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“Como vai você, que já modificou a minha vida, razão de minha paz já esquecida, nem sei se gosto

mais de mim ou de você”. Esses versos entoados por Vanusa, ganham a voz de Cassandra (Liniker)
em Manhãs de Setembro (o nome derivado do maior sucesso de sua “ídola”). Dividida entre o
trabalho de “motogirl” e cantora no Bar de sua amiga, a jovem transgênero é surpreendida pelo
descobrimento de um filho, Gerson (Gustavo Coelho), de 10 anos. A relação entre os dois é o centro
da narrativa. As paisagens cinzas do centro urbano que cercam os personagens – muitas gravadas no
Uruguai, devido à pandemia - contribuem para ressaltar o pesar de seus cotidianos. Desemprego,
preconceito, marginalização são vocábulos constantes nas sentenças que constroem o percurso
daqueles indivíduos. A fotografia ilustra isso ao filmá-los constantemente oprimidos na tela, em
contraluz ou segundo plano – vistos através de grades e reflexos, entre postes e construções que os
sufocam. A paleta “dessaturada” e a baixa profundidade de campo reforçam essas características.
Logo no início, o vermelho é usado para acentuar a conexão entre Cassandra e Gerson. A cor
aparece no capacete e camiseta da mulher ainda na primeira sequência. Após ser aceito para dormir
na casa da nova mãe, o menino usa uma jaqueta também em tons rubros. Assim, a direção de arte
enfatiza a relação que está se formando entre os dois. Apesar desse cuidado técnico, Manhãs de
Setembro acaba excedendo ao criar subtramas que não acrescentam muito a narrativa – um vício
recorrente entre as séries contemporâneas. No entanto, nada que comprometa o resultado da obra.
Ao som de “Como Vai Você?”, a última cena no carro traz um desfecho comovente – muito
semelhante a um plano marcante do filme italiano “O Quarto do Filho” (Nanni Moretti, 2001). A
representativa e forte voz de Liniker conduz os personagens. E os versos da música, regravados por
Vanusa em 1999, ressoam a trajetória de Cassandra.

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