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Considerações Iniciais
Neste texto analisa-se a construção da subjetividade como referência
epistemológica do pensamento moderno, tendo como foco o conflito entre a razão
Cartesiana e a razão Dialética, fundamental para a reflexão sobre a relação Filosofia e
Ciência.
A subjetividade é um dos eixos de sustentação do discurso científico moderno.
Isso significa que o problema da cientificidade das ciências humanas centra-se no
debate filosófico do sujeito consciente. Pensar a Ciência é pensar o ser humano e todo
seu processo histórico de sua produção do conhecimento, cultura e organização social,
política e educacional.
A reflexão sobre a subjetividade no pensamento moderno está associada ao
debate em relação ao processo de construção da racionalidade científica, que perpassa
pelo conflito de concepções de mundo antagônicas como o Idealismo e o Materialismo.
Ciência. Emerge, então, neste contexto, a problemática que envolve a passagem «de
sujeito do conhecimento ao objeto da Ciência», de cunho filosófico, epistemológico e
metodológico, questionando-se estatuto de cientificidade das Ciências Humanas e o fato
do referencial do conhecimento e da verdade ser posto na subjetividade, na consciência.
A filosofia moderna, na visão de Chauí (1990, p.80), é caracterizada pela
construção da subjetividade, porque:
realiza a primeira descoberta da Subjetividade propriamente dita, porque nela
o primeiro ato de conhecimento, do qual dependerão todos os outros, é a
Reflexão ou a Consciência de Si Reflexiva. Isto é, os modernos partem da
consciência da consciência, da consciência do ato de ser consciente, da volta
da consciência sobre si mesma para reconhecer-se como sujeito e objeto do
conhecimento e como condição de verdade [...] a filosofia moderna é a
primeira a reconhecer que, sendo todos os seres humanos seres conscientes e
racionais, todos têm igualmente o direito ao pensamento e à verdade.
Garcia-Roza (1987) destaca que a filosofia moderna não alterou a crença na
universalidade da verdade, existindo uma aproximação entre o pensamento moderno e a
episteme platônica, ao definir-se a Ciência como verdadeiro conhecimento.
Para este autor a filosofia moderna constrói uma subjetividade, uma
representação no interior da qual mantém as mesmas exigências e objetivos do discurso
platônico, a constituição da ciência e do conhecimento da verdade. Assim, a
subjetividade consiste no referencial do conhecimento e verdade. A representação é o
lugar de morada da verdade. Isto significa que a verdade habita a consciência seja numa
perspectiva racionalista ou empirista. Ambos diferem no caminho epistemológico, mas
visam o mesmo fim: a verdade, a universalidade e a identidade.
A subjetividade, que se dimensiona na força da razão humana, tem sua base no
racionalismo Cartesiano, perpassa por Kant e culmina em Hegel, referenciais da
concepção idealista moderna de mundo.
Descartes
EU - COGITO
EU DUAL: CONSCIÊNCIA E CORPO
EU = SER PENSANTE (Determinação da consciência sobre o corpo)
SUJEITO (consciência) > OBJETO (fenômeno) = VERDADE
(A racionalidade do Sujeito determina o processo de conhecimento)
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Descartes insiste na substância da alma como puro pensamento, heterógena à substância do corpo, mas
estabelece também a natureza puramente intelectual da alma.
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Descartes, tal como Platão, separa a certeza, cuja validade epistemológica está
situada na evidencia da razão, da opinião, sendo essa separação denominada por
Japiassu (1982) de «corte epistemológico».
Entretanto, Platão ao dicotomizar a episteme da doxa visa ascender da
particularidade sensível à universalidade da essência «Mundo das Idéias» enquanto
que Descartes visa obter a certeza do conhecimento pelo Cogito, mas com o mesmo
ideal platônico, a busca do verdadeiro conhecimento (GARCIA-ROZA, 1987).
PLATÃO DESCARTES
Mundo das Idéias Subjetividade
Universalidade da Essência (Cogito) = Universalidade da
consciência (natureza humana)
Mundo Inteligível (episteme) Corte Epistemológico
Mundo Sensível (doxa) Cogito Opinião
Objetivo Comum
A constituição da ciência, verdadeiro conhecimento e conhecimento da verdade
Conhecimento
Conhecimento
Imanente Transcendente
O conhecimento é
O conhecimento é das coisas externas
constituído pelas ao sujeito,
próprias idéias do realidade
sujeito fenomênica que
transcende ao eu
Transcendental
Conhecimento
Transcendental
As coisas se
apresentam nas
idéias do eu. O
sujeito conhece as
coisas nele
Imanente +Transcendente
Conhecimento Transcendental
Transcendente Imanente Transcendental
Sujeito Objeto Sujeito Objeto Sujeito Objeto
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“Sintéticos no sentido de que neles o predicado acrescenta algo de novo ao sujeito (o que não acontece
com os juízos analíticos); a priori porque têm uma validade necessária que a experiência não pode dar”
(ABBAGNANO, 1970, p. 90). Conforme Kant (1974), os juízos sintéticos são juízos de experiência (Ex:
todos os corpos são pesados) e os analíticos de explicação (Ex: todos os corpos são extensos).
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com uma consciência-de-si objetivada, isto é, uma outra consciência-de-si , vista como
objeto autônomo (EU imediato e singular).
ANTÍTESE (Negação)
Antítese (Negação)
Relação mediata (consciência) - Consciência de si
SÍNTESE
( Negação da Negação, afirmação que supera e conserva)
Síntese
(Negação da negação > afirmação que supera e conserva)
A razão é determinante
no conhecimento
Considerações Finais
O pensamento moderno é caracterizado pelo surgimento de uma nova
racionalidade, centrada no indivíduo e na razão, com poder de determinação no
processo do conhecimento e da verdade. É a possibilidade do ser humano tudo
conhecer, por intermédio da razão, o que lhe permite intervir sobre a natureza física e
humana.
O pensar idealista moderno tem em Descartes a sua gênese, por definir o homem
como res cogitans, perpassa pelo sujeito transcendental Kantiano e encontra no espírito
absoluto de Hegel, através da identidade entre o racional e o real, a culminância do ser
humano como «sujeito pensante».
Entretanto, essa forma de pensar é problematizada quando se reflete sobre o
nascimento das Ciências Humanas e busca-se explicar as conseqüências dessa
racionalidade na filosofia, na ciência e na história da humanidade, tendo como
parâmetro de análise, o materialismo histórico, a razão dialética, cuja concepção de ser
humano e os pressupostos lógicos e epistemológicos são opostos ao idealismo.
Kosik destaca o processo da racionalização e do irracionalismo gerado pela
razão cartesiana e Japiassu demonstra a inviabilidade da tese do “sujeito pensante”,
explicitando a necessidade da “deposição deste sujeito”.
Tanto na construção da subjetividade como referência epistemológica do
pensamento moderno, quanto no pensamento positivista de Comte na definição da
Ciência Moderna, evidencia-se o conflito entre a razão Cartesiana e a razão Dialética,
fundamental para a reflexão sobre a relação Filosofia e Ciência.
Historicamente, a crítica de Dussel à visão eurocêntrica, de Marx à posição
idealista e positivista delineia novos caminhos tanto para a filosofia como para a
ciência. O ser humano deixa de ser visto como “abstrato” e “individual” para ser
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Referências
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1987.
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KOSIK, Karel. - Dialética do Concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1969.
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Paulo: Brasiliense, 1990.
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