BEOWULF. Direção: Robert Zemeckis. Produção: Robert Zemeckis, Jack Rapke,
Roger Avary e Neil Gaiman. Intérpretes: Ray Winstone; Angelina Jolie; Anthony Hopkins; Crispin Hellion Glover e outros. Roteiro: Roger Avary e Neil Gaiman. Estados Unidos: Warner Bros., 2007. 1 DVD (1h53min), color.
Resenhado por Poliana de Almeida Guimarães, acadêmica do curso de Letras/Inglês
da Universidade do Estado da Bahia.
O poema lendário Beowulf, emergido no território referente à Inglaterra anglo-
saxônica, em um período correspondente a época anterior ao nascimento de Cristo, segundo considerado por especialistas, cuja autoria é desconhecida, inspirou a obra cinematográfica de igual nome, cujo título aponta para o personagem principal do enredo. Beowulf destaca-se ante o dom sobrenatural de força extraordinária que possui, semelhante aos heróis da mitologia grega, o qual o torna conhecido como o herói do campo nórdico, cuja missão consiste no enfrentar e vencer três seres monstruosos situados na Dinamarca, especificamente em Heorot, com o objetivo principal de obter riquezas materiais, prometidas pelo rei Hrothgar, bem como o reconhecimento por parte dos demais e, por conseguinte, a obtenção do alcance de termos valorosos como honra e glória. Inicialmente, o cenário dinamarquês estava marcado por um clima mortífero, particularmente no salão da realeza, cujo causador era o temível Grendel, grande destruidor de guerreiros, sendo este o primeiro alvo do valente Beowulf. E justamente em meio ao desespero do povo dinamarquês, surge uma esperança provinda da Escandinávia, na figura heróica do destemido Beowulf. O personagem Grendel era um ser excluído da sociedade, e este fato parece ser o real motivo da sua fúria atroz contra os habitantes da Dinamarca, sobretudo provenientes do Grande Salão Real, que realizavam verdadeiras extravagâncias ao se reunirem, como bebedeiras, glutonarias e, dentre outros aspetos, o ato da fornicação, como mencionado pelo rei Hrothgar. Apenas por meio de tais quesitos, é possível perceber a presença de uma atmosfera altamente pagã que circundava o reino, no que concerne ao povo pertencente à época ensejada pelo roteiro fílmico. Grendel era eficiente para efetuar seus morticínios, sua aparição era repentina, o que ressalta sua característica sutil. Todavia, é interessante notar que seus ataques se limitavam aos guerreiros do rei, sem contudo atingir seu representante principal, isto é, o rei Hrothgar. O acontecido estava vinculado a uma questão de cunho religioso, característico da época medieval, no que se refere à ideologia teocentrista, em que se considerava a posição real como algo inerente a proteção da divindade, portanto era mister que o monstro se distanciasse dele. Beowulf era habilidoso, formulou uma estratégia para atrair a atenção de Grendel, semelhante ao cenário encontrado pela fera durante a execução de ataques anteriores. Logo, na escuridão noturna e de sua habitação longínqua, ouviu Grendel os festejos, e saiu em disparada aos mesmos para abocanhar suas presas. Ao invadir o salão, os guerreiros de Beowulf foram ágeis em acertá-lo com as armas que levavam consigo, porém, sem sucesso, pois suas espadas eram incapazes de causar algum dano a Grendel. Portanto, foram vencidos em grande parte, exceto Beowulf, que permanecia vivo, e perseverante na luta contra o mal que assolava o reino. Apenas por meio da força das suas mãos, Beowulf saiu vitorioso na guerra contra Grendel; o monstro ficou aterrorizado após ter tido um membro do seu corpo arrancado, isto é, o seu braço, fugindo pouco tempo depois, e tendo a vida ceifada pelos golpes fatais do guerreiro Beowulf. Findo o conflito, quando a paz parecia reinar sobre o território dinamarquês, surge o inesperado: Beowulf foi surpreendido pela notícia de que ainda lhe restava um segundo desafio, isto é, o extermínio da mãe de Grendel, na figura de uma bruxa, cujos atributos físicos se contrapunham ao protótipo comumente atribuído a uma personagem dessa categoria. Imbatível até então, Beowulf fraqueja ao se deparar com a bruxa. Formosa à vista causa uma influência sedutora sobre o guerreiro, que não subsiste, e se entrega ao plano anteriormente arquitetado pela fera, ao se deitar com ela. Através do ocorrido, lhe foi possível dar à luz um segundo filho, o qual seria o meio pelo qual a mãe de Grendel havia encontrado para saciar sua sede de vingança contra o assassino do seu filho. O tempo passou, Beowulf envelheceu, e é neste momento da sua vida que ele sofreu um amargo arrependimento, no que tange ao seu relacionamento amoroso tido com a mãe de Grendel anos atrás, ante a aparição repentina do seu filho, que poderia ser considerado como um monstro mais poderoso do que Grendel, na figura de um dragão. Percebendo o grande perigo que assolaria o reino novamente, em decorrência do seu erro efetuado no passado, Beowulf aparece decidido em exterminar o monstro, ainda que para isso tenha que morrer. A luta ocorre, e mais uma vez Beowulf consegue vencer a fera, ao arrancar-lhe o coração, dentre outros golpes que realiza. Todavia, seu fim é certo, ambos morrem: monstro e homem. Disto depreende-se que não importa o quanto Beowulf demonstrasse ser forte, em seu ser havia a permanência de dois lados, afinal, embora sua força fosse anormal no que se refere à condição humana, ele possuía os demais aspectos humanos, e seu coração, inevitavelmente, o traiu. É curioso o ritual realizado para com o enterro do corpo do guerreiro, que em vez de ser sepultado, foi posto em um navio, com suas respectivas riquezas, e lançado ao mar, para ser consumido pelo fogo. Enfim, a lenda de Beowulf pode ser analisada como um verdadeiro conflito entre o bem e o mal, além de ser uma das histórias mais antigas da língua inglesa.