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A BEM-AVENTURANÇA DO CORAÇÃO LIMPO

Mateus 5:8
Estamos perante a bem-aventurança que exige de todo o que a lê parar, pensar
e auto-examinar-se. A palavra do idioma grego que significa puro é kázaros, e possuía
vários significados e usos diversos, cada um dos quais adiciona um matiz à concepção
da bem-aventurança que envolve a pureza na vida cristã.
(1) Em seu sentido original, significava simplesmente limpo, e podia usar-se, por
exemplo, em relação à roupa suja depois de ter sido lavada.
(2) Era usada normalmente para designar o trigo que foi separado da palha. Com
o mesmo significado, prega-se de um exército do qual se eliminaram todos os soldados
descontentes, covardes, mal dispostos e pouco eficazes em sua missão, e que portanto
constitui uma força militar integrada somente por combatentes de primeira qualidade.
(3) Aparecia freqüentemente em companhia de outro adjetivo grego – akératos.
Esta palavra pode ser empregada, por exemplo, para designar o vinho ou o leite que não
foram adulterados mediante a adição de água, ou o metal puro, sem mescla de liga
alguma.
O significado de kázaros, portanto, é sem mescla, não adulterado, sem liga. É por
isso que a bem-aventurança envolve uma exigência tão formidável. Poderia traduzir-se
da seguinte maneira: Bem-aventurado é o homem cujas motivações são sempre
integras e sem mescla de mal algum, porque este é o homem que verá a Deus. É
muito raro que realizemos até nossas melhores ações a partir de uma motivação
absolutamente pura. Se ofertarmos com generosidade e desinteresse a favor de alguma
boa causa, é possível que no fundo de nosso coração estejamos sentido o prazer de nos
sentir bem sob a luz de nossa própria aprovação, ao mesmo tempo que desfrutamos do
prestígio e a gratidão a que nos conduz nossa "generosidade".
Se fizermos algo belo, que exige algum sacrifício de nossa parte, é possível que
não estejamos totalmente livres do sentimento de querer que outros homens vejam em
nós algo de heróico ou que nos considerem como mártires. Até o ministro do Deus mais
sincero não está totalmente livre do perigo de sentir-se satisfeito consigo mesmo ao ter
pregado um bom sermão. Não foi João Bunyan quem ao dele se aproximar alguém um
dia para lhe dizer que tinha pregado um bom sermão replicou: "O diabo já me disse isso,
enquanto descia do púlpito"? Esta bem-aventurança nos exige a mais meticulosa
vigilância e auto-exame.
Que atitude guia nossas ações: a vontade de servir a outros, ou o desejo de
receber uma retribuição? Oferecemos nossos serviços desinteressadamente, ou porque
procuramos a melhor maneira de nos exibir? Trabalhamos na Igreja por amor a Cristo
ou para manter nosso prestígio? Nossa fidelidade na assistência ao culto dominical, parte
do desejo de ir ao encontro de Deus, ou é simplesmente o cumprimento de um costume
ou a forma de obter a mais convencional das respeitabilidades? Até nossas orações e
nossas leituras da Bíblia, são o resultado de um desejo sincero de andar em companhia
de Deus, ou no fundo o que nos move é o prazer de nos sentir melhores que outros, que
não manifestem tais demonstrações de piedade?
É nossa religião algo no qual somos conscientes nada menos que da
necessidade de ter a Deus em nosso coração, ou algo que nos permite pensar
placidamente em nossa própria piedade? Examinar as motivações mais profundas é uma
empresa árdua e que muitas vezes nos envergonha, porque há muito poucas coisas que
até os melhores dentre nós façamos por motivações completamente puras. Jesus
prosseguiu dizendo que somente os de puro coração verão a Deus. Um dos fatos mais
simples da vida é que vemos somente aquilo que somos capazes de ver.
Este asserção não vale somente no sentido físico, mas em qualquer outro sentido
possível. Se uma pessoa comum sair em uma noite estrelada, a única coisa que verá é
uma enorme quantidade de manchinhas luminosas que cintilam no firmamento; vê aquilo
que está capacitado a ver. Mas em idênticas circunstâncias o astrônomo poderá nos
dizer o nome de cada estrela e planeta, e passeará seu olhar pelas constelações como
se fossem suas velhas conhecidas. Sob o mesmo céu, um navegante lerá os sinais que
podem conduzir sua nave ao porto desejado através dos mares nos quais não há
caminhos nem rotas demarcadas. A pessoa comum pode caminhar pelo campo, e a
única coisa que verá na margem do atalho é um matagal de seixos e flores silvestres;
mas o botânico saberá o nome e uso de cada planta e até possivelmente seja capaz de
descobrir alguma raridade ou curiosidade de alto valor científico, porque para isso seus
olhos estão capacitados a ver.
Levemos duas pessoas a um museu cheio de quadros antigos. Quem não tiver a
formação necessária não será capaz de distinguir a obra autêntica da imitação
fraudulenta, enquanto que o crítico de arte poderá distinguir entre muitas telas de menor
importância artística aquela que, sendo obra de algum grande mestre, vale uma soma
enorme. Há pessoas de mente suja que em qualquer situação vêem a oportunidade para
debulhar uma anedota picante ou uma brincadeira suja. Em qualquer esfera da vida
vemos somente aquilo que somos capazes de ver.
É neste sentido que Jesus afirma que somente os limpos de coração verão a deus.
É muito importante recordar, como advertência, que se mediante a graça de Deus
conservamos limpos os nossos corações, ou mediante o pecado os enchemos de sujeira,
estamos determinando nossa futura capacidade ou incapacidade para ver a Deus. Esta
sexta bem-aventurança, portanto, poderia ler-se: Quão feliz é o homem cujas motivações
são absolutamente puras, porque este homem algum dia será capaz de ver a Deus!

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