende a observância dos direitos fundamentais nestas relações. A este respeito, o
TST já tem aplicado a eficácia diagonal dos direitos fundamentais nas relações trabalhistas para
combater atos discriminatórios.
a) todos os direitos sociais são formal e materialmente fundamentais: por isso a sua mera
enunciação na CF seria suficiente lhes atribuir um regime diferenciado de aplicabilidade
136
imediata (art. 5º, § 1º) e de limite material para a reforma da constituição (art. 60, § 4º, IV);
b) todos os direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, e, por isso, são normas
programáticas que não geram direitos subjetivos e não limitam o constituinte derivado;
c) direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, sendo materialmente fundamentais
apenas no que tange ao seu núcleo essencial (mínimo existencial): posição amplamente aceita
pela maior parte da doutrina e jurisprudência.
(a) a superação de uma certa “euforia judicialista”, com o reconhecimento de que o Poder
Judiciário, apesar da relevância da sua função, não é, nem tem como ser, por suas limitações
institucionais, o grande protagonista no cenário de afirmação dos direitos sociais, que
dependem muito mais das políticas públicas formuladas e implementadas pelo Legislativo e
Executivo e da mobilização da sociedade civil; e
(b) o traçado de parâmetros ético-jurídicos para as intervenções judiciais nesta seara. Afinal,
deve-se refletir sobre o potencial de universalização do que foi pedido sempre que estivessem
em jogo pretensões sobre recursos escassos, considerando- se a reserva do possível e as
limitações orçamentárias, com uma análise de “macrojustiça”, que envolve a legitimidade do
atendimento de determinados pleitos num quadro de escassez de recursos. Ademais, não se
devem ignorar as deficiências da capacidade institucional do Judiciário para tutelar os direitos
sociais, motivo pelo qual se deve adotar um parâmetro adicional para o exercício da proteção
judicial: quanto mais a questão discutida envolver aspectos técnicos de políticas públicas, mais
cautelosa e reverente em relação às decisões dos demais poderes deve ser a atuação do
Judiciário. Este parâmetro deve ser conjugado com outros, como a razoabilidade da
universalização da pretensão do titular do direito, e a essencialidade da prestação social
demandada no caso específico.
137
2. Que os direitos sociais fiquem absolutamente vinculados às escolhas exercidas.
ADPF 45(controle judicial das politicas publicas) e RE 410.715/SP – Análise do STF sob o
mínimo existencial. Na decisão monocrática do Min. Celso de Mello, este entendeu
inicialmente pela possibilidade de controle judicial das políticas públicas, como medida
necessária para a garantia da efetividade dos direitos sociais, em razão da omissão dos demais
Poderes Constituídos.
Inf. 780 do STF: “Os ideais da democracia e do constitucionalismo – não obstante caminhem
lado a lado – vez por outra revelam uma tensão latente entre si. É que, de um lado, a
democracia, apostando na autonomia coletiva dos cidadãos, preconiza a soberania popular,
que tem na regra majoritária sua forma mais autêntica de expressão. De outro lado, o
constitucionalismo propugna pela limitação do poder através de sua sujeição ao direito, o que
impõe obstáculos às deliberações do povo. (...) O problema consiste em saber até que ponto é
que a excessiva constitucionalização não se traduz em prejuízo do princípio democrático”
(MOREIRA, Vital. “Constituição e Democracia”. In: MAUÉS, Antonio G. Moreira (Org.)
Constituição e Democracia. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 272). Essa aparente contradição
entre os valores albergados pelo Estado Democrático de Direito impõe um dever de cautela
redobrado no exercício da jurisdição constitucional. Com efeito, é certo que os tribunais não
podem asfixiar a autonomia pública dos cidadãos, substituindo as escolhas políticas de seus
representantes por preferências pessoais de magistrados não eleitos pelo povo (...) a
Constituição não pode ser vista como repositório de todas as decisões coletivas, senão apenas
dos lineamentos básicos e objetivos fundamentais da República. Deve-se, portanto, rechaçar
qualquer leitura maximalista das cláusulas constitucionais que acabe por amesquinhar o papel
da política ordinária na vida social. (...) Na lição irretocável de Daniel Sarmento e Cláudio
Pereira de Souza Neto, “de um lado, deve-se reconhecer o importante papel do Judiciário na
garantia da Constituição, especialmente dos direitos fundamentais e dos pressupostos da
democracia. Mas, de outro, cumpre também valorizar o constitucionalismo que se expressa
fora das cortes judiciais, em fóruns como os parlamentos e nas reivindicações da sociedade
civil que vêm à tona no espaço público informal” (SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio
Pereira de. Direito Constitucional. Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte:
Fórum, 2012, 240)”.
138
supere o crivo da proporcionalidade; iii) que seja preservado o núcleo essencial do direito
envolvido.
V. Mínimo Existencial
Segundo Ingo Sarlet, a reserva do possível tem três dimensões: possibilidade fática
(disponibilidade de recursos necessários para satisfazer uma prestação relacionadas aos
direitos sociais), possibilidade jurídica (existência de autorização orçamentária para cobrir as
despesas e análise das competências federativas) e razoabilidade da exigência e
proporcionalidade da prestação.
Prova oral: explicar o princípio do não retrocesso, surgimento, aplicabilidade nos direitos
sociais e nas liberdades públicas.
10.NACIONALIDADE
10.1 Nacionalidade brasileira. (10.b)
139
10.2 Condição jurı ́dica do estrangeiro. (10.b)
1. Nacionalidade brasileira
A nacionalidade é um vínculo jurídico-político entre o Estado e o indivíduo. O direito à
nacionalidade, consagrado como direito humano na DUDH (art. 15) e no Pacto de São José da
Costa Rica (art. 20), é matéria constitucional no plano doméstico.
No plano internacional, importa anotar, a nacionalidade deve ser efetiva12, ou seja,
fundamentada em laços sociais consistentes entre o indivíduo e o Estado cujo caráter de
nacional se detém ou é pretendido, a exemplo de tempo de residência em seu território,
domínio do idioma oficial, laços familiares, investimentos no Estado etc.
O Brasil adota com relação a critério de nacionalidade, um critério justaposto, com
incidência mais ampla do jus soli . Assim, são brasileiros natos os nascidos no Brasil (jus soli13),
ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país (o serviço
deve ser público e afeto ao país da nacionalidade dos pais). Essa é a regra.
A CRFB adotou, ainda, como exceção, o critério jus sanguinis14, prevendo como
brasileiro nato aquele nascido no estrangeiro, de pai ou mãe brasileiros, quando qualquer
deles esteja a serviço do Brasil (compreende todo encargo derivado dos poderes da União,
Estados e Municípios, suas autarquias, e o serviço de organização internacional de que a
República faça parte). São, ainda, brasileiros natos os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe
brasileira, desde sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir
no Brasil e optem, a qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira, após atingida a
maioridade.
São brasileiros naturalizados (nacionalidade derivada) aqueles que venham a adquirir
a nacionalidade brasileira, possuindo todos os direitos do brasileiro nato, salvo o acesso a
cargos públicos eminentes (CF, art. 12, §3º) e a garantia de não ser extraditado (CF, art. 5º, LI).
Para a naturalização (que somente produz efeitos após a publicação no DOU), exigem-
se: a) Ordinária – estrangeiros que, sendo civilmente capazes, tenham residência no Brasil há
pelo menos 4 anos ininterruptos, com capacidade de comunicar-se em língua portuguesa e
não possuir condenação penal ou estiver reabilitado (o prazo de 4 anos pode ser reduzido
para, no mínimo, 1 ano, se o estrangeiro tem cônjuge/companheiro ou filho brasileiro ou
houver prestado/puder prestar serviço relevante ao Brasil ou capacidade profissional,
científica ou artística considerada necessária para o país); b) Extraordinária ou quinzenária –
estrangeiros que estejam fixados no Brasil há pelo menos 15 anos ininterruptos e não têm
condenação penal (não exige que o estrangeiro saiba ler e escrever em língua portuguesa),
mediante requerimento do estrangeiro, sendo ato vinculado, não permitindo a
discricionariedade do Poder Público; c) Provisória – migrante criança ou adolescente que
fixaram residência no Brasil antes de completarem 10 anos de idade. Depende de
requerimento do representante legal; d) Definitiva – aquela solicitada pelo detentor da
naturalização provisória até dois anos após a maioridade; e) Especial – destina-se ao
cônjuge/companheiro, há mais de 5 anos, de integrante do Serviço Exterior Brasileiro em
atividade ou de pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior. Também é chamada de
especial a naturalização do estrangeiro que tenha sido empregado em missão diplomática ou
em repartição consular do Brasil por mais de 10 (dez) anos ininterruptos; Requisitos:
12
Caso Nottebohm - no caso de dupla nacionalidade, a nacionalidade preponderante deveria ter correspondência com os fatos,
ou seja, somente se justificava por meio de laços fáticos entre a pessoa envolvida e um desses Estados.
13
O indivíduo tem a nacionalidade do Estado em cujo território nasceu – critério territorial (em regra, adotado pelos países de
tradição imigratória).
14
A nacionalidade se transmite por laços familiares de ascendência – critério familiar – fixado por laços sanguíneos. O indivíduo
tem a nacionalidade de seus pais, pouco importando o local em que tenha nascido (em regra, adotado pelos países de tradição
emigratória).
140
capacidade civil, capacidade de comunicar-se em língua portuguesa e não possuir condenação
penal ou estiver reabilitado; f) Específica para os originários de países de língua portuguesa –
procedimento facilitado, exigindo-se como requisitos apenas a residência no país, por 1 ano,
com título regular e idoneidade moral.
A perda da nacionalidade, que pode atingir brasileiro nato e naturalizado, ocorre com
a aquisição voluntária de outra nacionalidade, ressalvado, assim, o caso de imposição de
naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente no exterior como condição de
permanência em seu território ou para exercício de direitos civis. O naturalizado pode perder
sua nacionalidade em razão de exercício de atividade contrária ao interesse nacional,
mediante decisão judicial transitada em julgado15.
Uma vez perdida a nacionalidade por brasileiro, em razão da aquisição de outra por
vontade própria (ato materializado por Decreto Presidencial ou do Ministro da Justiça),
cessada a causa (perda/renúncia da nacionalidade estrangeira adquirida voluntariamente),
poderá readquiri-la ou ter o ato que declarou a perda revogado, na forma definida pelo órgão
competente do Poder Executivo.
O interessado na reaquisição da nacionalidade deverá, além de estar regulamente domiciliado
no país, dirigir o respectivo pedido ao Presidente da República e entregá-lo no órgão do
Ministério da Justiça de seu domicílio. A eventual reaquisição da nacionalidade será objeto de
novo decreto presidencial ou do Ministro da Justiça, mas não será concedida se for apurado
que o interessado, ao adquirir outra nacionalidade, o fez para se eximir de deveres a cujo
cumprimento estaria obrigado se mantivesse a nacionalidade brasileira.
Existe também o instituto da revogação da perda da nacionalidade, que beneficia
àqueles que queiram retornar à condição de brasileiros, mas não possuem domicílio no Brasil.
Para isso, deverão procurar a repartição consular com jurisdição sobre a região onde vivem e
solicitar a revogação do ato que declarou a perda da nacionalidade.
141
perda da nacionalidade originária. A suspensão dos direitos políticos no país de origem
acarretará também a extinção dos mesmos direitos no outro país.
O estatuto de igualdade se extinguirá com a perda, pelo beneficiário, de sua
nacionalidade, ou com a cessação da autorização de permanência.
3. Nacionais do MERCOSUL
Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Parte do Mercosul (Brasil,
Argentina, Paraguai e Uruguai) e Acordo sobre Residência para Nacionais do Mercosul Bolívia
e Chile (Estados Associados) – promulgados no Brasil pelos Decretos n. 6.964∕2009 e
6.975∕2009, respectivamente. O estrangeiro beneficiado com os Acordos de Residência possui
igualdade de direitos civis no Brasil. Deveres e responsabilidades trabalhistas e
previdenciárias são também resguardadas, além do direito de transferir recursos. Interessante
que os estrangeiros poderão requerer residência em quaisquer dos Estados signatários,
independentemente de estarem em situação migratória regular ou irregular. Os que estiverem
em situação irregular ficam isentos de multas ou outras sanções administrativas relativas à sua
situação migratória. É concedida a residência temporária por dois anos; 90 dias antes de
terminar esse prazo, o estrangeiro pode requerer a transformação em residência permanente.
11.DIREITOS POLÍTICOS
11.1 Direitos polı ́ticos. O papel da cidadania na concretização da Constituição. (15.b)
Oswaldo Costa
DIREITOS POLÍTICOS: os direitos políticos formam a base do regime democrático, sendo que
a expressão ampla se refere ao direito de participação no processo político como um todo, ao
direito ao sufrágio universal e ao voto periódico, livre, direto e igual, à autonomia de
organização do sistema partidário, à igualdade de oportunidade dos partidos. Nos termos da
Constituição, a soberania popular se exerce pelo sufrágio universal e pelo voto direto e
secreto e, nos termos da lei, mediante plebiscito, referendo e a iniciativa popular (art. 14,
CR). Podem ser positivos, aqueles que permitem a participação do indivíduo na vida política
do Estado: (a) sufrágio; (b) alistabilidade; (c) elegibilidade; ou negativos, que são
circunstâncias que restringem a elegibilidade: (a) inelegibilidade; (b) perda/suspensão dos
direitos políticos.
142
O PAPEL DA CIDADANIA NA CONCRETIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO: após a CR/88 se encontra
superada a doutrina segundo a qual cidadania significa a prerrogativa de votar e ser votado,
ou seja, de quem tem direitos políticos. A concepção contemporânea de cidadania,
incorporada no Texto Constitucional, foi introduzida pela Declaração Universal de 1948 e
reiterada pela Conferência de Viena de 1993. De acordo com José Afonso da Silva, citado por
Mazzuoli, a cidadania, atualmente, “consiste na consciência de pertinência à sociedade
estatal como titular dos direitos fundamentais, da dignidade da pessoa humana, da
integração participativa no processo do poder, com a igual consciência de que essa situação
subjetiva envolve também deveres de respeito à dignidade do outro e de contribuir para
o aperfeiçoamento de todos”. OBS.: alguns doutrinadores ainda se referem à cidadania
apenas como o direito de votar e ser votado (cidadania ativa e passiva), mas a atual
Constituição, ao elencar a cidadania como fundamento do Estado Democrático de Direito,
demonstra uma maior elasticidade de seu conteúdo, como consignado por José Afonso da
Silva. Sobre o tema, esclareça-se que o STF referendou a abertura do conceito de cidadania
no julgamento do RE 436.966/2005 (INF 407), no qual assegurou para as crianças de zero a
cinco anos o direito à educação, considerando ser um “direito fundamental à cidadania”.
Sobre o tema, por ocasião do término dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que
elaborou o texto constitucional de 1988, Ulisses Guimarães já exortava o papel fortemente
participativo que se imaginava proporcionar ao cidadão com a nova Constituição: “Pela
Constituição, os cidadãos são poderosos e vigilantes agentes de fiscalização através do
mandado de segurança coletivo; do direito de receber informações dos órgãos públicos, da
prerrogativa de petição aos poderes públicos, em defesa de direitos contra a ilegalidade ou
abuso do poder, da obtenção de certidões para defesa dos direitos; da ação popular, que
pode ser proposta por qualquer cidadão, para anular ato lesivo ao patrimônio público, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico, isento de custas judiciais; da fiscalização das contas
dos municípios por parte do contribuinte; podem peticionar, reclamar, representar ou
apresentar queixas junto às comissões das Casas do Congresso Nacional; qualquer cidadão,
partido político, associação ou sindicado são partes legítimas e poderão denunciar
irregularidades perante o Tribunal de Contas da União, do estado ou do município. A
gratuidade facilita a efetividade dessa fiscalização. A exposição panorâmica da lei
fundamental que hoje passa a reger a Nação permite conceitua-la, sinteticamente, como a
Constituição coragem, a Constituição cidadã, a Constituição federativa, a Constituição
representativa e participativa, a Constituição síntese Executivo-Legislativo, a Constituição
fiscalizadora”. (Ata da Assembleia Nacional Constituinte. Diário da Assembleia Nacional
Constituinte ano II, n. 308, 05.10.1988).
A respeito dos instrumentos postos na constituição em prol da cidadania cita-se, ainda, o
mandado de injunção, que, segundo Häberle, é uma prova da correção de sua tese da
sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, porque, nesse caso, o cidadão torna-se
legislador indiretamente mediante sua reclamação ao STF. O citado autor ainda esclarece que
o paradigma da sociedade aberta dos intérpretes da Constituição significa que cada cidadão e
cada partido político que vive na Constituição são co-intérpetes desta Constituição,
mormente porque o Poder Judiciário possui legitimação democrática apenas indireta, sendo
que primeiro poder da República é o Parlamento. O legislador parlamentar tem legitimidade
direta, pois é eleito pelo povo e, por isso, é importante que a sociedade também tenha
espaço para participar da interpretação da Constituição.
12.FEDERAÇÃO BRASILEIRA
12.1 União Federal: competência e bens. (7.b)
12.2 Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens. (3.c)
143
12.3 Municı ́pio: criação, competência, autonomia. Regiões metropolitanas. (5.c)
12.4 Intervenção federal nos Estados e intervenção estadual nos Municı ́pios. (10.c)
I. Introdução
Segundo Novelino, “fruto de uma aliança entre Estados, a União é uma pessoa jurídica
dotada de capacidade política existente apenas em Estados federais. Possui competência para
atuar em nome próprio e em nome da federação. A União, pessoa jurídica de direito público
interno, não se confunde com a República Federativa do Brasil, que é uma pessoa jurídica de
direito público internacional formada pela união dos Estados, DF e Municípios. Por fim, a
União, assim como os demais entes que compõem a federação brasileira, possui apenas
autonomia, apesar de exercer as atribuições decorrentes da soberania do Estado brasileiro”.
II. Competência
Aduz Novelino que, “os bens públicos pertencentes à União podem ser agrupados em
144
três categorias:
i) bens de uso comum–permitem o livre acesso e a utilização de todos;
ii) bens de uso especial–destinam- se à utilização da AP e ao funcionamento do governo
federal;
iii) bens dominicais–são aqueles passíveis de alienação, porquanto têm natureza jurídica
semelhante à dos bens privados, já que não afetos a nenhum interesse público. Tais bens
estão relacionados no art. 20 da CF, tais como, os recursos naturais da plataforma continental
e da ZEE; o mar territorial; as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-
históricos; as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”. Quanto às terras
tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas, decidiu o STF que a destruição de acessões
nelas feitas pode configurar crime de dano qualificado (art. 163, pár. único, III, CP)( STF. 2ª
Turma. Inq 3670/RR)
-> Lei estadual que disponha sobre bloqueadores de sinal de celular em presídio invade a
competência da União para legislar sobre telecomunicações. STF. Plenário. ADI 3835/MS;
-> É INCONSTITUCIONAL lei estadual que prevê prazos máximos para que as empresas de
planos de saúde autorizem exames médicos aos usuários. Isso porque se trata de lei que
dispõe sobre direito civil, direito comercial e política de seguros, matérias que são de
competência da União (art. 22, I e VII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 4701/PE;
-> É INCONSTITUCIONAL norma da Constituição Estadual que disponha as atribuições para a
defesa dos direitos e interesses das populações indígenas. Isso porque somente a União pode
legislar sobre a matéria, conforme determina o art. 22, XIV, da CF/88. STF. 1ª Turma. ADI
1499/PA;
-> É inconstitucional lei estadual que exija Certidão negativa de Violação aos Direitos do
Consumidor dos interessados em participar de licitações e em celebrar contratos com órgãos e
entidades estaduais. Esta lei é inconstitucional porque compete privativamente à União
legislar sobre normas gerais de licitação e contratos (art. 22, XXVII, da CF/88). STF. Plenário.
ADI 3.735/MS;
-> A lei estadual que trata sobre revalidação de títulos obtidos em instituições de ensino
superior dos países membros do MERCOSUL afronta o pacto federativo (art. 60, §4º, I, da
CF/88) na medida em que usurpa a competência da União para dispor sobre diretrizes e bases
da educação nacional (art. 22, XXIV). STF. Plenário. ADI 5341 MC;
-> A União não tem legitimidade passiva em ação de indenização por danos decorrentes de
erro médico ocorrido em hospital da rede privada durante atendimento custeado pelo Sistema
Único de Saúde (SUS). De acordo com a Lei 8.080/90, a responsabilidade pela fiscalização dos
hospitais credenciados ao SUS é do Município, a quem compete responder em tais casos. STJ.
1ª Seção. EREsp 1.388.822-RN;
-> A EC 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da
Constituição Federal, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas
costeiras sede de Municípios. STF. Plenário. RE 636199/ES
SV 2: É inconstitucional a lei ou ato normativo estadual ou distrital que disponha sobre sistema
de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loteriais.
SV 38: É competente o município para fixar horário de funcionamento de estabelecimento
comercial;
SV 39: Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias
civil e militar e do corpo de bombeiros militar do Distrito Federal;
SV 46: A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas
de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.
SV 49: ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de
estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.
145
3C. Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens.
I. Estado-membro
Fusão: dois ou mais Estados se unem com outro nome, perdendo sua
personalidade jurídica;
Cisão: um Estado divide-se em vários novos Estados-membros, desaparecendo
o Estado originário;
Desmembramento: há a separação de uma ou mais partes do Estado-membro,
sem que ocorra a perda da identidade do Estado-ente primitivo. Há duas
possibilidades de desmembramento:
o Desmembramento anexação: a parte desmembrada anexa-se a outro
Estado-membro.
o Desmembramento formação: a parte desmembrada constitui um
novo Estado-membro.
A formação de Estados exige, além dos requisitos do art. 18, § 3º, CR, a observância
dos requisitos previstos no art. 48, VI, CR: a) realização de plebiscito: trata-se de requisito de
procedibilidade do processo legislativo da lei complementar; b) audiência das Assembleias
Legislativas; c) aprovação pelo Congresso Nacional: exige-se quórum de maioria absoluta,
exigido para a edição da lei complementar; d) lei complementar.
II. Competência
146
Competência material comum: são as competências materiais atribuídas a
todos os entes federativos, prevista no art. 23 da CR.
Competência material residual: trata-se da competência material que não é
vedada ao Estado-membro e que lhe sobra, após a enumeração das
competências não-legislativas dos outros entes federativos (art. 25, § 1º, CR).
147
Observação: Pedro Lenza afirma que os serviços de gás canalizado serão explorados
diretamente pelos Estados ou mediante concessão, na forma da lei, vedando-se a
regulamentação da referida matéria por medida provisória.
III. Autonomia
Observação: o STF vem aplicando o princípio da simetria, que funcionaria como limite
ao poder constituinte decorrente, de forma que detalhes no arranjo institucional previstos na
Constituição da República deveriam ser reproduzidos no âmbito do Estado-membro. Daniel
Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto criticam tal princípio, alegando que ele não se
compatibiliza com o federalismo, que é um sistema que visa a promover o pluralismo nas
formas de organização política. Segundo tais autores, essa orientação impede que os Estados-
membros exerçam experiências institucionais inovadoras nos governos locais (laboratórios da
democracia), inibindo uma das mais interessantes funções do federalismo, que é permitir a
inovação dos arranjos institucionais e, assim, a própria evolução da organização estatal.
IV. Bens
148
Nos termos do artigo 26 da Constituição Federal, incluem-se entre os bens dos
Estados-membros: a) as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em
depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; b) as
áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob
domínio da União, Municípios ou terceiros; c) as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à
União; d) as terras devolutas não compreendidas entre as da União.
Cumpre fazer rápidos comentários sobre as terras devolutas, dado que a PFDC
apresentou representação à PGR em 2017 para oferecer argumentos para a elaboração de
parecer na ADI nº 5.623: com a Constituição da República de 1891, as terras devolutas foram
transferidas para os Estados, mantendo-se na propriedade da União aquelas situadas na faixa
de fronteira, modelo em que se baseou a Constituição da República de 1988 (v. art. 20, II e §
2º, CR). Tendo em vista a mutabilidade legal acerca dos requisitos legais para a venda de tais
bens, diversos Estados acabaram vendendo terras devolutas que se encontram na faixa de
fronteira e que, consequentemente, eram de domínio da União. Para evitar que a União
simplesmente retomasse o domínio de tais terras, tendo em vista que tal venda foi feita por
meio de títulos de domínio nulos, foram editadas leis prevendo a possibilidade de o particular
requerer a ratificação do registro do respectivo móvel perante o órgão competente, desde
que houvesse cumprimento dos objetivos previstos no art. 188 e no Estatuto da Terra, qual
seja, a promoção de reforma agrária, o cumprimento à função social da propriedade e a
ocupação da terra para cultura efetiva e moradia habitual. Tendo em vista que vários
registros imobiliários não foram submetidos à ratificação, sobreveio a Lei 13.178/15, objeto da
supracitada ADI, que prevê praticamente a ratificação automática e ex officio dos registros
imobiliários quando a área for inferior a quinze módulos fiscais, sem exigir, nos outros casos, o
cumprimento dos pressupostos constitucionais acima apontados (art. 188 da CR). Por tudo
isso, defende a PFDC que a norma questionada é inconstitucional.
Renan Lima
BREVE HISTÓRICO: De acordo com HELY LOPES MEIRELLES, o município, enquanto unidade
político-administrativa, “surgiu com a República Romana, interessada em manter a dominação
pacífica das cidades conquistadas pelas forças de seus exércitos. Os vencidos ficavam sujeitos,
desde a derrota, às imposições do Senado, mas, em troca de sua sujeição e fiel obediência às
leis romanas, a República lhes concedida certas prerrogativas que variavam desde simples
direitos privados até o privilégio de eleger seus governantes e dirigir a própria cidade”.
No que se refere ao histórico dos municípios no Brasil, HELY LOPES leciona que, no período da
Constituição Imperial de 1824, “as Municipalidades não passaram de uma divisão territorial,
sem influência política e sem autonomia na gestão de seus interesses”, em razão da previsão
em lei regulamentar que “as Câmaras eram corporações meramente administrativas”. Com o
passar os tempos os municípios foram adquirindo paulatinamente mais funções e mais
autonomia. No entanto, somente com a Constituição de 1988 que o município foi consagrado
como ente federativo autônomo, integrante da República Federativa do Brasil, com
capacidades e competências próprias.
NATUREZA JURÍDICA: Pessoa jurídica de direito público interno. Trata-se de ente federado,
dotado de autonomia política, conforme previsão expressa dos artigos 1º e 18 da CRFB/88.
CRIAÇÃO DE MUNICÍPIO: O art. 18, §4º, da CF prevê os requisitos para criação, incorporação,
fusão e o desmembramento de Municípios, quais sejam: i) edição de Lei Complementar
149
Federal estabelecendo o período dentro do qual poderá ocorrer a criação, a incorporação, a
fusão ou o desmembramento de município (obs: a EC 57/2008 convalidou os municípios cuja
criação, incorporação, fusão ou desmembramento ocorreu até 31/12/2006 sem a observância
deste requisito, desde que observadas as regras estabelecidas na legislação do respectivo
Estado); ii) divulgação dos estudos de viabilidade, nos termos previstos em lei ordinária
federal; iii) consulta prévia às populações dos municípios envolvidos; e iv) edição de lei
ordinária estadual, criando o novo município, desde que dentro do período previsto na Lei
Complementar Federal.
150
iv) AUTOADMINISTRAÇÃO (art. 30, incisos III a IX, da CF): Os Municípios possuem
competências administrativas expressas e implícitas, além daquelas decorrentes da sua
competência para legislar sobre assuntos de interesse local.
Além disso, os Municípios também podem instituir tributos (art. 156 da CF), o que demonstra
que, além da autonomia política, normativa e administrativa, a CF ainda atribuiu autonomia
financeira a tais entes. Diante desse quadro, MARCELO NOVELINO afirma que “não há no
direito comparado grau de autonomia equivalente ao conferido pela Constituição de 1988 aos
municípios brasileiros”. E conclui que: “No Brasil, os Municípios possuem âmbitos exclusivos
de competências políticas (legislativas e de governo), razão pela qual não há como negar-lhes a
condição de verdadeiros entes federativos”. Na mesma linha, HELY LOPES MEIRELLES leciona
que: “Em face dessas atribuições, já não se pode sustentar – como sustentavam alguns
publicistas – ser o Município entidade meramente administrativa. Diante de atribuições tão
eminentemente políticas e de um largo poder de autogoverno, sua posição atual no seio da
Federação é de entidade político-administrativa de terceiro grau”.
151
Além disso, a competência administrativa (“material”) dos Municípios divide-se em: i)
competência comum, cujas hipóteses estão previstas no art. 23 da CF; e ii) competência
exclusiva, cujas hipóteses estão previstas no art. 30, incisos III a IX, da CF.
STF: Súmula Vinculante 49 – “Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que
impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área”.
STF: Súmula Vinculante 38 – “É competente o Município para fixar o horário de funcionamento
de estabelecimento comercial”.
STF: Súmula 419 – “Os municípios têm competência para regular o horário do comércio local,
desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas”.
STF: Repercussão Geral – “O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com
União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico
com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c 30, I e II, da CRFB)”
[RE 586.224, rel. min. Luiz Fux, j. 5-3-2015, P Tema 145].
STF: Repercussão Geral – “É inconstitucional norma municipal que impõe sanção mais gravosa
que a prevista no CTB, por extrapolar a competência legislativa suplementar do Município
expressa no art. 30, II, da CF”. Neste sentido: ARE 638.574/ MG, rel. min. Gilmar Mendes, DJE
de 14-4-2011. Esta Corte possui ainda jurisprudência firmada no sentido de que compete
privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte, impossibilitados os Estados-
membros e Municípios a legislar sobre a matéria enquanto não autorizados por lei
complementar [ARE 639.496 RG, voto do rel. min. Cezar Peluso, j. 16-6-2011, P, DJE de 31-8-
2011, Tema 430].
STF: Repercussão Geral – “Definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de
instituições bancárias. Competência do Município para legislar. Assunto de interesse local.
Ratificação da jurisprudência firmada por esta Suprema Corte” [RE 610.221 RG, rel. min. Ellen
Gracie, j. 29-4-2010, P, DJE de 20-8-2010, Tema 272].
STF: “Os Municípios podem legislar sobre direito ambiental, desde que o façam
fundamentadamente. (...) A Turma afirmou que os Municípios podem adotar legislação
ambiental mais restritiva em relação aos Estados-membros e à União. No entanto, é
necessário que a norma tenha a devida motivação” (ARE 748.206 AgR, rel. min. Celso de Mello,
j. 14-3-2017, 2ª T, Informativo 857).
STF: O município tem competência para editar normas suplementares relativas à segurança
dos estabelecimentos bancários, como a instalação de sistema de monitoração e gravação
eletrônica de imagens nos terminais de autoatendimento, nos termos dos artigos 30, I e II, e
182 da CF (ARE 784.981 AgR, rel. min. Rosa Weber, j. 17-3-2015, 1ª T, DJE de 7-4-2015).
STF: “O Município pode editar legislação própria, com fundamento na autonomia
constitucional que lhe é inerente (CF, art. 30, I), com o objetivo de determinar, às instituições
financeiras, que instalem, em suas agências, em favor dos usuários dos serviços bancários
(clientes ou não), equipamentos destinados a proporcionar-lhes segurança (tais como portas
eletrônicas e câmaras filmadoras) ou a propiciar-lhes conforto, mediante oferecimento de
instalações sanitárias, ou fornecimento de cadeiras de espera, ou, ainda, colocação de
bebedouros” (AI 347.717 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 31-5-2005, 2ª T, DJ de 5-8-2005).
STF: “Os Municípios são competentes para legislar sobre questões que respeitem a edificações
ou construções realizadas no seu território, assim como sobre assuntos relacionados à
exigência de equipamentos de segurança, em imóveis destinados a atendimento ao público”
(AI 491.420 AgR, rel. min. Cezar Peluso, j. 21-2-2006, 1ª T, DJ de 24-3-2006).
STF: “A imposição legal de um limite ao tempo de espera em fila dos usuários dos serviços
prestados pelos cartórios não constitui matéria relativa à disciplina dos registros públicos, mas
assunto de interesse local, cuja competência legislativa a Constituição atribui aos Municípios”
(RE 397.094, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 29-8-2006, 1ª T, DJ de 27-10-2006).
152
INICIATIVA POPULAR DE LEIS EM ÂMBITO MUNICIPAL: Nos termos do art. 29, inciso XIII, da
CF, a iniciativa popular de projetos de lei de interesse específico do Município, da cidade ou de
bairros, depende da manifestação de, pelo menos, 5% (cinco por cento) do eleitorado.
OBS.: As regiões metropolitanas, criadas por LCE, não se confundem com as regiões
administrativas previstas no art. 43 da CF/1988, criadas por LCF, a exemplo da SUDAM,
SUDENE, SUDECO e SUFRAMA, cujo escopo é o fomento ao desenvolvimento dessas regiões e
a redução das desigualdades regionais, compreendendo, cada uma, um mesmo complexo
geográfico e social.
153
STF: ADI 2809/RS. A LCE não é de iniciativa exclusiva do Governador do Estado (art. 61, §1º, II
“e” da CF/1988), sendo constitucional a LCE cuja iniciativa foi deflagrada pela Assembleia
Legislativa.
STF: ADI 1841/RJ. Objeto: Art. 357, parágrafo único da CE/RJ: “a participação de qualquer
município em uma região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião dependerá de
prévia aprovação pela respectiva Câmara Municipal”. CONCLUSÃO DO STF: É inconstitucional a
previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 (LCE e Municípios limítrofes) para a
instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia aprovação pela Câmara
Municipal interessada .
STF: ADI 796/ES. É inconstitucional a previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 para
a instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia consulta plebiscitária
às populações interessadas.
Questões Objetivas
MPF\27 - Viola o princípio da livre concorrência a lei municipal que estabelece o horário de
funcionamento de farmácias. Assertiva incorreta.
154
nomeie, nesse mesmo decreto, o interventor, se couber (Lei 12.562/2011, art. 11).
Controle político: exercido em 24 horas pelo Congresso Nacional, que, se rejeitar a
intervenção, vincula o Presidente, sob pena de prática de crime de responsabilidade por este.
O controle é dispensado nas hipóteses do art. 36,
§3º, da CF. Nestas hipóteses, o decreto limita-se a suspender o ato impugnado, se esta medida
for suficiente. Caso não seja, decreta-se a intervenção federal e, neste caso, incide o controle.
Nas hipóteses de intervenção por solicitação e espontânea, o Presidente exerce juízo
discricionário. Nas demais, encontra-se vinculado.
Intervenção estadual nos Municípios: as hipóteses estão previstas nos incisos do art. 35
da CF. Em regra, o procedimento é o mesmo da intervenção federal (aplicado o princípio da
simetria – p. ex.: competência privativa do Governador).
Súmula 637 do STF: não cabe recurso extraordinário contra acórdão de TJ que defere
pedido de intervenção estadual em município.
ADI Interventiva Estadual: competência do TJ local. Legitimidade ativa do PGJ. Controle
político realizado pela Assembleia Legislativa, sendo dispensado na hipótese de provimento à
representação interventiva.
*Intervenção da União nos Municípios sediados em Territórios Federais: embora
caracterize intervenção federal, as suas hipóteses de incidência são as mesmas da intervenção
estadual (art. 35, I a IV da CF/1988, ressaltando a inaplicabilidade da 1ª parte do inciso IV, já
que o Território não possui CE que indiquem os aludidos princípios a serem observados).
13.ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
13.1Princı ́pios constitucionais sobre a Administração Pública. (11.b)
Renata Souza
Materiais consultados: Graal do 28º CPR; PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 14. ed.
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed.
rev., ampl. e atual. até 31-12-2014. São Paulo: Atlas, 2015; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 6.
ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.
30. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
I. Introdução
O art. 37, caput, da Constituição Federal, enumera cinco princípios administrativos: legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...)
O princípio da legalidade nasceu com o Estado de Direito e consiste em uma das principais
garantias de respeito aos direitos individuais.
Trata-se da diretriz básica da conduta dos agentes da Administração, significando que toda e
qualquer a atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Caso não seja autorizada por
lei, a atividade é ilícita.
155
O princípio da legalidade administrativa difere da legalidade geral aplicável aos particulares.
Enquanto, no direito privado, o que não está proibido está permitido (art. 5°, inciso II, CF/88),
no Direito Administrativo, o administrador só pode fazer o que a lei permite.
Assim, a Administração Pública, além de não poder agir contra a lei ou além da lei, somente
pode atuar segundo a lei. O ato eventualmente praticado com inobservância a tais parâmetros
é inválido e pode ser reconhecido como tal pela própria Administração que o praticou (em
virtude do princípio da autotutela) ou pelo Judiciário.
“Observe-se, ainda, que, em sua atuação, a Administração está obrigada à observância não
apenas do disposto nas leis, mas também dos princípios jurídicos ('atuação conforme a lei e o
Direito', na feliz redação do inciso I do parágrafo único do art. 2º da Lei 9.784/1999). Ademais,
a Administração está sujeita a seus próprios atos normativos, expedidos para assegurar o fiel
cumprimento das leis, nos termos do art. 84, inciso IV, da Constituição. Assim, na prática de
um ato individual, o agente público está obrigado a observar não só a lei e os princípios
jurídicos, mas também os decretos, as portarias, as instruções normativas, os pareceres
normativos, em suma, os atos administrativos gerais que sejam pertinentes àquela situação
concreta com que ele se depara.” – PAULO; ALEXANDRINO, 2015, p. 375.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro é clara: o princípio da legalidade, hoje, possui uma abrangência
muito maior porque exige submissão ao Direito. A ideia atual é de alargamento do princípio da
legalidade, com maior limitação à discricionariedade administrativa (em decorrência da
submissão da Administração Pública a princípios e valores) e ampliação do controle judicial.
Em sua acepção de finalidade da atuação administrativa, o referido princípio significa que toda
atuação da Administração Pública deve visar à satisfação do interesse público.
Consequentemente, é nulo por desvio de finalidade o ato praticado com objetivo diverso da
satisfação do interesse público, decorrente explícita ou implicitamente da lei.
156
Em sua acepção de vedação à promoção pessoal do administrador público, o princípio da
impessoalidade refere-se à noção de proibição de pessoalização das realizações da
Administração Público ou de proibição de promoção pessoal do agente público às custas das
realizações da Administração Pública. O art. 37, § 1º, da CF/88, dispõe:
Art. 37, § 1º: A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos
públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo
constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos.
V. Princípio da Publicidade
O princípio da publicidade “indica que os atos da Administração devem merecer a mais ampla
divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do princípio
propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes
administrativos. Só com a transparência dessa conduta é que poderão os indivíduos aquilatar a
legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem. É para observar esse
princípio que os atos administrativos são publicados em órgãos de imprensa ou afixados em
determinado local das repartições administrativas, ou, ainda, mais modernamente, divulgados
por outros mecanismos integrantes da tecnologia da informação, como é o caso da Internet.”
– CARVALHO FILHO, 2015, p. 26.
“Sem embargo da circunstância de que a publicidade dos atos constitui a regra, o sistema
jurídico – repita-se – institui algumas exceções, tendo em vista a excepcionalidade da situação
e os riscos que eventual divulgação poderia acarretar. O próprio art. 5º, XXXIII, da CF,
resguarda o sigilo de informações quando se revela indispensável à segurança da sociedade e
do Estado. O mesmo ocorre na esfera judicial: nos termos do art. 93, IX, da CF, com a redação
dada pela EC nº 45/2004, apesar de serem públicos os julgamentos, poderá a lei limitar que,
em certos atos, só estejam presentes as partes e seus advogados, ou, conforme a hipótese,
apenas estes últimos. A Constituição pretendeu proteger o direito à intimidade do interessado
diante de certos casos, considerando-o prevalente sobre o princípio do interesse público à
informação.” – CARVALHO FILHO, 2015, p. 29.
157
“Situação que merece comentário diz respeito aos efeitos decorrentes da falta de publicidade
(mais comumente de publicação) de atos administrativos. Cuida-se de saber se tal ausência se
situa no plano da validade ou da eficácia. Anteriormente, a doutrina era mais inflexível,
considerando como inválido o ato sem publicidade; ou seja, a publicidade seria requisito de
validade. Modernamente, tem-se entendido que cada hipótese precisa ser analisada
separadamente, inclusive a lei que disponha sobre ela. Em várias situações, a falta de
publicidade não retira a validade do ato, funcionando como fator de eficácia: o ato é válido,
mas inidôneo para produzir efeitos jurídicos. Se o for, a irregularidade comporta saneamento.”
– CARVALHO FILHO, 2015, p. 29/30.
O princípio da eficiência não constava da redação originária do art. 37, caput, da CF/88. Foi
introduzido em tal dispositivo através da EC 19/98, com o propósito de substituir a
Administração Pública burocrática pela Administração Pública gerencial.
Para José dos Santos Carvalho Filho, “o núcleo do princípio é a procura de produtividade e
economicidade e, o que é mais importante, a exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro
público, o que impõe a execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento
funcional. Há vários aspectos a serem considerados dentro do princípio, como a produtividade
e economicidade, qualidade, celeridade e presteza e desburocratização e flexibilização (...).” –
CARVALHO FILHO, 2015, p. 31.
“A eficiência não se confunde com a eficácia nem com a efetividade. A eficiência transmite
sentido relacionado ao modo pelo qual se processa o desempenho da atividade administrativa;
a ideia diz respeito, portanto, à conduta dos agentes. Por outro lado, eficácia tem relação com
os meios e instrumentos empregados pelos agentes no exercício de seus misteres na
administração; o sentido aqui é tipicamente instrumental. Finalmente, a efetividade é voltada
para os resultados obtidos com as ações administrativas; sobreleva nesse aspecto a
positividade dos objetivos.” – CARVALHO FILHO, 2015, p. 33.
Ao lado dos princípios gerais expostos, a doutrina reconhece outros princípios, como os da
livre concorrência aos cargos públicos; da motivação; da razoabilidade e proporcionalidade;
da segurança jurídica e proteção da confiança; da continuidade das atividades da
administração; da licitação/concorrência para a realização de obras e serviços públicos; da
responsabilidade civil do Estado; do contraditório, da ampla defesa e da celeridade nos
processos administrativos; e da probidade.
158
14.PODER LEGISLATIVO
14.1 Poder Legislativo. Organização. Atribuições do Congresso Nacional. Competências do
Senado e da Câmara. (1.b)
14.2 Legislativo e soberania popular. A crise da representação polı ́tica. (2.b)
14.3 Regime constitucional dos parlamentares. Imunidades e incompatibilidades. (15.c)
14.4 Estatuto constitucional dos agentes polı ́ticos. Limites constitucionais da investigação
parlamentar. Crimes de responsabilidade. Controle social, polı ́tico e jurisdicional do exercı ́cio
do poder. O princı ́pio republicano. (24.b)
14.5 Processo legislativo. Emenda Constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada,
medida provisória, decreto legislativo e resolução. O processo de incorporação dos tratados
internacionais. Devido processo legislativo. (7.a)
Poder legislativo dos territórios federais: de acordo com o art. 33, §3º, da CF/88, a lei
disporá sobre as eleições para a câmara territorial e sua competência deliberativa. Como não
existem territórios federais, ainda não foi regulamentado tal dispositivo constitucional. Deve-
se observar, contudo, que, quando criados, de acordo com o art. 45,
§2º, da CF/88, cada território elegerá o número fixo de 4 deputados federais, para
compor a câmara dos deputados do congresso nacional.
159
Reservas legais: o art. 48 trata das atribuições conferidas ao congresso nacional para as
quais se exige sanção presidencial (são reservas legais, ou seja, atribuições materializadas por
lei).
Competências exclusivas: já o art. 49 trata das matérias de competência exclusiva do
congresso nacional, sendo dispensada a manifestação do presidente da república através de
sanção ou veto (são atribuições materializadas por decreto legislativo).
Senado federal.
160
os territórios não terão representação no senado, na medida em que não têm autonomia
federativa.
Eleição: os senadores são eleitos pelo povo segundo o princípio majoritário, de acordo
com o art. 46 da CF/88. Cada estado e o DF elegerão o número fixo de 3 senadores, sendo
que cada senador é eleito com 02 suplentes. Mandato: é de 08 anos (duas legislaturas),
permitindo-se a reeleição. A renovação dos senadores eleitos dar-
se-á a cada 04 anos, na proporção de 1/3 e 2/3.
Requisitos para a candidatura dos senadores: a) ser brasileiro nato ou naturalizado (art.
14, §3º, I, CF/88); a exigência de ser brasileiro nato é apenas para ocupar a presidência do
senado (art. 12, §3º, III, CF/88); b) ser maior de 35 anos (art. 14, §3º, VI, a, CF/88); c) estar em
pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, §3º, II, CF/88); d) estar alistado eleitoralmente
(art. 14, §3º, III, CF/88); e) domicílio eleitoral na circunscrição (art. 14, §3º, IV, CF/88); f) filiação
partidária (art. 14, §3º, VI, CF/88).
Competências privativas do senado: as matérias de competência privativa do senado
estão previstas no art. 52 da CF/88 e não dependerão de sanção presidencial (são
materializadas através de resolução). Obs.: o senado tem apenas a iniciativa de projeto de lei
que vise à fixação da remuneração dos cargos, empregos e funções de seus serviços, devendo,
necessariamente, depois de aprovada nas duas casas, a matéria ir à sanção do presidente da
república (trata-se de mudança realizada pela EC19/98, que retirou do senado a competência
privativa para a fixação da referida remuneração, atribuindo-lhe tão somente a iniciativa da
lei).
Ativismo Congressual: manifesta-se em casos nos quais o Congresso Nacional, via
emenda constitucional ou por meio de leis ou resoluções, busca reverter situações
consideradas de “autoritarismo judicial” ou de “comportamento antidialógico” do Judiciário.
Note-se que o trânsito em julgado de decisão proferida pelo STF em processo objetivo garante
a plena eficácia de sua decisão em relação ao ato normativo impugnado. Contudo, a atividade
legislativa futura não estará vinculada ao que restou decidido. Ex: “Emenda da Vaquejada”.
STF: As decisões definitivas de mérito proferidas pelo STF no julgamento de ADI, ADC
ou ADPF possuem eficácia contra todos (erga omnes) e efeito vinculante (§ 2º do art. 102 da
CF/88). O Poder Legislativo, em sua função típica de legislar, não fica vinculado. Assim, o STF
não proíbe que o Poder Legislativo edite leis ou emendas constitucionais em sentido contrário
ao que a Corte já decidiu. Não existe uma vedação prévia a tais atos normativos. O legislador
pode, por emenda constitucional ou lei ordinária, superar a jurisprudência. Trata-se de uma
reação legislativa à decisão da Corte Constitucional com o objetivo de reversão jurisprudencial.
No caso de reversão jurisprudencial (reação legislativa) proposta por meio de emenda
constitucional, a invalidação somente ocorrerá nas restritas hipóteses de violação aos limites
previstos no art. 60, e seus §§, da CF/88. Em suma, se o Congresso editar uma emenda
constitucional buscando alterar a interpretação dada pelo STF para determinado tema, essa
emenda somente poderá ser declarada inconstitucional se ofender uma cláusula pétrea ou o
processo legislativo para edição de emendas. No caso de reversão jurisprudencial proposta por
lei ordinária, a lei que frontalmente colidir com a jurisprudência do STF nasce com presunção
relativa de inconstitucionalidade (leis in your face), de forma que caberá ao legislador o ônus
de demonstrar, argumentativamente, que a correção do precedente se afigura legítima. Assim,
para ser considerada válida, o Congresso Nacional deverá comprovar que as premissas fáticas
e jurídicas sobre as quais se fundou a decisão do STF no passado não mais subsistem. O Poder
Legislativo promoverá verdadeira hipótese de mutação constitucional pela via legislativa. STF.
Plenário. ADI 5105/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 1º/10/2015 (Info 801).
161
Efeito backlash: consiste em uma reação conservadora de parcela da sociedade ou das
forças políticas (em geral, do parlamento) diante de uma decisão liberal do Judiciário em um
tema polêmico.
Legislativo e Soberania Popular: Para José Afonso da Silva (2010, p. 131), a democracia
repousa sobre dois princípios fundamentais: (a) soberania popular (o povo é a única fonte de
poder) e (b) participação, direta ou indireta, do povo no poder (para que este seja a efetiva
expressão da vontade popular). A forma pela qual o povo participa no poder dá origem a três
tipos de democracia: direta, indireta (ou representativa) e semidireta. O Brasil adota o tipo
semidireto, ou seja, democracia representativa, com alguns institutos de participação direta.
Portanto, o Poder Legislativo, por meio dos representantes legitimamente eleitos pelo povo, é
o veículo primordial para o exercício da soberania popular. “Todo o poder emana do povo, que
o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”
(CF, art. 1º, parágrafo único).
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR; Direito Constitucional Esquematizado, Pedro Lenza, Ed. 2018.
162
O Estatuto dos congressistas representa o regime jurídico dos membros do Congresso
Nacional, em que a Constituição estabelece um conjunto de normas instituidoras de direitos e
prerrogativas e também deveres e incompatibilidades.
As imunidades ocupam posição relevante, uma vez que os membros do Legislativo devem
atuar com ampla independência no desempenho de suas atribuições constitucionais, bem
como para preservar a independência dos poderes.
Como já decidiu o Supremo Tribunal Federal, o fundamento das imunidades não consiste na
proteção do parlamentar nas relações privadas, porque não são privilégios pessoais, muito
menos abrigo para práticas ilícitas, mas sim pela função exercida no Poder Legislativo. (STF, RE
299109 AgR – a prerrogativa indisponível da imunidade material [...] constitui garantia
inerente ao desempenho da função parlamentar, não traduzindo, por isso mesmo, qualquer
privilégio de ordem pessoal).
Características:
Imunidade material
Natureza jurídica: a doutrina diverge, considera como causa excludente do delito (Pontes de
Miranda e Nelson Hungria); causa pessoa ou funcional de isenção de penal (Aníbal Bruno);
causa pessoal de exclusão de pena (Heleno Cláudio Fragoso); causa de irresponsabilidade
penal por motivos políticos (José Frederico Marques) e causa de exclusão da tipicidade
(Zaffaroni e Pierangeli, Fernando Capez).
Extensão: abrange opiniões, palavras e votos (responsabilidade criminal (não constitui crime
seus atos), civil (não pode ser responsabilizado por perdas e danos a responsabilidade
administrativa (não sofrerá sanções disciplinares) e política ( não poderá ser destituído pelos
eleitores ou pelo partido que o elegeu).
Âmbito espacial: recinto parlamentar (tribuna); externa corporis, é necessário vínculo com a
atividade política; na CPI, na divulgação pela imprensa de fatos protegidos pela inviolabilidade;
163
STF – caso do Deputado Jair Bolsonaro: “A imunidade parlamentar material (art. 53 da CF/88)
protege os Deputados Federais e Senadores, qualquer que seja o âmbito espacial (local) em
que exerçam a liberdade de opinião. No entanto, para isso é necessário que as suas
declarações tenham conexão (relação) com o desempenho da função legislativa ou tenham
sido proferidas em razão dela. Para que as afirmações feitas pelo parlamentar possam ser
consideradas como "relacionadas ao exercício do mandato", elas devem ter, ainda de forma
mínima, um teor político. Exemplos de afirmações relacionadas com o mandato: declarações
sobre fatos que estejam sendo debatidos pela sociedade; discursos sobre fatos que estão
sendo investigados por CPI ou pelos órgãos de persecução penal (Polícia, MP); opiniões sobre
temas que sejam de interesse de setores da sociedade, do eleitorado, de organizações ou
grupos representados no parlamento etc. Palavras e opiniões meramente pessoais, sem
relação com o debate democrático de fatos ou ideias não possuem vínculo com o exercício das
funções de um parlamentar e, portanto, não estão protegidos pela imunidade material. No
caso concreto, as palavras do Deputado Federal dizendo que a parlamentar não merecia ser
estuprada porque seria muito feia não são declarações que possuem relação com o exercício
do mandato e, por essa razão, não estão amparadas pela imunidade material”. STF. 1ª Turma.
Inq 3932/DF e Pet 5243/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgados em 21/6/2016 (Info 831).
Irrenunciável: por ser garantia institucional deferida ao Poder Legislativo e, portanto, por
decorrer da função que os seus membros exercem, a imunidade é irrenunciável. Seu início
ocorre com a diplomação, perdurando até o término do mandato.
Efeitos temporais: se prolonga no tempo, o que significa que o deputado/senador não poderá
sofrer sanção.
Imunidade processual:
Objetivo: garante ao parlamentar não ser ou permanecer preso, bem como a possibilidade de
sustar o processo penal em curso contra ele.
Conteúdo: os parlamentares, assim que forem diplomados, podem ser processados sem prévia
licença da Casa a que pertence. Após o recebimento da denúncia, por crime ocorrido após a
diplomação o STF dará ciência à casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela
representado e pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, poderá até a decisão final
sustar o andamento do processo. Eles podem ser presos em flagrante por crime inafiançável.
Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de24 horas à Casa respectiva, para que a maioria
absoluta dos parlamentares, delibere sobre a prisão.
Prisão preventiva de parlamentar: A 2ª turma do STF referendou decisão proferida pelo Min.
Teori Zavascki na AC 4.039, para admitir a prisão cautelar de Senador, tendo em vista a
presença de requisitos de prisão preventiva. A situação concreta não envolvia crime
inafiançável (organização criminosa) contudo, o STF entendeu que a inafiançabilidade
decorreria de situação concreta e nos termos da Lei, pois, de acordo com o art. 324, IV, do
CPP, não será concedida fiança quando presentes os motivos que autorizam a decretação de
prisão preventiva (art.312, CPP). Assim, se não será concedida fiança, estaria configurada a
situação de inafiançabilidade. (Notícias STF, 25.11.2015). Por sua vez, a 2ª turma do STF na AC
164
4.327 (26.09.2017) apreciou pedido de prisão preventiva de parlamentar federal, contudo,
sinalizou dúvida razoável, na hipótese acerca dos requisitos do art. 53, § 2º da CF, para fins de
decretação da prisão preventiva.
Abrangência: impede a prisão penal e a civil, o que significa que o parlamentar não poderá
sofrer constrição privativa de liberdade, salvo em crime inafiançável. No entanto, nada impede
a execução dessa pena, se definitivamente imposta. (INQ 510/DF, Min. Celso De Mello - a
garantia jurídico-institucional da imunidade parlamentar formal não obsta, observado o "due
process of law", a execução de penas privativas da liberdade definitivamente impostas ao
membro do Congresso Nacional).
165
Classificação das incompatibilidades: i) contratuais ou negociais (art. 54, I, a): não poderão,
desde a expedição do diploma, firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito
público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária
de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; ii) funcionais (art.
54, I, b e II b): não poderão, desde a expedição do diploma, aceitar ou exercer cargo, função ou
emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum, nas entidades
constantes no item anterior. Também não poderão ocupar cargo ou função de que sejam
demissíveis ad nutum, nas entidades referidas no item “i”; iii) profissionais (art. 54, II, a e II c):
não poderão, desde a posse, ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que
goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer
função remunerada. Do igual modo, não poderão patrocinar causa em que seja interessada
qualquer das entidades citadas no item “i”; iv) políticas (art.54, II, d); não poderão, desde a
posse, ser titulares de mais de um cargo ou mandato eletivo.
Depois, mais tarde, as imunidades parlamentares foram inscritas na Constituição dos Estados
Unidos da América de 1787 (art. 1º seção 6). Nesse país, se um congressista cometesse crime
fora do exercício da atividade, recebia o mesmo tratamento de qualquer cidadão comum,
sendo investigado, indiciado, processado e julgado, porque a inviolabilidade só alcança os
estritos limites do cargo. Fora da função parlamentar todos são iguais.
Nos países latinos, o instituto sofre distorções, sendo desfigurado. Enquanto na Inglaterra, nos
EUA, no Canadá e na Alemanha a imunidade parlamentar se restringe ao âmbito de atuações
políticas, no Brasil, na Itália, na Espanha, na Argentina, ela figura como abrigo de criminosos,
protegendo os parlamentares nos delitos comuns.
Estatuto constitucional dos agentes políticos. Agentes políticos são os titulares dos
cargos estruturais da organização política do País, ou seja, ocupantes dos cargos que integram
o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se
constituem nos formadores da vontade superior do Estado.
O Estatuto do Congresso Nacional vem previsto a partir do art. 53 da CRFB. É o
conjunto de regras diversas do direito comum previstas na Constituição que dão aos
parlamentares direitos, prerrogativas, deveres e incompatibilidades. Quanto às prerrogativas,
ressalta-se: a) imunidade material (são invioláveis civil e penalmente por opiniões, palavras e
votos); b) imunidades formais: b.1) prerrogativa de foro; b.2) não ser preso ou não
permanecer preso; b.3) possibilidade de sustar o processo penal em curso contra ele – art. 53,
§ 3º, CF; b.4) limitação quanto ao dever de testemunhar; b.5) isenção de serviço militar. Tais
prerrogativas são irrenunciáveis (Ruy Barbosa, citado por BULOS, p. 776).
166
Objetivo: assegurar independência no exercício das atribuições do Legislativo (fiscalizar
e inovar na ordem jurídica). Por simetria, aplicam-se as mesmas prerrogativas aos deputados
estaduais e distritais (art. 27, § 1º, CF). Atenção às hipóteses de perda e cassação do mandato
parlamentar (art. 55, CF). Limites constitucionais da investigação parlamentar.
Jurisprudência: Relativização da imunidade material no Caso Bolsonaro (recebimento
de denúncia pela prática dos crimes previstos nos arts. 286 e 140 do Código Penal)
relativamente a entrevista concedida pelo parlamentar em seu gabinete, no momento em que
reafirmou as declarações. O STF entendeu que o fato de a entrevista ter sido concedida dentro
do gabinete do Deputado foi um fato meramente acidental, de menor importância. Isso
porque não foi ali (no gabinete) que as ofensas se tornaram públicas. Elas se tornaram públicas
por meio da imprensa e da internet, quando a entrevista foi veiculada.
Dessa forma, tratando-se de declarações prestadas em entrevista concedida a veículo
de grande circulação não incide o entendimento de que a imunidade material seria absoluta.
É necessário avaliar, portanto, se as palavras proferidas estavam ou não relacionadas
com a função parlamentar. E, como, no caso concreto não estavam, ele não estará protegido
pela imunidade material do art. 53 da CF/88.
STF: A previsão constitucional do art. 86, § 4º (§ 4º O Presidente da República, na
vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de
suas funções), da Constituição da República se destina expressamente ao chefe do Poder
Executivo da União, não autorizando, por sua natureza restritiva, qualquer interpretação que
amplie sua incidência a outras autoridades, nomeadamente do Poder Legislativo.
(Inq 3.983, rel. min. Teori Zavascki, j. 3-3-2016, P, DJE de 12-5-2016.)
“5. Os autos da prisão em flagrante delito por crime inafiançável ou a decisão judicial
de imposição de medidas cautelares que impossibilitem, direta ou indiretamente, o pleno e
regular exercício do mandato parlamentar e de suas funções legislativas, serão remetidos
dentro de vinte e quatro horas a Casa respectiva, nos termos do §2º do artigo 53 da
Constituição Federal, para que, pelo voto nominal e aberto da maioria de seus membros,
resolva sobre a prisão ou a medida cautelar. 6. Ação direta de inconstitucionalidade julgada
parcialmente procedente.”
(ADI 5526, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ALEXANDRE
DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/2017)
CPI. A CPI atua como longa manus do Poder Legislativo. Por isso, sujeita-se ao controle
jurisdicional originário do STF. Alguns atos a CPI pode determinar diretamente, sem integração
do Judiciário, em razão de seus poderes instrutórios. São eles (art. 2°, Lei 1.579/52):
1) Notificação de testemunhas, investigados e convidados ― o cidadão comparece perante a
CPI ostentando uma destas qualidades. O investigado também é tratado como indiciado.
2) Condução coercitiva de testemunha ― a testemunha virá depor debaixo de vara.
3) Realização de exames, vistorias e perícias.
4) Afastar o sigilo bancário, fiscal e de registros telefônicos do cidadão ― a CRFB permite a
quebra do sigilo sem a necessidade de autorização judicial. Este ato só pode ser determinado
pelas CPIs do Congresso, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e da Assembleia
Legislativa. As CPIs de Câmaras Municipais não têm autoridade para afastar sigilo bancário e
fiscal diretamente, segundo o STF. Entendendo pela necessidade da quebra de sigilo, a CPI
municipal deverá se socorrer do Poder Judiciário. A decisão da CPI em quebrar os sigilos deve
sempre ser fundamentada (art. 93, IX – se o juiz deve fundamentar sua decisão, a CPI também
deve, pois está de posse de poderes de autoridade judicial).
A CPI pode afastar o sigilo, mas deve obediência ao princípio da colegialidade: quem
determina a quebra é toda a CPI, e não o seu presidente.
A quebra do sigilo telefônico refere-se somente aos dados de chamadas telefônicas, e não ao
teor das conversas. Em outras palavras, é permitido que a CPI quebra o sigilo de dados
telefônicos, mas NÃO que autorize a INTERCEPTAÇÃO DAS CONVERSAS TELEFÔNICAS E
TELEMÁTICAS (MATÉRIA SUBMETIDA À RESERVA DE JURISDIÇÃO)
167
A CPI não pode, por não deter autoridade para tanto (é necessária autorização judicial –
reserva constitucional de jurisdição):
5) Expedir mandado de prisão; 6) Expedir mandado de busca e apreensão; 7) Expedir mandado
de interceptação telefônica ― de acordo como art. 5º, XII, da CRFB, somente o juiz pode
determinar a interceptação telefônica. A CPI pode, no entanto, oficiar diretamente à
companhia telefônica solicitando dados telefônicos.
Segundo Uadi Lammêgo Bulos, são limites constitucionais formais das CPI: (i) impossibilidade
de investigar fato indeterminado; (ii) impossibilidade de renegar o quorum constitucional (um
terço dos membros da Casa para sua criação); (iii) impossibilidade de exceder prazo certo, que
pode ser prorrogado - o STF já entendeu, em votação não unânime, que podem existir
prorrogações sucessivas dentro da mesma legislatura, conforme prevê a Lei n. 1.579/52; (iv)
impossibilidade de desvirtuamento do âmbito funcional: os poderes são apenas
investigatórios. Não podem acusar, devendo enviar suas conclusões ao MP.
São limites constitucionais materiais: (i) separação de poderes; (ii) Estado democrático de
direito; (iii) reserva constitucional de jurisdição; (iv) direitos e garantias fundamentais; (v)
princípio republicano; (vi) não poderá também invadir área de competência de Estados e
Municípios (MENDES et alli, p. 903); (vii) segundo o STF, cabe à CPI apurar apenas fatos
relacionados à Administração (BULOS, p. 801).
Crimes de responsabilidade. Crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas
definidas nalegislação federal, cometidas no desempenho da função, que atentam contra a
existência da União, o livre exercício dos Poderes do Estado, a segurança interna do país, a
probidade na Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos políticos, individuais e
sociais e o cumprimento das leis e das decisões judiciais. O rol do art. 85 da Constituição é
meramente exemplificativo. As sanções estão previstas no art. 52, parágrafo único: perda do
cargo e inabilitação, por oito anos, para o exercício de qualquer função pública (inclusive
cargos de natureza política: STF, RE 234.223).
Para apuração dos crimes de responsabilidade do Presidente da República, o processo divide-
se em duas partes: juízo de admissibilidade, na Câmara dos Deputados, e processo e
julgamento, no Senado Federal. Arts. 13 a 38, Lei n° 1.079/50. Art. 51, I; art. 52, I e II; e art. 86,
todos da CF. A Lei n. 1.079/50 prevê os tipos criminais de responsabilidade e o procedimento
para o julgamento, que deve ser analisado à luz da CF/88.
O Poder Judiciário não pode alterar a decisão política do Congresso Nacional. O mérito da
decisão é inatacável. O Judiciário pode anular o julgamento por ofensa a princípios
constitucionais, mas não pode modificar o mérito da decisão.
Também são julgados pelo Senado Federal em caso de crime de responsabilidade: Ministros
do STF, membros do CNJ e do CNMP, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da
União. Ministros de Estado e os comandantes das Forças Armadas são julgados pelo Senado
nos crimes de responsabilidade quando estes forem conexos aos praticados pelo Presidente.
Caso contrário, serão julgados pelo STF.
Súmula Vinculante nº 46: A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das
respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da
União.
Rito do Impeachment (fonte: https://www.dizerodireito.com.br/2015/12/analise-juridica-da-
decisao-do-stf-que.html)
CÂMARA DOS DEPUTADOS (FASE DE JUÍZO DE ADMISSIBILDADE)
• O Presidente da Câmara admite ou não o prosseguimento da denúncia.
• Não há direito à defesa prévia antes do recebimento da denúncia pelo Presidente da
Câmara, ou seja, não é necessário ouvir antes o Presidente da República que estiver sendo
denunciado.
• Do despacho do Presidente que indeferir o recebimento da denúncia, caberá recurso ao
Plenário (art. 218, § 3º, do RICD).
• Caso seja admitido o prosseguimento da denúncia, deverá ser constituída comissão especial
formada por Deputados Federais para análise do pedido e elaboração de parecer.
168
• A eleição dos membros da comissão deverá ser aberta e não pode haver candidatura
alternativa (avulsa). A comissão é escolhida a partir de uma chapa única com nomes indicados
pelos líderes partidários. A votação aberta será apenas para que o Plenário da Casa aprove ou
não a chapa única que foi apresentada.
• O Presidente denunciado deverá ter direito à defesa no rito da Câmara dos Deputados.
Assim, depois que houver o recebimento da denúncia, o Presidente da República será
notificado para manifestar-se, querendo, no prazo de dez sessões.
• Vale ressaltar, no entanto, que não deve haver grande dilação probatória na Câmara dos
Deputados (o rito é abreviado). A comissão até pode pedir a realização de diligências, mas
estas devem ser unicamente para esclarecer alguns pontos da denúncia, não podendo ser
feitas para provar a procedência ou improcedência da acusação. Isso porque o papel da
Câmara não é reunir provas sobre o mérito da acusação, mas apenas o de autorizar ou não o
prosseguimento. Quem irá realizar ampla dilação probatória é o Senado.
• O Plenário da Câmara deverá decidir se autoriza a abertura do processo de impeachment por
2/3 dos votos.
• O processo é, então, remetido ao Senado.
SENADO FEDERAL
• Chegando o processo no Senado, deverá ser instaurada uma comissão especial de Senadores
para analisar o pedido de impeachment e preparar um parecer (arts. 44 a 46 da Lei nº
1.079/50, aplicados por analogia).
• Esse parecer será votado pelo Plenário do Senado, que irá decidir se deve receber ou não a
denúncia que foi autorizada pela Câmara.
• Assim, o Senado, independentemente da decisão da Câmara, não é obrigado a instaurar o
processo de impeachment, ou seja, pode rejeitar a denúncia.
• Se rejeitar a denúncia, haverá o arquivamento do processo.
• Se receber, iniciará a fase de processamento, com a produção de provas e, ao final, o Senado
votará pela absolvição ou condenação do Presidente.
• A decisão do Senado que decide se instaura ou não o processo se dá pelo voto da maioria
simples, presente a maioria absoluta de seus membros. Aplica-se aqui, por analogia, o art. 47
da Lei nº 1.079/50. Assim, devem estar presentes no mínimo 42 Senadores no dia da sessão
(maioria absoluta de 81) e, destes, bastaria o voto de 22 Senadores.
• Se o Senado aceitar a denúncia, inicia-se a instrução probatória e o Presidente da República
deverá ser afastado do cargo temporariamente (art. 86, § 1º, II, da CF/88). Se, após 180 dias do
afastamento do Presidente, o julgamento ainda não tiver sido concluído, cessará o seu
afastamento e ele reassumirá, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo.
• A defesa tem direito de se manifestar após a acusação: no curso do procedimento de
impeachment, o Presidente terá a prerrogativa de se manifestar, de um modo geral, após a
acusação.
• O interrogatório deve ser o ato final da instrução probatória: o interrogatório do Presidente,
instrumento de autodefesa que materializa as garantias do contraditório e da ampla defesa,
deve ser o último ato de instrução do processo de impeachment.
• Ao final do processo, os Senadores deverão votar se o Presidente deve ser condenado ou
absolvido. Para que seja condenado, é necessário o voto de 2/3 dos Senadores.
• Se for condenada, a Presidente receberá duas sanções: a) perda do cargo; b) inabilitação
para o exercício de funções públicas por 8 anos. Além disso, poderá ser eventualmente
denunciado criminalmente pelo Ministério Público.
• Caso seja condenado, quem assume é o Vice-Presidente, que irá completar o mandato (não é
necessária a convocação de novas eleições).
Controle social, político e jurisdicional do exercício do poder. O controle social é a
participação da sociedade no acompanhamento e verificação das ações de execução das
políticas públicas, avaliando os objetivos, processos e resultados. O controle é fiscalização,
sindicalização, investigação, acompanhamento da execução daquilo que foi decidido e
constituído por quem tem o poder político ou a competência jurídica de tomar decisões de
169
interesse público. O controle social é direito público subjetivo dos integrantes da sociedade e
decorre tanto do princípio republicano (art. 1º, CRFB), como do direito fundamental de
participação política, reconhecido na própria CF (ex.: art. 37, § 3º) e nos documentos
internacionais de Direitos Humanos. Dentre as formas de controle social, destacam-se a
possibilidade de representação e petição aos Poderes Públicos e os orçamentos e
planejamentos participativos.
O controle político em sentido amplo (lato sensu) pode ser interpretado como o controle
exercido pelas instituições políticas sobre os atos dos administradores das coisas públicas. Em
uma análise mais restritiva (stricto sensu), pode ser classificado como o controle exercido
pelos representantes eleitos do povo sobre os atos dos administradores públicos, eleitos ou
não.
O controle exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos da Administração tem suas origens na
tripartição dos Poderes, prevista por Montesquieu no século XVIII e adotada por todas as
constituições liberais a partir do século XIX. A ideia de pesos e contrapesos na regulação e
limitação dos Poderes coloca o Poder Judiciário como peça central neste sistema.
O princípio republicano. O princípio republicano é responsável por fixar a forma de governo
do Estado, estabelecendo a relação entre governantes e governados. A res publica (ou a coisa
do povo) se caracteriza pelo fato do povo, em todo ou em parte, possuir o poder soberano, ao
passo que, na monarquia, tem-se apenas um governante.
Tal forma de governo tem por base a defesa da igualdade formal entre as pessoas, de modo
que o poder político será exercido por mandato representativo e temporário. Destaca-se,
ainda, uma característica importante na forma republicana, que é a responsabilidade: os
governantes são responsabilizáveis por seus atos, seja com sanções políticas (impeachment),
seja com sanções penais e civis.
Ao se falar de República, destacamos os seguintes elementos: (1) forma de governo que se
opõe ao modelo monárquico, pois o povo é o titular do poder político, exercendo este de
forma direta ou indiretamente por meio de representante; (2) igualdade formal entre as
pessoas, pois não há tratamento estamental na sociedade e a legislação não permite
discriminações, devendo todos receber o mesmo tratamento; (3) eleição dos detentores do
poder político – tais eleições marcam o caráter temporário de permanência como detentor do
poder; (4) responsabilidade política do Chefe de Governo e/ou do Estado, cabendo a prestação
de contas de suas condutas (accountability).
Por fim, Canotilho destaca que o princípio republicano traz internamente mecanismos de
criação e manutenção de instituições políticas vinculadas à decisão e à participação da
sociedade (cidadãos) – o que os norte-americanos chamam de self-government. Isso implica a
afirmação de autodeterminação e autogoverno, impondo a observância das seguintes normas:
(1) representação territorial; (2) procedimento justo de seleção de representantes; e (3)
deliberação majoritária.
7A. Processo legislativo. Emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada,
medida provisória, decreto legislativo e resolução. O processo de incorporação dos tratados
internacionais. Devido processo legislativo.
Karine Hoffstaeter
Bibliografia: graal alternativo do 28 CPR; Aulas do Curso Estratégia (2018)
A função de legislar é uma das funções típicas do Poder Legislativo, cujo objetivo é produzir os
atos normativos primários, chamados assim porque têm seu fundamento de validade
diretamente da Constituição. Os atos normativos primários (emendas à constituição, leis
complementares, medidas provisórias, leis delegadas, decretos legislativos e resoluções) são
elaborados a partir de uma sistemática própria, prevista na Constituição e nos Regimentos
Internos de cada uma das Casas Legislativas, cuja sistemática recebe o nome de processo
legislativo.
170
O processo legislativo é o núcleo central do regime constitucional de um Estado democrático
de direito que permite a construção do Direito, que é um elemento essencial de integração da
sociedade pluralista em que vivemos. Consoante o Ministro Alexandre de Moraes, o processo
legislativo pode ser compreendido em duplo sentido: a) jurídico, que é o conjunto de
disposições que regula o procedimento a ser observado pelos órgãos responsáveis pela
produção das espécies normativas primárias; b) sociológico, que são os fatores reais de poder
que impulsionam a atividade legiferante.
Contudo, há espécies normativas que, apesar de serem primárias, estão fora do escopo do
processo legislativo, como os decretos autônomos e os regimentos dos tribunais, que são atos
normativos primários, mas que não são objeto do processo legislativo, bem como existem
ainda os atos normativos secundários, como os decretos regulamentares, que também não são
objeto do processo legislativo.
O processo legislativo divide-se em duas espécies: a) comum, que se destina à elaboração das
leis ordinárias; e b) especial, que é aquele utilizado para a elaboração de emendas à
Constituição, leis complementares, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos,
resoluções e leis financeiras (lei de plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias, leis
orçamentárias anuais e abertura de créditos adicionais).
O processo legislativo é o mecanismo por meio do qual são elaboradas as normas jurídicas do
art. 59, CF/88, contudo, o procedimento legislativo é a sucessão de atos necessários para a
elaboração das normas do art. 59, CF/88. Este procedimento legislativo pode ser classificado
em comum (destinado à elaboração da lei ordinária) e especial (destinado às outras espécies
normativas primárias). O Comum subdivide-se em: a) ordinário, que consiste no procedimento
mais completo, em que não há prazos definidos para o encerramento das fases de discussão
(deliberação) e votação, permitindo estudo mais aprofundado sobre as matérias objeto do
projeto de lei; b) sumário, que possui as mesmas fases do procedimento legislativo ordinário,
171
mas há imposição de prazo para o encerramento da fase de discussão (deliberação) e votação;
c) Procedimento legislativo abreviado: que é o procedimento que se aplica a projetos de lei
que, na forma dos regimentos internos das Casas Legislativa, dispensam a discussão e votação
em Plenário, podendo ser aprovados diretamente pelas Comissões, sem necessidade de irem a
Plenário.
O Presidente da República tem a iniciativa privativa de projeto de lei que trata da organização
do Ministério Público e da Defensoria Pública da União e de projeto de lei que versa sobre
normas gerais de organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do
Distrito Federal e dos Territórios. Ressalte-se que, por força do art. 128, § 5º, CF/88, a lei de
organização do Ministério Público da União é da iniciativa concorrente do Presidente da
República e do Procurador-Geral da República. Por simetria, as leis de organização dos
Ministérios Públicos Estaduais são de iniciativa concorrente do Governador e do Procurador-
Geral de Justiça.
Nas Emendas Constitucionais, que cuidam da reforma à Constituição, elas apresentam quatro
tipos de limitações: a) temporais, que ocorrem quando o Poder Constituinte Originário
estabelece um prazo durante o qual não pode haver modificações ao texto da Constituição,
sendo imutável, algo que não aconteceu com CF/88; b) circunstanciais, que se verificam
quando a Constituição estabelece que em certos momentos de instabilidade política do Estado
seu texto não poderá ser modificado, tais como estado de sítio, estado de defesa e intervenção
federal (CF, art. 60, § 1º), podendo apenas ser apresentadas, discutidas e votadas, sem
possibilidade de promulgação; c) formais, i) quanto à iniciativa restrita (1/3, no mínimo, dos
membros da câmara ou do senado; Presidente da República; mais da metade das assembleias
legislativas, manifestando-se, cada uma, pela maioria relativa de seus membros); ii) votação e
discussão em 2 turnos em cada casa legislativa e aprovação por 3/5 dos membros de cada uma
delas; iii) promulgação pelas mesas da câmara e do senado, com o respectivo número de
ordem, e iv) vedação à reapresentação, na mesma sessão legislativa, de proposta de emenda
nela rejeitada ou tida por prejudicada (irrepetibilidade absoluta); d) materiais, quando a
Constituição estabelece que determinadas matérias não poderão ser abolidas por meio de
emendas, conhecidas como explícitas ou expressas, quando previstas expressamente do texto
constitucional e, em oposição, implícitas ou tácitas, quando não estão expressas Constituição.
172
Os dois tipos de limitações materiais estão presentes na CF/88. As expressas estão previstas no
§ 4º do art. 60, segundo o qual não será objeto de deliberação a proposta de emenda
tendente a abolir: 1) a forma federativa de Estado; 2) o voto direto, secreto, universal e
periódico; 3) a separação dos Poderes e 4) os direitos e garantias individuais. Já as limitações
implícitas ao poder de reforma são limites tácitos, não podendo ser modificados, tais como: a
titularidade do Poder Constituinte Originário e Derivado e os procedimentos de reforma e
revisão constitucional.
Das medidas provisórias: Nestas espécies normativas, o Presidente da República (PR) poderá
adotá-las, com força de lei, em caso de relevância e urgência, devendo submetê-las de
imediato ao Congresso Nacional.
Registre-se que as medidas provisórias não podem tratar sobre qualquer matéria, tendo em
visa a existência de limitações constitucionais à sua edição, tais como: I – relativa a: a)
nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito
penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério
Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes
orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art.
167, § 3º (abertura de créditos extraordinários); II – que vise a detenção ou sequestro de bens,
de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV
– já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou
veto do Presidente da República.
Uma vez editada pelo Presidente, a medida provisória deverá ser submetida, de imediato, ao
Congresso Nacional, onde terá o prazo de 60 dias (prorrogáveis por mais 60) para ser
apreciada, não correndo durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. Será
apreciada por uma Comissão Mista, que emitirá parecer, para posterior apreciação pelo
Plenário das Casas Legislativas, iniciada obrigatoriamente na Câmara dos Deputados. Caso seja
integralmente convertida em lei, o Presidente do Senado a promulgará, não se falando em
sanção ou veto. Caso rejeitada integralmente, o CN deverá disciplinar, por meio de decreto
legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes, no prazo de 60 dias. No caso de modificações
do texto original, será transformada em projeto de lei de conversão, o qual será enviado para
sanção ou veto pelo Presidente da República.
173
Das Leis Delegadas: estas são as elaboradas pelo Presidente da República, no exercício da
função atípica legislativa, por delegação do Congresso Nacional, após sua solicitação (do PR). É
um ato discricionário do Congresso, podendo ser revogado a qualquer tempo. Na delegação
típica, não há qualquer intervenção do Legislativo, enquanto na atípica, o Congresso apreciará
antes de ser convertido em lei. A delegação não vincula o Presidente da República, que,
mesmo diante dela, poderá não editar a lei delegada, como não retira do Legislativo o poder de
regular a matéria. Elas não podem tratar de qualquer matéria, bem como o Congresso poderá
sustar atos do Executivo que exorbitem dos limites da delegação legislativa, com efeitos não
retroativos (ex nunc), chamado de “veto legislativo”.
Dos decretos legislativos e Das resoluções: ambos são espécies normativas primárias, com
hierarquia de lei ordinária, não sujeitos à sanção ou veto do Presidente da República. Os
decretos legislativos são atos editados pelo Congresso Nacional para o tratamento de matérias
de sua competência exclusiva (art. 49 da CF), dispensada a sanção presidencial. Segundo o Prof.
José Afonso da Silva, os decretos legislativos são atos com efeitos externos ao Congresso
Nacional. As resoluções são espécies normativas editadas pelo Congresso Nacional, pelo
Senado Federal ou pela Câmara dos Deputados, sendo utilizadas para dispor sobre assuntos de
sua competência que não estão sujeitos à reserva de lei (arts. 51 e 52 da CF), que apontam as
competências privativas da Câmara e do Senado, respectivamente. A Constituição exige a
edição de resoluções, também, em outros dispositivos constitucionais, dentre os quais: a)
delegação legislativa para a edição de lei delegada (resolução do Congresso Nacional); b)
definição das alíquotas máximas do imposto da competência dos Estados e do DF, sobre
“causas mortis” e doações, de quaisquer bens ou direitos (resoluções do Senado). Ademais,
promulgação da resolução se dá pelo Presidente da respectiva Casa legislativa.
174
“Aprovado o acordo, o Presidente do Senado emitirá um Decreto Legislativo, que aqui consiste
em mero instrumento de encaminhamento do tratado ao PR, a quem cabe decidir sobre a
ratificação. Nesta hipótese (aprovação), o DL não tem o efeito de ordenar (ao PR) o
cumprimento do tratado. Caso o CN não aprove o ato internacional, o PR fica impossibilitado
de ratificá-lo, sob pena de violação ao livre exercício do Poder Legislativo (CF, art. 85, II). Por
fim, quando o tratado entrar em vigor no âmbito internacional, o PR pode concluir o processo
de incorporação por meio da promulgação, ato pelo qual ordena a publicação do acordo e sua
execução em território nacional. A promulgação é feita por meio de Decreto, publicado no
DOU”.
15.PODER EXECUTIVO
15.1 Poder Executivo. Histórico. Presidencialismo e Parlamentarismo. Presidencialismo de
coalização. (2.b)
15.2 Presidente da República: estatuto. Competências. Poder normativo autônomo, delegado
e regulamentar. Ministros de Estado. (2.b)
175
Presidencialismo Parlamentarismo
Identidade entre chefia de estado e chefia de governo
(são a mesma pessoa). Há uma não identidade entre chefia de estado e
Chefe de estado exerce função simbólica de chefia de governo. O chefe de estado pode ser um
representar internacionalmente o país e de rei (um monarca) ou um presidente, ao passo que o
corporificar a sua unidade interna. chefe de governo é o 1º ministro, que exerce o
Chefe de governo executa as políticas públicas. governo conjuntamente com o seu gabinete
Ou seja, é quem efetivamente governa e também (conselho de Ministros).
exerce a liderança da política nacional.
176
dupla vacância na chefia do Poder Executivo.
Competência. José Afonso da Silva classifica as atribuições do Presidente da República em três
funções básicas:
a) Chefia do Estado: art. 84, VII, VIII, XVIII, segunda parte, XV, XVI, primeira parte, XIX, XX, XXI e
XXII. b) Chefia do Governo: art. 84, I, III, IV, V, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XVII, XVIII, primeira parte,
XXIII, XXIV e XXVII. c) Chefia da Administração Federal: art. 84, II, VI, XVI, segunda parte, XXIV e
XXV.
Atribuições delegáveis → Apenas três são delegáveis aos Ministros de Estado, ao
Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União: a) Inciso VI (decretos
autônomos); b) Inciso XII (conceder indulto e comutar penas); c) Inciso XXV, primeira parte –
prover (por lógica, abrange o desprover -exonerar)os cargos públicos na forma da lei.
Estatuto: imunidades e prerrogativas. Imunidade formal: só poderá ser processado por
crime comum ou de responsabilidade após o juízo de admissibilidade da Câmara dos
Deputados. E enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, não se
sujeita à prisão. Prerrogativa de foro: só poderá ser processado e julgado pelo STF no caso de
crimes comuns, e pelo Senado nos crimes de responsabilidade. Por fim, cabe referir a previsão
constante do § 4º do art. 86, o qual estabelece a irresponsabilidade pelas infrações que não se
relacionam com o exercício de suas funções. NÃO possui imunidades materiais, apenas
imunidades processuais! Imunidade processual temporária (por atos estranhos ao cargo,
somente após o mandato –art. 86 §4 → consequências: prescrição fica suspensa, após o
mandato não haverá controle de admissibilidade pela CD).
Constituição, art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República
que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos
Poderes constitucionais das unidades da Federação; III – o exercício dos direitos políticos,
individuais e sociais; IV - a segurança interna do País; V - a probidade na administração; VI - a
lei orçamentária; VII -o cumprimento das leis e das decisões judiciais. Esses crimes serão
definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento, atualmente
disciplinados na Lei n. 1079/50.
177
Antônio Bandeira de Mello) criticou duramente essa inovação, mas o STF a respaldou" (ADI
2.564). Poder Regulamentar: previsto no art. 84, IV, da Constituição. O regulamento de
execução explicita a lei sem inovar a ordem jurídica, sem criar direitos e obrigações, em face
do princípio constitucional da legalidade. Segundo a doutrina, fixa as regras destinadas a
colocar em execução os princípios institucionais delimitados e estabelecidos na lei. Poder
delegado: a delegação legislativa ao Presidente da República tem seus limites e contornos
previstos no art. 68 da Constituição. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a delegação
pode ser retirada pelo Congresso Nacional a qualquer momento.
178
criação e extinção de Ministério, não mais exigindo lei em sentido estrito para a determinação
de estruturação e atribuições.
Crimes de responsabilidade sem conexão com o Presidente e nos crimes comuns são
julgados pelo STF, nos crimes de responsabilidade com conexão com o Presidente a
competência é do Senado Federal.
16.PODER JUDICIÁRIO
16.1 Poder Judiciário: organização e competência. Normas constitucionais respeitantes à
magistratura. O ativismo judicial e seus limites no Estado Democrático de Direito. (3.b)
16.2 Supremo Tribunal Federal: organização e competência. Jurisdição constitucional. ( 5.b)
16.3 Súmula vinculante. Legitimidade e crı ́ticas. Mecanismos de distinção. (23.b)
16.5 Conselho Nacional de Justiça. História, composição, competência e funcionamento. (25.c)
Aline Morais
ÓRGÃOS – STF, CNJ (apenas funções administrativas), STJ, TST, TRFs e Juízes Federais,
Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares,
Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
Órgãos de convergência:STF, STJ, STM, TSE e TST (todas as matérias convergem para eles)
Órgãos de superposição: STJ (decisões se sobrepõem às justiças comuns) e STF (suas decisões
se sobrepõem a todas as demais justiças).
Classificação: MATERIAL: comum (Estadual e Federal) e especializada (eleitoral, militar e
trabalhista); NÚMERO DE JULGADORES: singular (juízes 1º grau) e colegiada (turmas e
tribunais);
STF: Guardião CRFB. Órgão de cúpula do Poder Judiciário. Obs. abordado no ponto 5.b.
CNJ: órgão de controle interno do Poder Judiciário, criado pela EC n. 45/04 (Reforma do
Judiciário), sendo órgão de natureza exclusivamente administrativa (ADI 3.367).Obs.será
abordado no Ponto 25.c.
STJ: Guardião da Legislação Federal, criado pela CRFB para desafogar o STF, ficando
responsável por uniformizar a interpretação da lei federal e garantir sua observância e
aplicação. Possui competência originária (art. 105, I), recursal (105, II) e especial (105, III). Tem
sede na Capital Federal, jurisdição em todo território nacional. Julga o incidente de
deslocamento de competência para a Justiça Federal, nos termos do artigo 109, §5º, CRFB.
Composição. Mínimo 33 (trinta e três) Ministros (alterável por lei), brasileiros (natos ou
naturalizados) com idade superior a 35 e inferior a 65 anos, com notável saber jurídico e
179
reputação ilibada. Investidura. - nomeados pelo Presidente da República, após sabatina e
aprovação por maioria absoluta do Senado Federal. Composição dos Ministros: 1/3 de juízes
dos Tribunais Regionais Federais; 1/3 de desembargadores dos Tribunais de Justiça; 1/3 de
advogados e de membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e
Territórios, alternadamente. Procedimento: No caso dos juízes dos Tribunais Regionais
Federais e dos desembargadores dos Tribunais de Justiça, o STJ elabora lista tr íplice, enviando-
a ao Presidente da República, que indicará um e o nomeará após aprovação do Senado
Federal. No caso dos advogados e membros do MP, serão eles indicados na forma das regras
para o quinto constitucional do art. 94 CRFB. Funcionam junto ao STJ - Escola Nacional de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (regulamenta cursos oficiais para o ingresso e
promoção na carreira) e Conselho de Justiça Federal (supervisão administrativa e
orçamentária da Justiça Federal com poderes correicionais e decisões).
Novas competências (EC45/2004)- homologação de sentenças estrangeiras e a concessão do
exequatur, e a preservação da competência para o julgamento de recurso especial quando a
decisão recorrida julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal (análise
da legalidade).
TRIBUNAIS E JUÍZES FEDERAIS: (art 108 e 109 CRFB) – Órgãos que compõem a Justiça Federal,
possuidores de competência originária e recursal: Juízes (1º grau) e TRFs (2º grau). Reinstituída
em 1965, pelo AI-2, teve as competências ampliadas. Composição TRF: mínimo 7 juízes
brasileiros (natos ou naturalizados), recrutados, se possível, na respectiva região,com idade
superior a 35 e inferior a 65 anos, nomeados pelo Presidente da República. Composição: 4/5
de juízes federais com mais de 5 anos de exercício, por antiguidade e merecimento,
alternadamente e 1/5 de advogados e de membros do Ministério Público Federal, com mais de
10 anos de efetivo exercício, alternadamente. Seções Judiciárias: Nos Estados e no Distrito
Federal, sede na Capital e subseções no interior. Pode constituir Câmaras Regionais. – cabe à
Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença da
União, suas autarquias e empresas públicas (Sum 150 STJ). Competência 1º grau: para as
causas que tenham com partes a União, suas autarquias e empresas públicas federais. Em
linhas gerais, compete-lhe julgar: (a) as causas em que a União, entidade autárquica ou
empresa pública forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes,
exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do
Trabalho; (b) as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou
pessoa domiciliada ou residente no País; (c) as causas fundadas em tratado ou contrato da
União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; (d) a execução de carta rogatória,
após o exequatur, e de sentença estrangeira, após a homologação; as causas referentes à
nacionalidade, inclusive a respectiva opção e à naturalização; (e) as causas relativas a direitos
humanos deslocadas da Justiça estadual para a Justiça Federal (IDC); (f) os crimes políticos e as
infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas
entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a
competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (g) os crimes: 1) previstos em tratado ou
180
convenção, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no
estrangeiro, ou reciprocamente; 2) contra a organização do trabalho e, nos casos
determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; 3)
cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; 4) de
ingresso ou permanência irregular de estrangeiros; (h) os habeas corpus, em matéria criminal
de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não
estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição, os mandados de segurança e os habeas datas
contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;
(i) a disputa sobre direitos indígenas
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS: julgar as causas cíveis de menor complexidade (até 60 salários
mínimos) e as infrações penais de menor potencial ofensivo.
TRFs - recursos nas causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício
de competência federal, na área de sua jurisdição e originariamente julgar: (a) o processo e
julgamento de juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da
Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério
Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral; (b) as revisões criminais e as
ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região; (c) os mandados de
segurança e os habeas data contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal; (d) os habeas
corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal; (e) os conflitos de competência entre
juízes federais vinculados ao Tribunal; (f), autoridades estaduais e municipais, que gozam de
prerrogativa de foro junto ao Tribunal de Justiça estadual. Configuram também competências
não expressas dos TRFs o processo e julgamento das ações rescisórias movidas por ente
federal contra acórdão de Tribunais de Justiça ou sentença de juiz de direito e os mandados de
segurança impetrados por ente federal contra ato de juiz estadual.
JUSTIÇA DO TRABALHO: (art. 111 a 116 CRFB) - Justiça especializada em razão da matéria, com
competência taxativamente prevista na Constituição. Órgãos: 1) TST; 2) TRT's; 3) Juízes do
Trabalho. As Varas do Trabalho são criadas por lei, podendo ser atribuída jurisdição aos Juízes
de Direito nas comarcas não abrangidas por elas, mas o recurso será para o TRT respectivo.
Competência da Justiça do Trabalho: processo e julgamento: de ações decorrentes de relação
de trabalho entendida esta como toda aquela submetida ao regime jurídico celetista.
Excluem-se causas que sejam instauradas entre o Estado e seus servidores, a ele vinculados
por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo (interpretação
conforme na ADI 3395 STF) e contratos de prestação de serviço regidos pelo CDC ou CC; EC
45/04: a) ações que versem sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e
trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores; MS, HC e HD na relação de trabalho;
indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho; ações relativas
às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das
relações de trabalho; direito de greve; executar, de ofício, das contribuições sociais previstas
no art. 195, I, “a”, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir (EC
20/98); conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista.
JUSTIÇA ELEITORAL. (art 118 a 121 CRFB) - Justiça especializada em razão da materia,
composta pelos seguintes órgãos: o Tribunal Superior Eleitoral; os Tribunais Regionais
Eleitorais; os Juízes Eleitorais e as Juntas Eleitorais. Lei complementar disporá sobre a
organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais.
TSE – Composição: mínimo 7 membros: 3 STF, 2 STJ, 2 advogados escolhidos pelo Presidente
da República, em lista sextupla formada pelo STF. Presidente e Vice são do STF e corregedor-
geral do STJ. Suas decisões são irrecorríveis, exceto quando contrariarem a Constituição e as
denegatórias de habeas-corpus ou mandado de segurança. TRE - .Um na Capital de cada
Estado e no Distrito Federal. Composição 7 juízes: cinco eleitos por voto secreto: 2
desembargadores de TJ, 2 juízes estaduais, 1 Juiz de TRF; 2 advogados escolhidos pelo
Presidente da República, em lista sextupla formada pelo TJ. O presidente e o vice são eleitos
181
entre os desembargadores. A atuação é por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois
biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo
processo, em numero igual para cada categoria. Recursos das decisões: a) contra disposição
expressa da CRFB; b) divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais
eleitorais; c) inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais; d)
anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais ou e)
denegarem HC MS HD MI. Obs.: O MP não participa da composição dos tribunais eleitorais.
JUSTIÇA ESTADUAL. (artigos 125 e 126 CRFB) – Justiça comum, de competência residual, ou
seja, o que não for da Justiça Federal, do Trabalho, ou Eleitoral. Composta por juízes e
desembargadores. No primeiro grau, organiza-se em Varas e Comarcas e em segundo no
Tribunal de Justiça com suas turmas e órgão especial.
JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL (art 125 §3º a 5º CRFB) – Criada por lei estadual de iniciativa do
TJ. Composição: 1º grau – juízes de direito e Conselhos de Justiça; 2º grau – TJ ou TJM quando
o efetivo supera 20 mil. Competências: processar e julgar crimes e atos disciplinares,
preservada a competência do júri quando a vítima for civil.
JUIZADOS ESPECIAIS – (art 98, I CRFB) Criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios,
e pelos Estados em seus territórios para conciliação, julgamento e execução de causas cíveis
de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo. Formados por juízes
togados e leigos, atuam mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas
hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de
primeiro grau.
JUSTIÇA DE PAZ REMUNERADA– (art 98, II CRFB) composta por cidadãos eleitos pelo voto
direto, universal e secreto, com mandato de 4 anos. Exercem competência não-jurisdicional,
como celebrar casamentos, verificar, de oficio ou em face de impugnação apresentada, o
processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de
outras previstas na legislação. A Justiça Estadual pode lhe atribuir outras. Em Minas Gerais é
responsável pela arrecadação de bens vagos, por exemplo.
QUINTO CONSTITUCIONAL: A CRFB reserva 1/5 dos lugares dos TRF's, TJ's, TST e TRT's aos
membros do MP com mais de 10 anos de carreira e aos advogados, indicados em lista
sêxtupla, com notório saber jurídico, reputação ilibada e mais de 10 anos de efetiva atividade
182
profissional. São requisitos exaustivos, vedada a estipulação de outros por Constituições
Estaduais (ver artigos 94, 111-A,I, e 115, I, todos da CRFB).STF entende que se o número total
não for divisível por cinco, arredonda-se para o número inteiro seguinte e admite a recusa pelo
tribunal de nomes da lista que deverá ser refeita .No STJ, 1/3 da composição deve caber, em
partes iguais, aos advogados e membros do MP (art. 104, parágrafo único, CRFB).
ÓRGÃO ESPECIAL: pode ser criado nos Tribunais com mais de 25 julgadores para exercer
atribuições administrativa e jurisdicionais delegadas da competência do pleno (art. 93, XI,
CRFB). Não podem ser delegadas atribuições políticas, como eleições de dirigente, e
legislativas, como elaboração de regimento interno (art. 96, I, “a”, CRFB). Essa composição
poderá variar entre 11 e 25 membros, sendo metade das vagas providas por antiguidade e a
outra por eleição do Tribunal pleno.
ATIVISMO JUDICIAL. Conceitos. Para Luís Roberto BARROSO, a “idéia de ativismo judicial está
associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos
valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois
Poderes. [...] (i) aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas
em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) declaração de
inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios
menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de
condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas
públicas”.Para Daniel SARMENTO, o conceito de ativismo é objeto de controvérsia, “atuação
183
mais enérgica e proativa da Corte, que pode ser ou não legítima, dependendo do caso e de
uma série de variáveis”. Ex: vedação ao nepotismo no Legislativo e no Executivo, aborto de
feto anencefálico, reconhecimento da união homoafetiva, pesquisa com célula-tronco. De
acordo com Barroso, o “oposto do ativismo é a auto-contenção judicial, conduta pela qual o
Judiciário procura reduzir sua interferência nas ações dos outros Poderes. Por essa linha, juízes
e tribunais (i) evitam aplicar diretamente a Constituição a situações que não estejam no seu
âmbito de incidência expressa, aguardando o pronunciamento do legislador ordinário; (ii)
utilizam critérios rígidos e conservadores para a declaração de inconstitucionalidade de leis e
atos normativos; e (iii) abstêm-se de interferir na definição das políticas públicas”. Ex: Caso
Eduardo Cunha.
Contextualização. O ativismo judicial está diretamente ligado ao neoconstitucionalismo, Para
Sarmento, as “mudanças, que se desenvolvem sob a égide da Constituição de 88, envolvem
vários fenômenos diferentes (a) reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e
valorização da sua importância no processo de aplicação do Direito; (b) rejeição ao formalismo
e recurso mais frequente a métodos ou “estilos” mais abertos de raciocínio jurídico:
ponderação, tópica, teorias da argumentação etc.; (c) constitucionalização do Direito, com a
irradiação das normas e valores constitucionais, sobretudo os relacionados aos direitos
fundamentais, para todos os ramos do ordenamento; (d) reaproximação entre o Direito e a
Moral, com a penetração cada vez maior da Filosofia”. O magistrado como defensor dos
direitos e garantias fundamentais atua no concretizar da Constituição, na efetividade das
normas constitucionais.
Críticas. A principal é a falta de legitimidade democrática dos magistrados – que não são
eleitos pelo povo – para criar regras e aplicá-las aos casos concretos, vinculando outros
poderes. Também se questionam limites e parâmetros de atuação que se desrespeitados
podem levar a uma ditadura do Judiciário. BERMAN indaga se diante da indeterminação das
disposições constitucionais, deva o Judiciário atribuir o que ele pensar ser o correto.
SARMENTO também apresenta críticas ao ativismo, pois esse modelo “tem dado ensejo ao
excessivo arbítrio judicial, através do que chamo de ‘carnavalização dos princípios
constitucionais’”. Ele não nega o fenômeno da judicialização da política,reconhece o papel
importante do Judiciário na defesa dos direitos fundamentais e proteção da democracia, mas
defende a centralidade dos movimentos sociais e da sociedade civil na arena constitucional.
Não se trata de apenas afirmar que tais atores podem participar da jurisdição constitucional –
como amici curiae ou expositores em audiências públicas – mas de reconhecer que há muito
Direito Constitucional fora dos tribunais. Nesta questão, o seu pensamento se aproxima de
uma corrente que é conhecida nos Estados Unidos como constitucionalismo democrático
– que não se confunde com o constitucionalismo popular, de autores como Mark Tushnet,
Larry Kramer e Jeremy Waldron, refratários controle jurisdicional de constitucionalidade.
Ademais, considera que a postura mais ativista do STF foi correta em alguns casos, e
equivocada em outros. A decisão sobre a união homoafetiva, por exemplo, seria ativista, pois
o STF se baseou em princípios constitucionais abstratos, de elevado teor moral, para resolver
uma questão altamente controvertida na sociedade, não dando tanto peso aos elementos
literal e histórico da interpretação constitucional. Já a decisão de Raposa Serra do Sol, na parte
em que impôs condicionantes às futuras demarcações de terras indígenas, também foi ativista,
mas ele entende que há ilegitimidade: o STF praticamente atuou como legislador e impôs
graves restrições a direitos básicos de uma minoria étnica vulnerável, que estão em total
desacordo com o texto constitucional e com a normativa internacional sobre direitos
humanos. Ao julgar ED opostos contra tal decisão, o lado negativo das condicionantes foi em
certa medida suavizado, já que o Supremo esclareceu que elas não são vinculantes para outros
casos, mas não foi eliminado, uma vez que tais restrições aos direitos indígenas foram
confirmadas, tendendo a pautar a atuação do Judiciário brasileiro em outros processos.
HABERMAS aponta outros aspectos que lhe faz rechaçar o ativismo judicial, dentre os quais se
destaca os seguintes: a) interesse público na coerência interna do direito; b) relativo
distanciamento do direito em relação à política; e c) direcionamento ao autoritarismo quando
184
o judiciário é conduzido preliminarmente pelos valores constitucionais. Também chama
atenção para a passividade do indivíduo e da sociedade que não luta por transformações. Fica
passivo esperando que o Poder Judiciário resolva. O Poder Judiciário também poderia se
posicionar de forma crítica analisando se outro poder ou órgão não seriam mais qualificados
para resolver a questão posta em juízo.
Riscos: conflito de atribuições entre Judiciário e Legislativo, com possível perda do efeito da
norma parlamentar e extinção da harmonia entre os poderes, necessidade de estabilidade
jurídica, e necessidade de segurança jurídica, politização da Justiça. Riscos para a legitimidade
democrática e dificuldade contramajoritária.
Judicialização da política. Para Luiz Roberto BARROSO, “a judicialização envolve uma
transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na
argumentação e no modo de participação da sociedade. O fenômeno tem causas múltiplas”,
tais como a redemocratização, a constitucionalização abrangente, o sistema de controle de
constitucionalidade. Ademais, a “judicialização e o ativismo judicial são primos”, mas não têm
as mesmas origens. A judicialização “decorre do modelo de Constituição analítica e do sistema
de controle de constitucionalidade abrangente adotados no Brasil, que permitem que
discussões de largo alcance político e moral sejam trazidas sob a forma de ações judiciais. Vale
dizer: a judicialização não decorre da vontade do Judiciário, mas sim do constituinte”, e o
“ativismo judicial, por sua vez, expressa uma postura do intérprete, um modo proativo e
expansivo de interpretar a Constituição, potencializando o sentido e alcance de suas normas,
para ir além do legislador ordinário”.
SÚMULAS
SÚMULA VINCULANTE N. 22: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as
ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho
propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam
sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da EC N. 45/04”.
SÚMULA VINCULANTE N. 23: A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação
possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da
iniciativa privada.
SÚMULA VINCULANTE 37: Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa,
aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.
SÚMULA VINCULANTE 53: A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da
Constituição Federal alcança a execução de ofício das contribuições previdenciárias relativas
ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir e acordos por ela
homologados.
STF 649 - É inconstitucional a criação, por Constituição Estadual, de órgão de controle
administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros poderes ou
entidades.
185
STF 628 – integrante de lista de candidatos a determinada vaga da composição de tribunal é
parte legitima para impugnar a validade da nomeação de concorrente.
STF 339 - Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos
de servidores públicos sob fundamento de isonomia.
STJ 428 -compete ao tribunal regional federal decidir os conflitos de competência entre
juizado especial federal e juízo federal da mesma seção judiciária.
JURISPRUDÊNCIA
838/STF - O ex-Deputado Federal Eduardo Cunha impetrou mandado de segurança no STF
pedindo a suspensão do processo de cassação que tramitava contra ele na Câmara dos
Deputados por quebra de decoro parlamentar. O pedido do impetrante foi negado. O STF só
pode interferir em procedimentos legislativos (ex: processo de cassação) em uma das
seguintes hipóteses: a) para assegurar o cumprimento da Constituição Federal; b) para
proteger direitos fundamentais; ou c) para resguardar os pressupostos de funcionamento da
democracia e das instituições republicanas. Exemplo típico na jurisprudência é a preservação
dos direitos das minorias, onde o Supremo poderá intervir. No caso concreto, o STF entendeu
que nenhuma dessas situações estava presente. Em se tratando de processos de cunho
acentuadamente político, como é o caso da cassação de mandato parlamentar, o STF deve se
pautar pela deferência (respeito) às decisões do Legislativo e pela autocontenção, somente
intervindo em casos excepcionalíssimos. Dessa forma, neste caso, o STF optou pela técnica da
autocontenção (judicial self-restraint), que é o oposto do chamado ativismo judicial. Na
autocontenção, o Poder Judiciário deixa de atuar (interferir) em questões consideradas
estritamente políticas. STF. Plenário. MS 34.327/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 8/9/16
851/STF - É inconstitucional norma do Tribunal de Justiça que permite a reeleição de
desembargadores para cargos de direção após o intervalo de dois mandatos. está reservada a
lei complementar de iniciativa do Supremo Tribunal Federal. Além disso, esta norma afronta o
tratamento que foi dado à matéria pelo art. 102 da LOMAN (LC 35/79). STF. Plenário. ADI
5310/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 14/12/2016
832/STF - Inexistência de inconstitucionalidade no corte do orçamento do Poder Judiciário
durante a tramitação da Lei Orçamentária Anual. Salvo em situações graves e excepcionais,
não cabe ao Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio da separação de Poderes,
interferir na função do Poder Legislativo de definir receitas e despesas da Administração
Pública, emendando projetos de leis orçamentárias, quando atendidas as condições previstas
no art. 166, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal. STF. Plenário. ADI 5468/DF, Rel. Min. Luiz Fux,
julgado em 29 e 30/6/2016
825/STF - Lei estadual que concede ressarcimento de despesas de saúde a magistrados não
viola a CF/88 nem a LOMAN que não proíbe que as leis estaduais prevejam o pagamento de
verbas de natureza indenizatória aos magistrados estaduais.STF. 1ª Turma. MS 27463/MT, Rel.
Min. Marco Aurélio, julgado em 10/5/2016
821/STF - Momento de comprovação dos três anos de atividade jurídica: inscrição definitiva
no concurso público. STF. Plenário. RE 655265/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão
Min. Edson Fachin, julgado em 13/4/2016 (repercussão geral)
855/STF - O STF é incompetente para apreciar feito (art. 102, I, n) em que um único
magistrado pretende o reconhecimento de direito à fruição de licença-prêmio por tempo de
serviço, pois a questão interessa também a outros agentes políticos e servidores públicos.
Afinal, o benefício pode estar previsto em estatuto jurídico do agente ou do servidor., AO
2126/PR, Segunda Turma).
866/STF - O Supremo Tribunal Federal entendeu que a justiça comum é competente para
julgar causa relacionada ao direito de greve de servidor público, pouco importando se se trata
de celetista ou estatutário.
794/STF - Judiciário pode determinar a realização de obras emergenciais em estabelecimento
prisional. STF. Plenário. RE 592581/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 13/8/2015
(repercussão geral)
186
721/STF - CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS A CRFB\88 e a Convenção
Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência asseguram o direito dos portadores
de necessidades especiais ao acesso a prédios públicos STF. 1ª Turma. RE 440028\SP, rel. Min.
Marco Aurélio, julgado em 29.10.2013,
741/STF É inconstitucional norma da Constituição estadual que preveja que a iniciativa da Lei
de organização judiciária é do Governador do Estado. É inconstitucional norma da Constituição
estadual que institua a criação de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do qual
participem representantes de outros Poderes ou entidades. STF. Plenário. ADI 197/SE, rel. Min.
Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014
752/STJ - Judiciário pode obrigar administração pública a manter quantidade mínima de
medicamento em estoque O que se está fazendo é controlar os atos e serviços da
Administração Pública que, neste caso, se mostraram ilegais ou abusivos STJ. 1ª Turma. RE
429903/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 25/6/2014
592/STJ - O Poder Judiciário pode condenar universidade pública a adequar seus prédios às
normas de acessibilidade a fim de permitir a sua utilização por pessoas com deficiência. Se um
direito é qualificado pelo legislador como absoluta prioridade, deixa de integrar o universo de
incidência da reserva do possível, já que a sua possibilidade é obrigatoriamente, fixada pela
Constituição ou pela lei. STJ. 2ª Turma. REsp 1.607.472-PE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado
em 15/9/2016 (Info 592).
543/STJ - Judiciário pode determinar reforma de cadeia ou construção de nova unidade
prisional. Constatando-se inúmeras irregularidades em cadeia pública, a alegação de ausência
de previsão orçamentária não impede que seja julgada procedente ação civil pública
mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira
da pessoa estatal. STJ. 2ª Turma. REsp 1.389.952-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em
3/6/2014
QUESTÕES OBJETIVAS
MPF\27º - Somente a vedação de nepotismo na esfera do Judiciário independe de lei formal,
haja vista a autonomia administrativa desse Poder. Assertiva incorreta.
MPF\27º - De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a fixação de tetos
remuneratórios diferenciados para membros da magistratura federal e estadual contraria o
caráter nacional e unitário do Poder Judiciário, não se aplicando aos juízes estaduais o limite
remuneratório de 90,25% (noventa vírgula vinte e cinco por cento) dos subsídios dos ministros
do STF, previsto no art. 37, XI, da Constituição da República e em Resoluções do Conselho
Nacional de Justiça. Assertiva correta
MPF\27º - A vitaliciedade é atributo exclusivo dos cargos das carreiras do Ministério Público e
do Poder Judiciário, significando que a desinvestidura, após o transcurso do estágio
probatório, depende de decisão judicial transitada em julgado. Assertiva incorreta.
187
posicionamento. Veja-se, a título de exemplo, os seguintes precedentes: HC 139724 / SP, REsp
1091710 / PR e HC 141790 / ES.
597-O que é a criação judicial do Direito? Há o velho bocardo "onde há Sociedade, há Direito".
OJudiciário também pode, excepcionalmente, criar o Direito. Tal aspecto vem sendo ainda
mais aprofundado com o Neoconstitucionalismo e o Ativismo Judicial, que vêm ampliando os
poderes do Judiciário na conformação do Direito, pode-se citar as sentenças aditivas no
controle concentrado de constitucionalidade que estabelecem verdadeiros regramentos da
aplicação de determinados institutos, p. ex, as regras para demarcação de terras indígenas no
caso Raposa Serra do Sol. O processo de criação do Direito pode ser legitimado pela
participação de agentes sociais através, p. ex., do Amicus Curiae ou das audiências públicas!
529-O que é significa a expressão “Supremocracia”? Termo criado para fazer críticas às
funções que vêm sendo desempenhadas pelo STF nos últimos tempos - argumentando que ele
não apenas mais está exercendo uma função de "proteção de regras" constitucionais, como
também vem exercendo, em muitos casos, o pale de órgão "criador dessas regras" - assim,
estaria acumulando exercício de autoridade com exercício de poder. Alguns alegam que isso
ocorreu na ADPF 132, a respeito da união estável homoafetiva. Em um artigo sobre o tema,
Oscar Vilhena Vieira define: Em um primeiro sentido, o termo supremocracia refere-se à
autoridade do Supremo recentemente adquirida pelo Supremo de governar jurisdicionalmente
(rule) o Poder Judiciário no Brasil. Em um segundo sentido, o termo supremocracia refere-se à
expansão da autoridade do Supremo em detrimento dos demais poderes.
188
República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o
Procurador-Geral da República; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de
responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da
Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do
Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter
permanente; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999) d) o habeas corpus,
sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de
segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da
República e do próprio Supremo Tribunal Federal; e) o litígio entre Estado estrangeiro ou
organismo internacional e a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Território; f) as causas e os
conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros,
inclusive as respectivas entidades da administração indireta; g) a extradição solicitada por
Estado estrangeiro; h) (Revogado pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) i) o habeas
corpus, quando o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for
autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo
Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única
instância; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 22, de 1999) j) a revisão criminal e a
ação rescisória de seus julgados; l) a reclamação para a preservação de sua competência e
garantia da autoridade de suas decisões; m) a execução de sentença nas causas de sua
competência originária, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos
processuais; n) a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou
indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de
origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados; o) os conflitos de
competência entre o Superior Tribunal de Justiça e quaisquer tribunais, entre Tribunais
Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal; p) o pedido de medida cautelar das ações
diretas de inconstitucionalidade; q) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma
regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da
Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do
Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal
Federal; r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do
Ministério Público; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) II - julgar, em recurso
ordinário: a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de
injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; b)
o crime político; III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou
última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b)
declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo
local contestado em face desta Constituição. d) julgar válida lei local contestada em face de lei
federal. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) Em resumo, as competências do
STF podem ser divididas, em: “a) originária (art. 102, I, “a” até “r”); b) recursal ordinária (art.
102, II) e c) recursal extraordinária (art. 102, III)”. Em relação as competências, destacam-se as
modificações introduzidas pela EC nº 45/2004: 1) A transferência de competência do STF para
o STJ no tocante à homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às
cartas rogatórias (art. 102, I, “h”, revogada; 105, I, “i” e art. 9º da EC 45/2004); 2) A criação do
requisito da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para o
conhecimento do recurso extraordinário
189
difuso-concreto, de origem norte-americana, com base no precedente Marbury v. Madison de
1803, no qual o judicial review compete a qualquer magistrado, diante de um caso concreto,
com decisão de efeitos ex tunc (retroativos); b) concetrado-abstrato, a partir da formulação de
Hans Kelsen, que concebeu uma Corte Constitucional especializada para exercer a função,
invalidando a norma impugnada com efeitos apenas prospectivos (ex nunc). Há ainda o
sistema misto, como ocorre no Brasil a partir da Emenda Constitucional 16/65, que incorporou
o controle concetrado-abstrato ao já existente controle difuso vindo desde Ruy Barbosa, na
Constituição de 1891. Também é imprescidível examinar as posições procedimentalistas e
substancialistas no contexto da jurisdição constitucional. Os procedimentalistas defendem um
papel mai modesto para a jurisdição constitucional, sustentando que ela deve adotar uma
postura de autocontenção a não ser quando estiver em jogo a defesa dos pressupostos de
funcionamento da própria democracia (são defensores da posição John Hart Ely e Jürgen
Habermas). Já os substancialistas advogam um papel mais ativo para a jurisdição constitucional
mesmo em casos que não envolvam os pressupostos da democracia. O neoconstitucionalismo
e a teoria da constituição dirigente se situam claramente no campo do substancialismo, por
conceberem papéis bastantes ambiciosos para as constituiões, que vão muito além da garantia
dos pressupostos do funcionamento da democracia. A Constituição de 88 é profundamente
substantiva, eis que pródiga na consagração de valores materiais, o que acentua a “dificuldade
contramajoritária” quando da atuação do STF, podendo ocorrer reações sociais às decisões
judiciais (o denominado efeito backlash), a exemplo do dissenso havido em relação à
“vaquejada” (ADI 4.983 v. EC 96/17).
III.I. ÓRGÃOS DE CONVERGÊNCIA E SUPERPOSIÇÃO. O Supremo Tribunal Federal (STF) e os
Tribunais Superiores (STJ, TST, TSE e STM) são órgãos de convergência, têm sede na Capital
Federal e exercem jurisdição sobre todo o território nacional, nos termos do art. 92 § 2º da
CRFB/88. Denominam-se órgãos ou centros de convergência na medida em que, conforme
ensina Dinamarco, “cada uma das Justiças Especiais da União (Trabalhista, Eleitoral e Militar),
tem por cúpula seu próprio Tribunal Superior, que é o responsável pela última decisão nas
causas de competência dessa Justiça, ressalvado o controle de constitucionalidade, que
sempre cabe ao Supremo Tribunal Federal. Quanto às causas processadas na Justiça Federal ou
nas locais, em matéria infraconstitucional a convergência conduz ao Superior Tribunal de
Justiça, que é um dos Tribunais Superiores da União embora não integre Justiça alguma; em
matéria constitucional, convergem diretamente ao STF. Todos Tribunais Superiores convergem
unicamente ao STF, como órgão máximo da Justiça brasileira e responsável final pelo controle
de constitucionalidade de leis, atos normativos e decisões judiciárias. O STJ e o STF são
também denominados de órgãos de superposição, na medida que não pertencem a qualquer
Justiça. Isso porque, embora não pertençam a qualquer Justiça, as suas decisões se sobrepõem
às decisões proferidas pelos órgãos inferiores das Justiças comum e especial. As decisões do
STJ se sobrepõem àquelas da Justiça Federal comum, da Estadual e daquela do Distrito Federal
e Territórios (o único que existia acabou, pois anexou-se a Pernambuco), ao passo que as
decisões do STJ se sobrepõem a todas as Justiças e Tribunais. Como adendo, cabe destacar o
suposto conflito existente também entre o direito interno, consubstanciado pelas decisões do
STF, e o direito internacional dos direitos humanos, formado e interpretado nas Cortes de
Direitos Humanos (especialmente a Corte IDH). O caso paradigmático diz respeito a ADPF 153
e o Caso “Gomes Lund”. Para solucionar a celeuma, impõe-se a adoção de um diálogo
internacional na interpretação constitucional, permitindo uma evolução hermenêutica que não
seja autista (Sarmento aduz ao princípio do cosmopolitismo; Carvalho Ramos à “fertilização
cruzada”, “diálogo das cortes” e ao “duplo crivo de direitos humanos”)
190
23B. Súmula vinculante. Legitimidade e críticas. Mecanismos de distinção.
191
Distinção entre a súmula vinculante e a súmula comum do STF (Uadi Lãmmego Bulos)
Súmula Comum Súmula Vinculante
Não vincula os órgãos do Judiciário, nem do Vincula os órgãos do Judiciário e da Administração Pública
Executivo (direta e indireta)
Precedentes que podem ou não ser adotados Padroniza a exegese de uma norma jurídica
Todavia, Gilmar Mendes observa que a súmula não vinculante já possui um perfil
indiretamente obrigatório, uma vez que, por conta dos recursos, constitui instrumento de
autodisciplina do STF, que somente deverá afastar-se da orientação nela preconizada de forma
expressa e fundamentada.
192
A natureza administrativa é conferida pelo rol de atribuições previstas no art. 103-B, §
4º, CF/88, pois tais atribuições não são jurisdicionais, eis que se submetem a controle judicial.
Não é órgão da União, mas instituição federal de âmbito nacional, cujo caráter federativo já
foi afirmado pelo STF. Por essas razões, o STF já decidiu que a criação do CNJ não ofendeu o
princípio federativo e nem o da separação de poderes.
II. Composição
Outra alteração advinda com a EC 61/2009 foi a retirada da restrição de idade, que, na
redação original, trazida pela EC 45/2004, estabelecia idade mínima de 35 anos e máxima de
66 anos. Dessa forma, atualmente, não há limite de idade para os membros do CNJ. Tal
alteração teve o nítido objetivo de adequar a composição da Presidência do CNJ sempre ao
Ministro Presidente do STF, pois é possível que esse ocupe a presidência com mais de 66 anos.
III. Competência
Exemplo de atuação administrativa regular do CNJ foi a imposição a todos os juízes que
se cadastrassem no BACEN-JUD para possibilitar eventuais penhoras on line. O CNJ não
poderia impor que os juízes se valessem do BACEN-JUD para execução de suas decisões, mas a
obrigatoriedade de cadastro está dentro do poder normativo do CNJ (STF, MS 27.621, 2011).
193
O CNJ tem competência para expedir atos normativos que retirem seu fundamento
diretamente da Constituição Federal para a concretização de princípios constitucionais. Esse
tema foi discutido por conta da Resolução 07/05 do CNJ, que vedou o nepotismo no Judiciário
(ADC, 2.009, ajuizada pela AMB). O caso acabou redundando na Súmula Vinculante 13, que
estendeu a vedação ao Legislativo e ao Executivo.
O CNJ não tem nenhuma competência sobre o STF e seus ministros, sendo esse o
órgão máximo do Poder Judiciário nacional, a que aquele está sujeito (ADI 3.367/DF). Além
disso, não pode se manifestar quando a matéria já está submetida à apreciação do Poder
Judiciário (STF, MS 27.650/DF, 2014).
V. Funcionamento
194
de obscuridade, contradição ou omissão, pode o interessado requerer sejam prestados
esclarecimentos, no prazo de cinco dias.
195
do MP dos estados (MPE). Conforme se extrai da CF/88, há um ministério público que atua na
justiça comum – tanto federal (MPF) quanto estadual (MPE) – e outros que atuam perante os
ramos especializados da justiça federal – justiça do trabalho (MPT), justiça militar (MPM) e
justiça eleitoral. Cabe observar, porém, que apesar de no âmbito federal existir uma carreira
própria do MP com atuação perante a justiça militar (MPM), no âmbito estadual, tanto no
primeiro quanto no segundo grau, a atuação dar-se- á por um membro do MPE, não havendo
uma carreira própria e específica de ministério público militar estadual. Do mesmo modo, o
MP eleitoral não tem estrutura própria e a sua formação é mista, sendo composto de membros
do MPF e do MPE. Apesar disso, a função eleitoral desempenhada pelo Ministério Público tem
natureza federal, de modo que, quando atuam como órgãos eleitorais, os promotores de
justiça os fazem como MPF, estando sujeitos à legislação que regre o ministério público
federal. Assim, nos termos da LC75/93 (que rege o MPU), as funções eleitorais do MPF perante
os juízes e juntas eleitorais serão exercidas pelo promotor eleitoral, que é membro de MPE; já
as funções eleitorais nas causas de competência dos tribunais eleitorais serão exercidas pelo
MPF.
Princípios constitucionais: o art. 127, §1º, da CF/88, prevê como princípios
institucionais do MP a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. I)Unidade: sob a
égide de um só chefe, o MP deve ser visto como uma instituição única, sendo a divisão
existente meramente funcional; II) Indivisibilidade: é possível que um membro do MP
substitua outro, dentro da mesma função, sem que, com isso, exista qualquer implicação
prática; quem exerce os atos, em essência, é a instituição, e não a pessoa do promotor ou
procurador; III) Independência funcional: trata-se de autonomia de convicção, na medida em
que os membros do MP não se submetem a qualquer poder hierárquico no exercício de seu
mister, podendo agir, no processo, da maneira que melhor entenderem; a hierarquia existente
restringe- se às questões de caráter administrativo, materializada pelo chefe da instituição,
mas nunca de caráter funcional.
Princípio do promotor natural: além de ser julgado por órgão independente e pré-
constituído, o acusado também tem o direito e a garantia constitucional de somente ser
processado por um órgão independente do estado, vedando-se, por consequência, a
designação arbitrária, inclusive, de promotores ad hoc ou por encomenda. Depois de muito
debate, o STF aceitou a tese do promotor natural no HC 67.759. No referido julgamento, o Min.
Celso de Mello estabeleceu que
o postulado do promotor natural repele, a partir da vedação de designações casuísticas
efetuadas pela chefia da instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra
uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do MP, na medida em
que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria
coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o
promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e predeterminados,
estabelecidos em lei.
Garantias do Ministério Público: I – Garantias institucionais: a) autonomia funcional –
é inerente à instituição como um todo e abrange todos os órgãos do MP, estando prevista no
art. 127, §2º, da CF/88, no sentido de que, ao cumprir seus deveres institucionais, o membro
do MP não se submeterá a nenhum outro poder, órgão, autoridade pública, etc., devendo
observar apenas a constituição, a lei e a própria consciência; b) autonomia administrativa –
prevista no art. 127, §2º, a autonomia administrativa consiste na capacidade de direção de si
próprio, autogestão, autoadministração, um governo de si; assim, o MP poderá, observado o
disposto no art. 169 da CF/88, propor ao poder legislativo a criação e extinção de seus cargos e
serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a
política remuneratória e os planos de carreira; c) autonomia financeira –prevista no art. 127,
§3º, ao MP assegurou-se a capacidade de elaborar sua proposta orçamentária dentro dos
limites estabelecidos na LDO, podendo, autonomamente, administrar os recursos que lhe
forem destinados; a EC45/04 regulamentou o procedimento de encaminhamento da proposta
orçamentária do MP e a solução em caso de inércia; proibiu, outrossim, a realização de
196
despesas ou a assunção de obrigações que extrapolem os limites fixados na LDO, exceto se
previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais. II –
Garantias dos membros: a) vitaliciedade –adquire-se a vitaliciedade após a transcorrência do
período probatório, ou seja, 02 anos de efetivo exercício do cargo, tendo sido admitido na
carreira, mediante aprovação em concurso de provas e títulos; a garantia da vitaliciedade
assegura ao membro do MP a perda do cargo somente por sentença judicial transitada em
julgado; b) inamovibilidade –o membro do MP não poderá ser removido ou promovido,
unilateralmente, sem a sua autorização ou solicitação; excepcionalmente, contudo, por motivo
de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do MP (no caso, o
CNMP), por voto da maioria absoluta de seus membros, desde que lhe seja assegurada a ampla
defesa, poderá vir a ser removido do cargo ou função; c) irredutibilidade de subsídios – é
assegurada ao membro do MP a garantia da irredutibilidade de subsídio (a garantia é contra a
irredutibilidade nominal, e não contra a corrosão inflacionária). Impedimentos: de acordo com
os arts. 128, §5º, II, §6º, e 129, IX, os membros do MP não poderão: a) receber, a qualquer
título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; b) exercer
advocacia; c) exercer representação judicial e consultoria jurídica de entidades públicas; d)
participar de sociedade comercial, na forma da lei; e) exercer, ainda que em disponibilidade,
qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; f) exercer atividade político-partidária,
sem qualquer exceção, nos termos da restrição trazida pela EC45/04 – a res. TSE 22.095/2005
previu ser imediata e sem ressalvas a aplicação da EC45/04, abrangendo aqueles que
adentraram nos quadros do MP tanto antes quanto depois da referida EC; em igual sentido, o
art. 13 da res. TSE 11.156/2006 estabeleceu que os magistrados, membros dos tribunais de
contas e membros do MP devem filiar-se a partido político e afastar-se definitivamente de suas
funções até 06 meses antes das eleições; em sentido contrário, porém, há julgado monocrático
do TSE que entendeu pela não aplicação da regra da EC45/04, que veda o exercício de
atividade político-partidária por membro do MP, por força do art. 29, §3º, do ADCT, àqueles
que ingressaram na carreira antes da promulgação da CF/88; destaca-se, ainda, o
entendimento adotado pelo STF no RE 59.794, que assegurou a membro do MP que já exercia
cargo eletivo o direito a concorrer à reeleição; g) receber, a qualquer título ou pretexto,
auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as
exceções previstas em lei; h) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes
de decorridos 03 anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.
Funções institucionais: as funções institucionais do MP estão previstas no art. 129 da
CF/88 em rol exemplificativo, uma vez que o inciso IX estabelece que compete, ainda, ao
MP exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua
finalidade
A tarefa de custos constitutionis: legitimidade e limitações. Em um sentido
amplíssimo, pode-se considerar que o MP funciona como fiscal da Constituição por meio de
todas as suas atitudes, judiciais ou extrajudiciais, na medida em que todas caminham no
sentido de proteção direta ou ao menos indireta das normas da Constituição Federal. Num
sentido mais específico, fala-se em custos constitutionis como atividade do MP no âmbito
do controle de constitucionalidade. E em sentido restritíssimo – em simetria à designação
de custos legis como sendo apenas a tarefa de intervenção no processo, sem ter sido o
autor da ação –, custos constitutionis é a tarefa de opinar nos processos de controle de
constitucionalidade em que não seja parte. O PGR detém legitimidade para ajuizar ADI, ADC
e ADPF perante o STF, tendo como parâmetro a CF, sendo sua legitimidade “universal”,
abrangendo qualquer matéria passível de ser objeto de tais ações, independentemente de
pertinência temática. O PGR será previamente ouvido em todos os processos de
competência do STF, inclusive nas ações diretas de controle de constitucionalidade e
naquelas em que a questão constitucional chega ao STF pela via recursal, destacando-se o
Recurso Extraordinário, devendo o PGR opinar livremente, atuando com independência
para defender a Constituição. Além disso, o MP pode manifestar-se em qualquer incidente
de inconstitucionalidade (observados os prazos e condições fixados no Regimento do
197
Tribunal, CPC, art. 482, §1º), o que faz com igual independência.
I. História
Observação: quando se diz que o controle do CNMP se limita aos atos administrativos
e financeiros da instituição, é necessário fazer uma distinção. Os atos extraprocessuais (ou
extrajudiciais) praticados no exercício das atribuições funcionais do Ministério Público, como
sua atuação como ombudsman (art. 129, II, CR) ou como legitimado coletivo (art. 129, III, CR),
não são atos administrativos, mas sim funcionais, motivo pelo qual eles não se submetem ao
controle do CNMP, mas sim a controle judicial e a controle institucional (no caso do MPF,
através das CCRs e da PFDC).
II. Composição
198
Note-se que a maioria é advinda do próprio Ministério Público. A existência de
membros vindos de outras carreiras pode ser vista como a conjugação da legitimidade
burocrático-corporativa (SAMPAIO, p. 252) de duas categorias de imediata interação com o
MP, com a legitimidade democrática, de dois cidadãos de notável saber jurídico e reputação
ilibada. Além disso, essa composição híbrida, as razões que justificaram sua criação e as suas
competências permitem caracterizar o CNMP, conforme já dito, como um órgão constitucional
autônomo de controle externo do Ministério Público.
III. Competência
Merece destaque a classificação adotada por José Adércio (SAMPAIO, p. 274 e segs.)
ao tratar das atribuições do CNJ, a qual pode ser aplicada ao CNMP:
a) atribuições políticas: zelar pela autonomia do Ministério Público e pelo cumprimento da lei
orgânica, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou
recomendar providências;
a.1) atribuição de planejamento: zela pela autonomia de adotar o papel de gestor
estratégico dos recursos administrativos, humanos, logísticos e financeiros do
Ministério Público;
a.2) atribuição de defesa da soberania (no original fala-se de soberania judiciária):
deve adotar todas as medidas necessárias contra as ameaças e as violações advindas
dos outros Poderes e, com certas cautelas, de setores da sociedade, em defesa da
“soberania” do MP. “Não se trata de atitude corporativa, mas institucional, pois o
Conselho não é sindicato de classe e sim órgão de poder” (p. 276);
a.3) atribuição de poder regulamentar: todavia, sem poder inovar na ordem jurídica.
“Não pode, por conseguinte, permitir o que a lei proíbe ou ordenar o que a lei não
obriga; nem alterar, restringir ou ampliar direitos, deveres, ações ou exceções;
tampouco é dado exemplificar o que o legislador definiu por taxativo, ou suspender ou
adiar a execução da lei, instituir tribunais ou criar autoridades públicas, nem tampouco
estabelecer formar de exteriorização de um ato, diferentes daquelas determinadas por
lei”;
a.4) atribuições mandamentais: recomendar providências, no sentido de ordem para
integrantes e servidores do MP, acompanhada das sanções cabíveis a todo
descumprimento de mandado de autoridade competente. Para autoridades públicas
externas, tem a natureza de representação, que, se não vincula aos resultados, obriga,
ao menos, a diligências e respostas; sanção, todavia, política e difusa (“pressão por
persuasão”);
a.5) atribuições de economia interna: elaborar seu regimento, prover os cargos
necessários à sua administração; fixar critérios para promoção de seus servidores,
conceder licenças etc.;
199
d) atribuições correcionais e disciplinares: a atribuição disciplinar pode ser originária ou
derivada. A originária ocorre quando se instaura a sindicância, a reclamação ou o processo
disciplinar em decorrência de representação feita ao Conselho. Já a derivada pode ser a
avocatória, quando já existe um processo em trâmite e o CNMP avoca; ou revisional, feita de
ofício ou mediante provocação, em relação aos processos disciplinares de membros do
Ministério Público da União ou dos Estados julgados há menos de um ano;
Ficar atento: o poder regulamentar do CNMP tem sido muito discutido, principalmente
em razão da edição de atos com forte caráter normativo, como a Resolução nº 181 do CNMP,
que tratou, por exemplo, do acordo de não-persecução penal. De acordo com Mauro Fonseca
Andrade (Investigação criminal pelo Ministério Público: Comentários à Resolução 181 do
CNMP, p. 217), o texto expedido pelo CNMP é uma resolução e, como tal, deveria se limitar a
tutelar interesse ou assunto interno, não podendo se afastar da lei processual nem se
sobrepor a ela. Apesar disso, o STF tem reconhecido atos regulamentares editados pelo CNJ,
como a resolução que tratou da audiência de custódia e a resolução editada pelo CNMP que
tratou de questões afetas à interceptação telefônica, desde que eles encontrem fundamento
legal, o que acontece no caso da Resolução nº 181 do CNMP, de acordo com Vladimir Aras,
para quem “os acordos de não-persecução penal, de cunho bilateral, fundam-se no art. 129,
inciso I, da Constituição, no art. 28 do CPP, no art. 3º do CPP (c/c o art. 3º do CPP) e noutros
dispositivos legais e convencionais que lhes dão seus fundamentos de constitucionalidade e
legalidade”. Tais acordos satisfazem diversos princípios penais, como da fragmentariedade e
da subsidiariedade, além de se coadunar com a justiça restaurativa e com a tendência de
acentuação do sistema penal negocial, fundados em correntes criminológicas como o
minimalismo penal, o labelling approach e as teorias críticas. Existem duas ADIs pendentes de
julgamento questionando a constitucionalidade da Resolução nº 181 do CNMP, nas quais a
PGR ainda não se manifestou (setembro de 2018).
Por fim, deve-se apontar que a criação do CNMP e a previsão de suas competências
excepcionou a inamovibilidade dos membros da instituição, pois, dentre as sanções aplicáveis
pelo órgão, consta expressamente a remoção compulsória (art. 130-A, § 2º, III, CR).
IV. Funcionamento
O CNMP será presidido pelo PGR, não havendo maior regulamentação legal sobre o
tema. O Corregedor Nacional é eleito dentre os membros do Ministério Público que integram
o CNMP para um mandato coincidente com o seu mandato de conselheiro, na forma do art. 30
do Regimento Interno do CNMP. A recondução ao cargo é proibida pela Constituição Federal
(130-A, §3º). É interessante observar que, no CNMP, o Corregedor é eleito, ao passo que, no
CNJ, a função de Corregedor necessariamente é exercida pelo Ministro advindo do STJ
(art.103-B, §5º,CF).
200
a) o CNMP somente pode aplicar as sanções disciplinares decorrentes da prática de
condutas previamente definidas em lei;
b) com a criação do CNMP, foi olvidada a necessidade de ser estabelecido, quanto aos
membros dos Conselhos, um lapso temporal de vedação ao exercício de outra função
pública, que não exija a prévia aprovação em concurso público, terminando por permitir e
estimular que benesses futuras sejam colhidas em troca de posicionamentos atuais;
II. Advocacia Pública. Representação judicial e consultoria jurídica da União, dos Estados e do
Distrito Federal
As mesmas regras são previstas para os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal
(art. 132, CF). Procuradores municipais não são mencionados na Constituição.
201
III. Advocacia privada
No tocante à OAB, frise-se que o exame de suficiência para ingresso na Ordem foi
considerado constitucional pelo STF (RE, 2011), pois é proporcional (com ele evita-se o grande
prejuízo que seria causado a terceiros por profissionais desqualificados) e não alcança o núcleo
essencial da liberdade de ofício.
Por fim, é digna de nota a discussão quanto à legitimidade da Defensoria para a tutela
coletiva. A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP) ajuizou ADIN
contra alteração da Lei da Ação Civil Pública que previu tal legitimidade, sob argumento de
que haveria afetação direta das atribuições do MP e afronta à função constitucional da
Defensoria, uma vez que nesse tipo de ação não seria possível garantir o benefício apenas de
pessoas carentes. Pediu, então, que a alteração fosse declarada inconstitucional ou que fosse
aplicada interpretação conforme para limitar a atuação da Defensoria aos casos de direitos
individuais homogêneos em que fosse possível identificar a presença de pessoas
economicamente hipossuficientes.
202
O STF entendeu que não havia inconstitucionalidade, sendo a lei compatível com o
texto originário da Constituição e tendo isso ficado ainda mais claro com a EC 80/14, que
alterou o art. 134 da CF para incluir expressamente a defesa dos direitos coletivos entre as
atribuições da Defensoria. Assim sendo, a Defensoria pode manejar ação civil pública para a
defesa de interesses difusos e coletivos em sentido estrito, não sendo necessário que a
totalidade dos beneficiados seja hipossuficiente, até mesmo por conta da indivisibilidade desse
tipo de direito (e.g. tutela do meio ambiente). No caso de direitos individuais homogêneos, a
eficácia da decisão seria um pouco mais restrita, porquanto somente poderia ser executada
por aqueles que comprovassem a necessidade econômica.
Ampliando ainda mais esse entendimento do STF, o STJ, alterando decisão exarada um
ano e meio antes, julgou que a Defensoria teria legitimidade para propor ação civil pública em
defesa de consumidores idosos (logo, direito individual homogêneo) que tiveram plano de
saúde reajustado em razão da mudança de faixa etária (EREsp, Corte Especial, Min. Laurita
Vaz, 2015). A ampliação mencionada decorreu do entendimento alargado da expressão
“necessitados” do art. 134, caput, da Constituição, para incluir ao lado dos carentes de
recursos financeiros os hipervulneráveis, ou seja, os necessitados jurídicos, que demandam
proteção estatal mesmo que disponham de recursos econômicos, como os socialmente
estigmatizados, as crianças, os idosos, as gerações futuras, etc.
8C. Defesa do Estado e das instituições democráticas. Estado de defesa. Estado de sítio. Papel
constitucional das Forças Armadas.
André Bica
O estado de defesa é uma medida excepcional menos gravosa que o estado de sítio,
decretada pelo Presidente da República com posterior aprovação do Congresso Nacional,
para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem
pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou
atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
203
Procedimento. A determinação do estado de defesa tem seu ato de instauração por
iniciativa e titularidade do Presidente da República, que determina que sejam ouvidos o
Conselho da República e o Conselho de Defesa (manifestações meramente opinativas).
O estado de sítio é medida mais gravosa, cabível em situações (i) que acarretam grave
comoção nacional ou quando as medidas assumidas no estado de defesa se mostraram
insuficientes ou inadequadas; (ii) declaração de estado de guerra ou resposta a agressão
armada estrangeira, ou mesmo quando for detectado. O Presidente dependerá de autorização
prévia do Congresso.
Certos direitos e garantias podem sofrer restrições, v.g., (a) obrigação de permanência
em localidade determinada; (b) detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados
por crimes comuns; (c) restrições relativas à inviolabilidade de correspondência, ao sigilo das
comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão,
na forma da lei; (d) suspensão de liberdade de reunião; (e) busca e apreensão em domicílio; (f)
intervenção nas empresas de serviços públicos; (g) requisição de bens. Apenas no estado de
sítio as imunidades parlamentares podem ser relativamente suspensas, observados os
requisitos constitucionais. (art. 53,§8o da CRFB/88).16
16
Art. 53, § 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas
mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso
Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida.
204
I. Nota pública PFDC 2017 – Duprat (contexto de declaração de General sobre possível
intervenção militar):
“As Forças Armadas brasileiras – constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica – são instituições integrantes do arcabouço constitucional de promoção e
proteção do Estado Democrático de Direito. Subordinadas à autoridade suprema do
Presidente da República, receberam da Constituição Federal a função de defesa da Pátria,
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
A conformação das Forças Armadas nos termos do artigo 142 da Constituição é uma
conquista democrática e expurga do cenário brasileiro o risco de golpes institucionais. O
papel desempenhado nas últimas décadas pelas Forças Armadas tem notoriamente reforçado
a consolidação do Estado Democrático de Direito e é incompatível com a valorização do
período passado no qual o País enveredou pelo regime ditatorial e a violação de direitos
humanos”.
205
anteriores17, a Constituição de 1988 lhe destinou capítulo específico (art. 144), em que a
consta como “dever do Estado” e como “direito e responsabilidade de todos”, com finalidade
na “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”.
Por essa razão, as políticas públicas de segurança pública deve se harmonizar com o
princípio republicano e democrático, com os direitos fundamentais e com a dignidade da
pessoa humana. O art. 5º, caput, da CRFB eleva a segurança à condição de direito
fundamental, que, como os demais listados, devem ser universal, 18 igual, não seletivo e não
sujeitos ao retrocesso social; e passível de atuação jurisdicional nas políticas públicas de
segurança. É implementada por meio da polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia
ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpo de bombeiros.
Desde o contratualismo dos séculos XVII e XVIII, preservar a “ordem pública” e a
“incolumidade das pessoas e do patrimônio” é a função primordial que justifica a própria
instituição do poder estatal. Na Era Moderna, a segurança era o elemento mais básico de
legitimação do Estado, o mínimo que se esperava da política. Na retórica novecentista do
laissez faire, a segurança chegava a ser concebida como a única função do Estado “guarda-
noturno” (Estado “Gendarme”). O Estado Social não só mantém a preocupação central com a
segurança pública, como amplia o seu escopo, concebendo-a como “segurança social” contra
os infortúnios da própria economia de mercado.
Atividades policiais: O texto constitucional de 1988 faz referência a seis modalidades,
nas respectivas funções:
a) a polícia ostensiva: prevenir e de reprimir de forma imediata a prática de delitos 19; b) a
polícia de investigação: realiza investigação criminal20; c) polícia judiciária: executar as
diligências solicitadas pelos órgãos judiciais; d) polícia de fronteiras, marítima, aeroportuária:
controle do fluxo de pessoas e de bens.21
Órgãos: plano federal: a) a Polícia Federal22, b) a Polícia Rodoviária Federal e c) a Polícia
Ferroviária Federal23; Estadual: Polícia Civil, Polícia Militar e Corpos de bombeiros militares
(incêndios e defesa civil).
Rol de órgãos policiais: o rol do art. 144 é taxativo. Aos Estados é vedado atribuir função
policial, por exemplo, ao departamento policial ou criar polícia penitenciária.24 As polícias
militares e o corpos de bombeiros militares são forças auxiliares e reserva do Exército, sendo
subordinados, juntamente com a polícias civis, aos Governadores dos Estados, do DF e dos
Territórios, aos quais compete a direção administrativa, financeira e funcional da polícia.
17
Constituições de 1891 e 1824 eram omissas. As Constituições de 1934, no seu art. 159 e a de 1937, no seu Art. 162,
especificavam o seguinte: "Todas as questões relativas à Segurança Nacional serão estudadas e coordenadas pelo Conselho
Superior de Segurança Nacional e pelos órgãos especiais criados para atender às necessidades da mobilização.. A Constituição de
1946, no seu Art. 179 especificava que: "Os problemas relativos à defesa do país serão estudados pelo Conselho de Segurança
Nacional pelos órgãos especiais das Forças Armadas incumbidos de prepará-las para a mobilização e as operações militares.". A
Constituição de 1967, Art. 89 e a Emenda Constitucional nº 1, de 1969, Art. 86 dizia que: "Toda pessoa natural ou jurídica é
responsável pela Segurança Nacional, nos limites definidos em lei”.
18
Por ser um serviço universal, inespecífico e indivisível, seu financiamento deve ser por impostos, não por taxas (ADI nº 2.424-
STF).
19
A atividade de polícia ostensiva é desempenhada, em geral, pelas polícias militares estaduais (CF, art. 144, §5º)Mas o
patrulhamento ostensivo das rodovias e ferrovias federais deve ser realizado, respectivamente, pela Polícia Rodoviária Federal
(art. 144, §2º) e pela Polícia Ferroviária Federal (art. 144, §3º).
20
A função é confiada às polícias civis estaduais e à Polícia Federal, no que se refere aos crimes comuns (art. 144, §1º, I, e §4º). 20
Todas exercidas pela Polícia Federal.
21
Todas exercidas pela Polícia Federal.
22
“Art. 144 § 1º: A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se a: I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses
da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão
interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas
respectivas áreas de competência; III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; IV - exercer, com
exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.”(Para ELA WIECKO a polícia estadual não pode investigar crime federal,
mas o contrário é possível – vide questão 113 da prova objetiva do 24CPR)
23
Patrulhamento ostensivo de rodovias e ferrovias federais, respectivamente.
24
STF: ADI nº 1.182, Rel. Min. Eros Grau, DJ 10 03. 2006; ADI nº 236, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 01.06 2001. No entanto, isso
não impede os Estados de instituírem órgão de coordenação de políticas de segurança.
206
Limitação das Forças Armadas: A Constituição não prevê sua participação. Segundo
Alexandre de Moraes, a multiplicidade dos órgãos de defesa da segurança pública, pela nova
Constituição, teve dupla finalidade: atendimento aos reclamos sociais e a redução da
possibilidade de intervenção das Forças Armadas na segurança interna. Pela interpretação
sistemática dos arts. 142 e 144 e outros dispositivos, conclui-se que a atuação das Forças
Armadas nas políticas de segurança está limitada às seguintes circunstâncias excepcionais: a)
estado de defesa (art. 136); b) estado de sítio (art. 137); c) intervenção federal(art. 34, III); d)
realização de investigações criminais no âmbito de inquérito policial militar (artigos 7º e 8º, b,
do Código de Processo Penal Militar (CPPM); e) operações de policiamento ostensivo no
interesse nacional, em casos de visitas de chefes de estados estrangeiros(no art. 5º do Decreto
nº 3.897/2001)25; f) ações de policiamento ostensivo por solicitação do Governador de Estado,
quando os meios no Estado se mostrarem indisponíveis, inexistentes ou insuficientes (LC nº
97/1999, art. 15, §2)º 26. Destinação constitucional principal: a defesa da soberania territorial, e
de forma subsidiária, a defesa da lei e da ordem.
Guardas municipais:. Não são órgãos policiais. Possuem a função de guarda patrimonial,
destinam-se à proteção dos bens, serviços e instalações dos Municípios sem a possibilidade de
exercício das funções de polícia ostensiva ou judiciária. Além dessa prerrogativa, os municípios
podem atuar na segurança pública por meio de restrições administrativas: horário de
fechamento de bares e restaurantes ou espaços de venda de bebidas alcoólicas, por exemplo.
Segurança viária: A EC 82/2014 incluiu o §10 no artigo 144, dispondo que: “§ 10. A
segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas
e do seu patrimônio nas vias públicas: I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de
trânsito, além de outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à
mobilidade urbana eficiente; e II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, aos respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito,
estruturados em Carreira, na forma da lei.” A expressão “segurança viária” refere-se ao
conjunto de ações destinadas a proteger a integridade física e patrimonial das pessoas que
utilizam as vias públicas.
Participação popular: por ser “direito e responsabilidade de todos”, a sociedade pode
participar na formulação e no controle da gestão das políticas de segurança. É o que acontece,
por exemplo, nos conselhos de segurança pública.
O tema no Supremo: “O direito a segurança é prerrogativa constitucional indisponível,
garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de
criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. É possível ao Poder
25
“Art. 5º- O emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, que deverá ser episódico, em área previamente definida
e ter a menor duração possível, abrange, ademais da hipótese objeto dos arts. 3º e 4º, outras em que se presuma ser possível a
perturbação da ordem, tais como as relativas a eventos oficiais ou públicos, particularmente os que contem com a participação de
Chefe de Estado, ou de Governo, estrangeiro, e à realização de pleitos eleitorais, nesse caso quando solicitado. Parágrafo único.
Nas situações de que trata este artigo, as Forças Armadas atuarão em articulação com as autoridades locais, adotando-se,
inclusive, o procedimento previsto no art. 4º.”
26
“§ 2o A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais,
ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.”
Essa hipótese tem sua constitucionalidade questionada por alguns juristas. Segundo Barroso (2007) a atuação das Forças
Armadas nas ações de segurança deve ser interpretada de forma restritiva. A LC 97/1999, art. 15, não prevê o controle pelo
Poder Legislativa, tal como para os casos os casos de estado de defesa, estado de sítio e intervenção federal. Por essa razão,
significa permitir medidas excepcionais sem observâncias de restrições constitucionais definidas e sem adoção de veículos
formais adequados.( BARROSO, Luís Roberto. Forças Armadas e ações de segurança pública: possibilidades e limites à luz da
Constituição, Revista de Direito do Estado, v.2 n. 7, 2007). O Ministro Lewandowski (2004,pag.4), quando então desembargador do
TJ/SP, em entrevista, disse que o emprego das Forças Armadas deve se limitar às hipóteses de decretação de estado de defesa,
estado de sítio e intervenção federal: “A utilização das Forças Armadas para combater a violência urbana, em caráter permanente,
é, portanto, inconstitucional, embora seja lícito o seu emprego temporário e limitado, em situações de emergência, claramente
caracterizadas. A decisão, entretanto, subordina-se ao prudente arbítrio do Presidente da República, que deverá buscar o
respaldo do Legislativo, assim que possível, sob pena de incorrer em crime de responsabilidade. (...) Não se pode esquecer que a
função primordial da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, segundo o texto constitucional, é assegurar a defesa da Pátria. A
rigor, só quando os órgãos constitucionalmente responsáveis pela preservação da lei e da ordem entrarem em colapso é que as
Forças Armadas poderão incumbir-se da tarefa”. (Forças Armadas no combate à violência, RT Informa, n. 31, maio-jun., 2004,
p.4).
207
Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas
públicas constitucionalmente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o
poder discricionário do Poder Executivo.” (RE 559.646-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento
em 7-6-2011, Segunda Turma, DJE de 24-6-2011);
“Lei 18.721/2010 do Estado de Minas Gerais, que dispõe sobre o fornecimento de
informações por concessionária de telefonia fixa e móvel para fins de segurança pública.
Competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações. Violação ao art. 22, IV,
da Constituição. Precedentes." (ADI 4.401-MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 23-6-
2010, Plenário, DJE de 1º-10-2010). Vide: ADI 4.369-MC-REF, Rel. Min. Marco Aurélio,
julgamento em 23-6-2010,Plenário, DJE de 4-5-2011.
Órgão Policial do Senado brasileiro: com as a seguintes atribuições: a segurança do
Presidente do Senado Federal, em qualquer localidade do território nacional e no exterior; a
segurança dos Senadores e autoridades brasileiras e estrangeiras, nas dependências sob a
responsabilidade do Senado Federal; a segurança dos Senadores e de servidores em qualquer
localidade do território nacional e no exterior, quando determinado pelo Presidente do
Senado Federal; o policiamento nas dependências do Senado Federal; o apoio à Corregedoria
do Senado Federal; as de revista, busca e apreensão; as de inteligência; as de registro e de
administração inerentes à Polícia; as de investigação e de inquérito.
Órgão da Câmara dos Deputados: responsável por exercer as funções de polícia
judiciária e apuração de infrações penais, com exclusão das que mantiverem relação de
subsidiariedade, conexão ou continência com outra cometida fora das dependências da
Câmara dos Deputados, além das atividades de polícia ostensiva e preservação da ordem e do
patrimônio, nos edifícios da Câmara dos Deputados e em suas dependências externas; efetuar
a segurança do Presidente da Câmara dos Deputados em qualquer localidade do território
nacional e no exterior; efetuar a segurança dos Deputados Federais, servidores e quaisquer
pessoas que eventualmente estiverem a serviço da Câmara dos Deputados, em qualquer
localidade do território nacional e no exterior, quando assim determinado pelo Presidente da
Câmara dos Deputados; atuar como órgão de apoio à Corregedoria da Câmara dos Deputados,
sempre que solicitado; planejar, coordenar e executar planos de segurança física dos
Deputados Federais e demais autoridades que estiverem nas dependências da Câmara dos
Deputados.
Força Nacional de Segurança Pública (FNSP): criada em 2004 e localizada no entorno do
Distrito Federal, no município de Luziânia, é um programa de cooperação de Segurança Pública
brasileiro, coordenado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), do Ministério
da Justiça (MJ). É um órgão que foi criado durante a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, idealizado pelo Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos.
Polícia das Forças Armadas: Polícia do Exército (Brasil), Polícia da Aeronáutica e
Companhia de Polícia do Batalhão Naval. Polícia do Exército (PE) - constituída de unidades de
infantaria às quais compete assegurar o respeito à Lei e ordem, bem como o cumprimento dos
regulamentos militares. Polícia da Aeronáutica (PA) - integra os Batalhões de Infantaria da
Aeronáutica Especiais (BINFAE) e possui as mesmas atribuições da Polícia do Exército no
âmbito da Força Aérea Brasileira. Companhia de Polícia do Batalhão Naval - Exerce as mesmas
atribuições das organizações policiais do Exército e da Força Aérea no âmbito da Marinha de
Guerra.
Lei n.° 13.060/2014: disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo
pelos agentes de segurança pública. Âmbito federal: tema já era tratado, de forma mais
detalhada, pela Portaria Interministerial 4226/2010, que vinculava o Departamento de Polícia
Federal, o Departamento de Polícia Rodoviária Federal, o Departamento Penitenciário
Nacional e a Força Nacional de Segurança Pública. Algumas das regras da portaria passaram ao
status de lei, valendo para todos os órgãos de segurança pública do país, incluindo polícias
civis e militares dos Estados-membros.
O uso subsidiário e moderado da força por órgãos de segurança pública é também
tratado nos seguintes documentos internacionais: I) Código de Conduta para os Funcionários
208
Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua
Resolução 34/169, de 17 de dezembro de 1979; II) Princípios orientadores para a Aplicação
Efetiva do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei,
adotados pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas na sua resolução 1989/61, de
24 de maio de 1989; III) Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos
Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotados pelo Oitavo Congresso das Nações
Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana,
Cuba, de 27 de Agosto a 7 de setembro de 1999; IV) Convenção Contra a Tortura e outros
Tratamentos ou penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotada pela Assembleia Geral das
Nações Unidas, em sua XL Sessão, realizada em Nova York em 10 de dezembro de 1984 e
promulgada pelo Decreto nº 40, de 15 de fevereiro de 1991.
Principal regra da Lei 13.060/2014: uso prioritário de instrumentos de menor potencial
ofensivo (IMPO). Art. 2o.
Vedação do uso de arma de fogo: Não é legítimo o uso de arma de fogo: I - contra
pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de
lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros; e II - contra veículo que desrespeite
bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos
agentes de segurança pública ou a terceiros (art. 2 o, p.u.).
A disciplina jurídica das finanças públicas traz regras sobre toda a atividade financeira do
Estado, que abrange captação de recursos públicos, gestão das contas públicas e realização
dos gastos. Tudo isso com vistas à concretização de direitos fundamentais, tomados em sua
dimensão individual e transindividual. LEITE diz que “a atividade financeira do Estado é um
instrumento para a realização do próprio fim estatal” (atendimento das necessidades
públicas). Na CRFB/88, o assunto é tratado de forma expressa no Título VI (Da Tributação e do
Orçamento), Capítulo II (Das Finanças Públicas). A Constituição determina que os seguintes
temas sejam reservados à lei complementar: finanças públicas (LC 101/00); dívida pública
externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo
Poder Público (L 8.383/91); concessão de garantias pelas entidades públicas; emissão e resgate
de títulos da dívida pública (art. 34, § 2º, I, ADCT); fiscalização das instituições financeiras (L.
4595/64); fiscalização financeira da administração pública direta e indireta (L. 4595/64);
operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios (L 4131/62, DL 9205/46 e DL 9602/46); compatibilização das funções
das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e condições
operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional (LC 101/00 e L. 4595/64).
Determina também que a emissão de moedas é competência da União, exclusivamente pelo
Banco Central (art. 164, CRFB). Ao Banco Central, por sua vez, é vedado conceder, direta ou
indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou entidade que não
seja instituição financeira. Por outro lado, há a possibilidade de comprar e vender títulos de
emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros;
o Banco Central é depositário das disponibilidades de caixa da União (§§ 1º, 2º, e 3º, do art.
164, da CRFB).
209
Segundo o STF, nem os Estados nem o Poder Judiciário possuem legitimidade para
apresentar projeto de lei que trate da destinação dos rendimentos oriundos das contas de
depósitos judiciais. Trata-se de matéria de competência exclusiva da União (direito
processual).
Orçamento é, basicamente, o instrumento de planejamento da gestão patrimonial e da
alocação de recursos públicos (Gilmar Mendes, pg. 1511). São três leis que compõem o
orçamento, mas a ideia de orçamento é UNA: I) PPA (4 anos); II) LDO (1 ano); III) LOA (1 ano).
Elaborar o orçamento significa planejar. Essas três leis são ordinárias e temporárias e deveriam
ser elaboradas de acordo com LC geral que iria auxiliar todos os entes federativos (art. 165,
§9°, CR/88). São elaboradas de forma harmônica, regidos pelo princípio da unidade,
integrando-se finalisticamente. Os prazos para envio estão no art. 35, §2°, ADCT: PPA (agosto
do primeiro exercício financeiro), LDO (abril de cada ano) e LOA (agosto de cada ano). Os
prazos para Estados e Municípios podem ser definidos nas Constituições Estaduais ou Leis
Orgânicas, respectivamente. O processo legislativo das leis orçamentárias é tratado no art. 166
da CRFB/88. A iniciativa das leis é do chefe do executivo. Os projetos serão examinados pelas
duas Casas do Congresso Nacional, sendo cada projeto examinado por Comissão mista
permanente de Deputados e Senadores (art. 166, § 1º). As emendas aos projetos serão
apresentadas na Comissão Mista (art. 166, § 2º), que emitirá parecer, cabendo sua apreciação
ao plenário das duas Casas do Congresso Nacional. As emendas à LOA devem ser compatíveis
com o projeto do PPA e LDO. Devem também indicar os recursos necessários à sua
implementação. Esses recursos não podem ser provenientes da anulação de dotações com
pessoal, serviços da dívida e transferências tributárias constitucionais para os demais entes da
Federação. O Presidente da República poderá enviar mensagem ao Congresso propondo
modificações nos projetos enquanto não iniciada a votação na Comissão mista, da parte que se
pretende alterar.
A LDO terá dois anexos, chamados de anexo de metas fiscais, onde irá estabelecer metas
relativas à receitas, despesas e resultado, outras sobre endividamento (como está a situação
da dívida pública) e anexo de riscos fiscais, que é reserva de contingência apta a suportar
gastos oriundos de imprevisibilidades (esse anexo pode ser considerado uma exceção ao
princípio da especificação, pois o orçamento, aqui reservado, não terá finalidade específica,
até ser necessário). A LOA, por sua vez é dividida em: a) orçamento fiscal: gasto
governamental; b) orçamento de investimento das empresas estatais: aporte de capitais
(aumento de participação acionária); e c) orçamento da seguridade social: RPPS (Regime
Próprio de Previdência Social) e INSS, neste caso, apenas relacionado ao déficit.
Quanto ao aspecto jurídico, LEITE ressalta que orçamento é lei e traça o plano de trabalho
para determinado exercício financeiro. Ainda sobre a natureza jurídica, o autor aponta três
posicionamentos na doutrina. Para León Diguit, o orçamento seria um mero ato administrativo
em relação às despesas e uma lei em sentido formal em relação às receitas. Para Gaston Jèze,
o orçamento não passa de um ato-condição para realização do gasto e ingresso da receita
(receitas e despesas possuem outras normas prevendo sua criação). Para a terceira corrente
210
(majoritária no Brasil e no STF), o orçamento é lei formal que autoriza a receita e prevê o
gasto, mas não é dotada de generalidade e abstração (é meramente autorizativa e não
impositiva). Há, ainda, uma corrente minoritária (FURTADO), para a qual o orçamento teria
natureza jurídica material, pois é expressão da vontade democrática popular (o Ministro
Marco Aurélio manifestou entendimento nesse sentido na ADI 4663). Ademais, o STF admite o
controle concentrado de constitucionalidade sobre leis orçamentárias (ADI 4048 e 4049),
independentemente da natureza geral ou abstrata dessas normas (o caso enfrentado dizia
respeito a medidas provisórias que não atenderam às hipóteses previstas para a abertura de
créditos extraordinários).
A EC 86/2015 alterou parcialmente esse cenário, pois tornou obrigatória (impositiva) a
execução do orçamento referente às emendas individuais ao projeto de lei orçamentária no
limite de 1,2% da receita corrente líquida prevista no projeto, desde que metade do
percentual corresponda a ações e serviços públicos de saúde. Somente não haverá
obrigatoriedade por impedimento de ordem técnica. Sobre o assunto, ressalte-se, ainda, a EC
95/2016 (“PEC do teto de gastos públicos”), que desvinculou o montante destinado às
emendas impositivas da receita corrente líquida, passando a ter como critério desde 2018 o
montante destinado ao exercício anterior corrigido pela inflação (IPCA).
VEDAÇÕES ORÇAMENTÁRIAS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ORÇAMENTÁRIOS PREVISTOS
NA CR/88:
a) Exclusividade em matéria orçamentária (art. 165, §8°, CRFB/88): orçamento não pode
conter dispositivo estranho à fixação de despesa e previsão de receita e não pode comportar
caudas orçamentárias (dispositivo de lei material) - "orçamento rabilongo" -, exceções ao
princípio da exclusividade: autorização dirigida ao chefe do executivo para que ele possa abrir
por decreto, crédito suplementar, e autorização para contratação de operações de crédito.
b) Especialidade/Especialização: orçamentos devem especificar e discriminar os créditos, os
órgãos a que se destinam e o tempo em que deve realizar as despesas. Espécies: I) quantitativa
(art. 167, VII, CRFB/88): determina a fixação do montante de gastos, proibindo a concessão e a
utilização de créditos ilimitados. II) qualitativa (art. 5, c/c art. 15, §1° c/c art. 20, parágrafo
único, Lei 4320/64): esta recomenda a vinculação dos créditos aos órgãos públicos, as rubricas
orçamentárias devem ser especificadas de acordo com sua natureza. III) temporal (art. 167,
§2°, CRFB/88): limita a vigência dos créditos especiais e extraordinários ao exercício financeiro
a que forem autorizados, salvo se o ato de autorização tiver sido promulgado nos quatro
últimos meses do ano. OBS: veda crédito com finalidade imprecisa ou com dotação ilimitada.
Exceção: Anexo de Riscos Fiscais da LDO
c) Legalidade. Espécies (subprincípios) I) super-legalidade: tem a ver com a supremacia da
constituição, as leis orçamentárias devem se coadunar com as normas constitucionais; II)
reserva de lei: o orçamento deve ser aprovado por meio de lei formal; III) primado da lei: o
poder regulamentar da administração pública só se pode manifestar nos espaços deixados
pelo legislador quando aprova os orçamentos.
d) Não vinculação de imposto a fundo, órgão ou despesa (art. 167, IV, CR/88): em regra, a
receita dos impostos é destinada a custear os serviços uti universi. Exceções: reparticição
constitucional da receita dos impostos; vinculação de recursos para ensino, fundo de combate
a erradicação da pobreza, para realização de atividades da administração tributária, para a
prestação de garantias às operações de crédito em antecipação de receitas e financiamento de
precatórios (EC 94/2016). É possível vincular receitas de taxas e contribuições de melhoria.
OBS: Lembrar da DRU - Desvinculação de Recursos da União - art. 76, ADCT (prorrogada até
31/12/2023 pela EC 93/2016).
e) Universalidade (art. 165, §5°, CR/88): todas as receitas e todas as despesas devem estar
previstas na lei orçamentária. Exceção: os tributos que podem ser cobrados de um ano para
outro, sem que estejam previstos na lei orçamentária, pois para eles vigoram a anterioridade
(vide súmula 66, STF).
f) Anualidade: para cada ano deve haver um orçamento, permite o controle. Não se confunde
com a anualidade tributária, não mais presente no sistema brasileiro.
211
g) Unidade (art. 165, §5°, CR/88): a peça orçamentária deve ser única e uma só, contendo
todos os gastos e receitas, cuida-se de princípio formal, isto é, o documento é único.
h) Superioridade e Indisponibilidade do Interesse Público na Atividade Arrecadatória de
Tributos. Significa que esta superioridade prevalece sempre, a não ser que exista um interesse
individual que se oponha a este interesse.
i) Transparência. Decorrência direta da publicidade e, portanto, relaciona-se também com a
fiscalização — se as receitas estão sendo bem aplicadas.
j) Proibição de estorno. A ações governamentais não podem ser reorganizadas mediante
transposição, remanejamento e transferência de recursos sem prévia autorização legislativa.
DISPONIBILIDADE DE RECURSOS A ÓRGÃOS DOTADOS DE AUTONOMIA (art. 168, CR/88): serão
entregues no dia 20 de cada mês por duodécimos. LIMITES COM DESPESA DE PESSOAL (art.
169, CR/88 com alteração pela EC/19 – reforma administrativa- e art. 19, LC 101/00): a soma
dos gastos de pessoal de cada ente federativo deve ser ater aos limites estabelecidos em LC
(LC101/00), art. 19 e 20. art. 20 LRF = estabelece a repartição dos limites globais, através de
percentuais que deverão ser repartidos entre os Poderes Públicos e seus órgãos. ADI 4426, ADI
4356: Lei ordinária de iniciativa exclusiva do Poder Executivo não pode fixar limites de
execução orçamentária ao Poder Judiciário e ao Ministério Público sem nenhuma participação
destes, por implicar indevida interferência sobre a gestão orçamentária desses órgãos
autônomos (CF, arts. 2º, 99, §1º e 127, §§2º e 3º).
A cobrança de multa imposta por Tribunal de Contas estadual à autoridade municipal deve ser
feita pelo Estado membro que mantém a corte, por meio de seus representantes judiciais.
Diferentemente, se há condenação de ressarcimento ao erário a titularidade do crédito será
do próprio ente público prejudicado (STJ, AgInt no REsp 1618830/MG). Prevalece que o
Ministério Público não possui legitimidade (AgInt no AREsp 917201 / MA).
LEGISLAÇÃO BÁSICA: CF: Art. 5º, 7º, 165/167, 203, 227 Lei n. 8.142/90; LRF; Lei
7.853/89; Decreto 3.298/99; Lei 8.112/90; Lei 8.213/91; Loas; Lei 10.098/00; Lei 10.216/01;
Lei 8.899/94; Lei 9.868/99.
NOÇÕES GERAIS: Em uma democracia, a ideia essencial é que as decisões políticas mais
importantes sejam tomadas pelo próprio povo ou seus representantes. Tais decisões envolvem
o dilema entre necessidades infinitas e recursos escassos. Em especial, a implementação de
políticas sociais demandam custos, razão pela qual é preciso contextualizar o tema da
efetividade destes direitos à luz dos problemas orçamentários. A escassez moderada de
recursos é um fato da vida que não pode ser ignorado, motivo pelo qual é possível o
argumento da reserva do possível, conquanto seja patente a possibilidade do judiciário
controlar excessos (ex: invertendo o ônus da prova - REsp 764.085). Temos aqui uma questão
de dosagem, uma vez que ao princípio majoritário se impõem limites (ex: proteção às
minorias, garantia de direitos básicos), mas o exagero na intervenção externa ao Legislativo
pode revelar-se antidemocrático, por cercear além da razoabilidade o poder do povo de se
autogovernar.
ORÇAMENTO: O orçamento é instrumento de planejamento (intervenção
indireta/função planejadora determinante para o setor público e indicativa para o setor
privado), e é o local por excelência para a realização de escolhas trágicas, tanto no que toca às
fontes de financiamento dos direitos sociais, quanto no que se refere às prioridades de
gastos. . Orçamento prevê receitas e autoriza gastos, sendo meramente autorizativo no Brasil.
O orçamento é instrumento de intervenção do Estado na economia, por meio do qual o Estado
exerce função planejadora (art. 174 da CF), determinante para o setor público e indicativa para
o setor privado. Além disso, o orçamento é instrumento poderoso para a realização das
atividades redistributivas do Estado, concretizando princípios tributários de equidade como a
212
progressividade fiscal e as imunidades, na medida em que destina as verbas arrecadadas aos
mais pobres. Na sistemática orçamentária constitucional (PPA, LDO e LOA), destaca-se o
orçamento da seguridade social, que integra finalisticamente a LOA (princípio da unidade
orçamentária, art. 165, § 5º).
FINANCIAMENTO: As principais fontes de financiamento dos direitos sociais são os
tributos, receitas derivadas e correntes. O financiamento pode se dar de forma direta, por
meio da receita dos impostos que vão para o caixa único de cada ente federativo, ou de forma
direita, por meio das contribuições sociais, de competência da União (art. 149 CF).
DESPESAS, VINCULAÇÃO E DESVINCULAÇÃO: Para garantir a destinação dos recursos
arrecadados para a efetivação dos direitos sociais utiliza-se a técnica da afetação, o que
representa exceção constitucionalmente autorizada (art. 167, IV CF). Sobre os percentuais para
saúde e educação cf. tópicos 19.c e 16.a. Sob o argumento de que a maior parte do orçamento
é engessado pelas vinculações constitucionais e pelas despesas correntes de caráter
obrigatório, o que impede o Governo de executar seus programas, criou-se a DRU
(desvinculações de receitas da União), por meio da qual se desvinculam recursos de impostos e
contribuições sociais e de intervenção afetados, no percentual de 20% (art. 76 ADCT). O STF já
se manifestou pela sua constitucionalidade (RE 537.310). A prorrogação da DRU até dezembro
de 2015, foi aprovada em 7 de dezembro de 2011.
CRIAÇÃO DE CRÉDITOS EXTRAORDINÁRIOS POR MEDIDA PROVISÓRIA: Ainda é
majoritário o entendimento de que as leis orçamentárias ainda possuem natureza jurídica de
lei formal, de lei temporária, porque a) não tem densidade normativa; e b) exteriorizam plano
de governo (orçamento programa - planejamento que é determinante para o setor público e
indicativo para o setor privado e, portanto, não caberia Ação Direta de Inconstitucionalidade
em face destas. Entretanto, ante a evolução doutrinária e os excessos de nossos
representantes, podemos exemplificar com a ADI 4048 MC (Informativo 502 - STF), em que o
STF entendeu que não restavam preenchidos os requisitos da urgência e relevância que
autorizariam a criação de créditos extraordinários, por Medida Provisória.
213
I - incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos
de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos; (Incluído
pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
II - liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de
informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios
eletrônicos de acesso público; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
III - adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão
mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A.
(Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os
entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a
informações referentes a: (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
I - quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da
execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos
dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço
prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao
procedimento licitatório realizado; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
II - quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras,
inclusive referente a recursos extraordinários. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de
2009).
214
precisa estar adstrita aos valores e objetivos constitucionais, sob pena de flagrante
inconstitucionalidade.
Quer se dizer com isso que, em caso de inobservância dos preceitos da Constituição,
bem como de omissão total ou parcial do legislador, o Poder Judiciário estará legitimado a
intervir para preservar a supremacia constitucional.
A intervenção do Judiciário manifesta-se como uma salvaguarda institucional, a fim de
garantir a existência de um modo de vida capaz de respaldar os direitos fundamentais dos
cidadãos.
Nesse sentido, os seguintes acórdãos:
EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA
PROVISÓRIA N° 405, DE 18.12.2007. ABERTURA DE CRÉDITO EXTRAORDINÁRIO. LIMITES
CONSTITUCIONAIS À ATIVIDADE LEGISLATIVA EXCEPCIONAL DO PODER EXECUTIVO NA
EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS. I. MEDIDA
PROVISÓRIA E SUA CONVERSÃO EM LEI. Conversão da medida provisória na Lei n°
11.658/2008, sem alteração substancial. Aditamento ao pedido inicial. Inexistência de
obstáculo processual ao prosseguimento do julgamento. A lei de conversão não convalida os
vícios existentes na medida provisória. Precedentes. II. CONTROLE ABSTRATO DE
CONSTITUCIONALIDADE DE NORMAS ORÇAMENTÁRIAS. REVISÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O
Supremo Tribunal
Federal deve exercer sua função precípua de fiscalização da constitucionalidade das leis e
dos atos normativos quando houver um tema ou uma controvérsia constitucional suscitada
em abstrato, independente do caráter geral ou específico, concreto ou abstrato de seu
objeto. Possibilidade de submissão das normas orçamentárias ao controle abstrato de
constitucionalidade. III. LIMITES CONSTITUCIONAIS À ATIVIDADE LEGISLATIVA EXCEPCIONAL
DO PODER EXECUTIVO NA EDIÇÃO DE MEDIDAS PROVISÓRIAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO
EXTRAORDINÁRIO. Interpretação do art. 167, § 3º c/c o art. 62, § 1º, inciso I, alínea "d", da
Constituição. Além dos requisitos de relevância e urgência (art. 62), a Constituição exige que a
abertura do crédito extraordinário seja feita apenas para atender a despesas imprevisíveis e
urgentes. Ao contrário do que ocorre em relação aos requisitos de relevância e urgência (art.
62), que se submetem a uma ampla margem de discricionariedade por parte do Presidente da
República, os requisitos de imprevisibilidade e urgência (art. 167, § 3º) recebem densificação
normativa da Constituição. Os conteúdos semânticos das expressões "guerra", "comoção
interna" e "calamidade pública" constituem vetores para a interpretação/aplicação do art. 167,
§ 3º c/c o art. 62, § 1º, inciso I, alínea "d", da Constituição. "Guerra", "comoção interna" e
"calamidade pública" são conceitos que representam realidades ou situações fáticas de
extrema gravidade e de consequências imprevisíveis para a ordem pública e a paz social, e que
dessa forma requerem, com a devida urgência, a adoção de medidas singulares e
extraordinárias. A leitura atenta e a análise interpretativa do texto e da exposição de motivos
da MP n° 405/2007 demonstram que os créditos abertos são destinados a prover despesas
correntes, que não estão qualificadas pela imprevisibilidade ou pela urgência. A edição da MP
n° 405/2007 configurou um patente desvirtuamento dos parâmetros constitucionais que
permitem a edição de medidas provisórias para a abertura de créditos extraordinários. IV.
MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA (ADI 4048 MC, Relator: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno,
julgado em 14/05/2008);
ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS
– POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS – DIREITO À SAÚDE – FORNECIMENTO DE
EQUIPAMENTOS A HOSPITAL UNIVERSITÁRIO – MANIFESTA NECESSIDADE – OBRIGAÇÃO DO
ESTADO – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – NÃO-
OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO
EXISTENCIAL. (…) 3. A partir da consolidação constitucional dos direitos sociais, a função estatal
foi profundamente modificada, deixando de ser eminentemente legisladora em pró das
liberdades públicas, para se tornar mais ativa com a missão de transformar a realidade social.
Em decorrência, não só a administração pública recebeu a incumbência de criar e implementar
215
políticas públicas necessárias à satisfação dos fins constitucionalmente delineados, como
também, o Poder Judiciário teve sua margem de atuação ampliada, como forma de fiscalizar e
velar pelo fiel cumprimento dos objetivos constitucionais. 4. Seria uma distorção pensar que o
princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos
direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos
sociais, igualmente fundamentais. Com efeito, a correta interpretação do referido princípio,
em matéria de políticas públicas, deve ser a de utilizá-lo apenas para limitar a atuação do
judiciário quando a administração pública atua dentro dos limites concedidos pela lei. Em
casos excepcionais, quando a administração extrapola os limites da competência que lhe
fora atribuída e age sem razão, ou fugindo da finalidade a qual estava vinculada, autorizado
se encontra o Poder Judiciário a corrigir tal distorção restaurando a ordem jurídica violada.
(Segunda Turma do STJ, Recurso Especial n. 1041197 – MS)
Artigos 170 a 192 da CF. O Título VII da CF (Da Ordem Econômica e Financeira) é
exemplo de elemento sócio-ideológico, revelando “caráter de compromisso das constituições
modernas entre o Estado individualista e o Estado Social, intervencionista”.
216
ATIVIDADE ECONÔMICA EM GERAL: atividade econômica latu sensu (matérias que podem ser
imediata ou potencialmente objeto de exploração lucrativa) é gênero dividido em (a) serviço
público – prestado preferencialmente pelo setor público, incidindo a figura do privilégio – e (b)
atividade econômica stricto sensu – prestado preferencialmente pelo setor privado (Eros Grau,
ADPF 46).
OBJETIVOS: art. 170, CF, i.e., “assegurar a todos existência digna” (mínimo necessário à
satisfação das necessidades humanas) “conforme os ditames da justiça social” (ideal da
igualdade de bens materiais, visando à diminuição de diferenças que impedem importantes
propósitos positivados na CF, como a dignidade humana; tem cunho ético e cultural). Esses
dois objetivos consagram expressamente o princípio da inclusão social e econômica, tratados
por Canotilho como princípio da democracia econômico-social (art. 3, I, II e III, CF).
217
DIREITO DE INICIATIVA: direito que todos possuem de se lançarem no mercado de trabalho
por sua conta e risco, sem encontrar restrições injustificadas do Estado. Ligada à concepção
liberal do homem, evidenciando sua individualidade. Conduz necessariamente à livre escolha
do trabalho que, por sua vez, constitui uma das expressões fundamentais da liberdade
humana. Consubstancia alicerce e fundamento da ordem econômica, e é também direito
fundamental.
Direta. Ocorre nas estritas hipóteses do art. 173 (relevante interesse coletivo ou
quando necessária aos imperativos nacional) e do art. 177 (regime de monopólio). A CF/88
adotou o princípio da subsidiariedade para nortear as atividades do Estado no domínio
econômico, de modo que a atuação estatal é excepcional (STF, AgRg no RE 369.252/PR).
Indireta. O Estado atua como agente normativo e regulador, na forma do art. 174.
Aqui, não há o desempenho de atividade econômica por parte do ente estatal. Ex.: poder
regulatório exerecido pela CVM ou poder de fomento exercido pelo BNDES.
O art. 175 estabelece que os serviços públicos serão prestados diretamente pelo
Estado ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação.
Concessão: está prevista na Lei nº 8.987/95 e consiste no contrato administrativo pelo qual a
Administração Pública transfere à pessoa jurídica ou consórcio de empresas a execução de
certa atividade de interesse coletivo, remunerada através do sistema de tarifas pagas pelos
usuários.
218
Permissão: há divergência quanto à respectiva natureza jurídica. Para Celso Bandeira de Mello
e Di Pietro, não obstante a evidente desnaturação do instituto (como verificado no art. 40 da
Lei nº 8.987/95), a permissão de serviço público é ato unilateral e precário, 'intuitu personae',
através do qual o Poder Público transfere a alguém o desempenho de um serviço de sua
alçada, proporcionando (como no caso da concessão) a possibilidade de cobrança de tarifas
dos usuários. Para Carvalho Filho, a permissão de serviço público é contrato administrativo
através do qual o Poder Público (permitente) transfere a um particular (permissionário) a
execução de certo serviço público nas condições estabelecidas em normas de direito público,
inclusive quanto à fixação do valor das tarifas. De qualquer forma, aplicam-se na escolha do
concessionário ou permissionário as regras gerais previstas na Lei nº 8.666/93, com as
modificações decorrentes da Lei nº 8.987/95 e da Lei nº 9.074/95.
V. Monopólios federais e seu regime constitucional
219
13B. Regime constitucional da propriedade. Função socioambiental da propriedade.
Desapropriação e requisição.
220
872 e 873).
Espécies: a) Comum (art. 5º, XXIV, CF e Lei 4.132/1962): por necessidade ou utilidade
pública ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro. Para a
maioria da doutrina, a necessidade relaciona-se com a urgência, e a utilidade, com o juízo de
conveniência. CABM não faz tal distinção. b) Urbanística ou por descumprimento da função
social urbana (art. 182, § 4º, III, CF e Lei 10.257/2001): adotada a titulo de penalização ao
proprietário do solo urbano que não atender à exigência de promoção do adequado
aproveitamento de sua propriedade, nos termos do plano diretor (o expropriante é
exclusivamente o Município) e da prévia legislação municipal regulando o assunto (a
desapropriação é a última das medidas possíveis a serem tomadas previamente pelo
município). Pode ser realizada a qualquer tempo, desde que decorridos 5 anos de infrutífera
aplicação da tributação progressiva (art. 8º do Estatuto da Cidade). A indenização é paga com
títulos da dívida pública aprovados previamente pelo Senado Federal e com prazo de resgate
de até 10 anos. c) Rural (art. 184, CF): incide sobre imóveis rurais para fins de reforma agrária.
Trata-se de modalidade específica da desapropriação por interesse social que objetiva a perda
da propriedade quando esta não estiver cumprindo sua função social (art. 186, CF). São
desapropriáveis: os latifúndios improdutivos e as propriedades improdutivas, mesmo que não
configurem latifúndios, quando seu proprietário possuir mais de uma. A expropriante é
exclusivamente a União e a indenização é paga em títulos da dívida agrária resgatáveis no
prazo de até 20 anos, a partir do segundo ano de sua emissão. As benfeitorias úteis e
necessárias serão pagas em dinheiro. Efetuada a desapropriação, a União terá três anos, a
partir do registro do titulo translativo de domínio, para destinar a área aos beneficiários da
reforma agrária (art. 16, Lei 8.629/93). Estados-membros e Municípios podem promover
desapropriação de imóvel rural, desde que por interesse social. Não podem promovê-la para
reforma agrária, a qual é privativa da União (RDA 152/122 e RT 595/266). d) Confiscatória ou
expropriatória (art. 243, CF): a perda da propriedade tem como pressuposto o fato de que
nela estão localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas (JSCF, p. 752 a 754). A área será
destinada ao assentamento de colonos para o cultivo de produtos alimentícios e
medicamentosos. CABM entende que a indenização é um dos requisitos de qualquer
expropriação, razão pela qual entende que o art. 243 trata de confisco, e não de
desapropriação. STF (RE 543.974/MG): toda a propriedade será suprimida, e não apenas o
local da plantação.
Política agrária e agrícola na Constituição: A política agrária engloba a política agrícola. Nesta,
há maior predominância de interesses econômicos. Aquela possui uma perspectiva mais social,
tratando de questões trabalhistas e previdenciárias no campo. Segundo o art. 1º, §2º, da Lei nº
4.504/64 (Estatuto da Terra) “entende-se por política agrícola o conjunto de providências de
amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da economia rural, as
atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de
harmonizá-las com o processo de industrialização do país”. A CF/88 alargou o conceito de
política agrícola, aduzindo que, no planejamento agrícola, incluem-se as atividades
agroindustriais, agropecuárias, pesqueiras e florestais (art. 187, §1º). A CF optou pela
expressão agrícola, evidenciando o eixo econômico da relação do homem no campo. A
doutrina critica esta denominação, tendo em vista que o direito que regula estas relações
possui fortes contornos sociais. A reforma agrária é o principal instrumento da política agrícola,
pois atua sob um eixo econômico, bem como sob um eixo social. A reforma agrária é “o
conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição de terra, mediante
221
modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e
ao aumento de produtividade” (art. 1º, §1º, do Estatuto da Terra).
222
melhoria das condições de vida do proprietário/possuidor e um aumento na produção primária
do país.
Desapropriação para reforma agrária: Nos moldes do definido no art. 184 da CF, compete à
União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não
esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida
agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a
partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. As benfeitorias
úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. O decreto que declarar o imóvel como de
interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de
desapropriação. A desapropriação, judicial ou extrajudicialmente, é executada pelo INCRA,
autarquia federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Determina o art. 184,
§5º, da CF que são isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de
transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. Segundo o STF, a isenção
deve ser entendida como imunidade e tem por fim não onerar o procedimento expropriatório
ou dificultar a realização da reforma agrária. Ademais, os títulos da dívida agrária constituem
moeda de pagamento da justa indenização devida e, dado seu caráter indenizatório, não
podem ser tributados. Todavia, terceiro adquirente de títulos da dívida agrária não goza da
referida imunidade, uma vez que o benefício alcança tão somente o expropriado (RE 168.110).
Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária receberão títulos de
domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de 10 anos. O título de domínio e a
concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente
do estado civil, nos termos e condições previstos em lei (art. 189 da CF). São insuscetíveis de
desapropriação para fins de reforma agrária: a propriedade produtiva e a pequena (de 1 a 4
módulos fiscais) e média (de 4 a 15 módulos fiscais) propriedade rural (ainda que improdutiva),
assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra. A Lei nº 8.629/93 dispõe
sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, o conceito
de pequena e média propriedade rural e de propriedade produtiva. Não se confunde latifúndio
e minifúndio com pequena e média propriedade, pois estas são fixadas em módulos fiscais e
aquelas em módulos rurais. Para ser latifúndio, basta ter no mínimo 1 MR e ser improdutiva. É
223
preciso que o proprietário da pequena ou média propriedade não possua outro imóvel RURAL.
Se o sujeito tiver 40 imóveis urbanos e 1 média propriedade, ela não poderá ser
desapropriada, pois a lei veda este benefício àquele que possuir outro imóvel rural e não
urbano. (Na usucapião especial rural, não pode o indivíduo ter qualquer outro imóvel). A Lei
Complementar nº 76/93 estabelece procedimento contraditório especial, de rito sumário, para
o processo de desapropriação de imóvel rural por interesse social, em conformidade com o
mandamento constitucional do art. 184, §3º. As ações concernentes à desapropriação de
imóvel rural, para fins de reforma agrária, têm caráter preferencial e prejudicial em relação a
outras ações referentes ao imóvel expropriando (art. 18 da LC). Qualquer ação que tenha por
objeto o bem expropriado será distribuída, por dependência, à Vara Federal onde tiver curso a
ação de desapropriação, determinando-se a pronta intervenção da União (§1º). Ainda, o MPF
intervirá, obrigatoriamente, após a manifestação das partes, antes de cada decisão
manifestada no processo, em qualquer instância (§2º).
21.ORDEM SOCIAL
21.1 Previdência social e assistência social na Constituição. (14.b)
21.2 Direito à saúde. Sistema único de Saúde na Constituição. Controle Social. O direito de
acesso às prestações sanitárias. (19.c)
21.3 Direito fundamental à educação. A educação na Constituição Federal. (16.a)
224
21.4 Comunicação social. A imprensa na Constituição. Liberdades públicas, acesso à
informação e pluralismo. (9.a)
21.5 Proteção constitucional à famı ́lia, à criança, ao adolescente e ao idoso. (17.a)
21.6 Direitos das pessoas portadoras de deficiência. A convenção da ONU sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo. (18.b)
Previdência Social
Previdente é aquele que consegue antever acontecimentos futuros e prováveis e em
relação aos quais se faz precavido. Desta feita, a previdência social pode ser entendida como a
previsão, antecipação ou antevisão, de determinadas contingências sociais previstas no art.
201 da Constituição Federal, para as quais providencia uma reserva atual (Custeio – Lei nº
8.212/91) para pagamento futuro (Benefício – Lei nº 8.213/91).
A previdência social, em um conceito simples, é uma espécie de seguro social, assim
denominado em razão de atender à sociedade contra os riscos sociais, que são os infortúnios
que qualquer pessoa está sujeita ao longo de sua vida, como doenças, acidentes, invalidez,
velhice etc., que a impeça de obter seu sustento.
No Brasil, a previdência social será organizada sob a forma de regime geral (Regime
Geral de Previdência Social (RGPS)), de caráter contributivo e de filiação obrigatória. Assim,
todo aquele que desempenha atividade remunerada é compulsoriamente vinculado ao RGPS
inclusive mediante contribuições.
Ademais, deverão ser observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atendendidas, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez,
morte e idade avançada; II - proteção à maternidade, especialmente à gestante; III - proteção
ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV - salário-família e auxílio-reclusão
para os dependentes dos segurados de baixa renda; V - pensão por morte do segurado,
homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes
A CF/88 estabeleceu as seguintes diretrizes para a previdência social: a) proibição de
adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria no Regime
Geral da Previdência Social - RGPS (exceção para atividades exercidas sob condições especiais,
art. 201, §1º); b) renda mensal nunca inferior ao salário mínimo; c) correção de todos os
salários de contribuição utilizados para o cálculo da renda mensal do benefício; d) preservação
do valor real dos benefícios (STF, AgRg no RE 322348/SC – impõe somente irredutibilidade
nominal); e) vedação de filiação ao RGPS, na qualidade de segurado facultativo, de pessoa
filiada a regime próprio de previdência; f) gratificação natalina para aposentados e
pensionistas; g) aposentadoria por tempo de contribuição e idade (EC20/98 excluiu a
aposentadoria proporcional); h) contagem recíproca do tempo de serviço/tempo de
contribuição para fins de aposentadoria; i) cobertura do risco de acidente do trabalho; j)
225
incorporação dos ganhos habituais do empregado; k) sistema de inclusão previdenciária para
trabalhadores de baixa renda (EC 47/05).
Insta anotar no tocante à Previdência Social, ainda, a presença marcante do princípio
da responsabilidade, cujo núcleo essencial impõe a todos agir de modo que as consequências
das nossas decisões presentes sejam compatíveis com uma futura existência humanamente
digna. Como corolário, ressai o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial que aponta para
uma necessária correlação entre os benefícios e serviços da previdência social, como sistema
de seguro, e as respectivas fontes de custeio, em ordem a lhe garantir continuidade e certeza
de longo alcance.
No âmbito da previdência social e dos direitos sociais de caráter prestacional (v.g.,
saúde, educação), o princípio da reserva do financeiramente possível impõe ao Poder Público
“escolhas trágicas” e prioritárias na alocação dos recursos públicos com vistas à satisfação do
mínimo existencial. Sarmento leciona que a reserva do possível desdobra-se em dois
componentes: fático (efetiva disponibilidade de recursos) e jurídico (previsão orçamentária
para o custeio). Segundo o autor, em razão do princípio da igualdade, a reserva do possível
fática deve ser concebida com razoabilidade da universalização da prestação exigida,
considerando os recursos efetivamente existentes, não podendo o juiz condenar o Estado a
prestar um direito social que não possa ser estendido às outras pessoas que estejam em
situação equivalente.
O artigo 195, §5º da CF/88 estabelece que “nenhum benefício ou serviço da
seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de
custeio total”. A Lei Complementar nº. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) no seu art. 24
repete o artigo supracitado da Constituição e previu no seu art. 17 as medidas de
compensação, ou seja, as condições sobre as despesas obrigatórias de caráter continuado. O
§1º do art. 24 da LRF dispõe os casos em que não serão exigidas as medida de compensação
do art. 17: a) concessão de benefício para pessoas que satisfaçam as condições previstas na
legislação correspondente; b) expansão quantitativa do atendimento dos serviços prestados; c)
reajustamento do valor do benefício ou serviço, a fim de preservar seu valor real.
Por fim, impende registrar que na previdência básica – RGPS, tanto os valores das
contribuições dos segurados como os das prestações (benefícios) têm limite máximo a ser
observado. A justificativa para tais limites decorre da natureza eminentemente alimentar do
benefício previdenciário básico. Qualquer complementação fica a cargo do próprio
beneficiário, podendo recorrer à previdência complementar, não assumindo o Estado
responsabilidade pela manutenção do padrão remuneratório do qual gozava o mesmo
enquanto em atividade laboral.
A referida previdência complementar, prevista no art. 202 da CRFB, apresenta as
seguintes características: caráter complementar; autonomia em relação ao RGPS;
facultatividade de adesão; operado por Entidades de Previdência Complementar; baseado
na constituição de reservas que garantam os planos oferecidos.
Assistência Social
A assistência social é prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social (art. 203 da CF/88), não consistindo, assim, em seguro social.
Visa a proteger a família, maternidade, adolescência e velhice; amparar as crianças e
adolescentes carentes; promover a integração ao mercado de trabalho; a habilitação e a
reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e promover sua integração à vida
comunitária; garantir um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso
que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família.
Ademais, a assistência social realiza-se de forma integrada às políticas setoriais,
visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de
condições para atender contingências sociais e à universalização dos direitos sociais.
226
Conforme prevê a CF, as ações governamentais na área da assistência social serão
realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, além de outras fontes, e
organizadas com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-administrativa,
cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos
respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e
de assistência social; II - participação da população, por meio de organizações representativas,
na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis, o que representa mais
uma oportunidade tópica de participação popular na administração pública prevista no bojo
constitucional.
Dentre as diversas ações da assistência social, uma se destaca com maior importância:
o benefício de prestação continuada – BPC, que é pago ao idoso ou pessoa com deficiência
que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, desde que a renda
familiar per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo.
Por fim, é facultado aos estados e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à
inclusão e promoção social até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida,
vedada a aplicação desses recursos no pagamento de: I - despesas com pessoal e encargos
sociais; II - serviço da dívida; III - qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente
aos investimentos ou ações apoiados.
19C. Direito à Saúde. Sistema Único de Saúde na Constituição. Controle Social. O Direito de
Acesso às Prestações Sanitárias
Direito à saúde. A constitucionalização do direito sanitário na atual Carta Magna possui duas
características principais: o reconhecimento do direito à saúde como direito fundamental e a
definição dos princípios que regem a política pública da saúde. A caracterização da saúde
como direito fundamental ocorre pela primeira vez na história constitucional brasileira,
acarretando uma série de consequências: a) abre-se o caminho para que todos os cidadãos
brasileiros possam dela usufruir tendo em vista que a saúde passa a constituir um direito
público subjetivo que é garantido pela existência do SUS; b) direito à saúde como cláusula
pétrea da Constituição: o direito à saúde, além de fundamental, é condicionante da dignidade
da pessoa humana; c) direito à saúde como valor: os direitos fundamentais reconhecidos pela
Constituição possuem não apenas uma dimensão subjetiva, atribuindo direitos aos cidadãos,
mas também uma dimensão objetiva, na qual se estabelecem os valores ou bens jurídicos
principais que devem ser objeto de proteção pelo Estado e pela sociedade. O direito à saúde
possui faceta individual e difusa, pois há o direito difuso de todos de viver em um ambiente
sadio, sem risco de epidemias ou outros malefícios à saúde. Por isso, determina a Constituição
de 1988 que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais
e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros gravames e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Sistema Único de Saúde – SUS. Logo após a entrada em vigor da CF, foi aprovada a Lei
Orgânica do SUS (Lei nº 8.080/90), que estabelece a estrutura e o modelo operacional do SUS,
propondo a sua forma de organização e de funcionamento. O SUS é concebido como o
conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais,
estaduais e municipais, da Administração direta e indireta. A iniciativa privada poderá
participar do SUS em caráter complementar. É um Sistema Único, porque segue a mesma
doutrina e os mesmos princípios organizativos em todo o território nacional, sob a
responsabilidade das três esferas autônomas de governo. O SUS não é um serviço ou uma
instituição, mas um Sistema, que significa um conjunto de unidades, de serviços e ações que
interagem para um fim comum. O art. 7º da mesma Lei preconiza os princípios e as diretrizes
do SUS. São princípios doutrinários do SUS: A UNIVERSALIDADE consiste na garantia de acesso
227
de toda e qualquer pessoa a todo e qualquer serviço de saúde, seja ele público ou contratado
pelo Poder Público. A EQÜIDADE é a garantia de acesso de qualquer pessoa, em igualdade de
condições, aos diferentes níveis de complexidade do Sistema, de acordo com a necessidade
que o caso requeira. A INTEGRALIDADE refere-se tanto ao homem quanto ao Sistema de
Saúde, reconhecendo que cada qual se constitui numa totalidade. Segundo os princípios da
REGIONALIZAÇÃO e da HIERARQUIZAÇÃO, as ações e os serviços de saúde devem ser
organizados em níveis de complexidade tecnológica crescente dispostos numa área geográfica
delimitada e com definição da população a ser atendida. A RESOLUTIVIDADE é a exigência de
que, quando um indivíduo busca o atendimento ou quando surge um problema de impacto
coletivo sobre a saúde, o serviço correspondente esteja capacitado para enfrentá-lo e resolvê-
lo até o nível de sua competência. A DESCENTRALIZAÇÃO é entendida como a redistribuição do
poder decisório, dos recursos e das competências quanto às ações e aos serviços de saúde
entre os vários níveis de governo. A PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS é a garantia constitucional
de que a população, através de suas entidades representativas, participará do processo de
formulação das políticas de saúde e do controle de sua execução, em todos os níveis, desde o
federal até o local. Essa participação deve se dar nos Conselhos de Saúde e nas Conferências
de Saúde. Segundo o princípio da COMPLEMENTARIDADE DO SETOR PRIVADO, a Constituição
definiu que, quando, por insuficiência do setor público, for necessária a contratação de
serviços privados, esta deve dar-se sob três condições: a) o contrato deverá ser celebrado
conforme as normas de direito público; b) a instituição privada deverá estar de acordo com os
princípios básicos e com as normas técnicas do SUS; c) a integração dos serviços privados
deverá se dar na mesma lógica do SUS, em termos de posição definida na rede regionalizada e
hierarquizada dos serviços. Entre os serviços privados, devem ter preferência os serviços não
lucrativos, conforme determina a Constituição.
228
O direito de acesso às prestações sanitárias. É dever do Estado garantir a saúde (Art. 196 e
ss. da CF/88). A saúde é um bem de interesse social vinculado aos interesses primários da
sociedade. A sua prestação tem como sujeito ativo todos os cidadãos brasileiros e como sujeito
passivo o Poder Público. Além disto, é de interesse público secundário a sua administração. A
escassez de recursos financeiros e a reserva do possível. A doutrina da reserva do possível
condiciona o reconhecimento (em verdade, efetivação) dos direitos subjetivos a prestações à
disponibilidade dos recursos públicos. Logo, faz-se o possível dentro dos limites orçamentários.
O posicionamento do Ministério Público restou firmado no Simpósio sobre Política Nacional de
Saúde: “O MP não admite qualquer postura do gestor que busque flexibilizar direitos previstos
na Constituição Federal. Quando todos os entes públicos, das três esferas da federação
estiverem cumprindo a EC-29 (determina a aplicação de recursos mínimos em saúde), o MP
poderá estar aberto à discussão da ideia de equidade”. Para BARROSO, nos últimos anos, a
Constituição conquistou, verdadeiramente, força normativa e efetividade. A jurisprudência
acerca do direito à saúde e ao fornecimento de medicamentos é um exemplo emblemático
disso. Para o autor, o Judiciário não pode ser menos do que deve ser, deixando de tutelar
direitos fundamentais. De outra parte, não deve querer ser mais do que pode ser, presumindo
demais de si mesmo e, a pretexto de promover os direitos fundamentais de uns, causar grave
lesão a direitos da mesma natureza de tantos outros. A atividade judicial deve guardar
parcimônia e, sobretudo, procurar respeitar o conjunto de opções legislativas e administrativas
formuladas acerca da matéria pelos órgãos institucionais competentes. Em suma: onde não
haja lei ou ação administrativa implementando a Constituição, deve o Judiciário agir. Havendo
lei e atos administrativos, e não sendo devidamente cumpridos, devem os juízes e tribunais
igualmente intervir. Porém, havendo lei e atos administrativos implementando a Constituição
e sendo regularmente aplicados, eventual interferência judicial deve ter a marca da
autocontenção. O autor traça parâmetros para racionalizar e uniformizar a atuação judicial no
fornecimento de medicamentos: i) no âmbito das ações individuais, a atuação jurisdicional
deve ater-se a efetivar a dispensação dos medicamentos constantes das listas elaboradas pelos
entes federativos; ii) a alteração da lista pode ser objeto de discussão no âmbito de ações
coletivas ou mesmo por meio de ações abstratas de controle de constitucionalidade, nas quais
se venha a discutir a validade de alocações orçamentárias e exigirá um exame do contexto
geral das políticas públicas discutidas, produzindo efeitos erga omnes. Nesses casos, o
Judiciário ii.a) só pode determinar a inclusão, em lista, de medicamentos de eficácia
comprovada, excluindo-se os experimentais e os alternativos; ii.b) deverá optar por
substâncias disponíveis no Brasil, dando preferências aqueles conveniados ao SUS; ii.c) deverá
optar pelo medicamento genérico, de menor custo; ii.d) deverá considerar se o medicamento
é indispensável para a manutenção da vida; iii) em relação à legitimidade passiva, o ente
federativo que deve figurar no polo passivo de ação judicial é aquele responsável pela lista da
qual consta o medicamento requerido.
229
entendimento de que o chamamento ao processo não é adequado às ações que tratam de
fornecimento de medicamentos, por ser obstáculo inútil ao cidadão que busca garantir seu
direito fundamental à saúde. REsp 1.203.244-SC, 9/4/2014. Estrangeiros e beneficiários de
assistência social. Os estrangeiros residentes no País são beneficiários da assistência social
prevista no art. 203, V, da CF, uma vez atendidos os requisitos constitucionais e legais. O caso
envolve os preceitos relativos à dignidade humana, à solidariedade social, à erradicação da
pobreza e à assistência aos desamparados. O substrato do conceito de dignidade humana
pode ser decomposto em três elementos: a) valor intrínseco, b) autonomia e c) valor
comunitário. O estrangeiro residente no País, inserido na comunidade, participa do esforço
mútuo, na construção de um propósito comum. Esse laço de irmandade faz-nos, de algum
modo, responsáveis pelo bem de todos, até mesmo daqueles que adotaram o Brasil como
novo lar e fundaram seus alicerces pessoais e sociais nesta terra. Ao lado dos povos indígenas,
o País foi formado por imigrantes, os quais fomentaram o desenvolvimento da nação e
contribuíram para a criação e a consolidação da cultura brasileira. Desde a criação da nação
brasileira, a presença do estrangeiro no País foi incentivada e tolerada. Não seria coerente
com a história estabelecer diferenciação tão somente pela nacionalidade, especialmente
quando a dignidade está em xeque em momento de fragilidade do ser humano — idade
avançada ou algum tipo de deficiência. A óptica veiculada na regra infralegal (Lei 8.742/1993),
ao silenciar quanto aos estrangeiros residentes no País, não se sobrepõe à revelada na CF.
Descabido o argumento de pertinência do princípio da reciprocidade, ou seja, arguir que o
benefício somente poderia ser concedido a estrangeiro originário de país com o qual o Brasil
tenha firmado acordo internacional e que preveja a cobertura da assistência social a brasileiro
que esteja em seu território. O SUS é regido pelo princípio da universalidade. Assim, ao
ingressar no território brasileiro, o estrangeiro tem direito a atendimento médico
pelo SUS, caso precise de assistência de urgência, sem necessidade de reciprocidade para
garantir tal suporte. Em suma, somente o estrangeiro com residência fixa no País pode ser
auxiliado com o benefício assistencial, pois, inserido na sociedade, contribui para a construção
de melhor situação social e econômica da coletividade. Somente o estrangeiro em situação
regular no País, residente, idoso ou portador de necessidades especiais, hipossuficiente em si
mesmo e presente a família pode se dizer beneficiário da assistência em exame. Nessa linha,
os estrangeiros em situação diversa não alcançam a assistência, haja vista o não
atendimento às leis brasileiras, fato que, por si só, demonstra a ausência de noção de
coletividade e de solidariedade a justificar a tutela do Estado. RE 587970/SP, rel. Min. Marco
Aurélio, 20.4.2017. Direito à saúde e dever de o Estado fornecer medicamento. Recurso
extraordinário em que se discute o dever de o Estado fornecer medicamento de alto
custo a portador de doença grave sem condições financeiras para comprá-lo. Marco Aurélio
(relator) propôs a seguinte tese: o reconhecimento do direito individual ao fornecimento, pelo
Estado, de medicamento de alto custo, não incluído em política nacional de medicamentos ou
em programa de medicamentos de dispensação em caráter excepcional, constante de rol dos
aprovados, depende da demonstração da imprescindibilidade (adequação e necessidade), da
impossibilidade de substituição, da incapacidade financeira do enfermo e da falta de
espontaneidade dos membros da família solidária em custeá-lo, respeitadas as disposições
sobre alimentos dos artigos 1.649 a 1.710 do Código Civil e assegurado o direito de regresso.
Roberto Barroso afirmou que, no caso de demanda judicial, o Estado estaria
obrigado a fornecer medicamento incorporado pelo SUS. Em tais circunstâncias, caberia ao
Judiciário apenas efetivar as políticas públicas já formuladas no âmbito do sistema
de saúde. Nessa hipótese, deve-se exigir apenas que o requerente comprove: a necessidade do
fármaco; e a prévia tentativa de sua obtenção pela via administrativa. Já no caso de demanda
judicial por medicamento não incorporado pelo SUS, inclusive de alto custo, o Estado não pode
ser, como regra geral, obrigado a fornecê-lo. Não há sistema de saúde que resista a um
modelo em que todos os remédios, independentemente de seu custo e impacto financeiro,
devam ser oferecidos pelo Estado a todas as pessoas. É preciso racionalizar a judicialização
da saúde, bem como prestigiar as decisões dos órgãos técnicos, conferindo caráter
230
excepcional à dispensação de medicamentos não incluídos na política pública. Para o
deferimento, pelo Poder Judiciário, de determinada prestação de saúde, cinco requisitos
cumulativos devem ser observados: a) a incapacidade financeira de arcar com o custo;
b) a demonstração de que a não incorporação do medicamento não resultou de decisão
expressa dos órgãos competentes; c) a inexistência de substituto terapêutico incorporado
pelo SUS; d) a comprovação de eficácia do medicamento pleiteado à luz da medicina baseada
em evidências; e e) a propositura da demanda necessariamente em face da União, já que a ela
cabe a decisão final sobre a incorporação ou não de medicamentos ao SUS. Propôs,
ainda, a observância de um parâmetro procedimental: a realização de diálogo
interinstitucional entre o Poder Judiciário e os entes ou pessoas com expertise técnica na área
da saúde. Para o ministro Edson Fachin, as tutelas condenatórias visando à dispensa de
medicamento ou tratamento ainda não incorporado à rede pública devem ser,
preferencialmente, pleiteadas em ações coletivas ou coletivizáveis, de forma a conferir-se
máxima eficácia ao comando de universalidade que rege o direito à saúde. A tutela de
prestação individual não coletivizável deve ser excepcional. Julgamento suspenso em virtude
do pedido de vista do ministro Teori Zavascki. RE 566471/RN, rel. min. Marco Aurélio,
julgamento em 28-9-2016.
Sarah Cavalcanti
231
c) atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino. Aqui, é ínsita a ideia de inclusão social;
d) educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade.
Na jurisprudência do STF e STJ predomina o entendimento no sentido da obrigatoriedade de
os municípios oferecerem o ensino infantil, configurando hipótese legítima de controle de
políticas públicas a ingerência do Judiciário nas demandas que pleiteiam a construção de
creches. (RE 410.715-5);
e) garantir o acesso aos níveis mais elevados de ensino, da pesquisa e da criação
artística, segundo a capacidade de cada um;
f) garantir a oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
g) garantir atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por
meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde.
232
planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e
títulos, aos das redes públicas: o reconhecimento econômico deve refletir a relevância da
missão desempenhada. Assim, cabe ao Estado criar um Plano de Carreira e Remuneração do
Magistério para os profissionais do ensino fundamental público, em que se assegure
remuneração condigna e melhoria da qualidade de ensino (Lei nº 9.424/96).
f) Gestão democrática do ensino: busca a concretização da democracia participativa
(art. 1º, pu, CF/88) e do pluralismo.
Ocupações nas escolas: o ato político de ocupação é compatível com o preparo do
indivíduo para o exercício da cidadania (art. 205). Além disso, a interação humana e a
convivência nos movimentos sociais integram os processos formativos que se inserem na
educação. Entretanto, a gestão democrática do ensino impõe que sejam consideradas a
oposição de alunos que desejam o reestabelecimento das aulas. O papel do MP, portanto, é
intervir para a facilitação do diálogo.
g) Garantia do padrão de qualidade;
h) Piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública:
foi criado pela Lei nº 11.738/2008.
SUPERIOR
233
financiará as instituições de ensino público Federal e exercerá, em matéria educacional,
função redistributiva e supletiva. (art. 211, §§ 1º, 2º e 3º CF).
A educação básica tem como fonte adicional a contribuição social do salário educação,
de competência da União, cujas cotas são distribuídas proporcionalmente ao número de
alunos matriculados nas redes públicas de ensino. (art. 212, §§ 5º e 6º)
VII. Casuística
a) cotas raciais: em ADIN que discutia a constitucionalidade das cotas
raciais, STF confirmou a constitucionalidade destas porque permitem que a igualdade
material seja alcançada através de técnica de “justiça distributiva”, onde há a intervenção
do Estado para realocação de bens e oportunidades em benefício de todos (INF 663/STF).
b) cotas nas universidades: o S T J manteve a vaga, na universidade, de uma aluna
negra que fez parte do ensino médio em escola privada devido a bolsa de estudos integral
(quando somente alunos de escola pública teriam acesso às cotas), por se tratar de
situação peculiar que atrairia a proteção do Estado na garantia do direito à educação (STJ,
REsp 1.254.118).
234
emissores das manifestações, priorizando, também, os direitos dos receptores ao amplo
acesso a pontos de vista diversificados. Neste passo, os meios de comunicação social não
podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.
A regulação da imprensa deve preencher as falhas naturais do mercado no ramo da
comunicação social, de modo que o Estado deve fomentar a melhoria da qualidade do debate
público e a inclusão do maior número possível de grupos sociais e pontos de vida distintos no
mercado de ideias (democratização do espaço comunicativo). Sarmento enfatiza que há o risco
de que intervenções estatais resultem não em pluralização do debate público, mas em censura
disfarçada ou favorecimento aos pontos de vista dos governantes. Mas esse risco não autoriza
a adoção de um modelo de absenteísmo estatal, pois devem ser adotados meios de diminuir
abusos. Destaca-se a “fairness doctrine”, que tem origem nos EUA e sustenta que se o Estado
não intervém no mercado livre da imprensa e do fluxo de ideias, muitas vozes nunca terão o
direito de se expressar.
II. A imprensa na Constituição. A liberdade de imprensa garante o bom
funcionamento do regime democrático, pois contribui para a formação da opinião pública
independente e tomada de decisões, na medida em que veicula informações acerca da coisa
pública em todos os seus aspectos, necessárias para o exercício responsável dos direitos de
cidadania, especialmente o voto, bem como possibilita o controle social do poder.
A liberdade de expressão depende da garantia de liberdade de empresa jornalística e
de radiodifusão, porém, a própria CF limita esta liberdade ao dispor que a propriedade de
empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros
natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis
brasileiras e que tenham sede no país, sendo que pelo menos 70% do capital total e do capital
votante deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há
mais de dez anos, os quais exercerão, obrigatoriamente, a gestão das atividades e
estabelecerão o conteúdo da programação. Lei disciplinará a participação de capital
estrangeiro nas referidas empresas e as alterações de controle societário serão comunicadas
ao Congresso Nacional. Ainda, em qualquer meio de comunicação social a responsabilidade
editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada são privativas de
brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos.
Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização
para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens. A não renovação da concessão ou
permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em
votação nominal. O cancelamento da concessão ou permissão, antes de vencido o prazo,
depende de decisão judicial. O prazo da concessão ou permissão será de dez anos para as
emissoras de rádio e de quinze para as de televisão. O Congresso Nacional instituirá, como
seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei.
Distingue-se censura de controle. A censura consiste em exame prévio de conteúdo e
configura instrumento odioso utilizado pelos regimes ditatoriais, não compatível com o regime
democrático, razão pela qual o Constituinte assegurou a liberdade de expressão da atividade
intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de licença, vedada toda
e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. Por outro lado, são admitidos
certos tipos de controle dos meios de comunicação: a) controle administrativo, no sentido de
competir à União exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de
programas de rádio e televisão, bem como a outorga de concessão, permissão e autorização
para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens; o controle judicial (inafastabilidade
da jurisdição); c) controle realizado pelas próprias emissoras ou autorregulação; d) o controle
social.
A CF88 relativizou a autonomia editorial das rádios e televisões, ao estabelecer
princípios que devem observar em sua programação: “preferência a finalidades educativas,
artísticas, culturais e informativas”, “promoção da cultura nacional e regional e estímulo à
produção independente que objetive sua divulgação”, “regionalização da produção cultural,
artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei”, e “respeito aos valores
235
éticos e sociais da família” (art. 221, CF). Tais princípios concretizam a função social da
comunicação e consubstancia direito difuso que pode ser objeto de ACP.
A publicação em veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.
Mas os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagem deverão ser explorados
diretamente pela União ou mediante autorização, concessão ou permissão observado a
complementaridade dos sistemas privado, público e estatal (art. 223, caput). O sistema
público de comunicação é importante para concretizar a liberdade de manifestação do
pensamento de forma dissociada dos programas estatais e da dominação por parte de
interesses privados afetos ao mercado. Assim, o sistema público de comunicação possibilita a
divulgação livre de posições contramajoritárias, em ordem a robustecer o pluralismo e a
diversidade. Neste sentido, a PFDC, por meio da Nota Técnica 7/2016 e de Representação à
PGR para ajuizamento de ADI, considera inconstitucional a Medida Provisória (posteriormente
convertida em Lei) que promoveu alterações na estrutura da Empresa Brasil de Comunicação.
Inconstitucionalidade formal, por ausência de relevância e urgência (art. 62), pois houve
alteração dos contornos de participação social, o que demandaria prévio e amplo debate com
a sociedade civil. Neste aspecto, menciona-se a zona de certeza positiva (presença de
relevância e urgência), a zona cinzenta (dúvida), e a zona de certeza negativa (ausência
patente de relevância e urgência), que foi o caso da MP em questão. Ressaltou-se que a atual
jurisprudência do STF é no sentido de que os vícios formais da MP não são superados com a
sanção e a conversão em lei. Também foi alegada a quebra do princípio da separação dos
poderes, ante a utilização abusiva da função legislativa pelo Poder Executivo, pois a MP é via
inadequada para o caso. No aspecto material, houve violação à liberdade de manifestação de
pensamento e plena liberdade de informação jornalística: “As inúmeras modificações na
estrutura da EBC, notadamente a extinção do Conselho Curador e do mandato do diretor-
presidente, bem demonstram a intenção de enfraquecer a autonomia na formulação da linha
editorial e da programação da emissora, buscando, assim, torná-la mais vulnerável em face do
mercado e, em especial, do Poder Executivo. A existência de um sistema de comunicação
pública, não governamental, no seio do Estado tem por objetivo central assegurar a efetiva
realização da liberdade de manifestação do pensamento, notadamente pela possibilidade de
serem ouvidas outras vozes, além daquelas emitidas pelo Poder e pelo mercado. Retira-se a
possibilidade material de serem veiculadas informações jornalísticas que possam contrariar os
interesses dos governantes, já que não se conta mais com a presença institucionalizada do
Conselho Curador, bem como não há a possibilidade de resistir aos comandos governamentais,
pois os dirigentes são todos demissíveis pela simples vontade dos governantes.”. Também
configurou ofensa ao princípio da complementariedade: art. 223 c/c art. 5o, inciso XIV, da CF:
“A Constituição Federal, para assegurar o pluralismo democrático (artigo 1o), além de
estabelecer diversos princípios e mecanismos institucionais, no capítulo reservado à
Comunicação Social, previu, de forma expressa, a proibição da concentração (artigo 220, § 5o)
e, também, a complementariedade entre os sistemas existentes (privado, estatal e público ).”
Por fim, houve afronta à proibição do retrocesso e lesão ao direito a igualdade com a extinção
do conselho curador e, portanto, de participação da sociedade civil no controle de produção
da informação e na garantia plena da liberdade de expressão sob o viés do direito da
informação.
III. Liberdades públicas, acesso à informação e pluralismo. As principais classificações
do direito de expressão são: (i) Direito de informar, se informar, e ser informado: o direito de
informar tem relação com o direito de ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o
saber, bem como com o direito de antena, em que há possibilidade de repartir, partilhar e
trocar informações. O direito de se informar é garantido a todos, resguardado o sigilo da fonte,
quando necessário ao exercício profissional. O direito de ser informado se refere ao dever do
Estado de dar publicidade aos seus atos e ao dever-poder de informação que recai sobre os
veículos de comunicação em atenção à sua função social; (ii) Direito de crônica, crítica, de
expressão de ideias, de expressão artística. A crônica consiste na narrativa de fatos, enquanto
na liberdade de crítica predomina a contextualização das informações e valoração dos dados,
236
sendo assegurada ainda que desfavorável e em tom contundente. A liberdade de expressão de
ideias consiste em conteúdos mais abstratos e concepções gerais, como teorias, doutrinas,
opiniões. O direito de expressão artística é voltado ao lazer e criação artística, não sendo dado
ao Estado definir o que é arte. Sobre isto, a PFDC, na Nota Técnica 11/2017, concluiu que nas
manifestações artísticas deve ser tomada como parâmetro a figura do “expectador reflexivo”
(e não de uma pessoa que desconhece as formas como a arte se manifesta ou com educação
abrangente). Toda criança ou adolescente terá acesso a diversões e espetáculos públicos e os
responsáveis pelos eventos têm a obrigação de informar ao público, prévia e adequadamente,
sobre a respectiva natureza e faixas etárias a que não se recomende, de forma a permitir a
escolha livre e consciente por parte de pais e responsáveis.
Os limites à liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicações estabelecidos na Constituição são os seguintes: a) a vedação do anonimato
(para assegurar eventual responsabilização posterior; b) a ofensa à honra e à imagem de
terceiros acarretará a possibilidade de direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização; c) o direito de crianças e adolescentes a diversões e espetáculos públicos
adequados à sua faixa etária, mediante indicação da natureza do conteúdo; d) o direito das
pessoas e das famílias de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão
que contrariem os princípios constitucionais, bem como da publicidade de produtos, práticas e
serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente; e) manifestações de caráter
racista ou dirigidas à propagação do ódio, mas muitas vezes é difícil distinguir o discurso de
ódio de uma manifestação que apenas desagrada. Restrições diversas ao direito somente
podem decorrer da ponderação com outros princípios constitucionais fundamentais, mas a
liberdade de expressão ocupa uma “posição de preferência”/“prioridade prima facie”, de
modo que há maior carga argumentativa para afastá-la. Ainda, são suspeitas todas as medidas
que limitem a liberdade de expressão, bem como, dada a proibição da censura, tem-se a
primazia das responsabilidades posteriores pelo exercício eventualmente abusivo (Nota
Técnica 11/2017 PFDC). A liberdade de expressão é essencial para a concretização de outros
direitos fundamentais (metadireito) e há de ser entendida como gênero (direito-mãe), pois
abrange todas as liberdades comunicativas correlatas (de imprensa, manifestação do
pensamento, informação).
Esfera pública e discursividade: O chamado right to communicate (“r2c”) possui duas
facetas: o direito do comunicante e o do recipiente. Ingo Sarlet destaca que as liberdades
comunicativas concretizam a dignidade, na vertente da autonomia e desenvolvimento da
personalidade, bem como, numa dimensão social e política, asseguram a democracia e o
pluralismo político. A propagação e debate de ideias no espaço público confere maior
densidade ao princípio da igualdade, protegendo minorias e concretizando o direito à
diferença. Não há liberdade sem acesso LIVRE à informação: um mundo de homens livres é um
mundo de homens informados que fazem suas opções com consciência. Habermas defende a
democracia deliberativa, privilegiando o debate de ideias em espaço público.
Daí a consagração do direito de resposta, o qual consubstancia, de um lado, tutela
específica dos direitos individuais, oriunda da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas
relações entre particulares (que exige contraditório e ampla defesa), e de outro, tutela do
direito difuso de acesso à verdade (de ser informado). É instrumento de MÍDIA COLABORATIVA
(Gustavo Binenbojm), pois o público é convidado a colaborar com versões e pontos de vista.
Não está limitado à prática de algum ilícito penal/civil pela empresa de comunicação, pois
abrange quaisquer fatos de interesse público. Sarmento faz interpretação sistemática da CF e
adota concepção mais ampla do instituto, que permite o exercício coletivo do direito de
resposta, como um instrumento de pluralização dos meios de comunicação social.
Ainda, Sarmento diz que o Estado deve atuar para promover tanto o pluralismo
externo e interno no âmbito da comunicação social. Pluralismo externo: trata-se não só de
combater a formação de monopólios e oligopólios no âmbito da comunicação de massas (art.
220, §5º, CF), como também de desenvolver uma mídia pública, e ainda fomentar o
surgimento de veículos alternativos, destinados a setores que não têm acesso aos canais
237
tradicionais da comunicação social, abrindo espaço para novas vozes (ex. rádios comunitárias).
Pluralismo interno: Estado deve assegurar que os meios de comunicação de massa se
dediquem ao tratamento de temas de interesse público e que proporcionem cobertura
adequada dos diversos pontos de vista existentes, tal como exigido pela fairness doctrine. A
intervenção do Estado, no que tange à promoção do pluralismo interno, deve ser a posteriori
e submetida a controle social e jurisdicional. Os agentes estatais de fiscalização do
pluralismo da mídia devem gozar de plena independência e o modelo mais apropriado, para
Sarmento, seria de agência reguladora, com representantes de variados setores da
sociedade e atuação limitada por regras claras, que impeçam qualquer tipo de censura e
favorecimento de pontos de vista preferidos pelo governo ou interesses privados (prevenção
de abusos).
O pluralismo político é fundamento constitucional, não se restringe à acepção político-
partidária e alcança todas as concepções e ideias, de sorte que a regulação dos meios de
comunicação de massa, à vista do poder de influência, deve pautar-se pela amplitude do
discurso público. Gustavo Binenbojm entende que o Estado tem o dever de reconhecimento e
promoção de fenômenos como as “rádios comunitárias”, que dão voz a grupos alijados do
debate. É contraditório que o Estado, além de não prover acesso adequado das comunidades
carentes à grande mídia, vede o uso do instrumental por elas mesmas desenvolvido. Destaca a
necessidade de acabar com sua ilegalidade (inconstitucionalidade por omissão).
Jurisprudência do STF: (1) ADPF 130-7/DF: não recepção “in totum” da Lei de
Imprensa, por incompatibilidade material insuperável, sob pena de sufocar todo o pensamento
crítico do país; (2) RE 511961: dispensa de diploma para o exercício profissional do jornalismo,
aplicado o princípio da proporcionalidade; (3) RE 414426: a profissão de músico não está
condicionada ao prévio registro ou licença de entidade de classe, em razão do direito de
expressão artística; (4) ADI 4274 e ADPF 187: liberdade de reunir e expressar-se pela abolição
penal sem que configure alusão criminosa (marcha da maconha); (5) caso Ellwanger: liberdade
de expressão não abrange o discurso de ódio (hate speech, fighting words). Trata-se de hard
case envolvendo publicações antissemitas, cujo conteúdo violou os princípios da dignidade e
igualdade, além de configurar racismo; (6) caso Gerald Thomas (HC 83996): diretor de teatro
foi vaiado e reagiu com ato obsceno. Ordem concedida em HC, pois o ato foi abarcado pela
liberdade de expressão; (7) Caso Jonas Abib (RHC 134682): liberdade religiosa abrange
proselitismo e crítica a outras religiões; (8) RHC 146303: a incitação ao ódio público contra
quaisquer denominações religiosas e seus seguidores não está protegida pela liberdade de
expressão; (9) ADI 485 (biografias): não necessitam de autorização prévia em especial porque a
eficácia horizontal dos direitos fundamentais (caso Luth) veda aos particulares a censura; (10)
ADI 4451 (humor): o rádio e a televisão, por constituírem serviços públicos dependentes de
outorga do Estado, têm o dever de imparcialidade, mas isso não os impede de difundir opinião
contrária. Permitida a trucagem, montagem ou outro recurso de áudio e vídeo que degrade,
ridicularize candidato, partido ou coligação. (11) ADI 2404: classificação indicativa é
meramente informativa, de modo que é inconstitucional a expressão “em horário diverso do
autorizado”, contida no art. 254 do ECA, que tipifica como infração administrativa a
transmissão, via rádio ou televisão, de programação em horário diverso do autorizado. É
legítima a exigência de que as emissoras submetam os programas à análise e classificação pelo
Ministério da Justiça, mas o Poder Público pode apenas recomendar os horários adequados, e
não proibir a exibição. Permanece o dever das emissoras de exibir o aviso de classificação
etária, e não estão livres de responsabilização em caso de abusos; (12) Cabe reclamação contra
decisão judicial que determina retirada de matéria jornalística de blog ou site, por afronta ao
decidido na ADPF 130 (não recepção da lei de imprensa); (13) não cabe reclamação contra
sentença que julgou improcedente pedido de direito de resposta sob o fundamento de que
não houve ofensa, pois necessário o reexame de matéria fática; (14) ADI 2566: é
inconstitucional o dispositivo da Lei nº 9.612/98 que proíbe, nas emissoras de radiodifusão
comunitária, a prática de proselitismo. A liberdade de pensamento inclui o discurso persuasivo
e não apenas a divulgação de informações.
238
Em evento na ESMPU, Deborah Duprat consignou que mesmo as informações tidas
como “falsas” estão abrangidas pela liberdade de expressão. Entende que a expressão “fake
news” é equivocada, pois pensamentos, opiniões e fatos se colocam sempre na perspectiva de
indivíduos ou grupos situados historica e culturalmente, com inúmeras variáveis. Não há certo
e errado. Não deve prosperar a noção de que fatos devem ser verdadeiros e opiniões não
precisariam refletir a verdade, pois tudo está no âmbito da liberdade de expressão. Precisamos
concordar que somos seres discordantes. É contra todos os projetos de lei que existem para
estabelecer limites, punições e regras ao que é dito na internet, ante o efeito
inibidor/silenciador. A internet é espaço para ampliação de ideias e discussões. Teme as
soluções que colocam nas mãos das plataformas privadas a possibilidade de retirar conteúdos
tidos como falsos e odiosos, pois os particulares estão sujeitos a pressões políticas/econômicas
e têm preferências e concepções a respeito do que é ou não falso/odioso. A censura estaria
sendo colocada nas mãos de ente privado. É contra a supressão de qualquer conteúdo da
internet, salvo decisão judicial. É necessário pensar em soluções propositivas e não
repressivas, trabalhar na base da contrainformação, com estímulo a espaços independentes
que façam levantamento de informações. Destacou a lei de acesso à informação, cujo
cumprimento deve ser vigiado pelo MP. Entende que a censura atinge principalmente os
grupos historicamente silenciados, por isso é necessário que a internet seja cada vez mais livre
e de acesso igual.
239
EXPULSÃO DO ESTRANGEIRO CASADO OU EM UNIÃO ESTÁVEL: (a) O óbice à
expulsão, previsto no art. 55, II, ‘b’, L13.445/2017 ("Não se procederá à expulsão quando: lI - o
expulsando: b) tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil, sem discriminação alguma,
reconhecido judicial ou legalmente"), pressupõe verdadeira comunhão de vida, e não simples
relacionamento eventual; (b) "O fato de o expulsando ter sido visitado pela amásia na prisão,
durante certo período, enquanto esteve cumprindo pena, não configura a hipótese [...] a
obstar a expulsão." (HC 80.322 , Min. Sydney Sanches)
UNIÃO HOMOAFETIVA: ADI 4277 e ADPF 132. A despeito de a redação do art. 226,
§6º, tratar de união estável entre homem e mulher, bem como de se conhecer a pretensão do
constituinte de não estender aos pares homoafetivos a proteção conferida à união estável, o
STF reconheceu que pessoas do mesmo sexo podem constituir união estável e, por
conseguinte, fazerem jus aos mesmos direitos conferidos às famílias heterossexuais. Os
principais argumentos foram: a) igualdade entre homo e heterossexuais e liberdade de
manifestar a sexualidade (art. 5º CRFB); b) a família é núcleo de afetividade, que não se
diferencia entre pessoas de diferentes sexualidades; c) o art. 226, §3º, traz norma de inclusão,
que não pode restringir a proteção das famílias homoafetivas. Com base nessa decisão o STJ,
ao decidir o REsp 1183378/RS avançou no tema e entendeu possível o casamento civil entre
pessoas do mesmo sexo, vez que inexiste no ordenamento pátrio qualquer vedação à
habilitação para o casamento de pessoas do mesmo sexo, bem como o mandamento
constitucional de facilitação da União Estável em casamento.
"Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial
significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída,
ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988,
ao utilizar-se da expressão 'família', não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a
formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada
que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade
civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de
concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por 'intimidade e vida
privada' (art. 5º, X). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente
ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma
autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é
conteúdo. Imperiosidade da interpretação não reducionista do conceito de família como
instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da CF de 1988
no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-
cultural. Competência do STF para manter o Texto Magno na posse do seu fundamental
atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual
das pessoas." (ADI 4.277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, 5-5-2011)
DIVÓRCIO: a partir da EC 66/10, o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio,
de forma direta, prescindindo de lapso temporal como requisito.
TRANSFERÊNCIA DE PRESÍDIO: o simples fato de o paciente estar condenado a delitos
tipificados como de gravidade elevada não obstaria, por si só, a possibilidade de ser
transferido para um presídio não distante de sua família, considerada a base da sociedade e
dotada de especial proteção por parte do Estado (CF, art. 226). HC 101540, Rei. Min. Ayres
Britto (lnf . 605).
TUTELA CONSTITUCIONAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE : Sobressai da ordem
social preconizada na CR/88, Capítulo VII, Título VIII, a explícita priorização na proteção da
criança e do adolescente, com a previsão de uma ordem de proteção máxima e especial que
lhes fora atribuída, conforme se constata do caput do art. 226 , "A Família, base da sociedade ,
tem especial proteção do Estado" combinado com o art. 227, §3º: "É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o
direito à vida, à saúde, à alimentação , à educação , ao laser, à profissionalização , à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação , exploração, violência, crueldade e
240
opressão". Tal função garantista da CF deve ser compreendida com a convocação do
metaprincípio da dignidade da pessoa humana, em face da condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento em que se encontram as crianças e adolescentes. Criança é aquela com idade
de até 12 anos incompleta; adolescentes são aqueles com idade de 12 anos completos aos 18.
Excepcionalmente, o ECA aplica-se àqueles que já completaram 18 anos, como na aplicação de
medidas socioeducativas e de proteção, antes do advento dos 21 anos (art. 122, § 5º e STJ HC
27.363) . Dentre os princípios:
Doutrina da protecão integral: Impõe ao Estado, à família e à sociedade, com absoluta
prioridade, assegurar ao jovem, à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade, à convivência comunitária, à proteção contra a negligência, à discriminação, à
exploração, à violência, à crueldade e à opressão;
Princípio do melhor interesse da criança: Impõe o dever de busca da solução que
proporcione maiores benefícios para a criança, adolescente ou jovem. Este princípio foi
argumento decisivo na decisão do STJ sobre a possibilidade de adoção por casal homoafetivo
(REsp 889.852), porquanto atenderia ao melhor interesse da criança. No âmbito da
cooperação jurídica internacional em matéria civil destaca-se a convenção de Haia de 1980
sobre o aspecto civil do seqüestro internacional de crianças, que toma como objetivo
concretizador do melhor interesse da criança o retorno imediato da criança ilicitamente
transferida para qualquer estado contratante (art. 1º). Autoridade central brasileira para o
tema é a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência.
EXPULSÃO DE ESTRANGEIRO COM FILHO BRASILEIRO: "Habeas corpus. Medida
liminar. Expulsão de estrangeiro . Paternidade sobre filho menor impúbere brasileiro nascido
após a prática do delito ensejador do ato de expulsão. O status quaestionis na jurisprudência
do STF. Condições de inexpulsabilidade: dependência econômica ou vínculo socioafetivo .
Considerações em torno do afeto como valor constitucional irradiador de efeitos jurídicos. A
valorização desse novo paradigma como núcleo conformador do conceito de família. A relação
socioafetiva como causa obstativa do poder expulsório do Estado. Dever constitucional do
Estado de proteger a unidade e de preservar a integridade das entidades familiares fundadas
em relações hetero ou homoafetivas. Necessidade de proteção integral e efetiva à criança
e/ou ao adolescente nascidos no Brasil. Plausibilidade jurídica da pretensão cautelar .
Configuração do periculum in mora. Medida cautelar deferida." (HC 114.901-MC, rel. min.
Celso de Mello, decisão monocrática, 26- 11-2012)
ALIENAÇÃO PARENTAL: A Lei 12.318/2010 dispôs sobre a alienação parental.
“Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou
do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham
a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor
ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”.
ADOÇÃO INTERNACIONAL: regulada pelo ECA e pela Convenção Relativa à Proteção e
Cooperação Internacional em Matéria de Adoção Internacional (Dec. n. 3.087/99). Caracteriza-
se como o único modo de colocação em família substituta estrangeira. De acordo com o art.
31 do ECA, trata-se de medida excepcional, sendo preferível a adoção por brasileiro ou
estrangeiro residente no País àquela para fora do Brasil (internacional). Obs. A adoção por
brasileiros residentes no exterior é considerada internacional. No âmbito da cooperação
jurídica internacional, destaca-se a convenção de Haia de 1980, sobre o aspecto civil do
sequestro internacional de crianças, que toma como objetivo concretizador do melhor
interesse da criança, o retorno imediato da criança ilicitamente transferida para qualquer
estado contratante. (art. 1º). A autoridade central brasileira para o tema é a Secretaria Especial
de Direitos Humanos da Presidência.
INIMPUTABILIDADE: Por disposição constitucional os menores de 18 anos são
inimputáveis (art. 228), aplicando-se às crianças que praticam atos equiparados a crimes
medidas de proteção e aos adolescentes medidas de proteção e medidas sócioeducativas.
241
Muito se discute na doutrina se o art. 228 é cláusula pétrea que impediria a redução da
maioridade penal.
18B. Direitos das pessoas portadoras de deficiência. A Convenção da ONU sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo.
A origem dos direitos das pessoas com deficiência compreende quatro fases: a fase da
exclusão, marcada pela intolerância e privação de acesso ao mercado de trabalho, à educação
e ao convívio social (a pessoa com deficiência era vista como um perigo a ser afastado); a fase
da segregação, em que as pessoas com deficiência tinham acesso ao mercado de trabalho, à
educação e à serviços diversos, mas apenas em instituições próprias, em uma espécie de
apartheid; a fase de integração, de cunho assistencialista, marcada pela perspectiva médica e
biológica de que a deficiência era uma “doença a ser curada”, com a inserção social, inclusive
no ensino e mercado de trabalho regular, mas com a adoção de medidas de atendimento
somente em salas exclusivas e atividades específicas; e, por fim, a fase de inclusão, orientada
pelo paradigma dos direitos humanos, em que emerge o direito à participação igualitária em
todos os aspectos, com a adoção de medidas para eliminar obstáculos e barreiras culturais,
físicas e sociais. Desse modo, tendo em vista a virada paradigmática, não se fala mais em
pessoa portadora de deficiência, mas em pessoa com deficiência, pois o termo “portador”
remete a ideia de enfermidade.
242
No âmbito constitucional, vale citar o dispositivo que proíbe qualquer discriminação
no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência (CF, art. 7º, XXXI),
bem como a previsão de que a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para
as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão (art. 37, VIII).
Ainda, é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
cuidar da garantia das pessoas portadoras de deficiência. Por fim, compete à União, aos
Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre proteção e integração social das
pessoas portadoras de deficiência.
Ainda, é possível a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria às pessoas com deficiência, seja pelo regime geral (RGPS) ou próprio (RPPS) de
previdência social, nos termos definidos em leis complementares. O art. 100, § 2º, estabelece
preferência no pagamento de precatórios de natureza alimentar cujos titulares sejam pessoas
com deficiência.
Ademais, a assistência social tem como objetivos, entre outros, a habilitação e
reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida
comunitária, bem como a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa com
deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou
de tê-la provida por sua família (LOAS).
No tocante à educação, o constituinte consignou o dever do Estado de garantir
atendimento educacional especializado às pessoas deficiência, preferencialmente na rede
regular de ensino, bem como a criação de programas de prevenção e atendimento
especializado, a integração social mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a
facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos
arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. A CF também incumbiu o legislador
infraconstitucional da elaboração de normas deconstrução e adaptação dos logradouros e dos
edifícios de uso público e dos veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso
adequado.
No âmbito infraconstitucional, vale destacar: a Lei 7.853/89, que criou a
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa com Deficiência – CORDE; o Decreto
3.298/99 que regulamentou a Política Nacional para a Integração da Pessoa com Deficiência; a
Lei 8.112/90, que reservou 20% das vagas de concurso público às pessoas com deficiência,
desde que as atribuições do cargo postulado sejam compatíveis; a Lei 8.213/91 trouxe a
obrigatoriedade de empresas a partir de 100 empregados preencherem percentuais de seus
cargos com beneficiários reabilitados e pessoas com deficiência habilitadas; a Lei 8.749/93
regulamenta o benefício assistencial de prestação continuada ao deficiente e ao idoso (LOAS);
a Lei 8.899/94 dispõe sobre a concessão de passe livre às pessoas com deficiência no
transporte coletivo interestadual e é regulamentada pelo Decreto 3.691/00; a Lei 9.394/96, ao
regulamentar a educação especial, atentou para currículos, métodos, técnicas e recursos
educativos específicos, bem como professores especializados e capacitados para a integração
dos educandos com deficiências nas classes comuns; a Lei 10.098/00 trouxe critérios básicos
para a promoção da acessibilidade, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias
e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma dos edifícios e nos meios de
transporte e de comunicação; a Lei 10.216/01 regulamenta a proteção e os direitos das
pessoas com transtornos mentais, redimensionando o modelo de assistência à saúde mental
no Brasil; a Lei 12.764/2012 instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos de Pessoa
com Transtorno do Espectro Autista. O uso da expressão “espectro autista” busca eliminar o
termo pejorativo “autista” e autoriza abranger outras síndromes; a Lei 13.146/2015, conhecida
como Lei Brasileira de Inclusão (inspirada pela Convenção da ONU); e a Lei nº 13.409/2016,
que alterou a lei de cotas no ensino técnico e superior, para prever reserva de vagas às
pessoas com deficiência.
A Organização das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência (2007), internalizada pelo Decreto 6949/2009, reconhecendo que todas as
pessoas devem ter a oportunidade de alcançar de forma plena o seu potencial, ante a
243
superação do modelo médico pelo paradigma de direitos humanos. A Convenção e seu
Protocolo Facultativo foram os primeiros tratados internacionais de direitos humanos
aprovados nos termos do art. 5º, §3º, da CR/88 (rito das emendas constitucionais) de modo
que integram o bloco de constitucionalidade.
O texto da Convenção dispõe que pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdades de condições com as demais pessoas. Trouxe o conceito de “discriminação por
motivo de deficiência”, que significa qualquer diferenciação, exclusão ou restrição baseada
em deficiência, com o propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o
desfrute ou o exercício, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os
direitos humanos e liberdades fundamentais nos âmbitos político, econômico, social, cultural,
civil ou qualquer outro. Abrange todas as formas de discriminação, inclusive a recusa de
“adaptação razoável” (right to accommodation), a qual diz respeito às modificações e os
ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido,
quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam
gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais. A adaptação razoável deve ser produto de um processo
de diálogo entre os envolvidos e nunca ser imposta de forma unilateral. O ônus será indevido,
em síntese, quando a adaptação amesquinhar desproporcionalmente o objetivo da medida,
ensejando riscos à segurança, saúde, bem estar, etc., e/ou for muito custosa, mas a análise de
custos e benefícios não se restringe aos aspectos financeiros e não se esgota nos sujeitos ativo
e passivo especificamente implicados. Ainda, a convenção traz o conceito de “desenho
universal”, que significa a concepção de produtos, ambientes, programas e serviços a serem
usados, na maior medida possível, por todas as pessoas, sem necessidade de adaptação ou
projeto específico, mas não excluirá as ajudas técnicas para grupos específicos de pessoas com
deficiência, quando necessárias.
A Convenção contempla a vertente repressiva (proibição de discriminação) e a
vertente promocional (promoção de igualdade), elencando oito princípios gerais: 1) o respeito
pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as próprias
escolhas, e a independência das pessoas; 2) A não-discriminação; 3) A plena e efetiva
participação e inclusão na sociedade; 4) O respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas
com deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade; 5) A igualdade de
oportunidades; 6) A acessibilidade; 7) A igualdade entre o homem e a mulher; e 8) O respeito
pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças
com deficiência de preservar sua identidade. O texto convencional traz uma série de “direitos
básicos”, tais como: reconhecimento igual perante a lei; acesso à justiça; liberdade e segurança
da pessoa; prevenção contra tortura ou tratamentos ou penas cruéis; prevenção contra a
exploração, a violência e o abuso; proteção da integridade da pessoa; liberdade de
movimentação e nacionalidade; vida independente e inclusão na comunidade; mobilidade
pessoal; liberdade de expressão e de opinião e acesso à informação; respeito à privacidade;
respeito pelo lar e pela família; direito à educação; direito à saúde; direito à habilitação e
reabilitação; direito ao trabalho e emprego; direito a um padrão de vida e proteção social
adequados; direito à participação na vida política e pública e o direito à participação na vida
cultural e em recreação, lazer e esporte.
Importante destacar que os Estados Partes reconheceram expressamente que as
mulheres e meninas com deficiência estão sujeitas a múltiplas formas de discriminação
(interseccionalidade dos direitos humanos), e, portanto, tomarão medidas apropriadas para
assegurar-lhes o pleno e igual exercício de todos os direitos e liberdades fundamentais, bem
como estimular o avanço e o empoderamento. Houve, portanto, preocupação extra com as
minorias que também se encaixam no conceito de deficiência e se tornam ainda mais
potenciais alvos de discriminação.
244
Também é prevista a instituição de um órgão fiscalizador do cumprimento, pelos
Estados, dos deveres acordados. Trata-se do Comitê sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência (treaty body), ao qual os Estados Partes deverão apresentar relatórios periódicos. A
cada dois anos, o Comitê submeterá à Assembléia Geral e ao Conselho Econômico e Social um
relatório de suas atividades e poderá fazer sugestões e recomendações gerais baseadas no
exame dos relatórios e nas informações recebidas dos Estados Partes. O Protocolo Facultativo
à Convenção tem por escopo principal a disciplina das questões referentes ao Comitê. Há
menção à competência para receber comunicações de pessoas ou grupos de pessoas, ou em
nome deles, alegando serem vítimas de violação das disposições da Convenção por um Estado
Parte. O Comitê não receberá comunicação referente a qualquer Estado Parte que não seja
signatário do Protocolo. As hipóteses em que o Comitê considerará inadmissível a
comunicação são: a) comunicação for anônima; b) abuso do direito de submeter tais
comunicações ou for incompatível com as disposições da Convenção; c) A mesma matéria já
tenha sido examinada pelo Comitê ou tenha sido ou estiver sendo examinada sob outro
procedimento de investigação ou resolução internacional; d) Não esgotamento dos recursos
internos, salvo demora injustificada ou impossibilidade de solução efetiva; e) A comunicação
estiver precariamente fundamentada ou não suficientemente substanciada; ou f) fatos
ocorridos antes da entrada em vigor do Protocolo para o Estado Parte, salvo se continuaram
ocorrendo após aquela data. O Comitê poderá enviar um pedido para que o Estado Parte tome
as medidas de natureza cautelar que forem necessárias para evitar possíveis danos
irreparáveis à vítima ou às vítimas da violação alegada.
Tendo em vista que o conceito de pessoa com deficiência trazido pela Convenção tem
contornos amplos e genéricos, caracterizando-se como qualquer obstáculo que impeça a igual
vivência em sociedade, a PGR ajuizou ADPF (182), para que fosse reconhecida a não recepção
do retrógrado conceito trazido pelo art. 20, §2º, da Lei 8.742/93 (LOAS), que considerava
pessoa com deficiência aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. O
legislador, posteriormente, alterou o dispositivo e reproduziu o conceito trazido pela
Convenção da ONU. Ante a incorporação do aspecto social para fins de deficiência, no âmbito
da concessão do benefício assistencial de prestação continuada a avaliação deve ser
MODULADA, para abranger não apenas a incapacidade para o trabalho, mas também a
impossibilidade de desfrutar da vida em sociedade de forma livre e igual.
Vale mencionar outrossim, que o Tratado de Marraqueche, com vigor iniciado em
2016, também foi incorporado pelo rito das emendas constitucionais e prevê a facilitação ao
acesso e uso de obras por pessoas com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter
acesso ao texto impresso, mediante a disponibilização de obras em formatos acessíveis. Há
que se destacar, também, a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas
de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (Decreto 3.956), em que o
termo “deficiência” significa restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou
transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida
diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social.
A deficiência é considerada um conceito social (e não simplesmente médico) em
evolução, resultante da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras do ambiente em
que vivem. Na medida em que as sociedades removam essas barreiras culturais, tecnológicas,
físicas e de atitudes, as pessoas com impedimento devem ter asseguradas a sua cidadania. A
Lei 13.146 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) também passou a observar a questão sob o
ponto de vista social, e não mais puramente médico. A grande inovação trazida da lei é a
concessão de plena capacidade civil às pessoas com deficiência. Além disso, o Estatuto da
Pessoa com Deficiência consagrou o princípio do superior interesse da pessoa com deficiência,
modificou o instituto da curatela, além de instituir a tomada de decisão apoiada.
O STF entende pela constitucionalidade e convencionalidade das políticas públicas de
inserção dos portadores de necessidades especiais na sociedade, sendo inoponível a reserva
do possível, por exemplo, para o caso relacionado à inserção de deficientes auditivos que
necessitam de professores especializados em libras (ARE 860.979). Ainda, o STF julgou
245
improcedente a ADI 5.357, que impugnava os art. 28, §1º, e 30, da Lei brasileira de inclusão,
que estabelecem a obrigatoriedade de as escolas privadas promoverem a inserção de pessoas
com deficiência no ensino regular e promoverem as medidas de adaptação necessária sem que
ônus financeiro seja repassado às mensalidades, anuidades e matrículas.
Jurisprudência do STJ:
- as instituições financeiras devem dispensar atendimento prioritário aos deficientes,
mas não há direito à instalação de terminal de autoatendimento para melhor atender às
condições pessoais do autor, se aquele já existente se encontra em conformidade com os
parâmetros legalmente fixados;
- as instituições financeiras devem utilizar o sistema braille nas contratações bancárias
estabelecidas com a pessoa com deficiência visual, a fim de atender ao direito de informação
do consumidor;
- As pessoas com deficiência têm direito a um mínimo das vagas ofertadas em
concurso público; caso a aplicação do referido percentual resulte em número fracionado, este
deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente, desde que respeitado o limite
máximo do percentual legal;
- As reservas de vagas em concursos públicos destinadas às pessoas com deficiência
não pode se restringir àquelas oferecidas por localidade, devendo ser computadas pela
totalidade de vagas oferecidas no certame.
- de acordo com as disposições do Decreto 3298/99, a avaliação da compatibilidade
entre as atribuições do cargo e a deficiência do candidato deve ser feita por equipe
multiprofissional durante o estágio probatório e não no decorrer do concurso público.
- O portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às
vagas reservadas aos deficientes (súmula 377). O portador de surdez unilateral não se qualifica
como pessoa com deficiência para o fim de disputar as vagas reservadas em concursos
públicos (súmula 552).
- é direito do devedor fiduciante a retirada dos aparelhos de adaptação de veículo
automotor (pertenças) para direção por deficiente físico, se anexados ao bem principal em
momento posterior à celebração do contrato fiduciário, quando houver o descumprimento do
pacto e a consequente busca e apreensão do bem;
- é possível o reconhecimento do direito a nova isenção legal de IPI à pessoa com
deficiência, quando comprovado o roubo do veículo anteriormente adquirido.
- o rol de moléstias que defere isenção de IR é taxativo, de modo que não abrange a
surdez por interpretação analógica aos casos de cegueira.
- É cabível ACP que objetiva obrigação de fazer a fim de garantir acessibilidade nos
prédios púbicos ou privados às pessoas com deficiência.
O primeiro precedente da Corte IDH sobre violação de direitos humanos de pessoa
com deficiência mental foi o Caso Ximenes Lopes vs. Brasil, em que se determinou a
elaboração de uma política antimanicomial. Foi a primeira condenação do Brasil na Corte. A
responsabilização derivou de atos cometidos por particulares (clínica privada de saúde que
praticou maus tratos). A Corte entendeu que a “sujeição”, ou seja, qualquer ação que interfira
na capacidade de um paciente tomar decisões ou que restrinja sua liberdade de movimento, é
uma das medidas mais agressivas a que se pode submeter um paciente em tratamento
psiquiátrico, diante do que só pode ser empregada como último recurso e unicamente para
proteger o paciente, o médico ou terceiros. No caso Furlan e familiares vs. Argentina, a Corte
IDH assentou o dever dos Estados de incluir a pessoa com deficiência na sociedade, pois
qualquer pessoa que se encontra em uma situação de vulnerabilidade é titular de uma
proteção especial.
A PFDC editou a Nota Técnica 7/2017, sobre a rede de atenção psicossocial a pessoas
com transtornos mentais. A Lei nº 10.216/2001, que instituiu a Reforma Psiquiátrica, adotou o
paradigma da desinstitucionalização, com incentivo aos tratamentos extrahospitalares. Tal
cenário, aliado à promulgação da Convenção da ONU e da Lei brasileira de inclusão, albergam
um modelo que visa a reinserção psicossocial. Todavia, a realidade demonstra que muitas
246
“comunidades terapêuticas” promovem segregação e praticam “laborterapia”, a qual resulta,
em muitos casos, em tratamento cruel, desumano, degradante e submissão à condição
análoga à escravidão. As pessoas com transtornos decorrentes do uso de álcool e outras
drogas devem ser igualmente beneficiadas com a reforma psiquiátrica, afastando-se a
internação e priorizado o convício, a autonomia e abordagem multidisciplinar, sem medidas
asilares. A proposta de manutenção, financiamento e ampliação de hospitais psiquiátricos e de
custódia segue rumo contrário ao ordenamento constitucional brasileiro.
ÍNDIOS NA CONSTITUIÇÃO (arts. 22, XIV, 49, XVI, 129, V, 210, §2º, 231 e 232 da CR/88;
art. 67 do ADCT): Todas as Constituições de nossa era republicana, ressalvada a omissão da
Constituição de 1891, reconheceram aos índios direitos sobre os territórios por eles habitados.
A Constituição de 88 trata dos índios especialmente nos artigos 231 e 232.
Remoção de grupos indígenas: O art. 231, §5º veda a possibilidade de remoção dos
grupos indígenas, salvo ad referendum do CN, nos casos de catástrofe, epidemia que ponha
em risco a população indígena e interesse da soberania do País. STF: No HC 80.240, julgado em
20.06.2001, com base no art. 231, §5º, decidiu que, se uma CPI tenciona ouvir um índio, deve
fazê-lo na própria área indígena, em hora e dia combinados previamente, na presença de
representantes da FUNAI e de antropólogo especializado. (Gilmar Mendes, fl. 924).
Defesa judicial dos direitos dos índios: Art. 232 define que são legitimados ativamente
os índios, suas comunidades e organizações. Em relação especificamente ao MP, a
Constituição determina ser uma de suas funções institucionais “defender judicialmente os
direitos e interesses das populações indígenas”(CRFB/88, art. 129, V). Além disso, o MP deve
intervir nas ações ajuizadas pelos índios, suas comunidades e organizações em defesa de seus
direitos e interesses (art. 232). Destaca-se que o MP poderá ser Estadual ou Federal, a
depender da matéria tratada e da respectiva competência da Justiça Estadual ou Federal.
Educação: art. 210, §2º, estipula que o ensino fundamental regular será ministrado em
língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas
maternas e processos próprios de aprendizagem. Para Pedro Lenza (obra citada, item 19.10.9),
ambas as línguas (portuguesa e materna) devem ser ensinadas. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação fala em educação bilíngue para índios (art. 78 da Lei 9.364/96). No mesmo sentido, o
Plano Nacional de Educação (aprovado pela Lei 10.172/2001).
INOVAÇÕES CONCEITUAIS DA CR/88: em relação às Constituições anteriores e ao
Estatuto do Índio:
1 - abandono de perspectiva assimilacionista/integracionista, que entendia os índios
como categoria social transitória, fadada ao desaparecimento. Rompendo uma tradição
secular, ela reconheceu ao índios direitos à diferença. Eles já não teriam que ser incorporados
à comunhão nacional, ou serem forçados a assimilar nossa cultura. Suas organizações sociais,
tradições e os seus direitos originários às terras que ocupam, passaram a ser
permanentemente reconhecidos.
2 - superação da figura da tutela através do reconhecimento de sua autodeterminação
e a plena capacidade civil, esvaziando a concepção do Código Civil de 1916 e da Lei específica
de 1973 - Estatuto do Índio, que destinavam a "incapacidade relativa" aos índios. O art. 232 da
247
CF/88 permitiu aos índios, suas comunidades e organizações, a legitimidade para ingressar em
juízo em defesa de seus direitos e interesses.
3 - direitos dos índios sobre suas terras são definidos enquanto direitos originários, isto
é, anterior à criação do próprio Estado; isto decorre do reconhecimento do fato histórico de
que os índios foram os primeiros ocupantes do Brasil.
OCUPAÇÃO TRADICIONAL: 1) “os territórios indígenas, no tratamento que lhes foi dado
pelo novo texto constitucional, são concebidos como espaços indispensáveis ao exercício de
direitos identitários desses grupos étnicos. As noções de etnia/cultura/território são, em larga
medida, indissociáveis”. 2) Constituições dos países capitalistas inscreveram como direito
fundamental o direito de todos serem proprietários (caráter universal e indisponível), o que
diverge do direito de propriedade em si (direito patrimonial). A inversão desses valores tem
sido comum atualmente sendo que, aos índios, “se recusa a ocupação de seus espaços
definitórios, subtraindo-lhes a possibilidade de exercício amplo de seus direitos identitários,
em nome do suposto direito de propriedade”. 3) “Não bastasse a disputa que se estabelece
entre direitos indígenas e direitos de propriedade, há forte incompreensão no que diz respeito
ao que sejam terras tradicionalmente ocupadas”. Vez por outra o conceito resvala para a
imemoriabilidade, e o juiz exige a produção de um laudo arqueológico que evidencie que a
presença indígena no local remonta a tempos pré-colombianos”. “o requisito da
imemorabilidade, no entanto, de há muito foi abandonado. A uma, por sua impossibilidade
lógica. O processo dito colonizador avançou sobre esses territórios, descaracterizando-os. A
duas, porque esse mesmo processo promoveu deslocamentos constantes, e a territorialização
desses povos teve que ser constantemente redefinida. E, a três, porque estamos a tratar de
populações que existem no presente, com perspectivas de vida atuais e futuras, e que não
podem ser condenadas a um imobilismo do passado”
Em resumo: A ocupação tradicional não é caracterizada (a) pela imemorialidade; (b) nem
pela ocupação pré- colombiana; não há laudo arqueológico porque a territorialidade dos povos
indígenas é constantemente redefinida por múltiplos aspectos; desde (a) a ação
(expropriatória) do colonizador (“não há como recuperar Copacabana para os índios”); até (b)
a própria ação dos povos indígenas, com perspectivas de vida atuais e futuras.
O conceito de terras tradicionalmente ocupadas exige uma compreensão narrativa das
vidas dos povos indígenas, que não é mera repetição do passado que as originou, mas
participação num sentido presente da experiência história de sua reafirmação e
transformação. Exige-se laudo antropológico, que permite a compreensão e a tradução
linguístico-cultural das maneiras como o grupo se vê ao longo de sua trajetória existencial,
como vê o mundo e nele se organiza. Esse laudo não é “neutro” ou “objetivo” e deve conferir
“força normativa” ao grupo (Duprat, 2011) Não descaracteriza o animus possidendi dos índios
248
terem sido forçados a se retirar de suas terras (STF, ACO 323/93).
O INDIGENATO é um instituto que, desde 1680, com o Alvará de 01.04, “reservado o
direito dos índios, primários e naturais senhores dela [terra]”; na Lei de Terras – Lei 601/1850,
"Quer da letra, quer do espírito da Lei de 1850, se verifica que essa Lei nem mesmo considera
devolutas as terras possuídas por hordas selvagens estáveis: essas terras são tão particulares
como as possuídas por ocupação legitimável, isto é, originariamente reservadas de devolução,
nos termos do Alvará de 1º de abril de 1680, que as reserva até na concessão das sesmarias;
não há (neste caso) posse a legitimar, há domínio a reconhecer [...]", constitucionalizado em
1934, na CF/67, bens da União, em 88, direitos “originários”. Os territórios indígenas são
propriedade da União e de posse (permanente) privada, mas coletiva, cabendo exclusivamente
aos índios o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos.
USUFRUTO: Usufruto exclusivo quer dizer que não é transferível para qualquer
apropriação individual e que os resultados de qualquer uso ou trabalho será sempre coletivo.
Logo, é possível o uso indireto, como o trabalho alheio ou o contrato que explore riqueza do
território. É vedado o exercício do direito de propriedade (brasileiro) nas terras indígenas,
onde é cogente o direito consuetudinário indígena, que pode permitir apropriação individual
segundo seus costumes (Marés, 1998). “Salvaguardas institucionais” – STF no Caso Raposa
Serra do Sol: o usufruto exclusivo: (a) pode ser relativizado por relevante interesse público da
União em LC; (b) não abrange (b.1) o aproveitamento dos recursos hídricos e potenciais
energéticos (autorização do CN); (b.2) pesquisa e lavra de riquezas minerais (índios têm
participação nos resultados, e idem); (b.3) garimpagem nem faiscação (exige permissão); (c)
Política de Defesa Nacional, cujas ações são implementadas independentemente de consulta
às comunidades e à Funai; idem para as ações das Forças Armadas e a Polícia Federal; (d) não
impede a instalação pela União de equipamentos públicos; (e) em unidade de conservação fica
sob responsabilidade do ICMBio, que administra a UC e deve ouvir as comunidades; nas UC
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admite-se visitantes e pesquisadores não-índios; no restante da área, idem mas administrado
pela Funai; sempre sem cobrança; (f) terras indígenas não podem ser objeto de arrendamento
ou qualquer ato ou negócio que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela
comunidade; (g) são vedadas aos não-índios a caça, pesca, coleta ou agropecuária extrativa.
Terra, usufruto e rendas gozam de imunidade tributária plena. É vedada a ampliação de terra
já demarcada (certamente contra posição do MPF). Direitos às terras são imprescritíveis,
inalienáveis e indisponíveis. É assegurada a participação das UF em todas as etapas do
processo de demarcação.
OBS: Quanto ao aproveitamento dos recursos hídricos e lavra de riquezas minerais (b 1
e 2 do parágrafo acima), o §3º do art. 231 fala “só podem ser efetivados com autorização do
CN, ouvidas as comunidades afetadas”. PGR apresentou parecer na Reclamação nº 14.404
(construção da UHE Belo Monte) com o entendimento de que o CN não pode delegar essa
oitiva das comunidades afetadas. Por isso posicionou-se no sentido de que o Decreto
Legislativo 788/2005 violou o art. 231, §3º da CRFB/88
JURISPRUDÊNCIA: ACO 312 (STF): deferido pedido da FUNAI para declarar a nulidade de
todos os títulos de propriedade rural expedidos pelo Governo do Estado da Bahia para glebas
localizadas dentro da área da Reserva Indígena Caramuru- Catarina-Paraguaçu. Não é
necessária a prova de que as terras foram de fato transferidas pelo Estado da Bahia à União ou
aos índios, pois no Brasil é juridicamente impossível haver disputa por terra indígena, entre
quem quer que seja e os índios. Tão pouco é necessária a demarcação prévia da área para que
o STF decida se é ou não área indígena. Na CF/67, o direito estaria ligado à posse indígena
sobre a terra, fundada no indigenato, teria relação com o ius possessionis e com o ius
possidendi, a abranger a relação material do sujeito com a coisa e o direito de seus titulares a
possuírem-na como seu habitat. O reconhecimento da posse era possível mesmo tendo os
índios saído do local por conta de conflitos com os produtores rurais, pois foi mantido o laço
familiar entre aqueles que saíram e aqueles que ficaram. Entretanto, o Min. Celso de Mello
destacou não estar em jogo conceito de posse ou de domínio no seu sentido civilístico, pois
tratar-se-ia de proteção a um habitat de um povo — em suas acepções física e cultural —, cujo
parâmetro seria constitucional. Apontou não caber indenização ao ocupante de modo
indevido, ainda que com título registrado em cartório, de terra indígena. Seria apenas devido
ressarcimento por benfeitorias, desde que comprovada a boa-fé.
REsp 1.133.648 (STJ): conceito de terras tradicionalmente ocupadas por índios a serem
demarcadas pela União e de imprescritibilidade dos direitos sobre elas surgiu na CR/88 (art.
231,caput e § 4º, da CF/1988). Assim, o Estado qu na década de 1960 promoveu
estabelecimento de colonos em área depois demarcada como terra indígena não é obrigado a
indenizar os colonos.
PET 3388 ED (STF - Raposa Serra do Sol): TEORIA DO FATO INDÍGENA como marco para
caracterizar a titularidade do direito sobre a terra indígena: presença constante e persistente
dos índios na terra pleiteada em 5º de outubro de 1988. Esse critério traria maior segurança
jurídica do que a análise de ocupação imemorial. Entretanto, não protege os índios que
tenham sido expulsos de sua terra por violência ou ilicitude na legitimação de títulos por parte
do Estado. As condições estabelecidas pelo STF fizeram coisa julgada material e não podem ser
questionadas em outros processos relativos à Raposa Serra do Sol, pois estabeleceram as
diretrizes em que o usufruto dos indígenas se compatibiliza com outros direitos
constitucionais. Tais condições não são vinculantes a outros casos. Entretanto, possuem força
argumentativa, pois são o entendimento do STF sobre a interpretação do sistema
constitucional. Exige-se LC para atuação da União em terras demarcadas (art. 231, §6º, CRFB),
mas não para o patrulhamento de fronteiras, a defesa nacional e a conservação ambiental nas
áreas demarcadas. Consulta prévia deve ser respeitada (Convenção 169, OIT), mas aceitação
dos indígenas não é requisito de validade das decisões do Poder Público. Administração de
área de preservação ambiental deve levar em conta interesse dos indígenas, mas também as
exigências da tutela do meio ambiente. Planejamento de operações militares não exige
250
consulta prévia. Impossibilidade de ampliação por revisão administrativa: o procedimento da
demarcação do art. 231 não pode ser usado para ampliar terra indígena, mas esta pode ter sua
área ampliada por outros meios (ex. aquisição de imóveis pela União ou pelos indígenas).
Vedação à autotutela no caso, não podendo a União rever o ato por conveniência ou
discricionariedade, e nem declará-lo nulo por vício, uma vez que sua regularidade formal e
material foi reconhecida pelo STF (OBS: MS 14.987/DF (STJ): possibilidade de revisão de limites
de terras indígenas demarcadas antes da Constituição Federal de 1988). Permitida a
garimpagem e faiscação pelos indígenas, desde que esta fosse caracterizada como forma
tradicional de extrativismo praticada imemorialmente, forma de expressão de sua cultura. A
exploração mineral como atividade econômica, mesmo pelos índios, depende de autorização
da União (CF, arts 176, § 1º, e 231, § 3º). A execução do julgamento não ficou a cargo o STF,
mas sim da Justiça Federal local.
QUESTÕES - ORAL
1. Pode um índio ser professor em escola pública? Precisaria ele de concurso público para
isso?
2. Aponte as diferenças entre o regime de terras indígenas da Constituição da República de
1988 em relação às Constituições de 1934, 1946 e 1967.
3. Comente sobre a decisão do STF no caso Raposa Serra do Sol.
4. Fale sobre as formas de tutela jurídica das terras indígenas previstas no direito
brasileiro.
5. A impossibilidade de revisão de demarcação de terras indígenas é absoluta?
6. Como se dá a exploração econômica em terras indígenas e em terras de comunidades
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tradicionais?
7. Como se insere a questão indígena na Constituição Federal de 1988? Apenas na questão
territorial?
8. Fora dos arts. 231 e 232 da CF há algum dispositivo constitucional dos índios? Qual
dispositivo de políticas públicas fora desses artigos?
9. Multiculturalismo e interculturalidade. Direito à diferença e reconhecimento. Discorra.
O que são aculturados, noque tange aos índigenas? É correto o uso dessa terminologia?
Têm na Convenção 169 da OIT sua fonte internacional principal (no BR, supralegal – RE
466343), mas já há outros documentos internacionais mais avançados, em especial no tocante
às questões indígenas, como a Declaração da ONU e a Declaração Americana (soft law).
O fato de tais documentos tratarem principalmente dos povos indígenas não exclui a
sua aplicação aos outros grupos, havendo uma abertura a todos os grupos culturalmente
diferenciados (art. 1.a da Conv. 169 da OIT e CorteIDH, nos Casos Comunidade Moiwana e
Pueblo Saramaka). Assim, estão abarcados por este conceito os índios, quilombolas, ciganos,
faxinais, ribeirinhos etc.
O ponto central das comunidades tradicionais, a partir de então, passa a ser o direito
ao reconhecimento, ao respeito e à diferença.
São os grupos étnico-raciais (1), segundo critérios de autoatribuição (2), com trajetória
histórica própria, dotados de relações territoriais específicas (3), com presunção de
ancestralidade negra relacionada à opressão histórica sofrida (4).
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dentre outras). Dessa forma, o elemento de fuga é mais um entre outros a serem
considerados. Ademais, embora usualmente se faça referência ao caráter rural da
comunidade quilombola, a falta desse elemento, pura e simplesmente, não é suficiente para
descaracterizá-la.
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Há PEC tramitando para instituir imunidade tributária das terras quilombolas quanto
ao ITR e ao IPTU.
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