Revista Bodisatva > Sabedorias > A liberdade que nunca cessa: Entrevista com James Low
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REVISTA BODISATVA: James, obrigado por aceitar o nosso
convite. Vamos lá… Me interesso muito pelas trajetórias, pelos
movimentos que fazemos no nosso caminho do Darma e gostaria
de saber, inicialmente, como você se tornou budista.
JAMES LOW: Eu me tornei budista por ter ido à Índia. Antes disso, eu
estava muito interessado no hinduísmo. Quando fui para a Índia, num
primeiro momento, viajei para locais de peregrinação hindu. Mas
gradualmente fui me sentindo mais atraído pelo budismo. Naquela época,
Chögyam Trungpa estava morando na Escócia e eu costumava encontrá-lo
no Samyé Ling Monastery, que estava só começando. Além disso, na
universidade, eu estava estudando filosofia e religião indianas, história
indiana, e também antropologia social. Então eu tinha uma noção do
desenvolvimento histórico do budismo na Índia, do contexto. E,
obviamente, também tinha curiosidade em relação a qual era o limite da
vida, porque estávamos em 1966, 1967, 1968, e havia uma sensação de
liberdade muito forte. Contudo, essa liberdade era colocada em termos de
liberdade em relação a alguma coisa: à opressão, à limitação, etc. O
budismo, por outro lado, abordava a liberdade como a liberdade de ser você
mesmo, ou de despertar para a sua natureza de Buda. Então, em algum
ponto na interface entre essas diferentes ideias de liberdade, eu comecei a
me interessar pelo budismo.
Mas, na verdade, ter presenciado essa cena foi muito útil! Um grande
problema no budismo é que as pessoas o idealizam – idealizam o lama,
idealizam a prática… Mas se você segue essa orientação transcendente e
pensa que existem algumas pessoas raras e especiais, todas as outras se
tornam umas idiotas perdidas e confusas.
O tantra funciona exatamente com base nesse princípio. Você reza para as
deidades, elas são maravilhosas e especiais e, pela prática, elas retornam
para dentro de você. Então, a projeção e a re-internalização se equilibram.
Mas dá muito trabalho! Por que você projeta para depois introjetar? É
porque você é uma pessoa comum e não consegue acreditar que a sua
mente é perfeita.
Então, esta ideia de que todos deveriam fazer o ngöndro é uma espécie de
“budismo de produção em massa”. Por que você deveria, necessariamente,
fazer ngöndro? Se você fosse ao médico e ele dissesse “tome esses
antibióticos”, você argumentaria: “Como assim? Não é essa a minha
doença”. Primeiro você faz o diagnóstico, depois dá o remédio. O budismo,
em geral, não tem feito um diagnóstico: “você está só vagando pelo samsara,
é disso que você precisa”. Não é verdade.
Dizer que existem nove yanas e que no topo está o Dzogchen não significa
nada. Porque esse é o topo para você. Talvez a prostração seja a prática de
topo pra algumas pessoas. Havia um lama, um lama Drukpa Kagyu
chamado Apo Rinpoche, cuja esposa fez muitas e muitas centenas de
milhares de prostrações, cerca de um milhão e seiscentos mil prostrações.
Esta era a prática dela, é o que considerou que a fazia amadurecer.
Acho que é disso que temos que estar muito conscientes: estou ensinando a
mim mesmo? E como eu vou saber se isso está funcionando para mim? Os
textos tibetanos tradicionais têm todo tipo de sinais, de que você vai ter
certos tipos de sonhos, ou certas coisas vão acontecer. Mas geralmente, no
Dzogchen, a vida fica mais fácil. Há mais espontaneidade, mais
conectividade entre você e o mundo, a sua intuição amadurece, e portanto
você consegue encontrar seu caminho em diferentes situações sem pensar.
Você não fica tão preso em operações mentais.
Mas é claro que isso não se mostra como uma espécie de formação
particularmente budista. Você não se torna um budista melhor no
Dzogchen. Não vai formular nenhum tipo de identidade social. Enquanto
que, se você for tibetano e fizer o ngöndro, a prática de yidam e um retiro de
três anos, você se torna um lama, e daí recebe mais comida e roupas
melhores pra vestir. É uma mudança na carreira.
Sim. Por exemplo, agora você é Tara, então você estrutura sua
vida como se fosse esse tipo de deidade, então você vai ver tudo,
sua vida a partir dessa mandala… Você acha que o tantra poderia
oferecer esse tipo de ajuda às pessoas?
Bom, você precisa ter muita fé e precisa estar em uma situação em que
consiga manter isto, manter o orgulho da deidade. É necessário mantê-lo o
tempo todo. Nas culturas modernas, em que você tem que se mover entre
vários papéis, principalmente no trabalho, é mais problemático, porque
externamente você precisa mudar seu comportamento e suas respostas de
acordo com as circunstâncias. Então eu diria que sim, essas práticas são
muito boas se você encontrar uma maneira de realmente adentrá-las e
entender o que significam.
Às vezes não é muito fácil para as pessoas fazerem isso. Mas eu fiz muita
prática tântrica. E essencialmente isso significa que você transforma o
mundo profano no mundo sagrado, e então percebe que tudo é sagrado e
que não existe um mundo profano. Isso diz respeito ao profundo despertar
para a real sacralidade de toda a existência.
Tem uma árvore aqui na nossa frente. Eu começo a andar em volta dela, e a
cada passo que eu dou, tenho uma árvore diferente. Não é possível
apreender a árvore. Mas você pensa: “E daí? É uma árvore! Deixa pra lá!”.
No nosso processo de conceitualização, é como se ao nomear nós
chegássemos a alguma coisa, mas se nós ficamos com o fenômeno,
percebemos que ele é inapreensível. É irrefutável, mas inapreensível. Mas
se você descansa dentro do nome — “ah, isso é só uma árvore”, “aquilo é só
um carro” — isso lhe dá um falso senso de poder e inteligência.
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5 Comentários
Maravilhoso!
Gratidão!
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