Fundado em 1864

www.dn.pt / Domingo 20.2.2022 / Diário / Ano 158.º / N.º 55 823 / € 1,80 / Diretor-geral editorial Domingos de Andrade / Diretora Rosália Amorim / Diretor adjunto Leonídio Paulo Ferreira / Subdiretora Joana Petiz

PANDEMIA
ECONOMIA GANHOU 65 MIL
POSTOS DE TRABALHO
Emprego recuperou do choque provocado pelo vírus e em 2021 cresceu 1,6% face aos dados de 2019, com mais 65 402 trabalhadores a descontar para a Segurança Social, revelam
os dados anuais finais a que o DN/Dinheiro Vivo teve acesso. Média mensal das remunerações ficou em 967 euros, graças a maior recuperação nas profissões mais qualificadas.
PÁG. 17

PEDRÓGÃO GRANDE
Vilamoura
PJ ainda procura HOJE
DEPOIS DOS INCÊNDIOS,
suspeitos de terem
pegado fogo a bar GRÁTIS
PINHAL INTERIOR SECOU
PÁGS. 12-13
PÁGS. 14-15
REVISTA
Inovação
Agroalimentar
aposta em
palhinhas
comestíveis
e garrafas
biodegradáveis
NUNO BRITES / GLOBAL IMAGENS

PÁGS. 18-19

Reportagem REINVENTAR
na Guiné PORTUGAL 2022/2026
“Há uma luta para Luís Carvalho
Presidente
controlar o poder da Escola Superior
de Enfermagem do Porto
dentro do poder”
PÁGS. 26-27 “GOVERNO DEVE REFORÇAR
LEGISLATIVAS QUEM FEZ A SAÚDE COVID AJUDOU Matheus Nunes
FINANCIAMENTO DO ENSINO
SUPERIOR”
MAIORIA ABSOLUTA DE COSTA? A REDUZIR CONSUMO O “menino PÁG. 11

MAIORES DE 34 ANOS, MULHERES DE ANTIBIÓTICOS

descarado”
tornou-se joia

E MENOS INSTRUÍDOS PÁG. 8 NO PAÍS PÁGS. 4-6

rara no Sporting
PÁGS. 30-31

157 ANOS A INFORMAR “RIGOR, HISTÓRIA, QUALIDADE, SERVIÇO, INOVAÇÃO”. O MELHOR DO DN PELA VOZ DE 22 PERSONALIDADES PÁGS. 20-23
2 EDITORIAL Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias

EDITORIAL
Joana Petiz
Subdiretora do Diário de Notícias

Mudar de vida
1
Mais velhos e com grau de instrução
abaixo do secundário. E pela primeira
vez há um gender gap a considerar: as
mulheres também votam mais no PS.
São as conclusões reveladas na análise feita
aos votos dos portugueses nas últimas le-
gislativas e que ajudam a explicar de onde
veio a maioria absoluta de António Costa.
Há outros fatores, potencialmente liga-
dos a estes, que também ajudarão a justifi-
car a propensão maior para o voto socialis-
ta. E que passam pelo retrato da própria po-
pulação portuguesa.
Por exemplo, o número de funcionários
do Estado, que cresceu como nunca duran-
em 2021, em pleno processo de desmate-
rialização e digitalização, a função pública
engordou umas significativas 14.500 pes-
soas. Salários pagos pelo Estado, despesa
pública permanente, e por aí fora...
A estes podemos ainda juntar 1,9 milhões
de reformados, cujas pensões são natural e
justamente pagas pelo Estado.
A questão é que a análise feita aos resulta-
dos eleitorais faz também um retrato do
país: um Portugal cada vez mais envelheci-
do e ainda com uma grande percentagem
de pessoas com baixas qualificações – e re-
duzidas remunerações também.
mais recente retrato estatístico, cujos resul-
tados conhecemos já no arranque deste
ano, um em cada quatro portugueses tem
mais de 65 anos. Para o que contribui o fac-
to de, nos últimos 20 anos, o número de
nascimentos ter caído em 25% – e nos 10
mais recentes a fatia de mais velhos ter en-
gordado em mais de 20%.
O problema demográfico é mais do que
português, é europeu, mas ainda assim nós fi-
camos pior nesta péssima fotografia, que nem
a imigração tem sido capaz de compensar.
Somos o terceiro país da União Europeia
com um rácio mais preocupante de idosos
para jovens – para cada dois, há três pessoas
Se o nível de escolaridade em Portugal
melhorou, como revelam os Censos, a ver-
dade é que ainda está em valores que não
são propriamente motivo de orgulho: só
um em cada cinco portugueses tem o en-
sino secundário completo e no total de
mais de 10 milhões de residentes não che-
gam a dois milhões os que têm uma licen-
ciatura.
Este retrato não pressagia um bom futuro
para Portugal. Não nos podemos conformar
com a ideia de minguarmos até desapare-
cermos, de perdermos sucessivamente
qualidade de vida e meios de sustentar os
nossos velhinhos e, em simultâneo, garantir

2
te os seis anos de governação socialista,
chegando no final do ano passado a um re-
corde absoluto de 733.495 trabalhadores
nos serviços públicos centrais ou locais. Só
Porém, se nos desligarmos do fator idosas (pior do que nós, só Itália) – e o pri- boas perspetivas de desenvolvimento aos
votação e olharmos só o retrato do meiro em percentagem de pessoas entre os nossos mais novos. É isso que esperam os
país, a frio, temos razões sérias para 25 e os 64 anos sem ensino secundário ou mais frágeis da nossa sociedade, muitos dos
preocupação. De acordo com o superior. quais ajudaram à maioria absoluta.

FOTO DE 1936 OPINIÃO HOJE

“As novas silhuetas
da Armada”, Sebastião Daniel
escrevia o Diário de
Notícias a 6 de
Bugalho Deusdado
Algo está podre no reino Carros elétricos: o bom
fevereiro de 1936, das eleições e tudo o que ainda falta
noticiando “O PÁG. 9 PÁG. 16
ressurgimento da
Armada”. O
programa de Joana João Lopes
Da privacidade
substituição das Amaral Dias à obscenidade
embarcações da Adeus, civilização
PÁG. 34
Marinha, a maioria PÁG. 10
do século XIX,
lançado na década
de 30 estava então José Mendes
Lítio: sim e quanto antes
prestes a entrar
PÁG. 10
numa nova fase. “A
nossa Marinha de
Guerra”, lia-se então
no jornal, “dispõe já
de 14 unidades dps,
aos modernos tipos.
O que parecia um
sonho é já uma
realidade.”

Diretor-geral editorial Domingos de Andrade Diretora Rosália Amorim Diretor adjunto Leonídio Paulo Ferreira Subdiretora Joana Petiz Secretário-geral Afonso Camões Diretor de arte Rui Leitão
Diretor adjunto de arte Vítor Higgs Editores executivos Carlos Ferro, Helena Tecedeiro, Pedro Sequeira e Artur Cassiano (adjunto) Grandes repórteres Ana Mafalda Inácio, Céu Neves e Fernanda Câncio
Editores Ana Sofia Fonseca, Ricardo Simões Ferreira, Rui Frias, Filipe Gil,João Pedro Henriques e Nuno Sousa Fernandes Redatores Ana Meireles, Carlos Nogueira, César Avó, David Pereira,Isaura Almeida,
Paula Sá, Susete Francisco, Susete Henriques, Susana Salvador e Valentina Marcelino Fecho de edição Elsa Rocha (editora) Arte Eva Almeida (coordenadora), Fernando Almeida, Maria Helena Mendes e Lília Gomes
Digitalização Nuno Espada Dinheiro Vivo Joana Petiz (diretora) Evasões Pedro Ivo Carvalho (diretor ) Notícias Magazine Inês Cardoso (diretora ) Conselho de Redação Ana Mafalda Inácio, Carlos Nogueira,
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20.2.2022
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Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 3

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4 EM FOCO
SAÚDE
Pandemia ajudou
a reduzir consumo
de antibióticos.
Portugal abaixo
da média europeia
EVOLUÇÃO Há uma década, Portugal era dos países da Europa que
mais consumia antibióticos e que tinha das mais altas taxas de infeções
hospitalares. Em 2013 iniciou um programa nacional de prevenção e de
controlo e hoje “os resultados são francamente positivos”, mesmo com
dois anos de pandemia, diz José Artur Paiva. Mas ainda há muito a fazer.
TEXTO ANA MAFALDA INÁCIO
N
a década de 2000 Portu-
gal era dos países que
mais consumia antibió-
ticos, quer em ambula-
tório, através da venda em farmá-
cias, quer nos hospitais. De tal for-
ma que em 2007 a então ministra
da Saúde, Ana Jorge, criava, por
despacho, uma Comissão Técnica
para a Prevenção das Resistências
aos Antimicrobianos, a atuar na
dependência direta do diretor-ge-
ral da Saúde. Os argumentos ex-
postos no documento eram preci-
samente o facto de “a resistência
aos antimicrobianos ser uma das
maiores ameaças à saúde pública”
e por “Portugal ser um dos países
da Europa que apresenta as taxas
mais elevadas de resistência aos
antibióticos”, de acordo com os da-
dos do Centro Europeu de Preven-
ção e Controlo de Doenças (ECDC,
sigla inglesa).
O retrato envergonhava o país e
havia que fazer algo. Depois da co-
missão criada, começou a ser ela-
borado um programa nacional de
prevenção e de controlo, quer para
o uso de antibióticos quer para as
infeções bacterianas surgidas em
meio hospitalar e resistentes a es-
tes. O programa viria a ser aprova-
do em 2013 e o caminho que se
adivinhava bastante longo, mas ao
fim de quase uma década o diretor
do Programa de Prevenção e Con-
trolo de Infeções e a Resistências a
Antimicrobianos (PPCIRA) da
DGS, José Artur Paiva, diz ao DN
que os resultados “são francamen-
te positivos”. Aliás, nos dois últimos
anos, em plena pandemia, “Portu-
gal foi um dos dois únicos países
europeus que conseguiu reduzir o
consumo de antibióticos. O outro
foi a Noruega”.
Levou tempo a inverter a situa-
ção no que toca ao consumo de an-
tibióticos, mas a pandemia ajudou.
“Com menos infeções respiratórias
na comunidade, mas também por
uma outra razão, esta negativa,
menos acesso dos utentes aos cui-
dados de saúde, o que todos sabe-
mos que aconteceu”, admite o mé-
dico Artur Paiva, explicando que,
“se os doentes não chegavam ao
seu médico, não havia prescrição,
não havendo, não havia também
consumo de antibiótico”.
No balanço sobre as infeções
bacterianas que surgem em meio
hospitalar e que são multirresis-
tentes aos antibióticos as melho-
rias ainda não são tão evidentes. O
médico refere que “a tendência
também é de diminuição, mas não
com os resultados claros alcança-
dos no consumo de antibióticos”.
Na área das infeções, a covid-19
não ajudou. Até porque, e como
destaca o diretor do PPCIRA, os
doentes críticos da covid-19 cor-
rem um maior risco de desenvol-
verem este tipo de infeção adicio-
nal, devido ao próprio estado de
debilidade que o vírus deixou no
seu sistema imunitário. E quando
tal acontece, há uns que resistem à
agressão das bactérias, outros não,
mas Artur Paiva destaca que, mes-
mo com a pandemia, “tem-se
mantido a tendência de diminui-
ção da incidência em algumas in-
feções hospitalares”.
José Artur Paiva
Diretor do PPCIRA
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Consumo de antibióticos
nos hospitais não desceu
tanto quanto na comunidade.
Em 2019 e 2020, consumo
de antibióticos reduziu 23%
De acordo com os dados que dis-
ponibilizou ao DN e que constarão
do relatório que será entregue à tu-
tela e à DGS até ao final deste pri-
meiro trimestre, entre 2019 e 2020
Portugal reduziu em 23% o consu-
mo de antibióticos na comunida-
de – isto é, através da compra em
farmácias – e 4,5% de 2020 para
2021, conseguindo que o consumo
global deste tipo de fármaco ficas-
se abaixo da média europeia. Ou
seja, o país registou um consumo
de 13,7 DDD (dose definida diária)
por mil habitantes, enquanto a mé-
dia europeia é de 15,0 DDD por mil
habitantes.
José Artur Paiva salienta mesmo
que, nos últimos seis anos, o país
conseguiu atingir uma redução da
ordem dos 69% no consumo de qui-
nolonas, uma das classes de anti-
bióticos mais indutoras de resistên-
cia bacteriana.
Em relação ao consumo de anti-
bióticos nos hospitais, e ainda se-
gundo os dados disponibilizados
pelo diretor do programa nacional,
a descida não foi tão acentuada
como no ambulatório, mas, mesmo
assim, o país também já está abaixo
da média europeia, ao ter registado,
no mesmo período, “uma redução
de 19% no consumo da classe de
antibióticos de mais largo espetro,
as carbapenemes. Entre 2020 e 2021
a redução foi de 6,3% no consumo
de antibióticos hospitalares por
doentes saídos”, explicou ao DN.
No que toca à resistência bacte-
riana, entre 2013 e 2020 o médico re-
fere ter havido uma redução na
maioria das bactérias, de 48% para
30% em relação ao Staphylococcus
Aureus na resistência à meticilina,
de 70% para 15% em relação ao Aci-
netobacter na resistência às carba-
penemes, e de 15% para 10% a resis-
tência extensiva da Pseudomonas.
“Conseguimos reduzir francamen-
te o consumo de antibióticos. Os re-
sultados são muito claros, não só na
perspetiva global de consumo de
antibióticos, como no foco especial
dos antibióticos que são mais indu-
tores de resistência das bactérias,
caso das carbapenemes no meio
hospitalar e das quinolonas na co-
munidade.”
No entanto, e apesar de se ter con-
seguido inverter uma situação que
se prolongou durante décadas, há
um único senão a salientar: “Um
tipo de resistência que aumentou si-
gnificativamente, a Klebsiella resis-
tente a carbapenemes, que passou
de 2% em 2013 para 12% em 2020”,
assume José Artur Paiva.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
É necessário um sistema
de vigilância integrado
Por isso, e quase uma década de-
pois da aprovação do programa e
da sua aplicação no terreno, admi-
te haver “ainda muito por fazer”
para se melhorar a performance
nestas áreas. Até porque a pande-
mia também veio trazer alguma
aprendizagem a estas áreas. Uma
delas é a necessidade de “um siste-
ma de vigilância epidemiológico in-
tegrado. Isto é, temos de deixar de
vigiar o consumo de antibióticos
num sistema de informação, a re-
sistência de bactérias noutro e as
infeções hospitalares ainda noutro.
A vigilância epidemiológica tem de
ser registada num só sistema, para
podermos estabelecer razões de
causalidade”. Aliás, esta será mes-
mo uma das medidas a ser reco-
mendada no documento a entregar
à tutela.
Por agora, uma coisa é certa.
“Tanto no consumo de antibióticos
na comunidade como a nível hospi-
talar, podemos dizer que já estamos
na metade boa da Europa. Na meta-
de que consome menos antibióti-
cos de entre todos os países que re-
gistam dados no ECDC e na OCDE,
sendo que 80% são os 27 da União
Europeia.” Artur Paiva não avança
com lugares de tabelas, como argu-
menta, “não estamos a falar de uma
‘liga de futebol’”, mas não deixa de
referir que, em termos de posiciona-
mento, Portugal estará entre os 10
melhores no consumo de antibióti-
cos na comunidade e entre os seis
melhores a nível hospitalar.
O percurso foi longo, mas a inver-
são da situação enorme. “Até 2012
éramos o país mais consumidor de
quinolonas, que, como disse, são
dos mais indutores de resistência às
bactérias, e foi precisamente nesta
área que se alcançou uma redução
de 69%. Desde 2013 que o nosso
Nos últimos seis anos
o país conseguiu
atingir uma redução
da ordem dos 69%
no consumo de
quinolonas, uma das
classes de antibióticos
mais indutoras de
resistência bacteriana.
consumo de antibióticos teve três
intervenções. A primeira dirigida ao
cidadão, no que toca à literacia so-
bre o tema, como os efeitos do uso
inadequado de um antibiótico, a se-
gunda dirigida aos profissionais, aos
prescritores, com normas e reco-
mendações sobre o uso destes fár-
macos e regras sobre boas práticas,
e a terceira assentou na definição de
estratégias de acompanhamento da
prescrição e do seu feedback, com o
objetivo de se melhorar a prática e
os efeitos desta nos doentes. A par-
tir daqui, Portugal passou a ter tam-
bém um Programa de Apoio à Pres-
crição de Antibióticos. “Em cada
hospital e em cada agrupamento de
centros de saúde (ACeS) passou a
existir uma equipa que acompanha
a prescrição de determinadas tipo-
logias de antibiótico, como de largo
espetro. Estas equipas passaram a
interagir diretamente com quem
prescreve e a avaliar se tal prescrição
é mesmo necessária ou não. Foi um
trabalho de parceria e de educação
que se iniciou e que começou a dar
resultados”, argumenta.
Mas não só. A sobrecarga de tra-
balho “também criou dificuldades
no acesso dos doentes aos cuidados
de saúde primários”. Ou seja, “as
pessoas foram menos aos cuidados
de saúde e, portanto, houve menos
GERARDO SANTOS / GLOBAL IMAGENS
prescrição de antibióticos”. E isto é
“outro dos pontos negativos da pan-
demia”. O ponto positivo é que, ao
mesmo tempo, fez com que a pres-
crição de antibióticos diminuísse
francamente na comunidade. “Ti-
vemos períodos de isolamento,
mais tempo em casa, adquirimos
outros hábitos, como uso de másca-
ra e higienização frequente das
mãos, e isso tam bém reduziu o apa-
programa se focou muito nesta recimento de outras infeções respi-
preocupação.” ratórias”.
Segundo explica, o programa O médico explica que em 2019 e
aprovado em 2013 teve logo a preo- 2020 já se notava uma redução no
cupação de criar uma estruturação consumo deste tipo de medica-
vertical para melhor funcionar. A mentos na comunidade e que esta
começar na autoridade central, redução também se manteve em
DGS, com um grupo de trabalho 2021, apesar de o país ter tido um
que faz a ponte também com o In- confinamento geral longo no início
farmed, depois com grupos de tra- do ano. Quanto ao consumo dentro
balho nas autoridades regionais das unidades hospitalares, essa des-
(administrações regionais de saúde) cida não se confirma. “Tivemos
e, por fim, com grupos de trabalho muitos internamentos por covid
nas unidades locais de saúde: “Cada grave e estes doentes acabavam por
unidade tinha de ter pessoas que ficar tão debilitados e frágeis pela
trabalhariam esta área.” doença que adquiriam infeções adi-
cionais, infeções hospitalares, o que
Pandemia travou fez com que, a nível hospitalar, o
acompanhamento nesta área consumo de antibióticos, e tendo
E assim foi. Até há dois anos, admi- sempre como denominador o nú-
te. Um dos pontos negativos da mero de doentes saídos, aumentas-
pandemia relativamente ao traba- se neste dois anos de pandemia, so-
lho que se estava a fazer no terreno bretudo em 2020.”
foi precisamente o de ter “sugado a O país mudou o retrato de há uma
esmagadora maioria destas pessoas década, mas é preciso retomar o tra-
para o combate ao vírus. Do ponto balho que estava a ser feito. Como
de vista dos recursos, o efeito de suc- sublinhou o diretor do PPCIRA, “é
ção da pandemia resultou numa so- urgente um sistema de vigilância in-
brecarga de trabalho tal que acabou
por limitar o investimento em ou-
tegrado”. É urgente que “se encare as
práticas de controlo e de boa pres-
tras atividades de prevenção, no- crição de antibióticos à luz de uma
meadamente em ações sobre a estratégia que não pode estar ape-
prescrição de antibióticos”. nas baseada na educação, isto é, em
Parecendo que não, isto é muito normas para educar os profissio-
significativo, porque “a melhoria no nais”, mas também que é necessária
5
Em termos de
posicionamento,
Portugal estará entre
os 10 melhores no
consumo de
antibióticos na
comunidade e entre
os seis melhores a
nível hospitalar.
uma estratégia que leve “a uma mu-
dança comportamental”. Por exem-
plo, “as tarefas nesta área exigem
tempo. É preciso que as unidades de
saúde, quer sejam da rede hospita-
lar, dos cuidados primários ou dos
cuidados continuados, deem um
tempo específico aos profissionais
para esta matéria. Se formos ver o
despacho fundador do programa,
isto está lá previsto, mas na prática
não é implementado”. Por fim, “é
preciso reconhecer que tivemos
muito melhores resultados no con-
sumo de antibióticos do que no
controlo das infeções hospitalares e
resistência das bactérias”. E para
mudar esta tendência é preciso
apostar nos recursos humanos,
“numa dotação de pessoal que per-
mita um ratio de enfermeiros por
doente adequado”.
Como destaca, “o controlo das in-
feções hospitalares não passa só por
uma questão clínica ou de boas prá-
ticas, mas também pelos recursos
humanos e pela arquitetura dos es-
paços”. Portanto, é preciso também
apostar na “modernização da arqui-
tetura dos espaços, para que estes
permitam reduzir a transmissão de
micro-organismos resistentes”, ex-
plicando:“Uma enfermaria com seis
doentes e só com uma casa de ba-
nho partilhada fomenta esta trans-
missão, quando o risco seria muito
menor se tivermos enfermarias
mais pequenas, de dois doentes, por
exemplo, com uma casa de banho.”
No final, José Artur Paiva, médico
de medicina intensiva no Hospital
São João, no Porto, professor da Fa-
culdade de Medicina da Universida-
de do Porto e presidente do Colégio
da Especialidade de Medicina In-
tensiva da Ordem dos Médicos,
conclui: “Se há lição que a pande-
mia trouxe à área das infeções e das
resistências bacterianas, foi a de que
é cada vez mais necessária uma boa
avaliação do risco de todos os doen-
tes à entrada em qualquer unidade
de saúde. Se é logo feita uma avalia-
ção do risco na admissão de um
doente, ou seja, se este é portador
ou não de bactérias, como se fez
para o SARS-CoV-2, impondo polí-
ticas de isolamento, é um passo
para se prevenir o desenvolvimen-
to de mais infeções.”
anamafaldainacio@dn.pt
6 EM FOCO
» continuação da página anterior
Doentes com covid grave têm maior risco
de desenvolver infeção hospitalar
PANDEMIA Não se sabe quantos, mas sabe-se que alguns doentes críticos de covid-19 acabaram por sucumbir às ditas
infeções hospitalares, mesmo depois de terem recuperado do vírus. José Artur Paiva explica porque é difícil evitar isso.
TEXTO ANA MAFALDA INÁCIO
P
aulo tinha uma doença on-
cológica ainda ativa quan-
do em novembro foi infeta-
do pelo SARS-CoV-2, ape-
sar de ter o esquema vacinal
primário – as duas doses. Sabia que
era um doente de risco. Tinha os
seus cuidados, mas um dia o vírus
conseguiu passar a sua barreira de
proteção. Dos sintomas de uma
constipação rapidamente passou a
febres muito altas e à dificuldade de
respirar. Recorreu a um serviço de
urgência de um hospital central de
Lisboa e já não saiu. Um dia depois
estava a ser transferido para outra
unidade daquele centro hospitalar,
para entrar numa enfermaria covid.
E em menos de 48 horas passava
para uma unidade de cuidados in-
tensivos (UCI). O seu estado foi
muito crítico durante mais de duas
semanas, acabou por resistir e por
testar negativo ao vírus.
Da UCI passou para uma unida-
de de cuidados intermédios, conti-
nuava a melhorar até que foi trans-
ferido para outra enfermaria de me-
dicina interna de outra unidade do
mesmo centro hospitalar. Aqui já
estava estável. Cansado, mas com
ânsias de trabalhar. Até que come-
çou a ficar confuso e com a febre a
subir. Mais exames e foi-lhe deteta-
da uma “infeção hospitalar”. Foram
usados antibióticos, mas Paulo não
resistiu a esta infeção adicional aos
56 anos. Não resistiu a uma bactéria
que conseguiu invadir e desenvol-
ver-se no seu organismo, deixando
os seus órgãos em falência, talvez
devido à debilidade em que o pró-
prio vírus pode ter deixado o seu sis-
tema imunitário ou que pode ter
surgido até pelos procedimentos
agressivos que são feitos nas UCI e
que se destinam a “salvar vidas”.
“Há procedimentos que colocam
dispositivos a passar por órgãos
nossos que estão cheios de bacté-
rias, como a nossa boca, até outros
que não têm bactérias. Só este pro-
cedimento pode desencadear o
desenvolvimento de uma bactéria”,
exemplifica ao DN o diretor do Pro-
grama de Prevenção e Controlo de
Infeções e de Resistências a Antimi-
crobianos (PPCIRA), da DGS, José
Artur Paiva.
Na certidão de óbito de Paulo
nada é referido sobre a infeção hos-
pitalar que lhe pode ter causado a
morte depois da covid-19, mas o
Um internamento longo em cuidados intensivos também debilita as respostas do sistema imunitário.
seu caso não é único. Aconteceu a
outros. Não se sabe a quantos, por-
que os dados de monitorização das
infeções hospitalares “não fazem
esta separação”, explica Artur Paiva,
confirmando que tal “aconteceu a
alguns doentes”. Até porque os
doentes que desenvolveram for-
“Não se pode pensar
que havendo uma
infeção hospitalar é
sempre um sinal de má
prática, porque nem
sempre o é.” Esta
questão também tem a
ver com a dotação de
recursos humanos por
doente e com as
condições dos espaços.
mas graves de covid têm maior ris-
co de contrair uma infeção deste
tipo por “várias razões. Uma é o fac-
to de terem estado muito tempo em
cuidados intensivos, sujeitos a tra-
tamentos que são agressivos e que
debilitam o sistema imunitário –
como disse, há procedimentos que
implicam o uso de dispositivos que
passam por locais que têm bacté-
rias e por outros que não têm, e,
apesar de todos os cuidados para se
evitar uma sepsia, às vezes esta des-
envolve-se –, e porque a própria co-
vid também o debilitou”. Ou seja, há
maior probabilidade de estes doen-
tes poderem desenvolver uma infe-
ção adicional devido à debilidade
do sistema imunitário, conseguin-
do alguns resistir e outros não, tam-
bém por causa da capacidade de
reação deste.
Eliminar a infeção hospitalar
é uma miragem
O médico de medicina intensiva do
Hospital de São João explica: “Al-
guns dos doentes críticos faleceram
diretamente pela covid 19, mas ou-
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
a morte e, ao fazê-lo, aumentamos
também o grupo de pessoas que vi-
vem com um sistema imunitário
debilitado e com menos defesas.
Isto não é mau. É bom, pois quer di-
zer que doenças que eram fatais an-
tigamente foram transformadas
em doenças crónicas – por exem-
plo, muita da patologia oncológica,
que matava rapidamente há 20
anos ou há 10, hoje já não mata. Os
doentes vivem com medicação que
lhes salva a vida, mas que os debili-
ta. Mas o facto de vivermos com
uma população com as defesas di-
minuídas faz com que seja impos-
sível eliminar a infeção hospitalar”.
Rever metodologias para
reduzir a infeção hospitalar
Eliminar não, mas é possível dimi-
nuir. E para isso José Artur Paiva diz
ARTUR MACHADO / GLOBAL IMAGENS
que o grupo que coordena está a “re-
ver as metodologias que possam le-
var a uma redução da infeção hospi-
talar”. Por exemplo, “metodologias
de lavagem da boca que sabemos
que poderão reduzir a incidência de
infeção”. Por fim, deixa um alerta:
“Não se pode pensar que, havendo
uma infeção hospitalar, é sempre
um sinal de má prática, porque nem
sempre o é.” Aliás, esta questão não
tem só a ver com a prática clínica,
tros pelas complicações que esta mas também com a dotação de re-
gerou, nomeadamente infecciosas cursos humanos por doente – se há
ou cardiovasculares”, voltando a su- um enfermeiro que tem de tratar
blinhar que “as complicações infec- muitos doentes, o risco de infeção
ciosas acontecem frequentemente aumenta – e com os espaços, uma
em doentes críticos de covid-19. O enfermaria com seis doentes e só
estar muito tempo em cuidados in- uma casa de banho também au-
tensivos faz com que o doente seja menta o risco de infeção.
alimentado artificialmente. Só isto Em relação aos dados sobre infe-
debilita o seu organismo”. Mas o ções hospitalares, afirma que a ten-
que há de importante a dizer é que dência em Portugal é agora de dimi-
“a mortalidade em Portugal por co- nuição da incidência em algumas
vid grave em cuidados intensivos foi áreas, nomeadamente no que toca
relativamente baixa. Andou à volta à “pneumonia associada à entuba-
de 25%, o que é um bom resultado à ção (em UCI), à infeção associada
escala europeia”. à cirurgia da prótese do joelho, à in-
José Artur Paiva defende que que- feção associada à cirurgia da vesícu-
rer atingir risco zero para a infeção la, de pneumonia neonatal associa-
hospitalar é impossível. “Há grupos da a ventilação e de infeção neona-
que investem muito nesta ideia de tal associada a cateter”. E, como diz,
se poder eliminar as infeções hospi- “é preciso reconhecer que os resul-
talares, mas na minha opinião isso tados no controlo da infeção hospi-
é uma miragem.” Quando pergun-
tamos o porquê, argumenta com a
talar e da resistência microbiana
não são tão bons como os alcança-
longevidade da vida. “Tratamos dos no consumo de antibióticos”.
cada vez mais pessoas num limite Portanto, “temos de continuar a tra-
de fragilidade. Cada vez mais em- balhar para melhorar o que ainda é
purramos a fronteira da vida para necessário”.
mais longe.” Ou seja, “empurramos anamafaldainácio@dn.pt
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 7

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8 POLÍTICA
Raio-X eleitoral.
Quem fez a maioria
absoluta do PS?
LEGISLATIVAS 2022 A partir dos dados
de uma sondagem à boca de urna, dois politólogos
analisaram o voto por idades, género e graus de
instrução.
TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES
U
ma análise feita pelos politó-
logos Pedro Magalhães e João
Cancela aos “dados micro”
(instrução, idade e género) da
sondagem à boca de urna feita pela Pi-
tagórica no dia das eleições legislativas
demonstra que o Parlamento teria se-
guramente outra composição – sem
maioria absoluta do PS – se o eleitora-
do fosse mais jovem, mais masculino e
mais instruído. Essa sondagem fez-se
com recolha de dados em urna de
33157 eleitores, espalhados por 55 fre-
guesias dos 18 distritos do continente.
Magalhães e Cancela sublinham é
que desta vez, nestas eleições, “tudo
aponta” para que tenha ocorrido, pela
primeira vez, um gender gap : “o voto
feminino mais à esquerda que o voto
masculino”.
O partido mais claramente feminino
no seu eleitorado é o PAN (71% de mu-
lheres e 29% de homens). A seguir, o PS
(57% de mulheres e 43% de homens). E
depois, por esta ordem, do mais femi-
nino para o menos: Bloco de Esquerda,
CDS, PSD (o único partido rigorosa-
mente paritário), Livre, CDU, Iniciati-
va Liberal (IL) e Chega (o partido mais
masculino de todos, onde quase dois
em cada três eleitores são homens).“O
modern gender gap português é criado
por novos partidos, com capacidades
de atração muito diferentes para ho-
mens e mulheres”, mas “a feminização
dos votantes” do PS “também contri-
buiu para esse fenómeno.”
Outra variante analisada foi a idade
dos eleitores. Desmentindo a ideia de
Politólogos detetaram,
a partir dos dados da
Pitagórica, o que pode
ser uma nova tendência,
gender gap: mulheres
votam à esquerda e
homens à direita.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
que a CDU tem um grave problema de
envelhecimento eleitoral, verifica-se
SIMULAÇÃO PEDRO MAGALHÃES/JOÃO CANCELA
que na verdade isso é muito mais notó-
rio no PS. O PS é notoriamente o parti-
do com o eleitorado mais envelhecido –
e, portanto, ganha com o facto de Por-
tugal ser um dos países mais envelhe-
cidos do mundo (o quarto na UE e o
quinto do mundo, atrás do Japão, Itália,
Grécia e Finlândia). No PS, só 15% dos
eleitores são da faixa etária dos 18-34
anos. A partir daí, 37% têm entre 35 e 54
e quase metade (48%) têm 54 ou mais.
Quem foi então beneficiado com o
voto jovem? Os autores do estudo con-
cluíram que “os partidos mais novos —
Chega, PAN, Livre e (especialmente) IL
— foram desproporcionalmente mais
apoiados pelos votantes mais jovens”.
Ou, dito de outra forma: “Há um con-
traste claro entre os partidos ‘estabele-
cidos’ e os novos a este respeito, com o
BE e o Chega a ocuparem uma posição
SIMULAÇÃO PEDRO MAGALHÃES/JOÃO CANCELA
intermédia.” No campeonato da juven-
tude, o IL distingue-se claramente:
quase metade dos seus eleitores tem 34
anos ou menos. Se só votassem os elei-
tores com menos de 25 anos, o IL fica-
ria em terceiro lugar – e o PSD venceria,
deixando o PS em segundo.
Quanto a graus de instrução, o estu-
do revela que o PS é o partido com
maior percentagem de eleitorado com
menos que o ensino secundário com-
pleto (43%). Já o partido com menos
eleitores com formação universitária
(21%) é o Chega . Os “fenómenos” são o
IL e o Livre: em ambos, “três em cada
cinco votantes têm um diploma uni-
versitário”.
Em síntese: “Esta eleição reforçou al-
guns elementos que já estavam presen-
tes em atos anteriores, como a capaci-
dade de o PS atrair o voto do eleitorado
mais velho e a preferência dos eleitores
SIMULAÇÃO PEDRO MAGALHÃES/JOÃO CANCELA
mais instruídos por partidos à direita
do espectro político.” A resposta à per-
gunta em título é então a seguinte: os
mais velhos, as mulheres, os menos
instruídos.
Há, porém, “novas pautas”: a “emer-
gência de uma assimetria de género no
comportamento eleitoral” e a “assina-
lável capacidade do Iniciativa Liberal e
do Chega em atrair o voto de segmen-
tos muito específicos do eleitorado”.
joao.p.henriques@dn.pt
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Opinião
Sebastião
Bugalho
Algo está podre no reino das eleições
O
que se passou este mês
na votação das comuni-
dades não atingiu pro-
porções de escandaleira
por inconveniência partidária e
desinteresse jornalístico. Caso o
Tribunal Constitucional não tives-
se decidido repetir a eleição do cír-
culo da Europa, o episódio teria be-
neficiado de uma indiferença ain-
da maior. Se num país civicamente
ativo os vários capítulos da novela
teriam provocado choque, revolta
e escrutínio, por cá pouco ou nada
aconteceu. Por mais versões da
história que haja, e bastante con-
trainformação e amadorismo nela
envolvidos, não há forma de inter-
pretar o sucedido sem uma pro-
funda tristeza pelo desrespeito
com que o ato eleitoral foi tratado
pela maioria. Infortunadamente,
as várias instituições do regime de-
mocrático não se mostraram mini-
mamente merecedoras da demo-
cracia que este representa – e que
algumas delas fundaram.
Vamos ao pesaroso resumo
Em 2019, a votação das comunida-
des foi pela primeira vez assolada
pelo recenseamento automático,
que fez disparar o número de elei-
tores e que confrontou a contagem
de votos com obrigações legais
pouco amigas da sua realidade. A
obrigatoriedade de uma fotocópia
do cartão de cidadão anexa ao voto
contrastava com as tecnologias
que fiscalizam a contagem por cor-
respondência – um código de bar-
ras que identifica imediatamente o
eleitor através da morada e preju-
dicava a participação eleitoral, vis-
to que uma larga percentagem dos
votantes não cumpria com a dita
fotocópia, cumprindo com tudo o
resto. A Comissão Nacional de Elei-
ções deliberou, posteriormente,
que essa obrigatoriedade era “ape-
nas um reforço das de si fracas ga-
rantias do exercício pessoal do
voto”, não sendo “um elemento
obrigatório para a validade do bo-
letim”, e inseriu-o no manual dos
membros das mesas eleitorais.
Em 2022, com base nisso e não
tendo a obrigatoriedade sido re-
movida da lei, a Secretaria do Mi-
nistério da Administração Interna
reuniu com os partidos, que, de
forma unânime, acordaram que a
ausência da cópia de identificação
não anularia votos nos círculos da
emigração. O PSD, independente-
mente de ter participado na reu-
nião com os seus delegados e man-
datários, mudaria depois de posi-
ção quanto ao círculo da Europa
(que perdeu), mas não quanto ao
fora da Europa (que venceu), pro-
testando nas mesas de contagem
(que misteriosamente não separa-
ram os votos cumpridores dos in-
cumpridores, como deviam) e na
mesa de apuramento (ironica-
mente presidida por um membro
da CNE), que anularia assim os 157
mil votos misturados. No círculo
fora da Europa, onde ninguém
protestou, tudo se aceitou e nada
se cumpriu, sendo a mesa de apu-
ramento presidida por um assessor
do secretário de Estado da Admi-
nistração Interna.
Rui Rio, na originalidade que o
caracteriza, apresentou uma quei-
xa-crime no Ministério Público
contra as mesas do círculo da Euro-
pa, processando, também ironica-
mente, dezenas de militantes do
PSD que deram o seu tempo e cara
para escrutinarem um ato eleitoral
a seu convite. Um pequeno e pouco
conhecido partido chamadoVolt,
por sua vez, entregou um requeri-
mento no Tribunal Constitucional
contra a anulação dos 80% da vota-
ção do círculo, conseguindo, com
sucesso, que a eleição se repita.
9
Em resposta à decisão, sem a
mais remota autoridade para o fa-
zer, a CNE veio contradizer o TC
quanto à data da repetição e
quanto ao número de mesas que
repetirão o ato eleitoral. Numa ci-
nematográfica conferência de im-
prensa, a CNE informou o país de
que era afinal a favor da obrigato-
riedade da tal fotocópia do cartão
de cidadão (apesar de ter delibe-
rado a favor da sua indiferença) e
que fez de tudo para informar os
eleitores das comunidades sobre
isso, mas que nada tem a ver com
o seu incumprimento, com o
acordo entre os partidos para ig-
norarem a lei eleitoral (como a
própria CNE previamente opina-
ra) ou com o facto de os dois círcu-
los da emigração terem apurado a
eleição com critérios diferentes.
Se ninguém protestar, diz a CNE,
não importa se legal ou ilegal, “fica
consolidado para sempre”. Ficá-
mos a saber, portanto, que se a
pata de um gatinho borrar o bole-
tim de um português no estran-
geiro, a mesa o tomar como um
voto no PAN e nenhum partido re-
clamar, nada acontece: é o gati-
nho que vota.
A vergonha, essa, está mais do
que consolidada.
Colunista.
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10 POLÍTICA
Opinião
Joana
Amaral Dias
Adeus, civilização
N N
o mundo ocidental de hoje,
supostamente na civilização
mais avançada de sempre, en-
tre os herdeiros do Iluminis-
mo, quem, por exemplo, protestar con-
tra passaportes digitais terá as suas con-
tas bancárias congeladas (ou quem doar
tanto como 20 euros para a causa) ou
quem, por exemplo, disser algo que res-
soe, ainda que remotamente, a politica-
mente incorrecto verá as suas redes so-
ciais bloqueadas.
Aliás, um dos grandes promotores
desta nova censura é o Facebook (Meta),
que hoje é sobretudo uma colossal in-
dústria de dados pessoais. Como se cos-
tuma dizer, quando a coisa é de borla, o
produto somos nós, e actualmente o ne-
gócio de Zuckerberg é sacar essas infor-
mações privadas aos utilizadores para
as vender com objectivos que, na me-
lhor das hipóteses, serão comer-
ciais/publicitários. Portanto, quando
começou a gestão da covid e os gover-
nos lançaram a tesoura, lápis azul e bor-
racha a todos os que tinham dúvidas ou
meras críticas à narrativa oficial (conde-
nando, inclusivamente, médicos, inves-
tigadores e profissionais, como se a
ciência fosse monolítica e dogmática), o
Facebook há muito que já estava nessa
deriva despótica. Depois, foi só darem
O Facebook faz
chantagem com a
Europa. Se o Velho
Continente não
permitir que os dados
dos utilizadores
europeus sejam
enviados para os seus
servidores nos EUA, a
rede social sai desses
mesmos países.
as mãos. Governos e novos patrões, sia-
meses juntos pela cabeça. Censura ana-
lógica e digital unidas. Esta escandalosa
escalada chegou à obscenidade. A lista é
extensa, mas só como ilustração veja-se
o caso do silenciamento feito ao Dr.
Martin Kulldorff (professor de Harvard)
e ao Dr. Jay Bhattacharya (professor
Stanford) ou a censura ao British Medi-
cal Journal, publicação de alto prestígio
com quase dois séculos, por causa de
um artigo em que, como é sua função,
colocava dúvidas científicas e éticas so-
bre a recusa da Pfizer em divulgar certas
informações sobre as inoculações coro-
navírus. Armados em fact-checkers, o
apelido dos neófitos donos do Ministé-
rio da Verdade, consideraram que o dito
texto ia contra os ironicamente designa-
dos “padrões da comunidade”. E isto pe-
rante questões dirigidas a uma farma-
cêutica que recebeu milhões de dinhei-
ros públicos para desenvolver esses
mesmos produtos. Mas quem são esses
verificadores de factos que se arrogam
ao police verso, verso police , quais impe-
radores romanos, quando, na verdade,
não passam tantas vezes de meninos a
soldo de interesses pouco nobres?
Entretanto, o Facebook faz chantagem
com a Europa. Se o Velho Continente não
permitir que os dados dos utilizadores
europeus sejam enviados para os seus
servidores nos EUA, a rede social sai des-
ses mesmos países. E esta altivez de
Zuckerberg persiste até depois de o Tri-
bunal de Justiça Europeu ter proibido,
em 2020, essa mesma remessa, amea-
çando com multa. Sucede que se o pro-
duto somos nós, as redes sociais não são
um órgão de soberania, não podem
substituir um tribunal a condenar ou
castigar nem tão-pouco podem queimar
a Constituição. Mas é neste ponto que es-
tamos, em pleno século XXI. Milhões de
pessoas esclarecidas e centenas de go-
vernos democráticos estão a compac-
tuar com cortes censórios que ainda va-
gamente nos lembramos como começa-
ram (diz que era nudez velada), mas que
sabemos muito bem – pela história e
pelo infelizmente comum comporta-
mento da humanidade – como é que
acaba. Derrocada triste de uma era. Fim.
Psicóloga clínica. Escreve
de acordo com a antiga ortografia.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Opinião
José
Mendes
Lítio: sim e quanto antes
ão vou cometer nenhuma in-
confidência, porque não reve-
larei nomes nem afiliações. A
história tem cerca de quatro
anos e passou-se numa reunião com um
interlocutor de um partido político com
representação parlamentar, que se ma-
nifestava contra diversas formas de pro-
dução de energia. Curioso, perguntei se
era assim porque sim ou se apresenta-
vam uma proposta alternativa para a
produção sustentável da energia que
move o mundo. A conversa avançou até
chegar a um paradoxo, que está hoje bem
patente no incompreensível movimento
de contestação à exploração das reservas
de lítio existentes em Portugal.
Vamos então à dita síntese. O meu in-
terlocutor manifestou-se contra a conti-
nuação do uso dos combustíveis fósseis.
“De acordo”, disse eu, “desde que salva-
guardado um processo inteligente e viá-
vel de transição.” Depois, revelou-se con-
tra o nuclear, porque era inseguro. E tam-
bém contra a energia hídrica, porque as
barragens inundavam o território –
“aquele que já quase não tem pessoas”,
retorqui – e mexiam com os ecossiste-
mas. Também não aceitava mais eólicas,
porque tinham impacto na paisagem,
causavam ruído e as suas pás talhavam
os pássaros. De caminho, ainda me re-
cordou que os parques fotovoltaicos, que
sugam do sol a energia elétrica, também
não eram bem-vindos, porque ocupa-
vam demasiado o solo e para isso já bas-
tavam as estufas. Ah, já me esquecia!
Também foi categórico na rejeição do lí-
tio, porque as minas deviam acabar.
Confuso, apesar de já ter ouvido algo
semelhante de outros primos políticos
do meu interlocutor, revi mentalmente o
Os territórios onde
existe o lítio estão
moribundos, com um
passado e presente de
recessão e, em muitos
casos, miséria.
racional – ou irracional, se preferirem – do
meu interlocutor: “Portanto, é contra o
nuclear; é contra o petróleo, o gás e o car-
vão, pelo que deverá ser a favor das ener-
gias renováveis; mas é contra o hídrico, o
eólico, o fotovoltaico e... o lítio, que faz fal-
ta às baterias que armazenam a eletrici-
dade renovável!” Na tentativa de encon-
trar terreno comum, vagueei pela sala até
que o meu olhar aterrou sobre a mesa,
mais propriamente sobre o telemóvel do
meu interlocutor. Eureka! Perguntei: “E,
diga-me, como acha que a bateria do seu
magnífico smartphone funciona? Com
ou sem lítio?”
Este é o estado da arte que caracteriza
uma certa fação política que se opõe à
exploração do lítio em Portugal. Como
têm braço político, influência nas ONG,
palco mediático e ativistas internacio-
nais, que não sabem nem querem saber
da história e das necessidades locais, es-
tão a veicular um movimento que, mais
do que irracional, contribui para perpe-
tuar o subdesenvolvimento no interior.
Ultimamente importaram uma rapazia-
da que andou pelo Barroso e por outros
locais a pintar, em tudo o que era cruza-
mento, o suposto grito de revolta: “Lítio,
não!” Uma fraude pela simples razão de
que aquelas inscrições não foram feitas
pelos residentes locais.
O que está em causa? Simples, o lítio é
crítico para a transição energética. Portu-
gal tem a sexta reserva de lítio do mundo,
que é a maior da Europa, avaliada em 60
mil toneladas. Nunca o país, se excluir-
mos os Brasis de outros séculos, teve ta-
manha oportunidade de mandar num
recurso que todos querem. Os territórios
onde existe o lítio estão moribundos,
com um passado e presente de recessão
e, em muitos casos, miséria, que lhes re-
duziu a população a algumas centenas
de pessoas velhas, porque os jovens fugi-
ram há muito. Perante tudo isto, aquilo
que deveriam estar a reivindicar era não
menos mas mais lítio. E também minera-
ção responsável, respeito por regras de
exploração e recuperação ambiental-
mente exigentes, atestadas por estudos
de impacto ambiental nos termos da lei,
investimentos na cadeia de valor, para
além da mineração e retenção de valor
nas regiões em causa.
Professor catedrático.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 11

Luís Carvalho Presidente da Escola Superior de Enfermagem do Porto

“Governo deve assegurar o reforço do
financiamento das instituições de ensino
superior. E promover a boa gestão”
DEPOIMENTOS RECOLHIDOS POR ROSÁLIA AMORIM

1
O que espera da maioria
absoluta de António Costa?
De um governo com maioria abso-
luta espera-se o cumprimento, o
mais integral possível, do progra-
ma eleitoral a que se propôs, res-
democraticamente eleitos e pro-
gramaticamente responsáveis te-
rão sempre de se preparar para, por
via parlamentar ou governativa, se-
rem parte da solução. De facto, não
é apenas uma responsabilidade de
um partido, mas de todos.

peitando os compromissos com os
cidadãos que, com expressividade,
o elegeu. No caso do ensino supe-
rior, espera-se a revisão necessária
do Regime Jurídico das Instituições
de Ensino Superior, que, depois de
mais de 10 anos de implementa-
ção, necessita de ajustes, adaptan-
do-o às exigências da atualidade.
5
Dois ou três deputados
a que vai estar particularmente
atento? E porquê?
Não teremos, como instituição de
ensino superior público, nenhuma
predileção por este ou aquele de-
putado. Pretende-se, ao inverso,
que o conjunto de deputados res-

2
O país será melhor
ponda cabalmente à responsabili-
dade que lhe recai de representar o
país e os cidadãos.
governado com maioria

absoluta do que com acordos
ou ‘geringonças’?
O país será sempre melhor gover-
nado com a legitimação do proces-
so eleitoral, qualquer que seja a
composição na Assembleia da Re-
pública. De facto, esta nova mate-
mática parlamentar poderá permi-
tir uma execução mais rigorosa do
programa eleitoral a que o PS se
propôs, o que, a julgar pelos resulta-
dos, é o desejo do povo português.
6
Que expectativa tem em
relação aos pequenos partidos
que viram as suas bancadas
reforçadas no Parlamento?
Todos os lugares na Assembleia da
República contam. Espera-se des-
tes e de todos os outros que pug-
nem a sua ação pelo respeito pela
Constituição, pela lei e pela demo-
cracia que representam e que, em
suma, dignifiquem o cargo para

3 que foram eleitos.

O que espera da atual
oposição?
Da oposição espera-se o mesmo de
sempre: responsabilidade, apre-
sentação de propostas e medidas
concretas e capacidade de conse-
guir negociar com o governo as
medidas que, numa ótica de ga-
nho-ganho, sejam melhores para o
país e para os portugueses.
7
Preocupa-o que um partido histó-
rico da democracia, o CDS, esteja
agora ausente do Parlamento?
Preocupa-me que haja uma real re-
presentatividade democrática do
país na Assembleia da República. fica, e exige, a manutenção de um para uma fórmula sustentada na lorize e reconheça a enfermagem
Nisso os resultados eleitorais foram ministério próprio, que agregue a excelência e nos resultados anuais enquanto disciplina do conheci-
claros e, portanto, devemos respei- ciência, a tecnologia e o ensino su- obtidos, promovendo a boa ges- mento.
tar a superior vontade dos eleitores. perior. Neste contexto, importa re- tão. Por fim, a questão de foco. Nos es-

4 ferir três aspetos centrais no âmbi- Relativamente à oferta formativa, tudantes, com a necessidade de

O PSD deve preparar-se

para ser uma alternativa,
mesmo que demore mais quatro
anos a chegar ao poder?
O PSD inicia agora um novo ciclo
político, decorrente dos seus resul-
tados eleitorais. Todos os partidos
8
O governo está prestes a tomar
posse. Para a educação e ensino
superior, qual será, a seu ver,
a medida mais urgente?
O ensino superior encerra um con-
junto de especificidades que justi-
to do ensino superior para, efeti-
vamente, “reinventar Portugal”.
Desde logo, a questão do financia-
mento, assegurando o reforço do
financiamento das instituições de
ensino superior, prosseguindo os
trabalhos de alteração da estraté-
gia de financiamento e evoluindo
importa assegurar que todos os ci-
clos de estudo, nomeadamente o
3.º ciclo, possam ser outorgados,
finalmente, no subsistema poli-
técnico. Importa também, no caso
da Escola Superior de Enferma-
gem do Porto, que a organização
do sistema de ensino superior va-
reforço das medidas de apoio e
ação social e ainda no conheci-
mento, prosseguindo políticas
que apostem na valorização e
translação da ciência para a socie-
dade, promovendo um país mais
capaz de enfrentar os desafios do
século XXI.
 Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
12 SOCIEDADE
As atividades relacionadas
com o turismo já estão a ser
bastante afetadas pela seca.
Pedrógão Grande J
osé Pais caminha vagarosa-
mente pela rampa que des-
ce desde a estrada até à praia
fluvial da albufeira do Cabril,
junto à barragem, em Pedrógão
Depois do fogo, Grande. Fevereiro vai em contraci-
clo, está um sol de primavera, com
mais de 20ºC, que se reflete em
todo o caudal que resta do rio
a seca que consome
Zêzere – e que é muito pouco. “Eles
apontam 30 e tal por cento… não
sei se chegará a tanto”, diz ao DN o
atual gerente do parque de cam-
pismo, única infraestrutura que se
o Pinhal Interior mantém aberta. À volta, tudo fe-
chou: o restaurante Lago Verde
(propriedade da câmara, está para
concessão) e dois ou três bares.
ALERTA A Barragem do Cabril vai minguando todos os dias. “O que me José Pais, engenheiro florestal de
formação, já foi responsável pela
preocupa é se houver um incêndio”, diz o presidente da Câmara de Praia das Rocas, em Castanheira
de Pera (aquela que produz ondas
Pedrógão Grande, cioso da importância da albufeira para o combate. artificiais, a 80 km do mar). Era lá
Por ora, é o turismo que já sofre os efeitos da seca. Na Foz de Alge, em que estava em junho de 2017,
quando deflagrou o incêndio em
Figueiró dos Vinhos, a ribeira está a desaparecer, e com ela todos os Pedrógão Grande que haveria de
desportos náuticos. colocar no mapa do país toda
aquela região pelas piores razões.
No verão passado, quando aca-
TEXTO PAULA SOFIA LUZ bara de ganhar a concessão do
NUNO BRITES / GLOBAL IMAGENS
parque de campismo, começou a
aperceber-se de que o nível das
águas “estava a baixar continua-
mente, de semana para semana.
Muitos turistas, habituais frequen-
tadores, também se aperceberam
do mesmo. Por isso isto não é uma
situação de agora. Há muito que
andamos a alertar e questioná-
mos, mesmo. Este verão foi des-
carregar água de uma forma anor-
mal. O que nos foi dito foi que a
energia estava mais cara, os espa-
nhóis estavam com necessidade e
foi preciso fazê-lo”. José Pais perce-
beu que o timing não tinha sido o
melhor: “Levámos com tudo; foi a
alteração da lei que regula as auto-
caravanas, foi o covid, foi os testes
e as implicações que tudo isso
trouxe e depois a barragem a su-
mir-se, que no fundo é o nosso
postal, a nossa imagem.” O enge-
nheiro conhece o território há
mais de 30 anos, já viu outras se-
cas. Nesta altura preocupa-o ainda
outra questão: “Se não chove em
quantidade daqui até ao verão,
corremos um enorme risco, por
várias razões: é mau para a produ-
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 13

ção de energia, é mau para todos
os desportos náuticos associados
a esta albufeira e a todas as outras.
E depois não nos podemos esque-
cer da questão dos incêndios.”
Esse é o ponto que nesta altura
preocupa autarcas e população
em geral, para lá da questão turís-
tica. Porque mesmo antes do gran-
de incêndio de 2017, que matou 66
pessoas, feriu 250 e deixou um ras-
to de destruição sem precedentes,
já havia um histórico de fogo com
muita expressão em toda aquela
região. E a Barragem do Cabril
sempre foi o ponto de abasteci-
mento de água para os bombeiros,
a reserva dos helicópteros e dos
aviões de grande porte, como os
1931 e o 2.º mais seco desde 2000.
Como consequência da falta de A falta de chuva está a deixar
chuva, numa medida preventiva, o toda a zona do Pinhal Interior
governo restringiu o uso de várias sem reservas para, por exemplo,
barragens para produção de eletri- acudir a um incêndio.
cidade e para rega agrícola, devido
à seca em Portugal continental.
Para já, há quatro barragens cuja
água só será usada para produzir
eletricidade cerca de duas horas
por semana, garantindo valores
mínimos para a manutenção do
sistema: Alto Lindoso e Touvedo,
no distrito de Viana do Castelo,
Castelo de Bode (Santarém) e Ca-
bril, precisamente no limite do dis-
trito de Leiria com o distrito de
Castelo Branco.
Entretanto, o tema vai ser discu-

NUNO BRITES / GLOBAL IMAGENS

Canadair. “Estamos muito preocu-
pados”, afirma ao DN o presidente
da Câmara de Pedrógão Grande,
António José Lopes, que assinou
uma posição conjunta com os de-
mais autarcas que integram a Co-
munidade Intermunicipal da Re-
gião de Leiria. “Isto prejudica o tu-
rismo, prejudica o abastecimento,
prejudica tudo”, acrescenta o au-
tarca, que ainda assim recorda es-
tar previsto um leilão para a insta-
lação de painéis solares flutuantes
na albufeira, “para uma produção
de 33,3 megawatts. Mas vamos ver
se com a instabilidade do nível das
águas ainda é possível realizar esse
investimento.”
O autarca apela a “uma gestão
mais cuidada da albufeira”, uma
vez que “era do conhecimento das
autoridades e de quem está a gerir
as barragens as condições de me-
teorologia que se adivinhavam”.
Seca agrava-se
nos últimos meses
Segundo o Instituto Português do
Mar e da Atmosfera (IPMA), em ja-
tido amanhã no Conselho de Mi-
nistros Europeu da Agricultura e
Pescas, onde serão debatidas me-
didas concretas de mitigação dos
impactos da seca em Portugal e Es-
panha, designadamente nas ativi-
dades pecuárias e agroalimentares.
O eurodeputado socialista Car-
los Zorrinho defendeu, na semana
passada, que “os agricultores têm
de continuar a dispor da água para
produzir de forma eficiente os
bens de que necessitamos, a água
tem de continuar a estar disponí-
Praias fluviais correm
vel nas torneiras para um uso ra-
cional”, bem como a indústria e os
serviços que dela precisam “para
risco de “desaparecer”
este verão
disponibilizar produtos essen-
ciais”. De resto, salientou que o
Fundo de Solidariedade da União
Europeia “está cá para isso quando
for necessário, complementando PREOCUPAÇÃO A manter-se, ou a agravar-se, a seca, a região Centro
as ações dos Estados-membros e
das suas instituições”. vai sofrer grandes impactos económicos nos próximos meses em áreas
“A Agência Europeia do Ambien- como o turismo, gastronomia e vinhos, como refere Pedro Machado.
te, no relatório recentemente divul-
gado sobre Riscos climáticos em
mutação na Europa, adverte que o
Sul da Europa deve preparar-se

neiro “verificou-se um agrava-
mento muito significativo da si-
tuação de seca meteorológica,
com um aumento da área e da in-
tensidade, estando no final do mês
todo o território em seca, com 1%
em seca fraca, 54% em seca mode-
rada, 34% em seca severa e 11% em
seca extrema”.
Ainda de acordo com o IPMA,
em relação à precipitação, janeiro
de 2022 foi o 6.º mais seco desde
A
para verões mais quentes, secas preocupação sobre o fu-
mais frequentes e um maior risco turo turístico no Centro
de incêndio”, recordou Zorrinho, do país cresce também
que sublinhou também o facto de a no Turismo da região,
mesma instituição referir ser “pro- como reconhece o seu presidente.
vável que a Europa Central registe Pedro Machado considera que as
uma menor precipitação estival e repercussões da seca no setor pri-
fenómenos meteorológicos extre- mário são, em si mesmo, “um gran-
mos mais frequentes e mais fortes, de problema para o turismo; desde
incluindo precipitação intensa, logo para a gastronomia, mas tam-
cheias, secas e riscos de incêndio”. bém estamos a pensar nos vinhos,
dnot@dn.pt para toda a questão económica
que está relacionada com o setor
primário, onde a água é vital para
garantir as atividades de animação
turística”.
De resto, o presidente da Entida-
de Regional do Turismo do Centro
adianta que “temos já algumas das
infraestruturas naquilo que cha-
mamos ‘doca seca’, face ao que es-
tamos habituados a ver”. Aponta o
caso de Figueiró dos Vinhos, mas
NUNO BRITES / GLOBAL IMAGENS
O responsável do Turismo do
Centro sublinha que, por ora, está
preocupado em “sinalizar a situa-
ção, porque mais importante é a
satisfação das necessidades bási-
cas, o consumo humano”. Mas
lembra que é preciso olhar para o
que está a acontecer e para o futu-
ro: “Tem de estar ligado a modelos
de reaproveitamento do que é o ci-
clo da água, que no âmbito do PRR
o pudéssemos inscrever, que esta
fosse uma prioridade do governo
português, e não apenas a transi-
ção digital e as questões relaciona-
das com as alterações climáticas.”
Viver do rio, da nascente à foz
Victor Gomes recorda que“há mui-
ta gente que depende do rio para vi-
ver, da nascente à foz. “A maioria
são até pessoas com alguma idade,
que têm o seu barquito de madeira
beira de Alge e as margens do Zêze-
re, uma equipa da autarquia dedi-
cava-se à limpeza dos ramos e ga-
lhos das árvores que circundam o
parque, na foz de Alge. Junto ao
Clube Náutico, os barcos permane-
cem ancorados, à espera que o cau-
dal permita navegar. Os restantes
desportos náuticos também espe-
ram por melhores dias. Tal como
Victor, que é o último otimista:“Tal-
vez eu seja a única pessoa que gos-
ta do rio vazio. Quando era peque-
no, assisti ao que se está a passar
duas ou três vezes. Aliás, eu acredi-
to que o rio ainda vai descer mais.
Mas também lhe posso dizer que se
o parque estivesse aberto, nestes
dias recebi mais de 50 chamadas de
pessoas que queriam reservar bun-
galows. Porque se gerou uma curio-
sidade tremenda à volta disto. E
sim, pode ser uma oportunidade

frisando que todo o Pinhal Interior
começa a dar sinais preocupantes
nas praias fluviais. “Toda aquela re-
gião depende muito, em plano de
água, da animação nas albufeiras.
E se deixarmos de ter água, se esti-
ver concentrada apenas no consu-
mo humano, iremos ter uma dimi-
nuição grande das praias fluviais”,
José Pais alerta desde o verão passado para a redução da água na adverte Pedro Machado.
albufeira de Cabril.
e estão habituadas a lançar as redes
e a vender o seu peixe.” Como o
achigã que se servia no restaurante
do Parque de Campismo da Foz de
Alge, agora de portas fechadas, até
que a Câmara de Figueiró dos Vi-
nhos decida qual das quatro pro-
postas a concurso é a melhor para
continuar naquela infraestrutura.
No dia em que o DN percorreu a ri-
de ver o rio assim, que tão cedo não
volta a repetir-se.”
Por estes dias, o único ponto de
atração “turística” é mesmo o leito
do rio, que quase dá para atraves-
sar a pé. A seca deixou a descober-
to as ruínas da Fundição de Ferro
da Foz de Alge, que se tornou uma
das mais fotografadas da região.
dnot@dn.pt
14 SOCIEDADE
Uma semana depois
PJ ainda procura
suspeitos de atear fogo
ao bar de Vilamoura
SEGURANÇA Têm sido vários os registos de incêndios em bares
e discotecas. Só o ano passado, foram quatro, todos em áreas
de praia, e cabe à PJ investigar estas situações. A destruição
do The Funky Dogo pelas chamas, ateadas por três pessoas,
é um caso isolado, segundo as autoridades policiais do Algarve.
TEXTO CÉU NEVES
T
rês homens encapuçados
entraram pelo The Funky
Dogo, em Vilamoura, ao fi-
nal da tarde do último do-
mingo. Pediram a quem estava que
saísse e regaram o estabelecimen-
to com gasolina. Ouviu-se um es-
trondo e, de repente, as chamas
alastraram por todo o lado. As au-
toridades investigam, tudo indi-
cando que foi um ato isolado. Sus-
peita-se que terão sido clientes que
provocaram desacatos e foram ex-
pulsos nessa semana. Ou seja, terá
sido um “ajuste de contas”.
O bar fica no rés-do-chão do
aparthotel Luna Olympus, na se-
gunda linha da Marina de Vila-
moura. Eram 18h45 de domingo
quando os bombeiros foram cha-
mados para combater as chamas
num bar. Primeiro seguiu a corpo-
ração de Loulé, depois as de Albu-
feira e de Faro. Com eles, a GNR, a
Cruz Vermelha e, por fim, a PJ.
A GNR percebeu que não era um
acidente e é a Judiciária que inves-
tiga estas situações. Diz a legislação
que é da sua competência “a inves-
tigação de crimes de incêndio em
que o facto seja imputável a título
de dolo, de acordo com a alínea f)
do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º
49/2008, de 27 de agosto, sem pre-
juízo do artigo 8.º”. Ou seja, “em to-
das as ocorrências de incêndio, ex-
plosão, libertação de gases tóxicos
ou asfixiantes ou substâncias ra-
dioativas, desde que, em qualquer
caso, o facto seja imputável a título
de dolo”.
A PJ não respondeu às perguntas
do DN nem indicou se fogo posto
no bar de Vilamoura é uma situa-
ção isolada. “Há discussões e rixas
em bares e discotecas, mas não in-
cêndios deste género, em que al-
guém o terá provocado devido a
problemas anteriores. Este é um in-
cêndio com intenção de dolo”, ex-
plica o major Abel Adriano, do Co-
mando Territorial da GNR de Faro.
João Fonseca, o porta-voz do Co-
mando Nacional da GNR, esclare-
ce: “No dia 13 de fevereiro ocorreu
um incêndio num estabelecimen-
to de restauração e bebidas em Vi-
lamoura. No decorrer das diligên-
cias policiais, foi possível apurar
que o incêndio teve origem dolosa,
em que três indivíduos regaram o
interior do bar com gasolina e atea-
ram fogo, colocando-se em fuga
num veículo de cor escura.” Acres-
centa que “não há conhecimento
de outras situações idênticas na
zona de ação do Comando Territo-
rial de Faro nos últimos cinco
anos”. Os factos foram comunica-
dos ao Tribunal Judicial de Loulé.
“No decorrer das
diligências policiais, foi
possível apurar que o
incêndio teve origem
dolosa, em que três
indivíduos regaram o
interior do bar com
gasolina e atearam
fogo, colocando-se
em fuga num veículo
de cor escura.”
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
O alerta para os bombeiros foi às
18h45 e o incêndio foi declarado
extinto às 20h00. Envolveu 55 ope-
racionais e 22 viaturas; os profis-
sionais de saúde registaram dois
feridos ligeiros, que reencaminha-
ram para o hospital, e assistiram a
15 pessoas no local, essencialmen-
te por inalação de fumo. É o regis-
to do Comando Regional de Ur-
gência e Proteção Civil do Algarve.
“Tudo muito rápido”
“Ouvi um estrondo, desci pelas es-
cadas do prédio e, quando cheguei
à porta, estava tudo a arder, foi tudo
muito rápido. Havia um fumo hor-
rível, eu e a minha mulher só quise-
mos sair o mais rápido possível”,
conta Custódio Fernandes, um nos bares. A Sortami, agência imo-
emigrante de Braga que ali tem biliária mesmo em frente do Luna
casa de férias. Mora no segundo Olympus, era dos poucos estabe-
andar, a cuja habitação regressou lecimentos abertos. “Ouvi um ba-
eram 23h00 de domingo. rulho da explosão e, logo de segui-
Só o 1.º andar ficou inabitável, as da, tudo a arder. Começou peque-
paredes do rés-do-chão (onde fun- no e, de repente, propagou-se, e foi
cionava o The Funky Dogo e ou- tudo muito rápido. Entretanto,
tros estabelecimentos comerciais) juntaram-se os bombeiros, ambu-
e o terraço, no 1.º piso, estão com- lâncias, polícia”, conta Rui Rua, o
pletamente pretos, até parece que promotor imobiliário que estava
essa era a sua cor de origem. “Está A remodelação do bar, na agência no momento do fogo.
tudo destruído, canalizações, par- O aparthotel pertence ao grupo
te elétrica, tudo. Também é preci- inaugurado há menos Luna Hotéis, que não avança com
so ver se não tem consequências de um ano, custou informações sobre o pós-incêndio,
para o prédio. A sorte foram as pa- apenas sublinha que o espaço es-
redes de vidro, que rebentaram, e cerca de 250 mil euros. tava alugado. E que será o seguro a
as chamas propagaram-se para o Há uma semana, as avaliar os prejuízos, sem especifi-
lado, pelo rés-do-chão, em vez de car a quem competem as obras de
subirem para os andares”, conta
chamas destruíram recuperação. Segundo os testemu-
António Cruz, outro morador. A tudo, prevendo-se que nhos dos vizinhos, o inquilino é in-
zona está isolada com “fita baliza- glês e ainda não esteve em Vila-
dora”, incluindo a parte onde estão
a recuperação do moura depois do incêndio.
localizados um outro bar e um estabelecimento Avaliar as repercussões do fogo é
café. ascenda a mais de a fase em que comerciantes e mo-
O comércio em geral está fecha- radores se encontram. Tenta-se re-
do no domingo à tarde e, à hora do 700 mil euros. cuperar alguns géneros alimentí-
incêndio, era fraco o movimento cios e bebidas, limpa-se o que se
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 15

uma distância suficiente para não

ser atingido pelas chamas.
A história que ouviu contar do
que se terá passado é a que todos
contam. “Nessa semana, houve
uns clientes que não se portaram
bem, com ofensas verbais, acabou
em tareia e foram postos na rua.
Pensa-se que podem ter sido eles a
atear o fogo”, conta.

Incêndios são frequentes

Têm sido vários os registos de in-
cêndios em bares e discotecas. Só o
ano passado, por exemplo, houve
notícias de chamas que destruíram
o Yamba Bar, na Costa da Caparica
(23 de maio de 2021), funcionava no
antigo Masstige, também reduzido
a cinzas em 2015. O mesmo aconte-
ceu ao Rock in River, em Vila Nova
de Paiva (3 de maio de 2021), na
Praia do Ouro, em Sesimbra (18 de
outubro de 2021) e no Bar do Peixe,
no Meco (12 de novembro de 2021).
Recuando mais no tempo, os bom-
beiros foram chamados a combater
as chamas no Old Beach, em São
Pedro de Moel (10 de agosto de
2019), n’O Amarelo, em Santo Ama-
ro de Oeiras (22 de maio de 2019), no
Bar do Bruno, no Baleal (4 de setem-
bro de 2018) e numa discoteca em
Argoncilhe, em Santa Maria da Fei-
ra (10 de janeiro de 2015). Na maio-
ria dos casos, ocorreram fora das
horas de funcionamento e em mui-
tos destes fogos foi chamada a PJ.
O DN questionou as autorida-

FOTOS CARLOS VIDIGAL JR. / GLOBAL IMAGENS

des policiais no sentido de perce-
ber se tem havido mais incêndios
movidos por um ajuste de contas,
tendo em atenção, sobretudo, a
forma como os suspeitos de Vila-
moura atuaram e a rapidez com
que o fizeram. Não houve deten-
ções no local e as autoridades no
Algarve não têm registos de situa-
ções idênticas.
“Discussões, rixas, acontecem
com alguma frequência em bares e
discotecas, mas não chegam a este
tipo de situação”, refere um ele-
pode, os outros comerciantes não mento da Diretoria do Sul da PJ.
sabem quando poderão abrir, até Tanto a GNR como a PSP reme-
porque há áreas que não oferecem tem a explicação sobre aqueles ca-
segurança. Há funcionários de sos para a PJ. “Sempre que as cau-
uma empresa de construção civil a sas de um sinistro não são absolu-
avaliar os estragos, tomam notas. tamente claras e ou detetamos
António Cruz acompanha: “Sou da indícios de difícil contextualiza-
área e tenho interesse em que a si- ção/justificação e ou se verificam
tuação se resolva.” Calcula o valor vítimas ou danos avultados, a PSP
dos prejuízos na ordem dos 700 informa a PJ.” Acrescenta esta po-
mil euros, mas “para cima”. lícia que, a partir daí, deixam de
acompanhar o processo. O mes-
Remodelado há um ano mo acontece com a GNR.
Está a fazer um ano que o The Não há informação disponível
Funky Dogo foi inaugurado. Serão sobre quantos foram esses casos. E
dois os sócios e terão gasto 250 mil tanto a GNR como a PJ justificaram
euros na renovação do espaço. “O não ser possível obter essa infor-
bar anterior era o Spot, este abriu o mação em tempo útil. “Pela dificul-
ano passado, já depois do confina- dade de contextualização, não nos
mento. Era um bar muito tranqui- será possível apresentar a estatísti-
lo, com muito bom ambiente. Os ca solicitada (porquanto não dis-
donos era um senhor de mais idade pomos dos sinistros classificados
e outro mais jovem, são pessoas pelas categorias propostas)”, justi-
muito amigáveis, muito simpáticas. fica a PSP.
Nunca me apercebi que tivessem Os responsáveis pela PJ limita-
A imagem a destruição provocada pelas chamas no The Funky Dogo, após ter sido regado com problemas com os clientes”, conta ram-se a não responder aos e-mails
gasolina, fazendo com que o fogo se propagasse rapidamente (em cima). Custódio Fernandes (em Célia Gonçalves, que explora a Ta- do DN.
baixo), que mora no segundo andar do aparthotel, teve poucos minutos para fugir. bacaria Ruby, ao lado do bar mas a ceuneves@dn.pt
16 SOCIEDADE
Número de internados
continua a descer em Portugal,
em dia com mais 37 mortos
COVID-19 Unidades de cuidados intensivos estão com uma
ocupação semelhante à do início de dezembro.
P
ortugal registou 14.160 no-
vos casos de covid-19 e 37
mortes, bem como uma
nova diminuição dos inter-
namentos, de acordo com o bole-
tim epidemiológico divulgado on-
tem pela Direção-Geral da Saúde
(DGS) e que se refere às 24 horas
anteriores.
Segundo a DGS, estavam inter-
nadas 1799 pessoas, menos 137 do
que no boletim de sexta-feira, en-
quanto nas unidades de cuidados
intensivos encontravam-se 118
pessoas (menos nove), embora
nem todos os internamentos se de-
vam à covid-19, podendo ser moti-
vados por outras patologias apesar
da existência de infeção com SARS-
-CoV-2.
O nosso país registou, pelo se-
gundo dia consecutivo, menos de
dois mil internamentos, o valor
mais baixo do último mês, tendo-
-se verificado números idênticos a
16 de janeiro, quando estavam in-
ternados nas enfermarias dos hos-
pitais 1813 pessoas. Também os
cuidados intensivos registam uma
ocupação semelhante à do início
de dezembro de 2021.
O número de casos ativos dimi-
nuiu para 504.185, menos 12.705
do que na sexta-feira, e foram da-
das como recuperadas 26.828 pes-
soas, para um total de 2.653.049
desde o início da pandemia. Deixa-
ram ainda de estar em vigilância
12.965 contactos, mas as autorida-
des de saúde ainda mantêm
521.186 pessoas nesta situação.
Das 37 mortes por covid-19 assi-
naladas no boletim de ontem da
DGS, 16 aconteceram na região
Norte, 11 na zona de Lisboa e Vale
do Tejo, oito na região Centro, uma
no Algarve e uma no Alentejo.
A maior parte dos novos contá-
gios foi diagnosticada na região de
O número de casos ativos desceu no boletim de ontem para 504.185.
Lisboa e Vale do Tejo, com 4505 in-
feções, seguindo-se o Norte (3194),
o Centro (2624), os Açores (1525), o
Algarve (836), o Alentejo (907) e a
Madeira (569).
Medidas de alívio já em vigor
As novas medidas de alívio das res-
trições, como o fim da exigência de
certificado digital e do isolamento
de contactos de risco, entraram on-
tem em vigor. Estas medidas cons-
tam de um diploma com a resolu-
ção do Conselho de Ministros de 17
de fevereiro, publicado na sexta-
-feira em Diário da República, que
justifica as alterações com a “evolu-
ção positiva” que a situação epide-
miológica causada pela covid-19
tem tido em Portugal.
Assim, desde ontem deixa de ser
necessário os contactos de risco fa-
zerem isolamento, passando este a
abranger apenas quem teste posi-
tivo à covid-19. Deixa igualmente
de ser necessária a apresentação de
certificado digital, exceto no con-
trolo das fronteiras, bem como de
teste negativo para aceder a gran-
des eventos, recintos desportivos,
bares e discotecas. A nova legisla-
ção põe ainda fim à recomendação
do teletrabalho e acaba com os li-
mites de lotação em estabeleci-
mentos, equipamentos e outros lo-
cais abertos ao público, que voltam
a ter a sua lotação normal.
As medidas que ainda se man-
têm em vigor são a exigência de
teste negativo ou certificado de re-
cuperação ou de vacinação com-
pleta com dose de reforço para vi-
sitas a lares e utentes internados
em estabelecimentos de prestação
de cuidados de saúde. O uso de
máscara nos espaços interiores,
onde é exigida atualmente, tam-
bém se mantém.
DN/LUSA
EPA/MARIO CRUZ
Carros elétricos: o bom
e tudo o que ainda falta
A
solução para a descar-
bonização é o transpor-
te público ou veículos
de mobilidade mais le-
ves, como a bicicleta – e andar a
pé. Ainda assim, há muitas famí-
lias que têm crianças pequenas
ou maus transportes e precisam
de um veículo elétrico. E há tam-
bém o mundo das empresas,
com várias pessoas e equipa-
mentos, onde a viatura elétrica
pode ser uma ótima opção. É fá-
cil? Não é. Mas tem de se come-
çar por algum lado. Tento expli-
car como.
A empresa onde trabalho ad-
quiriu um veículo com capaci-
dade para fazer viagens em tem-
po razoável entre Porto e Lisboa.
“Autonomia” é o que toda a gente
quer saber. Qual a autonomia de
um elétrico? Esta pergunta é
vaga. A razão é simples: a auto-
nomia do veículo depende, em
primeiro lugar, da capacidade da
bateria (no nosso caso, 73 kW) e
da velocidade a que se viaja. Se
vou a 120, com ar condicionado
ligado, quatro pessoas e mala
cheia, o carro gasta 25 kW por
cada 100 km. Como tenho 73 kW,
a autonomia é de quase 300 km
(por mais que a publicidade diga
que são 480 km). É como num
carro a combustível: o consumo
depende da velocidade.
Do Porto a Lisboa, os 300 km
de autonomia não são suficien-
tes para uma viagem sem para-
gens. Precisa de carregamento. E
isso é fácil? Depende. Na A1 sim.
A Brisa e as concessionárias estão
a instalar postos de carregamen-
tos rápidos. Por exemplo, os da
Ionity, nas estações de serviço da
Cepsa (Leiria), permitem carre-
gar um carro a mais de 200 kW/h.
Ou seja, se tenho uma bateria de
73 kW, carrego o carro até 80%
em 18 minutos. Os 20% finais são
muito mais lentos, por questões
de segurança das baterias.
Os carregamentos Ionity são
muito caros e menos competiti-
vos face ao gasóleo. Qual o valor?
Depende. Já nos cobraram 55
cêntimos por quilowatt. Mas as
tarifas estão sempre a mudar. E,
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Opinião
Daniel Deusdado
portanto, estão quase sempre
vazios. Já os fast charge da Via
Verde/EDP, por exemplo em
Santarém, são mais baratos e
têm uma boa performance: car-
regam a 160 kW/h, embora este-
jam mais vezes ocupados. E fi-
car-se meia-hora à espera que al-
guém acabe (só há um
carregador ultrarrápido por esta-
ção de serviço) é uma experiên-
cia dolorosa para quem tem
agendas a cumprir.
Há, apesar de tudo, soluções
intermédias – carregamentos a
50 kW/h. No nosso caso, se o car-
ro ficasse ligado uma hora, fica-
ria com 66% de bateria e 200 km
de autonomia para autoestrada.
Mas ficar uma hora parado é im-
possível – e não é necessário che-
gar-se a 100%. É importante, sim,
que o carro chegue a casa ou até
outro ponto onde temos mais
tempo de carregar. Daí a vanta-
gem de se abastecer a 200 kW/h
ou a 160 kW/h. Mais caro, mas
mais eficaz na autoestrada.
Uma outra nota: encontrar
carregamento nas cidades co-
meça a ser mais fácil. Os velhos
postos da Mobi-e abastecem a 3
kW/h ou a 7 kW/h e só são úteis
para quem carrega à noite du-
rante muitas horas. Mas os su-
permercados e parques de esta-
cionamento públicos começam
a ter carregadores com 11 kW/h
ou 22 kW/h, e através das apps
(edp ev.charge ou miio, por
exemplo) pode verificar-se à dis-
tância se estão ou não disponí-
veis. Há uns meses fui a Bragan-
ça. O melhor carregamento esta-
va no parque do Lidl. As apps
mostram tudo. Deixei-o a carre-
gar duas horas a 50 kW/h en-
quanto almoçávamos e fiquei
com 100%.
Por fim, carregar em casa con-
tinua a ser a maior questão de to-
das. Conseguir passar um cabo
num prédio, desde a habitação
até à garagem, é, na maioria dos
casos, impossível. A solução é li-
gar o carregador ao quadro co-
mum do prédio, além de ter de se
instalar um pequeno contador
próprio (200 euros, pelo menos).
Isto necessita de coordenação
com a gestão do condomínio e
um débito mensal em separado,
o que depende da agilidade da
gestão de cada condomínio.
Outro obstáculo: um carrega-
dor doméstico pode custar perto
de 500 euros (ou mais) e o ideal é
que seja trifásico, para se ajustar
melhor à potência disponível no
prédio. Algumas marcas auto-
móveis, por vezes, oferecem-nos
durante campanhas promocio-
nais, mas não é regra.
E um ponto essencial: carregar
no horário depois da meia-noite
é muitíssimo mais barato e am-
bientalmente melhor. Outro en-
trave: toda a gente do prédio
querer fazer o mesmo, o que di-
minui a capacidade de carrega-
mento – a potência divide-se pe-
los carregadores. Além disso, em
muitos casos os edifícios terão de
rever as potências contratadas
com os comercializadores de
energia. Idealmente, se os con-
domínios começassem a instalar
painéis solares, poder-se-ia car-
regar de dia a custo zero e de ma-
drugada em tarifas muito mais
baratas. Os apoios do Fundo
Ambiental a painéis solares do-
mésticos são uma boa oportuni-
dade, sobretudo se depois pude-
rem ser partilhados por todos.
Em resumo: é extraordinário
fazer-se esta mudança. Para
quem usa essencialmente veícu-
los em pequenas deslocações, os
híbridos, que têm baterias sufi-
cientes para 40 ou 50 km, fazem
desaparecer a conta da gasolina
ou gasóleo diário. Para quem
tem elétricos e os pode carregar
sempre em casa, o valor é muitís-
simo menor que o combustível –
menos dois terços ou mais. E
hoje já se pode ter a ambição,
tranquila, de ir a qualquer ponto
do país e não ficar mal. Portugal
está à frente de Espanha e de ou-
tros países, Alemanha incluída. E
note – não desistir é a questão.
Tudo se resolve, exceto o aqueci-
mento global.
Jornalista.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Economia com mais 65 mil postos de
trabalho do que antes da pandemia
ATIVIDADE O emprego em Portugal cresceu 1,6% face ao nível de 2019. Média mensal
das remunerações declaradas à Segurança Social ficou nos 967 euros no último ano.
TEXTO MARIA CAETANO
O
emprego recuperou do
choque trazido pela pan-
demia e superou no ano
passado em 1,6% o nú-
mero de postos de trabalho declara-
dos em 2019, com mais 65 402 traba-
lhadores a descontar, revelam os da-
dos anuais finais de gestão de
remunerações da Segurança Social
a que o DN/DinheiroVivo teve aces-
so.
Na média anual de 2021, são con-
tabilizados cerca de 4,3 milhões de
trabalhadores por conta de outrem,
um máximo da última década e em
linha com a tendência que os dados
de evolução do emprego do Institu-
to Nacional de Estatística (INE) têm
vindo a evidenciar.
Em 2020, e na sequência do cho-
que a várias atividades dependentes
da circulação de pessoas trazido
pela pandemia, o trabalho por con-
ta de outrem declarado recuou
0,7%, com menos 30 577 indivíduos
a descontar, em termos líquidos e de
média final anual. Mas, ao longo dos
meses desde a chegada da covid, fo-
ram várias as flutuações, com a pri-
mavera de 2021 a ser marcada ainda
por perdas expressivas no nível de
emprego face a 2019, penalizando
sobretudo os salários mais baixos,
com perdas de emprego superiores
DINHEIRO 17
A ministra do Trabalho, Há perda de emprego
Solidariedade e
Segurança Social, nos de salário mais
Ana Mendes Godinho. baixo, mas os de
remuneração mais alta
e as profissões mais
qualificadas têm
recuperação maior.
O que ajuda a explicar
subida da média salarial.
tendo crescido 2,9%, apesar da des-
truição provocada pela pandemia.
Estes dados, que dizem respeito a
retribuições totais (incluindo subsí-
dios de férias e de Natal) ficam abai-
xo da média de salário total avança-
MIGUEL A. LOPES/LUSA
da já pelo INE para 2021, nos 1361
euros. Este valor pondera não ape-
nas os salários declarados à Segu-
rança Social, mas também aqueles
que são declarados à Caixa Geral de
Aposentações.
Em volume global anual, os em-
pregadores do país declaram no ano
passado 57,8 mil milhões de euros
em salários, um valor recorde que
representou um crescimento de
6,9% face a 2020, e que fica também
9,1% acima do total de salários pa-
gos a trabalhadores por conta de ou-
trem em 2019.
Já as contribuições para a Segu-
rança Social em nome destes traba-
lhadores atingiram os 19,5 mil mi-
lhões de euros, ficando 9,1% acima
do volume global de descontos de
2020, que nesse ano caíram, em re-
sultado sobretudo das medidas de
isenção e redução de taxa social úni-
a 100 mil postos de trabalho, nos cál- ca concedidas às empresas no âm-
culos feitos então a partir de dados bito dos regimes de lay-off simplifi-
mensais. cado e apoio à retoma progressiva.
Os dados a que o DN/Dinheiro Face a 2019, o volume global de con-
Vivo teve acesso não permitem ain- tribuições para a Segurança Social
da avaliar em que escalões salariais declaradas no último ano cresceu
houve maior crescimento de em- 8,6%.
prego, e se houve já uma recupera- Mas, se o mercado de trabalho re-
ção no trabalho declarado entre cuperou de forma geral entre quem
quem recebe as remunerações mais trabalha por conta de outrem, o
baixas. O INE tem apontado alguns mesmo não sucedeu ainda com os
segmentos que têm ficado ainda trabalhadores independentes que
para trás nesta recuperação, como descontam para a Segurança Social,
o dos jovens – onde o desemprego cujo número caiu pelo segundo ano
continua a subir – e os trabalhado- consecutivo.
res de setores como o alojamento e Na média final de 2021, a Seguran-
a restauração. ça Social conta 518 067 recibos ver-
FONTE: MTSSS E CÁLCULOS DINHEIRO VIVO
A perda de emprego entre salários des a descontar, menos 13 527 (ou
mais baixos e a tendência de recu- menos 2,5%) do que o máximo al-
peração mais forte nas remunera- cançado no ano anterior à pande-
ções mais altas e profissões mais mia, 2019 – ano que coincidiu tam-
qualificadas, num processo de re- bém com a implementação do novo
composição do emprego, ajuda a regime contributivo dos trabalhado-
explicar uma subida mais acelerada res independentes, que atraiu mais
da média salarial declarada. de 100 mil novos inscritos para o sis-
Nos cálculos do DN/Dinheiro tema.
Vivo a partir dos dados da Seguran- Os descontos feitos por estes tra-
ça Social, a média mensal dos salá- balhadores também não recupera-
rios com descontos para a Seguran- ra. Ficaram no ano passado em
ça Social terá subido 4,5% no último 491,5 milhões de euros, ainda me-
ano, para um valor de cerca de 967 nos 5,3% do que o volume global das
euros (mais 41,30 euros). Em 2020, contribuições pagas em 2019. Era
a média mensal de remunerações então de 519,3 milhões de euros.
declaradas rondava os 926 euros, maria.caetano@dinheirovivo.pt
18 DINHEIRO
De palhinhas comestíveis
a garrafas biodegradáveis:
a inovação no agroalimentar
CONSUMO A sustentabilidade pode ter dado o mote, a par da mudança no comportamento
dos consumidores. O certo é que as empresas apostam cada vez mais na investigação e
desenvolvimento para se diferenciarem no mercado com produtos inovadores e mais “verdes”.
TEXTO ALEXANDRA COSTA
O
consumidor de hoje não
é o mesmo consumidor
de 2019. Um estudo rea-
lizado pela Mintel, a pe-
dido da PortugalFoods – Associação
do Setor Agroalimentar português,
revelou que o comportamento mu-
dou. E tudo indica que é uma via-
gem sem retorno. Hoje quem com-
pra é mais exigente. Quer estar in-
formado sobre o que consome,
quer adquirir produtos que sejam
sustentáveis. Quer ter um maior
controlo e, principalmente, quer
transparência. E procura produtos
alimentares que lhe proporcionem
“experiências únicas”.
Tudo isto “obrigou” o setor a ace-
lerar a inovação. O certo é que, e de
acordo com Deolinda Silva, direto-
ra executiva da PortugalFoods,
houve uma grande evolução nos úl-
timos anos . Hoje o setor está “qua-
lificado e orientado para o merca-
do, acompanhando as tendências
mundiais para se adaptar e diferen-
ciar no mercado global”. Os núme-
ros demonstram-no, com as expor-
tações a crescerem nos últimos dois
anos, apesar da pandemia. Em
2020 cresceram 2,5% face a 2019 e
no ano passado deram um salto de
11,4% para 7 709 milhões de euros.
Portugal tem dado cartas na ino-
vação nesta área. Para a diretora
executiva da PortugalFoods, a ex-
pectativa é mesmo que, neste ano,
o país passe novamente a estar no
grupo dos países fortemente ino-
vadores.
O certo é que muitas empresas
portuguesas souberam responder
ao desafio. Há vários projetos, al-
guns já com produtos no mercado,
outros ainda em fase de desenvol-
vimento, que mostram que a inves-
tigação e a inovação portuguesas
estão de boa saúde.
Novarroz aposta em
embalagens de papel
O plástico há muito que domina
os lineares dos supermercados na
área da mercearia. Mas a estraté-
gia de sustentabilidade da No-
vaarroz levou a uma decisão que
mudou tudo. As medidas tomadas
ao longo do tempo para reduzir o
consumo de plástico, a par do
apoio à produção integrada, pro-
dução biológica, promoção de
programas de biodiversidade na
produção agrícola, eficiência
energética a nível industrial e a re-
ciclagem de resíduos e valorização
dos subprodutos, tiveram como
culminar o desenvolvimento de
uma embalagem 100% de papel.
Como a marca explicou ao
DN/Dinheiro Vivo, a decisão obri-
gou a vários investimentos nas li-
nhas de produção e procura de
novas soluções de abastecimento.
No caso específico desta embala-
gem, o maior desafio foi o de en-
contrar uma solução de papel
com a janela transparente.
A inovação tem de
procurar adequar-se
às tecnologias
existentes, com
pouco investimento
por parte das
empresas, ou estará
condenada ao
insucesso, defende o
CEO da Água de
Monchique.
O resultado final nasceu de um
trabalho conjunto e multidiscipli-
nar, que contou com grande en-
volvimento das equipas de
marketing, I&D, procurement e
produção, e ainda a estreita cola-
boração com fornecedores. Se-
gundo a empresa, a aceitação da
nova embalagem tem sido muito
positiva, o que reflete a crescente
preocupação dos clientes e con-
sumidores na procura de solu-
ções mais sustentáveis e amigas
do ambiente.
Depois deste “sucesso” a em-
presa, e ainda no âmbito das em-
balagens, refere que 2022 será um
ano de consolidação da substitui-
ção das embalagens de plástico,
com um objetivo de redução glo-
bal do consumo anual de 200 to-
neladas de plástico. Contam ain-
da apresentar novidades ao nível
de novos produtos no eixo do
bem-estar e saúde, conveniência
e produção biológica. A nível
energético está previsto um au-
mento substancial da energia so-
lar (investimento em painéis foto-
voltaicos), “que poderá represen-
tar cerca de 80% do nosso
consumo energético”.
Wissi traz as algas para
a alimentação quotidiana
A paixão pelo mar e a prática do
surf estiveram na base da decisão
de Diogo Teixeira Lopes, CEO fun-
dador da Wissi, de procurar um
negócio que promovesse “um re-
curso sustentável da nossa costa
atlântica”. A escolha recaiu nas al-
gas, que auferem aos consumido-
res um alimento saudável, inova-
dor e de alto valor nutricional.
Mas nem tudo foi fácil. Diogo Tei-
xeira Lopes teve de ultrapassar
hábitos de consumo enraizados,
assim como dificuldades de fi-
nanciamento de um setor ali-
mentar de produtos nicho. Sem
esquecer que “vivemos de experi-
mentação e degustação fruto da
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
conjuntura pandémica que nos
impede de promover os nossos
produtos junto de potenciais
clientes”. Apesar de todas as difi-
culdades, a empresa tem recebi-
do recetividade ao projeto.
A Wissi trabalha em parceria
com a Direção-Geral e Recursos
Naturais, Segurança e Serviços
Marítimos, que concedeu a licen-
ça de apanha de algas. Além disso,
e segundo Diogo Teixeira Lopes, a
empresa tem contactos institu-
cionais com o IPMA e um proto-
colo estabelecido com a Escola de
Hotelaria do Estoril, a par de par-
cerias com o Cascais Food Lab.
Contactos que “nos ajudam a di-
vulgar e promover o projeto de al-
gas Wissi com evidências de fide-
lização e aprendizagem desta
nova tendência por parte de todos
os intervenientes”.
O projeto começou com as al-
gas desidratadas Alface do Mar
30g, mas hoje já conta com “três
gamas (desidratada, fresca e aro- bens de consumo: garrafas 100%
mática), considerando as algas biodegradáveis e compostáveis e
que comercializamos (Alface do que além de não criarem qual-
Mar, Kombu, Esparguete do Mar, quer interferência na qualidade
Wakame e Chorão do Mar), ga- da água, podem ser consumidas
mas e os vários formatos existen- pela fauna marinha, caso che-
tes”. A empresa está neste mo- guem ao oceano.
mento a testar uma nova gama: Essencial era que a nova emba-
barras snacks com algas, tendo lagem preservasse as qualidades
em vista a conveniência. químicas e bacteriológicas da
Água de Monchique em
Água Monchique. Algo que tinha
de ser compatível com a higiene e
garrafa biodegradável segurança dos vários produtos e
A inovação faz parte do ADN da respeitar toda a regulamentação
empresa. Depois de, em 2021, ter existente para o setor alimentar.
apresentado a primeira garrafa de “Outro desafio exigente foi de que
água totalmente produzida a par- esta solução pudesse ser aplicada
tir de PET reciclado, surgiu a ideia à tecnologia de produção já exis-
de, através da parceria com a Uni- tente no mercado, nomeadamen-
versidade do Minho e Fundação te no processo de sopro”, explicou
Mirpuri, criar a primeira embala- o gestor que acrescentou que a
gem portuguesa 100% biodegra- inovação tem sempre de procurar
dável. O resultado foi o que Vítor adaptabilidade e adequação às
Hugo Gonçalves, CEO da Socie-
dade da Água de Monchique,
tecnologias existentes, com pou-
co ou nenhum investimento por
considera ser um exemplo para o parte das empresas, ou estará
mundo e para a indústria dos sempre condenada ao insucesso.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Consumidores mais exigentes estão a
levar a indústria alimentar a acelerar a
inovação, desenvolvendo produtos mais
saudáveis e amigos do ambiente.
ComTemp: PET reciclado
nos vinagres
Uma das maiores dificuldades da
empresa no que concerne a ino-
var no processo produtivo pren-
de-se com a dificuldade de en-
contrar o tipo de tecnologia ne-
cessária em Portugal. Neste
momento, a ComTemp, detento-
ra da marca Cristal, está a traba-
lhar com uma universidade em
Portugal e com outra no Brasil,
quer para melhoria de processos
produtivos, quer para novos pro-
dutos. Está também a estudar um
processo produtivo inovador na
Alemanha. Um dos seus investi-
mentos passa por substituir a
quantidade de PET virgem utiliza-
do nas embalagens. O resultado
foi que a Cristal foi “a primeira
marca de vinagres em Portugal (e
uma das primeiras no mundo) a
introduzir PET reciclado (25%)”
nas suas garrafas de vinagre,
como explica Tiago Carneiro, di-
retor de estratégia da ComTemp.
O executivo acrescenta que a em-
presa tem um laboratório próprio
de pesquisa e desenvolvimento, o
que permite que a maioria dos
produtos criados pela empresa e
que posteriormente passam para
a fase de desenvolvimento na ver-
tente industrial, sejam resultado
Consumidores de um trabalho 100% interno.
querem alimentos Sobre as dificuldades sentidas
no caminho da inovação, Tiago
com menos açúcar e Carneiro é perentório: a educação
gordura e mais do consumidor e a posição geo-
gráfica de Portugal. Sendo que “a
ingredientes naturais, culpa é dos produtores, das em-
e o desafio é oferecer presas, das marcas, não tenha-
“mais opções mos dúvida. É preciso educar de
melhor forma e criar melhor in-
saudáveis a preços formação”, refere, acrescentando
cada vez mais que “é essencial dar informação
precisa que permita ao consumi-
competitivos”, dor entender os produtos que fa-
defende fundador zemos, como os fazemos e por-
que o seu consumo pode trazer
da CFER Labs. benefícios, desde a saúde ao sa-
bor de um prato”.
19
vimento de produtos com menos
açúcar ou gordura, com ingredien-
tes mais naturais, metodologias
mais inovadoras de fabrico ou com
processos ou ingredientes poten-
cialmente menos prejudiciais para
a saúde das pessoas. No entanto, o
executivo considera que ainda há
trabalho a fazer, nomeadamente no
sentido de conseguir “apanhar” os
consumidores que, por motivos fi-
nanceiros, não têm estes temas
como prioridade.
Para Daniel Abegão o futuro da
alimentação passa pela capacida-
de de dar aos consumidores cada
vez mais opções saudáveis a preços
cada vez mais competitivos. “ A ali-
mentação será cada vez mais trans-
parente e terá cada vez mais profis-
sionais a investigar novas metodo-
logias de produção, de forma a
maximizar e a otimizar todo o siste-
ma produtivo e de abastecimento”,
afirma, acrescentando que há duas
tendências que vieram para ficar: a
alimentação vegetariana e plant-
-based e a rapidez e comodidade na
compra e consumo de qualquer
produto.
Sense Test: o sabor
continua a ser essencial
Avaliar a perceção sobre todos os
aspetos intrínsecos e extrínsecos de
um produto desde que avaliado
utilizando os sentidos. Esta é a tare-
fa da Sense Test, que se dedica à
análise sensorial e, com isso, perce-
ciona a reação dos consumidores a
determinados produtos. Como ex-
LEONARDO NEGRÃO / GLOBAL IMAGENSS
plica Daniel Rocha, comercial na
Sense Test, do ponto de vista intrín-
seco os produtos podem ser avalia-
dos desde as suas características
sensoriais até como estas se corre-
lacionam com a aceitação ou como
nos fazem sentir do ponto de vista
emocional.
Já no que concerne ao ponto de
vista extrínseco, todos os aspetos
relacionados com a embalagem e
usabilidade podem também ser
avaliados. No caso específico da
CFER Labs: ovo 100% Sense Test, a empresa trabalha dife-
vegetal e palhinhas rentes metodologias para avaliação
comestíveis da resposta emocional a um produ-
to. Isto é importante para as mar-
“Temos como missão desenvolver cas, porque hoje o consumidor tem
principalmente produtos que con- à sua escolha uma imensa diversi-
tribuam para o bem-estar, saúde e dade de produtos, o que torna im-
sustentabilidade de todos os envol- perativo estudar e perceber os mo-
vidos no processo produtivo e ali- tivos da sua escolha.
mentar, desde o produtor ao con- Por outro lado, refere Daniel Ro-
sumidor final, mas que também se cha, mesmo com as novas tendên-
destaquem por serem inovadores cias de procura de produtos mais
e terem o seu espaço no mercado”. saudáveis, convenientes e susten-
É desta forma que Daniel Abegão, táveis, o sabor continua a ser um fa-
fundador e manager da CFER Labs tor essencial. “Os consumidores
apresenta a empresa que está pres- procuram bem-estar e uma expe-
tes a lançar um preparado líquido riência sensorial e emocional com-
de ‘ovo’ vegetal, que é 100% feito a pleta e positiva. Desta forma, ir
partir de plantas e sem qualquer “para lá da aceitação” será a ten-
vestígio de ovo animal. A par disso, dência para conseguir prever e per-
acrescenta, estão a preparar palhi-
nhas e colheres comestíveis e bio-
ceber todos os fatores de decisão de
forma integrada, sem perder a bar-
compostáveis, como alternativa reira métrica do hedónico”, explica,
aos plásticos de utilização única. acrescentando que a perceção do
Os consumidores estão a mudar consumidor é a chave principal
a sua alimentação e isso obriga, se- para o sucesso dos novos produtos.
gundo Daniel Abegão, ao desenvol- dinheirovivo@dinheirovivo.pt

20 ESPECIAL
António
Capinha
Jornalista
O que é que o DN repre-
senta para si?
O Diário de Notícias é
para mim, desde há déca-
das, uma referência do
jornalismo português. Ao
longo dos muitos anos de
existência, o DN tornou-
-se num dos jornais mais
credíveis, um excelente
exercício de liberdade e
independência.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Sou um leitor de jornais e
faço-o por prazer em su-
porte de papel. O DN faz
parte dos meus hábitos de
leitura, lido também pela
minha família quando o
levo para casa.
Rigor, qualidade,
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
O DN, com o seu rigor
profissional e a sua atitu-
serviço, inovação.
de responsável, tem sido
uma ferramenta essencial
para a toda a população
portuguesa, qualquer que
O melhor do DN
seja a geografia onde ela
se encontre. Ao longo des-
tes 157 anos o Diário de
Notícias foi um dos órgãos
de comunicação social
pela voz de 22
mais relevantes no escla-
recimento e na informa-
ção dos factos de maior si-
gnificado que a sociedade
personalidades
portuguesa foi vivencian-
do.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
CELEBRAÇÃO Académicos, políticos, designers, mento?
Ao longo da minha carrei-
empresários, médicos e outras destacadas figuras ra profissional publiquei
da sociedade portuguesa que escrevem regularmente muitos artigos e reporta-
gens em muitos jornais,
nas páginas deste jornal relatam a sua experiência diários e semanários, mas
com o Diário de Notícias e explicam porque, ao fim foi no caderno principal
do Diário de Notícias que
de 157 anos a informar sobre o que se passa no país publiquei o meu primeiro
e no mundo, continua a fazer sentido ler-nos. artigo de opinião, inte-
grando assim o corpo de
E porque é mais importante hoje de que nunca cronistas do DN.
manter-se bem informado.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Rute
Agulha
Psicóloga clínica e forense,
terapeuta familiar e de casal
O que é que o DN repre-
senta para si?
Representa informação ri-
gorosa e objetiva, uma ja-
nela para o mundo.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Tenho memórias de ser
ainda muito nova e ver o
DN pela casa, leitura fre-
quente do meu pai. Mais
tarde, quando me prepa-
rava para a célebre prova
de acesso à universidade,
a PGA, passei também eu
a ler diariamente o DN,
ávida de informação que
me ajudasse a ultrapassar
aquele desafio.
Desde então, o DN faz
parte da minha vida. Aci-
ma de tudo em papel, por-
que nada substitui o chei-
ro de um jornal e o prazer
de o folhear enquanto se
bebe um café numa espla-
nada.
Na sua perspetiva, de que
forma tem sido o DN im-
portante para o país?
O DN é um símbolo de
qualidade e de rigor, man-
tendo os portugueses in-
formados de uma forma
que gera confiança. E a
confiança é algo que se
conquista ao longo do
tempo.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
O meu primeiro artigo foi
publicado no suplemento
DN Life, passando mais
recentemente para o DN.
Guilherme
d’Oliveira Martins
Administrador executivo da
Fundação Calouste Gulbenkian
O que é que o DN repre-
senta para si?
O DN é uma referência de
toda a vida. Lembro-me de
o meu pai começar ao do-
mingo por ler Os Corvos, de
Leitão de Barros. Eduardo
Coelho criou um jornal so-
bretudo noticioso e essa é
uma característica essen-
cial. Os principais jornais
eram sobretudo políticos,
como A Revolução de Se-
tembro, e o DN mudou a
orientação geral. Eça e Ra-
malho aqui publicaram O
Mistério da Estrada de Sin-
tra” E foi o grupo do DN que
criou o Cavaleiro Andante,
que marcou a minha gera-
ção.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Como disse, o jornal diário
era um ponto de encontro
que circulava por todos.
Ainda conheci o diretor Au-
gusto de Castro e recordo
grandes amigos que dirigi-
ram o jornal – invocando a
memória de Mário Betten-
court Resendes.
Na sua perspectiva, de que
forma tem sido o DN impor-
tante para o país?
Como veículo de boa infor-
mação, o DN foi e será muito
importante. É o grande de-
safio que lhe está posto. To-
dos os dias importa garantir
esta responsabilidade!
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro ar-
tigo foi o DN, o DN Jovem ou
algum seu suplemento?
O DN foi dos primeiros jor-
nais em que colaborei, ten-
do sido ininterruptamente
colaborador permanente
na análise política e cultural
desde 1978 a 1995, quando
assumi funções governati-
vas.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 21

Manuel Portugal Lage

Cronista

O meu saudoso pai foi jornalista que o DN “é da casa”. Não há me-

na rádio, depois na imprensa es- mória de um outro periódico que
crita – em Portugal e no estran- se mantenha ao longo de tantos
geiro – e na televisão, pelo que anos presente nas nossas vidas
desde sempre fui habituado a ter como o DN. Continua hoje a ser
jornais por perto. Ao longo de to- fundamental para uma democra-
dos estes anos, o DN foi sempre cia saudável e para uma impren-
uma presença assídua. Este foi o sa livre, esclarecida e plural. Sabe-
Luís Castro Francisco Rodrigo jornal que nos acompanhou na mos que houve momentos difí-
Mendes George Saraiva nossa viagem à volta do mundo, ceis, mas esses são passado. O
de Lisboa para Washington e daí futuro espera-se risonho e cheio
Diplomata e escritor Ex-diretor-geral da Saúde Deputado do Iniciativa Liberal
para Macau. A nossa referência de sucesso!
do jornalismo de qualidade e da
liberdade de imprensa teve sem-
O que é que o DN representa para O que é que o DN repre- O que é que o DN representa pre um nome: DN. Para além dis-
si? senta para si? para si? to, ainda se guardam lá em casa
Seguindo a filosofia de Groucho Um jornal diário de qua- Para além do seu papel relevante os exemplares onde se referem
Marx, deveria dizer que nunca pode- lidade, inteligente, aber- em vários momentos da Histó- alguns feitos de familiares do iní-
ria ser admirador de um jornal que to, livre e moderno, mas ria de Portugal, consequência de cio do século passado. Esta é uma
aceitasse colaboração minha. Mas histórico. Grafismo uma vida de 157 anos, foco-me espécie de herança que vai sendo
libertando-me um momento das atraente, quer impresso no momento atual e no seu pa- transmitida de geração em gera-
peias do marxismo, linha Groucho, ou versão online. pel para o futuro. Sou dos que ção. Assim, com esta ligação en-
saúdo aqui os 157 anos de um gran- De que forma o jornal tem acreditam fortemente no papel tre a história da família e este jor-
de jornal que há muito acompanha estado ligado à sua vida, essencial do Quarto Poder como nal, é natural que consideremos
as nossas vidas. à sua família? um dos pilares das democracias
De que forma o jornal tem estado li- Desde a minha infância, liberais, e é isso que espero de
gado à sua vida, à sua família? ao ver meu pai ler o jornal qualquer órgão de comunicação Victor Ângelo
Na minha adolescência, o DN era o todos os dias. Fazia ques- social, que seja um poder, com a Conselheiro em segurança internacional. Ex-secretário-geral-adjunto da ONU
jornal oficioso do regime, embora tão em ser ele o primeiro, sua independência, com a sua li-
não tão ideológico como o Diário da a fim de assegurar o for- nha editorial, a escrutinar os ou-
Manhã: mas a desconfiança que mato e paginação origi- tros poderes e a informar os ci- A minha mãe aprendeu a escre- do-as no chão por onde os perus
esse condicionalismo suscitava era nais. Era a época do ma- dadãos. Um poder escrutinador, ver e a ler graças ao Diário de No- vagueavam. Pouco a pouco
equilibrada e compensada pelo no- tutino de grandes pági- mas também aberto à crítica, tícias. Nasceu e foi criada na cin- aprendeu a escrever. Só depois se
tável suplemento literário, dirigido nas, apregoado e vendido como pilar da liberdade. tura das pequenas quintas que, apercebeu do significado de cada
por Natércia Freire, com as críticas li- por ardinas pelo preço de De que forma o jornal tem estado nos arredores de Évora, alimenta- letra e a mágica ligação entre elas,
terárias de João Gaspar Simões e a 8 tostões. ligado à sua vida, à sua família? vam a cidade. Há noventa e pou- a leitura. E sempre que alguém ia
colaboração constante de David Na sua perspectiva, de Curiosamente, foi no DN que cos anos Évora era em geral po- à cidade, pedia-lhe que trouxesse
Mourão Ferreira, ou pelas excelentes que forma tem sido o DN dei a única entrevista em con- bre e as gentes das quintas eram pelo menos uma página do DN,
crónicas de Leitão de Barros sobre importante para o país? junto com o meu pai. Era diri- ainda mais pobres. As famílias ti- fosse de que dia fosse.
Lisboa, Os Corvos. A importância que o DN gente associativo e a saudosa nham muitos filhos e cada um
Na sua perspectiva, de que forma representa resulta da sua Cadi Fernandes, que acompa- trabalhava no campo para ajudar
tem sido o DN importante para o história como órgão in- nhava o setor da educação, con- a precária economia doméstica.
país? formativo de referência. vidou-nos para uma entrevista Ainda menina de tenra idade, fi-
O DN atravessou as sucessivas fases Acompanha a vida portu- conjunta. Recordo também, cou com o encargo de pastorear
do processo revolucionário que se guesa e internacional tendo sido a Cadi a ligar-me, que os perus que acabariam no mer-
seguiu à Revolução de Abril: tivemos desde o tempo dos reis no 1 de janeiro, há 20 anos, fui cado. Teria oito ou nove anos
a fase Saramago, em que o Ministé- Luís, Carlos e Manuel, uma das pessoas a responder o quando viu pela primeira vez
rio dos Negócios Estrangeiros era depois durante a I Repú- que iria fazer com os primeiros umas páginas do DN que um ir-
constantemente atacado por não fa- blica, o Estado Novo e, euros que tinha. mão mais velho trouxera da cida-
zer o “saneamento” dos diplomatas agora, em plena demo- Na sua perspectiva, de que for- de. Com uma vara, começou a co-
(Mário Soares e Melo Antunes não cracia. ma tem sido o DN importante piar e a juntar as letras, rabiscan-
quiseram sanear o MNE por razões O primeiro jornal onde foi para o país?
ideológicas, afastando apenas os publicado o seu primeiro Em 157 anos de vida, para desta-
funcionários que se tinham com- artigo foi o DN, o DN Jo- car a importância do DN na his- Viriato Soromenho-Marques
prometido numa colaboração ativa vem ou algum seu suple- tória do país, recordo um mo- Professor universitário
com a PIDE), a fase Mário Mesquita, mento? mento pela negativa, pois tam-
de independência rigorosa e exem- Não. O meu primeiro ar- bém fazem parte da construção
plar, e depois este jornal foi-nos tigo foi publicado na Im- de algo e há episódios que não Não me lembro do primeiro con- do honroso convite de João Mar-
acompanhando no dia a dia e habi- prensa Académica, nos devem ser deixados no esqueci- tacto com o Diário de Notícias, celino, passei a ter o privilégio de
tuámo-nos à sua companhia. De tal anos 60, na altura clan- mento para que não se repitam. mas há muito alimentei a ilusão fazer parte desta equipa, que
modo nos foi acompanhando que destina. Por isso destaco o Verão Quente de que o DN sempre se interes- pratica esse permanente, disci-
só quando nos faltou a edição em de 1975, quando José Saramago sou por mim, pois ainda hoje te- plinado e atento respeito pelo
papel sentimos profundamente a fica diretor-adjunto do DN e nho pendurado no meu escritó- mundo, que é a essência do au-
falta que nos fazia. Felizmente, essa procede ao saneamento de 24 rio a primeira página da edição têntico jornalismo.
fase foi superada e temos o nosso jornalistas, como ato da tentati- do dia do meu nascimento …
jornal de novo nas bancas. va de controlo que o PCP estava Desde a sua fundação, em 1864,
O primeiro jornal onde foi publicado a fazer da imprensa. Saramago, que o DN se constituiu como um
o seu primeiro artigo foi o DN, o DN tal como o PCP, não queriam lugar de ativa interpretação do
Jovem ou algum seu suplemento? que o DN fosse aquilo que deve país e do mundo. Nenhuma His-
A minha atenção e a minha colabo- ser a imprensa, livre. tória de Portugal poderá ser es-
ração juvenil dirigiram-se, porém, O primeiro jornal onde foi publi- crita com competência sem pas-
antes para o Diário de Lisboa e o Re- cado o seu primeiro artigo foi o sar pelos milhões de páginas do
pública, jornais do “reviralho”. Foi no DN, o DN Jovem ou algum seu su- DN, onde se juntam todas as
Diário de Lisboa Juvenil que publi- plemento? crenças e talentos, nessa frágil e
quei os meus primeiros textos literá- Foi no DN. plural omnisciência que nós, hu-
rios e foi no República que comecei a manos, podemos atingir. Desde
publicar artigos de natureza política. 5 de novembro de 2010, depois

22 ESPECIAL
Jorge Costa
Oliveira
Consultor financeiro
e business developer
O que é que o DN repre-
senta para si?
O DN é o jornal tradicio-
nal de Portugal, sóbrio,
com qualidade, com jor-
nalistas rigorosos, com
opinião qualificada.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
O DN era o jornal diário
comprado na casa dos
meus pais. E nele me ha-
bituei a obter informação
sobre o país, em especial
nas secções de política,
internacional e de opi-
nião. Incluindo quando
estive expatriado, através
da edição online.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
Desde o 25 de Abril, o DN
tem sido um repositório
de valores do jornalismo
sério e competente, que
não cede à lógica tabloide
mercantil.
Só essa postura presta um
serviço inestimável à cau-
sa de um Estado de direito
democrático escorado em
cidadãos informados.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
O DN.
Adriano
Moreira
Cronista
O que é que o DN repre-
senta para si?
A memória da realidade
internacional e nacional,
na visão do querido Au-
gusto de Castro, incansá-
vel professor. Os efeitos da
prática vieram mais tarde.
Fui pelo menos sempre
leitor confiante. Espero
um grande triunfo, do in-
teresse nacional, para a
publicação atual.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
As palavras, à noite, no
jornal eram aula prática.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
Regressarmos com exce-
lente memória da velha
experiência.
O primeiro jornal onde foi
publicado o meu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Nasceu antes de mim. O
bom trabalho já existia.
José Ribeiro
e Castro
Advogado e ex-líder do CDS
O que é que o DN repre-
senta para si?
É uma companhia quase
permanente. Jornal que
leio desde sempre e onde
tenho transmitido tam-
bém, em diferentes tem-
pos, as minhas ideias.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Foi o meu primeiro jornal.
Em Lisboa, quando era
criança, havia um sistema
contratado com o ardina,
melhor que assinatura.
Pagava-se-lhe ao mês. E,
manhã cedo, o ardina ia
pela rua, dobrava o jornal,
enrolava em triângulo e, à
mão, lançava-o para as
varandas dos clientes.
Conseguiam lançar até ao
3.º andar! Nós vivíamos
no 1.º andar, mais fácil. Às
7e meia, 8 horas, lá estava
o DN para o pequeno-al-
moço dos meus pais. To-
dos os dias.
Na sua perspetiva, de que
forma tem sido o DN im-
portante para o país?
Atenção à atualidade,
polo de debates, varieda-
de da opinião, referência
cultural e, mais que cente-
nário, pilar da História do
país.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Em 1977, publiquei no DN
uma série de artigos sobre
o personalismo, a doutri-
na do CDS, que ando a ver
se consigo recuperar. Nes-
te género, foi das minhas
primeiras prosas. Tinha 23
anos.
Miguel Romão
Professor da Faculdade
de Direito da Universidade
de Lisboa
O que é que o DN repre-
senta para si?
O DN representa consis-
tência, sobriedade, me-
mória e rigor, valores de
sempre na imprensa.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida,
à sua família?
Em casas por onde sem-
pre houve jornais, umas
vezes mais arrumados,
outras vezes mais espa-
lhados, o DN era um de-
les, enquanto cresci e de-
pois de adulto. Com ele
também aprendi a ler, a
escrever e a conhecer o
mundo. Há quem o deva
à escola… Eu devo-o pro-
vavelmente mais aos jor-
nais e aos livros.
Na sua perspetiva, de que
forma tem sido o DN im-
portante para o país?
O DN tem contribuído
decisivamente para a
nossa memória coletiva e
continua a ser um espe-
lho fiel do que somos
hoje, nas nossas luzes e
nas nossas sombras. As-
sim possa continuar mais
157 anos.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Aos 12 anos publiquei o
meu primeiro texto num
jornal – e, naturalmente,
teve de ser no DN Jovem!
Por aí me mantive vários
anos, em diálogo com ou-
tros jovens “escritores” e
com o fundamental Ma-
nuel Dias, alma do DN Jo-
vem. Sem o DN e sem o
DN Jovem, a minha rela-
ção com a imprensa seria
necessariamente diferen-
te e foi um privilégio para
mim ter vivido esse tem-
po de entusiasmo e de
aprendizagem, feito em
papel de jornal às terças-
-feiras.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Maria da Graça
Carvalho
Eurodeputada
O que é que o DN repre-
senta para si?
Não existem muitas insti-
tuições, em Portugal ou
no mundo, em qualquer
ramo de atividade, que
contem 157 anos de exis-
tência. O DN tem perdu-
rado ao longo de todo
este tempo, enfrentando
diversos desafios e con-
textos políticos, reinven-
tando-se, sem nunca ab-
dicar da sua missão de le-
var a informação às
pessoas. Para mim é um
exemplo de resiliência.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida,
à sua família?
O DN era o jornal do meu
avô, dos meus pais. Foi
sempre o jornal lá de
casa. Comecei a espreitá-
-lo mais ou menos ao
mesmo tempo que
aprendi a ler. E desde en-
tão tem-me acompanha-
do sempre.
Na sua perspetiva, de que
forma tem sido o DN im-
portante para o país?
O DN, desde a sua ori-
gem, sempre foi inova-
dor. Foi o primeiro jornal
moderno – ou seja, como
hoje os conhecemos – do
país. E ao longo do tempo
nunca deixou de inovar,
com novos formatos e
conteúdos. Tem tido uma
influência enorme na in-
formação em Portugal.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Foi o DN. A estreia coinci-
diu com a minha entrada
na política. Até então as
minhas publicações ti-
nham mais a ver com a mi-
nha atividade científica.
José Crespo
de Carvalho
Presidente do ISCTE
Executive Education
O que é que o DN repre-
senta para si?
Representa um bastião
equidistante das notícias
diárias. Um companheiro
de leituras várias, desde a
adolescência até à idade
adulta e em todas as oca-
siões.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
É e sempre foi um jornal
de família, da família.
Acompanhou o caminho
familiar a par e passo e
sempre foi o primeiro, de
manhã, a chegar a nossa
casa. Previsão do tempo,
palavras cruzadas, con-
cursos e programação da
televisão em mais novo e
artigos de opinião e jor-
nalismo mais tarde.
Não me posso esquecer
nunca, e não esqueço, de
que, enquanto miúdo, foi
também o DN que me deu
um primeiro lugar no
concurso da areia. O meu
cavalo empinado estava
feito para ganhar e ga-
nhou o primeiro prémio.
Foi o DN que me entregou
em primeiríssima mão
esse prémio e recebi uma
bicicleta nova. Nesse ano
conheci o desconforto da
popularidade sem nunca
ter percebido muito bem
porque falavam tanto de
mim.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
Estruturante. Acompa-
nhou o antes da democra-
cia, o durante e o depois.
Foi acompanhando a his-
tória e fazendo história.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
O Diário de Notícias.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Raul M. Braga
Pires
Politólogo/arabista
O que é que o DN repre-
senta para si?
O DN representa 157 anos de
futuro. Resumo o meu senti-
mento desta forma, pela cer-
teza que tive quando numa
papelaria me disseram que
DN em papel só ao fim de se-
mana. Nesse momento pen-
sei “mais um que foi à vida!”.
No entanto, cá estamos de
novo a dar-lhe gás e cientes
de que o futuro depende de
todos nós, direção, jornalis-
tas e colaboradores.
De que forma o jornal tem es-
tado ligado à sua vida, à sua
família?
O Arquivo DN foi o primeiro
arquivo de um jornal em que
entrei para fazer pesquisa
para um trabalho escolar du-
rante o meu 12.º ano, em
1988. Em casa dos meus pais,
ainda hoje lá está a edição do
dia 25 de Abril de 1974, cuida-
dosamente guardada pelo
meu pai.
Na sua perspectiva, de que
forma tem sido o DN impor-
tante para o país?
O DN vem do jurássico jorna-
lístico português, um sobrevi-
vente, uma referência, e um
povo, uma comunidade, con-
solida-se com isso mesmo,
com referências, com memó-
rias. A importância do DN
para Portugal é permitir-nos
enquanto povo um fio do
tempo, uma continuidade
passada, presente e futura.
O primeiro jornal onde foi pu-
blicado o seu primeiro artigo
foi o DN, o DN Jovem ou algum
seu suplemento?
Foi de facto no DN que publi-
quei o meu primeiro artigo
sobre a relação de forças étni-
cas na Guiné-Bissau e de
como isso se reflectiria nas le-
gislativas de 1999, graças a
um encontro furtuito que tive
no Colombo com a Patrícia
Viegas. Recordo também a
longa caminhada que fiz des-
de a praia à Aldeia do Meco
para aí comprar um exem-
plar e de no regresso ir alegre-
mente a lê-lo em voz alta e a
imaginar um futuro próspero
e risonho enquanto politólo-
go e arabista. Estou quase lá!
Jorge Fonseca
de Almeida
Cronista
O que é que o DN repre-
senta para si?
Através da linguagem, da-
mos sentido ao mundo e
construímos a nossa iden-
tidade. O DN, dele discor-
dando muitas vezes, foi
voz sempre presente, que
me moldou e ajudou a for-
mar como indivíduo e
como português.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Li-o enlevado na juventu-
de, nervosamente à espe-
ra do nascimento do meu
primeiro filho, desespera-
damente nas horas que
durou a operação da mi-
nha mãe, profissional-
mente em busca de infor-
mação.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
O sucesso e a longevidade
do DN radicam em:
a) Escola de jornalismo,
formando profissionais
de qualidade;
b) Alinhamento estratégi-
co com a situação política
vigente – monarquia, Es-
tado Novo, Revolução de
Abril e regime atual –,
transmitindo com clareza
as opiniões das elites go-
vernantes. Jornal oficioso
do regime, que não desta
ou daquela fação ou parti-
do, torna-se leitura obri-
gatória para todos os qua-
drantes políticos;
c) Marca de comunicação
respeitada – nome bem
gravado na mente dos lei-
tores de jornais.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Sim, o Dinheiro Vivo.
Ana Isabel
Trigo Morais
CEO/administradora-delegada
da Sociedade Ponto Verde
O que é que o DN repre-
senta para si?
O DN é para mim uma
presença diária, logo pela
manhã. Desde 1994 que
me habituei a começar o
dia com a sua leitura e a
seguir a atualidade com a
marca de confiança da in-
formação e opinião do
jornal. Com a evolução
das plataformas digitais,
visito o DN mais vezes ao
dia.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Interessante… Encontrei
muitas vezes no DN e nos
seus suplementos ideias e
sugestões para viver em
família, descobrindo lei-
turas, artistas, lugares,
pessoas e motivos de con-
versa à mesa. E, obvia-
mente, muita informação
relevante para acompa-
nhar a atualidade nacio-
nal e internacional.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
Será um cliché, por de-
mais reconhecido, dizer
que o DN acompanhou ao
longo dos seus 157 anos
de vida tudo o que de im-
portante aconteceu na
história do país, trazendo-
-nos o dia a dia que cons-
truiu essa história… Mas é
impossível não destacar a
instituição de referência
que é no jornalismo de
qualidade, acompanhado
de uma visão pluralista do
quotidiano e dos seus
protagonistas. Pessoal-
mente, é esta marca que
muito valorizo.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
Não me consigo recor-
dar…
Carlos
Rosa
Designer e diretor do IADE
O que é que o DN repre-
senta para si?
Portugalidade! Sendo
uma das marcas mais an-
tigas e icónicas em Portu-
gal, o DN faz parte da cul-
tura portuguesa.
De que forma o jornal tem
estado ligado à sua vida, à
sua família?
Os jornais sempre estive-
ram presentes no meu dia
a dia, em particular o DN,
porque é um dos mais
premiados jornais no
campo do design gráfico.
A qualidade da linguagem
visual sempre foi decisiva
para mim no momento da
compra.
Na sua perspectiva, de
que forma tem sido o DN
importante para o país?
O DN é uma das marcas
de referência no campo
da informação, onde tam-
bém se destacaram e con-
tinuam a destacar grandes
nomes das artes visuais,
do design e da ilustração.
A dimensão visual tam-
bém deve ser valorizada
pelos jornais, e o DN sem-
pre o fez muito bem.
O primeiro jornal onde foi
publicado o seu primeiro
artigo foi o DN, o DN Jo-
vem ou algum seu suple-
mento?
O meu primeiro artigo foi
publicado online. E quan-
do o DN voltou a circular
diariamente nas bancas,
passei a escrever e a ilus-
trar para a edição em papel
no separador de cultura.
23
António Araújo
Historiador
O que o DN representa que vive e perdura no meio
para mim não será muito social». De facto, o DN vive
diferente, creio eu, do que enraizado no nosso meio
representa para o país in- social e aí perdura há 157
teiro: um jornal sério e rigo- anos – como obra, como
roso, objetivo e credível, re- empresa, sobretudo como
sistente à prova do tempo. ideia. Uma ideia de jorna-
Comecei a escrever no DN lismo, uma concepção de
Jovem há muitos e muitos liberdade. Sinto que às ve-
anos, mais do que a memó- zes, por vezes, vezes de-
ria alcança, o que faz com mais, não lhe agradecemos
que o DN seja o jornal onde como devíamos.
escrevo há mais tempo, e
mais em proveito próprio
do que a benefício dos
meus leitores. É habitual
chamar-lhe uma «institui-
ção», conceito difícil de de-
finir, mas que, há muitos
anos, um grande jurista
francês caracterizou como
«ideia de obra ou empresa
Bruno Bobone
Empresário
O Diário de Notícias foi pio- Grupo Pinto Basto foi e
neiro ao introduzir um di- continua a ser retratada
ferencial qualitativo no pa- pelo Diário de Notícias,
norama da comunicação com o qual partilhamos a
social em Portugal, tendo missão de servir Portugal. É
inaugurado a tradição do com enorme orgulho que
jornalismo independente e todas as semanas escrevo a
próximo das pessoas. Ao crónica com as minhas
celebrar os seus 157 anos, o ideias e contributos para a
Diário de Notícias continua construção de um país me-
a ser para mim o jornal de lhor para todos.
referência, mantendo sem- m-
pre, independentemente nte
dos momentos mais con- n-
turbados da nossa História,
ria,
um jornalismo de vanguar- ar-
da, com isenção, rigorr e
questionando sempre os
factos em busca da verda-da-
de. Por outro lado, uma ma
parte muito importante nte
dos 250 anos da história do
Bernardo Ivo Cruz
Investigador associado do CIEP / Universidade Católica Portuguesa
Ter nascido em 1864 e con- pais e, quando os meus pais
tinuar em circulação é um nasceram, o mais lido na
feito que, segundo uma pes- casa dos meus avós. Por
quisa rápida, só dois jornais isso, escrever no DN é um
na Europa se podem gabar. prazer semanal e uma res-
No ano em que o DN apare- ponsabilidade para com a
ceu, Lincoln foi reeleito pre- história do jornal, a nossa
sidente dos Estados Unidos, história coletiva e com os
a Primeira Internacional So- seus leitores, incluindo os
cialista nasceu em Londres, meus pais.
em Genebra foram aprova-
dos os direitos dos soldados
feridos em combate e o
príncipe D. Carlos foi reco-
nhecido como herdeiro do
trono de Portugal. De lá para
cá, o mundo mudou várias
vezes e o DN relatou-o.
Quando eu nasci, 104 anos
depois, o DN era o jornal
mais lido em casa dos meus

24 LOCAL
Câmara de Peniche quer substituir
barracas por habitação condigna
ESTRATÉGIA Projeto Kher Nevo pretende erradicar barracas onde vivem quase 300 pessoas
da comunidade cigana. Mediadores ajudam no contacto com esta população.
TEXTO FLÁVIA CALÇADA
A
Câmara de Peniche pre-
tende erradicar as barra-
cas onde vivem quase três
centenas de pessoas da
comunidade cigana e tem em cur-
so o projeto Kher Nevo, destinado à
sua integração social.
A viver há mais de 30 anos num
dos três acampamentos existentes
no concelho, Sónia Cesteiro, 44
anos, aceita dar a cara pela “misé-
ria” em que a família habita, com
ratos e “sem condições” em casa.
“Se tivesse melhores condições,
mudaria do acampamento”, refere
à agência Lusa, questionando logo
de seguida: “Quanto não vale ter
uma casa?!”
Ruben Marques, 33 anos, e a famí-
lia já saíram do acampamento há
sete meses, depois de conseguirem,
com muita dificuldade, arrendar
uma casa na cidade, para terem
“mais higiene” e melhores condi-
ções habitacionais. “Saí porque que-
ria viver em melhores condições e
outros não saem porque não conse-
guem alugar casa”, explica o outrora
vendedor ambulante e atual funcio-
nário municipal, acrescentando que
“a sociedade não aceita muito bem
os ciganos”, daí a dificuldade que a
comunidade tem em recorrer ao
mercado de arrendamento.
Tendo como prioridade erradicar
as barracas que servem de habita-
ção no concelho, o município foi
ao encontro da minoria através do
projeto Kher Nevo, que na língua
romani significa “casa nova”, estan-
do para isso a trabalhar em várias
vertentes. Criou uma equipa de
mediadores interculturais para fa-
cilitar a comunicação com a comu-
nidade e envolvê-la nas decisões.
José Silva, 29 anos, de etnia ciga-
na e funcionário municipal, pas-
sou a desempenhar essas funções
desde setembro. O mediador inter-
cultural desdobra-se em tarefas
diárias muito diversas, desde trans-
portar crianças da escola para a
sala de apoio ao estudo, entregar
convocatórias das escolas para os
pais e ser o verdadeiro “elo de liga-
ção entre a câmara e os membros
da comunidade cigana”. “Há pes-
soas na câmara que explicam de
uma maneira que os meus tios e
primos não entendem, e eu tenho
de explicar de outra maneira”, con-
ta José.
Programa na rádio local
Tendo em conta o nível baixo de es-
colaridade entre a comunidade, a
autarquia criou uma sala de apoio
ao estudo para as crianças e jovens
ciganos que frequentam as escolas
do concelho.
Cerca de 300 pessoas
da comunidade cigana
vivem em barracas.
A pensar na integração social da
comunidade e na sua aceitação
pela população em geral, foi tam-
bém criado um programa na rádio
local, a 102 FM Peniche, em que
por cada edição semanal são dados
a conhecer os seus hábitos e tradi-
ções, com relatos na primeira pes-
soa. O concelho possui ainda vá-
rios projetos destinados a resolver
problemas de carência económica.
Um trabalho que vai muito além de
dar uma casa, refere Vanda Duarte,
adjunta do presidente da câmara.
Câmara Municipal de
Peniche prevê o
aumento da oferta de
casas sociais, de forma
a beneficiar mais 279
famílias, ou seja, entre
600 e 700 pessoas.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
BREVES
Mata do
Bussaco recebe
melhorias
A Mata do Bussaco, no
concelho da Mealhada, tem
novas condições para
receber visitantes ao abrigo
de um investimento de 250
mil euros assumido por três
entidades. Em comunicado,
a Fundação Mata do
Bussaco informou ontem
que “estão finalizadas as
ações previstas” no
protocolo que estabeleceu,
em 2021, com o Fundo
Ambiental e o Instituto de
Conservação da Natureza e
das Florestas. “As
intervenções incluíram a
substituição de portas de
acesso às galerias de água”,
segundo a nota, referindo
ainda que “a reabilitação da
Casa da Rainha constituiu
também um dos pontos
centrais, cuja intervenção
era urgente, uma vez que o
telhado se encontrava
danificado”. Por outro lado,
25 novas mesas de
piquenique foram
colocadas na mata,
JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA
substituindo as anteriores,
que já se encontravam
deterioradas.
Évora Capital
da Cultura aposta
Na sua Estratégia Local de Habi- na proximidade
tação, a autarquia traçou como
prioridade para os próximos seis A candidatura de Évora a
anos erradicar as barracas e atri- Capital Europeia da Cultura
buir habitação condigna às 45 fa- 2027 vai aceitar convites
mílias da comunidade cigana. “Os para apresentar o seu
três acampamentos são o principal conceito e pedir
foco, porque temos mais de 200 in- contributos para a
divíduos na cidade e 50 a 60 nas al- estratégia. “Não é tanto
deias. Estamos a falar de um núme- transmitir a candidatura,
ro significativo de pessoas de etnia mas é para que as pessoas
cigana no concelho que não têm assumam a candidatura
direito a habitação”, refere a res- como sua e possam dar um
ponsável. contributo seu, individual
A estratégia passa também por ou coletivo”, explicou
resolver outros casos de habitação ontem o presidente da
em mau estado de conservação e Câmara de Évora, Carlos
até de insalubridade. Apesar de, no Pinto de Sá. Este programa
total, mais de 300 famílias viverem chama-se À Mesa com, que
em fogos de habitação social neste prevê que a equipa de
concelho do distrito de Leiria, há missão aceite convites para
uma centena em lista de espera visitar associações, escolas
para uma morada condigna. “Esta- e até casas particulares para
mos numa zona em que os preços apresentar o conceito da
dispararam muito, temos muita candidatura. “Queremos
procura e pouca oferta, e, em ter- chegar ao cidadão comum
mos de rendimento, os valores das e que o cidadão comum
rendas são extremamente eleva- sinta a candidatura como
dos”, explica. sua e possa dar o seu
A Estratégia Local de Habitação contributo”, pois no
da Câmara Municipal de Peniche Alentejo “o saber fazer”
prevê o aumento da oferta da habi- surge da “experiência
tação social, beneficiando mais 279 própria de cada um”,
famílias, com 600 a 700 pessoas. sublinhou o presidente
Jornalista da Agência Lusa do município.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 25

Matosinhos quer
assembleia jovem
Matosinhos está a preparar a sua
Assembleia Municipal Jovem, com o
objetivo de incentivar os jovens a ter Maia: recicle mais
uma participação ativa na vida política
do município. A primeira iniciativa está e pague menos
prevista para maio, mas cerca de 40 Numa medida de incentivo à
jovens de oito estabelecimentos de separação do lixo, o custo do
ensino do concelho já se encontraram tratamento de resíduos no concelho
para uma “sessão de brainstorming” na da Maia deixa de estar indexado ao
Biblioteca Municipal Florbela Espanca. consumo da água, para depender do
número de vezes que o contentor de
lixo indiferenciado é despejado nos
veículos de recolha porta a porta. O
princípio “Recicle mais, pague
menos” visa incentivar a separação e,
com isso, baixar o custo mensal.

Gaia financia obras

de igreja na Granja
Consciente da “importância da
reabilitação” do espaço e da
“proteção das obras de arte sacra”,
a Câmara Municipal de Vila Nova de
Gaia vai apoiar financeiramente,
com uma verba de cerca de 100 mil
euros (a aprovar em reunião do
executivo), os trabalhos de
recuperação da Capela de Santa
Pavilhão da Água Cruz, na Praia da Granja, que sofreu
a derrocada de parte do telhado.
com descontos
O Pavilhão da Água, situado no
Parque da Cidade, passa a poder
ser visitado a um preço mais
convidativo. Para tal, basta ser
aderente do cartão Porto.
(residente) ou do Porto.CARD
(turistas). Os residentes com
cartão podem usufruir de 50% de
desconto nas entradas. Já os
turistas com Porto.CARD tem 15%
de desconto no preço do bilhete.

Porto no pódio das

cidades do futuro
Porto XL
A cidade do Porto subiu ao pódio
do ranking European Cities and
ROTEIRO O Porto viu o Financial Times reconhecer
Regions of the Future, promovido a sua estratégia para atrair investimento estrangeiro,
pela fDi Magazine, publicação do
Financial Times especializada em
enquanto na Maia nasceu um sistema inovador de
investimento internacional, pagamento de tratamento de resíduos indexado à
alcançando a 3.ª posição no
ranking de cidades europeias de reciclagem de cada um. Matosinhos quer atrair jovens
média dimensão, na categoria de para a vida política ativa e Gaia contribui para
melhor estratégia de atração de
investimento direto estrangeiro. requalificação de igreja na Praia da Granja.
TEXTO DN

26 INTERNACIONAL
Fodé Mané
“Há uma luta
para controlar
o poder dentro
do poder na
Guiné-Bissau”
TENSÃO O presidente da rede de defensores dos
direitos humanos não crê que tenha havido uma
tentativa de golpe de estado no dia 1 de fevereiro.
O antigo reitor da Universidade Amílcar Cabral
aponta para o narcotráfico e para o apoio do
Senegal no endurecimento do regime.
ENTREVISTA CÉSAR AVÓ, EM BISSAU
Qual a sua leitura dos acontecimen-
tos de dia 1?
A minha leitura baseou-se nas de-
clarações de Umaro [Sissoco Emba-
ló, presidente da Guiné-Bissau],
quando disse que foi um grupo iso-
lado, ligado ao narcotráfico. Porque
se fosse um golpe de estado ia apa-
recer alguém que ia encabeçar e
tentar convencer as pessoas. Eu fa-
zia essa leitura há muito tempo, de
que a divergência no seio do partido
que apoia Umaro [Madem G-15],
principalmente entre ele e Braima
Camará, tinha a ver com a luta dos
gangues. Esses gangues querem in-
fluência e quando têm influência
afastam o outro grupo. Cada um
quer ter muita influência, com a eli-
minação dos próximos de Braima e
a ascensão dos próximos de Umaro.
E o Braima Camará, que agora está
em Portugal, foi quem fez este
monstro político. Aquando do con-
sulado do Jomav [José Mário Vaz,
presidente até 2020] tinha todos os
poderes, demitia o governo, nomea-
va o fulano tal, enviava dinheiro vivo
para Lisboa, e perdeu essa influên-
cia com o Umaro. Os traficantes
quando vão atacar não é para matar
à primeira, atacam para fazer terror
e conseguir uma exigência. Para
mim é difícil falar de golpe de esta-
do, já tivemos aqui, e agora recentes
à volta, sabemos como se faz. E as
pessoas acusadas são pessoas liga-
das ao narcotráfico. Para mim não
está em causa a sucessão do poder,
está em causa o domínio de uma
determinada fação de negócio ilíci-
to. Os traficantes não lutam para ter
o poder, mas para terem controlo
dos que têm poder. É uma luta para
controlar melhor o poder dentro do
próprio poder, e que está a ser apro-
veitada para silenciar outras vozes,
na qual o Senegal, devido ao seu
próprio interesse, está a patrocinar.
Neste momento qual é o interesse
da comunidade internacional para
ter uma força [militar]? Para fazer a
interposição entre quem? Para
substituir as nossas forças armadas?
Ou para, como algumas pessoas es-
tão a supor, garantir que o acordo de
exploração de petróleo seja irrever-
sível? O Senegal teve duas experiên-
cias na Guiné de que não saiu bem e
tem uma rebelião na parte sul. A es-
tratégia do Senegal é influenciar a
CEDEAO e o seu presidente é neste
momento líder da União Africana,
que na questão da Guiné vai estar si-
lenciada.
Macky Sall é amigo de Umaro Sis-
soco Embaló.
Não é só amigo, é cônsul, ele é que o
dirige. Até acordos para apoios a
Umaro foram assinados com o apa-
drinhamento de Macky Sall, no Se-
negal. As pessoas dizem que eles
têm o sonho de uma aliança polar,
de tentar que um grupo étnico, o
fula, controle a zona.
Isso é crível?
Tem muitos adeptos, mas não é
possível que vá avante, não é possí-
vel exercer o poder em nome de um
grupo étnico. Mesmo o Umaro con-
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
seguiu o apoio dos muçulmanos,
não só dos fulas, mas também dos
balantas por causa do PRS do Nuno
Nabiam. Não é por acaso que só
com cinco deputados ficou primei-
ro-ministro.
Essas dissensões interétnicas não
são racismo?
É uma espécie de racismo. Qual é o
fundamento? Que uma etnia é su-
perior à outra, só que aí está a sua
fragilidade. Dentro dos próprios
grupos há hierarquização, há os
“As pessoas dizem que descendentes de escravos, outros
da nobreza. É um aproveitamento
Embaló e Sall têm o político sem pernas para andar no
sonho de tentar que caso da Guiné. Hoje é difícil sermos
um grupo étnico, o puros, por assim dizer. Por exemplo,
sou da etnia biafada, que é menos
fula, controle a zona. de 3% da população. A minha mu-
Mas não é possível lher é da etnia nalu. Digo que existe
tribalismo e racismo mas não com
exercer o poder força para vencer.
em nome de um Até porque na Guiné-Bissau
existem muitas etnias.
grupo étnico.” Estima-se em cerca de 30. A questão
étnica não funciona. E veio a ques-
LEONARDO NEGRÃO/GLOBAL IMAGENS
tão religiosa, nós sabemos que à cor-
rente tradicional islâmica surgiram
outras e entram em confronto com
as formas tradicionais, mas há várias
correntes e nenhuma tem o domí-
nio sobre as outras. Essa composi-
ção sociológica é garantia de coesão.
Vê alguma ligação entre o 1 de feve-
reiro e o ataque à Rádio Capital, dias
depois?
Há uma ligação clara: depois de 1 de
fevereiro intensificou-se a seguran-
ça, mas havia especulação quanto
ao que aconteceu. Para o governo
era uma tentativa de golpe de esta-
do, para outras pessoas não, e havia
uma contradição com o que Umaro
Sissoco Embaló tem dito. Então as
pessoas estiveram a questionar, es-
tamos perante o quê? Ajuste de con-
tas do narcotráfico, como disse o
presidente, se foi um grupo de des-
contentes que quer assumir o poder,
se é uma manobra de tentar endure-
cer, como aconteceu na Turquia de-
pois daquela tentativa de golpe que
Erdogan aproveitou. Era na Rádio
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Capital que as pessoas tinham voz.
Os comentários de Rui Landim ti-
nham muita audiência, especial-
mente na nossa diáspora. Enten-
deu-se que enquanto esta rádio
mantinha esta linha editorial, que
era a de dar o que as autoridades di-
zem, mas depois ouvir outras pes-
soas, tinha de ser atacada. Não te-
mos dúvidas. Primeiro, porque an-
tes houve ameaças; segundo, os
comentários que fizeram depois; e
no dia seguinte, nos comunicados
oficiais não se menciona a Rádio Ca-
pital. E na comunidade internacio-
nal ninguém se solidarizou com a
rádio, só com o governo.
Há um ano queixou-se do aumento
da violência sobre os defensores
dos direitos humanos. Quem são
estas pessoas e que violência têm
sofrido?
Os defensores fazem parte de insti-
tuições como a Liga Guineense dos
Direitos Humanos. Depois há as pes-
soas que são sensíveis às questões de
direitos humanos, que constante-
mente intervêm. E também aqueles
que intervêm em áreas setoriais,
achamos que estão a defender os di-
reitos humanos. Por exemplo, o di-
reito à educação, direito à saúde, di-
reitos das mulheres, direitos dos tra-
balhadores. Temos a rede nacional
de defesa dos defensores e a partir de
2020, com a instalação do atual regi-
me, que coincidiu com a pandemia
mundial, o poder político tinha um
problema de legitimação, porque
não havia uma decisão sobre as elei-
ções do Supremo Tribunal, e um
grande setor das forças armadas es-
tava reticente. Como forma de con-
solidar o poder decretou-se o estado
de emergência, sem que haja condi-
ções no país. Depois aumentou-se o
recrutamento das forças de seguran-
ça de forma desorganizada e come-
çou a haver muitas perseguições.
Nós, ativistas, estivemos atentos a
denunciar as situações.
Que situações?
Por exemplo, o Estado não fornece
máscaras e no início da pandemia
custavam entre 750 e 1000 francos
CFA. Um quilo de arroz custa 400
francos CFA. Poucos tinham aquela
possibilidade e depois havia exérci-
to a bater nas pessoas na rua. Mais
tarde passou-se para o estado de sí-
tio, em que a partir das 20.00 nin-
guém podia estar nas ruas. Houve
muçulmanos que estavam a rezar
na rua e que foram espancados. Ou-
tro caso: os professores têm o esta-
tuto da carreira docente aprovado
em 2011, que não está a ser aplicado.
Em contrapartida, os titulares de ór-
gãos públicos, por ex. Quem ganha-
va 150 mil francos CFA passou para
2 milhões. Foi aí que começaram os
protestos e houve adesão maciça
dos professores. Como não são há-
beis em lidar com esta situação, cor-
taram os salários a esses professores
que estão a reivindicar legitima-
mente, porque a nossa lei prevê o di-
reito à greve.
cesar.avo@dn.pt
O DN viajou a convite do governo
da Guiné-Bissau.
Palácio do Governo passou a ter segurança reforçada.
Um mistério com três
semanas, três suspeitos
e explicações diferentes
ATAQUE A justiça está a fazer o seu trabalho, garante o
PM guineense. Até lá continuam as dúvidas.
A
o fim de três semanas
do ataque ao Palácio do
Governo da Guiné-Bis-
sau, que se saldou na
morte de oito pessoas (uma delas
atacante), as dúvidas permane-
cem para lá das vítimas e dos vi-
dros estilhaçados e buracos cau-
sados por bazucas. Quem foram
os autores do tiroteio que durou
cinco horas? Qual o seu objetivo?
Quem são os mandantes? E por
que razão os militares e a força es-
pecial da polícia não interveio,
deixando a guarda presidencial a
tentar retomar o palácio sozinha?
Segundo o presidente Umaro
Sissoco Embaló, que naquele dia
presidia ao conselho de ministros,
como é seu hábito, quem levou a
cabo o ataque foram “assassinos
financiados pela máfia da droga”,
sem ligação às forças armadas, e o
móbil era o de matá-lo para impe-
dir a sua luta contra o narcotráfi-
co. Dias depois, o chefe de estado
designou três condenados por
tráfico de drogas nos Estados Uni-
dos como responsáveis pelo ata-
que, que considerou também ser
uma tentativa de golpe de estado.
Os suspeitos são o antigo contra-
-almirante José Américo Bubo Na
Tchuto, Tchamy Yala e Papis Dje-
mé, que já cumpriram pena de
prisão e foram deportados para a
Guiné. Na semana passada terão
sido detidos.
Já o porta-voz do governo apre-
sentou uma versão diferente. Fer-
nando Vaz, que também é minis-
tro do Turismo, responsabilizou
um “grupo de militares e parami-
litares”, o qual teria como objetivo
“a decapitação do Estado gui-
neense, com recurso a pessoas
envolvidas no narcotráfico e con-
tratação de mercenários, rebeldes
de Casamansa”.
27
Polícia usa gás contra
camionistas em Otava. Pelo
menos 47 pessoas detidas
LEONARDO NEGRÃO/GLOBAL IMAGENS
CANADÁ Manifestação do autodenominado Comboio
da Liberdade bloqueia há três semanas fronteiras com
os Estados Unidos por causa das restrições da covid-19.
A
polícia de Otava ad- so para acabar com a ocupação
mitiu ontem ter usado na quinta-feira, com a detenção
“substâncias quími- de dois líderes do protesto e in-
cas” para dispersar terditando grande parte da área
centenas de camionistas “agres-
sivos” que estão a bloquear esta
do centro da capital federal ca-
nadiana para impedir que ou-
cidade no Canadá, depois de
mais de três semanas de protes-
tras pessoas se juntassem aos
manifestantes.
tos contra as restrições da co-
vid-19. “Os manifestantes con-
A capital federal é o último re-
duto do movimento contra as
tinuam a ser agressivos e a ata- restrições impostas devido à
car os agentes policiais”, referiu pandemia, o autodenominado
a força policial numa publica- Freedom Convoy (Comboio da
ção na rede social Twitter. Liberdade, em tradução livre),
A polícia contou que os ca- após três semanas de manifes-
mionistas se recusam a obede- tações e bloqueios que encerra-
cer às ordens de dispersão, mo- ram as fronteiras entre o Cana-
O primeiro-ministro Nuno Na- tivo pelo qual usou aquelas dá e os Estados Unidos da Amé-
biam, que revelou os pormenores substâncias. rica (EUA), causaram danos
da fuga dos ministros em entre- No âmbito destes protestos, a económicos a ambos os países
vista à Radio France Internacional polícia prendeu já 47 pessoas e e criaram uma crise política
(RFI) – e que passou por terem de rebocou cerca de 30 camiões. para o primeiro-ministro cana-
saltar o portão das traseiras do pa- “Quem for encontrado na diano, Justin Trudeau.
lácio – preferiu não entrar em acu- área do centro da capital do Ca- A polícia de Otava deixou cla-
sações. “Há muita especulação. nadá, paralisado há três sema- ro na quinta-feira que se prepa-
Não gosto de me pronunciar sem nas pelos manifestantes, será rava para acabar com o protes-
ter factos. Tudo está sob investiga- preso”, avisaram as autoridades to e retirar os mais de 300 ca-
ção. Há pessoas que foram deti- numa outra publicação. miões, com o chefe da polícia
das porque há uma ligação à vol- Os manifestantes em Otava interina de Otava a avisar: “A
ta de tudo isto. Há suspeitas. Esta- fazem parte de um movimento ação está iminente.”
mos à espera que a justiça faça o que organizou bloqueios ao Estes protestos abalaram a re-
seu trabalho”, disse à RFI. “É ver- longo da fronteira com os Esta- putação do Canadá de civilida-
dade que o presidente falou disto, dos Unidos, tendo causado de e obediência às regras e ins-
relacionou os factos com a ativi- prejuízos económicos nos dois piraram outros semelhantes em
dade do narcotráfico e também países. França, Nova Zelândia e Países
falou-se na possibilidade de ser A polícia deu o primeiro pas- Baixos. DN/LUSA
um golpe orquestrado ou de um
ato terrorista”, disse ainda.
Dias depois, a Rádio Capital foi PUB
alvo de um ataque por pessoas ar-
madas: o equipamento ficou des- PLANOCAMPO - Empreendimentos Agrícolas, SA
truído e sete pessoas ficaram feri- Sede Social: Rua Dr. Alfredo da Costa, 19 - 4.° dto. - Miraflores
das, entre elas a jornalista e ativis- Pessoa Coletiva n.º 504 219 219. Capital Social: 275.000 €
ta Maimuna Bari, que devido à Matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º 7255
gravidade dos ferimentos teve de
ser transportada para Lisboa.
Também foi atacada a casa do co-
CONVOCATÓRIA
mentador daquela estação Rui Nos termos da lei e dos estatutos, são convocados os Senhores Acionistas
Landim. da PLANOCAMPO – Empreendimentos Agrícolas, SA para se reunirem em
Por fim, o chefe das Forças Ar- Assembleia Geral no dia 31 de março de 2022, pelas 17 horas, na sua
madas Biagué Na Ntan, regressa- sede social, com a seguinte “Ordem de Trabalhos”:
do ao país depois de tratamento 1. Deliberar sobre o Relatório de Gestão, o Balanço e os restantes
médico em Espanha, deu “direti- documentos de prestação de contas relativos ao exercício de 2021 ;
vas de comando” a todos os mili- 2. Deliberar sobre a Proposta de Aplicação de Resultados;
tares para iniciarem ações de bus- 3. Proceder à apreciação geral da administração e fiscalização da
ca para encontrar os autores do Sociedade;
ataque. Perante os comandantes 4. Proceder à eleição dos novos membros para os órgãos sociais para
militares, o general considerou o quadriénio 2022/2025;
“uma vergonha” que os militares 5. Deliberar sobre qualquer outro assunto do interesse da Sociedade.
“não tenham feito nada, não te-
As propostas de documentação de apoio aos diversos pontos da ordem
nham perseguido” os autores dos do dia estão à disposição dos Senhores Acionistas na sede da Sociedade.
ataques ao Palácio do Governo. E
disse que iria receber uma delega- Lisboa, 10 de fevereiro de 2022
ção da CEDEAO para saber a sua O Presidente da Mesa da Assembleia Geral
posição sobre o envio de uma for- Assinatura ilegível
ça militar. C.A.

28 INTERNACIONAL
EUA. Mulher sem VIH
após transplante
Uma semana depois da morte do francês Luc
Montagnier, um dos cientistas que descobriu o
vírus do VIH/SIDA, soube-se de mais um caso de
cura da doença. Uma mulher birracial de Nova
Iorque, que tinha sido diagnosticada em 2013 e
descobriu quatro anos depois que tinha leucemia
mieloide aguda, recebeu um transplante de células
estaminais do cordão umbilical de um dador
resistente ao HIV em 2017. Está livre do vírus há 14
meses, não precisando de tratamentos, e também
está há quatro anos em remissão da leucemia. É o
terceiro caso de cura, sendo os anteriores ambos
homens (um caucasiano e um latino), que
receberam células estaminais adultas, usadas mais
frequentemente em transplantes de medula óssea.
Honduras. Ex-presidente
é preso e arrisca extradição
Juan Orlando Hernández, que deixou a presidência das
Honduras no final de janeiro após oito anos no poder, foi
detido esta semana e arrisca a extradição para os EUA. A
justiça norte-americana acusa o ex-presidente
conservador, de 53 anos, de facilitar o tráfico de 500
toneladas de cocaína, tendo já condenado vários dos
seus aliados e até o seu irmão. Hernández entregou-se às
autoridades horas depois de um juiz ter emitido um
mandato para a sua captura, com dezenas de pessoas a
celebrar à porta de sua casa quando saiu algemado.
O ex-presidente rejeita as acusações, mas vai ficar, para
já, em prisão preventiva.
Mapa-múndi
PODERES A natureza mostrou o seu poder nas cheias de
Petrópolis e a ciência em mais um caso de cura do vírus da SIDA
nos EUA. Outros poderes políticos foram usados por Trudeau,
no Canadá, para tentar acabar com o bloqueio dos camionistas
em Otava, e há poderes militares empenhados em colocar o
líder do golpe na presidência do Burkina Faso. Em Espanha, a
guerra pelo poder é dentro do PP.
TEXTO SUSANA SALVADOR
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Canadá. Trudeau usa poderes
especiais contra camionistas
O primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, recorreu esta
semana à Lei de Emergência para tentar pôr fim ao protesto
dos camionistas, que mantêm bloqueado o centro da capital,
Otava. Esta é apenas a segunda vez (em tempo de paz) que
tal lei é usada – a outra foi em 1970, pelo então chefe do
governo Pierre Trudeau (o seu pai), para responder aos
separatistas do Quebeque, que tinham dois canadianos e um
britânico como reféns. A decisão de voltar a recorrer a esta
lei (que dá mais poder para deter os manifestantes e
apreender os camiões, para desbloquear a situação) surge
depois de, durante duas semanas, quase nada ter sido feito
pelas autoridades, num gesto que foi muito criticado – e que
levou à demissão do chefe da polícia de Otava, Peter Sloly. A
polícia começou a tentar desmantelar o acampamento de
camionistas na sexta-feira.
Brasil. Rasto de morte
nas cheias em Petrópolis
As sirenes de alerta para o risco de
deslizamentos de terra voltaram a soar na
sexta-feira, quando a chuva voltou a cair em
Petrópolis, dias depois de as águas terem
arrastado as casas da antiga cidade imperial
na região serrana do Rio de Janeiro. Já estavam
contabilizadas 120 mortes, mas havia ainda
uma centena de desaparecidos e continuam as
buscas por sobreviventes. O presidente
brasileiro, Jair Bolsonaro, sobrevoou a zona,
falando de uma “catástrofe muito grande”
e de uma “zona quase de guerra”.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 29

Espanha. Guerra no PP
entre Ayuso e Casado
A revelação de que a direção nacional do PP de Pablo
Casado teria alegadamente espiado o irmão da presidente
da Comunidade de Madrid, Isabel Díaz Ayuso,
desencadeou uma guerra aberta no maior partido da
oposição. Em causa estará o facto de o irmão de Ayuso ter
sido intermediário num contrato de 1,5 milhões de euros
para a compra de máscaras contra a covid-19, cobrando
uma comissão – ela confirma um pagamento de 55 mil
euros. A ideia seria, alegadamente, usar a informação para
prejudicar Ayuso, que, após a vitória expressiva nas
eleições regionais de 2021, procura assumir a liderança do
PP de Madrid. A presidente da Comunidade acusa o
partido de agir de forma “cruel” contra si e apontou o dedo
a Casado, que exige explicações.

Hong Kong. Eleição

de novo líder adiada
Hong Kong adiou para 8 de maio o
processo de eleição do seu próximo
líder executivo, numa altura em que o
território enfrenta o pior surto de covid-
-19 desde o início da pandemia, com
milhares de novos casos diários. A atual
chefe do governo, Carrie Lam, falou em
“riscos para a saúde pública”. A eleição,
prevista inicialmente para março, é feita
por um comité de apenas 1462 pessoas,
incluindo deputados, representantes de
várias indústrias e profissões e
representantes pró-Pequim. Vários
candidatos, incluindo o produtor de
cinema Checkley Sin e o empresário
Titus Wu, confirmaram a intenção de
concorrer. Não é claro se Carrie Lam,
no poder na região administrativa
especial da China desde 2017, é
candidata à reeleição.

Austrália. Morto
por tubarão em Sydney
Foi o primeiro ataque fatal de um
tubarão numa praia de Sydney desde
1963. Simon Nellist, um instrutor de
mergulho britânico, de 35 anos, morreu
diante dos pescadores, nas rochas
próximas, que nada puderam fazer
diante do ataque de um tubarão-branco,
que se estima tivesse três metros. Os
ferimentos eram “catastróficos”,
segundo as autoridades, que
Burkina Faso. Líder do golpe recuperaram os restos do corpo. A praia
assume presidência foi fechada e foram feitos esforços para
tentar encontrar o animal, mas sem
O tenente-coronel Paul-Henri Sandaogo Damiba, de 41 anos, tomou sucesso.
posse como presidente do Burkina Faso, três semanas depois do golpe
de Estado que derrubou Roch Marc Christian Kaboré (criticado pela
resposta fraca aos insurgentes jihadistas). Numa cerimónia transmitida
pela televisão estatal, vestido com o uniforme militar, Damiba jurou
“preservar, respeitar, cumprir e defender a Constituição”. Na semana
passada, o Tribunal Constitucional reconheceu-o formalmente como
chefe de Estado e comandante supremo das Forças Armadas depois
de a junta militar ter dito que seria nomeado para estes cargos durante
um período de transição, cuja duração ainda não está decidida.

30 DESPORTO
Matheus Nunes
O ‘menino
descarado’ que
se fez joia rara
no Sporting
DESTAQUE Ex-diretor do scouting e ex-treinador
contam ao DN o que viram no médio para
recomendarem a sua contratação. As “ameaças”
detetadas no perfil são hoje a sua mais-valia, por
culpa da intervenção potenciadora de Rúben
Amorim. Prevê-se leilão por ele no verão e muitos
milhões nos cofres leoninos.
TEXTO ISAURA ALMEIDA
O
relatório do scouting do
Sporting e o depoimento
do então treinador da
equipa de sub-23 eram
claros na recomendação da contra-
tação de Matheus Nunes. “É um
grande talento” e “vale a pena correr
o risco”. O risco era pagar meio mi-
lhão de euros por 50% do passe de
um jogador adulto, quase sem for-
mação ou presença em seleções,
que até aos 19 anos só tinha jogado
nos distritais. E tudo isto num con-
texto de crise profunda para os la-
dos de Alvalade, com mudança de
presidente e cinco treinadores
numa época.
A prospeção leonina “já o tinha
debaixo de olho” por causa da Liga
Revelação, mas quando Alexandre
Santos, então treinador dos sub-23,
recomendou a aquisição do médio
que o tinha deslumbrado no Estoril,
as observações foram intensifica-
das. “Tinha um perfil diferente, que
valia a pena seguir. Projetava um
conjunto de características raras no
mercado, que podiam ser alavanca-
das pelo treinador da equipa princi-
pal”, explicou ao DN o então diretor
do scouting, José Chieira, que dei-
xou o cargo em dezembro.
Habituado a não ter preconceitos
com perfis diferentes, para ele o im-
portante é perceber o que há de trei-
nável no jogador para o potenciar
tendo em vista o mercado. Por isso,
“mesmo tendo consciência do pro-
cesso formativo retardado e menos
qualificado, isto na teoria, porque a
realidade mostrou o contrário”,
Chieira e os colegas sabiam que ele
“seria sempre um jogador que, com
uma intervenção no momento cer-
to, poderia atingir patamares muito
interessantes”.
Havia também algumas “amea-
ças” sinalizadas. “A perceção dos es-
paços e dos momentos não era a
necessária na altura, algo normal,
porque a exigência que ele tinha em
nível de treino e nos sub-23 era di-
ferente do que aquilo que seria a
exigência no Sporting, mas tam-
bém aí vimos potencial. Se evoluís-
se ao nível de biomecânica, isso
ajudá-lo-ia a melhorar a perceção
de espaço”, explicou.
Numa questão de meses, as coi-
sas a melhorar transformaram-se
em mais-valias. “Ao contratar Rú-
ben Amorim, o Sporting encontrou
o parceiro perfeito para o Matheus
passar para outro patamar. O trei-
nador percebeu tudo e encontrou
maneira de o potenciar a um nível
estratosférico, deu-lhe soluções e
instrumentos para crescer com o
jogo”, elogiou o ex-diretor de scou-
ting.
As boas exibições e
os golos marcados ao
Benfica ajudaram
Matheus Nunes a
conquistar o carinho
dos adeptos do
Sporting .
Segundo Chieira, o perfil psicoló-
gico – “nem sempre é devidamente
analisado ou enquadrado nos pro-
cessos de recrutamento”– mostrava
grande dimensão volitiva ao nível
comportamental: “O Matheus tinha
uma presença grupal muito empá-
tica e positiva e revelava uma enor-
me disponibilidade para aprender
e ouvir. Um ‘menino descarado’ mas
muito respeitador e sério em todos
os ambientes e circunstâncias.”
E também por isso a ascensão do
jogador é uma história de encantar,
com muitos capítulos ainda por es-
crever. Contraria todo o processo do
futebol moderno, assente na forma-
ção nas academias, alguém que ou-
“Ao contratar Rúben
Amorim, o Sporting
encontrou o parceiro
perfeito para Matheus
Nunes passar para
outro patamar”,
segundo o ex-diretor
do scouting do
Sporting.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
viu tantas vezes “não fica”, “não ser-
ve”, “não é o que procurámos” e que
chegou a duvidar dele próprio. A
mãe não o deixou desistir do futebol
e hoje é campeão nacional pelo
Sporting e “um dos melhores joga-
dores do mundo neste momento”,
segundo Pep Guardiola, que assim
o elogiou após a goleada dos leões
com o Manchester City (5-0).
Não, não, não, não... Simmm!
Nascido no Brasil a 17 de agosto de
1998, Matheus sonhava jogar fute-
bol, mas aos 13 anos teve de se mu-
dar para Portugal com a mãe e o pa-
drasto português. Na Ericeira, traba-
lhou na pastelaria do padrinho,
Humberto Salvador, antigo jogador
do clube da Ericeira, para ajudar a
família (tem três irmãos), ao mesmo
tempo que jogava no Ericeirense,
nos distritais da AF Lisboa.
No primeiro ano de sénior foi
para o Oriental (Lisboa), para jogar
o Campeonato de Portugal (tercei-
ro escalão). As coisas até pareciam
estar a correr bem, mas uma lesão
na coxa obrigou-o a parar duas se-
manas e quando regressou... foi dis-
pensado. Desanimado e algo enver-
gonhado, voltou ao Ericeirense. Mas
o talento era tanto que foi treinar ao
Leicester durante duas semanas. O
clube sagrou-se campeão da Pre-
mier League e no meio da festa não
havia tempo para lhe dar atenção, e
o médio voltou a Portugal. Ainda foi
fazer testes ao Lille, ao Sp. Braga e ao
Benfica, onde o relatório, segundo
disse o padrinho ao MaisFutebol,
foi: “Tem valor, mas não está prepa-
rado para a exigência de uma II Liga
e da equipa B do Benfica.”
O cenário mudou quando Luís
Freire (agora no Rio Ave), que tinha
treinado o Ericeirense, foi orientar o
Estoril e pediu ao clube para olhar
para um tal de Matheus Nunes. Foi
assim que ele acabou nos canari-
nhos. Treinava com a equipa princi-
pal, mas jogava mais pelos sub-23,
sob as ordens de Alexandre Santos,
que em dezembro de 2019 foi con-
vidado a orientar os sub-23 do Spor-
ting e sugeriu a contratação do mé-
dio, segundo contou ao DN. “Disse-
-lhes que o Matheus Nunes era um
grande talento. Se ele sem formação
revela capacidades natas para inter-
pretar o jogo, bem orientado e num
clube estruturado como o Sporting
explodirá.”
Passados dois anos, o agora trei-
nador do Petro de Luanda (líder em
Angola) não tem dúvidas de que
aquele rapaz humilde e introverti-
do chegará ao mais alto nível do fu-
tebol mundial. Já na altura o médio
impressionava também pelo perfil
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
morfológico: alto, longilíneo e ágil.
“Não tem um ar guerreiro, mas não
precisa disso. Ganha duelos com o
corpo e sem meter o pé. E com pou-
cos toques ou só com um, às vezes,
consegue tirar o adversário do ca-
minho e sair em contra-ataque, as-
sim como faziam Iniesta e Xavi”, su-
blinha Alexandre Santos.
“Não é fácil encontrar um médio
que consiga pressionar muito bem
em zonas altas e ser agressivo em
zonas mais baixas. Não é fácil passar
de uma situação de recuperação
para uma de ataque, e ele faz isso
com uma naturalidade que assusta,
até mesmo nos jogos grandes. Não
joga para trás e para o lado, é verti-
cal. Acho que é por isso que o Guar-
diola disse aquilo. Essa verticalida-
de faz dele o jogador ideal para a
Premier League. Muitos dos golos
do Sporting surgem de passes dele
ou transições”, elogiou o antigo ad-
junto de Peseiro.
Depois de ouvir Guardiola, Ale-
xandre Santos mandou-lhe uma
mensagem a dar os parabéns por ter
arrancado tamanho elogio a um dos
melhores treinadores da história e
ele respondeu que “preferia ter ga-
nho o jogo”. Isso, segundo o técnico,
“mostra o nível de comprometi-
mento que tem para com a equipa.
O Matheus nunca teve nada dado,
31
Amorim
desvaloriza
ausências
por castigo
JESUS DIGES/EPA
R úben Amorim, treinador do
Sporting, garantiu ontem
que a sua equipa tem quantida-
de e qualidade suficientes para
vencer hoje o Estoril, às 18h00,
em Alvalade, apesar das ausên- João Félix faz voltar Atlético às vitórias
cias de Coates, Palhinha, Taba-
ta e Ricardo Esgaio, todos casti- Três meses depois, o Atlético de Madrid voltou a ganhar um jogo
gados na sequência dos inci- fora de casa para a Liga espanhola. E bem pode agradecer a João
dentes do clássico da semana Félix, que, frente ao Osasuna, abriu o marcador logo aos três
passada com o FC Porto, no minutos e fez a assistência para Luis Suárez fazer o segundo golo
Dragão (2-2). “Obviamente, so- aos 59’. Ángel Correa fixou o resultado em 3-0, numa partida em
mos mais fortes quando pode- que o avançado português foi muito elogiado.
mos contar com todos, mas po-
demos vencer qualquer jogo
mesmo com as nossas baixas”,
disse.
O treinador leonino garantiu
ainda que “a equipa está sem- Sérgio Conceição admite
pre forte em termos de espírito”,
apesar da goleada sofrida (0-5) ser parecido com Sá Pinto
GERARDO SANTOS / GLOBAL IMAGENS
a meio da semana com o Man- I LIGA Os dois treinadores vão estar frente a frente no
chester City para a Liga dos
Campeões. “O que queremos Moreirense-FC Porto, que tem início às 20h00.
fazer é aquilo que já fizemos nas
outras vezes, que é sair da Liga
dos Campeões e perceber que o
campeonato é muito impor-
tante e é a nossa prioridade.
Ainda não saímos oficialmente
S érgio Conceição, treinador
do FC Porto, admitiu ontem
que tem um feitio parecido com
O técnico portista espera que
a sua equipa consiga “desmon-
tar a organização defensiva” do
da Liga dos Campeões, mas já Ricardo Sá Pinto, técnico do Mo- adversário, lembrando que “o
pensamos em voltar lá, portan- reirense, com quem vai medir FC Porto teve sempre dificulda-
to passa muito por ganhar os forças esta noite (20h00) em Mo- des” em Moreira de Cónegos.
foi tudo conquistado, por isso valo- nossos jogos”, frisou. reira de Cónegos, em partida da Quem não vai estar ainda
riza as oportunidades que lhe dão. Sobre o regresso à I Liga, Rú- 23.ª jornada da I Liga. “É um trei- disponível para o jogo desta
Nunca se queixa de jogar só cinco ben Amorim garantiu que, “en- nador com experiência, que já noite é o defesa Rúben Seme-
minutos, aproveita-os ao máximo”. quanto for matematicamente passou por vários clubes. Passa do, que chegou do Olympia-
possível”, o Sporting irá lutar para os jogadores a sua paixão e cos. Sérgio Conceição revelou
“Vai pagar Rúben Amorim” pelo título e tem de “acreditar a forma efusiva de viver os jogos. que o internacional português
Tinha 20 anos quando o Sporting o sempre”. Nesse sentido, avisa Temos algumas parecenças nes- vai jogar hoje... pela equipa B.
contratou a troco de 500 mil euros para a necessidade de não faci- se sentido”, disse Conceição, “O Rúben está no bom cami-
(50% do passe), em janeiro de 2019, litar frente ao Estoril, um adver- lembrando “a caminhada” que nho. Quero que tenha minutos
ficando o clube com a opção de ad- sário que “sempre defendeu fizeram juntos e que lhe deu e competição, porque está há
quirir mais 30% por mais 450 mil muito bem e forte na transição”. “uma alegria enorme, na seleção algum tempo sem competir”,
euros, o que fez antes do prazo. Tal Outro dos temas abordados e no Standard de Liège”. explicou.
como aconteceu em 1997, quando pelo treinador do Sporting fo-
um dirigente leonino aceitou pagar ram os elogios de Pep Guardio-
cinco mil contos (25 mil euros) por la a Matheus Nunes, sobre os PUB
Cristiano Ronaldo, então com 12 quais procurou colocar travão.
anos, também o valor pago pelo “Acho que ele pode ser muito
luso-brasileiro deu que falar no melhor. Tem de ficar contente
universo sportinguista e levou o com os elogios, mas não deve li-
presidente, Frederico Varandas, a gar muito. O futebol é o dia a dia
defender-se dizendo, para espanto e ele tem de provar sempre o jo-
de muitos, em entrevista ao Canal gador que é”, advertiu, refor-
11 que “só Matheus Nunes vai pa- çando a ideia de que o médio MEMÓRIA
gar Rúben Amorim”. “tem de trabalhar para manter
Ora, tendo em conta que o técni-
co custou 10 milhões de euros
o nível”.
O Sporting recebe o Estoril
STAËL MARIA FERRAZ DE SAMPAIO
(mais juros), essa fasquia parece pela 27.ª vez em jogos a contar MELO E CASTRO DA SILVA CARVÃO
agora irrisória para aquilo que
Matheus Nunes já vale – 40 milhões
para o campeonato, sendo que
os canarinhos apenas por três
DE ATAÍDE DE MENESES BARATA
de euros, segundo o site Transfer- vezes conseguiram conquistar FEIO PEREIRA DE OLIVEIRA
markt – ou para os 60 milhões que pontos, com dois empates (1-1
o Sporting espera receber pela sua e 2-2) em 1993 e 2012, respetiva- A família participa que será celebrada missa do 125.º aniversário do nascimento,
joia rara no muito provável leilão mente, e uma vitória (1-0) al- hoje, dia 20, pelas 12.15 horas, na igreja dos Salesianos (Praça S. João Bosco),
durante o mercado de verão. cançada em 2014, graças a um agradecendo a todos quantos se dignem assistir a este ato solene em sua lembrança.
isaura.almeida@dn.pt golo de Evandro.

32 CULTURA
A febre
do policial:
crimes e
escapadelas
televisivas
SÉRIES Se há géneros que nunca passam de
moda são as histórias de detetives e o true crime.
Estreias recentes de séries no streaming dão
conta de uma diversidade de abordagens – há
por aí delitos e investigações para todos os gostos.
TEXTO INÊS N. LOURENÇO
N
“ ão percebo porque é que
não estás mais fascinado
com isto. Quer dizer, po-
díamos estar a morar ao
lado de um assassino!” O comentá-
rio é de Diane Keaton para um
amedrontado Woody Allen, em O
Misterioso Assassínio em Ma-
nhattan (1993), e resume bem o es-
pírito nova-iorquino de excitação
com os crimes de bairro. De livros a
séries, passando por filmes, docu-
mentários e podcasts, o chamado
true crime tem vindo a impor-se,
sobretudo nas plataformas de
streaming, e com ele muitas varia-
ções de narrativas policiais. Uma
tendência que se consolidou com
os hábitos necessariamente mais
caseiros dos últimos dois anos: o
espectador-detetive é uma realida-
de tida em conta por muita da fic-
ção que se produz hoje em dia.
Mare of Easttown (HBO), Homi-
cídios ao Domicílio (Disney+) e
Landscapers (HBO) são apenas
três bons exemplos do género, tí-
tulos do ano passado, cada um
com as suas nuances mais dramá-
ticas ou mais cómicas, cientes des-
se bichinho detectivesco que há
em nós. Nas últimas semanas, as
estreias de algumas séries no strea-
ming confirmam que o policial
está bem vivo... e com diferentes
facetas.
Grace, no Disney+
Adaptada dos best-sellers de Peter
James, esta produção britânica
está na categoria mais clássica das
histórias de detetives, com um
protagonista experiente, audaz e
melancólico, como se quer. Roy
Grace (John Simm) é um reputado
detetive de Brighton que no início
do primeiro episódio não atraves-
sa o melhor momento da carreira,
depois de ter assumido em tribu-
nal que consultou um vidente
para o ajudar numa investigação.
Aos 46 anos, com o talento desa-
proveitado em trabalho de secre-
tária (departamento de casos ar-
quivados), caído em desgraça pela
mão da imprensa e ainda sofren-
do com o desaparecimento da es-
posa, há seis anos, ele é resgatado
da monotonia pelo colega Glenn
Branson (Richie Campbell), que
precisa da “velha magia” de Grace
para resolver o caso de outro
De livros a séries,
passando por filmes,
documentários e
podcasts, o chamado
true crime tem vindo
a impor-se, sobretudo
nas plataformas
de streaming.
Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
Grace (Disney +) está incluída
nas séries clássicas de
histórias de detetives.
desaparecimento: um jovem pro-
motor imobiliário que parece ter-
-se evaporado na sequência de
um acidente rodoviário, na noite
da sua despedida de solteiro. Isto
envolve também a estranha au-
sência do padrinho de casamento
e parceiro de negócios, que alega
um voo atrasado... Para quem so-
fre de claustrofobia, desaconse-
lha-se este episódio, porque a cer-
ta altura haverá alguém preso
dentro de um caixão funerário e a
experiência vista do interior da
urna não é agradável.
Desenvolvido para a televisão
por Russell Lewis, o criador de En-
deavour (série, também disponí-
vel no Disney+, que retrata os pri-
meiros anos da carreira do famo-
so inspetor Morse), Grace põe a
atmosfera em movimento através Sharon Stone é uma das celebridades convidadas de Murderville, da
de uma montagem inteligente e Netflix (cima). Já Alan Ritchson substitui Tom Cruise em Reacher,
ritmada, que cumpre um tempo série que está disponível na Prime Video (dir.).
justo de revelação: cada episódio
tem hora e meia. Para além disso,
a primeira temporada só apresen-
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
Para algo
completamente
diferente... Pense-se
na investigação de
um crime como um
concurso
apalermado.
Murderville é uma
versão americana da
sitcom britânica
Murder in Successville
(2015-2017).
ta dois episódios – corresponden-
tes a dois romances –, sendo o se-
gundo sobre um esquema maca-
bro na dark web. A intercalar a
ação, os planos cinzentos da cida-
de litoral inglesa dão um toque
particular à angústia discreta do
detetive, que tenta manter-se no
cargo apesar da pressão constan-
te para se mudar para outra cida-
de. “És Brighton dos pés à cabeça”,
diz-lhe a chefe, e essa especifici-
dade do herói é a especificidade
da série.
Reacher,
na Prime Video
Baseado noutro sucesso literário,
o da personagem criada por Lee
Child, Reacher vem “corrigir” a de-
silusão dos fãs, que, depois de dois
filmes, nunca conseguiram vis-
lumbrar na pequena estatura de
Tom Cruise o Jack Reacher descri-
to nos livros: um homem muito
alto, corpulento e de poucas pala-
vras. Alan Ritchson é então o ator
que enche as medidas do papel,
não só em altura como em massa
muscular, exibindo uma silhueta
imponente que fala por si – logo
nos primeiros minutos, sem pre-
cisar de proferir uma sílaba, trava
uma situação de violência domés-
tica limitando-se a fixar os olhos
do agressor à porta de uma cafeta-
ria. Neste episódio-piloto de uma
primeira temporada que adapta
Do Fundo do Abismo (o romance
inaugural dos 26 da saga), Rea-
cher acaba de chegar de autocar-
ro a uma pequena cidade fictícia
na Georgia, Margrave, onde não
demora muito a ser detido por um
homicídio que não cometeu.
Uma vez na esquadra, começa-
mos a perceber que os dotes do
herói não são apenas físicos. Rea-
cher é o homem que se torna fun-
damental para resolver o quebra-
-cabeças dos sucessivos assassi-
natos que chocam a comunidade.
Basicamente, temos um Sherlock
Holmes com bíceps de parar o
trânsito. Alguém capaz de combi-
nar instintos apurados e finura de
observação (sublinha sempre que
“os detalhes importam”) com a
força bruta, quando necessário.
Reacher aumenta, assim, a dose
de ação no registo detetivesco,
sem permitir que uma coisa anu-
le a outra. Um equilíbrio garanti-
do pela pena de Nick Santora, que
ao longo de oito episódios vai
adensando o perfil do protagonis-
ta, um ex-polícia militar – ainda
não o tínhamos mencionado –,
entre o brilhantismo musculado e
a sensibilidade. Neste último as-
peto, veja-se como enfrenta o
dono de um cão, invadindo-lhe a
propriedade só para encher a taça
de água quando vê o animal se-
dento, ou a suave vibe romântica
que tem com uma agente da polí-
cia local (Willa Fitzgerald). Rea-
cher está acima da sua sinalética
comercial: o cartaz sugere um he-
rói de ação, mas há mais deleite
sherlockiano aqui do que se julga.
Uns ossos partidos são ossos do
ofício.
Murderville
e Catching Killers,
na Netflix
E agora para algo completamente
diferente... Pense-se na investiga-
ção de um crime como um con-
curso apalermado. Murderville é
uma versão americana da sitcom
britânica Murder in Successville
(2015-2017). Cada episódio conta
com celebridades convidadas
para resolver casos de homicídio
ao lado de um detetive de pouco
préstimo, Terry Seattle (Will Ar-
nett), que orienta os “estagiários”
no processo de investigação. O
formato, de meia hora, é sempre o
mesmo: três suspeitos, três inter-
33
rogatórios, e no final o convidado
tem de apontar o dedo ao culpado
com base nas pistas que recolheu.
Naturalmente, o grau de diversão
varia conforme os convidados e as
situações a que são expostos. Com
uma galeria que inclui Conan
O’Brien, Marshawn Lynch (joga-
dor de futebol americano), Kumail
Nanjiani e Sharon Stone, entre ou-
tros atores – num total de seis epi-
sódios –, a comicidade atinge pon-
tos altos, em particular no caso a
cargo de Lynch, em que os suspei-
tos são trigémeos, e Nanjiani, que
tem dificuldade em controlar o
riso perante os pedidos absurdos
do detetive Seattle. Quanto a Sha-
ron Stone, a levar com os toscos
avanços de sedução de Will Arnett,
só quer despachar o mistério, por-
que esta não é a praia dela.
No lado oposto da comédia,
mas na mesma plataforma
(Netflix), encontra-se Catching
Killers, uma série documental em
que detetives e outros envolvidos
relatam a fundo as fases de inves-
tigação de alguns dos casos mais
impactantes de serial killers dos
tempos modernos. Logo no pri-
meiro episódio analisa-se o caso
de Gary Ridgway, conhecido
como ‘o assassino de Green River’,
condenado a prisão perpétua por
49 homicídios – todas as vítimas
eram mulheres. Uma marcha len-
ta de investigação e condenação
que demorou quase 20 anos (Rid-
gway foi preso em 2001), depen-
dente de avanços tecnológicos
que não permitiram confirmar
mais cedo o ADN do suspeito. Es-
tamos a falar de muito investi-
mento pessoal, de processos que
marcaram a vida de quem se dedi-
cou a eles e do peso da memória.
Fica à vista a dificuldade que os
entrevistados têm de controlar as
lágrimas a cada passo da narração
na primeira pessoa.
Mas Catching Killers procura
também analisar a mente dos as-
sassinos (aqui é o seu lado
Mindhunter), estudando os pa-
drões assinalados pelos procedi-
mentos dos investigadores... e as
surpresas. Como aquela que se
conta no segundo episódio sobre
a assassina em série Aileen Wuor-
nos, que Charlize Theron interpre-
tou no filme Monstro (2003), de
Patty Jenkins. Este é o tipo de série
que põe os olhos na história e na
expressão realista do true crime
para transmitir os métodos e os
sentimentos que se misturam
numa experiência tão envolvente
quanto perturbadora. A frieza do
detetive é uma invenção de ator.
Na vida real, ninguém sai ileso do
contacto com a morte dos outros.
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34 CULTURA Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias

Opinião
João Lopes

Da privacidade à obscenidade

R
evi recentemente Gente Vulgar,
primeiro trabalho de Robert Red-
ford como realizador, vencedor de
quatro Óscares de 1980, incluindo
melhor filme do ano. Nele se encena uma
crise familiar cujo tríptico – pai, mãe e filho,
personagens compostas, respetivamente,
por Donald Sutherland, Mary Tyler Moore e
Timothy Hutton – adquire uma espécie de
ponto de fuga dramático na pessoa de um
psiquiatra, interpretado por Judd Hirsch.
Redford e Hutton ganharam Óscares, o pri-
meiro de realização, o segundo como ator
secundário, com Alvin Sargent a receber a
estatueta dourada de melhor argumento
adaptado (a partir de um romance de Ju-
dith Guest).
Esquematizando (e muito!), recordo que
havia um filho mais velho, falecido num
acidente. Depois da sua morte, o irmão so-
brevivente tentou suicidar-se – as suas ses-
sões com o psiquiatra surgem na sequên-
cia de tudo isso, funcionando como um ce-
nário “alternativo” (entenda-se: privado),
em que vão ecoar as relações dos pais com
o filho e também, inevitavelmente, entre
pai e mãe.
Evitemos a estupidez corrente (que tan-
to mal tem feito ao cinema americano, e Judd Hirsch e Timothy Hutton em Gente Vulgar (1980): entre palavras e silêncios.
não só) que obriga qualquer dispositivo
dramático a funcionar como amostragem
“edificante” de bons e maus comporta- não estou a duvidar das competências, Escusado será dizer que não há qualquer prio fator humano que se torna descartá-
mentos: Gente Vulgar não é sobre “a” famí- muito menos da honestidade, dos especia- paralelismo “temático” com Gente Vulgar. vel. Se o perfil psicológico de qualquer indi-
lia como abstração transparente e, por isso listas que acharam por bem pronunciar-se Também não é essa a questão. A subtil nar- víduo – seja ele um potencial criminoso ou
mesmo, não procura generalizações mora- (publicamente) sobre a tragédia protagoni- rativa do filme permite-nos compreender, o mais neutro dos cidadãos – pode ser
listas para acomodar as boas consciências zada por aquele estudante. Estou, isso sim, isso sim, que qualquer existência indivi- transformado em “objeto” público de supo-
– é um filme sobre “uma” família concreta, a perguntar-me o que faz com que a com- dual é uma filigrana de factos conhecidos e sições e especulações (neste caso sem qual-
não generalizável. plexidade labiríntica de análise de um silêncios enigmáticos, porventura impene- quer conhecimento direto, isto é, clínico,
Revi o filme por altura da proliferação de comportamento individual possa ser trata- tráveis. Quando tal existência surge promo- do próprio indivíduo), isso significa que a
notícias sobre o estudante que planeou da e, sobretudo, instantaneamente parti- vida a vaudeville da praça pública, é o pró- conceção de comunidade passou a estar
um atentado a ser perpetrado nas instala- lhada como uma espécie de cálculo de pro- parasitada por noções grosseiras de “vigi-
ções da Faculdade de Ciências, em Lisboa. babilidades para uso mediático… E não sei lância” e “purificação”.
A acompanhar tais notícias, assisti a um responder. Além do mais, um filme é um filme…
fenómeno que não saberei definir de ou- Como qualquer cidadão, senti o assunto não uma avalanche de “análises” que
tro modo que não seja a “democratização” como muitíssimo perturbante. Mas não é transformam a perturbação do desconhe-
simplista (a meu ver, francamente inade- essa a minha questão. Acontece que a fula- cido em alarido público. Seria salutar pen-
quada) de muitas formas (psicológicas, nização “científica” do caso do jovem que sar tudo isso no plano cultural. Porquê?
psiquiátricas, etc.) de investigação, análise tinha programado um atentado só pode Porque a cultura não é uma mera agenda
e diagnóstico dos comportamentos hu- contribuir para agravar uma doença infan- Quando a dimensão de eventos, mas sim o sistema de valores
manos. til das nossas sociedades de hipervigilância em que vivemos e morremos. Penso nas
O terreno é escorregadio, suscetível de mediática. A saber: a redução de todas as privada é tratada palavras de Louis Aragon (citado por Jean-
atrair vários equívocos. Vivemos um tempo formas de privacidade a “coisas” que, mais como espetáculo -Luc Godard): “Quando for necessário fe-
em que o ruído mediático – alimentado por cedo ou mais tarde, vão suscitar alguma vo- char o livro, será sem nada lamentar. Vi
alguns discursos jornalísticos que não pen- zearia tribal – como se a transformação da público, está posta tanta gente viver tão mal e tanta gente
sam a sua responsabilidade social – é infini- privacidade humana em espectáculo obs- em causa a própria morrer tão bem.”
tamente mais poderoso do que qualquer ceno (veja-se o horror ontológico do Big
princípio de reflexão serena e pensamento Brother televisivo) fosse a nova lei das tro- noção de
exigente. Gostaria que se entendesse que cas sociais. comunidade. Jornalista.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 35

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SAIBA MAIS EM

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 Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
36 ACONTECEU EM

O DN
DE HÁ CEM
ANOS

AS NOTÍCIAS
DE 20 DE FEVEREIRO

DE 1922
PARA LER HOJE
SELEÇÃO DO ARQUIVO DN
POR CRISTINA CAVACO, LUÍS MATIAS E SARA GUERRA

COM O APOIO INSTITUCIONAL:

Diário de Notícias Domingo 20/2/2022 37
 Domingo 20/2/2022 Diário de Notícias
38 VIVER

Chef Nikita Polido

Ruivo, couve-flor
e coco
TEXTO E EDIÇÃO FILIPE GIL

Ingredientes:
400 g de peixe ruivo
400 g de couve-flor
100 g de avelãs
1/2 cebola
1 dente de alho
250 g de leite de coco
Aneto q. b. (ou qualquer outra erva
fresca, como coentros)
Sal
Pimenta
Azeite

Confeção:
Refogar a cebola e o alho com
um pequeno fio de azeite.
Quando estiver translúcido, juntar
o leite de coco e temperar.

Colocar tudo num robô de

cozinha, juntando os coentros
crus e triturar até ficar uniforme.

Colocar o molho numa frigideira

e cozinhar no mesmo o ruivo
filetado e cortado.

Assar no forno os ramos

de couve-flor temperados
com cominhos e sal.
Tostar ligeiramente as avelãs
e servir!

A Chef
A chef Nikita Polido está atualmente
à frente da cozinha do seu restaurante Celmar,
no Meco. Além disso, dá aulas na Escola de
Hotelaria de Setúbal. Antes de se dedicar à
cozinha, estudou numa área completamente
diferente: engenharia geológica, mas nunca
exerceu. Esteve em Barcelona vários anos a
A acompanhar
RICARDO RODRIGUES

trabalhar em cozinhas como o La Barra, do

A chef Nikita aconselha chef Carlos Abellan, com uma estrela
que a sua receita seja Michelin, e antes disso foi sous-chef no
acompanhada por um restaurante Bravo 24 e na cozinha do hotel W.
espumante Maria Quando regressou a Portugal, trabalhou como
Gomes, de Luís Pato. food stylist no Raw Studio.
Diário de Notícias Domingo 20/2/2022
CARTOON E PASSATEMPOS 39

PALAVRAS CRUZADAS SUDOKU

Horizontais: Moral. Gomo.

1. Jazigo de minérios. Peça de qualquer aparelho que se move com o pé. 2. Camareira. Pequeno 9. Arar. Colete. 10. Limitar. Cem. 11.
quarto de vestir. 3. Traçar. Galho. 4. Especiaria indiana. Gracejar. 5. Situado no centro. Tântalo Parir. Catar. 7. Em. Labutar. 8. Dar. Lutar.
(símbolo químico). 6. Que apresenta diversas cores e feitios. Relativo ou pertencente à boca. 7. Oval. 4. Canil. Are. 5. Cartoon. Ma. 6.
Sufixo nominal de origem latina, designativo, sobretudo, do lugar onde os animais se recolhem 1. Maré. Viela. 2. III. Cálculo. 3. Nascer.
e que, por vezes, tem sentido diminutivo. Profissional de televisão ou de rádio que lê textos ou Verticais:
faz a apresentação de programas. 8. Repetição. Respeitante a nascimento. 9. Peça de vestuário Olear. Remo.
para a mão. Gato (popular). 10. Sobressaltar. Possui. 11. Lubrificar. Instrumento que faz avançar 9. Luva. Tareco. 10. Alarmar. Tem. 11.
na água embarcações pequenas. Vário. Bucal. 7. Il. Locutor. 8. Eco. Natal.
Verticais: Ramo. 4. Caril. Rir. 5. Central. Ta. 6.
1. Disposição (figurado). Rua estreita. 2. Três em numeração romana. Conta. 3. Vir ao mundo. Do 1. Mina. Pedal. 2. Aia. Camarim. 3. Riscar.
feitio de ovo. 4. Lugar onde se alojam ou criam cães. Centésima parte do hectare. 5. Desenho Horizontais:
humorístico ou satírico publicado normalmente em revistas ou jornais. Símbolo de miliampere. 6. Palavras Cruzadas
Dar à luz filhos. Espiolhar. 7. Preposição que indica lugar. Trabalhar. 8. Oferecer. Esforçar-se. 9. Sulcar.
Peça de vestuário sem mangas e geralmente sem abas que se usa por cima da camisa. 10. SOLUÇÕES
Restringir. Dez vezes dez. 11. Ética. Divisão natural da polpa de certos frutos, como a laranja.

Procure bons negócios

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QUEM PROCURA ENCONTRA.

O ESSENCIAL DA INFORMAÇÃO, TODOS OS DIAS EM BANCA

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SORTEIO: 015/2022
CHAVE: 30-35-38-43-44 + 11
NÃO DISPENSA A CONSULTA DOS RESULTADOS OFICIAIS

MNE diz a portugueses Melo avança, mas ala mais

conservadora movimenta-se
para deixarem a Ucrânia CDS-PP Nuno Melo avançou, mas os setores mais
próximos do atual líder não vão ficar quietos. O
ultraconservador Miguel Mattos Chaves entrou no jogo.
TENSÃO “Saiam antes que, mesmo querendo, não o consigam fazer.”
Este foi o aviso do MNE aos emigrantes lusos – que serão cerca de 240.

O
eurodeputado Nuno tido“convictamente ancorado no
Melo confirmou on- humanismo personalista”, onde
tem à tarde que será as pessoas “estão no centro da
candidato à liderança ação política”, defendeu uma
do CDS. O anúncio foi feito na “economia de mercado saudável

O
Governo português sede nacional do partido, em Lis- para as pessoas”, que não faça do
aconselhou ontem os boa. E avançou dizendo que“hoje mercado “o centro dogmático do
cidadãos nacionais que não começa a última batalha de seu programa”.
se encontrem na Ucrâ- um CDS perdido”, mas antes “a Tentou, por outro lado, alinhar
nia, e que “não tenham uma razão primeira batalha para um CDS re- o partido com “novas realidades”:
premente para ficar, a que saiam nascido”, pela qual está disposto a importância imperativa da tran-
do país enquanto o podem fazer a “dar o peito às balas”. sição digital, a importância das
pelas vias normais”. “Atendendo O eurodeputado recordou que questões ambientais e ainda, por
ao possível agravamento da situa- no Parlamento o Iniciativa Libe- exemplo, a necessidade de liderar
ção de segurança no país e even- ral (IL) pediu para se sentar entre a luta em prol da igualdade sala-
tual suspensão de voos comerciais, o PS e o PSD (o que considerou rial entre homens e mulheres.
aconselhamos os cidadãos portu- “um exercício de honestidade”) e Melo terminou a sua interven-
gueses que se encontrem na Ucrâ- o Chega, por sua vez, quer sentar- ção desejando sorte a Francisca
nia e não tenham uma razão pre- -se “à direita do próprio regime”. Sampaio, a cabeça de lista pelo
mente para ficar a que saiam do Assim, “há todo um espaço en- partido no círculo da Europa –
país enquanto o podem fazer pelas tre o IL e o Chega” e “esse espaço é eleição que faz o partido sonhar
vias normais”, aconselha um aviso nosso e temos de lá voltar”: “O com a possibilidade de afinal se
publicado no Portal das Comuni- CDS faz falta a Portugal” e “en- manter no Parlamento. “Se esti-
EPA/SERGEY DOLZHENKO

dades Portuguesas.
Além de Portugal, outros países
pediram aos seus cidadãos na
Ucrânia para que deixem o país. A
lista inclui Estados Unidos, Cana-
dá, Reino Unido, Noruega, Dina-
marca, Bélgica, Países Baixos, Ale-
manha, Espanha, Israel, Austrália,
Nova Zelândia, Japão, Iraque, Ku-
wait e Itália. Estes apelos seguiram-
-se à declaração dos Estados Uni-
dos de que a Rússia poderá invadir
a Ucrânia “a qualquer momento”
nos próximos dias.
NATO muda pessoal
Há uma semana, os serviços con-
sulares já sugeriam aos portugue-
ses residentes na Ucrânia que dei-
xassem temporariamente o país, se
não tivessem de permanecer por
razões essenciais, como sublinhou
então o ministro dos Negócios Es-
trangeiros. Augusto Santos Silva in-
dicou existirem 240 portugueses
residentes no país, com os quais a
embaixada e a secção consular em
Kiev estavam em contacto perma-
nente.
A NATO mudou o seu pessoal da
delegação da capital ucraniana,
Kiev, para Lviv, a maior cidade do
oeste da Ucrânia, para longe da
zona de tensão no leste, e para o
seu quartel-general em Bruxelas
Reservistas do Exército ucraniano em exercícios.
por razões de segurança, afirma-
ram ontem fontes da Aliança Atlân-
tica à agência Efe. “A segurança do
nosso pessoal é o principal, por isso
todos foram recolocados em Lviv e
Bruxelas”, assinalaram as mesmas
fontes, que reforçaram que as dele-
gações da NATO na Ucrânia “conti-
nuam a funcionar”. Segundo sa-
lientaram, a organização e os paí-
ses seus aliados estão “a seguir e a
avaliar a situação de perto”, e con-
tinuam a “tomar todas as medidas
necessárias” e continuam a “pedir
à Rússia para que reduza a tensão e
escolha o caminho da diplomacia”.
Os EUA já tinham anunciado a mu-
dança temporária da sua embaixa-
da de Kiev para Lviv.
Eurodeputados cancelam
A visita de uma delegação do Parti-
do Popular Europeu (PPE) à Ucrâ-
nia, entre domingo e segunda-feira,
foi ontem cancelada a pedido das
autoridades ucranianas e alemãs,
revelou à Lusa o eurodeputado por-
quanto acreditarmos, o CDS não
acabou. Não me resigno ao facto
de o espaço político que o CDS si-
gnifica não estar representado
neste momento na Assembleia
da República”.
Nuno Melo reconheceu que “o
primeiro obstáculo” ao regresso
tuguês Paulo Rangel, que fazia par- do CDS à vida parlamentar é o fi-
te da comitiva. O social-democrata nanceiro, devido à forte perda de
explicou que as autoridades ucra- receita com o desaparecimento
nianas pediram para cancelar a vi- parlamentar do partido. Assim,
sita porque o primeiro-ministro e o ele próprio, nos próximos dois
ministro da Defesa daquele país ti- anos, não receberá nada enquan-
nham de estar “totalmente concen- to presidente do partido.
trados” na gestão da crise em curso. Depois falou nas dificuldades
Além disso, também o ministro dos “quase psicanalíticas” que o par-
Negócios Estrangeiros da Alema- tido enfrenta e, nesse contexto, a
nha pediu à comitiva para não via- urgência de “reconciliar o CDS
jar até à Ucrânia por motivos de se- com o seu passado”. “Não há es-
gurança, acrescentou. paço para zangas, não há espaço
A estes motivos Paulo Rangel dis- para tribalismos, não há espaço
se juntar-se um terceiro relaciona- para ajustes de contas. Nesse
do com o facto de a companhia aé- novo ciclo quero ser a ponte, não
rea alemã Lufthansa ter anunciado quero ser a barreira”, afirmou,
a suspensão dos seus voos regula- propondo-se, portanto, liderar
res para as cidades de Kiev e Odes- “um CDS onde as tendências
sa a partir de segunda-feira e, pelo unam e não subtraiam”.
menos, até ao fim do mês. “Isto E será fácil o caminho? “Não!”,
[cancelamento da visita] significa assegurou o eurodeputado. Mas
que houve uma grande deteriora- acrescentando: “Alguma vez no
ção da situação, aliás é essa a infor- CDS tivemos vida fácil? Quem
mação qualificada que nós temos”, quer vida fácil vai para o PS ou
afirmou. para o PSD!”
DN/LUSA Afirmando que quer o seu par-
vermos à altura, vão ser os portu-
gueses a querer devolver o CDS à
Assembleia da República.”
O congresso de eleição do novo
líder decorrerá nos dias 2 e 3 de
abril, em local ainda a definir, se-
gundo foi decidido na reunião do
Conselho Nacional do partido
realizada dia 11. O atual líder,
Francisco Rodrigues dos Santos,
já declarou que não será candida-
to, depois de o partido ter passa-
do de cinco deputados para zero.
Mattos Chaves avança
Melo avançou, mas a ala conser-
vadora do partido, mais próxima
do atual líder, também se está a
movimentar. Ontem, com uma
nota no Facebook, um histórico
do partido, Miguel Mattos Chaves,
anunciou que será candidato.
Membro da Comissão Política
Nacional, Mattos Chaves disse
que está a recolher as assinaturas
que lhe permitirão apresentar
uma moção global, após o que
apresentará a sua candidatura a lí-
der. Há quatro meses, foi notícia
quando saudou a saída do partido
de militantes como Adolfo Mes-
quita Nunes: “O partido é final-
mente gerido por pessoas e não
por grupos globalistas, LGBT, etc.”
JOÃO PEDRO HENRIQUES

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