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Generos e Sequencias Textuais
Generos e Sequencias Textuais
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l
Kirsten Adamzik
Patrizia Violi
Brian Paltridge
Jean-Michel Adam
Vijay Bhatia
John Swales
lnger Askehave
~E ~
EDITORA UNIVERSIDADE
DE PERNAMBUCO
Dados Internacionais de Catalogação na Publ icação - CIP
Universidade de Pernambuco - Recife
248p .
ISBN : 978-85-7856-009-6
Apresentação, 9
Bernardete Biasi-Rodrigues
Doutora em Lingüística pela Univers idade Federal de Santa Catarina
(UFSC), com estágio pós-doutoral na Eberhard Karls Universiti:it, Tübin-
gen - Alemanha; professora da Universidade Federal do Ceará (UFC);
pesquisadora vincu lada ao Programa de Pós-Gradua ção em Lingüísti-
ca/UFC; coordenadora do Grupo de Pesquisa TRADICE. Desenvolve
pesquisas em Lingüística de Texto, particularmente na área de Análise
de Gêneros, nas perspectivas sincrônica e diacrônica. E-mail: bernar-
dete.biasi @ gmail.com
Em âmbito interna ciona l, o tema tem igua lmente a lcan çado grande
pre stígio, com importantes pontos de debate e o surgimento de inúme -
ros abordagens teórico-metodológicos, dentre os quais vale destacar o
sócio-retórico, a interacionista sociodiscursivo, o sistêmico funciona l e o
bakhtiniono . Se no início (no segundo metade dos anos 80) o foco eram os
gêneros vistos indi vidua lmente (como o artigo de pesquiso), no atualidade,
o ênfase tem sido dado à inter-relação entre gêneros e ao modo como
eles constituem conjuntos de práticos em ambientes sociais específicos . Em
relação ao contexto acadêmico, por exemplo, o literatura tem mostrado
não só como alguns dos principais gêneros se constituem (o exemplo do
artigo, do tese, do resenho), mos também a formo como são implementa-
dos, considerando tanto as práticos sociais e discursivos envolvidos quanto
ao papel dos gêneros ve lados (occ/uded genres , nos pa lavras de John
Swales), * como são exemp los as cortas de aceitação, os solicitações de
financiamento e os pareceres .
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n::,
e dialogais.
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c::r O primeiro capítu lo, de Kirsten Adomzik, sob o título O que é o pes -
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V,
quiso de gêneros textuais orientada pela Pragmática?, aporto reflexões crí-
cu
V,
e
cu
e:: • Termo usado em seu últi mo livro Reseorch genres: explorotion ond opplicotions, pub licado pelo
,cu
~ Cambridge Unive rsi ty Press em 2004 .
ticas sobre o modo como certas abordagens de uma lingüística textual
fundada na Teoria dos Atos de Fala têm praticado a análise de gêneros,
ao tomarem como ponto de partida o ato ilocucionário e o falante, além
de outras dimensões contextuais . Reconhecendo as limitações de diversos
trabalhos que adotam essa perspectiva, as considerações da autora culmi-
nam com a constatação de que a pesquisa de gêneros deve ser ampliada
de modo a contemplar " estruturas comunicativas mais abrangentes e seu
mútuo entrelaçamento" .
.....,
ro
quatro, cinco e seis, um pressuposto da Análise do Discurso de orienta- e:
a,
V,
Para dar ao leitor uma dimensão clara das idéias de Adam, acres-
centamos, no sexto capítulo, um artigo mais recente do autor, intitulado
Uma abordagem textual da argumentação : "esquema", seqüência e frase
periódica, em que ele discute a sua teoria da seqüência argumentativa em
comparação ao modelo de esquema argumentativo de Toulmin e respon-
de a uma série de questionamos que lhe foram feitos por autores diversos
em relação a seu modelo de análise .
1 .,
textuais, além de se defrontar com questões fascinantes que estão longe
de ser respondidas .
EDUPE, 2009
Universidade de Pernambuco - UPE 2009
Copyright @ by Benedito Gomes Bezerra, Bernardete Biasi-Rodrigues e
Mônico Magalhães Cavalcante
Este livro não pode ser reproduzido por qualquer meio sem
autorização do Editor.
Tradutores
Benedito Gomes Bezerra
Bernardete Biasi-Rodrigues
Hans Peter Wieser
Lívia de Lima Mesquita
Maria Erotildes Moreira e Silva
Maria Helenice Aroú;o Costa
Mônico Magalhães Cava/cante
Revisão Geral
Benedito Gomes Bezerro
EDUPE
Av. Agamenon Magalhães, s/ n - Santo Amaro-Recife/ PE -
CEP. 50103-010 - Fone : (81) 3183 3724 - Fax : (81) 3183 3718
Filiada à
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DAS EDITORAS UNIVERSITÁRIAS
l""'"'I
Oque é a pesquisa dos gêneros textuais -o
orientada pela Pragmática r-~
Kirsten Adamzik
15
vez mais, a idéia da "classificação em vários níveis" 2 . Os critérios diferentes
focalizam, cada um , aspectos diferentes, mas igualmente essenciais, deste
complexo fenômeno chamado texto . Nisso é preciso levar em considera -
ção, além das características "externas ao texto", ou seja, pragmáticas,
também a organização lingüística . Não é necessário colocar esses crité-
rios - conforme sua importân cia ou aspectos semelhantes - numa ordem
hierárquica fi xa, pois eles representam dimensões descritivas que se com-
pletam 3.
16
nimo abrangente que incluiu uma multiplicidade colorida de abordagens
que surgiram, entre muitas outras áreas, no âmbito da sociolingüística, das
ciências de comunicação e de mídias, da crítica ideológica e da crítica
à norma (l ingüística). 5 Certamente, essa abertura foi extraordinariamente
fértil para novas questões ou para perguntas longamente negligenciadas,
e para objetos que exigiam novas pesquisas empíricas, mas ela também
colocou a pesquisa diante de uma dificuldade : as categorias tradicionais
de descrição foram pouco adequadas ou até inadequadas à compreen-
são das novas questões. Foi preciso, então, desenvolver novos modelos
teóricos e novos métodos analíticos. Contudo, a discussão abstrata so-
bre teorias, de um lado, e o árduo trabalho empírico, de outro, absorveu
uma parte tão grande de energia dos pesquisadores que, apesar de tudo,
recorreram , muitas vezes, às grades analíticas tradicionais para fazer as
análises concretas . Convém mencionar, como exemplos para isso, os tra-
balhos sobre os códigos "restrito" e "elaborado" na tradição de Bernstein,
as análises das linguagens publicitária, jornalística e política ou o modelo
desenvolvido na Universidade de Freiburg, que aspira a uma tipologia das
constelações conversacionais . Numa boa parte desses estudos, os autores
tentaram combinar novas categorias teóricas com o arsenal trad icional
das teorias com o qual se abordavam fenômenos sintáticos, morfológi-
cos e lexicais . Talvez tenha sido, crucialmente, por causa do crescimento
quantitativo da nova geração acadêmica e da pressão subseqüente da
concorrência que, entre as abordagens de origem pragmática no sentido
amplo que inovaram a teoria e a metodologia, apenas algumas consegui-
ram se estabelecer permanentemente no campo da pesquisa . De fato, é
preciso afirmar que, no fundo, apenas uma escola conseguiu prevalecer
amplamente, considerando -se que sua abordagem analítica, hoje em dia,
aparece com direitos iguais ao lado dos modelos descritivos tradicionais e
é transmitida como conhecimento básico em introduções gerais etc. Assim,
ao lado das categorias tradicionais da análise relacionada ao sistema da
língua, também as "categorias padronizadas" desta escola são aplicadas
nos trabalhos empíricos que analisam os diferentes gêneros textuais e que
se ocupam (entre outras coisas) com a dimensão pragmática . É claro que
5 . Essa situação do pesqu iso é documentado, por exemplo, nos introduções à pragmático de
Sc hlieben-Longe (1975) e Brounroth et oi. (1975).
17
se trata, nessa abordagem , da Teoria dos Atos de Fala . Nesse contexto,
uma avaliação no dicionário de Bussmann (1990, p . 606 ss .) é particular-
mente elucidativa :
Claro que, no fundo, não é muito importante determ inar a qual sub -
discipl ina ob jetos, questões e estudos particulares são atribu ídos . Em nosso
conte xto , o olhar breve à compreensão da Pragmática no passado tem
importância, apenas, na medida em que a lingüística dos gêneros textuais,
que se compreende como comunicativa , comunicativo-funcional ou prag-
mática , recorre, antes de qualquer coisa , às categorias da Teoria dos Atos
de Fala e, desse modo, delimita estreitamente a questão da funcionalidade
V,
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dos textos .6 Isso é surpreendente, antes de tudo , porque, com a Teoria
~ dos Atos de Fala , foi escolhida uma abordagem que, se for adequada de
..'=l
V,
rc alguma maneira, de certo será pouco adequada para tornar descritível
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esta qualidade dos gêneros textuais sobre a qual há uma unanimidade
: ::::)
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V,
c:u
V,
6 . Hei nemann & Vie hweger (1 9 91 : cap . 1.2 .5.) definem a d omínio da "orientação pragm ático"
e
QJ
um pouco mai s a mpla mente, porque incluem abo rdagens re lacionadas a uma concepção da
e: ação que foi proposta pe lo psico logia lingüística do União Soviética ; no enta nto, nessa obro tam -
<QJ
l..::J bém, não é possíve l recon hecer modelos mois elabo rados e mais abrangentes .
18
quase perfeita, isto é, seu condicionamento histórico-social. 7 Em seguida,
os problemas causados por uma análise dos gêneros textuais fe ita (exclu-
sivamente) no âmbito da teoria dos atos de fala será discutida sob quatro
aspectos .
19
análise de validade geral , que se baseia na teoria da ação. Concebidas
como intenções, essas categorias são atribuídas a um falante abstrato e
"ideal" . Nesse procedimento, o falante aparece como um ser que age ra-
cionalmente; e mais ainda , com vistas à formação da teoria, é reduzido a
essa qualidade. Ele é modelado, então, como uma pessoa racional e não
como uma pessoa social, ou seja, como um membro de uma determinada
sociedade . Sem dúvida, o ser humano é, entre outras coisas, também um
ser racional , e, com certeza, suas intenções podem ser representadas , tam-
bém, pelas categorias universais da teoria da ação, mas não é bem esse
aspecto que poderia ser adequado para analisar oportunamente sua ação
como um ser histórico-social - e para ter em conta, também, um estudo
pragmático dos gêneros te xtuais no sentido mais amplo .9
20
neamente, que ela representa a situação menos adequada para compre-
ender os padrões de interação que foram desenvolvidos e influenciados
social e historicamente . A especificidade e a di vergência das economias
comunicativas de sociedades diferentes mostram-se tão mais reveladoras
quanto mais há formas de interação que se afastam da "situa ção comuni-
cativa arquetípica " e quanto mais intensamente ocorrem a divisão de tra -
balho e os outros processos da dife rencia ção soc ial. Como se sabe, uma
diferenciação social desse tipo costuma ser acompanhada de um enorme
crescimento de gêneros textuais específicos . Nesse processo evolucionário,
sobressaem -se, especialmente, os textos transmitidos pelas mídias de mas -
sa, de um lado, e os textos que, de uma maneira ou outra, são ligados às
instituições, de outro lado .
21
tipicamente em outro enquadre de interação, a saber, a doação caritativa .
O " vendedor" apresenta-se como uma pessoa necessitada que pede aju-
da ao cliente potencial. O que se assemelha a esse padrão, nesse aspecto,
são as vendas domiciliares que são realizadas diretamente por ordem de
organizações caritativas.
22
nicativo na venda do produto ou na venda dos textos publicitários, é
preciso que as mercadorias oferecidas, assim como o conteúdo e a
forma do texto publicitário sejam harmonizados, de uma maneira ou
de outra, com a mídia (e vice-versa). Isso explica os tipos diferentes de
publicidade e esclarece a interdependência entre os gêneros textuais da
parte redacional e os da parte publicitária.
l O. Sobre esse ponto, cf. Techtme ier (2000 : cap . 3.2 .).
23
publicidade como um artigo de consumo, o qual foz parte do espírito da
época que caracteriza a "sociedade do prazer" .
24
um potencial descritivo muito maior do que a classificação de uma popu-
lação conforme cinco grupos de idade ou classes sociais. Nesse sentido, é
muito surpreendente que a delimitação das categorias aproximativas que
compreendem, cada uma, uma única qualidade do texto seja considerada
muito satisfatória do ponto de vista teórico-metodológico, e, na qualidade
de um modelo que possa ser aplicado continuamente, é tomada como
base das análises . Seria muito mais urgente investigar intensivamente as
seguintes questões : quais são as subcategorias distintivas de padrões bási-
cos funcionais que devem ser consideradas? Quais são os fatores pragmá-
ticos adicionais que podem ser compreendidos com base em outros crité-
rios tipológicos? E em que sentido pode se pressupor que as subcategorias
e os critérios supostos são válidos e significativos para todas as classes de
texto delimitadas pelo tema, pela área específica de comunicação ou por
qualquer outro princípio de distinção e, desse modo, também para todos
os corpora empiricamente analisáveis?
25
mesmo que a restrição das categorias básicas da teoria dos atos de fala
cumpra exigências teóricas, é certo também que essa delimitação repre-
senta, apenas à primeira vista, um louro sobre o qual é possível deitar.
26
formula-se uma exigência ao objeto de descrição e não uma exigên-
cia à sua compreensão científica: nesse ponto de vista, não deveriam
existir, no mundo empírico, objetos que se encontrassem tanto em uma
quanto na outra ou até entre as categorias . Essa exigência, porém,
não pode ser levantada convenientemente para os objetos das ciências
empíricas e, evidentemente, ela também não é proposta nas ciências
naturais que, nesse contexto, são consultadas freqüentemente como
ideais. Isso significaria, por exemplo, que entre os seres humanos, na
categoria gênero natural, haveria apenas seres masculinos e femininos,
mas nenhum híbrido ou que, na fauna, seria preciso estabelecer a priori
uma categoria própria para cada um dos cruzamentos teoricamente
possíveis entre as espécies, mesmo que esse cruzamento, na realidade,
(quase) nunca ocorra. Todavia, as categorias precisam ser monotípicas
apenas na qualidade de grandezas intelectuais - apenas nesse sentido
trata-se de entidades científicas às quais é possível fazer exigências me-
todológicas .
27
valece há muito tempo . 15 Além disso, nas categorias lingüísticos dos níveis
clássicos de descrição, também, não há nada mais comum que contar
com categorias híbridas no nível sistemático, de um lado (por exemplo, os
afixóides) , e contaminações, ambigüidades, etc. (intencionais ou involun-
tárias) no nível da parole, de outro lado. Em todos esses casos, é comum
considerar como uma vantagem da análise quando ela consegue tornar
explícitas diferentes leituras através de descrições estruturais alternativas ou
mutuamente complementares .
1.2.4. Conclusão
Partindo do fato de que é preciso considerar o recurso às categorias
da Teoria dos Atos de Fala nas anál ises de gêneros textuais que são orien-
tadas pela pragmática como a abordagem atualmente mais proeminente
para a compreensão da funcionalidade dos textos , mostrou-se através de
aspectos centrais a problemática de tal orienta ção. Em resumo , há duas
conclusões : em primeiro lugar, certos pressupostos básicos da Teoria dos
Atos de Fala são pouco adequados para uma análise de gêneros te xtuais
caracterizados como padrões histórico -sociais do comportamento comu-
nicativo ; trata-se, especialmente, da modela ção de um falante ideal como
um se r ra cional, cuja s a ções são orientadas para a finalidade , um ser cujo
enca ixamento concreto no sistema social é abstraído . Em segundo lugar, o
poten cial de uma distinção diferenciada de tipos ilocucionários já faz parte
da teoria clássica dos atos de fala e foi desenvolvido inicialmente por ela .
Esse potencial - que tem que incluir, ao lado do objetivo ilocu cionário (illo-
cutionary point), uma série de outras dimensões - fo i pouco aproveitado e
VI está longe de ser absorvido .
·ro
::::1
.......
X
w
.......
VI
ro
· .::::;
1.3. Elementos da análise de gêneros textuais orientada pela Pragmática
e:::
,w
:::::::, A maneira como foi realizada, no item 2, a ex posi ção das coroe-
c:r
OJ
VI
w 15 . Cf., também, Krouse (2000 : cop. 2 . 1.3 .), que reo iço os divergências nos opin iões sobre o
V,
o rea lidade cogn itivo dos gêneros textuais, mos que, desse modo , to rno mais cloro ainda que o
cü desa cordo nesse ponto nõo se refe re ma is ao "se", mos ao "como" do questão. - Cf. , também ,
e::
<OJ
...::::,
Tech tmeier (2000: co p. l) .
28
terísticas de uma análise de gêneros textuais orientada pela Pragmática
restringiu a discussão quase completamente à situação do debate sobre a
teoria e a metodologia . Nisso, é preciso notar que foi possível chegar a um
consenso apenas no sentido de que o componente ilocucionário/ acional
dos textos deve ser suposto como o critério decisivo . Todavia, discute-se
ainda sobre o número e a lotação das categorias que devem ser consi-
deradas nessa dimensão . Seguindo Heinemann (2000) , quero pressupor,
também , que há um acordo quase unânime a fa vor da abordagem da
classificação em vários níveis, que parte da idéia de que, numa descrição
diferenciadora, é preciso incluir várias dimensões, uma ao lado da outra,
e não ordenadas de modo hierárquico . Acredito igualmente que há pouca
discordância sobre o fato de que é conveniente, com respeito a essas di-
mensões ou níveis te xtuais., considerar fatores conteudístico-temáticos , for-
mais e situacionais também. Todavia, não está bem resolvido, ainda, quais
são os aspectos que a dimensão situacional deve incluir, ou seio , quais
são os outros critérios funcional-pragmáticos que devem ser considerados,
isto é, não existe atualmente uma grade mais ou menos obrigatória para
esses componentes. Nesse sentido, gostaria de concordar com a opinião
de Antas & Tietz (l 997 : VIII) , que afirmam que a discussão teórica , durante
muito tempo , não avançou .
29
Klein (2000) que, com base em estudos específicos, sobretudo de gêneros
textuais da política e das mídias, defende exp ressamente uma ampliação
do inventário das categorias da pesquisa dos gêneros textuais .
30
trar que, num caso concreto, a posição abstrata do falante tem que ser
decomposta, às vezes, em vários níveis, nos quais os falantes agem como
portadores de diferentes papéis sociais . Evidentemente, o problema do fa-
lante abstrato está ligado ao do receptor abstrato, que não é levado em
consideração ou ao qual cabe a tarefa de "decifrar" a intenção do falante
corretamente, mas, naturalmente, os receptores também aparecem com
papéis sociais diferentes - e lidam, em parte, de modo diferente com um
texto (cf. mais detalhes sobre esse ponto também em Hartung, 1997) .
16. Schw ito llo (1994 , p. 19) vê uma dos diferenças entre os modalidades ora l e escrito do língua
no foto de que, no segundo coso, "o significado do texto[ .. .] num certo sentido [é) ' pronto'; ele
tem que ser reproduzido e desco berto pelo leitor" (d., também, o apresen ta ção dessa compara-
ção em Hess-Lüttich, 2000). Não ve jo, no entonto, o necessidade de fazer o suposição de que os
receptores possam lidar (ape nas) dessa maneira com os textos escritos (ou que eles possam fazer
isso somente com textos dessa modalidade) .
31
escolhida de sentido determinará o comportamento futuro e influenciará
- quem sabe - apenas com um grande atraso o conceito cognitivo do pa-
drão comunicativo para o qual essa troca de papéis pode até ser típica; o
que demonstra o papel dos investigadores da polícia ou do se rviço secreto .
Um exemplo da história atual pode ilustrar isso :
VI
ºi'õ
:::,
......,
X Seria possível acrescentar a isso : somente agora muitos compreendem
~
VI
ro com que padrões comunicativos eram confrontados; então , na retrospec-
·;::;
e::
<C:U
ção, eles fazem, também , uma reinterpretação dos padrões . Isso demonstra:
: :::,
0-
0.I
as diferentes atribuições de sentido podem ser o resultado não apenas dos
VI
ClJ diversos papéis sociais e comunicativos, das experiências repetidas de gru-
VI
eClJ
pos determinados - que, como foi mencionado no exemplo, podem causar
e::
<OJ uma profunda desconfiança diante dos portadores de certos papéis sociais
l..!:I
32
- e, naturalmente, de experiências individuais também. Pelo contrário, é con-
veniente esperar que, em tempos diferentes, sentidos diferentes sejam atribuí-
dos a acontecimentos -éomunicativos individuais e que as particularidades de
certos padrões comunicativos sejam reconstruídas, de maneira distinta, nos
diversos momentos da história inteira da interação.
33
dor representa uma relação assimétrica (nomeadamente, "se p ao fazer q,
não segue: q ao fazer p"), ele não é muito adequado paro compreender
intenções ou rendimentos encontrados simultaneamente em gêneros tex-
tuais que se destacam, do ponto de vista pragmático, por particularidades
estranhas e dificilmente compreensíveis.
VI
ro
·w
e::
<QJ
1.3.2. Modo de validade
: ::::,
c::r Ao contrário do termo "padrão de ação te xtual" , a expressão "modo
Q.l
V'I
QJ de validade" de Klein (2000 : seção 3) parece bem adequado paro com-
V'I
e
(l)
preender como "as pretensões, as obrigações e os direitos de emisso res
e::
<(l) e receptores são "associados à produção de textos, especificamente nas
\.:::>
34
instituições e nos gêneros textuais ." "Trata-se da força compromissivo dos
exemplares de um gênero textual" (id . ibid .) e, o que poderia ser acres-
centado, da força compromissivo de certos gêneros textuais também . Isso
se assemelha à quarta dimensão do ato ilocucionário definida por Searle
(1982, p.22) : "diferenças na força ou intensidade pela qual a finalidade
ilocucionária é proferida" (por exemplo, propor alguma coisa versus insistir
em alguma coisa) . Contudo, no trabalho de Searle, trata-se outra vez de
uma determinação que é formulada exclusivamente do ponto de vista do
falante . Nesse caso, ela se refere à questão de quanto o falante quer se
comprometer com alguma coisa . Todavia, o que é muito relevante, do
ponto de vista pragmático, é, antes de tudo, a observação de que o grau
tencionado de validade de um enunciado ou de um gênero textual não
precisa coincidir, necessariamente, com o grau de validade reconstruído
pelo receptor. Klein (2000, p. 37) realça justamente esse ponto quando dá,
como um exemplo para o modo de validade, os textos de uma campanha
eleitoral. Neles, o modo de validade é influenciado
35
Aqui aparece, também, uma oportunidade de fazer uma ligação entre
alguns pontos já discutidos na seção anterior: a questão de como a valida-
de de certos textos ou gêneros textuais se apresenta ao rece ptor depende,
decisivamente, da maneira como ele vê o falante e da relação que há
entre os dois .20 De que maneira isso pode ter efeito nos textos publicitários
mostra muito bem um texto de Androutsopoulos (2000) . O gênero textual
flyer - como uma forma particular de propaganda - se caracteriza por
um modo de validade completamente diferente do modo de validade de
outros textos publicitários, entre outras razões, porque são produzidos por
membros de subculturas . Os papéis do comitente, do desenhista da propa-
ganda (designer) e do divulgador coincidem totalmente (home made flyer)
ou são ocupados por pessoas cuja distância social é muito pequena, visto
que pertencem à mesma rede, como Androutsopoulos diz.
36
Também pertence a esse assunto a questão de quando e quantas vezes eles
têm que se r proferidos . Será que a sauda ção entre um cai xa e um cliente
(que não são familiarizados um com o outro) num supermercado faz par-
te desse pad rão interacional? É possível , é um dever ou uma obrigação
fazer (ou não fazer ou fazer demasiadamente) elogios sem compromisso?
E como se deve reagir? É preciso rejeitá-los ou aceitá-los? 22 Será que é
perm itido fazer "elogios negativos" - como é possível o bservar freqüente -
mente entre os alemães que se distinguem " por uma rela ção fanática para
com a máxima da verdade" (Weinrich , 1986, p . l l )? Quanto é sé rio um
dissenso (exibido com ostenta ção)? 23 É preciso agradecer um convite (por
escrito)? Etc., etc.?
22. Q uanto oos elogios sem compro misso, d. Manes & Wo lfso n (198 1); qua nto à literatu ra sobre
prob lemas que surgem na com unicação intercu ltura l, cf. a bibli ografia de H innenkamp (1994 ).
23. Sobre esse ponto, d ., po r exem plo, Kotthoff (1989) .
24. Sobre esse ponto, cf. Adamz ik (200 1).
37
selhado freqüentemente. 25 Claro que isso não impede certos grupos de
receptores - por exemplo, certamente o grupo alvo principal, os estudantes
- de atribuir a esses textos apenas uma validade bastante delimitada e a
comportar-se conforme essa sua avaliação .
25. Sobre esse ponto, cf. os pormenores em Pieth & Adomzik (1997).
26. Cf. Adomzik (200 l : co p. Ili) .
38
anúncios publicitários para automóveis que as outras pessoas; consultará,
certamente, catálogos dos produtores; terá conversas com vendedores de
automóveis e, eventualmente, com outros donos de automóveis também ;
lerá , ocasionalmente, revistas especializadas e os resultados de testes pu-
blicados; prova velmente, terá que produzir textos para conseguir um crédi -
to ; além disso, será obrigado a assinar um contrato de compra, fazer um
seguro , ler uma parte do manual, etc .
Até onde sei, a proposta mais antiga que leva sistematicamente essas
relações em consideração foi apresentada por Klein (l 99 l ), que, entre
outras coisas, descreveu a complexidade impressionante da rede de gê -
neros textuais em que se baseia o procedimento legislativo . Infelizmente,
essa proposta não foi ainda aproveitada suficientemente . Por isso , o au-
tor ensaiou outra investida (Kl ein, 2000) e ilustra sua abordagem, entre
outras coisas, lançando mão de um gênero te xtual das mídias, a saber,
as telenovelas (soap opera) . Nesse trabalho, ele chama aq uela relação
de " intertextualidade dos gêneros textuais" (Textsorten-lntertextualitéit). É
até possível que o fato de reco rrer ao con ce ito atualmente tão popula r
da intertextualidade possa promover a divulga ção da sua idéia básica,
mas me parece lamentá vel nesse contexto que, desse modo, as relações
paradigmáticas passem para o segundo plano . As teleno velas represen-
tam apenas uma forma de entretenimento na televisão; logo, é preciso
pesqu isar sua particularidade certamente ao considerar também os outros
recursos pelos quais se tenta satisfazer essa necessidade comunicativa . E,
para aproximar-se mais do objetivo mais amplo de fazer uma descri ção da
economia comunicativa de uma sociedade, é preciso considerar, também,
o valor quantitativo e qualitativo que esses gêneros textuais mantêm (para
certos grupos sociais) : quem consome esses gêneros textuais, com qual
freqüência, e como os receptores lidam com esse gênero, isto é, qual é o
papel que esses programas têm para as outras atividades comunicativas
dessas pessoas e qual é o rendimento que deles tiram ? Qual é o enquadre
discursivo a que os receptores associam esses programas? Do seu pon-
to de vista, trata - se de entretenimento, de informa ção, de um meio para
vencer as dificuldades cotidianas , etc.? Aqui se abre, também, um vasto
campo para a pesquisa interdisciplinar.
Todavia, nem é preciso in1c1ar projetos tão abrangentes para des-
cobrir que há novos pontos de partida para uma pesquisa dos gêneros
te xtuais que se orienta pela Pragmática . O que me parece ser essencial
para tal abordagem é libertar-se da fixação em produtos textuais, quer
dizer, da análise de corpora como é geralmente realizada hoje e comple-
mentar esse tipo de pesquisa por investigações sistemáticas com respeito
ao convívio com os gêneros textuais . Nisso, é mister colocar os comuni-
cadores, ou seja, os usuários dos gêneros te xtuais , no centro . Até agora,
isso se fez principalmente com a finalidade de reconstruir conceitos de gê-
neros textuais, o que vale, por exemplo, também para Techtmeier (2000) .
Aprovo explicitamente a opinião dessa autora que afirma ser necessário
recorrer mais freqüentemente a entrevistas e questionários diretos. Ora,
quero ampliar a sua concepção ainda mais, pois, abstraindo-se do fato
de que é útil, certamente , perguntar aos falantes quais sejam as idéias que
associam a certos gêneros te xtuais, parece -me ser aconselhável perguntar-
lhes diretamente quais são os gêneros textuais que usam , quantas vezes e
de que modo os usam, ou seja, desenvolver métodos adequados para a
observação e a análise disso. 27 Aqui também, o aspecto da avalia ção (ou ,
também , a problemática) dos gêneros textuais, isto é, o modo de validade
deve pôr-se em evidência, uma vez que ganhou importância, por assim
dizer, contra a vontade de Techtmeier, já na tentativa de analisar somente
o conhecimento dos padrões .
27 . Ta mbé m a trabal ha de And ra utsapa ulas (2 000 : cap . 2 e 3) ba sei a-se e m da das desse tipa .
28. Aqu i tam bém, cf. a método de An d ro utsopou los (2000) .
40
aqui, há recursos tradicionais suficientes que poderiam ser usados para
pesquisas desse tipo. Apesar disso, os pesquisadores são, pelo menos na
sua própria disciplina, especialistas (insider) e, sendo assim, podem apro-
veitar sua competência em gêneros textuais dessa área . Finalmente, con-
vém chamar a atenção, ma is uma vez, para o fa to de que tal abordagem
é recomendável particularmente para estudos que comparam diferentes
línguas ou culturas . Essa abordagem já é aplicada pelo projeto já mencio-
nado que compara as ciências alemãs e francesas de língua e literatura
(cf. Adamzik, 200 l) e em cujo âmbito já foram apresentados resultados
concretos. Lá, como acima foi exigido teoricamente , escolhe-se uma tarefa
complexa de comunicação como ponto de partida para a investigação de
gêneros textuais relevantes e do seu valor nas culturas supracitadas; trata-
se, nomeadamente, da tarefa de introduzir estudantes iniciantes na ciência .
Um resultado geral dessa pesquisa pode ser formulado assim: no que diz
respeito à língua e à literatura, vistas como objetos específicos de um ramo
do conhecim~-nto que são relevantes, também, para os leigos, observa-se
que os enquadres discursivos, ciência e público, são engrenados, nestas
culturas, em graus diferentes - um resultado que não surpreende muito,
face aos diferentes contextos sócio-históricos . Contudo, a problemática
escolhida tem um alcance maior, na medida em que é possível mostrar
concretamente como se manifesta esse contexto (a inda hoje) por diferen-
ças no valor, na construção e na forma lingüística dos gêneros textuais
científicos .
4. Referências
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1986.
44
N
Odiálogo eletrônico entre a oralidade e a -o
escrita: uma abordagem semiótica'~
Patrizia Violi
O objetivo prin cipa l deste traba lho é investigar os aspectos que ca-
racterizam o e -mail como um gêne ro textual específico, que o tornam uma
form a única de diá logo escrito .
O e-ma il pode ser cons iderado como um subgê nero do gênero tex-
tua l mais gera l da troca episto lar; ce rtamente a prese nta aspectos comuns
com o esquema gera l q ue caracteriza o gên ero , mas também apresenta
diferenças importantes e únicas. Para ilustrar tanto as seme lhanças como
as diferenças, temos q ue prim eiro co nsi derar a form a geral de uma tro -
ca epistolar qua lq uer e então ana lisa r os elementos específicos q ue di s-
tinguem as formas d ife rentes de diálogo escrito, em particu lar, em nosso
caso , a correspondência eletrônica da correspondência reg ul ar.
45
escrito . Mas quais são as d iferenças entre os diálogos orais e escritos, além
do uso de um meio diferente? Elas podem ser reduzidas à oposição escrito
vs oral?
e
OJ pantes, sua acessibilidade mútua (o lhar, gestos, movimentos do corpo
e:::
( OJ
\,.;:) e assim por diante) e sua localiza ção no mesmo lugar e tempo.
46
Quando nos voltamos para os diálogos escritos, tais como as cartas,
vemos que realmente a diferença crucial não é tanto o uso de um meio es -
crito em vez de um falado, mas a situação de elocução alterada . A escrita
separa drasticamente a situação de produ ção da de recepção e introduz
um vácuo entre o emissor e o receptor, entre o tempo e o espaço da escri-
ta, e o tempo e o espaço da leitura .
Primeiro de tudo, nas cartas, o emissor, juntamente com sua localiza- o..
47
ção espacia l e temporal, é inscrito textualmente . É impossível eliminar sua
presença, uma vez que cada carta é escrita por alguém cuja emergência
no texto é inevitável e marcada pela assinatura . A referência à localização
espaço -tempo do emissor, marcada pela dato e localidade em cada corta ,
representa a ancoragem para o desenvolvimento subseqüente do sistema
dêitico de referência.
48
Contudo, seria um erro pensar no e -mail simp lesmente como uma
carta que " leva menos tempo" para chegar. Conforme se afirmou antes,
uma mudança na tecnologia da comunicação implica uma diferente estru-
turação do sistema de comunicação em si mesmo, que, por sua vez, afeta
a estrutura textual e as estratégias de escrita . As transformações técnicas
nunca são apenas técnicas, elas mudam tanto as formas de nossa escrita
como as de nossa interação .
49
acesso recíproco aos seus sistemas comp lexos de fenomenologia corpo -
ral , uma situação que é compartilhada com as cartas, mas também, pelo
menos em parte, com algumas formas de comunicação oral, tais como
co nve rsações ao telefone , em que somente a voz dos falantes é acessível ,
estando ausentes todas as demais dimensões corporais .
50
no ambiente do corre io eletrôn ico pode ser quase imediata , e esse é fre-
qüentemente o caso, quando duas pessoas estão usando o sistema ao
mesmo tempo . Mais uma vez, o que é re leva nte não é saber se esse é
sempre o caso, e determinar qua l o espaço de tempo rea l, mas o fato de
que o e -mail parece induzir à idéia de uma possíve l contem poraneidade .
A lém disso, do ponto de vista tempora l, uma mensagem e sua resposta
fazem parte da mesma ' unidade tempora l' . Isso é verdadeiro mesmo que,
em tempo rea l, ocorra um hiato entre a primeira mensagem e a segunda.
Na verdade, o que eu chamo de uma 'unidade tempora l' não é definido
por uma dimensão de tempo extratextual, mas pe la maneira como o tempo
está inscrito no texto . Desse ponto de vista, o 'agora' do remetente é assu-
m ido como sendo o mesmo 'agora' do destinatário; em outros termos, os
dois tempos de elocução são tomados como coincidentes . Uma situação
como essa está muito mais próxima da conversação ora l que das cartas
escritas . A co -presença em tempo é constitutiva do diá logo ora l, enquanto
sua ausência não apenas é constitutiva das cartas, mas também textua l-
mente inscrita ne las como uma estratégia de escrita . (Em latim, existia um
sistema de tempo verba l, usado somente nas cartas, que mudava o ponto
de referência para o tempo futuro, quando o destinatário estaria lendo a
carta . Este é um exemp lo extremo, mas, mesmo em nossa língua, podemos
en contrar um exemp lo interessante da distância temporal sendo inscrita
nas cartas, embora nem sempre de uma forma tão a ltamente codificada) .
51
Agora a mesma situação seria impossível no e-mail, não porque o
correio eletrônico seja um meio menos sexista, mas porque a seqüência de
textos de um único participante seria provavelmente quase incompreensí-
vel. De fato , um aspecto que caracteriza fortemente as trocas de e -mail é a
a lta freqüência de referências anafóricas entre as mensagens de diferentes
participantes, como por exemplo, uma resposta que somen te diz: "Sim ,
concordo plenamente" . Obviamente uma mensagem assim não pode ser
entendida sem referência a uma mensagem anterior, como é freqüente-
mente o caso em um turno único na conversação . A analogia com o diálo-
go ora l é ainda mais forte no caso, que ocorre com muita freqüência hoje,
da reprodução da mensagem de outra pessoa dentro de sua própria res-
posta. A razão para uma reprodução dessas é obviamente a necessidade
de tornar disponíveis o background conversaciona l e seu tópico . De forma
ba stante interessante , essa reprodução é feita, muitas vezes, pe la simples
cita ção de linhas ou parágrafos da outra mensagem , e a escrita de umas
poucas linha s depois em re sposta ao citado. Nesta forma, a mensagem de
correio eletrônico torna-se uma simulação muito próxima, através de um
meio escrito, de uma interação ora l, com seus turnos conversacionais. Esse
é um exemplo interessante de co mo uma possibi lidade tecnológica pro-
porcio nada pelo meio produz uma nova estrutura textua l e, em algumas
formas, um novo discurso . As características técnicas do sistema permitem
e, ao mesmo tempo , forçam o e -mail a se aproximar de um diá lo go oral.
52
isso não acontece, porque nós podemos ter dúvidas sempre sobre o grau
de intencional idade da ausência de resposta e, portanto, a implicatura
não é necessariamente que existe por parte do outro uma clara recusa a
se comunicar. No e -mail, de fato, há sempre a possibilidade de uma falho
técnica, como havia nos 'velh os tempos' do serviço postal, e essa é, em
parte, o razão de nós esperarmos uma pronta resposta: uma vez que uma
troca de e -mail é considerada parte de uma mesmo unidade temporal, se
tal não acontece, então a inferência plausível é a de que o mensagem foi
perdida . Por isso, algumas vezes, a fim de respeitar a etiqueta do e-mail,
as pessoas mandam de vo lta uma mensagem meramente ' vazio' como
resposta, para dar ciência de seu recebimento ('Recebi sua mensagem,
escreverei de volto assim que for possível'). A função dessas mensagens é
principalmente impedir o imp licatura do silêncio como uma recuso à par-
ticipação na interação.
53
feito, oferecendo uma tecla especial de 'resposta', que a maioria dos sis -
temas tem .
54
Finalmente, a escrita de e-mail é geralmente caracterizada por um
certo 'desleixo ' quanto à ortografia e à pre cisão da digitação, que se com-
bina, pelo lado do leitor, com um grau de tolerância muito alto para a
grafia e os erros d~ d igita ção . O que pode ria ser ina ceitável na carta d igi-
tada não requer correção no fo rmato do e -mail, o que aumenta a natureza
informal de seu estilo . Essa é uma característica interessante, que mostra
muito bem como as restrições técnicas podem afetar a forma da escrita,
induzindo a um novo padrão estilístico. De fato , pelo menos na época do
começo do e -mail, as interfaces entre os usuários não eram totalmente
amigáveis e era difícil e complicado corrigir porções do texto já escrito .
Além disso, antes de os sistemas de edição de e -mail oH-line se tornarem
dispon íve is, a escrita de e-mail era possível apenas enquanto se estava co-
nectado diretamente ao sistema através de um modem . Isso forçava uma
forte redução no tempo de escrita em detrimento do refinamento formal da
men sagem. Agora, essas restrições técnicas são menos relevantes, uma vez
que é possível escrever mensagens como textos regulares e só então entrar
no sistema e enviá-las; apesar disso, o estilo informal com sua alta tole-
rância à imprecisão parece .ter-se tornado uma característica do padrão na
comunicação por e-mail .
55
geralmente segue o que pode ser definido como um 'código' restrito, no
sentido dado por Bernstein .
Contudo, importantes diferen ças em rela ção à intera ção real persis-
tem e não devem ser descartadas . Consideremos, por exemplo, a tomada
de turno. No e-mail, estamos livres para tomar nosso turno sempre que
quisermos . Certamente, há expectativas mais ou menos padrões quanto
ao tempo de resposta, como eu já afirmei antes, mesmo assim, dentro
desse intervalo de tempo, não temos obriga ç_ão prescri tivo de respeitar o
turno, como é o caso na interação face-a-fa ce, em que a tomada de turno
é fortemente regulada . Isso permite considerável liberdade, especialmente
quando estão acontecendo conversa ções entre multi-usuários. Nesse caso,
a diferença em relação às intera ções orais torna-se mais acentuada, visto
que todas as pessoas podem entrar na conversação sem terem de nego-
ci ar seus turnos e, de ce rto mo do, independentemente das interven ções
dos outros parti cipantes. Isso significa que as normas usuais que regulam
co nve rsa ções entre muitos falantes já não são operativas, ou pelo meno s
não da mesma forma que elas o são nas conversa ções , uma vez que nem
sempre fi ca claro quais deveriam ser essas novas no rmas . Uma situa ção
assim pode algumas vezes produzi r rupturas no quadro geral da co muni -
cação, como poderemos ver em um minuto .
56
Justamente por causa das características que mencionei , o e -mail
também pode produzir um efeito muito interessante, oposto ao efeito de
imediato da oralidade, que nós poderíamos chamar um 'efeito de dis-
tanciamento ' . Curiosamente, isso gera lmente acontece quando o e -mail
é usado num ambiente em que não apenas não existe o hiato temporal,
mas também não há a distância espacial, estando os usuários no mesmo
espaço fís ico ou geográfico . Estou pensando no caso mais ou menos fre-
qüente do uso do e -mail por pesquisadores ou funcionários que trabalham
no mesmo espaço físico , geralmente em escritórios, não mais distantes que
un s poucos metros um do outro . Qual é a função do meio nesses casos? E
por que o uso do meio eletrônico em vez da interação face-a-face , quando
isso poderia ser não apenas possível, mas até mais simples? A resposta
não pode ser simplesmente para ganhar tempo ou evitar o deslocamento
físico para outro escritório .
57
o q ue nã o faci lita a comunicação de grupo, mas, ao contrário , induz à
fragmentação do diálogo no tipo de trocas um-a-um o u um-a-todos, mais
centrado no remetente do que na interação.
A lém do mai s, os efeitos qua se expl osivos dessa comunica ção ' insa -
na' são, em último caso, fun ções dos aspectos técnicos do meio . Sendo as-
sim próximo da instantaneidade da comunicação oral, o e-mail geralmente
nos induz a escrever "como nós fa lamos" em maior grau do que o faríamos
numa carta regular, mas, então, tudo fica gravado e nós temos acesso a
todas as mensagens anteriores, uma possibi lidade comp letamente fora de
alcance num diá logo oral rea l.
58
eletrônico uma semiótica não verbal , idealmente ligada a formas mais
diretas e icôn icas de significado. Além disso, eles são necessariamente
inscritos na ordem linear da escrita, diferindo profundamente, portanto, da
comunicação não verba l na conversação regular, em que os sinais corpo-
rais acontecem simultaneamente com a fala . Assim, apesar de os smilies
poderem ter algum tipo de função meta-comunicativa, tal função é muito
diferente da forma como o sistema complexo da semiótica não verbal (que
inclui olhar, expressões faciais, movimentos do corpo, gestos etc.) afeta e
modifica o significado das palavras em diversos contextos .
59
e produz transformações na comunicação, independentemente dos usos
que fazemos dela. Já foi comum o argumento de que a tecnologia era,
em si mesma, neutra , e somente seu uso poderia ser bom ou mau . Discor-
do fortemente de tal argumento : a tecnologia não é jamais neutra , e ela
sempre molda em formas complexas nossa experiência de mundo, nossas
relações, ou nossa própria subjeti vidade, como tentei mostrar no caso mais
restrito e localizado do e -mail .
VI
ro
·w
e:::
<OJ
: ::::,
c:::r
O.J
V,
O.J
V,
o
.._
O.J
.e:::
<O.J
1..!:I
60
rt"\
3.1. Introdução
O interesse atual pela noção de gênero, na pedagogia lingüística,
tem produzido alguns movimentos importantes no ensino e aprendizagem
de língua . Uma importante linh a de influência, nessa área, decorre da
obra de lingüistas e professores de língua que pretenderam aplicar idéias
derivadas da lingüística sistêmico-funciona l à pedagog ia de língua (ver,
por exemplo, Drury e Goll in, 1986; Hammond , 1987; Ca ll aghan e Ro-
thery, 1988; Christie, 1989a, 19896; Jones, Gollin, Drury e Economou,
1989; Macken, Ka lantzis, Kress, Ma rtin, Cope e Rothery, 1989; Martin,
1989; Derewianka, 1990; Drury e Webb, 199 1; Cope e Ka lantzis, 1993) .
61
momento, examinou criticamente as bases da identificação de estágios tex-
tuais no desenvolvimento de noções como estrutura esquemático (Martin,
1989), potencial genérico estrutural (Hasan, 1984, 19890) ou movimentos
e passos (Swa les, 1981, 1990). Este trabalho examina alguns exemplos
de análise de gêneros, com o objeti~o de detectar os critérios utilizados na
identificação de fronteiras textuais nos referidos estudos .
62
em uma série de textos de "encontros comerciais" apresentados por Ha-
san (1989a) confirmou , posteriormente, essa posição . Esse fato é ilustrado
pela análise apresentada na Figura l . Como pode ser visto nessa análise,
a cadeia lexical presente no Texto l ultrapassa as fronteiras dos elementos
estruturais identificados por Hasan . A cadeia referencial no Texto 2 também
oferece um exemplo de itens que vão além das fronteiras dos elemen-
tos estruturais nos textos . O exame dos padrões de coesão lexica l em um
exemplo de aná lise de gêneros apresentado por Bhatia (l 993) igualmente
ilustra esse ponto (ver a Figura 2). Também nessa análise, cada uma das
cadeias lexicais apresentadas estende-se para além das f~onteiras dos ele-
mentos estruturais identificados no texto. Essas análises, por mais simp le s
que sejam, mostram claramente que, ao contrário do que afirma Hasan
(l 978), nem sempre é possível determinar as fronteiras dos elementos es-
truturais presentes nos textos por meio de padrões de coesão, tais como a
coesão lexica l ou a referência.
63
Figura 1: Padrões de coesão e elementos estruturais: encontros comerciais
(conforme HASAN, 1989a)
Texto 2 (Referência)
Elemento es trutura l Te xto Cadeia referen cia l
se C: Por favor, dê-me meia dúzia de
maçãs ve rdes . maçãs ve rdes
1
QC C: Elas são regionai s? elas
Elas parecem muito boa s. ela s
V: Sim, ela s são de Blue Mountains. elas
AS V: Só isso mesmo? isso
C: Só . Obrigada .
-~ Abrevia turas:
ro
:::::i
-+--'
X
SC: so licitação de compro I AS: atendimento da so licita ção I N : negocia ção I A : aquisição do
2 produto I FC: fechamento da com pro/ ve nda I C: cliente I V: ven dedor I QC: questionamento
V"I
ro do cliente.
· ,::;
e::
<Q.J
: ::::,
o-
cu
V'I
OJ
V'I
.....
C)
OJ
e::
<OJ
\..:::1
64
Figura 2: Coesão lexical e elementos estruturais: resumo de artigo de pesquisa
(baseado em FRENCH, 1989; BHATIA, 1993)
Elementoestrutural I Texto Cadeias lexicais
~ Brian Paltridge
3.3. Atributos semânticos e unidades estruturais em textos
Hoson fa la de dois tipos principais de atributos semânticos que podem
ser identificad os através da descrição dos "atributos esse nciais da s 'uni da-
des estruturais importantes' em qua lquer tipo de texto" (Hoson, 1984, p.
83) . Tro ta-se de atributos semânticos nucleares e eloborotivos (ou, como a
autora d iz, de propriedades semânticas). A diferenço entre esses dois atri-
butos é que "é essencia l haver pe lo menos a lgum tipo de se leção dentre as
propriedades nucleares poro o movimento [de um texto], mos [o texto] pode
progredir sem nenhuma se leção das propriedades elaborotivos" (Hosan,
1984, p. 88). A lém d isso, os atri butos nucleares podem ser d ivid idos em
duas categorias: atribu tos cruciais e associados. A diferenço entre atributos
cruciais e associados é que os primeiros precisam estar presentes no ele-
mento estrutura l, enqua nto os últimos "não devem obrigatoriamente estar
presentes, mos freqüentemente estão" (Hosan, 1984, p. 85) . Deste modo,
os atribu tos semânticos nu cl eares sempre ocorrem em uma seção determ i-
nado do texto , os atributos associados não precisam, mos freqüentemente
ocorrem, e os atributos elaborotivos de modo a lgum precisam ocorrer. A
diferença entre todos esses tipos de atributos está sumariado no Figuro 3 .
N ucleores Eloborotivos
(de modo a lgum precisom ocorrer)
66
feita por Hasan (1989a) oferece uma descri ção gera l dos atributos semân-
tico s nu cleares presentes nos elementos " solicita ção de compra " e " ques-
tionamento do cliente " . Essa análise está resum ida na Figura 4 .
67
Figura 5: Atributos semânticos elaborativos do elemento estrutural "questionamento do
cliente" em encontros comerciais (baseado em HASAN, 1989a)
Ques tionam ento do Refe rência à quo lidode do "E les não parecem
C liente prod uto muito mad uros."
Uma aná lise mais deta lhada dos atributos semânticos de elementos
estruturais em textos pode ser encontrada na descri ção que Hasan faz do
elemento " lo ca liza ção" (por exemp lo, " era uma vez ... ") em histórias infan -
ti s (Hasan , 1984) . Aqu i, Hasan examina tanto os atributos nucleares como
o s elaborat ivos desse elemento estrutura l em pa rticu lar, incluindo sentidos
cru cia is e associ ados, bem com o ana li sando em deta lhe suas codificações
léxico-gramaticais .
68
em parágrafos[ .. .] referências metatextuais a seções , ra ciocínios,
argumentos e coisas do tipo. (Martin, 1986 , p. 104)
69
Tabela 1: Atributos semânticos: informação de base
(introdução de artigos de pesquisa)
70
divisões no uso de termos de conteúdo bem amplo, tais como "estabe-
lecendo o campo" e "indicando lacunas". Em estudos de validação de
algumas das análises de Swales, Crookes (l 985, 1986) prefere trabalhar
com definições mais detalhadas dos vários estágios textua is, os quais são
avaliados e então referidos na análise . Contudo, essas definições também
são baseadas no conteúdo e diferem da abordagem de Swales apenas na
quantidade de detalhes fornecidos.
71
pragmática (Leech, 1980, 1983) .
A: O telefone!
B: Estou no banho!
A: Certo!
72
Tentativas de aplicação de critérios lingüísticos para a validação de
perspectivas psicológicas, contudo, não são uma condição necessária para
sustentar abordagens funcionais à descrição da língua e não deveriam ser
vistas como uma ameaça aos postulados ce ntrais dos expoentes de tais
abordagens. Nos termos de Fadar:
3.4. Conclusão
Os analistas de gênero, portanto, pretendendo apresentar explicações
lingü ísticos para as divisões textuais, às vezes são forçados a estabelecer
relação entre o que é e o que não é linguagem, indo além dos limites em
que tal visão seria sustentá vel. Como nota Fadar (l 980), existe um nível
em que é possível a descri ção dos fatos da linguag em (em termos gramati-
cais); além desse nível , torna-se necessário entrar em outras preocupações
teóricas . O que parece claro é que o analista de gêneros precisa se afastar
dos aspectos físicos da linguagem e de como eles reflete m a rea lidade ,
73
passando a ocupar-se da maneira como o texto, tomado g lobalmente, é
condicionado por razões externas . Nas palavras de Todoro v:
VI
ro Todavia , isso não significa que a aná lise de gêneros não seja, ou
·w
e:::
<C.l não deva ser, um emp reendimento lingüístico, ou que não esteja dentro
: ::::>
0-
Q.) do domínio da lingüística. Isso depende, antes, do modo como se define
VI
Q.)
o domínio da li ngüística. Caso se abrace a posi ção de que a lin güística
VI
o
ai diz respeito ao estudo do processamento e uso da linguagem pe los seres
e:::
<(l)
l.!:l humanos, então certamente a análise de gêneros perten ce à lin güística .
74
Contudo, isso não implica necessariamente que tudo que diz respeito ao
uso da linguagem tem a ver com fenômenos textuais observáveis.
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78
v
Textualidade e seqüencialidade: -o
oexemplo da descrição'~
Jean-Michel Adam
Como bem destaca M .-J. Borel (1981 ), logo que se busca caracteri-
zar a narração, a descrição ou a argumentação, surgem, imediatamente,
uma heterogeneidade e uma complex idade que parecem constitutivas do
discurso em língua natura l. A partir do momento em que se procura a uni-
dade, efeitos irruptivos se mu ltip licam a po nto de fazer d issipar-se a be la
ordenação teórica. Diante dessa constatação, podemos ou renunciar, logo
à primeira vista, a toda tentativa tipo lógica, 1 ou delimitar cuidadosamente
um quadro de pesquisa .
79
seqüenciais da discursividade . Em outros termos, trata -se de examinar o
modo como se constitui, a partir de uma seqüência de enunciados - para
um intérprete leitor ou ouvinte -, um efeito de seqüência. Os trabalhos
atuais de psicologia cogniti va , no domín io da compreensão/ produção de
textos confirmam que as operações que orientam a seqüência (ou o tex-
to como uma série de seqüências) são determinadas por esquemas de
reconhecimento mais ou menos codificados e por regras (a precisar) de
encadeamentos de séries (ou seqüências) de enunciados. Resta ao lingüista
dizer se existem ou não tipos de (micro) proposições e de seqüências de
microproposi ções e/ou de macroproposições . O presente artigo versará,
sobretudo, sobre exemplos descritivos .
30
ESQUEMA 1
PRÁTICAS DISCURSIVAS
1
Instituições
& DISCURSO (D)
Formações Imaginários
Gêneros do
Discurso (GD)
INTERAÇÃO (1)
~-------- - ----- -- - --- -- -- --- -- ----- - - --- -------- r--- -- ---- - --- ------- - ----- - ------ - -•
' ' '
' TEXTO (T) ' :
-
DIMENSAO CONF IGURACIONAL (DC)
~ ~ -
DIMENSAO SEQUENCIAL (OS)
..
/\
PRAGMÁTI CA
LINGÜÍSTICA
SEMÂNTICA (S)
Global
~Loco/
1
Estruturo Seqüencio!
A
Super- • Planos Progressão
A Pontuação
Es1ruturo do texto e Repetição Anóforos
(SS) (P de T) conectores
Globo/ Loco/
Mocro- Léxico e lsotopias
Estruturo Rep resenta ções
Discursivos
Universo de Crenças
ARGUMENTATIVO ENUNCIATIVO
~Loco/
Globo/ Globo/
~ Loco/ E
ro
~
Mocrooto Microoto Ancoragem Pio nos cü
de discurso Tro ços de enunciativo de enunciação -=
'-'
(A) arg umen tos (AE) (História/Di scursos) ~1
e::
(conectores) (Dêixis/ Anóforo) Moda lidades ro
QJ
--,
,- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ,
, CAMPO TE Ó RICO DA LINGÜÍSTICA TEXTUAL '
~--- -------- -- --- -- ---- ------------ ------- ------- --------- -- -- ----- ----------- ------ · 81
4.1. Bases de tipologização: as tipologias discursivas
l .O O esquema l permite-nos loca lizar, de um lado, o objeto Texto
no campo teórico da lingüística textual , e, de outro lado, d iferentes bases
de tipo logização . Distingo seis demarca ções tipológicas com suas respec-
tivas bases de tipo logização :
83
formações discursivas (FD) que regram o que pode/ deve se r dito e como
dizê-lo; eles não são, então, lingüísticos e nem podem constituir o objeto
de uma pragmática - eventualmente textual - que tenha a condição de
redefinir o próprio campo (ou o próprio conceito) .
84
discursivização e é inseparável da progressão da sequencia lingüística.
Distinguindo uma enunciação enunciativa global (a ancoragem enunciati-
va) e outra local (os "planos de enunciação"), quero ressaltar os riscos de
um tratamento quantitativo que só atenderia à ancoragem enunciativa (AE)
e nivelaria, assim, um aspecto essencial da textualidade .
85
4.2.1 Limites de tipologias textuais (e)
Para uma tipologia de tipo (e), existem grandes TI POS DE TEXTO.
Citare i, sem justificar aqu i o limitação da enumeração : a NARRAÇÃO,
a DESCRIÇÃO, o ARGUMENTAÇÃO, a EXPOS IÇÃO (com os seus subti-
pos exp licativos e relatos de experiência), a INJUNÇÃO-INSTRUÇÃO, a
CONVERSAÇÃO e o "POEMA'' (ou tipo autotélico -poético) . Nesse nível de
genera li dade - que adotei em meus trabalhos anteriores -, eu me ocuparei
de uma tipolog ia muito g loba l que não leva muito em conta a heteroge-
neidade dos próprios textos.
86
2. Seqüencio/idade descritivo;
3. Seqüencio/idade argumentativo;
4. Seqüencio/idade expositivo -explicativo;
5. Seqüencio/idade in;untivo-instrucionol;
6 . Seqüencio/idade conversocionol;
7. Seqüencio/idade poético-outotélico.
Parece-me que podemos, assim, deslocar o "paradoxo de tipologias"
operando, certamente, um movimento de restrição em direção a um pe-
queno número de seqüencialidades, mas tendo em conta, sobretudo, a
heterogeneidade e o diversidade de possibilidades de textualizoção .
<
Elípticas
T - estrutura seqüencial • n Seq
Completas
87
de continuidade e progressão, distinguindo uma continuidade-progressão
local (Tema-Remo) e uma continuidade-progressão global (seqüencial) . A
primeira dinâmica é teorizável em termos de gramática de texto (quer dizer,
de maneira geral), fora de toda questão de tipologia , enquanto que a se-
gunda não pode escapar a uma tipologização mínima (D .
P de T
> n. seqüência(s) > n. macroproposição(ões) > n.
microproposição(ões)
ss
88
Esses dois aspectos da seqüencialidade não se distinguem tanto por
seu grau de convencionalidade (como escrevi em outro trabalho, afirman-
do que as SS seriam mais convencionais que os P de T) . Um P de T pode
ser completamente convencional ; a diferença ma ior res ide na caracterís-
tica adquirida por uma práxis e memorizada (por isso " profunda") das SS
e na característica dada (por isso mais "superficial" e sujeita a variação
no tempo) dos P de T. É necessário acrescentar que um P de T (mais ou
menos convencional, então) pode muito bem vir a se sobrepor a uma SS
por razões instrucionais-comunicacionais . Numa narração, os planos (da-
dos) só realizam na superfície, a maior parte do tempo, a SSn (canônica e
adquirida de maneira estável desde a idade de 12 anos) . Ao contrário , na
descrição, diferentes tipos de planos, mais ou menos convencionais, levam
em conta a linearização de uma SSd não-linear (tabular como mostrará o
esquema 4).
89
cardinais, os 5 sentidos ou os 5 continentes, etc., mas também a ordem
alfabética e a ordem numérica (o primeiro, o segundo, etc.) . Esses quadros
podem utilizar conectores enumerativos do tipo : inicialmente - em segui-
da - enfim - de uma parle - de outra parte - uns e outros (- outros ainda),
etc.; conectores adversativos : enormes - mínimos - por um lado - por outro
lado, etc. Os planos de textos descritivos mais correntes correspondem a
quatro dimensões :
90
Esquema 2
Superestrutura narrativa (SSn)
Esquema 3
SSn
~
Nível l : História Moral ou Esta do final
~
(PnS)
Nível 3 :
~Acontecimen tos Açã o ou Aval iação
~
(Pn3)
91
pies de C. Simon em seu Discurso de Estocolmo:
92
Confrontada com corpora mais naturalmente complexos, 3 a descri-
ção tipológica seqüencial (f) é levada a introduzir a no ção de estrutura
seqüencial heterogênea com dois novos casos de figura : o inserção de
seqüên cias heterogêneas e o dominância seqüencial da qual falarei mai s
tarde (2 .5 .). No prime iro caso , então, as seqüênc ias de tipos d iferentes se
alternam; ou seja, uma relação de INSERÇÃ0 4 entre seqüência inseridora
e seqüência inserida . O que chamo de exemplo narrativo corresponde à
estrutura (seq . argumentativa (seq. narrativa)) . A presen ça de uma des-
crição num romance corresponde a uma estrutura de tipo (seqüêncio(s)
narrativa(s) (seq . descritiva)). A presença de um diálogo em uma narrativo
obedecerá ao seguinte modelo : (seq. narrativa (seq . conversacional)) e a
presen ça de uma narrativa em uma conversação obedecerá ao caso inver-
so : (seq . conversacional (seq. narrativa)) .
3. Eu ente ndo "n oturo lmente" no se ntid o de língua natural e consi d ero o heterogeneidade E
rc
como a manifestação mais comum do textualidade . Isso levo certos li ngü istas o pensar um -o
<(
pouco apresso domen te que o texto não com porto macro-reg ularidades.
cü
_e:
4 . Prefiro aqui "inse rção" o "e nq uo drome nto" que utilizei anteriormen te, mas que me porece u
lingüisticome nte ma is a mbíguo e proponho manter, se jo po ro designar um fenôme no sin tático ::]E
loco l, se ja poro d istingu ir os fenôme nos de ho mogenei dad e: seqüências de mesmo tipo enco- e:::
rc
aJ
deados ou "enquad rados" ou construídos em para lelo . --.
Fro ntei ra Fro nteira
narrati vo
94
de começar a escalar a aresta (= 11). Eles respiraram longamente (= li),
admiraram (= Ili) a paisagem, (= V) - familiar para o velho, bastante nova
para o jovem (= I), - os Alpes Grées (= V). O dia estava magnífico e se
podia distinguir até o infinito (= IV) em direção ao sul os Alpes (= V) se
sucedendo em andares planos( ... ).
J'y vais une piece-montée que ie peux regarder d'abord par la base
(type VOIR) ou en voyant (=li) /e ma'itre queux (= I) qui a commencé à /ui
(=IV) faire (= Ili) une base, puis la bâtit comme ça .. . (type FAIRE) .
Eu veio um bolo armado que posso obseNar primeiro pela base (tipo E
rc
-i:::,
VER), ou, ao ver (=li) o mestre-cuca (=/) que começou a fazer( = /11)-lhe <
ÕJ
(= IV) uma base, depois a constrói assim ... (tipo FAZER) . ..e:
u
~
e:::
rc
QJ
--,
95
c) Descrição do tipo DIZER:
(2) Os homens (=li) dizem (=Ili): ignição eletrónico integral (=IV). Eu,
por mim, (=li) digo (= Ili) : ele começa a andar sempre num quarto de volta
(= IV). Peça a uma mulher para lhe falar de LNA. . .Tudo se torna simples.
Quando os homens lhes falam disso, eles dizem: Km partida terminada em
41 "1 . Eu digo: é elegante chegar sempre na hora (. .. ).
96
moi . Cadette délaissée , sa parture ne composait que de la dépouil le de ses
soeurs. Qu'on se figure une petite filie maigre, trop grand pour son ôge,
bras dégingandés, air timide, parlant avec difficulté et ne pouvant rien ap -
prendre; qu' on lui mette une robe empruntée à une autre taille que la sien -
ne; renfermez sa poitrine dons un corps piqué dont les pointes lui faisaient
des plaies aux côtés; soutenez son cou par un collier de fer garn i de velour
brun; retroussez ses cheveux sur le haut de sa tête; rattachez-les avec une
toque d ' étoffe noire; et vous verrez la misérab le créature qui me frappa em
rentrant sous le toit paternel. Personne n' aurait soupçonée dons la chétive
Lucile, les talents et la beauté qui devaient un jour briller en elle (Chateau-
briand, Mémoires d' outre -tombe l 3, cité par P. Hamon 198 l , p. l 02) .
(3) Lucila, a quarta de minhas irmãs, tinha dois anos a mais que eu .
Caçu la abandonada, seus enfeites eram apenas o despojo de suas irmãs .
Que se nos figurava como uma menina magra, muito grande para sua
idade, braços desengonçados, ar tímido, fa lando com dificu ldade e não
podendo aprender nada; que se ponha ne la um vestido emprestado de um
tamanho diferente do seu; que se contenha seu peito num corpo corroído
cujas pontas lhe façam feridas dos lados; que se sustente seu pescoço com
uma coleira de ferro forrada de veludo marrom; que se levantem seus ca-
belos no alto da cabeça prendendo-os com uma touca de tecido escuro; e
se verá a miserável criatura com que me deparei entrando sob o teto pater-
no . Ninguém teria suspeitado na mesquinha Lucila, os talentos e a beleza
que deviam um dia bri lhar nela . (Chateaubriand, Mémoire s d 'outre -tombe
13, citado por P. Hamon 198 l, p. 102) .
97
(4) Imagine vários milhares de microcomputadores, com funções múl -
tiplas, ligados uns aos outros por milhões de linhas, cada conjunto poden-
do ser comprimido num espaço de 1mm3 . Junte a isso um elegante siste-
ma de condutos trazendo matérias primas e levando dejetos, uma patrulha
móvel de segurança e uma enorme indústria química capaz de sintetizar
ou de destruir milhares de substâncias num segundo . Junte esta massa de
quase 1400 gramas na metade superior do crânio humano . Esta descrição
é, na verdade, um modelo bem pálido e terrivelmente simplificado do cé-
rebro . (Llllustré, citado por Apothéloz, 1983, p. 32) .
* Tra verser le pont, puis la route. Continuer tout droit jusqu' à un deu-
xieme pont. Apres le pont suivre le chemin tout droit et traverser la route
que l'on rencontre .
98
• Em um momento, virar à direita .
Gary Hemming
s'est suicidé .
99
podemos dizer que essas três microproposições narrativas correspon -
dem a uma macroproposição narrativa exemplar, da qual já falei acima: o
Resumo (PnO). Cada frase se decompõe da seguinte maneira:
100
- Microproposições ava liativas podem vir a saturar a seqüência na r-
rativa a ponto de fazê-la osci lar do simp les resumo-relato à narrativa con -
versacional, como bem estudou Uta Quasthoff (1985) .
101
Esquema 4
SUPERESTRUTURA
DESCRITIVA
Tema -títu lo
OPERAÇÃO
DE ANCORAGEM
OPERAÇÃO DE
AS PECTUALIZAÇÃO
------------- -~~~~;ÇÃO DE
ESTABE LECIMENTO DE UMA RELAÇÃO
Pd . PROPR Pd . PART
~
Pd.S IT Pd . ASS
(qua lidades) (sinédoques)
c~:P
for~
tamanh o etc.
M
Parte 1 Parte2
OPERAÇÃO DE TEMATIZAÇÃO
etc.
~ -
OP. AS PECTUALIZAÇÃO OP. ESTABELECIMENTO
A
pd PROP pd . PART
DE UMA RELAÇÃO
···...............
metqiímia s
proposições
na rralivas (pn)
etc. etc.
p~0--:<\SS
etc. ele .
Outros objetos suscetíveis
de ser tematizados
OP DE TEMATIZAÇÃO
O P. AS PECTUALIZAÇÃO
~ O P. ESTAB ELECIMENTO DE
etc. UMA RELAÇÃO
ele.
102
4.3.1 Asuperestrutura descritiva
Poro comentar o esquema 4, destaco primeiramente o caráter aberto
(infinito teoricamente, mas lim itado pra(gma)ticamente) de sua expansão :
os ETC anotados várias vezes fazem parte aqui da estrutura. Acrescento em
seguida que, assim como em uma seqüência narrativa, (micro)proposições
avaliativas podem sempre aparecer em todos os pontos da seqüência (mo-
dalizações, marcas de uma operação de consideração). Observo, enfim,
que, pelos hífens, é destacado o caráter facultativo e, além disso, cumula-
tivo com as outras proposições de SIT e de ASS .
A situalização (Pd . SIT) pode ser do tipo meton ímica (Sit. Meto), ou do
tipo espacial (Sit. Loc) , ou do tipo temporal (Sit. T ps). Por situa lização do
tipo metonímica (Sit. Meto), diferentemente da relação de sinédoque (Pd.
PART), entendo os desenvolvimentos contíguos que versam, por exemplo,
sobre as vestimentas de um personagem e não sobre as partes de seu
corpo em si . A situalização do tipo temporal (Sit. Tps) é o lugar corrente de
um desenvolvimento de microproposições narrativas (a ser diferenciado,
como foi visto anteriormente, da inserção de uma seqüência narrativa) . A
assimilação (Pd .ASS) pode ser de tipo comparativo (Comp .), de tipo meta-
fórico (Meta .), ou do tipo por reformulação (Ref; veremos alguns exemplos
mais adiante). E
rc
As microproposições descritivas (pd) correspondem, por sua vez, a ~
c:u
níveis hierárquicos de "profundidade" 2, 3, 4, etc. O argumento-individu- ..e::
u
~
ado foi previamente tematizado , quer dizer, tomado como subtema para e::
rc
uma expansão predicativa do tipo propriedades-qualidades (pd .PROP) e/ c:u
----,
103
ou partes (pd .PART) e/ou situaliza ção (pd .SIT) e/ou assimilação (pd .ASS) .
O estudo de dois exemplos ilustra~á todos esses casos de figura .
le Pas-de-l'Ours
o Pa s-d e-l'Ours
-~ Com esse exemplo, assim como com (9), estudados mais adiante,
ro
::::J
.......
X
podemos sublinhar a dinâmica da construção de uma representação dis-
....,
<l.l
cursiva descritiva (Rd). Muito simplesmente, a ordem das operações de
VI
ro
· .:::; interpretação-construção do sentido é a seguinte :
e::
<<l.l
: ::::,
cr a) A primeira linha do texto correspo nde a uma primeira proposição
<l.l
VI
(JJ
descritiva que, em razão da ausência do determinante, está à espera
VI
2 de uma referência . Seja então uma primeira microproposição des-
(JJ
e:: critiva com argumento (A) e pred icado qualificativo (PRq) :
<O.J
\,!:)
104
pd(a) : (det0) A1 + PRq (PROPR)
quadro verdejante
105
ção Pd .PART que viria a se acrescentar a pd(c): Pd .PROPR .
Esquema 5
T-título
O Pas-de-l'Ours
~
quadro rochedo
Pd(2)PROPR pd(2)PROPR
1 1
verde jante franco (e) maciço tudo para agradar
.!!! possui duas partes A l e A2 para as propriedades positivas (apelo aos valo-
ro
::::,
........ res eufóricos) que entram numa relação de isotopia com o verbo agradar.
X
~ A propriedade "ter tudo para agradar" (espécie de sintagma estereotipado)
VI
ro garante o estabelecimento de uma macroestrutura conforme o mecanismo
· .::.;
c:::
<(lJ
:::::, publicitário mais clássico: escolha de um objeto do discurso (Tema-título-
0-
.
(lJ
V, argumento-individuado), depois adjunção de uma propriedade conotada
(l)
VI
(ou antes "esclarecida") positivamente . Aqui, a propriedade escolhida é um
e
(l) tipo de hipérbole que ultrapassa as duas únicas partes do todo considera-
e:::
< (l)
\.!:I do (Al e A2) .
106
A abordagem da dimensão configuracional desta seqüência passa
também pelos dois componentes da dimensão que eu chamei mais acima
(esquema 1) de pragma-lingüística . Do ponto de vista enunciativo, falta o
paciente do verbo transitivo indireto : agradar é sempre agradar a, se r uma
fonte de prazer para alguém . Segundo uma retórica publicitária , mais uma
vez, este lugar vazio se destina ao leitor: "(A3) ... tem tudo para SEU pra-
zer" . Tem-se um caso de enunciação submisso à própria leitura do enun-
ciado . A leitura parece mesmo ser uma atividade enunciativa semelhante à
tomada de fala, 5 e o enunciado está lá para ser considerado por aquele
que o lê . A ausência de designação de um paciente do verbo agradar (...
tudo para agradá-LOS, .. . para agradar a X ou a Y) só leva à designação,
vazia, daquele que lê o enunciado .
E
n::,
--e,
<(
5 . Como mostrei anteriormente (19856, p. 173-184) em relação a uma p ichação; poderíomos ci:i
..e:
u
temor oqui tombém os coses de injunção de tipo " Proibido fumor/ entror", "dane-se quem ler",
~1
que não se dirigem a nenhuma pessoa especifi camente, e sim a todos que, um após o outro , os e::
n::,
lêem. QJ
--,
107
Esquema 6
TEXTO
Seq . descritiva
Semântica Pragmáti ca
(esquema 5)
Macro-
~
enu nciativa argu mentativa
estrutura
1
Macrooto de
discurso
(Pd( l )PRO PR)
1
1 implícito o
tem tudo para agradar tem tudo para agradar
derivar
VOCÊ
/recomendaçâo/
(9) ... Le boy chinois : quand j'y repense! Quelle n' avait pas été notre
surprise à Anne-Marie et moi lorsque nous avions été le chercher à la gare!
Tout guindé en gentleman, jaune dons les attifements du blanc, avec son
VI
·ro costume bleu rayé, son noeud papillon et ses chaussures en daim , on aurait
:::1
........
X dit défileur de carnaval. Pourtant, grand et mince, visage sculpté dons le
..,__.
(lJ
VI
ro bois dur des jungles, des yeux de tigre et de hautes pommettes, c'était um
·e:;
e::
<<lJ
véritable Seigneur de la guerre ...
, ::::,
0-
(lJ
VI
(9) O boy chinês: quando relembro dele! Qual não foi nossa surpre-
. (l)
VI
sa, para Ana Maria e para mim, quando fomos buscá-lo na estação! Todo
~
(l) afetado de cavalheiro, amarelo nos adornamentos do branco, com seu
e::
< (l)
\.!:l traje azul listrado, sua gravata borboleta e sapatos de pelica, ter-se-ia dito
108
"desfilador" (que desfilava no) de carnaval. Todavia , grande e fino , cara
esculpida na madeira dura das florestas, olhos de tigre e de altas maçãs
do rosto, era um verdadeiro Senhor da guerra ...
P3 todavia P4
Esquema 7
(P3)
Tema-título
O boy chinês
ESTABELECIMENTO DE RELAÇÃO
ATr lZAÇÀO
Pd(l)PROPR
~
Pd( 1)SIT(Meto) Pd (l )ASS .Ref
~
Todo afetada amarelo
tra;e
~ gravata sapatos
1
um desfilante
1 borbole ta 1
de carnaval
1 1
pd(2)ASS pd(2)SIT
pd(2)PROPR pd (2)PROPR
1
de cavalheiro
1
nos
adornamentos
do branco
A
azul listrado
1
de pelica
E
ro
-o
<(
cü
..e::
u
:E
'
e::
n::J
(lJ
--,
109
Esquema 8
(P 4)
Temo-título
O boy ch inês
1
TO DAVIA
~
Pd(l)PROPR Pd(l)PART
1
Pd(l)ASS. Ref
A
Grande (e) fin o
1
ca ra um (verdadeiro)
~
Senhor do guerra
1
escu lpido
~
olhos (e) maçãs do rosto ,
1 1 1
pd(3)SIT pd(3)ASS pd(3)PROPR
1 1 1
no madeiro de tigre altos
1
pd(4)PROPR
~
duro dos florestas
110
avaliativas dão instrução de derivar da primeira frase (esquema 7) uma
macroestrutura semântica que corresponde a uma macroproposição argu-
mentativa de conteúdo p, e da segunda frase (esquema 8), uma macroes-
trutura semântica que corresponde a uma macroproposição argumentati -
va de conteúdo q . Se especificarmos ainda as instruções próprias para o
todavia refutatório, é necessário acrescentar que esse sinal de argumento
introduz dois universos de crença (U e U') e que a proposição q tem valor
de verdade em num universo de crença do locutor (U), enquanto que p te m
valor de verdade em um universo de crença U' onde o fato F descrito em
pé visto como causa de não-G (entendendo por G o fato descrito em q).
O movimento da refutação pelo todavia ressalta que o fato F, descrito em
p, não impede o fato G descrito em q. Veja o esquema :
/ U/
111
pelo movimento argumentativo geral e pelo fato G introduzido na memória
textual.
Para concluir esta breve análise, vemos quais são as re la ções entre
estrutura seqüencial (aqui descritiva), estabelecimento de uma macroes-
trutura semântica e orientação argumentativa do texto . É, pelo menos, o
essencial de tudo o que este artigo gostaria de evidenciar.
4.5. Referências
VI
·ro ADAM, J.-M .. Le Récit, Que sais-je? . Paris, PUF, nº 2149, 1984 .
......
::::1
X
2 _ _ _ . Le texte narratif. Paris : Nathan-Université, 1985 .
VI
ro
-~ _ __ . Enonciation et textualité : !'exemp le d'um graffiti . ln Pour /ire /e
<C.I
'& poeme . Bruxe lles: De Boeck-Wesmae l, 19856.
().J
V,
()J ADAM, J.-M. Prolégomenes à une définition lingu istique de la descripti on,
V,
e
().J
Travaux du Centre de Recherche sémiologique, Cahiers nº 51, Université
,@ de Neuchâtel, 1986.
~
112
ANSCOMBRE , J. -C. Pour autant (et comment) : à petite causes grands effets,
Cohiers de Linguistiques Françoise nº 5, Université de Geneve, 1983.
APOTHELOZ, D. Élements pour une logique de la description et du raiso-
nement spatial, Degres nº 35-36, Bruxelles, 1983 .
DIJK, T.A. von Les textes de l'enfermement. Vers une sociologie critique du
texte, Trovou x et mémoires de lo moison de lo moison Descartes, Amster-
dam nº 3, Presses Universitaires de Lille, 1980.
113
Quadro teórico de uma tipologia
seqüenciai~·,
Jean -Michel Adam
115
Os gêneros do discurso, compara dos às formas da língua, são
muito mais mutáveis, flexívei s, mas, paro o indivíduo falante,
eles não deixam de ter também um valor normativo : eles lhe
são dados, não é ele que os cria . É porque o enunciado, em
sua singularidade, a despeito de sua individualidade e de sua
criatividade, não pode ser considerado como uma combinação
absolutamente livre da s formas da líng ua . (l 984, p.287) .
Quando esco lhemos um dado tipo de propos ição, não esco lhe-
mos somente uma proposição dada, em função do que quere-
116
mos ex pri mir com a ajuda desta proposição; nós selecio namos
um tipo de proposi ção em fun ção do todo do enunciado fin ito
que se apresenta à nossa imaginação ve rbal e que determina
nossa opi nião . A idéia que temos da forma de nosso en unci ado,
quer dizer, de um gênero preciso do discurso, nos guia em nosso
processo discurs ivo (1984, p.288).
Em dive rsos ensa ios (Adam , 1986, 1989 e, sobretudo, 1990a), tente i
teorizar sobre a relativa autonomia do sistema da língua e sobre sua sobre-
determinação parcial das formas elementares ("primárias") da " colocação
em texto", que eu designo sob o conceito de seqüência . Propus também
(1987a e 1990a, p . 19-25) distinguir texto e discurso . Quero relembrar
somente que podemos considerar as práticas discursivas como formas ela-
boradas - "secundárias" , se preferirmos, e como objetos pluridisciplinares
por excelência - e, certamente , falar de discurso literário, mas também de
discurso religioso, jornalístico, político, militar etc., e de gêneros do discur-
so religioso, como a prece, o sermão, a hagiografia, a parábola etc.; de
gêneros do discurso jornalístico, político, científico , didático, publi citário
etc. Quer dizer que, além do sistema lingüístico único e das formas ele-
mentares de coloca ção em texto, "outras codifica ções sociais, o gênero
notadamente, operam em toda comunica ção verbal " (Rastier, 1989, p.37).
Ou seja, também as hipóteses tipológicas podem se r formuladas a parti r
de perspectivas muito diversas .
117
umas das outras, e mesmo [ ... ] uma argumentação não oferece nenhuma
ho moge neidade" (l 974, p. l 86). Quanto à descrição, ela raramente ex iste
em seu estado pu ro e autônomo; ela só constitui gera lmente um momento
de um texto narrativo ou exp licativo . Uma narrativa pode ser, do mesmo
modo, apenas um momento de uma argumentação, de uma exp licação ou
de uma conversação, e não existe narrativa sem descrição mínima .
118
intenção (do texto , senão de seu autor) : "A coerência do discurso -
tal qual é construída em comum pelos enunciadores - [...] é a de
um ato que visa, através de uma série de transforma ções regradas,
a atender a um objetivo" (Caron, 1983, p. 117). Compreender um
texto é entender a intenção que se exprime sob a forma de um ma -
croata explícito ou a derivar do conjunto do texto (Adam, 1986,
p.7-8 e 19900, p . 103) .
119
sável em termos de isotopia(s) e de coesão com o mundo represen -
tado.
120
Pô r algo em " palavras gráficas" , com aplica ção de sin ais de
pontuação, tem por fun ção con duzir a uma leitu ra visua l, com
todas as conseqüên ci as para os dife rentes níve is, lexicais , sintá-
ti cos, semânti cos . O "dar a ver" aqu i coma nda a produção da
significação (1982, p. l 7- 18).
121
5.3. Por uma abordagem unificada da estrutura seqüencial dos textos
A "sintaxe das grandes massas verbais", bem cara a Bakhtin, pode
ser abordada, às vezes, pelos modos locais de textualização que repre-
sentam as cadeias, os períodos e os parênteses e pelos empacotamentos
que advêm dos tipos de estruturas seqüenciais e que constituem modos
específicos de estruturação textual.
Uma das razões que fazem com que a lingüística ignore as for-
mas de enunciado tem a ver com a extrema heterogeneidade de
sua estrutura compos icional e co m as partic ularidades de seu vo-
lume (extensão do d iscurso) - que vai da rép lica mono lexemática
ao romance de vários tomos . A forte variabi lidade do volume é
válida também para os gêneros discursivos orais (1984, p.288) .
V,
ro
-.:::.;
e::
<C.I
: ::::,
0- Definir o texto como uma estrutura seqü encia l permite abordar a
w
. V\
QJ
heterogeneidade composiciona l em termos hierárquicos muito gerais .
V\
A SEQÜÊNC IA, un idade constitu inte do texto, é composta de blocos de
e
QJ
e::::
<QJ
proposições (as macroproposições), elas mesmas formadas de n (m icro)
~
122
propos ições . Esta definição está de acordo com um princípio estrutural de
base : "Ao mesmo tempo que elas se encadeiam, as unidades elementa-
res se encaixam em unidades mais amplas" (Ricoeur, 1986, p. 150). Ou
seja, trata-se de uma estrutura hierárqu ica elementar que vale para todos
os textos e que permite ultrapassar a definição mais empírica de Harold
Weinrich : "Um texto[ ... ] pode ser defin ido como uma seqüência significan -
te de signos entre duas interrupções manifestas da comunica ção" (1973,
p . 198) . Eu noto aqui como/#/ a delimitação das fronteiras do (para)texto
para marcas de começo e fim de comunicação :
123
gênea, duas possibilidades se apresentam :
124
tivas nas narrativas romanescas, sintagmas introdutores típ icos e orações
bastante estereotipadas são freqüentemente utilizados (ver Hamon, 1981
e Adam e Petitjean , 1989 para uma análise detalhada) . Do mesmo modo,
a presença de porções narrativas em uma peça de teatro, por essência
d ialogal , foi objeto de numerosas reflexões na época cláss ica : tratava -se
explicitamente de se perguntar como gerenciar tal heterogeneidade (Adam
e Adam-Le Clerc, 1988) .
12
b) predicados X e X' definindo A (predicados qualificati vos ou funcio-
nais) respectivamente antes e depois do início e do fim de um pro-
cesso;
e) uma lóg ica singular em que o que vem depois aparece como tendo
sido causado por (é o post hoc, ergo propter hoc, clássico);
VI
"rê
:::J
.......
X 5 .4.3 Argumentativo: não se deve confundir o fato de que todos os
.....
QJ
VI
ro textos comportam uma orientação argumentativa com o fato de que existe
· ..::;
e::
<QJ
este tipo de coloca ção em seqüên ci a cujo grau zero é certamente repre-
: ::::1
0-
Cl.l
sentado pelo silogismo e pelo entim ema . O. Ducrot me parece dar uma
V,
Cl) excelente definição do que eu entendo po r seqüên ci a argumentativa : " [ ... ]
V,
e
Cl)
Seu objeto é ou para demonstrar, ou para refutar uma tese . Para fazer
e::: isso, partem de premissas, nem sempre expl ícitas anteriormente, reputadas
<Cl)
~
126
como incontestáveis, e eles tentam mostrar que não saberíamos admitires-
sas premissas sem admitir também esta ou aquela concl usão - a conclusão
sendo ou a tese a demonstrar, ou a negação da tese de seus adversários.
E, para passar das premissas às conclusões, eles utilizam diversos passos
argumentativos que ele s imaginam que nenhum homem sensato pode se
recusara realizar" (1980, p .8 1).
127
seqüência, mais que as frases e os enunciados isolados, que se tornam a
unidade de aná lise" (1984, p .5) . Podemos, então, chegar a um acordo
sobre a definição seguinte : um texto conversaciona l é uma seqüência hie-
rarquizada de seqüências chamadas de trocas .
128
seqüênc ia do d iscu rso, relações que são definidas nos níveis de represen-
tação "superficiais" da seqüência ." (Ruwet, 1975, p .316) . Nos níveis foné-
tico e silábico (o metro faz da sílaba uma unidade, uma unidade de me-
dida), acres ce ntam-se os princípios assinalados mais acima com re lação
ao período (ritmo estruturante) e à segmentação . O plano de organização
periódica (ritmo e paralelismos de construção) e a segmentação definem
de tal modo o passo para a estrutura hierárquica que podemos conceber
o poético como um modo de planificação que vem a se superpor a uma
seqüencialidade de um desses tipos de base. Mais que uma superposição,
parece ter a ver com um duplo trabalho : trabalho da seqüencia lidade "de
origem" e da sintaxe para a textualização do texto poético . Na poesia des-
critiva, na poesia didática (explicativo-expositiva), na poesia argumentativa
e, sobretudo, nos poemas narrativos, um tipo de base se deixa identificar.
Nas formas dialogais que constituem a tragédia e o drama clássico em
verso, os momentos narrativos, argumentativos, expositivos e puramente
dialogais são todos textualizados segundo as leis do poético.
5.5. Conclusão
A extrema heterogeneidade dos "gêneros do discurso", já assinala-
da por Bakhtin como uma característica da lingu agem humana, é uma
co nstatação empírica anterior a qualquer definição de diferenças . A he-
terogeneidade é um dado que o lingüista não pode ignorar e me parece
im possível, depois de tudo, desenvolver uma teoria um pouco conseqüe nte
do TEXTO sem ter em conta, de modo tão econômico e geral quanto pos-
síve l, a experiência comum dos sujeitos falantes . Proponho, então, a título
de hipótese de trabalho, a definição seguinte :
129
5.6. Referências
ADAM, J. -M .. Réflexion linguistique sur les types de textes et de compé-
tences en lecture . l:orientation sco laire et professio nelle , nº 4 , XIV Paris,
19850.
130
Ed. De la Ma ison des Sciences de l'h omm me, 1984 .
131
Ro manistische n Ling uistik, vol. IV (Ital ia no , Corso, sardo), G . Holtus et ai.
Éds . Tübingen : Niemeyer, 1988.
PEYTARD, J. Les variantes de pon ctuatio n do ns le chant prem ier des Cha nts
de maldoror, ln : Fu chs , C et ai. (éds .) Genese d u texte : les mode les linguis -
tiques. Paris : Éditions du C.N .R.S. , 1982.
132
Uma abordagem textual da argumentação:
"esquema", seqüência e frase periódica'·,
Jean-Michel Adam
l . N ão abordo aq ui o qu estão dos gê neros re tó ricos do arg umenta ção que estó no centro dos
meus tro bo lhos so bre os discurso s publici tário, po líti co e literá rio. Ad ema is, não falo do dim ensão
argume nta tivo de to do interação em língua natura l, do loto de o língua ser meno s um suporte d e
tronsm issã o do info rmação d o q ue um instrumento de a ção e de co nfro nto, qu e o retó rico teve
muito cedo como ob je tivo organiza r o trovés do descrição e d o ens ino . Exami no o ques tã o do s
re la ções entre re tó ri co e lin g üístico num a rtigo (Adam , 20 0 2c) qu e term ino por apon tar o abor-
dagem lingüístico do ethos di scursivo, outro as pecto do orgume nto çõo q ue esta co ntribui çã o não
abo rdo .
134
pois não há discurso, mesmo mono loga i, que não seja dialógico, em um
certo níve l de seu funcionamento, mas não quer dizer que se ja d ia loga l
qua nd o textual izado. Atua lm ente, é precisame nte a diversid ad e lingüística
das formas de textualizar que está no ce ntro de meus traba lhos . A hipótese
do TODO ARGUMENTATIVO insere-se justamente no nível da teoria prag-
mática geral : um enunciado, uma descrição, uma exp licação têm freqüen-
teme nte a função globa l de argumentar. Como disse Grize : "todo discurso
pode se r uma argumentação", ma s acrescenta que, "tom ad o em si mes mo
(... ), um enunciado não é nem argume ntativo nem não-argumentativo"
(l 996 , p. 18). Concordamos que "o caráter argumentativo de um discur-
so repousa a ntes de tudo nos pro pósitos daque le que o produ z" (G RIZE,
1996 , p .1 9) . Mais amp lame nte, para retomar um exem pl o de Grize, o
enunciado "deixai vir a mim as criancinhas" remete à identidade de locuto -
res como Jesus Cristo, um agro ou uma agro, ou um pedófi lo, sign ificand o
coisas dife rentes . Po rém, essas identidades locuciona is são inseparáveis
dos textos que circu lam no interdi scurso de uma comunidade: Evange lhos,
co ntos ou faits divers.
135
ções interessantes (Berrendonner, in Mievill e e Berrendonner (eds), 1997,
p .219 )2. Encontrei na lógica natura l uma fecunda retomada da questão
da redução da argumentação a mecan ismos lógicos de inte rl ocutores abs-
tratos e universais : Grize opõe a lógica- sistema demonstrativa à lógica -
processo discursiva, e as proposições, aos enunciados, como a lingüística
opõe frase a enunciado :
Fie l à tradi ção lógico , fale i até aqui de propos ições e não de
enunciados. Tonto os primeiros co mo os segu ndos exprimem
co nteúdos de ju lgamento, porém, em um enunciado, o conte-
údo do ju lgamento fico o cargo de um sujeito enunciador. Disto
resu lto , por um lodo, que tan to o va lor epistêmico do enunciado
quanto seu va lo r de verda de têm importância e, po r o utro, que
a ordem em que tais enunciados são produzidos não é indife-
rente .
l . D : DADOS (Dato)
136
3. visto que G (L) : Garantia (Warront): licen ça para inferir ou Le i de
passagem L, segundo Plantin . Convém fazer a distinção entre Dados
(D) Garantias (G) : "aqueles são invocados explicitamente e estas,
implicitamente" (Tou lmin , 1993 [l 9 5 8], p. 12 l ).
137
Esquema 1
t
(3) visto qu e Garantia
t
(5) provave lmente Q (F)
Lei de Passagem Indicador Moda l de Forço
t
(4) tendo sid o dado F (S)
t
(6) so lvo se Reservo
Suporte Condição de Refutação
VI
"rê
:::,
........ Esquema 2
X
.....,
QJ
VI
ro Foto (l) (sustentação) LOGO Asserção
· .:::;
e: (Argume nto) Conclusivo (2)
t
<ClJ
t
: ::::,
c:r
(l)
V'I
Vis to que Pp (3) Solvo se
C1J
V'I
o Restrição (6)
1
õ:i Em vi rtude de
e:::
<OJ
\.!:l Base (4)
138
J-B Grize sintetiza os movimentos argumentativos possíveis em duas
fórmulas de encadeamento potencial dos enunciados :
E
ro
-e:,
Do ponto de vista lingüístico , o enunciado de um dado factua l <(
139
(C) , em fun ção de um terceiro, o lei de passagem (L), sobre o
qual repouso definitivamente o construção argumentativo. (... )
Introduzindo esta noção no suo teo ria do argumentação, Tou l-
min redescobriria o noção de topos , ou de lugar comum , sobre
o qual o retórico antigo fundou os teorias do invenção . (Plontin,
1990, p. 29)
140
A dissociação das noções e dos valores permite "fundar uma conclusão
oposta à de um adversário, por meio de uma interpretação talvez radical
dos dados factuais" (l 993, p.245). 5 Contento-me em ressaltar que, em
posição de Reserva-Restrição ou ainda em Condição de refutação (R6),
um segundo movimento argumentativo freqüentemente se fixa ao primeiro
(encadeamento) .
141
segmento sustentador corresponde ao que podemos considerar uma frase
periódico argumentativo mínima.
Poro tentar dar conto dessa questão da extensão dos segmentos ar-
gumentativos, fui levado (Adam, 1996 e Adam, 2002a) o distinguir duas
unidades textuais não exatamente opostas, mas situadas num continuum
de complexidade crescente : as frases periódicas argumentativas e as célu-
las ou seqüências argumentativas.
Vl
"rê • C2 como efeito de/ visto que Fl logo / conseqüentemente C2'
::::,
~
....,
(l)
C2 [se ja m prudentes ao pegarem a estrada esta manhã]
Vl
ro
·.:::; Visto que F l [pois fez muito frio esta noite]
e::
<<l.l
: ::::,
c:::r
(l)
(F l) conseqüentemente C2' [e arrisca ter gelo na estrada]
V,
<l.l
VI
• Fl conseqüentemente C2 . [C2 = Fl') conseqüentemente C2'
e
(l)
e:: Visto que F l [como fez muito frio esta noite]
<<l.l
\.!:I
142
Conseqüentemente C2 [arri sca ter gelo na estrada .]
143
Causa (ele foi ambicioso) >>> Conseqüência (eu o matei)
Vl
EXPLICAÇÃO > É PELO enunciado q] .
"rcí
::::,
........ Os enunciados de tipo [se p, é porque q], [se p temos que q] ou [se p,
X
......
(J.l
é para q] têm a propriedade de dar suporte à transformação [É{PORQUE/
Vl
ro
·.::::; PARA} q QUE p] : "É PARA ganharem sua liberdade QUE os esportistas
e:
<CJ.l
: ::::, radicais se vendem".
O"
(J.l
V'I
(J.l Esta ordem regressiva : [se p < < é porque q] é característica da es-
Vl
e trutura explicativa : p é verdade [os esportistas radicais precisam de potro-
(J.l
e::
<C:U
l.!:I 6 . Nã o aprofundaremos aqu i esta proximidade entre explicação e argumenta ção.
144
cinadores e então se vendem], mas por quê? Porque q [para ganharem
sua liberdade] . O movimento inferencial parte do indício/fato observado
(p) para retornar à causa/razão (q). O contexto que constrói o enunciado
[SE p] é o indicativo de um fato pertencente a um mundo que é nosso, no
contexto do mundo do comércio, mundo problemático, pois pode gerar
inferências éticas negativas . Como os alpinistas e esquiadores de a ltas
montanhas podem abandonar seus va lores e a gratu idade fundamenta l
de suas ações? É neste contexto que é momentaneamente reco nhecido
[é verdade que p os esportistas se vendem] para pôr em desvantagem a
ênfase sobre a enunciação da causa/razão (q) . O enunc iado (q) reintroduz
um valor: a liberdade, de que resu lta o problema subjacente .
145
Em um movimento de refutação dos próp rios termos do debate para
o qua l o esportista foi conv idado a participar ("Patrocínio e mediatiza ção :
a aventura dos esportes rad icais"), o locutor argumenta em um en unciado
muito comp leto para ser isolado em leg en da de foto e, precedid o por um
enunci a do atributivo de pa lavra, forma uma organização periód ica bas -
tante elaborada para constituir uma seqüência argumentativa elementar.
146
assegurada por marcas argumentativas que têm o aspecto de encadea-
mentos de argumen tos-provas correspondentes tanto aos suportes de uma
lei de passagem, quanto a micro-cadeias de argumentos ou a movimentos
argumentativos encadeados .
Esquema 3
Dados Asserção
(Premi ssas) co nclu sivo
Fo tos
i
Suslenloção
e
i
Princíp io
Base
147
comp lexo a segui r, que reservo um lugar poro o co ntra-argumentação em
dois po ntos do estruturo, ao nível das macro -proposições argumentativos
P o rg . O e P arg. 4 :
Tese Dados
Lo g o provavelmente C o nclusão (C)
Anterior + Fatos (F)
(nava) tese
P arg . O P arg . l
i
Susten tação
i
A menos que
P arg . 3
P arg . 2 Restrição
(princípios base) (R)
P arg . 4
148
tiva ou explicativa . O objetivo de meus traba lhos, e em particular de meu
livro de 1992, foi submeter e testar essa hipótese a regu lagens diferencia-
das que eu denomino seqüenciais . Os cinco tipos de seqüências de base
correspondem a cinco tipos de rela ções macro-semânticas pré-formata-
das, memorizadas por impregna ção (leitura e audi ção) e transformadas
em esquemas de reconhecimento e estruturação da informação textual. A
rea lização incompleta de uma seq üência, muito freqüente na oralidade, se
traduz por simp les encadeamentos periódicos .
(3) < 1 > Dominique Perret, esquiador rad ica l: " < 2 > Não somos kami-
kazes suic idas : < 3 > é verdade que corremos riscos, < 4 > mas eles
são calcu lados" .
149
(PdVl vs PdV2) . Começar pela negaçã o < 2 > pe rm ite loca li zar a refo rm u-
la ção da no ção de " esquiador radical" no in íc io do movimento e tornar
identificável a conclusão C que o interp retante deve tirar de É VERDADE
QUE < 3 > . O que ve m po r último na dinâmica do esque ma 5 loca liza- se
no início do enun ciado -texto :
Esquema S
1 7
11
co rre mos ris cos" "eles são calcu lados"
<3> <4>
LU
::)
CJ
Va lo res segu ndo LU
o Va lores segundo
um PdVl (L;,e El) <(
o um PdV2 (L = El)
Asserção ""'
LU
> Orien tação
concedida • LU
(logo)
argum e nta tivo
(logo)
L t
Conclusão C
l
Co nclusão não- C < 2 > _J
"os esquiadores radi cais "Nós (os esquia d o res
(são) radicais) não somos
"kamikazes sui cidas" kamikazes suicidas "
150
Se ap licarmos a (3) o esquema de argumenta ção de Toulm in revisto
por Grize , teremos a confirmação do fato de que R é o lugar de inserção
de outro movimento argumentati vo (com suas sustenta ções pe los princí-
pios Pp l e Pp2 e apo iado na s ba ses l e 2):
(3) < 2 > [Neg . C] Nós não somos kamikazes sui cidas :
< 3 > [F l] na verdade , corremos riscos, < 4 > [F2] mas eles são
calcu lados .
Esquema 6
Fl É VERDAD E Q UE LOGO C0
<3>
1 F2
1
MAS Reservo -Refutação
Uma vez que Pp l
< 4> Logo não-C < 2 >
Em vi rtude de B l
1
Uma vez que Pp2
Em vi rtud e d e B2
151
(correr riscos ca lcu lad os < 4 > ) provo ca não -C (é um comp o rtamento não -
suicida , mesmo se todos os perigos não podem ser elim inados < 2 > ).
Esquema 7
Dad os Conclusão
É VER DAD E Q UE
Fl < 3 > - - - -- - C0
P. arg . l' P. org . 3'
152
(2) < F 1 > The United Notions Secu rity C o uncil hos not lived up to its
responsibi lities, < C2 > so we wi ll rise to ours .8
(3)
(5) We believe in the mission of the United Nations . One reoson the UN
was founded after the second world war wos to co nfront agressive
d ictotors, actively and early, before they can ottock the innocent ond
destroy the peace. 9
(6) ln the case of lroq, the Security Counci l did act, in the eorly 19 9 0s .
Under Reso lutions 678 and 687 - both still in effect - the United E
ro
"'O
<(
8 . O Conse lho de Segurança dos Noções Unido s não esteve à alt ura de suas respo nsabi lidades. õ:í
..e::
Então , vamos assumir os nossos . [trod . do autor] w
9 . Acreditamos no missão dos Noções Unidos . Uma dos razões pelos quais o ONU foi fundado :E
e:::
ro
depois do li Guerra Mundial foi o de se opo r ativamente e sem dem oro à agressividade dos regi-
-OJ
,
mes ditatoria is, antes que eles al ocassem os inocen tes e destruíssem o paz. [trod . do autor]
153
States a nd our a ll ies are au th o ri sed to use force in ri ddi ng lraq of
weapon s of mass destructi o n. Thi s is nota question of authority, it is
a question o f will. 10
(6)
t
uma vez que Pp3
t
salvo se 0
(5) em virtude de B4
Todo o argum enta ção da administra ção ameri cana con siste em se
a poi ar sob re o sustenta ção l, re lativo à posição dos Nações Unidas , poro
ju stifica r que os Estados Unidos substitu em uma organiza ção interna cion a l
acusada de ser desprovido de vontade e fra cassado .
Para isso, é ne cessário colocar uma o utra legal idade, por mei o de
ou tra seqüê ncia a rgumentativa :
(7) < F l ' > The united States of Ame ri ca has the sovrereign outho rity to
use fo rce in oss uring its own notional securi ty. < Pp3' > Thot duty fali s
to me, os C o mmander-in -Chi ef, < B4' > by th e ooth I have sworn , by
th e ooth I will keep . 1 1
l O. N o caso do lroque , o Co nse lho de Segura nço atuou no início dos onos 1990. Sob a s reso-
luções 678 e 687 - am bas ainda ho je va lend o - as Estad as U nid os e OS nossas a liadas são
a utoriza dos a utilizar a força para elimi na r as armas de destruiçã o em massa na Iraq ue . Nã o é
uma questão de ou toridod e, é umo q uestão de vo ntad e. [trad . do ou to r] '
11. Os Estad as Uni dos do Amé rica têm auto rida d e sobera na de utilizar a força poro ossegu ra r
suo própria seguranço . Este d ever recai sob re mi m , como com onda nte e che fe , em virtu de do
juramen to que já fiz e daque le que jurarei . ltra d . do au tor]
154
Este segmento da alocução de Bush se apresenta como uma seqü-
ência à qual falta a asserção co nclusiva C. Esta asserção implícita é am-
plamente apoiada por Pp3' e B4' e vem a reafirmar C2 (Nós assumimos
no ssas responsabilidades), isto é, a afirmar que os Estados Unidos estão
prestes a entrar em guerra. Notemos que aqui também nenhuma restrição
R6 é vista:
t
uma vez que Pp3'
t
so lvo se 0
em vi rtud e de B4'
E
ro
"O
<
cii
..e:
u
12 . Soddom Hussein e seus filhos devem deixar o Iraque d entro de 48 horas. Su o recuso em ~
fazê- lo resu ltará em um confl ito armado que co meçará no momento em que decidirmos . [trod. '
e::
rc
a,
do outorl --,
155
6.6. Referências
ADAM, J.-M .. Les textes : types etprototypes . Paris : Nathan, 2001 [l 992] .
APOTHÉLOZ , D.; M IÉVILLE , D. Matériaux pour une étud e des re lations ar-
V,
gumentatives, ln: RUBATTEL, C. (éd .), Modeles du discours. Rech e rches
ro
·;:::; actue lles en Suisse romande . Berne : Peter Lang , 1989, pp . 247 -60 .
e:::
<OJ
: ::::>
0- BARTLETT, F. C. Rememberin g. Cambridge (GB) : Cambridge Unive rsity
0J
V'I
OJ Press, l 932.
V'I
o
ã:i BER REN DONN ER, A Schématisation et topograph ie imaginaire du dis-
e::::
<OJ
l.!:l cours, ln: M IÉVILLE , D. E; BERRENDONNER, A (éds) , Log iqu e, dis-cours
156
et pensée. Méfanges offerts à Jean -Blaise Grize. Berne : Pete r Lang, 1997,
pp . 219-38 .
157
PLANTIN, C., Essois sur 1' orgumentotion. Pa ris : Kimé, 1990.
158
.......
Aanálise de gêneros hoje* -o
Vijay K. Bhatia
7.1. Introdução
Embora seja um desenvolvimento relativamente recente no campo
dos estudos aplicados do discurso, a análise de gêneros tem se tornado ex-
tremamente popular nos últimos anos. O interesse pela teoria dos gêneros
e suas aplicações não se restringe mais a um grupo específico de pesquisa-
dores de uma área em particular ou de um setor qualquer do globo terres -
tre, mas cresceu a ponto de assumir uma re levância muito mais ampla do
que jamais foi imaginado . Candlin (l 993) indaga com propriedade:
159
"Claramente, trata-se de um conce ito que encontrou seu momento
opo rtu no", aponta ele . Há atrativos óbvios nos diferentes modos como o
termo tem sido uti li zad o na literatura recente . A própria natureza da estru-
turação dos gêneros é mu ltidiscip linar. A teoria dos gê neros leva a aná lise
do discurso da descrição para a explanação da língua, tentando freqüen-
temente responder à questão : por que os membros de comunidades dis-
cursivas específicas usam a língua da maneira como fazem? A resposta
não leva em consideração somente fatores sócio -cultura is, mas também
fatores cognitivos, tentando, dessa forma, esclarecer não apenas os pro-
pósitos comunicativos da comunidade discursiva em questão, mas também
as estratégias cognitivas empregadas por seus membros para atingir esses
propósitos . Esse aspecto tático da construção do gênero, sua interpretação
e uso, provave lmente, é um dos fatores mais significativos que concorrem
para sua popu laridade atua l no campo dos estudos do discurso e da co-
municação . Uma das desvantagens de ta l popu laridade é que quanto ma is
popu lar um conce ito se torna, ma is variações de interpretação, orienta-
ção e estruturação são encontradas na literatura existente. Os ana li stas do
discurso interessados na teoria dos gêneros encontram-se presentemente
numa situação de a lgum modo simi lar a essa.
.'!:!
ro 7.2. Análise de gêneros
:::,
+-'
X
......,
Q.) Aná lise de gêneros é o estudo do comportamento li ngüístico situado
VI
ro em co ntextos acadêmicos ou profissionais, seja qua l for o modo co mo
·e:;
e: é abordado ; quer em termos de tipologias de ações retóricas, como em
<Q.I
: ::::,
O"
CJ Mi ll er (l 984) e Berkenkotter e Huckin (l 995); em termos de regularidades
V"I
Q.) de processos sociais de vários níveis e orientados para uma meta, como
V"I
o em Martin, Christy e Rotery (l 987) e Martin (l 993) ; ou em termos de con-
ã:i
e:::
< Q.)
1..::;:J
sistência de propósitos comunicativos, como em Swa les (l 990) e Bhatia
160
( 1993) . A teoria de gêneros, a despeito dessas orientações aparentemente
diversas, apresenta uma considerável base comum. Embora eu quisesse
resistir à tentação de demonstrar exaustivamente os pontos comuns nes-
sas diferentes abordagens, va le a pena apontar alguns dos traços mais
importantes que as caracterizam . O primeiro é a ênfase no conhecimen -
to convencionado, que confere a cada gênero sua integridade. As três
abordagens igualmente reputam esse aspecto como central para qualquer
forma de descrição de gêneros. O segundo é a versatilidade da descrição
dos gêneros, e o terceiro, embora possa parecer algo contraditório em
relação ao primeiro, é a tendência para a inovação, advinda da natureza
essencialmente dinâmica do gênero . Deixe-me reforçar esses três aspectos
da teoria de gêneros .
161
levante. Levando isso um pouco adiante, em direção às formas lingüísticos,
é possível identificar regu laridades típicas de formas estruturais e organiza-
cionais que freqüentemente delineiam um construto genérico . Conseqüen-
temente , para uma série de interesses em ap lica ção, especialmente no
ensino de línguas, o conceito de situação retórico talvez seja o mais geral ,
fornecendo a estrutura necessária dentro da qual podem ser locali zados
os propósitos comunicativos, que, por sua vez, são percebidos nos usos
mais ou menos típicos de formas léxico-gramaticais e discursivas . Para o
estudo dos gêneros, especialmente para os propósitos da lingüística apli-
cada, todos os três níveis inter-relacionados de descrição de gêneros são
importantes . Até esse ponto, não vejo qualquer tensão entre essas assim
chamadas abordagens conflitantes . De fato, elas parecem complementar-
se mutuamente, fornecendo não só um suporte teórico úti l, mas também a
va lida ção necessária à desconstrução dos construtos de gêneros . A noção
de propósito co municati vo parece ser mais centra l à teoria de gêneros, por
um lad o, por estar inserida em contextos retóricos específicos e, por outro
lado, por determinar, invariavelmente, esco lha s específicas de formas es-
truturais e léxico-gramatica _
is .
Outro ponto importante a notar nas três orienta ções é a ênfase, co-
mum a todas elas, em certos traços específicos da descrição de gêneros,
seja em termos de recorrên cia, comparti lh amento ou regu laridades, cada
um deles destacando aspectos convencionais da construção e interpreta-
ção de gêneros . Seja qual for o modo de abordagem (ver Jamieson, 1973;
Swa les, 1990; Miller, 1984; Martin, 1985; Dudley-Evans, 1986; Bhatia,
1993 e 1994), o denominador comum têm sido sempre os aspectos con -
venciona lizados, institucionalizados e permissíveis (ao invés de aspectos
criativos, inovadores e exploráveis) da construção dos gêneros . Isso tam-
bém é perfeitamente compreensíve l. Como sUstenta Swa les (l 990), gê -
V'I
ro ne ros não são criados da noite para o dia. El es se desenvolvem por certo
· .::::;
e:::
<(lJ
período e não são reconhecidos até que se tornem bastante padronizados.
: :::,
0-
(lJ
Nesse conte xto, a teoria de gêneros tem enfatizado muito os aspectos ins-
VI
O.J titu cional izados da constru ção e interpreta ção de gêneros .
V'!
o
cu
e::
Fairclough (l 989, p . 59) ilustra a importância das conven çõ es ao
<O.J
~ examinar o en contro médico entre um gineco logista e sua paciente . Fre-
162
qüentemente, o ginecologista precisa tranqüilizar a paciente, com uma voz
gentil e suave, no momento do exame interno: "relaxe o máximo possível,
serei o mais delicado que puder" . Com muita razão , Fairclough pergunta:
"o que, neste breve enco ntro, permite à paciente interpretá-lo como um
encontro médico e não como um encontro sexual?" Como resposta , ele
aponta:
161
de gêneros é realmente estreita em seu foco e ampla em sua visão . O
próprio conceito de propósito comunicativo é muito versátil. Ora ele pode
ser identificado em um nível realmente alto de generalização, ora pode ser
limitado a um nível bem específi co . Igualmente, tanto pode haver um ún ico
propósito comunicativo como um bem detalhado conjunto de propósitos
comunicativos. Dependendo do nível de generalização e do deta lhamen -
to em que o propósito comunicativo é especificado, pode -se chegar à
condição de identificar o status de um gênero em particular, bem como o
uso que ele faz das convenções do gênero . Vou fundamentar melhor isso
tomando como exemplo o que é comumente chamado de discurso promo-
cional (veja o diagrama).
1 1
sinopses de livros resenhas de livros anúnc ios cartas promocionais inscrições poro
de venda s empregos
VI
ro
::::i comerciais de TV anúncios impressos anúncios radiofônicos
.......
X
2
VI
ro
· e:;
e:: anúncios anúncios anúncios anúncios anúncios
<<lJ
::::> de co mputadores de livros de co mpanhias aéreos d e automóveis de cosméticos
c:r
(lJ
V\
(l.J
V\
e
(l.J
e::: anúncios anúncios
<(l.J
~
d e pacotes de férias de viagens comerciais
164
Embora os gêneros sejam identificados essencia lmente em termos
dos propósitos comunicativos aos quais tendem a :.ervir, esses propósitos
comunicativos podem ser caracterizados em diferentes níveis de gene ra li -
zação . Eles podem ser vistos em termos de uma combinação de processos
retóricos, que também podem ser considerados como valores genéricos
primários. Halliday e seus seguidores, trabalhando dentro de uma orien-
tação sistêmica da descrição de gêneros, têm aplicado essa noção, com
bastante sucesso, ao ensino de gêneros no nível escolar (ver Reid, 1987).
No caso dos gêneros profissionais, sempre é possível postular diversos ní-
veis de generalização. Considerando o caso dos gêneros promocionais,
encontramos, no nível mais alto de generalização, o "discurso promocio-
nal na forma de uma constelação de gêneros intimamente relacionados,
dotados do mesmo propósito comunicativo de promover um produto ou
um serviço para um cliente potencial. Como exemplos comuns de gêneros
promocionais podem-se incluir anúncios, cartas promocionais, inscrições
para empregos (no sentido de que seu propósito também é vender os ser-
viços do candidato a um empregador potencial, d. Bhatia, 1993), sinopses
de livros, panfletos comerciais, panfletos turísticos e vários outros. Todos
esses e muitos outros exemplos desse tipo apresentam um alto grau de
superpos ição no propósito comunicativo a que procuram atender e essa
é a principa l razão por que são vistos como parte de uma co lônia discur-
siva intimamente relacionada, servindo mais ou menos a um propósito
promociona l comum, a despeito do fato de que alguns podem também
apresentar diferenças sutis em sua realização. É, ainda, possível ver cada
um desses gêneros, e.g., os anúncios, em um nível mais baixo degenera-
lização e fazer distinções entre suas realizações mais específicas. Exemplos
óbvios incluirão anúncios impressos, come rciais de TY, anúncios radiofôni-
cos e outros . As diferenças entre esses gêneros são pouco discerníveis em
termos de propósitos comunicativos e mais em termos do meio de discurso,
portanto pertencem, como gêneros, à mesma categoria geral popularmen-
te conhecida como anúncios. Indo um passo adiante, considerando agora
somente os anúncios impressos, ainda é possíve l considerá -l os em termos
de categorias como anúncios diretos, anúncios com associação de figuras
e legendas, anúnc ios baseados na imagem, testemunhos, falsos gêneros,
etc . (Kathpalia, 1992) . Seja qual for a subcategoria, todos esses anún-
165
cios servem ao mesmo conjunto de propósitos co municativo s, embora a
maioria deles utilize estratégias diferentes para promover o produto ou
serviço. Anúncios diretos geralmente usam a "ava lia ção do produto" como
prin cipa l estratégia persuasi va , enquanto anúncios baseados em imagem
apoiam-se mais especificamente no estabe lecimento de credencia is como
fonte principal de persuasão . Outra diferença encontrada no uso dos re-
cursos lingüísticos é que alguns tipos apóiam-se em estratégias verba is
(anúncios diretos utilizando a ava lia ção do produto) , enquanto outros, e .g .,
os anúncios do tipo figura-legenda, concentram-se mais em estímulos visu-
ais . É possível , ainda, tomar os anún cios diretos e diferenciá -los em termos
do uso de recursos lingüísticos para a valiação do produto, ou tal vez em
termos do tipo de produto que anunciam, ou mesmo em termos do público
a que se dirigem . Em cada caso, estamos certos de que encontraremos
diferenças sutis no uso de estratégias para descri ção, avaliação ou diferen-
cia ção do produto e que essas diferenças eventualmente ocasionarão usos
específicos dos recursos ling üísticos . Mas o importante é que todas essas
variações somente se tornam gêneros diferentes no momento em que co-
meçam a indicar uma diferença substancial nos propósitos comunicativos .
166
7.2.3. Integridade genérica x tendência para a inovação
Nas seções anteriores, tentei enfatizar que os gêneros podem ser vistos
como o resu ltado das práticas discursivas conven cionadas e institucionaliza -
da s de co munidades di sc ursi vas específi ca s. É esse co nhecimento conve n-
cionado do modo como os gêneros são construídos, interpretados e usados
dentro das comunidades discursivas específicas que confere a seus membros
reconhecidos uma vantagem sobre outros que estão fora dessas comunida-
des. Em outra s palavras, é esse conhecim ento das convenções genéricas que
ajuda os profiss ionais experientes a identificá-las (Bhatia, 1993) . Contudo, é
interessante notar que, embora os gêneros sejam tipicamente associados a
co ntextos retóricos recorrentes e sejam identificados com base em propósitos
comunicativos comparti lhados, com restri ções a contribuições permitidas no
uso de formas discursivas e léxico-gramatica is, eles são construtos dinâmi -
cos. Berkenkotter e Huckin (1995) ressaltam que :
... gê ne ros são es truturas retó rica s inerentemente dinâm ica s que
pod em ser manipu ladas de acord o com as co ndiçõ es de uso, e
que o conheci mento de gê nero s é, por conse g ui nte, mais bem
co nceituad o como uma fo rma de cogn ição si tuada e im brica da
em culturas discip linares .
167
mente competitivo (tanto acadêmico com o empresaria l) e, aci ma de tudo,
à necess idade de criatividade e inovação na comunicação profissiona l.
168
Esse é o poder do gênero, e a e le vo ltaremos nas últimas seções
deste artigo . Contudo, neste estágio, gostaria de tratar das comp lexidades
do mundo profissiona l e discutir como a teoria de gêneros pode lidar com
essa realidade .
169
Esse processo de exploração dos valores genéricos estabelecidos para
criar construtos genéricos mistos ou imbricados é sempre visto pelos mem-
bros das comunidades profissionais como taticamente superior e eficiente.
A explora ção de recursos genéri cos para criar formas m istas ou imbricadas
sempre se base ia no que iá fo i estabelec ido dentro da comunidade pro -
fissional. É quase como a exploração publicitária do clichê the shape o f
things to come na frase de abertura do seguinte comercial de automóvel:
170
formais sobre como um conjunto de con stituintes pode ser apro -
priadamente combinado . (Fowler, 1982, p . 31)
171
Os gêneros, nesse sentido, possuem uma tend~ncia natura l à imbri-
cação e à mistura, pelo fato de que a maioria dos gêneros apresenta mais
de um valor genérico (ver Bhatia , 1995) . O seguinte exemplo de anúncio
de emprego (ver a seguir), por exemplo, apresenta dois valores genéricos
diferentes, mas comp lementares .
172
ENGENHE IROS ELETRÔN ICOS
(4 VAGAS)
17
trás do item anunciado, despertando o atenção de uma cl ie ntela
potenci a l paro o nome da empresa ou do produto ... , têm fe i-
to surgir subcategorias como ... os Fa lsos Gêneros, qu e im itam
o formo to de outros gêneros ... Esse procedi mento gerativo da
criação ou do dese nvo lvim ento de gêneros é ma is popu lar em ...
pub licidade, uma vez que os publ icitá rios estão co nstantemente
com petindo en tre si por originalid ad e e inovação em um mer-
ca do inundado de marcas co ncorre ntes de produ tos e servi ços
e de um número igua lmente grande de anúncios publicitários . _
(Kothpa lia, 1992, p . 394)
O
l JOGADOR : Como foi sua vi agem à Ind onésia ?
2º JOGADOR : Ótima . Reso lvi todos os negócio s... e fui a um
clube de golfe .
O
l JOGADOR : Ouvi dizer que os neg óc ios estã o em alta , ló .
2º JOGADOR : É, estamos muito otimistas sobre o futuro . Abrire-
mos um escritório em Jacarta no mês que vem .
O
l JOGADOR : Então você está investindo pesado ló?
2° JOGADOR: Bom, a empresa está. Minhas ap licações são
VI
mais líquidas . Prefiro co mprar ações de inves-
ro
· e:; timento.
e:::
<CJ O
: ::::>
c::::r
l JOGADOR : Pensei que você tinha gostado da Indon ésia .
.w
V,
2º JOGADO R: E gostei . Eu apliquei no Fundo Ba rclays da Indoné-
CJ
V,
o sia. Rendeu mais de 60% nos últimos três anos*.
õ:i 1º JOGADOR : Parece bo m . Você conhece alguém ló?
e::::
< (l)
\,!:}
174
2 ° JOGADOR: Ligue para meu contato no Barclays, Sarah Ro-
bbins, pelo fone 826- 1988, ou peça ajuda a
seu consu ltor financeiro.
l O JOGADOR: Obrigado. Farei isso . A propósito, você acabou
de bater na minha bola .
HK
BARCLAYS
BARCLAYS
BARCLAYS INTERNATIONAL FUND MANAGERS
175
cional do anúncio pub licitário, contendo a linha padrão de assinatura, lo-
gotipo e demais deta lhes. O objetivo é atrair a atenção do potencial cliente
através de estratégias d iferentes dos convencionais dizeres e figuras .
VI
criatividade e variabilidade resu lta na inviabi liza ção de tentativas de iden-
ro
"ü tifica ção do gênero. O caso dos gêneros introdutórios que freqüentemente
e::
<QJ
: ::::,
cr são encontrados nas páginas iniciais dos livros é interessante . Os termos
w
V'\ " introdu ção" , " prefá cio" , "apresentação" e "agradecimentos" são todos
O.J
V'\ usados na indústria editoria l com um grau notáve l de flexibil idade, de
e
cu
e: modo que até o melhor dos dicionários desistirá de distinguir precisamente
<CU
l.!:l
entre os três primeiros , isto é, " introdu ção", prefácio" e " apresenta ção" .
176
Consideremos os seguintes exemp los e vejamos como os praticantes os
exploram em várias trocas e combinações .
INTRODUÇÃO
Este livro ob jetiva exp licar a teoria da aná lise do d iscurso e de-
monstrar sua re levância prática para o ensino/ aprendizagem da
língua . A Parte l examina ... a Parte 2 explora .. . {continua descre-
vendo o conteúdo do livro}
PREFÁC IO
APRE SENTAÇÃO
177
do modo como ele é tradicional mente entendido no Ing laterra : tro-
to ... o fonético como porte do lingüístico geral ... [começo descreven-
do positiva mente e explicando o orientação teórica do livro]
V'\
o O d ire ito a um di scurso é orga nizad o e lim itado por uma am plo
w
e::
< (l) variedade de meios, como pa péis pa rticu lares, status, profissões
\.!:)
178
e assim por diante. Seme lhantemente, a institucionalização do
discurso é limitada em termos de sua apropriação legítima e das
situa ções restritivas de sua recepção - igreja, tribunal, escola,
campanhas eleitorais, etc.
179
As disciplinas são como cultura s em que os memb ros possuem
crenças compartilhadas e assum idas como certas ; essas cren ças
podem ser mutuamente incompreensíveis de uma cultura paro
outro ; sõo co dificadas em uma língua ; são in corpo radas em prá-
ticas ; novos membros são admitidos através de rituais . (Myers,
1995, p. 5)
180
Embora a boa compreensão do co nhecimento genérico seja pré-re-
quisito para qua lq uer manipu lação dos recursos dos gêneros, ela de modo
a lgum é suficiente para que tai s inovações e explorações sejam aceitas pela
comun idade disciplinar. Kress (1987) menciona dois importantes critérios
pelos quais as inovações nos gêneros são aceitas : se elas são apoiadas ou
por uma situação socia l estáve l ou por uma autoridade .
Continua ele:
181
7.4.1. Mantendo a integridade genérica
Em algumas formas do discurso acadêmico, especialmente nos arti-
gos de pesquisa, podem-se ver, geralmente, dois tipos de mecanismos em
ação para assegurar a integridade genérica : o processo de revisão em pa-
res e a intervenção editorial. Ambos os mecanismos, mesmo operando em
diferentes níveis, são ativamente invocados para assegurar que tod os os
relatos de co nhecimento novo estejam em conformidade com os padrões
de comportamento institucionalizado que são esperados pela comun idad e
da disciplina específica dos revisores em questão. Embora possam variar
os ju lgamentos individuais entre os membros de comunidades disciplinares
específicas, muitas vezes se garante um alto grau de consenso pe la se le-
ção de especialistas da mesma linha de pensamento, em um quadro bem
definido de fronteiras disciplinares . Por exemplo, se examinarmos alguns
periódicos que regularmente publicam artigos sobre análise do discurso,
descobriremos que, embora todos publiquem artigos sobre vários aspec-
tos do discurso, eles possuem com issões ed itoriais muito diferentes, que
examinam reivindicações de inclusão de material nas respectivas revistas .
Caso encontremos nomes como Cazden, Geertz, Goffman, Gumperz,
Hymes, Milroy, Saville-Troike, Scollon , Tannen ou Zimmerman no comitê
editoria l de uma rev ista, podemos seguramente apostar que eles dificil -
mente aceitarão artigos sem uma perspe cti va soc iolingüística do discurso .
Artigos que tratem de ou tros aspectos do discurso provavelmente serão
desen cora jad os ou mesmo rejeitados . Por outro lad o, se encontramos no-
mes como Ackerman, Bazerman, Berkenkotter, Comprone, Doheny-Farina ,
Huckin, Linda Flower, Miller ou Odell , podemos esperar que artigos com
uma forte orientação retórica serão bem-vindos . Semelhantemente, diante
de nomes como Carter, Christie, Ha lliday, Hasan, Kress, Martin e Rothery,
chegaremos à inevitáve l conclusão de que a revista favore ce rá uma visão
VI
mais sistêmica do discurso .
ro
· .::::;
e::: Depois da revisão em pares, a segunda interven ção mais importante
<Cl.l
: ::::>
o::::r- vem dos ed itores, que desfrutam de todo o poder imagin áve l para manter
.e;
(l) a identidade e a integ ridade do gênero art igo de pesquisa . Berkenkotter
V'\
o e Huck in (l 995) registram um estudo profundo e fascinante desse tipo de
ã:i
e:::
<OJ co ntro le editorial na manuten ção da in tegridade genérica . Esses autores
1-:::i
182
afirmam q ue a "atividade te xtual " é tão importante para a construção e
divulgação do conhecimento quanto a "ativi dade científica" .
183
profissão, destruir suo união e suo força, o maneiro mais eficaz serio proibir
o uso de suo linguagem característica ." (Hudson, 1979, p. l ).
Diante disso, não surpreende que a maioria dos tentativas , por po-
derosos lobbies reformistas, de introduzir o inglês comum nos con textos
leg islativos de muitos democracias ocidentais é vista como uma imposição
de foro e tem sido firmemente rejeitada pela comunidade legi slativo profis-
siona l. Paro trator do contexto em que os leis são redigidos, interpretados
e usados, precisamos adotar uma perspectiva etnometodológico e enfocar
o gênero em seus próprios termos.
184
do discurso jurídico é o de que o verdadeiro poder legislativo, em todas
as democracias parlamentares, deve permanecer com os legisladores, e
não com o judiciário. Essa é uma das importantes razões por que clareza,
precisão, não-ambigü idade e caráter inclusi vo são va lores tão altamente
cultivados no discurso leg islativo britânico, o que confere aos propósitos
legislativos um grau relativamente elevado de transparência.
185
ções de homogeneidade para os que pertencem à comunidade , ao mesmo
tempo inte nsifica a distância socia l entre estes e os que não pertencem ,
res ultando , a lgumas vezes, em conseqüênc ias desastrosas para quem não
tem acesso a ele . Esse conh ecim ento po de res id ir na fo rma dos recursos
lingüísti co s uti lizados para construir um gênero; ou na percepção da s re-
gras de uso da linguagem , a lgumas das quais são socia lmente aprendidas,
como aque las associadas ao discurso de sa la de au la ou a outros gêneros
acadêmi co s, enquanto outras podem se r legal mente reforçadas, tal como
aque las relacionadas a procedimentos forenses . O tribuna l é um contexto
a ltamente forma l em que a ap lica ção da justi ça depende essencia lmente
da contrib uição dada pelas testemun has; no entanto, todas as formas de
comportamento, inclusive quem diz o quê, estratégias de perguntas e res-
postas dos participantes e mesmo o conteúdo das perguntas e respostas,
são estritamente controladas pe las regra s do jogo, as quais a maioria das
testemunhas norma lmente desconhe ce . Poucas testemunhas detêm qua l-
quer conhecimento sobre como sua contribuição é receb ida , interpreta-
da e usada pe los participante s a uto ri zados . All en e Guy (1989) (citando
uma comunicação pessoal de Worthington , 1984) relatam um excelente
exe m plo dessa fa lta de con hec imento comparti lhado em uma audiên cia
de tribu nal :
186
Isso deu suporte à alegação, por pa rte da defesa, de intenção
criminosa e garantiu a absolvição do pol icial.
Essa informação pode ser extremamen te enga nosa, a não ser para
quem está bem consc iente das prá ticas d iscursivas da comun idade pro -
fissiona l dos agentes financeiros. Qua lquer um que ten te ente nder a
afirmação deve saber que esse c rescimento de 60% em três anos, em
seu valor nom ina l, pode ser no m ínimo enganador. Embora o anúncio
inclua a costumeira ressa lva regu lamentar em forma de nota em letras
miúdas dizendo que "o desempenho anterior não indica necessaria-
mente o desempenho f uturo, o preço das co tas tanto pode subir como
desc er, e não pode ser garantido", um leigo ainda pode ser levado a
pensar que seu investimento provave lmente lhe dará ·um retorno de
aproximadamente 60% . Por outro la d o, o fato é que o va lor das co-
tas pode ter caído 100% por vo lta do último ano , e ainda pode estar,
à época do anúncio, indicando uma tendência de queda . Há várias
outras perspectivas possíveis , só acessíveis para aqueles que detêm o
conhecimento do modo como esses gêneros fun c ionam , e não para
aqueles que estão de fora .
rt:l
-..;::i
Se, por um lado, o poder do gênero pode ser visto como uma força n::J
..e::
legítima freqüentemente usada para manter a so lidariedade dentro de uma =
:X:
comunidade d iscip linar, por outro lado, essa força pode ser usada para >,
n::J
:=,
manter os de fora da comunidade a uma distância respe itáve l. Por um >
lado, ela capacita uns, os membros da comunidade, enquanto, ao mesmo
tempo, si lencia a outros, especia lmente os de fora.
188
que tinha prod uzid o um resumo exce pcional. Tudo que ela deve
ter ficado sabend o foi que seu arti go tinha si do rej eitado pelo
pro grama . (Berken kotter e Hu cki n, 1995, p. 11 5).
189
res do poder. Boa parte do discurso acadêmi co ainda não consegue reco-
nhecer as fontes de variedades, especia lmente aquelas da marginalidade
e da exclusão, dando a impressão de que não há , ou não deve ria ha ver,
nenhuma va riação no modo como os gêneros são co nstruídos, interpreta-
dos e usados .
190
a lime nte a mínima ambição de participar de uma comunidade disciplinar
especia lizada . Como afirma Bakhtin (1986, p. 80), "os gêneros devem ser
perfeitamente dominados, para serem usados criativamente" .2
2 . N . T. : No edição em porluguês, o texto de Bokhtin diz: " ... poro usá-los livremen te , é preciso um
bom dom ínio dos gêneros" (Bak htin, M . M. Estética do criação verba l. 2 . ed . São Paulo: · ·. arlins
Fontes, 199 7, p. 303 .)
191
ração das convenções genéricas, a fim de responder a situações retóricas
recorrentes, ou nem tão recorrentes , e não como um esquema a ser co-
piado.
7.7. Referências
ABERCROMBIE , D. Elements of general phonetics. Edinburgh : Edinburgh
University Press, 196 7 .
192
vote intentions" v. "socially recognised purposes" . ln : BRUTHIAUX, P. ;
BOSWOOD, T.; BERTHA, B., , eds. Explorations in English for professional
communication. Hong Kong : City University of Hong Kong .
BR IGHT, W. The view from the editor's desk : 30 years of American Lingu is -
tics. A talk given at the C ity University of Hong Kong , 1996 .
193
1985 .
104
B. L., BACKLUND, 1., eds . Writing in academic co ntexts. Uppsalo University,
1995, pp . 3- l l .
THOMAS, R. Plain English and the law, Statute Law Review, 9(3) : 144,
1985 .
rc
·..;:::;
rtJ
..e:
=
:::.:::
195
00
Repensando gêneros: nova abordagem ao -o
conceito de comunidade discursiva''(
John M. Swales
107
fessores, bem como nossos antecedentes acadêmicos, influenciarão nossa
maneira de conceber e de propor o conce ito de gênero. Será importante,
por exemp lo, para nossos a lu nos que se encontrarem no estágio inicial,
médio ou avan çado de socialização dentro das comunidades disciplinares,
assim como para os que forem falantes nativos ou não-nativos da língua
de socia lização . Permitam-me ilustrar, brevemente, este último aspecto .
Penso que pode ser demonstrado que os usos genéricos aum entam
considerave lmente no nível da forma lidade e nos níveis da abstra ção e
.!!!
da generalização . Como conseqüência, os a lunos de pós -gradua ção não
ro
:::J
........ podem evitá- los faci lmente . A lém disso, penso que pode ser demonstrado
X
......
(lJ
que os genéricos tendem a ser assoc iados a certos tipos de declara ções
Vl
ro categóricas : declara ções tipicamente iniciadas com partes do corpo (a ca-
· .::;
e:::
< (lJ
: :::::i
beça , o fígado) ; espécies de organismos (a ameba, o sapo) ; partículas (o
0-
(lJ
V'I
nêutron, o fóton) ; certos construtos tecnológi cos (o gás cromatógrafo, a
(lJ
V'I
máquina de escrever); categ o rias ocupacionais (o professor, o a luno); e,
e(lJ não menos importante, em nosso contexto, os próprios nom es de gêneros
e::
< (lJ
~ (um requerimento, uma encíclica papal) . Podemos, portanto, demonstrar
198
que, de modo bem sutil, alguns assuntos, tópicos e tratamentos são mais
abertos a uma realização genérica, em oposição à indefinida , do que ou-
tros : a medicina mais que a engenharia elétrica; a pedagogia mais que
a economia; a história social mais que a história política. Para o falante
não-nativo, o uso do artigo genérico é uma difícil questão de sintonia
gramático-retórica; para o falante nativo, ele acontece naturalmente .
199
almente gostaria de começar com algo um pouco além de " registro " e
" campo, modo e relação do discurso" . Sobre Biber, culpado , mas com
circunstâncias atenuantes . Biber alcan çou-me um tanto tardiamente no
processo de escrita, e li ve dificuldades tan to em a ce itar a ba se de corp us,
como em entender como um estudo que del iberadamente ignora com eço ,
meio e fim de textos poderia adequar- se a outro que tinha particular inte-
resse exatamente nesses começos , meios e fins . Culpado, quando muito,
de indolência . E, o que é mais importante, onde está Bakhtin? Culpado de
todas as acusações, lamentave lmente . Nada melhor que a resposta do Dr.
Johnson à dama que lhe perguntava : " Por obséqu io , Dr. Johnson, por que
o senhor define pastem , em seu dicionário, como uma parte do co rpo do
ca valo, se paste m é um tipo de portão ?" " Pura ignorância, senhora ." 1
l . N.T. : Postem rea lmente desig no uma porte mínimo do pato do cava lo , si tuado um po u~o acima
d o casco do un ho .
200
Mas, é claro, há uma armadilha aqui. Se a diferença entre "bate-papo"
e, digamos, "mesa-redonda" é tão acentuada, tão fundamental , então
seria log icamente bastante espantoso que os gêneros secundários pudes-
sem ter se desenvolvido a parfir dos gêneros primários . Bakhtin enfatiza,
corretamente, a imporfância do desen volv ime nto histórico , e em anos re-
centes tem havido um expressivo número de excelentes relatos da história
dos gêneros, sendo não menos imporfante o estudo de Chuck Bazerman
sobre a evolução do arfigo científico a parfir, originalmente, de conjuntos
de observações em forma episto lar. Mas, a crer-se em Bakhtin, ainda
há a questão das discrepâncias . Permanece o enigma de como surge a
grande diferença entre nosso relato de testemunha ocular a respeito de
um incidente e sua versão no jorna l loca l (Zuck e Zuck, 1984). Ainda
mais comp licadas são as co isas, como as impressionantes diferenças en-
tre nosso comporfamento verbal falando ao telefone com um interlocutor,
por oposição a quando deixamos uma mensagem gravada . A evo lução
faz mais sentido após um longo espa ço de tempo . Com tantos gêneros
secundários se formando ao redor de nós, com tanta disponibilidade de
orientação instrucional dirig ida para esses objetivos, com tantas pessoas
produzindo exemp lares de gêneros a parfir de livros (como meus alunos
e seus resumos), pode ser que o lento e bastante natural pro cesso de
evolução adaptativa pareça cada vez mais com uma metáfora cuja força
foi reduzida . É possível que devêssemos brincar com outras imagens, tais
co mo a metamorfose .
201
bíguos" ou LI AR 2 (Andrew Cohen) :
o) Você terá sorte se conseguir que esta pessoa trabalhe poro você.
2 . N .T. : Em ing lês , " lhe Lexicon oi lntentiona lly Ambiguous Recommendations", LIAR (" mentiro-
so").
202
cheio de ecos e re ve rberações de outros en unciados com os
quais se rela ciono atra vés do comunidade de esfera comum de
comunica ção discu rsivo . (p . 91)
V'I
·ra
:::,
....... Há, portanto, fortes motivos para se manter a linha sobre a comu-
X
~ nidade discursiva, especialmente quando vista como veículo de controle
V'I
rc para a produção e adm inistração dos gêneros . Mas há também questões
·.::::;
e::
<C:U
: ::::::, e incertezas igualmente fortes . Permanece aquela pergunta : se desafinar-
O"'
. OJ
V,
mos essa corda, que desarmonia se seguirá? Teoricamente, a comunidade
QJ
V,
discursiva é um construto social robusto, uma categorização defensável de
e
QJ algum grupo específico e importante? Ou é, nas palavras de Herzberg,
, e:
c:u
...::::, apenas "o centro de um leque de idéias", uma conveniente e abra<ngente
204
metáfora, ou pior, uma visão ilusória que nos oferece a duvidosa facilidade
de te ntar general izações a respei to do mundo e de suas palavras?
205
seados em sua experiência em Ann Arbor, eles observam que a comunida-
de acadêmica ou outras comunidades discursivas influenciam , interagem e
contribuem com a comunidade de fala mais ampla . Assim, temos cidades
universitárias (Oxford, Ann Arbor, Madison), cidades esportivas (SI. An-
drews, Saratoga) , cidades políticas (Ottawa , Canberra), cidades religio sas
(Assis, Meca), cidades pesqueiras, cidades empresariais, cidades lemáticas
e assim por diante . Esses estudantes vêem na Academia círcu los concêntri-
cos de co-participa ção que se irradiam das especialidades ou esco las para
o departamento, para a universidade e para a cidade. E, quanto mais se
desenvolve o processo de irradiação do núcleo central para a periferia ,
mais as características da co munidad e discursiva se confundem com as
da comunidade de fala; e, qua nto mais nos afastamos das associações
invisíveis em redes nacionais ou internacionais de pessoal especializado,
mais fortemente os aspectos locai s exercem sua influência . Creio que eles
estã o certos . A "verdadeira" comunidade discursiva pode ser mai s rara e
esotérica do que eu pensava .
Meus antigos cri térios para uma comunidade discursiva também não
sobreviveram ao teste do tempo . Para efe itos de reg istro histórico: eu argu-
mentava que uma comunidade discursiva :
206
- sugerindo que os critérios acima são um pouco menos reducionistas,
utópicos e estáticos do que os propostos por muitos outros , eles aind a
manifestam essas tendências . A autora cita, com aprovação, a observação
de Barbara Heronste in Smith de que muitos estudiosos "esquece m e o bs -
curecem" a participação individual em múltiplas comunidades , as quai s
requerem diversos papéis sociais, re lacionamentos variados com outras
comunidades e, em co nseqüência, "um mosaico ... de fide lidades, cren-
ças e motivações" . Também não há nada em meus critérios que se refira
expressamente ao impu lso de ir adiante ou à busca do novo : novas ma-
neiras de rea lizar as coisas, novos gêneros, novos temas, novos produtos
e a cria ção de um novo espaço de pesquisa . Entretanto, diversos estudos
(Tom Huckin, Greg Myers, Caro l Berkenkotter, etc.) mostram que mesmo
as pesquisas mais enfadonhas são lançadas sempre com a re ivindicação
de co nstituir conhe cimento novo, de va lor inesperado, e com a intenção
de serem dignas de nota. A lém disso, todo congresso anua l apresenta seus
novos temas "quentes" e seus novos jargões.
Tentemos, pois, novamente. Eis aqui os seis critérios mais uma vez,
todos (exceto o segundo) modifi cad os para rep rese ntar um mundo mais
com p lexo e um tanto o bs curo . Uma com unidade discursiva :
207
ressobre os trabalhos de alunos (ingleses) da pós-gradua ção mostra muito
bem a base coerciva do feedback . Esse autor propõe que a ma ioria dos
comentários de fechamento segue um esquema quádrup lo :
4) utiliza uma seleção crescente de gêneros para alcan çar seu co njunto
de objetivos e para praticar seus mecanismos parti cipativos . Eles
freqüentemente formam conjuntos ou séries (Bazerman) .
208
de pássaro digna de nota" . Também aprendi que diferentes convenções
aplicam-se ao evento genérico relativamente novo e, até então, sem desig-
na ção, que ocorre no início de cada reunião , quando o presidente diz algo
como : " Bem , vamos começar como sempre fazemos , lentando desco brir
que pássaros vocês viram desde a última reunião ". Não há truque algum
aí; antes, trata-se de uma oportunidade para os membros demonstrarem
entusiasmo . Mas, então, novamente acontece algo muito diferente durante
o períod o de debates, após a fala do palestrante principal, em geral algum
tipo de especialista . Em uma pa lestra recente, dada pelo biólogo oficial
responsá vel pelo Programa de Recuperação do Plover Cantador, 5 uma se-
nhora muito tranqüila, que ocupa um cargo burocrático em Ann Arbor,
fez a seguinte pergunta (que me surpreendeu tanto que imediatamente a
anotei) : "O senhor poderia fazer uma estimativa dos efeitos re lativos da
ação predatória de gai votas e corvos sobre os filhotes de passarinhos?" Ela
nunca fala assim , a não ser quando as convenções de gênero dentro dessa
comunidade discursiva a encorajam a fazê-lo .
209
nicações na marinha americana . Eis aqu i uma amostra de uma peça de
co rrespond ênci a interna da marinha :
210
autores revelam que os oficia is conce bem escritores que uti li zam o esti lo
burocrático como profissionais, objetivos e inteligentes - tra ços correspon-
dentes à imagem que a marinha espera que seus oficiais incorporem . Por
outro lado, escritores cu jo estilo seja preciso e claro são tidos por seus
co legas como não convincentes e até suspeitos.
Mas essa excelente história não acaba aí. Desde 1984, a fim de re -
duzir (no Congresso e noutros lugares) o ridículo causado por sua corres-
pondência externa, a marinha vem treinando seus oficiais para usarem as
diretrizes do Manual de Correspondência da Marinha - diretrizes (como
não usar a voz passiva, etc.) semelhantes às que geralmente se ensinam
em cursos de comunicação empresarial . Essas mudanças têm encontrado
mu ita resistência . Suchan e Dulek registra m comentários do tipo : "Como
posso respeitar a mim mesmo e ser respeitado por meus homens se escre-
ver como um rapaz de dezoito anos?" "Serei execrado se escrever como
se fosse um recruta" .
211
esse conceito seja apenas uma metáfora, é uma fi cção conveniente que
serve de veícu lo para a verdade .
212
continuar com uma certa arbitrariedade (no bom sentido) em cursos de
escrita básicos.
213
assume no contexto institucional, a idéia de com unidade d iscursiva tem s·e
revelado um excelente e necessário antídoto para o preconceito fácil e o
prescricionismo . Dada a qualidade atual dds obras que na prática , embora
nem sempre explicitamente, operam com esse con ce ito na in vestigação
de microcosmos discursivos ou retóricos, ele func iona como uma espécie
de estrela . Certamente, isso acontece em parte porque entendemos a co-
munidade discursiva, como Leslie O lsen observou recentemente , como a
própria matriz. Sejam quais forem as nossas inclinações acadêmicas, nossa
deformation profess ionelle, independentemente de nos interessarmos por
comunicação acadêmica ou comunica ção nos lugares de trabalho, se nos-
so interesse é monocultural ou transcultural, à parte nosso envolvimento
com sociologia ou retórica, escrita ou literatura, etnografia, análise do
discurso, redação ou Inglês como Segunda Língua (ESL), o conceito de co-
munidade discursiva estabelece, embora de maneira imprecisa, uma rede
de conexão interdisciplinar.
VI
ro drickson e Swales (a sair) comparam introduções de artigos de dois grupos
·.::;
e: diferentes : grandes comun idades anglo-americanas de pesquisa, em que
<QJ
: :::J
=-
(1)
V,
há forte competição por espaço de pesquisa, e uma pequena comunidade
QJ sueca que trabalha com o discurso em sueco moderno. Os lingüistas suecos
V,
e
QJ
ressaltam, coerentemente, que não há necessidade de se criar um espaço de
e:::: pesquisa para eles. Afirmam que existe uma quantidade enorme de dados e
<QJ
~
214
praticamente ninguém trabalhando com eles. Como disse um deles : "Qua l-
quer coisa que alguém fizer será útil ; há trabalho demais a se fazer para
uma pessoa entrar em competição com outra - portanto, não precisamos
escrever o tipo de introdução de que vocês falam" . Mauranan (a sair) é mais
clara em afirmar que alguns traços do discurso acadêmico "podem ... ser
tidos como determinados pelo gênero e outros como determinados pela cu l-
tura" . A autora exemplifica o segundo caso com a tendência em se co locar
a tese principal de um texto ou re lativamente cedo ou relati vamente tarde.
Em seguida, ela considera a noção de metatexto ou metadiscurso, para
afirmar que líderes da área, tais como Crismore e Farnsworth, permanecem
fiéis à tradição norte-americana, pela qual seq ue r admitem a possibilidade
de que o metadiscurso possa ter um ponto fraco; que possa realmente ser
menosprezado em certas tradições cu lturais, tais como a japonesa e a es-
candinava. Eis aqui as conclusões de seu estudo comparativa da escrita de
economistas finlandeses e anglo-americanos :
215
Portanto, aí está, senhoras e senhores, sob uma perspectiva fin-
landesa, metadiscurso é marketing . Por trás da discussão acima, está a
pressuposição subjacente de que existe algo como uma tradição escrita
anglo-americana (se os canadenses estão incluídos, é outra questão) . Essa
pressuposição precisa ser examinada .
216
rão em uma série de ampla s asserções - uma espécie de visão
fraturada da nova ordem mundial. Essa peroração será seguida
de um punhado de provas desordenadas, freqüentemente de
obscura procedência e de relação remota co m suas al ega ções .
O artigo terminará com uma seção que, mesmo quando chama-
da de Discussão ou Conclusão, será pouco mais que um resumo
das seções prévias (uma vez que, em todo caso, as idéias princi-
pais já foram co locadas desde o início) .
217
pequenas regras de paralelismo e a necessidade de adesão comp leta a um
estilo formal impecável. Os americanos (talvez em reverência ao manual
de estilo da Associação Americana de Psicologia) são avessos ao uso de
itálicos para efeitos de ênfase ou contraste , pois julgam que "a sintaxe deve
falar por si mesma" (Sandy Si lberstein, comunicação pessoal) . Os ing leses
apreciam itálicos exatamente porque eles evocam o ponto e contraponto
de uma situação ora/ . E assim por diante.
218
doutorado, re-enfatiza esse rito de passagem definitivo - e transforma, tal-
vez para sempre, nosso pensamento so bre ele. Temos , em um ponto, uma
revisão de literatura em forma de conferência pelo candidato, com interjei-
ções pelo orientador; no ca pítu lo dois, temos uma enciclopédia do tema,
cuja primeira entrada (convenientemente Ashmore) fornece uma sinopse
da tese ; temos , então, um capítulo final travestido de uma transcrição pa -
rodística da defesa oral. Muita ênfase aqui no macronível; e, similarmente,
no micronível. Considerem -se as notas como matéria final do livro . Elas
começam assim :
CAPÍTULO l
l . Bem-vindo às notas . Espero que vis ite essa parte do texto re-
gularmente . Haverá muitas coi sas aqui e seria uma pena perdê-
las . Mas, vamos ao assunto dessa nota em particular: posso per-
guntar-lhe por que caminho você chegou ao capítulo l , nota l?
Se você é um " notéfilo" , provave lm ente foi guiado diretamente
pe lo número _d a nota no texto, na página 15 - e acertadamente .
Todavia , pode ser que você chegasse a ler esta nota por causa
da referê ncia a Mulkay 1984 b, que leva ria você até a bib li ogra-
fia , onde o texto em questão teria o estranho título " 15 de agos-
to de 1984, C a ro Malcolm" e se localizaria neste mesmo texto
(Ashmore 1989) e neste mesmo ponto (pá gina 227 , nota l ). I
1
8.1. Referências
ASHMORE, Malcolm . Th e reflexive thesis: writing sociology of scientific .
V'1
knowledge. Chicago : University of Chicago Press, 1989. (J,J
rõ
BAKHTIN, Mi khail. Speech genres and other late essays. Austin , TX: Univer- ~
~
sity of Texa s Press, l 986 . e:::
_e::
o
---,
BHATIA, Vijay. Genre analysis. UK : Longm an , 1993.
710
ELBOW, Peter. Reflections on academic discourse : how it relates to fresh-
men and colleagues . College English 53, 135-155, 1991.
MAHALA, Dan. Writing utopias : writing across the curricu lum and promise
of reform. College English 53, 773-89, 1991 .
220
Identificação de gênero e propósito
comunicativo: um problema e uma
possível solução'~ -----
9.1. Introdução
Desde que o "novo" movimento de gêneros começou a fl orescer
no início dos anos 80, tem havido uma visão amp lamente consensual de
que os gêneros são ma is bem definidos como entidad es o ri entadas para
objetivos ou propósitos . Martin (l 985) afirmou, em célebre formu lação,
que "gêneros são o modo como as coi sas são feitas quando a linguagem
é usada para realizá- las" (p . 250); Mi ller (l 984) argumentou que "uma
definição de gêneros retoricamente saudável deve concentrar-se não na
substância ou na forma do discurso, mas na ação que ele é usado para re -
a lizar" (p. 15 l ); e Swa les (l 99 0 ), na te ntativa de definir gênero, acentuou
o pape l do propósito comunicativo em ta l defi nição . Mais recentemen te ,
Bhatia (l 997) sugeriu que, "ao tomar o propósito comunicotivo co mo tra -
ço característico de um gênero, a a ná lise tenta des li ndar os mistérios do
artefato em questão" (p . 313) e Johns (l 997) observou que " porque o
propósito é um aspecto importante, os gêneros freqüentemente têm sido
categorizados de acordo com as tarefas específicas que eles são usados
para realizar" (p. 24) . Em bora, mais adiante, advirta contra a atribuição de
propósitos únicos para os gêneros, como alguns têm feito, Johns também
nota que "um argumento centra l dos teóricos e pedagogos de gêneros na
Austrália e em outros lugares é que o propósito interage com os elementos
• Tradução de Benedito Gomes Bezerro, Maria Erotildes Moreira e Silvo e Bernordete Bio si-Rodrigues.
221
textuais em todos os níveis do discurso" (1997, p. 25). Embora nem todos
os proponentes principais de abordagens baseadas em gêneros o tenham
privilegiado (por exemplo, Berkenkotter e Huckin (1995) dão pouca aten-
ção ao conceito), permanece o fato de que o propósito comunicativo está
imbricado na maioria das grandes abordagens contemporâneas (Hyon,
1996) dos gêneros e de suas implicações e aplicações pedagógicas .
Miller, em seu influente artigo de 1984, observa que "o impulso para
a classificação é fundamental" (p. 151 ), o que Johns (1997) corrobora :
"nomear e categorizar são uma característica humana, e quem compar-
tilha o conhecimento de gêneros dentro de uma cultura geralmente com-
partilha um nome" (p . 22) . Apesar disso, o movimento de gêneros como
um todo não tem dado prioridade absoluta a taxonomias per se, em parte
talvez como uma reação contra o interesse literário em tal mapeamento e
em parte pela convicção de que os discursos não-literários têm importantes
papéis funcionais a desempenhar, bem além do que poderia indicar qual-
quer classificação . De fato, tentativas do movimento de gêneros de impor
esquemas taxonômicos, tais como os " seis gêneros ele mentares" de Martin
e Rhotery (1981 ), têm se mostrado sempre sujeitas a controvérsias . An-
tes, tem-se dado ênfase à categorização dos discursos como membros de
determinadas classes ("isto é uma carta comercial?"; "aqui lo é um artigo
de pesquisa?"), freqüentemente empregando adaptações da obra clássica
de Wittgenstein (1958) sobre "seme lhanças de famílias" ou do trabalho
de Rosch (1975) sobre a teoria dos protótipos, mais do que esquemas
abrangentes cobrindo universos de discurso inteiros, e isso apesar dosa-
lutar interesse recente em sistemas ou conjuntos de gêneros (por exemplo,
Bazerman, 1994) .
222
comercial. Têm sido realizados importantes trabalhos sobre os processos
de produção de gêneros (por exemplo, Myers, 1990) e sobre a recepção
dos gêneros (Rogers, 2000) . Além disso, as abordagens contemporâneas
de gêneros não-literários têm estabelecido para si mesmas um conjunto de
nós multidisciplinares de conexão . Os elementos-chave dessa rede incluem
Bakhtin (1986) e sua noção de intertextualidade; Giddens (1984) e ateo-
ria da estruturação (comentada assim por um professor de administração
conhecido nosso : "as rodas da vida vão girando e, à medida que giram ,
formam sulcos por onde giram as rodas da vida"); Vygotsky (por exemplo,
1978) e sua importante obra sobre temas como a Zona de Desenvo lvimen-
to Proximal, o valor dos "andaimes" na aprendizagem e a situacionalidade
de muitos processos cognitivos; e a Aná lise Crítica do Discurso, tal como
desenvolvida por Fairclough (por exemplo, 1992) e outros, que têm ofere-
cido, inter alia, uma proveitosa crítica das complexas relações entre poder
e gênero. Em termos de metodologia, tem havido um crescente emprego
de entrevistas baseadas no discurso e outras técnicas ainda mais etnográ-
ficas, tais como o "sombreamento" (Dudley-Evans e St John, 1998), ou o
acompanhamento de profissionais selecionados por dias - ou mesmo se-
manas - enquanto eles cumprem suas tarefas d iscursivas e não-discursivas
quotidianas . Como defendem Duranti e Goodwin (1992) e Tracy (1998), o
contexto , anteriormente considerado apenas parte do "ruído" de fundo , foi
promovido a primeiro plano . Conseqüentemente, cada vez mais se aceita
que a cognição é pelo menos parcia lmente "situada" no ambiente em que
se desenvolve (Berkenkotter e Huckin, 1 995) e que o conhecimento retóri-
co é pelo menos parcialmente " local" (Prior, 1998) e, assim, adquirido em
e moldado por circunstâncias pessoais e educacionais particulares .
223
comunicativo ser usado para decidir se um determ inado texto se qualifica
para filiação em um dado gênero, por oposição a outro? Como pode o
propósito comunicativo ser mantido como um critério orientador "privi le-
giado" (Swales, 1990), se ele é tipicamente indescritível a priori, se só pode
ser estabelecido após pesquisa considerável e se pode gerar discordâncias
entre os especialistas "de dentro" e os analistas de gênero "de fora " , ou
até mesmo entre os próprios especialistas? Neste trabalho, primeiramen-
te tentamos esclarecer melhor essa situação paradoxal, depois discutimos
alguns casos ilustrativos da dificuldade de se determinar o propósito co-
municativo e, finalmente, sugerimos um procedimento que permite que o
importante (especialmente em contextos aplicados) conceito de propósito
comunicativo seja mantido .
Vl
O propósito comuni cativo é um critério privilegiado e que ope-
· n5
:::::, ra para manter o escopo de um gênero, tal como concebido
........
X
cu
...... aqui, estritamente enfocado numa ação retórica comparável. ..
Vl
n:, O nome dos gêneros, herdados e produzidos pelas comunida-
·e;
e:: des discursivas e importados pelos demais, constitui valiosa co-
<CU
: :::::,
o::::r
(J.J
municação etnográfica, mas tipicamente necessita de va lidação
VI
cu posterior.
VI
e
cu
e::
<CU
l..!:I
224
Uma conseqüê ncia imediata desse tipo de abordagem funcional é que
os gêneros são encarados não tanto em termos de categorias de discurso,
mas, antes, como eventos sociais ou comunicativos. Ademais, a defini ção
procura estabelecer uma relação entre o propósito realizado e a estrutura do
gênero, ao sugerir que o propósito comun icativo (um critério "privi legiado ")
modela o gênero e imprime a ele uma estrutura interna - uma estrutura es-
quemática . Outra vantagem alegada é que o " propósito" permite ao analis-
ta sustentar e defender um conceito "estreito" de gênero; com efeito, se dois
textos, de outro modo semelhantes, tiverem propósitos comunicativos distin-
tos, deverão ser categorizados como gêneros diferentes. Conforme a defi-
nição, esses propósitos são "reconhecidos" pelos especialistas na área per-
tinente e podem, presumivelmente, ser deduzidos deles pelo analista. Desta
forma, políticos poderiam explicitar os propósitos de seus pronunciamentos,
cientistas especificariam os propósitos de artigos de pesquisa e juízes, os das
in stru ções aos jurados, e assim por diante . Porém, assim como Swales, na
parte final de sua definição, questiona a va lidade dos " nomes de gêneros",
utilizados pelas comunidades, quanto a sua exatidão, confiabilidade e per-
cepção, dúvidas semelhantes podem certamente ser levantada s a respeito
da visão dos especialistas sobre os "propósitos comunicativos".
225
Dessa discussão, parece bastante claro, agora, que a opinião de
especialistas sobre os propósitos não apresenta, em última análise, mais
credibilidade do que sua posição sobre a nomenclatura . Por uma razão
simples : os especialistas, em uma com unidade profissional , podem não
concordar sempre com respeito ao propósito de um gênero . Mesmo no
caso de concordarem, a citação acima sugere que os analistas podem ter
suas próprias tarefas a executar ao esmiuçarem os fundamentos lógicos
subjacentes aos gêneros . Com efeito, se os cientistas afirmam que artigos
de pesquisa realmente são apenas "simples relatos de experimentos", e
sem dúvida alguns dirão isso, eventualmente será possível mostrar que eles
estão equivocados . Certamente, nesse estágio do raciocínio, pareceria que
apontar o propósito comunicativo de um texto ou categoria de textos não
é sempre uma tarefa fácil ou rápida .
226
co" (1993, p. 16) . Uma ilustração de Bhatia para essas táticas é o caso
dos repórteres experientes, capazes de insinuar suas perspectivas políticas
preferidas sob a aparência de um noticiário objetivo. De fato , é esse tipo
de situação que leva Bhatia a acentuar a importância de um "informante-
especialista" que possa revisar as conclusões dos analistas ou , de outra
forma, orientá-los em suas investigações . Sejam ou não corretas as ob-
servações de Bhatia, o espectro de manipulação estratégica e intenções
particulares é capaz de acrescentar elementos adicionais ao "conjunto"
de propósitos comunicativos e, assim, complicar ainda mais o processo
de sua nomeação. De forma mais genérica, Swales já tinha reconhecido a
complexidade gerada pelos vários tipos de conhecimento interno : "Embora
se destine, sem dúvida alguma, a manter a audiência atualizada sobre os
eventos do mundo (inclusive eventos verbais), a transmissão de notícias
também pode ter o propósito de moldar a opinião pública, orientar o com-
portamento das pessoas (como numa emergência) ou apresentar seus con-
troladores e patrocinadores sob uma luz favorável" (1990, p . 47) . Embora
não encontremos exatamente "intenções particulares" aqui, certamente re-
conhecemos que certos jogadores podem conhecer as "regras do jogo" e
ter perspectivas de mais longo termo sobre estratégias subjacentes e dispo-
sições institucionais . Em conseqüência, não estamos mais procurando uma
simples lista ou "conjunto" enumerável de propósitos comunicativos, e sim
um conjunto muito complexo, em que alguns propósitos provavelmente
não serão oficialmente "reconhecidos" pela instituição, ainda que sejam
"identificados" - particularmente, em situações não oficiais - por alguns
de seus membros especializados .
227
tivo" . Um claro exemplo da ace itação atual do "propósito comun icativo"
pode ser visto nesse trecho de um artigo recente :
228
9.3. Esclarecendo a questão
A fim de investigar o problema, tomamos três exemplos em ordem de
complexidade ostensivamente crescente quanto a propósito comunicativo,
complexidade textual e retórica, e extensão . São eles : (1) listas de compras;
(2) breves " cartas-respostas" a recomendações; e (3) folders empresariais .
última cultura . j
Quanto ao propósito comunicativo das listas de compras, ele parece ::E:
e:
ser muito simples . Certamente, uma lista de compras é um lembrete útil -=
-o,
QJ
para o cliente, fazendo-lhe recordar o que precisa comprar. Tipicamente, QJ
>
a lista de compras é escrito à mão pelo próprio/a cliente, por um membro n::,
..r:::
QJ
da fam ília ou por alguém de casa, em um papel pequeno ou dobrado . ..JX:
V'I
<....
Contudo, quando entrevistou clientes na saído de um supermercado da QJ
o.o
Califórnia, Witte (1992) descobriu variações de propósito comunicativo E:
229
bem ma iores do que o que se poderia esperar. W itte descobriu, de fato,
que alguns clientes usavam suas listas pri meiramente poro fins de autodis -
ciplina. Para esses clientes, a lista de compras funcionava , por omissão,
como uma injunção sobre o que não comprar (" se não estiver na lista , não
compre "), sendo usada , portanto, como uma forma de prevenir compras
por impulso . Evidentemente, é difícil certifi car-se do grau de dissem ina ção
desse uso alternativo, embora seja razoável supor que seu uso deve ser
mais freqüente entre pessoas que estão atravessando d ificuldades financei-
ras ou fa zendo reg ime! Também não sabemos se há alguma conseqüência
textual desse propósito "anti- impulsivo", por oposi ção ao propósito de au-
xílio à memória . Se presumirmos que não, chegaremos à desconfortável
posição - pelo menos para quem enfatiza o papel categorizador do pro-
pósito comun icativo - de termos dois textos idênticos ou quase idênticos
realizando propós itos comun icativos bem diferentes.
Lima e limão
Couve e repolh o
Salsa e tom ilho
Ce rveja e vinho
230
9.3.2. Resposta à carta de recomendação
Nosso segundo exemplo de um gênero com propósitos múltiplos vem
do mundo acadêm ico - mais especificamente, o processo relacionado
com a nomeação de novos docentes nas universidades americanas . Ao
postular o cargo de professor-assistente, os cand idatos tendem a convidar
de três a cinco professores titulares para darem referências que possam
ser enviadas a todas as institu ições que as tenham solicitado . Nos dias
de hoje, as referências são quase sempre favoráveis ao candidato, em
parte por causa da competitividade do mercado de trabalho e talvez em
parte pela preocupação com potenciais litígios se forem feitos comentários
negativos. Parece que tais cartas de referência, pelo menos no contexto
das escolas de negócios norte-americanas, podem gerar uma breve nota
oficial de reconhecimento e agradecimento - que poderíamos chamar de
"carta-resposta" (Swales et ai., 2000). Eis um exemplo típico (usou-se um
pseudônimo) :
231
candidato . Talvez o "move " ("movimento retórico") mais interessante no
pequeno corpus examinado por Swales et ai. (2000) cons ista nas declara-
ções sobre a natureza árdua da produção de cartas de recomendação, tais
como : "Agradecemos seu tempo e esforço em escrever esta carta, que será
de grande auxílio em nossa decisão" . Vemos, aqui, uma certa tentativa de
expressar reconhecimento pelo considerável trabalho envolvido e assegu-
rar ao autor da recomendação que seu esforço não foi em vão .
232
comunicativos" que motiva a aparente extensão do sistema de gêneros
(Bazerman, 1994) que orquestra o processo de nomeação de docentes nos
Estados Unidos co ntinua , até o presente momento, obscuro. Como Swa les
observa, "precisaríamos de mais dados sócio-cognitivos do que aqu ilo que
o próprio texto fornece" (1993, p . 690) .
Poderia ser tentador simp lesmente conc luir, como Bhatia (1993, p . 59)
de fato fez, que o folder empresarial é um "gênero promociona l" e, con -
seqüentemente, que seu propósito comunicativo é "promover a lgo" (neste
caso , a empresa) . Entretanto, o problema dessa descrição de Bhatia é que
ela continua muito gera l e, assim , não contribui muito para a descri ção
d o gênero como uma a tividade propos ital e inten cio nal, especi al m ente se
considerada do ponto de vista dos produtores/ emissor. Askehave ( 1998)
tenta reve lar algumas das assim chamadas intenções "veladas" dos foi-
ders, ao lado da inten ção mais abrangente que é a promoção da empresa .
Usando os princípios básicos da lingüística sistêmico-funcional (isto é, que
o contexto cultura l e situaciona l acres centa sentido e propósito ao te xto),
As kehave argumenta que, se desejamos descobrir e identificar o propós ito
de um texto , não podemos evitar a investiga ção do co ntexto em que o
texto é util iza do . Dessa fo rma , no intuito de ir além do ó bvi o propósito de e::::
...i:::
o
--,
" p rom over a lgo " e inferir o que a empresa está ten tando fa zer através de
sua pro mo ção, prec isamos nos volta r para o mercado ind ustria l e para os
ob jetivos e inte nçõ es dos parti cipantes desse merca do.
233
no mercado industrial. No entanto, uma análise do contexto cultural suge-
re que o estabelecimento de relações comerciais duradouras é de superior
importância no mercado industrial atual - dessa forma , a capacidade de
entrar em relações cooperativas é vista como uma ferramenta esse ncial e
como um bem extremamente valioso . Portanto, um dos principais obietivos
mercadológicos de uma companhia que opera no mercado industrial é
proietar-se como um parceiro comercial qualificado e respeitável, e aqui
o folder pode ser visto como desempenhando esse importante papel. Em-
bora não possam, por si mesmos, estabelecer tais parcerias, os folders
podem facilitá-las, apresentando o empresa como um parceiro qualificado ,
e isto, sugere Askehave, emerge como a proposta central e implícita dos
folders empresariais por ela examinados.
234
como um sina l de sua existência; isto é, se a companhia tem um folder, é
uma empresa "de verdade" . Assim, o fo lder empresarial é de fato um texto
multifuncional, cu jos propósitos comunicativos representam um verdade iro
desafio para o ana lista .
235
discursos pol íticos do que outros tipos de carta (Martin, 1985,
p.17) .
236
aquele estilo. O texto tem todos os traços superficiais que poderíamos es -
perar em um resumo, mas é evidentemente uma paródia , que acreditamos
ter sido composta por Michael Swan vários anos atrás .
237
fazer uma negociação de compra e venda" . Por um lado, é amplamente
reconhecido que os negócios têm como premissa a competição entre as
partes envolvidas, porém, por outro, isso pode ser difícil de admitir para os
ana listas de gênero que trabalham com a comunicação empresarial e ne-
cessitam de um conceito do tipo "guarda-chuva" para unificar sua troca de
mensagens. Askehave (l 998) mostra o papel do folder como parte de uma
busca por parceiros comerciais, mas sabemos ig ua lmente que as empresas
também podem estar preocupadas com a substituição de seus parceiros
tradicionais por outros novos e me lhores . O propósito "todo abrangente"
situa-se desconfortavelmente d iante de todos os movimentos comerciais
relacionados com o descarte de fornecedores ineficientes, negligentes e
dispendiosos, e coisas seme lhantes . E, se retornamos ao gênero lista de
compras, mais uma vez poderíamos optar por a lguma caracterização de
ordem maior, que possa abranger os propósitos a lternativos descobertos
por Witte (l 992), ta l como a proposta de que a lista de compras "tem a fi-
na lidade de orientar expedições de compra de forma eficiente e prudente" ,
mas ta l caracterização pareceria "vazar" para outros gêneros, tais como os
pedidos feitos por fax ou por te lefone para entrega em domicílio, e outras
semelhantes .
e
cu
a vantagem de recusar a tipificação para listas de compras que são po-
e::: emas, paródias, cartas de amor ou materia l de ensino de língua) . Nesse
<Cl.J
<..::I
238
particular, a fusão feita por Bhatia , de duas modalidades de textos pro-
mocionais tão diferentes, com audiências tão diferentes, em um "mesmo"
gênero, cria muito mais problemas do que resolve .
2.
t
"gênero"
3.
t
co ntexto
4.
t
re-propósi'J do gênero
239
fissionois operando com muita forço (Dressen e Swo les, 2000) . Segundo, os
usos ini ciais do propósito (no passo l ) e do gênero (no posso 2) foram postos
entre aspas poro indicar seu status provisório naqueles estágios do procedi -
mento. Terceiro, em uma época em que os instituições parecem estar reali -
zando suas "reengenharias " e revendo suo missão, não sentimos necessidade
de nos desculpar demais por usar o neologismo "re-propósito". Quarto, no
momento atual, preferimos pensar em "revisão do status do gênero" como um
tipo de categoria aberto , que pode impli car o revisão de fronteiros genéricas,
ou o defeso da existência de um novo gênero ou da atrofio ou descaracteri-
zação de um gênero antigo. Finalmente, não dispomos de espaço, aqui, poro
discutir ou definir o que entendemos por "co ntexto". Antes, pensamos que é
preferíve l deixá-lo como uma "caixa preta" que pode ser operacionalizado por
investigadores individuais de acordo com suas circu nstâncias. Como observo
Von Oijk, "não há um limite a priori poro o campo de ação e poro o nível do
que conto como contexto relevante " (l 994, p.1 4), embora todos nós, co mo
ana listas, tenhamos conhecimento de a lguma versão do " lei do menor retor-
no", à medido que nossos investigações se expandem no tempo e no espaço,
além do corpus que temos .em mão.
2.
i
Va lores, obje tivos, condi ções materiais do comu nidade discu rsiva
3.
i
Ritmos do traba lho, horizontes de expectativas
4.
i
Repertório de gê neros e normas de etique ta
5.
i
Re -propósito dos gêneros
6.
i
Característ icas do:
G ênero A Gênero B G ênero C G ênero D
240
Descrições esquemáticas de procedimentos, tais como mostramos
nas figuras 1 e 2, são sem dúvida idealizadas e higienizadas, mas mostram
que a atribuição de propósitos comunicativos a um comp lexo de gêneros
é um estág io tardio do processo . A abordagem etnográfica, como traba -
lho in tensivo, tem também produzido resultados extraordinários . Beaufort
(2000), em seu estudo sobre a escrita em uma organização sem fins lucra-
tivos, pôde estabelecer uma hierarquia de gêneros, dependendo do tempo
e dos recursos gastos neles e da importância relati va dos destinatários .
Swales (1998) explorou a produção e os produtores de textos em um her-
bário de universidade e pôde mostrar que botânicos sistemáticos operam
dentro de um conjunto de gêneros de flora, monografia e tratamento que
é completamente diferente do que é tipicamente admitido para a pesquisa
acadêmica nas ciências biológicas (Myers, 1990), enquanto Winsor re-
velou, em seu estudo de 'í\gricorp", o aspecto político do gênero como
ação soc ial , identificando "ordens de serv iço como um gênero que tanto
desencadeia como dissimula o traba lho dos técnicos , permitindo que desa-
pareça frente ao trabalho dos engenheiros" (Winsor, 1999, p. 155) .
241
representa um corretivo útil contra uma posição realista em relação à no-
menclatura . A esse respeito, um estudo particularmente valoroso é Mou-
ranen (1994), que demonstrou, entre outras coisas, que "uma tutoria" tem
conotações e denotações muito diferentes nas universidades finlande sas e
britânicas, e ousamos dizer que tais diferenças cu lturais podem se multipli-
car facilmente . Mesmo dentro de um sistema unitário, convenções sócio -
históricas podem assegurar que práticas classificatórias adquiram um va lor
simbólico que supere qualquer noção simples de propósito comunicati vo
(comunicação pessoal de Kramsch) . À medida que as instituições terciários
se tornam mais sensíveis às necessidades e esperan ças de seus alunos (e
de seus pais), pode haver uma considerável vantagem simbólica em man-
ter o rótulo genérico de "tutoria", indicando uma interação personalizada
entre tutor e tutelado, quando de fato a soi-disant tutoria hoje é realizada
inteiramente por computador. De modo se melhante, o tradicionalmente
ameaça_dor rito de passagem, a defesa de tese de doutorado, tem assu-
mido em muitos países um sabor aparatoso e perdido muito do seu cará-
ter inquisitorial. O "re-propósito" encoraja o estudo sóc io-retórico de tai s
tendências e também permite concentrar a atenção na questão altamente
contemporânea de como o avanço tecnológico afeta o modo como os
exemplares de gênero são perceb idos e classificados em relação ao seu
meio de tran smissão : tele x, fa x, telefone, e-mail, interação face-a -face,
vídeo-conferência, jornal eletrônico, jornal impresso e outros .
242
compartilham um conjunto de propósitos comunicativos" (Swales, 1990,
p.58), ou como "uma combinação de eventos comunicativos que cum-
prem uma função social comum" (Bex, 1996, p. l 37), para o analista, a
descoberta desses propósitos comunicativos nos gêneros mais reputados,
e a inclusão ou exclusão de exemplares de gêneros marginais ou peculia-
res , é suficientemente carregada de incertezas e incompreensões para ser
tipicamente "uma matéria para trabalho de campo prolongado" . Assim,
sugerimos que o propósito (mais exatamente, os conjuntos de propósitos
comunicativos) retenha o status de um critério "privilegiado", mas em um
sentido diferente daquele originalmente proposto por Swales. Não é mais
privilegiado pela centralidade, proeminência ou clareza evidente, nem cer-
tamente pelas crenças reportadas pelos usuários de gêneros, mas por sua
posição como recompensa ou retribuição aos investigadores no momento
em que chegam a completar o círculo hermenêutico .
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243
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