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26 mar, 12:00
Sim, mas ainda não conseguimos perceber se é mais prejudicial. E não é claro o
quanto se tenha espalhado. Não acho que seja necessário entrar em pânico
neste momento. Quero dizer, isso faz manchetes de jornais, mas não acho que seja
algo com que nos devemos preocupar mais. Acho que um dos problemas que
estamos a ver é que o VIH costumava ficar nas primeiras páginas e agora isso já não
acontece. E, como estamos a prestar menos atenção a isso, o sexo seguro deixou de
ser uma prioridade. E mesmo na prevenção da sida, estamos a dar maior ênfase à
prescrição de comprimidos do que à promoção da segurança sexual, ou com menos
parceiros. E, por isso, vamos ver aumentos de casos nos próximos tempos.
De facto, muitas pessoas descobrem que são positivas, são encaminhadas para uma
clínica, vão a uma consulta e depois param de ir. Isto faz com que a sua carga viral
suba e se tornem infecciosas novamente. Portanto, para a sua saúde e para impedir a
propagação do VIH, é muito importante manter estes pacientes sob cuidados
médicos. Esse é um problema principal agora.
Acho que esse estigma está a reduzir. Parte do estigma associado ao VIH provinha do
facto de ser um assassino. Agora, as pessoas vivem bem com a doença, o que
afastou parte do medo em torno dela. Mas acho que a dificuldade é que nós, como
humanos, somos hedonistas no nosso comportamento e moralistas nas nossas
atitudes. Quando vou à Índia, por exemplo, dizem-me que não posso falar sobre estas
coisas, que é um lugar conservador. Mas ligo a televisão e aparece a MTV, e é só sexo.
Portanto, o problema é que, mesmo que as pessoas tenham vários parceiros sexuais,
há sempre uma vergonha associada a isso. Isso não vai desaparecer, e há cada vez
mais uma tendência internacional contra a educação sexual nas escolas.
Estou tão feliz por ouvir que esses anúncios chegaram a Portugal. Porque, há uns
anos, trabalhávamos com uma agência externa e eles faziam coisas muito chatas.
Então, pensei: por que é que não avançamos com a nossa própria agência de
publicidade? Assim, criámos esse departamento dentro da AHF. Por isso, quando
ouço que os nossos trabalhos estão a ser seguidos em todo o mundo, fico
emocionado.
Um dos anúncios mais polémicos da AHF associa a raça Dachshund a um órgão sexual
E têm tido impacto?
"Vamos apanhá-los todos". Campanha da AHF utiliza a imagem associada à marca Pokémon para chamar a atenção para as
doenças sexualmente transmissíveis
Mas não teme que às vezes tenha o efeito oposto, contribuindo para a
estigmatização dos doentes com VIH?
Quero dizer... deixe-me colocar desta forma. É possível? Sim. Mas será que mantê-lo
no armário vai melhorar a situação? Não. Então, há uma fase intermédia onde temos
de acostumar as pessoas à ideia de que temos de começar a falar sobre estas coisas.
Mas o estigma está principalmente na mente da pessoa, só podemos ser
estigmatizados na medida em que aceitamos que alguém nos estigmatize. Para
empoderar uma pessoa que vive com VIH, há que lhe dar uma voz. Essa voz era muito
alta e muito forte nos anos 80 e 90, e isso desapareceu.
Nos anos 80 e 90, nos primeiros dias da sida, não existia tratamento e a
esperança média de vida era bastante baixa. A AHF foi fundada nessa altura.
Existiu alguma história em particular que o tenha levado, a si e ao Chris
Brownlie, co-criador da AHF que morreu de sida aos 39 anos, ao ativismo?
A verdade é que as pessoas estavam a morrer nos corredores dos hospitais de Los
Angeles. E eu estava a canalizar a minha raiva, a minha dor para o ativismo. Para que,
pelo menos, conseguíssemos cuidar das pessoas nos últimos meses de suas vidas.
Eu senti que a sida naquela época era como um terrorista. Não sabíamos quando e
quem ia atacar. E estávamos nessa mentalidade de guerra. Mas Chris Brownlie, que
era uma pessoa que vivia com sida, e a sua história, informou-nos sobre as lutas pelas
quais as pessoas que vivem com HIV passam.
A AHF começou como um hospício em Los Angeles que teve o nome do Chris
(Brownlie), que acabou por lá ser internado. Há um caso que me marcou, de facto.
Uma pessoa que veio ter ao hospício e disse que não queria lá ter ido, mas que era a
sua única opção. Disse que queria continuar a lutar, mas um dia, enquanto estávamos
a tomar o pequeno-almoço, levantou-se da sua cadeira, dirigiu-se para o quarto,
cruzou os braços sobre o peito e morreu.
Chris Brownlie, por outro lado, mesmo quando não estava consciente, o corpo dele
estava a lutar. Por isso, nunca sabemos como as pessoas vão ser no final. Mas o
engraçado é que as pessoas normalmente me dizem «bem, deve ser tão deprimente
trabalhar num hospício», mas eu sempre achei muito encorajador, porque há uma paz
associada a estar com as pessoas nos seus últimos dias. Era um lugar de amor, não
um lugar de tristeza e morte.
Uma das lutas mais controversas da AHF foi pela obrigação dos atores
pornográficos utilizarem preservativos durante as gravações. Em Los Angeles,
o primeiro projeto de lei patrocinado pela AHF foi precisamente sobre este
assunto, em 2012. Esse primeiro projeto passou numa dimensão local com
uma votação favorável, mas um projeto de lei semelhante em 2016 foi
chumbado a nível estatal. Porquê?
A analogia que fizemos foi que numa zona de obras, todos são obrigados a usar um
capacete. Quando alguém está a lavar janelas tem de usar um arnês. Neste caso, se é
um ator de um filme porno tem de usar um preservativo. Para além disso, há muitos
profissionais da pornografia que foram infetados com o VIH. Mas há outro fator: os
jovens hoje em dia recebem a sua educação sexual através da pornografia. Não
importa aquilo que os pais pensam, essa é a realidade. E o que eles estão a aprender
é que é sexy ter relações sexuais sem proteção.
Mesmo no início, antes de sequer existir a AHF, existia uma iniciativa nas urnas da
Califórnia para colocar em quarentena as pessoas seropositivas e, para nos opormos,
o nosso slogan era proteger a saúde pública. O objetivo era olhar para o VIH através
das lentes da saúde pública . Assim, expandimos a nossa missão e desenvolvemos
mais programas, e essa filosofia básica é o cerne do que estamos a fazer. Mas as
pessoas que estão envolvidas no trabalho de campo contra a sida veem as coisas de
uma maneira diferente da nossa.
De que maneira?
Sim. Eu dizia muito às pessoas isto: tem de ser muito paranóico para, vestindo calças,
querer usar cinto e suspensórios. Ninguém que está a tomar aquele comprimido vai
usar preservativo. É o que está a acontecer.
Não nos prejudicou. É aquela velha história de toda a publicidade ser boa publicidade.
A questão dos preservativos na pornografia são um exemplo perfeito disso. Por
exemplo, tivemos uma manifestação na China para fazer com que o país contribuísse
com mais dinheiro para o fundo global. Tínhamos 100 pessoas no protesto, mas só os
jornais locais apareceram. Já em tudo aquilo que fizemos sobre pornografia todas as
câmaras estavam lá. Olhe, depois de termos perdido a eleição a nível estatal, eu disse
que tínhamos sido bem sucedidos. Porquê? Porque recebemos milhões de dólares
em publicidade gratuita.
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